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O COMPORTAMENTO VERBAL

Skinner, B. F. (1978). O Comportamento Verbal

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  • O COMPORTAMENTO VERBAL

  • Obra publicada com a colaborao da

    U N IV E R SID A D E DE S O P A U LO

    Reitor: Prof. Dr. Waldyr Muniz Oliva

    EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    Presidente: Prof. Dr. Mrio Guimares Ferri

    Comisso Editorial:

    Presidente: Prof. Dr. Mrio Guimares Ferri (Instituto de Biocincias). Membros: Prof. Dr. Antonio Brito da Cunha (Instituto de Biocincias), Prof. Dr. Carlos da Silva Lacaz (Faculdade de Medicinai Prof. Dr. Prsio de Souza Santos (Escola Politcnica) e Prof. Dr. Roque Spencer Maciel de Barros (Faculdade de Educao).

  • CIP-Brasil. Catalogao-na-Fonte Cmara Brasileira do Livro, SP

    Skinner, Burrhus Frederic, 1904- S639c O comportamento verbal / B. F. Skinner ; traduo

    de Maria da Penha Villalobos. So Paulo : Cultrix : Ed. da Universidade de So Paulo, 1978.

    1. Behaviorismo (Psicologia) 2. Comportamento verbal3. Comunicao oral 4. Linguagem Psicologia I. Ttulo.

    17. e 18. CDD-150.1943417. -001.518. -001.54

    78-0676 17. e 18. -401.9

    ndices para catlogo sistemtico:

    1. Comportamento lingstico : Psicologia da linguagem401.9 (17. e 18.)

    2. Comunicao verbal 001.5 (1 7 .) 001.54 (1 8 .)3. Linguage*n : Psicologia 401.9 (17. e 18.)4. Neo-behaviorismo : Psicologia 150.19434 (17. e 18 .)5. Skinner : Sistema : Psicologia 150.19434 (17. e 18 .)

  • B. F. S K I N N E R

    OCOMPORTAMENTO

    VERBAL

    Traduo de M a r i a d a P e n h a V i l l a l o b o s

    (Assistente-Doutor do Departamento de Filosofia da Educao e Cincias da Educao da Faculdade

    de Educao da Universidade de So Paulo.)

    EDITORA CULTRIXSO PAULO

    EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SO PAULO

  • Titulo do original:

    VERBAL BEHAVIOR

    Original English language edition published by Prentice-Hall, Inc., Englewood Cliffs, New Jersey, U .S .A .

    Copyright 1957 by Appleton-Century-Crofts, Inc.

    M C M LXXV III

    Direitos de traduo para a lngua portuguesa adquiridos com exclusividade pela

    EDITORA C U LTR IX LTDA.Rua Conselheiro Furtado, 648, fone 278-4811, 01511 S. Paulo, SP,

    que se reserva a propriedade literria desta traduo.

    Impresso no Brasil Printed in Brazil

  • ParaJ u l i e e D e b b ie ,

    minhas fontes primrias

  • S U M R I O

    P r e f c io

    I PARTE: UM PROGRAMA

    1. Uma Anlise Funcional do Comportamento Verbal2. Problemas Gerais

    II PARTE: VARIVEIS DE CONTROLE

    3. O Mando4. O Comportamento Verbal Sob o Controle de Estmulos

    Verbais5. O Tacto6. Condies Especiais que Afetam o Controle de Estmulos7. O Auditrio8. O Operante Verbal Como Unidade de Anlise

    III PARTE: VARIVEIS MLTIPLAS

    9. Causao Mltipla10. Estimulao Suplementar11. Novas Combinaes de Respostas Fragmentrias

    IV PARTE: A MANIPULAAO DO COMPORTAMENTO VERBAL

    12. O Autocltico13. A Gramtica e a Sintaxe Como Processos Autoclticos14. A Composio e Seus Efeitos

    11

    1528

    55

    74107182209224

    273303349

    373395411

  • V PARTE: A PRODUO DO COMPORTAMENTO VERBAL

    15. A Autocorreo 44316. Condies Especiais da Autocorreo 45917. O Autofortalecimento do Comportamento Verbal 48118. O Comportamento Verbal Lgico e Cientfico 49819. O Pensamento 514

    Dois Eplogos Pessoais 538 Apndice: A Comunidade Verbal 547

  • P R E F A C I O

    Foi preciso muito tempo para escrever este livro. Uma classificao de respostas verbais como uma primeira verso da I I Parte foi terminada no vero de 1934. Alguns experimentos de apoio foram ento realizados com a Somatria Verbal, e foram feitas analises estatsticas de vrias obras literrias, de dados obtidos com experimentos de associao de palavras e do comportamento da adivinhao. Todo esse material foi usado em cursos sobre Comportamento Verbal e Literrio na Universidade de Minnesota, nos ltimos anos da dcada de trinta, e na Universidade de Harvard, no vero de 1938, e na Universidade de Chicago, no vero de 1939. Um manuscrito da extenso deste livro deveria ser completado sob os auspcios de uma bolsa da Guggenheim em 1941, mas a guerra interferiu no projeto. A bolsa foi retomada em 1944- -1945 e uma verso ficou quase pronta. Essa verso foi a base de um curso sobre Comportamento Verbal na Universidade de Coimbra, no vero de 1947; no ano seguinte, notas taquigrficas do mesmo, mimeografadas, foram postas em circulao pelo Dr. Ralph Hefferlein.

    No outono de 1947, do manuscrito preparado para as William James Lectures, na Universidade de Harvard extraiu-se um material do qual vrias centenas de cpias mimeografadas tm circulado desde ento. Na preparao dessas conferncias verificou-se que o manuscrito estava comeando a adquirir o carter de uma reviso bibliogrfica e que o tema central estava-se tornando obscuro. Por isso, ao completar o manuscrito para fins de ^publicao, foram omitidos os sumrios da literatura acerca do assunto. O trmino do manuscrito final foi ento adiado em favor da realizao de um livro sobre o

    U

  • comportamento humano (Cincia e Comportamento Humano), o qual disporia uma referncia sobre assuntos no essencialmente verbais. A atual verso duas vezes mais longa que as James Lectures e contm muitas mudanas feitas para se adaptarem aos progressos recentes realizados na anlise experimental do comportamento humano ou no. Com exceo dos dois ltimos captulos, ela foi escrita durante o perodo de primavera de 1955, em Putney, Vermont.

    O trabalho foi generosamente subvencionado pela Society of Fellows da Universidade de Havard (uma bolsa de 3 anos) pela Universidade de Minnesota {uma licena sabtica de meio ano), pela Fundao Guggenheim (uma bolsa de meio ano), pela Universidade de Harvard (conferencista das William James Lectures e uma licena sabtica). Devo agradecimentos a todas essas instituies. Infelizmente, no possvel reconhecer de forma adequada a generosa ajuda recebida de alunos e colegas durante estes anos, bem como as crticas feitas s verses anteriores, publicadas ou inditas. .0 manuscrito final foi muito beneficiado pelas crticas e pelo auxlio editorial recebido de Mrs. Susan R. Meyer, da Dra. Dorothy Cohen e pela preparao cuidadosa feita por Mrs. Virgnia N. Maclaury.

    Cambridge, Massachusetts.

    B. F. S k i n n e r

  • I P a r t e

    U M P R O G R A M A

  • Captulo 1

    UMA ANLISE FUNCIONAL DO COMPORTAMENTO VERBAL

    Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez so modificados pelas conseqncias de sua ao. Alguns processos que o organismo humano compartilha com outras espcies alteram o comportamento para que ele obtenha um intercmbio mais til e mais seguro em determinado meio ambiente. Uma vez estabelecido um comportamento apropriado, suas conseqncias agem atravs de processos semelhantes para permanecerem ativas. Se, por acaso, o meio se modifica, formas antigas de comportamento desaparecem, enquanto novas conseqncias produzem novas formas.

    O comportamento altera o meio atravs de aes mecnicas, e suas propriedades ou dimenses se relacionam freqentemente, de uma forma simples, com os efeitos produzidos. Quando um homem caminha em direo a um objeto, ele se ve mais prximo deste; quando procura alcan-lo, provvel que se siga um contacto fsico; se ele o segura, levanta, empurra ou puxa, o objeto costuma mudar de posio, de acordo com as direes apropriadas. Tudo isso decorre de simples princpios geomtricos e mecnicos.

    Muitas vezes, porm, um homem age apenas indiretamente sobre o meio do qual emergem as conseqncias ltimas de seu comportamento. Seu primeiro efeito sobre outros homens. Um homem sedento, por exemplo, em vez de dirigir-se a uma fonte, pode simplesmente pedir um copo d^gua, isto , pode produzir um comportamento constitudo por certo padro sonoro, o qual por sua vez induz algum a lhe dar um copo dgua. Os sons em si mesmos so facilmente descritveis em termos fsicos, mas o copo de gua s chega ao falante como conseqncia de uma srie complexa de acontecimentos que

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  • incluem o comportamento de um ouvinte. A conseqncia ltima, o recebimento de gua, no mantm qualquer relao geomtrica ou mecnica com a forma do comportamento de pedir gua. Na verdade, caracterstico deste comportamento o fato de ele ser impotente contra o mundo fsico. Raramente nossos gritos derrubam as muralhas de Jerico, ou somos bem sucedidos ao ordenar ao sol para que no se mova ou para que as ondas se acalmem. Palavras no quebram ossos. As conseqncias de tal comportamento surgem por intermdio de uma srie de acontecimentos no menos fsicos ou inevitveis que as aes mecnicas, mas bem mais difceis de descrever.

    Os comportamentos que s so eficientes atravs da mediao de outras pessoas possuem tantas propriedades topogrficas distintas que se justifica um tratamento especial e, at mesmo, se exige tal tratamento. Problemas colocados por esse modo especial de ao usualmente so atribudos ao campo da linguagem ou da fala. Infelizmente, o termo fala destaca o comportamento vocal e dificilmente pode ser aplicado a situaes em que a pessoa mediadora afetada de forma visual, como ao escrever um bilhete. A palavra linguagem est agora satisfatoriamente afastada de suas ligaes originais com o comportamento vocal, mas, por outro lado, acabou por se referir mais s prticas de uma comunidade lingstica do que ao comportamento de um de seus membros. O adjetivo lingstico sofre das mesmas desvantagens. O termo comportamento verbal tem muitas vantagens, que recomendam-lhe o uso. Sua sano etimolgica no excessivamente poderosa, mas destaca o falante .individual e, quer seja reconhecido ou no por quem o usa, especifica o comportamento modelado e mantido pelas conseqncias mediatas. Tem tambm a vantagem de ser relativamente pouco familiar aos modos tradicionais de explicao.

