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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP Ana Paula Perovano dos Santos Silva A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número pela Criança MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA São Paulo 2012

São Paulo 2012 Paula Perovan… · PEROVANO, Ana Paula. A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número pela Criança

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP

Ana Paula Perovano dos Santos Silva

A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número

pela Criança

MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

São Paulo

2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP

Ana Paula Perovano dos Santos Silva

A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número

pela Criança

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para obtenção do título de MESTRE EM

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, sob a orientação da

Professora Doutora Sandra Maria Pinto Magina.

São Paulo

2012

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Banca Examinadora

________________________________________

________________________________________

________________________________________

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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta

Dissertação por processos de foto-copiadora ou eletrônicos.

Assinatura: __________________________________ Local e Data: ______________

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Dedico esse trabalho a:

Fernando Santos, meu esposo e Giovanna Perovano

minha querida filha que me acompanharam nos

momentos de conquistas e dificuldades.

Ailton Galdino, meu pai, que mesmo distante se fez

presente nessa jornada.

Sandra Magina, minha orientadora que iluminou os

meus passos na construção dessa dissertação.

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Agradecimentos

Com a ideia de inovar no momento de agradecer as pessoas que me

auxiliaram, seja direta ou indiretamente, na trajetória desta

dissertação, optei por utilizar uma nuvem de tags, ou nuvem de

palavras, tão comum em web sites.

Na nuvem aparecem em maior proeminência as palavras que mais

ocorreriam se fossem escritas ao longo de um texto, em meu caso,

texto de agradecimento.

Agradeço a CAPES pelo apoio com a bolsa flexibilizada.

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RREESSUUMMOO

PEROVANO, Ana Paula. A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número pela Criança. . 183 p. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012. O presente estudo tem por objetivo investigar que concepção(ões) está(ão) presente(s) quando professores se propõem trabalhar o conceito de número com alunos do 1º e 2º ano do Ensino Fundamental de Escolas de Jequié – BA. Para tanto buscamos aporte teórico que permite analisar o número sob a perspectiva: da Educação Matemática enfatizando as ideias de Piaget e Kamii e das Políticas Públicas traduzidas neste trabalho pelos documentos oficiais: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) e Diretrizes Curriculares do Estado da Bahia. Para tratar a ótica do professor agregamos a essa reflexão, os conhecimentos, saberes e concepções dos professores. Desenvolvemos uma pesquisa na abordagem qualitativa de cunho descritivo em que participaram como sujeitos 13 professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental de três escolas da Cidade de Jequié – BA. A coleta dos dados foi efetuada por meio de questionário e entrevista semiestruturada. Como resultado desse processo de reflexão, constata-se que as professoras têm a concepção de que número é sinônimo de numeral; percebemos, também, indícios da concepção empirista, e aproximações das tendências formalista clássica e socioetnocultural. A confusão do objeto matemático com sua representação pode se refletir no momento do ensino implicando numa limitação do trabalho docente, restringindo o trabalho com os número às atividades de leitura e escrita de numerais. Esperamos contribuir no sentido de trazer reflexões aos professores, em relação à construção do conceito de número pela criança.

Palavras-chave: Conceito de Número; Ensino Fundamental; Professor dos Anos

Iniciais.

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ABSTRACT

PEROVANO, Ana Paula. The Conception of Early Years Teachers of Elementary School on the Constrction of the Concept of Number the Child. 183 p. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

The present study aims to investigate concepts that are present when teachers work proposes the concept of number with students from 1st and 2nd years of elementary school of the Jequié – BA. To this end, we theoretical uses a framework that allows us to analize the number perspective: Mathematics Education emphasizing the ideas of Piaget and Kamii and Public Policy for thjis work translated official documents, PCN, RCNEI and Curriculum Guidelines and the State of Bahia. To address the perspective of the teacher we add to this reflection, knowledge and conceptions of knowledge teachers. Developed research in a descriptive qualitative approach in with 13 teachers participated as subjects of the early years of elementary school for three scholls in the city of Jequié – BA. Data collection was made though a questionnaire and semistructured interview. As a results of this process of reflection, it appears that the teachers have the idea that number is synonymous with the numeral, perform, too empirical evidence of design, trends and approaches of classical and formalistic socioenocultural. That confusion may be reflected upon education implying a limition of teaching, restricting the number to work with the activities of reading and writing numerals. Hope helping bringing ideas to teachers in relation to the construction of the concept of number for the child.

Keywords: concept of number; elementary school; teacher of early years.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 – A síntese operatória entre o caráter cardinal e ordinal do número ....... 27 Figura 1.2 – A classe operatória: síntese entre os dois caracteres – compreensão

e extensão ............................................................................................ 32

Figura 1.3 – A diferenciação entre as relações simétricas e assimétricas ............... 33

Figura 1.4 – Níveis de Abstração .............................................................................. 39

Figura 1.5 – Indicação do número 3 como quantidade de elementos do conjunto .. 43

Figura 1.6 – Disposição das bolinhas ....................................................................... 44

Figura 1.7 – A palavra oito usada para se referir ao grupo inteiro de objetos .......... 46

Figura 1.8 – Representando a ideia do oito com símbolos e sinais ......................... 48

Figura 1.9 – Exemplo de uma rede de relações numéricas ..................................... 52

Figura 2.1 – Organização Curricular para o 1º ano do Ensino Fundamental de Nove anos ............................................................................................. 64

Figura 4.1 – Questões 1 a 7 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil .......... 111

Figura 4.2 – Questões 8 a 12 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras .......................................... 112

Figura 4.3 – Questão 13 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras ...................................... 112

Figura 4.4 – Questão 14 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras ......................................... 113

Figura 4.5 – Questões 15 a 18 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras .......................................... 113

Figura 4.6 – Questões 19 a 21 do Instrumento Diagnóstico, referente à concepção das professoras .................................................................. 114

Figura 4.7 – Questões 22 e 23 do Instrumento Diagnóstico, referente à concepção das professoras .................................................................................... 114

Figura 4.8 – Questões 1 e 2 do Instrumento Diagnóstico, referente ao entendimento de número na visão das professoras ............................ 115

Figura 4.9 – Questão 3 do Instrumento Diagnóstico, referente às situações de Ensino ................................................................................................... 115

Figura 5.1 – Extrato do questionário da professora Bromélia ................................... 129

Figura 5.2 – Extrato do questionário da professora Hortência ................................. 129

Figura 5.3 – Extrato do questionário da professora Tulipa ....................................... 129

Figura 5.4 – Extrato do questionário da professora Açucena ................................... 130

Figura 5.5 – Extrato do questionário da professora Margarida ................................. 130

Figura 5.6 – Extrato do questionário da professora Rosa ........................................ 130

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Figura 5.7 – Extrato do questionário da professora Acácia ...................................... 136

Figura 5.8 – Extrato do questionário da professora Érica ......................................... 137

Figura 5.9 – Extrato do questionário da professora Orquídea .................................. 138

Figura 5.10 – Extrato do questionário da professora Margarida ............................... 138

Figura 5.11 – Extrato do questionário da professora Açucena ................................. 139

Figura 5.12 – Extrato do questionário da professora Orquídea ................................ 139

Figura 5.13 – Extrato do questionário da professora Acácia .................................... 142

Figura 5.14 – Extrato do questionário da professora Angélica ................................. 143

Figura 5.15 – Extrato do questionário da professora Violeta .................................... 144

Figura 5.16 – Extrato do questionário da professora Açucena ................................. 145

Figura 5.17 – Extrato do questionário da professora Hortência ............................... 145

Figura 5. 18 – Extrato do questionário da professora Magnólia ............................... 146

Figura 5.19 – Extrato do questionário da professora Bromélia ................................. 147

Figura 5.20 – Extrato do questionário da professora Hortência ............................... 148

Figura 5.21 – Extrato do questionário da professora Dália ....................................... 149

Figura 5.22 – Extrato do questionário da professora Acácia – Comparação ........... 150

Figura 5.23 – Extrato do questionário da professora Dália – Propriedade Numérica 150

Figura 5.24 – Extrato do questionário da professora Dália ....................................... 151

Figura 5.25 – Extrato do questionário da professora Orquídea ................................ 152

Figura 5.26 – Extrato do questionário da professora Açucena ................................. 153

Figura 5.27 – Extrato do questionário da professora Acácia .................................... 154

Figura 5.28 – Extrato do questionário da professora Magnólia (seriação) ............... 154

Figura 5.29 – Extrato do questionário da professora Tulipa (sequenciação) ........... 155

Figura 5.30 – Extrato do questionário da professora Acácia (classificação) ............ 155

Figura 5.31 – Extrato do questionário da professora Açucena (comparação) .......... 156

Figura 5.32 – Extrato do questionário da professora Tulipa ..................................... 157

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LISTA DE QUADROS

Quadro 2.1 – Conteúdos de Matemática listados por série ...................................... 77

Quadro 3.1 – Teorias sobre os ciclos vitais dos professores ................................... 95

Quadro 3.2 – Contrastes entre formação e desenvolvimento profissional ............... 98

Quadro 4.1 – Quantidade de alunos matriculados por escola .................................. 104

Quadro 4.2 – Quantidade de professoras por escola ............................................... 107

Quadro 4.3 – Sujeitos da investigação por série e escola que leciona .................... 108

Quadro 5.1 – Atuação das professoras, no passado e presente, por ano escolar ... 122

Quadro 5.2 – Quantidade de professoras por quantidade de aulas semanais de Matemática ......................................................................................... 126

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 5.1 – Distribuição das professoras por idade................................................ 118

Gráfico 5.2 – Distribuição das professoras por tempo de serviço............................. 120

Gráfico 5.3 – Categorias das respostas das professoras à questão “Como você

explicaria para alguém o que é número?............................................ 136

Gráfico 5.4 – Categorias das respostas das professoras à questão “ Quando você

considera que uma criança já sabe o que é número?”.................... 138

Gráfico 5.5 – Classificação das situações elaboradas pelas professoras................. 142

Gráfico 5.6 – Classificação das situações elaboradas pelas professoras

considerando as operações lógicas.................................................... 152

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 15

Motivações para Realizar o Estudo .................................................................... 15

Relevância e Delimitação do Problema .............................................................. 17

Objetivos do Trabalho e Questão de Pesquisa .................................................. 19

Descrição da Dissertação ................................................................................... 20

CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 23

O NÚMERO NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA .................. 23

1.1 Sobre a Origem do Conceito de Número ..................................................... 23

1.2 As Contribuições de Piaget .......................................................................... 26

1.2.1 A Gênese do Número ......................................................................... 26

1.2.1.1 Operações Lógicas ................................................................ 30

1.2.2 Abstração Reflexionante ................................................................ 35

1.3 O Número e suas Multifaces ........................................................................ 40

1.3.1 As Funções do Número ...................................................................... 42

1.3.2 A Representação do Número ............................................................. 47

1.3.3 As Estruturas Aditivas na Construção do Número ............................. 49

1.4 Estudos Correlatos ....................................................................................... 54

CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 61

O NÚMERO NA PERSPECTIVA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

BRASILEIRA ...................................................................................................... 61

2.1 O Sistema Educacional Brasileiro ................................................................ 61

2.1.1 A inclusão da Criança com Seis Anos nos Ensino Fundamental ....... 63

2.2 O Número Segundo os Documentos Oficiais ............................................... 65

2.2.1 O Número segundo o PCN ................................................................. 66

2.2.2 O Número na perspectiva do RCNEI .................................................. 69

2.2.3 O Número na perspectiva das Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental – Matemática do Estado da Bahia ..........................................

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CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 81

CONHECIMENTOS, SABERES E CONCEPÇÕES DO PROFESSOR ............. 81

3.1 OS Conhecimentos dos Professores na Visão de Shulman ....................... 81

3.2 O Conhecimento Didático na Perspectiva e Ponte e Oliveira ...................... 87

3.3 Os Saberes no Olhar de Tardif .................................................................... 92

3.4 O Desenvolvimento Profissional na Visão de Imbernón e Ponte................ 97

3.4 As Concepções sob diversas Óticas ........................................................... 99

CAPÍTULO 4 ............................................................................................................. 105

OS CENÁRIOS E OS CAMINHOS METODOLÓGICOS .................................... 105

4.1 A Natureza da Pesquisa ............................................................................... 105

4.2 O Universo de Estudo ............................................................................. 106

4.2.1 As escolas .......................................................................................... 106

4.2.2 Os Sujeitos ......................................................................................... 107

4.3 Os Instrumentos ........................................................................................... 108

4.4 Os Procedimentos ........................................................................................ 110

4.5 O Planejamento da Análise e a Interpretação dos Dados ............................ 116

CAPÍTULO 5 ............................................................................................................. 117

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ................................................ 117

5.1 Perfil das Professoras .................................................................................. 117

5.1.1 A Faixa Etária ..................................................................................... 118

5.1.2 A Formação ........................................................................................ 119

5.1.3 O Tempo de Experiência ................................................................ 120

5.1.4 Experiência com os primeiros anos do Ensino Fundamental ............. 122

5.1.5 Síntese do Perfil das Professoras....................................................... 123

5.2 Preferência e Concepções das Professoras ................................................ 124

5.2.1 Preferência das Professoras em Relação a Matemática e seu Ensino .................................................................................. 125

5.2.2 Concepção das Professoras sobre Planejamento Docente ............... 128

5.2.3 Concepções das Professoras sobre Avaliação, Ensino e Aprendizagem de Matemática ............................................................ 132

5.2.4 Síntese das Preferências e Concepções das Professoras ................. 134

5.3 O Entendimento de Número na Visão das Professoras ............................... 135

5.3.1 O Número na Visão das Professoras Investigadas ............................ 136

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5.3.2 Síntese do Entendimento de Número na Visão das Professoras ........................................................................................ 140

5.4 Situações Problema nas quais os Números são Trabalhados ..................... 141

5.4.1 Classificação das Situações ............................................................... 141

5.4.2 Classificação das Situações Segundo as Operações Lógicas ........... 152

5.4.3 Síntese das Situações Elaboradas ..................................................... 157

CAPÍTULO 6 ............................................................................................................. 159

CONCLUSÃO ............................................................................................................ 159

6.1 Caminho Percorrido .................................................................................. 159

6.2 Principais Resultados .................................................................................. 161

6.3 Respondendo a nossa Questão de Pesquisa............................................... 164

6.4 Caminhos a ser Percorridos ......................................................................... 166

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 169

APÊNDICES .............................................................................................................. 175

Apêndice A – Questionário .................................................................................. 175

Apêndice B – Roteiro da Entrevista .................................................................... 178

Apêndice C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .............................. 179

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IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO

Motivações para Realizar o Estudo

O tema que despertou meu interesse nessa investigação foi pesquisar sobre

a ideia que as professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental têm sobre a

construção do conceito de número pela criança.

Em minha trajetória profissional, lecionei Matemática durante sete anos a

alunos dos anos finais do Ensino Fundamental e a alunos do Ensino Médio. Nos

últimos dois anos, comecei a perceber a dificuldade dos alunos em lidar com essa

disciplina. Intrigava-me que alunos com mais de seis anos de escolarização ainda

apresentassem dificuldade em lidar com conceitos como as quatro operações. Com

o intuito de identificar em que momento da aprendizagem ocorria esse problema,

busquei alguma resposta por meio de leituras e observação dos anos anteriores.

Apareceu um indício de que tal dificuldade estava presente também nos anos

iniciais, nos quais a criança começa a formalizar o conceito de número1. Essa

descoberta despertou meu interesse por entender a apropriação de tal conceito.

Essas observações se deram para além da sala de aula, pois, paralelamente

ao ensino, sou mãe de uma menina que, em 2010, tinha sete anos. Ela conhecia os

números, sabia contar até 100 e fazia pequenas operações de adição e subtração

do tipo: 8 5− ; 3 4+ ; 10 6+ , etc. Entretanto, uma situação cotidiana recente me

chamou a atenção:

1 Adotamos o termo conceito de número tal como proposto por Keith Devlin “uma abstracção de certos padrões existentes no mundo à nossa volta”. (2002, p. 15), para esse autor os números são resultado do reconhecimento de padrões no mundo, portanto incluímos neste conceito também as funções do número.

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AO VOLTAR DO SUPERMERCADO COLOQUEI NA MESA DUAS FILEIRAS DE BALAS. AMBAS POSSUÍAM A MESMA QUANTIDADE DE BALAS, PORÉM AS FILEIRAS TINHAM

COMPRIMENTOS DIFERENTES. EU PEDI PARA QUE ELA ESCOLHESSE UMA DAS

FILEIRAS DE BALAS PARA ELA FICANDO EU COM A OUTRA. ELA ESCOLHEU A FILEIRA

MAIS COMPRIDA. O PAI, QUE ASSISTIA À SITUAÇÃO, INTERVEIO:

- MINHA FILHA, TANTO FAZ UMA FILEIRA OU A OUTRA, PORQUE AS DUAS FILAS

POSSUEM A MESMA QUANTIDADE DE BALAS!

- NÃO TEM NÃO, AFIRMOU VEEMENTEMENTE. ESSA – APONTANDO PARA A MAIS

COMPRIDA – TEM MAIS, VEJA: UM, DOIS, TRÊS, QUATRO, CINCO – CONTANDO A

FILEIRA MENOS COMPRIDA – E AQUI, UM, DOIS, TRÊS, QUATRO, CINCO... CINCO!?

FICOU EM DÚVIDA, FEZ UMA CARA DE ESPANTO E NÃO SATISFEITA CONTOU

NOVAMENTE AS DUAS FILEIRAS:

- UM, DOIS, TRÊS, QUATRO, CINCO E UM, DOIS, TRÊS, QUATRO, CINCO. É MESMO! AS

DUAS TÊM BALAS IGUAIS.

MAS, MESMO ASSIM, ESCOLHEU A FILEIRA MAIS COMPRIDA.

Nesse momento, fiquei intrigada: como poderia ela ter tido a convicção de que

a quantidade de balas era diferente nas fileiras? Por que ela se baseou apenas na

disposição espacial das balas se já conhecia a numeração e se já efetuava

pequenas operações com números maiores que cinco? O que pode pensar uma

criança sobre número? Como será que as crianças constroem o conceito de

número?

As situações acima relatadas foram os fatores que motivaram a minha

inserção no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Dessa forma, ingressei, em fevereiro

de 2010, no Grupo de Estudos e Pesquisa REPARE em EdMat – Reflexão,

Planejamento, Ação, Reflexão em Educação Matemática sob a coordenação da

Professora Doutora Sandra Magina.

O objetivo desse grupo é investigar os processos de ensino e aprendizagem

da Matemática, desde a Educação Infantil até o Ensino Superior, cujo interesse se

foca, particularmente, em pesquisas sobre números e operações (estruturas aditiva

e multiplicativa), estudando tanto os aspectos relativos ao aluno quanto ao

professor; essa dissertação, portanto, insere-se num projeto maior que investiga as

estruturas aditivas e nosso foco será analisar como os professores dos anos iniciais

trabalham a construção do conceito do número com seus alunos.

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Penso ser relevante destacar que, a partir desse ponto, modificarei o foco

narrativo para a primeira pessoa do plural, pois os apontamentos, as considerações,

as reflexões, as análises e as conclusões apresentadas ao longo desta dissertação

não são apenas minhas, mas de um conjunto de pensamentos, de descobertas, de

estudos constituídos por mim, pela orientadora deste estudo, pelas discussões com

o grupo REPARE, com os professores do curso, pelos diálogos com os colegas e

professoras e pelas contribuições teóricas dos autores que sustentam esta

investigação. Logo, o que será relatado ao longo desta dissertação deixa de ser

singular para tornar-se plural.

Relevância e Delimitação do Problema

Como já foi anunciado, a partir das situações relatadas acima, surgiu o

interesse por entender como se dá a apropriação do conceito de número na criança.

Buscando entendimento na literatura especializada, logo nos deparamos com a obra

de Piaget e Szeminska intitulada “A Gênese do Número na Criança” (1971), obra

que discute a complexidade envolvida na formação do conceito de número.

Essas leituras acarretaram uma reflexão não somente voltada para a

aprendizagem, mas também voltada para o ensino: O que é número na visão dos

professores que atuam nos anos iniciais? Como a ideia de número é trabalhada por

estes professores? Quando o professor pode considerar que seu aluno já sabe o

que é número?

No que tange ao ensino do número, Burgo, Nogueira e Bellini (2010),

apontam uma dicotomia entre a teoria e a prática: “Parece que há um

distanciamento entre a riqueza de materiais didáticos, produtos de pesquisas que o

professor tem à sua disposição, e o ensino do número em sala de aula” (BURGO;

NOGUEIRA; BELLINI, 2010, p.3). As autoras salientam a importância de o professor

conhecer como seu aluno constrói o conceito de número, para nortear a sua prática:

O conhecimento de como a criança constrói o conceito de número é fundamental para que os educadores possam planejar a sua intervenção educativa com estratégias e atividades que favoreçam esta construção e

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tornem o número significativo para o contexto na qual estão inseridas. (BURGO; NOGUEIRA; BELLINI, 2010, p.2).

Nessa direção, Weisz e Sanches (1999) ponderam que, se o professor não

conhece o que o aluno pensa ou pode pensar, sobre o conteúdo a ser trabalhado –

nesse caso o número – então “o ensino que oferece não tem ‘com o que dialogar’.

Restará a ele atuar como numa brincadeira de cabra-cega, tateando e fazendo sua

parte, na esperança de que o outro faça a dele: aprenda”. (p.42).

Desse modo, vemos quão importante é a reflexão do professor sobre como a

criança constrói o conceito de número. É preciso que ele tenha sempre em mente

que essa construção acontece dentro de um processo dinâmico, desenvolvido em

um largo período de tempo. Isto implica dizer que tal conceito não pode ser

ensinado, mas sim construído pelas próprias crianças, respeitando sua maturação e

suas experiências.

Partimos da ideia de que, desde muito cedo, a criança interage com várias

situações, nas quais estão envolvidos os números: a representação de uma medida,

a placa de um carro, um número de uma residência, as relações entre quantidades e

as noções de espaço. Tal interação se dá por meio familiar e/ou social quando a

criança se depara com perguntas tais como: “qual é a sua idade?” “Quantas balas

você ganhou?” “Você pode pegar 3 batatas para mamãe?” “Qual é o número da sua

casa?” “Quantos irmãos você tem?”,entre outras situações de seu cotidiano.

Essas perguntas deixam antever que a criança tem contato com os números

desde muito cedo, porém não significa que tenha construído internamente o conceito

de número.

Assim, ao ingressar na escola, ainda na fase da Educação Infantil, a criança

já possui o conhecimento matemático informal bem desenvolvido, conforme destaca

Wadsworth (1996). Nesse sentido, a escola é o espaço instituído, onde as crianças

irão organizar suas informações e estratégias, de modo a propiciar condições para a

construção de novos conhecimentos matemáticos. A este respeito, Mello afirma que

a argumentação é um meio de explorar as informações e estratégias utilizadas

informalmente pelos alunos.

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As habilidades de ler, escrever e solucionar problemas, onde a estratégia da argumentação permite explorar os procedimentos adotados, pode contribuir para legitimar os recursos empregados informalmente pelas crianças e que muitas vezes não são valorizados pela escola. (MELLO, 2009, p. 15).

Lorenzato (2006) reconhece que as experiências dos primeiros anos de vida

do aluno desempenham forte influência em todos os anos seguintes, pois elas

marcam sua vida. Dessa forma, “faz-se necessário oferecer ao aluno uma boa

formação matemática já nas séries iniciais” (MAGINA, 2009, p.1). Completando tais

ideias, Smole, Diniz e Cândido (2000) ressaltam a importância dessa etapa escolar,

justificando que as ideias matemáticas aprendidas nesse período serão importantes

em sua vida acadêmica e cotidiana.

Uma hipótese é a de que as crianças são ensinadas a falar e a escrever os

números, mas não são levadas a entender o conceito de quantidade, ordem o que

implica o entendimento do número como sendo apenas um nome; “não basta de

modo algum à criança pequena saber contar verbalmente ‘um, dois, três etc.’ para

achar-se na posse do número.” (PIAGET e SZEMINSKA, 1971, p.15). Corroborando

os autores, Souza (2009, p.1) afirma que “[...] recitar os numerais em ordem e sem

erros não significa absolutamente que a criança compreende o sentido de cada um

deles nem a relação de todos eles.”

Para que o professor possa direcionar sua prática é necessário entender

como a criança constrói o conceito de número e, a partir das informações trazidas

pela criança, oferecer situações que envolvam e estimulem a busca de soluções;

encorajar a troca de opiniões e argumentos; estabelecer relações com os mais

diversos eventos, objetos e situações, tudo isso, com o objetivo de possibilitar que a

criança construa tal conceito.

As afirmações de todos os autores mencionados levaram-nos a ponderar

mais profundamente sobre o papel do professor na construção do conceito de

número pela criança. Traçamos, assim, nossos objetivos e questões de pesquisa

que exporemos a seguir.

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Objetivos do Trabalho e Questão de Pesquisa

Diante do exposto, e pela necessidade de investigar os professores que já

atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental, conforme evidenciado por

Carmo (2010), apresentamos a seguir nosso objetivo, formulado na direção de

entender o papel do professor na construção do conceito de número pelo aluno.

INVESTIGAR QUE CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

Esse objetivo pretende ressaltar a ideia e a percepção do professor, bem

como destacar sua ação em relação à referida construção. Dessa forma,

procuraremos responder a duas questões específicas:

O QUE É NÚMERO NA VISÃO DE PROFESSORES QUE ATUAM NO 1º E 2º ANO E QUANDO

ESTES PROFESSORES CONSIDERAM QUE SEUS ALUNOS JÁ SABEM O QUE É NÚMERO?

COMO A IDEIA DO NÚMERO É TRABALHADA POR ESTES PROFESSORES?

A partir das respostas encontradas para as questões anteriores buscaremos

responder a questão norteadora que instiga a investigação proposta, qual seja:

QUAL(IS) CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

A seguir, faremos uma descrição desta dissertação.

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Descrição da Dissertação

Nesta Introdução, apresentamos a motivação para realizar o estudo, a

relevância e delimitação do problema. Definimos o nosso objetivo, bem como nossas

questões específicas e a questão norteadora da pesquisa.

No primeiro capítulo – o Número na Perspectiva da Educação Matemática –

abordaremos as contribuições de Piaget e Skeminska (1975) em relação à

construção do Número. Apresentaremos os estudos de Kamii (1989), que trouxe às

ideias de Piaget para a sala de aula. Trataremos sobre as funções do número e sua

representação dentro da perspectiva piagetiana e discorremos sobre as estruturas

aditivas, pois elas estão imbricadas na construção do conceito de Número.

Finalizaremos apresentando alguns estudos correlatos a esta investigação.

No segundo capítulo – O Número na Perspectivas das Políticas Públicas –

apresentaremos como o ensino de número é vislumbrado em documentos oficiais

que tratam da prática docente em Matemática. Para tanto buscamos os Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN, 1997), resgatamos o Referencial Curricular Nacional

para a Educação Infantil (RCNEI, 1998), e como nosso estudo foi realizado no

Estado da Bahia buscamos um documento local – Diretrizes Curriculares de

Matemática para o Ensino Fundamental do Estado da Bahia (1994) – para descrever

o que é sugerido que a criança aprenda em relação ao número nos anos de

alfabetização matemática.

No terceiro capítulo – Conhecimentos, Saberes e Concepções do Professores

– abordaremos os conhecimentos, os saberes dos professores na visão dos

teóricos, Shulman (1986, 2005), Tardif (2002), Ponte e Oliveira (2002). Discutiremos

sobre desenvolvimento profissional e concepções dos professores, sob a ótica de

Imbernón (2010), Ponte (1998, 1992) e Fiorentini (1995).

No quarto capítulo – Os Cenários e os Caminhos Metodológicos –

apresentamos a nossa escolha teórico-metodológica, assim como a descrição do

instrumento de coleta de dados.

Os dados coletados, na realização de nossa investigação com as professoras

dos anos iniciais do Ensino Fundamental possibilitarão a análise proposta no quinto

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Capítulo – Análise e Discussão dos Resultados. Essa análise será realizada por

categorias que se delinearam em nossos momentos de reflexões.

Concluímos nosso estudo com o sexto Capítulo – Conclusão – no qual

tentaremos responder à nossa questão de pesquisa, seguido de nossas sugestões

para futuras pesquisas.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 11 OO NNÚÚMMEERROO NNAA PPEERRSSPPEECCTTIIVVAA DDAA

EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO MMAATTEEMMÁÁTTIICCAA

O objetivo deste capítulo é discorrer sobre o conceito de número e como a

criança o constrói segundo Piaget. O presente capítulo está estruturado em quatro

seções: inicialmente traçaremos um breve histórico sobre a origem do conceito de

número, na segunda seção, apresentaremos as contribuições de Piaget em relação

a essa construção, na terceira seção trataremos acerca da abstração reflexionante

que é necessária à construção do número e finalmente, na quarta seção,

discorremos sobre o número e suas multifaces.

1.1 Sobre a Origem do Conceito de Número

Esta seção apresenta um breve histórico sobre a origem do conceito de

número, uma vez que segundo Ifrah (1997), as crianças percorrem um caminho

semelhante ao da evolução da inteligência humana.

Dessa forma, propomos um mosaico sobre o número e seu ensino,

considerando que:

Cada peça acrescentada num mosaico contribui um pouco para a nossa compreensão do quadro como um todo. Quando muitas peças já foram colocadas, podemos ver, mais ou menos claramente, os objetos e as pessoas que estão no quadro, e sua relação uns com os outros. Diferentes fragmentos contribuem diferentemente para nossa compreensão: alguns são úteis por sua cor, outros por que realçam os contornos de um objeto. Nenhuma das peças tem uma função maior a cumprir; se não tivermos sua contribuição, há ainda outras maneiras para chegarmos a uma contribuição do todo. (BECKER, 1999, p. 104 – 105).

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Assim, ao lançar esse olhar para o passado, faremos um recorte, amparando-

nos em alguns teóricos que investigam o tema.

Como terá surgido o conceito de número? A origem do conceito de número é

histórica e seu uso é tão milenar como a própria existência do homem. Conforme as

mudanças e necessidades sociais foram se configurando, este aprendeu a utilizar o

número de forma a poder comunicar resultados.

A conceituação de número foi objeto de especulações diversas, incluindo as

de origem religiosa conforme Kroceck citado por Gerdes (1989, p. 35) “os números

inteiros são criados pelo Senhor Deus, tudo o resto é trabalho do homem”; a de

conhecimento inato do homem conforme Kant e, a dos pitagóricos, segundo os

quais: “o conceito de número expressava a própria concepção do universo” e,

ensinava-se que ‘tudo é número’”(MIARKA e BAIER, 2010, p. 99).

Segundo Gerdes (1989), os recolectores e caçadores constituíram as

primeiras sociedades humanas, embora sem possuir uma noção explícita sobre

número, já extraiam conclusões importantes para a reprodução da vida e

sobrevivência da espécie. Com o intuito de se comunicar e tomar decisões sobre

esses aspectos, o homem começou a comparar coleções de objetos.

Gerdes (1989) apresenta esta comparação com o exemplo hipotético: dois

caçadores que partem em direções diferentes e encontram mamutes. Ao retornarem

à aldeia, revela: “Vi tantos mamutes como um pássaro tem asas”; e o outro: “Vi

tantos mamutes como a minha mão ‘conta’ dedos”.

Ao expor essas comparações de quantidades, os caçadores estavam

lançando mão da correspondência biunívoca, que consiste em por em relação cada

elemento de um conjunto com um elemento de outro conjunto. Segundo Ifrah (1997),

foi graças à correspondência que, durante milênios, o homem pré-histórico pode

exercitar a aritmética, antes mesmo de ter consciência do que é um número

abstrato.

A noção de número (os números naturais mais pequenos) foi nascendo num processo de abstrair, cada vez mais, de determinadas propriedades das colecções de objetos que os homens nas sociedades de caçadores e recolectores encontrava, como respostas criadoras aos problemas que enfrentava em seu trabalho. Essa noção reflecte a experiência de “inumeráveis” gerações. [...] As operações sobre números (adicionar,

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multiplicar, subtrair e dividir) foram-se desenvolvendo como reflexo das operações efectuadas com objetos concretos. Por exemplo, a adição corresponde à operação diz juntar duas ou mais coleções (os frutos colhidos por um grupo, com os frutos colhidos por outro grupo, etc). A multiplicação desenvolve-se, em grande medida, a partir do hábito de contar “dois por dois”, “três por três”, etc., assim acelerando a contagem do número de animais num rebanho, por exemplo. (GERDES, 1989, p. 41 – 42).

Através do trabalho dessas gerações, as regularidades foram sendo

descobertas, as quais, de acordo com Gerdes (1989, p. 44), desaguavam em regras,

tais como na nossa linguagem simbólica 2 + 3 = 5, “[...] o resultado a adição de dois

números é independente da ordem em que se procede”.

Nesse movimento histórico, os homens gradualmente mudaram sua relação

com o meio ambiente, passando de caçadores para agricultores e pastores o que

ampliou os problemas: que quantidade de sementes podemos comer e que

quantidade devemos semear? Como comunicar a perda de animais de determinado

rebanho?

Miarka e Baier (2010) afirmam que os conhecimentos matemáticos foram

criados na intenção de responder as perguntas de cada época, imbricados numa

conjuntura histórica e cultural.

As novas necessidades sociais e econômicas exigiam uma extensão do conceito de número e das operações com os números.

Saber contar o número de animais num rebanho, o número de dias num ano, o número de produtos numa troca, etc., saber contar colecções cada vez maiores e saber comunicar a outras pessoas os resultados das contagens, provocaram inovações.[...]

Tornavam-se socialmente necessárias inovações tanto no aperfeiçoamento e na simplificação dos nomes dos números, como na introdução ou no melhoramento dos símbolos para representar números. (GERDES, 1989, p. 45, grifo do autor).

Para representar quantidades, o homem primitivo usou vários recursos e

esses sofreram modificações no transcorrer do tempo. De início, foram saquinhos de

pedras, varetas, depois entalhes na pedra, em ossos, na madeira; hoje, com os

algarismos formamos numerais e, com eles, representamos as quantidades.

[...] a introdução de símbolos para os números tinha um significado importante para o desenvolvimento da aritmética e mesmo, para o desenvolvimento da matemática. Eles dão uma encorporação simples do

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conceito de número, mesmo em tal medida que muitas pessoas identificam, embora isto seja incorrecto, um número como o seu nome simbólico, como se o país Moçambique fosse idêntico ao conjunto (ordenado) das letras do seu nome! Os símbolos facilitam fazer as contas; podemos calcular no papel (barro, solo, etc.,) em vez de precisar juntar dois rebanhos para saber quantas vacas há num total, etc. Eles estimularam a extensão do conceito de números até números tão grandes que nunca pudessem ser o resultado duma contagem directa: quantas vidas humanas seriam precisas para poder contar 1010? (GERDES, 1989, p. 46 – 47, grifo nosso).

Portanto, por esse processo histórico/social e informal é que a humanidade foi

construindo os conhecimentos matemáticos com base nas necessidades de cada

momento histórico e a introdução dos símbolos permitiu um salto qualitativo na

evolução do conhecimento matemático.

1.2 As Contribuições de Piagetianas

Reservamos esta seção para apresentar as contribuições de Piaget em

relação à contrução do conceito de número para o que, inicialmente apresentaremos

a obra de Piaget e Szeminska: A Gênese do Número. Nela, os autores efetuam

experimentos por meio de operações lógicas sobre as quais discorremos em

seguida. Posteriomente, trataremos do processo de abstração reflexionante que é

necessário à construção do número.

1.2.1 Sobre a Gênese do Número

O interesse de Piaget e Szeminska nessa obra é pelos fundamentos da

construção do conceito de número evidenciando as operações lógicas. Nas palavras

dos autores, “foi unicamente o problema da construção do número em relação às

operações lógicas que nos prendeu a atenção.” (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p.

12).

Em seu trabalho, os autores procuraram demonstrar que a construção do

conceito de número pela criança é realizada em estreita relação com a conservação

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numérica (invariância do número) e com as operações lógicas de classificação

(como classe de inclusão) e a seriação de relações assimétricas2 (ordenação de

grandezas).

