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Modapalavra e-peridico
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL: UM DESAFIO PARA A MODA
Environmental sustainability : a challenge for fashion
Neide Khler Schulte1 e Luciana Lopes2
Resumo
Neste artigo se prope uma reflexo sobre um paradigma que se estabeleceu no sculo XXI: o desenvolvimento ambientalmente sustentvel, e sua implicao na criao de produtos para o vesturio. O consumidor, a indstria, o criador de novos produtos, todos tm papis determinantes na consolidao deste paradigma. Os impactos ambientais devem ser considerados em todas as etapas nos projetos de novos produtos, da origem da matria-prima at o descarte pelo consumidor. O desenvolvimento sustentvel um grande desafio para a criao de novos produtos para o vesturio de moda, pois o ciclo de vida muito curto destes produtos, e o apelo ao consumismo, representam um entrave. Diante deste contexto, so identificados novos cenrios para a moda.
Palavras-chave: desenvolvimento sustentvel, novos cenrios, moda
Abstract
In this article is proposed a reflection about a paradigm which was established in
the XXI century: the sustainable environmental development and the implication
of that in the creation of clothing products. The costumers, the industry, the
creator of new product, all of them have determinant roles in the consolidation of
this paradigm. The environmental impacts must be considered in all the steps of
the project of new product, from the origin of the raw material to the discard by
the costumers. The sustainable development is a big challenge for the creation of
new products, and the appeal for consumerism represents a barrier. Observing
this context, are identified new scenarios for fashion.
Key words: sustainable development, new scenarios, fashion
Introduo
1 Mestre em Gesto do Design pela Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. Professora de Desenho de Moda na Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC2 Especialista em Moda Criao e Produo pela Universidade Estadual de Santa Catarina UDESC. Professora de Modelagem Industrial na Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC.
Ano 1, n.2, ago-dez 2008, pp. 30 - 42. ISSN 1982-615x 31
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O artigo prope uma reflexo sobre o paradigma que se estabeleceu no sculo XXI: o
desenvolvimento ambientalmente sustentvel e sua implicao na criao de produtos para o
vesturio de moda. A pesquisa Eco fashion: consolidao de uma tendncia ecolgica na moda,
foi o ponto de partida para as reflexes sobre o sistema da moda diante dos princpios
estabelecidos para um desenvolvimento sustentvel: economicamente vivel, socialmente justo e
ecologicamente correto. Conceber novos produtos para o vesturio, de acordo com estes
princpios, um grande desafio para moda. Os ciclos curtos de vida destes produtos e o apelo ao
consumismo representam um entrave ao desenvolvimento sustentvel. O consumidor, a
indstria, o criador de novos produtos, todos tm papis determinantes na consolidao deste
paradigma. Os impactos ambientais devem ser considerados em todas as etapas nos projetos de
novos produtos, da origem da matria-prima at o descarte pelo consumidor. Diante deste
contexto, preciso identificar novos cenrios.
Para compreender como se configurou o contexto atual, da relao entre o homem e a
natureza, torna-se necessrio um breve retorno na histria da humanidade. O homem teve
diferentes percepes da natureza. Inicialmente a respeitava, tinha uma viso sacralizada,
considerando-a onipotente, imprevisvel e indomvel, um verdadeiro culto natureza. Os Deuses
eram entendidos como agentes dos fenmenos naturais, o homem aceitava e temia seus
desgnios, agradecendo a generosidade proporcionada: a chuva, as plantas, os animais. Depois,
com os fsicos gregos e, mais tarde com o judasmo-cristo, o homem passa a ter uma postura
interrogativa e contemplativa (CAMARGO, 2002).