    Uma definio do comportamento verbal como comportamento reforado pela mediao de outras pessoas precisa, como veremos, de maiores esclarecimentos. Alm do mais, tal definio no nos diz muito sobre o comportamento do ouvinte, mesmo que houvesse pouco comportamento verbal a considerar se algum ainda no tivesse adquirido respostas especiais para os padres de energia gerados pelo falante. Essa omisso pode ser justificada, pois o comportamento do ouvinte, ao servir de mediador para as conseqncias do comportamento do

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  • falante, no necessariamente verbal em nenhum sentido especial. Na verdade, no podemos distingui-lo do comportamento em geral e uma descrio adequada do comportamento verbal precisa cobrir apenas aqueles aspectos do comportamento do ouvinte necessrios para explicar o comportamento do falante. O comportamento do falante e do ouvinte juntos compem aquilo que podemos chamar de episdio verbal total. No h em tal episdio nada alm do comportamento combinado de dois ou mais indivduos. Nada emerge na unidade social. O falante pode ser estudado pressupondo-se um ouvinte, e o ouvinte pressupondo-se um falante. As descries separadas que da resultam esgotam o episdio do qual os dois participam.

    Seria loucura subestimar a dificuldade deste assunto, mas progressos recentes, obtidos pela anlise do comportamento, permitem-nos abord-lo com certo otimismo. Novas tcnicas experimentais e novas formulaes revelam um novo nvel de ordem e de preciso. Os processos e as relaes bsicas que do ao comportamento verbal suas caractersticas especiais so agora bastante bem compreendidos. Muito do trabalho experimental responsvel por tal progresso foi realizado com outras espcies, mas os resultados revelaram-se surpreendentemente livres de restries quanto s espcies. Trabalhos recentes revelaram que os mtodos podem ser estendidos ao comportamento humano sem srias modificaes. Longe da possibilidade de extrapolar descobertas cientficas especficas, essa formulao fornece uma nova abordagem, muito proveitosa do comportamento humano em geral e nos habilita a tratar mais eficazmente desta subdiviso chamada verbal.

    A compreenso do comportamento verbal algo mais do que o uso de um vocabulrio consistente, com o qual instncias especficas podem ser descritas. Ela no deve ser confundida com a confirmao de qualquer grupo de princpios tericos. Os critrios devem ser mais exigentes. O alcance de nossa compreenso do comportamento verbal numa anlise causal deve ser avaliado pelo alcance das nossas previses de ocorrncia de casos especficos e, eventualmente, pela extenso de nossa capacidade de produzir ou controlar tais comportamentos mediante a alterao das condies em que ele ocorre. Na apresentao de tal objetivo, salutar ter em mente certas tarefas especficas do planejamento. Como pode o professor estabelecer os repertrios verbais especficos, que constituem os principais

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  • produtos finais da educao? Como pode o terapeuta revelar o comportamento verbal latente numa entrevista teraputica? Como pode o escritor evocar seu prprio comportamento verbal no ato da composio? Como pode o cientista, o matemtico ou o lgico manipular seu comportamento verbal no pensamento produtivo? Problemas prticos desse tipo so, claro, infindveis. Resolv-los no o alvo imediato de uma anlise cientfica, mas eles esto subjacentes aos tipos de processos e relaes que tal anlise deve considerar.

    FORMULAES TRADICIONAIS

    A cincia do comportamento no encontrou este campo desocupado. Sistemas altamente elaborados de termos para descrever o comportamento verbal j foram desenvolvidos. O vocabulrio leigo abundante. A retrica clssica, a gramtica, a lgica, a metodologia cientfica, a lingstica, a crtica literria, a patologia da fala, a semntica e muitas disciplinas contriburam com termos tcnicos e princpios. De maneira geral, porm, o assunto aqui considerado ainda no foi claramente identificado, nem mtodos apropriados para seu estudo foram ainda projetados. A lingstica, por exemplo, registrou e analisou os sons da fala e prticas semnticas e sintticas, mas comparaes de lnguas diferentes e o traado das mudanas histricas assumiram precedncia sobre o estudo do falante individual. A Lgica, a Matemtica e a metodologia cientfica reconheceram as limitaes que as prticas lingsticas impem ao pensamento humano, mas de maneira geral satisfizeram-se com uma anlise formal; de qualquer modo, elas no desenvolveram as tcnicas necessrias para uma anlise causal do comportamento do homem pensante. A retrica clssica foi responsvel por um elaborado sistema de termos que descrevem as caractersticas das obras de arte literria, aplicveis igualmente ao falar cotidiano. Ela tambm deu alguma ateno aos efeitos sobre o ouvinte. Mas as primeiras e precoces promessas de uma cincia do comportamento verbal nunca foram realizadas. A crtica literrria moderna, excetuando-se, algumas vezes, o uso do vocabulrio tcnico da psicanlise, raramente vai alm dos termos empregados por um leigo inteligente. Um ataque frontal eficiente (uma formulao apropriada a todos esses campos especiais) no emergiu sob os auspcios de nenhuma dessas disciplinas.

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  • Talvez esse fato seja responsvel pelo surgimento da semntica como uma descrio geral do comportamento verbal. O estudo tcnico do significado j estava sendo realizado como um campo perifrico da lingstica quando, em 1923, Ogden e Richards1 demonstraram a necessidade de uma cincia mais ampla do simbolismo. Esta deveria ser uma anlise geral do processo lingstico aplicvel a qualquer campo e no estar dominada por nenhum interesse especial. Foram feitas tentativas para levar a cabo tal recomendao, mas uma cincia adequada do comportamento verbal no foi obtida. Existem vrios tipos correntes de semntica e elas representam os mesmos interesses especiais e empregam as mesmas tcnicas especiais de at ento. O mtodo original de Ogden e Richards era filosfico com tendncias psicolgicas. Alguns dos sistemas mais rigorosos so francamente lgicos. Em lingstica, a semntica continua a ser uma questo de como os significados so expressos e como se modificam. Alguns semanticistas lidam principalmente com o maquinrio verbal da sociedade, particularmente a propaganda. Outros so essencialmente terapeutas que afirmam que muitos dos problemas do mundo so erros lingsticos. O uso corrente do termo semntica revela a necessidade d uma cincia do comportamento verbal que esteja divorciada de interesses especiais e que seja til onde quer que a linguagem seja usada, mas a cincia em si mesma no surgiu sob esta gide.

    A responsabilidade final caber s cincias do comportamento e particularmente psicologia. O que ocorre quando um homem fala ou responde a uma fala claramente uma questo relativa ao comportamento humano e, portanto, uma questo a set respondida com os conceitos e tcnicas da psicologia enquanto cincia experimental do comportamento. primeira vista, isto no parece constituir uma questo particularmente difcil. Excetuando-se o aspecto relativo simplicidade, o comportamento verbal tem muitas caractersticas favorveis enquanto objeto de tsudo. Sua observao costuma ser fcil (se no o fosse, ele seria ineficaz como comportamento verbal); nunca houve falta de material (os homens falam e ouvem muito); os fatos so reais (observadores cuidadosos geralmente concordaro acerca do que dito em qualquer circunstncia dada); e o desenvolvimento da prtica arte de escrever propor-

    1. Ogden, G. K. e Richards, I. A., O significado do Significado (Nova Iorque, 1923).

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  • cionou um sistema pronto de notao para o registro do comportamento verbal, o qual mais conveniente e preciso do que qualquer outro disponvel no campo no-verbal. O que est faltando um tratamento causal ou funcional satisfatrio. Ao lado de outras disciplinas relacionadas com o comportamento verbal, a psicologia j arrolou fatos e s vezes ordenou- -os numa ordem conveniente, mas nessa massa de material ela no conseguiu ainda demonstrar as relaes significativas que constituem o ncleo de uma descrio cientfica. Por razes que, retrospectivamente, no so muito difceis de descobrir, ela foi levada a negligenciar alguns dos fatos necessrios para uma anlise funcional ou causal. Ela o fez porque o lugar de tais fatos vinha sendo ocupado por certas causas fictcias das quais a psicologia custou a se desembaraar. Examinando mais de perto algumas dessas causas, podemos encontrar uma explicao para a demora do surgimento de uma cincia do comportamento verbal.

    Admite-se, geralmente, que para explicar o comportamento, ou qualquer um de seus aspectos, devemos atribu-lo a fatos ocorridos no organismo. No campo do comportamento verbal, esta prtica outrora foi representada pela doutrina da expresso das idias. Entendia-se que uma alocuo se explicava por apresentar as idias que expressava. Se o falante tivesse tido idias diferentes, ele teria pronunciado palavras diferentes, ou as mesmas palavras numa ordenao diferente. Se sua alocuo era pouco comum, isto se dava porque suas idias eram novas ou originais. Se ela parecia vazia, ele deveria ter sentido a falta de idias ou ter sido incapaz de express-las em palavras. Se ele era incapaz de se manter em silncio, era por causa da fora de suas idias. Se falava de forma hesitante, era porque suas idias surgiam lentamente ou estavam mal organizadas. E assim por diante. Assim se explicavam todas as propriedades do comportamento verbal.

    Tal prtica tem obviamente o mesmo alvo que a anlise causal, mas no os mesmos resultados. A dificuldade reside no fato de que as idias para cuja expresso os sons so pronunciados no podem ser observadas de forma independente. Se pedimos uma prova de sua existncia, provvel que a reafirmemos com outras palavras, mas uma reafirmao no est mais prxima da idia do que o enunciado original. A reafirmao mostra apenas que a idia no se identifica com uma nica expresso. De fato, freqentemente, ela definida como

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  • algo comum a duas ou mais expresses. Mas ns no alcanaremos esse algo mesmo que expressemos uma idia de todas as maneiras concebveis.

    Outra resposta comum o apelo s imagens. Diz-se que a idia aquilo que passa pela mente do falante, aquilo que o falante v, ouve e sente quando ele est 4 * tendo'1 a idia. Foram tentadas exploraes dos processos mentais subjacentes ao comportamento verbal pedindo-se aos pensantes para que descrevessem experincias dessa natureza. Mas apesar de alguns exemplos selecionados terem sido por vezes convincentes, apenas uma pequena parte das idias expressas em palavras pde ser identificada com o tipo de acontecimento fsico sobre o qual repousa a noo de imagem. Um livro sobre Fsica muito mais do que a descrio das imagens das mentes dos fsicos.

    H, bvio, algo suspeito na facilidade com a qual descobrimos num conjunto de idias precisamente aquelas propriedades necessrias para explicar o comportamento que as expressa. Ns, evidentemente, construmos as idias vontade, a partir do comportamento a ser explicado. No h, claro, uma verdadeira explicao. Quando dizemos que uma observao confusa porque a idia no clara, parece que estamos falando acerca de dois nvejs de observao, embora s exista, de fato, um nico. a observao que confusa. Esta prtica pode ter sido defensvel quando as investigaes acerca dos processos verbais eram filosficas, e no cientficas, e quando se pensava que uma cincia das idias pudesse um dia ordenar melhor o assunto; mas hoje o assunto encarado de outra forma. funo de uma fico explicativa mitigar a curiosidade e levar a investigao a um fim. A doutrina das idias teve esse efeito na medida em que ela parecia transferir problemas importantes do comportamento verbal a uma psicologia de idias. Os problemas pareciam ento ir alm do alcance das tcnicas do estudante de linguagem ou pareciam ter-se tomado excessivamente obscuros para qualquer estudo ulterior proveitoso.

