Tornar visível o invisível

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  • 8/12/2019 Tornar visvel o invisvel

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    Tornar visvel o invisvel, 31/01/1995Claudio Ulpiano

    Parte I

    A partir do incio do sculo XX, destacou-se um componente como matria de

    pensamento esse componente chama-se IMAGEM. E destacou-se a tal ponto que,mais ou menos na dcada de 40-50, Jean Paul Sartre escreve doisgrandes livros umchamadoImaginaoe outro chamadoImaginrio onde procura fazer um inventriodas imagens, supondo, com esses livros, ter feito a narrativa de todasas imagensexistentes.

    Ao ler esses livros que eu tambm li Deleuze assinala um fatosurpreendente:Sartre no trata da imagem em movimento em nenhum dos dois livros, ou seja, no tratade cinema a imagem em movimento inteiramenteesquecida por ele!

    A nossa questo no dizer que ns vamos nos preocupar mais com a imagem em

    movimento do que com a imagem plstica ou a imagem grfica, de maneira nenhuma. Anossa questo entendermoso que imagem. esseo nosso processo nesta aula dehoje.

    (Daqui para o fim da aula, na hora em que eu precisar, ns vamos projetar algumastelas).

    Ento, eu vou fazer o seguinte: eu vou pegar as imagens e, inicialmente, vou dizerque elas, as imagens, se dividem em trstipos.

    H uma prtica do conhecimento chamada TAXIONOMIA que uma prticaclassificatria. Quando voc trabalha com classificao, voc no classifica osindivduos voc classifica os tipos. Por exemplo, no sculo XVI, salvo equvoco,Lineu, o botnico, inventou a taxionomia, procurando fazer uma classificao das

    flores. Ento, ele no classificava esta rosa ou este lrio, ele classificava arosa, olrio (Certo?), porque inclusive ele dizia que Deus havia feito este mundo, mas haviafeito o mundo e misturado tudocom tudo. Ento, num pequeno torro de terra, vocencontra uma rosa, um lrio, uma mosca, um cocozinho de cobra: voc encontra ali milcoisas misturadas. E a razo humana tem a funo desepararesses elementos, queesto juntos, e formar buqus especficos: buqus de rosa, de lrio, buqus de jasmimOu seja, esses buqus aparecem na razo; no aparecem no mundo porque no

    mundo as coisas aparecem juntas. Ento, voc tem no mundo uma mosca misturadacom um jasmim e um pedao de bambu; mas, no intelecto, voc coloca os bambus deum lado, as moscas de outro e os jasmins do outro e isso se chama taxionomia.Ento, como se o pensador fosse um construtor de buqus das semelhanas.(Certo?).

    Mas, quando voc vai ver um filme, voc encontra essas imagens que na ordem dopensamento esto inteiramente separadas umas das outras e no cinema esto todasjuntas. Eu vou fazer a classificao tipolgica das imagens e usar inicialmente trsnomes para fazer essa tipologia. O que estou fazendo muitoimportante para o nossocaminho. Didaticamente, at mais importante! Na classificao que eu vou fazer das

    imagens, eu vou chamar uma imagem de IMAGEM-PULSO, outra imagem deIMAGEM-AO e ainda uma terceira imagem que eu vou chamar de IMAGEM-

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    AFECO. (Por enquanto, eu vou deixar de lado a imagem-percepo!). Ora, essastrs imagens maisa imagem-percepo; logo, as quatro chamam-se IMAGENS-MOVIMENTO. Ento, existe um conjuntode imagensque so tipificadas comoimagens-movimento. E quando elas recebem essa tipificao, imagens-movimento,elas so divididas em quatro tipos de movimentos: percepo, afeco, pulsoe ao.

    Seriam os quatro tipos de movimento.

    (Vocs entenderam?)

    Ento, a minhapreocupaoagora mostrar pra vocs esses quatro tipos demovimento; mas antes,eu tenho que dizer pra vocs o que movimento. Porque nstemos que partir da noo que ns sabemos maisou menoso que vem a ser umaimagem.

    Uma imagem o que aparece refletido no espelho, o que aparece na televiso, o queaparece no cinema, uma sombra, um reflexo no mar, pode ser uma imagem sonora

    ou um eco Ento uma imagem Eu estou classificando as imagens e agora voutornar ainda mais claro. Eu vou dividir as imagens (eu queria que vocs marcassem!)em ticase sonoras. Ento, so doistipos de imagens: as imagens ticase as imagenssonoras.

    Se a gente perceber, o cinema moderno umasimbioseentre essas duasimagens aimagem ticae asonora. Quem no conhece, por exemplo, o Fellini? Quem noconhece o Nino Rota, que era o responsvel pelas imagens sonoras dele? Quem nosabe que o Nino Rota acabou se juntando com o Coppola e ganhou um prmio qualquerno segundo O Poderoso Chefo? Ou seja, o cinema ento constitudo de imagensticasesonoras. Mas, neste instante, para no ter nenhum problema de compreensoterica, eu vou me preocupar com as imagens enquanto ticas. (Certo?). Mas apenascom as imagens que eu estou chamando de imagens-movimento. E eu vou dar adefinio de movimento.

    Movimento o deslocamento que um corpo faz de um lugarpara outro lugar isso a definio clssica da fsica. E a chamada imagem-ao exatamente isso: odeslocamento que um corpo faz de umlugar para outrolugar. Grosseiramente oGary Cooper andando no meio da rua: uma imagemse deslocando de um lugar paraoutro lugar. Ento, a imagem-ao o movimento da imagem-ao constitudo peloque se chama COMPORTAMENTO.

    Ento, o que imagem-ao? O deslocamento de um corpo de um lugar para outrolugar. Essa prtica chama-se comportamento. Quando h um comportamento, umcorpo se desloca de um lugar para outro lugar e isso se chama AO; e essa aosempre se d numa SITUAO (anotemsituao) Essa ao sempre se d numasituao.

    Por exemplo, o comportamento de um homem numa situao qualquernumacidadezinha do interior. Os bandidos esto roubando o dinheiro do pai da mocinha a situao dada; e ali, dentro daquela situao, algum vai articular um comportamento.Ou, de outra forma: todos ns exercemos comportamentos dentro de uma situao dada.

    Ns estamossempredentro de uma situao, efetuando um determinadocomportamento. Esse nosso comportamento reguladoe desreguladopelas

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    EMOES e SENTIMENTOS. As emoes e os sentimentos regulam os nossoscomportamentos.

