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Grupo I TEXTO E era simpático o pobre Alencar! Com que cuidado exagerado, ao falar de Pedro, de Arroios, dos amigos e dos amores de então, ele evitara pronunciar sequer o nome de Maria Monforte! Mais de uma vez, pelo Aterro fora, estivera para lhe dizer: — Podes falar da mamã, amigo Alencar, que eu sei perfeitamente que ela fugiu com um italiano! E isto fê-lo insensivelmente recordar da maneira como essa lamentável história lhe fora revelada, em Coimbra, numa noite de troça, quase grotescamente. Porque o avô, obedecendo à carta testamentária de Pedro, contara-lhe um romance decente: um casamento de paixão, incompatibilidades de naturezas, uma separação cortês, depois a retirada da mamã com a filha para a França, onde tinham morrido ambas. Mais nada. A morte de seu pai fora-lhe apresentada sempre como brusco remate de uma longa nevrose... Mas Ega sabia tudo, pelos tios... Ora uma noite tinham ceado ambos; Ega muito bêbado, e num acesso de idealismo, lançara-se num paradoxo tremendo, condenando a honestidade das mulheres como origem da decadência das raças: e dava por prova os bastardos, sempre inteligentes, bravos, gloriosos! Ele, Ega, teria orgulho se sua mãe, sua própria mãe, em lugar de ser a santa burguesa que rezava o terço à lareira, fosse como a mãe de Carlos, uma inspirada, que por amor de um exilado abandonara fortuna, respeitos, honra, vida! Carlos, ao ouvir isto, ficara petrificado, no meio da ponte, sob o calmo luar. Mas não pôde interrogar o Ega, que já taramelava, agoniado, e que não tardou a vomitar-lhe ignobilmente nos braços. Teve de o arrastar à casa das Seixas, despi-lo, aturar-lhe os beijos e a ternura borracha, até que o deixou abraçado ao travesseiro, babando-se, balbuciando «que queria ser bastardo, que queria que a mamã fosse uma marafona!...» 1 Ciclo de Estudos 2007/2010 Teste modelo do módulo 8

Teste Modelo 8 Blog

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Grupo ITEXTO

E era simptico o pobre Alencar! Com que cuidado exagerado, ao falar de Pedro, de Arroios, dos amigos e dos amores de ento, ele evitara pronunciar sequer o nome de Maria Monforte! Mais de uma vez, pelo Aterro fora, estivera para lhe dizer: Podes falar da mam, amigo Alencar, que eu sei perfeitamente que ela fugiu com um italiano!

E isto f-lo insensivelmente recordar da maneira como essa lamentvel histria lhe fora revelada, em Coimbra, numa noite de troa, quase grotescamente. Porque o av, obedecendo carta testamentria de Pedro, contara-lhe um romance decente: um casamento de paixo, incompatibilidades de naturezas, uma separao corts, depois a retirada da mam com a filha para a Frana, onde tinham morrido ambas. Mais nada. A morte de seu pai fora-lhe apresentada sempre como brusco remate de uma longa nevrose... Mas Ega sabia tudo, pelos tios... Ora uma noite tinham ceado ambos; Ega muito bbado, e num acesso de idealismo, lanara-se num paradoxo tremendo, condenando a honestidade das mulheres como origem da decadncia das raas: e dava por prova os bastardos, sempre inteligentes, bravos, gloriosos! Ele, Ega, teria orgulho se sua me, sua prpria me, em lugar de ser a santa burguesa que rezava o tero lareira, fosse como a me de Carlos, uma inspirada, que por amor de um exilado abandonara fortuna, respeitos, honra, vida! Carlos, ao ouvir isto, ficara petrificado, no meio da ponte, sob o calmo luar. Mas no pde interrogar o Ega, que j taramelava, agoniado, e que no tardou a vomitar-lhe ignobilmente nos braos. Teve de o arrastar casa das Seixas, despi-lo, aturar-lhe os beijos e a ternura borracha, at que o deixou abraado ao travesseiro, babando-se, balbuciando que queria ser bastardo, que queria que a mam fosse uma marafona!...

E ele mal pudera dormir essa noite, com a ideia daquela me, to outra do que lhe haviam contado, fugindo nos braos de um desterrado um polaco talvez! Ao outro dia, cedo, entrava pelo quarto do Ega, a pedir-lhe, pela sua grande amizade, a verdade toda...()

Ega, ento, l ganhou nimo, l balbuciou a sua histria - a que ouvira ao tio Ega - a paixo de Maria por um prncipe, a fuga, o longo silncio de anos que se fizera sobre ela...

