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Como referenciar este trabalho: BUNICK, Mario Srgio, RIBEIRO, Cesar Leandro. O MAL, O SOFRIMENTO HUMANO. CADERNO TEOLGICO DA PUCPR, CURITIBA, V.2, N.1, P.21-37, 2014.
O MAL, O SOFRIMENTO HUMANO
BUNICK, Mario Srgio1
RIBEIRO, Cesar Leandro2
Resumo: O artigo apresentado neste trabalho de pesquisa tenta explicar o
tema do Mal, do Sofrimento humano. Qual a razo deste sofrimento? Por
que sofremos? Por que existe o mal? Existe sentido para o sofrimento
humano? O sofrimento do homem seria um castigo de Deus? O objetivo
desta investigao bibliogrfica tentar obter respostas visando
compreender o sofrimento que aflige todos os seres humanos. Procura dar
um desfecho teolgico baseado nos documentos da Igreja. Objetiva-se
explicar o mal ontolgico, o mal moral e o mal natural, numa perspectiva
crist catlica baseada na doutrina da Igreja, especialmente o Catecismo da
Igreja Catlica. Temos conscincia de que este artigo no d um desenlace
definitivo para o tema ora pesquisado, compreendendo que o assunto no
se esgota.
Palavras-chave: sofrimento humano; mal moral; mal natural.
Mario Srgio Bunik
1 Bacharel em Teologia pela PUCPR, [email protected]
Cesar Leandro Ribeiro2 Professor do Curso de Teologia da PUCPR,
Licenciado sob uma Licena Creative Commons
Caderno Teolgico da PUCPR ISSN:2318-8065
22 Caderno Teolgico da PUCPR, Curitiba, v.2, n.2, p. 21-37, 2014
1. Introduo
O presente trabalho tem a finalidade de investigar atravs de pesquisas
bibliogrficas, inmeras correntes de pensamentos que tratam do assunto relacionado
ao mal e sofrimento humano, onde, por muitas vezes, autores com a mesma formao
crist pensam de forma diferente sobre este assunto.
O tema do Mal sempre foi questionado pela percepo humana, da seguinte
forma: se Deus existe, qual seria a origem do mal, de onde viria a maldade que atinge
toda a humanidade? De um modo ou de outro todos ns somos atingidos pelo mal,
causando-nos a dor fsica, que tambm atinge todos os animais, bem como o mal
moral que habita entre os homens.
Embora a dor fsica esteja presente no mundo animal, somente o homem ao
sofrer sabe que sofre e busca a razo desse sofrimento, se perguntando o porqu?
Sofrendo tambm por no encontrar resposta plausvel para o sofrimento. Da mesma
forma, o homem indaga-se sobre o porqu do mal no mundo? Ambas perguntas so de
difceis respostas, cujas perguntas podem ser feitas, tanto para o prprio homem,
quanto para Deus. O homem, ao no conseguir responder essas perguntas, fica
frustrado e, por vezes, entra em conflito com Deus, chegando at mesmo a nega-lo.
(SALVIFICI DOLORIS, 1984 pp.16, 17).
A dor, como bvio, em especial a dor fsica, encontra-se amplamente difundida no
mundo dos animais. Mas s o homem, ao sofrer, sabe que sofre e se pergunta o
porqu; e sofre de um modo humanamente ainda mais profundo se no encontra uma
resposta satisfatria. Trata-se de uma pergunta difcil, como tambm difcil uma outra
muito afim, ou seja, a que diz respeito ao mal. Por que o mal? Por que o mal no mundo?
(SALVIFICI DOLORIS, 1984 p.16).
[...] bem sabido que, quando se percorre o terreno desta pergunta, chega-se no s a
mltiplas frustraes e conflitos nas relaes do homem com Deus, mas sucede at
chegar-se prpria negao de Deus. (SALVIFICI DOLORIS, 1984 p. 17). [...] O seu
sofrimento o de um inocente: deve ser aceito como um mistrio que o homem no
est em condies de entender totalmente com a sua inteligncia. (SALVIFICI
DOLORIS, 1984 p. 19).
As pessoas quando se deparam com o sofrimento sempre se queixam,
perguntando a Deus o porqu de seu sofrimento, procurando respostas e sentido para
o sofrimento pelo qual passam. O homem sempre indaga a Deus e a Jesus Cristo
acerca do sofrimento que lhe assola, no encontrando respostas imediatas. (SALVIFICI
DOLORIS, 1984 p. 57).
O homem, por vezes, pergunta-se: como pode um Deus que deseja o bem
da humanidade permitir que entre as espcies uma alimente-se de outra. (Ap. Orlando
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FRANCESCHELLI. Dio e Darwin, Natureza e uomo tra evoluzione e creazione.
Donzelli, Roma 2005, p. 87 apud BOFF, 2009, p. 108). A exemplo do homem que se
alimenta praticamente de todas as espcies de animais; plantas, sementes e frutos da
natureza.
(Frei Clodovis Boff doutor em teologia pela Universidade Catlica de Lovaina.
Professor de Mariologia no Instituto Marianum Roma, professor de Teologia
Sistemtica no Bacharelado em Teologia e no Programa de Ps-Graduao em
Teologia da Puc/Pr).
No Antigo Testamento, escrito em hebraico, no havia diferena entre as
palavras Mal e Sofrimento. Somente a partir do Novo Testamento, escrito em grego,
passou haver diferena entre estas palavras, passando as mesmas a terem um sentido
diferente (SALVIFICI DOLORIS, 1984 p.12).
A Sagrada Escritura um grande livro sobre o sofrimento. As palavras
sofrimento e dor tem sentido semelhante, embora distintas. A dor propriamente dita tem
sentido fsico, assemelha-se a dor do corpo, enquanto que o sofrimento pode ser
interpretado como dor da alma; ou sofrimento espiritual. (SALVIFICI DOLORIS, 1984
p.10, 11).
