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Skinner e Terapia Maly Delittil Silvia Groberman2 Escrever sobre este assunto é muito complexo. Em pri- meiro lugar porque Skinner não foi um terapeuta. Foi um ci- entista e um pensador completo e intrigante, cujo modelo teórico é muito maior e mais abrangente que uma análise terapêutica ou curativa. Sua preocupação e sua proposta eram que a Análise do Comportamento deveria ser utilizada para planejar e estruturar uma sociedade de modo que os indivíduos pudes- sem viver em contingências mais reforçadoras. A Ciência do Comportamento deveria ser utilizada com objetivo de pre- venção, mais que de solução de problemas. Nesse sentido, a Terapia Comporta mental não foi a sua proposta principal. Entretanto, como esta tem se desenvolvido muito e vem sendo aplicada com sucesso, vale a pena, a partir do que o próprio Skinner escreveu sobre Terapia, fazer alguns comen- tários. Para tanto, foram selecionados trechos de algumas de suas obras, como o disposto a seguir. Há um segundo estágio no processo terapêutico. O aparecimento do comportamento previamente punido na presença de uma audiência não-punitiva torna possível a extinção de alguns efeitos da punição. Esse é o principal resultado da terapia. Os estímulos automaticamente gerados pelo próprio comportamento do paciente tornam- se menos e menos aversivos e com menor probabilidade de gerar reações emocionais. O paciente sente-se menos errado, menos culpado ou menos pecador. Como conseqüência direta é menos provável que exiba as várias formas de comportamento operante que, como vimos, fornecem um meio de fugir desta estimulação autogerada (Skinner, 1953/2003, pA04). 1 Doutora IPUSP e Profa. da PUC/SP 2 Mestre em Psicologia da Educação PUC/SP. 3 No final de cada citação, haverá o número da página na qual se encontra e uma sigia. Esta sigla refere-se à respectiva obra de B. F. Skinner de onde a citação foi retirada, sendo: QR: Questões Recentes na Análise do Comportamento; CCH: Ciência e Comportamento Humano; CV: Comportamento Verbal e 5B: Sobre o Behaviorismo. 59

Skinner e Terapia

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Skinner e TerapiaMaly Delittil

Silvia Groberman2

Escrever sobre este assunto é muito complexo. Em pri­meiro lugar porque Skinner não foi um terapeuta. Foi um ci­entista e um pensador completo e intrigante, cujo modeloteórico é muito maior e mais abrangente que uma análiseterapêutica ou curativa.

Sua preocupação e sua proposta eram que a Análisedo Comportamento deveria ser utilizada para planejar eestruturar uma sociedade de modo que os indivíduos pudes­sem viver em contingências mais reforçadoras. A Ciência doComportamento deveria ser utilizada com objetivo de pre­venção, mais que de solução de problemas. Nesse sentido, aTerapia Comporta mental não foi a sua proposta principal.

Entretanto, como esta tem se desenvolvido muito e vemsendo aplicada com sucesso, vale a pena, a partir do que opróprio Skinner escreveu sobre Terapia, fazer alguns comen­tários. Para tanto, foram selecionados trechos de algumasde suas obras, como o disposto a seguir.

Há um segundo estágio no processo terapêutico. Oaparecimento do comportamento previamente punido napresença de uma audiência não-punitiva torna possível aextinção de alguns efeitos da punição. Esse é o principalresultado da terapia. Os estímulos automaticamentegerados pelo próprio comportamento do paciente tornam­se menos e menos aversivos e com menor probabilidadede gerar reações emocionais. O paciente sente-se menoserrado, menos culpado ou menos pecador. Comoconseqüência direta é menos provável que exiba as váriasformas de comportamento operante que, como vimos,fornecem um meio de fugir desta estimulação autogerada(Skinner, 1953/2003, pA04).

