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Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de caso da General Motors Renato Silva de Rezende Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Instituto Coppead de Administração Mestrado em Adminisração ORIENTADORA: DENISE LIMA FLECK, Ph D. Rio de Janeiro – Brasil 2009

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Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de

caso da General Motors

Renato Silva de Rezende

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ

Instituto Coppead de Administração

Mestrado em Adminisração

ORIENTADORA: DENISE LIMA FLECK, Ph D.

Rio de Janeiro – Brasil 2009

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Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de

caso da General Motors

Renato Silva de Rezende

Dissertação apresentada ao corpo docente do Instituto COPPEAD de

Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).

Aprovada por:

___________________________________________ - Orientadora

Profª. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ)

___________________________________________

Prof. Agrícola de Sousa Bethlem, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ)

___________________________________________

Prof. Pedro Lincoln Carneiro Leão de Mattos, Ph.D. (UFPE)

Rio de Janeiro – Brasil 2009

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FICHA CATALOGRÁFICA

Rezende, Renato Silva de R. Sucesso e Fracasso Organizacional: Um estudo de caso da

General Motors. – Rio de Janeiro, 2009. xii, 264 f. f.: il Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal

do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto COPPEAD de Administração, 2008. Orientadora: Denise Lima Fleck 1. Estratégia Empresarial. 2. Crescimento da Firma. 3. Indústria

Automobilística. – Teses. I. Fleck, Denise Lima (Orientadora). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de Administração. III. Sucesso e Fracasso Organizacional: Um estudo de caso da General Motors.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho...

... à minha esposa Fernanda, que me deu uma verdadeira demonstração de amor ao

me apoiar e contribuir de forma decisiva para a conclusão deste mestrado;

... aos meus país, Joaquim e Marly, por me ensinarem o prazer da busca pelo

conhecimento;

... aos meus irmãos Gustavo e Daniela, por compartilharem comigo os primeiros e

mais profundos exercícios de apredizado;

... às minhas avós Joana e Tereza, que puderam acompanhar a conquista de mais

uma etapa, que de certa forma também é fruto de seus esforços.

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AGRADECIMENTOS

A decisão de fazer o COPPEAD representou uma grande mudança para mim e

para Fernanda, quando ainda éramos namorados e tivemos de enfrentar o recomeço

da vida profissional e a construção de um lar, tudo em uma nova cidade. Juntamente

com o rigoroso processo de aprendizado, a inqueitação dos sonhos de ambos em

estruturar uma família levou-nos a um período intenso em realizações, repleto de

desafios, e que culminou com a celebração do nosso casamento e a conclusão do

mestrado.

A realização de tantos sonhos não teria sido possível sem a dedicação e o

amor que recebi da Fernanda, hoje minha esposa. A ela devo eterno agradecimento,

não só pelo amor e companheirismo vividos em momentos de grandes alegrias, mas

também por compartilhar intimamente as angústias latentes nas horas mais difícies.

Sempre com muito carinho e paciência, ela ajudou-me na superação de cada

obstáculo.

Agradeço especialmente aos meus pais, Joaquim e Marly, pelos exemplos,

pelo incentivo e apoio que sempre me deram para que buscasse aprender, crescer e

me tornar uma pessoa melhor. Aos meus irmãos Gustavo e Daniela. Junto com eles

aprendi as lições mais marcantes da minha vida e guardo as lembranças de nossa

infância com muito carinho.

Quero agradecer também à professora Denise Fleck, pelo empenho em fazer

deste um processo de busca e desenvolvimento de nossa identidade. Sua dedicação

para tornar o aprendizado um desafio enriquecedor servirá como inspiração sobre o

papel e o compromisso de um educador.

Não posso deixar de agradecer aos colegas de Seminário de Pesquisa, Paula,

Luiz Gustavo e, especialmente, Luiz Eduardo e Gustavo pela valiosa troca de

conhecimentos e pelo companheirismo reconfortante ao longo dos inúmeros dias de

confinamento e dedicação ao trabalho.

Agradeço ainda à turma 2007 do mestrado do COPPEAD, pois o rico processo

de aprendizado que compartilhamos não seria possível sem a dedicação de todos.

Aos professores e funcionários do COPPEAD, especialmente às meninas da

Secretaria Acadêmica, por se empenharem no desenvolvimento desta instituição.

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A minha família, em especial, meus avós Roque (in memorian) e Tereza,

Laurindo (in memorian) e Joana, meus padrinhos Maria e Flávio, e primos Tiago e

Mariana. Agradeço, pois embora estivessem distantes, foram pessoas muito

importantes para o meu desenvolvimento.

Gostaria de agradecer também aos meus novos familiares, por parte da minha

esposa, especialmente meu sogro e sogra, Fernando e Ruth, que vibram com cada

uma de nossas conquistas. À tia Margariada, que nos acolheu no Rio de Janeiro e

ajudou de forma incansável sempre que precisamos. E também à famíla da Clarissa,

Ricardo, Pedro e Maria Clara por acompanharem e torcerem por nós.

Agradeço a todos os demais familiares e amigos que em função das distâncias

ficam saber bem o que estou fazendo, mas ainda assim torcem por mim. Também

agradeço à Valnice, que carinhosamente se preocupou em cuidar para que eu não me

esquecesse das refeições em momentos de grande concentração.

Por fim, agradeço aos professores Agrícola Bethlem e Pedro Lincoln de Mattos

pelas valiosas contribuições a esta pesquisa.

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RESUMO Rezende, Renato Silva de. Sucesso e fracasso organizacional: um estudo

de caso da General Motors. Orientadora: Denise Lima Fleck. Rio de Janeiro:

UFRJ/COPPEAD 2009. Dissertação (Mestrado em Administração)

A General Motors foi fundada por William Durant em 1908, quando ele liderou o

processo de aquisição de diversas empresas fabricantes de veículos automotores e

suas partes. Ao longo de um século, a organização expandiu suas atividades e ocupou

uma posição de destaque na indústria automobilística. Desde o final do século 1920

até 2007, a General Motors manteve-se como maior fabricante mundial de veículos,

além de ter ocupado o topo da lista de maiores empresas em faturamento dos Estados

Unidos. Apesar do prolongado sucesso em termos de receita, lucros, participação de

mercado e prestígio de suas marcas, a General Motors não foi capaz de evitar uma

degeneração de sua posição na indústria e enfrentou um processo de declínio que

levou a organização a um estado de fracasso, com a abertura de concordata em junho

de 2009.

O fenômeno ocorrido com a General Motors torna relevante o estudo de fatores

que contribuíram para a organização ter alcançado um reconhecido sucesso e

posteriormente encontrar-se em um estado de fracasso. Diante desse desafio, este

trabalho utilizou o arcabouço teórico dos arquétipos do sucesso e do fracasso

organizacional de Fleck (2009) para entender as condições desenvolvidas pela

General Motors que a conduziram entre uma situação e outra.

A pesquisa levantou registros históricos para reconstituir a trajetória da

organização entre 1908 a 2009 e realizou uma análise longitudinal dos padrões de

ação em relação às respostas aos desafios à longevidade saudável (FLECK, 2009).

As conclusões do trabalho indicaram que a ausência de capacitações de coordenação

levou a General Motors a responder de forma auto-destrutiva ao desafio da gestão da

diversidade.

O caráter fragmentador das ações de coordenação da organização apresentou

raízes que remontam a sua formação. Portanto, apesar das condições favoráveis

desenvolvidas em outros desafios, combinadas com o ambiente competitivo e

institucional, terem viabilizado a evolução para uma posição hegemônica, tais fatores

não foram suficientes para promover uma propensão à auto-perpetuação.

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ABSTRACT Rezende, Renato Silva de. Sucesso e fracasso organizacional: um estudo

de caso da General Motors. Orientadora: Denise Lima Fleck. Rio de Janeiro:

UFRJ/COPPEAD 2009. Dissertação (Mestrado em Administração)

General Motors was created by William Durant in 1908, when he led the

acquisition process of several manufacturers of automobile and parts. Throughout a

century, the organization expanded its activities and reached a remarkable position in

the automobile industry. From 1928 until 2007, General Motors maintained the position

of biggest carmaker in the world, besides occupying the top of the list in total revenue

among all corporations in the United States. Despite the long success in terms of

revenues, profits, market share and prestige of its brands, General Motors couldn’t

avoid the degeneration of its position in the industry and faced a decline process, which

led the filling for the Chapter 11 rehabilitation request in June, 2009.

The phenomenon occurred with General Motors made relevant the study of the

factors that contributed for the organization to reach a recognized success, and

afterwards find itself in a state of failure. Given such challenge, this work has used the

theoretical framework of the archetypes of organizational success and failure of Fleck

(2009) to understand the conditions developed by General Motors that conducted it

between one situation and the other

The research raised historical facts and data to reconstruct the trajectory of

General Motors from 1908 to 2009, and conducted a longitudinal analysis of the

organization patterns of action relating them to the responses to the longevity’s

challenge (FLECK, 2009). The conclusions of the study indicate that the lack of

coordination capabilities led General Motors to respond in a self-destructive way to the

challenge of diversity management.

The fragmenting character of the organization’s coordination actions presents

roots that recall its formation. Therefore, in spite of the competitive and institutional

environment combined with the favorable conditions developed on other challenges

have enabled a hegemonic position, these factors were not sufficient to promote a self-

perpetuating propensity.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 4-1 Receita e Lucro líquido da GM de 1909 a 1915 (em milhões de dólares) ......................................................................................................................... 52

Tabela 4-2 Receita e Lucro líquido da GM durante a segunda guerra mundial. ...................................................................................................................... 107

Tabela 9-1 Receita Líquida, Lucro e Ativo Total da General Motors entre 1917 e 2008 ................................................................................................................ 258

Tabela 9-2 Produto nacional bruto do Estados Unidos entre 1917 e 2009 ...................................................................................................................................... 260

Tabela 9-3 Vendas de veículos nos Estados Unidos entre 1900 e 2008... 262

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 3-1 Fontes secundárias obtidas através do levantamento das bibliotecas da HEC e McGill ................................................................................... 21

Gráfico 4-1 Evolução da participação da carroceria fechada nas vendas da indústria de 1919 a 1927 (em porcentagem) ...................................................... 81

Gráfico 4-2 Receita líquida e participação de mercado da GM ................... 190

Gráfico 4-3 Evolução do crescimento da General Motors 1904 a 2008 .... 192

Gráfico 4-4 Evolução das vendas de veículos da indústria e da General Motors nos Estados Unidos, entre 1900 e 2008 .............................................. 193

Gráfico 4-5 Lucro Líquido sobre ativo total, corrente e média móvel em 10 anos ............................................................................................................................. 196

LISTA DE FIGURAS

Figura 2-1 Modelo dos requisitos para o desenvolvimento da propensãa auto-perpetuação organizacional ........................................................................... 8

Figura 4-1 Posicionamento de preço dos veículos de Ford e GM em 1926 ........................................................................................................................................ 82

Figura 4-2 Fluxograma do processo de desenvolvimento de novos modelos entre 1935 e 1962 ..................................................................................... 92

Figura 4-3 Trajetória das respostas aos desafios do crescimento, no continuum entre auto-destruição e auto-perpetuação. ................................. 230

Figura 8-1 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do empreendedorismo ................................................................................................. 250

Figura 8-2 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico ..................................................................... 252

Figura 8-3 Padrões encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da diversidade ........................................................................................... 253

Figura 8-4 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos ....................................................... 255

Figura 8-5 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da Complexidade ...................................................................................... 256

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LISTA DE QUADROS

Quadro 2-1 Cinco desafios organizacionais ........................................................ 9

Quadro 2-2 Elementos da dinâmica organizacional de Selznick (1957) e Cyert e March (1963) ................................................................................................. 17

Quadro 3-1 Extrato exemplificativo da tabela de entrada de fatos históricos da General Motors ................................................................................. 24

Quadro 3-2 Extrato exemplificativo da tabela de codificação dos fatos .... 25

Quadro 4-1 Empresas integrantes da General Motors Company, em 191044

Quadro 4-2 Faixas de preços dos modelos oferecidos pelas divisões da General Motors em 1921 (em U$) .......................................................................... 71

Quadro 4-3 Segmentação por preços recomendadas pelo comitê especial (em U$) ......................................................................................................................... 71

Quadro 4-4 Margem líquida de GM, Ford e Chrysler e vendas da indústria entre 1946 e 1950 ..................................................................................................... 117

Quadro 4-5 Classes de veículos no início da década de 1970, segundo o comprimento ............................................................................................................. 151

Quadro 4-6 Síntese das respostas da GM aos desafios em duas fases distintas ...................................................................................................................... 228

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .............................................................................. 1

2. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................ 6

2.1. OS ARQUÉTIPOS DO SUCESSO E DO FRACASSO ............................................................................ 9 2.1.1. Desafio do empreendedorismo ........................................................................................... 10

2.1.2. Desafio da navegação no ambiente dinâmico .................................................................... 11

2.1.3. Desafio da gestão da diversidade ....................................................................................... 14

2.1.4. Desafio do aprovisionamento de RH .................................................................................. 15

2.1.5. Desafio da gestão da complexidade ................................................................................... 15

2.2. DINÂMICA DE MUDANÇA NAS ORGANIZAÇÕES ........................................................................ 16

3. METODO .....................................................................................19

3.1. DELIMITAÇÃO DO TEMA E DO OBJETO DE ESTUDO .................................................................... 19 3.2. ESTRATÉGIA DE PESQUISA ........................................................................................................ 20 3.3. COLETA DE DADOS ................................................................................................................... 20 3.4. PROCESSAMENTO E CODIFICAÇÃO DOS DADOS ......................................................................... 22 2.5 ANÁLISE DAS EVIDÊNCIAS ............................................................................................................ 26

4. RESULTADOS DA ANÁLISE ......................................................29

4.1. HISTÓRICO DA GENERAL MOTORS E DA INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA .................................. 29 4.1.1. O nascimento da indústria .................................................................................................. 29

4.1.2. Da Buick a General Motors ................................................................................................ 33

4.1.3. A gestão dos bancos de 1910 a 1915 .................................................................................. 48

4.1.4. O Surgimento da Chevrolet e o Retorno de Durant à GM ................................................. 54

4.1.5. Primeira Guerra Mundial, retomada da expansão e o fim da era Durant ......................... 58

4.1.6. A gestão de Pierre S. du Pont ............................................................................................. 69

4.1.7. Sloan no comando, rumo ao topo ....................................................................................... 76

4.1.8. A grande depressão e a consolidação dos comitês ............................................................. 86

4.1.9. Relações trabalhistas e a greve de ocupação de 1936-1937 (sit-down strike) ................... 96

4.1.10. General Motors na Segunda Guerra Mundial .................................................................. 100

4.1.11. A expansão do pós-guerra ................................................................................................ 108

4.1.12. Negociações com a UAW e o contrato de 1948 ................................................................ 112

4.1.13. Hegemonia recuperada na gestão Wilson ........................................................................ 115

4.1.14. Gestão Harlom Curtice .................................................................................................... 121

4.1.15. Fim do ciclo Sloan-Du Pont e a reorganização ............................................................... 127

4.1.16. O legado de Harlom Curtice ............................................................................................ 130

4.1.17. Hegemonia de Finanças ................................................................................................... 132

4.1.18. Segurança veicular e controle de emissões ...................................................................... 137

4.1.19. A Gestão de James Roche ................................................................................................. 140

4.1.20. Desafios na primeira metade da década de 1970 ............................................................. 151

4.1.21. Choque do petróleo e o início da gestão de Thomas Murphy .......................................... 156

4.1.22. Recuperação da indústria até o 2º choque do petróleo .................................................... 159

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4.1.23. A organização do século XXI de Roger Smith .................................................................. 165

4.1.24. General Motors e suas mudanças questionadas ............................................................... 179

4.1.25. Rota ajustada e o fim da gestão Smith .............................................................................. 185

4.1.26. Redução de custos, venda de ativos e concordata ............................................................ 189

4.2. ANÁLISE DAS RESPOSTAS AOS DESAFIOS À LONGEVIDADE ..................................................... 191 4.2.1. Desafio do Empreendedorismo ......................................................................................... 192

4.2.2. Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico ................................................................ 204

4.2.3. Desafio da Gestão da Diversidade ................................................................................... 210

4.2.4. Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos ...................................................... 218

4.2.5. Desafio da Gestão da Complexidade................................................................................ 221

4.3. SÍNTESE DAS RESPOSTAS AOS DESAFIOS ................................................................................ 226

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 234

5.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUCESSO E O FRACASSO DA GENERAL MOTORS................................. 235 5.2 IMPLICAÇÕES DO CASO DA GM PARA OUTRAS ORGANIZAÇÕES ................................................... 238 5.3 CONTRIBUIÇÕES AO ARCABOUÇO TEÓRICO ................................................................................. 239 5.4 SUGESTÕES PARA ESTUDOS FUTUROS ......................................................................................... 239

6 REFERÊNCIAS .......................................................................... 241

7 APÊNDICE A ............................................................................. 250

7.1 MAPAS VISUAIS DA TRAJETÓRIA DA GENERAL MOTORS ............................................................. 250

8 ANEXOS .................................................................................... 258

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1. INTRODUÇÃO

O sucesso e o fracasso das organizações é um tema de potencial interesse

para os administradores, dado que grande parte do trabalho que executam no dia-a-

dia é permeada pela idéia de que este deve contribuir para que a organização seja

conduzida para o sucesso e, conseqüentemente, evite encontrar o fracasso. O esforço

de gestores e pesquisadores, ao longo história das organizações industriais, produziu

uma quantidade de indicadores e ferramentas de administração visando prover meios

de identificar objetivos e controlar as ações na direção desejada. Entretanto, apesar de

inúmeras organizações terem encontrado mecanismos que permitiram atingir objetivos

lançados, acumulando riqueza e prestígio, algumas destas mesmas empresas se

viram incapazes de sustentar tal estado e, eventualmente, enfrentaram o que se

considerou o fracasso.

A inexistência de uma fórmula gerencial unânime e a falta de consenso sobre

os conceitos que definem os dois extremos dos possíveis destinos faz com que as

noções que organizações têm sobre seu próprio sucesso ou fracasso sejam

heterogêneas e com certo nível de abstração, embora freqüentemente sejam

associados a situações concretas e medidas de desempenho, tais como rentabilidade,

participação de mercado, valor de ativos e faturamento. Porém, independentemente

do conjunto de conceitos que se admita para configurar um ou outro estado, os

estudos e a prática das empresas apontam duas grandes vertentes no que diz respeito

aos fatores determinantes do destino das organizações. Uma delas estaria relacionada

ao ambiente externo, repleto de demandas e restrições fora do controle do gestor.

Outra vertente trata da atuação da organização em si, ou seja, como ela adquire e

utiliza recursos para oferecer produtos e serviços de maneira eficaz.

Diversos estudos e publicações na literatura acadêmica e de negócios buscam

descrever e prescrever ações que visam alcançar o sucesso. Nestes casos, enfatiza-

se o processo de formação da estratégia, seja ela deliberada ou emergente, com

mudanças adaptativas ou radicais, como fator determinante no destino das

organizações. No extremo oposto, certas abordagens defendem a predominância dos

fatores ambientais sobre as empresas, atribuindo aos gestores o papel de reféns do

ambiente. Por exemplo, alguns estudos que adotam metodologias de ecologia das

populações (também denominada como ecologia das organizações (MELLAHI, K. &

WILLKINSON, 2004, p. 24)) sugerem a incapacidade de adaptação das organizações a

alterações nos fatores externos. Outras linhas de pesquisadores ressaltam o controle

externo das coalizões que legitimam a existência da organização, evidenciando uma

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dinâmica interação entre gestor e ambiente, composta de diversas respostas

estratégicas aos processos de isomorfismo das organizações (Pfeffer & Salancic,

1978; Oliver, C. 1991).

Em uma visão conciliadora dos fundamentos que sustentam desde os

deterministas aos defensores da administração estratégica, Mintzberg et al (2000)

sintetizaram o que chamaram de escola de configuração. Iniciada a partir de uma

abordagem histórica, esta escola vê a estratégia como um padrão estável de ações

por um dado período de tempo, com eventuais movimentos de transição para outro

período de estabilidade, na busca de uma sincronia com novas condições do

ambiente. Neste sentido, o sucesso e o fracasso estariam associados com a

adequação de um determinado conjunto de padrões de ações, a configuração, de uma

organização ao seu ambiente, bem como com a capacidade desta organização adotar

nova configuração à medida que o ambiente se transforma.

Avançando no sentido de relacionar a estratégia das organizações ao sucesso

e ao fracasso, Fleck (2009) propõe um modelo que coloca a capacidade de a empresa

criar configurações vantajosas ou inapropriadas sobre um contínuo cujos pólos

opostos contemplam estados ideais, arquétipos, do sucesso (auto-perpetuação) e do

fracasso (auto-destruição) organizacional. A propensão para que a organização

sobreviva a seus membros possui duas condições necessárias que devem ser

providas por seus mecanismos. Uma das condições trata do processo de crescimento

contínuo e a outra da continuidade da existência.

Para Fleck (2009) o sucesso organizacional não é um estado final, mas sim um

estado potencial, do qual organizações podem se aproximar na medida em que

nutram uma propensão para a auto-perpetuação. Por outro lado, o fracasso

organizacional é tido como o estágio final do processo de declínio. O modelo teórico

sugere que a capacitação (ou incompetência) para prover as duas condições

necessárias está relacionada à resposta da organização a cinco desafios do

crescimento. Portanto, uma posição mais próxima de um ou outro pólo pode ser

evidenciada a partir dos padrões de ações, positivos ou negativos, com que a

organização responde a cada um desses desafios.

Motivado pela idéia de melhor compreender os elementos e a dinâmica que

contribuem para que uma organização encontre o sucesso ou o fracasso, este

trabalho utiliza-se da construção teórica proposta por Fleck (2009) para investigar

como organizações que por um considerável período de tempo conviveram o

reconhecido sucesso, um dia se deparam com o declínio e, por vezes se vêem atadas

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a um processo crônico de incapacidade para alcançar resultados, em uma trajetória

voltada para o fracasso.

A pesquisa adota uma visão de processo (Langley, 1999; 2007) e, a partir do

estudo de caso em uma perspectiva histórica, realiza análise longitudinal por meio da

identificação dos padrões de ações, confrontando-os com o que a proposição teórica

oferece (YIN, 1989). Ao final, é possível identificar a trajetória da organização em

termos de suas respostas aos desafios, podendo entender melhor os mecanismos que

a levaram de uma situação a outra.

A organização escolhida para servir como unidade de análise deste estudo é a

General Motors Company (GM). O interesse inicial por esta empresa e também pela

indústria automobilística é devido à intenção de melhor compreender a formação de

uma das maiores indústrias do mundo, que viabilizou a construção de algumas das

maiores empresas existentes. Apesar de poder contar com os benefícios do tamanho

em uma indústria madura, algumas empresas do setor, em especial as norte-

americanas, enfrentam um difícil ambiente competitivo e vêem sua condição de

liderança ser ameaçada por concorrentes que ocuparam ou ocupam posições

intermediárias e até mesmo periféricas nesta atividade.

A General Motors Company (GM) possui atributos que a credenciam como um

caso apropriado para o questionamento proposto. Formada em 1908 a partir de um

intenso processo de aquisições, a empresa participou desde os anos iniciais de sua

indústria nos Estados Unidos e desempenhou um papel central nesta atividade, tanto

no período de formação, quanto na fase de crescimento e consolidação do setor. A

General Motors foi a maior empresa na fabricação e comercialização de automóveis

durante quase todos os anos de sua existência. Em número de automóveis

produzidos, a GM manteve-se numa seqüência ininterrupta como maior fabricante

desde 1931 até 2008, enquanto que em anos anteriores a esse período a empresa já

intercalava com a Ford a liderança neste quesito.

Extrapolando a comparação de tamanho e crescimento para outras atividades

da economia, a General Motors acumulou também uma posição de destaque entre as

maiores empresa do mundo. Dentre os 56 levantamentos das maiores empresas

americanas, realizado pela revista Fortune anualmente, o fortune 500, a General

Motors apareceu todas as vezes entre as três maiores em faturamento. Sendo que em

37 das 56 edições do ranking ela esteve na primeira colocação.

Apesar da consistência das evidências que colocaram a General Motors como

uma empresa de sucesso durante um considerável período de tempo, a organização

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enfrentou um crônico processo de declínio que se tornou aparente a partir da década

de 1970 e que culminou com um processo de concordata no ano de 2009.

A partir desta verificação preliminar, induzida pela grande exposição que a

General Motors e os fatos que a cercam recebem, um estudo que possa revelar os

mecanismos que contribuíram para ambas as situações de sucesso e de declínio

torna-se relevante, pelo fato de poder, ao final, oferecer esclarecimento sobre o

processo de construção e degeneração de uma empresa que esteve desde seus

primeiros anos, portanto, durante quase um século, entre as maiores organizações de

seu tempo.

Este estudo de caso também se faz significativo dado que o modelo teórico a

ser utilizado contempla uma ampla base de escolas e perspectivas da ciência que

estuda as organizações e é respaldado por verificações empíricas que indicam sua

validade. O trabalho de síntese oferecido por Fleck (2009) fornece tanto uma visão

alinhada com um consistente arcabouço teórico, quanto contribui de forma original

para a construção de teoria sobre o processo de desenvolvimento da propensão a

auto-perpetuação em organizações.

Tendo em vista a alta disponibilidade de relatos, notícias e informações a

respeito da General Motors referentes a todos os períodos de sua história, é esperado

que as evidências encontradas sejam suficientes para construir uma descrição

fidedigna do histórico da organização. A partir dos fatos será possível reconstituir

traços e padrões de ação que alimentarão as análises e, portanto, encontrar

elementos que contribuíram para que a GM tenha desenvolvido tamanho crescimento

e em seguida o declínio. Os resultados encontrados neste trabalho poderão não

somente contribuir para o fortalecimento do modelo teórico adotado, como também

produzir por si só, ou combinado com a repetição deste estudo em outras

organizações, novas idéias e questionamentos a serem explorados em pesquisas

futuras.

O trabalho foi organizado em seis capítulos. O capítulo presente introduz a

proposta da pesquisa. O capítulo 2 traz o referencial teórico utilizado no trabalho,

apresentando as idéias de Fleck (2009), Penrose (2006), Chandler (1977), Selznick

(1957), Cyert e March (1963), dentre outros que contribuem para compor o arcabouço

utilizado na análise. O capítulo 3 apresenta a metodologia utilizada para a pesquisa.

Os resultados da análise são apresentados no capítulo 4, onde constam o

histórico da empresa, a identificação dos padrões de ação em relação ao referencial

teórico, e a síntese das condições desenvolvidas pela GM em relação ao sucesso e ao

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fracasso. Por fim, as considerações sobre os resulados encontrados frente às

intenções de pesquisa acima propostos são discutidos no capítulo 5, no qual também

são comentadas as limitações da pesquisa e contribuições para estudos futuros.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

Dado que o objeto deste estudo é uma organização, cabe inicialmente

considerações sobre os conceitos que a definem. Coase (1937) tratou da firma como

sendo uma forma de organização da produção, que era resultante de um processo de

internalização de serviços movidos pela economia nos custos de transação. Os limites

da organização seriam determinados quando os contratos de serviços deixassem de

ser estáveis e passassem a ser negociados por sistemas de livre mercado. Por este

conceito, a firma existe e cresce à medida que a economia nos custos de transação é

maior do que os custos de coordenação e decresce ou deixam de existir à medida que

a eficiência na coordenação das atividades internalizadas é menor do que os custos

de contratação dos serviços no mercado aberto.

Barnard (1938), por sua vez, apresentou a noção de que os integrantes de

uma organização são dotados de uma propensão à cooperação1, a qual torna os

indivíduos dispostos a agir de forma a abnegar da maximização do benefício individual

com o objetivo de manter a força da organização. A disposição dos indivíduos em

cooperar estaria relacionada ao alinhamento de sua tarefa com o propósito da

organização. Porém, Cyert e March (1963), ao escreverem sobre uma teoria

comportamental da firma, sugeriram que a organização não possui apenas um

propósito, mas que a sua própria existência é o resultado da formação de uma

coalizão, composta de sub-coalizões com diferentes objetivos. Portanto, a formação

dos objetivos comuns da organização é resultado de um processo de negociação

entre os grupos que a compõem. Cyert e March (1963) também afirmaram que os

objetivos dos participantes da organização mudam à medida que estes adquirem

experiência. Assim sendo, a existência continuada estaria relacionada à capacidade

de a organização constantemente atender às demandas dos grupos que a compõem.

Penrose (2006) definiu a firma produtiva como sendo, além das pessoas que

compõem a organização administrativa, o conjunto de recursos (físicos e humanos) e

a forma como eles são dispostos dentre os diversos usos possíveis, a fim de produzir

e vender bens e serviços. Em relação aos objetivos da firma, Penrose (2006)

apresenta a idéia de que todos eles podem, na maioria das vezes, ser associados à

capacidade e ao desejo da mesma em gerar lucros a longo prazo. A autora ainda se

refere a lucro em longo prazo e a crescimento como sendo sinônimos, uma vez que a

1 Traduçào livre do termo “willingness to cooperate”

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própria aplicação de recursos gera a expansão da firma e, ao mesmo tempo, é uma

condição necessária para produzir lucro.

Tendo em vista os argumentos acima, temos que a capacidade da organização

atender às demandas de seus membros e a de gerar lucros a longo prazo está

associada à idéia de crescimento. Desta forma, a existência da organização está

diretamente vinculada a sua expansão. Contudo, o sucesso não pode ser associado

apenas ao aumento de tamanho da organização. Uma firma pode aumentar de

tamanho e, em seguida, falir, trazendo contratempos indesejados para seus

integrantes. A respeito do crescimento e da continuidade de organização, Chandler

(1977) argumenta que a capacidade da organização em se auto-perpetuar está

relacionada a dois processos. O primeiro, de crescimento contínuo, onde a realização

de uma expansão traz novas oportunidades para o crescimento e para a renovação. O

segundo trata da existência continuada, que está relacionada à capacidade de a

organização manter sua integridade.

Fleck (2009), em linha com os conceitos desenvolvidos por Penrose (2006) e

Chandler (1977), apresenta um arcabouço teórico que relaciona o sucesso da

organização com a capacidade de desenvolver a propensão à auto-perpetuação. Para

Fleck (2009), tal propensão possui duas condições necessárias. Uma está relacionada

ao desenvolvimento de um processo de crescimento e renovação organizacional. A

segunda condição decorre da manutenção da integridade organizacional. Estes dois

processos, por conseguinte, são decorrentes da maneira como a organização

desenvolve respostas a cinco desafios do crescimento: empreendedorismo,

navegação no ambiente dinâmico, aprovisionamento de recursos humanos, gestão da

diversidade e gestão da complexidade.

Há uma diversidade de autores que propuseram outros esquemas teóricos

para analisar o sucesso ou do crescimento das organizações, dentre eles Starbuck

(1965), Peters & Waterman (1982), Greiner (1998) e Collins & Porras (2002). Um

número menor de referências tem como tema o declínio e o fracasso de organizações,

como por exemplo, Weitzel (1989) e Miller (1990 e 1993). No entanto, o modelo

apresentado por Fleck (2009) foi selecionado para este trabalho por oferecer uma

alternativa abrangente em relação aos aspectos que envolvem a atividade

organizacional, e também por incorporar dentro de um mesmo modelo a possibilidade

de analisar os processos que conduzem a organização ao longo de dois extremos

possíveis, o sucesso e o fracasso. Na figura 2-1, a seguir, é apresentada de forma

esquemática a relação entre os desafios do crescimento e o sucesso de longo-prazo,

proposta por Fleck (2009).

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Figura 2-1 Modelo dos requisitos para o desenvolvimento da propensãa auto-perpetuação organizacional

DESAFIOS DO

CRESCIMENTO

EMPREENDEDORISMO

NAVEGAÇÃO NO AMBIENTE DINÂMICO

APROVISIONAMENTO DE RECURSOS

HUMANOS

GESTÃO DA DIVERSIDADE

GESTÃO DA COMPLEXIDADE

CRESCIMENTO ORGANIZACIONAL

E RENOVAÇÃO

FOLGA

INTEGRIDADE ORGANIZACIONAL

SUCESSO DE LONGO PRAZO:

Propensão a Auto-Perpetuação da

Organização

5

8

4

8

6

8

1

3

2

7

7

7

7

8

+/-

+/-

+/-

+/-

+/-

CN

CN

CN

CN

CN

CN

CN

CN: Condições Necessárias

Fonte: Adaptação de Fleck (2009)

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2.1. Os arquétipos do sucesso e do fracasso

A teoria de Fleck (2009) fornece uma perspectiva sobre a organização, na qual

dois arquétipos posicionados nos extremos de um contínuo representam respostas a

desafios que conduzem a organização para o sucesso de longo prazo – a auto-

perpetuação – ou para o fracasso – a autodestruição. Cada um dos arquétipos

contempla um conjunto de capacitações e vulnerabilidades2 para cada desafio. Estes

conjuntos definem estados ideais de organizações auto-perpetuadoras de um lado do

contínuo, e organizações auto-destrutivas, no lado oposto.

A representação dos arquétipos posicionados no contínuo das respostas aos

desafios e a descrição de cada conjunto de respostas são apresentadas no quadro 2.1

abaixo. Na prática, as respostas das empresas estarão posicionadas entre os dois

pólos, variando sua proximidade a um extremo ou outro, dependendo de cada desafio.

Além disso, é necessário considerar a natureza dinâmica do desenvolvimento de

capacitações, que faz com que uma empresa possa se aproximar ou se distanciar de

um pólo à medida que nutre a formação de novas capacitações.

Quadro 2-1 Cinco desafios organizacionais

Categoria do desafio

Descrição do desafio

Pólo de respostas aos desafios

Auto-destruição Auto-perpetuação

Empreendedorismo Promoção de contínuo empreendedorismo a partir da disposição da empresa de realizar expansões com mecanismos de reforço e criação de valor sem expô-la a riscos desnecessários.

Baixo (baixos níveis de ambição, versatilidade, imaginação, visão,capacidade de levantar recursos financeiros, e realização de expansões nulas ou defensivas)

Alto (altos níveis de ambição,

versatilidade, imaginação, visão, capacidade de levantar recursos

financeiros, e realização de expansões produtivas ou

híbridas)

Navegação no ambiente dinâmico

Tratar com múltiplas partes interessadas para assegurar captura de valor e legitimidade.

Passivo (Monitoramento ruim, mal uso de estratégias de navegação)

Ativo (Monitoramento regular, uso

correto de estratégias de navegação)

Gestão da diversidade

Manter a integridade da firma diante de aumento de conflitos e rivalidades

Fragmentação (Fracasso no estabelecimento de relacionamentos de integração e de capacitações em coordenação)

Integração (Estabelecimento bem sucedido

de relacionamentos de integração e de capacitações

em coordenação)

Aprovisionamento de recursos humanos

Fornecer à firma recursos humanos qualificados de forma estável

Tarde (Ações no momento que existe necessidade ou depois dela)

Planejado (Ações planejadas com

antecedência)

Gestão da complexidade

Gerenciar problemas complexos e solucioná-los diante de aumento de complexidade

Ad-hoc (Baixa capacitação para solução de problemas, utilizando rápida análise e sem aprendizado)

Sistemático (Capacitação para solução de

problemas, promovendo busca correta por soluções e

aprendizado)

Fonte:Tradução livre de Fleck (2009)

2 Tradução livre do termo usado pela autora: (liabilities)

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A seguir, serão apresentados mais detalhadamente cada um dos desafios e as

respostas a partir das quais serão desenvolvidos paremetros para identificação de

padrões durante a análise.

2.1.1. Desafio do empreendedorismo

De acordo com Fleck (2009), o desafio do empreendedorismo consiste em

promover o crescimento da empresa em base contínua, e não apenas momentâneo.

Respostas positivas a este desafio estão relacionadas ao desenvolvimento de serviços

empreendedores (PENROSE, 2006) que priorizem o crescimento produtivo – com

motivação de promover a mudança e aumentar a produtividade – em relação ao

crescimento defensivo, que tem o propósito de conter a mudança e proteger contra o

avanço de competidores (CHANDLER, 1977).

O crescimento da firma é condicionado pela existência de serviços

empresariais. Estes serviços atuam na identificação de novas oportunidades

produtivas, que permitam a combinação dos serviços oferecidos pelos recursos

internos e outros adquiridos fora da organização, de forma a oferecer bens e serviços

à sociedade de maneira mais eficiente, criando valor que pode ser capturado pela

organização. (PENROSE, 2006). De acordo com Penrose (2006), são quatro os

serviços empresariais:

a) Ambição: está no cerne da atividade empresarial. Constitui-se na predisposição

psicológica de assumir riscos e dedicar esforços e recursos na expectativa de

ganho. A ambição é uma característica difícil de ser medida, pelo fato de tratar de

traços pessoais evidentes apenas a partir de seu efeito nas ações dos indivíduos.

Atividades de especulação de novas oportunidades ou a mera aplicação de

recursos para tal indicam a presença da ambição.

b) Versatilidade: está relacionada à imaginação e à visão de possibilidades viáveis

de combinar os serviços produtivos a partir dos recursos existentes, ou de adquirir

novos recursos, de forma a oferecer bens e serviços e criar valor para a

organização.

c) Mobilização de recursos financeiros: trata de desenvolver os meios para

empresa obter recursos financeiros, necessários para a expansão e operação do

negócio. De maneira geral, depende da capacidade em gerar confiança e

interesse de fornecedores de capital. Porém, empresas pequenas ou recém-

criadas podem não ter a mesma facilidade de empresas grandes. A falta de

recursos financeiros normalmente é apontada como a razão da falência de

empresas, no entanto, na maioria dos casos, a razão não é exatamente a

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escassez de oferta de recursos, mas sim a baixa qualidade dos serviços

empresariais.

d) Julgamento diante do risco e da incerteza: está menos relacionado a traços

pessoais do que os serviços anteriores. A capacidade de emitir julgamentos

depende mais da correta aplicação de recursos para coleta de informação,

consultas e realização de projeções do entorno da organização, de forma a

produzir uma melhor interpretação dos riscos e das incertezas.

2.1.2. Desafio da navegação no ambiente dinâmico

De acordo com Fleck (2007), o desafio da navegação no ambiente dinâmico diz

respeito ao sucesso em lidar com os múltiplos stakeholders da organização, de forma

a assegurar captura de valor e legitimidade organizacional. Respostas positivas a este

desafio contemplam um ativo monitoramento do ambiente, mapeando adequadamente

suas mudanças, bem como o uso de respostas estratégicas (OLIVER, 1991)

apropriadas, a fim de neutralizar pressões externas e assegurar o fluxo de recursos.

O trabalho de Pfeffer e Salancik (1978), intitulado O Controle Externo das

Organizações3, estabelece diversos conceitos que contribuem para fundamentar

dimensões de análise sobre o desafio da navegação no ambiente. Segundo os

autores, a organização pode ser entendida como um conjunto de coalizões, entre

grupos e indivíduos, engajadas em trocar suas contribuições por algum incentivo,

adotando um comportamento que seja estável e contínuo ao longo do tempo. Assim

sendo, a organização se torna dependente dos recursos providos pelos seus

participantes, enquanto as coalizões se tornam interdependentes. Dado que alguns

recursos são mais valiosos do que outros, determinados grupos possuem maior ou

menor controle sobre a organização.

Os grupos que sustentam a atividade da organização, como governo,

comunidade, fornecedores, empregados, clientes, credores e proprietários, mantêm

seu apoio a tal coalizão na medida em que percebem que isto lhe será vantajoso e a

abandonam quando qualquer vantagem percebida deixa de existir. No entanto,

pessoas e grupos possuem interesses e preferências variados, e por isso adotam

diferentes critérios para avaliar os benefícios que recebem da organização. Isto,

eventualmente, cria um problema de demandas conflitantes. Neste sentido, é plausível

a idéia de que à medida que uma organização cresce e amplia a coalizão que a

sustenta, amplia também o potencial para que exista incompatibilidade entre os

3 Tradução livre do inglês: The external control of organizations

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critérios de avaliação de seus stakeholders, tornando maior o desafio dos gestores em

encontrar uma combinação eficaz, ou seja, que satisfaça todas as demandas externas.

Esta noção de dependência de recursos destaca a relevância em se observar a

organização também sob a perspectiva de suas relações externas, ou seja, além das

fronteiras de sua autoridade. Freqüentemente, conflitos entre stakeholders ou

mudanças no ambiente, como racionamento de recursos, controle de preços ou o

surgimento de novas tecnologias, impõem restrições à ação dos gestores, limitando o

leque de alternativas a sua disposição e, por vezes, tornando sua atuação meramente

ritualística. Contudo, a atividade gerencial não se resume a desempenhar um papel

simbólico. Embora o gestor seja limitado por restrições do ambiente, a interação entre

organização e coalizões ocorre em uma dinâmica de quase resolução de conflitos

(Cyert & March, 1963). Portanto, o gerente exerce um papel de mediador, buscando

conciliar o conflito entre demandas, já que os interesses dos stakeholdres, em geral,

tendem a buscar satisfação e não maximização, criando uma zona de tolerância

(Doyle, 1994) a partir do ponto em que as mínimas expectativas dos múltiplos atores

são atendidas.

Segundo Pfeffer & Salancik (1978), dado que muitas restrições ao gestor

derivam da ação de outros, torna-se uma importante função do gestor influenciar estes

outros, de modo a determinar seu próprio ambiente. Para tanto, o reconhecimento do

contexto social e das restrições dentro da qual a organização deve operar passa a ser

um componente da ação gerencial igualmente importante. Uma falha da organização

em obter um correto entendimento do ambiente pode significar sua incapacidade, seja

de realizar ajustes em suas atividades para entrar em conformidade com as restrições,

seja para guiar e controlar o processo de manipulação do ambiente.

Em um artigo que combina a perspectiva de dependência de recursos com a

teoria institucional, Oliver (1991) apresenta um conjunto de respostas estratégicas ao

processo institucional. A gama de possibilidades utilizadas pelas organizações

contempla respostas que variam de acordo com o grau de passividade, consciência,

resistência, controle e oportunismo com que a organização procura moldar ou entrar

em conformidade com o ambiente. Abaixo, segue uma descrição resumida de cada

uma das tipologias apresentadas por Oliver (1991):

a) Estratégia de aceitação: A organização cede às pressões institucionais do

ambiente. As táticas utilizadas para essa estratégia podem ser de hábito:

aderência inconsciente; imitação: mimetismo consciente ou não de modelos

institucionais; conformidade: obediência consciente na incorporação de valores,

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normas ou requerimentos institucionais, a fim de assegurar benefícios de apoio

social ou estabilidade de recursos.

b) Estratégia de negociação: A negociação normalmente se posiciona em um

tênue limite para resistência à pressão institucional. Organizações normalmente

se deparam com situações de conflito entre demandas institucionais,

circunstâncias nas quais podem procurar conciliar interesses e expectativas de

atores externos. As táticas são: balancear: acomodação das demandas de

múltiplos atores em resposta às pressões institucionais; pacificação:

conformidade parcial com expectativas de um ou mais atores, porém mantendo

um mínimo de resistência; barganha: é uma forma mais ativa de negociação,

pois envolve o esforço da organização em obter concessões de um ator externo

sobre suas demandas e expectativas.

c) Estratégia de evitar: a organização tenta evitar a necessidade de conformidade

com pressões institucionais. As táticas são: táticas de ocultação: envolve o

disfarce de uma não-conformidade. A organização apresenta uma resposta de

fachada, mas não chega a implementá-la; prevenção: tentativa de reduzir a

freqüência com a qual a organização é fiscalizada por atores externos, por meio

do afastamento e isolamento de áreas críticas ao contato externo; fuga: a

organização deixa o domínio sobre o qual a pressão é exercida ou altera

significativamente seus objetivos, atividades ou domínios para evitar a

necessidade de conformidade.

d) Estratégia de desafio: essa é a forma mais ativa de resistência, pois representa

uma rejeição inequívoca de normas e expectativas nos processos institucionais.

São mais prováveis de ocorrer quando o custo de abandono da estratégia é

percebido como baixo: quando interesses internos divergem de valores externos,

quando a organização considera possuir argumentação consistente ou quando

percebe o custo de desafiar como sendo baixo. As táticas são: ignorar: a

organização ignora normas e valores institucionais; contestar: a organização se

envolve em um desafio ofensivo contra normas e expectativas institucionais,

normalmente acreditando na consistência de suas convicções; atacar: diferencia-

se da tática de contestar pela intensidade e agressividade que a organização se

distancia das expectativas e pressões externas, denunciando valores

institucionalizados e atores que os expressam.

e) Estratégia de moldagem: moldagem é a forma mais ativa de resposta a

pressões externas, pois tem a intenção de ativamente mudar ou exercer poder

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sobre o conteúdo e a origem das pressões externas. As táticas são: cooptar:

persuadir atores externos a juntarem-se à organização ou ao conselho de

administração dos diretores da empresa; influenciar: é mais direcionado a

valores e crenças institucionalizados, mudando a percepção pública sobre a

indústria onde a empresa atua, por exemplo, fazer lobby sobre órgãos

reguladores para alteração de regras; controlar: esforços específicos para

estabelecer poder e dominância sobre atores externos que exercem pressão na

organização.

2.1.3. Desafio da gestão da diversidade

Segundo Fleck (2009), o desafio da gestão da diversidade está relacionado à

manutenção da integridade da organização, à medida que ela experimenta o aumento

da diversidade. O próprio crescimento da organização aumenta a diversidade, como a

ampliação de mercados, novas linhas de produtos, diversificação não-relacionada,

aquisições de outras empresas ou o mero aumento do número de empregados. Além

da diversidade gerada pelo crescimento, as coalizões que compõem a organização

possuem demandas conflitantes (CYERT e MARCH, 1963) e produzem rivalidade

organizacional (SELZNICK, 1957). De acordo com Fleck (2009), respostas positivas

ao desafio da gestão da diversidade dizem respeito ao desenvolvimento de relações

de compartilhamento de recursos e de capacitações de coordenação. As respostas

devem resultar na neutralização de pressões para fragmentação, sendo orientadas

para sustentar a integridade.

A gestão bem-sucedida da diversidade organizacional distingue elementos

homogêneos e heterogêneos da organização e fomenta a relação de ligação

adequada (Stickland, 1998; apud Fleck, 2006). Os recursos homogêneos quando

compartilhados podem fornecer economias de escala, escopo e velocidade

(CHANDLER, 1977), enquanto que recursos heterogêneos levam a relações de

intercâmbio. Nos dois casos a organização necessita da criação de capacitações de

coordenação. Segundo Porter (1987) o compartilhamento de recursos requer

colaboração entre unidades da organização. Caso a organização falhe em fomentar a

cooperação, ela poderá comprometer suas vantagens competitivas ao invés de

beneficiar-se os das relações entre as unidades.

As relações de compartilhamento de recursos incluem não somente prédios,

patentes e serviços administrativos como também outros menos tangíveis, como

reputação, mitos e percepções comuns sobre a organização (SELZNICK, 1957). O uso

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compartilhado de recursos pode não só promover maior aproximação entre os

membros da organização, mas também produzir economias de escala e escopo. Além

disso, o compartilhamento de recursos pode criar um sistema complexo de relações

entre as atividades da organização, criando uma vantagem competitiva difícil de ser

replicada por concorrentes (PORTER, 1996; BARNEY 1997).

Os mecanismos de coordenação, por sua vez, não eliminam a

heterogeneidade. Ao invés disso, faz o uso construtivo dos elementos heterogêneos,

estimulando a integração da organização (FLECK, 2009). Tais mecanismos podem

ser, por exemplo, comitês multidisciplinares, gerentes de projeto ou departamentos de

integração.

2.1.4. Desafio do aprovisionamento de RH

O desafio do aprovisionamento de recursos humanos trata de prover a

organização com pessoas qualificadas para exercer as funções gerenciais. Os

recursos gerenciais são condição necessária para o crescimento (PENROSE, 2006) e

para a existência continuada (CHANDLER, 1977). Recursos humanos não entram na

organização prontos para exercer plenamente as funções gerenciais. Segundo

Penrose (2006) a medida que os recursos humanos aprendem sobre suas funções

novos serviços podem ser desenvolvidos a partir deles, porém é necessário tempo

para que isto ocorra.

De acordo com Fleck, respostas positivas para este desafio estão relacionadas

ao abastecimento permanente dos recursos gerenciais a organização, promovendo as

atividades o recrutamento e formação, a retenção e a preparação para sucessão de

forma antecipada. Já as respostas negativas estão dizem respeito ao

aprovisionamento atrasado dos recursos gerenciais.

2.1.5. Desafio da gestão da complexidade

De acordo com Fleck (2009) conforme a empresa cresce a complexidade dos

problemas com que ela se depara também aumenta. As respostas ao desafio da

gestão da complexidade, portanto, estão relacionados a capacidade de a organização

lidar com situações cada vez mais complexas. Respostas positivas a este desafio

envolvem a adoção de procedimentos sistemáticos para a busca de solução dos

problemas e, portanto, afeta a qualidade das respostas aos demais desafios.

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As capacitações para busca de solução de problemas dizem respeito à

presença de uma orientação para solução de problemas, incentivando a ampliação da

área de busca por soluções promovendo o aprendizado organizacional (CYERT &

MARCH, 1963), associada à Sistematização de procedimentos, que inclui a

codificação de processos de coleta e análise de dados, bem como, a adoção de

métodos para tomadas de decisão e implementação.

2.2. Dinâmica de Mudança nas Organizações

O referencial teórico baseado no modelo dos desafios a longevidade de Fleck

(2009) servirá como uma lente para analisar os padrões de ação da General Motors e

relacioná-los aos arquétipos do sucesso, propensos a auto-perpetuação, ou de

fracasso, propensos a auto-destruição. Tal análise buscará identificar padrões em

torno dos quais se desenvolvem as ações da General Motors ao longo do tempo.

Dado a perspectiva longitudinal em que se desenha a pesquisa e a suposta

ocorrência de movimentação de um extremo ao outro do contínuo. Passa a ser

relevante também para a maior clareza na condução do estudo algumas referências

relacionadas às dinâmicas que formam e alteram o comportamento e as instituições

das organizações.

Cyert e March (1963) apresentaram um importante referencial para entender a

formação do comportamento da firma. Segundo os autores, a natureza de evolução

desigual das demandas dos integrantes da organização cria uma dinâmica de quase

resolução de conflito na definição dos objetivos da organização. A busca de novos

objetivos da organização é orientada pelo surgimento de problemas, que nesta visão

indica o fracasso de um objetivo anunciado. Algumas regras básicas da busca de

soluções determinam o seqüenciamento da hierarquia dos problemas e os princípios

que norteiam este aprendizado:

a) A busca por soluções ocorre inicialmente nas imediações - do

problema e expande a área (e complexidade) da busca a medida que os

objetivos fracassam. Portanto, se há um problema na área de vendas, a

organização vai direcionar buscas dentro equipe de vendas e,

eventualmente, expandir, por exemplo, para marketing caso a primeira

solução (objetivo) fracasse.

b) A busca também começa pelas vizinhanças das alternativas já

conhecidas e eventualmente se expandem para áreas menos conhecidas.

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c) A expansão das buscas tende a seguir para áreas mais vulneráveis da

organização e, conseqüentemente evitar questionar áreas mais fortes da

organização.

d) A expansão tende a seguir para áreas onde há folga organizacional.

Por exemplo, um laboratório de desenvolvimento pode ser um freqüente

criador de soluções para os problemas da firma.

Em um estudo com o objetivo de compreender o executivo em seus papéis

gerenciais e de liderança, Selznick (1957) produziu um importante referencial sobre o

processo de institucionalização nas organizações. De acordo com o autor, as decisões

administrativas são menos relevantes, pois tratam de rotinas e de problemas do dia-a-

dia, que não conferem um caráter distintivo e fazem do gerente uma peça dispensável.

Por outro lado, o gestor deve se ocupar das decisões críticas, pois estas permitem a

institucionalização, um processo infusão de valores além dos requisitos técnicos de

uma atividade.

As instituições conferem uma proteção às organizações, que passam a contar

com o esforço de seus membros para manter a representação de seus valores,

criando um caráter que a distingue das demais. Contudo, as instituições tornam-se

também fonte de resistência à mudança e, neste caso, o papel do líder é novamente

essencial, pois é ele que, através de decisões críticas, é capaz de perceber valores

emergentes nos grupos internos e externos da organização e promover sua infusão

em substituição a instituições em declínio.

Os arcabouços teóricos de Selznick (1957) e Cyert e March (1963) adotam

perspectivas diferentes acerca da atividade organizacional, um com foco sobre a

atuação das lideranças e o outro sobre o comportamento da firma. No entanto, alguns

elementos principais apresentados pelos autores são complementares naquilo que

descrevem sobre a dinâmica organizacional. O quadro 2-2 abaixo apresenta a

comparação entre esses elementos:

Quadro 2-2 Elementos da dinâmica organizacional de Selznick (1957) e Cyert e March (1963)

Autor

Elemento

Selznick (1957) Cyert e March (1963)

Eficácia Infusão de valores que atrai o compromisso dos grupos que

sustentam a organização

Coalizão de consenso entre membros da organização em

torno de objetivos

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18

Padrões de ação

Instituições organizacionais mantêm um caráter distintivo estável, sustentado por seus

membros

Busca de novos objetivos somente quando surgem novos

problemas

Rivalidade organizacional

Valores heterogêneos entre grupos gerando rivalidade

Objetivos diferentes, quase resolução de conflitos

Pressões para mudanças

Valores dos grupos internos e externos são dinâmicos,

conflitando com instituições

Objetivos dos integrantes mudam conforme passam por

novas experiências

Adaptação Líder estadista conduz

processo de Institucionalização lento e gradual

Busca orientada pelo surgimento de problemas; inicialmente nas imediações de dos problemas e

das alternativas conhecidas

Resistência a mudança

Desenvolvimento de ideologias administrativas; criação e

proteção de elites; e formação de grupos políticos rivais

Busca de soluções se expande em direção a áreas mais

vulneráveis, afastando-se das áreas mais fortes

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19

3. Método

3.1. Delimitação do tema e do objeto de estudo

Entender os elementos que contribuem para o sucesso ou o fracasso de

organizações é um problema central da atividade gerencial. A partir desta questão

genérica desenvolveu-se o interesse em pesquisar como organizações que

alcançaram e se mantiveram por determinado período em um estado reconhecido de

sucesso eventualmente enfrentaram o declínio e, em seguida, o fracasso. Esta

pergunta genérica encontra um relevante objeto de estudo no fenômeno ocorrido com

a General Motors. A GM foi, durante a maior parte dos seus 101 anos de existência, a

maior empresa de seu ramo de atividade e esteve constantemente entre as maiores

empresas em faturamento do mundo. Os inúmeros produtos campeões de venda, a

força de suas marcas, a capacidade de gerar lucros e a credibilidade nos mercados

financeiros comparável aos títulos mais seguros não impediram que a GM entrasse

em um crônico processo de declínio e viesse a pedir concordata. Portanto, a General

Motors configura-se na unidade de análise escolhida para desenvolver as intenções de

pesquisa.

O estudo de caso se mostra adequado para a condução da pesquisa, dado que

segundo Yin (1989), o método é apropriado para casos onde a questão da pesquisa é

do tipo “como e por que”, a investigação não requer controle sobre o evento e o

enfoque trata de um evento contemporâneo.

Diante da abrangência das atividades e da diversidade de países em que a GM

está presente, o estudo priorizou os dados referentes à operação nos Estados Unidos,

onde se localiza sua matriz e, também, onde está a maior parte de suas atividades e

das vendas de seus produtos. Esta delimitação da coleta de dados permite conciliar a

necessidade de trazer o máximo de evidências relevantes e, ao mesmo tempo,

assegurar um volume de informação capaz de ser processado. Outra delimitação do

estudo foi em relação ao uso de fontes secundárias, devido à dificuldade de acesso a

potenciais fornecedores de dados primários relevantes.

Através do estudo de caso, os dados coletados sobre a General Motors são

analisados à luz do modelo teórico de Fleck (2009), a fim de obter explicações para o

fato de a GM ter desenvolvido crescimento e lucros tão expressivos e não ter sido

capaz de evitar o fracasso. Segundo Yin (1989), o método do estudo de caso

apresenta limites quanto ao poder de generalização, porém o mesmo possui

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20

vantagens devido à possibilidade de análise mais detalhada e flexível sobre o

fenômeno estudado. Portanto, a principal contribuição deste estudo em relação à

questão genérica da pesquisa será em termos da confirmação da validade do

arcabouço teórico, quando aplicado em um caso de alta relevância, como é o da GM.

3.2. Estratégia de pesquisa

A pesquisa adota uma visão de processo (LANGLEY, 1999; 2007). As

estratégias genéricas utilizadas foram combinadas de forma a atender objetivos de

precisão e de simplicidade (LANGLEY, 1999) na apresentação dos resultados da

pesquisa. A análise dos dados se apoiou no modelo teórico dos arquétipos da auto-

perpetuação e auto-destruição, sendo que os cinco desafios à longevidade forneceram

os parâmetros para a identificação de padrões de ação. Assim sendo, a organização

do trabalho se deu da seguinte forma:

• Coleta de dados – Busca de livros, documentos, artigos, reportagens, estudos de

caso e bases dados.

• Processamento e codificação dos dados – Leitura, escaneamento de trechos

relevantes, elaboração da tabela de fatos, codificação dos fatos relacionados a

cada desafio

• Análise das evidências – Elaboração da narrativa histórica, elaboração de séries

quantitativas longitudinais, organização de mapas visuais, comparação de

padrões, elaboração de quadros temporais.

A seguir, é apresentado com maior detalhamento o desenvolvimento de cada

uma dessas etapas.

3.3. Coleta de dados

A busca por fontes de informação ocorreu em diversas frentes. A principal

delas foi por meio do levantamento feito pelo sistema de bibliotecas da Haute École de

Commerce (HEC) e McGill, em Montreal, no Canadá, que disponibilizou uma grande

quantidade de livros, reportagens e estudos de caso representativos de todos os

períodos da história da General Motors, conforme é apresentado no gráfico 3-1. A

busca ainda foi expandida para as bases de dados eletrônicas do Proquest, Ebsco

Host, portal de periódicos da CAPES, JSTOR e Google Acadêmico.

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21

Gráfico 3-1 Fontes secundárias obtidas através do levantamento das bibliotecas da HEC e McGill

Rubenstein, J. (2001) Making and

Selling Cars

Revista Business Week1988-2008

Revista Forune 1988-2008

Lee, A. (1988) Call me Roger

Keller, M. (1989) Rude Awakening

the rise, fall and struggle for

recovery of GM

Cray, E. (1980) Chrome Cossus:

General Motors and its times

Wright, J. (1974) On a clear day you

can see General Motors

Freeland, R. (2001) Struggle for

Control of the Modern Corporation

Sloan, A. (1963) My years with

General Motors

Pound, A. (1934) The Turning Wheel

Madsen, A. (1999) The deal maker:

how William Durant made GM

As fontes secundárias na forma de biografias, livros históricos e de negócios,

enciclopédias, artigos acadêmicos, estudos de caso e reportagens de jornais e

revistas são abundantes ao longo da história da General Motors. A falta de relatos

sobre a GM não chegou a ser um problema para a condução da coleta e da análise,

embora dois aspectos tenham exigido cuidados extras. O primeiro aspecto está

relacionado ao potencial viés implícito em algumas das principais fontes de dados,

como biografias de ex-executivos como Alfred Sloan, John Delorean, Roger Smith e

Walter Chrylser. O outro aspecto refere-se às fontes de dados a partir do final da

década de 1980, quando nenhuma outra fonte com conhecimento profundo do dia-a-

dia das decisões da GM publicou suas memórias. Além disso, o trabalho das

assessorias de imprensa a partir da década de 1970 produziu o efeito de filtro sobre a

saída de informações da organização.

Assim sendo, a reconstituição dos fatos a partir das fontes disponíveis contou

com uma atenção especial para tentar identificar afirmações que parecessem pouco

coerentes em relação aos acontecimentos contemporâneos, ou em relação à cadeia

de acontecimentos observada tanto na história que antecedeu a tal fato quanto na que

sucedeu. Para os casos nos quais foi identificada alguma das incoerências

mencionadas, a descrição sobre o referido evento ou ação proveniente daquela fonte

foi descartada para efeito de análise.

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Outras fontes importantes, tanto para coleta de fatos históricos quanto para os

dados quantitativos, foram:

• CHANDLER, A. (1964) Giant Enterprise: Ford, GM and the automobile industry

• CHANDLER, A. (Ed. 1979) Managerial Innovation at GM

• CHRYSLER, W. (1991) Life o f an American workman

• IACOCCA, L. (1986) Iacocca: an Autobiography

• KHUN, A. (1986). GM passes Ford , 1918 – 1938

• MAY, G. (Ed. 1989) The Automobile Industry, 1920-1980 (Encyclopedia of

American Business History and Biography)

• MCSHANE, C. (1997) The automobile: a chronology of its antecedents,

development and impact.

• PASCALE, R (1994) Administrando no Limite

• Relatórios anuais da General Motors, Sec Fillings, K-10, de 1994 a 2008,

disponível na página da General Motors na internet

• Relatórios anuais Moody’s sobre a General Motors de 1923 a 1998

3.4. Processamento e codificação dos dados

Dado que a abundância de fontes gerou grande carga de leitura e que os

trechos identificados como relevantes necessitavam ser frequentemente consultados

ao longo do processo de análise, os dados foram organizados em uma tabela do

Excel, com a utilização de um equipamento de scanner e de um sistema de

reconhecimento óptico instalado no computador. Este método permitiu que a leitura de

livros e artigos ocorresse com maior fluidez, apenas fazendo pequenas marcas no

início e no fim dos trechos a serem extraídos, acompanhado de uma pequena

marcação lateral com ano inicial e final a que o evento destacado se referia.

Os resultados das extrações feitas através do scanner e com sistema IRIS de

reconhecimento óptico (em inglês, Optical Character Recognition, OCR)

frequentemente exigiu que ajustes fossem feitos nos textos antes que estes fossem

depositados no banco de dados do Excel. Mesmo com trabalho de verificação e

correção dos textos extraídos, este método se mostrou altamente superior às

alternativas de digitação dos textos ou de não utilização de recursos digitais. No total,

foram coletados 2288 fatos, sendo que destes foram efetivamente utilizados na

elaboração da análise 1703 fatos. A tabela de fatos para armazenamento dos trechos

extraídos das fontes de dados foi composta dos seguintes itens:

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• Número do fato: atribui um número no momento em que o fato é registrado

• Ano inicial: indica o ano em que o evento teve início

• Ano final: indica o ano em que o evento se encerrou

• Fato: reproduz em texto exatamente a descrição do fato como ele é narrado ou

escrito segundo a fonte

• Comentário: apresenta alguma informação adicional que eventualmente pode ter

sido considerada útil para melhor compreensão do fato

• Fonte: descreve a fonte de onde o fato foi obtido

O quadro 3-1, a seguir, apresenta um extrato exemplificativo da tabela de fatos

elaborada para a etapa de análise.

Em virtude da necessidade de se organizar sobreposição das múltiplas fontes

de dados, costurando associações dos trechos extraídos entre si e deles em relação

aos polos das respostas a cada um dos desafios à longevidade, a tabela de entrada

de fatos foi acrescida de mais 14 colunas referentes às dimensões de análise

inicialmente estabelecidas a partir do referencial teórico. Com uma coluna definida

para cada dimensão da resposta a um desafio, foi possível desenvolver uma

codificação dos fatos da tabela, de modo a permitir o uso de filtros e ordenação do

Excel que vieram a facilitar o processo de análise como mostra o quadro 3-2.

• Desafio do empreendedorismo

o Ambição o Versatilidade o Mobilização de recursos financeiros o Julgamento

• Desafio da navegação no ambiente dinâmico: ações de monitoramento e uso de respostas estratégicas em relação aos stakeholders

o Sociedade e economia o Acionista o Empregados o Tecnologia o Indústria automotiva e concorrentes o Governo e legislação

• Desafio da gestão da diversidade

o Compartilhamento de recursos o Mecanismos de coordenação

• Desafio do aprovisionamento de recursos gerenciais

o Aprovisionamento antecipado e planejado

• Desafio da gestão da complexidade

o Busca sistemática para solução de problemas

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Quadro 3-1 Extrato exemplificativo da tabela de entrada de fatos históricos da General Motors

fato n°ano

inicialano final

Pg. Início Pg Final Fato Comentário Fonte e Pag.

907 1946 1946 208

The proceeds of this borrowing were received on August 1, 1946, and gave the corporation a good deal more flexibility in meeting its increased capital needs. But the Financial Policy Committee felt that the corporation needed still more capital of a permanent na¬ture, and on August 5, 1946, it authorized Mr. Bradley to negotiate with underwriters "with a view to determining the basis upon which it might be possible to sell a new issue of $125,000,000 pre¬ferred stock." The committee had considered other methods of obtaining permanent capital. One factor in our decision was that we could market a preferred-stock issue which we could retire at will, under specified conditions, but which did not have any man¬datory provisions requiring retirement by a certain date. As things worked out, however, the public market would not absorb as much preferred stock as we had hoped, except under terms we thought to be too stringent. As a result the issue had to be cut down to $100 million, that is, one million shares of $3.75 preferred offered at par. The stock was offered on November 27, 1946, and yielded the corporation $98 million after underwriting discounts and commissions.

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 208

908 1948 1949 209

And because our expansion program had been completed, our plant expenditures were relatively modest -$273 million in 1948 and 1949, only $64 million more than our pro¬vision for depreciation. Our capital position improved so rapidly, in fact, that we decided to prepay the $125-million note issue in December of 1949, thereby eliminating our debt. We were also able to increase our liquidity and to pay substantial dividends.

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 209

909 1950 1950 209

Our next major expansion was an outgrowth of the Korean War. We had learned from experience that wars create a backlog of un¬satisfied demand. After a good deal of thought we concluded that the long-run potential of the cal' market required a large expansion of our productive facilities and justified spending corporation money on new plant facilities for defense production that ultimately could be used for commercial operations.

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 209

910 1950 1950 209 210

I outlined my views in a letter dated November 17, 1950, to the members of the Financial Policy Committee, with the following recommendations: 1. We should make a survey, which is under way, to determine the quantitative measurements of the trend of demand over the next ten years, with particular reference to that after five years. Consideration should be given to such peaks as may develop due to deferred demand resulting from the curtailment of production incidental to the rearmament program. 2. We should develop a broad outline of a master plan to meet such prospective increase in production, if any, as our judgment may determine. This should include ways and means to best carry out such expansion. It should embrace the various categories of production involved in the Corporation's present scheme of things-each category following its own potential. This broad outline should be [filled] in as more facts become available ... 3. We shall be called upon to provide facilities for the rearmament program. Such needs should be integrated with the proposed master plans in broad outline so that we shall be able to move more rapidly and efficiently

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 209-210

911 1950 1953 210In the four years 1950 through 1953 we spent $1279 million on new plant and equipment - about one third of it for defense facilities. During this period, however, our earnings were restricted by the excess-profits tax and by the fact that the margin on defense business under our policy was lower than on commercial sales.

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 210

912 1953 1954 210 211

At the beginning of 1954, with our financial resources already under strain, we announced a forward program of plant expenditures calling for an outlay of $1 billion in two years. With a plant-expenditure program of this magnitude, and the in¬flationary pressures an casts, it was clear that we would have to raise new capital if we were to continue to pay out a substantial part of each year's earnings in the form of dividends. Toward the end of 1953 the Financial Policy Committee reviewed the problem and determined that a debt issue could be sold to advantage. In contrast to the situation in 1946, however, the insurance companies and other institutional investors did not have any excess funds available; they were, instead, committed for some time ahead. Hence we turned to the public market and in December 1953 sold an issue of $300 million of twenty-five-year 3¹/4 per cent debentures, netting (after deducting underwriters' fees and commissions) $298.5 million. This, too, was an

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 210-211

913 1955 1955 211

In January of 1955 our plant-expenditure program was expanded from $1 billion to $1.5 billion (and later to $2 billion). In analyzing our future capital requirements, therefore, we decided that we would need to raise more outside capital. And so in February 1955 we offered holders of common stock the right to subscribe to 4,380,683 shares of new stock (five-dollar par value) at the rate of one share for each twenty shares held. The subscription price for each new share was $75; at the closing date of the offering, the stock was selling at 96 7/8. The stock offer was underwritten by a group of 330 underwriters, but the underwriters had to subscribe to only 12.8 per cent of the issue. The net pro¬ceeds to the corporation approximated $325 million after payment of underwriting fees and commissions. This was the largest indus¬trial common-stock issue in the United States up to that time and was a remarkable success, attesting to the correct evaluation of the market at a time

SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New York, Currency Doubleday, 1990. p 211

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25

Quadro 3-2 Extrato exemplificativo da tabela de codificação dos fatos Aprovisiona gestão da

AmbiçãoVersatilid

adeFund

raisingJulgamen

toSóicio-

economico acionistaEmpregad

o TecnoligiaConcorrên

ciaPolítico-

legalcompartilhamento coordenação

Antecipado e planejado

Resolução de

problemas

926 Sloan 1924 1924

General Motors Research Corporation began working in the early twenties on the problem of balancing engines, and a crankshaft-balancing machine was developed and first used in the production of the 1924 Cadillac engines. This ma¬chine, hundreds of which are now in use throughout the world, was exc1usively a General Motors devel.9pment and gave us a long lead in engine balancing in the industry.

engenharia aplicada

staff de engenharia

inovação tecnológica

990 Sloan 1924 1924

From this committee carne the corporation's first regular testing program. Cars then were being tested on public roads, and there was no easy way of telling whether the test driver had pulled up at the side of a road, taken a nap, and then driven faster than the test schedule called for to make up the necessary mileage...The most important step we took to standardize and improve test procedures was the establishment in 1924 of the General Mo¬tors Proving Ground, the first of its kind in the automobile industry the thought was that we would have a large area, properly protected, and entirely closed to the public. It would be provided with roads of various types representing all the various demands on the motorcar from the standpoints of high speed, hills of various grades, smooth roads, rough roads, ability of a car to move through water - which is frequently required

campo de provas

comite tecnico geral

comite tecnico geral

campo de provas

992 Sloan 1924 1924

The idea was approved and the necessary capital made available. The next problem was to find out where such a proving ground could be located. What we wanted was a varied terrain centrally situated with relation to our manufacturing operations in Lansing, Flint, Pontiac, and Detroit. Michigan is rather flat, and at first we had difficu1ty locating an area of sufficient size that would give us all the various grades we needed. However, almost every foot of the United States has been measured topographically, and the rec¬ord was available in Washington. We went to Washington and from the Geological Survey maps available there we determined a location that appeared to fulfill our needs. At Milford, Michigan, would meet the requirements we had in mind... I delegated one of my executive assistants, W. J. Davidson, to take responsibility for developing the Proving Ground, and he appointed F. M. Holden as the first resident manager. Not long after¬ward Mr. Holden went to Oakland at his own request and was succeeded at the Proving Ground by O. T. ("Pop") Kreusser. All three of these men contributed greatly to the success of this project.... The land was surveyed; the straightaways were

campo de provas

testes com carros dos concorrente

s

campo de provas

corporativo

comite tecnico geral

campo de provas

759 Sloan 1924 1925

In1924 and 1925 the committee gave attention to the education of the dealers and sales departments on the advertising and sales value of current engineering developments. I asked the committee to develop a series of criteria by which "car value" of the different makes and models might be objectively determined. In 1924, too, I gave the committee the task of setting up the broad specifications of the different cars to assist in our efforts to keep the several Gen¬eral Motors' cars distinct and separate products and in a proper price and cost relationship to one another.

piramide de marcas

piramide de marcas

comite de vendas

piramide de marcas

796 Sloan 1924 1925

We worked out in 1924 and 1925 a system of statistical reports to be sent by the dealers to the divisions every ten days. The core of these reports was the information on dealers' sales of cars and trucks to consumers during ten-day periods, together with deliveries of used cal's to consumers and the number of both new and used cars on hand in dealers' lots. Used-car inventories were important because if they backed up in the hands of dealers they would block the sale of new cars. With this information in hand each ten days, the divisions thereafter had an up-to-date, comprehensive picture of the situation in the field. The divisions and the headquarters staff were then able to take corrective action and make new forecasts with greater accuracy.... The headquarters staff assisted the division managers in this task with a seasonal analysis of the year's sales estimate, and a computa¬tion for each division of an absolute minimum working stock to be maintained and the maximum seasonal excess over that minimum that was allowable at the end of each four-month forecast

análise do real vs projetado

statísticas dos

fornecedores

supervisão do desmpenho das unidades

staff financeiro

sistema de informação de

vendas

808 Sloan 1924 1925

The early return-on-investment form, which with some modifications is still used in General Motors, was the first step in educating our operating personnel in the meaning and importance of rate of return as a standard of performance. It provided executives with a quantitative basis for sound decision making, and thereby laid the foundation for what was to be one of General Motors' most im¬portant characteristics, namely, its effort to achieve open-minded communication and objective consideration of facts.

retorno sobre o capital

análise de

retorno da

unidade

decisões baseadas no ROA

retono financeiro

988 Sloan 1924 1931

The Engineering Staff provides an intermediate, medium-range link between the Research Laboratories and divisional engineering activities. It chiefly develops new engineering concepts and designs, and appraises them for commercial application. We did not have a department or section of the corporation under the title "Engineering Staff" until1931. But the various persons and functions that were brought together to make up this staff already existed. Some of them went back to the early twenties. When, for example, Mr. Hunt and Mr. Crane worked up the new Pontiac car in the Chevrolet Division in 1924 and 1925, that was a species of

staff de engenhari

a

mediação do staff de

engenharia

staff de engenharia

staff de engenharia

tema

livrofato n°

ano inicia

lano final Fato

Gestão da diversidadeEmpreendedorismo Navegação no ambiente

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26

2.5 Análise das evidências

Para proceder com a análise das evidências reunidas através da tabela de fatos,

diversas estratégias de pesquisa baseadas em processo (LANGLEY, 1999) foram

utilizadas. A primeira das estratégias foi a elaboração de mapas visuais. De acordo com

Langley (1999) esta estratégia não é necessariamente boa para detectar mecanismos, e

requer de cinco a dez casos para poder tornar os padrões evidentes. Apesar de em

princípio não ser uma estratégia recomendada para este tipo de estudo, os mapas visuais

foram utilizados pela facilidade que oferecem para lidar com relacionamentos e com o

tempo. Portanto, em virtude da complexidade das relações entre os fatos, das relações

entre fatos com as dimensões de análises, da sobreposição de fontes e o longo período

analisado, os mapas visuais permitiram a organização visual da sequência dos processos

relacionados a cada desafio, desde o ano de fundação da GM até o final da década de

1980.

Para elaborar os mapas visuais foi utilizada a codificação dos fatos em relação às

respostas aos desafios à longevidade na tabela do Excel. A codificação foi feita através

da leitura de cada fato, atribuindo àqueles que apresentassem alguma relação com

determinada dimensão um título que representasse tal relacionamento, mesmo que este

tenha sido produto de uma reflexão superficial. A maior contribuição deste processo de

codificação não esteve relacionada à qualidade e precisão da identificação de respostas,

mas sim à simplificação de uma primeira triagem dos processos que poderiam conter

alguma informação relevante para uma fase posterior da análise. Com os fatos

codificados na planilha do Excel, foi possível ordenar e filtrá-los por critérios, como data,

fonte, e principalmente relação com determinado desafio. Este método permitiu realizar

uma leitura dos fatos ligados a um determinado desafio de forma contínua e, a partir da

interpretação dos múltiplos relacionamentos, estabelecer mapas visuais que indicaram a

ocorrência de processos estáveis, pontuais ou intermitentes em cada desafio. Esta

estratégia de análise, por ter um papel intermediário na estratégia geral, não é

apresentado no capítulo de resultados da análise, porém os mapas visuais podem ser

consultados no Apêndice A.

Outra estratégia de pesquisa utilizada foi a de quantificação. Para tanto, foram

elaborados, a partir dos demonstrativos financeiros e de indicadores macroeconômicos,

gráficos contendo análises longitudinais da evolução de certos indicadores. Um dos

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principais indicadores utilizados foi o indicador de tamanho proposto por Fleck (2005). Os

dados obtidos nos relatórios da agência Moody’s e na Securities Exchange Comission

(SEC) e das séries temporais do Federal Reserve permitiram elaborar o cálculo do

indicador de tamanho e de desempenho a partir das seguintes equações:

Tamanho = Vendas * 100 GNP

Desempenho = Lucros * 100

GNP

Outros indicadores quantitativos em perspectiva longitudinal foram elaborados, tais

como vendas de veículos da indústria e da General Motors, e o de retorno sobre o ativo

(Lucro líquido dividido pelo ativo total). Entretanto, esta estratégia de pesquisa, neste caso

contribui pouco para explicação dos eventos, pois estes métodos requerem grande

quantidade de casos para poderem ser generalizados. A existência destes indicadores em

perspectiva longitudinal é relevante apenas na medida em que pode fornecer importantes

questionamentos para pesquisa.

De acordo com Langley (1999) a estratégia de narrativa envolve a construção

detalhada de uma história a partir de dados brutos. Esta estratégia tem os papeis de

análise preliminar, de organização dos dados e potencialmente pode agregar elementos

analíticos. O histórico da General Motors foi elaborado na forma narrativa em seqüência

cronológica. Para redação do texto, todos os fatos selecionados para a análise foram

copiados para o corpo do texto e organizados em de acordo com o evento que

descreviam. Estes blocos de fatos foram diferenciados entre si pelas cores da fonte.

A partir da ordenação dos blocos de fatos em macro assuntos, dentro de cada

bloco os fatos eram novamente organizados em ordem cronológica e de afinidade. Novas

divisões de cores do texto foram utilizadas para organizar os assuntos. Por fim a narrativa

foi redigida em um processo no qual a coerência e a ênfase dada a cada evento era

periodicamente verificada com o auxílio dos mapas visuais elaborados inicialmente.

