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Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 200722222

EditorialEditorialEditorialEditorialEditorial

 

Elaine Cristina Rodrigues Gomes Vidal

ENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDAMENTAMENTAMENTAMENTAMENTAL DEAL DEAL DEAL DEAL DE

9 ANOS: SENTIDO OU9 ANOS: SENTIDO OU9 ANOS: SENTIDO OU9 ANOS: SENTIDO OU9 ANOS: SENTIDO OUSENTIMENTSENTIMENTSENTIMENTSENTIMENTSENTIMENTO OBRIGAO OBRIGAO OBRIGAO OBRIGAO OBRIGATÓRIO?TÓRIO?TÓRIO?TÓRIO?TÓRIO?

Subsídio - Uma publicação do GRUHBAS- Projetos Educacionais e Culturais

Conselho Editorial Geraldo Roberto Pereira de Carvalho, MárioMonteiro Neto e Sueli de Oliveira RochaJornalista responsável Luciana Lane Valiengo - MTb. 30.758Colaboradores Alfredina Nery, Ana Lucia Barboza Caetanode Jesus, Ana Lúcia Silva Souza, AndréiaLisboa Sousa, Bel Santos Mayer, DeniseCardoso de Campos, Edna Roland, ElaineCristina Rodrigues Gomes Vidal, Fátima R. B.Mendes, Leonora Pilon Quintas, Luana SerraElias, Luciana Lane Valiengo, Margarete A. F.Fernandes, Miguel Arroyo, Ordália AlvesAlmeida, Rosane de Almeida Pires, SecretariaMunicipal de Educação de Guarulhos, Suelide Oliveira Rocha, Telma Ferraz Leal

Revisão de textos Sueli de Oliveira RochaEditoração Eletrônica e fotografias Luciana Lane Valiengo - MTb. 30.758

Impressão 

Gráfica Diário do LitoralTiragem 4.000 exemplares

Subsídio é uma publicação do GRUHBAS- Projetos Educacionais e CulturaisAv. Almirante Cochrane, 194 conj. 51 e 52Santos - SP - CEP: 11040-002Tel.: (13) 3271-9669Home page: www.gruhbas.com.brE-mail: [email protected]* As idéias aqui apresentadas são deresponsabilidade dos articulistas.

ExpedienteExpedienteExpedienteExpedienteExpediente

Desde a aprovação da Lei no 11.114, de 16 de maio de 2005, queestabeleceu a obrigatoriedade do início do Ensino Fundamentalaos seis anos de idade, educadores de todo país têm se

debatido com inúmeras questões: por que um Ensino Fundamental de 9anos? Como concretizá-lo? Por onde começar? Que benefícios essamudança poderá trazer às escolas, aos professores e, sobretudo, àscrianças? Quais riscos ela envolve?

Como tudo que é novo, o Ensino Fundamental de 9 anos temencontrado, país afora, adeptos veementes e críticos intransigentes. Antesde se entrar no mérito sobre os possíveis benefícios e prejuízos dessa

medida, já podemos encontrar, nela, uma grande contribuição: poucasvezes tantos educadores, em tantos lugares, voltaram seus olhares paraa criança, e a escola que a acolhe. As crianças de 6 anos têm sidoobjeto de acaloradas discussões, tendo seu desenvolvimento e suasnecessidades debatidos em fóruns e seminários. Que bom seria setambém tivessem essa oportunidade de atenção às crianças de 7 anos,8, 9, 10...

Podemos refletir sobre o Ensino Fundamental de 9 anos procurandoresponder às questões elementares que nos colocamos quando nosdeparamos com um objeto desconhecido: quem? Quando? Onde?Como? Por quê?

Comecemos, então, a exploraressas questões, uma a uma:Quem iniciou essa discussão sobrea ampliação do Ensino Funda-mental, e quando isso começou?

Ao refletirmos sobre essaquestão, já encontramos uma dascríticas mais recorrentes: a de queesta decisão seria fruto de umgrupo restrito de pessoas, movidaspor interesses político-partidários,querendo projetar os feitos deste oudaquele governo.

Este é um pensamento que podesurgir quando pensamos sobre“quem” aprovou a medida; masessa crítica perde completamenteo sentido quando continuamos areflexão e nos colocamos aquestão: “quando?” Isso porque adiscussão a respeito do assunto éantiga, e passa por mais de um

governo, envolvendo pessoas dediferentes opiniões, trajetórias eposicionamentos políticos.

A LDB, em 1996, já sinalizava umEnsino Fundamental de 9 anos (Art.32 da LDB). O Plano Nacional deEducação, aprovado em 2001,coloca a ampliação do EnsinoFundamental como meta da

educação nacional. O período entre 2003 e 2004 compreende, por partedo MEC, a publicação de vários documentos de orientação sobre oassunto, a realização de uma série de discussões e seminários emdiversas regiões, com variados interlocutores e uma enormepossibilidade de diálogo, com vistas a dar à medida o caráter maiscoletivo possível.

Assim, em meio a essa efervescência de debates, é aprovada,em 16 de maio de 2005, a Lei 11.114, estabelecendo aobrigatoriedade do início do Ensino Fundamental aos 6 anos de idade.Vale lembrar que, ao estabelecer um prazo de 5 anos para que asmudanças sejam implementadas, a lei reconhece as possíveisdif iculdades a serem encontradas pelos sistemas, para se

adaptarem. Desta forma, tendo 2010 como prazo-limite paraadaptação, cada sistema de ensino pode implementar as mudançasno seu ritmo, sem necessidade de precipitações que poderiamprejudicar o processo.

Continuando as indagações sobre o assunto, é conveniente nosperguntarmos: onde o Ensino Fundamental de 9 anos já érealidade? A maioria dos países desenvolvidos tem EnsinoFundamental com duração superior a 8 anos, e escolaridadeobrigatória anterior aos 7 anos de idade. Alguns, como a França,por exemplo, já conseguiram universalizar a escolaridade a partirdos três anos de idade, o que significa, na prática, que todas ascrianças a partir desta faixa etária já se encontram na escola.Outros, como nossa vizinha Argentina, discutem a obrigatoriedadeda escolaridade após os 14 anos, mas já têm como certa anecessidade da criança ingressar na escola aos 6 anos de idade,ou mesmo aos 5. O Brasil já vinha sendo questionado a respeito

do assunto há algum tempo, por pessoas diferentes: EmíliaFerrei ro, por exemplo, grande autor idade no assunto daalfabetização, já colocava, em 2003:

“Na maioria dos países latino-americanos, as crianças ingressam na escola de 1º grau aos seis anos. Seria interessante perguntar-se por que o Brasil mantém sete anos como idade de ingresso.” 1

Ao voltarmos nosso olhar para dentro do Brasil, verificamos que muitosmunicípios e estados já adotavam a escolaridade obrigatória aos 6 anosmuito antes da aprovação da lei que regulamenta o assunto.

Atualmente, mesmo com prazo até 2010 para se adaptarem, muitossistemas já adotam o Ensino Fundamental de 9 anos. Este já é realidadenas redes estaduais de 15 estados da Federação e em um númeromuito superior de municípios, incluindo capitais como Belo Horizonte ePorto Alegre.

Respondida a questão “onde?”, podemos nos lançar à pergunta: “Por

que é importante, ou necessário, um Ensino Fundamental de 9 anos,com início aos 6 anos de idade?”

A resposta a esta questão atende a duas vertentes: a primeira,concernente às políticas públicas de educação, e a segunda, de caráterpedagógico.

O viés político diz respeito aos milhões de crianças brasileiras deseis anos de idade que se encontram fora da escola. Pelo fato daEducação Infantil não ser obrigatória, muitas vezes, essas criançasque estão fora dos sistemas não aparecem em estatísticas. O fato

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desta exclusão não ganhar a repercussão que deveria só torna maisgrave nosso compromisso moral de reverter, com a máxima urgênciapossível, esta situação. Nesses casos, que muitas vezes ocorremem municípios com poucas escolas de Educação Infantil, atender ascrianças de 6 anos no Ensino Fundamental, em caráter obrigatório,pode ser a única saída encontrada para abrir para elas a porta daescola.

Já atendo-nos às questões pedagógicas, são indiscutíveis osbenefícios que o contato com um universo letrado traz às criançaspequenas, tanto no próprio momento em que este contato ocorre,quanto nos reflexos futuros que esta ação trará. Crianças de classemédia que, em geral, obtêm sucessos permanentes na escola, emsua imensa maioria provêm de universos nos quais as práticassociais de leitura e escrita ocupam papel relevante.Por esta razão, poderíamos até mesmo dizer, comalgum cuidado, que estas crianças não sofreriamgrandes prejuízos se ingressassem na escola aos 7anos de idade. No entanto, são justamente elas quecostumam ingressar cedo nas instituições escolares,

não apenas aos 6 anos, mas muitas aos 5, aos 4, ouaos 3 anos de idade! Já as crianças oriundas dascamadas mais pobres da população, maiores vítimasda exclusão social e escolar, têm – ou deveriam ter!  – na escola uma das poucas oportunidades decontato com o universo social da cultura escrita. Porprovirem de lares onde outras necessidades básicasdemandam esforço e atenção que impedem o exercício efetivo econstante dos hábitos de leitura e escrita, essas crianças precisam,para obter sucesso em sua alfabetização, de ambientes que lhesproporcionem contato permanente com materiais escritos, e deprofissionais que exemplifiquem e estimulem as práticas sociais daleitura e da escrita. E, para essas crianças, quanto mais cedo estesambientes lhe forem oferecidos, maiores se tornam suaspossibilidades de sucesso. Há quem diga que antecipar o ingressoda criança no Ensino Fundamental significaria antecipar o fracasso

escolar. Realmente, isso pode ser realidade se este ingresso nãofor cercado de todos os cuidados que merece. Entretanto, apesardeste risco inevitável, a entrada no Ensino Fundamental aos seisanos ainda oferece à criança a chance de encontrar bonsprofissionais, que desenvolvam um trabalho significativo, e lhepossibilitem o sucesso. Mantê-la do lado de fora da escola tira-lheaté mesmo essa chance. Incluir a criança de 6 anos pode (ou não)antecipar o fracasso escolar. Excluí-la apenas retarda o fracasso,mas o torna muito mais provável. Passemos, agora, à questão que,deliberadamente, foi deixada por último: “Como implementar oEnsino Fundamental de 9 anos? Como atender essa criança queingressa mais cedo?”

A decisão de deixar esta pergunta para o final deveu-se, emparte, ao fato dela não ter uma resposta pronta. Este como deve ser respondido além deste texto, por cada equipe, porcada professor em sala de aula, no dia-a-dia de seu fazerpedagógico.

A descoberta se dará no cotidiano das escolas brasileiras, mas algunscaminhos podem, desde já, ser apontados:

Receber a criança de seis anos na escola não significa simplesmenteanexar ao Ensino Fundamental o estágio final da Educação Infantil, emuito menos antecipar a antiga 1ª série, com todas as suas práticashabituais. Ampliar a permanência da criança na escola implica,necessariamente, repensar o Ensino Fundamental em seu conjunto,incorporando esta série inicial às subseqüentes, de modo a propiciar aoaluno um processo contínuo e coeso.

Uma das questões que mais têm sido colocadas é: deve-se ounão alfabetizar essa criança de 6 anos? Esta pergunta não se  justifica, pois traz implícito o pressuposto de que é o professorquem decide alfabetizar ou não o aluno, o que está em desacordocom todas as pesquisas que têm sido feitas sobre o assunto nasúlt imas décadas. É por pensarem desta forma que muitosprofessores de crianças de 6 anos adotam posições extremas:enquanto alguns defendem a al fabet ização nesta fase, epraticamente obrigam a criança a apropriar-se do código escrito,através de sucessivos treinos motores, auditivos e visuais, outrosse dizem “defensores da infância” e, em nome dessa defesa,impedem a criança de ter qualquer contato com a língua escrita,para que ela não corra o risco de se alfabetizar e “queimar etapas”,

como se fosse impossível uma concomitânciaentre um ambiente lúdico e um letrado. Ao invésde se perguntarem se devem ou não ensinar acriança de 6 anos a ler e escrever, essesprofessores deveriam, na verdade, apenas sepreocupar em permitir que ela aprenda .

Ampliar o Ensino Fundamental para 9 anosrequer uma reorganização geral da escola, emseus múltiplos aspectos: envolve reorganizar agestão escolar e o projeto político-pedagógicodesta “nova” escola, repensar o currículo, asmetodologias e conteúdos, adaptar à criança de 6anos os materiais e espaços da escola de Ensino

Fundamental, refletir detidamente sobre todo o processo deavaliação, e buscar relacionar as etapas da escolaridade aos temposda vida humana, refletindo sobre as características da infância e daadolescência.

Um bom ponto de apoio a quem deseja se embrenhar nesta reflexãosobre o Ensino Fundamental de 9 anos é a consulta aos documentosorientadores produzidos pelo MEC, distribuídos a todos os sistemasde ensino do país, e disponíveis no site do Ministério (www.mec.gov.br).

Para f inal izar, é imprescindível lembrarmo-nos de que a

Educação Infantil não está sendo reduzida, pois, independente deleis ou decretos, a infância continua a mesma, e infantil ainda é aeducação da criança de 6 anos, assim como a da criança de 7, 8,9 ou 10 anos de idade. A aprovação da Lei 11.114 definiu um rumo,dando à ampliação da escolaridade um caráter de sentidoobrigatório. Contudo, ao percebermos que o Ensino Fundamentalde 9 anos apenas busca propici ar, a todas as crianças, um tempomais longo de convívio escolar, maiores oportunidades de aprendere, com isso, uma aprendizagem com qualidade, este sentidoobrigatório multiplica-se, enriquecendo-se de outros sentidos,transformando-se, finalmente, num sentimento obrigatório a todosaqueles que se julgam comprometidos com uma educação dequalidade.

Elaine Cristina Rodrigues Gomes Vidal é educadora, licenciadaem Letras (USP), capacitadora e coordenadora pedagógica doGruhbas Projetos Educacionais e Culturais e colaboradora do jornalBolando Aula.

Nota:

1 FERREIRO, Emília – Com todas as letras. 11ª ed. – São Paulo:Cortez, 2003 – p. 36

“Receber a criança de seis

anos na escola não significa

simplesmente anexar ao

Ensino Fundamental o estágio

final da Educação Infantil, emuito menos antecipar a

antiga 1ª série, com todas as

suas práticas habituais.”

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BBBBBUSCANDO SOLUSCANDO SOLUSCANDO SOLUSCANDO SOLUSCANDO SOLUÇÕES PUÇÕES PUÇÕES PUÇÕES PUÇÕES PARA UMAARA UMAARA UMAARA UMAARA UMA

ESCOLA NOESCOLA NOESCOLA NOESCOLA NOESCOLA NOVVVVVA:A:A:A:A: VISÃO GLVISÃO GLVISÃO GLVISÃO GLVISÃO GLOBOBOBOBOBALALALALALDenise Cardoso de Campos

Estamos cercados de problemas importantíssimos, de questõesfundamentais em relação ao cotidiano escolar, formação de discentese docentes.

É mais que necessário repensar a estrutura da educação/ensino. Hoje maisdo que nunca, o profissional da educação deve buscar informações, terconhecimento, aceitar novas propostas e procurar trabalhar de maneirainterdisciplinar; além disso, deve ser um pesquisador e transformador da própriaprática docente.

Passamos anos e anos reproduzindo aquilo que consideramos certo, não nosdamos conta de nosso enraizamento e simplesmente reproduzimos aquilo quefavorece os desígnios da política educacional vigente, sem questioná-la devidamentemesmo que tenha fatores negativos. Aceitamos o que é imposto de cima parabaixo.

O profissional da educação, relegado a segundo plano e desvalorizado diantedas políticas governamentais de educação, torna-se por vezes alienado epassivo. Com isso, não se encontra preparado para novos desafios e novaspráticas.

Tentar rever posturas já incorporadas e conceitos pré-estabelecidos é tarefaárdua mas necessária para alcançar as mudanças em favor da melhoria profissionale, conseqüentemente, em favor também de alunos mais preparados e derealizações concretas.

Assim, é primordial analisar a atual cultura fragmentada do saber, a falta devisão global e o futuro que nos espera. É tempo, portanto, de reavaliar as“certezas não tão certas”, aprender nas transgressões, entender o subsolo denossa docência.

Muito se tem falado que o sistema tradicional de educação parece ultrapassadono espaço global. Existe a preocupação em criar sistemas globalizadores emcomunicação, economia e política; nãoexiste, porém, a preocupação em formaralunos dentro deste contexto, de modoa torná-los aptos para o mundo que osespera.

Faz-se necessária a coragem pararomper este sistema que forma o aluno

com base na fragmentação do ensino,na cultura conteudista e na memóriapara medir o conhecimento, pois essaspráticas favorecem o individualismo.

É de relevância para a educação abrirespaços e adotar novas posturas, pois temos que ter consciência de que osalunos são capazes de vivenciar e aprender com situações inovadoras que irãopossibilitar um novo olhar em relação a si, aos outros e ao mundo. Levá-los aconstruir o conhecimento através de atitudes interdisciplinares é levá-los àabordagem de um mundo futuramente mais justo e solidário, rompendo de vezcom a “educação que nos ensinou a separar, isolar” (ARROYO, 2000:171),reproduzindo nossa própria formação, a qual não gerou a concepção da visão dotodo, do Global. O conhecimento global torna-se vital numa época em que ossaberes surgem e se acumulam rapidamente, mas não garantem um crescimentopessoal mais humanizado pela incorporação de valores. Recusando a fragmentaçãodo conhecimento, aprendemos a considerar diferentes ângulos da realidadetomada como um todo.

Devemos incorporar a capacidade de sempre refletir sobre nossa práticadocente, com o objetivo de evitar a reprodução de erros educacionais. Temos queaprender e compreender nossas tarefas como formadores de cidadãos e, dessa

forma, assumir posições emancipadoras.A formação dos docentes nunca esteve tão tumultuada entre tantos e diferentes

dilemas educacionais, principalmente em meio às inúmeras transformações deum mundo conturbado.

Nós, professores, devemos reconhecer nossa responsabilidade social.Precisamos estar minimamente preparados para formar o cidadão digno no mundoatual. No processo da educação, em síntese, precisamos desenvolver uma parceriade co-responsabilidade (professor – aluno – comunidade). Para isso, faz-senecessário que o docente esteja bem preparado e, acima de tudo, atualizado emotivado pelas novas tendências, preparando-se efetivamente para realizarmudanças, adotando atitudes “transgressoras” e posturas reflexivas, baseadas

na colaboração e solidariedade, para que objetivamente ocorram as esperadasconversões que tornarão o conhecimento algo vivo, prazeroso, participativo,agradável.

O educador espanhol Fernando Hernandez defende a idéia de que embora asdificuldades existam, devemos acreditar que é possível alcançar qualidades semter a preocupação em cumprir “ordens”, programas e conteúdos pré-estabelecidos.

