Upload
edsondgil
View
217
Download
0
Embed Size (px)
DESCRIPTION
dyuj tyui eyu tyik tyik ujkl fdrth eth ddtyuj etyudrtfh tyj
Citation preview
Rahner caracteriza logo de início seu percurso com a
descrição, prontamente oferecida, da maneira como procederá à abordagem das categorias
do pensamento transcendental, ressaltando que não entende tal abordagem da construção
teológica como necessariamente vinculada ao desenvolvimento da Trans, posto que o
conteúdo histórico explicita o que, no olhar teológico, encontra-se desde sempre implícito
e dado, tendo sido, pelo pensamento reflexo, posto em evidência nominal (pág. 1, 1º §).
Esta terminologia conceitual irá perpassar, como teremos ocasião de verificar, todo o
itinierário teológico rahneriano1, não sem antes lançar sólidas raízes filosóficas nas
tentativas de explorar a aproximação do tomismo junto ao kantismo, magistralmente
expostas em Geist in Welt e Hörer des Wortes.
Na realidade, a conceituação trabalhada por Rahner,
consubstanciada na explicitação terminológica da implicitude teológica
vivencial/explicitude reflexiva transcendental, revela a peculiar e refinada maneira como
(re)trabalha os motes fundamentais do pensamento transcendental, com certa influência da
visão hegeliana do Absoluto na História, ou historicidade fenomenológica do Espírito
(ainda que, como veremos, ele rejeite a “vocação tentacular” desta em absorver a
singularidade e a concretude) . Ao definir a categorização transcendental da filosofia como
o dar-se histórico, em pensamento reflexo, da implicitude presente na consciência teo-
lógica do ser humano, Rahner termina por postular a historicidade de todo movimento
reflexo do espírito como de-finição do existencial vivido na abertura essencial – portanto
necessária e ontologicamente presente – à graça, entendida não como extrínseca à estrutura
humana, mas sim como a própria possibilidade de se abrir à - e ouvi-la – revelação divina
(pág. 1, 2º §). A graça é a própria implicitude estrutural do ser humano, na medida em que
a possibilidade de audição atua independentemente de sua manifestação reflexa ou
explicitação histórica. A implicitude já é ato manifesto no próprio ek-sistir humano,
valendo-se Rahner das análises existenciais heideggerianas e jasperianas.
1 Para um paralelo do nosso texto com o desenvolvimento mais amplo do
tema nas obras sistemáticas de Rahner, além dos seus Scriften zur Theologie (tradução espanhola: Escritos
de Teologia, Barcelona: Sígueme, 1986ss), pensamos prioritariamente no Curso Fundamental da Fé, São
Paulo: Paulinas, 1989 (cf. págs. 39-49 (Introdução, cap. 3, primeira seção, itens 2 e 3) e 173-176 (quinta
seção, item 2). Ressalte-se que, como teremos ocasião de sublinhar adiante, para Rahner, a teologia é
essencialmente ato (atitude experiencial e vivencial, exercida na concretude histórica) de fé (o crer é a
própria intersecção da com a Trans), e não uma reflexão dedutiva a respeito do conteúdo crido. Daí sua
suma teológica ser intitulada, diversamente da nomenclatura tradicional, um curso sobre a fé (e não sobre a
teologia).
Após pontuar em dois passos o programa da teologia
transcendental, quais sejam: 1) utilização do instrumental Trans; e 2) proceder ao
exame, de forma mais clara e explícita que as construções teológicas tradicionais, das
condições a priori existentes no sujeito da fé para o conhecimento das verdades reveladas
[condições estas entendidas como possibilidades de realização/atuação do existencial
salvífico, o qual, como acima aludimos, vem a ser a graça incriada (cf. Natureza e
Graça2)], e em decorrência elucidar o paralelo, bem como o diferencial, em relação à
própria Trans, Rahner passa ao desenvolvimento de seu tema, que terá como seu
primeiro momento a análise da própria possibilidade de um tal enfoque transcendental do
labor teológico (pags. 1-3), e numa segunda etapa, o perpassar os grandes dogmas da fé
cristã sob o prisma do transcendentalismo teológico (pág. 3-4).
II – A possibilidade da Trans
1) Analysis fidei (análise da fé) já é Trans = determinante de todo o edifício
teológico – Pergunta pela possibilidade da fé (como assentimento) ante a revelação divina
[palavra (comunicação) de Deus] enquanto crida como tal, o que exige o postulado da
graça [auto-comunicação de Deus que possibilita (elemento fundacional/transcendental)] =
condiciona e conduz à reflexão sobre as condições de conhecer no sujeito que crê.
2) A Trans se auto-limita (reconhece suas próprias limitações) em seu
próprio âmbito e independência, no escopo de seu próprio desenvolvimento. Depreende-se
um momento anti-hegeliano no interior da exposição rahneriana, quando percebemos a
utilização, por parte do teólogo, de certo “antídoto” heideggeriano à filosofia da história de
cunho hegeliano: se a auto-limitação da Trans não fosse obra própria, originária de si
mesma, ela como que perderia sua legitimidade à pergunta pelo todo. Mas tal
questionamento pelo todo da existência é, em si mesmo, o postulado vértice da Trans,
na medida em que remete à concretude histórica da subjetividade essencial, irredutível à
lógica da explicitação necessária do Absoluto, e vista na possibilidade de ser vivenciada
como história de revelação e salvação (ou perdição). Tal postulado se evidencia como
transcendental enquanto reflexão do sujeito criado a respeito, precisamente, deste remeter-
se à história como a sua história, a sua de-cisão, a sua destinação.