Tendo constituído a tabela de fatos codificada, a narrativa em ordem cronológica e

os mapas visuais, a etapa seguinte da análise foi a identificação e comparação dos

padrões de ação (YIN, 1989) da General Motors em relação aos padrões estabelecidos

para cada desafio nos pólos de auto-perpetuação e auto-destruição (FLECK, 2009). A

identificação dos padrões partiu inicialmente dos fatos descritos na narrativa histórica da

General Motors, os principais eventos indicativos de padrões de ação da GM foram

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selecionados e confrontados com os trechos originais dos fatos na tabela de fatos e com

os mapas visuais do respectivo desafio. Os padrões de cada desafio foram então

descritos em uma perspectiva cronológica, e as observações a respeito desses padrões

foram a utilizados para sintetizar as respostas da General Motors a longo de sua

trajetória.

Para elaborar a síntese das respostas duas estratégias de pesquisa foram

utilizadas, a elaboração de quadros temporais permitiu a comparação entre diferentes

fases identificadas em termos dos padrões de resposta aos desafios. Em seguida,

novamente foram utilizados mapas visuais para simplificar a as relações entre respostas,

desafios e a evolução ao longo do tempo.

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4. Resultados da análise

A análise dos dados recolhidos sobre a evolução da General Motors é

apresentada em três partes. A primeira delas é a reconstituição do histórico dos

acontecimentos dentro da organização e do contexto que a cercou. A segunda parte trata

de analisar as evidências em termos dos padrões de respostas da organização a cada um

dos desafios à longevidade de Fleck (2009). A terceira parte desta análise fornece uma

síntese da evolução das respostas da General Motors, buscando identificar as condições

desenvolvidas pela organização em relação aos pólos da auto-perpetuação e da auto-

destruição e, por fim, estabelece a ligação destas respostas com a trajetória crescimento

e declínio.

4.1. Histórico da General Motors e da Indústria Automobilística

4.1.1. O nascimento da indústria

O surgimento do automóvel – veículo mecânico terrestre, autopropulsado, para o

transporte de cargas e passageiros – ocorreu ao longo da segunda metade do século

XVIII e durante o século XIX, em meio a um contexto de mudanças nos padrões e hábitos

da vida urbana, na Europa e nos Estados Unidos, e quando avanços em diversas áreas

da ciência estimularam experimentações na locomoção dentro e entre cidades. O

crescimento das aglomerações urbanas, em virtude do processo de industrialização,

provocou uma série de reações sociais que desencadearam políticas de urbanização

baseadas na formação de subúrbios - mais comuns na Inglaterra e nos Estados Unidos -

e no início da verticalização das cidades, como no caso da França. Em ambos os casos,

resultaram destas mudanças maiores esforços na pavimentação de ruas e estradas, bem

como tentativas de melhor organizar os crescentes fluxos de pessoas e de veículos de

transporte.

Concomitante ao desenvolvimento acelerado de centros urbanos, avanços

tecnológicos possibilitaram o surgimento do automóvel e o desenvolvimento de sua

indústria. Novas proposições nas leis da termodinâmica e o domínio sobre manipulações

de materiais petroquímicos, da siderurgia, da metalurgia e da eletricidade impulsionaram

os experimentos. Inicialmente, ciência e engenharia progrediram nos veículos movidos a

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vapor, como os apresentados por Nicholas Cugnot em 1769, na França, e por Richard

Trevithick em 1801 e 1804, na Inglaterra. Em pouco tempo, foi possível desenvolver

locomotivas a vapor capazes de transitar de forma eficaz sobre um percurso de trilhos de

aço. Assim, a indústria ferroviária emergiu e revolucionou o transporte em longas

distâncias.

Outros esforços da engenharia caminharam na busca de um motor de combustão

interna. As experiências neste sentido se intensificaram a partir da década de 1820 e

diversas patentes foram registradas na Inglaterra, França e Estados Unidos, onde as

novas descobertas eram mais bem asseguradas pela legislação sobre propriedade

intelectual. Uma variedade de modelos foi produzida de 1823 a 1877, quando Nicklaus

Otto, a partir de sua fábrica em Colônia, na Alemanha, recebeu a patente sobre o motor

de quatro tempos (four-stroke cycle), ou motor de ciclo otto, tecnologia que, então, se

tornou dominante. A patente foi caçada nos tribunais anos depois, mas mesmo assim Otto

manteve-se comercial e popularmente reconhecido pela invenção do motor. O alemão

Gottlieb Daimler também é lembrado por sua contribuição ao desenvolvimento do

automóvel. Após dez anos na empresa de Nicklaus Otto, na qual chegou a diretor técnico,

Daimler se demitiu para poder trabalhar a idéia de um motor de alta rotação. A tecnologia

patenteada por Daimler em 1883 viabilizou motores menores e aumentou a rotação de

100 RPM para 900 RPM e apesar da irrelevância histórica dos veículos criados por

Daimler, seus motores tiveram grande influência no surgimento da indústria.

As tentativas de acoplar um motor a um veículo de transporte foram inúmeras e

estiveram espalhadas pela Europa e pelos Estados Unidos, testando tecnologias a vapor,

eletricidade e de combustão interna. A primeira patente de um automóvel a gasolina

comercializável foi concedida a Karl Benz, em 1886. Ele acoplou um motor de ciclo otto a

um veículo de três rodas, batizado de Motorwagen. A Benz and Co. Rhenish Gas Engine

Works, até então fabricante de motores estacionários, passou a fabricar o veículo, que em

1893 atingiu o volume de 45 unidades e, em 1900, de 603. Logo após o início do

desenvolvimento em terras alemãs, o núcleo dos avanços na tecnologia automobilística

migrou para a França, que possuía excelentes estradas, legislação favorável, bom corpo

de engenharia e uma elite disposta a financiar melhorias nos modelos, sobretudo sob a

bandeira de um novo e nobre esporte: a corrida de automóveis.

Nos Estados Unidos, a fabricação e comercialização de automóveis tiveram início

quase dez anos depois da Europa. O primeiro registro histórico de um carro com motor a

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gasolina foi o pedido de patente de George Baldwin Selden, submetido em 1879. Selden

era um advogado, que mesmo sem ter conseguido construir a máquina que projetou,

obteve, em 1895, os direitos sobre a produção de automóveis. Um automóvel a gasolina

só foi realmente produzido em solo americano em 1893. Charles e Frank Duryea, após

lerem uma descrição do carro do alemão Benz na Scientific American, construíram, em

Massachusetts, um modelo que adaptou uma charrete usada e algumas peças

disponíveis. No entanto, as atividades da The Duryea Motor Wagon Co., fundada em

1895, não foram muito além de 1896. Uma vitória contra três veículos Benz na primeira

corrida dos Estados Unidos, promovida pelo Chicago Herald Tribune, a comercialização

de 13 unidades similares e a participação em uma corrida na Inglaterra foram as

principais marcas alcançadas pelos dois irmãos antes de liquidarem a empresa.

O surgimento da carroça sem cavalos (horseless carriages) despertou atenção e

curiosidade nos Estados Unidos. Em 1893 foram exibidos na Chicago Wolrd’s Fair dois

veículos elétricos, um veículo a vapor, além de um motor Daimler. Visitaram a exibição

internacional de invenções alguns pioneiros da futura indústria, como, os próprios irmãos

Duryea, os fabricante de bicicleta Albert Pope e Alexander Winton, os então engenheiros

Elwood Hayes e Henry Ford, fabricantes de carroças como Willian Durant e os Irmãos

Studebaker, além de Ramson Olds que à época era fabricante de motores a gasolina e

também já dirigia um carro a vapor criado por ele mesmo. Veículos de comunicação já

escreviam sobre o novo meio de transporte, como foi o caso da corrida vencida pelos

Duryea. A loja Macy’s passou a vender o triciclo de Benz importado da Alemanha em

1895, mesmo ano em que o escritório de patentes dos Estados Unidos registrou o

recebimento de 500 pedidos de patentes relacionadas a automóveis.

Nos primeiros anos da indústria automobilística dos Estados Unidos, houve uma

grande quantidade de modelos de veículos surgindo a cada ano, normalmente adotando o

desenho das carroças existentes e acoplando um motor embaixo do assento do

passageiro. As tecnologias para a locomoção do veículo variavam entre as empresas. À

época, veículos a vapor, a eletricidade e a gasolina apresentavam vantagens e

desvantagens entre si e dividiam a preferência de fabricantes e consumidores. O motor a

vapor possuía uma boa relação de potência e controle na aceleração, mas demorava para

iniciar o funcionamento e seu combustível requeria muito espaço. O carro elétrico era

silencioso e de fácil operação, entretanto, era pesado, tinha baixa autonomia e demorava

muito para recarregar. Já o motor a gasolina era de rápida ignição, tinha boa relação peso

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e eficiência de combustível, mas, por outro lado, a operação era complexa e fazia ruído

em demasia. Além disso, independentemente da motorização, nos primórdios, os veículos

em geral eram pouco confiáveis e exigiam uma manutenção complicada para cidadãos

comuns.

O primeiro carro produzido em grande quantidade na América foi o Curved Dash

Runabout, que vendeu 4.000 unidades em 1903. O pequeno carro a gasolina da

Oldsmobile tinha o desenho de um buggy (uma carroça de quatro rodas para dois

passageiros) e foi desenvolvido em 1901. Com o objetivo de fabricar motores e

automóveis, Ramson Olds fundou a Olds Motor Works em 1897, tendo como acionista S.

L. Smith, um magnata da indústria do cobre, de Detroit. Ramson já vinha trabalhando com

a fabricação de motores e veículos em Lansing, Michigan, desde a década de 1880.

Porém, foi em 1899 que ele inaugurou, em Detroit, uma fábrica exclusivamente

desenhada para a produção de automóveis, a maior existente até então. A Oldsmobile é a

mais antiga empresa de automóvel dentre as absorvidas pela General Motors em sua

formação.

No ano de 1900, diversos eventos podem ser vistos como indicadores da

mobilização que o automóvel e sua indústria criaram nos Estados Unidos. Os fabricantes

de peças e componentes começaram a ser envolvidos no desenvolvimento dos veículos,

a Associação Nacional de Fabricantes de Automóveis (NAAM) foi fundada e o Clube do

Automóvel da América realizou a primeira corrida em Nova York. Neste mesmo ano, o

primeiro anúncio pago de um automóvel apareceu em um jornal de grande circulação, o

Saturday Evening Post, enquanto que a primeira feira nacional do automóvel (National

Automobile Show), realizada em Nova York, atraiu 48.000 pessoas ao Madison Square

Garden para ver 40 fabricantes de veículos e 11 de peças e acessórios, em uma

exposição que contou com aproximadamente 300 carros diferentes.

Até 1902, os veículos a gasolina eram vendidos em menor quantidade do que os

elétricos e os a vapor. Porém, já na virada para o século XX, indícios da superioridade da

tecnologia a gasolina já podiam ser percebidos: em 1900, apenas sete veículos a vapor

foram expostos na feira em Nova York e, pela primeira vez, um veículo a gasolina venceu

uma corrida contra um carro elétrico em Chicago.

Em meio ao ambiente de inovação e à promessa de novas possibilidades que

cercaram o automóvel em seu início, muitos americanos deixaram suas carreiras ou

direcionaram suas empresas, a fim de desbravar a indústria nascente. Henry Ford foi um

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desses casos. O jovem filho de um fazendeiro foi para a cidade ser aprendiz de mecânico

e, após trilhar breve carreira como engenheiro, desenvolveu seu primeiro quadriciclo em

1896. Em 1903, após algumas tentativas frustradas, Ford incorporou a Ford Motor

Company associando-se a um grupo de investidores de Detroit.

4.1.2. Da Buick a General Motors

Outro pioneiro foi David Dumbar Buick, um escocês que perdeu o pai ainda

criança, pouco depois de a família migrar para os Estados Unidos, e cuja história é

escassa em registros precisos. Buick freqüentemente é descrito como tendo sido uma

pessoa com alta capacidade criativa. Ele e seu colega William Sherwood assumiram a

falida empresa na qual trabalhavam, fabricante de peças para banheiros, e a tornaram um

negócio de sucesso ao desenvolverem uma inovadora técnica para colar cerâmica ao

aço. Os dois sócios entraram em conflito quando Buick, entusiasmado com a idéia de

construir um automóvel a gasolina, passou a se dedicar menos às atividades de sua

empresa. Em 1899, a lucrativa empresa foi vendida por U$ 100.000 (em valores de 2007,

cerca de U$ 2,7 milhões), e Buick aplicou sua metade no desenvolvimento de motores a

gasolina e do automóvel Buick, que, posteriormente, veio a ser o principal pilar de

sustentação nos anos de formação da General Motors.

A General Motors só foi fundada por Willian Crapo Durant em 1908. Enquanto a

indústria automotiva nascia, Durant comandava de Flint, Michigan, a Durant-Dort Carriage

Company (D&D), empresa fabricante de carroças que expandia a passos largos para se

tornar a maior do país. Durant nasceu em Boston, em 1861, e viveu a infância em Flint

após a separação de seus pais. Filho de um especulador fracassado no mercado de

ações e neto, por parte de mãe, do ex-governador do estado de Michigan, Durant

abandonou a escola, aos 17 anos; tornou-se representante de vendas, agente de seguros

e, posteriormente, empreendedor. Em 1885, aos 24 anos de idade, se impressionou com

a suavidade da suspensão da charrete de um amigo e, no dia seguinte, mesmo sem ter o

dinheiro necessário, formalizou um pré-contrato de compra da patente e da empresa

fabricante de carroças da cidade de Coldwater, Michigan.

Willian C. Durant usou a reputação de sua família nos empréstimos bancários e se

associou a Josiah Dallas Dort para compor o capital necessário para iniciar sua empresa -

U$ 1500 para aquisição, mais U$ 500 para iniciar a operação. Apoiada nas vendas

promovidas por Durant e pelos representantes por ele nomeados, nos primeiros anos a

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D&D cresceu vertiginosamente em pedidos de compra de seus produtos, equanto a

produção das carroças ainda era terceirizada.

Para viabilizar a busca por escala, Durant arregimentou pessoas nas quais

identificou talentos, seja recrutando em outros fabricantes, seja em seu próprio chão de

fábrica. Foram os casos de Alexander Hardy (A.B.C. Hardy), vindo de um concorrente

vizinho, e de Charles J. Nash, que começou como ferreiro na D&D. Ambos

acompanharam Durant posteriormente na General Motors, ocupando importantes cargos

gerenciais. Além disso, para assegurar o fluxo de produção, Durant abriu novas plantas

subsidiárias e adquiriu outros fabricantes de carroças e fornecedores de componentes,

algumas vezes motivado apenas pela defesa contra cartéis ou desabastecimento. Em

1895, ano inaugural da indústria automotiva, a D&D fabricou 75 mil unidades em 14

plantas, nos Estados Unidos e no Canadá, e era motivo de orgulho para a cidade de Flint.

O sucesso na fabricação de carroças fez com que Durant não participasse da indústria

automobilística desde o seu primeiro momento, mas em 1904 a corrida empreendedora e

a Buick bateram à sua porta oferecendo uma oportunidade.

David Buick havia aplicado todo o dinheiro que conseguiu com a venda, em 1899,

da empresa de peças para banheiros no desenvolvimento de seu veículo. Em 1901,

contratou o mecânico Walter Marr e, em 1903, uniu-se a eles o experiente engenheiro

francês Eugene C. Richard. Juntos, eles patentearam o sistema de válvula no cabeçote

(overhead valve - OHV) que aumentou significativamente o desempenho do motor. A

Buick Auto-Vim & Power Co. esgotou seus recursos ao desenvolver seu veículo, e Buick

teve que recorrer aos irmãos Benjamin and Frank Briscoe, à época fornecedores de folha

de metal, para financiar a empresa. Com o investimento, os irmãos Briscoe tornaram-se

detentores de 99% das ações da Buick Motor Car Co.

Em uma visita aos familiares em Flint, os novos proprietários da Buick souberam

do interesse de James H. Whiting, um dos fabricantes locais de carroças, em trazer para

a cidade a produção de automóveis. Whiting adquiriu a Buick, em 1903, tendo como

sócios David Buick e outros empresários da cidade. A instalação da produção da empresa

em Flint gerou grande repercussão na imprensa local e os experimentos conduzidos por

Buick, Marr e Richards resultaram nos primeiros veículos comercializados: o Modelo A e,

em seguida, o Modelo B. Os novos motores de dois cilindros conferiram ao Buick uma

confiabilidade e potência raras nos demais carros da época, contudo, contrariando as

expectativas de James Whiting, a indústria automotiva se apresentou mais complexa e

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com maior demanda por capital quando comparada à produção de carroças. Em

setembro de 1904, Whiting apresentou a Durant o Buick Modelo B e, junto com ele, uma

oferta para que o prestigiado e bem sucedido empreendedor tomasse parte no negócio.

Registros autobiográficos dão conta de que Durant dirigiu incessantemente o

veículo, testando à exaustão suas capacidades em diferentes terrenos, e sempre

retornando à oficina da empresa para solucionar os diversos problemas mecânicos que

surgiam. Durant observou em seus testes o interesse que o carro despertava ao passar

pelas cidades, também constatou a necessidade dos serviços de manutenção estarem

disponíveis aos donos dos veículos. Nas negociações com Whiting e Buick, Durant exigiu

total controle sobre a nova empresa, o que foi aceito pelos demais, mas não assumiu a

presidência, nomeando Charles S. Begole para este lugar. Em 1 novembro de 1904 o

negócio foi concluído. Durant ampliou o capital da empresa de U$ 75.000 para U$

300.000, tornando-se o acionista controlador da Buick Motor Company.

Entrar para a indústria automotiva na época em que Durant assumiu a Buick era o

sonho de muitos empreendedores americanos. Em 1903, 88 empresas de automóveis

foram abertas, incluindo Buick, Cadillac e Ford. Porém, apesar das promessas de uma

demanda voraz, poucas empresas estavam fazendo dinheiro e a quantidade que saía de

operação a cada ano quase empatava com os novos entrantes. Nesta época, havia

diversos obstáculos para um iniciante na indústria. Os bancos estavam receosos em

financiar as empresas, e assegurar matéria-prima tornava-se um desafio a mais para os

competidores devido à disputa por fornecimento de componentes. Além disso, a adoção

do motor a gasolina como padrão ampliou o raio de atuação da patente de George Selden

(válida a partir de 1895).

Ainda em 1903, foi formada por alguns fabricantes de veículos a Associação dos

Fabricantes de Automóveis Licenciados (em inglês, ALAM) com o intuito de determinar os

critérios e valores de licenciamento para a produção e comercialização de veículos a

gasolina. Dentre as atribuições da ALAM estavam a fiscalização e a cobrança dos

royalties da patente de Selden e também a moderação da competição, já que a entidade

podia arbitrariamente recusar a entrada de um fabricante, ou impor requisitos mínimos de

capital investido, por exemplo, para eliminar pequenos aventureiros. Porém, nem todas as

empresas fabricantes aderiram à ALAM - a Ford foi uma delas. Ainda mera debutante na

indústria, a Ford se recusou a pagar royalties para o grupo de Selden e foi acionada

judicialmente em um processo que ganhou notoriedade nos Estados Unidos. Após uma

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vitória em primeira instância da ALAM, em 1909, o recurso da Ford obteve êxito na

suprema corte americana em 1911.

Assim que assumiu a Buick, Durant tratou de acelerar a produção. Sem

instalações adequadas na cidade de Flint, adquiriu uma fazenda de 220 acres para

construir sua planta. Enquanto isso, ele utilizou as instalações da fábrica de rodas da D&D

em Jackson (a 100 milhas de Flint) para a montagem final do Buicks Modelo B. A Buick

montava de cinco a oito veículos por semana e mantinha a fabricação de motores,

transmissões e carrocerias em Flint. Com o primeiro Buick Modelo B pronto, Durant o

levou para o Salão do Automóvel de Nova York, de onde voltou semanas depois com

pedidos de venda para 1108 veículos. A divisão da produção entre Jackson e Flint exigia

grande dedicação de seus gestores. Durant vivia apressado. Entre as duas cidades e

demais viagens, o empreendedor tomava importantes decisões, cuidava de captar

recursos, encontrar fornecedores e distribuidores, além de empurrar as vendas.

Enquanto corria para colocar a Buick entre as grandes fabricantes de veículos,

Durant procurou manter uma relação segura com os detentores da patente de Selden. A

Buick nunca chegou a se associar a ALAM, mas Durant adquiriu uma licença na

liquidação da Pope-Robinson que entrou em falência, em 1904. Posteriormente, em 1908,

já na recém-criada General Motors, aconselhado por advogados, Durant não só

suspendeu o pagamento de royalties a ALAM como, quando processado, contra atacou,

acusando o grupo de empresas de conspiração. Pouco depois, com a derrota judicial da

Ford para a ALAM, em 1909, voltou atrás em sua decisão e pagou U$ 1 milhão em

royalties retroativos.

O fato de a Buick ter sua produção dividida entre duas cidades também trouxe

oportunidades para a empresa. Durant aproveitou-se do prestígio que havia construído

com sua empresa de carroças e, durante o verão de 1905, utilizou-se de uma jogada para

captar recursos e, assim, alavancar seu negócio. Após anunciar que a produção em

cidades com tamanha distância era inviável, Durant passou a estimular lideranças locais

das duas cidades, interessadas em geração de riqueza e empregos, em uma espécie de

competição para ser a sede definitiva da Buick. Durant divulgou em Jackson e em Flint

que a Buick se instalaria em definitivo em uma dessas cidades, caso uma delas fosse

capaz de aumentar o capital da empresa para U$ 1 milhão. Como a cidade de Flint

ultrapassou a marca em U$ 500 mil, ela assegurou a presença da Buick em seu território.

Em 11 de setembro de 1905, os quatro bancos, as empresas e centenas de indivíduos da

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cidade compraram ações da Buick, aumentando seu capital para U$ 1,5 milhão. A

produção mudou-se para Flint em três meses, tornando-se a maior planta para fabricação

de automóveis da época.

Ao contrário do que ocorria na fabricação de carroças, onde a D&D controlava a

produção de todos os principais componentes, em 1905, na indústria automobilística,

nenhum fabricante possuía recursos suficientes para produzir todos os componentes de

um carro e, com isso, boa parte deles era fabricada por terceiros. Por exemplo, Ford e

Cadillac e Reo compravam motores dos irmãos Dogde. Os rolamentos eram fabricados

pela Hyatt Company, do recém-graduado do MIT, Alfred P. Sloan. Já os radiadores eram

feitos com as folhas de metal dos irmãos Briscoe. Durant logo percebeu que atrasos na

entrega de componentes eram fatais para o fluxo de caixa da empresa. Uma peça mais

simples como um eixo, por exemplo, passava a ser tão crucial quanto um motor.

Pensando nisso, William Durant persuadiu a Charles Mott, dono da Weston-Mott,

fabricante de eixos, a mudar sua fábrica de Utica, no estado de Nova York, para Flint.

Mott concordou com a mudança após Durant assegurar um investimento de U$ 100 mil

para que fosse montada uma fábrica ao lado da Buick.

Com o motor de dois cilindros, o Buick Modelo B foi um sucesso imediato. A

empresa corria atrás para atender a quantidade de pedidos sempre superior à

capacidade. Em 1905, foram entregues 750 unidades e, no ano seguinte, o volume

aumentou para 2.295, cerca de 7% da produção da indústria. Em 1906, Arthur Mason, um

mecânico vindo da Cadillac, desenvolveu um novo motor aumentando a rotação de 1800

rpm para 4000rpm e, conseqüentemente, elevando a potência do Buick. Isto tornou os

veículos de Durant ainda mais atrativos.

Para ampliar a produção, a Buick teve de levar mão-de-obra de fora para a cidade

de Flint. Com cerca de 15.000 habitantes, os cidadão viram sua população dobrar em

cerca de dois anos. Homens iam espontaneamente de outros estados em busca dos

salários mais altos que a indústria prometia, mas também recrutadores percorriam os

Estados Unidos oferecendo aos artesãos e operários a passagem de trem e as refeições

até que recebessem o primeiro salário. Nesta época, cresceu em importância na cidade

de Flint e entre os operários da Buick a Flint Vehicle Workers Mutual Benefit Association,

uma associação formada ainda em 1901, inicialmente como uma sociedade de seguro

mútuo, que gradualmente desenvolveu atividades sociais, atléticas e de entretenimento.

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A demanda continuou crescendo e a Buick não conseguia acabar com os pedidos

em backlog. Durant corria atrás de recursos para poder aumentar a produção no ritmo em

que o mercado pedia, mas por mais que a cidade de Flint e a D&D fossem generosas

com a Buick, a empresa precisava de maior volume de investimento e, assim, seu dono

saiu a percorrer os demais bancos do estado de Michigan. A limitação de recursos não

impediu o ímpeto expansionista de Willian Durant. A Buick passou a operar em três

turnos de produção e dobrou o volume em 1907. Nesta época, a cidade explodia com a

chegada de novos operários. A falta de estrutura para acomodar o crescimento da

população fez com que os hotéis e pensões de Flint alugassem o mesmo quarto para o

dia ou para a noite.

A Buick abriu pontos de venda em grandes cidades dos Estados Unidos. William

Durant procurou nomear distribuidores que pudessem manter lojas com espaços para

mostrar os veículos e que oferecessem serviços pós-venda, uma novidade no setor.

Durant trouxe o Harry Shiland, distribuidor e crítico da manutenção complexa dos

veículos, para ser diretor de serviços. Um outro distribuidor, H. J. Koeler, em Nova York,

foi responsável por introduzir a Buick no automobilismo. Koeler usava a potência e o bom

desempenho do Buick nas corridas para impulsionar suas vendas. Foi assim que, em

1906, após dois anos e 36 troféus em corridas de automóvel, ele chegou com um pedido

de compra de 500 unidades, aproximadamente 10% de toda produção. Durant logo

percebeu a oportunidade que as corridas representavam em publicidade e, em 1907,

autorizou a criação da Buick Team. A equipe de mecânicos e pilotos passou a representar

a marca nas provas pelo país, contudo, o automobilismo rendeu ainda mais frutos à Buick

do que somente vitórias e publicidade. Durant, por vezes, priorizou testar novas

tecnologias e aproveitar para copiar segredos de concorrentes, mesmo tendo que

comprometer a subida ao pódio. Além disso, por meio das corridas, Durant trouxe para a

Buick o talentoso piloto e mecânico francês, Louis Chevrolet.

Com uma crise no setor bancário, 1907 foi um ano difícil para os Estados Unidos,

sobretudo para sua atividade industrial. A economia americana vinha de vários anos de

crescimento, a produção de automóveis aumentou, de 1900 a 1907, a uma taxa anual

média de 27%. Entretanto, em outubro, o país viu o pânico financeiro e a escassez de

crédito se espalhar. A crise começou em Nova York, depois de uma frustrada fusão entre

bancos em Wall Street. Todos os bancos passaram a cortar linhas de crédito e a não

renovar empréstimos em vencimento, com isso, os fabricantes de automóveis foram

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atingidos dos dois lados. Havia menos recursos para pagar fornecedores e financiar a

produção e, na outra ponta, consumidores não conseguiam crédito para comprar veículos

por meio de financiamentos. A resposta dos fabricantes em geral foi de reduzir a atividade

produtiva e até demitir funcionários, como fizeram Cadillac e Olds, mas Durant seguiu

pelo caminho contrário.

A Buick ignorou a crise e continuou aumentando sua produção e fazendo estoque

de produtos acabados. Com a exceção da folha de pagamento, Durant passava notas

promissórias que eram aceitas por fornecedores e até descontadas em alguns bancos

locais. Nas vendas, a Buick também aceitava títulos de dívidas dos clientes. Felizmente

para ele, apesar da queda no PIB naquele ano, o pânico acabou rapidamente. Em

fevereiro de 1908, apenas cinco meses depois do início da crise, a situação estava

normalizada. A demanda reprimida de automóveis, somada à escassez de oferta pelos

concorrentes, fizeram explodir as vendas da Buick. Como resultado, Durant obteve ainda

mais prestígio e colocou a Buick entre as empresas mais valorizadas do setor.

Em 1908, a Buick era a segunda fabricante em quantidade, atrás apenas da Ford,

que neste ano lançaria seu popular Ford Modelo T. A empresa de Willian Durant, que

começara com um modelo de dois cilindros, quatro anos antes, agora possuía dois

modelos de dois cilindros, quatro de quatro cilindros, fabricando 8.487 veículos. O rápido

crescimento trouxe desafios gerenciais para a empresa. Para coordenar tantas atividades,

Durant dispunha de um corpo de gerentes e técnicos, alguns vindos das operações da

D&D, como A.B.C. Hardy, outros descobertos na própria indústria, como nos casos de

Walter Marr, Enos Waters, Arthur Mason, Harry Shiland e Charles Van Horne. Willian

Durant, no entanto, centralizava as decisões importantes. Ao se envolver em tantas

atividades, trabalhava mais horas do que qualquer um de seus homens. Ele dormia

pouco, mas mantinha sempre o semblante e um tratamento amigáveis para com seus

subordinados. A autoridade de Durant se refletia na forma como se referiam a ele dentro

de sua empresa: “the man” (o homem). Muitas vezes a referência “the man says” (o

homem diz) acompanhava a transmissão de suas decisões.

Willian Durant acreditava que o mercado de automóveis ainda estava longe de

uma saturação. Um repórter de Detroit, após entrevistá-lo, escreveu “Durant vê –

realmente vê – 90 milhões de pessoas ansiosas para andar em automóveis pelas

estradas deste país” (tradução livre de MADSEN, A. 1999, p 89). Com convicção de um

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futuro positivo para a indústria automobilística, Durant perseguiu a idéia de uma

consolidação entre empresas do setor.

Durant passou boa parte de 1907 e 1908 arquitetando uma fusão, na tentativa de

consolidar a indústria automobilística. Por meio de Herbert L. Satterlee, advogado e genro

de Jack Pierpont Morgan, Durant chegou à J. P. Morgan & Co. A proposta era que o

grupo financeiro introduzisse a indústria automobilística no circuito de Wall Street,

capitalizando a fusão que envolveria a Buick, a Maxwell-Briscoe, a Ford e a Reo Motor

Works, à época, responsáveis por mais de 60% da produção total de veículos. As

negociações entre os fabricantes avançaram significativamente, com Durant e Frank

Briscoe coordenando as conversações. Os donos das quatro empresas se reuniram pela

primeira vez em Detroit e, na segunda vez, em 24 e 25 de janeiro de 1908, já em Nova

York, chegaram a discutir valores e a possível estrutura gerencial (Durant defendia

apenas a formação de uma empresa holding e Briscoe sugeriu integrar atividades de

vendas, marketing e engenharia). Henry Ford estava inicialmente propenso a vender sua

empresa, supostamente temendo perdas decorrentes da derrota em primeira instância

contra a patente de Selden. Por outro lado, dono da empresa líder da indústria e com a

idéia de popularização do automóvel, Ford provavelmente temia que um natural aumento

dos preços inviabilizasse seus planos para o iminente Modelo T. Além disso, relatos

atestam que o negócio foi inviabilizado quando Henry Ford e Ramson Olds exigiram

receber o pagamento por suas empresas em dinheiro ao invés de ações. Com duas das

quatro empresas exigindo dinheiro, o representante de J. P. Morgan esfriou seu ímpeto e

se afastou da negociação.

Os irmãos Briscoe e Durant não desistiram da idéia de iniciar um processo de

consolidação na indústria, mas seus planos e empresas caminharam em sentidos

diferentes a partir de então. A Maxwell-Briscoe veio a fundir-se com a Columbia Car

Company, formando a United States Motor, porém a nova empresa entrou em concordata

em 1912. Durant ainda manteve conversação com representantes do J. P. Morgan,

entretanto a frieza das expectativas sobre as negociações podem ser deduzidas a partir

da carta enviada por Durant a seu advogado, relatada por Madsen (1999), em tradução

livre abaixo:

"Tive uma longa e acalorada sessão com nossos amigos em Nova York ontem e estava

bem próxima de um encerramento ao final. Se você pensa que é um assunto fácil

conseguir dinheiro de capitalistas de Nova York para financiar uma proposição de uma

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indústria de carros no Michigan, pode pensar em outra idéia. Não obstante o fato de as

taxas de juros de empresas cotadas [em bolsa] serem bem baixas, o dinheiro é difícil de

conseguir devido a certo inexplicável sentimento de insegurança e a uma descrença

generalizada na proposta automotiva.”

A saída para os planos de Durant surgiu após uma visita a Detroit onde ele esteve

reunido com Samuel e Fred Smith, pai e filho, proprietários da Olds Motor Works. Após

despontar como pioneira na produção em larga escala, sob o comando de Ramson Olds e

com um veículo pequeno e barato, Olds e seus sócios capitalistas divergiram sobre qual

posicionamento a Oldsmobile deveria adotar. Em 1904, Ramson Olds deixou a empresa

para seguir com o projeto próprio na Reo Motor Works, e a Oldsmolbile passou a ser

conduzida pelos Smiths que enfim introduziram o novo modelo de quatro cilindros, quatro

vezes mais caro que o pequeno Curved Dash Runabout. Ironicamente, a partir de então a

Oldsmobile entrou em declínio e, depois de quatro anos lutando, seus proprietários

estavam dispostos a vendê-la para Durant.

Novamente com a oportunidade de consolidação, desta vez de forma

independente, William Durant procurou o mesmo Hebert Saterlee em busca de

orientações para estabelecer sua holding. O advogado aconselhou que a nova empresa

fosse aberta no estado de Nova Jersey, pois, ao contrário de Michigan, as firmas lá

abertas não enfrentavam quase nenhuma restrição sobre suas atividades. Assim sendo,

em 16 de setembro de 1908, foi fundada a General Motors Company (GM), com um

capital de U$ 2.000, tendo William Eaton, gerente de uma firma de investimentos, como

presidente e Durant como vice-presidente. Doze dias depois de fundada, a General

Motors iniciou suas atividades. Com a primeira injeção de capital, foi adquirida a Buick

Motor Company, logo depois a nova holding adquiriu a W. F. Stewart Company, fabricante

de carrocerias, pagando U$ 240.000 em ações da GM e que, em seguida, foi arrendada a

Buick. A General Motors partiu então para concluir a aquisição da Olds Motor Works. Na

negociação ficou acertado o pagamento de aproximadamente U$ 3 milhões em ações da

GM e mais U$ 17.279 em dinheiro. A General Motors poderia nomear a maioria dos

diretores no conselho da Olds e, em contrapartida, seus antigos proprietários teriam

direito a dois assentos no conselho da General Motors.

Para trazer a Oldsmobile novamente à lucratividade, Durant foi para a fábrica de

Lansing com um engenheiro e o gerente de produção. Levou também a carroceria de um

Buick Modelo 10, um veículo de passeio compacto, para quatro passageiros e sucesso de

vendas à época. Durant ordenou que serrassem a do veículo da Buick em quatro partes,

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cortando ao meio a carcaça de pára-choque a pára-choque, e também de uma lateral a

outra. Assim, o protótipo da Oldsmobile foi montado mais largo e mais comprido do que o

Modelo 10. A Oldsmobile pasou a ter em sua linha de veículos grandes e caros um

modelo mais barato e atraente, porém maior do que o Modelo 10, a ponto de não interferir

nas vendas da Buick. As intervenções de Willian Durant na Oldsmobile pareceram surtir

efeito, a produção cresceu de 1.055 unidades em 1908, para 6.575 em 1909, primeiro ano

sob o guarda-chuva da General Motors.

Em janeiro de 1909, o conselho de diretores da General Motors autorizou a

aquisição de metade das ações da Oakland Motor Car Company. A Oakland havia sido

criada em 1907 por Edward M Murphy, um bem sucedido fabricante de carroças em

Pontiac, Michigan, que, ao ver a iminente substituição dos veículos de tração animal pelo

automóvel, resolveu lançar-se na nova indústria. Quando Willian Durant chegou para

comprar a empresa, a Oakland enfrentava dificuldades com a produção de um veículo de

quatro cilindros que em 1908 vendeu apenas 278 unidades. Com 50% das ações da

empresa adquirido com o pagamento em ações da GM, a Oakland entrou para a holding

de Durant. Pouco depois da aquisição, Edward Murphy faleceu, e Lee Dunlap, número

dois da Oakland desde a época em que fabricava carroças, assumiu como gerente geral

da empresa. Durant desenvolveu na Buick, Oakland e Oldsmobile uma maneira de

comandar as empresas sob a alçada da General Motors, que viria a replicar nas outras

unidades absorvidas pela holding. Normalmente, o fundador da GM mantinha boa parte

dos gestores e das práticas das empresas adquiridas, pouco ou nada exigia em termos de

índices de desempenho ou sistemas de gestão, entretanto centralizava todas as grandes

decisões em suas mãos. O depoimento de Dunlap, gerente da Oakland, sobre a

construção de uma nova fábrica em 1910 ilustra a relação de Durant com as empresas da

General Motors:

Quando o Sr. Durant visitava uma de suas plantas era como a visita de um ciclone. Ele

conduzia o staff para dentro, tirava seu casaco, começava a deliberar ordens, ditar cartas

e ligar para os confins do continente ao telefone; conversando a sua maneira rápida e

fácil com Nova York, Chicago, São Francisco. Este tipo de coisa era menos comum

antes do que é hoje, colocando a maioria de nós curvada a seus pés. Apenas a mais

fenomenal memória poderia cumprir com todos os acordos; ele trabalhava tão rápido que

o registro das coisas estava sempre correndo atrás.

Nesta visita que estou pensando, no início de 1910, eu esperava que ele ficasse vários

dias enquanto discutíamos todo o assunto da expansão da planta. Mas depois de

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poucas horas, Sr. Durant disse, “bem, partiremos para Flint.” Com desânimo eu o levei

para uma rápida inspeção pela planta. Instantaneamente ele concordou que teríamos

que construir e me pediu para ir a Flint e levar os planos de expansão no dia seguinte.

Não havia qualquer plano e nenhum podia ser desenhando em tão pouco tempo, mas

sua vontade sendo lei e nossa necessidade sendo enorme, alguma coisa tinha que ser

feita.

Então eu convoquei dois desenhistas para ajudar-me e naquela noite nós fizemos um

layout de fábrica como um brinquedo – prédios existentes em uma cor, prédios

desejados em outra. Desenhamos um mapa de toda propriedade, mostrando ruas e

linhas de trem, e daí colamos os prédios existentes nos seus exatos lugares. Sentindo

como um garotinho com um novo brinquedo, eu levei este layout para Flint e com certo

medo coloquei-o diante do chefe. Eu não precisava ser avisado do amadorismo de

nosso layout. Ele ficou satisfeitíssimo. Passamos um ótimo momento encaixando no

quadro os novos prédios que estavam espalhados sobre sua mesa. Colocamos esses

prédios primeiro aqui, depois ali, debatendo a situação. Quando concordamos em onde

deveriam ficar, ele disse, “colem as peças e chamem W. E. Woods”

O Sr. Woods chegou minutos depois e recebeu a ordem de iniciar a construção. Em toda

a história da América, até aquele momento, prédios nunca tinham sido levantados tão

agilmente quanto aqueles. Empreiteiro, Woods teve homens, materiais e máquinas se

movendo em direção a Pontiac dentro vinte e quatro horas e nós estávamos instalando o

maquinário em parte das estruturas em três semanas. Mas, obviamente, não

conseguíamos ser igualmente ágeis para pagá-los. Isto era outro assunto. Mas, naquela

época, nenhum de nós se preocupava demais com isso, pensávamos que o “pequeno

camarada” encontraria dinheiro em algum lugar. O que ele de fato fez no final, embora

saibamos que houve muitos problemas antes das contas serem recebidas.

Estes primeiros anos no negócio automotivo foram marcados pela tremenda atividade

pessoal e uma muito grave falta de capital. Qualquer um que fosse direto da fabricação

de carroças para fabricação de automóveis poderia ter pouca noção do enorme uso de

capital requerido no novo campo. (POUND. A, 1933, p 96-96)

As duas primeiras marcas adicionadas à General Motors além da Buick não foram

empresas que contribuíram imediatamente com o caixa. Ambas enfrentavam dificuldades

e, a despeito do valor dos ativos que traziam consigo, ainda levaram um tempo para se

estabelecer. Desta forma, a Buick continuava sendo o pilar de sustentação da Holding. A

primeira aquisição de uma empresa que crescia e apresentava bons resultados

financeiros foi a da Cadillac. Fundada em 1902 por Henry Leland, considerado um grande

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inventor e mestre da precisão, a Cadillac Automobile Company rapidamente conquistou

seu espaço com um veículo de alta qualidade. Em 1908, legitimou sua reputação ao

tornar-se a primeira empresa norte-americana a ganhar na Inglaterra o Dewar Trophy,

importante premiação internacional para contribuições ao automóvel, com seu sistema de

peças intercambiáveis. Durant iniciou as conversas com Wilfred Leland, irmão de Henry,

em 1907, contudo a negociação se desenrolou até julho de 1909, quando finalmente

Durant foi capaz de levantar os recursos suficientes para a transação. Concluída a

compra, paga novamente com ações da GM, ele convidou os Irmãos Leland para

continuarem à frente da empresa. H. Leland respondeu que ficaria somente se os

princípios e padrões que havia estabelecido permanecessem. Isso era exatamente a

forma como Durant pretendia.

A General Motors mantinha em seu líder o centro para a tomada das principais

decisões. William Durant passou os anos de 1909 e 1910 em uma frenética missão de

aquisição de empresas. Em dois anos, a GM adicionou à holding 25 empresas. Neste

período, ele reuniu 11 fabricantes de veículos (caminhões e carros), sendo, na maioria

das vezes, pequenas empresas adquiridas pelo corpo de engenharia que possuíam, por

suas patentes ou por algum novo dispositivo que nelas vinha sendo desenvolvido. Este foi

o caso da Cartercar, que tinha patentes que poderiam se tornar valiosas, enquanto as

tecnologias de transmissão seletiva e motor a fricção ainda disputavam a hegemonia.

Outras empresas eram fabricantes de partes e peças do automóvel, e duas eram

fabricantes de lâmpadas. As empresas de autopeças foram adquiridas primordialmente

para assegurar o fluxo de material para as plantas de automóveis e também de

caminhões. Foi o caso da Champion Ignition Company, que deu origem à AC Spark &

Plug, criada por Albert Champion, um ex-fabricante de bicicletas e piloto de automóveis,

que a convite de Durant mudou-se para Flint juntamente com sua empresa de velas

automotivas. Abaixo segue a relação de empresas que compunham a General Motors e a

cidade em que se localizavam:

Quadro 4-1 Empresas integrantes da General Motors Company, em 1910 Empresa Localidade

Buick Motor Company Flint, MI W.F. Stewart Company plant number 4 Flint, MI Olds Motor Works Lansing, MI Seager Engine Works Lansing, MI Oakland Motor Car Company Pontiac, MI Marquette Motor Company Saginaw, MI

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Cadillac Automobile Company Detroit, MI Michigan Motor Casting Company Flint, MI Randolph Truck Company Flint, MI Champion Ignition Company Flint, MI Reliance Motor Truck Company Osowo MI Rainier Motor Company Saginaw, MI Welch Motor Car Company Pontiac, MI Welch Detroit Company Detroit, MI Jackson-Church-Wilcox Company Jackson, MI Michigan Auto Parts Company Detroit, MI Rapid Motor Vehicle company Pontiac, MI Cartercar Company Pontiac, MI Ewing Automobile Geneva, OH Elmore Manufacturing Company Clyde, OH Dow Rim Company New York City Northway Motor & Manufacturing Company Detroit, MI Bedford Motors Company London, England National Motor Cab Company Novelty Incandescent Lamp Company Heany Lamp Company York ,PA Brown-Lipe-Chapin Company Syracuse, NY Oak Park Power Company Flint, MI

Outras empresas não foram adicionadas nesta época ao grupo que Willian Durant

construía por ele não encontrar recursos financeiros suficientes para levar adiante a

aquisição. Tentou novamente negociar com Henry Ford para colocar a marca mais

popular do mercado dentro de seu projeto de consolidação da indústria. As negociações

entre Durant e Ford avançaram ao ponto de acertarem em U$ 8 milhões o valor da

empresa. Até a forma de pagamento esteve estipulada: U$ 2 milhões em dinheiro e o

restante em ações da GM. O negócio emperrou quando Durant, após ter a aprovação do

conselho da General Motors, não encontrou bancos dispostos a financiar a operação.

Além disso, algumas empresas tiveram apenas parte de seu controle adquirido. A

Weston-Mott, fabricante de eixos, a qual, em 1905, Durant havia persuadido a mudar-se

para Flint, finalmente colocou um pé dentro da holding em 1910, quando 49% de suas

ações foram compradas. Outro caso foi a fundação da McLaughlin Motor Car Company

Ltd., no Canadá, em 1910. Sucessora da McLaughlin Carriage, empresa licenciada para a

produção de carroças da D&D, a McLaughlin Motor Car tinha 42% de suas ações

pertencentes à Buick e ficou responsável por representá-la no país vizinho.

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Ao seu estilo, William Durant se transformou em um dos ícones da indústria

automobilística. O criador da General Motors era admirado por muitos dentro e fora do

setor. As descrições sobre ele freqüentemente o caracterizam como um gênio, visionário,

uma pessoa capaz de vender qualquer produto ou qualquer idéia em que acreditasse.

Atribuíam a Durant a imagem de um homem de negócios generoso, íntegro e leal às suas

empresas. Por outro lado, pessoas próximas a ele relatam também um homem que

sobrecarregava seu tempo e centralizava o poder, deixava todos sempre à sua espera,

era excessivamente casual em suas decisões e menosprezava a aplicação de

ferramentas de contabilidade, orçamento e medidas de controle.

Em 1910, o império que Durant construía viveu os sinais de sua primeira grande

ameaça. A rápida expansão realizada pela General Motors consumiu os recursos

financeiros que a empresa e seu comandante possuíam. As empresas integrantes do

grupo exigiam capital para girar seus negócios, expandir plantas, desenvolver novos

modelos. Durant seguia sua caçada por aquisições e causou desconforto no conselho da

GM ao anunciar o início de negociações para comprar a Willys-Overland, em um

momento em que a escassez de recursos era evidente. Em maio de 1910, obras de uma

planta da Buick foram suspensas, demissões se tornaram crônicas em Flint e o

pagamento de salários enfrentava dificuldades. Em uma ocasião, o distribuidor Harry

Noyes enviou de Boston o dinheiro em espécie para o pagamento da folha. Noyes

também coletava o dinheiro da Buick para a despesa de pessoal e depositava em sua

conta particular para que não fosse gasto em outra despesa. Até mesmo a Cadillac, que

mantinha uma gestão mais conservadora e contribuiu, em um ano, com um lucro de U$ 2

milhões, foi salva por um empréstimo de emergência no valor de U$ 500 mil, horas antes

de pagar seus empregados. A falta de controle passou a ser notada por alguns agentes

do mercado financeiro, uma vez que não havia um sistema contábil central. Além disso,

alguns financistas se assustavam com as projeções de Durant de que a produção nos

Estados Unidos atingiria 300 mil veículos, quando em 1909 havia sido de 76 mil. Para

alguns banqueiros conservadores, a indústria do automóvel seria somente uma febre de

um brinquedo, mais sofisticado do que a bicicleta havia sido.

Em 19 de setembro de 1910, o conselho de administração da General Motors

admitiu não haver um registro confiável que atestasse qual era a dívida da empresa. Para

tentar reverter a situação da falta de crédito, Durant distribuiu folhetos para divulgação de

títulos de dívida da General Motors em Nova York, comparando a variação dos preços de

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seus papéis com os de outras empresas, como General Electric, US Steel e International

Harvester. Ele também fez apelos aos acionistas para não venderem suas ações,

anunciando que grandes coisas aconteceriam para alavancar seus preços. Mas em 25 de

setembro de 1910, Durant e os principais executivos da General Motors se reuniram com

uma comissão de Bancos Credores, em Nova York, para tratar da situação financeira em

que a empresa se encontrava.

A reunião começou com todos os representantes dos bancos, um a um,

discursando sobre a insustentabilidade da situação e da impossibilidade de ampliar o

crédito para a General Motors. Durant replicou que a empresa necessitava de U$ 15

milhões em empréstimos e passou para a apresentação das finanças da Buick. Apesar do

crescimento nas vendas da Buick, as projeções de ganhos não eram suficientes para

evitar o aumento no endividamento, fato que não soou bem para o grupo credor. Ao final,

os bancos pediram para que Wilfred Leland apresentasse a situação da Cadillac. Leland

conseguiu mudar a perspectiva do grupo que o assistia. Mostrando uma empresa

altamente rentável, com uma gestão mais conservadora, W. Leland e a Cadillac foram

capazes de fazer os banqueiros repensarem a insolvência da GM.

A reunião fez uma pausa até o próximo dia, porém, durante o intervalo uma

comitiva de cinco representantes dos bancos convidou W. Leland, e não Durant, para

uma conversa reservada. Na ocasião, os bancos revelaram a Leland que acreditavam na

possibilidade de salvar a General Motors. Após o primeiro ano de operação, a holding

havia faturado U$ 29 milhões, com um total disponível para dividendos de U$ 9 milhões.

No ano corrente, as receitas estavam por dobrar mesmo com o número de empregados

reduzindo de 14.250 para 10.000. A perspectiva de lucro fez com que o capital já

emprestado às empresas do grupo, mais os U$15 milhões solicitados por Durant,

parecessem uma aplicação financeira aceitável desde que algumas condições pudessem

ser controladas.

No dia seguinte, os bancos apresentaram seus termos, oferecendo um limite

autorizado de U$ 20 milhões para emissão de títulos a 6%, com um prazo de cinco anos.

Como parte do acordo, ações da General Motors seriam entregues aos bancos, dando ao

grupo credor total controle sobre a holding durante o período do empréstimo. Não vendo

outra alternativa para salvar sua empresa da concordata, William Durant engoliu seu

orgulho e aceitou as condições impostas pelos representantes dos bancos. O contrato de

empréstimo foi assinado em 11 de novembro de 1910, e dos U$ 20 milhões em títulos

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autorizados, a General Motors emitiu apenas U$ 15 milhões. Com isso, o caixa da

empresa recebeu os U$ 12,75 milhões que precisava para tirá-la daquela situação, uma

vez que os títulos foram tomados a 85% do valor.

4.1.3. A gestão dos bancos de 1910 a 1915

O novo conselho formado sob o controle do grupo de bancos credores tomou

posse em 15 de novembro de 1910, tendo James J. Storrow como presidente interino.

Neste dia, diversos membros do conselho de administração e diretores fortemente ligados

a Durant, dentre eles W. Leland (fundador da Cadillac), E. R. Campbell (genro), William

Eaton (presidente da GM), Harry Hamilton, C.R. Hatheway (tesoureiro) e R. S. McLaughlin

(presidente da GM do Canadá), se retiraram e deram lugar aos representantes de

instituições financeiras de Boston, Nova York e Detroit. Willian Durant permaneceu ainda

um grande acionista da empresa e, possivelmente em respeito à experiência que

acumulara no setor automobilístico, não só foi mantido no conselho como também foi

indicado presidente do comitê de finanças. Apesar de mantido, William Durant foi forçado

a se conformar com a drástica redução de um patamar onde possuía poder quase

absoluto para outro no qual se tornou apenas um entre vários que exerciam influência nas

decisões. Mesmo assim, James Storrow acatou a sugestão de Durant para nomear o

novo presidente da Buick e, ainda em 1910, Charles Nash assumiu a função. Nash era o

então presidente da fabricante de carroças D&D, onde havia começado como ferreiro e

era reconhecido por sua grande capacidade de organizar atividades gerenciais.

Com o controle passado para as mãos dos banqueiros, a mudança de direção nas

políticas da General Motors foi imediata. A prioridade deixou de ser o crescimento e a

reaplicação dos recursos e passou a ser o controle das atividades e a eliminação de

ineficiências. A nova orientação se justificava com a finalidade de assegurar à GM a

capacidade de pagamento aos credores. Dentre as primeiras medidas do novo corpo de

executivos, ainda em 1910, destacou-se a decisão de se desfazer das empresas que não

apresentavam perspectivas de lucros e vinham consumindo recursos da holding ao

investirem em desenvolvimento de novos produtos ou em produção.

Durante o período de 1910 a 1915 houve intensa reorganização dos ativos da

General Motors. Empresas com fraco desempenho foram vendidas, absorvidas, fundidas

ou simplesmente tiveram suas atividades encerradas e os ativos liquidados.

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Com a reestruturação, foram vendidas a National Motor Cab Company, a

Randolph Truck Company e a Welch Motor Car Company. O caso da Welch ilustra bem

um lado negativo da política de Durant, de se formar uma carteira de empresas,

colocando um grande número de apostas sob o mesmo interesse, como forma de

diversificar o risco. A Welch possuía um veículo de luxo, desenvolvido pelos irmãos

Welch, e que aos olhos de Durant possuíam grande potencial de se tornar um sucesso,

em 1909. Entretanto, três meses após a aquisição, Frederick Welch, a principal força

motora da empresa, morreu afogado em um lago. Não sendo capaz de encontrar alguém

que o substituísse, a empresa em pouco tempo deixou de ser uma promessa, para se

tornar um peso no caixa da GM.

Algumas empresas com fraco desempenho, apesar terem sido rapidamente

colocadas à venda, não encontraram compradores e após algum tempo tiveram suas

atividades encerradas. Esses foram os casos da Elmore Manufacturing Co., da Ewing

Automobile, Dow Rim Company e da Seager Engine Works.

Na General Motors, o foco passou a ser eliminar o que não era essencial a fim de

assegurar a sobrevivência. Logo no primeiro ano em que os bancos assumiram, o salário

de todos os executivos da GM foi reduzido em 50% do valor. Outro fato importante foi

interrupção do famoso Buick Modelo 10, o mais barato de todos os veículos da GM,

marcando a desistência do mercado de veículos compactos. Esta decisão contrariava as

idéias de popularização do automóvel de William Durant e abriu espaço para que Henry

Ford e o Modelo T dominassem este segmento mais facilmente. Sem o Buick, a Ford

passou da produção de 32 mil veículos em 1910 para cerca de 70 mil veículos em 1911,

enquanto que a Buick reduziu seu volume de 30 mil unidades para pouco mais de 13 mil.

A relação de Durant com a nova filosofia da administração da General Motors não

se sustentou por muito tempo. Para ele, havia sido difícil abrir mão do controle de sua

empresa e, com os bancos no comando, além de suportar contestação de tudo que havia

criado, era obrigado a assistir, quase passivamente, a GM perder oportunidades em um

mercado em vigorosa expansão. Willian Durant permaneceu como vice-presidente da

General Motors e presidente do comitê de finanças até 1911. Sua derradeira participação

nesta primeira passagem foi na liquidação dos ativos da Heany Lamp. Após o fracasso de

mais uma de suas apostas, renunciou às suas atividades gerenciais na GM,

permanecendo apenas como membro do conselho de administração. Em 11 de novembro

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de 1911, Durant foi substituído por J. J. Storrow no comitê de finanças e ficou livre para se

dedicar a novos empreendimentos.

Não obstante o intenso trabalho de eliminação de ativos “fracos” conduzido pelos

controladores, diversas empresas reunidas por Durant mantiveram-se lucrativas,

aproveitando o bom momento da economia norte-americana. Buick, Oldsmobile, Oakland

e Cadillac haviam consolidado suas marcas no mercado. Outras empresas fornecedoras

também dispunham de boa performance econômica, como a A/C Spark & Plug, fabricante

de velas de ignição, a Jackson-Church-Wilcox, fornecedora de caixas de câmbio para a

Buick, a Weston-Mott, que fornecia eixos para parte da indústria, e a Brown-Lipe-Chapin

de Siracusa, Nova York, fornecedora de diferenciais de câmbio. As duas últimas tiveram o

restante de seus ativos comprados pela GM posteriormente.

A GM não se concentrou apenas na limpeza dos ativos, mas também buscou

reaproveitar alguns dos recursos, integrando algumas empresas. Com isso, a Michigan

Motor Company e a Stewart foram incorporadas aos ativos da Buick, da qual já eram

fornecedoras. A Michigan autoparts foi absorvida pela Northway, fabricante de motores e

transmissões para a Oakland e Oldsmobile. As fabricantes de Caminhões Reliance e

Rapid foram fundidas, dando origem a General Motors Truck. Foi fundada a General

Motors Canada, que absorveu a McLaughlin Motor Car Co. E, para as exportações, foi

criada a GM Exports, que centralizou estas atividades antes espalhadas pelas demais

empresas da holding.

A nova administração da GM ainda ampliou os investimentos em algumas das

antigas apostas de Durant, mas que não se concretizaram. A Rainier Motor Company

absorveu os ativos da Marquette Motor Company para fabricação de seu veículo de alto

preço em Saginaw, MI. Em 1911, a GM ainda insistiu na empresa, decidiu comprar o

restante das ações da Rainier e, em seguida, juntou a com a fabricante de peças, Welch-

Detroit, para formar a Peninsular Motor Company. Anos depois, a Peninsular não se

mostrou viável, suas atividades foram encerradas e os ativos absorvidos por outras

empresas da GM. Outra aposta que o conselho decidiu continuar foi a Cartercar. Em

1912, a GM comprou o restante das ações da empresa, mas com a queda na utilização

da friction drive, seu o maior trunfo, o Cartercar se arrastou até 1916 antes de ter suas

operações encerradas e sua planta vendida.

Durante esta reorganização dos ativos da General Motors, foram adotados

procedimentos mais sistemáticos para a tomada de decisão do que a comum

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informalidade utilizada por Durant. Um exemplo destes novos métodos ocorreu na

decisão sobre a remoção do maquinário da Welch-Detroit, de Detroit, para a planta da

Marquette, em Saginaw. Na ocasião, Albert Strauss defendeu o transporte dos

equipamentos pela água, ao descobrir que as duas plantas eram próximas aos portos

fluviais de suas cidades. No entanto, a decisão só foi tomada após a preparação de

relatórios estatísticos comparando as alternativas e demonstrando ser mais barato o

transporte via ferrovia, devido ao alto custo do transporte até o porto.

A orientação adotada pelo conselho da GM também resultou na disseminação de

novas práticas gerenciais nas unidades de negócio. Muitos novos gerentes assumiram as

posições nas empresas e as palavras de ordem eram cortar custos e adotar controles

contábeis. Apesar da grande dificuldade, sobretudo no início, com o tempo e um trabalho

persistente e atento a cada detalhe da operação, os processos de controle das unidades

puderam ser harmonizados, de forma que as empresas que compunham a GM passaram

a dispor de ferramentas e demonstrações contábeis padronizadas.

Ainda no espírito de disseminação da informação, a General Motors circulou pela

primeira vez a Insider, uma das primeiras publicações corporativas existentes. A Insider

passou a ser um importante canal de transmissão da mensagem da GM para seus

empregados, bem como promover certa integração entre diferentes áreas e unidades de

negócio.

Nesta nova fase da GM, muitas pessoas vieram de fora do setor automotivo para

compor os quadros gerenciais. Além de Charles Nash que veio assumir a Buick, dois

meses depois de assumir interinamente a presidência, James J Storrow foi substituído na

por Thomas Neal, então presidente de uma empresa de produtos químicos em Detroit.

Outro que se juntou à GM, para em seguida desenvolver uma carreira de destaque na

empresa e na indústria automobilística, foi Walter Chrysler. Com uma bem sucedida

trajetória como executivo na indústria ferroviária, Chrysler era apaixonado por carros e

aceitou o convite de J. Storrow. Ele deixou o emprego na ferrovia para trabalhar na Buick,

concordando com uma redução de 50% em seu salário.

Mesmo com algumas caras novas, muitos dos que já estavam na GM

permaneceram. George E. Daniels, que havia sido presidente na fundação da GM,

passou pela presidência da Cartercar e, em seguida, assumiu a presidência da Oakland,

no lugar de Lee Dunlap. Outro que permaneceu e teve um papel relevante, foi Henry

Leland. No comando das atividades de pesquisa e desenvolvimento da Cadillac, H.

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Leland persistiu na idéia de desenvolver um sistema de partida elétrica para automóveis.

Com a tecnologia desenvolvida por Charles Kettering, da Dayton Engineering Labs em

1912, a Cadillac lançou seu modelo com partida elétrica, que causou enorme impacto na

indústria, pois atraiu a população feminina para o mercado consumidor de automóveis,

antes afastada pelo rústico mecanismo de partida manual.

Ainda que o foco do grupo controlador da GM estivesse em cortar desperdício e

controlar custos, as atividades de pesquisa e desenvolvimento não foram abandonadas.

Pelo contrário. Contratados pelo presidente J. Storrow, em janeiro de 1911, a consultoria

Artur D. Little Inc. de Massachusetts, aconselhou a criação de um laboratório de pesquisa

e de um departamento técnico que centralizariam os esforços de todas as empresas

dentro da General Motors. O laboratório foi montado em um ano, composto de nove

técnicos e seus assistentes, e os primeiros problemas estudados foram pintura,

lubrificantes, teste de materiais para o departamento de compras e teste de novos

acessórios submetidos à GM. Outras inovações desta época incluem o farol com

acionamento interno, buzina elétrica, roda removível, radiador tipo celular, carroceria

fechada e o primeiro veículo V-8 norte-americano.

Com todos os esforços de redução de custos realizados pelo novo grupo

controlador da GM e um mercado consumidor pujante, rapidamente a empresa recuperou

sua capacidade de pagamento e, conseqüentemente, sua credibilidade nos mercados de

crédito. A presença de grandes agentes financeiros da época, tanto no conselho

administrativo, quanto no corpo executivo da empresa contribuíram para a General Motors

tornar-se a primeira empresa do setor automotivo a emitir ações em Wall Street em 1911.

O resgate do acesso ao crédito fez com que os executivos da GM descobrissem

outra vantagem associada à saúde financeira. O consumidor americano parecia

fortemente influenciado em suas decisões de compra, pela robustez financeira do

fabricante. Especula-se que este comportamento do consumidor estivesse relacionado a

expectativas de garantia de serviços de manutenção, melhor preço de revenda e outras

frustrações anteriores relacionadas à falência do fabricante. Um dado indica que dos

cerca de 300 fabricantes existente nos Estados Unidos em 1910, apenas 50 restavam no

início da Primeira Guerra Mundial em 1914.

Tabela 4-1 Receita e Lucro líquido da GM de 1909 a 1915 (em milhões de dólares) Ano Receita total Lucro líquido

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1909 29,0 9,1 1910 49,4 10,2 1911* 42,4 3,3 1912 66,9 3,5 1913 87,0 7,5 1914 85,3 7,2 1915 121,1 14,5

Fonte: dados estimados a partir de POUND (1934) * O ano de 1911 teve o fechamento antecipado de outubro para julho.

Os esforços para conter a crise, iniciados em 1910, em pouco tempo mudaram

para esforços de crescimento. Ao final de 1911, houve um tímido aumento no número de

funcionários, fechando o ano em 11 mil empregados. O resultado das vendas em 1911

ainda foi de U$ 7 milhões, 15% menor do que no ano anterior, porém os prejuízos

puderam ser contidos, e a GM fechou o primeiro ano sob o controle dos bancos com um

lucro de U$ 3 milhões, quantia meramente suficiente para pagar os dividendos das ações

preferenciais. Nos anos seguintes a GM aumentou a produção, as vendas e o número de

funcionários, com exceção de 1914, quando uma depressão na economia produziu uma

estagnação nas vendas (ver tabela 4-1). No entanto, o crescimento da empresa não

acompanhou o ritmo que a indústria como um todo teve nesta época. Ao desistir do

mercado de veículos de baixo preço, a GM, que em 1910 respondia por 21% da produção

americana, em 1915, apesar do crescimento, obteve apenas 8,5% na participação da

produção norte- americana.

Henry Ford com o Modelo T e sua linha de montagem levou ao extremo os

conceitos da administração científica de Taylor e revolucionou os parâmetros de produção

em massa. Ford acreditava na idéia de um veículo de baixo custo que fosse acessível ao

trabalhador médio americano. Com essa idéia em mente, reduziu drasticamente o custo

de seu veículo, em uma busca incessante para otimizar processos de fabricação. Ford se

tornou uma figura emblemática na historia da indústria, e sua empresa, a grande

concorrente da General Motors. A popularização do automóvel era uma tendência

irreversível que escapou aos olhos do grupo que controlava a General Motors na época,

mas não escapou aos olhos de Durant. Embora não pudesse contar com o apoio da

estrutura da GM, Durant ainda encontrou na cidade de Flint, na D&D Carriage e nos

fornecedores de materiais fontes generosas de recursos, capazes de financiar parte de

seus novos negócios automotivos. Durant criou a Chevrolet Motor Company, empresa

que se transformou no caminho para a sua volta ao controle da GM e para o retorno a GM

ao segmento de veículos compactos.

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4.1.4. O Surgimento da Chevrolet e o Retorno de Durant à GM

Antes mesmo de se desligar das atividades da GM, Durant adquiriu uma antiga

fábrica de motores da Buick, em Flint, e criou inicialmente a Mason Motor Company,

colocando Arthur Mason, autor do primeiro motor de alta compressão da Buick, e vários

outros ex-empregados vindos da Buick para trabalhar em um motor inovador. Logo em

seguida, Durant fundou, em 30 de outubro de 1911, a Little Motor Car Company e, na

mesma fábrica em Flint, começou a produzir o Little runabout, com motor e transmissão

da Mason. Além de Mason, vieram para a Little Motor Car, William H. Little, ex-presidente

da Buick, Charles Begole e William S. Bellenger. O primeiro carro possuía quatro cilindros

e seu preço foi colocado em U$ 650, para competir com o Ford. O veículo até tinha bom

design, mas a potência deixava a desejar. Mesmo assim, no primeiro ano foram vendidas

3.500 unidades.

Enquanto a Little tentava com seu carro, Louis Chevrolet, patrocinado por Durant,

vinha desde 1909 experimentando um modelo de seis cilindros. Dois anos depois,

finalmente desenvolveu o seu Modelo C já em ponto de ser produzido. Com isso, uma

planta foi alugada em Detroit e, em 3 de novembro de 1911, Durant fundou a Chevrolet

Motor Company de Michigan, abrindo lojas em Chicago, Filadélfia e Boston. O Chevrolet

Modelo C teve seu preço estabelecido em U$ 2.500, e as vendas em 1912 ficaram em

torno de 3.000 unidades.

Em 1913, conforme a data do vencimento dos títulos emitidos para os bancos se

aproximava, Durant iniciava seus planos para comprar a GM de volta. O primeiro passo

foi se liberar das atividades gerenciais para se dedicar à campanha de compra de ações.

A gestão de duas empresas, Chevrolet, em Detroit, e Little, em Flint, se mostrou inviável,

pois demandava grande esforço de coordenação. Portanto, em agosto do mesmo ano, a

sede da Chevrolet foi levada de Detroit para Flint e a Little foi incorporada a ela, tendo

A.B.C. Hardy como gerente geral da Chevrolet. Com a venda do terreno reservado para a

Chevrolet em Detroit, Durant comprou uma área em Nova York onde passou a fazer

também a montagem final de parte dos veículos. A fábrica de Nova York, apesar do custo

mais alto, uma vez que os componentes eram despachados de Flint para lá, também

servia como ferramenta de promoção da Chevrolet. As visitas de pessoas e,

principalmente, de financistas ajudavam Durant a conquistar o respeito por sua nova

empresa e assim financiar seu crescimento acentuado.

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Em 1914, a empresa lançou dois novos modelos, um deles foi o Baby Grand

touring car, que passou a ser o maior carro da marca e era vendido a U$ 875, ou seja, U$

25 a mais do que o popular concorrente da época, o Ford Modelo T. O outro modelo foi o

Royal Mail roadster, um veículo para competir em preço, sendo vendido a U$ 750. A

demanda neste ano de 1914 foi alta e, assim sendo, tudo que pode ser produzido foi

vendido à vista, com alta margem, o que permitiu o acúmulo de recursos. Neste ano,

Durant chegou a anunciar a produção de 25 mil unidades, quando a capacidade da

fábrica era de apenas 5 mil.

Adotando a gravata borboleta como símbolo da marca, a Chevrolet passou a

expandir seus escritórios de vendas e fábricas para outros estados norte-americanos

utilizando-se de uma estratégia de parcerias com capital local para financiar as novas

unidades. Desta forma, Durant inaugurou escritórios na Califórnia, em Kansas City e em

Atlanta. Em uma parceria com Russell Gardner, passou a montar os modelos da

Chevrolet em Saint Louis e o mesmo ocorreu com os já conhecidos McLaughlin, pai e

filho, no Canadá. Além disso, com um empréstimo do Chatham and Phoenix Bank, de

Detroit, e do Marquette National Bank, de Nova York, ambos presididos por seu novo

aliado Louis Kauffman, William Durant comprou também a planta da Maxwell Motor

Company, em Tarrytown, NY, e, com isso, rapidamente alcançou uma produção com

distribuição nacional.

No primeiro dia de 1915, a Chevrolet lançou um novo modelo compacto para

competir com a Ford naquele ano. O Modelo T básico da Ford, que vinha sem pára-brisa,

medidores de velocidade ou de combustível e até sem portas, tinha o preço de U$ 490 na

porta da fábrica. A Chevrolet deu nome e preço ao seu novo modelo exatamente de “490”,

que vinha com a vantagem do sistema de partida elétrica da Cadillac. A resposta de Ford

foi imediata, abaixando o preço do Modelo T para U$ 440. Mesmo assim, o resultado nas

vendas para a Chevrolet nos primeiros seis meses foi considerado fantástico. Em junho

do mesmo ano, havia 46.611 pedidos colocados por distribuidores, já assegurados com

depósitos em dinheiro.

O rápido crescimento da Chevrolet culminou com uma posição financeira

extremamente positiva no relatório apresentado em julho de 1915, ano de vencimento dos

títulos que davam o controle da GM aos bancos. Com um lucro de quase U$ 15 milhões

no ano e com uma disponibilidade de caixa superior a esse valor, William Durant

continuou aplicando os recursos gerados pela Chevrolet na compra das ações da GM. Os

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preços das ações da GM foram aumentando significativamente durante a implementação

do plano de Durant, e ainda assim ele continuava comprando, não importava o preço. De

uma alta de U$ 40 e uma baixa de U$ 25, em 1913, as ações da General Motors

passaram para uma alta de U$ 99 e uma baixa de U$ 37, em 1914, chegando à alta de

U$ 558 e à baixa de U$ 82, em 1915.

Com a proximidade da reunião dos acionistas da GM em setembro de 1915,

William Durant começou a reunir ações e aliados para consolidar sua posição de detentor

do controle da GM. Durant, que nunca havia vendido as ações que possuía desde a

fundação da GM, trouxe para seu lado familiares, velhos amigos e parceiros de negócio

que também detinham parte da empresa, além de contar, obviamente, com todas as

ações da GM na tesouraria da Chevrolet.

Neste processo, é destacável a relação de confiança entre Durant e seus

parceiros. Primeiramente, detentores das ações da GM atenderam às indicações de

Durant para não vendê-las. Mesmo vendo uma tremenda valorização no mercado,

confiaram em sua proposta de ganhos ainda maiores com a troca das ações da GM pelas

da Chevrolet na base de 1:5. Em segundo lugar, a entrega das ações da GM a Durant foi

feita sem qualquer outra garantia além de sua palavra. A Chevrolet Motor Company, de

Delaware, foi organizada especialmente para realizar a troca das ações da GM pelas suas

próprias. No entanto, esta só foi incorporada em 23 de setembro, ou seja, sete dias

depois da reunião do conselho da GM, quando Durant já possuía todas as ações em

mãos.

Na reunião de 16 de setembro para eleição do conselho de administração da

General Motors, Durant entrou na sala do Hotel Belmont, em Nova York, confiante e

acompanhado de outros acionistas da GM, como Louis Kauffman, Dallas Dort e

McLaughlin. Com o desenrolar da reunião, ele anunciou que naquele momento detinha o

controle da General Motors. O conselho da GM, à época, era composto em sua maioria

por representantes indicados por bancos credores e naturalmente se opôs à reivindicação

de Durant. O conflito foi amenizado, evitando uma disputa judicial, com a indicação de

Pierre Samuel du Pont para presidir uma comissão que se encarregaria de mediar e

encontrar uma solução para o impasse, além de nomear um novo conselho de

administração.

Pierre S. du Pont era membro da família Du Pont, proprietária da E. I. Du Pont de

Nemours, tradicional empresa fabricante de pólvora que, com o estouro da Primeira

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Guerra Mundial na Europa, expandia sua produção para atender à demanda dos países

aliados. Pierre S. du Pont, aconselhado pelo tesoureiro da Du Pont, John J. Raskob,

adquiriu ações da GM e, ao que se sabe desavisado da iminente disputa pelo controle da

empresa, decidiu atender ao convite para participar da reunião dos acionistas. Pierre S.

du Pont, foi nomeado para presidir a comissão por ser considerado neutro e por possuir

notória experiência nos negócios. A comissão foi composta ainda por John Raskob e

Henry Berlin, primo e cunhado de du Pont.

Na mesma reunião do dia 16 de setembro, foi decidida a distribuição de dividendos

aos acionistas. Pela primeira vez, desde que os bancos haviam assumido o controle, a

GM pagou dividendos às ações ordinárias. A GM desembolsou $ 50 por ação, em um

montante que foi o maior da história de uma empresa de Wall Street até então. Como

detentora da maioria das ações, a Chevrolet foi a maior beneficiada, para o alívio de

credores e acionistas que viram suas contas novamente equilibradas com a injeção de

recursos, recuperando-se do grande esforço de caixa decorrente da campanha de compra

de ações de Durant. O novo conselho de administração, indicado pela comissão de Pierre

du Pont, foi eleito em 16 de novembro de 1915. Na composição de seus dez integrantes,

quatro assentos foram dados a Durant e seus aliados em nome da Chevrolet, três

integrantes, incluindo o presidente da GM, Charles Nash, vinham do lado dos bancos e

outros três eram do interesse de Pierre du Pont que também foi indicado para assumir a

presidência do conselho da empresa. Com a coalizão entre Willaim Durant e Pierre S. du

Pont, o estratagema que norteou a criação da Chevrolet se concretizava e Durant, com

sete dos dez conselheiros retomava o controle sobre a General Motors.

Apesar de a Chevrolet ter alcançado importantes resultados em uma velocidade

espantosa, seu tamanho em relação a General Motors, em 1915, ainda era pequeno e

tornou a realização dos planos de Durant um feito extraordinário. É possível que a

realização de Durant só tenha ocorrido devido a certa desatenção, desdém ou

desarticulação do grupo de bancos credores. Dos U$ 15 milhões em títulos que garantiam

o controle acionário, apenas U$ 2,3 milhões restavam ser pagos em meados de 1915, ou

seja, a participação nas ações da GM reduziu com o passar dos anos. Apesar do esforço

realizado por Durant para levantar recursos e comprar ações, o grupo de credores era

composto de alguns dos maiores investidores da época e, portanto, possuía uma

capacidade de financiamento amplamente superior a de seu oponente. O fato é que o

grupo de credores só se mobilizou quando se aproximou a data para a eleição do novo

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conselho. No início de 1916, uma circular foi assinada por oito diretores posicionando-se

contrários a cessão do controle à Chevrolet, um desses diretores era Charles Nash. Após

a circular, um significativo número de acionistas assinou em favor da criação de um novo

grupo gestor. Dentre eles, sete casas de investimentos de Boston, Nova York e Detroit,

além de Charles Mott (fundador da Weston-Mott e prefeito de Flint). Mas Durant estava

em vantagem neste momento. Sua manobra propondo a troca de ações da Chevrolet

pelas da GM fez com que muitos de seus oponentes vendessem seus títulos.

Em março de 1916, a renúncia de James Storrow e de dois outros membros do

conselho marcou a desistência do grupo de bancos de retomar o controle da GM. Charles

Nash, então presidente, pediu demissão em 18 de abril e ficou no cargo até 27 junho,

quando William Durant foi eleito presidente da General Motors.

4.1.5. Primeira Guerra Mundial, retomada da expansão e o fim da era Durant

A retomada do controle da General Motors teve grande repercussão na imprensa

norte-americana. William Durant foi aclamado por sua astúcia, agilidade, visão e

capacidade de realização. Sua luta foi comparada à de Davi contra Golias, e a vitória

afetou positivamente o valor da General Motors no mercado financeiro. Em uma semana,

o preço da ação saiu de U$ 340 para U$ 558. O ano de 1916 foi de forte crescimento para

a indústria, e a General Motors aproveitou para ampliar seu volume de vendas. A

produção totalizou 165 mil carros e 6 mil caminhões, com a participação de mercado

aumentando de 7% para 10%. Adicionalmente, a Chevrolet, que ainda não fazia parte da

Holding, produziu cerca de 70 mil unidades. Apesar do desempenho animador, a GM

ainda assistiu a Ford se distanciar na posição de maior da indústria. Com o Modelo T, a

Ford foi responsável por 50% dos veículos vendidos. Ao final de 1916, as empresas que

formavam a holding General Motors Company foram transformadas em uma única

empresa, a General Motors Corporation, com cada empresa do grupo tornando-se uma

divisão. A mudança de holding para uma empresa operacional não chegou alterar a

dinâmica interna das divisões, que continuaram sendo responsáveis por suas decisões

gerenciais.

O período de expansão da indústria nos Estados Unidos entre 1914 e 1919 esteve

fortemente ligado ao contexto mundial da época. Pouco antes de Durant retomar o poder

na GM, em 1914, teve início na Europa a Primeira Guerra Mundial. A escassez na oferta

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mundial produziu aumento nos preços de muitos produtos e materiais, embora não tenha

chegado a impedir o suprimento de matéria-prima à indústria americana. A forte demanda

da Europa fez aumentar a produção nos Estados Unidos e contribuiu para o crescimento

da renda do trabalhador americano, impulsionando também as vendas de veículos. Com

a entrada dos Estados Unidos para o lado dos Aliados, em 1917, o governo passou a

estabelecer controles sobre o fluxo de materiais como forma de assegurar suprimentos ao

esforço de guerra. Mesmo assim, a demanda por automóveis seguiu expandindo,

puxados pelo crescimento econômico que as próprias compras do governo geravam.

