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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
IDORLENE DA SILVA HOEPERS
TRADUÇÕES DA POLÍTICA DE ENSINO SUPERIOR NO CONTEXTO DA
PRÁTICA EM INSTITUTOS SUPERIORES DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO
BRASIL E DE PORTUGAL
ITAJAÍ, SC
2017
2
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura
Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE
Curso de Doutorado em Educação
IDORLENE DA SILVA HOEPERS
TRADUÇÕES DA POLÍTICA DE ENSINO SUPERIOR NO CONTEXTO DA
PRÁTICA EM INSTITUTOS SUPERIORES DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO
BRASIL E DE PORTUGAL
Tese apresentada ao colegiado como requisito
parcial à obtenção do grau de Doutor em Educação
– área de concentração: Educação – Políticas para
a Educação Básica e Superior.
Orientador: Prof.a Dr.
a Regina Célia Linhares
Hostins.
ITAJAÍ, SC
2017
3
UNIVALI
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura
Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE
Curso de Mestrado Acadêmico em Educação
CERTIFICADO DE APROVAÇÃO
IDORLENE DA SILVA HOEPERS
TRADUÇÕES DA POLÍTICA DE ENSINO SUPERIOR NO CONTEXTO DA
PRÁTICA EM INSTITUTOS SUPERIORES DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO
BRASIL E DE PORTUGAL
Tese avaliada e aprovada pela Comissão
Examinadora e referendada pelo Colegiado do
PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de
Doutor em Educação.
Itajaí (SC), 2 de fevereiro de 2017.
Membros da Comissão:
Orientadora: ______________________________________
Prof.ª Dr.ª Regina Célia Linhares Hostins
Membro Externo: _______________________________________
Prof.ª Dr.ª Rosânia Campos (UNIVILLE)
Membro Externo: _______________________________________
Prof.ª Dr.ª Dora Maria Ramos Fonseca de Castro (UA)
Membro representante do colegiado: _______________________________________
Prof.ª Dr.ª Cássia Ferri
4
Aos que lutam pela igualdade de direitos e deveres.
5
AGRADECIMENTOS
Tenho muito e bons motivos para agradecer:
Ao Instituto Federal Catarinense (IFC) e, em especial, ao Campus Camboriú, onde
exerço minhas atividades, pois o afastamento durante parte do tempo de doutoramento foi de
suma importância para a imersão nos estudos.
À Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), minha escola no processo formativo e
local onde, também, ingressei na docência no Ensino Superior. Um lugar de muitos
significados e aprendizagem, que contribuiu decisivamente para minha trajetória profissional.
Ao Instituto Politécnico do Porto (P.Porto), em Portugal, por me receber em outro
―sítio‖ e possibilitar o desenvolvimento de parte da pesquisa que hoje se materializa.
Aos gestores do IFC e P.Porto que, como participantes da pesquisa, contribuíram de
modo ímpar para o desenvolvimento deste processo de aprendizagem.
À Prof.a Dr.
a Regina Célia Linhares Hostins, orientadora que, com seu conhecimento e
experiência, foi mostrando os equívocos e aprimorando minha capacidade analítica.
À Prof.a Dr.
a Dora Maria Ramos Fonseca de Castro, por ter aceitado o desafio de
acompanhar e co-orientar minha pesquisa no P.Porto e por suas contribuições teóricas.
Aos Professores integrantes da banca de qualificação e defesa pelas contribuições e
pelo tempo dedicado à leitura atenta desta tese.
À Capes, pois ser Bolsista do Observatório de Políticas Educacionais proporcionou
apoio financeiro e possibilitou aprendizagens que, por meio das pesquisas desenvolvidas, se
somaram à minha atuação profissional.
Aos integrantes do Grupo de Pesquisa do Observatório de Políticas Educacionais, por
dividirem comigo as reflexões e as aprendizagens das pesquisas que realizamos em conjunto.
Aos funcionários das duas instituições; na UNIVALI, em especial à Mariana e à
Tânia; e no P.PORTO, aos funcionários da Biblioteca, ―sítio‖ onde passei meus dias de
estudos mais intensos, por terem estado sempre dispostos a auxiliar nas questões que surgiam.
Aos colegas professores do IFC, porque tenho consciência de que, quando nos
afastamos para formação, são eles que assumem mais atividades para suprir nossa ausência.
Aos acadêmicos que, como meus orientandos, alguns em vias de conclusão de suas
pesquisas, também sentiram meu afastamento ao trocarem de professor orientador.
Aos Professores do PPGE, pelas contribuições teóricas e reflexões durante o percurso
das disciplinas.
6
Dito isso, considero que o agradecimento é necessário, eu diria essencial. Ao
agradecermos movimentamos energias positivas. No processo de doutoramento, vivemos
muitos momentos de tensão, de ansiedade, de angústias e de cansaço físico e mental extremos.
Inicialmente, temos uma turma, conhecemos novas pessoas e, ao cursar as disciplinas nas
apresentações de seminários, em meio a mil e uma leituras, estudos e exigências dos
professores quanto às sínteses necessárias na elaboração e no aprofundamento do
conhecimento, vivemos também em um espaço de transição.
Aos poucos, as disciplinas terminam e a conversa interior com os autores e o pavor das
linhas em branco fica mais intensa. As ideias estão expostas, a essência também, mas o ato de
compreender e abstrair o que lá está escrito é um movimento intenso e complexo que somente
se consegue com muito esforço. Fazer uma tese e uma pesquisa pautada na ética, na seriedade
e no comprometimento implica fazer escolhas e, para cada uma delas, seremos cobrados pelos
avaliadores. São escolhas teóricas, metodológicas, organizacionais em meio a tantas outras, e
a sombra da tese está sempre a nos acompanhar. É necessário produzir, mas até entendermos
que não é tudo o que lemos que deve estar na tese também demora um tempo. Isso é um
aprendizado imprescindível.
Para além do aprofundamento dos conhecimentos, há outras partes boas, momentos
intensos na descoberta do novo. Entre elas, estão as pessoas. Algumas passam, mas os amigos
que ficam têm um papel fundamental, eu diria que são a essência. Neste processo, fiz bons
amigos, principalmente no grupo dos “Dalits”. Alguns já conhecia, mas com certo
afastamento; e outros foram chegando tão intensamente que a dimensão temporal já não
importava. Não será necessário citar nomes, mas cada um deles vai se reconhecer aqui. Há os
que são luz, os alegres, os sensíveis, os exigentes, os discretos, mas todos disponíveis para
ajudar e sempre muito próximos, pois, quando as coisas ficavam nebulosas, eles lembravam
que estavam ali, bem ao meu lado.
Foram muitos almoços, cafés, trocas de abraços, angústias, boas conversas e risadas,
mas o que importava mesmo era celebrar a energia, o encontro que de tão significativo rompia
a barreira dos grupos deste ou daquele professor orientador. Estes ficarão e continuarão
porque são preciosos, joias raras. Se aqui fiz bons amigos, há também aqueles que chegaram
em circunstâncias profissionais, mas com igual valor. Entre eles, há uma pessoa ímpar, Sônia
Fernandes. Eu a considero a maior responsável por este processo que está agora em vias de
finalização. Com ela, aprendi a ver possibilidades que, antes, somente conseguia ver
dificuldades - isso foi decisivo para chegar até aqui. Não é necessário termos um milhão de
7
amigos, mas é imprescindível que tenhamos alguns bons e sinceros - e estes fazem a
diferença. Parece um contrassenso, mas com eles, ao dividirmos, somamos.
Agradeço ainda:
Aos familiares que acompanharam este processo, alguns deles mais próximos e outros
mais distantes, com eles sempre há uma possibilidade de aprender. Em especial, à Maria, por
estar sempre perto comemorando e incentivando minhas conquistas, mesmo quando havia um
oceano a nos separar.
Ao Vilmar, marido e companheiro de longa data, que suportou minhas ausências em
momentos nos quais as tarefas cotidianas ficavam muito mais a seu encargo. Quando o
processo se tornava árido e desgastante, era ele quem ouvia minhas angústias e, calmamente,
me lembrava da importância de ter-se calma e persistência.
Ao Fabrício, meu grande presente, que não é somente filho, mas também um amigo
precioso, que está sempre pronto para uma boa conversa com palavras de incentivo, em
especial neste processo de doutoramento. Aos dois minha eterna gratidão e respeito, pois são
pessoas ímpares. Cada um a seu modo compreendeu a importância dos momentos de
afastamento e brindam comigo este momento.
Aos meus pais, Otávio e Dozolina, que, hoje, me acompanham em outra dimensão,
mas continuam presentes em minha vida. Termino com eles, mas, na verdade, foi onde tudo
começou. Foi com eles que aprendi a valorizar o conhecimento e que, para sermos felizes,
precisamos de muito pouco. A essência e a sensibilidade estão nas pequenas coisas e se as
mãos são pontes, contei com muitas delas nesta travessia.
Agradeço ainda a uma LUZ maior que me move e me guia.
Obrigada!
8
Ao concluir mais esta etapa do meu processo de formação e como professora que sou, não
posso deixar de manifestar minha indignação com os recentes acontecimentos
e encaminhamentos da política educacional brasileira. Mais uma vez, como
política de governo, a educação é tratada como privilégio de alguns,
aprofundando as desigualdades e negando a educação
como direito de todos.
Por esse motivo me reporto a Orwell:
Todos são iguais
mas alguns são mais iguais
do que os outros.
George Orwell
9
RESUMO
Esta Tese, vinculada à Linha de Pesquisa Políticas para a Educação Básica e Superior e ao
Observatório de Políticas Educacionais, tem por objeto a política de ensino superior no
contexto dos Institutos Superiores de formação profissional no Brasil e em Portugal. O
problema consiste em analisar como são traduzidas essas políticas, notadamente as dirigidas à
Pós-Graduação e às atividades de pesquisa e à produção do conhecimento nos Institutos cuja
identidade original esteve centrada, prioritariamente, na formação técnica. A tese é de que na
tradução das políticas, no contexto da prática, os institutos constroem suas estratégias e táticas
forjadas em redes de poder e disputas sustentadas na luta pela construção/afirmação da
identidade institucional no campo do Ensino Superior, buscando reconhecimento nas
atividades relacionadas à Pós-Graduação, pesquisa e produção de conhecimento. A tese
sustenta-se na compreensão de que as políticas, geradas em contextos globais, influenciam as
agendas das políticas nacionais e, estas, por sua vez, ao chegar nas instituições, são
interpretadas e traduzidas em diferentes configurações, por diferentes atores, em um
movimento tal que produz efeitos na gestão e na identidade institucional. O objetivo geral
deste trabalho foi analisar a tradução das políticas de Ensino Superior, notadamente as
dirigidas à Pós-Graduação e consequentes atividades de pesquisa e produção do
conhecimento, pelos gestores do Instituto Federal Catarinense (IFC) no Brasil, e do Instituto
Politécnico do Porto (P.Porto) em Portugal. Mais especificamente, buscou-se: a) identificar as
redes de influência e de produção de textos das políticas para o Ensino Superior no contexto
brasileiro e português, notadamente a partir da década de 1990; b) compreender no contexto
das políticas para o Ensino Superior a constituição da identidade do IFC no Brasil e do
P.Porto em Portugal; c) identificar as estratégias e táticas adotadas pelas instituições, com
vistas à implantação/consolidação da Pós-Graduação e da pesquisa no contexto de
reorganização como instituições de Ensino Superior. Os referenciais teórico-metodológicos
que ancoram esta tese pautam-se na abordagem do Ciclo de políticas (BALL; BOWE, 1992) e
na teoria do Policy Enactment (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012) que evidencia o processo
dinâmico e não linear de resposta à política e o papel dos diferentes atores como protagonistas
do policy work no contexto da prática. A partir de abordagem qualitativa comparada,
utilizaram-se dois tipos de fontes: a) documentais: documentos internacionais, nacionais e
institucionais circunscritos àqueles que impactaram diretamente na reorganização da
Educação Superior no âmbito dos institutos; b) empíricas: entrevista semiestruturada,
composta por seis questões abertas, com 16 gestores (oito de cada instituição) das áreas de
Pós-Graduação, Pesquisa e Conselhos Técnico-Científicos. O estudo evidencia que a agenda
globalmente estruturada para as reformas na educação na década de 1990 produziram efeitos
nas políticas para o Ensino Superior, as quais chegaram aos Institutos estudados, em tempos
distintos, porém de maneira contundente, interferindo na reorganização de suas identidades
antes direcionadas prioritariamente para a formação técnica. Por influências das políticas
globais, tanto no contexto brasileiro como de Portugal, foram estabelecidos a diversificação
do Ensino Superior, o encurtamento do tempo nas formações, o vínculo entre o
desenvolvimento econômico e a educação, os discursos de eficiência e qualidade, as
regulações externas e, principalmente, as assessorias técnicas e financeiras como garantias
para a implantação das recomendações nas reformas efetuadas. Na constituição/consolidação
de suas identidades, em face das novas diretrizes da política, os institutos estão inseridos no
Ensino Superior com o alargamento de suas atividades, o que fatalmente interfere na
construção da identidade e atinge gestores e professores. Nesse posicionamento, estes lidam
com as disputas, as redes internas de poder, os constantes embates e as necessidades de
acordos e as latentes condições que precisam ser criadas para ser reconhecida como uma
10
instituição de pesquisa e Pós-Graduação aliada à necessidade de fabricar uma imagem de
compromisso desta com a política, decorrente dos processos avaliativos externos. Nessa luta,
estratégias e táticas vão sendo forjadas na dificuldade de diálogo e de articulação entre as
ações, na declaração de acordos, nas disputas por áreas de domínio, na sobreposição de
poderes, mas também na identificação de possibilidades expressa nos desejos de convergência
e não esfacelamento das identidades originárias, de verticalização de currículos, de
fortalecimento do olhar para as demandas locais e interesses regionais, de consolidação da
pesquisa e redes de pesquisa, de estímulos à produção científica, de referencialidade em
determinadas áreas de conhecimento e inovação como estratégia de marcar presença, ser
visível e competitivo no espaço do Ensino Superior.
Palavras-chave: Ciclo de políticas. Policy enactement. Contexto da prática. Política para o
Ensino Superior. Instituto Federal Catarinense. Instituto Politécnico do Porto.
11
ABSTRACT
This Thesis is linked to the Line of Research Policies for Basic and Higher Education
Research, and to the Observatory of Educational Policies. Its object of research is Higher
Education policy in the context of the Higher Education Institutes of Vocational Education in
Brazil and Portugal. The research problem consists in analyzing how these policies are
translated, especially those geared towards Postgraduate studies and the activities of research
and production of knowledge, in Institutes whose original identity was primarily built on
technical education. The theory is that in the practical application of the policies, the institutes
built their strategies and tactics forged in networks of power and disputes sustained in the
struggle for the construction/affirmation of institutional identity in the field of Higher
Education, seeking recognition in activities related to Postgraduate education, research and
the production of knowledge. The theory is supported by the understanding that policies,
generated in global contexts, influence the agendas of national policies and, in turn, when they
reach institutions, are interpreted and translated in different configurations, by different
actors, into a movement that influences the institutional management and identity. The main
objective of this work was to analyze the translation of Higher Education policies, especially
those aimed at Postgraduate studies and consequent activities of research and production of
knowledge, by the managers of the Instituto Federal Catarinense (IFC), in Brazil, and the
Instituto Politecnico do Porto (P. Porto), in Portugal. More specifically, we sought to: a)
identify the networks of influence and production of texts for Higher Education policies in the
Brazilian and Portuguese context, particularly since the 1990s; b) understand, in the context of
Higher Education policies, the constitution of the identity of the IFC in Brazil and of P. Porto
in Portugal; and c) identify the strategies and tactics adopted by the institutions in the
implantation/consolidation of Postgraduate studies and research in the context of
reorganization as Higher Education Institutions. The theoretical-methodological references
that support this thesis are based on the approach of the Policy Cycle (BALL; BOWE, 1992)
and Policy Enactment theory (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012), which highlights the
dynamic, non-linear process of response to the policy and the role of the different actors, as
protagonists of the policy work in the context of practice. Based on the comparative
qualitative approach, two types of sources were used: a) documental: international, national
and institutional documents, circumscribed to those that directly impacted the reorganization
of Higher Education in the scope of the institutes; and b) empirical: semi-structured
interviews, consisting of six open questions, with 16 managers (eight from each institution) in
the areas of Postgraduate studies, Research and Technical-Scientific Counselling. The study
shows that the globally structured agenda for education reforms in the 1990s produced effects
on Higher Education policies, which reached the institutes studied, at different times, but in a
decisive manner, influencing the reorganization of their identities, which were previously
focused primarily on technical education. Due to the influence of global policies, in both the
Brazilian and Portuguese contexts, there occurred a diversification of Higher Education,
shortening of education time, link between economic development and education, efficiency
and quality discourses, external regulations, and in particular, technical and financial
advisories, as guarantees for the implementation of the recommendations in the reforms
carried out. In the constitution/consolidation of their identities, faced with the new policy
guidelines, the institutes are inserted in Higher Education with the extension of their
activities, which ultimately influences the construction of their identities and affects the
managers and professors. In this new positioning, they deal with disputes, internal power
networks, constant clashes, and the demand for agreements and latent conditions that need to
be created in order for the institutions to be recognized as research and Postgraduate
12
institutions, along with the need to construct an image of commitment to the policy, due to
processes of external evaluation processes. In this struggle, strategies and tactics are being
forged in the difficulty of dialogue and articulation between the different actions, in the
declaration of agreements, in disputes over domain areas, in the overlapping of powers, and in
the identification of opportunities, expressed in the desires for convergence and in the
disruption of the original identities, verticalization of the curricula, strengthening of the ability
to cater for local demands and regional interests, consolidation of research and research
networks, stimulation of scientific production, referentiality in certain areas of knowledge,
and innovation as strategy to mark their presence, becoming more visible and competitive in
the area of Higher Education.
Keywords: Policy cycle. Policy enactment. Context of practice. Policy for Higher Education.
Instituto Federal Catarinense. Instituto Politécnico do Porto.
13
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Distribuição dos campi no Estado de Santa Catarina 41
Figura 2 - Mapa do Distrito do Porto com as localizações dos três campi 48
Figura 3 - Composição dos campi com suas sete Escolas e Institutos 50
Figura 4 - Composição dos campi com suas oito Escolas e Institutos 51
Figura 5 - Década de ingresso dos entrevistados no IFC 56
Figura 6 - Década de ingresso dos entrevistados no P.Porto 58
Figura 7 - Rede de Influências de Políticas Globais nas Políticas Educacionais do Brasil e de
Portugal 67
Figura 8 - Processo de Bolonha e alterações no Ensino Superior 89
Figura 9 - Organização do Ensino Superior português conferente de grau após instituição do
Processo de Bolonha 93
Figura 10 - Representação dos subsistemas de ensino Português 123
Figura 11 - Evolução do Sistema Politécnico na prática 125
Figura 12 - Dilemas dos gestores na configuração da política no IFC 144
Figura 13 - Estratégias e táticas do IFC na tradução das políticas 169
Figura 14 - Dilemas dos gestores na configuração da política no P.Porto 178
Figura 15 - Estratégias e táticas do P.Porto na tradução das Políticas 207
Figura 16 - Estratégias e táticas comuns ao IFC e P.Porto 215
14
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Documentos nacionais selecionados 59
Quadro 2 – Documentos Institucionais selecionados 60
15
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Titulação dos professores efetivos dos cinco campi do IFC 42
Tabela 2 - Total de cursos, alunos e docentes em cada campus do IFC 46
Tabela 3 - Número de trabalhadores docentes P.Porto (2014) 52
Tabela 4 - Total de Cursos e alunos nas sete Escolas / Institutos do P.Porto (ano base 2015) 53
Tabela 5 - Total de Cursos nas oito Escolas / Institutos do P.Porto (ano base 2016) 54
Tabela 6 - Cursos Superiores criados a partir de 2010 nos campi de origem do IFC 57
Tabela 7 - Quadro de docentes, técnicos administrativos e alunos das Escolas Agrotécnicas
Federais e Colégios Agrícolas vinculados à proposta prévia para constituição do
IFC 102
Tabela 8 - Número de docentes efetivos por nível de formação nas Escolas Agrotécnicas
Federais e Colégios Agrícolas vinculados à proposta prévia de composição do IFC
102
Tabela 9 - Composição mínima do corpo docente/investigador exigidos nos ensinos superior
universitário 182
16
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
A3ES Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior
AACEF Avaliação / Acreditação e Ciclos de Estudo em Funcionamento
ARI Assessoria de Relações Internacionais
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM Banco Mundial
BSM Plano Brasil Sem Miséria
CAC Colégio Agrícola de Camboriú
CAEE Certificado de Apresentação para Apreciação Ética
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CECISP Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos
CEFET Centros Federais de Educação Tecnológica
CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CEPROF Centro Educacional Profissional de Fraiburgo
CERTIFIC Rede Nacional de Certificação Profissional e Formação Inicial e Continuada
CET Curso de Especialização Tecnológica
CNAVES Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior
CNE Conselho Nacional de Educação
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CTC Conselho Técnico Científico
CTESP Cursos Técnicos Superiores Profissionais
CTFP Contrato de Trabalho em Funções Públicas
DDE Diretoria de Desenvolvimento de Ensino
DE Dedicação exclusiva
DGES Direção Geral do Ensino Superior Português
DRH Diretoria de Recursos Humanos
17
EAF Escolas Agrotécnicas Federais
EAFS Escola Agrotécnica Federal de Sombrio
ECTS European Credit Transfer System
ESE Escola Superior de Educação
ESHT Escola Superior de Hotelaria e Turismo
ESMAD Escola Superior de Média Artes e Design
ESMAE Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo
ESTG Escola Superior de Tecnologia e Gestão
ESTSP Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto
ETI Equivale a tempo integral
ETVARPE Escola Técnica Vale do Rio do Peixe
EUR-ACE Agência European Accreditation Engineering Programmes
EURASHE Associação Europeia de Instituições de Ensino Superior
EV Escolas Vinculadas às Universidades Federais
FAPESC Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa
Catarina
FCT Fundação para a Ciência e a Tecnologia
FHC Fernando Henrique Cardoso
FIC Formação Inicial e Continuada
FMI Fundo Monetário Internacional
FURB Fundação Universidade Regional de Blumenau
GQT Gerência da Qualidade Total
IFC Instituto Federal Catarinense
IFET Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPP Instituto Politécnico do Porto
18
ISCAP Instituto Superior de Contabilidade
ISEP Instituto Superior de Engenharia
LB Lei de Bases do Sistema Educativo
LDB Lei de Diretrizes e Bases Nacional
MCTI Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação
MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MEC Ministério da Educação
MP Mestrado Profissional
MQ Manual de Qualidade
MTE Ministério do Trabalho e Emprego
NAPNE Núcleo de Atendimento às Pessoas com Necessidades Específicas
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
PB Processo de Bolonha
PDI Plano de Desenvolvimento Institucional
PE Planejamento Estratégico
PET Programa de Educação Tutorial
PIBID Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência
PNPG Plano Nacional de Pós-Graduação
Prodocência Programa de Consolidação das Licenciaturas
PROEJA Programa Nacional de Educação de Jovens e Adultos
PROEP Programa de Expansão da Educação Profissional
PROEX Pró-Reitoria de Extensão
PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
PROPI Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação
PROUNI Programa Universidade para Todos
SEMTEC Secretaria de Educação Média e Tecnológica
19
SETEC Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
SISTEC Sistema Nacional de Informações da Educação Profissional e Tecnológica
TAE Técnico Administrativo da Educação
TESP Técnicos Superiores Profissionais
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UE União Europeia
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UTC Unidade Técnico-Científica
UTFPR Universidade Tecnológica Federal do Paraná
20
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 22
2 PERCURSO PARA O ESTUDO DA TRADUÇÃO DAS POLÍTICAS 32
2.1 ABORDAGEM DE STEPHEN BALL COMO MÉTODO DE PESQUISA NAS
POLÍTICAS EDUCACIONAIS 32
2.2 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA 36
2.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO 39
2.3.1 Perfil dos Campi do IFC 40
2.3.2 Perfil dos Campi do Instituto Politécnico do Porto – P.Porto 47
2.4 OS PARTICIPANTES DA PESQUISA 55
2.4.1 Os gestores do IFC 55
2.4.2 Os gestores do P.Porto 58
2.5 PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS 59
2.5.1 Coleta de dados 59
2.5.1.1 Fontes documentais 59
2.5.1.2 Entrevistas 61
2.5.2 Análise de dados 63
3 AS INFLUÊNCIAS GLOBAIS NO ÂMBITO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS
PARA O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E EM PORTUGAL 64
3.1 INFLUÊNCIAS NAS POLÍTICAS PARA O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL 69
3.2 INFLUÊNCIAS NAS POLÍTICAS PARA O ENSINO SUPERIOR EM PORTUGAL 83
3.3 UNIÃO EUROPEIA E PROCESSO DE BOLONHA: AS IMPLICAÇÕES PARA O
ENSINO SUPERIOR EUROPEU 88
4 A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DOS INSTITUTOS NO BRASIL E EM
PORTUGAL: MOVIMENTOS DA POLÍTICA 99
4.1 A MATRIZ DE CONSTITUIÇÃO DO IFC: FORMAÇÃO TÉCNICA E FORMAÇÃO
TECNOLÓGICA 99
4.1.1 O IFC no contexto de criação e expansão da Rede de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica 103
4.1.2 O olhar dos gestores sobre a identidade do IFC nos documentos institucionais 108
4.2 A MATRIZ DE CONSTITUIÇÃO DO P.PORTO: FORMAÇÃO TÉCNICA E ENSINO
SUPERIOR DE CURTA DURAÇÃO 118
4.2.1 Os Institutos Politécnicos no contexto de criação e expansão 120
4.2.2 A Declaração de Bolonha e as implicações para a organização do Ensino Superior
português 121
4.2.3 O olhar dos gestores sobre a identidade do P.PORTO nos documentos institucionais 126
21
5 INTERPRETAÇÕES E TRADUÇÕES DA POLÍTICA NO IFC 134
5.1 DILEMAS DA TRANSIÇÃO DA IDENTIDADE DE PROFESSOR / PESQUISADOR
PARA GESTOR 135
5.2 CONTRADIÇÕES DA POLÍTICA: DIRETRIZES, AVALIAÇÃO E REALIDADE EM
MOVIMENTO 145
5.2.1 A exigência da verticalização 152
5.3 FRAGILIDADE DO DIÁLOGO E ARTICULAÇÃO DO PLANEJAMENTO ENTRE
SETORES 157
5.4 ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO DA POLÍTICA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO IFC 162
6 INTERPRETAÇÕES E TRADUÇÕES DA POLÍTICA NO P.PORTO 172
6.1 DILEMAS DA TRANSIÇÃO DA IDENTIDADE DE PROFESSOR/PESQUISADOR
PARA GESTOR 172
6.2 CONTRADIÇÕES DA POLÍTICA: DIRETRIZES, AVALIAÇÃO E REALIDADE EM
MOVIMENTO 178
6.2.1 As polêmicas da oferta dos Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTESP) 189
6.3 FRAGILIDADES DO DIÁLOGO E ARTICULAÇÃO DO PLANEJAMENTO ENTRE
SETORES 197
6.4 ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO DA POLÍTICA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO
P.PORTO 199
7 CONSIDERAÇÕES 210
REFERÊNCIAS 219
APÊNDICES 234
ANEXOS 240
22
1 INTRODUÇÃO
―Nada existe de permanente, a não ser a mudança‖. Em tempos de neoliberalismo, as
palavras de Heráclito de Éfeso parecem continuar pertinentes à realidade que se apresenta. Há
um constante movimento que, por meio das políticas, altera a forma e as funções internas do
Estado vinculadas ao contexto externo. Transitar entre o local e o global, nos limites desta
tese, significa aproximar-se de elementos que, presentes nos dois contextos, auxiliam na
compreensão das realidades, especificamente aquelas voltadas ao Ensino Superior e à Pós-
Graduação de duas instituições públicas situadas no Brasil e em Portugal, objeto deste estudo.
Ao olhar para realidades distintas, na perspectiva dos estudos comparados, observa-
se um movimento, uma trama entre vários fios. Dessa trama participam tanto as redes de
influência, como as pessoas e as instituições que constroem estratégias e táticas para
responder aos desafios colocados pelas políticas em contextos locais específicos (BALL,
2012a). Há uma agenda globalmente estruturada para a educação (DALE, 2004), na qual as
ações locais legitimam as indicações de acordos e pressões gestadas em locais distantes,
também como resultado das posições de poder que determinadas pessoas, a exemplo dos
Ministros, ocupam dentro dos Estados quando participam de discussões maiores. Ou seja, por
meio da rede de relações, as ideias políticas movem-se e envolvem outros atores que as
traduzem para suas realidades, tornando opacas as fronteiras entre o local e o global.
Há um jogo de interesses que situa o Estado, não como vítima, mas como
estrategista, pois são as políticas de governo que direcionam as ações e redefinem suas
funções para o alcance de metas fixadas globalmente. Este parece ser um dos fatores que
historicamente tem influenciado descontinuidades e direcionamentos nas políticas e
interferido na definição das reformas, com destaque para as reformas educacionais, em todo o
mundo, nomeadamente aquelas desencadeadas após os anos de 1990.
Os países selecionados para o estudo – Brasil e Portugal – vivenciaram, no período
nomeado, suas últimas reformas educacionais e expressam, nas suas políticas, as influências
de direcionamentos globais para a educação, nomeadamente as direcionadas ao Ensino
Superior dirigidas à Pós-Graduação, a exemplo da diversificação da oferta com a criação de
―[...] uma série de instituições de baixo custo, com distintas missões, funções e modalidades
de desempenho [...]‖ (WORLD BANK, 1998, p. 3). No Brasil, a aprovação da Lei de
23
Diretrizes e Bases da Educação Nacional1 (LDB Nº 9.394/1996) e, posteriormente, a Lei de
Criação dos Institutos (LEI Nº 11.892/2008) marcam a reorganização do Ensino Superior e a
luta dos Institutos de formação Tecnológica para forjarem seu lugar nesse nível de ensino. Em
Portugal, o processo iniciado em 1986, com a aprovação da Lei de Bases do Sistema
Educativo2 (LB Nº 46/1986), teve seu desfecho com as alterações posteriores, visando
adequar a Lei e o ensino superior às exigências de Bolonha, o que também impactou
sobremaneira na tradução das políticas no interior dos Institutos Politécnicos.
É nesse contexto que se inserem as duas instituições as quais, por meio do
testemunho dos seus gestores, participaram desta pesquisa. No Brasil, o Instituto Federal
Catarinense (IFC), criado em 2008; e, em Portugal, o Instituto Politécnico do Porto (P.Porto),
criado em 1979. Ambos têm suas origens longevas e, consideradas suas peculiaridades, são
originários das Escolas de Artífices e dos Institutos Industriais e Comerciais respectivamente.
Seus percursos históricos, e, portanto, constitutivos de suas identidades, assentam-se no
1 Conforme esta lei, que rege o Sistema Educacional Brasileiro, a educação escolar é composta por dois níveis:
Educação Básica e Educação Superior. A Educação Básica é formada pela Educação Infantil, Ensino
Fundamental e Ensino Médio, obrigatória dos quatro aos dezessete anos de idade. A Educação Infantil é ofertada
até os cinco anos de idade. Até os três anos, é de caráter facultativo e oferecida em creches. A partir dos quatro
anos de idade, torna-se obrigatória sendo oferecida nas pré-escolas. O Ensino Fundamental tem duração de nove
anos, dividido em anos iniciais, com duração de cinco anos e anos finais, com duração de quatro anos. Nos anos
iniciais, prioritariamente por um professor e, nos anos finais, por professores distintos, conforme a área do
conhecimento. O Ensino Médio, última etapa da Educação Básica, tem três anos de duração e poderá, desde que
atendida à formação geral, preparar para o exercício de profissões técnicas. É ministrado por vários professores,
conforme a área do conhecimento. Desse modo, a Educação Profissional poderá ser desenvolvida articulada ao
Ensino Médio, ou de forma subsequente para aqueles que já o concluíram. O Ensino Superior é formado pelos
cursos de Graduação e Pós-Graduação que compreende os programas de mestrado, doutorado, especialização,
aperfeiçoamento e extensão desde que atendidos os requisitos fixados pelas instituições de ensino. Há, ainda, as
modalidades especiais dirigidas à Educação Especial e Educação de Jovens e Adultos. 2 A Lei de Bases do Sistema Educativo Português (Lei Nº 46, de 14 de outubro de 1986) foi posteriormente
alterada pelas Leis Nº 115, de 19 de setembro de 1997, e Lei Nº 49, de 30 de agosto de 2005. Na maior parte, as
alterações referiram-se ao Ensino Superior, sem alterações significativas quanto à organização geral do Sistema
de Ensino. No Capítulo II, dessa Lei, está definida a organização que engloba a educação pré-escolar, a educação
escolar e a educação extra-escolar na perspectiva da educação continuada. A educação escolar compreende a
Educação pré-escolar, o Ensino Básico, o Ensino Secundário e o Ensino Superior. A Educação pré-escolar é de
caráter facultativo e pode ser frequentada dos três aos cinco anos de idade. O Ensino Básico é universal,
obrigatório (dos seis aos quinze anos), gratuito, com duração de nove anos. Está organizado em três ciclos: o
primeiro de quatro anos (globalizante e sob a responsabilidade de um único professor), o segundo de dois anos
(organizado por áreas interdisciplinares com professores que atuam nas suas áreas específicas) e o terceiro de
três anos com plano curricular unificado envolvendo áreas vocacionais diversificadas e um professor por
disciplina. O Ensino Secundário, obrigatório e gratuito, tem duração de três anos e somente pode ser frequentado
por aqueles que completaram com aproveitamento o Ensino Básico. É organizado de forma a contemplar
elementos de formação técnica, tecnológica e profissionalizante, além da cultura e da língua portuguesa. Há
ainda as modalidades especiais de educação escolar compreendidas como: educação especial, educação
profissional, o ensino recorrente de adultos, o ensino à distância e o ensino português no estrangeiro, sendo cada
uma delas regida por legislações especiais. O ensino superior é dividido entre universitário e politécnico, porém
somente as licenciaturas e os mestrados são comuns aos dois. A oferta formativa do doutorado é exclusiva das
universidades.
24
ensino técnico e profissionalizante, com o objetivo de preparar mão de obra básica para o
mercado de trabalho, nomeadamente indústria, comércio e agricultura.
Atualmente, as duas instituições estão inseridas no Ensino Superior e na Pós-
Graduação; no entanto, ambas também são pressionadas pelas determinações oriundas das
políticas nacionais, o que pode ser entendido como limitações e desafios que alteram sua
lógica organizacional e influenciam sua identidade, pois interferem no seu âmbito de atuação.
Além disso, em cada contexto, a expressão ―educação tecnológica‖ tem significado distinto.
Enquanto, no Brasil, estende-se da Educação Básica ao Ensino Superior, em Portugal essa
expressão vincula-se ao ensino secundário. Essa diferenciação opera como um marcador das
peculiaridades do processo formativo em cada país e dos seus sistemas de ensino.
Essas duas realidades distintas, de lógicas institucionais e organizacionais, são
delineadas pelas políticas educacionais, especialmente nesta tese: as voltadas ao Ensino
Superior dirigidas à Pós-Graduação. Em ambas e em tempos históricos distintos, a identidade
institucional foi alterada com as políticas de expansão do Ensino Superior para responder ao
movimento das reformas educacionais desencadeadas globalmente e às pressões da população
quanto ao acesso a esse nível de ensino. Em Portugal, esse movimento iniciou nos anos de
1970, e, no Brasil, mas tardiamente, nos anos de 2000.
No Brasil, o Instituto Federal Catarinense (IFC), pertencente à Rede Federal de
Educação Profissional, Científica e Tecnológica, é composto, atualmente, por quinze campi e
uma reitoria situada em Blumenau. Foi formado inicialmente pela integração das Escolas
Agrotécnicas Federais de Concórdia, de Rio do Sul e de Santa Rosa do Sul, conhecida como
Escola Agrotécnica Federal de Sombrio, que se dedicavam, precipuamente, à oferta de
formação profissional técnica de nível médio, em suas respectivas áreas de atuação, além da
inclusão dos Colégios Agrícolas de Camboriú e Araquari, até então vinculados à Universidade
Federal de Santa Catarina.
Com essa nova organização, o IFC insere-se no campo da Educação Superior, com
foco, conforme Decreto Nº 6.095/2007, nos cursos de bacharelados de natureza tecnológica,
cursos de licenciatura e cursos superiores de tecnologia, visando a formação de profissionais
para os diferentes setores da economia (BRASIL, 2007b). Outra exigência refere-se à
implantação de programas de Pós-Graduação (tanto lato como stricto sensu), processo que faz
parte da política de governo de expansão e interiorização da Educação Superior no contexto
brasileiro.
Esse arranjo vem trazendo/provocando desdobramentos que necessitam ser
investigados. Conforme a Lei de criação, em seu artigo 2º:
25
Os Institutos Federais são instituições de educação superior, básica e profissional,
pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e
tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de
conhecimentos técnicos e tecnológicos com as suas práticas pedagógicas, nos termos
desta Lei. (BRASIL, 2008b, p. 1).
No contexto português, o Ensino Superior é dual e composto pelo ensino universitário
e ensino politécnico. O Instituto Politécnico do Porto (IPP), atualmente identificado como
P.Porto, está inserido no Ensino Superior Politécnico que, como subsistema, vem sendo
problematizado e discutido por vários autores, a exemplo de Antunes (2005) e Amaral (2005),
dentre outros. O Ensino Superior Politécnico foi criado em 1979, em substituição ao Ensino
Superior de curta duração que havia sido instituído em 1977, momento em que se deu a
formalização dos dois subsistemas de Ensino Superior.
Entre as décadas de 1980 e 1990, em um processo mais moroso do que o previsto no
Decreto de criação, as escolas e os institutos foram integrados ao P.Porto. Atualmente, é
composto pelo Instituto Superior de Engenharia (ISEP), Instituto Superior de Contabilidade
(ISCAP), Escola Superior de Educação (ESE), Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo
(ESMAE), Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (ESTSP), Escola Superior de
Tecnologia e Gestão (ESTG), Escola Superior de Média Artes e Design (ESMAD), Escola
Superior de Hotelaria e Turismo (ESHT).
Para efeito de legislação, os subsistemas são diferenciados, o que vem gerando
resistências e desdobramentos no campo de atuação institucional. Enquanto o universitário
está mais voltado à investigação científica, o politécnico estaria mais vinculado à investigação
aplicada, com maior proximidade aos setores industriais. No entanto, na prática, o que se
observa é um sombreamento das atividades e um campo intenso de disputas entre
universidades e institutos, alargada em certa medida pelas políticas educacionais vigentes e
que impactam sobremaneira na identidade.
Se, por um lado, há algumas conquistas via legislação, a exemplo do ingresso no
Ensino Superior; por outro, a mesma legislação provoca entraves que transitam desde a
diferenciação do financiamento até os limites da oferta formativa. Além desse fato, na década
de 2000, como resultado da adesão de Portugal à Declaração de Bolonha ocorrida em 1999, o
Ensino Superior português foi reestruturado, impactando diretamente na organização e no
funcionamento das instituições educativas, entre elas o P.Porto.
No caso brasileiro, o processo de mudanças causou e tem causado profundas
inquietações e embates, dada a abrupta alteração da identidade das instituições atingidas por
essa política no campo da formação tecnológica. Particularmente, vivenciei esse processo
26
logo após meu ingresso como docente no IFC. Vivi e observei os dilemas e a necessidade de
olhar para essa nova institucionalidade evidenciada no cotidiano, nas trocas de ideias e de
angústias com os colegas de trabalho. Tudo era muito novo e, nesse novo, muitos professores
e técnicos administrativos foram chegando. O lugar historicamente ocupado pelo ensino
técnico era ampliado com o ingresso do Ensino Superior, trazendo consigo os
desdobramentos da Pós-Graduação e os desafios de implantá-la.
Nesse contexto, o IFC está vivendo tempos de transição que lhe impelem ao processo
de reestruturação, tirando-o do lugar confortável conquistado como instituição reconhecida no
ensino técnico. Há uma identidade anterior e uma outra a ser construída, em um campo de
atuação e em uma cultura institucional que não muda de uma hora para outra e que, por outro
lado, não pode negar sua história anterior. Na Lei, o novo papel institucional a ser
desempenhado está claro, porém, nas condições reais e objetivas do cotidiano, há necessidade
de ser construído. A política vai sendo traduzida internamente pelos atores institucionais e
pelas estratégias que respondem aos desafios.
Com o ingresso no doutorado, e, posteriormente, como bolsista no Grupo de Pesquisa
do Observatório de Políticas Educacionais, as inquietações iniciais foram ampliadas com os
estudos sobre as redes de políticas globais (BALL, 2012a). Esses estudos, aliados ao interesse
em conhecer outras realidades e lógicas de organização no contexto internacional, levaram-
me a realizar o estágio doutoral (de quatro meses) no Instituto Politécnico do Porto em
Portugal, o qual mantém convênios de parcerias com o IFC, minha instituição de origem. O
propósito do estágio foi compreender, no contexto das políticas públicas, como ocorreu a
construção e a transição da identidade institucional do P.Porto e quais as estratégias e táticas
adotadas pela instituição para o seu reconhecimento como instituição de formação científica
superior, de modo a estabelecer conexões – similaridades e distanciamentos - com a realidade
brasileira.
