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"Sociedade da Informação": reestruturação capitalista e esfera pública global César Ricardo Siqueira Bolaño Universidade Federal de Sergipe Se é verdade que o capitalismo passa hoje por um processo de globalização inelutável, o Estado, enquanto garantidor das condições gerais necessárias ao processo de desenvol- vimento que o capital individual não tem a capacidade de suprir, deveria estar pas- sando por uma reestruturação simétrica. O Estado produz as condições externas neces- sárias para a acumulação e, para que ele cumpra a contento essa função, deve garan- tir também a sua própria legitimidade, atra- vés de uma política social que atenda, de al- guma forma, as necessidades das mais am- plas camadas da população. O interessante da situação atual é que, na medida em que o Estado nacional se debilita frente ao capi- tal globalizado, e dado que isso se traduz em um alto grau de incapacidade de fazer frente à crise e inclusive de administrá-la, coloca-se a questão da possibilidade da construção de algo parecido a um Estado global, capaz de garantir efetivamente a estabilidade do sis- tema frente às tendências destrutivas da con- corrência entre os capitais individuais e en- tre os Estados nacionais capitalistas (Bolaño, 1997a). É claro que não se pode pensar em um Es- tado desse tipo como um Estado territorial que funde sua soberania por oposição à sobe- rania de outros Estados territoriais rivais. In- dubitavelmente, as transformações no nível da base territorial dos Estados nacionais de- vem ser consideradas em detalhe na análise do processo de globalização, tanto no que se refere aos processos de fragmentação, como nos de constituição de blocos de países. Mas tudo isso permanece nos marcos dos pro- cessos mais ou menos clássicos de reestru- turação do espaço, não apontando necessa- riamente para a constituição de um Estado global, ainda que a reestruturação das rela- ções de hegemonia que está por trás da cri- ação ou destruição de conglomerados políti- cos internacionais seja um dos elementos da constituição do bloco histórico hegemônico do Estado global em construção. As carac- terísticas da estrutura social e econômica do Estado nacional de origem são também de- terminantes do poder de negociação de uma classe ou fragmento de classe específicos no interior do bloco hegemônico. Seja como for, essa negociação deve le- var a compromissos institucionalizados e à constituição de instâncias multinacionais de regulação que vão formar a espinha dorsal burocrática do Estado global: ONU, Banco Mundial, OCDE, OTAN, Parlamento Euro- peu, Conselho de Ministros, OMC, uma in-

Sociedade da Informação: reestruturação capitalista e ... · "Sociedade da Informação": ... para usar as categorias de Habermas, que discutirei em seguida. Mas podemos ampliar

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"Sociedade da Informação":reestruturação capitalista e esfera pública global

César Ricardo Siqueira BolañoUniversidade Federal de Sergipe

Se é verdade que o capitalismo passa hojepor um processo de globalização inelutável,o Estado, enquanto garantidor das condiçõesgerais necessárias ao processo de desenvol-vimento que o capital individual não tema capacidade de suprir, deveria estar pas-sando por uma reestruturação simétrica. OEstado produz as condições externas neces-sárias para a acumulação e, para que elecumpra a contento essa função, deve garan-tir também a sua própria legitimidade, atra-vés de uma política social que atenda, de al-guma forma, as necessidades das mais am-plas camadas da população. O interessanteda situação atual é que, na medida em queo Estado nacional se debilita frente ao capi-tal globalizado, e dado que isso se traduz emum alto grau de incapacidade de fazer frenteà crise e inclusive de administrá-la, coloca-sea questão da possibilidade da construção dealgo parecido a um Estado global, capaz degarantir efetivamente a estabilidade do sis-tema frente às tendências destrutivas da con-corrência entre os capitais individuais e en-tre os Estados nacionais capitalistas (Bolaño,1997a).

É claro que não se pode pensar em um Es-tado desse tipo como um Estado territorialque funde sua soberania por oposição à sobe-

rania de outros Estados territoriais rivais. In-dubitavelmente, as transformações no nívelda base territorial dos Estados nacionais de-vem ser consideradas em detalhe na análisedo processo de globalização, tanto no que serefere aos processos de fragmentação, comonos de constituição de blocos de países. Mastudo isso permanece nos marcos dos pro-cessos mais ou menos clássicos de reestru-turação do espaço, não apontando necessa-riamente para a constituição de um Estadoglobal, ainda que a reestruturação das rela-ções de hegemonia que está por trás da cri-ação ou destruição de conglomerados políti-cos internacionais seja um dos elementos daconstituição do bloco histórico hegemônicodo Estado global em construção. As carac-terísticas da estrutura social e econômica doEstado nacional de origem são também de-terminantes do poder de negociação de umaclasse ou fragmento de classe específicos nointerior do bloco hegemônico.

Seja como for, essa negociação deve le-var a compromissos institucionalizados e àconstituição de instâncias multinacionais deregulação que vão formar a espinha dorsalburocrática do Estado global: ONU, BancoMundial, OCDE, OTAN, Parlamento Euro-peu, Conselho de Ministros, OMC, uma in-

2 César Ricardo Siqueira Bolaño

finidade de instituições mais ou menos po-derosas, mais ou menos abrangentes, fazemparte dessa extremamente complexa estru-tura do poder global na qual a grande corpo-ração capitalista é o elemento predominante.Assim, de um ponto de vista sociológico, po-demos verificar o surgimento não apenas desuperburguesias nacionais globalizadas, comuma interpenetração patrimonial crescente ealianças estratégicas extremamente comple-xas, mas também de uma classe média glo-bal, constituída, antes de mais nada, pelosaltos funcionários dessas corporações e pe-los altos burocratas das instituições que com-põem o Estado global em gestação, incorpo-rando ainda uma infinidade de setores em-presariais, políticos, mafiosos e intelectuais,hierarquicamente inferiores.

Na verdade, segmentos cada vez mais am-plos das chamadas classes médias passam aagir e raciocinar globalmente e a evoluçãodos setores de transporte e turismo estão aípara provar isso. No seio da própria classetrabalhadora, o movimento se faz sentir, es-pecialmente no que se refere aos seus seg-mentos mais instruídos ou mais organizados(para não entrarmos aqui na questão crucialdos movimentos migratórios internacionais).É claro que esse processo se dá justamentenum momento em que essa classe sofreu amaior derrota de toda a sua história, de modoque avança, paralelamente, a exclusão sociale a miséria. Já tive a oportunidade de apon-tar, não obstante (Bolaño, 1995), que a mu-dança estrutural em curso altera profunda-mente o perfil do operariado, incorporandoamplas camadas de trabalho intelectual e ex-plicitando a necessidade de uma análise re-novada da estrutura de classes que prevale-cerá no século XXI e da retomada, em novas

bases, de algumas das velhas questões que omarxismo vulgar não conseguiu responder.

O surgimento da Indústria Cultural, na vi-rada do século XIX, está ligada ao que Har-bemas (1961) chama de "mudança estrutu-ral da esfera pública", ou seja, a esterilizaçãodas suas características críticas e da sua ca-pacidade de ação política em favor de formasmanipulatórias (publicitárias e propagandís-ticas) de comunicação, como reação ao cará-ter potencialmente explosivo que vinha ad-quirindo a partir do momento da transforma-ção do Estado liberal em Estado democráticode massa, eliminando as restrições que o pri-meiro impunha à participação das camadasnão proprietárias e não instruídas. Do meuponto de vista, o que vivemos hoje é umanova reestruturação da esfera pública, queretoma o caráter excludente e crítico da es-fera pública burguesa clássica, mantendo eaprofundando, para a maioria da populaçãomundial, o paradigma da cultura de massa edo Estado nacional.

A internet é o exemplo mais importantedessa tendência. Brindada inicialmentecomo uma estrutura revolucionária, não hie-rarquizada, de comunicação entre indivíduoslivres e iguais, mostra-se claramente hojecomo um espaço formado por uma teia com-plexa e extremamente assimétrica de ato-res, onde a capacidade de comunicação e deacesso à informação relevante depende jus-tamente daqueles elementos que no passadogarantiam o acesso à esfera pública liberal:poder econômico (propriedade), político econhecimento, nessa ordem de importância(Bolaño, 1997b). A mudança profunda porque passam hoje todos os sistemas de co-municação aponta não para um avanço dademocracia, mas para a constituição de ummundo em que o poder, cada vez mais con-

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centrado, torna viável uma "ação comuni-cativa"crítica para determinadas parcelas dapopulação mundial, ficando a imensa mai-oria excluída e iludida pela possibilidadede uma participação periódica em processoseleitorais cada vez mais inócuos, inclusiveno que se refere à política interna, já queo poder de decisão, mesmo nessa matéria,encontra-se em outra parte.

Do ponto de vista teórico, procurarei di-alogar com o referencial habermassiano daTeoria de Ação Comunicativa, propondocomo alternativa uma perspectiva, em faseainda inicial de formação1, mas que en-contra respaldo na corrente crítica da Eco-nomia Política da Comunicação, no interiorda qual destacam-se os trabalhos de Gar-nham, Mosco, Miège, entre outros. Essaperspectiva teórica tem sido muitas vezesapresentada como oposta àquela dos estudosculturais, apoiados muitas vezes em autoreslatino-americanos, como Canclini e Barbero,numa perspectiva de cunho basicamente an-tropológico. No segundo caso, é central otema da mediação, enquanto que, no pri-meiro, o conceito básico é o de trabalho (cul-tural, intelectual, conceitual, artístico).