Torna-se claro, pois, que a transcendentalidade da teologia reside
justamente na intercondicionalidade da graça salvífica e historicidade concreta humana,
vivenciadas não de modo dialético, porém nos correlatios
sobrenaturalidade/existencialidade, pergunta/resposta, reflexão/revelação, correlações
2 In O Homem e a Graça, São Paulo: Paulinas, 1970
estas que se dão não na essencialidade lógica do Real, mas na vivência da concretude
mundana.
Assim definido o postulado central da Trans, Rahner trata
imediatamente de cuidar para a fixação com precisão do seu alcance, para que não caiamos
justamente na tentação do reducionismo ou da absolutização do postulado de base face ao
todo do sistema. A Trans marca, caracteriza, direciona até mesmo, a construção do
edifício teológico, porém não é o próprio, precisamente por apontar para irredutibilidade
da vivência concreta. Tal é pois o significado existencial do transcendental: o
conhecimento da facticidade da vivência concreta não é conhecimento a posteriori, mas
sim as condições do exercício da própria fé. “... essa graça livre como determinação
transcendental do homem tem sua própria história naquilo que chamamos de história da
salvação e revelação, a qual não pode existir e ser compreendida como tal, sem esta
possibilidade apriorística do homem, chamada graça (da fé).” (itálico nosso).
III – Teologia transcendental dos Dogmas Fundamentais do Cristianismo
1. A partir da seção III de nosso texto, Rahner principia por explicitar algumas
conclusões do postulado fundamental Trans. Em nosso resumo, cuidaremos tão somente
de pontuar tais explicitações, precisando o caráter de transcendentalidade nelas observado.
Antes porém, Rahner chama a atenção para o fato de que, uma vez aceito o postulado, este
não permanece como que externo ao labor teológico, alheio e/ou superficial, porém sua
postulação como que redefine e condiciona toda a construção.
2. Antes de tudo, Rahner ressalta que, em relação ao dogma antropológico, ou
em termos clássicos a questão referente às relações entre o ser humano e a graça divina,
não é necessário ir além da simples conclusão direta do postulado central: a graça não é
adição (em outros trabalhos, notadamente Possibilidade de uma concepção escolástica da
Graça Incriada, reunido em seus Schriften e traduzido em português3, o teólogo explicita o
conceito como graça originária na auto-comunicação criativa de Deus) à natureza humana,
antes porém se constitui na própria transcendentalidade do ato de fé (categoria central
de todo o pensamento rahneriano) que fundamenta todo conhecimento e liberdade
constituintes do ser humano.
3. Com relação ao dogma trinitário, ou Tratado da Trindade, Rahner recorre à
sua própria conceituação, tornada célebre e referencial, da Trindade econômica como
idêntica à imanente, ou seja, a Trindade que se revela na economia da salvação é idêntica à
3 In O Homem e a Graça, op.cit.
que se revela como imanente e ontológica, não sendo aquela uma simples decorrência do
processo salvífico, mas sim a própria expressão da natureza divina. A recorrência a tal
conceituação o faz Rahner com o fito de ressaltar como ela se dá em termos da Trans: se
na compreensão de Deus como infinito e eterno, e portanto o incompreensível, dá-se-me a
compreender a própria transcendência a me revelar como aberto à comunicação de tal
realidade que a mim se comunica. A condição de tal comunicabilidade – relação – é o
próprio a priori histórico e salvífico, e portanto o próprio Deus a se encarnar, ou seja, a
assumir nossas possibilidades e condições.
4. Em decorrência, a cristologia resulta claramente como a culminância da
comunicação paradoxal divina para o ser humano: ao confessar a fé na concretude
histórica do Verbo que comunica (se encarna), ou seja, no assumir a pessoa histórica de
Jesus Cristo como a Palavra de Deus a me tomar a existência em diálogo com o
incompreensível e absoluto, vivencio a própria transcendentalidade do conhecimento na
historicidade manifesta e concreta de minha existência temporal. Precisamente aqui é
possível perceber o modus operandi teologal e conceitual de Rahner, na maneira como
entende o binômio facticidade/transcendentalidade: esta como dedução e re-constituição
da essência do vivido na experiência concreta e singular.
Em seguida, Rahner explicita três decorrências da cristologia definida como
culminância paradoxal da relação entre e Trans: 1) a cristologia como fundamento à
antropologia transcendental, na medida em que torna compreensível (crível) a idéia de
Deus-Homem como culminância do movimento do Espírito (reassumindo o componente
hegeliano do sistema); 2) a encarnação como escopo transcendental à história salvífica, na
medida em que o Verbo (), a Palavra ou Expressão/Comunicação/Relação
encarnada vem a se constituir no Locus Dei por excelência à humanidade que o busca; 3) a
cristologia legitima a busca da salvação do ser humano no próprio ser humano: na história,
no vivenciado, no humanizado, no encarnado.
Roberto Carlos Pignatari