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T E C N O L O G I A V E R D E 18 por Fábio Reynol Indústria automobilística busca sair da lista dos vilões ambientais Ao ligar o seu carro para ir ao traba- lho toda manhã você estará entre os prin- cipais responsáveis pela emissão de car- bono na atmosfera. Caso você trafegue pela Grande São Paulo, 97% desse ele- mento lançado diariamente no ar da região sairá do seu e dos outros 7,3 milhões de veículos da maior megaló- pole do país. Em média, para cada litro de gasolina queimado num motor de car- ro são expelidos mais de dois quilos de dióxido de carbono (CO2). Se o combus- tível for álcool saem do escapamento aproximadamente 1,4kg de CO2 por litro consumido. Os dados foram registrados pela Companhia de Tecnologia de Saneamen- to Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e divulgados no recém-publica- do relatório de 2006 de qualidade do ar no estado. Os números mostram a con- siderável participação dos veículos auto- motores nos níveis de poluição urbana e no conseqüente aumento no efeito estu- fa. A indústria automobilística, por for- ça de lei e para atrair um público cada vez mais interessado em questões ambientais, está respondendo ao pro- blema com novas tecnologias de redu- ção de poluentes. Uma das respostas do setor ao mal que sai dos escapamentos está na pró- xima geração dos sistemas de partida a frio para motores bicombustíveis. Desde o seu lançamento no fim da década de 1970, o motor a álcool brasileiro sempre apresentou dificuldades para entrar em funcionamento nos dias frios. De lá para cá, pouca coisa mudou na solução encon- trada para contornar o problema: um mini-tanque de gasolina para ajudar na partida. A diferença é que na década de 1980 era o motorista que apertava um botão para injetar gasolina durante as manhãs de inverno, hoje um software faz isso automaticamente, mas o tan- quinho ainda está lá anexado aos moder- nos motores flex. O novo sistema de partida a frio dosa a quantidade exata de calor necessário para aquecer o combustível antes de ele ser injetado. "Com isso obtemos uma melhor queima do álcool, gasolina ou qualquer mistura dos dois e reduzimos as emissões de poluentes em torno de 18%", revela Fábio Ferreira, gerente de desenvolvimento de produto da unida- de de sistemas a gasolina da Robert Bosch da América Latina, uma das empresas que estão desenvolvendo a tec- nologia. Prevista para equipar os carros brasileiros a partir do próximo ano, a nova partida a frio é uma das promes- sas de carros menos poluidores. Em simu- lações de laboratório, os técnicos da empresa chegaram a obter uma redu- ção de até 40% nas emissões de poluen- tes, segundo Ferreira. Além disso, ela trará mais segurança ao eliminar o tan- quinho de gasolina. Reduzir emissões através da econo- mia de combustível é o objetivo de outra tecnologia também em desenvolvimen- to nos laboratórios da Bosch. Batizado de "Start-Stop", o sistema consiste em um leitor que reconhece uma série de condições de uso do carro. Desse modo, a unidade de comando desliga automa- ticamente o motor quando o automóvel fica parado em marcha lenta por um lon- go período. Assim que o motorista acio- na o acelerador o motor é religado. O "Start-Stop" deve reduzir o consumo de combustível entre 5% e 15%, segundo os técnicos da empresa. Em paralelo com as pesquisas de oti- mização de consumo estão as de desen- volvimento de motores que usam com- bustíveis mais limpos. É no que aposta a unidade brasileira do grupo francês PSA Peugeot Citroën. Desde junho a empresa exporta motores bicombustí- veis para o mercado europeu. A fábrica de Porto Real (RJ) é a primeira do Brasil a fornecer motores flex para outros paí- POR FORÇA DA LEI E PARA ATRAIR UM PÚBLICO CADA VEZ MAIS INTERESSADO EM AÇÕES PARA A PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE, SETOR INVESTE EM NOVAS TECNOLOGIAS DE REDUÇÃO DE POLUENTES