Minha própria contribuição (se é que sepode falar assim) à economia política da co-municação vai no sentido de destacar o ca-ráter mediador do trabalho intelectual, o queremete, evidentemente, para a possibilidadede uma articulação entre os dois enfoquescitados, crucial, a meu ver, para o desen-volvimento de uma perspectiva marxiana ri-gorosa de análise dos fenômenos culturais,sob o capitalismo. O interesse do próprio

1Cujo resultado mais elaborado encontra-se na úl-tima versão (Bolaño, 1997 c) da tese de doutoramentoapresentada em 1993 ao Instituto de Economia daUniversidade Estadual de Campinas.

Marx pela antropologia e a importância dasua contribuição para essa ciência (Krader,1974, 1983), freqüentemente subestimados,deveriam ser um indicador da relevância deuma aproximação entre economia política eestudos culturais.

Sem entrar diretamente nessa discussão,procurei, na prática, apontar uma possibili-dade nesse sentido, ao estudar o tema espe-cífico da Indústria Cultural (Bolaño, 1997 c),tratando de deixar claro que é possível to-mar as diferentes teorias da comunicação eo conjunto dos enfoques da chamada pós-modernidade como teorias "burguesas"que,presas ao mundo da circulação, onde vigorao fetiche da mercadoria e do dinheiro, nãochegam a desvendar as leis gerais, a uni-dade essencial que está por trás do caos apa-rente. Realizar a crítica dessas teorias passapor compreender o sentido metodológico dacrítica da economia política e procurar, nonosso caso específico, a articulação íntimaque existe entre o trabalho cultural, no sen-tido que lhe dá a economia política da comu-nicação, e a ação de mediação realizada pelaIndústria Cultural entre as instâncias sistêmi-cas (capital e Estado)2 e o mundo da vida,para usar as categorias de Habermas, quediscutirei em seguida.

Mas podemos ampliar essa discussão paraoutro campo, o da educação, por exemplo,como faz Neide Sobral Silva (1996), o queenvolve uma dificuldade importante devidaao fato de que, enquanto a Indústria Cul-tural funciona fundamentalmente segundo

2A atual aproximação entre essas duas lógicas,permitida pela mudança estrutural que o conjunto dosistema capitalista vem sofrendo em nível global, epelo predomínio da ideologia neoliberal nesse pro-cesso, é outro elemento complicador que precisa serconsiderado.

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uma lógica de consumo, a escola está maispróxima da questão do controle social, demodo que a contradição capital-Estado ad-quire contornos bastante diferenciados numcaso e no outro. O sistema educacional emseu conjunto é um amplo e extremamente hi-erarquizado espaço de mediação, que incluidesde os professores primários até o Minis-tro da Educação e os burocratas do Minis-tério, passando pelos professores universitá-rios e pelos técnicos das secretarias de edu-cação. Espaço construído historicamente,serve fundamentalmente à reprodução ideo-lógica do sistema, mas articula também ele-mentos de resistência.

Nesse contexto, podemos entender a ques-tão do material didático (do livro ao com-putador), por exemplo, no interior do pro-cesso de permanente reafirmação das assi-metrias e hierarquias que conformam o sis-tema como uma estrutura complexa de po-der, de hegemonia e de resistência. Da cri-ação à utilização final, o material didáticopercorre um longo caminho em que a hie-rarquização se revela, revelando-se tambémos graus de liberdade de cada nível e decada elemento específico. Isso mostra, poroutro lado, que a função do material didá-tico e das tecnologias educacionais não ésimplesmente apoiar o processo de ensino-aprendizagem, mas fundamentalmente tam-bém enquadrar o trabalho do conjunto dosparticipantes do processo em seus diferentesníveis, ativando toda uma complexa cadeiade micro-poderes que leva a que a domina-ção se exerça não através de um programa ouum objeto particular, mas no fluxo contínuode programas e objetos ao longo das linhashierárquicas cuja ativação garante as condi-ções de reprodução da totalidade do sistemaeducacional e de efetivação da sua função de

dominação, do seu papel no conjunto da re-produção social.

O livro, como o currículo, a TV ou o com-putador, como os diferentes programas es-peciais gestados nas instâncias superiores dosistema, são elementos estruturantes funda-mentais de um espaço hierarquizado de me-diação cuja compreensão em todas as suasdimensões não pode prescindir da contribui-ção de autores como Bourdieu, inclusive oseu conceito de "campo", e da apropriaçãomarxista, à la Poulantzas, por exemplo, deFoucault. Nesta linha de argumentação, po-demos discutir a questão da introdução dasnovas tecnologias comunicacionais no pro-cesso educativo, demonstrando, em primeirolugar, o seu caráter marcadamente conserva-dor, o que é fundamental para refutar o falsootimismo com que esses desenvolvimentosvêm sendo recebidos, não só por defenso-res do neoliberalismo, como seria de se es-perar, mas também, de forma não totalmentesurpreendente, por autores que se declaramcríticos. Mas não podemos por isso deixarde notar as potencialidades liberadoras queas novas tecnologias trazem e que dependemtambém dos graus de liberdade que o tra-balho de mediação dos educadores envolve,abrindo-lhes certas possibilidades de ação ede articulação com os movimentos sociais eas camadas populares.

A discussão sobre a mediação nos permi-tirá ultrapassar tanto o determinismo quantoo voluntarismo que constituem os pólos detensão entre os "dois marxismos"de que falaGouldner (1980)3. Apenas para ilustrar o

3Segundo Gouldner, a tensão entre voluntarismoe determinismo não constitui uma situação especialapremiante do marxismo. De fato, só é a expressãodentro deste de uma situação mais geral própria da te-oria social, da sociologia acadêmica, não menos do

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ponto, podemos citar a conhecidíssima crí-tica de Thompson (1978) a Althusser, ondeao autor inglês procura devolver à histó-ria a liberdade que lhe havia sido negadapelo estruturalismo althusseriano, onde a vi-são dos sujeitos como "suportes de estrutu-ras"parecia expulsar da análise toda a "agên-cia"humana. Nesse sentido, Thompson en-tende como "a característica mais profundada dialética marxista",

a história como processo,como acontecer inacabado eindeterminado - mas não por issodestituído de lógica racional oude pressões determinantes - nosquais as categorias são definidasem contextos próprios mas sofremcontinuamente uma redefiniçãohistórica, e cuja estrutura não épré-fornecida, mas protéica, mu-dando constantemente de forma e

que do marxismo."(Gouldner, 1980, p. 49). O autorcita em seguida a seguinte passagem de Peter Berger eStanley Pullberg: "as teorias sociológicas podem seragrupadas em dois polos. O primeiro nos apresentauma concepção da sociedade como uma rede de sig-nificados humanos e encarnações de atividades huma-nas. O segundo ... nos apresentou uma sociedade con-cebida como uma facticidade coisificada, que vigiaseus membros individuais com controles coercitivose os molda em seus processos socializadores ... a pri-meira concepção apresenta o homem como ser sociale a sociedade como sendo feita por ele, enquanto quea segunda coloca a sociedade como uma entidade queestá sobre e contra o homem, e mostrou a este comosendo feito por ela"(idem). Na seqüência, Gouldneraponta que essa tensão está presente não apenas nateoria social, mas também na filosofia moderna (ondecita a oposição entre existencialismo e estruturalismo)e na teologia cristã, remetendo o dilema para a Gré-cia antiga, para concluir que "a tensão entre volunta-rismo e determinismo faz parte da estrutura profundado pensamento ocidental. O marxismo não inventouessa tensão nem a resolveu"(idem, p. 51).

articulação (Thompson, 1978, p.97).

Esse movimento de mão dupla é chamadode "diálogo"ou "dialética"entre a história e ateoria (cf. Thompson, 1978, p. 54) que, parao autor, só pode ser formulada nesse nívelde abstração, reduzindo a lógica imanente aoque o autor chama de "lógica de processo"4.O mérito do trabalho de Thompson, está jus-tamente na explicitação de noções tão impor-tantes como as de agência ou de experiên-cia 5 que, não sendo assimiláveis num nível

4"O conceito de história como processo suscitaimediatamente as questões da inteligibilidade e in-tenção. Cada evento histórico é único. Mas muitosacontecimentos, amplamente separados no tempo eespaço, revelam, quando se estabelece relação entreeles, regularidades de processo .... O materialismohistórico, desde a época de Vico, vem buscando umaexpressão que denote as uniformidades de costumes,etc., as regularidades de formações sociais e as análi-ses não como necessidades sujeitas a leis, nem comocoincidências fortuitas, mas como pressões modela-doras e diretivas, articulações indicativas das práti-cas humanas. Já sugeri que a discussão avançará seabandonarmos a noção de ’direito’ e a substituirmospela de "lógica de processo’... A ’resultante’ histó-rica não pode ser proveitosamente concebida comoo produto involuntários da soma de uma infinidadede volições individuais mutuamente contraditórias ...Pois essas ’vontades individuais’, por mais ’particu-lares’ que sejam as suas ’condições de vida’, foramcondicionadas em termos de classes; e se a resultantehistórica é então vista como a conseqüência de umacolisão de interesses e forças de classe contraditó-rios, podemos ver então como a agência humana dáorigem a um resultado involuntário - ’o movimentoeconômico afirma-se finalmente como necessário’ - ecomo podemos dizer, ao mesmo tempo, que ’fazemosa nossa própria história’, e que a história se faz a simesma’,"(Thompson, 1974, p. 978 a 101).

