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Terceira Comissão da Assembléia Geral das Nações Unidas para Assuntos Sociais, Culturais e Humanitários (SoCHum) Tópico: Gênero e Política Mundial: Emancipação Feminina no Oriente Médio e Norte da África

Autores: Jean Paul Damas Raulino Coly Larissa do Espírito Santo Andrade

Laura Sant’Anna Luedy Oliveira Pétalla Brandão Timo Teresa Bosco Ferreira

Introdução Diversos conflitos da política internacional contemporânea têm como

explicação a oposição de idéias decorrentes de diferentes concepções e crenças básicas. A emancipação feminina e o empoderamento1 das mulheres se inserem, assim, em um contexto mais amplo que envolve valores culturais arraigados às diversas sociedades que compõem o sistema internacional de Estados. Nesse sentido, a criação de mecanismos institucionais para a promoção da igualdade de gênero constitui um desafio, na medida em que envolve não somente a reorientação de políticas públicas, mas também a revisão de hábitos perpetrados pela cultura.

A subrepresentação feminina na política é, hoje, um problema que se manifesta em diferentes níveis nos mais diversos países. Deste modo, a Declaração do Milênio2, aprovada em setembro de 2000 pela Assembléia Geral das Nações Unidas reforça o compromisso dos Estados em relação aos princípios da liberdade, solidariedade e tolerância. Mais que isso, a partir da idéia de igualdade, é reafirmada a necessidade de conceder os mesmos direitos e oportunidades a homens e mulheres.

O presente artigo fornece informações sobre a evolução da emancipação feminina no mundo, com o objetivo de analisar a promoção da igualdade de gênero no Oriente Médio e no Norte da África. Nesse ponto, faz-se necessária a delimitação da região a qual dispensaremos especial atenção. Para fins analíticos, o Oriente Médio é definido como a região que inclui Arábia Saudita, Bahrein, Irã, Iraque, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbano, Líbia, Omã, Qatar, Síria, Turquia, Emirados Árabes Unidos e Iêmen. Já a África setentrional é definida como a região que compreende os territórios da Algéria, do Egito, do Líbano, do Marrocos e da Tunísia3. A princípio, a análise da conjuntura política e da situação atual das mulheres nos países supracitados teve como foco a dimensão cultural. Dessa forma, além de questões referentes à presença de mulheres na política, serão avaliados conceitos como multiculturalismo e relativismo cultural, a fim de suscitar a discussão sobre a influência dos valores culturais na marginalização política e econômica das mulheres.

1 Vide Glossário em anexo

2 A/RES/55/2. Disponível em: http://www.un.org/millennium/declaration/ares552e.pdf Visualizado em:

09/12/2008 3 Population Reference Bureau. Empowering Women, Developing Society: Female Education in the

Middle East and North Africa. Mais informações em: http://www.prb.org/pdf/EmpoweringWomeninMENA.pdf ; Visualizado em: 09/12/2008

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Por fim, propõe-se o debate acerca do potencial das políticas atuais, bem como dos empecilhos impostos ao avanço da mulher pelas normas e instituições formais. Em resumo, a discussão proposta representa o compromisso das Nações Unidas, aqui representadas pela Terceira Comissão da Assembléia Geral para assuntos Sociais, Culturais e Humanitários, com a promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais às quais todos os povos têm direito, independentemente de fatores como raça, sexo, língua ou religião4.

Mandato da Comissão

A comissão da Assembléia Geral para assuntos sociais, culturais e humanitários (SoCHum), também conhecida como Terceira Comissão é um dos principais órgãos da Organização das Nações Unidas (ONU), podendo ser comparado a um parlamento de nações. A Assembléia Geral das Nações Unidas (AGNU) é um comitê central para as discussões internacionais, sendo a partir dela que os países expõem suas políticas sobre os temas de maior relevância nos debates internacionais. A Assembléia possui representação dos 192 países-membros da ONU5, cada um com direito a um voto. Assim, as decisões tomadas na AGNU são um bom índice da opinião mundial, apesar dessas decisões não terem caráter mandatório. Muitas são as funções da Assembléia Geral. Entre elas recomendar ações para a paz e segurança internacionais, eleger os membros não permanentes do Conselho de Segurança, iniciar estudos a fim de apoiar a cooperação internacional, promover o desenvolvimento do sistema jurídico internacional, estabelecer a proteção dos direitos e liberdades fundamentais e favorecer a colaboração para temas econômicos, educacionais, de saúde, entre outros. A AGNU foi criada segundo os preceitos da Carta das Nações Unidas6 e tem por objetivo circunscrever todos os temas abordados nesse documento. Devido a essa diversidade de temas que deve tratar, a AGNU se divide durante suas sessões em seis comissões principais7. Todos os membros da AGNU estão representados em cada uma dessas comissões, que se propõem a discutir os temas a fim de apresentar propostas de resoluções ou outras questões a serem consideradas nas sessões plenárias da AGNU.

A Terceira Comissão é fundamental nas discussões das Nações Unidas pela importância das questões por ela tratadas. Assuntos sociais e humanitários são centrais nas discussões do SoCHum assim como temas sobre a interpretação e a implementação dos Direitos Humanos e das diversas convenções ligadas a eles. Nessa perspectiva, o SoCHum trabalha juntamente com o Conselho de Direitos Humanos, principalmente por meio de relatórios enviados a esse órgão.

4 Carta das Nações Unidas, artigo 13. Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/doc2.php Visualizado

em: 09/12/2008 5 A relação dos países-membros está disponível em: http://www.un.org/members/list.shtml, acessado

em 7 de dezembro de 2008. 6 A Carta das Nações Unidas está disponível em português no endereço: http://www.onu-

brasil.org.br/documentos_carta.php, acessado em 25 de novembro de 2008. 7 As seis comissões são: Primeiro Comitê (Desarmamento e Segurança Internacional); Segundo Comitê

(Econômico e Financeiro); Terceiro Comitê (Social, Cultural e Humanitário); Quarto Comitê (Políticas Especiais e Descolonização); Quinto Comitê (Administrativo e orçamentário) ; e Sexto Comitê (Jurídico)

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Os trabalhos da terceira comissão têm como foco a questão dos Direitos Humanos e dos direitos e liberdades fundamentais, produzindo resoluções sobre violações desses direitos em vários países e relatórios e resoluções ligados ao desenvolvimento dos jovens, à proteção e promoção dos direitos das crianças e à situação da mulher. Essas preocupações do SoCHum condizem com o plano mais geral estabelecido dentro das Nações Unidas, as Metas do Milênio. Ademais, as decisões do SoCHum impactam amplamente sobre outros órgãos do sistema das Nações Unidas, pois praticamente todo conflito nacional ou internacional possui um aspecto social e cultural a ser considerado, como a questão dos refugiados8, da prostituição9, dos civis em situação de conflito10 e mesmo do imperialismo cultural11, entre outros. Cada situação conflituosa no mundo possui conseqüências sociais que na maior parte das vezes vão além das fronteiras do país em litígio, pois a inter-relação entre os países é de tal forma importante que as proporções de um conflito acabam afetando o Meio Internacional. Nesse sentido, faz-se necessária a discussão sobre as repercussões de tais conflitos pela comunidade internacional como um todo dentro de fóruns como o SoCHum.

Gênero e Cultura: Relativizando Conceitos

Gênero: Genealogia do Processo de Emancipação Feminina na Modernidade

Por vezes, conceitos que em sua origem apresentam significados bastante distintos são utilizados sem discernimento, como perfeitos sinônimos, e não é raro que tal interpretação de similaridade seja conferida aos conceitos de ‘gênero’ e ‘mulheres’. Especialmente, porque é comum tratar em um debate sobre gênero do assunto mulheres.

Deve-se, portanto, compreender as diferenças inerentes às duas definições, uma vez que focar o tema do debate em gênero não representa uma escolha ou preferência aleatória. Ao utilizar o termo gênero pretende-se evidenciar a interconexão existente entre homens e mulheres. Ou melhor, pretende-se evidenciar a natureza de tal importante relação, que acaba por determinar muitas outras estruturas sociais, tal como as instituições políticas12. Essa noção poderia perder-se no debate caso se focasse exclusivamente no tema mulheres. Ademais, o termo ‘mulheres’ não deve ser utilizado como uma categoria homogênea a despeito das diferenças culturais, de etnia, de classe econômica, entre outras, existente entre os

8 Refugiados são pessoas que saem de seus países em busca de asilo em outras regiões. Normalmente

eles buscam asilo devido a crises humanitárias e sua inserção em outros países nem sempre é fácil, por isso a constante presença da ONU nas negociações sobre o tema. 9 A presença de exércitos gera um aumento do número de mulheres envolvidas com a prostituição, nem

sempre esse envolvimento é voluntário e a situação dessas mulheres tende a ser problemática. 10

Nenhum conflito deve atingir a população civil quando isso acontece, em geral, as Nações Unidas se manifestam e procuram a melhor maneira para evitar mais agressões e amenizar os danos. 11

A questão do imperialismo cultural é bastante lembrada por diversos atores internacionais como um conflito não armado, por ser uma questão de importância mundial ela também é discutida no âmbito da AGNU. 12

Por exemplo, o termo patriarcalismo foi cunhado, a partir de tal concepção, para descrever sistemas socais marcados pela dominação masculina (vide Glossário anexo). Gênero, nesse sentido, pode ser compreendido como uma maneira de significar relações de poder.

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diversos países e, também, no interior desses, entre os milhares de mulheres do mundo. O termo gênero, tal como raça, foi usado inicialmente por cientistas para descrever uma diferenciação social. Gênero era visto como uma construção social, ou seja, as diferenças de gênero eram compreendidas a partir da socialização diferenciada que meninos e meninas vivenciam. Segundo essa abordagem, diferenças entre homens e mulheres que antes eram vistas como biológicas, inerentes e universais, passaram a ser questionadas. As diferenças de gênero foram, assim, reconhecidas como histórica e culturalmente moldadas a contextos específicos, de modo que poderiam ser alteradas por meio de vontade política, por exemplo. Com o passar do tempo, essa noção foi se tornando mais complexa e o foco passou a ser não mais a maneira como as pessoas são socializadas, mas sim as formas como a masculinidade e a feminilidade são construídas no sujeito individual. Nessa mesma época, uma diferenciação entre os termos ‘gênero’ e ‘sexo’ começou a ser utilizada, no sentido de que o primeiro representaria as construções sociais, enquanto o segundo diria respeito a uma categoria biológica, apenas. Boa parte do interesse elaborado sobre as relações de gênero deve-se aos esforços do movimento feminista em trazer essa discussão para o seio da sociedade e, assim, para o topo das agendas internacionais. Feministas são conhecidos principalmente pela luta empreendida a partir dos anos 1970 em favor da emancipação da mulher, pois consideravam que as relações de gênero eram, ou são, essencialmente desiguais e de subordinação. É importante ressaltar, contudo, que tal movimento abrange uma multiplicidade de idéias e de diferentes atores. Por exemplo, a corrente do feminismo liberal, que foi alvo de duras críticas nos anos 1980, proclamava que a socialização de homens e mulheres em diferentes papéis sociais, reforçada pela discriminação e preconceito, eram os fatores responsáveis pela posição desigual da mulher na sociedade. Destarte, as soluções a essa desigualdade deveriam vir por meio de mudanças legais e institucionais, que dariam mais oportunidades às mulheres nos mesmos termos que aos homens.13

Algumas das críticas a esse modelo dizem respeito ao excesso de ênfase depositado na ‘mulher’ como categoria analítica unitária e não-histórica, tratando as mulheres como um grupo homogêneo:

“Isso em geral significava que a experiência de mulheres ocidentais, brancas e de classe-média eram generalizadas para mulheres negras, da classe-trabalhadora de países de Terceiro Mundo. (...) Isso teve o efeito de remover a capacidade de agência das mulheres de Terceiro Mundo, colocando-as como objetos, e não sujeitos, e como vítimas passivas de práticas barbáries e primitivas”14.

Foi nesse mesmo período, em meados dos anos 1980, que a diferenciação

entre ‘gênero’ e ‘sexo’ passou a ser amplamente questionada. O ressurgimento do debate sobre ‘igualdade versus diferença’ trouxe à tona uma importante questão: não são as diferenças o problema, mas a forma como se lida com elas. A linguagem, então,

13

WAYLEN, Georgina. 1996. Gender in Third World Politics. United States: Lynne Rienner Publishers, Inc, p. 7 14

Ibid., p. 8.

