TCC O SERVIÇO SOCIAL NA ATUAL POLÍTICA DE

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    CENTRO DE FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS

    ESCOLA DE SERVIO SOCIAL

    ADRIANA PEREIRA DA FONSECA

    O SERVIO SOCIAL NA ATUAL POLTICA DE

    PREVIDNCIA SOCIAL:

    implicaes dos processos de contra-reforma para o exerccio

    profissional dos assistentes sociais no Instituto Nacional de

    Seguro Social

    Rio de Janeiro2011

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    ADRIANA PEREIRA DA FONSECA

    O SERVIO SOCIAL NA ATUAL POLTICA DE

    PREVIDNCIA SOCIAL:

    implicaes dos processos de contra-reforma para o exerccio

    profissional dos assistentes sociais no Instituto Nacional deSeguro Social

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado Escola de

    Servio Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro,

    como parte dos requisitos necessrios obteno do grau de

    bacharel em Servio Social.

    Orientadora: Silvina Vernica Galizia

    Rio de Janeiro2011

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    AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar preciso agradecer a trs pessoas que foram indispensveis

    para que eu pudesse realizar minha graduao, proporcionando todas as condies

    necessrias. Aos meus pais, Adevair e Julia ficam meu eterno carinho e

    agradecimento pelas conversas, pelos puxes de orelha e por sempre estarem ao

    meu lado no importa o que acontea, e minha av La, a quem sempre serei

    grata por ter me recebido em sua casa e aberto seu corao para dividir seu

    cantinho comigo.

    Quero agradecer tambm aos meus tios Adriano, Adivaldo, Hugo, Malheiro,

    Cosme e Ben; s minhas tias, Cladia, Najla e Mrcia; s minhas primas Ana

    Paula, Dbora, Gabriela, Maria Vitria e Juliane; e aos meus primos Marcelo,

    Fernando e Henrique que me proporcionam tantos momentos de alegria. Em

    especial, preciso agradecer a minha prima-irm Janana, as minhas tias Cris, Sandra

    e Marlia, e a minha prima Elize, que mesmo sem saber serviram de inspirao para

    muitos dos momentos de escolhas que surgiram durante esses cinco anos.

    Agradeo tambm a minha nova famlia, Rita, Ercole, Mariana e Juliana, por terem

    me acolhido com tanto carinho.

    Agradeo ainda a minha eterna supervisora Madalena, que foi fundamental no

    momento de estgio, escolhida a dedo para me acompanhar neste processo e quecontinua a me incentivar a querer sempre ser uma profissional melhor.

    Sou grata tambm a professora Rita, a quem devo uma parte importante da

    minha formao profissional, que orientando, conversando, discutindo textos e

    casos, dividindo trabalhos sempre possibilitou que ns alunos fossemos capazes de

    refletir sobre os dilemas do cotidiano e do exerccio profissional de forma crtica e

    consistente. Suas aulas so sempre inspiradoras!

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    Preciso tambm agradecer as minhas queridas professoras de pesquisa, com

    as quais durante os ltimos dois anos eu pude crescer e amadurecer muito,

    intelectualmente e como pessoa. professora Alejandra, obrigada pela

    oportunidade de fazer parte da pesquisa, pelas discusses sempre muito ricas e

    pelos apontamentos durante a elaborao e discusso de trabalhos. E professora

    Silvina, minha coordenadora de pesquisa, orientadora e professora de monitoria,

    obrigada pela pacincia, pela dedicao dispensada e tambm pela oportunidade de

    fazer parte do grupo de pesquisa.

    Aos colegas do grupo de pesquisa, Amanda, Lucas, Sarah e Josi por

    partilharem discusses, conhecimentos e histrias nas quartas-feiras tarde, e em

    especial a Mary e ao Rodrigo, por dividirem comigo o trabalho da pesquisa, vocs

    foram fundamentais para esse TCC ter se concretizado.

    Aos meus queridos amigos Abel, Tiago, Vitor, Mah, Rodrigo, Dbora, Luciana,

    Amanda, Mariana, Fred, Bruna, Morgana, Costinha, Evelyn, Thiago, Lo, Malayne,

    Vincius, Fran e Vanessa que j so indispensveis e tornam os momentos de

    tenso muito mais fceis de lidar, que me fazem rir sempre e que esto comigo em

    todos os momentos mesmo quando no esto perto, por isso fica meu muito

    obrigado cheio de carinho.

    Agradeo ao meu companheiro, amigo, parceiro e namorado Rafael, comquem h quatro anos divido alegrias, tristezas, angstias, incertezas, felicidades e

    que nenhum dia sequer esteve ausente. Obrigada pelo carinho, amor, suporte,

    dedicao e compreenso. Quero continuar para sempre a dividir todos os

    momentos da minha vida com voc.

    Por ltimo fica o agradecimento a Fundao Carlos Chagas Filho de Amparo

    Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) pela concesso da Bolsa de

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    Iniciao Cientfica durante o ano de 2010, sendo um suporte importante para

    realizao da pesquisa.

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    RESUMO

    FONSECA, A. P. O Servio Social na atual Poltica de Previdncia Social:implicaes dos processos de contra-reforma para o exerccio profissional dos

    assistentes sociais no Instituto Nacional de Seguro Social. Rio de Janeiro, 2011.Trabalho de Concluso de Curso (Graduao em Servio Social) - Escola de ServioSocial, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011.

    O presente trabalho constitui o Trabalho de Concluso de Curso na

    graduao de Servio Social. resultado de desdobramentos de estudos

    desenvolvidos na pesquisa A assistencializao da Proteo Social brasileira:

    implicaes para o Servio Social na Previdncia desenvolvido na Escola de

    Servio Social da Universidade Federal do Rio Janeiro. Visa analisar a interveno

    do assistente social na Previdncia Social, tendo por objetivo apreender as

    mudanas ocorridas no exerccio profissional do Servio Social na Poltica de

    Previdncia Social, a partir de 1990 at a atualidade, tomando como espao para

    realizao dos estudos as agncias no Estado do Rio de Janeiro do Instituto

    Nacional do Seguro Social (INSS). Constitui-se como uma pesquisa emprica e

    terica, composta por realizao de dez entrevistas semi-estruturadas e de reviso

    bibliogrfica e documental. Partindo das relaes existentes entre oServio Social e

    as polticas sociais, as anlises realizadas trazem subsdios que permitem afirmar

    que os processos de contra-reformas do Estado, da Seguridade Social e da

    Previdncia Social ocorridos a partir dos anos 1990 tm implicaes para o exerccio

    profissional dos assistentes sociais do INSS na atualidade. A principal conseqncia

    das contra-reformas est expressa na restrio dos direitos sociais, com nfase nas

    privatizaes e mercantilizao dos servios sociais, alm da reestruturao das

    polticas de proteo social, imprimindo uma nova direcionalidade ao trabalho

    profissional dos assistentes sociais.

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    SUMRIO

    INTRODUO 08CAP TULO I

    1.1 AS POL TICAS SOCIAIS NO MODO DE PRODUO CAPITALISTA 14

    1.2 BRASIL: A ESTRUTURAO DAS POL TICAS DE PROTEO

    SOCIAL NO BRASIL

    19

    CAP TULO II

    2.1 SERVIO SOCIAL: SURGIMENTO E INSTITUCIONALIZAO 29

    2.2 O SERVIO SOCIAL NO MBITO DA PREVIDNCIA SOCIAL: ATRAJETRIA DOS DIVERSOS PROJETOS DE PROFISSO

    34

    2.3 ATRIBUIES PROFISSIONAIS 43

    2.3.1 AS ATRIBUI ES GERAIS 43

    2.3.2 AS ATRIBUIES DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLTICA

    DE PREVIDNCIA SOCIAL: TENTATIVAS DE

    DESCARACTERIZAO DA PROFISSO

    46

    CAPTULO III

    3.1 AS CONTRA-REFORMAS DO ESTADO BRASILEIRO, DA

    SEGURIDADE SOCIAL E DA POLTICA DE PREVIDNCIA SOCIAL:

    IMPLICAES PARA O EXERCCIO PROFISSIONAL

    49

    3.2 O SERVIO SOCIAL NA PREVIDNCIA: QUESTES ATUAIS PARA

    CONFORMAO DO EXERCCIO PROFISSIONAL NO INSTITUTO

    NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

    56

    CONSIDERAES FINAIS 66

    BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 71

    APNDICE A ROTEIRO DE ENTREVISTA 77

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    INTRODUO

    O surgimento das polticas sociais e do Servio Social no Brasil est

    associado necessidade do capital em responder as demandas impostas pelas

    expresses da questo social. Ambos originam-se na fase monopolista do capital,

    mais especificamente durante a dcada de 1930. Enquanto a poltica social

    constitui-se como resposta do Estado s manifestaes da classe trabalhadora; o

    Servio Social em um primeiro momento desenvolve sua interveno a partir de um

    vis educativo, para posteriormente consolidar as polticas sociais como principal

    campo scio-ocupacional da profisso, tendo como norte de seu exerccio

    profissional a democratizao dos direitos sociais institudos por aquelas polticas.

    O desenvolvimento e a consolidao das polticas sociais so marcados por

    momentos de retrocesso e avanos expressos ao longo das ltimas oito dcadas.

    Estes momentos se materializam no processo de maturao da profisso, muitas

    vezes guiando as suas diretrizes. A aproximao entre a profisso e as polticas

    sociais deve-se ao fato de tais polticas constiturem-se em um dos mais importantes

    espaos scio-ocupacionais para o assistente social.

    Dentre as principais polticas sociais nas quais o Servio Social est inserido

    atualmente destacam-se as polticas que constituem a Seguridade Social sade,previdncia e assistncia. O assistente social encontra-se assim nos diversos nveis

    de gesto destas polticas, desde a elaborao at a implementao. No geral, os

    profissionais esto inseridos em instituies pblicas, privadas e/ou do terceiro setor,

    onde desenvolvem diferentes atividades relacionadas s polticas sociais setoriais.