Com o desenvolvimento da cincia, passou a ser fundamental compreender o significado
das coisas que aconteciam. O que a cincia no explicava, era atribudo ao divino, uma relao
homem-natureza dentro de princpios metafsicos e divinos. Com a revoluo da cincia no
sculo XVII e depois com a revoluo industrial, o modelo orgnico de mundo me-terra, foi
substitudo pelo modelo mecanicista mundo-mquina. Com isso, o universo material, incluindo
a natureza, passou a ser considerado como uma mquina, que pode ser completamente entendida
e analisada; a afirmao do homem como sujeito, um ser inteligente, e a realidade, como objeto.
A natureza e o universo eram compreendidos como coisas mutveis, a serem dominadas,
exploradas e pesquisadas pelo homem (CAPRA, 1996).
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Surge no sculo XX, uma viso romntica da natureza como um grande todo harmonioso,
que levou alguns cientistas a ver a Terra como um todo integrado. A cincia trouxe uma
perspectiva holstica da natureza, conhecida como pensamento sistmico, surgindo uma nova
cincia: a Ecologia. A natureza passa a ser vista como uma teia inter-conexa de relaes, cujas
propriedades essenciais nenhuma das partes possui isoladamente. A viso sistmica reconhece
que todos os conceitos e teorias so limitados e aproximados, e a cincia no fornece uma
completa e definitiva compreenso da realidade (CAPRA, 1996).
Este todo harmonioso, o planeta Terra, est sendo destrudo. Os cientistas tm alertado
para a necessidade urgente de recuperao e preservao da natureza. Todos sabem dos
problemas ambientais, porm saber apenas no basta. preciso incorporar tal saber, tornar-se
sensvel e agir. Atitudes simples na vida cotidiana, como a reciclar o lixo, no desperdiar gua
e energia, so muito significativas para a preservao ambiental. A escolha mais criteriosa dos
produtos consumidos, o uso de combustveis alternativos, e principalmente a reduo do
consumo, entre outras aes, so de grande importncia para a minimizao dos problemas
ambientais e para a promoo do desenvolvimento sustentvel.
Desenvolvimento sustentvel
Existem definies de vrios autores e organizaes ambientais para desenvolvimento
sustentvel. Segundo a Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente (1987) a explorao
equilibrada dos recursos naturais, nos limites da satisfao das necessidades e do bem-estar da
presente gerao, assim como de sua conservao no interesse das geraes futuras. o
desenvolvimento que atende s necessidades do presente sem comprometer a capacidade das
geraes futuras de atenderem as suas necessidades CMMAD - Comisso mundial de Meio
Ambiente e Desenvolvimento Comisso Brundtlant (1987). Para estabelecer as diretrizes do
desenvolvimento sustentvel foi criada a Agenda 21. Programa para o sculo XXI adotado em
1992, na Reunio da Cpula da Terra, por 170 chefes de Estado e de Governo. Define os grandes
princpios de ao desejveis para traar o caminho em direo ao desenvolvimento sustentvel,
em setores to diversos quanto economia, gesto de recursos naturais, a educao e a situao
das mulheres3.
3 Tnia Mara Tavares Gasi Curso Produo + Limpa So Bento do Sul SC, novembro de 2006.
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Na verdade, praticar a sustentabilidade ambiental significa cuidar das coisas. Do menor
de todos os produtos, at o planeta inteiro e vice-versa. A transio para a sustentabilidade pode
acontecer por caminhos traumticos, uma transio forada por efeitos catastrficos, que de fato
obrigam a uma reorganizao do sistema, a mais indolores, uma transio por escolha, isto ,
como efeitos de mudanas culturais, econmicas e polticas voluntrias que reorientem as
atividades de produo e consumo (VEZZOLI, 2005).
Dentro deste escopo, desde a dcada de 90, com a ISO 14000, algumas empresas txteis
brasileiras e demais setores, passaram a incorporar a questo ambiental. Alm de rever todo
processo produtivo e tratar os efluentes, para minimizar os prejuzos ambientais, passaram a
desenvolver projetos ambientais e sociais. No entanto, ainda so poucas as empresas txteis que
procuram se adequar aos princpios da sustentabilidade ambiental.