    Talvez hoje em dia ningum mais seja enganado por uma idia como uma fico explicativa. Idiomas e expresses que parecem explicar o comportamento verbal em termos de idias so to comuns em nossa lngua que impossvel evit- -las, mas elas podem ser pouco mais que figuras de retrica moribundas. A formulao bsica todavia foi preservada. O sucessor imediato da idia foi o significado e o lugar

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  • deste ltimo est correndo o risco de ser disputado por um recm-chegado, a informao. Todos esses termos tm o mesmo efeito, o de desencorajar uma anlise funcional e o de copiar certas prticas inicialmente associadas com a doutrina das idias.

    Uma conseqncia funesta a crena de que a fala tem uma existncia independente do comportamento do falante. As palavras so encaradas como ferramentas ou instrumentos, anlogos a marcas, fichas ou bandeiras de sinalizao que so, algumas vezes, empregadas para fins verbais. verdade que o comportamento verbal comumente produz entidades objetivas. A gravao de uma fala, as palavras numa pgina, os sinais transmitidos por telefone ou telgrafo so registros produzidos pelo comportamento verbal. Como fatos objetivos, todos eles podem ser estudados, como j o foram ocasionalmente, pela lingstica, pela engenharia de comunicaes, pela crtica literria e por outras disciplinas. Mas embora as propriedades formais dos registros das expresses vocais sejam interessantes, temos de preservar a distino entre uma atividade e seus traos. Devemos, particularmente, evitar a formulao artificial do comportamento verbal como uso de palavras. No temos maiores razes para dizer que um homem usa a palavra gua ao pedir para beber do que para dizer que ele usa um instrumento de alcance ao pegar o copo oferecido. Nas artes, nos ofcios, nos esportes, especialmente onde a instruo verbal, os atos s vezes so nomeados. Dizemos que um jogador de tnis usa um drop stroke ou que um nadador campeo no estilo crawl. Mas provavelmente ningum se enganar quando nos referimos a drop stroke e a crawl como coisas, mas as palavras so um assunto diferente *. Uma compreenso errnea tem sido comum e freqentemente desastrosa.

    Uma prtica complementar tem sido a de atribuir uma existncia independente aos significados. O significado, bem como a idia, tem sido entendido como algo que expresso ou comunicado por uma expresso vocal. Um significado explica a ocorrncia de um conjunto particular de palavras com o sentido de que, se houvesse um significado diferente a ser expresso, um conjunto diferente de palavras teria sido empregado. Uma expresso vocal ser afetada dependendo de o significado

    * Drop stroke > rebate curto do tenista, fazendo a bola cair logo depois de ter ultrapassado a rede; to crawl, "arrastar-se e, tambm, modalidade de nado de peito. (N. da T .)

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  • ser claro ou vago, e assim por diante. O conceito tem certas vantagens. Onde quer que idias (assim como sentimentos e desejos, que so tambm considerados como exprimveis por palavras) devam estar no interior do organismo, h uma possibilidade promissora de que os significados possam ser mantidos do lado de fora da pele. Nesse sentido, eles so to observveis como qualquer parte fsica.

    Podemos ns, porm, identificar de uma forma objetiva o significado de uma alocuo? Um argumento promissor pode ser apresentado no caso de nomes prprios e de alguns substantivos comuns, verbos, adjetivos e advrbios palavras em relao s quais a doutrina das idias dificilmente poderia ser sustentada por meio do apelo s imagens. Mas, e no caso de palavras como tomo, ou gen, ou menos um, ou o esprito do tempo, nas quais entidades no-verbais correspondentes no so facilmente discernveis? E para palavras tais como todavia, contudo, embora e ui! parece necessrio procurar dentro do organismo a inteno, atitude ou sentimento do falante, ou qualquer outra condio psicolgica.

    Mesmo palavras que parecem preencher um padro semntico exteriorizado apresentam problemas. Pode ser verdade que os nomes prprios mantm uma correspondncia biun- voca com as coisas, supondo-se que cada coisa tenha seu nome prprio, mas o que dizer dos nomes comuns? Qual o significado de gato? um gato a totalidade fsica de todos os gatos, ou a classe de todos os gatos? Ou devemos ns abrir mo da idia de gato? Mesmo no caso dos nomes prprios a dificuldade permanece. Admitindo-se que haja um nico homem chamado Joo, o prprio Joo o significado de Joo? Certamente ele no transmitido ou comunicado quando a palavra usada.

    A existncia de significados torna-se ainda mais duvidosa quando passamos das palavras para os conjuntos que dizem alguma coisa. O que dito por uma sentena algo mais que o significado das palavras que a compem. As sentenas no se referem apenas s arvores, ao cu e chuva: elas dizem algo sobre eles. Este algo as vezes chamado de proposio que um precursor algo mais respeitvel da fala, mas muito semelhante idia, a qual, segundo a antiga doutrina, era considerada algo que era expresso pela prpria sentena. Definir uma proposio como algo que pode ser dito em qualquer Ungua no nos diz o que so as proposies, ou de que

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  • material elas so feitas. O problema tambm no se resolve definindo-se uma proposio como todas as sentenas que tm o mesmo significado que outra sentena qualquer, uma vez que no podemos identificar uma sentena como membro dessa classe sem conhecer seu significado ponto, no qual nos vemos enfrentando nossos problemas originais.

    Tem sido tentador buscar estabelecer uma existncia separada para as palavras e os significados, pois com isso torna- -se possvel obter uma soluo bastante elegante para certos problemas. As teorias do significado usualmente tratam de arranjos correspondentes de palavras e coisas. Como as entidades lingsticas, de um lado, podem corresponder s coisas ou fatos que constituem seu significado de outro lado, e qual a natureza da relao entre elas que chamamos de referncia? Num primeiro relance, os dicionrios parecem suportar as noes de tais arranjos. Mas os dicionrios no fornecem significado; na melhor das hipteses eles oferecem palavras que possuem o mesmo significado. O esquema semntico, tal como concebido usualmente, tem propriedades interessantes. Os matemticos, os lgicos e os tericos da informao tm explorado amplamente os possveis modos de correspondncia. Por exemplo: em que medida podem as dimenses da coisa comunicada serem respresentadas nas dimenses do meio de comunicao? Mas falta mostrar que tal construo guarda uma semelhana prxima com os produtos das atividades lingsticas genunas.

    De qualquer forma, tal prtica negligencia propriedades importantes do comportamento original e levanta outros problemas. No podemos, com sucesso, preencher um quadro de referncia semntica recorrendo inteno do falante at que uma explicao psicolgica satisfatria da inteno tenha sido dada. Se o significado conotativo deve suplementar uma denotao deficiente, necessrio um estudo do processo associativo. Quando alguns significados so classificados como emotivos, outro campo psicolgico difcil e relativamente pouco desenvolvido invadido. Todas essas tentativas constituem esforos para preservar a representao por meio da construo de categorias adicionais para palavras excepcionais. Elas constituem uma espcie de colcha de retalhos que conseguiu principalmente mostrar quo batida e gasta a noo bsica. Quando conseguimos fornecer o material suplementar necessrio para esta representao do comportamento verbal,

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  • descobrimos que nossa tarefa foi proposta em termos embaraosos, se no impossveis. Os dados observveis foram pr- -esvaziados e o estudioso do comportamento viu-se a braos com processos mentais vagamente identificados.

    O desejo de explicar o significado facilmente compreensvel. Perguntamos O que voc quer dizer? porque a resposta freqentemente til. O esclarecimento dos significados nesse sentido desempenha um importante papel em qualquer tipo de esforo intelectual. Para os fins do discurso efetivo, o mtodo da parfrase costuma ser suficiente; podemos no precisar de referncias extra verbais. Mas no se deve permitir que a explicao do comportamento verbal gere um sentido de explicao cientfica. No se explica uma observao pelo simples fato de parafrasear o que ela significa.

    Indubitavelmente, podemos definir idias, significados, etc., de tal forma que eles poderiam se tomar cientificamente aceitveis e at mesmo teis na descrio do comportamento verbal. Mas tal esforo em conservar os termos tradicionais seria dispendioso. a formulao geral que est errada. Ns procuramos as causas do comportamento que possuam um status cientfico aceitvel e que, com sorte, possam vir a ser suscetveis de medidas e de manipulao. Dizer que isto tudo o que se entende por idias ou significados deturpar a prtica tradicional. Precisamos encontrar as relaes funcionais que governam o comportamento verbal a ser explicado; chamar tais relaes de expresso ou comunicao correr o perigo de introduzir propriedades e fatos enganadores e exteriores. A nica soluo rejeitar a formulao tradicional do comportamento verbal em termos de significado.

    UMA NOVA FORMULAO

    A direo a ser tomada em outra alternativa dita a prpria tarefa. Nossa primeira responsabilidade simplesmente descritiva-. qual a topografia desta subdiviso do comportamento humano? Uma vez respondida essa questo, pelo menos de forma preliminar, podemos avanar para o estgio da explicao: que condies so relevantes para a ocorrncia do comportamento quais so as variveis das quais ele funo? Uma vez identificados tais fatores, podemos explicar as caractersticas dinmicas do comportamento verbal dentro de um qua-

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  • dro apropriado ao comportamento humano como um todo. Ao mesmo tempo precisamos considerar o comportamento do ouvinte. Relacionando-o com o comportamento do falante, completamos nossa explicao do episdio verbal.

    Mas isto apenas o comeo. Uma vez estabelecido um repertrio do comportamento verbal, uma poro de novos problemas surgem da interao de suas partes. O comportamento verbal usualmente o efeito de mltiplas causas. Variveis separadas combinam-se para ampliar seu controle funcional e novas formas de comportamento surgem da recombi- nao de velhos fragmentos. Tudo isso exerce influncia sobre o ouvinte, cujo comportamento, por sua vez, exige anlise.

    Outro grupo de problemas surge do fato, freqentemente apontado, de que um falante tambm, normalmente, um ouvinte. Ele reage a seu prprio comportamento de vrias maneiras importantes. Parte do que ele disse est sob o controle das outras partes de seu comportamento verbal. Referimo-nos a esta interao quando dizemos que o falante qualifica, ordena ou elabora seu comportamento no momento em que ele produzido. A mera emisso de respostas constitui uma descrio incompleta quando o comportamento composto. Outra conseqncia do fato de que o falante tambm um ouvinte que o comportamento do ouvinte se assemelha ao comportamento do falante, particularmente quando o ouvinte entende o que se diz.