    Atualmente, o desenvolvimento da prtica profissional do assistente social,

    que tem por finalidade a concretizao das polticas sociais e a viabilizao dos

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    direitos sociais, orientado por um projeto tico-poltico profissional hegemnico1na

    categoria baseado em uma concepo de direitos e cidadania que no se limita

    concepo de direitos da sociedade capitalista, se coloca em defesa da autonomia e

    da plena emancipao dos indivduos, tendo como objetivo contribuir para a

    construo de uma nova ordem social. Dessa forma, a concretizao das polticas

    sociais enquanto espao scio-ocupacional do assistente social impe uma

    dualidade ao seu exerccio profissional: por um lado o assistente social pode

    aproximar-se da concepo de cidadania e direitos presente no projeto tico-poltico

    profissional, colocando-se em defesa dos interesses dos trabalhadores; por outro o

    profissional pode responder to somente as demandas da instituio em que se

    insere seja ela pblica ou privada sendo assim funcional conservao da

    ordem capitalista (BEHRING; BOSCHETTI, 2010).

    Apreendo a importncia dessa relao, este trabalho tem como proposta fazer

    um estudo sobre a insero dos assistentes sociais nas polticas sociais, buscando

    explicitar as principais implicaes existentes. No entanto, devido amplitude das

    polticas sociais necessrio fazer um recorte para que a qualidade do trabalho no

    seja comprometida e o aprofundamento no tema seja possvel. Dessa forma, um dos

    fatores determinantes para tal recorte define-se como a insero da aluna no projeto

    de pesquisa "A assistencializao da proteo social brasileira: implicaes para oServio Social na Previdncia desenvolvido junto ao grupo de pesquisa Polticas

    sociais na Amrica Latina: mudanas nos padres de proteo social na Escola de

    1 Importa esclarecer que o conceito de hegemonia aqui utilizado relaciona-se com a concepo deGramsci. Assim o projeto tico-poltico com base na concepo de direitos e cidadania, que seaproxima de um projeto societrio que luta pelo fim da sociedade de classes prevalece acima deoutros projetos existentes na categoria profissional, mesmo sem significar que aceito pela maioriados profissionais. A partir do pensamento de Gramsci pode-se entender que a hegemonia, como

    possvel argumentar, no se reduz a legitimao, falsa conscincia, ou instrumentalizao da massada populao, cujo senso comum ou viso de mundo, segundo Gramsci, composto de vrioselementos, alguns dos quais contradizem a IDEOLOGIA dominante, como alis grande parte daexperincia cotidiana (BOTTOMORE, 2001, p. 178).

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    Servio Social/UFRJ e, consequentemente, a aproximao da aluna com a temtica.

    Assim, o foco do trabalho a poltica de Previdncia Social.

    A partir das questes apresentadas possvel ento determinar o objeto

    deste trabalho: a interveno profissional do assistente social na Previdncia Social.

    Entendendo que esta interveno perpassada por diversos determinantes scio-

    polticos e econmicos que imprimem direes para sua realizao atravs da

    trajetria histrica, define-se como objetivo estudar as mudanas ocorridas no

    exerccio profissional do Servio Social na poltica de Previdncia Social a partir de

    1990 at a atualidade, tendo como espao principal de insero dos assistentes

    sociais o maior rgo representativo desta poltica o Instituto Nacional de Seguro

    Social (INSS).

    Assim temos como pressuposto que a determinao do perodo definido

    acima se deve ao entendimento de que as mudanas impressas a partir da

    implementao e desenvolvimento das polticas neoliberais nos mbitos econmico,

    poltico e ideolgico, expressas principalmente pelas contra-reformas do Estado,

    Seguridade Social e da Previdncia Social, implicam em modificaes que tendem a

    redefinir a atuao do Servio Social nas instituies, alterando tanto o seu espao

    scio-ocupacional quanto seu exerccio profissional.

    importante ressaltar que a poltica de Previdncia Social tal como seestrutura hoje composta por dois regimes previdencirios: o Regime Geral de

    Previdncia Social (RGPS), normatizado pela Lei n 2.213 de 1991; e o Regime

    Prprio de Previdncia Social (RPPS), o qual se divide em servidores pblicos civis

    da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios e servidores militares

    dos Estados e do Distrito Federal, sendo normatizado pela Lei n 9.717 de 1998.

    Alm destes dois regimes ainda existe um benefcio opcional constitudo pela

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    Previdncia Complementar, composta pelos sistemas de previdncia privada

    (abertas) e pelos fundos de penso (previdncia fechada). Dentre os dois regimes e

    a previdncia complementar, o RGPS forma de seguro mais abrangente e onde

    h o maior nmero de assistentes sociais atuando, sendo o seu rgo representativo

    o INSS.

    Para alcanar o objetivo deste trabalho a metodologia no se limitou

    discusso e anlise de textos, documentos e legislaes, mas conjugou estas fontes

    de informao com entrevistas semi-estruturadas de carter quantitativo-qualitativo

    com assistentes sociais do INSS. Tais entrevistas foram inicialmente pensadas como

    parte do projeto de pesquisa "A assistencializao da proteo social brasileira:

    implicaes para o Servio Social na Previdncia e por esse motivo o roteiro

    composto por 53 questes dividas em 08 blocos (Apndice A), que ultrapassam o

    objetivo deste trabalho. Portanto, para sua elaborao, no foi realizada uma anlise

    de todas as questes, foramselecionados somente os itens que trazem subsdios

    para responder ao objetivo deste trabalho2.

    Em relao realizao das entrevistas, cabe explicitar como foi definida a

    amostra. No estado do Rio de Janeiro, o INSS possui 07 Gerncias Executivas:

    Centro/Rio de Janeiro, Norte/Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Niteri, Campos dos

    Goytacazes, Centro/Petrpolis e Centro/Volta Redonda. Cada Gerncia responsvel por um determinado nmero de Agncias da Previdncia Social (APS),

    de acordo com o nmero de bairros e/ou municpios que estejam em sua

    abrangncia e conta com uma quantidade de assistentes sociais em seu quadro que

    varia com a localidade. Assim, devido disposio das Gerncias e com a

    possibilidade de locomoo e acomodao dos pesquisadores, optou-se por realizar

    2Os itens selecionados correspondem as questes dos blocos I e III do roteiro de entrevista.

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    a pesquisa nas Gerncias do Centro/Rio de Janeiro, Norte/Rio de Janeiro, Caxias e

    Niteri.

    Em funo da organizao interna da instituio foram encontrados alguns

    obstculos para realizao do trabalho de campo, por isso no foi possvel definir

    uma amostra exata da quantidade de entrevistas a serem realizadas. Foi pensado

    inicialmente no critrio de maioria simples para cada Gerncia. Contudo, s foi

    possvel a realizao de 10 entrevistas com profissionais que se encontravam no

    momento nas funes de Responsvel Tcnico (RT) e Assistente Social de APS,

    sendo destas 03 RTs e 07 com as profissionais que trabalham nas agncias. Assim,

    utilizou-se a metodologia de entrevistas por saturao, visto que no foram

    identificados dados adicionais nas entrevistas realizadas (FLICK, 2009). Alm disso,

    importante ressaltar que as referidas repeties do contedo tm relao com a

    prpria estrutura do INSS, rgo nacional que possui padronizao das atividades

    realizadas em suas agncias. O perodo de realizao das entrevistas compreende o

    segundo semestre de 2010 e o primeiro semestre de 2011, tendo ocorrido nas

    Gerncias de Niteri, Duque de Caxias e Centro.

    A anlise das entrevistas juntamente com a realizao da reviso bibliogrfica

    do conjunto de textos, documentos das entidades representativas da categoria

    Conselho Federal de Servio Social (CFESS) e Conselho Regional de Servio Social(CRESS) e de legislaes que trazem determinaes tanto para a prtica

    profissional dos assistentes sociais quanto para elaborao e implementao das

    polticas sociais, possibilitou a definio do pressuposto deste trabalho.

    O trabalho se divide em trs captulos e as consideraes finais. Entendendo-

    se que para conhecer a atual insero dos assistentes sociais na poltica

    previdenciria e, mais especificamente, no INSS necessrio conhecer os

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    processos que compreendem o surgimento e a estruturao das polticas sociais e,

    em especial, da poltica de Previdncia Social no Brasil, no primeiro captulo

    apresentada primeiramente a estruturao dessas polticas, demarcando as

    determinaes do modo de produo capitalista, tendo como marco inicial a fase

    monopolista abrangendo at o neoliberalismo. Depois, so abordados os processos

    de conformao e estruturao das polticas sociais no Brasil, delimitando-se como o

    momento de surgimento a dcada de 1930.

    O segundo captulo apresenta a histria do surgimento e estruturao do

    Servio Social, destacando-se os principais processos que o conformam at a

    atualidade. Alm disso, aborda-se a insero da profisso na poltica de Previdncia

    Social, enfatizando-se as determinaes que redefinem o exerccio profissional, e o

    conjunto de atribuies profissionais da categoria, especificamente na poltica

    previdenciria, que orientam o exerccio profissional na atualidade.

    No terceiro captulo so discutidas as contra-reformas do Estado, da

    Seguridade Social e da Previdncia Social, apontando-se as principais modificaes

    impostas por elas e suas implicaes para o Servio Social na Previdncia. Em

    seguida procura-se estabelecer uma relao entre esta discusso e as questes

    identificadas a partir da anlise da pesquisa emprica realizada nas Gerncias

    Executivas do INSS no Rio de Janeiro. Pretende-se com essa relao demonstrarquais so as principais modificaes no exerccio profissional dos assistentes sociais

    inseridos no INSS.

    Por ltimo, nas consideraes finais, procura-se apontar de forma preliminar

    as tendncias atuais para os processos de reestruturao das polticas sociais e de

    modificaes no exerccio dos assistentes sociais.

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    CAPTULO I

    1.1 AS POLTICAS SOCIAIS NO MODO DE PRODUO CAPITALISTA

    O modo de produo capitalista a partir da dcada de 1930 e, em especial, no

    ps-II Guerra Mundial fez desenvolver ainda mais um dos elementos da interveno

    do Estado: a conservao fsica da fora de trabalho. Esta interveno tem

    propsitos e manifestaes diferenciadas dentro dos diferentes momentos no interior

    da fase monopolista do capitalismo.

    No capitalismo concorrencial a interveno do Estado nas refraes da questo

    social tem por objetivo responder coercitivamente as lutas dos trabalhadores,

    buscando preservar a propriedade privada. De outro modo, no capitalismo

    monopolista a referida interveno ocorre atravs da preservao e controle da fora

    de trabalho ocupada e excedente, constituindo-se como uma funo bsica

    manuteno da ordem. Neste contexto, o Estado regula a disponibilidade da fora

    de trabalho em funo das necessidades do capital.

