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PONTO 4. Teorias contemporâneas da justiça “Perguntar se uma sociedade é justa é perguntar como ela distribui as coisas que julgamos importantes: renda e riqueza, obrigações e direitos, poder e oportunidades, ofícios e honras. Uma sociedade justa distribui esses bens do jeito certo; dá a cada pessoa o que é devido. A questão difícil começa quando perguntamos o que é devido, e qual a razão”. Michael Sandel, Justice. Nas últimas décadas, boa parte do debate político está ligado não à questões envolvendo poder, soberania ou legitimidade, mas sim à justiça, liberdade e comunidade. Assim, na esteira da obra Uma Teoria da Justiça de John Rawls (1971), houve o desenvolvimento de uma série de teorias que conectam justiça e liberdade, enfatizando direitos individuais, mas divergindo quanto ao bem que deve ter mais importância (o chamado valor fundacional). Assim, primeiramente abordaremos o utilitarismo, o qual foi a corrente política predominante no contexto liberal a partir do século XVIII. Em seguida, apresentaremos o liberalismo-igualitário, que ofereceu uma alternativa ao consenso utilitarista e redirecionou o debate contemporâneo. 1. Utilitarismo De forma simplória, podemos dizer que, de acordo com o utilitarismo, é moralmente correta uma ação ou política que produz a maior quantidade de felicidade para o conjunto de uma comunidade. 1

Teorias Contemporâneas Da Justiça

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Teoria do Direito

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PONTO 4. Teorias contemporâneas da justiça

“Perguntar se uma sociedade é justa é perguntar como ela distribui as coisas que julgamos importantes: renda e riqueza, obrigações e direitos, poder e oportunidades, ofícios e honras. Uma sociedade justa distribui esses bens do jeito certo; dá a cada pessoa o que é devido. A questão difícil começa quando perguntamos o que é devido, e qual a razão”. Michael Sandel, Justice.

Nas últimas décadas, boa parte do debate político está ligado não à

questões envolvendo poder, soberania ou legitimidade, mas sim à justiça,

liberdade e comunidade. Assim, na esteira da obra Uma Teoria da Justiça de John

Rawls (1971), houve o desenvolvimento de uma série de teorias que conectam

justiça e liberdade, enfatizando direitos individuais, mas divergindo quanto ao

bem que deve ter mais importância (o chamado valor fundacional).

Assim, primeiramente abordaremos o utilitarismo, o qual foi a corrente

política predominante no contexto liberal a partir do século XVIII. Em seguida,

apresentaremos o liberalismo-igualitário, que ofereceu uma alternativa ao

consenso utilitarista e redirecionou o debate contemporâneo.

1. Utilitarismo

De forma simplória, podemos dizer que, de acordo com o utilitarismo, é

moralmente correta uma ação ou política que produz a maior quantidade de

felicidade para o conjunto de uma comunidade.

Como aponta Jeremy Benthan, “a natureza colocou o gênero humano sob

o domínio de dois senhores soberanos: a dor e o prazer. Somente a eles compete

apontar o que devemos fazer, bem como determinar o que na realidade faremos”

(Uma introdução aos princípios da moral e da legislação). O reconhecimento de

tal sujeição leva à adoção, por Benthan, do chamado princípio da utilidade, o qual

“aprova ou desaprova qualquer ação, segundo a tendência que tem a aumentar

ou diminuir a felicidade da pessoa cujo interesse está em jogo, ou, o que é a

mesma coisa em outros termos, segundo a tendência a promover ou

comprometer a referida felicidade” (idem).

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Assim, segundo W. Kymlicka, o utilitarismo possui dois atrativos

principais: conforma-se com nossa intuição no sentido de que o bem-estar

humano é importante e à noção de que as regras morais, ao invés de se fundarem

em alguma crença religiosa ou metafísica, devem ser testadas de acordo com

suas consequências ao bem-estar humano.

