Trabalho Moderna

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    Universidade Federal FluminenseInstituto de Cincias Humanas e FilosofiaCurso de Histria

    Disciplina: Histria ModernaProfessor: Rodrigo Bentes Monteiro

    UTOPIA: THOMAS MORE E SUA ADEQUAO NAS DIFERENTESVISES DE HOMEM RENASCENTISTA

    Apresentado por:

    ALANA RIBEIRO DA SILVA

    DOUGLAS COUTINHO DIAS

    MARCELLO HAUR SILVA JINNATLIA CEOLIN E SILVA

    PABLO ANDRADE AFONSO

    Niteri2013

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    INTRODUO

    Neste presente trabalho buscaremos analisar uma das mais importantes obras da

    literatura mundial, Utopia, apresentando brevemente a biografia de seu autor, Thomas More(Ou Thomas Morus, em sua forma latinizada), para depois identificar em sua obra aspectos

    das vises de homem renascentista apresentadas pelos trabalhos de Jacob Burckhardt, Paul

    Kristeller e Eugenio Garin, que estejam presentes ou mesmo ausentes em sua vida e/ou seus

    escritos.

    ANALISANDO A UTOPIA DE MORE

    Thomas More (1478-1535) nasceu em Londres. Em 1490, ingressou faculdade de

    Oxford, e recebeu esta oportunidade do arcebispo John Morton (1420-1500), do qual recebeu

    forte influncia intelectual. A pedido do pai, estudou Direito. Dedicava-se concomitantemente

    teologia e literatura grega e latina.1 De 1529 a 1532, ocupou o cargo de Chanceler do

    Reino de Henrique VIII. Recusando-se a assistir a coroao de Ana Bolena e a assinar a Lei

    de Sucesso, mantendo-se do lado da Igreja Catlica e da autoridade papal, More julgado

    como traidor e tem como sentena a decapitao.

    No ano de 1516 publicado o livro Utopia, mais famoso trabalho de More e fonte de

    anlises inesgotveis at os dias atuais no que se refere ao seu contedo filosfico, poltico e

    social. Anlise que j iniciamos pelo prprio ttulo: a palavra utopia original do grego, e

    significa lugar nenhum, indicando no s o conhecimento do idioma pelo autor, mas

    tambm demarcando a inexistncia do local para aqueles que tambm possussem o

    conhecimento da lngua em questo. Mas antes de embarcar de maneira mais profunda na

    anlise da obra, faz-se necessrio estabelecer a situao histrica na qual o livro foi escrito.

    Como dito pelo prprio autor, o relato se passa em meio a uma pausa de uma

    negociao diplomtica. More enviado por Henrique VIII como embaixador a Flandres,

    representando os mercadores de Londres, para resolver uma disputa entre o monarca ingls e

    o ento prncipe de Castela, Carlos V, herdeiro dos Pases Baixos. A disputa girava em torno

    da proibio holandesa da importao de l inglesa.2E no intervalo das negociaes, quando

    More vai a Anturpia, que ele relata ter sido apresentado Rafael Hitlodeu por seu amigo, o

    1Jos Amrico Motta Pessanha. Vida e Obra.In: Coleo Os Pensadores: Erasmo e More. So Paulo: AbrilCultural, 1979. p. 1542Joo Almino. Prefcio. In: Thomas More. Utopia. Braslia: Universidade de Braslia: Instituto de Pesquisa deRelaes Internacionais, 2004. p. X

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    tambm humanista Peter Gillis. Hitlodeu (que tambm vem do grego e significa versado em

    patranhas), personagem fictcio, seria um navegante explorador portugus que teria

    acompanhado Amrico Vespcio em trs de suas quatro viagens,3 e quem conta sobre

    todas as maravilhas da ilha de Utopia, lugar magnfico e sem injustias ou desigualdades.

    O primeiro livro dedicado a relatar o encontro de More com Rafael, e pontuar todas

    as crticas do personagem em relao sociedade europeia de ento, enquanto o segundo

    dedicado ao relato das experincias do mesmo em Utopia, de tudo o que ele viu e aprendeu.