    Assim, a passagem entre estas duas fases do capitalismo ocorre ao mesmo

    passo em que as lutas dos trabalhadores organizados se fortalecem e os partidos

    polticos de massa surgem. Esses dois fenmenos so uns dos diversos elementos

    que condicionam a lgica do capital, em especial luta dos trabalhadoresorganizados estabelece um tipo de presso poltica que limita o capitalismo,

    forando o Estado a atender questes de cunho poltico antes de exercer suas

    funes econmicas.

    Na realidade de cada pas, esta articulao entre funes econmicas e

    polticas condicionada pelo prprio desenvolvimento do capitalismo e pela

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    correlao de foras existente composta por vrios grupos no interior do

    movimento operrio e da burguesia.

    importante destacar que o atendimento das demandas sociais pelo Estado

    ocorre como resposta a uma presso especfica dos trabalhadores e na medida em

    que esta possa ser refuncionalizada em favor do aumento dos lucros para o capital.

    Estabelece-se assim uma dupla dinmica: por um lado o Estado busca legitimidade

    poltica atravs de processos democrticos, incluindo polticas de trabalho e

    atendendo a demandas da classe trabalhadora; por outro sua interveno tem por

    objetivo preservar as condies de reproduo do capital.

    A interveno do Estado nas expresses da questo social, a partir do

    capitalismo monopolista, sistemtica e tem por objetivo manter o controle sob a

    fora de trabalho, o poder de consumo dos indivduos e a manuteno da ordem

    social. As expresses da questo social so tratadas como disfuncionalidades dos

    indivduos, mistificando-se os processos de produo das desigualdades sociais.

    Esta interveno do Estado se materializa atravs das polticas sociais de forma

    fragmentada e parcial. Assim, estas polticas, enquanto instrumento de interveno

    do Estado, surgem com a funo de desmobilizar a luta da classe trabalhadora

    (NETTO, 2011).

    Nesse sentido, a conformao das polticas sociais na sociedade capitalista perpassada por mltiplas determinaes, estruturando-se como o produto de um

    conjunto de interaes entre determinaes econmicas, polticas, sociais e

    culturais, tal como a correlao de foras expressa pelas lutas sociais. Destacam-se

    como principais elementos que explicam o surgimento e o desenvolvimento das

    polticas sociais a natureza do capitalismo, a funo do Estado no processo de

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    regulamentao e implementao daquelas e a ao das classes sociais (BEHRING;

    BOSCHETTI, 2010).

    A principal expresso das referidas polticas durante finais do sculo XIX e

    incio do sculo XX so os seguros sade, desemprego e acidente de trabalho. No

    entanto, no ps-II Guerra Mundial com a adoo da forma de produo keynesiano-

    fordista pelo capitalismo ocorrem mudanas na concepo e estruturao das

    polticas sociais. Nesse sentido, o fordismo representa mais que uma mudana

    tcnica na estrutura da produo, significa um novo tipo de regulagem das relaes

    sociais em condies polticas determinadas.

    Este momento, ademais, marca a expanso do modelo de proteo social

    desenvolvendo o Welfare State. Segundo Marshall (1967 apud BEHRING;

    BOSCHETTI, 2010) o surgimento e o desenvolvimento deste modelo representam a

    superao da tica securitria e a incorporao do conceito ampliado de seguridade

    social.

    So dois os principais tipos de estruturao do Welfare State. O primeiro

    modelo bismarkiano oriundo da Alemanha e conhecido como de seguros sociais,

    que tem como princpio a garantia compulsria de prestaes de substituio de

    renda em momentos de riscos derivados da perda de trabalho assalariado pelo

    Estado. O segundo, conhecido como beveridgiano, surgido na Inglaterra, preconizaum Estado garantidor de mnimos sociais em momentos especficos de

    necessidades a todos os cidados e tem como princpios a unificao institucional e

    a uniformizao dos benefcios (BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 97). Estes

    modelos se consolidam nos pases da Europa permanecendo como guias de

    estruturao das polticas sociais.

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    Contudo, a partir de 1970 inicia-se um perodo de estagnao do capitalismo, o

    qual coloca novas condies econmicas e polticas para a implementao das

    polticas sociais. Os anos 1980 so marcados por fenmenos que do respostas

    crise do capital. Por um lado inicia-se o processo de reestruturao produtiva,

    conformado pela revoluo tecnolgica e organizacional da produo.

    Conjuntamente ocorreu um processo de aprofundamento da economia,

    pressionando o Estado para o surgimento de um novo tipo de polticas econmicas e

    industriais. Como principais resultados deste processo destacam-se o desemprego

    estrutural; o desenvolvimento de novas formas de gesto da fora de trabalho,

    sendo um exemplo o neo-corporativismo por parte dos trabalhadores formais; e o

    ataque desorganizao poltica dos movimentos operrio e popular. De outro lado

    ocorre a estruturao de um novo padro de relao dentre Estado e sociedade civil,

    o qual estabelece conseqncias para as polticas sociais, como a desestruturao

    dos direitos sociais. Este novo padro de relao entre Estado e sociedade

    expresso pelos processos de contra-reforma do Estado, que ocorrem de acordo com

    as orientaes e determinaes de polticas de ajuste das economias perifricas

    recomendadas pelos organismos internacionais. (IAMAMOTO, 2011)

    Este processo de aprofundamento da economia demarca o momento de

    esgotamento da perspectiva de regulao keynesiana das relaes econmicas,polticas e sociais e do surgimento da poltica neoliberal (BEHRING ; BOSCHETTI,

    2010, p. 125). Tal poltica representa segundo Anderson (1995 apud BEHRING;

    BOSCHETTI, 2010) uma resposta de cunho terico defesa de estruturao de um

    Estado intervencionista e de bem-estar. Assim, o neoliberalismo preconiza a reduo

    de gastos pblicos, provocando diretamente uma reduo de gastos nos sistemas

    de proteo social.

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    O processo de reestruturao produtiva implica em mudanas na organizao

    do trabalho tais como o crescente desemprego e a precarizao das relaes de

    trabalho, levando ao aumento dos empregos intermitentes, instveis e no

    associados a direitos e em reconfiguraes nas polticas sociais como as

    limitaes no acesso a direitos derivados de empregos estveis. Dessa forma, no

    sculo XXI, as polticas sociais expressam uma das principais modificaes

    advindas das reformas neoliberais: neste momento as polticas sociais podem ser

    caracterizadas prioritariamente como restritivas, seletivas e focalistas.

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    1.2 BRASIL: A ESTRUTURAO DAS POLTICAS DE PROTEO SOCIAL NO

    BRASIL

    A conformao das polticas sociais perpassada por determinaes das

    dimenses econmicas, polticas e sociais no interior da relao Estado e sociedade

    civil. As suas funes bsicas podem ser definidas como: criar condies mnimas

    para a reproduo da fora de trabalho, dar legitimidade aos governos e garantir o

    reconhecimento da cidadania e o acesso aos direitos sociais pelos indivduos.

    A conformao e a trajetria das polticas sociais no Brasil podem ser dividas

    em quatro amplos momentos. O primeiro compreende o perodo de 1930 at 1960 e

    tem como caracterstica principal a implementao dos seguros sociais para

    trabalhadores. O segundo inicia-se em 1964 e perdura por todo o Regime Militar

    (1964-1985), sendo marcado pela implantao do complexo militar-industrial-

    assistencial (FALEIROS, 2009; BEHRING; BOSCHETTI, 2010). O terceiro momento

    corresponde dcada de 1980 e todo o perodo da constituinte, sendo caracterizado

    pela ampliao, ou tendncia ampliao, dos direitos sociais. E por ltimo, tm-se

    os anos 1990 demarcando o quarto momento. Este perodo, que permanece at a

    atualidade, caracterizado pela expanso e consolidao do neoliberalismo, pelos

    processos de contra-reformas do Estado e Seguridade Social e as reorganizaesdas polticas sociais.

    O primeiro momento de conformao das polticas sociais (1930-1960) marca

    na verdade a introduo dessas polticas no Brasil. Assim, o ano de 1930 define o

    momento no qual ocorreu uma importante mudana nas relaes capitalistas no

    Estado brasileiro. A Revoluo de 30, que traz ao governo federal Getlio Vargas,

    cria um Estado moderno estruturado a partir da reorganizao dos grupos

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    dominantes, quebrando-se a hegemonia cafeeiro-exportadora orientadora da poltica

    durante a Repblica Velha (1889-1930). Alm disso, o ps-1930 ainda marcado

    pelo corporativismo como forma de organizar as polticas para responder s

    expresses da questo social. Questionando o ideal de que questo social era

    caso de polcia, assim como ocorreu no perodo anterior, orientao corporativista

    buscava incorporar ao aparelho de Estado o movimento sindical (COUTINHO,

    2008, p. 116).

    As regulamentaes das relaes de trabalho tinham por objetivo transformar

    a luta de classe em colaborao de classe, desarticulando os trabalhadores. Nesse

    sentido, durante o perodo de 1930 a 1943 destacam-se como principais inovaes

    das polticas sociais a criao do Ministrio do Trabalho, Indstria e Comrcio

    (1930), a expanso da Lei de Acidente de Trabalho (1919) e a introduo da poltica

    de cobertura do risco, a qual incorporava a regulao de acidentes e os benefcios

    de aposentadorias, penses, auxlio doena, famlia e desemprego. Outras duas

    inovaes importantes foram criao da Carteira de Trabalho em 1932 e a

    unificao das Caixas de Aposentadorias e Penses (CAPs) criadas em 1923

    constituindo os Institutos de Aposentadorias e Penses (IAPs) em 1933,

    organizando os trabalhadores por categoria e no mais por empresas e

    possibilitando assim o binmio controle/cooptao por parte do governo.A criao dos IAPs significou o desenvolvimento da tecnocracia na conduo

    da poltica do Governo Vargas. Os riscos cobertos por estes institutos relacionavam-

    se com a perda da capacidade laborativa (velhice, morte, doena, invalidez) e os

    benefcios eram diferenciados de acordo com a fora poltica de cada grupo.

    Em 1930, tambm foi criado por Vargas o Ministrio da Sade, o qual

    desenvolveu uma Poltica Nacional de Sade estruturada em trs eixos: a Sade

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    pblica que tinha por objetivo cuidar da higiene das cidades e das campanhas

    epidemiolgicas; a Medicina Previdenciria que era prestada pelos IAPs aos seus

    segurados; e a Sade Privada (mdico-hospitalar), conseguida mediante

    pagamento. Esta estruturao da poltica de sade, apesar de permitir o acesso

    sade de uma clientela antes excluda, caracterizava-se por ser hierrquica e

    excludente. O acesso aos servios mdicos estava condicionado insero do

    trabalhador em um IAP. Assim, grande parte da populao permanecia sem acesso

    queles servios.