    Por exemplo, eu vou pedir emprego ao presidente da repblica, a eu me preparo todo,preparo o meu comportamento, e at incluo uma gravata no meu comportamento, (no

    ?). A vou l, regulo o meu comportamento pela razo que eu suponho que seja aemoo mais suave; e possvel que eu agrade ao presidente e acabe arranjando umemprego.

    Ento, o comportamento uma ao regulada ou desregulada por emoes esentimentos, numa situao dada. Isso daqui chama-se MUNDO REALISTA. Esse omundo realista. (Vocs entenderam?) Isso o realismono cinema, na literatura e navida Ou seja, nas nossas vidas ns estamossempretendo um comportamentoemdeterminadassituaes. Estamos sempre agindo, em determinadas situaes. Quando assituaes se tornam insuportveis, as nossas aes se tornam explosivas: a ao querexplodir aquilo dali e, de imediato, se torna explosiva. Ento, a aopode ser

    chamada de ao explosivaou ao retardada. Uma ao retardada em que vocprocura reformara situao, mas com lentido, com retardamento. E outra, em quevoc quer modificar a situao explosivamente. Ento, isso se chama comportamentono mundo da ao/situao. Isso o REALISMO.

    Al: A razo-

    Cl: A razo a razo Evidentemente eu vou ter que dar uma resposta pra voc emtermos de conseqncia de silogismo. Isso tudo implicaria uma longaaula. A razo

    provavelmente, em ns, a emoo mais suave (o que estou dizendo muito difcil,viu?). A razo um sentimento suave. A diferena entre a razo e uma exacerbaosexual que a exacerbao sexual leva a atividades quase que enlouquecidas, atividadesque os gregos chamavam de HIBRIS. Ento, por exemplo, na fundao de Roma, quemexerce o poder ali Rmulo e Rmulo um homem de exacerbaes sexuais.Exacerbaes apaixonadas: ele um homem que s age exacerbadamente. Quando elecai, vai ser substitudo no poder por um homem chamado Numa Pomplio. NumaPomplio um homem tranqilo, calmo, racional, morale sua histria a passagem domundo mgico-religiosopara o mundojurdico-poltico. Ou seja, no mundo jurdico-

    poltico que a razo toma todoesse poder no nosso mundo. Ela toma todo esse podersendo agrandeelaboradora dos comportamentos. Evidentemente que o Rmulo nunca

    poderia suportar a suavidade da razo. (Rmulo e Remo, que foram alimentados por

    uma loba, tinham comportamentos exaltados, altamente exaltados, apaixonados,incestuosos)

    (No sei se eu te respondi).

    Al: essa passagem do mundo

    Cl: do mundo mgico-religioso para o mundo jurdico-poltico. Porque, o que euacabei de falar pra vocs que o estado eu vou dar uma definio frgil, fraca ementirosa do estado; supostaa definio que eu vou dar:

    O estado o centrodo poder. E, ao longo da histria, o estado tem duascabeas; apenasduas: ele mgico-religiosoe ele jurdico-poltico. Foi esse o grande confronto

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    Estados Unidos/Unio Sovitica. A Unio Sovitica seria o estado mgico-religioso; e oestado americano, o jurdico-poltico. Ento, so esses dois estados: os nicos queexistem. Agora, muitagente tem o estado dentroda cabea; no precisa ter o estado dolado de fora o estado est dentro! Tendo o estado mgico-religioso dentro dele ele, ento, um arcasta; e vai, por exemplo, acabar com os cinemas e fundar igrejas

    universais, sobretudo na Praia do Flamengo (risos). E assim por diante(entendeu?).

    Ento, vocs verificaram que esses arcasmos que esto dentro de uma cidade Puxa!O arcasmo dentro de uma cidade onde os cidados j viram [filmes como]Blade

    Runnere 2001[Uma odissia no espao]De repente os cinemasso substitudos porigrejas universais, e o teatropor bingos! Nisso da o bingo no um arcasmo, o bingoacho que um futurismo (T?) (Risos). Agora, isso da define bem define bem, oque eu estava colocando pra vocs, que o estado est dentrode ns (no ?), ele noest fora de ns!

    Bom! O que , ento, o mundo realista?Ao,situaoe o comportamentoregulado poremoesesentimentos. (Vocs entenderam?) ento, aqui vem o John Wayne andando(Todo mundo conhece o John Wayne?) Vem o John Wayne andando. O que o JohnWayne est fazendo? Ele est se comportando, ele est praticando uma aodentro deumasituao. E o comportamento dele est sendo regulado por sentimentos e emoes(certo?). E, provavelmente, se esses sentimentos e essas emoes comearem a produzirmuita preocupao na situao dada ele no vaiser curado pelo psicanalista; o LeeMarvin vai mat-lo. (Risos). Vai dar umtiro nele e acabou. Isso se chama mundorealista seja na literatura, no cinemaou na vida.

    Agora, h uma teoria, uma teoria definitiva, que o NATURALISMO Vamos dizerque o grande naturalista brasileiro foi Alusio de Azevedo? Ele escreveu O Cortio(no?). Mas o grande naturalista da histria, todo mundo sabe quem foi mile Zola(certo?). O naturalismo no alguma coisa que se oponha ao realismo. O naturalismoacentuaos traos do realismo. Ento, vamos dizer que o realismo seja cor-de-rosa, onaturalismo rosa-shocking. Ento, no realismo, ns temos os comportamentos. Nonaturalismoos comportamentos transformam-se em PULSES. (Vamos tentarcompreender isso daqui).

    A diferena do realismo para o naturalismo que nonaturalismoo comportamentovaise transformar em pulso. Vou dar um exemplo para vocs de violnciano realismo:

    vocs viram O homem que matou ofacnora?Lee Marvin, James Stewart, JohnWayne Qual o director, John Ford? John Ford? O Homem que Matou o Facnora.Ali um filme cheio de violncia; e a violncia do Lee Marvin qualquer coisa deassustador. Ele violento at por causa de um bife um negcio impressionante aviolncia dele. Mas a violncia do realismo diferente da violncia do naturalismo. Porqu? Porque no naturalismo j no hmais comportamento, no naturalismo o que existe apulso. Ento, no hcomportamento naturalista hpulsonaturalista. E aviolncia no naturalismo chamada de VIOLNCIA ESTTICA. tantaviolncia,que se ela se transformar em ao, como na violncia realista, essa violncia vai destruira prpria personagem. Ento, a personagem naturalista traz nela uma violncia contida,uma violncia estticaassustadora. Vocs podem ver, por exemplo, o Edward Fox no

    filme Casa de Bonecas, do Joseph Losey. (Vocs encontram em vdeo). Nesse filmevocs veriam isso com a maior clareza!