O não insistir em reformular nossa postura limita nosso espaço e nossa visãode educação. Ao sairmos em busca de respostas, acreditando em mudanças,

nós, profissionais da educação,poderemos nos surpreender, pois esteé o caminho para sair da crítica pesadae agonizante — tão repetida nas últimasdécadas — que só vê negatividade naescola e, por extensão, no professor deescola pública.

Nós, docentes, temos consciênciade que contribuímos para que nossoaluno se torne capaz de resolverdiferentes tipos de problemas que seapresentem nas mais variadassituações; também temos consciência

de que contribuímos para que esse aluno desenvolva o repensar e a transformaçãoda sociedade. Temos consciência, portanto, de que contribuímos para a formaçãodo cidadão.

Edgar Morin, em suas reflexões sobre a vida, visualiza a educação do futurocentrada na condição humana situada no Universo, no qual a inteligência e oconhecimento não são parcelados. Ele ressalta que o ser humano, assim comoa sociedade em que se vive, é multidimensional.

É preciso, portanto, coragem para romper as amarras, e conhecimento parafundamentar e efetivar as novas propostas, descartando a “educação bancária” esuperando as práticas conteudistas e o ensino marcado pelo positivismo/ racionalismo. É preciso buscar alternativas para superar os padrões que foramimpostos na formação educacional de várias gerações, nas quais os verdadeirossaberes ficaram abandonados, gerando indivíduos adormecidos ao verdadeirosentido do conhecimento, que é a própria vida.

É preciso portanto buscar, na escola, esta mudança que levará ao

desenvolvimento do homem e de seu convívio social e político em direção aoconhecimento baseado na busca de relações entre os fenômenos naturais, sociaise pessoais, os quais ajudarão a compreender melhor a complexidade do mundoem que vivemos e que se configurará como um processo em construção, compermanente aprendizagem.

Falando de forma concisa, a força motriz da educação está na busca de novaspropostas, na coragem de remover, alterar e reavaliar velhas posturas, na esperança deque, no terceiro milênio, alcancemos uma educação norteadora de um mundo melhor.

Afinal somos responsáveis pelos futuros cidadãos. Assim, a educação nãopode produzir “insensibilidade, incapacidade de responder aos apelos da vida,restringindo, portanto a possibilidade de futuras experiências mais ricas”(DEWEY,1971:14). Está em nossas mãos a construção da escola Hoje.

Denise Cardoso de Campos é Pós-graduada em Gestão Educacional e emGestão Escolar para Formação de Profissionais da Educação; professora deHistória da E.E. “Profª Amália G. R. Patto”, em Tremembé, SP.

“A formação dos docentes

nunca esteve tão tumultuada

entre tantos e diferentes

dilemas educacionais,

principalmente em meio àsinúmeras transformações de

um mundo conturbado.”

“..a força motriz da educação está

na busca de novas propostas, na

coragem de remover, alterar e

reavaliar velhas posturas, na

esperança de que, no terceiro

milênio, alcancemos uma

educação norteadora de ummundo melhor.”

Referências

ARROYO, M. Ofício de mestre : imagem e auto-imagem. 5ª edição.Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

DEWEY, John. Experiência e Educação . São Paulo: Nacional, 1971.FAZENDA, I. Dicionário em Construção : Interdisciplinaridade. São Paulo:

Cortez, 2001.MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro . 3ª edição.São Paulo: Cortez ; Brasília, DF: Unesco, 2001.

TAVARES, J. “Uma sociedade que aprende e se desenvolve. Relaçõesinterpessoais”, in ALARCÃO, Isabel. Escola reflexi-va e nova racionalidade .Cap. 3, Porto Alegre: Artmed, 2001.

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Miguel Arroyo

Miguel Arroyo: “Por que projetos sobre correção de fluxo” 

Por que projetos sobre correção de fluxos? Que importânciapodem ter para Secretários e Secretarias que trabalham esão responsáveis pela educação de um município e até do

Estado? Nós temos como missão criar direitos na EducaçãoFundamental. Estamos orgulhosos de ver que 97% das crianças de 7a 14 anos, adolescentes inclusive, estão na escola. Mas será suficienteque estejam todos na escola? Será que elas não teriam direito a algomais do que estar na escola? Será que elas não têm direito a umpercurso digno ao longo de seu tempo de escola? Esta é a perguntaque hoje nos fazemos, quando quase todas as crianças e adolescentesestão nas escolas. Não é suficiente dizer que 92, 95 ou 100% dascrianças e adolescentes de 7 a 14 anos estejam na escola. É precisoanalisar o percurso delas: é um percurso sem atropelos, ou é um

percurso cheio de interrupções? O problema não é se são repetentesou multi-repetentes, o problema é que toda criança tem direito a umtempo de escola, a um percurso escolar digno e contínuo. Mas para amaior parte de nossas crianças e adolescentes, esse é um percursocheio de acidentes, truncado. Assim, pensar em projetos sobrecorreção de fluxo é pensar em projetos re-ferentes a um percursodigno e sem interrupções.

Como fazer um projeto sobre correção de fluxo escolar ou sobregarantia do direito a um percurso escolar? É preciso primeiro fazer umdiagnóstico que justifique o projeto. Esse momento é fundamental. Comovamos olhar o fluxo escolar? Como vamos analisar o direito a um percursoescolar e diagnosticar tantos percursos truncados, tantas crianças “defa-sadas”? Dependendo do diagnóstico que façamos, serão propostas asmedidas. Então, quais são os possíveis diagnósticos?

Primeiro tipo de diagnóstico, muito freqüente: culpar os educandospela defasagem, por não seguirem um percurso normal, seminterrupções. Ao final, o diagnóstico terminaria sendo este: quantosrepetentes existem na escola? Quantos repetentes por série?

Quantos são multi-repetentes? A que atribuímos isto? O diagnósticomais freqüente é pensar que o problema é do aluno, que não temcapacidades para aprender, que tem “problemas de aprendizagem”,como se fizesse parte da condição humana unsterem mais capacidade, outros mais ou menos,outros nenhuma. Se é natural que uns sejam maiscapazes do que outros, a escola não tem nada afazer e nem adianta apresentar um projeto. Se oproblema é de outra ordem, que diagnóstico fazer?A que atribuirmos a defasagem, esse fluxo nãofluido? Ultimamente se fala em falta de motivação.E quem sabe, se começarmos a cantar, a dançar,a fazer piruetas na frente deles, quem sabe se,depois de tudo, eles se motivam para o saber? Que uma pessoa naterceira idade não tenha motivação para umas tantas coisas aindaé aceitável, mas dizer que uma criança não tem motivação para avida, para aprender, para perguntar, para querer saber, é que algumacoisa grave está acontecendo. Eu duvido, que o problema seja de

motivação, mas há muitos projetos fundamentados nessediagnóstico.

O segundo tipo de diagnóstico, ainda centrado no educando, dizrespeito à classe social, pois quem tem mais dificuldade para aprendernão são os filhos da classe média alta. Segundo esse raciocínio, a escolanunca será um direito das camadas populares. A psicologia, a sociologiae a antropologia já afirmaram que todos têm capacidade de aprender. Efalamos em alunos lentos, em ritmos lentos. Um projeto com essediagnóstico não dará em nada, já por princípio é errado, porque não háfundamento teórico para essa classificação.

Cor Cor Cor Cor Cor r r r r r eção de Feção de Feção de Feção de Feção de FluxluxluxluxluxoooooLeia a seguir síntese da palestra do professor Miguel Arroyo a respeito dos fundamentos para projetos sobre correção de fluxo.

Mexer com educação émexer com pessoas e

não só as pessoaseducandos, mas as

pessoas educadores.

É possível um novo diagnóstico, uma fundamentação com outroshorizontes quando nos perguntamos se o problema é da escola. Se,no dia em que se matriculam na primeira série ou na pré-escola, todostêm a mesma capacidade como todas as ciências falam, somos nósque não sabemos conduzir essa capacidade de aprender, essacuriosidade, essa motivação. É por isso que a criança se motiva edepois de um tempo se desmotiva. Será que a culpa é da escola?Mas a escola é muita coisa. A escola são professores. Será que nós,docentes, não somos capazes de motivar, de ensinar? Será que o

problema é o material didático, que está ultrapassado, não motiva,fala das mesmas coisa há tanto tempo? Estará o problema nosconteúdos, com tanta bobagem que é ensinada? Nas didáticas   tão

ultrapassadas diante das novas tecnologias dainformação, muito mais atraentes, mais ricasenquanto ficamos no cuspe e no giz? Por que, pormais que tentemos inventar novas didáticas, novasmotivações, os alunos ficam apáticos? O proble-ma é da escola? Essa é uma pergunta já mais séria.Não se trata de apenas dizer de quem é a culpa, oudizer: a culpa é tua, repetente . Não gosto da palavrarepetir , porque não são os alunos que repetem. Sãoreprovados e não são eles que se reprovam, alguém

os reprova. E eles não reprovam só na escola. A coincidência é queesses são os mesmos reprovados na vida. Então, que diagnósticofazer? Já percebemos que, na medida em que o percurso escolar vaipara a frente, o índice de motivação vai para trás. É nessas coisasque temos que pensar ao diagnosticar: o que desmotiva? O que não

desmotiva? Que áreas têm motivação, que outras áreas não têm?Que didáticas desmotivam, que didáticas motivam? Não se trata decondenar a escola, professores, diretores ou secretários. Temos queacabar com essa história de culpados, mas temos de ter coragemde olhar para toda a instituição e procurar ver com mais clareza ondeestão os pontos em que o percurso escolar se interrompe. Porexemplo, o que há em determinadas áreas do conhecimento que astorna tão duras, tão excluentes? E por quê? Em nome do que, porexemplo, a matemática reprova em 30%? O diagnóstico tem que iràs culturas docentes, Cada um de nós chega à escola não só com

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Miguel Arroyo é Professor titular da Faculdade de Educação daUniversidade Federal de Minas Gerais. Foi Secretário Municipal deEducação de Belo Horizonte, coordenou a elaboração e a implantaçãodo projeto Escola Plural. Autor de vasta obra em educação, entre elesDa escola carente à escola possível, Ofício de mestre e Imagensquebradas: trajetórias e tempos de alunos e mestres (Vozes).

Como fazer um projetosobre correção de fluxo

escolar ou sobregarantia do direito a um

percurso escolar? Épreciso primeiro fazer

um diagnóstico quejustifique o projeto.

... o que produz aretenção, a defasagem,a reprovação, é a lógica

que estrutura nossosistema escolar.

nossa aula bem preparada, mas também com nossa auto-imagem,com nossa cultura e com as culturas das áreas de conhecimento.Num projeto sobre correção de fluxo, é preciso fazer um diagnóstico

das culturas docentes, inclusive por área, para ver qual delas tem osfiltros mais fechados, quais as que reprovam mais, que retêm mais,para então fazer um projeto de intervenção sobre como trabalhar asculturas docentes. O problema é mais profundo do que as dificuldadesde aprendizagem. O problema das culturas docentes, das culturas deáreas, tem que ser colocado com muito cuidado, mas também commuita coragem. O que levou as ciências, estas ciências duras, a seconstituírem como filtros inquestionáveis de é ou não retido ? Quemdeu a elas esse direito? Se não mexermos, estaremos repetindo asmesmas coisas e elaborando osmesmos projetos, gastandodinheiro e daqui a 4 ou 5 anos, osproblemas de repetência serão osmesmos.

Há, ainda, alguns pontos quedeveriam ser diagnosticados e,para eles, elaborados projetos paraintervenção. Quais seriam estes

outros pontos?Hoje, faz-se o diagnóstico do

custo da repetência, não o custohumano, mas o custo financeiro,o custo para o orçamento. Écurioso que muitos dos bancos que fazem f inanciamento à educaçãoestejam fornecendo diagnósticos sobre o custo de se ter 20 ou 30%de alunos repetentes: o custo de recursos humanos, do materialescolar, das vagas etc. Hoje muitas das políticas de correção defluxos têm por obrigação baixar os custos — não humanos, masfinanceiros. Seria possível apresentar um projeto usando esseargumento como justificativa, pois, por exemplo, há estatísticas quemostram que a média de anos para completar a oitava série chegaa quase 12, ou seja, quatro a mais, o que representa um custoadicional de 50%. Assim, pode-se apresentar um projeto que tenhacomo final idade reduzir os custos, se não nos motivam osargumentos pedagógicos de que é necessário pensar em medidasde correção de fluxo para educação. Hoje muitas medidas vão nesta

direção: fala-se que é necessário facilitar o fluxo, a passagem, commedidas que se transformaram em progressão automática,procurando-se dar mais tempo para os mais lentos, ou dar umacompanhamento paralelo, ou criar turmas de aceleração. O queestá acontecendo, a motivação principal, é exatamente estediagnóstico que se fez de que os custos da lentidão dos fluxos sãotão altos que é neces-sário corrigi-los. Este diagnóstico tem queser feito, sim, mas o que não podemos aceitar são as medidasque terminam rebaixando o direito à Educação ao mínimo O quenão podemos é criar agora uma categoria de direito à Educação,diríamos, com 100% de direito, 50% de direito e apenas 20% dedireito, porque os que vão ficar nos 20%, são os de sempre — ospobres, os meninos de rua, os adolescentes que trabalham, osnegros, enfim, os que na vida não têm nem 20% de moradia, nem20% de salário, nem 20% de saúde e agora nem 20% de educação.

Outro ponto é que há outras formas de equacionar a correçãode fluxo. O que nos falta é perguntarmo-nos: O que produz adefasagem? O que produz a interrupção do fluxo? Quem produz

defasagem? Quem produz a retenção do fl uxo escolar? A cada diame convenço mais de que o que produz a retenção, a defasagem,a reprovação, é a lógica que estru tura nosso sistema escolar. Umalógica que já fo i superada na maior parte dos s is temaseducacionais do mundo, mas que nós teimamos em manter: é alógica estruturante de nossos conteúdos, de nossa escola, denossa docência, de nossas didáticas, de nossa organização dostempos e dos espaços. Que lógica é esta que, de alguma forma,nos obriga a ter que reter, a ter que reprovar, a ter que censurar, ater que excluir?

No meu entender, o que nos leva a ter que reprovar é uma lógicapropedêutica, sempre preparatória para algo. A forma como falamosda escola, do sistema escolar é sempre no sentido de preparar para .

Em vez de se falar do direito à educação que a criança tem, fala-seem educação pré -escolar. A palavra pré-escolar é a expressão clarada concepção que temos do sistema escolar, no qual tudo é feitopara preparar para alguma coisa. O pré-escolar prepara para a 1a a4a, a 1a a 4 a prepara para 5a a 8 a, a 5a a 8 a prepara para EducaçãoMédia, que prepara para o vestibular — palavra que vem de vestíbulo ,que é antes da entrada —, que prepara para a universidade. Há todauma concepção preparatória que obriga a ter que reter aquele quenão adquiriu os conhecimentos preparatórios para a próxima etapa.Então, não é nenhum professor de matemática que reprova, é a lógicapropedêutica, que não vê a Educação como um direito de cada tempopela vida, mas como uma preparação para a próxima etapa.Conseqüentemente quem não está preparado não vai para a próximaetapa. Por isso, falamos: está reprovado porque é lento, porque está desacelerado, porque tem um problema, porque tem um problema de matemática, porque não gosta. Mas, na realidade, não é isso, trata-se da lógica propedêutica, preparatória que ainda predomina em nossacabeça, em nossa formação e na organização de nosso sistema

educacional. Mas a Educação Básica — o nome já diz — não épreparatória para a Universidade, é para garantir o direito básicoobrigatório ao oferecimento da cultura, da arte, das ciências. Seriamaravilhoso se as redes de ensino elaborassem um projeto quetentasse diagnosticar qual é a lógica estruturante da escola quetermina produzindo a defasagem e a retenção, quebrando o direitoao fluxo escolar. É uma lógica, também seriada, etapista, em quecada etapa, cada série tem que ir atrás da outra, subindo como lajes,em que cada série é fruto de uma laje. É também uma característicadesta lógica ser classificatória, sempre há os lentos e os rápidos, os

com problemas e os semproblemas, os que querem e osque não querem, sempreclassif icados, numa lógicaexcludente. E são os mesmos desempre os reprovados por nóseducadoras e educadores: osreprovados na vida, os reprovados

no emprego, os reprovados nacadeia, os reprovados pela

polícia. Que função é a nossa? É esta a questão. Vamos fazer projetos,partindo de quais diagnósticos? Se assumimos isso comodiagnóstico, a medida tem que ser qual? Mexer nessa lógica. Masserá que é possível outra lógica? Será que não é utopia pensar noutralógica? Sabemos que não é fácil jogar pela janela tão facilmentenossas personalidades, nossas crenças, nossos valores, nossasconcepções. Mexer com educação é mexer com pessoas e não sóas pessoas educandos , mas as pessoas educadores . O livro “Ofíciode Mestre” toca em imagens e auto-imagens e a pergunta fundamentaldele é: O que está acontecendo com a gente? Estamos triturando,estamos num momento muito complicado de nossa vida pessoal, denossas crenças, nossas imagens. Temos coragem para fazer essediagnóstico? Se tivermos, temos que pensar nas medidas para darconta desse diagnóstico que nos diz que somos todos — professores,diretores, secretários — vítima da lógica do sistema educacional. Asvítimas que mais sofrem com essa lógica são as crianças,

adolescentes, jovens “defasados”. Olhem que palavra bonita,“defasados” ...

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A LEI 10.639/2003 ALTERA A LDB, O OLHAR

SOBRE A PRESENÇA DOS NEGROS NO BRASILE TRANSFORMA A EDUCAÇAO ESCOLAR1

Bel Santos Mayer

“Pode ser verdade que seja impossível decretar a integração por meio da lei,mas pode-se decretar a não-segregação. Pode ser verdade que seja 

impossível legislar sobre moral, mas o comportamento pode ser regulamentado. Pode ser verdade que a lei não seja capaz de fazer que uma 

pessoa me ame, mas pode impedi-la de me linchar”.(Martin Luther King Jr)

Aalteração dos artigos 26 e 79 da Lei 9.394/1996 de Diretrizes e Basesda Educação - LDB, através da lei 10.639/2003 deve ser entendida comoum passo importante a caminho de uma pedagogia e de uma didática

que valorize a diversidade étnico-racial e cultural presente no Brasil.Uma das características do processo de democratização do país tem sido a

alteração do marco legal, incluindo em forma de leis, antigas reivindicações sociaisde acesso aos direitos. São exemplos a Constituição Brasileira (1988), o Estatutoda Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), a LDB (Lei 9.394/1996) e sua recentealteração (Lei 10.639/2003), tema deste breve artigo. Indistintamente, essas leisincorporaram ao conceito de inclusão o direito inerente a todas as pessoas deserem tratadas em condições de igualdade independente de sua cor ou raça, aomesmo passo que deixaram patente que a democracia racial, tão apregoada, nãoé ainda uma realidade, necessitando, portanto, ser garantida por lei.