5O conceito de experiência é crucial: ele "faz amediação entre ser social e consciência social, nãocomo uma simples dialética, ou ponto de interação,mas como a experiência de pressões, limites, e pos-

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muito elevado de abstração, como o de Marxno Capital, são não obstante imprescindíveispara a análise histórica e para a construçãoda necessária ponte entre o abstrato e o con-creto. O autor insiste, de um lado, na ques-tão da liberdade na história e, de outro, nanecessidade de se entender a lógica de pro-cesso como algo distinto à lógica do capitalexposta por Marx. É certo que, se esta últimase impõe historicamente, isto não se dá se-não através de um processo de lutas, de avan-ços, de recuos, de resistências, que chega atémesmo a delimitar as possibilidades efetivase o tipo de avanço capitalista num determi-nado momento histórico. Toda a dificuldadereside na articulação entre essas duas lógi-cas, articulação cuja necessidade Thompson,na verdade, nega6.

Assim, por exemplo,

se a concorrência intercapita-lista ’põe em prática’ as leis in-ternas do capital, é forçoso reco-nhecer ’a dominância da concor-

sibilidades do ser social sobre a consciência social ...visto que o povo nunca se constituiu de fato em clas-ses, os meios pelos quais um modo de produção de-termina a formação de classes (em qualquer grau) nãopode ser facilmente entendido sem referência a ’algocomo uma experiência comum ...’ A determinação daconsciência social pelo ser social transparece no cursoda experiência e concomitantemente a inclinação, oupropensão, a agir como classe"(Kaye, 1984, p. 206 eseg.).

6Na sua crítica ao cartesianismo althusseriano, oautor caba negando o próprio método de Marx n’OCapital, visto como uma "gigantesca incoerência",produto de "miscigenação teórica"entre o materia-lismo histórico e a economia política, de modo queo que Marx teria feito no Capital e sobretudo nosGrundrisse seria uma anti-economia política, marcadapor "formulações ’idealistas (até mesmo autorealiza-doras, teleológicas) derivadas do procedimento abs-tracionista"(Thompson, 1978, p. 77).

rência entre capitais sobre as re-lações entre capital e trabalho nomovimento do modo capitalista deprodução’. Ou seja, se as leis in-ternas do capital somente se rea-lizam através do permanente con-fronto entre os distintos capitais,a análise desta realização - queconforma o ’movimento real’ domodo de produção - deve ser reme-tida em primeira instância à con-corrência intercapitalista, e não àsrelações entre capital e trabalho(Mazzucchelli, 1985, p. 53).

Mas, se estas observações estão corre-tas, não são menos verdadeiras, por exem-plo, as dificuldades apontadas por Hobsbawn(1984) para a introdução do taylorismo naInglaterra, em função da resistência impostapelos operários artífices que haviam cons-truído, ao longo do século XIX, uma cul-tura de classe e uma organização sindical quetornavam bastante efetiva aquela resistência.Isso explica em boa medida, segundo o au-tor, as peculiaridades do capitalismo inglês.7

Toda dificuldade reside na articulação en-tre a lógica interna do capital que, como re-lação social, já subsume o trabalho comoseu elemento dominado (o que evidencia o

7O próprio Mazzucchelli aponta o problema comcorreção: "a análise deve, de início, se centrar na in-trodução da maquinaria a partir da ’relação do capitalcom o trabalho vivo’, e só a partir dela. Mas, concre-tamente, a introdução da maquinaria é determinadapela concorrência intercapitalista, em particular pela’lei de redução dos custos de produção’ com vistas àobtenção do lucro extraordinário, e não - diretamente- pela relação do capital com o trabalho vivo. Trata-se, evidentemente, de dois planos teóricos distintosque devem, entretanto, manter uma relação de uni-dade."(idem, p. 47).

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acerto da afirmação de Mazzucchelli), e o dalógica do processo histórico, onde não ape-nas as determinações provenientes da rela-ção de capital, mas também as do Estado etodas aquelas decorrentes do fato de estarsendo considerado não um modo de produ-ção puro, mas uma formação social especí-fica, devem ser levadas em consideração8 .

Habermas pretende resolver a tensão ex-plicitada por Gouldner através da articula-ção entre "sistema"e "mundo da vida". Aproposta da Teoria da Ação Comunicativa énada menos que constituir uma "nova teoriada sociedade", incorporando as mais varia-das contribuições dos clássicos da sociolo-gia e da psicologia, de Marx a Durkheim,passando por Weber, Parsons, Mead e Pia-get, para ficarmos apenas nos mais importan-tes. Não tenho a pretensão de discutir aqui oconjunto dessa contribuição. Ao contrário,limitar-me-ei a uma análise da TAC centradono seu eixo "marxista", que parte de Lukácse passa pelos clássicos da teoria crítica9.

8Apenas para explicitar um único complicador, seno nível da análise das funções, o elemento determi-nante da dinâmica, do ponto de vista da relação ma-terial típica do capitalismo, é, como explicitou Maz-zucchelli, a concorrência capitalista, uma vez que, narelação capital-trabalho, o segundo polo é subsumidopelo primeiro, o mesmo não ocorre quando considera-mos a forma Estado das relações sociais capitalistas.Neste caso, é antes de mais nada a luta de classes queimprime a dinâmica dos sistema. Essa complexidadeinerente à análise do processo histórico prova, por ou-tro lado, a necessidade da ampliação do referencial domaterialismo histórico para além da consideração darelação material específica do capitalismo. Sobre arelação forma/função e a teoria marxista do Estado,inclusive a teoria da derivação, vide os dois capítu-los introdutórios (às partes I e II respectivamente) deBolaño (1993), eliminados da versão de 1997.

9Para a discussão da proposta teórica de Haber-mas no seu trabalho de 1981, vide Bernstein (1988),

A crítica de Habermas a Luckàcs é, na ver-dade, o ponto de partida de sua análise darecepção de Weber na tradição marxista (ede sua leitura weberiana do marxismo), quedesemboca na discussão que o autor faz dacontribuição de Adorno e Horkheimer. Oautor lembra que o processo de racionaliza-ção segundo Weber e as teses associadas de"perda de sentido"e "perda de liberdade"sãotraduzidas por Luckàcs como um processode "coisificação"(Verdinglichung). Assim, aforma específica da objetividade no capita-lismo, que pode ser descoberta através doprotótipo que é a estrutura da relação mer-cantil, fixa a forma como os indivíduos "con-cebem categoricamente a natureza objetiva,suas relações interpessoais e sua própria na-tureza subjetiva", de modo que as relaçõessociais e as vivências pessoais são assimila-das a coisas, "a objetos que podemos perce-ber e manipular".

Luckàcs desenvolve seu conceito de coisi-ficação a partir da análise de Marx da formamercadoria, considerado, por outro lado, coi-sificação e racionalização como dois aspec-tos de um mesmo processo, com o que "podedesenvolver dois argumentos que se apóiamna análise de Weber e que, não obstante,se dirigem contra suas consequências": porum lado, o conceito de racionalidade for-mal é reinterpretado "no sentido de que aforma mercadoria assume um caráter univer-sal, convertendo-se assim na forma de objeti-vidade simpliciter da sociedade capitalista"e,por outro, o conceito de forma de objetivi-dade é reconduzido "ao contexto da teoriado conhecimento, de onde subrepticiamente

Thompson e Held (1982) e Habermas (1984). Parauma visão do conjunto da obra do autor, vide Mc-Carthy (1987).

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havia sido tomado, para levar a cabo umacrítica da coisificação da perspectiva filosó-fica da crítica de Hegel a Kant", com o ob-jetivo implícito de negar "a afirmação cen-tral de Weber de que a dissociação das es-feras culturais de valor ... a unidade da ra-zão que a metafísica havia suposto ... nãopode ser reconstruída nem sequer dialetica-mente"(Habermas, 1981, vol. I, p. 453 eseg.).

É nesse plano da crítica de Hegel a Kantque Luckàcs pretende "uma demonstraçãode tipo filosófico das barreiras imanentes àracionalização". É claro que a recepção deHegel por Luckàcs é feita pelo filtro da crí-tica de Marx, de modo que a reconciliaçãodos momentos dissociados da razão não sedá no campo da filosofia, mas no da ação.Mas Luckàcs comete, segundo Habermas, "oerro decisivo, que certamente lhe vem suge-rido por Marx, de voltar a absorver na te-oria a conversão da filosofia em ’prática’ ede representá-la como realização revolucio-nária da filosofia", redundando numa "voltaao idealismo objetivo"(idem, p. 460 e seg.).Assim sendo, a versão luckàsiana da coisifi-cação seria "teoricamente questionável pelasua conexão afirmativa com o idealismo ob-jetivo de Hegel", além de, por outro lado,ter sido desmentida historicamente, seja pelofracasso da revolução soviética, que veioconfirmar o prognóstico de Weber de umaburocratização acelerada, ao mesmo tempoem que o terror estalinista confirmava "a crí-tica de Rosa de Luxemburgo à teoria da or-ganização de Lenin e aos fundamentos queesta tinha na filosofia objetivista da história",seja pela capacidade de integração demons-trada pelas sociedades capitalistas, capaci-dade essa presente tanto no fascismo comona cultura de massas.