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também passou a ser foco de análise na medida em que foi reconhecida a diversidade existente entre as mulheres e inerente a cada indivíduo. Segundo essa abordagem mais recente, a política se torna o discurso por meio do qual as pessoas determinam quem são e quem deverão se tornar como seres sociais15. Desse modo, a inter-relação entre gênero e política tornou-se importante alvo de análise.

Atualmente, dados estatísticos e documentais mostram claramente que homens e mulheres participam de maneiras diferentes em todos os níveis da política formal, seja em países desenvolvidos ou países em desenvolvimento. Além disso, é possível verificar que as mulheres são atores marginalizados e sub-representados na burocracia estatal, principalmente quando se trata de altos escalões de poder. A tais fatos são atribuídas as mais diversas explicações causais, ao mesmo tempo em que as estruturas permanecem inalteradas. É comum, por exemplo, apontar a existência de mitos e estereótipos, tal como a noção de que mulheres são passivas e apolíticas, como uma das explicações para as desigualdades nos níveis de participação.

A separação entre público e privado, ponto chave na discussão sobre a relação entre gênero e política, acaba por legitimar e reforçar ainda mais a idéia de separação entre mulheres e participação. O domínio público seria aquele no qual o indivíduo é incorporado como cidadão ao mundo político, dizendo respeito às ações que afetam a vida dos demais cidadãos. O domínio privado, por sua vez, é visto como uma esfera doméstica alheia à interferência do Estado e das demais pessoas16. A esfera pública seria dominada por homens, ao passo que as mulheres estariam relegadas à privada. A partir desse ponto, torna-se possível compreender que a política é definida como masculina em um senso muito profundo e arraigado, excluindo grande parte das atividades nas quais as mulheres estão envolvidas como ‘não-políticas’17.

Tudo isso não significa, no entanto, que “as políticas elaboradas e implementadas pelo processo político não tenham um enorme impacto na vida dos diferentes grupos de mulheres, bem como nas relações de gênero em geral”18. Pelo contrário, as políticas públicas possuem um impacto diferenciado em homens e mulheres. A própria concepção de cidadania, que estabelece o vínculo entre o indivíduo e o Estado, incorporou historicamente homens e mulheres de maneiras diferentes.

O Estado, porém, não deve ser categorizado como essencialmente “mau” em função disso. Suas práticas refletem, em grande parte, as relações já cristalizadas no ideário da própria sociedade em que atua. A complexidade da questão, contudo, advém do fato de que o Estado também é, potencialmente, o principal definidor dessas relações por meio de suas decisões. Isso porque as leis e práticas políticas que emanam do Estado legitimam divisões e identidades de gênero, sendo possível que a negociação política contra a discriminação e a igualdade, no âmbito estatal, acabem por direcionar o processo de mudança entre os cidadãos.

É importante ressaltar ainda que a participação feminina na política não deve se restringir à mulheres integrando o processo formal de decisão na arena

15

WAYLEN, Georgina. Op. Cit, p. 9. 16

LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Abril Cultural, 1978. 17

A distinção entre público e privado tem sido fortemente debatida e polemizada atualmente na medida em que questões antes fortemente relegadas ao domínio privado, como aborto e estupro, começaram a ser tratadas pelas autoridades governamentais. 18

WAYLEN, Georgina. Op. Cit, p. 12.

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convencional. Participação política deve ser entendida em uma definição mais ampla, onde o empoderamento das mulheres seja caracterizado por um engajamento crescente de atoras em partidos políticos, grupos da sociedade civil organizada, atividades políticas autônomas, funcionalismo público, corporações militares, entre outras áreas19.

Em conclusão, cumpre esclarecer que empoderamento feminino20 diz respeito não apenas a um maior envolvimento de representantes mulheres em cargos públicos, mas também ao próprio debate sobre o tema, travado tanto na esfera individual quanto na esfera política, de modo que soluções e medidas em favor da eqüidade21 sejam alcançadas. Além disso, significa a possibilidade de mulheres e meninas compreenderem seus direitos e deveres, bem como verem suas demandas sendo representadas e defendidas, qualquer que seja o sexo (ou gênero) do gestor público. Significa, por fim, rever as relações de poder que determinam e hierarquizam vínculos sociais, permitindo voz e ação ativas a grupos que historicamente encontram-se marginalizados.

Multiculturalismo e Relativismo Cultural: em Busca da Universalidade de Direitos

“A cultura é como uma lente através da qual o homem vê o mundo. Homens de culturas diferentes usam lentes diversas e, portanto, têm visões desencontradas das coisas”.22

Vivemos em um mundo plural. Um mundo moderno que, em sua pluralidade,

abriga 192 países cujas independências são formalmente reconhecidas pela comunidade internacional. Se tomarmos de início apenas esse número de Estados, já poderíamos começar a considerar a enorme diversidade de costumes, modos, crenças e hábitos que constituem àquilo que convencionamos chamar de humanidade. Sabemos, no entanto, que as diferenças vão além dos limites geográfico e institucional dos Estados. Há de se considerar também a diversidade de povos e costumes que existem dentro do próprio núcleo estatal, ou para além dele.

Neste ponto podemos, então, questionar: o que nos define enquanto humanos? Diferenças ou semelhanças? Para além das questões biológicas, iremos tratar aqui da noção de cultura. Não caberia conceituar definitivamente o termo já que, considerando a dinamicidade da língua e da significação, sem dúvidas o conceito de cultura poderia abarcar diversas definições e entendimentos.23 Nesse sentido, consideraremos cultura como um todo complexo de práticas sociais adquiridas que caracteriza e define uma dada comunidade de indivíduos.

19

Tais arenas de atuação política têm sido historicamente dominadas por homens e por visões masculinizadas sobre a dinâmica da sociedade. No entanto, são constantemente vistas como arenas neutras, abertas a ampla participação tanto de homens quanto de mulheres. 20

Apesar de não haver definição fixa, imutável e consensual sobre o tema. 21

Para maiores esclarecimentos sobre o termo, vide Glossário anexo. 22

BENEDICT, Ruth. 1972. O Crisântemo e a Espada. S. Paulo: Perspectiva. 23

“Parece que ainda não atingimos uma definição concisa, inequívoca, inclusiva e exclusiva de cultura.” KROEBER, Alfred. 1917. A natureza da Cultura. Lisboa. p.40.

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Cultura, no entanto, não é um sistema fechado, uma série de rígidos moldes aos quais se deva conformar a conduta de todos os seus membros.24 O comportamento de cada indivíduo, embora submetidos ao mesmo hábito e aprendizagem, varia em relação ao dos demais. Assemelha-se, contudo, em variado número de interpretações e visões de mundo, aos quais um povo pode ser tão fortemente convicto que esteja disposto a lutar e morrer por eles.

Além disso, “qualquer sistema cultural está num contínuo processo de modificação”,25 sendo que a mudança pode ocorrer tanto por processos internos à comunidade quanto por fatores exógenos, resultantes, por exemplo, do contato entre dois sistemas culturais distintos. Isso porque o mecanismo básico de intercâmbio cultural é inevitável, e recíproco, em todo contato entre povos.26 Tal fato pode ser especialmente verificado nos dias atuais, a partir dos processos de globalização e interdependência.27

Ainda com relação às mudanças, é significativo ressaltar o tempo como elemento importante na análise da cultura, já que modificações podem ocorrer de modo lento e gradual, ou rapidamente, partindo de um choque brusco. Isso, no entanto, não significa que exista um sentido único de evolução ou progresso cultural, no qual se insiram comunidades desenvolvidas e/ou primitivas.

Assim, temos que o ser humano, onde quer que esteja, estabelece para si e para sua comunidade metas e ideais específicos, que balizam seu comportamento. O fato de estarem submetidos à mudança, ou diferirem de povo para povo, não torna tais códigos de conduta menos efetivos numa dada sociedade durante o período em que prevaleçam.28 Isso porque as práticas sociais, seus valores e avaliações, são relativas ao contexto cultural em que surgem. Ou seja, o ser humano enxerga e julga a realidade a partir do ponto de vista de seus valores culturais, sua experiência sobre o que pode ser considerado normal ou anormal diz respeito ao seu marco cultural de referência.

“O fato de o homem ver o mundo através de sua cultura tem como conseqüência a propensão em considerar o seu modo de vida como o mais correto e o mais natural.” Tal tendência é denominada etnocentrismo.29 O etnocentrismo é o mecanismo primário de avaliação da cultura, segundo o qual o seu próprio modo de vida parecerá sempre preferível ao do outro. É um mecanismo universal, e que caracteriza a vitalidade de uma cultura por operar em favor do ajustamento individual

24

HERSKOVITZ, Melville. 1963. O Problema do Relativismo Cultural. Em: Antropologia Cultural. S. Paulo: Mestre Jou, p.86. 25

LARAIA, Roque de Barros. 1986. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro:Jorge Zahar, p.100. 26

HERSKOVITZ. Op.Cit, p.95. 27

Globalização está aqui entendida como um processo de encurtamento das dimensões espaço-temporais, que possibilita a intensificação das conexões globais em velocidade e intensidade nunca antes verificadas na História, com conseqüente ruptura na coincidência existente entre Estado, território e processos econômicos, sociais e culturais. (HELD, David. MCGREW, Anthony. GOLDBLATT, David. PERRATON, Jonathan. Global Transformations: Politics, Economics and Culture. Stanford University Press, Califórnia: 1999.) A noção de interdependência, por sua vez, diz respeito à capacidade de interferência mútua que os países detêm, por meio de suas ações, nas realidades e decisões de terceiros países. (KEOHANE, Robert O. NYE, Joseph S. Power and Interdependence: World Politics in Transition. 1977) 28

HERSKOVITZ, Op. Cit., p.100. 29

LARAIA, Op. Cit, p.75.

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e da integração social30. Em seus casos extremos, no entanto, pode ser responsável pela ocorrência de diversos conflitos sociais.31

Neste ponto, torna-se sobremaneira importante considerar que “todo sistema cultural tem sua própria lógica e não passa de um ato primário de etnocentrismo tentar transferir a lógica de um sistema para outro”.32 Por fim, antes de terminar o exame do relativismo cultural, certas questões devem ainda ser consideradas. Pode ser verdade que todos os seres humanos vivem de acordo com os modos de vida que aprenderam e que consideram como melhores. Tais modos foram, sem dúvidas, efetivos em termos de valor de sobrevivência, já que os povos continuam existindo. “Mas não quererá isso dizer que todos os sistemas de valores morais, todos os conceitos de certo e errado, estão fundados em areias tão movediças, que não há necessidade de moralidade, de conduta própria, ou de códigos éticos? Será que uma filosofia relativista implica em sua negação?”33 Para responder a tais perguntas, é essencial traçarmos uma distinção entre valores absolutos e valores universais. Os primeiros estão fixos, não se admitindo variações, seja de cultura para cultura ou de época para época. Por outro lado, os universais são aqueles mínimos denominadores comuns, retirados indutivamente da compreensão sobre as variadas manifestações do mundo cultural. Ou seja, dizer que não há nenhum critério absoluto de valor ou de moral não significa que tais critérios deixem de conter os universais da cultura humana em suas diferentes formas.

É possível reconhecer, em toda parte, “certos valores da vida humana, embora não haja duas culturas cujas instituições sejam idênticas na forma. A moralidade é universal, assim também como o prazer estético e algum critério da verdade”.34 O próprio núcleo do relativismo cultural é o respeito mútuo à diferença. Tal ênfase procura compreender e harmonizar os diversos fins em concepções universais.

Histórico da Questão nas Nações Unidas

Pode-se dizer que o marco das ações das Nações Unidas em vista do progresso das mulheres seja a assinatura de sua própria Carta fundadora, em cujo preâmbulo está explícito que todos os países membros crêem nos “direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana, nos direitos iguais dos homens e das mulheres (...)”35. Embora de modo algum as manifestações em prol da igualdade de gênero e dos direitos das mulheres no Oriente Médio e no Norte da África tenham ocorrido somente a partir de um contato dessas sociedades com o Ocidente, hoje, assim como na época neocolonial, é esse contato um dos grandes catalisadores desses debates e o responsável pela sua repercussão global.

