Tecnocolonialismo - O Rio Nas Lentes Do Passado e Do Presente

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  • Tecnocolonialismo? O Rio nas margens do passado e do presente

    Tunico Amancio

    Universidade Federal Fluminense

    [email protected]

    Resumen:

    O Brasil tem sido representado nas narrativas cinematogrficas da grande indstria

    dentro dos modelos de condensao que implicam em esteretipos j bastante

    assimilados pelas plateias internacionais. Isto se verifica com maior intensidade no

    campo mais sutil e fantasioso da fico e no interior das fronteiras dos gneros

    consolidados.

    Alguns filmes contemporneos lidam com este repertrio consagrado ao qual no

    falta a necessria atualizao, marcada a maior parte das vezes pela mais espetacular

    tecnologia. E a arena principal onde se d esta performance a mise-en-scne da cidade

    do Rio de Janeiro. Esta comunicao pretende averiguar tal incidncia nos filmes

    Velozes e furiosos 5- Operao Rio, Os mercenrios, O incrvel Hulk, Comer, beber,

    rezar, e finalmente Rio, apontando os efeitos modernizantes porventura produzidos por

    estas obras. Pretendemos tambm refletir sobre o porqu desta imagem ideolgica ter

    passado a ser legitimada em certas instncias da sociedade brasileira.

    Palabras clave: representao flmica - esteretipos cinematogrficos

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  • Tecnocolonialismo? O Rio nas margens do passado e do presente

    So conhecidos os esforos dos pases de economia perifrica, antes de sua

    emergncia ao estatuto de parceiros ativos do grande capital internacional, no que se

    convencionou chamar de globalizao, no sentido de requerer uma autonomia de

    representao, uma demanda por sua visibilidade internacional sem as marcas da

    colonizao. H que se considerar nesta afirmao a impreciso e instabilidade dos

    conceitos de parceria capitalista ativa, de globalizao e mesmo de autonomia

    representacional. Vamos estabelecer alguns marcos histricos da emergncia desses

    fenmenos: o colapso da guerra fria (1989/1991), o fim de boa parte dos regimes de

    exceo convertidos democracia, a adeso da China Comunista ao sistema capitalista.

    E tambm a consolidao da unificao europia, o fortalecimento da Amrica do Norte

    sob o Tratado Norte-Americano de Livre Comrcio, a criao do MERCOSUL, a

    formao da Unio Africana. Leve-se em conta tambm o desenvolvimento da World

    Wide Web, matriz da conexo entre redes internacionais dos protocolos de transmisso

    e encaminhamento das redes militares e cientficas que vo permitir nos anos 80 a

    exploso do seu uso privado. Outro elemento a ser considerado a revitalizao do

    processo expansionista americano com a difuso dos modelos ideolgicos, econmicos

    e polticos baseados no liberalismo, na abertura de mercados, livre competio e

    desregulamentao das estruturas jurdico-administrativas que mantinham as economias

    dos pases da Amrica Latina em suas perspectivas nacionalistas, a partir do Consenso

    de Washington, num rigoroso ajustamento macroeconmico do mundo em

    desenvolvimento. Estas medidas impactaram de maneira profunda em alguns setores

    estratgicos, entre eles o das telecomunicaes, que atravessou mudanas estruturais

    significativas e permitiram um avano tecnolgico sem par na histria da circulao da

    informao. Tais mudanas foram conseguidas atravs da desregulamentao dos

    processos que ativam os mercados e, nesta perspectiva, estabeleceu-se de maneira mais

    efetiva o princpio do Estado mnimo, com um menor controle sobre as foras

    produtivas postas na negociao social. Naturalmente que o aparato institucional para a

    cultura e as artes foi um dos que mais se viu desamparado, num vis internacionalizante,

    atravs de vrias medidas de abertura do mercado ao capital estrangeiro, agora

    representado por um incremento da circulao de produtos internacionais, aquisio e

    fuso de empresas, abertura de fronteiras, transmisso rpida de informaes e dados,

    globalizao de gostos e de preferncias, padres mundiais de qualidade, etc, etc, etc. O

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  • campo do audiovisual sofreu enorme revitalizao, com um trnsito mais intenso de

    informaes, consolidao das estruturas de produo (TV, cinema, publicidade) e

    maior participao no cenrio internacional enquanto indstria do entretenimento.

    Na virada do sculo, com o alerta sobre a inconsistncia e inadequao do projeto

    neo-liberal, alguns governos latino-americanos, de cunho progressista, iniciam um

    processo de embate anti-hegemnico, resistindo s polticas econmicas ditadas por

    Washington, retomando bandeiras polticas histricas: posse da terra, fim da dvida

    externa, uma sociedade justa e identitria, com uma lgica alternativa de maior

    preocupao com as questes sociais. Recolocando os modos de interveno estatal,

    freando o desmantelamento dos aparatos administrativos e revigorando a regulao em

    diversos setores, alm de modernizar os servios pblicos. ( SADER, apud MORAES,

    2009, p. 106).

    a partir deste contexto que nos interessa pensar a insero da cidade do Rio de

    Janeiro no imaginrio contemporneo do cinema, desde a virada do sculo, considerada

    a intensificao dos intercmbios econmicos e culturais, a permanncia de certos

    signos construdos historicamente e sua cristalizao na memria coletiva ocidental. E

    para isto preciso rever um pouco o percurso de sua formao.