O número se organiza, etapa após etapa, em solidariedade estreita com a elaboração gradual dos sistemas de inclusões (hierarquia das classes lógicas) e de relações assimétricas (seriações qualitativas), com a sucessão dos números constituindo-se, assim, em síntese operatória da classificação e da seriação. [...] quando o sujeito aplica êste sistema operatório aos conjuntos definidos pelas qualidades de seus elementos, torna-se então necessário considerar à parte as classes, que repousam sôbre as equivalências qualitativas desses elementos, e as relações assimétricas, que exprimem suas diferenças seriáveis, donde o dualismo da lógica das classes e da lógica das relações assimétricas. Mas quando o mesmo sistema se aplica aos conjuntos fazendo-se abstração dessas qualidades, então se realiza a fusão da inclusão e da seriação dos elementos numa só totalidade operatória formada de classes e de relações assimétricas reunidas, e esta totalidade constitui, sem mais nada, a série dos números inteiros finitos, indissociàvelmente cardinais e ordinais. (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p 12 – 13).

Identificamos pela citação anterior que o número é construído pela abstração

que elabora gradativamente as relações assimétricas e o sistema de inclusão. Ao

manipular coleções de objetos, a criança pode observar, descobrir propriedades,

juntar por semelhança, separar por diferenças, ou seja, ela vai criando relações que

a conduzirão na construção do conceito do número, que é indissociavelmente

cardinal e ordinal. Uma boa ilustração que resume essa construção é apresentada

em Rangel (1992, p. 132).

Figura 1.1: A síntese operatória entre o caráter cardinal e ordinal do número.

2 “As relações assimétricas são as que empregamos ao seriar objetos, na forma ascendente ou descendente, pelas diferenças ordenáveis de um atributo.” (RANGEL, 1992, p. 110)

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Note que Rangel (1992) ilustra a inclusão hierárquica do número que é a

capacidade de perceber que o “um” está incluído no “dois” e o “dois” está incluído no

“três”, e assim por diante, de modo que, na figura acima, o número seis corresponde

a todo os elementos do conjunto apresentado e não apenas ao sexto elemento.

A hipótese de trabalho dos autores, Piaget e Szeminska (1971) é que a

construção do número corresponde ao desenvolvimento da própria lógica e que um

nível pré-lógico corresponde a um nível pré-numérico. Dessa forma, eles formularam

experimentos e analisaram as respostas dos alunos não apenas em relação à

avaliação numérica, mas também em relação às operações lógicas.

O conjunto da obra está divido em três partes: a conservação das

quantificações e a invariância dos conjuntos, a correspondência termo a termo

cardinal e ordinal, as composições aditivas e multiplicativas. Em todas as partes, os

autores efetuam experimentos e, para cada experimento, apresentam resultados

agrupados em três fases:

Na primeira fase, a criança não alcança o raciocínio que lhe foi solicitado ela

não coordena as relações e raciocina sobre cada uma delas por vez. Seu

julgamento está fundamentado na percepção, por isso, ela não possui a noção de

conservação (considera que a quantidade de líquido mudou, assim que ele

extravasa em cilindros de forma ou número diferentes); apresenta dificuldades para

efetuar correspondências termo a termo (por exemplo, é solicitado que se faça

corresponder flores e jarras); ela não conserva a equivalência numérica entre dois

conjuntos (de feijões, por exemplo.) desde que se afastem os elementos de uma das

duas fileiras a comparar; ela não consegue ordenar pequenos bastões de grandeza

crescente em uma série ascendente; enfim, ela é incapaz de comparar uma

subclasse, como por exemplo, as pérolas marrons de um colar, que comporta

também pérolas brancas à classe total (todas as pérolas do colar, as pérolas de

madeira).

Um exemplo para ilustrar essa fase: ao solicitar à criança que compare duas

fileiras com a mesma quantidade de fichas, porém uma delas com as fichas mais

espaçadas, ela simplesmente dirá que a fileira mais comprida tem mais fichas que a

outra.

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A segunda fase é marcada pelas respostas intermediárias, pois ocorre o

conflito entre o que a criança vê e o que ela pensa. Dessa forma, ocorre à

necessidade de se efetuarem correções nas percepções iniciais, a criança percebe a

contradição provocada por suas hipóteses e os resultados apontados pela

experiência.

No caso do exemplo citado na fase anterior, à criança fica em dúvida, ora

acha que a quantidade é a mesma nas duas fileiras, ora acha que a fileira mais

comprida é a que possui mais elementos. Mesmo sabendo contar a criança não

confia na contagem para fundamentar sua resposta, a percepção visual entra em

conflito com o resultado de sua contagem, o que gera nela a dúvida.

Na terceira fase, a criança obtém êxito em relação ao raciocínio que lhe foi

solicitado, apresentando o domínio das operações lógicas propostas: conservação

de quantidades contínuas (líquidos) ou descontínuas (pérolas), conservação da

equivalência numérica, seriação, quantificação correta da inclusão de classes,

seriação das relações assimétricas, etc., pois o seu raciocínio não está associado

apenas à percepção e à intuição.

No exemplo das fileiras, a criança mostra-se segura de que as quantidades

permanecem iguais nas duas fileiras, mesmo que alguém chame a atenção para a

diferença existente no comprimento delas.

São de Piaget e Szeminska (1971) as palavras que se seguem,

O sujeito começa - e nisso permanece durante a primeira fase - por não considerar mais que relações perceptíveis não-coordenadas entre si de igualdade ou de diferença qualitativas, constituindo assim respectivamente as qualidades e as quantidades brutas, não componíveis como tais. Depois, no decorrer da segunda fase, inicia um processo de coordenação lógica que se concluí na terceira fase e que resulta na classificação das igualdades e na seriação das diferenças (aditiva e multiplicativamente), com esta seriação levando à constituição das quantidades intensivas. Por fim, a terceira fase é assinalada pela constituição das quantidades extensivas, graças à igualização das diferenças intensivas e, consequentemente, à aritmetização dos grupamentos lógicos. (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p. 50).

Dessa forma, segundo os autores aqui citados, a construção do conceito de

número é uma construção interna a partir das relações que estabelecemos entre

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dois ou mais conjuntos de objetos. Na seção a seguir discutiremos sobre as

operações lógicas apresentadas nesta obra.

1.2.1.1 Sobre as Operações Lógicas

As operações lógicas são essenciais para a aprendizagem, não apenas na

Matemática, como também nas mais diversas áreas do conhecimento, podendo

referir-se a objetos e situações. São elas:

Correspondência: é a ação que estabelece a relação “um” a “um”. A ideia

de correspondência já faz parte do cotidiano da criança. Por exemplo, ao brincar de

casinha, quando arruma a mesa e coloca uma xícara em cada pires, está

estabelecendo uma relação e através desta, descobrirá a estrutura da

correspondência. Lorenzato (2006) destaca que

[...] apesar de a correspondência ser um processo necessário à formação do conceito de número, o fato de uma criança conseguir realizar correspondência um a um, de todos os elementos de um conjunto A com todos de um conjunto B, não garante que ela esteja percebendo que os conjuntos A e B possuem a mesma quantidade de elementos. (LORENZATO, 2006, p. 92).

E, nas palavras de Piaget e Skeminska (1975),

A correspondência termo a termo surge como o instrumento empregado pelo espírito para decompor as totalidades a serem comparadas entre si, ela não basta sob sua forma ou suas formas originais para conferir às coleções correspondentes a equivalência propriamente dita, ou seja, a mesma “potência” ou valor cardinal, concebido a titulo de constante originada da correspondência como tal (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p. 71).

Assim, cabe ao professor apresentar uma diversidade de atividades que

envolvam a correspondência de modo que o aluno possa vir a perceber a

equivalência de conjuntos que possuem a mesma cardinalidade. Posteriormente,

essa correspondência se mostrará importante para o entendimento das noções de

numeral, número ordinal, e outros.

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Comparação: é a ação de instituir diferenças ou semelhanças.

Frequentemente as crianças já comparam: formas, tamanho, cores, quantidades,

entre outras variedades de objetos.

A comparação é necessária para a compreensão e para o estabelecimento de relações de ordem, envolvidas na compreensão da formação da sequência numérica natural. Também a adição é necessária para que a justificativa comparação numérica não se atenha apenas ao aspecto ordinal do número. (MARANHÃO, 2005, p. 9).

Cabe ao professor estimular seus alunos para encontrarem semelhanças e

diferenças características entre os elementos que se quer comparar, explorando o

material que tem disponível. Futuramente o aluno fará comparações de figuras

geométricas, por exemplo.

Classificação: é a ação de separar em categorias, observando as

semelhanças ou as diferenças, isto é, agrupar itens ou objetos reunindo todos os

que se incluem num mesmo critério, separando-os dos que divergem deste mesmo

critério. Lorenzato (2006) reforça “toda classificação exige uma prévia comparação”.

(p. 105). Assim, o aluno ao manipular os blocos lógicos, a partir das comparações

agrupará, por exemplo, as peças pelo critério cor.

Para classificar, utilizamos a relação simétrica que, segundo Rangel (1992), é

a utilizada quando relacionamos “objetos em função de suas semelhanças,

aproximando-os, ao mesmo tempo em que os separamos de outros que deles

diferem”. (RANGEL, 1992, p. 102).

Piaget anuncia que a classe operatória só é possível quando o sujeito consegue realizarem sua mente uma assimilação recíproca entre dois caracteres que a definem, ou seja, entre a compreensão (aspecto qualitativo da classe) e a extensão (aspecto quantitativo da classe). Esta síntese inicia quando a criança consegue coordenar a relação de semelhança pensada (compreensão), estendendo a todos os objetos aos quais ela pode ser aplicada, ao mesmo tempo que os separa dos outros aos quais tal relação não é aplicável. A síntese, então, se consolida quando a criança postula a assimilação recíproca entre a extensão e a compreensão da classe, sendo capaz de compreender que todos os objetos agrupados são alguns dentre

os objetos da totalidade a quem pertencem. (RANGEL, 1992, p. 103).

A autora ilustra sua fala com o exemplo: ao pensar nas espécies de frutas, um

aluno, separando em um cesto todas as laranjas (L) das outras frutas (não laranjas)

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(L’), terá atingido esta síntese recíproca entre a compreensão (ser ou não laranja;

ser ou não fruta) e a extensão (aplicação dos quantificadores todos e alguns), se for

capaz de arquitetar em sua mente a complementaridade e, principalmente, a

inclusão inferindo as conclusões apresentadas na Figura 1.2.

Figura 1.2: A classe operatória: síntese entre os dois caracteres - compreensão e extensão

Fonte: Rangel (1992, p. 104).

As crianças, nessa situação, podem elaborar que as laranjas com as outras

frutas que não são laranjas formam a coleção das frutas. Da coleção de frutas

retirando as laranjas ficará com as outras frutas que não são laranjas. Da coleção de

frutas retirando as outras frutas que não são laranjas ficarão as laranjas. A coleção

de frutas é maior que a coleção de laranjas e a coleção de laranjas é menor que a

coleção de frutas.

Sequenciação: é a ação de fazer suceder a cada elemento, outro elemento

sem considerar a ordem entre eles, não havendo critérios pré-determinados para

esta sequência. Por exemplo, empilhar as peças de um dominó, cantar números

num jogo de bingo.

Seriação: é a ação de ordenar uma sequência de acordo com um critério.

Então, para seriar objetos de uma coleção, devemos observar um critério, por

exemplo, arrumar em ordem crescente ou decrescente de tamanho, peso, volume ou

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espessura, etc, determinado conjunto. Para Piaget e Szeminska (1971) “seriar

operatòriamente é coordenar as duas relações inversas s > r com s < t, o que

implica, portanto, a possibilidade de desenrolar a série nos dois sentidos”. (PIAGET;

SZEMINSKA, 1971, p. 217).

Quando seriamos, utilizamos as relações assimétricas, em função de um

atributo, colocando os objetos numa determinada ordem: ascendente ou

descendente. Rangel (1992) destaca a diferença entre as relações simétricas e

assimétricas.

[...] as relações assimétricas diferem essencialmente em sua natureza das simétricas, pois nestas, a aproximação entre dois objetos a e b é no sentido recíproco, tal que, por exemplo, se a tem o mesmo tamanho de b, b tem o mesmo tamanho de a.(RANGEL, 1992, p. 110).

A autora ilustra a estrutura da seriação e da classificação com o exemplo:

Figura 1.3: A diferenciação entre as relações simétricas e assimétricas.

Fonte: Rangel (1992, p. 111).

Na classificação a relação é simétrica de a para b e na seriação a relação é

assimétrica de a para b e de b para a. Para seriar, é necessário que a criança efetue

a coordenação reciprocamente às relações maior que (>) e menor que (<). Por

exemplo, ao observar um elemento intermediário da série, é necessário que a

criança coordene que ele é, ao mesmo tempo, maior que os anteriores e menor que

os posteriores.

Inclusão: é a ação de fazer abranger um conjunto por outro, ou seja, um

conjunto estará contido no outro. A criança está efetuando a inclusão quando

percebe que o grupo de quadrados está contido no grupo das figuras geométricas,

que os pássaros pertencem ao grupo dos animais. Lorenzato (2006) argumenta:

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[...] durante a construção do conceito de número as crianças precisarão da inclusão, pois num primeiro momento, elas concebem o 5 completamente distinto e independente do 4, mas, para ampliar sua compreensão, elas precisarão perceber que não existe a quantidade 5 sem a 4; assim, o 4 está incluso no 5. (LORENZATO, 2006, p. 119).

Desse modo, para quantificar objetos a criança necessitará colocá-los em

uma relação de inclusão, isto é, ela terá que incluir mentalmente o 1 em 2, o 2 em 3.

Conservação: é ação de perceber que a quantidade permanece a mesma,

independente da forma, arrumação ou posição do objeto. A criança alcança a

conservação quando percebe, por exemplo, que dois copos de água possuem a

mesma quantidade de água mesmo que diferenciados pelo seu formato (um mais

largo e o outro mais comprido).

Na perspectiva de Piaget e Szeminska (1971) as noções aritméticas são

estruturadas, progressivamente em função da necessidade de conservação, e esta é

imposta ao espírito humano como uma espécie “a priori” funcional do pensamento,

“a conservação de alguma coisa é postulada pelo espírito, a título de condição

necessária de qualquer inteligência matemática” (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p.

24).

Discorrendo sobre essas operações, Lorenzato (2006) salienta que, se elas

não forem trabalhadas pelo professor, em sua prática, os alunos enfrentarão

dificuldades na aprendizagem de número, contagem e outras noções. “Sem o

domínio desses processos, as crianças poderão até dar respostas corretas, segundo

a expectativa e a lógica dos adultos, mas, certamente, sem significado ou

compreensão para elas”. (LORENZATO, 2006, p. 25). Isso acontece, por exemplo,

quando os alunos são ensinados a falar e escrever os numerais, sem o

entendimento do conceito de quantidade, resultará apenas em aprender nomes, sem

significado real.

Os processos aqui descritos não estão restritos a um determinado campo do conhecimento, na medida em que podem interagir com qualquer situação do cotidiano. Na verdade eles são abrangentes e constituem-se num alicerce que será utilizado para sempre pelo raciocínio humano, independentemente do assunto ou tipo de problema a ser enfrentado. (LORENZATO, 2006, p. 27).

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No entendimento de Lorenzato (2006), as operações lógicas fundamentam o

nosso raciocínio, independente do assunto, conteúdo ou problema que

necessitemos enfrentar.

Como citamos anteriormente que o número é construído pela abstração que

elabora gradativamente as relações assimétricas e o sistema de inclusão,

discorreremos a seguir sobre abstração, especificamente abstração reflexionante.

1.2.2 Abstração Reflexionante

Sendo o número uma construção interna, como ajudar a criança na

construção desse conhecimento? O que é o conhecimento? Como se dá a

construção do conhecimento? Desde a antiguidade tais questões já vêm sendo

debatidas pelos estudiosos.

Na visão de Piaget, o conhecimento tem origem nas ações do sujeito sobre o

objeto, e é agindo que ele estrutura e adquire o conhecimento. Para esse autor,

existem três tipos de conhecimento: conhecimento físico, conhecimento lógico-

matemático e conhecimento social. Discorreremos sobre esses conhecimentos,

fundamentando-nos em reflexões da leitura de Kamii (1989) e Rangel (1992).

O conhecimento sobre os objetos da realidade exterior compõem o

conhecimento físico e pode manifestar-se pela observação, cuja estruturação é dada

a partir da abstração empírica.

O conhecimento lógico-matemático é originado na coordenação das ações

que a criança pratica sobre os objetos, desenvolvendo-se com a manipulação

simbólica e atingindo o raciocínio dedutivo. O conhecimento lógico-matemático é

estruturado pela abstração reflexionante.

Inicialmente, a experiência lógico-matemática se relaciona com ações materiais exercidas sobre os objetos; porém com os progressos da inteligência, ela pode dispensar a aplicação sobre os objetos, e esta criação e coordenação de relacionamentos ocorre sobre as operações simbolicamente manipuláveis. (RANGEL, 1992, p. 24).

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Desse modo, o conhecimento lógico-matemático é relacionado inicialmente ás

ações sobre os objetos evoluindo até dispensar o emprego deles.

O conhecimento social é o conhecimento adquirido a partir das convenções

construídas pelas pessoas e sua característica é a natureza arbitrária por se

fundamentar no consenso social.

A criança só pode adquirir o conhecimento social a partir da interferência de

outras pessoas, para que ela possa entender as convenções criadas pela sociedade

em que ela vive. Kamii (1989) cita como um exemplo da arbitrariedade a celebração

do Natal, data que alguns povos comemoram e outros não. Outra relação também

arbitrária é a relação de um objeto e seu nome:

O mesmo objeto pode ter diversos nomes em línguas distintas, uma vez que não existe nenhuma relação física ou lógica entre um objeto e o seu nome. [...]

As palavras um, dois, três, quatro são exemplos de conhecimento social. Cada idioma tem um conjunto de palavras diferente que serve para o ato de contar. Contudo, a idéia subjacente ao número pertence ao conhecimento lógico-matemático, o qual é universal. (KAMII, 1989, p. 24 – 25).

A autora explana que tanto o conhecimento físico quanto o conhecimento

social necessitam de uma estrutura lógico-matemática para sua assimilação e

organização, e ilustra, colocando que

a criança necessita de uma estrutura lógico-matemática para reconhecer um peixe vermelho como tal (conhecimento físico), ela necessita da mesma estrutura lógico-matemática para reconhecer uma palavra obscena como tal (conhecimento social). Para reconhecer uma palavra obscena a criança necessita fazer dicotomias entre “palavras obscenas” e “palavras não obscenas”, e entre “palavras” “tudo o mais”. A mesma estrutura lógico-matemática é usada para construir tanto o conhecimento físico quanto o social” (KAMII, 1989, p. 24).

De uma maneira geral e singela, podemos dizer que a fonte de cada

conhecimento físico, social e lógico-matemático são: os objetos, as pessoas, e

interna e inerente ao sujeito, respectivamente.

Nessa direção, Rangel (1992) pontua que se faz necessário analisar “como

ocorre o desenvolvimento das estruturas do conhecimento e quais os fatores que

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influenciam ou o determinam, para se entender como trabalhar com a Matemática,

com vistas a favorecer tal desenvolvimento.” (RANGEL, 1992, p. 29 – 30).

[...] De modo geral, o professor que atua nas séries iniciais quase nada estudou sobre o desenvolvimento cognitivo e moral das crianças; tal deficiência é agravada pelo pouco domínio da compreensão do próprio conhecimento matemático, tanto no que diz respeito à natureza desta ciência quanto ao processo de construção deste conhecimento pela criança. (RANGEL, 1992, p. 16).

Se o professor concebe que a Matemática pode ser transmitida, ele conduzirá

sua prática pedagógica a partir dessa perspectiva, reduzindo o conhecimento lógico-

matemático ao conhecimento de regras e convenções.

Kimura (2005) afirma que para Piaget o conhecimento é uma construção

sucessiva de operações e novas estruturas pelo processo de abstração. E o que

seria operação? E abstração?

A operação é uma ação interiorizada, no plano do pensamento, envolvendo a atividade do sujeito, que tanto transforma os dados dos objetos como a si próprio para compreendê-los. Cognitivamente, a operação permite transformar, incorporar, modificar e organizar em pensamento os dados disponíveis. [...]

As operações constituem a base da atividade cognitiva na construção de conhecimento. (BRANDT; ROSSO, 2010, p. 313).

Segundo Piaget, o principal mecanismo utilizado pela criança para efetuar

relações é a abstração, quando ele menciona abstração, está se referindo ao

processo pelo qual uma criança estrutura o conhecimento e não à sua capacidade

de representação (KAMII, 2003). Ele apresenta dois tipos básicos de abstração: A

abstração empírica e a abstração reflexionante. A abstração reflexionante desdobra-

se em pseudo-empírica e refletida.

Na abstração empírica, as informações são depreendidas do objeto: a criança

as percebe ou “descobre” agindo sobre o objeto, com base nas informações

perceptivas quando ela “focaliza” ou isola determinada propriedade.

Assim, a sustentação da abstração empírica está nas propriedades físicas

dos objetos como, por exemplo: o peso, a cor, a forma e a textura; na

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experimentação ou ação da criança tais como: apalpar, pegar, dobrar, puxar,

sacudir, jogar, mover, dobrar, esticar.

Kimura apresenta o exemplo:

Uma criança, para perceber a diferença de peso, poderá pegar objetos em suas mãos e verificar que eles têm pesos diferentes, constatando que coisas maiores, geralmente, pesam mais do que coisas menores, mas que às vezes, às menores pesam mais que as maiores. O peso ou diferença do peso não pode ser abstraído sem atividade, ou seja, é uma propriedade que não depende do tamanho/forma etc. (KIMURA, 2005, p. 76).

Pela experimentação, a criança começa a criar seus esquemas de

classificação que permitem distinguir os objetos, segundo uma categorização da

propriedade do objeto.

A abstração reflexionante trata da coordenação das ações sobre o objeto,

isolando determinadas propriedades de operações do sujeito e de seus esquemas.

Envolve a construção de relação entre objetos, por exemplo, a relação: A é menor

que B; não existe nem no A nem no B, é arquitetada pela criança ao pôr os dois

objetos em relação. As relações criadas não estão nos objetos, elas são construídas

mentalmente por cada sujeito. Kamii sugere (1989) a substituição do termo

abstração reflexionante por abstração construtiva, uma vez que essa abstração é

construída pela mente do sujeito.

Dessa forma, a abstração reflexionante está apoiada nas atividades

cognitivas e depende das coordenações das operações mentais do sujeito. De

acordo, com Kimura (2005) Piaget nomeia abstração reflexionante, por duas razões:

como sendo o ato de pensar sobre e o de espelhar, supondo “um refletir em um

patamar superior ao que é retirado de um plano inferior”, ou seja, as situações

seriam transpostas ou espelhadas para planos superiores, onde seriam melhor

compreendidas, ou seja, pensadas mais abstratamente. Seria a passagem da ação

para a representação e da representação para a operação.

Kimura (2005) afirma que Piaget evidencia e enfatiza essa distinção entre as

abstrações empírica e reflexionante porque, segundo ele, a Matemática sempre

depende da abstração reflexionante. De acordo com Kamii (1989), os números são

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aprendidos através dessa abstração, à medida que as crianças vão construindo

relações com as situações apresentadas e vivenciadas por elas.

É salientado, também, pelo autor que não há possibilidade de um dos tipos de

abstração existir sem o outro. A este respeito Kamii (1989) explica:

[...] um sistema de referência lógico-matemático (construído pela abstração reflexiva) é necessário para a abstração empírica, por que nenhum fato pode ser “lido” a partir da realidade externa se cada fato fosse um pedaço isolado do conhecimento, sem nenhuma relação com o conhecimento já construído numa forma organizada. (KAMII, 1989, p. 17).

Assim, entendemos que quando interagimos com objetos que buscamos

conhecer, efetuamos “leituras” em determinados níveis relacionando-as aos

conhecimentos que já estão construídos em nossa mente. Para ilustrar tal afirmação

recorremos à Figura 1.4 abaixo.

Figura 1.4: Níveis de abstração.

Fonte: http://www.inf.ufsc.br/infoedu/Lages/piaget.html

Para que os alunos construam significados é importante que o professor

viabilize diversas e distintas situações e experiências que sejam pertinentes a

ambiente vivenciado pelo aluno. Essas situações devem ser retomadas e

reapresentadas em diversos momentos e nas mais variadas circunstâncias para que

o aluno possa refletir e apresentar o que aprendeu.

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1.3 O Número e Suas Multifaces

Na visão de Piaget e Skeminska (1971) o conceito de número é construído a

partir da abstração reflexionante e requer operações lógicas como: conservação,

inclusão e seriação, sendo, portanto necessário que o professor tenha clareza

desses processos para poder trabalhar com atividades que possibilitem a construção

desse conceito por parte das crianças.

É apontado por Carmo (2010) que o conceito de número é descuidado, tanto

no Ensino Fundamental quanto na Educação Infantil, possivelmente por causa de

sua aparente simplicidade.

[...] Nem a Educação Infantil nem o Ensino Fundamental dedicam a devida atenção às noções matemáticas fundamentais.

Uma dessas noções básicas frequentemente negligenciada no ensino da Matemática Elementar é o conceito de número. Possivelmente tal conceito é visto pelos professores como algo bastante simples cuja aprendizagem muitas crianças já trazem antes mesmo de ingressar na escola. Lidamos com numerais em nosso cotidiano e os tratamos como coisas óbvias e prontamente aprendidas por qualquer pessoa. Além disso, por ser considerado algo simples e de fácil apreensão, não damos muita atenção, dentro ou fora da escola, às condições necessárias ao aprendizado do número. (CARMO, 2010, p. 2).

Corroborando com a posição de Carmo (2010) e focando mais

especificamente os anos iniciais, Lorenzato (2006, p. 30) assevera que há pouco

tempo o ensino dos números privilegiava apenas o reconhecimento dos numerais

(símbolos), e ele reforça: “a formação do conceito do número é um processo longo e

complexo”. Nessa mesma direção, Rangel (1992) pontua que

[...] o ensino da Matemática, em nossas classes de 1ª série, é sustentado pela crença de que o número é aprendido a partir das habilidades de contar, ler e de escrever os numerais – habilidades essas desenvolvidas através do trabalho com a teoria dos conjuntos: relação pertinência, correspondência termo a termo, cardinal de conjuntos, etc.

A origem desta crença está no desconhecimento, por parte do professor da natureza do número e de como a criança constrói este conceito. Tal desconhecimento, porém, ainda está além do professor. (RANGEL, 1992, p. 16).

A concepção do professor sobre como a criança constrói as ideias

matemáticas, delineará a sua prática pedagógica, que poderá ser observada, por

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exemplo, através da metodologia de ensino. Sobre isso, Wadsworth (1996), alerta

que a Matemática é a área em que a metodologia tradicional, de memorização e

repetição, causou os efeitos mais nocivos na aprendizagem escolar infantil, pois os

métodos e as demandas não estão centrados no pensamento infantil e na sua

construção dos conceitos matemáticos. O ensino empregando a metodologia

tradicional concentrasse nos cálculos e encoraja a memorização, o que força as

crianças a abandonarem o seu pensamento próprio.

Mello (2009) afirma que os métodos baseados na transmissão do

conhecimento e respostas corretas criam lacunas no conhecimento, lacunas essas

difíceis de serem preenchidas e prejudiciais ao pensamento autônomo infantil. Já

antes de Mello (2009) Smole (1996) assumia posição similar enfatizando que:

O trabalho com a matemática na escola de Educação Infantil3 tem sido baseado na concepção de que a criança aprende exercitando determinadas habilidades ou ouvindo informações do professor [...] Uma proposta de trabalho para a Escola Infantil deve encorajar a exploração de uma grande variedade de idéias matemáticas relativas a número, medidas, geometria e noções rudimentares de estatística de forma que as crianças desenvolvam e conservem um prazer e uma curiosidade acerca da matemática. (SMOLE, 1996, p. 62, grifo nosso).

De fato, trabalhar com a Matemática dessa forma permite que a criança

construa seus conhecimentos, especificamente o conhecimento lógico-matemático

que é elaborado com base nas ações do aluno sobre os objetos. Tal ação permitirá

que a criança assimile: as noções de ordem, classe, inclusão, tempo, número,

massa, volume, área.

Não se trata, pois, de treinar “formas” em si mesmo para sustentar aprendizagens posteriores, mas apelar para ação produtiva do sujeito, que, agindo sobre os fatos matemáticos e refletindo sobre as relações criadas em sua mente, torne-se capaz de postular coordenações novas em seu pensamento, melhorando e superando, portanto, suas formas atuais de conhecer, na medida em que reinventa o próprio

saber matemático. [...] O ensino-aprendizagem da matemática deve, portanto, apoiar-se na concepção construtivista, que defende a construção progressiva das estruturas operatórias pela atividade do sujeito. (RANGEL, 1992, p. 55).

3Relembrando: a literatura existente ainda trata a criança com seis anos como estando na Educação Infantil.

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Assim fica claro que na teoria construtivista o aluno não é mais apenas

assimilador, passando a ser sujeito ativo no processo ensino aprendizagem. A esse

respeito, Kamii (1989) afirma que a maneira mais precisa para apresentar o

construtivismo é afirmar que os alunos edificam seus conhecimentos, criando e

coordenando relações; a ampliação do seu conhecimento acontece por meio de

hipóteses e conhecimentos anteriores, mediados pelo professor, que deve encorajar

seus alunos a estarem atentos e ajudá-los a relacionar os eventos, objetos e

situações apresentadas.

Dessa forma, concordamos com Rangel (1992) quando manifesta que o

ensino e a aprendizagem da Matemática devem estar apoiados na concepção

construtivista, pois, por meio da ação, o aluno vai estruturando suas habilidades

mentais.

1.3.1 As Funções do Número

Podemos fazer diferentes leituras a partir de um número dado: ele pode

indicar uma quantidade de objetos, um número da casa, uma placa, um telefone,

uma representação de medida e as crianças já convivem com algumas delas em seu

cotidiano, mas o que pode pensar uma criança sobre o número?

Algumas funções do número com as quais nos deparamos em nosso

cotidiano são apresentadas por Lorenzato (2006):

Número localizador: pode ser encontrado designando endereço, latitude, distância.

Número identificador: está nas datas, nos telefones, nas páginas, nos automóveis, nas camisas dos jogadores;

Numero ordenador: indica o andar do apartamento, a posição obtida numa competição;

Número quantificador: indica velocidade, consumo, remuneração, altura;

Número (numerosidade) com significado de quantidade total, em que é forte a cardinalidade. Por exemplo: na sala estudam 43 crianças;

Número como final de contagem, em que é forte a ordinalidade. Por exemplo: ele é o 4º filho;

Número (cálculo) como resultado de operações;

Número (medida) como resultado de mensuração. (LORENZATO, 2006, p. 29).

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Tratando também sobre as funções do número, Carraher (1995) afirma que

“os números têm diferentes funções e por isso o mesmo número ou a mesma

expressão pode ter diversos significados.” (CARRAHER, 1995, p. 53). E a autora

exemplifica,

Figura 1.5: Indicação do número 3 como quantidade de elementos do conjunto

3

Fonte: Adaptado de Carraher (1995, p. 53)

Na figura acima o número três indica a quantidade de peixes.

Mas o mesmo número três pode ser usado como um nome. Quando dizemos “meu apartamento é o três” ou “tome o ônibus número três”, estamos usando o número como um nome. Como é que a criança pode saber ao certo quando o número indica quantidade e quando ele está servindo de nome??? (CARRAHER, 1995, p. 53).

Corroborando nossa reflexão, Maranhão, Sentelhas e Mesquita (2004)

afirmam que existem duas funções inseparáveis do número:

Uma é o número como memória e outra é o número como possibilidade de antecipar resultados. O número como memória pode ser tomado como “memória de quantidade”, que permite a criança lembrar-se de uma quantidade, sem que ela esteja presente e que corresponde ao aspecto cardinal do número. Pode ser tomado também como “memória da posição na seqüência numérica natural, o que corresponde ao aspecto ordinal. O número como possibilidade de antecipar resultados pode ser tomado como o que é usado em situação não presente, ou ainda não realizada, e sobre a qual se dispõe de algumas informações; exige o emprego de procedimentos numéricos que envolvem cálculos ou contagem. (MARANHÃO; SENTELHAS; MESQUITA, 2004, p. 51).

Desse modo, observamos que a criança se depara com situações em que os

números assumem diferentes funções e a “significação de um número vai se dar

pelo seu emprego” (MARANHÃO, 2005, p. 2). Assim, é necessário que o professor

possibilite situações em que as crianças se deparem com as funções do número,

para poder construir o seu significado de acordo com os contextos apresentados.

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De acordo com Piaget e Szeminska (1971, p. 24) “um número só é inteligível

na medida em que permanece idêntico a si mesmo, seja qual fora disposição das

unidades das quais é composto: é isso o que se chama de ‘invariância’ do número”.

Através das relações que a criança vai construindo em seu contato com mundo ela

vai construindo internamente seu conceito de número e este não será baseado

simplesmente pela percepção, por ser um processo intelectual que ocorre

gradualmente.

Algumas crianças, diante da Figura 1.6, afirmam que A2 possui mais bolinhas

que A1, “a percepção das qualidades espaciais leva de vencida mesmo a

numeração verbal” (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p. 92), ou seja, mesmo para a

criança que já sabe contar, ela efetua seu julgamento comparando, pela percepção,

o comprimento das fileiras; podemos dizer então que, o conceito de número ainda

não está claro para esta criança.

Figura 1.6: Disposição das Bolinhas

Ao trazer as ideias de Piaget para a sala de aula, Kamii e DeClark (1994, p.

50) afirmam que “os conceitos de número não podem ser ensinados [...] a criança o

constrói de dentro de si mesma, pela sua capacidade natural de pensar”. Quando a

autora afirma que os conceitos de número não podem ser ensinados não se

pressupõe que o professor fique esperando que a criança realize essa construção

sozinha; espera-se que o professor possa encorajar o pensamento espontâneo da

criança, buscando estratégias de ensino que possibilitem seus alunos construírem o

conceito de número.

O objetivo para “ensinar” o número é o da construção que a criança faz da estrutura mental de número. Uma vez que esta não pode ser ensinada diretamente, o professor deve priorizar o ato de encorajar a criança a pensar ativa e autonomamente em todos os tipos de situações. Uma criança que pensa ativamente, à sua maneira, incluindo quantidades, inevitavelmente constrói o número. (KAMII, 1989, p. 41).

A1

A2

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Diante do explicitado, percebemos a necessidade de o professor conhecer

como a criança constrói o conceito de número para poder articular sua prática com

atividades que possibilitem essa construção por parte das crianças.

A referida autora ainda afirma que o número não é construído fora do

contexto diário da criança, por isso “o professor deve encorajar a criança a colocar

todos os tipos de coisas, idéias e eventos em relação todo o tempo, em vez de

focalizar apenas a quantificação”. (KAMII, 1989, p. 70).

Quando o professor proporciona um ambiente em que existam números

falados e números escritos, ele instiga a curiosidade e o interesse da criança em

aprender e compreender o que é visto e o que é falado, e isso ocorre a partir de sua

estrutura mental, portanto de seu interior.

Sobre a construção do conceito de número, Kamii (1989) chama a atenção

para os princípios básicos a fim de que o professor auxilie seus alunos nessa

construção:

� Imaginar como é que o aluno está pensando e, intervir de acordo com aquilo

que parecer estar acontecendo em sua cabeça;

� Estimular a intercâmbio de ideias dos alunos com os seus companheiros;

� Incitar as crianças a fazerem conjuntos com objetos móveis;

� Encorajar que as crianças quantifiquem objetos logicamente e comparem

conjuntos (em vez de incentivá-las a contar);

� Incentivar o pensamento sobre o número e as quantidades de objetos que

sejam significativos para os alunos;

� Estimular a criação de todos os tipos de relações com eventos, objetos e

situações.

A autora esclarece a diferença entre a construção do número e a

quantificação de objetos. A estrutura mental (Figura 1.7) já existe ou existirá na

cabeça da criança, não podendo ser, observável. Quando lhe solicitamos que pegue

folhas suficientes para todos os coleguinhas de classe, a criança estará trabalhando

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com a quantificação. E, segundo Kamii (1989, p. 37) “Uma parte da quantificação é

observável através de seu comportamento, mas o pensamento que se desenvolve

em sua cabeça não.”

Figura 1.7: a palavra oito usada para se referir ao grupo inteiro de objetos.

Fonte: Kamii e DeClark (1994, p. 34).

A referida autora sugere que seja trabalhada a quantificação em situações de

ensino, porque o pensamento que a criança envolve na tentativa de quantificar

objetos deve ajudá-la na construção do número. Entretanto, ela adverte que os

professores se lembrem de que o objetivo com a quantificação é o pensamento que

a criança está construindo e não o fato de que ela quantifique acertadamente.