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por Fábio Reynol

Indústria automobilística buscasair da lista dos vilões ambientais

Ao ligar o seu carro para ir ao traba-lho toda manhã você estará entre os prin-cipais responsáveis pela emissão de car-bono na atmosfera. Caso você trafeguepela Grande São Paulo, 97% desse ele-mento lançado diariamente no ar daregião sairá do seu e dos outros 7,3milhões de veículos da maior megaló-pole do país. Em média, para cada litrode gasolina queimado num motor de car-ro são expelidos mais de dois quilos dedióxido de carbono (CO2). Se o combus-tível for álcool saem do escapamentoaproximadamente 1,4kg de CO2 por litroconsumido.

Os dados foram registrados pelaCompanhia de Tecnologia de Saneamen-to Ambiental do Estado de São Paulo(Cetesb) e divulgados no recém-publica-do relatório de 2006 de qualidade do arno estado. Os números mostram a con-siderável participação dos veículos auto-motores nos níveis de poluição urbanae no conseqüente aumento no efeito estu-fa. A indústria automobilística, por for-ça de lei e para atrair um público cadavez mais interessado em questõesambientais, está respondendo ao pro-blema com novas tecnologias de redu-ção de poluentes.

Uma das respostas do setor ao malque sai dos escapamentos está na pró-xima geração dos sistemas de partida afrio para motores bicombustíveis. Desdeo seu lançamento no fim da década de1970, o motor a álcool brasileiro sempre

apresentou dificuldades para entrar emfuncionamento nos dias frios. De lá paracá, pouca coisa mudou na solução encon-trada para contornar o problema: ummini-tanque de gasolina para ajudar napartida. A diferença é que na década de1980 era o motorista que apertava umbotão para injetar gasolina durante asmanhãs de inverno, hoje um softwarefaz isso automaticamente, mas o tan-quinho ainda está lá anexado aos moder-nos motores flex.

O novo sistema de partida a frio dosaa quantidade exata de calor necessáriopara aquecer o combustível antes de eleser injetado. "Com isso obtemos umamelhor queima do álcool, gasolina ouqualquer mistura dos dois e reduzimosas emissões de poluentes em torno de18%", revela Fábio Ferreira, gerente dedesenvolvimento de produto da unida-de de sistemas a gasolina da RobertBosch da América Latina, uma das

empresas que estão desenvolvendo a tec-nologia. Prevista para equipar os carrosbrasileiros a partir do próximo ano, anova partida a frio é uma das promes-sas de carros menos poluidores. Em simu-lações de laboratório, os técnicos daempresa chegaram a obter uma redu-ção de até 40% nas emissões de poluen-tes, segundo Ferreira. Além disso, elatrará mais segurança ao eliminar o tan-quinho de gasolina.

Reduzir emissões através da econo-mia de combustível é o objetivo de outratecnologia também em desenvolvimen-to nos laboratórios da Bosch. Batizadode "Start-Stop", o sistema consiste emum leitor que reconhece uma série decondições de uso do carro. Desse modo,a unidade de comando desliga automa-ticamente o motor quando o automóvelfica parado em marcha lenta por um lon-go período. Assim que o motorista acio-na o acelerador o motor é religado. O"Start-Stop" deve reduzir o consumo decombustível entre 5% e 15%, segundo ostécnicos da empresa.

Em paralelo com as pesquisas de oti-mização de consumo estão as de desen-volvimento de motores que usam com-bustíveis mais limpos. É no que apostaa unidade brasileira do grupo francêsPSA Peugeot Citroën. Desde junho aempresa exporta motores bicombustí-veis para o mercado europeu. A fábricade Porto Real (RJ) é a primeira do Brasila fornecer motores flex para outros paí-

POR FORÇA DA LEI E PARA ATRAIR UM

PÚBLICO CADA VEZ MAIS INTERESSADO EM AÇÕESPARA A PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE, SETOR

INVESTE EM NOVAS TECNOLOGIAS DE REDUÇÃO

DE POLUENTES

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ta o químico Miguel Dabdoub, coorde-nador do Ladetel e Presidente da CâmaraSetorial de Biocombustíveis do Governodo Estado de São Paulo. "Todos os esta-dos brasileiros poderão se desenvolvercom o biodiesel através da utilização deoleaginosas oriundas de cada região,"aposta o pesquisador.

