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Setembro de 2019 ISSN 1414-9230 50

Setembro de 2019 - web.bndes.gov.br...A primeira concessão federal de aeroportos ocorreu em 2011, com a concessão de um novo aeroporto para atender à cidade de Natal (RN), o Aeroporto

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Setembro de 2019

ISSN 1414-9230

50

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BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL

PresidenteGustavo Montezano

DiretoresAndré LaloniFábio AbrahãoLeonardo CabralPetrônio CançadoRicardo BarrosRoberto MaruccoSaulo Puttini

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Vol. 25 | setembro de 2019

50ISSN 1414-9230

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 1-266, set. 2019

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Os artigos assinados são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, a opinião do BNDES.

Av. República do Chile, 100 Rio de Janeiro - RJ - CEP 20031-917 Tel.: (21) 3747-7994 http://www.bndes.gov.br

© 2019

Esta publicação está disponível em formato digital em www.bndes.gov.br/bibliotecadigital

Distribuição gratuita

É permitida a reprodução parcial ou total dos artigos desta publicação, desde que citada a fonte.

Para assinar esta publicação, envie e-mail para: [email protected]

BNDES SetorialPublicação semestral editada em março e setembro

Comissão editorialCarla Gaspar PrimaveraLeonardo Pereira Rodrigues dos SantosMarcos Rossi Martins

EditorAntônio Marcos Hoelz AmbrozioEdiçãoGerência de Editoração e MemóriaCoordenação editorialGabriel CanedoGerência de EditoraçãoFernanda Costa e Silva

Produção editorialExpressão EditorialCapaRefinaria DesignImpressãoEdigráficaTraduçãoTikinet

BNDES Setorial, n. 1, jul. 1995 - Rio de Janeiro, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 1995 - n. Semestral. ISSN 1414-9230 Periodicidade anterior: quadrimestral até o n. 3. 1. Economia - Brasil - Periódicos. 2. Desenvolvimento econômico - Brasil - Periódicos. I. Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. CDD 330.05

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Sumário

A evolução recente do modelo de concessão aeroportuária sob a ótica da financiabilidade . . | 7 |Bernardo Vianna Zurli Machado Martin Ingouville Thiago Machado Damasceno Daniel Cardoso de Salles Clarissa Taquette Vaz Albuquerque

Estaleiro de reparo e manutenção naval . . . . . | 67 |Caio Márcio de Ávila Martins Pinhão Marco Aurélio Ramalho Rocio André Pompeo do Amaral Mendes Cássio Adriano Nunes Teixeira Haroldo Fialho Prates

O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016 sobre os setores da indústria de transformação . . . . . . . . . . . . | 109 |Job Rodrigues Teixeira Junior Beatriz da Silva Mello

Políticas públicas na gestão de resíduos sólidos: experiências comparadas e desafios para o Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . | 153 |Vanessa Pinto Machado e Silva Luciana Xavier de Lemos Capanema

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

Aeroportos

* Respectivamente, engenheiro do Departamento de Infraestrutura e Concessões Rodoviárias da Área de

Saneamento, Transporte e Logística do BNDES e mestre em Planejamento Energético pelo Instituto Alberto

Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro

(UFRJ); engenheiro do Departamento de Infraestrutura e Concessões Rodoviárias da Área de Saneamento,

Transporte e Logística do BNDES e graduado em Engenharia de Produção pela Pontifícia Universidade

Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); engenheiro do Departamento de Mobilidade Urbana e Logística da Área

de Saneamento, Transporte e Logística do BNDES e graduado em Engenharia de Produção pela Universidade

Federal Fluminense (UFF); coordenador de Serviço do Departamento de Infraestrutura e Concessões

Rodoviárias da Área de Saneamento, Transporte e Logística do BNDES e graduado em Engenharia de Produção

pela UFRJ; e gerente do Departamento de Mobilidade Urbana e Logística da Área de Saneamento, Transporte

e Logística do BNDES e mestre em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ (interlocutor).

A EVOLUÇÃO RECENTE DO MODELO DE CONCESSÃO AEROPORTUÁRIA SOB A ÓTICA DA FINANCIABILIDADE

Bernardo Vianna Zurli Machado Martin Ingouville Thiago Machado Damasceno Daniel Cardoso de Salles Clarissa Taquette Vaz Albuquerque*

Palavras-chave: Aeroportos . Concessões . Infraestrutura . Regulação . Modelagem .

Financiador . Evolução .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

Airports

* Respectively, engineer of the Infrastructure and Road's Concession Department of BNDES's Sanitation,

Transport and Logistics Division with a master's degree in Energetic Planning from Instituto Alberto Luiz

Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) of the Federal University of Rio de Janeiro

(UFRJ); engineer of the Infrastructure and Road's Concession Department of BNDES's Sanitation, Transport

and Logistics Division, graduated in production engineering from PUC-Rio; engineer of the Urban Mobility

and Logistics Department of BNDES's Sanitation, Transport and Logistics Division, graduated in production

engineering from Fluminense Federal University (UFF); coordinator of the Infrastructure and Road's

Concession Department of BNDES's Sanitation, Transport and Logistics Division, graduated in production

engineering from UFRJ; and manager of the Urban Mobility and Logistics Department of BNDES's Sanitation,

Transport and Logistics Division with a master's degree in production engineering from Coppe/UFRJ.

THE RECENT EVOLUTION OF THE AIRPORT'S CONCESSION MODEL FROM THE FINANCIABILITY VIEW

Bernardo Vianna Zurli Machado Martin Ingouville Thiago Machado Damasceno Daniel Cardoso de Salles Clarissa Taquette Vaz Albuquerque*

Keywords: Airports . Concessions . Infrastructure . Regulation . Modelling . Creditor .

Evolution .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

ResumoEste artigo contém um histórico do modelo de concessões ao setor aeroportuário – desde seu início, em 2011, até os dias atuais – e uma análise de sua evolução, com foco na financiabilidade dos projetos. O setor passou por intensivos investimentos com a implantação do pro-grama, que é considerado um caso de sucesso. Passados apenas oito anos da primeira concessão, o modelo foi aprimorado, reequilibrando seus riscos e incentivos e atraindo novos investidores. Algumas concessões, contudo, ainda passam por dificuldades, o que revela a oportunidade de continuidade no processo de melhoria do modelo de concessão e de aspectos regulatórios. Inserem-se, neste trabalho, sugestões para con-tribuir no contexto desses aperfeiçoamentos, e a conclusão destaca a importância dos credores na viabilização das concessões.

AbstractThis article contains a history of the concessions model for the airport sector – since its beginning, in 2011, until today – and an analysis of its evolution, focusing on projects financiability. The sector has faced intensive investments with the program’s opening, which is considered a success case. Having passed only eight years of the first concession, the model was enhanced, rebalancing its risks and incentives and attracting new investors. Some concessions, however, still face difficulties/hindrance, which reveals the opportunity of maintaining the improvement process of the concession model and its regulatory aspects. In this work are included suggestions to contribute in the context of these improvements. The conclusion highlights the creditor’s importance for concessions feasibility.

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11A evolução recente do modelo de concessão aeroportuária sob a ótica da financiabilidade

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

Introdução

O transporte aéreo é importante componente da matriz de movimen-tação de passageiros e cargas de um país. Especialmente em um país com largas dimensões, viabiliza a integração nacional e fluxo comercial e turístico, interno e externo. No Brasil, o setor iniciou um período de grande desenvolvimento a partir do início dos anos 2000, marcado pelo processo de evolução regulatória e de movimentação de passageiros.

Até o fim da década de 1980, a regulação do transporte aéreo no Brasil tinha caráter protecionista, não existia concorrência plena entre as empresas aéreas e o preço das passagens era tabelado. A partir da década de 1990, iniciou-se a implantação de medidas para promoção de competição no setor. Essas medidas foram reforçadas em 2001, com a liberalização do preço das passagens aéreas, e em 2005, com a criação de uma agência regulatória específica – a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

As mudanças promovidas aliaram-se ao desenvolvimento econômico do país. O crescimento do produto interno bruto (PIB)1 e a ascensão social das camadas de baixa renda geraram novos consumidores para o mercado de aviação civil. Houve um crescimento elevado do número de passageiros e, ao mesmo tempo, uma grande redução do preço das passagens aéreas,2 conforme gráficos 1 e 2.

1 Segundo Iata (2008), a elasticidade da demanda/PIB para a aviação é cerca de 1,4, podendo chegar a 2,0, o que

indica que a demanda é consideravelmente sensível às variações do PIB .

2 As mudanças também promoveram uma alteração na dinâmica competitiva do mercado de aviação civil . As companhias

aéreas mais antigas não se adaptaram ao mercado desregulado, culminando no encerramento de suas operações (Varig,

Vasp e Transbrasil) . Contudo, houve a entrada de novas empresas como a Gol (em 2001) e, em um segundo momento, a

Azul (em 2008) . Outra alteração foi o abandono de mercados menores, com baixa taxa de ocupação .

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12 Aeroportos

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Gráfico 1 | Produto interno bruto real brasileiro e valor da tarifa aérea

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

1,2

0

1

2

3

4

5

6

7

8

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

PIB real em R$ trilhões – eixo esquerdo

Preço real médio da tarifa aérea (R$/km) – eixo direito

Fonte: Elaboração própria, com base em dados da Série Histórica do PIB Brasileiro, disponível em: https://www .ibge .

gov .br/estatisticas/economicas/contas-nacionais/9300-contas-nacionais-trimestrais .html?=&t=series-historicas&utm_

source=landing&utm_medium=explica&utm_campaign=pib%23evolucao-taxa#evolucao-taxa (acesso em: 27 ago . 2019),

e em Consulta Interativa – Indicadores do Mercado de Transporte Aéreo, disponível em: https://www .anac .gov .br/assun-

tos/dados-e-estatisticas/mercado-de-transporte-aereo/consulta-interativa/tarifas-por-ligacao (acesso em: 30 jul . 2019) .

Gráfico 2 | Movimentação nos aeroportos (milhões de passageiros)

0

50

100

150

200

250

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

Crescimento médio de 14,46%

4,12% -0,26%

Fonte: Elaboração própria, com base em Hórus (2019a) .

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13A evolução recente do modelo de concessão aeroportuária sob a ótica da financiabilidade

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Como é possível notar, a movimentação de passageiros3 cresceu a uma taxa de 14,5% entre 2004 e 2011, o que causou uma grande pressão sobre a infraestrutura aeroportuária, que, por sua vez, não foi capaz de se desenvolver na mesma medida.

Segundo McKinsey & Company (2010), a infraestrutura aeroportuária era majoritariamente operada pelo poder público (federal e estadual), com destaque para a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) – estatal federal que operava 67 aeroportos. A Infraero vinha enfrentando desafios na execução de obras, frustrando recorrentemente os investimentos planejados.4 Como consequência, constatou-se a existência de grande déficit de infraestrutura aeroportuária. Treze5 dos vinte principais aeroportos no Brasil estavam com restrições operacionais em função da capacidade de pátio de aeronaves e/ou de terminal de passageiros. Havia uma expectativa de saturação ainda maior com o aumento da demanda gerado pela perspectiva de crescimento do PIB e a ocorrência de grandes eventos mundiais no país, a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016.

O desafio de realizar vultosos investimentos de curto e médio prazos, somado às restrições fiscais do poder público e à possibilidade de ganho de eficiência com o setor privado, motivou o processo de concessão dos aeroportos.

A primeira concessão federal de aeroportos ocorreu em 2011, com a concessão de um novo aeroporto para atender à cidade de Natal (RN), o Aeroporto de São Gonçalo do Amarante. Essa ação foi considerada um piloto, cujo objetivo foi testar o modelo antes de expandi-lo. Em seguida, os aeroportos de maior relevância e em situação mais crítica de satura-ção passaram a ser licitados. Em 2012, foram leiloados Guarulhos (SP),

3 Número de passageiros, somando embarque, desembarque e conexões .

4 A estatal executava cerca de 53% de seu investimento orçado, conforme Neto (2016) .

5 Aeroportos de Guarulhos, Congonhas, Santos Dumont, Confins, Brasília, Porto Alegre, Salvador, Fortaleza, Curitiba, Natal, Florianópolis, Vitória e Goiânia .

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14 Aeroportos

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

Viracopos (Campinas – SP) e Brasília (DF) e, em 2014, Galeão (Rio de Janeiro – RJ) e Confins (Belo Horizonte – MG).

Em 2017, realizou-se a primeira licitação no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI),6 que concedeu os aeroportos de Florianó-polis (SC), Fortaleza (CE), Porto Alegre (RS) e Salvador (BA). Em 2019, na denominada Quinta Rodada, foram licitados 12 aeroportos agrupados em três blocos: (i) Nordeste, com seis aeroportos – Recife (PE), Maceió (AL), João Pessoa (PB), Aracaju (SE), Campina Grande (PB) e Juazeiro do Norte (CE) –; (ii) Centro-Oeste, com quatro aeroportos – Cuiabá, Sinop, Rondonópolis e Alta Floresta, todos em Mato Grosso; e (iii) Sudeste, com dois aeroportos – Macaé (RJ) e Vitória (ES). Utilizou-se o princípio de alocação de subsídios cruzados dentro dos blocos, de forma a conceder à iniciativa privada aeroportos menores e menos rentáveis conjuntamente com aeroportos de maior movimentação, os aeroportos-âncoras.

A Figura 1 retrata a linha de tempo das concessões e o grupo de ativos leiloado em cada rodada.

Figura 1 | Rodadas de concessões aeroportuárias

Terceira rodada

2012 2014 2017 2019

Guarulhos

Viracopos

Brasília

Galeão

Con�ns

Porto Alegre

Florianópolis

Salvador

Fortaleza

Nordeste

Centro-Oeste

Sudeste

Contratação

Aeroportos

Segunda rodada Quarta rodada Quinta rodada

2011

Primeira rodada

São Gonçalodo Amarante

Fonte: Elaboração própria .

6 O PPI foi criado pela Lei 13 .334, de 13 de setembro de 2016, com a finalidade de ampliar e fortalecer a interação entre o Estado e a iniciativa privada, por meio da celebração de contratos de parceria e de outras medidas de desestatização .

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15A evolução recente do modelo de concessão aeroportuária sob a ótica da financiabilidade

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Oito anos depois da primeira concessão, no momento de elaboração deste artigo, já foram concedidos 22 aeroportos, que processam mais de dois terços da movimentação de passageiros do país e representam 19% do número de aeroportos com oferta de voos comerciais.

Figura 2 | Maiores aeroportos com voos comerciais do país, conforme movimentação de passageiros anual

25 maioresAeroporto Passageiros

2018 (milhões)GRU (SP) 41,8CGH (SP) 22,2BSB (DF) 17,8GIG (RJ) 15,0

CNF (MG) 10,6SDU (RJ) 9,2VCP (SP) 9,2REC (PE) 8,5POA (RS) 8,3SSA (BA) 7,8FOR (CE) 6,6CWB (PR) 6,3FLN (SC) 3,8BEL (PA) 3,5

GYN (GO) 3,1VIX (ES) 3,1

CGB (MT) 3,0MAO (AM) 2,8NAT (RN) 2,4IGU (PR) 2,3MCZ (AL) 2,2NVT (SC) 1,9BPS (BA) 1,7SLZ (MA) 1,6CGR (MS) 1,6JPA (PB) 1,4

Fonte: Elaboração própria .

Nota: Demais aeroportos incluem aqueles operados pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero),

pelos estados e municípios, pelo Comando da Aeronáutica (Comaer) e por concessões estaduais .

A expectativa futura, exposta no Plano Aeroviário Nacional (PAN) 2018-2038 (BRASIL, 2018), elaborado pela Secretaria Nacional de Avia-ção Civil (SAC), é de que o setor cresça, em média, cerca de 4,6% ao ano

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16 Aeroportos

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nos próximos vinte anos. Isso implica dizer que dobrará de tamanho em 2033, causando, mais uma vez, pressão sobre a infraestrutura. Em consonância, o governo atual manifesta interesse em continuar com as concessões, tendo até iniciado um processo de consulta pública relacio-nado à próxima rodada (sexta), com 22 aeroportos separados por blocos. Uma sétima rodada seria realizada na sequência, de forma a concluir a concessão de todos os aeroportos da Infraero. A Figura 2 permite vi-sualizar a relevância do programa de concessões na malha aérea do país.

O resultado inicial das rodadas de licitação realizadas foi um sucesso inegável do ponto de vista de ágio sobre a variável de leilão e de melhoria do nível de serviço dos aeroportos – o índice de satisfação geral de passa-geiros saltou de 3,85, em 2013, para 4,35, em 2018, conforme Ministério da Infraestrutura7 –, e talvez por isso tenha se consagrado a concessão como um modelo vencedor para o setor. Ofertou-se em outorga fixa o montante de R$ 55,6 bilhões, a ser pago ao longo do prazo de concessão.

Gráfico 3 | Investimentos público e privado no setor de aeroportos (R$ bilhões)

0

1

2

3

4

5

6

7

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Privado PúblicoFonte: Elaboração própria, com base em dados de Neto (2016) .

7 Dados apresentados no módulo gerencial do sistema Hórus (https://horus .labtrans .ufsc .br/gerencial/#Principal) .

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Adicionalmente, os investimentos realizados pelas concessionárias foram expressivos. No Gráfico 3, observa-se que o programa de con-cessões elevou substancialmente o patamar de investimentos do setor.

No entanto, a crise econômica e política que acometeu o país entre a terceira e a quarta rodada reduziu consideravelmente o número de passageiros nos aeroportos e afetou as empresas de construção civil, que estavam entre as grandes vencedoras dos leilões até então. Isso revelou que existia um extremo otimismo no momento da realização dos leilões (ver Box Winner’s curse).

A alta ociosidade dos aeroportos, aliada à falta de capacidade finan-ceira das concessionárias e de seus acionistas, revelou fragilidades na modelagem das primeiras concessões, pois afetou tanto o pagamento das outorgas ao poder concedente quanto o pagamento das dívidas assumidas perante os credores e, ainda, pôs em risco o nível de serviço dos aeroportos. Ou seja, os altos ágios e investimentos se relevaram insustentáveis. O caso mais emblemático dessa situação é o Aeroporto de Viracopos, com recuperação judicial vigente.

Winner’s curseTrata-se de fenômeno que pode ocorrer em leilões e pelo qual o vencedor

tende a pagar em excesso, em geral em razão de informações incompletas,

mas também por outros fatores, como uma visão mais otimista do projeto .

Ainda que os planos de negócio das concessionárias não sejam públicos,

uma vez que houve ágios em todos os leilões até o momento, o Estudo de

Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA) pode ser considerado

uma proxy conservadora desses planos de negócios . O Gráfico 4 apresenta a

projeção de passageiros do EVTEA para o Aeroporto de Viracopos e o valor

realizado até o momento .

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Gráfico 4 Movimentação de passageiros no Aeroporto de Viracopos (milhares de passageiros)

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Projeção do EVTEA

Valor realizado

Fonte: Elaboração própria, com base em dados do sistema Hórus, disponível em: https://horus .labtrans .ufsc .br/

gerencial/#Principal (acesso em: 30 ago . 2019), e em planilha do Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica

e Ambiental (EVTEA) divulgada com o edital da Concessão de Viracopos (ANAC, 2011) .

Em 2018, o aeroporto teve menos de 40% da demanda projetada

originalmente . Na medida em que passageiros e cargas são os principais

drivers de receita do aeroporto, a sustentabilidade financeira do ativo fica

bastante prejudicada diante de tamanho erro de projeção .

Não obstante os pontos negativos, cada novo edital de licitação apre-sentou mudanças no modelo de concessão, especialmente nos incen-tivos oferecidos, de forma a incorporar o aprendizado adquirido nas experiências anteriores e considerar a diferença existente entre os aeroportos concedidos.

O BNDES participou em alguma medida da modelagem de alguns dos editais de concessão, porém sua principal participação nesse processo se deu no financiamento das concessionárias para a realização dos investi-mentos pactuados. Foram financiados pelo Banco todos os aeroportos até a terceira rodada e dois dos quatro aeroportos da quarta rodada.

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Cabe ressaltar que o montante de capital empregado, principalmen-te no início das concessões, tanto para a realização de investimentos, quanto para o pagamento de outorgas, e o descasamento com o fluxo de receitas (geralmente menor no início da operação e distribuído no decorrer do contrato de longo prazo) transformam o credor em figura primordial para a viabilidade do modelo, além de requerer acionistas fortes e com capacidade para realização de aportes.

Este artigo objetiva, por meio do conhecimento adquirido pelo BNDES no contato com o setor, avaliar a evolução do modelo de concessão na ótica da financiabilidade. A segunda seção apresenta e analisa aspectos relevantes dos editais de concessão de aeroportos, expõe sua evolução e ressalta as lições aprendidas ao longo do tempo. A seção subsequente sugere possibilidades de melhoria a serem incorporadas nos próximos editais, e a quarta conclui o trabalho.

Evolução do modelo de concessões

Nas cinco rodadas de concessões aeroportuárias, houve franca evo-lução do modelo de concessão do ponto de vista da financiabilidade dos projetos. As principais alterações entre as rodadas de concessões podem ser acompanhadas na Figura 3, assim como os resultados dos leilões.

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Figura 3 | Evolução dos editais

Outorga �xa (25%+ ágio adiantado;

carência; ramp up) Outorga variável

Outorga �xa(100% adiantada) Outorga variável

(carência e ramp up)

Outorga

Capital mínimo 5% a 10% do Capex dos primeiros cinco anos 25% da outorga �xa + ágio

49 0Participação da(Infraero) (%)

Outorga �xa anual

Outorga variável

Grandes investimentos sem gatilhoGatilhos de capitalexpenditure (Capex) Com gatilho

Ágio

Primeirarodada

0

Anexo 3 ao Contrato de Concessão: obras do poder públicoObras públicas Ausente

Com gatilho

Per�l vencedor Predomínio de construtoras nacionais Predomínio de operadoras estrangeiras

Outorga �xa anual

Segundarodada

Terceirarodada

Quartarodada

Quintarodada

São Gonçalo do Amarante 229%

Guarulhos 374%Brasília 673%Viracopos 160%

Galeão 294%Con�ns 66%

Fortaleza 18%Salvador 113%Florianópolis 58%Porto Alegre 852%

Nordeste 1.010%Sudeste 830%Centro-Oeste 4.739%

Fonte: Elaboração própria, com base nos contratos de concessão dos aeroportos (ANAC, 2016, 2017a, 2017b, 2017c,

2017d, 2018a, 2018b, 2018c, 2018d, 2018e, [2018a], [2018b]) e em Governo . . . (2017), Leilão . . . (2012) e Leilão . . . (2013) .

Se os editais da segunda e da terceira rodada eram muito similares, a quarta e a quinta rodada trouxeram diversas inovações que mitigaram diferentes riscos para o financiador. Essas mudanças, associadas à crise política e econômica de 2014, tiveram grande impacto nos resultados das concessões de 2017 e 2019, especialmente em relação aos grupos econômicos vencedores. Nas subseções a seguir, é aprofundado cada um dos aspectos relevantes dos editais.

Participação da Empresa Brasileira de Infraestrutura AeroportuáriaA Infraero é a maior operadora de aeroportos no Brasil e uma das maiores do mundo. Detém 55 aeroportos em todo o território nacional, além de participação de 49% em cinco aeroportos: Brasília, Guarulhos, Viracopos, Confins e Galeão.8 Essa participação resulta de uma exigência

8 https://transparencia .infraero .gov .br/sobre-a-infraero/ .

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dos editais da segunda e da terceira rodada. Yosimoto e outros (2016) destacam duas justificativas para essa decisão. A primeira foi manter a lógica de subsídios cruzados entre os aeroportos superavitários da rede e os deficitários. Isso porque parte relevante da receita da Infraero utilizada para investir e manter os aeroportos deficitários provinha dos aeroportos concedidos nas primeiras rodadas. Portanto, a não participação da empresa nesses aeroportos poderia botar em risco o sistema de aviação regional. A segunda justificativa foi permitir que a Infraero internalizasse nos outros aeroportos por ela operados as prá-ticas inovadoras incorporadas nos aeroportos concedidos, aumentando sua eficiência financeira.

Assim, a estrutura acionária típica das concessões da segunda e da terceira rodada está representada na Figura 4.

Figura 4 | Estrutura acionária típica da sociedade de propósito específico na primeira e na segunda rodada

Sócio privadonão operador

Sócio privadooperador

Acionistaprivado Infraero

SPE

x% (100-x)%

51% 49%

Fonte: Elaboração própria, com base em Anac (2014) .

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Como se pode observar, o acionista privado foi formado por um consórcio de empresas. O motivo principal para esse fato foi o edital de licitação estabelecer a obrigação de participação de operador aero-portuário com experiência comprovada. O sócio privado não operador geralmente era o controlador e se tratava de uma empresa de origem brasileira, enquanto o sócio privado operador era uma empresa de ori-gem estrangeira com participação minoritária.

Essa estrutura acionária leva a algumas consequências notáveis. Uma delas é que, apesar de a Infraero ser a maior acionista individual da sociedade de propósito específico (SPE) – em comparação com o sócio privado operador e o sócio privado não operador –, ela tem relativamente pouca ingerência sobre a gestão da SPE, pois o acordo de acionistas da SPE (firmado entre a Infraero e o acionista privado) prevê que o acionista privado deverá manter o controle da sociedade. A Infraero tem o direito de indicar um dos cinco integrantes do Conselho de Administração da SPE e o poder de veto sobre determinados assuntos.

Já o sócio privado não operador, mesmo com um percentual de partici-pação indireto baixo, tem poder de controle (nos limites impostos pelos respectivos acordos de acionistas) sobre a SPE. Em um exemplo extremo, se o sócio privado detém 51% do acionista privado, indiretamente ele tem 26% da concessão (inferior, portanto, aos 49% da Infraero) e exerce o controle com essa baixa participação. Nesse exemplo, o sócio privado não operador pode decidir pela necessidade de aumento de capital da SPE, mas sua obrigação é de botar apenas 26% desse capital.

Esse aspecto pode agravar outra limitação dos editais de licitação, que foi a falta de regulação de transação com partes relacionadas, em especial em relação ao consórcio construtor. O que se verificou nas primeiras rodadas foi que o sócio privado não operador, além de ser o controlador da concessão, era o construtor responsável pelas obras e via nelas seu

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maior retorno. Esse tipo de situação gera sérios conflitos de interesse e pode fazer o construtor inflar o Capex e, depois da conclusão das obras, comprometer-se pouco com o projeto.

Outra observação relevante é que o valor da outorga (variável de leilão) é definido pela proponente, sem a participação da Infraero. Apesar de deter 49% da participação da SPE e de ter o ônus de contribuir com o pagamento de 49% da outorga anual fixa, a Infraero não realiza nenhuma avaliação econômica sobre a razoabilidade da proposta econômica. Destaca-se ainda que, conforme padrão do acordo de acionistas que constou no edital dos leilões da terceira rodada (Galeão e Confins), obrigava-se a Infraero, “na proporção de sua participação, a acompanhar os aumentos de capital necessários para realizar os investimentos da Fase I-B do Contrato [...]” (ANAC, 2014, anexo 21, p. 5),9 sendo esta a fase na qual eram realizados os principais investimentos obrigatórios iniciais. Passada a Fase I-B, o acionista privado ficaria com a obrigação de aportar recursos adicionais para viabilizar o Plano de Exploração Aeroportuária (PEA), caso os re-cursos previamente aportados fossem insuficientes. Nesse caso, a Infraero dispunha da opção de acompanhar o aporte, proporcionalmente a sua participação. Ficava implícito que, caso decidisse não acompanhar o sócio privado, a participação da Infraero seria diluída.

A natureza estatal da empresa também introduz alguns elementos adi-cionais, além da possível morosidade na tomada de decisão e no aporte de recursos na SPE. Conforme normas emanadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) que tratam do contingenciamento de crédito a órgãos e entidades do setor público (resoluções BCB 2.827, de 30 de março de 2001,

9 A redação da segunda rodada (Aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos) era mais favorável à Infraero . No edital

(ANAC, 2011), constava: “Caberá ao Acionista Privado aportar recursos necessários para a cobertura de todas e quaisquer

deficiências de recursos que a Concessionária venha a enfrentar para realizar o pleno atendimento ao Plano de Exploração

Aeroportuário (PEA), caso estes sejam superiores ao montante mínimo inicialmente subscrito” .

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e 4.589, de 29 de junho de 2017), há restrições às instituições financeiras para a realização de operações que importem em transferência, a qual-quer título, da responsabilidade direta ou indireta pelo pagamento de dívida para órgãos ou entidades do setor público. Além disso, tal norma conceitua como operação de crédito a concessão de garantia de qualquer natureza (art. 1º, II, ‘d’, da Resolução BCB 2.827/2001).

Essas resoluções permitem interpretar que a Infraero está impossibi-litada de prestar garantias, seja por meio de fiança corporativa, seja por meio de penhor de ações de emissão das concessionárias de titularidade da Infraero, embora essa interpretação não esteja consolidada e haja pre-visão de prestação de garantias pela empresa no acordo de acionistas da terceira rodada. Com tais restrições, a segurança jurídica de credores, na forma de corporate ou de project finance, é prejudicada. Adicionalmente, pode impor ao acionista privado um ônus maior por ter de garantir não apenas a parcela referente a sua participação no financiamento, mas também, de forma solidária, a da Infraero.

Por fim, o compromisso de a Infraero aportar recursos nos aeroportos como acionista, seja para pagar as outorgas fixas, seja para realizar os investimentos obrigatórios do contrato de concessão, vinha pressionan-do o caixa da União em um momento de severa restrição fiscal. Esse conjunto de situações fez o Governo Federal desistir da participação obrigatória da Infraero a partir da quarta rodada.

Curva de pagamento da outorgaOutro ponto do modelo de concessões aeroportuárias que evoluiu desde 2012 foi a sistemática de pagamento das outorgas.

As duas variáveis de leilão mais utilizadas nas concessões brasileiras são: (i) menor tarifa; e (ii) maior outorga. Nos leilões de menor tarifa,

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vence o leilão o proponente que cobrar do usuário a menor tarifa pelo serviço prestado. Nos certames definidos pela maior outorga, vence o leilão aquele que oferecer o maior pagamento, ou outorga, ao poder concedente pelo direito de explorar aquele serviço público a uma tarifa predeterminada, atualizada por algum índice de preços.

Todas as concessões aeroportuárias tiveram como variável de leilão a maior outorga. No entanto, a forma de realização do pagamento dessa outorga ao longo de cada concessão evoluiu significativamente, com relevante impacto para a estrutura de financiamento desses ativos.

Na segunda e na terceira rodada, a outorga é composta de dois com-ponentes: (i) a outorga variável; e (ii) a outorga fixa. A outorga variável é o valor correspondente à multiplicação de uma alíquota sobre a receita bruta das concessionárias. A outorga variável não era critério de decisão do leilão, pois as alíquotas eram fixadas pelos editais. No Quadro 1, expõem-se as alíquotas das outorgas variáveis vigentes em cada rodada.

Quadro 1 | Alíquotas de outorga variável

Rodada de concessão

Aeroporto Outorga variável

Primeira São Gonçalo do Amarante Não teve outorga variável

Segunda Viracopos  5%

Guarulhos 10%

Brasília  2%

Terceira Confins  5%

Galeão  5%

Quarta Florianópolis  5%

Porto Alegre  5%

Fortaleza  5%

Salvador  5%

(Continua)

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(Continuação)

Rodada de concessão

Aeroporto Outorga variável

Quinta Nordeste 3,3% (sexto ano), 6,6% (sétimo), 9,9% (oitavo), 13,2% (nono), 16,5% (a partir do décimo)

Sudeste 2,48% (sexto ano), 4,97% (sétimo), 7,45% (oitavo), 9,94% (nono), 12,42% (a partir do décimo)

Centro-Oeste 0,41% (sexto ano), 0,82% (sétimo), 1,23% (oitavo), 1,65% (nono), 2,06% (a partir do décimo)

Fonte: Elaboração própria, com base em dados dos contratos de concessão da primeira à

quinta rodada divulgados pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC, 2016, 2017a,

2017b, 2017c, 2017d, 2018a, 2018b, 2018c, 2018d, 2018e, [2018a], [2018b])

Já a outorga fixa é um pagamento realizado ao poder concedente cujo valor real é fixo e determinado pelo proponente em seu lance durante o leilão. Esse componente era, portanto, a variável de leilão. No caso da primeira, da segunda e da terceira rodada, as outorgas fixas eram divididas pelo prazo de concessão e pagas anualmente com uma atuali-zação monetária. A Tabela 1 sumariza os valores nominais de outorga ofertados em cada um dos aeroportos, considerando o momento do leilão; portanto, sem correção e antes da reprogramação.

Tabela 1 | Outorga fixa anual

Aeroporto Outorga fixa anual (R$ milhões) Ágio (%)

São Gonçalo do Amarante 6,8 229

Brasília 180,4 673

Viracopos 127,4 160

Guarulhos 810,7 374

Confins 60,7 66

Galeão 760,8 294

Fonte: Elaboração própria, com base em Leilão . . . (2012) e Leilão . . . (2013) .

Na Tabela 1, não foram incluídas a quarta rodada e a seguinte,

em razão da alteração na forma de pagamento da outorga fixa .

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Os elevados valores resultantes de outorgas fixas foram uma das carac-terísticas mais marcantes da segunda e da terceira rodada. O fato de a outorga fixa e seu ágio, nessas rodadas, estarem inseridos no fluxo de caixa do projeto, sem que seja necessário, a princípio, comprometer capital significativo com o projeto (pois o requerimento de capital não estava associado à outorga fixa ou a seu ágio), favorece licitantes mais agressivos. Sagrar-se vencedor do leilão é semelhante a uma aquisição alavancada (leveraged buyout – LBO),10 tendo em vista a semelhança entre a outorga fixa e uma dívida (a outorga fixa é reconhecida nas de-monstrações financeiras como uma obrigação semelhante a uma dívida com o poder concedente). Exemplo da semelhança entre o formato das primeiras rodadas e um LBO pode ser encontrado no índice patrimônio líquido/ativo total das concessionárias em suas primeiras demonstrações financeiras (portanto, antes da contratação de financiamentos signifi-cativos): aproximadamente 3% em Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão) (2014), Aeroporto Internacional de Brasília (2013) e Aeroporto Internacional de Guarulhos (2013); 10% em Aeroporto Internacional de Viracopos-Campinas (2013); e 17% em Aeroporto Internacional de Belo Horizonte-Confins (2014). Tais níveis desse indicador, mesmo an-teriormente à contração de dívidas relevantes, são típicos de empresas altamente alavancadas.

Outra maneira de encarar o encargo da outorga fixa é como um custo fixo e, nesse caso, os concessionários contam com uma grande alavan-cagem operacional. De toda forma, o fato é que o grau de alavancagem (operacional, financeira ou total) das concessionárias é elevado.

10 Um LBO é uma aquisição de uma companhia financiada com uma quantidade substancial de dívida . O percentual

de dívida na estrutura de capital é variável, mas levantamento do Center for Private Equity and Entrepreneurship (2013)

indica que a participação de capital próprio tem variado de cerca de 10%, no fim da década de 1980, para um percentual

próximo a 40%, no início dos anos 2000 .

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Como agravante, o setor aeroportuário é caracterizado por uma alta elasticidade-PIB da demanda. Manual publicado pela Organização da Aviação Civil Internacional estimou em 2,31 a elasticidade-PIB da demanda da aviação mundial (ICAO, 2006): ou seja, um crescimento de 1% no PIB resultaria em um crescimento de 2,31% na demanda por voos. Há, ainda, consenso de que países em desenvolvimento têm uma elasticidade-PIB superior àquela de países desenvolvidos. Com a alta elas-ticidade, a rentabilidade da concessão está bastante associada a seu potencial de crescimento, além de ensejar volatilidade no fluxo de caixa, pois a receita tende a variar mais que o crescimento/decréscimo do PIB. Esse fator aumenta o risco de um ativo; quando combinado com uma alta alavancagem, amplifica ainda mais a percepção de risco.

