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SOBRE O ESTÔMAGO - Repositório Abertorepositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/17293/2/84_9...ESCOLA HEDICO-GHGIC 0 PORT0 t O C0NSELHE1R0-DIRECT0R DR. WENCESLAU DE LIMA SECRETARIO

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DE SOBRE

O ESTÔMAGO

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MANUEL JOSE' AGUIA

m Ë mm DE SI SOBRE

O ESTÔMAGO

DISSERTAÇÃO INAUGURAL

APRESENTADA Á

ESCOLA MEDICO-CIRURGICA DO P0RÎ0

v i /

PORTO PAPELARIA E TYPOGRAPHIA MORGADO

27, Passeio 6a Cordoaria, 31

1836

ESCOLA HEDICO-GHGICt 00 PORTO C0NSELHE1R0-DIRECT0R

DR. W E N C E S L A U DE LIMA SECRETARIO

DR. RICARDO D'ALMEIDA JORGE

CORPO DOCENTE P r o f e s s o r e s p r o p r i e t á r i o s

t.* Cadeira—Anatomia deseriptiva ge­ral João Pereira Dias Lebre.

2.a Cadeira— Physiologia . . . . Antonio Placido da Costa. 3. a Cadeira—Historia natural dos me­

dicamentos e ma eria medica. . IDydio Ayres Pereira do Volte. 4.a Cadeira—Pathologia externa ethe-

rapeuthica externa Antonio Joaquim de Moraes Caldas. 5." Cadeira—Medicina operatória. . Pedro Augusto Dias. 6." Cadeira—Partos, doenças das mu­

lheres de parlo e dos recem-nas-cidos Dr. Agostinho Antonio do Souto.

7.a Cadeir*—-Pathologia interna e the-rapenthica interna Antonio d'Oliveira Monteiro.

8." Cadeira—l'linica medica . . . Antonio d'Azevedo Maia. 9 a Cadeira—Clinica cirúrgica. . . Eduardo Pereira Pimenta. 10.» Cadeira—anatomia pathologic» . Augusto Henrique d'Almeida Brandão. 11.a Cadeira—Medicina legal, hygiene

privada e publica e toxicologia . Hicardo d'Almeida Jorge. 12.a Cadeira—Pathologia geral, se-

meiologia e historia medica . . Maximiano A. d'Oliveira Lemos. Pharmacia Nuno Dias Salgueiro.

P ro fes so res j u b i l a d o s

,, , ,. ( Dr. José Carlos Lopes. Secção medica j J o s é d - A n d r a d e Gramacho. Secção cirúrgica Visconde de Oliveira.

P ro fes so res s u b s t i t u t o s

,, . .. í João Looes da Silva Martins Junior. Secção medica y • c , . . * Cândido Augusto Correia de Pinho. heeçao cirúrgica j H o b c r l o j j e | a , l u m 0 do Itosario Frias.

D e m o n s t r a d o r de a n a t o m i a

Secção cirúrgica Vaga.

A Escola nao respondo pelas doutrinas exponiidas na dissertaarão e enunciadas nas proposições.

(Regulamento ia Escola de 23 d'alril de 1840, art. 183.°)

AO MEU ILLUSTRADO PRESIDENTE

O EX. m o SNH.

j]r. Jobcrto «clarmino do Joaarto Irias

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I

Escolhendo para assumpto da nossa these a «Ac­ção do bicarbonato de soda sobre o estômago», não ti­vemos a pretensão de acerescentar novas experiên­cias ás que já foram realisadas por sábios experi­mentadores, taes como Linossier e Lemoine; o nosso fim é somente discutir o que já é conhecido a tal respeito, e mostrar que o desaccôrdo manifesto no resultado das diversas experiências é consequência da diversidade de cireumstancias em que os experi­mentadores se collocaram.

Esta discordância accentua-se principalmente na acção do bicarbonato de soda sobre a secreção gástrica-, eé a analyse dos trabalhos feitos n'este sentido que constituirá o assumpto da primeira parte do nosso trabalho.

Estudaremos na segunda parte a acção do sal sobre a motilidade do estômago, e na terceira fare­mos o estudo da sua acção analgésica.

Antes, porém, de começarmos, seja-nos permit-tido esperar dos Illustres Professores, que hão de julgar-nos, a benevolência que, durante o nosso cur­so, nos foi proãigalisada.

PRIMEIRA PARTE

ACÇÃO SOBRE A SECREÇÃO

CAPITULO PRIMEIRO f

Historia

O bicarbonato de soda, hoje d'um uso tão fre­quente nas doenças d'estomago, é um medica­mento recente.

Mas este sal, ignorado outr'ora, era já utilisado d'uma maneira empírica na cura das doenças, graças ao emprego de certas aguas mineraes, taes como as de Vichy, de que constitue o principal elemento. E logo que os progressos da chimica fizeram conhecer a composição d'estas aguas, o bicarbonato de soda tomou um logar importante na therapeutica.

Começaram então a multipiicar-se as investi­gações sobre a acção d'esté medicamento, e nós para nos limitarmos ao assumpto que nos occu-

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pa, estudaremos somente a sua acção sobre as affecções do estômago.

Chomel foi um dos primeiros medicos que distinguiu a dyspepsia acida da dyspepsia alcali­na, e contra a primeira prescrevia o bicarbonato de soda, excluindo todo o regimen acido.

Mais modernamente Blondlot imagina as fis­tulas gástricas, e graças a este processo permitte estudar melhor a secreção estomacal.

Cl. Bernard admitte que fracas doses de bi­carbonato de soda são um excitante da secreção gástrica.