    Formatando os modelos

    Nos variados cenrios brasileiros explorados pelo cinema estrangeiro, a cidade do

    Rio de Janeiro tem, sem dvida, o papel principal. Isso se deve fora de sua imponente

    e particular geografia ( que congrega montanha, praia e floresta), de sua importncia

    poltica na histria do pas (enquanto ex capital da Colnia, do Imprio e da Repblica)

    e dos equipamentos urbanos, culturais e de lazer que oferece. O Rio sedia tambm

    importantes conglomerados de empresas de mdia, comunicao e petrleo, indstria

    naval, um porto importante e muitas outras atividades, sustentadas pelo segundo maior

    PIB do pas. Uma cidade global marcada por seu intenso capital cultural, identificado e

    reconhecido nacional e internacionalmente. Ao lado de toda esta potncia, e como

    resultado das polticas pblicas de desenvolvimento, historicamente marcadas pelo fardo

    do colonialismo e pelas desigualdades oriundas do processo de acumulao de um

    capitalismo perifrico, a cidade v crescerem os ndices de excluso social, de

    marginalidade e de violncia.

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  • Este movimento essencialmente contraditrio como reflexo e reflexo - vai

    definir um modo de ser carioca, essencialmente urbano, marcado pela cultura do sol e

    pela frico das raas e das classes que compem a sua populao, atributos que sero

    bem explorados pelas lentes da fico dos filmes de longa-metragem

    A representao do Rio de Janeiro no cinema, para alm da historicidade de seus

    marcos iniciais vai se nutrir de uma conjugao homem-natureza, em que tero destaque

    as belezas fsicas e os construtos do stio urbano moldados pela singularidade das gentes

    que nele habitam. Esta paisagem carioca comporta uma caracterstica simblica de

    exotismo e erotismo, calcada na originalidade, na pregnncia de um real histrico

    contaminado por um imaginrio de mestiagem, sensualidade e cordialidade

    caracterstico de uma utopia dos trpicos. Uma utopia que, no Rio, se confunde com a

    modernidade do assentamento urbano.

    O Rio se torna, assim, prisioneiro de sua prpria imagem, ainda que

    periodicamente explodam nas telas instantneos que rompem com figuraes j

    assimiladas e reconhecidas. Por isto, uma observao panormica de parte dessa

    produo pode nos orientar na percepo da variedade cultural desse registro.Vamos

    cuidar aqui, apenas, do Rio visto pelo cinema estrangeiro de fico.

    The girl from Rio, de 1927, ou Sumuru, seu nome original, foi um filme de 1927,

    dirigido por Tom Terriss, com personagens de nomes hispnicos circulando por uma

    cidade esqulida. Em 1931, outra produo de Hollywood, chamada Rios Road to hell ,

    provoca total aborrecimento no pblico e nas autoridades brasileiras que pedem sua

    retirada de circulao, sendo sua solicitao negada ( FREIRE-MEDEIROS, 2005, p.8).

    s com Voando para o Rio ( EUA, Thornton Freeeland, 1933) que a imagem do

    Rio de Janeiro consolidada no cinema estrangeiro de fico, atravs de um repertrio

    que j define um modelo de representao, o do balnerio elegante, voltado para o

    turismo internacional, impregnado de msica e de um povo docilizado e amigvel. O

    filme narra um tringulo amoroso se deslocando para o sul, dos Estados Unidos ao

    Brasil, via Haiti, e a trama vai quebrando fronteiras e acentuando o carter paradisaco

    do ponto de chegada. O Rio de Janeiro apresentado atravs de uma srie de cartes

    postais que ilustram a cidade, indcios de uma rede desfrutvel de lazer, dos signos da

    modernidade melhoramentos urbanos, grandes empreendimentos imobilirios, sintonia

    entre cultura e natureza recriados atravs de stock-shots. O filme conta tambm com

    exuberantes nmeros musicais e ainda com um espetaculoso nmero acrobtico em que

    belas garotas danam sobre avies, desenhando bizarras simetrias nas altitudes do que se

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  • convencionou ali serem as praias do Rio. Esto presentes j os elementos que, com

    pequenas variaes, vo compor o cenrio carioca no cinema estrangeiro das primeiras

    dcadas.

    Nos anos 40, aproximados aos princpios de solidariedade continental da Poltica

    de Boa Vizinhana do Governo Roosevelt, veremos aparecer as imagens cosmopolitas

    do Rio dentro de uma das criaes animadas de Walt Disney, o Al,

    amigos(EUA,1943) que fez nascer o malandro papagaio Z Carioca, exportando

    samba, cachaa e malemolncia, sob a marca de um grafismo colorido e tropical. Orson

    Welles e seu Its all true (EUA, 1942) teriam sido a contrapartida dessas imagens de

    carto postal, investindo no carnaval e no samba de morro, mas a aventura foi abortada

    pelos executivos da RKO que se espantaram com aquela multido mestia pulando e

    com a adio de um episdio de conotaes inusitadas - a viagem de jangadeiros

    nordestinos pela costa brasileira at o Rio para reivindicar a Getlio seus direitos

    trabalhistas. Quando suas imagens foram encontradas em 1985 um Rio carnavalesco

    veio luz, os desfiles de rua e os bailes de gala dos sales elegantes, os tipos populares e

    a marcao dos instrumentos do samba determinando por um ouvido atento o erotismo

    que um olhar extasiado podia apenas supor.