Quando o assunto é lei, vêm logo a nossas mentes algumas expressões dosenso comum: “lei no Brasil não pega... é só mais uma ”, “é para inglês ver ”, “se fosse bom o governo não dava, vendia ”, “é mais uma lei que vem de cima para baixo, para complicar a vida do/a professor/a 2 e da es cola”, “logo esquecem ”.

As organizações do movimento negro e diferentes instituições de pesquisa seempenharam para desvelar as desigualdades raciais que reduzem as oportunidadesda população negra, apresentando dados questionadores da democracia racial emnosso país3. Basta ligar a televisão, passar os olhos pelas bancas de jornal ououtdoors para identificarmos a ausência da diversidade étnico-racial brasileira nosmeios de comunicação. Em contrapartida, as campanhas e propagandas de cunho

social (como saneamento básico, alfabetização, doação para orfanatos etc) ou deadvertência à violência se valem da imagem de pessoas negras, naturalizando ouprovocando a rápida associação entre negro e miséria, negro e violência.

Assim é! Todos nós vemos! Todos os dias: no jornal, na novela, nas revistas, noslivros... Assim é a nossa sociedade! Assim acontece fora da escola, porque dentro...

Como acontece dentro? Como negros e negras são representados nos livros didáticos?Qual enfoque é dado à sua participação na história e cultura do país? Contamos a históriados escravos ou dos escravizados? Falamos de Zumbi e do Quilombo dos Palmares... Eo 20 de novembro? E as demais insurreições negras? Quantas foram? Onde aconteceram?Quais as atuais reivindicações pautadas pelos movimentos negros? Elas são apenas paraos negros e negras ou beneficiarão toda a sociedade? Se para lá dos muros da escola osconteúdos procuram inferiorizar negros e negras, o que acontece no espaço interno?Como a escola se contrapõe, vai à contramão e oferece possibilidades para que crianças,adolescentes e jovens negros e brancos construam uma justa imagem de si mesmos?

Perguntas como estas há décadas orientam os estudos e intervenções deorganizações negras e intelectuais brancos e negros, como F. Rosemberg4, AnaCélia Silva5, Eliane Cavalleiro6 e outros. Permito-me argumentar que ainda que outrasleis sejam resultantes da reivindicação popular, a inclusão da história e cultura daÁfrica nos currículos escolares destaca-se pela intensa mobilização social e pelacompetente metodologia produzida à margem do sistema oficial de ensino.

Entendendo que mudar o imaginário de África incidia diretamente no imagináriosocial sobre a população negra no Brasil, organizações do movimento negro,como o Ilê-Ayê da Bahia, passaram a desenhar uma proposta educacional parasuas crianças, incluindo uma história positiva da África, incluindo os mitos, aancestralidade, a topografia do terreiro à sua concepção pedagógica. A princípioessas práticas pretendiam ser complementares ou alternativas à educação escolarque, baseada na ditadura do “mono”, invalidava e abortava a diversidade cultural eracial presente em seus alunos, produzindo com esta invisibilização uma escalade valores na qual a história e a cultura da África ocupavam os últimos lugares.

A experiência do Apo Afonjá, sistematizada por Vanda Machado7 é um felizexemplo de busca de uma pedagogia nagô, que liga a educação escolar ao

mundo do terreiro com toda a sua riqueza material e simbólica, envolvendo todaa comunidade com a ação educativa, promovendo o conhecimento e o respeitoàs religiões de matriz africana. Crianças ainda muito pequenas ouvem ereescrevem com suas educadoras histórias de reis e rainhas africanos como aRainha Nzinga, de lutadores como “O caçador de uma flecha só, que trouxe alegria” , e assim aprendem a gostar mais de si mesmas. O passo seguinte foilevar esta pedagogia para a escola, incluir este novo olhar e novos sentidos àformação dos educadores da rede pública e aos espaços acadêmicos.

Se formos um pouco mais longe no tempo, encontraremos, desde 1940, oTeatro Experimental do Negro preocupado com uma educação que valorizasse aparticipação do negro na construção da história. Para atender esta necessidade,criaram cursos de alfabetização, arte e cultura para adultos e crianças8.

Na última década, é possível mapear várias iniciativas de educadores e degestores do setor público e privado, voltadas para a difusão do “20 de novembro”como o Dia da Consciência Negra e do combate ao racismo.

O conjunto dessas práticas impulsionou a inserção da história e cultura da Áfricae dos afro-brasileiros no currículo oficial de algumas secretarias de educação nadécada de 1990 e, em 2003, em todo o sistema educacional, como lei federal.Portanto, a Lei 10.639/2003 não é um “presente do governo”; não vem “de cima parabaixo”. É uma conquista das organizações do movimento negro para a sociedadebrasileira. Um passo importante neste processo foi a consolidação no Plano de Açãoda III Conferência Mundial Contra o Racismo, do direito de ter incluído nos currículosescolares a história que até então não havia sido contada oficialmente nas escolas.

Atuando na formação de educadores sobre as relações raciais, tenho observadoque, no geral, as unidades educacionais já reconhecem ser sua tarefa educarpara a igualdade racial, ainda que alguns educadores estejam esperando umasituação explícita de racismo, para então pensar no assunto. Há, também, aquelesque acreditam ser necessário fazer algo, porém, têm dúvidas sobre como fazê-lo. A tendência é delegar esta missão ao professor e professora negros militantesou aos docentes de História, que são considerados como “aqueles que sabemdestas coisas”, enquanto os demais ficam à espera do dia em que estarão bempreparados para tratar tema tão delicado!

As dificuldades muitas vezes estão pautadas mais em receios, medos, mágoase inseguranças para a abordagem da temática racial do que na falta de conteúdos,materiais ou fontes de pesquisas. Acreditamos que tais sentimentos ou conteúdossubjetivos não devem ser ignorados. Muitas vezes, os educadores brancos, negros,indígenas não tiveram oportunidade de refletir sobre sua própria identidade racial eétnica, sobre como vivenciaram e vivenciam as relações raciais. Cabe uma propostaefetiva (planejada, contínua, consistente) de formação de educadores, oferecendoconteúdos, mas também, dando conta das questões subjetivas, para encorajá-losa uma prática que promova a igualdade racial e enfrente o racismo. Trata-se demudar não apenas os conteúdos ministrados em sala de aula, mas também oolhar e os sentidos dados a estes conteúdos e à diversidade étnico-racial.

Assim, as práticas de combate ao racismo e promoção da igualdade, precisamcontribuir para:

•Reconhecimento das desigualdades étnico-raciais e uma postura crítica diantedo “mito da democracia racial”.

•Discussão sobre as relações raciais e não sobre os problemas de negros e índios.• Reflexão sobre o que significa ser pessoa branca no Brasil.• Releitura dos processos históricos, considerando os conflitos e valorizando

as formas de lutas e resistências de negros/as e indígenas.• Inclusão do corte étnico-racial nas leituras e análises da realidade e nas

experiências concretas.•Contato subjetivo com o tema, ou seja, com os próprios sentimentos envolvidos

no modo como a pessoa viveu as relações raciais na família, na escola, no localde trabalho etc.

• Percepção do impacto do racismo e suas combinações com outras formasde discriminação, no currículo escolar.

• Diálogos com outros educadores, com organizações do Movimento Negro,com os formadores.

• Estratégias de combate a atitudes preconceituosas e discriminatórias nasociedade e no espaço escolar.

• Plano de ação para a inclusão do tema étnico-racial no espaço escolar.

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Acreditamos que estes sejam passos importantes, para que a escola cumprasua tarefa de educar; nas palavras de MUNANGA (2005) fazendo de “nós verdadeiros educadores, capazes de contribuir no processo de construção da 

democracia brasileira, que não poderá ser plenamente cumprida enquanto perdurar a destruição das individualidades históricas e culturais das populações que formaram a matriz plural do povo e da soc iedade brasileira .”9

Nessa perspectiva, podemos afirmar que significativas práticas “alterativas”10

vêm se multiplicando em território nacional: Semanas da Consciência Negracom debates, oficinas, cursos e marchas, a exemplo da VII Semana daConsciência Negra de Guarulhos; bibliografias afro-brasileiras têm chegado àssalas de leitura e bibliotecas das escolas; secretarias municipais têm realizadoprogramas de formação continuada sobre o tema em unidades escolares duranteos horários coletivos; seleção, análise e disseminação de práticas educacionaiscomo o organizado pelo PrêmioEducar para a Igualdade Racial , promovido peloCentro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades – CEERT11.

Daquilo que temos observado, quanto à inclusão da história e cultura da Áfricae dos afro-brasileiros no currículo escolar, podemos dizer que a inclusão de umaperspectiva africana ao currículo tem provocado grandes mudanças no modo deensinar, nas metodologias de ensino e nos recursos didáticos. Observa-se umamaior coerência entre o conteúdo, a metodologia, o método e as técnicas. Estaspráticas tendem a ser mais participativas, contam com a presença da comunidadeescolar em seu sentido mais amplo (familiares, organizações sociais etc), estimulama pesquisa, valorizam a oralidade, os símbolos, os mitos, a ancestralidade.

Não tememos ser otimistas, ao dizer que a Lei 10.639/2003, já nasceultrapassando o limite da obrigatoriedade. Aos poucos, a África está deixando deser um “país carente ” para se tornar um continente cheio de contradições e belezashistóricas. Na mesma medida, a escola vai deixando de ser o terreno da exclusãode crianças negras e indígenas, para se tornar espaço de intervenção pedagógicade combate ao racismo e de promoção da igualdade racial. Vão desaparecendo asações solitárias das salas de aula e emergindo projetos coletivos, “projetos- continente ”, partilhados com outros educadores e educadoras, com organizaçõesdo movimento negro, com pesquisadores e gestores da educação. Os livros comvisões estereotipadas vão cedendo espaço àqueles que falam de tantas diferentesgentes, em tantas diferentes línguas, de tantos diferentes modos, com tantosdiferentes sentimentos, jeitos, cabelos e visões de mundo. Rompe-se o silênciodiante de situações de discriminação, sejam elas explícitas ou não. Não se esperaque o discriminado aprenda a ser forte para suportar o racismo; aos poucos aquelesque discriminam vão sendo chamados à responsabilidade, à construção de novasrelações que superem os preconceitos. A enciclopédia de heróis brasilei ros vai seenegrecendo e as novas gerações podem se orgulhar de negros e negros queprotagonizaram momentos históricos e que estavam esquecidos ou embranquecidos.

Na medida em que educadores têm dificuldades para abordar a temática racial outêm vontade de aprofundar sua formação sobre estudos afro-brasileiros, podemcontar com vasta bibliografia e com a parceria das universidades e seuspesquisadores. Os quilombos deixam de ser referência do passado e fazem, cadavez mais, parte do universo das escolas. Uma boa escola passa a ser assimdenominada, na medida que reflete em todos os seus aspectos, a diversidadeétnico-racial presente na sociedade brasileira. Utopia? Utopias possíveis? Projeto?Desejos? Um “projeto-continente”, que não está pronto. Está sendo e poderá serconstruído por cada um, por cada uma de nós, cotidianamente. Sua implantaçãoimpulsionará mudanças tão substanciais, que estudantes negros, brancos,indígenas e de outros grupos étnicos terão que consultar o dicionário paracompreender os termos preconceito, racismo, discriminação e exclusão!

Para ampliar o debate:Vídeos:“Vista minha pele” – CEERT“Rompendo o silêncio” - SEBRAP

Filmes:“A negação do Brasil “, de Joel Zito Araújo. Documentário sobre a representação

do negro na telenovela brasileira“Filhas do Vento” de Joel Zito Araújo. O filme ambientado em Minas Geraisapresenta a trajetória de quatro mulheres negras.

“Kiriku e a feiticeira ”, de Michel Ocelot. Desenho animado que tem como heróinegro, o pequeno Kiriku, que já nasce falando e querendo descobrir porque a feiticeiraKarabá, que engoliu todos os homens da aldeia africana onde vive, é má.

“Serafina: o som da liberdade” , de Darrel Roodt; Na África do Sul, uma professoraensina seus alunos a lutar por seus d ireitos e contra a discriminação racial.

Músicas:“Haiti ”, de Caetano Veloso e Gilberto Gil.

“A carne ”, de Marcelo Yuka, Seu Jorge e Wilson Cappellette.“Txai”, de Milton Nascimento.

Sites:<www.dialogoscontraoracismo.org.br>. Informações sobre a campanha “Onde você guarda seu racismo ?”, iniciativa de 40 instituições da sociedade civil, quetêm promovido “Diálogos contra o racismo ”, como forma de impulsionar e consolidara igualdade racial em nossa sociedade.

Livros:BENTO, Maria Aparecida da Silva. Cidadania em preto e branco. São Paulo:

Ed. Ática, 1999.ROCHA, Rosa Margarida de Carvalho. Almanaque Pedagógico Afrobrasileiro.

Uma proposta de intervenção pedagógica na superação do racismo no cotidianoescolar. Mazza Edições: Belo Horizonte, 2004.

LIMA, Heloísa Pires. Personagens negros: um breve perfil na literatura infanto-  juvenil. In: MUNANGA Kabengele (Org). Superando o racismo na escola. SECAD/ MEC, 2005.

MEC, CNE/CP 003/2004. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana.

SANTOS, Isabel Aparecida, “A responsabilidade da escola na eliminação do preconceitoracial: alguns caminhos”. In: CAVALLEIRO, Eliane (org). Racismo e anti-racismo na educaçã o: repensando nossa escola. São Paulo: Summus, 2001, p. 97-114.

SOUSA, Andréia Lisboa. A representação da personagem feminina negra naliteratura infanto-juvenil brasileira. In: Educação anti-racista : caminhos abertos pelaLei Federal nº 10.639/2003. Coleção Educação para Todos. SECAD/MEC, 2005.

Notas:1 Este artigo foi originalmente elaborado para o caderno do Programa “Salto

para o Futuro” da TVE do Rio de Janeiro em 2004, sendo feitas algumasatualizações em novembro de 2007.

2 A partir deste momento, para efeito de facilitação da leitura e da escrita,utilizaremos os artigos femininos apenas quando se tratar especificamente dogênero feminino. Nos demais casos, utilizaremos o gênero masculino.

3 De acordo com dados do Instituto de Pesquisas Aplicadas – IPEA, combase na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 1999, apesardos negros representaram pouco menos da metade da população, são 70% dosque vivem em situação de miséria; a pobreza atinge 38% das crianças brancas e65% das negras; um negro, com mesmo nível de escolarização que um brancoganha até 54% a menos que este; entre os meninos brancos 44,3% estão cursandoo II ciclo do Ensino Fundamental, já para os negros este percentual cai para

27,4%; sete em cada dez negros não completam o ensino fundamental.4 ROSEMBERG, Fúlvia, Literatura infantil e ideologia. São Paulo: Global, 1985.5 SILVA, Ana Célia da. A discriminação do negro no livro didático. Salvador:

EDUFBA/CEAO, 1995; e Desconstruindo o racismo no livro didático. Salvador,EDUFBA/CEAO, 2001.

6  CAVALLEIRO, Eliane. Do silêncio do lar, ao silêncio escolar. Racismo,preconceito e discriminação na educação infantil. São Paulo: Ed Contexto, 2000.

7 MACHADO, Vanda. Ile Axé.Vivências e Imersão pedagógica: as crianças do Apo Afonjá.

8 Quilombo: Vida, problemas e aspirações do negro, vols. 1-2, n° 1-11, Rio deJaneiro, 1948-50. Jornal do Teatro Experimental do Negro.

9 MUNANGA, Kabengele (Org.). Superando o Racismo na Escola. SECAD/ MEC, 2005.

10 O termo “alterativo” cunhado por outros autores, destaca a importância dealterar-se a realidade e não apenas alternar os conteúdos.

11 O Prêmio Educar para a Igualdade Racial em três edições, recolheu e analisoumais de 700 (setecentas) experiências educacionais de promoção da igualdaderacial/étnica, da educação infantil, do ensino fundamental e médio. Maioresinformações sobre as experiências e sobre como participar do Prêmio, podemser obtidas pelo site www.ceert.org.br.

Bel Santos Mayer é educadora social, formada em Ciências Matemáticaspela Universidade São Judas Tadeu e tem especialização em Pedagogia Socialpela Universitá Salesiana di Roma (Itália). Desde 1988 atua em organizaçõesnão-governamentais. Foi uma das fundadoras e coordenadora de Centros deDefesa dos Direitos da Criança e do Adolescente. De 1997 a 2004 coordenou oprograma “Educar para a Igualdade Racial” do Centro de Estudos das Relaçõesde Trabalho e Desigualdades – CEERT. Desde 1997 é co-coordenadora doPrograma de Formação em Direitos Humanos do Instituto Brasileiro de Estudose Apoio Comunitário – IBEAC. É empreendedora social da Ashoka desde 2004e membro da Comissão de Educação de Jovens e Adultos (CNAEJA) do MEC.

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ALei nº 10.639 de 2003 tornou obrigatório o ensino da História daÁfrica e dos afro-brasileiros no Ensino Fundamental e Médio etrouxe, ou talvez, reforçou nas escolas a discussão sobre o

papel e a posição do negro em nossa sociedade. Talvez seja realmentea escola o lugar mais adequado para se discutir a consciência negra, afim de superarmos a questão do preconceito racial.

Para tanto, é necessário que a escola abrace uma demanda urgenteque é a de ampliar a discussão e os projetos pedagógicos que privilegiema igualdade racial. Uma boa reflexão nesse sentido pode começar com

apenas uma questão: “Com quantas situações de preconceito e discriminação você se depara todos os dias? ”Um verdadeiro trabalho de consciência negra precisa começar desde

a mais tenra idade, privilegiando a questão da identidade, da diversidadee da auto-aceitação.

A criança negra precisa se amar, se aceitar e enxergar-se como cidadãherdeira de uma cultura e de uma raça guerreira, repleta de valores esignificados ímpares. A criança negra precisa enxergar-se como negra,respeitando sua imagem e valorizando seu padrão de beleza sem apreocupação de adequar-se a estereótipos maciçamente europeus.

Na verdade, esse trabalho deve ser desenvolvido em toda a escola enão apenas focando as crianças afro-descendentes. Todos precisamconhecer a cultura negra de uma forma livre dos preconceitosperpetuados pela maioria dos livros didáticos. É essencial enfocar ascontribuições dos africanos para o desenvolvimento da humanidade eas figuras ilustres que se destacaram nas lutas em favor do povo negro.

Vale lembrar que a escola deve divulgar o lado positivo da história negra,não apenas as questões de escravidão, miséria e sofrimento, mastambém as de heróis e heroínas negras, danças, cultos, crenças,músicas e manifestações sociais e culturais.

A literatura infantil tem muitos livros que permitem um trabalho deconscientização, interesse, valorização da cultura e identidade negra eposicionamento crítico a respeito das questões de segregação racial.Entre eles, estão Felicidade não tem cor , de Julio Emílio Braz e As tranças de Bintou , de Sylviane Diouf.

Uma proposta de trabalho significativo é sugerida pelo livro Menina Bonita do Laço de Fita , de Ana Maria Machado (Ed. Ática). Com um textoprimoroso e delicado, as crianças podem iniciar-se nessa reflexão demaneira prazerosa e divertida, onde a autora homenageia a beleza daraça negra.