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    O que desaparece no naturalismo? Desaparece o comportamento, para apario dapulso. Ento, so duas imagens: uma imagem que se comporta; e uma imagem que pulsional.

    (Pode preparar o projetor, Eduardo)

    A imagem pulsional, no caso, uma imagem propriamente violenta, como eu estoudizendo pra vocs. Ela no como a imagem realista. A imagem-pulso transforma(Ateno!), transforma o comportamento em PREDADOR. A imagem pulso tem umobjetivo: exauriros comportamentos, destruiros sentimentos, destruiras emoes,destruiros comportamentos. Por isso, voc pega um filme naturalista essa a grandechave e v que no comeo dele ele realista, ele inteiramente realista. Ou seja, as

    personagensse comportam, elas esto em ao, elas esto em situao Voc encontrauma famlia, todo mundo l dentro se comporta do mesmo modo como se comporta emuma famlia oubemou mal; com o comportamento regulado e desregulado e, derepente, comea a emergira pulsoali dentro. Quando a pulso comea a emergir o

    personagem se transforma em predador. Ele vai se transformando em predador.

    Al: Voc baseou todo a sua colocao sobre a questo da violncia no cinema. Hoje huma polmica muito grande em cima desse diretor, Tarantino. Voc qualificaria oTarantino de pulsional?

    Cl: No, eu no diria Do Tarantino, ns s temos o Ces de Aluguel(no ?). OPulpFictionainda no chegou pra gente ver. Vamos dar uma olhada no Ces de Aluguelparaver como que ns classificaramos o Tarantino. Eu j diria de sada que ele no umcineasta realista, ele no um cineasta realista.

    Al: Seria a coisa da pulso porque a pulso destri o personagem se ela for realizada.A realidade dele seria a pulso realizada?

    Cl: Deixe-me explicar Eu j falei uma coisa no comeo da aula que tem que serlevada em conta. Ateoria que faz os buqus: buqu de imagem-pulso, buqu deimagem-ao, buqu de imagem-afeco; mas l no filme est tudo misturado.(Entendeu?).Nadaimpede que voc encontre uma violncia realistae umaviolncianaturalista voc pode encontrar essa mistura. Ento, vamos examinar, para depoischegar ao Qentin Tarantino. Compreender bem para chegar ao Tarantino.

    O ponto que eu cheguei foi que o comportamentose transforma empulso ouseja: o filme naturalista comearealista. (Vocs entenderam?). Ele comeacomportamento, ele comea ao, ele comea situao muito interessante o filmedo Losey TheGo-Between; em portugus, O Mensageiro que se fosse um filmerealista voc estaria vendo uma famliafelicssima, uma famlia nobre, muito feliz, comtudo ocorrendo muito bem Mas, de repente, dentro daquela famlia aparecem duasimagens pulsionais a imagem de Ted Burgess (Alan Bates); e a imagem de Marian Lady Trimingham (Julie Christie). Ento, eles comeam a passar as foras pulsionaisali dentro em cima de uma criana Eles comeam a passar aquela forae surge uma

    personagem vivida pelo Edward Fox quem viu o filme deve ter reparado que ele temuma cicatriz no rosto, que o exemplo dessa violncia esttica, dessa violncia contida.

    Ento, a imagem-pulso no a mesma coisa que a imagem-ao.

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    Al: Nos filmes do Fassbinder no poderia encontrar a imagem-pulso?

    Cl: Tambm poderia encontrar, e dessa maneira que eu falei: como se fossem todas asimagens misturadas.

    Eu acho melhor a gente compreenderas trs imagens e de maneira nenhuma vocsperguntarempra mim. Vocs mesmos podem ver! Olha, eu no sei se esse filme colorido ou no, vou perguntar ao professor. No! No isso, (no ?) A gente vai lver e vai dar conta. Vocs vo compreender e vocs vo dar conta. O que oFassbinder o que ele est fazendo com o cinema dele. H uma questo: o Fassbinderest fazendo um cinema-movimento? H essa questo tambm

    Qual a imagem que ns estamos trabalhando? Na imagem-movimento, que se divideem imagem-percepo, imagem-ao, imagem-pulso e imagem-afeco. (Certo?). melhor dessa maneira, para a gente ter a resposta.

    Agora, a terceira imagem, a imagem-afeco. A imagem-afeco vai trazer o momentomais maisfantstico! Porque a imagem-afeco como a imagem-pulso e como aimagem-ao um movimento porque todas trs so movimentos.

    E o que o movimento? o deslocamento de um corpo mas de um lugar paraoutro lugar. A imagem-pulsofaz isso e a imagem-aotambm faz isso. Mas omovimento daimagem-afeco, j no mais o movimento de deslocao de um corpode um lugar para o outro porque j no mais o movimento extenso. O movimentoda imagem-afeco o que se chama MOVIMENTO INTENSO. Apareceu aqui umacategoria, que parece literria, mas no em absoluto uma categoria literria umacategoria da fsicado sculo XVI.

    Sou eu fazendo a distino de dois tipos de movimento. Quais? O movimento extenso,que o clssico movimento de deslocamento de um corpo de um lugar para outro lugar;e o movimento intenso. Ento, a esse movimento intensoque ns temos que dar umaateno agora, antes de fazer certas projees.

    Ento, ns j temos doismovimentos: o movimento da ao, o mais fcil de todos, que o comportamento regulado ou desregulado numa ao e numa situao; e omovimento pulsional, que um movimento difcil e a melhor maneira de secompreender vendo determinadas imagens, como, por exemplo, o Dirk Bogard em O

    Criado, na cena da escada em que ele, nitidamente, se torna um predador. A imagem-pulso, o melhor exemplo que eu dou, como se fosse um monstro como omonstro doMdico e o Monstro que sasse de dentro de ns e finalizasse o nossocomportamento e o nosso comportamento de repente se transformasse em pulso.

    Por exemplo, eu conquisto uma linda mulher e levo pra casa atravs de comportamentoshesitantes deliciosos, assustadoressei lcomo. De repente, eu transformo aquelecomportamento em pulses a, eu me torno um predador e comeam a aparecermovimentos do tipo canibalismo,sadomasoquismo(vocs esto entendendo?)ourelao sexual com cadveres

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    A pulso agora eu acho que encerro, a nomenclatura exata literalmenteumCOMPORTAMENTO PERVERSO. A pulso isso: ela um comportamentoperverso.