    Ainda no Governo Vargas, mais especificamente no perodo que conforma o

    Estado Novo, foi criada em 1942 a Legio Brasileira de Assistncia (LBA) com o

    objetivo de prestar assistncia parcela da populao no inserida no sistema

    previdencirio. A LBA era dirigida pela primeira-dama do pas e representava

    principalmente a busca pela legitimidade poltica do governo.

    Este modelo paternalista e corporativista de estruturao das polticas sociais,

    em especial da poltica de Previdncia Social, permaneceu at golpe de 1964.

    Durante o Governo Dutra (1946-1950), a represso social e o arrocho salarial

    continuaram como formas de controle da populao. O Governo de Juscelino

    Kubitshek (1955-1960) foi marcado pelo incentivo industrializao e pela abertura

    gradual ao capital estrangeiro. Em 1960, foi promulgada a Lei Orgnica daPrevidncia Social (LOPS), pelo Ministrio de Trabalho e Previdncia Social,

    promovendo uma expanso, mesmo que restrita, da poltica previdenciria atravs

    da unificao e uniformizao dos contribuintes/beneficirios.

    O Golpe Militar de 1964 rompe com o pacto populista presente nos governos

    anteriores, mas conserva o corporativismo e autoritarismo como traos da relao

    entre Estado e sociedade civil. Assim o segundo perodo de conformao das

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    polticas sociais no Brasil marcado por uma poltica de governo que tem como foco

    o desenvolvimento econmico do pas, incentivando a entrada dos capitais externos

    com participao do Estado e uma restrita redistribuio social a populao.

    A Ditadura Militar (1964-1985) se estabelece atravs de processos de

    represso que se expressam pelo controle do Congresso Nacional e pela profunda

    centralizao, do autoritarismo e da tecnocracia como vieses da estruturao das

    polticas de governo. Assim, os Governos Militares procuram conseguir legitimidade

    para suas aes atravs da poltica social. Dessa forma, o atendimento s

    expresses da questo social ocorre em trs eixos: a assistncia social, para a parte

    da populao que no se encontrava inserida formalmente no mercado de trabalho e

    vinculada ao sistema previdencirio; o campo privado, que tinha por expresso

    maior famlia e o direcionamento da responsabilidade financeira dos custos

    voltavam-se para o indivduo; e os seguros sociais representados pela previdncia

    social e sade, as quais tinham suas prestaes interligadas destinadas aos

    trabalhadores formais.

    Dessa forma, dentre as principais inovaes/modificaes das polticas

    sociais destacam-se a unificao, uniformizao e centralizao dos IAPs em 1966

    no Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS). Este processo caracteriza-se

    pela retirada dos trabalhadores do controle da proteo previdenciria, pelodesenvolvimento de uma administrao altamente tecnocrtica e pela ampliao de

    benefcios3.

    3Em 1971 os trabalhadores rurais so incorporados atravs do FUNRURAL; em 1972 a vez dosempregados domsticos; em 1973 so inseridos no sistema previdencirio os jogadores de futebol; e1978 introduzidos os ambulantes/autnomos, aqueles trabalhadores sem vnculo formal de trabalho.

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    Alm da criao do INPS, este perodo ainda marcado pela instituio da

    Renda Mensal Vitalcia (RMV)4e pela criao do Ministrio da Previdncia Social e

    Assistncia Social, ambas em 1974. O referido Ministrio incorporou organizaes

    como a LBA, a FUNABEM (Fundao para o Bem-Estar do Menor), a Central de

    Medicamentos do Estado (CEME) e a DATAPREV (Informtica) responsveis por

    gerir aspectos especficos das polticas sociais sob uma nica administrao. Ainda

    destaca-se como estratgia dos Governos Militares, como busca de sua

    legitimidade, a criao do Sistema Nacional de Previdncia e Assistncia Social

    (SINPAS) em 1977, incorporando o INPS, o Instituto Nacional de Assistncia Mdica

    da Previdncia Social (INAMPS) e o Instituto Nacional de Administrao Financeira

    da Previdncia e da Assistncia Social (IAPAS). O SINPAS permaneceu funcionado

    at a criao da Constituio Federal de 1988, e tinha como objetivo prestar

    assistncia mdica curativa, individualizada, privatista, medicalizada aos segurados

    do sistema previdencirio (FALEIROS, 2009).

    No perodo da Ditadura Militar, duas outras polticas alm da previdenciria e

    de sade se destacam. A poltica de Assistncia Social composta por um complexo

    de redes conveniadas e servios, tendo como principal rgo a LBA, e como pblico

    alvo os excludos da Previdncia Social. E a Poltica Nacional de Habitao, que

    com a criao do Banco Nacional de Habitao (BNH) impulsionou a economia,promovendo financiamento para determinados setores da sociedade com o suporte

    do Estado.

    4 A Renda Mensal Vitalcia (RMV) foi criada por meio daLei n 6.179/74 como benefcioprevidencirio destinado s pessoas maiores de 70 anos de idade ou invlidos, definitivamenteincapacitados para o trabalho, que, em um ou outro caso, no exerciam atividades remuneradas eno auferiam rendimento superior a 60% do valor do salrio mnimo. Alm disso, no poderiam ser

    mantidos por pessoas de quem dependiam, bem como no poderiam ter outro meio de prover oprprio sustento. Ministrio do Desenvolvimento e Combate a Fome. Disponvel em:http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/renda-mensal-vitalicia-rmv.Acesso em: 01 nov.2011.

    http://www.mds.gov.br/sobreoministerio/legislacao/assistenciasocial/leis/Lei%20no%206.179-%20de%2011%20de%20dezembro%20de%201974.pdfhttp://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/renda-mensal-vitalicia-rmvhttp://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/renda-mensal-vitalicia-rmvhttp://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/renda-mensal-vitalicia-rmvhttp://www.mds.gov.br/sobreoministerio/legislacao/assistenciasocial/leis/Lei%20no%206.179-%20de%2011%20de%20dezembro%20de%201974.pdf
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    O sistema de proteo social desenvolvido pelos Governos Militares

    concretiza seu carter dualpara quem pode pagar e para quem no pode pagar

    ao abrir espaos privados para a sade e educao, por exemplo. importante

    destacar que o prprio Estado incentiva e ajuda a instalao de instituies privadas

    de venda de servios sociais para a populao atravs de financiamentos, entre

    outras formas.

    Contudo, em 1974 surgem os primeiros sinais de esgotamento do projeto

    tecnocrtico, modernizador e conservador implementado pela Ditadura Militar. Inicia-

    se ento um processo de transio democrtica lenta e gradual que, devido a

    presses da sociedade civil, acabou por ser mais radical do que previsto pelo

    Governo Geisel (1974-1979), o presidente militar da poca (COUTINHO, 2008).

    Dessa forma, as presses do movimento operrio e popular influenciaram a

    conformao da Constituio Federal de 1988, imprimindo algumas diretrizes como

    a

    reafirmao das liberdades democrticas; impugnao das desigualdadesdescomunal e afirmao dos direitos sociais; reafirmao de uma vontadenacional e da soberania, com rejeio das ingerncias do Fundo MonetrioInternacional (FMI); direitos trabalhistas; e reforma agrria (BEHRING;BOSCHETTI, 2010, p. 141).

    Embora houvesse a presena e presso dos movimentos sociais e de

    trabalhadores organizados (representados pelos sindicatos), as classes dominantes

    tambm foram atuantes na construo da Constituio, resultando assim em um

    texto constitucional com avanos e conservao de alguns aspectos, refletindo a

    disputa pela hegemonia entre os segmentos de classe.

    A Constituio de 1988 pode ento ser definida com caractersticas liberais,

    democrticas e universais, sendo sua principal inovao na rea das polticas

    sociais a instituio de um modelo de proteo social baseado na Seguridade

    Social, regulamentada pela Lei n 8.212 de 1991 (Lei Orgnica da Seguridade

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    Social) conformada pela integrao do trip sade, assistncia social e

    previdncia. Sendo a sade caracterizada pelo seu carter universal, a assistncia

    social direcionada a quem dela necessitar passando ambas as polticas a ser

    direitos do cidado e dever do Estado, e a previdncia mistura contribuio com

    financiamento estatal (FALEIROS, 2009, p. 204), preconizando-se uma ampliao

    da proteo social e do acesso aos direitos e servios sociais pela populao.

    Na dcada de 1990, cada poltica ganhou uma lei orgnica prpria que definiu

    as diretrizes e regulamentou suas aes. No entanto, importante ressaltar que o

    marco de separao entre as trs polticas foi instituio em 1990 do Instituto

    Nacional de Seguro Social (INSS)5. A partir da criao do INSS houve a

    desvinculao de todos os benefcios assistenciais que estavam sob a regulao da

    Previdncia Social para a Assistncia Social.

    Assim, apesar da poltica de Assistncia Social ser estruturada para o

    atendimento daqueles que dela necessitem, a prestaes de servios e benefcios

    assistenciais tm sido direcionadas s pessoas comprovadamente pobres e o

    desenvolvimento de seus programas e projetos focalizados para uma parte

    especfica da populao. Por outro lado, a poltica de Sade desvinculou-se da

    lgica previdenciria e foi definida a partir de uma orientao democrtica tendo

    como princpios, dentre outros, a universalizao do servio e a uniformizao dosdireitos (BOSCHETTI; BEHRING, 2003).

    Entretanto, no texto constitucional ainda est presente a conciliao entre a

    instituio de polticas estatais e polticas de mercado para estruturao do modelo

    de proteo social. Assim caracteriza-se o terceiro momento de conformao das

    polticas sociais. Momento que aponta tendncias para ruptura com os modelos

    5O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) criado com o Decreto n 99.350, de 27 de junho de1990, a partir da fuso do Instituto de Administrao Financeira da Previdncia e Assistncia Social IAPAS e do Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS).

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    anteriores e de desenvolvimento de polticas democrticas e universais, mas que

    tambm responde s necessidades do capital.

    ainda neste perodo que comea a se compor o quarto e ltimo momento

    de conformao das polticas sociais e que ter sua maior expresso no final da

    dcada de 1990 e incio dos anos 2000, permanecendo at a atualidade. Este

    momento marcado pela expanso do neoliberalismo e o incio do processo de

    reformasdo Estado e das prprias polticas sociais.