Posteriormente, John Stuart Mill revisitou os princípios utilitaristas para

adequa-los melhor aos direitos individuais. Neste sentido, reelaborou o

utilitarismo de modo que a sustentar que liberdade individual, ao ser respeitada,

traz maiores benefícios no longo prazo. Com isso, Mill teria tentado obter uma

boa justificativa para o não sacrifício da liberdade ainda que, no presente, este

sacrifício traga maior utilidade à maioria da sociedade (v.g. a proibição de uma

pequena seita por parte de uma maioria que pertença à religião rival).

Além disso, admitiu que há uma espécie de hierarquia entre prazeres e

dores distintas, apelando, contudo, para um ideal moral de dignidade humana e

personalidade independente da utilidade, aproximando-se de Kant. De todo

modo, o utilitarismo não foi capaz de responder adequadamente tais questões já

que não é possível estabelecer um consenso confiável acerca do conceito de

utilidade.

A partir destas características centrais do utilitarismo é possível

compreender a crítica de John Rawls, o qual elaborou uma crítica de ordem

moral contra o sacrifício de certos direitos tidos por invioláveis dentro de um

programa político utilitarista.

2. Liberalismo-igualitário

2.1. John Rawls

Como mencionado, a teoria de John Rawls, o qual se posicionou

contrariamente ao utilitarismo e ao intuicionismo1, foi determinante para a

definição dos rumos filosofia política das últimas décadas. Em sua teoria, o autor

1 Uso de um critério tido como evidente para a determinação dos princípios fundamentais de certo sistema axiológico.

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busca determinar quais direitos e liberdades devem ser protegidas dentro de

uma teoria de justiça.

Sua concepção geral de justiça consiste em uma ideia central: todos os

bens sociais primários - liberdade e oportunidade, renda e riqueza, todas as bases

para a autoestima - devem ser distribuídas igualmente, a não ser que uma

distribuição desigual de qualquer um desses bens implique uma vantagem aos

menos favorecidos. A partir dessa ideia centra é possível estabelecer um sistema

de prioridades do seguinte modo:

Primeiro princípio: cada pessoa deve ter um direito igual ao esquema mais

abrangente de liberdades básicas iguais que for compatível com um esquema

semelhante de liberdades para as demais (v.g. direito ao voto, ao devido

processo, à liberdade de expressão e associação etc.)

Segundo princípio: as desigualdades sociais e econômicas deverão ser

constituídas de tal modo que ao mesmo tempo: a) espere-se que sejam

razoavelmente vantajosas para todos; b) vinculem-se a empregos e cargos

acessíveis a todos (igualdade de oportunidade).

Dentro deste sistema, liberdades iguais têm precedência sobre igualdade

de oportunidade que tem precedência sobre recursos iguais.

Rawls é atraído pela ideia de que é justo que indivíduos tenham mais

recursos se os conseguiram em uma situação de igualdade de oportunidade, ou

seja, se tais discrepâncias não surjam em razão de algum dos participantes

participar do “grupo errado” (v.g. minorias étnicas, grupos vulneráveis etc).

Contudo, Rawls aplica o mesmo raciocínio à desigualdade de talentos naturais,

eis que, também neste caso, parcelas distributivas não deveriam ser

influenciadas por fatores que são arbitrários do ponto de vista moral. Talentos

naturais e circunstâncias sociais são questões de sorte bruta, e argumentos

morais não podem depender de sorte. Assim, o autor conclui que “ninguém

merece sua maior capacidade natural ou um ponto de partida melhor na

sociedade” (Theory of Justice).

Diante desta questão, Rawls propõe o princípio da diferença, segundo o

qual “a estrutura básica da sociedade deve ser arranjada de modo que estas

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contingências trabalhem para o bem dos menos afortunados” (Theory of Justice).

Ou seja, as desigualdades são aceitáveis desde tragam vantagens para os menos

afortunados da sociedade.

Para sustentar seus princípios de justiça, Rawls tem dois argumentos

principais. Em primeiro lugar, argumenta que sua teoria se acomoda melhor a

nossas intuições de justiça. Em segundo lugar, argumenta que em uma situação

hipotética de escolha das condições do contrato, seus princípios seriam

escolhidos. Trata-se do argumento da posição original, construção que visa

mostrar como pessoas livres, racionais e não invejosas, em uma posição de

igualdade, definiriam as características deste contrato social.