Dependendo do montante a ser pago anualmente de outorga fixa, esse compromisso financeiro pode pôr em risco a realização de inves-timentos e o pagamento do serviço da dívida. Isso é exatamente o que ocorreu com as concessões aeroportuárias da segunda e da terceira rodada. Os lances agressivos dessas rodadas aliados à crise econômica brasileira que se iniciou em 2014 pressionaram sobremaneira as fi-nanças das concessionárias. A título de exemplo, em 2017 o valor da outorga fixa do Aeroporto do Galeão corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) chegava a quase R$ 1 bilhão, superior à totalidade da receita líquida do aeroporto, de R$ 896 mi-lhões (CARJ, 2017). Assim, a outorga fixa anual provou ser um risco substancial não só para o financiamento dos projetos, como também para suas operações.

A forma encontrada pelo Governo Federal para minimizar o problema no curto prazo foi a edição da Lei 13.499, de 26 de outubro de 2017, que possibilitava às concessionárias da segunda e da terceira rodada

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repactuar a curva de pagamento da outorga. A Portaria 135 do Minis-tério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, de 28 de março de 2017, estabeleceu que em troca de um pagamento antecipado equivalente a x anos de outorga fixa, a concessionária ganharia um período de carência de pagamento de outorgas equivalente a 2x anos. Depois desse período, a concessionária voltaria a pagar a outorga fixa anual originalmente pactuada. Como a carência obtida é o dobro da antecipação, nos últimos anos da concessão as concessionárias pagam um valor superior ao origi-nalmente pactuado, de modo a manter o valor presente líquido (VPL) da curva de pagamento de outorga originalmente pactuada. Os aero-portos de Brasília, Guarulhos, Galeão e Natal aderiram à repactuação. Do ponto de vista do financiador, o risco de inadimplência durante o período de carência fica parcialmente mitigado, pois a outorga fixa não compete mais com o serviço da dívida. Além disso, as concessionárias ganham alguns anos para que a demanda volte a ter bom desempenho, de modo que, quando o período de carência terminar, as finanças das concessionárias estejam em outro patamar.

O Governo Federal, considerando as dificuldades da segunda e da terceira rodada, resolveu modificar a sistemática de cobrança de ou-torgas na quarta rodada. Primeiro, fixou a alíquota de outorga variável para todos os ativos em 5% da receita bruta. Para a outorga fixa, optou por seguir uma lógica muito parecida com a das reprogramações das rodadas anteriores. Assim, adotou-se uma outorga fixa mínima para cada aeroporto, e foi exigido do adjudicatário o pagamento de 25% dessa ou-torga fixa mínima no ato da assinatura dos contratos de concessão, bem como de qualquer eventual ágio. Os 75% da outorga fixa remanescente seriam pagos a partir do sexto ano (depois de um período de cinco anos de carência), de forma escalonada e crescente até o décimo ano, a partir do qual as parcelas ficariam fixas.

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Do ponto de vista do financiamento, há dois importantes ganhos com esse modelo. O primeiro é que todo o ágio e 25% da outorga fixa mínima já foram quitados antes de as concessionárias assumirem os aeroportos. Assim, boa parte da concorrência pela geração de caixa do aeroporto resultante da coexistência entre a outorga fixa anual e serviço da dívida está resolvida de antemão. O segundo ganho é que o período de carência coincide em parte com o período de maior obrigação de investimento dos aeroportos. Assim, não há concorrência por recursos entre Capex, pagamento de outorga fixa e serviço da dívida. Portanto, o modelo da quarta rodada exige uma estrutura de financiamento menos complexa.

Na quinta rodada, houve mais um aprimoramento quanto ao pagamento de outorgas: foi eliminada a outorga fixa anual. Assim, 100% de toda a outorga fixa mínima e todo o ágio foram pagos de antemão. Apenas a outorga variável ficará no projeto e ela terá um período de carência de cinco anos, com alíquotas crescentes do sexto ano das concessões até o décimo ano, a partir de quando as alíquotas ficam fixas.

Magnitude do Capex obrigatório sem gatilhos de demandaUm terceiro aspecto do modelo de concessões aeroportuárias que trouxe prejuízo à financiabilidade das concessões foi a obrigatoriedade de rea-lizar investimentos de grande monta sem gatilho de demanda. O gatilho de demanda acontece quando a obrigação de aumentar a capacidade de determinado ativo está diretamente atrelada à demanda. Ou seja, quando a demanda atingir determinado valor, geralmente anterior à capacidade máxima do ativo, a concessionária deve realizar investimentos adicionais para ampliar a capacidade do aeroporto e, consequentemente, manter o nível de serviço mínimo estipulado.

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Destaca-se que as concessões aeroportuárias ocorreram em um mo-mento em que os pátios de aeronaves e terminais de passageiros estavam no limite ou além de sua capacidade. O pátio e o terminal de Guarulhos e Brasília já operavam no limite de sua capacidade em 2009. Viracopos tinha previsão de atingir o limite de sua capacidade de pátio e terminal até 2014. O terminal de Galeão (o menos pressionado de todos) chegaria a seu limite em 2030. O terminal de Confins já estava em sua capaci-dade máxima em 2009 e seu pátio deveria chegar a seu limite em 2020 (MCKINSEY & COMPANY, 2010).

Assim, o Governo Federal dividiu as expansões de capacidade dos aeroportos em duas fases. A Fase I tipicamente tinha um período de dois ou três anos, e seu objetivo era a realização de investimentos capa-zes de trazer os aeroportos a um nível de serviço adequado aos padrões internacionais. A Fase II começaria ao término da Fase I, e seu objetivo era manter esse nível de serviço com base em determinados parâmetros relativos, como metro quadrado de área de saguão de embarque por passageiro, tempo máximo de fila de imigração, ou número de pousos e decolagens por hora. Ou seja, a partir da Fase II, novos investimentos só seriam necessários quando a demanda crescesse o suficiente para pressionar o nível de serviço.

Na medida em que investimentos em infraestrutura estão sujeitos a depreciação e elevação de custos fixos, seu provimento deve idealmente estar associado a sua utilização para evitar gastos desnecessários. Con-tudo, essa sistemática não foi adotada em alguns contratos, a exemplo de Viracopos e Confins.

Exemplo de tal configuração pode ser encontrado no PEA de Confins. Conforme o contrato, em sua versão original, havia a previsão de dupli-cação da pista de pouso e decolagem quando a movimentação anual de

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aeronaves atingisse o valor de 198 mil, ou até 31 de dezembro de 2020 (o que ocorresse anteriormente):

Quando a demanda do sistema de pistas atingir 144.000 movimentos anuais, a

Concessionária deverá apresentar à ANAC o anteprojeto e o cronograma de-

talhado de construção de uma pista de pouso e decolagem, com comprimento

mínimo de 2.500 metros, projetada para aeronaves Código E, paralela à pista

16/34 existente quando da assinatura do contrato, de modo a implantar um

sistema de pistas 16/34 para aproximações paralelas e independentes em opera-

ção IFR. A pista deve ser construída e estar plenamente operacional antes de a

demanda atingir 198.000 movimentos anuais ou até 31 de dezembro de 2020, o

que ocorrer primeiro (ANAC, 2019, anexo 2, p. 14).

É evidente que o investimento exigido guarda relação com a demanda prevista estimada à época dos estudos de tráfego (no caso de Confins, os estudos eram de 2013), mas não há uma relação direta com a demanda realmente observada depois que a concessionária assumiu o aeroporto. A crise econômica de 2014 derrubou a demanda dos aeroportos, o que fez o terminal de passageiros entregue em 30 de novembro de 2016 ter uma capacidade para atender a uma demanda que não viria a surgir por vários anos. No ano de 2018, o aeroporto processou menos de 100 mil aeronaves, aproximadamente metade do valor projetado pelo EVTEA para 2020.

O primeiro limite, de 198 mil pousos/decolagens, é um exemplo típico de gatilho de demanda. O limite temporal, até 31 de dezembro de 2020, não é um gatilho de demanda e pressionaria a concessionária a realizar robustos investimentos em uma pista sem que a demanda os justifique.

Posteriormente, em um sinal de que, na opinião da Anac, esse não seria o modelo ideal para a expansão da infraestrutura, essa cláusula contratual foi alterada por meio do Termo Aditivo 3, de 6 de março de 2019, e o limite temporal de dezembro de 2020 foi removido:

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Quando a demanda do sistema de pistas atingir 144.000 movimentos anuais, a

Concessionária deverá apresentar à ANAC o anteprojeto e o cronograma de-

talhado de construção de uma pista de pouso e decolagem, com comprimento

mínimo de 2.500 metros, projetada para aeronaves Código E, paralela à pista 16/34

existente quando da assinatura do contrato, de modo a implantar um sistema

de pistas 16/34 para aproximações paralelas e independentes em operação IFR.

A pista deve ser construída e estar plenamente operacional antes de a demanda

atingir 198.000 movimentos anuais (ANAC, 2018a, anexo 2, p. 14-15).

Ainda que a Anac tenha entendido que não fazia sentido o marco temporal, a alteração contratual é motivo de reequilíbrio econômico--financeiro a favor do poder concedente.

Situação semelhante, porém mais crítica, ocorre no PEA de Vira-copos. O aeroporto foi concedido em fevereiro de 2012, quando a expectativa de crescimento de longo prazo da economia brasileira era de 4,5% ao ano,11 e com a possibilidade de absorver parte da de-manda dos aeroportos de Congonhas e Guarulhos, cujas capacidades imaginava-se que seriam esgotadas em médio prazo. Desse modo, pou-cos aeroportos tiveram sua projeção de demanda tão alterada quanto Viracopos. No estudo de viabilidade técnica (ANAC, 2011) realizado anteriormente à licitação, projetava-se que o aeroporto ultrapassaria a marca de 180 mil movimentações de aeronaves em 2016 e a marca de 350 mil por volta de 2025 (em 2011, o aeroporto havia alcançado aproximadamente 100 mil movimentações; portanto, projetava-se um aumento de 80% em cinco anos seguido de um aumento de pra-ticamente 100% em nove anos).

11 Considerou-se que a expectativa de crescimento de longo prazo da economia brasileira é equivalente à mediana

das projeções de crescimento do PIB para 2014 e 2015 na data de realização do leilão de Viracopos (6 de fevereiro de

2012), conforme o Sistema de Expectativas de Mercado do Banco Central (https://www3 .bcb .gov .br/expectativas/publico/

consulta/serieestatisticas) .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

Nesse contexto, foi incluída a exigência de construção de uma segunda pista no aeroporto quando a demanda atingisse 178 mil movimentações anuais, e uma terceira quando alcançasse 350 mil:

Obrigatoriamente até o final da Fase II [até o fim do contrato]12 ou quando a

demanda do sistema de pistas atingir 178.000 movimentos anuais, o que ocorrer

primeiro, construção de uma segunda pista paralela de pouso e decolagem de

pelo menos 3.600 metros de comprimento, projetada para aeronaves Código F,

com distância mínima de 1.525m entre seu eixo e o eixo da pista 15/33 existente

quando da assinatura do contrato.

Obrigatoriamente até o final da Fase II ou quando a demanda do sistema de

pistas atingir 351.000 movimentos anuais, o que ocorrer primeiro, construção

de uma terceira pista paralela de pouso e decolagem de pelo menos 2.600 metros

de comprimento, projetada para aeronaves Código E, com distância mínima de

1.525m entre seu eixo e o eixo da pista 15/33 existente quando da assinatura do

contrato (ANAC, 2017c, p. 14).

Na avaliação mais recente da Secretaria de Aviação Civil, de setembro de 2017, a projeção é de menos de 200 mil movimentações de aeronaves em Viracopos em 2037 no cenário otimista e de menos de 175 mil movi-mentações no cenário conservador (BRASIL, 2017). Assim, é improvável que o gatilho de 350 mil movimentos anuais seja alcançado até o fim da concessão, em 2042.

Tal situação gera uma série de questões delicadas. Conforme a redação original, dado que o gatilho de demanda não será atingido, a obrigação de construir a terceira pista deverá ser cumprida até o fim da Fase II, o que corresponde ao último dia da concessão. Nesse caso, não haveria

12 De forma simplificada, a Fase II do contrato de concessão de Viracopos começa cerca de quatro anos depois do

início da concessão e dura até o fim do contrato .

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35A evolução recente do modelo de concessão aeroportuária sob a ótica da financiabilidade

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

descumprimento contratual até que o contrato de concessão vencesse, de modo que a força do poder concedente para exigir o cumprimento dessa obrigação é bastante reduzida, pois o inadimplemento terá sido materializado apenas depois de vencido o contrato de concessão.

Essa expansão da infraestrutura com pouca ou nenhuma flexibilidade ao concessionário, a crise de 2015-2016 e a retração da demanda que se seguiu geraram significativa capacidade ociosa nos aeroportos.

A forma ideal de avaliar se há capacidade ociosa seria o fator de utilização da capacidade instalada. De forma simplificada, tal fator seria o resultado da divisão da utilização total (no caso de aeroportos, quantidade de passageiros em determinado período) pela capacidade teórica (quantidade máxima de passageiros que o aeroporto poderia processar no mesmo período). No entanto, aferir a capacidade teórica de um aeroporto não é uma tarefa simples, uma vez que ela consiste em vários processos realizados em série e em paralelo. Para embarcar um passageiro internacional, são necessários, no mínimo, os seguintes processos:13 check-in, inspeção de bagagem, imigração, portão de embarque e capacidade de pista. Em tese, a capacidade máxima de processamento seria dada pelo gargalo desses processos; no entanto, essas informações não são usualmente divulgadas pelas concessionárias.

Visto que não há dados públicos para avaliar a capacidade teórica dos aeroportos, optou-se por usar as demonstrações financeiras das concessionárias para avaliar a magnitude do Capex realizado. Uma métrica comumente utilizada para avaliar o quão intensiva em capital é uma empresa é a razão entre ativos e receita. Esse indicador ilustra o valor de infraestrutura física necessário para produzir uma unidade de

13 Esse exemplo foi bastante simplificado, pois o aeroporto necessita ainda de diversas outras estruturas de suporte

a esses processos, como estacionamento para automóveis, posições de pátio para aeronaves, esteiras de bagagem etc .

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receita. Assim, um indicador maior relaciona-se a uma base maior de ativos (ou seja, de investimentos passados não amortizados) necessária para gerar aquela receita. No Gráfico 5, a intensidade de capital das concessionárias brasileiras é comparada à de empresas internacionais da mesma indústria – Fraport AG e Flughafen Zürich, ambas com presença no Brasil – e de indústrias sabidamente capital-intensivas – como de petróleo (Petróleo Brasileiro S.A.– Petrobras) e de energia (Centrais Elétricas Brasileiras S.A. – Eletrobras):14

Gráfico 5 | Indicador de intensidade de capital – ativo não circulante ajustado/receita líquida

1,3

1,7

2,1

2,3

2,3

2,5

4,0

4,1

6,2

Eletrobras

Petrobras

Fraport AG

Flughafen Zürich

Aeroportode Guarulhos

Aeroporto Internacionaldo Galeão

Aeroportode Brasília

Aeroportode Con�ns

Aeroportode Viracopos

Fonte: Elaboração própria .

Percebe-se, portanto, que o indicador de intensidade de capital é com-parativamente alto nos aeroportos brasileiros em relação a seus pares internacionais e mais alto ainda quando comparado a outras indústrias

14 Em todos os casos, foi considerada apenas a porção do ativo responsável pela infraestrutura física necessária à

operação da empresa . No caso da indústria de petróleo e energia, isso significou o imobilizado de longo prazo e, no

caso dos aeroportos, o ativo não circulante líquido referente à infraestrutura física (não foi considerado, por exemplo,

o direito de outorga) .

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intensivas em capital. Em especial, Viracopos, Confins e Brasília parecem ter sido os aeroportos com maior superdimensionamento. Nos dois pri-meiros casos, as estimativas do EVTEA para a demanda dos aeroportos foram muito superiores ao valor realizado, o que pode explicar por que esses aeroportos têm indicadores tão elevados. Confins está operando com aproximadamente 50% da demanda projetada (menos de 100 mil movimentações de aeronaves em 2018 diante de quase 200 mil movi-mentações projetadas pelo EVTEA para 2020), enquanto Viracopos está em cerca de 40%.

Além dos casos de Confins e Viracopos, anteriormente à consulta pública da quarta rodada de concessões, dispositivo semelhante ao de Confins havia sido incluído no PEA do Aeroporto de Salvador (quarta rodada), no qual se exigia a construção de uma segunda pista antes de a demanda atingir 130 mil movimentos anuais, ou até 31 de dezembro de 2021 (o que ocorresse primeiro). Essa redação, no entanto, foi alterada depois da consulta pública, e a versão final do contrato exige a construção somente quando o gatilho de demanda for alcançado.

Na quinta rodada, com exceção do Aeroporto de Recife, todos os outros aeroportos tinham uma definição de investimentos com base na demanda realizada observada. A redação varia um pouco de aeroporto para aeroporto, mas o conceito pode ser exemplificado pela obrigação que ficou definida para o Aeroporto de Cuiabá:

Ampliar a capacidade de processamento de passageiros e bagagens no aeroporto,

incluindo área de movimento de aeronaves, terminal de passageiros, estaciona-

mento de veículos, vias terrestres associadas e outras infraestruturas de apoio,

de modo a prover área e equipamentos adequados para processar no aeroporto,

pelo menos, a demanda de passageiros na Hora Pico apurada nos 12 (doze) meses

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compreendidos entre o 23º (vigésimo terceiro) e o 34º (trigésimo quarto) mês da

concessão, em embarque e desembarque (ANAC, [2018b], p. 36).

Com esse tipo de redação, entende-se que a concessionária pode usar seu conhecimento para definir o cronograma de investimentos que mais se adequa ao nível de serviço exigido pelo poder concedente, e este poderá monitorar apenas os parâmetros de nível de serviço.

Assim, gatilhos de demanda são desejáveis do ponto de vista da financiabilidade, pois garantem alinhamento entre o investimento em ampliação de capacidade e o aumento de faturamento do aeroporto. Justificam o financiamento do investimento, à medida que o aumento de receita ajuda o projeto a pagar o serviço da dívida incremental. Se houver um investimento relevante que não é justificado pela demanda, o fluxo de caixa do projeto será pressionado. Outro ponto importante a ser considerado é que os investimentos não são prescritivos como nas rodadas anteriores. Ou seja, o concessionário tem mais liberdade na solução adotada para garantir o nível de serviço.

Obras de responsabilidade do poder públicoNos contratos assinados na primeira, na segunda e na terceira rodada de concessões, o Anexo 3 consistia em “Obras do Poder Público”. Trata-se de intervenções que, mesmo depois de assinado o contrato de conces-são e de transferida a operação do aeroporto ao ente privado, seriam de responsabilidade do poder público. A maior parte era de obras que já estavam em andamento ou, em alguns casos, situadas fora do sítio aeroportuário, a exemplo do contrato do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante.

Constituem riscos suportados exclusivamente pelo Poder Concedente, que

poderão ensejar revisão extraordinária [...]:

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5.2.1 custos decorrentes da entrega das obras descritas no Anexo 3 - Obras do

Poder Público em atraso, com defeitos ou em desacordo com as especificações

constantes naquele anexo, que impeçam o atendimento total ou parcial das

obrigações da Concessionária [...] (ANAC, 2018e, p. 37).

Em todos os aeroportos nos quais se realizavam obras do poder pú-blico, houve solicitação de reequilíbrio por parte das concessionárias com base nessa cláusula. Embora a possibilidade de reequilíbrio esti-vesse previamente indicada nos contratos, o processo de reequilíbrio é demorado e seu cálculo envolve estimativas (como custo das obras assumidas pelo concessionário e prejuízo pelo atraso das obras) cuja aferição enseja controvérsias.

No Aeroporto de Confins, por exemplo, a Infraero era responsável por executar obras como a modernização e a ampliação do Terminal 1 e a reforma e a ampliação da pista de pouso e do sistema de pátios. A estimativa presente no Anexo 3 do contrato de concessão era de que as obras acabassem até o fim de 2014 e custassem R$ 497 milhões. Entretan-to, a Infraero não conseguiu concluir todas as intervenções previstas, e a concessionária, em atendimento ao contrato, viu-se obrigada a realizar o investimento restante para finalizar as obras.

Além disso, em casos mais dramáticos, havia obras de responsabilidade do poder público que eram fundamentais à operação dos aeroportos e que, mesmo assim, não constaram no contrato de concessão. O exemplo mais emblemático dessa questão ocorreu justamente em São Gonçalo do Amarante. Por se tratar do único aeroporto greenfield entre os con-cedidos à iniciativa privada, havia necessidade de construir uma estrada de acesso a ele, visto que o único acesso disponível era uma estrada de terra. A conclusão dessa obra, cuja responsabilidade seria do estado do Rio Grande do Norte, atrasou, e sua possibilidade de reequilíbrio não constou do contrato de concessão.

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A partir da quarta rodada, não mais se inseriu um anexo com obras do poder público nos contratos de concessão. Todavia, situação aná-loga à de São Gonçalo do Amarante ocorreu no Aeroporto de Flo-rianópolis. Conquanto não se tratasse de um greenfield, a construção de um novo terminal tornou necessária também a construção de um novo acesso ao aeroporto. No contrato de Florianópolis, constou a seguinte cláusula:

5.2 Constituem riscos suportados exclusivamente pelo Poder Concedente, que

poderão ensejar Revisão Extraordinária, nos termos deste contrato:

5.2.3. restrição operacional decorrente de decisão ou omissão de entes públicos,

exceto se decorrente de fato imputável à Concessionária;

5.2.3.1. configura a hipótese de que trata o item 5.2.3 a não disponibilização

pelo Poder Público, após o término da Fase I-B, de acesso rodoviário ao sítio

aeroportuário, desde que demonstrado pela Concessionária que o novo terminal

de passageiros de que trata o item 7.1.1 do PEA se encontra em condições de

operar (ANAC, 2017a, p. 34).

No caso de Florianópolis, o acesso ao terminal é composto por dois trechos, e a expectativa atual é de que, na data de abertura do novo terminal, um dos trechos esteja concluído, de modo a possibilitar a operação integral do aeroporto. Contudo, a não conclusão do segundo trecho deverá impactar no trânsito, podendo prejudicar a experiência do usuário.

Requerimento de capitalAs exigências dos editais das primeiras concessões não especificaram um conjunto de fatores que incentivasse um compromisso de longo prazo do acionista privado com a concessão, e talvez este seja um dos

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principais fatores que contribuíram para que a participação de ope-radores aeroportuários internacionais não tenha sido majoritária nos primeiros leilões.

Uma série de fatores colaborou para essa conjuntura, em especial o capital mínimo obrigatório. O requerimento de capital estabelecido pelo edital das primeiras rodadas era determinado exclusivamente pelo Capex projetado para os primeiros anos da concessão, sem haver qualquer relação com a outorga ou o ágio a serem pagos. Como consequência, os acionistas se comprometeram pouco com o projeto financeiramente. Na quarta rodada de concessões, 25% da outorga fixa e todo o ágio deveriam ser integralizados na concessionária como condição para assinatura do contrato de concessão. Na quinta rodada, a integralidade da outorga fixa deveria ser integralizada, somada a valores predefinidos por cada bloco no edital.

Destaque-se que, na segunda e na terceira rodada, a baixa exigência de capital soma-se aos aspectos explorados na subseção “Participação da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária”: acionistas pri-vados não operadores que detinham o controle da concessão com baixa participação em seu capital.

Visto que a maior parte do retorno de uma concessão de longo prazo para o acionista tende a estar concentrada no fim do prazo da concessão (em função da usual necessidade de aportes para investi-mento e/ou outorga em seu início), o leilão atraiu, em parte, inves-tidores que fossem capazes de extrair recursos no curto prazo das concessionárias. Tal perfil foi atraente para empresas construtoras, as quais, por meio de contratos com partes relacionadas de outras subsidiárias do mesmo grupo econômico, conseguiram remunerar seu capital no curto prazo.

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Impacto da evolução dos editais sobre o perfil vencedorA evolução do modelo de concessão aeroportuária foi parcialmente responsável pela alteração no perfil dos vencedores das concessões. O Quadro 2 apresenta as empresas ou os grupos econômicos vencedores. Observa-se que, no caso da segunda e da terceira rodada, os percentuais referem-se apenas à composição da participação privada (nesses casos, a Infraero é detentora de 49% de suas ações).

Quadro 2 | Vencedores dos leilões

Primeira rodada Segunda rodada Terceira rodadaSão Gonçalo do Amarante

Guarulhos Brasília Viracopos Galeão Confins

Engevix (50%) Invepar (90%)

Engevix (50%)

Triunfo (45%)

Odebrecht (60%)

CCR (75%)

Corporación América (50%)

ACSA (10%)

Corporación América (50%)

Egis (10%)

Changi (40%)

Zurich Airport

(24%)

UTC (45%)

Munich Airport

(1%)

Quarta rodadaFortaleza Salvador Florianópolis Porto AlegreFraport AG (100%) Vinci (100%) Zurich Airport

(100%)Fraport AG (100%)

Quinta rodadaLote Nordeste Lote Centro-Oeste Lote SudesteAena (100%) Socicam (85%) Zurich Airport (100%)

Sinart (15%)

Fonte: Elaboração própria .

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Na primeira, na segunda e na terceira rodada, de modo geral, os consórcios vencedores são compostos de grandes grupos construtores brasileiros associados a participações minoritárias de operadoras aero-portuárias estrangeiras (em negrito, no Quadro 2). A participação de um operador com experiência mínima em operação aeroportuária foi uma exigência desses editais. Além da Infraero, não havia empresa brasileira operadora aeroportuária que atendesse ao requerimento de passageiros do edital, o que favoreceu operadores estrangeiros.

Nessas três primeiras rodadas, os percentuais em parênteses referem-se às participações de cada empresa no acionista privado (lembrando que os editais dessas rodadas obrigavam a participação de 49% da Infraero na SPE). Na quarta e na quinta rodada, referem-se à participação das empresas diretamente na SPE.

O interesse dos grandes grupos construtores nas primeiras rodadas pode ser explicado pelas características dessas concessões aeroportuá-rias e pelos incentivos dados pelo modelo de concessão. As obras de modernização e ampliação são muito concentradas nos primeiros anos da concessão, gerando um concentrado fluxo de receitas de construção no início da concessão, geralmente apropriado por construtoras do próprio grupo acionista. De modo inverso, as despesas de outorga fixa nos primeiros anos das primeiras rodadas são proporcionalmente baixas em comparação às rodadas seguintes, nas quais uma parcela relevante da outorga deveria ser paga antes de a adjudicatária assumir a concessão. Essas condições, portanto, favoreceram ofertas agressivas por parte dos grupos construtores nas primeiras rodadas.

A crise econômica iniciada em 2014 e a operação Lava-Jato atingiram muitos desses grandes grupos brasileiros de construção. Esse contexto, associado às relevantes mudanças no modelo de concessões, favoreceu

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as grandes operadoras internacionais na quarta rodada. A ausência de obrigatoriedade de participação da Infraero permitiu que as operado-ras estrangeiras pudessem deter até 100% da SPE. Adicionalmente, o pagamento prévio à assinatura do contrato, na quarta rodada, de 25% da outorga fixa e de 100% do ágio provavelmente contribuiu para atrair players com perfil operador (com maior compromisso com o longo prazo da concessão), em detrimento aos de perfil construtor (mais comprome-tido com o curto prazo). Como resultado, todos os aeroportos da quarta rodada foram arrematados por operadoras estrangeiras que ficaram com 100% de seu controle.

O edital da quinta rodada especificou que 100% da outorga fixa e 100% do ágio serão pagos na largada, potencialmente intensificando o efeito da quarta rodada. Com a exceção do lote do Centro-Oeste, os outros dois lotes também tiveram como vencedoras duas operadoras estrangeiras que levaram 100% do controle dos aeroportos.

Caso ilustrativo – Aeroporto de ViracoposEsta seção, ao tratar a evolução do modelo, cita em diversos momentos o Aeroporto de Viracopos. Isso ocorre pelo fato de essa concessão, licitada na segunda rodada, acumular boa parte dos pontos negativos do modelo. Por conta de sua relevância e para contextualizar o presente artigo, esta subseção visa ilustrar o caso do Aeroporto de Viracopos.

Antes de ser concedido, o Aeroporto de Viracopos teve uma movi-mentação, em 2011, de 7,4 milhões de passageiros. O aeroporto é hub da empresa aérea Azul desde 2008 e, em 2012, a empresa aérea atendia a 85% da demanda de Viracopos. Em relação à carga, o Aeroporto de Viracopos era o segundo maior do país (22% do market share em 2012). Cargas representavam 60% da receita do aeroporto à época.

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A União concedeu ao setor privado o Aeroporto de Viracopos no leilão realizado em 6 de fevereiro de 2012. O edital determinou que a Infraero fosse acionista minoritária no aeroporto, com participação de 49%. Adicionalmente, estabeleceu uma participação mínima do opera-dor aeroportuário de 10% no capital do sócio privado, cujo requisito é comprovar experiência em operação em aeroportos que tenham tido movimentação anual agregada de pelo menos 5 milhões de usuários nos últimos dez anos.

O consórcio Aeroportos Brasil foi o vencedor do leilão, oferecendo R$ 3,82 bilhões de outorga fixa (ágio de 159,7%), divididos em trinta parcelas anuais, atualizadas pelo IPCA. Assumiu, ainda, o compromisso de realizar um Capex estimado de R$ 8,7 bilhões até o fim da concessão. A Figura 5 ilustra a estrutura societária da concessionária.

Figura 5 | Árvore societária do Aeroporto de Viracopos

UTCParticipações

TriunfoParticipações eInvestimentos

EgisAirport

Operations

InfraeroAeroportos

45% 45% 10%

Aeroportos Brasil(acionista privado)

49% 51%

Aeroportos Brasil –Viracopos

(concessionária)

Fonte: Elaboração própria .

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Tanto a Triunfo quanto a UTC são grupos econômicos brasileiros que detêm participações em empresas de infraestrutura e de construção civil. A francesa Egis é operadora de 11 aeroportos no mundo (além do de Viracopos). As obras ficaram a cargo do Consórcio Construtor Viracopos, formado pela Constran S.A. (do grupo UTC) e Construtora Triunfo (do Grupo Triunfo).

Entre as obrigações de investimento previstas, incluem-se duas no-vas pistas de pouso e decolagem. A primeira, de 3.600 metros, deverá ser construída antes de atingir 178 mil movimentações de aeronaves; enquanto a segunda deverá ser construída antes de atingir 351 mil mo-vimentações. Se os gatilhos, porém, não forem acionados (como não foram até o momento), o contrato de concessão determina que as pistas sejam concluídas antes do fim da concessão.

As obras da Fase I do aeroporto deveriam ter sido entregues em maio de 2014, de acordo com o contrato de concessão, e até o momento não foram concluídas (está ainda pendente a conclusão de 11 portões de embarque no Píer B), fato que importou na aplicação de multa no valor de R$ 384 milhões (valor na data-base de 14 de agosto de 2018 e ainda em curso) pela Anac.

A crise econômica reduziu a demanda do aeroporto em relação ao pro-jetado ao mesmo tempo que os grupos econômicos se viram envolvidos na Operação Lava-Jato, restringindo sua capacidade de tomar crédito. Em 2018, o número de passageiros e a quantidade de carga transportada foram, respectivamente, 61% e 45,8% menores do que os previstos nos estudos de viabilidade do Governo Federal para esse ano. Em decorrência da grande frustração de demanda desconectada das obrigações de investimentos es-tabelecidas no contrato de concessão, o novo terminal de passageiros com capacidade para processar 25 milhões de passageiros apresenta atualmente enorme ociosidade perante a demanda de 9,2 milhões de passageiros.

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Com suas receitas deprimidas e sem poder contar com seus acionistas privados – Triunfo Participações e Investimentos e UTC Participações, que entraram em processos recuperacionais respectivamente em 21 de julho de 2017 (recuperação extrajudicial) e 16 de julho de 2017 (recu-peração judicial) –, a concessionária não tem sido capaz de honrar seus compromissos de outorga desde 2016, quando a outorga foi paga me-diante acionamento de seguro de performance pela Anac, estando com as fixas e variáveis de 2017, 2018 e 2019 em aberto.

Em 29 de julho de 2017, considerando os diversos problemas financeiros, Viracopos solicitou à Anac e ao PPI sua qualificação para relicitação, com fulcro na Lei 13.448, de 5 de junho de 2017. Desde então, o processo não avançou, aguardando a regulamentação da lei, que ocorreu apenas em 6 de agosto de 2019 (Decreto 9.957).

Em decorrência de consecutivos inadimplementos, em especial o não pagamento das outorgas e a não manutenção de seguro-garantia, em 9 de fevereiro de 2018, a Anac iniciou procedimento para verificação de inadimplência(s) da concessionária, potencialmente ensejadora de caducidade da concessão.

Finalmente, em 7 de maio de 2018, a referida companhia apresentou ao foro de Campinas (SP), juntamente com outras empresas do mesmo grupo,15 pedido de recuperação judicial, tornando-se a primeira conces-sionária de aeroportos a utilizar o dispositivo. Atualmente o processo de recuperação judicial evolui, mas sem grandes decisões, e o processo de caducidade está suspenso por liminar.

De forma contraditória, mesmo aparentemente sendo o aeroporto em pior situação econômico-financeira, Viracopos recorrentemente é eleito

15 Sua holding privada, a Aeroportos Brasil, e sua subsidiária integral, Viracopos Estacionamento .

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o melhor aeroporto do Brasil, na pesquisa de satisfação de passageiros realizada trimestralmente pela Secretaria de Aviação Civil. Desde o início da concessão, Viracopos esteve em primeiro lugar no ranking brasileiro por 11 trimestres.

Por conta do ineditismo das dificuldades presentes nessa concessão, seu desfecho deverá servir de guia para o tratamento de situações similares no futuro. Uma eventual assimetria no prejuízo alocado entre as partes envolvidas pode impactar negativamente na viabilidade das concessões futuras, pois reduz o interesse e a disposição de assumir riscos pela parte mais prejudicada.

Propostas para o setor

Há um consenso entre especialistas do mercado, compartilhado pelos autores deste artigo, de que houve uma franca evolução no modelo de concessão aeroportuária ao longo das cinco rodadas pelas quais o país já passou. Ainda assim, acredita-se que há espaço para melhorias adicionais no modelo e em aspectos regulatórios. A seguir, estão listadas algumas sugestões.

Partes relacionadasO histórico descrito no capítulo anterior revelou que algumas fragilidades das concessões da primeira à terceira rodada eram relativas à transação com partes relacionadas, em especial nos contratos de construção. A participação de construtoras como controladoras dos consórcios formados levou a um foco na etapa de investimentos e baixo comprometimento de longo prazo com a concessão. Essa questão ainda não foi tratada de forma objetiva nas licitações mais recentes.

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Os contratos de concessão passados preocuparam-se em regular tran-sações com partes relacionadas apenas para exploração de receitas comerciais. Do ponto de vista do poder concedente, trata-se de um aspecto relevante, visto que há incidência de outorga variável nas recei-tas comerciais. Caso não houvesse tal vedação, a concessionária teria o incentivo de celebrar contratos com partes relacionadas em condições mais favoráveis e usufruiria de uma receita comercial menor, pagando, assim, uma outorga variável menor (enquanto parte do valor seria ex-traído pelo explorador da receita comercial).

Conforme consta no contrato da quinta rodada de concessões (e em todas as demais, com redações ligeiramente diferentes): “É vedado à Concessionária [...] celebrar contratos com suas Partes Relacionadas para explorar atividades econômicas que gerem Receitas Não Tarifárias” (ANAC, [2018b], p. 27).