Para além da atual conjuntura, considerei importante conhecer a gênese desses dois
institutos para melhor compreender o momento atual de transição identitária. Essa tarefa
requereu a compreensão das origens das referidas redes, as lutas pelo poder, as disputas e o
processo pelos quais as ações foram tomando a atual forma. Assim, assume relevância o
contexto histórico no qual as ações foram desencadeadas. Nesse caso, é o ato de olhar por
dentro as políticas educacionais, considerando a via de mão dupla entre distintos lugares,
sejam eles internacionais, nacionais, regionais ou locais. Tais instituições não ficaram imunes
às influências das políticas governamentais e sofreram com descontinuidades e rupturas
expressas nos cortes orçamentários de financiamentos, readequações curriculares e
27
pedagógicas, intensificadas nas políticas educacionais dos governos a partir da década de
1990, momento no qual se dá o recorte temporal de análise desta pesquisa.
Na conjuntura mais ampla, nos últimos anos e, mais intensamente, a partir da década
de 1990, Brasil e Portugal vêm passando por profundas mudanças em seu cenário econômico,
político, social e educacional. Tais movimentos não são exclusivos do Brasil e Portugal;
atingem a maioria das sociedades ocidentais, tanto desenvolvidas como em desenvolvimento,
especialmente no setor público, quanto às formas de organização da provisão social (BALL,
2006).
Essas transformações estão inseridas, principalmente, no contexto do neoliberalismo3
tatcherista, desencadeado no Reino Unido, nos anos oitenta. A partir desse período, conforme
alguns autores, a exemplo de Chauí (2001), Afonso et al. (2007), Silva Júnior e Spears (2012),
a lógica do Estado de bem-estar social com mudanças genéricas, situadas nas formas de
emprego, cultura, valores e financiamentos, é alterada. São afetadas também as relações
sociais que atingem, em grande medida, as estruturas organizacionais, os estilos
administrativos e, principalmente, os papéis das instituições públicas.
Com essa ruptura, passa-se, então, lentamente, para um Estado de trabalho, não
somente pautado no discurso fordista de produtividade e de planejamento, mas,
principalmente, reforçado pelo argumento de flexibilidade e de empreendedorismo. Nessa
lógica, há reconfiguração da participação do Estado que se reestrutura, permitindo-se, por um
lado, atravessar pelas leis do mercado e, por outro, mantendo-se intencionalmente como
Estado avaliador por meio de políticas públicas de avaliação e, entre elas, mais
especificamente, as voltadas ao Ensino Superior e à Pós-Graduação.
Outro ponto importante que merece destaque na instalação da lógica neoliberal, tanto
no Brasil quanto em Portugal, refere-se à influência de organizações financeiras
internacionais e multilaterais, a exemplo do Banco Mundial (BM), Organização das Nações
3 É um sistema econômico que defende a intervenção mínima do Estado na economia, deixando o mercado se
autorregular com total liberdade. O chamado neoliberalismo corresponde ao momento em que entra em crise o
Estado de Bem-Estar, de estilo Keynesiano e social-democrata, no qual a gestão dos fundos públicos era feita
pelo Estado como parceiro e regulador econômico, que operava a partir da ideia e da prática de planejamento
econômico e da redistribuição da renda por meio de benefícios sociais conquistados pelas lutas sindicais e
populares dos anos 1930-1940. Sua certidão de nascimento foi a crise capitalista do início dos anos de 1970,
quando o capitalismo conheceu, pela primeira vez, um tipo de situação imprevisível, isto é, baixas taxas de
crescimento econômico e altas taxas de inflação: a famosa ―estagflação‖. Na perspectiva do que viria a ser
designado como neoliberalismo, a crise fora causada pelo poder excessivo dos sindicatos e dos movimentos
operários que haviam pressionado por aumentos salariais e exigido o aumento dos encargos sociais do Estado e
teriam, dessa maneira, destruído os níveis de lucro requeridos pelas empresas, desencadeando os processos
inflacionários incontroláveis (CHAUÍ, 2001, p. 17-18).
28
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Fundo Monetário Internacional
(FMI), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entre outras.
Essas agências, por meio da cooperação bilateral, têm acentuada participação nas
alterações em curso, pois seus documentos indicam ações que devem ser implementadas pelos
países emergentes com ―[...] o discurso ‗justificador‘ das reformas que, preparadas em outros
contextos, necessitavam erigir consensos locais para sua implementação‖ (SHIROMA;
CAMPOS; GARCIA, 2005, p. 430, grifo das autoras).
Na década de 1990, a lógica neoliberal na organização da educação, especialmente a
superior, atingiu seu ápice no Brasil e em Portugal, ainda que sob a maestria de diferentes
organizações. No Brasil, no contexto latino-americano, o Banco Mundial, em conjunto a
outras organizações mencionadas, produziu as orientações para a reorganização do Estado e
do Ensino Superior, a exemplo do papel desempenhado pela União Europeia (UE) em
Portugal.
Nessa lógica, com o passar do tempo, os discursos de excelência, de produtividade, de
qualidade, de competitividade e de visibilidade tornaram-se atribuições da cultura do novo
gerencialismo, com ênfase nos resultados e nas formas de controle, muitas vezes em
detrimento do processo. Da mesma forma, ganha força o discurso da diversificação da oferta
do Ensino Superior e da simplificação de modelos educacionais com ampliação de respostas
às necessidades de mercado. Esse novo modelo afeta a estrutura e a cultura das instituições
que buscam não só se adequar às novas demandas da política, mas também estabelecer formas
de resistência e de demarcação de suas legítimas identidades nesse espaço de luta.
Nessa perspectiva, as razões para o desenvolvimento da presente pesquisa sustentam-
se:
na necessidade de aprofundar estudos, na perspectiva da educação comparada, sobre
as políticas educacionais para os Institutos e sua inserção no campo do Ensino
Superior, no Brasil e em Portugal;
na relevância de analisar os desdobramentos e as respostas dos gestores dos Institutos
às políticas, as quais vêm produzindo mudanças significativas na configuração
institucional, no seu perfil de formação e na gestão do Plano de Desenvolvimento
Institucional, Planejamento Estratégico e Manual de Qualidade;
na importância do direcionamento do olhar para os diferentes contextos geradores das
políticas públicas e sua consequente tradução no contexto da prática onde são
29
produzidas diferenciadas formas de condução, interpretação e definição de
estratégias;
na oportunidade de conhecer a política deste outro ponto de vista, de um lugar no qual
são criados espaços de manobra e de construção de estratégias específicas para a
implantação das mudanças.
A presente pesquisa insere-se no contexto do processo de transição, que envolve
ambas as instituições, na construção de uma nova identidade que traz uma história e uma
identidade anterior, bem como os esforços institucionais na implantação/consolidação e
organização da Pós-Graduação. Esse movimento exigiu e exige, dessas instituições, um olhar
voltado ao novo contexto, para além da técnica, com a inserção da inovação vinculadas às
políticas de governo e aos desafios presentes encontrados pelos gestores em momentos e
espaços nem sempre planos e delimitados.
Em face do contexto apresentado e do referencial teórico-metodológico que guiou esta
tese, fundamentado, primordialmente, nos estudos de Ball (2012a), Ball, Maguire e Braun
(2012), Teodoro (2003), Antunes (2005), Robertson (2009), delineou-se a seguinte questão de
pesquisa: Como são traduzidas as políticas de Ensino Superior, notadamente as dirigidas
à Pós-Graduação e consequentes atividades de pesquisa e produção do conhecimento, no
Instituto Federal Catarinense (IFC), no Brasil, e no Instituto Politécnico do Porto
(P.Porto), em Portugal?
Inseridas nessa problemática anunciada, há outras questões que decorrem da questão
principal:
Como se constituem as redes de influência e de produção de textos das políticas para o
Ensino Superior nos contextos brasileiro e português, notadamente a partir da década
de 1990?
Como ocorre a constituição da identidade do IFC no Brasil e do P.Porto em Portugal?
Quais as estratégias e as táticas adotadas pelas instituições, com vistas à
implantação/consolidação da Pós-Graduação e da pesquisa no contexto de
reorganização como instituições de Ensino Superior?
Com o intuito de prosseguir com esse desafio, apresenta-se como objetivo geral desta
tese: Analisar a tradução das políticas de Ensino Superior, notadamente as dirigidas à
Pós-Graduação e consequentes atividades de pesquisa e produção do conhecimento,
30
pelos gestores do Instituto Federal Catarinense (IFC), no Brasil, e do Instituto
Politécnico do Porto (P.Porto), em Portugal.
Na sequência, os objetivos específicos:
Identificar as redes de influência e de produção de textos das políticas para o Ensino
Superior no contexto brasileiro e português, notadamente a partir da década de 1990.
Compreender, no contexto das políticas para o Ensino Superior, a constituição da
identidade do IFC, no Brasil, e do P.Porto, em Portugal.
Identificar as estratégias e as táticas adotadas pelas instituições, com vistas à
implantação/consolidação da Pós-Graduação e da pesquisa no contexto de
reorganização como instituições de Ensino Superior.
Tendo como fio condutor as argumentações, as indagações e os objetivos
apresentados, a tese aqui defendida é a de que, na tradução das políticas, no contexto da
prática, os institutos constroem suas estratégias e táticas forjadas em redes de poder e
disputas sustentadas na luta pela construção/afirmação da identidade institucional no campo
do Ensino Superior, buscando reconhecimento nas atividades relacionadas à Pós-Graduação,
à pesquisa e à produção de conhecimento.
A tese sustenta-se na compreensão de que as políticas, geradas em contextos globais,
influenciam as agendas das políticas nacionais e, estas, por sua vez, ao chegarem nas
instituições, são interpretadas e traduzidas em diferentes configurações, por diferentes atores,
em um movimento tal que produz efeitos na gestão e na identidade institucional. No caso dos
institutos estudados, a Pós-Graduação, as atividades de pesquisa e a produção do
conhecimento são o ponto fulcral no processo de afirmação e de consolidação de suas
identidades como instituições de Ensino Superior.
O alcance dos objetivos elencados para esta tese está diretamente atrelado às escolhas
metodológicas considerando suas peculiaridades e organização. É exatamente o referencial
teórico e o percurso metodológico que darão suporte às análises e à caracterização da pesquisa
descritas no segundo capítulo da tese.
Na sequência, no capítulo três, o foco de análise recairá sobre as redes de influência e
o processo de elaboração das políticas desencadeado nos dois países. Busca-se empreender
um movimento de olhar com maior proximidade para as influências sofridas pelo Brasil e por
Portugal na peculiaridade de seus contextos, quanto à elaboração de políticas locais,
31
nomeadamente aquelas dirigidas ao Ensino Superior e pensadas para adequar seus sistemas de
ensino às exigências de agendas maiores, gestadas globalmente. Em cada contexto e em
tempos distintos, as influências dos vários organismos internacionais fazem-se presentes na
produção dos textos, evidenciando, também, o movimento de forças desiguais.
No capítulo quatro, a abordagem vincula-se à compreensão da identidade do IFC e do
P.Porto, no âmbito das políticas para o Ensino Superior. Foi na busca pela origem, que, por
meio da legislação, procurou-se identificar qual era a identidade pretendida por tais
instituições no momento histórico, político, econômico e educacional de sua criação. Nesse
movimento, estão também, em evidência, as recomendações dos organismos internacionais.
Por outro lado, desvela-se o processo de metamorfose pelo qual os institutos compelidos pela
legislação vão alterando sua identidade em meio a resistências e disputas. Ainda, nesse
capítulo, apresentam-se os depoimentos dos gestores sobre a identidade institucional e o seu
olhar sobre o modo pelo qual foram elaboradas as diretrizes de planejamento institucional
sistematizadas nos documentos norteadores.
Nos capítulos cinco e seis, serão abordados, em momentos distintos para cada
instituição, as interpretações e as traduções da política, identificando, por meio dos
depoimentos dos gestores, as estratégias e as táticas utilizadas em cada lócus para responder
aos desafios impostos pela política em cada contexto, como um campo de disputas intra e
inter institucional, notadamente as dirigidas para a Pós-Graduação e as consequentes práticas
de pesquisa e produção do conhecimento. Na sequência desses capítulos, será apresentado o
desfecho da pesquisa.
32
2 PERCURSO PARA O ESTUDO DA TRADUÇÃO DAS POLÍTICAS
Neste capítulo, apresento o referencial analítico norteador do estudo, pautado na
abordagem de Stephen Ball como método de pesquisa nas políticas educacionais, a
caracterização e a delimitação da pesquisa, a descrição do perfil geral dos institutos objeto do
estudo - IFC (Brasil) e o P.Porto (Portugal) - e seus campi, os procedimentos de coleta e de
análise de dados.
2.1 ABORDAGEM DE STEPHEN BALL COMO MÉTODO DE PESQUISA NAS
POLÍTICAS EDUCACIONAIS
As principais contribuições de Stephen Ball e seus colaboradores para esta tese são a
abordagem do ciclo de políticas, o conceito de redes políticas e a teoria do policy enactment
utilizada na tradução das políticas.
A abordagem do ciclo de políticas desenvolvida por Stephen Ball e Richard Bowe, na
década de 1990, traz valorosas contribuições para a análise do presente objeto de estudo. Para
a análise de políticas públicas educacionais em diferentes contextos, Stephen Ball (2009)
esclarece que o ciclo de políticas é um método, uma maneira de pesquisar e teorizar sobre
políticas e não uma explicação das políticas. A ideia de que as políticas são implementadas é
rejeitada, pois, segundo Ball (2009), não há um processo linear entre o texto escrito das
políticas e a dimensão prática. Entre um e outro extremo há alternâncias.
A prática é investida de valores locais e pessoais, nos quais ajustes e acordos em
instâncias secundárias fazem-se presentes e são necessários. Nesse sentido, Ball (2011), ao
escrever sobre a inclusão das pessoas nas políticas, destaca:
[...] políticas colocam problemas para seus sujeitos, problemas que precisam ser
resolvidos no contexto. Soluções para os problemas postos pelos textos políticos
serão localizadas e deveria ser esperado que discernissem determinados fins e
situações confusas. Respostas que precisam, na verdade, ser ―criativas‖. As políticas
normalmente não dizem o que fazer; elas criam circunstâncias nas quais o espectro
de opções disponíveis sobre o que fazer é reduzido ou modificado ou em que metas
particulares ou efeitos são estabelecidos. Uma resposta ainda precisa ser construída
no contexto, contraposta ou balanceada por outras expectativas, o que envolve
algum tipo de ação social criativa. (BALL, 2011, p. 45-46).
Ao considerar todas as variantes citadas, Ball e seus colaboradores propuseram um
ciclo contínuo constituído por três contextos principais: contexto de influências, contexto da
produção de texto e contexto da prática. Cada contexto apresenta-se inter-relacionado com os
33
demais e envolve disputas e embates que têm como protagonistas lugares e grupos de
interesse distintos.
O contexto de influências é o lugar dos discursos políticos, onde, normalmente, as
políticas são pensadas. É a esfera de atuação dos partidos políticos, das redes sociais, lugares
nos quais os conceitos são legitimados formando a base para a política. Caracteriza-se por um
momento de embate porque, muitas vezes, recebe apoio; enquanto, em outros, recebe as
resistências daqueles que têm o poder de influenciar o espaço público de ação.
Nesse espaço, também estão inseridas as comissões e os grupos representativos no
processo de formulação das políticas nacionais. Entre eles podem ser considerados os
contextos mais globais e internacionais, seja mais diretamente pelo fluxo de ideias constituído
por meio das redes políticas e sociais que envolvem a circulação internacional de ideias, seja
pelo processo de importação de políticas. Ou, ainda, pela venda de soluções no mercado
político, utilizando as publicações em artigos, periódicos, livros e conferências nos quais os
idealizadores, por um lado, apresentam suas ideias e, por outro, criam ambientes favoráveis à
movimentação das ideias consensuadas e disseminadas para além das fronteiras nacionais. Os
organismos internacionais, como o BM, a OCDE, a UNESCO, o FMI e a UE também
exercem influências significativas sobre as políticas nacionais, a partir de suas exigências e
recomendações. Contudo, não há mera transposição das políticas; elas são reinterpretadas e
recontextualizadas pelos estados-nação em seus contextos específicos ao efetuar a
transposição entre a esfera global e a local.
Em outra instância, no movimento descendente, situa-se o contexto da produção de
texto geralmente articulado com ―a linguagem do público mais geral‖ como representante das
políticas. Os textos envolvem negociações e intenções internas ao Estado e ao processo de
formulação da política em que, algumas vozes, são mais ouvidas do que outras. Após a
elaboração das políticas nos momentos legislativos, faz-se necessária a leitura vinculada ao
tempo e ao espaço específico do seu contexto de produção, no qual a ausência de passividade
marca novamente interesses dos grupos que competem entre si pelo controle das
representações da política.
No contexto das práticas, as políticas carregam limitações materiais e possibilidades.
Apesar de serem intervenções textuais, suas consequências são sentidas, vividas, inseridas.
Mais uma vez esse contexto não recebe passivamente o texto escrito. Tais textos estão sujeitos
a reinterpretações e recriações; produzem efeitos e consequências muitas vezes traduzidas em
mudanças significativas na política original. Assim, por exemplo, no caso do IFC e P.Porto,
os gestores, ao participarem das decisões, também fazem um movimento entre suas
34
convicções pessoais e o que é esperado deles pelas instituições, lançando mão de estratégias e
táticas produtoras de sentido.
Em uma leitura mais aprofundada do ciclo de políticas, Ball e seus colaboradores vêm
trabalhando com a teoria do policy enactment e ampliando o contexto da prática (BALL,
MAGUIRE; BRAUN, 2012; BALL, 2013a). Para os autores, a interpretação é apenas uma
leitura inicial, com o objetivo de aproximar-se do sentido da política. A tradução, por sua vez,
vincula-se à compreensão do texto dentro dos limites da ação, nos quais ocorre um processo
de re-representação, reordenação, que se processa por meio de várias práticas materiais e
discursivas.
―Enactments‖ constituem respostas em curso à política, às vezes durável, às vezes
frágil, nas diversas redes e cadeias de relações. No entanto, essa resposta não é direta nem
reproduz linearmente as diretrizes da política. É na interação e na inter-relação entre diversos
atores, textos, conversas, tecnologias e objetos (artefatos) que a política é interpretada,
traduzida, reconstruída e refeita em diferentes, mas similares caminhos (BALL; MAGUIRE;
BRAUN, 2012).
Nas pesquisas em escolas secundárias inglesas, Ball, Maguire e Braun (2012)
exploram a teoria da interpretação/tradução da política no contexto da prática, ou seja, a
política como estratégia discursiva por meio da análise do conjunto de textos, de
acontecimentos, de artefatos e de práticas que retratam o processo de escolarização, a
produção do estudante, os propósitos da escolarização e a construção pelos professores, como
um conjunto constituinte da formação discursiva da escola em suas pesquisas. Uma dessas
pesquisas foi financiada pelo Conselho de Pesquisa Social (ESRC) intitulada Policy
enactments in the secondary school, desenvolvida entre outubro de 2008 e abril de 2011.
Para suas análises, Ball, Maguire e Braun (2012) destacam a importância de quatro
contextos e suas dimensões:
1. O contexto situacional, que se interessa em conhecer os aspectos históricos e
sua inter-relação com o ambiente escolar.
2. As culturas profissionais, que dizem respeito aos compromissos assumidos
dentro da escola pelos professores, seus valores e como eles moldam a atuação
política (enactment). A forma como os atores políticos veem e entendem as
políticas depende do lugar onde literalmente estão.
3. Os contextos materiais, os quais se voltam aos aspectos físicos das escolas, sua
infraestrutura, sua tecnologia de informação.
35
4. Os contextos externos mais amplos, os quais geram expectativas e pressões
advindas da política nacional, refletindo a centralidade da preocupação com o
desempenho (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012).
Nessa perspectiva, o discurso pode ser um instrumento de poder que define o modo
como certas declarações adquirem o estatuto de verdade. Encontra-se no escrito, no dito e no
pensado, como regras discursivas que definem as razões, tornando possível o exercício do
poder. Do mesmo modo, estão presentes as resistências, as quais operam na interpretação e na
reinterpretação dos eventos sob vários aspectos, entre eles os profissionais, os pessoais, os
emocionais e os psicológicos.
Assim, os estudos de Stephen Ball que utilizam a abordagem teórico analítica das
políticas públicas, com a abordagem do ciclo de políticas (BALL, 2009) e a teoria do
enactment4 (BALL, 2013a), possibilitam a análise das políticas públicas como espaço de
reflexão e compreensão sobre os múltiplos contextos que envolvem o fazer políticas e de
como os sujeitos se apropriam e traduzem tais políticas no campo prático e no campo
discursivo. Nesses campos, estão presentes as redes, as relações de poder, as resistências, as
responsabilizações que se instalam e se desenvolvem sob a perspectiva das práticas
individuais do coletivo institucional.
―A resistência é normalmente considerada como um exercício coletivo da atividade
política pública‖ (BALL; OLMEDO, 2013, p. 85), não como o cuidado de si exposto por
Foucault, mas como espaço no qual são produzidas subjetividades. Desse modo, conforme os
autores, o neoliberalismo faz surgir novos atores, novas redes e novas subjetividades,
reconfigurando a governamentabilidade em outros espaços de decisão e ação na lógica da
competição.
Ao aproximar o olhar sobre as políticas e o modo como as redes influenciam sua
elaboração nos contextos locais, aqui considerados Brasil e Portugal, e, dentro deles, nos
micro espaços das instituições, revela-se uma importante possibilidade de compreensão dos
movimentos e das múltiplas conexões. Nos contextos também estão presentes as
4 Segundo Mainardes, em nota de revisão do livro Como as escolas fazem política: Atuação em escolas
secundárias (BALL, 2016, p. 3): ―O termo enactment é de difícil tradução. Originalmente, essa palavra tem sido
usada no contexto legal para descrever o processo de aprovação de leis e de decretos. […] os autores a utilizam
no sentido teatral, referindo-se à noção de que o ator possui um texto que pode ser apresentado/representado de
diferentes formas. O texto, no entanto, é apenas uma pequena parte (porém, uma parte importante) da produção.
Os autores usam esse termo para indicar que as políticas são interpretadas e materializadas de diferentes e
variadas formas. Os atores envolvidos (no caso, os professores) têm o controle do processo e não são ―meros
implementadores‖ das políticas. Para a Língua Portuguesa, ―policy enactment‖ pode ser entendido como as
políticas que são encenadas, colocadas em ação‖.
36
interpretações e as traduções como respostas latentes às políticas em diferentes arenas. Nessas
arenas, a interpretação apresenta-se na estratégia e a tradução envolve as táticas, mas ambas
também podem estar intimamente entrelaçadas e sobrepostas nas ações dos sujeitos que, nesse
caso específico, são representadas pelas traduções dos gestores.
Nessa perspectiva, não há fenômeno totalizante, mas sim peculiaridades e fragilidades
nas ações caracterizadas por limites, ausências e divisões. Esses discursos e ações são
produzidos no interior das instituições como novas relações, novos procedimentos e novas
identidades que, por sua vez, materializam novas formas de organização de redes internas, do
espaço e do tempo. Da mesma forma, ocorre a produção e a constituição de um conjunto de
práticas discursivas, de eventos e de textos que contribuem para as respostas políticas nas
relações e nos processos mais amplos da estrutura social e cultural.
Nesse movimento permeado entre o global e o local, nos limites desta tese, realizou-se
o esforço de compreensão entre textos, discursos e práticas forjados nas redes internas dos
dois institutos e expressos nas formas de organização e nas estratégias e táticas específicas a
cada contexto.
2.2 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
A opção metodológica desta pesquisa centrou-se na abordagem qualitativa comparada,
pois se buscou durante as análises aspectos qualitativos e comparados que interferiam ou
contribuíam para a temática em questão. Considerou-se essa abordagem coerente com o tipo
de estudo realizado porque abria-se a possibilidade de olhar para o processo no lócus de
atuação dos participantes onde, conforme avançavam as análises, os significados iam sendo
construídos. O exercício foi de compreensão e os ambientes analisados guardavam íntima
relação com a realidade social mais ampla no constante movimento entre o geral e o
específico.
Para Garrido (1986), a metodologia comparada é uma das metodologias de base que
busca compor capacidades fundamentais para o entendimento humano, nomeadamente a
compreensão espacial. ―Sobre o ponto de vista descritivo, comparar inclui três aspectos: ver,
analisar e ordenar, cada um deles terá maior ou menor relevância conforme aquilo que se
compara.‖ (GARRIDO, 1986, p. 127). Nessa perspectiva, os debates e análises sobre a
política evoluíram recentemente de uma perspectiva de ―política doméstica‖ para uma
perspectiva do ―domínio público‖ no contexto global, nos quais os problemas complexos são
colocados aos estudos das políticas educacionais. Essas abordagens, nomeadamente a
37
educação comparada, abriram possibilidades de olhar para as políticas educacionais,
movimentando as análises entre o local e o global e vice-versa, em estreita relação entre a
política e a centralidade do poder (TEODORO, 2003).
A maior parte dos estudos realizados na perspectiva comparada com finalidade
científica não tem como principal objetivo chegar a decisão concreta, mas compreender e
aumentar o conhecimento de determinadas realidades que poderão levar a ações concretas
futuras. Garrido (1986) ainda esclarece que a comparação não pode assentar-se em realidades
completamente heterogêneas, o que resultaria no exercício de situar somente as diferenças, de
outro modo, também não há possibilidade de comparar o que é igual. ―Para que exista
comparabilidade, que é o mesmo que dizer possibilidade de comparação, é preciso que haja
homogeneidade entre os fenômenos que se comparam. Homogeneidade quer dizer
semelhança em seus traços constitutivos, em seus princípios essenciais.‖ (GARRIDO, 1986,
p. 132).
Na perspectiva da educação comparada também são bem-vindas as contribuições de
Cowen (2012) ao destacar que o ―ato de ler o global‖ muda continuamente, ―[...] significa a
seleção de uma agenda de trabalho acadêmico, a identificação de ansiedades e perplexidades
inseridas em uma interpretação das partes estrangeiras do mundo que são vistas – no sentido
de que tais localidades tornam-se deliberadamente visíveis‖ (COWEN, 2012, p. 407). Nesse
sentido, quando o pesquisador considera essas possibilidades, ele vê coisas diferentes, pois a
agenda de pesquisa vai alterando conforme vão surgindo novas inquietações e novos
questionamentos.
No campo específico da educação e das políticas educacionais, trata-se de um
exercício de olhar para os textos produzidos, para os discursos, para as práticas e como estes
desencadeiam lógicas de organização e ação em determinados contextos. ―[...] é preciso que a
educação comparada seja um meio de compreender o outro, sobretudo o outro que é tão
diferente e que olha o mundo com outros sentidos e com outros sentimentos.‖ (NÓVOA,
2009, p. 53). É o movimento entre o global e o local que, com a globalização, intensifica as
relações em nível mundial, estabelecendo conexões com o local, de modo que estes são
influenciados por fenômenos iniciados em outros lugares e, principalmente, o modo como
estes movimentos são apropriados pelas diferentes nações.
Considerando seu significado mais global, o processo educativo constitui além
disso, como acertadamente se vem assinalando nos últimos anos, um sistema social
em permanente estado de vinculação com outros sistemas sociais; e em
consequência é muito difícil estudá-lo em separado retirando-o destas outras
realidades sistêmicas. O sistema político, o sistema econômico, o sistema cultural, o
38
sistema de informação, o sistema de crenças, etc. incluem referências contínuas e
fundamentais ao sistema educativo de uma região, de um país ou de um grupo de
países. Raro é o âmbito, de ação ou de estudo, que não provoque consequências
diretas ou indiretas sobre a educação (insumos) ou que não seja afetado pela
educação (por seus produtos). (GARRIDO, 1986, p. 202).
Buscando captar esse movimento destacado por Garrido, julgou-se que a entrevista
com roteiro semiestruturado seria uma opção acertada e justificada pelo fato de desenvolver-
se a partir de um roteiro básico que permitiria, se necessário, fazer adequações, esclarecer
pontos que não tivessem ficado claros ou ainda complementar informações. No caso desta
pesquisa, a entrevista possibilitou extrapolar o âmbito do texto da política, de forma a auxiliar
na compreensão de como traduzem e pensam os gestores sobre as políticas em suas práticas.
É nesse sentido que as fontes documentais se fizeram necessárias, pelo fato de que as leis
estão expressas em textos legais das políticas para a educação. Neles, foi possível retirar
evidências imprescindíveis para o processo analítico, no exercício de compreensão de como
ocorre o fluxo das ideias e consensos por meio das redes políticas e como essas ideias são
materializadas no contexto da prática pelos gestores em suas redes internas.
Ao considerar que coleta e análise de dados são etapas do processo que se
retroalimentam, também foi utilizada a triangulação entre os documentos norteadores das
políticas nacionais e internacionais, os documentos institucionais e as entrevistas realizadas.
Esse modo de entrelaçar as informações significa ―[...] antes de tudo tentar escapar da fácil
interpretação daquilo que estaria ‗por trás‘ dos documentos, procurando explorar ao máximo
os materiais, na medida em que eles são uma produção histórica, política; na medida em que
as palavras são também construções [...]‖ (FISCHER, 2001, p. 199, grifo do autor). A
triangulação, por sua importância, merece destaque, pois são os cruzamentos que nos
permitem observar várias vezes determinado fenômeno. ―Ela pode nos dar mais confiança de
que determinamos corretamente o significado ou [...] de que precisamos analisar as diferenças
para enxergar significados múltiplos e importantes‖ (STAKE, 2011, p. 139).
Quer seja para confirmar o que já havia sido encontrado ou mostrar que há outros
significados, até então implícitos, ou ainda para revelar a complexidade das análises, a
triangulação é um ponto positivo a ser considerado. A exemplo dos sujeitos ligados à
educação em suas funções específicas, podem ser considerados três aspectos para triangulação
(TRIVIÑOS, 2013): os processos e os produtos centrados no sujeito, que, nesta pesquisa,
especificamente se referem aos gestores; os elementos produzidos no ambiente do sujeito,
nesse caso os instrumentos legais (documentos institucionais), entre outros; e os processos e
os produtos originados pela estrutura socioeconômica e cultural do macro-organismo social
39
do sujeito, aqui entendidos como os documentos criados no âmbito nacional e internacional
de cada realidade, para responder às demandas específicas.
2.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
Conforme assinalado na introdução, o recorte temporal selecionado para esta tese foi a
partir dos anos de 1990 até o presente, pelo fato de que, nessa década, ocorreu uma ampla
reforma educacional, designadamente no Ensino Superior, tanto no Estado brasileiro como no
português, influenciando as políticas educacionais, que, em função da legislação em vigor,
alterou significativamente a organização das instituições nos dois contextos. A pesquisa
empírica desenvolvida realizou um duplo movimento entre o contexto brasileiro, no âmbito
do IFC, e o contexto português, no âmbito do P.Porto, pois o lócus no qual essas instituições
se situam é também o espaço de construção de respostas aos desafios impostos pela nova
legislação. Os aspectos relevantes foram captados na dinâmica de espaço-tempo no qual o
IFC e P.Porto, ambas instituições públicas, se organizam para responder às demandas
decorrentes das atuais políticas públicas nos seus contextos específicos de atuação.
O IFC foi recentemente constituído (2008), mas, anteriormente a essa transformação,
há um percurso histórico de mais de meio século de algumas das instituições que agora o
compõem. Suas origens estão nas Escolas de Artífices (1909)5. Essa instituição é formada por
uma estrutura multicampi complexa. Cada campus possui organização própria e diferenciada,
desde número de professores, alunos e técnicos administrativos, além da infraestrutura física e
administrativa requerida e organizada de acordo com a demanda de cursos em cada realidade,
prevista em lei, com a necessidade de contemplar as demandas locais e regionais, nas quais as
unidades estão instaladas. Desse modo, no IFC, há grande variedade de campi e cursos, ainda
que se tenha em vista a verticalização do ensino, em concordância aos documentos legais.
Esse perfil diferenciado de cada campus será objeto dos próximos itens.
O P.Porto foi criado em 1979, mas suas origens ancoram-se em tradicionais
instituições conhecidas anteriormente como Escola Industrial do Porto (1852) e, algum tempo
depois, Instituto Comercial do Porto (1886). Essas instituições passaram por várias alterações
5 As Escolas de Artífices foram criadas no início do século XX, quando, em 1909, o então Presidente da
República Nilo Peçanha, por meio do Decreto Nº 7.566, instaurou 19 Escolas de Aprendizes Artífices
subordinadas ao Ministério dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio. Seu objetivo inicial era preparar
o jovem, em risco social, econômico e socialmente desfavorecido para o mundo do trabalho, oferecendo o ensino
de um ofício, por meio da qualificação de mão de obra, útil às necessidades industriais; um sujeito disciplinado
que se manteria assim, longe da ociosidade e dos vícios, tornando-se útil à nação (BRASIL, 1909).
40
e rupturas quanto ao processo formativo de mão-de-obra básica para o comércio e indústria.
Com o passar do tempo e novos encaminhamentos nas políticas educacionais portuguesas,
também ampliaram sua área de atuação. Atualmente, oferecem graduação, pós-graduação e
mestrado, além de cursos técnicos de nível superior, que serão objetivo de discussão em
capítulo posterior.
A organização administrativa e pedagógica do P.Porto, a exemplo do IFC, é formada
por complexa estrutura multicampi com variada oferta de cursos em áreas distintas do
conhecimento, as quais contemplam vários perfis formativos alocados em oito
escolas/institutos e uma presidência.
2.3.1 Perfil dos Campi do IFC
A gestão central do Instituto Federal Catarinense (IFC) está localizada na Reitoria,
na cidade de Blumenau, e organizada conforme o organograma (Anexo A). No total são 8.781
alunos matriculados, distribuídos em 100 cursos6, com 1.585 servidores computados em seus
campi de lotação, sendo destes 808 docentes subdivididos em 694 efetivos - entre eles, 649
com dedicação exclusiva (DE). Além desses, há 84 professores substitutos7, 30 temporários,
com carga horária de 20 ou 40 horas, e 777 técnicos administrativos. Na Reitoria não há
docentes lotados, porém há professores que desempenham suas funções na administração
central.
Na figura 1, pode-se observar como está a distribuição dos campi no Estado, com
abrangência em todas as regiões geográficas.
6
Somente são considerados os cursos ativos cadastrados no Sistema Nacional de Informações da Educação
Profissional e Tecnológica (SISTEC), coordenado pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
(SETEC/MEC. 7 A contratação de professores substitutos e temporários está prevista na Lei Nº 8.745/93, artigo 2º, IV -
admissão de professor substituto e professor visitante, § 1º - A contratação de professor substituto de que trata o
inciso IV do caput poderá ocorrer para suprir a falta de professor efetivo em razão de: I - vacância do cargo; II -
afastamento ou licença, na forma do regulamento; ou III - nomeação para ocupar cargo de direção de reitor, vice-
reitor, pró-reitor e diretor de campus. O professor temporário está contemplado no mesmo artigo 2º, X -
admissão de professor para suprir demandas decorrentes da expansão das instituições federais de ensino,
respeitados os limites e as condições fixados em ato conjunto dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e
Gestão e da Educação. (BRASIL, 1993c, p. 18937).
41
Figura 1 - Distribuição dos campi no Estado de Santa Catarina
Fonte: Homepage
8 da Reitoria. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
Os números da Figura 1 correspondem aos seguintes campi: Abelardo Luz (2),
Araquari (3), Blumenau (4), Brusque (5), Camboriú (6), Concórdia (7), Fraiburgo (8), Ibirama
(9), Luzerna (10), Rio do Sul (11), Santa Rosa do Sul (12), São Bento do Sul (13), São
Francisco do Sul (14), Sombrio (15) e Videira (16), além da Reitoria (1), instalada na cidade
de Blumenau.
Nos campi a gestão, de modo geral, está organizada em Direção geral, Diretoria de
Desenvolvimento de Ensino (DDE), Coordenação de Ensino, Coordenações de Cursos e
responsáveis por outros setores, a exemplo da Pesquisa e Pós-Graduação. Os cursos, tanto os
técnicos como os de graduação, podem se repetir em vários campi de acordo com as
necessidades da região na qual estão localizados.
Na sequência, apresenta-se breve perfil9 de cada campus a partir dos dados coletados
nas suas homepages e da consulta aos dados do Censo Interno realizado bimensalmente pela
Reitoria, publicado no mês de novembro, tendo como referência os meses de setembro e
outubro (2015). Nesse Censo, não estão computadas as matrículas referentes aos cursos
oferecidos no Programa Nacional de acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC)10
.
8 Disponível em: <http://www.ifsc.edu.br/campus>. Acesso em: 5 set. 2015.
9 Inicialmente, são listados os perfis das cinco escolas que deram origem ao atual Instituto Federal Catarinense e,
na sequência, as pertencentes ao plano de expansão dessa instituição. 10
O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) foi criado pelo Governo Federal,
em 2011, por meio da Lei 12.513/2011, com o objetivo de expandir, interiorizar e democratizar a oferta de
cursos de educação profissional e tecnológica no país. O Pronatec busca ampliar as oportunidades educacionais e
de formação profissional qualificada aos jovens, trabalhadores e beneficiários de programas de transferência de
renda. (Fonte: http://portal.mec.gov.br/pronatec).
42
Nos cinco campi selecionados, a atual titulação dos professores encontra-se assim
distribuída:
Tabela 1 - Titulação dos professores efetivos dos cinco campi do IFC
Campus Licenciados e
Bacharelados
Especialistas
(Pós-Grad.) Mestres Doutores Total
Araquari 3 3 50 35 91
Camboriú 3 8 61 33 105
Concórdia 1 3 44 32 80
Rio do Sul 4 5 44 35 88
Santa Rosa do Sul 5 6 50 25 86
Total 16 25 249 160 450
Fonte: Diretoria de Gestão de Pessoas – Reitoria IFC (novembro, 2015). Adaptada pela autora para fins de
pesquisa.
Considerando o total de quinze campi, os cinco campi que originaram o IFC
concentram mais de 55% dos docentes (450 de um total de 808) e mais de 55% dos Técnicos
Administrativos da Educação (TAEs) (428 de um total de 777 - Censo, novembro, 2015).
Camboriú – o Colégio Agrícola de Camboriú (CAC) foi fundado em 8 de abril de
1953, fruto de acordo firmado entre a União e o Estado de Santa Catarina, com publicação no
Diário Oficial de 15 de abril de 1953. Suas atividades pedagógicas foram iniciadas em 1962
com o oferecimento do curso Técnico em Agricultura, passando a denominar-se, em 1973,
Curso Técnico em Agropecuária. Inicialmente, a responsabilidade pela escola pertencia à
Diretoria do Ensino Agrícola do Ministério da Agricultura, com a parte pedagógica vinculada
à Secretaria de Ensino de segundo grau do MEC. Em 25 de janeiro de 1968, com a publicação
do Decreto Nº 62.178 (BRASIL, 1968b), a responsabilidade administrativa e financeira do
colégio foi transferida para a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com vínculo
direto à Pró-Reitoria de Ensino, oferecendo o ensino de segundo grau profissionalizante. O
local possui 9.024 m² de área construída.
Araquari - fundado em 26 de fevereiro de 1954 por meio de acordo firmado entre a
União e o Estado de Santa Catarina, sob a denominação inicial de Escola de Iniciação
Agrícola Senador Carlos Gomes de Oliveira, com publicação no Diário Oficial Nº 63, de 18
de março de 1954. Suas atividades iniciaram somente em 1959, pois, apesar de ser uma escola
destinada ao ensino agrícola, ela não possuía a terra em condições de cultivo na qual os alunos
pudessem pôr em prática os conhecimentos adquiridos. Até o ano de 1963, três turmas de
operários agrícolas formaram-se. Após esse período, a instituição foi transformada em
Ginásio Agrícola Senador Gomes de Oliveira, formando seis turmas de Mestre Agrícola.
Em 1968, o então Ginásio Agrícola foi integrado ao Sistema Federal de Ensino e
transferido para a Universidade Federal de Santa Catarina sob a Denominação de Colégio
Agrícola Senador Carlos Gomes de Oliveira, pelo Decreto Nº 62.163, de 25 de janeiro de
43
1968, publicado no Diário Oficial da União em 26 de janeiro de 1968 (BRASIL, 1968a). Sua
finalidade era a de formar técnicos agrícolas em nível de segundo grau, em conformidade com
a Portaria Nº 59, de 24 de julho 1981, emitida pela Secretaria de primeiro e segundo grau do
Ministério da Educação (IFC, 2014a). Em seu percurso histórico de quase meio século, em
suas dependências, foi ministrado somente o curso Técnico em Agropecuária, nas
modalidades concomitante e subsequente ao Ensino Médio.