Gradativamente, a preocupao com a preservao do meio ambiente, no processo de
desenvolvimento de produtos, passa a fazer parte do sistema da moda. J possvel encontrar no
mercado brasileiro algumas marcas que trabalham com este valor agregado a seus produtos e este
nmero est crescendo. Entre os produtos j disponveis no mercado, pode-se citar o tecido
ecovogt, 100% ecolgico, que foi criado pelo estilista brasileiro Caio Von Vogt. uma inovao
na indstria mundial da moda, que pode ser utilizado em qualquer tipo de roupa ou acessrio (na
confeco de camisetas, vestidos, calas, bolsas, cintos ou calados). Ao contrrio de outros
produtos do mercado, o ecovogt, que uma fibra de origem vegetal, se decompe em dois anos,
enquanto o algodo, que tambm uma fibra de origem vegetal, demora 10 anos, e o polister
leva um sculo4.
Outro exemplo de produtos para o vesturio com vis ecolgico e tambm social, a marca
para vesturio infantil Pistache & Banana. Uma empresa de Santa Brbara do Oeste, So Paulo,
que apresentou em 2006 ao mercado brasileiro, sua primeira coleo com peas produzidas em
algodo orgnico. Todo o processo de produo do algodo foi desenvolvido em Goioer,
Paran, por famlias de produtores da Coagel (Cooperativa Agroindustrial). O algodo vira fio,
tecido, cortado e acabado, em Santa Brbara do Oeste, nas linhas de produo da Pistache &
Banana5. A costura e bordados das peas so realizados por pequenos grupos e cooperativas de
44 www.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/comunidade 03/11/20065 www.pistachebanana.com.br
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costureiras e bordadeiras. A empresa procura seguir todas as etapas do processo de comrcio
justo, do fornecedor do algodo at o produto final, disseminando a responsabilidade e incluso
social e tambm conscincia ecolgica entre parceiros e clientes.
Alm das iniciativas de algumas marcas de produtos para o vesturio, eventos importantes
de moda como a 22 SPFW (So Paulo Fashion Week), maior evento de passarela de moda do
Brasil e quarta passarela de moda mundial, ao eleger o tema sustentabilidade ambiental,
contribuem para sensibilizao da indstria de produtos de moda, bem como o consumidor, a fim
de que esses incorporem uma realidade imperativa: o desenvolvimento de produtos
ambientalmente sustentveis. O objetivo do discurso ecolgico da SPFW tornar a indstria da
moda mais consciente. A proposta criar mais com menos, fazendo um evento e uma moda
economicamente viveis, socialmente justos e ambientalmente corretos. Estes so os trs
princpios da sustentabilidade, idia que comea a tomar forma nessa edio e que pretende ser
levada risca pela organizao nos prximos anos6.
O respeito pelo meio ambiente, a utilizao de fibras e tintas naturais e a reciclagem de
roupas e objetos usados, so a base da moda ecolgica, que pouco a pouco tem conquistado os
consumidores e estilistas na Itlia e em outros pases. Na chamada ecomoda, tambm se
confecciona roupa orgnica. Essas roupas so elaboradas com tecidos em cuja produo no so
usados produtos qumicos, nem fertilizantes, nem pesticidas. E, embora a moda de baixo impacto
ambiental esteja mais desenvolvida em mercados como o ingls e o alemo, at gigantes do
ramo, como Giorgio Armani, esto dispostos a aderir tendncia. Armani cria jeans
ecologicamente corretos, feitos com algodo orgnico. Outras grifes famosas internacionais
vendidas na Itlia, como Levi Strauss, Gap, Nike ou Marks & Spencer, tambm uniram-se
moda ecolgica. Ponchos feitos com fibra de soja, trajes elaborados com embalagens de ovos ou
calas fabricadas a partir de algas so alguns exemplos desta moda alternativa que combina
criatividade com materiais inslitos. Muitos estilistas tambm reutilizam vestidos velhos ou que
j no servem mais, chamada de vintage, como uma forma de conservar os recursos naturais. A
ecomoda esteve em voga nos anos 80, mas era um estilo pobre ou hippie. Atualmente,
entretanto, uma tendncia, com exibies especiais em capitais da moda como Londres, Nova
York ou Milo. Porm, o repentino interesse de marcas importantes em confeccionar roupas que
respeitem o homem e a natureza gera reparos de alguns ecologistas. A experincia de Armani
6 www.g1.com.br 30/01/07
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interessante, mas nem todas as empresas esto dispostas a se renovar para reduzir o impacto
ambiental, disse Gabriella Foglio, representante da Legambiente, a maior organizao no-
governamental da Itlia. Afirma ainda, que no existe um mercado forte na Itlia para vender
ecomoda, nem consumidores que possam pagar mais caro por roupas ecolgicos7.