A partir do livro, podem ser exploradas situações de leitura e escrita,dramatizações, produções de texto e até projetos de trabalho relacionados

a histórias das famílias, descendências, árvore genealógica, imigraçõese identidades raciais.

Abaixo, sugiro uma seqüência didática para as séries iniciais do EnsinoFundamental, a partir do livro Menina Bonita do Laço de Fita , enfocandoo trabalho voltado à Consciência Negra, comemorado no dia 20 deNovembro:

• mostrar apenas a capa do livro e pedir que as crianças levantemhipóteses a respeito do seu cotidiano;

• ler a história para as crianças na Roda de Leitura;

• espalhar algumas bonecas e bonecos pela sala (brancos e negros)e pedir que as crianças escolham um;

• iniciar uma discussão coletiva sobre os critérios de escolha adotadose os seus porquês;

• anotar as explicações das crianças “...escolhi a loira porque é a mais bonita ”; “gosto mais dessa porque tem olhos azuis ”; “...a roupa da Barbie é a mais bonita ”; “...o pretinho tem cara de bandido ”;

• questionar as explicações das crianças, tentando desmitificar oesteriótipo europeu adotado em nosso país como padrão de beleza ecomparar com as diferenças de beleza existentes em nosso país, acomeçar pela sala de aula;

fazer um levantamento do número de alunos negros na classe e naescola, assim como o número de professores e funcionários negros;criar um gráfico de barras e buscar, com as crianças, as explicaçõespara os números encontrados (diferenças entre escolas centrais eperiféricas);

• trabalhar a questão do preconceito racial, convidando algum lídercomunitário negro, ou pai de aluno, ou voluntário para falar sobre asdiscriminações sofridas ao longo de sua vida;

• pesquisar a história de negros brasileiros bem-sucedidos que jásofreram situações de preconceito (Ex.: Pelé);

•pesquisar a história de heróis e heroínas negras como a rainha Nzinga(líder da libertação do reino africano Ndongo em 1660) ou Dandara(guerreira do Quilombo dos Palmares, ao lado de Zumbi);

• explorar a árvore genealógica dos alunos e levantar a história familiarde cada um;

• trabalhar sons e ritmos africanos (capoeira, samba, maracatu);

• confeccionar máscaras africanas;• trabalhar obras de Debret sobre a escravidão, para sensibilização,

reflexão e comparação com a situação do negro atualmente;• produzir textos coletivos e individuais sobre a temática; organizar

exposições artísticas com trabalhos manuais e apresentações orais ecorporais de danças e jogos;

• produzir um livro, ou jornal, ou fôlder, ou calendário, ao longo de todoo processo de pesquisa e criação.

Essa temática é muito rica e permite uma diversidade muito grandede olhares e vieses sobre a mesma história.

A criatividade de cada educador permitirá a extrapolação dessapequena sugestão de trabalho sobre uma discussão social tão urgenteem nosso país.

Nas palavras do líder negro americano Martin Luther King (1929 –1968): “Temos de nos arrepender nessa geração não tanto pelas más ações das pessoas más, mas pelo silêncio assustador das pessoas 

boas ”.

Luana Serra Elias é professora da rede pública de Santos,capacitadora do Gruhbas Projetos Educacionais e Culturais ecolaboradora dos jornais Bolando Aula e Bolando Aula de História.Coordenadora da elaboração e uma das autoras do Caderno de Atividadespara a Série Inicial do Ensino Fundamental de 9 anos, produzido peloGruhbas.

TRABTRABTRABTRABTRABALHANDOALHANDOALHANDOALHANDOALHANDO A CONSCIÊNCIAA CONSCIÊNCIAA CONSCIÊNCIAA CONSCIÊNCIAA CONSCIÊNCIANEGRA DESDE CEDONEGRA DESDE CEDONEGRA DESDE CEDONEGRA DESDE CEDONEGRA DESDE CEDO

Luana Serra Elias

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Por volta dos seis anos, após assistir ao filme A Dama e oVagabundo, senti um desejo enorme de aprender a tocar piano.Nesse filme, há uma cena em que a dona de Lili, senta-se ao

piano e toca uma canção de ninar, para o filho recém-nascido. Isso foide tamanha força e emoção para mim, que desejei viver um momentoigual.

Implorei à minha mãe, durante alguns meses, para que me colocassenum curso de piano, sem revelar a ela o motivo do súbito interesse pormúsica. Finalmente, quando fiz sete anos iniciei o curso. No primeirodia, eu estava muito feliz e ansiosa. A professora apresentou-me o piano,teclas, cordas, pedais, sons graves, agudos... mostrou partituras e, por

fim, colocou-me sentada à frente do piano e deixou que eu apertasse asteclas. Que emoção!

Depois abriu um livro e ensinou a nota dó. E essa foi a primeira lição:apertar a tecla dó, alternando polegar direito e polegar esquerdo,cantarolando simultaneamente "dó, dó, dó, dó, dó, eu já sei onde eleestá. E assim, por algumas semanas, o mesmo exercício foi repetidoutilizando as demais notas, até que, finalmente aprendi algumas escalase outras "músicas" ridículas e tolascomo a primeira. Que tédio!

Eu repetia aquela tolice,esperando ansiosamente pela tãodesejada "canção de ninar". Eassim passaram-se os anos,sempre esperando por aquelamelodia tão encantadora. Mas noseu lugar, a professora ensinava

exercícios para eu ter "agilidade erapidez". Eram tão chatos eentediantes que passei a odiarcompositores como Bach, Chopin,Schubert... Isso sem falar nasintermináveis aulas de solfejo!Finalmente, no quinto ano - aosonze anos de idade - decidi que nãoqueria mais aprender nada e desistido piano.

Mas minha mãe me obrigou acontinuar, alegando que já havia gasto muito dinheiro com as aulas, quehavia comprado o piano - essas coisas de mãe. Então continuei osestudos, sem o menor interesse e sob a maior pressão.

No ano seguinte, porém, meu avô me deu uma coleção de três livrosmaravilhosos! Neles havia partituras de músicas que eu conhecia atravésdos discos que escutava em casa e passei a tocá-las. Dentre essaspartituras, estava a minha tão amada melodia de ninar!

Os anos seguintes no conser-vatório tornaram-se suportáveis, porquecomecei a procurar e comprar partituras de músicas que meinteressavam. Foi possível aprender a amar Bach e Chopin, entre outroscompositores clássicos, através dos discos com que meu avô mepresenteava.

E assim, aos dezesseis anos me formei. Aos vinte e três, quando tiveminha filha, realizei meu primeiro grande sonho: toquei aquela lindacanção de ninar para adormecê-la, revivendo a cena do filme que tanto

O que a criança deseja? Do que a criançaprecisa? O que a escola ensina?Fátima R. B. Mendes

Fátima R. B. Mendes é pedagoga, vencedora do prêmio "EducaçãoCidadã - Melhores Práticas do Temas transversais", promovido peloSIEEESP, MEC, UNESCO, em 2002. É capacitadora do GRUHBAS -Projetos Educacionais e Culturais e colaboradora do jornal Bolando Aula.

“A língua escrita,uma maravilhosa

construção humana,tão cheia de magias

e melodias, éoferecida aos

meninos da maneira

mais equivocadapossível: primeiro,pequenas partes,sílabas, palavras,frases... para quedepois produzam

textos (geralmenteredações).”

me encantou.Mas o que esse relato tem a ver com alfabetização?Penso que muitas reflexões podem ser feitas a partir dessa história,

em especial a questão do desejo: o que os nossos alunos desejam?Desejam aprender a ler e escrever? Para quê? Por quê? O que osencantou em relação à leitura e à escrita? Todos viveram situações emque o mundo escrito tenha despertado desejos e encantos? E os quenão as vivenciaram? Em que momento o interesse e o desejo seentrelaçam com a fantasia? Será que aquela canção, tão desejada pormim, era extremamente bela ou será que a fantasia e a magia do filme afizeram especial ?

As crianças, até uns 10/11 anos, vivem uma fase em que a fantasia, amagia e o encantamento são essenciais ao seu desenvolvimento

cognitivo e emocional. De que forma temos encantado nossas crianças?O que temos feito para que desejem penetrar no mundo escrito? Temostocado seus corações com as lindas melodias dos contos infantis outemos ensinado a ridícula música de uma só nota? Temos enriquecido oimaginário infantil ou temos dado exercícios estéreis, enfadonhos e semsentido? Temos alimentado sonhos ou estamos esquecendo de permitire possibilitar que as crianças sonhem?

Isso nos remete a uma outra questão, de caráter fundamental e quecada vez mais se torna necessário discutir: o que temos ensinado aosalunos? Cada vez mais "despejamos" na cabeça dos alunos conteúdosdesconexos, vazios, medíocres.

Qual o desejo que emana de atividades do tipo "separe/ordene as sílabas ", "passe para o masculino/feminino ", "dê o plural/singular ",entre outras tão arraigadas no universo escolar? Qual a fantasia queemerge da cópia de palavras como cuia, caduco, filó...? Onde está osentido, o significado desses exercícios?

A língua escrita, uma maravilhosa construção humana, tão cheia demagias e melodias, é oferecida aos meninos da maneira mais equivocadapossível: primeiro, pequenas partes, sílabas, palavras, frases... para quedepois produzam textos (geralmente redações). Tal como no ensino depiano: primeiro as escalas, o solfejo, os exercícios horríveis em buscada agilidade e técnica, depois (se o aluno resistir) a entrada no mundode "músicas de verdade".

É preciso permitir que a criança mergulhe no universo escrito atravésdo que houver de maior qualidade e encantamento e mais próximo douniverso infantil, como os contos universais, poemas, músicas, porexemplo. Esse mergulho precisa ser muito suave, prazeroso e, aomesmo tempo, profundo.

Para que as crianças aprendam a ler e escrever, precisam ler eescrever textos dos mais diferentes gêneros. Isso será determinantepara a ampliação e qualidade de sua competência de leitura e escrita enão os exercícios gramaticais e ortográficos, que vêm sendo ensinadoao longo dos tempos.

É preciso refazer esse caminho, pois estamos começando pelo fim.Primeiro deve vir o belo, o mágico, a melodia, o que fizer sentido, o quepermitir significações, não a técnica.

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ALFALFALFALFALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTABETIZAÇÃO E LETRAMENTABETIZAÇÃO E LETRAMENTABETIZAÇÃO E LETRAMENTABETIZAÇÃO E LETRAMENTOOOOOENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTAAAAA11111 COMCOMCOMCOMCOM TELMA FERRAZ LEALTELMA FERRAZ LEALTELMA FERRAZ LEALTELMA FERRAZ LEALTELMA FERRAZ LEAL

Bolando Aula:  Que cuidados a escola deve tomar para que aimplantação do Ensino Fundamental de 09 anossignifique uma real oportunidade de colocar a criança de 06 anos em contato com a cultura 

escrita e não uma antecipação da antiga 1ª série do Ensino Fundamental de 08 

anos? Telma Ferraz Leal: O Ensino Fundamental de 09 anos é realmente um

grande avanço para a educação brasileira. Na verdade, ele só se constituicomo novidade para as crianças das escolas públicas, pois nas escolasprivadas de maior reconhecimento social, mesmo considerando que aalfabetização é uma etapa escolar da Educação Infantil, há um grandeinvestimento no ensino da leitura e da escrita. Ou seja, aos 5 ou 6 anos deidade, as crianças já estão, via de regra, com um conhecimento maisconsolidado sobre o sistema de escrita e estão imersas em situações deleitura e produção de textos.

O Ensino Fundamental de 09 anos é uma tentativa de garantir aos alunosque freqüentam as escolas públicas uma atenção especial nesse sentido. Narealidade, essas crianças precisam dessa garantia para que realmente possamavançar na escolarização sem grandes atropelos e sem a cobrança de que sealfabetizem em apenas um ano, como vem ocorrendo atualmente. Se ascrianças participam de situações em que a leitura e a escrita permeiam asinterações desde cedo, as crianças podem ir se apropriando dosconhecimentos de forma gradativa e podem construir os saberes com mais

tranqüilidade.Uma das grandes preocupações que surgem a partir dessas mudanças

diz respeito ao perigo de “roubar” das crianças o tempo de brincar e devivenciar a infância. Na realidade, acredito que essa tem que ser umapreocupação não apenas em relação às crianças de 6 anos, mas, sim, àsoutras crianças que freqüentam hoje nossas escolas. O espaço para abrincadeira, o respeito ao ritmo das crianças e aos seus valores eexperiências devem ser garantidos em todo o ensino fundamental e nãoapenas na Educação Infantil. Precisamos discutir essa questão de umamaneira mais aprofundada, de modo a promover um ensino lúdico , voltadopara o crescimento não apenas intelectual, mas afetivo-social em todas asetapas de escolaridade.

Aos 6 anos, as crianças das escolas públicas podem e devem brincar naescola e fora dela e podem e devem ter acesso à cultura escrita e aosconhecimentos a ela agregados de modo consistente, para que não tenham quedar conta em um ano daquilo que as crianças de nível socioeconômico mais altose apropriam desde os três anos de idade.

Queremos, assim, que o Ensino Fundamental de 09 anos leve as crianças

que estão fora da escola para dentro desse espaço e que favoreça um tempo eum espaço de aprendizagem rico, sadio e construtivo.

Bolando Aula:  O conceito de “construtivismo”, na realidade,abriga práticasdocentes muitas vezes contraditórias. Jean Hébrard, autor da reforma no sistema de ensino francês em 2002 econhecedor da realidade escolar brasileira, em entrevista aosjornais do Gruhbas, afirmou que aqui no Brasil fizemos um construtivismo “à brasileira”.Essa afirmaçãoé exagerada ou ela encontra mesmo respaldo no que acontece nas salas de aula de nossas escolas? 

Telma Ferraz Leal: Qualquer abordagem teórica, ao ser incorporada àspráticas escolares, sofre os efeitos da cultura e do momento histórico que estásendo vivenciado no país em que ela está sendo incorporada. O problema não étermos “abrasileirado” o construtivismo ou qualquer outra abordagem teórica. As

práticas docentes, na verdade, são construídas no cotidiano escolar e os docentesse apropriam das teorias e fazem suas adaptações. Isso é saudável e faz parteda construção histórica.

O construtivismo surgiu no Brasil para se contrapor a outras abordagensque não estavam dando conta das expectativas e da realidade escolarnaquele momento e foi interpretado a partir dessas expectativas. No entanto,precisamos considerar que as práticas docentes não foram de fatotransformadas à luz dos princípios de aprendizagem dessa abordagem.Alguns princípios foram muitas vezes incorporados, como o de que era precisolevar textos autênticos para a sala de aula, mas não tivemos umamadurecimento sobre a didática do ensino que realmente levasse em contaos modos de apropriação dessas crianças. A psicogênese, por exemplo,serviu, muitas vezes, apenas para classificar as crianças, mas não paraentendermos suas hipóteses e construir situações didáticas paraproblematizar a partir delas. Por outro lado, não eram feitas reflexões sobreas propriedades desse sistema de escrita para que os professoresentendessem as razões para a emergência dessas hipóteses. O que foimais ressaltado foi uma “hipótese” de que esse percurso seria igual para

todas as crianças. Ou seja, é preciso reconhecer quais foram as contribuiçõesdessa abordagem e avançarmos para superar seus limites. Precisamos,também, reconhecer que, ao lado das atividades de classificação das criançasquanto às hipóteses de escrita, assistíamos, muitas vezes, práticas deensino baseadas nos métodos sintéticos, que continuaram e continuambastante vivas nas escolas brasileiras.

Ao lado disso, tivemos, como diz Magda Soares, uma reação negativa aoestudo e discussão sobre os métodos de alfabetização, de modo que muitasvezes o construtivismo foi interpretado como ausência de ensino. Algunsprofessores, a partir das contribuições de pesquisadores de diferentes camposde conhecimento, como a Psicologia, a Lingüística e a própria Pedagogia,acharam que deveriam apenas esperar que os alunos chegassem aoconhecimento individualmente ou em interação com seus colegas. Oconhecimento não era de fato problematizado, de forma que eles pudessementender a lógica do nosso sistema de escrita. Por outro lado, vivenciamos,tanto na pesquisa quanto no ensino, uma discussão necessária e importantesobre os processos de letramento e sobre a importância de dar acesso aosdiferentes textos que circulam na sociedade. Mais uma vez, alguns

interpretaram que para ensinar a ler e escrever, bastaria propiciar o contatocom os textos diversos. Ou seja, a organização do ensino, com sistematizaçãode saberes, com planejamento de situações problematizadoras, tanto naaprendizagem do sistema de escrita, quando na aprendizagem da leitura eprodução de textos foi sendo negligenciada. O tempo pedagógico também foipouco discutido, de modo que os professores não tinham espaço de reflexãosobre como organizar o tempo, de modo a ajudar os alunos a entender osistema de escrita e paralelamente se inserir nas práticas de leitura e produçãode textos.

Considero, então, que não podemos creditar ao construtivismo todas as

No encontro da Undime Nacional, realizado em Brasília no período de 22 a 25 de maio deste ano, chamou-nos a

atenção a fala da professora doutora Telma Ferraz Leal, da Universidade Federal de Pernambuco. De forma

consistente e muito bem articulada, a professora deu ao público uma visão clara sobre questões como

alfabetização e letramento. Pela pertinência do tema, entramos em contato com ela, que gentilmente nos

concedeu a entrevista que ora publicamos, visando oferecer aos nossos leitores subsídios para uma produtiva

discussão nas reuniões dos horários de trabalho pedagógico.

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falhas do nosso ensino. O construtivismo se contrapôs a um ensinomecanicista, com ênfase apenas nos processos de memorização. Ele mostrouque a aprendizagem se dá por construção e que os aprendizes precisa m

elaborar hipóteses e analisar os fenômenos para construir conhecimentos maissólidos. Precisamos, agora, aliar isso a uma reflexão sobre a didática que dêcondições para que os alunos possam realmente construir esses conhecimentoscom a ajuda do professor, que garanta um espaço e um tempo pedagógicopara tal.

Não dá para alfabetizar um grupo de 30 ou 40 alunos sem vivenciarsituações sistematizadas de reflexão sobre os princípios do nossosistema de escr i ta, nem dá para ensinar o sistema de escr i tadesconsiderando as práticas sociais de uso dessa escrita. Precisamos,portanto, avançar e discutir quando e como vamos alfabetizar nossascrianças.

Bolando Aula: O quesignifica “alfabetizar na perspectiva do letramento”? Em que essa perspectiva seafasta do que pregam os adeptos da consciência fonológica? 

Telma Ferraz Leal: Podemos encontrar várias interpretações para essaexpressão. Alguns consideram que alfabetizar na perspectiva do letramentosignifica organizar situações de leitura e produção de textos desde o início da

escolarização para que os alunos, a partir dessas situações, se alfabetizem.Há, nesse caso, uma crença de que a compreensão do sistema de escritanão é um objeto de ensino específico. Há, sim, a idéia de que a criança va ientender essa lógica na medida em que ela se depare com a necessidade deler e escrever textos. Assim, os professores são desestimulados a realizarqualquer atividade de reflexão sobre as palavras ou unidades menores que aspalavras.