Concórdia – Suas atividades foram iniciadas em março de 1965 sob a denominação
de Ginásio Agrícola. Seu funcionamento foi autorizado pelo Decreto Nº 60.731, de 19 de
maio de 1967, e sua primeira turma formou-se em 1968. Em 12 de maio de 1972, por força do
Decreto Nº 70.513, passou a denominar-se Colégio Agrícola. Após algum tempo, em 4 de
outubro de 1979, passou a denominar-se Escola Agrotécnica Federal de Concórdia. A Lei Nº
8.731, de 16 de novembro de 1993, transformou-a em Autarquia Federal vinculada ao MEC.
Com o Decreto Nº 2.147, de 14 de fevereiro de 1997 (BRASIL, 1997a), por meio da
Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC), adquiriu autonomia didática,
disciplinar, administrativa, patrimonial e financeira. Possui área construída de 70.300 m².
Rio do Sul – A Escola Agrotécnica Federal de Rio do Sul foi criada pela Lei Nº 8.670,
de 30 de junho de 1993. Iniciou suas atividades oferecendo o curso de Técnico em
Agropecuária, no sistema de Escola Fazenda, com duração de três anos, em regime de
internato e semi-internato. Como Escola Agrotécnica, a instituição já possuía um terreno na
área urbana, centro da cidade, e outro na área rural.
Santa Rosa do Sul – Conhecido como campus de Sombrio, foi formado por uma
unidade central instalada no município de Santa Rosa do Sul e uma unidade descentralizada,
situada no município de Sombrio. É importante destacar que a unidade de Sombrio
recentemente conquistou autonomia administrativa. A antiga Escola Agrotécnica Federal de
Sombrio (EAFS) foi inaugurada em 5 de abril de 1993 com o objetivo de atuar como uma
Unidade de Ensino Descentralizada da Escola Técnica Federal de Santa Catarina, localizada
em Florianópolis. Mais tarde, por meio da Lei Nº 8.670, de 30 de junho de 1993 (BRASIL,
1993a), passou a denominar-se Escola Agrotécnica Federal de Sombrio. Em 16 de novembro
de 1993, pela Lei Nº 8.731 (BRASIL, 1993b), foi transformada em Autarquia Federal. Iniciou
suas atividades em 28 de março de 1994, oferecendo Ensino Médio e cursos Técnicos. Possui
área construída de 17.065 m².
Abelardo Luz – Encontra-se em fase de implantação e está administrativamente
ligado ao campus de Concórdia. Até o momento sua oferta formativa concentra-se nos cursos
técnicos.
44
Blumenau – Atendendo ao previsto no plano de expansão do IFC, em setembro de
2009, foram iniciadas as negociações com a Universidade Regional de Blumenau (FURB)
para implantação de um campus na cidade. Atualmente, está localizado às margens da
Rodovia BR 470, no bairro Badenfurt, após adaptação da antiga estrutura predial para a
unidade escolar. Possui área construída de 5.397,36 m². O primeiro curso iniciado nessa
unidade foi o Técnico em Informática.
Brusque – Esse campus também é fruto do plano de expansão e as tratativas para sua
instalação iniciaram em 2011. Atualmente, conta com área construída de 5.577,39 m². A partir
do levantamento das demandas sociais realizadas em audiências públicas, o campus foi
autorizado a funcionar pelo MEC, em outubro de 2013, ofertando, inicialmente, cursos na
modalidade PRONATEC por meio de parceria firmada com a Gerência Estadual de Educação
do município.
Fraiburgo – A partir do plano de expansão do IFC, esse campus iniciou suas
atividades pedagógicas em 1 de agosto de 2012 nas instalações do então federalizado antigo
Centro Educacional Profissional de Fraiburgo (CEPROF). Inicialmente, foram ofertados os
cursos Técnico em Informática (concomitância externa)11, Técnico subsequente em Segurança
do Trabalho e o Programa Mulheres Mil12
, capacitando cem mulheres de baixa renda na área
de confeitaria naquele mesmo ano.
Ibirama – Fruto do plano de expansão do IFC, sua instalação e o início de suas
atividades pedagógicas ocorreram em 2010, na antiga Escola Hamônia, com a oferta do curso
Técnico em Informática. A partir de 2011, ofereceu também os cursos técnicos integrados ao
Ensino Médio em Eletromecânica e Vestuário. Em 2012, ampliou a oferta nas modalidades
subsequentes dos cursos técnicos em Eletromecânica e Vestuário e a modalidade integrada do
curso de Informática. Até fevereiro de 2011, durante o processo de implantação, esteve
vinculado ao campus de Rio do Sul.
11
São cursos nos quais o aluno pode frequentar o curso técnico e simultaneamente cursar o Ensino Médio em
outra instituição. 12
O Programa Nacional Mulheres Mil foi instituído em 2011 pelo Ministério da Educação (MEC), por meio da
Portaria Nº 1.015, de 21 de julho de 2011. Com a metodologia Acesso, Permanência e Êxito, o Programa passou
a ofertar cursos profissionalizantes às mulheres em situação de vulnerabilidade social. São cursos de Formação
Inicial e Continuada (FIC), com carga horária mínima de 160 horas, que atendem a um público específico de
mulheres, utilizando uma metodologia específica, que privilegia temas como direitos e deveres das mulheres,
empreendedorismo, economia solidária, saúde, elevação da autoestima, entre outros, buscando promover a
inclusão produtiva, a mobilidade no mercado de trabalho e o pleno exercício da cidadania. Em 2013, o Mulheres
Mil passou a integrar o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) por meio da
iniciativa Bolsa Formação. A oferta é resultado da parceria entre o MEC e o Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS), no âmbito do Plano Brasil Sem Miséria (Pronatec/BSM), articulado com a
meta de erradicação da pobreza extrema no país. (Fonte: http://portal.mec.gov.br/programa-mulheres-mil).
45
Luzerna – Suas atividades pedagógicas foram iniciadas em 2010 na estrutura predial
da antiga Escola Técnica Vale do Rio do Peixe (ETVARPE), federalizada no mesmo ano. Os
primeiros cursos oferecidos foram os Técnicos em Automação Industrial, Mecânica e
Segurança do Trabalho. O curso de Engenharia de Controle e Automação foi o primeiro curso
superior ofertado a partir de 2011, além dos cursos de Formação Inicial e Continuada (FIC)
em Informática Aplicada ao Estudo da Matemática, Inglês e Espanhol. No processo de
implantação, esteve vinculado ao campus de Videira, passando a tornar-se campus a partir de
julho de 2012.
São Bento do Sul – Em fase de implantação e ainda não oferta cursos13.
São Francisco do Sul – Em respeito ao previsto no plano de expansão do IFC, as
negociações entre o Campus de Araquari e a Prefeitura de São Francisco do Sul tiveram início
em 2010. As atividades do campus foram iniciadas em março de 2010 em espaço cedido pela
Escola Municipal Franklin de Oliveira, com a oferta do curso Técnico em Informática. A
partir de 2011, passou a funcionar em sede provisória no centro de São Francisco do Sul. Em
2012, recebeu da Prefeitura Municipal a doação de um terreno na localidade de Iperoba, onde
está em processo de construção sua sede definitiva. Seu funcionamento foi autorizado pela
Portaria Nº 330, de 23 de abril de 2013, com publicação no Diário Oficial da União em 24 de
abril de 2013. A partir de 2015, estão sendo ofertadas vagas para o curso de Ensino Médio
Integrado ao Técnico em Administração.
Sombrio – Esse campus esteve vinculado à antiga Escola Agrotécnica Federal de
Sombrio. O vínculo continuou após a transformação em IFC ocorrida em 2009.
Recentemente, conquistou autonomia administrativa e possui área construída de 1.008,54 m².
Visando atender aos arranjos produtivos locais, o campus oferece o curso de Técnico em
Informática integrado ao Ensino Médio e, em nível superior, os cursos de Tecnólogo em
Gestão de Redes de Computadores, Tecnólogo em Gestão de Turismo e Licenciatura em
Matemática, além de cursos na modalidade FIC.
Videira – Inicialmente, esse campus constituiu-se como extensão da Escola
Agrotécnica Federal de Concórdia, oferecendo o curso Técnico em Agropecuária por meio de
convênio estabelecido com a Prefeitura Municipal iniciado em 2006. A partir de 2009, com a
instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, passou a
compor um campus do IFC. A construção da atual sede iniciou em 2009, mas, até que suas
instalações não estivessem prontas para uso, ela funcionou provisoriamente nas dependências
13
O campus foi inaugurado em maio/2016, após a coleta de dados. Até o momento, ele oferece apenas cursos
técnicos.
46
da Escola de Educação Fundamental Criança do Futuro (CAIC) de Videira, local cedido pela
Prefeitura Municipal. A oferta dos cursos técnicos iniciou em março de 2010.
Na sequência, a Tabela 2 apresenta um resumo do quantitativo de cursos (técnicos,
graduação, pós-graduação), cursos, alunos e docentes em cada campus, tendo como mês de
referência o censo de novembro (2015).
Tabela 2
14 - Total de cursos, alunos e docentes em cada campus do IFC
Campus Técnico Graduação Pós-Graduação
(Lato Sensu)
Total
de
Cursos
Total
de
Alunos
Total
de
Docentes Cursos Alunos Cursos Alunos Cursos Alunos
Araquari 5 539 4 552 1 20 10 1.111 109
Camboriú 7 930 5 721 1 5 13 1.656 135
Concórdia 4 509 5 574 - - 9 1.083 96
Rio do Sul 6 579 4 595 - - 10 1.174 96
Santa
Rosa do
Sul
3 451 4 387 - - 7 838 68
Abelardo
Luz 1 25 - - 1 21 2 46 2
Blumenau 3 263 1 123 - - 4 386 43
Brusque 2 54 - - - - 2 54 12
Fraiburgo 2 209 - - 1 23 3 232 19
Ibirama 4 204 1 43 - - 5 247 28
Luzerna 3 232 2 242 - - 5 474 51
São Bento
do Sul - - - - - - - - 1
São
Francisco
do Sul
4 72 2 167 - - 6 239 32
Sombrio 2 149 3 228 - - 5 377 41
Videira 7 591 2 193 3 2 12 786 75
Total 53 4.807 33 3.825 7 71 93 8.703 808
Fonte: Censo Interno IFC (novembro, 2015)15
. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
14
Nesta tabela, não foram incluídos os números de alunos (78) dos 7 cursos de Formação Inicial Continuada
(FIC), CERTIFIC, PROEJA e Mulheres Mil que fazem parte do Censo Interno.
A Rede Nacional de Certificação Profissional e Formação Inicial e Continuada - Rede CERTIFIC - constitui-se
como uma Política Pública de Educação Profissional e Tecnológica voltada ao atendimento de trabalhadores,
jovens e adultos que buscam o reconhecimento e a certificação de saberes adquiridos em processos formais e não
formais de ensino-aprendizagem e formação inicial e continuada a ser obtido por meio de Programas
Interinstitucionais de Certificação Profissional e Formação Inicial e Continuada – Programas CERTIFIC. (Fonte:
http://portal.mec.gov.br/setec-secretaria-de-educacao-profissional-e-tecnologica/programas?id=15266). 15
Ao observar a Tabela 1, referente à Titulação dos Professores efetivos dos cinco campi, e a Tabela 2, que
apresenta o total de cursos, alunos e docentes de cada campus, fica evidente que há uma divergência entre os
números apresentados naquela e nesta tabela. A razão que justifica essa diferença reside no fato de que aquela
apresenta somente o quantitativo da formação dos professores efetivos, enquanto nesta é apresentado o total de
professores considerando, efetivos, substitutos e temporários em cada um dos campi.
47
Os números mostrados na Tabela 2 possibilitam observar alguns indicativos
relacionados a cursos e a alunos dos níveis técnico, graduação e pós-graduação lato sensu. Os
cursos técnicos representam 56,99%; os cursos superiores, 35,48%; e os cursos de pós-
graduação, 7,53% do total de cursos oferecidos. O número de alunos dos cursos técnicos
também são os mais expressivos com 55,23%, seguidos pelos de graduação com 43,95% e a
pós-graduação com 0,82%. Nesse movimento de transição, os cursos técnicos continuam
sendo os oferecidos em maior número, mesmo nos campi implantados após a criação do IFC,
o que pode ser considerado um indício de uma acentuada identidade voltada ao ensino
técnico, mas que, por outro lado, busca alternar oferecendo também o Ensino Superior. Há
apenas três campi (Concórdia, Santa Rosa do Sul e Sombrio) nos quais os cursos superiores
são oferecidos em maior quantidade que o ensino técnico.
2.3.2 Perfil dos Campi do Instituto Politécnico do Porto – P.Porto
A gestão central do Instituto Politécnico do Porto (P.Porto) está localizada no
campus I e conta com uma presidência organizada de acordo com o organograma (Anexo B).
No total, conforme o Portfólio da Oferta Formativa (2016), são 18.000 alunos matriculados,
distribuídos em 108 cursos. O total de trabalhadores, apresentado no Balanço Social16
, é de
1.838, sendo destes 1.430 docentes. Todas as unidades orgânicas do P.Porto estão situadas na
região geográfica pertencente ao Distrito do Porto em conformidade com a Figura 2.
16
Dados obtidos por meio de documento fornecido pela Diretoria de Recursos Humanos, Presidência do P.Porto,
enviado por e-mail para a pesquisadora em 14 de junho de 2016 por [email protected].
48
Figura 2 - Mapa do Distrito do Porto com as localizações dos três campi
Fonte: Portfólio formativo do P.Porto referente ao ano de 2016. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
A Escola Superior de Educação (ESE) foi criada por meio do Decreto-Lei Nº 513 –
T/1979 e fez parte, em 1983, da Escola do Magistério Primário do Porto, a qual oferta cursos
de formação de professores. Com a integração ao P.Porto, ocorrida em 1985, e o movimento
político que transcorria na reorganização do sistema de ensino português quanto à exigência
da formação em nível superior para professores e educadores que atuavam no ensino primário
da época, a Escola reorganizou seus planos de cursos e itinerários formativos. Foi a primeira
Escola a ser integrada ao atual P.Porto.
O Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) tem sua
oferta formativa diluída em várias áreas, entre elas marketing, finanças, administração,
documentação e informação, tradução e interpretação especializadas entre outras.
O Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP) é o maior do P.Porto e o único
que, atualmente, tem também autonomia financeira (Despacho Nº 7936/2009). Essa
autonomia está vinculada à autorização do Ministério da Tutela e depende do cumprimento
cumulativo de alguns critérios fixados na Portaria Nº 485, de 10 de abril de 2008,
considerando a data de 31 de dezembro dos últimos três anos letivos, a exemplo da média de
alunos superior a 5.000 mil, docentes em tempo integral superior a 400 e receitas próprias
49
iguais ou superiores a 5 milhões de euros (PORTUGAL, 2008). O atendimento desses
critérios situa o ISEP como o maior instituto do P.Porto.
A Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (ESTSP) tem suas origens na
década de 1980 quando, nos Centros de Formação, em conformidade com a Portaria Nº 709,
de 23 de setembro de 1980, foi iniciado o ensino nas áreas das Tecnologias de Diagnóstico e
Terapêutica. Em momento posterior, esse ensino foi ministrado pela Escola Técnica dos
Serviços de Saúde do Porto (Decreto-Lei Nº 371, de 10 de setembro de 1982). No entanto,
com o objetivo de adequar-se aos acordos firmados pela União Europeia e reformas no
Sistema de Ensino Português, essa etapa formativa passou a pertencer ao Ensino Politécnico;
e, pelo Decreto-Lei Nº 415, de 23 de dezembro de 1993, a Escola recebeu a denominação de
Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto.
A Escola Superior de Música Artes e Espetáculo (ESMAE), atual denominação,
tem suas origens na Escola Superior de Música criada em 1985. O prédio que abriga suas
atividades foi construído no final do século XIX (1883) para funcionamento da Escola de
Magistério Primário, posteriormente conhecida como Escola Normal do Porto.
A Escola Superior de Estudos Industriais e de Gestão (ESEIG) foi criada pelo
Decreto-Lei Nº 9, de 4 de janeiro de 1990, e o Curso de Bacharelado em Contabilidade e
Gestão foi o primeiro a ser oferecido. Entre outras atividades, também disponibiliza
consultorias e outros serviços às empresas.
A Escola Superior de Tecnologia e Gestão (ESTGF) passou a existir por meio de
uma Resolução que determinou sua criação integrada ao P.Porto no ano de 1997. O Decreto-
Lei de criação Nº 264 é de 14 de julho de 1999, ano letivo que marca o início das suas
atividades com a Licenciatura Bietápica17
em Ciências Empresariais que, de acordo com a
definição do Instituto Nacional de Estatística de Portugal, se refere aos cursos ministrados
pelas escolas de Ensino Superior Politécnico, organizados em dois ciclos: o primeiro era
condizente ao grau de bacharel e o segundo, ao grau de licenciado. Essa organização
acadêmica entrou em extinção a partir da publicação do Decreto Lei Nº 74, de 24 de março de
2006, respeitando exigências da legislação portuguesa.
Com os impactos de Bolonha (1999), o ensino superior português foi reestruturado
atingindo diretamente a organização e o funcionamento das instituições educativas, entre elas
17
Curso ministrado pelas escolas de Ensino Superior Politécnico, organizado em dois ciclos, conduzindo o
primeiro ao grau de bacharel e o segundo ao grau de licenciado. (Fonte:
http://smi.ine.pt/Conceito/Detalhes/4942).
50
o P.Porto. Até recentemente, o P.Porto encontrava-se organizado em sete Institutos/Escolas
distribuídas por três campi no Distrito do Porto, conforme pode ser observado na Figura 3:
Figura 3 - Composição dos campi com suas sete Escolas e Institutos
Fonte: Homepage do P.Porto. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
A estrutura apresentada na Figura 3 foi alterada em 11 de maio de 2016, pelo
Conselho Geral do Instituto Politécnico do Porto, por meio da aprovação da alteração dos
estatutos. Desse modo, a atualização da atual estrutura do P.Porto está representada na Figura
4:
51
Figura 4 - Composição dos campi com suas oito Escolas e Institutos
Fonte: Portfólio formativo do P.Porto referente ao ano de 2016. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
Ao observar a Figura 4, pode-se perceber que a Escola Superior de Estudos Industriais
e de Gestão, no Campus II, foi transformada em Escola Superior de Hotelaria e Turismo, a
partir de 1º de agosto de 2016. Nessa alteração, também foi criada a Escola Superior de Media
Artes e Design que antes estava contemplada no Portfólio formativo da ESMAE. A partir de
2016, o P.Porto passa a ser composto por oito Escolas/Institutos.
Embora os três campi estejam localizados no Distrito do Porto, sua organização
técnica e administrativa é diferenciada conforme pode ser constatado nos (Anexos C, D, E, F,
G, H, I), os quais apresentam os organogramas individuais. De acordo com o Manual de
Qualidade do P.Porto (2015), as Escolas/Institutos possuem autonomia estatutária, científica,
pedagógica, cultural e administrativa e, atualmente, dedicam-se a uma área específica que, no
âmbito da formação no P.Porto, somente ocorre naquele espaço, como forma de otimizar
recursos e definir com maior clareza o perfil de atuação. De modo geral, a gestão de cada uma
delas está organizada em Unidades Técnico-Científicas (UTC) ou Departamentos. Há um
Presidente, Conselho Técnico-Científico, Conselho Pedagógico e, em algumas unidades, há
também o Conselho de Administração e o Conselho Consultivo. Além destes, participam da
gestão os Coordenadores ou Diretores de cursos de acordo com a nomenclatura adotada em
cada Escola/Instituto. Em todas, há laboratórios para o desenvolvimento de pesquisas e vários
52
projetos, tanto com parcerias nacionais como internacionais, envolvendo volumes
consideráveis de investimento e financiamento inclusive no âmbito do Erasmus18.
Segundo o Balanço Social da Direção de Recursos Humanos19
, o total de funcionários
é igual a 1.838, sendo entre eles 1.430 docentes distribuídos na totalidade das unidades,
representando 77,80%. O maior número de contratos de trabalho dos docentes na ESTSP,
ISCAP, ESMAE, ESE, ESEIG, ESTGF é realizado por meio do Contrato de Trabalho em
Funções Públicas (CTFP) a termo resolutivo certo, ou seja, por tempo determinado. O ISEP é
a única exceção, uma vez que a maioria dos seus docentes é contratado por tempo
indeterminado. A Tabela 3 evidencia a formação dos docentes.
Tabela 3 - Número de trabalhadores docentes P.Porto (2014)
20
Escola / Instituto Licenciados e
Bacharelados
Especialistas
(Pós-Grad.) Mestres Doutores Total
ISEP 58 125 213 396
ESTSP 128 117 64 309
ISCAP 48 5 107 79 239
ESMAE 92 56 20 168
ESE 28 53 67 148
ESEIG 27 41 33 101
ESTGF 43 42 38 123
Total 424 5 541 514 1.484
Fonte: Presidência P.Porto (número de trabalhadores docentes, 2014). Adaptada pela autora para fins de
pesquisa.
Os quantitativos de mestres e doutores representam 36,45% e 34,64%
respectivamente, com os licenciados e bacharelados representando 28,57% e os especialistas,
0,34%. Esses percentuais podem, por um lado, ser considerados uma evidência da
importância da formação por parte dos professores no âmbito do Ensino Superior e Pós-
Graduação. No entanto, por outro, colocam em evidência a formação dos professores em um
nível mais básico certamente direcionado ao exercício das atividades relacionadas aos cursos
técnicos e profissionalizantes, o que pode ser entendido como uma demonstração dos níveis
nos quais a oferta formativa se materializa.
18
Na homepage da Direção Geral do Ensino Superior Português (DGES) consta que o Erasmus Mundus é um
programa de cooperação e mobilidade no âmbito do Ensino Superior que apoia projectos de cooperação e
mobilidade entre a Europa e países terceiros. Tem por objetivo tornar a União Europeia em um polo de
excelência, no domínio do Ensino Superior, de nível mundial e, ainda, promover o diálogo e a compreensão por
meio da cooperação com países terceiros (DGES, 2016). 19
Dados obtidos por meio de documento fornecido pela Diretoria de Recursos Humanos, Presidência do P.Porto,
enviado por e-mail para a pesquisadora em 14 de junho de 2016 por [email protected]. 20
Ao comparar as informações do Balanço Social da Direção (DRH, 2015), quanto ao somatório de docentes
(1430) e as informações da Presidência no Relatório do Número de Trabalhadores Docentes por Unidade
Orgânica (2014), Tabela 3, percebe-se que houve uma redução de 54 docentes, pois, em 2014, o total era de
1484, representando uma redução de 3,64%.
53
Ao todo, a oferta formativa do P.Porto contempla Cursos Técnicos Superiores
Profissionais (CTESP), licenciaturas, mestrados, mestrados profissionalizantes, mestrados de
Especializações, Pós-graduações, Especializações e Doutorados (em parceria com outras
instituições de ensino superior) conforme Tabela 4.
Tabela 4 - Total de Cursos e alunos nas sete Escolas / Institutos do P.Porto (ano base 2015)
Escola
/ Instituto
Cursos
TESP
Cursos
Lic.
֎
Cursos
Mest.
֎
Cursos
Mest
Prof.
֎
Cursos
Mest.
Esp.
֎
Cursos
Pós G.
Cursos
Esp.
Cursos
Dout.
֎
Total
Alu.
Lic.*
Total
Alu.
Mest.
ISEP 14 12 21 4784 1782
ESTSP 11 7 13 3 1 2032 187
ISCAP 2 8 12 6 3 3233 360
ESMAE 3 2 684 167
ESE 5 11 9 8 1 1174 481
ESEIG 2 10 8 7 1105 234
ESTGF 7 7 8 1 980 194
Total 16 64 49 9 8 48 6 2 13.992 3405
Fonte: As informações referentes aos Cursos foram retiradas das homepages das Instituições. Adaptada pela
autora para fins de pesquisa.
* O total de alunos foi informado pela Presidência do P.Porto. No total de alunos, foram considerados somente
os com matrícula ativa nos ciclos de estudos conferentes de grau.
֎ Cursos conferentes de grau.
Ao observar a Tabela 4, é possível perceber a predominância dos cursos de
licenciaturas na maioria das Escolas/dos Institutos com o número de alunos
consideravelmente maior que os dos mestrados. No entanto, quando somados os mestrados, o
somatório de cursos ultrapassa o número de licenciaturas. Considerando que no Portfólio da
oferta formativa (2016) consta que o P.Porto tem 18.000 estudantes, é possível deduzir no
cruzamento das informações entre o Portfólio e as fornecidas pela Presidência que há 603
alunos frequentando os outros níveis não conferentes de grau e que não foram oficialmente
informados. Considera-se que esse seja um indício da negação da identidade técnica que foi
construída ao longo do tempo para os politécnicos.
Além dos elencados, há outros cursos de curta duração na perspectiva da formação
continuada e cursos do ano zero oferecidos aos alunos que tenham concluído ou que estejam
em vias de conclusão do décimo segundo ano do ensino secundário. Essa oferta também é
uma forma de captar alunos potenciais que, antes do ingresso ao Ensino Superior, têm a
possibilidade de conhecer o ambiente no qual poderão vir a estudar.
A título de esclarecimento, após as reformas educacionais no Ensino Superior
Português, adaptadas às exigências de Bolonha, somente são oferecidas licenciaturas (1º
ciclo). As nomenclaturas utilizadas para os cursos seguem as encontradas nas páginas das
54
Escolas/dos Institutos e do livro da oferta formativa para 2016. No caso específico da Escola
Superior de Educação (ESE), são oferecidos os Mestrados Profissionalizantes (2º ciclo) para
os professores, pois estes somente podem exercer a docência se tiverem cursado o mestrado.
Os mestrados de especializações são para os profissionais que almejam se especializar em
outras áreas para além daquela da sua formação. Dependendo da área de atuação, os
mestrados também podem ser nomeados somente como Mestrados. Há ainda as pós-
graduações e as especializações diferenciadas pela quantidade de European Credit Transfer
System (ECTS).
Os Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTESP) são resultantes de uma política
nova com oferta formativa iniciada em 2014/2015 e, em conformidade com o Nível de
Qualificação Europeia, correspondem ao nível 5 de formação, ou seja, os cursos são
oferecidos no ambiente do Ensino Superior Politécnico, mas não conferentes de grau
acadêmico e situados entre o Ensino Superior e o Secundário. A exigência dessa oferta
somente para os Politécnicos tem gerado resistências e questionamentos que serão discutidos
em tópico posterior.
Conforme esclarecimento anterior, a partir do ano letivo de setembro de 2016, a
ESEIG deixou de existir e, em seu lugar, teve início a oferta formativa em duas novas
Escolas. Desse modo, de acordo com o Portfólio, a oferta formativa ficará assim distribuída:
Tabela 5 - Total de Cursos nas oito Escolas / Institutos do P.Porto (ano base 2016)
Escola /
Instituto
Cursos
CTESP
Cursos
Lic.
Cursos
Mest.
Cursos
Mest.
Prof.
Cursos
Mest.
Esp.
Cursos
Pós G.
Cursos
Esp.
Cursos
Dout. Total
ISEP 12 12 17 41
ESTSP 11 3 2 13 1 30
ISCAP 8 12 5 2 27
ESMAE 2 4 4 10
ESE 8 10 4 1 23
ESMAD 4 1 2 1 8
ESHT 2 3 2 2 3 12
ESTGF 6 7 7 1 21
Total 8 55 41 10 8 43 5 2 172
Fonte: Portfólio da oferta formativa P.Porto 2016. Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
Na nova organização, a predominância, de modo geral, continua sendo a oferta dos
mestrados (59), seguidas pela oferta de cursos de licenciaturas (55) e pós-graduação (43).
Nesse caso, destacam-se o Instituto Superior de Engenharia (ISEP), com igual número de
licenciaturas (12) e mestrados; seguido pela Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto
55
(ESTSP), com maior concentração de oferta nas licenciaturas (11). O Instituto Superior de
Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) oferece mais mestrados (12) do que
licenciaturas (8), situação também observada na Escola Superior de Educação (ESE): 14
mestrados e 8 licenciaturas.
Neste momento, o P.Porto vive um intenso processo de reestruturação. Ele visa
cumprir objetivos fixados em seu Planejamento Estratégico e também como resposta aos
atuais desafios que se fazem presentes com as políticas externas, desafios estes que serão
discutidos na sequência deste trabalho.
Consideradas as devidas peculiaridades dos perfis do IFC e do P.Porto, observa-se que
as duas instituições estão inseridas no Ensino Superior e oferecem ensino de Graduação e
Pós-Graduação, ambas organizadas em campi, com um corpo docente majoritariamente
constituído por mestres e doutores. Entre as áreas comuns que caracterizam a abrangência de
atuação, em termos de oportunidades, estão presentes as engenharias e a educação. A
organização dos campi é diferenciada em cada instituição. No P.Porto, cada campus
concentra-se em uma área de atuação, e, no IFC, os cursos repetem-se nos vários campi. Essa
forma de organização, em cada contexto, está ligada à história institucional e expressa as
traduções da política no âmbito da produção de documentos e também na formação da
identidade.
2.4 OS PARTICIPANTES DA PESQUISA
Nas duas Instituições, IFC e P.Porto, os gestores entrevistados exerciam funções
ligadas à pesquisa, pós-graduação e Conselhos Técnico-Científicos.
2.4.1 Os gestores do IFC
Os gestores que participam diretamente da pesquisa, no IFC, são os que ocupam
funções referentes à Pós-Graduação na Reitoria e em cada um dos cinco campi que
originaram o atual IFC. Na Reitoria, foram selecionados os responsáveis (Pró-Reitor e
Diretor) pela Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação (PROPI) e pela
Coordenação de Pós-Graduação. Nos cinco campi, os participantes foram os responsáveis
pela Pós-Graduação (Camboriú, Araquari, Rio do Sul, Santa Rosa do Sul, Concórdia),
totalizando oito participantes.
Os entrevistados são todos doutores, efetivos e cinco deles possuem o título há mais de
cinco anos. Nos relatos da maioria dos gestores, está presente o fato de terem sido bolsistas de
56
pesquisa durante o processo formativo. Apenas um, S3, ingressou na década de 1990, em uma
Escola agrotécnica Federal que hoje compõe o IFC. Todos os outros ingressaram na
instituição recentemente, há menos de dez anos, com maior concentração de ingressos, a
partir de 2010, conforme pode ser observado na Figura 5.
Figura 5 - Década de ingresso dos entrevistados no IFC
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
O incremento no ingresso dos gestores, a partir de 2010, está ligado a outros
desdobramentos. Ele coincide com a expansão e a abertura de vários cursos de nível superior
que representa, também, o movimento institucional vivenciado com a ampliação das
atividades por ocasião do fortalecimento da política via consolidação da Rede de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica. Na Proposta Conjunta elaborada em março de 2008,
que será discutida no capítulo 4, referente à identidade (Tabela 7, p. 102), havia nos cinco
campi 454 servidores, destes 190 eram docentes. No primeiro censo interno divulgado
(setembro de 2012), o somatório de servidores, na totalidade dos campi, havia aumentado
para 1047, entre eles 568 docentes.
Quando considerados somente os cinco campi de origem, em 2012, eram 760
servidores, dos quais 414 eram docentes. Assim sendo, em relação ao ano de 2008, pode ser
constatado que o número total de servidores aumentou em 67,40%, e o número de docentes
teve um acréscimo de 117,89%. O incremento nos números de servidores do IFC demonstra o
vigor da política de governo e os investimentos na expansão.
Um aumento de tamanha envergadura, especialmente no quantitativo de docentes,
explica-se, conforme será discutido no capítulo quatro, pela alteração do perfil formativo com
implantação de cursos superiores, o que afetou também a identidade institucional. Na Tabela
6 que segue, estão listados os cursos criados a partir de 2010. A exceção, conforme pode ser
constatado, está nos campi de Concórdia e Rio do Sul, duas escolas agrotécnicas que haviam
iniciado cursos superiores de tecnologia nos anos de 2007 e 2008 respectivamente.
Provavelmente esses cursos foram extintos com a nova conjuntura organizacional implantada
na criação do IFC que necessitava atender, entre outras, as demandas surgidas por força de lei,
57
a exemplo das engenharias. Naquele contexto, o curso superior de Tecnologia de Alimentos
foi extinto e substituído pelo curso de Engenharia de Alimentos em Concórdia. Em Rio do
Sul, esse movimento deu-se pela substituição do curso de Tecnologia de Horticultura pelo
curso de Agronomia.
Tabela 6 - Cursos Superiores criados a partir de 2010 nos campi de origem do IFC
Campus Número
de cursos
Nome do Curso Ano
de
início
Total de
docentes
(2012)
Total de
docentes
substitutos
(2012)
Total de
docentes
efetivos
(2012)
Total de
docentes
efetivos
(2008)21
Araquari 4
Medicina Veterinária 2010
73 12 61 25
Sistemas de
Informação
2010
Licenciatura em
Ciências Agrícolas
2010
Licenciatura em
Química
2011
Camboriú 5
Pedagogia 2011
97 18 79 41
Lic. Matemática 2010
Tecnologia em
Negócios Imobiliários
2010
Sistemas de
Informação
2010
Sistemas para Internet 2011
Concórdia 6
Tecnologia em
Alimentos (Extinto)
2007
75 16 59 37
Engenharia de
Alimentos
2011
Lic. Física 2011
Lic. Matemática 2010
Medicina Veterinária 2010
Agronomia 2015
Rio do Sul 5
Agronomia 2010
88 18 70 51
Ciências da
Computação
2010
Tecnologia em
Horticultura (Extinto)
2008
Lic. em Física 2011
Lic. em Matemática 2010
Santa Rosa
do Sul
(Sombrio)
4
Agronomia 2010
81 16 65 36
Lic. em Matemática 2011
Rede de
Computadores
2011
Tecnologia em Gestão
de Turismo
2011
TOTAIS 24 414 80 334 190
Fonte: Censo de setembro 201222
acrescido de informações fornecidas pelo Setor de Pesquisa Institucional -
Reitoria. Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
A abertura de novos cursos com perfil formativo, diferenciado daqueles que vinham
sendo desenvolvidos até então, revelou a necessidade urgente de novas contratações com
professores de perfil acadêmico também diferenciado. Como pode ser observado, na Tabela 6,
em quatro dos cinco campi, havia pelo menos um curso de licenciatura, iniciado em 2010 com
21
Informação retirada da Proposta para Constituição do IFC encaminhada ao Secretário de Educação
Profissional e Tecnológica/MEC, por meio de Ofício Conjunto Nº 001/2008, de 10 de março de 2008. 22
Neste Censo, somente foram informados os totais referentes aos campi de exercício.
58
abertura do segundo curso em 2011, o que explica, pelo menos em tese, o repentino aumento
do número de professores que iniciaram suas carreiras no IFC e que atuavam na formação de
professores, algo inédito para a instituição até aquele momento e que, certamente, provocou
alterações na dinâmica de organização e de gestão.
Com entradas anuais, uma característica que diferencia o IFC das universidades já
estabelecidas, à medida que os cursos foram avançando, foi necessário também alocar
professores para as novas disciplinas que estavam previstas nas matrizes curriculares. Ao todo
foram iniciados vinte e dois novos cursos superiores (dos 24, dois deles entraram em
extinção), que exigiram a ampliação da infraestrutura, a exemplo de novas salas de aula,
bibliotecas e laboratórios para atender às demandas em uma única instituição que, na época,
abrigava cinco outras, com experiências distintas na trajetória formativa e na gestão.
2.4.2 Os gestores do P.Porto
No P.Porto, os gestores participantes da pesquisa, consideradas as peculiaridades
organizacionais, seguiram a mesma lógica de seleção. Na presidência, os selecionados foram
o Vice-Presidente, responsável pela investigação e pela internacionalização; e o responsável
pela acreditação e avaliação dos cursos, o qual acumula também as funções de Presidente do
Conselho Técnico Científico de uma das unidades orgânicas. Em cada Escola/Instituto os
participantes foram os Presidentes dos Conselhos Técnicos Científicos, totalizando oito
participantes.
Um dos entrevistados ingressou em uma instituição que compõe o P.Porto no final de
década de 1980. Seis deles, nos anos de 1990, e um, nos anos de 2000, conforme mostra a
Figura 6.
Figura 6 - Década de ingresso dos entrevistados no P.Porto
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Considera-se, aqui, que a maior concentração de ingressos dos agora gestores na
década de 1990, ainda que a amostra dos entrevistados seja reduzida, esteja associada ao que
Castro, Seixas e Cabral Neto (2010, p. 42) nomeiam como ―emergência do ensino superior de
massas‖, momento de acentuada expansão e diversificação desse nível de ensino. Todos são
doutores e ingressaram como professores. Apenas um concluiu o doutoramento na década de
59
1990. Os outros entrevistados obtiveram o título nos anos de 2000. Todos os gestores fizeram
referência às atividades de pesquisa e sua identificação com a área de investigação e com a
docência. Alguns deles tiveram outras experiências em empresas, em momento anterior ao
seu ingresso na docência, ou ainda foram professores em outras instituições, tanto no Ensino
Superior, como na Educação Básica.
2.5 PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANÁLISE DE DADOS
A complexidade desta pesquisa exigiu que a coleta e análise de dados lançasse mão de
instrumentos diversificados, distribuídos em três etapas: a primeira referente à consulta
bibliográfica e análise documental. A segunda, de caráter empírico, consistiu na elaboração de
uma entrevista semiestruturada direcionada aos gestores e a terceira foi referente ao
movimento de análise entrelaçando as informações. Quando tecidos os fios das três etapas,
abriram-se as possibilidades de olhar as diferentes nuances e variações locais das políticas
ligadas aos contextos externos.
2.5.1 Coleta de dados
A coleta de dados foi dividida em fontes documentais e entrevista.
2.5.1.1 FONTES DOCUMENTAIS
Para identificar as redes de influência e de produção de textos das políticas para o
ensino superior no contexto brasileiro e português, notadamente na década de 1990, foram
realizadas consultas aos documentos circunscritos àqueles que impactaram diretamente na
reorganização da Educação Superior no âmbito dos institutos conforme o Quadro 1 que segue.
Quadro 1 – Documentos nacionais selecionados
BRASIL PORTUGAL
Plano Decenal de Educação para Todos (1993)
Lei Nº 8.948 (1994)
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDBEN (1996)
Decreto Nº 2.208 (1997)
Resolução CNE/CP Nº 3 (2002)
Proposta em Discussão: políticas públicas para a
Educação Profissional e Tecnológica (2004)
Decreto Nº 5.154 (2004)
Declaração de Fortaleza (2004)
Lei Nº 5 (1973)
Decreto-Lei Nº 402 (1973)
Decreto-Lei Nº 830 (1974)
Decreto-Lei Nº 313 (1975)
Decreto-Lei Nº 327 (1976)
Lei Nº 61 (1978)
Decreto-Lei Nº 513-T (1979)
Lei de Bases (1986, 1997, 2005)
Decreto-Lei Nº 64 (2006)
60
Lei Nº 11.195 (2005)
Plano de Expansão da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica (2005)
Chamada Pública MEC/SETEC Nº 002 (2007)
Proposta Conjunta (IFET, 2008)
Lei Nº 11.892 (2008)
Referenciais Orientadores para os Bacharelados
Interdisciplinares e Similares (2010c)
PNPG 2011 – 2020 (2010)
Lei Nº 12.513 (2011)
Decreto-Lei Nº 369 (2007)
Decreto-Lei Nº 43 (2014)
Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.
Para compreender as redes de influência, foi necessário realizar leituras em outros
documentos. Para fazer essa discussão, buscaram-se as interfaces dessas políticas com a
consulta aos seguintes documentos produzidos pelos organismos internacionais: Tratado de
Maastricht (1992), Declaração de Sorbone (1998), Declaração de Bolonha (1999), Higher
education: the lessons of experience - Banco Mundial (1994), Constructing Knowledge
Societes: new challenges for Tertiary Education – Banco Mundial (2003), Conferência
Mundial sobre o Ensino Superior: as novas dinâmicas do Ensino Superior e pesquisas para
mudança e o desenvolvimento social - UNESCO (2009b), Declaração da Conferência
Regional da Educação Superior na América Latina e no Caribe – (UNESCO, 2009a) e o
Quadro Europeu de Qualificações (2009).
Como norteadores, esses documentos auxiliaram na compreensão sobre a elaboração
das políticas globais e suas influências para a elaboração das políticas nacionais. Por meio de
leituras cruzadas entre os documentos, buscou-se a compreensão sobre as diretrizes das
políticas de Educação Superior dirigidas à Pós-Graduação nos dois contextos.
No âmbito institucional, espaço micro peculiar do IFC e P.Porto, os documentos
utilizados foram:
Quadro 2 – Documentos Institucionais selecionados
IFC P.PORTO
Regimentos Internos dos Colégios Agrícolas (1988)
Regimentos Internos das Escolas Agrotécnicas Federais
(1998)
Acordo de Metas e Compromisso (2010)
Plano de Desenvolvimento Institucional – PDI (2014 –
2018)
Regimento Geral do IFC (2015)
Planejamento Estratégico – PE (2013 – 2017)
Planejamento Estratégico – PE (2013 – 2017)
Manual de Qualidade – MQ (2015)
Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.
