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1 Título: Jardim Boa Vista: sua história, o papel da EMEF Solano Trindade e do Memorial Escolar no processo de transformação Aluno: Augusto Rolim Saraiva N° USP: 7611943 Programa: PIC/FE Faculdade de Educação Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga Resumo: O presente projeto está vinculado ao Projeto de Pesquisa Memória, narrativa e a dimensão discursiva da experiência escolar” e ao Projeto de Extensão Memórias, histórias, pertencimento: pesquisa colaborativa na escola e comunidade, formação docente e identidade local, ambos coordenados pela Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga. Este trabalho de Iniciação Científica tentará perceber as transformações ocorridas no bairro Jardim Boa Vista, na Zona Oeste de São Paulo, buscando compreender a participação da EMEF Solano Trindade e do Memorial nesse processo contínuo. A pesquisa partirá da ideia de que o lugar não é apenas um produto das relações econômicas, mas é, ao mesmo tempo, determinado pelos sujeitos desse processo em suas relações: sociais, políticas, ideológicas, culturais, jurídicas etc. Palavras-chave: Memorial Escolar, Relação Escola-Bairro, Relação Comunidade- Escola.

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Título: Jardim Boa Vista: sua história, o papel da EMEF Solano Trindade e do

Memorial Escolar no processo de transformação

Aluno: Augusto Rolim Saraiva

N° USP: 7611943

Programa: PIC/FE – Faculdade de Educação

Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga

Resumo: O presente projeto está vinculado ao Projeto de Pesquisa “Memória,

narrativa e a dimensão discursiva da experiência escolar” e ao Projeto de

Extensão “Memórias, histórias, pertencimento: pesquisa colaborativa na escola e

comunidade, formação docente e identidade local”, ambos coordenados pela

Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga. Este trabalho de Iniciação Científica

tentará perceber as transformações ocorridas no bairro Jardim Boa Vista, na Zona

Oeste de São Paulo, buscando compreender a participação da EMEF Solano

Trindade e do Memorial nesse processo contínuo. A pesquisa partirá da ideia de

que o lugar não é apenas um produto das relações econômicas, mas é, ao

mesmo tempo, determinado pelos sujeitos desse processo em suas relações:

sociais, políticas, ideológicas, culturais, jurídicas etc.

Palavras-chave: Memorial Escolar, Relação Escola-Bairro, Relação Comunidade-

Escola.

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Sumário

1. Introdução...........................................................................................................3

2. Contextualização do bairro e da escola...........................................................5

2.1 O bairro Jardim Boa Vista............................................................................5

2.2 EMEF Solano Trindade.....................................................................................11

3. Fundamentação Teórica...................................................................................14

4.1 Métodos..............................................................................................................21

5. Cronograma das atividades.............................................................................22

5.1 Atividades realizadas até o momento.............................................................22

5.2 Cronograma das próximas atividades............................................................24

Referências bibliográficas.....................................................................................25

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1. Introdução

O presente projeto está vinculado ao Projeto de Pesquisa “Memória,

narrativa e a dimensão discursiva da experiência escolar” e ao Projeto de

Extensão “Memórias, histórias, pertencimento: pesquisa colaborativa na escola e

comunidade, formação docente e identidade local”, ambos coordenados pela

Profa. Dra. Elizabeth dos Santos Braga.

Este trabalho de Iniciação Científica possui o intuito de dar continuidade a

um projeto já consolidado dentro da EMEF Solano Trindade através das práticas

cotidianas na escola, na relação da mesma com o memorial e o bairro. A relação

da escola com o bairro e de que forma a escola, ou seja, a sua comunidade

escolar, participa do processo de construção e ressignificação do espaço é

também tematizada., Em relação ao Memorial Solano Trindade, neste momento,

busca-se uma maior autonomia da comunidade escolar em relação ao

funcionamento regular e às atividades aí desenvolvidas.

Os projetos de iniciação científica anteriores apontaram diversos aspectos

relevantes na relação do Memorial com os alunos, na relação do Memorial com os

professores, na importância do estudo do bairro para o ensino entre outros. 1

Já o trabalho presente tentará perceber as transformações ocorridas no

bairro Jardim Boa Vista, na Zona Oeste de São Paulo, buscando compreender a

participação da EMEF Solano Trindade e do Memorial nesse processo contínuo.

A pesquisa partiu da ideia de que o lugar não é apenas um produto das

relações econômicas ou de que a um bairro periférico seria apenas o lado

desprivilegiado economicamente na relação com os bairros centrais, como se

1 “Relações sociais e seus significados no contexto escolar e seu entorno: um estudo etnográfico” de Thaís

Brando Balázs da Costa Faria, 2010; “Memorial escolar: seus impactos e significados na escola e no bairro”,

2013 e “Memórias na escola: a participação dos alunos na dinâmica do memorial escolar”, 2014, ambos feitos

por Larissa de Magalhães Rosa Andrade; “Prosseguindo o trabalho com o memorial escolar: sua dinâmica e

significados para a comunidade", 2013 de Lia Ikeoka; "Uma proposta pedagógica com o memorial escolar: sua

dinâmica e significados para os alunos", 2014 e “Prosseguindo o trabalho com os alunos no memorial escolar:

uma proposta pedagógica com o Ciclo Autoral do Ensino Fundamental”, 2015, ambos de Camila Rissato

Santos.

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buscaram caracterizar as diferentes formações periféricas. A partir da

compreensão de que o bairro é um lugar e como tal é, ao mesmo tempo,

determinado pelos processos econômicos urbanos e pelos sujeitos desse

processo em suas relações sociais, políticas, ideológicas, culturais, jurídicas etc.

