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Luta na Frente Oriental Os poloneses, ante a passividade russa, lutam pela liberdade O Levante de Varsóvia Durante os primeiros momentos da guerra no leste, ao se desencadear o choque entre a Alemanha e a União Soviética, os exércitos russos em retirada deixaram para trás um grande número de combatentes cercados pelos exércitos alemães. Muitos desses homens foram mortos ou aprisionados; outros, porém, conseguiram romper o cerco e se internar nos bosques, tanto do território russo como polonês. Mais tarde, quando as soviéticos começaram a se recuperar dos primeiros golpes, os comandos começaram a organizar os milhares de ex-combatentes do exército vermelho que ficaram na retaguarda das linhas alemães. Assim nasceram as guerrilhas russas. No outono de 1941, os soviéticos lançaram, de pára-quedas, no coração do território dominado pela Alemanha, tanto russo como polonês, numerosos agentes especializados em guerrilhas, com a missão de dirigir os bandos de irregulares. Estes homens, cumprindo o seu objetivo, organizaram e adestraram na luta guerrilheira uma grande quantidade de antigos soldados russos. A população polonesa, que nos primeiros instantes via naqueles homens os seus aliados na luta contra os alemães, logo compreendeu que, na realidade, se encontrava em presença de combatentes que desenvolviam a sua ação como soldados em um país ocupado. A Polônia era, na realidade, uma nação ocupada por soldados alemães e guerrilheiros russos. Estes últimos, em sua luta pela subsistência, não vacilavam em confiscar todo o tipo de abastecimento. A atitude deles contrastava com a dos guerrilheiros poloneses pertencentes ao Movimento Secreto, que obedecia às autoridades do governo polonês com sede em Londres. Estes, dentro das suas possibilidades, evitavam aumentar ainda mais os sofrimentos da população civil e adquiriam os alimentos pagando-os com dinheiro sonante ou bônus de racionamento. Por outro lado, ao executar atos de sabotagem evitavam, dentro do humanamente possível, efetuá-los nas proximidades de povoados que poderiam, depois, sofrer represálias. Os grupos de guerrilheiros russos ligavam muito pouco para esse fato, e provocavam, com seus atos, graves conseqüências para as populações civis da nação polonesa. Os dirigentes poloneses, estudando minuciosamente os aspectos oferecidos pela atuação dos russos em seu território, comprovaram que, enquanto em território russo a atividade dos guerrilheiros soviéticos tinha um caráter puramente militar, na Polônia tal atividade parecia ter mais relação com as atividades políticas do que com a guerra em si.

Segunda Guerra Mundial(O Levante de Varsovia)

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Luta na Frente Oriental Os poloneses, ante a passividade russa, lutam pela liberdade

O Levante de Varsóvia  Durante os primeiros momentos da guerra no leste, ao se desencadear o choque entre a Alemanha e a União Soviética, os exércitos russos em retirada deixaram para trás um grande número de combatentes cercados pelos exércitos alemães. Muitos desses homens foram mortos ou aprisionados; outros, porém, conseguiram romper o cerco e se internar nos bosques, tanto do território russo como polonês. Mais tarde, quando as soviéticos começaram a se recuperar dos primeiros golpes, os comandos começaram a organizar os milhares de ex-combatentes do exército vermelho que ficaram na retaguarda das linhas alemães. Assim nasceram as guerrilhas russas. No outono de 1941, os soviéticos lançaram, de pára-quedas, no coração do território dominado pela Alemanha, tanto russo como polonês, numerosos agentes especializados em guerrilhas, com a missão de dirigir os bandos de irregulares. Estes homens, cumprindo o seu objetivo, organizaram e adestraram na luta guerrilheira uma grande quantidade de antigos soldados russos. A população polonesa, que nos primeiros instantes via naqueles homens os seus aliados na luta contra os alemães, logo compreendeu que, na realidade, se encontrava em presença de combatentes que desenvolviam a sua ação como soldados em um país ocupado. A Polônia era, na realidade, uma nação ocupada por soldados alemães e guerrilheiros russos. Estes últimos, em sua luta pela subsistência, não vacilavam em confiscar todo o tipo de abastecimento. A atitude deles contrastava com a dos guerrilheiros poloneses pertencentes ao Movimento Secreto, que obedecia às autoridades do governo polonês com sede em Londres. Estes, dentro das suas possibilidades, evitavam aumentar ainda mais os sofrimentos da população civil e adquiriam os alimentos pagando-os com dinheiro sonante ou bônus de racionamento. Por outro lado, ao executar atos de sabotagem evitavam, dentro do humanamente possível, efetuá-los nas proximidades de povoados que poderiam, depois, sofrer represálias. Os grupos de guerrilheiros russos ligavam muito pouco para esse fato, e provocavam, com seus atos, graves conseqüências para as populações civis da nação polonesa. Os dirigentes poloneses, estudando minuciosamente os aspectos oferecidos pela atuação dos russos em seu território, comprovaram que, enquanto em território russo a atividade dos guerrilheiros soviéticos tinha um caráter puramente militar, na Polônia tal atividade parecia ter mais relação com as atividades políticas do que com a guerra em si. Aliás, as unidades de guerrilheiros russos estavam sob as ordens de um oficial do exército e, também, de um político, chamado Politruk, que representava o Partido Comunista. As grandes unidades achavam-se equipadas com pequenas máquinas de impressão e desenvolviam uma intensa campanha de propaganda entre a população civil, com o ajuda de volantes, efetuando também reuniões políticas. Além disso, os autoridades do Movimento Secreto comprovaram que os russos pressionavam os jovens poloneses, obrigando-os a alistar-se nos seus grupos de guerrilheiros. Ante a gravidade da situação, foi decidido pôr os cartas na mesa. Então, buscou-se contato com os chefes dos grupos guerrilheiros russos, e foi quando surgiu o primeiro impasse. Tais autoridades, em forma de comando central, não existiam na Polônia. Era imprescindível chegar até a instância máxima, isto é, Moscou. E, com tal propósito, em novembro de 1942, o embaixador polonês em Londres, senhor Raczynski, entregou uma nota ao embaixador soviético, Bogomolov. O contato, porém, não trouxe nenhum resultado positivo. A nota nunca foi respondida. Por coincidência, a propaganda comunista na Polônia começou a fazer circular, cada vez com maior intensidade, versões hostis ao Movimento Secreto e ao governo polonês sediado em Londres. Nessas circunstâncias, os comunistas poloneses, já organizados pelos emissários soviéticos, condicionaram a sua colaboração com o Movimento Secreto: 1°) Repúdio à Constituição de 1935 e, 2°) Começo imediato de uma guerra total contra a Alemanha. Ora, o governo polonês estabelecido em Londres devia sua legalidade à citada Constituição de 1935. Portanto, concretamente, os russos exigiam que os combatentes poloneses não reconhecessem o governo sediado em Londres...