Diz-nos com eíTeito este auctor: «quando se administra ferro com um alcali fraco, o ferro é mais rapidamente atacado. N'este caso o alcali neutralisou sem duvida uma certa quantidade de acido do sueco gástrico; mas as glândulas foram excitadas pela acção do alcali a segregar uma maior quantidade de sueco, que compensou, e talvez excedesse, o que foi saturado.»

Mais tarde Richet, que também'fez investiga­ções sobre o sueco gástrico, injectou agua de Vichy n'um individuo portador d'uma fistula gás­trica e duas horas depois administrou ovos e len­tilhas, e conclue que esta agua tem uma acção depressiva sobre a secreção, sem comtudo nos indicar a quantidade d'agua empregada.

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Trousseau no segundo volume do seu Tratado de Therapeutica pensa que o bicarbonato de soda dado em fracas doses excita a secreção gástrica; e dado em doses elevadas satura o acido chlorhy-drico do estômago, favorecendo a digestão biliar e pancreática.

Somente previne os práticos contra o empre­go de doses muito elevadas, porque, segundo elle, o uso immoderado d'esté alcalino levaria o doente a cachexia.

Hoje esta theoria da cachexia está completa­mente abandonada, havendo medicos que dão a um doente 20 grammas de bicarbonato de soda por dia sem produzir estado cachetico.

Quando Kussmaul descobriu a bomba esto­macal, que permittia fazer a analyse do sueco gástrico, começou uma nova era fecunda em ex­periências; tanto mais que o instrumento pouco commodo e mesmo perigoso de Kussmaul foi logo substituído por os tubos de Faucher e de Debove, d'um manejo muito mais fácil e inoffen­sive <; Leube foi um dos primeiros que estudou o sueco gástrico do homem e classificou nitida­mente as dyspepsias em hyperchlorhydricas e hy-pochlorydricas, administrando os alcalinos no pri­meiro caso e os ácidos no segundo.

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Em 1886 Jaworski escreveu uma longa me­moria sobre a acção" do bicarbonato de soda e da agua de Carlsbad, e concluiu que em pequenas doses este sal augmenta a secreção acida do es­tômago, diminuindo-a pelo contrario quando a dose é elevada.

Faz notar também que com doses excitantes a excitação se não produz immediatamente, por­que é encoberta a principio pela acção do alcali­no que satura o acido.

Gegel e Abend fizeram duas séries de expe­riências e demonstraram com a primeira série, que depois da administração de 1 gramma de bi­carbonato de soda, a secreção chlorhydrica do estômago tinha triplicado.

Na segunda série das suas experiências admi­nistraram 50 grammas de bicarbonato de soda, e reconheceram que a secreção tinha diminuído.

Mesnil concluiu também das suas experiên­cias, que uma pequena dose de bicarbonato de soda depois de ter neutralisado o conteúdo do estômago excita as glândulas acidas, mas acima d'uma certa excitação a glândula fatiga-se.

Devemos notar que estes auctores allemães fizeram a maior parte das suas experiências com o sal e a agua de Carblsbad.

Ora o principal elemento d'esta agua é o sul-

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phato de soda, e portanto as suas conclusões nào são inteiramente applicaveis ao bicarbonato.

Os différentes tratados sobre doenças d'es-tomago, o de Debove e Rémond por exemplo, sem discutirem esta questão, aconselham em ca­sos d;hyperclorhydria doses bastante elevadas de bicarbonato de soda.

Em março de 1893 Linossier e Lemoine com-municaram á Academia de Medicina de Lyon um importante trabalho sobre a acção dos alcalinos no homem.

As suas conclusões, relativamente á adminis­tração em altas doses do bicarbonato de soda, são bem différentes das que acabamos de referir.

Possuindo para experiência e observação um soldado atacado de merycismo, poderam multi­plicar as suas analyses durante a digestão. Fize­ram a analyse do chymo estomacal três vezes em cada digestão; uma hora, duas horas e três horas

.depois d'urna refeição composta de 80 grammas de carne, 80 grammas de pão e 250 centigrammas d'agua.

O bicarbonato de soda foi administrado n'uma primeira série d'experiencias, uma hora antes da refeição, nas doses de 1, 5 e 10 grammas.

E n'uma segunda série, o sal foi administrado

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no principio da refeição, nas doses de 2, 5 e 10 grammas.

N'uma terceira série, o sal foi ingerido uma hora depois da refeição e nas mesmas doses de 2, 5 e 10 grammas.

Eis como podem resumir-se as suas conclu­sões:

A acção immédiate do bicarbonato de soda sobre a secreção gástrica é essencialmente exci­tante, qualquer que seja a dose.

O primeiro effeito da excitação é a saturação da alcalinidez; se a dose é fraca ou moderada, a excitação produz-se depois d'esta saturação.

Se a dose é massiça, a energia secretória da mucosa esgota-se a luctar contra a alcalinidez; uma vez a reacção acida do chymo readquirida o periodo d'excitaçao pára prematuramente. A acção excitante manifesta-se ao máximo quando o bicarbonato de soda é administrado uma hora antes da refeição, notando-se que a proporção maxima d'acido é obtida tanto mais tardiamente, quanto mais forte fôr a dose do bicarbonato de soda.

A producção d'acidos orgânicos do fermenta­ção é favorecida pela administração do bicarbo­nato de soda, durante todo o periodo que sepa­ra a ingestão do medicamento da acidez normal,

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e estes ácidos contribuem com o acido chlorhy-drico para a saturação da alcalinidez.