2. A natureza humana
Deus no pode ser culpado pelo sofrimento causado pelo uso indevido da
liberdade humana, fruto de nossa irresponsabilidade. O pecado no castigo de
Deus, pois um Deus Pai que ama seus filhos no quer o sofrimento, quer a alegria de
seus filhos.
A doena no deve ser compreendida como a mo de Deus, uma
ocorrncia natural, que deve ser encarada com lucidez, pois a doena e morte fazem
parte da natureza humana.
4. O sofrimento humano o resultado normal da fragilidade fsica e moral da
humanidade e do mundo. O sentido de tal ou tal sofrimento , dessa forma, puramente
imanente ao acontecimento e s suas causas concretas, em princpio assinalveis.
Um acidente de carro, por exemplo, no tem outro sentido seno de ser o resultado de
um estouro em alta velocidade de um pneu gasto. Se o motorista morre, porque o
homem relativamente frgil e no pode absorver todo e qualquer choque.
5. A essa primeira causa, que a fragilidade, acrescentam-se infelizmente a maldade, a
violncia e a injustia do homem.
6. A condio humana de fragilidade (4) e de vulnerabilidade (5) representa uma
provocao e um escndalo para o desejo ilimitado do homem: essa ausncia de
segurana choca com o desejo do homem e o provoca a reaes, ativas ou passivas,
que s fazem agravar ainda mais o sofrimento e sua falta de sentido.
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8. Essa condio de fragilidade e de vulnerabilidade, Deus a quer para o homem a fim
de que, pela escolha, pela f, pela esperana e pela resistncia, seja ela o caminho de
seu devir, o caminho histrico e nico em que uma multido de desejos humanos
possam aparecer e se estruturar, como capacidade da glria de Deus multido que
Deus, no fim desse devir, acolhe e recria na participao em sua plenitude. (Varone,
2001, pp. 266, 267, 268).
(Varone, sacerdote catlico e formador de padres e leigos).
3. A autonomia do homem
Existem tambm correntes filosficas que acham que o mal no pode ser
original, pois o homem nasce bom, pervertendo-se no transcorrer da vida; fruto de sua
autonomia, surgindo o mal por conta de sua educao e cultura: Tudo est bem
quando sai das mos do Autor das coisas, tudo degenera entre as mos dos homens.
(Emlio, I. I, Martins Fontes, So Paulo 1995, p. 7, apud BOFF, 2009, p. 157). Contudo,
sendo Deus autor e criador de tudo que existe ou possa existir, Deus que permite as
falhas e desastres, visando um bem maior.
Alguns telogos modernos tentam explicar o mal do mundo como sendo
fruto de sua autonomia e seu livre arbtrio, sendo o mal fruto de suas atitudes e no
responsabilidade de Deus. (Ap. Orlando FRANCESCHELLI, Dio e Darvin. Natura e
uomo tra evoluzione e creaazione. Donzelli, Roma 2005, pp 92-96; apud BOFF, 2009,
p. 117).
A autonomia e dependncia da criatura, conforme Gaudium et Spes (n 36)
expe a relao de sua liberdade e sujeio das criaturas perante o Criador; onde
Deus diretamente autor de tudo que existe ou pode existir, ocorrendo defeitos e
sinistros, sendo Deus autor das normas, Ele que permite estas falhas e desastres.
(BOFF, 2009, p. 118).
Que ningum, quando tentado, diga; minha tentao vem de Deus. Pois Deus no
pode ser tentado a fazer o mal e no tenta ningum. Cada um tentado por sua prpria
concupiscncia que o arrasta e seduz (Tg 1,13-14).
Deus no pode ser culpado pelo sofrimento causado pelo uso indevido da
liberdade humana; bem como a doena no pode ser compreendida como a mo de
Deus, pois trata-se de uma ocorrncia natural, visto que a doena e morte fazem parte
da natureza humana, que frgil, tanto fisicamente quanto moralmente. Um acidente
de carro, por exemplo, fruto ou da inabilidade do motorista ou de um defeito
mecnico do veculo. Somando-se ainda fragilidade humana e sua vulnerabilidade a
maldade, violncia e injustia do homem.
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4. Sofrimento e evoluo
Na obra A Origem das Espcies, Darwin observa o sofrimento que ocorria
para chegar-se a evoluo das espcies; onde ocorria a guerra da natureza, feita
tambm de fome e morte, tem, como resultado direto, o fato mais notvel que se pode
conceber: a produo de animais superiores. (DARWIN, Charles. A origem das
espcies e a evoluo natural, trad. E. N. Fonseca, Hemus, Curitiba 2002, p. 457 apud
BOFF, 2009, p. 109).
Dores e destruies fazem parte da evoluo humana, a dor e a morte
pertencem ao plano de Deus; para Santo Tomas, Deus permite o mal particular,
visando o bem universal, pois se Deus quisesse impedir o mal no mundo poderia priv-
lo de outros bens.
Diante do exposto, o homem passa a articular algumas respostas para esta
questo, no encontrando ainda respostas definitivas e satisfatrias para esta questo:
O sofrimento, como a fome pode contribuir positivamente com o
desenvolvimento da agricultura e a indstria da alimentao, o frio e o sol geram o
desenvolvimento da produo de tecidos para nos proteger das intempries, a dor
fsica ou o sofrimento psicolgico, ou mental, desenvolve o sistema mdico hospitalar
para aliviar nossa dor e sofrimento. Nossa civilizao vive da esperana de felicidade e
da busca incansvel contra a dor. (LEPARGNEUR, 1985, p.35, 36).
(Lepargneur sacerdote e professor de seminrios e da Puc/Sp)
5. A queda moral do homem
5.1. O Compndio do Vaticano II; Na Constituio Pastoral Gaudium Et spes (n 13),
ao se reportar sobre o Mal, ou pecado, apresenta as seguintes explicaes: Constitudo por Deus em estado de justia, o homem, contudo, instigado pelo maligno,
desde o incio da histria abusou da prpria liberdade. Levantou-se contra Deus
desejando atingir seu fim fora dele. Apesar de conhecerem a Deus, no o glorificaram
como Deus. O seu corao insensato se obscureceu e eles serviram criatura ao invs
do Criador. Por isso o homem est dividido em si mesmo. Por esta razo, toda a vida
humana, individual e coletiva, apresenta-se como uma luta dramtica entre o bem e o
mal, entre a luz e as trevas...
