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PESQUISA AGRÍCOLA Ingrid Santiago Oliveira 1 Suely Xavier de Brito Silva 2 Ana Karina da Silva Cavalcante 3 Antonio Souza do Nascimento 4 1 – Engenheira Agrônoma, aluna do Mestrado Profissional em Defesa Agropecuária (MPDA) da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB); e-mail: [email protected] 2 – Engenheira Agrônoma, Fiscal Estadual Agropecuá- rio (ADAB), Co-Orientadora - MPDA; e-mail: [email protected] 3 – Engenheira Agrônomo, Docente da UFRB, Orienta- dora – MPDA; e-mail: [email protected] 4 – Engenheiro Agrônomo, Pesquisador (EMBRAPA/ CNPMF), orientador - MPDA/UFRB; ‘e-mail: [email protected] A Clorose Variegada dos Citros (CVC), ou “Amarelinho” é impor- tante praga da citricultura por pro- mover considerável impacto eco- nômico à produção, a exemplo do que aconteceu com a citricul- tura paulista no final dos anos 90, cujas estimativas de perdas su- peraram os 650 milhões de reais (PREJUÍZOS, 2001) e por ser um patossistema complexo em que envolve duas formas eficientes de disseminação da praga: insetos vetores e material propagativo in- fectado, a curtas e longas distân- cias, respectivamente (SANTOS FILHO, et al., 2010). O agente causal da CVC é a bac- téria Xylella fastidiosa que coloni- za o xilema das plantas cítricas promovendo sintomas em folhas, ramos e frutos, sendo que estes últimos os mais fáceis de serem percebidos no campo por conta da drástica redução do tamanho (Figura 1A), endurecidos, ama- relados, com casca mais fina e sujeitos a queimaduras do sol (Figura 1B). Nas folhas, os sintomas podem ser confundidos com deficiência nutricional e com sintomas de ou- tras doenças (mancha graxa dos Status fitossanitário da Clorose Variegada dos Citros (CVC) na Bahia e perfil dos citricultores* * Agradecimentos: à FAPESB pela concessão da Bolsa ao primeiro autor; à ADAB pelo apoio logístico nas atividades de campo, em especial à Maria Aparecida C. C. Almeida; aos produtores por terem disponibilizado as informações e suas propriedades para a concretização deste trabalho. Foto: Heckel Júnior 88

Status fitossanitário da Clorose Variegada dos Citros (CVC ... · Informativo Centro de Citricultura Sylvio Moreira. Setembro, 2001 Setembro, 2001 SANTOS FILHO, H. P. et. al. Clorose

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PESQUISA AGRÍCOLA

Ingrid Santiago Oliveira1

Suely Xavier de Brito Silva2

Ana Karina da Silva Cavalcante3

Antonio Souza do Nascimento4

1 – Engenheira Agrônoma, aluna do Mestrado Profissional em Defesa Agropecuária (MPDA) da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB); e-mail: [email protected]

2 – Engenheira Agrônoma, Fiscal Estadual Agropecuá-rio (ADAB), Co-Orientadora - MPDA;e-mail: [email protected]

3 – Engenheira Agrônomo, Docente da UFRB, Orienta-dora – MPDA; e-mail: [email protected]

4 – Engenheiro Agrônomo, Pesquisador (EMBRAPA/CNPMF), orientador - MPDA/UFRB;‘e-mail: [email protected]

A Clorose Variegada dos Citros (CVC), ou “Amarelinho” é impor-tante praga da citricultura por pro-mover considerável impacto eco-nômico à produção, a exemplo do que aconteceu com a citricul-tura paulista no final dos anos 90, cujas estimativas de perdas su-peraram os 650 milhões de reais (PREJUÍZOS, 2001) e por ser um patossistema complexo em que envolve duas formas eficientes de disseminação da praga: insetos vetores e material propagativo in-fectado, a curtas e longas distân-cias, respectivamente (SANTOS FILHO, et al., 2010).