A advertência de Kamii é para que o professor analise os erros como fonte de

informação sobre o pensamento de seus alunos e como meio de compreender os

esquemas e relações que estão criando, pois na visão de Wadsworth (1996, p. 92),

“é o raciocínio delas, mais do que as respostas em si que, em geral, fornece a maior

parte das informações sobre seus conhecimentos e conceitos”. Nessa direção, o

erro é o reflexo do pensamento da criança; cabe, portanto, ao professor intermediar

ajudando o aluno a perceber sua contradição e a superá-la, incentivando sua

aprendizagem.

Ainda em relação à quantificação de objetos, Kamii (1989) recomenda e

apresenta situações que conduzem a essa ação, que ela divide em os fatos da vida

diária e jogos em grupo. Em cada uma delas, a autora adverte que deve ser

estimulado o pensamento do número e de quantidades que sejam significativos para

a criança.

Como situações da vida diária, Kamii (1989) sugere distribuição de materiais,

divisão e coleta de objetos, registro de informação, arrumação da sala; os jogos em

grupo, recomendados por ela são baralho, dados, boliche, jogos de tabuleiro, jogo

da memória entre outros; a autora afirma que, ao jogar as crianças além de

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pensarem em números, elas discutem e argumentam entre si, tomam decisões e

comparam resultados.

O uso dos jogos é também defendido no PCN (1997). Neste documento

encontramos uma sólida argumentação a favor do uso de jogos como elemento que

contribui para a formação de atitudes, socialização das estratégias e decisões,

motivação, criatividade, e a imaginação. Esta última tantas vezes deixada de lado,

mas de extrema importância para a construção do processo de abstração do aluno

nas aulas, principalmente nas de Matemática. Partilhando dessa visão Smole, Diniz

e Cândido (2001) recomendam o uso de brincadeiras como recurso ao ensino de

Matemática, como por exemplo, a amarelinha

[...] podemos dizer que a amarelinha auxilia no desenvolvimento de noções de números, medidas e geometria. Contagem, seqüência numérica, reconhecimento de algarismos, comparação de quantidades, avaliação de distância, avaliação de força, localização espacial, percepção espacial e discriminação visual são alguns conceitos e habilidades do pensamento matemático envolvidos nesse jogo. (SMOLE; DINIZ; CÂNDIDO, 2001, p. 22).

Assim, conhecer as diversas possibilidades que os jogos e as brincadeiras

podem trazer para o contexto escolar, possibilita ao professor aproveitar esses

momentos para ajudar seus alunos na construção de seus conhecimentos.

1.3.2 A Representação do Número

Ao quantificar as cores do arco-íris, utilizamos o numeral sete. O número sete

e o numeral sete são o objeto matemático e a representação desse objeto,

respectivamente.

Em relação à representação do número, Kamii (1989), Kamii e DeClark,

(1994) afirmam que como o número é construído pela abstração reflexionante e

apenas quando a criança construiu sua ideia é que é capaz de representá-lo com

símbolos ou signos tais como a palavra falada e sua representação gráfica. Ou seja,

é no pensamento da criança que está à fonte dos símbolos que elas próprias podem

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criar. Ilustrando a representação da ideia oito com símbolos e sinais temos a Figura

1.8, abaixo.

Figura 1.8: Representando a ideia do oito com símbolo e sinais.

Fonte: Kamii e DeClark (1994, p. 84).

As autoras, fundamentadas na teoria piagetiana, diferenciam o símbolo do

signo,

Um símbolo na teoria de Piaget, é um significante que traz uma semelhança figurativa com a coisa representada, e pode ser inventado pela criança. Portanto, os símbolos não precisam ser ensinados. Um signo, por outro lado, é um significante convencional. Os signos não tem semelhança com a coisa representada, e são partes de um sistema criado para a comunicação com outras pessoas. A palavra “oito” e o numeral “8” são signos, e como tais exigem transmissão social. (KAMII; DECLARK,1994, p. 83).

Assim, entendemos que o símbolo é um significante que pode ser elaborado

pela criança e que guarda semelhança com o que se quer representar. O signo é

também um significante, porém não possui semelhança com o que se quer

representar. Desse modo, o signo pertence ao conhecimento social e necessita de

transmissão social. Por esse motivo, Kamii (1989) não prioriza o ensino de signos

nos anos iniciais de escolaridade, pois nas palavras dessa autora,

A representação com signos é super-enfatizada na educação inicial e eu prefiro colocá-la em segundo plano. Muito os professores ensinam as crianças a contar, ler e escrever numerais, acreditando que assim estão ensinando conceitos numéricos. É bom para a criança aprender a contar, ler e escrever numerais, mas é muito mais importante que ela construa a estrutura mental de número. Se a criança tiver construído esta estrutura terá maior facilidade em assimilar os signos a ela. Se não a construiu, toda a

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contagem, leitura e escrita de numerais será apenas de memória (decorando). (KAMII, 1989, p. 40).

Dessa forma, faz-se necessário que o professor perceba se a criança está

construindo seu conhecimento com significado numérico. Solicitar que as crianças

façam contagens não é uma boa maneira de ajudá-las a quantificar objetos, Kamii

(1989), sendo uma boa abordagem seria solicitar que comparem conjuntos, pois nas

palavras da autora,

As crianças não aprendem conceitos numéricos com desenhos, tampouco aprendem conceitos numéricos meramente pela manipulação de objetos. Elas constroem esses conceitos pela abstração reflexiva á medida em que atuam (mentalmente) sobre os objetos. (KAMII, 1989, p. 58).

Entendemos então, que ao ser solicitado que a criança distribua lápis para

sua turma, o importante não é a manipulação dos lápis, mas o raciocínio que ela

está desenvolvendo enquanto os distribui lápis para as crianças. Estão também

entremeadas na construção do número as operações de adição e subtração,

compondo este processo, segundo Moro (2004). Assim, discorreremos, a seguir,

brevemente sobre tais operações.

1.3.3 As Estruturas Aditivas na Construção do Número

Abrimos esta subseção esclarecendo que não vamos aprofundar uma

discussão sobre estrutura aditiva por não ser este o foco de nosso estudo. No

entanto, entendemos ser importante pontuar as operações das estruturas aditivas

por que elas fazem parte da construção do número. Assim, iniciamos a discussão

trazendo uma reflexão de Santana (2010) com a qual concordamos inteiramente.

o Campo Conceitual das Estruturas Aditivas é ao mesmo tempo, o conjunto das situações cujo tratamento implica uma ou várias adições ou subtrações, e o conjunto dos conceitos e teoremas que permitem analisar essas situações como tarefas matemáticas. (SANTANA, 2010, p. 49).

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Especificamente sobre adição, Kamii e Housman (2002) asseguram que ela é

uma ação intelectual construída pela abstração reflexionante

de combinar dois totais para criar um total de ordem superior no qual os totais anteriores se tornam duas partes. Os dois totais, para começarmos, podem ser 3 e 5, por exemplo. A soma de 8 é um total superior no qual o 3 e o 5 se tornam duas partes. (KAMII; HOUSMAN, 2002, p. 84)

No entendimento dessas autoras a inclusão de classes, as relações parte-

todo são muito complicados para crianças pequenas. Foi observado pelas autoras a

existência de dois fenômenos quando crianças de pré-escola e 1ª série adicionam

números, um é contar tudo e o outro é contar para frente.

Na contagem para frente, as crianças somam 3 e 5, por exemplo, contando os dedos a partir de 3 dizendo: “Quatro – cinco – seis – sete – oito”. Na contagem do todo, ao contrário, elas contam três dedos, então outros cinco dedos e contam todos eles de ponta a ponta, começando de “um” (um-dois-três-quatro-cinco-seis-sete-oito). (KAMII; HOUMAN, 2002, p. 85).

Explicando o motivo para a necessidade de algumas crianças contarem tudo,

as autoras argumentam que

Crianças que contam-tudo precisam contar a partir de um pela seguinte razão: quando elas contam três dedos, “três” constitui um total; quando elas subsequentemente contam cinco dedos, “cinco” constitui um outro total. Uma vez que é difícil parta elas pensar simultaneamente nos dois totais que fizeram e em um total de ordem superior, elas “homogenizam” o “três” e o “cinco” transformando ambos em “1+1+1+1+1+1+1+1” . Eliminando assim os totais originais, elas evitam a dificuldade de pensar hierarquicamente. (KAMII; HOUMAN, 2002, p. 85).

As autoras alertam para o fato de alguns professores trabalharem o contar

para frente como uma habilidade que deve ser treinada, somente quando as

crianças superarem essa necessidade, elas contarão para frente, independente da

solicitação do professor.

Em relação ao uso de materiais para o trabalho com a adição, um caminho

comumente adotado pelo professor é ele escrever no quadro, por exemplo, 2 + 3,

efetuar a leitura para as crianças, convidando-as a separem dois (palitos, pedrinhas,

tampinhas, bolinhas de gude) e depois três (palitos, pedrinhas, tampinhas, bolinhas

de gude). Na sequência solicita-lhes para efetuem a contagem dos materiais que

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elas separaram e, por fim pergunta qual o resultado da soma. As crianças

respondem ‘cinco’ e o professor então escreve no quadro 2 + 3 = 5. Depois de

chegar ao resultado correto da operação, o professor costuma apresentar uma

situação, pensando que seus alunos já entenderam as relações envolvidas na

operação. A este respeito Kamii (1989, p. 25) assegura que “pode-se ensinar as

crianças a darem a reposta correta para 2+3, mas não será possível ensinar-lhes

diretamente as relações que subjazem esta adição.”

O uso do material concreto é recomendado nesses anos escolares, no

entanto, não é a utilização de material concreto que garante a compreensão do que

foi solicitado no problema e na resolução (SPINILLO; MAGINA, 2004). Entretanto,

não é o uso do material concreto que auxiliará o aluno na descoberta da operação a

ser empregada, sua vantagem é

oferecer referentes para as quantidades, permitindo assim, atribuir um significado à situação. Portanto, não é a presença de objetos que facilita a compreensão, mas a presença de referentes que auxiliam a criança a extrair significado da linguagem matemática formal.

Enquanto o material concreto tem a função de tornar as quantidades fisicamente manipuláveis, os referentes, por sua vez, permitem que a criança manipule as quantidades mentalmente ou utilizando formas gráficas. (SPINILLO; MAGINA, 2004, p. 10).

É agindo sobre os objetos, construindo e quantificando coleções e

coordenando estas ações na mente que a criança vai evoluindo na “estrutura do

número arimetizado, concebendo, por convicção própria, em seu espírito, diferentes

operações aditivas, justificando-as pela ‘leitura da realidade’ por ela manipulada,

transformada e operada” (RANGEL, 1992 p. 29).

A ação de operar com os números e lembrar-se dos resultados dessas ações

era o objetivo da adição que Kamii e DeClark (1994) apresentaram. Entretanto, esse

objetivo foi revisto e reformulado por Kamii e Housman (2002): “Nosso objetivo na

adição de um dígito é que as crianças se tornem capazes de pensar flexivelmente

sobre números e construir uma rede de relações numéricas.” (KAMII; HOUSMAN,

2002, p. 86 – 87). Um exemplo dessa rede de relações numéricas pode ser vista na

Figura 1.9, logo abaixo.

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Figura 1.9: Exemplo de uma rede de relações numéricas.

Fonte: Kamii e Housman (2002, p. 87).

Note que essa rede de relações numéricas inclui a subtração e noções de

multiplicação e divisão. Dessa forma, há várias maneiras de se pensar em “sete”, por

exemplo: sete é a metade de 14, é 14 menos sete, é três a mais que quatro e 3 a

menos que 10, é igual a 6 mais 1, entre outras relações que podem ser visualizadas

na figura acima.

Tal como a adição, a subtração é também é uma ação intelectual construída

pela abstração reflexionante, porém no entendimento de Kamii e Housman (2002)

A adição é fácil por que envolve apenas “ascender” de dois totais (de 5 e 4, por exemplo) para um total de ordem superior (9). [...] A subtração envolve dois níveis hierárquicos [...] e requer “descender” do total (9) para uma parte (5) e, simultaneamente, “ascender” de volta para o total (9) e “descender” para a outra parte (o número desconhecido). (KAMII; HOUSMAN, 2002, p. 105).

Do que foi explicitado pelas autoras, entendemos que a dificuldade na

subtração consiste em pensar simultaneamente, em duas direções “descentente” e

“ascendente”. Kamii e Declark (1994) afirmam que na perspectiva dos matemáticos

e dos adultos em geral, a subtração é o inverso da adição; entretanto, “Para crianças

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pequenas, subtração não é simplesmente o inverso de adição “para crianças de 1ª

série, a subtração é muito mais difícil que a adição.” (KAMII; HOUSMAN, 2002, p.

115).

Na visão dessas autoras, ensinar técnicas para que sejam usadas

mecanicamente não garante o aprendizado nem a compreensão dos conceitos

inerentes as operações de adição e subtração porque as crianças necessitam

passar pelo processo construtivo semelhante ao de nossos ancestrais para

compreender os algoritmos empregados atualmente.

Quando o professor ensina o algoritmo sem significado para o aluno induz as

crianças a pensarem que a Matemática precisa ser memorizada e dessa forma,

abandonam suas hipóteses sobre quantidade, números etc., para repetirem o que

está sendo apresentado a elas. Para Kamii (1999), a utilização do algoritmo formal é

prejudicial para crianças dos primeiros anos do ensino fundamental, porque força a

criança a desistir do pensamento numérico, torna a criança condicionada ao arranjo

espacial dos dígitos.

Se a criança inventa uma técnica como contar nos dedos, aquele método é dela própria, baseado na sua maneira de pensar. Quando lhe ensinamos uma técnica inventada, estamos ensinando-lhe uma coisa que vem do exterior que ela vai usar mecanicamente para dar respostas que agradam aos adultos. (KAMII; DECLARK, 1994, p. 140).

Dessa forma, entendemos que o ensino baseado em regras memorização

falha ao dar ênfase a técnicas, sinais convencionais e algoritmos em vez de

encorajar o desenvolvimento da capacidade de raciocínio da criança.

As autoras também defendem que a educação deve formar alunos

autônomos, que possam raciocinar por si mesmos em qualquer situação. Salienta

que cabe ao professor estar atento a todas as situações de sala de aula e afirma

que a capacidade de pensar não é desenvolvida apenas nas aulas de matemática,

“ela está enraizada na capacidade geral de pensar da criança”. (KAMII; DECLARK,

1994, p. 225).

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1.4 Estudos Correlatos

Apresentaremos nesta seção, a revisão de literatura destacando alguns

estudos que consideramos relevantes a esta investigação. Os estudos que fazem

parte da presente revisão, possuem enfoque na construção do conceito de número.

Em seus estudos, realizados no norte do Paraná, Burgo (2007) investigou

quais eram as concepções de ensino de número para crianças de 4 a 6 anos de

idade entre dez professores de Educação Infantil, que atuavam em escolas da rede

pública e privada. A autora realizou entrevista semiestruturada com os professores

investigados e como proposta para o ensino de número numa situação lúdica,

aplicou ao grupo de professores o jogo Quantifica e a situação Brincar de Casinha.

O pano de fundo da investigação foi a teoria piagetiana de construção de

número. Partiu da leitura do livro: A gênese do número na criança” de Piaget e

Szeminska e analisou algumas obras que divulgaram as ideias de Jean Piaget no

Brasil.

A autora afirma que, para que haja compreensão dos números, a criança

necessita estabelecer a relação quantitativa entre determinados elementos e o

número correspondente a essa quantidade. E exemplifica, – a relação entre 8

elementos e o número 8. Para chegar a esse entendimento, a criança deve fazer

uma síntese operatória entre procedimentos de classificação e de seriação, uma vez

que o número designa “uma classe de objetos seriados”. O número 5, por exemplo,

corresponde a uma classe de 5 elementos e, ao mesmo tempo, pertence a uma

série.

A autora aponta a existência de um destaque nas atividades pré-numéricas

na pré-escola que induzem a criança a efetuar correspondências do tipo provocada,

como requisito para a construção do número. Em relação à abordagem da

reciprocidade entre ordinais e cardinais, poucos são os livros que tratam deste

detalhe, sendo o de Kamii uma exceção. A autora reforça que, em quase todos os

livros, a questão metodológica ou pedagógica recomenda a construção linear do

número com estabelecimento primeiro das classes e das séries, para só depois vir o

número.

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Burgo (2007), afirma que o desconhecimento que o professor possui sobre a

natureza do número e sobre como a criança constrói esse conceito faz com que eles

entendam que ensinar consiste em repetição, treino e exercício até que os alunos

repitam o que foi transmitido corretamente. Porém, a construção do conceito de

número sugere relações de classe, de série, de relações de igualdade e diferença. É

uma construção solidária e interdependente entre classes, séries e números.

Em relação às operações aditivas e multiplicativas, a autora reforça que elas

já se encontram subentendidas no número, porque um número é a reunião aditiva

das unidades e a correspondência termo a termo entre duas coleções envolve uma

multiplicação.

Burgo (2007) investigou, também, a formação dos professores polivalentes

que estavam atuando na Educação Infantil, e sinalizou que os currículos vigentes

não privilegiam nem o conhecimento matemático nem o de psicologia da

aprendizagem que possibilitem uma ação pedagógica que favoreça esse trabalho

com números.

Foi observada, ainda pela autora, a existência de uma dissociação do

discurso e da prática docente dos professores investigados que pode ser

evidenciada pelas respostas às indagações: I) Você acredita que a criança aprende

ou constrói o conceito de número? II) Como você sabe se o aluno construiu

(aprendeu) o conceito de número?

As respostas à primeira questão demonstraram que os sujeitos investigados

possuíam as noções básicas do construtivismo como podemos perceber pelas

categorias de análise desta pergunta: a) Construção no dia a dia, na escola (6); b)

Construção por jogos e brincadeiras (3); c) Construção por etapas (estágio) (1). Em

relação às respostas dadas à segunda pergunta, a autora encontrou uma concepção

empirista no relado da prática docente dos professores investigados, o que pode ser

notado pelas respostas: a) saber contar, contagem; (5); b) associar número e

quantidade (5) e c) usar a matemática para resolver problemas do dia a dia (1).

Uma dicotomia foi encontrada também nas respostas às indagações: No

processo de aprendizagem, qual o papel do professor? A maioria das professoras

(oito) concebe esse papel com um perfil construtivista, ou seja, como mediador, que

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auxilia e direciona as situações de aprendizagem e duas como transmissor de

conhecimento, em uma concepção empirista. Já na pergunta: No processo de

aprendizagem qual o papel do aluno?, Seis professoras enfatizam o perfil de aluno

receptor (e uma concepção empirista de aluno) e quatro apresentam um perfil

construtivista.

Em sua análise, a autora afirma que, para as professoras investigadas, o

ensino do número para crianças da educação infantil passa por várias concepções,

em termos de discurso, apresentam noções construtivistas e mesmo na prática

essas se fazem presentes. Porém, permanecem como crença das professoras

muitos postulados empiristas. A autora destaca o mais firme entre as nossas

professoras, o de que os conhecimentos são externos aos aprendizes. Ou seja, o

conhecimento matemático está nos objetos e, dessa forma, a aprendizagem vem de

fora para dentro dos alunos. Mesmo com o discurso e propostas pedagógicas -jogos,

resolução de problemas - adjacentes ao construtivismo, a ideia de transmissão, o

entendimento do aluno como receptor, permanece entre as professoras

investigadas.

Os resultados sugeriram que as concepções das professoras de Educação

Infantil em relação ao ensino de número são empiristas, mescladas de situações do

contexto construtivista, prevalecendo a orientação da prática, em detrimento da

teoria em seu cotidiano.

Apesar desse panorama, as sugestões metodológicas, apresentadas pelas

professoras nas situações lúdicas, mostraram-se construtivistas, propondo

atividades lógicas e numéricas sincrônicas e solidárias, emergindo daí uma

concepção construtivista com a proposta de atividades que contemplam, claramente,

a construção do conceito de número na perspectiva piagetiana, sem que, no

entanto, mostrassem consciência deste fato.

Com o objetivo de oferecer um modelo conceitual de número baseado nos

princípios de aprendizagem da Análise do Comportamento e no paradigma de rede

de relações equivalentes, propondo aproximações entre a produção da Análise do

Comportamento e os Educadores que lidam com o ensino e a aprendizagem da

matemática. Carmo (2002) enfoca a aprendizagem do conceito de número a partir

de uma perspectiva behaviorista.

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O pano de fundo dos estudos do referido autor é a formação do professor de

Matemática, a preocupação de esse professor refletir sobre sua prática docente e a

necessidade de debruçar-se sobre a aprendizagem de conceitos matemáticos

fundamentais, como é o caso do conceito de número.

Em seus estudos o autor propõe a substituição do termo conceito de número

por comportamento conceitual numérico pois segundo esse autor, o conceito de

número remete a processos cognitivos e, dessa forma são internos ao indivíduo, o

que dificulta relações mais amplas de interação entre o indivíduo e o ambiente; já o

comportamento conceitual numérico enfatiza as relações mantidas entre os eventos

ambientais, possibilitando a descrição operacional dos desempenhos que compõem

uma rede de relações numéricas equivalentes. Percebemos que o autor, mesmo

utilizando uma perspectiva behaviorista, entende que o conceito de número é uma

construção interna ao indivíduo tal como defende Piaget.

Carmo (2002) argumenta que, provavelmente por considerarmos os

algarismos algo tão conhecido, que ao falarmos em número, utilizamos esse termo

como sinônimo de numeral. Em outras palavras, o numeral (a representação

simbólica do número) é confundido com o número (ideia abstrata). Decorre daí,

possivelmente, a precipitação no julgamento de que uma criança “já sabe” o que é

número pelo fato de ela identificar de maneira correta um numeral. Entretanto, dizer

que uma criança apresenta a relação numeral-quantidade, não garante que a

relação inversa, quantidade-numeral, já tenha sido dominada por ela.

O autor, utilizando as palavras de Vegnaud afirma que o conceito de número

não pode ser separado das suas funções e propriedades que as principais noções

fundamentais ao conceito de número são a cardinalidade, a adição e a ordem.

Discute, ainda, questões ligadas à formação do professor, às possíveis

contribuições que a Análise do Comportamento pode oferecer à prática dos

professores e as possibilidades de aproveitamento escolar do modelo de rede de

relações elaborado pelo autor em seus estudos.

O autor defende a ideia de que não há apenas um comportamento conceitual

numérico e sim comportamentos conceituais numéricos cujos componentes são

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gerados e mantidos por nossa cultura. A rede de relações numéricas, utilizada pelo

autor, embasou três estudos:

I) estudo experimental com adolescentes com atraso no desenvolvimento

cognitivo, verificou-se quais relações numéricas já haviam sido adquiridas, quais

relações poderiam ser ensinadas e quais emergiram sem ensino direto, completando

a rede de relações numéricas. Os resultados demonstraram a possibilidade de uso

da rede na ampliação do repertório pré-matemático dos participantes.

II) estudo em forma de levantamento, quando se questionaram a futuros

professores de matemática sobre “o que é número” e “quando você considera que

uma criança já sabe o que é número” partindo da hipótese de que as declarações

seriam mais apuradas e, deste modo, diferente do senso comum. Entretando, os

resultados demonstraram um equívoco por parte dos participantes da pesquisa que

consideram os números como símbolos para representação de quantidade, o que

evidencia o pouco conhecimento dos licenciandos quanto ao conceito de número,

sem nenhuma coesão quanto aos critérios empregados para avaliar se uma criança

já sabe o que é número.

III) estudo comparativo, quando foram comparadas as respostas dadas por

estudantes de pedagogia e pós graduandos em educação, às mesmas perguntas do

estudo II. As respostas dos alunos levantam indícios de uma grande proximidade

entre suas concepções e as concepções do senso comum, pelo menos quanto ao

conceito do conceito de número, pois o critério mais citado foi a relação numeral-

quantidade, o que demonstra a não existência de um refinamento conceitual. Dessa

forma, os resultados replicam as respostas dos estudantes de Matemática.

Frente a essas evidências, Carmo (2002) afirma que qualquer que seja a

abordagem teórica adotada pelo professor, as situações de aprendizagem deveriam

proporcionar aos alunos a oportunidade de produzir descobertas que por si só são

motivadoras, ao invés de atividades que sempre dependam da concordância final do

professor. Dessa forma, o autor designa por situações desafiadoras como sendo

arranjos no ambiente de aprendizado que “provoquem” ações gerais no aluno em

busca de prováveis saídas, soluções e interpretações, e não simplesmente a

emissão de informações já prontas.

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O autor observa que se considerarmos a proposta apresentada por ele em

seus estudos, não haverá sentido em falar em conceito de número como algo pronto

e sim de um conceito que se transforma a partir de novos contextos culturais. Ou

seja, os repertórios numéricos se modificariam, a partir de novas contingências a

que são expostos.

Em seus estudos, Dehaene (2010), destaca que os números são como as

cores, elas não existem no mundo físico, é um atributo criado por uma área do nosso

cerebro que calcula o comprimento da onda de luz em relação ao reflexo dos

objetos. O autor ainda apresenta o exemplo de que uma banana tende a pemanecer

amarela independente das condições de iluminação. Isto é apenas uma qualidade

pessoal construída mentalmente sendo possível porque nossa capacidade de

percepção das cores evoluiu até nosso estágio atual.

A alegação do autor é que como vivemos em um mundo cheio de objetos

singulares e móveis, é extremamente útil a capacidade de extrair o número dos

objetos físicos. Ele acredita que, pelo menos a teoria dos números, “é uma pirâmide

cada vez mais abstrata de construções mentais baseadas unicamente em (1) nossa

capacidade de notação simbólica, e (2) nossa capacidade não-verbais para

representar e compreender quantidades numéricas.” 4(tradução livre)

Dessa forma, o autor vem corroborar as ideias de Piaget, quando afirma que

o número é uma sintese feita por abstração reflexionante, portanto pela nossa

capacidade mental para representar e compreender quantidades numéricas.

No próximo capítulo, abordaremos o entendimento de número, segundo os

documentos oficiais: os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, os Referenciais

Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – RCNEI e as Diretrizes Curriculares

para o Ensino Fundamental – Matemática do Estado da Bahia.

4 I believe that mathematics, or at least arithmetic and number theory, is a pyramid of increasingly more abstract mental constructions based solely on (1) our ability for symbolic notation, and (2) our nonverbal ability to represent and understand numerical quantities.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 22 OO NNÚÚMMEERROO NNAA PPEERRSSPPEECCTTIIVVAA DDAASS

PPOOLLÍÍTTIICCAASS PPÚÚBBLLIICCAASS BBRRAASSIILLEEIIRRAA

Neste capítulo, apresentamos o entendimento de número, segundo os

documentos oficiais e as pesquisas sobre o tema. Entretanto, faz-se necessário

pontuar sobre o sistema educacional brasileiro e a inclusão da criança, com seis

anos de idade, no primeiro ano na Educação Básica.

2.1 O Sistema Educacional Brasileiro

Apresentaremos um breve panorama do sistema educacional brasileiro e a

inclusão da criança com seis anos de idade, no Ensino Fundamental.

O sistema educacional brasileiro é estruturado em dois níveis: a Educação

Básica, que abrange o Ensino Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio e, a

Educação Superior, que abrange a Graduação e a Pós-Graduação.

Em 1937, foi estabelecida no País a obrigatoriedade do Ensino Primário para

alunos de 7 a 10 anos, pela Constituição de 1934 e, em seguida, ratificada nas

Constituições de 1937 e de 1946. Posteriormente, a Constituição de 1967 estendeu

a obrigatoriedade para a faixa de 7 a 14 anos, reafirmada pela Lei 5.692/1971, Lei

de Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus.

Os avanços e as tentativas de inovações na Educação passaram a ser mais

observados a partir da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB), Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que chegou para atender

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aos desafios educacionais da época. Nela, há a mobilização em relação ao direito

do indivíduo à Educação, consta à busca de um vínculo entre a escola, o trabalho e

a cidadania, prevê a valorização da aprendizagem, do conhecimento e dos

profissionais da Educação, deixando claro que, para haver o reconhecimento e a

valorização do professor, não é necessária apenas a melhoria salarial, mas também

a qualificação profissional. A LDB reconheceu a importância da educação de

crianças de zero a seis anos, recomendando o seu acompanhamento durante toda a

sua trajetória escolar, buscando oferecer subsídios para que os alunos sejam

autônomos e conscientes de suas respostas perante os problemas da vida.

Com relação às orientações curriculares para a Educação Básica, o Ministério

da Educação (MEC) publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) das

diferentes disciplinas do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Esses documentos

apresentam diferentes propostas e direcionamentos para elaboração do currículo

escolar, entre eles o da Matemática. Servem de referência para as Secretarias de

Educação municipais e estaduais elaborarem suas propostas curriculares e dão o

norte para autores elaborarem os materiais didáticos.

Segundo Pires (2010), a finalidade do MEC em propor os PCN foi de fornecer

elementos de discussão para:

ampliar o debate nacional sobre o ensino de Matemática e socializar informações, resultados de pesquisas, levando-as ao conjunto dos professores brasileiros, para que possam projetar seu trabalho de forma a reverter o quadro atual, que torna essa disciplina altamente seletiva e muito pouco atraente aos alunos.

construir um referencial que oriente a prática escolar de forma a garantir, a toda criança brasileira, o acesso a um conhecimento matemático que lhe possibilite de fato sua inserção, como cidadã, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura.

nortear a formação inicial e continuada de professores (na medida em que se tornam claros os fundamentos do currículo, fica implícito o tipo de formação que se pretende para o professor) e para orientar a produção de livros e de outros materiais didáticos, contribuindo dessa forma, para a configuração de uma política voltada à melhoria do ensino fundamental. (PIRES, 2010, p. 3).

Em 1998, o MEC também publicou o Referencial Curricular Nacional para a

Educação Infantil (RCNEI) que apresenta “referências e orientações pedagógicas

que visam contribuir com a implementação de práticas educativas de qualidade que

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possam promover e ampliar as condições necessárias para o exercício da cidadania

das crianças brasileiras” (BRASIL, 1998, p. 13). Sua função é socializar informações,

discussões e pesquisas para auxiliar o trabalho dos professores e demais

profissionais da Educação Infantil.

Em seis de fevereiro de 2006, a Lei nº 11.274/2006, ampliou o número de

anos do Ensino Fundamental, instituindo nove anos de duração para esse nível de

ensino. Nesse sentido, a matrícula para o início desse ensino foi antecipada de sete

para seis anos, para ingresso no 1º ano do Ensino Fundamental. Passaremos a

discutir sobre essa mudança.

2.1.2 A Inclusão da Criança com Seis Anos no Ensino Fundamental

A passagem da criança de seis anos da Educação Infantil para o Ensino

Fundamental solicita aos educadores uma nova maneira de pensar e realizar o

processo educativo, pois não há uma orientação clara para os professores sobre o

que deve ser ensinado a essa criança.

Para a implantação dessa inclusão, o MEC elaborou o documento Ensino

Fundamental de Nove Anos: Orientações para a Inclusão das Crianças de Seis Anos

de Idade (2006). Segundo o documento, o objetivo dessa inclusão é assegurar um

tempo mais longo de convívio escolar com maiores oportunidades de aprendizagem

para a criança.

No referido documento, estão estabelecidas as orientações gerais para a

implantação do Ensino Fundamental de nove anos, solicitando uma preservação do

trabalho realizado na Educação Infantil, tendo em vista que o 1º ano escolar da

criança não é apenas a preparação dela para a série seguinte.

Nessa perspectiva, Corsino (2010) pondera que “não se trata de transferir

para a criança de 6 anos conteúdos e atividades da 1ª série tradicional” (p. 1),

implicando a reflexão de que o tratamento a ser dado é a construção de uma

proposta pedagógica coerente com o perfil específico desse aluno. A autora reforça

ser necessário assegurar que a transição da Educação Infantil para o Ensino

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Fundamental ocorra do modo mais natural possível, “não provocando nas crianças

rupturas e impactos negativos no seu processo de escolarização.” (CORSINO, 2010,

p. 2)

Dessa forma, torna-se essencial que a escola, para receber a criança com

seis anos no Ensino Fundamental, reorganize seu espaço, os materiais, os

conteúdos, os objetivos, as situações de aprendizagem e a avaliação de modo que

permitam ao aluno condições de se sentir inserido e acolhido num ambiente propicio

à aprendizagem.

Em relação a essa reorganização, Rangel (1992), fundamentada na teoria

psicogenética de Piaget, aponta a necessidade de que o currículo de Matemática

dos anos iniciais do Ensino Fundamental seja redefinido, a partir da investigação dos

mecanismos empregados pela criança na construção do número e dos conceitos

matemáticos subsequentes em sua atividade espontânea sobre o meio adjacente no

qual interage.

Com relação à discussão curricular e as recomendações do documento

Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientações para a Inclusão das Crianças de

Seis Anos de Idade, Corsino (2006) alega que o currículo para o 1º ano do Ensino

Fundamental de nove anos deve ser organizado em grandes áreas:

Figura 2.1: Organização curricular para o 1º ano do Ensino Fundamental de nove anos

Fonte: Elaborado a partir da leitura do documento Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientações para a Inclusão das Crianças de Seis Anos de Idade (2006).

Nossa atenção volta-se para as noções lógico-matemáticas. Pautando-se em

Kamii (1989), Corsino (2006) explicita que o objetivo do trabalho com estas noções é

o estabelecimento de relações com objetos, eventos, situações e ações por parte da

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criança. Nessa perspectiva, o documento Ensino Fundamental de Nove Anos:

Orientações para a Inclusão das Crianças de Seis Anos de Idade evidencia que,

Encorajar as crianças a identificar semelhanças e diferenças entre diferentes elementos, classificando, ordenando e seriando; a fazer correspondências e agrupamentos; a comparar conjuntos; a pensar sobre números e quantidades de objetos quando estes forem significativos para elas, operando com quantidades e registrando situações-problema (inicialmente de forma espontânea e, posteriormente, usando a linguagem matemática). [...] Especialmente nessa área, é fundamental o professor fazer perguntas as crianças para poder intervir e questionar a partir da lógica delas. (BRASIL, 2006, p. 60, grifo nosso).

Pela citação acima, percebemos que é sugerido ao professor o trabalho

com as operações lógicas e que este considere importante a lógica das crianças,

quando efetuar questionamentos e intervenções. Tal documento, no entanto, não

avança em suas sugestões em relação ao trabalho com as noções-lógico-

matemáticas.

Trataremos, a seguir, das orientações que os documento oficiais apresentam

para o ensino de número nos anos inicais do Ensino Fundamental.

2.2 O Ensino de Número Segundo os Documentos Oficiais

Fomos buscar nas recomendações dos documentos oficiais o entendimento

sobre o ensino de número. Os documentos de que trataremos nesta investigação

serão o PCN, o RCNEI e as Diretrizes Curriculares de Matemática para o Ensino

Fundamental, do Estado da Bahia. Assim, nesta seção, descreveremos as

orientações que tais documentos apresentam para o ensino de número, nos anos

iniciais do Ensino Fundamental.

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2.2.1 O Número segundo os PCN

A ideia dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática, 1ª a 4ª séries5,

é a construção de referenciais com pontos em comum em relação aos princípios e

metas educacionais para o país, relacionando a vida cotidiana com o conhecimento

numa relação dialética.

Assim, esses documentos constituem referência para o ensino dessa

disciplina, nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, indicando metas para

o ensino, ensino esse que deve estar voltado à formação do aluno como cidadão,

que utiliza, cada vez mais, os conceitos matemáticos em suas relações do contexto

social.

Os parâmetros têm como objetivo auxiliar o professor no desenvolvimento de

situações de aprendizagem que requerem tratamento de conceitos matemáticos. A

organização desse documento possibilita uma perspectiva das expectativas de

ensino e de aprendizagem para os dois primeiros ciclos do Ensino Fundamental, o

que implica uma divisão das séries desse segmento de ensino: a primeira parte

corresponde à 1ª e 2ª séries, a segunda parte à 3ª e 4ª séries.

Ressaltamos que o referido documento foi publicado no ano de 1997, época

em que o Ensino Fundamental era organizado em oito anos, não havendo dessa

forma, um tratamento exclusivo para os anos iniciais do novo Ensino Fundamental

de 9 anos.

O referido documento recomenda que, para uma boa abordagem dos

conteúdos, o professor reflita sobre o papel do próprio PCN (1997) e como utilizá-lo

de modo a atingir os objetivos proposto.