    Mas , entretanto, por um vis mais glamoroso que o Rio se inscreve no circuito

    internacional de turismo, valorizando seus equipamentos culturais e suas configuraes

    fsicas. Notamos isto, por exemplo, quando os argentinos vm ao Brasil em busca do

    usufruto esttico dos monumentos urbanos e naturais, dos hotis de luxo e dos cassinos,

    nos cruzeiros elegantes, como o fazem Catita e Serrano numa comdia ligeira ( Luna de

    miel en Rio, Manuel Romero, 1940), embora as imagens do Rio sejam todas em back-

    projection. Assim sero tambm Estranha passageira(EUA, Irving Rapper, 1942) e

    Interldio (EUA, Alfred Hitchcock, 1946), envolvendo tramas de amor e espionagem,

    ou ainda A caminho do Rio ( EUA, Road to Rio, Norman Z. McLeod, 1947). So

    tambm comuns, nos anos 40 e 50, as reprodues cenogrficas que privilegiam uma

    leitura panormica da cidade. Recriada em estdios, a geografia da Baa de Guanabara

    evidencia bem o seu papel de fundo, de cenrio privilegiado para que acontea em

    primeiro plano a pretendida integrao entre norte e sul, entre os americanos e

    brasileiros, entre congas e maracas. Carmen Miranda foi a embaixatriz dessa delicada

    misso desde Uma noite no Rio (EUA, Irving Cummings, 1941), cantando com Don

    Ameche as delcias do panamericanismo, em frente imponente paisagem carioca,

    celebrada numa exploso de fogos de artifcio. Estes gigantes cenrios hiper-realistas,

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  • que se aproximam de verdadeiras reprodues fotogrficas vo ser ainda utilizados por

    Robert Z. Leonard em Romance carioca (EUA, 1950) e Melvyn LeRoy em Meu

    amor brasileiro(EUA, 1953), confirmando a tendncia americana para o artifcio

    baseado na espetacularidade. Eles tornam presente a geografia do Rio espcie de

    atrativo essencial e a fazem ser contemplada a partir de hotis de luxo e restaurantes

    finos, moldura sofisticada de uma natureza sem par. Esta resoluo plstica bem mais

    oportuna do que aquela que fizera Robert Siodmark com seu minimalista cenrio carioca

    de papier-mach, onde um Corcovado parecendo um vulco contornado por palmeiras

    soava to falso quanto as escravas brancas que eram trazidas Cidade Maravilhosa em

    Le chemin de Rio( ou Cargaison Blanche, FRA, 1935). Um artificialismo da paisagem

    que condizia com o tratamento dado s gentes do lugar, encenando seus papis

    estereotipados e secundrios, relegadas a um segundo plano na trama.

    O Rio foi tambm o literal pano de fundo de algumas aventuras cmicas,

    acolhendo escroques que, fugidos da Europa e dos Estados Unidos, sero encontrados,

    presos e repatriados. Tanto em Cinco dedos( EUA, Joseph Mankiewicz, 1952), quanto

    em O Mistrio da Torre ( ING, Charles Crichton, 1951), a cidade ser apenas uma

    ltima imagem fugidia que os espertalhes apreciam, sua falsa nobreza denunciada.

    no fim dos anos 50 que o Rio passou a ser objeto quase exclusivo do interesse

    europeu, como parte de um bom nmero de aventuras cinematogrficas, na verdade

    grandes priplos pelo Brasil, estada primeira de uma peregrinao a Braslia,

    Amaznia, a Foz do Iguau. Viajantes como os que no passado registraram as belezas

    naturais do pas, os europeus constituram um repertrio de imagens frescas, quase

    documentais, extradas diretamente da realidade, a servio da fico. A cidade do Rio de

    Janeiro foi esquadrinhada de variados ngulos, os filmes sobem o morro, cruzam o

    centro da cidade, participam de uma sociedade em vias de transformao, reproduzindo

    o traado e os caminhos da cidade destituda do status de Capital Federal. O cinema

    estrangeiro perdeu a timidez frente ao Brasil e se misturou s ruas, quase sempre

    embalado pela msica brasileira. J incorporada ao imaginrio obrigatrio das imagens

    do Brasil, a cidade cumpriu suas funes externas com eficincia: vitrine do pas,

    sinalizadora de contedos fixados nos monumentos, sntese da representao de

    estruturas histricas, econmicas e sociais reconhecveis como um todo, depositria

    sentimental das emoes associadas felicidade, ao prestgio social, ao modernismo, ao

    luxo, sustentados por um sistema de referncia a um Brasil vivel, moderno, dinmico

    que excitava a fantasia.

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  • A primeira revelao foi Orfeu Negro ( FRA, Marcel Camus, 1959), que

    transitou pela cidade atualizando sua tragdia musicada e continuou percorrendo o

    mundo, j investido nas glrias de uma Palma de Ouro e de um Oscar de filme

    estrangeiro. O carnaval, a favela e a bossa nova foram os cones preciosos de um novo

    Brasil que se construiu na tecla da mestiagem, da democracia racial, de um

    miserabilismo que encontrou encantos l onde ainda no se vislumbrava a falncia

    social. As platias internacionais se identificaram com essa cidade vista quase sempre

    do alto, numa profuso de cores e sons que acabou fazendo repertrio definitivo.

    Seguiram-se Marisol rumo ao Ro (ESP, Fernando Palcios, 1963), com seus

    quiproqus sobre gmeas separadas, O homem do Rio (L'Homme de Rio, FRA,

    Phillipe de Broca, 1964), com uma nova leitura da favela e do traado urbano da cidade.