Outra forma de conceber a alfabetização na perspectiva do letramento,com a qual eu concordo, é a de que precisamos organizar o ensino de modoque os alunos, desde o início da escolarização, vivenciem práticas de leiturae produção de textos. Consideramos fundamental que eles possam ouvir eescrever textos diversos que circulam na sociedade; que eles possaminteragir com pessoas da escola e de fora da escola por meio da escrita.Por outro lado, consideramos essencial também que eles possam refletirsobre a lógica do nosso sistema de escrita, ou seja, que seja garantido umtempo na rotina escolar para que eles possam pensar sobre os princípios dosistema alfabético de escrita. Isso pode ser feito por meio de leitura e reflexãode textos que contenham rimas e outras semelhanças sonoras, tais como

os poemas, parlendas, trava-língua; que eles brinquem com jogos em quetenham que comparar palavras, decompor palavras, compor palavras, dizernomes de letras, dentre outras; que eles possam discutir em grande gruposobre os princípios do sistema de escrita. Ou seja, considero que paraalfabetizar na perspectiva do letramento, precisamos organizar o ensino demodo que o eixo da reflexão lingüística sobre o sistema de escrita sejacontemplado, sem que seja negligenciado o trabalho com a variedade detextos de circulação social.

Essa proposta se diferencia dos métodos fônicos, pois, por um lado,consideramos que na rotina pedagógica precisamos contemplar de modosistemático e reflexivo tanto o eixo da apropriação do sistema alfabético,quanto o da leitura e produção dos diferentes gêneros textuais. Por outrolado, consideramos que para o ensino do sistema alfabético não é suficientea reflexão fonológica, embora seja necessária. Consideramos, também,que não são todas as habilidades fonológicas que precisam ser ensinadas.Por exemplo, não consideramos necessário trabalhar a decomposição oraldas palavras em fonemas. Temos encontrado em nossas pesquisas muitasevidências de que os alunos se alfabetizam sem que tenham tal habilidade.

No entanto, não concordamos com a idéia de que a consciênci a fonológicaseja desconsiderada. Na verdade, quando comparamos palavras quantoàs semelhanças sonoras ou quando real i zamos at iv idades dedecomposição de palavras em sílabas, ou mesmo quando realizamosidentificação de rimas, estamos voltados para o desenvolvimento dehabilidades fonológicas.

Ressaltamos, no entanto, que há grandes diferenças entre o que estamospropondo e o que os adeptos dos métodos fônicos propõem. Em primeirolugar, como já dissemos, defendemos um trabalho sistemático voltado parao desenvolvimento das capacidades textuais desde o início da

escolar ização; em segundo lugar ,defendemos propostas de ensino do sistemade escrita pautadas em reflexão sobre os

princípios desse sistema, ou seja, construçãodos conhecimentos sobre a lóg ica deconstituição da escrita alfabética e nãoapenas na memor ização das cor res-pondências grafofônicas; em terceiro lugar,fazemos uma defesa de que, embora aconsciência fonológica seja importante, nãosão todas as habilidades que precisam serfoco de aprendizagem sistemática.

Queremos que os alunos pensem sobre aescrita e sobre as práticas sociais mediadaspor essa escrita e que vivenciem desde cedosituações de interação em que essa escritaesteja presente. Ao lado disso, queremos que eles entendam o nossosistema de escrita e desenvolvam capacidades de reflexão lingüística quepossam ajudá-los a entender que a língua é objeto de interação e dereflexão.

Bolando Aula:  As pesquisas mostram que pessoas consideradas alfabetizadas têm uma capacidade muito l imitada para l idar com textos escritos de forma autônoma. Um trabalho sério e sis temático — q u e n ã o p r e g u e o u s o d e f ó r m u l a s m á g i c a s , m a s q u e  realmenteseja capaz de combater o analfabetismo funcional — como deve ser? 

Telma Ferraz Leal: Consideramos que é necessário realizar um ensinoem que seja contemplado o eixo da análise lingüística, da oralidade, da leiturae da produção de textos. Para que nossos alunos desenvolvam autonomiapara lidar com os textos orais e escritos, eles precisam, além de ter acessoa uma variedade de textos, vivenciar situações de reflexão e de interação pormeio deles.

Por outro lado, compreender o sistema alfabético e consolidar oprocesso de alfabetização é um passo necessário. Realizar atividadespor meio das quais os alunos possam manipular as palavras e busc arentender a lógica de construção histórica desse instrumento culturalpode ajudar esses alunos a entender que a língua é um objeto a sermanipulado, analisados. Desenvolver atitude reflexiva frente à língua e

frente às práticas de l inguagem é um objetivo de grande amplitude.Com isso, os alunos aprendem não apenas sobre o sistema de escrita,mas desenvolvem at i tudes f rente aos própr ios processos deaprendizagem.

Tel ma Fer r az Lea l possu i g r aduação em Ps i co l og i a pe l aUniversidade Federal de Pernambuco (1988), mestrado em Psicologia(Psicologia Cognitiva) pela Universidade Federal de Pernambuco (1993)e doutorado em Psicologia (Psicologia Cognitiva) pela UniversidadeFederal de Pernambuco (2004). Atualmente é professora adjunta daUniversidade Federal de Pernambuco. Tem experiência na área de

Educação , com ên f ase em Ens ino - Apr end i zagem, a t uandoprincipalmente nos seguintes temas: produção de textos, leitura,alfabetização e argumentação. É autora de várias obras, entre as quaisdestacam-se, pela editora Autêntica: A argumentação em textos escritos: a criança e a escola ; Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino Fundamental  (org., juntamente com A. C. P.Brandão); Desafios da Educação de Jovens e Adultos: construindo práticas de alfabetização  (org., juntamente com E. B. Albuquerque);Alfabetização: apropriação do sistema de escrita alfabética  (org.,

 juntamente com A. G. Moraes e E. B. Albuquerque).

Nota:

1 Entrevista concedida por e-mail a Sueli de Oliveira Rocha, editora dos jornais Bolando Aula, Bolando Aula de História e Subsídio.

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O BRINCAR E A LINGUAGEMINFANTIL: REFLEXÕES

Todos nós, independentemente daclasse social da qual fazíamos parte,em diversas circunstâncias, vivíamos

experiências de brincar quando criança.Muitos de nós temos saudades dos velhostempos. Tempos bons eram aqueles em quepodíamos fazer o que era próprio da infância,BRINCAR.

Hoje, que pena! As crianças não têm maistempo para brincar ou, se têm, não podem maisbrincar, como brincávamos. Elas não precisamexplorar seu universo imaginário e suacapacidade de inventar e construir, pois antesmesmo de terem acesso ao brinquedo, a mídia

 já tratou de explorá-lo. Assim, ao ganhá-lo, ascrianças executam algumas ações pré-determinadas para acioná-lo e, o encanto,momentâneo e passageiro, não lhes permitedar asas à imaginação.

Às vezes, perguntamo-nos: por que ascrianças de hoje, que vão muito cedo para asinstituições de educação infantil, apresentamtantas dificuldades no aprendizado tanto dalinguagem oral quanto na linguagem escrita?

Voltamo-nos a lembrar dos velhos tempos. Nossos avós, nossos pais, eaté mesmo nós, tivemos o privilégio de brincar, no sentido mais puro dapalavra. Não era preciso ir à escola antes dos sete anos; não havia à vendamuitos brinquedos fabricados; era preciso, pois, explorar a imaginação einventar os próprios brinquedos; ouvíamos as pessoas mais velhas contandoe inventando histórias, cantando brincos e músicas, explorando o nossouniverso imaginário; havia mais espaço e lugares para a gente andar, falar,

cantar, correr, saltar,pular, subir, esconder,inventar, construir etantas outras coisasmais.

Nesse nosso dile-tantismo, não estamosdefendendo a idéia deque a criança pequenanão precisa ir para umainstituição de EducaçãoInfantil. Pelo contrário,todos que nos co-nhecem sabem quesomos uma pessoa-prof issional que hámuito luta pela garantiaefetiva das crianças, dequalquer classe social,terem acesso a umaeducação infanti l dequalidade.

Consideramos opor-tuno o momento para,mais uma vez, chamar a

atenção de todos os envolvidos com a criançapequena — seja na qualidade de gestor,coordenador, professor , seja na de pais — parao fato de que nós precisamos mudar nossaprática educativa. Não podemos continuarinsistindo em uma prática que tem nos mostradoque a forma como a maioria dos professores temtrabalhado com as crianças não possibilita aelas o desenvolvimento de todo o seu potenciallúdico, lingüístico e intelectual.

Precisamos resgatar o espaço do brincarna Educação Infantil, precisamos dar àscrianças o que lhes é de dire ito. Por que essanecessidade de transformá-las em adultos emminiatura novamente, reportando as criançasa reviverem experiências tão criticadas porRousseau (1995) no século XVIII? Essemesmo autor, em sua obra Emílio , destacouque, “quando as crianças começam a falar,passam a chorar menos. Esse progresso énatural, uma linguagem é substituída pelaoutra”.

É prec iso, então, darmos a e las apossibilidade de explorarem vários contextoslingüísticos, para que possam fazer uso de

todos eles nas diferentes formas de brincar, isso é, o jogo, a dramatização,a literatura infantil, o desenho, o movimento, a construção, a música, apintura ... As crianças só podem desenvolver suas múltiplas linguagens sepuderem viver o que é próprio da infância. Vamos lutar pela ampliação donúmero de instituições de Educação Infantil, mas vamos, também, dar àscrianças o direito de, novamente, inventarem seus brinquedos ebrincadeiras, de saírem de dentro de quatro paredes e reconquistarem odireito de correr, falar, saltar, cantar, pular, viver... Assim, com certeza,estaremos criando as condições para que elas desenvolvam todo o seupotencial.

Freinet já dizia: a criança só aprende a andar, andando. E nós continuamosa dizer: só aprende a brincar, brincando; a desenvolver sua linguagem oral eescrita, falando, cantando, desenhando, pintando, correndo, escrevendo,dramatizando, sonhando, vivendo ...

Ordália Alves Almeida

Ordália Alves Almeida é Doutora em Educação pela Universidade de SãoCarlos/SP, Coordenadora do Curso de Pedagogia/UFMS e Professora da linhade pesquisa “Educação, psicologia e prática docente”, do Programa de Pós-Graduação em Educação/UFMS. Vice-coordenadora do GT 07 — Criança de 0a 6 anos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

 — ANPED.

Nota:Este texto foi originalmente apresentado no16º Encontro Estadual de Educação Infantil

e Séries Iniciais e 2º SeminárioInternacional da OMEP/BR/MS, no TeatroDom Bosco, em Campo Grande/MS, no

período de 25 a 28/05/2005.

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EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE CULTURALNUMA PERSPECTIVA DE GÊNERO E RAÇA

Edna Roland

Na década de 90, a UNESCO lançou um projeto internacional – a Rotado Escravo – com o objetivo de tornar visível o tráfico de escravos,considerando que há um verdadeiro “buraco negro” a este respeito na

história da humanidade e que temas candentes da atualidade, tais como odesenvolvimento social, os direitos humanos e o pluralismo cultural estão fortementeconectados a essa experiência histórica. O significado h istórico e moral dessa tentativade obscurecer este fato pode ser apreendido pela afirmação do Prêmio Nobel ElieWiesel: o carrasco mata sempre duas vezes – a segunda vez, através do silêncio. 1

Segundo Doudou Diène, idealizador do Projeto Rota do Escravo, o tráficotransatlântico de escravos se reveste de uma tripla singularidade na história dahumanidade: sua duração - aproximadamente quatro séculos; a especificidade desuas vítimas - a criança, a mulher e o homem negros do continente africano; e sualegitimação intelectual - a depreciação cultural da África e dos Negros e a conseqüenteconstrução da ideologia do racismo anti-Negro e sua organização jurídica nos“Códigos Negros”, vergonhosos textos excluídos da memória jurídica e histórica. 2

O Projeto Rota do Escravo parte da concepção de que nenhum grande problemaatual da África está totalmente desconectado da sangria brutal e da violência sofridapelo continente com o tráfico transatlântico de escravos: nem o subdesenvolvimentoeconômico, nem uma certa cultura da violência, tampouco a desarticulação social nocontinente.

Por outro lado, conforme reconhecido pela Declaração e Programa de Ação deDurban, as desigualdades atuais sofridas pelos afrodescendentes têm também asua origem na experiência histórica da escravidão a que seus antepassados foramsubmetidos e que são recriadas por mecanismos atuais, nos quais as linhas decontinuidade das idéias e concepções racistas jogam um papel fundamental.

A Declaração e Plano de Ação de Durban, que resultaram da III Conferência Mundialcontra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlatareconhecem que os povos de origem africana têm sido secularmente vítimas deracismo, discriminação racial e escravidão e da negação histórica de muitos deseus direitos. Afirma ainda que reconhecimento deve ser dado aos seus direitos: 3

à cultura e à sua própria identidade; à participação livre e com iguais condições da vida política, social, econômica

e cultural; ao desenvolvimento, no contexto de suas aspirações e costumes; à manutenção, preservação e promoção de suas próprias formas de

organização, do seu modo de vida, da sua cultura, tradições e expressões religiosas; à manutenção e ao uso de suas próprias línguas;

à proteção de seu conhecimento tradicional e de sua herança artística ecultural; ao uso, gozo e conservação dos recursos naturais renováveis de seu habitat; à participação ativa no desenho, implementação e desenvolvimento de

programas e sistemas educacionais, incluindo aqueles de natureza específica ecaracterística; e, quando procedente, à sua terra ancestralmente habitada.4

A Declaração de Durban reconhece também que os membros de certos gruposcom uma identidade cultural própria enfrentam obstáculos atribuídos a uma complexainteração de fatores étnicos, religiosos e outros, bem como de suas tradições ecostumes. Neste sentido, a Declaração exorta os Estados a assegurarem quemedidas, políticas e programas que objetivem erradicar o racismo, discriminaçãoracial, xenofobia e intolerância correlata abordem os obstáculos que esta interaçãode fatores cria.5

A Declaração de Durban atribui um papel fundamental para a educação em todosos níveis e em todas as idades como a chave para a mudança de atitudes ecomportamentos baseados no racismo, na discriminação racial, na xenofobia e naintolerância, bem como para a promoção da tolerância e do respeito à diversidadenas sociedades.6

Representando um avanço conceitual, a Declaração de Durban afirma de formacategórica que o racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância revelam-sede maneira diferenciada para mulheres e meninas dos grupos discriminados,

podendo levar a uma deterioração de sua condição de vida e à limitação ou negaçãode seus direitos.7

Em adição, reconhece e lamenta profundamente os enormes sofrimentos demilhões de seres humanos causados pela escravidão e pelo tráfico de escravos,convocando os Estados a honrar a memória das vítimas das tragédias do passado,restaurando a sua dignidade.8

Se a memória das vítimas do passado é uma dimensão fundamental que deveser contemplada pelas políticas públicas de promoção da igualdade para que sepromovam as necessárias mudanças culturais, atingindo os corações e mentesdos que hoje convivem com as resultantes dessas experiências históricas dopassado, Durban também oferece propostas concretas para acelerar a busca daigualdade efetiva, destacando a necessidade de se desenhar, promover e

implementar programas, políticas e legislação que possam incluir medidas positivase especiais para um desenvolvimento social igualitário.

Alerta, ainda, para a necessidade de que essas iniciativas contribuam para arealização de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais das vítimas doracismo e discriminação racial, inclusive pelo acesso mais efetivo às instituiçõespolíticas, jurídicas e administrativas, bem como a necessidade de se promover oacesso efetivo à justiça para garantir que os benefícios do desenvolvimento, daciência e da tecnologia contribuam efetivamente para a melhoria da qualidade devida para todos, sem discriminação.9

De maneira ainda mais explícita, Durban propõe que as medidas especiais oupositivas em favor das vítimas do racismo devem incentivar a participação igualitáriade todos os grupos raciais, culturais, lingüísticos e religiosos em todos os setoresda sociedade, dentre as quais devem figurar medidas para o alcance derepresentação adequada nas instituições educacionais, de moradia, nos partidospolíticos, nos parlamentos, no emprego, especialmente nos serviços judiciários, napolícia, exército e outros serviços civis, os quais – afirma – em alguns casos devemexigir reformas eleitorais, reforma agrária e campanhas para a igualdade departicipação.10

Após os atentados do 11 de setembro, a UNESCO empreendeu a elaboração daDeclaração Universal sobre a Diversidade Cultural, considerando que o respeito àdiversidade cultural é um instrumento fundamental para a promoção da paz e dasegurança internacional e que a cultura se encontra no centro dos debatescontemporâneos sobre a identidade, a coesão social e o desenvolvimento de umaeconomia fundada no saber.

Com base em vários instrumentos anteriores, esta Declaração afirma que a culturadeve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais,intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e queabrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver junto,os sistemas de valores, as tradições e as crenças.11

Tais esforços e iniciativas, embora sirvam de indicativo dos rumos a seremseguidos não podem esconder o enorme desafio que ainda se coloca diante daspessoas e das organizações que a eles se filiam. Neste sentido, poder-se-ia afirmarque a promoção do respeito à diversidade cultural está diretamente associada àpromoção de uma melhor qualidade de vida para aqueles grupos sociaistradicionalmente discriminados e excluídos.

Conseqüentemente, não se pode perder de vista que a qualidade de vida de umdeterminado grupo social, em geral, está associada ao seu nível de renda que, porsua vez, costuma decorrer da sua inserção nas atividades produtivas ou econômicasda sociedade. E, esta inserção é grandemente afetada pelas discriminações

associadas à raça e a gênero.Nesse sentido, a implementação da Lei 10.639/2003, que modifica as Diretrizese Bases da Educação, determinando a obrigatoriedade do ensino da História eCultura Afro-brasileira, joga um papel fundamental na promoção dos direitoseconômicos, sociais, e culturais dos negros brasileiros: a revisão do papel históricodos negros e negras brasileiros é um dos principais instrumentos para que a justiçasocial possa ser feita. Contamos com os professores e professoras da RedeMunicipal de Guarulhos. Esperamos que cada mestre, no cotidiano da sua sala deaula, contribua para que esta verdadeira epopéia possa ser reescrita. E que tenhamosafinal uma cidade mais justa com todas as suas crianças e cidadãos de todas asorigens étnicas e culturais.

Notas1 UNESCO, The Slave Route, pág. 3.2 Idem, pág. 5.3 Idem, ibidem, pág. 5.4 Declaração de Durban e Plano de Ação, III Conferência Mundial de Combate ao

Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, Ministério daCultura, Fundação Cultural Palmares, s.d., parágrafo 34, pág. 22.