Antes do advento do Islã, que hoje é a ordem prevalecente nas áreas citadas acima, elas contavam com uma incrível diversidade de organizações sociais independentes36, e, portanto, de normas sociais, leis e costumes que versavam sobre 30

HERSKOVITZ, Op. Cit., p.91. 31

LARAIA, Op. Cit., p.75 32

Ibid., p.90. 33

HERSKOVITZ, Op. Cit., p.99. 34

Ibid., p.100. 35

Disponível em: http://www.un.org/Conferences/Women/PubInfo/Status/Scrn2.htm Visualizado em: 05/10/2008 36

Coincidentes com cada etnia.

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os direitos e o status das mulheres. Em certas regiões, há fortes indicações de que mulheres ocupassem altas posições sociais e tivessem amplos direitos. Contudo, fora dos núcleos de organizações tais como as tribos árabes, não havia ordem ou lei senão a do mais forte, e uma das naturais conseqüências disso é a predominância da opressão feminina.37

Geralmente, as mulheres contavam com um status social hierarquicaente inferior ao dos homens, tanto que, em boa parte da região, eram consideradas um fardo digno de infanticídio38 ou de ser privado do que entedemos hoje por seus direitos básicos. Entretanto, ao contrário do que consta no Corão, a prática do infanticídio de meninas, proibida pelo Islã, já estava praticamente extinta na época de em que essa religião se estabeleceu. Esse fato, no entanto, não diminui em nada o mérito dessa ordem social haver contribuído para a unificação de um espaço social fragmentado, para a predominância do indivíduo equilibrado pelos conceitos de comunidade e de família, bem como o mérito de ter instituído um sistema em que todos deveriam ser entendidos como iguais espiritual e moralmente. Os laços de coesão a partir de então seriam, no Oriente Médio e no Norte da África, os princípios religiosos - e foram estes que definiram os direitos das mulheres.39

Os islâmicos acreditam que as faculdades mentais e físicas e o temperamento de cada sexo são diferentes e complementares, e que não se pode conceber igualdade pura e simples, posto que esta minaria a capacidade das mulheres de desenvolver sua natureza livremente.40 São precisamente essas concepções diferentes acerca do conceito de igualdade as origens dos choque das duas grandes esferas culturais do Ocidente e do Oriente em torno das questões de gênero. Se antes o neocolonialismo originou duas correntes rivais de feminismo no Oriente Médio e no Norte da África - uma identificada com o pensamento europeu e que concebia o véu como um símbolo de dominação a ser abolido, outra que se baseava numa interpretação diferente e mais favorável aos direitos políticos e sociais das mulheres no Corão e que via na outra corrente feminista um instrumento de aculturação ocidental ser combatido41- hoje, na formulação de políticas e ações da ONU, persiste a dificuldade de conciliar a universalidade dos direitos da mulher com a necessidade da garantia de persistência e fortalecimento de elementos culturais.

O Congresso Internacional das Mulheres (ICW) foi a primeira organização internacional feminina. Ele foi fundado durante a Segunda Conferência Internacional da Associação Nacional do Sufrágio das Mulheres (NWSA), cujo objetivo era discutir a criação de um Conselho Nacional da Mulher em cada país nele representado. O ICW foi, por muito tempo, tido por grupos feministas como a mais conservadora organização internacional de mulheres, pois evitou tratar de questões mais substantivas e polêmicas. Por manter essa posição inicial, incitou a formação de organizações mais radicais, como a Aliança Internacional das Mulheres (IWA) em 1902, que lutou pelo direito ao sufrágio e à cidadania legal das mulheres. A partir de 1899, o ICW começou a abdicar do silêncio acerca de problemas mais substantivos e

37

Disponível em: http://www.mwlusa.org/topics/history/herstory.html Visualizado em: 16/10/2008 38

Assassinato de crianças, especialmente de recém nascidos. 39

Disponível em: http://www.mwlusa.org/topics/history/herstory.html); http://www.mwlusa.org/topics/equality/gender.html Visualizado em: 05/10/2008 40

MAZHERIDDIN SIDDIQI, Muhammad. Women in Islam. The Mahmud Printing Press. pp. 15-20. 41

AHMED, Leila. Women and Gender in Islam. Yale University Press. pp 169 -188

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até hoje cumpre seu objetivo inicial de unificar, de permitir que seja conjunta a ação das organizações internacionais em favor dos direitos humanos das mulheres e da igualdade de gênero. Ao decorrer da década de 1920, tanto o ICW quanto a IWA contribuíram e estabeleceram conexões com a Liga das Nações.42 Hoje, o ICW tem status consultivo43 perante o Conselho Econômico e Social (ECOSOC)44, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização das NU para Agricultura e Alimentação (FAO), a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Programa das NU para o Desenvolvimento (PNUD), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD), entre outros corpos da Organização das Nações Unidas (ONU).

Depois da Segunda Guerra Mundial, a presença das mulheres nas organizações intergovernamentais ainda era mínima. Poucas foram inclusas no planejamento da formação da ONU, em 1945. No mesmo ano foi estabelecida pela Carta das Nações Unidas, a Assembléia Geral (AGNU) e é em sua Terceira Comissão, a Comissão Social Cultural e Humanitária (SOCHUM), que são discutidas questões relativas ao avanço das mulheres. Ainda em 1945, as aspirações de reconstruir os sistemas educacionais dos países diretamente envolvidos na Segunda Guerra e de construção de um órgão internacional comprometido com a promoção de solidariedade moral e intelectual da humanidade inspiraram a fundação da UNESCO, agência especializada que auxilia governos a construir e desenvolver suas capacidades institucionais e humanas.45 Um de seus cinco setores especializados, o de Ciências Humanas Culturais, trabalha com o campo de Direitos Humanos, dentro do qual se trata de questões como a Igualdade de Gênero e da formulação de políticas por meio de informações sobre, por exemplo, como as estruturas sociais são construídas com base em questões de gênero e como isso afeta a capacidade de obter-se igualdade de oportunidades universal.46

A Comissão sobre o Status da Mulher (CSW), que é da competência do ECOSOC, foi fundada em 1946. A CSW se dedica exclusivamente a questões acerca da igualdade de gênero e do progresso social das mulheres. Seu objetivo é reportar e preparar recomendações sobre a promoção dos direitos políticos, econômicos, civis, sociais e educacionais para o ECOSOC47 e ela se reúne anualmente para monitorar a situação das mulheres, promover seus direitos em todo o mundo e preparar recomendações e reportagens para a ONU em qualquer ponto crucial que concirna questões de gênero.

42

International Council of Women Records, Sophia Smith Collection, Smith College, Northampton, Mass. Disponível em: http://asteria.fivecolleges.edu/findaids/sophiasmith/mnsss96.html#list-ser3 Visualizado em: 16/10/2008 43

Quando uma organização, governaental ou nãogovernaental, tem status consultivo perante algum braço da ONU, isso significa que há um acordo para que ela preste consulta, troque informações com o braço da ONU e questão acerca de quaisquer assuntos que concirnam ao que for da sua competência. Há três categorias de status consultivo na ONU, numa das quais as organizações devem se classificar. 44

Principal órgão da ONU para coordenar o trabalho econômico e social da organização. 45

Disponível em: http://portal.unesco.org/en/ev.php-URL_ID=3328&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html Visualizado em: 30/11/2008 46

Disponível em: http://portal.unesco.org/shs/en/ev.php-URL_ID=8277&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html Visualizado em: 30/11/2008 47

Disponível em: http://www.un.org/womenwatch/daw/csw/index.html Visualizado em: 16/10/2008

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Caso a Comissão constate algum problema urgente acerca da violação de direitos das mulheres, ela pode convocar apoio internacional imediato.48

O Fundo de Desenvolvimento para a Mulher (UNIFEM) fornece apoio financeiro e assistência técnica para soluções acerca do empoderamento das mulheres e das questões de gênero. O UNIFEM funciona como porta voz das questões e dos direitos das mulheres dentro do sistema da ONU. Suas atividades são pautadas por quatro metas: reduzir a exclusão e a pobreza de mulheres, acabar com a violência contra a mulher, reverter a proliferação de HIV/AIDS e apoiar a liderança de mulheres no governo e em reconstruções pós-conflitos.49 O UNIFEM trabalha em conjunto com os países na criação de leis e medidas que eliminem toda discriminação baseada em gênero e que promovam os direitos das mulheres.50 Em 1946 foi criado o que hoje é a Divisão para o Progresso da Mulher (DAW), parte do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais (DESA), que atuou como secretariado para as quatro conferências mundiais sobre a mulher da ONU e que fornece serviços ao CSW e ao Comitê para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra Mulheres (CEDAW).

Nas décadas de 1950 e 1960, os acontecimentos internacionais mais relevantes para o debate acerca das questões de gênero foram a promulgação da Convenção para Igual Remuneração (1958), a Convenção (nº 111) da OIT contra a Discriminação no Emprego e na Ocupação (1958), a Convenção (n°100) sobre Igualdade de Remuneração - em que os países membros concordaram com o direito e a necessidade emergente de que as mulheres pudessem votar e ser elegíveis a quaisquer cargos públicos em igualdade de oportunidades com homens -51 a Convenção sobre a Nacionalidade das Mulheres Casadas (1957), a Convenção contra a Discriminação na Educação (1960) e a Convenção sobre o Consentimento no Casamento, Idade mínima para o Casamento e Registro de Casamentos (1962).

A partir dos anos 1970, notar-se-á uma mudança considerável no modo de se lidar com as questões de gênero. Se antes as mulheres eram vistas como destinatárias passivas de apoio e assistência, agora são declaradas, mais freqüentemente, completas e totais parceiras dos homens nas na formulação e aplicação de políticas sociais, com direitos, recursos e oportunidades iguais. Uma das repercussões dessa transformação pode ser observada com relação à idéia de desenvolvimento: o discurso de que o desenvolvimento serviria à integração das mulheres é alterado por uma concepção de desenvolvimento como atributo indissociável da participação total das mulheres.

Em 1972, a AGNU proclamou, em sua resolução 3010 (XXVII) de 1975, o Ano Internacional da Mulher.52 Nesse ano, houve a inauguração da Década das Mulheres das Nações Unidas (1975-85) com a Primeira Conferência das Mulheres das Nações Unidas, na Cidade do México. Nessa conferência os governos concordaram em engajar-se numa política global para acabar com a discriminação contra a mulher53 e 48 Disponível em: . Visualizado em: 05/10/2008 49

Disponível em: http://www.unifem.org/about/brochure.php Visualizado em: 23/11/2008 50

Idem 51

Disponível em: http://www.unhchr.ch/html/menu3/b/22.htm Visualizado em: 29/10/2008 52

Disponível em: http://www.un.org/womenwatch/daw/beijing/otherconferences/Nairobi/Nairobi%20Chapter%201.pdf Visualizado em: 23/11/2008 53

TICKNER, J. Ann. Gendering World Politics. Columbia University Press. p. 111

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foram convidados a formular estratégias nacionais para identificar prioridades em seus esforços de garantir a integração feminina. Foram identificados três objetivos-chaves, que se tornariam a base das ações da ONU em benefício das mulheres: total igualdade de gênero e eliminação de qualquer discriminação de gênero, integração e participação total das mulheres no desenvolvimento, crescente contribuição das mulheres no processo fortalecimento da paz mundial.54A participação das mulheres na Conferência foi ativa e decisiva na formulação das questões (das 133 delegações presentes, 113 foram chefiadas por mulheres).55 Nela se recomendou a criação do que, em 1976, seria originado pelo ECOSOC - o Instituto Internacional de Treinamento e Pesquisa para o Avanço das Mulheres (INSTRAW).56

Foi na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979 que foi instituído o Comitê para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), comitê composto por 23 especialistas eleitos por cada um dos países que ratificaram a convenção. O Comitê trata especificamente da supervisão dos progressos feitos em favor das mulheres em cada um dos seus Estados-membros, monitorando as medidas nacionais vertidas para isso e fazendo recomendações específicas ou gerais acerca do tema.57 Hoje, o CEDAW é um dos comitês de especialistas independentes que monitoram a implementação dos tratados de Direitos Humanos mais centrais e está, portanto, ligado ao Escritório do Alto Comissionado para Direitos Humanos (OHCHR), que, por sua vez, fornece assistência aos governos para implementar medidas em acordo com o perpetuamento da vigência dos Direitos Humanos em seus territórios.58