Um dos materiais mais usados na indstria txtil e do vesturio o algodo, e tambm
um dos mais controvertidos. Segundo estimativas da Organizao Mundial da Sade, no mundo
existem entre 500 mil e dois milhes de vtimas de intoxicaes agroqumicas, e um tero delas
de cultivadores de algodo. Assim, a reciclagem outro componente importante da moda
ecolgica, no s para proteger o meio ambiente, como tambm para promover a economia nas
grandes empresas e recuperar materiais nos pases em desenvolvimento. Em Milo, o IED
(Instituto Europeu de Desenho) reutiliza materiais e consegue criar saias de peas de ao,
vestidos de fio eltrico ou de papel de embalagem, e calas de metal de bicicleta, por exemplo.
So projetos dos estudantes que manipulam materiais como as meias de nylon ou as solas dos
sapatos e os transformam em vestidos originais e ecolgicos. Apenas experimentam e do
alternativas a materiais que, de outro modo, iriam para o lixo. Annika Saunders e Kerry Seage,
fundadoras da Junky Styling, que produz jias e vestidos com material reciclado, compartilham
da filosofia de no jogar nada no lixo. A produo destas criadoras, das mais conhecidas no
ambiente da ecomoda, vendida com facilidade, apesar de serem elaboradas com base em peas
usadas e fora de moda8.
As iniciativas apresentadas anteriormente precisam ser aceitas pelo consumidor, passando a
considerar o impacto ambiental dos produtos que consome. uma forma de pressionar as
indstrias, seja de moda ou de outros produtos, para diminurem o prejuzo que causam
natureza. A lgica dos lucros rpidos e cada vez maiores, sem considerar o que est em risco,
tem sido a causa de muitos problemas ambientais.
Em alguns pases j existe uma legislao rgida obrigando as indstrias a se adequarem
para diminuir os danos ao meio ambiente, tambm h consumidores conscientes que procuram
por produtos ecologicamente concebidos, que se preocupam com a natureza e com as geraes
futuras. Na Frana, j representam 15% da populao e vm crescendo acentuadamente. Diante
7 http://www.envolverde.com.br em 08/05/20068 http://www.envolverde.com.br em 08/05/2006
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deste contexto, as empresas no podem mais ignorar este fenmeno, bem como no devem
esquecer de divulgar sua preocupao com o meio ambiente ao desenvolverem seus produtos9.
Novos cenrios
O filsofo francs, Lipovetsky, na sua obra, Imprio do Efmero, diz que moda o
espelho da sociedade. Diante desta definio, como conciliar a moda com o desenvolvimento
sustentvel se os indivduos atomizados, absorvidos consigo mesmos, esto pouco dispostos a
considerar o interesse geral, a renunciar aos privilgios adquiridos; a construo do futuro tende
a ser sacrificada s satisfaes das categorias e dos indivduos do presente
(LIPOVETSKY,1989, 13). Indubitavelmente se est diante de um grande desafio.