    Furia na Bahia para OSS-117 (FRA, Andr Hunebelle, 1965), na linha dos agentes

    secretos que mistura locaes exticas com espaos elegantes, Samba, com Sarita

    Montiel ( ESP. 1965, dir. Rafael Gil), L'Alibi (ITA, Adolfo Celi, Vittorio Gassman,

    Luciano Lucignani, 1969) e Pour un amour lointain (FRA, Edmond Schan, 1967),

    filmes europeus que, de uma forma ou de outra, pensaram, refletiram e recriaram a

    cidade.

    Nos anos 60, sintonizado com os novos tempos, o Rio de Janeiro pulsou com a luz

    da rebeldia, propondo uma representao do pas radicalmente independente dos

    modelos vigentes enquanto o cinema que olhava de fora se ocupava da cidade de uma

    forma mais comedida no desenvolvimento de sua fico. Exatamente nos momentos

    mais difceis da ditadura. Por conta disto, talvez, os filmes sobre o Rio sejam escassos.

    O cinema estrangeiro contemplava de longe a poltica e no se interessou pela vida

    nacional. E s vamos voltar a encontrar a cidade no fim dos anos 70, envolvida na ao

    que reinveste a guerra fria de significados, e nela o seu agente mais poderoso, defensor

    do primeiro mundo capitalista o espio ingls James Bond, e suas movimentadas

    passagens pela cidade, explorando seu potencial turstico, onde se entrecruzam a

    exuberncia da paisagem e a singularidade das manifestaes culturais. O agente secreto

    recuperou um Rio extico pelas vias de uma desvairada fantasia., em Moonraker: 007

    contra o foguete da morte ( ING, Lewis Gilbert, 1979). tambm por uma via musical

    transversa que os sobreviventes da banda punk Sex Pistols, Paul Cook e Steve Jones,

    desfilaram pelas praias do Rio de Janeiro acompanhados pelo ladro ingls Ronald

    Biggs, no filme The great rocknroll swindle( ING, Julian Temple, 1980).

    Considerado o Cidado Kane dos filmes de rock, parece um filme brasileiro, misto de

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  • chanchada da Atlntida e Cinema novo, segundo um crtico, com seus momentos

    comdia-pastelo, desenho animado e grand guignol, captando bem o esprito cafajeste

    carioca.1 Quem passou tambm pela cidade, em descontrada apario em interiores bem

    decorados e freqentados por gente bem foi a francesa Emmanuelle, no quarto filme

    da srie (FRA, Bruno Zincone, 1983). A paisagem ficou quase ocultada, mas o clima

    descontrado dos cariocas contaminava a trama. Descontrado como o humor dos

    italianos Bud Spencer e Terence Hill na comdia Eu, voc, ele e os outros( ITA, E.B.

    Clucher, 1984), como ssias de milionrios que freqentam manses imponentes e casas

    suspeitas no cais do porto. Neste mesmo ano o Rio recuperou sua projeo ednica no

    filme Feitio no Rio(EUA, Stanley Donen, 1984), carregando nas tintas para a

    obteno de uma cor local fantasiosa que entretm o roteiro, como na inacreditvel

    sequncia de praia com todas as mulheres em topless, em meio ao mais desacertado

    folclore: tucanos e macacos, grupos de msica, capoeira, um grupamento harmnico na

    areia em frentica celebrao. Os heris se envolvem em arriscadas aventuras amorosas,

    mas escapam inclumes, porque afinal de contas.... a culpa do Rio. Uma cidade feita

    para seduzir, cujo registro imaginrio passa a ser reintroduzido no pragmtico territrio

    turstico, ao qual se adiciona uma pitada de transgresso sexual. A cmera vasculha,

    desta vez, atentamente a cidade, omitindo as reas de atrito, vocacionada de novo para a

    sensualidade, o primitivismo das religies populares, para a imerso numa natureza

    selvagem que a todos contamina. O mesmo tipo de desvario que tomou conta do pai do

    protagonista nos planos iniciais de Um dia a casa cai( EUA, Richard Benjamin,

    1986), (re) casando-se nas areias de uma praia do Rio, numa cerimnia religiosa que

    mistura candombl, escolas de samba e fogos de artifcio. Neste tom tambm a trama

    de No Rio vale tudo( FRA, Philippe Clair, 1987), um quiproqu entre irmos

    gmeos, um padre e um malandro, s voltas com um carregamento de droga que circula

    pela cidade, do cais do porto ao subrbio, com a participao de militares em manses

    onde se pratica sexo e se consome entorpecentes livremente e onde a mocinha da

    histria se revelava finalmente um travesti. O ttulo do filme em portugus j anunciava

    esta suspenso das interdies que uma trama tmida buscava desenvolver, sem ocultar

    seu projeto real, mais voltado para a observao da anatomia humana do que para os

    contornos possveis de uma cidade. O Prisioneiro do Rio ( EUA, Lech Majewski,

    1988) tentou recuperar o fascnio monumental urbano e romper com as amarras de uma

    clicheria j gasta pelo abuso. Seus planos iniciais, no Cristo Redentor, so uma tentativa

    1 - Antonio Bivar em PUNK-ROCK Zip/net - 1999

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  • de re-enquadramento da iconografia carioca numa moldura de bom gosto e zelo pela

    composio formal. Usando os efeitos de luz e sombra, de recorte e de perspectiva, a

    fotografia tenta ser uma extenso da narrativa, mas sucumbe ao poder inquestionvel

    dessas imagens j estatudas enquanto mito e se deixar absorver pela trama, mesmo

    quando percorre quase documentariamente as ruas da cidade. O filme trabalha com uma

    geografia precisa e com uma trama que envolve o ingls Ronald Biggs perseguido pela