    Ento, a palavra perverso acrescentada palavra comportamento igual a pulso:

    perverso o que torna um comportamento pulsional. Essa perverso leva tantoopredadorquantoapresa, necessariamente, para a DEGRADAO. A degradao(eu queria que vocs marcassem isso muito forte), passa a ser um componente domundo naturalista. O mundo naturalista necessariamente degradado porque ocomportamento perverso. Porque ele necessariamente perverso, necrfilo, e assim

    por diante. E sendo um mundo degradado talvez vocs aqui comecem a entender oBuuel:

    O Buuel um cineasta naturalista. O que acontece no naturalismo do Buuel, (prestemateno!), que a repetio seja qual for o tipo sempre uma repetiodegradada. As repeties vo se dando, vo se dando, e os comportamentos vo ficando

    cada vez maisperversos. Buuel mostra a repetio como necessariamente degradada mas vai marcar uma coisa muito interessante nos filmes dele: que ainda que arepetio seja necessariamentedegradao, pode aparecer o que se chama REPETIOSALVADORA. Que o caso doAnjo Exterminador.Nesse filme, vai aparecer umarepetio salvadora, que depois daquela repetio (fim de fita)

    ParteII

    [Plato, em sua obra O Timeu,] afirma que este mundo, no diaem que este mundonasce, noprimeirosegundo, comeaa se degradar: o mundo j seria degradado por

    ponto de partida: muito prximo do que o Buuel est dizendo. Ento, h umarepetioque sempre uma repetio degradante, uma repetioperversa, em quetudo vai sendo destrudo mas pode aparecer uma repetioque seria salvadora. Nocaso doAnjo Exterminadora repetio salvadora a repetio original.

    O que quer dizer repetio original? Quer dizer repetir o gesto do primeiro [momento]exatamente comoele foi feito. essa repetio exataque liberta os personagens presosna casa embora, depois, na igreja, eles venham a ficar presos outra vez.

    Ento, a repetio a categoria do cinema naturalista do Buuel e de outro famosodiretor (que aqui vai-nos interessar menos) chamado Erich von Stroheim os dois

    trabalhariam com essa repetio degradante, e isso seria do cinema naturalista. Ento, oconceito definitivopara se entender a prtica naturalista o que eu chamei, o sintagmaque eu constitui, decomportamento perverso. Quando um comportamento se torna

    perverso,[aparece] a necrofilia o sadomasoquismo comportamentos perversos queemergem no cinema pulsional. No cinema do Buuel, no cinema do Losey, vocs vover isso com muita clareza.

    Mas, em terceiro lugar, a imagem-afeco. isso que importa agora. Na imagemafeco o movimentodeixa de ser extenso, ou seja, vai desaparecer esse movimentoem que um corpo vai de um lugar para outro lugar e vai aparecer o que se chamamovimento intenso. Esse movimento intenso a ltima coisa que eu vou falar nessa

    parte pra vocs o fato de que o homem um ser esquartejado. O homem tem umaparte chamada SENSRIA: que a parte com a qual ns apreendemos o movimento do

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    intenso. Ento, o Van Gogh o que toda arte visa isso: tornar visvel o que no estvisvel, que a intensidade. (Eu acho que foi bem)

    Al:??

    Cl: No porque isso eu j mostrei na aula passada e tambm nesta aula, que aemooe o sentimentofazem parte do regulamentoe do desregulamentodocomportamento. E o comportamento pressupe um ego h sempre um egoque secomporta.No h egono mundo da expresso. (Foi o que eu dei pra vocs na aula

    passada). a diferena da segundidade e da primeiridade no Peirce.

    No mundo expressivo, no mundo da intensidade, no h, de forma nenhuma, um sujeitopessoal manifestandosua emoo, manifestandoseu sentimento. O que aparece nessemundo do movimento intenso so as intensidades que nopertencem a nenhumsujeito. Elas no pertencem a nenhum sujeito. Ento, no soemoes, porque asemoes so do cinema realista. Aqui o cinema expressionista: ele no tem emoo

    ele tem AFETOS!

    Vocs podem ver isso muito bem no fato de que a funo do sistema sensrio, do nossosistema sensrio, apreender o movimento e passar o movimento para os esquemasmotores. Mas, na imagem afeco, oprpriosistema sensrio faz a devoluo domovimento. Ento, quando o sistema sensrio devolve o movimento, ele devolvemovimentos afetivos que so um levegesto da boca, um olhar So olharesnoprimeiro plano, rostosno primeiro plano que so movimentos inteiramenteafetivos. Ou seja, so movimentos que no tmsequerum espao-tempo real, no tmnada disso ali, s aparece afetividade.

    Vocs conseguiram entender a distino entre um afetoou um movimentoexpressivo, e o movimento no comportamento do mundo realista?

    completamente diferente! o mundo afetivo, o mundo das expresses, o mundoque torna visvel aquilo que estaria invisvel. Isso que est invisvel, em ltima anlise,so os afetos do tempo no pertencem ao sujeito humano. Ou seja, o mundoexpressivo, o mundo da imagem afeco uma desumanizao, voc desfazo humano.Da mesma forma que no mundo pulsional, o humano desfeito. O humanohabita omundo realista ele se desfazno mundo pulsional e desapareceno mundoexpressivo. No a histria pessoalque est se manifestando nesse mundo expressivo,

    nesse mundo da imagem afeco e dos movimentos intensivos

    o que est semanifestando so os AFETOSouas QUALIDADES PURAS.

    (Eu volto na prxima aula o mximoque eu posso dizer nesse momento, eu achoque j ficou bem)

    Eu vou fazer agora a projeo de umas quatroimagens de um pintor austraco chamadoEgon Schiele (1890/1918), morreu aos 28 anos Morreu no, foi suicidrio tomouuma peste a gripe espanhola do corpo de uma mulher; morreu em 1918. Esse

    pintor figurativo, daquela escola da ustria , a mesma do [Gustav] Klimt e do [Oskar]Kokoschka, toda aquela ustria do principio do sculo, envolvida com um moralismo

    muito poderoso mas a passagem da artetambm se dando muito possante

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    E esse ele, esse ele, o Egon Schiele

    Auto-retratos (Clique nas imagens)

    Egon Schiele

    Auto-retrato com Camisa Vermelha, 1914

    Fonte:www.leninimports.com

    Egon Schiele

    Lutador, 1913

    Fonte:www.cs.cmu.edu

    Vocs j podem notarpelo rosto, que esse rosto no de uma imagem realista impossveldizer que esse rosto pertence a uma imagem realista! Voc j verifica nelealguma coisa diferentedo que ns chamamos de comportamentoreguladopor umsentimentoe por uma emoo que estejam passando por ali.