Com relação ao número, de forma bastante simples, pode-se dizer que é um indicador de quantidade (aspecto cardinal), que permite evocá-la mentalmente sem que ela esteja fisicamente presente. É também um indicador de posição (aspecto ordinal), que possibilita guardar o lugar ocupado por um objeto, pessoa ou acontecimento numa listagem, sem ter que memorizar essa lista integralmente. Os números também são usados como código, o que não tem necessariamente ligação direta com o aspecto

5 Quando o documento (PCN) foi elaborado o Ensino Fundamental era composto por oito anos escolares, os quais eram chamados por “séries”. Desta forma, como estamos apresentando uma visão da política pública educacional para o início da escolarização obrigatória trataremos esses anos escolares pelo mesmo termo utilizado pela PCN qual seja, SÉRIE.

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cardinal, nem com o aspecto ordinal (por exemplo, número de telefone, de placa de carro, etc.).

No entanto, essas distinções não precisam ser apresentadas formalmente, mas elas serão identificadas nas várias situações de uso social que os alunos vivenciam e para as quais o professor vai lhes chamar a atenção.

É a partir dessas situações cotidianas que os alunos constroem hipóteses sobre o significado dos números e começam a elaborar conhecimentos sobre as escritas numéricas, de forma semelhante ao que fazem em relação à língua escrita. (BRASIL, 1997, p. 48).

Percebemos que o referido documento trata o número em seu aspecto

cardinal, ordinal e como código. Destacamos, também, que essa distinção deve ser

construída pelas crianças e, para isso, cabe ao professor chamar a atenção de seus

alunos para as situações cotidianas vivenciadas por eles e propor atividades em que

os discentes experienciem situações que solicitem a distinção entre os diferentes

significados de número.

A sugestão do PCN vai ao encontro da perspectiva de Maranhão (2005), “a

significação de um número vai se dar pelo seu emprego” (MARANHÃO, 2005, p. 2).

Assim, é necessário que o professor ofereça oportunidades para que o aluno

construa significados para o número, de acordo com os contextos apresentados,

pois, “à medida que se deparar com situações-problema – envolvendo adição,

subtração, multiplicação, divisão, potenciação e radiciação – ele irá ampliando seu

conceito de número.” (BRASIL, 1997, p. 39). Entendemos que cabe ao professor

proporcionar um exercício de aproximação de seus alunos com atividades que

envolvam números, operações, formas, espaço e organização de informações, para

que o aluno possa ampliar seu conhecimento matemático.

As operações lógicas são também consideradas nos PCN de Matemática

(BRASIL, 1997). No documento, recomenda-se que o trabalho com as operações

seja combinado aos demais conteúdos, desde os anos iniciais. Como exemplo, o

referido documento apresenta “ao estudarem números, os alunos podem perceber e

verbalizar relações de inclusão, como a de que todo número par é natural; mas

observarão que a recíproca dessa afirmação não é verdadeira, pois nem todo

número natural é par.” (BRASIL, 1997, p. 54).

O objetivo do ensino de Matemática no primeiro ciclo, em relação ao ensino

de número, espera-se levar o aluno a:

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Construir o significado do número natural a partir de seus diferentes usos no contexto social, explorando situações-problema que envolvam contagens, medidas e códigos numéricos.

Interpretar e produzir escritas numéricas, levantando hipóteses sobre elas, com base na observação de regularidades, utilizando-se da linguagem oral, de registros informais e da linguagem matemática. (BRASIL, 1997, p. 47).

Percebe-se que, para formar o aluno como cidadão consciente da realidade,

espera-se que sejam apresentadas a ele propostas diferentes de atividades

envolvendo resolução de situações-problema, as quais podem estar

contextualizadas no mundo-vida do aluno, favorecendo a reflexão e a construção de

significados dos conceitos matemáticos. Nessa perspectiva, os PCN (1997)

recomendam atividades problematizadoras, que necessitam da postura mediadora

do professor, no sentido de encaminhar o aluno às descobertas e à construção da

aprendizagem, estimulando para que sejam utilizadas diferentes estratégias de

resolução.

Quanto a estratégias de avaliação nas aulas de Matemática, o referido

documento recomenda que, ao final do primeiro ciclo, o aluno saiba:

Resolver situações-problema que envolvam contagem e medida, significados das operações e seleção de procedimentos de cálculo.

Ler e escrever números, utilizando conhecimentos sobre a escrita posicional.

Comparar e ordenar quantidades que expressem grandezas familiares aos alunos, interpretar e expressar os resultados da comparação e da ordenação.

Medir, utilizando procedimentos pessoais, unidades de medida não-convencionais ou convencionais (dependendo da familiaridade) e instrumentos disponíveis e conhecidos.

Localizar a posição de uma pessoa ou um objeto no espaço e identificar características nas formas dos objetos. (BRASIL, 1997, p. 53 – 54).

A expectativa é a de que o aluno resolva situações-problema, seja por meio

de situações orais, textuais ou até mesmo, pelas representações matemáticas para

fazer mobilizar seu repertório de conhecimento sobre números, medidas e

significados das operações.

Em relação ao número, espera-se que o aluno possua capacidade de utilizá-

lo como um “instrumento para representar e resolver situações quantitativas

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presentes no cotidiano”, identificando, comparando, ordenando quantidades, bem

como localizá-lo numa sequência numérica.

2.2.2 O Número na Perspectiva dos RCNEI

Resgatamos o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil

(RCNEI), pois, ao ser elaborado, em 1998, levou em consideração orientações para

profissionais que trabalham com crianças de zero a seis anos. Pelo novo Ensino

Fundamental, as crianças devem completar seis anos até o final do ano letivo, por

isso acreditamos que traga direções sobre o ensino de número. Nesse documento, é

evidente o cuidado com o papel social da Matemática, ao afirmar que o trabalho com

essa disciplina pode contribuir para a formação de cidadãos autônomos, capazes de

pensar por conta própria, sabendo resolver problemas.

Verificamos, também, a preocupação no sentido de que a criança aprenda a

comunicar ideias matemáticas, seja por meio da linguagem oral e da linguagem

matemática, e que possam se comunicar e expor suas hipóteses, ideias,

pensamentos e resultados (BRASIL, 1998). No entanto, embora o referido

documento apresente essa preocupação, não encontramos orientação evidente

sobre como se apresentará a aproximação da língua materna com a linguagem

matemática e suas representações escritas.

O documento explicita que o desenvolvimento das pesquisas em Educação

Matemática e estudos sobre o desenvolvimento da criança tornaram possível

questionar a concepção de que a criança aprende por meio da memorização,

repetição e associação. Nessa perspectiva,

Há uma idéia corrente de que as crianças aprendem não só a Matemática, mas todos os outros conteúdos, por repetição e memorização por meio de uma seqüência linear de conteúdos encadeados do mais fácil para o mais difícil. São comuns as situações de memorização de algarismos isolados, por exemplo, ensina-se o 1, depois o 2 e assim sucessivamente. Propõe-se exercícios de escrita dos algarismos em situações como: passar o lápis sobre numerais pontilhados, colagem de bolinhas de papel crepom sobre numerais, cópias repetidas de um mesmo numeral, escrita repetida da sucessão numérica. Ao mesmo tempo, é comum enfeitar os algarismos, grafando-os com figuras de bichos ou dando-lhes um aspecto humano, com olhos, bocas e cabelos, ou ainda, promovendo associação entre os

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algarismos e desenhos, por exemplo, o número 2 associado a dois patinhos. Acredita-se que, dessa forma, a criança estará construindo o conceito de número. (BRASIL, 1998, p. 209).

Essa é uma perspectiva empirista, a qual concebe a aprendizagem como uma

construção pela associação, memorização e repetição, defendendo-se que, dessa

forma, a criança construiria o conceito de número.

Embora o Referencial Curricular questione essa concepção – a de que a

criança aprende por meio da memorização, repetição e associação – na seção

Jogos e Brincadeiras, do referido documento, apresentam-se as mnemônicas que

são rimas sem música para fixar ou ensinar número ou nomes,

As mnemônicas referem-se a conteúdos específicos, destinados a fixar ou ensinar algo como número ou nomes: “Um, dois, feijão com arroz/ Três, quatro, feijão no prato/ Cinco,seis, feijão inglês/ Sete, oito, comer biscoito/ Nove, dez, comer pastéis...”, ou “Una, duna, tena,catena/ Bico de pena, solá, soladá/ Gurupi, gurupá/ Conte bem que são dez...”. (BRASIL, 1998, p. 71).

Apesar de questionar a memorização e a repetição como recurso para a

aprendizagem, o referido documento não as descartam como possibilidade para o

ensino do número.

Tal como os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (BRASIL,

1997), as operações lógicas são também consideradas no RCNEI (1998) para o

ensino da Matemática e, especialmente, para o ensino de número:

o ensino da Matemática seria beneficiado por um trabalho que incidisse no desenvolvimento de estruturas do pensamento lógico-matemático. Assim, consideram-se experiências-chave para o processo de desenvolvimento do raciocínio lógico e para a aquisição da noção de número as ações de classificar, ordenar/seriar e comparar objetos em função de diferentes critérios. (BRASIL, 1998, p. 210).

O documento adverte, no entanto, para que o professor não converta as

operações lógicas em conteúdos de ensino, pois as mesmas já são utilizadas no

cotidiano da criança, como, por exemplo, quando guarda determinado jogo em

caixa, ela seleciona as peças que fazem parte daquele jogo das peças que não

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fazem e, dessa forma, ela classifica as peças incluindo-as numa relação de

pertinência a determinado jogo.

A classificação e a seriação têm papel fundamental na construção de conhecimento em qualquer área, não só em Matemática. Quando o sujeito constrói conhecimento sobre conteúdos matemáticos, como sobre tantos outros, as operações de classificação e seriação necessariamente são exercidas e se desenvolvem, sem que haja um esforço didático especial para isso. (BRASIL, 1998, p. 210).

A sugestão de RCNEI vai ao encontro das ideias de Lorenzato (2006) que

ressalta a importância de o professor conhecer as operações lógicas porque as

mesmas são relevantes na construção do conhecimento, principalmente do

conhecimento matemático.

O RCNEI sugere que a abordagem da Matemática para a faixa etária de

quatro a seis anos seja o aprofundamento e a ampliação das aproximações com as

noções matemáticas presentes no cotidiano das crianças, garantindo a oportunidade

para que sejam capazes de

reconhecer e valorizar os números, as operações numéricas, as contagens orais e as noções espaciais como ferramentas necessárias no seu cotidiano;

comunicar idéias matemáticas, hipóteses, processos utilizados e resultados encontrados em situações-problema relativas a quantidades, espaço físico e medida, utilizando a linguagem oral e a linguagem matemática;

ter confiança em suas próprias estratégias e na sua capacidade para lidar com situações matemáticas novas, utilizando seus conhecimentos prévios. (BRASIL, 1998, p. 215)

Depreendemos a existência de uma preocupação com a comunicação das

ideias matemáticas, pelas crianças, por meio da linguagem oral e matemática,

referente à sua utilização para expressar hipóteses, procedimentos e resultados.

A escolha e a disposição dos conteúdos necessitam a consideração dos

conhecimentos prévios dos alunos e as possibilidades de desenvolvimento de seu

processo cognitivo. Nesse sentido, a aprendizagem de Matemática, para o referido

documento, é um processo sucessivo de abstração, em que os significados e

relações são estabelecidos com base no que as crianças observam, experimentam e

agem, sobre os elementos do ambiente físico e sociocultural (BRASIL, 1998).

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A competência matemática, segundo o documento, é construída

paralelamente ao desenvolvimento de outras competências, tais como comunicar-se

por meio da fala, efetuar leituras e escritas, cantar, etc. Os conteúdos estão

organizados em três blocos: Números e Sistema de Numeração, Grandezas e

Medidas e Espaço e Forma. É afirmado, no referido documento, que os alunos

vivenciam esses conteúdos de forma integrada e que e a disposição dos conteúdos

apresentada proporciona a visibilidade dos conhecimentos matemáticos que serão

trabalhados. Buscaremos o entendimento do RCNEI em relação ao ensino e

aprendizagem do número no bloco Números e Sistema de Numeração.

Esse bloco abrange contagem, notação e escrita numéricas e as operações

matemáticas e, assim, prevê a

Utilização da contagem oral nas brincadeiras e em situações nas quais as crianças reconheçam sua necessidade.

Utilização de noções simples de cálculo mental como ferramenta para resolver problemas.

Comunicação de quantidades, utilizando a linguagem oral, a notação numérica e/ou registros não convencionais.

Identificação da posição de um objeto ou número numa série, explicitando a noção de sucessor e antecessor.

Identificação de números nos diferentes contextos em que se encontram.

Comparação de escritas numéricas, identificando algumas regularidades. (BRASIL, 1998, p. 217).

Para os Referenciais Curriculares, convivemos diariamente com os números,

e eles servem para “memorizar quantidades, para identificar algo, antecipar

resultados, contar, numerar, medir e operar.” (BRASIL, 1998, p. 220). De acordo

com o referido documento, a contagem é uma tática vital para que seja estabelecida

a quantidade de objetos de um determinado conjunto e

Isso fica evidenciado, quando se busca a propriedade numérica dos conjuntos ou coleções em resposta à pergunta “quantos?” (cinco, seis, dez etc.). É aplicada também quando se busca a propriedade numérica dos objetos, respondendo à pergunta “qual?”. Nesse caso está também em questão o valor ordinal de um número (quinto, sexto, décimo etc.)”. (BRASIL, 1998, p. 220).

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A ideia de contagem apresentada pelo RCNEI vai ao encontro do

entendimento apresentado por Fayol (1996): “a contagem [...] repousa sobre um

conhecimento abstrato que diz respeito à ordem e à cardinalidade.” (p. 60).

Quando a criança se depara com os números em contextos diversificados, ela

constrói hipóteses a partir do uso que faz deles em sua vivência. É quando cabe ao

professor convidar seus alunos a refletirem que

Nem sempre um mesmo número representa a mesma coisa, pois depende do contexto em que está. Por exemplo, o número dois pode estar representando duas unidades, mas, dependendo da sua posição, pode representar vinte ou duzentas unidades; pode representar uma ordem, segundo, ou ainda representar um código (como nos números de telefone ou no código de endereçamento postal). Compreender o atual sistema numérico envolve uma série de perguntas, como: “quais os algarismos que o compõem?”, “como se chamam?”, “como são escritos?”, “como podem ser combinados?”, “o que muda a cada combinação?”. Para responder essas questões é preciso que as crianças possam trabalhar desde pequenas com o sistema de numeração tal como ele se apresenta.

[...] Há diversos usos de números presentes nos telefones, nas placas de carro e de ônibus, nas camisas de jogadores, no código de endereçamento postal, nas etiquetas de preço, nas contas de luz etc., para diferenciar e nomear classes ou ordenar elementos e com os quais as crianças entram em contato, interpretando e atribuindo significados. (BRASIL, 1998, p. 220).

Percebemos que o referido documento recomenda que o professor trabalhe

com os números, não só explorando que ele representa uma quantidade, mas que,

dependendo do contexto, o número pode representar ordem ou um código. Esse

aprendizado será relevante se esses números forem os que fazem parte do

cotidiano e repertório da criança e para isso é necessário “pesquisar os diferentes

lugares em que os números se encontram, investigar como são organizados e para

que servem” (BRASIL, 1998, p. 222).

O Referencial Curricular apresenta como possibilidades para que a criança

possa investigar as regularidades do sistema numérico, leitura do índice e da

numeração das páginas de um livro, colecionar em grupo álbum de figurinhas, tipos

de calendários, informações numéricas da turma (idade, número de sapato, número

de roupa, altura, peso etc.), jogos de baralho, de adivinhação, fichas que indicam a

ordinalidade – primeiro, segundo, terceiro. Ao trabalhar com essas sugestões, o

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professor permite que as crianças busquem a confirmação de suas ideias e ampliem

o repertório de seus conhecimentos.

O documento, RCNEI, indica que as crianças, ao comparar quantidades,

podem se fundamentar na contagem, na utilização dos dedos para efetuar uma

correspondência termo a termo,

Pode-se propor para as crianças de cinco e seis anos situações em que tenham de resolver problemas aritméticos e não contas isoladas, o que contribui para que possam descobrir estratégias e procedimentos próprios e originais. As soluções encontradas podem ser comunicadas pela linguagem informal ou por desenhos (representações não convencionais). Comparar os seus resultados com os dos outros, descobrir o melhor procedimento para cada caso e reformular o que for necessário permite que as crianças tenham maior confiança em suas próprias capacidades. (BRASIL, 1998. p. 225).

Entendemos que o referido documento recomenda que não sejam dadas à

criança contas isoladas como um treinamento do algoritmo formal mas, que sejam

apresentadas situações-problema que estimulem e motivem a busca de soluções,

em que os alunos possam trocar opiniões e possam argumentar, pois, dessa forma,

eles irão relacionar eventos, objetos e situações e essa relação os auxiliará na

construção do conceito de número.

A seguir, daremos continuidade à discussão das políticas públicas dos anos

iniciais da Educação Básica, a partir do Estado da Bahia. Isto porque nossa

pesquisa de campo será realizada com professoras que atuam na rede pública

desse Estado, sendo, portanto, regida por suas Diretrizes Curriculares.

2.2.3 O Número na perspectiva das Diretrizes Curriculares de Matemática para

o Ensino Fundamental, do Estado da Bahia

Gostaríamos de iniciar esta subseção informando sobre a dificuldade que

tivemos em obter este documento, pelo fato de existir um novo documento, em fase

de reestruração, segundo afirmação da Secretaria de Educação, do Município de

Jequié. Assim, só nos restou trabalhar com a última Diretriz Curricular do Estado,

publicada em 1994.

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O grupo responsável pelas diretrizes afirma que a qualidade, a coerência, a

objetividade, o rigor dos conceitos e da linguagem matemática foram uma

preocupação constante, durante o processo de elaboração para que se

configurassem com “um material de apoio à ação docente e discente que deverão

ter claros os objetivos e as intenções do processo educacional.” (BAHIA, 1994, p.

11).

É sugerido que sejam efetuadas leituras, discussões pelos profissionais que

participam da Educação. Na Introdução, o documento, entre outros

questionamentos, existe um em específico: “por que existe tão pouca relação entre a

matemática que se aprende na escola e a que se usa na vida prática?” (BAHIA,

1994, p. 15). A redação do texto é seguida pela apresentação da necessidade

básica para o ensino da Matemática, no século XXI, recomendada pelo National

Concil of supervisors da matemathcis (NSCM), áreas nas quais os alunos deverão

apresentar habilidades, entre outras a Comunicação de ideias matemáticas e

Aplicação da Matemática a situações da vida cotidiana.

De acordo com o referido documento, a Matemática se faz presente nas

diferentes linguagens do dia a dia, em relação a números, porque

aparecem a cada instante da vida: nas contagens, nas medidas, nas tabelas, nos indicadores econômicos e sociais, e nos códigos alfa-numéricos e numéricos, endereçamentos postais, telefônicos, emplacamentos de veículos, localização de ruas ou linhas de transportes, etc. Os jornais, diariamente, circulam com manchetes e matérias onde o número se apresenta como ente matemático ‘vivo”, cuja leitura será adequadamente apreendida se o indivíduo tiver uma cultura de matemática de base. (BAHIA, 1994, p. 23 – 24).

Percebemos uma preocupação desse documento com o papel social da

Matemática na construção da cidadania do aluno e o cuidado com a linguagem

matemática. Esta é considerada um dos objetivos do ensino da Matemática nessa

fase, pois, a escrita e a leitura matemática desempenham um papel significativo no

cotidiano de qualquer pessoa.

Em particular, o desenvolvimento da linguagem matemática para a criança favorece a aquisição das primeiras noções intuitivas da Matemática. Contagens, correspondência, classificações, construções de sequências, seriações, relações quantitativas, espaciais, são algumas das noções, de idéias matemáticas que, experimentadas pela criança e bem orientadas

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pelo professor, constituem a gênese do conceito de número. (BAHIA, 1994, p. 27).

Podemos verificar que são consideradas, no referido documento, as

descobertas das pesquisas em Educação Matemática sobre a construção do

conceito de número e a importância das operações lógicas. Elas são o alicerce do

nosso raciocínio, independente do assunto, conteúdo ou problemas que precisamos

enfrentar (LORENZATO, 2006). Dessa forma, é necessário que o professor articule

sua prática com atividades que possibilitem o trabalho com as operações lógicas

que, por sua vez, implicará também, na construção do conceito do número.

É ressaltado que a construção da linguagem não vislumbre apenas o

desenvolvimento lógico nem a aprendizagem de técnicas de emprego imediato e,

sim, a construção de esquemas conceituais. (BAHIA, 1994).

Segundo o referido documento, o ensino da matemática deve proporcionar

condições para que os alunos se desenvolvam como cidadãos, utilizem o

pensamento lógico estabelecendo relações e descobrindo propriedades, formulem

conceitos, analisem dados, comparem, classifiquem, ordenem, sintetizem,

generalizem, abstraiam e avaliem situações, bem como

Comuniquem os seus pensamentos matemáticos de maneira clara, precisa, utilizando as distintas formas de expressão matemática (numérica, gráfica, geométrica, lógica e simbólica).

Interpretem informações matemáticas (dados estatísticos, tabelas, gráficos...) relativos a diversos fenômenos (sociais, econômicos, científicos, matemáticos...), presentes em notícias de jornais, livros, revistas e publicidade, analisando-as criticamente, para uma melhor compreensão, estabelecendo prognósticos sobre o comportamento ou evolução dos fenômenos considerados.

[...] Empreguem números, de forma adequada em cada situação, com a precisão necessária, realizando cálculos com algoritmos básicos, com instrumentos diversos (calculadora, computador) ou, mentalmente, dependendo da natureza do problema. (BAHIA, 1994, p. 31).

No momento em que as Diretrizes Curriculares foram elaboradas, havia uma

tendência em estruturar os conteúdos de Matemática do Ensino Fundamental em

“três temas fundamentais, historicamente definidos: número, geometria e medida”

(BAHIA, 1994, p. 17). E, dessa forma, os conteúdos de cada ano escolar estão

divididos nesses blocos. A preocupação com o papel social da Matemática na

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construção da cidadania do aluno e a busca de uma prática docente construtivista e

sociointeracionista, destacadas pela proposta, não impede que os conteúdos sejam

listados por série. Tais conteúdos estão no Quadro 2.1, a seguir.

Quadro 2.1: Conteúdos de Matemática listados por série. Conteúdos da 1ª Série Conteúdos da 2ª Série

- idéia de número natural Classificação Ordenação Sequência não numéricas Comparação de quantidades Representação simbólica e literal dos primeiros números Sequência numérica: o acréscimo sucessivo de um elemento Introdução do zero e sua representação Números ordinais Ideia de ordinal Leitura e escrita em símbolo e por extenso de numerais ordinais até 10º Agrupamento e troca em diferentes bases. - numeração decimal hindu-arábica Princípio fundamental da numeração ( agrupamentos de 10 em 10 e troca de 10 por 1: unidade, dezena, centena). Leitura e escrita de números naturais (representação simbólica e literal). Composição e decomposição de numerais: unidade, dezena. Relações entre números Comparação de números naturais: igualdade e desigualdade Representação de números naturais na reta numérica: antecessor e sucessor Escrita progressiva e escrita regressiva de números naturais (ordem crescente e ordem decrescente). Números pares e números ímpares. - operações com números naturais: Adição/subtração Adição – ideia de juntar, acrescentar, adicionar. Subtração – ideia de retirar, tomar, subtrair, comparar, completar. Cálculos sem algoritmo: adição/subtração (construção dos fatos fundamentais) Representação dos fatos fundamentais da adição e da subtração Calculo mental com verbalização Algoritmo da adição sem e com reserva (técnica operatória) Verificação da exatidão da soma, usando a troca das parcelas. Resolução de problemas.

- números: Numeração decimal hindu–arábica Princípio fundamental da numeração (agrupamentos de 10 em 10 e troca de 10 por 1:unidade, dezena, centena) Leitura e escrita de números naturais (representação simbólica, literal e ordinal) Composição e decomposição de numerais: unidade, dezena, centena. Relações entre números Escrita sequencial de números naturais (2 em 2, ..., 5 em 5, ..., 10 em 10, ...) Comparação de números naturais: igualdade e desigualdade Escrita progressiva e regressiva de números naturais (ordem crescente e ordem decrescente) Antecessor e sucessor Pares e ímpares - operações com números naturais Adição Cálculo sem algoritmo (revisão dos fatos fundamentais) Cálculo mental com verbalização Algoritmo da adição sem e com reserva (técnica operatória) Verificação da exatidão da soma, usando troca de parcelas Resolução de problemas Subtração Cálculo sem algoritmo (revisão dos fatos fundamentais) Cálculo mental com verbalização Algoritmo da subtração sem e com recurso (técnica operatória) Verificação da exatidão da subtração através da propriedade fundamental da subtração Resolução de problemas - números fracionários Representação fracionária Ideia de dividir em partes iguais Noção de meio, terço, quarto, quinto,.., décimo. Representação através de desenhos.

Fonte: Bahia (1994, p. 35 - 37)

Percebemos que constam, na lista de conteúdos da 1ª série, as operações

lógicas e entendemos que isso significa um desvio do sentido da teoria piagetiana,

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pois as provas piagetianas foram elaboradas para dar respostas às questões

teóricas e as fases encontradas nestas provas não são, necessariamente, as etapas

pelas quais os alunos passarão naturalmente.

Destacamos, ainda, que fazem parte nos conteúdos da 1ª e 2ª série a

construção e revisão dos fatos fundamentais da adição e subtração. A esse respeito,

Kamii e Housman não corroboram a ideia de abordar a operação 853 =+ como

sendo “fato de adição” e justificam,

Um fato é empiricamente observável, e números não são observáveis. Três fichas são observáveis, mas o número “três” não. As fichas são um exemplo de conhecimento físico, mas três é uma relação, feita por abstração construtiva, e é conhecimento lógico-matemático. Se três não é observável,

853 =+ também não é observável. [...] A adição origina-se da própria lógica das crianças e não é um “fato” que existe no mundo exterior. (KAMII; HOUMAN, 2002, p. 86).

Dessa forma, o objetivo “conhecer fatos de adição”, frequentemente

defendido pelos professores, não é, portanto, um objetivo apropriado na visão

dessas autoras.

O documento aconselha que os conteúdos recomendados, embora estejam

numa certa ordem, não sejam trabalhados isoladamente. Em seus comentários e

sugestões, recomenda que sejam trabalhadas situações problematizadoras (ricas e

abertas) que induzam seus alunos à construção de conhecimentos, por meio de

experimentações, formulação de hipóteses, busca de soluções e questionamentos.

a idéia de ordinal é muito importante em numeração e deve ser explorada, intuitivamente, a partir de conjunto de pessoas ou de objetos. A representação dos ordinais, seja na forma literal (primeiro, segundo, ...) seja na forma simbólica (1º, 2º, ...), deve ser introduzida somente depois que o aluno demonstra ter compreendido a noção de ordinal. (BAHIA, 1994, p. 56).

Embora as Diretrizes Curriculares de Matemática comentem e recomendem

que a forma simbólica do número ordinal seja inserida após a compreensão do aluno

da noção de ordinal, não deixa claro, no entanto, como o aluno constrói essa noção.

O documento critica o trabalho “com símbolos e nomenclatura da teoria de

conjuntos (vazio, unitário, ..., pertinência, ..., representações, diagrama de Venn)”

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pois entende esse trabalho como uma linguagem a mais, que o aluno terá que

aprender, e aconselha que este tema seja trabalhado a partir de

observações e comparações, quando são agrupados objetos por semelhança, de acordo com algum critério (iniciando com classificações livres, classificações que envolvam aspectos físicos, até o critério quantidade). Assim, está-se fazendo uma classificação que é uma das formas de pensamento lógico e uma das habilidades essenciais para a construção do número.

Também a partir da observação e da comparação, podemos estabelecer relações entre objetos, arrumando-os em sucessão, de acordo com um critério. Posteriormente, estabelecendo relações entre número de elementos, o aluno perceberá que cada elemento da série numérica é um a mais que o antecessor e um a menos que o sucessor, percebendo da relação de inclusão entre os números. (BAHIA, 1994, p. 57 – 58).

Percebemos que o referido documento, entende que as atividades de

classificação, seriação, ordenação e inclusão auxiliam na construção de relações

mentais inerentes ao conceito de número. “Esta noção não é facilmente adquirida

pelos alunos, mesmo quando ‘canta’ os nomes dos números.” (BAHIA, 1994, p. 58).

Para o referido documento, os números

indicam uma característica dos conjuntos, isto é, as quantidades de elementos que eles possuem. Assim, o número 5 é a propriedade (característica) comum a todos os conjuntos, de cinco elementos. Logo, cada número natural designa uma coleção de coleções com a mesma quantidade de elementos e que ocupam um lugar na série numérica. Por conseguinte, os números não são objetos reais, são propriedades. A representação dos números é o que denominamos de numerais e seus signos de algarismos. (BAHIA, 1994, p. 57-58).

A visão de ensino de número apresentada documento (BAHIA, 1994) vai ao

encontro da concepção de Kamii que assevera ser o número uma construção mental

que necessita das operações lógicas. O documento citado também distingue o

objeto matemático (número) de sua representação (numeral), cuja distinção implica

o entendimento de que trabalhamos em nossa prática docente com a representação

do objeto matemático.

Nas ideias expostas nas diretrizes, a avaliação é “entendida como reflexão da

prática pedagógica (professor-aluno) para tomada de decisões, durante todo o

processo educacional, e, não apenas no momento final da ação educativa.” (BAHIA,

1994, p. 60). A concepção de avaliação do documento reflete o entendimento dessa

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avaliação como um processo interativo, por meio do qual educando e educadores

aprendem sobre si mesmos e a realidade escolar, não ficando restrito

exclusivamente à constatação, mas, principalmente, à decisão de o que fazer para

superar os obstáculos e avançar na aprendizagem.

Assim sendo, o aluno não será sujeito singular do processo de avaliação;

inclui-se nesse processo todos os funcionários da escola, professores,

coordenadores, diretores, funcionários “Avaliados quanto ao desempenho das suas

atividades, ao conteúdo desenvolvido, aos objetivos propostos a serem alcançados,

à metodologia utilizada e á aprendizagem do aluno.” (BAHIA, 1994, p. 60). Nessa

perspectiva, a avaliação será uma prática, no sentido analisar o andamento e

desempenho de todos os envolvidos na escola.

Ao compararmos o PCN com o RCNEI e as Diretrizes Curriculares do Estado

da Bahia, percebemos ser evidente, nos três documentos, uma preocupação com a

capacidade de o aluno descrever e interpretar a sua realidade, utilizando

conhecimentos matemáticos.

Em relação ao número, O PCN e o RCNEI fazem menção de sua utilização

como quantidade e ordem e como nome/rótulo/código; apenas as Diretrizes

Curriculares do Estado da Bahia não evidenciam a possibilidade de o número se

apresentar como um nome/rótulo, admitindo apenas o seu aspecto cardinal e

ordinal. As operações lógicas são consideradas como relevantes na construção do

conceito de número, nos três documentos analisados; entretanto, as diretrizes

baianas indicam algumas das operações como conteúdos a serem trabalhados em

sala de aula.

Compreender as recomendações e sugestões contidas nos documentos

oficiais nos ajuda a perceber como o ensino do número é vislumbrado em

documentos que tratam da prática docente de Matemática.

No próximo capítulo, abordaremos os conhecimentos, os saberes e as

concepções dos professores.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 33

CCOONNHHEECCIIMMEENNTTOOSS,, SSAABBEERREESS EE

CCOONNCCEEPPÇÇÕÕEESS DDOO PPRROOFFEESSSSOORR

A fim de refletir sobre questões que tratam dos conhecimentos, saberes e

concepções do professor, fomos buscar nas ideias de Tardiff, Shulman, Ponte e

Oliveira, Fiorentini e Moron e Brito subsídios que sustentem a importância do

conhecimento do docente para a prática e seu desenvolvimento profissional.

3.1 Os Conhecimentos do Professores na Visão de Shulman

Discutiremos, agora os conhecimentos do professor. Um autor que ganha

destaque nesta discussão é Shulman e ele será, portanto, a referência desta seção.

Shulman (1986) efetuou uma investigação histórica e pesquisou o

conhecimento dos professores ao longo de décadas, no EUA, a partir dos exames

aplicados aos professores para serem introduzidos na carreira do magistério. Pelo

que foi averiguado por Shulman (1986), nos anos 70, esses exames priorizavam o

conhecimento sobre o conteúdo. Na década de 80, houve uma modificação no foco,

e as questões metodológicas e procedimentais ganharam evidência. Portanto,

entendemos que na década de 70, a ênfase era no conteúdo a ser ensinado e, uma

década depois, privilegiou-se a pedagogia. No que tange a essa década, ele

identificou que a ausência de conteúdos não se restringia apenas aos exames para

professores; as pesquisas na área de educação focavam também as questões

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metodológicas e procedimentais, “Da mesma forma, mesmo na comunidade de

pesquisa, a importância do conteúdo foi esquecida.”6 (SHULMAN,1986, p. 6).

Shulman identificou a “ausência” de conteúdos, que ocorria não somente na

formação de professores como também nas pesquisas sobre o ensino como

“paradigma pedido”. Dessa forma, ele apontava as lacunas existentes entre

conteúdo e pedagogia, que podem ser percebidas até os dias de hoje, nos cursos de

formação inicial de professores polivalentes.

Seus estudos (SHULMAN, 1986, 2005) ressaltam um ponto importante para a

análise dos processos de ensino: o conhecimento que os professores possuem

sobre os conteúdos a serem ensinados e o modo como tais conteúdos são

transformados em ensino. Para o autor, esta base de conhecimentos está

relacionada à compreensão que o professor necessita ter para desenvolver suas

tarefas de forma a promover aprendizagem dos alunos.

Shulman (1986) identificou três vertentes no conhecimento do professor:

Conhecimento do conteúdo (CK), Conhecimento didático do conteúdo (PCK) e

Conhecimento do Currículo7, as quais discutiremos detalhadamente a seguir.

� Conhecimento do conteúdo (CK): está relacionado ao que o professor sabe a

respeito do conteúdo específico da disciplina trabalhada, pois, em diferentes áreas

de conhecimento, os modos de tratar a sua estrutura são diferentes. Assim, estão

incluídas nessa vertente, a quantidade e organização de saberes na mente do

professor. Ela também abrange a compreensão de fatos, conceitos, processos,

princípios e procedimentos desta área específica, bem como os conhecimentos

relacionados de sua construção. Ao refletir sobre essa vertente, Damico (2007)

afirma que:

A necessidade de saber em profundidade a matéria que o professor vai ensinar é um ponto em que encontramos a mais absoluta concordância entre os pesquisadores na área de formação de professores. Se admitimos que o ensino de um conteúdo matemático esteja estreitamente ligado a

6 Tradução nossa para o texto: “Similarly, even in the research community, the importance of content has been forgotten.” 7 Tradução nossa para os termos: Content Knowledge (CK); Pedagogical Content Knowledge (PCK) e Curricular Knowledg. Embora tenhamos traduzido os termos utilizados por Shulman (1986) estamos usando a sigla conforme o original.

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habilidade do professor criar/selecionar e organizar tarefas/atividades, levantar questões produtivas sobre o assunto em pauta, implantar uma metodologia eficiente para a construção dos conhecimentos desejados e avaliar a aprendizagem dos alunos, então a compreensão profunda do que deve ser ensinado passa a ser uma exigência central do ato de ensinar. (DAMICO, 2007, p. 36).

Dessa forma, percebemos que ter um profundo conhecimento de Matemática

não garante, por si só, a capacidade de um professor para a efetivação de um bom

ensino. Nosso entendimento vai ao encontro das ideias de Shulman (1986) quando

afirma que o conhecimento do conteúdo por si só não basta, é preciso saber

transformá-lo ao ensinar, para que os alunos possam compreender o que lhes é

passado.

Ressaltamos que, embora o autor trate dos conhecimentos de professores

especialistas, nossos sujeitos de investigação são professoras de 1º e 2º anos do

Ensino Fundamental e, portanto, trabalham com todas as disciplinas, Português,

Matemática, Estudos Sociais, Artes. No entanto, em nossa investigação, trataremos

como o conhecimento do conteúdo da disciplina relacionado ao conhecimento do

conteúdo de Matemática, especialmente as compreensões das professoras dos

anos iniciais de escolaridade sobre números e operações, especificamente a

construção do conceito do número.