61
A consulta a esse conjunto de documentos constituiu-se de importante ferramenta para
compreender, no contexto das políticas para o Ensino Superior, a constituição da identidade
do IFC no Brasil e do P.Porto em Portugal, bem como perceber as formas pelas quais as
respostas são efetivadas no contexto da produção de textos e da prática. Tratou-se de
aproximar o olhar para os desdobramentos que, por meio de textos legais, expressam a forma
como as políticas vêm sendo nacionalmente traduzidas no Brasil e em Portugal.
Quando olhados de modo entrelaçado, esses três conjuntos de documentos guardam
estreita relação com as recomendações globais e com os direcionamentos das políticas de
ensino superior dirigidas à Pós-Graduação nacional e institucional. Estes são os lugares onde
ocorre a tradução dessas políticas nos documentos orientadores institucionais e, também,
espaço de manobras para a elaboração da política de Ensino Superior dirigidas à Pós-
Graduação no qual as ações se efetivam.
A análise do conjunto documental em diálogo com as análises das entrevistas
possibilitou a identificação e a compreensão dos jogos de poder que, quando chegam à
prática, neste caso, no IFC e P.Porto, são interpretados sob a ótica do lugar onde se
materializam as ações e também geram discursos. Perceber esse movimento no processo de
reestruturação e de mudança requer compreender o cotidiano como possível revelador de
práticas, de embates, de estratégias e de espaço de manobras utilizadas para responder à
política em vigor em relação direta com a posição ocupada pelos sujeitos, nesse caso, os
gestores.
2.5.1.2 ENTREVISTAS
Quanto à entrevista semiestruturada, o roteiro foi composto por seis questões abertas
(instrumento de coleta de dados – Apêndices A e B). No caso do P.Porto, o roteiro manteve-
se com o mesmo número de questões com os devidos ajustes para a realidade portuguesa. De
modo geral, o roteiro teve o objetivo de direcionar e organizar a sequência lógica do trabalho,
sem restringir possíveis aberturas de diálogo que pudessem surgir durante a conversa.
Em função do objetivo previsto para esta pesquisa, no escopo do roteiro constava uma
questão sobre a trajetória dos gestores nas instituições e os desafios inerentes à função
ocupada, bem como os motivos que os levaram a aceitá-la. Na sequência foram elaboradas
duas questões que versavam sobre a identificação das políticas nacionais voltadas ao Ensino
Superior/à Pós-Graduação e às políticas desenvolvidas no âmbito institucional, com foco nas
estratégias e nas táticas utilizadas pelos gestores para responder às exigências das políticas. A
equiparação às universidades em termos de avaliação também foi abordada em outra questão
62
buscando elementos reveladores das condições concretas de operacionalização, devido às
especificidades e às trajetórias institucionais, o que envolve novamente a produção de
artefatos.
As peculiaridades de organização da oferta, nomeadamente as referentes à
verticalização no caso do IFC e à exigência dos Cursos Superiores Profissionalizantes no
P.Porto, também estiveram presentes. A última questão versava sobre o Planejamento
Estratégico (PE) e/ou Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), suas formas de produção
e as ações presentes nos documentos que contemplam as políticas institucionais para o Ensino
Superior/Pós-Graduação.
No caso do IFC, as entrevistas foram agendadas via telefone e e-mail e realizadas
pessoalmente, nos respectivos locais de trabalho, ou por Skype, respeitando a disponibilidade
e o acordo firmado com os participantes. As entrevistas tiveram a duração de 45 a 90 minutos.
No P.Porto, os agendamentos foram todos realizados por e-mail e as entrevistas realizadas
pessoalmente, com a mesma média de duração das realizadas no IFC. Ao todo foram
realizadas 16 entrevistas.23 Conforme as entrevistas iam sendo realizadas, os gestores foram
identificados em ordem crescente como S1, S2, S3, S4, S5, S6, S7, S8 em cada instituição.
Elas foram gravadas e transcritas para posterior análise. Após redigida, cada transcrição teve a
extensão entre 6 e 12 páginas em espaçamento simples.
Ressalta-se que a presente pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da Universidade
do Vale do Itajaí sob o processo CAAE Nº 44008915.9.0000.0120 aprovada pelo Parecer Nº
1.112.307. O termo de Consentimento Livre e Esclarecido encontra-se no Apêndice C.
Assim, considera-se que a análise documental e a entrevista apresentam sintonia,
possibilitando perceber discursos e estratégias que emergem em cada contexto. É nessa linha
de pensamento que são imprescindíveis as contribuições de Ball na análise das políticas. Não
há espaço de neutralidade, pois textos e discursos são submetidos a constantes
reinterpretações nas diversas formas de produção de discursos. As políticas são exploradas
como estratégias discursivas a partir de textos, eventos e artefatos discursivos que remetem a
23
No primeiro contato realizado via telefone, S8 concordou em colaborar com a entrevista por Skype, porém esta
não se efetivou. Foram realizados vários agendamentos via telefone e e-mail, porém em todas as datas pré-
agendadas, houve cancelamento por diversos motivos, a exemplo da sobrecarga de trabalho. S8 solicitou
responder às questões por escrito. O formulário com as questões foi enviado juntamente ao Termo de
Consentimento Livre Esclarecido (TLC), por e-mail. Por solicitação da pesquisadora, as respostas foram
devolvidas por e-mail em arquivo PDF datado e assinado. No TLC S8 fez uma observação de próprio punho
informando que as repostas foram concedidas por escrito. Em função do ocorrido, no decorrer das análises, S8
foi brevemente citado, pois suas respostas são incompletas, a exemplo da primeira questão sobre os motivos de
aceitar a função de gestão da pesquisa, que não foi respondida. Considera-se que a falta de diálogo entre a
pesquisadora e o sujeito da pesquisa, na redação, tenha sido determinante para as respostas incompletas e
evasivas, fato que impediu a retomada durante a escrita.
63
processos sociais mais amplos que geram resistências e disputas entre as práticas e o exercício
do poder, nos quais o discurso, seja ele falado, escrito, pensado ou praticado, faz-se presente.
2.5.2 Análise de dados
As análises das entrevistas foram orientadas pela análise de conteúdo conforme Franco
(2005). As quatro categorias foram identificadas por meio de um processo de repetidas
leituras dos textos das entrevistas, para, em um segundo momento, destacar as palavras que
pudessem ser agrupadas nos diferentes ―significados lógico-semânticos‖ (FRANCO, 2005, p.
72), grifando com cores diferenciadas.
Desse movimento, as quatro categorias que agrupavam os principais sentidos
presentes nos discursos foram se compondo por meio das palavras, expressões que foram
classificadas nas ―categorias molares‖ (FRANCO, 2005, p. 71), listadas a seguir:
dilemas da transição da identidade de professor/pesquisador para gestor;
contradições da política: diretrizes, avaliação e realidade em movimento;
fragilidades do diálogo e planejamento entre setores;
estratégias de tradução da política.
Essas categorias estão organizadas nos capítulos 5 (referente ao IFC) e 6 (referente ao
P. Porto). Esses capítulos foram dedicados ao aprofundamento das traduções da política pelos
gestores no contexto da prática, com maior ênfase na apresentação dos depoimentos. No
entanto, as falas dos gestores estão inseridas no texto, a partir do terceiro capítulo, em um
esforço de entrelaçar a discussão teórica e suas traduções.
No próximo capítulo, será apresentado o contexto de influências e as redes políticas
que influenciam a produção das políticas nacionais nos dois objetos desta tese.
64
3 AS INFLUÊNCIAS GLOBAIS NO ÂMBITO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS
PARA O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E EM PORTUGAL
Era imprescindível ocultar esse fato ao restante do mundo.
Encorajados pelo colapso do moinho de vento, os humanos andavam
renovando mentiras sobre a Granja dos Bichos.
(ORWELL, 2000, p. 24).
Assumindo que nos estudos sobre política está incluída a centralidade do poder e
considerando seu caráter provisório em meio a negociações e interesses de grupos
dominantes, neste capítulo, procuro identificar as redes de influência e de produção de textos
nas políticas educacionais para o Ensino Superior no contexto brasileiro e português,
notadamente na década de 1990.
Nessa perspectiva, o contexto de influências (BALL, 1994) é considerado como o
lugar no qual as políticas públicas se originam e também onde os discursos primeiros são
construídos. É um campo de disputas e consensos, que, ao jogar com interesses, estabelece
princípios básicos orientadores das políticas. ―É o território em que são hegemonizados os
conceitos centrais da política, criando-se um discurso e uma terminologia próprios que visam
a legitimar a intervenção‖ (LOPES; MACEDO, 2011a, p. 257).
Retornando à centralidade do poder, são bem-vindas as contribuições de Teodoro:
Centralidade não significa que uma política possa ser entendida como uma resposta
simples e directa aos interesses dominantes, mas antes o resultado, sempre
provisório, de um processo de negociação assimétrico entre grupos e forças
econômicas, políticas e sociais potencialmente conflituais. (TEODORO, 2003, p.
15).
Ou, ainda, sob a forma de prescrições que com objetivos bem definidos projetam
imagens de ideais societários, formados por elementos multifacetados, heterogêneos e
complexos (BALL, 1990).
Particularmente neste capítulo, busco identificar, nas políticas do Ensino Superior
implantadas nos países em estudo, a expressão dessas redes, seus conceitos centrais, a
exemplo da diversificação, das avaliações em larga escala, da adaptabilidade e sua articulação
com as políticas globais. Nessa perspectiva, considero que inseridas em contextos mais
amplos e vinculadas às políticas globais estão as políticas educacionais nacionais,
nomeadamente as voltadas ao Ensino Superior, especialmente as dirigidas à Pós-Graduação
brasileira e portuguesa. Compreendê-las nos limites desta tese requer o alargamento do campo
de análise, pois as políticas educacionais globais exercem forte influência sobre a forma como
aquelas são internamente organizadas. O contexto de influências e o enactment (BALL, 2006;
65
BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012) são fundamentais para desvelar discursos, práticas,
relações de poder e de resistências instaladas no interior do processo. No Ciclo de Políticas, a
análise do Estado tem lugar assegurado; no entanto, é impossível considerar somente a
perspectiva de controle estatal já que este se encontra irremediavelmente relacionado a outros
contextos.
Na inter-relação desses contextos, após o término da Segunda Guerra Mundial, quando
as nações experimentaram tempos econômicos e sociais de grande complexidade em situação
de penúria, ocorreu, na Conferência de Bretton Woods24 (1944), a fundação das primeiras
instituições que viriam a ocupar o lugar de destaque no processo de retomada de crescimento
da economia mundial. Nesse sentido, a formação da rede de organizações internacionais de
cunho intergovernamental propiciou também a criação de instituições especializadas em
determinados aspectos organizacionais dos Estados. São exemplos a UNESCO e o Banco
Mundial (BM), atuantes na área da educação, ciência e cultura; o Fundo Monetário
Internacional (FMI), nas finanças e no desenvolvimento; e, ainda, a Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), voltada ao planejamento da cooperação
econômica em espaços geográficos previamente definidos – a OCDE justifica que o cerne das
reformas do setor público ancora-se no monitoramento dos sistemas e na produção de
informação.
Além dos Organismos aqui citados, é importante destacar o papel desempenhado pela
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) que, especificamente na
América Latina, na década de 1990, introduziu, por meio do documento intitulado Educacion
Y Conocimiento: Eje de la Transformacion Productiva con Equidad (1992), os conceitos de
equidade, produtividade e eficiência que impactaram na agenda política educacional dos
Estados, o que caracteriza também a alternância de hegemonia entre os Organismos.
Essas organizações ainda orientam as questões educacionais dos Estados atreladas à
lógica mercantilista e do capital consideradas pelo ponto de vista economicista e da
globalização, utilizando como estratégias, entre outras, a internacionalização e as avaliações
em larga escala. Como resultado desse processo, cada vez mais, em uma curva ascendente, os
países periféricos tornaram-se dependentes da legitimação e da assistência técnica desses
organismos na formulação das suas políticas educacionais. De acordo com Teodoro:
24
A Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas ocorreu na cidade de Bretton Woods, estado de
New Hampshire, Estados Unidos. Participaram dela 730 delegados de 44 países, entre eles o Brasil, com o
objetivo de ―[…] reconstruir o capitalismo mundial, a partir de um sistema de regras que regulasse a política
econômica internacional‖ (IPEA, 2009).
66
O esforço para estabelecer uma racionalidade científica que permitisse formular leis
gerais capazes de guiar, em cada país, a acção reformadora no campo de educação
esteve no centro das inúmeras iniciativas [...] realizadas por todas essas organizações
internacionais, permitindo criar vastas redes de contatos, de financiamentos e de
permuta de informação e conhecimento entre autoridades político-administrativas de
âmbito nacional, actores sociais, experts e investigadores universitários.
(TEODORO, 2003, p. 31).
Essas iniciativas, de certo modo, foram a pedra de toque para a formação das redes
políticas que vêm sendo discutidas por Ball nos últimos anos. Para além da formação de
redes, os planos de estabilização econômica, estudos de contexto, avaliações externas,
acordos, relatórios técnicos, conferências e eventos divulgados em escala mundial por esses
organismos têm um duplo desdobramento. Por um lado, legitimam as opções internas
assumidas pelos legisladores no plano nacional; e, por outro, induzem a planificação das
políticas educacionais que, por meio do estabelecimento de metas, fixa uma agenda comum
com prioridades e soluções padronizadas no tratamento dos problemas para atingir aos
objetivos propostos. Esse modus operandi tem sido observado nas diferentes regiões, a
exemplo da Europa, da América Latina e da África, além de outros (TEODORO, 2001, 2003).
Os vários atores atuantes nas esferas de poder dos governos nacionais e internacionais,
partidos políticos e agências multilaterais, difundem as ideias por meio de variadas
interlocuções. Nas sociedades contemporâneas, as políticas são também produções de
discursos e elo na rede de poder ligados pelos conceitos de liberdade e de escolhas mantidas
por laços exógenos às comunidades epistêmicas. Por meio desses mecanismos, ocorre a
proliferação do fluxo de ideias criando a aparência de aceitação crescente e multiplicação de
novos adeptos. Há uma movimentação entre diferentes setores e campos nos quais ocorre o
deslocamento entre o social, o político e o jogo de interesses (BALL, 1994, 2012a).
Para Ball (2014, p. 29, grifo do autor), as ―[...] redes políticas são um tipo de ‗social‘
novo, envolvendo tipos específicos de relações sociais, de fluxos e de movimentos. Eles
constituem comunidades de políticas, geralmente baseadas em concepções compartilhadas de
problemas sociais e suas soluções‖. As narrativas são construídas e disseminadas dentro das
redes de relações e da governança em rede para problemas de difícil equacionamento na
esfera global, a exemplo da educação. Assim, as políticas são arquitetadas por um conjunto
diversificado de participantes que transitam entre as agências multilaterais, governos
nacionais e grupos de interesse dos mais variados por meio da mobilidade, não somente física,
mas, sobretudo, a intelectual ocupada pelos especialistas que elaboram os documentos e os
relatórios técnicos nas mais variadas organizações. Embora cada organização tenha objetivos
67
específicos, estão permanentemente conectadas por meio das redes políticas conforme
demonstrado na Figura 7.
Figura 7 - Rede de Influências de Políticas Globais nas Políticas Educacionais do Brasil e de Portugal
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Com a Figura 7, procuro evidenciar a rede de influências e conexões nas políticas
educacionais dos dois países, orientadas e coordenadas pelos organismos internacionais,
contextos nos quais são estabelecidos os primeiros consensos. Assim, as políticas nacionais,
designadamente as educacionais voltadas ao Ensino Superior, efetivam-se em grande medida
pelas cooperações técnicas que determinam princípios e diretrizes gerais que devem ser
considerados na elaboração das políticas. O conjunto de documentos produzidos por esses
organismos é extenso, mas, como exemplo, podem ser citados os produzidos pela OCDE que,
desde a década de 1990, divulgam os indicadores mundiais para a educação nos quais
costumeiramente são apresentadas análises comparativas dos sistemas de ensino, com
desempenho, recursos financeiros, humanos e a evolução da aprendizagem como retorno do
investimento educacional realizado. Esses documentos circulam entre os organismos e,
também, são endereçados aos países analisados, caracterizando as influências e a mobilidade
68
das informações, como argumentos para proposição das reformas. Para Ball (2003), por meio
de publicações regulares sobre as Nações, a OCDE promove mecanismos de controle que
levam à performatividade. Há um monitoramento constante que mede e compara o alcance
das metas estipuladas para as Nações, o que impacta diretamente na elaboração das políticas
locais. É um movimento que se efetiva em termos globais onde a governança se instala e
influencia as relações que estão em esferas superiores aos Estados, mas também entre eles e
para além deles.
Ainda sobre a rede de influências demonstrada na Figura 7, o fato de o Tratado de
Bolonha ter sido implementado no contexto do Ensino Superior europeu não impediu seus
efeitos nas políticas brasileiras, fato que evidencia a mobilidade das ideias e a rede de
influências em um mundo globalizado, pois, tanto lá quanto aqui, as políticas de Ensino
Superior realizam um movimento de encurtamento do tempo de formação. São exemplos os
mestrados e doutorados realizados em tempos menores, de dois e três anos, respectivamente,
que têm se tornado comuns em muitos países para além da UE. Nesse âmbito, podem ser
citadas outras iniciativas da esfera federal, como, por exemplo, a criação do Espaço de Ensino
Superior dos Países pertencentes à Comunidade dos Países25 de Língua Portuguesa (CPLP),
assinado na Declaração de Fortaleza (2004), o qual apresenta objetivos semelhantes aos de
Bolonha, como a mobilidade de estudantes, de docentes, de investigadores e técnicos, a
cooperação nas formações e o reconhecimento mútuo internacional das formações realizadas
nesse Espaço. No documento, também há destaque para a importância do Ensino Superior
como meio de desenvolvimento dos países e redução das desigualdades.
Mais recentemente, o documento Referenciais Orientadores para os Bacharelados
Interdisciplinares e Similares (BRASIL, 2010c), elaborado por um grupo de trabalho
instituído por portaria do MEC, apresenta a ideia da formação em ciclos nas universidades. Os
bacharelados interdisciplinares seriam formações em nível de graduação, de natureza geral
organizados pelas grandes áreas do conhecimento. A proposição do desenho alternativo
também traz elementos de Bolonha, como, por exemplo, a estrutura de ciclos, a mobilidade e
a transferência de créditos inter e entre instituições.
O que está em jogo não é mais somente o acesso, mas, mais do que isso, o tempo de
permanência na universidade e na Pós-Graduação. Bianchetti (2015, p. 28) destaca que ―[...]
as evidências são de que o PB26
está ultrapassando os contornos do continente europeu [...]‖.
25
Integram essa comunidade o Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e
Príncipe e Timor Leste. 26
Processo de Bolonha.
69
Nessa dinâmica, o discurso que convence em defesa da reforma oculta as reais intenções por
meio do uso de álibis distanciados dos reais objetivos, por meio das iniciativas
governamentais.
De acordo com Pereira (2010), o Banco Mundial tem atuado como prescritor e mentor
político, intelectual e financeiro das políticas educacionais globais. A concretização das
políticas envolve muitos interesses em conjunto aos organismos multilaterais, e, por meio
desse movimento, são gestadas em instâncias externas as políticas para todos os continentes,
no caso desta tese, particularmente as referentes ao Brasil e a Portugal, com maior ênfase a
partir dos anos de 1990. Enquanto no Brasil se intensificava o movimento de atuação dos
organismos internacionais, em Portugal ocorria o processo inverso com o afastamento parcial
do Banco Mundial, OCDE, UNESCO, os quais continuaram produzindo documentos em
segundo plano, porém não menos importantes, a exemplo dos relatórios. Esse afastamento
está ligado à criação da União Europeia, que passou a ocupar o lugar de mentora das políticas
na Europa, mas que continua trabalhando em conjunto aos organismos internacionais aqui
citados.27
Assume relevância a compreensão dos meios pelos quais o Banco Mundial e as
agências multilaterais, por meio das redes políticas, influenciaram e continuam influenciando
a indução das políticas nacionais, especialmente aquelas em que os discursos estavam e ainda
permanecem voltados à Educação Superior e à Educação Profissional, dirigidas à Pós-
Graduação. Como resultado do processo, as instituições passam a organizar-se na lógica da
competitividade nos espaços nacionais e institucionais.
3.1 INFLUÊNCIAS NAS POLÍTICAS PARA O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
Entre o período correspondente aos anos de 1950 e 1970, a política do BM estava
direcionada à concessão de empréstimos aos países do Terceiro Mundo visando a sua inserção
subordinada ao sistema comercial internacional. A crença estava ancorada no binômio
pobreza e crescimento econômico, acreditando que, com o seu crescimento, aquela seria
reduzida, porém isso não ocorreu, pois a pobreza manteve-se (SOARES, 2003).
A década de 1980 foi marcada por intenso período de reorientação nas políticas do
banco e, também, dos organismos multilaterais, quanto à provisão dos financiamentos
27
No contexto europeu, o Tratado de Lisboa (2007) também é um marco no sentido de caracterização da
identidade do europeu, influenciando principalmente as políticas de ensino superior e os processos de
internacionalização aos quais as instituições estão submetidas.
70
(ARRUDA, 2003; SOARES, 1996, 2003). Os países do Terceiro Mundo, principalmente os
pertencentes à América Latina, com altas dívidas externas, propiciaram o contexto político
favorável ao banco para as renegociações, o que deixou os países vulneráveis e submissos às
exigências condicionantes e à reestruturação interna imposta pelos organismos internacionais
(SOARES, 1996, 2003).
No Brasil, especificamente, esse processo de reestruturação e reformas de estado,
pautado na lógica neoliberal, iniciou-se na década de 1980, mas foi na década de 1990 que
ocorreu o aprofundamento das políticas de abertura comercial, desregulamentação e
privatização (HADDAD, 2008). Tais políticas influenciaram de forma crescente as teorias
―monetaristas neoliberais‖ que se tornaram hegemônicas na condução das políticas globais e
estão na base ideológica de atuação do BM e do FMI (SOARES, 2003). Em um contexto de
dependência econômica, a América Latina tornou-se o laboratório para experimentação das
políticas. No Brasil, as intervenções do FMI foram marcadas pelos planos de estabilização
econômica ocorrida durante a crise do petróleo na década de 1980 (OLIVEIRA, 2006;
SOARES, 1996, 2003).
Na década de 1990, ocorreram fatos importantes e decisivos para a indução de
políticas públicas educacionais brasileiras, especialmente as voltadas ao Ensino Superior. Foi
o momento no qual a ―mão de ferro‖ dos novos ordenamentos foi sentida com maior
intensidade ocasionando rupturas em processos, a exemplo do financiamento da Educação
Superior, que estava cristalizado e acomodado sob a égide do Estado Provedor. Foi nessa
década que ocorreu, também, a publicação de vários documentos do Banco Mundial, os quais
redirecionaram as prioridades dos países, recomendando a urgência da redução dos gastos
estatais com forte ênfase na Educação, notadamente na Educação Superior. Entre eles merece
destaque o documento Higher education: the lessons of experience (WORLD BANK, 1994).
Nesse documento, havia recomendações e estratégias quanto às ações que deveriam
ser desenvolvidas pelos países interessados em receber seus auxílios. Entre esses países estava
o Brasil que vinha desenvolvendo projetos vinculados ao BM desde a primeira metade da
década de 1970 em um processo de cooperação do Banco, o qual incluía ―[...] a assessoria aos
órgãos centrais de decisão, em áreas de política, planejamento e gestão, assim como o
desenvolvimento de projetos específicos‖ (FONSECA, 2003, p. 229), o que deixava o país à
mercê da dependência sob todos os ângulos.
Sobre o Ensino Superior, o documento (WORLD BANK, 1994) reconhecia sua
importância para o desenvolvimento econômico e social, de forma a contribuir para o
aumento da produtividade no trabalho, bem como maior crescimento nacional em longo
71
prazo. O documento destacava que a crise tinha proporções mundiais com dependência de
financiamento por parte do Estado em todos os países, inclusive ressaltando a necessidade de
reduzir os gastos alocados por estudante. Enfatizava, ainda, que a crise nos países em
desenvolvimento apresentava maior gravidade devido aos ajustes fiscais mais drásticos para
os quais se fazia necessária a utilização mais racional dos recursos.
Com base no cenário constatado nas experiências de outros países, nos quais o ideário
neoliberal já estava mais avançado, o Banco Mundial (1994), de modo genérico, elencou
quatro orientações consideradas, sob seu ponto de vista, essenciais para a reforma
educacional:
1. Diferenciação das instituições e desenvolvimento das instituições privadas.
2. Incentivos de diversificação de financiamento pelas instituições públicas.
3. Redefinição da função do governo no Ensino Superior.
4. Políticas voltadas à qualidade e à equidade do Ensino Superior.
O olhar atento a cada uma das orientações implícita ou explicitamente possibilita
conjecturas sobre as concepções ideológicas, políticas e econômicas que envolvem a
Educação Superior e suas conexões com o Estado e sociedade civil. As ideias centrais
estavam na diferenciação, diversificação, redefinição, qualidade e equidade. Essas
recomendações foram interpretadas por um conjunto de leis que alteraram significativamente
a organização da educação e os moldes de atuação estatal.
No Brasil, a década de 1990 foi profícua na elaboração de documentos que
evidenciavam os encaminhamentos gerais e a incorporação dos discursos globais nas políticas
educacionais. O Plano Decenal de Educação para Todos (BRASIL, 1993d), ainda que
elaborado no apagar das luzes do governo anterior e posto em prática no primeiro mandato de
Fernando Henrique Cardoso (FHC), foi um desses documentos. Logo na sua introdução
reportava-se à Conferência da Tailândia, citando, entre outros, a UNESCO e o Banco Mundial
como integrantes do grupo mentor do consenso, que serviria de base para a elaboração dos
Planos Decenais em cada país signatário, o que demonstra a formação da rede de influências
com a movimentação das ideias.
Entre os objetivos elencados no Plano, estava a articulação das ações das
universidades às ações governamentais e não governamentais, aos políticos e empresários por
meio de acordos e parcerias. Ao referir-se à privatização indireta ocorrida na reconfiguração
das esferas públicas e privadas, Mancebo (2004) ressalta que essa configuração possibilita a
72
entrada das empresas comerciais na educação ―[...] pela introdução de mecanismos de
administração e gerenciamento empresariais nas instituições públicas educacionais,
especialmente para a busca de recursos no mercado‖ (MANCEBO, 2004, p. 853).
Nesse movimento de reorientação, foi instituído o Sistema Nacional de Educação
Tecnológica. Por meio da Lei Nº 8.948/94, as Escolas Técnicas Federais foram
gradativamente transformadas em Centros Federais de Educação Tecnológica, os quais
deveriam ter a estrutura organizacional e funcional estabelecidas em estatuto e regimento
próprios. Nessa Lei, também estava prevista, mediante avaliação de desempenho a ser
realizada pelo Ministério da Educação, a transformação da Escolas Agrotécnicas pertencentes
ao Sistema Nacional de Educação Tecnológica em Centros Federais de Educação
Tecnológica, fato que insere as instituições no âmbito do Ensino Superior. No texto, a
evidência das parcerias expressa o movimento de tradução das políticas e sua adequação às
recomendações internacionais.
Os moldes da expansão da oferta da educação profissional foram tratados no artigo 5º:
A expansão da oferta de educação profissional, mediante a criação de novas
unidades de ensino por parte da União, somente poderá ocorrer em parceria com
Estados, Municípios, Distrito Federal, setor produtivo ou organizações não
governamentais, que serão responsáveis pela manutenção e gestão dos novos
estabelecimentos de ensino. (BRASIL, 1994, p. 18882, grifos nossos).
A palavra ―somente‖ no texto da referida Lei impõe uma exigência que, por um lado,
desonera o Estado e, por outro, aproxima a educação profissional do setor produtivo e das
organizações não governamentais.
Outra lei que merece destaque é a Lei de Diretrizes e Bases (LDB Nº 9.394/96) no
contexto de influências dos organismos internacionais vinculado à produção dos textos
nacionais. Quanto à orientação do BM em relação à diferenciação do Ensino Superior, na
LDB, no artigo 45, observou-se a seguinte definição: ―A educação superior será ministrada
em instituições de ensino superior, públicas ou privadas, com variados graus de abrangência
ou especialização‖ (BRASIL, 1996, p. 15). A ideia que permeia a diferença de graus de
abrangência das instituições pode ser pensada como uma possibilidade de aproximação entre
as demandas mercadológicas e a geração de tecnologias. Para algumas instituições, a pesquisa
continua sendo importante, embora com fontes diversificadas de financiamento, como por
exemplo aquelas oriundas de instituições da sociedade civil.
Sem ênfase acentuada na pesquisa, as instituições privadas seriam organizações mais
simples com rápida capacidade de resposta às demandas mercadológicas e, ao mesmo tempo,
contribuiriam significativamente para a redução de investimentos estatais. O desenvolvimento
73
de instituições não universitárias, como os institutos politécnicos, técnicos e profissionais com
cursos de curta duração, são opções de baixo custo e mais atrativos para os estudantes com
respostas rápidas e flexíveis às demandas do mercado laboral. Dias (2004) alerta para o fato
de as ações efetivarem-se de modo contrário, pois, antes de se decidir o tipo de universidade
que se pretende construir, é imprescindível ter clareza sobre que tipo de sociedade se busca
consolidar.
Nessa perspectiva, a redefinição da função do governo no Ensino Superior evidencia a
necessidade de alterar profundamente as relações entre o governo e as instituições, com
redução da participação governamental considerada ineficiente aos olhos dos organismos
internacionais. O controle direto seria, então, substituído pela criação de um ambiente de
políticas favoráveis nas instituições públicas e privadas com efeito multiplicador dos recursos
públicos para satisfazer as necessidades de ensino e pesquisa nacionais contemplando também
as avaliações em larga escala.
Quanto às políticas voltadas à qualidade e equidade do Ensino Superior, pode-se
concentrá-las em três grandes objetivos (WORLD BANK, 1994):
Aumentar a qualidade do ensino e pesquisa (mecanismos de autoavaliação
institucionais e avaliação externa executados pelos governos).
Mais adaptabilidade da educação às demandas do mercado laboral (orientação
de representantes dos setores produtivos nos programas de ensino e pesquisa
para garantir a pertinência dos programas acadêmicos com o desenvolvimento
de pesquisas conjuntas entre as instituições e a indústria e profissionais das
indústrias em tempo parcial para fortalecer a comunicação entre o ensino e os
setores econômicos). Esse movimento pode ser constatado nos editais das
agências de fomento.
Mais equidade (educação pública de boa qualidade e ingresso dos grupos
menos favorecidos da população em todas as etapas educacionais anteriores
pode ser determinante para o maior ingresso no Ensino Superior). Nesse item,
são contempladas as reivindicações dos movimentos sociais quanto ao acesso
(WORLD BANK, 1994).
O conjunto de recomendações do Banco Mundial e a necessidade de ajuste econômico
e fiscal que deveria se efetivar nos países em desenvolvimento pautam-se na análise
econômica da relação custo/benefício, situando a Educação Superior como dependente do
74
mercado e o ―saber como um bem privado‖ (SGUISSARDI, 2009). A educação é pensada e
planejada conforme as análises de profissionais da área econômica, buscando produzir o
consenso conforme a lógica do mercado.
O Ensino Superior como bem privado, situado na área de prestação de serviços, é
antagônico quanto aos direitos sociais assegurados na Constituição Brasileira (1988). Para o
BM, a educação é a grande solução para a redução da pobreza e crescimento econômico das
nações, mas não se esclarece, por exemplo, as causas da pobreza e o fato de que essa solução
causa o alargamento dos processos de exclusão social e desigualdade. Sua influência
evidencia um discurso que permanece segundo as mesmas linhas, como agência prescritora
das políticas econômicas e sociais de grande parte dos países, enquanto outras instituições, a
exemplo da UNESCO, vêm modificando suas linhas de ação.
Essa constatação foi anunciada por Dias (2004) ao discutir as diferentes perspectivas
adotadas em documentos internacionais publicados na década de 1990 pelo BM e UNESCO.
[...] ambos partindo de diagnósticos semelhantes, mas chegando a conclusões e
elaborando propostas totalmente divergentes, fruto de uma visão radicalmente
diversa da sociedade, uns vendo-a como instrumento para reforçar o mercado, outros
como uma entidade coletiva que deve ser considerada segundo suas especificidades
sociais e culturais. (DIAS, 2004, p. 1).
No âmago da divergência, está a educação. Para o BM, é um bem privado e um
mecanismo regulador do mercado, sem espaço para o debate e com recomendações gerais que
desconsideram as peculiaridades de cada região e priorizam o uso eficiente dos recursos na
perspectiva economicista. Para a UNESCO, na perspectiva humanista, é um bem público em
uma sociedade que é em sua origem uma entidade coletiva.
Ao considerar os pontos de vista do BM e da UNESCO, há de questionar-se os
motivos pelos quais as recomendações do BM se sobrepõem às da UNESCO. O BM indica
ajustes fiscais e reformas que impactam nos serviços ofertados pelo Estado, e a UNESCO
humaniza o discurso. Para Dourado (2002), a resposta reside no fato de que, ao ignorar as
recomendações da UNESCO, não há punições para os Estados-Membros, enquanto para as
recomendações do BM há severas implicações que envolvem o repasse de empréstimos. ―[...]
os empréstimos estão condicionados à adoção das diretrizes do Banco Mundial‖
(DOURADO, 2002, p. 239). Os Organismos têm papéis distintos no processo, mas agem sob
a mesma lógica considerando a educação como um bem individual. É nesse sentido que se
configuram as redes de interesses e negociações. Ao apregoar a educação como agente capaz
de fazer a revolução na perspectiva mercantilista, pertinente faz-se lembrar de Orwell (2000),
75
pois a revolução estaria fadada à tirania possibilitando a ascensão de um novo bloco de poder
com outros protagonistas ao sabor de interesses e influências.
No entanto, as recomendações da UNESCO que, na década de 1990, apresentavam
maior distanciamento das emanadas pelo Banco Mundial, nos anos de 2000 sofreram uma
rápida inversão. Isso pode ser constatado, por exemplo, na Declaração da Conferência
Regional da Educação Superior na América Latina e no Caribe (2009)28
na qual o discurso
era no sentido de enfrentamento:
A Educação Superior como bem público social enfrenta correntes que
promovem sua mercantilização e privatização, assim como a redução do apoio e
financiamento do Estado. É fundamental reverter esta tendência, de tal forma
que os governos da América Latina e do Caribe garantam o financiamento
adequado das instituições de Educação Superior pública e que estas respondam
com uma gestão transparente. A Educação não pode, de modo algum, reger-se
por regulamentos e instituições com fins comerciais, nem pela lógica do
mercado. O deslocamento do nacional e do regional em direção ao global (bem
público global) tem como conseqüência o fortalecimento de hegemonias que
existem de fato. [...]. Afirmamos, ainda, nosso propósito de agir para que a
Educação, em geral, e a Educação Superior, em particular, não sejam
consideradas como serviço comercial. (UNESCO, 2009a, p. 3-4, grifos nossos).
O discurso presente nesse documento opõe-se à redução de financiamento e ao apoio
do Estado, marcando o posicionamento dessa agência. Entretanto, em outro documento
resultante da Conferência Mundial sobre o ensino superior: as novas dinâmicas do ensino
superior e pesquisas para mudança e o desenvolvimento social (2009), há uma intensa
aproximação às orientações defendidas pelo BM, ao naturalizar investimentos do mercado no
Ensino Superior. Entre as recomendações são encontradas: ―Manter e, se for possível,
aumentar o investimento no ensino superior a fim de sustentar continuamente a qualidade e a
igualdade, além de promover a diversificação tanto no fornecimento do ensino superior
quanto nos meios de seu financiamento‖ (UNESCO, 2009b, p. 6, grifos nossos). Além
dessa, há indicação para que sejam desenvolvidos e fortalecidos sistemas de certificação de
qualidade e regulação, com a participação total dos investidores, promoção da educação a
distância e tecnologias como mecanismo de apoio à procura crescente do Ensino Superior e
parcerias público-privadas. Ainda, ―[...] maior cooperação regional é desejável nas áreas de
reconhecimento de qualificações, garantia de qualidade, governança, pesquisa e inovação. A
educação superior deve refletir as dimensões nacional, regional e internacional tanto no
ensino, quanto na pesquisa‖ (UNESCO, 2009b, p. 5).
28
É importante ressaltar que esse Documento foi elaborado pela Secretaria Regional da UNESCO, no auge da
reestruturação dos Estados na América Latina com governos nacionais mais de centro esquerda, a exemplo do
Brasil, Bolívia, Chile, Equador, Uruguai, Venezuela entre outros, que influenciaram também a elaboração dos
documentos dos Organismos Internacionais.
76
O que se pode depreender das publicações dessas agências, na década de 1990 e 2000,
é que muitos direcionamentos nas políticas de Ensino Superior nos países latinos e
especialmente no Brasil têm sua origem naqueles documentos, o que evidencia as traduções
dos governantes nas produções dos textos e os acordos firmados.
No contexto brasileiro, em 1994, havia sido criado o Sistema Nacional de Educação
Tecnológica, com a LDB; dois anos depois, a educação profissional teve lugar em duas
passagens: uma vinculada à Educação Básica como educação profissional técnica de nível
médio29; e outra, em capítulo específico, voltada à educação profissional e tecnológica. A
regulamentação dos artigos dessa Lei ocorreu pelo Decreto Nº 2.208/97 distinguindo a
educação profissional em três níveis: básico, técnico e tecnológico (BRASIL, 1997b).
Enquanto o básico destinava-se a qualificar e requalificar os trabalhadores,
independentemente da escolarização, o técnico concedia habilitação profissional aos jovens
egressos do Ensino Médio, com organização curricular autônoma, de curta duração e modular.
O tecnológico, por sua vez, estava voltado aos cursos superiores de tecnologia, aos quais
tinham acesso os concluintes do Ensino Médio e Técnico. Os cursos de nível superior
deveriam ser organizados para atender aos diversos setores da economia. A titulação seria a
de tecnólogo, remetendo, ainda que de forma velada, ao documento do BM (1994) quanto à
ênfase na formação técnica visando atingir produtividade e competitividade. A Pós-
Graduação somente era citada nos objetivos da educação profissional e vinculava a formação
profissional às aptidões para o exercício de atividades específicas no trabalho. Na legislação,
por exemplo, não havia indícios de ligação da Pós-Graduação às atividades da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)30.
A implementação do conjunto de dispositivos legais dirigido ao Ensino Médio e
Profissional contava com o financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID)31 em conjunto ao MEC, Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e BM, por meio do
Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP). É inegável o consentimento das
autoridades governamentais submetido aos princípios dos organismos internacionais e aos
seus apelos econômicos. E nesse processo transformacional, são geradas novas subjetividades,
29
Quanto à educação profissional técnica de nível médio, com a Lei Nº 11.741/2008, a LDB foi alterada e
incluída uma seção que define as formas de desenvolvimento e articulação com o Ensino Médio. 30
Esta agência, criada em 11 de julho de 1951, é uma fundação do Ministério da Educação (MEC), desempenha
papel fundamental na expansão e na consolidação da Pós-Graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em
todos os estados da Federação. Em 2007, passou também a atuar na formação de professores da Educação Básica
ampliando o alcance de suas ações na formação de pessoal qualificado no Brasil e no exterior. (Fonte:
http://www.capes.gov.br/historia-e-missao). 31
O BID tem a finalidade específica de prover financiamentos aos países da América Latina e Caribe.
77
pois a aproximação do mercado envolve não apenas mudanças estruturais, mas também de
incentivos (BALL, 2011).
O que pode ser observado com a publicação do Decreto Nº 2.208/97 é a nítida
separação entre o Ensino Médio e o Profissional, o que certamente corroborou com o
surgimento de sistemas e redes diversas, desqualificando a Educação Básica como etapa
fundamental para a formação de jovens e de trabalhadores. Além disso, é importante destacar
o duplo sentido: trabalhador e acadêmico em uma formação cindida - para uns somente a
prática; para outros, o teórico.