Devemos notar que estas considerações se applicam exclusivamente á acção immediata do bicarbonato de soda, e não á acção d'um trata­mento prolongado, acção que, segundo Hayem, seria muitas vezes uma diminuição da secreção chlorhydrica.

N'um tratamento prolongado, intervém um outro factor importante, que é a acção modifica­dora dos alcalinos sobre a nutrição geral.

Depois da communicação de Linossier e Le-moine, as suas conclusões foram contradictadas por diversos experimentadores.

Novas investigações foram realisadas por Gil­bert, Watlier e Laboulais, e as suas experiências levaram-nos a conclusões um pou::;o différentes. Parece que quanto mais se repelem as investi­gações sobre a acção do bicarbonato de soda, tanto mais esta questão se torna obscura.

Felizmente este facto, que é bastante frequente em sciencia, leva os auctores a novos estudos, e Linossier e Lemoine no congresso de medicina em Lyon defendem e explicam a primeira opi­nião por elles emittida. São as suas conclusões que vamos seguir indagando se no estudo das condições em que realisaram as experiências os

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seus contradictores, acharemos a explicação da diflerença das suas conclusões.

Tractando d'esté assumpto, é da mais alta im­portância para sua clareza estabelecer uma dis-tincção bem nítida entre a acção immediata e a acção prolongada do bicarbonato de soda. Cha­mamos acção immediata, a que provoca uma dose única d'esté sal durante as primeiras horas que se seguem á ingestão ; e acção prolongada a que persiste depois da cessação d'uni tratamento mais ou menos longo.

CAPITULO SEGUNDO

Acção immediata

Na acção immediata do bicarbonato de soda, ha dois factos a estudar :

1,° — Um facto chimico, que é a saturação do acido pelo alcalino.

2.°--Um facto physiologico consistindo na ex­citação da secreção.

Durante os primeiros momentos que seguem a ingestão, o facto chimico predomina de maneira a passar despercebida a excitação physiologica; porque o acido segregado é saturado á medida que se produz; e este phenomeno é tanto mais duradouro, quanto mais forte for a dose adminis­trada.

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Depois, quando o acido ê saturado, começa um novo período em que o chymo tende a read­quirir a sua acidez normal.

Emfim, vem um terceiro período, em que a producção d'acido chlorhydrico se eleva mais ou menos acima da normal, notando-se que este ul­timo período pôde faltar. Se com effeito se dâ uma dose massiça de bicarbonato de soda, a ex­citação não se traduz senão pela saturação com esgotamento ulterior da mucosa. Estes diversos phenomenos, que se passam no estômago em se­guida á acção do bicarbonato de soda, permittem-nos já comprehender certos pontos de discordân­cia nas investigações feitas a tal respeito.

Seguiremos estas investigações pela sua or­dem chronologica, e examinaremos se certas cau­sas de contradicçào devem ser attribuidas ás con­dições différentes em que se collocaram os ex­perimentadores. Pouco tempo depois da commu-nicação de ] Jnossier e Lemoine, Gilbert partici­pou á Sociedade de biologia o resultado das suas observações sobre esta questão; as suas conclu­sões tinham já sido relatadas nas Lições de the-rapeutica de Hayem, mas a sua memoria não appareceu seuão em julho de 1893,

As suas observações foram feitas durante dois annos n'um cão de fistula gástrica, ao qual tez

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tomar aguas alcalinas naturaes e artificiaes *, an­tes, durante e depois da refeição, quer sós na dose de 400 grammas, quer misturadas a carne na dose de 200 grammas d'agua para 200 de car­ne e concluiu: que em alta dose o bicarbonato de soda, dado ao mesmo tempo que a carne, dá na primeira meia hora reacção alcalina ao conteú­do do estômago.

A acidez só apparece no fim d'esté tempo para augmentai' progressivamente. Em fraca dose o bicarbonato de soda tem sobre o chymismo gás­trico uma acção muito menos intensa, mas orien­tada no mesmo sentido.

Produz uma diminuição d'acidez que é notá­vel durante um quarto d'hora, menos sensível passada meia hora, desapparecendo por completo três quartos d'hora depois da ingestão.

As conclusões em que Gilbert parece ad-mittir uma acção depressiva do bicarbonato de soda, estão pois em contradicção manifesta com as de Linossier e Lemoine.

Mas facilmente se pôde explicar a causa d'esta divergência, se atténdermos ao momento em que as analyses foram feitas.

O conteúdo gástrico, diz Gilbert, foi extrahido de quarto em quarto d'hora para ser submettido á analyse, a extracção não foi feita além da pri-

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meira meia hora seguinte á administração da agua alcalina isolada, e além da primeira meia hora após a administração da agua com a carne. Estas investigações não visam por consequência mais do qne a acção do bicarbonato de soda rio prin­cipio da digestão.

Ora n'este momento a saturação do acido pelo alcalino encobre a outra acção do bicarbonato de soda, a acção excitante da secreção, e é natu­ral que Gilbert, cujas analyses não foram além da primeira meia hora, não observasse o segun­do phenomeno, e fosse levado a concluir por uma acção depressiva do alcalino. Notemos tam­bém que as experiências que Gilbert realisou no cão dão resultados que não podem applicar-se d'uma maneira absoluta ao homem. Demais, em logar do bicarbonato de soda, serviu-se das aguas de Vichy, cujo sal mais importante é de facto o bicarbonato de soda, mas que contém além d'isso muitos outros principieis que podem influir na secreção estomacal.