    Scotland Yard, assim como com a representao de uma tipologia humana afeita

    negociao sexual, prostitutas e travestis que comungam de um estado de esprito

    nacional de inverso dos valores estabelecidos. A dcada se encerra com Orqudea

    selvagem ( EUA, 1990, Zalman King), onde um enredo de alto teor sensual tem a

    capacidade de se desenvolver numa cidade que uma mistura de Rio e Salvador, uma

    metrpole hbrida e quase imaginria, condensando algumas referncias culturais das

    duas cidades, praias e casario colonial, bahianas e lambada, trio eltrico e

    empreendimentos imobilirios, sempre comprometida com a intensa voracidade sexual

    de seus habitantes. Mestios e europeus se encontram no meio s prticas sexuais mais

    glamurizadas e fotognicas, enquanto a cidade vista de maneira distanciada,

    plataforma cnica que no compartilha do prazer de seus personagens.

    Os anos 80 fazem do Rio um refgio dessas gentes tardiamente empenhadas na

    conquista de uma sexualidade plena, num cenrio que dialoga com toda a tradio da

    liberalidade dos costumes, da miscigenao tnica e da cordialidade ingenuamente

    nativa. A cidade um pano de fundo para histrias de desenganos amorosos, centradas

    num oportunismo ertico e extico que preenche a tela com cartes postais plidos

    emoldurando um romantismo de segunda mo. Atrao Selvagem(ITA, Michele

    Massimo Tarantini, 1992) e Comando Delta 2 Conexo Colmbia (EUA, Aaron

    Norris, 1992) Kickboxer III (EUA, Rick King, 1992) Il barbiere di Rio (ITA,

    Giovanni Veronesi, 1997), Boca( Zalman King, EUA, 1994), Filhas de Iemanj

    (FIN, Pia Tikka, 1996), em tonalidades variadas, no fogem velha regra de uma

    locao extica, onde se explora a cultura local ou que buscam no social alguns

    elementos dramticos. A favela passa a ser incorporada trama, deixando de ser um

    espao de fundo e vindo ao primeiro plano, num repertrio de trfico de drogas,

    prostituio infantil, meninos de rua, embaladas seja pelo humor ou pela aventura. A

    cidade contamina as histrias e a perspectiva ednica quase totalmente abolida. A

    metrpole j no condensa os sonhos de modernidade, e a esperana mudou de lugar. A

    cidade o territrio da injustia, da concorrncia, da explorao. Os personagens esto

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  • presos numa malha urbana que corrompe os herosmos e onde as marcas da histria so

    os smbolos da decadncia. O cenrio do Rio se associa ao inferno.

    A dinmica da representao da vida carioca no cinema estrangeiro obedece a

    trmites scio-polticos muito precisos e prova de sua representatividade frente ao

    conjunto de imagens projetadas pelo Brasil l fora. A descontinuidade e a recorrncia de

    alguns paradigmas tornam explcita a existncia de uma rede imaginria maior que a

    evoluo do stio urbano, j que periodicamente recuperada e posta de novo em ao.

    A cidade identificada, antes de qualquer coisa, pelo seu perfil fsico. Depois, pela

    singularidade das expresses culturais que lhe do substncia e cujo fundamento

    histrico oferece narrativas de interao e sociabilidade, num contexto de lazer e

    disponibilidade que as transformam em domnio de apelo irresistvel. Ainda que o

    irresistvel territrio esteja se contaminando com as mazelas de nosso modelo

    econmico e um outro campo de gravitao, baseado na excluso e na violncia, esteja

    se estabelecendo.

    O cinema de fico estrangeiro, de matriz industrial, sensvel a tudo aquilo que

    seja extico, original, surpreendente ou chocante, adjetivos que o Rio sustenta ainda,

    com uma certa displicncia. Ainda que precria, a imagem do Rio no cinema

    permanece. No histrico da representao do espao urbano carioca se verifica a marca

    de algumas ntidas flutuaes, calcadas em polaridades visveis: a cidade feminina do

    ideal amoroso (para Dolores del Rio, Bette Davis e Lana Turner) e a cidade masculina,

    da ao ( do agente OO7, dos espies de Hitchcock, das correrias da Interpol, do Boca

    americano). Uma cidade sedutora e miscigenada, cenografada para a emoo, oposta e

    uma outra cidade vibrante de movimento, enganosa e traioeira.

    Uma cidade baixa, de significaes construdas em torno dos desenhos das

    caladas de Copacabana e o mundo do turismo e a cidade alta, projetada em torno da

    mitologia da favela, que vai de Orfeu a Boca, da lrica musical ao fuzil AR-15.

    Binmios que se completam, que interagem, que do cidade uma substncia dramtica

    afinada com a solidez de sua beleza plstica. sob esse olhar que a cidade faz sua

    inscrio histrica na balana de intercmbios de produtos simblicos entre o Brasil e o

    mundo.