Não há, contudo, nenhuma vedação à celebração de contratos para a operação16 ou a construção da infraestrutura. Pelo contrário, os con-tratos da quinta rodada afirmam que: “É permitido à Concessionária [...] celebrar contratos com suas Partes Relacionadas para realização de obras e serviços” (ANAC, [2018b], p. 27).

Destaque-se, porém, que o contrato também determina que: “Quais-quer contratações com Partes Relacionadas devem se dar em termos e condições equitativas de mercado” (ANAC, [2018b], p. 27).

Apesar do exposto, não há nenhuma especificação de como apurar se tais contratos foram celebrados em condições de mercado. Uma possibi-lidade seria a exigência de realização de processo de concorrência, com procedimentos e documentação previamente estabelecidos, bem como

16 No caso de partes relacionadas na operação, pode-se exemplificar o Aeroporto de Confins, o qual gastou

aproximadamente 16% de sua receita líquida com transações com partes relacionadas na operação do aeroporto no

período de 2015-2018 .

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a exigência de aprovação prévia pelo Conselho de Administração das concessionárias, com a exclusão de membros com interesse conflitan-te, para a celebração de transações com partes relacionadas cujo valor exceda um limite predefinido, em linha com o que sugere o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC (IBGC, 2018).

Com o melhor alinhamento de incentivos fornecido pela lógica recente de licitação, conforme já foi descrito neste artigo, além das dificuldades por que passam as grandes construtoras do país, o problema de obras com partes relacionadas tem se tornado menor (e as últimas rodadas de concessões, nas quais o perfil de operadores aeroportuários se sagrou vencedor, são uma prova disso).

Contudo, o problema pode persistir, ainda que em menor grau, já que não existe vedação. Há, entre os operadores estrangeiros, grupos econômicos que também atuam no ramo de construção civil e, na quinta rodada, construtoras participaram, ainda que não tenham se consagrado vencedoras do leilão. Além disso, com o aumento no número de aeropor-tos concedidos, com grupos econômicos atuando em mais de um ativo, há a possibilidade de contratos com partes relacionadas para operação e outros serviços compartilhados.

Por esses motivos, acredita-se que uma regulação mais específica com relação à realização de transações com partes relacionadas, que defina processos mínimos para assegurar termos e condições equitativas de mercado, poderia reduzir conflito de interesses e trazer maior conforto a investidores e credores.

Previsibilidade sobre a dinâmica competitivaAeroportos, como outros setores de infraestrutura, são caracterizados por altos custos fixos e significativos custos afundados. Esse perfil torna o setor semelhante a um monopólio natural, de modo que a solução

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ótima para o fornecimento desse serviço seria um único ofertante, desde que submetido a uma regulação eficiente que o impeça de abusar de seu poder de mercado.

O fato de parcela razoável dos custos se referirem a custos fixos enseja grandes economias de escala – quanto maior o tamanho do ofertante, maior tende a ser o retorno que é capaz de gerar, pois há maior dilui-ção dos custos fixos e, portanto, menor custo por unidade de serviço prestado (por exemplo, menor custo por passageiro embarcado). Dadas as características do setor, é importante que haja certa previsibilidade com relação à dinâmica competitiva à qual o aeroporto está sujeito.

No caso dos contratos assinados até o momento, o risco de alterações na dinâmica competitiva está alocado ao concessionário, conforme excerto do contrato de concessão de Confins:

Dos Riscos da Concessionária

[...]

não efetivação da demanda projetada ou sua redução por qualquer motivo,

inclusive se decorrer da implantação de novas infraestruturas aeroportuárias

dentro ou fora da área de influência do Aeroporto [...] (ANAC, 2018a, p. 39).

Está claro, portanto, que o risco de demanda está integralmente alo-cado ao concessionário. No entanto, o risco de implantação de novas infraestruturas aeroportuárias parece ser: (i) demasiado grande para ser suportado exclusivamente pelo concessionário; e (ii) em grande parte, decorrente de uma decisão do poder público, já que é ele o responsável por fornecer as autorizações necessárias para a operação de aeroportos. Esses pontos são ainda agravados pela falta de previsibilidade das ações governamentais, uma vez que não há um plano oficial de longo prazo atualizado. Essa combinação de fatores causa um desbalanceamento no

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equilíbrio de forças do contrato de concessão, pois o poder concedente conta com a prerrogativa de remover grande parte da atratividade econô-mica do contrato com uma única decisão. A previsão de alguma espécie de reequilíbrio em favor do concessionário, caso o poder público autorize a implantação de um novo aeroporto na área de influência de aeroportos concessionados, promoveria uma distribuição mais equitativa de riscos.

Exemplo desse desbalanceamento pode ser extraído do caso de Confins. O Aeroporto da Pampulha é o principal concorrente local, porém este conta com uma grande vantagem: está localizado a 9 km do centro de Belo Horizonte, enquanto Confins está a 41 km de distância. Dessa forma, é um consenso de que, se Pampulha tiver a possibilidade de ofertar voos regulares de grande porte, Confins não terá como reter esses passageiros e enfrentará uma grande redução em sua demanda. Em 2018, passaram por Confins aproximadamente 10 milhões de passageiros; o Aeroporto da Pampulha obteve 3,2 milhões de passageiros em seu auge, em 2004 (depois desse ano, foi limitado o porte das aeronaves que servem o Ae-roporto da Pampulha a um máximo de cinquenta passageiros).

Em outubro de 2017, o então Ministério dos Transportes publicou a Portaria 135 (TCU, 2017), cujo efeito prático era reestabelecer a possi-bilidade de voos regulares domésticos sem restrições na Pampulha. O efeito da portaria, contudo, foi suspenso pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e, posteriormente, o próprio Ministério dos Transportes voltou atrás em sua decisão de reabertura irrestrita do aeroporto. Na situação atual, a operação do Aeroporto da Pampulha segue restrita a voos regionais, o que limita bastante sua capacidade de captação de pas-sageiros (pouco mais de 200 mil passageiros transitaram pelo aeroporto em 2018). Entretanto, caso se decida por permitir que Pampulha volte a operar com sua demanda de 2004, seria de esperar que não tivesse dificuldade de captar novamente 3,2 milhões de passageiros de Confins.

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Situação semelhante, porém em grau mais especulativo e de menor gravidade, é passível de ocorrer com o Aeroporto de Maceió, da quinta rodada de concessões. Parte da demanda de Maceió é de passageiros com destino à região turística conhecida como Costa dos Corais, da qual Maragogi é o principal expoente. Embora não haja estimativas oficiais da quantidade de passageiros com destino à Costa dos Corais que passam pelo Aeroporto de Maceió, avalia-se que pelo menos de 5% a 10% dos passageiros desse aeroporto tenham Maragogi como destino. O Plano de Desenvolvimento da Aviação Regional (PDAR) do Governo Federal, de 2014, previa a implantação de um aeroporto em Maragogi. O PDAR foi posteriormente abandonado e, assim, a probabilidade de que o Aeroporto de Maceió seja afetado por isso é remota.

Um exemplo de país que considera, em algum grau, o risco de abertura de novos aeroportos nas proximidades do aeroporto concedido é a Índia, onde os contratos de concessão restringem novos aeroportos comerciais de passageiros em um raio de 150 km, enquanto o aeroporto concedido estiver atendendo satisfatoriamente à demanda da região (INDIA, 2004; 2012). Na concessão do Hyderabad International Airport, de 2004, um novo aeroporto só pode ser construído a partir do 25º ano da concessão, enquanto a concessão do Delhi Indira Gandhi International Airport, de 2006, garante ao concessionário o direito a recusar o controle do novo aeroporto.

Nesse sentido, todas as concessões aeroportuárias, até o momento, concentram o risco de demanda na concessionária e, por isso, o risco de abertura de novo aeroporto em sua área de influência, por decisão unilateral do poder concedente, pode ser crítico e de difícil gerencia-mento. Dessa forma, os autores do presente artigo sugerem que os con-tratos de concessão restrinjam novas autorizações dentro de um raio de abrangência, e, caso a abertura de fato ocorra, preveja proteções, como reequilíbrio e/ou direito de controle.

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Revisão extraordináriaA revisão extraordinária é a forma prevista pelos contratos de conces-são para a concessionária solicitar o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, tendo em vista impacto à concessão advindo de um risco associado ao poder concedente. O instrumento é regulado pelos con-tratos de concessão e, até recentemente, pela Resolução Anac 355, de 17 de março de 2015.

A partir da quinta rodada de concessões aeroportuárias, a Anac res-tringiu a figura de alteração relevante, descrita como eventos isolados que causem impacto superior a 1% da receita bruta anual média17 da concessão. Qualquer pleito de reequilíbrio, com base nos riscos assu-midos pelo poder concedente, só será apreciado quando, isoladamente, representar uma alteração relevante.

A justificativa, por parte da Anac, é garantir que os custos associados à intervenção regulatória sejam justificáveis perante os benefícios gerados. Contudo, ao considerar os eventos isoladamente, a Anac possibilita que o prejuízo à concessionária se some indefinidamente, ainda que o traba-lho de análise possa auferir ganhos de produtividade. Além disso, gera um incentivo para que o poder concedente faça sucessivas alterações de baixo impacto. Desse modo, entende-se que seria prudente permitir que o pleito inclua a soma dos impactos, ainda que essa soma deva superar outra porcentagem da receita para ser considerada para reequilíbrio.

O instrumento ainda desincentiva a concessionária a exercer seu di-reito ao reequilíbrio, quando prevê o poder concedente, representado pela Anac, como o único avaliador do pleito, não havendo recurso por meio de arbitragem ou terceira parte qualquer (que não a via judicial).

17 Considera a média dos três últimos anos .

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O prazo para análise também é longo, podendo se estender em até 180 dias, quando não prorrogado unilateralmente, e, ainda, caso a Anac exija um estudo extra para análise, esse custo não é incluído no cálculo de reequilíbrio.

Esse conjunto de fatores, embora, talvez, secundários no contrato de concessão, contribui para desequilibrar a relação entre as partes do contrato e traz incerteza ao investidor e credor. Por isso, conclui-se que a Anac poderia criar um critério para avaliar reequilíbrios em conjunto, assim como poderia restringir a possibilidade de prorrogação da análise dos pleitos e permitir o recurso à câmara arbitral.

Previsibilidade da indenização em caso de término antecipado da concessãoNo caso de término antecipado do contrato de concessão, por caducida-de, encampação, rescisão, anulação, relicitação ou falência, o investidor tem direito a receber indenizações referentes aos investimentos em bens reversíveis não amortizados. Este é um assunto especialmente relevante para as concessões aeroportuárias da segunda e da terceira rodada, uma vez que obtiveram, desde o início de sua exploração, desempenho finan-ceiro e operacional muito aquém do previsto, tendo, por outro lado, executado investimentos de grande monta. Apesar de extremamente relevante, não existe hoje qualquer normatização de metodologia, de base contratual ou regulamentar, para o cálculo das indenizações referentes aos bens reversíveis não amortizados.

Soma-se a isso o fato de que, a depender de quem der causa ao término antecipado, o operador privado ou o poder concedente, pode haver a frequente aplicação de multas, e a indenização líquida apurada pode ser muito inferior aos recursos comprometidos pelos financiadores, sem que eles tenham qualquer ingerência sobre o processo.

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Regularmente, países optam pela adoção de pisos à indenização com base nos financiamentos de longo prazo como forma de incentivar o mercado de crédito à infraestrutura reconhecendo seu papel relevante para o desenvolvimento econômico. A inserção desse mitigador de risco (de crédito) ancora-se também no diagnóstico de que os credores submetem-se a uma situação de grande assimetria informacional ao financiar concessões.

Entende-se aqui que a adoção de pisos à indenização paga para cada uma das modalidades de término antecipado da concessão baseadas em percentuais do financiamento dos investimentos apresentaria uma sinalização positiva ao setor de infraestrutura e, principalmente, ao mercado de crédito de longo prazo para infraestrutura.

Em consonância com a construção de um mecanismo de término de concessão que procure alinhar corretamente incentivos, o manual de ris-cos disponibilizado pelo Global Infrastructure Hub,18 o Allocating Risks in Public-Private Partnership (GI HUB, 2016), no caso de concessões aeroportuárias, por exemplo, indica que a boa prática mundial estabelece o compartilhamento de risco entre o parceiro privado e o poder conce-dente nas situações de término antecipado dos contratos, em especial naquelas causadas por inadimplementos do concessionário, de modo que seja assegurado aos financiadores e seguradores um ressarcimento entre 100% e 95% de seu crédito. Vale dizer que o manual registra que o financiador não deveria suportar o risco pelo término antecipado da concessão, posto não ser um risco por ele gerenciado.19

18 Referência em pesquisa de infraestrutura em países emergentes e desenvolvidos com foco na promoção de boas

práticas nos setores público e privado de infraestrutura .

19 O estudo argumenta que a discricionariedade do poder concedente para avaliar/determinar o término da concessão

faz esta não ser uma escolha dos financiadores, que manterão correto alinhamento de interesses na viabilização da

continuidade do negócio (a despeito de uma boa recuperabilidade nesse cenário) .

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Apesar de ser um aspecto de discussão mais geral, poderia ser avaliado como uma evolução nos futuros contratos de concessão aeroportuária, principalmente na medida em que os aeroportos restantes tornam-se menos rentáveis e mais arriscados àqueles que lhes concedem crédito.

Outro aspecto relacionado ao cálculo da indenização é a definição dos bens reversíveis, aqueles que serão entregues ao poder público ao fim da concessão, sejam eles preexistentes ou constituídos ao longo do prazo da concessão. A identificação de quais são esses bens é de suma importância para o cálculo da indenização. Apesar disso, os contratos de concessão não apresentam definição dos bens reversíveis, e não existe um processo estabelecido para acompanhamento e avaliação desses bens.

Como alternativa de evolução normativa e contratual para aten-der às boas práticas de regulação, podem-se destacar como possí-veis medidas: (i) a adoção (normatização) de processo-padrão para acompanhamento do inventário de bens, com definição clara no contrato de concessão sobre o que se consideram bens reversíveis; e (ii) a divulgação periódica da listagem dos bens reversíveis e sua avaliação (preferencialmente usando avaliador independente). No caso dos ativos inicialmente transferidos, sugere-se tornar o termo de aceitação definitiva e permissão de uso de ativos mais detalhado, incluindo listagem dos bens transferidos com seu estado de conser-vação e avaliação.

Conclui-se que a definição de um processo de gestão de bens reversí-veis, aliada ao estabelecimento de uma metodologia clara de cálculo de indenização e de um teto para multas, reduziria a percepção de risco dos credores, permitindo que estipulem uma alavancagem máxima que assegure o ressarcimento do crédito.

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Possibilidade de término antecipado coordenado e amigável do contrato de concessãoA inserção de previsão de término antecipado coordenado e amigável no contrato de concessão representaria uma melhoria relevante ao permitir uma transição coordenada na administração de um ativo de infraestrutura que esteja em dificuldades, de outra forma, insuperáveis pela regulação contratual aplicável e/ou por soluções privadas de mercado.

Tal dispositivo preenche uma carência do quadro regulatório brasileiro que só previa soluções de descontinuidade quando esta for mais benéfica a uma das partes contratuais, ignorando a existência de situações em que o término coordenado e amigável represente a melhor situação ao interesse público.

O Estatuto da Relicitação, ou devolução amigável, foi criado por meio da Lei 13.448/2017 e regulamentado pelo Decreto 9.957/2019. Sendo tal instituto um sucedâneo menos traumático e litigante da caducidade, entende-se que seria um avanço regulatório incorporá-lo ao contrato de concessão como uma modalidade de término antecipado da concessão normatizando pontos específicos a concessões aeroportuárias.

É imprescindível, considerando se tratar de uma via consensual e negociada, que sua normatização balanceie incentivos para que apenas concessões em situações financeiras que inviabilizem sua continuidade busquem pelo dispositivo sem, ao mesmo tempo, representar punição extremamente danosa aos agentes envolvidos.

Nesse sentido, ao incluir a relicitação como uma possibilidade de término antecipado da concessão, o Poder Concedente poderia avançar em alguns pontos deixados em aberto na regulamentação em vigor, por exemplo: (i) a definição de um teto para a aplicação de penalidades;

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(ii) o estabelecimento prévio das obrigações (incluindo as financeiras) que serão mantidas na operação de transição depois da adesão da con-cessionária ao processo; e (iii) as condições para a migração das dívidas contraídas para investimento em bens reversíveis da concessionária atual para a futura SPE.

Aos credores, a previsibilidade de um processo de relicitação que preserve os financiamentos que viabilizaram investimentos da concessão representa uma significativa redução na percepção do risco regulatório do projeto.

Em última instância, tal melhora na percepção de risco aumenta a propensão da estruturação de financiamentos na modalidade de project finance, considerado um fator essencial para viabilizar projetos de in-fraestrutura e que, tratando-se de um mecanismo complexo, requer segurança jurídica e um ordenamento que tutele o crédito.

Conclusões

Este artigo mostrou a evolução do modelo de concessão ao longo de cinco rodadas de licitação realizadas. Boa parte das fragilidades observadas no modelo foi superada, tornando os projetos mais atrativos a investidores e financiadores. Ainda assim, buscou-se evidenciar espaço para novas melhorias, que podem impactar, principalmente, a financiabilidade dos projetos.

Os credores são parte importante da equação necessária para viabili-zar investimentos no setor, pois, tradicionalmente, projetos na área de infraestrutura são marcados por vultosos investimentos de longa matu-ração e alta alavancagem. Tendo em vista essa necessidade, investidores

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demandam dos credores melhores condições e flexibilidade de garantias, como a estruturação de financiamentos na forma de project finance, em que o próprio projeto e suas receitas são garantias da operação.

Nesse sentido, concessões com maiores incertezas aumentam a per-cepção de risco dos financiadores, tornando mais difícil a estruturação de financiamentos. Regras claras e bem definidas, adequada alocação de riscos e responsabilidades, e clareza acerca da recuperabilidade dos recursos comprometidos, mesmo em casos extremos, dão segurança para que os financiadores tomem mais riscos nas operações e forneçam melhores opções aos investidores.

Portanto, as evoluções no modelo de concessão e na regulação do setor contribuíram, e podem continuar a contribuir, de forma significativa para melhorar a financiabilidade do setor aeroportuário.

Referências

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64 Aeroportos

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 7-65, set. 2019

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

Indústria naval

* Respectivamente, engenheiro, geólogo, gerente setorial, analista de sistemas e chefe do Departamento de

Gás, Petróleo e Navegação da Área de Energia do BNDES.

ESTALEIRO DE REPARO E MANUTENÇÃO NAVAL

Caio Márcio de Ávila Martins Pinhão Marco Aurélio Ramalho Rocio André Pompeo do Amaral Mendes Cássio Adriano Nunes Teixeira Haroldo Fialho Prates*

Palavras-chave: Estaleiro naval . Estaleiro de reparo . Construção naval . Navegação marítima .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

Shipbuilding industry

* Respectively, engineer, geologist, sectorial manager, systems analyst and head of department of the Gas,

Oil and Navigation Department of the BNDES’s Energy Division.

REPAIR AND MAINTENANCE SHIPYARDS

Caio Márcio de Ávila Martins Pinhão Marco Aurélio Ramalho Rocio André Pompeo do Amaral Mendes Cássio Adriano Nunes Teixeira Haroldo Fialho Prates*

Keywords: Shipyard . Repair and maintenance shipyard . Shipbuilding . Sea navigation .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

ResumoEstaleiros são instalações industriais destinadas à construção, manutenção e reparo de embarcações. A importância da indústria naval para a eco-nomia leva vários países, até hoje, a manter estaleiros e políticas públicas de incentivo a essa atividade. O Brasil já ostentou o posto de segundo maior construtor naval do mundo. Serão relatadas, muito brevemente, a história da indústria naval brasileira e a atual situação dos estaleiros de grande porte. O foco, contudo, recairá na descrição das diferenças e semelhanças entre dois tipos de estaleiros: aqueles dedicados ao reparo e manutenção e aqueles dedicados à construção de novas embarcações. Para isso, serão detalhadas as diversas atividades envolvidas e suas caracterís-ticas. O objetivo de mostrar o potencial para a atividade de manutenção e reparo naval no Brasil incitou a apresentar, também, considerações acerca da frota nacional de grande porte da marinha mercante e do tráfego de cabotagem na costa das regiões Norte e Nordeste do Brasil.

AbstractShipyards are industrial facilities for the construction, maintenance and repair of vessels. The importance of the shipbuilding industry to the economy has led many countries to maintain shipyards and public policies to encourage this activity. Brazil has once held the rank of second largest shipbuilder in the world. Very briefly, the history of the Brazilian shipbuilding industry and the current situation of large shipyards will be reported. The focus, however, will be on describing the differences and similarities between two types of shipyards: those dedicated to repair and maintenance and those dedicated to building new vessels. For this, the various activities involved and their characteristics will be detailed. The objective of showing the potential for naval maintenance and repair activity in Brazil prompted the presentation of considerations about the large national merchant navy fleet and cabotage traffic along the coast of the North and Northeast of Brazil.

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71Estaleiro de reparo e manutenção naval

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

Introdução

Estaleiros são instalações industriais destinadas à construção e ma-nutenção de todos os tipos de embarcações, sejam elas de finalidade militar – fragatas, corvetas, porta-aviões e submarinos, por exemplo – ou finalidade civil – como as embarcações para transporte de carga, de passageiros, turismo, balsas, lanchas, plataformas de exploração de petróleo e demais barcos de apoio às atividades offshore.

Os principais equipamentos de um estaleiro são os diques, onde re-pousam as embarcações a serem trabalhadas. Também integram o esta-leiro outras unidades de suporte e apoio, como caldeiraria, carpintaria, oficinas mecânicas e elétricas, pintura, entre outras, além de grandes equipamentos como os guindastes.

Em diversos países, a presença do Estado, materializada em políticas públicas, foi fundamental para a indústria naval. No Brasil, no período 1956-1961, houve o Plano de Metas do Governo Federal. O desenvolvi-mento relevante dessa indústria teve início nos anos 1970, considerados os anos de ouro para a construção naval no país.

Implementaram-se planos plurianuais. O 1º Plano de Construção Naval, executado entre 1970 e 1974, e o 2º Plano, entre 1975 e 1979, proporcionaram um crescimento significativo ao setor. Viabilizaram-se a ampliação e a modernização da frota mercante (tanto para cabotagem quanto para longo curso) e a consequente consolidação de um parque de estaleiros no país. Em 1979, os estaleiros empregavam cerca de 40 mil trabalhadores e levaram o Brasil a ser o segundo maior construtor de navios do mundo, atrás apenas do Japão. Os impactos negativos das crises do petróleo, em 1973 e 1979, com a consequente retração do mercado mundial, foram minimizados graças à adoção desses planos.

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72 Indústria naval

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

A mudança da política econômica e a abrupta abertura da economia ao mercado internacional marcaram a década de 1990. Nesse período, o setor naval assistiu ao desaparecimento de inúmeras empresas de na-vegação brasileiras, que passaram ao domínio do capital estrangeiro. A estagnação do setor naval na última década do século passado resultou em grande defasagem tecnológica em relação aos demais países constru-tores e em uma forte evasão da mão de obra especializada. A exploração de petróleo offshore crescia significativamente, mas as encomendas de embarcações de grande porte eram direcionadas aos países asiáticos.

A partir de 1999, iniciativas como o primeiro Programa de Renovação da Frota de Embarcações de Apoio Marítimo (Prorefam), da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras), e posteriormente, a partir de 2003, a amplia-ção do Prorefam e o início do Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef), da Petrobras Transporte S.A. (Transpetro), em 2005, concomitantes com a existência de uma política de conteúdo local para o setor de petróleo e gás (P&G), foram determinantes para a revitalização do setor, de forma análoga ao que se pode observar em muitos países cuja indústria naval se desenvolveu.

Considera-se o marco do ressurgimento da indústria naval no Brasil, com a retomada da construção de embarcações de grande porte, a assi-natura do contrato entre a Transpetro e o Estaleiro Mauá, em dezem-bro de 2007, para a construção de quatro petroleiros. Outro momento relevante nesse processo foi a criação, pelo Governo Federal, do Fundo de Garantia da Construção Naval (FGCN),1 em setembro de 2009, com aporte financeiro de R$ 5 bilhões para garantir o risco de operações

1 O FGCN é administrado pela Caixa Econômica Federal e foi criado com o objetivo de garantir o risco de crédito das

operações de financiamento para construção ou produção de embarcações e o risco de performance do estaleiro brasileiro .

É um fundo de natureza privada, com patrimônio próprio dividido em cotas e que está sujeito a direitos e obrigações

próprias, não contando com qualquer tipo de garantia ou aval por parte do setor público . Atualmente, o FGCN está

praticamente sem recursos depois de honrar o pagamento aos credores da Sete Brasil, em fevereiro de 2016, na ordem

de R$ 4,4 bilhões (divididos entre Banco do Brasil, Itaú, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Santander) .

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73Estaleiro de reparo e manutenção naval

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

financeiras na construção de embarcações.2 Isso conferiu sustentabilidade para o crescimento da indústria de construção naval, que, empregando apenas 1.900 trabalhadores diretos no ano 2000, chegou a empregar mais de 82 mil trabalhadores diretamente em 2014 (SINAVAL, 2018).

A crise econômica que se seguiu, a partir de 2015, com a derrubada dos preços do petróleo para um patamar de US$ 30/barril, o envolvimento da Petrobras em escândalos financeiros e o contexto político brasileiro afetaram dramaticamente o setor naval, que perdeu quase 50 mil postos de trabalho entre os anos 2014 e 2016 (Gráfico 1).

Gráfico 1 | Empregos no setor naval, 2005-2018

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

70.000

80.000

90.000

14.4

42

19.6

00 29.1

25

33.2

77 40.5

00

56.1

12

59.1

67

62.0

36

78.1

36

82.4

72

57.0

48

34.7

77

34.0

26

23.1

31

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

Fonte: Sinaval (2018) .

No período 2007-2014, as políticas públicas destinadas à indústria de construção naval brasileira resultaram na construção de novos esta-leiros, na modernização dos já existentes e na criação de novas regras

2 O Brasil teve, em 2012, a quarta maior carteira de encomendas de navios do mundo, segundo dados do Portal Marítimo .

Disponível em: https://www .portalmaritimo .com/ . Acesso em: 12 set . 2018 .

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74 Indústria naval

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

de financiamento para os armadores brasileiros, além da produção de dezenas de navios de grande porte e de mais de uma centena de navios de apoio à produção offshore de petróleo. No entanto, a atividade de reparo e manutenção naval no país historicamente sofre com a falta de investimentos (FELIPE, 2012), diante do desinteresse dos estaleiros nacionais por esse nicho de mercado.3 Mesmo nesse período de alta atividade do setor, ocorreu o deslocamento de parte da frota mercante brasileira para reparos em estaleiros no exterior.

A racionalidade na operação da atividade de manutenção e repa-ro é bem distinta da observada na atividade de construção naval de embarcações de grande porte, apesar de terem muitas características em comum, como será apontado ao longo do texto, que apresenta um panorama sobre os estaleiros de reparo e o potencial para essa atividade no Brasil. Observa-se, contudo, que, no mundo, são poucos os estaleiros que se dedicam simultaneamente às duas atividades, a de manutenção e reparo e a de construção, na mesma área industrial.

Principais instalações de construção naval de grande porte no Brasil

A seguir, são apresentadas breves informações sobre os principais estalei-ros brasileiros com capacidade de construção ou reparo de embarcações de grande porte, que poderiam ser utilizados pelos armadores brasileiros. Essas informações são, em grande parte, baseadas em Felipe (2012).

3 Os órgãos reparadores dos meios navais da Marinha do Brasil, com destaque para o Arsenal de Marinha do Rio de

Janeiro (AMRJ), a Base Naval de Aratu (BNA) e a Base Naval de Val-de-Cães (BNVC), também apresentam sérias dificuldades

para a docagem de seus navios, diante dos inúmeros serviços de manutenção e reparo em andamento, do prolongado

período de manutenção geral dos meios mais complexos da Marinha (fragatas e corvetas, entre outros), da obsolescência

de seus equipamentos, da escassez de mão de obra especializada e do número reduzido de diques .

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75Estaleiro de reparo e manutenção naval

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 67-107, set. 2019

• Estaleiro Atlântico Sul (EAS) – localizado no município de Ipo-juca (PE), no Complexo Industrial Portuário de Suape. Está vol-tado para a construção de todos os tipos de navios cargueiros e petroleiros, além de plataformas off-shore. Possui um dique seco4 e cais de acabamento com 700 m. Sua capacidade instalada de pro-cessamento é de 160.000 t de aço por ano. Em meados de 2019, finalizou a construção de navios Aframax para a Petrobras, época em que não contava com novas encomendas em sua carteira.

• Estaleiro Vard Promar – também localizado no Complexo de Suape, em Ipojuca (PE). Tem como parceiro tecnológico a Vard, do Grupo Fincantieri, da Itália. Entregou sua primeira embar-cação em agosto de 2014. Até o fim de 2018, não contava com novos pedidos em sua carteira.

• Estaleiro Rio Grande (ERG) – localizado às margens do canal de acesso à Lagoa dos Patos, no município de Rio Grande (RS). Está voltado à construção naval. Foi inaugurado em 2010, para atender, entre outras demandas, à construção de cinco platafor-mas para a Petrobras. Tem capacidade de processar 30.000 t/ano de aço, e seu dique seco tem 350 m de comprimento, 133 m de largura e calado de 13,8 m. Até o fim de 2018, estava com suas atividades paralisadas, em recuperação judicial.

• Estaleiro Jurong Aracruz (EJA) – localizado em Aracruz (ES). Faz parte do Grupo SembCorp Marine (SCM), pertencente ao governo de Singapura. Tem capacidade de processamento de

4 A construção ou reparo das embarcações podem ser feitas em três tipos de instalação: dique seco, dique flutuante

ou carreira (detalhados mais adiante) . No dique seco, a embarcação é colocada ou construída em um tanque que será,

ao fim dos trabalhos, alagado para a retirada do barco . O dique flutuante consiste em uma embarcação que é inundada

e submerge abaixo do barco a ser trabalhado e depois volta a flutuar na superfície da água com a retirada da água de

lastro do equipamento . A carreira é usada para embarcações de menor porte e consiste em construir o barco na beira

do cais e, quando o casco fica pronto, é empurrado para a água, onde é finalizado .

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48.000 t/ano de aço. Em 2018, finalizou a integração de módulos da plataforma Petrobras P-68.

• Estaleiro Enavi Renave (Empresa Brasileira de Reparos Navais) – localizado na Ilha do Viana, na Baía de Guanabara, na cidade do Rio de Janeiro (RJ). Está voltado para realização de reparos, jumborização5 e conversão de navios. Possui um dique seco de 184 m e três diques flutuantes. Encontrava-se, até o fim de 2018, em atividade, atuando somente como estaleiro de reparo.

• Estaleiro Mauá – localizado na Ponta d’Areia, na cidade de Ni-terói (RJ). Está voltado para a construção de navios cargueiros, full containers,6 petroleiros, graneleiros, roll-on/roll-off,7 quími-cos e plataformas petrolíferas. Tem capacidade de processar 36.000 t/ano de aço e construir navios de até 70.000 DWT (ou porte bruto da embarcação – TPB). Também efetua conversões e reparos em dique seco ou em dique flutuante. Até o fim de 2018, estava realizando reparos de pequenas embarcações.

• Eisa (Estaleiro Ilha) – localizado na Ilha do Governador (RJ). Era focado na construção de grandes e médias embarcações. Possui duas carreiras, 730 m de cais de acabamento e tem capacidade de processar 52.000 t/ano de aço. Até o fim de 2018, encontrava-se em processo de recuperação judicial.

• Estaleiro Inhaúma (antigo Ishibras) – localizado no Rio de Ja-neiro (RJ). Dedicava-se à construção, reparo e conversão de na-vios graneleiros, de petroleiros, de carga geral e plataformas de

5 Jumborização é o processo em que se realiza um corte transversal vertical no navio para a inserção de um novo

conjunto de porões e trecho de casco que depois é fundido às seções do casco original .

6 Navio do tipo full container é aquele especializado para o transporte de todos os tipos de contêineres .

7 Navios do tipo roll-on/roll-off, ou simplesmente ro-ro, são navios em que a carga entra por seus próprios meios; logo, são

especializados no transporte de veículos . Os embarques e desembarques são realizados pelas rampas existentes no navio .

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petróleo. Tem como parceiro tecnológico o grupo estatal Cosco, da China. Em 2010, foi arrendado pela Petrobras, que preten-dia se capacitar para a conversão dos navios tipo very large crude carrier (VLCC) em plataformas tipo floating production, storage and offloading (FPSO). Possui dois diques secos com 350 m de comprimento e calado de 7 m e outro com 160 m. Sua capaci-dade de processamento de aço é de 50.000 t/ano. Até o fim de 2018, estava sem atividades e vem operando como um terminal de uso privado (TUP), basicamente movimentando contêineres.

• Estaleiro Brasfels (antigo Verolme) – localizado em Angra dos Reis (RJ). Está voltado para reparos offshore e construções de grande porte. Conta como parceiro tecnológico com a Keppel Fels, de Singapura. Tem capacidade de construir navios de até 600.000 TPB e pode processar até 50.000 t/ano de aço. Possui um dique seco de 80 m de comprimento por 70 m de largura e duas carreiras de mais de 300 m. No fim de 2018, concluiu a integração da Plataforma Petrobras P-69.

• Estaleiro Enseada do Paraguaçu – localizado em Maragogipe, no Recôncavo baiano. Seria um estaleiro de grande porte para cons-trução de sondas e plataformas, porém nunca entrou em opera-ção. Até o fim de 2018, estava sendo utilizado como um TUP.

• Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ) – localizado no centro da cidade do Rio de Janeiro. É dedicado à Marinha do Brasil para manutenção e reparo de embarcações militares. Pos-sui três diques secos (de 255 m, 165 m e 88 m de comprimento), um dique flutuante (de 100 m de comprimento) e duas carreiras de 116 m.

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Reparo e construção naval: diferenças e semelhanças

Estaleiros são unidades fabris do setor naval em que são construídas ou reparadas embarcações de diversos tipos e tamanho. Em um primeiro momento, essas atividades realizadas nos estaleiros podem ser enten-didas como sendo de uma mesma natureza. No entanto, a construção naval é uma atividade industrial, ao passo que o reparo é tipicamente uma atividade do setor de serviços. Se, em princípio, tecnicamente nada impediria que os estaleiros de construção fizessem reparos e que os estaleiros de reparo realizassem a construção de embarcações, exis-tem dificuldades econômicas, de negócio e estratégicas que não tornam simples para um estaleiro intercambiar entre as duas atividades, mesmo os processos subjacentes tendo muitos pontos em comum.

Uma grande diferença entre a construção e o reparo de embarcações é que a construção geralmente é realizada em diques secos8 (ou carreiras,9 para barcos menores) e o reparo e manutenção podem usar, além do dique seco, diques flutuantes10 ou o cais.

Observe-se que um dique seco usado para reparo não poderia ser compartilhado com uma embarcação em construção, já que os prazos para realização dos serviços de manutenção e reparo são de ordem de

8 Dique seco (dry dock) é uma estrutura de concreto dotada de uma comporta de aço na qual a construção do navio se dá

no plano horizontal . A comporta permite o alagamento do dique . Uma vez terminada a construção, o navio é posto a flutuar .

9 Carreira (berth, inclined berth, slipway) é um plano inclinado no qual um navio é edificado ou montado durante a

construção, ou ainda, onde é encalhado para passar por revisão ou reparos . Pode ser longitudinal ou lateral .

10 Dique flutuante (floating dock) é uma estrutura de aço em forma de U, dotada de tanques cujo esvaziamento permite

a elevação da embarcação que será reparada .