A crítica da razão instrumental de Adornoe Horkheimer se propõe justamente, segundoo autor, a superar essa limitação de Luckàcs,fazendo a crítica da coisificação "sem assu-mir as consequências de uma filosofia obje-tivista da história"(idem, p. 465 e seg.). Suasolução parte de uma generalização da cate-goria de coisificação, cujas raízes históricasvão além da constituição da relação mercan-til, para ancorar-se "nos próprios fundamen-tos antropológicos da história da espécie, naforma da existência de uma espécie que temque se reproduzir por meio de trabalho". As-sim, a razão instrumental é concebida em ter-mos de relações sujeito-objeto. Mas o domí-nio sobre a natureza inclui o domínio sobreo homem, de modo que a razão instrumen-tal transforma a "dominação da natureza in-terna e externa"em "fim absoluto da vida",tornando-se "motor de uma auto afirmaçãoselvagem"(idem, p. 482 e seg.). Mas,a razão instrumental é uma razão ’subjetiva’também no sentido de que expressa as re-lações entre sujeito e objeto da perspectivado sujeito cognoscente e agente, mas nãoda perspectiva do objeto percebido e mani-pulado. Daí que não ofereça nenhum meiode explicar o que significa a instrumentali-zação das relações sociais e intra-psíquicas,vista da perspectiva da vida violentada e de-formada ... A crítica da razão instrumental,ao permanecer prisioneira das condições dafilosofia do sujeito ... carece de uma concei-tuação suficientemente dúctil para referir-seà integridade daquilo que diz destruído pelarazão instrumental"(idem, p. 496 e seg.).

É assim que, segundo Habermas, a teo-ria crítica se coloca ante o paradoxo de, porum lado, prosseguir a grande tradição filo-sófica e, por outro, decretar o seu fim. Aconseqüência disso em Adorno é a "renún-

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cia às pretensões próprias da teoria: dialé-tica negativa e teoria estética não podem fa-zer outra coisa senão ’remeter-se impoten-tes uma à outra’". A conclusão de Haber-mas é de que o fracasso do programa da pri-meira teoria crítica se deve ao esgotamentodo paradigma da filosofia da consciência, cu-jos limites Adorno e Horkheimer transbor-dam. O objetivo explícito do autor é reto-mar a crítica da coisificação, abandonandoesse paradigma e substituindo-o por "umateoria da comunicação [que] permite retor-nar a uma empresa que no seu momento fi-cou interrompida com a ’crítica da razão ins-trumental’; essa mudança de paradigma per-mite uma reposição das tarefas da teoria crí-tica da sociedade"(idem, p. 493).

Em Adorno e Horkheimer, a integridadeé dada pela faculdade mimética que, na me-dida em que "apela espera à conceituação dasrelações sujeito-objeto definidas em termoscognitivo-instrumentais", deve ser conside-rada "como genuinamente contrária à razão,como impulso". Segundo Habermas, o nú-cleo racional dessas operações miméticas sópode ser esclarecido abandonando-se o para-digma da filosofia da consciência em favordo paradigma da "filosofia da linguagem, doentendimento intersubjetivo ou comunica-ção", de modo a inserir o aspecto cognitivo-instrumental "no conceito mais amplo de ra-cionalidade comunicativa"(idem, p. 497). Aseguinte assertiva resume o ponto de partidade Habermas:

se partimos de que a espéciehumana se mantém através dasatividades socialmente coordena-das de seus membros e de que estacoordenação tem que se estabele-cer por meio da comunicação ten-

dente a um acordo, então a repro-dução da espécie exige também ocumprimento das condições de ra-cionalidade imanentes à ação co-municativa(Habermas, 1981, vol.I, p. 506).

A idéia é que o processo de racionali-dade em que as imagens religioso-metafísicado mundo vão perdendo sua credibilidade (eque culmina com a modernidade) faz comque o conceito de autoconservação adquirauma orientação a um tempo universalista eindividualista, tendo que satisfazer as condi-ções de racionalidade da ação comunicativa,passando a depender assim das "operaçõesinterpretativas dos sujeitos que coordenamsua ação através de pretensões de validadesuscetíveis de crítica". Assim, "a perspec-tiva utópica de reconciliação e de liberdadeestá baseada nas próprias condições de soci-alização comunicativa dos indivíduos, está jáinserida no mecanismo linguístico de repro-dução da espécie"(idem, p. 506 e seg.). Mas,por outro lado,

a integração dos membros dasociedade que se efetua através deprocessos de entendimento encon-tra seus limites não somente na vi-olência dos interesses em pugnamas também na pressão que exer-cem os imperativos da autocon-servação do sistema, os quais de-senvolvem objetivamente seu po-der penetrando através das orien-tações de ação dos atores afeta-dos. A problemática da coisifica-ção não resulta então tanto de umaracionalidade dirigida a fins abso-lutizada a serviço da autoconser-vação de uma razão instrumental

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convertida em selvagem, como deque a razão funcionalista da au-toconservação sistêmica, quandofica abandonada a seu próprio mo-vimento, passa por cima da pre-tensão de razão radicada na soci-abilidade comunicativa.(idem, p.507 e seg.).

Chegamos aqui ao núcleo da alternativaproposta por Habermas e ao aspecto mais in-teressante de sua contribuição. Como acabeide apontar, a solução do autor para o impassea que chegou a teoria crítica radica na subs-tituição do paradigma da filosofia da cons-ciência pelo da ação comunicativa, de modoa tornar possível uma articulação entre teo-ria da ação e teoria dos sistemas, articulaçãoque teria como objetivo fornecer uma alter-nativa ao conceito teleológico de ação da dia-lética idealista. Com isso seria possível fugirda armadilha hegeliana a que Luckàs estariapreso, sem cair no beco sem saída do pessi-mismo frankfurtiano.

Habermas pretende resolver o dilema atra-vés de uma articulação entre os dois concei-tos opostos e complementares de "sistema"ede "mundo da vida"(Lebenswelt), partindo,com Durkheim, das mudanças nas bases daintegração social assentada em práticas ritu-ais que constituem o núcleo da integraçãosocial nas sociedades primitivas. Habermasfala de um processo de racionalização social(de "linguistização do sacro") em que a for-mação do consenso depende cada vez maisda ação comunicativa que passa, assim, aincorporar as funções sociais originalmentecumpridas pela prática ritual e pelo simbo-lismo religioso. Nesse processo formam-seas estruturas de um mundo da vida liberto domito, definido como "um acervo de padrões

de interpretação transmitidos culturalmentee organizados linguisticamente"(Habermas,1981, vol. 2, p. 172), "um a priori social ins-crito na intersubjetividade do entendimentolingüístico"(idem, p. 186).

Mas a Lebenswelt não se resume ao "saberde fundo transmitido culturalmente", senãoque inclui também o "saber intuitivo", quepermite aos indivíduos fazer frente a situa-ções determinadas, e a "práticas socialmentearraigadas"(idem, p. 190). O mundo da vidaseria, assim, formado por três componentesestruturais, relacionados a três processos dereprodução. McCarthy resume o ponto comprecisão:

assim pois, aos diferentes com-ponentes estruturais do mundo davida (cultura, sociedade, perso-nalidade) correspondem processosde reprodução (reprodução cultu-ral, integração social, socializa-ção), aspectos que estão enraiza-dos nos componentes estruturaisdos atos de fala (proposicional,ilocucionário, expressivo). Essascorrespondências estruturais per-mitem à ação comunicativa cum-prir suas diferentes funções e ser-vir como meio adequado para areprodução simbólica do mundoda vida. Quando essas funçõessofrem interferências, produzem-se perturbações no processo dereprodução e os correspondentesfenômenos de crise: perda de sen-tido, perda de legitimação, con-fusão de orientações, alienação,psicopatologias, rupturas da tra-

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dição, perda de motivação(Mc-Carthy, 1987 , p. 466).10

Habermas pensa numa dinâmica evolu-tiva em que as sucessivas coações impos-tas pela necessidade de reprodução materialda Lebenswelt vão progressivamente consti-tuindo mecanismos automáticos de coorde-nação que não dependem de uma ação co-municativa voltada ao entendimento e quese impõem como imperativos sistêmicos quese, por um lado, facilitam a articulação derespostas aos problemas impostos pela re-produção material no mundo da vida pro-vocam, por outro, um desacoplamento pro-gressivo entre as formas de interação socialcaracterísticas deste e as formas de integra-ção sistêmica. Este processo tem, segundoo autor, dois momentos decisivos: primeiro,a passagem das sociedades primitivas às so-ciedades tradicionais estatalmente organiza-das, quando o poder de Estado "se diferenciadas imagens religiosas do mundo que legiti-mam a dominação"e, segundo, o surgimentodas sociedades modernas, onde "os subsis-temas economia e administração estatal, es-pecializados, ... se diferenciam daqueles deação que cumprem primariamente tarefas dereprodução cultural, de integração social ede socialização"(Habermas, 1981, vol. 2, p.238 e seg.).