No entanto, no contexto nacional, os desdobramentos práticos do Decreto Nº 2.208/97
não foram simples. O que ao primeiro olhar parecia de fácil implementação, mostrou-se frágil
e de enorme complexidade, a exemplo da falta de articulação entre as ações federais,
estaduais e municipais, gerando confusões entre conceitos e nomenclaturas divergentes nas
várias instâncias (SHIROMA, 2003). No contexto da prática (BALL, 1994), a interpretação
das políticas gerou dúvidas quanto às competências e às responsabilidades nas diversas
instituições e esferas com poder de decisão (CARVALHO, 2003). Logo foram sentidas,
também, pelo mercado, os problemas advindos dessa formação desarticulada: a enorme
confusão de termos nas nomenclaturas para as certificações e a disparidade de carga horária
entre as formações na educação profissional foram alguns deles (LOPES, 2003). As questões
que levaram a esse discurso estavam vinculadas à diminuição de custos, pois o Ensino
Técnico e Profissionalizante requeria instalação de laboratórios experimentais. Assim, ofertar
a Educação Básica generalista mostrava-se duplamente mais simples; diminuía os custos e
automaticamente abria as portas para investimentos por meio de parcerias, além de atender as
necessidades mais urgentes do mercado de trabalho. Esses encaminhamentos atingiram
diretamente os institutos que, de longa data, ofertam o ensino técnico e profissionalizante no
contexto brasileiro. É importante destacar que, nesse período, ainda não há evidências de
orientações e diretrizes da oferta de Pós-Graduação na formação profissionalizante, nem
menção aos documentos da CAPES e sua sistemática de avaliação. Ambas seguiam caminhos
distintos.
No final do segundo mandato de FHC, as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais
para a organização e o funcionamento dos Cursos Superiores de Tecnologia foram instituídas
pela Resolução CNE/CP Nº 3, de 18 de dezembro de 2002. Logo em seu artigo 1º, essa
Resolução esclarecia sobre o objetivo: ―A educação profissional de nível tecnológico,
integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, objetiva
garantir aos cidadãos o direito à aquisição de competências profissionais que os tornem aptos
78
para a inserção em setores profissionais nos quais haja utilização de tecnologias‖ (BRASIL,
2002a, p.162). Nessa Resolução, e em outros documentos que tratam da educação profissional
e dos cursos superiores de tecnologia ou tecnólogos, está explícito que a diferença se dá pela
aquisição de competências profissionais diretamente aplicadas no mundo do trabalho com o
uso de tecnologias.
Com base nessa concepção, a educação profissional assume maior relevância no
âmbito do Ensino Superior, pois os cursos de educação profissional de nível tecnológico,
agora nomeados cursos superiores de tecnologia, deveriam, entre outras premissas: ―I -
incentivar o desenvolvimento da capacidade empreendedora e da compreensão do processo
tecnológico, em suas causas e efeitos; II - incentivar a produção e a inovação científico-
tecnológica, e suas respectivas aplicações no mundo do trabalho; [...]‖ (BRASIL, 2002a,
p.162).
Ao enfatizar a compreensão do processo tecnológico, a produção e a inovação há um
direcionamento para o domínio de outras habilidades para além do uso, e ainda que não
apareça de forma explícita, a pesquisa é um dos elementos presentes. Ao estabelecer os
critérios para a organização e o planejamento de tais cursos, a referida Resolução ainda
vincula a vocação institucional e o atendimento às demandas da sociedade, o que aproxima as
instituições que oferecem a educação profissional dos cursos superiores de tecnologia, e entre
elas as pertencentes à Rede Federal, ainda que naquele momento essa rede fosse de menor
expressão.
Não por acaso, em 2003, o BM publicou um novo documento sobre a Educação
Superior no qual reconheceu a necessidade da adoção do enfoque holístico baseado na
diversidade (educação a distância), flexibilidade, eficácia, para atender as necessidades da
economia do conhecimento. A flexibilização refere-se às estruturas governamentais e rígidas
práticas de gestão na perspectiva economicista. Apesar de reconhecer a importância da
Educação Superior para o desenvolvimento econômico e social e o redirecionamento das
políticas do Banco, para além do financiamento da Educação Básica e Profissional, as ideias
centrais defendidas anteriormente permaneciam.
A alternativa era a expansão do Ensino Superior em massa e, consequentemente,
também, o aligeiramento da Pós-Graduação. O ensino técnico com a prática em laboratórios
agregando possibilidades de pesquisa era defendido sob a perspectiva da qualificação de mão
de obra a ser absorvida pelo mercado de trabalho. Ao recomendar a criação de ações
favoráveis e incentivos adequados por parte do Estado, a regulação apresentava-se como uma
importante ferramenta de acesso para facilitar o ingresso de novas instituições, entre elas as
79
privadas e as virtuais. Na perspectiva do Banco Mundial (2003), a regulação ficava restrita
aos requisitos mínimos de qualidade, evitando barreiras para o acesso ao mercado e as
avaliações pensadas para classificar as instituições quanto à qualidade.
A exemplo de outros países da América Latina, no início dos anos de 2000, no
mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o cenário brasileiro sofreu alterações no campo
político, econômico, social e principalmente no educacional, nomeadamente no Ensino
Superior. A lógica neoliberal que vinha sendo desenvolvida foi contornada em alguns
aspectos, entre eles os educacionais. As ações governamentais seguiram em duas frentes: por
um lado, foram criados mecanismos que deram continuidade ao cenário favorável às
instituições privadas que passaram a receber alunos financiados pelo poder público, na forma
de bolsas de estudo. No entanto, por outro lado, a ideologia de governo, mais voltada ao
social, contemplou os apelos dos movimentos da sociedade civil e de grupos historicamente
excluídos, o que implicou um movimento contrário à lógica até então vigente sob a égide das
recomendações dos organismos internacionais. Nesse movimento, a expansão, a
interiorização do Ensino Superior e a criação dos Institutos Federais (2008), com a gratuidade
do ensino em locais até então desprovidos desse nível de ensino, privilegiou uma legião de
cidadãos e afetou a identidade das instituições.
No processo de reorientação da política educacional brasileira especialmente voltada
ao Ensino Superior e Educação Tecnológica, o cenário encontrado foi duramente criticado sob
os olhos de um governo que se anunciava mais vocacionado ao social. Ao retomar as
discussões e expressar uma intencionalidade de revigorar a educação profissional e
tecnológica, a equipe de governo produziu um documento intitulado Proposta em Discussão:
políticas públicas para a Educação Profissional e Tecnológica‖ (BRASIL, 2004b),
considerado, pelo então governo, de importância estratégica para coordenar as ações e um
marco na reorientação da política de expansão da Rede Federal. No documento, há duras
apreciações à política em vigor desde a década de 1990: ―Foi uma política imposta
autoritariamente, sem que as instituições tivessem tempo para amadurecer os novos rumos
possíveis, recursos e técnicas em suas instituições‖ (BRASIL, 2004b, p. 12).
Posteriormente, ocorreu a publicação do Decreto Nº 5.154/2004, o qual revogou o
Decreto Nº 2.208/97. Enquanto este compreende a educação profissional nos níveis básico,
técnico e tecnológico, com cursos superiores tecnológicos conferentes de grau de tecnólogo,
aquele situa a educação profissional com o desenvolvimento de cursos e programas de ―[...] I
- formação inicial e continuada de trabalhadores; II - educação profissional técnica de nível
médio; e III - educação profissional tecnológica de graduação e de pós-graduação‖ (BRASIL,
80
2004a, p. 18). Esta última substituiu a expressão ―tecnólogo‖ utilizada para os cursos com
menor tempo de duração (entre dois ou três anos) oferecidos pelas instituições na década de
1990. Esse Decreto pode ser considerado o estágio embrionário do que viria a ser a
verticalização formalizada na criação dos Institutos Federais porque apresentava a
organização do ensino técnico, tecnológico e pós-graduação. Por outro lado, com a Resolução
Nº 03/2002, publicada no apagar das luzes do governo de FHC, havia a formalização da
educação profissional de nível tecnológico oferecida no âmbito do Ensino Superior e a
aproximação com a pesquisa, o que de certo modo contribuiu com o vínculo futuro com a
Pós-Graduação explicitada no Decreto Nº 5.154/2004.
Apesar desse esforço, o que se tem é uma educação profissional que, como política
pública, se mantém fortemente articulada às tendências de mercado, com investimento
governamental, o que lhe confere limites e subordinação às lógicas externas. Nesse sentido:
Os principais atributos da Educação Tecnológica são o foco, a rapidez, a inserção no
mercado de trabalho e a metodologia. O foco desta modalidade é a formação em um
campo de trabalho definido, alinhado às necessidades atuais. A rapidez refere-se à
oferta do curso com uma carga horária menor, de dois ou três anos. Por estarem
pautados em pesquisas de mercados para sua oferta e funcionamento, visam à rápida
inserção do aluno no mercado de trabalho de acordo com as tendências do mercado.
(TAKAHASHI; AMORIM, 2008, p. 217).
Sob esse entendimento, os cursos tecnológicos são criados, extintos e reorganizados
curricularmente com o objetivo de atender rapidamente a demandas específicas.
Buscando mecanismos que, pelo menos em tese, passassem a ideia de um novo tempo,
em 2005, por meio da Lei Nº 11.195 (BRASIL, 2005a), foi alterada a concepção de
obrigatoriedade da expansão da Rede. O artigo 5º da Lei Nº 8.948/94, que afirmava que essa
expansão ―somente poderá ocorrer‖ por meio de parcerias, foi alterado pela possibilidade de
escolha, com a expressão ―ocorrerá preferencialmente‖ (BRASIL, 1994, p. 18882), com
parcerias entre o poder público e o setor produtivo ou organizações não governamentais. Essa
alteração inicialmente passa a impressão de que o discurso do texto foi suavizado, mas,
implicitamente, deixa claro que a ―preferência‖ será para aqueles que realizarem parcerias
desonerando o Estado, retirando de sua responsabilidade a gestão e a manutenção das
instituições. A base da ideia continua.
Apesar da abertura, há outras possibilidades pela via da preferencialidade, o Estado
regulador mantém-se. A supervisão e a avaliação continuam a cargo do Ministério da
Educação. Esse discurso revela as intencionalidades que sutilmente vão sendo incorporadas
aos textos das legislações e expressam direcionamentos processados por aqueles que têm o
poder de legislar.
81
Na sequência das políticas governamentais, em face do terreno preparado para as
mudanças de concepção, foi implantado o Plano de Expansão da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, iniciado em 2005, e projetado para ser desenvolvido
em duas fases: a primeira iniciada no mesmo ano, com a construção de 60 novas unidades de
ensino financiadas pelo Governo Federal; a segunda, iniciada em 2007, intitulada Uma escola
técnica em cada cidade-polo do país, previa a implantação de 150 novas unidades de ensino
com a oferta de 180 mil novas vagas.
No próprio slogan, as palavras ―escola técnica‖ dão o tom do discurso; não há menção
ao Ensino Superior, nem à Pós-Graduação, mas há uma perspectiva de um processo de
construção de uma nova identidade pautada no ensino técnico como grande aposta. Novas
oportunidades para aqueles que até então estavam excluídos. O fato de transitar nas análises
documentais das políticas propagadas, tanto nos governos de FHC como de Lula, possibilita
perceber evidências de que, na mudança de perspectiva anunciada, foram abertas novas
oportunidades sem romper efetivamente com o que existia.
Essas ações, de certo modo, deram fôlego à rede federal que, nos anos de 1990, havia
sofrido com o sucateamento da rede da educação profissional e também das universidades
públicas, causando sua desarticulação. O viés social universal da política governamental de
expansão da rede federal considerou a potencialidade estratégica dessas instituições por meio
da mudança de foco de ação que, até então, era historicamente voltada à formação
predominante de mão de obra para absorção pelo mercado de trabalho. A mudança discursiva
efetivou-se via qualidade e inclusão social, utilizando-se de instituições reconhecidas e
fisicamente organizadas que, de certo modo, continuou com a expansão no governo de Dilma
Rousseff.
No ano de 2011, a então Presidenta anunciou a terceira fase de expansão da rede
federal, (2011 – 2020) com previsão de 86 novos campi de institutos federais dos quais 46
eram referentes à conclusão da segunda fase anunciada por Lula em 2007 (BRASIL, 2011).
Além da continuidade da expansão da Rede Federal, por meio da Lei Nº 12.513, de 26 de
outubro de 2011, foi criado o PRONATEC, que tem entre seus objetivos:
I - expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional
técnica de nível médio presencial e a distância e de cursos e programas de formação
inicial e continuada ou qualificação profissional; [...] VI - estimular a articulação
entre a política de educação profissional e tecnológica e as políticas de geração de
trabalho, emprego e renda. (BRASIL, 2011, p. 1).
Entre as instituições que ofertam esse Programa, conforme a referida lei, estão as
instituições de educação profissional e tecnológica, mas também os serviços nacionais de
82
aprendizagem das instituições públicas e privadas de Ensino Superior e fundações públicas e
privadas dedicadas à Educação Profissional e Tecnológica. Todas essas instituições recebem
repasses correspondentes aos valores das bolsas-formação. Novamente, mantém-se a lógica
de expansão da rede federal contemplando com recursos, também outras instituições, a
exemplo do ―Sistema S‖ e a legitimação das parcerias público privadas, com destaque para a
qualificação para o trabalho, inclusive com formação a distância. Ao abrir esse leque de
oportunidades, a educação pode ser entendida como oferta de um serviço, o que se aproxima
das recomendações dos organismos multilaterais discutidos.
Ainda que a ideologia entre os mandatos de Lula e Rousseff, em linhas gerais, tenham
sido mantidas, à medida que vão mudando os gestores federais com poder de decisão também
são alteradas as formas de conduzir as políticas, o que ocasiona contradições nas orientações,
nesse caso específico, da SETEC para com os Institutos. Esse tema foi abordado por um dos
gestores entrevistados, ao analisar os encaminhamentos do governo que deveriam ser
seguidos pelo IFC para aprovação de novos cursos na Pós-Graduação. Ele destaca: “Então até
mesmo a política nacional não está ainda muito bem definida. E aí nós passamos, por
exemplo, por esse momento de transição, acabou o governo Dilma e continuou o governo
Dilma, mas com outras pessoas ali dentro. Então as estratégias também acabam mudando
um pouco” (S2). Ainda sobre a política de governo, mas referindo-se à criação dos Institutos,
S5 destacou: “Do ponto de vista da atuação dos Institutos, em termos dos arranjos
produtivos locais, e até do ponto de vista da geração, da produção de tecnologia; acredito
que seja uma política de governo, porém, há a necessidade de a questão da pesquisa ser um
pouco melhor entendida dentro das instituições. E, de qualquer forma, a sociedade, em geral,
tem uma demanda muito grande por qualificação de mão de obra e formação de pessoal”
(S5).
Os depoimentos desses dois gestores evidenciam como as mudanças nas políticas e as
orientações alteram a dinâmica de atuação institucional. O discurso governamental, no
momento da criação, foi fortalecido com a perspectiva de considerar os arranjos produtivos
locais e suas necessidades, trazendo, pelo menos em tese, como desdobramento, a melhoria da
qualidade de vida da população, o que não exclui as contradições da política no campo da
influência e da prática.
A expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica,
como política nos governos de Lula e Rousseff, é, sem sombra de dúvida, algo sem
precedentes na história brasileira e decisiva para inserção da pesquisa e aproximação com a
Pós-Graduação dos Institutos Federais no campo do Ensino Superior. Uma rápida consulta à
83
homepage da SETEC possibilita constatar que, no período de 1909 até 2002, a Rede Federal
de Educação Profissional era formada por apenas 140 escolas distribuídas em 119 municípios.
No ano de 2010, somavam-se 356 unidades que atendiam 321 municípios; no ano de 2014,
578 unidades instaladas em 511 municípios; e a previsão para 2016 é de atingir 644 unidades
distribuídas em 568 municípios. Esses números comprovam que, nos últimos treze anos,
considerada a projeção para 2016, houve um crescimento da Rede Federal que corresponde a
360%, o que certamente faz a diferença na vida e na formação de um contingente de cidadãos
até então excluídos, ainda que lógicas anteriores, a exemplo da destinação de recursos federais
para as instituições privadas, tenham permanecido.
3.2 INFLUÊNCIAS NAS POLÍTICAS PARA O ENSINO SUPERIOR EM PORTUGAL
Para Teodoro (2003), a atuação das autoridades portuguesas junto às organizações
internacionais (OCDE, UNESCO e Banco Mundial) que prestavam assistência técnica
ocorreu em um ambiente privilegiado para a legitimação e o mandato das ações, inclusive
quanto à legislação nacional. Esse fato, conforme o autor, está relacionado ao posicionamento
de Portugal como país de semiperiferia32 na sociedade internacional.
Embora o recorte temporal desta tese esteja fixado na década de 1990, no contexto
português, é necessário retroceder para compreender o movimento de alternância naquele
contexto e o movimento do fluxo de ideias por meio das redes políticas. Até meados da
década de 1970, a OCDE, apesar das resistências iniciais do governo português ditatorial, foi
a protagonista do auxílio financeiro por meio do Plano Marshall (European Recovery
Program) de ajuda norte-americana à Europa. A rejeição quanto à aceitação de auxílio
financeiro pelo governo português devia-se ao receio de que os Estados Unidos, por meio da
liberalização econômica mundial e união política com a Europa, pudessem ascender aos
territórios europeus, deixando-os vulneráveis e dependentes financeiramente do capital
americano. Contudo, com a criação da Organização Europeia de Cooperação Econômica
(OECE), na segunda Conferência de Paris no ano de 1948, o ideário português de resistência
perdeu força, fato que provocou o movimento de inversão, da recusa para a solicitação de
auxílio (TEODORO, 2003; STOER, 1986).
O auxílio financeiro provocou mudanças significativas na política educacional e, ao
mesmo tempo, propiciou que os legisladores e políticos participassem de discussões
32
Conforme Boaventura Sousa Santos (1993), Estados Semiperiféricos são caracterizados pelo equilíbrio das
atividades produtivas entre as produções centrais e as periféricas com processos de regulação específicos,
estrutura heterogênea e graus de desenvolvimento intermediários.
84
internacionais e evoluíssem no campo educacional na perspectiva das recomendações dos
organismos internacionais. Essa mudança vinha ao encontro da OECE/OCDE visto que, para
esta, há um estreito vínculo entre educação e desenvolvimento econômico, com a utilização
racional da mão-de-obra disponível. Ou seja, a questão central estava no protagonismo da
ciência para impulsionar o progresso, fato que seria alcançado com a formação de
profissionais que pudessem ser aproveitados em larga escala pelas indústrias, o que coincide
com a emergência da teoria do capital humano e, em momento posterior, com os exames
anuais aplicados em larga escala pela OCDE. Os resultados desses exames são utilizados
como base para as ações sugeridas às Nações na perspectiva da economia (TEODORO,
2001).
A educação tem valor econômico que reflete na aproximação mais intensa de
consultores técnicos internacionais na elaboração dos projetos educacionais. ―Ao quebrar o
isolamento de Portugal e ao obrigar à elaboração regular de relatórios detalhados sobre a
situação económica e educativa, que mostravam de forma brutal, a distância a que o país se
encontrava de outros seus parceiros [...]‖ (TEODORO, 2003, p. 40-41), sob o mandato da
OCDE, cria-se uma ideologia educativa que reconhece como legítimas as propostas dos
setores desenvolvimentistas na perspectiva do planejamento educativo e da necessária
formação de mão-de-obra. Naquele momento, era a OCDE que representava a instituição de
excelência e reconhecimento internacional nas recomendações sobre as políticas educacionais
em vários países, inclusive os da Europa.
No entanto, o movimento de alternâncias de interesses e acordos é cíclico entre os
Estados e instituições, sejam elas nacionais ou internacionais. Tem seus reflexos diretos na
forma como a educação é entendida, o que naquele contexto de período pós revolucionário de
valorização dos movimentos sociais provocou seu deslocamento, situando-a como
instrumento de libertação dos socialmente marginalizados e oprimidos (STOER, 1982).
Com esse deslocamento, a instituição que respondia mais proximamente aos anseios
nacionais era a UNESCO (1974 – 1975), com uma visão socialista de desenvolvimento33
da
qual os técnicos eram os protagonistas. Estes produziam diagnósticos e relatórios e, em suas
análises, eles destacavam
[...] o facto de não se constatar a existência no campo educativo de um projeto
global, integrado e coerente, em manifesto atraso face aos outros setores de
actividade, insistia na necessidade de se definir uma estratégia, que os peritos da
33
A visão socialista de desenvolvimento assenta-se no fato de que naquele momento Portugal estava saindo de
um longo período ditatorial, o que expressa também o movimento realizado pelos Organismos Internacionais nos
documentos regionais. Nesse mesmo período, no Brasil, o discurso da UNESCO era desenvolvimentista.
85
UNESCO propunham que se fundasse sobre a ideia de uma educação permanente
[...]. (TEODORO, 2001, p. 139, grifos do autor).
Em linhas gerais, se antes a ideia era de privilegiar o desenvolvimento econômico,
agora a ideia de educação permanente apresenta recomendações quanto à necessidade de
formar quadros técnicos e culturais. A UNESCO valorizava as classes desfavorecidas com
sólido vínculo entre as necessidades econômicas e sociais e o planejamento da política
educacional, em um período marcado pela revolução.
No entanto, no período pós revolução (1976 a 1978), havia a necessidade de marcar
novas concepções que consideravam as credenciais da UNESCO como inadequadas em
função de sua abordagem socialista e vínculo com os países do terceiro mundo. O
protagonismo passa a ser do Banco Mundial que, apesar de estar envolvido com políticas
educacionais desde a década de 1960, assume, naquele momento em Portugal, o posto de
instituição internacional forte atuando na dupla via de consultoria e financiamento (STOER,
1986), fato também observado no auxílio prestado aos países da América Latina. Desse modo,
o BM legitima as novas orientações educacionais e presta auxílio financeiro aos países em
dificuldades dos quais Portugal fazia parte. Além disso, necessitava responder à opinião
pública que situava o ingresso ao Ensino Superior como ponto central nas ações da política
educacional.
Em momento posterior à análise e à avaliação situacional do sistema educacional
português, o Banco Mundial propôs uma reforma que criava o Ensino Superior de curta
duração, de caráter técnico, que excluía a investigação das grades curriculares, com vistas à
formação de nível intermediário (STOER, 1982; TEODORO, 2001, 2003). A indicação que
acelerava a formação de recursos humanos direcionada para determinados setores industriais
foi vista com bons olhos pelos administradores, pois era também uma forma de responder
rapidamente às pressões sociais que clamavam por ampliar o acesso ao Ensino Superior.
Essas ações tiveram generosas fatias de financiamento do Banco Mundial e possibilitaram a
criação, a construção e a compra de equipamentos para os Institutos Politécnicos, inclusive
formação em nível de Pós-Graduação para os docentes nos Estados Unidos na década de 1970
(TEODORO, 2003).
Além das alternâncias de hegemonia até aqui evidenciadas, o FMI também atuou em
Portugal nas décadas de 1970 e 1980, por meio do Acordo de Estabilização Econômica e
ajustamento estrutural no qual as recomendações estavam centradas na redução do consumo
estatal, obrigatoriedade de limitação de tetos salariais, incremento de impostos, além da
desvalorização cambial. Os empréstimos, por um lado, estavam vinculados ao alívio da
86
recessão econômica que se agravava no país, mas, por outro, preparavam o terreno para as
privatizações que foram contempladas com a revisão constitucional realizada em 1989
(AMARAL, 2007).
Como resultado das constantes trocas dos protagonistas, fruto das políticas de
governo, o Ensino Superior português tornou-se dualista (SOUSA, 2011). Apesar de a Lei de
Bases de 1986 ter distinguido o ensino universitário e o ensino politécnico, essa distinção
começou a delinear-se na década de 1970, conforme apresentado anteriormente, quando os
antigos Institutos Industriais e Comerciais passaram a denominar-se Institutos Superiores.
Com a Lei Nº 61, de 28 de julho de 1978, foi instituído o ―Ensino Superior de curta
duração‖ destinado ―à formação de técnicos e de profissionais de educação de nível superior‖
(PORTUGAL, 1978, p. 1530). Aprofunda-se, assim, uma ambiguidade anteriormente
instalada que, por um lado, reduzia a distância entre a universidade e o politécnico, e, por
outro, situava-o em um nível inferior. Nas palavras de Grácio: ―Um ensino definido mais pela
negativa, não tanto pelo que é mas pelo que não é e que no entanto não parece longe de poder
ser‖ (GRÁCIO34
, 1998, p. 193).
No ano seguinte, com o Decreto-Lei Nº 513-T, de 26 de dezembro de 1979, formaliza-
se a distinção entre os dois subsistemas. Um olhar mais atento ao processo que envolve a
participação do Banco Mundial evidencia que o investimento na educação e no treinamento
de técnicos para adaptação ao mercado de trabalho se desdobra também em economia. Ao
invés de contratar mais professores, o seu número foi reduzido com o fechamento de centros
de formação sob a preservada imagem da reorganização do ensino (STOER, 1982). Em
momento posterior, o autor ainda destaca:
Neste sentido, esta organização internacional, enquanto portadora de teoria da
modernização, teve o papel de apoiar a redefinição e reestabelecimento do Estado
português quer proporcionando um modelo para o desenvolvimento educativo,
baseado na teoria técnico-funcional da educação, quer patrocinando um apoio
externo a um Estado extremamente necessitado de refazer a sua imagem e de se
credenciar face à comunidade económica internacional. (STOER, 2001, p. 251).
As palavras-chave da mudança estavam centradas na eficiência e na qualidade do
sistema de ensino português, no aprimoramento da competência profissional dos professores,
no planejamento e no treino da mão-de obra com a prerrogativa de atender às expectativas da
população. As ações tinham via de mão dupla: por um lado, com a criação do Ensino Superior
de curta duração, ampliam-se as vagas; por outro, ocorre o contingenciamento do acesso ao
34
Sérgio Grácio (1998), no livro Ensinos Técnicos e Política em Portugal 1910/1990, elabora ampla
contextualização, histórica, política e educacional da organização deste ensino.
87
Ensino Superior por meio do numerus clausus35. A prioridade nas propostas do Banco
Mundial era o crescimento econômico e como agência internacional representava os
interesses do capital e não os interesses sociais. A educação sob o olhar dos banqueiros é vista
sob o prisma da economia (STOER, 1986). O resultado dessa abordagem é a centralidade da
eficiência equacionando despesas e resultados que desconsideram o contexto e suas
peculiaridades.
A década de 1980 foi marcada por mais uma alteração no protagonismo educacional
com o retorno da influência da OCDE que vem na contramão das determinações do Banco
Mundial e, no contexto interno, na preparação do terreno para uma nova Lei de Bases que
viria a tornar-se realidade em 1986. Enquanto para o Banco Mundial a prioridade era o Ensino
Superior de curta duração nos politécnicos, para a OCDE o foco estava na formação técnica e
profissional dos jovens e na aquisição das qualificações especializadas industriais a partir dos
quatorze anos, fato que limitava a formação à técnica sem acesso ao ensino superior,
considerada desnecessária sob esse ponto de vista, mas mantendo a mesma lógica do BM. O
desdobramento das recomendações foi o retorno do ensino profissional e técnico-profissional
como propulsor da modernização da economia, o que afeta também a identidade dos Institutos
Politécnicos que alternam a formação entre o Ensino Técnico Profissionalizante e o Ensino
Superior.
O que fica perceptível com o movimento de alternância dos organismos internacionais
na política educacional de Portugal são as novas formas de regulação exteriores, mas que
também ocorrem porque há interesse dos governos locais, tanto referente à reestruturação
quanto ao financiamento que propicia a entrada do país no contexto global. Nesse sentido,
retoma-se os estudos de Ball (2002) quanto ao novo gerencialismo coerente com o projeto de
desenvolvimento global. Este prevê liberalização financeira, disciplina e reforma fiscal e
investimento externo para reorganização do Estado que vai sendo moldado à medida que a
educação se torna uma moeda de troca em que menos é mais. ―Os relatos que os governos dão
em suas reformas fundem, com frequência, novas formas de prestação de serviços com o
trabalho de reconfiguração do sistema, a criação de novas infraestruturas e transações [...]‖
(BALL, 2014, p. 166). Para além das inversões, as redes de interesses fortalecem-se nos
consensos e, internamente, nas instituições, as pessoas vão sendo responsabilizadas pelos
35
―O numerus clausus foi considerado como um importante meio para fazer funcionar o sistema de ensino não
só ―normalmente‖, mas também de ―forma eficiente‖ – procurando ligar directamente o número das entradas no
sistema de ensino com os prováveis lugares no mercado de trabalho ou com as prováveis vagas no sistema
ensino (em termos de instalações existentes).‖ (STOER, 1986, p. 65, grifos do autor).
88
desempenhos sob a ótica de novas formas de controle em uma existência calculada pela
performance.
Nessa lógica, a onda de reformas capitaneadas pelos organismos internacionais,
especialmente pelo Banco Mundial, penetra na vida de todas as nações e, entre elas, os países
pertencentes à Europa e à América Latina, definindo as diretrizes para suas políticas. Como
destacado, ainda que em tempos distintos, no contexto brasileiro, também em Portugal foi
estabelecida a diversificação do Ensino Superior, o encurtamento do tempo nas formações, o
vínculo entre o desenvolvimento econômico e a educação, os discursos de eficiência e
qualidade, as regulações externas e, principalmente, as assessorias técnicas e financeiras como
garantias para a implantação das recomendações nas reformas efetuadas.
3.3 UNIÃO EUROPEIA E PROCESSO DE BOLONHA: AS IMPLICAÇÕES PARA O
ENSINO SUPERIOR EUROPEU
As origens da União Europeia (UE) estão ancoradas na década de 1950 quando, no
período pós-guerra, as nações estavam desgastadas pelas disputas e necessitavam de
estratégias que pudessem fortalecê-las na defesa de interesses comuns (TEODORO, 2003;
ANTUNES, 2005). Esse grupo caracteriza-se por um bloco político e econômico ao qual
pertence, atualmente, a maior parte dos países europeus que, com a união, se tornam mais
fortes para fazer reivindicações e pressões globalmente.
Ao longo do tempo, a UE foi consolidando várias inovações, mas, aqui, destaca-se
uma das apresentadas no Tratado de Maastricht (1992) que é a instituição da cidadania
Europeia. O Tratado concedeu a qualquer pessoa que tivesse nacionalidade de um dos
Estados-Membros o direito de circulação entre os países. Nessa lógica, passa-se de um
domínio econômico para o domínio geral visando aumentar o sentimento de pertença dos
cidadãos à UE (SOARES, 2005). Ou, ainda, conforme Robertson (2009), criando ―mentes‖ e
―mercados‖ na economia da Europa do conhecimento.
Talvez essa inovação da cidadania Europeia seja uma das bases para a mobilidade que
veio a se materializar no Processo de Bolonha que, de modo ambicioso, foi idealizado para
responder aos urgentes desafios sociais, econômicos e educacionais que se apresentavam no
apagar das luzes do século XX. Se até então a Europa vinha conquistando sucesso nos
acordos políticos e econômicos, era chegado o momento de considerar também o alargamento
do campo intelectual, cultural, científico e tecnológico como fator preponderante para o
crescimento social e humano dos cidadãos europeus.
89
O movimento de valorização da circulação dos cidadãos europeus e do papel central
da universidade, nesse sentido, já havia se tornado real na Declaração de Sorbone em 25 de
maio de 1998, criando o Espaço Europeu de Ensino Superior. Em continuidade ao processo,
na Declaração de Bolonha (1999), a centralidade do Ensino Superior estava pautada em três
premissas: necessidade de mudança, adaptação da universidade às novas exigências da
sociedade e avanço científico e tecnológico, que traria competitividade, comparabilidade e
compatibilidade às instituições de Ensino Superior e oportunidades de emprego para os
cidadãos. No entanto, Antunes (2005) destaca o fato de que a Declaração de Bolonha é o
resultado de um processo que já havia iniciando na década de 1980 com a criação de outros
programas de ação de menor envergadura, a exemplo do ERASMUS36
. A autora considera que
o ineditismo se refere ao fato de que, naquele momento, se presenciava ―[...] a constituição
formal e explícita de um nível de governação supranacional como lócus de inscrição das
políticas a desenvolver para os sistemas educativos de formação‖ (ANTUNES, 2005, p. 129).
As principais alterações ocorridas no Ensino Superior Europeu com o Processo de
Bolonha estão sistematizadas na Figura 8 que segue.
Figura 8 - Processo de Bolonha e alterações no Ensino Superior
Fonte: Declaração de Bolonha (1999). Adaptada pela autora para fins de pesquisa.
36
Programa de intercâmbio estudantil criado em 1987.
90
Nessa perspectiva, ao unir competitividade, mobilidade e empregabilidade, a
universidade foi considerada a principal agente de transformação. Isso também traria
profundas mudanças organizacionais que, nas últimas décadas, afetaram a universidade em
todas as dimensões. Essas mudanças estruturais ocorridas no período tornam-se ainda mais
intensas se consideradas na dimensão longitudinal, na qual a história da universidade se
compõe por três grandes períodos. Inicia na Idade Média e perdura sem alterações
significativas até fins do século XVIII quando cedeu lugar às universidades modernas que
perpetuaram o academicismo, a transmissão do saber atendendo aos interesses formativos da
elite.
Esse modelo que perpetuava o isolamento da sociedade resistiu até recentemente
quando ocorreu a transição para o modelo universitário universal que pode ser entendido no
contexto organizacional e de gestão das instituições (MORA, 2001). Essas mudanças
efetivam-se ―[...] alcançando a vasta maioria da população e tornando-se global, isto é, ligada
a outras organizações em todo o mundo, competindo pelos estudantes, pela equipe de ensino e
oferecendo seus serviços no mercado global‖ (MORA, 2001, p. 100, tradução nossa).
As novas relações estabelecidas pelas universidades impactam na forma como
desenvolve os trabalhos da pesquisa ao ensino e as associações que faz com outros setores
para garantir financiamentos e também competitividade. No entanto, é necessário considerar
que essas alterações ocorreram em função de instâncias maiores que a impeliram a trilhar
outros caminhos e que envolve diretamente o currículo, os docentes, os alunos e os
pesquisadores no movimento entre o global e o local.
Nesse contexto, a Declaração de Bolonha representa um projeto do qual fazem parte
cada uma e todas as nações pertencentes à União Europeia, o que requereu a complexa
reestruturação interna dos sistemas educacionais de cada País e das Universidades na
implementação da Declaração para chegar à ―Europa do Conhecimento‖ (UNIÃO
EUROPEIA, 1999). Uma reestruturação de tal envergadura foi acompanhada de intensas
discussões originada, inicialmente, no âmbito da política e, posteriormente, estendida às
universidades, pois estas ingressariam, a partir de então, em um contexto altamente
competitivo que envolvia a necessidade de maior liberdade (HORTALE; MORA, 2004).
Os autores ainda destacam que, ao almejar maior liberdade, as universidades referiam-
se aos problemas enfrentados pelas instituições de Ensino Superior quanto à ―[...] rigidez
estrutural que as impede de atuar adequadamente em um contexto competitivo, porque
carecem de maior liberdade e flexibilidade para planejar, distribuir recursos, contratar
91
professores, fixar regras de admissão de alunos ou definir os cursos‖ (HORTALE; MORA,
2004, p. 947). Essa rigidez organizativa e funcional também é citada por Sousa Santos (1999).
Ao considerar que o prazo inicialmente fixado para a consolidação do Espaço Europeu
de Ensino Superior na Declaração de Bolonha foi o ano de 2010 e que, posteriormente, a
União Europeia reafirmou a necessária renovação da pesquisa e do Ensino Superior na UE,
tanto na reunião de Lisboa em 2000 quanto na reunião de Barcelona ocorrida em 2002, há
evidências do movimento de valorização e o compromisso de incrementar a qualidade e a
competitividade das universidades Europeias. Pautada na racionalização e na padronização de
parâmetros e indicadores, o que se tem como resultado efetivo é o aumento do controle que,
por meio de mecanismos supranacionais, avaliam as políticas educacionais nacionais no
âmbito da formação superior. Como desdobramento, o Ensino Superior passa a ter papel
fundamental, operando tanto na formação de trabalhadores como nas atividades de pesquisa e
desenvolvimento que deverão fornecer novos produtos e processos ao mercado. Conforme
Seixas (2001):
O papel do ensino superior é, por conseguinte, crucial. Não só se exige uma maior
eficiência dos sistemas na formação dos trabalhadores altamente qualificados mas
também na componente de investigação e desenvolvimento. Exige-se do ensino
superior a descoberta de novos produtos e processos necessários para manter a
posição nacional na economia mundial. (SEIXAS, 2001, p. 213).
Entre as metas e os objetivos da Declaração de Bolonha há de compreender-se o que
cada um deles representou e vem representando no contexto da União Europeia e, mais
especificamente, em Portugal, e entre o que foi proposto e o que realmente foi efetivado.
Vários autores vêm acompanhando o desenvolvimento do Processo de Bolonha e seus
impactos no mundo globalizado. Entre eles estão os estudos de Morgado (2009), Cabrito
(2011), Paraskeva (2011), Cardoso et al. (2007), Antunes (2005), Robertson (2009) e Sousa
(2011).
No entanto, a ideia de um mundo globalizado com mais oportunidades e redução de
desigualdades sociais e econômicas, políticas e culturais não tem se efetivado pois a
globalização ocorre em diferentes níveis entre os países e regiões em confronto com grupos
de interesses distintos. Nesse sentido, ―[...] a globalização tem, em muitos casos, contribuído
para tentar ―impor‖ determinados padrões e estilos de vida, para estimular o consumo e a
competição desenfreada entre empresas e trabalhadores [...]‖ (MORGADO, 2009, p. 39,
grifos do autor), o que de certo modo também ocorre com o Processo de Bolonha, provocando
―[...] um processo de europeização das políticas educativas‖ (ANTUNES, 2005, p. 126, grifo
da autora). Por meio das ações e pressões, são legitimadas as intervenções supranacionais
92
criando condições que ampliam seu alcance no contexto da União Europeia, priorizando
políticas nacionais e comunitárias.
Ao consensuar interesses comuns no âmbito da União Europeia, os contextos
nacionais, de modo particular quanto às políticas educacionais, foram forçados a tomar
decisões que comportassem a regulação transnacional atuando em uma ―lógica modelada‖
(MORGADO, 2009), o que não exclui a responsabilidade dos Estados-Membros nos acordos
firmados, pois os Organismos Internacionais são compostos por membros dos Estados com
poder de decisão. Por meio dos acordos firmados em níveis ministeriais, o Estado é redefinido
e o espaço de sua atuação reduzido às implementações técnicas. Há assim uma dupla via entre
as decisões externas e a realidade local com dimensões sociais, culturais, institucionais e
contextos históricos peculiares, criando relações de interdependência que destroem a
diversidade programática em prejuízo da diversidade institucional (AMARAL, 2005). Ao
elaborar uma agenda globalmente estruturada para a educação, essas dimensões ―[...] que
estão no cerne dos sistemas nacionais de ensino superior são cuidadosamente ignoradas e
ocultadas sob afirmações de enaltecimento respeitoso das diversidades e das diferenças‖
(ANTUNES, 2005, p. 133).
No Ensino Superior especificamente, há perda de autonomia, pois, conforme a
universidade vai se ajustando às novas demandas, ela passa a atuar na prestação de serviços
mais centrada na dimensão utilitarista para compensar as reduções de apoio financeiro estatal.
Essa redução na autonomia também reflete no maior controle dos currículos e dos processos
que passam a ter uma necessária equivalência. Nesse movimento, o currículo foi europeizado
uniformizando conteúdos e estruturas que atendem aos interesses econômicos de grupos
dominantes que utilizam a educação como moeda de troca (AMARAL, 2005).
As alterações em curso oscilaram entre os pessimistas e os otimistas e foram vistas
como oportunidades por algumas instituições que aproveitaram para aumentar sua reputação,
acreditando que seus estudantes seriam favorecidos por opções mais amplas no mercado de
trabalho (CARDOSO et al., 2007). Os resultados da pesquisa realizada por Cardoso e seus
colaboradores no ano de 2007, em período de implantação do Processo de Bolonha,
evidenciaram que, até aquele momento, as instituições que já haviam adaptado seus currículos
aos moldes de Bolonha tiveram um impacto positivo com o aumento da demanda de
estudantes potenciais como primeira opção.
Tencionando as relações entre Bolonha e Ensino Superior, Amaral (2005) afirma que
o ponto central não é a criação do Ensino Superior competitivo, mas a competitividade
Europeia, os salários elevados, os resquícios do Estado Providência e a necessidade de
93
competir com outros sistemas educacionais, a exemplo de Estados Unidos e Japão na nova
ordem da economia global. A questão de fundo está centrada nas exigências econômicas
internacionais (CABRITO, 2011; ANTUNES, 2005). Outra importante chamada que Amaral
(2005) faz refere-se à substituição do termo ―emprego‖ por ―empregabilidade‖ que transfere a
responsabilidade para as pessoas e ao mesmo tempo desonera o Estado.
Ao definir o primeiro ciclo curto de estudos, vincula-se necessariamente à sua
relevância em termos de mercado de trabalho. É a pessoa que necessita manter-se empregado
e investir na formação ao longo da vida. Enquanto na graduação há maior financiamento, nos
ciclos seguintes referentes ao mestrado e doutorado há uma acentuada diminuição do auxílio e
um aumento no valor das ―propinas‖37
. Nessa perspectiva, Angus (2015) e Ball (2014)
destacam que as instituições assumem cada vez mais a perspectiva de quase-mercado ao
adotarem abordagens empreendedoras que, ao mesmo tempo, se antecipem e satisfaçam as
expectativas dos consumidores dos produtos educacionais. A centralidade está nas pessoas,
mas de modo dependente do mercado, ou seja, a formação ao longo da vida é para atender ao
mercado.