Assim, a pesquisa busca uma compreensão das transformações do bairro

Jardim Boa Vista percebendo a participação da Escola Municipal de Ensino

Fundamental Solano Trindade e do Memorial Solano Trindade nesse processo.

O trabalho de pesquisa se realiza em diferentes etapas que ocorrem, em

alguns casos, simultaneamente e não em ordem cronológica, tais como:

- Refletir sobre os processos que determinam a reprodução sócio-espacial na

metrópole de São Paulo e que podem ter influenciado na história do bairro Jardim

Boa Vista;

- Analisar as transformações que ocorreram no bairro a partir dos documentos

existentes no memorial, da pesquisa de campo e observação no bairro, da entrevista

de moradores, estudantes e professores, bem como documentos de órgãos

públicos;

- Compreender a importância da EMEF Solano Trindade e do Memorial Escolar nas

relações sócio-espaciais estabelecidas pelos moradores do bairro e nas suas

possibilidades de transformação;

- Auxiliar na organização e no funcionamento do Memorial Escolar, assim como de

exposições temáticas de seu acervo;

- Disponibilizar o conhecimento gerado na pesquisa para a comunidade, no próprio

Memorial e em exposições.

2. Contextualização do bairro e da escola

2.1 O bairro Jardim Boa Vista

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O bairro Jardim Boa Vista está localizado na Zona Oeste do Município de São

Paulo, pertencente à área de abrangência da Subprefeitura do Butantã, mais

especificamente ao Distrito Raposo Tavares. Para se compreender de maneira

profunda o bairro Jardim Boa Vista é necessário conhecer o processo histórico de

formação geográfica da região.

A partir de informações da Base de Dados da Subprefeitura do Butantã (SP/BT)

2008, a região do Butantã foi rota de passagem para os bandeirantes ao interior

do país. “Foi nessa região que Afonso Sardinha montou o primeiro trapiche de

açúcar da vila de São Paulo, em sesmaria obtida em 1607. As terras da antiga

sesmaria tiveram várias denominações: Ybytatá, Uvatantan, Ubitatá, Butantan e,

finalmente, Butantã. Há duas versões para o significado do nome ‘Butantã’: ‘terra

socada e muito dura’ e ‘lugar de vento forte’”.2 Esta sesmaria foi doada para o

Colégio de São Paulo e em 1759, com a expulsão dos jesuítas, as terras foram

confiscadas e vendidas. As terras tiveram vários donos até que um dos últimos

proprietários, a família Vieira de Medeiros, vendeu em 1915 para a Cia. City

Melhoramentos, companhia responsável pela urbanização das margens do Rio

Pinheiros.

2 Base de Dados Subprefeitura Butantã 2008. Prefeitura da Cidade de São Paulo, Secretaria de

Coordenação das Subprefeituras, Subprefeitura do Butantã, Apresentação, sem número.

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Antigo Mapa da região do Butantã – 1924.

Fonte: http://vivaobutanta.blogspot.com.br/ Acessado em 22 de Mar. De 2016.

A região do Butantã foi ocupada através de diversos sítios em toda sua

extensão, que depois foram loteados e vendidos como parte do processo de

expansão da malha urbana da cidade de São Paulo. Um grande marco no processo

de urbanização da região foi a instalação do Instituto Butantã em 1898. “O Instituto

Butantã foi oficialmente inaugurado em 1901. Sua origem está associada ao

combate da peste bubônica, que por volta de 1898 causava uma epidemia em

Santos, litoral paulista. Para produzir o soro contra a peste, foi escolhida uma área

fora do perímetro urbano da cidade de São Paulo.”3 Posteriormente, em 1934, foi

construída dentro da área do Instituto Butantã, aquela que veio a se tornar a

principal universidade do Brasil, a Universidade de São Paulo. Tais instituições

3 Idem.

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tiveram um papel importante no processo de urbanização da região que, até o início

do século XX, ainda possuía características de uma área rural.

Início do loteamento da região do Butantã na década de 1940.

Fonte: http://vivaobutanta.blogspot.com.br/ Acessado em 22 de Mar. De 2016

“A partir dos anos 1920, começaram a surgir os primeiros bairros como Vila

Butantã, Vila Lageado e Cidade Jardim. Nos anos 1930, surgiram os bairros Peri

Peri, Vila Clotilde, Vila Gomes e Caxingui. Nas décadas de 1940 e 1950, foram os

bairros Jardim Guedala, Previdência, Vila Progredior, Vila Hípica, Jardim Ademar,

Jardim Trussardi, Vila Pirajussara. (...) Entre os anos 1950 e 1960, surgiram os

bairros Rolinópolis, Esmeralda, Ferreira, Monte Kemel, Vila Maria Augusta, Jardim

Bonfiglioli, Jardim Pinheiros entre outros.”

Para tentar compreender como se deu a formação dos bairros mais

periféricos da região do Butantã, os quais se localizam principalmente nos distritos

Raposo Tavares e Rio Pequeno, é preciso considerar os aspectos que estão direta

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ou indiretamente relacionados ao processo de periferização que marcou o

crescimento e a consolidação da cidade de São Paulo.

“A formação dos bairros mais periféricos da região do Butantã, localizados nos

distritos Raposo Tavares e Rio Pequeno, não pode ser compreendida sem

considerar alguns aspectos da formação e expansão urbana do próprio município de

São Paulo, sobretudo no que se refere ao processo de periferização que marcou o

crescimento e consolidação da cidade.