1 Doutora IPUSP e Profa. da PUC/SP

2 Mestre em Psicologia da Educação PUC/SP.

3 No final de cada citação, haverá o número da página na qual se encontra e umasigia. Esta sigla refere-se à respectiva obra de B. F. Skinner de onde a citaçãofoi retirada, sendo: QR: Questões Recentes na Análise do Comportamento;CCH: Ciência e Comportamento Humano; CV: Comportamento Verbal e 5B:Sobre o Behaviorismo.

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Na consolidação do vínculo terapêutico, a empatia docliente pelo terapeuta é fundamental. Em havendo empatia,a relação da díade terapêutica é reforçada e o terapeutapassa a ser modelo para aprendizagem de novos comporta­mentos. Esta aprendizagem inclui a emissão de comporta­mentos que já foram punidos e, devido a este fato, extintosdo repertório do cliente. Cabe ao terapeuta, enquanto audi­ência não-punitiva, criar condições para que o cliente volte aapresentar tais comportamentos livres de reações emocio­nais e aprenda formas de se comportar em seu ambientenatural que gerem conseqüências reforçadoras.

O poder inicial do terapeuta como agente controlador seorigina do fato de que a condiçãodo pacienteé aversivae de que, portanto, qualquer promessa de alívio épositivamente reforçadora (Skinner, 1953/2003,pA02).

Uma pessoa pode procurar terapia por diversos moti­vos; mas todos eles remetem a situações ligadas a contin­gências aversivas. O início do processo terapêutico em si tam­bém pode ser aversivo ao cliente, como demonstram algumasverbalizações com as quais o terapeuta pode se deparar noinício da terapia: "Estou aqui porque não sei mais o que fazer,mas não me sinto à vontade"; "Só vim porque as pessoas a mi­nha volta insistiram muito, mas na verdade não sei direito o por­quê"; "Eu não acredito muito neste negócio de terapia, mas nãotive alternativa"; "Já ouvi falar da terapia e nunca pensei que umdia iria precisar, mas enfim, aqui estou ... "; "Já vou dizendo logoque estar aqui não me agrada ..."; "Conheço pessoas que fazemterapia e gostam muito, então vim ver o que ela pode fazer pormim". Nota-se que em todas estas verbalizações existe al­gum grau de aversividade: pode ser em relação à própria te­rapia ou à vida do cliente. Portanto, o terapeuta deve consi­derar que estar na sessão, muitas vezes, não é fácil para ocliente e que ser uma figura reforçadora no início do processoterapêutico é fundamental para que o cliente volte outras ve­zes e o vínculo possa ser estabelecido e fortalecido.

O terapeuta usa qual for o poder limitado queoriginalmente possuipara assegurar-sede que o pacientecontinuará a ter contato com ele - que o pacientevoltarápara continuar o tratamento. Contudo, à medida que otratamento progride seu poder aumenta. Assim comoum sistema social organizadose desenvolve,o terapeutase torna uma importante fonte de reforço. Se temsucesso em fornecer alívio, o comportamento dopaciente de voltar a ele em busca de auxílio seráreforçado. A aprovação do terapeuta pode vir a serespecialmente eficiente. (Skinner, 1953/2003,pA02)

Fortalecer o comportamento de voltar para a próximasessão é o primeiro desafio que o terapeuta enfrenta com

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um novo cliente. Isto porque, procurar um terapeuta talveznão seja tão agradável, já que é sinal de que as coisas nãovão bem e que a pessoa não está dando conta sozinha dasua vida. Assim, em todos os sentidos, a situação é aversiva.Partindo deste ponto de vista, o terapeuta precisa ser umafigura reforçadora e acolher o cliente, principalmente, no iní­cio do processo terapêutico, pelo fato de muitas vezes, oestar lá já ser aversivo para ele.

Desta forma, reforçar o comportamento do cliente deretornar na próxima sessão é o objetivo imediato do terapeutapara que o vínculo possa ser construído gradativamente.Conforme as palavras de Skinner, "... a aprovação do terapeutapode vir a ser especialmente eficiente" uma vez que reforçaráo retorno do cliente à terapia, mesmo quando o assunto abor­dado for aversivo. Percebe-se que o poder de controle doterapeuta é muito grande e ele deve usar esta variável comoum reforçador positivo para o seu cliente.