Foi em 1980 que ocorreu a Segunda Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Copenhagen59, que adotou, entre outras resoluções, o Programa de Ação para a Segunda metade da Década da Mulher das Nações Unidas.60 Nesse programa foram identificadas três medidas para a igualdade, o desenvolvimento e a paz: igual acesso à educação, igual acesso às oportunidades de emprego, igual acesso aos serviços da saúde.61 Em 1985, a Terceira Conferência das Mulheres, em Nairóbi, tratou de questões sobre a participação das mulheres no mercado informal e da formulação das Estratégias de Perspectiva para o Progresso das Mulheres62, documento que expressa a visão das mulheres sobre negócios mundiais, guerra, paz, família e crianças, e no qual igualdade, desenvolvimento e paz foram declarados inter-relacionados e mutuamente reforçantes.63 As três categorias básicas tratadas foram: medidas constitucionais e legais, igualdade e participação social e igualdade, participação

54

Disponível em: http://www.un.org/womenwatch/daw/beijing/otherconferences/Mexico/Mexico%20conference%20report%20optimized.pdf Visualizado em 23/11/2008 55

Disponível em: http://www.choike.org/nuevo_eng/informes/1453.html Visualizado em: 05/10/2008 56

Corpo autônomo que se ocupa de pesquisa e atividades de treinamento para o progresso das mulheres. 57

Disponível em: http://www.un.org/Conferences/Women/PubInfo/Status/Scrn4.htm ; Visualizado em: 05/10/2008 58

Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/AboutUs/Pages/WhatWeDo.aspx 59

TICKNER, J.Ann. Gendering World Politics. Columbia University Press. p. 114 60

Disponível em: http://www.choike.org/nuevo_eng/informes/3986.html ; Visualizado em: 07/10/2008 61

Disponível em: http://www.un.org/esa/devaagenda/gender.html ; Visualizado em: 05/10/2008 62

The Forward Looking Strategies on The Advancement of Women 63

TICKNER, J.Ann. Gendering World Politics. Columbia University Press. pp. 116-118

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política e tomada de decisões.64 No mesmo ano, em resposta à resolução 1985/46 do ECOSOC e à necessidade de garantir maior coerência e eficiência das políticas e programas voltados para questões de gênero e desenvolvimento dentro do sistema da ONU, foi preparado o Plano Sistemático de Médio Prazo para o Avanço das Mulheres (SWMTP). O SWMTP é um planejamento estratégico que auxilia todas as entidades do sistema ONU no monitoramento e na implementação a Plataforma de Beijing e Beijing+5, que serão tratadas em seguida.65

O fim da guerra fria e, conseqüentemente, a menor preocupação com os temas tradicionais de segurança permitiram que mais importância fosse dada a agendas feministas. Em 1995, ocorre a Quarta Conferência das Mulheres das Nações Unidas, em Pequim, cujo foco foram os Direitos Humanos aplicados às mulheres, sua definição e as tensões entre noções de universalismo e respeito por diferenças culturais.66 A sua Plataforma de Ação, uma agenda para o empoderamento das mulheres, almeja acelerar a implementação das Estratégias de Perspectiva para o Progresso das Mulheres, considerando também a CEDAW bem como todas as outras resoluções relevantes adotadas pelo ECOSOC e pela AGNU. O seu objetivo é remover todos os obstáculos para a participação da mulher nas esferas pública e privada, por meio de uma parcela igual econômica, social, cultural e de tomada de decisões políticas e por meio da promoção do princípio de poder e responsabilidade compartilhados. Ela foi formulada de modo a estabelecer um grupo de ações prioritárias que devem ser tomadas durante cinco anos. A quarta Conferência tratou de doze áreas críticas, entre elas “Mulheres no poder e na tomada de decisões”, “Mecanismos institucionais para o progresso das mulheres” e “Direitos humanos para as mulheres”67 e o monitoramento de sua implementação foi feito pelo Escritório do Conselheiro Especial do Secretário Geral sobre Questões de Gênero e Avanço das Mulheres (OSAGI).68 O ano 2000 assistiu a Vigésima Terceira Reunião Especial da Assembléia Geral, que deu origem ao documento conhecido como Beijing + 5, programa de ações e iniciativas adicionais para a implementação da Plataforma de Ação da Declaração de Beijing.69

A participação das mulheres até 1990, na ONU e em outras organizações internacionais formais, era proporcionalmente mínima. A partir dos anos 1990, esse quadro mudou ligeiramente: uma percentagem de 38,6 mulheres profissionais já está presente na ONU, apesar de que, em geral, estas se concentram em cargos hierarquicamente mais baixos. A maior concentração de mulheres é na CSW e elas continuam participando fracamente da Assembléia Geral e do Conselho de Segurança. Basicamente, mulheres ainda tendem a não ocupar postos diplomáticos em esferas das Nações Unidas que não sejam especialmente direcionadas para questões que não concirnam diretamente gênero ou que não sejam condizentes com o papel social tradicionalmente atribuído a elas.70 Hoje a presença de mulheres nos governos é maior que nunca - a proporção de mulheres nas assembléias nacionais aumentou em 8% desde 1998, no entanto, mesmo assim estima-se que países em desenvolvimento só 64

Disponível em: http://www.un.org/esa/devaagenda/gender.html Visualizado em: 07/10/2008 65

Disponível em: http://www.un.org/womenwatch/ianwge/swmtp.htm Visualizado em: 29/10/2008 66

TICKNER, J.Ann. Gendering World Politics. Columbia University Press. p. 118 67

Disponível em: http://www.un.org/esa/devaagenda/gender.html ; Visualizado em: 05/10/2008 68 “IV Conferência Mundial sobre a Mulher”, Editora Fiocruz, pp. 12-13 69

Disponível em: http://www.un.org/womenwatch/daw/followup/beijing+5.htm Visualizado em: 05/12/2008 70

TICKNER, J.Ann. Gendering World Politics. Columbia University Press. pp. 119-120

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alcançarão a paridade (situação em que nenhum dos sexos ocupa mais que 60% dos cargos) em 2045.71

Perspectiva de Gênero no Norte da África

“As culturas não são pedras no caminho da universalidade dos direitos humanos, mas sim elementos essenciais ao alcance desta última. A diversidade cultural há de ser vista, em perspectiva adequada, como um elemento constitutivo da própria universalidade dos direitos humanos, e não como um obstáculo a esta.”72

Nos países que integram o Norte da África73, a condição da mulher, em seus vários contextos, ainda está ligada à idéia de discriminação e desigualdade. Por serem os países da África Branca pertencentes ao mundo muçulmano, é impossível que o conflito sobre normas culturais e símbolos esteja separado da luta empreendida pelas mulheres por poder e autoridade dentro de sua casa e comunidade. Essas mulheres, por estarem inseridas em uma cultura patriarcal, são freqüentemente caracterizadas por estereótipos. Assim, são reconhecidas pelo seu simbólico papel de mães e guardiãs da honra da família. Além disso, em muitos desses países, os privilégios dos homens sobre as mulheres são codificados e institucionalizados.

Embora todos os países do Norte da África tenham ratificado a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), uma série de obstáculos impede as mulheres de usufruírem de plenos direitos legais, sociais, políticos e civis nessa região. Essa realidade é observada quando se analisa as próprias reservas feitas à CEDAW por parte de países como a Argélia, Egito e Líbia74.

Um dos debates mais polêmicos sobre os obstáculos à promoção dos direitos das mulheres gira em torno da integração delas na vida pública. Embora as constituições de alguns países incluam artigos que declarem que não deve existir discriminação entre cidadãos de sexos diferentes (Argélia, Líbia, Tunísia) ou que declarem apenas que todos os cidadãos são iguais perante a lei (Egito e Marrocos), é perceptível que às mulheres não é dado o mesmo status no que se refere às leis de cidadania.

Grande parte dessa diferença entre o status do homem e da mulher no que concerne os direitos de cidadania se deve à presença marcante do patriarcalismo nos valores que permeiam a esfera doméstica. As mulheres são vistas como zeladoras do lar, do marido e dos filhos e são comparadas a crianças que necessitam de cuidado e controle. É sobre essa base que os Estados justificam leis que requerem da mulher a permissão do seu responsável para casar, viajar e abrir negócios. Além disso, as mulheres muitas vezes não usufruem dos mesmos direitos de nacionalidade. Com

71

Disponível em: http://www.unifem.org/progress/20008/politics.html Visualizado em: 04/12/2008 72

CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. 1a ed.

Porto Alegre: Fabris, 2003. pp. 336-337. 73

A África Branca, África Setentrional ou Norte da África compreende Egito, Sudão, Líbia, Marrocos, Argélia, Tunísia, Mauritânia e Saara Ocidental. 74

WORLD BANK, The International Bank for Reconstruction and Development. Gender Overview: Middle East and North Africa. Disponível em: http://siteresources.worldbank.org/INTMENA/Resources/MENA_Gender_Overview_2007.pdf

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exceção da Tunísia e Egito, uma mulher que casa com um estrangeiro não pode transmitir seus direitos de cidadania e nacionalidade a seus filhos.

Um outro aspecto que coloca a mulher em uma situação de inferioridade perante o sistema legal se refere ao seu status nas leis que envolvem o relacionamento familiar. Em muitos países da região, por exemplo, é permitido ao homem divorciar-se a qualquer momento, sem a necessidade de ir ao tribunal de justiça e alegar uma razão determinada. Entretanto, são exigidas condições específicas para a mulher que pretende dar início ao divórcio. Situações semelhantes também são encontradas em leis nacionais que tratam de matérias relacionadas ao casamento, direito a herança, custódia dos filhos e acesso à justiça.

É relevante salientar que a religião é uma importante, senão a principal instituição, que influencia todo o aparato legal dos países do Norte da África. Apesar da diversidade entre os sistemas legais dos países, as leis estão baseadas nos preceitos do Alcorão, a grande fonte da jurisprudência islâmica. Para o Islã, a diferença entre os direitos do homem e da mulher é justificada porque a natureza os criou diferentemente.75

“O islamismo não acredita em uma só espécie de direito, uma só espécie de dever e uma só espécie de penalidade tanto para o homem como para a mulher, em cada circunstância. Considera que uma série de direitos, deveres e penas são mais apropriados para os homens e uma outra série mais apropriada para as mulheres. Por conseguinte, em algumas circunstâncias o Islamismo toma uma posição idêntica em relação tanto às mulheres como aos homens, e noutras circunstâncias assume posições diferentes.”76

Alguns países têm buscado equiparar o status legal das mulheres ao dos

homens, embora sejam acusados de contrariar os preceitos da Sharia. A reforma que o Marrocos empreendeu em 2004 exerceu um grande impacto regional nesse sentido.

Chamada de Mudawana, a reforma da lei marroquina foi formalmente introduzida pelo rei Muhammad VI em outubro de 2003 e permite, dentre outras coisas, o direito da mulher de casar sem o consentimento prévio de um tutor ou uma figura de autoridade, o aumento da idade mínima para o casamento de quinze para dezoito anos, o direito ao divórcio e garantia de direitos sobre propriedade adquirida durante o casamento, o direito de consentir ou não uma segunda esposa para o marido e a permissão dada aos netos de conseguir a herança do avô materno. É interessante observar que as opiniões sobre o aumento da liberdade da mulher são diferentes entre aqueles que vivem na parte rural e aqueles que vivem nas cidades. Os moradores da zona rural criticam algumas das reformas valendo-se do argumento de que elas resultam de uma errônea interpretação do Islã. Outro ponto que merece destaque é que essa reforma da lei marroquina sobre a família foi fruto de um longo processo, impulsionado não apenas pelo rei, mas por um movimento de mulheres muito vigoroso.

75

MUTAHHARI, Murtadã. Os Direitos das Mulheres no Islão. Lisboa: Islâmica Alqalam, 1998. p.107. 76

MOGHADAM, Valentine M., Women`s Rights in the Middle East and North Africa – Freedom House Report. Disponível em: http://www.freedomhouse.org/template.cfm?page=384&Key=24&parent=2&report=56.