Se as mudanas na moda dependem da cultura estabelecida e dos ideais sociais que a
compem, complexo pensar a moda inserida no contexto do desenvolvimento sustentvel. No
entanto, sob a aparentemente tranqila superfcie da cultura esto intensas correntes psicolgicas,
das quais a moda rapidamente capta a direo. Ento, se em uma sociedade democrtica, onde
existem diversas iniciativas e movimentos para estabelecer o desenvolvimento sustentvel, a
moda rapidamente ir incorpor-lo.
A roupa envolve o corpo, protege, comunica. Lurie (1997) diz que, embora ocasionalmente
consideraes prticas como: conforto, durabilidade, viabilidade e preo interferem na escolha,
escolher roupas, em casa ou na loja, nos definir e descrever. Para Eco (1989) o hbito fala pelo
monge, assim, o vesturio comunicao, o vesturio fala. Portanto, se o vesturio de moda
agregar o desenvolvimento sustentvel, o usurio poder comunicar que um sujeito consciente,
sensvel mudana de paradigma e que se preocupa com as futuras geraes e a preservao do
planeta.
inerente ao ser humano a necessidade de se expressar, se comunicar. Atravs do
vesturio expressam-se desejos, sentimentos, convices, crenas, ideais, entre outros, e a
prpria personalidade. Coelho (1995) diz que a roupa nos fala de quem a veste, ela uma
linguagem, um sintoma individual e social: diga-me o que vestes e eu te direi como ests,
9 www.cdra.asso.fr 27/09/05
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quanto tens, a que grupo pertences. Pode-se dizer, ento, que uma das funes do vesturio a
de comunicar e expressar caractersticas dos indivduos e do contexto social.
Outra funo do vesturio pode ser da expresso esttica. Para De Masi (2000) o terceiro
milnio ser o imprio da esttica. Esta proposio no se refere especificamente moda, mas a
todos os produtos. A funo esttica pode ter maior importncia do que a funcionalidade do
produto. Ou ento, na deciso de compra o consumidor opta pelo produto de maior valor
esttico. No caso do produto de moda o valor da funo esttica ainda maior. Quanto maior
valor esttico agregado, mais atraente se torna o produto. O consumidor compra por impulso e
desejo e no por necessidade. As roupas so trocadas e/ou descartadas com muita freqncia,
geralmente antes do fim de sua vida til, apesar de terem alta durabilidade.
Este consumo sem necessidade do vesturio motivo de crtica ao sistema de moda. No
entanto, no o nico produto consumido sem necessidade. Automveis, mobilirio, entre
outros produtos tambm so trocados com freqncia sem que apresentem qualquer dano.
Apenas porque surgiu um novo produto, com maior valor esttico ou com novas funes e novas
tecnologias.
Este comportamento do consumidor foi construdo a partir da Revoluo Industrial e tem
sido mantido pela publicidade e pelo sistema da moda, devido o interesse das indstrias, lojas,
em vender cada vez mais. Portanto, trata-se de uma questo rdua. O consumismo desenfreado
uma realidade. Reverter isto uma misso quase utpica. preciso identificar mecanismos para
lidar com este cenrio que se configurou e se consolidou no sculo XX.
No que se refere aos produtos do vesturio de moda, o pesquisador italiano Carlo Vezzoli,
do Instituto Politcnico de Milo, prope quatro cenrios para um consumo mais consciente10.
Vezzoli desenvolve atividades didticas e de pesquisa no mbito dos mtodos, das estratgias e
instrumentos para o desenvolvimento sustentvel.