Este argumento, ligado ao contratualismo rawlsiano, busca representar

uma situação puramente hipotética para o estabelecimento de certo conceito de

justiça. Além disso, este contrato social rawlsiano tem outra diferença em relação

às demais formulações: o autor reconhece que no estado de natureza há

diferenças entre os contratantes, o que pode levar à vantagens arbitrárias no

estabelecimento do contrato. Por isso, Rawls estabelece que as condições devem

ser escolhidas por trás de um véu de ignorância, o qual exige um afastamento do

conhecimento dos antecedentes sociais e individuais de cada um. Trata-se de um

teste intuitivo de equidade.

Importante ressaltar, neste contexto, o que são os bens primários para

John Rawls, os quais são importantes para a escolha de princípios de justiça na

posição originária. Segundo o autor existem bens primários sociais, os quais são

diretamente distribuídos por instituições sociais (v.g. riqueza, oportunidades,

poder, direitos e liberdades) e bens primários naturais, como saúde, vigor,

talentos naturais, os quais são afetados por instituições sociais mas não são

diretamente distribuídos por elas.

Assim, ao escolher princípios de justiça, as pessoas por trás do véu da

ignorância buscarão garantir que tenham o maior acesso possível a esses bens

distribuídos por instituições sociais. Ademais, considerando as circunstâncias do

véu da ignorância, tais escolhas não serão pautadas pelo egoísmo, mas sim pela

benevolência. Deste modo, a opção racional seria a da estratégia maximin, ou

seja, a maximização daquilo que você teria se recebesse o mínimo distributivo.

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2.2. Ronald Dworkin

A concepção deste autor possui fortes vínculos com a de John Rawls,

diferindo em alguns pontos específicos. Em primeiro lugar, de acordo com

Dworkin o liberalismo-igualitário deve distinguir entre “personalidade” e

“circunstâncias” que cercam cada um de modo a permitir que os indivíduos

sejam responsáveis por seus gostos e ambições. Neste sentido, um estado

igualitário não deve arcar com os “gostos caros” de quem quer que seja. Em

segundo lugar, Dworkin rejeita uma medida subjetiva de bem-estar, sugerindo o

uso do conceito de “recursos”, o qual aproxima-se dos bens primários de Rawls.

Em terceiro lugar, insiste que a justiça não é apenas uma questão de recursos,

mas sim de recursos iguais. Por fim, para Dworkin um estado igualitário deve ser

neutro em matéria ética.

Em síntese, para Dworkin, uma concepção igualitária plausível deve

permitir que as pessoas possam iniciar suas vidas com iguais recursos materiais

e devem ter igual possibilidade de se garantir contra eventuais desvantagens,

mas sempre levando em consideração determinadas escolhas pessoais.

3. Libertarianismo:

De acordo com a posição libertária, o liberalismo-igualitário seria uma

teoria insuficientemente liberal. Assim, tais teóricos, dentre os quais se destaca

Robert Nozick com a obra Anarquia, Estado e Utopia, advogavam um Estado

mínimo dedicado exclusivamente à proteção das pessoas contra fraudes e uso

arbitrário da força, e a garantir o cumprimento de contratos celebrados entre

estes indivíduos. Suas ideias emergiram a partir de autores que se voltaram ao

welfare state, como Friedrich A. Hayek, Ludwig von Mises e Milton Friedman, e o

libertarismo teve especial influência nos governos da Nova Direita de Reagan e

Tatcher nos anos 80.

No libertarianismo, o livre-mercado não é defendido pelo seu caráter

instrumental, ou seja, por sua capacidade de maximizar utilidade ou proteger

direitos civis e políticos. De acordo com os libertários, qualquer medida

redistributiva é intrinsecamente errada por violar direitos de propriedade de

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terceiros. Neste sentido o governo não teria qualquer direito de interferir no

mercado, ainda que isso aumente sua eficiência ou diminua as desigualdades

sociais.