A criação de um sistema de transporte baseado no ônibus facilitou o acesso a

essas áreas mais periféricas e operou no sentido de mudar o padrão de urbanização

da cidade. Inicialmente, as linhas de ônibus cobriam, sobretudo, as áreas centrais,

mais lucrativas. No entanto, esse tipo de transporte não exigia percurso fixo, nem

grandes investimentos iniciais, permitindo, ao contrário do bonde, a constituição de

redes ramificadas de transporte em áreas de baixa densidade demográfica,

favorecendo, assim, a implantação de loteamentos periféricos”.4

Assim, o processo de urbanização da região está relacionado à possibilidade

do uso de meios de transporte de uma região afastada do centro urbano. Já o

surgimento dos meios de transporte motorizado foi um passo adiante na expansão

da malha de transportes, que antes estavam concentrados no centro de São Paulo

através dos chamados “bondinhos” sobre trilhos. A utilização de ônibus está

relacionada não só aos avanços tecnológicos da indústria automobilística norte-

americana e europeia, mas também ao processo de industrialização da cidade de

São Paulo. O surgimento de fábricas a partir do capital investido pelos banqueiros e

barões do café exigia não só a existência de trabalhadores, mas de meios para

esses trabalhadores poderem morar e se locomover até o local de trabalho, servindo

assim como mão de obra.

A partir dos anos 1950, a expansão urbana da cidade de São Paulo foi

caracterizada “pelo padrão periférico de crescimento da cidade, baseado no trinômio

loteamento/periferia/casa própria”.5 O processo acelerado de industrialização da

4 Idem.

5 Idem.

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década de 50, em especial no governo de Juscelino Kubitschek, com o grande ritmo

de investimento do capital estrangeiro no Brasil, em especial na região metropolitana

de São Paulo com a vinda das grandes montadoras de automóveis, levou a um

aumento considerável do fluxo dos imigrantes, em especial nordestinos, que

chegavam em São Paulo buscando novas oportunidades de trabalho e de moradia.

Apesar do crescimento da cidade e do transporte público ter chegado em

massa a áreas mais periféricas, a expansão urbana segue para regiões ainda mais

distantes. A população que não tinha condições de adquirir lotes nestas áreas, por

ser mais pobre, acaba encontrando a favela como sua única opção de moradia, já

que as favelas formaram-se, em grande parte, nas áreas livres de loteamento: áreas

de uso comum (jardins, praças, etc.), áreas próximas a córregos e, no caso do

Jardim Boa Vista e de grande parte do distrito Raposo Tavares, na Macrozona da

Proteção Ambiental – destinada a preservação e conservação ambiental.

Em 1968, onde se localiza atualmente o bairro Jardim Boa Vista, havia uma

chácara pertencente a uma família de japoneses. Posteriormente, boa parte da

área foi vendida à Samara Empreendimentos e a família ficou apenas com uma

pequena gleba.

O fim da década de 70 e as duas décadas seguintes foram muito importantes

para o crescimento e consolidação do bairro - apenas em 1977 o bairro começou a

contar com linhas de transporte público e a conquista por água encanada e

legalização do loteamento ocorreu somente em 1980. Tais conquistas foram o

resultado da mobilização da comunidade em torno da luta pela garantia das

condições mínimas necessárias para se viver ali. Com uma comunidade formada em

sua quase totalidade por trabalhadores, o bairro viveu um momento de ebulição

política, assim como o Brasil viveu um período de grande turbulência com o final da

ditadura militar. O clima de mobilização e de radicalização dos trabalhadores foi um

elemento importante na conquista das melhorias para o bairro.

Buscando discutir problemas relativos ao bairro, uma equipe de trabalho

edifica-se como União dos Moradores do Jardim Boa Vista em 1979 e, após ser

reconhecida judicialmente, começa a buscar soluções para os problemas

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encontrados. Infelizmente, por problemas de organização política, a diretoria da

União dos Moradores se divide, criando, assim, uma nova entidade, a Sociedade

dos Amigos de Bairro do Jardim Boa Vista.

Muitos movimentos ocorreram no bairro, entre 1992 e 1996, como, por

exemplo, a construção e ampliação da sede da “Sociedade dos Amigos de Bairro do

Jardim Boa Vista”; construção e ampliação de escolas de primeiro e segundo grau;

canalização do córrego situado ao lado da EMEF Solano Trindade; arborização;

mais linhas de ônibus ligando o bairro a outras localidades de São Paulo;

calçamento das vielas; conscientização da população em relação ao meio ambiente;

construção de um posto de saúde etc.6

Dessa maneira, o bairro Jardim Boa Vista cresceu largamente com o passar

dos anos e, atualmente, abriga mais de 15 mil famílias. Segundo os dados do

Observatório Rede Nossa São Paulo, no Distrito Raposo Tavares moram cerca de

100.743 habitantes.

Existem diversas instituições escolares no bairro Jardim Boa Vista como: a CEI

Roberto Arantes Lenhoso, a EMEF Solano Trindade, a EMEI Deputado Gilberto

Chaves, a E. E. Prof. Oswaldo Walder e o Colégio Waldorf Micael de São Paulo,

este último da rede particular de ensino.

No distrito Raposo Tavares há quatro Unidades Básicas de Saúde (UBS) que

realizam diariamente o atendimento de Atenção Básica (ações de saúde que

trabalham com promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação) e

Integral (ações de saúde que oferecem assistência de diversos profissionais

capacitados como, por exemplo, assistência odontológica), sendo que uma está

localizada no Jardim Boa Vista.