A General Motors não aderiu imediatamente ao esforço de guerra e, quando o fez,

foi de forma tímida, tal como sua principal concorrente, a Ford. De acordo com Madsen

(1999), a adesão da GM à fabricação de produtos para o uso militar foi motivo de

controvérsias entre Durant e os Leland (Henry e Wilfred), no comando da Cadillac. Henry

Leland insistiu para que a GM contribuísse com os aliados fabricando aviões, enquanto

Durant resistia à idéia de desviar recursos para o esforço de guerra. Apesar das

animosidades, H. Leland persistiu e conseguiu um contrato com o governo para o

fornecimento de 10 mil motores liberty para aviões e iniciou sua produção em uma nova

fábrica em Nova York. A insistência dos Leland com os aviões levou-os a serem demitidos

por Durant. A relação entre Durant e Leland posteriormente ainda foi agravada, quando

uma comissão do Senado questionou atrasos nas entregas dos motores liberator. Os

depoimentos de Henry e Wilfred Leland tornaram públicas as opiniões de Durant,

contrárias ao envolvimento da GM com a guerra.

A hesitação de Durant e da GM se refletiu nos números finais sobre a participação

da empresa no suprimento aos militares durante a guerra. A General Motors declarou que

18 de suas 23 unidades operacionais estiveram envolvidas em contratos de produtos de

defesa, entretanto, a quantidade de motores e veículos vendidas ao governo foi

inexpressiva quando comparada aos volumes da empresa. No biênio 1917-1918, a GM

produziu, para fins militares, 5.000 ambulâncias, 2.350 carros oficiais, 1.157 motores para

tratores e, no caso dos motores liberty, fabricou 2.528, antes de ter o contrato de 10 mil

motores suspenso. A produção para fins civis, no mesmo período, foi superior a 500 mil

automóveis (incluindo a Chevrolet que operou separadamente em 1917). A GM ainda

deixou de participar de um grande contrato do exército americano para o fornecimento de

11.000 caminhões, aproximadamente metade do volume que havia sido produzido por

toda indústria antes da guerra.

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Mesmo não aproveitando plenamente as oportunidades originadas pela Primeira

Guerra e ainda com a produção sofrendo restrições das agências do governo, a GM deu

continuidade em sua expansão por meio de aquisições. Nesta segunda fase de Durant à

frente da empresa, as aquisições de novos fabricantes de automóveis se tornaram raras.

Somente duas pequenas marcas foram adquiridas, a Scripps-both, em 1918, e a

Interstate Motor Company, em 1919, porém nenhuma efetivamente emplacou seus

modelos no mercado.

Importantes aquisições deste período seguiram o caminho da integração vertical

sobre a cadeia de fornecedores, tendência que também ocorria de forma intensa na

concorrente Ford. Com o apoio do banqueiro Louis G. Kaufman, William Durant

organizou, em 1916, a United Motors Corporation, com o objetivo de consolidar as

empresas fabricantes de autopeças e assegurar os estoques e o suprimento de

componentes, atendendo além das fábricas, a reposição de peças nas ramificações da

GM em todo o território americano. Foram adquiridas no mesmo ano a New Departure

Manufacturing Co (esferas metálicas), a Hyatt Roller Bearing (rolamentos), a Remy

Electric Company (ignição elétrica), a Dayton Engineering Laboratories Co – Delco

(sistemas elétricos e laboratório de pesquisa), e a Perlman Rim (rodas). Alfred P. Sloan,

então dono da Hyatt Roller Bearing, foi nomeado presidente da United Motors. Seu

conselho foi formado pelos antigos proprietários das companhias adquiridas que também

eram sócios na nova empresa, pois haviam recebido parte do pagamento em ações,

assim como Sloan.

Em sua biografia, Sloan (1963) relata que as decisões da United Motors eram

deixadas inteiramente a cargo dele. Não havia qualquer interferência de William Durant

sobre a gestão da nova empresa. Com isso, a United Motors adquiriu e integrou às suas

divisões a Harisson Radiator Corporation e a fabricante de buzinas Klaxon Company. As

peças produzidas por essas divisões da United Motors eram vendidas para a toda

indústria automobilística e não só para a GM. Este nível de autonomia seguiu até 1918,

quando a GM decidiu absorver toda a produção da United Motors. Para tornar a United

Motors uma divisão da GM, John Raskob, presidente do comitê de finanças, negociou a

troca de ações com os demais sócios da United Motors. Alfred Sloan foi mantido no

comando da United Motors dentro da GM, recebendo o cargo de vice-presidente da GM e

sendo nomeado membro do comitê executivo.

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Pouco antes da incorporação da United Motors, ainda em 1918, a GM havia

passado também a Chevrolet para dentro de sua estrutura. A divisão Chevrolet se tornou

a quinta marca de automóveis relevante da empresa, juntamente com Buick, Cadillac,

Olds e Oakland. Na preparação para a absorção, a Chevrolet passou a comprar a

participação que investidores locais possuíam em algumas de suas subsidiárias, como as

fábricas de montagem de Oakland, Califórinia e Saint Louis, Missouri. Em 2 de maio,

realizando uma troca de ações extremamente vantajosa para os acionistas da Chevrolet,

a GM absorveu seus ativos, dentre eles outras empresas que haviam sido adquiridas por

Durant, como a Samson Tractors (tratores), a National Cycle Company, a National Truck

Motor Company e a Warner Gear Company (fabricantes de autopeças).

A idéia do término do armistício na Europa e a liberação da atividade industrial nos

Estados Unidos estimulou uma importante movimentação dentro da General Motors.

Segundo Chandler (1964), William Durant via no fim da Primeira Guerra o sinal de partida

para que a indústria desenvolvesse todo o potencial do mercado. Para financiar seu plano

de expansão Durant procurou um parceiro que contribuísse para a injeção do capital e

convidou du Pont para este papel. Na mesma época, a E.I Du Pont de Nemours, empresa

fabricante de pólvora e explosivos, via no provável fim da Primeira Guerra a necessidade

de aplicar, em outras atividades, os recursos que havia lucrado com o armistício. Em 10

de dezembro de 1918, após autorização dos conselhos de ambas as empresas, o capital

da General Motors foi ampliado, e a Du Pont adquiriu 23% das ações ordinárias. A

participação da Du Pont no capital da GM ainda veio a ser ampliada por duas vezes, em

1918 e 1919, alcançando 28,5%. Com maior participação da Du Pont, os dois principais

comitês da GM foram divididos entre os dois grandes acionistas. John Raskob, tesoureiro

de Pierre S. du Pont, presidia o comitê de finanças, no qual Durant tinha direito a um

assento. Willian Durant presidia o comitê executivo e du Pont também tinha direito a um

assento.

Se a General Motors aumentou suas operações e o seu capital, o número de

empregados também cresceu. A GM havia passado dos cerca de 10 mil empregados que

permaneceram na GM durante a crise de 1910 para 14 mil em 1914. Com o retorno de

Durant, a GM fechou o ano de 1916 com mais de 25 mil funcionários. Em 1918, quando o

número ultrapassou 49 mil pessoas, a GM implantou um programa de distribuição de

bônus como forma de incentivo aos empregados.

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Relatos contam que a versão preliminar do programa de bônus da GM ocorreu em

1917, com 56.855 ações preferenciais que restaram da criação da GM Corporation e que

foram distribuídas em reconhecimento às pessoas que prestaram grandes contribuições à

empresa. A partir do ano seguinte, o programa de bônus passou a ser oferecido de forma

sistemática, de modo que 10% dos lucros compunham um fundo que era distribuído aos

funcionários em duas categorias: Sênior Awards para os que recebiam acima de U$

2.400; e Junior Awards para os outros os empregados da empresa. No primeiro ano,

3.884 bônus foram distribuídos.

A preocupação com remuneração e satisfação dos empregados na indústria

automobilística já havia sido manifestada por outra empresa antes desta ação da GM.

Henry Ford, em 1914, em um programa de divisão de lucros e com o intuito de dar melhor

qualidade de vida aos seus empregados, aumentou o salário de seus operários de U$ 2

para U$ 5 por dia e ainda reduziu a jornada para oito horas diárias. Segundo o

depoimento de John Lee, à época responsável pela criação do programa, dentre os

objetivos de tal medida estavam: prover melhores condições de vida e de saúde para que

os funcionários apresentassem melhor desempenho na linha de montagem e, também,

atrair os melhores operários para as frentes de trabalho da Ford.

No caso da Ford, para o plano tornar-se viável, pelo menos duas condições foram

cruciais, ambas derivadas da padronização e sistematização dos processos produtivos de

seu sistema de produção em massa. Uma condição foi a imensa vantagem em custo

obtida, que provia ampla margem de contribuição para ser distribuída aos stakeholders.

Além disso, a produção em massa também possibilitou a uniformização da mão-de-obra,

de modo que as diversas categorias de trabalhadores qualificados, semi-qualificados e

não qualificados praticamente se transformaram em uma grande classe semi-qualificada e

um pequeno corpo de supervisores. Comparativamente, o sistema produtivo da General

Motors era caracterizado pela divisão do processo de produção em áreas ou oficinas de

trabalho. Segundo Chandler (1964), neste tipo de sistema havia mestres ou encarregados

de produção, pessoas mais experientes e conhecedores da operação, que possuíam

parte significativa da responsabilidade de contratar, treinar e decidir sobre a remuneração

em determinado setor. O sistema utilizado pela GM era adotado de forma generalizada na

indústria e a diversidade de categorias de operários e de níveis de salários que esse

sistema produzia dificultava eventuais tentativas de se equiparar ao patamar salarial

adotado pela Ford.

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Apesar da repercussão que as medidas da Ford produziram entre empresários e

na mídia, não se viu grandes conseqüências para as demais empresas, possivelmente

devido às implicações da Primeira Guerra Mundial. Alguma movimentação da GM no

mesmo sentido ocorreu somente em fevereiro de 1919. A GM encomendou um amplo

estudo sobre as condições sociais de seus empregados, com o intuito de orientar as

ações da empresa para prover melhores condições de vida aos operários nas diversas

cidades norte-americanas em que possuía operações produtivas. Como resultado deste

estudo, foi criado um programa habitacional de grande escala que iniciou a construção de

casas para os empregados em todas as cidades onde a GM estava presente. Além disso,

a GM criou dois fundos de aplicação para funcionários, um de investimentos nas próprias

ações da GM e outro de poupança com remunerações pré-fixadas - ambos os fundos

possuíam uma contrapartida da empresa para cada dólar aplicado pelo empregado.

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, a economia americana viu seus recursos

serem liberados e o consumo no país avançar rapidamente. Em 1919, a General Motors

reagiu imediatamente ao fim das restrições à produção e colocou em prática um amplo

plano de expansão. Os projetos incluíam a ampliação da capacidade produtiva de todas

as unidades de negócio, em alguns casos dobrando a capacidade do ano anterior. A GM

também expandiu os prédios administrativos de suas divisões e iniciou a produção de um

grande edifício em Detroit, o Durant Building, que posteriormente passou a chamar-se

The General Motors Building e abrigaria as atividades administrativas das divisões da

empresa.

Os esforços de crescimento nas principais divisões da GM em 1919 foram

apresentadas no relatório anual da General Motors de abril de 1920 (CHANDLER, 1964) e

são resumidos a seguir:

Buick – Capacidade ampliada de 350 carros por dia para 500 carros por dia.

Construções em andamento em Flint e em Saint Louis aumentarão a capacidade

da Buick para 700 carros por dia.

Cadillac – A construção de uma nova fábrica iniciada no começo de 1919 está em

rápido progresso. Quando concluída, terá capacidade de 30 mil veículos por ano.

Chevrolet – Durante 1919, a capacidade das fábricas foi ampliada para um total de

800 carros por dia. Construções adicionais, quando completadas, permitirão a

fabricação de 900 carros e 50 caminhões por dia.

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Oldsmobile – A capacidade da Olds Motor Works foi ampliada para 300 unidades

por dia, além de operar de forma mais independente, produzindo diversos

componentes que antes eram fornecidos por outras divisões.

Oakland – Quando completada as novas construções iniciadas em 1919, a

capacidade será ampliada para 350 carros por dia. Diversos outros departamentos

também darão maior autonomia assegurando o suprimento dos principais

componentes.

GM Trucks – Com o rearranjo da fábrica em Pontiac, a planta atual permitirá a

produção de vinte mil unidades por ano. O congestionamento da planta será

largamente aliviado com a construção de uma nova fábrica durante 1920.

Scripps Booth – Esta companhia foi recentemente removida para uma moderna

fábrica. A capacidade da nova planta permitirá a fabricação de 100 carros por dia.

Samson Tractor – A General Motors tem se dedicado ativamente a fabricação de

tratores e implementos agrícolas. Novas dependências, praticamente concluídas,

permitirão a fabricação de cem mil tratores por ano.

O impulso expansionista liderado por William Durant não se restringiu à expansão

das unidades fabris. Em março de 1919, com o auxílio de John Raskob, Durant criou a

General Motors Acceptance Corporation (GMAC) para ser o braço fornecedor de crédito

ao consumidor para toda a rede concessionária sob suas bandeiras. O crédito ao

consumo não era novidade em outras indústrias nos Estados Unidos. No caso do

automóvel, embora incipiente até o surgimento da GMAC, há indícios de vendas

financiadas esporadicamente por bancos a partir de 1910. Em 1915, John Willys,

presidente da Willys-Overland, criou a primeira instituição de crédito para automóveis, a

Guaranty Securities Company. Segundo o relatório anual de 1920 (CHANDLER, 1964), o

total negociado pela GMAC em seu primeiro ano foi de U$ 20 milhões. Nos anos

seguintes, rapidamente o crédito passaria a representar uma parte significativa das

vendas. Líder de mercado à época, a Ford não adotou um sistema de crédito ao consumo

até 1928 e, apenas em 1950, criou uma agência própria para este fim, a Ford Motor

Credit.

Durant ainda buscou investimentos não relacionados à indústria automobilística.

Em 1918, seguindo a indicação de investidores, William Durant foi visitar o engenheiro

Alfred Mellowes. Ele lutava para manter aberta a empresa que tentava comercializar sua

invenção, uma caixa de gelo elétrica. Com a informalidade que era característica dos

negócios que realizava, Durant comprou a Guardian Frigerator Corporation com um

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cheque pessoal. Em março de 1919, ele batizou o novo produto de Frigidaire e incorporou

a empresa à General Motors, alocando-a na planta de autopeças da Northway, e

colocando A.B.C. Hardy para gerenciar a empresa, que possuía alguns clientes na cidade

de Detroit dispostos a pagar pelo serviço de manutenção do complicado e instável

eletrodoméstico.

Dentro da estratégia para 1919, em 25 de setembro, a GM adquiriu 60% controle

acionário da Fisher Body Corporation, importante fabricante de carrocerias, em uma ação

que teve como objetivo assegurar o suprimento para os carros com carrocerias fechadas.

No mesmo dia, a empresa ainda autorizou o investimento de U$ 500 mil na Goodyear Tire

& Rubber Company, que acabou sendo vendida tempos depois. O interesse pelo carro

fechado vinha crescendo desde 1917. Pontiac e Oldsmobile foram algumas das primeiras

a adotarem a tecnologia em seus modelos. Inicialmente, as divisões tiveram que enviar

compulsoriamente alguns modelos fechados nos carregamentos que saíam da planta

para os distribuidores. Porém, a perspectiva de poder utilizar o veículo inclusive no

período de inverno despertou rapidamente o interesse de muitos consumidores, e as

vendas cresceram de forma acelerada.

Com a onda de crescimento, uma preocupação que foi tema freqüente nas

reuniões do comitê de finanças foi a de como financiar tamanha expansão. Em uma

estimativa de gastos preparada por Raskob para a reunião do comitê de finanças, o

investimento de capital para o ano de 1919 seria de U$ 52,8 milhões, sendo que U$ 36,1

em caráter urgente, por se tratarem de obras com início imediato. Como solução, Raskob

sugeriu a ampliação do capital em 15%, equivalente a U$ 28,6 milhões, que juntamente

com o caixa resultante da operação saldariam os gastos do período. Para o ano de 1920,

com todas as divisões almejando expansão, a conta de Raskob para fechar as

necessidades de caixa requeria a emissão de U$ 64 milhões em novas ações para um

investimento total de U$ 100 milhões. Porém, a indisponibilidade de recursos no mercado

no começo do ano anunciava as dificuldades que a GM viria a enfrentar no fechamento do

período. Do total previsto, apenas U$ 21 milhões em ações encontraram compradores na

Inglaterra e no Canadá. O restante foi obtido em arranjos emergenciais que envolveram

subsidiárias da Du Pont e um sindicato encabeçado pelo J. P. Morgan.

Ao final de 1920, a economia americana viu uma forte depressão no consumo, e o

solavanco na indústria automobilística expôs a fragilidade causada pela falta de controles

na operação da General Motors. A crise econômica durou até meados de 1921, custou

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caro para General Motors e principalmente a William Durant. A divisão de tratores

Samson, Scripps-Both e a Scheridan foram encerradas. A GM recorreu a um empréstimo

emergencial junto ao J. P. Morgan de U$ 83 milhões para cobrir a liquidação de ativos de

cerca U$ 90 milhões, com isso o balanço de 1921 registrou prejuízo de U$ 38 milhões.

Apesar dos prejuízos, a conseqüência que mais marcou esta crise foi o desligamento de

William Durant da gestão da GM, como condição de uma operação de resgate às suas

finanças pessoais, que ele vinha utilizando em imprudentes operações no mercado

financeiro para manter em alta as ações da GM.

Mesmo antes da crise de 1920, a ausência de controles e os riscos a que a

operação da GM estava exposta já haviam alarmado os representantes da Du Pont que

gradualmente vinham sendo incorporados à gestão de William Durant. Em 1919, o

consultor E. L. Bergland foi contratado pela Du Pont para fazer um diagnóstico da gestão

da General Motors. Um trecho deste relatório é apresentado a seguir:

O Sr. Durant aparentemente tem total comando de todo o planejamento e dita amplamente

as políticas a serem seguidas. Sua opinião é consultada para decisão em uma grande

quantidade de casos, de forma a não haver nenhuma outra instância para arbitrar sobre os

vários planos e novos desenvolvimentos... Quando novas plantas estão para serem

construídas, Durant freqüentemente supervisiona pessoalmente a confecção do contrato e

os detalhes de engenharia com as firmas contratadas, mas os detalhes de design

recebem pouca atenção e muito poucas informações detalhadas são conhecidas pelos

membros da organização... Não há qualquer sistema semelhante ao nosso sistema de

ordem de trabalho para fazer sugestões e não há organização central de engenharia. Há

também, certa falta de espírito de cooperação entre as diferentes plantas. Estas plantas

são praticamente independentes em relação a compras, contabilidade e outras

organizações. Como elas eram operações independentes antes de a GM ser formada e

vêm funcionando da mesma forma desde então, é fácil entender um espírito deste tipo, já

que não há organização central direcionando-as, exceto de maneira mais geral. (tradução

livre de MADSEN,1999 - p197-198)

Dentre as recomendações de Bergland a Du Pont estava o envio de especialistas

da Du Pont para levar técnicas de centralização de registros contábeis, unificação de

tarefas e procedimentos de supervisão. Um dos primeiros enviados para compor o staff

de William Durant foi John L. Pratt, um engenheiro experiente nos processos gerenciais

da Du Pont. Pratt passou rapidamente da condição de consultor para a de assistente

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especial do presidente e iniciou na GM os primeiros trabalhos de análises estatísticas na

área de compras, como preços de alumínio, vidro e outros componentes.

A centralização das decisões mencionada no relatório de Bergland, em 1920,

havia se tornado um problema grave dentro da GM. Os casos de gerentes aguardando a

visita de Durant para ter minutos de sua atenção, como o caso relatado por Lee Dunlap

anteriormente, tornaram-se raros. Com o aumento da complexidade das atribuições de

Durant, executivos com John Raskob e Walter Chrysler viajavam para onde Durant

estivesse para poder se reunir com ele. Em certa ocasião, Chrysler foi de Flint para a

Califórnia para encontrar Durant e, depois de passar um dia todo na sala de espera,

desistiu e retornou sem ter sua reunião. Este e outros desencontros em seguida

motivaram Chrysler - então presidente da Buick e a quem Durant ofereceu um aumento

de salário de U$ 25 mil para U$ 500 mil por ano para que ele permanecesse na empresa

após a saída dos bancos em 1915 - a pedir demissão e a iniciar planos para uma nova

empresa.

A falta de controle e de procedimentos gerenciais criou um efeito bola de neve

nos gastos da GM nos anos que precederam a crise de 1920. Com divisões

independentes e uma orientação geral de Durant para expansão, projetos para

ampliações e construções de novas fábricas foram submetidos simultaneamente pelos

gerentes das divisões em 1918 e em 1919. Para solucionar a restrição de caixa, novas

ações eram emitidas ao invés de qualquer tipo de racionamento. Além dos programas de

expansão, não havia qualquer controle para formação de estoques. Os gerentes das

divisões faziam a programação da produção e as compras de matérias-primas no início

do outono para que a produção e os estoques formados no inverno abastecessem a

temporada de vendas na primavera e verão do ano seguinte. Com os estoques

aumentados para viabilizar o crescimento, agravava-se ainda mais a necessidade de

capital para a GM.

Dois comitês especiais, dentro do comitê executivo, foram criados em 1919 para

tentar conter o aumento nos gastos. Em dezembro de 1919, Alfred Sloan foi indicado para

presidir um comitê que estabeleceria regras de aquisição (incluindo projetos de

expansão). Outro comitê foi criado em maio de 1920 para estabelecer regras para a

alocação de estoques. Como resultado, um teto de U$ 150 milhões foi determinado para

toda a corporação. Porém, com as divisões controlando o próprio caixa e os pedidos de

compra, os estoques chegaram a U$ 209 milhões em outubro. O comitê de finanças ainda

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nomeou outro comitê para tentar solucionar o problema dos altos estoques em outubro,

mas era tarde demais. A crise teve inicio em setembro de 1920. Com a queda nas

vendas, a Ford, líder de mercado com o barato Modelo T, reduziu seus preços entre 20%

e 30%. Durant e a GM tentaram resistir à redução de preços, mas os gerentes das

divisões tiveram dificuldades para cumprir suas folhas de pagamento, e já em outubro

todas as fábricas, exceto Buick e Cadillac, tiveram as atividades suspensas.

Enquanto a recessão econômica impunha dificuldades às divisões da GM e

provocava estragos na indústria em Detroit, com a demissão de 150 mil operários, em

Nova York, centro financeiro dos Estados Unidos, William Durant enfrentou graves

problemas também decorrentes da ausência de controles, só que neste caso, em suas

contas pessoais. As tentativas sem sucesso de emissão de ações em 1919 e 1920

indicavam que mesmo para uma empresa como a GM, que produzia retornos de 30%

sobre o investimento e que fazia questão de manter constantes os altos dividendos, a

escassez de capitais afetaria o preço de suas ações. Não está claro se a intenção de

Durant foi de evitar ataques especulativos contra as ações da GM e assim proteger seus

investidores ou se ele próprio ensaiou uma arbitragem para lucrar com ações

artificialmente desvalorizadas. O fato é que ele empreendeu uma grande operação de

compra de ações da GM nos meses que precederam a crise. Durant mobilizou uma vasta

rede de brokers e agentes financeiros fazendo empréstimos para compra de ações e

colocando as suas próprias como garantia. Quando a recessão se instaurou, logo em

seguida veio uma quebra na bolsa de valores, e a sua posição junto a diversos

operadores deu origem a rumores sobre sua solvência.

Os rumores chegaram aos ouvidos de Pierre du Pont e John Raskob em

novembro de 1920. Ao apertarem Durant sobre o assunto, descobriram que ele temia

sobre a própria capacidade de saldar os compromissos feitos e reconhecia não ter

condições de afirmar qual era a real posição de suas ações e empréstimos junto aos

brokers. Em uma operação arquitetada em conjunto com o J.P. Morgan, du Pont e

Raskob levantaram U$ 60 milhões para criar uma nova empresa, que assumiu todas as

dívidas e ações de Durant. As ações da nova empresa foram distribuídas em 40% para

Durant, 40% para a Du Pont e 20% para um grupo de bancos organizados pelo

J.P.Morgan. Como resultado da operação, Durant se viu salvo da situação que construíra

para si, porém teve seu patrimônio drasticamente reduzido, além de ser forçado a

renunciar seu posto de presidente, o que ocorreu em 30 de novembro de 1920. Para a Du

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Pont, o risco de ver um contágio no controle e na reputação da GM foi evitado. Restou o

desafio de encontrar um novo presidente para a General Motors e, simultaneamente,

retirá-la da situação de crise em que se encontrava.

4.1.6. A gestão de Pierre S. du Pont

Após a renúncia de William Durant, Pierre S. du Pont, então presidente do

conselho de administração (chairman), emergiu como a alternativa mais óbvia para

assumir a presidência da General Motors. Apesar de não ter experiência significativa no

setor automotivo, du Pont era um executivo experiente, que havia se aposentado da

presidência da E. I. Du Pont de Nemours e dispunha de excelente reputação como

executivo sério e bem-sucedido, especialmente junto aos agentes financeiro que estavam

apreensivos após a saída de Durant. As dúvidas sobre a capacidade de a GM se reerguer

sem Durant também pairavam sobre as mentes dos prefeitos das cidades onde havia

fábricas das divisões. Dentre suas primeiras atividades, du Pont teve de cumprir uma

agenda de viagens e encontros com governadores, prefeitos e credores reafirmando a

confiança no futuro da GM e da indústria automobilística.

Para obter controle sobre a organização, du Pont reduziu a composição do CE

para quatro integrantes. A ele se juntaram John Raskob, então presidente do CF; J.A.

Haskell, executivo indicado pela Du Pont que ocupava assento no CE desde 1919 e

passou a ser o vice-presidente de operações; e Alfred Sloan, o único com carreira na

indústria, tornando-se vice-presidente encarregado do que passaria a ser o staff

consultivo. Sloan já vinha elaborando um detalhando estudo da organização, desde sua

indicação para presidir o comitê de apropriação em 1919. O “Organization Study”, como

foi chamado, havia sido apresentado a Durant e a du Pont, embora não tivesse

despertado grande interesse. Entretanto, sob a liderança de Pierre du Pont, uma nova

estrutura para a organização, amplamente baseada na proposta do estudo de Sloan, foi

submetida para consideração do CE e aprovada depois de pouco mais de um mês de sua

gestão, em 3 de janeiro de 1921.

A nova estrutura manteve os comitês de finanças e executivo respondendo ao

conselho de administração, bem como a autonomia administrativa das divisões que

deveriam prestar contas ao CE. Duas organizações de staff foram criadas para auxiliar os

comitês, o staff financeiro e o staff consultivo, com a incumbência de realizar estudos e

análises, um em finanças e o outro em operações, como forma de prover informações e

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propostas de medidas a serem deliberadas pelos respectivos comitês. Para chefiar o staff

financeiro, Donaldson Brown foi trazido da Du Pont. Brown ocupava a função de

tesoureiro e havia sido responsável por criar avançados mecanismos de controle

financeiro que permitiam avaliar o retorno sobre o capital investido nas divisões da Du

Pont. Juntamente com Brown, os controllers, que já haviam sido trazidos para as divisões

pela Du Pont, em 1919, teriam a incumbência de desenvolver um sistema de controle

financeiro sobre as operações.

A movimentação em direção ao controle das finanças das divisões causou a saída,

logo no início de 1921, dos gerentes gerais que haviam sido nomeados por Durant. Na

Oakland e Cadillac, Fred Warner e Richard Collins foram demitidos após fazerem

retiradas de suas participações nos lucros antes da realização das auditorias. Na

Oldsmobile, Edward Ver Linden foi demitido por fazer o mesmo, embora neste caso seu

contrato não previsse este tipo de remuneração variável. A.B.C Hardy, fiel escudeiro de

Durant em seus empreendimentos, foi removido da gerência da Chevrolet, mas ainda foi

mantido no staff consultivo. Apenas no caso da Buick, Harry Bassett foi mantido, após a

insistência de Sloan com Pierre du Pont, que temia os riscos de efetuar tal mudança na

maior e mais lucrativa das divisões.

O passo seguinte foi reavaliar a linha de produtos, até então deixada a cargo das

divisões, que decidiam quais carros fabricar e como posicionar seus produtos, geralmente

causando grande canibalização entre as divisões. O CE deliberou a criação de um comitê

especial do staff consultivo, auxiliado por consultores externos, a fim de avaliar imagem,

qualidade e competitividade dos veículos sob as bandeiras da GM e propor uma nova

política de produtos corporativa. A recomendação do CE era de que a GM deveria entrar

no mercado de veículos de baixo preço, para competir com a Ford com seu Modelo T.

A conclusão dos consultores foi devastadora: apenas duas das sete marcas, Buick

e Cadillac, eram percebidas pelos consumidores com alguma distinção de qualidade,

enquanto as demais eram vistas como carros desatualizados e pobres em qualidade.

Além disso, diversos modelos oferecidos pela GM competiam de forma ilógica em uma

estreita faixa de preços, entre U$ 1000 e U$ 2000, enquanto o Chevrolet 490 competia só

no mercado de inferior a U$ 1000, como mostra a o quadro X abaixo. O modelo da

Chevrolet custava o dobro do concorrente Ford e detinha 4% de participação de mercado,

contra os 60% do Modelo T.

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Quadro 4-2 Faixas de preços dos modelos oferecidos pelas divisões da General Motors em 1921 (em U$)

Marca Modelo Faixa de

preços

Chevrolet 490 - quatro cilindros 795 - 1375

FB - quatro cilindros 1320 - 2075

Oakland seis cilindros 1395 - 2065

Oldsmobile

quatro cilindros (FB) 1445 - 2145

seis cilindros 1450 - 2145

oito cilindros 2100 - 3300

Scipps-Booth seis cilindros 1545 - 2295

Sheridan quatro cilindros (FB) 1685

Buick seis cilindros 1795 - 3295

Cadillac oito cilindros 3790 - 5690

Fonte: tabela adaptada a partir de Sloan (1963) p. 59

A proposta da nova política de produtos definiu segmentos em função de faixas de

preços, conforme o quadro 4-2 acima, onde a General Motors deveria posicionar seis

modelos básicos de forma a competir no topo de cada faixa. Construídos com tal

qualidade, os veículos atrairiam compradores de concorrentes com preços inferiores, que

apreciassem melhores benefícios com um pequeno aumento no preço. Por outro lado, os

carros no topo de uma faixa poderiam conquistar consumidores da faixa superior que

buscassem um produto com preço menor. Foi recomendado ainda que Scripps-Booth e

Sheridan fossem descontinuadas, já que seria necessário reduzir a diversidade da oferta,

dado que estas divisões não dispunham de instalações para fabricar seus próprios

motores. A orientação de estabelecer uma pirâmide de marcas (RUBENSTEIN, 2001),

sem competição entre divisões, não chegou a ser seguida exatamente à risca, porém os

princípios definidos por este comitê deram origem a uma estratégia de produtos da GM

que perdurou por décadas e ficou famosa por seu slogan “Um carro para todo bolso e

propósito” 4.

Quadro 4-3 Segmentação por preços recomendadas pelo comitê especial (em U$) Segmento Faixa de preço

(a) 450 - 600

(b) 600 - 900

(c) 900 - 1200

(d) 1200 - 1700

(e) 1700 - 2500

4 Tradução livre do original em inglês: “A car for every purse and purpose”

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(f) 2500 - 3500

Fonte: tabela adaptada a partir de Sloan (1963) p. 67

Mesmo antes de iniciar os estudos para uma política de produtos, o CE da General

Motors iniciou as atividades para o desenvolvimento de um novo veículo, que contaria

com um motor refrigerado a ar (air cooled engine) e permitiria significativa redução de

peso e de custo. Os experimentos com motor a ar vinham sendo conduzidos por Charles

F. Kettering, dos laboratórios da Delco, em Daytona, desde 1918. Kettering já dispunha de

considerável reputação como inventor quando Durant adquiriu sua empresa de sistemas

elétricos, em 1916, e em uma apresentação para o CF, em 1919, ele impressionou os

executivos da GM com seus projetos. No ano seguinte, Durant criou a General Motors

Research Labs (GMRL), com o intuito de fomentar as pesquisas de Kettering e seus

engenheiros.

No dia seguinte ao que du Pont assumiu como presidente, em dezembro de 1920,

Kettering enviou-lhe um relatório afirmando que o motor a ar poderia ficar pronto para ser

oferecido ao mercado ainda em 1921, caso os desenvolvimentos apropriados fossem

completados. Uma comissão de executivos foi até Daytona para avaliar os

desenvolvimentos no motor a ar. Após a visita, o CE decidiu que o carro em

desenvolvimento deveria passar por testes rigorosos e que seria lançado pela Chevrolet

par substituir o modelo 490. Em poucas semanas, o projeto do motor a ar aumentaria em

abrangência. O CE decidiu ampliar também para a Oakland a utilização de um motor de

seis cilindros, que seria desenvolvido juntamente com o de quatro cilindros, para a

Chevrolet. A empolgação do CE e de du Pont com o motor a ar levaria a GM a persistir

por 2 anos e meio, contra as resistências e desencontros que emergiram ao longo do

desenvolvimento, até a desistência, em 1923. O fracasso no lançamento do motor a ar,

posteriormente batizado de “copper cooled”, marcou o que talvez tenha sido o primeiro

grande fiasco de lançamento da GM.

O desenvolvimento do motor a ar evoluiu de forma conturbada dentro da GM. O

presidente du Pont decidiu que o veículo seria lançado pela Chevrolet, enquanto que o

seu desenvolvimento seria conduzido pela equipe de Kettering e não pelos engenheiros

da divisão, o que provocou imediata resistência por parte de K. Zimmerschied, gerente

geral da Chevrolet. Sentindo que a indisposição da divisão atravancava o

desenvolvimento naquele ano, o CE deliberou que o veículo fosse lançado em 1922, com

prioridade para o modelo de seis cilindros da Oakland. Porém, ao final de 1921, quando o

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GM Research Labs enviou os primeiros protótipos para testes na Oakland, os resultados

foram desanimadores. O carro possuía graves problemas de durabilidade, e o projeto teve

de retroceder algumas etapas em seu desenvolvimento.

Diante da decepção inicial com o desempenho do motor a ar, as ações na GM se

dividiram em duas direções. Discretamente, Sloan, que passara a vice-presidente

corporativo de operações, recomendou que engenheiros da Chevrolet começassem a

trabalhar em melhorias na linha de produtos existente, para o caso de nova decepção

com o motor a ar. De outro lado, Pierre du Pont decidiu relançar o programa do motor a

ar, em fevereiro de 1922, posteriormente batizando-o de “copper-cooled”5. O novo

programa concentrava-se no desenvolvimento do modelo da Chevrolet, cujo lançamento

foi agendado para junho de 1923. William Knudsen, que renunciara a um alto posto na

gestão da fábrica da Ford, foi contratado como vice-presidente de operações da

Chevrolet. O gerente geral da divisão, K. Zimmerschied, foi transferido para o staff

consultivo, e Pierre S. du Pont passou a acumular as presidências do conselho de

administração da General Motors e a gerência geral da Chevrolet.

O novo motor copper-cooled foi apresentado em veículos protótipos da Chevrolet

no salão do automóvel de Nova York, em janeiro de 1923. O otimismo com a boa

repercussão no evento contagiou os planos de fabricação do novo produto. A data para o

início da produção foi agendada para fevereiro, começando em 1000 unidades por mês e

com a capacidade aumentando gradualmente até outubro, quando chegaria ao pico de 50

mil unidades por mês. O copper-cooled dividiria a linha da Chevrolet com o tradicional

modelo refrigerado a água com a capacidade de 30 mil unidades por mês.

Apesar de em fevereiro encontrar problemas na produção, os modelos copper-

cooled da Chevrolet começaram a ser oferecidos no mercado nos meses de março e

abril, porém duas situações determinaram um novo fracasso no projeto tão defendido por

du Pont e Kettering. Logo os primeiros carros que saíram das fábricas da Chevrolet

apresentaram novamente problemas de qualidade e desempenho que e os relatórios

sobre os defeitos no campo confirmaram a necessidade de melhor desenvolvimento.

Paralelamente, a indústria que em 1922 apenas havia recuperado os níveis de vendas

anteriores à crise, em 1923 viu a demanda explodir, praticamente dobrando o volume do

ano anterior e esgotando todos os modelos Chevrolet com motores a água. Tal situação 5 O nome fazia referência às placas de cobre (em inglês copper) usadas para refrigeração através de um sistema de ventilação, em substituição a sistema tradicional de refrigeração usando água armazenada em um radiador

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exigiu que a GM tomasse uma decisão sobre como alocar a capacidade de suas plantas

para aquele ano.

Talvez motivado pelo fracasso de seu principal projeto, Pierre S. du Pont

renunciou à presidência em maio de 1923, permanecendo como presidente do conselho

de administração e indicando Alfred Sloan para sua sucessão. A decisão sobre continuar

com o copper-cooled finalmente foi deixada para a próxima gestão.

A despeito do fiasco com as tentativas do motor a ar, a gestão de du Pont

produziu grandes avanços nos controles financeiros e administrativos. O staff financeiro

iniciado sob a regência de Donaldson Brown foi responsável pela sistematização de uma

série de ferramentas que aumentaram significativamente a eficiência das divisões. Além

das pessoas recrutadas na Du Pont, a GM iniciou uma prática que perdurou por muitos

anos ao recorrer às universidades americanas na seleção de jovens considerados de alto

potencial para preencher seu staff de finanças. O primeiro deles talvez tenha sido Albert

Bradley, um Ph. D. em economia da universidade de Michigan, que iniciou como

assistente de controller e, depois de escalar gradualmente as posições na organização de

finanças, finalmente ocupou a presidência do conselho de administração da GM, em

1956.

O alto nível de estoques, que havia sido um dos complicadores da crise em 1920,

foi um dos primeiros problemas a serem combatidos pelo novo staff. O empréstimo de

cerca de U$ 80 milhões junto a bancos ligados ao J. P. Morgan havia ajudado a resolver

as emergências de caixa. Além disso, o novo comitê de estoques, liderado por J. Pratt,

determinou a suspensão de toda e qualquer compra pelas divisões. Por um período de

sete meses, o plano de compras mensal de cada divisão devia ser previamente aprovado

pelo comitê de estoques antes de efetuarem-se os pedidos junto aos fornecedores. Este

sistema emergencial contribuiu para que o nível de estoques caísse do pico de U$ 215

milhões para U$ 94 milhões em junho de 1922, e o giro do estoque aumentou de duas

para quatro vezes por ano. No entanto, em 1921 um novo sistema fez retornar o controle

sobre as atividades de compras para as divisões. A proposta de Donaldson Brown,

aprovada no CF, estabeleceu que a divisão elaborasse um plano de produção

quadrimestral, atualizado mensalmente, que seria revisado e aprovado pelo vice-

presidente de operações. A partir deste plano a tesouraria estabelecia um calendário de

liberação gradual dos recursos para as compras.

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75

Concomitante ao sistema de gestão de compras, um novo controle de caixa foi

criado pelo staff de finanças, que extinguiu a antiga gestão de caixa das divisões. Até

1921, as divisões mantinham total autonomia sobre seu caixa. Todas as receitas

entravam em uma conta própria, da qual também efetuava pagamentos de suas

despesas, como salários, contas de fornecedores e acertos com outras divisões. O acerto

com a sede da General Motors era feito apenas quando balancetes das divisões eram

concluídos, geralmente no prazo de um a dois meses. Com a centralização do caixa, a

GM abriu contas de depósitos em uma centena de agências bancárias pelo país, onde

poderia receber todos os pagamentos em nome de suas divisões. A liberação dos

recursos para saldar as despesas nas divisões passou então a ser controlada através de

limites mínimos e máximos em suas contas e a partir de cronogramas de liberação de

valores previstos em seus planos de produção. Além disso, foi possível estabelecer um

sistema de compensação das transações entre divisões, que eliminava um complexo

fluxo de transações. Assim sendo, a GM passou a trabalhar com projeções de seu fluxo

de caixa, de forma a poder aplicar saldos de caixa em fundos de curto prazo que

remuneravam recursos financeiros não utilizados.

Nos dois anos e meio da gestão de Pierre S. du Pont, a organização das finanças

foi sensivelmente alterada. O sistema de formação de estoques e de controle de caixa foi

viabilizado pela adoção de métodos de previsão e acompanhamento de vendas e

produção. Até 1921, apenas uma previsão de vendas e lucros era preparada pela

tesouraria para o CF, que não incluía sequer o detalhamento por divisões. Para viabilizar

o controle, Sloan passou a solicitar que os gerentes das divisões encaminhassem a

programação da produção para o mês seguinte e uma expectativa de vendas para os três

meses subseqüentes. Gradualmente Sloan foi criando novos relatórios a serem enviados

pelas divisões, de modo a aumentar a sofisticação de seu sistema. Em 1922, os gerentes

das divisões já informavam, além de estimativas de produção, faturamento e lucro para o

ano e para o quadrimestre, bem como os números realizados em cada mês.

Quando, em abril de 1922, o manual para aprovações de apropriações e despesas

de capital foi aprovado pelo CE e pelo CF, a GM tornou-se capaz de projetar e controlar

despesas e receitas para o ano de tudo que envolvia capital de giro e investimentos de

expansão. O desenvolvimento de regras para apropriações e despesas de capital havia

começado no comitê especial criado pelo CE, em 1919, com Alfred D. Sloan como

presidente. O manual desenvolvido sob a liderança de Sloan determinou que projetos que

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envolvessem despesas de capital seriam aprovados e controlados por um comitê de

apropriação, que envolveria CE e CF. O método de avaliação definiu princípios de retorno

sobre o investimento, mediação de interesses entre divisões, relevância relativa a outros

projetos da corporação, além de critérios técnicos de forma e apresentação. Os projetos

aprovados passariam então a ter gastos examinados mensalmente de forma semelhante

àquela do controle dos gastos com capital de giro.

4.1.7. Sloan no comando, rumo ao topo

No dia 10 de maio de 1923, Alfred D. Sloan foi eleito pelo conselho de

administração como presidente da General Motors. Desde o início de seu mandato, Sloan

demonstrou seu reconhecimento em favor da busca por soluções gerenciais por meio de

comitês. Ainda em 1922, então vice-presidente de operações, Sloan havia estabelecido

dois comitês, de compras e de propaganda, e, além disso, persuadiu o conselho a

adicionar ao CE Charles Mott e Fred Fisher, homens experientes de operações. Com a

questão do copper-cooled deixada por du Pont para ser resolvida pelo seu sucessor,

Sloan, em sua primeira reunião como presidente do CE, apontou um comitê de três

engenheiros para avaliar o status do motor a ar, que também estava sendo desenvolvido

em seis cilindros para equipar um Oldsmobile.

O relatório apresentado ao CE dez dias depois apontou no motor a ar problemas

como má pré-ignição e perda de potência em altas temperaturas. Recomendava-se que

os desenvolvimentos para sua fabricação fossem suspensos. Na Chevrolet, 759 modelos

haviam sido produzidos, dos quais 239 foram descartados ainda na fábrica. Os demais

veículos comercializados foram recolhidos dois meses depois. No dia 26 de junho de

1923, o projeto do motor a ar, para frustração de Charles Kettering, foi oficialmente

descontinuado das atividades da General Motors.

Segundo o próprio Sloan (1963), os comitês de compras e de propaganda, criados

em 1922, forneceram contribuições apenas razoáveis para a organização durante suas

curtas existências, no entanto, foram os precursores de sua idéia de gestão por políticas e

deram grandes contribuições sobre a prática de coordenação entre as divisões. Em 1923,

determinou a criação do Comitê Técnico Geral (CTG). Ao CTG foi designada a

incumbência de integrar as atividades de engenharia das divisões e o GM Research Labs,

além de coordenar a formulação de políticas naquilo que dissesse respeito ao conjunto

das divisões. O CTG rapidamente desenvolveu uma dinâmica de reuniões sobre assuntos

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técnicos importantes – como, por exemplo, estabelecimento de procedimentos de testes

para o campo de provas, inaugurado em 1924, workshops e troca de informações sobre

melhores práticas de engenharia em assuntos como freios, pneus, consumo de

combustível, lubrificantes e compressão de itens do motor – e criou também outras ações,

como programa de treinamento para vendedores sobre atributos técnicos dos veículos.

Os resultados da coordenação promovida na área de engenharia animaram Alfred

Sloan, que, em 1924, determinou a criação de outro comitê “interdivisões”, o Comitê Geral

de Vendas (CGV), o qual teve como primeiro presidente Donaldson Brown, vice-

presidente de finanças. Ainda em 1924, Sloan procurou replicar a dinâmica de comitês em

outras instâncias e persuadiu o conselho a ampliar o CE para dez integrantes, sendo sete

com ampla experiência em operações e três com formação em finanças, dentre eles John

Raskob e Pierre du Pont. Em seguida, Sloan decidiu ativar o Comitê de Operações (CO)

criado por du Pont, mas nunca utilizado. O CO era composto dos gerentes gerais das

divisões e tinha a incumbência de avaliar o desempenho da General Motors e verificar a

necessidade de novas políticas, embora não as formulassem, nem as aprovassem.

Desta forma, a General Motors de Sloan em 1925 possuía a seguinte dinâmica: as

divisões tinham autonomia para operar dentro das políticas corporativas; CE aprovava

políticas, sob a supervisão da CF, sobretudo quando envolvesse gastos acima de certo

limite; os grupos de políticas, como o CTG e o CGV, funcionavam com staffs consultivos

para formulação de políticas para a CE, enquanto o staff financeiro fazia o equivalente

para a CF; e, finalmente, o CO funcionava como um fórum para verificação por parte das

divisões da adequação de suas práticas às políticas e vice-versa.

Enquanto as gestões de du Pont e de Sloan davam os passos iniciais para a

criação de uma organização central na GM após a crise de 1920, o mercado de

automóveis nos Estados Unidos não demorou a retomar uma trajetória de crescimento.

Assim, o desempenho da General Motors em termos de vendas e de lucro se recuperou

na mesma velocidade. Em 1922, os patamares de venda da GM e da indústria anteriores

à crise foram novamente alcançados, e em 1923 o recorde de 4 milhões de unidades da

indústria permitiu que a GM vendesse pouco mais de 750 mil carros naquele ano. Com

isso, sua receita aproximou-se de U$ 700 milhões, enquanto o lucro foi de U$ 72 milhões.

No começo de 1924, porém, a indústria deu sinais de desaceleração. O sistema de

informações desenvolvido pela GM para realizar as estimativas de vendas evitava a

formação de estoques de produtos acabados nas divisões, mas não alcançava com

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eficiência os estoques na rede de distribuição. Ainda assim, em março, Sloan começou a

receber os relatórios dos concessionários, informando, com três meses de atraso e sem

muita precisão, níveis crescentes de estoques nas lojas, o que o levou a negociar com os

gerentes de divisões reduções em seus planos de produção. Dois meses após rever os

planos de produção, Alfred Sloan e Donaldson Brown decidiram percorrer alguns

distribuidores para checar pessoalmente a situação que enfrentavam. A constatação foi

pior do que se imaginava: o nível de estoques na rede havia aumentado mesmo com a

redução na produção. Com isso, Sloan emitiu ordens para que todas as divisões

reduzissem imediatamente seus programas, diminuindo a produção total em 30 mil

unidades por mês.

Ao final do ano, devido aos controles financeiros, o impacto da desaceleração

reduziu a receita da GM em 18%, mas ainda manteve seus lucros na casa dos U$ 50

milhões. Contudo, o susto provocado pelos métodos rudimentares de estimativa de

vendas fez com que o CGV, de Donaldson Brown, empreendesse a tarefa de desenvolver

um sistema corporativo de previsão de demanda. O sistema foi desenvolvido ao longo de

1924 e 1925 e se dividia em duas frentes. Uma delas tratava do dimensionamento da

demanda total da indústria. Para tanto, uma série de análises estatística, a partir da

pirâmide de demanda identificada anteriormente, procuraram encontrar correlações entre

a venda de automóvel e outros setores da atividade econômica. A outra frente buscou

desenvolver um sistema de relatórios ao longo da organização de vendas e da rede de

distribuição, reduzindo para dez dias o prazo de atualização das informações de vendas e

de situação dos estoques. Essa estimativa corporativa da demanda passou a indicar uma

referência para os planos de produção de cada divisão, e um sistema decenal de revisão

do real versus o projetado permitia uma reação mais rápida a alterações para mais ou

para menos.

O componente final do sistema de controles gerenciais, implementados na década

de 1920, alinhou as diversas atividades de controle espalhadas ao longo da operação da

GM em torno do princípio fundamental de retorno sobre o investimento. Donaldoson

Brown, ex-tesoureiro da Du Pont e que lá implantou um sistema semelhante, apresentou,

em 1925, o conceito que chamou de “standard-volume”. O conceito do standard-volume

se expressava em um método para avaliar o desempenho de longo prazo da organização,

cujo objetivo era obter não a mais alta taxa de retorno possível, mas a mais alta taxa de

retorno de forma consistente ao longo do tempo.

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A partir da abordagem estabelecida pelo standard-volume, as atividades como

planejamento de produção, projetos de expansão e lançamentos de novos modelos das

divisões puderam ser avaliadas em termos de retorno sobre o investimento e poderiam

ser devidamente encaixadas no conjunto das divisões, formando uma visão geral da

mesma análise para a corporação. Decisões de preços de venda de veículos ou de

compra de matéria-prima, diante de uma situação de variação nas condições de oferta e

demanda ou de pressões de competidores, passaram a ser avaliadas em função de seu

impacto no retorno sobre o capital investido. Esta análise levava em conta a evolução de

preços, custos, volumes e lucros dentro da curva de sazonalidade anual e também

considerava as tendências de evolução da indústria e da economia nos anos seguintes.

Com seu sistema de controle gerencial estabelecido, e superada a retração da

indústria de 1924, a General Motors de Sloan concentrou-se, durante os anos seguintes,

no seu desafio contra a líder de mercado Ford. A política de posicionamento de produtos

da GM no topo de cada segmento, buscando maior percepção de qualidade, era oposta à

estratégia de um único modelo básico - posicionado-o com o menor preço e maior escala

- adotada pela Ford. Entre os anos de 1925 e 1927, quando a GM finalmente superou sua

adversária, outras práticas contribuíram para que a GM alcançasse o topo.

Em 1925, a Chevrolet reverteu a queda nas vendas que havia amargado com o

copper-cooled e o reformado “490”, rebatizado como Superior, lançando um novo modelo.

Sob o comando de William Knudsen, gerente geral, e Ormond E. Hunt, chefe de

engenharia, a Chevrolet lançou o Modelo K, aumentado em tamanho e espaço interno,

incorporando uma série de pequenas inovações em acessórios e com a nova pintura

Duco. A pintura Duco foi desenvolvida em parceria entre o GM Research Labs e a Du

Pont e resolveu uma das mais demoradas e custosas etapas de produção para que os

modelos pudessem ser oferecidos em cores diferentes6. Com isso, o novo modelo pôde

cumprir o objetivo de ocupar o topo da faixa mais baixa de preço e conquistar

consumidores de outros modelos. No ano, as vendas da Chevrolet aumentaram em 64%,

contra um crescimento de 18% da indústria. A participação de mercado foi de 8% para

11%, enquanto a da Ford caiu de 54% para 45%, com o volume permanecendo estável.

A Chevrolet foi a principal divisão a contribuir para que a GM alcançasse o topo da

indústria: suas vendas foram de 293 mil unidades em 1924 para 940 mil em 1927, ano em

6 No caso da Ford os modelos eram oferecidos apenas na cor preta, pois esta era a única cor que não exigia o uso de verniz e possuía secagem mais rápida, permitindo reduzir o tempo de fabricação do veículo.

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80

que tornou-se a marca mais vendida nos Estados Unidos. Diversos fatores contribuíram

para que a GM conquistasse tal posição. Segundo Sloan (1963), nos anos 1920 houve

uma transição na indústria automobilística, passando do mercado de massa, que originou

a produção em massa da Ford, para outro de massa em classes7. Para ele, a raiz de tal

transformação pode ser resumida, sem perdas significativas, a quatro elementos que

moldaram a indústria nos anos seguintes – o crédito ao consumo, a carroceria fechada, o

ano/modelo e o mercado de usados. A General Motors participou de forma ativa no

desenvolvimento destes elementos e tornou-se a maior empresa de sua indústria. Suas

práticas se estabeleceriam como referência para os concorrentes nas próximas décadas.

A General Motors não foi a primeira empresa automobilística a oferecer crédito ao

consumo, porém a GMAC, criada em 1919, desenvolveu um papel de liderança nesta

atividade na indústria. As políticas básicas da GMAC foram finalmente formuladas em

1925. Nos anos anteriores, a GM patrocinou estudos de crédito ao consumo, feitos pelo

professor E. Seligman, que se tornaram referência para outros bancos em gestão de risco

de crédito ao consumidor. Como resultado, A. L. Deane, vice-presidente da GMAC,

estabeleceu um sistema de provisão para perdas que limitava boa parte dos riscos do

distribuidor, em caso de não pagamento e impossibilidade de execução da garantia. Além

disso, a GM criou dentro da GMAC a General Exchange Insurance Corporation (GEIC),

que passou a oferecer aos compradores seguro contra danos físicos aos veículos. As

vendas financiadas na indústria, em 1925, foram em torno de 65% do total, e a venda de

seguros, em 1926, acompanhou 40% dos financiamentos vendidos pela GMAC.

A carroceria fechada também se tornou hegemônica nas vendas de automóveis

durante os anos 1920, conforme mostra o gráfico 4-1 abaixo, pois a substituição da

carroceria aberta pela fechada permitiu que o veículo fosse usado em diversas condições

de clima, sobretudo em regiões com inverno mais rigoroso. A GM havia adquirido 60% do

controle da Fisher Body em 1919, quando a carroceria fechada representava apenas 10%

das vendas da indústria, assegurando a prioridade no fornecimento de carrocerias na

tecnologia em que a Fisher era a principal referência da indústria. A fusão completa da

Fisher Body, tornando-se uma divisão da GM, ocorreu em 1926, em um episódio que

ganhou notoriedade devido às circunstâncias que tornaram desvantajoso o contrato de

garantia de compra para a GM e os altos valores negociados na compra do restante das

ações (COASE,R. 2000, 2006; KLIEN, B. 2000, 2007).

7 Tradução livre dos termos “mass market” e “mass-class market” em Sloan (1963, p 150)

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Gráfico 4-1 Evolução da participação da carroceria fechada nas vendas da indústria de 1919 a 1927 (em porcentagem)

Adaptado de Sloan (1963, p 152)

Após a trajetória de crescimento acelerado desde 1900, interrompido apenas por

alguns poucos e esparsos anos de recessão econômica, as vendas de veículos

mantiveram-se em um patamar em torno de quatro milhões de unidades por ano entre

1923 e 1928, exceção feita aos anos de 1924 e 1927, quando a recessão e a expectativa

sobre o novo modelo da Ford (1927) seguraram as vendas8. Com a estabilização dos

volumes, os comuns excessos de demanda em anos de crescimento deixaram de ocorrer,

e o número de fabricantes de veículos nos Estados Unidos reduziu de 108 em 1920 para

44 em 1929. A nova política de produtos da GM, embora não perfeitamente

implementada, evitou parte da competição entre divisões. Em 1926, as cinco divisões da

GM estavam posicionadas ao longo de faixas de preços, acima da Ford, e de maneira

razoavelmente separada, como mostra o gráfico 4-1 a seguir.

O sucesso do Modelo K da Chevrolet evidenciou a cristalização da mudança no

gosto do consumidor americano, o qual passou a valorizar o apelo de atributos de design

e novos acessórios que eram incorporados nos modelos. Segundo Sloan (1963), o

conceito de ano/modelo, que previa a mudança anual em toda a linha de veículos, não foi

estabelecido formalmente até o início dos anos 1930, mas, na prática, a General Motors

realizava mudanças anuais desde 1923 e, mesmo antes disso, ainda em 1908, novos

modelos eram apresentados todos os anos nos salões e feiras espalhados pelo país.

8 Gráfico da evolução das vendas de veículos na indústria norte-americana de 1900 a 2008 em anexo.

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Figura 4-1 Posicionamento de preço dos veículos de Ford e GM em 1926

0

0

1000

2000Ford Modelo T (14 variações)

1000

2000 Chevrolet Modelo K (5 variações)

0

1000

2000 Pontiac 110 WB (2 variações)

Oakland “6” (6 variações)

Pe

so d

o v

eíc

ulo

em

em

Kg

Preço em U$

0

1000

2000 Cadillac Standard Line (6 variações)

Cadillac Custom Built

Cadillac 138 WB (6 variações)

1000

2000 Buick Standard (6 variações)

Buick Master (3 variações)

Buick 128 WB (6 variações)

0

1000

2000 Oldsmobile “30” (6 variações)

0

Adaptado de compilação da publicação Motor Age de janeiro de 1926, encontrado em Chandler (1964)

A prática do ano/modelo, juntamente com a pirâmide de marcas, contribuiu para

encontrar a saída de um problema enfrentado pela indústria. Em uma estimativa

apresentada por Chandler (1964), o número de famílias com carros em 1926 girava em

torno de 19 milhões, cerca de 77% do total de famílias. Dos veículos em circulação, cerca

de 12 milhões eram Ford Modelo T. A estimativa de restar apenas 4,4 milhões de famílias

ainda não motorizadas, ou seja, o equivalente ao volume de vendas de um ano para a

indústria, indicava a gravidade do problema de Henry Ford em manter sua estratégia de

produção em massa. A alternativa para manter as escalas de produção na indústria

seguiu na direção das práticas da GM, que estimulava o consumidor a trocar seu veículo,

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fosse para ter acesso a inovações, fosse para subir na escala de preços e demonstrar

alguma melhoria de status social.

Para acelerar ainda mais o declínio do Ford Modelo T, o grande número de

veículos nas mãos dos americanos fez emergir um robusto mercado de veículos usados.

Com novos modelos sendo oferecidos, consumidores que desejavam trocar de carros

vendiam seus usados para realizar uma nova compra. Com o tempo, as lojas

concessionárias e agências de crédito, dentre elas as da GM, passaram a aceitar o

veículo usado como parte do pagamento de um novo e, em seguida, financiar a venda

daquele usado para um novo consumidor. Assim sendo, carros usados com melhores

atributos e mesmo a alternativa de um modelo igual, porém mais barato por ser usado,

passaram a competir diretamente com os veículos Ford que saíam da fábrica sem

inovações.

Em maio de 1927, após consecutivas quedas nas vendas, Henry Ford decidiu

fechar sua planta de River Rouge e a manteve sem produção por quase um ano,

enquanto transformava a linha para fabricar um novo carro, o Modelo A. Desta forma, o

caminho ficou livre para a Chevrolet assumir a ponta da indústria e, também, abriu espaço

para desafiantes, como o Plymouth de Walter Chrysler.

Segundo Sloan (1963), estas mudanças na indústria e na General Motors não

foram pensadas de forma conjunta e antecipada. As decisões eram avaliadas em cada

situação, como forma de resolver o problema daquele momento. O movimento como um

todo e a dinâmica entre seus elementos só foram razoavelmente esclarecidos olhando

para trás depois que tudo já havia ocorrido. Neste ambiente de intensa alteração na

prática de fabricar e vender automóveis, diversas atividades foram ocasionalmente

incorporadas à GM, de forma que suas evoluções fizeram emergir um sofisticado sistema

de coordenação da atividade de pesquisa e de desenvolvimento de novos produtos.

O sucesso do Modelo K desenvolvido pela Chevrolet em 1925 despertou a idéia

de replicar as inovações para outros segmentos. Olhando para a pirâmide de demanda e

para a linha de produtos das divisões da GM, duas lacunas entre os produtos

despontavam. A mais óbvia delas era entre o topo de linha da Buick (U$ 1995) e o mais

barato da Cadillac (U$ 2995). Mas, em termos de volume, o espaço entre o mais caro

Chevrolet (U$ 775) e o mais barato Oldmobile (U$ 875) representava um potencial

significativo. Sendo assim, o chassi e as carrocerias da Chevrolet foram adaptados para

receber um motor de seis cilindros. Conforme o tema do posicionamento do novo veículo

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foi debatido no CTG, a Oakland se manifestou interessada em receber o modelo de seis

cilindros. No entanto, temendo a limitação na capacidade de engenharia da Okaland,

Sloan decidiu que o desenvolvimento e o teste fossem concluídos pela experiente

engenharia da Chevrolet e, somente depois, o veículo seria designado para produção à

Oakland. Esta ocasião significou um importante aprendizado na coordenação de

desenvolvimento de engenharia entre divisões. O novo modelo foi chamado de Pontiac e

posicionado a U$ 825. Grande sucesso de vendas, esse veículo posteriormente definiu

uma nova posição para a divisão, que anos depois descontinuou o Oakland e mudou de

nome para Pontiac.

A outra lacuna na linha de produtos da General Motors era entre Cadillac e Buick.

Sloan propôs que a Cadillac adicionasse um novo veículo na faixa de U$ 2000. O gerente

geral da Cadillac, Lawrence P. Fisher, havia visitado algumas concessionárias na

Califórnia e descobriu um designer que, associado ao dono de uma loja, preparava carros

sob medida para estrelas de Hollywood. Fisher convidou o designer Harley J. Earl a ir a

Detroit trabalhar no desenvolvimento de seu novo carro. O resultado foi o La Salle,

lançado em 1927 e sucesso de vendas. O La Salle marcou a história da indústria, pois foi

o primeiro carro desenvolvido com participação de um designer de estilo a ser fabricado

em escala industrial. O êxito da inclusão do design no desenvolvimento de novos

produtos rapidamente despertou o interesse da Buick e, posteriormente, da Chevrolet.

Harley Earl foi contratado pela GM para iniciar o que se tornaria gradualmente o staff de

estilo.

Em 1928, quando a Ford lançou o Modelo A, a General Motors vendeu mais de

1,7milhão de veículos, sendo a Chevrolet responsável por mais de 65% desse volume. O

sucesso das práticas nas áreas de engenharia e de organização de vendas na Chevrolet,

e os desenvolvimentos de estilo na Cadillac fizeram com que Sloan iniciasse uma

tentativa de replicar boas práticas para o restante da organização. O. E. Hunt, chefe de

engenharia, e Richard Grant, responsável pela área de vendas, foram promovidos a vice-

presidentes das áreas de engenharia e vendas, respectivamente. O staff de operações

era restrito, nesta época, às atividades de pesquisa avançada no GM Research Labs, às

atividades de testes do campo de provas e à recém-criada sessão de estilo de Harley

Earl.

Com Hunt à frente do CTG, o comitê passou a coordenar grupos de estudos de

projetos de produtos especiais. Estes grupos eram executados por equipes de força-

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tarefa formadas por membros das divisões, tendo eventuais despesas custeadas pela

corporação. O primeiro grupo a ser formado por Hunt, em 1929, foi incumbido de adaptar

um Chevrolet para ser produzido pela subsidiária Vauxhaull, adquirida na Inglaterra em

1925. O mesmo grupo desenvolveu também um carro para a subsidiária Opel, adquirida

na Alemanha, em 1929. Gradualmente foram formados grupos de estudos de partes dos

veículos, como suspensão, transmissão e motor. Assim, as atividades dos grupos, apesar

de freqüentemente serem executadas nas divisões, foram sendo transferidas para uma

emergente organização de pesquisa e desenvolvimento em quatro áreas vitais:

desenvolvimento de transmissões; desenvolvimento de estruturas; desenvolvimento de

suspensão; e design e novos tipos de carros.

Ao final de 1928, a General Motors tinha motivos para comemorar seu

desempenho na década. De um início em crise, com prejuízo, queda nas vendas e na

participação de mercado, a General Motors passou a ser líder em vendas e em lucros.

Seus modelos faziam sucesso no mercado, com a participação saindo de menos de 20%

para mais de 40%. Todo esse desempenho encheu o orgulho e o bolso dos gerentes.

Em 1923, John Raskob havia criado, além do plano de bônus para os

empregados, a Managers Securities Company (MSC), uma empresa com o objetivo de

aumentar o vínculo de propriedade de alguns gerentes com a General Motors. O sistema

foi estruturado da seguinte maneira: a MSC comprou um lote de ações da General Motors

a um preço pré-estabelecido e pagou emitindo títulos de dívida pré-fixados, com prazo de

oito anos, e comprados pela própria GM. Paralelamente, a MSC emitiu ações que foram

oferecidas a um seleto grupo de 80 gerentes. Ao optar por comprar sua cota, um gerente

pagaria uma entrada em dinheiro e o saldo no prazo de oito anos, podendo usar futuros

bônus e dividendos da GM para isso. Os 80 gerentes eram indicados por seus superiores

e aprovados por um subcomitê do conselho de administração. Durante o prazo do

programa, o gerente passaria por avaliações anuais, e a GM poderia recomprar as ações

dos gerentes caso este pedisse demissão ou tivesse um baixo desempenho. Ao final de

oito anos, os gerentes poderiam resgatar suas cotas compradas no começo do programa,

recebendo-as na forma de ações da GM em seu preço corrente.

Ainda em 1928, o conselho de administração assistiu à saída de seu presidente

Pierre du Pont e de John Raskob. Raskob decidiu participar da campanha presidencial do

partido democrático e foi pressionado por Sloan e outros membros do conselho a optar

entre a GM e a política. Pierre du Pont tentou defender a continuidade de seu ex-

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tesoureiro, mas diante da irredutibilidade de Sloan e dos demais membros do conselho,

decidiu acompanhar a renúncia de John Raskob. No lugar de Pierre du Pont assumiu

outro membro da família, Lammont Du Pont, e a presidência do CF passou para

Donaldson Brown. Uma das primeiras medidas tomadas pelo conselho de administração

sob o comando de Lammont Du Pont foi antecipar o resgate da MSC para 1929, a fim de

iniciar outro programa semelhante, desta vez através da Management Corporation (MC),

que ampliou o número de gerentes contemplados de 80 para 250. Os gerentes

beneficiários do programa realizaram lucros enormes, uma vez que compraram suas

cotas em uma época de baixa e praticamente não tiveram que desembolsar o restante

das parcelas, já que os próprios dividendos distribuídos foram suficientes para a

amortização.

4.1.8. A grande depressão e a consolidação dos comitês

O ano de 1929 apresentou em boa parte uma aceleração do crescimento da

indústria. As vendas atingiram o volume recorde acima de 5,3 milhões, elevando o

patamar de quatro milhões nos anos anteriores. A General Motors também fechou o ano

com recorde em vendas, cerca de 1,8 milhões de veículos, mas sua participação de

mercado caiu de 39% para 34%. A Ford, com seu Modelo A, ficou próxima dos 30%. Em

maio de 1929, porém, o sistema de revisão decenal da projeção de vendas da GM

antecipou a sutil inversão nas tendências de evolução do mercado. Três semanas antes

da quebra da bolsa de Nova York no final de outubro, Sloan havia alertado acionistas

sobre a perspectiva de um longo período de queda na rentabilidade.

A grande depressão iniciada no final de 1929 produziu conseqüências

devastadoras na indústria automobilística. O volume de vendas caiu 72% entre 1929 e

1932, chegando ao nível de 1,9 milhões de unidades. Dos 44 fabricantes no início dos

anos 1930, somente oito mantiveram-se em atividade até o final da década. A General

Motors também viu sua operação encolher, entretanto, os controles gerenciais

desenvolvidos ao longo dos anos 1920 permitiram que a GM atravessasse a mais grave

crise econômica da história dos Estados Unidos sem apresentar prejuízos em um ano

sequer. Apesar da natureza de altos custos fixos e mantendo a operação apenas a 30%

da capacidade, a GM, com seu standard-volume, conseguiu produzir um lucro de U$ 165

mil em 1932, o pior ano da depressão. A participação de mercado subiu para 38% durante

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a crise, e a quase totalidade dos baixos lucros gerados foram distribuídas em dividendos,

que também tiveram seu nível reduzido em relação aos anos anteriores.

Para lograr tal resultado, novos investimentos foram praticamente eliminados da

pauta do CE, dado que as perspectivas de retorno eram quase nulas. No ano de 1932,

foram gastos apenas U$ 5 milhões em novos equipamentos nas plantas, enquanto nos

cinco anos entre 1930 e 1934 gastos como estes totalizaram U$ 81 milhões. Durante a

depressão, alguns equipamentos ociosos foram retirados da linha, e o desenvolvimento

de produtos que envolviam novas tecnologias também foi suspenso. Por exemplo: o uso

de vidros laminados que havia sido lançado no Modelo A da Ford era considerado uma

melhoria significativa em termos de segurança em relação ao vidro comum, que era

utilizado até então. Sloan resistiu durante três anos à adoção da nova tecnologia de

vidros, alegando que o consumidor não iria pagar a mais pela inovação e,

conseqüentemente, o valor teria de sair do bolso do acionista.

Ainda antes da quebra da bolsa de valores, em setembro de 1929, a GM deu mais

um passo na construção de sua estrutura corporativa. O CO, que reunia os gerentes

gerais das divisões, passou a ter sessões conjuntas com o CE, mas os representantes

das divisões foram substituídos pelos executivos que haviam sido recém-promovidos aos

cargos de vice-presidentes, responsáveis pelos staffs de finanças e operações. Desta

forma, o CO foi composto da seguinte maneira: John T. Smith, Albert Bradley, Richard

Grant e Ormond Hunt, que eram respectivamente vice-presidentes de assuntos jurídicos,

finanças, vendas, engenharia. Juntou-se a este grupo Charles E. Wilson, um engenheiro

que havia apresentado excelentes resultados na divisão Delco-Remy, galgando posições

e chegando ao topo em 1925, quando foi nomeado vice-presidente de operações.

Em junho de 1931, Alfred Sloan determinou a criação de grupos consultivos.

Segundo o próprio Sloan (1963), este seria o primeiro passo para a nova organização que

tinha em mente. Os grupos consultivos foram a transição entre os grupos de estudos de

projetos especiais, formado por membros das divisões, para o que ficou conhecido

posteriormente como staff de operações ou staff corporativo. Estes grupos passaram a

operar através dos comitês gerais no levantamento de fatos e dados, análise e proposição

de políticas para o CO e a CE.

Apesar da grave situação da economia, a General Motors manteve suas divisões

de automóveis operando, apenas com a troca do nome Oakland por Pontiac. Contudo,

diante do aprofundamento da recessão, em março de 1932 o CO apresentou uma

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proposta para reformular a política de produtos da GM. Com a aprovação, o sofisticado

arranjo de divisões, que formava a pirâmide de marcas e havia sido grande sucesso na

década de 1920, sofreu mudanças radicais. As atividades de produção da Chevrolet e da

Pontiac foram unificadas e colocadas sob o comando de William Knudsen. As áreas de

vendas das marcas que disputavam os segmentos intermediários, Buick, Oldsmobile e

Pontiac, foram fundidas em uma única organização denominada com a sigla BOP. As

lojas concessionárias das três bandeiras passaram a vender os modelos dessas divisões.

A decisão do CE da General Motors foi uma resposta ao entendimento de que,

com a recessão, o mercado anteriormente já reduzido, concentrava-se ainda mais em

veículos menores e mais baratos – 73% em 1932 contra 52% em 1926. Com isso, o plano

de diferenciar marcas em função de tamanho e sofisticação de acessórios foi trocado por

outro que teve como objetivo unificar chassis e carrocerias em somente três tamanhos, a

serem usados de forma comum entre as divisões, otimizando lotes de compra e o

processo de produção. A diferenciação entre as marcas se daria através da sessão de

estilo, que à época já estava integrada às atividades de desenvolvimento e possuía em

seu espaço, no prédio da GM Resarch Labs, estúdios e equipes dedicados a cada

divisão.

A única divisão de veículos a permanecer intacta foi a Cadillac, que dispunha de

distinção especial de sua marca, embora viesse perdendo mercado para a luxuosa

concorrente Packard. Em Junho de 1932, com as vendas em baixa, o CE considerava a

hipótese de replicar a estratégia de concentrar as vendas em produtos posicionados com

preços mais baixos, neste caso, abandonando os modelos superiores da Cadillac e

mantendo esforços sobre o La Salle. Entretanto, uma proposta alternativa emergiu de

dentro da divisão. Sabendo da intenção do CE em descontinuar o topo da linha da

Cadillac, o ex-mecânico e gerente de serviços da divisão, Nicholas Dreystadt, pediu uma

reunião com Sloan e Brown. Do contato com a rede de distribuição, Dreystadt tinha

aprendido que o Cadillac era um grande parâmetro de sucesso para uma pequena

burguesia de negros emergente nas cidades americanas. A venda de Cadillac, assim

como outros bens e serviços de luxo, era proibida para negros nos Estados Unidos, mas

comumente eles pediam a intermediação de brancos para comprarem um Cadillac, o qual

passou a ser uma das poucas formas de demonstração de status para essas pessoas.

Dreystadt ganhou um prazo de 18 meses para estabelecer este mercado e, em 1934, a

Cadillac já estava de volta aos lucros.

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Com o anúncio de Lammont Du Pont, em 1933, de que ele e a Du Pont deixariam

de ocupar a presidência em favor de Sloan, novas alterações no quadro de executivos

foram realizadas. Um novo grupo de gerentes assumiu o posto principal nas divisões, em

substituição aos que foram promovidos para compor a estrutura corporativa que se

formava ou se aposentaram. As divisões passaram a responder diretamente a William

Knudsen, promovido da Chevrolet para ocupar o novo cargo de vice-presidente de

operações e que seria o representante das divisões nos comitês da GM. Alfred Sloan

passou a acumular as presidências do conselho de administração e da General Motors, o

que lhe fazia também presidente do CE. Esta movimentação foi também uma sinalização

de um plano de sucessão que colocou Knudsen como sucessor natural de Sloan.

Em 1934, a indústria apresentava indícios de recuperação. Apesar das vendas

ainda serem inferiores ao patamar de antes da crise, o ano fechou com um aumento de

44% no volume em relação ao ano anterior – o dobro se comparado ao pior momento da

crise, dois anos antes. Com isso, a General Motors desfez a unificação de atividades das

divisões, como a BOP e a produção conjunta entre Chevrolet e Pontiac. Entretanto, a

comunização de chassis e carrocerias em três versões de tamanho (A, B e C) foi mantida.

O A body, como era chamado, era usado pelos modelos da Chevrolet; o B body, pela

Pontiac, Oldsmobile e Buick; e o C body, por Cadillac e os modelos maiores de Buick e

Oldsmobile. Desta forma, a diferenciação entre as marcas continuou a depender em

grande parte do design.

Ainda em 1934, uma nova mudança na estrutura marcou a evolução da gestão

corporativa da General Motors para o sistema que posteriormente ganhou notoriedade,

chamado de “gestão por políticas”. Os primeiros grupos de políticas foram criados em

outubro de 1934. Eram eles: Grupo de Política de Engenharia (GPE) e Grupo de Política

de Preços (GPP), ambos evoluções naturais dos comitês de política liderados pelos vice-

presidentes de engenharia (CTE) e de vendas (CGV). A diferença entre os grupos de

políticas e seus predecessores era a eliminação da participação formal dos gerentes das

divisões e, conseqüentemente, na formulação de políticas. Os membros das divisões

foram substituídos por executivos de staff, cuja formação iniciara-se em 1931 com a

formação dos grupos consultivos. Participavam ainda outros executivos corporativos,

incluindo o presidente da GM. As divisões ficaram com a responsabilidade administrativa

de implementar as políticas aprovadas.

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Esses grupos de políticas respondiam para o CE e não possuíam autoridade sobre

as divisões, nem aprovavam políticas. Sua responsabilidade era coordenar a formulação

de políticas para a corporação e submetê-las ao CE, que possuía autonomia para

aprovar, recusar ou solicitar alterações. Entre 1934 e 1937 nove grupos de política foram

criados, divididos em conjuntos de dois tipos: aqueles cujo nome indicava uma área

funcional – Engenharia, Distribuição, Pesquisa, Recursos Humanos e Relações Públicas;

e outros cujo nome se referia a uma operação propriamente dita – Mercados Externos,

Canadá, Motores Gerais e Utilidades Domésticas. O primeiro conjunto era mais

relacionado à atividade automotiva, e os trabalhos eram conduzidos pelo staff relacionado

à determinada funcionalidade. O segundo conjunto funcionava sob a responsabilidade de

um executivo de grupo que coordenava um staff dedicado àquela operação. Os grupos de

políticas, em especial o de GPE, foram a forma que a GM encontrou para coordenar as

atividades das divisões, cujos veículos eram compostos de uma grande quantidade de

componentes, com fornecedores internos e externos, e que possuíam evoluções

tecnológicas independentes. Além disso, as linhas das divisões deveriam se diferenciar

umas das outras em relação ao estilo, sendo que cada modelo de veículo tinha de ser

renovado ano a ano.

Em sua autobiografia, Sloan (1963) descreve um procedimento para

desenvolvimento de novos modelos que, segundo ele, foi formalizado a partir do GPE por

volta de 1935 e consolidou diversas práticas de desenvolvimento de produtos,

emergentes desde a década de 1920, em um sistema em que o staff de engenharia por

meio do GPE coordenava as ações das várias áreas envolvidas em pesquisa, estilo,

fabricação e comercialização de veículos. Ainda de acordo Sloan (1963), o protocolo que

ele descreve passou por revisões de tempos em tempos, mas de maneira geral manteve

a base até a década de 1960, quando ele se afastou da GM.

Anualmente os veículos eram remodelados, adotando novos atributos de design,

de acabamento e de acessórios. Outras alterações mais profundas em sua estrutura de

chassi, carroceria e mecânica também ocorriam, mas estas geralmente possuíam um

intervalo maior, de quatro a seis anos. O ciclo de desenvolvimento para troca do

ano/modelo levava cerca de dois anos. O primeiro ano se concentrava na definição do

design e na preparação dos programas de lançamento, quando uma elaborada seqüência

de aprovações consolida uma proposta de design interno e externo para toda a linha da

GM, além de todo orçamento de custos e investimento para produção e comercialização.