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 As verdadeiras intenções dos comunistas poloneses e de seus chefes russos começavam a vir à tona. Suas conseqüências iriam se fazer sentir mais tarde. Os dirigentes poloneses, imediatamente, exigiram dos grupos comunistas uma prova concreta que demonstrasse sua independência das autoridades soviéticas. Esse pedido foi recusado sem nenhuma explicação. Os poloneses, enquanto isso, apesar da manifesta hostilidade dos russos, tratavam por todos os meios de conseguir um acordo que possibilitasse a luta contra o inimigo comum. Foi com esse fim que, durante a noite de 26 para 27 de fevereiro de 1943, o embaixador polonês na Rússia, Romer, manteve uma conferência com o Marechal Stalin, no Kremlin, que se alongou por mais de três horas. No decorrer do mesma, o Embaixador Romer informou Stalin acerca das atividades dos homens do Movimento Secreto e salientou que a organização estava pronta para iniciar uma vasta campanha de ações contra os alemães, a partir de 1o de março. Era necessário, esclareceu, coordenar a ação dos poloneses com os exércitos russos e efetivar um estreito contato entre as duas forças, para assegurar o êxito da operação e impedir uma verdadeira matança de combatentes poloneses, se estes ficassem entregues ò sua própria sorte. Stalin, sem dar ao embaixador polonês respostas concretas, esquivou-se de uma definição. Enquanto isso, ao mesmo tempo que o ditador russo negava aos poloneses a colaboração necessária, as organizações russas de propagando incitava-os à luta contra o invasor, instigando-os a que atacassem os alemães "com as armas... com a primeira coisa que lhes caísse nas mãos... uma foice, uma faca, um machado..." A disparidade de atitudes entre um Stalin, que se negava o colaborar, e uma organização de propaganda, que exigia ação, obrigava os poloneses a encarar a situação em termos realistas: uma ação como a que a propaganda russa pedia seria respondida pelos alemães com um ataque maciço, com um verdadeiro banho de sangue; enquanto isso, os soviéticos, de acordo com os reticências de Stalin, seriam simples espectadores, não colaborando. E qual seria a conseqüência? Apenas a lógica: o extermínio da parte ativa dá população polonesa, a inevitável matança dos seus homens jovens, dos seus soldados patriotas, dos seus oficiais insubornáveis; a inevitável matança daqueles que, no futuro, poderiam opor-se à dominação russa. Os dirigentes poloneses compreenderam o verdadeiro alcance da posição soviética. Porém, antes que sua atitude pudesse ajustar-se à realidade, os acontecimentos se precipitaram e, dois meses mais tarde, a 25 de abril de 1943, o governo soviético rompeu relações com o governo polonês. Ocorrera o já conhecido episódio de Katyn.   Assassinato em massa Os antecedentes do fato remontam ao mês de setembro de 1939. Nessa ocasião, cerca de 250.000 homens do exército polonês que recuavam diante do avanço dos contingentes alemães, encontraram-se na zona dominada pelos russos, que os aprisionaram. De imediato, foram transportados a três grandes campos de prisioneiros de guerra em Kosielsk (província de Smolensk), Starobielsk (Ucrânia) e Ostashkov (a noroeste de Moscou). As cartas enviadas a esses milhares de homens chegaram às suas mãos, sem problemas, até o mês de abril de 1940. A partir dessa data, a correspondência era devolvida com um carimbo: "Voltar ao remetente; endereço desconhecido". Em Londres, entretanto, o governo polonês no exílio teve conhecimento de que mais de 8.000 oficiais haviam sido aprisionados pelos russos. A busca, minucioso, não deu nenhum resultado. Os oito mil homens desapareceram. Em princípios de abril de 1943, o chefe do Serviço de Propaganda no distrito de Varsóvia, dependente do exército alemão, reuniu um numeroso grupo de poloneses conceituados e lhes anunciou a descoberta de enormes tumbas coletivas nas proximidades de Smolensk. Ali se encontravam, segundo declarou, as vítimas do terrorismo soviético. 

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A informação oriunda dos alemães dizia que, em outubro de 1942, quando um grupo de trabalhadores poloneses realizava obras em uma estrada, nos arredores de Katyn, os habitantes da localidade os informaram acerca da existência, nas vizinhanças, de tumbas de poloneses executados pelos agentes da NKVD (Polícia Secreta Russa), na primavera de 1940. Os trabalhadores, então, ergueram no local duas cruzes de madeira que chamaram a atenção dos oficiais dos Corpos de Inteligência alemães. Estes, em fevereiro de 1943, abriram as tumbas, comprovando que, de fato, jaziam ali inúmeros cadáveres. Após examinarem os arredores, verificaram que existiam ainda outras tumbas coletivas, Semelhantes à primeira. Nas tumbas, em estado de decomposição, porém com seus uniformes e insígnias perfeitamente identificáveis, encontravam-se os corpos de uma grande quantidade de oficiais poloneses, entre os quais muitos foram reconhecidos, como no caso dos Generais Smorawinski e Bohatyrowics. No dia 14 de abril, o General Rowecki enviou a Londres o seguinte radiogroma: "Os alemães encontraram os tumbas de milhares de oficiais poloneses do campo de Kozielsk. Vários poloneses de Varsóvia, Crocóvia e Lublin foram especialmente levados ao local para inspecionar as tumbas. Seus informes não deixam lugar a dúvidas quanto à ocorrência de um assassinato em massa". No dia 17 de abril, o governo polonês em Londres emitiu uma comunicação que, entre outras coisas, dizia: "... já nos acostumamos às mentiras da propaganda alemã... porém, em vista da abundante e detalhada informação com relação à descoberta dos corpos de milhares de oficiais poloneses... torna-se necessária uma investigação nessas tumbas... por um competente Corpo de caráter internacional, como a Cruz Vermelha...". Os russos, diante da atitude polonesa, reagiram violentamente, negando o seu consentimento para a citada comprovação. Em seguida, anunciaram que romperiam suas relações com o governo polonês no dia 25 de abril. Implacavelmente, o Soviete cumpria os seus planos. Enquanto isso, um emissário enviado ao local da descoberta pelo General Bor Komorowski, informou a este que, ao todo, em sete das imensas tumbas já abertas, os corpos chegavam a 4.000. O emissário, além disso, trazia consigo balas, cartuchos e cordas utilizadas pelos executores do crime coletivo. As balas, como declararam os russos, eram de fabricação alemã e tinham a marca comercial de Geco (marca usada pela Companhia Gustav Genschow de Durlach, nas proximidades de Karlsruhe, em Baden). Os alemães, porém, longe de negar o fato, o publicaram em seus informes, esclarecendo (como se pôde comprovar) que munições dessa marca haviam sido enviadas à Polônia e à Rússia antes da guerra, em grandes quantidades. Vários "Diários" e "Memórias" chegaram, igualmente, às mãos do general polonês Komorowski. Um deles, assinado pelo professor Pienkowski, datava sua última nota de 9 de abril. Outro, do próprio punho do doutor Dobieslaw Jakubowicz, concluía, no dia 22 de abril de 1940, com a seguinte anotação: "O trem saiu à 1h:30m. Ao meio-dia chegamos a Smolensk". Os demais terminavam, sem exceção no dia da saída de Kozielsk ou no da chegada a Gnezdovaya, nas cercanias de Katyn. O do Major Adam Solski terminava assim: "Abril 9. Saída em carros fechados divididos em celas (terrível). Nos conduzem a algum lugar, pela montanha. Fazem uma minuciosa inspeção nas nossas coisas. Ficaram com meu relógio, que marcava 6h:30m, pediram-me o anel, rublos, cinturão e canivete". Da lista de nomes dos oficiais poloneses assassinados pelos soviéticos em Katyn, podia-se chegar à conclusão de que todos haviam saído de um mesmo campo: Kozielsk. O plano soviético O verdadeiro objetivo da suposta indignação dos russos só pôde ser percebido quando Moscou rompeu relações diplomáticas com a Polônia. A partir do momento do rompimento, os russos aceleraram a criação de forças militares polonesas fiéis a Moscou e núcleos civis em condições de constituir as autoridades de um Estado, instrumento incondicional, naturalmente, da União Soviética. Por outro lado, todos os esforços das organizações comunistas foram encaminhados no sentido de desacreditar os méritos das organizações de patriotas poloneses que respeitavam o governo sediado em Londres, e até mesmo de atribuir a si os triunfos militares conquistados por aquelas. A finalidade evidente de todo aquele aparato política-militar consistia em diminuir a importância das autoridades patriotas polonesas e aumentar, proporcionalmente, a dos adeptos incondicionais dos russos.