O agente causal da CVC é a bac-téria Xylella fastidiosa que coloni-za o xilema das plantas cítricas promovendo sintomas em folhas, ramos e frutos, sendo que estes últimos os mais fáceis de serem percebidos no campo por conta da drástica redução do tamanho (Figura 1A), endurecidos, ama-relados, com casca mais fina e sujeitos a queimaduras do sol (Figura 1B).

Nas folhas, os sintomas podem ser confundidos com deficiência nutricional e com sintomas de ou-tras doenças (mancha graxa dos

Status fitossanitário da Clorose Variegada dos Citros (CVC) naBahia e perfil dos citricultores*

* Agradecimentos: à FAPESB pela concessão da Bolsa ao primeiro autor; à ADAB pelo apoio logístico nas atividades de campo, em especial à Maria Aparecida C. C. Almeida; aos produtores por terem disponibilizado as informações e suas propriedades para a concretização deste trabalho.

Foto: Heckel Júnior

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citros) e até por injúrias provoca-das por insetos (cochonilhas). São sintomas típicos (Figura 2A): pon-tuações cloróticas na face supe-rior do limbo foliar, distribuídas ao acaso; e de forma correspondente ao que aparece em cima da folha, são observadas bolsas de goma de coloração marrom (palha), em sua face inferior (Figura 2B) (SAN-TOS FILHO, H. P. et al., 2010). Nos ramos tornam-se “envassourados” pelo encurtamento dos entre-nós e em situações mais severas, secam e desfolham.

Os insetos vetores da bactéria da CVC são conhecidos como cigar-

rinhas de xilema (Hemiptera, Cica-dellidae) da subfamilia Cicadelli-nae (MOLINA et al., 2006) e nos pomares da Bahia já foram de-tectadas pelo menos três espécies eficientes na transmissão da X. fastidiosa (MIRANDA et. al., 2009).

A ocorrência da CVC no território baiano foi registrada pela primeira vez em 1997 na região do Litoral Norte (LN) e no ano 2009, encon-trou-se um foco da doença na re-gião sul do Recôncavo da Bahia (RB) (SANTOS FILHO, et al., 2010).

Apesar da CVC no território baia-no ser realidade fitossanitária

constatada por técnicos dos seg-mentos da pesquisa e da defesa agropecuária, essa é uma “doen-ça invisível” aos olhos da cadeia produtiva, seja pela incapacidade de reconhecimento dos sintomas da doença, considerando-se a grande semelhança entre eles e diversas doenças e com defici-ência nutricional dos pomares, ou até pelos reflexos dos anos em que a citricultura baiana foi sub-metida a severa estiagem.

Mas, afinal de contas, qual o status da CVC “Amarelinho” no Estado da Bahia? Qual o perfil do citricul-tor e sua percepção sobre esse

Figura 2 – Sintomas foliares da CVC: pontuações amarelas na face superior (A) e lesões em tonalidades marrom “palha” na face inferior (B)Fonte: SANTOS FILHO, H. P., 2012

Figura 1 – Frutos amarelos, pequenos, endurecidos (A) e queimados pelo sol (B)Fonte: (A) – BARBOSA, C. J., 2012; (B) – SILVA, S. X. B., 2012

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problema fitossanitário? Esse tra-balho teve por objetivo mapear a prevalência da Clorose Variegada dos Citros (CVC) na Bahia, bem como conhecer o perfil dos citri-cultores inseridos nessas regiões.

MATERIAL EMETODOS

O mapeamento da CVC foi reali-zado no período de setembro de 2013 a agosto de 2014, iniciando--se a amostragem de um por cento (1%) da área plantada com citros (SIDRA/IBGE, 2012) em 22 municípios do Recôncavo Baiano, inspecionando-se 1.390 plantas de 50 pomares. No Litoral Norte, foram inspecionadas 8.225 plan-

tas de 130 pomares, nos 14 muni-cípios amostrados. A prevalência da CVC (%) em cada município foi calculada por regra de três simples entre o número total de plantas sintomáticas e o número total de plantas amostradas, inde-pendente do nível de severidade encontrado.