O relacionamento entre justiça é mercado é um dos pontos centrais da

teoria de Robert Nozick, cujo argumento central é o seguinte: se assumirmos que

todos são titulares de suas propriedades atuais, então uma distribuição justa é

simplesmente qualquer uma que seja resultado de trocas livres. Neste sentido, a

única tributação legítima é aquela instituída para a manutenção de instituições

que garantam o livre mercado.

Mais precisamente, há três princípios na “teoria da titularidade” de

Nozick: a) um princípio de transferência (tudo que foi adquirido justamente

pode ser transferido); b) um princípio da justa aquisição inicial (um princípio

sobre como as pessoas inicialmente possuem coisas que podem ser transferidas

conforme “a”); c) um princípio da retificação da injustiça (como lidar com

propriedades se elas foram injustamente adquiridas ou transferidas). Neste

contexto, como mencionado, apenas um Estado mínimo é que não viola direitos,

o que ocorre no esquema liberal-igualitário, o qual admite tributação para

compensar aqueles natural e socialmente em desvantagem.

O principal argumento de Nozick para fundamentar seu esquema está no

direito de auto-propriedade (self-ownership), derivado da máxima kantiana de

que os seres humanos devem ser tratados como um fim em si mesmo. Neste

ponto, é possível notar uma semelhança com a crítica de Rawls ao utilitarismo,

eis que ambos concordam que ninguém pode ser usado para beneficiar terceiros.

Todavia, enquanto para Rawls um dos mais importantes direitos é o de

igualdade de recursos, para Nozick são estes direitos sobre si mesmo. Com isso,

Nozick formula a seguinte crítica ao esquema liberal-igualitário: com a auto-

propriedade, tenho meus talentos, com os quais produzo determinadas riquezas.

Assim, a demanda de tributação redistributiva dos talentosos para os menos

talentosos viola este direito de auto-propriedade.

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4. Marxismo analítico 2

Diante da constatação de que a sociedade não avançava natural e

inevitavelmente para o comunismo, alguns marxistas (como G.A. Cohen e J.

Elster) passaram a formular questões relacionadas à justiça e à igualdade, pelas

quais antes não se interessavam.

Portanto, de pronto salientamos que apesar destes autores usarem certos

conceitos marxistas, outros foram prontamente rejeitados, em especial o

materialismo histórico. Neste sentido, o marxismo como uma teoria da

inevitabilidade histórica deu lugar a um marxismo como uma teoria política

normativa voltado a mostrar porque uma sociedade socialista seria desejável.

Desta forma, atualmente os marxistas analíticos aceitam escassez,

conflito, pluralismo e racionalidade imperfeita como características permanentes

da condição humana e presentes em qualquer sociedade futura, de modo que se

torna necessária uma teoria política normativa que lide com tais fatos. A partir

desta constatação se torna possível uma teoria marxista da Justiça.

Vale distinguir esta justiça marxista do liberalismo-igualitário, eis que

ambos possuem a igualdade como norte. Neste sentido, a diferença não está na

extensão da equalização dos recursos, mas sim na forma com que essa

equalização deve ocorrer. Isto porque, enquanto no modelo ralwsiano deve

haver uma equalização da propriedade privada, no marxismo esta deve ser

abolida mediante a socialização dos meios de produção. Há, portanto, um foco

inclusive na redistribuição desses meios de produção, e não apenas dos produtos

das forças produtivas como ocorreria no liberalismo-igualitário de acordo com

os marxistas analíticos.

Além disso, os marxistas apontam que uma das principais falhas da justiça

liberal seria a permissão da exploração, já que neste modelo a compra e venda de

trabalho ainda seria possível. Ressalte-se que a exploração, sob a ótica marxista,

refere-se à mais-valia. Todavia, contra essa postura mais ortodoxa, certos

autores marxistas apontaram que a exploração implica um desigual acesso aos

meios de produção nos termos já citados.