Adota-se, assim, o modelo conhecido por 3+2+3, ou seja, três ciclos correspondentes
ao Ensino Superior (1º ciclo, 3 anos), ao Mestrado (2º ciclo, 2 anos) e ao Doutorado (3º ciclo,
3 anos), conforme representado na Figura 9.
Figura 9 - Organização do Ensino Superior português conferente de grau após instituição
do Processo de Bolonha
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Vieira (2005) considera que, nessa lógica de organização, a uniformização do número
de anos de estudo seja inevitável ―[...] em cada ciclo em toda a Europa comunitária. Quem
37
Expressão utilizada em Portugal para fazer referência ao pagamento de mensalidades nas instituições.
94
quiser ficar fora dessa ‗moeda pedagógica Européia‘ perderá mais do que o que ganhará‖
(VIEIRA, 2005, p. 104, grifo do autor). Ou seja, negar o consenso construído sob os
argumentos das nações mais influentes significaria ficar à margem, o que no caso português
traria consequências ainda maiores como país periférico que é.
Por outro lado, para Robertson (2009) e Ball (2014), os consensos e as trocas ocorrem
em arenas de negociação nos quais estão inevitavelmente presentes os conflitos e a
competição. Se o vínculo nacional com a globalização é forte, forte também será a pressão
sentida. ―Quanto mais forte é o vínculo de uma nação com a economia global, mais ela vai se
sentir pressionada a ‗saltar na trilha‘ da nova lógica que está sendo produzida‖
(ROBERTSON, 2009, p. 418, grifo da autora).
Para os Institutos Politécnicos inseridos no contexto do Ensino Superior, as exigências
de Bolonha também resultaram nas adequações estruturais que foram realizadas pelas
universidades. Sob o ponto de vista da diversificação do Ensino Superior, os politécnicos são
instituições que possuem maior capacidade de adaptação às demandas do mercado. De acordo
com Mendes (2006), esse perfil formativo dos politécnicos, e entre eles o P.Porto, no processo
de reorganização pós Bolonha, facilitava o cumprimento das alterações, pois ―[...] vindas da
sua experiência de licenciatura bietápica: o bacharelato em três anos passaria a ser designado
como licenciatura, e o ano suplementar transformar-se-ia em dois conducentes a mestrado‖
(MENDES, 2006, p. 5).
Em recente pesquisa sobre as alterações de Bolonha em uma das unidades
pertencentes ao P.Porto, Sousa (2011) concluiu:
No subsistema ensino politécnico [...] ao contrário do ensino universitário, faz todo
o sentido que seja visada a aplicação imediata dos conhecimentos no âmbito de uma
entrada rápida no mercado de trabalho. Neste ponto, o Processo de Bolonha deveria
ser encarado como uma oportunidade de fazer mais e melhor, recusar uma reforma
cosmética e empreender numa cultura de aprender a aprender. (SOUSA, 2011, p.
444).
A ―reforma cosmética‖ a que a autora faz referência é no sentido da necessária
mudança de atitude em relação à prática por parte dos docentes. Essa dimensão extrapola os
requisitos formais e está vinculada ao estabelecimento de condições estruturais que permitam
o desenvolvimento das habilidades pelos alunos e das atividades pelo professor. ―Quando as
condições não existem, parece ser mais fácil para os docentes adoptarem uma atitude de
resistência e desmotivação, gerando-se, assim, meramente procedimentos adaptativos‖
(SOUSA, 2011, p. 444).
Para além dos achados de Sousa, de modo geral, entre a implantação e o
desenvolvimento do Processo de Bolonha, pode-se perceber que há desafios ainda presentes
95
como os citados por Cabrito (2011), a exemplo da equidade, da perspectiva de aprendizagem
ao longo da vida e do financiamento do Ensino Superior. Os estudos de Cabrito (2011) e de
Cardoso et al. (2007) revelam que o Ensino Superior português, nos últimos trinta anos,
vivencia situações bem distintas que vão desde o crescimento explosivo de matrículas durante
os anos de 1990 até o decréscimo acentuado iniciado a partir dos anos de 2000. Esse
movimento está diretamente relacionado à queda demográfica portuguesa que implica a
redução do número de matrículas na Educação Básica, agravada pelo abandono após
cumprida a escolaridade obrigatória. Sobre esse aspecto, um dos gestores entrevistados
destacou: “A taxa de natalidade é fraca e agora começa a aumentar, portanto, dessa
maneira, a procura decaiu”, referindo-se ao Ensino Superior.
O quadro de redução da procura dos estudantes pelo Ensino Superior levou a uma
outra estratégia que visa alcançar os jovens maiores de 23 anos, que, no caso português,
ocorreu por meio do Decreto-Lei Nº 64/2006, em resposta ao Comunicado da Comissão
Europeia ao Parlamento Europeu sobre a Agenda de Modernização das universidades,
incluindo ensino, investigação e inovação. O objetivo central dessa ação pautou-se na
ampliação do acesso a outros públicos que não frequentaram o Ensino Superior na idade
adequada. Para o ingresso, faz-se necessário realizar prova presencial, apresentar o currículo
conforme o modelo europeu (Europass CV) e submeter-se à entrevista demonstrando
capacidade de frequentar com sucesso esse nível de ensino. Ao considerar as experiências e as
habilidades formativas e profissionais, vincula-se diretamente a aprendizagem ao longo da
vida.
Ao privilegiar a mobilidade estudantil, surgiu a necessidade de criar mecanismos de
equiparação para validação dos créditos. O instrumento utilizado foi European Credit
Transfer System (2003) que prevê a uniformização das unidades expressas em créditos
vinculados às horas de trabalho do aluno (60 ECTS por ano letivo) representando as
competências adquiridas, e não do professor como usualmente vinha sendo realizado.
Ao fazer referência à mobilidade, um dos gestores entrevistados afirmou: “[...] com o
Processo de Bolonha, necessariamente, as instituições, para que seja possível favorecer a
mobilidade de alunos e docentes dentro do espaço europeu, com o reconhecimento
automático dos cursos, estão associadas às exigências em termos de avaliação. Portanto,
digamos que, em Portugal, como em qualquer país europeu, o estarmos associados a essas
possibilidades de mobilidade significa o estar associado a um processo que tem que ser
reconhecido na avaliação das instituições ou dos cursos, para que, evidentemente, em cada
país, eu me sinta perfeitamente sossegado quando reconheço a formação que foi realizada em
96
qualquer um dos outros 27 países da Europa, da União Europeia. Digamos que a avaliação,
em qualquer país da União Europeia, está reforçada por esta questão da mobilidade dentro
do espaço europeu e do reconhecimento automático dos cursos feitos no espaço da União
Europeia, uma grande conquista europeia, esse reconhecimento, digamos, automático das
formações que são feitas” (S1).
As consequências da globalização estão vinculadas às políticas e estas se revelam no
que Ozga (2000) nomeia como ―economização da educação‖, realocando-a no mercado de
trabalho. À medida que se reconfigura o capital global, ocorrem o redesenho da política e a
reestruturação do papel da educação nas sociedades sob a batuta de orientações prescritivas
dos governos. Nessa óptica, as funções de gestão assumem alta relevância, baseadas em
produtos porque são eles que suprem a necessidade dos mercados (BALL, 2014).
A política educacional também é utilizada para satisfazer interesses para além dos
Estados e prevê o aumento de sua eficiência e utilidade no mercado. ―A privatização da coisa
pública está a fazer-se em ritmo esfuziante. As ‗parcerias‘ público-privado, onde o público
perde e o privado lucra, encontram-se em marcha acelerada.‖ (CABRITO, 2011, p. 20, grifo
do autor). Nesse movimento, as estratégias da globalização atingem irremediavelmente as
relações entre a sociedade e o ensino superior (PARASKEVA, 2011). ―Se estabelece um
conjunto de várias articulações e apoios concretos, uma poderosa e extensa formação
discursiva que exerce diferentes influências sobre os processos da reforma pública.‖ (BALL,
2014b, p. 3).
As medidas políticas que vêm sendo implantadas pelas Nações após a Declaração de
Bolonha estão indo ao encontro da privatização da educação. E, nesse processo, o ensino
superior público é compelido a buscar formas alternativas de diversificação do financiamento,
além de produzir conhecimento para o mercado e situar o aluno como um cliente que paga
pelos serviços oferecidos como uma consequência do elevado desinvestimento do Estado
(CABRITO, 2011; PARASKEVA, 2011).
Quanto às alterações curriculares, o fato de reduzir-se o tempo do primeiro ciclo de
cinco para três anos modifica também substancialmente o caráter formativo, que passa a ter
ênfase muito mais profissionalizante. Com essas alterações, as discussões epistemológicas
sofreram considerável redução e cederam lugar às discussões mais diretamente vinculadas ao
exercício da profissão que atendem ao utilitarismo. No atual sistema, a equidade, ―figura de
retórica do discurso político‖ (CABRITO, 2011, p. 20), tanto a institucional como a
individual, está altamente prejudicada. Nas instituições, dependendo da área de atuação, há
maior ou menor proximidade com o mercado e a capacidade de captar recursos. A título de
97
exemplo podem ser citados os cursos das áreas de humanidades, linguística, filosofia entre
outros que deixam de ser ofertados por não se mostrarem economicamente viáveis. No plano
individual, os extratos sociais com maior carência econômica tendem a abdicar do Ensino
Superior pelo fato de terem que pagar o que situa este nível de educação no campo das elites
(CABRITO, 2011; PARASKEVA, 2011).
Por outro lado, as reduções quanto ao nível de currículo e duração dos cursos
acarretam formas de diferenciação, pois não foram implementadas em todas as áreas. Há
aqueles, a exemplo de Medicina, que continuam a ter cinco anos de duração no primeiro ciclo
e tendem a ter mais prestígio gerando diferenciações entre docentes e discentes
(PARASKEVA, 2011).
No entanto, conforme Cabrito (2011), a expectativa dos resultados esperados quanto
ao ingresso precoce dos jovens recém-formados no mercado de trabalho não tem se
confirmado, pois, em tempos de recessão econômica, as vagas acabam sendo destinadas aos
que possuem maior qualificação. Como forma de responder a essas exigências do mercado
laboral, mais de 90% dos jovens que terminam o 1º ciclo ―[...] prosseguem estudos para a
obtenção do segundo ciclo‖ (CABRITO 2011, p. 21). A mobilidade acadêmica é considerada
ponto positivo, pois abre possibilidades de cursar o segundo ciclo em áreas distintas do
primeiro ciclo, o que agrega no momento de competir pelas restritas vagas laborais.
Entretanto, se a mobilidade acadêmica foi incentivada pela adoção da comparabilidade
entre os sistemas de crédito, o que deixa os sistemas mais transparentes, os estudos de
Cardoso et al. (2007) alertam sobre algumas controvérsias do processo quanto aos currículos
que têm frequentemente sido interpretados como uma versão comprimida de programas
formativos mais extensos. Essas ações trazem como consequência o pouco tempo para que o
aluno assimile os conteúdos constantes da grade curricular o que compromete o processo de
formação.
Entres avanços e desafios no período pós Bolonha, Paraskeva (2011) destaca:
É por demais evidente, perante as estatísticas, que o ensino superior em Portugal
segue seguindo um espaço de segregação, não deixando todavia de revelar um
paradoxo. Ou seja, pese embora seja inquestionável que a vasta maioria dos
escolarizados não atinge o ensino superior, não deixa também de ser verdade que
uma percentagem substantiva dos que terminam o ensino superior não conseguem
encontrar trabalho — dependendo dos cursos, esta realidade atinge a esmagadora
maioria dos recém-formados. (PARASKEVA, 2011, p. 246).
Para além do que foi até aqui discutido, a afirmação do autor tenciona as relações entre
o acesso ao Ensino Superior, que, nesse caso, continua servindo às elites e, por outro lado,
não consegue garantir postos de trabalho aos recém-formados. Como consequência da
98
realidade apresentada, duas alternativas estão se fortalecendo entre os estudantes: ou
continuam seus estudos até o doutoramento, ou optam por deixar o país na busca pelo
emprego em outros países europeus e, até mesmo, em outros continentes.
A segunda opção ocasiona a temida fuga de cérebros, uma realidade que, em muitos
países da Europa, em Portugal especificamente, vem se mostrando forte. Ao terminarem os
ciclos de estudos, se não há postos de trabalhos disponíveis para absorver a mão de obra, a
saída apresenta-se como uma possibilidade de conquistar outros mercados.
No próximo capítulo, o foco será na compreensão da constituição da identidade dos
Institutos entre o movimento do que eram e do que passaram a ser, a partir das diretrizes da
política para o Ensino Superior estabelecida nos dois países.
99
4 A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DOS INSTITUTOS NO BRASIL E EM
PORTUGAL: MOVIMENTOS DA POLÍTICA
Identidade é [...] resultado a um só tempo estável e provisório,
individual e coletivo, subjetivo e objetivo, que, conjuntamente,
constroem os indivíduos e definem as instituições.
(DUBAR, 2005, p. 136).
Inicio este capítulo com as contribuições de Dubar acerca da identidade, por entender
que há um movimento contínuo entre os âmbitos institucional e pessoal na definição da
identidade. Dito isso e considerando que as políticas globais de acordo com as discussões do
capítulo anterior influenciam a elaboração das políticas locais e afetam a construção da
identidade, neste capítulo meu objetivo é compreender no contexto das políticas para o Ensino
Superior a constituição da identidade do IFC no Brasil e do P.Porto em Portugal.
Além disso, o direcionamento das políticas ao privilegiar determinados campos de
atuação impactam e alteram a matriz de constituição e de identidade das instituições, que,
muitas vezes, após serem pensadas e criadas para atender demandas específicas, são alteradas
passando a atuar em outros campos. Essas alterações impactam de modo acentuado na
organização dos Institutos, objeto deste estudo, tanto no Brasil quanto em Portugal.
4.1 A MATRIZ DE CONSTITUIÇÃO DO IFC: FORMAÇÃO TÉCNICA E FORMAÇÃO
TECNOLÓGICA
A necessidade de compreender o contexto situacional (BALL; MAGUIRE; BRAUN,
2012), isto é, a trajetória das instituições envolvidas no processo de transição de Colégios
Agrícolas e Escolas Agrotécnicas para instituições de ensino superior - IFC – impulsionou-me
na busca de documentos que, como registros vivos da história, possibilitassem conhecer quais
eram seus objetivos, qual era sua função social, ou, ainda, qual era sua matriz identitária.38
No caso dos Colégios Agrícolas de Camboriú e Araquari (Colégio Agrícola Senador
Gomes de Oliveira), como ambos eram vinculados à Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), os Regimentos Internos com redação idêntica, após deliberação do Conselho
38
O processo de busca de certo modo foi impactante para esta pesquisadora, pois, ao contatar as Chefias de
Gabinete dos cinco campi, objetos de estudo desta pesquisa, após vários contatos telefônicos e troca de e-mails,
não foram encontrados nos arquivos, registros dos Regimentos Internos anteriores ao ano de 2008. Parecia que a
história havia sido apagada ou, então, no mínimo esquecida. Na maioria dos campi consultados, os funcionários
novos não localizaram tais documentos e por desconhecerem a história tecida antes do IFC foi necessário
recorrer ao Departamento de Recursos Humanos para localizar antigos funcionários que conheciam a existência
dos documentos, o que foi de grande auxílio, pois, em um dos campi, havia cópias pessoais dos Regimentos
Internos. Após conversas informais com esses funcionários e sabendo que existia um documento norteador das
ações em ambas as instituições, realizei pesquisa na Imprensa Nacional e no Arquivo Central da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), nos quais obtive os documentos que procurava.
100
Universitário (Resolução Nº 092/Cun/88), foram aprovados pelo Reitor em 5 de dezembro de
1988, por meio da Portaria Nº 1.155/GR/88.39
De acordo com o documento analisado, o regime didático pedagógico adotado nos
colégios era o seriado anual e a finalidade a de ministrar
[...] o Ensino de 2º grau profissionalizante (Curso Técnico em Agropecuária e
ainda os Auxiliares Técnicos ou Supletivos, bem como os Cursos de
Aperfeiçoamento, Habilitações e Reciclagens), visando atender às necessidades do
mercado de trabalho, observando a legislação vigente para cada caso. (UFSC,
1988, p. 2, grifos nossos)40
.
O objetivo geral da formação nos colégios era
[...] proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas
potencialidades, como elemento de auto-realização, qualificando-o para o trabalho e
preparando-o para o exercício consciente da cidadania: a) Formativo: proporcionar o
crescimento humano, intelectual e psicológico do aluno, por meio de atividades que
desenvolvam suas potencialidades criativas e intelectuais, através do cumprimento
curricular do núcleo comum; b) Formação Profissional: desenvolver no educando
habilidades profissionais, por meio de estudos técnicos e práticos; c) Sócio-
Econômico: formar Técnicos Agrícolas para atender ao desenvolvimento da
agropecuária, formando profissionais de nível médio em agropecuária; d) Servir
de campo de observação, pesquisa, experimentação, demonstração e aplicação
de métodos e técnicas de ensino à Comunidade Universitária. (UFSC, 1988, p. 3,
grifos nossos).
Merece destaque o fato de que, na matriz de constituição, os colégios agrícolas
destinavam-se prioritariamente à formação profissional de técnicos agrícolas, de nível médio,
com ênfase nos estudos técnicos e práticos. Serviam como campo de observação, pesquisa,
experimentação, demonstração e aplicação de métodos e técnicas de ensino à Comunidade
Universitária, o que os situava como laboratórios de pesquisa para as universidades aos quais
estavam vinculados. Evidencia-se, assim, a existência da pesquisa para as universidades e não
para os técnicos que deveriam dominar conhecimentos técnicos e práticos o que os situa como
―[...] indivíduo executor de atos técnicos‖ (PINTO, 2013, p. 181). Seu lugar não é o de criador
do método ou de instrumento, mas aquele que executa a prescrição de outro, que, nesse caso,
poderia ser considerado como aquele que aplica os resultados das pesquisas produzidas nas
universidades. A formação tecnológica não era mencionada e os Regimentos Internos
raramente eram alterados.
39
Em um Colégio Agrícola foi localizada uma versão de Regimento Interno (cópia pessoal de um funcionário)
referente à década de 1990, após a LDB Nº 9.394/1996. Contudo, essa versão não foi localizada nos arquivos da
UFSC, nem a Resolução de aprovação, o que pode ser interpretado como uma versão que foi produzida, mas não
aprovada. 40
Documento intitulado Pesquisa Regimento Interno Colégio Agrícola, enviado à pesquisadora por e-mail em 1
de abril de 2016, pelo Arquivo central da USFC ([email protected]).
101
Para as Escolas Agrotécnicas Federais foi o Decreto Nº 2.548, de 15 de abril de 1998,
que aprovou o documento base dos seus Regimentos Internos, fixando o prazo de sessenta
dias para aprovação do regimento de cada instituição pelo então Ministro da Educação. Nesse
documento base, estavam explícitas as finalidades:
I - oferecer educação tecnológica com vistas à formação, qualificação,
requalificação e reprofissionalização de jovens, adultos e trabalhadores em geral,
nos vários níveis e modalidades de ensino, para os diversos setores da economia,
especialmente nos da agricultura e agroindústria, II. realizar pesquisas
tecnológicas e desenvolver novos processos, produtos e serviços, em articulação
com setores produtivos, especialmente os da agricultura e agroindústria e a
sociedade em geral; III - desenvolver estratégias de educação continuada. (BRASIL,
1998, p. 3, grifos nossos).
Tendo como base o texto do Decreto supracitado, foram publicados no Diário Oficial
os Regulamentos Internos de cada uma das três escolas: Santa Rosa do Sul, Concórdia e Rio
do Sul em setembro de 1998. Os Regimentos produzidos pelas Escolas Agrotécnicas em
questão foram publicados com textos similares ao documento norteador, com pouquíssimas
alterações que mantinham as finalidades previstas no documento base.
As Escolas Agrotécnicas de Santa Rosa do Sul, Rio do Sul e Concórdia foram também
criadas em tempos históricos distintos conforme descrito na metodologia. Enquanto Santa
Rosa do Sul e Rio do Sul iniciaram suas atividades na década de 1990, a de Concórdia foi
instituída como Ginásio Agrícola em 1965 e somente passou a denominar-se Escola
Agrotécnica em 1979. As três Escolas foram transformadas em autarquias pela Lei Nº 8.731,
de 16 de novembro de 1993, ou seja, em momento anterior à criação do Sistema Nacional de
Educação Tecnológica – Lei Nº 8.948 ocorrida em 1994, o que também alterou sua
identidade.
Com a publicação da referida Lei (Art. 1º, § 2º), a finalidade do Sistema Nacional de
Educação Tecnológica era favorecer a ―[...] articulação da educação tecnológica, em seus
vários níveis [...] visando o aprimoramento do ensino, da extensão, da pesquisa tecnológica,
além de sua integração aos diversos setores da sociedade e do setor produtivo‖ (BRASIL,
1994, p. 18882).
A análise dos Regimentos Internos dos dois grupos de instituições que, nos anos de
2000, viriam a transformar-se em IFC indica que, na sua origem, cada grupo estava voltado a
itinerários formativos, finalidades e identidades distintas. Enquanto umas serviam de campo
para as pesquisas realizadas pelas universidades, as outras tinham por finalidade a realização
de pesquisas tecnológicas. No entanto, o vínculo maior do perfil formativo, a expertise, era o
que se aproximava da indústria e da agricultura. Ao se unirem em uma única instituição, sua
102
natureza tornou-se ainda mais complexa, porque as formas organizacionais passaram a ser
regidas por um outro módus operandi, como será discutido na sequência desta tese.
Na Proposta Conjunta (IFET, 2008), elaborada em março de 2008 pelas cinco
instituições e submetida à Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, em momento
anterior à transição, é possível observar, conforme a Tabela 7 organizada com informações
constantes naquele documento, o número de docentes, técnicos administrativos e alunos de
cada uma das instituições.
Tabela 7 - Quadro de docentes, técnicos administrativos e alunos das Escolas Agrotécnicas Federais e Colégios
Agrícolas vinculados à proposta prévia para constituição do IFC
Instituição Docentes Técnicos
administrativos
Total de
servidores
Total de
alunos
Escola Agrotécnica Federal de Santa Rosa do Sul 36 72 108 863
Escola Agrotécnica Federal de Rio do Sul 51 56 107 605
Escola Agrotécnica Federal de Concórdia 37 67 104 1121
Colégio Agrícola de Camboriú 41 43 84 873
Colégio Agrícola de Araquari 25 26 51 545
Total 190 264* 454 4007
Fonte: Elaborada pela autora com base na Proposta para Constituição do IFC (2008).
Observação: * Quanto à formação, do total de 264 técnicos administrativos, 159 (60,22%) tinham a formação de
nível médio.
Na Tabela 7, pode-se observar que havia equilíbrio entre o número de técnicos
administrativos e o número de docentes em três das unidades – Rio do Sul, Camboriú e
Araquari. Nas Escolas Agrotécnicas de Santa Rosa do Sul e Concórdia, o número dos técnicos
administrativos era superior, correspondendo a 66,67% e 64,42% do total de servidores,
respectivamente, o que também é um indício da maior concentração nas atividades técnicas.
Quanto à formação dos docentes, os quantitativos eram distribuídos como mostra a Tabela 8.
Tabela 8 - Número de docentes efetivos por nível de formação nas Escolas Agrotécnicas Federais e Colégios
Agrícolas vinculados à proposta prévia de composição do IFC
Instituição Graduação Especialização Mestrado Doutorado Total
Esc. Agrotéc. Fed. de Santa Rosa do Sul 3 10 20 3 36
Esc. Agrotéc. Fed. de Rio do Sul 2 7 37 5 51
Esc. Agrotéc. Fed. de Concórdia 0 12 23 2 37
Colégio Agrícola de Camboriú 6 9 20 6 41
Colégio Agrícola de Araquari 2 6 14 3 25
Total 13 44 114 19 190
Fonte: Elaborada pela autora com base na Proposta para Constituição do IFC (2008).
Observação: Na tabela original, havia um professor pós-doutor no Colégio Agrícola de Camboriú. Nesta tabela,
ele está inserido na coluna de doutorado.
103
Quanto à formação, na Tabela 8, pode-se constatar a predominância de professores
mestres (60%), com número reduzido de doutores (10%) em todas as instituições. Os
especialistas representavam 23,16% e os graduados 6,84%. Essa disparidade pode ser
justificada pela tipologia dos cursos oferecidos. Até aquele momento (2008), dos 34 cursos
oferecidos, havia somente um curso superior em andamento em uma Escola Agrotécnica
Federal. A maioria dos cursos era de nível médio / técnico, concomitante ou subsequente, o
que caracteriza uma vocação institucional e identitária vinculada à formação técnica, embora
pudesse ser oferecida a formação tecnológica.
Considerando os delineamentos das políticas voltadas à educação nas décadas de 1980
e 1990, quanto à preparação de mão de obra para ser absorvida no mercado de trabalho, os
cursos técnicos nas redes federais eram, por um lado, reconhecidos pela qualidade e, por
outro, atendiam à formação básica e célere que estava indiretamente prescrita pelas
recomendações dos organismos internacionais. A formação, conforme enfatizado no capítulo
3, estava cindida e diferenciada entre os níveis básico, técnico e tecnológico.
4.1.1 O IFC no contexto de criação e expansão da Rede de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica
A constituição de uma única Rede distribuída em grande parte do país tendo como
ponto de partida as instituições que historicamente ofereciam educação profissional esteve
presente na agenda política do governo Lula. Ao articular Educação Básica e Profissional com
estruturas multicampi e pluricurriculares na oferta de educação profissional e tecnológica,
houve mudança no perfil das instituições e, consequentemente, em sua identidade, em relação
à estrutura que vinha sendo desenvolvida nos governos anteriores e nos documentos
institucionais que até então eram os Regimentos Internos.
No entanto, no escopo de análise, necessário faz-se considerar que, ao retomar o
diálogo sobre a expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica,
algumas direções tomadas pelo Governo Federal são essenciais para compreender o
movimento desenhado. Se, por um lado, as ações romperam com o ritmo acelerado das
privatizações; por outro, ocorreu o que Mancebo (2004) denomina de privatizações indiretas
pelas parcerias público-privadas. Houve mudança na perspectiva, mas não seu rompimento,
em grande medida pela proposta de ações sociais serem a mola mestra do governo do
Presidente Lula. Ao injetar dinheiro público no financiamento da expansão e interiorização da
rede federal e, consequentemente, do Ensino Superior, criou-se a expectativa para que as
pessoas que, até então, não tinham acesso aos cursos técnicos, tecnológicos e superiores,
104
pudessem adquirir as bases formativas para ingresso no mercado de trabalho, melhorando as
condições de vida.
Se o discurso inicial posto em prática parecia dar conta de algumas questões, logo
surgiram outras de complexa solução. À medida que as unidades foram sendo instaladas,
algumas em locais de difícil acesso, vieram à tona outros problemas, a exemplo da dificuldade
de acesso, de transporte, tanto para professores e corpo técnico administrativo quanto para
alunos - situação encontrada também no IFC que possui, por exemplo, unidades instaladas no
interior de assentamentos. A disponibilidade de matrícula existe, mas as condições de
permanência e sucesso tornam-se uma equação difícil de resolver, o que, de certo modo,
acarreta um novo processo de exclusão para os alunos e dificuldades na fixação de
professores e técnicos administrativos.
A reengenharia da aproximação entre a rede federal e a universidade foi sendo
delineada com novos dispositivos legais. Em 2006, o Decreto Nº 5.773, ao dispor sobre o
exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de Educação
Superior, cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino,
posicionou igualmente as funções da Secretaria de Educação Superior e da Secretaria de
Educação Profissional e Tecnológica, indicando um movimento de aproximação entre as duas
secretarias.
Considera-se, aqui, o ano de 2007 decisivo para a implantação da atual Rede, pois, por
meio do Decreto Nº 6.095 (BRASIL, 2007b), foram estabelecidas as diretrizes para o
processo de integração das instituições federais de educação tecnológica, para fins de
constituição dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFET), no âmbito da
Rede Federal de Educação Tecnológica.
Logo em seu Artigo 1º, § 2º havia a indicação de que a identidade dos institutos seria
alterada substancialmente:
Os projetos de lei de criação dos IFETs considerarão cada instituto como instituição
de educação superior, básica e profissional, pluricurricular e multicampus,
especializada na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes
modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e
tecnológicos às suas práticas pedagógicas, nos termos do modelo estabelecido neste
Decreto e das respectivas leis de criação. (BRASIL, 2007b).
O fato de considerar cada instituto como instituição de ensino superior especializada
na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, ainda
que essa etapa fosse a fase embrionária do que viriam a se tornar os institutos, é um indicativo
formal da alteração identitária.
105
Ainda nesse mesmo Decreto, outro indicativo que estava vinculado à mudança
estrutural e didático-pedagógica dos institutos era a exigência referente à obrigatoriedade da
elaboração do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) integrado após a celebração do
acordo. As exigências na elaboração do PDI estavam vinculadas à vocação institucional e
acadêmica.
A vocação institucional deveria contemplar, entre outras, ações referentes à oferta da
educação profissional e tecnológica para: formação de profissionais dos diversos setores
produtivos, como processo educativo e investigativo na geração de produtos e soluções com
base empírica, programas de extensão e pesquisa aplicada. No plano acadêmico,
especialmente em nível superior, a oferta de cursos de graduação de natureza tecnológica, de
licenciatura para formação de professores da Educação Básica, de Pós-Graduação lato e
stricto sensu “preferencialmente de natureza profissional‖, em conformidade às demandas
locais e regionais (BRASIL, 2007b).
A agregação das instituições à Rede, conforme Decreto, seria ―voluntária‖ com
aprovação pelos órgãos superiores de gestão das instituições envolvidas. Como pode ser
observado, as bases para a Lei de criação dos Institutos Federais estavam lançadas, inclusive
quanto a sua equiparação às universidades na regulação, na avaliação e na supervisão das
instituições e cursos da Educação Superior. A Pós-Graduação também estava prevista, tanto
no lato como no stricto sensu. No entanto, não estavam previstos os desdobramentos quanto à
implantação de tais cursos e programas, a exemplo das dificuldades do IFC em aprovar as
propostas dos novos cursos na CAPES. As dificuldades referenciadas aqui são aquelas
vinculadas aos mestrados em rede que se utilizam da colaboração de profissionais de diversos
campi na perspectiva interdisciplinar e as referentes aos quantitativos de produção científica
dos docentes conforme discussões nos próximos capítulos.
Olhar para os documentos observando a prática discursiva oficial orientadora das
ações de criação da Rede em curso não nos dá a dimensão do real significado de sua tradução
na prática e nas ações cotidianas daqueles que participaram do processo. Esse exercício foi
desenvolvido por Ortranto (2010) ao pesquisar41
sobre as primeiras ações efetivadas com o
objetivo de implantação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia em toda a
extensão do território nacional. As constatações da pesquisadora revelam que, apesar do
41
A amostra foi composta por 35 instituições de educação profissional que avaliaram a opção da transformação
em IFET, sendo 15 Escolas Agrotécnicas Federais (EAF), 9 Centros Federais de Educação Tecnológica
(CEFET), e 11 Escolas Vinculadas às Universidades Federais (EV), abrangendo todas as regiões do Brasil, em
20 estados da federação. Procurou-se levantar os principais motivos apresentados pelas instituições para a
tomada de decisão a favor ou contra a transformação em IFET, e os posicionamentos dos Conselhos que as
representam, contidos nos documentos de 2007. (ORTRANTO, 2010, p. 1).
106
Decreto Nº 6.095/2007 prever o ingresso voluntário das instituições à Rede, não foi
exatamente o que aconteceu. As instituições foram ―surpreendidas‖ com a publicação do
Decreto. Essa nova determinação governamental logo gerou questionamentos e
argumentações diferenciados em cada grupo, colocando novos atores nas negociações.
Estavam em jogo dois divisores de águas: de um lado a política pública que alterava a
identidade de instituições; e, do outro, as resistências assentadas sobre as peculiaridades
organizativas, culturais, administrativas e pedagógicas de cada instituição. A SETEC tentava
responder por meio do discurso oficial, indicando possíveis sanções à não adesão às diretrizes,
a exemplo da redução do orçamento. Como as dúvidas e as resistências por parte de algumas
instituições continuavam, no final de 2007, foi lançada a Chamada Pública MEC/SETEC Nº
002/2007 (BRASIL, 2007a).
Essa Chamada Pública tinha ―[...] por objeto a análise e seleção de propostas de
constituição de Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFETs‖ (BRASIL,
2007a, p. 2). Esclarecia sobre a elegibilidade dos proponentes, as características que deveriam
conter as propostas, forma de apresentação e processo de seleção, estabelecendo prazo de 90
dias para adesão com envio das propostas e resultado da seleção, previsto em 31 de março de
2008 (BRASIL, 2007a). Nos anexos, constava uma tabela com o quantitativo máximo de
IFETs por unidade da federação, prevendo a instalação de dois IFETs em Santa Catarina,
além da minuta do Projeto de Lei de Criação dos Institutos. De fato, essa previsão confirmou-
se, pois, hoje, há dois Institutos em Santa Catarina: o Instituto Federal Catarinense (IFC) e o
Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC). Ao todo, no anexo, eram 27 Estados, tendo a
maioria deles previsão de instalação de um único instituto. As exceções eram Minas Gerais
(4), Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul (3), Bahia, Goiás, Pernambuco, Santa Catarina (2)
(BRASIL, 2007a).
As razões pelas quais cada grupo de instituições foi aceitando a ideia da alteração
esteve respaldada por diferentes interesses. Por sua vez, as Escolas Agrotécnicas Federais
(EAFs) viram a possibilidade de transformação em Centros Federais de Educação
Tecnológica (CEFETs) ampliando a ―[...] autonomia e ascensão à categoria de instituição de
educação superior‖ (ORTRANTO, 2010, p. 3). Os CEFETs, que já haviam conquistado esse
patamar, logo sonharam em ―[...] chegar a ser, um dia, uma universidade tecnológica, a
exemplo do que havia acontecido com o CEFET do Paraná‖42
(ORTRANTO, 2010, p. 7).
42
Quanto a oferta de Ensino Superior, sua história iniciou no final da década de 1970, e nas décadas de 1980 e
1990 criou Programas de Pós-Graduação. Em 1998, apresentou um projeto de transformação da instituição em
107
Nessa perspectiva, concorda-se, aqui, com Ball, pois internamente também existe a
rede de interesses nas quais os consensos vão se fazendo presentes e pactuando algumas
condições que permitem a participação de novos e velhos atores, na possibilidade de obter
vantagens. Nesse caso, a ascensão para um nível mais elevado, buscando maior
reconhecimento social. Esse movimento evidencia o que Ball (2013) denomina de
negociações que ocorrem no interior das instituições e entre os diversos grupos na defesa de
interesses em disputas de poder, influência e reconhecimento.
Em decorrência do processo iniciado com o Decreto Nº 6.095/2007, seguido pela
Chamada Pública MEC/SETEC Nº 002/2007, a Lei Nº 11.892, de criação dos Institutos
Federais, foi sancionada em 2008 e representou a expressão maior da articulação política do
Governo Federal. Ao instituir a Rede de Educação Profissional, Científica e Tecnológica,
além de reorganizar as unidades existentes e implantar outras novas em locais até então
desprovidos de oportunidades de formação profissional e tecnológica, oportunizou que muitos
tivessem acesso aqueles níveis de ensino, com significativa contribuição na ampliação do
ingresso, especialmente no Ensino Superior.
Ainda que tenha sido de grande avanço ao formar a gigante Rede de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica, é impossível perder de vista o Documento do BM
(1994) com as recomendações sobre a diversificação do Ensino Superior. Sob esse ponto de
vista, os IFs atendem perfeitamente às pretensões colaborando com o aumento de matrículas
nesse nível de ensino e, ao mesmo tempo, coesos com o discurso de melhoria da qualidade de
vida da população que vive em seu entorno, por meio dos arranjos produtivos locais. Na Lei
de criação dos Institutos, os artigos 6º e 7º, ao tratar das finalidades e das características,
chamam a atenção para a necessidade de desenvolver pesquisa aplicada e a formação de
profissionais para os diferentes setores da economia, marcando aproximação com os setores
produtivos e a sociedade civil (BRASIL, 2008b).
É nesse cenário que a criação da Rede de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica vem trazendo desdobramentos e implicações para a construção da nova
identidade, a exemplo do Instituto Federal Catarinense (IFC) que, até então, na qualidade de
Escola Agrotécnica e Colégio Agrícola, não tinha tradição em curso superior, nem inserção na
Pós-Graduação. Para cada grupo formado, consideradas suas peculiaridades, os desafios
também são particulares, pois em alguns casos as instituições já estavam familiarizadas com o
Ensino Superior e a Pós-Graduação. Nesse contexto, os antigos CEFETs são a expressão
Universidade Tecnológica. Em 2005, o CEFET-PR foi transformado em Universidade Tecnológica Federal do
Paraná – UTFPR. (Informação retirada do site institucional).
108
máxima que representam as diferenças organizacionais e de foco de atuação. Enquanto alguns
estavam vinculados ao ensino agrícola, outros se dedicavam aos cursos técnicos na área de
informática e, de certo modo, já praticavam a verticalização.
A mudança de identidade traz também o ônus da ascensão ao ser equiparada às
universidades. Essa Rede passa a responder aos mesmos critérios e indicadores de avaliação
empregados nas avaliações externas da graduação realizadas pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). À medida que os cursos de
Graduação são avaliados, é necessário atender a critérios de exigência, como a elaboração do
Plano de Desenvolvimento Institucional, laboratórios, acessibilidade, acervo de livros na
biblioteca, formação pedagógica e acadêmica docente. As avaliações são complexas e
envolvem visitas in loco considerando, conforme o Instrumento de Avaliação de Cursos de
Graduação Presencial e a Distância (INEP, 2015), as dimensões da organização didático-
pedagógica, corpo docente, infraestrutura, tanto para autorização de cursos, quanto para
Reconhecimento e Renovação de Reconhecimento de Curso.
Ainda sobre a avaliação, o fato de serem equiparados às universidades e necessitarem
desenvolver atividades de ensino, pesquisa e extensão, com implantação de cursos de Pós-
Graduação lato e stricto sensu os submete às regras de avaliação da CAPES em processos
novos, até então desconhecidos. Há implícito um jogo de poder tanto entre quem determina as
políticas no âmbito nacional, como entre aqueles que traduzem tais políticas no contexto da
prática. Essa tradução envolve estratégias, enactments, nos quais os atores buscam solucionar
os problemas impostos por contextos maiores e problemas impostos pelas redes de poder no
interior das próprias instituições (BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012). Ao fazer o movimento
entre o macro e o micro contexto, da prática e da tradução das políticas, faz-se necessário
considerar a estrutura organizacional do Instituto Federal Catarinense (IFC), como espaço
revelador da tradução das práticas e dos discursos, à medida que se desvelam as estratégias e
as táticas utilizadas pelos gestores.
4.1.2 O olhar dos gestores sobre a identidade do IFC nos documentos institucionais
No escopo desta pesquisa, os documentos institucionais mais relevantes para as
análises estão assentes no Planejamento Estratégico (PE) (2013-2017) e no Plano de
Desenvolvimento Institucional (PDI) (2014-2018) pois expressam as diretrizes da
macropolítica e do planejamento em médio e longo prazo e, portanto, considerados essenciais
para a gestão e identidade institucionais. Ao contemplarem a análise do ambiente, o
diagnóstico das oportunidades, ameaças, pontos fortes e fracos e, principalmente, os objetivos
109
estratégicos para o período compreendido, marcam a linha de atuação institucional e, por
meio delas, também, o processo de construção da identidade no movimento de vir a ser. Um
dos pontos fracos elencados no PE (IFC, 2013, p. 18) refere-se justamente à ausência da
―cultura do planejamento‖.
O IFC, ao estabelecer que sua missão, como propósito fundamental, é ―[...]
proporcionar educação profissional atuando em ensino, pesquisa e extensão, comprometida
com a formação cidadã, a inclusão social e o desenvolvimento regional‖ (IFC, 2014, p. 22)
busca responder ao motivo de sua existência aliada à visão de ―ser referência em educação
profissional, científica e tecnológica em Santa Catarina‖ (IFC, 2014, p. 22), expressando,
dessa forma, sua intenção de alcançar uma situação futura desejada.
O fato de transitar entre uma identidade que, em sua origem, era técnica para uma
outra que agrega formação científica e tecnológica tem seus desdobramentos. De acordo com
Pinto (2013), o termo tecnologia tem várias acepções, mas aqui apresenta-se do ponto de vista
etimológico. ―[...] a ‗tecnologia‘ tem de ser a teoria, a ciência, o estudo, a discussão da
técnica, abrangidas nesta última noção às artes, as habilidades do fazer, as profissões e,
generalizadamente, os modos de produzir alguma coisa‖ (PINTO, 2005, p. 219, grifo do
autor). Essa definição é de suma importância porque requer a unificação dos elementos
presentes e transita entre a técnica, as habilidades, mas, sobretudo, entre a ciência, a produção
do conhecimento que, de certo modo, interpela a todos os integrantes da instituição.