Justamente as frias chegavam. Apenas em Sta. Olavia, Carlos contou ao av a bebedeira do Ega, os seus discursos doidos, aquela revelao vinda entre arrotos. Pobre av! Um momento nem pde falar - e a voz por fim veio-lhe to dbil e dolente como se dentro do peito lhe estivesse morrendo o corao. Mas narrou-lhe, detalhe a detalhe, o feio romance todo at quela tarde em que Pedro lhe aparecera, lvido, coberto de lama, a cair-lhe nos braos, chorando a sua dor com a fraqueza duma criana. - E o desfecho desse amor culpado, acrescentara o av, fora a morte da me em Viena da ustria, e a morte da pequenita, da neta que ele nunca vira, e que a Monforte levara... E eis a tudo. E assim, aquela vergonha domestica estava agora enterrada, ali, no jazigo de Sta. Olavia, e em duas sepulturas distantes, em pas estrangeiro...

Carlos recordava-se bem que nessa tarde, depois da melanclica conversa com o av, devia ele experimentar uma gua inglesa: e ao jantar no se falou seno da gua que se chamava Sultana. E a verdade era que da a dias tinha esquecido a mam. Nem lhe era possvel sentir por esta tragdia seno um interesse vago e como literrio.()

Baptista trouxera o ch, o charuto do Alencar acabara; - e ele continuava na chaise-longue, como amolecido nestas recordaes, e cedendo j, num meio adormecimento, fadiga do longo jantar... E ento, pouco a pouco, diante das suas plpebras cerradas, uma viso surgiu, tomou cor, encheu todo o aposento. Sobre o rio, a tarde morria numa paz elisea. O peristilo do Hotel Central alargava-se, claro ainda. Um preto grisalho vinha, com uma cadelinha no colo. Uma mulher passava, alta, com uma carnao ebrnea, bela como uma Deusa, num casaco de veludo branco de Guinava. O Craft dizia ao seu lado trs-chic. E ele sorria, no encanto que lhe davam estas imagens, tomando o relevo, a linha ondeante, e a colorao de coisas vivas.

Eram trs horas quando se deitou. E apenas adormecera, na escurido dos cortinados de seda, outra vez um belo dia de inverno morria sem uma aragem, banhado de cor de rosa: o banal peristilo de Hotel alargava-se, claro ainda na tarde; o escudeiro preto voltava, com a cadelinha nos braos; uma mulher passava, com um casaco de veludo branco de Gnova, mais alta que uma criatura humana, caminhando sobre nuvens, com um grande ar de Juno que remonta ao Olimpo: a ponta dos seus sapatos de verniz enterrava-se na luz do azul, por trs as saias batiam-lhe como bandeiras ao vento. E passava sempre... O Craft dizia trs-chic. Depois tudo se confundia, e era s o Alencar, um Alencar colossal, enchendo todo o cu, tapando o brilho das estrelas com a sua sobrecasaca negra e mal feita, os bigodes esvoaando ao vendaval das paixes, alando os braos, clamando no espao:

Abril chegou, s minha!

I

1. Localize o excerto na aco da obra a que pertence.

2. Divida o texto em partes, justificando as suas opes.

3. Identifique o motivo que leva Carlos, neste momento da narrativa, a fazer uma viagem ao passado da sua famlia.

4. Neste texto, surge uma analepse.

4.1. Prove a veracidade desta afirmao.

4.2. De que forma se verifica neste excerto que Afonso da Maia uma personagem de carcter forte e vincado? Justifique a sua resposta com elementos do texto.4.3. Caracterize a personagem Joo da Ega, a partir do excerto apresentado, mas tendo em conta outros momentos da obra em que a personagem entra em aco.

4.3.1. Relativamente a esta personagem, que tipo de caracterizao predomina neste excerto? Justifique a sua resposta.4.4. Nem lhe era possvel sentir por esta tragdia seno um interesse vago e como literrio.4.5. Comente esta atitude de Carlos, explicitando as hipotticas razes da mesma.

5. Atente nos trs ltimos pargrafos

5.1. Explique de que modo o sonho transfigura a realidade.5.2. Identifique trs recursos estilsticos diferentes, caractersticos do estilo querosiano, justificando a sua resposta

6. A associao e a proximidade entre duas personagens neste excerto podem ser os indcios da desgraa que se abater sobre a famlia dOs Maias.6.1. Identifique as duas personagens e esclarea a afirmao apresentada.

7. A mulher amada surge divinizada. Justifique esta afirmao.II8. Escolha uma das seguintes propostas de produo escrita:

A) Elabore um texto, 150 a 200 palavras, integrando Os Maias na corrente esttico-literria em que se insere.

B) Em Os Maias, Ea de Queirs criou personagens, para criticar diversos sectores da vida social e cultural de Lisboa.

Relembrando a leitura deste romance, desenvolve esta afirmao, num texto de carcter argumentativo, 150/200 palavras, referindo-te a trs personagens e crtica social que atravs delas se faz.

Teste modelo do mdulo 8

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