    Eu vou passar apenas os autoretratos do Egon Schiele, mais nada. Porque,provavelmente eu acredito que sim, eu posso estar equivocado o Egon Schiele seeternizar na obra de arte plstica exatamente pelos seus autoretratos. Eu considero osautoretratos do Egon Schiele

    (No joga ainda outra imagem deixa, j jogou)

    Olha a. Esse da um autoretrato, e eu estou chamando esse autoretrato de umaimagem-pulso. D prasentiraqui que essa imagem dificilmente poder ser chamada deimagem-realista. uma imagem onde a violnciaaparece contida, a violncia estestticaem cima desse corpo, ele est todo contorcido ele est todo contorcido. E oobjetivo aparente pelo menos me parece ser esse o objetivo do Egon Schiele mostrar, em cima do mundo-realista, os excessosdo mundo-naturalista.

    Eu no preciso falar muito sobre as imagens do Egon Schiele.

    Al: Aquele pintor Munch tambm?

    Cl: No ouvi. Munch? No, eu consideraria o Munch um pintor ainda realista. Eu aindachamaria o Munch de realista.

    (Depois eu volto, depois da chuva)

    Todos esses so autoretratos

    Vocs podem comparar esses autoretratos com os retratos apaziguados do mundorealista No que no mundo realista tenha que ter um apaziguamento total, mas no

    se d essa forma que est a.

    http://www.leninimports.com/http://www.leninimports.com/http://www.leninimports.com/http://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/schiele_fighter.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/schiele_self_red_shirt.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/schiele_fighter.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/schiele_self_red_shirt.jpghttp://www.leninimports.com/http://www.leninimports.com/http://www.leninimports.com/
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    como se a gente sentisse uma violncianele (no ?) uma explosodentrodeleuma exploso que no vem pra fora uma esttica da convulso uma estticaexatamente da convulso, de alguma coisa que quer vir pra fora e no vem.

    (Vai passando Eu acho que basta aqui)

    Ento, eu estou colocando os autoretratos do Egon Schiele como exemplo de imagem-pulso.

    (Ento, acende a luz e prepara os Bacon)

    Al: Claudio, isso seria o corpo histrico?

    Cl: Eu no chamaria isso ainda de corpo histrico, no. Estou tentando chamar isso deimagem pulsional. (No sei se voc estava na primeira parte da aula) Foram osexemplos que eu dei na primeira parte da aula que essa imagem da umaexacerbaodo comportamento. O ponto esse: essa afirmao de que a imagemnaturalista uma acentuaoda imagem realista, ela acentua a imagem realista, isso que ela faz. Ela no oposta ao realismo, uma acentuao, elaprolonga, elaexacerbao realismo. Ento, ali, a imagem se tornapulsional,predadora, violenta. uma estticada imagem. Quando eu digo esttica da imagem,est implcita uma ticada imagem uma estticae uma ticada imagemque o Egon Schiele est

    produzindo ali.

    Agora, em seguida, vem o que me importa mais aqui. O que me importa mais achamada imagem-afeco. Porque essa imagem afeco ( muito bonito, muito rico, agente tem que ter velocidade pra compreender o que vai acontecer) A imagem pulsovai-se confrontar com a imagem afeco.

    Eu vou fazer um corte, um parntese e vou dar uma pequena explicao pra vocs,forando um pouquinho. Eu vou considerar o Losey porque conhecido por todomundo como um exemplodo cinema naturalista. Vou fazer isso, o Losey umexemplo do cinema naturalista, porque simplifica Est cheio de Losey no vdeo,vocs apanhem e ele fica como cinema naturalista.

    Eu estou falando pra vocs nessa aula toda sobre imagem movimento a imagem-movimento quatro tipos de movimento:percepo,pulso, aoe afeco. So

    esses quatro tipos de movimento. Agora, existe outrotipo de imagem chama-seIMAGEM-TEMPO. Eu ainda no toquei nela. na imagem-tempo, por exemplo, ondeestariam o Cassavetes, o Godard, pode ser o Tarkovsky, o Robbe-Grillet. Quer dizer,ainda no apareceu uma imagem-tempo, no estou falando de imagem tempo, eu estoufalando de imagem movimento.

    (Agora, prestem ateno).

    A histria do pensamento eu j no estou mais exclusivamente no cinema encontrou esses dois eventos no universo: um evento chamado movimentoe um eventochamado tempo. Quem encontrou isso? Os homens encontraram Ns encontramos

    E o nosso pensamento afrontou ps-se diante do movimento e do tempo.

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    A Antiguidadenos dizia: o temposubordinadoao movimento. Essa a mximaaristotlico-platnica: o tempo subordinado ao movimento.

    A partir do sculo XIX, com Kant, vai haver uma inverso omovimentovai setornarsubordinado ao tempo. essa a inverso que vai haver. Mas quando ns estamos

    trabalhando na imagem movimento, nessas quatro imagens, nessas quatro imagenstrata-se somente de movimento. Quando ns passarmos para a imagem tempo a nsvamos encontrar, por exemplo, Antonioni O cinema de Antonioni s cinema tempo.(Eu vou mostrar isso para vocs). Agora, no lado de c, no. tudo cinema imagemmovimento. Mas acontece que o cinema naturalista, surpreendentemente, produz umaimagem do tempo. O cinema naturalista, o cinema pulsional, ele vai produzir umaimagem do tempo, uma imagem do tempo chamada TEMPO NEGATIVO. Ele vai

    produzir (Isso que vocs vo ter que entender Na prxima aula vocs vo ter queentender isso). A imagem de tempo que o cinema naturalista projeta um tempo, mas um tempo negativo.

    O que quer dizer tempo negativo? O tempo negativo quer dizer o tempo que subordinado ao movimento. Isso que o tempo negativo. Ento, nesse cinemachamado naturalista, vai haver

    Vou contar mais uma histria pra vocs: O Losey e o Visconti ambos pretendiam uma megalomania mas ambos pretendiam filmarEm Busca do Tempo Perdido, doProust. Quer dizer, 36 horas de cinema. Os dois pretendiam Mas o Visconti umcineasta do tempo. O Losey tambm um cineasta do tempo. Mas o tempo do Visconti o tempo do cristal, o tempo puro; enquanto que o tempo do Losey o temponegativo o tempo da pulso de morte.