    Estas ltimas passam a sofrer com os cortes nos gastos sociais e a serem

    pensadas a partir do conceito insero social. Conceito o qual contrrio

    excluso, mas que preconiza uma reestruturao atravs da defesa da focalizao e

    da empregabilidade. Neste contexto, o princpio da focalizao passa a substituir o

    ideal de universalidade dos direitos sociais.

    Dessa forma, apresenta-se como tendncia geral para a poltica de Proteo

    Social o binmio restrio/reduo dos direitos, acompanhado da transformao das

    polticas sociais em aes pontuais e compensatrias. Esta tendncia expressa

    correlao de foras existentes entre as classes sociais e o baixo grau de

    consolidao da democracia e da prpria poltica social no pas (BEHRING;

    BOSCHETTI, p. 2010).

    A poltica neoliberal em curso neste momento defende a estruturao daspolticas sociais a partir de trs princpios: privatizao, focalizao e

    descentralizao. Este ltimo de acordo com Behring e Boschetti (2010), enquanto

    caracterstica da poltica neoliberal, no deve ser entendido como o partilhamento do

    poder entre as esferas pblicas (princpio constituinte de uma poltica de ordem

    democrtica), mas sim como um processo de passagem das responsabilidades para

    outros domnios do Estado e/ou para instituies privadas. As polticas sociais neste

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    contexto ainda podem ser definidas pelo seu carter compensatrio, seletivo,

    fragmentado e setorizado.

    De acordo com Mota (1995 apud BEHRING; BOSCHETTI, 2010), o quadroeconmico-social que se instaura neste momento caracterizado pela restrio do

    acesso universal aos direitos sociais e aos bens de consumo coletivo, ao mesmo

    tempo em que h uma articulao entre assistencialismo focalizado e mercado livre.

    Assim, a privatizao gera uma dualidade discriminatria, constituindo-se em um

    movimento de transferncias patrimoniais(BEHRING; BOSCHETTI, 2010, p. 159),

    ao mesmo passo que a seletividade combinada a focalizao garante o acesso as

    polticas e aos servios somente aos indivduos que comprovem pobreza ou extrema

    pobreza, reafirmando a desconstruo do carter universal da Proteo Social.

    A caracterizao do quadro estrutural realizada por Mota remete uma

    tendncia dual do Estado que vem ocorrendo a partir da dcada de 1990: por um

    lado tem-se a privatizao das polticas permanentes, como sade, educao e

    previdncia; e por outro a ampliao das polticas e programas assistenciais (MOTA,

    2008). Nesse sentido, a (re) configurao das polticas, e em conseqncia dos

    direitos sociais, enfatiza o desenvolvimento e busca de servios privados (sendo

    exemplo os planos privados de sade) e/ou a transferncia de responsabilidades

    para a sociedade, caracterizando um processo de retorno famlia e de ampliaodas ONGs (terceiro setor), entendidos como responsveis pela promoo do bem-

    estar em substituio da poltica pblica (BEHRING; BOSCHETTI, 2010).

    Entende-se que os processos de reestruturao ocorridos a partir dos anos

    1990 e intensificados na dcada de 2000, tm consolidado um padro de poltica

    social que se caracteriza: pela privatizao dos servios para quem pode pagar; pelo

    binmio focalizao/seletividade estruturante de polticas e servios de baixa

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    qualidade e resolutividade direcionados a parcela mais pobre da populao; e pelo

    processo de descentralizao, marcado pela desresponsabilizao do Estado no

    provimento de servios e benefcios e na consolidao de direitos. Dessa forma,

    pode-se observar uma dupla possibilidade da poltica social, que pode a ssumir

    tanto um carter de espao de concretizao de direitos dos trabalhadores, quanto

    ser funcional acumulao do capital e manuteno do status vigente (BEHRING;

    BOSCHETTI, 2010, p. 195).

    Tendo por base as principais caractersticas do processo de conformao e

    estruturao das polticas sociais no Brasil, importante demarcar a existncia de

    um vnculo estrutural entre a constituio das polticas sociais e o surgimento dessa

    profisso [do Servio Social] na diviso social e tcnica do trabalho (BEHRING;

    BOSCHETTI, 2010, p.13). A relao entre o Servio Social e as polticas sociais no

    Brasil surge a partir da dcada 1930, quando o Estado brasileiro aumenta seu

    carter interventor acompanhando as tendncias mundiais e enfatizando a

    particularidade nacional da necessidade de interveno sobre as expresses da

    questo social para legitimao o governo. Dessa forma, a poltica social constitui-se

    como um espao scio-ocupacional do assistente social, trazendo implicaes para

    a sua prtica profissional ao mesmo passo que esta pode imprimir direo as

    polticas sociais.Partindo desta relao, entende-se ser necessrio conhecer os processos de

    conformao e estruturao do Servio Social e os rebatimentos da contra-reforma

    para atuao do Assistente Social na poltica de Previdncia Social, objeto deste

    trabalho.

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    CAPTULO II

    2.1 SERVIO SOCIAL: SURGIMENTO E INSTITUCIONALIZAO

    A conformao da profisso de Servio Social marcada por dois momentos:

    o de surgimento e de institucionalizao, assim para se pensar estes momentos

    sero utilizados os conceitos apresentados por Iamomoto (2007). O primeiro

    momento data dos anos 1930 e destaca-se pela relao entre a profisso e o

    movimento social mais amplo oriundo da Igreja, que tinha o objetivo de recuperar

    seu poder de influncia nas relaes sociais enfraquecido por mudanas na

    organizao da sociedade, como o redimensionamento do Estado.

    O surgimento do Servio Social tambm possui relao com as mobilizaes

    da classe operria ocorridas nas primeiras dcadas do sculo XX, as quais

    impulsionaram o debate sobre a questo social e o posicionamento do Estado, das

    classes dominantes e da Igreja. Nesse sentido, Igreja e Estado se unem como

    estratgia de ao para intervir na questo social e se opor ameaa do

    socialismo. Dessa forma, o Servio Social aparece como uma das frentes

    mobilizadas para a formao doutrinria e para o aprofundamento sobre os

    problemas sociais de militantes da Igreja Catlica (IAMAMOTO, 2007, p. 19).

    Neste primeiro momento, a profisso se caracteriza para alm de umaprofissionalizao da caridade, se constituindo como uma forma de interveno

    ideolgica sobre a vida da classe trabalhadora que tem como principal objetivo

    enquadrar esta classe nas relaes sociais da sociedade capitalista. A sua ao

    caracteriza-se pelo vis educativo e individualizante dos problemas e da proteo

    social.

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    Nos anos 1940, a profisso modifica suas bases tericas passando do

    pensamento conservador europeu para a sociologia conservadora norte-americana,

    incorporando a noo de comunidade como guia de sua interveno. Observa-se

    assim uma atualizao do carter conservador do Servio Social ao mesmo tempo

    em que passa a responder s exigncias de tecnificao de sua interveno postas

    pela modernizao da sociedade e do Estado. Esse processo marcado ainda por

    uma tendncia de desvinculao entre teoria e prtica, entendendo-as como

    momentos diferenciados da ao profissional, e por uma interveno que dicotomiza

    o individual e o coletivo.

    Este o segundo momento, o de conformao da profisso, o qual se

    constitui pelo processo de institucionalizao do Servio Social, ou seja, seu

    reconhecimento enquanto profisso na diviso social do trabalho e que possui

    estreita relao com criao das grandes instituies assistenciais, estatais,

    paraestatais ou autrquicas (IAMAMOTO, 2007, p. 92). Estas instituies surgem

    como aes do Estado na tentativa de responder s demandas das novas foras

    sociais urbanas que se fortalecem nesta poca, buscando assim realizar um controle

    sobre estas foras para alm de intervir na regulamentao do trabalho.

    Neste momento, a ao profissional do assistente social no mbito das

    instituies se conforma por seu carter educativo e controlador da classetrabalhadora, respondendo prioritariamente s demandas institucionais. O

    profissional desenvolve assim uma interveno caracterizada como de coero e

    consenso das massas, que tem por objetivo o controle sobre as classes subalternas

    em defesa dos interesses da classe dominante e do Estado.

    Assim, como ocorre uma ampliao dos campos de atuao da profisso, sua

    clientela tambm se amplia, passando de pequenos grupos para uma grande

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    massa de proletariados. Segundo Iamamoto (2007), o objetivo do Servio Social

    tambm se modifica deixando de ser um instrumento de distribuio da caridade [...]

    para se transformar, prioritariamente, em uma das engrenagens de execuo da

    poltica social do Estado e de setores empresarias (p. 31), evidenciando-se a

    estreita relao entre a profisso e as polticas sociais.

    A interveno profissional orientada pelas necessidades dos setores

    dominantes, que conformam o empresariado. A demanda da classe trabalhadora, o

    principal alvo da ao do assistente social, permanece submissa aos imperativos do

    capital por controle da fora de trabalho.

    O vis conservador que norteia a interveno profissional se mantm e os

    movimentos para repensar a profisso se restringem ao aperfeioamento do

    instrumental tcnico-operativo, reafirmando a relao do Servio Social com

    demandas das polticas estatais de dominao e o controle da classe trabalhadora.

    Ao final da dcada de 1950 comearam a surgir s primeiras manifestaes que

    buscam romper com essa herana conservadora, as quais foram aprofundadas com

    o Movimento de Reconceituao na dcada de 1960.

    Desde sua institucionalizao enquanto profisso inserida na diviso social do

    trabalho, a insero do Servio Social nas relaes sociais tem sido pensada atravs

    de duas teses contraditrias, ambas unilaterais. A primeira pensa o Servio Social apartir de uma viso mecanicista, como instrumento exclusivo do poder da classe

    dominante e sem possibilidade de ser sujeito de sua prtica, conferindo-lhe um

    direcionamento social (IAMAMOTO, 2007, p. 98). A segunda tese est imbuda de

    uma viso voluntarista e entende o profissional como o agente capaz de promover a

    transformao da estrutura social. Nesse sentido, supervaloriza o papel poltico da

    profisso e subestima a fora poltica dos movimentos sociais.

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    Esta dualidade, que perpassa a insero do Servio Social na sociedade,

    expressa a estreita relao existente entre o exerccio profissional e a conformao

    das relaes sociais nas diversas conjunturas histricas. Isso significa dizer que o

    Servio Social, enquanto profisso que se insere no processo de reproduo das

    relaes sociais, sofre influncia de determinaes econmicas, polticas, sociais e

    culturais no seu trabalho profissional.