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  • Mais perto de ns

    Como o Rio de Janeiro representado agora? De que modo o to propalado fluxo

    de informaes em simultaneidade, essa conexo global, instantnea e feroz, a to

    estudada convergncia tecnolgica, de que modo todo esse processo pode tem nuanado

    as imagens de um pas to intensamente conectado quanto o Brasil e nele sua capital

    cultural, sua Cidade Maravilhosa? Ns estamos falando de cinema, e de cinema

    comercial pensado numa escala industrial para circulao global, baseado num sistema

    de estrelas e de gneros, atravessado pela relativizao de fronteiras da

    contemporaneidade, um cinema que respeita os valores ideolgicos de sua platia

    dominante, que por sua vez, exerce um tipo de hegemonia indireta. Transformando em

    universal um cdigo palatvel para o espectador ocidental, uma espcie de criana

    mimada do processo ( SHOHAT Ella, STAM Robert, p.274.)

    Por aqui se deduz o que uma difusa mquina de elaborao imaginria registra

    sobre o Brasil e sobre o Rio e os contornos imprecisos dessa representao, pautada

    por um acervo de imagens partilhadas para o gosto e a educao mdios, e ancoradas em

    estruturas dramticas de repetio. Voltando ao Rio de Janeiro no cinema vamos

    perceber que, no sistema de trocas simblicas institudo com os grandes centros

    produtores de imagens e sons, a marca favela acabou se constituindo uma grife

    importante. Talvez mesmo pelo sucesso de nossos filmes recentes e amplamente

    difundidos, antecedidos por incurses das mais variadas matrizes entre as quais as

    investidas da indstria fonogrfica. Michael Jackson filmado por Spike Lee cantando

    They don't care about us em 1996 na Favela Santa Marta ou Snoop Dogg cantando

    Beautiful em 2002 em favelas do Rio, Alicia Keys e Beyonc tambm gravando no

    morro em 2010, e mesmo Madonna visitando as favelas cariocas. Para alm de qualquer

    trao de oportunismo ou de esprito de solidariedade, a favela de fato rende muito

    visualmente, vista de dentro, por seus intrincados labirintos, ou por espelhar, de maneira

    cinematogrfica, a decantada paisagem da baa de Guanabara. Uma imagem que fica,

    que se mantm intocvel e separada daquela do resto do pas, mesmo expondo mltiplas

    significaes geogrfico-culturais associadas a um todo-Brasil.

    Nesta paisagem e nesta favela diferenciada exatamente pela possibilidade de

    oferecer uma viso de conjunto espetacular, assimilada a uma topografia acidentada e

    nada padronizada, diferentemente das favelas horizontais caso de So Paulo, por

    11

  • exemplo - o cinema americano vislumbrou a atualizao do exotismo que caracterizou,

    no passado, esta relao montanha/praia/floresta, apangio da cidade maravilhosa.

    Eles chegam fugidos, se instalam na favela e dali organizam seus golpes. Eles so

    Velozes e Furiosos e esto na Operao Rio ( Fast Five, Justin Lee, 2011),

    esquadrinhando a cidade em grande velocidade, tentando um espetacular golpe que

    envolve o dinheiro arrecadado em atividades ilcitas pelo todo poderoso chefo do crime

    carioca, unha e dente com a polcia corrupta local. Para complicar, o governo americano

    vai mandar seu mais truculento agente, liderando uma tropa policial de elite para ca-

    los. A paisagem carioca ser o ncleo central da ao frentica que vai se desencadear

    na cidade, as favelas centralizando o drama, que termina numa acelerada perseguio

    automobilstica na ponte Rio-Niteri. Bom, isto o que diz o filme, a diegese, porque

    nossa experincia cotidiana nos mostra que nossa ponte no bem aquela. Dublada

    por Porto Rico, a cidade do Rio mostrada no filme mistura habilmente cenas rodadas

    nessas diferentes locaes, por eficiente efeito de montagem. Pena! Mas as favelas

    tambm foram potencializadas em O incrvel Hulk (Louis Leterrier, 2008), acobertando

    o cientista Bruce Banner, que veio ao Brasil buscar o antdoto para os efeitos dos raios

    gama a que tinha sido exposto. Aqui entra em cena o tpico da biodiversidade brasileira,

    j que o remdio parte de uma flor extica da flora nativa, cujo processamento

    finalmente vai se revelar insatisfatrio. O filme promove tambm belas cenas areas,

    perseguies entre as ruelas da favela, invases de domiclios e Bruce Banner vai sair do

    morro e cair nas florestas... da Guatemala, atitude cinematogrfica s permitida aos

    heris de quadrinhos.

    Licena potica algo que tambm anima outro grupo de heris de

    aventuras, que vm ao Rio em Os mercenrios (The Expendables, Sylvester Stallone,

    2010), em que a cidade compartimentada em locaes que so desfiguradas pelas

    exigncias da fico, passando-se por um pas latinoamericano de nome Ilha Vilena.

    Prevalece no filme a representao de uma republiqueta de bananas, com ditadores

    onipotentes, chefes do narcotrfico, garotas em perigo e toda uma iconografia old

    fashion capaz de justificar a presena de Stallone, Mickey Rourke, Dolf Lundgreen, Eric

    Roberts, Jason Statham e Jet Li e ainda as participaes especiais de Arnold

    Schwarzenegger e Bruce Willis. Espcie de canto do cisne dos principais protagonistas

    do gnero, a maioria mal disfarando as rugas, o filme elege a cidade como reserva de

    sentido de todo um imaginrio gasto pelo cinema colonial de aventuras.