    Destacamos nesse momento a principal caracterstica literria do nosso autor renascentista,

    presente principalmente na prpria ideia de pintar um mundo perfeito sem explicitar sua

    inexistncia: a forte ironia e senso de humor cido. Caracterstica essa, tambm presente nas

    obras de seu amigo Erasmo de Rotterdam, que remonta tradio literria de um autorclssico, principal fonte de inspirao para ambos no que concerne ao estilo: Luciano de

    Samsata, escritor que viveu no sculo II d.C., conhecido por ser um dos maiores satiristas de

    todos os tempos.4Em Utopia, More se reveste de inspirao lucinica para tratar dos assuntos

    levantados pelo prprio Luciano em sua Saturnlia, principalmente o fim das desigualdades,

    quando escravos so tratados como reis, e adornos de ouro nada mais so do que

    representaes de inferioridade.

    Contrariando um equvoco interpretativo um tanto quanto geral em relao aoshumanistas renascentistas, Thomas More se revela um homem extremamente religioso,

    inclusive morrendo por ficar ao lado da Igreja Catlica e no da Anglicana, do rei Henrique

    VIII. Porm, o fato de ser religioso no impede o escritor de ser crtico em relao ao tema:

    mesmo que no possamos tomar todas as palavras de Rafael Hitlodeu como expresses do

    pensamento de More, provvel assumir uma certa afinidade de ideias entre autor e

    personagem, principalmente pela forma como Rafael retratado no livro, sempre envolto em

    uma aura de sabedoria e conhecimento, sempre pintado de maneira positiva. E seguindoessa linha de pensamento que destacamos a passagem em que o explorador portugus define o

    clero como os primeiros vagabundos deste mundo,5algo inimaginvel de ser dito por um

    religioso do perodo medieval, fortalecendo a ideia de rompimento exposta por Eugenio

    Garin e Jacob Burckhardt em oposio ideia de continuidade trazida pelo texto de Kristeller.

    Essas evidncias trazem tambm uma outra possvel crtica: no seria Utopia o modelo de

    sociedade crist perfeita? Vlido lembrar que na constituio de Utopia se l que uma das

    3Idem. p. X-XI4Carlo Ginzburg.Nenhuma ilha uma ilha. So Paulo: Companhia das Letras, 2005. p. 295Thomas More. Op. cit. Lisboa: Guimares Editores, 1990. p. 49

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    mais antigas instituies aquela que diz que ningum pode ser agredido em razo de sua

    religio.,6em contraste com a realidade das Inquisies da Igreja.

    Em meio a toda essa anlise, consideramos de vital importncia refletir sobre o que

    diz Paul Kristeller ao falar do movimento humanstico. Procurando desfazer uma confuso

    geral sobre o uso do termo humanstico, o autor decide empreg-lo apenas para designar os

    especialistas e professores das chamadas studia humanitatis, conjunto de disciplinas doutas

    que envolviam, entre outras, a retrica, histria, poesia, etc. vlido o esforo do autor em

    tentar desfazer uma confuso, e sua justificativa muito lcida, pois os professores destas

    disciplinas eram de fato chamados de humanistas epoca, dentro das universidades e

    demais instiuies de ensino. Mas exatamente a tambm que ele erra: ao limitar sua anlise

    ao mundo acadmico, Kristeller no s ignora qualquer contributo que no tenha sado destemeio, como tambm ignora pensadores e autores importantes que no foram formados ou

    cursaram as tais disciplinas. Thomas More, por exemplo, era formado em direito, logo no

    se encaixaria na definio de humanista de Kristeller, apesar das bvias caractersticas

    humansticas (mesmo se nos limitarmos anlise do autor em questo) presentes em seu

    trabalho, sendo o domnio e uso do latim e grego apenas uma delas. Nos parece grave tambm

    a passagem em que o filsofo alemo diz que o contributo de novidade dos humanistas

    consistiu em introduzir a convico de que para falar e escrever bem era necessrio estudar eimitaros antigos. (grifos nossos).7Fica difcil concordar com Kristeller depois de ler uma

    obra to completa quanto Utopia, de inspiraes clssicas claras, mas ao mesmo tempo de

    uma contribuio filosfica imensa, muito mais do que simples cpia ou imitao, trazendo

    para a vida cotidiana de muitos que a leram (o juiz Vasco de Quiroga, por exemplo8) impactos

    sensveis no modo de pensar e/ou de agir.