    Ento, esse investimento que ns temos que fazer para destacar exatamente o que ocinema naturalista. Saber o que pulso de morte, saber o que a flecha do tempo,saber o que mundo originrio Ou seja, todo esse universo que o Losey produz comum brilhantismo excepcional na obra dele, mas que ainda assimele no consegueconquistar o tempo, porque a paixo dele, na verdade, no o tempo, a paixo dele amorte.

    Porque os filmes naturalistas, os exrcitos que exaltam os filmes naturalistas passampela Avenida Rio Branco gritando Morte! Morte! Morte! Morte! Ou seja, o cinemaprisioneiro do mundo originrio, dospedaos, dospntanos, dassepulturas, da

    entropia, dofim do mundo, do comeo do mundo, da morte. Vocs podem se lembrar erradamente, mas um modelo bom; no um cinema naturalista, mas serve comomodelo do momento antropofgicodoPocilga, do Pasolini. Se vocs se lembramdo momento antropofgico do filme, que com o (como mesmo o nome dele? Oartista mais bonito do cinema Clmenti, Pierre Clmenti (no ?)

    No, no o Helmut Berger. o Clmenti, que dez vezes mais bonito que o HelmutBerger. Pierre Clmenti, foi ele que fezBela da Tarde

    Bom! Ento, a nossa questo conhecer o tempo negativo. Esse tempo negativo,vamos s colocar as marcas: pulso de morte, entropia, flecha do tempo, mundo

    originrio. Esse cinema naturalista de uma beleza excepcional, mas ele no vaiconseguir conquistar o tempo.

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    E de outro lado ns temos a imagem-afeco. Eu disse que imagem afeco que tipode movimento? Movimento intenso. Movimento intenso, no isso? Esse movimentointenso implica a ALMA. (Olha! As aulas comeam a ficar altamente difceis, ouviu?).Esse movimento intenso implicaa alma. Ou seja, s h movimento intenso na almana alma. Se no houvesse alma, no haveria movimento intenso. esse movimento

    intenso da alma (ateno!) que vai libertar o tempo. Ele que vai libertar o tempo, porexemplo, das suas coordenadas naturalistas que so apulso de mortee o temponegativo. Libertar o tempo!

    Quando eu digo libertar o tempo esses movimentos intensivos da alma vo libertar otempo, o tempo vai ser libertado esse tempo que em Proust chama-se TEMPOREDESCOBERTO. esse tempo que o Visconti, na maioria dos filmes dele, diz queno pode ser alcanado porque TARDE DEMAIS Mas todaa obra do Visconti

    para encontraresse TEMPO PURO.

    A CONQUISTA desse tempopeloPENSAMENTO a obra do Espinoza, no V Livro

    da ticaa conquista do tempo a conquista da LIBERDADE da VIDA. (Certo?).Ento, a obra do pensamento Ns vamos ter que entender o que vem a ser

    pensamento. At agora ns sabemos apenas do pensamento que uma faculdade pura.(Foi assim que eu disse?) o pensamento puro da faculdade das essncias, mas exatamente esse pensamento puro que vai conquistar o tempo e ao conquistar otempo ele conquista a liberdade.

    Por que, ao conquistar o tempo, o pensamento conquista a liberdade? Porque a histriado homem (eu vou simplificar novamente, ouviu?) a histria do homem a histria doaprisionamentodo pensamento, segundo o modelo platnico que o pensamento no

    poderiapensarporque o obstculodo pensamento seria o CORPO. Ou seja, todamotivao filosfica do Plato a morte porque a morte a libertao do corpoe, a

    partir da, a alma, o esprito, o nous, pode pensar.

    Ento, toda a histria do Plato o corpo impedindoo pensamento de pensar. E o queeu estou mostrando pra vocs que aqueles pensadores que conquistaram o tempo no importa em que rea Cassavetes no cinema, Bacon na pintura, Rimbaud na

    poesia, e assim por diante, vo tornar o corpo, noo obstculo do pensamento; mas ocorpocomo aquilo queforao pensamentoa pensar. preciso

    (final da fita)

    Parte III

    E quando o pensamento for pensar, o que ele pensa o corpo. Ou seja, a nicamatriado pensamento o corpo, com as suas categorias da vida. Quer dizer: a nicafunoque o pensamento tem pensar a vida o que fora esse pensamento a pensar ocorpo.

    Ento, o que eu estou trazendo com essa descrio, com essa apresentao do que sechama imagem-afeco nessa imagem-afeco onde apareceram os movimentosintensos da alma para mostrar que forado pelo corpo que o pensamento vai

    deixar de dormir para comear a pensar. Esse corpo que fora o pensamento a pensar(Prestem ateno! s uma simplificao)

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    O que um corpo faz? Um corpo dorme, um corpo tem insnia, um corpofala, um corpose droga Ento, so essasforas do corpo, no importa qual osono, a insnia, adroga, o lcool, apoesia, o amor, aexaltao essasforas que fazem o

    pensamento pensar. So essas foras que levamo pensamento a pensar. E quando opensamento forado a pensar ele se volta para o impensado que oprprio

    corpo, que a vida.

    Ento, a questo do pensamento pensara vida. E pensar a vida com um nicoobjetivo: aumentar apotnciada vida.Aumentara potncia da vida. Ento, estticaeticase juntam elas se juntam; e afilosofia, a artee a cinciaouo pensamentoso

    forasque prestamservios prticos vida mais nada! (Entenderam?) Serviosprticos vida. Aarteno valeenquanto arte, a arte vale como uma prtica.Noexistea arte pictrica, existe estaou aquelaarte: a arte bruta, que feita pelo pessoal da

    Nise da Silveira; a arte figuraldo Francis Bacon; ou mesmo a arte pulsional;a pop artdo Lichenstein, pouco importa. O que a artevisa,nas suas prticas, tanto quanto afilosofiacomo a cinciapensare entenderas categoriasda vida. A nica

    importncia que tem o pensamento, a nica coisa que importa a VIDA. (Certo?)

    Ento, agora eu vou mostrar pra vocs umas trs ou quatro telas do Francis Bacon, spara que aqueles que no conhecem tenham contato com as telas dele, s para isso, oobjetivo s esse para na prxima aula eu poder falar.