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  • exatamente este nosso ponto: o modo como o que eu chamo de reserva de

    tipicidade dinmica, parte do processo de negociao simblica introduz, reitera e

    cristaliza sentidos na mdia contempornea. Podemos ento falar de um recurso

    cultural, passvel de ser gerenciado, dentro da lgica de uma racionalidade econmica,

    uma reserva (de sentido) disponvel em uma cultura de globalizao acelerada, como

    quer George Ydice. Atentando para um capital imaginrio de elementos distintivos

    aptos a circular globalmente, numa velocidade cada vez maior, atravs das indstrias de

    servio e produo de bens simblicos, atestando um protagonismo capaz de alimentar o

    universo da informao e do conhecimento ( YUDICE, 2004. p.13)

    O importante aqui reconhecer esta memria da coletividade, forjada por

    mltiplas experincias de mltiplas fontes e que no cinema se cristaliza em imagens e

    sons arrebatadores porque endereados direta e primeiramente aos sentidos. Figuras

    lanadas numa imagosfera, como sugere Suely Rolnik, uma camada contnua de

    imagens que se interpe como filtro entre o mundo e nossos olhos2, em um movimento

    de identificao acrtico que condiciona as subjetividades para submet-las s foras que

    movem a hipermquina da produo capitalista. Ou uma memria cultural circulada,

    finalmente, no dizer de ELLIS (1982, 3-5), corroborando o peso de conceitos que lidam

    com a tal reserva imaginria de imagens que o cinema evoca, mesmo que indiscernveis

    no momento da percepo, mas que permitem a localizao do espectador frente a essas

    noes de alteridade, o pas dos outros, a msica dos outros, a representao dos outros,

    enfim...

    E com isto chegamos ao filme que lida de modo mais eficiente com este conjunto

    de imagens registradas no disperso imaginrio internacional sobre a antiga Capital

    Federal. Ele parte de um pressuposto no totalmente realista, por se tratar de uma

    animao, tcnica associada a uma abstrao s s vezes atravessada pelo real social,

    valorizada pelo uso intenso da cor uma paleta tropical, naturalmente, excitando o

    olhar, e recheada de nmeros musicais evocando os filmes do passado. Alm do mais, o

    filme em 3D, o que possibilita a maximizao dos efeitos de movimento e de captao

    de profundidade do campo. Estamos falando de RIO, (Carlos Saldanha, 2011), a histria

    de Blu, uma ararinha azul que vendida para os Estados Unidos, onde adotada por

    uma garota. Anos mais tarde um jovem cientista vai busc-lo, para cruzar no Brasil e

    perpetuar a espcie, em fase de extino. No Rio, ele conhece a fmea Jade e ambos so

    2 Memria do corpo contamina museu - http://www.concinnitas.uerj.br/resumos12/rolnik.pdf acessado em 17/07/2011- concinnitas ano 9, volume 1, nmero 12, julho 2008

    13

  • seqestrados por contrabandistas de animais. A favela vai ser seu ponto de priso e a

    cidade, cenrio de suas tentativas de fuga, passando pelas locaes tradicionais

    consagradas em uma iconografia j clssica. Tematicamente, o filme lida com questes

    sociais, ambientais e refere espetacularmente o carnaval, o futebol e a floresta tropical,

    enquanto lana um olhar indulgente sobre a cidade, monumentalizando seu passado o

    casario colonial, o bonde ao mesmo tempo dramatizando suas franjas de excluso

    encravadas nos morros. Rio, o filme, condensa, atualiza e expande a coleo de imagens

    sobre a cidade, assim como tinha feito o filme Al amigos ( Saludo, amigos, 1942),

    produzido por Walt Disney nos reflexos da Poltica da Boa Vizinhana. Alm dos

    mritos dessa condensao, que junta uma exuberante natureza, seres antropomrficos,

    msica e costumes caractersticos e uma fauna humana amigvel e de grande

    sociabilidade, os dois filmes tm como protagonistas duas aves aparentadas, Z Carioca

    e Blu, ambos da famlia dos papagaios, da ordem dos psitacdeos. Ento j podemos

    falar do conceito de psitacismo. O papagaio uma espcie que em geral imita bem a

    voz humana, o que levou na medicina caracterizao do psitacismo como um estado

    patolgico que faz repetir frases sem sentido uma comunicao assimblica - e no

    terreno da linguagem a um discurso de repetio mecnica, idias que aceitamos sem

    pensar, que constituem lugares comuns, frases feitas, imagens-clich que no sabemos

    de onde vm nem quem as ensina (AMANCIO, 2000, p.134).

    Assim, os papagaios da fico americana metaforizam a constante repetio de

    chaves sobre o Brasil e sobre o Rio de Janeiro, pensados fora de um universo

    tecnolgico e de modernidade, em favor de uma constante volta natureza e aos

    instintos e sensaes mais primitivos.

    Tudo leva a crer que o Rio de Janeiro continuar a ser, portanto, esta reserva de

    contedo ednico e tropical, habitado por gentes gentis e contaminado pelas mazelas de

    seu projeto de nao e pela sua condio sempre emergente, na expectativa de que

    outros fluxos de informao alterem o quadro atual. exatamente por isto que, enquanto

    no mundo acadmico nos debatemos com a pertinncia ou no dessas imagens e dessas

    representaes, h todo um esforo institucional do Estado brasileiro em estimular que

    sejamos objeto mais constante do olhar do cinema estrangeiro, inserindo-nos de modo

    mais visvel e talvez mais matizado no badalado circuito das mdias contemporneas. Se

    tem sido pequena a mudana nos modelos de representao, a forma de agenciamento

    dessas aparies tem sido bastante dinamizada e agressiva.