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grandeza muito diferente dos prazos da construção (cerca de 15 dias para reparos e pelo menos dez meses para construção).

As instalações de construção possuem guindastes muito potentes, com grande capacidade de içamento, para o transporte de módulos montados fora do dique, ou mesmo fora do estaleiro, além de grandes oficinas de produção. O reparo, por outro lado, demanda equipamentos menores, embora mais versáteis, além de as oficinas metal-mecânicas, pela natureza da atividade, precisarem ser mais diversificadas e flexíveis.

A localização geográfica de um estaleiro de construção não é determi-nante para a conquista de uma carteira de clientes, já que a construção da embarcação dura um ano ou mais. Por outro lado, os serviços de reparo e manutenção são realizados em poucas semanas e, portanto, o armador tem preferência por estaleiros próximos a suas rotas mais frequentes.

Apesar dessas diferenças fundamentais, as duas atividades têm siner-gias que nem sempre são enxergadas. Dentre os fatores da atividade de reparo que favorecem a de construção, cinco se destacam (VERAX CONSULTORIA, 2009):

• O primeiro relaciona-se ao desenvolvimento de know-how que de-corre da frequência e da diversidade de navios reparados, usual-mente construídos por diferentes construtores ou projetistas, em diferentes países. A atividade de reparo é um dos principais atalhos para evoluir tecnicamente rumo ao domínio do processo de construção naval, pois oferece a oportunidade de conhecer projetos, embarcações, materiais e, eventualmente, até métodos de construção utilizados por inúmeros outros estaleiros.

• O segundo refere-se à estabilidade de receitas que o reparo e a manutenção permitem, quando desenvolvidos em paralelo com a construção. Os longos ciclos da construção naval não ocor-

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rem na atividade de reparo, como visto, muito mais curtos. Não tendo ciclos correlacionados, em períodos de contração de um segmento, muitas vezes, o outro poderia sustentar a viabilidade econômica do estaleiro.

• O terceiro relaciona-se ao fato de ambas favorecerem a formação, ou consolidação, de uma cadeia de fornecedores de peças, supri-mentos, sistemas e serviços navais (também chamados de navipe-ças). As atividades de reparo e manutenção estimulam a indústria de navipeças a se desenvolver, sendo, para o caso de alguns com-ponentes, até mesmo mais relevantes que a própria construção.

• O quarto é o fato de ser mais fácil para um estaleiro que já tenha adquirido a confiança de armadores, pela prestação do serviço de reparo, obter uma clientela que viabilize o início de sua atua-ção como construtor.

• O quinto é que a lucratividade da atividade de reparo é bem maior que a da construção, apesar de os volumes financeiros en-volvidos serem bastante inferiores.

Assim, sempre existe a possibilidade de transformar um estaleiro de construção em um estaleiro de reparo e vice-versa, desde que haja viabili-dade de mercado e econômica e que sejam realizados investimentos ne-cessários às adaptações requeridas ao exercício das respectivas atividades.

Manutenção, reparo e conversão

Como apresentado na seção anterior, a construção de novas embarcações é realizada em diques secos, carreiras ou em diques cobertos. Depois de uma primeira etapa de finalização do casco, podem ser lançadas à água,

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onde serão feitos os acabamentos e instalados os demais equipamentos. Trata-se de um bem de capital com longo prazo de produção, em geral superior a dez meses, que envolve internamente diversas oficinas de suporte à construção, bem como um grande número de fornecedores (localizados fora do estaleiro) de peças e de conjuntos montados.

Os estaleiros de manutenção e reparo prestam serviços aos armadores para que eles cumpram os requisitos e regulamentos da Organização Marítima Internacional (OMI)11 e das sociedades de classificação nos navios, além de manterem as embarcações em alto padrão, conforme exigência das sociedades classificadoras, e os requisitos e regulamentos de navegabilidade contínua.12

Como afirmado, diferente da atividade de produção industrial da construção naval, o reparo é uma atividade típica de serviço. No en-tanto, ambas são intensivas em trabalho e capital (em menor volume, no caso dos reparos). A intensidade do trabalho dificulta a automação, apesar dos avanços tecnológicos realizados. Isso traz competitividade de custos para os países em desenvolvimento, que dispõem de mão de obra de baixo custo (MOUS, 2011).

A construção naval de embarcações de grande porte é uma atividade realizada predominantemente em alguns países asiáticos, como China, Japão e Coreia do Sul, e em menor intensidade em alguns países europeus que realizaram investimentos significativos em estaleiros no passado (OCDE, 2008). Além disso, outros países emergentes também dispõem de estaleiros de construção e de reparo, que não são tecnicamente

11 A OMI foi criada em 1948 com os seguintes propósitos: (i) promover mecanismos de cooperação; (ii) promover a

segurança marítima e a prevenção da poluição; e (iii) favorecer a remoção dos óbices ao tráfego marítimo . Disponível

em: https://www .marinha .mil .br/dhn/?q=pt-br/node/35) . Acesso em: 5 set . 2018 .

12 Os planos de gerenciamento de manutenções dos navios e dos equipamentos estão previstos em legislação, no item

10 do padrão International Safety Management Code (ISM Code) .

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avançados, porém contam com uma oferta de mão de obra relativamente qualificada e de baixo custo.

Observe-se que as embarcações modernas são cada vez mais com-plexas, com sistemas automatizados e eletrônicos. Logo, até para as manutenções e retificações regulares, também se vê aumentar a so-fisticação e a qualificação demandadas aos prestadores de serviços de reparo (MOUS, 2011).

Tipos de reparos e manutençãoA manutenção e os reparos de navios podem ser classificados em dois grandes grupos: manutenção periódica e manutenção de operação. Essas atividades podem ser mais divididas, em um total de cinco subgrupos, como descritos a seguir (BOZORGPOUR; OMARAEE; ASADI, 2017):

• Manutenção diária e durante a operação: reparos de rotina, realizados pelo pessoal técnico do navio de acordo com as ins-truções do fabricante; ou feitos com base na necessidade e na urgência levantadas durante a viagem e durante a operação, sem precisar de reparador externo, bastando a capacidade técnica da própria tripulação.

• Reparo de operação: denominação dada a uma série de repa-ros de rotina, mas que estão além da capacidade da tripulação. Assim, o navio precisará ser despachado para um estaleiro que efetuará os reparos previstos.

• Reparos periódicos: para as embarcações com menos de 15 anos, são exigidos reparos periódicos uma vez a cada cinco anos. Aci-ma de 15 anos, a frequência passa a ser de um reparo a cada dois anos e meio de seu ciclo operacional. Trata-se de reparo em doca seca, com execução de revisão geral do corpo do navio, da super-

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fície inferior à linha d’água, dos equipamentos e maquinarias da casa de força, do convés e dos instrumentos de navegação.

• Reparações relacionadas com a conversão e alteração do uso do navio: referem-se a todos os serviços relacionados à alteração da estrutura e configuração dos navios, de modo a permitir-lhes alcançar outros objetivos operacionais, além dos inicialmente definidos quando foram projetados e construídos.

• Reparos sem planejamento antecipado: qualquer reparo ne-cessário em decorrência de fatores externos, como colisões ou acidentes, que levem a falhas ou avarias em componentes da embarcação, tais como eixos, hélices, motores, casco ou qual-quer outra parte vital. É um tipo de reparo que tem de ser feito o quanto antes, para devolver ao navio sua capacidade de navegação.

A docagem também ocorre no momento da desativação, desmobili-zação e sucateamento de uma embarcação.

LocalizaçãoJá foi citado que os estaleiros especializados na construção de novas embarcações não são tão sensíveis à localização, ao passo que aqueles especializados em reparo e manutenção têm grande vantagem compe-titiva quando localizados próximos às principais rotas ou aos principais pontos de carga e descarga. Isso decorre da minimização do tempo de inatividade dos navios, que não perdem muito tempo no deslocamen-to até o estaleiro de reparo. Exemplos de localizações estratégicas são Singapura, o Golfo Pérsico e o Mediterrâneo.

Além disso, para aproveitar a economia de escala, é comum que se instale um agrupamento de estaleiros em uma determinada região. De

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fato, vê-se a formação de polos navais, com uma força de trabalho mais focada e com um maior número de fornecedores de navipeças e serviços, garantindo maior competitividade. Os agrupamentos acabam definindo uma vocação para cada região, umas se dedicando mais à construção e outras, ao reparo. O efeito disso pode ser visto no Japão, na China e na Coreia do Sul, que são mais conhecidos pelos estaleiros de construção naval, enquanto Singapura, Dubai e Bahrein se destacam como centros de reparo de navios.

Competitividade dos estaleiros de reparo

Em 2018, o valor do mercado global de serviços de reparo e manutenção naval foi da ordem de US$ 20 bilhões, e estima-se que será de algo em torno de US$ 40 bilhões em 2028, segundo estudo da Future Market Insights (FMI, 2018a). O serviço de reparo e manutenção de embarcações é geograficamente disperso, visto que a localização é de suma importância competitiva para o negócio. Os reparos de rotina tendem a ser realizados perto das rotas de operação do navio. Para reparos envolvendo trabalhos mais complexos, o raio de competição é mais amplo, podendo envolver a disputa entre estaleiros geograficamente mais distantes.

Um estaleiro de reparo é um negócio intensivo em mão de obra, especialmente para embarcações mais antigas, o que faz sua instalação naturalmente ocorrer em regiões de baixo custo, como na China, na Ásia e no Oriente Médio. A parcela dos serviços de manutenção e reparo nos custos totais de uma embarcação, ao longo de sua vida útil, é relativamente baixa, entre 5% e 7%, inferior aos custos de tripulação

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e combustível. No entanto, quando os navios estão mais antigos, esse percentual pode chegar a cerca de 20% dos custos totais (FMI, 2018b).

Na Tabela 1, são indicados os custos relativos à mão de obra de alguns países selecionados comparados à mão de obra nos estaleiros coreanos. Embora os dados sejam de 2006, pode-se conjecturar que não houve alterações significativas na comparação relativa entre os países, ainda va-lendo para o cenário atual. Observa-se que, além de Singapura, dois países europeus, Polônia e Portugal, apresentavam custos competitivos para a mão de obra em 2006. Entretanto, os custos do trabalho na Alemanha, na Noruega e no Reino Unido eram significativamente mais elevados.

Tabela 1 | Custo da mão de obra dos estaleiros com base na Coreia do Sul, 2006

Continente País Custo da mão de obra

US$/hora Coreia do Sul = 100

Ásia Japão 20,20 137,2

Coreia do Sul 14,72 100,0

Singapura 8,55 58,1

Europa Alemanha 34,21 232,4

Itália 25,07 170,3

Noruega 41,05 278,9

Polônia 4,99 33,9

Portugal 7,65 52,0

Espanha 18,83 127,9

Reino Unido 27,10 184,1

América Estados Unidos da América 23,82 161,8

Fonte: Song, Seo e Yum (2010) .

Em estudo elaborado pelo Ipea em 2014, o custo de mão de obra (ano--base 2011) da China era de cerca de US$ 4 por homem-hora (Hh) e o do Brasil era próximo de US$ 6/Hh, enquanto o da Coreia do Sul era de aproximadamente US$ 14/Hh (NETO; POMPERMAYER, 2014).

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Quatro fatores desempenham um papel importante na conquista de um contrato de reparo (BOZORGPOUR; OMARAEE; ASADI, 2017):

• proximidade: um estaleiro de reparos deve estar localizado pró-ximo às principais rotas comerciais ou próximo aos principais portos de carga e descarga, como citado anteriormente;

• custo: também já comentado, por se tratar de uma atividade in-tensiva em mão de obra, os países de baixo custo do trabalho podem vir a ser mais atrativos, desde que essa mão de obra de baixo custo tenha boa qualificação;

• rapidez: o prazo de execução das manutenções e reparos é dife-rencial importante na opção do armador por um determinado estaleiro, pois interessa que a embarcação volte o mais rápido possível à operação; e

• competência: além de atender às três exigências anteriores, um estaleiro de reparo deve contar com know-how, maturidade, tra-dição, excelência na execução dos serviços e confiabilidade, esta última adquirida com o tempo e o reconhecimento dos clientes. Também é importante que o estaleiro disponha de uma série de certificações de classe, ou de qualidade, que são emitidas por empresas independentes e atestam o cumprimento de diversas exigências de segurança e qualidade pelo estaleiro.

Estima-se que o mercado global de serviços de reparo e manutenção de navios melhore durante os próximos anos, em razão do aumento da vida útil dos navios e da necessidade de proporcionar a maior segurança possível à tripulação e à carga durante o transporte. Além disso, com o aumento do comércio mundial, países como Rússia, China, França e Índia devem ampliar a demanda por navios, o que também redunda no aumento da demanda pelos serviços de reparo e manutenção (FMI, 2018b).

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Pontos fortes e fracos para um estaleiro de reparos no Brasil

O Brasil pode atrair a instalação de novos estaleiros direcionados à ati-vidade de manutenção e reparo, bem como pode reformular o escopo de atuação de algum estaleiro de construção. Dentre os pontos favoráveis para o Brasil atrair essas atividades, destacam-se:

• a extensão do litoral brasileiro;

• a posição geográfica do país, favorável por conta das rotas entre o Atlântico Sul, o Atlântico Norte, o Canal do Panamá e o Gol-fo do México;

• a intensa atividade na exploração de petróleo offshore;

• o fato de o Brasil não sofrer tempestades tropicais;

• a existência atual de mão de obra qualificada e de baixo custo; e

• a boa qualidade dos serviços.

Por outro lado, algumas fragilidades dessa indústria no Brasil seriam:

• os custos de reparo são maiores que na China e em alguns outros países da Ásia;

• a duração de reparos periódicos (reparo em doca seca) e reparos de operação, em média, ainda é superior à de outros países (o pra-zo é o fator mais importante para as companhias de navegação);

• o fraco desempenho observado em muitos estaleiros do país, notadamente os mais antigos, pode decorrer da falta de instru-mentos de gestão;

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• a descentralização dos fornecedores de navipeças (provedores de equipamentos e peças de reposição), tecnologias obsoletas, a escas-sez de oficinas especializadas e a falta de competência técnica de alguns terceirizados são fatores que diminuem a  competitividade;

• o governo reconhece pouco a importância estratégica do setor naval, o que se revela na dificuldade de formulação adequada de políticas, ao longo do tempo, para atrair investidores do setor privado, como fazem os principais países nessa área;

• há risco cambial, uma vez que a estrutura de receita tem forte componente em moeda estrangeira;

• as regras e os regulamentos alfandegários são complexos;

• há debilidade nos sistemas logísticos para o fornecimento com-petitivo de peças e equipamentos de reparo necessários, apesar da posição geográfica adequada do país; e

• os estaleiros têm dificuldade em atrair especialistas nacionais e estrangeiros necessários a essa indústria.

Atualmente, o serviço de reparos navais para grandes embarcações é ofertado principalmente no Enavi Renave, que possui cinco diques, três flutuantes e dois secos, onde realiza todos os tipos de reparos, con-versões e docagens. Embora tenha capacidade para atender a mais de cem navios por ano, seu parque industrial é antigo, o que prejudica sua competitividade. Com isso, os armadores de navios de longo curso em geral realizam os reparos periódicos de suas embarcações em estaleiros no exterior.

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Estaleiro de reparo ou estaleiro de construção?

A grave crise existente no setor naval brasileiro, depois de vultosos in-vestimentos realizados entre os anos de 2003 e 2014, remete à questão da possibilidade de utilização de estaleiros de construção, alguns deles inau-gurados relativamente há pouco tempo, como estaleiros de reparo. Essa alternativa poderia trazer um pouco de fôlego ao setor, que espera por uma política pública que favoreça a utilização do parque produtivo instalado.

No Brasil, existem estaleiros de construção de grande porte que se encontram fechados ou subutilizados. Tecnicamente, eles poderiam ser utilizados para reparo, caso houvesse investimentos para readequar seu foco de atividade e houvesse demanda suficiente para a atividade de reparos no país. Dos 12 estaleiros de grande porte, dois estão sem atividades, dois se encontram em recuperação judicial e dois vêm sendo utilizados como TUP (SINAVAL, 2018). O EAS, um dos maiores do Brasil, também sofre com a falta de encomendas.

O EAS veio ganhando competitividade e reduziu significativamente os prazos de entrega, trilhando a curva de aprendizado de modo análo-go ao observado nos melhores estaleiros do mundo. O primeiro navio entregue levou mais de quarenta meses para ser construído, ao passo que o último deverá ser entregue em menos da metade desse tempo, aproximando-se dos prazos praticados no mercado internacional. Para não encerrar suas atividades e não desmobilizar toda sua mão de obra qualificada ao longo de uma década, uma das possibilidades para o EAS poderia ser atuar como estaleiro de reparo e de manutenção até que retornassem as encomendas para novas construções.

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As semelhanças existentes entre as instalações de reparo e as de cons-trução significam que a mudança de um foco para outro, apesar da complexidade quanto a reposicionamento do negócio, não é impossível (OCDE, 2008). Tal flexibilidade no posicionamento depende, em grande medida, da disponibilidade de instalações e competências existentes nos estaleiros, além de tipo, magnitude e complexidade do trabalho que estariam habilitados a realizar.

Embora não seja impeditivo para se tornarem estaleiros de reparo, os estaleiros dedicados à construção naval estão se movendo rumo a serem “montadores”, reduzindo o número de componentes produzidos internamente e buscando ampliar as peças e componentes terceirizados. Per se, isso reduz sua capacidade de competir efetivamente no mercado de reparo, que requer muita flexibilidade, pela necessidade de se ter que lidar com os mais diversos tipos de embarcações, de fabricantes e de serviços demandados (OCDE, 2008).

Vê-se, no Quadro 1, como as principais instalações de um estaleiro po-dem ser utilizadas para construção ou reparo, caso existisse a decisão de intercambiar seu negócio de uma atividade para outra.13 Essencialmente, o quadro permite observar que pode haver diferenças consideráveis entre as instalações especializadas na construção e as especializadas em reparo. Isso não quer dizer que essa diferenciação seja encontrada em todos os estaleiros. Um exemplo de diferenças inerentes entre as instalações é que estaleiros de reparos têm pouca necessidade de desenvolver capacidade avançada de projeto, logo teriam mais dificuldade para entrar no mercado de novas construções, no qual tal capacitação é essencial. Por outro lado, um estaleiro de construção que terceiriza intensamente peças de aço

13 Em razão de sua maior afinidade com a construção naval do que com o reparo de navios, a instalação de conversão

de navios compartilharia mais pontos em comum com os estaleiros de construção .

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talvez tenha mais dificuldade em migrar para o trabalho de reparo, em que a demanda por tais peças é constante e, em geral, pouco padronizada.

Além disso, os estaleiros de reparo devem dispor de maior variedade de ferramentas do que as exigidas pelos construtores, já que cada embarcação reparada pode ser única. Esses estaleiros, porém, não precisam investir tanto em grandes equipamentos, como os estaleiros de construção.

Quadro 1 | Atividades comuns a estaleiros de construção e de reparo

Construção Reparo

Pátio de aço x  Galpão de caldeiraria x  Centro de provisionamento x  Armazenagem de blocos x  Área de montagem x  Centro de design x  Pátio de docagem   xOficina mecânica   xOficina elétrica   xCarpintaria   xOficina de reparo de flutuantes   xPlanta de tratamento   xOficina de tubos x xMetalurgia x xCais x xPintura x xArmazém x xGuindastes e gruas x xEscritórios administrativos x xServiços técnicos x xServiços médicos e de saúde x xCentro de treinamento x xTransporte e estacionamento x xAlimentação e refeitório x x

Fonte: Elaboração própria, com base em OCDE (2008) .

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Opções de docagem

Embora em volume menor que no caso dos estaleiros de construção, os estaleiros de reparo também exigem um investimento financeiro elevado. Os sistemas de docagem representam o item de maior valor nos investimentos em estaleiros, sejam eles de construção ou de repa-ro. Particularmente, os sistemas de docas secas são os mais onerosos entre todos, mas podem ser utilizados tanto para construção quanto para reparo.

No Quadro 2, são mostradas as especificações básicas dos sistemas de docagem, incluindo suas possibilidades de operação em reparo ou novas embarcações. Verifica-se que a construção pode ser realizada apenas quando o estaleiro dispõe de carreira ou de dique seco, e carreiras não suportam a construção de embarcações de grande porte.

Um comentário importante sobre estaleiros de reparo seria que a forma mais fácil e rápida para aumentar sua capacidade é por meio da aquisição de docas flutuantes, inerentemente não adequadas para a construção de embarcações. Já no caso dos diques secos, tipicamente presentes nos estaleiros de construção, embora possam ser utilizados para reparos também, é economicamente inviável utilizá-los concomitantemente para construção e reparo, em virtude da discrepância entre os prazos dessas atividades, como mencionado anteriormente.

Portanto, mesmo quando ambos os tipos de estaleiros – construção e reparo – partilham características básicas, existem diferenças sig-nificativas que nem sempre são totalmente intercambiáveis técnica, operacional e comercialmente.

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93Estaleiro de reparo e manutenção naval

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Quadro 2 | Principais sistemas de docagem

Carreira Dique suspenso

Dique flutuante

Dique seco

Possibilidades operacionais

Principalmente construção

Reparo, conversão e construção

Reparo e pequenas conversões

Reparo, conversão e construção

Tempo de docagem

Aprox. 1 hora

Aprox. 30 a 45 minutos

Aprox. 1,5 a 2 horas

Padrão entre 6 e 10 horas

OperaçãoMão de obra qualificada

Mão de obra qualificada

Mão de obra qualificada

Operação simples

Manutenção Significativa Pequena Considerável Pequena

Vida útil 10 a 15 anos 25 anos 15 a 20 anos 30 anosFonte: Drewry (2001) .

Frota de embarcações de grande porte da Marinha Mercante Brasileira

Na discussão aqui tratada, é importante conhecer o número de embar-cações nacionais, pois elas são significativas na constituição da demanda potencial para serviços de reparo e manutenção em estaleiros brasileiros. Existem 380 embarcações de bandeira brasileira operando na navegação de cabotagem.14 Delas, 35 podem ser consideradas de pequeno porte (botes, cábreas, catamarãs, chatas, lanchas e pesqueiros). Das demais 345 embarcações, de médio e grande porte, 106 são balsas que operam em navegação interior e 99 são embarcações de apoio marítimo, que serão tratadas em um grupo próprio. Assim, retirando-se essas balsas e embarcações de apoio, tem-se 140 embarcações de bandeira brasilei-ra de médio e grande porte que operam em navegação de cabotagem

14 Segundo banco de dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), em 2018 . Disponível em: http://

web .antaq .gov .br/Portal/Frota/ConsultarFrotaGeral .aspx .

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e de longo curso. Esse seria o principal grupo demandante de serviços de reparo e manutenção no país. Na Tabela 2, vê-se o número dessas embarcações segundo os tipos.

Tabela 2 | Número de embarcações de bandeira brasileira de médio e grande porte que operam em navegação de cabotagem e de longo curso, segundo o tipoTipo de embarcação Quantidade

Balsa (longo curso/cabotagem) 3

Barcaça 49

Carga geral 17

Gases liquefeitos 9

Graneleiro 9

Petroleiro 33

Porta-contêiner 16

Químico 4

Total 140

Fonte: Elaboração própria, com base em http://web .antaq .gov .br/Portal/Frota/ConsultarFrotaGeral .aspx .

Acesso em: 31 out . 2018 .

Além das embarcações que operam em navegação de cabotagem e de longo curso, a frota brasileira compreende outras 553 embarcações de médio porte de apoio portuário e marítimo que podem demandar serviços de manutenção e reparo em estaleiros brasileiros, como mos-trado na Tabela 3.

Tabela 3 | Número de embarcações de apoio de médio porte de bandeira brasileira, segundo o tipoTipo de embarcação Quantidade

Rebocador/empurrador portuário 214

Rebocador/empurrador de alto-mar 53

Supridor de plataformas marítimas 286

Total 553

Fonte: Elaboração própria, com base em http://web .antaq .gov .br/Portal/Frota/ConsultarFrotaGeral .aspx .

Acesso em: 31 out . 2018 .

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Os navios supridores de plataformas marítimas (usualmente chamados de navios de apoio a plataformas) tendem a realizar reparos em esta-leiros de médio porte localizados nas regiões Sudeste e Sul do país, os polos de construção naval desses tipos de embarcações. A maior parte deles opera na região Sudeste.

Tráfego de embarcações de cabotagem e longo curso na costa do Norte e do Nordeste brasileiros

Além da dimensão da frota brasileira, para inferir o potencial de demanda de serviços de reparo e manutenção em estaleiros que venham a se instalar nas costas das regiões Norte e Nordeste, é importante estimar o tráfego marítimo vizinho a essas regiões, principalmente o realizado nas rotas marítimas do Atlântico Sul e nas rotas provenientes do Atlântico Norte. Essa estimativa foi feita com base em dados de trânsito naval obtidos no portal MarineTraffic,15 um projeto aberto que fornece informações em tempo real sobre o movimento e a localização dos navios.

São três as principais rotas marítimas adjacentes à costa do Norte e do Nordeste brasileiros: (i) a rota de cabotagem brasileira; (ii) a rota de longo curso entre a costa brasileira e a Europa; e (iii) aquela entre o Golfo do México/Costa Leste dos Estados Unidos da América (EUA) e a costa da África Ocidental, abrangendo o trecho do Golfo da Guiné ao Cabo da Boa Esperança, na África do Sul, também de longo curso.

15 https://www .marinetraffic .com .

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Com base nas informações das rotas marítimas, selecionou-se a área de amostragem no portal MarineTraffic, da qual se obtém o número de embarcações que poderiam demandar serviços de reparo programado ou eventual. A área de amostragem escolhida abrange uma superfície de projeção retangular de cerca de 17,34 milhões de quilômetros quadrados (x = 6.128 km; y = 2.829 km, aproximadamente), dos quais cerca de 43% correspondem à porção da superfície do oceano Atlântico e cerca de 57%, à porção da superfície continental.

A inclusão da parte continental teve o objetivo de levar em conta as embarcações de cabotagem e de longo curso que percorrem os rios da bacia do Amazonas e que, pela proximidade e facilidade de acesso, podem de-mandar serviços de manutenção e reparo em estaleiro instalado em algum ponto daquela costa. De Belém a João Pessoa, ao longo da costa, percorre-se uma distância de, aproximadamente, 1.900 quilômetros, ou 1.026 milhas náuticas. A uma velocidade média de 25 nós, ou 25 milhas náuticas por hora, um cargueiro seria capaz de perfazer o percurso entre aquelas cidades em 41 horas. A área de amostragem é apresentada na Figura 1.

Além da área de amostragem, foram selecionados quatro horários de observação do número de embarcações, a saber: às 12h, às 13h, às 16h e às 18h. Além do número de embarcações de todos os tipos, foi possível discriminar o número de cargueiros e o de tanqueiros. A Figura 2 ilus-tra a área de amostragem com a seleção de cargueiros (pontos verdes) e a Figura 3, a área de amostragem com a seleção de tanqueiros (pon-tos vermelhos). Em cada momento de observação, não se procedeu à identificação das embarcações. Por meio da contagem, visou-se tão só a inferência do número diário de embarcações em trânsito na região adjacente à costa norte-nordeste brasileira, principalmente aquelas que navegam ao longo das três rotas citadas e que poderiam demandar serviços de reparo ou manutenção em estaleiro ali instalado.

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Figura 1 | Área de amostragem no portal MarineTraffic

Fonte: https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018 .

Figura 2 | Área de amostragem de cargueiros (pontos verdes) no portal MarineTraffic

Fonte: https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018 .

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Figura 3 | Área de amostragem de tanqueiros (pontos vermelhos) no portal MarineTraffic

Fonte: https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018 .

Com base nas quatro observações diárias, definiu-se a quantidade média de embarcações na área de amostragem no período monitorado, entre 30 de julho e 31 de outubro de 2018. No Gráfico 2, registram-se as médias diárias de embarcações de todos os tipos compreendidas na área de observação; no Gráfico 3, as médias de cargueiros; e, no Gráfico 4, as médias de tanqueiros.

Gráfico 2 | Médias diárias do número de embarcações de todos os tipos na área de amostragem

0

100

200

300

400

500

30 ju

l.2

ago.

5 ag

o.8

ago.

11 a

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14 a

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20 a

go.

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1 se

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7 se

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set

.13

set

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set

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set

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set

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set

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set

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4 ou

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10 o

ut.

13 o

ut.

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22 o

ut.

25 o

ut.

28 o

ut.

31 o

ut.

Núm

ero

deem

barc

açõe

s

Média diária Média das médias diárias

Fonte: Elaboração própria, com base em https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018-31 out . 2018 .

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99Estaleiro de reparo e manutenção naval

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Gráfico 3 | Médias diárias do número de cargueiros na área de amostragem

0

50

100

150

200

250300

30 ju

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ago.

5 ag

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Núm

ero

deem

barc

açõe

s

Média diária Média das médias diárias

Fonte: Elaboração própria, com base em https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018-31 out . 2018 .

Gráfico 4 | Médias diárias do número de tanqueiros na área de amostragem

0

20

40

60

80

100120

30 ju

l.2

ago.

5 ag

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20 a

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set.

7 se

t.10

set

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set

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set

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out.

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Núm

ero

deem

barc

açõe

s

Média diária Média das médias diárias

Fonte: Elaboração própria, com base em https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018-31 out . 2018 .

Com base nos dados registrados, a Tabela 4 contém os valores mínimo, médio e máximo das médias diárias do número de embarcações na área de amostragem, segundo o tipo de embarcação.

Tabela 4 | Valores mínimo, médio e máximo das quantidades médias diárias do número de embarcações na área de amostragem, segundo o tipo de embarcaçãoTipo de embarcação Mínimo Médio Máximo

Todos 189 258 459

Cargueiros 96 130 243

Tanqueiros 39 58 107

Fonte: Elaboração própria, com base em https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 30 jul . 2018-31 out . 2018 .

Nota: A cada dia, considerou-se a quantidade média de embarcações obtida por meio das quatro coletas realizadas .

Foram geradas três séries de 63 médias diárias: uma para cargueiros, outra para tanqueiros e uma para embarcações de

todos os tipos . Os valores apresentados na tabela referem-se aos valores mínimos, médios e máximos dessas séries .

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Panorama mundial dos estaleiros de reparo

Os navios de longo curso realizam reparos e manutenções preferencial-mente em estaleiros em sua rota. Na Figura 4, apresentam-se as principais rotas marítimas e suas respectivas densidades.

Figura 4 | Principais rotas de navegação mundial e suas densidades

Fonte: https://www .marinetraffic .com/ . Acesso em: 9 nov . 2018 .

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A Ásia, na região do Pacífico, representa mais de 80% da construção naval mundial e deve essa posição, obtida nos últimos cinquenta anos, à política de investimentos no setor naval dos governos da Coreia do Sul, da China e do Japão (ver Gráfico 5). Mais recentemente, os prestadores de serviços e fabricantes de navios mudaram o foco dos investimentos para Índia, Vietnã e outros países da região, para combinar bom nível tecnológico e mão de obra de custo relativamente baixo (FMI, 2018b).

Gráfico 5 | Capacidade de construção dos principais países (% de processamento de aço)

32

32

19

314

China Coreia do Sul Japão Filipinas Outros

Fonte: Elaboração própria, com base em OCDE (2017) .

Bases tradicionais de reparo, como Roterdã, Hamburgo, Singapura e Japão, enfrentam forte concorrência em serviços que vão desde atividades simples (como reparos gerais) até tarefas complexas ou conversões. Essa competição vem de estaleiros da Europa Oriental, da China e do Vietnã, que formam o grupo de novos entrantes no mercado (OCDE, 2008).

Apesar dos avanços tecnológicos (como robótica, fabricação modular, digitalização, sistemas e procedimentos), o reparo de navios continua

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sendo uma atividade de trabalho intensivo, uma vez que nem sempre a automação é solução disponível. Essa intensidade de trabalho significa que as instalações com acesso à mão de obra qualificada e de baixa remu-neração têm vantagem de custo para trabalhos de reparo e manutenção menos complexos sobre seus concorrentes.

A escolha do estaleiro de reparo apropriado tornou-se crucial para os armadores, que, frequentemente, devem decidir entre um centro de baixo custo financeiro, com certo grau de confiabilidade, ou a sofis-ticação técnica disponível na Europa, por exemplo. Enquanto alguns armadores são atraídos para estaleiros de menor custo, em locais como a China, outros escolhem estaleiros que possam oferecer maior capacitação tecnológica, mesmo a um custo maior. Singapura tem boa reputação de serviços em gaseiros (GNL e GPL); por outro lado, alguns estaleiros europeus e norte-americanos têm nicho significativo no setor de navios de cruzeiro (OCDE, 2008).

Espera-se que o mercado de serviços de reparo e manutenção da América Latina, do Oriente Médio e da África tenha um crescimento substancial, em razão da expectativa do aumento da demanda por ma-nutenção e reparos, em decorrência da idade da frota, especialmente em países como Brasil, Emirados Árabes Unidos, África do Sul e Turquia (FMI, 2018b).

Considerações finais

O setor de construção naval brasileiro experimentou, na década de 2000, um movimento de retomada de investimentos, resultando tanto na expansão e na modernização da capacidade produtiva quanto no

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aumento da produção de embarcações. O crescimento das atividades petrolíferas offshore foi decisivo para isso, especialmente depois da descoberta do pré-sal, com uma política de conteúdo local que visava permitir a absorção doméstica dos efeitos positivos do crescimento da indústria petrolífera, alavancando a construção de embarcações e plataformas no Brasil.

Contratações de longo prazo oferecidas pela Petrobras, maior dispo-sição em assumir riscos por parte dos empresários e financiamentos por meio dos agentes financeiros do Fundo de Marinha Mercante (FMM) viabilizaram a retomada do setor naval brasileiro no período que se estendeu até meados dos anos 2010, quando atingiu um pico de mais de 82 mil empregos diretos em 2014.

Com a brusca queda no preço do barril de petróleo e a não menos vertiginosa queda nas taxas diárias das embarcações, o que se viu a partir de meados de 2014 pode ser classificado como um choque sistêmico nas indústrias de P&G e naval mundial. Para além dos impactos diretos do que se sucedeu no mundo todo, contudo, no Brasil a situação foi ainda mais drástica, pois devem ser adicionadas aos fatores desse choque as profundas crises política e econômica, imbricadas ao contexto da Operação Lava-Jato.

No início de 2017, a política de conteúdo local do setor de P&G foi flexibilizada, sendo reduzido o percentual de conteúdo local exigido nos novos contratos de exploração e produção de petróleo. Na prática, provavelmente isso significa que poderá não haver mais construção de cascos de plataformas de petróleo no Brasil, uma vez que os estaleiros que as faziam por aqui ainda trilhavam a curva de aprendizagem, adquirindo experiência e produtividade necessárias para poderem competir com os estaleiros asiáticos. Assim, na falta das condições que permitissem o

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ressurgimento da indústria naval brasileira, as carteiras de encomendas dos estaleiros nacionais de grande porte foram esvaziadas, e muitos deles encerraram suas atividades.

Nesse contexto de falta de encomendas, cogitam-se como possibilidades para os estaleiros de grande porte remanescentes:

• realizar somente a montagem de módulos das plataformas, quando o casco for construído no exterior;

• realizar investimentos de adequação para se tornarem estaleiros de reparo, o que pode não ser plausível para alguns por sua loca-lização, ou mesmo pelo desinteresse dos acionistas em realizar os investimentos necessários;

• transformar suas instalações em TUP, o que alguns estaleiros já fizeram; ou

• encerrar suas operações.