    Baconmorreu h trs anos, hein? [1909-1992]

    Prestem ateno ao rosto. Prestem ateno ao rosto do Bacon e vocs podem confrontaro rosto do Bacon com os rostos dos autoretratos do Egon Schiele. Ele no tem os dois a

    para mostrar, mas s por lembrana das imagens que ns acabamos de passar vocsfazem isso. Vocs veem que o rosto do Bacon um rosto que est como que sendoescovado ele est sendo escovado ele est perdendo os traos humanos.

    Quais so as caractersticas humanas do rosto? Socializao, comunicaoeindividuao. O que est sendo rompido aqui, rasgado aqui, so essas trscaractersticas. O Bacon est procurando romper essas caractersticas e ele vai aoextremo nesse esforo para liberar as foras ativas do corpo.

    Francis Bacon

    Retrato de Peter Beard, 1975-1976Fonte:loutshelter.blogspot.com

    Francis Bacon

    Auto-Retrato,1971Fonte:justinsomnia.org

    Olhem o rosto olhem a deformao ali naboca Ento, eu utilizei a palavraDEFORMAO. A deformao agora s uma confrontao para vocsentenderem. A deformao no Francis Bacon aqui muito explcito, nessa boca.

    Olhem aqui - Olhem aqui, a deformao essa deformao que aparece noFrancis Bacon, tem como objetivoliberar os afetos.

    http://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_self-portrait.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/Bacon_retrato_peter-board_1975.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_self-portrait.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/Bacon_retrato_peter-board_1975.jpghttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.com
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    A deformao no Bacon tem a mesma funo que o sujeito artistano Proust. O sujeitoartista no Proust quer quebraro sujeito pessoal. (No foi isso que eu disse?). Ele querdesfazero sujeito pessoal Eu usei as figuras do amore da amizade, que seriamcaractersticas do sujeito pessoal, o sujeito artista em Proust visa a isso. Aqui, adeformao o componente para desfazer as caractersticas humanas do rosto.

    Francis Bacon

    Trs Estudos par a uma Cruci f icao,1962Fonte:contemporaryartsem.wordpress.com

    O nico exemplo que estou dando esse daqui, mas vocs vo notar uma coisa muitoimportante na obra dele, que so trs elementos. O primeiro elemento aqui eu vouchamar de pista. H outro elemento aqui que eu vou chamar de redondo redondo ouoval. E isso daqui no uma figura eu mostro na prxima aula pra vocs, porque nocaso do Egon Schiele era uma figura. Aqui o que vai se chamar FIGURAL.

    Figural uma classificao do Jean Lyotard, feita no sculo XX. Ento, seguindo atradio desta aula, os objetivos fundamentais da obra do Bacon so literalmente contraa imagemrealista: contra ocomportamento, contra a ao, contra a situao, contra ahistria, contra a narrativa que so os componentes constituintes do mundo realista.

    No mundo realista tem ao, temsituao, tem uma histria pessoal, tem umanarrativa, tem comunicao, temsocializao, tudo isso que o Bacon vai tentardesfazer. Ento, para compreender o Bacon com clareza opor o Bacon ao mundorealista. O que ele quer desfazertodas as caractersticas do mundo realista.

    (Foi bem aqui? Com essa noo que eu estou dizendo, desfazer o mundo realista?).

    Ento, vamos colocar mais duas imagens Essa um trptico Ento, passa essa.

    Francis BaconPintura, 1946

    Fonte:miltonisland.wordpress.com

    Olhem novamente aqui So sempre as trs caractersticas:pista, redondoefigural.Quando eu for explicar, vocs j tm essas trs caractersticas elas esto sempre

    presentes na obra dele! Esse daqui o terrvel guarda-chuva, com a carne adeformao aqui atingiu uma extremidade brutal!

    http://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_pintura_1946.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_estudos-crucificacao1.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_pintura_1946.jpghttp://claudioulpiano.org.br.s87743.gridserver.com/wp-content/uploads/2010/03/bacon_estudos-crucificacao1.jpghttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.comhttp://www.artnet.com/Galleries/Artists_detail.asp?G=&gid=111884&which=&aid=1799&ViewArtistBy=online&rta=http://www.artnet.com
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    Al: Parece com alguma coisa do Bosch, no ?

    Cl: Voc acha? Bosch, ali Olha

    Al: Eu achei Aquela coisa ali de carcaa

    Cl: A carcaa l atrs? Olha, eu acho que ainda mais forte que o Bosch, porque oBosch a gente sente um pouco de sonho, um pouco de pesadelo e o pesadelo umafigura do realismo. Aqui no um pesadelo, aqui como se voc entrasse nummundo monstruoso realmente. um mundo de carnificina, um mundo que ferebrutalmentea alma realista. Ela fica profundamente chocada dentro desse mundo Elano sabe o que fazer. Ela diz: felizmente isso no real. Quando ela diz felizmente issono real, porque ela s acredita no realismo. Ela pensa que o realismo diz tudo, queo realismo a verdade, o resto falso. o medo (no ?).

    V mais um A est aqui novamente, aqui . Pode tirar.

    Os quadros do Bacon

    Al: Onde esto os quadros?

    Cl: Eu sei que o Deleuze tem alguns. No MOMA, em Nova Iorque, por exemplo. Foi oMOMA, no tenho certeza, que fez uma exposio recente do Bacon, anteriormente auma exposio que eles fizeram do Lucien Freud. (Certo?). Ento, ns podemos teresperana de que daqui a uns trinta e cinco anos chegue no Brasil Mas voc faz umaviagenzinha para Nova Iorque e voc vai ver o Bacon; e hoje ele j tem um sucessor,que o Lucien Freud que, inclusive, foimodelo para o Bacon. O Lucien Freud seassemelha ao Bacon, embora a questo em sua pintura no seja a deformao, a questodele a carne.

    (Ento, nas prximas aulas, eu ainda vou tentar dar alguma coisa pra vocs).

    Eu diria que o Lucien Freud se explica pela fenomenologia do corpo vivido e o Baconse explica pelo corpo sem rgos. (Eu vou tentar mostrar, nas prximas aulas, o queseria isso.)

    (Tem algum Lucien Freud a? Ento bota s um Lucien Freud, s para esclarecer.)

    Al:- o surrealismo?

    O surrealismo, ele o realismo. O que voc pode fazer assim: naturalismo,surrealismo e realismo, a voc pode juntar os trs. Mas os naturalistas costumam dizer:ns no somos surrealistas! Porque o surrealismo uma espcie de prolongamento dorealismo. um prolongamento do realismo.

    Aluno:-??