No curso da evolução social há não ape-nas um progressivo distanciamento entre Le-benswelt e sistema e uma diferenciação es-trutural no interior da primeira, mas tambémuma diferenciação e especialização no inte-rior do sistema que se transforma, por suavez, em uma segunda natureza, ou seja, que

10Versão em castelhano que amplia a versão origi-nal em inglês de 1978, incluindo um epílogo sobre a"Teoria da Ação Comunicativa".

não apenas se desliga das estruturas sociaisdo mundo da vida, mas que chega a impor-sesobre este em função dos imperativos indis-pensáveis a uma coesão social cada vez me-nos ligada ao consenso normativo comuni-cativamente produzido. Há nesse ponto umainflexão da tendência que permitiu a supera-ção das imagens míticas do mundo fazendocom que o consenso de base religiosa fossesubstituído por processos linguísticos de for-mação do consenso.

Com o capitalismo, há um processo con-trário de deslinguistização, com a constru-ção de meios de controle independizados doprocesso de formação do consenso através daação comunicativa dirigida ao entendimento.Na verdade, não se trata propriamente deuma mudança de sentido, já que as duas ten-dências são constitutivas do processo de ra-cionalização que é a base da teoria haber-massiana da evolução social e de sua pro-posta de "reconstrução do materialismo his-tórico"(vide Habermas, 1976). O que ocorrecom o capitalismo, a primeira das socieda-des modernas, é que a progressiva separaçãoentre ação orientada ao êxito (base da inte-gração sistêmica) e a ação orientada ao en-tendimento (base da integração social) se es-tabelece em termos de uma colonização daLebenswelt pelo sistema, pela predominân-cia dos meios de comunicação deslinguisti-zados que substituem a necessidade do en-tendimento através da ação comunicativa poruma forma de interação que não exige dossujeitos mais do que um sim ou um não di-ante das pretensões de validade suscetíveisde crítica, como exemplificam os sistemaseleitorais das democracias modernas.

Mas a solução final de Habermas redundanum funcionalismo de tipo parsoniano, cujosimplismo pode ser devidamente medido

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pela leitura do quadro apresentado na página454 do segundo volume da "Teoria da AçãoComunicativa"(Habermas, 1981), onde todaa complexidade das relações entre sistema emundo da vida se vê transformada em doisfluxos circulares em que a esfera da vida pri-vada se liga ao sistema econômico por inter-mediação do dinheiro e a esfera da opiniãopública, ao sistema administrativo por meiodo poder. Na verdade, toda a sua engenhosasolução parte do reconhecimento de que umaoutra, teoricamente mais consistente, como ade Marx, já não seria possível.

A superioridade da análise marxiana, se-gundo Habermas, reside justamente na ca-pacidade de Marx em articular, através deum mesmo princípio, as duas formas de in-tegração (social e sistêmica) a que se referequando propõe a análise da relação entre sis-tema e mundo da vida:

Com a análise do duplo ca-ráter da mercadoria Marx obtémos pressupostos fundamentais dateoria do valor que lhe permitemdescrever o processo de desenvol-vimento das sociedades capitalis-tas, da perspectiva econômica doobservador, como um processo de(autovalorização ou) autorrealiza-ção do capital submetido a cri-ses cíclicas; e simultaneamente, daperspectiva histórica dos afetados(ou do participante virtual) comouma interação entre classes soci-ais prenhe de conflitos(Habermas,1981, vol. 2, p. 472).

Ou, mais adiante:

a força de trabalho se con-some, por um lado, em ações e em

plexos de cooperação e, por ou-tro, como redimento abstrato paraum processo de trabalho formal-mente organizado com vistas à re-alização do capital. Nesse sen-tido, a força de trabalho que osprodutores alienam constitui umacategoria em que os imperativosde integração sistêmica se encon-tram com os imperativos da in-tegração social: como ação per-tence ao mundo da vida dos produ-tores, como rendimento, ao plexofuncional da empresa capitalista edo sistema econômico em seu con-junto (idem, p. 473).

Assim, a inerência da força de trabalho aosujeito, que a diferencia de todas as outrasmercadorias, implica em que "no trabalhoassalariado estão indissoluvelmnete mescla-das as categorias de ’ação’ e ’ função, de in-tegração social e de integração sistêmica". Éa partir daí que, para o autor, Marx pode ex-plicar o processo de abstração real e de coi-sificação da força de trabalho:

a esta força de trabalho mo-netarizada, de que o empresáriose apropria como uma mercado-ria estranha ao contexto da vidado produtor, Marx chama de ’tra-balho abstrato’... A análise do du-plo caráter da mercadoria forçade trabalho esquadrinha passo apasso as operações neutralizado-ras pelas quais se constitui essetrabalho abstrato posto à disposi-ção de imperativos sistêmicos quese tornam indiferentes ao mundoda vida(Habermas, 1981, vol 2, p.474).

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Para o autor, a superioridade de Marx emrelação à economia política clássica se devejustamente a essa capacidade de encarar, aum tempo, a integração sistêmica e a inte-gração social. O erro dos economistas clás-sicos teria sido justamente o de não perce-ber a contradição entre esses dois princípios,procurando mostrar os imperativos sistêmi-cos como harmônicos com as "normas fun-damentais de uma comunidade que garante aliberdade e a justiça"11 .

11A contribuição de Marx pode então ser assimvista: "na forma de uma crítica da economia política,Marx destruiu essa ilusão prenhe de conseqüênciaspráticas. Mostrou que as leis da produção capitalistade mercadorias têm a função latente de manter umaestrutura de classes que desmente os ideais burgueses.O mundo da vida das camadas proprietárias do capi-talismo, que se autointerpreta no direito natural racio-nal e nos ideais da cultura burguesa em geral, se con-verte, em Marx, numa superestrutura sócio-cultural.Com a imagem da base e da superestrutura Marx dátambém expressão à exigência metodológica de tro-car a perspectiva interna do mundo da vida por umaperspectiva externa a partir da qual possam ser apre-endidos, a tergo, os imperativos sistêmicos da eco-nomia autonomizada que operam sobre o mundo davida burguês."(Habermas, 1981, p. 262). Assim, "acrítica marxista da sociedade burguesa parte das re-lações de produção porque aceita a racionalização domundo da vida, mas trata de explicar as deformaçõesdesse mundo da vida racionalizado a partir das con-dições de sua reprodução material."(ide, p. 210) Éinteressante esclarecer que Aberramos adota a metá-fora da base e da superestrutura, entendendo a basecomo "o complexo institucional que ancora no mundoda vida o mecanismo sistêmico que se faz em cadacaso com o primado evolutivo e com isso circunscreveas possibilidades de aumento da complexibilidade emuma determinada formação social"(Habermas, 1981,vol. 1, p. 237) e interpretando a metáfora., comoKautsky, "na perspectiva de uma teoria da evoluçãosocial"(cf. Habermas, 1976). Assim, nas sociedadesprimitivas, "é o sistema de parentesco que assume opapel de relações de produção. A sociedade consta debase e super-estrutura num só compartimento: nem

Na verdade, a solução de Marx tem umavantagem decisiva em relação àquela do pró-prio Habermas: a de chegar à referida arti-culação que este último pretende sem a ne-cessidade de lançar mão de idealizações dotipo "situação ideal de fala", "discurso racio-nal", "comunicação sistematicamente distor-cida", "formação de vontade isenta de co-ação"(que até o habermassiano McCarthy -1987, p. 434 e seg. - crítica), conceitos queservem basicamente para a construção de umtipo ideal que permita isolar as contradiçõesinerentes à própria Lebenswelt (contradiçõescuja existência, diga-se, o autor em princí-pio não nega), com o objetivo de construiraquele regime de dicotomias (entendimento-sucesso, sociedade crítica-Estado) cuja raizkantiana Sfez (1988), entre outros, denunciae que lhe permitirá reduzir todas as contradi-ções ao binômio durkheiminiano integraçãosocial-integração sistêmica. Com isso, o au-tor não faz senão trocar a utopia socialista deMarx 12 como veremos adiante, pela utopiade uma ação comunicativa isenta de coaçõesexternas13, o que lhe permite substituir, naanálise da coisificação, a teoria da consciên-

sequer a religião está tão diferenciada das institui-ções de parentesco que possa ser caracterizada comosuper-estrutura. Nas sociedades tradicionais as rela-ções de produção estão encarnadas na ordem política,enquanto que as imagens religiosas do mundo desem-penham funções ideológicas. Só com o capitalismo,onde o mercado cumpre também a função de estabili-zar relações de classe, adotam as relações de produçãoforma econômica"(idem, p. 238).

12que tem, de fato, um papel na articulação da suateoria (cf. Fausto, 1983, cap. 1 e apêndice 1), comoveremos mais adiante.