Dos problemas existentes no surgimento do bairro, alguns permanecem até os

dias atuais, como a precariedade do transporte público, falta de segurança e a

6 “Memorial escolar: seus impactos e significados na escola e no bairro”, 2013 de Larissa de Magalhães Rosa

Andrade.

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pouca iluminação pública. Há uma grande demanda por áreas para prática de

esporte e de lazer, uma vez que há uma enorme carência de equipamentos culturais

públicos e privados na região. Há um movimento de moradores e das associações

de bairro que lutam pela construção do parque linear ao redor do córrego, uma

reivindicação que busca atender não só a utilização da área para lazer, mas também

para garantir uma área verde na região e melhorias no saneamento básico.

Entretanto, é preciso dialogar com as comunidades do Morumbizinho e Mar

Vermelho, uma vez que eles seriam diretamente afetados pela construção do

parque, podendo inclusive haver remoção de moradias.

Dentre os movimentos coletivos existentes do bairro podemos citar a –

ACOMI (Associação Comunitária Micael), Sociedade dos Amigos de Bairro Jardim

Boa Vista, Associação Vira Lata, União dos Moradores da Favela do Jardim Boa

Vista, Associação de moradores do Morumbizinho e Associação do Mar vermelho.

Cada uma dessas associações realiza um trabalho diferente no bairro.

[A] Associação Comunitária Micael – ACOMI (trabalha a pedagogia

waldorf com as crianças do bairro e também realiza o atendimento

nas áreas de saúde e de arte a crianças e adultos da comunidade),

Associação Vira Lata (trabalha com a coleta e a reciclagem de lixo,

antigamente realizada por pessoas do bairro, e hoje por uma

equipe composta por outras pessoas da Zona Oeste de São

Paulo); a sede localiza-se no bairro, mas o trabalho já não

foca esta população), Sociedade Amigos de Bairro do Jardim Boa

Vista (representa os moradores do bairro, mas está desativada

atualmente) e União de Moradores da Favela do Jardim Boa

Vista (representa os moradores da favela e é hoje uma das mais

ativas no bairro. (FARIA, 2010, p. 13)

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Algumas instituições do bairro (escolas, UBS e associações) criaram um

movimento denominado Rede Boa Vista. Por meio de reuniões mensais, eles

buscam identificar as possibilidades existentes no bairro.

A Rede Boa Vista é formada por um grupo de profissionais que,

desde 2010, se reúne mensalmente visando unir todos os esforços

existentes no bairro. Procura-se, então, promover a participação

da população em discussões que envolvem os problemas que

afetam a todos os indivíduos do bairro.

As instituições que participam desses encontros, por meio de representantes, são: PAVS (Projeto Ambientes Verdes e Saudáveis, da Secretaria Municipal do

Verde e Meio Ambiente); EMEF Solano Trindade, E.E. Oswaldo Walder, EMEI Deputado Gilberto Chavez, CEI Roberto Lanhoso, Colégio Waldorf Micael de São Paulo, Associação Comunitária Micael e a UBS. (ANDRADE, 2013, p. 55)

A Rede Boa Vista passa por um processo de reorganização a partir da entrada

de novas instituições e das novas possibilidades de atuação à margem das ações

oficiais do Estado, mas também se apropriando das possibilidades de parceria com

a prefeitura entre outras esferas de governo.

2.2 EMEF Solano Trindade

A história da Escola Municipal de Ensino Fundamental Solano Trindade se

confunde com a história do próprio bairro Jardim Boa Vista. A rápida urbanização

iniciada na região a partir da década de 60 e 70 levou à demanda por serviços

públicos que atendessem as necessidades mais elementares da população tais

como água encanada, saneamento básico, energia, asfalto, transporte público e

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escolas. A permanência daquelas famílias naquele espaço, muitas delas formadas

por imigrantes nordestinos, dependia da garantia das condições de estudo para seus

filhos, não só para o benefício intelectual e social destes, mas para eles pudessem

se deslocar até o trabalho podendo deixar suas crias em um ambiente seguro.

Inicialmente, a Escola Municipal de Primeiro Grau (EMPG) Jardim Boa Vista,

conhecida carinhosamente pela comunidade como barracão, começou a funcionar

em 1980 em uma construção de madeira, simples e rústica. Ao seu lado, havia um

prédio de alvenaria que abrigava os sanitários (dos professores e alunos) e também

a cozinha.7

O Decreto n.º 16.529, de março de 1980, marcou a criação da Escola Municipal

de Primeiro Grau (EMPG) Jardim Boa Vista. Em Novembro do mesmo ano, a escola

ganha o seu Patrono, o poeta Solano Trindade, através do Decreto n° 17.014, de

Novembro de 1980. A EMPG Jardim Boa Vista torna-se Escola Municipal de

Primeiro Grau (EMPG) Solano Trindade.

O barracão é desocupado, cedendo lugar à EMEI Deputado Gilberto Chaves –

o novo prédio da EMEF Solano Trindade, local em que se situa até os dias atuais é

inaugurado em 1982. Na ocasião, o prédio da escola foi inaugurado com a

participação especial de Raquel Trindade, a filha do poeta Solano Trindade.

7 Idem.

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Antiga sede da escola, o “barracão” em 1981

Antiga sede da escola, o “barracão” em 1982.

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Inauguração do novo prédio da EMEF Solano Trindade, 1982.

Já em Janeiro de 1999 é publicado o Decreto n° 37.796. A EMPG Solano

Trindade torna-se Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Solano

Trindade.