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No segundo ano, as divisões implementavam o sistema de produção e realizavam testes

de desempenho e durabilidade dos novos modelos. O fluxo dos processos para

desenvolvimento de novos modelos é apresentado a diante.

De acordo com Sloan (1963), a seqüência de revisões do desenvolvimento do

design dos produtos na primeira metade do ciclo apresentado minimizava a chance de

ocorrer desistência ou mudanças radicais em uma etapa mais avançada do

desenvolvimento de um veículo, embora eventualmente isto tenha ocorrido. O processo

também poderia ser acelerado em relação a um ou outro modelo, em virtude de algum

lançamento feito por um concorrente.

A descrição do processo deixa claro também como ocorria a separação das

atividades de formulação de políticas nos grupos e comitês e a administração da divisão.

Apesar de não participar diretamente na materialização das idéias para a nova linha,

segundo Sloan (1963), havia um processo de feedback informal que ocorria antes e

durante o desenvolvimento, entre os engenheiros do staff e das divisões. Além disso, os

gerentes das divisões eram eventualmente convidados a participar das reuniões do staff

de engenharia que diziam respeito a seus produtos. Assim, estabelecia-se uma dinâmica

de persuasão mútua e negociação de consenso sobre conceitos técnicos e de estilo a

serem implementados.

Com a redução do investimento em novas tecnologias, em função da grande

depressão, alguns concorrentes passaram a construir uma reputação com o lançamento

de inovações, como o compacto de motor V-8 lançado pela Ford. A resposta da GM foi

concentrar-se no desenvolvimento de novos desenhos para seus veículos. Por exemplo,

em 1932, a sessão de estilo sugeriu que o porta-malas fosse montado já na estrutura da

carroceria, cobrindo o tanque de gasolina, e não pela fixação de um suporte como era

utilizado. O teste foi feito com o Cadillac naquele ano e replicado para a Chevrolet no ano

seguinte. Diante da boa aceitação, outros modelos foram incorporando o novo desenho.

O mesmo ocorreu em 1934, quando a indústria siderúrgica desenvolveu folhas de aço de

80 polegadas de largura. O teto feito em aço anteriormente havia sido rejeitado devido ao

barulho causado pela vibração. Com a nova tecnologia, os “turret tops” começaram a

equipar os veículos da GM em 1834 e logo se tornaram grande sucesso.

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Figura 4-2 Fluxograma do processo de desenvolvimento de novos modelos entre 1935 e 1962

Feedback

informal sobre

modelos anteriores

junto às

divisões

Staff de

estilo

Fisher

Body

Staff de engenharia

(Comitê de política

de engenharia)

Executivos corporativos

(comitê executivo)

Staff de Finanças

(Comitê de política

Financeira)

Divisão de

veículos

Análise das

inovações das

divisões, staffs e

laboratórios

Kickoff meeting:

diretrizes gerais

de estilos e programas

Preparação

dos modelos

de argila em tamanho real

Meses 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24

Aprovação

do estilo dos

modelos em argila

Preparação

de modelos

em plástico

Preparação

de

modelos em plástico

reforçado

Aprovação de

medidas da

carroceria

Aprovação

das medidas

de chassis

Aprovação

do estilo

para toda a linha

Estimativas de custo de

fabricação de peças,

ferramentas e preparação das fábricas

Ajuste de detalhes

de acabamento,

instrumentos e acessórios junto as

divisões de

veículos

Desenho de peças

distribuídos aos

departamentos para estimativas

de custo de

fabricação

Estimativas de custo de

peças e investimentos para

produção e comercialização

Aprovação dos

programas de

novos modelos

Aprovação

do EC

Aprovação

da FPC

Início da

produção de

ferramentas para linha piloto de

protótipos

Engenharia de

produção consulta

engenharia dos fornecedores

Comitê decide

comprar ou fazer

Protótipos

artesanais

de chassis

Carrocerias

usadas

para protótipos

Testes de rodagem de

protótipos para

correção de erros

Planejamento e

seqüenciamento das

operações de manufatura e montagem

Início

das

vendas

Preparação da

linha de

montagem

Início da

fabricação

dos modelos

testes corporativos

realizado no campo de

provas para identificação de falhas

Planejamento e

seqüenciamento das

operações de manufatura

Preparação

da linha de

montagem

Início da

fabricação

dos modelos

Fonte: adaptado do processo descrito em Sloan (1963, p. 240-246)

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Mesmo com investimento em inovações de engenharia andando em ritmo lento,

em virtude da crise, a ligeira melhora do mercado a partir de 1933 despertou a busca por

inovações mecânicas nas engenharias das divisões. Em 1934, a Cadillac desenvolveu a

primeira transmissão automática a ser produzida em escala industrial, lançando o câmbio

hidramático. Simultaneamente, outras inovações foram gradualmente sendo

apresentadas pelas divisões, como, por exemplo, transmissão automática para

caminhões, suspensão dianteira independente, suspensão tipo wishbone, câmbio semi-

automático e transmissão I.V.

Até o ano de 1937, quando o volume de vendas se aproximava do nível de cinco

milhões de veículos atingidos em 1929, o desenvolvimento de inovações de design e

engenharia havia se tornado o principal meio de competição perseguido pelos fabricantes

de veículos. Com isso, a sessão de estilo da General Motors criou mais uma ferramenta

para ajudar no desenvolvimento de novos conceitos de design. Em 1937, a Buick e o staff

de estilo lançaram a idéia de exibir um carro com conceitos de design experimentais

durante o salão do automóvel e perceber qual era a reação do público. Os conceitos

apresentados em protótipos experimentais não seriam lançados na linha de produtos

daquele ano, mas contribuíam no desenvolvimento de modelos futuros na medida em que

permitiam ao designer ter uma idéia melhor sobre o gosto do consumidor.

O início da recuperação da economia americana ao final da primeira metade dos

anos 1930 fez com que outros negócios não automotivos da General Motors, iniciados

timidamente durante a década de 1920, também prosperassem. Um desses negócios era

a Frigidaire. Durante a década de 1920, quando a Frigdaire foi incorporada à Delco,

diversas melhorias desenvolvidas pela equipe de pesquisa do GM Research Labs, como

em materiais para isolamento térmico e gases de resfriamento, tornaram o produto mais

eficiente, leve e barato. Em 1928, a atividade fabril da Frigidaire já havia sido removida da

planta de Northway para Moraine e, em 1933, tornou-se uma divisão dentro da GM.

A General Motors também havia decidido diversificar sua atividade para a indústria

aeronáutica, temendo que o surgimento de um avião de baixo custo pudesse ameaçar o

negócio automotivo. Em 1929, com um investimento de U$ 23 milhões, três empresas

foram adquiridas, duas apenas por meio de participação acionária e outra por completo. A

GM adquiriu 40% da fabricante de aeronaves Fokker Airkraft Corporation of American. Em

1933, a Fokker fundiu-se com a General Aviation Manufacturing Corporation, formando a

holding North American Aviation, da qual a GM passou a ter 30% . Outra empresa de

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relativo sucesso na fabricação de aviões foi a Bendix, sobre a qual a GM adquiriu 24%

das ações. Além dessas, a GM também adquiriu integralmente a Allisson Engineering

Company, uma empresa pequena, com cerca de 200 empregados e que custou pouco

mais de U$ 500 mil. O relacionamento da General Motors com essas empresas era

limitado. Em duas delas, representantes da GM apenas ocupavam um assento no

conselho de diretores, enquanto a Allisson permaneceu como um investimento em

engenharia, tentando desenvolver motores para aviões pequenos.

Durante a grande depressão, a principal alteração nos investimentos da GM em

aviação foi a determinação judicial, após a aprovação do Air Mail Act em 1934, que

obrigou a North American a se desfazer de participações em empresas operadoras de

transporte aéreo, como a Eastern Air e a Trans World Airlines (TWA), usadas para

controlar a fabricação e a operação de aeronaves. As ações das empresas de transporte

aéreo foram distribuídas aos acionistas da North American, dentre eles a GM, que

recebeu 13% das ações da TWA e as vendeu em 1935. Apesar dos negócios na indústria

aeronáutica caminharem de forma razoável durante os anos 1930, ao final da década,

com o início da Segunda Guerra Mundial, as três empresas nas quais a GM havia

investido começaram a apresentar resultados que indicavam o período de lucros que

estaria por vir.

Outra atividade não ligada ao automóvel na qual a General Motors se aventurou e

teve uma importante evolução durante os anos 1930 foi a inauguração da indústria de

locomotivas a diesel. Charles Kettering, chefe do GM Research Labs, já havia estudado

motores a diesel no início da década de 1920, mas foi em 1928, após comprar para si um

iate, que o interesse pelos problemas desta tecnologia de motores chamou-lhe a atenção.

Uma equipe de engenheiros de Kettering realizou testes com todos os motores a diesel

oferecidos no mercado e, depois dos estudos realizados, combinou algumas soluções já

conhecidas a um sistema de injeção de combustível e a uma bomba de alta precisão

capaz de injetar o diesel em alta pressão, viabilizando um motor de dois tempos (two-

cycle) de alta velocidade. Ao longo de 1930, a GM adquiriu duas empresas associadas, a

Winton Engine Company e a Electro-Motive Engineering Company, que desenvolviam e

fabricavam motores a diesel, especialmente para barcos.

Por um tempo, as duas empresas operaram como antes de serem adquiridas, mas

em 1932, Charles Kettering decidiu fabricar um motor a diesel de dois tempos, com oito

cilindros, que produziriam 600 cavalos de potência, pensando que haveria boa utilidade

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aplicando-o para gerar energia durante a exposição da World’s Fair de Chicago, em 1933.

Antes mesmo de o novo motor ser completado, Ralph Budd, presidente de uma empresa

operadora de estradas de ferro, ficou sabendo por um amigo sobre as intenções de

Kettering e pediu que o motor equipasse um trem articulado para o transporte de

passageiros. Kettering resistiu à idéia, por se tratar ainda da primeira versão, mas a

insistência de Ralph Budd o convenceu e, em 1934, o motor estava pronto para ser

testado. Após alguns ajustes, o motor apresentou um desempenho surpreendente de

velocidade e de custos de operação em relação à alternativa de locomotivas a vapor, a

gasolina ou elétricas. Antes mesmos dos testes finais, Charles Budd já havia

encomendado motores maiores e com o dobro da potência para locomotivas maiores,

sendo entregues a partir de 1935. Rapidamente os motores de Kettering tornaram-se

sucesso entre empresas ferroviárias, que começaram a pedir que a Winton fornecesse

locomotivas completas e não apenas os motores.

Em 1935, Charles Kettering e Harold Hamilton, presidente da Winton que

permaneceu no cargo após a aquisição, decidiram iniciar uma nova planta para fabricação

de locomotivas a diesel. A fábrica ficou pronta em 1938, em La Grange, Illinois, quando a

Winton, cujo nome mudou para Cleveland Diesel Engine Division (CDED), passou a

fornecer locomotivas e carros de movimentação de vagões.

Apesar da recuperação da economia e dos negócios da GM na segunda metade

dos anos 1930, a grande depressão teve um efeito severo sobre um dos mecanismos

criados pela GM para motivar seu corpo de gerentes. No meio do período de recessão,

em 1933, a queda nos preços das ações e a redução dos dividendos fizeram com que

muitos gerentes ficassem temerosos com o risco de não ser possível recuperar o

investimento que vinha sendo feito no programa de compra de ações. Sloan pediu para

que o CF analisasse a possibilidade de realizar alterações no programa a fim de aliviar a

possibilidade de perdas para os gerentes, que já vinham tendo seus bônus

compulsoriamente absorvidos pela GM para o pagamento das parcelas do plano. No ano

seguinte, a estrutura do plano incorporou algumas mudanças, reviram valores a serem

pagos pelos gerentes e, principalmente, constituiu um fundo que criava uma provisão para

ressarcimento dos gerentes em caso de as ações estarem desvalorizadas no momento do

resgate.

Ao final de 1935, com a economia sinalizando uma recuperação, a General

Motors, após realizar um estudo da capacidade de suas fábricas que haviam sido

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reduzidas durante a depressão, aprovou um tímido programa de expansão, no total de U$

50 milhões. No ano seguinte, o problema de falta de capacidade persistiu: a Chevrolet,

cujas vendas voltaram a ultrapassar a casa de um milhão de veículos em 1935 e 1936,

teve problemas em atender a demanda, e outras fábricas da GM, incluindo as divisões

não-automotivas, passavam por dificuldade semelhante. Isso e mais a tendência de

redução da jornada semanal de trabalho levaram a GM a aprovar mais um programa de

U$ 60 milhões para ampliação e modernização de plantas, que foi implementado em dois

anos.

Em maio de 1937, o conselho de administração aprovou uma mudança na

estrutura de comitês no topo da organização. A mudança arquitetada por Sloan e

Lammont Du Pont reduziu o número de integrantes do Conselho de Administração, para

que este pudesse se reunir mensalmente, e unificou os Comitês de Finanças (CF) e

Executivo (CE), transformando-os no Comitê de Política (CP). Além disso, o CO foi

substituído pelo Conselho de Administração (CA) e passou a ser formado inteiramente

pelos gerentes das divisões. Desta forma, a nova dinâmica da formulação de políticas

ficou da seguinte maneira: os grupos de políticas, formados exclusivamente por

executivos corporativos e de staff, continuavam subordinados ao CE, estudando e

formulando propostas de novas políticas. As propostas formuladas nos grupos eram

encaminhadas antes para o CA, que não tinha poder para aprová-las e apenas

encaminhava para o CE, acompanhadas de recomendações de aprovação, alteração ou

rejeição. Por fim, já apontado como natural sucessor para o comando da GM, William

Knudsen foi promovido a presidente, enquanto Sloan ainda permanecia como presidente

do Conselho de Administração e do CP.

4.1.9. Relações trabalhistas e a greve de ocupação de 1936-1937 (sit-down strike)

Os anos de depressão econômica foram sofridos para o trabalhador americano

das linhas de produção da indústria automobilística. O número de empregados, que era

de 470 mil em 1929, caiu pela metade, e a média do salário semanal foi de U$ 33 para U$

20. Como tentativa de reverter a forte recessão, em 1933, o presidente dos Estados

Unidos, Franklin Roosevelt, eleito no ano anterior, deu início à sua política do New Deal. A

política consistiu na criação de agências e regulamentações que visaram intervir em

setores da economia, como bancos, agricultura e indústria e gastos públicos, na tentativa

de coordenar uma recuperação do crescimento. Um das ações lançadas pelo New Deal

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foi a aprovação do National Industry Recovery Act. (NIRA), que teve como objetivo

estabelecer critérios para assegurar empregos e salários, dentre eles a redução da

jornada semanal e o fim do trabalho infantil. A operacionalização do NIRA começou com a

criação do National Recovery Administration (NRA), que teria a incumbência de

intermediar empresas e trabalhadores na criação de novos códigos.

A reação da General Motors ao NIRA foi a de aparentar apoio, enquanto agia

discretamente para minar sua legitimidade. Publicamente, assim como várias outras

grandes empresas, a GM aderiu à campanha em favor da criação de códigos de

competição justa na indústria e da geração de empregos, exibindo o adesivo de membro

do NRA em seus produtos e adotando o teto para jornada de trabalho de 48h semanais.

No entanto, o NIRA previa também o estabelecimento de negociações coletivas dos

contratos de trabalho, o que era um assunto considerado de alto risco. Assim sendo, a

GM também passou a financiar, através de seu acionista controlador, Du Pont, a

American Liberty League (ALL), que foi fundada em 1934 para fazer oposição ao NIRA e

ao presidente Roosevelt. A ALL não obteve sucesso em evitar a reeleição do presidente

em 1936, porém, em 1935 o NIRA foi considerado inconstitucional pela suprema corte dos

Estados Unidos, por interferir, por meio da fixação de salários, na soberania dos estados

para regulação do comércio dentro de seus territórios.

A aprovação do NIRA despertou a movimentação dos trabalhadores americanos

no sentido da organização sindical. A principal organização sindical americana para os

trabalhadores da indústria era a American Federation League (AFL), fundada em 1881

para representar o interesse dos sindicatos dos artesãos. A AFL teve dificuldades em

exercer uma representação plena dos interesses dos operários da indústria

automobilística até meados da década de 1930, pois o surgimento das técnicas de

produção em massa, levando ao uso intenso de mão-de-obra não-qualificada, ia de

encontro ao princípio da valorização da qualificação do artesão, grupo hegemônico na

AFL. A despeito das deficiências da AFL, a General Motors não se limitou a assistir à

distância as tentativas de organização dos trabalhadores. A partir de 1933, a GM

contratou agências de detetives, dentre elas a Pinkerton, e infiltrou agentes disfarçados

em suas linhas de produção. De acordo com Cray (1980), a GM se tornou a maior

empregadora de detetives dos Estados Unidos entre 1933 e 1936, gastando algo em

torno de U$ 1 milhão pelo serviço de não menos do que 15 agências.

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A resposta do presidente Roosevelt à derrubada do NIRA foi a aprovação do

National Labor Relations Act (NLRA), também conhecido como Wagner Act, em julho de

1935. A nova legislação assegurou o direito do trabalhador de filiar-se ao sindicato,

proibindo qualquer reprimenda por parte do empregador, e estabeleceu a negociação

coletiva entre o empregador e um representante de escolha da maioria dos empregados.

O NLRA estabeleceu também a criação do National Labor Relations Board (NLRB),

conselho responsável por fiscalizar e investigar suspeitas de violação da nova legislação.

Assim como o NIRA, o NLRA também seria questionado judicialmente. A decisão final da

Suprema Corte americana ocorreu somente em 1937 e, desta vez, foi em favor da

legislação. Porém, antes mesmo do reconhecimento definitivo, as novas regras

produziram um grande impacto na relação com empregados na General Motors e no

restante da indústria.

Com a porta novamente aberta, sindicatos ligados à AFL retomaram suas

atividades para organizar a representação dos trabalhadores. Em maio de 1935, um

grupo de sindicatos organizou dentro da AFL o Congress of Industrial Organization (CIO),

como forma de tentar centralizar os interesses dos trabalhadores das indústrias. No

processo de criação do CIO, foi formado o United Auto Workers (UAW) para ser o

sindicato que representaria o interesse dos trabalhadores da indústria automobilística. Em

1936, a AFL tentou impedir a formação do grupo dentro de sua organização, no entanto, a

posição contrária da AFL teve efeito inverso e contribuiu para fortalecer o CIO, que

passou a se organizar fora da AFL. Os esforços do CIO se concentraram inicialmente

sobre a indústria siderúrgica, mas o UAW decidiu não esperar a liderança do CIO para se

estabelecer como representante dos trabalhadores e em 1936 mobilizou os operários

para estabelecer a negociação com as montadoras.

O UAW escolheu a General Motors como primeiro alvo9, dentre as três grandes

fabricantes, em sua estratégia para ser reconhecida pela indústria automotiva. Uma greve

foi planejada para iniciar em janeiro de 1937, após o pagamento do bônus de final de ano,

que ajudaria as famílias dos operários durante a greve. Os planos do UAW apontavam

para a planta N° 1 da Fisher em Flint que, por concentrar a pintura das carrocerias nos

novos modelos para 1937, poderia rapidamente parar boa parte da produção da General

Motors. A idéia de realizar uma greve contra a GM na cidade de Flint não era uma tarefa

9 Segundo Rubenstein (2001), a Ford foi descartada pelos métodos violentos de repressão de seus agentes de segurança. A Chrysler, que seria uma escolha mais lógica, já havia organizado negociações coletivas com a representação sindical da AIWA

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fácil. A GM empregava um quarto de toda a população da cidade, possuía grande

influência sobre a prefeitura e a polícia da cidade e seus detetives infiltrados ocupavam

inclusive dois assentos no comitê local do UAW.

Ao final de 1936, o UAW teve dificuldades em conter o ímpeto dos trabalhadores

de iniciar a greve. A reeleição de Roosevelt e as vitórias que outras organizações locais

do UAW vinham conseguindo em plantas de fornecedores e da própria Fisher, em outras

cidades como Detroit e South Bend, Clevland, Atlanta e Kansas City, ameaçavam se

espalhar por outras plantas antes de o UAW estar pronto em Flint. O UAW acelerou a

realização da primeira manifestação de greve em 30 de dezembro de 1936, ocupando as

plantas N° 1 e N° 2 em Flint. A notícia da greve se espalhou e trabalhadores de fábricas

da GM em outras cidades também organizaram paralisações no início de janeiro. A

General Motors entrou na justiça e obteve um mandado de segurança para desocupação

das plantas. Porém, antes que o mandado fosse cumprido, o UAW reverteu a decisão ao

comprovar que o juiz havia violado a lei, pois era detentor de ações da General Motors.

Em 11 de janeiro, um conflito com a polícia de Flint iniciou-se na planta N°2

quando membros do UAW tentaram forçar a entrega de comida para os grevistas. A ação

dos policiais e a reação dos grevistas deixaram 14 feridos e isolou os trabalhadores de

volta ao interior do prédio. Diante dos atos de violência, o prefeito de Flint recorreu à

ajuda do Governador de Michigan, Frank Murphy. Este, por sua vez, respondeu com o

envio e 1200 homens da Guarda Nacional com a orientação de posicionarem-se em

escolas próximas às plantas, apenas para evitar que alguém mais se ferisse.

Temendo o possível esfriamento da greve, o UAW organizou a ocupação de uma

terceira planta da GM, mas, dessa vez, para evitar a violência, o sindicato executou uma

manobra para despistar os agentes infiltrados da GM. Em 1 de fevereiro, o UAW anunciou

os planos de greve em duas pequenas fábricas de componentes em Flint e, enquanto a

polícia se movimentava para antecipar a ocupação, o UAW direcionou os trabalhadores

para a Chevy – 4, que fabricava todos os motores para os veículos da Chevrolet. Com

isso, a greve de ocupação seria capaz de paralisar grande parte da operação em questão

de dias.

A General Motors conseguiu novamente na justiça um mandado para a

desocupação de suas fábricas, o qual foi encaminhado para que o governador executasse

a decisão. Diante da possibilidade de um conflito entre grevistas e a Guarda Nacional

resultar em um banho de sangue, o governador recusou-se a cumprir a decisão da justiça,

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e a General Motors viu-se, então, forçada a aceitar reivindicações do comando da greve.

O acordo entre a GM e o UAW reconheceu o sindicato como representante de 17 plantas

principais da GM para um mandato de seis meses. Além disso, o UAW poderia livremente

realizar a filiação de trabalhadores nas fábricas, o que a permitiria ser eleito representante

nas negociações futuras.

Apesar das seis semanas de greve no início de um ano que foi o segundo melhor

desempenho em vendas da indústria até então, atrás somente de 1929, a GM conseguiu

fechar 1937 com um crescimento 2% nas vendas. A Chevrolet foi a divisão mais afetada

pela greve, a única a não aumentar o volume de vendas em relação a 1936, fechando

com queda de 7%. Com isso, a participação de mercado da GM recuou em 2%, para

38%, e os lucros que haviam totalizado U$ 238 milhões em 1936, ultrapassando pela

primeira vez na década a marca dos U$ 200 milhões, recuaram para U$ 196 milhões.

Com a vitória, o UAW abriu caminho para se estabelecer como representante dos

trabalhadores também nas demais fabricantes de veículos e peças. No entanto, outros

capítulos na história da negociação entre sindicato e GM teriam de esperar até 1945. Em

1938, ano seguinte à conquista da UAW, uma forte recessão interrompeu a seqüência de

quatro anos de recuperação econômica. A indústria de veículos sofreu uma queda de

48%. Para contornar a redução na demanda, a GM demitiu 30 mil operários e colocou os

230 mil restantes revezando sob o regime de semana de três dias10. Nos dois anos

subseqüentes, a indústria apresentou ligeira recuperação, mas a pressão inflacionária, em

função do acirramento da guerra na Europa, fez o governo lançar um programa de

estabilização de salários, que congelou a possibilidade de negociação salarial até o

término da Segunda Guerra Mundial.

4.1.10. General Motors na Segunda Guerra Mundial

Após a recessão de 1938, o crescimento da demanda mundial, devido ao aumento

dos gastos com defesa dos países europeus, teve efeito positivo sobre a renda e o

consumo nos Estados Unidos. A indústria de veículos se recuperou durante os anos de

1939 e 1940, crescendo 43% e 25% respectivamente. A General Motors aumentou sua

participação de mercado para 44% em 1940 e bateu seu recorde de vendas, chegando a

1,95 milhão de veículos. Apesar do bom desempenho no negócio automotivo, ao final de 10 A expressão “semana de três dias”, ou “semana de quatro dias”, é usada comumente na indústria automobilística para indicar um regime especial onde o operário horista tem sua escala de trabalho semanal reduzida dos usuais cinco dias, a fim de acomodar redução na produção sem que haja demissões.

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1940 e início de 1941 os contratos para fornecimento de materiais de defesa começaram

a ocupar um espaço na atividade da empresa. Em 1940, os contratos de defesa da GM

totalizaram U$ 75 milhões, equivalente a 4% do faturamento daquele ano. Em janeiro de

1941, a GM já tinha mais de U$ 683 milhões em contratos de produtos de defesa para os

governos dos países aliados. No ano em que a venda de carros da GM bateu novo

recorde, ultrapassando pela primeira vez a marca de 2 milhões de veículos, a receita com

contratos de defesa já significava 16% do faturamento.

Uma das primeiras atividades da General Motors a ser envolvida na indústria de

defesa foi a aviação. Bendix e North American, onde a GM atuava apenas com

representação em seus conselhos de administração, faturaram cerca U$ 40 milhões cada

durante o ano de 1940. Ao longo da Segunda Guerra, seus contratos de fornecimento

chegaram a um pico de U$ 800 e U$ 700 milhões, respectivamente. A terceira empresa

envolvida com aviação era a Allison Engineering, que até então vinha se dedicando

apenas a desenvolvimentos de engenharia. No início dos anos 1930, a Allisson conseguiu

um contrato junto ao governo britânico para desenvolver um novo motor. Após alguns

anos trabalhando em conjunto com o GM Research Labs, a Allison teve, em 1937, a

aprovação de seu motor V-1710. O novo motor para aviões de combate da Allison foi o

primeiro com refrigeração por fluído a obter sucesso nos Estados Unidos, operando em

alta temperatura e desenvolvendo 1000 cavalos de potência. Apesar de haver ordens

firmes para apenas 863 unidades, em 1939 a GM decidiu construir uma planta para a

Allison e, com o sucesso do motor, novos contratos foram fechados. Em 1941 a fábrica já

operava com a produção mensal de 1100 motores.

Os Estados Unidos aderiram aos aliados no confronto bélico da Segunda Guerra

Mundial em dezembro de 1941. A partir de janeiro de 1942 a General Motors envidou

todos os seus esforços na conversão de suas unidades produtivas para fabricar produtos

de defesa. A conversão para a produção militar ocorreu logo nos primeiros meses de

1942. A receita da GM no ano da conversão foi de U$ 2,25 milhões, dos quais apenas

15% foram de produtos civis. Em 1942, a General Motors era a maior empresa do país,

possuía 10% das instalações da indústria metal-mecânica. De fevereiro de 1942 até

setembro de 1945, toda a produção da General Motors foi dedicada aos contratos de

defesa. No início do último ano de conflito, a GM operava cerca de 120 plantas no país,

sendo 18 delas arrendadas junto ao governo. O total de contratos significou um

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faturamento de U$ 12 bilhões durante o período, cerca de 8% do gasto do norte-

americano com equipamentos de defesa.

A forma de organização da General Motors em 1937 começou a enfrentar

dificuldades em virtude da complexidade das novas decisões envolvendo o emergente

mercado de equipamentos de defesa. As decisões sobre novos contratos de defesa eram

analisadas em duas partes antes de ser encaminhadas para aprovação. Primeiro, a

proposta seria debatida por executivos corporativos e membros do staff no CA. Em

seguida, antes de qualquer compromisso ser assumido, o contrato era analisado pelo staff

financeiro e o de assuntos jurídicos. Além disso, como estes contratos em geral envolviam

várias divisões, cada divisão apontava um membro para representá-la quando ela

estivesse envolvida no projeto. Contudo, os contratos nunca eram realmente fechados

caso não houvesse interesse pela divisão, levando, muitas vezes, uma agência

governamental a ser colocada em contato com a divisão para que a negociação fosse

feita antes do projeto ser encaminhado para análise dos comitês.

Em junho de 1940, o presidente da General Motors, William Knudsen, renunciou

ao cargo para integrar o comitê de defesa dos Estados Unidos. A saída do presidente da

GM desencadeou uma reorganização de sua estrutura, que incluiu a nomeação de

Charles E. Wilson, que ocupava a vice-presidência executiva de operações, como novo

presidente. Para auxiliá-lo, foram nomeados como assistentes da presidência O. E. Hunt,

vice-presidente de engenharia, e James Mooney, vice-presidente de mercados externos.

Knudsen, como presidente da GM, exercia a função de chefe de operações e era o

natural sucessor de Alfred Sloan, então presidente do conselho de administração e

também chefe do executivo, pois acumulava a presidência do CP. Na ausência de

Knudsen, além da promoção de Wilson, Sloan transferiu Albert Bradley, vice-presidente

de finanças, para o cargo de vice-presidente encarregado das operações de carros e

caminhões. Desta forma, Sloan pretendia atribuir-lhe experiência em operações e torná-lo

uma alternativa para sua sucessão no conselho de administração.

Ainda em junho de 1940, com o intuito de melhorar a coordenação da GM ao lidar

com o crescente mercado de defesa, Sloan criou o Comitê de Relações com Materiais de

Defesa (CRMD). O novo comitê teria como presidente James Mooney. O CRMD era

formado por todos os membros do CP, menos os três representantes da Du Pont, e a

atividade principal era formular as políticas relacionadas aos contratos de defesa. Na

prática, todas as decisões sobre contratos de defesa passaram a se deliberadas pelo

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grupo de executivos do CMRD e encaminhadas, a posteriori para o CP, apenas para

cumprir formalidades. Para assegurar aos acionistas a supervisão da atividade do CMRD,

relatórios dos projetos em andamento passaram a ser encaminhados para aprovação,

demonstrando análises de necessidades de capital, volume de vendas, projeção de lucros

e de retorno, número de empregados envolvidos, implicações tributárias e outros riscos.

Além disso, contratos com valor acima de U$ 1 milhão, ou estimativa de gastos capital

acima de U$ 500 mil, não poderiam ser iniciados sem a aprovação do CP.

O CMRD coordenou a obtenção de contratos de materiais de defesa até o final de

1941. Porém, o anúncio da entrada dos Estados Unidos no confronto na Europa e a

perspectiva de conversão total da General Motors para o abastecimento das forças

armadas provocaram nova mudança na estrutura da organização. Em 5 de janeiro de

1942, o DMRC foi substituído pelo Comitê Emergencial de Guerra (CEG). O CEG passou

a centralizar todos os poderes na condução das atividades de formulação e aprovação de

políticas, antes conferidas ao CP e ao CA, devendo apenas apresentar relatórios de suas

decisões ao CP. A formação do CEG permaneceu com os sete membros do DMRC, à

exceção de Frederic Donner, recém nomeado vice-presidente de finanças, no lugar de

James Mooney, que renunciou para trabalhar junto ao governo dos Estados Unidos.

Em questão de semanas a General Motors deveria preparar sua complexa rede de

fábricas de partes e peças e linhas de montagem, para produzir cerca de três mil produtos

de aplicação militar, muitos dos quais a maioria a GM não possuía qualquer experiência

em fabricar e outros nunca antes produzidos em uma linha de montagem. Muitas vezes

os contratos referiam-se a produtos cujos desenhos e especificações não estavam

disponíveis, ou não apresentavam qualquer base para estimativa de custos. Com isso, as

divisões passaram a participar de forma ativa na definição do contrato, pois, como cada

novo contrato envolvia uma nova e, às vezes, complexa relação de fornecedores internos

e externos, era necessário que houvesse coordenação entre as atividades de cada

divisão.

Dos U$ 12 milhões obtidos em contratos de defesa durante a Segunda Guerra,

cerca de U$ 8 milhões referiram-se a produtos completamente novos para a General

Motors. Portanto, a capacidade de coordenação e a agilidade para produzir novos

produtos tornaram-se cruciais. Por exemplo, a Cadillac, para organizar a fabricação do

tanque de guerra M-24, teve de organizar a obtenção de partes e peças junto a 17

fornecedores internos. À medida em que a GM convertia suas plantas, uma nova

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mudança na organização da estrutura corporativa era implementada em maio de 1942.

Apenas cinco meses depois de sua criação, o CEG foi abolido e, em seu lugar, criado o

Comitê de Administração de Guerra (CAG), que uniu aos sete integrantes do grupo

anterior os vice-presidentes de operações, que integravam o CA. Excepcionalmente

durante a existência do CAG, os gerentes gerais das três principais divisões, Marvin

Coyle da Chevrolet, Edward Fisher da Fisher Body e Harlom Curtice da Buick, foram

promovidos ao status de vice-presidentes de grupo e incorporados ao comitê.

A formação do CAG consolidou a organização corporativa que a General Motors

adotaria até o final da Segunda Guerra. Com isso, a dinâmica estabelecida para a

obtenção de contratos de fornecimento de materiais militares foi amplamente

descentralizada, com as divisões sendo responsáveis pela negociação dos contratos. O

CAG formulava as políticas que estabeleciam parâmetros gerais para a operação e

supervisionava o andamento dos contratos das divisões.

As políticas que estabeleceram o sistema de gestão dos contratos de defesa foram

sendo formuladas desde os primeiros contratos do começo da década de 1940. Uma das

primeiras decisões do CP à época foi de provisionar, para os contratos de defesa, um

fundo de reconversão das plantas ao término do fornecimento. Em agosto de 1940, outra

política determinou regras para o financiamento das construções ou adaptações das

fábricas. A recomendação era de que a GM só financiaria a construção de novas fábricas

casos o governo oferecesse garantias contra perdas do capital investido, caso contrário,

quando as fábricas projetadas não pudessem ser reconvertidas para a fabricação de

automóveis, o governo deveria providenciar os recursos para o investimento antes da GM

aceitar o contrato.

Em 1942, a GM se antecipou ao departamento de ajustes de preços do Conselho

de Guerra e, voluntariamente, impôs um limite máximo de 10% para a margem de lucros

antes de impostos durante o esforço de guerra. Este limite estava ligado à estratégia de

lobby para evitar que o governo americano implantasse formas alternativas de controles

dos lucros de empresas com o fornecimento de materiais de defesa, as quais vinham

sendo discutidas, e que envolviam limitações sobre a taxa de retorno sobre o

investimento. Finalmente adotado pelo Conselho de Guerra, o limite de 10% sobre a

margem de lucro, proposto pela GM, combinado com a já utilizada política de contratos

em preço fixo, assegurou um caminho para que a General Motors preservasse sua taxa

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de retorno, bastando manter a margem em 10% e aumentar o faturamento, obtendo o

maior número de contratos sobre a mesma base de investimentos.

Assegurar a capacidade de cumprimento dos compromissos assumidos de

entregas de materiais de defesa tornou-se um grande desafio diante da complexidade de

cadeias internas de fornecimento. Além disso, o principal determinante de capacidade da

maioria das fábricas americanas, incluindo as da GM, passou a ser a disponibilidade de

mão-de-obra, dado que muitos operários treinados e experientes foram servir no front de

batalha. Ao longo dos anos em que se seguiu a Segunda Guerra, a GM contratou e

treinou, ao todo, cerca de 750 mil novos operários, sobretudo mulheres. Diante desta

situação, a CEG aprovou, no início de 1942, o Plano de Distribuição de Cargas (PLC). A

política implementada a partir deste plano estabeleceu um sistema que convertia os

valores de um contrato na forma de índices, os quais poderiam ser comparados com o

limite máximo que uma divisão poderia aceitar. O PLC estabelecia o seguinte

procedimento: o prospecto de um contrato era analisado pela CEG, e seu fluxo de

entregas era definido em termos de valor de pico anual, que consistia no valor em dólar

da produção de doze meses, considerando o mês de pico de capacidade mensal

requerido pelo contrato. Assim, os contratos com prazos diferentes poderiam ser

comparados entre si. Depois de calcular o valor de pico anual, os executivos subtraíam os

custos com matéria-prima, e o valor restante seria considerado a carga líquida. O valor

apontado como carga líquida era usado para estimar o número de trabalhadores que cada

contrato iria requerer em termos de mão-de-obra no pico da produção. Com isso, os

gerentes das divisões poderiam analisar se os contratos estavam dentro dos limites que

seriam capazes de cumprir.

Desta forma, os gerentes das divisões possuíam autonomia para aceitar ou rejeitar

contratos de materiais de defesa que respeitassem o limite de sua capacidade, bem como

em outras atividades, como compras e engenharia. Quando um contrato exigisse mais do

que a capacidade disponível, ele somente poderia ser aprovado pela CEG

(posteriormente a CAG). Devido a tal autonomia e diante da dificuldade em encontrar

fornecedores específicos, muitas vezes as divisões desenvolviam os componentes e

transferiam a produção para outro fornecedor. Com isso, um intenso mercado de

contratação entre as divisões emergiu e atribuiu maior flexibilidade para que a GM

obtivesse novos contratos.

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O controle da atividade das divisões pelo CAG era feito por meio de dois relatórios,

um mensal e outro quinzenal, sobre o andamento dos contratos. O relatório mensal

reportava o volume produzido até então em cada contrato, produção agendada para os

próximos quatro meses em cada um deles, projeção de picos de produção, picos de

capacidade das instalações e datas de término do fornecimento de cada contrato. O

relatório quinzenal comparava a produção dos quinze ou trinta dias do mês com os

recebimentos que haviam sido programados pelas forças armadas. As divisões deveriam

também encaminhar explicações para qualquer desvio no cumprimento das entregas.

A centralização da formulação e aprovação de políticas que culminou com a

criação do CAG praticamente paralisou os trabalhos que vinham sendo desenvolvidos

pelos grupos de políticas, com exceção dos de finanças, assuntos jurídicos, preços e de

planejamento pós-guerra, os quais participavam da análise dos contratos. Contudo, em

1943 conforme a nova rotina de operações foi se estabilizando, outros grupos emergiram,

dentre eles grupos de políticas de produtos. Os novos grupos de políticas seguiam os

moldes desenvolvidos ao longo da década de 1930, com um executivo corporativo no

comando de uma equipe de staff que coordenava o trabalho de desenvolvimento junto às

divisões. Por exemplo, o Grupo de Desenvolvimento de Transmissões havia suspendido

as atividades no desenvolvimento da transmissão automática para os veículos civis e,

posteriormente, passou a trabalhar no desenvolvimento de um câmbio hidramático para

cargas pesadas, que, quando pronto, equipou os tanques de guerra do exército,

aumentando sua eficiência, durabilidade e facilidade de operação. A General Motors

aplicou sua engenharia em diversos produtos, como motores a diesel, motores para

aviões, sistemas de freio, sistemas de direção, metralhadores e outras armas,

melhorando significativamente a tecnologia dos equipamentos de defesa durante a

Segunda Guerra.

Ao final da guerra, em 1945, a General Motors havia se estabelecido como o maior

fornecedor de equipamentos de defesa do governo americano. Com a vitória na Europa,

em maio, algumas plantas começaram a reconversão para fabricação de veículos.

Imediatamente após a vitória sobre o Japão, em agosto, todos os contratos de

fornecimento às forças armadas foram cancelados. A GM deixaria de receber U$ 1,75

bilhão em materiais de defesa, além de descartar grande parte dos estoques

armazenados em suas fábricas. Após 45 dias do término da guerra, os primeiros carros

saíram das fábricas da GM nos Estados Unidos.

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Apesar das perdas com cancelamento de contratos e da adoção de controle sobre

margem de lucros, o saldo da participação da General Motors na Segunda Guerra, em

termos financeiros, foi considerado positivo. Como mostra a tabela 4-2,, a receita da GM

chegou ao nível recorde, ultrapassando U$ 4 bilhões, com os lucros mantendo-se em

média em U$ 175 milhões, entre 1940 e 1945, quando os contratos representaram mais

de 80% das vendas.

Tabela 4-2 Receita e Lucro líquido da GM durante a segunda guerra mundial. Ano Receita total

(em U$ milhões) Participação de contratos

de defesa (em porcentagem)

Lucro líquido (em U$ milhões)

1939 1.376,8 -- 183,3 1940 1.794,9 4% 195,6 1941 2.436,8 16% 201,7 1942 2.250,5 84% 163,7 1943 3.796,1 100% 149,8 1944 4.262,2 100% 171,0 1945 3.127,9 82% 188,3

Fonte: dados obtidos em relatórios anuais Moody’s (1940-1946) e em Sloan (1964).

A General Motors investiu cerca de U$ 130 milhões na conversão e expansão de

suas plantas entre 1940 e 1944 e ainda arrendou sob sua operação outros U$ 650

milhões em fábricas do governo norte-americano. Para financiar sua produção e gastos

de capital, a GM obteve um linha de financiamento junto ao governo de U$ 1 bilhão,

embora só tenha efetuado empréstimo de cerca de 10% desse valor, cujo pagamento

ocorreu em menos de um ano. A maior parte da operação da GM, à exceção das plantas

construídas pelo governo, foi financiada com o caixa da própria operação. Ainda assim,

com a política de constituição de fundo para reservar recursos para a reconversão, a

disponibilidade de caixa aumentou de U$ 290 milhões, em 1940, para U$ 597 milhões ao

final de 1944, mesmo a GM tendo distribuído dividendos que totalizaram 77% do lucro

líquido do período.

A partir de 1945, as atenções das divisões da GM voltaram-se para a indústria de

automóveis. Durante os três anos em que o país esteve dedicado à guerra, a atividade de

fabricação e comercialização de veículos novos ficou completamente parada. Entre 1941

e 1944 o número de concessionários da GM no país caiu de 17.360 para 13.791, apesar

do programa lançado por Sloan, no início de 1942, para tentar amenizar perdas nos

negócios dos concessionários com sistemas de alocação de veículos e peças. O esforço

de reconversão, portanto, teria não somente que readaptar as plantas, mas também

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restabelecer parte de sua organização de vendas e desenvolver toda a linha de novos

veículos.

4.1.11. A expansão do pós-guerra

A General Motors começou a preparar-se para o fim da guerra pouco depois da

entrada definitiva dos Estados Unidos para o conflito. Por iniciativa de Alfred Sloan, em

1942, foi estabelecido o Grupo de Política para o Planejamento do Pós-Guerra (GPPPG).

Edward Riley, gerente geral da divisão de operações em mercados externos, foi nomeado

com a orientação de analisar e apresentar a Sloan e aos demais integrantes do GPPPG

uma síntese das principais idéias sobre as situações políticas e econômicas que poderiam

emergir após a Segunda Guerra Mundial.

O GPPPG também era composto de outros seis executivos corporativos e dois

chefes de staff. A partir de 1943, com a melhora na rotina de contratação da fabricação de

materiais de defesa, esse grupo passou a desenvolver uma lista de questões de longo

prazo, as quais a GM enfrentaria com o término do confronto. Uma agenda de discussão

foi criada, e gerentes das divisões eram convidados a participar das reuniões para realizar

projeções para os próximos dez a quinze anos sobre capacidade produtiva, evolução da

demanda, mix de produtos e necessidades de capital. Após alguns meses e sob a revisão

do staff financeiro, o GPPPG concluiu um amplo plano de crescimento, visando

acompanhar a retomada da demanda reprimida de automóveis no pós-guerra, mantendo

os níveis participação de mercado de antes da guerra. Para tanto, previa-se a

necessidade de investimentos de capital de U$ 500 milhões na modernização e

ampliação das instalações produtivas.

As recomendações do plano do pós-guerra compreendiam todas as atividades nas

quais a GM estava envolvida. Para a aviação, o plano previa que o mercado do pós-

guerra iria se consolidar em três grandes setores: aviação militar, aviação comercial de

transporte de cargas e de passageiros e aviação civil particular. A recomendação de

Sloan e do estudo era para que a GM abandonasse o mercado de montagem final de

aviões e se mantivesse apenas na fabricação de partes e motores, que normalmente

representavam 45% do valor da aeronave e cuja engenharia oferecia sinergias com a

atividade automotiva.

Outra atividade não-automotiva abordada pelo plano do CPPPG foi divisão de

locomotivas a diesel. O staff financeiro havia se posicionado contra a continuidade desta

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109

operação, argumentando que o mercado de locomotivas havia se estabilizado e que

perspectivas de retorno sobre investimentos nesta indústria seriam baixos. Por outro lado,

gerentes das divisões defenderam que o mercado logo após a guerra apresentaria

crescimento, e que os investimentos manteriam retornos razoáveis por um longo período.

O impasse foi solucionado com a recomendação de que a divisão de locomotivas a diesel

ampliasse a capacidade para oferecer também serviços de manutenção de locomotivas e

motores, que apresentava uma tendência promissora na indústria.

Quanto à divisão Frigidaire, os estudos do GPPPG reconheceram que a GM havia

falhando em não acompanhar a tendência de diversificação para outros eletrodomésticos,

como rádios, lavadora de roupas e de pratos e ferros de passar, como fizeram

concorrentes como GE e Whestinghouse durante os anos 1930. O grupo, então, realizou

pesquisas junto à rede de lojas revendedoras e elencou uma série de utilidades

domésticas com recomendação para serem desenvolvidas, tais como freezers, lavadoras

automáticas, secadora de roupas, lavadora de roupas, fornos e fogões.

O plano elaborado pelo GPPPG também propôs investimentos na modernização

da organização de engenharia. Até a Segunda Guerra, as atividades do staff de

engenharia, o laboratório de engenharia avançada e o staff de estilo funcionavam em

prédios distantes, sendo que em alguns casos estavam mal acomodados. Com isso, o

plano do pós-guerra incluiu o projeto de construção de um centro de engenharia que

reuniria as atividades de pesquisa e de desenvolvimento em uma área comum.

O GPPPG encaminhou o estudo sobre o pós-guerra para a análise do CAG. O

plano permaneceu em discussão durante poucos meses, quando sofreu algumas

alterações no mix de produtos, cortes e adições de capacidade produtiva entre as

divisões. No começo de 1944, o CAG enviou plano com recomendação de aprovação

para o CP. Quase um ano antes do fim da guerra, em setembro de 1944, o CP aprovou o

plano de expansão do pós-guerra, que previa investimentos de U$ 500 milhões, em

ampliação e modernização de plantas, totalizando a capacidade de 2,1 milhões de

veículos por ano, a ser financiado com o caixa gerado durante a guerra.

Enquanto se preparava para a implementação de seu plano, em 1945, a General

Motors voltou a discutir a organização de sua estrutura administrativa. A estrutura

centralizada de formulação de políticas do CAG, criado especialmente para lidar com as

demandas de defesa, necessitava ser desfeita. Por outro lado, a tentativa de estabelecer

um único comitê que reunia a aprovação financeira e de operações, usada desde 1937

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110

até o início do esforço de guerra, também havia se apresentado problemático. As

dificuldades do sistema centralizado deviam-se tanto ao excesso de relatórios e de

assuntos a cada reunião, quanto à dificuldade em reunir executivos capazes de avaliar

aspectos financeiros e de operações de forma equivalente.

De maneira geral, na GM, finanças e operações eram duas carreiras distintas

dentro da organização. Executivos de finanças normalmente eram contratados recém-

graduados de boas universidades de economia e contabilidade e construíam suas

carreiras em uma longa escada de promoções dentro do staff financeiro. Já os executivos

de operações, a exceção dos mais antigos, que vieram junto com as empresas

adquiridas, eram geralmente engenheiros graduados que passavam por uma formação

técnica na área automotiva por meio do General Motors Institute (GMI) e giravam pelas

várias divisões à medida em que eram promovidos. Executivos que iniciavam em uma

carreira e depois trocavam para a outra eram raros. Um desses poucos casos foi Harlom

Curtice, que havia começado como contador na Spark & Plug, onde seu desempenho o

levou a gerente geral para, em seguida, assumir a gerência geral da Buick.

A mudança na estrutura e funcionamento da organização foi debatida pelo grupo

do conselho de administração formado por Sloan (presidente), Donaldson Brown (vice-

presidente) e os representantes da Du Pont, Lammont Du Pont e Walter Carpenter.

Depois de mais de um ano de discussão, em junho de 1945, o conselho aprovou a

reorganização no topo da gestão da General Motors, com a definição de três comitês. O

Comitê de Política Operacional (CPO), composto por executivos corporativos de staff e

operações, seria responsável por aprovar políticas formuladas nos grupos de políticas sob

sua orientação. O Comitê de Política Financeira (CPF), formado por representantes da Du

Pont, executivos do staff financeiro e os presidentes da Genenral Motors e do conselho de

administração. O CPF possuía total poder sobre a aprovação de gastos de capital e todas

as políticas de contabilidade e controladoria. O terceiro comitê era o Comitê de

Administração (CA), que seria formado pelos membros do CPO, mais os gerentes das

principais divisões. O CA teria um caráter consultivo, apenas recomendando sua

avaliação sobre novas políticas ao CPO. Alfred Sloan passou a presidência do CPO, que

significava a função de CEO, para Charles Wilson e, para que continuasse como

presidente do conselho, a aposentadoria compulsória aos setenta anos foi

excepcionalmente suspensa. Albert Bradley assumiu a presidência do CPF, com a

decisão de Donaldson Brown de se aposentar.

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111

A implementação do plano de expansão durou de 1945 a 1947, quando foram

investidos na reconversão, ampliação e modernização de plantas U$ 588 milhões, U$ 88

milhões a mais do que originalmente planejado. O plano desenvolvido estabeleceria a

capacidade produtiva em 14 mil carros e 3,5 mil caminhões por dia e incluía o programa

de um novo carro compacto, o Chevrolet Cadet, que iria atender a uma demanda

potencial para veículos baratos, identificada em pesquisas junto ao consumidor, e

assegurar os níveis de participação de mercado de sua maior divisão. No entanto, a

seqüência de eventos em 1946 obrigou a GM a rever as metas de seu plano.

A liberação das atividades e a retomada do consumo no final de 1945 e início de

1946 provocou escassez de matéria-prima e uma onda de inflação na economia

americana. A General Motors, apesar de seus investimentos, não era capaz de ocupar

toda a capacidade e o volume de vendas ficou abaixo do esperado. Adicionalmente, uma

greve dos operários que reivindicavam a recuperação dos salários congelados desde

1941 paralisou as fábricas por 113 dias. Diante das perspectivas de queda na receita e

nos lucros, a GM reduziu suas metas de expansão, postergando parte das obras de

construção do centro de engenharia, e reduziu seu programa de produção, retendo

expansão da capacidade em 10 mil carros e 2,5 caminhões por dia. Outro corte relevante

foi o cancelamento do programa do Cadet. O carro compacto da Chevrolet já era motivo

de controvérsia entre finanças e operações. O CPF alegava que o Cadet seria somente

de U$ 100 a U$ 150 mais barato do que o próximo veículo mais barato da linha, que por

sua vez era maior e mais luxuoso e, portanto, teria baixo retorno sobre o investimento. Já

o CPO argumentava que o produto era importante para proteger a participação de

mercado da Chevrolet. Com a nova necessidade de priorizar investimentos, o CPF

prevaleceu.

Além disso, a GM precisou recorrer a alternativas de financiamento externo para

manter níveis seguros de caixa. Em 1946, U$ 125 milhões em títulos de 30 anos a 2,5%

foram vendidos para um grupo de oito seguradoras. Em seguida, outros U$ 100 milhões

em ações preferenciais foram emitidos. As medidas de contenção de gastos e

investimento surtiram efeito nos números financeiros. Em 1946, a receita havia caído

37% em relação ao ano anterior, e o lucro de U$ 87 milhões foi insuficiente para pagar os

dividendos daquele ano. No ano seguinte, a GM bateu seu recorde histórico de lucro, U$

288 milhões, e com as sobras de caixa, antecipou o resgate de seus títulos para 1949.

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112

4.1.12. Negociações com a UAW e o contrato de 1948

Além dos problemas de oferta de matéria-prima que surgiram na recuperação do

pós-guerra, uma grande movimentação dos operários da GM e da UAW, em favor da

reposição dos salários comprimidos pela inflação durante a guerra, tomou conta de parte

da agenda dos executivos. O presidente norte-americano Harry Truman anunciou o

descongelamento dos salários nos Estados Unidos em agosto de 1945, e o contrato da

GM com a UAW terminaria em novembro. Em outubro, os ânimos começaram a

esquentar com a proposta encaminhada por Walter Reuther, líder da UAW, exigindo

aumento de 30% nos salários. Charles Wilson respondeu que nesses termos os preços

dos veículos aumentariam em 30% no dia seguinte. A negativa do presidente da GM

levou a UAW a anunciar a greve no final de 1945 na maioria das fábricas da empresa.

Entre 1937 e 1941 as negociações da GM com o sindicato eram conduzidas pelo

então presidente William Knudsen, acompanhado do vice-presidente de assuntos

jurídicos, John T. Smith, e do vice-presidente de finanças, Donaldson Brown. Quando a

greve teve início em 1945, Sloan, ainda como CEO, nomeou um novo grupo negociador

liderado por Charles Wilson, juntamente com outros executivos de operações de Detroit.

O impasse, entretanto, estendeu a greve pelos últimos 40 dias do ano e chegou a janeiro

de 1946 sem perspectivas de acordo.

Com o intuito de mediar a solução de um assunto que ganhava grande

repercussão no país, o presidente Truman nomeou uma comissão de três pessoas, que

tinham a tarefa de indicar uma proposta de reajuste dentro da capacidade de pagamento

da indústria. Em 10 de janeiro de 1946, a comissão do governo apresentou a

recomendação de aumento de 17,5% nos salários, sem repassar custos para os preços

dos produtos. A proposta do governo foi prontamente rechaçada por ambas as partes, e o

impasse continuou.

A greve, que ocorria simultaneamente na Ford e na Chrysler, representava altos

custos para empresas e também para as famílias dos trabalhadores, que ficavam sem

receber salários. Durante o tempo em que as plantas da GM ficaram paralisadas, o caixa

da empresa reduziu de U$ 378 milhões para U$ 219 milhões. A solução para o impasse

começou no final de janeiro, quando Chrysler e, logo em seguida, Ford estabeleceram

acordo com representantes locais da UAW, concedendo um aumento de 18,5% nos

salários. Em 13 de fevereiro, as fábricas da General Motors representadas pelo sindicato

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United Electrical Workers (UEW) aceitaram os 18,5% de reajuste e restaram apenas as

fábricas da GM representadas pela UAW. Apesar da precedência aberta por outros

contratos, a UAW resistiu por mais um mês e, após 113 dias de greve, assinou um

contrato de dois anos com a General Motors, em troca do aumento de 18,5% e de outros

benefícios, como a equiparação do salário feminino, a preferência de transferência para

os mais velhos, adicional de hora-extra e pagamento de férias.

O acordo fechado com a UAW assegurou a estabilidade na produção pelo resto do

ano de 1946 e durante todo o ano seguinte, porém, no início de 1948, a UAW iniciou as

movimentações para nova negociação. Em março, a UAW apresentou proposta para um

novo contrato, que foi considerado ultrajante por executivos da GM. Dentre os termos de

negociação exigidos pelo sindicato incluíam-se aumento nominal de 25 centavos por hora

nos salários (em torno de 18%), programa de pensão e aposentadoria e garantia de

semana de 44 horas.

A reação da General Motors diante da oferta inicial da UAW foi de evitar o início de

diálogo nos termos apresentados. Com isso, a movimentação das partes permaneceu fria

nos dois meses seguintes. Em 12 de maio, a UAW iniciou greve nas fábricas da Chrysler

e começou também a mobilizar operários nas fábricas da GM para a votação sobre nova

greve. Diante da iminente ameaça de prejuízos como os de 1946, a GM decidiu

encaminhar uma proposta para uma nova fórmula de reajuste salarial. Desde 1941,

Charles Wilson vinha defendendo internamente a formulação de um sistema de reajuste

dos salários de acordo com o impacto da inflação sobre o custo de vida dos

trabalhadores. Os estudos de Wilson haviam sido colocados de lado devido ao

congelamento dos salários, no início da guerra. Além disso, internamente, a proposta

inicial foi severamente criticada, tachada de mecanismo gerador de inflação. Porém, com

Wilson como presidente da GM (chefe de operações) e do CPO (chefe do executivo), sua

proposta foi novamente colocada na pauta.

A proposta tinha por princípio separar o cálculo do reajuste do salário em dois.

Uma parte do reajuste, chamada de ajuda de custo11, seria variável de acordo com a

inflação, e a outra seria um aumento de salário, chamado de ganho de produtividade, com

valor anual pré-fixado no contrato. O sindicato aceitou o princípio apresentado, e uma

negociação foi estabelecida para acertar os detalhes. A fórmula final e os demais itens do

11 Tradução livre do termo em inglês utilizado: cost allowance

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contrato foram definidos por uma equipe mista de força-tarefa com dois representantes de

cada parte.

A validade do contrato foi estendida para três anos, e o ano-base para o cálculo do

reajuste da inflação seria 1940, último ano sem aumentos significativos dos preços. Com

isso, a defasagem, em relação à inflação, nos salários em vigor foi calculada em 9% e,

para compensar, a formação do salário-base para o cálculo foi adicionado em U$ 0,08 à

média salarial da GM, totalizando em U$ 1,49 (dólar por hora). Portanto, a fórmula final

para o reajuste ficou da seguinte forma para cada um dos três anos:

• A título de ganhos de produtividade, aumento anual de U$ 0,03 (por hora), cerca de

2%;

• A título de ajuda de custo, para cada 1,14% de aumento na inflação anual, reajuste de

U$ 0,01 (por hora).

Na fórmula de reajuste, o ganho de produtividade previa um aumento automático,

que seria concedido independentemente de haver ganho real na eficiência das atividades

produtivas. Outros benefícios concedidos no acordo de 1948 incluíam um plano de

pensão para os empregados e seguro de saúde que cobria também suas famílias. Os

gastos com os dois benefícios criados seriam cobertos por meio de um fundo de

investimento em ações, criado por Charles Wilson. Como contrapartida, a UAW

concederia flexibilidade à GM para automatizar processos da linha de produção.

Alem disso, a partir deste acordo, GM e UAW estabeleceram uma nova dinâmica

para solução de controvérsias enquanto o contrato estivesse em vigor. GM e UAW

criaram um sistema de hierarquias de comitês para a resolução dos problemas que

emergiam do chão-de-fábrica, por meio da definição de quatro instâncias de negociação.

A primeira tratava da negociação direta entre sindicado e encarregados de produção. As

questões, não resolvidas passariam a ser tratadas entre o comitê de fábrica,

representantes eleitos pelos operários e a gerência da planta. A instância seguinte seria

um conselho de apelação, que envolveria representantes da UAW regional e gerentes da

divisão. Somente após estas etapas a solução para o conflito iria para mediação e

arbitragem externa.

O contrato assinado pela GM e a UAW em 1948 significou um marco nas

negociações sindicais dali por diante e seu modelo seria replicado para toda a indústria.

As próximas negociações entre GM e o sindicato adotariam diversas revisões deste

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modelo, como, por exemplo, aumento nos valores concedidos com ganhos de

produtividade, rebalanceamento dos índices de ajuda de custo, ampliação do prazo para

cinco anos e inclusão de benefícios, como seguro desemprego complementar.

Entretanto, os princípios de contrato de longo prazo e a fórmula de reajuste salarial

seriam adotados como padrão, assegurando à GM um longo período de estabilidade, sem

greves entre 1948 e 1971

4.1.13. Hegemonia recuperada na gestão Wilson

Os eventos inesperados em 1945/1946 retardaram o retorno das condições

projetadas para a indústria e, conseqüentemente, alguns dos planos elaborados pela GM

em 1944 e 1945 tiveram de ser protelados. No caso dos mercados externos, a

recomendação foi para operar via subsidiária, nos países onde a indústria automotiva

estivesse instalada, e via exportação de veículos prontos ou desmontados nos demais

países. Logo após o final do conflito na Europa, a GM retomou as atividades na inglesa

Vauxhaul e iniciou a formação de uma subsidiária na Austrália, onde havia adquirido a

fábrica de peças da Holden em 1931. Contudo, as operações da GM na alemã Opel não

foram retomadas até 1948. Uma prolongada indecisão, que envolvia diferenças nas

visões do CPO e do CPF, prorrogou as negociações para que a GM assumisse o controle

de suas plantas. Também somente em 1948, a GM se desfez de suas ações da North

American e da Bendix, mantendo a Allison na indústria de aviões, como havia sido

recomendado pelo plano do pós-guerra.

Durante os primeiros anos do pós-guerra, o esforço para restabelecer a indústria

fez com que as fabricantes de veículos oferecessem modelos bastante semelhantes

àqueles que eram oferecidos em 1941, de forma a poderem priorizar a reconversão de

suas linhas. Contudo, conforme a atividade da indústria se normalizou, as empresas

voltaram a pensar os diferenciais competitivos de seus produtos. A General Motors havia

construído uma grande vantagem sobre suas concorrentes com a centralização de

desenvolvimento de técnicas de design durante os anos 1920 e 1930. No entanto, após a

Segunda Guerra, suas duas principais concorrentes, Ford e Chrysler, procuraram reduzir

a distância em relação à líder e adotaram laboratórios e procedimentos para

desenvolvimento de estilo semelhantes aos da General Motors, inclusive contratando

alguns de seus designers. Com isso, as inovações em design ditaram o ritmo da

competição na indústria no final da década e continuariam durante os anos 1950.

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O laboratório de estilo da GM, liderado por Harley Earl, desenvolveu a primeira

versão do design que ficou famoso como “rabo de peixe”, lançado no modelo do Cadillac

de 1948. O rápido sucesso fez com que o conceito fosse replicado para as demais

divisões e se tornasse um padrão da indústria durante os 15 anos seguintes. O processo

de desenvolvimento de novos modelos da GM permaneceu semelhante ao que havia sido

formalizado em 1935, apesar da revisão sofrida em 1946. O laboratório de estilo, as

divisões e o staff de engenharia concordavam sobre atributos mecânicos e de design para

renovação anual dos modelos, com a mediação e supervisão do grupo de política de

engenharia.

Além do design, outro artifício que retomou sua importância no final da década de

1940 foi o crédito ao consumidor. A ferramenta de crédito vinha sendo amplamente usada

por fabricantes de veículos desde os anos 1920 para impulsionar vendas, a ponto de o

governo dos Estados Unidos apontar abusos durante os anos 1930. A GM havia sido

forçada a alterar seu plano de financiamento de 1935, devido a uma divulgação que

causava dúvidas ao consumidor, e foi novamente contestada pelo governo em 1938 e

1939 em duas ações antitruste que envolviam também Ford e Chrysler. O período de

guerra nos anos 1940 havia esfriado as atividades de crédito e os processos na justiça,

porém, ao final da década os questionamentos voltaram a ganhar força, e a GM, que

vinha negando irregularidades em seu sistema de crédito, negociou uma saída na forma

de uma nova legislação para regulamentar tal atividade na indústria.

Ao final de 1947, conforme a GM se aproximou da conclusão da ampliação da

capacidade, Charles Wilson apresentou um novo programa de expansão produtiva,

estimando um investimento total de U$ 600 milhões, e que seria implementado ao longo

de 1948 e 1949. No entanto, o CPF, responsável pela aprovação financeira, autorizou

apenas parte dos projetos do programa, que totalizava U$ 273 milhões, e decidiu

prorrogar a avaliação do restante do plano elaborado pela organização de operações.

Ambos os planos de ampliação da capacidade após a Segunda Guerra tiveram o

escopo reduzido pelo CPF, um no início e outro ao final de 1947. No entanto, as vendas

de veículos nos Estados Unidos decolaram a partir de 1946 e chegaram ao volume

recorde de cerca de oito milhões de unidades em 1950. A rápida aceleração da demanda

permitiu que as empresas aumentassem significativamente os preços dos veículos. Em

julho de 1948, o CPF comunicou ao CPO que a fórmula de preços definida pelo método

stadard-volume não determinava limites máximos para os preços, e que ficava a cargo de

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operações aumentarem as margens além do necessário para atingir as metas de retorno.

Com isso, os preços dos veículos da GM aumentaram 8% naquele mês.

Quadro 4-4 Margem líquida de GM, Ford e Chrysler e vendas da indústria entre 1946 e 1950

1946 1947 1948 1949 1950

General Motors 4,5% 7,5% 9,4% 11,5% 11,1%

Ford -0,9% 4,2% 4,9% 7,9% 8,6%

Chrysler 3,1% 4,9% 5,7% 6,3% 5,8%

Vendas totais da indústria (em mil unidades)

3.089 4.797 5.285 6.253 8.003

Fonte: Relatórios anuais Moody’s de GM, Ford e Chrysler de 1947 a 1951 e Chandler (1964) p. 4.

Nos dois anos seguintes, a tendência se manteve tanto na GM quanto em suas

concorrentes. O resultado foi o aumento significativo da margem líquida das empresas

entre 1946 e 1947, como pode ser observado na tabela X acima. As margens líquidas

obtidas por GM e Ford em 1949 e 1950, respectivamente, representaram suas melhores

marcas deste indicador desde a Segunda Guerra até o final do século XX. Para a

Chrysler, o ano de 1949 significou sua terceira melhor marca, ultrapassada apenas no

biênio 1984 e 1985.

Apesar de aproveitar-se da escassez da oferta de veículos, a General Motors teve

que, ao mesmo tempo, mobilizar sua organização de vendas para coibir comportamentos

oportunistas em sua rede de concessionários que, diante do aumento na demanda,

também procuraram meios de obter vantagens.

As redes de distribuição das divisões da GM passaram a ter processos formais de

expansão a partir dos anos 1920. O método da General Motors para designar os pontos

de vendas de suas divisões estabeleceu fórmulas para encontrar o potencial de vendas

de cada região e, baseado nisso, as divisões submetiam pedidos de nomeação ou

substituição de concessionárias. As organizações de venda das divisões, sob a

coordenação de Richard Grant, construíram amplas redes de lojas e, durante a década de

1930, a coordenação da rede de distribuição foi complementada com a criação de duas

instâncias de mediação. Uma delas foi o Comitê de Distribuidores, em 1934, cujo objetivo

era servir de fórum consultivo entre concessionários e executivos para auxiliar no

desenvolvimento de políticas de distribuição. Quatro anos depois, foi criado o Conselho

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de Relação com Distribuidor, que era composto de executivos corporativos, com a tarefa

de mediar preventivamente conflitos que surgissem entre concessionários de divisões.

As políticas que tratavam da relação entre GM e concessionários era amparada

dentro de um contrato de franquia. Todo o aparato desenvolvido pela GM para organizar

sua atividade de vendas fez com que esse contrato evoluísse ao longo dos anos.

Entretanto, em 1949, duas cláusulas do contrato de franquia tiveram que ser retiradas,

alterando as condições de competição entre concessionários. As cláusulas que

determinavam a fixação do preço pelo fabricante e a área geográfica de atuação foram

removidas depois que a GM consultou o Departamento de Justiça norte-americano e

descobriu que ambas feriam a legislação antitruste. Assim sendo, no final da década de

1940, o desequilíbrio entre oferta e demanda provocou o surgimento de duas práticas

desleais de venda, o “price packaging” e o “bootlegging” 12.

O price packing foi o nome dado à prática do concessionário de adicionar margens

extras, atribuindo-as a itens fictícios de custos ou taxas. Por exemplo, Rubenstein (2001)

relata que o revendedor de carros, durante os anos 1950, determinava o preço com a

seguinte composição:

• Custo de aquisição;

• Margem bruta de 1/3 do custo do veículo;

• Despesas de frete e de propaganda e armazenagem, repassadas diretamente ao

consumidor;

• Adicional de serviço de 10%;

• Margem adicional sobre acessórios equipando o veículo.

Dos itens acima, apenas custo de aquisição e despesas de frete eram práticas

regulares na determinação do preço; os demais passaram a ser aplicados de forma

oportunista. Os consumidores levaram um tempo para descobrir que o preço passara a

ser diferente entre concessionárias, mas quando isto ocorreu, tornou-se um hábito de

compra percorrer as lojas em busca do melhor negócio.

Além disso, a diferença do preço no frete cobrado para cada região estimulou a

prática de bootlegging, nome dado quando o concessionário de uma região, onde o frete

12 Decidiu-se por manter os termos em ingles, pois ambos significam práticas específicas, restritas à atividade da comercialização de veículos, cujas expressões equivalentes em português não foram encontradas.

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era baixo, levava veículos novos para serem vendidos em regiões de frete caro, atraindo

consumidores que comprariam nas lojas daquelas regiões. No começo dos anos 1950, o

preço do frete para Detroit era de U$ 11 enquanto que para Los Angeles ou São

Francisco chegava a U$ 280. De acordo com Rubenstein (2001), no começo dos 1950,

um quinto das vendas de novos veículos na Califórnia era feita por meio de bootlegging.

Ambas as práticas nasceram no período de escassez de oferta do final dos anos

1940 e perduraram nos anos 1950. O price packing só veio a ter fim em 1958, quando

uma nova legislação obrigou fabricantes a indicarem o preço sugerido em gravações no

vidro dos veículos. Já o bootlegging foi eliminado em 1965, quando a GM passou a

reduzir a diferença entre os preços dos fretes cobrados em cada região, incorporando no

preço de venda do atacado o custo dessa equalização.

O aumento dos preços e, conseqüentemente, das margens de lucro dos veículos,

fortaleceu o resultado apresentado pelas divisões da General Motors. Com isso, a gestão

de Charles Wilson, durante a segunda metade da década de 1940 foi marcada por

significativa melhora nos indicadores de desempenho. Por exemplo, o faturamento da GM

saltou de U$ 1,9 milhão para U$ 7,5 milhões entre 1946 e 1950. No mesmo período, o

lucro saiu de U$ 87 milhões para U$ 834 milhões, enquanto a participação de mercado foi

de 36,4% para 45,2%. Dado que estes resultados foram obtidos apesar da redução nos

investimentos em 1947, houve um natural aumento nos índices de retorno sobre o ativo,

saindo de 4,4% em 1946, para 24,2% em 1950.

A despeito do sucesso financeiro, outras questões atraíram a atenção de Charles

Wilson ao final dos anos 1940.

Durante o pós-guerra, muitos dos executivos mais experientes e que ocupavam as

principais posições corporativas se aproximavam da aposentadoria. Uma linha de

sucessão se fazia necessária, contudo, apesar de entregarem bons resultados

financeiros, poucos gerentes de divisões eram suficientemente experientes para serem

promovidos a executivos corporativos. Dentre os gerentes das divisões, Nicholas

Dreystadt, gerente geral da Chevrolet, e Harlom Curticem, gerente geral da Buick, eram

os mais experientes e, em tese, favoritos para uma sucessão. Com a morte de Draystadt

em 1946, Curtice tornou-se a principal opção e, como parte de sua preparação para

sucessão, Charles Wilson o nomeou vice-presidente executivo encarregado do staff.

Ainda assim, diante da escassez de potenciais sucessores, Wilson trouxe Roger Kyes de

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fora da General Motors para ser assistente especial da presidência. Kyes serviria como

alternativa caso houvesse qualquer contratempo na carreira de Harlom Curtice.

Em junho de 1950, teve início o conflito armado entre as Coréias do Norte e do

Sul. A intervenção americana no mês de julho alertou a indústria para o início de uma

nova preparação para abastecimento de equipamentos de defesa às forças armadas. Os

Estados Unidos declararam estado de emergência em dezembro de 1950 e entraram

definitivamente no confronto, que duraria até 1953. Novamente a GM teria participação

significativa no fornecimento ao governo americano, entretanto, as circunstâncias do novo

conflito eram diferentes da experiência da Segunda Guerra Mundial. O governo anunciou

o retorno do controle sobre preços e salários, porém, não impôs restrições à produção

civil, com exceção de algumas matérias-primas, como borracha e cobre. Além disso, os

contratos de fornecimento do governo teriam novamente a limitação de 10% da margem

de lucro.

Diante da evolução da indústria nos anos anteriores e da perspectiva de

investimento em fábricas de equipamentos bélicos, a General Motors elaborou um

ambicioso plano de investimentos em novas fábricas, aprovado pelo CPF em março de

1951. A GM decidiu incluir no plano a antecipação de sua preparação para atender à

demanda reprimida que se previa ocorrer com o término da guerra. Desta forma, os

esforços de expansão seriam divididos entre as plantas para finalidade civil, que deveriam

ficar com 80% capacidade, e plantas de defesa, que teriam 20%. Além disso, as fábricas

de materiais de defesa seriam financiadas com capital próprio, e deste modo poderiam

ser construídas com a preparação para serem convertidas em fábrica de automóveis

assim que o contrato de defesa terminasse. Ao final do plano, o aumento da capacidade

produtiva seria de 24%, chegando ao volume anual de 4,5 milhões de unidades. O

investimento previsto foi de U$ 750 milhões, sendo U$ 300 milhões para instalações e

máquinas para produtos de defesa e U$ 450 milhões para reconversão e modernização

da produção de veículos. Para cobrir os investimentos, a GM reduziria os dividendos de

U$ 6 para U$ 4 por ação e diminuiria exigências de caixa da empresa.

Ao final de 1952, no decorrer da Guerra da Coréia, Dwight D. Eisenhower foi eleito

presidente dos Estados Unidos, sucedendo Harry S. Truman. Charles Wilson aceitou o

convite para assumir como secretário de defesa americano e renunciou à presidência da

General Motors em dezembro. No lugar de Wilson, assumiu Halom H. Curtice, que desde

1948 era vice-presidente executivo, encarregado das atividades de staff.

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4.1.14. Gestão Harlom Curtice

Os produtos para atender aos contratos de defesa durante a guerra da Coréia

eram versões avançadas daqueles fabricados durante a Segunda Guerra. A General

Motors foi novamente a principal fornecedora do governo dos Estados Unidos, com

contratos totalizando U$ 5,7 milhões. Esta, porém, seria a última vez que equipamentos

para as forças armadas teriam destaque nas atividades da GM. A partir de 1955, os

contratos de defesa buscariam fornecimento de artefatos mais sofisticados, como mísseis

balísticos e componentes de armas nucleares, e grande parte do foco sairia da produção

para atividades de pesquisa e desenvolvimento. Com isso, a GM teria sua participação

em contratos reduzida gradualmente, embora duas divisões permanecessem ligadas à

atividade militar. A Allison manteve-se como fornecedora de motores de aviões de

combate e transmissões para veículos pesados, como tanques e caminhões. E a AC

Spark & Plug passou a participar no desenvolvimento e fabricação de sistemas de

navegação, utilizados principalmente em mísseis teleguiados e futuramente no programa

aeroespacial americano.

Harlom Curtice assumiu a presidência da GM e do CPO seis meses antes do fim

da guerra, ainda com contratos em andamento, e enquanto a GM executava suas obras

de expansão e modernização da produção. Também no início de seu mandato, uma ação

antitruste movida pelo Departamento de Justiça norte-americano contra a relação da Du

Pont com a GM intimidou as interferências dos acionistas no CPF e no Conselho de

Administração. Nesse contexto, Curtice promoveu alterações na organização corporativa,

centralizando decisões em suas mãos e, ao mesmo tempo, envolvendo mais as divisões

no processo de formulação de políticas. Curtice decidiu não nomear substituto para sua

antiga posição. Ao invés disso, ele acumulou sua função anterior, fazendo com que toda

atividade de staff respondesse diretamente à pessoa do presidente e CEO, e não mais ao

CPO. Além disso, contrariando o já tradicional princípio de gestão da GM de separar

estratégia e administração, Curtice aprovou, em 1954, a nomeação de dois gerentes de

divisões de automóveis ao CPO e ainda manteve todas as divisões não automotivas,

inclusive caminhões, respondendo diretamente a ele.

O novo CEO da GM, apesar de não ser engenheiro, desenvolveu durante sua

carreira nas divisões uma longa experiência em operações. A forma centralizada, e ao

mesmo tempo mais próxima das unidades de negócios, em que a organização corporativa

passou a funcionar, acelerou a velocidade das decisões e aumentou a influência das

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divisões nos rumos da organização. Mas, por outro lado, o estilo adotado por Curtice para

conduzir as reuniões do CPO, onde políticas eram aprovadas, reduziu o debate sobre as

propostas apresentadas. De acordo com (Freeland, 2001), Harlom Curtice limitava os

executivos, durante as reuniões do CPO, a emitirem suas opiniões somente quando o

assunto em discussão envolvesse sua respectiva área ou divisão.

Ao final de 1953, os gastos com fábricas e equipamentos, que haviam sido

previstos em U$ 750 milhões para os três anos, chegara à marca de U$ 1,28 bilhão. A

demanda de veículos se recuperou em relação aos dois anos anteriores e chegou a 7,3

milhões de unidade. A participação de mercado da GM aumentou em relação a 1951 e

1952, voltando para a casa dos 45%, e o faturamento ultrapassou a marca de U$ 10

bilhões, embora o lucro líquido não tenha aumentado na mesma intensidade, devido ao

limite de margens de lucros nas vendas ao governo. Ainda assim, totalizaram U$ 1,66

bilhão nos três anos.

A General Motors anunciou no início de 1954 um novo ciclo de investimentos,

prevendo a aplicação de U$ 1 bilhão ao longo de dois anos. O valor do investimento

superaria as perspectivas de geração de caixa e, portanto, a GM antecipou futuras

necessidades de capital recorrendo a financiamento externo. Um mês antes do anúncio,

em dezembro de 1953, o staff financeiro da GM realizou uma bem sucedida emissão de

debêntures, com vencimento em 25 anos, a 3,25% ao ano, totalizando uma captação de

U$ 298,5 milhões depois dos descontos.