Os quatro cenrios so propostos para que o ciclo de vida dos produtos do vesturio de
moda seja relativamente mais longo. Nos dois primeiros cenrios os consumidores
compartilhariam os produtos de moda. Primeiro cenrio os consumidores compartilhariam as
10 Palestra apresentada por Vezzoli no Politcnico em 16/02/2006, Milo
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roupas com outras pessoas. Como exemplo, uma rouparia coletiva num condomnio residencial,
onde pessoas cuidariam da manuteno e limpeza das roupas, sem que cada morador tivesse a
necessidade de ter mquina de lavar e demais produtos. No segundo cenrio um sistema de
aluguel de roupas para o dia-a-dia. O consumidor compraria apenas peas bsicas e as demais
alugaria, sem ter a necessidade de lav-las, passar e consertar. Assim poderia estar vestindo
sempre roupas diferentes, sem repetir.
Nestes dois primeiros cenrios a proposta compartilhar. Para outros dois cenrios, os
consumidores comprariam os produtos do vesturio de moda, mas teriam uma relao mais
apaixonada com os mesmos, e ficariam mais tempo com o produto. Terceiro cenrio o
consumidor participaria da criao e produo, personalizando as peas; e no quarto cenrio as
empresas/lojas ofereceriam servios de manuteno, restaurao e roupas sob-medida. Nestes
dois ltimos cenrios, a proposta a maior durabilidade dos produtos e uma identificao do
consumidor com as mesmas, de forma que ele mantenha satisfatoriamente as peas por mais
tempo. Pressupe um consumidor que investe no que veste.
Vezzoli (2006) ressalta que so propostas de cenrios que precisam ser implementadas e
testadas, para serem difundidas e aceitas pelos consumidores. A partir destas propostas podem
surgir desdobramentos que resultem num ciclo de vida mais longo para os produtos do vesturio
de moda. Trata-se de um grande desafio, pois a indstria da moda como est estabelecida
atualmente, prope um cenrio muito diferente. Trocar os produtos a cada estao ou, a cada
coleo. Este comportamento precisa ser revisto. Vezzoli questiona sobre o porqu necessita-se
de tantas coisas, de que coisas tm-se realmente necessidade, e o que melhor fazer para
aumentar o bem-estar enquanto se reduzem os consumos?
Enquanto se busca respostas para tais questionamentos, vale ressaltar que iniciativas no
campo da moda, como da 22 SPFW, das marcas que trabalham com uma produo mais limpa
com menos impacto no meio ambiente e de trabalhos como da CoopaRoca no Rio de Janeiro11,
so indcios da consolidao de do novo paradigma no sculo XXI: o desenvolvimento
sustentvel.
11 COOPA-ROCA - Cooperativa de Trabalho Artesanal e de Costura da Rocinha www.coopa-roca.org.br
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No Rio de Janeiro, associados da Coopa-Roca - Cooperativa de Trabalho Artesanal e de
Costura da Rocinha, desenvolvem produtos do vesturio de moda a partir de materiais reciclados
e sobras de tecidos, doadas por empresas de confeco, utilizando tcnicas artesanais como
fuxico, patchwork, bordado, croch, tric e outros. Estilistas brasileiros reconhecidos utilizaram
os trabalhos da cooperativa em grandes desfiles nas passarelas brasileiras e internacionais. Ao
mesmo tempo o trabalho tem grande importncia social, pois gera emprego e renda para muitas
pessoas da comunidade, e tambm difusor da importncia de preservao do meio ambiente. A
reutilizao de materiais, a transformao em produtos com valor agregado e com qualidade
esttica, desenvolve gradativamente a conscincia ecolgica de quem produz e de quem consome
os produtos.
Nas universidades brasileiras, este conceito tambm vem sendo aplicado em projetos de
novos produtos do vesturio de moda. Nas apresentaes dos estudantes da UDESC de Santa
Catarina e marcas de produtos do vesturio de todo Brasil, no I Veg Fashion (evento de moda
com desfiles e exposies), que aconteceu durante o 36 Congresso Mundial de Vegetarianismo,
de 08 a 14 de novembro, em 2004, em Florianpolis, o tema que norteou os trabalhos foi Moda
sem crueldade. Nos produtos apresentados no havia nenhuma matria-prima de origem animal,
e se trabalhou com a reutilizao de tecidos, arrecadados em campanhas de doao. Em agosto
2006, outro trabalho foi apresentado durante o I Congresso Brasileiro e Latino-americano, em
So Paulo, no Museu da Amrica Latina. O desfile modaCOMpaixo, com o mesmo conceito
do I Veg Fashion, despertou a ateno da mdia e foi apresentado no programa de televiso
Alternativa Sade no GNT- Brasil.