Os combustíveis de origem vegetaltambém são a maior esperança de outramontadora francesa, a Renault, paracumprir a sua meta mundial: venderaté 2008 um milhão de veículos queemitam menos de 140 gramas de dió-xido de carbono (CO2) por quilômetrorodado. Com isso, a empresa pretendefigurar em 2009 entre as três mais efi-cientes automobilísticas do mundo embaixa emissão de CO2. Até lá, a Renaultespera ter 50% de seus veículos a gaso-lina vendidos na Europa equipados commotores bicombustíveis. "A tecnologiaflex brasileira será a referência para osistema europeu", afirma o supervisorde engenharia da Renault no Brasil,Carlos Bonote.

Outra cartada da montadora france-sa para reduzir emissões é o chamado"downsizing" que nada mais é que adiminuição da cilindrada dos motores,mas mantendo o desempenho de mode-

los mais robustos. Com essa filosofiaa empresa criou o TCE, um motor de1,2 litro com potência de 100 cv, típicade motores 1,4 litro, e torque de 145Nm, próprio dos carros 1,6 l. Utilizandoo mesmo princípio, a General Motorsdo Brasil desenvolveu o motor 1,4Econoflex. Com uma taxa de compres-são maior, o motor apresenta potên-cia superior a veículos 1,6 litro.

Além do chamado marketingambiental, todos esses investimentostêm por trás outro poderoso motiva-dor, a legislação. Baseado em paísesdesenvolvidos, o Programa de Controlede Poluição do Ar por Veículos Auto-motores (Proconve) estabelece redu-ções graduais de emissões nos veícu-los novos. Desde o seu início em 1986,o Programa registrou uma redução deaté 96% nos poluentes em comparaçãoaos motores produzidos há duas déca-das. Atualmente, os veículos leves sãoa maior prioridade do Proconve. Devidoà sua grande quantidade, os carros depasseio formam o grupo que leva amaior culpa pela baixa qualidade do ardos grandes centros. Por isso, automó-veis que poluem menos podem signifi-car céus mais azuis e consciências maisleves na hora de ligar o motor.

ses e atualmente equipa veículos vendi-dos na França e na Suécia. Com umalegislação ambiental cada vez mais exi-gente, a Europa viu na tecnologia brasi-leira uma alternativa de redução da polui-ção. Os motores flex feitos aqui se ajus-taram bem ao álcool europeu, que usabeterraba como matéria-prima e é ven-dido sempre misturado à gasolina.

Ainda visando o exigente mercadoeuropeu, a PSA firmou uma parceriacom o Laboratório de Desenvolvimentode Tecnologias Limpas (Ladetel) da USPde Ribeirão Preto para testar veículosde passeio movidos a biodiesel. OLaboratório tem obtido sucesso com oB30, 30% de biodiesel misturado com70% de óleo diesel. Um dos objetivosdo projeto é examinar amostras de bio-diesel feitas a partir de diferentes maté-rias-primas como soja, soja com mamo-na e palma. Até agora os técnicos nãoencontraram sinais de desgaste emcomponentes provocados pelo novocombustível e ainda registraram umaredução de 23% na emissão de partícu-las e de 11% nas emissões de monóxi-do de carbono.

Além das vantagens ambientais, obiodiesel pode trazer benefícios sociaise econômicos ao Brasil. É no que acredi-

Divulgação

Laboratório da USP de Ribeirão Preto

testa veículos movidos a biodiesel

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