    CONCLUSOCOMPARANDO E CONFRONTANDO VISES

    extremamente satisfatrio poder estudar o Renascimento quando podemos entrar

    em contato com a arte produzida no perodo. Ler Utopia antes de qualquer coisa um

    exerccio de verdadeira recompensa mental, no s pela escrita de qualidade acima do

    comum, como pelos levantamentos filosficos acerca da sociedade e dos indivduos que dela

    fazem parte. Thomas More representa o homem renascentista em suas diferentes e fascinantes

    facetas: o homem de muitas qualidades e habilidades de Burckhardt, advogado, diplomata,

    6Idem. p. 1157Paul Kristeller. Tradio clssica e pensamento do Renascimento. Lisboa: Edies 70, 1995. p. 208Carlo Ginzburg. Op. cit.p. 37-38

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    escritor e at santo (!); o homem que domina o grego e latim, lembrado por Kristeller,

    oferecendo uma nova maneira de estudo dos clssicos; o homem que contribui para a sua

    mudana e para a mudana da sociedade em que vive, atravs de seu sentir, de suas relaes

    no apenas com a sociedade terrena, mas tambm com a Igreja e Deus, como ressalta Garin.

    E j que criticamos a viso geral de Paul Kristeller em especial sobre o homem

    renascentista, nada mais justo do que reconhecer um ponto extremamente vlido de sua

    argumentao e que deixa uma pulga atrs da orelha depois da leitura do nosso livro de

    trabalho: ao discutir a contribuio filosfica do perodo, Kristeller reconhece apenas o

    contributo na rea da retrica, o que discordamos pelos motivos j apresentados no incio

    desta pgina, mas levantamos uma questo pertinente. Seria Utopiaum grande exerccio de

    retrica?Depois de relatar um mundo perfeito, muito mais vivo do que a Repblicade Plato,

    quase palpvel e ao mesmo tempo to distante, to ideal, Thomas More deixa escapar nas

    ltimas pginas que adoraria ver refletida nas cidades europeias a realidade de Utopia, porm

    ressalta que isso coisa que mais desejo do que espero.9Modelo, luz no fim do tnel ou

    exerccio de brilhante retrica? Uma questo que parece to importante, em verdade no .

    Pois o fato que uma criao to bela e imaginativa quanto Utopia no necessita de

    categorizaes a limitar-lhe os movimentos. to livre e complexa quanto seu autor, tpicacriao de um homem-produto e produtor de uma poca de criaes e transformaes que no

    merecem sntese, e sim apaixonada anlise.

    9Thomas More. Op. cit.p. 132

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    REFERNCIAS

    BURCKHARDT, Jacob.A Cultura do Renascimento na Itlia. So Paulo: Companhia das

    Letras, 1991.GARIN, Eugenio (org.). O homem renascentista. In: O Homem Renascentista. Lisboa:Presena, 1991.

    GINZBURG, Carlo.Nenhuma Ilha uma Ilha. So Paulo: Companhia das Letras, 2005.

    KRISTELLER, Paul. O movimento humanstico. In: Tradio Clssica e Pensamento doRenascimento. Lisboa: Edies 70, 1995.

    LINDER, Douglas O. The Trial of Sir Thomas More: A Chronology. Disponvel em:

    http://law2.umkc.edu/faculty/projects/ftrials/more/morechrono.html. Acesso em 17/10/2013

    MORE, Thomas. Utopia. Braslia: Editora Universidade de Braslia: Instituto de Pesquisa deRelaes Internacionais, 2004.

    MORE, Thomas. Utopia. Lisboa: Guimares Editores, 1990.

    PESSANHA, Jos Amrico Motta. Vida e Obra. In: Coleo Os Pensadores: Erasmo eMore. So Paulo: Abril Cultural, 1979.