Do ponto de vista do paciente,o terapeuta em princípioéapenas mais um membro de uma sociedade que temexercidoexcessivocontrole. É tarefa do terapeuta colocar­se em situação diferente (Skinner, 1953/2003, pA03).

Um analista do comportamento discordará de uma pes­soa que diga que o indivíduo é totalmente livre para fazeropções na vida. Isto porque há agências de controle (reli­gião, governo, terapia, etc.) que, como o próprio nome diz,controlam o comportamento do homem. Para os analistas docomportamento, o homem é livre na medida em que é capazde identificar quais as variáveis que controlam o seu compor­tamento e atuar sobre elas. De certa forma, é autônomo,mas isto não implica em dizer que é totalmente livre.

Voltando então à citação, pelo fato da psicoterapia seruma agência de controle, é claro que o terapeuta é "... maisum membro de uma sociedade que tem exercido excessivo con­trole", mas é função do terapeuta, como apontado tambémpelo autor, mudar esta concepção que o cliente tem a seurespeito e se tornar uma figura reforçadora, colocando-seem "situação diferente". Mais uma vez, percebe-se que oterapeuta é central para a progresso do processo terapêutica,e que ser uma figura reforçadora permeia todos os momen­tos da terapia: desde reforçar o cliente a voltar na próximasessão, como aumentar cada vez mais o seu poder de con­trole sobre o cliente e, desta forma, consolidar e aprofundaro vínculo terapêutico.

À medida que o terapeuta gradualmente se estabelececomo uma audiência não-punitiva, o comportamentoque até então foi reprimido começa a aparecer norepertório do paciente (Skinner, 1953/2003, pA03) ..

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Mais uma vez, Skinner refere-se à figura do terapeutacomo sendo fator essencial para o progresso da terapia. Con­forme discutido em citação anterior; o próprio terapeuta é mem­bro pertencente de uma sociedade com excessivo controle etambém figura controladora, já que a psicoterapia não deixa deser uma agência de controle. O ponto está em que o terapeutadeve utilizar o seu poder de controle de uma forma contrária aoque a sociedade está acostumada; deve atuar como alguémreforçador e não punitivo, para ser visto como modelo a serseguido. Tal fato só aumenta o poder de controle do terapeuta- no sentido positivo do termo - e o seu valor para o cliente.

Desta forma, o terapeuta se consolida como uma audi­ência não-punitiva e, de acordo com a citação em questão,"... o comportamento que até então foi reprimido começa a apa­recer no repertório do paciente".

O paciente também pode começar a descrevertendências atuais para se comportar de modo punível(Skinner, 1953/2003, p.403).

Uma vez que o terapeuta passa a ser considerado pelocliente como uma audiência não punitiva, surge a oportunida­de do cliente se comportar de modo punível. Isto quer dizerque o cliente passa a emitir comportamentos que, em ambien­te natural, seriam ou já foram punidos. Levando em conta ocaráter planejado da terapia, o terapeuta deve arranjar con­tingências para que esses comportamentos passíveis de pu­nição em ambiente natural sejam emitidos na sessão, paraque possam ser discutidos com o cliente, e formas maisadaptativas sejam ensinadas. O objetivo da terapia, nestecaso, é ensinar ao cliente comportamentos alternativos quepossam ser emitidos em contingências similares, de modo queo cliente seja reforçado, e não punido, por apresentá-Ios.

Se, em face desse comportamento, o terapeuta tiversucesso na manutenção de sua posição como nãopunidor, o processo de redução do efeito da puniçãose acelera (Skinner, 1953/2003, p.403).