5 Idem, parágrafo 67, pág. 28.6 Idem, parágrafo 95, pág. 34.7 Idem, parágrafo 69, pág. 29.8 Idem, parágrafos 100 e 101, pág. 35.9 Idem, parágrafo 107, pág. 37.10 Idem, parágrafo 108, pág. 37.11 Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural in http://www.unesco.org.br/ 

programas/cultura/div_cultural.asp

Edna Roland é Coordenadora da Coordenadoria da Mulher e da Igualdade Racialda Prefeitura Municipal de Guarulhos, ex-Coordenadora de Combate ao Racismo e àDiscriminação Racial para a América Latina e Caribe, da UNESCO/Brasil, membrodo Grupo de Especialistas Eminentes Independentes das Nações Unidas,encarregado da implementação da Declaração e Programa de Ação de Durban.

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Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 2007Edição Especial - dezembro de 20071818181818

Plantar uma semente,É tempo

Ganhar o futuro,É tempo

Com força e busca,É tempo

Viver o saber,É tempo

Libertar o serÉ tempo

Liberte a criançaÉ tempo

(Dora Incontri e Moacyr Camargo )

Desde 1989, venho me dedicando às múltiplas linguagens como meiode desenvolver as habilidades criativas das crianças das séries iniciais.Em 1991, eram desenvolvidas atividades utilizando as inúmeras

linguagens propostas na educação. O que me seduzia naquele momento e o queainda hoje me move é a redescoberta do ser criativo, o prazer de colocar nocorpo, na voz, na escrita e no desenho a emoção, a estética e a descoberta doser ético.

Desejava caminhos novos para desbloquear a criatividade, proporcionando às criançasprazer nas atividades, para que experimentassem maneiras diversas de aprender eexigissem a partir daí, possibilidades novas de conhecer o mundo com arte.

Contava com uma metodologia composta pelo tripé observação,experimentação e construção. Iniciei com as incontáveis combinações que ocorpo, a voz, o desenho e a escrita podiam produzir, recombinando-os nas emexperiências criativas.

A partir da descoberta do caminho “das pedras”, o educador alarga aspossibilidades de criação; e foi refletindo sobre esses 15 anos de experiênciascom as múltiplas linguagens que percebi claramente que a Educação Estéticafaz renascer um aluno novo no solo “sagrado” da escola.

O conto tem sido meu parceiro há mais de uma década. Muitas vezes, idéias,atividades e projetos nasceram após a leitura de uma história, um poema, umamúsica. Não foi diferente a maneira como comecei a planejar os “convites” quefiz às crianças para embarcarem no projeto que idealizei, Linguagens múltiplasna diversidade cultural e racial, e que elas batizaram de Brincadeiras domundo inteiro.

O projeto foi desenvolvido no segundo semestre de 2004, em Santos/SP nocolégio COC-Universitário, com crianças de 6 a 10 anos.

Iniciei com a história da menina KEIKO (Cristina Von, editora)

Ela veio da terra do Sol Nascente.Do Japão, do outro lado do mundo, quando aqui é dia, lá é noite.Seu pai trouxe toda a família para trabalhar na lavoura.Ela era a terceira filha, e se chamava Keiko...

Da história exploramos tudo: país, cultura, nomes, histórias, e principalmenteas brincadeiras. E como sempre acontece em nossos encontros, em cada etapa

 já nasciam as próximas. Após as crianças adotarem a “Keiko” como colega de

classe, partimos para outras nacionalidades, a partir de um jogo com cartelasque representavam crianças de várias partes do mundo. Elas quiseram desenharas cartelas escolhidas e aproveitei para solicitar que cada criança ou grupoprocurasse curiosidades e principalmente as brincadeiras daquele país.

Na semana seguinte, as curiosidades foram tantas que senti falta de uma caixa paraguardá-las. Foi então que criamos as pastas de curiosidades e a caixa de brincadeiraspara crianças do mundo inteiro. Líamos as curiosidades na roda de conversa.

Percebemos a dificuldade de encontrar o registro das brincadeiras existentesnos países escolhidos. Por isso, resolvemos decorar uma caixa com desenhosde crianças de diversas partes do mundo e criar brincadeiras, registrando-as e

apresentando-as em classe. Ficou combinado que se conseguíssemos jogardeterminada brincadeira que os alunos tivessem inventado, ela ganharia registro,regras, pontos etc. e seria colocada dentro da caixa. Esse gesto simbolizariaque qualquer criança, em qualquer parte do planeta, também conseguiria jogá-la.Para criar as brincadeiras, divididos em grupos, os alunos espalharam-se pelaescola à procura de concentração e criatividade. Todos receberam papéis ecanetas, pois o registro era muito importante. Após a primeira semana, todosqueriam apresentar seus jogos para serem testados. Iniciou-se assim a primeiraMostra de Jogos e Brincadeiras das Séries Iniciais do COC-Universitário, Santos.

Após apresentação dos jogos, eram escolhidos voluntários para testá-los. Nessafase, muitas vezes foram feitos ajustes, complementos e até mudanças emalgumas regras das brincadeiras criadas.

É necessário que o educador insira o brincar em um projeto educativo,o que supõe ter objetivos e consciência da importância de sua ação em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem das crianças.

Tânia Ramos Fortuna 

Deixo registradas neste projeto algumas das brincadeiras criadas pelascrianças, para que você as experimente com seus alunos e eles comecem acriar outras tantas brincadeiras.

PETGOL(Victor, Rodrigo, Lucas M. Ian/3ª série )

PARTICIPANTES: Números pares para cada lado e um goleiro para cadaequipe.

ESPAÇO: um lugar que lembre uma pequena quadraACESSÓRIOS: Um funil (feito de garrafa do tipo PET) para cada jogador; dois

funis para o goleiro; uma bola de tênis.DINÂMICA: Cada equipe deverá jogar a bola encaixando-a de funil a funil, até

conseguir fazer o gol. O goleiro terá dois funis para defender. Ganhará a equipeque conseguir o maior número de gols.

BASFUTEQUETE (Mistura de basquete com futebol)(Marcela, Isabela, Juliana e Julia/3ª série )

PARTICIPANTES: De 4 a 8 participantes em cada equipe. Cada jogadorparticipará jogando uma das modalidades que constituem o jogo, basquete oufutebol. Os goleiros andarão com um cesto.

ESPAÇO: Uma pequena quadra.ACESSÓRIOS: Uma bola de futebol.DINÂMICA:Cada participante movimentará a bola de acordo com a modalidade

que representa. Deverá sempre procurar aproximar-se do goleiro que estarátentando levar o cesto para perto de seus parceiros. Os jogadores da equipeadversária deverão impedir que o gol (ou a cesta) aconteça, tal como é feito nofutebol ou no basquete. Ganhará o jogo a equipe que conseguir fazer o maiornúmero de gols (ou cestas) em 15 minutos.

TRÊS PULOS(Marcos, João Victor Motin, Caio/ 2ª série )

PARTICIPANTES: 3 criançasESPAÇO: Local onde tenha um muro para pendurar-se.DINÂMICA: Três crianças deverão correr juntas em direção de um muro e

pendurar-se. Ganhará quem conseguir cair por último.

AMARIPEGA(Julia, Juliana e Vitória A. /2ª série )

PARTICIPANTES: Uma classe de até 15 alunos.ESPAÇO: Local onde acontece o recreio.DINÂMICA:As crianças só poderão correr para pegar parceiros de outra equipe

em movimento de amarelinha. Quem foi pego, deverá ficar “congelado”, sendosalvo por algum parceiro de equipe, que se aproxime em movimento de amarelinhatambém.

Linguagens múltiplas na diversidade cultural e racial

É tempo de múltiplos olhares... Brincadeiras do mundo inteiroAna Lucia Barboza Caetano de Jesus

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Aleitura da literatura infanto-juvenil pode contribuir com a promoção daigualdade étnico-racial em ambientes educativos. Esta é uma dasbandeiras há muito levantadas por ativistas do movimento negro,

educadores (as) e pesquisadores (as) envolvidos (as) com o assunto. Atualmentea discussão ganha densidade mediante a aprovação da Lei 10639/2003 e doParecer CNE/CP 003/2004, documentos que instituem a obrigatoriedade doensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos de EducaçãoBásica.

Tomar a promoção da igualdade étnico-racial como política pública, aos poucosainda tímida e insuficientemente, tem tido importantes repercussões pedagógicase vem influenciando vários segmentos, entre eles o mercado editorial. Nessecontexto social, a produção de literatura infanto-juvenil busca firmar-se com novasposturas e temáticas em relação às questões raciais.

O que há de novo e de bom no mercado editorial? Como saber? Como escolherlivros? Com promover a leitura de livros de literatura com temática afro-brasileiraem sala de aula, que aqui estamos chamando de afro-literatura? Este é um

conjunto de questionamentos que devem estar presentes nos cursos de formaçãode professores, em todas as modalidades, instigando o redesenho de princípiose práticas para lidar com assuntos antes silenciados ou tratados de maneiradanosa ou perversa.

Adiantamos que a tarefa em torno da leitura destes livros é dupla econcomitante: reconhecer e denunciar abordagens, textos e imagens quepossam de alguma maneira desfavorecer a construção positiva daidentidade da população negra e também identificar materiais, livrosadequados, fomentando boas práticas de leitura, capazes de questionare desconstruir mecanismos e práticas racistas e discriminatórias. Trata-

Afro-literatura brasileira:O que é? Para quê? Como trabalhar?

DEBAIXO DA TERRA DE CARA PRO SOL(Patrícia, Marília, Mariana/2ª série ).

PARTICIPANTES: Os pares que a classe conseguir formar.

ESPAÇO: Sala de aulaDINÂMICA: Ao som de uma música inventada pela turma (Debaixo da terra de 

cara pro sol ), uma criança do parzinho deverá ficar de perna aberta. A outra dopar, durante a música, passará por entre as pernas de sua parceira, ficando empé imediatamente, para seu par passar pela abertura também. A cantora daturma, ao parar de cantar, deverá dizer os nomes dos que ficaram embaixo daterra. Esses sairão, formando novos pares entre si, iniciando-se a músicanovamente. Terminará o jogo quando sobrar apenas um par.

A realização desse projeto mostra que a pergunta “brincar pra quê?” é vã, poisbrinca-se por brincar, porque brincar é uma forma de viver. Como recordamYamamoto e Carvalho (2002), o indivíduo que brinca não o faz porque essa atividadeo torna mais competente, seja no ambiente imediato, seja no futuro. A motivaçãopara brincar é intrínseca à própria atividade.

Mesmo sem intenção de aprender, quem brinca aprende, até porque se aprendea brincar. Como construção social, a brincadeira é atravessada pela aprendizagem,uma vez que os brinquedos e o ato de brincar, a um só tempo, contam a história dahumanidade e dela participam diretamente. A brincadeira, sendo algo aprendido,

não é uma disposição inata do ser humano. Sua aprendizagem se dá maisfreqüentemente na relação entre os pares do que em um ensino diretamentetransgeracional (Carvalho et al., 2003, p. 21; CARVALHO, A.M.C. et al. Brincadeira 

e cultura: viajando pelo Brasil que brinca . Vol. 1 e 2. São Paulo: Casa do Psicólogo,2003.).

O projeto É tempo de múltiplos olhares... Brincadeiras do mundo inteiro

foi desenvolvido nos dois primeiros meses do segundo semestre de 2004. Nosmeses seguintes, alargamos nossas propostas, pois gostaríamos de saber seas crianças do mundo brincam sempre.

Após esses questionamentos, começamos a nos preocupar com os direitosdas crianças. Trabalhando as músicas do CD Direitos das crianças (Toquinho),confeccionamos tapetes com mensagens desses direitos. Incorporamos, em derepresentações teatrais, as várias nacionalidades. No encerramento do ano, maisde 80 crianças, numa grande quadra, representaram as várias nacionalidades ecantaram o direito das nossas crianças.Esse projeto representa o trabalho de uma professora e de alunos que sonhamcom um futuro em que todos os direitos humanos sejam respeitados. Nós reunimosdados, opiniões, histórias, poemas e brincadeiras de crianças do mundo inteiro,e pudemos concluir de que a forma mais direta e objetiva de pensar os direitoshumanos e promovê-los é acreditar neles e ensiná-los.

Ana Lucia Barboza Caetano de Jesus é arte-educadora, pedagoga,professora do Colégio COC-Santos, Capacitadora do Gruhbas - Projetos

Educacionais e Culturais, colaboradora do jornal Bolando Aula e uma das autorasdo Caderno de Atividades para a Série Inicial do Ensino Fundamental de 9 anos,produzido pelo Gruhbas.

se de construir e promover espaços voltados à eqüidade social e étnico-racial.

Nesse sentido, este artigo, reconhecendo que ainda há muito por fazer, indicaalguns caminhos para a leitura, seleção e movimentação do acervo de afro-literatura e leitura em sala de aula.

Leitura, literatura e sociedade

Em uma sociedade como a nossa, na qual o acesso à cultura letrada é aomesmo tempo valorizado e tão restrito à grande parte da população, adisseminação e o incentivo à leitura e escrita e ao uso da oralidade torna-sefundamental para a busca do exercício da cidadania, considerando-se o direitoàs diferenças.

Ressalta-se que a leitura deve ser entendida como prática social, ação múltiplarealizada com diferentes objetivos, em diversos contextos e por meio de váriosrecursos que se entrecruzam incessantemente.

Pensar as práticas sociais de leitura como fonte e canal de informação eformação requer considerar a necessidade de articular o uso de diferentes tiposdos textos com temáticas em torno de aspectos comuns à vida dos educandose educandas. Além disso este conhecimento precisa estabelecer relações entreesse aprendizado na sala de aula e o cotidiano, desafiando a pensá-lo comoparte do processo educativo que acontece durante toda a vida do leitor.

Leitor é aquele que percebe a leitura, a escrita, a oralidade, a imagem e osgestos para entender o seu tempo, apreendendo, problematizando informações,intenções e propondo atitudes.

E o texto literário?

Ana Lúcia Silva SouzaAndréia LisboaRosane de Almeida Pires

Escrevemos este texto em março, quando se comemora o Dia Internacional das Mulheres. Dedicamos

a todas elas, em especial às nossas mães, sábias, contadoras de histórias, leitoras do mundo.

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Afro-literatura - outros olhares sobre o texto literário

Texto literário é todo aquele que nos modifica, nos faz sair da cômoda posição

de leitor para a de sujeito-leitor — que tem o direito de intervir no texto, caminharpor ele, invadi-lo. É aquela produção textual que nos instiga e arrebata, trazendoconsigo a beleza inquietante de nos permitir criar, recriar e tecer outrassignificações a partir de sua tessitura.

A produção literária afro-brasileira possibilita aos seus leitores todos essesmovimentos, além de provocar a necessária reflexão sobre as relações étnico-raciais na sociedade brasileira.

A afro-literatura brasileira poderia ser entendida/percebida, ainda, como aquelaprodução que: possui uma enunciação coletiva, ou seja, o eu que fala no texto traduz

buscas de toda uma coletividade negra; propõe (e se propõe como) uma releitura da história de nosso país; traduz uma ressignificação da memória do povo negro brasileiro; realiza fissuras nos textos que representam o discurso hegemônico da

nacionalidade brasileira; se caracteriza por um processo de reterritorização da linguagem,

ocupando lugares e desmontando estereótipos; se configura como narrativa quilombola, porque realiza verdadeiras

manobras de resistência: é pouco disseminada e sofre boicote de editores edistribuidores; no entanto, sua produção é constante e bem extensa.

O trabalho com esse novo padrão estético-étnico-racial e cultural pode ocorrerde modo paulatino, porém mostra-se eficaz.

Para a promoção desta leitura, deve-se construir o ambiente de leitura comtodos os pormenores e cuidados que a atividade exige: dialogar com o texto,mesmo antes de abri-lo, criar “aquele” clima antes e ao apresentar o textoescolhido para a leitura; acrescentar informações pertinentes ao tema do livroescolhido por meio de vídeos, passeios, presença de artistas, autores, ilustradorese outras pessoas ligadas ao contexto de produção da obra a ser lida; promoverroda de conversa acerca do título, especulando sobre seu conteúdo; apresentaras ilustrações; estabelecer alianças com professores (as) de outras disciplinaspara um trabalho coletivo e interdisciplinar.

Há que se pensar na necessidade de cultivar olhares sensíveis para selecionarlivros que abordem a cultura afro-brasileira. Nesse caso, há uma outra reflexão ase fazer: quais livros selecionar? É fato que, em geral, os livros mais divulgados,conhecidos e lidos são os que apresentam, ainda, maior nível de estereotipia,racionalização e propostas utilitárias que cumprem o papel de veicular

ensinamentos, a fim de determinar o comporta-mento do leitor, reafirmando e/oulegitimando os preconceitos, as discriminações e as imagens caricaturizadas dapopulação negra.

Para que o livro seja uma obra de referência, como a defendida neste artigo,não basta trazer personagens negras e abordagens sobre os preconceitos. Éimportante levar em consideração o modo como são trabalhados o texto e ailustração.

A afro-literatura brasileira necessita ser lida pelo viés da contramão, ou seja,desvencilhando de olhares etnocêntricos, buscando nos sentidos possíveis dalinguagem apresentada no texto, a beleza da oralidade escrita e do fazer lingüísticocaracterístico das temáticas e dos escritores de afro-literatura.

Quantas vezes já paramos para realizar um quadro comparativo entre arepresentação de personagens brancas e negras que aparecem nos livros ouentão identificar preconceitos e estereótipos presentes nas obras?

Para construção/constituição de acervo que contemple a diversidade étnico-racial, os professores e demais profissionais envolvidos nessa escolha necessitamestar atentos aos materiais: que apresentem ilustrações positivas de personagens negras; cujos conteúdos remetam ao universo cultural africano e afro-brasileiro;que possibilitem aos leitores o acesso a obras onde habitem reis e rainhas

negras, deuses africanos, bem como os mitos afro-brasileiros; cujas tessituras realizadas durante a leitura possam construir a elevação

do aumento da auto-estima das crianças negras; que representem, sem estereótipos, a população negra brasileira;Os profissionais envolvidos na escolha desse acervo devem também analisar a

contribuição das obras estrangeiras em que aparecem essas personagens. Muitasobras, praticamente desconhecidas, rompem com a tradição da representaçãoestereotipada das narrativas e ilustrações em relação à população negra.

Mais que livros na mão: compromisso com a valorização da diversidade

As políticas públicas parecem pretender avançar neste campo da leitura e da

literatura por meio da distribuição de livros. Cabe intensificar ações maiscomprometidas com o enfrentamento do desafio que é trazer para a sala de aulao universo cultural africano e afro-brasileiro.

Contudo, sabe-se que somente a distribuição de livros não garante a leitura,nem mesmo o acesso a eles. Para que o livro circule na sala de aula, e fora dela,depende também, e em grande parte, do grau de organização da unidade escolar- biblioteca funcionando, orienta-dores informados e responsáveis por ela,divulgação do acervo e dos temas dos livros, propostas interessantes a todos osenvolvidos.