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 A conclusão prática dessas manobras foi a absoluta e terminante negativa das autoridades soviéticas de colaborar com os patriotas poloneses leais ao governo sediado em Londres. Além disso, como complemento imprescindível para a consecução dos objetivos russos, estes apoiavam a organização de um exército comunista e de um governo de idêntica orientação. Era evidente que convinha à política russa que o governo polonês de Londres se convertesse num inimigo e deixasse de ser um aliado. Assim, a entrada dos russos na Polônia seria a de um exército que "ocupa um país inimigo e instala suas próprias autoridades" e não a de um exército que chega a um país aliado com governo próprio... ". O Exército da Pátria Em julho de 1943, o governo polonês de Londres irradiou uma mensagem para Varsóvia, dirigida aos grupos da resistência, informando que o General Bor Komorowski acabava de ser nomeado comandante do Exército da Pátria, a maior organização polonesa de resistência. Nessa data, o total de homens que, de uma ou de outra maneira, tomavam parte nesse exército ascendia a 300.000. Os membros do Exército Secreto propriamente dito estavam divididos em três categorias. A primeira reunia a maioria dos combatentes e era formada por aqueles homens que viviam uma vida dupla: na vida comum, trabalhavam em escritórios e oficinas, mantendo-se, ao mesmo tempo, em contato com superiores que lhes indicavam as missões a cumprir. A segunda categoria compreendia os homens aos quais se podia dar o nome de conspiradores profissionais; isto é, tratava-se de combatentes que dedicavam todos os seus esforços à ação da guerra. O terceiro grupo, afinal, era formado pelos homens que viviam nos bosques, usando uniforme e lutando permanentemente contra os alemães. O General Bor Komorowski descreve a organização do Exército da Pátria, da seguinte maneira: "A organização provincial do Exército da Pátria era baseada no sistema de administração civil anterior à guerra, isto é, na divisão de setores e cantões. "Em nossos termos, um "distrito" compreendia uma extensão igual à de um setor anterior à guerra e à área de um cantão."Os comandantes de província estavam diretamente subordinados ao Comandante do Exército da Pátria; uma província compreendia de dois a três distritos e se formava somente quando fosse aconselhável unir vários distritos sob um comando especial... Um comandante de distrito e seu Estado-Maior eram diretamente responsáveis por todos os assuntos relacionados com a organização do seu distrito."Um inspetor regional era o contato indireto de ligação tática entre um comandante de distrito e os comandantes de duas ou três áreas."Um comandante de área e seu Estado-Maior eram responsáveis por todos os assuntos de organização no território ou área sob suas ordens."Os comandantes de postos de vanguarda ficavam à frente de esquadras (pelotões) organizadas no local."Um pelotão era a unidade básica de tática e organização. A força de um pelotão era geralmente de cinqüenta homens...". A ação se precipita Em fins de junho de 1944 o exército vermelho se lançou à ofensiva em todas as frentes do Leste. Em julho, a situação dos alemães começava a se tornar crítica. Nessas circunstâncias, o General Bor Komorowski enviou o seguinte informe, ao Comandante-Chefe:" 14-7-1944"Embora as relações diplomáticas com a Rússia não tenham sido restabelecidos, o Exército do Pátria não pode permanecer ocioso diante da retirada alemã e do avanço soviético, nem no caso de um desbaratamento interno das forças alemães e da ameaça de ocupação soviética. O Exército da Pátria deve travar a batalha final contra os alemães, seja em operações do tipo Burza (plano de sabotagem) seja pela insurreição, ou ainda, nas duas formas ao mesmo tempo. Se acaso ocorresse a desintegração alemã nos territórios do leste da Polônia, levantaríamos a insurreição nos restantes. "Nossa orientação final será:a) Mostrar ao mundo nossa intrépida atitude contra os alemães e nossa vontade de combate-lo até o fim.b) Privar os russos dos seus argumentos de propaganda malévola que visam colocar-nos numa categoria de aliados silenciosos diante dos alemães ou na categoria de neutros.

