25
Ser jovem, ser pobre é ser perigoso ? Cecília M. B. Coimbra Maria Lívia do Nascimento Coimbra, C.M.B. & Nascimento, M.L. (2005). Ser jovem, ser pobre é ser perigoso? [ Links ] Consultado em 16/03/2005 de http://www.slab.uff/exibetexto2.php?link=. %2Ftexto23.htm&codtexto=23&cod+23&tp+t&nome_autor São perigosos, São tão perigosos ruins demais. Fingem que gemem nas macas, que sangram nas facas, que morrem. Tem televisão qualquer barracão da escória desse país. Com que direito, pedem os leitos limpos dos meus guris? (Jorge Simas/Paulo Cesar Feital) Este trabalho coloca em análise algumas características atribuídas à juventude, tomadas como se fossem uma natureza, tornando-se, assim, inquestionáveis. Para tal apontaremos algumas produções ocorridas, em especial no Brasil, durante o século XX que têm caracterizado o jovem pobre como perigoso, criminoso e, portanto, não humano. A seguir, discutiremos alguns efeitos forjados hoje em nosso mundo globalizado pelas práticas que têm associado periculosidade, criminalidade e condição de não humanidade à situação de pobreza. Alguns desses efeitos podem ser expressos, por exemplo, pelo aumento dos 1

Ser jovem, ser pobre +® ser perigoso

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Psicologia.