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Além da tentativa de conciliação do Islã com mecanismos que promovam o empoderamento das mulheres, tem havido um progresso para elas no que tange o acesso à educação. Nas últimas duas décadas, o investimento feito na educação feminina apresentou resultados bastante satisfatórios. Conforme relatório do Banco Mundial para a região, entre os anos de 1990 e 2004, o nível de alfabetização aumentou (principalmente entre a população feminina jovem), assim como diminuiu a disparidade de alfabetização existente entre jovens do sexo feminino e masculino. Na Tunísia, por exemplo, mais de 50% dos estudantes universitários são mulheres.77

Uma outra tendência de destaque revela que tem aumentado o número de mulheres optando por disciplinas não consideradas tradicionalmente como femininas. Muitas, portanto, já optam por cursar disciplinas do campo das ciências exatas ou engenharia. Apesar desses avanços, ainda é considerável a disparidade entre o nível de alfabetização feminina no meio urbano e na zona rural.

A educação é considerada a principal área para a garantia da emancipação feminina no Norte da África. Primeiro porque o vínculo entre o progresso nessa arena juntamente com maiores garantias de integração da mulher ao mercado de trabalho pode proporcionar melhores condições de vida para ela e sua família. Segundo, e mais importante, porque o acesso à educação permite que as mulheres conheçam melhor seus direitos civis e políticos e tornem-se capazes de exigi-los.

Ao contrário da visível situação de melhora no que envolve aspectos educacionais, é grande o desafio que as mulheres da região ainda têm de enfrentar para alcançar maior participação política. Nesse quesito, são marcantes as diferenças entre os países sobre a discussão de permitir que as mulheres tenham mais direitos políticos. Muitas vezes, o próprio tipo de regime político existente atua como um empecilho para essa maior participação feminina em todos os aspectos da vida pública.

Devido à natureza autoritária do regime ditatorial da Líbia, tanto homens como mulheres não possuem direitos políticos e cívicos fora aqueles sancionados pelo Estado. Qualquer um que tente se engajar na vida pública e cívica pode ser detido e até mesmo sofrer tortura. Também não há no país o direito a liberdade de expressão, assim como só são admitidas associações de mulheres com o consentimento prévio do Estado.

Em uma situação bem diferente se encontra o Marrocos. Desde a sua independência, em 1956, as sucessivas constituições trouxeram consigo cada vez mais direitos políticos direcionados às mulheres. Em fevereiro de 2002, o governo adotou uma lista de trinta assentos para as mulheres nas eleições legislativas de setembro do mesmo ano. Apesar dessa medida, muitas Organizações Não-Governamentais (ONG´s) continuam pressionando o governo a adotar medidas para ampliar a participação das mulheres na liderança de partidos políticos.

Diversas ONG´s buscam agir como umas das forças promotoras da emancipação feminina em todo mundo. Entretanto, alguns países não aceitam a atuação delas na defesa dos direitos das mulheres. A Tunísia, mesmo com uma das legislações mais liberais da região, impõe severas restrições governamentais sobre a atuação efetiva de muitas ONG´s. O governo da Líbia não permite nem mesmo que organizações da sociedade civil operem livremente no país de forma independente, já

77

NACIRI, Rabéa. Women`s Rights in the Middle East and North África – Freedom House Report. Disponível em: http://www.freedomhouse.org/template.cfm?page=384&Key=18&parent=2&report=56.

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que cabe ao Estado permitir a criação das mesmas. Isso acaba por impedir a própria cooperação entre essas ONG´s e outros atores transnacionais que visam a afirmação feminina.

Além das ONG`s, o movimento feminista cresceu nos últimos anos na região, principalmente nos países que dão mais abertura à discussão de questões sobre as mulheres, como Egito e Marrocos. Os ativistas do Norte da África têm feito esforços no sentido de promover uma reinterpretação do Alcorão a fim de contestar e alterar a legislação que impede a ampliação dos direitos da mulher e a sua ascensão social. Assim, o denominador comum das diversas experiências feministas é que todas dão espaço à religião, buscando acabar com o abismo existente entre o que o Alcorão diz e a maneira pela qual seus ensinamentos são colocados em prática.

Como é possível perceber, a emancipação da mulher do Norte da África, em seus diversos contextos, não é um processo que tem ocorrido de forma uniforme em todos os países envolvidos. Apesar disso, é consenso que quaisquer medidas que busquem esse objetivo devem abarcar uma interdependência entre novas percepções de estruturas institucionais, como a religião, e mecanismos de nível nacional, regional e internacional, como novas diretrizes governamentais.

Oriente Médio: o conflito entre valores tradicionais e a emancipação feminina

No decorrer de sua longa história, o Oriente Médio tem sido palco de múltiplos conflitos localizados, que fizeram da região um foco de tensão no cenário internacional. A emancipação feminina emerge, nesse contexto, como uma necessidade crucial não somente para a resolução de conflitos, mas também para o desenvolvimento político e econômico da região. Apesar dos esforços de movimentos sociais pautados por princípios feministas, a igualdade de oportunidades e a equidade de gênero são objetivos que se contrapõem aos valores culturais tradicionais presentes em diversos países da região. Assim sendo, esses valores, comumente associados à religião, constituem um obstáculo à promoção dos direitos humanos das mulheres.

Conforme exposto no artigo quinto da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), a modificação de comportamentos tradicionais é uma das ações previstas para a promoção da igualdade de gênero pelos países signatários:

“Os Estados – Partes tomarão todas as medidas apropriadas para modificar os padrões socioculturais de conduta de homens e mulheres, com vistas a alcançar a eliminação dos preconceitos e das práticas consuetudinárias, e de qualquer outra índole que estejam baseados na idéia de inferioridade ou superioridade de qualquer dos sexos ou em funções estereotipadas de homens e mulheres” 78.

A criação de mecanismos institucionais de representação das mulheres é, de

fato, uma necessidade para a supressão da discriminação em relação à participação

78

LIBARDONI, Alice. Direitos Humanos das mulheres em outras palavras: subsídios para capacitação legal de mulheres e organizações. Brasília: Agende, 2002.

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feminina na vida pública. Apesar disso, esse processo passa não somente pela formulação de políticas governamentais que permitam a elas participar dos processos decisórios do país, mas principalmente por uma mudança nos hábitos sociais que acabam por restringir a atuação dos indivíduos, com base no sexo. Nesse contexto, a própria mulher se insere em um processo de mudança no qual as percepções sobre a sua capacidade de influir positivamente a formulação de políticas públicas são alteradas. De modo geral, a baixa participação feminina na disputa pela gestão pública em países do Oriente Médio está intimamente relacionada ao conflito entre os que desejam manter os costumes e aqueles que anseiam adaptar as velhas tradições a uma nova realidade, especialmente em países muçulmanos. Nesses casos, a religião se torna um complicador, na medida em que é usada para justificar o acesso diferenciado de homens e mulheres à educação, ao trabalho e, em última instância, à vida política. Em síntese, a clara distinção das funções sociais se reflete na restrição do desenvolvimento delas na esfera pública. Em qualquer sociedade, os indivíduos não agem livremente na medida em que o seu comportamento é condicionado por uma série de restrições impostas pela existência de regras formais e não-formais. Nesse sentido, a sub-representação das mulheres nos países do Oriente Médio pode ser explicada, em grande medida, pela influência das instituições que enfatizam valores patriarcais. Ao estabelecerem normas desiguais que reforçam a diferenciação do status dos indivíduos com base no sexo, os valores culturais contribuem diretamente para o déficit de representação das mulheres e para a discriminação. Diversos fatores podem ser apontados como causas para o recrudescimento do debate acerca da aplicação de normas e códigos religiosos na região do Oriente Médio desde os anos 80. Nesse período, a expansão de movimentos islâmicos influenciou profundamente a emergência de manifestações em prol da conformidade cultural que, por sua vez, contribuíram para a adesão irrestrita às leis e normas religiosas. Atualmente, as discussões sobre a reforma islâmica envolvem o debate sobre a legitimidade das interpretações contemporâneas da Sharia79. Para os reformistas, esse guia para o comportamento dos fiéis não representaria um código legal fixo, mas sim, um código de ética aberto à reinterpretação. Sendo assim, não haveria incompatibilidade entre o Islã e os Direitos das mulheres ou entre o Islã e a democracia.

De acordo com Samuel Huntington, o mundo islâmico careceria de atributos básicos que teriam permitido o florescimento da democracia no mundo ocidental80. Esses atributos estariam relacionados, principalmente, à separação entre autoridades religiosas e o poder público, entre outros fatores. Nesse sentido, na medida em que as fontes para a legitimidade governamental e para as políticas do Estado são as instituições religiosas, as concepções islâmicas de política contradizem os princípios da democracia de modo que a variável cultural seria, assim, essencial para explicar o déficit de democracia nos países islâmicos e, em especial, entre os Estados árabes81. 79

Vide Glossário anexo. 80

HUNTINGTON, Samuel P. Democracy’s Third Wave. Baltimore e Londres: The Johns Hopkins University Press, 1996, p. 19. 81

Considerando os dados da pesquisa anual sobre liberdade no mundo desenvolvido pela ONG Freedom House, aproximadamente dois terços dos países do globo podem ser considerados democráticos. Já entre países árabes, essa proporção é de apenas um quarto. Disponível em: http://ksghome.harvard.edu/~pnorris/ACROBAT/Inglehart%20Foreign%20Policy.pdf

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Em se tratando de regimes teocráticos, a desigualdade econômica e de status entre homens e mulheres pode ser analisada a partir dessa perspectiva, na medida em que a não separação entre governo e religião tende a agravar os problemas que decorrem do conflito entre as regras religiosas e os direitos humanos das mulheres. Deste modo, as restrições fundamentadas no sexo são freqüentemente legitimadas por códigos legais discriminatórios.

Em países como Kuwait, a liberdade da mulher de desenvolver atividades econômicas, como requerer empréstimos ou mesmo procurar emprego, é restrita por códigos civis que determinam a necessidade de obter permissão prévia de um parente do sexo masculino, isto é, do pai ou do marido82. Esse fato se justifica na medida em que a família é entendida como a instituição primordial que reserva à mulher a condição de guardiã do lar, restringindo suas funções à esfera privada. De acordo com relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), nenhum país da região prevê constitucionalmente a separação entre a religião e o Estado. Entretanto, embora compartilhem desafios institucionais comuns, a região do Oriente Médio não pode ser classificada como um todo homogêneo. No âmbito político, modelos de governo variam desde teocracias, como os da Arábia Saudita e da República Islâmica do Irã, a regimes democráticos como o de Israel. Essas distinções entre os regimes políticos têm impacto direto sobre as limitações impostas às mulheres nos diferentes países. Atualmente, o UNIFEM desenvolve dois programas especificamente voltados para os Estados Árabes. No âmbito político, o órgão tem promovido o empoderamento feminino nestes países, por meio do programa Mulheres Árabes Parlamentares83. O objetivo do projeto é a inclusão de mulheres aos processos de tomada de decisão, para que essas tenham maior poder de transformação da realidade em que vivem. Mais que isso, o UNIFEM enxerga na participação das mulheres uma oportunidade para a formulação de uma agenda mais sensível aos efeitos da pobreza, bem como às dificuldades enfrentadas pelas próprias mulheres. A lista de países assistidos inclui Jordânia, Kuwait, Egito, Síria, Líbano, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Omã e Marrocos. As políticas implementadas pelo UNIFEM consistem no treinamento não só das mulheres presentes no parlamento, mas também daquelas que possuem perspectivas de atuar em postos de liderança. Dessa forma, as Nações Unidas procuram melhorar a atuação das mulheres na política, não por meio de ações afirmativas, mas sim por uma abordagem qualitativa do problema. Ao qualificar mulheres para a gestão de assuntos públicos, gerando transformações positivas para realidade social dos países, espera-se reduzir o abismo entre a proporção de homens e mulheres eleitos para o exercício de funções públicas. Os resultados das políticas públicas e estratégias adotadas nos países do Oriente Médio podem ainda ser avaliados por meio da análise de dados e do monitoramento de metas traçadas por instrumentos internacionais de promoção dos direitos das mulheres. Nesse aspecto, um dos principais mecanismos existentes é a

82

Mais informações em: http://hdr.undp.org/docs/publications/background_papers/2004/HDR2004_Valentine_Moghadam.pdf Visualizado em: 06/12/2008 83

Arab Women Parliamentarians – Mais informações em: http://www.unifem.org.jo/pages/projectslist.aspx?gn=17 Visualizado em: 07/12/2008

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Plataforma de Ação da Declaração de Beijing (Beijing + 5). Essa Convenção estabelece doze áreas críticas, dentre elas, a dimensão da participação política, definida como “mulheres no poder e tomada de decisões”.