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c) Tomar sob nossos auspícios aquela parte da comunidade que não pertence ao Exército da Pátria, mas que, contudo, deseja compensar seus erros nas mãos dos alemães, com o fim de uni-la numa ação mútua tendente à independência, não permitindo que caia sob a influência soviética."A inatividade por parte do Exército da Pátria no momento da entrada dos russos não tem possibilidade de refletir um estado geral de passividade na frente polonesa. A iniciativa de combater os alemães passaria então para o PTP (comunista) e uma parte dos cidadãos mal informados pode unir-se a eles. Nesse caso, o país ficará sujeito a colaborar com os russos e ninguém terá condições de evita-lo. Também nesse caso, os russos não seriam recebidos pelo Exército da Pátria, fiel ao governo e ao Comandante-Chefe, mas sim pelos seus próprios elementos, prontos para servi-los, de armas na mão. Então não sobraria nenhum obstáculo para se opor a uma proclamação apócrifa no sentido de que a nação desejaria converter-se na 17a república russa."O Exército da Pátria expressa o desejo da nação de ganhar a sua independência. Isso forçaria a Rússia a ter que nos dominar pela força e entorpeceria seu trabalho de minar interiormente nossa organização. "Estou de acordo que descobrir o jogo implica num grave perigo: o de extermínio dos nossos melhores elementos. Contudo, não daremos aos russos a oportunidade de operar em segredo e terão que recorrer a atos de violência também declarados...". Em meados de julho, o Comando do Exército da Pátria decidiu preparar a captura de Varsóvia antes que os russos penetrassem nela. O ataque devia ser feito de dentro para fora, pelas unidades estacionadas na capital. A 22 de julho, o comando polonês em Varsóvia captou transmissões alemães que demonstravam claramente a amplitude da derrota das suas forças na frente de batalha. Foi nessas circunstâncias que os poloneses se inteiraram da travessia do Vístula pelos contingentes russos. Decididos a empunhar armas e lutar, os poloneses fizeram um levantamento de suas forças e de sua capacidade de organização. Nesse momento, as unidades combatentes em Varsóvia possuíam uns 40.000 homens armados e treinados, aos quais se uniam umas 4.000 mulheres. Depois de muitas experiências, o comando conseguiu fazer chegar uma ordem até a menor e mais distanciada unidade em um lapso de duas horas. Era necessário, também, organizar minuciosamente os contatos entre os diferentes grupos e unidades, o envio de ordens e informes, a divulgação de contra-senhas, a distribuição de armas e munições e a sistematização de todos os tipos de movimentos, avanços e retiradas. Era, em resumo, uma tarefa ciclópica a que se apresentava ante os patriotas poloneses que queriam salvar o seu país das duas escravidões que o ameaçavam: a alemã e a soviética. Nessa mesma data, os russos deram ampla publicidade à formação do chamado Comitê de Libertação Nacional. Em sua imensa maioria, os integrantes do mesmo eram membros da União de Patriotas Poloneses de Moscou e membros do antigo Partido Comunista Polonês. Em sua proclamação, os russos declaravam que a administração de todo o território polonês seria colocado nas mãos desse Comitê. Como bem disse o General Bor Komorowski, "não havia dúvida que se pretendia a formação de um governo completamente dependente da Rússia". A 25 de julho, a população de Varsóvia começou a ouvir o ribombar distante da artilharia russa, cada vez se aproximando mais. Os bombardeiros soviéticos, por sua vez, atacaram durante várias noites seguidas os objetivos militares da capital da Polônia. A 28 do mesmo mês, comunicados que apareceram nas ruas de Varsóvia determinavam, por ordem do comando alemão, que 100.000 homens se concentrassem no dia seguinte nas praças públicas, com o fim de serem distribuídos na construção de obras de defesa. O Comando Supremo do Exército da Pátria, de imediato, ordenou que tais concentrações não fossem efetuadas. A 29 de julho chegou a Varsóvia a informação dos acontecimentos que se sucediam em Londres. Ali, o ministro polonês Mikolajczyk acabara de realizar árduos esforços para reatar as relações com a Rússia. O embaixador soviético, contudo, havia imposto condições inaceitáveis. Os russos pretendiam que o governo repudiasse a Constituição sobre a qual se assentava sua legalidade; além disso, mantinham exigências territoriais e solicitavam uma declaração que admitisse publicamente que seu apelo à Cruz Vermelha Internacional na questão de Katyn era uma insinuação caluniosa para o Soviete. No próprio dia 29 apareceram sobre os muros de Varsóvia proclamas de uma organização militar secreta comunista (PAL). O manifesto, assinado por "Czarny", líder político da organização, e por Skokowski, seu chefe militar, afirmava, falsamente, que o General Komorowski havia fugido da cidade. "Czarny" fazia um apelo à população civil para combater os alemães sob suas ordens. No dia 30 de julho, as rádios de Varsóvia

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captaram uma proclamação em idioma polonês, emitida por Moscou. Esse texto já havia sido irradiado no dia anterior, 29, às 20h:15m. Dizia o seguinte: "Sem dúvida alguma, Varsóvia já escuta o fragor do combate que, dentro em breve, virá libertá-la. Aqueles que nunca abaixaram a cabeça diante do poder de Hitler, voltarão, como em 1939, a unir seus esforços contra os alemães, desta vez para a ação decisiva. O Exército Polonês, que agora entra em território da Polônia, treinado na URSS, une-se neste momento ao Exército do Povo para formar os Corpos dos Forças Armadas Polonesas, o núcleo armado de nossa nação na luta pela sua independência. Seus diversos postos serão preenchidos amanhã pelos filhos de Varsóvia. Eles perseguirão, junto com os exércitos aliados, o inimigo em sua fuga rumo ao oeste... e assestarão um golpe mortal no último baluarte do imperialismo prussiano. Para Varsóvia, que não se deu por vencida, mas continuou de pé, em luta, a hora da ação já soou. Com toda certeza os alemães tentarão defender em Varsóvia e aumentarão a destruição e o número de vítimas. Nossas casas e parques, nossas pontes e estações de estrada de ferro, nossas fábricas e nossos edifícios públicos serão convertidos em posições de defesa. A cidade ficará exposta à ruína e seus habitantes à morte. Tratarão de conservar as posições mais seguras e converter em pó todas as que forem obrigados a abandonar. Por isso, é cem vezes mais necessário que nunca recordar que... tudo o que não for salvo mediante um esforço ativo, se perderá, tudo o que não for salvo por uma luta direta e efetiva nas ruas de Varsóvia, em suas casas, em suas fábricas e lojas... com esse esforço, não somente chegará mais rápido o momento da libertação final, mas também será salva a propriedade nacional e as vidas de nossos irmãos". Outro manifesto soviético, assinado por Molotov e Osobka-Morawski, nomeado chefe do Comitê de Libertação Nacional, foi repetidamente irradiado. Seu texto dizia: "Poloneses, chegou a hora da libertação... Às armas, poloneses... Cada lar polonês deve converter-se em uma frente de luta contra o invasor... Não há um momento a perder!" Essas duas proclamações foram irradiados numerosas vezes e também lançadas, como volantes, pelos aviões soviéticos que sobrevoavam a cidade. "Que principie!..." A 30 de julho, em