As fragilidades e as dificuldades relacionadas no documento (PE) são marcadores que
evidenciam, por exemplo, a identidade institucional e a marca do IFC. Entre seus objetivos
estratégicos o de ―criar política de identidade institucional‖ (IFC, 2014, p. 26) e o de ―definir
eixos tecnológicos por câmpus‖ (IFC, 2014, p. 27) demonstram que a identidade ainda está
em processo de construção, alternando entre o que era e o que necessita ser. No PDI, o
objetivo repete-se, porém não há indícios de como essa política de identidade vá se
desenvolver. Quanto à definição dos eixos tecnológicos, estes estão vinculados àqueles
definidos no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, considerando as peculiaridades de cada
campus. Obviamente a ―Identidade institucional – marca do IFC‖ no PE (IFC, 2013, p. 18) é
um dos pontos fracos identificados.
No item Perspectiva: Processos Internos, que define os responsáveis pelo alcance dos
objetivos estratégicos dos eixos tecnológicos e da identidade, constata-se que cada um deles
está sob a responsabilidade direta de um campus, o que demonstra a carência de articulação
institucional, ausente de participação da gestão central. Uma política que visa fortalecer a
110
identidade necessita ser pensada no âmbito institucional e não em uma única unidade isolada
como neste caso (IFC, 2013).
Na fala dos gestores entrevistados, a indefinição da identidade também está presente
como algo ainda não resolvido, envolto em uma espécie de sombreamento dos antigos
Colégios Agrícolas e Escolas Agrotécnicas, como pode ser constatado na fala de S4: “O
pessoal conhece o Colégio Agrícola, falou em Colégio Agrícola... „Ah, eu sei onde é!‟, agora
falou em campus Camboriú, opa, onde é? Por isso que eu digo, o pessoal às vezes diz que nós
temos crise de identidade... O problema é que nós somos jovens, ainda estamos fazendo
história”. Para S1, a afirmação da identidade institucional sofre prejuízos em função da
diversidade existente na oferta de cursos nos vários campi: “[...] isso também acaba
dificultando por outro lado porque são muito diversos... É a mesma instituição, mas cada
campus tem a sua especificidade, então isso acaba também às vezes não fortalecendo uma
área específica, cada campus vai ter um foco, uma necessidade específica”.
Para S3, a identidade institucional também atravessa um momento crítico porque ainda
está colada no passado, embora reconheça sua importância no vivido e a complexidade do
processo. “Às vezes critico, às vezes acho ruim, mas essa tradição muito agrotécnica, muito
colégio agrícola, também atrapalha. Isso não quer dizer que quando falo isso, que é uma
crítica, eu esteja dizendo que temos de esquecer, rasgar, apagar o passado, não. [...]. Claro,
tem várias experiências bacanas daquele modelo de escola, mas nós temos de nos dar conta
que a nossa realidade hoje é outra e nós não podemos ficar presos àquelas práticas, àquelas
lutas, nós temos que repensá-las. E é nesse sentido que eu acho que está faltando virar a
chave, sabe. [....]. Parece que estamos presos a uma rotina das antigas escolas agrotécnicas
ou colégios agrícolas”.
S2 destaca as orientações externas, a exemplo da CAPES, que influenciam na
construção da identidade institucional na oferta formativa: “[...] a CAPES deu uma
orientação de que deveríamos ter uma identidade diferente de uma academia, de uma
universidade, de uma faculdade. Então começamos a formar propostas de Mestrado
Profissional para atender uma demanda ou uma população que, muitas vezes, não é atingida
pela universidade. Se somos diferentes da universidade, precisamos fazer algo diferente”. No
PE (2013), a demanda por Pós-Graduação lato e stricto senso, de modo geral, é vista como
uma oportunidade, porém considerada de modo genérico e, no PDI (2014), há previsão de
estímulo e apoio aos campi para elaboração de propostas de ―[...] programas de pós-graduação
stricto sensu, preferencialmente profissionais, nas áreas de conhecimento em que há
capacidade instalada para atender as exigências dos órgãos oficiais de avaliação, que
111
apresentem demanda e atendam às necessidades dos arranjos produtivos [...]‖ (IFC, 2014, p.
53 -54, grifos nossos). A preferência na oferta de mestrados profissionalizantes é um indício
da definição da identidade que se diferenciaria das universidades pela oferta formativa e
também marca uma orientação institucional presente desde 2014.
Quando questionados sobre a elaboração dos documentos, os quais registram a
metodologia participativa e o diálogo, os entrevistados manifestaram diferentes pontos de
vista sobre o processo institucional desenvolvido. As percepções oscilaram entre os polos
participativo e não participativo dependendo do envolvimento de cada um e da
responsabilidade que cada um chamou para si no processo, ou seja, o engajamento com as
chamadas institucionais (BALL, 2003). Metade dos entrevistados declarou não ter participado
das discussões e da elaboração dos documentos.
Alguns deles ainda não tinham ingressado na instituição, enquanto outros não estavam
exercendo a função de gestão. S6 participou de comissões e considera que houve diálogo
entre a reitoria e os gestores dos campi. S5 declarou que também não participou, mas que tem
conhecimento de que houve “toda uma agenda [...] que possibilitou a participação de forma
democrática, na construção do documento” (S5). Sobre esse aspecto, no PDI, encontra-se:
―[...] a Comissão buscou realizar um trabalho contundente no sentido de permitir a todos a
participação tanto na construção quanto na discussão e validação desse Plano de
Desenvolvimento Institucional [...]‖ (IFC, 2014, p. 10). No entanto, esse sentimento de
participação não é unânime. Ao falar sobre o processo, S6 afirma: “Na minha opinião, foi
construído pela Reitoria, que é quem tem que fazer isso, pelos diretores, mas houve diálogo,
tanto é que eles montaram algumas comissões para fazer isso, eu fiz parte de algumas
comissões, mas como falei, o pesado do PDI foi montado, digamos, pela Pró-Reitoria de
Ensino e, por isso, a pós-graduação acaba ficando de lado, acredito” (S6).
A percepção desse entrevistado quanto às ações que contemplam a implantação da
Pós-Graduação é reveladora de indícios de que as Pró-Reitorias trabalham de modo
desarticulado quanto às prioridades. “Em teoria, a pós-graduação está dentro da Pró-
Reitoria de Pesquisa. Em teoria, quem tem que ajudar na implantação da pós-graduação é a
Pesquisa. [...]. Mas em relação a recurso financeiro e a pessoal, em comparação à Pró-
Reitoria de Ensino, é muito limitado. Eu acho que a Reitoria acaba dando muita ênfase à
Pró-Reitoria de Ensino e pouca ênfase à Pró-Reitoria de Pesquisa e a Extensão. Acredito que
talvez eles encarem como carro-chefe o ensino da graduação, não a pós-graduação.” (S6).
Por sua vez, S5, apesar de não ter participado do processo, afirma conhecer os
documentos o que, mais uma vez, evidencia que a chamada é institucional, mas a adesão e o
112
engajamento é pessoal na ocupação dos lugares e das discussões: “[...] eu conheço o
documento, e acho que as políticas da pós-graduação, precisam ser melhor definidas. [...]
discutidas para ampliar seu espaço, por que através da pesquisa e obviamente da pós-
graduação, dos projetos de pesquisa, amplia-se tanto a formação de pessoas como a
captação de recursos, o número de convênios, e isso seria todo um círculo virtuoso no
sentido de ampliar a participação do Instituto na sociedade. [...] a pesquisa leva para esse
caminho” (S5). A indefinição nas políticas citadas por esse gestor sugere uma possível
relação entre o percurso a ser construído na qualidade de política institucional e a identidade
pretendida. Se as políticas não estão claras, a identidade também é fragilizada porque existem
os centros e as periferias de poder geradores de resistências, como pode ser observado na fala
do gestor quanto à implantação da Pós-Graduação: “[...] até então, a pós-graduação, por
incrível que pareça, para alguns colegas, é vista como o patinho feio dentro do Instituto; e
com alguma relutância de alguns colegas aceitarem, inclusive, a possibilidade de se ter a
pós-graduação dentro do Instituto” (S5).
Essas resistências demonstram que, para muitos professores, a identidade do IFC ainda
está em forte conexão com a identidade técnica, permanecendo nas amarras estruturais das
antigas escolas agrotécnicas e colégios agrícolas. Para S5, há carência de aproximação e
integração entre os campi e a reitoria. “[...] os campi atuam ainda de forma muito
independente, até em função da própria estrutura do Instituto. Só que em termos de pós-
graduação, e diria até em nível de graduação, há a necessidade de uma aproximação dos
campi, porque parece que estamos na mesma casa, só que cada um não sai do seu quarto... E
aí em termos especialmente de pós-graduação, há a necessidade de interação entre os campi.
Isso vai ser fundamental, na verdade.” (S5). No PE (IFC, 2013, p. 18), esse é um dos pontos
fracos identificados: ―Integração entre os câmpus – visão individualizada‖. Esse é mais um
indício de que os campi, quanto à forma de atuação, permanecem na lógica de organização
anterior, na qual cada escola ou colégio tinha maior independência, o que na essência também
afeta a identidade. Nesse caso, é a identidade institucional atribuída pelo outro (DUBAR,
2005) que se choca com a trajetória anterior colidindo com as novas exigências.
Quanto à Pós-Graduação, a análise do PE permite observar que ela está no limbo. A
palavra ―pós-graduação‖ somente é encontrada em duas passagens. A primeira refere-se à
esfera de atuação institucional, e somente cita a pós-graduação lato sensu.
Com uma larga e verticalizada oferta de formação, na Formação Inicial e
Continuada, nos cursos técnicos em diversos eixos tecnológicos, em especial na
forma integrada com o ensino médio, nas licenciaturas, cursos superiores de
113
tecnologia e bacharelados, estendendo-se à Pós-Graduação lato sensu, com foco
predominantemente na pesquisa aplicada e inovação tecnológica. (IFC, 2013, p. 10,
grifos nossos).
Na segunda ocorrência, sob o título Oportunidades: influências externas positivas,
encontra-se ―Demanda por Pós-Graduação – Lato e Stricto Sensu‖ (IFC, 2013, p. 21).
Novamente, constata-se a carência de articulação. Se a demanda por Pós-Graduação é uma
oportunidade, fica a pergunta: quais ações permitem aproveitar esse nicho?
No item Análise do ambiente: pontos fracos dificuldades e fragilidades do IFC, estão
listados trinta e quatro itens nos quais são feitas menções à pesquisa e à Pós-Graduação, de
forma indireta, como, por exemplo:
Número de publicação de pesquisas em periódicos listados no Qualis; [...] Execução
dos recursos para pesquisa e extensão; [...] Integração do ensino, pesquisa e
extensão; [...] Pesquisas aplicadas direcionadas aos arranjos produtivos locais –
produção tecnológica [...]. (IFC, 2013, p. 18).
Entre os pontos fortes da instituição, identifica-se ―[...] o fomento às atividades de
pesquisa e extensão‖ (IFC, 2013, p. 19). Todavia, o ponto forte entra em contradição com um
dos pontos fracos listados que foi a falta de ―execução de recursos para a pesquisa e
extensão‖.
Ainda, sobre esse documento, ao listar os trinta e oito objetivos estratégicos,
novamente a Pós-Graduação é citada indiretamente, via atividades de pesquisa. Sobre a
Política de expansão para criação de novos cursos, há intenção de: ―Criar política para a
implantação gradativa de novos cursos‖ (IFC, 2013, p. 26) e ―Criar programa de incentivo e
fortalecimento de grupos de pesquisa, de acordo com as áreas de atuação do câmpus‖ (IFC,
2013, p. 34). O fortalecimento dos grupos de pesquisa está vinculado à atuação da Pró-
Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, mas, em momento algum, são encontradas
as metas direcionadas à Pós-Graduação, o que parece confirmar que tanto o lato quanto o
stricto sensu não estão entre as prioridades dos objetivos estratégicos institucionais, pelo
menos no âmbito documental.
Sobre a elaboração do PDI, S7 destacou: “O PDI foi elaborado entre os gestores dos
campi e da Reitoria, não entre toda a comunidade. Há uma série de metas nas mais diversas
áreas”. S1 destaca que as metas inseridas no PDI necessitam estar adequadas, conforme a
capacidade de recursos humanos e materiais, pois o que se tem visto é que “algumas coisas
realmente às vezes não se concretizam”, referindo-se às ações que parecem ser somente
inseridas para cumprir protocolo sem uma reflexão de viabilidade real. “O que a gente sempre
ouve nas reuniões é o seguinte: „Olha, o que estiver marcado no PDI, a gente pode fazer. O
114
que não estiver, não tem como‟. Então o que eu vejo também é que as pessoas ficam
preocupadas que pode surgir a oportunidade de elas fazerem, mas como não está no PDI elas
não vão poder fazer e aí: „Ah, então vamos colocar, é uma possibilidade que a gente tem e se
não der certo, não deu‟”. (S1).
A leitura atenta do PDI (2014) possibilita observar que cada campus inseriu suas
―pretensões‖ quanto à oferta de novos cursos, o que nem sempre vem se concretizando,
gerando, assim, demandas a justificar. Nesse sentido, S1 refere-se à ausência de um processo
de reflexão e discussão dos vários grupos e às cobranças que têm vindo da reitoria sobre as
ações previstas e não executadas que necessitam ser justificadas. Ainda, S1 argumentou que
as dificuldades fazem parte de um processo em que tudo é muito novo e as respostas precisam
ser buscadas. As evidências e o próprio PDI demonstram que há uma cultura de planejamento
em médio e longo prazo que necessita ser construída para que as ações, uma vez inseridas,
possam efetivamente ser cumpridas e, ao mesmo tempo, uma ausência na perspectiva na
cultura dos resultados, com ações inseridas sem possibilidades de concretização. Esse
planejamento requer que a equipe gestora tenha mais aproximação com as ferramentas de
gestão, que, na perspectiva administrativa, maximiza resultados e diminui gastos, adequando
o potencial humano e material.
O fato de os atores da política no interior da instituição submeterem-se ao que está
inserido no PDI em algumas situações - “O que não estiver, não tem como” (S1) - permite
pensar no que Ball (2000) chama de fabricação do discurso para responder à política. Para
Ball, a fabricação organizacional fornece uma fachada calculada da organização e do
ambiente. No entanto, em outro sentido, o trabalho de fabricar a organização requer
submissão aos rigores da performatividade e as disciplinas da concorrência. Há um excedente
de sentido em tais exercícios. Um excesso que transborda para a vida cotidiana da
organização de modo que outras possibilidades de ação ficam condicionadas às ações
calculadas e previstas no planejamento cujo conteúdo expressa o compromisso da instituição
com a política.
S4 destaca que as propostas em fase de submissão, referindo-se às da Pós-Graduação,
foram planejadas e estão inseridas no PDI. “[...] estamos estudando essas áreas que tem
maior potencial, elas já estão inseridas. [...] a Pró-Reitoria vem apoiando, fomentando ou
publicando editais que contemplam professores ou projetos que estão envolvidos em
determinadas áreas para tentar fortalecer esses cursos. [...] ou direcionando algum recurso
financeiro para compra de equipamentos que sejam multi-setoriais, por exemplo.” (S4).
115
Sobre o processo de elaboração no desenvolvimento dos documentos, S4 explicou que
houve discussão entre os vários grupos, a exemplo das Pró-Reitorias e dos campi: “Primeiro
cada Pró-Reitoria organizou, conforme a sua obrigatoriedade da pasta e também foram
envolvidos os campi. Foram chamados DDEs, diretores, cada campus fez, os cursos que
tinham de ser aprovados. Aí depois em reunião a gente fez a leitura, colocando o que seria
necessário e definindo o que era prioridade” (S4).
Para S4, os trabalhos estão sendo desenvolvidos de forma sincrônica, pois as propostas
dos novos cursos passam também pela disponibilidade e pelo interesse do professor e do
diretor que têm consciência de que vão precisar disponibilizar seus colaboradores para outros
campi. Reconhece que o esforço é institucional e não de um campus específico, por esse
motivo também os deslocamentos dos professores necessitam ser pensados
institucionalmente, com a gerência da Pró-Reitoria. “[...] pensar como uma instituição, traçar
diretrizes que são do IFC. [...]. Cada campus tem sua particularidade, mas nós temos que ter
...” (S4).
S2 considera o PDI importante para o planejamento institucional em longo prazo com
“[...] perspectivas, planos e estratégias para o desenvolvimento da instituição. Obviamente
que nesse PDI ou no planejamento existem muitas coisas que de momento parecem ser
tangíveis e no decorrer das atividades a coisa não chega bem àquilo” (S2), em uma clara
demonstração da fabricação do discurso escrito. Nesse ponto específico, S2 faz referência às
dificuldades encontradas para a aprovação das propostas submetidas à CAPES, citando o
Mestrado Profissional que não foi inserido no PDI, porque inicialmente as propostas eram
para o mestrado acadêmico. Esse trânsito entre as propostas de mestrado acadêmico e
profissional marca ainda mais intensamente a volatilidade identitária.
É como se ficasse no ar o seguinte questionamento: Mudamos: mas para onde estamos
indo? Essas evidências reforçam a gênese das políticas voltadas aos contextos genéricos e
ideais que, por terem essa característica, impactam tão intensamente na constituição das
pessoas e das instituições. Por outro lado, concorda-se aqui com Ball (2003, p. 225) que, na
perspectiva gerencialista e performativa amplamente difundida nas organizações, ―[...] cada
vez mais, as instituições do setor público também são requeridas a construir uma variedade de
textos formais, responsabilizando-se através de planos de desenvolvimento, documentos
estratégicos, conjunto de objetivos‖.
S3 foi enfático quanto à metodologia utilizada na elaboração do PDI: “Eu não
concordei com a forma pela qual o plano institucional foi feito, com a metodologia utilizada.
[...] eu, como coordenação de pós-graduação, ajudei dizendo quais eram as minhas
116
diretrizes, quais eram as políticas que seriam adotadas. Quem disse quais cursos iriam ser
criados, foram os campi. Quando isso veio dos campi, foi direto para quem coordenava e não
voltou para a gente, no caso, para mim, na coordenação de pós-graduação ou para nós, na
Pró-Reitoria avaliarmos se aquilo estava afinado com as diretrizes e políticas que tínhamos
colocado. Então, sabe, virou uma colcha de retalhos, virou um somatório de textos que cada
um mandou, em alguns aspectos, contraditórios”. No entanto, no PDI, o discurso escrito que
consta sobre a participação é: ―A gama de informações e projeções feitas neste documento
reflete os dados fornecidos por todos os câmpus que sistematizados ajudaram a compor o PDI
em sua totalidade, sendo que esse documento foi discutido e validado pela comunidade da
Reitoria e de todos os câmpus‖ (IFC, 2014, p. 10).
No discurso desse gestor, no processo de elaboração do PDI, houve carência de
diálogo, articulação e convergência das ações propostas, o que evidencia também um campo
de disputas entre os setores institucionais, fato observável na leitura atenta dos documentos.
“Nada muito conectado... Nada muito articulado. Porque se a gente pensa em criar cursos
Lato e Stricto Sensu, especialmente, você tem que ter todo um trabalho anterior. Para criar o
Stricto Sensu, você tem que ter os grupos de pesquisa, você tem que ter os projetos de
pesquisa, tem que ter os laboratórios, tem que ter o professor doutor, você tem que ter esse
professor doutor publicando. Então você tem que pensar em uma série de coisas que passam
pela estrutura física, equipamentos, apoio, recurso para pesquisa, apoio a grupos de
pesquisa, e isso está fora de questão.” (S3). Esse gestor demonstra conhecimento sobre
planejamento. Em seu depoimento, ele expõe a visão do processo necessário para chegar à
Pós-Graduação. No entanto, no documento, as ações desde o fortalecimento da pesquisa à
implantação do stricto senso são pensadas ao mesmo tempo, fato que fragiliza a submissão de
propostas.
Enquanto no PDI, item referente à internacionalização, a colaboração da Pró-Reitoria
de Pesquisa está centrada nas parcerias com as instituições de Ensino Superior, no item
referente à Política de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, entre outras ações, está previsto
―[...] o estabelecimento de parcerias com institutos, universidades, centros de pesquisa e
outras instituições nacionais e/ou internacionais, incluindo as organizações privadas, na área
de pesquisa e desenvolvimento [...]‖ (IFC, 2014, p. 53), o que de certo modo exemplifica a
falta de articulação e a ―colcha de retalhos‖ citada por S3.
Os depoimentos dos gestores sinalizam que a perspectiva organizacional que
permanece é a individual em que cada campus se organiza e, na ausência de uma diretriz
institucional que sugere falta de familiaridade para lidar com planejamento, as ações e as
117
projeções são pensadas em tempos “[...] distintos e desarticulados sem as bases, algumas
coisas e que estão projetadas, você vai olhar e dizer, bom, para isso você precisa daquilo... E
cadê? Então,... procura no PDI e não localiza. Nós tivemos dificuldade para justificar
determinadas coisas na Pró-Reitoria junto a auditorias, por exemplo, onde é que isso está no
PDI? Vai no PDI e... Não está. [...]. Esse é o desafio. E eu diria até que o próximo Reitor tem
vários desafios, um deles é pegar esse PDI e reavaliar. Rearticulá-lo, porque o atual PDI
nosso é problemático” (S3).
Nessas falas dos gestores e nos registros dos documentos, há indicação de um processo
contraditório que interfere na construção identitária da instituição e influencia o modo como
as ações são pensadas e executadas em consonância com as políticas que chegam como
imposições externas. Por outro lado, o fato de serem os primeiros documentos elaborados para
o IFC explicita um caminho que vai sendo construído por um grupo, que sob o ponto de vista
da gestão também tem experiências ainda não consolidadas sobre o planejamento
institucional. ―No processo de tradução das políticas alguns líderes e administradores atentam
conscientemente para ‗desenhar atenção‘ à substância da política com a produção de materiais
visuais que documentam o que deve ser feito‖ (BALL, 2012, p. 121). Esses documentos são
artefatos que marcam a direção da política e reforçam o modo de responder “as auditorias”,
por exemplo. No entanto, quando elaborados superficialmente, causam constrangimentos.
No PE, no PDI e nos depoimentos dos gestores entrevistados, ou seja, tanto no
discurso falado quanto no escrito, há indícios de que a identidade institucional ainda está em
um espaço indefinido, encoberto pela névoa. A dificuldade de firmar-se uma identidade
assenta-se nas diferenças de perfis docentes, de tempo de vivência na instituição, da falta de
experiência com a gestão, de práticas e culturas individualizadas que, de repente, precisam ser
abrangentes e articuladas. Além disso, estão latentes as condições que precisam ser criadas
para ser uma instituição de pesquisa e pós-graduação aliada à necessidade de fabricar uma
imagem de compromisso da instituição com a política.
Em alguns aspectos até aqui destacados, o PE e o PDI são contraditórios com
diretrizes desconectadas, em que cada Pró-Reitoria e até mesmo os campi têm objetivos
distintos, o que caracterizam as disputas e os centros de poder que dificultam a integração e a
afirmação da identidade. Há constantes embates e necessidades de acordos para constituir-se
uma instituição de formação profissional, científica e tecnológica que, no âmbito do Ensino
Superior, possa transitar entre ensino, pesquisa e extensão. Para que isso possa ser alcançado,
o planejamento, que ainda é uma cultura a ser construída, é o fio de Ariadne no qual os
gestores por meio da decisão colegiada têm importante papel, pois dos acordos, das
118
negociações e das disputas erigem as táticas que legitimam os discursos oficiais escritos e
falados, demonstrando a unidade de pensamento ou a ausência dela.
4.2 A MATRIZ DE CONSTITUIÇÃO DO P.PORTO: FORMAÇÃO TÉCNICA E ENSINO
SUPERIOR DE CURTA DURAÇÃO
A origem do Instituto Politécnico do Porto é longínqua. De modo geral, ele foi
pensado para a formação profissionalizante vinculada ao ensino secundário, com o objetivo de
atender às demandas econômicas do país, a exemplo do comércio, da indústria, da agricultura.
Até o início da década de 1970, o Ensino Superior português estava circunscrito a poucas
Universidades tradicionais, entre elas a de Lisboa, Porto e Coimbra, que se mostravam
incapazes de absorver as demandas crescentes por ingresso. No entanto, com a proposição da
Reforma Veiga Simão, intitulada Projecto do Sistema Escolar e as Linhas Gerais do Ensino
Superior (1971), discutida durante dois anos, foi aberta a possibilidade de argumentar sobre a
modernização e o desenvolvimento do país, situando a educação como meio para o
desenvolvimento. Após intensas discussões, o projeto tornou-se lei em 1973, apresentando o
conceito de democratização em um governo até então marcado pelo nacionalismo e pelo
conservadorismo (STOER, 1983).
Para Leão (2006), com a reforma Veiga Simão, tinha-se a esperança de que as
alterações introduzidas levassem ao surgimento de técnicos e cientistas que, como
profissionais, fossem ―[...] capazes de operar a modernização de um país, o que em Portugal
se repercutiria ao nível da superação de carências e da possibilidade de se poder vir a respeitar
compromissos assumidos com a OCDE na qual o principal fundamento é o econômico‖
(LEÃO, 2006, p. 49). Essa inferência da autora evidencia os redirecionamentos das políticas
internas e a rede de influências para proceder ajustes que contemplavam os acordos externos
firmados com os organismos internacionais. As indicações da OCDE estavam voltadas à
abertura da educação em massa como forma de suprir a carência de recursos humanos
qualificados para preencher os postos de trabalho. Conforme discutido anteriormente,
Portugal tinha grande elitização no acesso ao Ensino Superior e, por outro lado, estava sendo
pressionado por mais acesso a esse nível de ensino pela população que, após concluir o
Ensino Secundário, achava-se impedida de ascender ao Ensino Superior.
Com a Lei Nº 5, de 25 de julho de 1973, institucionalizaram-se as bases da reforma do
sistema educativo. Quanto ao Ensino Superior, assegurava-se que seria oferecido por ―[...]
Universidades, Institutos Politécnicos, Escolas Normais Superiores e outros estabelecimentos
equiparados‖ (PORTUGAL, 1973, p. 1318). No entanto, por um lado, os institutos estavam
119
inseridos no Ensino Superior; por outro, no texto da mesma Lei, havia a diferenciação: as
universidades poderiam conferir o grau de bacharel, licenciado e doutor, enquanto os
institutos estavam limitados ao oferecimento do grau de bacharel com duração de três anos e
com perfil formativo para o exercício de profissões específicas.
Nos desdobramentos da reforma, com o Decreto-Lei Nº 402, de 11 de agosto de 1973,
foram criadas novas Universidades, Escolas Superiores de Educação e Institutos Politécnicos
com o objetivo de expandir e diversificar o Ensino Superior que levaria, pelo menos em tese,
ao desenvolvimento da sociedade portuguesa. No texto do Decreto-Lei, explicitava-se a
necessidade de ―[...] aumentar a escolaridade no ensino superior de modo a atingir-se uma
taxa de 9% para o grupo etário dos 18 aos 24 anos, o que impõe a expansão e diversificação
do ensino superior de curta e longa duração e de pós-graduação‖ (PORTUGAL, 1973, p.
1402).
A distinção entre Ensino Superior de longa e curta duração formalizou o perfil
formativo de cada uma das instituições, aqui entendidas, respectivamente, como universidades
e institutos, tendo início, assim, a dualidade - fato que se mantém até os dias atuais. Essa
diferenciação afetou a identidade dos Institutos Politécnicos que, até então, estavam
vinculados à oferta do ensino profissionalizante secundário. No artigo 4º do referido Decreto-
Lei, encontra-se a definição da natureza dos Institutos:
Os Institutos Politécnicos são centros de formação técnico-profissional, aos quais
compete especialmente ministrar o ensino superior de curta duração, orientado de
forma a dar predominância aos problemas concretos e de aplicação prática, e
promover a investigação aplicada e o desenvolvimento experimental, tendo em
conta as necessidades no domínio tecnológico e no sector dos serviços,
particularmente as de carácter regional. (PORTUGAL, 1973, p. 1402).
O que se tem aqui é a institucionalização do Ensino Superior de curta duração, voltado
não somente aos problemas concretos para aplicação na prática, mas também à investigação
aplicada, ao desenvolvimento experimental e ao domínio tecnológico no setor de serviços. Em
linhas gerais, a reforma do Sistema Educativo ocorrida antes da Revolução de abril de 1974
havia criado algumas situações que, de acordo com Leão (2006), culminaram com a
publicação do Decreto-Lei Nº 830, de 31 de dezembro de 1974, que criou os Institutos
Superiores de Engenharia. Esse Decreto foi publicado como resultado das pressões e das
mobilizações dos Sindicatos de Engenheiros e alunos dos institutos industriais que, ao serem
formados em cursos de três anos, eram discriminados dos formados pelas universidades com
duração de 4 anos. Essa alteração de institutos industriais para Institutos Superiores de
Engenharia foi facilitada
120
[...] por um lado pelo facto da duração da escolaridade dos institutos industriais ser
semelhante à dos bacharelatos do ensino superior e por outro lado, pela
circunstância de o desempenho profissional dos diplomados pelos institutos
industriais estar bem conceituado. Ao grau de bacharel conferido pelos recém
criados institutos superiores de engenharia foi atribuído o título profissional de
engenheiro técnico, já existente. (LEÃO, 2006, p. 60).
Ainda que a ênfase continuasse a estar focada no título de engenheiro técnico, ficou
evidente a consistente formação oferecida (dado o bom desempenho dos alunos dos institutos)
e as pressões dos profissionais da área, o que contribuiu para o upgrade no título concedido.
Nos desdobramentos das alterações, por meio do Decreto-Lei Nº 313, de 26 de junho de 1975,
os Institutos de Coimbra, Lisboa e Porto, passaram a subordinação direta da Direção Geral do
Ensino Superior, fato que aconteceu também com os Institutos de Contabilidade por meio do
Decreto-Lei Nº 327, de 26 de maio de 1976. As ações tinham o objetivo de ampliar as
possibilidades de formação para o setor público, administrativo e empresarial. Aos poucos,
nas legislações posteriores, foram incluídas outras escolas e institutos, com o objetivo de
formar profissionais qualificados de nível superior.
4.2.1 Os Institutos Politécnicos no contexto de criação e expansão
Os contornos e as alterações do Ensino Superior de caráter mais pragmático,
ministrado nos institutos politécnicos, a partir do Decreto-Lei Nº 513-T/197943
, estavam, de
modo geral, atrelados às recomendações das instituições internacionais, nomeadamente FMI,
UNESCO, OCDE e Banco Mundial, nas quais predominavam as diretrizes para uma atuação
mais próxima às necessidades regionais, e o desenvolvimento da pesquisa, principalmente a
acadêmica, estava ausente. No referido Decreto, havia o reconhecimento formal de que o
Ensino Superior Politécnico, marcado por características profissionalizantes, se distinguia do
universitário: ―[...] de características mais conceptuais e teóricas, traduzindo a real
diversificação operada no âmbito do sistema de ensino superior, é o resultado de uma opção
ditada por razões de eficiência e de adequação daquele sistema à estrutura sócio-econômica
[...]‖ (PORTUGAL, 1979, p. 3350-3361).
Na sequência, exaltava-se a ―pretensão‖ de conferir ao sistema politécnico ―dignidade
idêntica‖ a que tem o sistema universitário, o que intensificava a ideia de que não havia
igualdade de reconhecimento para os dois sistemas.
Ao ensino superior politécnico, ao qual se pretende conferir uma dignidade idêntica
ao universitário, incumbe, em íntima ligação com as actividades produtivas e
43
Conforme referido no capítulo três desta tese, nos anos de 1970, também foi necessário limitar o acesso ao
Ensino Superior por meio do numerus clausus.
121
sociais, formar educadores de infância, professores dos ensinos primário e
preparatório e técnicos qualificados nos domínios da tecnologia industrial, da
produção agrícola, pecuária e florestal, da saúde e dos serviços, sendo essa formação
conferida por escolas superiores de educação e escolas superiores técnicas,
respectivamente. (PORTUGAL, 1979, p. 3350-3361).
Na década de 1980, seguindo as linhas já implantadas quanto à formação oferecida nos
institutos politécnicos, a formação das massas alinhava-se à profissionalização na afirmação
de uma identidade marcadamente técnica, embora inserida no nível superior.
Com a aprovação da Lei de Bases ocorrida em 1986, os graus conferidos pelo ensino
superior eram bacharel, licenciado, mestre e doutor, porém os objetivos do ensino
universitário e do ensino politécnico seguiam linhas diversas.
O ensino universitário visa assegurar uma sólida preparação científica e cultural e
proporcionar uma formação técnica que habilite para o exercício de atividades
profissionais e culturais e fomente o desenvolvimento das capacidades de
concepção, de inovação e de análise crítica.
O ensino politécnico visa proporcionar uma sólida formação cultural e técnica de
nível superior, desenvolver a capacidade de inovação e de análise crítica e ministrar
conhecimentos científicos de índole teórica e prática e as suas aplicações com vista
ao exercício das actividades profissionais. (PORTUGAL, 1986, p. 3071).
No texto da Lei, é possível perceber a distinção na formação. Na primeira, a
preparação é científica, cultural e técnica. Na segunda, a formação é cultural e técnica. A
capacidade de inovação e análise crítica está nos dois, mas a ênfase na índole teórica está na
primeira, enquanto a prática está na segunda. Conforme Leão (2006), com a aprovação da Lei,
ocorreu a aproximação aos princípios internacionais considerados elementares para a
democratização do sistema, a exemplo do planejamento. Nessa lógica, a diferenciação entre
os subsistemas mantém-se inclusive com as alterações posteriores efetuadas na referida Lei
nas décadas de 1990 e 2000, visando adequação à Declaração de Bolonha.
4.2.2 A Declaração de Bolonha e as implicações para a organização do Ensino Superior
português
Com a Declaração de Bolonha, o Ensino Superior português sofreu drásticas
mudanças com o objetivo de adequar-se às novas regulações externas, provocando o
deslocamento das agências internacionais, entre elas o Banco Mundial, a OCDE e a
UNESCO, que passaram a atuar em segundo plano, por meio de estudos, de relatórios, de
avaliações e de divulgação de resultados, cedendo, assim, o lugar de protagonista à União
Europeia como Instituição responsável pelo desenvolvimento do projeto implantado por meio
de Bolonha, pois quem assina, novamente, são os integrantes dos Estados Membros. No
entanto, as influências daqueles organismos quanto à organização do ensino foram as bases
122
constituintes para a organização após Bolonha que, além de manter a dualidade pré-existente,
formalizou o encurtamento nas formações e intensificou, entre outros, os processos
avaliativos externos.
Ao analisar as alterações efetuadas na Lei de Bases nos anos de 1997 e 2005, fica
evidente o alargamento dos objetivos concernentes ao Ensino Superior na perspectiva de
―educação ao longo da vida‖ e do conhecimento dos problemas globais, principalmente os
europeus. Na alteração de 2005, no Artigo 12 que tratava sobre o acesso ao Ensino Superior,
foi incluído o item 7: ―Os trabalhadores-estudantes terão regimes especiais de acesso e
ingresso e de frequência do ensino superior que garantam os objectivos da aprendizagem ao
longo da vida e da flexibilidade e mobilidade dos percursos escolares‖ (PORTUGAL, 2005,
p. 5122).
Além dessa inserção, outros itens foram alterados no Artigo referente aos objetivos do
Ensino Superior. Como exemplo, cita-se a letra ―f‖ que, na Lei de 1986, constava: ―Estimular
o conhecimento dos problemas do mundo de hoje, em particular os nacionais e regionais,
prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de
reciprocidade‖ (PORTUGAL, 1986, p. 3071). Já na Lei de 2005, a redação desse item passou
a ser: ―Estimular o conhecimento dos problemas do mundo de hoje, num horizonte de
globalidade, em particular os nacionais, regionais e europeus, prestar serviços especializados
à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade‖ (PORTUGAL, 2005, p.
5122).
O acesso ao Ensino Superior foi tratado nas três versões. Enquanto nas versões de
1986 e 1997 a idade para o acesso ao Ensino Superior, por meio de prova específica, aos não
habilitados no ensino secundário, era de 25 anos; na versão de 2005, essa exigência foi fixada
em 23 anos.
Na distinção entre o ensino universitário e o politécnico, foram acrescentados: ―O
ensino universitário, orientado por uma constante perspectiva de promoção de investigação e
de criação do saber [...]‖, ―O ensino politécnico, orientado por uma constante perspectiva de
investigação aplicada e de desenvolvimento, dirigido à compreensão e solução de problemas
concretos [...]‖ (PORTUGAL, 2005, p. 5122). O destaque é para o olhar global e o contexto
europeu na prestação de serviços.
É notório que os Politécnicos são o resultado das políticas de promoção do
desenvolvimento local e regional (CARDOSO et al., 2007). O que se tem com essa alteração
é o aprofundamento da dualidade e a diferenciação dos dois subsistemas entre a investigação
123
científica e a investigação aplicada, entre um itinerário formativo mais voltado ao campo
teórico e outro mais voltado à prática conforme representado na Figura 10 a seguir.
Figura 10 - Representação dos subsistemas de ensino Português
Fonte: Elaborada pela autora com base na Lei de Bases (2005).
Essa dualidade pode ser analisada sob várias dimensões, mas a distinção entre os seus
objetivos pode ser interpretada quanto à organização curricular, à duração dos cursos, ao
vínculo profissionalizante e à ―lógica de organização regional‖ (ARROTEIA, 1996, p. 38).
Naquele contexto, fazia-se necessário também investir na possibilidade de reduzir as
assimetrias regionais apostando no Ensino Superior como uma das possibilidades para
promover o acesso a alunos procedentes de outros extratos sociais desejosos de ingressar
nesse nível de ensino, conforme recomendações do Banco Mundial que, de certo modo, foram
ratificadas pela UE.
Era necessário criar cursos e formar recursos humanos que respondessem às
exigências do mercado, mais especializados e técnicos, capazes de ―[...] incentivar linhas
específicas de investigação nas quais se aliam as instituições de ensino superior e as empresas
[...]‖ (ARROTEIA, 1996, p. 66). O interesse percorria um caminho de mão dupla entre a
investigação e a organização das empresas possibilitando transferir experiências nos dois
sistemas. Por outro lado, era indispensável perceber o caráter dinâmico da lógica
124
profissionalizante que necessitava se adequar rapidamente às transformações do cenário. ―[...]
há funções e profissões que morrem, enquanto outras nascem, ao mesmo tempo em que as que
permanecem vão modificando seu perfil de competências‖ (SIMÃO; COSTA, 2000, p. 28).
Outro ponto importante referia-se à imagem social criada sobre o ensino politécnico,
na maioria das vezes formulados sobre a lógica comparativa entre o ensino universitário e o
politécnico, esquecendo que este tem uma identidade própria e que difere dos referenciais
dominantes na sociedade portuguesa baseados no ensino academicista, situando-o em um
plano inferior àquele (SIMÃO; COSTA, 2000; SEIXAS, 2003). No entanto, as alterações
estavam muito mais vinculadas ao ensino politécnico do que ao universitário, que continuava
a ser de cinco anos na maior parte dos cursos de licenciatura e distantes das qualificações do
mercado de trabalho (STOER, 1986).
Nesse sentido, reveste-se de fundamental importância perceber a existência de dois
paradigmas formativos e vocações institucionais distintas sem que um seja superior ou
inferior ao outro. ―[...] os dois paradigmas formativos têm condições idênticas para fazer a sua
própria afirmação, em matéria de qualidade científica, de exigência técnica e, ainda da
respectiva moldura vocacional‖ (SIMÃO; COSTA, 2000, p. 45). Contudo, para além da
dualidade presente no Ensino Superior português, prevista na legislação, na prática, os
Institutos Politécnicos avançaram e, atualmente, contam com sólidas áreas de pesquisa
desenvolvidas em parcerias nacionais e internacionais, o que, apesar de não estar na Lei de
Bases (2005), possibilita acrescentar mais um elemento à Figura 10 anteriormente apresentada
(Ver Figura 11).
125
Figura 11 - Evolução do Sistema Politécnico na prática
Fonte: Elaborada pela autora com base na Lei de Bases (2005).
As atividades de Ensino, Pesquisa e Prestação de Serviços estão presentes em todas as
unidades orgânicas do P.Porto. Em consultas aos sites das diversas unidades, são encontrados
destaques que informam ao público as atividades de pesquisa, laboratórios, parceiros e
projetos que estão sendo desenvolvidos com instituições nacionais e internacionais. No site do
P.Porto, encontra-se, ainda, a informação de que ao todo somam 30 grupos de investigação.
Ao enfrentar os desafios impostos pela legislação, as instituições representadas por seus
gestores vão construindo caminhos e alternativas que aproximam ensino, pesquisa e prestação
de serviços na geração de produtos, que, de certo modo, reverte em reconhecimento social.