Localizada no bairro Jardim Boa Vista, na divisa com Osasco, a EMEF Solano

Trindade possui ao seu redor o Colégio Waldorf Micael de São Paulo, a favela

do Morumbizinho, a comunidade do Mar Vemelho e um córrego. A escola já

esteve envolvida diretamente em diversas ações com o objetivo de preservar e

manter limpo o córrego que passa ao seu lado e evitar que houvesse novas

enchentes que sempre afetaram de uma maneira trágica a vida de muitos

moradores que perdiam suas casas e/ou seus pertences, quando não perdiam a

vida de moradores. Uma das diversas campanhas desenvolvidas pela escola foi

a passeata “Todo lixo vira arte” em maio de 2010. A atividade foi organizada

pelos funcionários da escola e pelos alunos representados pelo Grêmio, em

parceria com outras instituições (UBS, E.E. Oswaldo Walder, ACOMI, Colégio

Waldorf Micael de São Paulo, etc.). O objetivo da mobilização era chamar a

atenção dos órgãos competentes em relação ao problema do córrego sem

canalização e poluído que passa ao lado da EMEF Solano Trindade. A

passeata foi dividida em alas que representavam o presente (ruas sujas, rio

malcheiroso, etc.) e o futuro do bairro (ruas limpas, parque linear ao longo do

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córrego, árvores, etc.). Tal movimento é um dos exemplos mais marcantes

acerca de que forma a escola intervém no processo de transformação do bairro

e dos próprios moradores.

O início do projeto da Profª. Elizabeth Braga na escola “Memória, narrativa e a

dimensão discursiva da experiência escolar” em 2009 deu um novo impulso na

relação da comunidade escolar consigo mesma e com a comunidade ao redor da

escola. Como consequência deste projeto ocorreu a inauguração do Memorial

Solano Trindade como um espaço físico não só para guardar o acervo de materiais

e registros da escola, do seu bairro e de seu patrono, assim como para abrigar

exposições temáticas diversas organizadas em conjunto com professores e alunos.

O Memorial Solano Trindade se divide em três eixos de atuação. O Eixo

“Escola” visa contar, armazenar, resignificar a história da escola. O eixo “Bairro” que

visa contar, armazenar, resignificar a história do bairro. E o eixo “Patrono” que visa

contar, armazenar, resignificar e divulgar a história do patrono Solano Trindade.

Desde a sua criação, o Memorial Solano Trindade participou de diversas exposições

e atividades envolvendo alunos, professores, direção escolar e moradores do bairro.

Algumas das inúmeras exposições realizadas foram a exposição de materiais

pedagógicos em 2015, a exposição em comemoração aos 35 anos da EMEF Solano

Trindade no mesmo ano, a exposição de materiais permanentes em 2014 sobre os

três eixos do Memorial Solano Trindade (Patrono, bairro e escola), uma exposição

em homenagem ao professor e funcionário da escola Vitório, que recebeu esta

homenagem após o seu falecimento.

3.1 Fundamentação Teórica

Este projeto está vinculado ao Projeto de Pesquisa e Extensão “Memórias,

histórias, pertencimento: pesquisa colaborativa na escola e comunidade, formação

docente e identidade local” coordenado pela Profª. Dra. Elizabeth dos Santos Braga,

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desenvolvido na EMEF Solano Trindade, no bairro Jardim Boa Vista, na Zona Oeste

de São Paulo. Tal projeto busca uma reflexão acerca do processo de composição de

narrativas sobre as práticas sociais que ocorrem na escola e no bairro, procurando

identificar elementos característicos próprios de uma memória coletiva e discursiva.

Para a compreensão do papel da EMEF Solano Trindade no bairro Jardim Boa

Vista é necessário compreender o papel que o bairro desempenha numa metrópole

como São Paulo. Tal dimensão não servirá para minimizar as relações existentes

intrabairro, mas para compreender de que forma o “todo” afeta o “particular” e de

que forma o “particular” afeta o “todo” a partir de diferentes escalas. Todo processo

social possui um tempo histórico e dessa forma, não é possível compreender o

espaço atual sem observar o seu desenvolvimento histórico.

Seria impossível pensar em evolução do espaço se o tempo não

tivesse existência no tempo histórico, (...) a sociedade evolui no

tempo e no espaço. O espaço é o resultado dessa associação que se

desfaz e se renova continuamente, entre uma sociedade em

movimento permanente e uma paisagem em evolução permanente.

(...) Somente a partir da unidade do espaço e do tempo, das formas e

do seu conteúdo, é que se podem interpreta as diversas modalidades

de organização espacial. (SANTOS, 1979, pp. 42-43).

Para compreensão do espaço é preciso investigar a sua história. A região da

subprefeitura do Butantã, onde está localizado o bairro Jardim Boa Vista, foi uma

antiga rota de passagem de bandeirantes e jesuítas para o interior do Brasil em suas

expedições. Na maior parte da existência da cidade de São Paulo, que remonta o

século XVI, esta região se manteve como uma rota de passagem e posteriormente

como uma área rural próxima à cidade, mas distante do seu centro histórico na

região Sé e do Pátio do Colégio.