É de se esperar que, com o progresso do processoterapêutico, o valor reforçador da figura do terapeuta au­mente e, desta forma, generalize-se para tudo o que diz res­peito à terapia. Assim, o cliente passa a encarar as sessõesde terapia como um local relativamente "livre" de punições,no qual pode se comportar da maneira que julgar adequada,sem sofrer maiores conseqüências aversivas. É claro que oterapeuta irá trabalhar com o cliente a noção de limites, sen­do esta noção determinada diretamente pelas conseqüênci­as dos seus próprios comportamentos. Tal fato remete à im­portância do processo de discriminação, isto é, o cliente sa­ber discriminar em que situação pode ou não emitir determi­nado comportamento e qual será a sua conseqüência.

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Portanto, se o terapeuta conseguir se manter comouma audiência não-punitiva e gradativamente solidificar o vín­culo com o cliente, cada vez mais ele se sentirá à vontadepara emitir comportamentos antes reprimidos em ambientenatural. Dito de outra forma, os comportamentos aprendidosna sessão de terapia, que foram anteriormente punidos, po­dem, a partir de uma adequada análise funcional, ser nova­mente emitidos pelo cliente em seu cotidiano e, assim, pas­sar a fazer parte de novas contingências.

Se, contudo, o terapeuta se torna crítico, ou pune deoutra forma, ou ameaça punir, ou se o comportamentopreviamente punido começa a ser emitido muitorapidamente, o processo pode cessar repentinamente.A condição aversiva que se origina para reverter atendência algumas vezes se denomina resistência(Skinner, 1953/2003, pA04).

A relação terapêutica é central para o andamento daterapia. Nesta relação, a figura do terapeuta como estímulodiscriminativo para possíveis respostas que, se emitidas, se­rão provavelmente reforçadas, é importante para que o cli­ente possa apresentar comportamentos que, em outros am­bientes, já foram ou seriam punidos. Neste sentido, oterapeuta está associado a reforça dores positivos. Contudo,se o terapeuta se constitui numa figura punitiva, apresen­tando comportamentos de crítica e desaprovação, é associa­do à condições aversivas e torna-se sinalizador de eventospassíveis de punição.

Assim, ser uma audiência não-punitiva e possibilitar aemissão de comportamentos que já foram punidos em ambi­ente natural, é o segredo para o sucesso da terapia; casocontrário, de acordo com Skinner, "o processo pode cessar re­pentinamente", gerando a "resistência", que implica na que­bra do vínculo terapêutico e, conseqüentemente, o términoda terapia.

O objetivo da psicoterapia em geral é encarado comoa liberação do comportamento reprimido e, por isso,perturbador - de certa forma, há uma analogia com atarefa da remoção de um tumor, de drenagem de umferimento infectado ou da administração de um laxante(Skinner, 1957/1978, p.477).

O cliente que procura terapia está passando por mo­mentos aversivos em sua vida. Para se "curar" deste "qua­dro", procura a ajuda de um profissional, que na sua concep­ção, poderá fornecer alívio imediato ao indicar formas de com­bater as situações que causam desconforto. Neste sentido, oterapeuta pode ser comparado a um médico que tem comotarefa remover o tumor de um paciente e melhorar as suas

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condições de saúde. O paciente procura o médico para se "li­vrar" de algo que pode comprometer o seu estado físico; ocliente procura o terapeuta para se "libertar" de algo que, emprincípio, é aversivo e não está sendo funcional na sua vida.Ambos buscam no profissional apoio e esperança de melhorana sua condição de vida atual. Conforme a citação do autor,cabe ao terapeuta criar condições para que o cliente possaliberar os comportamentos reprimidos, sendo necessário paratanto, um ambiente acolhedor, livre de punições.

Novamente, fica evidente que a figura do terapeutacomo audiência não-punitiva, é uma variável importante parao bom andamento da terapia.