Uma vantagem de converter um estaleiro de construção em reparo é aproveitar parte dos investimentos realizados para a nova atividade. Po-rém, quando um estaleiro de construção é convertido em um estaleiro de reparo, pode não ser possível estabelecer um layout ótimo para a realização de serviços em diversas embarcações simultaneamente, configuração pre-vista desde a concepção de um estaleiro focado nas atividades de reparo e manutenção. Trata-se, portanto, de um fator potencialmente prejudicial à competitividade, sem contar o já mencionado de localização. A localização de um estaleiro de construção talvez não seja a melhor para a prestação do serviço de reparo e manutenção, na medida em que proximidade das rotas marítimas mais movimentadas é questão estratégica.

A frota brasileira de navios de cabotagem de grande porte não é expres-siva, desaconselhando a conversão de diversos estaleiros de construção

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em estaleiros de reparo, o que geraria subutilização. A viabilização da atividade de reparo e manutenção de grandes embarcações no Brasil demandaria atender a embarcações estrangeiras, que utilizam rotas ma-rítimas próximas ao Brasil. Entretanto, destaca-se que a competição por reparo e manutenção de navios de longo curso é global, já que existem diversas opções para realização desse serviço no mundo ao longo das rotas de navegação comercial.

Por fim, a atividade de reparo e manutenção é mandatória no setor naval mundial e favorece o desenvolvimento substantivo de know how por requerer que se lide com diversos modelos de navios, além de possibilitar certa estabilidade de receitas para os estaleiros de reparos bem-estabele-cidos. Singapura é um importante exemplo de sucesso de indústria naval desenvolvida pela atividade de reparo e manutenção. O país se especializou nesse nicho por dispor de localização altamente privilegiada e de ações governamentais positivas. Com o decorrer dos anos, a indústria naval singapuriana valeu-se de todo o conhecimento técnico absorvido com as atividades de reparo e manutenção de embarcações para expandir suas atuações para outras de maior valor agregado na indústria naval.

Referências

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106 Indústria naval

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107Estaleiro de reparo e manutenção naval

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Indústria de transformação

* Respectivamente, gerente e estagiária do Departamento de Bens de Consumo, Comércio e Serviços da Área

de Indústria, Serviços e Comércio Exterior do BNDES. Os autores agradecem aos técnicos do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE) o fornecimento de dados de tabulação especial.

O IMPACTO HETEROGÊNEO DAS CRISES DE 2008-2009 E 2015-2016 SOBRE OS SETORES DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO

Job Rodrigues Teixeira Junior Beatriz da Silva Mello*

Palavras-chave: Economia brasileira . Indústria de transformação . Desindustrialização .

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Manufacturing industry

* Respectively, manager and intern of the Consumer Goods, Commerce and Services Department of BNDES's

Industry, Services and Foreign Trade Division. The authors would like to thank the analists of the Brazilian

Institute of Geography and Statistics (IBGE) for providing customized data for this study.

THE HETEROGENEOUS IMPACT OF THE 2008-2009 AND 2015-2016 CRISES ON MANUFACTURING SECTORS

Job Rodrigues Teixeira Junior Beatriz da Silva Mello*

Keywords: Brazilian economy . Manufacturing industry . De-industrialization .

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ResumoEntre 2009 e 2016, a economia brasileira apresentou taxa negativa de crescimento do produto interno bruto (PIB) em três ocasiões – 2009, 2015 e 2016 – que refletiram o quadro geral desfavorável do país. Contudo, as consequências desse cenário não foram homogêneas dos pontos de vista setorial e regional. Este trabalho descreve um panorama dos impactos das crises de 2008-2009 e 2015-2016 na indústria de transformação (IT) e mostra quais setores e regiões foram mais afetados e se houve exceções que preservaram suas trajetórias, sem passar pelos efeitos dessas crises.

AbstractBetween 2009 and 2016, the Brazilian economy presented a negative rate of the gross domestic product (GDP) growth on three occasions, that is, in 2009, 2015 and 2016 the country environment as a whole presented an unfavorable overall picture. Within this broad movement, however, the impacts were not homogeneous from the sectoral and regional points of view. This paper presents an overview of the impacts of the 2008-2009 and 2015-2016 crises on the manufacturing industry, showing which sectors and regions were most affected and whether there were exceptions that ignored the crises and preserved their trajectories.

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113O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

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Introdução

Este texto tem como tema central a evolução recente da indústria de transformação (IT) brasileira e seu comportamento durante as crises de 2008-2009 e 2015-2016. Na comparação das duas crises, mostra-se que elas foram diferentes do ponto de vista da composição setorial, uma vez que os setores mais afetados nem sempre foram os mesmos, e do ponto de vista da intensidade dos impactos, tanto no período 2008-2009 quanto no período 2015-2016 observam-se gran-des diferenças. Dessa forma, as crises não foram neutras em relação à estrutura produtiva, causando alterações na composição setorial da indústria e afetando de modo diferenciado as principais regiões industriais do país.

A segunda seção traz alguns marcos temporais, pondo em perspectiva histórica o desenvolvimento econômico, a indústria e os desequilí-brios e imperfeições que a estrutura produtiva brasileira enfrenta e deve corrigir.

A terceira seção compõe-se de um breve resumo das crises, muito mais descritivo do que analítico, uma vez que não é objetivo deste trabalho debater suas causas, mas apenas destacar algumas estatísticas descritivas capazes de qualificar o impacto em termos setoriais e regionais.

Para o observador que assume o ponto de vista de cada setor, uma crise é um choque exógeno. Para uma proxy do grau de severidade de cada choque sofrido, a quarta seção compara as linhas de tendência dos 12 meses imediatamente anteriores à eclosão de cada crise com as linhas dos 12 meses seguintes: as crises podem afetar essas trajetórias, e o ângulo

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114 Indústria de transformação

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entre as duas retas de regressão pode ajudar a distinguir os setores que sofreram as inflexões mais agudas dos que mantiveram trajetórias iguais ou até mesmo melhores. Será visto, nessa seção, por exemplo, que o setor têxtil (divisão 13 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – Cnae) foi severamente impactado nas duas crises (assim como o estado de São Paulo), e que o setor de bebidas (divisão 11), ao contrário, esteve sempre entre os de menor impacto (assim como Pernambuco).

A quinta seção examina a resultante geral das crises e constitui-se em uma síntese do período. As comparações entre os 12 meses anteriores e posteriores à eclosão de cada crise mostram até que ponto a IT foi impactada e se alterou entre 2007 e 2017.

As conclusões constantes da sexta seção apontam que as crises cau-saram impacto negativo sobre a IT e que tal impacto foi heterogêneo em termos tanto regionais quanto setoriais. Alguns setores de grande importância para a economia brasileira estão entre os mais afetados.

Contexto histórico

A economia brasileira sustenta-se em uma estrutura produtiva ainda em construção, cuja formação, expansão e evolução em competitividade, produtividade, viés exportador e capacidade de inovar constituem um complexo processo histórico que marca o desenvolvimento socioeco-nômico do país.

De modo estilizado, é possível resumir esse processo em cinco grandes linhas, sendo a primeira delas o longo período colonial e imperial de predomínio extrativista e agrário-exportador que povoou o território,

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115O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

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consolidou as fronteiras e lançou as bases mais profundas da cultura do país, mas cujo caráter pré-industrial tornou-se insustentável e incom-patível com as aspirações da sociedade brasileira (FURTADO, 1980; ERBER, 2007).

A isso se seguiu uma época de transição, entre a abolição da escravatura (1888) e a Era Vargas (1930), durante a qual fenômenos marcantes do século XX, como a industrialização e a urbanização, deram seus primeiros passos (SILVA, 1976; CARDOSO DE MELLO, 1982).

A economia brasileira tal como se constitui hoje, porém, é produto das cinco décadas que vão de 1930 a 1980. As transformações desse período foram profundas, sobretudo pela expansão da indústria, pela urbanização acelerada e por um intenso ritmo de crescimento do produto interno bruto (PIB) – sem, contudo, atenuar as desigualdades sociais e regionais (LESSA, 1983; TAVARES, 1972; CASTRO; SOUZA, 1985).

Não é esperado que alterações de tal magnitude se deem de modo linear e constante; e, de fato, o que se observou foram muitas oscilações, crises econômicas e institucionais, bem como um acúmulo de desequilíbrios que se fariam presentes cedo ou tarde, algo que pode ser interpretado como o custo implícito do processo histórico da industrialização e do desenvolvimento econômico de um país que, em 1930, ainda era muito retardatário.

Concluídas as etapas fundamentais de formação da moderna estru-tura produtiva brasileira, que ganhou novos setores, mais dinâmicos e com maior capacidade de criar valor, o país entrou em uma nova fase de transição. Nessa fase, parte dos desequilíbrios acumulados ao longo da história assumiu a forma de desajustes macroeconômicos, seja nas crises externas que em alguns momentos afetaram com certa gravidade

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116 Indústria de transformação

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o balanço de pagamentos, como em 1982, seja no descontrole do nível de preços que se tornou o símbolo de uma época: entre 1986 e 2002, o lançamento e/ou o gerenciamento de uma sucessão de planos econô-micos fez do combate à inflação a principal meta de vários governos (MODIANO, 1990; FRANCO, 1995).

Depois de alguns fracassos iniciais desses planos na primeira metade desse período (1986-1994), as altas taxas anuais de inflação conver-giram para o intervalo entre 3% e 8%, havendo uma substituição de desequilíbrios macroeconômicos: o setor externo e o nível de preços mantiveram certa estabilidade depois dessa fase, mas o custo foi a im-posição ao país de taxas de juros elevadas e de taxas de câmbio quase sempre apreciadas.

Todavia, o objeto deste texto é a etapa atual. Desde 2003, a economia brasileira convive com reminiscências dos desequilíbrios gerados por seu vigoroso processo histórico de desenvolvimento – ora com taxas de juros muito elevadas, ora com taxas de câmbio muito apreciadas. Também integram o panorama atual um quadro fiscal pressionado e um sistema tributário ineficiente, e é nesse contexto que a estrutura produtiva do país tenta progredir, atenuando as imperfeições do que foi forjado entre 1930 e 1980, adaptando-se às novas tecnologias e convivendo com lacunas ainda abertas de uma inadiável agenda de produtividade, competitividade, inovação e presença nos mercados globais (FERRAZ; KUPFER; HAGUENAUER, 1995; TEIXEIRA JUNIOR et al. , 2012; COSTA; MONTEIRO FILHA; GUIDOLIN, 2011).

Além desse contexto histórico (complexo per se), o período atual im-pôs às empresas brasileiras o desafio de suportar em um curto intervalo de menos de dez anos duas graves crises, e este texto procura mostrar de que modo elas afetaram os diversos setores da IT brasileira.

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117O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

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As crises brasileiras do início do século XXI1

No Brasil, houve duas crises entre 2001 e 2018: (i) a primeira no biênio 2008-2009, quando houve recessão em 2009 (-0,1%); e (ii) a segunda no biênio 2015-2016, com recessões em 2015 (-3,5%) e em 2016 (-3,3%). Em média, nessas quase duas décadas, o PIB brasileiro cresceu 2,3% ao ano (a.a.) em termos reais, enquanto a expansão do PIB per capita foi de 1,2% a.a. O Gráfico 1 ilustra a evolução da economia brasileira nesse período.

Gráfico 1 | Produto interno bruto (PIB 2000 = 100) e taxa de crescimento do PIB (%), 2000-2018

-4

-2

0

2

4

6

8

100

110

120

130

140

150

160

2000

2001

2002

2003

2004

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2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

PIB (2000 = 100) Taxa percentual real de crescimento anual do PIB

Fonte: Ipeadata . Macroecônomico, Contas Nacionais, PIB – preços de mercado –

var . real anual . Disponível em: http://ipeadata .gov .br/beta3/ . Acesso em: 20 ago . 2019 .

1 Dados sobre PIB, Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e taxa de câmbio baseados em http://

ipeadata .gov .br/beta3/ (acesso em: 20 ago . 2019) .

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118 Indústria de transformação

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A crise brasileira de 2008-2009 teve uma nítida origem externa (KRUGMAN, 2009; FARHI, 2018), cuja face mais visível foi uma abrupta depreciação cambial, com o valor de US$ 1,00 passando de R$ 1,63, no último dia útil de agosto de 2008, para R$ 1,91, no último dia útil do mês seguinte, fechando o ano em R$ 2,33. Foi uma crise relativamente curta, com dois trimestres consecutivos de queda do PIB – o último de 2008 e o primeiro de 2009 –, o que caracterizou uma recessão técnica. A queda do quarto trimestre de 2008 foi especialmente significativa, de -4% em relação ao trimestre anterior.

Ainda assim, o PIB do ano de 2008 fechou com um forte crescimen-to, de 5,1%, coroando uma sequência de dez semestres de crescimento econômico (do segundo semestre de 2003 ao primeiro de 2008), um período equivalente a cinco anos durante os quais a taxa de inflação, a taxa de desemprego, a taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), a relação dívida/PIB, o coeficiente de Gini e o endivi-damento externo caíram em bloco, no que parecia um processo gene-ralizado de reequilíbrio dos fundamentos socioeconômicos do Brasil.

O ano de 2009 foi de pequena queda do PIB (-0,1%), e em 2010 a expansão foi de 7,5%. Portanto, a crise de 2008-2009 pode ser definida como curta e de baixa magnitude (o efeito sobre o mercado de trabalho foi modesto), mas duas características a tornam especialmente significa-tiva: (i) tratar-se de uma recessão entre dois anos de forte crescimento que eclodiu depois de cinco anos de prosperidade, sendo, portanto um fenômeno brusco e que representou uma grande ruptura nas expectativas; e (ii) os formuladores de política econômica terem reagido por meio do acionamento de mecanismos anticíclicos que reverteram por alguns meses o processo de redução da relação dívida/PIB (líquida), processo este que, a partir de 2010, foi retomado (voltando a se reverter a partir de 2014, a ponto de voltar em 2018 ao patamar de 2003).

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119O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Apesar de o afrouxamento da política econômica ter surtido o efeito esperado em 2010 e 2011 (taxas anuais de crescimento do PIB de 7,5% e 4%, respectivamente), a pressão sobre os fundamentos e a paulatina perda de potência das medidas adotadas contribuíram para certa desa-celeração da economia, cujos resultados foram mais modestos em 2012 e 2013 (1,9% e 3%, respectivamente).

A crise de 2015-2016 foi diferente em vários aspectos. Não é nítido que a origem tenha sido externa, embora a forte queda da cotação internacional do petróleo2 observada em 2014 tenha contribuído para desorganizar alguns mercados e para aumentar o grau de incerteza – entre outros motivos, por afetar a maior empresa do país, a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras).

O ciclo político também parece ter sido uma das causas, seja pela polaridade especialmente aguda do processo eleitoral e pós-eleitoral de 2014, seja pelo complexo quadro de correlação de forças observado em 2015. Como uma das consequências, a agenda do Governo Federal no Congresso Nacional não encontrou acolhida no Parlamento.

A tentativa de repetir a estratégia de 2003, com um choque de austeridade no início do mandato presidencial para lançar bases sustentáveis para os semestres subjacentes, dessa vez não logrou sucesso. Os fundamentos ma-croeconômicos, assim como algumas conjunturas setoriais (por exemplo, o setor elétrico), haviam acumulado certa deterioração ao longo do período anterior – como reação, um abrupto realinhamento dos preços administrados causou uma forte aceleração do Índice Nacional de Preços ao Consumidor

2 Entre janeiro de 2013 e julho de 2014 a cotação média do Brent foi de US$ 109,00, oscilando sem viés dentro do

intervalo entre US$ 97,00 e US$ 119,00, configurando certa estabilidade que perdurou desde 2012 . Entre 1º de julho de

2014 e 30 de janeiro de 2015, porém, a cotação caiu de US$ 110,84 para US$ 47,52 – e depois de uma breve recuperação

voltou a cair, até chegar a US$ 26,01 em 20 de janeiro de 2016 . Dados disponíveis em: https://fred .stlouisfed .org/series/

DCOILBRENTEU .

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120 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Amplo (IPCA)3 já no primeiro trimestre de 2015, e a seguir o nível de atividade caiu, causando também queda na arrecadação de impostos, o que contribuiu de modo decisivo para a precipitação da crise econômica.

Todo o período 2015-2016 foi ainda caracterizado pelas investigações da Operação Lava-Jato, bem como por interações muito intensas entre os três poderes. Completam esse conjunto de hipóteses e conjecturas alguns pro-blemas de natureza climática, que, entre tantos outros elementos, ajudam a caracterizar as causas da crise de 2015-2016 como difusas e complexas.

Além de ser diferente no que diz respeito a suas causas, as caracterís-ticas econômicas da crise de 2015-2016 também foram muito distintas do que se observou em 2008-2009. Trata-se de uma crise mais longa, com oito trimestres consecutivos de queda do PIB, desde o primeiro trimestre de 2015 até o quarto de 2016. É também uma crise de alta magnitude, com o PIB apresentando quedas de -3,5% em 2015 e -3,3% em 2016. O efeito sobre o mercado de trabalho, por sua vez, foi muito intenso (a taxa de desocupação passou de 6,5% no último trimestre de 2014 para 12% no último trimestre de 2016) (IBGE, 2019b).

Enquanto a recessão de 2009 foi precedida e sucedida por anos de alto crescimento, eclodindo depois de dez semestres de prosperidade, a recessão de 2015-2016 ocorreu depois de um ano de estagnação (cresci-mento do PIB de 0,5% em 2014) e antes de um ano de baixo crescimento (1,1% em 2017). Não houve, assim, abrupta reversão, mas sim gradual e contínua piora das expectativas, em um processo que se acelerou.

Além disso, os dez semestres anteriores a 2015 não representam um bloco de contínua prosperidade – a expansão foi: (i) elevada em 2010-2011, com 7,5% e 4%; (ii) modesta em 2012-2013, com 1,9% e 3%; e (iii) muito baixa em 2014, com 0,5% –, tampouco houve queda significativa e persistente do

3 As variações mensais do IPCA nos seis primeiros meses de 2015 foram respectivamente de 1,24%, 1,22%, 1,32%, 0,71%,

0,74% e 0,79%, comprometendo em um semestre a meta anual de inflação . O teto da meta foi superado em julho (0,62%) .

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121O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

IPCA (que oscilou nesse período entre 5,5% e 6,5%) e da Selic (que foi muito volátil, subindo por três semestres, caindo, a seguir, por dois semestres e, entre fins de 2012 e de 2014, mantendo-se constante, subindo e, por fim, voltando a se manter constante). O coeficiente de Gini, a taxa de desem-prego e a relação dívida/PIB (líquida), por sua vez, caíram – ou seja, não há entre 2010 e 2014 a mesma trajetória de melhoria contínua e generalizada dos fundamentos macroeconômicos, que oscilaram e se mantiveram em certos intervalos, mas sem tampouco apresentar um amplo movimento de piora (embora entre o segundo semestre de 2014 e o primeiro semestre de 2015 tais variáveis tenham experimentado uma acelerada deterioração).

O Gráfico 2 mostra a evolução da relação dívida/PIB entre dezembro de 2001 e maio de 2019, uma variável crítica que sintetiza grande parte da política econômica do período.

Gráfico 2 | Relação dívida/produto interno bruto, dez. 2001-mai. 2019 (%)

29

34

39

44

49

54

59

64

Dez

. 200

1

Set.

200

2

Jun.

200

3

Mar

. 200

4

Dez

. 200

4

Set.

200

5

Jun.

200

6

Mar

. 200

7

Dez

. 200

7

Set.

200

8

Jun.

200

9

Mar

. 201

0

Dez

. 201

0

Set.

201

1

Jun.

201

2

Mar

. 201

3

Dez

. 201

3

Set.

201

4

Jun.

201

5

Mar

. 201

6

Dez

. 201

6

Set.

201

7

Jun.

201

8

Mar

. 201

9

Fonte: Ipeadata . Macroecônomico, Finanças públicas, Dívida – total –

setor público – líquida . Disponível em: http://ipeadata .gov .br/beta3/ . Acesso em: 20 ago . 2019 .

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122 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Em resumo, a crise de 2008-2009 foi marcante por haver uma rup-tura muito abrupta, enquanto a crise de 2015-2016 é notável por sua magnitude. Outro fator de distinção é que, em 2008-2009, o governo partiu de um passado recente de melhorias nos fundamentos macroe-conômicos e aos poucos foi implementando algum afrouxamento da política econômica; já em 2015 o ponto de partida não era tão claro no que diz respeito a tais fundamentos – a política monetária adotada foi contracionista, enquanto a política fiscal mostrou-se dúbia, porém contida ao longo do primeiro semestre.4

Há uma última variável que merece destaque: uma diferença espe-cialmente importante, sobretudo para a IT, é que em 2008-2009 a depreciação cambial foi modesta e breve. Depois de saltar de aproxi-madamente R$ 1,60 para R$ 1,90 entre agosto e setembro de 2008, atingindo o patamar de R$ 2,40 em dezembro, o câmbio voltou a se apreciar, e já em agosto de 2009 estava de volta a R$ 1,80. Desde julho de 2011, quando atingiu a mínima pós-2009 de R$ 1,53, até setembro de 2015 (R$ 4,20), a trajetória da taxa de câmbio foi sempre crescente, e o breve período de apreciação cambial que perdurou até outubro de 2017 (R$ 3,10) não foi profundo e já foi revertido. Em geral, entre março de 2015 e julho de 2019, a taxa de câmbio manteve-se acima de R$ 3,00.

4 Depois de mais de uma década de superávit primário, a evolução da necessidade de financiamento do setor público

(NFSP) primária mostra uma queda gradual do superávit a partir de 2011, que passou de 2,9% em 2011 para 2,2% em

2012, chegando a 1,7% em 2013, quando foi revertida para um resultado deficitário, embora de apenas 0,5% em 2014 .

Em 2015, porém, tal déficit saltou para 1,9% . Esses dados, referentes ao acumulado de 12 meses em dezembro, mostram

uma realidade diferente no primeiro semestre de 2015, quando se observa a evolução mês a mês: enquanto entre abril

e dezembro de 2014 o resultado fiscal se reduziu ao ritmo de 0,28 ponto percentual (p .p .) ao mês e passou de superávit

de 1,7% para déficit de 0,6%, entre janeiro e junho de 2015 tal percentual se estabilizou, chegando a 0,8% (ritmo de

0,03 p .p . ao mês) . Em setembro de 2015, o déficit foi de 0,4%, menor do que o de dezembro de 2014 . Tal contenção

se deu em um quadro desfavorável da evolução da receita, indicando que a política fiscal do primeiro semestre foi bem

menos expansionista do que a observada no ano anterior .

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123O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Gráfico 3 | Taxa de câmbio do dólar comercial – média diária de compra, jan. 2001-jan. 2019 (R$)

1,5

2,0

2,5

3,0

3,5

4,0

4,5

Jan.

200

1

Jan.

200

2

Jan.

200

3

Jan.

200

4

Jan.

200

5

Jan.

200

6

Jan.

200

7

Jan.

200

8

Jan.

200

9

Jan.

201

0

Jan.

201

1

Jan.

201

2

Jan.

201

3

Jan.

201

4

Jan.

201

5

Jan.

201

6

Jan.

201

7

Jan.

201

8

Jan.

201

9

Fonte: Ipeadata . Macroecônomico, Câmbio, Taxa de câmbio – R$/US$ – comerical –

compra – média . Disponível em: http://ipeadata .gov .br/beta3/ . Acesso em: 20 ago . 2019 .

A recessão como um choque exógeno5

Impacto geral de curto prazoOs dados da Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram a evo-lução real da produção de diversos setores da IT. Para obter uma proxy do grau de impacto da eclosão de uma crise sobre a trajetória de um setor, comparou-se o ritmo de crescimento nos 12 meses anteriores e nos 12 meses posteriores a uma data escolhida como marco das crises, tendo

5 Esta seção baseia-se em dados de IBGE (2017; 2019a) .

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124 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

por base o coeficiente angular das respectivas retas de regressão. Para a crise de 2008-2009, foi utilizado o mês de julho de 2008, comparando-se os 12 meses entre agosto de 2007 e julho de 2008 com os 12 meses entre julho de 2008 e junho de 2009. Adotou-se o perío do de 12 meses porque períodos maiores poderiam introduzir aspectos estruturais e de longo prazo na proxy, distanciando-a do choque, e as retas de regressão obtidas com períodos mais curtos teriam baixa qualidade estatística e estariam mais sujeitas a efeitos sazonais. O mês escolhido para a crise de 2015- -2016 foi outubro de 2014.

Figura 1 | Linhas de tendência da produção física industrial

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2019a) .

A Figura 1 mostra que, antes da crise de 2008-2009, a produção in-dustrial permanecia quase constante, havendo uma leve tendência de crescimento: a eclosão da crise representou um choque, uma vez que a reta de regressão girou 72,5° no sentido horário. Em 2015-2016, houve um impacto de magnitude semelhante, embora em contexto distinto: a produção industrial crescia claramente, mas essa tendência foi revertida para um quadro de queda, o que é representado por um giro de 69,1° no sentido horário.

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125O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Observe-se que o ângulo da revolução não pretende expressar o impacto final de cada crise, mas tão somente indicar a magnitude do choque ime-diato. Desse modo, um setor pode ter experimentado um cho que forte, mas reagido ou ter se beneficiado de outros choques posteriores (por exemplo, climáticos, cambiais ou tarifários), apresentando um impacto final distinto do impacto imediato.

Impactos setoriais de curto prazoNa IT, houve choques considerados fortes,6 tanto no período 2008-2009 quanto no período 2015-2016, em alguns setores: divisões Cnae 13 (têxteis), 22 (borracha e plástico), 25 (produtos de metal), 27 (aparelhos e materiais elétricos), 28 (máquinas e equipamentos), 29 (veículos automotores), 30 (embarcações e aeronaves) e 32 (produtos diversos). A divisão 28, por exemplo, girou -113° na primeira crise e -90° na segunda. No outro extremo, há setores que foram relativamente poupados nas duas crises: divisões Cnae 10 (alimentos), 11 (bebidas), 12 (fumo), 14 (vestuário), 16 (produtos de madeira), 19 (derivados do petróleo), 20B7 (limpeza e higiene pessoal, perfumaria e cosméticos – HPPC) e 26 (informática, ótica e eletrônicos). A divisão 11, por exemplo, girou +38° em 2008-2009 (ou seja, melhorou) e -9° em 2015-2016 (um desvio insignificante).

A Tabela 1 expõe os ângulos das principais divisões ao lado do res-pectivo peso do setor no valor adicionado da IT no ano anterior a cada crise. O Quadro 1 segrega os setores entre os que foram duplamente impactados, os que foram duplamente poupados e os que sofreram um impacto forte em apenas uma das crises. A Tabela 2 mostra um ranking baseado na média aritmética dos dois ângulos.

6 Foram definidos como “fortes” os impactos associados a ângulos acima da mediana .

7 A PIM-PF subdivide a divisão 20 em 20B (limpeza e HPPC) e 20C (demais produtos químicos) .

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126 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Tabela 1 | Desvios das trajetórias setoriais

Classificação Nacional de Atividades Econômicas

Descrição Impacto Ângulo 2008-2009

(graus)

Peso no produto interno

bruto (PIB) industrial em 2007

(%)

Ângulo 2014-2015

(graus)

Peso no PIB

industral em 2013

(%)

10 Alimentos • (16,1) 9,8 (11,1) 15,4

11 Bebidas • 38,5 3,0 (9,3) 3,2

12 Fumo • (2,1) 0,7 2,2 0,8

13 Têxtil • (55,6) 2,1 (101,0) 1,9

14 Vestuário • (27,9) 2,3 (52,7) 3,0

15 Calçados   (1,4) 1,6 (104,3) 1,9

16 Produtos de madeira • (13,2) 1,6 (15,9) 1,4

17 Papel e celulose   (76,9) 3,9 (18,9) 3,2

18 Gráficas   (X) 1,1 (124,0) 1,1

19 Biocombustíveis e derivados do petróleo • (37,4) 14,7 (22,5) 10,5

20B Cosméticos   60,6 1,3 (43,4) 1,2

20C Outros produtos químicos   (20,5) 6,8 (60,1) 6,2

21 Farmacêuticos   (82,7) 2,6 (26,5) 2,4

22 Borracha e plástico • (96,4) 3,7 (72,4) 4,0

23 Minerais não metálicos   (95,6) 3,3 (50,0) 4,6

24 Metalurgia   (108,8) 9,8 (28,7) 6,1

25 Produtos de metal • (98,9) 4,7 (59,9) 4,6

26 Informática, ótica e produtos eletrônicos • (42,4) 2,8 (36,3) 2,8

27 Máquinas, aparelhos e materiais elétricos • (43,7) 2,9 (90,6) 3,4

28 Máquinas e equipamentos • (113,3) 5,3 (90,4) 6,2

29 Veículos automotores, reboques e carrocerias • (126,8) 10,5 (77,6) 9,5

30 Embarcações, aeronaves e outros veículos • (87,7) 1,9 (64,8) 1,9

31 Móveis   (16,9) 1,1 (66,2) 1,5

32 Diversos (brinquedos, joias, equipamentos médicos etc .)

• (49,5) 1,1 (93,2) 1,5

33 Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos

  (X) 1,3 (92,8) 1,8

• Setores com forte impacto nas duas crises

• Setores com impacto fraco nas duas crises

(X) Dado não disponível

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2017; 2019a) .

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127O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Quadro 1 | Síntese dos impactos setoriais das crises de 2008-2009 e 2015-2016

2008-2009Forte Fraco

2015-2016 Forte 13, 22, 25, 27, 28, 29, 30 e 32

15, 20C e 31

Fraco 17, 21, 23 e 24 10, 11, 12, 14, 16, 19, 20B e 26

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2017; 2019a) .

Tabela 2 | Ranking setorial dos impactos das crises de 2008-2009 e 2015-2016

Classificação Nacional de Atividades Econômicas

Descrição Ângulo 2008-2009

(graus)

Ângulo 2014-2015

(graus)

Ângulo médio (graus)

29 Veículos automotores, reboques e carrocerias

(127) (78) (102)

28 Máquinas e equipamentos (113) (90) (102)

22 Borracha e plástico (96) (72) (84)

25 Produtos de metal (99) (60) (79)

13 Têxtil (56) (101) (78)

30 Embarcações, aeronaves e outros veículos (88) (65) (76)

23 Minerais não metálicos (96) (50) (73)

32 Diversos (brinquedos, joias, equipamentos médicos etc .)

(50) (93) (71)

24 Metalurgia (109) (29) (69)

27 Máquinas, aparelhos e materiais elétricos (44) (91) (67)

21 Farmacêuticos (83) (27) (55)

15 Calçados (1) (104) (53)

17 Papel e celulose (77) (19) (48)

31 Móveis (17) (66) (42)

14 Vestuário (28) (53) (40)

20C Outros produtos químicos (21) (60) (40)

26 Informática, ótica e produtos eletrônicos (42) (36) (39)

19 Biocombustíveis e derivados do petróleo (37) (23) (30)

16 Produtos de madeira (13) (16) (15)

10 Alimentos (16) (11) (14)

12 Fumo (2) 2 0

20B Cosméticos 61 (43) 9

11 Bebidas 39 (9) 15

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2019a) .

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128 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Os dados expostos nesta subseção mostram a heterogeneidade do impacto da crise nos diversos setores da IT. Na quinta seção, serão examinados os impactos finais em cada um desses segmentos.

Cada trajetória setorial apresentou desvios, cujos ângulos estão ilus-trados na Figura 2. Observa-se que apenas dois setores aceleraram suas trajetórias de crescimento em 2008-2009, ao que correspondem ângulos positivos (primeiro quadrante), enquanto o outro extremo também é raro, mas com exceções mais numerosas. Nas duas crises, verifica-se o mesmo padrão: a maior parte dos setores mostrou desvios negativos, sobretudo com ângulos pertencentes ao terceiro quadrante.

Figura 2 | Ângulos dos desvios das trajetórias setoriais

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2019a) .

Em conjunto, o peso dos setores fortemente impactados em 2008- -2009 era de 51,8% do valor adicionado da IT em 2007, às vésperas dessa crise. No caso de 2015-2016, o peso do conjunto análogo era um pouco menor (47,0%). Assim, não é possível afirmar que uma crise tenha se concentrado em setores especialmente mais importantes, embora a

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129O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

crise de 2008-2009 apresente certo viés nesse sentido (PIA-Empresa do IBGE).

Quanto ao mercado de trabalho, os setores mais impactados pelo choque de 2008-2009 totalizavam em 2007 46,2% das ocupações da IT, enquanto os mais afetados em 2015-2016 respondiam por 45,6% em 2014. Portanto, não houve diferenças significativas entre os dois períodos e também não houve claro viés relativo aos setores mais intensivos em trabalho, segundo dados da PIA-Empresa do IBGE.

Impactos regionais de curto prazoUma vez que a IT não se distribui uniformemente pelo território, é de se esperar que a heterogeneidade observada no caso setorial se reflita na dimensão espacial.

Alguns dos principais estados industriais da federação tiveram impactos menos severos nas duas crises (AM, BA, PE e RJ), enquanto para outros o impacto foi sempre forte (ES, PA, PR, RS e SP). Em Pernambuco, por exemplo, os ângulos foram muito modestos (+1° em 2008-2009 e -13° em 2015-2016), enquanto no Rio Grande do Sul os impactos foram bem mais intensos (-93° em 2008-2009 e -81° em 2015-2016). Mais uma vez, portanto, os dados indicam que as crises brasileiras foram fenômenos heterogêneos, isto é, os impactos não atingiram as diversas regiões com a mesma intensidade.8 A Tabela 3 e o Quadro 2 contêm os dados em recorte territorial.

8 Os impactos foram diferentes nas diversas regiões, sobretudo como reflexo de suas diferentes composições setoriais .

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130 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Tabela 3 | Desvios das trajetórias regionais

Estado Impacto Ângulo

2008-2009

(graus)

Peso no

produto

interno bruto

(PIB) industrial

(2007)

(%)

Ângulo

2015-2016

(graus)

Peso no PIB

industrial

(2013)

(%)

AM • (26,2) 4 (27,4) 3

BA • (61,6) 5 (30,8) 4

CE (26,3) 1 (93,5) 1

ES • (113,9) 2 (54,1) 3

GO (74,5) 2 (4,4) 3

MG (89,0) 11 (38,7) 12

MT (X) 1 (7,0) 1

PA • (70,4) 2 (57,7) 3

PE • 0,8 1 (12,7) 2

PR • (103,3) 7 (55,4) 7

RJ • (50,6) 10 (38,3) 11

RS • (93,1) 7 (81,8) 7

SC (45,8) 5 (74,1) 5

SP • (81,4) 39 (64,5) 34

Demais estados 3   4

• Estados com forte impacto nas duas crises

• Estados com impacto fraco nas duas crises

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2017; 2019a) .

Quadro 2 | Síntese dos impactos regionais das crises de 2008-2009 e 2015-2016

2008-2009

Forte Fraco

2014-2015 Forte ES, PR, RS, SP e PA CE e SC

Fraco MG e GO BA, RJ, AM e PE

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2017; 2019a) .

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131O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Antes e depois: as alterações na indústria de transformação9

A indústria de transformação entre 2007 e 2017O período não foi favorável para a IT:10 conforme mostra o Gráfico 4, entre 2008 e 2016 sua taxa de crescimento foi menor do que a do PIB em sete dos nove anos, igual em um (2013) e maior em um (2010).

Gráfico 4 | Taxa de crescimento da indústria de transformação vs. produto interno bruto (% ao ano)

1,2

6,1

4,1

-9,3

9,2

2,2

-2,4

3

-4,7

-8,5

-4,8

1,7 1,3

2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018

Indústria de transformação Produto interno bruto, a preços de mercado

Fonte: Elaboração própria, com base em IBGE (2019c) .

Como consequência, o peso da IT na economia caiu de 16,6% em 2007 (um ano antes da crise de 2008-2009) para 12,2% em 2017 (um ano de-pois da crise de 2015-2016). Em virtude do maior dinamismo das outras

9 Esta seção baseia-se em IBGE (2019c), para dados do PIB, e em IBGE (2017), para dados sobre valor adicionado .

10 Para uma discussão sobre a presença de aspectos pós-industriais na economia brasileira, ver Galinari e Teixeira

Junior (2014) .