O homem foi constitudo por Deus em estado de justia, porm instigado
pelo maligno, abusou de sua liberdade, levantando-se contra Deus, desejando igualar-
se a Deus, serviu criatura, o Diabo, ao invs do Criador, destruindo a harmonia
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consigo mesmo, com os outros homens e com as outras coisas criadas. Por esta razo
toda a vida humana passa a lutar entre o bem e o mal; entre a luz e as trevas. O
homem tentado pelo Diabo, desobedecendo ao mandamento de Deus, cometeu o
primeiro pecado, recalcitrando a Deus e a sua confiana e bondade.
5.2. O Catecismo da Igreja Catlica, em diversos pargrafos, refere-se ao pecado ou o
mal nos seguintes termos:
397. O homem, tentado pelo Diabo, deixou morrer em seu corao a confiana em seu
Criador e, abusando da sua liberdade, desobedeceu ao mandamento de Deus. Foi nisto
que consistiu o primeiro pecado do homem. Todo pecado, da em diante, ser uma
desobedincia a Deus e uma falta de confiana em sua bondade.
398. Neste pecado, o homem preferiu-se a si mesmo a Deus, e com isto menosprezou a
Deus: optou por si mesmo contra Deus, contrariando as exigncias do seu estado de
criatura e consequentemente de seu prprio bem. Criado em um estado de santidade, o
homem estava destinado a ser plenamente divinizado por Deus na glria. Pela
seduo do Diabo, quis ser como Deus, mas sem Deus, e antes de Deus, e no
segundo Deus.
401. A partir do primeiro pecado, uma verdadeira invaso do pecado inunda o mundo:
o fratricdio cometido por Caim contra Abel; a corrupo universal em decorrncia do
pecado...
A partir do pecado inicial ocorre uma propagao do pecado; o fratricdio de
Caim cometido contra Abel, ocorrendo a corrupo universal em decorrncia deste
pecado; ficando o homem radicalmente pervertido e sua liberdade anulada pelo pecado
original; herdando cada homem a tendncia para o mal; a concupiscncia que ser
insupervel. Atravs da inveja do Diabo a morte entrou no mundo, enfraquecendo a
natureza humana, sendo o homem submetido ao sofrimento, dominao da morte e
inclinando-se ao pecado, chamado de concupiscncia, passando a dor e a morte fazer
parte da natureza humana.
406. A doutrina da Igreja sobre a transmisso do pecado original adquiriu preciso
sobretudo no sculo V, em especial sob o impulso da reflexo de S. Agostinho contra o
pelagianismo, e no sculo XVI, em oposio Reforma protestante. Pelgio sustentava
que o homem podia, pela fora natural da sua vontade livre, sem a ajuda necessria da
graa de Deus, levar uma vida moralmente boa; limitava assim a influncia da falta de
Ado a um mau exemplo. Os primeiros Reformadores protestantes, ao contrrio,
ensinavam que o homem estava radicalmente pervertido e sua liberdade anulada pelo
pecado original: identificava o pecado herdado por cada homem com a tendncia ao mal
(concupiscncia), que seria insupervel. A igreja pronunciou-se especialmente sobre o
sentido do dado revelado no tocante ao pecado original no segundo Conclio de
Oranges em 529 e no Conclio de Trento em 1546.
413. Deus no fez a morte, nem tem prazer em destruir os viventes... Foi pela inveja do
Diabo que a morte entrou no mundo.
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418. Em consequncia do pecado original, a natureza humana est enfraquecida nas
suas foras, submetidas ignorncia, ao sofrimento e dominao da morte, e
inclinada ao pecado (inclinao chamada de concupiscncia).
O mal fsico, notadamente a dor e a morte, conforme explicaes no livro do
Gnesis so atribudos a Ado e Eva, que so castigados pela sua desobedincia do
pecado original. Causando a inimizade entre os animais e o homem, as dores do parto,
os espinhos e os estrepes, o po que dever ser ganho com o suor do prprio rosto,
bem como a volta ao p (Gn 3,15-19). (BOFF, 2009, p. 119).
Estas contradies fazem parte das relaes do homem com Deus e com o
mundo; dores e destruies fazem parte da evoluo e do desenvolvimento humano.
No podemos imaginar que antes do pecado de Ado as feras fossem mansas. Santo
Toms explica que o O pecado do homem no mudou a natureza dos animais, como
se, antes do pecado original, os lees e os falces vivessem de ervas. (ST I, q. 96,
a.1, ad 2 apud BOFF, 2009, p. 119), Para Santo Toms, realista que era, da
natureza do leo nutrir-se de cervos. (ST I, q. 19. A.9, c apud BOFF, 2009, p. 119).
A luta pela sobrevivncia funciona desde o big bang, e no somente aps o
pecado de Ado, no sendo Ado culpado pela desarmonia do universo. (BOFF, 2009,
p. 120).
Se o mundo evolutivo e conflitual e se assim foi criado por Deus, ento, a
dor e a morte pertencem ao plano do Criador. Ele as quis como parte de sua criao.
Elas tm ai uma funo. (BOFF, 2009, p 121).
Para Santo Toms, Deus permite o mal particular, visando o bem universal,
pois se Deus quisesse impedir o mal no mundo, poderia priv-lo de outros bens. (ST I,
q. 22, a. 2, ad 2, afirmando que a Providncia divina se ocupa com as coisas
singulares, at mesmo as corruptveis apud BOFF, 2009, p. 121).