A psicoterapia é particularmente importante quando ascontingências responsáveis por um informe verbal sãotão poderosas que a própria pessoa não sabe que "estácom medo". O terapeuta "a auxilia a descobrir seutemor". Quando ela age corajosamente embora sentindomedo, é o tipo de pessoa que é nesse momento. Nãoprecisamos presumir que haja uma pessoa temerosaemboscada nas profundezas (Skinner; 1974/2003, pA03)

Na terapia, o cliente aprende a identificar que seusmedos e problemas são o resultado de sua história de apren­dizagem e não de uma entidade ou de uma personalidadeou caráter interior, além de aprender outra forma deexperienciar seus temores e enfrentá-Ios.

O psicoterapeuta que tenta levar seu paciente acompreender-se está presumivelmente salientandorelações causais de que este ainda não havia tomadoconsciência (Skinner, 1974/2003, p.150).

Na situação de terapia o terapeuta cria condições paraque o cliente discrimine sob que contingênciasdeve atuar parachegar a mudar os padrões que considera inadequados parasua vida. A terapia consiste não em dar a solução pronta parao cliente, mas em mudá-Io de modo que ele seja capaz de des­cobrir qual é a solução. Neste caso, pode-se relacionar o en­contrar a solução de seu problema ao aprender por contingên­cias como mais efetivo do que aprender sob controle de regras.

Supõe-se amiúde que a terapia do comportamento éexclusivamente uma questão de idear contingênciasreforçadoras, mas ela também inclui, de forma bastanteapropriada, dar ao paciente avisos, conselhos, instruçõese regras a serem seguidas (Skinner; 1974/2003, p.150).

Uma das tarefas importantes do terapeuta é criar con­dições para que o cliente entre em contato com as contin­gências de sua vida cotidiana e, a partir delas, formule suaspróprias regas. A regra básica que o terapeuta ensina aoseu cliente é "dê uma chance às contingências'~.

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A psicoterapia é, freqüentemente, um espaço paraaumentar a auto-observação, para "trazer àconsciência" uma parcela maior daquilo que é feito edas razões pelas quais as coisas são feitas. Tanto napsicoterapia como na literatura, a análise dapersonalidade é freqüentemente denominada "buscado eu verdadeiro". Quando o comportamento é punido,em geral ele é escondido, tanto da própria como deoutras pessoas. Nesse caso, "verdadeiro" podesignificar "primitivo", porque o que é sentido é devidotanto à seleção natural como às contingênciasreforçadoras - comida, sexo e agressão - similares àsque devem ter desempenhado um papel predominantena seleção natural (Skinner, 1989/2003, p.46-47).

O cliente procura a terapia por vivenciar alguma situa­ção aversiva em sua vida e por não dar conta de resolvê-Iasozinho. Assim, espera que o terapeuta possa lhe fornecermeios para lidar com a situação e, assim, ter uma qualidadede vida melhor.

Partindo desta concepção, a terapia tem como objeti­vo ensinar ao cliente comportamentos que sejam adaptativosàs contingências de sua vida. Para tanto, torna-se necessá­rio iniciar esta aprendizagem pela auto-observação, com aqual o cliente aprende a identificar as variáveis que contro­lam o seu comportamento. Neste sentido, a auto-observa­ção é o passo inicial para uma mudança no comportamento.A partir do momento que o cliente está apto a se auto-obser­var e identificar o que o controla, pode descrever a contin­gência em questão e verificar o que não está adequado; amudança é a etapa seguinte.

Assim, quando Skinner se refere à psicoterapia comosendo um espaço para aumentar a auto-observação e trazerà consciência o porquê de as coisas serem feitas, em outraspalavras, ele quer dizer que a terapia é um lugar para o cli­ente aprender a discriminar as variáveis que o controlam e,desta forma, mudar o que julgar não ser ideal. Dito de outraforma, o cliente aprende a fazer a análise funcional das con­tingências que vivencia no cotidiano.

Os psicoterapeutas devem falar com seus clientes e, comraras exceções, fazem-no na linguagem cotidiana, que éfortemente marcada por referências a causas internas _"Eu comi porque estava com fome", "Fiz isso porque sabiacomo", e assim por diante (Skinner; 1974/2003, p.150).