    O ouvinte e o falante, quando so uma nica pessoa, se engajam em atividades tradicionalmente descritas como pensamento. O falante manipula seu comportamento; ele o rev e pode rejeit-lo ou emiti-lo de forma modificada. A extenso em que ele realiza tais atos pode variar amplamente, determinada tal variao em parte pela medida em que ele funciona como seu prprio ouvinte. O falante hbil aprende a modificar o comportamento fraco e a manipular variveis que geraro e reforaro novas respostas em seu repertrio. Tal comportamento comumente observado nas prticas verbais da literatura bem como da cincia e da lgica. Uma anlise dessas atividades, assim como de seus efeitos sobre o ouvinte, leva-nos finalmente ao problema do papel do comportamento verbal no problema do conhecimento.

    Este livro descreve os principais traos de uma anlise feita desse ponto de vista. A II Parte descreve a topografia do comportamento verbal relacionada com suas variveis con

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  • troladoras e na III Parte, algumas das conseqncias da interao de variveis. A IV Parte descreve a manipulao do comportamento verbal no ato de composio, enquanto que a V Parte considera as atividades envolvidas na correo e na produo criativa de comportamento usualmente chamada pensamento verbal. Nenhuma suposio feita acerca de qualquer caracterstica exclusivamente verbal e os princpios e mtodos empregados adaptam-se ao estudo do comportamento humano como um todo. Um tratamento extensivo do comportamento humano em geral, feito segundo o mesmo ponto de vista, pode ser encontrado alhures. 2 A presente explicao auto-suficiente.

    Um trao importante da anlise que vamos empreender que ela se volta para o comportamento do falante e do ouvinte individual; no recorremos a conceitos estatsticos baseados em dados obtidos com grupos. Mesmo com respeito ao falante e ao ouvinte individual pouco uso se far de resultados experimentais especficos. Os fatos bsicos a serem analisados so bem conhecidos de qualquer pessoa educada e no precisam ser confirmados estatisticamente ou experimentalmente no nvel de rigor aqui tentado. No se fez nenhum esforo no sentido de acompanhar a literatura relevante. A nfase ser dada a um conjunto de fatos bem conhecidos, de acordo com a formulao do comportamento derivada de uma anlise experimental mais rigorosa. A atual extenso ao comportamento verbal assim um exerccio de interpretao, mais do que uma extrapolao quantitativa de resultados experimentais rigorosos.

    A falta de rigor quantitativo , at certo ponto, compensada pelo fato de que as condies a serem consideradas nesta anlise devem, na medida do possvel, ser accessveis e manipulveis. A formulao ser eminentemente prtica e sugerir aplicaes tecnolgicas imediatas. Apesar da enfase no ser experimental nem estatstica, o livro no propriamente um livro terico no sentido comum. Ele no recorre a entidades explicativas hipotticas. O objetivo ltimo a previso e o controle do comportamento verbal.

    2. Skinner, B. F .: Science and Human Behavior (Nova Iorque, 1954). V H

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  • Captulo 2

    PROBLEMAS GERAIS

    O COMPORTAMENTO VERBAL COMO UMA VARIVEL DEPENDENTE

    Nosso assunto o comportamento verbal e devemos aceit-lo na forma crua em que ele observado. Ao estudar a fala, temos de explicar uma srie de atividades musculares complexas que produzem rudos. Ao estudar a escrita ou os gestos, lidamos com outros tipos de respostas musculares. H muito tempo reconhece-se que este o material com o qual so feitas as lnguas, mas tal reconhecimento tem sido qualificado de forma a destruir o ponto principal. Como disse Jespersen1 h muitos anos, A nica definio no-impugn- vel de uma palavra que ela um hbito humano. Infelizmente, ele sentiu necessidade de acrescentar: um ato habitual da parte de um indivduo que tem, ou pode ter o efeito de evocar alguma idia na mente de outro indivduo. Da mesma forma, Bertrand Russel2 afirma que assim como saltar uma classe de movimento. . . assim tambm a palavra cachorro' [outra] classe, mas ele acrescenta que as palavras diferem de outras classes de movimentos corporais porque tm um significado. Nos dois casos algo foi acrescentado para uma descrio objetiva.

    Tem-se dito freqentemente que tal acrscimo necessrio, mesmo quando o comportamento no verbal. Qualquer esforo para tratar o comportamento como um movimento das

    1. Jespersen, O. Language (Nova Iorque, 1922).2. Russel, B. Inquiry into Meaning and Truth (Nova Iorque,

    1940).

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  • partes de um organismo enfrenta imediatamente a objeo de que no o simples movimento que importa, mas o que o movimento significa, seja para o organismo que tem determinado comportamento seja para o observador. Afirma-se comumente que podemos ver significado ou objetivo no comportamento e, portanto, no podemos omitir tal significado de nossa explicao. Mas o significado no propriedade do comportamento enquanto tal, mas das condies sob as quais o comportamento ocorre. Tecnicamente, os significados devem ser buscados entre as variveis independentes numa explicao funcional e no como propriedades da varivel dependente. Quando algum diz que pode perceber o significado de uma resposta, ele quer dizer que pode inferir algumas das variveis das quais a resposta uma funo. A questo particularmente importante no campo do comportamento verbal, onde o conceito de significado desfruta de to grande prestgio.

    Na definio de comportamento verbal como comportamento reforado por intermdio de outras pessoas, no especificamos, nem o podemos fazer, qualquer forma, modo ou meio. Qualquer movimento capaz de afetar outro organismo pode ser verbal. Ns, provavelmente, escolhemos o comportamento vocal, no apenas porque o mais comum mas tambm porque tem pouco efeito sobre o meio fsico e porque quase necessariamente verbal. H porm linguagens escritas, linguagens por sinais e linguagens nas quais o falante estimula a pele do ouvinte. O comportamento audvel no- -vocal (por exemplo, bater palmas para chamar um criado ou tocar uma cometa) e os gestos so verbais, mesmo que no constituam uma linguagem organizada. O telegrafista hbil comport-se verbalmente ao mover o pulso. Algumas dessas formas normalmente surgem apenas aps o estabelecimento da forma vocal, mas isto no ocorre necessariamente. A escrita e a datilografia podem ser primordialmente verbais ou transcries de uma forma vocal anterior. Indicar palavras verbal, como alis qualquer indicao, uma vez que s eficaz quando altera o comportamento de algum. A definio cobre tambm a manipulao de objetos fsicos, realizada por causa de seu efeito sobre as pessoas, como por exemplo no caso dos adornos e das vestes cerimoniais. No caso de qualquer mdium, o comportamento ao mesmo tempo verbal e no-verbal: no- -verbal, em seu efeito sobre o meio; verbal em seus efeitos ltimos sobre o observador. A linguagem cerimonial, a linguagem das flores, das pedras preciosas, etc. so de pequeno interesse, por

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  • que possuem um vocabulrio pequeno e pouca ou nenhuma gramtica, mas, de qualquer forma, segundo os termos de nossa definio, elas so verbais. Por ser o comportamento verbal vocal a forma mais comum, podemos trat-lo como representativo, Quando for necessrio ou til, problemas paralelos de outras formas podero ser considerados.

    C o m p o r t a m e n t o V o c a l

    O comportamento verbal vocal executado por uma complexa musculatura: o diafragma, as cordas vogais, as falsas cordais vocais, a epiglote, a abboda palatina, a lngua, a bochecha, os lbios e o maxilar. O mais completo registro de um nico exemplo de uma locuo seria o registro eltrico ou mecnico da ao de todos os msculos envolvidos. Neste momento, o interesse por tal registro puramente terico, uma vez que at agora no se fez nada semelhante. Felizmente, uma cincia do comportamento verbal no precisa esperar por isso. As complexas respostas musculares do comportamento vocal afetam o meio verbal pela produo da fala audvel, um dado muito mais acessvel.

    O produto acstico do comportamento vocal verbal pode ser registrado fonograficamente. O disco assim gravado pode ser convertido numa forma visvel e, para maior convenincia, analisado num espectro de graus de intensidade. O registro acstico menos preciso que um registro da ao muscular, porque diferentes padres musculares presumivelmente produzem o mesmo som, mas ao menos ele exeqvel. Ele tambm mais conveniente, porque usa menos termos ou dimenses. provvel que no se perca nada importante porque o cientista se coloca essencialmente na mesma posio que o ouvinte e, para muitos fins, pode ignorar qualquer propriedade do comportamento verbal que no produza diferenas na corrente sonora. Mesmo assim, um registro acstico revela-nos mais do que usualmente queremos saber, exceto quando os detalhes acsticos devem ser especialmente destacados, e isso logo se torna difcil.

    Outro tipo de registro tornou-se possvel com a descoberta de que a fala podia ser dividida em seus sons componentes e pela descoberta de um alfabeto fontico para representar esses sons (Estes dois avanos, claro, foram anteriores ao estudo cientfico). Uma amostra de comportamento verbal pode ser registrada colocando-se os simbolos apropriados numa

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  • ordem correspondente, tal como feito, apesar de inexatamente, ao se escrever com o alfabeto ingls. No que nos interessa, tal registro torna simplesmente possvel identificar algumas das propriedades acsticas de uma alocuo. A transcrio permite que o leitor construa um fac-smile do comportamento, o qual ter sobre a comunidade verbal o mesmo efeito que a amostra original. Este tipo de registro prtico e econmico porque um nmero indefinido de acontecimentos acsticos diversos pode ser representado por meio de um pequeno nmero de simbolos.

    Este uso de um alfabeto fontico no acarreta nenhum compromisso acerca do significado funcional das unidades identificadas. Podemos usar a grafia inglesa para registrar cantos de passaros ( to-whit, to-whoo, ou peewee) ou os rudos de coisas inanimadas (pop e boom ), no sentido de que ao ler registros em voz alta reconstrumos um fac-smile razovel dos cantos ou rudos originais. Mas isto no quer dizer que os pssaros ou os tambores falem segundo fonemas ingleses. A funo analtica (mais do que a transcritiva) do fonema na lingstica moderna surge, por um lado, de uma incurso no domnio da fonologia, que no ter que ser feita aqui, e por outro, do estudo e comparao das prticas de comunidades verbais em seu conjunto. O lingista enfrenta os fatos seguintes: 1) numa comunidade verbal, as respostas pin e bin ocorrem em condies diferentes, enquanto que em outra comunidade verbal elas tm o mesmo efeito ou ocorrem nas mesmas condies; 2) numa comunidade verbal, as respostas pit e bit tm efeitos diferentes ou ocorrem sob circunstncias diferentes, enquanto que em outra comunidade verbal elas tm o mesmo efeito ou ocorrem sob as mesmas circunstncias; 3) nas comunidades em que pin e bin tm o mesmo efeito, pit e bit tambm tem o mesmo efeito; e onde as duas primeiras produzem efeitos diversos, as duas ltimas tambm os produzem. Tais fatos apresentam problemas que se situam alm da mera transcrio do comportamento verbal, porque incluem referncias s condies de ocorrncia do comportamento verbal ou aos efeitos produzidos no ouvinte. Trataremos aqui desses fatos adicionais de outra forma.