Também quando Gilbert repetiu mais tarde as suas experiências de collaboração com Modiano, como fizeram as suas analyses durante um pe­ríodo mais longo da digestão, as suas conclusões não são absolutamente idênticas ás primeiras con­clusões de Gilbert. N'este ultimo trabalho dão-

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nos os referidos experimentadores conta de dnas experiências em que o bicarbonato de soda foi administrado na dose de 1 gramma antes da refeição, e na dose de 10 grammas durante ella. Para examinar o trabalho chimico do estômago recorreram á tubagem em série continua prati­cada em 10 minutos, 30 minutos, uma hora, hora e meia, duas horas e duas horas e meia depois da refeição.

Das suas analyses concluíram: 1."— Que o bicarbonato de soda tomado com

as refeições, deprime o processo chimico do es­tômago na hypopepsia, d'uma maneira tanto mais notável, quanto mais elevada for a dose;

2.°—Tomado meia hora antes da refeição o bi­carbonato de soda, ao contrario, excita o traba­lho do estômago.

Assim, n'estas ultimas observações, em que me­lhor seguiram a evolução da digestão, nós vemos Gilbert e Modiano approximarem-se nas suas con­clusões das de Linossier e Lemoine; porque ad-mittem com effeito a acção excitante do bicarbo­nato de soda, tomado meia hora antes da refeição.

Todavia bem différente é o seu aviso quando admittem uma acção depressiva para as doses administradas no momento das refeições.

Mas notemos que, nas analyses de que nos

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dão conta, empregaram uma dose massiça de 10 grammas.

O único facto de vêr o chymo recuperar a sua acidez normal basta para rejeitar a ideia d'uma acção depressiva.

A acção depressiva não se traduz senão pela saturação do acido, com esgotamento ulterior da mucosa.

Uma gramma de bicarbonato de soda fixando com effeito 44 centigrammas d'acid o chlorhy-drico, foi preciso que a mucosa segregasse mais de 4 grammas d'acido para produzir a saturação, e comprehende-se bem, que um tal trabalho te­nha esgotado a energia secretória.

Pela mesma epocha Modiano publicou um certo numero d'experiencias pessoaes, realisadas sobre três doentes : uma mulher hypopeptica, um homem hypochlorhydrico e outro ligeiramente hyperchlorhydrico. As analyses foram feitas por série continua, realisando-se a extracção do conteúdo estomacal, e a sua analyse em phases différentes da digestão, chegando Modiano aos resultados que já tinha obtido de collaboração com Gilbert.

A acção depressiva só se manifesta com doses elevadas, e a mesma objecção que acabamos de fazer o estas doses massiças pôde applicar-se a

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este caso. Além d'isso, as suas experiências são susceptíveis de varias outras objecções.

Em primeiro logar poderá admittir-se que esta tubagem em série continua, esta passagem tão repetida da souda seja sem acção nas funccões secretorias do estômago?

Demais, notemos que, tendo achado uma acção depressiva quando o bicarbonato de soda era ad­ministrado durante o repouso, a ultima extracção que era feita duas horas e meia depois, era ainda muito próxima do momento da ingestão d'esté medicamento, para que se pudesse vêr nitida­mente a phase da excitação.

De resto, era difíicil a Gilbert e Modiano, ve­rem a phase da excitação, porque não sendo bas­tante copiosa a refeição empregada por elles, os alimentos tinham já deixado o estômago, quando, tendo terminado o phenomeno chimico da satu­ração, se tornava apparente o phenomeno physio-logico da excitação.

N'este mesmo mez Mathieu e Laboulais n'uma memoria apresentada á Sociedade medica dos hos-pitaes referem as suas observações sobre dois casos particulares, em que o bicarbonato de soda é dado meia hora e uma hora antes da refeição, e em que a extracção do conteúdo estomacal era

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feita de 30 a 40 minutos depois da mesma re­feição.

E chegaram ás conclusões seguintes: 1.°—Doses de 50 centigi-aratnas a 1 gramma

tomadas meia hora antes das refeições, parece não terem acção sensível sobre a secreção.

2.°—Uma dose de 3 grammas, tomada uma hora ou meia hora antes da refeição, diminue a secreção.

Mas notemos que as suas experiências são susceptíveis das mesmas objecções, que as pri­meiros experiências de Gilbert. A extracção do conteúdo estomacal era feita uma só vez, 30 a 40 minutos depois da ingestão, e n'este momento o phenomeno da saturação do acido pelo alcalino encobria ainda o phenomeno da excitação; é na­tural que os experimentadores, tendo observado somente o primeiro d'estes factos, concluíssem por uma acção depressiva do bicarbonato de soda.

Quando mais tarde Mathieu repetiu as suas investigações de collaboração com Hal lot, como as analyses foram feitas n'um período mais avan­çado da digestão, e por consequência bem mais affastado do momento da ingestão, as suas con­clusões conformam-se com as de Linossier e Le-moine.

As suas investigações foram feitas n'um ho-

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mem que não apresentava outros signaes de dys­pepsia, senão peso de cabeça e torpor depois das refeições.

A extracção do conteúdo estomacal foi feita em quatro experiências no fim d'uma hora ou de hora e meia, alternativamente; as doses de bicarbonato de soda empregadas foram 3 a 5 grammas, admi­nistradas uma hora antes da refeição, e conclui-ram que estas doses determinavam uma excita­ção motriz e secretora do estômago.

A excitação motriz seria a principio a mais manifesta, mas pôde perguntar-se também se a passagem repetida da sonda não tem influencia sobre essa motilidade.