Radoso, a quase 20 km de Varsóvia, um oficial dos Serviços de Inteligência do Exército da Pátria localizou uma coluna de tanques russos em missão de patrulha. Os postos de observação poloneses, além disso, informavam, minuto a minuto, sobre a penetração soviética e a iminência de uma ação decisiva. Algumas patrulhas russas, audaciosamente, já haviam penetrado nos subúrbios da capital. A 31 de julho, Komorowski decidiu que chegara o momento de lutar. Os russos estavam próximos a lançar-se ao assalto final e os alemães, por seu turno, evacuavam da cidade os civis e elementos auxiliares do seu exército. O Exército da Pátria não podia mais permanecer inativo. Nesse mesmo dia 31, às 17 horas, após discutir rapidamente com seus imediatos a situação imperante na frente, o General Bor Komorowski, dirigindo-se aos seus interlocutores, disse, com voz firme: "Muito bem, então, que principie a luta". Depois, olhando o Comandante do Distrito de Varsóvia, ordenou: "Amanhã, às dezessete horas exatamente, o senhor iniciará as operações em Varsóvia". Chegara o momento. A mais audaciosa operação de um exército clandestino acabava de ser posta em movimento. A sorte estava lançada. O destino decidiria. Nessa mesma noite, milhares de ordens correram por toda Varsóvia. Centenas de mensageiros atravessaram em todas as direções as ruas silenciosas, levando as diretivas da rebelião. A hora do levante, fixada para as cinco da tarde, tinha um sentido: até aquele dia, todos os movimentos haviam sido iniciados ao amanhecer ou entardecer. Desencadear a ofensiva em meio à tarde, tomaria os alemães de surpresa, que não a esperariam numa hora daquelas. Além disso, as ruas de Varsóvia, cheias de trabalhadores e empregados que, a essa hora, regressariam dos seus trabalhos, facilitaria o ocultamento dos grupos de combatentes clandestinos. O Comandante-Chefe do movimento, General Bor Komorowski, leal ao legítimo governo polonês com sede em Londres, assim descreve aqueles instantes que antecediam a revolta: "No dia seguinte me reuni novamente com meu Estado-Maior para dar instruções e ordens finais. Esta era a nossa última reunião secreta. No caminho passei por ruas que estavam cheias de milhares de jovens de ambos os sexos que, a toda

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pressa, se dirigiam para os seus postos. Quase todos carregavam maletas ou pastas; alguns levavam embrulhos volumosos. Tudo isso me causou uma grande ansiedade, pois comecei a temer que nossas atividades pudessem ser descobertos. De quando em quando havia patrulhas alemães, enquanto que carros blindados passavam, sem cessar, pelas ruas. Durante a manhã caíra uma chuva fininha. O insistente fragor da batalha chegava aos nossos ouvidos, vindo do Vístula. Toda essa noite e o dia seguinte escutou-se a nota ensurdecedora das explosões; eram os alemães que dinamitavam o equipamento ferroviário perto de Praga (bairro de Varsóvia). Deixei o Estado-Maior às 14 horas. Um dos meus homens ajustou as pistolas que sempre havíamos escondido em um estojo de gramofone. Depois as levou á fábrica Kammler, no subúrbio de Wola, onde estabeleceria o Quartel-General durante o levante. Os edifícios da fábrica deveriam ser ocupados pelos meus colaboradores mais imediatos. Também ali devia ser instalada a estação de rádio para a transmissão e recepção de comunicações da cidade, do país e do mundo. O resto do Estado-Maior ocuparia locais nas ruas adjacentes. A hora de reunião para o Estado-Maior foi fixada entre três e quatro da tarde". Começa a batalha Eram cinco horas da tarde quando a cidade pareceu estremecer. Os sons habituais foram cobertos pelo ruído característico de milhares de janelas que se abriram simultaneamente. Em seguida, após um segundo interminável em que um estranho silêncio cobriu tudo, estourou uma descarga de fuzilaria que envolveu a cidade como uma onda gigantesca. Dois segundos mais tarde, dezenas, centenas, milhares de armas automáticos, disparavam furiosamente contra as ruas, contra os caminhões alemães, contra as colunas blindadas e os edifícios ocupados pelos alemães. Começara a rebelião. Varsóvia iniciava sua longa agonia. O comando da insurreição, a cuja frente se encontrava o General Komorowski, foi instalado na fábrica Kammler, situada no setor oeste de Varsóvia. Nas proximidades, a poucos metros, se achava uma grande fábrica pertencente a um monopólio de fumo. Nela, os alemães haviam instalado uma forte guarnição. As ruas adjacentes, como era habitual nos redutos alemães, estavam semeadas de ninhos de metralhadoras. A posição do comando revolucionário, portanto, era muito perigosa. De acordo com os planos estabelecidos, às dezessete horas, o setor devia ser ocupado pelo Batalhão Kedyw, uma das unidades do Exército da Pátria que mais se destacara na luta clandestina. A missão do batalhão era desalojar os alemães das posições que ocupavam na fábrica anteriormente citada, e limpar a zona de possíveis atacantes. Quando o General Komorowski chegou ao comando, após a verificação de sua identidade, a entrada lhe foi franqueada. De imediato, apresentou-se diante dele o Tenente Kammler, proprietário da fábrica, que se encontrava no comando de um grupo de combatentes integrado por operários do estabelecimento. Eram trinta e três homens armados com quinze fuzis, umas quarenta granadas e algumas "filipinkas" (granadas fabricadas pelos revolucionários). A primeira ordem de Komorowski foi determinar que os homens de Kammler não abrissem fogo e tratassem de passar despercebidos até a chegada do Batalhão Kedyw. Em seguida, o chefe revolucionário dirigiu-se ao segundo andar da fábrica, onde já estavam reunidos os membros do Estado-Maior, o delegado do governo e o presidente do Conselho de Unidade Nacional. Enquanto isso, os engenheiros de uma das fábricas vizinhas começaram a instalar o equipamento de rádio. A tensão chegara ao máximo, quando o silêncio da rua foi quebrado pelo ruído de um motor que se aproximava. Era um grande caminhão alemão, que conduzia um grupo de soldados pertencentes à polícia de ferrovias. De súbito, inesperadamente, ouviram-se vários disparos em rápida sucessão. O caminhão alemão instantaneamente freou sua marcha e começou a retroceder. Nesse instante, o Tenente Kammler, de revólver em punho, acompanhado por dois dos seus homens, saiu para a rua. Kammler, sem vacilar, descarregou sua arma sobre o motorista do caminhão, matando-o, enquanto os poloneses que o acompanhavam, disparavam contra os soldados que o caminhão transportava, matando dois. Quase sem solução de continuidade, uma das metralhadoras alemães, que se encontrava numa das esquinas, começou a atirar com cadência máxima. Kammler e seus dois acompanhantes precipitaram-se para dentro da fábrica. Depois de alguns instantes de trégua, um segundo caminhão, carregado de soldados alemães apareceu no fim da rua. Os alemães chegavam armados de metralhadoras e granadas. Os poloneses, que os observavam das janelas da fábrica, compreenderam imediatamente que os alemães estavam desorientados não localizando exatamente a posição dos atacantes. Os soldados do primeiro caminhão, que se haviam refugiado nas casas vizinhas, começaram a fazer sinais desesperados para que seus camaradas se acobertassem. Estes, contudo, sem entender o sentido dos sinais, seguiram em frente, até deter-se, bem em baixo das janelas da fábrica