O que Deus quer a ordem e no a desordem, a qual sobrevm apenas
como efeito colateral indesejado, embora inevitvel. Assim acontece com o mdico:
corta, fere e faz sofrer, mas tudo para salvar o doente. (BOFF, 2009, p. 122).
6. A doutrina do pecado original
O pecado original, dogmatizado como verdade de f por trs conclios,
Cartago no ano de 418, Orange II em 529 e de Trento em 1546, ao tratar da remisso
pelo batismo, conduz indulgncia para as crianas que nascem com esta mcula
herdada de Ado. (BOFF, 2009, pp.150, 151).
28 Caderno Teolgico da PUCPR, Curitiba, v.2, n.2, p. 21-37, 2014
Embora o pecado original no se origine de uma ao e ou ato, mas sim de
uma situao, priva o ser humano do amor salvfico de Deus. (CIC n 405). (BOFF,
2009, p.155).
A doutrina do pecado original to importante que a soteriologia crist perderia em
grandeza dramtica se dela fosse amputada. Pois s na contraluz daquela doutrina se
pode entender de modo adequado a relevncia da redeno realizada em Cristo e a
magnitude do preo de nosso resgate: o sangue do Cordeiro sem mancha (cf. 1Co 6,20;
7,23; 1Pd 1,18-19; At 20,28) No que Cristo, falando em absoluto, precisasse sofrer o
que sofreu, mas o drama de sua paixo tem certa proporo - de convenincia, no de
necessidade com o drama do pecado humano. Da asseverar o Catecismo da Igreja
Catlica que no se pode atentar contra a revelao do pecado original sem atentar
contra o ministrio de Cristo (N 389). Vejamos como a redeno ganha relevncia
quando contrastada com o pecado original. (BOFF, 2009, p.160).
Sem a percepo do pecado original no se poderia explicar a necessidade
do perdo do homem, a urgncia da graa, e da redeno de Cristo. No reconhecer o
pecado original como falta voluntria de Ado, marcada em cada homem seria abdicar
da graa, negando a nossa salvao por Cristo. Reduzindo Jesus Cristo a um homem
de grandes predicados, porm sem sua qualidade Redentora e Salvadora.
Se a culpa de Ado e Eva atinge todo o ser humano que nasce, mais ainda o envolve a
graa de Cristo e de sua Igreja. E se cada recm-nascido partilha do pecado dos
primeiros pais, partilha mais ainda da graa salutar de Cristo pela f da sua Igreja.
(BOFF, 2009, p. 166).
Porquanto, se a culpa de Ado e Eva alcana toda a humanidade, a graa
de Cristo supera e ultrapassa toda nossa percepo de pecado.
Segundo Frei Clodovis, o Pecado herdado: pode ser assim refletido:
No ensaio anteriormente referido, P. Ricoeur desanca o pecado original como conceito absurdo e com outros qualificativos igualmente pesados. Ao contrrio dele, Santo
Toms nada v de inconveniens nem contra rationem na doutrina do pecado original.
Partindo do princpio de que Deus age na histria de maneira sbia, nada fazendo de
absurdo ou irracional, o Doutor Anglico funda a herana do pecado de Ado em um
princpio metafisicamente grande: a solidariedade ontolgica e, portanto, tambm moral,
existente entre todos os homens e que faz de todos como um s homem. Assim, na
pessoa de Ado estava toda a humanidade, de modo que seu pecado era, alm de
pessoal, um pecado da natureza. (BOPFF, 2009, pp. 153, 154).
[...] Sem dvida, a explicao solidarstica do pecado se choca com a moderna
concepo individualista de culpa. Representa, contudo, uma tentativa teolgica
coerente e rigorosa para dar teoricamente conta do dogma da culpa original. Os
modernos, por sua parte, eliminam simplesmente o problema, deixando-o impensado e
irresolvido. E de pouco vale criticar a verso atual dessa doutrina dada pelo Catecismo
da Igreja Catlica, acusando-a de historicizante e at de mitificante, e propondo que a
Igreja se liberte uma vez por todas dessas cadeias. (HRING, Hermann. Da queda ao
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pecado hereditrio: apontamentos ao Catecismo da Igreja Catlica, in Conciliun, n 304
(2004) 28-38, apud BOFF, 2009, p. 155) Pois se a igreja mantm ainda aquela
representao porque a teologia atual no lhe forneceu uma representao
alternativa, capaz de traduzir, de forma correta, as verdades irrenunciveis a contidas.
Portanto, e a teologia que est aqui em questo e no a igreja e sua doutrina. (BOFF,
2009, p. 155)
Agora, se a teologia, com todos seus esforos, ainda no conseguiu mostrar a
plausibilidade teolgica do pecado original para o homem de hoje, o que deve fazer
manter-se na f e, a partir dela, continuar a buscar as razes da f, sempre sedulo, piet
et sobrie, como recita o Vaticano I (DH 3016), mas no pretenda levantar os cornos de
uma inteligncia petulante, segundo a advertncia de Santo Anselmo e dos demais
doutores da Igreja. muita arrogncia querer que to altos mistrios possam caber em
nossa estreita cachola cerebral. (BOFF, 2009, p. 156).
7. O Deus Jav ameaador e castigador
Para Sanford, analista junguiano e padre episcopaliano; o prprio IAHVEH
o responsvel pelo mal, e os hebreus viam em IAHVEH a origem tanto do bem quanto
do mal.
A razo de encontrarmos poucas referncias a Sat no AT est no fato de que a o
prprio Iahweh o responsvel pelo mal, de modo que a figura de um demnio no
necessria. H muitos exemplos no AT mostrando que os antigos hebreus viam a
Iahweh como a origem tanto do bem como do mal. Por exemplo, considere-se Am 3,6:
Se acontece alguma desgraa na cidade, no foi Iahweh que agiu?" ou Is 45,5-7 Eu
sou Iahweh e no h nenhum outro..." Eu formo a luz e crio as trevas, asseguro o bem-
estar e crio a desgraa; sim, eu Iahweh, fao tudo isto; ou Is 54,16; Sabe que fui eu
quem criou o ferreiro que sopra as brasas no fogo e tira delas o instrumento para seu
uso; tambm fui eu quem criou o exterminador, com a sua funo de criar runas.