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132 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

indústrias,11 o peso da IT na indústria brasileira também caiu entre 2007 e 2017, passando de 61,2% para 57,4%.

A perda de peso na indústria de transformação pelos setores mais impactadosConforme indicado na quarta seção, as divisões Cnae 13, 22, 25, 27, 28, 29, 30 e 32, que vão desde plástico até construção de aeronaves, expe-rimentaram choques mais intensos nas duas crises. Em conjunto, tais setores perderam 4,1 pontos percentuais (p.p.) de sua participação no total do valor adicionado da IT, caindo de 32,2% para 28,1%. Observe--se que esses setores, que respondem por cerca de 30% do total da IT, foram impactados severamente duas vezes em um intervalo de apenas nove anos. Em termos nominais, a taxa anual de crescimento do valor adicionado desses setores entre 2007 e 2017 ficou entre 2% (divisão 29) e 9% (divisão 32), na maior parte dos casos situando-se entre 5% e 6%, o que corresponde aproximadamente à taxa de variação do IPCA no período.12

O ganho de peso na indústria de transformação pelos setores menos impactadosAs divisões 10, 11, 12, 14, 16, 19 e 26 foram menos impactadas pelas cri-ses. A participação desse bloco na IT subiu 5,5 p.p. entre 2007 e 2017, crescendo de 34,9% para 40,3%. O grupo inclui setores muito distintos,

11 No Sistema de Contas Nacionais, o IBGE segrega três grandes setores da economia – agropecuária, indústria e

serviços –, e o conceito de indústria engloba as indústrias extrativas, as indústrias de transformação, a indústria da

construção civil e os serviços industriais de utilidade pública (Siup), que são eletricidade, água, esgoto e lixo . O peso

da indústria extrativa na totalidade da indústria também diminuiu (de 10,9% para 7,8%) . Os segmentos industriais

que ganharam participação foram Siup (de 11,1% para 12,2%) e, principalmente, construção (de 16,8% para 22,4%) .

A própria indústria, em sua totalidade, também perdeu peso entre 2007 e 2017, passando de 27,1% para 21,3% . A

participação da atividade agropecuária manteve-se constante (oscilou de 5,2% a 5,4%), enquanto o setor de serviços

chegou a 73,3% (perante 67,7% em 2007) .

12 Entre janeiro de 2007 e dezembro de 2017, a variação do IPCA foi de 5,95% a .a ., de acordo com cálculo realizado

em https://www3 .bcb .gov .br/CALCIDADAO/publico/exibirFormCorrecaoValores .do?method=exibirFormCorrecaoValores .

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133O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

desde alimentos, bebidas (CERVIERI JÚNIOR et al., 2014) e fumo até derivados do petróleo13 e equipamentos de informática, passando por vestuário e produtos de madeira. Quanto à taxa de crescimento nominal do valor adicionado, ficou entre 3% a.a. e 14% a.a. (mediana dos setores igual a 6% a.a.).

Também integra esse conjunto uma parcela da divisão 20 (20B: limpeza e HPPC), que ganhou 0,5 p.p. de participação no valor adicionado da IT, com crescimento de 7% a.a.

Os setores de maior peso na economiaA IT brasileira é muito concentrada em poucos setores. Em 2007, bas-tavam apenas cinco divisões (19, 29, 10, 24 e 20) para ultrapassar 50% do valor adicionado (53% da IT): derivados do petróleo (14,7% de peso e taxa de crescimento nominal do valor adicionado de 3% a.a. no período 2007-2017), veículos automotores (10,5% a.a. e 2% a.a.), alimentos (9,8% a.a. e 14% a.a.), metalurgia (9,8% a.a. e 1% a.a.) e produtos químicos (8,2% a.a. e 7% a.a.). O peso dessas divisões manteve-se relativamente constante, perdendo apenas 1,6 p.p. (com expressivas quedas das divisões 19, 29 e 24 sendo parcialmente compensadas pelo salto da divisão 10).

Em 2017, o quadro alterou-se pouco, sendo ainda possível ultrapassar 50% do valor adicionado considerando-se apenas cinco divisões, que são as mesmas. A ordem, contudo, foi alterada: alimentos é a primeira (19,1% de peso no valor adicionado da IT), seguida de derivados do petróleo (10,5%), produtos químicos (8,7%), veículos automotores (7,3%) e metalurgia (5,7%).

O fato de três de suas cinco principais divisões terem apresentado baixo dinamismo entre 2007 e 2017 ajuda a explicar a perda de peso da IT no PIB.

13 Para uma visão ampla do setor, ver, por exemplo, Mendes e outros (2018) .

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134 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Os setores de maior peso no emprego da indústria de transformaçãoO emprego industrial também era bastante concentrado em 2007, com seis divisões respondendo por 51,1% do total das ocupações: 10, 14, 25, 29, 15 e 22 – duas delas experimentando impacto fraco (bebidas e vestuário) nas duas crises e três, impacto forte (borracha e plástico, produtos de metal exceto máquinas e veículos automotores). O peso dessas divisões no emprego da IT oscilou para 50,2%, mantendo-se quase constante depois de uma década.

Em 2017, ainda foi possível ultrapassar a metade das ocupações da IT com apenas seis divisões, mas ao perder 1,6 p.p. o setor de couro e calçados (divisão 15) deu lugar à fabricação de produtos de minerais não metálicos (divisão 23, que inclui vidros planos e revestimentos cerâmicos), cuja participação aumentou 0,7 p.p. A ordem das divisões também foi modificada: em primeiro lugar, 10 (de 18,6% para 21,2%), seguida de 14 (de 8,2% para 9,6%), 23 (5,2% para 5,8%), 29 (6,5% para 5,4%), 25 (6,6% para 5%) e 22 (5,4% para 4,8%).

A concorrência com a China14

O período estudado coincide com uma época de grande aproximação comercial entre o Brasil e a China. Em 2001, poucos eram os setores em que as importações de origem chinesa15 representavam mais do que 5%

14 As informações desta subseção são baseadas em dados de http://comexstat .mdic .gov .br/pt/home (acesso em:

20 ago . 2019), para estatísticas de comércio exterior; de IBGE (2017), para receita industrial; e de http://ipeadata .gov .br/

beta3/ (acesso em: 20 ago . 2019), para taxa de câmbio . O market share do Brasil em um dado setor no mercado interno

brasileiro é o quociente entre a receita do setor (R), subtraída do valor das exportações de produtos do setor (X), e o

consumo aparente de produtos do setor – dado pela receita do setor acrescida das importações de produtos do setor (M) e

subtraída do valor das exportações de produtos do setor . Assim, o market share é dado por (R-X)/(R-X+M) . O market share

de uma região em um determinado setor no mercado interno brasileiro é calculado pelo quociente entre as importações

brasileiras de produtos do setor provenientes da região (Mr) e o consumo aparente de produtos do setor – isto é, Mr/(R-X+M) .

15 China, Macau e Hong Kong .

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135O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

do mercado interno brasileiro (o exame estatístico de 83 dos 98 grupos16 da IT aponta apenas três setores: 152, artigos diversos de couro, 191, Coqueria, e 264, equipamentos de reprodução de áudio e vídeo, respec-tivamente com 11,8%, 61,5% e 6,3%). Já em 2010, porém, o market share da China no mercado doméstico brasileiro ultrapassava a marca de 5% em 14 grupos, e em 32 grupos em 2017. Contudo, quando o critério é de que tal participação atinja mais de 20%, esse total cai para apenas dez grupos.

A participação brasileira em seu próprio mercado doméstico em 2001 ultrapassava a marca dos 90% em quase quarenta grupos (e, em sessenta dos 98 grupos estudados, o market share nacional ultrapassava 75%), de modo que uma perda de mercado ao longo de duas décadas entre 5 p.p. e 10 p.p. não necessariamente representa uma grave crise, sobretudo porque em geral houve grande expansão do consumo aparente.

Além disso, em alguns casos o ganho de participação da China foi concomitante com o aumento da participação brasileira – as perdas foram obtidas pelas importações originadas nos Estados Unidos da América (EUA), na União Europeia (UE), no Mercado Comum do Sul (Mercosul) e/ou em outras regiões. A Tabela 4 mostra os grupos em que o ganho de participação da China no mercado doméstico brasileiro foi de pelo menos 7 p.p. entre 2001 e 2017, além das respectivas alterações das participações de outras regiões, enquanto a Tabela 5 indica os grupos em que a perda de participação do Brasil foi de 7 p.p. ou mais.

Dos 28 grupos em que houve expansão significativa das importações de origem chinesa, em sete a produção brasileira também ganhou market share e em 13 a perda nacional foi inferior a 7 p.p. – ou seja, em apenas oito dos 83 grupos pesquisados os produtores brasileiros perderam expressivamente participação no mercado doméstico que possa ser associada à expansão chinesa.

16 Os grupos da Cnae detalham a três dígitos as divisões (que têm dois dígitos) .

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136 Indústria de transformação

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Tabela 4 | Setores de maior avanço das importações de origem chinesa (p.p.), entre 2001 e 2017Grupo da Classificação Nacional de Atividades Econômicas

Descrição Brasil China Estados Unidos

da América

União Europeia

Mercado Comum do Sul

Demais

204 Fibras artificiais e sintéticas (9,9) 43,3 (3,9) (2,3) (9,5) (17,7)

261, 262 e 282

Máquinas e equipamentos de uso geral, componentes eletrônicos e equipamentos de informática

(5,1) 33,8 (11,3) (2,8) (0,4) (14,2)

131 Fibras têxteis (32,4) 30,3 5,8 (0,1) (1,6) (1,9)

152 Artigos diversos de couro (25,6) 25,7 (0,4) 2,8 (0,7) (1,8)

264 Equipammentos de reprodução de áudio e vídeo (TV, DVD, Micro-System)

(13,4) 25,2 (0,5) (1,1) (0,4) (9,9)

263 Equipamentos de comunicação (0,8) 23,3 (7,9) (7,5) 0,0 (7,0)

279 Demais equipamentos elétricos (eletrodos, contatos, equipamentos para sinalização e alarme etc .)

13,8 22,6 (13,4) (4,4) (0,6) (18,0)

202 Produtos químicos orgânicos (30,1) 21,2 (0,1) 5,5 (1,2) 4,7

281 Motores, bombas, compressores e equipamentos de transmissão

(10,5) 19,8 (4,8) 1,5 0,0 (6,1)

284 Máquinas-ferramenta 15,2 18,9 (1,8) (18,9) (1,8) (11,6)

254 Ferramentas, artigos de serralheria e cutelaria

5,6 14,7 (3,9) (9,3) (1,0) (6,2)

132 Tecelagem, exceto malha (8,6) 13,8 (0,3) (0,3) 0,5 (4,9)

285 Tratores não agrícolas e máquinas e equipamentos para prospecção e extração mineral e construção

(15,8) 13,1 (2,8) 2,4 2,1 1,0

272 e 273 Pilhas, baterias e acumuladores elétricos; equipamentos para distribuição e controle de energia elétrica

8,0 12,9 (7,3) (3,4) (1,5) (8,7)

271 Geradores, transformadores e motores elétricos

27,4 12,8 (23,8) (7,7) (0,4) (8,3)

286 Máquinas e equipamentos de uso específico (para metalurgia, alimentos, têxtil etc .)

0,4 11,7 (2,6) (2,5) (0,2) (6,9)

221 Produtos de borracha (inclui pneu) (2,1) 11,1 (1,1) (2,7) (0,5) (4,7)

309 Equipamentos de transporte (motocicletas, bicicletas e triciclos não motorizados etc .)

(5,5) 10,9 0,4 0,4 (0,1) (6,2)

135 Artefatos têxteis, exceto vestuário (cama, mesa e banho)

(3,3) 10,3 (1,6) (2,2) (1,0) (2,3)

293 e 294 Peças, acessórios, cabines, carrocerias e reboques para veículos automotores

(0,7) 10,1 (1,4) (5,9) (1,1) (1,0)

275 Eletrodomésticos (fogões, refrigeradores, máquinas de lavar etc .)

(6,8) 8,6 (0,5) (0,4) (0,3) (0,7)

133 e 142 Tecidos e artefatos de malha (6,4) 8,5 0,5 (0,2) 0,3 (2,7)

205 Defensivos agrícolas e desinfetantes domissanitários

(6,8) 8,4 (1,4) 0,0 (0,1) 0,0

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de http://comexstat .mdic .gov .br/pt/home

(acesso em: 20 ago . 2019), para estatísticas de comércio exterior; de IBGE (2017), para receita industrial;

e de http://ipeadata .gov .br/beta3/ (acesso em: 20 ago . 2019), para taxa de câmbio .

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137O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

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Tabela 5 | Setores de maior queda do market share nacional no mercado doméstico brasileiro (p.p.)Grupo da Classificação Nacional de Atividades Econômicas

Descrição Brasil China Estados Unidos

da América

União Europeia

Mercado Comum do Sul

Demais

131 Fibras têxteis (32,4) 30,3 5,8 (0,1) (1,6) (1,9)202 Produtos químicos orgânicos (30,1) 21,2 (0,1) 5,5 (1,2) 4,7152 Artigos diversos de couro (25,6) 25,7 (0,4) 2,8 (0,7) (1,8)285 Tratores não agrícolas e

máquinas e equipamentos para prospecção e extração mineral e construção

(15,8) 13,1 (2,8) 2,4 2,1 1,0

264 Equipamentos de reprodução de áudio e vídeo (TV, DVD, Micro-System)

(13,4) 25,2 (0,5) (1,1) (0,4) (9,9)

281 Motores, bombas, compressores e equipamentos de transmissão

(10,5) 19,8 (4,8) 1,5 0,0 (6,1)

241 Ferro-gusa e ferroligas (10,0) 2,2 0,3 1,4 0,1 6,0204 Fibras artificiais e sintéticas (9,9) 43,3 (3,9) (2,3) (9,5) (17,7)132 Tecelagem, exceto malha (8,6) 13,8 (0,3) (0,3) 0,5 (4,9)

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de http://comexstat .mdic .gov .br/pt/home

(acesso em: 20 ago . 2019), para estatísticas de comércio exterior; de IBGE (2017), para receita industrial;

e de http://ipeadata .gov .br/beta3/ (acesso em: 20 ago . 2019), para taxa de câmbio .

Cabe examinar como foi a evolução dos grupos Cnae de maior expansão das importações de origem chinesa (Tabela 4, exceto 142)17 entre 2007 e 2017 (antes e depois das crises). O conjunto respondia por 22,1% do valor adicionado da IT em 2007, havendo perda de 3,4 p.p. até 2017, quando o percentual caiu para 18,7%. Quanto à taxa nominal de crescimento, a mediana do conjunto foi de 4,6% a.a. (o primeiro quartil foi de 7,5% a.a., e o terceiro foi de 2,9% a.a.), enquanto para a IT foi de 6,2% a.a.

Embora os setores mais expostos à concorrência chinesa tenham apresen-tado menor dinamismo do que os demais, a perda de peso não foi muito elevada (pouco mais de 3 p.p. em uma década). Além disso, vale notar que o conjunto tem peso relativamente baixo (cerca de 20% do valor adicionado

17 Dado indisponível para o grupo 142 .

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138 Indústria de transformação

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da IT). Não parece haver, portanto, fundamento em afirmar que a concor-rência chinesa seja um dos principais problemas da indústria brasileira.

PorteAlém do ponto de vista setorial e regional, o valor adicionado da IT também é concentrado do ponto de vista do porte das empresas. As grandes empresas têm indicadores muito melhores em produtividade e na média salarial de seus trabalhadores, conforme mostram os dados da Tabela 6, relativos ao ano de 2016.

Tabela 6 | Dados econômicos segundo o porte das empresas

Porte (receita operacional bruta anual)

Número de

empresas

Produtividade (valor adicionado/

emprego) (R$/ano)

Market share (%)

Salário médio

(R$/mês)

Valor adicionado (produto interno bruto)

(%)Até R$ 40 milhões 169 .633 43 .395,91 12 2 .300,59 18,7De R$ 40 milhões a R$ 90 milhões

2 .763 76 .977,42 5 3 .959,04 5,4

De R$ 90 milhões a R$ 300 milhões

2 .088 83 .054,23 11 4 .424,10 10,0

De R$ 300 milhões a R$ 1 bilhão

870 120 .600,48 14 5 .612,75 14,1

Acima de R$ 1 bilhão 406 227 .018,22 58 8 .050,25 51,7Geral 175 .760 103 .318,26 100 4 .439,28 100,0

Fonte: Elaboração própria, com base em tabulação especial fornecida pelo IBGE

com base em dados da PIA-Empresa (IBGE, 2017) .

Nota: Dados de 2017 ainda não disponíveis .

Quando o detalhamento por porte é examinado com base em dados de emprego,18 observa-se certa estabilidade, o que aponta para ausência

18 Ver, por exemplo, a pesquisa Demografia de Empresas (IBGE, 2016) . Na IT, as empresas com até nove empregados aumentaram seu peso no total das ocupações de 11,3% para 12,5% entre 2007 e 2016, assim como as empresas com quinhentos ou mais empregados (de 38,1% para 39,9%), mostrando que os extremos ganharam peso . Nos portes intermediários, contudo, houve perda de participação: queda de 30,8% para 29,5%, no caso das empresas entre dez e 99 empregados, e de 19,9% para 18,1%, no caso das empresas entre cem e 499 empregados . Trata-se de variações modestas e que não apresentam nítida correlação com o porte – além disso, tais dados não permitem a análise do impacto de eventuais ganhos de produtividade, apontando para a necessidade de pesquisas mais aprofundadas .

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sobre os setores da indústria de transformação

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de impacto diferenciado. Partindo-se de dados em que a definição de porte é baseada na receita operacional bruta anual de cada empresa, entretanto, nota-se que a participação no valor adicionado da indústria das empresas com faturamento anual acima de R$ 300 milhões manteve-se constante entre 2007 e 2010 (de 61% em 2007 passou a 63% em 2008; a seguir para 59% em 2009; e voltou a 61% em 2010), porém cresceu19 continuamente a partir de então, atingindo 66% em 2016.

O Gráfico 5 exibe a variação da participação no valor adicionado da indús-tria entre 2007 e 2016 para três faixas de faturamento anual: até R$ 90 mi-lhões, entre R$ 90 milhões e R$ 300 milhões e acima de R$ 300 milhões.

Gráfico 5 | Participação no valor adicionado da indústria, por porte (%)

27

12

61

24

10

66

0

10

20

30

40

50

60

70

Até R$ 90 milhões De R$ 90 milhões a R$ 300 milhões

Acima de R$ 300 milhões

2007 2016Fonte: Elaboração própria, com base em tabulação especial fornecida

pelo IBGE com base em dados da PIA-Empresa (IBGE, 2017) .

19 Trata-se de uma aproximação sujeita a um fato estatístico: uma vez que a base de dados foi construída com fronteiras fixas entre as categorias de porte, o processo inflacionário faz algumas empresas migrarem de uma faixa para outra ao longo do tempo . Contudo, tal fenômeno estatístico restringe-se aos casos limítrofes, e é parcialmente compensado por entradas e saídas nos dois extremos .

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140 Indústria de transformação

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Os dados obtidos, embora úteis para revelar algumas características interessantes da indústria brasileira (por exemplo, em um universo de 175 mil empresas, o pequeno conjunto formado pelas 406 de maior porte responde por mais da metade do PIB industrial), não são conclusivos quanto a um possível impacto diferenciado das crises. Como as empre-sas de menor porte perderam peso no valor adicionado da IT, porém, é possível que tais empresas tenham recebido impacto um pouco mais severo, sobretudo na crise de 2015-2016.

Conclusão

Este texto procurou mostrar que as crises de 2008-2009 e 2015-2016 causaram impactos heterogêneos, havendo setores que tiveram suas tra-jetórias fortemente afetadas, enquanto para outros os efeitos das crises foram menos severos, às vezes brandos ou até mesmo inexistentes. Os quadros 1 e 2 resumiram as diferenças setoriais e regionais da intensidade do impacto causado pelas recessões.

Conforme visto na subseção “Impacto geral de curto prazo”, a eclosão das crises se fez acompanhar por grandes desvios na trajetória de evo-lução da IT, que não passou incólume pelas recessões aqui examinadas. Corroboram essa afirmação dados da subseção “A indústria de trans-formação entre 2007 e 2017”, que apontam para perda de participação da IT no PIB e para um ritmo de crescimento tipicamente mais lento do que o observado na economia em geral.

Nenhum fator, isoladamente, parece explicar a diferença entre as crises e a diversidade de seus respectivos impactos, seja o grau de exposição à concorrência chinesa, seja o porte das empresas, seja ainda a intensida-de tecnológica ou o peso do fator trabalho (uma vez que setores muito

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141O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

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distintos sob esses pontos de vista, como a fabricação de produtos têx-teis e a de veículos automotores, às vezes apresentam o mesmo grau de impacto). Assim, as duas décadas não são marcadas pelas especificidades de cada agente nem pelo contexto geral moldado pelas recessões, mas sim por uma complexa interação entre os níveis micro, meso e macro, bem como por fatores não econômicos.

As oscilações econômicas que têm marcado as duas primeiras décadas do século XXI revelaram-se capazes de causar um pequeno, mas não desprezível, efeito sobre o desenho da estrutura produtiva brasileira, talvez acelerando tendências ou aprofundando fragilidades, o que no caso da IT se reflete em peso menor, alterações em sua composição intrassetorial e redefinição da sua distribuição no território.

Como pano de fundo, o setor de serviços prosseguiu em sua tendência de longo prazo, cujo peso na economia cresceu de 64,7% em 2004 para 73,3% em 2018, como ilustra o Gráfico 6.

Gráfico 6 | Peso do setor de serviços no valor adicionado (%)

63

65

67

69

71

73

75

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014

2015

2016

2017

2018

Fonte: Elaboração própria, com base em dados de IBGE (2019c) .

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142 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Não obstante, a IT permanece com salários médios mais altos, gran-de potencial de criação de valor e vocação para dinamizar a economia brasileira, não sendo possível negligenciar o segmento: ao contrário, uma agenda de ganhos de produtividade e competitividade, com mais inovação e maior presença nos mercados globais, pode ser muito benéfica para o desenvolvimento socioeconômico do país.

Referências

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CASTRO, A. B.; SOUZA, F. E. P. A economia brasileira em marcha forçada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

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143O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

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IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF). 2019a. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pim-pf-brasil/tabelas. Acesso em: 20 ago. 2019.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD Contínua. 2019b. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pnadct/tabelas. Acesso em: 20 ago. 2019.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Sistema de Contas Nacionais. 2019c. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/cnt/tabelas. Acesso em: 20 ago. 2019.

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144 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Apêndices

Apêndice 1: Classificação Nacional de Atividades Econômicas – divisões

Classificação

Nacional de

Atividades

Econômicas

Descrição Denominação

10 Alimentos Fabricação de produtos alimentícios

11 Bebidas Fabricação de bebidas

12 Fumo Fabricação de produtos do fumo

13 Têxtil Fabricação de produtos têxteis

14 Vestuário Confecção de artigos do vestuário e acessórios

15 Calçados Preparação de couros e fabricação de artefatos

de couro, artigos para viagem e calçados

16 Produtos de madeira Fabricação de produtos de madeira

17 Papel e celulose Fabricação de celulose, papel e produtos

de papel

18 Gráficas Impressão e reprodução de gravações

19 Biocombustíveis e

derivados do petróleo

Fabricação de coque, de produtos derivados

do petróleo e de biocombustíveis

20B Cosméticos Fabricação de produtos de limpeza e HPPC –

higiene pessoal, perfumaria e cosméticos

20C Outros produtos

químicos

Fabricação de outros produtos químicos

21 Farmacêuticos Fabricação de produtos farmoquímicos

e farmacêuticos

22 Borracha e plástico Fabricação de produtos de borracha e de

material de plástico

23 Minerais não metálicos Fabricação de produtos de minerais

não metálicos

(Continua)

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145O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

(Continuação)

Classificação

Nacional de

Atividades

Econômicas

Descrição Denominação

24 Metalurgia Metalurgia

25 Produtos de metal Fabricação de produtos de metal, exceto

máquinas e equipamentos

26 Informática, ótica e

produtos eletrônicos

Fabricação de equipamentos de informática,

produtos eletrônicos e ópticos

27 Máquinas, aparelhos e

materiais elétricos

Fabricação de máquinas, aparelhos e

materiais elétricos

28 Máquinas e

equipamentos

Fabricação de máquinas e equipamentos

29 Veículos automotores,

reboques e carrocerias

Fabricação de veículos automotores, reboques

e carrocerias

30 Embarcações, aeronaves

e outros veículos

Fabricação de outros equipamentos de

transporte, exceto veículos automotores

31 Móveis Fabricação de móveis

32 Diversos (brinquedos,

joias, equipamentos

médicos etc .)

Fabricação de produtos diversos

33 Manutenção, reparação

e instalação de máquinas

e equipamentos

Manutenção, reparação e instalação de

máquinas e equipamentos

Fonte: Elaboração própria, com base em https://concla .ibge .gov .br/ busca-online-cnae .html (acesso em: 20 ago . 2019) .

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146 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Apêndice 2: Classificação Nacional de Atividades Econômicas – grupos citados

Classificação Nacional de Atividades Econômicas (três dígitos)

Descrição Denominação

131 Fibras têxteis Preparação e fiação de fibras têxteis

132 Tecelagem, exceto malha Tecelagem, exceto malha

133 e 142 Tecidos e artefatos de malha Fabricação de tecidos de malha, artigos de malharia e tricotagem

135 Artefatos têxteis, exceto vestuário (cama, mesa e banho)

Fabricação de artefatos têxteis, exceto vestuário (cama, mesa, banho)

152 Artigos diversos de couro Fabricação de artigos para viagem e de artefatos diversos de couro

202 Produtos químicos orgânicos Fabricação de produtos químicos orgânicos

204 Fibras artificiais e sintéticas Fabricação de fibras artificiais e sintéticas

205 Defensivos agrícolas e desinfetantes domissanitários

Fabricação de defensivos agrícolas e desinfestantes domissanitários

221 Produtos de borracha (inclui pneu)

Fabricação de produtos de borracha (inclui pneu)

241 Ferro-gusa e ferroligas Produção de ferro-gusa e de ferroligas

254 Ferramentas, artigos de serralheria e cutelaria

Fabricação de artigos de cutelaria, da serralheria e ferramentas

261, 262 e 282 Máquinas e equipamentos de uso geral, componentes eletrônicos e equipamentos de informática

Fabricação de máquinas e equipamentos de uso geral, componentes eletrônicos e equipamentos de informática

263 Equipamentos de comunicação

Fabricação de equipamentos de comunicação

264 Equipamentos de reprodução de áudio e vídeo (TV, DVD e Micro-System)

Fabricação de aparelhos de recepção, reprodução, gravação e amplificação de áudio e vídeo

(Continua)

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147O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

(Continuação)

Classificação Nacional de Atividades Econômicas (três dígitos)

Descrição Denominação

271 Geradores, transformadores e motores elétricos

Fabricação de geradores, transformadores e motores elétricos

272 e 273 Pilhas, baterias e acumuladores elétricos; equipamentos para distribuição e controle de energia elétrica

Fabricação de pilhas, baterias, acumuladores elétricos, equipamentos para distribução e controle de energia elétrica

275 Eletrodomésticos (fogões, refrigeradores, máquinas de lavar etc .)

Fabricação de eletrodomésticos (fogões, refrigeradores, máquinas de lavar etc .)

279 Demais equipamentos elétricos (eletrodos, contatos, equipamentos para sinalização e alarme etc .)

Fabricação de equipamentos e aparelhos elétricos não especificados anteriormente (eletrodos, contatos, equipamentos para sinalização e alarme etc .)

281 Motores, bombas, compressores e equipamentos de transmissão

Fabricação de motores, bombas, compressores e equipamentos de transmissão

284 Máquinas-ferramenta Fabricação de máquinas-ferramenta

285 Tratores não agrícolas e máquinas e equipamentos para prospecção e extração mineral e construção

Fabricação de máquinas e equipamentos de uso na extração mineral e na construção

286 Máquinas e equipamentos de uso industrial específico (para metalurgia, alimentos, têxtil etc .)

Fabricação de máquinas e equipamentos de uso industrial específico (para metalurgia, alimentos, têxtil etc .)

293 e 294 Peças, acessórios, cabines, carrocerias e reboques para veículos automotores

Fabricação de cabines, carrocerias, reboques, peças e acessórios para veículos automotores

309 Equipamentos de transporte (motocicletas, bicicletas e triciclos não motorizados etc .)

Fabricação de equipamentos de transporte não especificados anteriormente (motocicletas, bicicletas e triciclos não motorizados etc .)

Fonte: Elaboração própria, com base em https://concla .ibge .gov .br/ busca-online-cnae .html (acesso em: 20 ago . 2019) .

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148 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Apêndice 3: Pesos setoriais no valor adicionado da indústria de transformação, 2007-2017 (%)

Divisão da Classificação Nacional de Atividades Econômicas

2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2017-2007

(D p.p.)

10 9,8 10,7 12,5 13,6 14,8 16,2 15,4 15,7 18,5 19,0 19,1 9,3

11 3,0 3,0 3,7 3,4 3,4 3,7 3,2 3,4 4,1 3,6 3,5 0,5

12 0,7 0,7 0,9 0,6 0,7 0,8 0,8 0,8 0,8 0,5 0,5 (0,2)

13 2,1 2,0 2,1 2,1 2,0 2,0 1,9 1,9 1,8 1,8 2,1 0,0

14 2,3 2,0 2,8 2,6 3,1 3,1 3,0 2,8 2,6 2,7 2,8 0,4

15 1,6 1,6 1,7 1,8 1,8 1,9 1,9 1,9 1,9 1,9 2,0 0,3

16 1,6 1,5 1,4 1,4 1,3 1,4 1,4 1,3 1,3 1,2 1,4 (0,2)

17 3,9 3,4 3,5 3,3 3,2 3,3 3,2 3,2 4,4 4,2 4,5 0,6

18 1,1 1,0 1,1 1,1 1,2 1,1 1,1 1,1 1,0 1,0 0,9 (0,2)

19 14,7 14,6 14,6 12,6 11,5 9,3 10,5 12,7 8,1 13,5 10,5 (4,2)

20 8,2 7,3 6,6 6,8 7,2 7,3 7,4 7,3 9,3 8,9 8,7 0,5

21 2,6 2,4 2,6 2,6 2,4 2,4 2,4 2,5 2,7 2,9 3,2 0,6

22 3,7 3,4 4,0 4,0 4,0 4,0 4,0 4,1 4,1 4,0 4,1 0,4

23 3,3 3,7 4,1 4,2 4,5 4,8 4,6 4,6 4,4 3,5 3,1 (0,2)

24 9,8 10,1 6,3 6,6 5,7 5,8 6,1 6,3 6,1 5,3 5,7 (4,1)

25 4,7 4,8 5,0 4,6 4,8 4,7 4,6 4,4 4,3 4,0 3,9 (0,9)

26 2,8 2,5 2,3 2,5 2,5 2,6 2,8 2,4 2,6 2,3 2,6 (0,2)

27 2,9 3,1 3,2 3,2 3,0 3,2 3,4 3,0 3,1 2,8 2,7 (0,2)

28 5,3 5,5 5,1 5,8 6,1 6,1 6,2 5,9 5,5 5,1 4,9 (0,5)

29 10,5 11,1 10,7 10,8 11,0 9,5 9,5 7,5 6,3 5,4 7,3 (3,2)

30 1,9 1,9 1,7 1,9 1,7 1,7 1,9 2,0 1,9 1,7 1,7 (0,2)

31 1,1 1,1 1,2 1,4 1,4 1,6 1,5 1,6 1,4 1,4 1,4 0,3

32 1,1 1,1 1,3 1,2 1,3 1,5 1,5 1,5 1,6 1,4 1,5 0,4

33 1,3 1,4 1,5 1,5 1,6 1,7 1,8 1,9 2,1 1,9 2,1 0,8

Fonte: Elaboração própria, com base em IBGE (2017) .

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149O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Apêndice 4: Pesos regionais no emprego e no valor da transformação industrial da indústria de transformação – participação dos estados, 2007-2017 (%)Unidade da Federação/região

2007 2008 2009 2010

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

AC 0,06 0,03 0,06 0,02 0,07 0,03 0,07 0,03

AP 0,04 0,03 0,04 0,02 0,04 0,02 0,05 0,02

AM 1,56 4,04 1,53 3,97 1,47 3,99 1,49 3,83

PA 1,32 1,07 1,24 1,00 1,13 0,83 1,12 0,72

RO 0,39 0,22 0,40 0,20 0,34 0,22 0,35 0,25

RR 0,02 0,01 0,02 0,02 0,03 0,01 0,02 0,01

TO 0,15 0,06 0,14 0,05 0,14 0,06 0,17 0,08

N 3,53 5,45 3,44 5,28 3,21 5,16 3,27 4,94

AL 1,47 0,38 1,43 0,36 1,42 0,40 1,36 0,39

BA 2,59 5,14 2,62 5,31 2,71 4,39 2,84 4,44

CE 2,87 1,23 2,75 1,25 3,00 1,54 3,08 1,43

MA 0,45 0,45 0,45 0,38 0,40 0,25 0,41 0,25

PB 0,88 0,33 0,89 0,37 0,88 0,40 0,92 0,43

PE 2,61 1,26 2,64 1,27 2,75 1,65 2,78 1,66

PI 0,32 0,17 0,31 0,17 0,33 0,21 0,32 0,21

RN 0,87 0,25 0,90 0,26 0,88 0,30 0,88 0,42

SE 0,45 0,24 0,44 0,27 0,50 0,28 0,47 0,27

NE 12,51 9,46 12,42 9,65 12,88 9,43 13,06 9,50

ES 1,48 1,64 1,49 1,64 1,55 1,30 1,48 1,27

MG 10,25 10,21 10,22 10,82 10,18 9,62 10,25 10,10

RJ 5,15 7,34 5,24 7,37 5,35 7,29 5,37 7,95

SP 36,64 42,47 36,96 41,32 36,09 41,63 35,96 40,78

SE 53,53 61,67 53,90 61,16 53,17 59,84 53,07 60,09

PR 8,12 7,50 8,00 8,11 8,26 8,03 8,23 7,73

RS 9,37 7,37 9,04 7,25 8,92 7,68 8,99 7,68

SC 8,19 5,02 8,31 4,78 8,29 5,15 8,14 5,29

S 25,68 19,90 25,35 20,14 25,47 20,86 25,36 20,70

DF 0,33 0,21 0,36 0,29 0,40 0,32 0,38 0,29

GO 2,39 1,87 2,51 1,88 2,68 2,36 2,71 2,34

MT 1,19 0,87 1,17 1,04 1,22 1,32 1,17 1,29

MS 0,85 0,57 0,84 0,56 0,98 0,71 0,97 0,85

CO 4,76 3,52 4,89 3,78 5,27 4,71 5,24 4,77

(Continua)

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150 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

(Continuação)

Unidade da Federação/região

2011 2012 2013 2014

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

AC 0,08 0,03 ND ND 0,08 0,04 0,10 0,05

AP 0,05 0,03 ND ND 0,05 0,05 0,05 0,06

AM 1,61 3,55 1,52 3,39 1,66 3,51 1,57 3,60

PA 1,06 0,71 1,03 0,71 1,02 0,68 1,07 0,80

RO 0,40 0,26 0,40 0,24 0,45 0,30 0,45 0,29

RR 0,03 0,01 0,02 0,01 0,03 0,01 0,03 0,01

TO 0,17 0,09 0,18 0,10 0,20 0,13 0,21 0,18

N 3,41 4,68 3,15 4,45 3,48 4,72 3,49 4,99

AL 1,34 0,52 1,22 0,45 1,08 0,41 1,00 0,43

BA 2,93 4,24 2,74 4,14 2,81 3,99 2,77 4,26

CE 3,07 1,41 2,90 1,39 3,02 1,54 3,03 1,60

MA 0,43 0,34 0,42 0,42 0,50 0,41 0,51 0,54

PB 0,94 0,43 0,94 0,47 0,94 0,48 0,97 0,47

PE 2,84 1,60 2,74 1,83 2,89 1,79 2,90 1,92

PI 0,33 0,19 0,32 0,16 0,37 0,17 0,35 0,17

RN 0,82 0,44 0,75 0,46 0,75 0,46 0,75 0,55

SE 0,52 0,28 0,54 0,27 0,56 0,32 0,57 0,29

NE 13,21 9,45 12,58 9,59 12,93 9,57 12,84 10,24

ES 1,51 1,30 1,48 1,27 1,46 1,34 1,58 1,41

MG 10,23 9,56 10,49 9,34 10,34 9,45 10,40 9,68

RJ 5,28 8,04 5,42 8,06 5,50 7,54 5,50 7,18

SP 35,49 40,79 35,61 39,97 34,35 39,20 33,95 37,93

SE 52,51 59,69 53,00 58,64 51,64 57,54 51,44 56,19

PR 8,28 8,14 8,41 7,99 8,58 8,42 8,67 8,22

RS 9,21 7,74 9,13 8,12 9,16 8,21 9,03 8,20

SC 8,00 5,32 8,09 5,47 8,35 5,73 8,61 6,21

S 25,49 21,20 25,63 21,59 26,08 22,36 26,31 22,63

DF 0,40 0,32 0,37 0,29 0,39 0,28 0,38 0,33

GO 2,85 2,32 2,93 2,67 3,08 2,73 3,05 2,81

MT 1,15 1,39 1,26 1,69 1,32 1,60 1,35 1,52

MS 0,97 0,95 1,06 1,09 1,08 1,20 1,14 1,29

CO 5,37 4,98 5,63 5,74 5,86 5,81 5,92 5,93

(Continua)

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151O impacto heterogêneo das crises de 2008-2009 e 2015-2016

sobre os setores da indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

(Continuação)

Unidade da Federação/região

2015 2016 2017 2017-2007 (D p.p.)