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Kammler. No mesmo instante, uma "filipinka" descreveu uma parábola no ar e caiu dentro do caminhão. Uma violenta explosão praticamente destroçou o veículo espalhando os corpos ensangüentados de mais de trinta soldados. A alegria dos poloneses sitiados, porém, não duraria muito tempo. Poucos segundos mais tarde, um grito do Tenente Kammler alertou a todos. Pelas ruas adjacentes, avançando lentamente, aproximavam-se da fábrica, grande número de soldados alemães. Komorowski observou nervosamente ambos os lados da rua. O Batalhão Kedyw, que devia defender o setor, ainda não havia chegado e não se viam sinais da sua aproximação. O general polonês sabia que tentar defender a posição por muito tempo seria um suicídio; careciam para isso de homens e armamentos. Os minutos começavam a se escoar. O fogo alemão se intensificava e os poloneses disparavam desesperadamente, esforçando-se por cobrir todos os setores e todas as janelas da fábrica. Minutos mais tarde, quando a situação dos defensores chegava ao ponto crítico, um inesperado ataque distraiu a atenção dos alemães, que tiveram que dividir suas forças para enfrentar um grupo de poloneses que começaram a disparar contra eles. Por volta das seis da tarde, uma hora depois de terem sido iniciadas as ações, um novo alarma se espalhou pela sede do comando. Nessa hora, a sentinela, instalada no telhado do edifício, começou a pedir auxílio desesperadamente. Seis homens se precipitaram escadas acima, chegando a tempo de deter o ataque de um grupo de soldados alemães que haviam alcançado o telhado de uma fábrica vizinha. Às sete, dois homens se apresentaram na fábrica, arrastando-se para escapar ao fogo de alemães e poloneses. Recebidos pelo General Komorowski, declararam que faziam parte de uma patrulha avançada do Batalhão Kedyw que marchava para lá. Meia hora depois, o grosso do batalhão aparecia no fim da rua. Os alemães, apanhados entre dois fogos, passaram à defensiva e começaram a bater em retirada. Trinta minutos mais tarde, às oito da noite, um imenso clamor se elevou de diversos pontos da cidade. No comando, na fábrica Kammler, um dos poloneses de guarda no telhado do edifício, desceu rapidamente ao segundo andar e, apresentando-se ante o General Komorowski, tomado de grande agitação e manifestando irreprimível alegria, lhe pediu que o seguisse novamente ao terraço. Ali, a sentinela que permanecia em seu posto os saudou com a voz embargada de emoção: "A bandeira! A bandeira polonesa!... Nossa bandeira, exatamente no centro da cidade!... " Komorowski e os homens que o acompanhavam dirigiram o olhar para a parte central de Varsóvia. Ali, no topo da torre do mais alto edifício da cidade, no décimo sexto andar, tremulava uma enorme bandeira vermelha e branca. Depois de cinco anos, com os rostos banhados de lágrimas, os poloneses viam as cores da sua bandeira, uma vez mais, pairando sobre a cidade. Já nada podia deter a insurreição. Agora só restava aos combatentes uma alternativa: triunfo ou morte. Poucos segundos se passaram quando em diversos pontos da cidade começaram a aparecer dezenas de bandeiras. Muitas delas não eram mais do que pedaços de pano vermelho e branco. Todas, porém, simbolizavam o espírito indomável polonês. O combate, enquanto isso, se estendera, pouco a pouco, a toda a cidade. Os diferentes destacamentos entravam na luta com todos os seus efetivos, atacando os alemães nas ruas, nos veículos e em suas fortalezas. Os soldados alemães, surpresos por aquele ataque maciço, começaram a devolver o fogo com suas armas portáteis, entrincheirando-se nos umbrais das portas e atrás de seus veículos de patrulha. Lentamente, contudo, a maquinaria repressiva começou a se movimentar. O comando alemão, ante a realidade de um levante em grande escala e compreendendo que atrás daqueles ataques escondia-se um plano perfeitamente delineado ordenou o imediato agrupamento de suas unidades e acionou os dispositivos de alarma preparados de antemão para tais casos. Ordenaram-se, também, às formações blindadas, que aprontassem os tanques e canhões autopropulsados, assim como as unidades especiais de repressão. Poucos minutos depois de iniciada a luta, um matraquear constante ecoava por toda Varsóvia. As metralhadoras disparavam sem cessar enquanto explosões surdas denunciavam o estouro das granadas de mão alemães e das "filipinkas" polonesas. Os combatentes do Exército da Pátria, economizando suas preciosas munições, atiravam metodicamente, enquanto os alemães disparavam sem cessar contra as fachadas das casas e as ruas desertas. Varsóvia pegava em armas. A luta começara. A partir desse instante, só contavam a coragem dos poloneses e a tenaz repressão dos alemães.

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  Anexo Wladylaw SikorskiLutar como regulares até a morte e depois, ante a derrota, reorganizar-se em sótãos e esgotos para continuar o combate como irregulares, foi um dos ônus mais comuns do povo polonês.Durante o Renascimento, a Polônia era, pela sua amplitude geográfica e cultura, uma grande nação, porém a constante voracidade dos alemães e dos russos foi reduzindo-a, pouco a pouco. Talvez por essa razão seus homens combinam a sensibilidade espiritual com a consciência da liberdade mantida com unhas e dentes.Além disso, o polonês é nostálgico, pois uma das suas situações mais comuns é a do exílio.Wladyslaw Sikorski nasceu na Polônia, em 1881. Fortemente motivado pela situação da sua pátria, dividiu sua vida entre duas atividades: a militar e a política. Durante a Primeira Guerra Mundial, colaborou com a organização do Exército Secreto e participou na defesa da cidade de Lemberg.Encerrada a contenda, em 1920, à frente do exército, deteve a ofensiva soviética sobre Varsóvia. No ano seguinte derrotou a cavalaria russa, comandada pelo chefe do Estado-Maior, General Budienny.Em 1922, foi nomeado presidente do Conselho e Ministro da Guerra. O golpe de estado de 1926 obrigou-o a se refugiar na França, onde foi surpreendido pela notícia da invasão da Polônia pela Alemanha, em 1939. A partir desse momento, e como presidente do novo Conselho de Ministros do governo polonês no exílio, combateu as potências do Eixo, primeiro da França, depois de Londres, e finalmente, do Oriente Médio.Faleceu a 4 de junho de 1943, ao espatifar-se o aparelho em que voava do Cairo para a Inglaterra.  Aos que lutam na ruaA primeira mensagem do Comando do Exército da Pátria para os patriotas poloneses que combatiam rias ruas, dizia:"Soldados da Capital!"Emiti hoje a ordem pela qual todos vocês ansiavam, para que se dê início à guerra aberta contra os nossos velhos inimigos, os invasores alemães. Depois de quase cinco anos de luta incessante, levada a cabo em segredo, hoje, abertamente, levantam-se todos vocês, de armas em punho, para devolver a liberdade ao nosso país e para castigar os nazistas criminosos pelo terror e pelos crimes cometidos por eles em solo polonês.""Comandante-Chefe do Exército da Pátria".  