    O registro de uma alocuo num alfabeto fontico proporciona, claro, menos informao acerca de suas propriedades do que um registro acstico, mas isto no acarretar obje- oes caso possamos mostrar que as propriedades preservadas so

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  • as propriedades efetivas do comportamento verbal. Isto nos leva a um princpio importante da anlise do comportamento. Distinguimos entre um exemplo de resposta e uma classe de respostas. Uma nica resposta, como um exemplo de atividade de um organismo, pode ser descrita na medida das facilidades de que se dispuser. Mas, quando deparamos com o problema da predio do comportamento futuro, pode ser impossvel predizer os numerosos detalhes de um nico exemplo ou faz-lo, mais provavelmente, pode no ter importncia. Tudo o que queremos saber se ocorrer ou no uma resposta de determinada classe. Por determinada classe,, entendemos uma resposta que apresente certas propriedades selecionadas. Podemos querer saber se um homem abrir uma porta, e no como ele gira a maaneta. No que desprezemos os detalhes do girar a maaneta por no estarem submetidos a uma lei ou por serem indeterminados; simplesmente, tratamos do fato de ele abrir a porta sem atentarmos para os detalhes. A propriedade do comportamento em virtude da qual classificamos uma resposta como abrir uma porta constitui nosso interesse principal. Da mesma forma, no precisamos conhecer todos os detalhes de uma resposta vocal desde que o padro sonoro que ela produz obtenha certo efeito sobre uma comunidade verbal especfica. H muitas razes prticas e tericas para que se registre e analise certos exemplos de comportamento verbal to detalhadamente quanto possvel, mas elas no coincidem com nossos interesses de previso e controle do comportamento, pelo menos no estgio atual da cincia. O fonema foi um reconhecimento precoce do princpio da propriedade definidora de uma resposta. Infelizmente, para nossos objetivos atuais, a extenso do conceito para a lingstica histrica e comparativa obscureceu sua relevncia para a definio da unidade do comportamento verbal no falante individual.

    O problema do som da fala torna-se mais claro e, ao mesmo tempo, perde parte de sua importncia quando comparamos outros modos de comportamento. Se o comportamento verbal nunca fosse vocal, no existiria a fontica ou a fonologia. Todavia, muitos dos problemas a serem considerados no estudo do comportamento verbal permaneceriam. Numa comunidade, na qual todo comportamento verbal fosse escrito, teramos que identificar marcas de fala e descobrir suas propriedades geomtricas essenciais. Se tal linguagem se assemelhasse escrita moderna, teramos que estudar um maior nmero de marcas que funcionariam como, digamos assim, a

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  • letra a para podermos identificar seus traos comuns e para descobrir que propriedades poderiam, para muitos fins, serem ignoradas. Se tal comunidade falasse apenas por meio de mquinas de escrever, a extenso de propriedades seria menor. A vantagem de uma extenso menor para o leitor, assim como para o cientista, pode ser percebida pela instruo, to freqente: Por favor, use letras de forma. A grafologia proporciona uma fontica rudimentar do comportamento verbal escrito; tambm aqui os significados exigem outras tcnicas de anlise.

    Uma citao direta um registro de comportamento verbal que depende mais explicitamente de um conhecimento das condies em que ocorreu o comportamento. Freqentemente, porm, ela pouco mais que uma transcrio fontica ou acstica que permite ao leitor reconstruir propriedades relevantes do comportamento original. O relato falado de que algum disse So quatro horas reconstri no momento um caso de comportamento verbal. Um registro escrito permite que o leitor o reconstrua por si mesmo.

    Uma tcnica que permita a reconstruo de um dado pouco usual. A cincia geralmente no recorre a modelos ou imitao; suas descries dos fatos no se assemelham a esses fatos. No cainpo do comportamento no-verbal, realmente no relatamos o comportamento imitando-o. Todavia, ao falar uma linguagem que est sendo estudada, o cientista usa a imitao em vez de mtodos mais usuais de descrio, que no mantm uma correspondncia ponto por ponto com a coisa escrita. (Esta distino ser discutida mais adiante no Captulo 5.) Russell 3 chamou a ateno para o fato de que exemplos raros de comportamento verbal, como o Juramento da Coroao ouo Pai-Nosso, possuem nomes prprios. Ele tambm mencionao mtodo que se deve a Gdel, pelo qual se atribuem nmeros a palavras e, a partir da, a todas as sentenas possveis. O sistema de catalogao de uma biblioteca atribui nomes prprios (nmeros identificadores) a amplas amostras do conhecimento verbal conhecidas como livros. No provvel, todavia, que estes prenunciem um sistema descritivo no qual todas as respostas verbais venham a receber nomes prprios que no tenham maior semelhana com as coisas nomeadas do que as existentes entre os fatos e suas descries numa outra cincia qualquer.

    3. Russell, B. Inquiry into Meaning and Truth (Nova Iorque, 1940). i--------- ---- . _

    I ? ------- -

    I U N E S P A 33

  • No importa quo tentadora possa ser a utilizao da possibilidade especial de uma transcrio fontica ou de uma citao direta para reconstruir o comportamento que est sendo analisado; devemos acentuar que, do ponto de vista do mtodo cientfico, uma expresso como "So 4 horas o nome de uma resposta. No se trata, obviamente, da resposta que est sendo estudada, porquanto ela foi dada por alguma outra pessoa em outro lugar. Ela simplesmente se assemelha quela resposta do ponto de vista da forma. As condies responsveis pela resposta original podem no ter nada em comum com as condies responsveis pela resposta do cientista que descreve. Esta prtica, chamada hipostase, uma anomalia no mtodo cientfico. Como disse Quine4: Uma citao no uma descrio, mas um hieroglifo; ela designa seu objeto no por meio de uma descrio em termos de outros objetos, mas representando-o. Quine fala aqui dos registros escritos do comportamento verbal escrito. Em nenhuma outra cincia isto possvel porque em nenhuma outra cincia os nomes e as coisas nomeadas possuem estrutura similares.

    Uma citao , usualmente, mais do que uma transcrio fontica ou acstica, mais do que um hieroglifo ou um nome. Em primeiro lugar, freqentemente, embora no inevitavelmente, ela quebra em partes uma amostra claramente contnua de comportamento. Tais cortes no precisam refletir pausas atuais ou outras propriedades do padro de tempo e de intensidade do comportamento. Ao citarmos um episdio falado, ns o separamos no apenas em sons da fala representados por letras, como tambm em unidades mais amplas, chamadas palavras ou sentenas, representadas por cortes especiais ou por pontuao. A diferena entre um registro fontico e uma citao direta pode ser percebida no treinamento exigido nos dois casos. Um pequeno repertrio fontico suficiente para transcrever a fala inglesa com vistas a uma reconstruo. Mas milhares de palavras diferentes devem ser aprendidas antes que citaes diretas possam ser efetivamente escritas. O processo inclui, claro, o aprender a soletrar bem como, particularmente, a distino entre palavras homfonas. A habilidade em geral adquirida durante o processo de aprendizagem da escrita e, uma vez adquirida, amide considerada. Provavelmente, somos levados a desprezar o fato de que no momento est ocorrendo um processo de anlise.

    4. Quine, W. V. M athematical Logic (Nova Iorque, 1940), p. 26.

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  • Somos tambm levados, muito provavelmente, a menosprezar o fato de que, numa citao direta estamos inferindo algo acerca das condies sob as quais uma resposta foi emitida, ou sobre efeitos caractersticos num ouvinte. Pode-se fazer uma transcrio fontica razoavelmente boa de uma lngua que no se fala ou, como o estengrafo mostra freqentemente, de uma lngua familiar sem todavia reagirmos a ela como um ouvinte. Mas as unidades de citao direta especificam as respostas verbais como unidades sob controle funcional. Ao fazermos uma distino enrte through e threw * ou entre Send me two e send me, too ** , estamos especificando ou as condies normais nas quais as respostas so dadas ou seus efeitos normais sobre o ouvinte. Nas citaes indiretas dar-se- maior nfase a essas variveis adicionais. He said that he would go [ Ele disse que iria ] permite apenas uma reconstruo muito grosseira de uma resposta verbal dada, pois apenas go sobreviveu do original possvel I will go [ Eu irei ], e no poderamos sequer ter certeza de que outra resposta caracterstica da mesma situao no tivesse sido dada efetivamente. Mas sabemos, com alguma certeza, de que tipo de situao se tratava e que tipo de efeito a observao pode ter causado.

    U m a U n id a d e d e C o m p o r t a m e n t o V e r b a l

    Do registro muscular ou acstico do comportamento verbal passamos, por meio da transcrio fontica, citao direta e indireta. Na medida em que efetuamos essa passagem, guardamos cada vez menos informaes sobre o exemplo especfico. Esta perda de detalhes pode ser tolerada se as propriedades essenciais previso continuam a ser descritas. Ao mesmo tempo, comeamos a acrescentar inferncias ou fatos sobre as condies nas quais a resposta foi dada. Na tarefa de prever ou controlar o comportamento verbal devemos, claro, levar em considerao tais variveis adicionais, mas seu status deve ser esclarecido. As unidades tradicionais do comportamento verbal nunca fazem uma distino clara entre o observado e o inferido. Vejamos, por exemplo, o conceito de palavra. Tal

    * Mantivemos no original os exemplos dados. Trata-se de palavras com a mesma pronncia com sentido e grafia diferentes, como em portugus mal e mau. (N. da T .)tl ** Frases com pronncia idntica mas significado diferente:

    Envie-me dois ; Envie-me, tambm. (N. da T .)

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  • como usado pelo leigo e por muitos lingistas, uma palavra pode ser uma simples alocuo ( Quero dizer-lhe uma palavra ou A ltima palavra ) ou uma subdiviso convencional de uma alocuo ( O que seria dito em duas ou trs palavras em ingls freqentemente dito com apenas uma em alemo ) ou um smbolo objetivo real ou suposto ( escolher uma palavra ou juntar palavras ) ou algo comum a dois ou mais modos de comportamento ( uma palavra pode ser dita ou escrita ). Com menos razo, ns at falamos da mesma palavra em duas lnguas (O Francs e o Ingls usam a mesma palavra para acordo: accord ), ou em dois momentos histricos da mesma lngua, ou em duas formas afins ( diamante a mesma palavra que brilhante ). s vezes palavra parece significar apenas um padro lxico ( a palavra rpido ).