Entretanto, há historiadores e arqueólogos que contestam a ideia de que a

região foi primeiro foi habitada pelos bandeirantes e jesuítas. Para estes

pesquisadores, antes de se tornar uma rota de passagem para os bandeirantes ela

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já era uma rota de passagem para povos indígenas que faziam a travessia do litoral

do oceano Atlântico até o oceano Pacífico. Tal tese surgiu após a descoberta de

uma fonte escondida em um sítio na região do Morro do Querosene. O local é uma

das nascentes da bacia do Pirajussara, mas alguns pesquisadores vão além e

defendem que a fonte faz parte do Caminho do Peabiru, uma enigmática rota

indígena que já existia antes da chegada dos europeus à América do Sul. “O

caminho cruzava o continente ligando o oceano Atlântico ao Pacífico, estendendo-se

do Peru ao sul do Brasil. Essa rota teria sido apresentada ao português Aleixo

Garcia no começo do século XVI. Posteriormente, bandeirantes e tropeiros seguiram

a mesma trilha.” 8

O acelerado desenvolvimento industrial do Brasil nas décadas de 50 e 60 teve

como uma de suas consequências o aumento da concentração industrial na região

Sudeste, em especial na região metropolitana de São Paulo. O plano de metas do

Governo Federal de Juscelino Kubitschek levou a uma entrada vertiginosa de capital

estrangeiro no país, liderado pelas indústrias montadoras automobilísticas e

indústrias de autopeças, indústria química e petroquímica. O impasse no campo

gerado por uma elevada concentração de terras sob o controle de grandes

latifundiários e empresas agrícolas que iniciavam o processo de mecanização da

produção rural, acelerando ainda mais o processo de êxodo rural.

O forte desenvolvimento industrial na cidade de São Paulo verificado na cidade

de São Paulo nos anos 50 e 60 coincide com o aumento do número de imigrantes

vindos de todas as partes do país, em especial o Nordeste, em busca de

oportunidades para uma vida melhor com trabalho e moradia. É justamente neste

período que se intensifica o processo de urbanização da região do Butantã. Uma

região naquele momento ainda afastada do centro urbano de São Paulo, mas uma

possibilidade de vida para aqueles que chegaram à cidade sem um local para morar.

A região do Butantã já vivia um processo desenvolvimento a partir da fundação do

Instituto Butantã em 1858 e posteriormente, em 1934 com a fundação da

Universidade de São Paulo.

8 Fonte: http://www2.uol.com.br/historiaviva/noticias/vestigios_pre-colombianos_em_sao_paulo.html

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Desde o seu surgimento, o bairro Jardim Boa Vista passou por diversas

transformações evidentes tais como: a regularização de áreas de loteamento, o

fechamento da pedreira, o fim das enchentes no córrego que “corta” o bairro, a

formação de novas comunidades e condomínios fechados, o aumento do problema

da violência, entre muitas outras. Tais transformações ocorridas no bairro serão

melhor detalhadas no relatório final. Entretanto, “por detrás” das mudanças

aparentes, há diversas perguntas pertinentes que podem ser feitas tais como: Como

a comunidade participou deste processo? Como o bairro conquistou a instalação de

equipamentos públicos e se relacionou com eles? Quais são as demandas atuais da

comunidade?

Já a história da EMEF Solano Trindade parece se confundir com a história do

bairro Jardim Boa Vista. A construção dessa, que antes funcionava em uma casa de

madeira, pode ter sido uma das conquistas da comunidade no começo da abertura

política, após tantos anos de Ditadura Militar, na sua luta para garantir as condições

básicas para moradia e de vida. Não por acaso, naquele momento havia uma

grande efervescência política e cultural no Brasil, que pode ter sido sentida e vivida

de forma singular naquele lugar.

Mas, para se compreender o papel de uma escola no processo de

transformação do bairro é preciso compreender o que é o espaço e como ele se

transforma. Para o geógrafo Ruy Moreira,

“O espaço é um produto da história. Um ato de sujeitos. Sua matéria-prima é a

relação homem- meio” (MOREIRA, 2012, p. 30). Assim, a partir do conceito de

reprodução social do espaço, o espaço é o produto do intercâmbio do homem com a

natureza e nessa relação, ele extrai as suas condições de sobrevivência; ao mudar a

natureza, o homem ao mesmo tempo muda a si mesmo. Assim, a noção de espaço

perde um caráter meramente físico ou material, para ganhar uma dimensão humana.

Já para Milton Santos “O espaço é um verdadeiro campo de forças cuja

formação é desigual. Eis a razão pela qual a evolução espacial não se apresenta de

igual forma em todos os lugares”. (SANTOS. 1979 p.122). Assim, a ideia de um

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espaço homogêneo, assim como de um cidade homogênea se desfaz a partir de

suas contradições.

(...) O espaço por suas características e por seu funcionamento, pelo

que ele oferece a alguns e recusa a outros, pela seleção de

localização feita entre as atividades e entre os homens, é o resultado

de uma práxis coletiva que reproduz as relações sociais, (...) o

espaço evolui pelo movimento da sociedade total.

(SANTOS, 1978, p. 171).

Para Milton Santos, o espaço precisa ser considerado como totalidade:

conjunto de relações realizadas através de funções e formas apresentadas

historicamente por processos tanto do passado como do presente. O espaço é

resultado e condição dos processos sociais, elaboração amplamente difusa na

geografia dos anos 1970-80 em países como a França, EUA e Brasil, pois era

compreendido como uma categoria fundamental quando predominava a utilização

de princípios do materialismo histórico e dialético. Desse modo, o espaço, além de

instância social que tende a reproduzir-se, tem uma estrutura que corresponde à

organização feita pelo homem. É também uma instância subordinada à lei da

totalidade, que dispõe de certa autonomia, manifestando-se por meio de leis

próprias. Assim, o espaço organizado é também uma forma resultante da interação

de diferentes variáveis. O espaço social corresponde ao espaço humano, lugar de

vida e trabalho: morada do homem, sem definições fixas. O espaço geográfico é

organizado pelo homem vivendo em sociedade e, cada sociedade, historicamente,

produz seu espaço como lugar de sua própria reprodução.