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

Emprego Valor da transformação

industrial

AC 0,09 0,04 0,07 0,04 0,08 0,03 0,01 0,00

AP 0,05 0,05 0,05 0,05 0,05 0,02 0,02 0,00

AM 1,38 3,55 1,30 3,49 1,30 3,52 (0,26) (0,52)

PA 1,14 0,99 1,08 0,92 1,09 0,91 (0,23) (0,16)

RO 0,45 0,28 0,43 0,31 0,48 0,26 0,09 0,04

RR 0,03 0,01 0,03 0,01 0,03 0,01 0,01 0,00

TO 0,24 0,14 0,22 0,14 0,22 0,20 0,08 0,14

N 3,37 5,06 3,19 4,95 3,25 4,95 (0,28) (0,51)

AL 0,99 0,47 0,96 0,38 0,95 0,37 (0,51) 0,00

BA 2,93 4,59 2,86 4,65 2,90 4,17 0,31 (0,97)

CE 3,07 1,58 3,13 1,65 3,11 1,69 0,24 0,46

MA 0,54 0,71 0,51 0,57 0,47 0,61 0,02 0,17

PB 1,02 0,45 1,00 0,45 0,99 0,42 0,11 0,09

PE 2,94 2,12 2,88 2,18 2,84 2,31 0,23 1,05

PI 0,38 0,20 0,37 0,18 0,36 0,16 0,05 (0,01)

RN 0,75 0,51 0,77 0,49 0,70 0,51 (0,17) 0,26

SE 0,63 0,31 0,58 0,27 0,59 0,27 0,14 0,02

NE 13,25 10,94 13,05 10,82 12,92 10,52 0,41 1,05

ES 1,58 1,63 1,55 1,55 1,59 1,39 0,11 (0,25)

MG 10,36 9,52 10,43 9,33 10,50 9,83 0,24 (0,38)

RJ 5,25 7,24 5,01 7,04 4,85 7,22 (0,31) (0,12)

SP 33,76 37,22 33,95 37,52 33,65 37,46 (2,99) (5,01)

SE 50,95 55,61 50,95 55,43 50,58 55,90 (2,94) (5,77)

PR 8,77 7,89 8,73 8,14 8,91 8,33 0,79 0,82

RS 9,03 8,16 8,99 8,10 9,05 7,86 (0,32) 0,49

SC 8,66 6,01 8,95 6,05 9,06 6,28 0,87 1,25

S 26,47 22,06 26,67 22,30 27,02 22,47 1,34 2,57

DF 0,41 0,33 0,41 0,30 0,37 0,28 0,04 0,07

GO 3,15 2,95 3,13 3,11 3,23 2,91 0,84 1,04

MT 1,22 1,61 1,30 1,51 1,37 1,44 0,18 0,57

MS 1,18 1,44 1,30 1,57 1,26 1,54 0,41 0,97

CO 5,95 6,33 6,14 6,50 6,23 6,17 1,47 2,65

Fonte: Elaboração própria, com base em IBGE (2017) .

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152 Indústria de transformação

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 109-152, set. 2019

Referência

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Industrial Anual – Empresa (PIA-Empresa). 2017. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pia-empresa/quadros/brasil/2017. Acesso em: 20 ago. 2019.

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

Resíduos sólidos

* Respectivamente, engenheira do Departamento de Saneamento Ambiental da Área de Saneamento,

Transporte e Logística do BNDES e engenheira do BNDES, atualmente cedida ao Ministério do Desenvolvimento

Regional.

POLÍTICAS PÚBLICAS NA GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS: EXPERIÊNCIAS COMPARADAS E DESAFIOS PARA O BRASIL

Vanessa Pinto Machado e Silva Luciana Xavier de Lemos Capanema*

Palavras-chave: Resíduos sólidos . Economia circular . Saneamento .

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

Solid waste

* Respectively, engineer of de Environmental Sanitation Department of BNDES's Sanitation, Transports and

Logistics Division, and engineer of BNDES, on assignment at the Regional Development Ministry.

PUBLIC POLICIES IN SOLID WASTE MANAGEMENT: COMPARED EXPERIENCES AND CHALLENGES FOR BRAZIL

Vanessa Pinto Machado e Silva Luciana Xavier de Lemos Capanema*

Keywords: Solid waste . Circular economy . Sanitation .

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ResumoO modelo de produção linear – baseado na extração de recursos, sua transformação e descarte – vem ao longo dos anos comprometendo a sustentabilidade do meio ambiente. A escassez de recursos naturais e a disposição inadequada dos resíduos urbanos ameaçam o desenvolvi-mento econômico sustentável. Com isso, a transição para um modelo de economia circular vem ganhando força, especialmente na Europa. O mundo depara-se com um novo paradigma de produção em que o aperfeiçoamento da gestão de resíduos é ponto fundamental. No Brasil, apesar de instituída desde 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos não atingiu metas importantes, por exemplo, a extinção de lixões. A discussão das experiências internacionais pode contribuir para orientar o país na busca de soluções para a questão do manejo sustentável dos resíduos sólidos urbanos, que hoje representa um dos grandes desafios ambientais a serem enfrentados no Brasil e no mundo.

AbstractThe linear production model – based on the extraction of resources and furthermore, their transformation and disposal – has over the years continued to compromise environmental sustainability. The scarcity of natural resources and the improper disposal of urban waste persist to threaten sustainable economic development and, as such, the transition to a circular economy model is gaining momentum, especially in Europe. The world is undergoing a new production paradigm in which the improvement in waste management is a key factor. Whilst being established in Brazil since 2010, the National Solid Waste Policy has failed to achieve important goals such as the extinction of dumps. The discussion in relation to international experience can assist in the search for solutions to the pressing issue of sustainable management of urban solid waste, which today represents one of the major environmental challenges facing both Brazil and the international community at large.

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experiências comparadas e desafios para o Brasil

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

Introdução

Desde a Revolução Industrial, o modelo de produção vigente implica a geração e o descarte de resíduos. Ao longo do tempo, os resíduos foram se acumulando e, muitas vezes, sendo descartados de forma incorreta, impactando seriamente o meio ambiente.

Hoje, em meio a um cenário preocupante, percebe-se que vários países vêm implementando, em suas políticas públicas, medidas para redução de geração de resíduos com incentivo à promoção da economia circular por meio de reúso e reciclagem – e, nos casos em que essas atividades não se viabilizam, pelo aproveitamento energético. Os países desenvolvidos ainda enfrentam desafios na gestão de resíduos, e esses desafios são ainda maiores em países em desenvolvimento, como o Brasil.

Este artigo discute algumas das políticas públicas que estão sendo adotadas, em particular na Europa, que podem contribuir para inspirar avanços na gestão de resíduos sólidos no Brasil. Para isso, o estudo se inicia com o conceito de economia circular e apresenta, na sequência, iniciativas consideradas referência no tema – como as da Alemanha e da Suécia –, bem como a política que está sendo implementada pela União Europeia e a relevância do papel da China. Posteriormente, contextua-liza a situação atual do Brasil. Antes das considerações finais, há uma reflexão das autoras sobre o papel do BNDES na indução de políticas públicas e no incentivo a projetos no setor.

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Economia circular – conceito e implicações

O tradicional modelo de produção linear (extrair-transformar-descar-tar), cuja origem remonta à Revolução Industrial, mostra-se cada vez mais esgotado e ambientalmente insustentável. Resíduos são gerados, acumulados e, simplesmente, descartados, degradando o ambiente em favor do crescimento econômico.

Nesse contexto, a economia circular surge como alternativa para promo-ver o desenvolvimento econômico de forma mais sustentável. O conceito de economia circular é amplo e não há uma definição única consolidada.

Para fins deste artigo, considera-se economia circular o sistema eco-nômico que substitui o tradicional modelo de produção linear, ou, mais especificamente, sistemas regeneradores nos quais o consumo de recursos e resíduos, emissões e dissipação de energia são minimizados. Esse sistema pode ser obtido por meio de novos modelos de negócio que promovam reutilização, remanufatura, reciclagem, design de longa duração, desenvolvimento de materiais e embalagens biodegradáveis e recuperação de materiais nas fases de produção, distribuição e consumo. Desse modo, implica o engajamento de empresas, fabricantes e distri-buidores, além dos próprios consumidores e governos, com o objetivo de alcançar o desenvolvimento sustentável e promover benefícios para as futuras gerações (KIRCHHERR; REIKE; HEKKERT, 2017).

A transição para economia circular não se limita à redução dos impactos negativos do tradicional modelo linear. A concepção desse novo modelo é mais abrangente. Seu pilar é o reposicionamento do conceito de resíduo para insumo/matéria-prima. Os princípios circulares envolvem, dessa

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experiências comparadas e desafios para o Brasil

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forma, o estímulo à otimização do uso de recursos desde a concepção dos produtos até sua disposição final, de forma a ampliar seu ciclo de vida útil e garantir que somente rejeitos1 sejam descartados, conforme Figura 1.

Figura 1 | Representação da economia circular

Matéria-prima

Economia circular

Design

Fabricação

Distri

buição

ConsumoUso, reúso, reparo

Coleta

Recic

lage

m

Rejeito

Fonte: http://eco .nomia .pt/pt/economia-circular/estrategias . Acesso em: 25 jul . 2018 .

Esse movimento representa uma mudança de paradigma de produção, diretamente relacionada com o aperfeiçoamento da gestão de resí-duos e, nesse sentido, é uma resposta aos desafios de sustentabilidade e de competitividade.

De acordo com The World Bank,2 o mundo gera em torno de dois bilhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos por ano, e estimativa

1 Por rejeito entende-se “qualquer resíduo sólido que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e

recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que

não a disposição final ambientalmente adequada” (BRASIL, 2010) .

2 http://datatopics .worldbank .org/what-a-waste/trends_in_solid_waste_management .html . Acesso em: 10 abr . 2019 .

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conservadora aponta que 33% desse total tem destinação ambiental inadequada, por exemplo, os lixões.3 A disposição inadequada de resí-duos é extremamente prejudicial ao meio ambiente, conforme ressalta Mavropoulos (2015) em estudo realizado pela International Waste As-sociation (ISWA) em parceria com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). O chorume, líquido resultante da decomposição de resíduos, pode infiltrar no solo e contami-nar o lençol freático e mananciais de água potável e de água superficial. A poluição do solo pode ser causada pelo depósito de diferentes metais e agentes contaminantes, que, por sua vez, acabam transferidos para a vegetação e para os corpos d’água de diferentes maneiras. Fora isso, há proliferação de insetos, roedores e toda sorte de potenciais transmisso-res de doenças contagiosas. Lixões são, ainda, fonte de odores, poeira e particulados que também afetam a saúde dos residentes em seu entorno. Outro efeito nocivo decorrente da biodegradação do material orgânico, que ocorre até em aterros sanitários, é a produção de gás metano. Além de ser inflamável, o gás metano liberado na atmosfera contribui signi-ficativamente para o aquecimento global, em uma ordem vinte vezes superior à do gás carbônico.

Desse modo, a economia circular tornou-se uma meta para vários países, pois, ao mesmo tempo que proporciona oportunidades econômicas, seja por otimização de uso de recursos, seja por criação de novos negócios, também evita os efeitos nocivos do descarte inadequado para a saúde pública e o meio ambiente.

No entanto, segundo o relatório The circularity gap report, realiza-do pela Circle Economy, grupo apoiado pela agência do Sistema da

3 Por lixão entende-se um local de disposição em solo no qual ocorre disposição indiscriminada de resíduos sólidos,

com nenhuma medida de controle das operações e de proteção do ambiente do entorno, ou, no máximo, algumas bem

limitadas (MAVROPOULOS, 2015) .

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experiências comparadas e desafios para o Brasil

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

Organização das Nações Unidas (ONU) Meio Ambiente (DE WIT et al., 2019), hoje, apenas 9% da economia global é circular, o que significa que o planeta reutiliza menos de 10% das 92,8 bilhões de toneladas de minerais, combustíveis fósseis, metais e biomassa consumidos anual-mente em processos produtivos. O relatório destaca que, por conta de maior eficiência no uso de recursos, advinda da prática de reciclagem, reúso e remanufatura, há na economia circular um grande potencial para combater mudanças climáticas, bem como para estimular o cres-cimento econômico. O trabalho foi apresentado no Fórum Econômico Mundial de Davos como um alerta para governos sobre a importância da economia circular em suas políticas climáticas, a fim de atingir a meta do Acordo de Paris.4 Ele enfatiza a estreita ligação entre o uso intensivo de materiais e as alterações climáticas. Calcula que 62% das emissões de gases do efeito estufa (excluindo as geradas pelo uso da terra e pela silvicultura) são liberadas na atmosfera durante a extração, o processamento e a manufatura de bens.

Assim, a preocupação cada vez maior com o desenvolvimento susten-tável faz o conceito de economia circular ganhar força entre policymakers, órgãos de governo, agências intergovernamentais em esfera local, regional, nacional e internacional. A Alemanha foi pioneira em integrá-lo a suas leis nacionais, em 1996, com a promulgação do “Closed Substance Cycle and Waste Management Act”, seguida do Japão, que, em 2002, lançou a “Basic Law for Establishing a Recycling-Based Society”, e da China, com sua “Circular Economy Promotion Law of the People’s Republic of China” em 2009. Em 2015, a União Europeia incorporou o conceito em suas políticas com a divulgação da Estratégia de Economia Circular

4 O Acordo de Paris é um acordo mundial sobre as alterações climáticas alcançado em 12 de dezembro de 2015, em

Paris . O acordo contém um plano de ação destinado a limitar o aquecimento global a um valor “bem abaixo” dos 2 °C

e abrange o período a partir de 2020 (Disponível em: https://www .consilium .europa .eu/pt/policies/climate-change/

timeline/ . Acesso em: 12 abr . 2019) .

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da União Europeia (GEISSDOERFER et al., 2017). No Brasil, ainda há muito a se avançar no tema, especialmente, se considerado o desafio que o país enfrenta para o fechamento dos lixões existentes.

O exemplo europeu

Apesar de a gestão de resíduos ser um tema que avança cada vez mais na Europa, a União Europeia ainda enfrenta o problema da grande quantidade de resíduos dispostos em aterros sanitários, o que signi-fica o desperdício do potencial de reaproveitamento e reciclagem de matérias-primas como metais, madeira, papel e plásticos. Segundo um estudo do Parlamento Europeu, os dois grandes desafios para o futuro do continente são a redução do nível de geração de resíduos e o alinha-mento da política de gestão de resíduos com os princípios da economia circular (LEE et al., 2017).

De acordo com estatística oficial da União Europeia, em 2016, a Europa gerou cerca de 2,5 bilhões de toneladas de resíduos.5 Desse total, em torno de 38% foram reciclados, com o restante sendo destinado a aterros ou incinerado. Ressalte-se que esses números vêm melhorando ao longo dos anos, embora sejam bastante díspares entre os Estados-membros, com taxas que chegam a 80% de destinação em aterros sanitários em alguns países (como é o caso de Grécia, Croácia e Malta) e que não passam de 5% em outros (como Alemanha, Suécia, Bélgica, Holanda, Dinamarca e Áustria), conforme mostra a Figura 2 (LEE et al., 2017).

5 Dados disponíveis em: https://ec .europa .eu/eurostat/statistics-explained/index .php/Waste_statistics#Total_waste_

generation . Acesso em: 28 mar . 2019 .

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experiências comparadas e desafios para o Brasil

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Figura 2 | Destinação de resíduo sólido urbano a aterros sanitários na Europa, por Estado-membro (%)

Fonte: Lee e outros (2017) .

Nota: No centro do gráfico, lê-se “Meta 2030: não mais do que 10% do resíduo sólido municipal deve ser destinado a

aterros sanitários” . Na legenda do eixo vertical, lê-se “Participação de resíduo sólido destinado a aterros sanitários” .

Note-se que a meta europeia é chegar ao máximo de 10% de resíduos sólidos urbanos dispostos em aterros sanitários até o ano de 2030. Atualmente, somente seis Estados-membros já conseguiram alcançar esse nível. Para que a meta seja possível, o desafio é melhorar a coleta, a separação e a classificação do lixo, além do desenvolvimento de processos industriais, tecnologias e mercado secundário para materiais, de forma a estimular maiores índices de reciclagem e aproveitamento econômico dos resíduos no longo prazo.

A meta europeia para reaproveitamento e reciclagem dos resíduos sólidos urbanos é alcançar 65% em 2030. Esse número é bastante ousado, uma vez que hoje, segundo Lee e outros (2017), somente a Alemanha atenderia a esse nível, conforme Figura 3.

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Figura 3 | Formas de destinação de resíduo sólido urbano na Europa, por Estado-membro (%)

Fonte: Lee e outros (2017) .Nota: Nem todos os países reportaram estatísticas de disposição e reciclagem somando 100% dos resíduos gerados .

Por isso, a legenda “unreported” . No centro do gráfico, lê-se “Meta 2030: 65% dos resíduos sólidos municipais des-tinados a reúso e reciclagem” . Na legenda do gráfico: Material recycling – Reciclagem; Composting and digestion –

Compostagem e digestão; Incineration (energy recovery) – Incineração (recuperação de energia); Incineration (disposal) – Incineração (disposição); Landfill (disposal) – Aterro sanitário (disposição); e Unreported – Não reportado .

Por trás de toda a preocupação em estabelecer metas e promover a economia circular na Europa, estão o uso intensivo e, consequentemente, a grande dependência do continente da importação de matérias-primas, o que sempre foi considerado preocupante para sua economia. Esse alto volume de importação de insumos expõe a Europa a incertezas políticas e volatilidade de preços no mercado internacional, ameaçando a com-petitividade de sua indústria.

Estudo publicado em 2015 pela Ellen MacArthur Foundation em parceria com a consultoria McKinsey estimou impactos do uso de recursos em três setores críticos de gastos dos europeus, a saber, mobilidade, alimentação e

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infraestrutura. De acordo com o estudo, o modo de produção e o consumo de produtos e recursos nesses três setores custam, atualmente, à Europa € 7,2 trilhões por ano, incluindo uso de matérias-primas, gastos do go-verno e externalidades, como emissão de CO2, gastos com saúde, entre outros. Considerando os efeitos multiplicadores da redução de consumo de recursos primários e suas externalidades, estimou-se que a adoção da economia circular promoveria um benefício econômico total de € 1,8 tri-lhão no ano de 2030 para a Europa, isto é, reduziria os custos envolvidos nesses setores dos atuais € 7,2 trilhões para € 5,4 trilhões até 2030.

Em 2015, a Comissão Europeia adotou um pacote de propostas legisla-tivas em matéria de resíduos, o Plano de Ação para a Economia Circular. Esse plano estabeleceu como objetivo tratar os resíduos como recursos até 2020 e transformar a economia europeia em uma economia circular. O plano incluía metas de longo prazo e incentivos à maior utilização de instrumentos econômicos para assegurar a implementação da hierarquia de atividades desejável para gestão integrada e sustentável de resíduos. Com isso, busca-se estimular a reciclagem e reutilização em detrimento da disposição em aterros sanitários. Vale também destacar que plásticos e produtos químicos foram listados como materiais de alta prioridade para formulação de estratégias na Europa.

As propostas incluem objetivos de reciclagem mais rigorosos para materiais de embalagens, como papel, vidro, plástico, metal e madeira. Além disso, para elevar os níveis de reciclagem, reconhece-se a necessidade de implementação de melhorias na coleta e triagem de resíduos. Muitas vezes, essas atividades são financiadas pelos próprios fabricantes, segun-do o princípio de responsabilidade estendida.6 E, ainda, para garantir a

6 A responsabilidade estendida do produtor é uma abordagem política na qual os produtores recebem uma responsabilidade significativa – financeira e/ou física – pelo tratamento ou descarte de produtos pós-consumo, conforme https://www .oecd .org/env/tools-evaluation/extendedproducerresponsibility .htm . Acesso em: 26 jun . 2019 . O objetivo, assim, é estimular a recuperação de resíduos e a reciclagem, tornando os produtores responsáveis pelo impacto ambiental causado por seus produtos desde seu design até o descarte .

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qualidade e comparabilidade das estatísticas em toda a União Europeia, também deverá ser tratada a padronização nos conceitos e metodologias adotadas pelos países-membros (EUROPEAN COMMISSION, 2015).

Outra preocupação das autoridades europeias a fim de melhorar o nível de reciclagem é quanto à capacitação dos Estados-membros para promover investimentos em infraestrutura de coleta e reciclagem e incentivar o uso de instrumentos econômicos, por exemplo, taxas para disposição em aterro sanitário ou regimes de pagamentos diferenciados em função da quantidade de resíduos coletados/dispostos. Com isso, há previsão de prestação de assistência técnica para facilitar o intercâmbio das melhores práticas na região.

Ressalte-se que, nas políticas europeias para resíduos sem potencial de reciclagem, há previsão de direcioná-los à recuperação energética, o que é preferível à disposição final em aterros, em aspectos ambientais e econômicos. A produção de energia usando os resíduos deve estar orien-tada pelos princípios de hierarquia das atividades de gestão de resíduos vigentes na União Europeia, o que significa que não deve comprometer o atingimento de taxas de reutilização e reciclagem mais elevadas. Países como Dinamarca, Suécia, Holanda, Bélgica e França incineram, cada um deles, mais de 35% de seus resíduos sólidos urbanos. Assim, para esses países alcançarem a meta europeia de 65% de reciclagem, terão de enfrentar o desafio de redirecionar resíduos que hoje são incinerados para a reciclagem (LEE et al., 2017).

Outro obstáculo na União Europeia ao aumento das taxas de reciclagem é o transporte ilegal de resíduos, tanto interno como para outros países. Esse ponto é objeto de regulamentação específica adotada em 20147 voltada a facilitar a detecção das transferências ilegais (EUROPEAN COMMISSION, 2015).

7 Regulação UE n . 660, de 15 de maio de 2014 .

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Em 2018, o Parlamento Europeu aprovou as propostas da Comissão Europeia, lançando o Circular Economy Package e, em julho de 2018, a nova legislação sobre resíduos entrou em vigor. As novas regras repre-sentam, atualmente, a mais moderna legislação desse assunto no mundo, como parte do esforço de transformação da economia europeia. Como destaque, cita-se o estabelecimento de uma estratégia específica para plásticos, a fim de promover uma mudança na forma como esse mate-rial e produtos são concebidos, produzidos, utilizados e reciclados. Até 2030, a meta é o reúso ou reciclagem de todas as embalagens plásticas, criando uma oportunidade para a melhoria da competitividade e do grau de inovação da indústria.

A nova estratégia promete tornar a reciclagem uma atividade lucra-tiva. Estima-se que a melhoria das instalações de coleta e o aumento da reciclagem representem uma economia de cerca de € 100 por tonelada de plástico recolhida. A inovação também será reforçada por meio de apoio adicional de cerca de € 100 milhões do programa Horizon 2020, além dos mais de € 250 milhões já investidos no financiamento da cria-ção de materiais plásticos mais inteligentes e recicláveis, no aumento da eficiência dos processos de reciclagem e na detecção e remoção de subs-tâncias perigosas e poluentes dos plásticos reciclados (NOVA..., 2018).

Para alcançar o objetivo de expandir a reciclagem de plásticos, a Co-missão Europeia conta com o comprometimento da indústria e a coope-ração de organizações como a Plastic Recyclers Europe, Petcore Europe, European Carpet and Rug Association, Polyolefin Circular Economy Platform, European Plastics Converters, VinylPlus e Plastics Europe.

A estratégia para os plásticos adotada pela Europa é considerada elemento fundamental para a transição para o modelo de economia circular, além de uma contribuição importante para o cumprimento das metas estabelecidas no Acordo de Paris.

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O problema do resíduo plásticoO plástico foi um material essencial para o progresso da humanidade. Suas propriedades, como leveza e maleabilidade, permitiram uma ampla versatilidade de uso pelas mais diferentes indústrias, tornando-o um material extremamente popular. O mundo gerou mais de 8,3 bilhões de toneladas de plástico no período entre 1950 e 2015. Ainda permaneciam em uso, em 2015, 30% desse total. Dos 70% restantes, apenas 9% teriam sido reciclados desde os anos 1950. Do total do plástico produzido ao longo dos anos, mais da metade foi produzida nos últimos 16 anos, e isso está diretamente ligado à popularização do uso de embalagens plásticas descartáveis. A indústria de embalagem se destaca como o principal usuário desse material, sendo responsável pelo consumo de 42% da produção de plástico em 2015 (RITCHIE; ROSER, 2018).

O plástico foi se tornando um dos materiais mais poluentes da atua-lidade, em razão do tempo de sua degradação no meio ambiente, que pode chegar a centenas de anos no caso de garrafas plásticas.

Segundo a ONU Meio Ambiente (O QUE..., 2018), empresas enfren-tam o desafio de substituí-lo como insumo, pela crescente rejeição aos produtos plásticos, decorrente da conscientização dos consumidores sobre seu impacto ambiental.

A mensagem da ONU no Dia Mundial do Meio Ambiente de 2018 foi que o mundo deve se unir para vencer a poluição causada pelo descarte do plástico. Em resposta a essa preocupação foi lançado, em outubro de 2018, o Compromisso Global por uma Nova Economia do Plástico, liderado pela Ellen MacArthur Foundation, em colaboração com a ONU Meio Ambiente. Governos, organizações não governamentais e outros, incluindo alguns dos maiores fabricantes, marcas, varejistas e reciclado-res de embalagens do mundo, assinaram esse compromisso global para

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erradicar o desperdício e a poluição por plásticos. O objetivo é criar uma nova realidade para as embalagens plásticas, e as metas incluem desde o aumento da reciclagem e da reutilização em novas embalagens ou produtos, até sua eliminação completa.

Percebe-se, dessa forma, a essência do pensamento circular na preocu-pação com a ampliação da vida útil dos plásticos, evitando ou reduzindo seu descarte. Segundo a Ellen MacArthur Foundation, o compromisso global por uma nova economia do plástico é um marco para empresas, governos e outros atores ao redor do mundo, com a necessidade de uma união de esforços para promover a economia circular do plástico.

Os signatários desse compromisso incluem empresas que, juntas, representam 20% de todas as embalagens plásticas produzidas global-mente, como Danone, Carrefour, H&M, L’Óreal, Natura, PepsiCo, Coca-Cola e Unilever, além de importantes fabricantes de embalagens como a Amcor, a fabricante de plásticos Novamont e a especialista em gestão de recursos Veolia. Os governos que assinaram o Compromisso Global, tais como Chile, Portugal, Reino Unido, França, entre outros, se comprometem a estabelecer políticas públicas e condições viabilizadoras para apoiar suas metas e visão.

O Compromisso Global e sua visão para uma economia circular do plástico foram endossados também por Fórum Econômico Mundial, The Consumer Goods Forum,8 mais de cinquenta universidades e centros de pesquisa, além de 26 instituições financeiras (tais como European Investment Bank, BNP Paribas Asset Management e Robeco) e seis fundos de investimentos (Althelia Sustainable Ocean Fund, Closed Loop Partners, Creolus, Fifth Season Ventures, FORWARD.one Venture

8 Organização liderada por chiefs executives officers (CEO) representando cerca de quatrocentas varejistas e fabricantes

de setenta países .

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Capital for Hardware e Ultra Cap), que, por sua vez, se comprometeram a investir cerca de US$ 275 milhões nos próximos anos para desenvolver modelos de negócio, materiais e tecnologias que promovam a economia circular para o plástico (NEW..., 2019).

O documento destaca que os governos desempenham papel funda-mental para expandir essa consciência corporativa, por meio de in-centivos financeiros para a substituição do uso do plástico. O objetivo seria impulsionar a inovação tecnológica na busca de novos materiais, promovendo maior sustentabilidade (NEW..., 2019).

Relação União Europeia-ChinaO sucesso europeu em sua política ambiental e na busca de uma eco-nomia circular, no entanto, também se deveu à exportação de resíduos para a China. Em 2016, cerca de 56,4 milhões de toneladas de papel foram descartados pelos europeus e, desse total, cerca de 8 milhões de toneladas acabaram em centros de reciclagem chineses e retornaram à Europa como embalagem de produtos exportados pela China. Nes-se mesmo ano, 8,4 milhões de toneladas de plástico foram coletadas na Europa e 1,6 milhão desse total tiveram como destino a China (TAMMA, 2018).

Em 2017, a China anunciou a chamada National Sword ou Green Sword, uma nova política proibindo a importação de certos tipos de resíduos sólidos, tais como plásticos, papel e têxteis, bem como estabe-lecendo limites na contaminação de materiais recicláveis. A política, que passou a vigorar em janeiro de 2018, mudou o fluxo dos resíduos no mundo, especialmente o do plástico. A China sempre foi, até então, o principal destino dos resíduos plásticos do Grupo dos Sete (G7), e essa nova medida já impactou a indústria de reciclagem desses países,

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esperando seu reflexo no longo prazo na melhoria da gestão de resíduos nas principais economias mundiais (HOOK; REED, 2018).

Em um passo seguinte, em julho de 2018, a China e a União Euro-peia assinaram um Memorando de Entendimento de Cooperação em Economia Circular (MoU). O alinhamento entre esses dois signatários é um passo importante na transição para um sistema global voltado à eficiência no uso dos recursos e à redução da geração de resíduos.

A Europa tem uma agenda explícita de transição para um modelo de economia circular, e a China, por sua vez, foi um dos primeiros países a promulgar uma legislação sobre o tema, a Circular Economy Promotion Law of the People’s Republic of China, em 2009.

Uma área de cooperação no escopo do MoU é a troca de informa-ção estratégica sobre sistemas de gestão e políticas, englobando te-mas como ecodesign, rotulagem ecológica, reponsabilidade estendida do produtor e cadeias de fornecimento ecológicas. Tais discussões transformam a economia circular em uma agenda de inovação tanto para a China quanto para a Europa, o que pode até mesmo vir a ace-lerar a adoção de princípios circulares nas políticas de outros países (MEMORANDUM..., 2018).

De acordo com a Ellen MacArthur Foundation, o acordo histórico entre a China e a União Europeia representa, assim, a base para defini-ção de padrões e políticas que podem viabilizar a implantação efetiva desse novo modelo de gestão de resíduos e influenciar outros países. Ressalte-se que o problema dos resíduos plásticos já foi definido como prioridade tanto na agenda da União Europeia quanto na política chi-nesa (CHINA-EU..., 2018).

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A experiência alemãA Alemanha, por meio de programas de educação e política ambiental, serviu como exemplo para a formulação de políticas públicas e para a disseminação do tema da economia circular na União Europeia e, até mesmo, na ONU. Nos últimos vinte anos, perseguiu um caminho de sustentabilidade a fim de se tornar cada vez mais independente da im-portação de matérias-primas. Inicialmente, o foco foi o desenvolvimento da percepção do potencial de aproveitamento de seus próprios resíduos por meio de programas massivos de educação ambiental, política fiscal e tarifária e do desenvolvimento de negócios no setor. A estratégia foi desenvolver políticas e tecnologias para tornar o tratamento de resíduos sólidos uma atividade lucrativa, transformando resíduos em matéria-prima secundária e, assim, reduzindo a necessidade de importação de recursos.

Atualmente, cerca de 14% da matéria-prima usada na Alemanha é proveniente do tratamento de resíduos. Além disso, por volta de 20% dos objetivos assumidos pela Alemanha no Protocolo de Kyoto estão sendo cumpridos somente com a reutilização de seus resíduos (MACHADO, 2013).

Até o início dos anos 1970, havia cerca de 50 mil lixões na Alemanha, estando a maioria deles localizada na periferia das grandes cidades para a destinação de resíduos domésticos e comercial. Quando os riscos, es-pecialmente de contaminação do lençol freático, foram reconhecidos, o governo agiu. A primeira legislação sobre resíduos sólidos foi adota-da no país em 1972, chamada Waste Disposal Act. Seu objetivo era o fechamento dos lixões, substituindo-os por grandes aterros regulados e fiscalizados, sob a responsabilidade do governo, objetivo que foi al-cançado, porém, levou a problemas na localização de áreas para novas instalações (SCHNURER, 2002).

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Paralelamente, desde o século XIX, a incineração dos resíduos sólidos urbanos era uma prática estabelecida visando maior higiene nas cidades que não dispunham de espaços para construção de aterros sanitários. A crise de energia em 1973 tornou-se, então, uma oportunidade para o aproveitamento energético pela incineração de resíduos.

Segundo Federal Ministry for the Environment, Nature Conservation and Nuclear Safety [20--?], no fim dos anos 1980, a Alemanha enfrentava uma situação crítica com relação aos resíduos sólidos. A capacidade dos aterros sanitários chegava a seu limite e a percepção crescente dos riscos ambientais envolvidos na gestão de resíduos fizeram os interesses público e político voltarem sua atenção para a disposição mais segura dos resíduos sólidos e para a implantação de plantas de incineração com menor impacto ambiental.

No entanto, logo o governo reconheceu que apenas a preocupação com o descarte seguro não era suficiente. Para enfrentar essa crise dos resíduos, tornava-se necessária uma gestão mais responsável dos recursos. Em 1986, o governo lançou a Waste Avoidance and Management Act como tentativa para a redução do volume de resíduos e, consequente-mente, dos problemas decorrentes de sua disposição. A estratégia era, em vez de promover a criação de novos aterros e plantas de incineração para geração de energia, evitar a geração de resíduos e, quando isso não fosse possível, estimular a reciclagem. Esse foi o primeiro passo rumo à reorientação da política alemã de resíduos sólidos (SCHNURER, 2002).