Depois de um ano de seu lançamento, o plano de investimentos foi ampliado para

U$ 1,5 bilhão e, até o final de 1955, seria aumentado novamente, chegando a U$ 2

bilhões. Para mobilizar os recursos necessários, o CPF e o Conselho de Administração da

GM aprovaram uma oferta a seus acionistas de 4,38 milhões de lotes de novas ações a

U$ 75. A emissão foi bem sucedida e a GM captou U$ 325 milhões, após descontos, para

completar seu plano. Os investimentos de 1954/1955 visavam não somente ampliar

fábricas de veículos, mas principalmente novas ferramentas e equipamentos para fábricas

de acessórios e componentes, tais como ar-condicionado, power-brakes, motores V-8 e

direção hidráulica, que em meados da década de 1950 passaram a ser essenciais na

competição entre as Três Grandes: GM, Ford e Chrysler13.

13 A referência ao grupo formado por GM, Ford e Chrylser, como as “Três Grandes” é traduzido da expressão Big Three, comumente utilizada nos Estados Unidos e outros países de lingua inglesa para denominar as três maiores empresas americanas do setor automotivo

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A indústria automobilística veio gradualmente aumentando os investimentos em

design e engenharia desde 1948, à medida que a turbulência do pós-guerra começou a

estabilizar e a demanda voltou crescer. A renovação anual dos modelos determinou o

ciclo da disputa pelo mercado entre fabricantes, e o volume de vendas passou a ser

condição necessária para amortizar despesas com staffs de desenvolvimento. Com isso,

os poucos fabricantes independentes que restavam, além das Três Grandes, entraram em

franco processo de declínio e em poucos anos deixariam o mercado de veículos.

Portanto, a década de 1950 assistiu a uma intensa competição por inovações em estilo e

atributos de engenharia entre as empresas, porém, a supremacia da General Motors em

relação a concorrentes evitou que os efeitos da concorrência chegassem aos preços dos

veículos.

A GM possuía, desde 1937, a preocupação explícita de não caracterizar sua

dominação do mercado de forma a levantar questionamentos sobre violação das leis

antitruste. Assim sendo, sua participação de mercado era monitorada de forma a não

ultrapassar 50%, deixando os outros 50% para os concorrentes. Esta condição fez com

que os preços dos veículos, ao longo da década de 1950, aumentassem em média 43%,

o dobro da inflação (RUBENSTEIN, 2001), apesar da intensa disputa entre as Três

Grandes. O exemplo a seguir ilustra a sincronia no aumento de preços na época. Em

1956, a Ford lançou seus modelos com um aumento nos preços de U$ 50 em relação ao

ano anterior. Quando os modelos da Chevrolet de 1956 foram anunciados, incorporando

aumentos entre U$ 50 e U$ 160, a Ford se viu obrigada a aumentar seus preços em mais

U$ 50, equiparando-se à Chevrolet. A alternativa de manter os preços mais baixos e de

ganhar participação de mercado não era viável, uma vez que a GM dispunha de força

desproporcional para reagir. Sendo assim, a Ford preferiu aumentar suas margens e

assegurar uma operação lucrativa.

O mercado de veículos apresentou algumas mudanças, durante a década de

1950, em relação ao hábito de consumo dos americanos. O crescimento da renda fez

com que gradualmente as famílias passassem de um único carro, geralmente com

carroceria tipo sedan para acomodar a família e bagagens, para dois veículos por

residência e, eventualmente, mais de dois carros, quando filhos atingiam idade para

dirigir. Com isso, emergiram ao longo da década variações de estilo, como carros

esportivos, conversíveis com capota retrátil, peruas, além dos importados compactos,

sendo o mais bem sucedido deles o Volkswagen Fusca.

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Sob o comando de Curtice, as divisões ganharam maior flexibilidade para aprovar

os programas idealizados por suas engenharias. Os desenvolvimentos de design eram

conduzidos em estreito relacionamento das divisões com o laboratório de estilo que

mantinha estúdios e designers separados para cada uma delas. Os staffs de engenharia

continuaram coordenando as atividades de desenvolvimento através do GPE, porém,

agora respondendo diretamente a Curtice. O presidente tratava diretamente com as

divisões e a influência do gerente geral da divisão, na opinião de Curtice, significou mais

autonomia na aprovação de novos modelos, tornando mais rápidas a ação e a reação em

relação concorrência.

A General Motors consolidou sua estrutura de engenharia e estilo quando

inaugurou, em 1956, o centro de tecnologia, batizado em homenagem a Charles F.

Kettering, ex-vice-presidente executivo de pesquisa, que se aposentara em 1947. O

centro de tecnologia, em Warren, Michigan, iniciado após a Segunda Guerra, seria

comandado pelo substituto de Kettering, o PhD. em ciência nuclear, Lawrence R. Hafstad.

Com investimento total de U$ 150 milhões, a GM construiu um complexo de cinco prédios

que abrigaria as atividades de desenvolvimento de quatro mil funcionários, sendo 1300

alocados em pesquisas específicas, 1200 em estilo e outros 700 em desenvolvimentos de

engenharia e manufatura. Em seu discurso de inauguração, Hafstad deixou claro que as

atividades de pesquisas da GM não iriam aplicar esforços exagerados em pesquisa pura,

e que era essencial colher os frutos de tal atividade em um prazo não muito longo.

Para acelerar o desenvolvimento de produtos nas divisões, Curtice reforçou suas

equipes de engenharia. A Cadillac havia despontado com seus luxuosos carros, estilo

rabo de peixe, no final da década de 1940 e continuou a desenvolver modelos nesta linha

durante a década de 1950, juntamente com as intermediárias Buick e Oldsmobile. O

engenheiro de desenvolvimento da Cadillac, Ed Cole, foi transferido para a Chevrolet, a

fim de renovar seus modelos V-6, que vinham perdendo em atratividade aos V-8 da Ford.

A Pontiac não dispunha de um grande staff de engenharia e seus modelos eram

relativamente os mesmos oferecidos desde o fim da Segunda Guerra. Para renovar a

divisão, Curtice nomeou Semon E. Knudsen, filho do ex-presidente da GM, William

Knudsen, como gerente geral da Pontiac para comandar a renovação daquela divisão.

Knudsen trouxe Elliont Estes para ser chefe de engenharia e buscou na luxuosa Packard,

então em processo de concordata, o engenheiro John Z. Delorean. O resultado do esforço

de desenvolvimento foi o lançamento de carros com design mais esportivo, dentre eles os

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Chevrolet Belair e o Corvette, um dos primeiros no estilo “muscle-car” que predominaria

na década seguinte, e os potentes e bem acabados sendas médios da Pontiac, o

StarChief e Bonneville.

Com o esforço das divisões no desenvolvimento e variação dos novos modelos, a

General Motors ofereceu em 1957 cerca de 450 opções de acabamento dos carros,

variando as 75 carrocerias (duas portas, quatro portas, perua, conversível) sobre três

tamanhos básicos de chassi (A, B e C) entre suas cinco divisões (CRAY, 1980). A

variação de modelos e versões realçou a importância da criação de novas ferramentas e

da preparação da linha de montagem nos custos de desenvolvimento de novos produtos.

E, para lidar com tal variedade durante a década de 1950, o staff corporativo de

engenharia de manufatura, estabelecido em 1945, promoveu uma série de estudos sobre

as alternativas de automação da linha de produção que levaram ao início da aplicação de

sistemas de computadores para gerenciar a montagem dos produtos.

No entanto, a agilidade de reação à concorrência, incentivada por Harlom Curtice,

por vezes causou aumentos crônicos nos custos de desenvolvimento e fabricação dos

veículos. Durante a década de 1950, não seria raro ocorrer mudanças de última hora nos

planos dos produtos, com o andamento da implementação avançado, para reagir a

inovações anunciadas por Ford ou Chrysler. Isto freqüentemente provocava uma

escalada dos investimentos, uma vez que havia um prêmio a ser pago aos fornecedores

para acelerar encomendas de novas ferramentas e equipamentos. Além disso, os custos

de produção aumentavam significativamente, dado que o atraso na preparação da linha

de montagem obrigava plantas a operarem em turnos extras, a fim de formar os estoques

a tempo do lançamento no início da temporada de vendas.

Durante o mandato de Harlom Curtice, a GM também empreenderia outros

esforços para ampliar suas vendas de veículos, além das atividades tradicionais de suas

divisões. A coordenação entre empresas da indústria, sob a forma de associações, teve

início quase que simultaneamente que a própria atividade de fabricação e

comercialização de veículos automotores. A National Association of Automobile

Manufactures (NAAM), a já mencionada ALAM e o National Automobile Chamber of

Commerce (NACC) foram precursores, no início do século XX, em promover a

cooperação entre fabricantes, no sentido de construir legitimidade e difundir o automóvel

perante a sociedade americana. Estas entidades foram sucedidas pela Automobile

Manufacturers Association (AMA), em 1934, que tornou-se a principal representante do

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setor na promoção da educação de trânsito, organização de feiras e salões e no apoio a

construção de estradas pavimentadas. Em 1943, a AMA, sob forte patrocínio da GM,

aliou-se a outras associações para formar a American Road Builders Association (ARBA),

com o intuito de organizar o lobby em favor de um amplo programa de construção de

estradas nos Estados Unidos.

Em 1954, o presidente americano Dwight Eisenhower nomeou uma comissão para

diagnosticar a real necessidade do país em termos de estradas. Para presidir a comissão,

foi nomeado o general Lucius D. Clay, importante integrante do governo de ocupação da

Alemanha após a Segunda Guerra, e que desde 1951 passara a ser o primeiro membro

do conselho da GM que não era acionista nem membro do executivo.

O resultado da comissão foi a apresentação do projeto de lei para a criação do

programa de construção de um sistema nacional de rodovias durante os próximos 16

anos, prevendo o investimento de U$ 25 bilhões de dólares, que seriam cobertos com

impostos sobre produtos ligados à utilização do automóvel (combustível, pneus etc.) e

pedágios nas estradas. A aprovação do plano durante o governo Eisenhower deu início à

construção de diversas estradas interestaduais e desencadeou um processo de formação

de áreas suburbanas nos Estados Unidos. Durante a segunda metade do século XX, as

famílias gradualmente passariam a preferir residências fora das regiões centrais das

grandes cidades e, assim, o uso do automóvel teria um papel cada vez maior no dia-a-dia

dos norte-americanos.

O sucesso em seu primeiro ano como presidente, ainda contando com a

participação dos contratos de defesa, foi apenas o início de uma seqüência de três anos

de forte crescimento e altos lucros vivida pela GM. Nos dois anos seguintes, o programa

de expansão de Curtice levaria a GM a aumentar seu volume de vendas em 36%, para

mais de 4,4 milhões de veículos, ficando a participação de mercado em torno dos 50%. O

faturamento em 1955 bateria novo recorde de U$ 12,4 bilhões e, sem os controles do

governo e com os aumentos nos preços, o lucro também bateu recorde, pela primeira vez

ultrapassando os nove dígitos e chegando a pouco mais de U$ 1,2 bilhão. O indicador de

retorno sobre o ativo aumentou de 13,6% em 1953, para 18% em 1955.

Passado os três primeiros anos de seu mandato, Curtice assistiu a uma inversão

nos negócios da GM a partir de 1956. As vendas da indústria, que haviam alcançado o

nível recorde de nove milhões de unidades, em 1955, nos dois anos seguintes giraram em

torno de sete milhões, queda de 25%. O volume de vendas e o faturamento da GM

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caíram em 13% e 21%, respectivamente, em 1956, e permaneceram estagnados no ano

seguinte. O lucro líquido caiu 32%, para a faixa dos U$ 850 milhões, porém, com os altos

investimentos realizados na primeira metade da década, o retorno sobre o ativo caiu para

a casa do 12,5%. A queda do desempenho despertou pedidos de explicação vindas do

CPF para que Curtice justificasse as medidas adotadas em sua gestão.

O caso da Buick talvez tenha sido o mais crítico dentre as descobertas feitas pelo

CPF e o conselho de administração. No começo de 1956, a queda nos volumes da

indústria e a crescente competição dos importados da Volkswagen no mercado de preços

baixos fizeram com que Chevrolet, Ford e Plymouth, da Chrylser, incrementassem seus

modelos para disputar mercados onde as margens poderiam ser maiores. Com isso,

intermediárias como a Buick, Oldsmobile e Pontiac tiveram seus modelos espremidos na

luta por uma fatia de mercado menor. A Buick, divisão onde Curtice havia cumprido boa

parte de sua carreira, era a terceira marca mais vendida em 1955, com 780 mil unidades.

No começo de 1956, Harlom Curtice decidiu acumular a função de gerente da divisão

Buick, dedicando seus finais de semana em Flint para cuidar de suas tarefas

administrativas. Os dois anos que se seguiram foram de queda vertiginosa para a Buick:

31% em 1956 e 24% em 1957.

Pressionado por Sloan e por acionistas membros dos dois órgãos, Curtice nomeou

uma comissão para avaliar os recursos gerenciais da Buick e apontar um plano para

sucessão dentro da divisão. Apesar do esforço de Curtice para amenizar julgamentos

negativos sobre sua gestão, em 1958 ele chegaria a 65 anos e teria de se aposentar

compulsoriamente. Assim sendo, não lhe restaria tempo suficiente para reverter a

situação.

4.1.15. Fim do ciclo Sloan-Du Pont e a reorganização

A preocupação manifestada pela Du Pont durante a década de 1930 sobre evitar

questionamentos a respeito da violação das leis antitruste não evitou que GM e Du Pont

enfrentassem o julgamento das autoridades regulatórias americanas. A magnitude das

operações da General Motors se destacava em comparação a qualquer outra empresa

dos Estados Unidos. Em 1955, quando a empresa obteve seu recorde de vendas na

década, o faturamento da GM correspondeu a 3% do PIB americano e foi

aproximadamente o dobro da segunda maior empresa do país, a Exxon Mobil.

Comparada a suas concorrentes, a GM detinha 50% do mercado, faturou 37% a mais e

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lucrou o dobro do que suas duas principais concorrentes, Ford e Chrysler, juntas. A

desproporcional diferença entre a GM e as demais empresas chamou a atenção do

Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Sobretudo na relação entre a General

Motors e a Du Pont, que, além de principal acionista e controladora, também era

fornecedora de produtos químicos, especialmente para as atividades de pintura.

Alguns processos relacionados à preservação da livre concorrência foram

movidos, ou tiveram desfecho, contra divisões da GM ao longo da década de 1950,

embora nunca diretamente relacionados às divisões de automóveis e caminhões. Em

casos como o da Euclid Company, de máquinas rodoviárias, o da GMAC, acusada de

restringir o comércio de crédito ao consumo, e do monopólio sobre a fabricação de ônibus

urbanos, a General Motors obteve êxito em contornar a situação, cumprindo as decisões

da justiça, porém sem grandes perdas e com alterações meramente administrativas em

suas atividades.

A investigação e os processos sobre a relação da Du Pont com a General Motors

tiveram início na segunda metade da década de 1940, e o seu desfecho no final dos anos

1950 foi decisivo para a realização de mudanças na organização e no funcionamento da

estrutura corporativa da General Motors. Tais mudanças ocorreram na transição da

gestão de Harlom Curtice para Frederic Donner, em meio a um contexto de profunda

alteração na composição do conselho de administração, bem como na relação entre

gestão e os acionistas da GM.

Alfred Sloan presidiu o conselho de administração da General Motors durante 22

anos, entre 1934 até 1956, quando, aos 80 anos de idade, renunciou ao cargo, depois do

falecimento de sua esposa Irene. Para o seu lugar, Sloan favoreceu a nomeação de

Albert Bradley, a quem Sloan há alguns anos vinha preparando, e era vice-presidente

executivo de finanças e presidente do CPF. A promoção de Bradley puxou uma seqüência

de promoções na organização de finanças, apontando a linha de sucessores formada por

Frederic Donner, Richard Gerstenberg e George Russel. No lado da organização de

operações, a linha de sucessão para o presidente e CEO, Harlom Curtice, também

começou a ser preparada, em 1956, com a nomeação de John F. Gordon para a vice-

presidente de operações de produção de automóveis, promovido da gerência geral da

Cadillac, Ed Cole, chefe de engenharia, nomeado gerente geral da Chevrolet, James

Roche, ex-diretor de recusos humanos da Cadillac assumiu a gerencia geral no lugar de

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Gordon, e além desses, Semom Knudsen passou a ser uma opção mais distante, à frente

da Pontiac.

A ação do Departamento de Justiça contra a Du Pont teve o julgamento em

primeira instância concedendo a vitória à Du Pont em 1954. Contudo, a decisão final da

Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1957, condenou a E. I. Du Pont de Nemours na

acusação de restrição do comércio, por manter interferência na gestão da General

Motors, da qual era fornecedora de tintas automotivas e outros materiais químicos. A

sentença obrigava a Du Pont a se desfazer de suas ações da General Motors dentro de

um prazo de cinco anos e remover seus representantes do conselho de administração e

do CPF da GM.

Na metade de 1957, diante da decisão judicial que previa o afastamento da Du

Pont e da perspectiva das aposentadorias de Albert Bradley e de Harlom Curtice, em

1958, Alfred Sloan foi nomeado para presidir um subcomitê especial dentro do conselho

de administração, com a tarefa de estudar a sucessão e a reorganização da estrutura

corporativa da General Motors. O grupo, denominado internamente de “comitê de Sloan”,

era composto pelo presidente do conselho de administração, Albert Bradley, pelo

representante e presidente do conselho da Du Pont, Walter Carpenter, o membro do

conselho, General Lucius Clay e Harlom Curtice, além do próprio Sloan, e não

oficialmente de Donaldson Brown, ex-vice-presidente do conselho da GM.

Após o prolongado período de estudos e discussões conduzidos pelo comitê de

Sloan no conselho de administração, em agosto de 1958, a sucessão e a reorganização

da estrutura corporativa da General Motors foi aprovada, sem a participação de nenhum

membro representando a Du Pont.

A reorganização restabeleceu o Comitê Executivo (CE) em substituição ao CPO. O

CE contaria com a presença do presidente do conselho de administração, mas seria

presidido pelo presidente da GM. Também comporiam o CE os vice-presidentes

executivos (encarregados do staff) e os vice-presidentes de operações. Já o CPF foi

substituído pelo Comitê de Finanças (CF), o qual seria presidido pelo presidente do

conselho de administração. Comporiam o CF membros do conselho de administração,

executivos de finanças e o presidente da GM. Desta forma, o presidente da GM, chefe de

operações, ficou subordinado ao presidente do conselho, que por ocupar a presidência do

CF, colocou as decisões do CE sob intenso escrutínio CF. Os grupos de políticas

passaram a responder novamente de forma direta ao CE, eliminando a supervisão e a

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análise prévia do CA. Nesta nova configuração, o CA, composto pelos gerentes das

divisões, seria apenas uma instância consultiva do presidente da GM.

O conselho de administração aprovou, também em 1958, a nomeação de Frederic

Donner, vice-presidente de finanças, para substituir Albert Bradley e Harlom Curtice nas

funções de presidente do conselho e CEO. Donner nomeou John F. Gordon, o novo

presidente da General Motors.

4.1.16. O legado de Harlom Curtice

O ano de 1958 fechou com a General Motors enfrentando uma forte queda no

volume de vendas, cerca de 22%, acompanhando a diminuição da atividade no restante

da indústria. A GM, no entanto, se recuperaria até o final da década e fecharia 1960

obtendo faturamento recorde de U$ 12,7 milhões, com a venda de 3,7 milhões de

veículos que representavam aproximadamente 52% do mercado. Mesmo com uma ligeira

queda nas margens, o lucro líquido alcançaria U$ 959 milhões. A consolidação da

hegemonia ao longo da década só foi desafiada por um, ainda que pequeno, mercado de

veículos “subcompactos”14, que emergiu na segunda metade da década de 1950. A

Volkswagen começou a importar o Fusca em 1953 e, juntamente com o Rabler da

American Motors, outros compactos importados da Europa conquistaram cerca de 5% de

participação de mercado. Até 1960 os veículos compactos, a maioria importados como os

da própria Vauxhaul e Opel, receberiam concorrentes nacionais das Três Grandes.

Em 1956, o chefe da engenharia da Chevrolet, Ed Cole, havia assumido a

gerência geral da divisão. Dentre os principais planos de Cole estava a criação de um

veículo compacto, com motor traseiro, para competir de frente com os emergentes

Rambler e Fusca. Em 1957, a Chevrolet desenvolveu o primeiro protótipo e apresentou

aos executivos da GM. O novo veículo se chamaria Corvair e sua aprovação seria uma

das últimas conduzidas durante a gestão de Halom Curtice. Em 1958, Curtice e Ed Cole

trabalharam a aprovação no CE, contrariando opiniões de finanças e do ainda vice-

presidente de operações de carros e caminhões, John Gordon, que consideravam o

projeto como de baixo retorno devido à estreita margem de lucro. Quando Fred Donner

assumiu o comando, a GM decidiu que após o lançamento da Chevrolet a arquitetura do

14 No início da década de 1950 o segmento dos carros com as menores dimensões já possuía a denominação de compacto. Portanto, quando o novo padrão de tamanho se consolidou, o termo subcompacto foi adotado. No decorrer deste texto, o termo compacto será utilizado em referência ao padrão de veículos com a menor dimensão existente e não na forma habitual da indústria americana nos anos 1950.

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Corvair seria compartilhada pelas demais divisões, exceto a Cadillac, a fim de aumentar a

escala e melhorar o retorno sobre o investimento.

O Corvair foi aprovado sob uma série de condições impostas por Curtice. O carro

deveria ser lançado no final de 1959, com um motor traseiro feito em alumínio, com

sistema de refrigeração a ar e suspensão com eixos independentes, atributos que o

tornaria mais leve e econômico. Além disso, o modelo mais básico do Corvair deveria

competir em preço com o Fusca que, à época, custava pouco menos de U$ 2000.

A combinação de motor traseiro com o sistema de suspensão independente

resultava em complicações de engenharia que rapidamente foram identificadas pelas

equipes de teste da GM. O Corvair, quando dirigido em curvas de alta velocidade, tendia

a ficar instável e propenso a capotamentos. O comportamento nos testes foi devidamente

documentado e gerou uma grande discussão entre o staff corporativo e o gerente geral da

Chevrolet, Ed Cole. Charlie Chayne, vice-presidente de engenharia, defendia a inclusão

de barras estabilizadoras e o uso de pneus mais largos como forma de melhorar a

estabilidade do veículo, enquanto Cole afirmava que o Corvair dispunha de suficiente

estabilidade e que a adição destes itens inviabilizaria a competitividade de custos do

veículo. Diante do impasse técnico, Fred Donner optou por preservar as margens de

lucro, e o Corvair foi lançado sem os dispositivos em 1959.

A celeuma criada entre as engenharias rapidamente se espalhou para as demais

equipes das divisões. Os gerentes de Buick, Oldsmobile e Pontiac persuadiram a

organização corporativa a retirar o Corvair de seus planos. As três divisões

compartilhariam a arquitetura de um veículo compacto, com motor dianteiro, que vinha

sendo desenvolvido conjuntamente por Buick e Oldsmobile. Assim sendo, em 1960, o

Buick Special, Oldsmobile F-85 e o Pontiac Tempest foram introduzidos para competir no

mercado de compactos, que além dos importados do Rambler e do Corvair contaria

também com os lançamentos dos concorrentes, o Ford Falcon e o Plymouth Valiant.

O Corvair foi lançado com diversas combinações de acabamento e acessórios,

utilizados para aumentar a margem de lucro nas vendas. Dentre as versões levadas ao

mercado, a de maior sucesso foi o Corvair Monza, que explorava um apelo mais

esportivo. No entanto, os problemas de estabilidade do carro nas estradas dos Estados

Unidos começaram a retornar para a GM na forma de processos na justiça. Promovido à

gerência geral da Chevrolet, em substituição a Ed Cole que em 1961 se tornou vice-

presidente de operações de carros e caminhões, Semon Knudsen iniciou uma luta para a

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adoção de barras estabilizadoras no Corvair, a um custo de U$ 15. Diante da perspectiva

de ter seu pedido negado, Knudsen ameaçou deixar a General Motors caso sua proposta

não fosse aprovada. As barras estabilizadoras foram finalmente adotadas nos modelos

vendidos em 1964, no entanto, o dano à imagem do veículo seria irreversível.

Em 1965, uma série de processos na justiça levou à criação de um comitê no

senado dos Estados Unidos para investigar a segurança dos veículos. Os resultados

desta comissão foram desastrosos para a GM e para o Corvair. Entre 1959 e 1965, a

Chevrolet vendeu cerca de 1,5 milhão de unidades e, após a investigação do senado,

apenas 125 mil unidades foram vendidas até a descontinuação do modelo, quatro anos

depois.

4.1.17. Hegemonia de Finanças

Quando a General Motors se preparava para o lançamento de seu compacto

Corvair, Alfred Sloan, que ainda exercia certa influência como membro do conselho de

administração, alertou sobre a necessidade de a GM construir carros ainda menores do

que o Corvair. Para Sloan, o desenvolvimento de carros pequenos seria válido mesmo

que estes não fossem comercializados, pois proporcionaria um aprendizado para a GM e

a ajudaria a estar preparada para futuras mudanças no mercado (FREELAND, 2001). As

recomendações de Sloan ecoaram nas divisões, que submeteram ao GPE propostas de

programas para veículos compactos. No entanto, a orientação do CF e do CE foram no

sentido contrário, e as propostas geradas nas divisões eram seguidamente reprovadas

devido às baixas perspectivas de retorno sobre o investimento.

Um modelo topo de linha da Buick ou Oldsmobile, vendido por U$ 4500 na

concessionária, tinha o preço de atacado em torno de U$ 3400. Os custos de fabricação

girariam em torno de U$ 1900 a U$ 2000, gerando uma margem de cerca de U$ 1400 a

U$ 1500, que resultaria em um lucro, descontados os impostos, de cerca de U$ 850. Já

um veículo com grande carroceria e mais luxuoso, como o Cadillac DeVille, possuía um

custo de produção de U$ 300 a U$ 400 a mais que o intermediário Chevrolet Caprice,

enquanto que a diferença de preço entre os dois poderia chegar a U$ 3800. Com isso,

enquanto o lucro líquido dos modelos mais caros poderia chegar a U$ 2000, os modelos

intermediários gerariam lucros de U$ 400 dólares, e compactos como Corvair e o Pontiac

Ventura, algo entre U$ 150 e U$ 200. Além disso, modelos esportivos, com tamanhos

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intermediários, porém com grande apelo para o consumidor, poderiam ser vendidos a U$

4000, gerando lucros de cerca de U$ 900.

Outra maneira que as empresa encontraram para aumentar o lucro obtido em cada

venda era carregar os veículos com acessórios opcionais, cujos valores eram cobrados a

parte. Pacotes oferecidos com frisos cromados, pneus mais largos e outros adereços, a

um custo de U$ 15, permitiria um aumento de U$ 300 no preço do “novo” modelo. Ou

então, com o custo adicional de U$ 25, a troca dos pára-choques, bancos especiais,

tacômetro e manopla de câmbio cromada transformariam um modelo comum em sua

versão esportiva, elevando preço em U$ 400.

Dada a diferença de margens, as tentativas de desenvolver carros maiores, de

forma que pudessem receber mais acessórios, tornou-se uma tendência na General

Motors e na indústria a partir dos anos 1960. Com isso, modelos compactos lançados por

Buick, Pontiac e Oldsmobile no início da década receberiam motores mais potentes e

teriam suas carrocerias ampliadas para receber mais acessórios. A concorrente Ford

também seguiu o mesmo caminho, em um programa de U$ 800 milhões para a

revitalização de sua divisão Mercury, de veículos intermediários e grandes. Além disso, ao

longo da década de 1960, tornaram-se populares os “muscle-cars”, veículos

intermediários, com forte apelo esportivo em seu desing, equipados com motores

potentes e vendidos por um alto preço. Dentre os modelos que marcaram o início do

muscle-car estão o concorrente Ford Mustang, de 1964, e o Chevrolet Camaro, lançado

em 1967. No entanto, versões preliminares deste estilo já vinham sendo desenvolvidas

pela GM, como o Corvette 1957, o Corvair Monza e o experimental Chevy II, em 1962.

Com a atenção das grandes montadoras voltadas para o problema de como

incrementar as margens de seus veículos, a demanda por carros compactos de baixo

preço foi deixada novamente para os concorrentes importados. Tais veículos haviam

perdido espaço no início dos anos 1960, com os lançamentos dos nacionais Corvair, o

Ford Falcon e o Valiant da Chrysler, mas retomaram participação no mercado a partir de

1963. O Volkswagen Fusca aumentou suas vendas de 157 mil unidades em 1960 para

563 mil em 1968, ano em que importados conquistaram 10,5% do mercado.

O esforço de busca por margens, oferecendo mais opções de estilo, e a tentativa

de ampliar a escala, compartilhando o veículo desenvolvido em uma divisão com as

demais, fez com que, a partir do final dos anos 1950 e durante os anos 1960, a General

Motors aumentasse sua linha de produtos significativamente. O número de arquiteturas

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básicas saltou de três em 1955 para dez no final em 1969. Além disso, a GM aumentou

os tipos de carrocerias de 75 para 175, com um total de 918 opções de acabamento. Com

isso, o número de partes chegou a 15 mil, combinadas em 165 mil listas de materiais,

incluindo os modelos de carros e caminhões.

Para controlar a logística e uma produção de tamanha complexidade, a GM

utilizava sistemas computadorizados em suas fábricas, com os quais era possível

organizar a seqüência de produção. No lado do desenvolvimento de engenharia, a

mudança anual dos modelos passou a ser mais superficial, procurando limitar-se à

combinações de acessórios e detalhes mínimos de design. Além disso, o ciclo de

mudanças significativas na mecânica e na estrutura dos veículos foi ampliado de quatro

para seis anos. Ainda assim, a GM não foi capaz de reduzir o tempo de paralisação das

fábricas para a troca anual dos modelos, como conseguiram Ford e Chrysler, que

transferiram parte dos dias de paralisação para ajustes realizados nos finais de semana.

No começo dos anos de 1970, a Ford paralisava suas operações durante o equivalente a

42 dias de produção de uma planta para trocar toda a linha de produtos, enquanto que na

GM o mesmo processo levava o equivalente a 460 dias.

O aumento da diversidade de produtos e a atuação das divisões em todos os

segmentos, competindo entre si, exigiram maior coordenação entre suas atividades,

sobretudo no desenvolvimento de novos modelos. A responsabilidade de conduzir a GM

diante de tal desafio recaiu sobre o CEO Fred Donner, cuja carreira havia sido toda

desenvolvida em finanças. Para comandar gerentes e executivos que dispunham de

maior experiência em operações, Donner adotou uma prática que se tornou comum na

General Motors mesmo depois de sua saída. Assim que assumiu o comando, apontou

John Gordon como presidente da GM, que segundo John Z. De Lorean (WRIGHT, 1974)

era a escolha menos óbvia. Gordon era vice-presidente de operações de montagem, no

entanto, dentro da GM os dois principais nomes da área de operações cotados para

substituir Harlom Curtice eram os vice-presidentes executivos Cliff Goad e Bud Goodman.

Posteriormente, Donner ainda nomearia Roger Kyes como vice-presidente de operações

não-automotivas e, anos depois, para operações de carros e caminhões. Kyes havia feito

sua carreira fora da GM e, mesmo depois de entrar para a empresa, suas experiências se

restringiam à gerência das divisões Frigidaire e GM Truck & Coach.

No início da gestão de Donner, o desenvolvimento dos modelos manteve-se com o

sistema de revisões em comitê semelhante ao que fora estabelecido por Sloan. Novas

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propostas emergiam do trabalho conjunto entre divisões e o laboratório de estilo, e os

programas para toda a linha eram aprovados por meio de uma seqüência de revisões

conduzidas pelo staff de engenharia através do GPE, até consolidar uma proposta que

era encaminhada para a avaliação do CE e do CF. Em geral, inovações na mecânica ou

no design eram adotadas, primeiro, por uma divisão e, em caso de sucesso, eram

replicadas para as demais. Este processo, formalizado em 1935, veio gradualmente

transferindo as atividades de desenvolvimento das divisões para o staff de engenharia.

Porém, na gestão de Donner este processo foi deliberadamente acelerado e, ao longo da

década de 1960, as decisões de produto passaram a ser cada vez mais impostas às

divisões e com maior detalhamento das especificações a serem seguidas.

Em 1962, a Pontiac realizou por sua conta experimentos com o seu modelo

intermediário Tempest. A divisão comandada por Elliot Estes, que contava com John

DeLorean como chefe de engenharia, removeu todos os componentes supérfluos do carro

e o reequipou com novos freios, suspensão e componentes de motor. Com a melhora

significativa de desempenho, a Pontiac renomeou o veículo como GTO. A divisão Pontiac

conduziu o desenvolvimento do GTO sem informar o GPE, pois temia que este não

aprovasse as alterações propostas. O risco assumido por Estes foi recompensado, e as

vendas do GTO, em 1963, se revelaram um grande sucesso. A organização corporativa

da GM não teve outra opção senão reconhecer o novo produto. No entanto, a resposta de

Fred Donner viria logo em seguida, com a determinação de que todas as decisões de

produtos feitas pelas divisões fossem submetidas à corporação para aprovação.

O sistema de controles financeiros estabelecidos desde os anos 1920 contribuiu

para que a GM controlasse as decisões de suas divisões. O controler da divisão

elaborava o orçamento do ano sob a orientação do gerente da divisão, porém os valores

previstos e a programação de receitas e despesas eram aprovados e controlados pelo

staff financeiro. Com isso, a divisão só poderia alterar um modelo depois que ele já

estivesse aprovado pelo controle corporativo e, ainda assim, respeitando os limites

estabelecidos no orçamento. Por exemplo, a Pontiac, em 1966, elaborou um projeto para

remodelar um de seus veículos grandes, o Catalina, substituindo partes e componentes

por outros mais leves e mais baratos. O protótipo exibido formal e informalmente, porém

apesar da boa impressão causada ao staff de engenharia, foi aprovado com cortes no

orçamento que tornavam o projeto inicial inviável. Diante da restrição, a Pontiac

conseguiu a aprovação para substituir o Catalina por um modelo intermediário. O

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resultado foi a criação do Grand Prix, um sucesso de vendas, que inaugurou um

segmento de carros médios especiais. O Grand Prix tinha o preço de U$ 4000, gerando

um lucro de cerca de U$ 1500, enquanto que a média das linhas de veículos

intermediários era de U$ 600.

A autonomia das divisões, como os casos dos Pontiac GTO e Grand Prix, se

tornou cada vez mais limitada ao longo da gestão de Fred Donner e culminou em 1965

com a criação da General Motors Assembly Division (GMAD), que passaria a centralizar

as atividades de produção e montagem das divisões automotivas. No início, foram

reunidas fábricas de Buick, Pontiac, Oldsmobile e Fisher Body. Cadillac e Chevrolet

permaneceriam ainda com suas divisões até a década de 1970. Dois principais motivos

são apontados para justificar a criação da GMAD. Um deles é explícito e estava

relacionado ao plano de comunização de partes e componentes, que tinha por objetivo

aumentar escalas de produção e, conseqüentemente, reduzir custos. Outro motivo seria

fruto de uma suspeita de que a General Motors poderia ser novamente questionada sobre

o domínio que exercia no mercado. Com isso, temia-se que o fato de operar sob uma

estrutura composta de divisões razoavelmente autônomas, facilitasse uma sentença que

determinasse o desmembramento e a venda de algumas divisões, como forma de

restabelecer a concorrência no setor. Com a criação da GMAD, as divisões passariam a

se restringir a suas organizações de marketing, vendas e distribuição.

Frederic Donner foi presidente do conselho de administração e CEO da General

Motors entre 1958 e 1967. Durante sua gestão, a GM manteve sua participação de

mercado próximo ao nível de 50%, enquanto o volume de vendas gradualmente cresceu a

partir do baixo nível do primeiro ano, tendo o dobro de veículos saído de suas plantas no

ano recorde de 1965, quando foram vendidos 5,7 milhões de veículos. O faturamento da

GM saltou da faixa de U$ 10 bilhões nos anos que precederam Donner para a casa dos

U$ 20 bilhões nos três últimos anos de seu mandato. Em 1965, dois anos antes de sua

aposentadoria compulsória, Donner nomeou James Roche presidente da General Motors.

Em 1967, quando Donner finalmente se aposentou, Roche assumiu como novo CEO e

presidente do conselho de administração.

Diferentemente de Fred Donner, Roche não vinha de uma formação de finanças e,

assim sendo, não ocuparia a presidência do CF como seu antecessor. Para compensar a

nomeação de um CEO com formação em operações, foi criada a posição de vice-

presidente do conselho, a ser ocupada pelo vice-presidente de finanças George Russell,

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que passou a ser o segundo em comando na ausência de Roche. O cargo menos

favorecido com a mudança de gestão foi o de presidente da GM. Edward Cole foi

nomeado presidente, porém a partir de 1967 sua influência foi significativamente reduzida,

pois além de o CE passar a ser presidido por Roche, Cole teria autoridade somente sobre

as divisões de veículos, uma vez que nem as áreas não-automotivas nem os mercados

externos seriam subordinados a ele. Além disso, a composição do CE, responsável pela

aprovação de operações, mudou amplamente durante o mandato de Donner, reforçando

a influência de finanças. Em 1967, o CE da General Motors veria os vice-presidentes de

operações serem reduzidos à minoria. Até 1970, na gestão Roche, o CE passaria a ter

cinco membros, todos executivos corporativos relacionados às áreas de staff, sendo a

maioria de finanças.

4.1.18. Segurança veicular e controle de emissões

Um dos primeiros desafios de James Roche assim que assumiu a presidência da

General Motors, ainda com Donner como CEO, foi enfrentar a desastrosa participação da

GM na comissão de segurança veicular do senado dos Estados Unidos. As preocupações

com o crescimento do número de acidentes e mortes no trânsito acompanhou a difusão

do uso do automóvel pela sociedade americana. Em 1936, a indústria automobilística

criou a Automotive Safety Foundation (ASF) para realizar estudos e promover campanhas

para a redução de acidentes de trânsito. Com os custos pagos pelas montadoras, parte

dos trabalhos da ASF procurou retirar a responsabilidade do automóvel sobre os

acidentes e atribuir a maior parte das causas às más condições de estradas e sinalização.

Dentre as primeiras ações na tentativa de explorar comercialmente atributos de

segurança, a Ford lançou, em 1956, com ampla campanha de divulgação, um pacote de

segurança para equipar seus veículos, que incluía opcionais como sinto de segurança e

barra de direção resistente a colisões, a um custo de U$ 25. O pacote de segurança foi o

conjunto de acessórios mais vendidos pela Ford na época, cerca de 400 mil unidades em

18 meses. A Chrysler também acompanharia a concorrente Ford e em poucos meses

ofereceria o conjunto de opcionais. Entretanto, a General Motors alegaria que as

conclusões sobre a eficiência de equipamentos como sinto de segurança ainda

precisavam ser mais bem estudadas, e não ofereceria o dispositivo pelos próximos nove

anos. A recusa da GM em oferecer acessórios de segurança, concentrando esforços de

divulgação para os lançamentos de motores e carros mais potentes, fez com que a Ford

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retirasse sua campanha promocional do pacote de segurança seis meses depois e

retornasse para atividades semelhantes às da GM.

A resistência da GM em desenvolver melhor segurança para motoristas e

passageiros de seus veículos teve um fim estrondoso no ano de 1965. Um dos

protagonistas dos eventos que culminaram com a criação da legislação americana sobre

requisitos de segurança veicular foi Ralph Nader, um advogado de Harvard que passou a

investigar estatísticas de acidentes envolvendo o Chevrolet Corvair quando trabalhava

como consultor em processos envolvendo companhias de seguro. Com o tempo, Nader

passou a compartilhar as estatísticas e jurisprudências que encontrava para auxiliar

processos movidos por todo o país. Quando contratado como consultor por uma nova

subcomissão do senado norte-americano, Nader compartilhou seus achados com o

novato Senador Abraham Ribicoff. Em fevereiro de 1965, Ribicoff anunciou que sua

subcomissão colheria depoimentos de autoridades e fabricantes, para investigar as

razões de tantas mortes em acidentes de trânsito.

Em julho de 1965, Fred Donner e James Roche apresentaram-se à subcomissão

do senado para apresentar as atividades realizadas pela GM acerca da segurança de

seus veículos. Ao final do testemunho, o resultado foi desastroso para a GM. Quando

questionado pelo senador Robert Kennedy sobre quanto a GM havia investido em

projetos de segurança veicular no ano anterior, Donner prontamente respondeu o

montante de U$ 1,25 milhão, porém quando o mesmo senador indagou qual fora o lucro

da GM no mesmo período, Donner se engasgou com a resposta e afirmou não ter o

número de cabeça. A resposta repercutiu pessimamente na subcomissão, uma vez que o

lucro era uma informação pública, facilmente acessada. Pressionado pelos senadores,

James Roche interveio no depoimento e forneceu o valor de U$ 1,7 bilhão de lucros

reportados em 1964. A conclusão de Robert Kennedy, apresentada em sua réplica,

arrematou o péssimo desempenho da GM nos depoimentos e deixou uma má imagem da

organização perante os senadores.

Ainda em 1965, paralelamente aos trabalhos da subcomissão do senado, Ralph

Nader organizou um livro que apresentava uma análise das estatísticas de acidentes e

mortes do Corvair. O livro foi publicado no final do ano, sob o título de Unsafe at Any

Speed (Inseguro a Qualquer Velocidade). Semanas antes da publicação, ao tomar

conhecimento dos planos de Nader, o chefe da consultoria jurídica da GM, Aloysius F.

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Power, contratou detetives para investigar Nader, a fim de encontrar algo que pudesse

desacreditá-lo perante a opinião pública.

A ação da GM foi desmascarada quando Ralph Nader foi convocado para depor

na subcomissão do senado. Antes da seção se iniciar, os detetives que andavam em seu

encalço foram identificados por um segurança do senado americano como suspeitos de

estarem perseguindo o depoente. Alertado pela segurança, o presidente da subcomissão

Ribicoff elaborou uma estratégia de utilizar boatos na imprensa para forçar a

manifestação de pessoas que tivessem sido abordadas pelos detetives da GM. Em

poucos meses o escândalo estourou, e James Roche teve de pedir desculpas

publicamente em nome da GM pelos atos cometidos.

O resultado dos trabalhos da subcomissão culminou com a aprovação no

Congresso americano, em 1967, da Lei Nacional de Segurança de Veículos e no Trânsito.

A nova legislação criou o arcabouço para uma série de regulamentações, definindo

padrões, equipamentos e sistemas obrigatórios de segurança, bem como estabelecendo

as responsabilidades e garantias de qualidade dos veículos.

Também na metade da década de 1960 surgiram as primeiras leis de controle

sobre emissão de gases poluentes sobre os automóveis. Os efeitos nocivos de resíduos

emitidos durante o processo de fabricação começaram a ser estudados pelos próprios

fabricantes ainda na década de 1920. Porém, apenas no início da década de 1950 a

indústria começou a se mobilizar, ainda que timidamente, para amenizar pressões em

relação à poluição do ar. Em 1953, os fabricantes concordaram em ceder mutuamente às

patentes de dispositivos que contribuíssem para o controle de emissões. O estado da

Califórnia foi o primeiro a criar exigências sobre o controle de emissões dos automóveis.

Los Angeles era uma das cidades mais afetadas pela concentração de gases emitidos por

automóveis na década de 1950. Em 1961, o California Air Resources Board (CARB),

exigiu que todos os carros novos vendidos no estado fossem equipados com um

dispositivo de válvula de ventilação do cilindro, que reduzia significativamente a emissão

dos gases mais tóxicos, resultantes da queima inadequada do combustível. O dispositivo

havia sido desenvolvido pelo GM Research Labs em 1958 e sua patente foi liberada para

as demais montadoras em 1962.

O movimento pioneiro da Califórnia levou a aprovação no Congresso americano

da Lei Federal do Ar Limpo, em 1965. A legislação estabelecia que a Secretaria de

Saúde, Educação e Bem-Estar do governo americano tinha autoridade para estabelecer

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os limites e medidas que os novos veículos deveriam seguir. Os primeiros critérios de

controle foram anunciados em 1968. No entanto, alegando não terem capacidade de

cumprir com as novas regras a tempo, as montadoras persuadiram as autoridades a

postergar o início das novas regras para 1970. A partir deste ano, gradualmente os limites

seriam alterados, de forma a torná-los mais rigorosos, a fim de reduzir o nível de poluição

do ar, sobretudo em grandes cidades.

4.1.19. A Gestão de James Roche

Os desafios de James Roche, no início de sua gestão como CEO, em relação à

segurança e poluição não foram os únicos questionamentos externos aos quais a General

Motors teve de responder. Desde a saída da Du Pont do grupo de acionistas da GM,

nenhum outro acionista passou a deter quantidade suficiente de ações a ponto de exercer

influências decisivas nas ações da empresa. A maioria das ações estava distribuída nas

carteiras de fundos de investimentos, que quando ficavam insatisfeitos com atitudes da

GM simplesmente vendiam suas ações no mercado. No entanto, um pequeno grupo de

pessoas que aplicavam suas economias em ações começou a se manifestar nos

encontros anuais de acionistas.

Pouco antes do encontro de 1970, doze jovens acionistas criaram um movimento

ao qual deram o nome de Campanha GM. O pequeno grupo começou a solicitar votos

para a criação de um comitê de acionistas para responsabilidade social, além da inclusão

de três representantes da sociedade no conselho de administração da GM. Sabendo do

movimento com antecedência, Roche mobilizou acionistas para vetar as propostas,

alegando que elas restringiriam a capacidade gerencial da organização. No dia do

encontro, a votação foi esmagadora em favor de Roche, porém, considerando que a

maioria dos votos vinha de um pequeno grupo de fundos de investimento, os 3%

conseguidos pela Campanha GM foi uma vitória moral. Durante a reunião, novas

pressões surgiram, como, por exemplo, o questionamento sobre por que não havia

nenhum negro membro do conselho de administração.

Apesar de evitar alimentar tais manifestações entre os poucos acionistas

engajados, Roche adotou a prática de cooptar tais grupos logo no início dos

questionamentos. Assim sendo, após a reunião de 1970, James Roche indicaria o

reverendo Leon H. Sullivan, ministro da maior igreja de negros da Filadélfia, para integrar

ao conselho da GM. No ano seguinte, Roche indicaria a primeira mulher a fazer parte do

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conselho, bem como criaria a vice-presidência de assuntos de meio ambiente, com um

orçamento de U$ 26 milhões para incentivar pesquisas de redução da poluição. Além

disso, no início da década de 1970, a GM atendeu às pressões de seus acionistas e

passou a divulgar junto com o relatório anual as estatísticas de cumprimento dos

requisitos de segurança e controle de poluição.

Também durante a gestão de James Roche, a GM se viu novamente sob o desafio

de desenvolver um carro compacto com preço baixo. Ao longo da década de 1960, o

crescimento nas vendas do Volkswagen Fusca e a intensa competição entre os veículos

médios da Ford, Chrysler e de divisões da GM fizeram com que a Chevrolet, principal

marca da organização, visse sua participação de mercado reduzir de 31% em 1962 para

24% em 1968. Um dos carros de tamanho intermediário, o Chevy, sofreu uma queda nas

vendas de 600 mil unidades para 200 mil unidades no mesmo período, sem contar com o

Corvair, que praticamente parou de vender após os escândalos de 1965.

Com a confirmação da demanda por carros menores e mais baratos, as divisões

da GM, em especial a Chevrolet de Eliot Estes e a Pontiac de John DeLorean,

submeteram ao GPE suas propostas para o desenvolvimento de novos modelos que

competiriam neste segmento. Contudo, em 1967, o recém empossado presidente da GM,

Edward Cole, possuía planos diferentes para combater a ameaça dos importados. Cole

apresentou planos para um carro compacto que, diferentemente do processo tradicional

de criação de novos modelos, seria totalmente desenvolvido pelo staff de engenharia

corporativo. Os protótipos seriam entregues prontos para a Chevrolet, que desenvolveria

seu sistema de produção e comercializaria o veículo. Guardadas as diferenças devido à

evolução na estrutura e na equipe de engenharia, o projeto de Cole, batizado de XP-887,

tinha uma estratégia de desenvolvimento semelhante ao do fracassado copper-cooled de

Charles Ketering e Pierre du Pont, em 1921.

A GM adotou outra medida incomum em relação ao seu novo desenvolvimento.

Em outubro de 1968, o CEO James Roche anunciou publicamente os planos de

lançamento do novo veículo para 1970, divulgando ainda que o veículo teria peso inferior

a 900 quilos e preço final de U$ 1800. O detalhe do pronunciamento de Roche foi que as

estimativas apresentadas de custo e peso do veículo eram preliminares, projetadas a

partir dos desenhos iniciais do futuro modelo. O compromisso com tais metas, anunciado

pelo CEO da General Motors gerou grande expectativa em relação à reação da General

Motors.

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142

Assim como no caso do copper-colled, 47 anos antes, o processo de

desenvolvimento entre engenheiros de staff e da Chevrolet foi conturbado. Dentre as

primeiras polêmicas esteve a definição do ciclo do motor, quando o staff corporativo

impôs seu motor de ciclo longo contra a opinião dos engenheiros da divisão, defensores

de um motor de ciclo curto, que evitaria problemas de superaquecimento. Divergências à

parte, os primeiros protótipos enviados para a divisão apresentaram defeitos básicos. Nos

primeiros 12 quilômetros de teste, a frente do veículo se soltou e, para corrigir o defeito de

projeto, a divisão teve que acoplar um suporte extra, adicionando 10 quilos ao peso do

carro. Além disso, o projeto deixou de fora itens mandatórios, como barras laterais, na

tentativa de atingir metas de custo e de peso.

Conforme o XP-887 foi sendo aprontado para o lançamento, o limite de peso foi

ultrapassado em 100 quilos e as metas de custo, largamente estouradas. Depois de

pronto, o carro contrariou as estimativas feitas no projeto inicial, a ponto de não ser mais

competitivo no segmento de compactos de baixo preço. Porém, de acordo com John

DeLorean, que assumiu a gerência geral da Chevrolet no lugar de Elliot Estes, a maior

dificuldade do compacto não estava nos atributos do veículo, mas sim na tarefa de

motivar a equipe de engenheiros e a organização de marketing e vendas da Chevrolet a

se esforçarem para obter o melhor resultado possível com aquele produto (WRIGHT,

1974). A interferência do staff corporativo havia ido além da etapa de desenvolvimento e

assumiu também a responsabilidade sobre decisões de marketing, causando

descontentamento das pessoas na divisão. A definição do nome do novo veículo, por

exemplo, foi grande motivo de controvérsia entre divisão e staff. A Chevrolet propôs o

nome de Gemini, pois pesquisas junto ao consumidor indicavam a associação imediata da

fonética do nome com a referência GM “mini”. No entanto, os executivos corporativos

preferiram não associar o carro à GM e optaram pelo nome Vega. As pesquisas com

consumidores feitas pela divisão também procuraram identificar o melhor posicionamento

para o Vega. Após testarem diversas combinações, desde a mais básica até a mais

completa e luxuosa, a recomendação da Chevrolet foi para que o carro fosse posicionado

em suas versões maiores e mais equipadas, oferecendo ao mercado um veículo

compacto premium. Já as versões de mini-carros baratos para competir com o Fusca

deveriam ser abandonadas. Durante a revisão da política de preços, a corporação

novamente aprovou o preço sugerido pela divisão, porém retirou a maioria dos

incrementos de acabamento e de acessórios da versão básica, colocando-os como

opcionais, pagos separadamente.

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143

O Vega enfrentou diversas dificuldades no seu lançamento, além das questões de

custo, peso e posicionamento de preço. Uma greve que paralisou a fábrica onde o modelo

seria produzido alterou a programação de seu lançamento, causando desencontros nas

ações de marketing e de vendas. A fabricação e a distribuição do veículo foram finalmente

regularizadas em 1971, em meio à transição para o sucessor de Roche.

O desenvolvimento de um veículo completo pelo staff corporativo, em 1968, foi

mais uma evidência dos esforços da General Motors para tentar lidar com a complexidade

dos problemas decorrentes de seu tamanho e diversidade. O aumento no número de

modelos e o compartilhamento de plataformas levaram as divisões a tentarem diferenciar-

se, fazendo uso de atributos de design, acessórios e variações de acabamento. Por

exemplo, no caso da Chevrolet, um consumidor que fosse a uma concessionária para

comprar um veículo poderia escolher entre 179 combinações de carros e motores.

Contudo, 67% da quantidade de versões possíveis correspondiam a apenas 1% das

vendas.

Grande parte dos sistemas de gestão de operações da GM, durante a explosão de

variedade de modelos nas décadas de 1950 e 1960, permaneceu bastante semelhante

aos que foram criados na década de 1920 e razoavelmente atualizados ao final da

Segunda Guerra. Com a diferença que, em 1945, a GM possuía apenas três variações de

chassi e carroceria. A programação de produção era quadrimestral, com revisões

semanais. A coordenação continuava sendo feita pelo staff corporativo, que consolidava

os volumes solicitados pelas divisões, confrontava-os com a projeção do mercado e

realocava os volumes e o mix, formalizando uma programação que, em seguida, era

encaminhada para aprovação nos comitês. Esta forma impedia que houvesse

coordenação entre o volume a ser fabricado e as ações de marketing realizadas pelas

divisões. Com isso, ocorriam desencontros, como, por exemplo, a divisão realizar uma

campanha na TV promovendo determinado produto, enquanto os estoques nas lojas

estavam vazios. Quando finalmente os veículos chegavam à concessionária, os

compradores haviam se dispersado. Para tentar contornar os problemas de falta de

estoques, os gerentes das divisões superestimavam a programação de vendas que

enviavam ao staff corporativo. A somatória das estimativas das divisões, em geral, eram

sempre superiores à capacidade instalada. Para resolver o problema de alocação, o staff

deliberava de acordo com o histórico de vendas dos produtos. Desta forma, produtos que

haviam vendido bem em períodos anteriores seriam priorizados e tornava-se bastante

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144

provável que a divisão não recebesse o volume que realmente esperava ou poderia

vender de outros modelos.

As fabricas também sofriam com os sistemas de controle corporativo. Embora os

pedidos de compra de matérias-primas fossem delegados à gerência de cada planta, os

planos de produção eram periodicamente revisados pelo staff corporativo e, normalmente,

só eram informados a cada planta com uma semana de antecedência. Assim sendo, caso

houvesse falta de estoque, o gerente da planta saía em busca de estoque do mesmo

componente ou matéria-prima sobressalente em outra fábrica da GM. O sistema permitia

que plantas compartilhassem estoques, porém, com a programação sendo informada

semanalmente, eram freqüentes situações como a de uma planta solicitar um

componente no estoque de outra e, na semana seguinte, ter que fornecer o mesmo

componente para a planta que a havia socorrido.

Segundo John Delorean, diversas tentativas de reduzir os custos de operação das

linhas de produção eram sugeridas pelos gerentes das plantas. Ele mesmo, em suas

passagens por Pontiac e Chevrolet, disse ter apresentado 18 propostas para melhoria dos

sistemas, entre 1965 e 1972. Porém, todas as propostas eram encaminhadas para

análise do staff corporativo e para aprovação nas comissões e, devido à morosidade

desses processos, raramente chegavam a ser implementadas (WRIGHT, 1974). Além

disso, diversos sistemas computadorizados foram desenvolvidos para controlar a

seqüência de produção. Contudo, os sistemas não eram compatíveis entre si, e os

benefícios de coordenação em uma área não eram compartilhados com o restante do

sistema de produção e distribuição.

Para tentar resolver os problemas do aumento da complexidade, a GM realizou

diversos esforços, sobretudo na segunda metade da década de 1960. Um deles foi a

harmonização das peças entre os modelos das divisões. Tal mudança teria o objetivo de

diminuir o custo das peças, com o aumento das escalas de compra e produção. No

entanto, um outro efeito foi percebido. Os veículos que competiam em faixas de preços

mais baixas, notadamente os da Chevrolet, foram obrigados a compartilhar peças de

veículos mais luxuosos, que conseqüentemente eram mais caras. Com isso, os custos de

fabricação efetivamente subiram, pois nos veículos de maior volume o custo unitário

aumentou.

Outra medida já mencionada adotada pela GM para lidar com a complexidade do

sistema produtivo foi a criação da GMAD, que teve como um de seus objetivos unificar a

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gestão das linhas de montagem final dos veículos. Mas a criação da GMAD agravou

processos de desenvolvimento de produtos e de controle de qualidade. Com a GMAD,

aumentou ainda mais a departamentalização no desenvolvimento de produtos, sobretudo

a partir de 1971, quando finalmente as plantas da Chevrolet foram absorvidas pela divisão

de montagem.

Ao longo das décadas de 1950 e 1960, a GM apresentou uma sistemática

desvantagem no custo de desenvolvimento de novos modelos em relação a sua principal

rival. Uma comparação entre Ford e Chevrolet demonstra a magnitude da diferença no

custo de desenvolvimento. Enquanto a Ford desenvolveu, entre 1959 e 1969, quatro

novos modelos (Falcon, Mustang, Pinto e Maverick) com um investimento de U$ 350

milhões, a Chevrolet, no mesmo período, também desenvolveu quatro modelos

equivalentes (Corvair, Nova, Camaro e Vega), mas com um investimento total de U$ 800

milhões. A partir dos anos 1950, grandes inovações de engenharia, como câmbio

automático, direção hidráulica e motores de alta compressão, tornaram-se raras na

indústria, e o desenvolvimento de novos produtos passou a ser concentrado em

incrementos de design e de acessórios, a fim de justificar a troca anual dos modelos. O

início deliberadamente atrasado do desenvolvimento, praticado pela GM desde a gestão

Curtice, fez com que os orçamentos de desenvolvimento de produtos fossem estourados

ano após ano durante praticamente duas décadas. Em 1966, por exemplo, o orçamento

de engenharia fechou U$ 13 milhões acima do projetado, em 1968 o valor foi de U$ 11

milhões e em 1969, U$ 15 milhões.

No início dos anos 1970, a gestão de James Roche chegava ao fim, consolidando

uma burocracia corporativa que centralizava a coordenação de grande parte das ações

competitivas e também dos esforços de resolução de problemas. Atividades como o

sistema de controle financeiro, a unificação da gestão das atividades de montagem na

GMAD e a centralização do desenvolvimento fora da divisão, iniciada com o Vega, são

alguns casos resultantes dos esforços de sistematização do staff corporativo ao longo dos

anos. Para resolver novos problemas, a GM passou a utilizar-se, cada vez mais, de um

sistema corporativo baseado em comitês de política e equipes de força-tarefa. Porém, a

diversidade e a complexidade das atividades da organização fizeram com que os

processos conduzidos nesse sistema se tornassem proporcionalmente mais extensos e

demorados. Os executivos corporativos integrantes dos CE e do CF eram obrigados a

estudar uma grande quantidade de relatórios todos os dias, apenas para se prepararem

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para uma agenda repleta de reuniões para aprovação de assuntos como a revisão do

plano de produção para determinado mês, ou um contrato de arrendamento para um

escritório regional de vendas.

Os problemas e as atividades da GM eram freqüentemente traduzidos em índices

pelos staffs financeiros e de operações, portanto era comum que os diagnósticos

resultantes de equipes de força-tarefa nomeadas para analisar um problema fossem

apresentados na forma relatórios que sintetizavam indicadores de desempenho. O

depoimento de John DeLorean, que foi nomeado gerente da Chevrolet em 1969 para

tentar recuperar a divisão, ilustra os métodos da GM na época:

Embora muitas vezes Kyes oferecesse sugestões sobre como recuperar a Chevrolet,

ficou evidente a partir das conversas que tive com ele e outros executivos

corporativos que ninguém sabia o que havia de errado com a Chevrolet. Mas todo

mundo estava preocupado, porque a divisão caminhava para entrar no vermelho.

Internamente, me foram oferecidas quatro análises detalhadas dos problemas da

divisão preparadas pela equipe financeira, e estas também acabaram por serem de

pouca ajuda, porque eles analisaram de forma simplista apenas os efeitos dos

problemas da Chevrolet - a queda do retorno sobre o investimento, a perda de

participação de mercado e assim por diante. Eles não lidavam com as causas.

(tradução livre de Wright, 1974 p. 106)

Em outro trecho de seu depoimento, DeLorean descreve parte da burocracia e dos

métodos usados pelo staff de operações para tentar encontrar soluções para os

problemas:

Um conceito simplista praticado é o que eu chamo de "gestão por força-tarefa". Em

certo sentido, ela substituía "a gestão por comitê", pois parecia que toda vez que um

problema era levado a um dos comitês corporativos, uma "força-tarefa" era formada

para analisá-lo. Tivemos forças-tarefa sobre tudo: a iniciação dos novos modelos, os

aumentos dos custos materiais, gerenciamento das questões trabalhistas. Tornou-se

tão ridículo que uma vez Terrell organizou duas equipes separadas para trabalhar

sobre o mesmo projeto – problemas sobre desenvolvimento de novos modelos. Um

deles foi formado sob a direção da GMAD e o outro no âmbito do staff de manufatura.

As duas equipes exigiram que as divisões respondessem às mesmas perguntas. As

pessoas da Chevrolet ficaram sobrecarregadas apenas para responder às mesmas

perguntas vindas de duas fontes diferentes, e nós tivemos que trabalhar horas extras

para conseguir colocar a produção em ordem novamente.

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Quando os relatórios ficaram prontos e foram apresentados pelas duas equipes, as

divisões foram chamadas para ver o resultado. O que ouvimos foi apenas uma

repetição das informações que lhes tínhamos fornecido. Em outras palavras, eles nos

perguntaram como é que estavam fazendo em nossos planos para os novos

desenvolvimentos e, em seguida, nos chamaram para uma reunião na sede da

corporação para ouvi-los nos contar o que havíamos dito. Esta não foi a primeira vez

que isto havia ocorrido. E também não foi a última. (tradução livre de Wright, 1974 p.

212-213)

A burocracia nos staffs e comitês corporativos da General Motors não apenas

tornava a busca por solução e a implementação de mudanças lenta, mas também

dificultava que soluções para novos produtos ou problemas gerenciais nas divisões

fossem ratificadas ou replicadas para outras áreas que enfrentassem situações

semelhantes.

Um exemplo das dificuldades decorrentes da morosidade e inércia corporativa é o

caso de John Z. DeLorean à frente da Chevrolet entre 1969 e 1972. Nomeado para

chefiar a maior e mais problemática divisão da GM, DeLorean aplicou diversas práticas

inovadoras na gestão da Chevrolet, resultando na melhoria dos seus índices de

desempenho e culminando com a promoção do gerente geral à vice-presidência

corporativa, responsável por carros e caminhões na América do Norte. No entanto, a

frustração com a burocracia corporativa acabou por provocar uma saída precoce da GM.

Um resumo das principais ações promovidas por DeLorean é apresentado a seguir:

• Desenvolvimento de produtos coordenados por gerentes de produtos, ao invés da

departamentalização por funcionalidade e coordenação por comitê.

• Novo sistema de orçamento de projetos de engenharia, com controle por meio de

revisões periódicas, com maior flexibilidade e agilidade, ao contrário do tradicional

sistema com supervisão ao final da execução do orçamento.

• Utilização de pesquisas junto ao consumidor para pré-testar campanhas de

propaganda e, também, para medir resultados na percepção da população. Atividade

antes inexistente, o que fazia com que peças de campanha fossem feitas para

conseguir a aprovação nos comitês e não para atingir um objetivo de comunicação.

• Proposta para o desenvolvimento do K-car, uma plataforma comum para todos os

modelos compactos e médios da Chevrolet e que poderia tornar a linha de montagem

flexível para produzir todos os modelos sem grandes alterações.

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• Redução da quantidade de níveis hierárquicos na gestão da divisão, enxugando a

estrutura administrativa e acelerando a comunicação entre as áreas.

• Programa de controle de qualidade, com inspeções nos produtos ainda na fábrica.

Isto permitia que a causa dos defeitos fosse encontrada mais rapidamente, se

comparado com a prática anterior, quando um defeito só era identificado quando o

consumidor acionasse a garantia.

• Sistema de banco de engenheiros para as atividades de desenvolvimento. Com isso,

os profissionais eram alocados no início de um projeto e retornavam para o banco

quando este encerrava. Anteriormente, o desenvolvimento era departamentalizado em

partes específicas do veículo, e não havia movimentação entre departamentos em

função de aumentos na demanda de trabalho.

• Criação de um comitê de planejamento que reunia mensalmente um representante de

cada área da divisão para coordenar as atividades, identificar problemas e debater

soluções.

• Semelhante ao que ocorreu nas atividades de desenvolvimento, a organização de

marketing foi organizada por gerentes de produtos, ao invés da tradicional

departamentalização funcional. Com isso um gerente passou a coordenar atividades

de planejamento de volumes, promoção e vendas relativas a um produto.

• Pesquisas qualitativas durante o desenvolvimento do produto, submetendo atributos

como design e acabamento à apreciação de uma audiência controlada, monitorando e

identificando previamente possíveis percepções do consumidor.

• Implantação de um sistema de informação de marketing que permitia monitorar e

antecipar movimentações da demanda a partir da variação nas margens dos

concessionários, os quais eram livres para fixar o preço final do veículo. Até então, a

alteração na demanda só era percebida no início dos movimentos de aumento ou

diminuição das quantidades vendidas. O sistema permitiu integrar as atividades de

planejamento de produção e organização de distribuição e vendas com as ações de

marketing.

• Programa de “desproliferação” de peças, introduzindo avaliações estatísticas sobre o

volume de vendas de uma determinada peça ou acessório opcional e o custo de

desenvolvimento e manutenção em estoque. Acessórios que não se justificassem em

termos de retorno eram descontinuados.

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• Programa de teste e reparo, quando necessário, dos veículos que saíam da linha de

montagem, antes que estes fossem para o mercado.

• Estabelecimento de um programa de melhoria de lucros, definindo um especialista

interno para ajudar a avaliar a viabilidade e a controlar a implementação das idéias que

os gerentes das áreas tinham para reduzir o custo ou aumentar receitas.

• Criação de um departamento de análises de sistemas, com a finalidade de

harmonizar os diversos sistemas computadorizados da divisão, integrando marketing,

vendas e produção. Em três anos, a Chevrolet tornou compatível a linguagem dos

sistemas, permitindo relacionar desde a solicitação de produtos feita pelo distribuidor,

até o planejamento de compras de matérias-primas.

• Parcerias de desenvolvimento de componentes com fornecedores externos à General

Motors.

As ações de John DeLorean na Chevrolet produziram ganhos de eficiência e

recuperaram sua lucratividade. A divisão voltou a bater recorde de vendas, chegando a

3,1 milhões de veículos em 1972. Este volume foi atingido mesmo com a redução da

gama de produtos oferecidos. O número de modelos de carros diminuiu de 35 para 32, as

179 combinações de motor caíram para 75 e, no caso do Camaro, que possuía 2700

combinações de painel, a variedade foi reduzida para 96. A redução da diversidade de

peças e o melhor planejamento de produção aumentaram o giro dos estoques de 16 para

25 por ano, entre 1969 e 1972, e as despesas anuais com fretes extras caíram em U$ 11

milhões. Os custos de desenvolvimento também foram reduzidos: depois de dois anos,

com a reorganização das atividades, DeLorean havia eliminado 2400 cargos de

engenheiros, analistas e gerentes, sem que fossem necessárias demissões. Os

orçamentos de engenharia que tradicionalmente estouravam passaram a gerar sobras,

devido ao ganho de eficiência em desenvolvimento. Os gastos com desenvolvimento

caíram de U$ 273 milhões em 1970 para U$ 125 milhões em 1972. Com todas essas

ações, DeLorean simultaneamente aumentou vendas e reduziu custo, produzindo maior

lucro com menor investimento, portanto, melhorando a taxa de retorno da divisão.

Apesar de a atuação de DeLorean à frente da Chevrolet ter sido reconhecida como

de sucesso, as práticas que ele introduziu em raros casos foram rapidamente

aproveitadas em outras divisões da organização. Alguns dos projetos da Chevrolet sequer

foram autorizados a sair do papel, como foi caso do K-car. Outras práticas foram

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descontinuadas quando DeLorean deixou a General Motors ou, no caso das ações em

áreas de produção e qualidade, acabaram quando a GMAD absorveu as plantas da

Chevrolet. Em grande parte dos casos, os processos estabelecidos entre 1969 e 1972

foram incorporados na rotina da divisão, porém sem serem devidamente replicados ou

integrados a outras áreas até muitos anos depois. John DeLorean se sentiu frustrado

diante da incapacidade de atuar como queria nas atividades corporativas e, em 1973,

pediu demissão da General Motors, cerca de um ano após ter sido promovido (WRIGHT,

1974).

A passagem de DeLorean pela Chevrolet coincidiu com os últimos anos da gestão

de James Roche, que se aposentou em 1971. Durante a segunda metade dos anos 1960,

a GM manteve seu desempenho em faturamento, margens de lucro e retorno sobre o

ativo em níveis altos, porém com uma ligeira queda, já que o mau desempenho da

Chevrolet em determinado período foi apenas parcialmente compensado pelas altas

margens de suas divisões de veículos intermediários e de luxo. A GM manteve os altos

volumes de vendas e a participação de mercado próxima a 50%. A exceção foi o ano de

1970, quando uma recessão econômica e uma greve de 67 dias paralisaram fábricas e

causaram queda no faturamento. Ainda assim, a GM fechou a década com a operação

com lucros e mantendo a distribuição de dividendos.

Em termos financeiros, a General Motors se recuperou rapidamente em 1971, ano

em que a indústria bateu recorde de vendas e, pela primeira vez, ultrapassou a marca de

12 milhões de veículos. O bom ano recebeu, em dezembro, o novo CEO Richard

Gerstenberg, até então vice-presidente do conselho de administração e presidente do CF.

Gerstenberg assumiu com a perspectiva de um curto mandato, uma vez que a

aposentadoria compulsória aos 65 anos só o permitiria ficar no comando por dois anos.

No entanto, sua ascensão marcou o retorno de um executivo de finanças ao posto mais

alto da organização. A escolha de Gerstenberg efetivamente definiu a orientação

financeira que a organização teria para a posição do CEO dali em diante. O presidente Ed

Cole foi mantido no cargo, no entanto, Thomas Murphy foi movido da organização de

finanças para ocupar a vice-presidência, responsável pelas operações de carros e

caminhões. Tom Murphy teve sua carreira acelerada, saindo da posição de controler para

tesoureiro e, em seguida, para a área de operações, tudo em um período de apenas

quatro anos. Murphy estava sendo preparado para assumir a posição de Gerstenberg a

partir de 1973.

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4.1.20. Desafios na primeira metade da década de 1970

Apesar das boas expectativas que a aceleração nas vendas em 1971 causaram, o

início da década de 1970 seria marcado por muitos desafios para a General Motors. Além

do acirramento da concorrência dos importados e das dificuldades em desenvolver um

veículo compacto competitivo, a GM se veria novamente às voltas com greves e

negociações trabalhistas, além de diversos problemas com a qualidade dos produtos.

Após a intensa proliferação de modelos e estilos durante as décadas de 1950 e

1960, a indústria automobilística consolidava seus segmentos em cinco categorias de

automóveis, além das caminhonetes. As classes de veículos de passageiros são

apresentadas na tabela 4.6 abaixo:

Quadro 4-5 Classes de veículos no início da década de 1970, segundo o comprimento

Classes de veículos Comprimento médio Pacela da produção das Três Grandes

Carros grandes 5,4 metros 40% a 45%

Carros intermediários 5 metros 20% a 25%

Carros compactos 4,7 metros 10% a 15%

Carros subcompactos 4,3 metros 5% a 10%*

Carros especiais Diversas metragens 10% a 15%

Fonte: adaptado de Rubenstein (2001) p 224. *Os concorrentes importados se concentravam nesta categoria e detinham entre 15% a 20% do mercado.

As divisões da General Motors competiam em praticamente todas as classes de

tamanhos, compartilhando componentes e plataformas. A semelhança de desempenho e

de atributos dos veículos foi o resultado dos esforços para comunizar as peças, iniciados

na metade da década de 1960. Com isso, tornava-se cada vez mais difícil diferenciar os

produtos perante o consumidor a ponto de convencer-lhe a pagar mais por um Oldsmobile

que possuía exatamente o mesmo motor que o modelo equivalente da Chevrolet.

O crescimento da demanda por veículos compactos foi um desafio que, pela

segunda vez, a GM se propôs a enfrentar – a primeira vez havia sido com o fatídico

Corvair. Desta vez, a aposta era o lançamento do Vega, programado para setembro de

1970. O primeiro carro completamente desenvolvido pelo staff corporativo, porém, não

atenderia os objetivos traçados pelos executivos da GM quando o anunciaram. O Vega

havia ficado 170 quilos mais pesado do que a meta de 900 quilos, e a versão mais básica

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teve o preço final estabelecido em U$ 2091, ou seja, U$ 311 acima do Fusca e U$ 172

acima do preço do Ford Pinto. A despeito da falta de competitividade do compacto da GM,

o Vega enfrentou outro grave problema na época de seu lançamento: a greve iniciada

pela UAW, em outubro de 1970.

Após mais de 20 anos negociando com Ford e Chrysler e depois apenas

replicando os acordos feitos para a GM, em 1970, a UAW escolheu a GM como alvo para

a negociação do novo contrato. As exigências iniciais do Sindicato incluíam um aumento

de U$ 2,50 e o direito de aposentadoria após 30 anos de serviço. Porém, quando as

conversas se iniciaram, General Motors e UAW perceberam que a greve seria inevitável,

pois a distância entre as partes desta vez era grande. Com três semanas de pacíficas

paralisações nas fábricas, as posições ainda não haviam se aproximado o suficiente. A

GM oferecia 38 centavos de aumento, contra a exigência de 61 centavos. Além disso, a

empresa exigia limite mínimo de 58 anos para o direito à aposentadoria. A negociação só

foi ter um desfecho depois de 67 dias de greve, com ambas as partes fazendo

concessões. O aumento foi acertado em 51 centavos, enquanto a aposentadoria manteve

a idade mínima de 58 anos, sendo que, se o operário decidisse se aposentar antes desta

idade, deveria aceitar uma redução no valor do pagamento. A decisão das partes só

aconteceu depois de um alto custou pago por ambas. O sindicato consumiu todo o fundo

de greve e ainda se endividou para levantar os U$ 120 milhões usados para amparar 350

mil operários e suas famílias. Pelo lado da GM, cerca de 1,5 milhão de veículos deixaram

de ser fabricados, significando uma perda de receita de aproximadamente U$ 5 bilhões.

Dentre os veículos não produzidos estava o principal foco de atenção e grande aposta

dos últimos dois anos, o Vega.

Quando a greve iniciou na planta de Lordstown, havia apenas 24 mil Vegas em

estoque, porém a campanha publicitária de U$ 12 milhões programada para os meses de

outubro e novembro já estava rodando. O fornecimento aos concessionários só voltou a

ocorrer em janeiro de 1971. A estimativa de vendas da GM para o Vega era de 400 mil

unidades no primeiro ano, sendo que 100 mil desse total seria fruto da migração de

consumidores do Fusca. Contudo, o Vega foi um verdadeiro fiasco. Ao final de 1971,

apenas 245 mil unidades foram vendidas, e o novo veículo ficou atrás inclusive do

concorrente da Ford, que vendeu 317 mil unidades. Além disso, como se não bastasse a

frustração no desempenho nas vendas, o Vega ainda sofreria com outro grave problema:

a falta de qualidade.

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Os primeiros Vegas a saírem da fábrica não dispunham de grande confiabilidade.

Algum tempo depois do lançamento, 132 mil carros sofreram recall15 para troca de

componentes do carburador. Até o ano de 1972, o Vega teria novos recalls, que afetaria

95% dos veículos fabricados em Lordstown, fábrica exclusiva para o Vega. Porém, o

defeito mais danoso à imagem do veículo foi quando os motores em aluminium

começaram a sofrer com o super aquecimento. O efeito do calor excessivo gerado pelo

próprio funcionamento do carro provocava problemas irreversíveis em seu motor,

obrigando a sua troca.

Os problemas de qualidade e recalls nos veículos da GM começaram a se tornar

freqüentes depois da entrada em vigor da legislação de segurança veicular em 1967, que

também determinava a responsabilidade do fabricante sobre defeitos de fabricação.

Dentre os primeiros casos esteve o recall para reparar um defeito sistemático que

causava o vazamento para o compartimento de passageiros de resíduos gasosos da

combustão do motor. Em 1968, o inspetor Edward Gregory levantou a hipótese de que

veículos fabricados na planta de Saint Louis possuíam tal vazamento, depois de encontrar

dentro de um carro os corpos de três pessoas e dois cachorros mortos, intoxicados com

monóxido de carbono. Sete meses e outras 29 mortes depois de encontradas as

primeiras evidências, a GM lançou um recall, em 1969, de 2,5 milhões de veículos

fabricados entre 1965 e 1969. Na mesma época, foi feito outro recall para corrigir um

defeito no carburador de 2,9 milhões de carros e caminhonetes produzidos entre 1968 e

1969 em todas as divisões.

Outro importante recall ocorreu em 1970, quando a GM de uma só vez convocou

6,7 milhões de veículos à sua rede de concessionárias. O problema era decorrente do

coxim utilizado nos veículos, que era propenso à quebra depois de algum tempo de uso.