Especialistas, falando sobre os conteúdos relacionados a números

trabalhados em Matemática nos anos iniciais, têm apontado o que é essencial ao

professor. Assim, Maranhão e Carvalho são enfáticas ao apontar que,

O professor deve conhecer conceitos, propriedades e procedimentos aritméticos, bem como suas formas de representação, distinguindo o conceito de suas representações, por que estes são conteúdos que irá ensinar. O conhecimento conceitual e das propriedades propicia compreender os porquês, os fundamentos de procedimentos como os algoritmos das operações. A distinção entre as formas de representação numérica e o conceito de número natural é um conhecimento necessário do professor, por que as primeiras permitem acesso ao segundo, mas não se confundem com ele. Confusões sobre isso podem impedir outras aprendizagens. (MARANHÃO; CARVALHO, 2009, p. 9 – 10)

Note que as autoras ressaltam ser fundamental que o professor dos anos

iniciais do Ensino Fundamental tenha a compreensão sobre os conceitos, processos,

propriedades, procedimentos e as formas de representação em Matemática, bem

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como que faça uso de várias fontes de informação para o desenvolvimento de sua

prática que possa favorecer a aprendizagem de seus alunos.

� Conhecimento didático do conteúdo (PCK): Refere-se ao modo como o

professor ensina determinado conteúdo. Estão incluídos aqui “os tópicos

regularmente ensinados em cada área, as diversas formas de representação dessas

ideias, as mais poderosas analogias, ilustrações, exemplos, explicações e

demonstrações”8 (SHULMAN, 1986, p. 9), que o professor utiliza para favorecer a

aprendizagem dos alunos.

Podemos olhar o PCK como a maneira, ou o método, de ordenar e apresentar

o conteúdo a ser trabalhado. É saber: a) identificar as estratégias que facilitam e as

que atrapalham o aprendizado de determinado conteúdo, b) identificar as

concepções errôneas dos alunos; c) remediar as dificuldades, por meio do uso de

materiais pedagógicos e d) buscar uma forma diferente de apresentar determinado

conteúdo.

Shulman (1987) alega que o PCK inclui características específicas que

permitem ao professor que as possui ajudar seus alunos no entendimento dos

conteúdos. No entender deste autor, o PCK, entre outras componentes, abrange

“uma compreensão de tópicos particulares; problemas; as formas de como os

assuntos podem ser organizados, apresentados e adaptados aos interesses

diversos e habilidades dos alunos” (SHULMAN, 1987, p. 15). Menciona, ainda, que a

base do conhecimento para o ensino está na interseção do conteúdo e da

pedagogia. Dessa forma, parece-nos importante que o professor saiba transformar o

seu conhecimento dos diversos conteúdos de ensino em formas que sejam

pedagogicamente poderosas, pois é ele quem elabora as oportunidades para a

aprendizagem de seus alunos.

Apresentamos abaixo um resumo dessas ideias, a partir de um diagrama

elaborado por nós, focalizando os conteúdos matemáticos.

8 Tradução nossa para o texto: “the most regularly taught topics in one's subject área, the most useful forms of representation of those ideas, the most powerful analogies, ilustrations, examples, explanations, and demonstrations”.

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Diagrama 3.1: Conhecimentos necessários à prática docente.

Fonte: Elaboração a partir da leitura de Shulman (1987).

O diagrama traz embutida a ideia de que ensinar Matemática é uma mistura,

uma combinação entre o conteúdo matemático, as formas de apresentação desse

conteúdo, tendo presentes as estratégias de seu ensino. Nesta direção, Damico

complementa a ideia de que o PCK inclui o conhecimento do que se quer ensinar e

a maneira de como ensinar, considerando sempre as potencialidades dos alunos,

O PCK está diretamente vinculado ao conhecimento do professor concernente a matéria de ensino. Isto, como visto, engloba perspectivas variadas e envolve, por exemplo, o conhecimento do professor da potencialidades e limitações dos alunos, além dos modos de representação dos conteúdos matemáticos como meio para fazê-los compreensíveis para os estudantes. (DAMICO, 2007, p. 43)

Fica clara a importância apresentada por Damico (2007) da necessidade de o

professor transformar o conhecimento de um determinado conteúdo, adaptando-o às

potencialidades e limitações dos alunos de modo a torná-lo acessível a eles.

Shulman (1986) defende que o PCK é uma forma de conhecimento

característica dos professores de uma determinada disciplina que os distingue do

modo de pensar dos especialistas dessa mesma disciplina. Fazendo um paralelo

com a Matemática, o PCK é um conhecimento específico do professor de

Matemática ou pelo menos do professor que ensina Matemática (que é o caso das

professoras do nosso estudo) o que o distingue do conhecimento do Matemático.

Dessa forma, o PCK é um conjunto de conhecimentos e capacidades que

caracterizam o professor e, conforme Shulman (1986), inclui aspectos de

racionalidade técnicas associados a capacidades de improvisação, avaliação e

intuição. Em última análise, o PCK é um processo de raciocínio e ação docente que

consente aos professores recorrer aos conhecimentos e compreensão requeridos

Lugar próprio para ensinar os conteúdos matemáticos PCK

Conteúdos Matemáticos PK

Modos de Ensinar

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para lecionar algo, num dado contexto, para preparar planos de ação, mas também

para improvisar no caso de uma situação não planejada.

� Conhecimento do currículo: aborda o conhecimento do programa em si, não

somente os objetivos e os conteúdos específicos de cada nível, mas também os

recursos didáticos e materiais de apoio, disponíveis para auxiliar a aprendizagem

dos alunos, bem como o esclarecimento e a articulação e a história que envolve

esses conteúdos. Resume-se na habilidade de conhecer e fazer articulações

horizontais e verticais do conteúdo a ser ensinado.

Assim, esse conhecimento do currículo permite que o professor possa

relacionar determinado conteúdo com os diversos tópicos da grade escolar de

Matemática, não apenas daquele ano em que o professor esteja atuando

(articulação vertical – transdiciplinaridade). Permite, também, a articulação do tópico

com outras disciplinas (articulação horizontal – interdisciplinaridade). Como os

sujeitos de nossa investigação são professoras dos anos iniciais do Ensino

Fundamental, responsáveis por ensinar todas as disciplinas de determinado ano,

pressupomos que elas já utilizem a interdisciplinaridade durante sua prática docente.

Essa categorização sobre os “conhecimentos de base do professor” foi

ampliada por Shulman (2005) para sete categorias, e não apenas três delas, como

visto anteriormente, as quais apresentaremos resumidamente a seguir:

� Conhecimento acerca dos alunos e suas características, envolvendo o

conhecimento do que os alunos sabem, como aprendem, do que eles são capazes,

das suas potencialidades, limitações e dos seus interesses.

� Conhecimento didático geral: considera os princípios e estratégias gerais da

gestão e organização da classe, da didática propriamente dita, como a conhecemos

no Brasil.

� Conhecimento dos contextos educativos: envolvem desde o funcionamento

do grupo ou classe, quanto à gestão e o funcionamento, as diretrizes, o caráter das

comunidades e sua cultura.

� Conhecimento sobre os objetivos, os valores educativos e seus

fundamentos filosóficos e históricos.

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Shulman (2005) não discute com profundidade essas novas vertentes, como

o fez nas três categorias anteriores, embora afirme que elas são igualmente

importantes na composição do conhecimento do professor. Reconhecemos que,

para além das três vertentes, o professor também necessita ter conhecimento sobre

os alunos, as políticas públicas e as leis que tratam das práticas pedagógicas (LDB,

os PCN, RCNEI, a proposta curricular do Estado). Os conhecimentos apontados

acima estão, por sua vez, imbricados em outros tipos de conhecimentos, a saber:

conhecimento dos contextos educativos, conhecimento didático geral e o

conhecimento sobre os objetivos e valores educativos.

A reflexão sobre os conhecimentos do professor possui um papel relevante,

visto que o aprendizado dos alunos é, em grande parte, influenciado pela ação

desse professor. Passaremos, assim, a tratar especificamente do conhecimento

didático na perspectiva de Ponte e Oliveira.

3.2 O Conhecimento Didático na Perspectiva de Ponte e Oliveira

Ao tratar sobre o conhecimento do professor, Ponte e Oliveira (2002)

decompõem-no em: “o conhecimento na acção relativo à prática lectiva, à prática

não lectiva e à profissão e ao desenvolvimento profissional.” (PONTE; OLIVEIRA,

2002, p. 6). Nesta seção, cuidaremos do conhecimento didático, qual seja, aquele

que é mobilizado diretamente na prática docente, relacionando-se “com diversos

aspectos do conhecimento da vida quotidiana como o conhecimento do contexto

(incluindo o conhecimento da escola, da comunidade, da sociedade) e o

conhecimento de si mesmo do próprio professor.” (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 6).

Os autores dividem este tipo de conhecimento em quatro vertentes, conforme

apresentado no diagrama 3.2, por nós elaborado:

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Diagrama 3.2: Conhecimento Didático na Perspectiva de Ponte e Oliveira.

Fonte: Elaborado a partir das leituras de Ponte e Oliveira (2002).

Para Ponte e Oliveira (2002), a primeira vertente do conhecimento didático

(conhecimento matemático) leva em consideração a disciplina a ser ensinada.

Assim, os autores argumentam que não estão elencados nesta vertente apenas os

conteúdos a serem trabalhados, mas também a interpretação desses conteúdos que

o professor apresenta, fazendo a ponte entre o conteúdo matemático e seus alunos:

Não se trata, aqui, do conhecimento da Matemática como ciência, mas da interpretação que dela faz o professor enquanto disciplina escolar. Para além dos conceitos e procedimentos fundamentais da disciplina (indicados nos respectivos programas) surgem aqui igualmente as formas de representação desses mesmos conceitos (em diversas linguagens e suportes, incluindo representações gráficas e simbólicas), bem como a perspectiva geral sobre a Matemática escolar, incluindo as conexões internas (entre diversos tópicos) e externas (com outras disciplinas e áreas do conhecimento). (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 6).

Sob tal visão, os autores enfatizam alguns pontos precisam ser levados em

consideração, em relação ao ensino de Matemática, pelo professor no seu ofício de

ensinar:

[...] faz uma grande diferença se o professor está ou não à vontade no que respeita aos conceitos fundamentais da sua disciplina, como também, se os vê como fazendo parte de um todo integrado ou em compartimentos estanques. Faz uma grande diferença se o professor considera fundamentais os aspectos calculatórios, conceptuais ou argumentativos da Matemática, dando ênfase, em consequência, ao ensino de algoritmos, à compreensão de conceitos ou à argumentação e demonstração matemática. O conhecimento que o professor tem da Matemática escolar é o seu traço mais distintivo relativamente ao conhecimento dos outros professores – pois é aqui que intervém de modo mais directo a especificidade da sua disciplina. No entanto, o que está em causa não é o conhecimento de Matemática, como ciência, avaliado por padrões académicos de conhecimento (mais ou menos extenso, mais ou menos profundo), mas o conhecimento e a visão que o professor tem dos aspectos específicos do saber que ensina. (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 6).

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Entendemos que a visão que o professor possui da Matemática influencia nos

aspectos que serão enfatizados na sua prática docente, pois é essa visão que irá

dirigir suas ações como professor.

Aqui, notamos uma convergência entre as ideias de Ponte e Oliveira (2002) e

Shulman (1986), já que eles defendem que o conhecimento que o professor possui

sobre a disciplina que ele leciona é específico da sua profissão e é a apropriação

desse conhecimento que o determina enquanto professor. No entanto, enquanto

Shulman distingue o conhecimento que o professor tem sobre a Matemática do

conhecimento que um matemático tem sobre ela, Ponte e Oliveira diferenciam o

conhecimento de um determinado professor de Matemática com relação a outros

professores.

A segunda vertente do conhecimento didático, fundamental para o exercício

da prática docente, é o conhecimento do aluno e dos seus processos de

aprendizagem. Nessa vertente, os autores consideram que faz parte do

conhecimento saber sobre os alunos, enquanto pessoas, suas ideias, seus

interesses, suas motivações, valores, limitações e referências tanto da cultura

quanto da sociedade em que estejam inseridos.

[...] conhecer os seus alunos como pessoas, os seus interesses, os seus gostos, a sua forma habitual de reagir, os seus valores, as suas referências culturais, e conhecer o modo como eles aprendem são condições decisivas para o êxito da actividade do professor. Neste campo, reconhece-se a importância do estudo dos processos de aprendizagem dos alunos, das suas dificuldades cognitivas, das suas estratégias microssociais, bem como dos fenómenos de diferenciação e afirmação cultural (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 11).

Em relação ao conhecimento do aluno e de seus processos de aprendizagem,

esses autores relatam que, tanto a Psicologia quanto a Sociologia da Educação, se

detêm em investigar sobre estas questões, tendo como referência os diferentes

contextos sociais e culturais. No entanto, eles esclarecem que

[...] a investigação que se realiza neste campo é, frequentemente, mais geradora de controvérsia do que de consenso. O professor tem sempre as suas teorias (implícitas ou explícitas) sobre estas questões, nem sempre muito compatíveis com as teorias académicas dominantes. Também aqui não é a correspondência do conhecimento do professor com o conhecimento académico que está em causa, mas o facto do conhecimento

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que o professor tem sobre estas questões ser fundamental para o exercício dos seus papéis profissionais. (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 9).

Em outras palavras, podemos entender que é o professor quem formula suas

próprias teorias de acordo com sua prática. Porém, nem sempre esta teoria se ajusta

às teorias que discutem os processos de aprendizagem dos alunos. O que os

autores frisam é a importância que tais informações, sobre o conhecimento do aluno

e seus processos de aprendizagem, trazem para o exercício do professor, pois o

auxiliam na escolha de estratégias que possam interferir no desempenho dos seus

alunos, desafiando e mobilizando seus interesses, tornando assim a aprendizagem

mais significativa.

Como terceira vertente, Ponte e Oliveira (2002) trazem o conhecimento do

currículo e a maneira como o professor faz a gestão curricular:

Incluímos aqui o conhecimento das grandes finalidades e objectivos, bem como a organização dos conteúdos, o conhecimento dos materiais e das formas de avaliação a utilizar. Este conhecimento tem um papel fundamental na tomada de decisões sobre os assuntos a que deve dedicar mais tempo, sobre as prioridades a considerar a cada momento, sobre a forma de orientar o processo de ensino-aprendizagem. Ele necessita de ser constantemente alimentado e renovado, acompanhando a evolução das perspectivas curriculares. (PONTE; OLIVEIRA 2002, p. 7).

Os autores enfatizam a importância de o professor ter conhecimentos sobre

currículo, com suas finalidades e objetivos, para que possa selecionar o conteúdo e

os materiais a serem trabalhados em sala de aula, de acordo com as características

de seus alunos.

A última vertente proposta por Ponte e Oliveira (2002) diz respeito ao

conhecimento do processo instrucional, que eles nomeiam como a vertente

fundamental do conhecimento didático:

Este inclui como aspectos fundamentais a planificação de longo e médio prazo bem como de cada aula, a concepção das tarefas e tudo o que diz respeito à condução das aulas de Matemática, nomeadamente as formas de organização do trabalho dos alunos, a criação de uma cultura de aprendizagem na sala de aula, a regulação da comunicação e a avaliação das aprendizagens dos alunos e do ensino do próprio professor. Esta vertente inclui tudo o que se passa antes da aula, em termos de preparação e tudo o que se passa depois, em termos de reflexão, mas o seu núcleo

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essencial diz respeito à condução efectiva das situações de aprendizagem. (PONTE; OLIVEIRA 2002, p. 7).

Os autores asseveram que o essencial no conhecimento do processo

instrucional é o modo pelo qual o professor conduz as situações de aprendizagem.

Em seu fazer docente, o professor considera o conhecimento Matemático que vai

trabalhar, o objetivo a alcançar, quais recursos estão disponíveis para apresentar

determinado conteúdo, qual é a melhor maneira de trabalhar esse conteúdo e que

pontos deve priorizar, levando em consideração o currículo de seus alunos.

No entendimento de Ponte e Oliveira (2002), o conhecimento didático articula-

se também ao conhecimento de si mesmo e ao conhecimento do contexto de

ensino. O conhecimento de si mesmo “inclui tudo o que o professor sabe acerca de

si próprio, a sua autoconfiança, os seus recursos e capacidades” (PONTE;

OLIVEIRA, 2002, p. 11). O conhecimento do contexto de ensino é “essencial para

conhecer os alunos e, assim, [...] compreende, igualmente, o conhecimento de

outros aspectos do contexto como os colegas de profissão, a escola, os pais, a

comunidade, o sistema educativo, etc.” (PONTE; OLIVEIRA, 2002, p. 11). Em

relação ao conhecimento de si mesmo, os autores afirmam que, apesar de esse

conhecimento ser um domínio com poucas referências, ele possui grande relevância

na prática docente e em seu conhecimento profissional.

Tal como Shulman (2005), Ponte e Oliveira (2002) afirmam ser essencial à

prática de sala de aula, o conhecimento sobre o contexto de ensino, esse

conhecimento permite ao professor estabelecer com seus alunos um envolvimento,

uma sintonia. Envolve, igualmente, o conhecimento não apenas os aspectos de sala

de aula, mas também conhecer e interagir com os colegas de profissão, membros da

escola; lidar com questões referentes ao funcionamento e gestão da escola; lidar

com os pais, a comunidade, cultura, sistema educativo, entre outros.

Ponte e Oliveira afirmam que o conhecimento específico da profissão, usado

nas situações de prática docente, é o conhecimento profissional e para alguns

autores como, por exemplo, Schön (2000), esse conhecimento é tácito e pessoal e é

desenvolvido e consolidado através da experiência ao longo da carreira e reflexão

sobre a experiência. Converge para esse conhecimento a formação inicial, a

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interação com os colegas de profissão e os saberes que são construídos no

desempenho e até mesmo no planejamento das ações do professor.

Um autor que também considera que a prática agrega diferentes saberes com

os quais os professores se relacionam é Tardif. Passaremos a tratar sobre suas

ideias a respeito dos saberes docentes na próxima seção.

3.3 Os Saberes Docentes no Olhar de Tardif

Tardif (2002) considera que o professor ancora seu desenvolvimento

profissional nos conhecimentos disciplinares, didáticos e pedagógicos adquiridos em

sua formação e em conhecimentos curriculares veiculados em programas e livros

didáticos. O autor leva em consideração, ainda, a existência de fatores

intervenientes, como as concepções, crenças, com origem na cultura pessoal,

experiência de vida, escolaridade anterior e em seu próprio saber advindo das

experiências da prática.

No entendimento do referido autor, o saber do professor é um saber plural e

composto de vários saberes oriundos de fontes distintas. Ele classifica os saberes

em:

saberes profissionais - conjunto de saberes transmitidos pelas instituições de formação de professores. [...] é no decorrer de sua formação que os professores entram em contato com as ciências da educação. [...] a prática docente não é apenas um objeto de saber das ciências da educação, ela é também uma atividade que mobiliza diversos saberes [...] apresentam-se como doutrinas ou concepções provenientes de reflexões sobre a prática educativa.

saberes disciplinares - são saberes que correspondem aos diversos campos do conhecimento, aos saberes de que dispõe a nossa sociedade, tais como se encontram hoje integrados nas universidades, sob forma de disciplinas [...] emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes.

saberes curriculares - correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta os saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelos [...] Apresentam-se concretamente sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, métodos) que os professores devem aprender a aplicar.

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saberes experienciais - os próprios professores no exercício de suas funções e na prática de sua profissão, desenvolvem saberes específicos, baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento do meio.[...] brotam da experiência e são por ela validados. (TARDIF, 2002, p. 36 – 39).

Percebemos que o saber docente não é um saber único, ele decorre da

formação profissional, das disciplinas às quais o professor teve acesso, do currículo

sob a forma de programas escolares, ementas e experiências existentes “na prática

cotidiana dos professores em confronto com as condições da profissão” (TARDIF,

2002. p. 52). Desse modo, é necessário que o professor possua capacidade de

articulação, domínio, unificação e mobilização de tais saberes como condição para

sua prática, pois na sua visão,

o professor ideal é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e da pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos. (TARDIF, 2002 p. 39).

Neste cenário é possível perceber a importância dos espaços de formação de

professores, sejam de formação inicial ou continuada, uma vez que se configuram

como lócus privilegiado de reflexão, investigação e discussão da prática docente.

Por esse fato, Tardif (2002) posiciona-se contrário à ideia de que o saber é

produzido apenas em um nível teórico, distanciado do contexto da prática; dessa

forma, ele enfatiza os saberes experienciais que são aqueles que surgem na e pela

prática, validados pelo professor e atrelados na constituição de sua profissão.

Nessa direção, a prática “é, para o professor, a condição para a aquisição e

produção de seus próprios saberes profissionais.” (TARDIF, 2002, p. 21), “pode ser

vista como um processo de aprendizagem através do qual os professores

retraduzem sua formação e a adaptam à profissão” (TARDIF, 2002, p. 53). Assim

sendo, é por intermédio da prática que o professor vai selecionar e filtrar, os outros

saberes, reexaminando-os com o objetivo de ajustá-los a sua ação docente.

É pela prática que os professores vão se descobrindo, através da experiência,

numa comparação com os saberes adquiridos antes da profissão, enquanto

estudantes, saberes esses que têm influência na prática docente pois,

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Uma parte importante da competência profissional dos professores tem raízes em sua história de vida, pois em cada ator, a competência se confunde enormemente com a sedimentação temporal e progressiva, ao longo da história de vida, de crenças, de representações, mas também de hábitos práticos e de rotinas de ação (TARDIF, 2002, p. 69).

Isso se dá porque a trajetória de vida pessoal e escolar do professor também

exerce influência em sua constituição identitária, pois imprimem “um certo número

de conhecimentos, de competências, de crenças, de valores, etc., os quais

estruturam a sua personalidade e suas relações com os outros (especialmente as

crianças)” (TARDIF, 2002, p. 72.), considerando que tais saberes apontados por pelo

autor vão sendo adquiridos ao longo da vida do professor e em cada momento de

sua vida ele poderá desenvolver/adquirir um saber de acordo com o contexto em

que ele esteja inserido.

Desse modo, é importante conhecer essas fases, pois nos permitem

compreender que as experiências vivenciadas e partilhadas por esses professores

podem gerar diferentes concepções a respeito do ensino, aprendizagem, conteúdos

curriculares e suas interpretações e sobre sua própria profissão.

Em relação à trajetória de vida dos professores, García (1999), baseado nos

estudos de Sikes (1985) e Huberman (1990), afirma que os professores atravessam

diferentes fases em função das suas idades e do ciclo vital do professor.

Apresentaremos, no Quadro 3.1, elaborado por Castro (2010), que sintetiza essas

ideias.

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Quadro 3.1: Teorias sobre os ciclos vitais dos professores SIKES HUBERMAN

Idade dos

Profs. Fases

Anos de

Carreira Fases

21-28

Exploração das possibilidades da vida adulta e de início de uma estrutura estável na vida. Preocupação dos professores: problemas de disciplina decorrentes da ausência de autoridade; domínios dos conteúdos.

1-3

Entrada na carreira: sobrevivência (choque com a realidade) e descoberta (o entusiasmo dos começos, a experimentação, o orgulho de ter uma classe, os alunos, de fazer parte de um corpo profissional), que pode ser considerada fácil ou difícil.

28-33

Transição: é a fase da estabilidade no posto de trabalho para uns e a procura para outros. Os professores começam a estar mais interessados no ensino do que no domínio de conteúdo.

4-6

Estabilização: caracteriza-se pela facilidade de lidar com as classes, domínio de um repertório básico de técnicas de ensino, capaz de selecionar métodos e materiais apropriados em função dos interesses dos estudantes.

30-40

Grande capacidade física e intelectual, o que significa energia, implicação, ambição e confiança em si mesmos. Fase da estabilização e normalização, na qual os professores tentam ser mais competentes no seu trabalho.

7-25

Experimentação ou diversificação: não é igual para todos os professores. Para alguns: melhorar sua capacidade como docente; para outros: procura de promoção profissional por meio de desempenho de funções administrativas; e o último grupo: redução de seus compromissos profissionais, alguns deixam a docência ou têm outra atividade paralela. Para esses professores, essa fase supõe um reenquadramento.

40-50/55

Os professores já se adaptaram à sua maturidade, adotando novos papéis na escola e no sistema educativo. 25-35

Situação profissional estável: pode ser de mudança mais ou menos traumática para os professores que, com frequência, se questionam sobre a sua própria eficácia como docentes. Dividia em dois grupos de professores: o primeiro, serenidade e distanciamento; o segundo, conservadorismo.

55 até a jubilação [aposentadoria]

Preparação da jubilação, em que os professores afrouxam a disciplina, assim como as suas exigências em face dos alunos.

35-40

Têm-se três padrões de reação diante dessa fase: 1. perspectiva positiva: interesse em se especializar, maior preocupação com a aprendizagem dos alunos, trabalhando com os colegas com quem se dá melhor; 2. defensivo: semelhante ao anterior, mostra menos otimismo e uma atitude menos generosa em face das experiências passadas; 3. desencantados: pessoas que adotam padrões de desencanto em relação às experiências passadas, estão cansadas e podem ser uma frustração para os professores mais jovens.

Fonte: Castro (2010, p. 89).

Nessa direção, entendemos que, cada ciclo vital pelo qual o professor passa,

vai modelando e definindo a sua carreira, agregando saberes que serão refletidos,

reavaliados para compor sua ação docente. Desta forma, é importante destacar a

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relevância de pesquisas como estas, como meio de elucidar os saberes docentes,

bem como o ciclo de vida profissional de um professor.

Vale destacar, também, que a dimensão temporal da carreira é também

considerada por Tardif (2002). A base da profissão parece ser construída no início

da carreira “entre os três e cinco primeiros anos de trabalho. [...] representa também

uma fase crítica em relação às experiências anteriores e aos reajustes a serem

feitos em função das realidades do trabalho” (TARDFI, 2002, p. 82).

É baseado em suas expectativas, enquanto estudantes, que os professores

passam a criticar suas experiências enquanto professores, é o “rito de passagem da

condição de estudante à de professor” (TARDIF, 2010, p. 83). Dessa forma, na

primeira fase ocorre o confronto com a realidade da profissão, “a segunda fase

corresponde à iniciação no sistema normativo informal e na hierarquia das posições

ocupadas na escola” (TARDIF, 2010, p. 84). Passado o choque com a realidade, o

professor tende a se integrar no contexto de trabalho escolar, incorporando as

regras informais existentes. Na terceira fase, os professores descobrem os alunos

“reais” que não correspondem à imagem idealizada por eles.

[...] falam de um segundo fenômeno de marcação que caracterizaria a evolução da carreira docente. Haveria duas fases durante os primeiros anos de carreira: 1) Uma fase de exploração (de um a três anos), na qual o professor escolhe provisoriamente a sua profissão, inicia-se através de tentativas e erros, sente a necessidade de ser aceito por seu círculo profissional e experimenta diferentes papéis.[...]

2) A fase de estabilização e de consolidação (de três a sete anos), em que o professor investe a longo prazo na sua profissão e os outros membros da instituição reconhecem suas capacidades. Caracteriza por uma confiança maior em si mesmo e pelo domínio dos diversos aspectos do trabalho, principalmente os pedagógicos. (TARDIF, 2002, p. 84 – 85)

Nessa perspectiva, com o passar do tempo e de acontecimentos que marcam

a trajetória profissional, o professor vai modificando seu fazer docente. Ao iniciar sua

carreira, acontece o confronto com a realidade que será vivenciada; logo após, o

professor entra numa fase de integração com o contexto escolar e o ambiente de

trabalho e, por fim, passa a interessar-se mais pelos problemas de aprendizagem de

seus alunos, ao se dar conta de que eles não são os alunos idealizados.

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É esse conjunto de conhecimentos e saberes que nos definem enquanto

professores, e à medida que refletimos sobre eles, revendo, (re)avaliando e

ressignificando, estamos nos desenvolvendo profissionalmente. Dessa forma,

passaremos a tratar sobre o desenvolvimento profissional na próxima seção.

3.4 O Desenvolvimento Profissional na Visão de Ponte e Imbernón

Em relação ao desenvolvimento profissional, Imbernón (2010) destaca a

necessidade de não confundir termos e conceitos relativos à formação docente pois,

ao considerar formação permanente e desenvolvimento profissional como sinônimo,

estaremos entendendo que “a formação é o único meio de que o professor dispõe

para se desenvolver profissionalmente” (IMBERNÓN, 2010, p. 45)

O autor explica que a formação profissional constitui elemento relevante de

desenvolvimento profissional, porém ela não é nem o único e nem o fator decisivo

para isso. Concordando com a concepção de Imbernón (2010), consideramos que o

desenvolvimento profissional não se limita à formação. Nas palavras deste autor,

O desenvolvimento profissional do professor não é apenas o desenvolvimento pedagógico, o conhecimento e compreensão de si mesmo, o desenvolvimento cognitivo ou teórico, mas tudo isso ao mesmo tempo delimitado ou incrementado por uma situação profissional que permite ou impede o desenvolvimento de uma carreira docente.

O desenvolvimento profissional do professor pode ser um estímulo para melhorar a prática profissional, convicções e conhecimentos profissionais, com o objetivo de aumentar a qualidade docente de pesquisa e de gestão. (IMBERNÓN, 2010, p. 49).

Nessa direção, entendemos que o professor se desenvolve ao ser motivado

por diversos fatores que não são limitados apenas a formação, mas também

relacionados à sua situação profissional numa intenção de melhorar sua prática

docente.

Para esse autor, existem contrastes que diferenciam a formação e o

desenvolvimento profissional. Apresentaremos esses contrastes no Quadro 3.2

abaixo.

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Quadro 3.2: Contrastes entre formação e desenvolvimento profissional.

Formação Desenvolvimento Profissional É associada à participação de cursos;

A trajetória é de fora para dentro, o professor assimila aquilo que é transmitido;

Atua na carência do professor;

É dividido/separado (por conteúdo ou por disciplina);

Parte de teorias e pode-se restringir a elas.

Ênfase na normalização (conhecimentos formais, aspectos cognitivos);

Acontece em período determinado, (debate tópicos específicos).

A atuação é de formar variadas (leituras, trocas de experiências, participação em projetos, entre outros);

A trajetória é de dentro para fora, o professor decide o que quer priorizar, em quais projetos se envolverá.)

A atuação é nas potencialidades do professor;

Ver o professor como um todo (observando os aspectos cognitivos, afetivos, de relacionamentos);

A tendência é considerar a teoria e a prática, de forma integrada);

Ênfase na promoção da individualidade (conhecimentos formais e informais, afetivos, relacionais simultaneamente);

Acontece ao longo da vida profissional, com finalidade de tornar os professores aptos na:

Condução do ensino da Matemática;

Identificação de interesses e necessidades dos alunos;

Contribuição para a melhoria das instituições educativas;

Realização pessoal e profissional.

Fonte: Elaborado a partir da leitura de Ponte (1998).

Nessa perspectiva, podemos pensar que a formação, seja ela inicial ou

continuada, é um subconjunto do desenvolvimento profissional, a formação é uma

base sob a qual o desenvolvimento profissional pode ser ou não favorecido.

A finalidade do desenvolvimento profissional é, nas palavras de Ponte (1998),

“tornar os professores mais aptos a conduzir um ensino da Matemática adaptado às

necessidades e interesses de cada aluno e a contribuir para a melhoria das

instituições educativas, realizando-se pessoal e profissionalmente” (IMBERNÓN,

2010, p. 3).

No entendimento desse autor, para que o professor exerça adequadamente

sua atividade docente, ele necessita:

� Saber Matemática e gostar dessa matéria

� Conhecer o currículo e ser capaz de recriá-lo, segundo sua situação de trabalho;

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� Conhecer seus alunos em suas dificuldades, necessidades, potencialidades,

limitações) e os processos de aprendizagem.

� Dominar os processos de instrução, vários métodos e técnicas de ensino

sabendo relacioná-los com os objetivos e conteúdos curriculares;

� Conhecer o contexto de trabalho (escola e o sistema educativo),

� Conhecer a si mesmo como profissional.

Alguns desses fatores só podem ser apropriados pelo desenvolvimento

profissional e não pela formação, como por exemplo, conhecer seus alunos,e o

contexto de trabalho.

Ponte (1998) destaca que o desenvolvimento profissional possui dois

importantes elementos: o coletivo e o individual. O elemento coletivo favorece o

desenvolvimento profissional; no entanto, a responsabilidade por esse

desenvolvimento é individual, pois é o professor quem define suas metas, seus

objetivos, e deve refletir sobre sua prática.

No que tange ao elemento individual, existem vários fatores que influenciam

os professores, que são as relações familiares e as crises pessoais, entre outras. O

coletivo envolve o ambiente organizacional e este influencia a carreira profissional

através dos ajustamentos da profissão, características da gestão, e as expectativas

sociais, etc. (GARCÍA, 1999).

Como já foram tratados anteriormente, os conhecimentos e os saberes dos

professores exercem influência em sua atuação docente. Isso sugere, também,

discutir as concepções, tendo em vista de que a maneira como o professor ensina é

influenciada, também, pela forma como ele concebe o ensino de Matemática.

3.5 Concepções sob Diversas Óticas

Diversos autores empregam concepção como sinônimo de crença, opinião e

visão (CURY, 1999). Em nossa investigação utilizaremos o termo concepção tal

como foi proposto por Moron e Brito (2005),

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[...] concepção é definida como a maneira própria de cada indivíduo elaborar, interpretar, representar suas idéias e agir de acordo com as mesmas. É construída a partir das experiências individuais que são influenciadas por uma série de variáveis do ambiente (conhecimentos, valores, experiência prática, componente emocional). (MORON e BRITO 2005, p. 266 – 267).

Dessa forma, acreditamos que as experiências pelas quais os professores

passaram, constituíram o seu modo de interpretação, de representação e de ação.

Complementando as ideias de Moron e Brito (2005), Ponte (1992) destaca

que as concepções possuem, fundamentalmente, uma essência cognitiva, sendo

formada num processo individual e social. É individual, tendo em vista a decorrência

da nossa construção em relação à nossa experiência e é social tendo em vista que

termos um confronto de nossas construções com as elaborações de outras pessoas

com as quais convivemos. Na visão desse autor, as concepções,

Actuam como uma espécie de filtro. Por um lado, são indispensáveis pois estruturam o sentido que damos às coisas. Por outro lado, actuam como elemento bloqueador em relação a novas realidades ou a certos problemas, limitando as nossas possibilidades de actuação e compreensão. (PONTE, 1992, p. 1).

A Matemática normalmente é vista como um “bicho de sete cabeças”, pois

lida com números, cálculos, equações e abstrações e tudo isso pode ser um filtro

onde só se permite vislumbrar nuances do entendimento dessa disciplina o que

pode influenciar o processo de ensino e aprendizagem.

Nessa direção, Tompson (1997) pontua que “[...] qualquer esforço para

melhorar a qualidade do ensino de Matemática deve começar por uma compreensão

das concepções sustentadas pelos professores e pelo modo como estas estão

relacionadas com sua prática” (p. 14). Dessa forma, discorreremos abaixo sobre as

concepções da Matemática mais disseminadas, segundo Ponte (1992, p. 205):

� O cálculo é a parte mais essencial, mais acessível e fundamental da

Matemática. Seus aspectos não devem ser descuidados mesmo nos anos iniciais do

Ensino Fundamental. No entanto, conceber a Matemática apenas como cálculo,

limita a Matemática “a um dos seus aspectos mais pobre e de menor valor formativo

– [...] aquele que não requer especiais capacidades de raciocínio.”

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� A Matemática consiste na demonstração de proposições partindo de um

sistema de axiomas mais ou menos arbitrário; nessa concepção, é reconhecida a

influência do formalismo e limita a Matemática estrutura dedutiva. Entretanto, “A

dedução, só pode ter lugar na medida em que existe já uma linha condutora do

pensamento e um grande refinamento dos conceitos envolvidos.”

� Uma concepção que aparece atrelada à anterior é a de que a Matemática é o

domínio do rigor absoluto, da perfeição total. Nessa concepção a Matemática é um

conhecimento incontestável e acabado. Entretanto, “a prática da Matemática, como

produto humano, está sujeita às imperfeições naturais da nossa espécie. Nela há

margem para se desenvolverem diversos estilos ou se tomarem diferentes opções.”

� Outra concepção, advinda também da tradição formalista, tende a separar a

Matemática da realidade. Essa perspectiva não considera o processo histórico pelo

qual a Matemática se desenvolveu e nem se preocupa se, “encarada desta forma, é

ou não compreensível pelos alunos, e se o seu ensino corresponde ou não a uma

efectiva relevância social.”

� Por fim, a concepção de que nenhuma novidade pode ser feita em

Matemática, com exceção dos gênios. No entendimento de Moron e Brito (2005),

seria mais adequado classificar essa última concepção como sendo uma crença e

justificam: “as concepções são relativas ao domínio cognitivo, enquanto as crenças

são altamente influenciadas pela cultura e referem-se à aceitação de uma idéia sem

o devido suporte teórico” (MORON; BRITO, 2005, p. 267).