    Dessa forma, inserida no processo de reproduo das relaes sociais a

    profisso desenvolve uma dupla funo no interior da sociedade. Por um lado, atua

    reafirmando as condies polticas para o exerccio do poder da classe dominante,

    direcionando sua interveno para a criao das condies necessrias

    reproduo da fora de trabalho e reproduzindo as contradies prprias da

    sociedade capitalista. De outro, atua em defesa das necessidades da classe

    trabalhadora, visando garantir o acesso dos indivduos aos direitos de cidadania e

    reafirmando a luta dos movimentos sociais.

    Essa dupla funo traz determinaes ao exerccio profissional do

    assistente social. Atuando em instituies pblicas, privadas e paraestatais, o

    profissional desenvolve atividades junto aos usurios dos servios que se

    caracterizam por uma contradio. Por vezes, tem o objetivo de atender s

    requisies institucionais e por outras, se coloca em defesas das necessidades dapopulao, expressas nas lutas dos movimentos sociais. Assim, o assistente social

    encontra-se muitas vezes no lugar de mediador das relaes entre classes. No

    entanto, a atuao profissional desenvolvida neste lugar, caracterizada pela defesa

    da democracia, requer uma direo poltica que se aproxime de um projeto de

    sociedade igualitria, a qual deve estar expressa no projeto profissional hegemnico

    na categoria.

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    Cabe destacar que, apesar das instituies nas quais o profissional se insere

    colocarem requisies ao seu exerccio profissional, o assistente social dispe de

    uma autonomia relativa que lhe permite imprimir uma direo a sua ao profissional

    diferente das demandas postas pela instituio, permitindo ultrapass-las. Segundo

    Iamamoto (2007), este movimento se torna possvel devido relao singular que o

    profissional possui com o usurio expressa pelo contato direto, no qual o controle

    institucional no pleno.

    Essa autonomia que o profissional tem em seu trabalho deve servir de base

    para que o seu espao profissional seja pensado. Nesse sentido, as leis que

    regulamentam a profisso6 se destacam como orientadores no somente do

    exerccio profissional, mas tambm como guias para a construo deste espao.

    Estas leis so produtos de processos histricos e polticos, conformantes da luta da

    categoria profissional, e expressam uma tentativa de ruptura profissional com o

    conservadorismo, com uma prtica caracterizada como de tutela e controle da

    classe trabalhadora, e um exerccio profissional que ultrapassa a mera demanda

    institucional. Coloca-se ento como necessrio potencializar o espao ocupacional,

    redirecionando a ao do Servio Social para responder s necessidades sociais da

    classe trabalhadora, principal pblico atendido pela profisso. Dessa forma,

    entende-se que a construo de um exerccio e de um espao profissional assimcaracterizado

    envolve a explicitao e apropriao efetiva do espao ocupacional,decifrando as determinaes poltico-econmicas macroscpicas que oatravessam, para impulsionar a construo e implementao de estratgiasde ao que imprimam nova direo social ao planejamento e execuo deaes demandas ao Servio Social (IAMAMOTO, 2007, p. 111).

    6As leis aqui referidas so o Cdigo de tica Profissional dos Assistentes Sociais de 1993 e a Lei n8.662 de 07 de junho de 1993Lei de Regulamentao Profissional.

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    2.2 O SERVIO SOCIAL NO MBITO DA PREVIDNCIA SOCIAL: A

    TRAJETRIA DOS DIVERSOS PROJETOS DE PROFISSO

    A insero do Servio Social na poltica de Previdncia Social data da dcada

    de 1940 e relaciona-se com o momento histrico de expanso das instituies de

    seguro social, representadas nesta poca pelos IAPs (1943). A institucionalizao

    da profisso ocorreu em 19447atravs do Conselho Nacional de Trabalho (CNT),

    sendo definido como objetivo da ao profissional facilitar o acesso aos direitos

    previdencirios por meio de uma interveno social ampla e que tinha por finalidade

    modificar as condies de vida dos usurios, focando-se em duas possibilidades:

    mudar as condies individuais e/ou familiares e os aspectos relativos ao processo

    de reproduo social dos indivduos (SILVA, 2008).

    Ao longo das seis dcadas seguintes o exerccio profissional do assistente

    social foi orientado por vieses tradicionais, conservadores e crticos, refletindo a

    relao entre as conjunturas scio-histricas, a estruturao da poltica

    previdenciria e o movimento mais amplo da categoria para consolidao de um

    projeto profissional articulado com os interesses da classe trabalhadora. Uma

    expresso destas relaes so os documentos parmetros da ao profissional

    elaborados nestas dcadas: os Planos de Bsicos de Ao (PBA) de 1972 e 1978 ambos caracterizados por vieses tradicionais e conservadores como norteadores da

    ao profissionale a Matriz Terico-Metodolgica do Servio Social na Previdncia

    Social de 1994 documento que representa o movimento mais democrtico e

    progressista da sociedade na dcada de 1980 e expressa as referncias crticas dos

    assistentes sociais no INSS. Dessa forma, pode-se afirmar que a conformao e a

    7A institucionalizao da profisso na poltica previdenciria ocorre atravs da Portaria 25, de 08 deabril, do Conselho Nacional de Trabalho (CNT).

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    consolidao da profisso de Servio Social dentro da poltica de Previdncia

    relacionam-se diretamente, de forma mais ampla, com a estruturao da proteo

    social e, mais especificamente, com a prpria poltica previdenciria.

    Assim como a proteo social no era entendida como uma poltica universal

    e ampla, o Servio Social durante os primeiros quarenta anos (perodo

    compreendido entre o incio dos anos 1940 e meados da dcada de 1980) de sua

    insero naquela poltica constitui-se frente ao servio prestado nas instituies

    previdencirias como assistncia complementar, sendo caracterizado como

    supletivo, com aes individualizantes, humanizantes e de cunho educativo. O

    objetivo principal do exerccio profissional era alcanar o ajustamento social da

    populao beneficiria.

    Somente em 1960, em meio tentativa de legitimao do governo, a poltica

    previdenciria expandida atravs da Lei n 3.807 a Lei Orgnica da Previdncia

    Social (LOPS), a qual estende ao conjunto dos segurados um plano de benefcios e

    servios incluindo habitao, emprstimos e alimentao. A LOPS, apesar de ainda

    definir a profisso como assistncia complementar, comeou a apontar de forma

    mais consolidada as primeiras diretrizes de atuao do assistente social na

    Previdncia. No entanto, foi somente em 1965, com a Resoluo do Ministrio do

    Trabalho e Previdncia Social n 1.081, que as normas gerais para a profisso nasinstituies de Previdncia Social foram definidas, permanecendo ainda a

    concepo de assistncia complementar. Nesse sentido, importante relembrar o j

    apontado anteriormente: tal concepo da profisso, dentro da poltica

    previdenciria, relaciona-se com o conservadorismo presente na atuao

    profissional que, neste momento, possui um vis assistencialista (SILVA, 2008).

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    As prximas modificaes na estruturao do Servio Social na poltica

    previdenciria ocorrem a partir da instaurao da Ditadura Militar em 1964. A

    primeira mudana do Regime Ditatorial para a referida poltica, e que influncia na

    profisso, foi fuso dos IAPs no Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS)

    em 1966. A estruturao desta instituio resultado de uma profunda reforma na

    Previdncia Social conjugada com uma flexibilizao da legislao trabalhista, na

    qual a estabilidade do trabalhador no emprego substituda pelo FGTS8 (ABREU;

    LOPES, 2008, p. 46). Esta reforma o reflexo da poltica adotada pelo Regime

    Militar, que promove uma reorganizao do Estado baseada em uma racionalizao

    tcnico-administrativa das prticas institucionais.

    O INPS se consolida como o principal rgo da poltica de Previdncia Social

    em que o Servio Social vai atuar. Assim, o projeto profissional expresso neste

    momento caracteriza-se pela sua natureza poltico-pedaggica, pelo carter

    assistencialista e pela defesa de uma pretensa neutralidade do exerccio

    profissional. Tal projeto baseia-se na racionalidade tcnica para desenvolver sua

    prtica, respondendo s demandas do Estado pela afirmao do controle estatal

    atravs da conteno de tenses e presses provenientes do aprofundamento das

    contradies sociais.

    Essa estruturao da poltica de Previdncia e da atuao profissional sofreumodificaes a partir da dcada de 1970, quando ocorreu uma ampliao da

    cobertura da poltica como uma estratgia para responder s presses de alguns

    grupos das classes subalternas. No entanto, esta ampliao desenvolveu-se de

    forma controlada, caracterizando-se como uma expanso gradual, seletiva e

    associada abertura para o capital privado de reas estratgicas da proteo social

    8 O Fundo de Garantia por Tempo de Servio (FGTS) institudo pela Lei n 5.107 de 1966,substituindo a estabilidade no emprego e tem dupla funo de poupana obrigatria e capitalizao.

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    e da criao de fundos de trabalhadores. Este alargamento da cobertura configurou-

    se tambm como uma estratgia de legitimao do Governo Militar (1964-1985), o

    qual operou na dualidade de ampliao de direitos sociais ao passo que

    reduzia/anulava os direitos polticos dos indivduos (NEVES; SILVA, 2008).

    Em relao ao Servio Social, este momento marcado pela permanncia do

    conservadorismo no desenvolvimento da sua prtica profissional. Nesse sentido, o I

    Plano Bsico de Ao (PBA) de 1972 se destaca por reafirmar as perspectivas

    controladoras e disciplinadoras junto ao usurio. Este PBA expressa um projeto

    profissional com um enfoque psicossocial e que reduz a questo social a problemas

    individuais, reatualizando princpios tradicionais da individualizao e da

    autodeterminao do sujeito (ABREU; LOPES, 2008, p. 60). A interveno

    profissional neste momento caracteriza-se assim pelo foco no indivduo por si s e

    pelo entendimento de que ele o responsvel por suas condies de vida.