Citation preview

Ser jovem, ser pobre ser perigoso ?Ceclia M. B. CoimbraMaria Lvia do NascimentoCoimbra, C.M.B. & Nascimento, M.L. (2005). Ser jovem, ser pobre ser perigoso? [ Links ] Consultado em !"0#"2005 de $tt%&""'''.slab.u(("e)ibete)to2.%$%*link+.,2-te)to2#.$tm&codte)to+2#&cod.2#&t%.t&nome/autorSo perigosos,So to perigososruins demais.Fingem que gemem nas macas,que sangram nas facas,que morrem.Tem televisoqualquer barracoda escria desse pas.Comque direito,pedem os leitoslimpos dos meus guris?(orge Simas!"aulo Cesar Feital#Este trabalho coloca em anlise algumas caractersticas atribudas juventude, tomadascomosefossemumanaturea, tornando!se, assim, in"uestionveis. #aratal a$ontaremosalgumas $rodu%&es ocorridas, em es$ecial no Brasil, durante o s'culo (("ue t)m caracteriadoo jovem $obre como$erigoso, criminoso e, $ortanto, n*o humano. + seguir, discutiremos algunsefeitos forjados hoje em nosso mundo globaliado $elas $rticas "ue t)m associado$ericulosidade, criminalidadeecondi%*oden*ohumanidadesitua%*ode$obrea.+lgunsdessesefeitos$odemser e,$ressos, $or e,em$lo, $eloaumentodose,termniosocorridoscotidianamente contra a juventude $obre, $elo significativo n-mero de jovens cum$rindomedidas de reclus*o, dentre alguns outros as$ectos "ue ser*o a"ui assinalados. .inaliaremoscitandouma $es"uisa $or n/s realiada onde, atrav's de levantamentos feitos em $rocessosvinculados ao antigo 0uiado de Menores, hoje 0uiado da 1nf2ncia e da 0uventude, $ercebemoscomo os diferentes $rofissionais $resentes nesse estabelecimento, muitas vees, t)mfortalecido com suas $rticas um determinadomodo de ser e de e,istir$araa"ueles "ue t)m $rocurado esse /rg*o.1Majoritariamente, na sociedade ca$italista, o jovem tem sido construdo como um seremforma%*o, em crescimento, emdesenvolvimento, emevolu%*o. 3al $erodode vida,considerado comosendodetransi%*o, carrega certasmarcas"uet)msidoafirmadascomonatureas.+lgumas$rticasbaseadasnosconhecimentoshegem4nicosda Medicinae daBiologia, dentre outros, t)m afirmado, $or e,em$lo, "ue determinadas mudan%as hormonais,glandulares e fsicas, t$icas dessa fase, s*o res$onsveis $or certas caractersticas $sicol/gico!e,istenciais"ueseriam$r/$riasdajuventude. 5escrevem, assim,suasatitudes,com$ortamentose formasdeestar nomundo comomanifesta%&esdessascaractersticas,$ercebidascomoumaess)nciae, $ortanto, comoimutveis. 5essamaneira, 6"ualidades7 e6defeitos7 considerados t$icos do jovemcomo entusiasmo, vigor, im$ulsividade, rebeldia,agressividade, alegria, intros$ec%*o, timide, dentre outros, $assam a sersin4nimos da"uilo "ue' $r/$rio de sua naturea.#or "uetal formadecaracteriar ajuventudetemsidoa$licadaa$enasaalgunssegmentos sociais8 #or "ue o jovem $obre encontra!se e,cludo desse "uadro8 9ue outras articula%&es foram sendo $roduidas e fortalecidas, ao longo do s'culo ((, $ara a juventude$obre8 Articulando pobreza, periculosidade, criminalidade : anos trabalhando com algumas ferramentas $ro$ostas $or Michel .oucault ;>?,entendemos, como ele, "ue sejaim$ortante $ensar a emerg)ncia do ca$italismo industrial e do "ue esse autor chamou desociedade disci$linar, "uando as elites $assam a se $reocu$ar, n*osomente com as infra%&es cometidas $elo sujeito, mas tamb'm com a"uelas "ue $oder*ovir aacontecer. +ssim, o controle n*o se far a$enas em cima do "ue se ', do "ue se fe, mas$rinci$almentesobreo"uese$odervir aser, do"uese$odervir afaer, sobre asvirtualidades. Emnosso $as, "ue tra como heran%a mais de treentos anos de escravid*o,considerada '$oca como fato natural, o controle das virtualidades e,ercer um$a$elfundamental na constitui%*o de nossas $erce$%&es esubjetividades sobre a $obrea. #aratal, muitot)mcontribudoalgumasteoriascomoasracistaseeug)nicas, "ueemergemno s'culo (1(, na Euro$a, condenando as misturas raciais e caracteriando!as comoindesejveis, $rodutoras de enfermidades, dedoen%as fsicas e morais ;imbecilidades, idiotias,retardos, defici)ncias em geral, indol)ncia, dentre outras?. @ interessante notarmos "ue, nessemesmo$erodo, ocorrem, tamb'mna Euro$a, movimentos"ue$ro$ugnameinfluenciamas$ro$ostas de aboli%*o da escravatura negra nas +m'ricas. Au seja, ao mesmo tem$o em "ueemerge a figura de um certo trabalhador livre B segundo os interesses econ4micos vinculados aoca$italismo liberal da '$oca B $rodu!se uma ess)ncia $ara esse mesmo trabalhador.5efinindo!se formas consideradas corretas e verdadeiras de ser e de e,istir, forjam!sesubjetividades sobre a $obrea e sobre o $obreC di!se o "ue dever*o ser.Degundoal/gicadoca$italismoliberal, ostrabalhadoreslivrest)m liberdade $ara oferecer e vender sua for%a de trabalho no mercado, desde "ue se mantenham no seu devidolugar, desde "ue n*o $artici$em dessas misturas indesejveis, mantendo!se dentro das normasvigentes, desde"ue, $ortanto, res$eitemasregrasim$ostas$orumasociedadedeclasses.Dociedade essa "ue, $arado,almente, a $artir de certos $rinc$ios defendidos $or uma elite "ueascende ao $oder, $ro$ugna em seus discursos "ue os direitos humanos, $olticos, econ4micos,2sociais e culturais s*o direitos de todos, $roduindo!os, assim, como direitos universais atrav'sde suas famosas $alavras de ordemE liberdade, igualdade e fraternidade. Entendemos B como nos a$ontou Mar, B "ue a forma%*o da ri"uea, a acumula%*o doca$ital $rodu, tamb'm, oseucontrrio, amis'ria. #ela /ticae 6'tica7 doca$italismoesta$assa a ser naturalmente $ercebida como advinda da ociosidade, da indol)ncia e dos vciosinerentes aos $obres. #ortanto, esses$rinc$iosburguesesn*o$odem ser estendidos a todosecaracteriados como universais, $oisnumasociedadeondea liberdade'uma"uimera,adesigualdade e a com$etitividade s*o as regras do bom viver,uma e,ist)ncia livre, igualitria efraterna n*o tem lugar .+inda no s'culo (1(, na Euro$a, $ari $assu s teorias racistas e ao movimento eug)nicoe lhes servindo de base, temos a obra de Morel ;FG?, o63ratado das 5egeneresc)ncias7 ondea$arece o termo 6classes $erigosas7, definindo!o da seguinte maneiraE ;...? no seio dessa sociedade t*o civiliada e,istem 6verdadeiras variedades7 ;...? "uen*o$ossuem nem a intelig)ncia do dever, nem o sentimento damoralidade dos atos,e cujo es$rito n*o ' suscetvel de ser esclarecido ou mesmo consolado $or "ual"uerid'ia de ordem religiosa. 9ual"uer uma destas variedades foidesignada sob o justottulode classes$erigosas;...?constituindo $araasociedadeumestadode$erigo$ermanente. ;+$ud Lobo,