13que também cumpre um papel de articulação dateoria (cf. Mc. Carthy, 1987, p. 333 a 337)

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cia de Lukács pela problemática análise daspatologias da comunicação14.

Esse anti-clímax da Teoria da Ação Co-municativa está ligado intrinsecamente àidéia de que a felicidade da teoria marxiana,na articulação entre os elementos de deter-minação e de liberdade histórica, dever-se-iaà especificidade da mercadoria força de tra-balho, situada exatamente no ponto de inter-secção entre sistema e mundo da vida. Masessa especificidade do objeto de Marx não serepetiria em outros casos de modo que, po-demos deduzir, o método marxiano não seriageneralizável.

Ora, a Indústria Cultural, como tive aoportunidade de mostrar (Bolaño, 1997c)pode ser tomada justamente como elementode mediação entre mundo da vida e sistema,se observarmos que ela própria é capital quesubsume, no sentido marxiano, um tipo es-pecial de trabalho, o trabalho cultural, ne-cessário para a realização da sua função me-diadora entre as necessidades de reproduçãoideológica e de acumulação do capital, deum lado e, de outro, de reprodução simbólica

14Na verdade o autor abandona o referencial mar-xista (e o nível de abstração que ele envolve) em fa-vor de uma solução calcada em Parsons, acabandopor limitar-se a um modelo analítico funcionalista ex-tremamente simplificador, incorporando inclusive, noquadro da p. 454 do segundo volume da TAC (queo autor utiliza para discutir, na seqüência das críticasque faz a Marx - p. 479 e seg. -, a problemática dapacificação do conflito de classes no capitalismo tar-dio), o modelo de fluxo circular dos economistas ne-oclássicos, cujas limitações são sobejamente conhe-cidas. Mesmo que, a partir daí, o autor desenvolvauma série de considerações das mais sensatas sobre oWelfare State, em nenhum momento apresenta qual-quer evidência da superioridade do seu esquema ana-lítico em relação à teoria marxista e, mais, em nenhummomento trata de problemas que já não tenham sidoabordados pelos teóricos marxistas do Estado.

da própria Lebenswelt, de modo que o pro-cesso de "colonização"envolve negociação,dominação, dependência, hegemonia. Assimsendo, a tensão determinismo-voluntarismopode ser resolvida em termos puramentemarxianos, ao localizarmos precisamente otrabalho cultural como aquele elemento que,como no caso de trabalho em Marx, semdeixar de fazer parte do mundo da vida,transforma-se naquela mercadoria especial(força-de-trabalho), produtora da mais-valiaque garante a reprodução ampliada do sis-tema.

No caso da mercadoria força de traba-lho, analisada por Marx, sabemos o signifi-cado disso: a classe trabalhadora, ao mesmotempo em que participa do processo de pro-dução e reprodução do capital, pela sua pró-pria posição na estrutura produtiva, torna-seuma força revolucionária, podendo transfor-mar a cooperação capitalista em cooperaçãoa seu próprio favor e do conjunto das ca-madas subalternas, interessadas na supera-ção do capitalismo e na construção de umasociedade mais justa. No que se refere aotrabalho cultural, há três questões que de-vem ser consideradas: em primeiro lugar,como toda a economia política da comuni-cação mostra, a subsunção do trabalho cul-tural no capital é difícil, o que lhe confereum grau de liberdade, diferenciado evidente-mente por categoria, mas em todo caso maiordo que aquele atribuído ao trabalho manuala partir da Revolução Industrial, ainda quea tendência atual vá justamente no sentidodo apagamento dessa diferença. Em segundolugar, o trabalho cultural é um trabalho demediação simbólica e é precisamente essefato que dá relevância à questão com a qualnos ocupamos aqui. Finalmente, em dois ar-tigos recentes (Bolaño 1995 e 1997 b) pro-

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curei ampliar o alcance dessa discussão, nosentido de considerar o conjunto do trabalhointelectual, apontando, como a característicacentral da terceira revolução industrial, osprocessos convergentes de subsunção do tra-balho intelectual e de intelectualização geraldos processos de trabalho, que explicam, ameu ver, amplamente a essência da atual re-estruturação do capitalismo.

A generalização do conceito de trabalhointelectual e de suas especificidades na atualetapa de transformações por que passa o sis-tema capitalista em nível global (Bolaño,1995) pode ser útil para a compreensão daproblemática da ideologia na sua totalidadee, de modo muito especial, no debate sobrea introdução das novas tecnologias da comu-nicação e da informação nos diferentes pro-cessos sociais (na produção, na circulação,na organização das empresas capitalistas edo Estado, nas relações inter-empresas, nasrelações inter-pessoais), inclusive no pro-cesso educativo, terreno onde avança hojede forma assustadora a ideologia neoliberale suas aparentadas. É esse processo que for-nece os elementos concretos para a implan-tação da ideologia da "sociedade da informa-ção".

Podemos retomar agora rapidamente aquestão da educação posta bem acima e uti-lizar a chave interpretativa lá avançada paraentender o cerne da questão que nos inte-ressa. Com isso poderemos explicar o ver-dadeiro sentido daquilo que Lévy (1994)chama de "inteligência coletiva". A expan-são das redes telemáticas em nível mun-dial está de fato constituindo um ciberes-paço no qual a esfera pública global se arti-cula, abrindo possibilidades de ação criadoraque, no entanto, são bloqueadas pelo própriosistema, construído como uma teia extrema-

mente hierarquizada e assimétrica15 que es-teriliza em grande medida o seu potencialcrítico. Na realidade, ocorre algo semelhanteao que foi dito acima sobre o sistema de en-sino: a criação de uma estrutura complexade poder e hegemonia, destinada a enquadraro trabalho de cada um dos participantes, demodo a reproduzir constantemente as hierar-quias e as estruturas de dominação.

O sentido último desse movimento, quenão se limita ao que ocorre com a internetmas engloba todo o amplo processo de in-formatização geral das sociedades capitalis-tas nesta virada de século, incluindo e articu-lando as lógicas de reestruturação do Estadoe do capital e seus amplo impactos sobre omundo da vida, é a reconstrução das basesda expansão capitalista através da exploraçãodo trabalho intelectual, burocrático, de coor-denação. O desenvolvimento capitalista noséculo XXI, se não for bloqueado por fatoresque não cabe aqui analisar, ocorrerá sobre abase da exploração das energias mentais deuma classe trabalhadora renovada pela pró-pria crise em que estamos metidos (Bolaño,1995). Este é o outro lado da moeda, o ele-mento de inclusão da atual reestruturação dosistema que Kurz (1991) não consegue per-ceber, não conseguindo, em consequência,equacionar, nem sequer minimamente, a pro-blemática do "elemento subjetivo", perma-necendo seu enfoque totalmente restrito aopólo determinista da oposição entre os doismarxismos acima citada.

Se a revolução tecnológica, marca perma-nente do desenvolvimento capitalista, trazsempre inegáveis possibilidades liberadoras,como observou Marx com clareza em "O Ca-

15além do fato óbvio já apontado do seu caráter res-trito a uma parcela limitada da população mundial.

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pital", não é menos verdade que essas mes-mas possibilidades são negadas na práticapela própria forma fetichista que a introdu-ção do progresso técnico adquire nas condi-ções históricas em que prevalece a produçãocapitalista. Cabe aos interessados organizar-se politicamente para influenciar a trajetóriadas mudanças a seu favor, lutando, por exem-plo, pela redução da jornada de trabalho e,com isto, a socialização dos ganhos de pro-dutividade ou para a socialização do acessoàs redes telemáticas, a favor da maior auto-nomia possível da sociedade civil na sua uti-lização.

Nesse sentido, o papel do trabalho inte-lectual é absolutamente crucial pois, aindasendo ele trabalho humano em geral, a suaespecificidade dificulta uma subordinaçãototal e completa aos ditames da produçãomercantil, muito embora o movimento con-creto esteja apontando hoje justamente nessadireção. Mas a sua especificidade não é outracoisa senão o seu caráter de elemento neces-sário ao processo de mediação que, dirigidofundamentalmente para a legitimação das re-lações sociais capitalistas, abre possibilida-des de resistência e de ação libertadora. Nema utopia tecnológica de Lévy, nem o determi-nismo apocalíptico de Kurz podem dar contadesta contradição.

Ao contrário, uma perspectiva teóricacomo a aqui proposta, que restitui a centra-lidade do conceito de trabalho, ao mesmotempo em que incorpora, no cerne mesmoda definição da categoria fundamental, a pro-blemática da mediação cultural, apontandopara a possibilidade de integração entre osreferenciais da crítica da economia políticae de uma antropologia marxista, com vistasà compreensão do fenômeno atual de consti-tuição de uma cultura global capitalista, com

a invasão de todas as esferas de vida pelalógica do capital, essa perspectiva teórica éa única capaz de dar conta do problema emtoda a sua extensão.