    Aquilo de que necessitamos para nossos objetivos atuais e do qual a palavra tradicional se aproxima uma unidade de comportamento constituda por uma resposta de forma identificvel funcionalmente relacionada com uma ou mais variveis independentes. Em termos tradicionais, podemos dizer que necessitamos de uma unidade de comportamento definida em termos de forma e significado. A anlise do comportamento no-verbal esclareceu a natureza de tal unidade em condies de laboratrio nas quais a convenincia da unidade pode ser submetida a rigorosas verificaes. Uma extrapolao desse conceito para o campo verbal fundamental para a anlise representada pelo resto deste livro. Os tipos de comportamento nos quais estamos usualmente interessados tm, como vimos, um efeito sobre o meio, o qual por sua vez tem um efeito de retorno sobre o organismo. Tal comportamento pode ser distinguido das atividades primariamente relacionadas com a economia interna do organismo chamando as atividades que operam sobre o meio de comportamento operante. Qualquer unidade de tal comportamento convenientemente chamada de operante. Para muitos fins, o termo operante pode ser permutado com a tradicional resposta, mas os termos permitem-nos fazer uma distino entre um exemplo de comportamento (Fulano fumou um cigarro entre 2:00 e 2:10 horas ) e um tipo de comportamento (fumar cigarros ). O termo resposta muitas vezes usado para os dois casos, apesar de no trazer o segundo significado muito claro. A descrio de um exemplo de comportamento no requer a descrio das variveis relacionadas ou de uma relao funcional. O termo operante, por outro lado, est ligado com

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  • a previso e o controle de um tipo de comportamenio. Apesar de observarmos apenas exemplos particulares, estamos lidando com leis que especificam tipos.

    A distino d origem questo do formalismo. Uma resposta, como um exemplo, pode ser completamente descrita como uma forma de comportamento. Um operante especifica pelo menos uma relao com uma varivel o efeito que o comportamento caracteristicamente, se bem que no inevitavelmente, tem sobre o meio e no por isso uma unidade puramente formal. Uma especificao formal no pode ser evitada, desde que uma resposta s pode ser considerada um exemplo de operante por meio de uma identificao objetiva. Mas no basta a identificao. Como um exemplo de operante verbal, a resposta deve ocorrer como funo de certa varivel. Nesse sentido, podemos distinguir entre o operante rpido no qual a varivel controladora partilhada pelo operante veloz, e o operante rpido no qual a varivel controladora semelhante do operante fixo.

    Um problema sempre presente na anlise do comportamento verbal o da dimenso da unidade. As unidades lingsticas padronizadas so de dimenses variadas. Abaixo do nvel da palavra jazem razes ou, mais rigorosamente, as pequenas unidades significativas chamadas morfemas. Acima da palavra esto as frases, idiomas, sentenas, clusulas etc. Cada uma delas pode ter unidade funcional como operantes verbais. Uma partcula de comportamento to pequena quanto um nico som pode estar sob controle independente de uma varivel manipulvel. (Veremos exemplos de tais operantes verbais atomizados mais tarde.) Por outro lado, um amplo segmento do comportamento talvez uma frase como vasta maioria ou quando tudo foi dito e feito ou a verdade, toda a verdade e nada mais que a verdade ou toda uma sentena como quem muito quer tudo perde podem variar sob controle unitrio funcional semelhante. Apesar de partes desses operantes mais amplos terem a mesma forma que partes de outros operantes, ou mesmo de unidades completas, pode no haver interao funcional. Se isso pode parecer estranho para a anlise lingstica tradicional, preciso lembrar que o operante verbal exclusivamente uma unidade de comportamento do falante individual. A unidade funcional de um amplo operante e a extenso em que a presena desse operante no repertrio do falante pode afetar operantes de forma similar devem

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  • ser decididas a partir do estudo do comportamento deste falante. Nas prticas caractersticas de uma comunidade verbal, pode no ser possvel estabelecer a unidade funcional de uma ampla amostra semelhante de comportamento.

    Fizemos notar que um falante possui um repertrio verbal no sentido de que respostas de vrias formas de tempo em tempo, aparecem, em seu comportamento relacionadas com condies identificveis. Um repertrio, como uma alocuo de operantes verbais, descreve o comportamento verbal potencial de um falante. Perguntar onde est um operante verbal quando uma resposta no est sendo emitida o mesmo que perguntar onde est o movimento do joelho quando o mdico no est batendo na rtula. Um repertrio de comportamento verbal uma contruo conveniente. A distino entre operaate verbal e palavra pode ser comparada existente entre repertrio verbal e vocabulrio. Diz-se que uma pessoa possui um vocabulrio de tantas mil palavras quando estas so observadas em seu comportamento verbal durante certo perodo de tempo, Mas um vocabulrio muitas vezes encarado como um depsito de ferramentas inanimadas a partir do qual o falante faz uma seleo apropriada quando fala. O que se leva em considerao aqui no apenas que certas formas especficas de comportamento verbal so observadas, mas que elas so observadas cm circunstncias especficas. Estas circunstncias controladoras acrescentam um carter dinmico ao repertrio que falta ao vocabulrio.

    P r o b a b il id a d e d e R espo sta

    Algumas partes do repertrio verbal surgem mais provavelmente que outras. Esta probabilidade um conceito importante, se bem que difcil. Nosso dado bsico no a ocorrncia de uma dada resposta enquanto tal, mas a probabilidade de que ela venha a ocorrer num certo momento. Cada operante verbal pode ser concebido como tendo, sob circunstncias especficas, uma probabilidade de emisso que pode ser determinada emisso convenientemente chamada de sua fora. Baseamos a noo de fora em vrios tipos de evidncia.

    E m isso d e R espo st a

    Se a resposta emitida, o operante provavelmente forte. Todavia, a emisso um sinal melhor de fora se as circuns

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  • tncias so pouco comuns. Num tipo de lapso verbal, por exemplo, a resposta que se introduz ou que deforma o com- portamento (Ver Captulo 11 ) no apropriada para a situao imediata, mas apesar disso surge como especialmente forte. A resposta que aparece em circunstncias ambguas, difceis ou no-apropriadas, mas no um lapso, provavelmente forte pela mesma razo. O cientista que continua a falar sobre seu trabalho durante um emocionante jogo de futebol ou num barulhento trem de metr e o conversador compulsivo que no toma conhecimento de interrupes evidenciam repertrios especialmente fortes. Outras formas de comportamento verbal, por exemplo, o escrever apresentam evidncia do mesmo tipo.

    Entre as circunstncias pouco comuns que evidenciam fora podemos incluir estmulos verbais inadequados: do fato de uma pessoa ver seu nome numa relao escrita pouco clara ou muito sinttica, ou ouvir seu nome em meio a uma conversao barulhenta, podemos inferir a fora de seu nome em seu prprio repertrio.

    N v e l d e E n e r g ia

    A emisso de uma resposta constitui uma medida de tudo ou nada. Ela nos permite inferir a fora p.penas em termos da adequao das condies em que ocorre a emisso. Um segundo tipo de evidncia sugere-nos que a fora est numa escala contnua que vai de zero at um valor muito alto. Uma resposta pode ser executada com certa energia, que no deve ser confundida com fora como sinnimo de probabilidade. A energia parece variar com a probabilidade e muitas vezes aceita como medida de fora.5 Um enrgico e prolongado NO! no apenas uma resposta forte, mas sugere uma forte tendncia em responder, tendncia que no seria facilmente dominada por foras competitivas. Por outro lado, um tmido e breve NO aceito como um exemplo de um operante fraco, do qual inferimos alguma inadequao nas variveis independentes. Uma energia relativa permite inferncia semelhante. Da resposta um papagaio VERMELHO conclumos que a cor vermelha era de especial importncia para o falante, enquanto que de um PAPAGAIO vermelho inferimos a im-

    5. possvel que energia e probabilidade variem, uma em fun- ao da outra, apenas depois que a energia da resposta tenha sido diferencial mente reforada (ver Science and Human Behavior, p. 95).

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  • portncia especial do papagaio em si mesmo como uma varivel. Sob certas circunstncias pode ocorrer uma rpida mudana no nvel de energia, tal como o caso do Sr. Winkle nos Pickwick PaperSy o qual pouco antes de submergir num sonho alcolico gritou:

    Que venha mais uma garrafa, comeando com voz alta eterminando baixinho.

    Outras propriedades do comportamento verbal variam com o nvel de energia. Em nveis baixos, a parte da resposta que cai de tom chega at o sussuro. No outro extremo da linha outras propriedades topogrficas so afetadas. Provavelmente por causa do mecanismo do aparato da fala, o grau de intensidade do nvel de uma resposta tende a variar com a energia. Sendo o resto igual, quanto mais alta a resposta, mais alto o grau de intensidade. Por isso, o grau de intensidade pode s vezes ser tomado como indicador de fora. No comportamento de crianas pequenas, as observaes apropriadas a uma ocasio social emitidas em voz baixa e quase inaudvel, em contraposio aos gritos emitidos ao brincar, sugerem uma ordem de valores possveis. Outras formas de comportamento verbal apresentam em geral uma extenso mais limitada. No comportamento verbal escrito, algumas indicaes de fora podem ser encontradas no tamanho das letras, na presso da pena, nos itlicos etc. Alguma concesso a caractersticas comparveis se faz pelo modelo do tipo empregado. Estes so hoje expedientes convencionais, embora guardem algum trao de uma variao original da fora operante.

    V e l o c id a d e

    Outra propriedade do comportamento verbal emitido a velocidade com a qual as partes sucessivas da amostra se seguem uma s outras, ou a velocidade com que a resposta aparece depois que a ocasio para sua emisso tenha surgido. Admite-se em geral a implicao de que um comportamento verbal forte rpido e que hesitao revela pouca fora. Uma resposta pronta indica que o falante estava fortemente inclinado a d-la; uma demora na resposta nos leva a suspeitar que algo est possivelmente errado nas circunstncias controladoras. A fraqueza pode dever-se a um comportamento competitivo. Um homem absorvido na leitura de um livro pode demorar vrios segundos para responder a um chamado ou a uma per*

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  • gunta. Em crianas pequenas, nas quais o comportamento verbal franco porque ainda est sendo adquirido, atrasos de minutos so por vezes observados. Uma criana de 13 meses j havia adquirido a resposta Luz. Certa ocasio lhe foi mostrada uma luz e perguntaram-lhe: O que isso? Ela no deu qualquer resposta durante, pelo menos, um minuto e desistiu-se da tentativa de lev-la a responder. Ela j havia voltado a brincar quando a resposta surgiu claramente. Em comportamentos patolgicos pode haver atrasos ainda maiores. Um registro antigo de um caso se encontra em Head,6 que pediu a um de seus pacientes afasicos que contasse, isto , que repetisse a ordem numrica. O paciente no respondeu durante dez minutos, quando ento, subitamente, comeou: Um, dois, trs, quatro,. . . s vezes, inferimos a fora do comportamento verbal de algum com quem nos correspondemos a partir da velocidade com a qual uma carta respondida, e traos de velocidade na caligrafia proporcionam uma evidncia semelhante. Gestos frenticos demonstram velocidade na resposta em outra forma de comportamento.