    Em 1977 ocorrem mudanas na estruturao da poltica previdenciria e do

    INPS que implicam em uma reorganizao da profisso. Neste momento, houve

    uma separao entre atividades previdencirias e assistenciais, levando extino

    dos Centros de Servio Social do INPS, os quais se constituam como o principal

    local de atuao dos assistentes sociais. Este processo representou a destituio

    do espao scio-ocupacional na Previdncia (NEVES; SILVA, 2008, p. 98).No sentido de modificar este quadro, a Coordenadoria Nacional do Servio

    Social, a partir da implantao do Sistema Nacional de Previdncia (SINPAS),

    tambm em 1977, conseguiu inserir a profisso na Secretaria de Servios

    Previdencirios para que esta atuasse junto a Percia Mdica e a Reabilitao

    Profissional. Esta ordem de fatores caracterizou uma nova organizao scio-

    institucional que imps desafios no campo subjetivo e tcnico-operativo para a

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    atuao do Servio Social. Como questo subjetiva pode ser destacada a perda de

    significado frente ao conjunto das prticas sociais existentes na instituio,

    implicando o desprestgio desse profissional com a extino da estrutura

    organizacional e do espao fsico prprio (NEVES; SILVA, 2008, p. 99). Em outro

    sentido, tm-se as mudanas organizacionais que implicaram na fragmentao da

    insero dos profissionais em diversas unidades representativas da poltica de

    Previdncia, as quais tinham dinmicas institucionais e sociais desconhecidas aos

    assistentes sociais gerando assim as dificuldades de ordem tcnico-operativa para o

    exerccio profissional.

    Dessa forma, tendo por objetivo construir uma resposta tcnico-institucional

    s condies postas, em 1978 foi construdo o II Plano Bsico de Ao (PBA), a

    partir do qual teve incio um processo de mudana da concepo da profisso para

    uma perspectiva mais crtica de atuao. Esta poca marca o surgimento de

    oposies s prticas tradicionais e do movimento de defesa do desenvolvimento

    social atravs da reduo das desigualdades de renda e promoo do bem-estar.

    Neste contexto, o Servio Social ganha visibilidade perante a poltica de Previdncia

    Social, tendo sua atuao superdimensionada (NEVES; SILVA, 2008).

    Neste perodo, a construo do projeto profissional do Servio Social na

    amplitude da categoria relaciona-se com os desdobramentos do Movimento deReconceituao, gerando assim duas direes que se confrontavam quanto

    anlise e s respostas profissionais s requisies da dinmica social, mas que

    possibilitaram o desenvolvimento de uma prtica profissional mais crtica (NETTO,

    1991 apudNEVES; SILVA, 2008). De um lado tem-se a inteno de ruptura, a qualse tornou hegemnica na dimenso da formao dos alunos, ainda que no

    desenvolvesse propostas de modificaes significativas no mbito da prtica

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    profissional. De outro, estava a reatualizao do conservadorismo, caracterizada

    pela tendncia de modernizar a profisso. Ambas as direes constituem juntamente

    com a perspectiva modernizadora parte do processo de renovao do Servio

    Social brasileiro. Em especfico, a reatualizao do conservadorismo e a inteno

    de ruptura marcam a real renovao da profisso: a primeira, que teve sua

    expresso na segunda metade dos anos 1970, recoloca elementos histricos e de

    carter conservador da profisso sob uma base terico-metodolgica que se

    reclama nova (NETTO, 2008, p. 157), a fenomenologia; e a segunda ,

    marcadamente presente na dcada de 1980, tem por objetivo romper com o Servio

    Social tradicional de base positivista e busca uma aproximao com o pensamento

    crtico-dialtico marxista.

    Aquele projeto profissional expresso no II PBA permaneceu orientando os

    profissionais da poltica de Previdncia Social por dezesseis anos, at 1994 quando

    elaborada a Matriz Terico-Metodolgica do Servio Social na Previdncia Social,

    influenciada pelas mudanas no contexto mais amplo da profisso. O longo perodo

    que compreende a construo do II PBA at a Matriz Terico-Metodolgica pode ser

    explicado, dentre outros fatores, pela ausncia de uma poltica de capacitao

    continuada no interior da prpria instituio [...] e a no realizao de concurso

    pblico (NEVES; SILVA, 2008, p. 102). Em especial, a no realizao de concursopblico restringiu a entrada de novos sujeitos afinados com as mudanas ocorridas

    no mbito terico da formao profissional a partir da reviso curricular na dcada

    de 1980. Assim, at meados desta dcada, o exerccio profissional na Previdncia

    marcado por ser tradicional, a-histrico e com baixa fundamentao terica (NEVES;

    SILVA, 2008).

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    O tempo que compreende a elaborao dos dois documentos citados

    marcado tambm por diversas mudanas na estruturao do Estado brasileiro e da

    prpria poltica previdenciria, das quais se destacam o fim do Regime Ditatorial e o

    consequente processo de redemocratizao da sociedade brasileira, este ltimo

    acompanhando pela elaborao de uma nova Constituio Federal em 1988,

    marcada pela definio de um sistema de proteo social amplo baseado no trip

    sade, previdncia e assistncia e que se prope universal. Estes fenmenos

    trazem rebatimentos para a atuao do Servio Social e esto expressos na

    construo de uma nova proposta de ao do profissional, que se relaciona com o

    projeto tico-poltico hegemnico da categoria. Assim como destaca Silva (2008),

    na dcada de 1990, o Servio Social previdencirio passa a expressar osavanos apontados na Constituio Federal de 1988 em torno dos direitossociais e da participao dos usurios na gesto das polticas pblicas(SILVA, 2008, p. 31).

    Assim, a Lei n 8.213 de 1991, no seu art. 889 define as competncias do

    Servio Social na Previdncia Social, constituindo-se como o novo marco legislativo

    para o exerccio da profisso nesta poltica. No mbito interno da poltica

    previdenciria, uma expresso dos avanos presentes na Constituio Federal a

    elaborao do Projeto/24 de 1991 que requereu a mobilizao dos servidores e

    mudanas de rotinas de trabalho no INSS. A elaborao do Projeto/24 possibilitou a

    definio de uma nova competncia para o Servio Social e, consequentemente, a

    desqualificao do PBA de 1978, como norteador do exerccio profissional (NEVES;

    SILVA, 2008). A formulao de tal projeto insere-se em um movimento maior de

    modernizao administrativa do INSS operado pelo governo Collor (NEVES; SILVA,

    9 A Lei n 8.213 de 24 de julho - de 1991 dispe sobre os Planos de Planos de Benefcios daPrevidncia Social e d outras providncias e em seu art. 88 dispe que compete ao Servio Social

    esclarecer junto aos beneficirios seus direitos sociais e os meios de exerc-los e estabelecerconjuntamente com eles o processo de soluo dos problemas que emergirem da sua relao com aPrevidncia Social, tanto no mbito interno da instituio como na dinmica da sociedade(BRASIL,1991, p. 147).

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    2008). Esse processo de mudana impulsionou um movimento de discusso e

    possibilitou o desenvolvimento e consolidao de uma prtica reflexiva pelos

    assistentes sociais da instituio, tendo como resultado a construo da referida

    Matriz Terico-Metodolgica de 1994, a qual se baseia em trs pontos fundamentais:

    a) na ruptura com a orientao funcionalista [...]; b) na definio da direopoltica e da ao profissional, fundamentadas no compromisso com osdireitos sociais; c) por fim, na construo da instrumentalidade metodolgicaviabilizadora dessa nova orientao (NEVES; SILVA, 2008, p. 108-109).

    Nesse sentido, Yazbek (2008) afirma que a Matriz Terico-Metodolgica

    apresenta-se como um novo paradigma para o Servio Social, reestruturando o fazer

    profissional na Previdncia e constituindo-se em um marco para a profisso visto

    que representa a opo de um exerccio profissional guiado por princpios

    democrticos, que reafirmam o exerccio da cidadania e do direito. Assim, a partir da

    instituio da Matriz a profisso passa por mudanas em sua interveno

    profissional, que passa a ser orientada pela concepo da poltica de Previdncia

    Social como direito do trabalhador e ter como fundamento a realidade social.

    A Matriz expressa uma direo terico-metodolgica que modificou o fazer

    profissional e serve de base para a construo de uma proposta de atuao que tem

    como objetivos:

    a) implementar a Poltica Social Previdenciria sob a tica do direito social eda cidadania [...]; b) contribuir para a formao de uma conscincia coletivade proteo ao trabalho no mbito da Previdncia Pblica em articulao

    com os movimentos organizados da sociedade (BRASIL, 1995, p. 13).

    A elaborao da Matriz Terico-Metodolgica, alm de refletir o projeto tico-

    poltico hegemnico na categoria, expressa a escolha poltica dos profissionais

    inseridos no INSS por um processo de redefinio do fazer profissional, rompendo-

    se com o conservadorismo e o tradicionalismo presentes neste fazer no mbito da

    instituio. Dessa forma, implica no desenvolvimento de um exerccio profissional

    com direo poltica e intencionalidade diferentes das presentes nos PBA de 1972 e

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    1978, voltada para a socializao da informao, fortalecimento do coletivo e da

    assessoria aos movimentos sociais (YAZBEK, 2008).

    Apesar da dcada de 1990 expressar uma mudana na direo do trabalho

    profissional da categoria, ela tambm marcada pelo processo de contra-reforma do

    Estado e das polticas sociais, o qual se estende at a atualidade. Neste contexto,

    os direitos sociais tendem a ser mercadorizados e o princpio de universalizao do

    acesso as polticas e aos direitos substitudo por uma abordagem seletiva e

    focalista como resposta as demandas sociais. Este movimento implica em um

    redimensionamento da atuao do Servio Social, trazendo modificaes para a sua

    insero na poltica de Previdncia Social e para o seu exerccio profissional.

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    2.3 ATRIBUIES PROFISSIONAIS

    2.3.1 AS ATRIBUIES GERAIS

    Independente de onde o assistente social desenvolve seu trabalho seja no

    mbito das polticas sociais, instituies pblicas e/ou privadas ou organizaes no-

    governamentais suas atribuies e competncias so definidas pelo Cdigo de

    tica Profissional dos Assistentes Sociais de 1993 e pela Lei n 8.662 de 1993 a

    Lei de Regulamentao da Profisso. Estas legislaes balizam a atuao

    profissional nos diversos espaos scio-ocupacionais, dando subsdio ao exerccio,

    definindo deveres e direitos dos profissionais. Entender alguns desses preceitos se

    faz fundamental para que o objetivo deste trabalho seja alcanado. Para tanto, sero

    explicitados aqui os principais direitos e deveres dos assistentes sociais presentes

    nas legislaes citadas.