Se o terapeuta deve ser uma figura reforçadora para ocliente, de certa forma, atua como modelo para a aprendiza­gem de novos comportamentos. No contexto de terapia, mo­delo significa uma pessoa que tem prestígio e valor para ocliente e que, portanto, seus comportamentos poderão ser

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seguidos e/ou imitados. Partindo deste ponto de vista, oterapeuta deve analisar detalhada mente os comportamen­tos a serem emitidos, levando sempre em consideração oobjetivo-alvo. O terapeuta começa falando na linguagem docotidiano do cliente para favorecer a formação de um vínculoe, gradualmente, vai modificando sua linguagem. Uma carac­terística da terapia comportamental é seu aspecto didáticoou pedagógico, como na seguinte interação verbal:

Quando o cliente diz: "Meu jeito de ser tímido é porquena família todos são assim também ... ".

O terapeuta pode responder: "O seu jeito de ser, isto éo seu comportamento, foi aprendido ao longo de sua vida, narelação com a sua família e eles devem mesmo ter comporta­mentos como o seu".

"Tanto na instrução quanto na psicoterapia, osreforçadores correntes (com freqüência planejados)são arranjados para fortalecer o comportamento queo estudante e o cliente acharão útil" (p.97, QR).

Skinner (1968/1972) define o ensino como "um arranjode contingências sob as quais os alunos aprendem" (p. 72). Ar­ranjar contingências, nesta perspectiva, significa.planejar, pro­gramar atividades. Relacionar ensino apenas à educação for­mal é mero engano, uma vez que a terapia também tem umcaráter de ensino-aprendizagem, em que o terapeuta é oprofessor e o aluno é o cliente. Assim, o sentido dado porSkinner ao ensino relacionado à educação formal cabe à te­rapia, e deste modo, o terapeuta deve arranjar contingênci­as para promover a aprendizagem do seu cliente e o apare­cimento de comportamentos, que em ambiente natural, de­morariam a ocorrer ou não seriam adquiridos. Ao planejar, oterapeuta deve identificar quais comportamentos devem' serestabelecidos e com que respostas é possível contar, ou seja,o repertório comporta mental do seu cliente. Neste sentido,conhecer o cliente é fundamental no processo terapêutico,bem como definir os objetivos da terapia.

Observa-se nas diferentes citações de Skinner algunsaspectos constantes: a situação terapêutica como aquela emque há uma audiência não punitiva, o terapeuta como modeloe fonte de reforçadores sociais, a possibilidade de aprendiza­gem de novos padrões de comportamento. Na realidade, aTerapia Comportamental tem a característica de, justamentepor ser baseada nos princípios de aprendizagem propostospor Skinner, ser uma terapia baseada não no mistério, na es­peculação ou em teorias mentalistas, mãs em dados objetivose empíricos, em hipóteses testadas; isto é, na ciência.

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REFERÊNCIAS

Skinner, B. F. (2003) Ciência e Comportamento Humano. (J. C.Todorov & R. Azzi, Trad.) 1P ed. São Paulo: Martins Fontes.(Trabalho original publicado em 1953).

Skinner, B. F. (1978) O Comportamento Verbal. (M. P.Villalobos,Trad.) São Paulo: Cultrix. (Trabalho original publicado em 1957).

Skinner, B. F. (1972) Tecnologia do Ensino. (R. Azzi, Trad.) SãoPaulo, SP: Editora EPU. (Trabalho original publicado em 1968).

Skinner, B. F. (1974) Sobre o Behaviorismo. (M. P. Villalobos,Trad.) (8a ed). São Paulo: Cultrix. (Trabalho original publicado em1964) .

Skinner, B. F. (2003) Questões Recentes na AnáliseComportamental. (A. L. Néri, Trad.). (4a ed.) Campinas: PapirusEditora. (Trabalho original publicado em 1989).

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