Fiorentini (1995) identificou tendências que convergiram das concepções: de

Matemática, de ensino e de aprendizagem e de como se realiza o processo de

obtenção/produção/descoberta do conhecimento matemático no Brasil, para ele “a

forma como vemos/entedemos a Matemática tem fortes implicações no modo como

entendemos e praticamos o ensino da Matemática e vice-versa” (FIORENTINI, 1995,

p. 4). Dessa forma, pontuaremos a seguir, as tendências elencadas pelo autor por

que voltaremos o olhar para as concepções inerentes a elas.

� Formalista Clássica: nesta tendência a ênfase é dada nas ideias e nas

formas da Matemática Clássica segundo o modelo euclidiano e ligado à concepção

platônica. O modelo euclidiano é caracterizado pela reunião em um sistema lógico

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do conhecimento matemático, a partir de definições, axiomas, postulados. A

concepção platônica considera a Matemática a-histórica, estática e com o dogma de

que as ideias matemáticas existem independentes do homem. Dessa forma, o

homem não pode inventá-la nem construí-la; apenas pela intuição, ele descobre as

ideias matemáticas que preexistem no mundo ideal.

Essa tendência concebe a aprendizagem passiva e consistia na memorização

e na reprodução por imitação ou repetição. Dessa forma, o aluno repetia para reter

as informações e devolver as respostas prontas quando solicitado pelo professor. O

papel do professor é transmissor e expositor de conteúdos.

� Empírico – Ativista: surgiu da negação/oposição a tendência clássica

considerando a natureza da criança em desenvolvimento, suas diferenças, as

características biológicas e psicológicas, cabe ao currículo atender estas

características. Essa tendência acredita que as ideias matemáticas são descobertas,

porém a existência delas está no mundo natural e material, portanto, o conhecimento

emerge do mundo físico e é extraído pelos sentidos (empirismo).

Essa tendência concebe a aprendizagem a partir da manipulação e

visualização de objetos e atividades. Assim, o aluno desenvolvia atividades em

grupos com material didático/manipulativo, por que na visão dessa tendência se

aprende fazendo. O papel do professor é orientar e facilitar a aprendizagem.

� Formalista Modernista: é ligada ao movimento da Matemática Moderna,

convida a um retorno ao formalismo matemático, ligado, porém, às estruturas

algébricas, às definições e à linguagem formal da Matemática contemporânea.

Enfatiza o lógico sobre o psicológico, o formal sobre o social. Assim, concebe a

Matemática “neutra” sem relacioná-la a interesses sociais e políticos.

A concepção de ensino e aprendizagem pouco se modificou da tendência

clássica; o ensino é centrado no professor, que expõe e demonstra tudo no quadro,

com rigor, utilizando a linguagem matemática de forma precisa. Nessa concepção, o

papel do aluno continua passivo e reproduzia a linguagem e o raciocínio

apresentado pelo professor.

� Tecnicista: a pretensão dessa tendência era tornar a escola eficiente e

funcional, nos modelos de produção capitalista. Apoiava-se no behaviorismo que

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defende a ideia de que todo o comportamento humano é controlado por meio do

padrão estímulo-resposta. Essa tendência reduzia a matemática a um conjunto de

regras algoritmos sem fundamentação e justificativa.

Essa tendência concebe a aprendizagem por meio de técnicas de ensino e a

mais privilegiada era a “instrução programada” do tipo resolva os exercícios

seguindo o modelo. O foco não é nem no aluno nem no professor, os dois são

executores do processo de ensino cuja ênfase é nos objetivos instrucionais, nos

recursos e nas técnicas de ensino.

� Construtivista: surgiu a partir dos estudos de Piaget, sobre Epistemologia

Genética, apresenta a psicologia como núcleo central, fornencendo subsídios para a

educação, substituindo a prática mecânica, mnemônica e associonista em aritmética

por uma prática pedagógica que visa a construção do pensamento lógico-

matemático. Concebe a Matemática como construção humana, estabelecida por

estruturas e relações abstratas.

Essa tendência concebe o aluno ativo no processo de aprendizagem e o

papel do professor passa a ser mediador, desafiador, questionador. A concepção de

aprendizagem é a construção do pensamento do aluno na interação com os objetos,

situações e com seus pares.

� Socioetnocultural: essa tendência possui ênfase voltada aos aspectos

ambientais do processo de produção do fracasso escolar. Valoriza os procedimentos

matemáticos não formais, o saber prático, não universal, produzido histórico-

culturalmente. Segundo Fiorentini (1995) essa tendência beneficiaria a ocorrência da

aprendizagem significativa, implicando numa retenção mais efetiva do conteúdo.

A concepção dessa tendência é a de que a aprendizagem parte da realidade,

os problemas proposto pela escola seriam ligados ao cotidiano e á cultura; o método

de ensino preferido é a problematização.

Entender os conhecimentos, os saberes, as concepções e o desenvolvimento

profissional nos ajuda a refletir sobre a visão do professor em relação ao trabalho

com o conceito de número com alunos do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental.

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De posse da nossa construção teórica partimos para o capítulo que tratará

sobre o cenário e os caminhos metodológicos traçados nesta investigação.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 44

OOSS CCEENNÁÁRRIIOOSS EE OOSS CCAAMMIINNHHOOSS MMEETTOODDOOLLÓÓGGIICCOOSS

O objetivo do nosso estudo é investigar que concepção(ões) está(ão) presente(s)

quando professores se propõem trabalhar o conceito de número com alunos do 1º

e 2º ano do Ensino Fundamental de Escolas de Jequié – BA.

Para alcançar esse objetivo, tivemos que fazer nossas escolhas

metodológicas. Assim, no presente capítulo, apresentaremos a natureza da

pesquisa, o universo do estudo, os instrumentos, os procedimentos e alguns fatores

qualitativos de análise.

4.1 A Natureza da Pesquisa

Trata-se de uma abordagem qualitativa, tendo em vista que, conforme Minayo

(1994), a preocupação deste tipo de pesquisa é com “um nível de realidade que não

se pode ser quantificado”. Assim, a pesquisa qualitativa aborda “o universo de

significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes” (p. 22).

A preocupação da pesquisa qualitativa, no entendimento de Ludke e André

(1986), é com o processo, que se torna importante na obtenção de dados de

determinado grupo investigado, e que ocorrem no processo de interação e reflexão,

possibilitando um melhor conhecimento da perspectiva dos participantes da

investigação.

Os dados obtidos nesse tipo de pesquisa são descritivos e obtidos no contato

direto com o pesquisador e com a situação investigada. A preocupação é relatar a

perspectiva dos participantes sobre como a criança constrói o conceito de número.

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106

Como o objetivo é investigar as concepções relativas ao ensino de número,

fizemos a opção pela pesquisa descritiva. Segundo Fiorentini e Lorenzato (2006,

p.70) na pesquisa descritiva se “deseja descrever ou caracterizar detalhes de uma

situação, um fenômeno ou um problema”. Em nosso caso, a intenção é obter dados

que possam descrever as concepções dos professores em relação à construção do

conceito de número.

Nessa direção, Gil (1999) afirma que a pesquisa descritiva procura observar,

registrar, correlacionar e expor fatos ou fenômenos de uma realidade. O autor

ressalta, entretanto, a necessidade de se estabelecer um delineamento que irá aludir

ao planejamento da pesquisa.

Torna-se, pois, necessário, para confrontar a visão teórica do problema, com os dados da realidade, definir o delineamento da pesquisa.

O delineamento refere-se ao planejamento da pesquisa em sua dimensão mais ampla, envolvendo tanto a sua diagramação quanto a previsão de análise e interpretação dos dados. (GIL, 1999, p. 64).

Assim, classificaremos o delineamento da pesquisa como diagnóstica e

utilizaremos como instrumentos para coleta e análise dos dados, um questionário e

entrevista semiestruturada, que detalharemos adiante.

4.2 O Universo de Estudo e Sujeitos

Esta seção relata as opções na escolha do universo de estudo, tendo um foco

especial nos sujeitos de estudos que são os professores.

4.2.1. As Escolas

O universo de estudo selecionado foram as três maiores escolas públicas, em

número de alunos matriculados no Ciclo I do Ensino Fundamental, no Município de

Jequié – BA. A cidade é conhecida como Cidade Sol e está a 365 km de distância

de Salvador. Jequié possui, aproximadamente, 150 mil habitantes, 25 escolas de

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107

Ensino Fundamental do Ciclo I na sede. Esse número, no entanto, desconsidera as

escolas existentes nos distritos: Fazenda Velha, Florestal, Itaibó, Boaçu, Itajuru,

Monte Branco, Baixão, Oriente Novo, Tamarindo e Barra Avenida.

Quadro 4.1: Quantidade de alunos matriculados por escola.

Escola Quantidade alunos

matriculados no Ciclo I do Ensino Fundamental

1 600

2 650

3 500

Fonte: Dados divulgados pelas diretoras das Escolas em 2010

A escolha das escolas foi determinada, também, pela acessibilidade e a

adesão à pesquisa, por parte da Direção e do corpo docente, confirmada pela

assinatura dos sujeitos no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE),

apêndice C.

As escolas são Municipais de Ensino Fundamental e estão situadas em

diferentes bairros suburbanos de Jequié, a saber: A escola 1 situa-se no Km3, a

escola 2 no bairro Jequiezinho e a escola 3 no Brasil Novo. Todas ficam em área

residencial de classe econômica média-baixa, e atendem a alunos de nível

socioeconômico baixo, moradores de localidades próximas aos bairros em que as

escolas estão situadas.

4.2.2 Os Sujeitos

As professoras dos 1ºs e 2ºs anos dessas escolas foram os sujeitos nesta

investigação, assim distribuída:

Quadro 4.2: Quantidade de professoras por escola.

Escola Quantidade de Professoras

1 5

2 4

3 4

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108

Na tendência romântica da Educação Infantil, conforme assinalam Kramer

(1994) e Louzada (1999), as crianças que frequentam a escola são flores

desabrochadas das sementes plantadas no jardim de infância e a professora é uma

jardineira. Como forma de agradecimento pela participação e contribuição nessa

investigação, nomearemos as professoras como flores, conforme Quadro 4.3 abaixo:

Quadro 4.3: Sujeitos da investigação, série e escola que leciona.

Nome Série que Leciona Escola

ACÁCIA 1º ANO

AÇUCENA 1º ANO

ANGÉLICA 1º ANO

BROMÉLIA 2º ANO

DÁLIA 1º ANO

ESCOLA 1

ÉRICA 1º E 2º ANOS

HORTÊNCIA 2º ANO

MAGNÓLIA 1º E 2º ANOS

MARGARIDA 1º E 2 º ANOS

ESCOLA 2

ORQUÍDEA 2º ANO

ROSA 1º ANO

TULIPA 2º ANO

VIOLETA 2º ANO

ESCOLA 3

4.3 Os Instrumentos

Nossos instrumentos para coleta e análise dos dados foram: o questionário,

que está disponível no apêndice A e a entrevista semiestruturada, cujo roteiro se

encontra também no apêndice B que detalharemos a seguir.

De acordo com Fiorentini e Lorenzato (2006 p.116) “O questionário é um

instrumento tradicional de coleta de informações”. Auxilia na caracterização dos

sujeitos, levantando alguns dados como “idade, sexo, estado civil, nível de

escolaridade, preferências, número de horas de estudo, número semanal de horas-

aula do professor, matérias ou temas preferidos, etc. (FIORENTINI; LORENZATO,

2006, p. 117). O questionário foi proposto em quatro vertentes:

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a) O perfil do professor: para melhor caracterizar os sujeitos de nossa

investigação levantamos informações tais como: idade, formação, tempo

de experiência.

b) Preferência e concepções: solicitamos que as professoras

respondessem questões referentes às suas preferências em relação à

Matemática e ao seu ensino e suas concepções sobre planejamento,

avaliação, ensino e aprendizagem em Matemática.

c) Entendimento de número: solicitamos que as professoras descrevessem

seu entendimento sobre o conceito de número e como elas identificam que

seus alunos já se apropriaram do referido conceito.

d) Situações: convidamos as professoras a elaborarem seis situações em

que a aprendizagem do conceito de número é facilitada às crianças.

Utilizamos, também, entrevista, semiestruturada, cujo objetivo, de acordo com

Martins (2006), é entender e compreender o significado que os sujeitos atribuem a

questões e situações, que lhes são familiares do cotidiano escolar o que permitirá

uma maior profundidade do que queremos investigar.

O entrevistado discorre sobre o tema proposto com base nas informações que ele detém e que no fundo são a visão, a avaliação, a formação de professores, o planejamento do ensino, as relações entre a escola e a comunidade, enfim, toda esta vasta rede de assuntos que entram no dia-a-dia do sistema escolar, podemos estar seguros de que, ao entrevistarmos professores, diretores, orientadores, supervisores e até mesmo pais de alunos não lhes estaremos certamente impondo uma problemática estranha, mas, ao contrário, tratando com eles de assuntos que lhes são muito familiares sobre os quais discorrerão com facilidade. (LUDKE; ANDRE, 1986, p.36).

Nossa pretensão com a entrevista era a de obter um aprofundamento nas

respostas dadas às questões, que pudessem corroborar as evidências encontradas

pelo questionário, possibilitando um encadeamento a respeito de como o professor

“ensina” o conceito de número. Destacamos a palavra ensina, pois, o conceito de

número não é ensinado à criança, conforme afirmam Kamii e DeClark (1994); elas,

por meio de seus pensamentos e hipóteses constroem tal conceito.

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Para registrar todas as informações e ter fidelidade das respostas, gravamos

as entrevistas em áudio, as quais, posteriormente, foram transcritas e organizadas

por categorias. Recorremos aos dois instrumentos, para que, ao combinar

informações pudéssemos nos aproximar mais profundamente dessa realidade.

4.4 Os Procedimentos

No primeiro contato com os sujeitos participantes da pesquisa explicitamos o

motivo da visita, apresentamos em linhas gerais os objetivos da investigação à

Direção e à Coordenação, e agendamos um encontro com as professoras.

Num segundo encontro, também em linhas gerais, apresentamos a

investigação proposta bem como seus objetivos às professoras dos 1º e 2º anos,

destacando que a participação delas seria de extrema importância para o

desenvolvimento da pesquisa. Perguntamos se as professoras presentes

concordariam em participar da pesquisa respondendo a um questionário e a uma

entrevista, com o que todas consentiram.

Dessa forma, expusemos o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE), apêndice C, para a concordância final que, depois de lido, foi assinado

pelos sujeitos dessa investigação. Foi dada a liberdade para deixar o estudo a

qualquer momento e a garantia do sigilo dos informantes. Foi feito outro

agendamento com as professoras, de modo a não comprometer as atividades de

sala de aula e/ou reuniões.

No dia agendado pelas professoras, agradecemos pela participação na

investigação e aplicamos a primeira parte do questionário. Em outro encontro,

concluímos a aplicação do questionário, o que foi feito coletivamente, mas

respondido individualmente. Esta etapa durou aproximadamente 90 minutos em

cada escola.

Interessante observar que, após o preenchimento do questionário, as

professoras espontaneamente debateram entre si sobre sua prática pedagógica, a

troca de experiências de sucesso com seus alunos e problemas relativos à falta de

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material na escola. Esse debate também foi gravado. Após esse debate, agendamos

nova visita para a realização da entrevista com as professoras, entrevistamos sete

professoras. Apresentaremos os detalhes do questionário, a seguir.

Figura 4.1: Questões 1 a 7 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil das professoras.

Solicitamos que os professores colocassem seus nomes no instrumento, com

a intenção de garantir a sua identificação, pois esse item da pesquisa é composto de

duas partes e, na entrevista, poderíamos aprofundar algum dado do que tivesse sido

explicitado nas respostas do questionário. No momento da análise, numeramos cada

questionário, seguindo a ordem alfabética do nome das professoras por escola.

Com a questão 2, queremos identificar em qual fase da vida a professora se

encontra. Na questão 3, verificamos se os professores dos anos iniciais são do sexo

feminino ou do sexo masculino. Nossa intenção, com a questão 4 e 5 é conhecer a

formação dos nossos sujeitos de pesquisa de modo a verificar se esta influencia sua

prática escolar.

Na questão 6, nosso objetivo é verificar o tempo de prática docente das

professoras. Com a questão 7, a nossa intenção é avaliar o acúmulo de funções a

que o professor está submetido, de modo a verificar se ele dispõe de momentos

para efetuar seu planejamento.

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Figura 4.2: Questões 8 a 12 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras.

Nas questões 8, 9 e 10, nossa intenção foi a de averiguar em qual série a

professora estava atuando, qual foi a sua experiência e em qual delas sente-se mais

segura para ministrar aulas.

Nosso objetivo com a questão 11 foi saber como era a preferência pela

disciplina Matemática, enquanto as professoras eram alunas. A questão 12

possibilitou um “encontro” com a questão 11, pelo qual podemos identificar a

evolução da preferência desse professor, em relação à disciplina de Matemática.

Verificaremos se a preferência se relaciona também com o número de horas

disponibilizadas para o ensino de Matemática.

Figura 4.3: Questão 13 do Instrumento Diagnóstico, referente ao perfil, preferências e concepção das professoras.

A finalidade da questão 13 é identificar qual(is) conteúdos matemático(s) o

professor sentia mais segurança para ensinar. Oferecemos opções, seguindo os

blocos de conteúdos propostos pelos PCN. Deixamos, entretanto, espaço para a

indicação de outro conteúdo, caso assim o desejasse.

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Figura 4.4: Questão 14 do Instrumento Diagnóstico, referente à preferências e concepção das professoras.

Com a questão 14, pretendemos analisar qual(is) material(is) os professores

utilizam em suas aulas. Foram oferecidas algumas opções, dentro daquelas que

normalmente são utilizadas, mas também havia espaço para indicação de outro jogo

ou outro material.

Figura 4.5: Questões 15 a 18 do Instrumento Diagnóstico, referente à preferências e concepção das professoras.

O nosso interesse, na questão 15, é observar nas respostas dadas por nosso

sujeito a sua relação com a matemática.

As questões de 16 a 23 foram inspiradas e adaptadas da Tese de Castro

(2010) devido à sua correlação com o presente estudo, e por entendermos que o

planejamento é um ato imprescindível à prática educativa, pois através dele o

professor norteia a sua prática. Assim, nossa intenção nas questões 16 e 17, é

identificar o valor atribuído para a ação de planejar o ensino a curto e a longo prazo.

O objetivo da questão 18 é verificar o valor atribuído ao registro dos

acontecimentos da aula como um instrumento de reflexão e redirecionamento da

prática pedagógica.

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114

Figura 4.6: Recorte: Questões 19 a 21 do Instrumento Diagnóstico, referente à concepção das professoras.

A questão 19 tem a intenção de identificar a importância atribuída à

preparação do conteúdo. O objetivo da questão 20 foi identificar de quais materiais o

professor se utiliza na preparação e organização de sua aula. Com a questão 21,

temos o objetivo de identificar os instrumentos utilizados pelo professor para avaliar

seus alunos. Indagamos a respeito das formas de avaliação empregadas, visando

identificar instrumentos utilizados nos processos de avaliação empregados em sala

de aula.

Figura 4.7: Questões 22 e 23 do Instrumento Diagnóstico, referente à concepção das professoras.

A questão 22 aborda a concepção que o professor possui sobre o ensino de

Matemática, e a questão 23 aborda a concepção do professor sobre o que seja

aprender Matemática.

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Indagamos na segunda parte do questionário:

Figura 4.8: Questões 1 e 2 do Instrumento Diagnóstico, referente ao entendimento de número na visão das professoras.

As questões 1 e 2 foram extraídas da Tese de Carmo (2010) devido a sua

conexão com o presente estudo. A questão 1 aborda o entendimento que as

professoras possuem sobre o número. Com segunda questão queremos averiguar

como essas professoras identificam que seus alunos já se apropriaram do conceito

de número.

Figura 4.9: Questão 3 do Instrumento Diagnóstico, referente às situações.

Na questão 3, solicitamos a elaboração de seis situações que facilitam a

aprendizagem do conceito de número. Esperávamos que as situações formuladas

refletissem a ideia que as professoras têm em relação a como a criança constrói o

conceito de número e como ela trabalha com essa construção.

Acreditamos que as professoras farão uso de desenhos para ilustrar as

situações elaboradas; para tanto, deixamos espaço entre as questões a serem

elaboradas para o caso de elas ilustrarem a questão, tal como fariam se a situação

fosse apresentada aos seus alunos.

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116

4.5 Planejamento da Análise e Interpretação dos Dados

Para analisar os dados utilizamos a categorização porque, segundo Gomes

(1994), trabalhar com categorias significa agrupar elementos, ideias ou expressões

em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso. Nessa direção, Fiorentini e

Lorenzato (2006) entendem a categorização como um processo de seleção ou de

organização de informações em categorias estabelecidas, ou seja, em classes ou

conjuntos que contenham elementos ou características comuns.

A apresentação da análise dos dados foi agrupada em categorias que se

delinearam em nossos momentos de reflexões, amparadas em nosso referencial

teórico, a saber: Perfil das Professoras, Preferências e Concepções das

Professoras, entendimento de Número na Visão das Professoras e Situações

Problema nas quais os Números são Trabalhados.

Prosseguiremos no próximo capítulo, com a análise dos dados coletados em

nossa investigação.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 55

AANNÁÁLLIISSEE EE DDIISSCCUUSSSSÃÃOO DDOOSS RREESSUULLTTAADDOOSS

Com o intuito de atender ao objetivo do estudo, qual seja, investigar que

concepç(ão)ões est(á)ão presente(s) quando professores se propõem trabalhar o

conceito de número com alunos do 1º e 2º ano do Ensino Fundamental de

Escolas de Jequié – BA, analisaremos os resultados obtidos à luz do aporte

teórico que subsidiou a nossa pesquisa.

Assim, o objetivo deste capítulo é apresentar, descrever e analisar os dados

obtidos por meio dos instrumentos de coleta dados: o questionário complementado

pela entrevista. O presente capítulo está estruturado em quatro seções: inicialmente,

traçaremos o perfil das professoras investigadas, na segunda seção, delinearemos

um panorama sobre preferências e concepções dessas professoras em relação ao

ensino e aprendizagem em Matemática na terceira seção investigaremos seus

entendimentos sobre número e, finalmente, na quarta seção abordaremos as

situações sobre números, elaboradas por elas para trabalhar com estudantes dos

anos iniciais.

5.1 Perfil das Professoras

Esta seção dedica-se à descrição do perfil das professoras participantes de

nosso estudo. Tal descrição acontecerá dentro de quatro subseções: 1) faixa etária

(questão 2), 2) formação (questões 4 e 5), 3) tempo de experiência no magistério

(questão 6) e 4) experiência com os anos de alfabetização, objetos desta

investigação. Este perfil é traçado a partir das respostas das professoras na primeira

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parte do questionário (apêndice A), acrescido dos dados obtidos com a entrevista

(apêndice B).

5.1.1 A Faixa Etária

O motivo que nos levou a analisar as professoras considerando suas faixas

etárias, baseia-se no fato de que tais faixas interferem em seus modos de ação,

conforme assinalado no Capítulo 3. Assim, cada etapa de vida pessoal e profissional

pode se relacionar com os modos, as atitudes, as perspectivas, as percepções, as

expectativas e as inquietações das professoras, (GARCÍA, 1999). Apresentaremos,

a seguir, a distribuição do número de professoras por idade no Gráfico 5.1.

Gráfico 5.1: Distribuição das professoras por idade.

A partir dos dados retratados no gráfico 5.1, podemos constatar que uma

parte das professoras (cinco) encontra-se no intervalo de 30 a 40 anos. Para García

(1999), nesse intervalo, as professoras costumam apresentar muita disposição, tanto

física e intelectualmente, o que sugere a possibilidade de elas terem confiança em si

mesmas. O referido autor denomina esta fase de “estabilização, normalização, na

qual os professores tentam ser mais competentes no seu trabalho” (García, 1999, p.

62).

Grande parte das professoras investigadas (sete) tem mais de 41 anos. Esse

subconjunto, conforme o entendimento de García (1999, p. 63), "pode já ter se

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119

adaptado à sua maturidade, adotando novos papéis na escola e no sistema

educativo”.

Tais dados podem ser uma indicação de que a maioria das professoras

investigadas já tenha se adaptado à maturidade e, consequentemente, a

preocupação com o domínio do conteúdo, característico da primeira fase (21 a 28

anos), já não se faça tão presente.

5.1.2 A Formação

Considerando a formação das 13 professoras participantes do estudo, temos

que 10 possuíam o Magistério9 e três não informaram. Em relação ao Ensino

Superior, três professoras estavam cursando Pedagogia e 10 já o haviam concluído,

sendo que duas delas possuíam também formação em outra licenciatura (História e

Letras). Considerando ainda o conjunto das 10 professoras que tinham curso

superior completo, seis possuíam curso de especialização, sendo cinco em

Psicopedagogia e uma em Gestão e Supervisão Escolar.

Na perspectiva de Ponte (1998), o grupo mostrou uma preocupação com seu

desenvolvimento profissional, uma vez que quase a metade das professoras

participantes do estudo (seis das 13) não se contentara em cursar apenas

Pedagogia, investindo em cursos de especialização. Isto sem contar que duas delas

buscaram outras graduações.

Essas professoras atendem ao que é solicitado pelo Governo Federal através

das diretrizes anunciadas pela Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional –

LDBEN, Nº 9.394/96 em seu artigo 62: “a formação de docentes para atuar na

educação básica far-se-á em nível superior”, portanto são professoras do ponto de

vista da legislação aptas a atuar nesse nível de ensino.

Entretanto, Tardif (2002) expõe que é a partir dos saberes experienciais que os

professores julgam sua formação. Essa afirmativa pode ser constatada pela fala das

professoras Érica e Açucena, respectivamente: “a formação não foi suficiente para a

9 Magistério era o curso de formação em Nível Médio que habilitava professores para atuar na educação infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental.

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prática”, “a gente nunca aprende completamente, é na sala de aula que você se

completa”. Esse sentimento de insuficiência, comparando a formação com o que é

vivenciado na prática, parece ter impulsionado uma parte das professoras na busca

por novos conhecimentos, quer fosse numa outra licenciatura e/ou curso de

especialização, o que demonstra uma preocupação com a qualidade do ensino.

A partir das ações das professoras em buscar cursos de pós-graduação para

complementar sua formação e, ainda, pelas reflexões críticas sobre suas formações

– transcritas das falas das professoras Érica e Açucena, podemos supor que esse

grupo já possui algumas concepções provenientes dos saberes adquiridos nas

disciplinas cursadas em sua formação.

5.1.3 Tempo de Experiência

Em relação ao tempo de experiência no exercício do magistério, o Gráfico 5.2,

a seguir, apresenta distribuição do número de professoras pelo tempo em que atuam

no magistério.

Gráfico 5.2: Distribuição das professoras por tempo de serviço.

Constatamos que esse grupo de professoras possui um razoável tempo de

serviço, pois a maioria delas (10 professoras) atua há mais de 10 anos em sala de

aula com os anos iniciais do Ensino Fundamental. Como existem fases que

compõem a carreira do professor (Capítulo 3), a partir do Gráfico 5.2, podemos

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121

deduzir que a maioria das professoras investigadas já atravessou a fase da

“estabilização e de consolidação” (três a sete anos) (TARDIF, 2002).

De fato, para Tardif (2002), os anos de profissão modificam a identidade

profissional do professor e o seu modo de trabalhar. A fase anteriormente citada é

caracterizada pela confiança em si mesmo e pelo domínio dos diferentes aspectos

do trabalho. Isto implica dizer que há muita possibilidade de que as professoras

deste estudo sejam profissionais seguras no desempenho de suas tarefas.

Se considerarmos o que defende García (1999), essas professoras estão na

fase denominada de experimentação ou diversificação. Segundo o autor, tal fase é

vivenciada diferentemente de professor para professor. Para alguns, ela consiste na

busca de melhoria de sua capacidade; para outros o foco está na ascensão

profissional, por meio desempenho de funções administrativas. Por fim, ainda é

possível encontrar grupo que procure encurtar seus compromissos profissionais,

exercendo outra atividade paralela ou deixando de lado a carreira de professor.

A partir das ideias de Tardif (2002) e García (1999), podemos supor que com

o passar do tempo novas ações surgirão das experiências vivenciadas por essas

professoras, as quais serão refletidas e (re)avaliadas para compor seus repertórios

de ações. Assim sendo, discorreremos, a seguir sobre a experiência que essas

professoras possuíam em relação aos primeiros anos de escolaridade.

5.1.4 Experiência com os Primeiros Anos do Ensino Fundamental

Para efeito da análise sobre a experiência letiva das professoras que

participaram desta investigação, a Quadro 5.1 apresenta a distribuição dos anos

escolares em que essas 13 professoras já lecionaram anteriormente, e em quais

deles se encontram lecionando atualmente (no momento que o estudo de campo foi

realizado).

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Quadro 5.1: Atuação das professoras, no passado e presente, por ano escolar. Anos

Professoras

Educação Infantil

Ano 2º Ano 3º Ano 4º Ano

Antes X X X X X Acácia

Agora X

Antes X X X Açucena

Agora X

Antes X X Angélica

Agora X

Antes X Bromélia

Agora X

Antes X Dália

Agora X

Antes X X X X Érica

Agora X X

Antes X X Hortência

Agora X

Antes X X X X X Magnólia

Agora X X

Antes X X X X Margarida

Agora X X

Antes X X X X X Orquídea

Agora X

Antes X X Rosa

Agora X

Antes X X X X X Tulipa

Agora X

Antes X X X Violeta

Agora X

Estes dados expõem que há um equilíbrio na distribuição das professoras nos

anos escolares em que estavam lecionando, quando da coleta dos dados. Cinco

ensinavam no 1º ano, cinco no 2º ano e três nos dois anos, o que indica uma, que a

distribuição foi equitativa dos anos escolares.

Em relação à experiência anterior, a maioria das professoras (7) já teve

experiência com a Educação Infantil. Nessa etapa escolar, as noções de Matemática

são trabalhadas de modo lúdico, com jogos, brincadeiras e com a intencionalidade

de ampliar os horizontes conceituais dos alunos já prevendo uma transição da

Educação Infantil para o Ensino Fundamental de modo natural (CORSINO, 2010).

Considerando que a Educação Infantil não é obrigatória, pois o início da

escolarização do ponto de vista formal é no 1º ano do Ensino Fundamental,

podemos afirmar que 11 professoras tiveram e uma está tendo experiência com a

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123

iniciação escolar. Nove das 13 professoras têm experiência docente nos dois

primeiros anos escolares. Seis das 13 professoras atuaram nos quatro primeiros

anos obrigatórios do Ciclo I do Ensino Fundamental; isso demonstra uma

experiência neste ciclo, o que sugere um provável conhecimento do currículo de

Matemática desses anos escolares e evidencia que possivelmente elas percorreram

uma variedade de experiências matemáticas relativas a esses anos de escolaridade,

ampliando a possibilidade de fazer articulações horizontais e verticais dos conteúdos

a serem trabalhados. (SHULMAN, 1986).

No conjunto das 11 professoras que já atuaram no 1º ano, nove afirmavam se

sentir segura em sua atuação neste ano de escolaridade. Sabemos que o 1º ano do

Ensino Fundamental, é por excelência, o ano de alfabetização, tanto do ponto de

vista da Língua Portuguesa quanto da Matemática. De fato, no documento Ensino

Fundamental de Nove Anos: Orientações para a Inclusão das Crianças de Seis Anos

de Idade (BRASIL, 2006), o MEC propõe que o trabalho pedagógico com o 1º ano

do Ensino Fundamental seja organizado pelo estudo articulado das Ciências Sociais,

das Ciências Naturais, das Noções Lógico-Matemáticas e das Linguagens.

A experiência e a segurança em determinado ano escolar podem relacionar-

se ao sentimento de estarem desempenhando bem sua função, “muita coisa da

profissão se aprende com a prática, pela experiência, tateando e descobrindo, em

suma no próprio trabalho” (TARDIF, 2002, p. 86). É através da prática e da

experiência vivenciada que os professores se desenvolvem profissionalmente.

A próxima seção versará sobre as preferências e concepções das

professoras. Apresentamos essas características, na perspectiva de delinear o perfil

dos sujeitos da pesquisa que podem ser sintetizado abaixo.

5.1.5 Síntese do Perfil das Professoras

O grupo das professoras participantes de nosso estudo tinha 36 anos de

idade ou mais, o que sugere uma confiança em si mesmas e adaptação à

maturidade (GARCÍA, 1999). A maioria cursou o Magistério, e também Pedagogia

(10 professoras). Algumas buscaram novos conhecimentos em outros cursos

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124

superiores (História e Letras – duas professoras) e em cursos de especialização

(Psicopedagogia e Gestão e Supervisão Escolar – seis professoras).

Além disso, em relação à experiência docente, seis professoras já haviam

atuado nos quatros primeiros anos do Ciclo I do Ensino Fundamental, o que significa

um provável conhecimento do currículo de Matemática desse ciclo. Especificamente

nos anos de alfabetização (1º e 2º anos) nove das 13 professoras têm experiência

docente. Podemos, então, considerar, o grupo como profissionais experientes no

que tange à atuação docente nos anos de alfabetização. Assim, ponderamos, que

essas professoras já refletiram sobre a construção do conceito de número em sua

formação e em sua atuação profissional.

Considerando que o desenvolvimento profissional envolve a formação, o

desenvolvimento cognitivo e teórico e a compreensão de si mesmo (IMBERNÓN,

2010), podemos dizer que, esse grupo selecionado apresenta um desenvolvimento

profissional satisfatório na direção de alfabetizar o aluno numericamente. As

características evidenciadas no perfil indicam um grupo bem formado, maduro e

experiente e que já refletiu sobre número em momentos que não se restringiram aos

anos de alfabetização matemática. Esse perfil parece cooperar para que estas

professoras sejam profissionais com concepções e conceitos bem formados.

É pertinente destacar que estamos tratando de um grupo de professoras que

atuam no interior da Bahia, no sertão de um Estado nordestino podendo ter menos

condições de desenvolvimento profissional, mas, no entanto, buscaram avançar

nesse desenvolvimento.

5.2 Preferências e Concepções das Professoras

Reservamos esta seção para tratar sobre as preferências e concepções das

professoras, a partir das respostas dadas no questionário. Ela será dividida em três

subseções: 1) preferência das professoras em relação à Matemática e o seu ensino

(questões: 11 a 15); 2) concepções das professoras sobre o planejamento

(questões: 16 a 20) e 3) e concepção das professoras sobre avaliação, ensino e

aprendizagem de Matemática (questões: 21 a 23).

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5.2.1 Preferência das Professoras em Relação à Matemática e o seu Ensino

Iniciamos a análise da preferência das professoras em relação à Matemática

e ao seu ensino a partir das questões 11, 12 e 15. Nas duas primeiras questões

focamos a preferência dessas profissionais pela Matemática, enquanto estudantes e

professoras respectivamente. Já a questão 15 investigou se essa preferência se

relacionava com o número de horas destinadas para o ensino de Matemática em

suas turmas.

A análise da questão 13 buscou identificar em qual(is) conteúdos

matemático(s) as professoras possuíam segurança em trabalhar. Para tanto,

listamos sete opções seguindo os blocos de conteúdos propostos pelos PCN (1997),

havendo ainda espaço para listar outros conteúdos, caso assim a professora o

desejasse.

Finalmente, investigamos com a questão 14 os recursos didáticos utilizados

pelas professoras em suas práticas docentes.

No que diz respeito à preferência pela Matemática, constatamos que 10

professoras não tinham uma visão positiva dessa disciplina quando foram

estudantes: sete gostavam mais ou menos, uma gostava muito pouco e duas

detestavam. Tal quadro teve poucas mudanças quando elas passaram a atuar em

sala de aula, pois oito professoras permaneceram com uma relação não amistosa

com a Matemática: seis gostavam mais ou menos, uma gostava muito pouco e uma

detestava. Apresentamos, abaixo, três extratos de entrevistas, os quais ilustram a

visão que as professoras tinham sobre a Matemática quando eram estudantes:

AÇUCENA: GOSTAVA DE PORTUGUÊS E DETESTAVA MATEMÁTICA, SOFRI PARA ESTUDAR

MATEMÁTICA... [FICA PENSATIVA]. MATEMÁTICA PARA MIM ERA UM TERROR [...] NÃO É TODO

MUNDO QUE TEM FACILIDADE COM A MATEMÁTICA.

MARGARIDA: NÃO ERA BOA EM MATEMÁTICA, EU GOSTAVA E ME ESFORÇAVA, O ENSINO

TRADICIONAL COLOCAVA A MATEMÁTICA APENAS COMO OPERAÇÕES EXATAS.