A voz da sublevaçãoNo dia imediato ao começo do movimento, o Comandante-Chefe do levante, General Komorowski, enviou ao governo polonês em Londres estas mensagens:"Varsóvia 1o de agosto de 1944"Ao Primeiro-Ministro e Comandante-Chefe:"A data para o início da luta pela libertação de Varsóvia foi fixada por nós, unanimemente: 1o de agosto às 17 horas."A luta, portanto, começou."O Delegado do Governo e o Vice-Primeiro-Ministro do Governo Polonês."O Comandante-Chefe do Exército da Pátria." "Varsóvia 1o de agosto de 1944"Começamos a luta por Varsóvia a 1o de agosto às 17 horas; façam os arranjos necessários para que nos sejam imediatamente lançadas armas e munições nos seguintes lugares (detalhes) e também nas praças indicadas, dentro da cidade..."Como a luta para capturar Varsóvia já começou, pedimos que nos seja dada ajuda soviética, em forma de um ataque imediato, externo."O Delegado do Governo e o Vice-Primeiro-Ministro do Governo Polonês."O Comandante-Chefe do Exército da Pátria."  O manifesto do dia 3 de agosto"Varsóvia 3 de agosto de 1944"Poloneses!"A luta armada pela libertação da capital já começou! A 1o de agosto, o Delegado do Governo, o Vice-Primeiro-Ministro do Governo Polonês e o Presidente do Conselho de Unidade Nacional, de acordo com o Comandante do Exército da Pátria, decidiram recorrer às armas."Três dias de combate contra as forças de ocupação nos proporcionaram grandes vitórias táticas e morais. As forças do Exército da Pátria conquistaram a maior parte da capital, destroçando a resistência inimiga e, ao mesmo tempo, incutiram em cada coração polonês entusiasmo pela luta e fé na vitória."Toda a comunidade polonesa e principalmente o povo de Varsóvia estão-se prontificando generosa e desinteressadamente a prestar sua ajuda aos combatentes. Todos se colocaram sob as ordens e à disposição dos chefes

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do levante, utilizando toda sua capacidade e exibindo uma excelente disciplina moral, assim como um grande devotamento na ação."Tropeçaremos com mais de um obstáculo no caminho para completar a libertação, porém as forças unidas de toda a nação, sob a direção do Governo Polonês de Londres, do Conselho Nacional de Ministros e do Comandante do Exército da Pátria, hão de vencê-los, tão certo como estão quebrando hoje a resistência inimiga nas ruas de Varsóvia. "Todos os trabalhadores, camponeses, operários e os que formam o Serviço de Inteligência, estão pelejando, ombro a ombro, unidos por uma Polônia democrática, uma Polônia de justiça social; uma Polônia do povo!"Que a Polônia independente perdure!"O Delegado do Governo e o Vice-Primeiro-Ministro do Governo Polonês."O Comandante-Chefe do Exército da Pátria."O Presidente do Conselho de Unidade Nacional."  Dois patriotas poloneses"Súditos do governo geral!"Os vitoriosos exércitos alemães acabaram, de uma vez e para sempre, com o Estado Polonês. Fica para trás um episódio da história que deveis esquecer imediatamente; pertence ao passado e nunca voltará."Corriam os dias cinzentos de 1939 e as tropas alemãs e russas incluíam, uma vez mais, a Polônia no rol das suas conquistas. Para os poloneses, porém, o comunicado dava apenas uma nova motivação para continuar lutando pela sua liberdade. Entre os homens que resolveram continuar o combate, ou no exílio, ou nos sótãos das cidades ocupadas, estavam os Generais Anders e Bor Komorowski. Políticos e militares, mas antes de tudo, patriotas, ambos contribuíram para a libertação da pátria e para dar-lhe um honroso lugar na história. Komorowski continuou a luta na Polônia, organizando os grupos de resistência, estabelecendo ligações e, finalmente, colocando-se à frente da epopéia do levante de Varsóvia.Anders comandou o Corpo Polonês e, junto com os exércitos aliados, lutou na Itália, alcançando a sua maior glória na batalha de Monte Cassino. Se as frentes de combate, porém, eram diferentes, o ideal era comum e as angústias muito parecidas. Subjacente a quaisquer situações geográficas ou técnicas bélicas diferentes, estava o amor à Polônia e uma irreprimível sede de liberdade.Porque a Polônia não lutava somente contra o invasor alemão, mas também contra a incompreensão das outras potências aliadas, que encaravam os interesses gerais da contenda antes dos problemas de um país ocupado.Ao finalizar a Segunda Guerra Mundial, todos os esforços e o sangue derramado por estes homens e seus soldados foram retribuídos com tratados secretos, onde os poloneses não tiveram nenhuma participação.Em 1945, e depois de sofrer um prolongado cativeiro, Bor Komorowski escreveu:"Hoje, tudo está contra nós. Os longos anos de luta e fé na vitória de uma causa justa, a perda de tantas vidas, as indescritíveis tragédias suportadas na base da coragem, tudo isso parece ter sido feito em vão. A Alemanha foi derrotada, porém a Polônia não ganhou a liberdade por que pagou tão elevado preço. O Tratado de Ialta destroçou nossas maiores esperanças. Em conseqüência das decisões tomadas pelos governos que firmaram esse pacto, a Europa foi dividida em duas esferas de influência, e Stalin - que, em 1939, ajudou a Alemanha a acender o estopim da Segunda Guerra Mundial - pôde afinal saborear o butim que, de acordo com a cláusula secreta do Tratado Molotov-Ribbentrop, devia ter repartido com Hitler. Desta vez, a mesa foi servida pelas mãos aliadas.As potências ocidentais, em sua febre de paz, deixaram-se levar cegamente, com a esperança de uma cooperação da Rússia Soviética na reconstrução política e econômica do mundo. Esse anseio de cooperação foi acompanhado de uma política de concessões a Stalin, dando como resultado o fato de que o centro e o oriente da Europa passaram para o domínio comunista. A Polônia foi uma das vítimas."  "Muito velho!"Os "Tigres" avançavam uns 300 ou 400 metros fazendo funcionar suas metralhadoras. Depois se detinham e disparavam seus canhões. A técnica era simples, porém o efeito, atroz. A princípio, os poloneses mantinham-se a distância quando os tanques de 40 toneladas se aproximavam. Assim as granadas perdiam a eficácia e os "Tigres" continuavam a avançar. Finalmente, consegui-se convence-los da necessidade de esperar os blindados e disparar contra eles bem de perto. Tampouco essa técnica deu melhores resultados; os impactos eram certeiros mas sem força para deter os veículos. Por fim, pensou-se em lançar pencas de granadas contra as lagartas. Perto do quartel do Coronel Radoslaw obtiveram a primeira vitória: dois "Tigres" foram detidos, um deles com um lado destroçado; o outro não tinha avarias visíveis, mas também não funcionava. As tripulações alemães dos tanques não se opuseram a proporcionar informes completos acerca do mecanismo, porém era tão complicado que ninguém, nem mesmo os próprios alemães conseguiram encontrar o defeito. O tanque, com a lagarta quebrada, foi utilizado como peça de artilharia, já que era impossível consertá-lo. Continuaram tentando fazer andar o segundo sem resultados, até que de um edifício próximo saiu um velho, com roupas de trabalho. O levante talvez o surpreendera ali. - "Senhor" - disse, dirigindo-se ao oficial - "conheço um pouco esse trabalho. Deixe-me dar uma olhada. Até sábado passado estive trabalhando no "Heereskraftfarhpark" (oficina de manutenção de veículos militares). Até agora, somente reparei tanques alemães, porém pode ser que consiga fazer algo com um dos nossos."Não havia ferramentas, a não ser o equipamento do tanque, e as condições de trabalho estavam longe de ser adequadas. Todo o conserto teria que ser feito debaixo do fogo inimigo. As balas choviam e os tanques alemães provavelmente contra-atacariam para recuperar as unidades perdidas. O oficial hesitou, porém, afinal, resolveu aceitar.