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  • Em 2009 foi criada a Filme Rio - Rio Film Comission, fruto de uma parceria entre

    a Secretaria de Estado de Cultura e a RioFilme, empresa da Prefeitura voltada para o

    desenvolvimento da indstria audiovisual carioca, com a misso de atrair produes

    audiovisuais, nacionais e estrangeiras, para o Estado do Rio. Ela presta apoio nas esferas

    poltica, tcnica, legal, de infraestrutura e de logstica, valorizando a mo de obra, a

    tecnologia e a indstria locais. Tambm divulga as privilegiadas locaes disponveis

    para as gravaes e filmagens, na capital ou nos demais municpios do estado.

    Seu presidente o ex-chefo da Motion Picture Association para a Amrica

    Latina e atual presidente do Latin American Training Center-LATC, empresa regional

    de consultoria e treinamento audiovisual. O cinema brasileiro e, por vias indiretas, o

    cinema norte americanos estabelecem laos, neste setor, absolutamente inditos.

    A ttulo de curiosidade, no s o Rio que hoje possui sua Film Comission.

    Diversos estados brasileiros (Amazonas, Bahia, Minas, Santa Catarina, So Paulo, e

    outras ainda em institucionalizao) criaram suas respectivas organizaes estatais,

    privadas ou mistas que exercem a funo de buscar produes audiovisuais para suas

    localidades. Com maior ou menor atrao para os filmes estrangeiros.

    A idia principal, entretanto, constituir aes estruturadas e permanentes do

    Estado, para, num mdio prazo, se ver figurando ou protagonizando mais intensamente

    histrias nas mais diversas telas, seja no cinema, na TV, na internet ou no celular.

    Apesar dos esforos, as crticas vm se acelerando, e exigindo respostas a alguns

    equvocos demonstrados nos filmes recentes. Como exemplo, temos a explicao do

    atual diretor da Riofilme: O modo como a cidade aparece em "Velozes e furiosos 5" no

    , no geral, positivo. Exatamente como ocorreu com Tquio no filme anterior da

    franquia. Ou como ocorreu com Nova York e Londres em centenas de filmes que

    mostram aspectos no glamorosos dessas metrpoles. No podemos subestimar a

    inteligncia e a maturidade do pblico. Ningum deixou de ir a Nova York depois de

    ver "Taxi Driver". Ningum achou, a partir do clssico de Martin Scorcese, que em

    Nova York s h psicopatas, sujeira, violncia, sordidez e corrupo. O cinema, afinal,

    costuma ser um mergulho num microcosmo ficcional. E o pblico sabe disso. Por conta

    dessas consideraes, o presidente da entidade garante que no haver censura a temas

    incmodos, embora se conte com a promoo de uma imagem positiva do estado.3

    3 http://www.querodiscutiromeuestado.rj.gov.br/materia.php?publicacaoId=947 acessado em 24/07/2011 Frum permanente de desenvolvimento estratgico do estado

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  • Enfim definimos oficialmente um estatuto para o cinema. No h mais o que

    reclamar. Cinema fico e tudo agora vale a pena se pensamos no impacto na gerao

    de renda e emprego e na atrao de investimentos que o cinema estrangeiro propicia. E

    ele prossegue: "Velozes e furiosos 5" representou a entrada de US$2 milhes na

    economia carioca e a gerao de 400 empregos. No caso de "Amanhecer", da saga

    Crepsculo (filme de vampirinhos wasp lanado recentemente que teve cenas filmadas

    no Rio) foram US$3,5 milhes e 500 empregos.4 A expectativa da Prefeitura do Rio

    para os prximos anos consolidar o Rio de Janeiro como o principal plo de cinema

    no Brasil e na Amrica Latina. De 2009 a 2012, seria investido um total de R$ 90

    milhes no setor.5 Adeus, choror! Sim, sim, tudo vale a pena, sob esses critrios.

    Talvez agora passe a fazer mais sentido a perspectiva de uma imagosfera submetendo as

    imagens s foras que movem a hipermquina da produo capitalista. Talvez haja

    alguma coisa nova no mundo dos negcios de cinema, mas nas telas ainda estamos

    amarrados a velhas estruturas. E os papagaios, araras e louros, os psitacdeos em geral,

    esses vo provavelmente continuar repetindo sua cantilena.

    Bibliografia:

    AMANCIO, Tunico. O Brasil dos gringos: imagens no cinema. Niteri: Intertexto, 2000.

    ELLIS, JOHN. The Literary adaptation An Introduction. Screen, May-June, 1982.

    FREIRE-MEDEIROS, Bianca. O Rio de Janeiro que Hollywood inventou. Rio de Janeiro, Jorge Zahar

    Ed., 2005

    MORAES, Dnis de. A batalha da mdia: governos progressistas e polticas de comunicao na Amrica

    Latina e outros ensaios. Rio de Janeiro: Po e Rosas, 2009

    ORTIZ, Renato. Mundializao e Cultura. So Paulo: Brasiliense, 2000

    SHOHAT Ella, STAM Robert. Crtica da Imagem eurocntrica: multiculturalismo e representao. So

    Paulo. Cosac Naify, 2006

    YUDICE, George. A convenincia da cultura: usos da cultura na era global. Belo Horizonte, 2004. P.13.

    4 Sergio de S Leito 17/04/2011- http://rio-negocios.com/a-cidade-de-cinema/ - acessado em 23/07/20115 Revista Exame, 06/05/2011 - http://exame.abril.com.br/marketing/noticias/cinema-torna-se-vitrine-do-rio-para-turistas

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