VIOLETA: EU NÃO DETESTO A MATEMÁTICA PORQUE SEI DA IMPORTÂNCIA DELA, MAS NÃO

GOSTO PORQUE NÃO FUI ENSINADA CORRETAMENTE, ÀS VEZES O PROFESSOR PIORA A

SITUAÇÃO DO ALUNO, QUANDO ELE NÃO GOSTA, ELE NÃO SABE ENSINAR, EU TIRO POR MIM.

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Quando a professora Açucena diz que “não é todo mundo que tem facilidade

com a Matemática”, inferimos que há uma crença de que a Matemática é algo para

gênios (MORON; BRITO, 2005), em que está implícito o papel da Matemática como

filtro seletivo.

As professoras Margarida e Violeta conviveram com professores que

possuíam as concepções de que o cálculo é a parte mais importante da Matemática

e que a Matemática é um conhecimento incontestável e acabado, sem lugar para

erros e falhas (PONTE, 1992). Essa convivência pode ter influenciado o

conhecimento, as crenças e as concepções dessa professora, pois nas ideias de

Tardif (2002), os saberes da experiência do professor estão fundamentados também

nas concepções do herdadas de sua trajetória escolar.

Quando a professora Violeta afirma “quando ele não gosta, ele não sabe

ensinar”, percebemos que a relação que o professor tem com a Matemática parece

ser um fator importante na forma como ele lida com o ensino da disciplina.

A distribuição da quantidade de aulas semanais que as professoras

disponibilizam para trabalhar com a Matemática pode ser visualizada no Quadro 5.2

abaixo:

Quadro 5.2: Quantidade de professoras por quantidade de aulas semanais de Matemática.

Quantidade de aulas semanais de Matemática

Quantidade de Professoras

Até 2 aulas 1

Entre 3 e 4 aulas 6

Entre 5 e 6 aulas 5

Entre 7 e 8 aulas –

Estes dados são um indicativo de que as professoras estão conscientes sobre

a importância do ensino da Matemática. Podemos constatar que o pouco gosto pela

Matemática parece não refletir em sala de aula, já que onze professoras informaram

que trabalham Matemática, destinando de três a seis aulas10 semanais para o

trabalho com essa disciplina. Destacamos que uma professora não respondeu a esta

questão.

10 Estamos considerando como uma aula aquela que acontece antes ou depois do recreio. Dessa forma, uma professora dos Anos Iniciais dispõe de 10 aulas semanais em uma determinada turma.

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Como nossas professoras são professoras polivalentes, implica lecionar

diversas áreas de conhecimento, identificando possibilidades de diálogo entre elas.

Assim, estas professoras podem também aproveitar situações trabalhadas em

outras disciplinas para: apresentar situações que envolvam e estimulem a busca de

soluções para problemas que apareçam em sala de aula, encorajar a troca de

opiniões e argumentação, estabelecer relações com os mais diversos eventos,

objetos e situações. Dessa forma, seus alunos iriam construindo seus

conhecimentos e pela necessidade de resolução de problemas, impostos pela

variedade de situações apresentadas a eles, construiriam também seus

conhecimentos matemáticos (KAMII; DECLARK, 1994).

Em relação ao bloco de conteúdo preferido pelas professoras, nove preferem

o bloco Número e Operações, seguido pelo Espaço e Forma (cinco professoras) e

Grandezas e Medidas (quatro professoras). Em contraste com esses blocos, o

Tratamento da Informação não foi citado por nenhuma professora.

Ponderamos que a preferência de trabalho com o bloco de conteúdo Números

e Operações pode estar relacionada ao trabalho com o livro didático, pois o

Programa Nacional do Livro Didático – PNLD (2007) aprovou como satisfatório, que

os livros destinassem, aproximadamente, 50% do texto ao referido bloco de

conteúdo e que o restante fosse distribuído entre os demais blocos (PNLD, 2007, p.

26). Este dado evidencia a ênfase na divulgação do bloco de conteúdo Números e

Operações na ação docente, em detrimento dos demais, confirmando a importância

do livro didático como material de suporte e fonte de conhecimento para os

professores.

Quanto ao material didático utilizado nas aulas de Matemática, a combinação

preferida era livro e lousa e giz (12 professoras fazem essa combinação), sendo que

uma apontou apenas o livro e nove acrescentaram o uso de outros recursos

didáticos: o ábaco, jogos, brincadeiras (boliche, amarelinha, trilha, dominó, quebra-

cabeça e bingo), dados, material reciclado (palitos, sementes e bolinhas de gude).

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5.2.2 Concepções das Professoras sobre Planejamento Docente

Trataremos aqui das concepções que as professoras possuem sobre o

planejamento (questões: 16 a 20). Iniciaremos com as questões 16 e 17 cujo

objetivo é identificar o valor atribuído para a ação de planejar o ensino a curto e

longo prazo, respectivamente. Em seguida, trataremos da questão 18 cujo objetivo é

verificar o valor atribuído ao registro dos acontecimentos das aulas como sendo um

instrumento de reflexão e redirecionamento da prática pedagógica. Na questão 19

queremos identificar a relevância atribuída ao preparo prévio dos conteúdos de

ensino. E, por fim, com a questão 20 objetivamos identificar quais materiais o

professor utiliza na preparação e organização de sua aula.

De acordo com os dados referentes às repostas das professoras pudemos

observar que, o foco das professoras centrava-se no planejamento semanal: nove

delas o consideraram como essencial em sua prática pedagógica. Esse número caiu

para cinco em relação ao planejamento anual, sendo que quatro delas não

justificaram suas respostas em relação à importância do planejamento, o que nos faz

refletir se, realmente, a prática do planejamento anual existe nas escolas

investigadas.

O planejamento semanal está relacionado com a ação efetiva da sala de aula.

Todas as semanas estas professoras se reúnem para refletir e analisar o que será

feito na próxima semana. Essa prática permite o redirecionamento da rota de ação

dos professores, assim como corrigir os desvios e decidir sobre o aprofundamento e

intervenções sobre determinados conteúdos, de acordo com a evolução da turma.

O planejamento anual está voltado a olhar o aluno como um todo, discute as

formas mais gerais de trabalhar. Trata de questões teóricas como, por exemplo, o

que as políticas públicas esperam que o aluno aprenda ao final dos dois primeiros

anos escolares.

Os extratos, a seguir, apresentados nas Figuras 5.1, 5.2 e 5.3, retirado dos

protocolos de três professoras ilustram a importância dada ao planejamento

semanal.

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Figura 5.1: Extrato do questionário da professora Bromélia:

Figura 5.2: Extrato do questionário da professora Hortência:

Figura 5.3: Extrato do questionário da professora Tulipa:

A prática existente nas escolas investigadas é a construção coletiva do

planejamento semanal. É importante destacar que as professoras vislumbram esse

momento de trabalho coletivo com ressaltando a possibilidade de reflexões e

aprendizado.

Nota-se que a preocupação dessas professoras é com a prática de sala de

aula e isto está em conformidade com o entendimento de Smole (1996) quando

afirma que o planejamento é pensar as ações da sala de aula, buscando facilitar e

viabilizar a organização do trabalho docente levando em consideração as

necessidades dos alunos.

Quando a professora Tulipa responde em relação ao planejamento semanal:

“sem ele não sabemos se precisamos ir adiante ou voltar”, a atenção dela está

voltada para a prática, com o que ela efetivamente vai elaborar para sua ação

prática considerando o desenvolvimento do aprendizado de seus alunos.

Com relação às respostas dadas pelas professoras Bromélia e Hortência, que

dizem respeito à segurança nas ações e da importância da discussão e do

aprendizado com as colegas, elas estão em consonância com as ideias de Smole

(1996). A autora destaca que concebe o trabalho coletivo como meio de o professor

sentir-se encorajado a dividir suas ideias, suas dúvidas, debater preocupações e

incertezas, buscar avanços na experiência dos colegas. É nesse momento que o

professor pode ressignificar seu saber por meio da apresentação de suas dúvidas,

do debate, da elaboração de estratégias que poderão ser utilizadas em sala de aula.

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Outro destaque com relação ao planejamento semanal, é que ele parece ser

complementado pelas anotações sobre os acontecimentos da aula no diário de aula.

Sete professoras consideram o diário de aula essencial e sete o consideram

importante (uma professora marcou as duas opções). Ao escrever sobre sua prática,

o professor guarda a memória do trabalho com a turma, relembra e reflete sobre o

seu fazer pedagógico. Assim, o diário de aula também se configura como

instrumento de análise e avaliação dos avanços e retrocessos dos alunos, bem

como sobre as condições oferecidas pelo professor no desenvolvimento de

competências e habilidades por parte de seus alunos.

Ilustraremos abaixo, nas Figuras 5.4, 5.5 e 5.6, as justificativas dadas pelas

professoras investigadas sobre a importância do diário de aula:

Figura 5.4: Extrato do questionário da professora Açucena:

Figura 5.5: Extrato do questionário da professora Margarida:

Figura 5.6: Extrato do questionário da professora Rosa:

Os protocolos selecionados ratificam a concepção das professoras sobre o

diário de aula como um instrumento avaliativo, tanto do aprendizado de seus alunos

quanto do seu fazer docente. Assim, o diário de aula parece prover informações que

permitem a estas professoras ir regulando o ensino, moldando seu ritmo e

adaptando ao contexto de seus alunos. Dessa forma, o diário de aula é um valioso

item tanto de reflexão para as professoras sobre a sua prática pedagógica, quanto

um ponto de referência para o planejamento e a avaliação do seu fazer pedagógico.

A visão das professoras está de acordo com o que é preconizado pelo RCNEI

(1998), que defende, o registro como uma rica fonte de informações de que o

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professor dispõe em sua prática docente. Considera o RCNEI (1998) que, por meio

de seus registros, o professor pode recuperar momentos importantes da sala de

aula, permitindo análise do processo de aprendizagem de seus alunos, tanto no

geral como individualmente. O referido documento considera ainda que ao fazer o

registro de sua prática, o professor pode avaliar também seu processo de ensinar,

pois, a partir dessa análise, ele possuirá informações que subsidiarão a avaliação,

tanto de seus alunos quanto de sua prática cabendo novos encaminhamentos, se

necessários.

Com relação aos materiais que as professoras julgam importante para a

elaboração das suas aulas, todas concordam que o livro didático é um importante

material de apoio utilizado na preparação de suas aulas, seguido das atividades

criadas e discutidas com a colaboração de suas colegas durante o horário de

Atividade Complementar – A.C. – (10 professoras). Elas também consideram

importante buscar atividades na Internet (10 professoras).

A preparação das aulas é uma das atividades de maior relevância na prática

docente, pois, ao elaborar sua aula o professor necessita ter claro quem é seu

aluno, quais os temas serão trabalhados, como conduzir as atividades de modo a

atender as limitações e potencialidades de cada aluno e da turma.

Quando essas professoras relatam discutir a elaboração das atividades com

seus pares, significa que elas têm cuidado na criação destas atividades que serão

trabalhadas em sala de aula, que estão atentas e interessadas na aprendizagem de

seus alunos. Essa reflexão sobre as atividades está em conformidade com a visão

de Damico (2007) quando assinala a necessidade de o professor transformar o

conhecimento de um determinado conteúdo, adaptando-o ao contexto de sua sala

de aula em conformidade com o ritmo do aluno.

Isto significa que, ao preparar suas aulas, as professoras lançam mão do

repertório de conhecimento para escolher a maneira ou o método, de apresentar e

organizar o conteúdo os quais serão trabalhados em sala de aula, considerando os

materiais a serem utilizados, “as diversas formas de representação das ideias [desse

conteúdo], as mais poderosas analogias, ilustrações, exemplos, explicações e

demonstrações” (SHULMAN, 1986, p. 9) que contribuam com a aprendizagem dos

seus alunos. Dessa forma, mobilizam o conhecimento didático do conteúdo (PCK)

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também na preparação de suas aulas procurando estabelecer ligações entre

conteúdo e o aluno.

Ainda sobre a preparação das aulas, Castro (2010) fundamentada em Zabala

(1998), afirma que existem materiais curriculares de aula e materiais curriculares

para o aluno e, quando o professor vai planejar suas aulas, ele pode utilizar

materiais distintos mas que se complementam e o auxiliam no planejemanto, na

prática docente e na avaliação subsequente.

Dessa forma, o livro didático poderia não ser utilizado na organização da

prática pedagógica dessas professoras, mas a resposta delas está coerente com os

resultados relativos á questão 14, em que todas informaram que utilizavam o livro

didático como principal material usado nas aulas, e nessa questão todas voltam a

apontar o livro como sendo material mais importante para a elaboração de suas

aulas. Percebemos uma confirmação de que o livro didático constitui como uma

importante ferramenta no trabalho do professor.

Destacamos a inter-relação, entre o planejamento semanal, o diário de aula e

as discussões e reflexões ocorridas no horário de A.C.. Parece haver uma discussão

coletiva voltada para a prática de sala de aula e, se há momento de discussão

teórica, aparentemente, o mesmo não é valorizado.

5.2.3 Concepção das Professoras sobre Avaliação, Ensino e Aprendizagem de

Matemática

Nesta subseção, trataremos das questões 21, 22 e 23 do questionário. Nossa

análise iniciará pela questão 21, na qual questionamos sobre as formas de avaliação

utilizadas pelas professoras com o objetivo de identificar os instrumentos utilizados

para avaliar seus alunos. Investigamos as concepções sobre ensino e aprendizagem

em Matemática, nas questões 22 e 23.

A avaliação que essas professoras afirmaram praticar é a contínua, tendo em

vista que 11 delas disseram que avaliam seus alunos pela participação nas aulas e

pela correção do caderno. As que utilizavam a prova como instrumento avaliativo

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(cinco professoras), informaram que sempre a utilizam acompanhada por mais dois

instrumentos de avaliação, tais como correção no caderno e participação nas aulas,

pelo menos.

Ilustraremos esse fato com a justificativa dada pela professora Érica, sobre a

importância da avaliação:

ÉRICA: A AVALIAÇÃO ACONTECE NO DIA A DIA, É A PARTICIPAÇÃO DO ALUNO, A FREQUÊNCIA, O DESEMPENHO E A AUTONOMIA.

Esse discurso corresponde ao acompanhamento de seus alunos de perto,

verificando se o aluno é, efetivamente, capaz de fazer, analisando o que ele sabe,

como se porta frente aos conteúdos, constatando seus avanços, evoluções e

limitações.

O entendimento dessas professoras sobre avaliação está em conformidade

com o recomendado na proposta baiana que sugere que a avaliação seja entendida

como uma reflexão da prática docente, não restrita ao final da ação educativa, mas

durante todo o processo educacional. É considerada, também, como uma atividade

capaz de assegurar ao estudante a obtenção da autonomia, da capacidade criadora

e no exercício da cidadania. (BAHIA, 1994).

Há uma indicação de que as professoras possuíam uma ideia de que o ensino

de Matemática voltada para o cotidiano das pessoas, já que todas afirmam que

ensinar Matemática é relacionar os conteúdos vistos em sala de aula com a vida de

seus alunos. Para 12 professoras quando o aluno consegue expressar, mesmo em

linguagem natural, o que um determinado conteúdo matemático significa, denota

que ele aprendeu esse conteúdo. Saber resolver um problema é também um

indicador de aprendizagem em Matemática para 11 dessas professoras.

Se as professoras ensinam Matemática voltada para o cotidiano, para o saber

resolver problemas, e esses problemas estão ligados diretamente à vida de seus

alunos, isso, então, nos leva a crer que o ensino de Matemática na visão delas é

voltado para o dia a dia.

O entendimento do ensino de Matemática para essas professoras não

coaduna com a concepção que considera a Matemática separada da realidade

(PONTE, 1992). Essa visão se aproxima da tendência socioetnocultural, pois as

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professoras consideram saber resolver problemas relacionados com o cotidiano da

vida de seus alunos, um indicador de aprendizagem.

A visão das professoras está em conformidade com a sugestão do PCN

(1997) em relacionar o conhecimento matemático com a vida cotidiana e as

recomendações das Diretrizes Curriculares do Estado da Bahia (1994) que revê o

papel excludente da Matemática e parte do princípio da utilidade do conhecimento

matemático e da aplicação da matemática a situações da vida prática.

5.2.4 Síntese das Preferências e Concepções das Professoras

O grupo das professoras investigadas não possuía uma visão positiva da

Matemática enquanto estudante (10 de 13 tinham visão negativa), provavelmente

pela convivência com professores que concebiam que o cálculo era a parte mais

importante da Matemática e que ela era um conhecimento incontestável e acabado,

sem lugar para erros e falhas. Quando essas professoras passaram a atuar em sala

de aula, sua visão pouco modificou tendo em vista que o oito daquele total ainda

continuou com uma visão negativa da Matemática.

A pequena preferência por esta disciplina parece não ter reflexos em sala de

aula. Elas confirmavam estar da importância do ensino da Matemática e destinavam

de três a seis aulas semanais para lecionar tal disciplina.

No tocante ao trabalho em sala de aula, a preferência do grupo era o bloco de

conteúdos Números e Operações (nove professoras) e ponderamos que essa

predileção seja devida às prescrições do PNLD, que admitiu como satisfatória a

destinação de aproximadamente 50% do livro de matemática para tratar o referido

bloco.

Com relação ao material didático, o grupo (12 professoras) mostrou

preferência pelo uso do conjunto de material tradicional, qual seja, a combinação de

livro, lousa e giz. Nove professoras também usavam outros recursos didáticos:

ábaco, jogos, brincadeiras, materiais reciclados.

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No que tange ao planejamento, o livro didático foi o principal recurso para

planejar as aulas. Também eram utilizadas atividades criadas e discutidas nos

momentos de A.C. e atividades retiradas da Internet. Isso mostra uma busca de

adaptação dos conteúdos ao contexto de sala de aula em conformidade com o ritmo

da turma.

Ainda sobre o planejamento, para nove professoras a preferência era a

realização do planejamento semanal que se relacionava com a ação efetiva em sala

de aula e consideravam relevantes as anotações sobre os acontecimentos de aula,

justificando que por meio deles era possível refletir sobre o trabalho, analisando

quando necessário o redirecionamento de suas ações.

Por fim, o grupo defendia a avaliação contínua e o ensino da Matemática

voltado para o cotidiano, numa visão aproximada da tendência socioetnocultural

(FIORENTINI, 1995) e divergente da concepção que considera a Matemática

separada da realidade (PONTE, 1992).

5.3 O Entendimento de Número na Visão das Professoras

Esta seção é dedicada à descrição e análise das respostas das professoras

às duas primeiras perguntas da segunda parte do instrumento, complementadas por

excertos da entrevista. Na primeira questão (aberta) indagamos às professoras

como elas explicariam para alguém o que é número. Na segunda questão (também

aberta), inquirimos quando as professoras consideram que seus alunos já sabem o

que é número.

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5.3.1 O Número na Visão das Professoras Investigadas

O gráfico a seguir apresenta às categorias encontradas a partir das respostas

das professoras à pergunta: “Como você explicaria para alguém o que é número?”

(questão 1).

Gráfico 5.3: Categorias das respostas das professoras à questão “Como você explicaria a alguém o que é número?”.

Os dados do gráfico revelam que, para 11 professoras, o número está

relacionado com a quantidade, seja ela explicita por meio de sua representação,

escrita ou oral, ou seja, pela ideia de quantidade. Duas professoras alegaram que o

número está relacionado ao seu uso no cotidiano.

Para o subconjunto das 11 professoras “o esquema de construção do número

como cardinal largamente utilizado no período de 70 e 80” (MARANHÃO, 2005, p.

12) ainda não foi superado, pois nove delas declararam que o número é a

representação de quantidade ou significa quantidade. Observe um exemplo retirado

do questionário da professora Acácia que ilustra essa afirmação:

Figura 5.7: Extrato do questionário da professora Acácia:

Podemos inferir que a maioria das professoras (nove) entende o número

como sinônimo de numeral. Considerando que o numeral é a representação da

quantidade, logo essa distinção entre o número e o símbolo que o representa, não

está clara para estas professoras.

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Maranhão e Carvalho (2008) afirmam que essa diferença entre o número e o

seu símbolo é um conhecimento necessário para o professor. E, se essa distinção

ainda não está clara para essas professoras, como elas poderão ajudar seus alunos

a distinguirem o número (objeto matemático) de sua representação (numeral)? Essa

confusão entre o objeto matemático e sua representação pode resultar num trabalho

docente restrito à leitura e à escrita de numerais, supondo, dessa forma, que estão

ensinando conceitos numéricos a seus alunos, conforme afirma Kamii (1989).

Das 13 professoras investigadas, duas delas relacionaram o número à sua

utilidade no cotidiano. Veja um exemplo que explica este fato:

Figura 5.8: Extrato do questionário da professora Érica:

Pelas afirmações dadas por essas professoras, elas estão trabalhando com

os dois princípios de ensino que auxiliam os alunos na construção do conceito de

número apresentado por Kamii (1989). O primeiro deles propõe incentivar o

pensamento sobre número e quantidades de objetos quando estes sejam

significativos para os alunos. O segundo princípio refere-se ao estímulo da criação

de todos os tipos de relações com eventos, objetos e/ou situações.

Tudo indica que essas professoras estão levando em consideração que a

criança constrói o conceito de número, dentro do contexto diário. Por isso, elas

encorajam seus alunos a colocarem as ideias, os eventos, as situações e objetos em

relações (KAMII, 1989), em detrimento de focalizar sua prática docente apenas para

a quantificação.

Ao apresentar situações em que os alunos se deparam, com o número da

casa e com dinheiro, a criança é estimulada a pensar sobre o significado do número

em cada situação e contexto. O número da casa corresponde a um rótulo da casa e

o dinheiro, por exemplo, uma nota de cinco, corresponde uma quantidade

estabelecida por uma convenção. Trabalhando dessa forma a criança vai

construindo a significação do número conforme o emprega, o que vai ao encontro

das ideias de Maranhão (2005).

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Das 13 professoras, duas responderam que número é uma ideia, sendo uma

ideia não é um símbolo que o representa. Neste caso, é o numeral o símbolo

utilizado para expressar essa ideia, exemplificando:

Figura 5.9: Extrato do questionário da professora Orquídea:

Podemos deduzir que essas duas professoras entendem o número como

objeto matemático e essa ideia pode ser representada por numerais. A afirmação de

que o número é uma ideia é também apontada por Kamii e DeClark (1994). As

professoras associam essa ideia apenas à quantidade, deixando à parte a ordem e o

rótulo. Assim, parece que, como essas professoras distinguem as formas de

representação numérica e o conceito de número, elas podem direcionar a prática

docente para além da leitura e da escrita de numerais.

Após termos analisado a questão 1, passamos à análise da questão 2 –

“Quando você considera que uma criança já sabe o que é número?” – cujas

respostas das professoras encontram-se apresentadas no Gráfico 5.4 a seguir:

Gráfico 5.4: Categorias das respostas das professoras à questão “Quando você considera que uma criança já sabe o que é número?”.

Diante das respostas das professoras, constatamos que um número

considerável delas (10) respondeu que uma criança já sabe o que número quando

reconhece, relaciona e associa o numeral à quantidade, tal qual ilustra a resposta da

professora Margarida, apresentada na Figura 5.10 a seguir:

Figura 5.10: Extrato do questionário da professora Margarida:

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Para essa professora o número se relaciona com a quantidade. Porém,

sabemos que o número também pode se relacionar com a ordem e com um rótulo, a

depender da situação apresentada. Por exemplo: se a criança está numa fila e sabe

que é a 3ª daquela fila, ela está relacionando o número com a sua posição da fila. O

número da camisa de um jogador de futebol, só o identifica como um rótulo e não

indica a quantidade de jogadores, nem ordem e posição em campo.

A professora Acácia, em entrevista, também demonstra que relaciona o

numeral à quantidade. Em suas palavras:

ACÁCIA: EU TRABALHO O NÚMERO COM ASSOCIAÇÃO, ASSOCIANDO O NÚMERO A

QUANTIDADE.

Uma vez que essas professoras confundem o número com o numeral, é

possível que elas possam, também, julgar que seus alunos saibam o que é número

quando relacionam corretamente o numeral à quantidade.

Apenas uma professora considerou ser necessária, para entendimento da

criança, a capacidade em relacionar a ideia de número a uma quantidade, como

mostra o extrato do questionário da professora Açucena (Figura 5.11):

Figura 5.11: Extrato do questionário da professora Açucena:

Esta mesma professora (Açucena) expressou, na questão anterior, que o

número é uma quantidade representada, confundindo também o número com o

numeral.

Três professoras alegaram que seus alunos já sabiam o que era número

quando eles conseguiam definir e diferenciar quantidades. A Figura 5.12, exemplifica

esse caso:

Figura 5.12: Extrato do questionário da professora Orquídea:

A resposta a essas questões deixam antever o repertório conceitual dessas

professoras em relação ao número e o seu ensino. Assim, atingimos uma dimensão

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fundamental na atuação docente: o conhecimento do conteúdo a ser ensinado

(SHULMAN, 1986).

Tal como encontrado nos estudos de Carmo (2002) com futuros professores

de Matemática, com estudantes de Pedagogia e com pós-graduandos em

Educação, as professoras de nosso estudo também utilizam (entendem) os números

como símbolos para representação de quantidade. Dessa forma, elas trabalham com

a representação como sendo o próprio objeto. Defendemos a necessidade de essas

professoras distinguirem o número de suas representações, pois conforme

argumentam Maranhão e Carvalho “Confusões sobre isso podem impedir outras

aprendizagens” (MARANHÃO; CARVALHO, 2008, p. 10).

Nesta seção, analisamos as declarações sobre o entendimento que as

professoras investigadas relataram sobre número e seu aprendizado. A seguir

discorreremos sobre as situações elaboradas pelas professoras para o ensino do

número.

5.3.2 Síntese do Entendimento de Número na Visão das Professoras

O grupo entendia o número como sinônimo de numeral. A distinção entre o

número e o símbolo que o representa ainda não estava clara para este grupo e isto

pode resultar num trabalho docente restrito à leitura e à escrita de numerais,

supondo dessa forma que estão ensinando conceitos numéricos a seus alunos.

O grupo considerava que o aluno já sabia o que era número, quando ele

reconhecia, relacionava e associava o numeral à quantidade. Como essas

professoras confundiam o número com o numeral, é possível que elas julgassem

que seus alunos sabiam o que era número quando ele relacionava corretamente o

numeral à quantidade.

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5.4 Situações Problema nas quais os Números são Trabalhados

Esta seção é reservada para a apresentação e análise das situações

elaboradas pelas professoras para o ensino do número. Para tanto, traremos um

recorte dos dados obtidos da segunda parte do questionário.

Desejando entender o caminho trilhado pelas professoras que contribuem

para a construção do conceito de número, solicitamos que todas elaborassem seis

situações que promovessem a aprendizagem de seus alunos em relação à

aprendizagem do conceito de número. De posse das atividades elaboradas por elas,

elencamos algumas categorias para que fossem classificadas.

5.4.1 Classificação das Situações

Cabe mencionar que para a validação da classificação de cada situação

elaborada pelas professoras, contamos com a colaboração de 13 juízes (quatro

mestrandos, duas mestres e seis doutorandos e uma doutora) todos participantes do

Grupo de Pesquisa REPARE em EduMat da PUC/SP. Para tanto, fornecemos a

cada juiz uma síntese com as ideias básicas do que seria cada categoria, com

respectivos exemplos e todas as situações elaboradas pelas professoras. Cada juiz,

individualmente, procedeu à análise das situações elaboradas pelas professoras. Ao

final, consideramos como classificação definitiva, aquela que apresentou pelo menos

oito pontos de vista coincidentes.

As situações elaboradas foram classificadas conforme apresentado no

Esquema 5.1, abaixo:

Esquema 5.1: Classificação das situações elaboradas pelas professoras.

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Para identificar mais claramente a distribuição das situações elaboradas pelas

professoras, organizamos um gráfico que apresenta o percentual de situações de

acordo com nossa classificação. Foram analisadas 78 situações, resultado do

produto do número de professoras (13) com a quantidade solicitada de situações a

serem elaboradas (6). Salientamos que algumas das situações foram classificadas

em mais de uma categoria:

Gráfico 5.5: Classificação das situações elaboradas pelas professoras.

De acordo com os dados referentes às repostas das professoras pudemos

observar que, disparadamente, o foco de trabalho dessas professoras está nas

situações classificadas como quantidade, seguido das situações classificadas como

rótulo, contagem, ordem e outros. A seguir discorreremos sobre esse resultado por

categoria.

� Quantidade: Agrupamos nessa categoria as situações em que o número é

tratado em seu aspecto cardinal. O exemplo abaixo, retirado do questionário de

Acácia, é uma situação típica das situações classificadas como quantidade.

Figura 5.13: Extrato do questionário da Acácia:

Há uma predominância nas situações elaboradas pelas professoras

classificadas como quantidade. Cabe salientar que estão incluídas nesta categoria

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situações com operações que envolvem as Estruturas Aditivas e, assim, recorremos

a uma subclassificação da Categoria Quantidade, conforme pode ser observado no

Esquema 5.2:

Esquema 5.2: Classificação das situações quantidade.

É importante considerar que das 49 questões elaboradas e classificadas

como Quantidade encontramos 24% dessas operações envolvendo as Estruturas

Aditivas.

Essa prática está de acordo com o que alega Moro (2004) que as operações

de adição e subtração estão imbricadas na construção do número compondo este

processo. Convém destacar que, como estamos analisando professoras que atuam

no 1º e 2º ano, é natural o surgimento de pequenos problemas não só de adição

como também de subtração.

Elencamos na subcategoria operações as situações em que as professoras

elaboraram questões das estruturas aditivas. Esta, por sua vez, se divide em

operações pictóricas e não pictóricas.

As operações pictóricas são as situações em que a professora apresentava o

problema ou sugeria utilizar desenhos, palitos, feijões ou outros recursos

manipulativos, como por exemplo:

Figura 5.14: Extrato do questionário da professora Angélica:

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A justificativa apresentada pela professora para a utilização de palitos, na

situação apresentada é:

ANGÉLICA: OS DESENHOS, OS PALITOS FACILITAM ELES CONTAREM.

A utilização de materiais em aulas de Matemática é apropriada, no entanto,

conforme indicam Rangel (1992) e Spinillo e Magina (2004), eles devem constituir

instrumentos de apoio para a ação da criança e não instrumentos de repetição da

ação do professor. Não é o material que garante o aprendizado da criança, pois,

conforme destacam Spinillo e Magina o material concreto utilizado para representar

quantidades não contribui para a descoberta da operação a ser empregada, seu uso

proporciona “referentes para as quantidades, permitindo, assim, atribuir um

significado à situação” (SPINILLO; MAGINA, 2004, p. 10).

A maioria das situações classificadas como operações pictóricas está

relacionada às professoras do 1º ano (4 situações), apenas uma situação pictórica

foi elabora por uma professora do 2º ano. Observe a situação elaborada na figura a

seguir.

Figura 5.15: Extrato do questionário da professora Violeta:

Além de ser a única situação pictórica elaborada por uma professora do 2º

ano, essa questão despertou a nossa atenção também pela afirmação da

professora: O ALUNO “VÊ” O RESULTADO, como se o conhecimento matemático

estivesse presente no material utilizado e, portanto, externo aos seus alunos, o que

nos leva a supor que possivelmente, essa professora trabalhe com o número como

sendo fruto da abstração empírica. Dessa forma, inferimos que provavelmente a

concepção dessa professora é empírica, para ela o conhecimento emerge do mundo

físico. No entanto, defendemos a ideia que é pelo pensamento que a criança

constrói seu conhecimento matemático e não pela observação e imitação.

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Em relação às operações não pictóricas, essas são situações em que as

professoras apresentavam o problema escrito ou em forma de algoritmo. Duas

operações não pictóricas foram apresentadas por professoras do 1º ano e dessas

duas, uma chama a atenção pelo emprego do algoritmo formal.

Figura 5.16: Extrato do questionário da professora Açucena:

A utilização do algoritmo formal é prejudicial para crianças dos anos iniciais,

porque força a criança a desistir do pensamento numérico, descartando suas

próprias ideias, (KAMII, 1999). Isso acontece porque o algoritmo formal não traz um

significado que motive ou incentive a criança na busca de soluções, diferentemente

do que acontece quando o professor utiliza-se de situações-problema.

O trabalho com o algoritmo formal também não é recomendado pelas

Diretrizes Curricular do Estado da Bahia (BAHIA, 1994). O referido documento,

recomenda que sejam apresentadas situações problema que estimulem a busca de

soluções, em que os alunos possam trocar opiniões e possam argumentar. As

situações-problema foram mais utilizadas por professoras do 2º ano quando

elaboraram situações que classificamos como operações não pictóricas.

Figura 5.17: Extrato do questionário da professora Hortência:

Nas situações classificadas como não operações, ressaltamos que apesar de

as professoras terem respondido no questionário que não trabalham com o bloco de

conteúdo Tratamento da Informação, elas elaboraram duas situações que envolvem

leitura e interpretação de tabelas, fato que nos fizeram ponderar se essas

professoras conheciam os eixos do PCN.

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Figura 5.18: Extrato do questionário da professora Magnólia:

Questionadas sobre os blocos de conteúdos do PCN as professoras

relevaram:

MARGARIDA: BLOCOS DE CONTEÚDOS DO PCN... NÃO ME RECORDO... QUANDO SURGIU

PEGAVA O PCN PARA VER OS CONTEÚDOS, HABILIDADES E COMPETÊNCIA DE LÍNGUA

PORTUGUESA E MATEMÁTICA.

ÉRICA: É UMA FALHA, EU ME LEMBRO DOS PCN NA FACULDADE.

ACÁCIA: O PRÓPRIO LIVRO VEM TRAZENDO, VEM UM PLANO JUNTO PAUTADO NOS PCN.

Quando a professora Acácia justifica “O próprio livro vem trazendo, vem um

plano junto pautado nos PCN” constatamos que sua prática está apoiada nos

conhecimentos veiculados em programas e livros didáticos, tal como alega Tardif

(2002).

Pelo explicitado em suas falas, verificamos que elas não recordam dos blocos

de conteúdo do PCN e pelo fato de que eles já se encontram contemplados no livro

didático, as professoras entendem que já trabalham com o que é recomendado

pelos parâmetros, sem identificar os referidos blocos, o que, possivelmente, justifica

o fato de elas não marcarem no questionário o trabalho com o bloco Tratamento da

Informação e elaborarem atividades inerentes ao bloco citado nas situações de

ensino.

Pelos seus relatos identificamos que essas professoras não fazem uso do

PCN como material de referência de sua prática docente. O que pode implicar um

conhecimento limitado dos contextos educativos de sua prática pedagógica

(SHULMAN, 2005; PONTE, 1998).

Ressaltamos, também, que oito professoras elaboraram mais da metade das

situações solicitadas, com situações que foram classificadas por nós dentro da

categoria “quantidade”, o que nos faz supor que para essas professoras a

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construção do número como cardinal, herança dos anos 70 e 80 (MARANHÃO,

2005, p. 12) ainda se faz presente em sua prática docente dessas professoras.

� Rótulo (significado de uso social): reunimos nessa categoria as situações nas

quais o número é trabalhado sem expressar a cardinalidade ou ordinalidade. Possui

um significado em seu uso social, por exemplo, o número de telefone, a placa de um

carro, o número do código de barras de determinado produto. Trazemos uma

situação típica dessa categorização.

Figura 5.19: Extrato do questionário da professora Bromélia:

As situações classificadas como rótulo são mais trabalhadas pelas

professoras do 2º ano. Destacamos a alegação da professora: pela memorização o

aluno transpõe a dúvida. Ponderamos que a concepção desta professora se

aproxima da tendência formalista clássica (FIORENTINI, 1995). Desse modo, ela

concebe que a aprendizagem de seus alunos consiste na memorização dos

conteúdos transmitidos por ela.

De fato, essa professora (Bromélia) elaborou quatro situações (das seis

solicitadas) classificadas como rótulo, cujas situações envolviam: leitura e escrita,

recorte e colagem, cópia e identificação de numerais, o que corrobora a ideia da

aprendizagem por repetição.

Ao apresentar situações dentro de um mesmo padrão, não são criados

desafios e confrontos para as crianças e, dessa forma, o entendimento do número

para elas pode ficar limitado apenas ao rótulo. Se o significado do número será

construído pelo seu uso (MARANHÃO, 2005), e as crianças limitam-se a utilizá-lo

apenas como rótulo, como elas saberão quando utilizar o número para indicar uma

ordem ou uma quantidade? É necessário que o professor busque estratégias de

ensino que possibilitem situações em que as crianças se deparem com outras

funções do número para poder construir o seu significado de acordo com os

contextos apresentados.