2 Esta denominação decorre do fato destes autores marxistas se inserirem na tradição da filosofia analítica.

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5. Comunitarismo

A ideia de comunidade estava relegada a um segundo plano até que

autores como Michael Sandel, Michael Walzer, Alasdair MacIntyre e Charles

Taylor passaram a criticar o fato de tal conceito não ser suficientemente

valorizado nas teorias liberais de justiça.

Assim, instaurou-se um debate entre liberais e comunitaristas. O primeiro

grupo liga-se à tradição kantiana, e aponta que as normas moralmente

justificadas, ou seja, “justas”, transcendem os contextos em que são

fundamentadas e aplicadas, dando-se ênfase a uma concepção abstrata de

pessoa, livre de contextos e determinações históricas. Trata-se de uma visão

impessoal e imparcial de pessoa. Já os comunitaristas, ligados à tradição

hegeliana, afirmam que a justiça está atrelada aos contextos da comunidade:

história, crenças, práticas, valores etc., os quais formariam o horizonte

normativo para construção da identidade dos membros e dos princípios de

justiça. Criticam, portanto, a abordagem individualista e abstrata dos liberais.

Uma primeira crítica comunitarista ao liberalismo liga-se, portanto, a essa

busca por uma teoria universal de justiça. Neste sentido, Walzer afirma que o

único modo de identificarmos as exigências de justiça é observar como cada

comunidade em particular entende os valores de bens sociais. Portanto,

identificar princípios de justiça seria mais um exercício de interpretação cultural

do que de argumentação filosófica.

Para muitos comunitaristas, o problema do liberalismo não estaria tanto

neste universalismo, mas sim no individualismo. Deste modo, os comunitaristas

apontam que as “políticas de direitos” liberais deveriam ser abandonadas em

prol de “políticas do bem comum”, as quais enfatizariam a vida em comunidade.

Aqui, vale ressaltar que o estado liberal deve ser neutro, ou seja, não pode

estabelecer quais os fins que devem ser perseguidos por alguém, mas apenas

estabelecer uma estrutura de recursos meio que possibilite a cada um buscar

aquilo que valoriza, seja uma atividade cultural como teatro seja uma futilidade

como luta-livre.

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Contra este estado neutro, os comunitaristas defendem as “políticas do

bem comum”. Enquanto no estado liberal o bem comum é determinado pelas

escolhas individuais de cada membro, cujas preferências têm o mesmo peso, no

estado comunitarista o bem comum é concebido a partir de uma concepção

substantiva de vida que define a comunidade. Assim, o estilo de vida da

comunidade forma a base para uma classificação pública de concepções de bem,

e o peso dado a cada preferência individual depende quanto esta se conforma ou

contribui a este bem comum. Portanto, este estado pode e deve encorajar

condutas que se adequem a este bem comum definido a partir de práticas

existentes na comunidade.

Deste modo, a concepção comunitarista de eu (self) entende como falsa da

concepção rawlsiana, a qual, inspirada pela posição kantiana, vê o eu como livre

de quaisquer definições, pelo fato de ser membro de um grupo social, político,

econômico etc. Esta posição liberal ignoraria o fato de que estamos “situados” em

certas práticas sociais. Portanto, o Estado não respeitaria nossa

autodeterminação ao se afastar de nossos papéis-sociais, mas sim ao encorajar

uma imersão nestes em direção à construção do bem-comum.

Em síntese, a visão liberal do eu seria: a) vazia; b) violaria nossas

autopercepções; c) ignoraria nossa imersão em práticas comunais.

Bibliografia básica:

GARGARELLA, Roberto. As teorias da justiça depois de Rawls. São Paulo: Martins

Fontes, 2008.

KYMLICKA, Will. Contemporary Political Philosophy – an introduction. 2ª ed,

Londres: Oxoford University, 2002.

SANDEL, Michael. Justice: a reader. Nova York: Oxford University, 2007.

____________________. Justice: what’s the right thing to do? Nova York: FSG, 2009.

VITA, Álvaro de. A justiça igualitária e seus críticos. São Paulo: Martins Fontes,

2007.

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