Nas regiões da Chapada Dia-mantina e Oeste da Bahia foram amostrados quatro e três poma-res, respectivamente, dos mu-nicípios de Itaberaba, Wagner, Ibicoara, Seabra, Barreiras e Luis Eduardo Magalhães.

Para o delineamento do perfil do citricultor, foram realizadas entre-vistas estruturadas, mediante a aplicação de questionário em que

se pretendia levantar informações sobre o produtor (identificação, endereço, faixa etária, nível de es-colaridade, meios de informação mais utilizados), sobre a proprie-dade (identificação, localização geográfica, área, idade do pomar, nível tecnológico, serviço de as-sistência técnica utilizada) e sobre a praga em estudo (percepção no reconhecimento de sintomas). Foram entrevistados 29 citriculto-res familiares dos municípios de Cruz das Almas, Gov. Mangabei-ra, Muritiba, Sapeaçu, Conceição do Almeida, São Felipe, C. Para-guaçu, Castro Alves, Jaguaripe, Alagoinhas, Inhambupe, Itapicu-ru, Rio Real, Jandaíra, Acajutiba, Esplanada, Entre Rios, e quatro empresas rurais situadas em Rio Real, Esplanada, Entre Rios e

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Inhambupe. Os resultados per-mitiram a elaboração de mapas e gráficos, utilizando-se os progra-mas ArcGIS e Excel (Microsoft).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No levantamento fitossanitário re-alizado na Chapada Diamantina e Oeste da Bahia, não foram de-tectados sintomas da CVC. Des-taca-se que na primeira região há uma predominância de Limeira Ácida “Tahiti” e Tangerineiras e seus híbridos, e essas varieda-des, respectivamente, são des-critas como tolerantes à bactéria, ou apresentam baixa intensidade de sintomas em nível de campo (SANTOS FILHO, et al., 2010).

Mediante levantamento fitossa-nitário realizado no Recôncavo Baiano (Figura 3), com prevalência em plantas inferior a seis por cen-to (6%), a CVC foi detectada nos municípios de Jaguaripe, Castro Alves, Sapeaçu, Muritiba, Cruz das Almas e Cabaceiras do Paragua-çu. Já no município de Governador Mangabeira, a prevalência foi da ordem de 20% de plantas sintomá-ticas, proporção elevada e espera-da, pois, foi neste município em que se detectou o primeiro foco da doença na região, em 2009.

Deve-se salientar que mesmo exis-tindo um instrumento legal (Porta-ria estadual nº 119 de 28 de março de 2005, Art. 5º) proibindo a saída de material propagativo de regiões onde ocorre a CVC, isso não foi

FIGURA 3 PREVALÊNCIA DA CVC EM PLANTAS – RECÔNCAVO BAIANOESTADO DA BAHIA ANO/2014 (%)

Fonte: ADAB

0

1,11

1,67

2,86

5,63

1,54

2,5

20,83

FIGURA 4 PREVALÊNCIA DA CVC EM PLANTAS – LITORAL NORTEESTADO DA BAHIA ANO/2014 (%)

Fonte: ADAB

10

10,29

14,33

15,33

15,45

2,00

2,86

22,92

23,93

30,36

40

46,27

60,00

73,06

91

suficiente para preservar as áreas indenes, a exemplo do Recôncavo Baiano e que mesmo sendo uma região produtora de mudas cítri-cas, deve ter recebido algum lote de material infectado e 12 anos após a primeira detecção do “Ama-relinho” na Bahia, passou a exibir sintomas em seus pomares.

O levantamento fitossanitário rea-lizado no Litoral Norte demonstra que a CVC está presente nos 14 municípios (Figura 4) amostrados e em franca expansão, conside-rando-se os dados de Laranjeira et.al. (2008) em que não registra-ram a presença da praga em dois municípios (Acajutiba e Catu).

Comparando-se os cenários do RB e LN, no quesito faixa etária, os citricultores do RB são mais idosos que os do LN e 56% da-quele estão ente 40 e 60 anos de idade (Gráfico 1). Em ambas as regiões, pelo menos, 76% dos en-trevistados possuem o ensino fun-damental como grau máximo de escolaridade e preferem receber

informação através de programas veiculados pelo rádio e televisão.