Os trabalhos apresentados apontam para um novo tipo de consumidor que vem crescendo
nos ltimos anos, os vegetarianos. Este consumidor tem a preocupao em disseminar os valores
que esto relacionados ao que se pode chamar de filosofia da preservao: no matar animais
para alimentao e para elaborao de quaisquer produtos de uso geral, tais como: roupas,
calados, cosmticos, e demais produtos utilizados no cotidiano das pessoas; bem como no usar
os animais em quaisquer atividades, para trabalho e como cobaias em pesquisas, entre outros.
No que se refere alimentao, j possvel encontrar muitos itens que atendem a esse
pblico. Mas, quanto ao vesturio, so poucos os produtos que tm como pblico alvo este tipo
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de consumidor, que mais consciente quanto ao material empregado e ao processo de elaborao
dos produtos que consome.
Contudo, existem vrias matrias-primas disponveis para produo do vesturio, como o
couro vegetal, produzido na Amaznia, os tecidos naturais como o algodo orgnico, os tecidos
sintticos produzidos com materiais como o pet das garrafas de refrigerantes, evitando que sejam
jogados na natureza onde levaria muito tempo para se degradar. vivel desenvolver produtos
para este consumidor ecolgico, seja vegetariano ou no, mas com preocupao pela
preservao do planeta. Porm, h um problema cultural, razo pela qual, muitos fabricantes, em
vrios segmentos, tm receio em prejudicar as vendas, ao divulgar a existncia do Pet ou outros
materiais reciclados. Este problema ocorre, por exemplo, na confeco de calados
(CAVALCANTE, 2002).
Mais do que um dever, cuidar do meio ambiente uma questo de sobrevivncia para os
humanos, animais e de todo planeta. Estilistas e empresas sabem que moda pode, sim, conciliar o
desenvolvimento de produtos com a preservao da natureza. At o Oscar 2007 apostou na causa
e, pela primeira vez, integrou prticas ecolgicas sua produo, como a diminuio dos gastos
de energia e da emisso de carbono. Est cada vez mais fcil aderir moda verde12.
Consideraes Finais
Tornou-se imperativo a preservao ambiental. No mais uma luta apenas para
ambientalistas e ecologistas, mas para todos os seres humanos. Embora tenham ocorrido diversas
iniciativas na ltima dcada, esta-se chegando a um ponto crtico. Se no forem intensificadas as
aes para promover a preservao ambiental, a vida no planeta Terra estar cada vez mais
comprometida, seja das geraes futuras de humanos e ou dos demais seres vivos.
O antropocentrismo deve dar lugar ao biocentrismo, em que se valoriza todas as formas de
vida existentes no planeta Terra, considerando um que cada vida tem um valor inerente, portanto
deve ser respeitada pelos humanos.
12 www.manequim.abril.com.br/blog 18/03/2007.
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O produto do vesturio de moda exerce forte influncia sobre as pessoas. Assim, propor
produtos desenvolvidos com um apelo ecolgico um meio de estimular e consolidar o
desenvolvimento sustentvel e o consumo consciente.
Referncias Bibliogrficas
CAMARGO, Ana Luiza de Brasil. O desenvolvimento sustentvel e os principais entraves sua
implementao em mbito mundial. Dissertao de Mestrado apresentada no Programa de ps-
graduao em Engenharia de Produo. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianpolis,
2002.
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Coltrix, 1996.
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