Desta forma, estudar o bairro é estudar a relação estabelecida pela

comunidade com o meio.

Para Ana Fani Alessandri Carlos (2011, p. 69):

[...] a reprodução continuada do espaço se realiza enquanto aspecto

fundamental da reprodução ininterrupta da vida. Esse processo entre sociedade e

natureza segunda implica o entendimento de várias relações: sociais, políticas,

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ideológicas, jurídicas, culturais etc., compondo os níveis da realidade e dominando

um modo de produzir, pensar e existir, e, por extensão, também, um modo de vida.

Assim, pesquisar sobre o bairro é pesquisar a história dos sujeitos que se

relacionam com esse lugar, as relações que esses sujeitos produzem entre si e ao

mesmo tempo com suas dinâmicas próprias de suas vidas.

Logo, se o espaço é produto das relações sociais estabelecidas com o meio

em que vivem, como uma instituição de ensino local pode participar desse

processo?

A perspectiva histórico-cultural, criada por Lev Vygotsky, pode contribuir no

sentido de nos ajudar a compreender os diferentes fatores que envolvem o

desenvolvimento do individuo. De acordo com o modelo histórico-cultural, os traços

de cada ser humano estão intimamente relacionados ao aprendizado, à

apropriação do legado do seu grupo cultural. O comportamento e a capacidade

cognitiva de um determinado indivíduo dependerão de suas experiências, de sua

história educativa, que, por sua vez, sempre terão relações com as características

do grupo social e da época em que ele se insere (REGO, 2002, p. 50).

Assim, a escola, como um espaço de vivência importante na vida da criança e

do adolescente, possui um papel significativo no processo de aprendizagem e de

formação dos sujeitos que constituem a história do bairro. Além disso, qual a

importância da memória do bairro e da escola para os estudantes, que são sujeitos

do lugar onde moram?

Os bairros urbanos, conceituados pelos urbanistas como uma área

de características físicas e sócioeconômicas bem definidas e sendo

assim lugares, não são percebidos dessa maneira pela população

que lá reside. Já rua onde moram, é parte da experiência íntima de

cada um. O sentimento que se tem pela esquina da rua local não se

expande automaticamente com o passar do tempo até atingir o

bairro. (TUAN, Yi-Fu. 1983, p.11)

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A compreensão do conceito de lugar é uma possibilidade para se interpretar a

importância da cada espaço a partir da importância que ele tem para aqueles que se

relacionam com o próprio espaço, assim, não há uma definição genérica que possa

compreender o significado de um lugar, mas significações a partir das diferentes

relações estabelecidas.

Para Vygotsky (2001, p. 70), “Na educação [...] não existe nada de passivo, de

inativo. Até as coisas mortas, quando se incorporam ao círculo da educação,

quando se lhes atribui papel educativo, adquirem caráter ativo e se tornam

participantes ativos desse processo”.

O espaço, considerado como um mosaico de elementos de

diferentes eras, sintetiza, de um lado a evolução da sociedade e

explica, de outro lado, situações que se apresentam na atualidade.

(...) a noção de espaço é assim inseparável da ideia de sistemas de

tempo. (SANTOS, 1985, pp. 21-22)

Assim, a criação do Memorial na EMEF Solano Trindade em 2010 pode ter sido

um passo no sentido de ressignificar a história da escola, do bairro, de seu patrono

para toda comunidade local e escolar. Mas de que forma o Memorial pode ter

contribuído, ou poderá contribuir, para a transformação da escola, de sua relação

com a comunidade e o bairro?

A memória só conta realmente para os indivíduos, as coletividades, as

civilizações, se mantiver junto a marca do passado e o projeto do futuro, se permitir

fazer sem esquecer aquilo que se pretende fazer, tornar-se sem deixar de ser, ser

sem deixar de tornar-se (LEFEBVRE, 2006, p. 19).

Em um momento em que se discute o papel da escola pública na sociedade

brasileira a partir da constatação de uma crise, em que se percebe um

distanciamento dos estudantes em relação à escola, a resposta para tais perguntas

podem ajudar na compreensão dos desafios colocados para a educação no século

XXI. Assim, tal pesquisa tem o objetivo de contribuir para o desenvolvimento social e

humano da comunidade local e escolar, que mora em um lugar onde são sujeitos

ativos de sua transformação.

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4.1 Métodos

O trabalho desenvolvido tem como método básico a pesquisa qualitativa e

como procedimentos para a realização do mesmo: observação participante,

entrevistas e análise documental.

Na pesquisa qualitativa ou naturalística, o ambiente natural é sua fonte direta

de dados e o pesquisador é o seu principal instrumento, os dados coletados são

predominantemente descritivos, a preocupação com o processo é maior do

que o produto, o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos

de atenção especial do pesquisador e a análise dos dados tende a seguir um

processo indutivo (LUDKE E ANDRÉ, 1986).

A observação participante é combinada simultaneamente à análise documental

e à entrevista. Trata-se de um tipo de estratégia que pressupõe um grande

envolvimento do pesquisador na situação estudada.

A análise documental busca identificar informações factuais nos documentos a

partir de questões ou hipóteses de interesse. O Memorial já possui um grande

acervo de documentos a serem analisados, assim como é possível pesquisar

documentos em órgãos públicos, jornais, revistas sobre o bairro e a escola,

associações de bairro, etc.

Já uma das grandes vantagens da entrevista é que se estabelece uma

interação entre pesquisador e pesquisado, ao contrário de outros métodos, como a

observação unidirecional, por exemplo, onde se estabelece uma relação hierárquica

entre ambos.