Não é possível neste texto analisar o tra-balho de Kurz. O quadro de referência parauma avaliação crítica da sua contribuição, dequalquer forma, está explicitado de formabastante clara, assim espero, acima. No quesegue, vou procurar discutir o livro citado deLévy, cujo objeto está mais próximo daqueleque nos ocupa neste momento. Antes, devodizer, como já deve ter ficado muito claropara o leitor, que a solução aqui adotada parao problema das relações entre determinaçõesestruturais e liberdade histórica é muito maispróxima da do paradigma da coisificação deLukács do que daquela das patologias da co-municação de Habermas. Não é em Lukács,entretanto, que me inspiro em minha pro-posta de recuperação do referencial de Marxpara a compreensão da atual reestruturaçãocapitalista e da centralidade que nela adqui-rem as tecnologias da informação e da co-municação. Prefiro, neste ponto, citar RuiFausto mais uma vez.

Falando sobre o destino da antropolo-gia em Marx, Fausto aponta que as no-ções de "homem"e de "essência humana",na sua obra de juventude, "além de fun-cionar como fundamento teórico da crí-tica da economia (a rigor, fundamento deum fundamento, a noção de trabalho alie-nado’)"representam "uma espécie de ’funda-mento prático’ da política"(Fausto, 1983, p.227). No caso específico dos ManuscritosEconômico-Filosóficos, há "dois fundamen-tos práticos, ou um fundamento prático quese manifesta em dois níveis de consciência,o do Sujeito (o filosófico crítico) e do objeto(isto é, o dos sujeitos ’históricos’)"(idem, p.

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228) 16 . Isto muda na obra da maturidadede Marx: "à dupla transcendentalidade prá-tica na obra da juventude corresponde, naobra madura, uma dualidade não mais trans-cendental, a que distingue a consciência realdo proletariado da consciência revolucioná-ria do Sujeito (teórico-dirigente revolucioná-rio, ou partido)"(idem, p. 228 e seg.). Agorajá não há "ação revolucionária sem interven-ção do sujeito", como nos Manuscritos, e

a idéia de uma sociedade hu-manizada, a qual se abria paraum discurso plenamente tematizá-vel embora descrevesse uma si-tuação pós-histórica (essa duplacaracterística correspondia à suafunção de fundamento) passa a serum horizonte. É a antevisão neces-sariamente marginal da "humani-dade humana"(...). A essa trans-formação do fundamento subjetivoem horizonte ­ lugar por ex-celência da "antropologia"na obramadura ­ corresponde aemergência de dois discursos, au-sentes até aqui, o discurso his-tórico e o discurso estratégico.(idem, p. 229).

16Assim, "o filósofo pensa e tematiza um homemhumano que, conforme o terceiro manuscrito, só seriaproduzido num futuro longínquo. A consciência dofilósofo está ’ inclinada’ para este futuro e dessa pers-pectiva ­ que é a do socialismo (humanismo) -,ele critica a prática do futuro imediato, cujo princípiomotor é o comunismo. Pelo seu caráter intencional-mente ’utópico’, entretanto essa crítica não se propõeaparentemente alterar o curso do processo históricoobjetivo, mas apenas mostrar os seus limites"(Fausto,1983, p. 228).

Rui Fausto explica da seguinte forma asrelações entre os discursos histórico e polí-tico e a teoria d’O Capital :17

Para o discurso histórico-político definimos dois pontos quesão as suas referências extremas:um solo histórico que tem como umde seus níveis a consciência atualdo proletariado; um horizonte re-presentado pelo objetivo último, osocialismo. Esses dois pontos que,na obra política se dispõem ­diríamos ­ horizontalmente,vão-se refletir verticalmente em OCapital. O primeiro desses pon-tos se reflete, fora do espaço pro-priamente lógico, nos textos emque Marx descreve a experiênciado proletariado (...) Mas se o pri-meiro limite do discurso político sereflete fora do espaço lógico, o se-gundo, o horizonte do socialismo,se reflete no horizonte de signifi-cação (verticalmente, como o soloprimeiro, mas não fundante de sig-nificações). De fato, a leitura queMarx faz do capitalismo é uma re-constituição de suas leis sobre ofundo de um universo de referência

17O autor exprime assim a diferença entre o dis-curso lógico e o discurso histórico no marxismo: "Defato, de um duplo ponto de vista, o princípio da teo-ria de O Capital não é a memória mas a antimemó-ria: objetivamente, pois, para compreender as leis dosistema capitalista é necessário separar a sua articu-lação lógica da sua gênese; subjetivamente, porquenão há continuidade, nesse nível, entre a prática po-lítica e a prática teórica. Mas o mesmo não acon-tece com o discurso histórico e com o discurso tático-estratégico; eles pressupõem uma memória que, nãoobstante o hegelianismo da fórmula, é uma memóriade si."(Fausto, 1983, p. 230).

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que o transcende18 (Fausto, 1983,p. 232).

Nessa perspectiva, a utopia de uma "antro-pologia do ciberespaço"pode ser , em prin-cípio, aceita como "horizonte de significa-ção"para a análise teórica da chamada "soci-edade da informação", com o que podemosrecuperar os aspectos mais interessantes dacontribuição de Lévy, deslocando-os do con-texto utópico liberal em que foram formu-ladas e retomando o socialismo como "uni-verso de referência".

Para Lévy, à expansão das redes telemáti-cas e ao desenvolvimento de uma indústriamultimídia unificada, estão ligados "aspec-tos civilizatórios"(novas estruturas de comu-nicação, regulação e cooperação, novas lin-guagens e técnicas intelectuais) que apontampara a passagem "de uma humanidade a ou-tra". As "novas técnicas de comunicação pormundos virtuais"teriam aí uma dimensão im-portante como a dos avanços da conquistaespacial que, ao perseguir explicitamente oestabelecimento de colônias humanas em ou-tros planetas, indica uma mudança radical dohabitat e do meio para a espécie, ou daque-les da biotecnologia e da medicina, que "nosincitam a uma reinvenção da nossa relaçãocom o corpo, com a reprodução, com a do-ença e com a morte", levando a uma "seleçãoartificial do humano transformado em ins-trumento pela genética", ou do desenvolvi-

18"Esta justaposição das estruturas objetivas de umhorizonte (não um fundamento) significativo que asilumina, parece ser o segredo dos chamados textos an-tropológicos de O Capital, nos quais o althusserismoenxerga apenas sobrevivências de uma fase anterior.Eles representam, na verdade, a cifra da historicidadede O Capital, no interior do seu espaço lógico, e esta-belecem a articulação desse espaço com o tempo his-tórico"(Fausto 1983, p. 232 e seg.).

mento das "nanotecnologias capazes de pro-duzir materiais inteligentes em massa, capa-zes de modificar completamente nossa rela-ção com a necessidade natural e com o tra-balho".

No caso da constituição do ciberespaço,cuja forma e conteúdo estariam ainda "es-pecialmente indeterminados", são os proble-mas do laço social que estão sendo postos emnovas bases, ao mesmo tempo em que "osprogressos das próteses cognitivas com basedigital transformam nossas capacidades inte-lectuais tão nitidamente quanto o fariam mu-tações de nosso patrimônio genético"(Lévy,1994, p. 33 e seg.)19 .

Conclusão: "a hominização, o processo desurgimento do gênero humano, não terminoumas acelera-se de maneira brutal"(idem, p.15). No capítulo 5, essa, digamos, provo-cativamente, "ontologia do ser social"chegaao ápice quando, a partir de uma releitura dateologia farabiana que, entre os séculos X eXII teria "teorizado pela primeira vez o inte-lectual coletivo", o autor se propõe explici-tamente a desenhar "o programa de catedraisinvertidas, esculpidas segundo o espírito hu-mano", apresentando a perspectiva de uma"teologia transformada em antropologia", demodo que "o que foi teológico torna-se tec-nológico"(idem, p. 83).

Ao lado de índices bastante in-quietantes que voltam nossso olharaos aspectos mais sombrios da

19No capítulo 3, o autor realiza uma interessantediscussão sobre as grandes evoluções tecnológicas,classificando as tecnologias em arcaicas, molares emoleculares e relacionando-as com os mecanismosde controle das espécies vivas, da matéria, das men-sagens e de regulação dos grupos humanos. Infeliz-mente, não cabe aqui entrar nessa discussão.

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Terra, do Território e do UniversoMercantil, a passagem do terceiromilênio contém os germes, a fi-gura virtual de um espaço do sa-ber autônomo (...) Esse quartoespaço antropológico, caso venhaa se desenvolver, acolherá formasde auto-organização e de socia-bilidade voltadas para a produ-ção de subjetividades. Intelectuaiscoletivos caminharão nômades embusca de qualidades, modalidadesde ser inéditas. Não será o paraísona Terra, uma vez que os outros es-paços, com suas coerções continu-arão a existir.(Lévy, 1994, p. 122e seg.)20 .