Estes resultados obtidos pelas analyses feitas n'um periodo bastante avançado da digestão, ap-proximam-se, pois, melhor das conclusões de Li-nossier e Lemoine, do que os primeiros resulta­dos obtidos por Mathieu e Laboulais, quando fa­ziam a extracção do conteúdo estomacal 30 a 40 minutos somente depois da refeição.

Em fim, temos a assignalar a opinião de Hayem, dizendo que o erro resulta de que se não teem tomado em conta as perturbações evolutivas da digestão.

Segundo elle, o facto mais importante da acção do bicarbonato da soda é abreviar a duração da

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digestão, podendo suppôr-se um augmenta d'acido chlorhydrico, porque este attinge o seu máximo mais cedo ; mas o acido seria sempre em propor­ção mais fraca que o máximo attingido, se se não tivesse usado o bicarbonato de soda.

Mas se ha experiências ao abrigo d'esta objec­ção, são precisamente as de Linossier e de Le-moine, que seguiram o trabalho digestivo hora a hora e sem perturbações, graças ao caso exce­pcional de que dispozeram.

Além d'isso pouco importa que o máximo de acido chlorhydrico fosse attingido mais cedo ou mais tarde, uma vez que o cyclo da digestão foi minuciosamente seguido por elles. Assim, depois do que vemos na discussão das experiências pra­ticadas sobre a acção do bicarbonato de soda, nada pôde ainda invalidar as primeiras conclu­sões de Linossier e Lemoine.

Como elles avançaram na sua primeira me­moria, este sal é pois nos seus effeitos immédia­tes um excitante da secreção gástrica, seja qual for a dose empregada antes ou durante a refei­ção.

Ultimamente Dujardin Beaumetz veio em apoio d'estas ideias, e apontou algumas provas clini­cas, tiradas do beneficio que resulta do trata­mento pelas aguas alcalinas da hypopepsia.

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Mais recentemente ainda Mathieu, fallando d'esta questão n'uma das suas lições clinicas, admitte a acção excitante immediata do bicarbo­nato de soda; faz notar com razão que examinan­do a acção d'esté medicamento, é preciso ter em conta o estado pathologico da mucosa estomacal de cada individuo, porque é bem evidente que um excitante glandular, qualquer que seja, não pôde actuar sobre glândulas que desapparece-ram.

Em conclusão: 0 bicarbonato de soda é um excitante da secreção gástrica nos seus effeitos immediatos.

CAPITULO TERCEIRO

Aeçâo prolongada

Dujardin Beaumetz depois de ter admittido as conclusões de Linossiere Lemoine nos hypochlo-rhydricos, accrescenta: «se é fácil dar conta, graças ás investigações de Linossier e Lemoine, da acção das aguas alcalinas e do bicarbonato de soda nas dyspepsias hypochlorhydricas, é mais difficil comprehender a acção benéfica d'estas substancias no caso d'hyperchlorhydria, e aqui, confesso, a clinica parece dar razão ás experiên­cias do professor Hayem e de Mathieu».

O que constitue a acção verdadeiramente ma­ravilhosa das aguas de Vichy nas affecções do es­tômago é que são salutares nas dyspepsias hypo­chlorhydricas, como nas dyspepsias hyperchlo-rhydricas.

Gomo explicar este facto? Para o explicar vamos referir-nos agora a uma

outra acção do bicarbonato de soda : é a sua ac­ção prolongada, différente da sua acção immedia­te, que nos permitte explicar este facto parado­xal de que nos falia Dujardin Beaumetz.

*

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Emquanto, com efteito, que a administração d'uma única dose, fraca ou massiça, de bicarbona­to de soda produz uma excitação da secreção gástrica; a administração repetida d'altas doses produz pelo contrario no iîm d'um certo tempo uma depressão da secreção.

Mas sobre a acção prolongada, como sobre a acção immediata do bicarbonato de soda, não en­contramos um accôrdo perfeito entre todos os experimentadores que estudaram o assumpto. Hayem fez investigações sobre 20 doentes dos quaes 10 eram hyperchlorhydricos, examinou a sua secreção antes e depois d'um tratamento de 3 a 8 semanas, e concluiu que: 1.° Doses fracas (4 a 8 grammas) tomadas uma hora antes da re­feição augmentant a secreção chlorhydrica. 2.° Doses fortes (10 a 16 grammas) durante a diges­tão, deprimem-n'a.

Mais tarde parece modificar a sua opinião, quando nos diz que ha sempre depressão, pelo menos posteriormente á cura.

Linossier e Lemoine na sua memoria demons­traram que a acção prolongada do bicarbonato de soda se traduzia, 48 horas depois da cessação d'um tratamento de 12 dias, por uma excitação manifesta da secreção.

As doses variavam 50 centigrammas a 1 gram-

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ma. Nas primeiras experiências de Gilbert nota­mos que 2 annos de administração de bicarbona­to de soda, produziram n'um cão de que se ser­viu uma excitação secretora.

Mais tarde, quando repetiu os seus estudos de collaboração com Modiano, diz-nos que, ten­do feito tomar 1 gramma de bicarbonato de soda meia hora antes do almoço, e durante 21 dias successivos, a uma doente hypopeptica, e tendo no fim d'esté tempo submettido o seu estômago a um novo exame, demonstrou uma ligeira acce-leração dos processos chimicos.

Modiano na sua these diz-nos também : «o uso reiterado do medicamento produz uma diminui­ção do estado hypopeptico, uma tendência para a pepsia normal».

Ao contrario Mathieu e Laboulais demonstra­ram que 2 grammas de bicarbonato de soda a cada refeição foram seguidas no fim de 8 a 15 dias d'uma diminuição da secreção chlorhydrica.