    R e p e t i o

    Uma terceira indicao possvel de uma relativa fora a repetio imediata de uma resposta. Em vez de dizer NO! com grande energia algum pode dizer No! No! No! Uma forma de repetio indiscriminada est implicita na forma Mil vezes no!. Energia e repetio podem combinar-se. Ocasionalmente, pode-se observar o declnio da fora em respostas sucessivas, que vo paulatinamente diminuindo de energia, intensidade e velocidade: NO! no! no! A repetio aparentemente responsvel por uma classe de expresses que envolvem uma nfase especial; por exemplo: Venha, venha, venha, e Agora, agora. Expresses como again and again [muitas vezes], round and round [vezes sucessivas] e mi- lhas e milhas so complicadas por um princpio adicional, mas provavelmente revelam tambm o efeito da fora. Um engano muito, muito triste funciona no lugar de Um engano MUITO triste. A repetio pode ser diluda por um comportamento interposto. Na resposta, No, no , No foi nada, a fora excepcional da forma no evidente em sua repetio.

    6, Head, Henry: Aphasia (Nova Iorque, 1926).

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  • fcil superestimar a significao desses indicadores. Se duas ou mais propriedades do comportamento indicam a mesma coisa, elas devem variar juntas: mas energia, velocidade e repetio nem sempre satisfazem a essa exigncia. Classificamos as pessoas de acordo com a fora geral de seus comportamentos verbais, de uma forma que sugere que nossas medidas esto intimamente associadas. Por exemplo: a pessoa prolixa (quando prolixa) fala alto, depressa e se repete, enquanto o taciturno fala devagar, baixo e raramente repete. Mas nas respostas isoladas essas medidas se alteram por outras circunstncias e as excees devem ento ser explicadas. Por exemplo: uma resposta mal memorizada pode tardar por causa de sua fraqueza mas, durante a demora o carter aversivo da situao cresce e quando, finalmente, ela emitida, o nvel de energia pode ser alto. A aparente discrepncia entre retardamento e fora exige uma explicao especial.

    Outra complicao que nossas medidas nvel de energia, rapidez da resposta e mesmo repetio entram na construo de diferentes formas de resposta. Em ingls, isto no apresenta maior dificuldade. Nveis absolutos de altura e intensidade no so distintivos, nem tampouco so importantes os nveis de altura relativa. Mudanas de altura, todavia, distinguem diferentes tipos de alocuo. A energia da resposta no pode ser tomada como um indicador inevitvel de fora na medida que ela serve para tornar DE-sert (deserto) uma resposta diferente de de-SERT (sobremesa). O prolongamento de um som no significa necessariamente fora quando ele surge como quantidade, nem tampouco a reduplicao sempre um exemplo til de repetio de forma.

    Energia, velocidade e repetio so afetadas por condies especiais de reforo. Falamos mais alto com um surdo e mais devagar com um bobo e, nos dois casos, repetimos. A repetio pode tornar-se necessria num lugar barulhento. (Oua! Oua!) Quando nosso interlocutor est longe, aumentamos a energia e o nvel da voz e prolongamos cada som quando isso possvel. Uma resposta rpida e alta obter mais resultado numa situao competitiva, por exemplo, numa sala de aula. Podemos admitir condies especiais desse tipo na avaliao de qualquer medida dada apenas inferindo a fora operante, no do fato de que algum fala alto, mas do fato que esse algum fala mais alto do que o faria normalmente nas mesmas cir-

    L im it a e s da E v id n c ia d e F ora

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  • cunstncias. H algum consolo na averiguao de que mudanas de fora devidas a essas condies especiais freqentemente exageram a fora natural. Elas podem nos levar a confundir a importncia relativa de um indicador, mas no sua direo ou sinal.

    Infelizmente, outros tipos de conseqncia opem evidncias normais de fora. Valores extremos de qualquer uma dessas propriedades interferem no efeito sobre o ouvinte. A comunidade verbal, como uma coleo de ouvintes, fora a fala a um certo padro de velocidade, energia e repetio. Se a criana fala alto, corrigida. Se ela murmura, recomenda-se para que fale alto. Se suas palavras brotam aos tropeos, recomenda-se que seja mais ponderada. Repertir-se considerado m forma, mas a dupla negativa, que apenas o resultado inocente de um NO forte, considerado ilgico e no-gramatical.

    Mas se os indicadores so obscurecidos por esses interesses conflitantes, evidncias de fora continuam a sobreviver. Continuamos a fazer inferncias prticas acerca do comportamento do falante a partir de sua energia, velocidade e repetio. Um completo nivelamento com vistas monotonia impossvel de ser alcanado e a comunidade, de fato, se ope a isso. Em alguns tipos de comportamento verbal por exemplo, quando se l alto a varivel controladora gera um comportamento de um nvel razoavelmente constante de fora. Exceto no caso de respostas pouco familiares ou mal aprendidas, um texto normalmente no refora uma resposta mais do que outra. Mas uma srie de respostas de energia e velocidade uniformes no eficiente no que toca ao ouvinte. Por isso, o leitor levado a introduzir sinais esprios de fora. Ele l como se seu comportamento tivesse sido determinado, no por um texto, mas por um conjunto de variveis semelhantes s da fala real. Ora, significativo que ele faa isso modulando a intensidade, a energia e a velocidade. A partir desses indicadores de fora, o ouvinte infere um conjunto de condies determinantes. O leitor revelou uma boa interpretao.

    Nos tambm proporcionamos indicadores por outras razes. Se nos mostram uma apreciada obra de arte e exclamamos Que beleza! a velocidade e a energia da resposta no sero desperdiadas com o proprietrio. Podemos acentuar o efeito por meio de repetio: Que beleza, que beleza! Verdadeiramente, uma beleza! Isto percebido de forma to clara por qualquer pessoa que tornou-se parte de uma cultura simular

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  • caractersticas de fora, quer as variveis independentes apropriadas estejam presentes ou no quer o quadro proporcione ou no uma ocasio na qual tal comportamento verbal seria naturalmente forte. Dificilmente isso se daria se o significado de nossos indicadores tivesse sido inteiramente obscurecido por outras consideraes.

    F r e q n c ia A l t a

    Um terceiro tipo de evidncia a alta freqncia com que uma resposta aparece numa extensa amostra de comportamento verbal. Por exemplo: o nmero de vezes que um falante emite Eu, meu, mim, minha usado para indicar a fora de seu comportamento com relao a si mesmo como varivd controladora seu egocentrismo ou conceito. Outras respostas tm sido usadas para indicar outros temas. Com tal medida se pode mostrar que os interesses de um escritor mudam de ano para ano que ele se toma mais ou menos preocupado com o sexo, a morte ou com qualquer outro assunto. A prtica reconhece a noo geral de uma probabilidade varivel de resposta e a relevncia de uma alta freqncia ao medi-la, mas tais interpretaes dependem de certos pressupostos, que nem sempre so justificados.

    A contagem de palavras , muitas vezes, uma tentativa de desenvolver uma anlise puramente formal da varivel dependente isolada. O comportamento verbal estudado sem se levar em conta as circunstncias em que foi emitido. Mas, apesar de ser til saber que uma resposta de uma certa forma freqentemente emitida, tambm importante conhecer as condies predominantes. Desde que nossa unidade de anlise no puramente formal, no podemos ter certeza de que todos os exemplos de uma resposta so exemplos do mesmo operante, nem podemos ter certeza de que a freqncia no possa ser atribuda freqncia de ocorrncia de variveis de controle. No caso do egocentrismo, o prprio falante est sempre presente e a mudana de sua inclinao para falar sobre esse assunto pode ser significativa; mas uma resposta como neve deve variar, podemcs presumir, de acordo com a estao. Uma mudana de freqncia pode no refletir uma mudana de tendncia em falar sobre a neve quando ela est presente, mas apenas outras circunstncias. Mesmo a freqncia de respostas, tais como Eu, mim, meu e minha, pode variar como uma funo do ouvinte a quem se destina o comportamento

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  • verbal. A menos que saibamos que tal ouvinte permanece presente ou ausente, uma mudana de freqncia no pode ser usada para se inferir dela uma tendncia subjacente em emitir tais formas.

    Apesar de a alta freqncia ser um dado interessante e at mesmo satisfatrio, ela se afasta de nosso programa de lidar com o falante individual numa dada ocasio. Seus dados so mais relevantes para estudos de prticas caractersticas de uma dada comunidade verbal e, por isso, mais apropriados para as preocupaes comuns dos lingistas. Todavia, pode-se usar s vezes tais dados para inferir processos caractersticos do falante individual.

    P r o b a b il id a d e e E x e m p l o I solado

    Apesar de a lngua inglesa conter muitas expresses que sugerem que o conceito de probabilidade de uma resposta um conceito familiar e til, permanecem certos problemas a serem resolvidos para que ele possa ser empregado na anlise do comportamento. Em condies de laboratrio, a probabilidade da resposta facilmente estudada num organismo individual como freqncia de resposta. Em tais condies, mudanas de freqncia podem ser apontadas como funes precisas de variveis especficas, e tais estudos fornecem alguns dos fatos mais fidedignos disponveis sobre o comportamento. Mas precisamos caminhar do estudo das freqncias para a considerao da probabilidade de um fato isolado. O problema no apenas prprio do campo do comportamento. Ele bsico onde quer que os dados de uma cincia sejam probabilsticos, e isto significa as cincias fsicas em geral. Apesar de os dados sobre os quais tanto o leigo como o cientista fundamentam seus conceitos de probabilidade surgirem sob forma de freqncia, ambos querem falar acerca da probabilidade de ocorrncia de um nico acontecimento. Nos ltimos captulos deste livro, consideraremos a maneira pela qual diversas variveis, combinam num dado momento, contribuem para dar fora a uma dada resposta. Ao fazer isso, pode parecer que estejamos indo alm de uma interpretao da probabilidade em termos de freqencia; todavia, nossa evidncia para a contribuio de cada varivel baseia-se exclusivamente na observao das freqncias.

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  • VARIVEIS INDEPENDENTES E PROCESSOS CORRELATOS

    A probabilidade de que uma resposta verbal de determinada forma venha a ocorrer num dado momento constitui o dado bsico a ser previsto e controlado. Esta a varivel dependente numa anlise funcional. As condies e acontecimentos para os quais nos voltamos com vistas a conseguir previso ou controle as variveis independentes precisam agora ser consideradas.