A formação de leitores compromissados com a valorização da diversidade,imprescinde da existência de professores, leitores, investigadores que semprese perguntem uns aos outros: quais são as políticas públicas em curso? quaissão os bons livros? quais são as editoras que têm contemplado positivamente adiversidade não apenas em relação a obras com personagens negras mas tambémem relação aos escritores, ilustradores e outros profissionais envolvidos naprodução? como está a distribuição e circulação destes livros?Finalizando, independente de seu pertencimento étnico-racial, todos e todasmerecem ter acesso a obras literárias comprometidas com a promoção da

igualdade das relações étnico-racial.

Referências

SOUSA, Andréia L. Nas tramas das imagens: um olhar sobre o imaginário da personagem negra na literatura infantil e juvenil . SãoPaulo, 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade deEducação, Universidade de São Paulo.

  ________. “O Exercício do Olhar: Etnocentrismo na LiteraturaInfanto-Juvenil”. In: SILVEIRA PORTO, Maria do Rosário et al. Negro,Educação e Multiculturalismo . São Paulo: Ed. Panorama, 2002.

 ________. Personagens Negros na Literatura Infantil e Juvenil. In :CAVALLEIRO (org.). Racismo e Anti-Racismo na Educação: repensando nossa escola. São Paulo: Summus, 2001.

SOUZA, A L. S. Negritude, Letramento e Uso Social da Oralidade.In : CAVALLEIRO, E. (org.). Racismo e Anti-Racismo na Educação: repensando nossa escola. São Paulo: Summus, 2001.

 ________ . Igualdade nas relações raciais - as leis fora do papel.Bolando Aula de História - Apoio para professores do EnsinoFundamental. Ano 7. n. 47 novembro de 2004. Gruhbas, São Paulo,2004.

Ana Lúcia Silva Souza é Doutoranda em Lingüística Aplicada - Unicamp/ IEL. Integra a Associação Brasileira dos Pesquisadores Negros - ABPN - SP.Estuda as interfaces entre práticas de letramento, relações raciais e juventude.Organiza e assessora projetos relacionados leitura e dinamização de acervos.Assessora de Projetos da ONG Ação Educativa, Assessoria, Pesquisa eInformação. ([email protected])

Andréia Lisboa de Sousa é Fellow do Fundo Ryoichi Sasakawa,doutoranda pela Faculdade de Educação da USP, pesquisadora do Centrode Estudos do Imaginário, Cultura, análise de Grupos e Educação – CICE/ FEUSP. Foi Sub-Coordenadora de Políticas Educacionais da Coordenação

Geral de Diversidade e Inclusão Educacional /SECAD/MEC.([email protected])

Rosane de Almeida Pires é Mestre em Teoria da Literatura pela Faculdade deLetras da UFMG,professora da Educação de Jovens e adultos da Prefeitura deBelo Horizonte; compõe o Grupo de Educadoras Negras da FundaçãoCentro deReferência da Cultura Negra em Belo Horizonte FCRCN); sócia-proprietária daSobá - livraria especializada em livros étnicos e cd´s alternativos.([email protected])

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REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE GUARULHOS

DISCUTE QUESTÕES ETNICAS POR MEIO DADANÇA BABASSÁ – DANÇAS BRASILEIRAS,ESPAÇO DE DISCUSSÕES PEDAGÓGICAS,

CULTURAIS E POLÍTICASSecretaria Municipal de Educação de Guarulhos

Samba-lelê tá doente Tá com a cabeça quebrada Samba-lelê precisava É de umas boas palmadas 

OProjeto Político-pedagógico da Rede Municipal de Educaçãode Guarulhos fundamenta-se na afirmação da escola comoespaço privilegiado para o desenvolvimento integral do

educando. Isto significa atender as diferentes dimensões do ser humano,exigindo um trabalho com diversas linguagens (a fala, a escrita, o gesto,os sons etc.) e criando condições efetivas para a aprendizagem numespaço democrático, onde educando e educador são sujeitos do ensinar-aprender.

A partir desta proposta, a Secretaria Municipal de Educação incentivaà Rede Municipal de Educação o contato com a cultura afro-brasileira ecom a linguagem corporal através do curso Babassá - DançasBrasileiras.

O propósito central do Projeto é o de discutir a humanidade e adiversidade . Por outro lado, e como conseqüência desse primeiro,a proposta é também a de refletir sobre preconceito racial ,combatendo o racismo e todo tipo de discriminação, construídos ao

longo de nossa história e que se manifestam, explíci ta ouimplicitamente, em ações, falas e acontecimentos na escola e foradela.

O trabalho com danças brasileiras teve início na Rede Municipal deEducação de Guarulhos no ano de 2002, com cursos para professorese trabalho em escolas diretamente com as crianças. Em 2003, o projetofoi ampliado com a introdução do ensino de capoeira, a construção deinstrumentos de percussão afro-brasileira e a criação de uma identidadepara o projeto, que passou a se chamar “Babassá”, com a proposta detrabalhar questões étnico-raciais por meio da cultura popular,especialmente a dança.

O curso para educadores é composto por três módulos de 32horas cada. Nos encontros são tratadas questões referentes à dançacomo resultado da miscigenação que caracteriza a identidadebrasileira, à valorização de nossa cultura por meio do resgate de  jogos e brincadeiras da cultura popular, além de diversas outrasatividades. Há ainda indicação de fontes de informação que possamauxiliar o educador em seu trabalho junto às crianças, como sites ,vídeos, CDs, festas populares, museus. São também realizadasatividades extraclasse com os educadores a fim de ampliar suasvivências. Com as cr ianças, são real izadas v ivências debrincadeiras, jogos, danças, conversas e apresentação de vídeos,entre outras atividades.

Atualmente duas escolas são atendidas pelo projeto: Escola MunicipalVila Carmela e Escola Municipal Jardim Bananal.

Como objetivos do trabalho com danças brasileiras, podemos elencar:

Exercer e estimular atividades que propiciem a difusão e avalorização da cultura brasileira, oriunda da miscigenação de raças. Explorar as possibilidades de gestos, ritmos e movimentos. Contribuir no enriquecimento das bases de formação das

pessoas, aproximando-as de um trabalho com a magia da cultura popular. Iniciar as pessoas nesse universo, possibilitando a liberdade de

movimento, quebrando barreiras que muitas vezes bloqueiam a relaçãocom outras pessoas. Criar um canal de comunicação para uma convivência baseada

na troca, alegria, consciência e, sobretudo, no respeito pelo outro. Desmistificar estereótipos e preconceitos contra negros,

nordestinos e minorias étnicas. Fomentar a discussão acerca da diversidade etno-cultural de

nosso país.

Babassá – Danças Brasileiras

Curso para educadores composto por três módulos de 32 horascada. Mensal e permanente desde 2001 no Centro Municipal deEducação Adamastor.

Conteúdos dos módulos:

Histórico da dança e instrumentos africanosConfecção de instrumentos afro-brasileirosPesquisa sonora de material de sucataVisita a museus e festas popularesBrinquedos CantadosCantigas de ninar,RitmoLateralidadeJogos de integraçãoLendas brasileirasCacuriáCirandaCocoBumba meu BoiCana Verde

Contra-dança de folia de ReisJongoAfoxéBatuque de UmbigadaMaculelêMoçambiqueMaracatu

Equipe da Secretaria Municipal de Educação de Guarulhos

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Após a palestra que proferiu no Fórumem Barretos sobre a “Inclusão da

criança de 6 anos no EnsinoFundamental”, a educadora Alfredina Neryconcedeu entrevista à equipe de reportagem doSubsídio. Alfredina é graduada em Letras eMestre em Psicologia da Educação. Professoraaposentada da rede pública estadual, atualmenteassessora Secretarias de Educação e elaboramateriais didáticos para professores de LínguaPortuguesa.

Subsídio: Qual a importância de participar deum evento da Undime?

Alfredina Nery:  Participar do evento da Undime foi uma responsabilidadeimensa, porque lá estava o grupo que decide a educação no Estado. Participar éde uma importância capital e, ao mesmo tempo, de uma responsabilidade enormeporque são eles afinal que estão gerindo uma educação que tem muitos problemas,com dados estatísticos alarmantes. É esse o exemplo que precisa ser consideradono seu significado, porque são esses os Dirigentes que dão o tom para adiscussão.

Subsídio: Como está a questão sobre o Ensino Fundamental de 9 anos hoje?Alfredina Nery: O Ensino de 9 anos vem sendo implantado na prática de

algumas cidades há algum tempo. Quando o MEC assume a incumbência defazer essa proposta do ensino de 9 anos, evidentemente que a escola de EnsinoFundamental precisa se rever, porque ela vai receber uma criança com umaidade que tem uma especificidade que precisa ser considerada. A escola temque pensar nessa criança, pois precisa não envelhecer essa criança. O nossomedo é de que se pense que se a criança entrou para o ensino fundamental,agora a coisa é séria, a escola é pra valer, e assim envelhecemos essa criança.Mas ela não pode perder aquilo que contém a infância, que é a sua relação com

o mundo. Em geral essa relação é uma relação curiosa, uma relação de procurados sentidos. A criança questiona o tempo todo. Com os seus porquês, elaestá o tempo todo querendo encontrar explicações, como os grandes filósofos.Criança é filósofo por natureza. Os grandes filósofos perguntaram a vida inteirao que estamos fazendo aqui, e é isso que elas fazem o tempo todo, tentamcompreender isso. Se a escola não tiver a delicadeza nem o conhecimentopara lidar com a criança que chega ao Ensino Fundamental, o nosso medo éque ela “atarraxe” (essa é uma expressão que costumo usar) a criança nacadeira, o que é feito muitas vezes. Quero apostar no município que faz oinverso: que a criança com 6 anos quando entre no Ensino Fundamental traganovos ares para as crianças de 10 anos, que se garanta para as crianças da 10anos a singularidade da infância, que é aprender brincando, que é aprenderpela curiosidade, pelo querer saber, sem se transformar a aprendizagem numaforma desagradável, escolarizada sem sentido. Acredito que a criança de 6anos pode dar uma remexida nessa estrutura que está muito fixada e ruim. Narealidade não quero generalizar, pois é evidente que há todo um esforço dealteração da escola neste sentido. Minha perspectiva e minha aposta são quetalvez essa criança desacomode e tire a escola da zona do conforto. Que ela

consiga fazer isso, que sua entrada no Ensino Fundamental desacomode efaça com que as pessoas, o grupo escola e o sistema em si se mobilizem paramelhorar a escola.

Subsídio: Fale um pouco do trabalho com as modalidades organizativas.Alfredina Nery: Fiz uma fala na direção de apontar algumas possibilidades

de trabalho com as crianças não só com 6 anos, na verdade — masindependentemente da idade. É um trabalho em que o foco é pensar o tempodidático. Como organizamos a relação conhecer e o tempo para conhecer?Acreditamos que as modalidades organizativas, que são discutidas pela

Educador Educador Educador Educador Educador aaaaa Alfr Alfr Alfr Alfr Alfr edina Ner edina Ner edina Ner edina Ner edina Ner y f y f y f y f y f ala sobr ala sobr ala sobr ala sobr ala sobr eeeeeeducação no XV Fór educação no XV Fór educação no XV Fór educação no XV Fór educação no XV Fór um da Undime/SPum da Undime/SPum da Undime/SPum da Undime/SPum da Undime/SP

Foto: Luciana Lane Valiengo

educadora argentina Delia Lerner, podem dar um bom trabalho, um trabalhopositivo na direção de gerir esse tempo diferenciado. Ela organiza, ela divideas modalidades em atividades permanentes, atividades de sistematização,em projetos. Ela procura pensar na relação desse conhecimento da criança.É possível a escola pensar pedagogicamente a partir dessas modalidades,organizando as crianças em grupos diferentes, trabalhando-as individualmente.Eu faço também uma proposta para prática de letramento, que é uma questãofundamental para a escola em geral e para a entrada da criança. Pensar naspráticas de letramento relacionadas a essas modalidades é muito produtivono trabalho rotineiro da escola.

Na verdade, temos discutido o perigo do momento em que vivemos, que éa contradição de abrir uma escola tipicamente tradicional, na qual o conteúdo

é o centro do trabalho pedagógico independente. Havia nela bons conteúdos,o que era uma perspectiva e que passamos a condenar durante um tempo.Mas o problema é o que ficou no lugar disso. Houve um equívoco tambémque era o de tentar ficar à frente, sem conteúdo, o que é impossível. Entãoestamos vivendo a reacomodação do que é afinal ensinar, aprender, queescola e que aluno queremos, e como é que se faz isso. É preciso, pois,haver uma discussão de conteúdo, do que aprender e para que aprender talconteúdo, na tentativa de encontrar sentidos mesmo. Antes era só conteúdo,e agora não sei o que é, ou é conteúdo nenhum. Existe uma continuidadeentre um pólo e o outro, que é todo o trabalho que é feito. A discussãocurricular vai nessa direção também. Quando se discute currículo, afinal decontas qual é o currículo que queremos? É evidente que não estou pensandonum currículo único, num país como o Brasi l. Há necessidade de que cadalocal, cada cidade faça uma discussão forte sobre a concepção de currículo,porque também há um vazio aí.

Subsídio: E a dicotomia que existe entre a Educação Infantil e o EnsinoFundamental?

Alfredina Nery: É um equívoco terrível imaginar que na Educação Infantilnão se ensina e de que se vai ensinar no Ensino Fundamental. É evidente quea criança da Educação Infantil também está aprendendo e ela também tem odireito de ter uma escola boa, com conteúdos. A definição dos conteúdos éque é a distinção. Agora aquela criança não vai poder brincar? Brincar é umconteúdo e ela precisa aprender brincando. Aprender brincando o quê? A seconhecer, a conhecer o mundo, compreender melhor o mundo, experimentaresse mundo, dar nome para coisas do mundo. Portanto, a escola de EducaçãoInfantil é tão importante quanto qualquer outra escola de Ensino Fundamental.Há muita coisa que se precisa discutir em relação a isso.

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GESTÃO DE PESSOASNA ESCOLALeonora Pilon Quintas

Compreender a escolacomo fenômeno his-stórico requer descobrir

como se fundaram as bases daatual estrutura, as ações regu-lamentadas politicamente, oslimites definidos, as “verdades”

nela tidas como determinantes,enfim, sua cultura organizacional.

Desse modo, torna-se imp-ossível pensar em debater sobrequalquer estrutura educativa semantes não contextualizá-la, poiso processo de análise passanecessariamente pela maneiracomo o homem em um dadocontexto analisa sua realidade,seu mundo, percebendo-se umser produtor no seu tempo e no seu espaço, um transformador objetivo da suarealidade que racionalmente pode analisar e modificar, ou se alienar eacomodar.

Nota-se que, nesse modelo organizacional da gestão democrática escolar,ainda é possível perceber o distanciamento entre o pedagógico e oadministrativo, sobretudo no que concerne à coordenação de um projetopedagógico integrado.

Assim, de nada adianta uma Lei de Gestão Democrática do Ensino Públicoque "concede” autonomia pedagógica, administrativa e financeira às escolas, sediretor, professores, alunos e demais atores do processo desconhecem osignificado político da autonomia, a qual não é dádiva, mas sim uma construçãocontínua, individual e coletiva.

Para pensar este conceito, Vieira (2002) indica a autonomia que não podeser percebida como um objetivo por excelência, pois é elaque possibilitará ao sujeito "instituir", "criar suas própriasleis", deixando de viver sempre o "instituído" que lhe éestranho.

Freire (2001) cita: “... O mundo não é. O mundo está sendo.(...) Não sou apenas objeto da História, mas seu sujeitoigualmente. (...) caminho para a inserção, que implica decisão,escolha, intervenção na realidade...”. Portanto, ele retrata arazão emancipatória, que possibilita a visão da totalidade.

Dessa maneira, o projeto pedagógico na autonomiaconstruída deve permitir aos professores, alunos,coordenadores e diretores estabelecerem uma comunicação

dialógica, para propiciar a criação de estruturasmetodológicas mais flexíveis para reinventar sempre que forpreciso. A confirmação desse contexto só poderá ser dadanuma escola autônoma, onde as relações pedagógicas sãohumanizadas.

Faz-se necessário romper com as tendências fragmentadase desarticuladas do modo de conceber o projeto para re-significar as suas práticas, para criar a identidade de cada escola particularmente,tendo o planejamento como ponto de partida.

Padilha (2001) alerta a respeito “de quem planeja e de com quem se planeja”.

Partindo desse princípio, a escola precisa da participação da comunidade comousuária consciente deste serviço, não apenas para servir como instrumento decontrole em suas dependências físicas. Trata-se de romper com os muros daescola.

E os professores devem reconhecer a importância de romperem com asposições pedagógicas cartesianas para fazerem dialeticamente a relaçãonecessária entre as disciplinas que compõem o currículo escolar e a realidadeconcreta da vivência do aluno, a partir da visão interdisciplinar doconhecimento. Daí a importância do ato reflexivo no dinamismo da prática

pedagógica através da reflexão conjunta do projeto educativo, em oposiçãoà racionalidade técnica.

O desafio de um novo projeto pedagógico não deve levar em conta, comoponto de partida, o consenso, mas o conflito que favorece a diversidade, numatrajetória construída coletivamente na tomada de decisões.

O resultado do processo do planejamento será influenciar e provocartransformações nas instâncias e nos níveis educacionais que, historicamente,têm ditado o como, o porquê, o para quê, o quando e o onde planejar. Numsentido mais específico, Padilha (2001) afirma que “pensar o planejamentoeducacional e, em particular, o planejamento visando ao projeto político-pedagógicoda escola é, essencialmente, exercitar nossa capacidade de tomar decisõescoletivamente”.

Para complementar, segundo Gandim (2000),“... o planejamento deve alcançar não só que se façam bem as coisas

que se fazem (chamaremos a isso de eficiência), mas que se façam ascoisas que realmente importa fazer, porque são socialmente desejáveis(chamaremos a isso de eficácia)”.

Neste contexto, os profissionais da educação são desafiados constantemente

pelo desconhecido, e a renovação de suas práticas educacionais torna-se umaquestão de sobrevivência da escola. Porém esta renovação é complexa, primeiroporque perpassa todos os aspectos da prática pedagógica; segundo, porqueexige abertura dos envolvidos no processo com a vontade política de mudar; eterceiro, porque os meios para concretizar as aspirações devem estar emconsonância com o contexto histórico concreto.

“Reforçando: o conceito de gestão educacional,diferentemente do de administração educacional, abrange umasérie de concepções não abarcadas pelo de administração.Pode-se citar, dentre outros aspectos: a democratização doprocesso de determinação dos destinos do estabelecimentode ensino e seu projeto político-pedagógico; a compreensãoda questão dinâmica e conflitiva das relações interpessoaisda organização e o entendimento dessa organização comouma entidade viva e dinâmica, demandando uma atuaçãoespecial de liderança; o entendimento de que a mudança dosprocessos pedagógicos envolve alterações nas relações sociaisda organização; a compreensão de que os avanços das

organizações se assentam muito mais em seus processossociais, sinergia e competência, do que sobre insumos ourecursos.” (LÜCK, 1998)

Isso será possível pela compreensão da concepção crítico-reflexiva como pressuposto da autonomia a ser construídacoletivamente e articulada com o universo “mais amplo” daescola. Como defende Cortella (2002), “um amanhã sobre o

qual não possuímos certezas, mas que sabemos possibilidade”.A partir dessas premissas, buscamos a concepção de uma escola que aprende

a aprender; que requer diretores, coordenadores, professores e funcionários com

“De nada adianta uma Lei de

Gestão Democrática do Ensino

Público que “concede”

autonomia pedagógica,

administrativa e financeira às

escolas, se diretor,

professores, alunos e demais

atores do processo

desconhecem o significado

político da autonomia, a qual

não é dádiva, mas sim uma

construção contínua,

individual e coletiva.”