    Dentre os princpios fundamentais destas leis importante destacar que,

    assim como disposto no Cdigo de tica, constitui-se direito do assistencial social

    Art. 2 b) livre exerccio das atividades inerentes Profisso; c) participaona elaborao e gerenciamento das polticas sociais, e na formulao eimplementao de programas sociais; [...] g) pronunciamento em matria desua especialidade, sobretudo quando se tratar de assuntos de interesse dapopulao; h) ampla autonomia no exerccio da profisso, no sendoobrigado a prestar servios profissionais incompatveis com as suasatribuies, cargos ou funes (CRESS, 2009, p. 35).

    Ainda se constituem direitos do profissional junto s instituies

    empregadoras, dentre outros presentes no art. 7 do Cdigo de tica, ter condies

    dignas de trabalho, as quais possam garantir a qualidade do seu trabalho

    profissional, e ter acesso a informaes relacionadas ao seu local de trabalho que

    interfiram e/ou influenciem no seu pleno exerccio profissional, principalmente ao

    nvel de programas e polticas sociais. Com relao aos direitos profissionais

    importante destacar tambm a questo do sigilo profissional, o qual um direito do

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    profissional manter e relaciona-se diretamente com as condies de trabalho do

    assistente social.

    O Cdigo de tica tambm versa sobre deveres do profissional com relao

    as suas responsabilidades gerais, os usurios, as instituies empregadoras e

    outros profissionais. Nesse sentido importante destacar o seu art. 3 e as alneas a

    e c, as quais dizem respeito ao desenvolvimento de um exerccio profissional que

    respeite as legislaes vigentes, sendo eficiente e responsvel, e contrrio a prticas

    que restrinjam e/ou neguem a liberdade e os direitos dos usurios. Alm desse

    artigo, outro que deve ser destacado o art. 5 e suas alneas a, b e c, que versam

    a respeito do dever do assistente social em relao garantia do acesso e a

    democratizao da informao junto aos usurios, tendo por objetivo garantir a

    participao destes no espao institucional e na sociedade.

    Tambm se constituem deveres presentes no Cdigo a denncia de falhas

    e/ou irregularidades no interior da instituio, nos seus programas, normas e

    regulamentos; a contribuio do profissional para modificar a correlao de foras

    existente na instituio, apoiando as demandas da populao; e empenhar-se na

    viabilizao dos direitos sociais dos usurios, atravs dos programas e polticas

    sociais (CRESS, 2009, p. 38). Alm disso, o assistente social deve buscar

    desenvolver um trabalho profissional de carter interdisciplinar e que respeite aautonomia dos movimentos e organizaes populares e da classe trabalhadora

    (CRESS, 2009).

    Por ltimo, importante salientar que o Cdigo de tica dispe sobre

    condutas que so vedadas ao assistente social. Dentre elas importante destacar o

    bloqueio aos usurios s informaes e aos servios prestados; revelar o sigilo

    profissional; intervir na prestao de servio de outro profissional; e ser conivente

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    com falhas ticas de acordo com os princpios deste Cdigo e com erros tcnicos

    praticados por assistente social e qualquer outro profissional (CRESS, 2009, p. 39).

    Em igual importncia para a normatizao do Servio Social no seu exerccio

    profissional est a Lei n 8.662/93, a Lei de Regulamentao da Profisso. Nela

    constam questes referentes s competncias e atribuies privativas do assistente

    social e s competncias das entidades representativas da categoria, os quais

    sejam: os Conselhos Regionais de Servio Social (CRESS) e o Conselho Federal de

    Servio Social (CFESS). Dentre estas disposies, aqui sero destacadas as

    relacionadas primeira ordem de questes.

    No que diz respeito s competncias do assistente social essencial destacar

    a elaborao, implementao e avaliao de polticas sociais, programas e projetos;

    a prestao de orientao social a populao usuria, seja individualmente ou em

    grupo; a identificao de recursos e orientao sobre os mesmos populao com

    objetivo de atender e defender os seus direitos; a realizao de estudos scio-

    econmicos com a populao usuria, contribuindo para a anlise da realidade

    social e para o exerccio profissional; e a participao no planejamento, organizao

    e administrao de benefcios e servios sociais (CRESS, 2009).

    Com relao s atribuies privativas do assistente social as que devem ser

    destacas neste trabalho esto presentes nos incisos I, IV e XII do art. 5 da Lei8.662. Estes incisos dispem como atribuies

    I. coordenar, elaborar, executar, supervisionar e avaliar estudos, pesquisas,planos, programas e projetos na rea de Servio Social; [...] IV. Realizarvistorias, percias tcnicas, laudos periciais, informaes e pareceres sobrea matria de Servio Social; [...] XII dirigir servios tcnicos de ServioSocial em entidades pblicas ou privadas (CRESS, 2009, p. 25).

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    2.3.2 AS ATRIBUIES DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLTICA DE

    PREVIDNCIA SOCIAL: TENTATIVAS DE DESCARACTERIZAO DA

    PROFISSO

    As atribuies profissionais do assistente social na poltica previdenciria,

    mas especificamente no INSS, vm sofrendo modificaes desde sua insero. Os

    processos polticos, as modificaes no interior da profisso, como a construo de

    um projeto tico-poltico em conformidade com os interesses da classe trabalhadora,

    e a reestruturao da previdncia trazem implicaes para a definio das

    atribuies e competncias profissionais do assistente social.

    Na atualidade, a principal legislao que define as atribuies do Servio

    Social na Previdncia Social a Lei n 8.213 de 1991, que no seu art. 88 dispe

    Art. 88. Compete ao Servio Social esclarecer junto aos beneficirios seusdireitos sociais e os meios de exerc-los e estabelecer conjuntamente com

    eles o processo de soluo dos problemas que emergirem da sua relaocom a Previdncia Social, tanto no mbito interno da instituio como nadinmica da sociedade. [...] 3 O Servio Social ter como diretriz a participao do beneficirio naimplementao e no fortalecimento da poltica previdenciria, em articulaocom as associaes e entidades de classe. 4 O Servio Social, considerando a universalizao da PrevidnciaSocial, prestar assessoramento tcnico aos Estados e Municpios naelaborao e implantao de suas propostas de trabalho (BRASIL, 1991, p.147).

    Apesar das disposies desta lei j terem sofrido algumas modificaes, ela

    permanece como a principal orientadora da atuao profissional do assistente social

    na poltica previdenciria.

    No que diz respeito s modificaes na normatizao do exerccio

    profissional, importante destacar a Medida Provisria n 1.729 de 199810, que tenta

    excluir a profisso do quadro do INSS, sendo revertida pela luta conjunta dos

    profissionais da instituio com as entidades da categoria. Nesse sentido, o Decreto10A tentativa de excluso se expressa no art. 22 da referida Medida Provisria, o qual revoga o art.88 da Lei n 8.213 de 1991.

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    n 3.048 de 1999, tambm se destaca por modificar as condies de insero do

    assistente social no INSS. Em seu art. 16111 est exposto a principal mudana

    ocorrida, a partir da contra-reforma da Previdncia em 1998, para o Servio Social.

    O referido decreto dispe que a profisso constitui atividade auxiliar do seguro

    social, sendo excluda administrativamente do organograma da instituio. De

    acordo com este decreto, a ao profissional tem como o foco orientar e dar apoio

    ao beneficirio com o objetivo de solucionar problemas pessoais e familiares e

    melhorar a relao deste com a Previdncia Social, desenvolvendo-se um exerccio

    profissional caracterizado pela coero e pelo consenso.

    Estas legislaes expressam o momento poltico no qual o Servio Social

    encontra-se a partir do final da dcada de 1990, tanto no campo da poltica

    previdenciria quanto no mbito interno do INSS, caracterizando-se por um

    movimento de desvalorizao da profisso na instituio. Assim, as atribuies e

    competncias privatistas ao cargo de assistente social e sua presena no quadro

    geral do INSS, suprimidas pelo Decreto 3.048/1999, so resgatadas somente em

    2000 com a Portaria do Ministrio da Previdncia e Assistncia Social n 2.72112

    (CARTAXO; CABRAL, 2008).

    Outras duas importantes legislaes que modificam o exerccio profissional do

    assistente social no INSS so o Decreto n 3.668 de 2000, que extingue o parecersocial, e o Decreto n 6.214 de 200713, que define tambm como atribuio daquele

    11O art 161 do Decreto n 3.048 dispe que oservio social constitui atividade auxiliar do segurosocial e visa prestar ao beneficirio orientao e apoio no que concerne soluo dos problemaspessoais e familiares e melhoria da sua inter-relao com a previdncia social, para a soluo dequestes referentes a benefcios, bem como, quando necessrio, obteno de outros recursossociais da comunidade (BRASIL, 1999).12A referida Portaria define em seu art. 2 que os assistentes sociais do INSS ficam lotados nasDivises e Servios de Benefcios existentes nas Gerncias-Executivas (BRASIL, 2000)13 O Decreto n 6.214 de 2007 regulamenta o Benefcio de Prestao Continuada (BPC) daAssistncia Social para pessoa com deficincia e ao idoso, definindo que o benefcio dever serrequerido nas APS ou outros rgos autorizados e institui que sua concesso pessoa comdeficincia necessita da realizao da avaliao da deficincia e do grau de incapacidade. A

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    profissional a realizao da avaliao social para concesso do Benefcio de

    Prestao Continuada (BPC)14. Estas duas legislaes, em especial a ltima,

    implicam em transformaes para a estruturao, organizao e exerccio

    profissional do Servio Social no INSS na atualidade.

    Entende-se que a insero desta profisso na poltica de Previdncia Social,

    ao longo dos setenta anos de existncia, vem passando por grandes modificaes

    que influenciam diretamente no trabalho profissional dos assistentes sociais.

    Modificaes estas que se originam tanto do movimento interno da categoria e se

    relacionam com o prprio processo de institucionalizam da profisso (assim como

    abordado no item 2.1), quanto so determinadas pelas mudanas histricas,

    polticas e econmicas do pas, as quais promovem um processo de reestruturao

    das polticas sociais.

    A principal influencia daquelas modificaes diz respeito s condies de

    trabalho do assistente social no INSS, nas quais se incluem o espao fsico, os

    instrumentos de trabalho e os vnculos empregatcios. Estas condies tm sido

    alteradas e determinadas de acordo com conjunturas histricas e polticas, gerando

    mudanas tambm nas atribuies profissionais e no objetivo da interveno do

    assistente social.

    avaliao de deficincia ser composta pela avaliao mdica e social, devendo ser realizadas pelapercia mdica e pelo Servio Social do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

    14 O Benefcio de Prestao Continuada