Em discurso sobre o andamento dos objetivos traçados pela Plataforma de Beijing, em 2006, a diretora da Divisão das Nações Unidas para o Avanço da Mulher, Carolyn Hannan84, ressaltou os significativos avanços na participação política de mulheres ao nível nacional, destacando, em particular, a então recente universalização do voto no Kuwait. Na mesma ocasião, Carolyn Hannan identificou uma outra tendência. Apesar de a proporção de mulheres em parlamentos pelo mundo ter alcançado o maior nível na história (16%), o ritmo de inclusão se mostrava lento de modo que a meta de 30% de mulheres nas casas legislativas só havia sido alcançada por apenas 14 países.

A promoção da igualdade de gênero e do empoderamento feminino são objetivos fundamentais em qualquer região do mundo. O terceiro objetivo de desenvolvimento do milênio assume, portanto, especial importância, se considerado um aspecto claro do problema da sub-representação: a marginalização das mulheres é, sem dúvidas, um empecilho para o desenvolvimento, medido em termos econômicos ou políticos. Além disso, é inegável que esse objetivo se relaciona diretamente a diversos outros, tidos como primordiais pela Declaração do Milênio, tais como a redução da mortalidade infantil, a promoção da saúde materna ou o combate a AIDS, a malária e a outras doenças. Opiniões expressas por instituições diversas acerca da emancipação feminina convergem ao perceberem a ação governamental como um primeiro passo na reforma do tratamento dispensado às mulheres. No âmbito das instituições multilaterais, é clara a necessidade do exercício do diálogo como forma de promover objetivos comuns, respeitando lógicas culturais particulares. Dessa forma, um código universal de ética convive com a diversidade de visões de mundo, possibilitando o equilíbrio entre a diversidade cultural e histórica e a necessidade de valores comuns que permitam a coexistência e o enriquecimento das tradições.

Soluções propostas O terceiro objetivo do milênio escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) trata diretamente da igualdade de gênero e do empoderamento da mulher. Essa escolha não foi por acaso, uma vez que a situação das mulheres no mundo é assunto central para a efetivação dos Direitos Humanos e se relaciona a todos os outros objetivos também propostos em 200085. Diversas propostas surgem para efetivar esse empoderamento feminino, podendo ser muito frutíferas, dependendo de como forem aplicadas. Para isso é necessário lembrar que países, regiões e comunidades distintas estão em situações diferentes e devem receber enfoques particulares que levem em conta as suas

84

Mais informações em: http://www.un.org/womenwatch/daw/news/speech2006/Brescia%20University%20Kentucky%20FINAL%206%20April%202006.pdf ; Visualizado em: 07/12/2008 85

A UNIFEM possui uma publicação que relaciona bem a situação da mulher e o cumprimento das metas do milênio. Disponível em: http://www.unifem.org/attachments/products/GenderEqualityNow.pdf

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especificidades culturais, econômicas, políticas e demográficas. Não existem respostas prontas que sirvam a todos os lugares. Nesse sentido, o trabalho conjunto com organizações regionais de mulheres e de Direitos Humanos é fundamental para promover a igualdade de gênero.

Educação As disparidades educacionais entre meninas e meninos são consideráveis, e dificultam a igualdade entre os gêneros, pois, por serem menos escolarizadas, as mulheres de muitas regiões tornam-se mais dependentes e são inferiorizadas socialmente. Proporcionar vagas escolares em um ambiente de estudos saudável é essencial para que elas possam progredir academicamente. Um ambiente seguro inclui banheiros separados, bem como formas de se chegar à escola tranqüilamente entre outras questões tanto de infra-estrutura quanto de procedimento. Incorporar no currículo escolar questões ligadas ao empoderamento feminino e à igualdade de gênero são boas maneiras de inserir essa discussão na sociedade. A fim de promover a igualdade deve-se também enfatizar a eficácia de campanhas para conscientização de mães e pais sobre importância dos estudos e não apenas aumentar o número de alunas, mas também de professoras. O ambiente escolar pode ainda se tornar um lugar para que meninas e mães conheçam melhor seus direitos e discutam a sua situação na comunidade.

Conhecimento sobre os direitos da mulher Existem diversas formas de divulgar quais são os direitos da mulher, dentre as possibilidades estão campanhas públicas, grupos de mulheres e projetos de educação. Formar grupos de mulheres é bastante interessante, pois além de promover esse conhecimento sobre os direitos das mulheres ainda proporciona a elas a possibilidade de buscá-los de maneira criativa e autônoma. As mulheres reunidas podem definir quais seriam as ações mais eficazes para o seu empoderamento, por meio das discussões sobre a situação da sua região. Uma representante do governo nessas associações pode ainda facilitar a comunicação entre a sociedade civil e o Estado. Parcerias entre Estado, ONG's e as comunidades de mulheres podem ser profícuas em projetos como esses. Pode-se também incluir a mídia como um importante veículo de divulgação dos direitos das mulheres por seu amplo alcance sobre mulheres e homens. Por meio de campanhas educativas, a conscientização chega não só às mulheres, mas a toda a sociedade o que é fundamental, já que a igualdade de gênero também depende da luta dos homens pelos direitos igualitários.

Independência econômica O governo pode agir de diversas maneiras visando à emancipação feminina. Entre elas por meio da disponibilidade de micro-crédito para que as mulheres possam montar seus próprios negócios e manter uma renda para si e seus filhos, se os tiverem. O fornecimento de micro-crédito pode ser dado em conjunto com projeto de educação: alguns projetos, por exemplo, disponibilizam o crédito às mulheres após a conclusão de um curso ou um workshop sobre temas importantes como participação política e prevenção da AIDS.

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Alguns organismos internacionais vêm colocando além da disponibilidade de crédito, que pode vir tanto do governo quanto da iniciativa privada, cursos de profissionalização para mulheres como uma iniciativa que possibilita uma nova inserção da mulher no mercado de trabalho e, com isso, na sociedade.

Proteção jurídica e acesso à justiça Além da possibilidade de independência econômica, as mulheres precisam de garantias jurídicas de que terão apoio estatal e acesso aos tribunais em casos de violação de seus direitos, entre eles a violência doméstica. Uma das formas de prover assistência jurídica para as mulheres vítimas de violência doméstica é a criação de uma infra-estrutura básica para que esses casos cheguem a público e que se cumpram as leis.

Participação política A representação política feminina é parte essencial do empoderamento da mulher. Diversas atitudes comunitárias e governamentais podem ser usadas para gerar essa representação e também a participação política das mulheres, desde cotas em parlamentos até reuniões de governantes com representantes de organizações de mulheres. O importante é frisar que essa participação deve existir para que as políticas para as mulheres possam ser efetivas. Para colocar a igualdade de gênero na agenda dos governos a proporção entre homens e mulheres em cargos importantes deve ser observada sempre. Os governantes devem ter a percepção de que a representação política é muito mais difícil quando não existe uma inclusão das mulheres na sociedade em posições de decisão, em altos cargos tanto em departamentos públicos quanto em empreendimentos privados, e também quando as mulheres ainda são ligadas direta e unicamente ao trabalho doméstico.86 A partir da representação das mulheres na política elas podem propor meios para melhor direcionar e gerir as ações que visem à igualdade de direitos. Em nível internacional a participação feminina é essencial. Existem duas situações que devem ser pensadas pelos países, sendo a primeira é relacionada às delegações dos países perante foros internacionais. Cada Estado-Membro deve se preocupar em garantir que sua delegação possua mulheres em posições de igualdade com os homens e também que a política externa de seu país considere sempre a questão do empoderamento feminino. A segunda está ligada à representação feminina na equipe de funcionários dos organismos internacionais. Nessa situação elas também devem estar representadas em igualdade com os homens, objetivo sob responsabilidade dos Estados-Membros.

Cooperação Internacional Em último plano, a cooperação entre países, organizações internacionais e ONG's é fundamental para que diversas organizações interajam e busquem as melhores maneiras possibilitar às mulheres participação nas decisões políticas e sociais.

86

A presença das mulheres em parlamentos não é suficiente para garantir o empoderamento, quando a divisão doméstica e laboral ainda é sexista as mulheres tendem a não ter voz ativa na sociedade e assim também estão fora da política.

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O Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM) possui uma experiência positiva e exemplar sobre esse aspecto. Como parte das Nações Unidas o UNIFEM promove campanhas mundiais sobre temas ligados à igualdade de gênero e consegue reunir governos nacionais, ONG’s, a população civil e até mesmo empresas multinacionais.87 Acordos bilaterais sobre o tema também são uma possibilidade, considerando que alguns países possuem políticas e projetos eficazes nas áreas de emancipação e empoderamento femininos que podem ser adaptados à realidade de outros países. A cooperação e a troca de informações sobre essas ações é essencial para ajudar os governos dos países onde as mulheres ainda estão em situação muito desigual a melhor agirem sobre essa situação. Outra forma de um governo atuar internacionalmente nessa questão se dá por meio de ONG's internacionais. O governo pode identificar projetos interessantes de uma ONG em outro país e direcionar apoio a ela (esse pode ser financeiro, de pessoal ou de conhecimento), sempre procurando ajudar o governo e a sociedade civil dessa região a alcançar maiores níveis de empoderamento feminino.

Conclusão

Imagine um mundo em que os presidentes fossem as presidentes. Imagine que isso não significa que todos os presidentes de todos os países do

mundo sejam mulheres, mas simplesmente que o plural seja representado pela partícula feminina, e não pela masculina, tal como o é em nosso mundo. Imaginar, nesse caso, representa apenas um simples exercício reflexivo88 que pretende suscitar a seguinte dúvida: são neutras as estruturas sociais, sejam elas econômicas, lingüísticas ou políticas, no que diz respeito a gênero? Esse mundo imaginado transparece uma estrutura dominante discriminatória ou tendenciosa? E o mundo real?

A sensação de estranhamento que esse breve exercício poderá ter despertado em quem o lê deverá servir ao propósito de fomentar o debate político sobre emancipação feminina, tanto entre indivíduos de nível educacional ou faixa etária semelhantes, quanto entre líderes e representantes dos mais diversos países na arena internacional. Não são oferecidas respostas prontas para cada uma das perguntas colocadas acima, muito menos para as polêmicas que por vezes ficaram evidenciadas ao longo do presente artigo. As soluções aos problemas aqui apresentados deverão ser construídas em um processo contínuo de diálogo e negociação, no qual as alternativas apresentadas em cada nível (internacional, doméstico89, e individual) deverão influenciar as práticas dos demais.

Deve-se buscar compreender as causas da marginalização das mulheres frente aos processos políticos de tomada de decisão. Somente a partir desse ponto, será possível alcançar soluções efetivas a esta tão complexa questão, bem como aos seus problemas inter-relacionados, que atingem a todos os povos e deveriam ser, portanto,

87

Um exemplo atual da atuação do UNIFEM é a campanha contra a violência contra a mulher que reúne cerca de 60 países e mais de cem ONGs, além de assinaturas de pessoas de todo o mundo. Mais informações sobre essa campanha em: http://www.unifem.org/campaigns/vaw/, acessado em 7 de dezembro de 2008. 88

Que serve à língua portuguesa, mas que certamente não se aplica a alguns outros idiomas. 89

Refere-se ao âmbito nacional dos países.

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alvo da preocupação de todos os governantes. Assim, ter os países do Oriente Médio e Norte da África como foco principal do debate significa tratar de uma temática, de enorme relevância a todos os demais países, em uma região onde tal tema assume contornos ainda mais polêmicos e problemáticos devido a sua interface com outras questões, tais como religião, cultura e tradição. Dessa maneira, a discussão em torno dos direitos humanos das mulheres, em especial dos direitos civis e políticos, deverá perpassar outras questões, principalmente sobre segurança e regimes políticos.