Leonora Pilon Quintas

Foto: Arquivo Subsídio

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competências e habilidades para mudarem a maneira depensar, de sentir, de agir e de interagir da equipe; que pensaa instituição de ensino como um espaço no qual o trabalho

acontece através das relações interpessoais, que ocorremno “aqui e agora”, atravessados por tudo o que já viveram,tudo o que aprenderam, a cultura que adquiriram e o quesentem. Essa troca se dá com concepções previamenteconstruídas no contexto presente, no qual a percepção é oponto de partida para o relacionamento e a construção dealgo que se efetiva no tempo, mas também permiteaprendizagens nas dimensões intrapessoal, interpessoal ena escola.

O conhecimento dos valores e formas de agir doscomponentes do grupo têm fundamental valor para quese dê a construção da equipe, melhorando seu desempenho na medida emque ficam mais explícitos os potenciais e dificuldades de cada indivíduo.Nessa aprendizagem transformadora, a escola produz e é produzida pelossujeitos e nela também se encontram as relaçõe s assimétricas de poder.É nessa complexidade que as relações interpessoais ocorrem no processogrupal. Cabe ao gestor apreender essa complexidade e es tar preparadocom todas as ferramentas possíveis para a competência de “lidar com

gente”. Ele precisa ser hábil em articular as relações no cotidiano, o queexige flexibilidade, percepção, sensibilidade, comunicação, determinaçãoe visão.

Nesse contexto, apresenta-se a concepção das “organizações que aprendem”,dois termos que se uniram nos últimos anos para compor uma tendência mundial.A escola não poderia ficar de fora, apesar de ser inicialmente estranho falar emescola aprendente. Mas segundo Senge (2005),

“... as escolas podem ser recriadas, vitalizadas e renovadas de formasustentável, não por decreto ou ordem e nem por fiscalização, mas pelaadoção de uma orientação aprendente ”.

Para isso, é necessário que todos os envolvidos com a educação se juntempara somar forças, aprendendo a trocar idéias e confiar uns nos outros.

Esse tipo de exercício favorece o crescimento e a aprendizagem da equipe detrabalho e a torna mais comprometida com os objetivos a serem alcançados.Vemos, portanto, que o papel do gestor dentro de uma organização que aprendeé fundamental.

No exercício das habilidades necessárias, encontram-se as cinco disciplinasdas “Escolas que aprendem”.

a) Domínio pessoal Segundo Senge (2005):

“Domínio pessoal é uma série de práticas que ajudam as pessoas –crianças e adultos – a manter seus sonhos, enquanto cultivam umaconsciência da realidade atual que as rodeia. Essa consciência dual –aquilo que você quer e aquilo que você tem – freqüentemente cria umestado de tensão que, por sua natureza, busca resolução.”

Dessa forma, caberá à instituiçãoproporcionar um ambiente no qualessa tensão possa ser confrontadapara expandir e aprofundar a visãoindividual.

b) Modelos mentais “Esta disciplina de capacidades de

reflexão e investigação concentra-seno desenvolvimento da consciênciade atitudes e percepções – suas e

de outros ao seu redor”. (Senge,2005). Assim, esse desenvolvimento da consciência é uma prática defundamental importância, visto ser [a consciência] o maior limitador àspossíveis mudanças.

Segundo Boff, “todo ponto de vista é a vista de um ponto”, portanto toda leituraé uma releitura, e cabe à escola proporcionar esse espaço.

c) Visão compartilhada “Se, ao construir a visão compartilhada, um grupo de pessoas constrói

um sentido de compromisso conjunto” (Senge, 2005), esta disciplina busca

Leonora Pilon Quintas é especialista MBA em Gestão Educacional ePedagoga. Professora e coordenadora de Matemática do Ensino Fundamentalda Rede Municipal de Cubatão, onde coordena a reorientação curricular da área.Capacitadora do Gruhbas - Projetos Educacionais e Culturais.

a missão da escola, sua função social, em conjunto.Quando o planejamento estratégico se institui, osparticipantes assumem o compromisso com as metas

estabelecidas.

d) Aprendizagem em equipe Este processo baseia-se no conceito de alinhamento

que “começa com a capacidade de ver e respeitar uns aosoutros e de estabelecer certos modelos mentais comunsa respeito da realidade...” (Senge, 2005), impreterível àdinâmica de grupo no processo dialógico. Assim, a“Aprendizagem em equipe” requer muita atenção, poisSenge (2005) afirma:

“Esta é uma disciplina de interação de grupo. Por meio detécnicas como diálogo e discussões hábeis, pequenos grupos de pessoastransformam seu pensamento coletivo, aprendendo a mobilizar suasenergias e ações para alcançar objetivos comuns e produzir umainteligência e habilidade maior do que a soma dos talentos dos membrosindividuais.”

e) Pensamento sistêmico 

Segundo Senge (2005), “as pessoas aprendem a compreender melhor ainterdependência e a mudança...” na complexidade da organização, pois,

“O todo é uma unidade complexa. E o todo não se reduz à merasoma dos elementos que constituem as partes. É mais do que isto,pois cada parte apresenta sua especificidade e, em contato comas outras, modificam-se as partes e também o todo.” (PETRAGLIA2003)

A abordagem dessa concepção se insere como uma metodologia participativa,na qual é possível o desenvolvimento e a mudança na busca da qualidade sociale da autonomia para a prática da gestão democrática, para a qual a elaboraçãodo projeto pedagógico pode ser o ponto de partida.

“Os profissionais da

educação são desafiados

constantemente pelo

desconhecido, e a renovação

de suas práticas educacionais

torna-se uma questão de

sobrevivência da escola.”

“O conhecimento dos valores

e formas de agir dos

componentes do grupo têmfundamental valor para que se

dê a construção da equipe,

melhorando seu desempenho

na medida em que ficam mais

explícitos os potenciais e

dificuldades de cada

indivíduo.”

Referências

BRASIL. Lei no 9.394 , de 20 de dezembro de 1996. Estabelece asdiretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília,20 dez. 1996.

CORTELLA, Mario Sergio. A escola e o conheciment o – fundamentosepistemológicos e políticos. São Paulo: Cortez, 2002.FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia : saberes necessários à prática

educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2001.GANDIN, Danilo. A Prática do Planejamento Participativo . Petrópolis:

Vozes, 2000.LÜCK, Heloísa. A evolução da gestão educacional. In: ______. A escola 

participativa : o trabalho do gestor escolar. Rio de Janeiro: DP&A, 1998.NÓVOA, António (org.). As organizações escolares em análise .

Publicações Dom Quixote. Instituto de Inovação Educacional, Lisboa,1992.

PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico : como construir oprojeto político-pedagógico da escola. São Paulo: Cortez, 2001.

PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública . SãoPaulo: Ática, 1997.

PETRAGLIA, Izabel Cristina. Edgar Morin : A educação e a complexidadedo ser e do saber. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.

SENGE, Peter. Escolas que aprendem : um guia da Quinta Disciplina

para educadores, pais e todos os que se interessam por educação. Trad.Ronaldo Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2005.VIEIRA, Sofia Lérche (org) Gestão da escola : desafios a enfrentar. Rio

de Janeiro, DP&A, 2002.

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Por acreditar que é essencial a leitura dos documentos de interesse para a revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica que embasam a entrada da crian ça no Ensino Fundamental ao seis anos de idade, Subsídio transcreve o texto da Lei 11.114/ 05 e da Resolução CEB/CNE 03/05. Além disso, recomenda a leitura dos seguintes documentos, disponíveis em  http:// portal.mec.gov.br/cne: Lei 11274/06, que altera a redação dos arts.29, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394/96, dispondo sobre a duração mínima de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matríc ula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade; Parecer CNE/CEB nº 18/05, que trata das orientações para a matrícula das crianças 

de 6 (seis) anos de idade no Ensino Fundamental obrigatório, em atendimento à Lei nº 11.114/05.

Lei nº 11.114, de 16 de maio de 2005

Altera os arts. 6º, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com o objetivo de tornar obrigatório o início do ensino fundamental aos seis anos de idade.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono aseguinte Lei:

Art. 1º Os arts. 6º, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de

1996, passam a vigorar com a seguinte redação“Art. 6º. É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula dos

menores, a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental.”(NR)

“Art. 30. .......................................................................................................II – (VETADO)”

“Art. 32. O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos,obrigatório e gratuito na escola pública a partir dos seis anos, terá porobjetivo a formação básica do cidadão mediante:

..........................................................................................................” (NR)

“Art. 87. .....................................................................................................§ 3º ..........................................................................................................I – matricular todos os educandos a partir dos seis anos de idade, no

ensino fundamental, atendidas as seguintes condições no âmbito decada sistema de ensino:

a) plena observância das condições de oferta fixadas por esta Lei, nocaso de todas as redes escolares;

b) atingimento de taxa líquida de escolarização de pelo menos 95%(noventa e cinco por cento) da faixa etária de sete a catorze anos, nocaso das redes escolares públicas; e

ENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDENSINO FUNDAMENTAMENTAMENTAMENTAMENTAL DE 09AL DE 09AL DE 09AL DE 09AL DE 09 ANOSANOSANOSANOSANOSTEXTTEXTTEXTTEXTTEXTOS LEGAISOS LEGAISOS LEGAISOS LEGAISOS LEGAIS

Resolução CNE/CEB nº 3, de 3 de agosto de 2005

Define normas nacionais para a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos de duração.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacionalde Educação, no uso de suas atribuições legais de conformidade como disposto na alínea “c” do Artigo 9º da Lei nº 4024/61, com a redaçãodada pela Lei nº 9131/95, bem como no Artigo 90, no § 1º do Artigo 8º eno § 1º do Artigo 9º da Lei 9.394/96 e com fundamento no Parecer CNE/ 

CEB nº 6/2005, homologado por despacho do Senhor Ministro de Estadoda Educação, publicado no DOU de 14 de julho de 2005, resolve:

Art. 1º A antecipação da obrigatoriedade de matrícula no EnsinoFundamental aos seis anos de idade implica na ampliação da duraçãodo Ensino Fundamental para nove anos.

Art. 2º A organização do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos e daEducação Infantil adotará a seguinte nomenclatura:

c) não redução média de recursos por aluno do ensino fundamentalna respectiva rede pública, resultante da incorporação dos alunos deseis anos de idade;

..........................................................................................................”(NR)

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, com eficáciaa partir do início do ano letivo subseqüente.

Brasília, 16 de maio de 2005; 184º da Independência e 117º daRepública.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVATarso Genro Álvaro Augusto Ribeiro Costa 

Art. 3º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação,revogadas as disposições em contrário.

CESAR CALLEGARIPresidente da Câmara de Educação Básica

(*) Publicada no DOU de 08/08/2005, Seção I, pág. 27.

Etapa de ensinoEducação InfantilCreche

Pré-escolaEnsino FundamentalAnos iniciais

Anos finais

Faixa etária previstaaté 5 anos de idadeaté 3 anos de idade

4 e 5 anos de idadeaté 14 anos de idadede 6 a 10 anos de idade

de 11 a 14 anos de idade

Duração

9 anos5 anos

4 anos

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P or acreditar que é essencial a leitura dos documentos de interesse para a revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica que embasam a entrada 

da criança no Ensino Fundamental ao seis anos de idade, nosso jornal Subsídio   nº 17  publicou o texto da Lei 11.114/05 e da Resolução CEB/CNE 03/05, recomendando a leitura da Lei 11274/ 06, que altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394/ 96, dispondo sobre a duração mínima de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis)anos de idade. Como o assunto é de interesse de todos os que atuam a educação escolar, o Subsídio foi encaminhado a todos os nossos leitores. Neste número do Bolando Aula , publicamos  o texto da  Lei 11274/06.

LEI Nº 11.274, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2006.

Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no

9.394, de 20de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases daeducação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anospara o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6(seis) anos de idade.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o CongressoNacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o (VETADO)Art. 2o (VETADO)Art. 3o O art. 32 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996,

passa a vigorar com a seguinte redação:“Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9

(nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis)anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão,mediante:

...................................................................................” (NR)Art. 4o O § 2o e o inciso I do § 3o do art. 87 da Lei no 9.394, de

20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com a seguinte

redação:“Art. 87 ......................................................................................................................................................................§ 2o O poder público deverá recensear os educandos no ensino

fundamental, com especial atenção para o grupo de 6 (seis) a 14(quatorze) anos de idade e de 15 (quinze) a 16 (dezesseis) anosde idade.

§ 3o ...................................................................................I – matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) anos de

idade no ensino fundamental;a) (Revogado)b) (Revogado)c) (Revogado)...................................................................................” (NR)Art. 5o Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal terão prazo

até 2010 para implementar a obrigatoriedade para o ensinofundamental disposto no art. 3o desta Lei e a abrangência da pré-escola de que trata o art. 2o desta Lei.

Art. 6o

Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Brasília, 6 de fevereiro de 2006;

185o da Independência e118o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVAMárcio Thomaz Bastos

Fernando HaddadÁlvaro Augusto Ribeiro Costa

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A LIDERANÇA NA ESCOLA*A LIDERANÇA NA ESCOLA*A LIDERANÇA NA ESCOLA*A LIDERANÇA NA ESCOLA*A LIDERANÇA NA ESCOLA*Margarete A. F. Fernandes

Aprimeira vez em que ouvi falar em mudança de paradigma, num curso de pós-graduação,foi através de uma história contada por um professor.

Essa história dizia mais ou menos assim: uma senhora dirigia o seu carro por uma estradaconhecida, quando, em sentido contrário, passou outro veículo cheio de rapazes com acabeça para fora da janela, que lhe acenavam vibrantemente e gritavam em uníssono “vaca!”.

A senhora continuou seu trajeto, bastante inconformada e incrédula com tamanha faltade educação e de bons costumes dos rapazes, dizendo para si mesma que esses jovensnão eram mais como os de antigamente. Eram, isto sim, frutos de uma geração perdida.

Ao fazer uma curva mais fechada, deparou-se com uma vaca (animal da raça bovina)no meio da estrada, o que a obrigou a desviar bruscamente seu carro para o acostamento.Recuperada do susto e aliviada por ter conseguido escapar de um terrível acidente, sóentão pôde compreender o que realmente os rapazes haviam tentado lhe dizer naqueleinstante. Essa situação, enfim, era considerada a ruptura de um velho paradigma!

Isso posto, o professor nos falou a respeito da época em que estávamos vivendo, em quemuitos paradigmas estavam sendo substituídos por outros de maior eficácia para as condiçõesque se apresentavam e que era preciso estarmos atentos e abertos para essastransformações. Essa foi uma aula introdutória do curso que acabou nos levando a muitasoutras reflexões no campo educacional.

Na época, trabalhando em uma escola de cunho cognitivista, já estava vivenciando inúmerasmudanças na área da educação: a nova LDB, o trabalho com metodologia de projetos, aintrodução dos temas transversais, a educação orientada por competências e habilidades, opapel do professor dentro dessa nova perspectiva, o ensino centrado no aluno. Mas, ainda melembro como foi difícil a introdução de tantas mudanças no dia-a-dia daquela escola. Osprofessores que lá trabalhavam, cresceram e se formaram dentro de um modelo tradicional deensino, que até então havia dado certo. Como, então, romper de uma hora para outra comtudo o que consolidou esse caminhar? Como embarcar numa nova proposta que mal tinhamouvido falar? Foi uma época de muitas e muitas reuniões, muitas conversas, muito desânimo...

Um verdadeiro caos se instalou por detrás das paredes daquela escola. Uns se diziamabertos às novas mudanças, mas continuavam presos ao livro didático e à aula meramenteexpositiva, outros torciam o nariz e tentavam ganhar tempo para ver se o assunto acabaria sendoesquecido na semana seguinte e uns poucos, mais ousados, começaram a ler mais, pesquisarmais, estudar mais sobre o assunto.

Foi também nesse período que comecei a perceber o quanto a liderança é importantedentro de um contexto de adversidade e de mudança. O quanto saber administrar bem osconflitos que vão aparecendo traz segurança às pessoas que estão envolvidas no processo...

A diretora dessa escola praticamente “empurrou” os professores para um novo caminhar:contratou profissionais especializados para trabalhar junto deles dentro da própria escola,investiu em cursos, seminários e jornadas pedagógicas, promovendo verdadeiras caravanas

entre nossa cidade e São Paulo, para que todos tivessem contato com novas experiênciasque já estavam dando certo e não se sentissem solitários e amedrontados.À medida que o processo foi evoluindo, muitos professores resolveram abandonar o barco,

talvez por não acreditarem em sua própria capacidade de inovar uma vez ou porque essamudança exigia mais trabalho, mais leitura, mais pesquisa, estudo constante, uma novapercepção da realidade... Ainda por cima, vinha a parte mais difícil, que era a tarefa deconvencer os pais de que toda aquela transformação era necessária e pertinente ao momentohistórico que estávamos vivendo.

Nesse último embate, pudemos também contar com a firmeza dessa diretora, que abriu aescola aos pais, acolheu suas dúvidas e incertezas com paciência e cuidado, promoveuconstantes e exaustivas reuniões, contratou palestrantes e manteve-se abraçada firmementeà sua causa.

Com certeza, os professores que ficaram ganharam em muitos aspectos: passaram a vero mundo de outra forma, deixaram de lado muitos ranços da velha escola, se questionarammais a respeito de suas práticas, cresceram tanto no âmbito pessoal quanto no da convivênciahumana, além de proporcionarem a muitos dos alunos uma experiência inesquecível deautonomia, criticidade, compromisso e participação.

Abandonar um velho paradigma e lançar-se a algo inovador não é realmente tarefa fácil,pois exige abertura de pensamento, adaptabilidade ao diferente, novos questionamentos deverdades até então intocáveis.

O mais assustador de tudo isso é que dificilmente poderemos prever como e quandoacontecerá a próxima mudança de paradigma, mas, certamente será mais fácil compreendê-lo a partir do momento em que tivermos pessoas que se comprometam e liderem o processode mudança.

Margarete A. F. Fernandesé Professora de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental, formadaem Letras e Pedagogia, com pós-graduação em Coordenação Pedagógica pela UNISANTOS.

* Artigo escrito para o curso de Certificação de Diretores e Orientadores Pedagógicos,realizado durante o 1º semestre de 2005 pelo Gruhbas Projetos Educacionais e Culturais paraa Secretaria Municipal de Educação de Guarujá/SP.

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