    C o n d ic io n a m e n t o e E x t in o

    Qualquer operante, verbal ou de outro tipo, adquire fora e continua a ser mantido quando as respostas costumam ser seguidas por um acontecimento chamado reforo. O processo de condicionamento operante mais evidente quando o comportamento verbal adquirido inicialmente. Os pais cons- troem um repertrio de respostas na criana reforando muitos casos particulares de uma resposta. Obviamente, uma resposta deve aparecer pelo menos uma vez antes de ser fortalecida pelo reforo. Isto no quer dizer, todavia, que todas as formas complexas do comportamento do adulto estejam no repertrio vocal no-condicionado da criana. Os pais precisam esperar pelo surgimento da forma final. Respostas muito intrincadas podem ser construdas no comportamento de um organismo por meio de um processo que pode ser ilustrado pelo seguinte exemplo. Decidimos condicionar um pombo a caminhar em sua gaiola segundo um padro que obedecia ao modelo de um 8. Admitamos que o pombo esteja faminto e que podemos apresentar imediatamente a comida como um reforo conveniente. No precisamos esperar at que a figura 8 surja inteira para reforar o comportamento. Comeamos reforando qualquer seco isolada do comportamento que seja parte do modelo final. No caso de o pombo permanecer relativamente imvel, podemos ter que comear reforando o mais leve movimento. A ave torna-se ativa em pouco tempo, apesar de tal atividade no obedecer a qualquer padro determinado. Em seguida, suspendemos o condicionamento at que a ave comece a se mover numa direo como, por exemplo, o sentido do movimento dos ponteiros do relgio. O menor movimento nessa direo imediatamente reforado. Posteriormente, o reforo suspenso at que um movimento extenso

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  • seja executado. Movimentos circulares completos surgiro em breve. Isto constitui metade do resultado desejado. O operante ento parcialmente extinto, enquanto os reforos so suspensos at que a ave se mova em direo contrria ao movimento dos ponteiros do relgio. Pode ser necessrio reforar ocasionalmente um movimento feito segundo a direo dos ponteiros do relgio. Eventualmente a ave far voltas completas nas duas direes. As duas partes do padro escolhido esto agora disponveis, mas no ainda na ordem desejada. Podemos agora esperar por um padro correspondente ao numero 8 antes de proporcionar novo reforo. Em condies favorveis, o desempenho final relativamente complexo pode ser adquirido num curto espao de tempo.

    Ao ensinar uma criana a falar, as especificaes formais sobre as quais o reforo contingente so, no comeo, muito suaves. Qualquer resposta que se aproxime vagamente do com- portamento-padro da comunidade reforada. Quando tais respostas comeam a surgir com maior freqncia, passa-se a exigir maior preciso. Desta maneira, podem-se obter formas verbais muito complexas. (Veremos, no captulo 4, que h outras maneiras de se provocar um resposta complexa para que se possa refor-la. Este mtodo de aproximaes progressivas usualmente relevante apenas nos estgios iniciais de construo de um repertrio verbal.)

    Se as contingncias do reforo so, por qualquer razo, abrandadas ou relaxadas, as propriedades da resposta verbal sofrem uma mudana em outra direo. A degenerao das formas de comando militar um exemplo. Consideremos um sargento com um novo esquadro que deve ser condicionado a obedecer-lhe s ordens. O sargento comea com uma resposta verbal empregada pela comunidade verbal mais ampla, por exemplo, a resposta Marche! De incio, esta resposta precisa ser claramente enunciada, mas em breve o esquadro executa a resposta apropriada independentemente de muitas especificaes do comando, em parte porque outros aspectos da situa- ao comeam a controlar o comportamento. A forma da resposta ento se degenera de maneira caracterstica e eventualmente pode atingir o estgio de uma simples expulso forada de ar com alguma vocalizao, mas com pouca ou nenhuma torma ^ Apenas porque o comportamento apropriado do esquadro sobrevive deteriorao do comportamento do sargento que a forma final eficaz. O esquadro, enquanto grupo de ouvintes, foi progressivamente recondicionado. Um

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  • novo esquadro, todavia, pode trazer de volta uma forma de comportamento mais especfica por parte do sargento.

    As conseqncias do reforo continuam a ser importantes depois que o comportamento verbal foi adquirido. Sua principal funo manter a fora da resposta. A freqncia com que um falante emitir uma resposta depende, o resto sendo igual, da alta freqncia do reforo numa dada comunidade verbal. Se o reforo cessa, em virtude de alguma mudana de circunstncia, o operante enfraquece e pode mesmo desaparecer pela extino.

    Reforo operante, portanto, um simples meio de controlar a probabilidade de ocorrncia de determinada classe de respostas verbais. Se desejamos tornar a resposta de um dado tipo altamente provvel, providenciamos o reforo efetivo de muitos exemplos de tal tipo. Se desejamos elimin-la do repertrio verbal, providenciamos para que no haja mais reforo. Qualquer informao sobre a freqncia relativa de reforo caracterstica de uma comunidade verbal dada obviamente valiosa para a previso de tal comportamento.

    Co n t r o l e do E s t m u l o

    Uma criana adquire comportamento verbal quando vocalizaes relativamente no-padronizadas, reforadas seletivamente, assumem gradualmente formas que produzem conseqncias apropriadas numa dada comunidade verbal. Na formulao desse processo, ns necessitamos de mencionar estmulos que ocorram antes do comportamento a ser reforado. difcil, se no impossvel, descobrir estmulos que evoquem respostas vocais especficas na criana muito jovem. No h estmulo capaz de fazer uma criana dizer b ou a ou e da mesma forma que podemos lev-la salivao pingando limo em sua boca ou fazer suas pupilas se contrarem por meio de um raio de luz. A matria bruta a partir da qual o comportamento verbal construdo no elidida. Para reforar uma dada resposta preciso apenas esperar que ela ocorra.

    Todavia estmulos anteriores so importantes no controle do comportamento verbal. So importantes porque constituem uma contingncia de reforo de trs termos a qual pode ser expressa desta forma: na presena de um dado estmulo, uma dada resposta caracteristicamente seguida por um dado reforo. Tal contingncia constiui uma propriedade do meio.

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  • Quando ela prevalece, o organismo no s adquire a resposta que obtm o reforo, mas tambm torna-se mais propenso a emitir essa resposta na presena dos estmulos anteriores. O processo mediante o qual isto se constitui, chamado discriminao de estmulo, tem sido extensivamente estudado no comportamento no-verbal. Numerosos exemplos sero descritos em captulos posteriores.

    M otivao e E m oo

    Ainda que o reforo proporcione o controle de uma resposta, no usamos o reforo enquanto tal quando posteriormente exercemos controle. Reforando com acar, fortalecemos a resposta Acar! , mas a resposta s ser emitida quando a criana estiver faminta de acar. Assim sendo, controlamos a resposta, no por meio de reforos adicionais, mas privando ou saciando a criana com acar. Respostas no-verbais so controladas da mesma maneira. Quer uma porta seja aberta por meio de Tora a maaneta e empurre ou por meio de Fora!, ns tornamos a resposta mais ou menos provvel alterando a privao associada com o reforo de passar pela porta. Se a resposta foi reforada de vrias maneiras diferentes, podemos control-la mudando no a privao, mas o reforo iminente. Ns aumentamos a probabilidade de um homem vir a atravessar uma sala colocando um objeto comu- mente reforador na outra extremidade. Removendo tal objeto, ou melhor, colocando-o prximo do homem, reduzimos a probabilidade de que ele venha a atravessar a sala.

    Quando um operante adquirido, ele torna-se membro de um grupo de respostas que varia juntamente com a privao relevante. Um homem obtm um copo de gua de muitas maneiras: pegando um copo de gua, abrindo um torneira, vertendo gua de uma jarra, etc. O operante verbal gua! torna-se

    d s^se grupo quando reforado com gua. As probabilidades de todos os operantes assim reforados variam juntas. Respostas de todas as classes aumentam sua probabilidade de ocorrncia ^ quando privamos o homem de gua ou o levamos a perder gua por exemplo, induzindo-o a exerccios violentos alimentando-o COm sal, que deve ser eliminado, ou aumentando a temperatura do ambiente, provocando-lhe a transpirao. Por outro lado, tornamos tais respostas menos provveis de ocorrer pelo fato de levar o homem a beber grande quantidade de gua.

  • Tais operaes so designadas pelo leigo como criadoras ou mitigadoras de um estado de sede. Tal concepo apenas to vlida ou til na previso e controle quanto a observao sobre a qual repousa. Os acontecimentos importantes constituem as operaes que modificaram o estado de sede. Ao prever e controlar a resposta verbal gua! ns no mudamos diretamente a sede; ns iniciamos certas operaes que a modificaram. mais simples omitir qualquer referncia a um impulso e dizer que a probabilidade de uma resposta gua! pode ser modificada por meio dessas operaes.

    Suponhamos, todavia, que nosso falante, alm de beber gua, a tenha usado para apagar incndios. At termos verificado esse ponto, no podemos ter certeza de que uma resposta adquirida quando ele foi reforado com gua por estar sedento ser emitida quando o cesto de papis se incendiar. Se h alguma conexo funcional, ela deve ser buscada em certos fatos comuns ao beber gua e ao apagar um incndio. Se a resposta gua! foi reforada pela estimulao visual proporcionada pela gua antes do que pela gua na boca, e se tal estimulao desempenha um papel no controle do comportamento de apagar um incndio, ento a resposta adquirida apenas sob privao de gua pode ocorrer no caso de um desastre. O grupo de operaes que afetam a fora de gua! sugere, na linguagem comum alguma necessidade geral de gua mais do que sede. Mas teremos que examinar todos os comportamentos nos quais a gua desempenha um papel para definirmos essa necessidade. Podemos dizer que aumentamos a fora de qualquer resposta que tenha sido reforada com gua, inclusive a resposta verbal gua!, fortalecendo qualquer comportamento que requeira gua para sua execuo. (Em termos mais tcnicos, este comportamento seria descrito como qualquer comportamento sob o controle da gua como um estmulo discriminativo.)

    Co n t r o l e A ver siv o

    H outros tipos de conseqncias que alteram a fora de uma resposta verbal. O comportamento pode ser reforado pela reduo do estmulo aversivo, Quando um estmulo aversivo reduzido, chamamos o comportamento de fuga. Quando algumas condies que caracteristicamente precedem um estmulo aversivo so reduzidas, ns as chamamos de evitao. Assim, se a resposta verbal Pare! reforada quando acarreta

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  • a suspenso de uma injria fsica, a resposta um exemplo de fuga. Mas No toque em mim! pode ser reforado quando acarreta a suspenso de uma ameaa de tal injria de fatos que foram previamente seguidos de tal injria e que da por diante condicionaram estmulos aversivos e o comportamento ento chamado de evitao. Quando o falante teve uma histria de tal reforo, controlamos seu comportamento verbal criando as circunstncias apropriadas. Levamo-lo a dizer Pare! espancando-o, ou a dizer No toque em mim! ameaando-o com um espancamento.

    Uma descrio completa do comportamento verbal do falante individual leva-nos a observar outras variveis no campo da motivao e da emoo, mas os processos aqui so raros, se que isso ocorre alguma vez, e relacionam-se apenas com o comportamento verbal. Alguns pontos relevantes sero discutidos no captulo 8.

    O OUVINTE E O EPISDIO VERBAL TOTAL

    Nossa definio de comportamento verbal aplica-se apenas ao falante, mas o ouvinte no pode ser omitido de nossa descrio. O conceito tradicional de comportamento verbal, discutido no Captulo 1, admitia geralmente que certos processos lingsticos bsicos eram comuns ao falante e ao ouvinte. Processos comuns so sugeridos quando se admite que a linguagem acorda na mente do ouvinte idias presentes na mente do falante**, ou quando a comunicao tida como bem sucedida s quando uma expresso tem o mesmo sentido para o falante e para o ouvinte. Teorias do significado comumente sao aplicadas tanto ao falante como ao ouvin