(SANFORD, 1988, p 39).
Sendo Iahweh uma totalidade de opostos, tudo provm dele, inclusive o bem e o mal.
Assim para os antigos hebreus o mal no constitua um problema. Eles acreditavam
num nico Deus e, se havia o bem e mal no mundo, se o homem sofresse uma tragdia
ou fosse cumulado de bnos, se sucumbisse a humores destrutivos e paixes ms,
tudo isso tinha sua origem em Iahweh. Isso at que a conscincia moral hebraica se
desenvolvesse e eles sentissem um certo incmodo na ideia de um Deus que
aparentemente enviava tanto o bem quanto o mal sobre a espcie humana...
Podemos de fato ficar bastante incomodados com a ideia de que Iahweh o
responsvel pelo bem e pelo mal, mas o que nos apresenta o monotesmo claro e
persistente. (SANFORD, 1988, pp. 39, 40).
Como podemos observar, muitos males so atribudos A IAHWEH, contudo
tal pensamento contraria a Doutrina da Igreja Catlica; opondo-se aos prescritos no
Catecismo da Igreja Catlica, que prega um Deus bom, misericordioso e cheio de amor
pela humanidade.
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Deus, quando permite um mal, visa sempre o bem maior. O pensamento do
autor um pensamento maniquesta, cuja heresia j foi discutida, e superada pela
Igreja Catlica.
Mesmo pensamento tem o sacerdote catlico Lepargneur. Como
compreender o Jav bblico, ameaador e castigador, que pune os pecadores com a
imagem do Deus bondoso, piedoso, cheio de misericrdia que hoje recebemos?
Todos os povos na sua presena so como se no existissem, e ele os considera
como nada, uma coisa que no existe (Is 40,17). Nossos dias se consomem sob
vossa ira, nossos anos todos so um sopro (Sl 189). Descarregou sobre eles o fogo
de sua ira, clera, indignao, calamidade, uma legio de anjos da desgraa; deu livre
curso sua ira... No preservou suas almas da morte, suas vidas entregou peste...
(Sl 77). Que Pai proporciona com tamanha insensibilidade tanto ventura quanto
infortnio a seus filhos como se ambas as situaes tivessem o mesmo juzo? No livro
de J 2,10 Aceitamos a felicidade da mo de Deus; no devemos tambm aceitar a
infelicidade? (LEPARGNEUR, 1985, p. 125).
Por que Deus Pai, no cristianismo, entregou o Verbo encarnado ao suplcio da
cruz como condio do perdo para a humanidade? (LEPARGNEUR, 1985, p.126).
Sobre a resposta a estas perguntas nosso conhecimento acerca da questo do
mal esbarra em causas desconhecidas nossa razo, s cabendo a Deus o seu pleno
conhecimento. Deus criou o mundo e tudo que nele existe, inclusive o mal; a
Revelao, contudo, culpa Ado, Eva e a serpente pela origem do mal; mas, como
Deus tudo criou consequentemente teria Deus criado tambm o mal? (LEPARGEUR,
1985, pp. 126, 127).
O pensamento do autor no condiz com a doutrina da Igreja Catlica;
fazendo uma leitura fundamentalista e maniquesta.
8. O sofrimento de um inocente
A histria de J relata um homem justo e sem culpa nenhuma, que
provado por Deus, com muitos sofrimentos. Perdendo seus bens, seus filhos e por fim
sua prpria doena. Seus amigos tentam convence-lo de que tanto sofrimento s seria
possvel em decorrncia de uma falta grave de sua parte. No Antigo Testamento o mal
interpretado como castigo de Deus pelos pecados cometidos pelos homens. Sendo
Deus um legislador e juiz; atingindo aqueles homens que semeiam a maldade e a
iniquidade, colhendo o mesmo fruto que plantaram.
Nos primeiros captulos do Livro de J observamos que Deus d permisso
para Satans afligi-lo, porm sem atentar contra sua vida.
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Satans coloca prova a f e amor de J, alegando que J s fazia o bem
para receber bem. J submetido provao atravs de terrveis sofrimentos;
chegando J a blasfemar contra Deus exigindo explicaes para seu sofrimento. Deus
revela a J as maravilhas de sua criao, J por fim compreende que seria muita
pretenso de sua parte exigir explicaes; tampando sua boca com mo e calando-se,
em sinal de humildade.
J percebe que o problema do sofrimento do justo no deve ser
compreendido, o sofrimento deve ser aceito sem questionamentos, aceitando que o
justo tambm sofre, e atravs do sofrimento o inocente pode e deve fazer a experincia
com Deus; pois, mesmo no sofrimento e morte, podemos descobrir a presena
misteriosa do Deus da vida.
9. O mal natural e mal moral
Existe uma diferena entre o mal fsico, dor corporal ou sofrimento
emocional, e o mal moral, que o sentimento de culpa. Para Santo Agostinho h dois
tipos de males: um que o homem faz a outrem, que seria o pecado; e outro do qual o
homem vitima, que seria a pena; pervertendo a vontade Deus e negando o seu amor,
resultando na condenao irrevogvel. (BOFF, 2009, p.115).
9.1. O mal Natural
O mal fsico toda deformao fsica, principalmente a dor e a morte. As primeiras
pginas do Genesis ensinam que os males fsicos entraram no mundo por causa do
pecado de Ado e Eva: so os castigos da desobedincia original: a inimizade entre os
animais e homem, as dores de parto, a dominao na relao homem-mulher, os
espinhos e os abrolhos e o po ganho com o suor do rosto, enfim volta ao p. (BOFF
2009, p. 119).