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Uma hora mais tarde uma bandeirola polonesa tremulava sobre o tanque inimigo. A tripulação estava carregando as munições. Pouco depois os motores começaram a funcionar. O mecânico voluntário, com as mãos cheias de graxa, limpou o suor do rosto e disse: - "Senhor, há dois dias que venho pedindo para que me deixem combater, porém todos recusam porque sou velho. E agora, olhe: o velho serviu para alguma coisa, não é?" O oficial, ainda meio incrédulo, assentiu- "Como é o seu nome?"- "Jan Lumenski" - respondeu o velho, e foi embora...  Segundos antes do princípio"Os postos haviam sido escolhidos cuidadosamente, de acordo com um plano definido. A maior parte eram casas situadas nas esquinas com a finalidade de dominar os cruzamentos das ruas principais, estações ferroviárias, quartéis alemães, armazéns ou edifícios públicos. Os soldados do Exército da Pátria eram ainda simples transeuntes que se misturavam à multidão de civis e entravam nas casas que lhes haviam sido designadas em pequenos grupos. Situavam-se todos, enfim, perto daqueles pontos que deviam ser atacados e tomados nos primeiros assaltos.Cada soldado chegava à porta da casa escolhida, chamava o seu ocupante e lhe apresentava uma ordem de requisição firmada pelas autoridades do levante. As pessoas se mostravam nervosas, porém, em geral, ninguém se opunha. Pelo contrário, procuravam fazer o melhor que podiam para ajudá-los, oferecendo-lhes os seus melhores alimentos. Os soldados tomavam posições em janelas, desvãos e telhados. Na entrada das ruas montavam-se barricadas.Algumas sentinelas montavam guarda para que não fossem surpreendidos pelo inimigo. Trinta minutos antes da hora H, os preparativos estavam prontos. Então os soldados empunharam suas armas, colocaram braçadeiras de cor vermelha e branca. Esse era o primeiro sinal de um exército regular polonês no solo pátrio desde o começo da ocupação. Durante cinco anos todos haviam esperado essa oportunidade; agora os últimos segundos pareciam uma eternidade. As cinco da tarde deixariam de ser membros de um movimento secreto de resistência, para se converterem, uma vez mais, em soldados de um exército regular, que ia lutar de peito descoberto.""O Exército da Pátria" - Bor Komorowski  Quem é o melhor lançador de granadas?"Esperávamos que a qualquer momento aparecessem os soldados alemães da guarnição mais próxima. Rapidamente, e aos gritos, as ordens foram dadas e nosso pelotão distribuiu-se rapidamente, entrincheirando-se os soldados em janelas e portas. Quando voltei aos andares superiores, pude ver que os soldados alemães, bem equipados, se instalavam na casa em frente. As metralhadoras, disparando de ambos os fortins, mantinham uma cortina de fogo entre as duas ruas. A metralha crivava as paredes e os muros. Os vidros voavam aos pedaços, o ar se enchia de pó e de partículas de reboco soltas dos muros. Os alemães, que ocupavam as janelas da casa em frente, se encontravam a distância de um tiro de granada; as janelas mais altas da fábrica careciam de proteção. Propus que o delegado do governo, alguns oficiais e civis e várias mulheres que se achavam conosco, fossem para a parte de trás do edifício, porém as mulheres se recusaram. Aquela atitude me animou bastante, pois, com exceção do delegado do governo, ninguém dava sinais de nervosismo. Todos aqueles que estavam desarmados foram postos a trabalhar levantando barricadas nas portas de entrada do andar térreo. Em pouco mais de um minuto, as duas portas foram reforçadas com barras, carrinhos de mão, mesas, pranchas e móveis, que possuíamos em abundância. Todo objeto móvel foi amontoado contra as janelas do andar térreo para improvisar uma defesa a mais segura possível. Os edifícios formavam uma longa fileira provida de várias saídas e um certo número de lugares por onde um intruso poderia entrar facilmente sem ser observado. Nossos trinta soldados estavam completamente perdidos em todos esses edifícios. Olhei meu relógio. Eram quatro e meia. O incidente havia principiado há quinze minutos e tínhamos que nos defender sem ajuda pelo menos durante meia hora antes que chegassem reforços. Os soldados que vigiavam através de uma fenda na porta, anunciaram que os alemães se preparavam para um ataque, protegidos por fogo de metralhadoras. Uma metralhadora começou a martelar com insistência uma de nossas janelas, a 5 metros de distância. "Pelo amor de Deus", disse o chefe do Estado-Maior, "não podemos deixá-los abrir caminho até ao edifício. Uma vez dentro, nunca os expulsaremos com as armas que dispomos". Depois, voltando-se para os homens, acrescentou, rapidamente: "Quem de vocês é o melhor lançador de granadas?"Dois deles se adiantaram imediatamente. Grzegors ordenou que eles apanhassem algumas granadas e o acompanhassem até ao segundo andar; ali, outra dificuldade os aguardava. A enorme janela estava hermeticamente fechada. Tinham que abri-la para poder arrojar as granadas; e mostrar-se ao inimigo, na janela, ocasionaria sua imediata reação. Apesar disso, conseguiram arrebentá-la valendo-se de um grande cano de ferro. No mesmo instante, o fogo dos alemães se concentrou no janelão, mas os homens conseguiram lançar suas granadas em direção da metralhadora, que voou, aos pedaços. Pouco depois, vimos dois soldados mortos arrastados pelas pernas. Isto os desanimou por um instante, porém, pouco depois, voltaram ao ataque com granadas de mão. Uma dessas granadas feriu gravemente dois dos nossos homens.""Diário do levante de Varsóvia" - Bor Komorowski