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Glossário de Conceitos

Árabe: O termo árabe é uma denominação étnica, isto é, se refere à etnia árabe. Essa etnia é caracterizada pela língua árabe. Portanto, os povos que têm a língua árabe como oficial podem ser chamados de árabes. A título de exemplo, podemos citar os iraquianos, egípcios, palestinos e sauditas. Discriminação: Conduta (ação ou omissão) de violação dos direitos e exclusão da pessoa humana com base em preconceitos ou em critérios injustificados e injustos. Empoderamento: Processo pelo qual pessoas e/ou grupos sociais começam a participar ativamente de processos de decisão, principalmente voltado para a esfera política. Também pode ser definido como processo de emancipação através do qual pessoas e/ou grupos buscam igualdade dentro de uma sociedade. Eqüidade: princípio segundo o qual é necessário e justo partir de uma distribuição desigual, com base numa discriminação por necessidades especiais para alcançar a igualdade. Ou seja, esse princípio visa tornar igual provendo a parte menos favorecida com um benefício proporcionalmente mais favorável. Equidade de gênero se refere à garantia de iguais oportunidades de resultado para homens e mulheres, considerando suas necessidades e interesses diferentes. Estereótipo: Idéia ou julgamento estabelecido a partir de preconceitos sobre pessoas, grupos, coisas ou situações; Imagem pré-concebida, resultante de caracterização simplista ou da falta de conhecimento sobre o assunto em questão. Igualdade: qualidade e princípio segundo o qual objetos de comparação podem ser considerados perfeitamente similares por não apresentarem diferença de qualidade ou valor quanto ao aspecto considerado. Igualdade de gênero determinaria que não se deva ter direitos, responsabilidades e oportunidades diferenciados pelo fato de se ser homem ou mulher e que suas diferenças em outros aspectos sejam igualmente consideradas, valoradas e favorecidas. Islâmico: Os termos islâmico e muçulmano são sinônimos e se referem à pessoa que segue o Islamismo, religião monoteísta criada por Maomé no século VII d. c.

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Participação Política: Ação que objetiva interferir no processo político. Normalmente vinculada a Estados Democráticos nos quais os cidadãos possuem direitos políticos e são chamados a participar ativamente do processo decisório. Patriarcalismo: Modo de estruturação e organização da vida social baseado na prevalência das relações e concepções masculinas sobre as femininas. Preconceito: Julgamento, opinião, crença ou sentimento prévio, em geral, negativo, desfavorável ou intolerante que se tem sobre uma coisa, pessoa, comportamento ou característica. Representação Política: Relação entre políticos e eleitores estabelecida por meio de mecanismos90 de democracias representativas que possibilita aos cidadãos escolherem os governantes e regularem suas ações. A representatividade que um governante, ou qualquer pessoa com poder decisório, possui dentro de sua sociedade é um dos principais fatores que dão legitimidade para as visões e ações deste.91 Sharia: A Sharia é, para os muçulmanos, o sistema legal que deve governar todas as fases da vida dos fiéis, estipulando desde as regras de herança e divórcio até o comportamento na rua e na mesquita. Teocracia: Forma de governo em que autoridades religiosas possuem poder não somente sobre assuntos espirituais, mas também sobre questões cívicas, exercendo poder político em nome de uma autoridade divina. Assim, governos teocráticos são caracterizados pela subordinação do Estado ao clero. Etimologicamente, o termo Teocracia significa o mesmo que “Governo de Deus”.

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90

Eleições, referendos, plebicitos e outros mecanismos de prestação de contas são exemplos de mecanismos que promovem a representação política. 91

Se uma pessoa que está em situação de poder dentro de uma sociedade não representar de maneira real ao menos um grupo social, as ações dessa pessoa não serão consideradas legítimas pela sociedade.

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Posicionamento do Blocos

Bloco Asiático

(Arábia Saudita, Azerbaijão, Bangladesh, Brunei, Butão, Camboja, Catar, Cazaquistão, China, Cingapura, Coréia do Norte, Coréia do Sul, Filipinas, Geórgia, Hong Kong, Ilhas Maldivas, Índia, Indonésia, Japão, Kuwait, Laos, Macau, Malásia, Mongólia, Mianmar, Nepal, Omã, Quirguistão, Sri Lanka, Síria, Taiwan, Tadjiquistão, Tailândia, Tibete, Timor Leste, Turcomenistão, Uzbequistão e Vietnã)

O desempenho do bloco quanto às questões de gênero varia consideravelmente de acordo com o indicador considerado – enquanto que no tocante à paridade de acesso à educação os progressos são notáveis, nos demais pontos pode-se dizer que os países asiáticos não estejam tão avante. O Pacífico tem o menor nível de participação política feminina do mundo. No entanto, principalmente após haver sido ressaltada a importância das questões de política e gênero na Quarta Conferência das NU sobre as Mulheres, no Beijing+5 e no Istambul+5, o papel das mulheres na políticas local e nacional tem recebido atenção nas discussões na região. A região originou, inclusive, algumas das mais inovadoras e bem sucedidas estratégias para a igualdade de gênero e para o empoderamento das mulheres. Grande parte dos países que compõem o bloco assente publicamente ao fato de que o aumento do poder político das mulheres seja um imperativo para acrescer o status social das mulheres e prevenir e remediar de forma mais eficaz as violações dos Direito Humanos. Também é reconhecida a igualdade de gênero como fundamental em suas Constituições, sendo resolutamente contrários a qualquer forma de discriminação com base em gênero. Todos entendem que o empoderamento da mulher requer a construção de um ambiente local, nacional, regional e internacional propício nas esferas econômica, social e cultural. Certos países, como Sri Lanka92 e Malásia, mencionam que não se deva construir uma cultura de rivalidade entre homens e mulheres, mas sim de cooperação em nome da família e da sociedade. Contudo, é necessário esclarecer que virtualmente nenhum país do bloco está progredindo de forma igual em nenhum ponto. Por exemplo, Muitos países como a Malásia, Sri Lanka, Filipinas e Tailândia alcançaram paridade de gênero na educação em altos níveis de matricula, mas isso não se traduziu nas esferas econômica e política, sendo que o contrário acontece em Camboja.

92

Sri Lanka foi o primeiro país a ter uma mulher como Primeira Ministra e conta com uma presença comparativamente considerável de mulheres ocupando altos cargos.

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Alguns dos desafios comuns aos países do bloco são os obstáculos representados pelas normas, estereótipos e práticas tradicionais reativas a gênero, pelos impactos negativos das migrações – tais como a interrupção da educação, a dificuldade de acesso a serviços básicos, o maior risco de ingresso no tráfico humano etc. -, pela administração de uma descentralização dos processos para garantir a provisão de serviços básicos e oportunidades de participar do processo local de tomada de decisões para mulheres, pela necessidade de fortalecer a implementação de leis nacionais, de políticas e de garantir a eficácia das instituições nacionais na promoção da igualdade de gênero, além da necessidade de aperfeiçoar os mecanismos legais e o acesso à Justiça especialmente para as mulheres de comunidades marginalizadas.93 Alguns países adotaram medidas para a promoção da participação das mulheres no governo e na tomada de decisões. Por exemplo, a Índia, a Indonésia, o Timor Leste e Bangladesh, entre outros países, adotaram o sistema de cotas para a representação política das mulheres em órgãos públicos feita. Apesar disso, estatísticas mostram que as mulheres ainda são parcamente representadas nos governos locais e nacionais na região da Ásia em geral – as percentagens variam de 0% a 34%, com uma média de 15% de mulheres ocupando cargos nos parlamentos, e números ainda menores relativos aos cargos ministeriais.94 As razões para isso são diversas, mas certamente incluem a estrutura patriarcalista dos sistemas sociais em questão e os preconceitos, bem como a dependência financeira das mulheres inerente a eles.

Quanto às ações regionais, vale citar a assinatura do Plano de Ação de Jacarta, em 1996, cujo propósito era servir de parâmetro para políticas concretas e programas acerca de questões de gênero. A Comissão Econômica e Social das Nações Unidas para a Ásia e o Pacífico (UNESCAP) tem implementado o Programa de Avanço das Mulheres no Governo Local Urbano desde 1999, baseado na análise de 13 países da região95, e desde 1985, a Associação do Sul Asiático para a Cooperação Regional (SAARC)96 tem priorizado as questões de gênero em sua agenda social. Em 1988, os países membros da Associação das Nações do Sul Asiático (ASEAN)97 assinaram a Declaração do Avanço das Mulheres na Região da ASEAN. Pode-se dizer, a partir da análise dos documentos oficiais e dos vínculos efetivamente formados até então, que haja uma disposição considerável para cooperação e para o apoio mútuo pelo menos das políticas mais gerais em prol da igualdade e da equidade de gênero.

Bloco Latino Americano (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai, Venezuela, Belize, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Panamá, Cuba, Haiti, República Dominicana, México)

93 Pursuing Gender Equality through the Millennium Development Goals in Asia and the Pacific. Disponível em: http://www.unescap.org/esid/GAD/Issues/MDGs/Pursuing-Gender-Equality.pdf Visualizado em: 09/12/2008 94

Consultado a partir dos Dados levantados pelo IPU database em 2008. Disponível em: http://www.unifem.org/progress/2008/vs_politics4.html#vstats Visualizado em: 02/12/2008 95

Inclusive o Paquistão, que nesta divisão pertence ao bloco de países islâmicos do Oriente Médio. 96

Composta por Bangladesh, Butão, Índia, Maldivas, Nepal, Paquistão e Sri Lanka. 97

Composta por Indonesia, Malásia, Filipinas, Singapura, Tailândia, Brunei Darussalam, Vietnã, Lao e Camboja.

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Nos países da América Latina grandes avanços foram alcançados sobre a

situação das mulheres. Em sua maioria, os países latino-americanos e caribenhos assinaram a CEDAW98 visando a igualdade de gênero. Os artigos dessa convenção vêm sendo implementados nos países de distintas maneiras e com diferentes resultados, mas percebe-se que há vontade política da maioria desses países de progredir na busca pela igualdade de gênero. Existem tratados assinados sobre a questão de gênero no próprio sistema interamericano de Direitos Humanos99. Há uma comissão interamericana de mulheres com representação de todos os Estados-membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) que procura estudar políticas para promover a igualdade de gênero nos países americanos100. Também outras organizações regionais como o Mercado Comum do Sul (Mercosul)101 e a Comunidade Caribenha (Caricom)102 tem uma política regional para as mulheres. A representação feminina avançou principalmente devido a leis de cotas em cargos parlamentares ou em candidaturas que começaram a ser aplicadas na década de 1990. Contudo, essas leis são menos eficazes do que o esperado e na maioria dos países da região é marcante a necessidade de mais ação dos governos para uma política mais eficaz para a igualdade de gênero. A situação de pobreza da maior parte da população radicaliza a situação das mulheres por nesses países elas terem, em geral, menos educação e ocuparem cargos de menor qualificação e menor remuneração. Por essa razão os países da região procuram sempre voltar suas políticas para a esfera econômica. A pressão sobre esses governos por parte da sociedade internacional e também das Organizações Não Governamentais (ONGs) nacionais e estrangeiras é bastante forte. Por sua vez, a resposta dos governos tem sido positiva, apesar de não necessariamente rápida.