O coxim é utilizado para apoiar o motor dentro do compartimento do veículo e a sua

quebra provoca o deslocamento do motor. No caso dos carros da GM, o deslocamento

fazia com que o motor travasse a uma velocidade de 40 quilômetros por hora e causasse

diversos acidentes de trânsito. Segundo DeLorean (WRIGHT, 1974), este defeito havia

sido descoberto em testes realizados pela Pontiac ainda em 1966. Na época, a Pontiac

desenvolveu um novo coxim que passou a ser montado em seus carros, porém nenhuma

outra divisão decidiu usar o novo componente. Em 1969, quando os relatórios indicando o

15 Termo em inglês refere-se à convocação de proprietários de um produto para que recebam serviço gratuito de reparo de defeitos de fabricação. O termo “recall” foi mantido no texto por ser amplamente conhecido por consumidores e pela indústria no Brasil

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154

defeito começaram a chegar em grande quantidade, o presidente da GM, Ed Cole, e o

vice-presidente de carros e caminhões, Tom Murphy, ainda tentaram evitar que o recall

fosse feito, pois o custo da substituição das peças seria de cerca de U$ 40 milhões. No

entanto, diante da grande exposição negativa que o problema ganhou na mídia, a GM

cedeu à pressão e aprovou o recall dos veículos fabricados entre 1965 e 1970.

A atenção dos meios de comunicação com questões de segurança e qualidade

dos veículos passou a ser cada vez maior desde o incidente do Corvair em 1965. O Vega

seria um dos primeiros cujas vendas sofreriam com a má reputação do produto. Após os

diversos recalls e o problema de aquecimento do motor pelos quais o carro passou, uma

nova greve na fábrica de Lordstown em 1972 acrescentaria outra mancha à imagem do

produto.

A origem da greve desta vez não estava relacionada a aumento de salários, mas

sim a condições de trabalho. Quando as plantas da Chevrolet finalmente passaram para a

divisão GMAD, diversas mudanças foram promovidas. No caso de Lordstown, a fim de

torná-la mais competitiva em custo e em produtividade, logo em setembro de 1971, 700

operários foram demitidos, sendo parte deles aqueles que estavam alocados no programa

de inspeção de qualidade criado por DeLorean e prontamente eliminados pela GMAD.

Além disso, alguns processos produtivos foram automatizados e a velocidade da linha de

montagem foi acelerada para atingir a meta de 100 carros montados por hora. Em pouco

tempo, as reclamações dos operários começaram a se acumular, o excesso de horas

extras, faltas e problemas físicos, devido à alta carga de trabalho, foram alguns dos

problemas enfrentados pelos comitês de fábrica. O sindicato local iniciou uma greve

reclamando melhores condições de trabalho e redução da velocidade da linha de

produção. O movimento foi resolvido de forma razoavelmente rápida com um acordo

fechado em 22 dias. Diante da revolta dos empregados a GM reduziu a meta de

fabricação de 100 para 60 carros por hora, e os programas para ampliar a automatização

da linha foram suspensos.

No entanto, os danos para o Vega seriam bem mais graves do que a simples

perda de três semanas de produção. Durante as paralisações, operários grevistas

concederam entrevistas à imprensa atestando que os carros feitos em Lordstown eram de

péssima qualidade, que as máquinas utilizadas na linha operavam em ritmo acelerado,

impossibilitando a montagem adequada e a correção de defeitos. Com tantos problemas

envolvendo um de seus principais lançamentos no início da década de 1970, a GM ainda

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155

se esforçou para evitar o fracasso de mais uma tentativa de fabricar um carro compacto

de baixo preço. Para combater a queda nas vendas do Vega, a Chevrolet lançou, a partir

de 1973, um programa de garantia que cobriria reparos feitos até o veículo completar 60

mil quilômetros. A oferta de garantia aumentaria significativamente as despesas da GM

com este serviço adicional. Além disso, novas versões mais equipadas, como o Italian

Vega, recuperariam as vendas no decorrer da década permitindo que o compacto da

Chevrolet ultrapassasse seu competidor equivalente da Ford.

Apesar dos muitos problemas com a qualidade de seus veículos, a GM optou por

apenas manter o sistema de medição de defeitos criado ao longo da década de 1960,

incentivar o corte de custos e continuar oferecendo os serviços de garantias aos

compradores de seus produtos. Em 1960, a GM criou um índice que apontava o número

de defeitos por carros fabricados em uma planta, em uma escala que ia de 0 a 100. Um

carro com zero defeitos teria a pontuação de 100; se tivesse cinco defeitos pontuaria em

95, e assim por diante. Porém quando o índice foi aplicado em todas as fábricas, muitas

tiveram dificuldades em atingir a meta de 60, ou seja, 40 defeitos por veículo. Em 1968, a

GM estabeleceu nova escala para o índice, indo até 145, porém com a lista de defeitos

possíveis mantida em 100. Com isso, um carro com cinco defeitos teria a pontuação de

140, e um carro com 100 defeitos, a pontuação de 45. Os bônus dos gerentes das

fábricas passaram a incluir mais este critério em suas avaliações. Este sistema

permaneceu na GM até o final da década de 1980. O método utilizado pela General

Motors fazia com que gerentes de fábricas que atingissem um índice de 130, equivalente

a 15 defeitos por veículo, recebessem premiações por tal desempenho.

Com todos os problemas enfrentados pela GM no lançamento do Vega, na falta de

qualidade e nas questões com o sindicato nos primeiros anos da década, os principais

indicadores de desempenho da organização se recuperaram ao longo da gestão de

Gerstenberg e apresentaram alguns números recordes em 1973. O faturamento que havia

caído 22%, chegando a U$ 18 bilhões em 1970, atingiu U$ 35 bilhões em 1973. No

mesmo período, o lucro que havia caído para U$ 609 milhões também bateu novo

recorde, chegando a U$ 2,9 bilhões. O volume de vendas, que havia caído 32% em 1970,

com 3,6 milhões de unidades, aumentou 81% em quatro anos, estabelecendo novo

recorde de 6,5 milhões de veículos. Dentre estes principais indicadores, o único que a GM

não foi capaz de recuperar totalmente em relação aos níveis obtidos na década de 1960

foi o de participação de mercado. Os diversos problemas internos e externos no ano de

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1970 fizeram com que a participação de mercado da GM caísse momentaneamente do

patamar de 50% para 35%. Mesmo com a recuperação no volume das vendas para níveis

recorde em 1973, a participação de mercado fechou em 45%.

Um dos fatores que contribuiu para a recuperação da GM durante a gestão de

Richard Gerstenberg foi uma série de medidas adotadas pelo governo do presidente

norte-americano Richard Nixon em relação à política externa. Em 1970, o próprio

Gerstenberg, ainda vice-presidente do conselho da GM, foi indicado por Nixon para

participar da comissão presidencial sobre comércio e investimento internacional.

Trabalhando entre Detroit e Washington, Gerstenberg ajudou a elaborar o estudo que

propunha, dentre outras medidas, uma sobretaxa aos veículos importados. As

recomendações do estudo foram implementadas em um pacote aprovado pelo presidente

Nixon em 15 de agosto de 1971. Agindo sob a autoridade que lhe foi concedida na lei de

estabilização econômica aprovada um ano antes, o presidente dos Estados Unidos

eliminou um imposto federal de 7% sobre todos os automóveis vendidos nos país desde

1942 e passou a aplicar uma sobretaxa de 10% na importação de veículos. Além disso,

Nixon suspendeu o sistema de conversibilidade estabelecido no acordo de Bretton

Woods, levando o dólar a se desvalorizar perante as demais moedas internacionais. Com

as novas medidas do governo norte-americano em 1971, praticamente de um dia para o

outro, o compacto Chevrolet Vega reduziu a diferença de preço para o imbatível Fusca de

U$ 311 para apenas U$ 23.

4.1.21. Choque do petróleo e o início da gestão de Thomas Murphy

A discreta participação da GM na decisão do governo americano de aumentar as

tarifas de importação de veículos contrariou um longo histórico de defesa da liberalização

do comércio internacional, por meio da associação dos fabricantes AMA. O balanço de

pagamentos da GM nos Estados Unidos, com suas subsidiárias no exterior, acumulou um

total de U$ 11,7 bilhões entre 1946 e 1967, sendo que só em 1967 o valor foi de U$ 782

milhões. Tanto a GM quanto suas concorrentes americanas ampliaram suas operações

no exterior, adquirindo empresas e instalando subsidiárias. Das três subsidiárias no final

dos anos 1940 (Opel, Vauxhaul e Holden), a GM ainda abriu operações em países da

América Latina nas décadas de 1950 e 1960 e adquiriu participação em empresas locais

na Ásia, como na japonesa Isuzu, em 1971, e posteriormente na coreana Daewoo, em

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1979, mas manteria essas subsidiárias com operações autônomas respondendo

diretamente ao CE.

Apesar do aumento das operações internacionais por parte da GM, o ano de 1973

marcaria o primeiro de uma série de seguidos saldos negativos na balança comercial do

setor automotivo, registrando U$ 3,3 bilhões de déficit. As importações eram feitas em

pequenos volumes por empresas como Volvo, Fiat, Renault e Opel e, nos casos da

européia Volkswagen e das japonesas Toyota, Honda e Nissan, os números eram mais

significativos. Dessas quatro montadoras, apenas as japonesas sustentariam um

crescimento importante ao longo da década de 1970. Apesar da vantagem de preço e da

boa aceitação pelo consumidor americano conquistada durante a década de 1860, o líder

entre os importados, o Fusca, entraria em decadência após o volume recorde de 569 mil

unidades em 1970. Com seu modelo pouco alterado de um ano para outro, desde a

introdução no mercado em 1952, o Fusca foi descontinuado no mercado americano em

1977.

Em outubro de 1973, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo

(OPEP) declarou um embargo na venda de petróleo aos Estados Unidos, depois que seu

governo anunciou apoio militar ao estado de Israel na guerra do Yon-Kippur, no Oriente

Médio. O embargo causou a escalada dos preços internacionais do barril de petróleo e

afetou mais fortemente o abastecimento nos países importadores. Nos Estados Unidos,

um sistema de racionamento na venda de combustível passou a vigorar já no final de

novembro, com as vendas controladas pela placa do carro. O embargo da OPEP foi

suspenso cerca de seis meses depois, no entanto os preços do petróleo, antes em um

patamar estável de U$ 3 por barril, quadruplicaram, estabilizando-se na faixa de U$ 12

por barril. As conseqüências da crise do petróleo de 1973 provocariam mudanças

profundas na competição da indústria automobilística nos Estados Unidos e no mundo.

A partir de 1973 a preocupação com a eficiência no consumo de combustível

passou a ser altamente relevante na decisão de compra de um automóvel. Com isso, a

GM e suas concorrentes americanas, cuja linha se concentrava em veículos de alto

consumo por serem grandes e equipados com motores de oito e seis cilindros, viram suas

vendas despencarem. Em 1974, as vendas na indústria caíram 21%, mas na GM o

volume total diminuiu ainda mais, 28%, e ao se considerar o segmento de veículos

grandes, o percentual de queda chegou a quase 50%.

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A resposta dos executivos da GM foi imediata. Ainda sob o comando de

Gerstenberg, a GM aprovou no final de 1973 um amplo plano de redução no tamanho dos

veículos oferecidos ao consumidor. O Plano de Redução16, como ficou conhecido,

estabeleceu os seguintes objetivos:

• Priorizar a produção dos modelos compactos da GM, incluindo o Vega, de forma que

estes correspondessem a 25% dos produtos oferecidos em 1974, e 40% em 1975.

• Aumentar o conteúdo de acessórios embutidos nas versões dos modelos compactos

como forma de aumentar as margens de cada venda, a fim de manter as taxas de

retorno.

• Redimensionar toda a linha de veículos grandes e intermediários, reduzindo a distância

entre eixos, eliminando componentes e substituindo partes, de forma a torná-los mais

leves e econômicos.

Para cumprir com a tarefa de redesenhar todos os produtos da linha de produção,

a GM investiu um total de U$ 3 bilhões, sendo que U$ 600 milhões foram obtidos através

da emissão de títulos de dívida. Foi a primeira emissão desde o plano de expansão após

a Guerra da Coréia, 20 anos antes. Alguns dos efeitos do plano tornaram-se evidentes em

plena recessão econômica, no ano de 1974. A GM promoveu quatro aumentos de preços

durante o ano, acumulando uma alta de 20% sobre os preços do ano anterior. A guerra de

preços com os importados deu lugar a um aumento generalizado na indústria. Além dos

10% de impostos, os importadores se viram obrigados a aumentar os preços, mesmo com

o excesso de produtos em estoque, pois quando tentaram baixá-los foram repreendidos

sob a acusação de prática de dumping. Destoando dos demais importadores, a Toyota

decidiu manter os preços e as quantidades programadas de suas vendas.

A implementação do Plano de Redução ficou sob responsabilidade do novo

presidente do conselho de administração e CEO, Tomas Murphy, que substituiu Richard

Gerstenberg. Tom Murphy nomeou Elliot Estes como presidente da General Motors no

lugar de Edward Cole que, assim como Gerstenberg, aposentou-se no fim de 1973.

Thomas Murphy assumiu em meio a uma época tumultuada. Em certa ocasião, quando

conversava com um grupo de analistas financeiros, declarou publicamente, pela primeira

vez na história da GM, uma meta corporativa de retorno para o acionista de 15% a 20%

(CRAY, 1980).

16 Tradução livre do termo original utilisdo “Downsizing Plan”

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No ano de 1975, a GM apresentou sua linha de veículos com um aumento padrão

de U$ 500. A programação de produção para veículos grandes era correspondente a 32%

do total para o ano, no entanto, a rejeição destes modelos nas concessionárias obrigou a

GM a oferecer descontos que chegaram a U$ 600. Outro artifício utilizado para

impulsionar as vendas, tentando compensar o aumento nos preços, foi oferecer

financiamentos prolongados. A GMAC e outras financiadoras de veículos passaram a

conceder crédito com prazo de quatro anos, cujos juros ao final do empréstimo

correspondiam a um quarto do valor pago. O aumento na produção de carros compactos

seguiu conforme o projetado, chegando a dois milhões de veículos, cerca de 40% das

vendas. Ainda assim, a alta não foi suficiente para manter a participação de mercado da

GM nos níveis anteriores à crise, ficando em torno de 42%.

A queda na indústria nos anos de 1974 e 1975 reduziu o volume de vendas a um

patamar de 11 milhões de carros e caminhões, contra os 14,3 milhões em 1973. Essa

redução afetou mais fortemente as Três Grandes e abriu espaço para as importadoras

japonesas, como Toyota, Honda e Nissan, que ofereciam veículos compactos e

econômicos. O choque do petróleo marcaria o início da trajetória de crescimento das

fabricantes japonesas na indústria norte-americana. As vendas das três japonesas, que

era de 458 mil unidades em 1974, cresceram 222% em seis anos, chegando a 1,5 milhão

de carros. Em 1980, a participação de mercado estava em 13% ante os 4% registrados

seis anos antes. Apesar da redução nas vendas e da queda da participação de mercado,

a capacidade da GM em mobilizar recursos e acelerar a remodelação de todos os seus

veículos, ao mesmo tempo em que promovia mudanças nas linhas de produção, fez com

que os principais indicadores de desempenho permanecessem em níveis positivos. Ao

contrário da Chrysler, que amargou prejuízos, e da Ford, que viu seu lucro reduzir em dois

terços, a GM recuperou-se mais rapidamente. Em 1974, depois da queda no faturamento

e nos lucros, -12% e -60% respectivamente, em 1975 a GM apresentou crescimento de

13% no faturamento e de 32% no lucro, correspondentes a U$ 35 bilhões e a U$ 1,25

bilhão, respectivamente. Contudo, a força da resposta da GM à crise seria mais

claramente percebida na segunda metade da década de 1970.

4.1.22. Recuperação da indústria até o 2º choque do petróleo

A resposta do governo americano ao embargo dos países árabes veio em 1975

com a aprovação da Lei de Políticas e Conservação de Energia, que estabeleceu três

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principais medidas com o objetivo de contornar os problemas relacionados à dependência

do petróleo. A primeira medida foi a priorização da importação de petróleo de nações com

as quais os Estados Unidos possuíam boas relações, como Arábia Saudita, México e

Venezuela. Em segundo lugar, estabeleceu-se a criação de reservas estratégicas de

petróleo, capazes de ajudar a regular flutuações da oferta e da demanda. Por fim, foi

criada uma política de incentivo ao uso eficiente do petróleo. Dentre os principais

componentes desta terceira política estava a criação do Corporate Average Fuel Eficiency

(CAFE), que teria o objetivo de reduzir o consumo de combustível da frota de veículos

norte-americana.

Por meio do CAFE, o governo estabeleceu que a média do consumo de todos os

veículos vendidos em um ano, por cada fabricante ou importador, deveria atender a um

limite mínimo de quilômetros por litro (Km/L)17, o qual seria determinado e controlado pelo

Departamento de Transportes dos Estados Unidos. A pena para o não-cumprimento do

CAFE seria de U$ 2 por cada 0,04 Km/L acima do limite, multiplicado pelo número de

veículos vendidos. Assim sendo, um fabricante X que possuísse dois modelos A e B,

sendo que A tivesse vendido 5000 unidades com consumo médio de 10,7 Km/L, e B

tivesse vendas de 10000 unidades e consumo 8,5 Km/L, teria sua média calculada da

seguinte forma:

((5000 x 10,7) + (10000 x 8,5)) / 15000 = 9,93 Km/L

O limite estabelecido para o CAFE em 1975 foi de 7,7 Km/L, porém só entraria em

vigor para os veículos vendidos em 1978. A partir de 1979, os limites passaram a

diferenciar carros e caminhonetes. Os veículos comerciais leves com tração nas quatro

rodas receberam um CAFE de 6,3 Km/L, enquanto as com tração em duas rodas

passaram para 6,7 Km/L. A justificativa para tal mudança era que, por ser veículo de

carga, a caminhonete teria seu tamanho diminuído para cumprir com o CAFE, mas

produziria o efeito oposto em função do aumento do número de viagens. O CAFE ainda

seria gradualmente alterado até a década de 1990, quando os limites foram estabelecidos

em 11,5 Km/L para carros e em 8,5 Km/L para caminhonetes.

Inicialmente, as fabricantes americanas se opuseram ao CAFE, alegando que,

para atender aos limites, 90% de suas vendas teriam que ser de carros compactos. No

entanto, os executivos das montadoras não cogitavam ultrapassar os limites, uma vez que

17 A legislação faz referência a milhas por galão, que são as unidades de medidas oficialmente utilizadas nos Estados Unidos. Neste trabalho, a referência às medidas foi convertida para quilômetros por litro.

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seus cargos poderiam ser questionados por acionistas, caso houvesse descumprimento

de regulamentação federal. GM, Ford e Chrysler cumpriram com as normas do CAFE

promovendo uma série de alterações nos veículos, como redução nas dimensões da

carroceria, uso de partes de plástico e borracha, substituição dos pneus por pneus radiais,

modelos com tração dianteira, melhores e mais eficientes lubrificantes e, posteriormente,

controle de injeção eletrônica de combustível. Tais mudanças reduziram o peso e

melhoraram a eficiência no consumo.. Com isso, o consumo médio de combustível dos

novos veículos subiu de 6,7 Km/L em 1975 para 11,1 Km/L em 1982 (RUBENSTEIN,

2001).

Para atender aos novos limites de consumo de combustível, a GM acelerou o

andamento de seu Plano de Redução. Em 1975, foi lançado o Chevette, um compacto de

quatro cilindros baseado em uma plataforma desenvolvida pela Opel e que era vendida na

Europa e no Brasil. O Chevette passou a ser o menor e mais barato carro da linha da GM,

ao preço de U$ 2900. Tinha por objetivo competir com os importados japoneses e o

decadente Fusca. Ainda em 1975, a General Motors lançou, depois de dois anos de

indecisão do CE, o Cadillac Seville. O novo veículo encerrou o ciclo da divisão de luxo da

GM sob o lema de carros maiores e melhores. O Seville usaria a plataforma intermediária

da GM. Equipado com os acessórios mais luxuosos e com um preço de U$ 12000, seria

posicionado para enfrentar as vendas crescentes dos veículos da alemã Mercedes, que

com dimensões menores que os gigantes Cadillacs conseguiam um preço U$ 7000 maior.

No final de 1976, o Plano de Redução foi implementado em toda a linha de

veículos da GM. Com isso, os veículos grandes tiveram suas dimensões aproximadas dos

antigos intermediários e estes, por sua vez, foram reduzidos para um tamanho próximo ao

dos carros compactos. A mudança promovida pela GM, em função da crise do petróleo,

finalmente poria um fim nos enormes carros que haviam justificado os recordes de

margens e retornos durante as décadas de 1950 e 1960. Apesar disso, a redimensionada

classe de veículos grandes trouxe otimismo para a GM. Com a parcial recuperação do

volume de vendas da indústria, os novos modelos significaram um aumento de 68% nas

vendas da linha de veículos grandes em relação ao fraco ano de 1975 (RUBENSTEIN,

2001), fazendo com que a participação de mercado da GM chegasse ao recorde de 52%.

O ano de 1976 marcaria o maior pagamento de bônus para os executivos da GM até

então. Thomas Murphy recebeu 65% a mais do que no morno ano de 1975, com um

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bônus total de U$ 950 mil, enquanto o bônus do numero dois da organização, Elliot Estes,

foi de U$ 600 mil.

Ainda em 1976, a GM aprovou novos investimentos em pesquisa e

desenvolvimento na busca por carros com maior eficiência no consumo. Depois de dois

anos protelando a decisão, o CE aprovou o programa para a nova linha de X-cars. A

condução das atividades de desenvolvimento seria semelhante à do Vega no final dos

anos 1960, novamente sob de responsabilidade do staff corporativo. A plataforma X, que

era compartilhada por alguns veículos intermediários, seria reformulada, passando a rodar

com motor e tração dianteiros, o que reduziria o peso em 150 quilos. O X-car seria

lançado simultaneamente em quatro das cinco divisões, diferenciados apenas pelos

elementos de design. Além disso, a GM iniciou pesquisas sobre o uso de eletricidade. A

divisão Delco havia desenvolvido um veículo elétrico para uso do programa espacial da

NASA, e a idéia foi ampliada para novas frentes de pesquisa no GM Research Labs.

Além do esforço para superar os desafios nas operações automotivas, a GM

promoveu mudanças também na sua estratégia em relação a algumas de suas operações

não-automotivas. O designado para conduzir a recuperação da divisão não-automotiva e

de defesa, que incluía a Frigidaire, a Terex de escavadeiras e máquinas pesadas e a

Allison, foi George Boham Smith. Smith era um profissional da carreira de finanças que

seguiu passos semelhantes aos de Albert Bradley, Fred Donner, Richard Gerstenberg e

Thomas Murphy, recentes CEOs da GM, e continuaria seguindo, pois foi o substituto de

Tom Murphy em 1981. Na sua gestão à frente das atividades não-automotivas, George

Smith promoveu uma ampla análise da viabilidade dos negócios e surpreendeu aos

executivos membros do CE quando propôs que a melhor alternativa para duas das

operações, a Frigidaire e a Terex, era a venda das empresas. A aprovação da operação

proposta por Smith foi lenta, mas o promissor executivo persuadiu o CE, e ambas as

unidades tiveram vendas consideradas bem-sucedidas no final da década.

Aproximando-se do final da década de 1970, a indústria automobilística dos

Estados Unidos apresentava um panorama bastante diferente daquele que se construiu

desde o final da Segunda Guerra. A mudança na preferência do consumidor, somada com

as diversas exigências legais sobre especificações dos veículos, havia criado grandes

dificuldades para as concorrentes Ford e Chrysler. Ao não dispor de recursos suficientes

para alterar toda sua linha de produtos, estas empresas sofreram com a severa queda

nas vendas de seus veículos grandes. Ao mesmo tempo, os importados, sobretudo

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japoneses, competiam de forma implacável em preço e qualidade com suas linhas de

carros compactos. Desde os anos 1960, os importados vinham aumentando

gradualmente sua participação de mercado e atingiriam a faixa entre 18% e 20% na

segunda metade dos anos 1970. Dentre as americanas, apenas a General Motors

manteve um desempenho satisfatório durante a década.

Com todo o incentivo sobre as vendas de carros compactos, a GM teve um

desempenho apenas razoável em suas tentativas de competir no segmento de carros

pequenos e de baixo preço ao longo dos anos 1970. A primeira incursão neste mercado,

com o Chevrolet Vega, enfrentou graves problemas de qualidade e só foi decolar

realmente depois que alguns acontecimentos permitiram que a GM carregasse o veículo

de acessórios e de margem de lucro. O Vega foi descontinuado em 1978, permanecendo

apenas em sua versão esportiva Monza. No caso do super compacto Chevette, lançado

em 1975 com um preço U$ 124 mais barato do que o concorrente da Toyota, logo no

primeiro ano o programa de produção teve de ser reduzido em 10% devido à baixa

aceitação do consumidor americano. Porém, mesmo com a dificuldade em ser competitiva

no segmento que mais crescia, a General Motors apresentou rápida recuperação depois

do choque do petróleo de 1973. A tática de redimensionar sua linha de veículos grandes,

tornando-os mais eficientes e atrativos, fez com que a participação do mercado voltasse

para o patamar próximo a 50%. A receita líquida, que antes da crise de 1973 era de U$ 35

bilhões, alcançou o valor recorde de U$ 66 bilhões em 1979, enquanto o lucro, além de se

manter positivo mesmo nos piores anos da crise, alcançou valores recordes, chegando a

U$ 2,9 bilhões.

Em 1979, quando consumidores e indústria já se acostumavam com os novos

padrões do mercado de automóveis, uma série de movimentações políticas no Oriente

Médio provocou um novo choque nos preços do petróleo. A Revolução Iraniana, no

começo do ano, retirou do poder o Xá Reza Pahlavi e colocou o Ayatollah Ruhollah

Khomeini. Dentre as primeiras medidas do novo regime estava a decisão de reduzir a

produção de petróleo no Irã. Mesmo com a tentativa da Arábia Saudita e de outras

nações da OPEP de compensar a diminuição da oferta por meio do aumento do nível de

suas produções, os preços do barril de petróleo dispararam no mercado internacional. O

segundo choque do petróleo, como ficou conhecido, ainda foi agravado com a guerra

entre Irã e Iraque iniciada em 1980. Com o confronto, o Irã suspendeu totalmente a

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produção e fez aumentar ainda mais as incertezas nos mercados. A crise alterou o

patamar dos preços do petróleo, subindo de U$ 15 para U$ 39 o barril.

Com a nova escalada nos preços dos combustíveis, o interesse do consumidor

norte-americano novamente se concentrou em veículos com maior eficiência no consumo

de combustível, o que construiu um cenário promissor, na medida do possível, para a

nova linha do X-Car que chegava às divisões. Os novos Chevrolet Citation, Pontiac

Phoenix, Oldsmobile Omega e Buick Skylark eram derivados da mesma plataforma,

variando as suas dimensões entre o compacto e o intermediário, e haviam sido projetados

com a nova tração dianteira, que o tornava mais leve e com menor consumo de

combustível. A linha de X-cars foi lançada de forma antecipada no primeiro semestre de

1979 e causou grande furor nas vendas, sobretudo no modelo da Chevrolet. Contudo, o

desempenho nos meses seguintes não correspondeu às expectativas dos executivos. Os

veículos sofreram com seguidos recalls devido à baixa qualidade, e consumidores

passaram a protestar quando descobriram que haviam pago mais caro por um Buick ou

Oldsmobile, que eram praticamente idênticos ao modelo da Chevrolet. As marcas na

imagem dos veículos condenaram as pretensões da GM. A organização ainda insistiria

com os X-cars por mais alguns anos, mas em 1985 os modelos das quatro divisões

seriam precocemente descontinuados.

O impacto do segundo choque do petróleo na venda de automóveis foi imediato.

De 1978 para 1980, as vendas da indústria americana caíram 25% em relação ao recorde

de 15,4 milhões de unidades, chegando a meros 11,5 milhões, o mesmo nível de 1974.

Com o fracasso dos X-cars, o efeito nos volumes da GM foi ainda maior, com uma queda

de cerca de 30%. O último ano da gestão de Thomas Murphy marcou o fim de um ciclo de

59 anos de resultados positivos desde a crise de 1920. Em 1980, as Três Grandes

americanas encerraram o ano no vermelho. A Chrysler, com o prejuízo de U$ 1,7 bilhão,

acumulou, com os dois anos anteriores, mais de U$ 3 bilhões em perdas. Este

desempenho obrigou a caçula americana a pedir socorro ao governo, em um polêmico

episódio de concessão de empréstimo federal. A Ford amargou U$ 1,55 bilhão em

prejuízos, e a GM pouco menos da metade disso, U$ 762 milhões. Enquanto isso, as

japonesas Toyota, Honda e Nissan seguiam firme em seu crescimento no mercado.

Juntamente com os demais modelos importados, os carros japoneses já correspondiam a

cerca de um quarto do mercado dos Estados Unidos.

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O mês de janeiro de 1981 foi marcado pela escolha de George Smith para

substituir o CEO Thomas Murphy, que cumpriria a aposentaria compulsória. George

Smith, executivo formado no percurso tradicional da carreira de finanças, nomeou James

McDonnald como presidente da GM. McDonald havia iniciado sua carreira gerencial

assumindo a planta de fundição da GM em Ohio e escalou os degraus da área de

operações, passando pela gerência das divisões de transmissão Hydramatic, Pontiac e

Chevrolet. As nomeações de Simth e McDonald repetiam a combinação mais comum dos

últimos anos, com um CEO de carreira em finanças e o presidente, chefe de operações,

um engenheiro, formado pelo GMI, com a carreira feita nas divisões de automóveis. No

entanto, apesar da sucessão que respeitava a tradição das últimas gerações de CEO, a

gestão de George Simth não seguiria as receitas habituais de seus antecessores. A

década de 1980, para a General Motors, seria marcada por uma série de tentativas de

mudança na organização, e Smith se colocaria no centro de um esforço que prometia

preparar a GM para o século XXI.

4.1.23. A organização do século XXI de Roger Smith

Após a nomeação de James McDonnald, Smith aos poucos foi colocando os

executivos que julgou adequados, porém alguns nomes se destacaram pelo perfil

incomum nas práticas da GM. A nomeação mais inusitada talvez tenha sido a de Robert

O’Connell, tradicional executivo de finanças, para ocupar a vice-presidência de marketing.

Além dele, o advogado Elmer Johnson foi contratado, deixando seu escritório para ser

vice-presidente consultivo. Smith também nomeou Robert Frosch, ex-chefe da agência

espacial americana NASA, como vice-presidente encarregado das atividades dos

laboratórios de pesquisa.

A gestão de George Smtih teve o desafio, logo no seu início, de lidar com as

dificuldades decorrentes do segundo choque do petróleo e do fraco desempenho dos

novos lançamentos direcionados para o mercado de carros mais econômicos. Além dos

carros intermediários da plataforma X, lançados pela GM em 1979, a gestão de Smith

herdou também a linha de veículos compactos da nova plataforma J. Os J-cars, como

ficaram conhecidos, foram mais uma tentativa da GM, depois de Corvair (1959), Vega

(1970) e Chevette (1975), de finalmente emplacar um sucesso no segmento de carros

pequenos. Derivados da mesma estrutura básica, o Chevrolet Cavalier, o Pontiac 1200,

Oldsmobile Firenza, Buick Skyhawk e até mesmo o Cadillac Cimarron levaram a entrada

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simultânea de todas as divisões neste mercado. No entanto, os veículos pequenos de

tração dianteira, feitos para combater os importados, não obtiveram os volumes

esperados nos primeiros dois anos. As vendas desta linha só iram se recuperaram a partir

de 1984, com a substituição dos motores de quatro para seis cilindros. Além dos J-cars,

Roger Smith herdou o lançamento de uma nova linha de veículos intermediários, baseado

na plataforma A, mais próxima dos grandes, equipados com tração dianteira. Os

derivados da plataforma A foram bem recebidos pelo consumidor, embora nos dois

primeiros anos, 1981 e 1982, as vendas tenham sido afetadas pela queda generalizada

na demanda.

As vendas da indústria automobilística permaneceram em queda nos dois

primeiros anos da década. Depois da redução de 19% em 1980, o mercado encolheu

mais 6% em 1981 e 2% em 1982. Ainda assim, Roger Smith implantou severas medidas

para trazer a GM imediatamente de volta ao lucro. Dentre as ações de Smith estava o

fechamento de fábricas obsoletas ou de fraco desempenho, anunciadas ainda na gestão

anterior, substituindo algumas delas por plantas mais modernas ou linhas de montagem

no México. Roger Smith adicionou mais 90 mil demissões às 180 mil efetuadas na

véspera de seu mandato. Além disso, a GM liquidou um prédio em Nova York, vendeu a

fábrica da Hyatt Roller Bearings para os próprios empregados, fundiu a Roechester

Products à Diesel Equipment e a Harisson Radiator à Delco Air-conditioning,

reorganizando e enxugando suas estruturas. Smith ainda reduziu os valores dos

benefícios de seus empregados e cortou definitivamente a contribuição de U$ 16 milhões

à GMI, principal provedora de gerentes e executivos de operações desde os anos 1920,

que passou a ser uma instituição de ensino privada.

Na área de vendas, a GM passou a aplicar programas de financiamento ao

consumidor com juros subsidiados pelo fabricante, oferecendo em 1981 um taxa de

13,8%, considerada baixa para a época. As ações contingenciais de George Smith

reverteram o prejuízo de U$ 750 milhões para modestos lucros de U$ 333 milhões. Em

1982, a GM aumentou os preços dos veículos e ofereceu taxas ainda menores. O

resultado foi o aumento no lucro para U$ 962 milhões, mesmo com a queda de 4% no

faturamento, além da recontratação de 2400 operários demitidos no ano anterior. A

prática de subsídio à taxa e ao juro mostrou-se tão eficaz que a GM e o restante da

indústria passaram usá-la sistematicamente, criando um círculo vicioso de redução dos

juros ao consumo, que chegaram a 2,9%, em 1986.

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Em 1982, enquanto a GM se preparava para decidir sobre mais um esforço no

combate aos importados, George Smith tomou uma decisão diferente do habitual no que

diz respeito à alocação da produção. Ao avaliar as projeções sobre a nova proposta de

desenvolvimento para a plataforma S, de carros compactos, Smith pediu que fosse feito

uma comparação com a alternativa de se importar uma versão remodelada do veículo

fabricado pela Isuzu, da qual a GM havia adquirido 34% em 1971, que abastecia a

subsidiária Opel na Alemanha. A diferença de custos foi gritante. Enquanto o custo total

unitário de um carro S era estimado em U$ 5731, o modelo comparável da Isuzu chegaria

aos Estados Unidos ao custo de U$ 2857. A decisão de Smith, naturalmente, foi em favor

da importação do veículo japonês. A GM ainda compraria participação em outra japonesa,

a Suzuki, que produziria outro modelo a partir da mesma plataforma da Isuzu. Os carros

chegaram ao mercado americano no ano de 1984. Tal medida significou uma razoável

mudança nas práticas da GM, uma vez que, mesmo já tendo importado no passado

carros compactos de suas subsidiárias, esta foi a primeira vez que a GM reconheceu a

incapacidade de competir neste segmento com um modelo feito nos moldes tradicionais

de sua operação nos Estados Unidos.

À parte as ações emergenciais para retornar à lucratividade, Roger Smith nomeou

diversos grupos de trabalho para estudar e propor mudanças em quase todas as áreas da

organização. Uma dessas mudanças foi chefiada por Bob Dorn. Dorn era engenheiro

chefe da Pontiac quando foi nomeado para conduzir o desenvolvimento de uma nova

plataforma para veículos médios, a GM-10. O orçamento para o investimento era o maior

já aprovado até então, U$ 7 bilhões. O plano para o desenvolvimento foi conduzido de

forma diferente da tradicional departamentalização do staff de engenharia e das divisões.

O GM-10 teve uma equipe dedicada, que conduziu todos os aspectos da criação do

veículo, desde o design até o planejamento da linha de produção. O conceito usado pelo

GM-10 se assemelhava ao gerente de desenvolvimento de produtos criado por John

DeLorean à frente da Chevrolet em 1970, porém desta vez era o principal programa

corporativo.

Talvez o principal grupo de trabalho formado por George Smith em 1982 tenha

sido o responsável pela reorganização das divisões de automóveis da América do Norte.

Estudos preliminares sobre a integração das fábricas de motores já haviam sido

conduzidos por John Debbink, à época gerente geral da subsidiária Delco Moraine.

Porém, somente no segundo semestre de 1982, a GM aprovou a criação do grupo

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especial de força tarefa sob a coordenação de Debbink. A primeira atividade do grupo foi

visitar uma série de grandes corporações americanas para conhecer suas formas de

organização. A conclusão foi de que a GM necessitava de uma profunda mudança, que

enfatizasse uma estrutura mais participativa com uma filosofia mais empreendedora, a

mudança da mentalidade de auditor para outra de trabalho em equipe e cooperação,

estabelecendo uma comunicação aberta (KELLER, 1989).

Para ajudar na construção de um plano que atendesse os objetivos acima,

Debbink recorreu a consultores externos da McKinsey, que proveram métodos para

organizar a análise de toda a operação de automóveis, entrevistando 65 gerentes e 800

empregados. A proposta formalizada pelo grupo, juntamente com os consultores,

anunciava o objetivo básico de integrar a organização, eliminar redundâncias e criar

oportunidade para sistemas que atravessassem as divisões (KELLER, 1989). O plano de

reorganização estabeleceu que a operação automotiva fosse dividia em apenas duas

divisões, completamente autônomas. Com isso, seriam criadas a Chevrolet-Pontiac-

Canada (CPC) e a Buick-Oldsmobile-Cadillac (BOC), para as quais seriam repartidas

todas as atividades da GMAD e da Fisher Body. Esta última, apesar de estar sob o

comando da divisão de montagem, na prática operava de forma autônoma, quase

exatamente como fazia desde a década de 1920.

A nova organização foi definida com Robert Stempel, então gerente geral da

Chevrolet, como novo gerente da BOC e Lloyd Reuss, gerente geral da Buick, assumiu a

CPC. O vice-presidente de operações de carros da América do Norte passou a ser Alex

Cunningham, para quem as duas divisões respondiam. Charles Katko, gerente geral da

GMAD seria o responsável por assegurar que a transição fosse feita da forma mais

organizada possível. A equipe de planejamento da transição ainda seria auxiliada por

John Debbink e pela equipe de consultores da McKinsey, autores dos estudos que

propuseram a reorganização. A elaboração do plano levou cerca de seis meses durante o

ano de 1983. Alocado fora das dependências da GM, o quartel general de transição teve

como primeiro trabalho elaborar a descrição dos cargos que comporiam todas as

principais estruturas das duas divisões. Em seguida, quatro a cinco nomes eram

identificados para cada posição e cada um dava o seu voto naquele que achava mais

adequado. Ao final das alocações de pessoal, descobriu-se que novos engenheiros teriam

de ser contratados para completar posições antes centralizadas na Fisher e na GMAD e

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que agora teriam de ser replicadas, uma vez que as divisões deveriam dispor de

capacidade para operar de forma completamente autônoma.

O anúncio oficial da criação das duas divisões foi feito por George Smith em

janeiro de 1984. O início da implementação foi bastante conturbado, gerando grande

insatisfação na organização. Uma grande quantidade de pessoas foi movimentada tanto

em termos de posição e função na organização quanto na localização física do trabalho.

Os sistemas formais e informais de relacionamento e fluxo de informações, sobretudo em

relação às atividades da GMAD e da Fisher, foram praticamente interrompidos de um dia

para o outro, e os novos processos planejados pela equipe de transição não passaram a

operar de forma eficiente na mesma velocidade.

No caso das atividades das divisões de automóveis, a adaptação à nova

organização ocorreu de forma diferente entre CPC e BOC. A primeira era composta

basicamente de uma grande divisão, a Chevrolet, outra divisão consideravelmente menor,

a Pontiac, a estrutura de marketing e distribuição e algumas das fábricas que compunham

a divisão do Canadá. Com isso, Lloyd Reuss manteve parte da estrutura

departamentalizada como era habitual nas divisões. O desafio na BOC era um tanto

maior. Buick, Oldmobile, e Cadillac eram divisões com marcas bastante distintas e

localizadas cada uma em uma cidade, separadas por 70 quilômetros uma da outra. Para

mobilizar os integrantes da nova divisão, Robert Stempel adotou um método bastante

semelhante ao utilizado por John DeLorean, quando assumiu a Chevrolet em 1969.

Dentre os primeiros passos, Stempel criou um grupo, uma espécie de comitê, que reunia

os principais gerentes de cada área para discutir os problemas e elaborar os caminhos a

serem seguidos. A proposta elaborada por Stempel e pela BOC também se assemelhou

àquela utilizada por DeLorean. A BOC decidiu organizar-se em equipes de produtos, ao

invés dos tradicionais departamentos. Desta forma, a divisão adotaria três plataformas, as

quais contariam com equipes de desenvolvimento que coordenariam a formulação dos

programas de novos veículos, do início do design até a preparação para a produção.

A proposta de organização de Robert Stempel foi inicialmente vetada quando este

a apresentou para seus superiores James McDonnald e Alex Cunningham. No entanto,

Stempel, motivado por sua equipe, reformulou sua proposta, concentrando-se em rebater

as principais críticas que recebera. Na segunda oportunidade em que a levou a seus

superiores, ele conseguiu persuadi-los a o deixarem seguir em frente.

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Dentre os grupos de força-tarefa nomeados por George Smith no início de sua

gestão a situação das divisões de autopeças também foi alvo de mudanças. O conjunto

das divisões e subsidiárias que compunham a rede interna de fabricação de peças

acumulava uma força de trabalho equivalente à de sua principal concorrente americana. A

GM produzia internamente 70% de todos os componentes que utilizava, e alguns de seus

fornecedores internos eram também fornecedores de suas concorrentes em muitas

dessas peças. Grande parte das organizações fabricantes de peças operavam de forma

periférica na cadeia produtiva da GM desde os anos 1920 e recebiam pouca atenção ou

investimentos na melhoria de suas atividades. Havia grande disparidade entre os

fornecedores internos da GM, existindo desde empresas com conteúdo de alta tecnologia,

como Delco Electronics, Spark & Plug e Allison, até empresas fabricantes de simples

componentes, como rolamentos.

Pressionada por Lloyd Reuss, gerente da CPC e que queria ampliar as cotações

para os fornecedores externos, a GM nomeou W. Blair Thompson, vice-presidente do

Grupo de Componentes Automotivos (GCA), que reunia 139 fábricas e 2500 mil

empregados. Thompson contratou três empresas de consultoria para avaliar a

competitividade de cada uma das peças produzidas por este grupo. As fábricas seriam

classificadas em três cores, de acordo com a competitividade de seus produtos. As

fábricas de cor verde eram consideradas eficientes e lucrativas; as fábricas em amarelo

apresentavam um baixo desempenho em custo, porém poderiam ser melhoradas; e as

fábricas em vermelho, cerca de 4%, deveriam ser fechadas ou vendidas. A decisão de

terceirizar o fornecimento das plantas consideradas pelos consultores como não-

competitivas provocou forte manifestação do sindicato. Muitas dessas plantas reagiram à

notícia com forte mobilização, propondo eliminação de funções e medidas para ganho de

eficiência. Ao final de um ano e diante de tantos protestos dos sindicatos, os planos de

terceirização foram suspensos.

A pressão da UAW pela manutenção de empregos estava relacionada aos

acontecimentos mais recentes, que mudaram o foco das negociações sindicais. Por mais

de 35 anos os contratos entre UAW e montadoras baseou-se no estabelecimento dos

parâmetros de reajuste da ajuda de custo e do ganho de produtividade e, por vezes,

adicionalmente incluíam questões de benefícios como aposentadoria, auxilio saúde ou

seguro desemprego suplementar. Em geral, os contratos das Três Grandes possuíam

vencimentos em datas próximas, de modo que o sindicato escolhia uma das três

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empresas como alvo e, depois de conseguir o contrato, levava as mesmas exigências

para as demais. A mudança nos paradigmas de negociação começou em 1979, na

renegociação do contrato da Chrysler, que beirou a falência depois do segundo choque

do petróleo. Em 1982, UAW e GM, assim como também fez a Ford, decidiram

reciprocamente antecipar a negociação do contrato que venceria no final do ano. A UAW

estava preocupada com a manutenção dos empregos do número de seus associados,

que chegou ao pico de 1,5 milhão de pessoas em 1979, porém já havia declinado para

1,2 milhão em 1983. A GM, por meio de seu CEO, vinha seguidamente declarando na

imprensa que o custo de mão-de-obra nos Estados Unidos impossibilitava a competição

com outros países, sobretudo com o Japão. As negociações foram conduzidas por James

McDonald do lado da GM pelo novo presidente da UAW, Owen Bieber. O novo contrato

estabeleceu concessão de redução de salários por parte da UAW, enquanto a GM se

comprometeu a garantir o nível de emprego e o programa de participação nos lucros.

George Smith levou adiante outras ações para reduzir os custos de mão–de-obra,

que segundo suas declarações na época eram U$ 8 dólares por hora mais cara do que

Japão. A GM abriu as suas primeiras plantas no México em 1981, na cidade de Saltillo, e

passou a montar carros e motores a partir de peças importadas, reexportando-os aos

Estados Unidos. O México iniciou seu programa de abertura comercial na década de 1970

e a evolução dos acordos internacionais culminaria com a criação do NAFTA em 1994. A

abertura de plantas de montagem no México seria uma tendência na indústria

automobilística americana, principalmente como forma de reduzir custos de salário e fugir

das negociações com a UAW. Esta, por sua vez, continuaria a ver seu número de

associados reduzir ao longo da década 1980 e das seguintes, enfraquecendo

significativamente seu poder de barganha.

À medida que a General Motors e a indústria se recuperavam da depressão nas

vendas após o segundo choque do petróleo, George Smith direcionava o foco de suas

ações para moldar o futuro competitivo da General Motors. Smith determinou, em um

curto período de tempo, uma grande onda de investimentos da GM nas áreas de

tecnologia, diversificou sua atividade por meio de aquisições, fez parceria com a Toyota e

iniciou uma nova empresa para fazer o carro do futuro, partindo do zero.

Dentre os investimentos que George Smith anunciou como o caminho para a GM

se tornar uma empresa do século XXI, um dos primeiros tratou da automatização e

aplicação de robôs nas fábricas. Smith freqüentemente atacava publicamente o alto custo

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de mão-de-obra nos Estados Unidos. Para combater tal “desvantagem”, durante a década

de 1980 a GM anunciou a aplicação significativa de recursos para desenvolver e adquirir

robôs de solda, prensas de transferência, sistemas de reconhecimento óptico e Veículos

Automaticamente Guiados (VAG). entre outros equipamentos automatizados que

deveriam substituir a força de trabalho humana. Para concretizar o desenvolvimento

destas tecnologias, Roger realizou uma joint venture com a Fujitsu-Fanuc, líder em

tecnologia de robôs, para criar a GMF Robotics, que em poucos anos se tornaria a

número um em fabricação de robôs, sendo 70% para a GM.

O CEO da GM, em entrevistas, anunciou que até o final de seu mandato

aumentaria o número de robôs nas plantas da GM de 300 para 11 mil. Durante a primeira

metade da década de 1980, uma série de novos investimentos em planta foi anunciada.

Foram construídas 11 fábricas high-techs, outras 19 passaram por uma modernização e

três unidades de prensagem foram automatizadas. Entre estes investimentos, um

exemplo dos mais significativos foi a nova planta de Hamtramck, construída para

substituir a antiga fábrica da Cadillac, em operação desde o início dos anos 1920.

Hamtramck teria um investimento de U$ 600 milhões e contaria com 260 robôs.

Comparativamente, a Ford construía uma nova fábrica ao custo de U$ 350 milhões.

Outros investimentos importantes deste período foram a fábrica do futuro de Saginaw e a

Buick City. A primeira ficou conhecida depois de se afirmar que ela poderia funcionar com

as luzes apagadas, pois os robôs seriam capazes de realizar todas as atividades sem

intervenção humana. Já a Buick City empregaria os conceitos da Toyota City e teria todos

os fornecedores em um raio de 45 quilômetros, eliminando a necessidade de estoques.

Segundo Lee (1988), até 1986 os uso de tecnologia e robótica atingiria 79% das linhas de

montagem da GM, com um investimento total de U$ 42 bilhões.

A General Motors escolheu o caminho da tecnologia de informação para lidar com

a diversidade e a complexidade na renovação de seus mais de 600 modelos, cuja

preparação incluía a coordenação de cerca de 35 a 40 linhas de montagem nos Estados

Unidos. Em março de 1984 a GM lançou o projeto TRILBY, conduzido sob a

responsabilidade do GM Resarch Labs e chefiado por Robert Frosch, e que tinha por

objetivo conciliar e sistematizar tudo o que fosse de mais avançado em termos de

metodologias, técnicas e sistemas de coordenação e controle das atividades de pesquisa

e desenvolvimento. O TRILBY reuniu uma equipe de 100 engenheiros e especialistas que

durante cinco anos ficaram dedicados ao novo projeto. Como resultado, diversos novos

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sistemas e ferramentas foram aplicados às atividades de desenvolvimento, especialmente

na implementação das equipes de plataformas, como a do GM-10.

Pouco depois da criação do TRILBY, Roger Smith daria mais um passo no sentido

de integrar o uso de tecnologia de informação aos processos da General Motors. Um dos

objetivos declarados de Roger Smith era de que a informática seria a solução para a

diminuição da burocracia organizacional, permitindo o ganho de agilidade e a

coordenação entre as áreas da empresa. Smith freqüentemente condenava na imprensa

o alto uso de papel nos fluxos de informação entre áreas e apontava os sistemas

integrados como a solução do futuro. Em junho de 1984, a GM adquiriu o controle da

Electronic Data System, segunda maior empresa de sistemas de processamento de

dados dos Estados Unidos e comandada por Ross Perot. Perot havia se iniciado na área

de vendas quando começou sua empresa. O sucesso nos negócios e o amplamente

noticiado episódio em que ele organizou uma missão privada para resgatar dois

funcionários presos no Irã fizeram dele uma espécie de herói nacional.

A aquisição foi intermediada por um banco de investimento que, à pedido de

Roger Smith, saiu à procura de empresas de tecnologia que pudessem integrar à GM o

conhecimento esperado por Smith. O valor da transação foi de U$ 2,55 bilhões. Dentro do

contrato de compra, a GM ainda ofereceu ações da GM à Perot e aos principais

funcionários, como forma de incentivar suas permanências. No entanto, para o caso da

EDS, a GM criaria uma ação especial, chamada de Classe E, que receberia os dividendos

a partir do desempenho da própria EDS e não da corporação. Somente após a conclusão

da compra é que GM e a EDS foram tratar da forma como ocorreria a integração da nova

unidade da corporação. A EDS assumiria a responsabilidade por todo hardware e

software de informática espalhados pelas divisões da GM. À época, cada divisão da GM

dispunha de seus próprios sistemas e métodos arcaicos de integração entre eles. Os dez

mil funcionários de informática distribuídos nas diversas áreas da GM passariam a fazer

parte da equipe da EDS. Ross Perot continuou como presidente da EDS e passou a

integrar o conselho de administração da GM. A integração dos funcionários da GM à EDS

seria conduzida por Mort Meyerson, braço direito de Perot, que se mudou imediatamente

com uma equipe de 650 funcionários da EDS para Detroit. A EDS continuaria a oferecer

seus serviços no mercado, porém agora teria como seu maior cliente a General Motors,

cujos contratos seriam fechados diretamente com as divisões.

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Na onda de diversificação e integração de sistemas, Roger Smith levou a diante

mais duas aquisições nas quais enxergou a oportunidade de combinar as especialidades

da GMAC, em financiamentos ao consumidor, e da EDS, em integração de sistemas de

informação. A GMAC adquiriu por U$ 11 milhões a Norwest Mortgage, uma agência

financeira de hipotecas em Mineapolis. Além disso, em uma transação que custou U$ 190

milhões aos cofres do braço financeiro da GM, comprou o grupo Corestate, também de

hipoteca e composto por sete agências que operavam na costa leste dos Estados

Unidos. .

Em junho de 1985, uma nova aquisição na área de alta tecnologia, realizada pela

GM, gerou grande repercussão nos Estados Unidos. Porém, diferentemente da EDS,

desta vez a compra teve a concorrência de outras interessadas. A Huges Aircraft era uma

das empresas líderes mundiais em desenvolvimento de tecnologia, em especial aquelas

voltadas para uso militar. Conhecida por ter inventado o laser e também por ser

especializada em integração de sistemas, a Huges Aircraft tinha fornecido todo sistema

da rede de defesa dos Estados Unidos e da OTAN. Embora a Huges competisse com

outras empresas privadas, seu controle era detido por um instituto médico, que era isento

de impostos. Forçado pelo governo americano, o instituto controlador da Huges anunciou

o leilão de sua controlada, despertando o interesse de Boeing, Ford e General Motors.

Roger Smith enviou sua equipe para realizar uma avaliação sobre as

possibilidades de integração e geração de sinergias entre as atividades de Huges e GM.

A resposta da equipe liderada por Howard Kehrl e Donald Atwood, ambos experientes

executivos corporativos, apontou que, baseando-se no custo para adquirir ou desenvolver

as tecnologias disponíveis na Huges, o valor giraria em torno de U$ 500 milhões. Porém,

a equipe indicava também que seria difícil atribuir valores aos potenciais benefícios da

aplicação de tais tecnologias nas atividades da GM. A oferta de Roger Smith para a

compra da Huges foi a vencedora, totalizando U$ 5,2 bilhões, sendo U$ 2,7 bilhões em

dinheiro e o restante em ações de classe H da GM, criadas especificamente para o caso

da Huges, pois incluíam cláusulas de recompra em três anos. A Huges Aircraft passou a

se chamar Huges Electronics Corporation e absorveu os 18 mil empregados da Delco

Electronics e as atividades de sistemas e instrumentos da A/C Spark & Plug.

Com todos esses investimentos e aquisições, George Smith prometia em seus

discursos e entrevistas para a imprensa que a alta tecnologia levaria a General Motors a

ser competitiva no século XXI. No entanto, a concorrência na indústria era acirrada em

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meio à lenta recuperação do mercado. A General Motors tinha dificuldade em manter sua

participação de mercado, sobretudo no segmento dos compactos de baixo preço. Em

1981, as montadoras japonesas, pressionadas pela diplomacia dos Estados Unidos,

estabeleceram uma restrição voluntária de exportações, com um teto de volume de 1,68

milhão de unidades por ano. Contudo, a estagnação da indústria até praticamente 1985

fez com que nem o preço nem a participação de mercado das empresas japonesas

alterassem significativamente. Por outro lado, após a restrição voluntária, a Honda foi a

primeira montadora japonesa a anunciar a construção de uma planta em Ohio, em 1982.

Diante do regime de restrição voluntária, o plano de George Smith de importar os

veículos produzidos de Isuzu e Suzuki também ficou limitado quanto à perspectiva de

fazer desta uma alternativa de longo prazo. Com isso, Smith encontrou uma nova saída

para viabilizar a produção nos Estados Unidos de um modelo compacto fabricado com os

métodos japoneses. O CEO da GM usou intermediários para iniciar o contato com

executivos da Toyota sobre a possibilidade de investimentos conjuntos entre as duas

montadoras. Depois de uma extenuante negociação com viagens dos principais

executivos das duas empresas para reuniões em ambos os países, George Smith e Eiji

Toyoda, presidente e fundador da Toyota, anunciaram, no começo de 1983, a criação da

joint venture New United Motor Manufacturing Inc. (NUMMI). As duas empresas deteriam

50% sobre o novo investimento. A Toyota aplicou U$ 100 milhões em dinheiro, e GM

entraria com o equivalente, cedendo sua planta de Freemont na Califórnia, desativada em

1982. O acordo estabeleceu a meta de produção de 200 mil carros por ano. As operações

seriam conduzidas pela Toyota, que tinha o direito de indicar o presidente e CEO da nova

empresa. Um grupo de 16 gerentes da GM fez parte da equipe inicial. O contrato também

previa a prioridade para contratação de ex-operários da GM.

A fábrica em Freemont havia funcionado sob o comando da GM de 1963 até 1982.

Nos últimos anos antes de ser fechada, a planta estava entre os piores desempenhos de

toda a organização em termos de qualidade, reclamações de empregados e faltas no

trabalho. Quando o acordo da NUMMI foi fechado, a Toyota se viu pressionada em aceitar

que a UAW representasse os trabalhadores, fato que preocupou os japoneses. Contudo,

a Toyota persuadiu o sindicato e assegurou um acordo com flexibilidade para alterar

cargos e atividades dos operários dentro da linha de produção, em troca da garantia de

estabilidade. Tal liberdade era uma condição necessária para implantar seu sistema de

células de produção. A seleção dos funcionários seguiu um misto de entrevistas com

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176

dinâmicas de grupo para observar aqueles que melhor se encaixavam no perfil de

orientação para resolução de problemas da fabricante japonesa. Nenhum antigo gerente

da fábrica de Freemont foi contratado, pois temia-se que estes trouxessem os vícios da

experiência anterior.

Depois de selecionados, a Toyota investiu uma média de 600 horas de

treinamento para cada funcionário, sendo que 250 líderes escolhidos entre os operários

passaram diversas semanas no Japão aprendendo sobre a atividade de equipes de

produção. Líderes de equipes eram operários como os demais, porém deveriam saber

executar as tarefas de todos do seu grupo, composto em média por seis pessoas, e,

principalmente, mediar as atividades de melhoria contínua, ensinando as abordagens

para solução de problemas, decisão em grupo e as demais ferramentas de qualidade.

Quando as operações de montagem começaram na NUMMI, o início de cada

etapa não ocorria até que o processo anterior estivesse funcionando perfeitamente. Desta

forma, apesar do maior tempo necessário para implementação, os carros que

inauguraram a linha de montagem possuíam baixos índices de defeitos. Ainda assim, os

primeiros carros produzidos em Freemont não foram encaminhados às lojas, tampouco

formaram o estoque para um lançamento maciço. Diferentemente da prática das

montadoras americanas, estes carros foram distribuídos para alguns funcionários que

passaram a usá-los regularmente, observando eventuais defeitos que aparecessem

durante o uso do produto, de forma que pudessem ser corrigidos.

A NUMMI montou, em 1985, 65 mil Chevrolets Nova, derivado da plataforma do

Toyota Corolla. A fábrica somente atingiu a capacidade planejada em seu segundo ano,

quando introduziu outro modelo, o Toyota FX. Dos 2200 empregados, 84% eram antigos

operários da planta de Freemont. O desempenho, porém, era o oposto do que ocorrera

antes. A fábrica possuía o mesmo nível de produção: 200 mil carros por ano, com cerca

de metade do número de funcionários. A NUMMI necessitava de 20 horas para montar

um veículo, enquanto a operação anterior levava 34 horas. O absenteísmo foi de 2%, ao

passo que anteriormente havia chegado a picos de 20%, e a média nas outras fábricas da

GM era de 9%. As despesas com garantias dos carros produzidos em Freemont também

eram significativamente inferiores – em média, nos produtos da NUMMI era apenas um

terço dos U$ 350 gastos com os demais veículos da GM. Entretanto, a diferença mais

marcante entre a NUMMI e as demais fábricas da GM talvez tenha ocorrido em 1988,

quando uma redução de 29% nas vendas dos produtos da NUMMI, ao invés de provocar

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um plano de demissões, levou a Toyota a implantar um programa de treinamento,

retirando operários da linha, em grupos de 100, para treinamento.

O prazo de 10 anos estabelecido pela Comissão Federal de Comércio previa o

encerramento da NUMMI em 1984. No entanto, após o pedido apresentado pelas duas

montadoras, o limite de 10 anos foi suspenso. A NUMMI opera ainda em 2008, com a

capacidade ampliada para mais de 400 mil carros e caminhonetes, já tendo produzido

mais de 6,2 milhões de veículos.

Um outro esforço para o desenvolvimento de um carro compacto que fosse

competitivo foi divulgado em janeiro de 1985, quando foi criada a Saturn Corporation. As

ações que levaram a criação da Saturn decorriam da criação, ainda em maio de 1982, de

uma nova equipe de staff para engenharia avançada de produtos e manufatura, liderada

pelo experiente engenheiro Alex Mair. Este novo grupo teria a incumbência de retomar os

estudos sobre o programa da plataforma S – cujo desenvolvimento havia sido cancelado

em favor da importação dos carros de Suzuki e Isuzu – porém, partindo de um escopo

mais amplo de investigação, em busca de explorar todas as formas possíveis para tornar

o novo produto realmente competitivo. Os estudos envolveram a participação de cerca de

90 pessoas, incluindo gerentes de divisões e membros da UAW. Segundo Keller (1984),

o relatório final recomendava os seguintes pontos:

• O estabelecimento de um projeto para a construção de um carro que não fosse

apenas um programa de desenvolvimento de veículo, mas de um processo integrado

de negócio.

• Operar o projeto como uma empresa controlada, com gestão e relações sindicais

separados da GM.

• Criação de uma rede de concessionárias separadas a ser operada em conjunto com

o projeto.

• Desenvolvimento de um novo carro para ser lançado em 1990 com um desenho e

estrutura totalmente originais.

O resultado do estudo foi a criação da Saturn Corporation, uma empresa criada a

partir de uma folha em branco por uma equipe de 350 dos melhores engenheiros e

especialistas da GM.Em cinco anos, a Saturn Corporation teria um orçamento de U$ 5

bilhões, com o objetivo de desenvolver não só o carro do futuro, mas um novo jeito de

produzir e vender carros nos Estados Unidos. A nova organização teria total

independência da corporação. A responsabilidade de presidir a equipe que formaria a

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nova corporação foi dada a William Hoglund, que ocupava a gerência da Pontiac. Dentro

de sua equipe, Hoglund envolveu o então vice-presidente da UAW, Don Elphin, para

desenvolver um novo contrato trabalhista.

A Saturn estabeleceu um acordo que previu um papel bastante diferente para a

UAW e os operários. Dentre os planos para tais relações estavam:

• Remuneração dos operários divididas em 80% fixa e 20% variável.

• Garantia de estabilidade de empregos.

• Comitê consultivo estratégico, que envolvia o presidente da GM e a UAW.

• Comitê consultivo de manufatura para supervisão da planta, incluindo representantes

da UAW e especialistas em engenharia, design e produção.

• Comitê da unidade de negócio, responsável pela coordenação das atividades da

planta. Seria formado pelos gerentes da planta, especialistas e representantes da

UAW.

• Módulo de unidade de trabalho: uma estrutura de divisão em times, compostos de três

a seis unidades lideradas por um consultor.

• Unidades de trabalho:equipes de seis a quinze trabalhadores liderados por um

consultor da UAW

O anúncio da Saturn Corporation causou grande repercussão na mídia e na

população americana. A ameaça japonesa à hegemonia das Três Grandes era um

assunto freqüente nas páginas dos jornais americanos. Neste contexto, a Saturn surgiu

como a resposta que a maior empresa do país daria a tal desafio, reunindo e criando as

melhores e mais modernas práticas existentes no mundo dos negócios. Uma pesquisa

feita quatro meses após o anúncio da Saturn mostrou que 41% das famílias americanas

reconheciam o nome da nova empresa, apenas com a divulgação espontânea da mídia.

Segundo Lee (1988), os planos de Roger Smith para a Saturn eram de completa

automatização dos processos. O cliente iria a uma loja da Saturn onde o vendedor

conversaria para entender as preferências deste cliente e selecionar a configuração de

todos os opcionais do veículo. O pedido seria registrado em um terminal de computador,

de onde se dispararia imediatamente a solicitação de fornecimento dos cerca de 15 mil

itens. Em duas semanas, o carro seria entregue. A linha de produção seria controlada por

robôs, que teriam a capacidade de reconhecer as diversas configurações possíveis e

executar as tarefas de acordo com a seqüência especificada para cada produto. Com

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isso, a Saturn seria, segundo a definição de Smith, uma empresa sem papel, com todos

os processos integrados por sistemas eletrônicos.

O entusiasmo com o novo projeto da GM ficou evidente quando 38 governadores

americanos submeteram propostas para sediar as novas instalações da Saturn. Seis

meses depois do anúncio, a Saturn definiu como destino de sua planta uma pequena

cidade do Tenesse. Os U$ 5 bilhões em investimentos para criar a Saturn certamente não

seriam pagos pelo lucro gerado na venda dos 500 mil carros anuais projetados para

serem produzidos nesta planta. Porém, esperava-se que o novo empreendimento gerasse

um novo modelo que pudesse ser replicado e renovasse as demais atividades da GM.

4.1.24. General Motors e suas mudanças questionadas

Ao final de 1985, Roger Smith recebia o reconhecimento pelas mudanças que

havia implementado à frente da GM. A indústria recuperou o nível de venda de 15 milhões

de unidades, e a queda nos preços dos combustíveis fez com que a linha de carros

grandes ganhasse novamente a preferência de parte dos consumidores. As vendas, o

faturamento e o lucro da GM registravam seus níveis mais altos, e a expectativa gerada

pelos investimentos em tecnologia, com aquisições de grandes empresas, fizeram com

que Smith recebesse em 1984 e 1985 uma série de prêmios, promovidos por diversos

meios de comunicação, como o executivo do ano. No entanto, de fora da organização

pouco se notava o que ocorria internamente. Apesar da reestruturação iniciada em 1982,

o número de empregados da GM cresceu cerca de 18% nos três anos seguintes. A GM

havia investido U$ 45 bilhões desde 1980 e ainda planejava investir mais U$ 34 bilhões

até o final da década (LEE, 1988). Com isso, as perspectivas de lucros na operação

deveriam permanecer em níveis altos, a fim de justificar tamanha aplicação de recursos.

Ainda no embalo da expansão via aquisições, Roger adquiriu a empresa de carros

de corrida Lotus, da Inglaterra, por U$ 20 milhões. A Lotus era uma empresa pequena

para os padrões da indústria automobilística e concentrava seus investimentos em

desenvolvimento de engenharia avançada, apresentando importantes avanços na década

de 1980, como suspensão ativa controlada eletronicamente e uso de materiais especiais

em carrocerias monobloco. O valor da Lotus estava mais relacionado à capacitação de

seu quadro de engenharia, que prestava serviços para diversos fabricantes, inclusive GM

e Toyota, do que propriamente à sua linha de carros esportivos de alto luxo ou à sua

equipe de Fórmula 1.

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180

Quando perguntado sobre os investimentos feitos na Lotus, Roger disse: “Da

última vez que olhei dentro da caixinha verde, ela não estava vazia”. Quando tratou sobre

a área de tecnologia ainda afirmou: “É frustrante que às vezes a gente não consiga gastar

dinheiro na velocidade em que gostaria” (LEE, 1988). Porém, o clima de entusiasmo

manifestado externamente não refletia a situação interna da empresa. A reorganização

que criara CPC e BOC havia eliminado os principais sistemas informais de comunicação,

causando freqüente confusão e desencontros na operação. As atividades de

desenvolvimento foram severamente prejudicadas, e praticamente todos os lançamentos

a partir da reorganização sofreram atrasos. O GM-10, projeto que inaugurava o novo

método de engenharia de produto, foi postergado em dois anos, com um ciclo de

desenvolvimento total de sete anos, contra três da Toyota. Os modelos intermediários

derivados do GM-10, que passou a chamar-se plataforma W, veriam o concorrente

Taurus, da Ford, antecipar diversas das inovações que estavam sendo desenvolvidas.

Nos anos de 1984 e 1985, atrasos de seis meses a um ano nos demais lançamentos se

tornaram comuns, assim como os defeitos de fabricação e recalls que continuavam

gerando altos gastos com garantia.

Para conquistar vendas e assegurar a participação de mercado, a GM fazia uso

intenso dos subsídios à taxa de juros. Com isso, as margens eram severamente afetadas,

uma vez que a GM usava parte dela para cobrir os descontos nos juros feitos pela GMAC.

Além disso, com a criação das duas divisões, as estruturas foram aumentadas ao invés

de diminuídas. Somente a CPC contratou oito mil funcionários depois que foi formada.

Isto deixava a divisão que incluía Chevrolet e Pontiac com um total de 160 mil

funcionários, contra apenas 60 mil da Toyota, que em 1985 produziria os mesmos 3,5

milhões de carros do que a CPC.

As modernas fábricas planejadas e anunciadas como o supra-sumo da tecnologia

em robótica começaram a entrar em operação na metade da década. No entanto, os

robôs não funcionavam como o esperado por diversos motivos. Primeiramente, os

modernos equipamentos foram instalados e sua operação iniciada sem que houvesse

treinamento para a maioria dos operários da linha. Em muitos casos os homens e

mulheres da linha necessitavam de treinamentos mais básicos, como de alfabetização,

antes de aprenderem a lidar com computadores.

A inauguração da produção em algumas dessas plantas foi atrasada em função

dos problemas com a linha de robôs. No caso de Hamtramck, eram 260 robôs

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responsáveis por atividades como pintura e soldagem de carrocerias. A linha de

Hamtramck fabricava três modelos derivados da mesma plataforma para cada uma das

marcas da BOC. Os robôs eram capazes de reconhecer o seqüenciamento da produção e

produzir cada modelo sem a necessidade de alterações na linha. Contudo, o que se viu

quando a linha começou a funcionar foi que os robôs eram instáveis e cometiam falhas,

sobretudo quando a linha estava mais acelerada. Os erros eram corrigidos por operários

que deveriam ficar à disposição para os reparos. O resultado foi que as fábricas que

haviam custado duas ou três vezes mais do que as dos concorrentes, japoneses ou

americanos, operavam às vezes com a capacidade reduzida pela metade, utilizando uma

quantidade de operários 40% a maior. Ainda por cima, a percepção de qualidade dos

produtos que saíam destas fábricas ficava abaixo da média da indústria, gerando as mais

altas despesas com garantias.

Não bastasse os problemas com as operações automotivas, outra confusão

aflorou na segunda metade da década de 1980, também criada a partir dos planos de

modernização da GM iniciados por Smith. Assim como a reorganização das divisões, a

integração dos 10 mil empregados da GM aos quadros da EDS causou grandes

desencontros e, neste caso, os conflitos subiram os escalões da corporação. Para muitos

empregados, a transferência foi motivo de grande frustração devido aos salários menores

na EDS, onde a maior parte dos ganhos era variável de acordo com o desempenho. Por

outro lado, as divisões de automóveis da GM se irritavam com os contratos de custo +

margem18, onde a EDS não compartilhava do risco de o projeto ter que ser ampliado e

ainda assegurava uma operação sempre lucrativa, sendo que seus empregados recebiam

bônus e dividendos sobre o resultado da EDS e não da GM.

Os conflitos entre EDS e GM se acirraram devido à repercussão causada pelos

severos protestos e críticas que uma pessoa pública como Ross Perot fazia no conselho

de administração da GM e para a imprensa. A crise entre Perot e Smith chegou a níveis

críticos no final de 1986, ganhando notoriedade na imprensa, apesar de Smith sempre ter

tentado abafar o caso.

A alternativa que pareceu ser a melhor para CEO da GM foi comprar a saída de

Ross Perot da GM. A transação fez de Ross Perot, o maior acionista individual da GM na

época, um das pessoas mais ricas dos Estados Unidos. A GM já havia comprado a EDS

18 Referência utilizada para denominar o tipo de contrato de fornecimento de serviços cujo valor era calculado em função do custo do serviço, mais uma margem de lucro pré-definida.

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pelo alto valor de U$ 2,55 bilhões e a recompra das ações de classe E de Perot somou

U$ 700 milhões. No entanto, Ross Perot não parou sua onda de protestos quando

assinou o contrato de venda de suas ações. No dia seguinte, Perot anunciou na imprensa

que não era justo, diante do momento pelo qual passava a empresa, que ele recebesse

U$ 700 milhões sem antes consultar os demais acionistas sobre o assunto, e que estaria

disposto a devolver o dinheiro caso a maioria dos acionistas da GM assim o quisessem. O

anúncio de Perot agravou ainda mais a situação da Roger Smith diante dos acionistas,

uma vez que ele já vinha sendo pressionado desde o início de meados de 1986.

Desde quando a Du Pont foi obrigada a se desfazer de suas ações da GM, entre o

final dos anos 1950 e o início dos 1960, a propriedade das ações da GM era pulverizada

na mão de investidores privados e fundos de investimentos. A partir de então, a relação

da gestão da organização com os acionistas ocorreu sob um acompanhamento mais

distante, com raros episódios onde pressões e questionamentos foram mais relevantes do

que o anúncio dos lucros e dos dividendos. Entretanto, em abril de 1986, Roger Smith se

viu acuado com tantas críticas vindas de analistas financeiros durante um encontro com

os gestores das carteiras dos fundos de investimentos. Apesar dos lucros anunciados no

fechamento de 1985, o valor era 11% menor do em 1984, enquanto o faturamento havia

aumentado 14%. A preocupação dos analistas não era só com a queda nas margens,

mas também com a capacidade de a empresa gerar retornos sobre os investimentos.

Depois de mais de U$ 40 bilhões investidos, o ponto de equilíbrio da GM requeria uma

venda de no mínimo 5,6 milhões de carros, ou seja, 43% do mercado, isso apenas para

não ter prejuízo. Os analistas questionavam seriamente a lógica do plano de George

Smith de construir a General Motors do século XXI.

Após a reunião com os analistas, George Smith tomou uma série de medidas para

melhorar a imagem da GM e a sua própria perante os investidores do mercado financeiro.

Smith contratou a Gershon Kekst, uma consultoria especializada em gestão da relação

com acionistas, para lidar com as pressões que enfrentava. A GM adotou medidas para

controlar a divulgação de informações institucionais e, ainda no verão de 1986, poucos

meses depois da reunião, anunciou um plano de redução de custos que contemplava o

fechamento de 11 fábricas, com a redução de 25 mil empregados assalariados e 29 mil

operários, até 1990. Outras ações desse esforço de redução incluíam a venda das

operações de ônibus e de caminhões e o fechamento de unidades em países como

Filipinas, Grécia, África do Sul, Uruguai e Equador. A GM também reduziu os

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investimentos em suas atividades de desenvolvimento. Os carros da plataforma GM-10

tiveram o número de fábricas reduzidas de sete para quatro, o mesmo acontecendo com

a Saturn, que ao invés de duas linhas de montagem, iniciaria com somente uma. Além

disso, o projeto do carro que substituiria os esportivos Camaro e Firebird foi cancelado.

Com todas estas ações a GM se recuperaria do prejuízo registrado no terceiro

trimestre de 1986 e fecharia o ano com lucros de U$ 2,9 bilhões. Contudo, segundo Lee

(1988), para alcançar tal resultado, a GM alterou procedimentos contábeis: reviu

operações retroativamente e eliminou U$ 640 milhões dos custos, aumentando em U$

130 milhões os rendimentos líquidos. Ainda segundo Lee (1988), a GM realizou uma

operação contábil com a GMAC para adicionar U$ 5,5 bilhões em contas a receber aos

balanços. Mesmo com todas essas ações da GM para melhorar sua imagem junto aos

investidores, a principal concorrente, a Ford, fechou o ano com um lucro maior, pela

primeira vez desde 1924, com U$ 3,3 bilhões, embora tivesse um faturamento 35%

inferior. A situação da GM se agravava com o preço de suas ações em queda, enquanto

Ford e Chrysler anunciavam programas de recompra de ações, que faziam o preço subir.

O anúncio de Ross Perot feito no começo de dezembro de 1986 mobilizou

acionistas, já insatisfeitos com o desempenho da empresa, a apresentarem uma

proposição de resoluções que impedisse George Smith de seguir adiante com a compra

da saída de Perot. O Conselho Nacional de Investidores de Nova York, uma espécie de

sindicato que reunia fundos de investimento responsáveis por 10% dos votos de todas as

ações da bolsa, era presidido por John Goldin. Logo após o anúncio de Perot, Goldin

organizou um encontro com os representantes dos fundos de investimentos, Perot e

George Smith, os quais prontamente confirmaram a presença. Os acionistas tinham até

19 de dezembro para submeter novas proposições de resolução para que pudessem ser

votadas até maio do ano seguinte na convenção de acionistas da GM. No dia da reunião

com os investidores em Nova York, Smith não compareceu e sem avisar ou apresentar

explicações enviou uma equipe de cinco executivos corporativos em seu lugar.

Após o desgaste com o episódio de Nova York, George Smith passou a cumprir

uma intensa agenda de reuniões com representantes de fundos de investimentos,

colhendo procurações para evitar uma derrota na convenção de acionistas de maio, que

poderia significar sua demissão do cargo de CEO da GM. No dia da convenção, George

Smith havia reunido a maioria dos votos sob procuração em seu nome, mesmo assim a

votação das resoluções para alterar o estatuto da GM teve 20% de votos a favor. Apesar

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da vitória de Smith, a votação contrária à posição da gestão da organização foi a maior na

história da GM até então.

Mesmo diante da vitória na convenção, Smith saiu com a imagem arranhada do

episódio iniciado por Perot. Porém, pouco tempo depois, o CEO da GM anunciou mais um

pacote de medidas para redução de custo, que chegaria a U$ 10 bilhões por ano. O

pacote incluía o fechamento de mais três fábricas, demissão de mais 17 mil empregados

assalariados, reduções nos gastos do escritório central, liquidação de operações

deficitárias de componentes e redução em U$ 200 milhões nos gastos com garantias,

embora nestes três últimos itens a forma como os cortes seria feita não fosse

especificada. Além da redução de U$ 10 bilhões, Smith anunciou um plano de recompra

de ações no total de U$ 5 bilhões e a meta de alcançar um retorno de 15% para o

acionista até 1990.

Paralelamente ao anúncio dos cortes de gastos e compras de ações, Roger Smith

também implementou mudanças nos sistemas de bônus dos empregados administrativos.

O sistema de avaliação vigente na General Motors vinha desde os tempos de Sloan e o

empregado era avaliado por seu superior imediato, que o atribuía uma de três

classificações possíveis, sendo que não havia classificação para um desempenho

insatisfatório. Em 1987, o novo sistema reduziu para 3,5% o montante disponível para

distribuição de bônus, eliminou a ajuda de custo que era repassada da negociação com

os operários para os assalariados e determinou três classificações de desempenho, das

quais a última tornava o empregado não elegível ao bônus. Os gerentes passaram a ter

cotas para cada classificação, tendo obrigatoriamente que ordenar seus subordinados

quanto ao seu grupo de desempenho.