Eis pois diversas opiniões manifestamente con-tradictorias e que parecem todas apoiadas sobre experiências precisas ; todavia chega-se á conclu­são de que estas contradicções são mais apparen­tes' do que reaes, se se distinguirem duas phases bem distinctas na acção prolongada do bicarbo-

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nato de soda: uma phase de excitação e uma phase de depressão.

N'ura primeiro período os phenomenos d'ex-citaeão são muito apparentes, e a doença, se se trata d'hyperchlorhydria, é antes aggrava da do que melhorada pelo uso do bicarbonato de soda. Mas após um tempo mais ou menos longo do mesmo tratamento, o periodo de depressão ap-parece e é então somente que o doente tira pro­veito do medicamento.

Eis um exemplo bem frisante do que avança­mos:

Linossier aproveitou, para multiplicar os exa­mes do conteúdo estomacal, um individuo que tinha contraindo o habito de lavar o estômago e que o fazia sem nenhuma difíiculdade.

.Eis o resumo das suas analyses: uma hora depois das refeições achou no chymo :

Acido chlorhydrico livre vestígios. » » total 1,1.

Ha pois hypochlorhydria accentuada. Foram prescriptas 120 grammas d'aguas alca­

linas e a dosagem ' posterior a este tratamento deu:

Acido chlorhydrico livre » » total

0,60. 1,68.

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O cbymismo approxima-se pois do chymismo normal.

A dose d'agua alcalina foi em seguida elevada a 180 grammas antes de cada refeição e achou-se:

Acido chlorhydrico livre 1,51. » » total 2,56.

A excitação mantem-se. Repete-se o tratamento alcalino: 180 grammas

d'agua antes de cada refeição e a analyse dá:

Acido chlorhydrico livre 0,2 » » total 1,68

O doente suspende o tratamento em bom es­tado de saúde.

Fazemos no emtanto esta observação com as devidas reservas, pois que as analyses foram fei­tas depois da administração das aguas de Vichy, que não são absolutamente o mesmo que o bi­carbonato de soda.

Todavia este exemplo mostra-nos bem nitida­mente a successão dos dois phenomenos.

Apparece primeiro um período de excitação, em que o doente hypochlorhydrico se torna hy-perchlorhydrico ; depois vem o período de depres­são, em que a secreção chlorhydrica se torna nor­mal, como o prova a ultima experiência.

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De resto póde-.se muitas vezes observar na clinica estes dois períodos, quando se trata um hyperchlorbydrico pelo bicarbonato de soda.

Muitas vezes a dose que bastava no principio do tratamento para calmar as dores, torna-se in-sufficiente no fim d'alguns dias, a hyperchlorhy-dria accentuando-se momentaneamente, e não é senão depois d'uma medicação prolongada que se pôde diminuir ou mesmo supprimir o medica­mento.

Mas como explicar que o mesmo medicamen­to, excitando a secreção chlorhydrica, chegue depois d'um tempo mais ou menos longo do seu emprego a produzir uma depressão '?

Para a explicação d'esté facto paradoxal esta­mos reduzidos a hypotheses, e entre ellas ha uma muito engenhosa defendida por Linossier e Le-moine, subordinando a acção depressiva do bi-cai^bonato de soda á alcalinisação do sangue por este medicamento.

Pôde admittir-se que uma excitação moderada mas continua da mucosa produza uma superacti-vidade persistente, o que explicaria os benefícios das pequenas doses nos hypochlorhydricos.

Mas que esta excitação se torne violenta e muitas vezes repetida como no tratamento da hy-

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perchlorhydria, e chegar-se-ha ao esgotamento da mucosa.

Demais em therapeuthica encontramos bas­tantes exemplos de substancias, produzindo a principio uma acção excitadora e depois uma acção depressiva, quando foram empregadas du­rante um certo tempo e em doses fortes. A mor-phina, por exemplo, depois de ter provocado nas primeiras injecções uma excitação da intelligen-cia e dos sentidos, chega, quando as doses são repetidas e aogmentadas, a produzir uma de­pressão pelo menos sobre os sentidos.

Pôde admittir-se que a excitação é o resulta­do da acção immediata do bicarbonato de soda sobre às glândulas gástricas e a depressão o re­sultado da alcalinisação do sangue.

Esta hypothèse permitte-nos perfeitamente comprehender os efíeitos différentes do bicarbo­nato de soda.

Pequenas doses são com effeito insufficientes para influir no meio interior, e assim se manifes­ta somente a acção excitante local.

Pelo contrario com doses massiças e muitas vezes repetidas a mucosa esgota-se por excita­ções vivas e renovadas, a alcalinidez do meio in­terior accentua-se, a acção geral sedativa torna-se predominante e a secreção gástrica modifica-

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se, no sentido em que se modificam outras se­creções, taes como a urina e o suor, que sendo normalmente acidas, acabam por se tornar alca­linas sob a influencia prolongada do bicarbonato de soda.

A esta hypothèse apresentada por Linossier e Lemoine accrescenta Dujardin Beaumetz o se­guinte: a nyperchlorbydria é na immensa maio­ria dos casos o resultado d'uma irritação ou de uma congestão da mucosa gástrica.

As aguas alcalinas actuam como penso da mu­cosa inflammada, tendo uma composição que as approxima do soro sanguíneo e possuem, em con­tacto com a mucosa, propriedades calmantes e descongestivas, fazendo intervir talvez plienome-nos osmoticos.