Criaram-se, ainda, regulações considerando os diferentes tipos de re-síduos, para limitar emissões de gases provenientes da incineração, além de terem sido estabelecidos requisitos mais rigorosos na construção e operação de aterros. Municípios e empresas privadas investiram bilhões nas adaptações ambientais requeridas pelo governo alemão.

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Para evitar a poluição do ar, as plantas de incineração foram subme-tidas a rigorosos requerimentos quanto à emissão de gases poluentes e de metais pesados. Tornou-se obrigatória a instalação de complexos sistemas de filtragem, bem como foi regulada a disposição adequada desses filtros de modo a evitar ao máximo a contaminação do meio ambiente. Os princípios e requisitos de segurança desenvolvidos pelos alemães serviram, posteriormente, de base para a regulação da União Europeia sobre aterros e incineração de resíduos.9

Em 1991, outro avanço na legislação alemã foi o estabelecimento da responsabilidade do produtor no Packaging Ordinance, incluindo a obrigação de retorno das embalagens vazias para reciclagem. Essa lei levou a Alemanha a uma considerável redução no consumo de embala-gens, de cerca de 15%, assim como a um aumento no nível de reciclagem da maioria dos materiais utilizados em embalagens, na ordem de 60% a 80%. Além disso, houve o desenvolvimento de novas tecnologias para reciclagem, especialmente para embalagens plásticas, que serviram de modelo para outros materiais (SCHNURER, 2002).

Ainda nos anos 1990, a Alemanha tentou implementar uma medida econômica para controlar o crescente problema de resíduos, o Waste Charges Act. A proposta consistia na cobrança de uma taxa pela tonelada de resíduos disposta em aterros ou plantas de incineração. O operador dessas unidades deveria pagar uma taxa que variaria em função da natu-reza do resíduo e de sua toxicidade. O objetivo era tornar a disposição em aterros ou a incineração mais caras, a fim de estimular a prática de reciclagem e utilizar esse recurso para o desenvolvimento de tecnolo-gias de reciclagem e remediação ambiental. No entanto, essa medida enfrentou enorme resistência, particularmente, de setores industriais

9 Respectivamente, EU Directive on the Landfill of Waste, 1999, e EU Directive on the Incineration of Waste, 2000 .

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que são grandes geradores de resíduos e que seriam, em contrapartida, submetidos à taxação dos operadores, além de questões legais que aca-baram por levar o governo alemão a desconsiderar a implementação desse tipo de taxa (SCHNURER, 2002).

Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a Eco-92, proporcionou grandes avanços na pre-servação ambiental. O conceito de sustentabilidade ganhou força entre os países industrializados, e a Alemanha enfatizou, na ocasião, que a preservação dos recursos seria a nova meta da gestão de resíduos no país, abrindo caminho para a economia circular.

Na sequência, tornou-se pioneira na Europa ao inserir a economia circular em sua legislação. Em 1996, entrou em vigor o Closed Substance Cycle and Waste Management Act. Esse acordo foi aperfeiçoado e, em 2012, foi promulgado o Circular Economy Act, tornando lei os princípios da economia circular, tais como o princípio do poluidor pagador, a hierarquia de prioridades na gestão dos resíduos, a respon-sabilidade compartilhada entre o poder público e os agentes privados (SCHNURER, 2002).

Segundo publicação sobre o setor de resíduos do governo alemão, a gestão de resíduos no país evoluiu a ponto de, hoje, ter se tornado um setor econômico relevante. Há mais de 270 mil pessoas trabalhando em 11 mil empresas que movimentam cerca de € 70 bilhões anualmente. Além disso, o país destaca-se por suas altas taxas de reciclagem: 67% do lixo doméstico, cerca de 70% dos resíduos industriais e comerciais e quase 90% de resíduos da construção civil. Assim, hoje 14% das matérias--primas utilizadas pelo país são provenientes da recuperação de resíduos sólidos (FEDERAL MINISTRY FOR THE ENVIRONMENT, NATURE CONSERVATION AND NUCLEAR SAFETY, 2018).

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A economia circular é, portanto, uma alta prioridade da política ambiental alemã. A meta do governo é ampliar seu alcance, passando da perspectiva de gestão de resíduos para um fluxo de gerenciamento de recursos por meio da aplicação rigorosa da escala hierárquica dos resíduos, isto é, separação, pré-tratamento, reúso, reciclagem, além de recuperação de energia. Além disso, há o objetivo de aumentar a produ-tividade dos recursos aproveitando o máximo possível das substâncias e dos materiais contidos nos resíduos.

Incentiva-se cada vez mais a prevenção da geração de resíduos a fim de reduzir tanto o volume quanto a poluição em si. Em 2013, o governo alemão adotou um programa chamado The Waste Prevention Programme, que previa ações do poder público destinadas especificamente à redução do volume de resíduos. Esse programa, que será revisto em 2019, tem foco em produtos duráveis e reparáveis, evitando itens desnecessários e de vida útil curta, e no incentivo à compra de serviços em vez de bens, estimulando o compartilhamento em vez da compra, por exemplo. A preocupação do programa é mostrar que cada pessoa, consumidor ou produtor, tem responsabilidade na preservação do meio ambiente. Todo ano, no mês de novembro, a Alemanha sedia uma série de eventos da European Week for Waste Reduction, ressaltando os avanços que podem ser obtidos por iniciativas individuais, ideias inovadoras e comprome-timento com o meio ambiente.

Com todas essas medidas e políticas, a Alemanha vem desenvolven-do um modelo econômico comprometido com a redução do impacto ambiental, tornando-se uma referência no tema de economia circular. Medidas como o reaproveitamento de materiais, o incentivo à reciclagem e o aproveitamento energético dos resíduos ajudaram o país a reduzir o volume disposto nos aterros e, consequentemente, a minimizar a emissão de gases de efeito estufa, especialmente do metano. Desde 1990, de acordo

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com o governo alemão, as emissões de gases provenientes de aterros foram reduzidas em 56 milhões de toneladas de CO2 equivalente,10 o que significa mais de 20% da meta que a Alemanha havia assumido de redução de gases do efeito estufa no Protocolo de Kyoto (FEDERAL MINISTRY FOR THE ENVIRONMENT, NATURE CONSERVATION AND NUCLEAR SAFETY, 2018).

O exemplo da SuéciaA Suécia, ao longo dos anos, avançou na questão dos resíduos passan-do de uma visão de problema ambiental para a de aproveitamento de recursos. Com relação ao lixo doméstico, segundo dados referentes a 2017 divulgados por Avfall Sverige (2018), órgão sueco responsável pela gestão de resíduos, aproximadamente um terço do volume produzido foi destinado à reciclagem. No entanto, o aproveitamento energético vem crescendo, sendo a destinação de cerca de 50% do lixo doméstico. Outros 16% foram destinados a tratamento biológico (compostagem e digestão anaeróbica). O volume de resíduos domésticos destinado a aterros sanitários é, atualmente, de apenas 0,5%, muito abaixo da média dos países europeus (25%). Assim, mais de 99% do lixo doméstico é recu-perado na forma de materiais, nutrientes ou energia, o que demonstra o esforço perseguido nas últimas décadas, considerando que, nos anos 1970, somente 38% dos resíduos domésticos eram reaproveitados.

A partir dos anos 1960, o país observou um grande desenvolvimento de suas políticas ambientais e de resíduos rumo a uma gestão mais sustentável. Em 1969, o Environment Protection Act impôs obrigações ambientais a todas as novas unidades de tratamento de resíduos. Na década de 1970, de acordo com a Swedish Environmental Protection

10 CO2 equivalente é a forma usada para medir a equivalência dos gases do efeito estufa ao dióxido de carbono .

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Agency, os resíduos começaram a ser tratados como recurso na Suécia, com maior ênfase em separação, compostagem, incineração e constru-ção de plantas para esses fins. Nos anos 1980, o foco passou a ser na redução do impacto ambiental dos resíduos. Como resultado, maiores exigências foram impostas nas emissões geradas pelo tratamento de re-síduos, combinadas com prevenção da produção de resíduos e redução de substâncias tóxicas. Em 1985, por exemplo, o governo sueco concedeu uma moratória para novas plantas de incineração de resíduos até que o impacto ambiental dessas instalações fosse reduzido.

Grandes avanços nas políticas públicas foram alcançados na década de 1990. No ano de 1990, uma taxa sobre resíduos (Waste Bill) foi pro-posta pela primeira vez, e os municípios passaram a ser responsáveis pelo planejamento da gestão dos resíduos. Em 1992, o Government Bill introduziu o conceito de “ecociclos”, estimulando o reúso sustentável, a reciclagem e a disposição final adequada, sem prejuízo ao meio ambien-te. Uma medida importante foi a implementação da responsabilidade do produtor em coletar e descartar certos materiais. Inicialmente, essa medida afetou apenas embalagens, sendo estendida depois para pneus e equipamentos elétrico-eletrônicos. Em 1995, com sua entrada na União Europeia, a gestão de resíduos da Suécia passou a ser submetida às políticas e regulações europeias. Isso teve grande impacto, em razão da orientação da hierarquia de prioridades, especialmente quanto à redução da geração de resíduos e, por consequência, da quantidade a ser disposta nos aterros sanitários. Em 1997, foram adotadas medidas11 para reduzir o volume de resíduos destinado a aterros, com a proibição de envio de materiais que pudessem ser aproveitados em plantas de incineração e de resíduos orgânicos. Várias diretivas da União Europeia

11 A saber, bill on management of end-of-life products in a sustainable society .

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foram adotadas no fim dos anos 1990, com destaque para as referentes aos aterros e à incineração de resíduos (UE Landfill Directive e UE Waste Incineration Directive, respectivamente). Essas regulações tiveram grande peso na redução do impacto ambiental resultante da gestão de resíduos na Suécia, o que levou o país a adotar novas metas ambientais em 1999 (The Environmental Code) e a cobrar uma taxa sobre os resíduos destinados a aterros, que entrou em vigor no ano seguinte (SWEDISH ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY, 2005).

Desde então, a gestão de resíduos no país segue orientada pela legis-lação comum da União Europeia. Nas últimas três décadas, a Suécia experimentou o que o país considera uma revolução na reciclagem. No entanto, ressalte-se que houve investimento maciço no aproveitamento energético dos resíduos. Ao longo dos anos, a Suécia desenvolveu capaci-dade técnica e acumulou conhecimento para tratar os resíduos de forma eficiente e lucrativa. O país hoje chega a importar toneladas de lixo de vizinhos europeus para incineração visando à recuperação energética.

De acordo com Avfall Sverige (2019), em decorrência do aumento das exigências de emissões, melhores condições de combustão e melhor controle de resíduos, as emissões de poluentes provenientes da incine-ração de resíduos diminuíram significativamente nas últimas décadas. As emissões atmosféricas de metais pesados geradas pela incineração de lixo diminuíram quase 99% desde 1985. Assim, os riscos ambientais relacionados à incineração do lixo para geração de energia e calor pa-recem ser questões superadas para a Suécia, apesar de ainda ser tema controverso em diversos outros países, tais como o Brasil.

Contudo, de acordo com a orientação das políticas e regulações da União Europeia, há soluções melhores a serem incentivadas na gestão de resíduos que a destinação a aterros ou a incineração. A Suécia, por meio

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de educação e regulação, ainda pode avançar na redução da quantidade de lixo gerado, bem como na reciclagem e reutilização de materiais. Um exemplo, nesse sentido, foi a mudança no sistema tributário na Suécia, em 2017, que tornou mais barato consertos em bens usados.12 Nessa linha, a gigante de vestuário sueca H&M, por exemplo, passou a operar um sistema de reciclagem no qual clientes ganham desconto quando retornam roupas da marca.

Por meio de várias iniciativas e promoção de políticas públicas, a Suécia pode ser considerada um modelo de país que vem alinhando os objetivos de melhorar o nível de reciclagem com o aproveitamento energético e a redução da disposição em aterros sanitários.

Brasil: a Política Nacional de Resíduos Sólidos

Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal do Brasil, o saneamento básico passou a ser um direito assegurado a todos, e os municípios tornaram-se detentores da titularidade dos serviços locais. Posteriormente, em 2007, a Lei 11.445 definiu saneamento básico como o conjunto dos serviços, da infraestrutura e de instalações operacionais de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem urbana e de manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais.

No entanto, não havia no país um instrumento legal que estabele-cesse diretrizes gerais aplicáveis aos resíduos sólidos para orientar sua

12 https://sweden .se/nature/the-swedish-recycling-revolution/ . Acesso em: 30 mar . 2019 .

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gestão de forma adequada. Somente em 2010, depois de mais de vinte anos de discussões e tramitação no Congresso Nacional, foi aprovada a Lei 12.305, de 2 de agosto de 2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).

De acordo com Grisa e Capanema (2018), com princípios legais ali-nhados com o que há de mais avançado em outros países, o texto foi um marco importante no setor. A lei abrange todas as classes de resíduos sólidos e estabelece um conceito moderno e avançado de gestão de re-síduos, com instrumentos que preveem a hierarquização das atividades e a prioridade em prevenção e redução na geração de lixo, conforme apresentado na Figura 4.

Figura 4 | Ordem de prioridade na gestão e no gerenciamento de resíduos sólidos, com base na Lei 12.305/2010

Fonte: Grisa e Capanema (2018) .

A PNRS apresenta conceitos inovadores, como a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos entre poder público, iniciativa privada e cidadão. Ainda previu um conjunto de moder-nos procedimentos de logística reversa, para que resíduos voltem ao

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setor industrial de origem para reaproveitamento ou para descarte correto, alinhando conceitos com as melhores práticas internacionais (BRASIL, 2010).

O grande objetivo estratégico da PNRS é destinar o mínimo possível para o aterro sanitário, ou seja, dispor apenas os rejeitos.

No entanto, pontos importantes previstos na política não foram ainda alcançados, tais como as metas estabelecidas para a extinção dos lixões até 2014 e a elaboração de planos da gestão dos resíduos, em todos os níveis da administração pública, até 2012. O Governo Federal disponibilizou versão preliminar do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares) para consulta pública em 2011, mas, até hoje, o plano não foi concluído e oficializado (GRISA; CAPANEMA, 2018).

A situação atual no paísA gestão de resíduos sólidos é, hoje, um grande desafio para o país. Segundo dados mais recentes de Abrelpe (2018), foram gerados no país 78,4 milhões de toneladas de resíduo sólido urbano em 2017. Desse total, 71,6 milhões de toneladas foram coletadas, registrando-se um índice de cobertura de coleta de 91,2% para o Brasil. Isso significa que 6,9 milhões de toneladas de resíduos não foram sequer coletados e, consequente-mente, tiveram destinação imprópria.

Em relação à disposição final dos resíduos coletados e seu tratamento, os avanços ainda são lentos e refletem as disparidades entre as regiões do país. Foram dispostos 59,1% do que foi coletado em aterros sanitários. O restante (40,9%) teve destinação inadequada. Isso corresponde a mais de 29 milhões de toneladas de resíduos depositadas em lixões ou aterros controlados em 3.352 dos 5.570 municípios do país, o que representa risco à saúde da população e ao meio ambiente.

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Uma dificuldade para implantação da PNRS é o alto custo do pro-cesso de operação, que envolve a coleta, o tratamento e a disposição dos resíduos, aliado à falta de receita destinada ao setor. A maioria dos municípios no país não pratica cobrança de taxa ou tarifa para custear os serviços. Dessa forma, o problema começa com a falta de viabilidade financeira para gestão de resíduos sólidos, o que, por consequência, reflete-se na proliferação de lixões pelo país. Ressalte-se que a legislação já prevê essa cobrança, mas as prefeituras, muitas vezes, preferem não implantá-la por questões políticas (THATY, 2017b).

O Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis) alerta que a maioria dos municípios não pratica ainda a coleta seletiva (BRASIL, 2017). De acordo com dados obtidos dos 3.556 municípios que forneceram informações ao governo, apenas 1.254 desse universo amostral dispõem de alguma forma de coleta seletiva. Assim, estima-se que somente 22,5% dos municípios do Brasil contem com serviço de coleta seletiva, índice estagnado nos últimos três anos, de acordo com o Snis.

O Snis acrescenta que, embora a prática de coleta seletiva apresente alguns avanços, ainda se encontra em um patamar muito baixo. Con-siderando a fração de materiais secos, pode-se dizer que não mais que 13,2% de todo o montante potencialmente reciclável foi coletado de forma seletiva.

O Snis também calculou a taxa de recuperação de materiais recicláveis13

em relação à quantidade total coletada no país, chegando ao valor de apenas 2,1%, número idêntico ao levantamento feito no ano anterior.

Estimativa de Ipea (2010) indica que o país perde cerca de R$ 8 bilhões por ano ao não reciclar resíduos que poderiam ser aproveitados para

13 Exceto matéria orgânica e rejeitos .

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esse fim. A atividade de reciclagem não gera apenas benefícios econô-micos. Nos últimos anos, em todo o mundo, os benefícios ambientais associados à prática de reciclagem vêm ganhando importância, uma vez que se pode evitar uma série de externalidades negativas inerentes ao processo produtivo. A prática da reciclagem permite melhoria da qualidade ambiental urbana por meio da redução de pressão sobre os ecossistemas naturais ao substituir matérias-primas virgens por mate-riais reciclados, ao mesmo tempo que possibilita redução do consumo de energia e de emissões atmosféricas (SILVA, 2017).

Assim, embora a PNRS represente um avanço, ao estabelecer diretrizes semelhantes às existentes em países mais avançados no tema de gestão de resíduos, até hoje o Brasil convive com lixões e há uma grande assimetria de gestão de resíduo sólido urbano entre seus diversos municípios e regiões. Para inserir o país na lógica da economia circular, priorizando a prevenção e a redução do lixo, precisam ser estimuladas políticas de educação ambiental, a fim de conscientizar e educar a população sobre a importância da separação correta do lixo doméstico e sua reciclagem, bem como uma política tributária que promova incentivos econômi-cos para o aproveitamento dos resíduos por meio de logística reversa, valorização e transformação dos resíduos. Para isso, é necessária uma articulação mais forte entre o poder público e a iniciativa privada, assim como a mobilização da sociedade.

Na gestão de resíduos, o papel do cidadão é fundamental para o sucesso de qualquer ação, seja em sua conscientização como consumi-dor, seja em sua responsabilidade pelo descarte correto. Pesquisa rea-lizada pela Ibope Inteligência indica que população brasileira, apesar de reconhecer a importância da reciclagem, tem pouca ou nenhuma informação sobre coleta seletiva e materiais que podem ser reciclados (DESINFORMAÇÃO..., 2018).

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Segundo a PNRS, a responsabilidade pelo ciclo de vida do produto é compartilhada e deve abranger fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, bem como consumidores e, ainda, os titulares dos ser-viços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos. Um dos instrumentos para aplicação da responsabilidade compartilhada é a logística reversa, que, todavia, ainda precisa ser implementada de forma mais efetiva no país. Acordos setoriais importantes, por exemplo, de medicamentos e produtos eletroeletrônicos, têm de ser firmados. Além disso, ainda há insuficiência de informação e de conscientização da po-pulação sobre descarte ou devolução de forma apropriada, bem como sobre pontos de coleta nos principais centros urbanos. Acrescentem-se, também, os problemas de fiscalização e gestão pública na organização dos processos de logística reversa, até em setores nos quais já há acordo assinado, como ocorre com as lâmpadas fluorescentes. Calcula-se que o Brasil destine cerca de 600 mil lâmpadas por mês a lixões e aterros, o que representa risco de contaminação com mercúrio para o solo, rios e, por conseguinte, para toda a cadeia alimentar (LAMPERT, 2016).

Uma queixa recorrente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) é quanto à bitributação sobre os resíduos recicláveis que servem de matéria-prima, o que onera e, portanto, desestimula a logística reversa no país, especialmente em setores em que ela se torna mais cara, como os de lâmpadas, pneus, lubrificantes, medicamentos e agrotóxicos. Uma pesquisa encomendada pela CNI aponta que o Imposto sobre Merca-dorias e Serviços (ICMS) é responsável por 53% da bitributação dos resíduos recicláveis que servem de matéria-prima, com custos estimados à época em R$ 1,38 bilhão. Por ser um imposto estadual, a CNI destaca a dificuldade em negociar desonerações, na medida em que cada estado tem liberdade para legislar e, por isso, um dos pleitos da confederação para promoção da logística reversa é a harmonização das leis estaduais quanto à cobrança dos materiais recicláveis (CNI..., 2014).

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Uma iniciativa importante em andamento é o Projeto de Lei 7.535, de 2017, que propõe a criação de uma política de incentivo às ativida-des voltadas à reciclagem (GOMES, 2017). A proposta tem três eixos de atuação, a saber: (i) o incentivo direto a projetos de reciclagem; (ii) um fundo de apoio para ações voltadas à reciclagem (Favorecicle); e (iii) fundos de investimentos para projetos de reciclagem (ProRecicle). A incipiência da indústria de reciclagem no Brasil reflete-se na falta de economia de escala, o que provoca elevação de custos e dificulta o crescimento do setor. Nesse sentido, a criação de incentivos econômicos é um dos pilares para promover o aumento da taxa de reciclagem no país (XAVIER, 2018).

O aproveitamento econômico dos resíduos pode ser também explora-do por outras frentes; por exemplo, produção de combustível derivado do resíduo (CDR) e de biogás, ou ainda geração de energia elétrica por incineração ou por outros processos. Note-se que, todas as opções são, de acordo com a hierarquia de prioridades estabelecida na PNRS, preferíveis à disposição em aterros.

A geração de energia a partir de resíduo sólido urbano é uma agenda que ainda não se viabilizou no Brasil, apesar de ser uma prática já dissemi-nada em outros países e que se alia à discussão da necessidade de redução dos volumes destinados a aterros e da urgência de fechamento de lixões. Recentemente, em 30 de abril de 2019, foi publicada a Portaria Intermi-nisterial 274 dos ministérios do Meio Ambiente, de Minas e Energia e do Desenvolvimento Regional, regulando a matéria do uso da recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos (BRASIL, 2019b). Espera-se que, no curto prazo, viabilizem-se projetos usando essas tecnologias.

Além do alto valor desse tipo de investimento, há a falta de cobrança de taxa pelos municípios, o que inviabiliza a geração de receitas que poderiam tornar o setor sustentável e atrativo economicamente.

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Ressalte-se, também, o atraso do país na implementação de processos de coleta e separação, reciclagem e reúso de materiais, como também em tecnologias de aproveitamento energético. O desenvolvimento tecnológico traz oportunidades de melhoria da gestão de resíduos no país, de promoção da diversificação da matriz energética e, ainda, de redução do impacto ambiental, seja com controle de gases de efeito estufa, da poluição, seja evitando a contaminação do solo e do lençol freático, por exemplo.

A tecnologia predominante nos investimentos feitos no país é o aterro sanitário. Com alto custo de implantação e manutenção, o aterro sani-tário deveria ser utilizado apenas para disposição final de rejeitos, o que não ocorre no Brasil. O baixo índice de reciclagem e falta de políticas de reaproveitamento econômico de resíduos faz com que praticamente todo o lixo urbano gerado, quando não disposto de forma incorreta em lixões, seja depositado em aterros. Esse tipo de infraestrutura precisa ser bem projetada e operada, de forma a se evitar problemas ambientais sérios como a liberação de gás metano, além de possível contaminação de solo e lençol freático. O gestor público ainda enfrenta o desafio de desativar aterros com vida útil esgotada, recuperar a área por ele ocupada e devolvê-la para uso da população, além da dificuldade em encontrar um local para construção de um novo aterro. Nos grandes centros urbanos, a questão da localização fica cada vez mais crítica, com implicações lo-gísticas que podem encarecer, ainda mais, a operacionalização da gestão de resíduos sólidos, dado o custo de transporte dos resíduos.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil é composto em sua maioria (68,4%) por municípios de pequeno porte de até 20 mil habitantes, onde se concentram 15,4% da população do país. No entanto, pouco mais da metade da população brasileira (57%) vive em apenas 5,7% dos municípios, ou seja, em 317 municípios, que são

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aqueles com mais de 100 mil habitantes. Se for feito um corte para muni-cípios com mais de 500 mil habitantes, chega-se a apenas 46 municípios onde se concentram 31,2% da população brasileira (SILVEIRA, 2018).

O tamanho da cidade e a quantidade de lixo gerado têm impacto determinante sobre o financiamento do tratamento do lixo. Um aterro sanitário, por exemplo, só tem viabilidade econômica para municípios com população acima de 200 mil habitantes. Para aumentar os ganhos de escala, incentiva-se a formação de consórcios entre municípios pe-quenos para a construção de aterros, permitindo melhores condições financeiras para sustentabilidade e operação dessas instalações. No en-tanto, há questões políticas e financeiras a serem superadas para que esse tipo de arranjo funcione. Desavenças políticas entre os gestores, falta de alinhamento no rateio de despesas entre os municípios, dificuldade na formalização de acordos intermunicipais, inadimplemento são alguns dos obstáculos para que os consórcios se efetivem (THATY, 2017a).

Por outro lado, uma alternativa a ser estimulada para a gestão de resí-duos sólidos é a concessão dos serviços de manejo a prestadores privados. As concessões e parcerias público-privadas (PPP) são apontadas por muitos como a alternativa para modernização da gestão pública, dando protagonismo em questões públicas à iniciativa privada, especialmente, em situações nas quais o poder público não tem condições técnicas e financeiras de realizá-las. Nesse arranjo, cria-se oportunidade para esti-mular o mercado privado a atuar mais fortemente no setor, alavancando investimentos com a regulação do poder público.

Para viabilizar as concessões, mais uma vez, vale reforçar a importância da cobrança pela prestação dos serviços de manejo de resíduos sólidos urbanos (RSU). Para se permitir a concessão comum, mais atrativa e menos arriscada para o setor privado, é especialmente relevante que ela

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se dê na forma de tarifa. Uma vez que os serviços de manejo podem ser considerados divisíveis e mensuráveis, por proxy com consumo de água ou área residencial, caberia a cobrança de tarifa. A pacificação jurídica desse entendimento pode ser um importante impulsionador para o aumento da atratividade do setor para prestadores privados.

Assim, no cenário brasileiro atual, a questão da sustentabilidade financeira da gestão de resíduos sólidos torna-se crucial para que se viabilizem os investimentos necessários no país. A nova revisão do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) (BRASIL, 2019c) estimou os montantes necessários para expansão e reposição de aterros sanitários, considerando-se a erradicação dos aterros controlados, lixões e vaza-douros a céu aberto, no horizonte final do plano, ou seja, em 2033. O total de investimentos necessários para alcançar 100% de destinação final ambientalmente adequada para os resíduos sólidos urbanos, de 2019 até 2033, é de cerca de R$ 28,7 bilhões. Desse total, R$ 15 bilhões seriam referentes à expansão do sistema e R$ 13,7 bilhões à reposição da destinação final dos resíduos sólidos, incluindo o fechamento e a recuperação de lixões e aterros controlados.

Como referência, note-se que o custo para universalizar o acesso aos quatro serviços do setor de saneamento (água, esgotos, resíduos e dre-nagem), de acordo com o Plansab, seria de R$ 597,9 bilhões, no período entre 2019 e 2033. Portanto, o custo para universalização dos serviços de resíduos sólidos urbanos representa cerca de 5% desse total. No que se refere à origem dos investimentos, considerando-se a realidade fiscal do país, a nova versão revisada do Plansab prevê menor participação de recursos federais, estimados em 40% do total dos recursos necessários e, por outro lado, uma elevação da participação de recursos de outros agentes (agências internacionais, prestadores de serviços, orçamentos

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estaduais e municipais e setor privado), na forma de investimentos diretos ou de contrapartidas aos programas federais, na ordem de 60% do total. No contexto da gestão de resíduo sólido urbano, fica claro que será essencial equacionar a questão da cobrança pelo serviço por parte dos municípios, bem como a ampliação dos investimentos do setor privado (BRASIL, 2019c).

Os investimentos são expressivos e desafiadores na atual conjuntura econômica do país. Por outro lado, são fundamentais, em razão do retorno inestimável quando consideradas as externalidades positivas associadas a um sistema de saneamento eficiente para a população e o meio ambiente, o que traz benefícios não só às gerações atuais como também às futuras.

O papel do BNDES no apoio ao setor

O BNDES, como banco de desenvolvimento, pode assumir um papel relevante na promoção de uma gestão mais sustentável e integrada dos resíduos sólidos urbanos no país.

No apoio ao segmento de resíduos, o Banco já financiou projetos de reciclagem e inclusão social de catadores com recursos não reembolsáveis do Fundo Social e, hoje, oferece uma linha de crédito com condições prioritárias para projetos de saneamento – a BNDES Finem Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos, que atende, por exemplo, a financiamen-to de gestão de resíduos sólidos urbanos. Em outra linha de atuação, o BNDES dá suporte aos governos municipais para viabilizar a estruturação de projetos de escala com a participação de recursos privados por meio de concessões públicas e parcerias público-privadas (PPP).

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Desde o início de 2018, o BNDES vem estreitando a parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a construção de uma carteira de projetos com potencial de participação privada visando à promoção da gestão integrada dos resíduos sólidos urbanos no Brasil. O objetivo dessa parceria é realizar um mapeamento de oportunidades de investimento no setor de resíduos sólidos, com perspectiva de de-senvolvimento de projetos com participação do setor privado pela via de concessões ou PPPs.

Desse modo, o Banco pode atuar sendo financiador, ou, ainda, estru-turador de projetos, com o objetivo de ajudar o país na erradicação de lixões e na valorização dos resíduos.

O BNDES também pode apoiar projetos de racionalização da limpe-za urbana e de disposição de resíduos sólidos com recursos do Fundo Clima, um fundo de natureza contábil, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, que tem por finalidade financiar projetos voltados à mitigação de mudanças climáticas.

Além da continuidade das ações em andamento, o BNDES poderia avançar internamente em algumas agendas que impactam o setor de resíduos sólidos.

Inicialmente, a questão da reciclagem precisa ser estimulada no país, como prevê a hierarquia de prioridades da PNRS. Linhas de crédito específicas para projetos de reúso e reciclagem com incentivos para as empresas ampliarem essa prática poderiam ser pensadas no âmbito da política operacional do Banco. Hoje, não há no BNDES nenhum ins-trumento de apoio específico para essa finalidade.

O desenvolvimento tecnológico é outra agenda que poderia ser ali-nhada à busca de soluções para o problema dos resíduos sólidos no país,

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fomentada desde a triagem até o aproveitamento energético do recurso. Inovação é um elemento-chave para a transformação do modelo linear de produção para a economia circular. É necessário pensar em novas formas de produção, em desenvolvimento de novos materiais, em como agregar valor aos resíduos para geração de energia, por exemplo. Nesse sentido, o BNDES dispõe de linha de crédito específica para projetos de inovação, bem como de apoio, via renda variável, por fundos de investimento (capital semente, private equity ou venture capital). Além disso, o BNDES Fundo Tecnológico (BNDES Funtec) disponibiliza re-cursos não reembolsáveis para instituições tecnológicas ou instituições de apoio em projetos de parceria com empresas. Para promover a ino-vação, diferenciais nas condições de financiamento do Banco e criação de fundos específicos poderiam vir a estimular mais projetos voltados para o aproveitamento econômico de resíduos.

Outra agenda sensível e de grande impacto no setor de resíduos é a questão da dependência tecnológica, especialmente, nos processos de aproveitamento energético. Hoje, um grande empecilho ao financiamento do BNDES é a presença intensiva de equipamentos importados nesse tipo de projeto. Atualmente, o Banco pode financiar a aquisição de bens e serviços importados sem similar nacional, no âmbito de projetos de investimento apoiados pelo setor, mas com custo financeiro mais alto e prazo mais curto que os praticados pela linha BNDES Finem Saneamento Ambiental e Recursos Hídricos, o que acaba inviabilizando esse tipo de financiamento. Para incentivar projetos no setor, a política de financia-mento aos equipamentos importados poderia ser revista, tendo em vista a prioridade do saneamento e a carência de projetos no setor. O BNDES poderia desenvolver metodologia de conteúdo nacional progressivo para viabilizar a aquisição de equipamentos importados de forma a estimular a formação desse mercado no Brasil, prevendo sua gradual nacionalização.

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Ainda pensando em viabilizar novos projetos e atrair maior partici-pação do setor privado no financiamento de infraestrutura, a discussão da questão da flexibilização de garantias é um ponto essencial a ser aprofundado.

Hoje, há entraves externos importantes que dificultam a ampliação do apoio do BNDES ao setor, relacionados principalmente à:

• situação fiscal dos municípios;

• ausência de contratos de concessão de longo prazo compatíveis com suas necessidades de investimento;

• ausência de taxa ou tarifa para custeio dos serviços; e

• dificuldade de os prestadores privados constituírem garantias.

Nesse sentido, uma boa articulação do Banco com as diferentes esfe-ras do governo fortalece seu papel como banco de desenvolvimento e é fundamental para o aperfeiçoamento de instrumentos de financiamento ao setor. Por isso, uma atuação que sempre pode ser aprimorada é a co-laboração mais ativa nas formulações de políticas públicas. O BNDES, hoje, participa de alguns fóruns de discussões sobre regulamentação e iniciativas de ampliação da efetividade das políticas públicas aplicáveis ao saneamento no Brasil, tendo, inclusive, colaborado na revisão de nor-mativos e na definição de critérios de priorização de projetos a serem apoiados com recursos federais.

Além disso, a maior aproximação e parceria com instituições de outros países, como seus bancos de desenvolvimento, possibilitariam não só a cooperação técnica e a troca de experiência, mas também a abertura de espaço para novas alternativas de funding, uma vez que projetos de gestão de resíduos são estratégicos para a questão de mudança climática e, por isso, atraem atenção de governos estrangeiros.

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

O Brasil é um país de dimensão continental composto por municípios de grande diversidade entre si. Todos os atores – a saber, sociedade civil, governo e empresas –, sem exceção, precisam se aperfeiçoar na gestão dos resíduos sólidos urbanos, no maior incentivo à reciclagem e compostagem e no desenvolvimento de formas de aproveitamento energético; enfim, deve haver esforço coletivo no desafio do fechamento de lixões por meio da valorização do lixo como resíduo. Não haverá uma solução única para resolver o problema no país. Os investimentos necessários são vultosos e, por isso, deve haver a diversificação de fontes e a atração de investidores. Desse modo, o desafio de desenvolver novos produtos financeiros e aperfeiçoar o apoio ao setor pode resultar em maior entrega de valor do BNDES à sociedade no tema de resíduos sólidos urbanos.

Considerações finais

O conceito de economia circular vem ganhando progressivamente força entre policymakers, órgãos de governo e agências intergover-namentais. Destaca-se, no esforço relativo ao tema, a Europa, espe-cialmente Alemanha, Suécia e China. Por trás desse conceito reside uma preocupação cada vez maior com o esgotamento de recursos e o desenvolvimento sustentável.

A transição para uma economia circular implica, em última análise, melhor gestão dos resíduos.

A Europa foi a precursora desse conceito, incluindo-o em sua legislação e propondo, por um lado, metas ousadas de aumento de reciclagem e, por outro, a redução da disposição em aterros sanitários.

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195Políticas públicas na gestão de resíduos sólidos:

experiências comparadas e desafios para o Brasil

BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 25, n. 50, p. 153-200, set. 2019

No Brasil, o tema chega a reboque da necessidade de implementar a PNRS e de se tratar o passivo ambiental decorrente da destinação incorreta de resíduos. O cenário brasileiro é crítico, especialmente se considerado o desafio de fechamento dos lixões existentes no país.

Há muito para avançar na gestão de resíduos sólidos no mundo e, par-ticularmente, no Brasil. O BNDES, em seu papel de banco de desenvolvi-mento, pode – e deve – promover apoio a projetos comprometidos com a sustentabilidade ambiental por meio de sua atuação em saneamento.

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197Políticas públicas na gestão de resíduos sólidos:

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200 Resíduos sólidos

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BNDES Set., Rio de Janeiro, v. 24, n. 48, p. 153-204, set. 2018

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