Assim, as tecnologias da inteligência "nãose limitam a ocupar um setor entre outrosda mutação antropológica contemporânea:elas são potencialmente sua zona crítica,seu lugar político"(idem, p. 15). Ao criarum novo "espaço antropológico", o "espaçodo saber", abrem a possibilidade de auto-realização do gênero humano pois, "por in-

20O "espaço do saber"construído pelos "intelec-tuais coletivos"é visto como um dos quatro "espa-ços antropológicos"que, surgidos "progressivamenteao longo da aventura humana, ganharam consistên-cia, autonomizaram-se até se tornarem irreversíveis",contingentes, eternos, vivos, estruturantes, estendidosao conjunto da humanidade que os engendrou atravésde sua "atividade imaginária e prática"(Lévy 1994, p.127 e segue). O primeiro desses espaços é a Terra. Osegundo, o território, nasce com a revolução neolítica.O terceiro é o espaço das mercadorias, bem mais re-cente (não fica claro se ele se autonomiza na GréciaAntiga, no período da constituição do mercado mun-dial ou na Revolução Industrial. À discussão sobreesses espaços o autor dedicará toda a segunda partedo livro. Para nossos objetivos não há interesse emvoltar a ela.

termédio dos mundos virtuais, podemos nãosó trocar informações, mas verdadeiramentepensar juntos, pôr em comum nossas memó-rias e projetos para produzir um cérebro co-operativo"(idem, p. 96).

Deriva-se daí um conceito de demo-cracia radical, contra as "hierarquias bu-rocráticas (...), as monarquias midiáticas(...) e as redes internacionais da econo-mia (...). Uma democracia distribuída portoda parte ativa, molecular"que permitiriaà humanidade"reapoderar-se de seu futuro.Não entregando seu destino nas mãos de al-gum mecanismo supostamente inteligente,mas produzindo sistematicamente as ferra-mentas que lhe permitirão constituir-se emcoletivos inteligentes capazes de se orien-tar entre as marés tempestuosas da muta-ção"(idem, p. 15). Trata-se de um conceitode democracia imanente,21 oposta a autori-dades transcendentes: Deus, a Igreja, o par-tido, a escola, a TV, o chefe, os antigos, osespecialistas22 .

É interessante notar que a mesma radicali-dade não se aplica, em absoluto, ao capital:

a grande máquina cibernéticado capital, sua extraordinária po-tência de contração, de expan-são, sua flexibilidade, sua capaci-dade de se insinuar por toda parte,de reproduzir continuamente umarelação mercantil, sua virulên-cia epidêmica parecem invencí-

21Que o autor explicitará sobretudo no capítulo 4.22"Toda tomada de controle realizada por um pe-

queno grupo, do que provém de todos, toda fixaçãode uma expressão viva coletiva, toda evolução para atranscendência, aniquila imediatamente o caráter an-gélico de um mundo virtual, que cai então nas regiõesobscuras da dominação, do poder, da pertença e daexclusão (idem, p. 93).

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veis, inesgotáveis. O capitalismoé irreversível. É daqui por diantea economia, e a instituiu como di-mensão impossível de ser elimi-nada da existência humana. Sem-pre haverá o Espaço das Mercado-rias, como sempre haverá a Terra eo Território. (Lévy, 1994, p. 120)

Não deixa de ser interessante a idéia, queo autor desenvolve no capítulo segundo, emcontraposição justamente à de "sociedade dainformação", de uma economia que "girará­ como já o faz ­ em torno doque jamais se automatizará completamente,em torno do irredutível: a produção do laçosocial, o ’relacional’"(idem, p. 41). Nãoapenas uma "economia do conhecimento",mas algo mais geral, uma "economia do hu-mano", em que "as necessidades econômicasse associam à exigência ética", constituindo-se uma "verdadeira indústria de restruturaçãode laços sociais, de reinserção dos excluídos,de reconstituição de identidades para indiví-duos e comunidades desestruturados"(idem,p. 42). O autor percebe que não está fa-lando de uma economia mercantil23. Maso desejo de compatibilizar a sua "utopia"de"renovação do laço social por intermédio doconhecimento"(idem, p. 26) e de constitui-ção da inteligência coletiva com a economiamercantil leva-o ao seguinte:

Mas nem a economia do co-nhecimento, nem a economia am-pliada das qualidades humanas

23"Uma sociedade que admitisse explicitamente osprincípios da economia das qualidades humanas reco-nheceria, encorajaria e retribuiria todas as atividadessociais que produzem e sustentam essas qualidades,mesmo as que não fazem parte diretamente da econo-mia mercantil (Lévy, 1994, p. 43).

devem se desenvolver como econo-mias dirigidas(...) Não-mercantilnão significa forçosamente esta-tal, monopolista, hostil à iniciativaprivada ou alérgico a toda formade avaliação. O problema da en-genharia do laço social é inventare manter os modos de regulaçãode um liberalismo generalizado(p.43, grifo nosso).24

Ora, mas o que é, de fato afinal, o cibe-respaço onde se constrói a inteligência cole-tiva senão uma criação do capital, esse po-der transcendente (que se alça acima da Le-benswelt, diria Habermas), para atender aseus desígnios de potência e de dominação?Não estamos falando de outra coisa senãodaquela esfera pública global em construçãoa que me referi acima e que contém e re-produz as assimetrias e hierarquias própriasdo capitalismo, que repõe em nível globalas condições de criticidade e exclusão típi-cos da esfera pública burguesa clássica, re-legando a maioria da população mundial àsubmissão à lógica da massificação e do Es-tado Nacional.

O que seria, afinal, o intelectual coletivoque participa hoje desse ciberespaço senãotodos nós, proletários intelectualizados e tra-balhadores intelectuais em fase de acelerada

24E, mais adiante, uma pérola: "na economia dofuturo , o capital será o homem total"(Lévi, 1984, p.43). Ou ainda: "o intelectual coletivo é uma espéciede sociedade anônima para a qual cada acionista trazcomo capital seus conhecimentos, suas navegações,sua capacidade de aprender e ensinar"(idem, p. 94).O "sucesso no ambiente altamente competitivo que éo nosso"é tomado como premissa para a constituiçãodos "coletivos inteligentes... sujeitos cognitivos, aber-tos, capazes de iniciativa de imaginação e de reaçãorápidas"(idem, p. 19).

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proletarização e subsunção num capital inte-ressado hoje fundamentalmente na extraçãodas nossas energias mentais para garantir asua reprodução ampliada enquanto valor quese valoriza sugando trabalho vivo não pago?No momento atual, o intelectual coletivo nãoé aquele ser que se auto-constrói, mas o tra-balhador coletivo criado pelo (e criador do)capital, no interesse do qual se dá a coopera-ção.

Para que essa cooperação venha a dar-se em favor do próprio coletivo, para quea esfera pública global se autonomize e ex-panda ao ponto de constituir uma humani-dade como a que pretende Lévy, é preciso su-perar as barreiras impostas pelo próprio ca-pital à efetivação do potencial liberador queo de desenvolvimento capitalista cria. Paratanto, é preciso ultrapassar a utopia liberalradical do autor e repor o horizonte signifi-cativo do socialismo.

Com a constituição, hoje, do trabalha-dor intelectual coletivo, o Sujeito marxiano,transcendente, pode finalmente dissolve-seno sujeito histórico. Lévy, mais do que qual-quer outro dos "teóricos"do ciberespaço, de-tecta essa tendência e a expressa, ainda quede forma parcial e limitada. Isto posto, po-demos concluir com o belo trecho a seguir,cuja força emana do inegável poder de sedu-ção que têm as utopias.

Hoje, o novo proletariado nãotrabalha mais com signos ou coi-sas, mas com massas humanasbrutas. Acompanha os povos emtrânsito em meio às tempestadesda grande mutação. Ele humanizaos corpos, os espíritos, os compor-tamentos coletivos. Do coração dabatalha, forja às cegas , sem jeito,

as armas da autonomia. Eis os no-vos ’paus para toda obra’ da so-ciedade, os anônimos que produ-zem as condições da riqueza longedas luzes do espetáculo, aquelescujo trabalho é, ao mesmo tempo,o mais duro, o mais necessárioe o mais mal pago: a legiãodos educadores, diretores de co-légio, professores, formadores emgeral. Vem encorpar esse con-tingente a multidão de assistentes,trabalhadores sociais, policiais...e carcereiros que não aguentammais! E não esqueçamos a massade auxiliares: os associativos, osnão-governamentais, os caritati-vos, aqueles prontos a ajudar emtodas as infelicidades, todo o povomiúdo que segue atrás dos fracas-sados e recolhe as vítimas da des-territorialização. Esses novos pro-letários carregam sobre seus om-bros o relacional de massa, o laçosocial intensivo. Esses justos seencarregam de inserir toda umapopulação deixada por sua pró-pria conta. E, graças à mobili-dade e à aceleração dos fluxos,todos vivem à beira da exclusão,arriscando-se a saltar para fora.O novo proletariado só se eman-cipará pela união, saindo de suascategorias, prescindindo das ali-anças com aquele cujo trabalho seassemelha ao seu (mais uma vez,quase todos), evidenciando a ope-ração que efetua na sombra, fa-zendo com que a produção da in-teligência volte a ser objeto cen-tral de preocupação explícita de

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todos, investindo na pesquisa so-bre a engenharia do laço sociala fim de instrumentar, na medidado possível, aqueles que moldamo humano com as mãos nuas e àforça do afeto. Quando o novoproletariado se tornar conscientede si mesmo decidirá suprimir-seenquanto classe, instituirá a socia-lização geral da educação, da for-mação e da produção de qualida-des humanas(Lévy, 1994, p. 44 eseg.).

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