Mas esta explicação na qual Dujardin Beaumetz faz intervir um novo factor,—o elemento cathar-ral,—não está em contradicção com a hypothèse de Linossier e Lemoine, podendo a acção anti-phlogistica, que elle attribue ao bicarbonato de soda, sommar-se ás suas outras propriedades.

SEGUNDA PARTE

Aoçâo sobre a motilidade

Além da sua acção sobre a secreção gástrica o bicarbonato de soda também possue uma cer­ta acção sobre a motilidade do estômago. Nos auctores antigos não achamos geralmente notas particulares sobre esta acção excito-motriz do bi­carbonato de soda.

Todavia Richet n'um seu doente provou que a injecção d'agua de Viehy teve uma influencia tão feliz para apressara digestão, que 45 minutos depois estava quasi acabada.

N'estes últimos tempos diversos experimen­tadores notaram esta influencia do bicarbonato de soda sobre a motilidade.

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Hayem, por exemplo, admit te que este alca­

lino tomado em jejum tem por effeito accelerar a digestão e apressar a evacuação estomacal.

Mas é a Mathieu que se deve o estudo mais consciencioso sobre esta questão.

Mathieu, com effeito, notou os felizes resulta­

dos obtidos com o bicarbonato de soda na atonia motriz gastro­intestinal, e apoiando­se nas expe­

riências de Rosbach, que mostraram a influencia excitante da agua quente sobre o systema muscu­

lar do estômago, aconselha em caso d'atonia agua alcalina quente em jejum e um certo tem­

po antes da refeição. Emfim aconselha que, quando devam fazer­se

lavagens do estômago, se pratiquem com agua al­

calina a 40 ou 42 graus se quizermos excitar a motilidade. ' '■ ■

Mas onde Mathieu nos faz vèr bem a influen­

cia excito­motriz do bicarbonato de soda, é nas experiências que fez de collaboração com Labou­

lais. Notou em dois indivíduos a differença da quantidade de chymo. extraindo em relação com a quantidade de bicarbonato de soda empregado.

Assim, no primeiro individuo a quem tinha dado 3 grammas de bicarbonato de soda extra­

hiu.52 c. c. de chymo, Ora a quantidade menor de chymo extrahido

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quando se não tinham empregado senão 50 cen-tigrammas do mesmo sal, dado meia hora antes da refeição, tinha sido 72 c. c.

Estes resultados parecem pois provar que hou­ve acceleração da digestão com uma maior quan­tidade de bicarbonato de soda; porque a extrac­ção do chymo foi feita no fim de 40 minutos.

De resto para bem demonstrar que esta di­minuição de chymo era devida a uma accelera-ção da digestão, depois de terem administrado 3 grammas de bicarbonato de soda, praticaram uma vez a extracção do conteúdo estomacal 30 minu­tos depois da refeição, e a quantidade de chymo extrahido era notavelmente maior.

Quanto ao segundo individuo de que se ser­viram nas suas experiências não podemos to-mal-o como exemplo para demonstrar a influen­cia excito-motriz dos alcalinos.

A quantidade de chymo extrahido foi, é cer­to, em proporção decrescente com a quantidade de sal administrado, mas n'este caso serviram-se de citrato de soda, que é um sal neutro, e que por consequência não devemos comparar ao bicarbonato de soda. »

Quando Mathieu repetiu as suas investigações de collaboração com Hallot demonstrou pelas suas experiências que a excitação produzida pelo

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bicarbonato de soda é mais nitidamente motriz que secretora.

Mas n'este caso fazem intervir um novo factor: a excitação mechanica produzida pela passagem repetida da sonda; e, assim como elles próprios o fazem notar, é difflcil poder separar o que deve attribuir-se á influencia mechanica da sonda, do que pertence á acção do bicarbonato de soda.

TERCEIRA PARTE

Acção analgésica

Quando as dores estomacaes se manifestam sobre a influencia d?uma secreção gástrica muito acida, é evidente que a administração d'um sal alcalino, saturando os ácidos do estômago, deve calmar a dor.

Também esta acção analgésica do bicarbonato de soda sobre o estômago, quando a dôr é sym­ptomatica d'uma perturbação da secreção, foi demonstrada desde que as perturbações da se­creção chlorhydropeptica, foram nitidamente dií-ferenciadas.

Certos clínicos, appoiando-se sobre este effeito calmante do bicarbonato de soda em caso d'hv-

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perchlorhydria, pensaram fazer do sal um meio de diagnostico d'esta affeceão, sem recorrerem ao estudo do chymísmo estomacal.

Mas esta idéa deve ser rejeitada, porque, se o bicarbonato de soda calma as dores aos hyper-chlorhydricos, calma-as também a outros doen­tes, aos hypochlorhydricos por exemplo. Linos-sier, coni effeito, referiu ha pouco á Sociedade das sciencias medicas de Lyon um certo nume­ro d'observaçoes que mostram que a acção anal­gésica do bicarbonato de soda não se produz unicamente em caso de hyperacidez gástrica.

Estas observações, entre as quaes se acham diversos casos de neoplasmas e outros casos, nos quaes a analyse do sueco gástrico demonstrou um chymismo, ora normal, ora hypochlorhydrico, tendem a provar que o bicarbonato de soda tem um effeito analgésico sobre a maior parte das cri­ses dolorosas, que apparecem d'uma maneira fixa no fim da digestão. Eis aqui o facto, tal como o provou a historia dos doentes, cujo chymismo estomacal foi feito com cuidado, e nos quaes os effeitos do medicamento foram minuciosamente seguidos.