Em 1987, GM e Ford negociaram novo acordo com o sindicato. O contrato fechado

primeiro pela Ford e depois reconhecido pela GM novamente não se concentrou sobre

aumentos salariais. O contrato estabeleceu uma cláusula de estabilidade de emprego de

longo prazo, onde o fabricante se comprometia a não eliminar arbitrariamente os

empregos, limitando a redução de postos de trabalho na razão de um para cada dois

empregados aposentados. Por outro lado, o sindicato reconhecia a redução da força de

trabalho em períodos de retração na demanda, porém o contrato assegurava a

recontratação de empregados demitidos quando as condições de mercado se

restabelecessem. Outro ponto importante do contrato de 1987 foi o arcabouço para a

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criação de comitês de segurança no trabalho e de eficácia operacional, com o objetivo de

explorar oportunidades para melhor utilização da força de trabalho.

Todas essas medidas de cortes e ajustes nos gastos da GM ocorreram em um ano

em que a indústria apresentou uma ligeira retração de 7% no volume de vendas. Para a

General Motors, o compromisso assumido junto aos acionistas de priorizar as taxas de

retorno e de não utilizar mais subsídios à taxa de juros ao consumidor impôs uma

significativa perda de participação de mercado, de 40% em 1986 para 37% em 1987. Com

isso, as receitas da GM caíram 1%, para U$ 101,7 bilhões, enquanto o lucro aumentou

em 20%, chegando a U$ 3,5 bilhões, 23% menor que o da Ford.

4.1.25. Rota ajustada e o fim da gestão Smith

Os pacotes de demissão anunciados em 1986 e 1987 foram implementados na

maior parte entre 1987 e 1989. Contudo, ao invés da reorganização dos processos para

compensar a diminuição do número de pessoas em uma atividade, o que ocorreu foi a

terceirização dos serviços, continuando, em muitos casos, a serem prestados pelo mesmo

empregado, que passava a trabalhar em uma prestadora de serviços. A troca de

empregados contratados por empresas terceirizadas era freqüentemente a saída mais

cômoda para o gerente de uma área, que recebia uma meta de corte na folha de

pagamento (KELER, 1989; LEE, 1988).

Apesar do maior contato com as técnicas de gestão da Toyota depois da entrada

em operação da NUMMI em 1984, as tentativas da GM de aplicar as soluções aprendidas

por seus gerentes que atuaram em Freemont ocorreram de forma tímida, fragmentadas e

raramente com o apoio formal de algum programa corporativo. A ação mais relevante

deveria ter sido a Buick City, planejada para operar em um sistema modular, que tentaria

replicar técnicas Just-in-time praticadas na fábrica da Toyota no Japão. No entanto, os

relatos dão conta de que o método foi rapidamente corrompido pela gestão da fábrica,

com práticas como estoques secretos ou desprezo pelas técnicas de resolução de

problemas (LEE, 1988; PASCALE, 1994)

Outro método adotado para promover melhorias nas atividades produtivas foi o

uso de um sistema de competição por melhoria de desempenho entre plantas, sob a

condição de que a perdedora eventualmente fosse fechada. O caso apresentado por

Keller (1989) descreve a experiência de competição entre fábricas feita pela GM com as

plantas de Van Nuys e Norwood. A planta de Van Nuys, por estar mais próxima

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geograficamente de Freemont e diante da perspectiva de ser fechada, procurou replicar

algumas de suas técnicas aplicadas na NUMMI. Contudo, os métodos utilizados para a

transferência do conhecimento foram significativamente diferentes daqueles realizados

pela Toyota para trazer suas técnicas do Japão. Van Nuys utilizou vídeos gravados em

Freemont e recebeu visitas semanais de gerentes que, por um período, funcionaram

como consultores. O resultado foi a implementação de métodos distorcidos do sistema de

produção japonês. Dentre as principais barreiras estavam a resistência do representante

do sindicato e a desconfiança generalizada dos trabalhadores, que já davam seus

empregos como perdidos. O esforço realizado em Van Nuys, ao contrário de melhorar,

causou a queda nos indicadores de qualidade e produtividade. Mesmo assim, a planta

venceu a batalha contra Norwood, que foi fechada não por critérios de desempenho, mas

por ser mais antiga e com equipamentos mais velhos.

Outras iniciativas de replicar alguns dos métodos utilizados em Freemont foram

conduzidas por gerentes de plantas da GM espalhadas pelos Estados Unidos, em geral

com maior sucesso do que em Van Nuys. Entretanto, a diferença entre indicadores de

desempenho da NUMMI em relação às demais plantas da GM eram gritantes no final dos

anos 1980. Por exemplo, o índice de horas/homem, que indicava a quantidade de horas

dedicadas em média pelos trabalhadores na montagem cada veículo. Em Freemont era

de 23 horas/homem, enquanto que nas demais plantas da GM a média era de 40

horas/homem. Na planta de Ver Linden, uma das mais modernas e automatizadas da

época, cujo gerente, Dale Snyder, era um declarado entusiasta das técnicas japonesas,

alcançava um dos melhores índices da GM: 29 homens/hora.

A grande aposta de George Smith para competir com as empresas japonesas que

instalaram suas fábricas nos Estados Unidos ao longo da década de 1980 era realmente

a Saturn Corporation. O lançamento do veículo Saturn ocorreu em 1991. Em um dos

últimos atos de George Smith como presidente, ele dirigiu o primeiro modelo que saiu da

fábrica. Porém, quando a Saturn finalmente começou, sua operação era bastante

diferente daquela planejada em 1984. Ainda na fase de planejamento da nova empresa,

em 1986, diversas alterações no escopo do projeto foram efetuadas depois que alguns

dos conceitos de alta tecnologia e automação não apresentavam os resultados esperados

em outros projetos da GM. Além disso, as dificuldades financeiras e a pressão dos

acionistas exigiram um uso comprovadamente mais racional do capital. Naturalmente, a

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187

Saturn, sendo um dos principais projetos da GM na década, também se viu alvo de

cortes.

O modelo previsto inicialmente para a Saturn era de um carro compacto para

competir no segmento de baixo preço. Em 1986, Roger Smith aprovou a alteração para

um veículo maior e mais luxuoso, do qual fosse possível obter melhores margens. O

volume anteriormente projetado para 500 mil unidades/ano foi reduzido pela metade, com

a eliminação de uma das linhas de produção. Outro critério em relação ao produto

alterado no decorrer do projeto foi o compartilhamento de partes, peças e fornecedores

com os demais modelos da General Motors. Inicialmente a meta era que todos os

componentes do Saturn fossem projetados a partir de uma folha em branco, e que os

fornecedores fossem todos avaliados de forma independente pelos executivos da nova

empresa. A redução no orçamento de desenvolvimento obrigou a mudança nos planos, e

a Saturn passou a olhar para componentes usados em outras divisões, inclusive adquiriu

alguns equipamentos de outras plantas da GM para montar sua linha de produção.

Outra mudança considerável no desenvolvimento da Saturn foi em relação ao

sistema fornecido pela EDS para integrar desde a venda até o pedido de compra junto ao

fornecedor. A idéia de uma organização sem papel, defendida por George Smith também

foi abandonada. Os sistemas da EDS estavam presentes na operação da Saturn talvez

em maior nível de aplicação do que em outras divisões, porém o uso de computadores e

robôs nas atividades de vendas e produção foi severamente reduzido.

A Saturn manteve sim algumas inovações quando suas vendas foram finalmente

inauguradas. A organização de vendas era a única a operar com preço fixo em todo os

Estados Unidos. A eliminação da negociação de descontos ou sobrepreços na ação de

vendas permitiu que a Saturn implantasse um eficiente sistema de atendimento ao cliente,

o qual foi avaliado como o mais agradável do mercado. Além disso, o contrato de trabalho

dos empregados era composto de 80% fixo e 20% variável e, replicando um modelo

comumente usado em montadoras européias, o Sindicato tinha participação efetiva em

comitês consultivos da organização.

As vendas da nova subsidiária foram bem-sucedidas nos primeiros anos de

lançamentos. Os consumidores preferiam meses de espera e ter o carro em seu preço

cheio a adquirir modelos concorrentes repletos de descontos. As avaliações de satisfação

do consumidor e de qualidade percebida colocaram o Saturn no topo da lista dos veículos

vendidos nos Estados Unidos. Porém, mesmo com todo o sucesso de aceitação pelo

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188

consumidor norte-americano, a Saturn registrou prejuízos em seus primeiros dois anos de

operação e apenas empatou no terceiro ano, graças à transferência de U$ 3 bilhões

referentes aos investimentos para a conta da GM. Os índices de produtividade também

colocavam a Saturn bem distante de seu objetivo de ter o menor custo da indústria. Sua

média era de 35 horas/homem, quase o dobro dos índices obtidos nas plantas japonesas

nos Estados Unidos à época. A parte variável dos salários não foi atrelada a metas de

desempenho, mas sim de treinamento. Com isso, as 750 horas de treinamento em 11

especialidades diferentes garantiram uma média salarial de U$ 45 mil para os

empregados administrativos, a maior média salarial entre as divisões da GM (REHDER,

1993).

Os anos que antecederam o início da operação da Saturn indicaram a situação de

retração que estaria a indústria no momento do lançamento do carro. Após o recorde de

volume de vendas em 1988, que só seria batido dez anos depois, a indústria apresentou

três anos de quedas seguidas, acumulando uma redução de 20%. Para a GM, 1988

também havia sido um ano de recorde de faturamento e de lucros, contudo, a queda nas

vendas nos anos seguintes, combinada com a natureza altamente fixa dos custos de suas

fábricas high-techs, fez seu lucro despencar. O impacto nas vendas da GM foi maior do

que no restante da indústria, acumulando uma queda de 32%. Assim, os dois últimos

anos do mandato de George Smith levariam a GM ao terceiro e ao quarto prejuízo em 82

anos de história. Uma comparação de alguns índices de desempenho do início e do fim

do mandato de George Smith reforça as evidências do declínio vivido pela GM na década

de 1980, apesar do intenso esforço para reverter suas desvantagens em relação às

concorrentes. Entre 1980 e 1991, anos em que a indústria viveu momentos de recessão,

o nível do volume anual de vendas da General Motors caiu 22%, enquanto a participação

de mercado foi de 47% para 33%. Em 1990, a General Motors voltou a apresentar

prejuízos , desta vez de U$ 2 bilhões e, no ano seguinte, de U$ 4,5 bilhões.

George Smith partiu para sua aposentadoria deixando a GM nas mãos de Robert

Stempel em agosto de 1990. Stempel havia assumido a presidência da GM no lugar de

James McDonald que se aposentou em 1987, quebrando a tradição da organização de ter

um CEO com formação em finanças. Entretanto, o mandato do engenheiro, que havia

começado na Oldsmobile em 1958, acabou seis anos antes de ele atingir a idade de 65

anos e fosse obrigado a se aposentar, como era habitual para os presidentes da GM.

Stempel deixou o cargo em novembro de 1992, dois anos e três meses depois de

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189

assumir. A saída de Stempel foi uma decisão do conselho de administração da GM, do

qual ele era presidente. Diante da pior crise de sua história, quando a GM reportou um

prejuízo de U$ 23 bilhões, uma reorganização dividiu as funções de presidente do

conselho e CEO. Como novo presidente do conselho, foi eleito John G. Smale, ex-

presidente e CEO da Procter & Gamble e membro do conselho da GM desde 1982. As

funções de CEO e presidente da GM (COO) ficaram sob a responsabilidade de John F.

Smith Jr.

Jack Smith, como era chamado, fizera sua carreira nos escalões de finanças da

GM por 23 anos, até assumir a gerência das operações da GM no Canadá, em 1984. Dali

em diante, Smith tornou-se um executivo de operações, passando pelo comando de

diversas unidades em outros países até se tornar o responsável por toda a operação da

GM no exterior. John Smith assumiu o comando-executivo da GM com a missão de

recuperar a organização após inéditos três anos seguidos de prejuízos.

4.1.26. Redução de custos, venda de ativos e concordata

A partir de 1992, a GM adotou medidas severas de redução de custo e melhora

nos seus indicadores de retorno. Imediatamente foram anunciados fechamento de

fábricas e planos de demissão, a GM também replicou uma solução iniciada na Europa,

organizando um pool de compras globais. Alem disso, preparou o desenvestimento de

todas as empresas adquiridas na gestão Roger Smith. Com a recuperação do mercado a

partir de 1993 a GM adotou definitivamente a estratégia de importar o carro pequeno de

suas controladas. Investiu no desenvolvimento e ampliação da linha de caminhonetes e

utilitários esportivos. Carros grandes e de maior margem.

Em 1995 a GM organizou a Delphi. A nova empresa reuniu as unidades produtivas

de peças e posicionou-se como uma “empresa de mercado”, não mais uma subsidiária da

GM. Em 1999 a GM vendeu completamente sua participação de mercado. Para valorizar

as ações da Delphi a GM havia feito um contrato de exclusividade de fornecimento a nova

empresa que acabou em 2002. Dois anos depois, em 2004, a Delphi foi advertida pela

Securities Exchange Comission (SEC) que regula as exigências de goverança da Bolsa

de Valores. O motivo da punição foi de fraude nas práticas contábeis.

Em 1998 a GM implantou a sua primeira fábrica em consórcio modular, onde so

forencedores é que operavam a linha de montagem, sob as regras de um contrato. O

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190

modelo foi rapidamente replicado para as plantas nos Estados Unidos e as demais

abertas no México. Este movimento causou a greve mais cara de toda a história.

Com a volta dos baixos preços do petróleo e os japoneses dominando os

mercados de carros médios, a GM expandiu rapidamente para os já dominantes veículos

utilitários, entre estas expansões esteve a aquisição do derivado militar Hummer. Entre

2000 e 2004, a GM aumentou a quantidade de modelos de 51 para 63, sendo que o

número de caminhonetes subiu de 20 para 30. Apesar do aumento no faturamento, a

participação de mercado da GM diminuiu como pode ser observado no gráfico 4-2,

abaixo.

Gráfico 4-2 Receita líquida e participação de mercado da GM

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

0

50.000.000.000

100.000.000.000

150.000.000.000

200.000.000.000

250.000.000.000

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

participação de mercado Receita Líquida Fonte: Relatórios anuais da GM

A partir de 2004, o aumento do preço do petróleo devido ao aquecimento da

demanda mundial fez com que a GM perdesse de forma mais acelerada a participação de

mercado. Nesta época, a GM lutava também contra os altos déficits dos fundos de

pensão de assistência médica de seus funcionários. Estes benefícios haviam começado

na década de 1940, quando foram criados fundos para estes benefícios, que incusive

investiram nas ações da GM. Nos anos 1990, uma combinação que envolveu o aumento

dos preços dos serviços médicos, a redução da base de contribuintes e queda nas

vendas e lucros levou a GM a prejuízos recordes.

Anunciando novos planos de cortes em custo, investimentos, redução de pessoal

e o fechamento da Oldsmobile. A GM, sob o comando de Rick Wagoner, amargou quatro

anos de prejuízos. Recentemente e sob os efeitos da crise financeria nos Estados Unidos,

a GM foi ao Senado Norte Americano solicitar um emprétimos federais para cumprir os

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191

comprimissos financeiros da organização. O socorro do governo norte-americano à

General Motors foi aprovado em dezembro de 2008, juntamente com um acordo

semelhante para Chrysler. A ajuda do governo estabeleceu um limite de empréstimo de

até U$ 13,4 bilhões, tendo como garantia as ações da própria GM.

Em 1 de juho de 2009, a General Motors apresentou o pedido de concordata na

justiça dos Estados Unidos. O resultado deste processo foi a cisão dos ativos, liquidando

a parte ruim e reunindo a parte considerada boa em uma nova empresa, denominada

Nova GM, da qual o tesouro americano recebeu 60% das ações.

4.2. Análise das respostas aos desafios à longevidade

A General Motors desenvolveu ao longo de seus 100 anos de história uma

trajetória de ascensão e declínio como pode ser observado na curva de crescimento

relativa à atividade econômica dos Estados Unidos, no gráfico 4-3 abaixo. O crescimento

acelerado das quatro primeiras décadas atingiu o patamar mais elevado entre as décadas

de 1950 a 1970. Nos últimos 30 a 40 anos de sua trajetória a GM apresentou um declínio

crônico até o ano de 2009 quando foi pedida sua concordata.

O formato da curva de crescimento da General Motors mais uma vez sugere que

organização desfrutou de uma situação de sucesso inicial e, posteriormente, se deparou

com o fracasso. A análise das respostas da GM aos desafios à longevidade buscará

identificar estabilidade e/ou mudanças nos padrões de resposta e comparar com as

referências de propensão ao sucesso e ao fracasso, fornecidas pela teoria. As

constatações obtidas a partir desta comparação de padrões poderão contribuir para

entender as condições que levaram a organização a produzir tal trajetória.

Nos próximos sub-itens desta seção, os cinco desafios a longevidade são

analisados isoladamente. Na Seção seguinte será apresentada a síntese dos padrões de

respostas da GM aos cinco desafios, bem como o efeito combinado dessas respostas

sobre a evolução da posição da GM em relação a auto-perpetuação e auto-destruição.

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192

Gráfico 4-3 Evolução do crescimento da General Motors 1904 a 2008

y = -2E-11x5 + 6E-09x4 - 7E-07x3 + 3E-05x2 - 3E-05x + 0,000R² = 0,9

-0,005

0,005

0,015

0,025

0,035

Lucro Líquido/PNB Receita Líquida/PNB

4.2.1. Desafio do Empreendedorismo

O desafio do empreendedorismo está relacionado à promoção de serviços

empreendedores (PENROSE, 2006) e de motivações produtivas (CHANDLER, 1977) pela

organização, condições necessárias ao crescimento. A curva de crescimento da General

Motors indica uma tendência de contínua expansão durante seis décadas e

posteriormente apresenta uma inflexão, invertendo a curva em uma trajetória de declínio.

Apesar do declínio, as evidências indicam que a GM manteve processos contínuos para

prover a organização dos serviços empreendedores, assim como desenvolver

crescimento produtivo.

Motivações para o crescimento

As evidências indicam que a GM desenvolveu sua expansão diversificando a

aplicação dos motores do crescimento contínuo (FLECK, 2003). Inicialmente, motores de

integração vertical e horizontal por meio da aquisição de concorrentes e fornecedores

fizeram uso da capacidade de William Durant em mobilizar recursos financeiros para

expandir as fronteiras da organização. Dois grandes ciclos de aquisições foram

desenvolvidos, um entre 1908 e 1910, e outro entre 1916 e 1920, contudo este motor

encontrou a limitação com o esgotamento de empresas para serem adquiridas. Durante a

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193

década de 1920, as oportunidades de aquisições no setor automobilístico se tornaram

escassas, as últimas foram a Scripps-Booth e a Interstate, que logo foram

descontinuadas, além de subsidiárias na Europa, Vauxhall e Opel, e na australiana,

Holden. As demais aquisições já no final dos anos 1920 acionaram o motor de

diversificação, iniciado em 1916 com a guardian fridge, e posteriormente avançando sobre

áreas mais relacionadas como motores a diesel e aviação.

O crescimento da GM também acompanhou o aumento da demanda por

automóveis. O longo ciclo de expansão da indústria pode ser observado no gráfico 4-4

abaixo. A General Motors não só acompanhou a indústria, como aumentou sua

participação de mercado desde seu início até a década de 1970. A expansão inercial da

GM só não foi mais intensa porque encontrou limites na regulamentação da defesa da

concorrência, uma vez que ultrapassar a marca dos 50% do mercado traria

questionamentos jurídicos, e também porque o mercado consumidor se aproximou de um

ponto de saturação.

Gráfico 4-4 Evolução das vendas de veículos da indústria e da General Motors nos Estados Unidos, entre 1900 e 2008

0

2.000.000

4.000.000

6.000.000

8.000.000

10.000.000

12.000.000

14.000.000

16.000.000

18.000.000

19

00

19

03

19

06

19

09

19

12

19

15

19

18

19

21

19

24

19

27

19

30

19

33

19

36

19

39

19

42

19

45

19

48

19

51

19

54

19

57

19

60

19

63

19

66

19

69

19

72

19

75

19

78

19

81

19

84

19

87

19

90

19

93

19

96

19

99

20

02

20

05

20

08

Vendas de veículos totais (em unidades)

Vendas General Motors (em unidades)

Fontes: Relatório estatístico da Senate Fiscal Agency (2007), American Bureau of Statistics (apud CHANDLER, 1964), relatórios Moody’s (1917 a 1998), relatórios anuais da GM (1998 a 2009)

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194

As atividades desenvolvidas pela General Motors eram grandes geradoras de

recursos sob a forma de lucro. A reaplicação destes recursos para gerar mais crescimento

– inercial e via aquisição, principalmente – é uma evidência de motivação produtiva na

organização. Em alguns momentos, a GM também empregou processos de crescimento

de natureza híbrida, como por exemplo o lançamento de carros compactos nas décadas

de 1960 e 1970, mesmo obtendo uma taxa de retorno menor, porém defendendo o

mercado contra as importações.

Na década de 1980, a GM aplicou uma grande quantidade de recursos em

diversos processos de crescimento. Início de programas de inovações, diversificação via

aquisição e expansão vertical adquirindo fornecedores foram algumas das tentativas da

organização para produzir um crescimento e continuar gerando lucros. Contudo, apesar

de ter por trás uma orientação produtiva, grande parte dos esforços fracassou. Já a partir

da década de 1990, a GM desenvolveu um estágio de declínio de dissolução de partes do

negócio. A GM apresentou esforços de crescimento nulo, como a venda e a terceirização

de suas divisões, e também crescimento defensivo, com o uso de descontos e redução de

juros para manter a participação de mercado.

Ambição

A ambição foi uma das características marcantes da gestão de William Durant,

protagonista do processo de formação da GM. As evidências, inclusive registros

autobiográficos, deixam clara a ideia de Durant à respeito da consolidação da indústria

automobilística e a convicção sobre ocupar um papel importante neste processo. O ciclo

de investimentos em aquisições e a contínua construção de plantas para ampliar a

capacidade e desenvolvimento de novos modelos também indicam a forte presença da

ambição, que neste período emanava, sobretudo, do principal acionista e gestor da

empresa.

Por outro lado, conforme a organização aumentou de tamanho, outras pessoas

passaram a estabelecer um relacionamento de sócio-gestor e, portanto, passaram a

contribuir também como fontes deste serviço, foram os casos de Charles Mott, Henry e

Wilfred Leland, Charles Kettering e Alfred Sloan. A associação de Pierre du Pont e da Du

Pont à GM foi um forte incentivo à predisposição a promover o lucro e o crescimento. Tal

predisposição foi registrada no relatório preparado por John Raskob, tesoureiro da Du

Pont, quando ele recomendou a oportunidade de investimento devido a promissoras

perspectivas de rendimento. A participação efetiva da Du Pont na gestão da GM durou

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195

entre 1918 e 1958, neste período a Du Pont influenciou o início de dois importantes

processos que sistematicamente passaram a reforçar a ambição, o programa de bônus e

método de análise e tomada de decisão do standard-volume.

O bônus baseado em resultados, inicialmente implantado em 1918, sofreu

diversas adaptações ao longo do tempo, porém, independente do formato, instituiu, dali

em diante, a premiação em função de resultados para o grupo de gerentes e executivos

mais graduados. Este programa permitiu, por exemplo, que o CEO da General Motors,

Thomas Murphy, recebesse um bônus de U$ 950 mil em 1976, por ter alcançado, dentre

outras metas, uma participação de mercado de 52%, renovando toda a linha de produtos

para se adaptar as novas preferências do mercado após o Choque do Petróleo. Naquele

mesmo ano, outros executivos também alcançaram níveis recorde de bônus. Foi o caso

de Elliot Estes, número dois da GM, que no mesmo período recebeu bônus de U$ 600 mil.

O método de avaliação de retorno sobre o investimento, implantado por executivos

vindos da Du Pont, no início dos anos 1920, foi chamado de standard-volume. Tal

método consistia na conciliação de diversos sistemas de informação e análise que

incluíam procedimentos para projeção da demanda, estimativa de custos e investimentos

e, principalmente, estabelecia o retorno sobre o investimento como critério de decisão. O

objetivo associado ao método era de maximizar o retorno ao longo do tempo, o que

reforçava a predisposição não somente ao lucro, mas ao reinvestimento no negócio.

Embora as metas e a exata fórmula de cálculo de rentabilidade não tenham sido

oficialmente divulgadas, a literatura sobre a GM indica que desde os anos 1920 a

organização trabalhou com o objetivo de produzir um retorno de algo como 20% sobre o

investimento. Esta meta foi publicamente reconhecida pela primeira vez no final da

década de 1970 pelo então CEO da GM, Thomas Murphy, em reunião com acionistas. O

gráfico abaixo indica o longo período de sucessivos resultados positivos em termos de

lucro líquido em relação ao ativo, sobretudo durante o período entre 1920 e 1980.

Após 1980, o indicador de retorno sobre o ativo apresenta uma forte tendência de

queda, porém a análise histórica indica que tanto os princípios de retorno sobre o ativo

quanto os esforços para produzir o crescimento continuaram presentes na General

Motors, especialmente durante a gestão de Roger Smith, quando um novo ciclo de

aquisições foi conduzido. Tais evidências indicam que o declínio observado neste período

não esteve relacionado a uma queda nos níveis de ambição da organização.

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Gráfico 4-5 Lucro Líquido sobre ativo total, corrente e média móvel em 10 anos

-40%

-30%

-20%

-10%

0%

10%

20%

30%

19

05

19

08

19

11

19

14

19

17

19

20

19

23

19

26

19

29

19

32

19

35

19

38

19

41

19

44

19

47

19

50

19

53

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56

19

59

19

62

19

65

19

68

19

71

19

74

19

77

19

80

19

83

19

86

19

89

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92

19

95

19

98

20

01

20

04

20

07

GM - Lucro Líquido / ativo Média Móvel (10 anos)

Versatilidade

Os processos de expansão baseados em aquisições e desenvolvimento de

inovações, assim como a penetração e o desenvolvimento de mercado, ocorrem com

intensidade variada ao longo da história da General Motors, eventualmente esbarrando

nos limites existentes a cada um dos motores de crescimento contínuo. As evidências

indicam que os serviços empreendedores de versatilidade atuaram de forma relevante

durante esses processos, no entanto uma característica a se destacar é a fragmentação

entre os fornecedores deste serviço, que marcou a organização desde o seu início. A

separação entre aqueles que contribuíam com a capacidade de imaginação e a

criatividade para combinar os recursos e aqueles que forneciam a visão sobre as

possibilidades de criação de valor teve um papel decisivo no processo de formação da

General Motors. Portanto, o adequado provimento deste serviço dependeu fortemente da

cooperação entre as partes. A observação do histórico da GM evidencia que este foi um

dilema crescente, que acompanhou a expansão da organização e impôs uma repressão

gradual à versatilidade.

A aquisição da Buick por Willian Durant, que deu início ao que viria ser a GM,

representou também um marco da dinâmica que caracterizou os serviços de versatilidade.

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Na ocasião, David Buick, um inventor que havia criado um veículo capaz de operar com

eficiência, obteve sucessivos fracassos ao tentar criar valor a partir de sua inovação.

Contudo, após a aquisição, Durant não só atuou na mobilização dos recursos, mas foi

determinante na visão de serviços essenciais para a viabilidade do negócio, tais como

rede de vendas, assistência mecânica e instalações produtivas. Para tornar essa união

entre Buick e Durant eficaz, o primeiro aceitou ceder o total controle do negócio ao

segundo, porém tempos depois as divergências provocaram a saída de David Buick.

Essa dinâmica se repetiu com outros integrantes da GM que inicialmente

trabalharam em cooperação com Durant e depois entraram em algum conflito relacionado

à busca de novos serviços produtivos. Foram os casos de Louis Chevrolet, piloto criador

do primeiro veículo Chevrolet, Henry e Wilfred Leland, fundadores da Cadillac, e Walter

Chrylser, que saiu da GM para criar a Chrysler. Esses integrantes participaram de forma

versátil na criação de negócios para a GM, juntamente com outros que permaneceram por

mais tempo na organização, tais como Charles F. Kettering, Artur Mason, Harry Shiland e

Lee Dunlap.

De maneira geral, a conciliação entre a versatilidade daqueles mais próximos à

operação com a visão de William Durant foi obtida por meio da aplicação da folga de

recursos, especialmente financeiros, de forma a patrocinar ou adquirir frentes de

desenvolvimento semi-autônomas. Ao diversificar as apostas usando recursos

excedentes, Durant se protegeu contra erros de versatilidade de alguns e alavancou os

acertos de outros. Assim sendo, durante sua gestão, a GM colecionou fracassos

relevantes, como por exemplo, Heany Lamp, Welch Motors, Cartercar, Marquette e

Samson Tractor, mas também desenvolveu ações de grande versatilidade, tais como o

Buick Modelo 10, a partida elétrica, Oldsmobile, Oakland, a carroceria fechada, o

Chevrolet 490, a GMAC e a Frigidaire.

A mudança do controle para a Du Pont despertou um ensaio de novos processos

relacionados à versatilidade. O episódio principal foi a fracassada tentativa de

desenvolvimento do motor a ar, o copper-cooled. Na ocasião, Pierre du Pont procurou

submeter serviços de versatilidade de três divisões, o Laboratório de pesquisa, Chevrolet

e Oakland, a um processo corporativo, sob o comando de Charles Kettering. Contudo, o

desentendimento entre as divisões foi crítico e o projeto foi abortado. Após esse episódio,

as divisões permaneceram com estruturas e processos paralelos de desenvolvimento de

produtos e de expansão dos seus negócios.

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O aparato corporativo promovido pela Du Pont produziu como consequência

adversa o gradual abafamento sobre versatilidade nas unidades de negócio. Durante este

período, houve uma contínua adoção de diversos procedimentos que sistematizavam

atividades fortemente relacionadas à expansão dos serviços produtivos, como por

exemplo políticas para identificar preços e volumes de produção dos veículos, métodos

para avaliar a ampliação ou construção de plantas, sistemas para calcular a geografia de

mercado e assim expandir a rede de vendas, programações para renovação anual da

linha de produtos e também sistemas para definição e execução de orçamentos.

Tais procedimentos impuseram restrições sobre a atuação das unidades de

negócio, inicialmente com o intuito de dar maior eficiência à criação de valor da GM como

um todo. Por exemplo, a política de pirâmide de marcas dos anos 1920 segmentou uma

faixa do mercado para cada unidade de negócio, na qual cada uma possuía autonomia

para desenvolver seus produtos, levando em conta a orientação de se posicionar no topo

de cada faixa. Como resultado, a GM evitou a competição direta entre suas unidades e ao

mesmo tempo ficou em vantagem na disputa com concorrentes que se concentravam

apenas em determinados segmentos. Ao longo da trajetória da GM, no entanto, o nível de

restrição das políticas se elevou e o espaço para as unidades de negócio explorarem a

versatilidade de seus agentes foi gradualmente reduzido.

O desenvolvimento de novos produtos é uma atividade amplamente relacionada

aos serviços de versatilidade. A análise da evolução deste processo na GM evidencia

efeito negativo dos métodos corporativos. Durante a depressão dos anos 1930, a

estratégia de pirâmide de marcas deu lugar ao compartilhamento de chassis e carrocerias

entre as unidades de negócio, a fim de explorar economias de escala e assegurar a

sobrevivência no mercado reduzido e mais sensível a preço. Com a estrutura do veículo

pré-definida pela GM, as divisões passaram a investir na diferenciação de seus produtos

desenvolvendo novos atributos mecânicos, de acabamento e design dos veículos. A GM

então desenvolveu procedimentos sistematizados para renovar a linha de produtos e

compartilhar as soluções entre as unidades de negócio. Estes foram os casos do porta-

malas inteiriço, os tetos turret tops, transmissão automática, novas suspensões e o design

rabo de peixe, dentre outros que na maioria das vezes foram lançados por uma divisão e,

nos anos seguintes, compartilhados com as demais. Os processos de disseminação de

inovações e melhores práticas, além de reduzir o espaço para desenvolvimento nas

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199

divisões, também acirraram a competição entre as marcas que passaram a oferecer

produtos cada vez mais similares.

Conforme os programas corporativos avançaram sobre as especificações dos

produtos, as divisões que dispunham de maior estrutura, corpo de engenharia e

orçamento para desenvolvimento apenas prolongaram a capacidade de desenvolver

novas ideias. No entanto, até o início dos anos 1970, todas as divisões de veículos,

inclusive a Chevrolet, líder de mercado à época, transferiu a definição de seus produtos, e

também de seus processos produtivos, para o staff de engenharia e para a GMAD. Ao

longo deste processo, relatos como o de John Delorean atestam a rivalidade emergente

entre divisões e organização corporativa, que neutralizou a cooperação entre as partes,

tornando as inovações cada vez mais raras.

Se por um lado a versatilidade foi reprimida nas unidades por sistemas

corporativos, por outro a GM não foi capaz de gerar em nível corporativo processos

integrados para incentivar uma alta capacidade de imaginação e visão de novos serviços

produtivos eficazes. Após o fracasso do copper-cooled, Charles Kettering continuou à

frente da organização de pesquisa da GM e contribuiu, juntamente com outros

pesquisadores e engenheiros, para inovações tecnológicas de extrema importância, como

a pintura duco, a gasolina com chumbo, a refrigeração com gás freon e motores e

locomotivas a diesel. A versatilidade de Kettering e sua equipe resultou em efetiva

expansão e criação de valor para a GM. Entretanto, nenhum desses casos resultou em

processos contínuos e integrados de inovação e sim em novas divisões autônomas. De

maneira semelhante, outra iniciativa, a Allisson Engineering, apesar da alta versatilidade

em produtos de elevado conteúdo tecnológico, tornou-se uma divisão que atuou de forma

isolada sobre suas inovações, como por exemplo, motores e turbinas de aviões, e a

transmissão automática para veículos pesados e equipamentos aeroespaciais.

O isolamento das atividades de pesquisa avançada como as de Kettering e da

Allison é evidente quando se observa a facilidade com que essas divisões foram

desligadas da GM sem alterar o andamento das demais. A própria atuação do Laboratório

de Pesquisa da GM deixou de apresentar inovações relevantes após a aposentadoria de

Kettering, em 1947. A GM voltou a anunciar grandes projetos de desenvolvimento de

tecnologia em 1970, iniciando pesquisas para lançar um carro elétrico. Porém, nem o

projeto do carro elétrico, nem o do carro do futuro, Saturn, no final da década de 1980,

foram realizações eficazes na criação de valor.

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200

Em termos corporativos, a principal contribuição para o desenvolvimento de novos

produtos se concentrou mesmo na decodificação e transferências de inovações. A

atividade que, no início, era intermediada de forma limitada por Durant, como nos casos

da Oldsmobile e Oakland, após 1920, evoluiu para procedimentos formais da organização

corporativa. Comitês técnicos, grupos de política de produtos, estúdio de design e staff de

engenharia foram algumas das formas como esta atividade se organizou. A atuação da

GM transformou-se em uma capacitação para replicar soluções entre as próprias divisões

e atualizar produtos em relação aos concorrentes. Tal capacitação determinou as práticas

competitivas da GM, sobretudo no período entre as décadas de 1950 a 1970. Neste

período, foram recorrentes as práticas de espionagem industrial e táticas deliberadas de

atrasar programas para poder adaptá-los em relação a inovações de outras fabricantes.

Após a má experiência com o copper-cooled, nos anos 1920, a GM só voltou a

empreender projetos de desenvolvimento de veículos pelo staff corporativo no final da

década de 1960. Entretanto, esses produtos, apesar da grande expectativa gerada,

apresentaram resultados apenas medianos ou baixos, como os casos do Chevrolet Vega

em 1970, o X-car em 1979, o GM-10 em 1986, o Saturn em 1991 e o EV1 em 1996.

A GM empreendeu diversos processos de expansão durante a década de 1980,

investindo grande quantidade de recursos. Contudo, os esforços produziram uma

expansão praticamente nula, evidenciando a baixa versatilidade da organização

corporativa. Os U$ 42 bilhões em automação de plantas, mais os investimentos em

aquisições como a EDS, Huges Aircraft, Lotus, as joint ventures com Toyota e Fujitsu-

Fanuc e projetos como o TRILBI e a Saturn Corporation não atingiram seus objetivos em

termos de criação de valor.

Habilidade na mobilização de recursos financeiros

A habilidade na mobilização de recursos financeiros desenvolvida pela General

Motors representou um diferencial vantajoso e decisivo em diversos momentos de sua

história. O adequado uso da reputação, a atenção com o retorno aos credores e a

capacidade de argumentar sobre a atratividade do negócio foram qualidades notórias de

William Durant que viabilizaram o financiamento da expansão da GM em sua formação.

Ao longo do tempo, as competências para prover recursos financeiros foram

aperfeiçoadas a partir do surgimento de uma ampla organização financeira, que soube

não só obter recursos externos de maneira vantajosa, como mobilizou grande geração e

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201

reinvestimento de caixa, importantes para impulsionar o crescimento e a manutenção de

uma posição dominante na indústria.

Durante os anos de formação da indústria automobilística nos Estados Unidos, o

acesso a recursos financeiros foi um dos fatores mais críticos para a sobrevivência das

empresas que emergiram. William Durant transpôs esse obstáculo explorando a

reputação de empreendedor visionário e de empresário respeitador de seus

compromissos com credores, que havia desenvolvido na cidade de Flint e em outras no

estado de Michigan. No percurso de levantar recursos para seus investimentos, Durant,

entre bancos, investidores e novos sócios, caminhou para os maiores mercados

financeiros dos Estados Unidos. Porém, seu ímpeto esbarrou na dificuldade em cumprir

com requisitos mínimos de organização da transparência e informação sobre as finanças

de seu grupo. Tais requisitos entraram forçosamente na GM durante a gestão dos bancos

em 1910, gestão na qual a organização aderiu à bolsa de Nova York.

Durant recorreu à associação a investidores como L. Kaufman, J. P. Morgan e a

Du Pont para se adequar às exigências de fornecimento de capital. A ligação com a Du

Pont contribuiu intensamente para manter alta a capacidade de mobilização de recursos

financeiros da GM. Homens como Pierre S. du Pont, John Raskob e Donaldson Brown,

vindos da Du Pont, além de Alfred Sloan e Albert Bradley, foram responsáveis pela

organização de processos que elevaram a qualidade deste serviço empreendedor.

A transição entre os métodos informais de Durant e a sofisticada organização

financeira começou com a criação do comitê de finanças, que inicialmente apenas

recolhia estimativas orçamentárias grosseiras e se incumbia da emissão de ações e

títulos de dívida. A este processo foram se somando seguidos avanços, como auditoria

externa, métodos de orçamento e projeção de mercado e sistemas de tesouraria. A

adoção de procedimentos como estes permitiu que a GM criasse, nos anos 1920, um

avançado processo de análise financeira, o standard-volume, que maximizou a aplicação

e a geração dos recursos. Com isto, a organização não só melhorou seu crédito no

mercado como criou uma máquina de geração de lucro e caixa sem iguais na indústria.

A reaplicação maciça dos recursos obtidos na operação foi algo frequente na

gestão de Durant. Porém, a partir dos anos 1920, a geração de caixa foi tamanha que,

apesar de período com tendência de crescimento acentuada e prolongada na indústria, a

GM foi capaz de, além de pagar dividendos crescentes, financiar seu processo de

expansão praticamente todo com recursos provenientes de sua própria operação. A

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202

disponibilidade de recursos financeiros permitiu que a GM criasse a GMAC, um braço

financeiro que pôde aplicar os excedentes na maior atividade de crédito ao consumo do

setor.

A distinta capacidade de mobilizar recursos financeiros assegurou por diversas

vezes uma posição vantajosa para a GM em relação a seus concorrentes. Por exemplo, a

mudança nos requisitos em favor de veículos menores anos após o Choque do Petróleo,

fez com que a GM batesse recordes de vendas, de lucro e de participação de mercado,

pois ao contrário de suas principais concorrentes, ela dispunha de recursos para renovar

toda sua linha de forma simultânea. Em outra situação, durante os anos 1980, a despeito

da extravagância de investimentos em expansões nulas, a GM ainda contou com recursos

para aplicar na promoção das vendas por meio de subsídios e descontos em

financiamento. Esta prática, aliás, foi recorrente durante boa parte do declínio crônico nas

vendas, durante os anos 1990 e 2000.

A reaplicação de recursos da própria operação predominou na maior parte da

história da GM. A captação por meio de endividamento ou ampliação de capital, que foi

recorrente na fase de formação da empresa, tornou-se rara entre os anos 1920 e 1980.

Neste período, a GM só realizou captações externas em momentos de maior

instabilidade, como a expansão das fábricas durante a Segunda Guerra, o plano de

expansão após a guerra da Coreia e o plano de redução de veículos após o primeiro

Choque do Petróleo. Em todos os casos a GM obteve recursos em condições vantajosas

em relação à indústria.

A partir da década de 1980, quando os indícios de declínio tornaram-se mais

aparentes e a organização realizou seguidos investimentos, tornou-se mais frequente a

contração de endividamento. Porém, vale destacar que a GM manteve seus títulos de

dívida com os ratings em mais alto nível junto às agências classificadoras de risco, até

poucos anos antes de ser obrigada a recorrer a empréstimos federais em 2008.

Julgamento diante do risco e da incerteza

A natureza deste serviço empreendedor o relaciona mais à adequação na coleta e

processamento de informações do que propriamente a traços pessoais dos membros da

organização. Neste sentido, o esforço diferenciado de Durant para avaliar riscos e

incertezas, apesar de terem viabilizado a constituição da GM, mostraram-se de alcance

limitado, principalmente em momentos de instabilidade econômica. Com as atividades

iniciadas sob influência da Du Pont, no entanto, a qualidade deste serviço foi

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significativamente aprimorada por meio da aplicação sistemática de recursos na

interpretação dos riscos e incertezas do ambiente.

Os serviços de julgamento da GM na gestão de Durant foram o resultado da

combinação de seu tino empresarial com a colaboração de uma ampla rede de

relacionamentos da qual ele obtinha informações. Atuando desta forma, Durant

desenvolveu importantes noções sobre diversos riscos ao seu negócio, como por exemplo

a instabilidade no fluxo de matérias-primas, a volatilidade de inovações tecnológicas, a

potencial desvantagem de baixa economia de escala e a alta demanda por recursos

financeiros para sustentar a pesada estrutura de custos fixos. A reação da GM para

mitigar estes riscos contribuiu para respostas como diversificação de investimentos em

novas tecnologias e patentes, aquisição e associação a fornecedores, ampliação da

produção via aquisição e expansão orgânica, e busca para ampliar fornecedores de

capital.

Apesar da ampla coleta de informações e a diferenciada qualidade no julgamento,

Durant foi também conhecido pela aversão em lidar com a organização das informações e

pela abordagem superficial e informal a diversas questões. Tal característica impôs

limitações à qualidade do julgamento da GM, e a expôs a riscos quase fatais. À frente das

operações, Durant enfrentou quatro situações de desaceleração nas vendas da indústria.

Em duas delas, em 1907 e em 1918, a GM saiu ilesa, porém tanto em 1910 quanto em

1920, Durant não foi devidamente precavido contra ameaças à continuidade da GM. Em

ambos os casos, a saída de Durant do comando da organização foi posta como condição

para salvar a empresa.

A influência da Du Pont sobre os julgamento de riscos e incertezas começou com

a realização de estudos em caráter consultivo, como os realizados por E. Bergland e John

Pratt e Alfred Sloan, que inicialmente alertaram para vulnerabilidades da organização.

Após a saída de Durant, estudos pontuais deram lugar a equipes de staff consultivo de

finanças e de operações, que além de identificar riscos também passaram a propor

soluções para evitá-los. O trabalho dos staffs para a análise deste serviço empreendedor

representou a aplicação de recursos na busca pela identificação e neutralização de riscos

e incertezas, melhorando-o significativamente.

Adicionalmente, a instituição de princípios de retorno sobre o investimento e de

métodos de planejamento e controle nas decisões da GM determinou um sistema formal

para avaliar os riscos envolvidos ao longo da cadeia de decisões da empresa. Processos

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como monitoramento de estoques, projeções de demanda, sistemas orçamentários,

programas de desenvolvimento de produtos, projeções de fluxo de caixa, dentre vários

outros, permitiram que a GM transpusesse, sem apresentar prejuízos, situações

altamente hostis, como por exemplo a grande depressão, as negociações sindicais dos

anos 1930 e 1940, a Segunda Guerra, a Guerra da Coreia e o Choque do Petróleo.

Mesmo quando a GM, na década de 1980, realizou uma desastrada sequência de altos

investimentos com crescimento nulo, a operação contou com serviços eficientes de

julgamento que amenizaram o efeito desses insucessos, possivelmente evitando um

declínio ainda mais acelerado.

4.2.2. Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico

Segundo Felck (2006), respostas positivas ao desafio da navegação no ambiente

dinâmico referem-se ao contínuo monitoramento do ambiente e ao uso adequado de

respostas estratégicas (OLIVER, 1991), assegurando legitimidade e oportunidades para

captura de valor. As evidências encontradas na análise da trajetória da General Motors

indicam a existência de traços consistentes de aplicação de recursos para o

monitoramento do ambiente e uso ativo das respostas estratégicas. A resposta da GM a

este desafio apresentou a característica de explorar sua distintiva vantagem de

mobilização de recursos financeiros, aplicando-os para negociar, cooptar e controlar

processos externos, e assim moldar o ambiente. A GM obteve êxito ao moldar o ambiente

externo, especialmente nos processos de institucionalização da indústria automobilística.

Contudo, apesar de ter assegurado legitimidade e relevante captura de valor por pelo

menos oito décadas, a insistência nesta resposta não impediu a deterioração das

margens quando houve mudanças na rivalidade do ambiente competitivo.

Contínuo monitoramento do ambiente

Assim como buscava informações para exercer o julgamento de riscos e

incertezas, a GM, por meio de Durant e sua rede de relacionamentos, exercia o

monitoramento do ambiente. O comandante da GM peregrinava pelo país e nutria

relacionamentos com as diversas pontas de seu negócio. Políticos, advogados,

empresários, concorrentes, banqueiros, fornecedores, concessionários, pesquisadores e

pilotos de corrida são alguns típicos perfis de pessoas com quem Durant dialogava

frequentemente. Não obstante, a GM também contava com diversos gerentes e

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associados que também contavam com suas próprias fontes de informação e

eventualmente as compartilhavam com Durant.

Atuando desta forma, a GM manteve-se em contato com as expectativas e

exigências de seus múltiplos stakeholders e sobre as tendências da indústria. Apesar do

caráter informal e intuitivo das ações de Durant em relação a este aspecto do desafio de

navegação no ambiente dinâmico, é possível afirmar que a GM antecipou as dinâmicas

de mudança do ambiente externo, ou no mínimo esteve atualizada em relação elas. Tal

condição permitiu que a organização atuasse adequadamente, por vezes até com

pioneirismo, em questões como a disputa por patentes e inovações tecnológicas,

restrições de insumos produtivos, consolidação dos padrões da indústria, necessidades

da demanda, e desenvolvimento de mão-de-obra para as plantas, cumprimento de

exigências legais e ampliação de fontes de capital.

As gestões pós Durant, de Pierre S. du Pont e de Alfred Sloan, acrescentaram à

GM a regularidade e a sistematização na análise do ambiente por meio de processos

como estudos de força-tarefa, sistemas de coleta de informações, pesquisas de mercado,

contratação de consultorias, criação de equipes de staff especializados e de programas

dotados de etapas formais de supervisão e checagem das ações e do ambiente. O

estabelecimento destes processos permitiu à GM desenvolver regularidade no

monitoramento do ambiente e adequada precisão nas informações obtidas. Exemplos da

qualidade destes processos foram: as pesquisas sobre percepção de marca e

comportamento do consumo na década de 1920, os estudos sobre o ambiente do pós-

guerra, os sistemas de projeção da demanda e monitoramento de preços,

desenvolvimento e exposição de protótipos para avaliar a reação do público, espionagem

industrial e sindical, e hierarquias de comitês para mediação com sindicatos e a rede de

distribuidores.

Durante sua história, alguns eventos indicaram falhas nas respostas da GM em

lidar com certas mudanças no ambiente, como por exemplo o surgimento do mercado de

carros compactos, as preocupações com segurança e emissões de poluentes, novas

exigências de qualidade e as filosofias e métodos de produção enxuta. Contudo, em

nenhum dos casos estudados é possível indicar que as falhas da GM estiveram

relacionadas ao fraco monitoramento do ambiente. A tendência de carros compactos foi

detectada na GM logo após a Segunda Guerra, significativamente antes da entrada do

Volkswagen Fusca no final da década de 1950. Nos casos de preocupações com níveis

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de segurança, emissões e qualidade dos veículos, em todos os casos há evidências de

que a mudança no ambiente foi percebida pela organização. O mesmo ocorreu com o

surgimento das técnicas japonesas de produção, dado que a GM desenvolveu ligações

com Isuzu, Suzuki e Toyota e teve oportunidades efetivas de acessar seus métodos.

Manutenção da legitimidade e captura de valor

O surgimento do automóvel nos Estados Unidos gerou grande expectativa na

população americana. Logo o crescimento das vendas foi tão acelerado e as

oportunidades de captura de valor tantas que houve uma enorme proliferação de

fabricantes. As características do ambiente para essa indústria representaram desafios

críticos para a GM e seus concorrentes. A complexidade do novo produto, a evolução da

tecnologia, a ausência de regulamentações específicas, o estágio incipiente de algumas

indústrias e estruturas correlatas são alguns dos aspectos que marcaram está época.

As evidências revelam respostas ativas da GM e de Durant em relação ao

ambiente externo, como por exemplo a resistência oportunista contra a ALAM, o

investimento em equipes de corrida, as campanhas para atrair trabalhadores para Flint, a

mudança do registro para Nova Jersey, as lojas com exposição de produtos e a

assistência pós-venda. Todavia, as ações mais importantes deste período estiveram

relacionadas a quatro temas: a alta demanda por investimentos de capital, a instabilidade

do fluxo de insumos produtivos, o intenso surgimento de inovações tecnológicas e a

corrida por economias de escopo e escala. Nessas quatro frentes, a GM procurou

desenvolver respostas ativas que a conferiram vantagens que a distinguiram de seus

concorrentes, colocando-a em condições de criar valor.

Ao desenvolver fornecedores de capital, a GM usou amplamente a reputação de

William Durant como tática de influenciar investidores, persuadiu bancos oferecendo

remuneração favorável nos empréstimos, cooptou acionistas importantes, dentre eles a

família Du Pont, e aceitou fazer concessões de controle nas crises de 1910 e 1920. Em

todos os casos, de forma recorrente e muitas vezes explícita, houve a expectativa do

oferecimento de retornos excepcionais aos fornecedores destes recursos.

Para lidar com o fluxo de insumos produtivos e a volatilidade de inovações, a GM

utilizou táticas de cooptação por meio da aplicação de recursos excedentes na aquisição

de empresas e de patentes. Ao adquirir diversos fornecedores e empresas que

trouxessem novas tecnologias, pesquisadores e engenheiros, a GM pode prevenir

diversas situações que naquele período contribuíram para o fracasso de concorrentes, os

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quais optaram por estratégias diferentes. Portanto, apesar de muitas dessas aquisições

terem fracassado e representado perdas, a resposta pode ser considerada positiva.

Em relação às ameaças à baixa economia de escala, as respostas da GM foram

de cooptar fabricantes a atuar dentro de sua corporação em um processo de crescimento

horizontal via aquisição. Por outro lado, a GM também procurou controlar este processo

investindo amplamente na expansão da rede de distribuição e da capacidade produtiva,

além de insistir no oferecimento de veículos mais baratos, como o caso do Chevrolet 490.

Ao final da gestão de Durant, a Ford havia alcançado significativa vantagem de escala,

pois priorizou o investimento na produção em massa de seu Modelo T. No entanto, a

desvantagem da GM não representou um erro fatal. Nos anos seguintes, a GM, além de

equiparar as técnicas de produção mimetizando a própria Ford, foi capaz de usar

ativamente respostas estratégicas que moldaram o ambiente a seu favor.

A partir dos anos 1920, a evolução das forças competitivas (PORTER, 1979)

ampliaram a oportunidade para captura de valor. As altas economias de escala, tendo a

Ford como principal expoente, tornaram-se uma barreira a novos entrantes e contribuíram

para o shakeout na indústria. Sem fortes substitutos e com significativas barreiras de

entrada (PORTER, 1979), restou à GM disputar a rentabilidade da indústria com a Ford,

uma vez que ambas controlavam boa parte de suas cadeias produtivas até o consumidor

final. Durante este período, a GM empregou diversos processos para moldar os hábitos

de compra e uso de veículos nos Estados Unidos, dentre eles o financiamento ao

consumidor, o incentivo a troca anual dos modelos, a diferenciação de estilo e a qualidade

entre as marcas, o uso de carrocerias fechadas e a criação do mercado de carros usados.

A General Motors ainda contou com a desatenção da Ford em relação a essas mudanças

no ambiente e neutralizou as desvantagens de escala da concorrente.

O espaço criado pela GM para captura de valor foi tamanho que, durante a

depressão dos anos 1930, a pior crise econômica da história dos Estados Unidos, a

organização foi capaz de manter-se rentável, mesmo com a indústria reduzida a ¼ de seu

volume de vendas. Além disso, com a margem de lucro gerada na operação, Alfred Sloan

e a família Du Pont puderam instituir generosas metas de retornos sobre o investimento

para o acionista e ainda obter todo o financiamento necessário para a expansão da

General Motors. A partir dos anos 1930, as ameaças à GM vindas dos concorrentes foram

seguidamente neutralizadas por meio do ativo uso de respostas estratégicas de imitar

eventuais inovações de produtos, mesmo que isso apresentasse um custo adicional, e

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também de controlar as práticas do mercado, usando as vantagens de tamanho que

adquiriu para determinar preços e configurações de produtos.

Outras respostas ativas da GM para manter a captura de valor após a conquista

de uma posição hegemônica na indústria envolveram também outros stakeholdes da

organização. Por exemplo, as reivindicações sindicais nas décadas de 1930 e 1940

levaram a um intenso processo de negociação marcado por resistência e barganha no

início, porém culminando com a instituição de processos de pacificação, que passaram a

mediar a distribuição de recursos, minimizando a resistência. Durante a Segunda Guerra,

a GM influenciou fortemente o governo dos Estados Unidos, persuadindo-o à elaboração

de propostas de contratação de forma a favorecer as vantagens de escala que possuía.

Já na década de 1950, a GM coordenou a ação com outras indústrias para influenciar a

criação de um plano nacional de construção de estradas.

A segunda metade da década de 1960 marcou uma inflexão na legitimidade da

indústria automobilística nos Estados Unidos e em especial sobre a GM. Até então as

pressões da sociedade americana limitavam-se ao julgamento sobre a conformidade em

relação às leis existentes, como por exemplo a defesa da concorrência, que impôs o

ajustamento dos contratos da GMAC com distribuidores, o desinvestimento nas empresas

de aviação, a venda da operação de ônibus e o desligamento da Du Pont como acionista.

Entretanto, as pressões mais significativas foram decorrências de emergentes

preocupações da sociedade sobre a responsabilidade da empresa em questões como

segurança dos veículos, poluição do ar nas cidades, economia de combustível e

qualidade dos produtos. Tais movimentos questionaram mais fortemente a legitimidade da

GM, pois tiveram ampla mobilização dos cidadãos e dos governos, exigindo adequação a

padrões antes inexistentes.

Após a atuação desastrada no caso do Corvair, em 1965, quando

equivocadamente desafiou os questionamentos do senado americano e de Ralph Nader,

a GM não repetiu a mesma resistência quando viu sua legitimidade questionada. As

evidências indicam que nesses casos que envolveram a responsabilização do fabricante

sobre os efeitos do automóvel na sociedade, a GM optou por adotar respostas de

negociação mais passivas, baseadas mais na acomodação e pacificação do que

propriamente na barganha. Este tipo de atuação da GM predominou durante as

mobilizações para a criação de políticas e regulamentações, como a lei nacional de

segurança de veículos, a lei federal do ar limpo e a CAFE.

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O êxito na entrada de Toyota, Honda e Nissan no mercado americano aumentou

gradualmente a rivalidade na indústria a partir do final da década de 1960. A resposta

imediata da GM seguiu o padrão utilizado até então contra Ford e Chrysler de procurar

controlar a disputa usando sua força para ocupar os espaços. O lançamento do Vega, em

1970, foi a segunda tentativa de entrar no mercado de carros compactos, porém, assim

como no caso do Corvair, a GM foi incapaz de produzir o veículo a que se propôs.

A presença dos concorrentes japoneses foi impulsionada com o Choque do

Petróleo de 1973, pois estes, além do atrativo ligado ao menor consumo de combustível,

puderam ter a qualidade de seus veículos mais conhecida. Embora nos primeiros anos

pós-choque a GM tenha se favorecido devido aos problemas de caixa de Ford e Chrysler,

a pressão da concorrência dos produtos japoneses continuou aumentando nos anos

seguintes. Após a segunda crise do petróleo, a partir de 1979, a ameaça ganhou novo

impulso e a GM passaria a década seguinte em uma ativa cruzada competitiva, colocando

em prática uma ampla gama de respostas estratégicas, por vezes divergentes.

Uma das primeiras ações para recuperar as vendas foi negociar com o

consumidor. A GM passou a oferecer parte da sua margem na forma de descontos ou

redução dos juros em troca da preferência por seus produtos. No discurso à imprensa, o

CEO George Smith desfiou ataques à competição desleal da mão-de-obra asiática e

acusou sindicatos americanos de promover desvantagens competitivas. Quando esteve

diante do governo americano, procurou influenciá-lo a criar barreiras à importação, como

também a estabelecer acordo comercial com o México para obter acesso à mão-de-obra

mais barata. Posteriormente, se por um lado a GM negociou acordos sindicais mais

favoráveis, ela também cooptou as montadoras japonesas Suzuki e Isuzu, nas quais

adquiriu participação, a importar veículos que completavam a linha de compactos. Em

relação a produção nos Estados Unidos, a GM ao mesmo tempo que evitou os métodos

de produção japoneses apostando na tecnologia da informação em projetos como o

Trilbly e a Saturn, também cooptou a Toyota para associarem-se na criação da NUMMI.

A resposta mais significativa em termos de aplicação de recursos foi a corrida para

expandir a fronteira tecnológica. A série de aquisições de empresas de tecnologia,

robótica e processamento de dados, somada aos investimentos em novas plantas

automatizadas, representou a tentativa de desafiar as pressões e ao mesmo tempo

controlar o avanço tecnológico. O baixo resultado das respostas estratégicas conduzidas

ao longo da década de 1980 forçou a GM a entrar em conformidade com as exigências de

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210

seus acionistas, reduzindo os investimentos e negociando o nível da demanda com o uso

de incentivos de preço e financiamentos.

Durante as décadas de 1990 e 2000, a GM limitou-se a respostas de aceitação às

pressões institucionais, procurando imitar produtos e entrar em conformidade com novos

padrões de qualidade; passou a evitar confrontos competitivos ao desfazer-se aos poucos

de partes de sua operação e concentrar-se em segmentos de altas margens e, por fim,

negociar incentivos à demanda, cedendo suas margens para manter a operação rodando.

4.2.3. Desafio da Gestão da Diversidade

O desenvolvimento da integridade organizacional foi um desafio persistente ao

longo da trajetória General Motors, com o qual os gestores tiveram dificuldades em

apresentar soluções plenas. Ao conduzir a formação inicial da GM em uma holding

fragmentada e heterogênea, Durant ofereceu uma resposta que promoveu pouco

compartilhamento de recursos e foi limitada no oferecimento de processos de

coordenação. A evolução da estrutura para a empresa multidivisional foi acompanhada da

sistematização de procedimentos para identificar e promover o compartilhamento e

intercâmbio de recursos entre as divisões, na busca de economias de escala, escopo e

velocidade (Chandler, 1977).

Contudo, a ampliação do vínculo entre as partes da organização não foi

devidamente seguida do desenvolvimento de capacitações de coordenação eficazes. Em

vez disso, a GM procurou resolver as divergências com origem na heterogeneidade entre

as divisões por meio de processos corporativos de arbitragem, que gradualmente

acirraram a rivalidade entre divisões e organização corporativa. Os efeitos da resposta

negativa a este desafio levaram à redução da propensão à cooperação e incentivaram a

criação de um aparato corporativo excessivamente pesado para acomodar as diferenças

entre as partes.

Compartilhamento e intercâmbio de recursos

Durante o período de formação da General Motors diversas empresas foram

reunidas dentro da mesma holding. Os principais recursos compartilhados foram os

serviços empreendedores de Durant, em especial a habilidade em mobilizar recursos

financeiros. Outras relações de intercâmbio de recursos existiram na forma de

transferência de tecnologias e patentes, como por exemplo o uso da estrutura do Buick

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211

para o novo Oldsmobile, além, claro, da transferência de componentes das empresas

fornecedoras, mesmo sob uma relação típica de mercado.

Nos períodos em que esteve à frente da GM, Durant foi o principal responsável por

identificar recursos homogêneos e oportunidades para estabelecer relações de

compartilhamento. Porém, a informalidade e a superficialidade com que as questões eram

abordadas pelo comandante da GM representaram uma barreira para a qualidade desses

processos. Por outro lado, embora o nível do relacionamento entre as empresas tenha

significado um vínculo relativamente superficial, tratava-se do compartilhamento de

recursos extremamente valiosos naquele contexto da indústria. O acesso a

financiamentos para expansão, inovações tecnológicas e contínuo fluxo de insumos

mostrou-se suficiente para justificar que as partes permanecessem ligadas à organização

naquele momento.

Em 1910, ocorreram os primeiros esforços sistematizados para identificar

oportunidades de compartilhamento de recursos. A gestão do consórcio de bancos

credores promoveu a harmonização dos procedimentos contábeis e usou de cálculos

estatísticos para avaliar as diversas empresas que compunham a GM. O resultado foi a

fusão e absorção de diversas empresas para formar, por exemplo, a GM Trucks e a

Peninsular, bem como a venda de outras avaliadas como sendo de baixa viabilidade. Esta

gestão também desenvolveu novos processos compartilhados pelas unidades de negócio,

como o primeiro laboratório de testes, a GM Exports e revista Insider.

Na segunda gestão de Durant, novas empresas foram incorporadas à GM para o

fornecimento de produtos e serviços às demais fabricantes. A GMAC, a Fisher Body e a

New United ampliaram a transferência de recursos importantes para as divisões de

veículos, tais como serviço de crédito ao consumidor, componentes, carrocerias e

inovações tecnológicas. A partir de 1918, todas as empresas do grupo foram convertidas

em divisões. A GM formalizou a estrutura corporativa em divisões, em substituição à

holding. Porém, nos anos imediatamente seguintes, a operação das divisões permaneceu

sem alterações relevantes.

No início da década de 1920, a adoção de novos processos de sistematização de

procedimentos e de busca por soluções contribuíram imediatamente para novas ações

que significaram a ampliação de recursos compartilhados. Uma delas foi a unificação do

caixa das divisões, que veio acompanhada de métodos e regras sofisticadas de controle.

A outra foi a identificação da ameaça, comum às divisões de veículos que representava a

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produção em massa da Ford. Esta noção resultou no desenvolvimento de uma estratégia

comum de segmentação entre as divisões de veículos para dominar os espaços do

mercado.

A atuação de grupos e comitês consultivos, como o de vendas e o de produtos,

passou sistematicamente a identificar novas oportunidades de combinar e compartilhar

recursos entre as unidades, a disseminação de melhores práticas de engenharia, a

cessão de tecnologia de motor entre divisões ou a formação e equipes multidivisionais de

engenheiros para desenvolver novos componentes foram algumas formas pelas quais o

intercâmbio de recursos entre divisões ampliou-se.

Na década de 1930, o ambiente hostil da Grande Depressão acelerou o

compartilhamento de recursos entre as divisões. A quantidade de chassis e carrocerias foi

reduzida a três opções de tamanho, de modo que as divisões compartilhassem um tipo de

chassis com pelo menos mais uma divisão. A operação de marketing e vendas das três

divisões menores, Buick, Oldsmobile e Pontiac, foram unificadas em uma única

organização, a BOP, enquanto Chevrolet e Cadillac permaneceram separadas. Ao final da

depressão, a BOP foi desfeita, mas o compartilhamento de chassis continuou.

A partir de 1934, a padronização do fluxo de desenvolvimento de novos modelos

aplicado em todas as divisões e supervisionado pelo staff corporativo de engenharia

estabeleceram processos formais de identificação e transferência de recursos entre as

divisões. A programação do desenvolvimento de novos modelos da forma como foi

estabelecida promoveu acelerado intercâmbio e compartilhamento de recursos por um

longo período. As equipes de staff e os comitês corporativos também padronizaram e

compartilharam procedimentos relativos a outras áreas além do desenvolvimento de

produtos. Modelos de contratos para a rede de distribuição e sistemas de avaliação de

desempenho, de promoção e de bonificação foram disseminados a partir desta época.

Na década de 1950, o uso da informática para a organização dos processos

produtivos permitiu ampliar o compartilhamento de recursos, uma vez que praticamente

todas as opções de peças, acessórios, recursos de acabamento e design puderam ser

disponibilizados aos modelos das várias divisões. Com isso, o staff de engenharia

promoveu ampla comunização das plataformas de veículos por meio das marcas de cada

unidade de negócio. Avançando as relações de compartilhamento, entre 1965 e 1971, a

GM formou a divisão GMAD e estabeleceu a unificação dos recursos produtivos de todas

as divisões de veículos e da Fisher Body, fornecedora de carrocerias.

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A organização da GMAD parece ter sido o ápice do vínculo de compartilhamento

de recursos na General Motors. A partir do final dos anos 1960 e início dos 1970, a GM

iniciou uma reação a crescentes ameaças a sua competitividade, cujos efeitos

desencadearam um longo ciclo de cisão, venda e terceirização das atividades.

Em 1968, foi vendida a Euclid, de máquinas e equipamentos pesados, e em 1979

a divisão de eletrodomésticos Frigidaire. Na década de 1980, a GMAD foi desfeita e duas

divisões autônomas de veículos foram criadas, a BOC e a CPC. Operações deficitárias de

autopeças foram vendidas, fechadas ou absorvidas por outras divisões. A área de

processamento de dados da GM foi transferida para a EDS, que passou a funcionar como

um fornecedor externo. Outros investimentos para produzir novas tecnologias e depois

serem transferidas para as operações de veículos foram conduzidos de forma isolada,

como a joint-venture para desenvolvimento de robôs, a aquisição da Huges Aircraft, a

NUMMI e a criação da Saturn Corporation e da Lotus.

Nos anos 1990, a GM unificou suas áreas de compras no intuito de produzir

economias de escala. Desfez-se de diversas operações iniciadas na década anterior,

como a EDS e a Huges Aircraft e, além disso, unificou suas operações de autopeças com

a criação da Delphi e, posteriormente, vendeu sua participação. No final da década de

1990 e nos anos 2000, a GM passou a converter suas plantas para um sistema de

consórcio modular, terceirizando boa parte das operações de montagem e passando

parte dos custos fixos e do risco para fornecedores. Finalmente, o declínio continuado

levou à venda de diversas operações autônomas, como Electromotive, GM Defense,

GMAC, Allisson, e participações em Isuzu e Suzuki.

Capacitações de coordenação

A holding criada por Durant reuniu sob o nome da General Motors um conjunto de

empresas autônomas, praticamente em regime de gestão de portfólio (PORTER, 1987).

Foi comum nesta fase, após adquirir uma empresa, Durant mantê-la operando da mesma

maneira que fazia antes de esta entrar para a GM, como foi o caso da Cadillac. As

evidências referentes ao período inicial indicam uma ocorrência praticamente nula de

processos de coordenação. Ocasionalmente, Durant era levado a intermediar ações

conjuntas ou transferência de tecnologias entre unidades, porém, o fazia com

envolvimento superficial e informal. Em outros raros casos, processos de cooperação

entre empresas emergiram a partir do convívio social entre membros da organização.

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Os limitados processos de coordenação da GM de Durant e o alto grau de

autonomia de unidades de negócio ocasionalmente acirraram a rivalidade sobre da

utilização dos recursos, como as divergências sobre a produção em período de guerra

que causaram a saída de Henry Leland da Cadillac. No entanto, de uma maneira geral os

momentos críticos de impasse na relação entre unidades de negócio e a GM tiveram

como resposta processos de acomodação das posições. Em casos onde houve disputa

por recursos escassos entre as divisões, como nas crises de 1910 e 1920, a resposta da

GM foi de negociar novos recursos. Nesses dois casos especificamente coube a uma

direção externa arbitrar sobre a distribuição. É evidente que as condições da indústria em

forte expansão e sem concorrentes dominantes, aliadas à capacidade de Durant para

mobilizar recursos financeiros em condições vantajosas, permitiram à GM prolongar a

situação na qual manteve recursos compartilhados apenas superficialmente e, ao mesmo

tempo, dispensou a cooperação entre as unidades de negócio.

No início dos anos 1920, dois processos ampliaram recursos compartilhados entre

as divisões: a unificação do caixa e a estratégia de pirâmide de marcas contra a Ford. Em

ambos os casos, a coordenação entre as partes não seguiu o caminho da cooperação,

mas novamente o de acomodação por meio da arbitragem, desta vez na forma de

políticas corporativas que delimitaram a atuação de cada divisão. A principal instância

responsável pela arbitragem foi o comitê executivo nomeado por Pierre S. du Pont, que

além dele incluíam Alfred Sloan, John Raskob e J.A. Haskell, com Sloan sendo o único

com experiência na indústria automobilística. Cabe ressaltar que, para estas deliberações

do CE terem produzido um resultado esperado, a sistematização de procedimentos e a

adoção de métodos sofisticados de análise foram decisivos.

Pierre S. du Pont também tentou avançar no intercâmbio de recursos entre

divisões da GM, com o desenvolvimento de um novo veículo com motor refrigerado a ar, o

Cooper-cooled. Novamente, a coordenação do processo foi estabelecida através de uma

decisão arbitrária do comitê executivo. O novo veículo envolveria o Laboratório de

Pesquisas da GM, Chevrolet e Oakland, sendo que o Laboratório conduziria o

desenvolvimento e, posteriormente, transferiria para que as duas divisões o produzissem.

A Chevrolet se viu forçada a aceitar as ideias do CE, porém evitou contribuir para o

desenvolvimento que, após sucessivos fracassos, foi descontinuado.

Por determinado período dos anos 1920, a GM foi capaz de promover relativa

cooperação na coordenação entre as divisões. Contribuiu para isso uma série de

mudanças efetuadas por Alfred Sloan, depois que ele assumiu a presidência da GM.

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Sloan indicou para compor o CE da GM Charles Mott e Fred Fisher, executivos que, como

ele, haviam amplo relacionamento com todas as divisões, pois, em boa parte de suas

carreiras, tinham sido fornecedores com relevante nível de cooperação com as principais

divisões. Além disso, Sloan ativou o Comitê Operacional (CO) formado por gerentes das

divisões, que passou a supervisionar a atividade do staff. O staff de operações, formado

pelos comitês técnicos geral e de vedas, passou a conduzir grupos de estudo e equipes

força-tarefa, formados por membros das divisões, que avançaram em inovações em áreas

como transmissão, estruturas, suspensão e design.

A partir de 1930, o compartilhamento de recursos aumentou devido à unificação

das carrocerias e chassis para enfrentar a depressão econômica. No entanto, ao invés de

ampliar os processos de coordenação, a GM retrocedeu. Após a curta experiência da

BOP, as divisões permaneceram autônomas e os membros das divisões que participavam

nos grupos e comitês de staff foram substituídos, assim como os gerentes que faziam

parte do CO. Este comitê, que permitia às divisões influenciar a formulação de políticas

corporativas, foi extinto por um período e, depois da Segunda Guerra, retornou sob o

nome de Comitê de Administração, porém sem a atribuição de sugerir ou vetar políticas.

A criação de um programa padronizado de desenvolvimento de novos modelos

acelerou o intercâmbio de soluções entre as divisões e também a atualização dos

produtos em relação a inovações de concorrentes. A arbitragem através de políticas

permaneceu o principal mecanismo para acomodar as divergências entre as divisões.

Com o tempo, sistematizou-se também uma hierarquia de grupos de staff e comitês. O

CE e o CF continuaram as instâncias mais altas e, entre eles e as divisões, nove grupos

de políticas e diversos comitês foram criados.

À exceção do período da Segunda Guerra, quando a organização se

descentralizou amplamente para fornecimento de equipamentos bélicos, a forma como a

GM se organizou produziu um amplo potencial de divergências entre as divisões. O caso

descrito por John Delorean em sua biografia retrata o efeito negativo do sistema de

comitês de arbitragem em relação à coordenação: a programação de vendas das divisões

era superestimada por seus gerentes, de forma que a somatória das divisões era

frequentemente superior à capacidade. A acomodação dos volumes era, então, arbitrada

no comitê de vendas, formado por membros do staff corporativo, com base nas

estatísticas do histórico de vendas dos modelos. Portanto, se a divisão percebesse uma

oportunidade de reposicionar determinado produto com baixo desempenho nas vendas e

desenvolvesse alguma espécie de promoção, se a demanda aumentasse, fatalmente o

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produto não estaria disponível nas lojas, pois a ordem de aumento na produção teria sido

vetada em função do histórico.

Ao ocupar a presidência da GM na década de 1950, Harlom Curtice, promoveu

mudanças na organização corporativa, a fim de lidar com os processos de coordenação

das atividades. Ao estabelecer relação direta com equipes de staff e também com as

divisões, Curtice substituiu parte da hierarquia de comitês e passou ele mesmo a orientar

a formulação e a arbitrar as políticas da GM. Após a aposentadoria de Curtice, seus

métodos foram devidamente reprovados pela organização corporativa, que reformulou as

atribuições dos comitês no formato similar ao anterior, porém tornando ainda menos

influente a participação do CA, que passou a ter um caráter meramente consultivo.

Com os veículos cada vez mais semelhantes entre as divisões, a rivalidade entre

elas também aumentou. Para encontrar saídas para seus problemas competitivos

algumas divisões procuraram se diferenciar. A Pontiac, na década de 1950, adotou o

estilo mais esportivo em seus veículos; a Chevrolet também seguiu essa linha. Porém o

processo de desenvolvimento de novos modelos, conduzido pelo staff corporativo, passou

a ser cada vez mais detalhado sobre as especificações dos produtos, deixando pouco

espaço para a atuação das divisões. Tal nível de interferência das deliberações

corporativas aumentou o potencial de divergência entre divisões e staff. Nesta situação,

duas distorções principais dos processos de coordenação foram identificadas: uma foi a

ocultação de projetos nas divisões, como no caso do GTO, desenvolvido às escondidas

pela Pontiac, em 1966; a outra distorção foi a orientação das ações para a aprovação, ou

seja, as divisões passaram a planejar suas ações, como campanhas publicitárias, com o

objetivo de serem aprovadas nos comitês e não de terem a mensagem e a forma mais

apropriadas.

O esgotamento do processo de acomodação arbitrária entre as diferenças das

divisões fez com que a organização corporativa absorvesse parte das atividades das

divisões. Com os programas de comunização de peças e a GMAD estabelecidos ao longo

da década de 1960, a partir dos anos 1970 a GM gradualmente passou o

desenvolvimento de veículos das divisões para o staff corporativo de engenharia. Assim,

as divisões deixaram de conceber e de montar seus produtos, limitando-se a realizar a

promoção, a comercialização e a entrega dos veículos, ou no máximo, a criar derivações

dos veículos a partir de combinações de acabamento, como o Chevrolet Nova, derivação

esportiva do Vega.

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No início da década de 1980, após registrar queda no desempenho financeiro e

seguidas crises na qualidade dos produtos, o recém empossado presidente George Smith

promoveu uma ampla reorganização. A GM desfez a GMAD e organizou-se em duas

grandes divisões, a CPC e a BOC. No nível das divisões foi realizada também uma

restruturação envolvendo a substituição da estrutura em departamentos por

funcionalidade por outra organizada em torno de gerentes de produtos. Na área de

engenharia, duas equipes distintas para cada divisão foram formadas. Toda a concepção

e aprovação dessas medidas ocorreram no nível corporativo. Por exemplo: a seleção e a

formação das equipes e dos gerentes para cada área foi conduzida por uma equipe de

força-tarefa que entrevistou e analisou os membros da organização.

As dificuldades enfrentadas pela GM no início da década de 1980, prejuízo e

problemas crônicos com qualidade, levaram o CE a deliberar uma série de planos de

mudanças radicais, a fim de dar novos rumos para a organização. Fusão das divisões de

veículos e da GMAD em duas, CPC e BOC, substituição de departamentos por gerentes

de produtos, aliança para fabricação de robôs, construção de plantas automatizadas,

aquisições de EDS, Huges Aircraft e Lotus, criação da Saturn e da NUMMI foram as

principais ações. As decisões arbitrárias do CE foram acompanhadas de processos de

coordenação, baseados apenas no cumprimento da programação formulada pelos

comitês e equipes de força-tarefa. Nenhuma das ideias alcançou os objetivos traçados.

Na maioria delas houve um baixo nível de cooperação; integrantes e partes da

organização que foram colocados para trabalharem juntos desenvolveram rivalidade,

redes informais foram desfeitas de uma hora pra outra, houve atrasos em alguns

programas e gastos extraordinários para corrigir problemas em outros.

Pressionada pelos maus desempenhos, a GM anunciou seguidos planos de

redução de custos no final dos anos 1980 e início dos 1990. Alguns dos planos

estabeleceram programas de demissão, que em diversos casos, definiu metas de

redução, por departamento. Este processo seguiu a prática de deliberação de políticas, no

entanto a baixa coordenação entre comitês de políticas e departamentos nas divisões

refletiu na implementação da decisão, a necessidade de contar com os serviços de

pessoas que tinham de ser demitidas fez com que parte dos profissionais fossem

recontratados sob contratos de terceirização.