5. Cronograma das atividades (Período: 01/10/2015 a 30/09/2016)

5.1 Atividades realizadas até o momento

Outubro, Novembro e Dezembro de 2015

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Nas atividades do projeto de pesquisa do primeiro trimestre do projeto

(Outubro, Novembro e Dezembro de 2015) foi feito o trabalho de reorganização do

Memorial Solano Trindade, uma vez que o mesmo passou por uma reforma. Foram

feitas diversas visitas ao espaço para a continuidade da organização do mesmo.

Foram feitas diversas reuniões para organização e escrita de um livro com

diversos artigos escritos pelos professores da EMEF Solano Trindade, pela Profa.

Elizabeth Braga, pelo bolsista atual (por mim) e ex-bolsistas. Esse livro abordará em

seus diferentes artigos e a partir de diferentes ângulos os trabalhos realizados pelos

professores em associação com o Memorial Solano Trindade nos últimos anos

desde a inauguração do próprio Memorial. O livro relatará a história recente da

escola e os impactos dos projetos desenvolvidos desde o início das atividades do

Memorial Solano Trindade. Participo de forma mais direta na escrita de um artigo

sobre a história do patrono, o poeta e ator Solano Trindade, e a sua importância na

história da escola e da comunidade, assim como e quando mudou a relação da

escola com o seu patrono.

Após a reforma do Memorial foi feito um trabalho de preparação e organização

da exposição em comemoração aos 35 anos da EMEF Solano Trindade. Essa

exposição foi preparada a partir da coleta de depoimentos de professores ativos e

aposentados, funcionários ativos e aposentados, alunos e ex-alunos, funcionários da

coordenação e da direção, assim como aposentados da escola. A comemoração dos

35 anos da escola contou ainda com a apresentação da peça de teatro “Se tem

gente com fome, daí de comer” uma homenagem a Solano Trindade, encenada

pelos grupos “Ô de casa” e “Casillêoca”, tendo como participação o filho do Solano

Trindade, o ator Liberto Trindade.

Janeiro, Fevereiro e Março de 2016

No segundo trimestre (Janeiro, Fevereiro e Março/2016) foi realizado o estudo

de obras que possam contribuir na realização do projeto e na compreensão do

problema proposto na elaboração do projeto de iniciação científica, a partir do

estudo do bairro Jardim Boa Vista e da participação da escola na transformação do

mesmo.

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Foi dada continuidade às reuniões de escrita do livro em conjunto com os

professores sobre a escola.

Foi dada continuidade à reorganização do espaço do Solano Trindade.

Foi feito o registro de atividades escolares, tais como o “Dia de combate à

dengue”, quando ocorreu uma passeata dos alunos e professores pela comunidade

com o objetivo de alertar para a prevenção dos riscos para a proliferação do

mosquito Aedes Aegypti e das doenças transmitidas pelo mesmo. Após esta

atividade, foi realizada uma exposição no Memorial Solano Trindade com o objetivo

de divulgar as atividades realizadas pelos alunos no “Dia de combate à dengue” e

também divulgar os vídeos de TCC’s (Trabalhos de Conclusão de Curso) realizados

pelos alunos que se formaram no Ensino Fundamental em 2015.

Desde o ano passado também tenho participado das reuniões mensais da

Rede Boa Vista, que é uma organização formada por membros de diferentes

entidades provenientes dos bairros nos arredores da rodovia Raposo Tavares, no

qual faz parte o Bairro Jardim Boa Vista. Entre as entidades estão escolas públicas e

uma privada, a Unidade Básica de Saúde do Jardim Boa Vista, associações culturais

como o grupo “Vielada Cultural”, organizações não governamentais que realizam

projetos na região, além da participação eventual de órgãos públicos como o

conselho tutelar. A Rede Boa Vista visa avaliar os problemas vividos pelas

comunidades representadas pelas entidades e discutir projetos a serem

implementados de forma conjunta tais como atividades culturais, esportivas,

educativas, de saúde pública, etc. Participo da Rede Boa Vista representando o

Memorial Solano Trindade e procuro propor e apoiar ações que visem uma

potencialização das atividades das entidades no sentido de contribuir para os

moradores dos bairros e estudantes se apropriarem dos espaços públicos de

diferentes formas, contribuindo assim também para o desenvolvimento das diversas

potencialidades da comunidade.

Além dessas atividades foi realizado o trabalho de coleta de dados e

organização deste relatório parcial de pesquisa.

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5.2 Cronograma das próximas atividades

Abril, Maio e Junho de 2016

No terceiro trimestre (Abril, Maio e Junho/2016), o trabalho com a

reorganização do memorial continuará acontecendo a partir de projetos

desenvolvidos pelos professores em conjunto com os alunos e o bolsista do projeto.

Será dada continuidade à leitura de bibliografia, à pesquisa de documentos de

órgãos do governo, à continuidade da escrita do livro. Além disso, serão analisadas

entrevistas já realizadas e materiais coletados no bairro e na escola. Também serão

realizadas novas entrevistas com membros do bairro e integrantes da Rede Boa

Vista e representantes das diversas entidades.

Julho, Agosto e Setembro de 2016

No último trimestre, os relatos, entrevistas e documentos continuarão a ser

interpretados; a organização do memorial continuará a ser realizada; e haverá uma

reflexão teórica para que seja possível a elaboração do relatório final no último mês.

Além dessas atividades haverá o engajamento na organização de exposições

no Memorial Solano Trindade que ocorrem ao longo do ano em conjunto com os

professores, coordenação e direção da escola.

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