Vejamos agora como explical-o. Esta acção analgésica será devida á saturação

da fraca quantidade d'acido contido ainda no sueco

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gástrico, e capaz d'irritar uma mucosa doente? Será devida á evacuação d'alguns resíduos ali­

mentares, provocada pelo dispertar da contracti-lidade estomacal, sob a influencia do bicarbonato de soda?

Será o acido carbónico, desenvolvido d'esté sal, que determina uma acção analgésica sobre a mucosa gástrica?

Poder-se-ha ainda attribuir este effeito á saida d'uma certa quantidade de gazes estornacaes pelo cardia, determinada por uma grande distensão do estômago, sob a influencia do acido carbónico desenvolvido?

Eis as hypotheses que se podem invocar para a interpretação d'esté effeito calmante do bicar­bonato de soda sobre as dores do estômago.

Linossier pansa que estas différentes acções do bicarbonato de soda sobre o estômago podem combinar-se para produzirem uma acção analgé­sica sobre a mucosa, ou podem actuar separada­mente.

No fim da digestão, com effeito, as dores po­dem ser devidas quer a partículas alimentares que ficam no estômago e o irritam, quer á acidez do chymo, quer a uma grande quantidade de ga­zes ; por isso o bicarbonato de soda pôde produ­zir um effeito calmante, determinando ao mesmo

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tempo a evacuação das partículas alimentares, saturando os ácidos, anesthesiando a mucosa pelo acido carbónico desenvolvido e determi­nando a sahida de gazes estomacaes; ou então pôde actuar por uma única d'estas propriedades.

Todavia, sem procurar uma interpretação que poderia ser prematura, o que convém é reter o facto da acção analgésica demonstrada em bas­tantes experiências.

Mas esta acção analgésica do bicarbonato de soda não dura indefinidamente.

Muitas vezes para a obter, é-se obrigado a augmenter progressivamente as doses. Ás vezes, mesmo no fim d'uni certo tempo, o emprego de doses progressivamente crescentes não basta para supprima- as dores que desappareciam no principio do tratamento, sob a influencia de pe­quenas quantidades d'esté alcalino.

Mas n'isto o bicarbonato de soda não é infe­rior aos outros analgésicos, porque nós não te­mos em therapeutics nenhum calmante, cujos cffeitos possam durar indefinidamente.

CONCLUSÕES

Destes estudos dos différentes modos d'acçao de bicarbonato de soda sobre as funcções do es-

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tomago, nós não podemos deduzir regras preci­sas para a administração d'esté sal nas affeceões estomacaes.

Seria, com efïeito, um erro therapeutico sup-pòr que para prescrever com todo o conhecimento de causa um medicamento contra uma pertur­bação pathologica de qualquer órgão, basta co­nhecer a acção d'esse medicamento sobre o mes­mo órgão em particular, porque é preciso conhe­cer também a acção do medicamento sobre as outras funcções, sobre o organismo em geral.

Ora a acção geral do bicarbonato de soda, não foi estudada no nosso trabalho, por isso as nossas conclusões referem-se somente ao modo d'acçào do bicarbonato de soda sobre o estômago, a qual, segundo a analyse das experiências feitas, parece ser a seguinte:

I — O bicarbonato de soda nos seus effeitos immédiates é sempre um excitante da secreção gástrica, qualquer que seja a dose empregada e o momento em que se administrou.

II — O primeiro efïeito da excitação é a satu­ração da alcalinidez se a dose é moderada, a ex­citação produz-se depois d'esta saturação e pro­voca um augmenta d'acido chlorhydrico no chymo.

III — A proporção maxima d'acido chlorhy­drico no sueco gástrico é obtida'tanto mais tar-

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diamente, quanto mais fórte é a dose do bicar­bonato de soda.

IV—Em dose massioa, a excitação pôde não se produzir senão pela saturação da alcalinidez, voltando o chymo á sua proporção normal d'aci-do chlorhydrico, proporção que pôde mesmo não ser attingida quando os alimentos deixam o es­tômago se a refeição não foi bastante copiosa.

V—A acção prolongada do bicarbonato de soda sobre.o secreção gástrica traduz-se a principio pela excitação e depois pela depressão.

A excitação é devida á acção immediata do bi­carbonato de soda sobre as glândulas gástricas. A depressão parece, pelo contrario, dever attri-buir-se á acção geral do medicamento, ou, d'uma maneira mais precisa, á alcalinisação do sangue.

VI—A administração do bicarbonaLo de soda dado sobretudo em bebidas quentes e algum tem­po antes da refeição, parece determinar uma evacuação mais rápida do conteúdo estomacal.

VII — Quando" as dores gástricas apparecem d'uma maneira fixa no fim do período digestivo, obtem-se com o bicarbonato de soda um effeito analgésico bastante accentuado.

PROPOSIÇÕES

Anatomia.—Os lymphaticos da glândula mamtnaria são todos extra-lobulares.

Physiologia.—0 sueco gástrico tem um acido livre.

Ana tomia pathologica.—É no sangue que se dão principalmente as alterações orgânicas produzidas pelas doenças de malaria.

Materia medica.—O bicarbonato de soda favorece as funeções digestivas.

Pathologia geral.— Gondemno a theoria de Paul Bert para explicar o mal das Montanhas.

* Pathologia externa.—Admitto a origem parasita­

ria do furúnculo.

Pathologia interna.—A temperatura éosymptoma de mais valor na febre typhoide.

Operações.—Na laqueação da illiaca externa prefi­ro o processo de Roux a qualquer outro.

Partos.—A syphilis influe poderosamente no aborto.

Hygiene.—A vaccinação braço a braço não deve pra-ticar-se. .

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fREEIDENTE. PlRECTOF^.