9.2. O mal moral
O mal moral praticado exclusivamente pela liberdade humana. Nele, a
capacidade tica do ser humano anulada, e o homem acaba fazendo o mal que no
quer; Com efeito, no fao o bem que quero, mas pratico o mal que no quero. (Rm
7,19). Eis, pois, a concupiscncia.
Frei Clodovis cita nosso drama existencial: a concupiscncia:
[...] o cristianismo fala na tendncia para o mal como fruto do pecado original. Tal tambm chamada de fomes peccati ou de concupiscncia. Voltaire descreveu tal
tendncia com clareza e simplicidade: bastante cair para fazer o mal; para fazer o
bem, precisa subir. Tal a experincia humana de cada um e de todos sem exceo.
So Paulo a exprimiu com dramatismo em Rm 7: Vejo o bem que quero e fao o mal
que no quero. O poeta pago Ovdio concorda com isso quando recita: Vejo o que h
de melhor e o aprovo, mas sigo o que h de pior. Eis, pois o que a concupiscncia: o
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dramtico non posse non peccare. nossa radical incapacidade de amar
verdadeiramente: a Deus, sobretudo, e ao prximo como a ns mesmos. Com razo,
pois, a Gaudium et Spes declara que a fraqueza moral diante do mal a experincia
comum dos seres humanos (13). (Boff, 2009, p.137, 138).
[...] Mas j os grandes pensadores antigos tinham descrito essa situao de
precariedade moral do ser humano. Assim, Plato, depois de fazer o relato do anel de
Giges, no qual se conta que esse personagem aproveitava da invisibilidade que lhe
confere um anel mgico para cometer toda sorte de abusos, tira a seguinte concluso
geral: Ningum, de vontade prpria, se comporta segundo a justia. Em seguida, explica
o quanto fcil praticar a injustia e quantas vantagens humanas isso traz; e, ao
contrrio, quanto difcil ser justo e quantas complicaes isso comporta. (Plato. A
Republica, livro II, 360c e seg, apud BOFF, 2009, p. 138, 139).
Frei clodovis cita ainda a Origem de nosso drama existencial: o pecado
original: De onde vem, pois, a inclinao perversa que reina no corao do ser humano? De
onde vem essa anomalia existencial com a qual cada um faz a experincia? Como
explicar essa mal formao geral de nosso ser mortal? No provm certamente de
Deus, que sumamente bom e no pode querer nem operar o mal. Non est ex Padre,
diz So Joo (1 Jo 2,16) e o repete a Gaudium et Spes (n 13). Ser ento de quem, se
no da criatura?
Ora, aqui que se pe o dogma do pecado original, sem o qual o mal que habita no
corao humano e no mundo se torna incompreensvel. Faz-se porm, imediatamente
luz sobre esses problemas to logo se coloque a verdade de um acidente fatal,
sucedido no incio de nossa existncia. (BOFF, 2009, p. 140, 141)
10. O paradoxo do bem e do mal natural
O mal, para uns, pode ser o bem para outros, depende o ponto de vista de
quem olha, depende de que margem do rio se est olhando.
Para mim, a praga que destruiu minhas abboras era um mal, tanto quanto o esquilo
que foi neutralizado justamente por essa razo. No sei como a praga se sentiu. Mas
no resta dvida de que, para o esquilo, a destruio dos meus ps-de-tomate era um
gesto bom. Eu e minhas armadilhas ramos, para ele, o mal. Ou seja, o que para mim
era ruim, era bom para ele e vice-versa.
Em se tratando do mal, a primeira coisa com a qual nos defrontamos que, de um
ponto de vista humano, sua conceituao depende sempre do ngulo onde est o
observador. Portanto o que tido como bom para algum pode perfeitamente ser mau
para outro. (SANFORFD, 1988, p. 14)
A praga que destruiu meus ps-de abbora um exemplo de um mal natural tanto
quanto os terremotos, as enchentes de propores catastrficas ou at as epidemias.
Em contraposio, o mal moral advm de possveis motivaes negativas existentes no
corao mesmo dos seres humanos.
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No nova a ideia de que o bem e o mal so conceitos relativos. Por exemplo, o antigo
filsofo chins Chu Hsi cujas reflexes ocorreram h tanto tempo que ningum sabe
ao certo quando ele viveu ensinava que o bem e o mal no existem em si mesmos; ao
contrrio, eles so conceitos aplicados s coisas de acordo com os benefcios ou
prejuzos que trazem para quem as manipula ou para o ser humano em geral. Dizia Chu
Hsi que sem si mesma, a natureza est alm do bem e do mal, e ignora a nossa
terminologia egosta (SANFORD, 1988, pp. 15, 16).
Atravs da dor, do sofrimento, o crente v a mo de Deus ora para castigar, ora para
provar (ora simplesmente para proporcionar oportunidade de acumular mritos): eis os
dois grandes e bsicos significados que permitiram a bilhes de seres humanos padecer
com valentia sofrimentos inadiveis, sofrer com jbilo ou resignao, morrer com doce
esperana. A maioria dos brasileiros ainda se situa nesta categoria comportamental,
ainda que as classes abastecidas j tenham passado em massa para o outro lado.
(LEPARGNEUR, 1985, p. 10, 11)
[...] mal no ser antes do mais um julgamento de valor para apontar aquilo que me
contradiz? Que se ope a mim? O mal em si, se existe, algo indefinido, ambguo: pode
servir para o bem ou para o prejuzo do sujeito humano. (LEPARGNEUR, 1985, p. 35).
A civilizao humana um enorme sistema para combater males relativos; o
homem produz bens e servios para vencer estes males relativos: a fome gera o
sistema da agricultura e a indstria agro alimentcia; a nudez gera a indstria do
vesturio; a dor gera o sistema mdico hospitalar. (Lepargneur, 1985, p.36).