No final da década de 1990, a terceirização foi anunciada como alternativa para a

competitividade em custos. As plantas passaram a ser operadas por terceiros, regidos por

contratos minuciosos de fornecimento. Esta alternativa reforçou a utilização de processos

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de acomodação e arbitragem de políticas, neste caso, na forma de contratos associados a

um forte aparato analítico provido pelo staff corporativo.

4.2.4. Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos

A análise histórica da General Motors fornece evidências de que a organização

manteve processos voltados para antecipar a necessidade de recursos gerenciais.

Embora de uma natureza aparentemente intuitiva, os esforços para reunir

antecipadamente pessoas talentosas para gerir as atividades de uma indústria em

formação foram constantes na fase inicial da GM. Acompanhando a adoção de

procedimentos sistematizados a organização desenvolveu processos formais de seleção,

formação, retenção e desenvolvimento de recursos gerenciais, que foram satisfatórios ao

preparar os quadros de gerentes para as necessidades de expansão e de sucessão.

Como resultado, a GM em raras ocasiões necessitou recorrer ao recrutamento externo ou

improvisações emergenciais para atender às demandas por estes recursos.

Fornecimento constante e antecipado de Recursos Gerenciais

Nos primeiros anos da indústria não havia uma formação específica de onde

potenciais recursos gerenciais pudessem ser recrutados. Diversos homens, que

contribuíram de forma relevante para o seu crescimento, chegaram à GM pelas ações de

Durant. Por meio das aquisições, Durant recrutou Charles Kettering, Alfred Sloan, Weston

Mott, Henry e Wilfred Leland, Lee Dunlap, os irmãos Fisher e Albert Champion. Além

disso, Durant também contratou pessoas por meio de sua ampla rede de contatos, tais

como, Charles Nash, ABC Hardy, Sam Mclaughlin, Louis Chevrolet e Harry Shiland. Nesta

época, Durant manteve uma ampla rede de gerentes ligados às empresas da GM,

permitindo promovê-los a novas funções conforme a necessidade. Atuando desta forma,

Durant mobilizou pessoas com conhecimento específico sobre a indústria e criou uma

espécie de estoque de recursos humanos, antecipando as necessidades ocasionadas

pela expansão. Eventualmente, excessos foram cometidos por Durant para reter pessoas

com conhecimentos e habilidades raras, como foi o caso de Walter Chrysler. Porém, em

geral, os principais gerentes da GM eram também acionistas, pois suas empresas haviam

sido adquiridas com trocas de ações, fortalecendo a relação de vínculo ao negócio.

A transição entre as gestões de Durant e Pierre S. du Pont não se tratou de uma

sucessão antecipada. Durant estava longe da aposentadoria e, apesar de ocupar-se em

antecipar o recrutamento de gerentes, não previu a necessidade de um substituto

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imediato caso algo ocorresse consigo. Já na gestão de du Pont, uma série de processos

foi iniciada para prover os recursos gerenciais da GM.

Na década de 1920, o recrutamento e a formação de recursos humanos foram

influenciados pela adoção de ações planejadas que visavam antecipar as necessidades

da organização. A GM buscou na Du Pont executivos como John Raskob, Donaldson

Brown e John Pratt, cujas habilidades foram julgadas como necessárias para solucionar

os problemas da GM, assim como alguns executivos vindos da Ford com experiência

sobre as técnicas de produção em massa, como William Knudsen. Além disso, a GM

adotou processos de recrutamento de recém graduados com alto desempenho em boas

escolas de economia e negócios, e inaugurou o General Motors Institute (GMI), em 1922,

que passou a oferecer a formação de engenharia com a realização de estágios nas

próprias unidades da GM para futuros ocupantes das posições nas divisões.

O incentivo ao comprometimento dos gerentes com o negócio manteve o principio

de participação nos lucros da época de Durant, porém após os anos 1920, foram

estabelecidos programas de participação nos lucros e bônus para os gerentes. Para tanto,

a GM também estabeleceu hierarquias de cargos e responsabilidades, com sistemas de

avaliação e promoção dos empregados. Para supervisionar a formulação e aplicação de

políticas a respeito de assuntos como planos de bônus, participação nos lucros, opções

de compra de ações, foi formado um comitê externo, indicado pelo conselho de

administração.

Duas carreiras principais emergiram na organização, uma de finanças e outra de

operações. Em ambas desenvolveram-se trajetórias padrão para os executivos. Em

finanças, recém graduados eram recrutados nas escolas de negócio e avançavam os

degraus da organização de finanças conforme eram bem avaliados na realização de suas

atividades. Vários executivos que ocuparam as posições mais altas da organização

cumpriram este percurso, dentre eles Albert Bradley, Fred Donner, Thomas Murphy,

Richard Gerstenberg, George Smith, John Smith e Richard Wagoner. Pelo lado de

operações, os percursos dos executivos que chegaram ao topo foram mais variados, uma

vez que não necessariamente os gerentes haviam passado pelo GMI, porém, assim como

na organização de finanças, havia hierarquias dentro das divisões e também entre

divisões. Por exemplo, Semon Knudsen, Elliot Estes e John Delorean, entre 1956 e 1959,

foram respectivamente gerente geral, engenheiro chefe e gerente de engenharia da

Pontiac. O bom desempenho dos três produziu uma sequência de promoções,

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substituindo um ao outro, passando pela gerência geral da Pontiac, gerência geral da

Chevrolet e, em seguida, para a organização corporativa.

Após a turbulenta transição entre Durant e du Pont as demais sucessões no topo

da hierarquia corporativa foram conduzidas de forma mais planejada. Já na curta gestão

de du Pont, Alfred Sloan, que havia apresentado desempenho destacável, foi preparado

para assumir a presidência da GM e, em seguida a presidência do conselho de

administração. Após Sloan, a sucessão nas posições de presidente, CEO e presidente do

conselho em raras vezes teve de recorrer ao improviso ou a executivos de fora da

organização. O processo de escolha normalmente era iniciado anos antes da

aposentadoria do ocupante do cargo, quando o potencial sucessor era escolhido dentre

um grupo de vice-presidentes corporativos e, caso fosse julgado necessário, o candidato

era designado a alguma posição que completaria sua preparação. Foram os casos de

Albert Bradley, Thomas Murphy, George Smith, John Smith e Richard Wagoner, que

saíram da organização de finanças para assumir uma posição de operações antes de

serem nomeados CEO.

Com relação ao desenvolvimento de habilidades e competências dos gerentes,

além da natural evolução dos gerentes, que na medida em que avançavam as hierarquias

aprendiam a lidar com problemas gerenciais mais difíceis, a análise histórica não forneceu

evidências de que a GM tenha feito uso de treinamentos para desenvolver novas

qualificações nos gerentes, de modo a antecipar necessidades de habilidades

específicas. Os escassos registros de treinamentos planejados e executados pela

organização limitam-se à década de 1980, quando relatórios de consultorias apontaram

como ponto fraco da GM o baixo uso de treinamentos. Na mesma década, Lee (1988)

afirmou que ao buscar evidências da realização de treinamentos, não os encontrou em

nível corporativo e descobriu que estes ficavam mais a cargo das divisões. Outras

evidências encontradas a esse respeito foram a conferência corporativa trienal, com

registros a partir da década de 1960, onde eram feitas apresentações preparadas por

executivos da própria organização para uma massa de gerentes, além de um curso

contratado junto a Phillip Crosby na década de 1980, para treinar gerentes e líderes

sindicais, durante uma semana, sobre técnicas e conceitos de qualidade.

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4.2.5. Desafio da Gestão da Complexidade

As respostas a este desafio estão relacionadas aos processos desenvolvidos pela

organização para lidar com problemas complexos. Neste sentido, a análise da atuação da

General Motors ao longo da história indica que houve significativa alteração no padrão de

suas ações.

Na fase de formação da organização, as respostas empregadas sob o comando

de William Durant, marcadas pelo excesso de informalidade e improvisação, colocaram a

existência da GM em risco por pelo menos duas vezes em seus primeiros 12 anos. Após

1920, o esforço aplicado sob a influência da Du Pont determinou o início do

desenvolvimento de procedimentos sistematizados de coleta de informação, análise e

tomadas de decisão, implementação e controle, que ampliaram a capacidade da GM em

lidar com problemas complexos, afetando também capacitações relacionadas a respostas

a outros desafios.

A fórmula encontrada pela GM para promover esta mudança envolveu inicialmente

a aplicação de recursos na formação de equipes de força-tarefa, normalmente isentas de

atividades de operações, para estudar o problema e propor soluções transferíveis às

divisões. A evolução deste processo levou à formação de uma organização corporativa

com equipes de staff especializadas e permanentes, sob a orientação de uma hierarquia

de comitês corporativos. A atuação de staffs e comitês institucionalizou na GM um tipo de

gestão marcada pela formulação sistematizada de políticas corporativas.

Por outro lado, a forma como a GM empregou procedimentos sistematizados para

solucionar problemas produziu também um efeito negativo sobre a capacidade de

aprendizado da organização. O incentivo da GM ao desenvolvimento das ferramentas de

busca (CYERT & MARCH, 1963) concentrou-se nos processos desenvolvidos em nível

corporativo, ou seja, separando-os da atuação no nível das divisões que permaneceram

autônomas para conduzirem seus próprios processos. Portanto, à medida que a

organização cresceu, os processos corporativos tornaram-se ineficazes em incluir a busca

por soluções para problemas nas áreas mais distantes da organização, enquanto a busca

por soluções nas divisões enfrentou crescentes dificuldades ao esbarrar no cumprimento

dos limites impostos pelas políticas corporativas.

Busca sistemática por soluções de problemas

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No início da General Motors, além da atuação dos gerentes em cada divisão, as

ações na busca por soluções de problemas mais complexos ficavam a cargo de William

Durant. Alguns relatos da época, como os de Lee Dunlap, E. Bergland, Alfred Sloan, e

Walter Chrysler, descrevem a atuação de Durant como sendo de envolvimento superficial

com os problemas, desprovida de registros formais e com decisões fortemente baseadas

em seus instintos. Isto proporcionava soluções pobres em detalhes, por vezes

ocasionando conflitos com outros aspectos da organização, além de não conterem

parâmetros para controlar a implementação ou avaliar o resultado das soluções.

Apesar da forte expansão da GM durante a gestão de Durant, diversas vezes o

envolvimento superficial de Durant nos processos de crescimento, sobretudo nas

aquisições, conduziu a investimentos que resultaram em perdas, como nos casos da

Heany Lamp, Welch, Cartercar, Marquette, Rainier e Samson Sieve Grip. A ausência de

sistemas de controle financeiros básicos expôs a GM a riscos excessivos, sendo que em

duas crises econômicas, 1910 e 1920, a GM teve sua solvência questionada. Em 1910,

quando cobrada pelos credores, a GM foi incapaz de sequer saber o tamanho da dívida e

as datas de vencimento dos compromissos de suas empresas. Em 1920, novamente,

Durant impulsivamente aplicou recursos na compra de ações da GM sem qualquer

registro sistemático dos compromissos a serem saldados, até que, quando cobrado,

percebeu que havia ultrapassado sua capacidade de pagamento.

Outra evidência da baixa capacidade em lidar com a complexidade da GM neste

período inicial foi a exaustão do tempo disponível de William Durant. Logo nos primeiros

anos da GM o dia-a-dia de Durant já era repleto de compromissos, de modo que pouco

tempo era dedicado com exclusividade a cada um deles. Durant fazia amplo uso dos

meios de comunicação para estender o alcance de sua atuação nos diversos pontos onde

seus negócios estavam. No entanto, em determinado momento, o acesso a Durant ficou

tão restrito que os demais executivos passaram a viajar para onde ele estivesse apenas

para colher decisões. Houve casos como o de John Raskob e Walter Chrysler que tiveram

de cruzar o país para encontrar Durant, ficaram o dia todo na sala de espera e depois

foram obrigados a voltar sem conseguir uma reunião.

A limitada capacidade da GM de Durant em lidar com a complexidade fez com que

muitos dos problemas só despertassem esforços para uma busca por solução na medida

em que se tornassem urgências ou ameaças vitais à General Motors. Um dos exemplos

foi o aumento dos estoques em 1920. Na ocasião, seguidos alertas sobre os crescentes

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níveis de estoque não levaram a ações efetivas no sentido de reduzir o risco a que a

empresa estava se expondo. Já no episódio que ocasionou a saída de Durant da GM,

quando o rombo nas contas do presidente da GM foi descoberto, os rumores do mercado

financeiro já ameaçavam a credibilidade de toda a organização.

A primeira ação significativa no intuito de adotar procedimentos sistematizados na

identificação de problemas foi ainda em 1911, quando a gestão do grupo de credores

assumiu o controle da GM e promoveu a unificação dos procedimentos contábeis entre as

empresas. Em 1918, a associação de Durant com a Du Pont também resultou na

aplicação de recursos orientados a estabelecer novos processos para sistematizar a

busca por soluções, tais como o estabelecimento do comitê de finanças, a contratação de

consultores como E. Bergland, a vinda de John Pratt da Du Pont, além da dedicação

voluntária de Alfred Sloan no desenvolvimento de um estudo que propôs melhorias na

GM. No entanto, as medidas desta época não evoluíram para processos amplamente

estabelecidos na organização. Uma atuação sistemática para melhorar as respostas à

gestão da complexidade só começou mesmo a partir de 1920, quando Pierre S. du Pont

assumiu a presidência da GM.

Ao assumir a presidência da GM, Pierre S. du Pont trouxe Donaldson Brown, da

Du Pont, para conduzir a criação do staff de finanças, uma equipe dedicada a identificar e

a propor soluções para os problemas financeiros que assolavam a GM e as divisões até

então. A organização dos trabalhos foi sob a forma de equipes de força-tarefa, sob a

denominação de comitês, como o de vendas, o de políticas de estoque e o de

investimentos de capital. O resultado, depois de cinco anos de atuação do staff, foi a

criação de diversos processos interligados que sistematizaram a projeção da demanda, o

planejamento das vendas e da produção, a definição dos preços, e o controle sobre a

elaboração e execução dos orçamentos, com sistemas de coleta de dados e revisões

periódicas da realização dos planos. O conjunto de processos implementados por meio

das políticas elaboradas pelo staff financeiro culminaram no standard-volume que, em

1925, sistematizou um método de coleta de dados, análise e tomada de decisão,

buscando converter o impacto das decisões sobre as atividades das divisões em

indicadores financeiros.

Além da aplicação de recursos na formação do staff de finanças, a GM investiu em

algo semelhante para os problemas de operações. Porém, inicialmente o CE de Pierre S.

du Pont contratou o serviço de empresas de consultoria e constituiu equipes que

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realizaram estudos para identificar o posicionamento adequado dos carros das divisões

da GM, face à ameaça do Ford Modelo T. O resultado foi a formulação de uma política de

produtos que segmentava a atuação das divisões de acordo com o preço e o nível dos

atributos dos veículos.

Na segunda metade da década de 1920, a GM, sob o comando de Alfred Sloan,

iniciou a formação de um staff de operações. Em um primeiro momento, os grupos de

políticas foram compostos por membros das divisões. Sloan também estabeleceu um

comitê de operações, formado pelos gerentes das divisões, que teria o papel de orientar

os trabalhos de busca por solução. A atuação dos comitês e grupos de políticas ligados à

área de operações promoveram a organização de esforços para a busca por soluções,

primeiramente, com o mero intercâmbio de melhores práticas em seminários e

workshops, depois, ampliando para a formação de equipes de força-tarefa para

desenvolvimento de soluções específicas, como novas transmissões, sistema de freios e

motores.

Ao longo da década de 1930, sobretudo após os anos de depressão econômica, a

GM estabeleceu de forma mais ampla e sistematizada os processos de busca por

soluções para os problemas. Os grupos de políticas de operações, até então compostos

por membros das divisões, passaram a ser formados por equipes de staff. Entre 1934 e

1937, nove grupos de políticas foram criados, um para cada tema relacionado à atividade

das divisões automotivas e um para cada divisão não automotiva. Uma hierarquia de

comitês também estabeleceu uma forma sistemática de formulação e aprovação de

políticas corporativas. Essa configuração da organização corporativa permitiu que a GM

lidasse com problemas complexos que envolviam diferentes implicações para cada

divisão. O principal exemplo de solução providenciada por este sistema de gestão por

políticas foi a elaboração de um processo sistematizado para lidar com o problema da

renovação anual de toda a linha de produtos das divisões de veículos.

A forma desenvolvida pela GM para lidar com a complexidade de certas situações

foi replicada ao lidar com outros problemas conforme eles emergiam. Por exemplo, a GM

estabeleceu um sistema de hierarquia de comitês para solução de conflitos trabalhistas.

Algo semelhante foi criado para lidar com o relacionamento com a rede de

concessionárias. Em 1945, a GM criou um grupo de staff de engenharia de manufatura

para lidar com o aumento da complexidade dos problemas nas linhas de montagem. O

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225

trabalho da equipe de staff levou ao início do uso de computadores para controlar as

atividades de produção.

Apesar de a gestão por políticas ter conferido a GM um aumento da capacidade

em lidar com problemas mais complexos, o sistema desenvolvido pela organização deu

sinais de suas limitações já no final dos anos 1930. À época, o comitê executivo teve de

ser reformulado, pois a participação de membros externos à GM restringia a agenda de

reuniões, que precisaram se tornar mais frequentes. Somou-se também o fato de a cada

vez maior especificidade dos assuntos tornar improdutiva a participação de pessoas de

fora da organização.

Na década de 1950, a gestão de Harlom Curtice apresentou evidências que

sugerem a dificuldade do sistema de gestão por políticas em avançar no entendimento

dos problemas das divisões. Curtice reduziu o papel do comitê executivo, colocando as

equipes de staff subordinadas a si e estabelecendo uma comunicação direta com os

gerentes das divisões. Estas ações refletem a preocupação de Curtice, um executivo com

carreira nas divisões e que antes de ser presidente havia chefiado as equipes de staff, em

acelerar o processo de formulação e aprovação de políticas, o qual foi se tornando lento

com o aumento da complexidade dos problemas.

John Delorean, que teve atuação destacada na GM entre 1956 a 1973, também

apontou evidências do esgotamento da capacidade do sistema de gestão por políticas em

lidar com a complexidade. Por exemplo, os diagnósticos elaborados pelas equipes de

staff, quando uma divisão apresentava um problema, não eram capazes de ir além da

mera descrição dos problemas e de seus efeitos, traduzindo tudo em indicadores. Por

outro lado, as divisões, quando eram convidadas a fazer apresentações nos comitês

corporativos, por vezes tinham a sensação de que a linguagem que estavam falando não

estava sendo compreendida, devido a especificidade dos assuntos. Delorean afirma que

enquanto foi gerente geral da Chevrolet, encaminhou 18 propostas de soluções para

problemas que ele acreditava poderem ser transferidos às demais divisões, no entanto,

quase todas se perderam na morosidade dos comitês e nunca foram adiante.

O mesmo John Delorean, que depois foi nomeado executivo corporativo, descreve

a atividade dos comitês como sendo excessivamente burocrática. Segundo seus relatos,

a quantidade de relatórios e documentos cuja leitura era exigida daqueles executivos,

apenas para que estivessem em condições de acompanhar as discussões, era maior do

que a capacidade deles absorverem a informação.

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Não há indícios de que a GM tenha alterado ou criado novos processos de busca

por soluções, além da gestão por políticas. Embora existam poucas descrições

detalhadas sobre o funcionamento dos comitês de políticas da organização corporativa a

partir dos anos 1970, o histórico nos anos subsequentes não revela um aumento da

capacidade de lidar com problemas mais complexos.

Na década de 1980, a GM reforçou a busca por soluções usando equipes de

força-tarefa formadas por membros não envolvidos com a operação. A consultoria

McKinsey foi contratada para desenvolver um trabalho junto com uma equipe interna

nomeada para restruturar as divisões. A EDS foi adquirida para absorver as áreas de

processamento de dados da GM e ter a incumbência de solucionar os problemas

relacionados ao tema. Uma equipe dedicada foi nomeada para atuar exclusivamente no

desenvolvimento de uma nova empresa com um produto novo, a Saturn. Além disso,

outras aquisições e alianças foram estabelecidas para desenvolver externamente

soluções para os problemas internos.

As últimas evidências sobre as dificuldades na busca sistemática por solução de

problemas referem-se aos anos 1990 e início dos anos 2000, quando a GM passou a

gradualmente se desfazer de partes da sua operação, terceirizando a responsabilidade

para a solução dos problemas aos fornecedores. Além da venda de divisões não ligadas

estritamente a automóveis, como EDS, Huges Aircraft e GMAC, a GM constituiu e se

desfez da Delphi, que contemplou as divisões de autopeças, e por fim passou a terceirizar

partes inteiras das operações de montagem a partir de 1998.

4.3. Síntese das Respostas aos desafios

A análise das respostas da GM para cada um dos cinco desafios ao crescimento

de Fleck (2009), apresentados nas seções anteriores, revela que em um deles, o da

Gestão da Complexidade, houve uma mudança significativa no padrão das respostas

entre o período sob o comando de William Durant e as gestões subsequentes à de Pierre

S. du Pont. Segundo Fleck (2009), a gestão da complexidade afeta a qualidade das

respostas aos demais desafios, de modo que o desenvolvimento de capacitações de

busca sistemática para solução de problemas é uma condição necessária para que a

organização possa promover o crescimento e a renovação, enquanto mantém a

integridade. O caso da General Motors confirmou a existência de forte relação entre os

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processos de busca por soluções de problemas que emergiram a partir de 1920 com a

sistematização de procedimentos para responder aos demais desafios.

A mudança na gestão da complexidade da GM sugere a existência de dois

períodos distintos na trajetória da organização. O primeiro é relacionado à intensa

atuação de William Durant, que, no papel de empreendedor, concentra não só os serviços

empreendedores (PENROSE,1959), mas parte significativa das ações para responder aos

demais desafios. No segundo período, a influência da Du Pont, sobretudo nas gestões de

Pierre S. du Pont e Alfred Sloan, institucionaliza o sistema de gestão por políticas, que

criou estruturas e processos corporativos envolvendo comitês e equipes de staff. O

quadro 4-6 a seguir apresenta um resumo das respostas em duas fases, a primeira

chamada de “Líder Empreendedor” e a segunda de “Gestão por Políticas”.

Na figura abaixo, as setas indicativas que partem da caixa que resume a gestão da

complexidade, na fase de Gestão por Políticas, indicam as principais influências da

mudança nas respostas para lidar com a complexidade, sobre as respostas dos demais

desafios. Por exemplo, o procedimento estabelecido por equipes de staff e comitês,

denominado standard-volume, em 1925, definia um meta ambiciosa de retorno sobre

investimento de 20%, substituindo e sistematizando a alta ambição nos investimentos

espontaneamente promovida por William Durant. O mesmo pode ser dito sobre sistema

de bônus de executivos em relação aos gestores acionistas da fase do Líder

Empreendedor. Em outros casos, processos foram criados para solucionar problemas

antes não observados, como o compartilhamento de recursos ou os planos de sucessão

do CEO.

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Quadro 4-6 Síntese das respostas da GM aos desafios em duas fases distintas

DesafioLíder Empreendedor

(Entre 1908 a 1920)

Gestão por Políticas

(Entre 1920 a 2008)

Empreendedorismo

Ambição: Alta

• Forte ambição promovida por Durant

• Gestores acionistas

Versatilidade: Visão alta e imaginação dispersa

• Visão sobre a criação de valor de Durant

• Imaginação emergente nas divisões

Mobilização de recursos financeiros: Alta

• Reaplicação do caixa da operação

• Habilidade de Durant para captar recursos

Julgamento: Limitado

• Esforço pessoal porém disperso de Durant para coletar e avaliar

informações

Motivações para o crescimento: Positivas /Híbridas

• Expansões positivas vertical, horizontal, inercial e diversificação.

• Reaplicação dos recursos para gerar crescimento

Ambição: Alta

• Meta ambiciosa de 20% de retorno de longo prazo

• Programas de Bônus para executivos

Versatilidade: Visão alta e imaginação dispersa/reprimida

• Programas e equipes dedicados a vislumbrar a criação de valor

• Imaginação emergente nas divisões, gradualmente reprimida por políticas

corporativas

Mobilização de recursos financeiros: Alta

• Gestão eficiente para geração e re-investimento de caixa

• Alta reputação e credibilidade no mercado financeiro

Julgamento: Alto

• Equipes e comitês e métodos dedicados à coleta de informação, análise e

julgamento de riscos e incertezas

Motivações para o crescimento: Positivas /Híbridas

• Expansões positivas vertical, horizontal, inercial e diversificação.

• Reaplicação dos recursos para gerar crescimento

Navegação no

ambiente dinâmico

Monitoramento do ambiente: Ativo/centralizado

• Intenso desenvolvimento e exploração da rede de relacionamentos de

Durant para obter informações

Uso das respostas estratégicas: Ativo/ Defensivo

• Uso ativo de respostas estratégicas, lideradas por Durant

• Aplicação de recursos excedentes para defender-se contra pressões do

ambiente

Monitoramento do ambiente: Ativo

• Equipes de staff dedicadas e especializadas no freqüente monitoramento

do ambiente

Uso das respostas estratégicas: Ativo/ Defensivo

• Uso ativo de respostas estratégicas, definidas por comitês de política

• Aplicação de recursos excedentes para defender-se contra pressões do

ambiente

Gestão da

diversidade

Compartilhamento e intercâmbio de recursos: Limitado

• Compartilhamento limitado , porém recursos valiosos

•Capacitações de coordenação: Baixa cooperação/Decisões arbitradas

• Unidades de negócios autônomas e concorrentes

• Acomodação de conflitos , Decisões arbitrárias de Durant

Compartilhamento e intercâmbio de recursos: Alto

• Equipes de staff e processos dedicados a identificação e implementação

de relações de compartilhamento e intercâmbio

Capacitações de coordenação: Baixa cooperação/Decisões arbitradas

• Unidades de negócios autônomas e concorrentes

• Hierarquia de comitês para acomodar e/ou arbitrar conflitos

Aprovisionamento

de RH

Fornecimento de Recursos Gerenciais: Antecipado/ não programado

• Recrutamento preventivo de Durant

• Retenção baseada em incentivos financeiros

• Sucessão não programados

• Desenvolvimento de habilidades gerenciais no exercício da função

Fornecimento de Recursos Gerenciais: Antecipado, programado

• Formação sistemática de gerentes nas carreiras de finanças e operações

• Programas de promoção e remuneração

• Desenvolvimento e sucessão baseado na evolução na escada hierárquica

• Desenvolvimento de habilidades gerenciais no exercício da função

Gestão da

complexidade

Busca de soluções de problemas: Superficial

• Ausência de procedimentos sistemáticos de informações, análise, decisão

e implementação

• Busca superficial e soluções improvisadas por Durant

Busca de soluções de problemas: Sistemática/segregada

• Equipes de staff, isentas das funções de operações, dedicadas a desenvolver

processos de busca de soluções para os problemas

• Soluções por meio da formulação e aprovação de políticas corporativas

Fase

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As respostas ao desafio da gestão da complexidade da GM levaram a organização

a mover-se de um padrão de busca por solução de problemas – que era superficial,

improvisado e centralizado em William Durant, na fase de Líder Empreendedor – para

outro, no qual a busca passou a ocorrer em processos formais de coleta de informações,

análise, formulação de soluções e implementação, tendo como agentes principais equipes

de staff e comitês corporativos. A mudança ocorreu após a GM ter passado por um

processo crônico de incapacidade em lidar com a complexidade nos últimos anos da fase

do Líder Empreendedor, culminando, em 1920, com uma forte crise na coordenação dos

gastos e investimentos nas divisões. Este processo evidencia que a GM, em relação à

gestão da complexidade, desenvolveu capacitações que a permitiram movimentar-se na

direção do polo da auto-perpetuação (FLECK, 2009), afastando-se da auto-destruição.

Com relação aos demais desafios, apesar de as mudanças terem produzido

efeitos sobre a qualidade das respostas, não há evidências de que tenha havido

alterações significativas em termos de infusão de novos valores, movimentando o padrão

das respostas na direção de um ou outro polo. Ao longo das duas fases identificadas, o

padrão das respostas ao empreendedorismo, à navegação no ambiente dinâmico, à

gestão da diversidade e ao aprovisionamento de recursos humanos oscilou ao longo do

contínuo, dentro de uma mesma faixa ao longo da história da General Motors.

A figura 4-3 abaixo ilustra a trajetória das respostas da GM a cada desafio ao

longo do contínuo entre os polos da auto-perpetuação e da auto-destruição. As evidências

encontradas indicam que as respostas da GM ao desafio do empreendedorismo,

considerando as fases de Líder empreendedor e de Gestão por Políticas, oscilaram em

uma região do contínuo mais próxima do polo da auto-perpetuação, mantendo alta

ambição e capacidade de mobilizar recursos financeiros, melhorando a capacidade de

julgamento e visão da primeira para a segunda fase, porém reprimindo serviços de

imaginação de oportunidades produtivas (PENROSE, 2006) nas unidades de negócio por

meio de políticas corporativas.

No caso dos desafios da navegação no ambiente dinâmico e do aprovisionamento

de recursos humanos, a melhora na gestão da complexidade contribuiu significativamente

para a sistematização de procedimentos. Porém, os processos iniciados a partir de tal

influência promoveram a formalização e a continuidade do caráter em relação ao desafio

de uma fase para outra. Por exemplo, na navegação do ambiente, Durant optou por

aplicar recursos em excesso para neutralizar fontes de pressão externa, como a oscilação

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no fluxo de insumos e inovações tecnológicas. Na fase seguinte, o padrão se manteve,

porém voltado para novas fontes de pressão, como o caso das questões trabalhistas. Da

mesma forma, na fase do Líder Empreendedor, Durant já adotava a prática de antecipar

as necessidades de recursos gerenciais, contratando pessoas e comprando empresas

para absorver gerentes talentosos. Na fase de Gestão por Políticas, este caráter se

manteve, porém formalizado em programas mais eficientes de formação de gerentes.

Figura 4-3 Trajetória das respostas aos desafios do crescimento, no continuum entre auto-destruição e auto-perpetuação.

Pólos das respostas aos Desafios

Empreendedorismo

Baixo

Baixos níveis de ambição,

versatilidade, imaginação,

visão capacidade de levantar recursos

financeiros, e realização de expansões defensivas

ou nulas

Alto

Altos níveis de ambição,

versatilidade, imaginação,

visão, capacidade de levantar recursos

financeiros, e realização de expansões produtivas

ou híbridas

Navegação no

ambiente dinâmico

Passivo

Monitoramento ruim, mal

uso de estratégias de

navegação

Ativo

Monitoramento regular,

uso correto de estratégias

de navegação

Gestão da

diversidade

Fragmentação

Fracasso no

estabelecimento de

relacionamentos de integração e de

capacitações de coordenação

Integração

Estabelecimento bem

sucedido de

relacionamentos de integração e capacitações

de coordenação

Aprovisionamento

de RH

Tarde

Ações no momento que

existe necessidade ou

depois dela

Planejado

Ações planejadas com

antecedência

Gestão da

Complexidade

Ad-hoc

Baixa capacitação para

solução de problemas

utilizando rápida análise sem aprendizado

Sistemático

Capacitação para solução

de problemas,

promovendo busca correta por soluções e

aprendizado

Auto-perpetuaçãoAuto-destruição

Capacitações

para solução

de problemas

incipiente

Busca de soluções

sistemática, porém

segregada

Recrutamento

antecipado,

porém não

programado

Aprovisionamento

antecipado e

programado

Relações de

Integração

limitadas e baixa

coordenação

Relações de

integração altas e

baixa coordenação

Monitoramento

ativo e

navegação ativa

e defensiva

Monitoramento

ativo e navegação

ativa e defensiva

Alta ambição, visão e

mobilização de recursos,

imaginação dispersa e

julgamento fraco

Alta ambição, visão,

mobilização de recursos,

julgamento e imaginação

dispersa e reprimida

Fase do líder

empreendedor

Fase de gestão

por políticas

Oscilação das ações em torno de

padrões (sem resultar em movimento na

direção de um dos pólos)

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Ao longo da trajetória da General Motors os indícios são de que em três dos cinco

desafios o padrão das respostas oscilou em uma faixa mais próxima da auto-perpetuação

do que da auto-destruição, mesmo que em algum aspecto dos desafios a resposta não

tenha sido adequada. Tal observação se alinha à teoria de Fleck (2009), na medida em

que ela define o polo da auto-perpetuação como um estado ideal. Durante a fase do Líder

Empreendedor, em dois dos desafios, o da gestão da diversidade e o da gestão da

complexidade, a General Motors apresentou padrões mais próximos da auto-destruição

do que da auto-perpetuação. Conforme exposto anteriormente, a mudança nas respostas

à gestão da complexidade significaram uma reorientação dos padrões deste desafio na

direção da auto-perpetuação, mas as respostas da GM à gestão da diversidade não foram

capazes de estabelecer capacitações de coordenação e mantiveram, portanto, uma

propensão à auto-destruição estável ao longo história.

Apesar de durante a fase de Gestão por Políticas a General Motors ter

desenvolvido diversos relacionamentos de compartilhamento e intercâmbio de recursos

entre suas unidades de negócio, estes processos não foram acompanhados por

capacitações que promovessem a cooperação e a inovação entre as partes da

organização. Diferentemente do que a teoria de Fleck (2009) estabelece como condição

necessária, a GM procurou constantemente acomodar diferenças e conflitos entre as

partes, por exemplo, arbitrando a aplicação de recursos em excesso, como em casos

onde duas divisões produziram e comercializaram praticamente o mesmo veículo. Além

disso, a forma como a GM desenvolveu processos para responder a este desafio separou

as atividades de planejamento das de operações, nutrindo a rivalidade entre divisões e

organização corporativa e prejudicando a comunicação entre seus diversos níveis.

A forma como se configuraram as respostas da General Motors na fase de Líder

Empreendedor se mostraram auto-destrutivas, pois além do baixo vinculo e coordenação

entre as unidades de negócio, não havia capacitações para lidar com a crescente

complexidade de uma organização e uma indústria em forte expansão. A ausência de

duas condições necessárias ao crescimento contribuiu amplamente para duas crises

graves enfrentadas pela GM nesta fase.

O desenvolvimento de respostas positivas à gestão da complexidade permitiu que

a General Motors produzisse amplo crescimento nas primeiras décadas da fase de

Gestão por Políticas. Diversos fatores contribuíram para que a ausência de capacitações

de coordenação não fosse decisiva e pudesse ser substituída por processos de

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acomodação e arbitragem de políticas. Um dos fatores identificados foi o forte e

prolongado crescimento da demanda desde os anos 1920 até a década de 1970. Outro

ponto importante foi a relevância de vantagens competitivas associadas à capacidade de

mobilizar recursos financeiros, às economias de escala e à integração da cadeia

produtiva. Além disso, a General Motors contou com a desatenção de sua maior rival

americana, a Ford, que nos anos 1920 ignorou a necessidade de diversificação da linha

de produtos. Com isso, a General Motors foi capaz de elevar sua participação no mercado

para o limite institucionalmente aceito e pode acompanhar a evolução da demanda com

ampla vantagem de escopo e escala sobre seus concorrentes.

Durante a década de 1970, algumas mudanças no ambiente tornaram-se mais

evidentes. A proximidade da saturação do mercado, a competição japonesa no segmento

de compactos e os novos padrões exigidos dos fabricantes, tais como segurança,

economia, emissão de poluentes e qualidade, fizeram com que as pressões do ambiente

institucional e competitivo se tornassem maiores. O declínio da General Motors, no

entanto, só foi reconhecido de forma mais explícita em 1980, quando o primeiro prejuízo

em 60 anos foi anunciado. Apesar da nova crise do petróleo, que fez as vendas caírem de

forma generalizada, o declínio da GM esteve fortemente relacionado ao baixo nível das

respostas ao desafio da gestão da diversidade.

A série de ações para reverter o declínio, levadas adiante nos anos 1980,

apresenta evidências sobre o papel central que o caráter organizacional, em termos da

fraca gestão da diversidade, teve sobre o fracasso da organização. Ao longo da década, o

nível das respostas aos demais desafios manteve-se em níveis razoáveis, ou seja, mais

próximo da auto-perpetuação, dentro de uma faixa na qual já oscilavam. Por exemplo: o

volume de investimentos e o empenho dos executivos indicam o alto nível de ambição e

de capacidade de mobilizar recursos financeiros. A visão e o julgamento, embora a

maioria dos investimentos tenha fracassado, demonstraram estar na direção correta. A

automação, a transferência eletrônica de dados, as técnicas de produção enxuta dentre

outros processos referem-se a visões da GM que vieram a se mostrar viáveis em outros

negócios similares.

Outros desafios também mantiveram um padrão dentro da faixa mais próxima à

auto-perpetuação, durante a tentativa de mudança na década de 1980. Na navegação do

ambiente, a GM influenciou o governo para promover restrições aos importados e

negociar acordo comercial. Além disso, grande expectativa popular foi depositada sobre a

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GM como representante da competitividade e do orgulho americano. Os contratos

trabalhistas foram revisados para baixo, reduzindo benefícios, consentindo com

demissões e com transferência de plantas para o México. No desafio de

aprovisionamento de RH, a GM promoveu revisão do sistema de avaliação, comprou

empresas com gerentes talentosos, como EDS, Huges e Lotus, e reorganizou as divisões,

avaliando previamente o perfil dos gerentes, além de oferecer treinamentos. Quanto à

gestão da complexidade, a GM contratou a consultoria Mckinsey, montou equipes de

força-tarefa para os projetos, adotou organização matricial por produtos, realizou

benchmarking e adquiriu e desenvolveu um sistema avançado para desenvolvimento de

produtos.

Porém, com relação à gestão da diversidade, as capacitações de coordenação

continuaram minando a capacidade de realização da GM. Os projetos aprovados pelo

comitê de administração não foram implementados com sucesso pelas divisões. Os

problemas encontrados na operação não eram facilmente comunicados às equipes de

staff, tampouco aos comitês. Pessoas mudadas de local e de função ao longo da

restruturação viram suas redes de relacionamento desaparecer, e os processos

atrasaram de forma generalizada. E, por fim, mesmo algumas soluções que apresentaram

sucesso, como foi o caso da NUMMI, não houve coordenação para transferi-las a outras

áreas da organização.

Analisando através do arcabouço de declínio nas organizações de Weitzel (1989),

os esforços da General Motors na década de 1980 se assemelharam ao terceiro estágio

de declínio, no qual a organização realiza ações, porém inadequadas. O estágio seguinte,

quando a organização atinge o estado de crise, é análogo à situação enfrentada pela GM

nos anos 1990. Fortes prejuízos, demissão de um presidente, lançamentos fracassados e

a vinda de um presidente externo para o conselho de administração precederam o que

seria o último estágio de declínio, quando a organização é forçada a se dissolver. Neste

caso, a dissolução da GM foi gradual: inicialmente com a venda de operações menos

relacionadas, como EDS e Huges Aircraft, em seguida, de divisões de autopeças por

meio da Delphi; depois, foi a vez da terceirização da produção e, por fim, a venda ou

dissolução de divisões ligadas ao negócio central como a GMAC e Oldsmobile, que

precederam o pedido de concordata.

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234

5. Considerações Finais

O trabalho se propôs a analisar o caso da GM a fim de entender como uma

organização bem sucedida se deparou com o declínio e finalmente o fracasso. Para

responder ao questionamento proposto a análise buscou identirficar e comparar os

padrões das respostas da GM em relação aos desafios à longevidade de Fleck (2009). As

evidências coletadas para este estudo de caso permitiram reconstruir o histórico da

organização, confrontando especialmente relatos de biografias, artigos, reportagens e

relatórios corporativos e, desta forma, foi possível identificar elementos relevantes para

uma análise longitudinal, comparando as evidências aos parâmetros fornecidos pelo

referencial teórico.

A GM se desenvolveu na indústria automobilística dos Estados Unidos,

participando desde seus primeiros anos. Protagonizou a disseminação do automóvel na

sociedade, tornando esta uma das principais atividades industriais de seu tempo. O

levantamento de dados permitiu reconstituir a história em ordem cronológica com razoável

precisão sobre a sequência dos acontecimentos, desde anos antes da fundação da

General Motors, em 1908, até o pedido de concordata, em 2009. A partir deste

levantamento foi possível analisar os padrões das respostas da GM e identificar alguns

elementos que contribuíram para que a organização desenvolvesse destacável

crescimento e geração de lucros e, posteriormente, viesse a fracassar.

O estudo concluiu que o declínio e posterior fracasso da General Motors esteve

relacionado principalmente ao não desenvolvimento de capacitações de coordenação

para lidar com a gestão da diversidade da organização. Este padrão de resposta anulou

processos de cooperação entre partes da organização, nutriu a rivalidade e impôs

barreiras à comunicação. No lugar desta coordenação a GM adotou processos de

arbitragem e acomodação das diferenças, recorrendo à aplicação de recursos em

excesso para neutralizar pressões para a fragmentação.

A pesquisa concluiu ainda que, em uma primeira fase da trajetória da GM,

marcada pela atuação de seu líder empreendedor, William Durant, a organização

respondeu negativamente, além da gestão da diversidade, também ao desafio da gestão

da complexidade. A mudança de controle para a influência da Du Pont impulsionou a

institucionalização de processos que alteraram o padrão da gestão da complexidade,

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235

adotando a busca sistemática de soluções por meio de equipes de staff especializadas e

a gestão por políticas formuladas em comitês corporativos.

A propensão à auto-destruição desenvolvida a partir das fracas capacitações para

a gestão da diversidade, apesar de estável ao longo de toda trajetória da GM, não

impediu que a organização desenvolvesse negócios a ponto de ter o sucesso de sua

atividade aclamado de maneira generalizada. O resultado da análise aqui apresentada

também concluiu que, por trás do aparente sucesso durante décadas, alguns fatores

contribuíram de forma decisiva para que uma configuração auto-destrutiva como era a da

GM fosse viável. Dentre eles, o forte e duradouro ciclo de crescimento da indústria

automobilística nos Estados Unidos, a relevância de economias de escala e escopo sobre

o ambiente competitivo e a desatenção da principal concorrente Ford formaram um

ambiente piedoso que permitiu que a GM dominasse e defendesse sua participação de

mercado e crescesse de forma a acompanhar a evolução da demanda.

5.1 Considerações sobre o sucesso e o fracasso da General Motors

A General Motors esteve entre as organizações corporativas mais importantes de

seu tempo, inclusive sendo apontada, em determinadas épocas de sua história, como

detentora de práticas consideradas referência não só para a indústria automobilística,

como também para a gestão de empresas de um modo geral. Por ser uma organização

que encontrou o fracasso, apesar do amplo acesso a recursos para investir e promover a

continuidade das suas atividades, constituiu-se um fenômeno que tem provocado ampla

discussão nos meios acadêmicos, no ambiente de negócios e na mídia em geral.

Portanto, a identificação de elementos que contribuíram para que tal trajetória se

configurasse torna-se altamente relevante.

A análise das respostas aos desafios à longevidade apontou a ausência de

capacitações de coordenação da General Motors como o principal fator de uma gestão da

diversidade orientada à fragmentação e revelou a contribuição decisiva das respostas ao

desafio da gestão da diversidade para o declínio e o fracasso. No caso da General

Motors, a relação entre a gestão da diversidade e o fracasso torna-se mais relevante à

medida que tal característica esteve presente desde o processo de formação da

organização. Tal estabilidade indica que a gestão fragmentadora da diversidade foi um

traço institucionalizado da organização, que apesar de contribuir para o desenvolvimento

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236

de uma propensão a auto-destruição, não impediu que a GM desenvolvesse o

crescimento e a criação de valor por várias décadas.

Com relação aos elementos que levaram a General Motors, durante pelo menos

sete décadas, a ser amplamente aceita como organização de sucesso, a análise por meio

da teoria de Fleck (2009) não oferece relações de suficiência entre as respostas aos

desafios e o sucesso, mas de condições necessárias. Ainda assim, os resultados

encontrados na análise revelaram aspectos importantes a esse respeito. Primeiramente,

fatores do ambiente tornaram a atividade na indústria automobilística altamente rentável,

como o prolongado crescimento da demanda. Por outro lado, durante muitas décadas a

GM explorou eficazmente as vantagens de tamanho sobre seus concorrentes, com

economias de escopo e escala em atividades intensas na imobilização de capital, tais

como a construção de fábricas de componentes e veículos, engenharia para renovação

dos modelos, rede de distribuição, e crédito ao consumo.

Cabe destacar, que no início dos anos 1920 a GM era um conglomerado de

diversos fabricantes, sendo boa parte pouco rentáveis, enquanto a Ford dominava o

mercado com seu modelo T. Portanto, o sucesso da GM também contou com a miopia de

sua principal concorrente que resistiu em perceber as exigências da demanda e em

poucos anos deteriorou sua posição de liderança em favor da General Motors. Além

disso, as respostas relativamente positivas em relação aos demais desafios permitiram

que a GM pudesse dispor de grande folga organizacional para aplicar na neutralização

das pressões de fragmentação.

Os elementos encontrados neste estudo em relação aos desafios à longevidade

são relevantes também por apresentar aspectos diferentes do que até então vinha sendo

apresentado na literatura acadêmica e de negócios. As explicações obtidas a partir deste

trabalho se diferenciam, primeiramente, ao apresentar elementos sob uma perspectiva

cronológica que identifica a origem e a evolução dos processos que formam organização.

Em segundo lugar, o uso do arcabouço proposto por Fleck (2009) fornece uma leitura

abrangente e organizada sobre os aspectos que contribuem para a propensão ao sucesso

ou ao fracasso. O resultado das análises revelou formas diferentes para interpretar

algumas das justificativas para o fracasso da GM mais comunmente apresentadas.

Abaixo estão alguns exemplos de afirmações tradicionalmente usadas para explicar o

fracasso da GM, seguidos da perspectiva adicionada por este estudo.

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237

• O fracasso da GM esteve relacionado ao peso dos passivos trabalhistas

como fundos de pensão e de assistência médica – Ao longo da análise, o

excesso de reajustes e benefícios concedidos aos trabalhadores, a partir dos anos

1940, é considerado como uma folga aplicada para dissuadir um conflito, dentro de

uma prática de arbitragem e acomodação de exigências divergentes. Este foi um

padrão de resposta recorrente ao longo da trajetória da GM em relação a desafio

de navegação no ambiente dinâmico. Em nome da manutenção de uma atividade

altamente rentável, a GM passou a conceder recursos em excesso a seus

stakeholders, neste caso, trabalhadores, para que não criassem problemas para a

operação, porém subestimando as implicações destas decisões sobre a eficácia

da organização.

• O fracasso da GM deveu-se à competição desigual relacionada à mão-de-

obra mais barata de empresas asiáticas – As diferenças de custo operacional da

GM em relação às concorrentes asiáticas não estavam relacionadas somente ao

custo da mão-de-obra. Mesmo quando a GM teve acesso aos custos laborais

equivalentes, o sistema fragmentado e departamentalizado da General Motors

tornou inviável a adoção de técnicas de coordenação e de busca de solução de

problemas, que passaram a ser decisivos na diferença entre fabricantes. Desta

forma, a diferença salarial se acumulou a outras diferenças de eficácia e eficiência,

para apenas mascarar e retardar a constatação das limitações gerenciais da GM.

• A GM fracassou por causa da arrogância e menosprezo da General Motors

em relação a exigências como qualidade e demanda por carros compactos e

mais econômicos – A incumbência sobre a versatilidade da GM, desde os anos

1930 e mais intensamente a partir do final dos anos 1950, foi gradualmente

transferida das unidades de negócio para grupos de staff. Tal fragmentação entre

estratégia e implementeação foi a resposta encontrada pela organização para a

necessidade de coordenar a ampla diversidade entre unidades de negócio.

Contudo, teve como conseqüência a repressão das capacitações de inovação da

GM para acompanhar as exigências do mercado. Os novos desenvolvimentos da

GM passaram a seguir tendências já estabelecidas no mercado, usando as

vantagens de tamanho para compensar o atraso em relação aos concorrentes.

• A GM fracassou, pois foi tomada pela hegemonia de uma elite com uma

mentalidade demasiadamente financeira sobre a gestão – Esta característica é

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238

decorrente da separação entre as atividades de estratégia e operação. O perfil

exigido dos membros da organização corporativa, responsáveis pela formulação

de políticas, tornou-se fortemente tecnocrata, uma vez que as decisões passaram

a ser cada vez mais baseadas em conjutos de índices e projeções. A GM até

procurou conciliar perfis de marketing, engenharia e operações nos processos de

definição das políticas corporativas, como no emblemático caso de John Delorean,

no entanto a natureza dos processos decisórios favorecia profissionais que

tivessem maior facilidade em analisar a sobrecarga de relatórios repletos de

números e indicadores. Assim sendo, profissionais de Finanças possuíam uma

maior propensão a se destacar nas esferas mais altas da organização e

consequentemente serem favoritos para ocupar as funções de maior

responsabilidade.

5.2 Implicações do caso da GM para outras organizações

Por se tratar de um estudo de caso, os elementos identificados acerca do sucesso

e do fracasso da General Motors dificilmente podem ser diretamente generalizados para a

questão sobre como empresas que atingiram um reconhecido sucesso, eventualmente

enfrentaram o fracasso. Por outro lado, a comparação entre empresas semelhantes a

General Motors, a fim de permitir maior poder de generalização, traria significativas

complicações para o estudo, como encontrar uma amostra representativa de casos

contemporâneos, minimamente homogêneos, e lidar com o volume e a complexidade de

dados para produzir o nível de análise adequado a este modelo teórico.

As contribuições deste estudo para questões genéricas sobre a gestão das

organizações são mais relevantes quando associadas à validação das proposições

sugeridas pelo arcabouço teórico utilizado. Assim sendo, a relação de condição

necessária entre repostas positivas ao desafio da gestão da diversidade e a propensão a

auto-perpetuação, validada para o caso da General Motors, pode ser interessante para

gestores de outras organizações avaliarem como estão respondendo a este desafio.

Além disso, abordando os resultados do estudo para os demais desafios à

longevidade, ao se deparar com a constatação de que a GM alcançou altos níveis de

crescimento e de criação de valor, mesmo nutrindo um traço auto-destrutivo, pessoas

envolvidas com a gestão de organizações virtualmente reconhecidas como de sucesso

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239

podem despertar-se para questionar se algo semelhante não está se passando nas

empresas com as quais têm relação.

5.3 Contribuições ao arcabouço teórico

O estudo de caso sobre a General Motors validou a aplicação do modelo teórico

apresentado por Fleck (2009) para a compreensão de como esta importante organização

do setor automobilístico desenvolveu sua trajetória. O trabalho também pode comprovar a

adequada utilização do modelo teórico dos desafios à longevidade associado a uma

estratégia de pesquisa baseada em uma visão de processo (LANGLEY, 1999). A

abordagem histórica com a reconstituição cronológica dos eventos permitiu a identificação

de padrões e a comparação em relação à teoria.

Os resultados encontrados a partir da análise do caso da GM, sob a ótica do

modelo de Fleck, reforçam a capacidade deste referencial teórico em fornecer um

entendimento diferenciado sobre os fatores que contribuem para o sucesso ou o fracasso

de uma organização. As análises baseadas em referenciais teóricos tradicionais tenderam

a concentram-se nos aspectos mais nítidos de desencaixe entre a organização e o

ambiente, e apontam fatores como passivos trabalhistas, arrogância, competição desleal

de concorrentes asiáticos, menosprezo às exigências do mercado e hegemonia da elite

financeira como explicações para o fracasso da General Motors. Já o arcabouço teórico

utilizado neste trabalho mostrou-se capaz de revelar padrões da dinâmica dos processos

organizacionais que induziram a GM em direção ao crescimento ou ao declínio, e que

foram decisivos no desenvolvimento de vulnerabilidades que determinaram fracasso da

organização.

5.4 Sugestões para estudos futuros

A partir do estudo de caso da General Motors, sob o referencial teórico dos

arquétipos do sucesso e do fracasso de Fleck (2009), estabelece-se uma base para

outros estudos que, ao serem confrontados com este, podem responder perguntas

interessantes. Por exemplo, estudos semelhantes tendo como unidade de análise outras

organizações do setor automotivo, como Toyota, Ford, Chrysler, Honda, Hyunday,

Volkswagen ou Renault poderão fornecer explicações relevantes para a compreensão de

questões relativa à origem de diferenciais competitivos entre empresas, mimetismo e

isomorfismo na indústria e processos de coevolução.

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Por outro lado, outros estudos não necessariamente envolvendo o setor

automobilístico poderiam encontrar neste trabalho uma oportunidade para, a partir da

confrontação das análises, contribuir para a ampliação do entendimento sobre as

organizações. Por exemplo, a comparação do caso da General Motors com outras

empresas que apresentem padrões de fragmentação em relação ao desafio da gestão da

diversidade pode produzir novas constatações teóricas acerca deste desafio, ou mesmo

da relação dele com os demais. De forma análoga, a comparação entre o estudo de caso

na GM com estudos similares em empresas cujos padrões de resposta estejam em

posições opostas em relação à gestão da diversidade pode enriquecer o conhecimento a

respeito deste desafio e sua relação com a auto-perpetuação e a auto-destruição.

Por fim, cabe ressaltar que apesar de o estudo a partir das estratégias de pesquisa

utilizadas ter se verificado possível, as dificuldades em definir e implementar estratégias

para coleta e análise dos dados foram duros obstáculos a serem transpostos. A

quantidade de informações a ser coletada, referentes a um longo período de tempo, cria

problemas como heterogeneidade das fontes em termos de enfoque, viés e rigor,

concentrações variadas de informações em períodos da história, impossibilidade de

confrontar fontes primárias e secundárias, risco de ser influenciado pelo viés da narrativa

e lacunas de informação. Estudos futuros que ofereçam avanços em termos de soluções

para lidar com estes e outros problemas relacionados aos métodos de pesquisa

oferecerão relevante contribuição para a o desenvolvimento do conhecimento.

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7 Apêndice A

7.1 Mapas visuais da trajetória da General Motors

Desafio do Empreendedorismo

As respostas aos desafios do empreendedorismo compreendem quatro dimensões

da análise: ambição, versatilidade, mobilização de recursos financeiros e julgamento. A

evolução dos padrões de ação identificados ao longo da história da GM, apresentados na

Esta análise é feita separadamente entre as dimensões, pois é uma forma de tornar mais

claros os elementos que compõem os serviços empresarias da organização (PENROSE,

2006).

Figura 7-1 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do empreendedorismo

Ambição

(1) Gestor principal é também o maior acionista (2) Consórcio de credores assume o controle da operação (3) Gerentes eram acionistas das unidades de negócio e da General Motors (4) Plano de participação nos lucros (5) Retorno sobre o investimento é a principal meta corporativa (6) Esforço da Segunda Guerra, margem de lucro fixada em 10% (7) A meta principal é ampliar a participação nos mercados

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(8) Plano de compra de ações por executivos-chave da organização

Versatilidade

(9) Willam Durant adquire empresas que identifica como oportunidade (10) Engenheiros e gerentes incumbidos de implementar idéias de Durant (11) Desenvolvimento de novos produtos e inovações tecnológicas nas unidades de negócio (12) Staff de engenheiros, designers e pesquisadores desenvolvendo novas tecnologias e produtos (13) Subsidiária no exterior com modelos e estrutura local (14) Aquisição de empresa para lançar inovações tecnológicas desenvolvidas internamente (15) Importação de modelos de outros fabricantes do exterior para ocupar o mercado de compacto (16) Aquisição de empresas para incorporar tecnologias ao negócio automotivo (17) Joint venture com a Toyota para fabricação de compactos nos Estados Unidos (18) Início de uma nova empresa com equipe autônoma (Saturn)

Mobilização de recursos financeiros

(19) Durant usa prestígio, persuasão e recursos próprios para financiar as operações (20) Reaplicação dos recursos obtidos com a operação (21) Aquisições de empresas com parte do pagamento em ações da GM (22) Empréstimo a consórcio de bancos, com cessão do controle da empresa (23) Redução compulsória dos salários dos gerentes em 50% (24) Emissão de ações na Bolsa de Nova York (25) Associação à DuPont e minoritariamente ao JP Morgan (26) Empréstimos de longo prazo para completar parte do capital usado em planos de expansão

Julgamento

(27) Tino empresarial de William Durant aprova ou reprova os empreendimentos da GM (28) Um comitê de representantes do consórcio de credores avalia a viabilidade dos projetos (29) Comitê de finanças avalia necessidades de caixa para determinar necessidade de captação (30) Comitê de emergencia centraliza a availiação da viabilidade dos projetos (31) Staff financeiro por meio do CF, avalia as perspectivas de retorno sobre investimento (32) Staff operacional, geralmente por meio de comites e avalia viabilidade dos projetos (33) Formação de uma equipe independente, para analisar e deliberar a viabilidade da Saturn

Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico

Os padrões de ação da General Motors em resposta ao desafio da navegação no

ambiente dinâmico são apresentados na figura abaixo. Foram identificados nos fatos

históricos analisados seis dimensões do ambiente externo com as quais a organização

manteve esforços para captura de valor e manutenção da legitimidade. As seis dimensões

são as seguintes:

• Sociedade e economia - trata das ações da GM para monitorar, moldar ou se adaptar

às alterações na atividade econômica e nos hábitos e valores da sociedade.

• Acionista – refere-se a ações da GM para manutenção da reputação e da legitimidade

da gestão perante os detentores de suas ações.

• Relações trabalhistas – ações para assegurar o fluxo de mão-de-obra nas atividades

produtivas.

• Tecnologia – diz respeito a atividades de monitoramento do surgimento de tecnologias,

bem como de ações para moldar ou participar dos ciclos tecnológicos.

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• Indústria automotiva e concorrentes – ações praticadas pela organização para

monitorar e moldar a evolução da cadeia produtiva e dos concorrentes

• Governo e legislação – monitoramento de leis e de regras governamentais e ações

visando construir oportunidades a partir de medidas do governo e, ao mesmo tempo,

evitar pressões contra a legitimidade.

Figura 7-2 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Navegação no Ambiente

Dinâmico

Sociedade e Economia

(34) Observação e análise aleatória e esporádica de Durant e outros membros da organização (35) Informções não sistematizadas passadas por concessionários à organização de vendas (36) Análise de estatísticas nacionais eo de pesquisas realizadas com vendedores (37) Coleta de dados sistemática informações sobre demandas e estoques junto à rede de lojas (38) Exibição de protótipos e observação da reação do público em salões e exposições (39) Pesquisas de mercado durante o processo de desenvolvimento de novos modelos

Acionistas

(40) Acionista majoritário é também o principal gestor da organização (41) Grandes acionistas participando no conselho de administração 42) Pagamento de dividendos atraentes e constantes (43) Controle da empresa entregue a um consórcio de credores (44) Acionistas representados diretamente no CF (45) Acionistas representados diretamente em um CE (46) Acionistas elegem representantes indicados por gestores da empresa em convenção anual (47) Inclusão de representação direta de um grande acionista fruto da aquisição (Ross Perot)

Relações trabalhistas

(48) Ações voluntárias da GM em relação a recrutamento, treinamento, divisão do trabalho e bem-estar dos operários, evitando qualquer tipo de negociação (49) Contratação de espionagem nas fábricas e prevenção contra organização sindical (50) Concessões ao sindicato apenas mediante a greve extenuante barganha

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(51) Adoção de sistema de negociação de remuneração e benefícios (52) Fuga de sindicatos abrindo novas plantas fora da região de influência (53) Flexibilização dos contratos negociados com o sindicato

Tecnologia

(54) Observação e busca espontânea de tecnologias emergentes por parte de executivos (55) Aquisição de empresas detentoras de tecnologias desejadas (56) Staff de especialistas aplicados no desenvolvimento avançado de tecnologia (57) Cessão mútua de patentes ligadas ao controle de emissão de poluentes

Indústria automotiva e concorrentes

(58) Consolidação por meio de aquisição de concorrentes e fornecedores (59) Produção verticalmente integrada com prática de cotações de fornecimento comparando fornecedores internos e externos, com autonomia entre as divisões (60) Monitoramento de marcas, modelos e preços, posicionando-se no topo de cada segmento (61) Monitoramento e testes dos veículos dos concorrentes no campo de provas (62) Joint venture com a Toyota para fabricação de compactos nos Estados Unidos

Governo e legislação

(63) Monitoramento e cumprimento das exigências legais (64) Desafio à validade de patente sobre fabricação de veículos automotores (65) Resistência ao esforço de fornecimento de material militar durante a Primeira Guerra (66) Monitoramento, evitação e desafio à acusações de trusting entre a Du Pont e GM (67) Resistência a contestações judiciais sobre práticas de crédito através da GMAC (68) Cooperação para o fornecimento de materiais militares (69) Associação para lobby em favor de política pública federal de construção de estradas (70) Evitação de questionamentos sobre controle de emissão de poluentes (71) Evitação e dissuasão de aplicação de dispositivos de segurança veicular

Desafio da Gestão da Diversidade

As ações que indicam as respostas da Genaral Motors ao desfio da gestão da

diversidade são divididas em duas dimensões: o compartilhamento de recursos e os

mecanismos de coordenação.

Figura 7-3 Padrões encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da diversidade

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Relações de compartilhamento de recursos

(91) Integração vertical sobre a cadeia de fornecedores (92) Fusão de unidades com atividades relacionadas (93) Desinvestimento ou venda de unidades de negócios (94) Intercâmbio de partes e arquiteturas de veículos entre unidades (95) Unificação da gestão de caixa das divisões com um controle corporativo (96) Unificação de carrocerias por tamanho (97) Novos modelos feitos sobre a base de modelos anteriores (98) Paralisação anual da linha de montagem para troca de modelos (99) Comunicação de partes, ferramentas e arquiteturas para aplicação em todas as divisões (100) Contratos com dispositivos de seleção e proteção dos concessionários (101) Aumento pré-fixado, benefícios e equiparação à indústria (102) Fusão das operações de montagem em uma única divisão (103) Reorganização de seis divisões em CPC e BOC

Coordenação de recursos

(104) Coordenação centralizada em Durant, tratando diretamente com os chefes de divisões (105) Comitê representante de credores toma decisões na gestão da empresa (106) Staff ligado ao comitê executivo aplicado em estudos ad-hoc (107) Comitê executivo para decisões de operações e de finanças para gestão de tesouraria (108) Comitê executivo centralizador durante período de grande incerteza (109) Staff financeiro, com controllers nas divisões exercendo duplo report (110) Comitê de finanças aprova orçamento corporativo e das divisões (111) Comitês interdivisão para formulação de políticas consensos (112) Consenso entre divisões e staff obtido por meio de persuasão e venda de conceitos (113) CE formado por executivos corporativos e membros do board (114) CO formado por executivos corporativos para recomendar políticas ao CE (115) Staff permanente para formulação de estudos e consensos nas áreas operacionais (116) Conselho de distribuidores para formulação de políticas junto à rede de distribuição (117) Grupos temáticos de staff subordinados ao CE e dedicados a formulação (118) Centralização do poder no CEO, com controle sobre CF e CE (119) Desenvolvimento em equipes de produto

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Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos

As respostas ao desafio de aprovisionamento de Recursos Humanos foram

analisadas em três dimensões.

• Seleção e Formação – diz respeito às ações da GM para recrutar, treinar e formar

recursos gerenciais. Está inclusa nesta dimensão ações de identificação de talentos,

promoção e desenvolvimento de carreiras para formação de gerentes.

• Retenção – são ações orientadas para fomentar o compromisso de longo prazo de

gerentes com a organização.

• Sucessão – trata das ações para preparação e escolha dos sucessores nos postos

mais altos de liderança da organização.

Figura 7-4 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos

Seleção e Formação

(120) Recrutamento não-sistemático de profissionais (121) Promoções e rotação entre áreas e divisões mediante avaliação de desempenho pelo superior (122) Profissionais absorvidos na aquisição de empresas (123) Recrutamento de contadores e administradores recém formados em boas universidades (124) Escola corporativa provendo treinamento técnico (125) Recrutamento de executivos na Du Pont (126) Promoções dentro da organização de finanças mediante avaliação do superior (127) Busca de profissionais específicos já estabelecidos no mercado de trabalho

Retenção (128) Gerentes detentores de ações da General Motors e/ou de empresas absorvidas

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(129) Plano de bônus (130) Aumentos de salários em programa de avaliação de desempenho (131) Programa de compra de ações para altos executivos através da Managers Securities Co. (132) Extensão dos aumentos negociados pelo sindicato para os demais empregados assalariados (133) Programa de stock option para altos executivos (134) Lealdade ao chefe como critério para a promoção dos executivos

Sucessão

(135) Predomínio de Durant nas escolhas de sucessão de executivos (136) Consóricio de credores determina sucessão de gerentes (137) Escolha de sucessores de forma ad-hoc, com o crivo do board para os casos de executivos corporativos (138) Pool de executivos seniors atuando na formulação e aprovação de estratégias corporativas (139) Executivo indica o próprio sucessor (140) Sucessão do CEO planejada com antecedência (141) Estabelecimento de idade para aposentadoria compulsória (142) Predominância do executivo de finanças para as funções de CEO e Chairman

.

Desafio da Gestão da Complexidade

Os padrões de ação encontrados nas respostas da GM ao desafio da gestão da

complexidade são apresentados em duas dimensões. A primeira dimensão é a orientação

para solução de problemas, relacionada às ações, métodos e procedimentos que a

organização regularmente utiliza para resolver seus problemas. A segunda dimensão de

análise é a sistematização de procedimentos. Neste caso, procurou-se identificar padrões

na adoção de procedimentos sistemáticos para lidar com situações de alta complexidade.

Figura 7-5 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da Complexidade

Orientação para solução de

(143) Durant se envolve diretamente na busca de soluções para problemas

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problemas (144) Autonomia para as divisões resolverem seus problemas de forma independente (145) Aquisição de empresa para absorver capacitações e tecnologias (146) Comitê de credores analisa e delibera soluções (147) Staff corporativo de pesquisa avançada (148) Força-tarefa para estudo e busca de solução (149) Staff consultivo monitorando a operação e propondo soluções por meio de novas políticas (150) Intervenção corporativa nas unidades de negócio

Sistematização de procedimentos

(151) Sistema de produção por oficinas de trabalho aplicadas na linha de montagem (152) Sistematização das demonstrações financeiras das unidades de negócio e do consolidado (153) Sistema de controle financeiro a partir do método standard volume (154) Harmonização de práticas e parâmetros por meio de comitês temáticos interdivisionais (155) Avaliação de potencial geográfico para determinar a alocação de concessionárias (156) Sistema de gestão por políticas com hierarquia para formulação e aprovação (157) Sistema de conselho de distribuidores para mediar políticas de vendas (158) Sistema de contratação interna com margem fixa durante a Segunda Guerra (159) Sistema de comitês de fábrica e e negociação com o sindicato (160) Informatização do processo produtivo (161) Integração dos sistemas de produção, suprimentos, vendas e distribuição (162) Automação do processo produtivo aplicando intenso uso de robôs integrados (163) Adoção fragmentada de técnicas japonesas de melhoria contínua

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8 ANEXOS Tabela 8-1 Receita Líquida, Lucro e Ativo Total da General Motors entre 1917 e 2008

Ano Receita Líquida Lucro Líquido Ativo Total

1917 96.295.741 14.294.000 133.789.724 1918 269.796.829 14.826.000 299.489.336 1919 509.676.694 60.005.000 446.652.520 1920 567.320.603 37.750.000 604.806.868 1921 304.487.243 (38.681.000) 515.122.979 1922 463.706.733 54.474.000 522.335.034 1923 698.038.947 72.009.000 593.123.718 1924 568.007.459 51.632.000 592.570.918 1925 734.592.592 116.016.000 703.786.664 1926 1.058.153.338 186.231.000 920.894.106 1927 1.269.519.673 235.105.000 1.098.477.575 1928 1.459.762.906 276.468.000 1.242.894.869 1929 1.504.404.472 248.282.000 1.324.889.764 1930 983.375.137 151.099.000 1.315.813.059 1931 808.840.723 96.877.000 1.300.267.222 1932 432.311.868 165.000 1.115.228.641 1933 569.010.542 83.214.000 1.183.674.006 1934 862.672.670 94.769.000 1.268.532.026 1935 1.155.641.511 167.227.000 1.414.266.298 1936 1.439.289.940 238.482.000 1.518.188.800 1937 1.606.789.841 196.437.000 1.566.673.796 1938 1.066.973.000 102.190.000 1.598.012.229 1939 1.376.828.337 183.290.000 1.323.382.388 1940 1.794.936.642 195.622.000 1.535.916.531 1941 2.436.800.977 201.653.000 1.747.250.191 1942 2.250.548.859 163.652.000 1.979.771.117 1943 3.796.115.800 149.780.000 2.264.718.441 1944 4.262.249.472 170.996.000 2.182.609.504 1945 3.127.934.888 188.268.000 1.813.885.559 1946 1.962.502.289 87.526.000 1.982.692.134 1947 3.815.159.163 287.991.000 2.472.969.238 1948 4.701.770.340 440.448.000 2.957.769.607 1949 5.700.835.141 656.434.000 2.824.074.217 1950 7.531.086.846 834.044.000 3.444.195.961 1951 7.465.554.851 506.199.000 3.671.582.575 1952 7.549.154.419 558.721.000 4.001.294.708 1953 10.027.985.482 598.119.000 4.405.475.042 1954 9.823.526.291 805.974.000 5.130.093.595 1955 12.443.277.420 1.189.477.000 6.344.772.161 1956 10.796.442.575 847.396.000 6.569.400.736 1957 10.989.813.178 843.592.000 6.825.788.811

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259

1958 9.521.956.629 633.628.000 6.890.854.380 1959 11.233.057.200 873.100.000 7.246.408.027 1960 12.735.999.681 959.042.000 7.837.665.995 1961 11.395.916.826 892.821.000 8.272.596.180 1962 14.640.240.799 1.459.077.000 9.169.053.616 1963 16.494.818.184 1.591.823.000 9.641.165.359 1964 16.997.044.486 1.734.782.000 10.292.828.528 1965 20.733.982.295 2.125.606.000 11.478.546.590 1966 20.208.505.041 1.793.392.000 12.213.487.799 1967 20.026.252.468 1.627.276.000 13.273.082.524 1968 22.755.403.000 1.731.915.000 14.010.175.142 1969 24.295.141.000 1.710.695.000 14.820.094.529 1970 18.752.354.000 609.087.000 14.174.359.767 1971 28.263.918.000 1.935.709.000 18.241.900.040 1972 30.435.231.000 2.162.807.000 18.273.382.035 1973 35.798.289.000 2.398.103.000 20.296.861.419 1974 31.549.546.000 950.069.000 19.873.550.014 1975 35.724.911.000 1.253.092.000 21.664.884.594 1976 47.181.000.000 2.902.800.000 24.442.400.000 1977 54.961.300.000 3.337.500.000 26.658.300.000 1978 63.221.100.000 3.508.000.000 30.598.300.000 1979 66.311.200.000 2.892.700.000 32.215.800.000 1980 57.728.500.000 (762.500.000) 34.581.000.000 1981 62.689.500.000 333.400.000 38.991.200.000 1982 60.025.600.000 962.700.000 41.397.800.000 1983 74.581.602.000 3.730.194.000 45.694.500.000 1984 83.889.900.000 4.516.500.000 52.144.900.000 1985 96.371.700.000 3.999.000.000 63.832.800.000 1986 102.813.700.000 2.944.700.000 72.593.000.000 1987 101.781.900.000 3.550.900.000 162.343.200.000 1988 110.228.500.000 4.856.300.000 164.063.100.000 1989 112.533.200.000 4.224.300.000 173.297.100.000 1990 110.797.300.000 (1.985.700.000) 180.236.500.000 1991 123.109.000.000 (4.453.000.000) 184.325.500.000 1992 132.243.000.000 (23.498.000.000) 190.196.000.000 1993 138.219.500.000 2.465.800.000 188.200.900.000 1994 154.951.200.000 4.900.600.000 198.599.000.000 1995 160.254.000.000 6.881.000.000 213.663.000.000 1996 164.013.000.000 493.000.000 222.142.000.000 1997 178.174.000.000 6.698.000.000 228.888.000.000 1998 161.315.000.000 2.956.000.000 257.389.000.000 1999 189.058.000.000 6.002.000.000 274.730.000.000 2000 184.632.000.000 4.452.000.000 303.100.000.000 2001 177.260.000.000 601.000.000 323.969.000.000 2002 186.736.000.000 1.736.000.000 369.053.000.000 2003 195.645.200.000 3.822.000.000 448.507.000.000 2004 193.517.000.000 2.805.000.000 479.921.000.000

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2005 192.604.000.000 (10.600.000.000) 476.078.000.000 2006 204.467.000.000 (1.978.000.000) 186.304.000.000 2007 179.984.000.000 (38.732.000.000) 148.883.000.000 2008 148.979.000.000 (30.860.000.000) 91.047.000.000

Fonte: Relatório Moody’s de 1917 à 1998; Relatório anual da General Motors

Tabela 8-2 Produto nacional bruto do Estados Unidos entre 1917 e 2009 Ano Produto Nacional

Bruto 1917 60.400.000.000 1918 76.400.000.000 1919 84.000.000.000 1920 91.500.000.000 1921 69.500.000.000 1922 74.100.000.000 1923 85.100.000.000 1924 84.700.000.000 1925 93.100.000.000 1926 97.000.000.000 1927 94.900.000.000 1928 97.000.000.000 1929 104.400.000.000 1930 91.900.000.000 1931 77.000.000.000 1932 59.100.000.000 1933 56.700.000.000 1934 66.300.000.000 1935 73.600.000.000 1936 84.000.000.000 1937 92.200.000.000 1938 86.500.000.000 1939 92.500.000.000 1940 101.700.000.000 1941 127.200.000.000 1942 162.300.000.000 1943 198.900.000.000 1944 220.100.000.000 1945 223.400.000.000 1946 222.900.000.000 1947 245.300.000.000 1948 270.600.000.000 1949 268.600.000.000 1950 295.200.000.000 1951 341.200.000.000 1952 360.300.000.000 1953 381.300.000.000 1954 382.500.000.000 1955 417.200.000.000

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1956 440.300.000.000 1957 464.100.000.000 1958 469.800.000.000 1959 509.300.000.000 1960 529.500.000.000 1961 548.200.000.000 1962 589.700.000.000 1963 622.200.000.000 1964 668.500.000.000 1965 724.400.000.000 1966 792.900.000.000 1967 838.000.000.000 1968 916.100.000.000 1969 990.700.000.000 1970 1.044.900.000.000 1971 1.134.700.000.000 1972 1.246.800.000.000 1973 1.395.300.000.000 1974 1.515.500.000.000 1975 1.651.300.000.000 1976 1.842.100.000.000 1977 2.051.200.000.000 1978 2.316.300.000.000 1979 2.595.300.000.000 1980 2.823.700.000.000 1981 3.161.400.000.000 1982 3.291.500.000.000 1983 3.573.800.000.000 1984 3.969.500.000.000 1985 4.246.800.000.000 1986 4.480.600.000.000 1987 4.757.400.000.000 1988 5.127.400.000.000 1989 5.510.600.000.000 1990 5.837.900.000.000 1991 6.026.300.000.000 1992 6.367.400.000.000 1993 6.689.300.000.000 1994 7.098.400.000.000 1995 7.433.400.000.000 1996 7.851.900.000.000 1997 8.337.300.000.000 1998 8.768.300.000.000 1999 9.302.200.000.000 2000 9.855.900.000.000 2001 10.171.600.000.000 2002 10.500.200.000.000

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2003 11.017.600.000.000 2004 11.762.100.000.000 2005 12.502.400.000.000 2006 13.252.700.000.000 2007 13.910.000.000.000 2008 14.397.800.000.000

Fonte: Balke & Gordon (1989) até 1928; Buerau of Economic Analisys de 1929 em diante

Tabela 8-3 Vendas de veículos nos Estados Unidos entre 1900 e 2008 Ano Vendas

Totais de

veículos

Automóveis Caminhões e

utilitários

General

Motors

1900 4192 4192 0

1901 7000 7000 0

1902 9000 9000 0

1903* 11235 11235 16

1904* 22830 22130 700 37

1905* 25000 24250 750 750

1906* 34000 33200 800 2295

1907* 44000 43000 1000 4641

1908 65000 63500 1500 9875

1909 127287 123990 3297 30084

1910 187000 181000 6000 44564

1911 210000 199319 10681 35459

1912 378000 356000 22000 41358

1913 485000 461500 23500 56118

1914 572139 548139 24000 58987

1915 969930 895930 74000 97937

1916 1617708 1525578 92130 176834

1917 1873949 1745792 128157 195945

1918 1170686 943436 227250 213334

1919 1876356 1651625 224731 344334

1920 2227349 1905560 321789 362448

1921 1616119 1468067 148052 208306

1922 2544176 2274185 269991 419682

1923 4034012 3624717 409295 754810

1924 3602540 3185881 416659 533833

1925 4265830 3735171 530659 790880

1926 4301234 3692617 608617 1179214

1927 3401326 2936533 464793 1472494

1928 4358759 3775417 583342 1790736

1929 5337087 4455178 881909 1799427

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1930 3362820 2787456 575364 1105773

1931 2380426 1948164 432262 997594

1932 1331860 1103557 228303 506928

1933 1896817 1567599 329218 779029

1934 2737070 2160865 576205 1086321

1935 3971241 3273874 697367 1504698

1936 4461462 3679242 782220 1803275

1937 4820219 3929203 891016 1846621

1938 2508407 2019566 488841 1052873

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Page 276: Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de caso da ... · PDF fileiii FICHA CATALOGRÁFICA Rezende, Renato Silva de R. Sucesso e Fracasso Organizacional: Um estudo de caso da

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1971 12259700 10227800 2031900 5767138

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2007 16460300 7588100 8872200 3867000

2008 13501000 6757000 6744000

Fonte: Chandler (1964); Estatísticas do senado norte-americano; Relatório Moody’s; Relatório anual da General Motors * As vendas da GM nestes anos referem-se apenas a Buick