    Cl: Nenhuma! Nenhuma Prolonga o realismo Isso no quer dizer que no seja uma

    obra fantstica, notvel mas no atinge esses nveis que esto aqui.

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    Tudo isso para ns, que gostamos do modelo clssico de vida, so coisas de artista,sem a menor importncia. No, de maneira nenhuma, de maneira nenhuma. Essa nooque estou apresentando pra vocs poderosssima poderosssima que a noo deCAOS GERME. A noo de caos germequer dizer que, quando voc joga uma tinta emcima da tela a tinta comea a produzir linhas, que so GERMINAIS. Voc pode seguir

    aquelas linhas, que o mundo vai emergirdali. Voc no precisa produzir aquele mundoa partir da sua histria pessoal. Ou seja, o que ele quer, ao elaborar essa noo de caosgerme, rompercom a histria pessoal.

    Como vocs acompanharam nessas seis aulas que eu j dei pra vocs, parece que ogrande adversrio semprea histria pessoal. A histria pessoal, osujeito pessoal, o

    fantasma que so essas figuras que nos acompanham na nossa vida inteira e que, semsombra de dvida, vo tornando a nossa vida, a cada dia que passa, uma completaimpossibilidade. A nossa vida vai se tornando cada vezmais impossvel de ser vivida pelos temores, pelos horrores, pelos cacoetes, pelas reprodues, pelos medos, pelas

    fugasque ns vamos construindo, porque o sujeito pessoal que nos governa,

    exatamenteisso.

    Ento, o que se aspira como ticae como esttica agora, dizendo exatamente o queimporta: como ticae como esttica, digamos, em termos do Nietzsche adestruio radicaldo homem. A destruio radical do homem, ns j temos muito

    presente no nosso momento histrico. Essa destruio radical a presena dasmquinas de terceira gerao, os computadores, os hipertextose as interfaces, deum lado; a eletrnica, de outro lado; e as foras da vida, que j no so mais

    pensadas em termos de cdigo gentico, maspensadasem termos de transcodificao(eu vou explicar isso, nas prximas aulas); e, em terceiro lugar, o brilhantismodaliteratura, o excepcionalda literatura que rompe com as foras das lnguas

    standards,que procura quebrar as lnguasstandards, produzindo o que se chama oAGRAMATICAL.

    Ou seja, o escritor, o literato no esse que faz o best seller, que conta sua vida, que sempre uma vida maravilhosa; mas aquele que quer, segundo o programa do Nietzsche,

    produzir um homem superior, produzir osuper-homem comea a gerar oagramatical, para rompercom as LNGUAS MAIORES, que no tm nenhum valorsinttico, s tm valor de apoderao; para produzir as LNGUAS MENORES, que soas lnguas propriamente artsticas.

    Ento, o artista o artista no sculo XX ele um cartgrafo, um explorador, umexperimentadorde corpo ocorpoda lngua. E nesse corpo, ele nointerpreta, elenocai no campo da significncia, e nose submete a estruturas. Nessas viagens queele faz nesse corpo, o que ele produz so as frmulase as figurasagramaticais

    para quebraro regime de dominao da estrutura do significante.

    (Vocs entenderam? No, no ?)

    Estou apontando aqui eu posso apontar aqui pra qualquer coisa que vocs lerem emtermos de literatura do sculo XX. Por exemplo, simplificando, a poesia concreta. A

    poesia no sculo XX, Pound, Cummings, Fernando Pessoa, so todas experimentaes

    com um adversrio muito marcado a lngua standard. A lngua standard a lnguana qual ns nascemos, a lngua de que ns somos constitudos. essa lngua que vai

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    nos prover de hbitos, sentimentos, deveres e obrigaes. ela que vai constituir prans o mundo binrio de significncias. Ento, a literatura deixou de ser uma reproduodessa lngua, para ser experimentaode novas lnguas as chamadas lnguasmenores. Seria isso a literatura uma experimentaode liberdade. O Nietzschechama desuperhomem.

    Superhomem exatamente aquele que vai deixar de se submeter aos modelose asestruturasdominantes. Porque os modelos e as estruturas dominantes, diferena doque nos ensinam nas universidades, no soprticas de significnciae deinterpretao sofbricasde podere de dominao,fbricasde produodeobedincia. Ento, o que ns temos aqui de viver, viajar nessas prticas da arte,exatamente para que ns possamos encontrar a nossa liberdade, como um exerccio

    permanenteda nossa vida.

    O nosso exerccio pensar, produzir arte, produzir pensamento para sair dessemodelo dominante que o modelo da lngua, o modelo do campo social, o modelo

    dae, assim por diante, que so estruturas que caem sobre ns, e ns pensamos seremsistemas de significao, sistemas semnticos mas que, na realidade, so SISTEMASdePODER.

    Ento, vocs vejam que, quando eu falo em arte, cinciaefilosofia, eu estou falandosimultaneamente numapragmticae numaprtica. Ns estamos imbudos de uma

    prtica. evidente que o Estado e a Igreja, das maneiras transvestidas que aparecem,querem a manutenodos mesmos sistemas de dominao. E a arte, pelo apagamentode um rosto, pela expresso enlouquecida de um rosto; ou pelo abstracionismode umPollock, o que a arte tenta fazer a rompercom os sistemas de poder.

    (Terminando essa aula:)

    Sistema de podere modelo da representao(eu tentarei tocar nisso na prxima aula)sosinnimos, so amesmacoisa com doisnomes. Ou seja,sempreque a sua produofor uma produo re-presentativa (vou explicar o que representao para vocs), vocsestaro reproduzindo um sistema de poder. Ento, o que ns temos que romper,exatamente, com esse sistema de poder, produzindo esse rompimento atravs de dois

    procedimentos: filosofiae arte. Se nofor assim, a nossa existncia vai permanecerprotegida por um guarda-chuva, que no aguenta esse temporal que caiu agorinhamesmo aqui. Ento, ns vamos ser banhados queiramos ou no, durante toda a nossa

    vida, com um cobertor e um edredom, casa em Bzios ou em Paris

    ns vamos serbanhados pelo caos que passa por esse guarda-chuva, necessariamente. E a nica sadapara enfrentar esse caos no ir pra baixo do cobertor pensar.

    Ento, a minha aula exatamente uma prtica. A minha aula no uma teoria, fazerum agenciamento com vocs e ver, se juntos, ns poderemos fazer uma composio do

    pensamento para compor o nosso caos.

    (Por hoje s.)

    (Palmas)