Em média, a área das proprieda-des rurais do RB e LN têm 3,4 ha e 11,5ha, respectivamente. Enquan-

to que as empresas agrícolas jun-tas respondem por uma área de 7.483 ha. Nas duas regiões, o nível tecnológico foi classificado como baixo, pois, habitualmen-te não realizam fertilização dos

Gráfico 1

Fonte: Autores

COMPOSIÇÃO DA FAIXA ETÁRIA DOS CITRICULTORES DO RECÔNCAVO BAIANO/RB E LITORAL NORTE/LN

Citricultores entrevistados por faixa etária (anos)

5

4

3

2

1

0Até 30 31 a 40 41 a 50 51 a 60 61 a 70

Entrevistados RBEntrevistados LN

>70

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pomares, nem correção de solo; não monitoram pragas, nem dis-pões de técnicas de irrigação ou de conservação dos solos.

No RB, apenas 18% dos entre-vistados contam com serviço de assistência técnica rural particu-lar, entretanto, no LN os 48% dos citricultores contam com esse serviço. Talvez esse seja um fator que tenha influenciado na percep-ção dos sintomas da CVC pelos citricultores, visto que 62% dos citricultores do RB afirmaram não conhecer os sintomas da doença, enquanto que no LN, apenas 23% os desconheciam.

CONCLUSÃOA Clorose Variegada dos Citros (CVC ou “Amarelinho) encontra-se em franca expansão no território baiano não só por conta da forte pressão de inóculo, ou por persistir a produção de mudas no sistema a “céu aberto”, mas também pela de-sinformação acerca da sintomatolo-gia da praga e pela falta de adoção das medidas de manejo por parte de um dos elos mais importantes da cadeia produtiva: o citricultor.

O insuficiente serviço de assis-tência técnica rural, baixo nível de escolaridade da maioria dos citricultores os veículos de co-municação por eles utilizados para o processo de informação devem ser considerados em uma possível campanha inte-rinstitucional para esclarecimen-to e difusão das estratégias de manejo da praga.

O manejo da CVC deve ser en-tendido como uma responsabi-lidade a ser compartilhada por

todos os segmentos da cadeia produtiva dos citros na Bahia, sob pena dessa atividade que bem caracteriza a agricultura familiar do Recôncavo Baiano e Litoral Norte vir a fenecer nos próximos anos por conta de uma praga, gerando profundas mudanças no cenário regional, não só do ponto de vista sócio--econômico, mas também am-biental, a exemplo do que acon-teceu com a região cacaueira com o advento da “vassoura--de-bruxa”.

REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS EXPORTADORES DE SUCOS CÍTRICOS – CITRUS BR. Disponível em: <http://www.citrusbr.com/exportadores-citricos/setor/producao-192415-1.asp>. Acesso em: 22 maio 2014.

LARANJEIRA, F. F. et. al. Prevalence, incidence and distribution of citrus variegated chlorosis in Bahia, Brazil. Tropical Plant Pathology, v.33, n.5, p.339-347, 2008.

MIRANDA, M. P. et. al. Levantamento populacional de cigarrinhas (Hemiptera: Cicadellidae) associadas à transmissão de Xylella fastidiosa em pomares cítricos do Litoral Norte da Bahia. Neotropical Entomology, v.38, n.6, p.827-33, 2009.

MOLINA, O. R. Ocorrência de cigarrinhas vetoras de Xylella Fastidiosa em pomares cítricos do município de Loanda, no noroeste do Paraná. Laranja, Cordei-rópolis, v.27, n.2, p243-250, 2006.

PREJUÍZOS com a CVC. Informativo Centro de Citricultura Sylvio Moreira. Setembro, 2001

SANTOS FILHO, H. P. et. al. Clorose Variegada dos Citros: ameaça a citricultura do Recôncavo Sul. Citros em Foco, n. 34, nov. 2010.

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