Bloco Estados Unidos, Canadá e União Européia (Áustria, Bélgica, Bulgária, República do Chipre, República Tcheca, Dinamarca, Estônia, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Holanda, Polônia, Portugal, Romênia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Suécia, Reino Unido)

98

Vários países fizeram declaração e reservas à Convenção. A lista de declarações e reservas está disponível em inglês no site: http://www.un.org/womenwatch/daw/cedaw/reservations-country.htm. 99

A OEA se reuniu e aprovou em sua Assembléia Geral que 2010 será o Ano Interamericano das Mulheres. Esse documento está disponível no site: http://www.oas.org/37ag/docs/por/2322.doc em português. Esse documento é um bom resumo do posicionamento da OEA. 100

Mais informações sobre essa comissão estão no site: http://www.oas.org/cim/Spanish/Acerca.htm, em espanhol. 101

O Mercosul possui mantém uma reunião especializada da mulher. A resolução que estabelece essa reunião está disponível em português em: http://www.mercosul.gov.br/normativa/resolucao/1998/mercosul-gmc-res-no20-98/mercosul-gmc-res-no-20-98/?searchterm=mulher 102

Em 2000, Carla Barnett fez um discurso sobre empoderamento feminino no Caribe. Esse discurso apresenta uma boa descrição da situação da mulher na região. Disponível em inglês em: http://www.caricom.org/jsp/speeches/cag_conference_barnett.jsp

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Este bloco tem sido amplamente reconhecido por defender e promover, na arena internacional, a garantia e proteção dos direitos das mulheres em favor da igualdade de gênero. Tais países reconhecem que a emancipação feminina deve ser vista não somente sob a ótica dos direitos humanos, mas também como um componente essencial para a promoção da justiça social, do desenvolvimento sustentável, bem como da paz e segurança internacionais.

Claramente neste bloco, são os países da União Européia os que ainda apresentam os maiores desafios internos ao processo de emancipação dos direitos das mulheres, bem como de sua participação política. Contudo, o tema tem sido amplamente tratado no âmbito do Conselho Europeu, incluindo a adoção de mecanismos regionais sobre o tema. Canadá constitui um líder global na defesa da questão, incorporando fortemente a temática em sua política externa, bem como doméstica. Ratificou todas as convenções sobre o tema e atua diplomaticamente tanto nos foros multilaterais quanto em negociações bilaterais em defesa da ampla e igualitária participação das mulheres no processo político de tomada de decisão. Financiando, inclusive, projetos de assistência sobre o tema em outros países103.

No mesmo sentido, Estados Unidos reconhecem o respeito aos direitos das mulheres como um determinante de sua política externa bem como uma parte integral de seu Plano de Segurança Estratégica104. De tal maneira, o país possui, ademais de políticas e mecanismos domésticos, iniciativas de apoio à emancipação política e econômica das mulheres em várias regiões do mundo, em especial Afeganistão, Iraque e outros países do Oriente Médio por meio da iniciativa de parcerias MEPI105.

Bloco Paquistão, Afeganistão e Oriente Médio (Arábia Saudita, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Irã, Iraque, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbia, Omã, Qatar, Síria, Turquia)

As questões de gênero, assim como aquelas referentes aos direitos humanos

assumem, na visão dos países do Oriente Médio conotação distinta daquela difundida predominantemente. Em oposição às concepções ocidentais de direitos humanos que enfatizam a autonomia individual, o direito de escolha e a liberdade de agência, as idéias de direitos humanos e direitos das mulheres estão, segundo a concepção islâmica, relacionada a princípios como o respeito à família, a religião e a comunidade106. Essa visão abrange também a postura de Estados governados por regimes teocráticos islâmicos, sendo ainda mais difundida, entre os países árabes.

103

Por meio da Agência Canadense Internacional de Desenvolvimento (CIDA). Mais informações em: http://www.acdi-cida.gc.ca/equality ; Visualizado em: 30/11/2008 104

Discurso proferido pela Embaixadora Ellen Sauerbrey, Representante norte-americana na Comissão da ONU sobre o Status das Mulheres (CSW) em 08/03/2003. Disponível em: http://www.state.gov/g/wi/rls/18767.htm ; Visualizado em: 30/11/2008 105

Middle East Partnership Initiative. Mais informações em: http://mepi.state.gov/ ; Visualizado em: 30/11/2008 106

PNUD. Relatório de Desenvolvimento Humano. Disponível em: http://hdr.undp.org/docs/publications/background_papers/2004/HDR2004_Valentine_Moghadam.pdf Visualizado em: 05/12/2008

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De modo geral, a principal crítica a atuação dos países em questão versa em torno da resistência em aderir plenamente aos mecanismos internacionais para a superação da desigualdade de gênero. Nesse sentido, a relutância da maioria dos Estados em ratificar a Convenção sobre a Eliminação sobre Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW) sem reservas107 é tema de intenso debate. As principais restrições desses Estados estão relacionadas à promoção da igualdade de gênero nas relações familiares. Assim, diversos países se recusam a aderir aos compromissos expostos em artigos específicos, notadamente aqueles que se relacionam a medidas de não-discriminação (art. 2º), a promoção da participação de mulheres na vida pública e na política (art.7º), a igualdade de direitos entre homens e mulheres em questões de nacionalidade (art. 9º), a igualdade no casamento e na família (art. 16º).

Em relação às reservas implementadas pelos países do bloco, uma assume especial importância no contexto das instituições multilaterais. O artigo 29 da CEDAW estabelece que todas as discordâncias entre países relativas à interpretação da Convenção poderão ser submetidas ao juízo da Corte Internacional de Justiça, caso não haja acordo entre as partes no prazo de seis meses108. Assim, ao reservarem essa cláusula da Convenção, os países se isentam da obrigação de solucionar conflitos referentes à questão de gênero, por meio da arbitragem internacional.

Em diversos países, notadamente Irã, Arábia Saudita as instituições legais são governadas, em grande parte, com base na Sharia109, especialmente no que diz respeito ao Direito de família. Por sua vez, Egito e Jordânia são exemplos de regiões nas quais os códigos familiares islâmicos, a carência de direitos civis das mulheres e a presença de governos conservadores têm criado ambientes despojados de participação política feminina.

Conforme exposto pelo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), as reações dos governos da região do Oriente Médio às manifestações de movimentos de emancipação feminina são extremamente diversas. Em alguns casos, as demandas por maior participação política e pela eliminação da discriminação contra mulher são recebidas com hostilidade. Por outro lado, alguns Estados têm desempenhado esforços efetivos para a promoção dos diretos das mulheres por meio da reforma de instituições legais. Deste modo, países como Iraque110 e Jordânia tem apresentado aumentos significativos da proporção de mulheres no parlamento, por meio da adoção de políticas de cotas.

Bloco África Subsaariana

107

Reservas são mecanismos pelos quais um Estado se declara, no momento da assinatura ou ratificação do Tratado, isento do compromisso exposto em determinada cláusula. Os demais Estados-Partes, por sua vez, também não estarão obrigados pela cláusula reservada perante o Estado que formulou a reserva. 108

LIBARDONI, Alice. Direitos Humanos das mulheres em outras palavras: subsídios para capacitação legal de mulheres e organizações. Brasília: Agende, 2002. 109

Vide Glossário Anexo. 110

Segundo relatório produzido pela ONU e pela Liga dos Países Árabes, o Iraque atingiu, em 2005, a proporção de 25,5% de mulheres no parlamento, apresentando assim, a maior evolução entre os países árabes. Mais informações em: http://www.uis.unesco.org/template/pdf/EducGeneral/MDGsArab07.pdf Visualizado em: 09/12/2008

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(África do Sul, Angola, Benin, Botsuana, Burkina Faso, Burundi, Camarões, Cabo Verde, República Centro Africana, Chade, República Democrática do Congo, República Democrática da Costa do Marfim, Djibuti, Guiné Equatorial, Eritréia, Etiópia, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Quênia, Lesoto, Libéria, Madagascar, Malaui, Mali, Mauritânia, Maurício, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, Quênia, Ruanda, São Tomé e Príncipe, Senegal, Seychelles, Serra Leoa, Somália, Sudão, Suazilândia, Tanzânia, Togo, Uganda, Zâmbia, Zimbábue)

A África Subsaariana, também conhecida como África Negra, constitui o local

mais pobre do planeta e abriga mais de 60 % de todas as pessoas com HIV no mundo. Os países desse bloco têm levado em consideração essa realidade na hora da formulação de políticas que visem o empoderamento das mulheres, além de já ser ampla na região a idéia de que o fim das barreiras que impedem a igualdade de gênero tem uma contribuição primordial para o desenvolvimento dessa parte da África.

A participação de organizações da sociedade civil nos diálogos políticos exerce papel fundamental para a garantia de maiores benefícios e direitos para as mulheres na maioria dos países da região. Esse maior diálogo com os governos vêm crescendo substancialmente, criando parcerias que buscam a elaboração de programas que apóiem o planejamento familiar, medidas de prevenção à AIDS e maior assistência às gestantes. Além disso, os países têm favorecido a atuação de inúmeras organizações sem fins lucrativos que trabalham com a proteção dos direitos das mulheres HIV positivas. Exemplo de associação com essa finalidade é a Rede para Mulheres Positivas do Zimbábue (NZPW+), a qual conta com o apoio da UNIFEM.

É importante destacar também o espaço que as mulheres vêm alcançando em situações de pós-conflito. Em vários países, incluindo Angola, Moçambique, Libéria, Somália, Etiópia, Sudão e Ruanda e mais recentemente em Serra Leoa e Guiné-Bissau, o governo, juntamente com a sociedade civil e o setor privado, desenvolvem projetos e programas que almejam a institucionalização de um papel mais amplo da mulher nos vários setores de reconstrução e desenvolvimento. Essas estratégias têm sido fundamentais para a inclusão das mulheres em estruturas de governança e de tomada de decisão que envolvem todo o processo de reconstrução e promoção da estabilidade social.

Cabe enfatizar, por fim, que as oportunidades para a participação política feminina aumentou tanto em nível local como nacional. A eleição de Ellen Johnson Sirleaf como presidente da Libéria em 2006 é um exemplo emblemático. Um avanço nesse sentido ocorreu em agosto de 2008, quando líderes da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, após três anos de negociação, assinaram o Protocolo sobre Gênero e Desenvolvimento111. Dentre seus vários objetivos, o Protocolo prevê que as mulheres assegurem 50% das posições de tomada de decisão nos setores público e privado até 2015.

Bloco Norte da África (Argélia, Egito, Líbia, Marrocos e Tunísia)

111

Disponível em:

http://www.cladem.org/portugues/novidades/Protocol%20on%20Gender%20August%202008%20-

%20Portuguese0001.pdf ; Visualizado em: 09/01/2009

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É nítido o progresso alcançado pelos países que integram a África Setentrional no que se refere a emancipação das mulheres na região. Contudo, elas ainda são relegadas a um status inferior ao dos homens no que concerne o pleno exercício de seus direitos legais, sociais, políticos e culturais. De forma geral, o maior obstáculo ao empoderamento das mulheres tem sido a falta de mecanismos governamentais no sentido de reforçar e garantir o cumprimento de medidas que já visam acabar com a desigualdade de gênero.

No caso da Líbia, o regime político ditatorial é um dos entraves à maior participação da mulher na vida política, social e econômica. As associações para a defesa das mulheres estão intimamente ligadas ao aparato estatal e podem manter contato com outras associações internacionais somente com o aval do Estado. A partir dos anos 1990, o país iniciou uma maior aproximaçãot com a comunidade internacional, o que não significou, contudo, uma nova percepção sobre o status da mulher.

A Argélia, mesmo com um sistema legal baseado na legislação francesa, possui também um Código familiar baseado na interpretação das leis islâmicas. Enquanto sua constituição garante a igualdade entre os gêneros, o Código familiar possui claras demonstrações de discriminação contra a mulher sobre assuntos como casamento, herança, divórcio e custódia, e guarda de crianças. Essa divergência é muito polêmica, principalmente porque a constituição coloca o Islã como a religião oficial do Estado, ao mesmo tempo em que suas disposições chocam com aquilo que diz o Código.

Egito, Marrocos e Tunísia despontam como os países da região com maior avanço sobre o assunto, apesar de apresentarem reservas à CEDAW. A Tunísia se destaca pelo alto nível de alfabetização feminina alcançado, enquanto o Marrocos é reconhecido pela Mudawana, nome dado à reforma de suas leis visando a ampliação dos direitos das mulheres. As mulheres egípcias tiveram avanços nas últimas décadas, graças ao papel de uma sociedade civil ativa, organizações e defensores dos direitos das mulheres e a dedicação da primeira-dama Suzanne Mubarak.

A remoção das reservas à CEDAW é uma medida que cabe ao governo desses países para a maior afirmação das mulheres na região. Além disso, a releitura das leis islâmicas em favor de mais direitos à mulher é uma necessidade que deve ser levada em consideração. Por fim, seria interessante que países como Líbia e Egito extinguissem suas restrições à atuação das ONG's que visam o empoderamento das mulheres.

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