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� Contagem de objetos: agrupamos nessa categoria as situações que envolvem

a contagem de objetos. A seguir apresentaremos uma situação classificada como

contagem de objetos.

Figura 5.20: Extrato do questionário da professora Hortência:

Enquanto o rótulo não expressa cardinalidade nem ordinalidade, a contagem

“repousa sobre um conhecimento abstrato que diz respeito à ordem e à

cardinalidade.” (FAYOL, 1996, p. 60).

As situações de contagem (13) estavam assim distribuídas: seis foram

elaboradas pelas professoras do 1º ano, quatro foram elaboradas pelas professoras

do 2º ano e três foram elaboradas pelas professoras que atuavam nos dois anos

escolares acima citados. Percebemos que as situações que envolvem contagem vão

perdendo a força ao longo dos anos de escolaridade.

O trabalho com a contagem nos anos iniciais é importante porque a mesma

configura-se em um procedimento básico o qual permite que seja estabelecida a

quantidade de objetos de um determinado conjunto (FAYOL, 1996; BRASIL, 1998).

Entretanto, na atividade ilustrada na Figura 5.20, o que a criança vai escrever é o

numeral, que é uma das formas de representar um número.

A respeito da contagem Kamii (1989) assegura que a criança necessitará dela

para seguir até a adição. Contudo a autora chama a atenção, sobre a importância da

construção mental do número, afirmando que aprender a contar, ler e escrever

numerais é adequado para a criança dos anos iniciais “mas é muito mais importante

que ela construa a estrutura mental de número. [...] Se não a construiu, toda a

contagem, leitura e escrita de numerais será apenas de memória” (KAMII, 1989, p.

40).

Como a construção do número extrapola o nível verbal, “não basta de modo

algum à criança pequena saber contar verbalmente ‘um, dois, três etc.’ para achar-

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se na posse do número.” (PIAGET; SZEMINSKA, 1971, p. 15). Dessa forma, faz-se

necessário que o professor perceba se a criança está construindo seu conhecimento

com significado numérico, ou apenas recitando os números numa sequência.

� Ordem: Nesta categoria estão as situações em que o número é tratado em seu

aspecto ordinal. Apresentaremos abaixo é uma situação típica das situações dessa

classificação.

Figura 5.21: Extrato do questionário da professora Dália:

As situações que tratam de ordem prevalecem nas situações elaboradas

pelas professoras do 2º ano (cinco de oito situações elaboradas).

Percebemos, pelo extrato da professora Dália, que a situação elaborada vai

ao encontro do que é recomendado nas Diretrizes Curriculares do Estado da Bahia

que declara a relevância de se trabalhar com a ideia de ordinal e que a ela seja

“explorada, intuitivamente, a partir de conjunto de pessoas ou de objetos”. (BAHIA,

1994, p. 56).

Consideramos que a situação colocada pela professora indica uma tendência

socioetnocultural (FIORENTINI, 1995), pois apresenta o conteúdo para seus alunos

a partir do cotidiano e da realidade vivenciada por eles, (número da caderneta e

nome dos vizinhos). Salientamos que não há consenso na classificação dos

números das casas de determinada rua, nesta investigação, adotamos que os

números das casas referem-se a ordem.

� Outros: unificamos as situações em que o número é obtido da comparação de

conjuntos e na situação em que a professora está tratando das propriedades do

número natural. A seguir, apresentaremos e discutiremos um exemplo de cada uma

das duas situações.

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Figura 5.22: Extrato do questionário da professora Acácia – comparação:

Convém destacar que as situações elencadas nesta categoria foram

apresentadas pelas professoras do 1º ano, assim distribuídas: duas situações de

comparação e uma situação sobre propriedade numérica.

De acordo com Maranhão, Sentelhas e Mesquita (2004), as respostas dos

alunos a questões relacionadas à comparação podem estar baseadas tanto na

comparação numérica (referindo-se à quantidade) ou quanto na posição do número

na sequência numérica (referindo-se à ordem). Como não pudemos observar a

resposta dos alunos a estas questões, por não ser objeto de nosso estudo,

classificamos as situações nesta categoria, pois diante do explicitado pelas autoras,

elas não se encaixavam nas classificações anteriormente apresentadas.

A única situação que trata sobre propriedade numérica é a apresentada na

Figura 5.23 em que a professora trabalha números pares e ímpares.

Figura 5.23: Recorte do questionário da professora Dália – propriedade numérica:

Despertou-nos a atenção para uma situação relatada pela professora quando

ela iniciava o trabalho com propriedade numérica:

DÁLIA: PARA TRABALHAR COM PAR E ÍMPAR, EU COLOQUEI DESENHOS NO QUADRO E DISSE

PARA OS ALUNOS: SE CASAR É PAR E SE SOBRAR É ÍMPAR; [E FOI CONVERSANDO COM OS

ALUNOS], 2 CASA, CASA SIM; 3 CASA, CASA NÃO; UM ALUNO FALA NO FINAL DA SALA, CASA

SIM PROFESSORA, POSSA (SIC) SER UMA MULHER, UM MARIDO E UM AMANTE...[RISOS].

Apesar de se tratar de uma situação divertida que aconteceu em aula, está

implícita a necessidade de se ater a linguagem utilizada que nesses anos é uma

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linguagem informal através de uma contextualização do cotidiano ou do aluno ou do

professor. A professora expõe uma situação em que ela toma um termo do senso

comum, ‘casar’ no sentido de formar pares, e pela resposta do aluno ela percebe a

diferença entre o que ela disse e o que o aluno entendeu. A relação que o aluno cria

não é a mesma que a professora espera que ele possa criar.

Na situação relatada, identificamos o princípio de ensino do número

apresentado por Kamii (1989), “a criação de todos os tipos de relações”. O aluno

possivelmente relacionou por si mesmo o termo “casar” com sua provável realidade

e/ou imaginação. Desse modo, recomenda-se que o professor questione seus

alunos para poder intervir a partir da lógica deles (BRASIL, 2006).

� Incompatível: nesta categoria estão as situações em que não conseguimos

classificar em nenhuma das categorias citadas acima e/ou em que não conseguimos

identificar a forma de trabalho com os números. Exibiremos abaixo um exemplo

típico das situações aqui categorizadas.

Figura 5.24: Extrato do questionário da professora Dália:

Apenas três situações das 78 elaboradas foram classificadas como

“incompatível” por não conseguirmos identificar o trabalho com os números, sendo

duas situações elaboras por professoras do 1º ano e uma por professora do 2º ano.

A seguir, analisaremos as situações elaboradas observando, agora as

operações lógicas. Não pretendemos que as mesmas sejam convertidas em

atividades de ensino mas que elas sejam trabalhadas combinadas aos conteúdos

escolares tal como recomendado no PCN (1997).

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5.4.2 Classificação das Situações Segundo as Operações Lógicas

Classificamos as situações elaboradas também segundo as operações

lógicas (Capítulo 1), pois para Piaget e Szeminska (1971) os conceitos numéricos

são subordinados aos conceitos lógicos.

Algumas situações elaboradas são situações em que as professoras

trabalham o conhecimento social e nos referiremos a elas por Representação. Para

observarmos a distribuição das situações elaboradas pelas professoras de acordo

com essa classificação, organizamos o Gráfico 5.6 a seguir.

Gráfico 5.6: Classificação das situações elaboradas pelas professoras considerando as operações lógicas.

� Correspondência: Agrupamos nessa categoria as situações em que será

estabelecida a relação “um” a “um”. Apresentaremos abaixo uma situação

classificada como correspondência.

Figura 5.25: Extrato do questionário da professora Orquídea:

O que a professora pretende com a situação elaborada é que seus alunos

compreendam a equivalência entre os dois conjuntos que tenham a mesma

quantidade de elementos fazendo a correspondência um a um. Da maneira que a

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situação foi proposta não provoca/motiva uma atividade cognitiva por parte dos

alunos.

De fato, Kamii ressalta que exercícios desse tipo são desaconselhados

porque impedem a possibilidade de a criança movimentar objetos para efetuar a

equivalência dos conjuntos. A autora adverte que este tipo de exercício pode

naturalmente provocar “o tipo de pensamento que conduz à resposta correta pela

maneira errada” (KAMII, 1989, p. 57). Se perguntarmos como ela encontrou a

resposta correta elas podem responder: “você desenha linhas” (KAMII, 1989, p. 58).

Ao desenhar linhas entre as figuras as crianças podem fazer a correspondência

correta, no entanto, podem não entender a equivalência entre os conjuntos.

� Representação: reunimos nessa categoria as situações nas quais as

professoras trabalham com a representação do número, seja por algarismos, por

extenso ou por desenhos. A seguir um exemplo de uma situação classificada como

Representação.

Figura 5.26: Extrato do questionário da professora Açucena:

As situações de representação são mais trabalhadas pelas professoras que

atuam no 2º ano (10 problemas dos 13 que foram elaborados). Na situação

apresentada acima, a professora está trabalhando com a representação do número,

solicitando que as crianças nomeiem os numerais. Para ela, as crianças estão

nomeando os números. Podemos inferir que essa professora, possivelmente

confunde o número, (objeto matemático) com a sua representação. Essa confusão

pode sugerir para essa professora que seu alunos já sabem o que é número quando

eles nomeiam e representam numerais.

Inclusão: nessa categoria estão as situações em que se faz abranger um

conjunto por outro. Apresentaremos uma situação dessa classificação.

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Figura 5.27: Extrato do questionário da professora Acácia:

As situações que envolvem inclusão são mais utilizadas pelas professoras do

2º ano (sete situações das 10 elaboradas). Intuímos que as situações que envolvem

inclusão vão ganhando força ao longo dos anos de escolaridade.

A situação apresentada solicita que o aluno relacione o valor das cédulas que

eles tem em mãos, com suas compras, ou seja, será que o valor das compras que

ele vai fazer está incluído no valor que ele possui? É uma situação que favorece o

raciocínio do aluno, pois está apresentando uma situação ligada ao seu cotidiano,

provavelmente ele já passou por esta situação ou passará. Notamos, uma aplicação

da Matemática em situações da vida do aluno o que é sugerido pelas Diretrizes

Curriculares do Estado da Bahia (BAHIA, 1994).

� Seriação e Sequenciação: elencamos nessa categoria as situações em que

uma sequencia é ordenada de acordo com um critério (seriação) e as situações em

que é se faz suceder a cada elemento um outro sem considerar a ordem entre eles

(sequenciação).

Figura 5.28: Extrato do questionário da professora Magnólia (seriação):

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Figura 5.29: Extrato do questionário da professora Tulipa (sequenciação):

As professoras que ministram aula nos dois anos escolares elaboraram mais

situações que envolviam seriação (seis das nove situações elaboradas).

Nesta categoria, as professoras elaboraram várias situações que envolviam

brincadeiras e jogos: amarelinha e bingo. Conhecer as diversas possibilidades que

os jogos e as brincadeiras podem trazer para o contexto escolar possibilita ao

professor poder aproveitar esses momentos para auxiliar seus alunos na construção

de seus conhecimentos.

A utilização de jogos como recurso ao ensino da Matemática é recomendada

pelo PCN (1997), tendo em vista que contribuem com a interação das crianças, com

a motivação, com a elaboração das estratégias, com a criatividade, e a imaginação

tão deixada de lado, mas de extrema importância para a construção do processo de

abstração do aluno nas aulas.

� Classificação e Comparação: agrupamos nessa categoria as situações em

que é solicitada a separação em categorias, observando as semelhanças ou as

diferenças (classificação) e as situações em que são estabelecidas diferenças ou

semelhanças (comparação).

Figura 5.30: Extrato do questionário da professora Acácia (classificação):

As situações de classificação são mais trabalhadas pelas professoras do 1º

ano (cinco situações elaboradas de oito). Percebemos que as situações que

envolvem classificações vão perdendo a força ao longo dos anos de escolaridade.

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156

Em relação à situação apresentada pela professora Acácia, a pretensão dela

é trabalhar com a classificação; no entanto, quando ela determina critérios para

classificar não dá liberdade para que a criança construa suas próprias hipóteses de

categorização. As crianças, mesmo as do 1º ano já conviveram com símbolos, letras

e números, portanto caso a professora permitisse que as crianças efetuassem a

classificação sem as suas observações, questionando seus alunos sobre como

procederam ao classificar, permitiria que eles, evidenciassem seu pensamento

compartilhando suas ideias com seus pares. Ela não nos revelou como ela dá

“pistas” para que os alunos reconheçam os números.

Figura 5.31: Extrato do questionário da professora Açucena (comparação):

A pretensão da professora é de que as crianças efetuem comparações entre

os conjuntos. Na visão de Kamii (1989), o que é solicitado, nesse caso, é um

julgamento sobre igualdade e desigualdade dos conjuntos desenhados pela

professora. Para a referida autora, uma situação que possui um maior valor

educacional e um dos princípios básicos para o ensino de número é a de incitar as

crianças fazerem conjuntos com objetos móveis. No caso de comparação, quando

as crianças têm oportunidade de fazer um conjunto com objetos móveis, para

comparar com o que já está feito, ela inicia do zero e vai adicionando mais um até

ela mesma decidir quando deve parar.

A professora registra a importância da memorização na fase de alfabetização.

Consideramos essa relevância à memorização possivelmente por resquícios da

tendência formalista clássica (FIORENTINI, 1995), que concebe a aprendizagem

pela memorização e a ação do aluno restringe-se a copiar e a repetir os conteúdos

transmitidos pelo professor.

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157

� Incompatível: tal como na classificação anterior, aqui estão elencadas as

situações em que não conseguimos identificar diretamente a forma de trabalho com

os números. Observe uma das situações abaixo:

Figura 5.32: Extrato do questionário da professora Tulipa:

Ressaltamos que apenas três situações foram classificadas como

incompatível, o que é um dado positivo pois as professoras elaboraram situações

pertinentes ao trabalho com o número.

Não identificamos nas situações elaboradas: situações de repetição exaustiva

dos algarismos, situações que envolvessem quantidades contínuas, igualmente as

situações que tratassem medida e a relação de conservação. Destacamos, que na

visão piagetiana, a construção do número pela criança é realizada em estreita

relação com a conservação numérica (invariância do número) e com as operações

lógicas de classificação (como classe de inclusão) e a seriação de relações

assimétricas (ordenação de grandezas). Assim, para que a criança possa construir o

conceito de número se faz necessário também que ela possa compreender o

princípio da conservação.

No entendimento de Piaget e Szeminska (1971) as noções aritméticas são

estruturadas, progressivamente em função da necessidade de conservação; desse

modo, cabe ao professor oferecer as crianças uma diversidade de situações que

também possam contemplar o trabalho com a conservação a fim de ajudá-las a

construir o conceito de número.

5.4.3 Síntese das Situações elaboradas pelas professoras

O foco de trabalho do grupo de professoras voltava-se basicamente para as

situações que classificamos como “quantidade”, que são situações em que é

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158

privilegiado o aspecto cardinal dos números. É importante considerar que

aproximadamente 1/4 das situações elaboradas e classificadas como quantidade,

envolviam operações das Estruturas Aditivas. No tocante às operações lógicas, o

foco de trabalho eram as situações de “correspondência” as mais amplamente

exploradas. Percebemos, nas situações elaboradas, indícios da concepção

empirista, e aproximações das tendências formalista clássica e socioetnocultural

(FIORENTIN, 1995).

Por fim, os resultados nos permitiram inferir que esse grupo parece confundir

o número com a sua representação (numerais). Tal confusão pode se refletir no

momento do ensino. Como o grupo confunde o objeto matemático com a sua

representação, elas podem entender que seus alunos já sabem o que é número

quando eles apenas, reconhecem, nomeiam e representam numerais.

De posse dos resultados das análises realizadas com os dados coletados em

nossa pesquisa, prosseguiremos no próximo capítulo com a conclusão de nossa

investigação.

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CCAAPPÍÍTTUULLOO 66

CCOONNCCLLUUSSÃÃOO

O objetivo deste capítulo é realizar o fechamento de nosso estudo,

apresentando as conclusões às quais chegamos, baseando-nos nas análises dos

dados coletados e sob a luz das ideias teóricas aqui apresentadas. Para que

vislumbremos o mosaico, fruto deste trabalho, em sua completude, faremos uma

breve retrospectiva sobre o caminho percorrido até aqui.

6.1 Caminho Percorrido

O tema que despertou nosso interesse foi investigar a respeito da ideia que

as professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental têm sobre a construção do

conceito de número pela criança. Esse interesse resulta de inquietações por nos

depararmos com o fato de que, apesar de terem mais de seis anos de escolaridade,

as crianças apresentam ainda dificuldades em lidar com conceitos da Matemática,

tais como as quatro operações. Refletindo sobre eles, percebemos que existem

alguns conceitos anteriores às quatro operações como, por exemplo, o próprio

conceito de número. Desse modo, voltamos para o início dos anos iniciais, quando a

criança começa a formalizar o conceito de número.

Tomamos como hipótese do estudo o argumento que as crianças são

ensinadas a falar e a escrever os números, mas não são levadas a entender o

conceito de quantidade, o que implica o entendimento do número como sendo

apenas um nome. Assim, percebemos o quão importante é a reflexão do professor

sobre a maneira como a criança constrói o conceito de número, para poder nortear

sua prática. Assim sendo nossa investigação teve por objetivo:

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160

INVESTIGAR QUE CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

Este objetivo pretende ressaltar a ideia e percepção do professor bem como

destacar sua ação em relação à referida construção. Para atingirmos nosso objetivo,

elaboramos a questão que norteou nossa investigação:

QUAL(IS) CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

Para subsidiar o estudo buscamos apoio teórico nas ideias da teoria

piagetiana, especificamente no que se refere ao conceito de número. Piaget e

Skeminska (1971) afirmam que este é construído a partir da abstração reflexionante

e necessita de conceitos lógicos como conservação, inclusão e seriação. Nessa

direção, cabe aos professores dos anos iniciais conhecer como os alunos constroem

o conceito de número, para poderem planejar sua prática pedagógica com

estratégias e atividades que favoreçam esta construção.

Revisitamos ainda os estudos de Kamii (1989), que trouxe as ideias de Piaget

para a sala de aula. Dessa autora nos detivemos na advertência de que o número

não pode ser ensinado, a criança o constrói por si mesma, pela coordenação de

relações de ideias, eventos, situações e objetos. Espera-se que os professores

possam encorajar o pensamento espontâneo de seus alunos, buscando estratégias

de ensino que possibilitem a criança construir o conceito de número. A autora não

prioriza o ensino de signos nos anos iniciais de escolaridade porque, no seu

entendimento, quando a criança tiver construído a estrutura mental do número terá

mais facilidade em assimilar os signos à estrutura construída. Caso contrário, a

contagem, leitura e escrita de numerais serão apenas de memória sem significado

numérico.

Do ponto de vista dos autores brasileiros, encontramos subsídios teóricos

também nas ideias de Lorenzato (2006) e Maranhão (2005) no que tange às funções

que os números desempenham em nosso cotidiano. Vimos a importância de o

professor ter consciência dessas funções, para que se empenhe em buscar

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estratégias de ensino que possibilitem às crianças se apropriarem das funções do

número e, assim, construírem o seu significado de acordo com os contextos

apresentados.

Na sequência, discutimos o número sob a perspectiva das políticas públicas,

aqui traduzidas por seus documentos oficiais, PCN, RCNEI e Diretrizes Curriculares

para o Ensino Fundamental – Matemática do Estado da Bahia, na intenção em

perceber como o ensino do número é vislumbrado em documentos que tratam da

prática docente de Matemática. Os três documentos consideram relevantes na

construção do conceito do número as operações lógicas. Os documentos nacionais

fazem referência à utilização do número como quantidade, ordem e como

nome/rótulo. A diretriz baiana apresenta apenas a possibilidade de o número se

apresentar como quantidade e ordem, excluindo o número como nome/rótulo.

Tratamos das ideias que sustentam a importância do conhecimento do

professor para a prática e o desenvolvimento profissional nas ideias de Shulman

(1986, 2005), Tardif (2002), Ponte (1998) e Ponte e Oliveira (2002). Agregamos,

também, a essa discussão, uma reflexão sobre concepções, pois a forma com que o

professor concebe o ensino da Matemática irá direcionar sua prática docente.

Demarcando os caminhos metodológicos selecionados para a realização

dessa investigação, optamos por fazer uma pesquisa qualitativa descritiva, cujo

cenário de investigação selecionado foram três maiores escolas públicas em número

de alunos matriculados na cidade de Jequié – BA. Os sujeitos participantes dessa

investigação são 13 professoras que atuam no 1º e 2º ano do Ciclo I do Ensino

Fundamental. Empregamos como instrumento de coleta de dados, um questionário e

uma entrevista semiestruturada. De posse dos dados coletados por nossos

instrumentos, procedemos à sua análise, cujos principais resultados estão expostos

a seguir.

6.2 Principais Resultados

Iniciamos a apresentação do resumo dos principais resultados, explicando

como a análise foi realizada. Esta foi feita em quatro categorias: Perfil das

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162

Professoras, Preferência e Concepção das Professoras, Entendimento de Número

na Visão das Professoras e Situações Problema nas quais os Números são

Trabalhados.

Perfil das Professoras:

A maioria das professoras participantes de nosso estudo tinha 36 anos ou

mais de idade, tendo a maioria cursado o Magistério e também Pedagogia (10

professoras). Algumas buscaram novos conhecimentos em outros cursos superiores

(História e Letras – duas professoras) e em cursos de especialização

(Psicopedagogia e Gestão e Supervisão Escolar – seis professoras).

Em relação à experiência docente, especificamente nos anos de alfabetização

(1º e 2º anos), nove das 13 professoras têm experiência docente nesses dois anos

escolares, o que nos fez considerar o grupo como profissionais experientes, no que

tange a atuação docente nos anos de alfabetização.

Preferências e Concepções das Professoras:

O grupo das professoras investigadas não possuía uma visão positiva da

Matemática enquanto estudante (10 de 13 tinham visão negativa). Quando essas

professoras passaram a atuar em sala de aula, sua visão pouco se modificou, tendo

em vista que o oito daquele total ainda continuou com uma visão negativa da

Matemática. A pequena preferência por esta disciplina parece não ter reflexos em

sala de aula. Elas narravam que estavam conscientes sobre a importância do ensino

da Matemática e destinavam de três a seis aulas semanais para lecionar tal

disciplina.

No que tange ao trabalho em sala de aula, a preferência do grupo era o bloco

de conteúdos Números e Operações (nove professoras). O grupo (12 professoras)

mostrou preferência pelo uso da combinação de livro, lousa e giz. Nove professoras

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também usavam outros recursos didáticos: ábaco, jogos, brincadeiras, materiais

reciclados.

Sobre planejamento da ação docente, o livro didático foi o principal recurso

para planejar as aulas, sendo utilizadas também atividades criadas e discutidas nos

momentos de A.C. e atividades retiradas da Internet. Nove professoras preferem

planejar suas aulas semanalmente e consideram relevantes as anotações sobre os

acontecimentos de aula, justificando que por meio delas era possível refletir sobre o

trabalho, analisando quando necessário o redirecionamento de suas ações.

Por fim, o grupo defendia a avaliação contínua e o ensino da Matemática

voltado para o cotidiano, numa visão aproximada da tendência socioetnocultural

(FIORENTINI, 1995), e divergente da concepção que considera a Matemática

separada da realidade (PONTE, 1992).

Entendimento de Número na Visão das Professoras:

O grupo concebia o número como sinônimo de numeral. A distinção entre o

número e o símbolo que o representa ainda não estava clara para este grupo e isto

pode implicar um trabalho docente restrito à leitura e à escrita de numerais,

supondo, dessa forma, que estão ensinando conceitos numéricos a seus alunos.

O grupo considerava que o aluno já sabia o que era número, quando ele

reconhecia, relacionava e associava o numeral à quantidade. Como essas

professoras confundiam o número com o numeral, é possível que elas julgassem

que seus alunos sabiam o que era número quando eles relacionavam corretamente

o numeral à quantidade.

Situações-Problema nas quais os Números são Trabalhados:

O foco de trabalho do grupo de professoras voltava-se, basicamente, para as

situações que classificamos como “quantidade”, que são aquelas em que é

privilegiado o aspecto cardinal. É importante considerar que, aproximadamente, 1/4

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164

das situações elaboradas e classificadas como quantidade envolviam operações das

Estruturas Aditivas. No tocante às operações lógicas, o foco de trabalho eram as

situações de “correspondência” as mais amplamente exploradas.

Percebemos, nas situações elaboradas, indícios a concepção empirista, e das

tendências formalista clássica e sócioetnocultural (FIORENTIN, 1995).

Após termos retomado resumidamente, o nosso caminho teórico e

metodológico assumido por nós neste estudo, sentimo-nos aptas a oferecer uma

resposta para a nossa questão de pesquisa.

6.3 Respondendo a Nossa Questão de Pesquisa

Como já anunciado anteriormente, o estudo se propôs responder a seguinte

questão de pesquisa:

QUAL(IS) CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

Desmembramos tal questão norteadora em duas outras específicas. Somos

de posição de que as respostas a essas questões fornecerão subsídios suficientes

para que possamos responder, consistentemente, à questão principal. Assim sendo,

apresentaremos, a seguir, as questões específicas, seguidas de suas respectivas

respostas, para só então retornarmos à questão principal de nosso estudo.

O QUE É NÚMERO NA VISÃO DE PROFESSORES QUE ATUAM NO 1º E 2º ANO E QUANDO

ESTES PROFESSORES CONSIDERAM QUE SEUS ALUNOS JÁ SABEM O QUE É NÚMERO?

Para as professoras investigadas o número era sinônimo de numeral. Elas

confundiam o objeto matemático com a sua representação e isso pode levar a uma

limitação no trabalho docente, restringindo o trabalho com os números às atividades

de leitura e escrita de numerais supondo que estão trabalhando com conceitos

numéricos quando se está trabalhando com palavras e signos.

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As professoras investigadas consideravam que seus alunos já sabiam o que

era número, quando eles reconheciam, relacionavam e associavam o numeral à

quantidade. No entanto, essas professoras confundiam o número com o numeral. A

partir dessa informação, é possível que elas avaliassem que seus alunos sabiam o

que era número, quando eles relacionavam corretamente o numeral à quantidade.

COMO A IDEIA DO NÚMERO É TRABALHADA POR ESTES PROFESSORES?

O foco de trabalho dessas professoras se concentrava na exploração de

situações em que o número era tratado como “quantidade” e em relação à operação

lógica eram amplamente utilizadas as situações que envolviam “correspondência”.

Isso significa que o trabalho para a formação do conceito de número era limitado, o

que, consequentemente, também limitava a formação de tal conceito por parte dos

alunos.

Nesse momento, tendo respondido às duas questões específicas,

procederemos com a resposta à questão principal de nosso estudo:

QUAL(IS) CONCEPÇÃO(ÕES) ESTÁ(ÃO) PRESENTE(S) QUANDO PROFESSORES SE

PROPÕEM TRABALHAR O CONCEITO DE NÚMERO COM ALUNOS DO 1º E 2º ANO DO ENSINO

FUNDAMENTAL DE ESCOLAS DE JEQUIÉ – BA.

Por meio dos resultados mostrados em nossa análise e das respostas dadas

as nossas questões específicas, sentimo-nos confiantes para afirmar que as

professoras investigadas concebem o ensino da Matemática divergente da

concepção que considera a Matemática isolada da realidade (PONTE, 1992). A

visão que essas professoras apresentam se aproxima da tendência

socioetnocultural, pois, como indicador de aprendizagem saber resolver problemas

relacionados com o cotidiano da vida de seus alunos.

As professoras têm a concepção de que número é sinônimo de numeral;

percebemos, também, nas situações elaboradas indícios da concepção empirista,

que concebe a aprendizagem de seus alunos consistir na memorização dos

conteúdos transmitidos por ela, e aproximações das tendências formalista clássica e

socioetnocultural (FIORENTIN, 1995).

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166

Por fim, os resultados nos permitiram inferir que esse grupo parece confundir

o número com a sua representação (numerais). Tal confusão pode se refletir no

momento do ensino. Como o grupo confunde o objeto matemático com a sua

representação, elas podem entender que seus alunos já sabem o que é número

quando eles, reconhecem, nomeiam e representam numerais, o que resulta uma

confirmação para a hipótese levantada no início de nosso trabalho.

Defendemos a necessidade de essas professoras distinguirem o número de

suas representações, pois, conforme argumentam Maranhão e Carvalho (2008),

“Confusões sobre isso podem impedir outras aprendizagens” (p. 10), porque, quando

resumimos o trabalho com o conceito de número, atendo-se a um único perfil do seu

conceito, estamos restringindo/limitando a experiência do aluno com conceito

vislumbrando apenas uma nuance do mesmo.

Para concluir, queremos deixar claro que não temos a pretensão científica de

extrapolar os resultados para além dos encontrados em nossa amostra. Sabemos

que se trata de um universo muito pequeno e que não foi respeitada a escolha

estatisticamente aleatória dos sujeitos. Sabemos, por fim, que se trata de um estudo

descritivo de cunho qualitativo, portanto, sem alcance generalizativo. Contudo, as

informações obtidas nos permitiram um entendimento satisfatório sobre a visão que

tais professoras têm sobre o ensino de número. E essas informações, por seu

caráter detalhista e preciso, nos permitem inferir que, provavelmente, tal visão de

ensino está presente em muitos outros professores que atuam nos anos de

alfabetização do Ensino Fundamental. Assim sendo, estamos convictas de que o

presente estudo contribui para iluminar algumas das visões que os professores que

atuam nos anos de alfabetização numérica têm a respeito do ensino do número.

6.4 Caminhos a ser Percorridos

De um modo geral, este estudo atendeu ao objetivo proposto, qual seja, o de

investigar quais concepções estão presentes, quando professores se propõem

trabalhar o conceito de número com alunos do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental

de Jequié – BA. Entretanto, como costuma ocorrer, quando se chega à conclusão de

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167

uma investigação, algumas ideias, fruto de nossas meditações, surgem-nos como

possibilidades de encaminhamentos para futuras pesquisas.

A primeira delas seria um estudo comparativo da concepção de professores

que atuam nos anos iniciais (1º e 2º ano) sobre número, daqueles que não atuam (3º

e 4º ano). A concepção sobre número desses professores será diferente?

Entendemos que o foco de professores que atuam nos anos de alfabetização

Matemática é mais voltado para o trabalho com o número enquanto os professores

que atuam no 3º e 4º ano enfatizam um trabalho mais voltado às operações. Dessa

forma, tal estudo poderia investigar a seguinte questão de pesquisa: Existe diferença

de concepção sobre número de professores que atuam nos anos iniciais do ciclo I

do Ensino Fundamental para os que atuam nos anos finais desse mesmo ciclo?

A metodologia a ser empregada neste estudo seria também qualitativa de

cunho descritivo como a nossa, e a amostra seria dividida em dois grupos com 4

professores, sendo dois de cada ano escolar. O grupo dos professores dos anos

iniciais do ciclo I (1º e 2º ano – 4 professores) e o grupo dos professores dos anos

finais do ciclo I (3º e 4º ano – 4 professores).

Uma segunda sugestão seria investigar se essa concepção sobre número que

as professoras apresentaram é divergente da concepção de professoras que atuam

em escola particular? Também seria utilizada a metodologia qualitativa de cunho

descritivo. A amostra seria dividida em dois grupos, o grupo dos professores que

atuam nas escolas públicas e o grupo dos professores que atuam em escolas

particulares.

Outra sugestão, igualmente interessante, seria confrontar a visão de número

de alunos dos anos de alfabetização e a visão de seus professores. Os sujeitos

seriam os alunos de um dos anos escolares da alfabetização matemática e seu

respectivo professor. Utilizaria uma pesquisa diagnóstica e descritiva a ser realizada

com uma das turmas.

Por fim, uma última sugestão: a de confrontar a concepção sobre número que

professores relatam e as concepções presentes em sua prática docente. Seria um

estudo diagnóstico e descritivo com uma turma de cada ano escolar (1º e 2º ano).

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168

Utilizaria a observação participante para dar condições de descrever e analisar as

ações realizadas pelos sujeitos da pesquisa em sua prática.

Esperamos que esta pesquisa tenha contribuído no sentido de trazer

reflexões aos professores, em relação à construção do conceito de número pela

criança.

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RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS

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Apêndice – A

Questionário – Parte 1

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Questionário – Parte 2

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Apêndice B

Roteiro da Entrevista Bloco 1 – Da Escola Vamos conversar um pouco sobre a sua trajetória escolar,

• Ensino Fundamental; Médio e Superior. Conte-me como foi, onde você fez? Comente sua pior/melhor lembrança. Qual é a disciplina que você mais gostava? Por que você escolheu sua profissão? Você acha que sua formação foi suficiente para a sua prática pedagógica? Bloco 2- Da visão Macro da Profissão E hoje qual é a sua preferência em relação á matemática? Mudou? Permaneceu? Fez algum curso complementar (formação continuada)? Qual? Como você planeja suas aulas? Como foi a preparação para ensinar? Qual é o trabalho de Matemática que você faz? Quais eixos dos PCNs você conhece? Quais eixos você trabalha? Bloco 3 – Da Sala de Aula Em relação aos materiais de apoio didático você informou que usa jogos nestes jogos as crianças acumulam pontos? Os alunos sabem dizer quem ganhou? Eles sabem dizer com quantos pontos a mais ganharam ou perderam? Bloco 4 - Número Seus alunos conhecem número? Quais atividades você costuma apresentar para seus alunos como recurso para o ensino e aprendizagem de números? Você identifica a atividade(s) que eles mais apresentam resultado? Em relação a situação elaborada quais os conceitos inseridos na situação que você elaborou? Você identifica mais de uma função para o número? Número como rótulo, quantidade, ordem, quem sabe o que é? Quem já trabalhou com alguma situação que envolve número com essas funções? Relate a atividade. Quem teria na cabeça uma boa atividade que envolvam essas situações?

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Apêndice – C

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DO ALUNO Resolução nº 196/96 do CNS

O presente termo em atendimento à Resolução 196/96, destina-se a esclarecer ao participante da pesquisa intitulada: A Concepção de Professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental sobre a Construção do Conceito de Número pela Criança sob responsabilidade da Mestranda Ana Paula Perovano dos Santos Silva, do curso de Mestrado em Educação Matemática da PUC/SP, os seguintes aspectos:

Objetivos: Investigar a visão dos professores que atuam nos 1º e 2º anos do Ensino fundamental sobre a construção do conceito de número, bem como, identificar as estratégias pedagógicas que esses professores lançam mão para o ensino do número; identificar as ferramentas didáticas que eles utilizam para o ensino do conceito de número e Investigar as concepções dos professores que atuam no 1º e 2º ano do Ensino fundamental para o ensino do conceito de número. Participação: ao concordar com a participação na pesquisa, deverei estar à disposição para responder uma entrevista semi-estruturada constando de questões referentes à minha vida pessoal e profissional. Riscos: este estudo não trará riscos para minha integridade física, mental ou moral. Todos os dados que obtivermos serão utilizados somente para fins científicos com garantia de anonimato. Confidencialidade do Estudo: os registros da sua participação nesse estudo serão mantidos em sigilo. Serão guardados esses registros e somente os pesquisadores responsáveis terão acesso a essas informações. Se alguma publicação resultar deste trabalho, a identificação do participante não será revelada e os resultados serão relatados de forma sumariada preservando o anonimato da pessoa. Participação voluntária: toda participação é voluntária, não há penalidades para aqueles que decidam não participar desse estudo. Ninguém será penalizado se decidir desistir de participar do estudo em qualquer época. Podendo retirar-se da participação da pesquisa, sem correr riscos e sem prejuízo pessoal. Depois de conhecer e entender os objetivos, bem como de estar ciente da necessidade do uso de minha imagem e/ou depoimento, AUTORIZO, através do presente termo, a pesquisadora Ana Paula Perovano

dos Santos Silva a realizar as fotos que se façam necessárias e/ou a colher meu depoimento sem quaisquer ônus financeiros a nenhuma das partes. Ao mesmo tempo, libero a utilização destas fotos (seus respectivos negativos) e/ou depoimentos para fins científicos e de estudos (livros, artigos, slides e transparências), em favor dos pesquisadores da pesquisa, acima especificados, obedecendo ao que está previsto nas Leis que resguardam os direitos das crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei N.º 8.069/ 1990), dos idosos (Estatuto do Idoso, Lei N.° 10.741/2003) e das pessoas com deficiência (Decreto Nº 3.298/1999, alterado pelo Decreto Nº 5.296/2004). Jequié, ______ de__________ de_________ ______________________________________

Participante da Pesquisa