11. Um Deus a servio do homem
As pessoas que encontram no divino uma espcie de troca de favores,
enquanto est tudo bem com sua vida principalmente a vida material, dizem-se de bem
com Deus, e at protegidos por Ele. Porm, nas dificuldades financeiras, e ou nas
penrias de sade, sentem-se atacadas. Destarte, quando se encontram diante de
doenas graves no conseguem entender o porqu deste sofrimento. Estas pessoas
tem no divino um Deus a seu servio, acreditam em Deus enquanto lhe convm.
Um dos maiores sofrimentos possveis para muitos, se relaciona com a
morte de pessoas da famlia, ou de entes queridos.
Quem enxerga o porqu da sua existncia terrestre apenas nos gozos, j est em
vspera de frustrao. Quem confunde os objetos da vida fortuna, prazeres,
divertimentos com a razo-de-ser da sua existncia autoconhecimento e auto
realizao um profano, um exotrico, e no pode encontrar conforto na hora do
sofrimento. (ROHDEN, 1988, p. 58)
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12. Vida terrena transitria
Para ns cristos, a vida continua aps a morte fsica, a morte material;
nossa vida aps a morte transformada em vida eterna.
Para que a lagarta possa tornar-se borboleta, indispensvel que passe por uma
espcie de morte, a crislida, ou o casulo. No fim do seu perodo de lagarta, deixa ela
de comer, retira-se a um lugar solitrio e l se metamorfoseia. No sabemos se ela
sofre com esta metamorfose. E, se sofresse, tambm aceitaria de boa vontade esse
sofrimento, porque, indistintamente, a lagarta sabe que o seu verdadeiro estado o de
borboleta alada... Em vez de rastejar pesadamente pela terra, a borboleta voa
elegantemente pelos espaos ensolarados... (ROHDEN, 1988, p. 129, 130).
E o prprio Cristo diz: Se o gro de trigo no cair em terra e morrer, ficar estril: mas
se morrer, produzir muito fruto. (ROHDEN, 1988, p 130, 131).
Para alcanarmos o Reino de Deus indispensvel que morramos; s
alcana a vida eterna quem passa pela morte, esta vida aqui na terra transitria, vida
em abundncia encontraremos no paraso.
13. O sofrimento de Jesus
Jesus homem real, frgil e vulnervel como qualquer outro homem. Vence a
fobia dos perigos e das ameaas que o cercam. Jesus encara o sofrimento, em virtude
de fragilidade natural de seu corpo humano, diante dos poderes poltico e econmico e
vai em frente com a revelao do Reino de Deus; Jesus no procura o sofrimento, mas
no se desvia de sua misso, mesmo se devesse sofrer em nosso lugar, investindo sua
vida para nos libertar e nos salvar. (VARONE, 2001, p. 270, 271)
Jesus sentiu sofrimento, como homem que foi: Meu Pai, se possvel
passe de mim este clice! Contudo, no se faa como eu quero, mas como tu queres!
(Mt 26,39); e ainda: Meu Pai, se este clice no pode passar sem que eu o beba, faa-
se a tua vontade. Jesus se demonstra totalmente obediente ao Pai. (Mt 26,42). Estas
palavras foram pronunciadas no Getsmani antes de sua crucifixo; e aps
experimentar imenso sofrimento no Glgota, pronuncia as palavras de dor e sofrimento,
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes expressando seu sentimento de dor,
abandono e sofrimento. (SALVIFICI DOLORIS, 1984, P. 33, 34)
14. O sentido do sofrimento humano
O sofrimento humano no reveste para Deus nenhum valor de
compensao nem de reparao: ele no nem o prazer nem a exigncia jurdica de
Deus (VARONE, 2001, p. 265). O sofrimento humano no atinge o homem pelo efeito de uma disposio nem de uma
permisso precisa de Deus, sob forma de provao, de advertncia ou de punio de tal
pessoa ou de tal grupo.
Deus no intervm nos acontecimentos. (VARONE, 2001, p.265).
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A nosso ver, Deus intervm nos acontecimentos, caso contrrio no
aconteceriam as interferncias providenciais em nossas vidas.
O Livro de J pe, de modo perspicaz, a pergunta o porqu do sofrimento; e mostra
tambm que ele atinge o inocente, mas ainda no d a soluo ao problema.
[...] Mas, para poder perceber a verdadeira resposta ao porqu do sofrimento,
devemos voltar a nossa ateno para a revelao do amor divino, fonte ltima do
sentido de tudo aquilo que existe.
[...] O amor ainda a fonte mais plena para a resposta pergunta acerca do sentido do
sofrimento. Esta resposta foi dada por Deus ao homem, na cruz de Jesus Cristo.
(SALVIFI DOLORIS, 1984, pp. 21, 22).
O homem no deve passar imune ao sofrimento de outrem, pois quando
fazemos o bem aos nossos irmos mais humildes a Cristo que estamos fazendo. (Mt
25,40). O bom samaritano parou diante do sofrimento de um desconhecido, tendo
compaixo por sua dor, demonstrando que o O sofrimento est presente no mundo
para desencadear o amor, para fazer nascer obras de amor para com o prximo, para
transformar toda a civilizao humana na civilizao do amor. (SALVIFICI DOLORIS,
1984, p. 66).
E todos que sofrem foram chamados, de uma vez para sempre, a tornarem-
se participantes dos sofrimentos der Cristo. (1Pd 4,13). (SALVIFICI DOLORIS, 1984,
p. 67)
Cristo ensinou o homem a fazer o bem com o sofrimento e, ao mesmo
tempo, fazer o bem a quem sofre. Sob este duplo aspecto, revelou cabalmente o
sentido do sofrimento. (SALVIFICI DOLORIS, 1984, p. 67).
15. Privatio Boni
A Igreja sempre entendeu o mal como privatio boni, privao de um bem
devido. O mal no existe propriamente como coisa, mas existe apenas como
ocorrncia. O mal est em uma coisa, nunca uma coisa.
A doutrina da igreja nunca admitiu que o mal fosse uma substncia ou uma entidade
concreta, como acreditavam as religies de origem iraniana, a exemplo do mazdeismo,
do gnosticicismo e do maniquesmo. Ela entendeu sempre o mal como privatio boni:
Privao de um bem devido (cf. DH 286, 1333). Assim a dor: por certo, real, mas
como o que no deve ser. uma falta ou deficincia, justamente como o vazio do
estomago pela fome ou como a ausncia da pessoa amada na saudade. Portanto, o mal
no existe propriamente como coisa, mas existe apenas como ocorrncia. O mal no
(est), mas se d (datur). O mal est em uma coisa, nunca uma coisa. O mau existe,
sim, mas no o mal, que s existe no mau. (BOFF, 2009, p.114, 115)
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[...] O Homem sofre por causa do mal, que uma certa falta, limitao ou distoro do
bem. Poder-se-ia dizer que o homem sofre por causa de um bem do qual no participa,
do qual , num certo sentido, excludo, ou do qual ele prprio se privou. Sofre em
particular quando deveria ter participao num determinado bem segundo a ordem
normal das coisas e no a tem. Por conseguinte, no conceito cristo, a realidade do
sofrimento explica-se por meio do mal que, de certa maneira, est sempre em referncia
a um bem. (SAVIVI DOLORIS, 1984 pp. 13,14).
16. A Graa de Deus
O apostolo Paulo tinha visto e confessado que a abundncia do pecado
havia provocado a superabundncia da graa (cf. Rm 5,20). [...] homem, inclinado ao
mal por nascena, encontra em seguida novos estmulos para o pecado, que no se
vencem seno com esforos diligentes e o auxilio da graa. (Gaudium et Spes 25);
[...] Inserido nesta batalha, o homem deve lutar sempre para aderir ao bem; no
consegue alcanar a unidade interior seno com grandes labutas e o auxilio da graa
de Deus. (Gaudium et Spes 37).
17. Consideraes finais
Conforme pesquisas bibliogrficas, constatamos a existncia de opinies
divergentes acerca do tema. Autores, com a mesma formao, padres e sacerdotes,
manifestaram opinies diferentes da doutrina da Igreja Catlica em suas obras
expondo, por vezes, uma opinio maniquesta.
Para concluir, apoiamo-nos nas ideias do Frei Clodovis Boff e do Catecismo
da Igreja Catlica.
Para ele a doutrina da Igreja no admite que o mal seja uma coisa concreta,
mas sim uma ocorrncia. Deus quando permite um mal, visa sempre o bem maior.
Opinio coerente e em consonncia com a doutrina da Igreja Catlica.
Conforme o Catecismo da Igreja Catlica, paragrafo 309: no h uma
resposta rpida para a questo do mal; cuja resposta encontrasse no conjunto da f
crist.
309. Se Deus Pai Todo-Poderoso, Criador do mundo ordenado e bom, cuida de todas
as suas criaturas, por que ento o mal existe? Para esta pergunta to premente quo
inevitvel, to dolorosa quanto misteriosa, no h uma resposta rpida. o conjunto da
f crist que constitui a resposta a esta pergunta.
310. [...] Todavia, na sua sabedoria e bondade infinitas, Deus quis livremente criar um
mundo em estado de caminhada para a sua perfeio ltima [...].
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311. Os anjos e os homens, criaturas inteligentes e livres, devem caminhar para o seu
destino ltimo por opo livre e amor preferencial. Podem, no entanto, desviar-se. E, de
fato, pecaram. Foi assim que o mal moral entrou no mundo, incomensuravelmente mais
grave do que o mal fsico. Deus no de modo algum, nem direta nem indiretamente, a
causa do mal moral. Todavia permite-o, respeitando a liberdade da sua criatura e,
misteriosamente, sabe auferir dele o bem. Pois o Deus todo-poderoso..., por ser
soberanamente bom, nunca deixaria qualquer mal existir nas suas obras se no fosse
bastante poderoso e bom para fazer resultar o bem do prprio mal.
324. A permisso divina do mal fsico e do mal moral um mistrio que Deus ilumina
pelo seu Filho, Jesus Cristo, morto e ressuscitado para vencer o mal. A f nos d a
certeza de que Deus no permitiria o mal se do prprio mal no tirasse o bem, por
caminhos que s conheceremos plenamente na vida eterna.
Enfim, o sofrimento deve ser aceito como um mistrio que o homem no
est em condies de entender totalmente com sua inteligncia. As respostas das
perguntas sobre o mal e o sofrimento humano esto alm do nosso conhecimento e
so causas desconhecidas da nossa razo, s cabendo a Deus o seu pleno
conhecimento.
Referncias
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Criao e Evoluo Dilogo entre Teologia e Biologia. So Paulo: Ave Maria, 2009.
JOO PAULO II. O Sentido Cristo do Sofrimento Humano, Carta Apostlica Salvifici
Doloris; 2 edio, So Paulo: Edies Paulinas, 1984.
VARONE, Franois. Esse Deus que dizem Amar o Sofrimento. Traduo de Jos Augusto
da Silva. Aparecida. Santurio, 2001.
LEPARGNEUR, Hubert. Antropologia do Sofrimento. Aparecida: Santurio, 1985.
SANFORD, John A. Mal, o lado sombrio da realidade. Traduo de Silvio Jos Pilon, Joo
Silvrio Trevisan: reviso de Ivo Stornilolo. So Paulo: Paulus, 1988.
ROHDEN, Huberto. Porque Sofremos: diretrizes para um sofrimento sereno e calmo. 8
Ed. Alvorada, 1988.
COMPNDIO DO VATICANO II, Constituies, decretos, e declaraes, 30 edio,
Introduo e ndice de Frei Boaventura Kloppenburg, OFM. Coordenao Geral de Frei
Frederico Vier, OFM. Vozes, 1968.
CATECISMO DA IGREJA CATLICA, Editora Vozes, Edies Paulinas, Edies Loyola,
Edies Ave-Maria, 1993.
Submetido em 17 de setembro de 2014 Aprovado em 20 de outubro de 2014