Isso revela as movimentações dos subsistemas no sentido da ocupação do mesmo espaço e
das disputas pelo reconhecimento que provoca o sombreamento das áreas formativas e, ao
mesmo tempo, expressa uma resposta real às limitações impostas pela legislação, como, por
exemplo, o impedimento de ofertar doutoramentos pelos politécnicos.
126
Esse é um exemplo de que os impactos sociais de uma política extrapolam a dimensão
escrita, pois é no campo social que são geradas e, ao mesmo tempo, sentidos os conflitos e as
disputas que, por sua vez, alteram as relações entre os contextos e estabelecem a competição
(BALL, 1998).
O que se tem nesse momento no contexto português de Ensino Superior é uma
situação complexa que extrapola os limites da legislação e se concentra na ação, devido ao
reposicionamento das organizações universitárias e politécnicas. O decréscimo da taxa de
natalidade provocou uma retração na procura ao Ensino Superior, o que levou as instituições
dos dois subsistemas a buscar por ―[...] novos públicos [...] e práticas competitivas sem
precedentes pela atração de alunos‖ (LIMA; AZEVEDO; CATANI, 2008, p. 11). Uma, a
universidade, desejosa de manter-se no lugar de destaque historicamente construído; e a outra,
a politécnica, ansiosa por conquistar um lugar historicamente negado pela legislação e que se
aprofundou com o Processo de Bolonha. Uma das reivindicações dos Institutos Politécnicos é
que tenham permissão do Ministério para utilizar a designação ―University of Applied
Science‖ (Universidade de Ciências Aplicadas) nos documentos oficiais de divulgação
produzidos em língua estrangeira, conforme ocorre na Associação Europeia de Instituições de
Ensino Superior (EURASHE).44 Essa designação é comum em alguns países europeus, a
exemplo da Alemanha e da Suécia que têm sistemas binários de Ensino Superior. Além do
fato de que a padronização da designação pode contribuir para o estabelecimento de parcerias
internacionais, captação de alunos, visibilidade e reconhecimento como instituição
pertencente ao espaço europeu de ensino superior com uma identidade efetivamente vinculada
à pesquisa e à Pós-Graduação.
4.2.3 O olhar dos gestores sobre a identidade do P.PORTO nos documentos institucionais
Os documentos institucionais de maior relevância para este estudo são o Planejamento
Estratégico (PE) (2014-2018) e o Manual da Qualidade (2015), pois, além de serem
documentos norteadores das políticas e ações do P.Porto, foram produzidos de modo
articulado, expressando a complementariedade. Isso ficou muito presente nas falas dos
gestores, tanto para expressar sua concordância com o documento e o processo desenvolvido
na sua produção ou para ignorá-lo, negá-lo em suas afirmações.
44
Notícia veiculada em 22 de outubro de 2016. Disponível em:
<https://www.publico.pt/sociedade/noticia/politecnicos-querem-outorgar-grau-de-doutor-e-ser-universidades-de-
ciencias-aplicadas-1748458>. Acesso em: 10 nov. 2016.
127
―A estrutura metodológica teve por base práticas internacionais de planeamento
estratégico no ensino superior‖ (P. PORTO, 2014, p. 11). A utilização dessa estrutura no
processo de elaboração e de discussão pretendeu ser participativo, processo também
reconhecido pelos gestores. Palavras como rankings internacionais, investigação científica
aplicada, reposicionamento competitivo, racionalização necessária das ofertas formativas
existentes, aprendizagem ao longo da vida, estratégia comum, recursos partilhados e
internacionalização estão em evidência ao longo do texto.
De acordo com o documento do Planejamento Estratégico, a missão do P.Porto é:
[...] criar e disseminar conhecimento, ciência, tecnologia e cultura, e dotar os seus
estudantes de competências técnicas, científicas, artísticas e transversais, articulando
o conhecimento com a ação e, assim, construir-se em agente de transformação dos
territórios nacionais e internacionais em que intervém, contribuindo para o
desenvolvimento inteligente da sociedade. (P.PORTO, 2014, p. 15).
Ao destacar a criação e a disseminação do conhecimento e sua articulação com a ação,
embora não prevista em lei, a pesquisa como produção de conhecimento está nas entrelinhas,
vinculada à prestação de serviços, como contribuição ao desenvolvimento da sociedade. A
visão do instituto é a de afirmar-se ―[...] como instituição nacional de excelência, num quadro
de referência internacional, constituindo-se como agente ativo de transformação e
qualificação‖ (P.PORTO, 2014, p. 15). Do ponto de vista organizativo, o PE é composto pelos
objetivos estratégicos divididos em cinco eixos:
formação;
investigação e desenvolvimento e transferência de conhecimento;
internacionalização;
governação e gestão estratégica e pessoas;
cultura e cidadania.
Decorrentes dos eixos de intervenção, estão presentes os objetivos operacionais com
as ações a concretizar. Todos os eixos de algum modo estão articulados ao reposicionamento
competitivo do P.Porto, ou seja, tornar a instituição competitiva nacional e
internacionalmente.
Essa é uma característica presente na maioria das instituições de Ensino Superior nas
últimas décadas, a qual se aproximam dos pressupostos neoliberais na educação. Ao adotar
parâmetros da iniciativa privada para o gerenciamento das instituições públicas, as práticas de
gestão são transformadas e orientadas para o cliente com ―[...] decisões instrumentalistas
128
guiadas pela eficiência, custo-eficácia, busca por competitividade [...] e de novas técnicas
gerenciais, tais como gerência da qualidade total (GQT) e gerência de recursos humanos
(GRH)‖ (BALL; GEWIRTZ, 2011, p. 200).
Sobre o processo de reconhecimento internacional, S8 destacou: “Nós temos feito uma
aposta em sermos uma grande instituição. Somos o maior Politécnico do país, maior que o
Politécnico de Lisboa. Somos a quarta, quinta, maior instituição, mesmo considerando as
universidades, em termos de alunos”. Tornar-se uma grande instituição significa ser
competitiva no contexto português e europeu.
O Manual de Qualidade, outro instrumento de gestão, prima pela adequação às normas
do espaço europeu de Ensino Superior, com ênfase no controle constante da qualidade
institucional. Portanto, diz respeito especificamente à política e à estratégia da garantia da
qualidade quanto ao ensino e à aprendizagem, à investigação e ao desenvolvimento e à
transferência de conhecimento.
Quando questionados sobre o processo de elaboração do Planejamento Estratégico, de
modo geral, os gestores consideram que foi participativo e que todos os segmentos
institucionais, a exemplo de professores, alunos, funcionários e comunidade, estavam
representados. “O Plano de Desenvolvimento Institucional foi algo bastante participado. Nós
envolvemos todas as nossas Escolas, criamos grupos abertos onde as pessoas puderam
discutir vários temas, pesquisa e desenvolvimento, a parte da formação, da pedagogia, a
parte da internacionalização, a organização interna [...]. Foi um modelo participativo,
tivemos também apoio de uma consultora que nos ajudou em todo esse processo” (S8). A
metodologia utilizada foi sucintamente descrita em um diagrama no PE, no qual a
―Participação da comunidade – Abordagem Escola e Participação da comunidade –
Abordagem entre Escola e transversal‖ estão ligadas às ―estratégias de reposicionamento do
IPP‖, aos ―traços estruturais do IPP‖, às ―macrotendências de evolução impactantes da IES‖ e
ao ―contexto‖ (P.PORTO, 2014, p. 11). Essas ligações podem ser consideradas um modo de
demonstrar o processo de diálogo evidenciado pelos gestores.
Outros gestores ainda destacaram: “[...] fizemos uma reflexão interna muito profunda,
[...] ao nível de todas as unidades orgânicas, para identificar, os clusters de formação de
cada uma das Escolas. [...] chegamos à conclusão, que para aumentar de fato a nossa massa
crítica, das formações ministradas no Politécnico, haveria a necessidade, assim mais
premente, portanto, de extinguir uma Escola, criar duas novas Escolas, que é o que se está,
nesse momento, nessa fase, concreta; e reajustar, realocar cursos” (S3); “[...] criar o
máximo de concentração das áreas científicas em um determinado núcleo, ao qual chamaram
129
de cluster” (S4). O depoimento dos gestores destaca o processo de redefinição estratégica da
instituição em relação à política marcada por algumas táticas: participação de todos os
envolvidos, busca de unidades orgânicas, identificação e mapeamento dos clusters (identidade
ou força), e redesenho da estrutura administrativa com decisão de expansão para concentração
em áreas científicas. Essas táticas como se vê estão dirigidas para o fortalecimento da
identidade de instituição diferenciada na formação para concorrer no âmbito nacional e
internacional.
Nesse sentido, destacam-se, aqui, as falas de S1 e S6, mas que representam a
totalidade dos posicionamentos dos entrevistados quanto à alteração da identidade
institucional. A fala de S1 salienta o processo de resistência que permeou o reposicionamento
estratégico. “As instituições têm a sua história e tendem a ser muito resistentes a alterações
que mudem o perfil das instituições. Portanto, era um processo que, se adivinharia, muito
complicado, claro que houve algumas resistências, mas, no Conselho Geral, acho que não
houve nenhum voto contra e houve, não sei, duas abstenções; se não foi isso, foi muito perto
disso. Digamos que acaba por ser uma decisão muito consensual, embora, insisto, com
algumas resistências, mas no geral foi, digamos, bem aceito. O que mostra que não foi
propriamente um processo top-down, o que, aliás, seria muito difícil de realizar-se numa
lógica meramente top-down, criaria resistências que seriam muito difíceis de gerir; portanto
houve meio que um misto, de top-down e down-top, que permitiu que o processo se
desenrolasse, como diria, de uma forma bastante pacífica” (S1); ”[...] foi participado.
Naturalmente, o Plano Estratégico inclui opções estratégicas e as opções estratégicas sejam
elas quais forem nunca são do agrado de toda a gente, como também é perfeitamente
natural” (S6). Os depoimentos desses dois gestores vêm ao encontro das ideias de Ball ao
esclarecer que, no âmbito da prática, diversos atores agem e negociam em um processo muito
centrado nas realidades institucionais. Há um movimento de resistência, adesões e acordos
presente na tessitura da reorganização institucional.
Outros gestores também esclareceram que as alterações planejadas e levadas a efeito,
naquele momento, geraram constrangimentos e afetaram a vida das pessoas, principalmente
para aquelas mais diretamente envolvidas nesse processo. “[...] ser uma escola e tirar parte
deste e daquele curso ou até acabar com a escola em si, embora se criasse uma nova escola;
são sempre alterações difíceis” (S2); “Claro que tudo isto, depois, levanta questões sérias
quanto ao reposicionamento, envolvidas aos estudantes, aos docentes, porque implica que
alguns cursos transitem para outras unidades orgânicas, para outras Escolas e, portanto, isto
é muito difícil de implementar. É fácil conceitualizar, mas é muito difícil de implementar”
130
(S6); “[...] o que eu posso dizer é que realmente é a mudança uma coisa muito difícil para
todos nós” (S4); “[...] claro que vai implicar alterações na vida de algumas pessoas, é a
parte que mais me custa também como gestor, prezo muito fazer tudo para que os docentes
que trabalham na instituição tenham as condições ótimas e até, também, em termos pessoais,
para exercerem sua atividade” (S7).
Novamente, estão em pauta as negociações e o jogo de forças que implicam
reposicionamento e seleção de disciplinas e cursos no interior da instituição. Nesse sentido, o
currículo é negociado por sujeitos, que organizados em grupos expressam suas demandas,
engendrando-as em meio às relações de poder, como resultado das disputas travadas no
âmbito governamental ou institucional, como nesse caso (LOPES; MACEDO, 2011b).
De modo geral, os gestores concordam com os eixos prioritários e objetivos
estratégicos e operacionais presentes no documento. Eles citaram, por exemplo, os estudos
contratados pela instituição por assessorias externas. Entretanto, como o consenso em grandes
instituições é algo difícil de conseguir, também aqui há gestores que preferem se manter à
margem do processo, não reconhecem as políticas institucionais ou não se sentem
representados por elas. Quando questionado sobre as atuais políticas do P.Porto, o gestor (5)
limitou-se a dizer: “Isso terá que perguntar ao IPP [...], não somos nós que fazemos as
políticas do IPP”. Ele manifestou seu incômodo ao abordar tais questões e, de certo modo,
negou a pertença institucional. De forma acentuada também foi a resposta de (S2) ao fazer
referência à política institucional: “[...] se me perguntar por uma política geral do IPP que
depois aqui seja posta em prática, eu não vi, acho que as escolas o que fazem é elaborar a
sua própria política exceto, por exemplo, pelo orçamento que vem do IPP [...]” (S2).
Esse movimento que vem ocorrendo no P.Porto não pode ser compreendido de modo
isolado, pois há toda uma configuração de políticas, influências e regulações supranacionais e
nacionais discutida em capítulos anteriores, que, no âmbito da União Europeia, traz reflexos
para os Estados, entre eles Portugal. Ao readequarem suas políticas internas na lógica do
Processo de Bolonha, impeliram que as instituições também buscassem realizar ações que
lhes colocassem em condições de igualdade com outras instituições, tanto internas quanto
externas.
Como resultado, a lógica que vem norteando as ações institucionais submete a
educação, e, principalmente, a educação superior às leis do mercado, que fica refém da
racionalidade técnica, altamente amparada por ferramentas de administração, a exemplo de
consultorias externas, eficiência, qualidade, avaliação em larga escala. Nessa perspectiva,
possibilitam competir em várias arenas, entre elas a oferta formativa, a qualidade, os alunos,
131
os quais, como clientes, compram um produto vendável no mercado do Ensino Superior: a
formação. No eixo de governação e gestão estratégica, encontra-se: ―Consolidação do IPP
como instituição pública pautada por valores de accountability, segundo um modelo de
organização racional e colaborativo‖. Para esse eixo, há vários objetivos estratégicos, entre
eles: ―Generalizar na instituição uma prática sistemática de avaliação da satisfação dos
stakeholders‖ e ―Implantar o Sistema Interno de Garantia da Qualidade, unitário e integrado,
nas vertentes Ensino/Aprendizagem e Serviços‖ (P.PORTO, 2014, p. 28).
No decorrer das entrevistas, os outros gestores e também S5 e S2 foram citando
algumas ações que estão em desenvolvimento. Ao analisar a fala dos gestores e os eixos do
Planejamento Estratégico, considera-se, aqui, que ambos estão alinhados, pois os gestores, em
sua maioria, reconhecem tais ações como políticas e expressam sua concordância. A atual
política de maior importância para os gestores e que está em pauta de discussões dos últimos
anos será concretizada a partir do ano letivo de 2016, conforme detalhamento efetuado no
capítulo da metodologia desta tese. Para os gestores, essa política está centrada na ação de
“[...] clarificar, digamos, a área essencial de cada uma destas escolas” (S1); “[...] procurou-
se, no âmbito de uma reflexão sobre a política em geral, reorganizar a nossa oferta
formativa” (S2); “[...] o Politécnico do Porto está a implementar aquilo que neste momento
foi o desenvolvimento de seu Plano Estratégico, plano de reposicionamento estratégico”
(S6); “[...] o realinhamento é uma questão interessante e só peca por tardio [...] é mais
importante para o Instituto do que para nossa escola que já tem uma dimensão suficiente
uma área bem definida” (S5).
Os gestores destacam a necessidade de concentrar e aumentar a massa crítica de cada
área do conhecimento que está intimamente ligada à imagem institucional, com uma
identidade claramente definida. Tem-se aqui a ideia da essência, da existência e da associação
entre as duas (URBANO, 2011a, 2011b). O P.Porto objetiva competir por visibilidade no
espaço do Ensino Superior português. Nesse sentido, o realinhamento das áreas e a realocação
dos cursos entre as unidades têm o objetivo de racionalizar investimentos e custos. Conforme
vem-se discutindo e também presente nos depoimentos dos gestores na Elaboração do
Planejamento Estratégico, foram contratadas assessorias externas, ou seja, experts em
planejamento, descentralização e racionalização de recursos e pessoas para alcançar a
competitividade em uma estrutura heterárquica. ―Dentro e através desta heterarquia e de
muitos outros como ela, novas sensibilidades organizacionais, valores, perspectivas,
interesses e narrativas políticas são colocadas em jogo e legitimadas‖ (BALL, 2009, p. 2).
132
Nessas configurações, a performatividade é o cume da governança que, ao seduzir
colaboradores, ganha em eficiência e visibilidade (BALL, 2012a).
Trata-se de uma política institucional que, de forma agressiva, se impõe perante as
limitações estabelecidas pela legislação. A realocação envolve não somente a criação e a
extinção de escolas e cursos, mas também a aquisição de prédios em locais mais centrais, a
exemplo dos localizados no Polo Universitário, marcando a atuação institucional em espaços
demarcados por outras instituições em áreas específicas. Além da alteração da marca
institucional que deixa de ser ―IPP‖ para tornar-se ―P. PORTO‖, “dentro de um plano ainda
mais geral de valorização da imagem do próprio IPP; coisas também como o próprio
logotipo, a designação das Escolas, que ainda recentemente foi alterada, as relações com a
comunidade... Tudo isso foi bem pensado e foi planejado; coisa que até aí não tinha sido
feito, não tinha sido feito desse modo, tinha sido mais adhoc, feito um bocadinho segundo as
circunstâncias..” (S2); “[...] à nova imagem, eu diria, à nova oferta formativa do IPP” (S4).
Essa imagem evoca a ideia do novo, de reinventar-se, de uma empresa de sucesso altamente
engajada em conquistar clientes (COSTA, 1996), mas também uma arena política na qual as
decisões são negociadas entre grupos de maior ou menor poder e influência.
Ao longo deste capítulo, foram apresentados elementos que auxiliam na compreensão
de como a identidade dos dois Institutos vai sofrendo, em tempos distintos, a metamorfose
entre a identidade técnica e profissional que os constituiu e a que se apresenta hoje. Ambas as
instituições foram criadas para responder às necessidades de formação em um tempo histórico
situado e como fruto das políticas de governo em seus contextos específicos. Atualmente,
estão inseridos no Ensino Superior com o alargamento de suas atividades, o que fatalmente
interfere na construção da identidade e atinge gestores e professores. A identidade é
continuamente cingida pelas demandas e pelas contingências externas.
Como reflexo da competitividade e da globalização a que estão expostas, as duas
instituições fazem uso de ferramentas de gestão, nomeadamente o Planejamento Estratégico,
que, como diretriz da política, é um documento adotado em todas as instituições. Os
depoimentos dos gestores trouxeram evidências do modo como os documentos foram
elaborados. Em ambos, a metodologia apresentada nos documentos pretendeu ser
participativa, mas os gestores, em alguns casos, têm posicionamentos distintos sobre o
processo.
No IFC, a consulta aos documentos e os depoimentos dos gestores possibilitaram
perceber que há carência de articulação e integração entre o PE e o PDI, com uma cultura de
planejamento e resultados que ainda está em processo de construção. No P.Porto, o PE e o
133
Manual de Qualidade estão articulados com maior aproximação entre os objetivos e diretrizes,
com uma cultura sólida de planejamento e resultados em médio e longo prazo, o que também
está relacionado ao tempo de existência institucional. Enquanto o P.Porto tem décadas de
experiência em gestão e planejamento, o IFC, com menos de uma década, vai de modo
embrionário construindo as experiências de gestão e planejamento, ao elaborar suas diretrizes
institucionais.
Nos dois Institutos, estão latentes as disputas de poder, os acordos, as resistências e as
táticas que são construídas após a leitura inicial da política, ou seja, a sua interpretação. São as
respostas forjadas após a pergunta: O que vamos fazer? Nesse sentido, ao colocar em pauta o
desenvolvimento regional, o IFC direciona seu olhar para as carências regionais onde seus
campi estão instalados, com o viés na inclusão social, fruto de uma política de governo que,
de certo modo desafiou as recomendações internacionais quanto à redução de financiamento
estatal, com a criação da Rede Federal, o que beneficiou uma parcela significativa da
população. No P.Porto, no contexto da União Europeia e de Bolonha, as instituições de
Ensino Superior vivenciam a dualidade do sistema e estão mais voltadas à competitividade e à
prestação de serviços. No entanto, o ponto crucial de todo esse processo é identificar como os
gestores no exercício de suas funções traduzem as diretrizes da política. Essa e a tarefa dos
próximos capítulos.
134
5 INTERPRETAÇÕES E TRADUÇÕES DA POLÍTICA NO IFC
Aí é que estava a esperteza do Camarada Napoleão - disse.
- Ele fingira ser contra o moinho de vento, apenas como manobra
para livrar-se de Bola-de-Neve, que era um péssimo caráter e uma
influência perniciosa. Agora que Bola-de-Neve saíra do caminho, o plano
podia prosseguir sem sua interferência. Isso era uma coisa chamada tática.
Repetiu inúmeras vezes “Tática, camaradas, tática!”, [...]. [...] não estavam muito
certos do significado da palavra, mas Garganta falava tão persuasivamente [...] que
aceitaram a explicação sem mais perguntas.
(ORWELL, 2000, p. 19-20).
Nos capítulos anteriores, empreendi o desafio de articular a rede de influências das
políticas globais à elaboração das políticas nacionais, de forma a evidenciar o processo pelo
qual as regulamentações afetam a identidade institucional. Como fio de Ariadne, venho
traçando uma discussão do global para o local e, neste, no micro espaço institucional. Neste
capítulo e no próximo, proponho-me especificamente, conforme assinalado na introdução, a
identificar as estratégias e as táticas adotadas pelas instituições, com vistas a
implantação/consolidação da Pós-Graduação e da pesquisa no contexto de reorganização
como instituições de Ensino Superior.
Nestes dois capítulos, as entrevistas realizadas com os gestores são a expressão
máxima desta tese porque representam as estratégias e as táticas utilizadas por eles, no
contexto institucional, para responder aos desafios impostos por condicionantes externos, a
exemplo da rede de influências articulada às políticas e à materialização do ciclo de políticas,
que expressa a mobilidade das ideias desde o contexto de influências até o contexto da
prática. Nesse movimento, os espaços da gestão são singulares porque transitam pelas várias
dimensões que compõem uma instituição e expressam o como fazer na prática. Assim ficam
evidentes as lutas travadas, as disputas de poder, os consensos construídos. Por esse motivo,
retomo a tese de que, na tradução das políticas, no contexto da prática, os institutos constroem
suas estratégias e suas táticas forjadas em redes de poder e disputas sustentadas na luta pela
construção/afirmação da identidade institucional no campo do Ensino Superior, buscando
reconhecimento nas atividades relacionadas à Pós-Graduação, pesquisa e produção de
conhecimento.
Ao olhar para o local (IFC) e suas peculiaridades, é preciso considerar a complexidade
das políticas públicas e suas redes de conexões com o macro contexto. É um exercício de
compreensão na perspectiva da tradução da política e sua vinculação aos contextos
econômicos, sociais, políticos, culturais, profissionais e educacionais, por si só complexos.
Ao considerar o conjunto de fatores que influenciam a caminhada do IFC, a trajetória
135
profissional dos gestores é indicadora, neste caso, também do itinerário formativo que cada
um deles vivenciou.
Para efeitos de análise, as entrevistas foram organizadas em quatro tópicos: Dilemas
da transição da identidade de professor/pesquisador para gestor; Contradições da política:
diretrizes, avaliação e realidade em movimento; Fragilidades do diálogo e articulação do
planejamento entre setores; Estratégias de tradução da política no IFC.
5.1 DILEMAS DA TRANSIÇÃO DA IDENTIDADE DE PROFESSOR/PESQUISADOR
PARA GESTOR
Para apreender, ainda que brevemente, os dilemas da gestão vivenciados pelos
entrevistados, neste caso específico, necessário faz-se considerar suas experiências nos
âmbitos da profissão e da gestão. Em um contexto marcado pela acelerada expansão
institucional, havia a influência de pelo menos quatro variáveis, pois, como discutido no
capítulo 2, a maioria dos gestores que ingressou após a criação do IFC não vivenciou o
movimento de transição e assumiu precocemente as funções de gestão. Assim, a instituição
iniciava sua atuação em áreas totalmente distintas das até então praticadas, havia a inserção
em um novo nível de ensino com perfil formativo diferenciado, aumento repentino nos
números de professores e funcionários e urgência na ampliação da infraestrutura.
Os discursos dos gestores por si só são reveladores de alguns fatores a considerar:
elevada formação, pouco tempo no quadro de efetivos da instituição e o desafio de assumir
precocemente funções de gestão. Ou seja, na maioria dos casos, são professores novos na
instituição e na gestão da pesquisa, mas com experiência na realização de pesquisas. No
entanto, o fato de desenvolver pesquisa em um projeto como pesquisador ou como bolsista
difere do ato de planejar e pensar a pesquisa institucionalmente, fato este discutido pelos
entrevistados.
S7 reconhece que ser bolsista de pesquisa e ser gestor de pesquisa são atribuições
distintas que requerem habilidades diversas. ―Uma coisa é ser mestrando e doutorando como
bolsista, e ter que correr atrás de verba; outra coisa é estar no outro lado tentando
implementar essas políticas aqui.” Essa afirmação é reveladora do esforço de criar-se uma
cultura de pesquisa institucionalizada, que implica criar estratégias para responder aos
desafios impostos pelas políticas, nesse caso, inserindo profissionais que reconhecem a
importância de realizar-se pesquisas, dada sua formação, mas que reconhecem também a
necessidade de domínio de outras competências para a gestão da pesquisa e sua implantação
136
em um contexto culturalmente forjado e predominantemente constituído pela atividade de
ensino técnico.
Nesse contexto, o que se tem é um processo que exige transitar entre várias
identidades nas quais os neo gestores estão envolvidos. Todos constituíram-se pesquisadores
durante o processo formativo, mas, para além disso, são pessoas e professores, portanto
também com uma identidade em construção transitando entre as identidades pessoais e sociais
que, separadas e integradas, recebem continuamente tanto influências internas como externas.
No entanto, essas identidades também necessitam ser consideradas em tempos e situações
específicas (OLSEN, 2008).
A complexidade natural do processo de constituição da identidade dos docentes
gestores, nos limites desta pesquisa, é acrescida pelo processo de mudança de identidade
institucional. A travessia entre Colégios Agrícolas/Escolas Agrotécnicas para IFC altera sua
identidade institucional – do ensino, para o ensino, a pesquisa e a extensão –, mas também é
alterada pelas ferramentas de gestão introduzidas nas instituições públicas que se aproximam
da cultura de resultados, com a exigência do planejamento em longo prazo. Nessa lógica:
Os pontos-chave de ligação entre a reestruturação e a reavaliação (ou
redirecionamento ético) do setor público são os discursos de excelência, efetividade
e qualidade e a lógica e cultura do novo gerencialismo. Tomando este último
primeiramente: onde o neo-taylorismo (velho gerencialismo) focaliza a
intensificação dos sistemas de controle direto, o novo gerencialismo oferece um
modelo de organização ―centrado nas pessoas‖ que vê o sistema de controle
burocrático como difícil de ser gerenciado, pouco produtivo para a eficiência e
repressivo do ―espírito empreendedor‖ de todos os empregados. (BALL, 2006, p.
12).
À medida que o novo gerencialismo é centrado nas pessoas, e o professor entra no
contexto da gestão - aqui entendido como gestor de pesquisa, extensão, pós-graduação e
inovação -, ele se insere também em um campo de atuação que, em termos de gerencialismo
nas instituições públicas, é o critério mais acentuado, no qual são cobrados produtos
vinculados aos resultados, a exemplo da produção científica e da publicação. O
gerenciamento dos resultados controlado pelos novos gestores dos serviços públicos ―[...]
alcançam os propósitos das políticas de Estado por meio de uma combinação de práticas
micro-disciplinares e controle a distância‖ (BALL, 2006, p. 15). São essas práticas de controle
que impactam diretamente na produção e na organização do trabalho docente em que cada um
é responsável pelo resultado conseguido, em uma constante busca pela excelência e pelos
resultados na academia, na empresa e na sociedade.
137
As estratégias do neo-gerencialismo, que trazem agregadas a ideia de
performatividade, parafraseando Ball (2003), são tão intensas que não mudam simplesmente o
que as pessoas, como professores, gestores e pesquisadores, fazem, mas alteram o que eles
são, ou seja, a sua ―alma‖. No caso desta pesquisa, os gestores, são professores que envoltos
em suas atribuições controlam o grupo de docentes, seus colegas de trabalho, o que produz
alterações nas atitudes e nos comportamentos de ambos os lados.
O movimento de transição de Escola Agrotécnica/Colégio Agrícola para Instituto foi
vivenciado por dois dos entrevistados. Um deles, S4, que ingressou na Escola Agrotécnica em
2006, relatou que muitos professores ficaram com dúvidas e questionamentos sobre o
processo: ―Como seria?‖. Ele destaca que, desde o início de suas atividades, sempre esteve
vinculado à pesquisa, o que foi determinante para aceitar o desafio na gestão. “[...] sempre
desenvolvi pesquisa, trabalhei sempre com pesquisa, desde que entrei na instituição, mesmo
que não houvesse nenhum estímulo mais acentuado para a pesquisa antes de ser Instituto.
Sempre tinha lá um projetinho ou dois, que a gente desenvolvia. [...] Com a criação dos
Institutos, começou a ter esse fortalecimento para a pesquisa, cada vez foi mais pesquisa,
extensão, tentando fazer com que tivesse esse desenvolvimento de novos conhecimentos
dentro do próprio Instituto, também tentando atrelar pesquisa com o ensino.” (S4).
As ―dúvidas‖ e os ―questionamentos‖ enfatizados por esse entrevistado também foram
evidenciados na pesquisa desenvolvida por Ortranto (2010), discutida no capítulo referente à
identidade do IFC. A pesquisadora levantou os principais motivos apresentados pelas
instituições para a tomada de decisão favorável ou contrária à transformação em IFET. Nesse
sentido, os questionamentos giravam em torno do financiamento, das atribuições, das
penalidades45 que as instituições poderiam sofrer se não aderissem à proposta e,
principalmente, quanto ao aumento do efetivo de docentes.
O outro entrevistado, S3, por sua vez, iniciou a trajetória na década de 1990, em uma
escola agrotécnica que, hoje, compõe o IFC, mas, no momento da transição, estava atuando
no CEFET em outro estado, fato que, segundo ele, enriqueceu sua experiência ao coordenar
um dos cursos de graduação tecnológica, em processo de implantação. No intervalo de tempo
que esteve afastado da Escola Agrotécnica Federal, S3 teve a oportunidade de “[...] trabalhar
em uma universidade [...] fundacional do Estado de Santa Catarina [...] e justamente uma
das atribuições que recebi foi assessorar a coordenação de Pós-Graduação do campus [...]”.
45
Entre as penalidades, merece destaque o fato de que as escolas que não aderissem à transformação não seriam
elevadas à categoria de instituição de Ensino Superior e, quanto ao financiamento, também ficariam em
desvantagem, pois a prioridade de investimento do MEC seria para as escolas que aceitassem as condições
propostas na incorporação. (ORTRANTO, 2010).
138
Ainda que somente tenha retornado às atividades no IFC em 2013, sua trajetória é marcada
pela aproximação com a gestão da Pós-Graduação e desenvolvimento de pesquisa, tendo
atuado, não só na Assessoria de Pós-Graduação, mas também como professor de várias
turmas em cursos do lato sensu e em projetos de pesquisa, tanto com apoio interno como
externo.
A solicitação de retorno de S3 ao IFC foi desencadeada por uma situação pessoal, mas
ele considera que sua experiência com os trâmites da Pós-Graduação tenha sido fundamental
para assessorar, inicialmente, a Coordenação da Pós-Graduação a pedido do Reitor e, mais
tarde, coordenar a área de Pós-Graduação, vinculada à Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-
Graduação e Inovação. “Houve o interesse do IFC de que eu voltasse e contribuísse [...].
Então, essa trajetória, por mais que eu tenha trilhado alguns caminhos na pesquisa e na pós-
graduação – lato sensu, diga-se de passagem – como professor, mas o fato de eu ter
assumido a coordenação de Pós-Graduação, acho que tem a ver mais com uma situação de
momento mesmo, que foi o afastamento da professora que ocupava o lugar [....]. É, o aceitar
foi decorrente, vamos dizer assim, dessa experiência que eu achava que tinha, do
conhecimento, por exemplo, das normas, em função de ter participado da elaboração, do
planejamento e da aprovação dos cursos em outros lugares... Enfim, então... Conhecia as
normas, [...] não tinha dúvida com relação, não era algo estranho para mim... Um pouco de
experiência, da própria carreira acadêmica, como estudante de Doutorado recém-concluído
e propriamente de professor também. Então isso me deu os elementos que deram, digamos, a
segurança para tocar o trabalho.” (S3).
O destaque de S3 para a experiência sobre os trâmites da Pós-Graduação indica que
conhecer certas vias pode facilitar os encaminhamentos e o exercício das funções de gestão,
tornando-se diferenciais em uma instituição que, naquele momento, não tinha experiências
sobre o processo de implantação de cursos novos, tanto no Ensino Superior como na Pós-
Graduação e, principalmente, com as exigências da CAPES.
S2 iniciou suas atividades no IFC em 2010 e destacou que se vinculou a projetos de
pesquisa ainda na Graduação, seguindo no Mestrado e Doutorado. Como professor, também
começou a atuar com projetos de pesquisa. Ele considera que, apesar das várias alterações no
comando, o trabalho na Pró-Reitoria teve certa continuidade, pelo fato de os substitutos serem
provenientes do mesmo campus (S2 e S4 trabalhavam juntos anteriormente). Para ele, o
desafio de assumir o cargo de gestão o tirou da zona de conforto, mas determinante foi o fato
de trabalhar com alguém que já conhecia, acrescido da possibilidade de trocar experiências
com colegas formados em diferentes partes do Brasil. ―É uma hora interessante de termos
139
essa diversidade aqui dentro, porque o IFC ainda está crescendo, a gente ainda está
desenvolvendo um perfil da nossa instituição: [...] o que nós queremos, o que nós queremos
como pós-graduação, o que nós queremos como Instituto de educação tecnológica, qual a
nossa diferença para uma universidade, por que é que nós somos criados diferentes de uma
universidade?” (S2).
Essas afirmações revelam que o caminho ainda está em construção, com a presença de
incertezas que os próprios gestores reconhecem. A diversidade que retira a zona de conforto
anteriormente institucionalizada também desafia os gestores a pensar nas possibilidades de
respostas. Cada instituição, em ambientes cada vez mais competitivos, necessitam
desenvolver suas estratégias, que pensadas internamente são projetadas para alcançar
reconhecimento externo. A política educacional é a mesma para todas as instituições, mas a
forma como o IFC responde às demandas é que será, nos próximos anos, o diferencial em
relação às universidades já estabelecidas. De certo modo, é a gestão o elemento articulador
que transita entre os vários contextos citados por Ball, Maguire e Braun (2012), ou seja, os
contextos situados, as culturas profissionais, os contextos materiais e os contextos externos.
Os autores consideram que estes são constitutivos dos modos como a política é traduzida nas
instituições. Em relação aos contextos situados, os autores referem ser os aspectos vinculados
à história e ao ambiente; as culturas profissionais são os valores e os compromissos pactuados
pelos professores; os contextos materiais, aqueles referentes à infraestrutura, e os contextos
externos estão ligados às pressões em geral vinculadas à política.
Ao fazer inferência ao pouco tempo de existência do IFC e a mudança de perfil
ocorrida na transformação de Escola Agrotécnica para Instituto, S2 ressalta: ―[...] o IFC,
como uma instituição jovem ainda, foi formada há pouco tempo. [...] mas hoje ele já é muito
mais parecido com uma universidade [...] porque tem toda uma caminhada diferenciada de
uma escola agrotécnica, que eu vejo é um pouquinho mais fechado [...]”. O entrevistado
considera ainda que: ―[...]os professores das escolas agrotécnicas, tinham uma percepção
bastante diferente desse pessoal que está entrando mais tarde, que é um pessoal um
pouquinho mais ligado à academia, à uma universidade, e com uma concepção um
pouquinho diferente daqueles professores que já estavam antes” (S2).
A percepção diferenciada do perfil dos professores – os professores das escolas
agrotécnicas e os novos ingressantes, destacada por S2, pode ser entendida, nas entrelinhas,
como o movimento de resistência e adaptação às novas exigências institucionais. Como
escolas agrotécnicas, não havia a necessidade de pesquisa e publicação; e, embora ela
existisse, a ênfase estava mais nos processos técnicos e no ensino. Conforme discutido em
140
capítulo anterior, havia uma rotina estabelecida que, quando alterada pela nova
institucionalidade, provocou abertura e alargamento das atribuições do grupo que estava
habituado a desenvolver as atividades na concepção das escolas técnicas, aumentando,
significativamente, a natureza das atividades, que passaram a transitar entre a docência e a
pesquisa. Por exemplo, a docência, deixou de ser específica do ensino médio e técnico para
assumir outros níveis como a Graduação e a Pós-Graduação. A atividade de pesquisa, por sua
vez, requereu o envolvimento com editais e outros programas de nível nacional, que foram
iniciados, como o PRONATEC, Mulheres Mil, ampliação da oferta de cursos técnico pós-
médio, Projeto Cães-guia46, Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid)47,
Programa de Educação Tutorial (PET)48, Programa de Consolidação das Licenciaturas
(Prodocência)49.
S1 ingressou no IFC em 2014, como professor, e assumiu a gestão em fevereiro de
2015. Esclareceu que, no início, relutou em aceitar o cargo pelo fato de estar há pouco tempo
na instituição, mas, após conversas com colegas, aceitou. Seus argumentos: “[...] é
importante ter uma participação, conhecer como funciona essa parte da gestão, porque [...]
enquanto professor, [...] não se tem conhecimento de como é o funcionamento e é
interessante que todo professor passe por esse processo” (S1). Além disso, S1 aceitou a
função pensando em crescer profissionalmente. Ele considera que esse setor tem o triplo
desafio de articular pesquisa, pós-graduação e inovação e que, das três, a pós-graduação lhe é
a mais desconhecida. Na realização das atividades, recebe constantemente assessoria da Pró-
46
O Projeto Cães-guia iniciou em 2010 como uma ação do Núcleo de Atendimento às Pessoas com
Necessidades Específicas (NAPNE), recebendo o apoio da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
(SETEC/MEC) e da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD/SDH),
sendo posteriormente incorporado como uma das ações do Plano Nacional para as pessoas com deficiência, o
―Viver sem Limite‖, lançado em 2011 pelo Governo Federal. O projeto, que visa o aumento do número de cães-
guia, está sendo ampliado para outros seis Institutos Federais de diferentes regiões do país. (Fonte:
http://ifc.edu.br/pos-graduacao-em-treinador-de-caes-guia/). 47 O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) é uma iniciativa para o aperfeiçoamento e a
valorização da formação de professores para a Educação Básica. O Programa concede bolsas a alunos de
licenciatura participantes de projetos de iniciação à docência desenvolvidos por Instituições de Educação
Superior (IES) em parceria com escolas de Educação Básica da rede pública de ensino. Os projetos devem
promover a inserção dos estudantes no contexto das escolas públicas desde o início da sua formação acadêmica
para que desenvolvam atividades didático-pedagógicas sob orientação de um docente da licenciatura e de um
professor da escola. (Fonte: http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid/pibid). 48 O Programa de Educação Tutorial (PET) é desenvolvido por grupos de estudantes, com tutoria de um docente,
organizados a partir de formações em nível de graduação nas Instituições de Ensino Superior do País orientados
pelo princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e da educação tutorial. O grupo PET, uma
vez criado, mantém suas atividades por tempo indeterminado. No entanto, os seus membros possuem um tempo
máximo de vínculo: ao bolsista de graduação é permitida a permanência até a conclusão da sua graduação e, ao
tutor, por um período de, no máximo, seis anos, desde que obedecidas as normas do Programa. (Fonte:
http://portal.mec.gov.br/pet.). 49 O Programa de Consolidação das Licenciaturas (Prodocência) é uma ação da Capes cuja finalidade é o
fomento à inovação e à elevação da qualidade dos cursos de formação para o magistério da Educação Básica, na
perspectiva de valorização da carreira docente. (Fonte: http://www.capes.gov.br/educacao-basica/prodocencia).
141
Reitoria, pois se sente inseguro para tomar decisões, devido ao pouco tempo que integra a
instituição como docente e como gestor de pesquisa. Sobre esse aspecto, no Regimento Geral
do IFC versão 2015, a Coordenação de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação do campus está
subordinada a essa Pró-Reitoria. Todavia, no documento, no Art. 146, observa-se que o
destaque está centrado nas ações de pesquisa. A Pós-Graduação é citada somente no título. De
acordo com este artigo:
O IFC manterá mecanismos de desenvolvimento das ações de pesquisa, cuja
execução estará a cargo do quadro de servidores com acompanhamento e orientação
das Coordenações de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação dos câmpus, sob a
supervisão da Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação. (IFC, 2015, p.
55, grifo nosso).
O investimento na criação de mecanismos de desenvolvimento da pesquisa parece ser
o fio condutor para chegar à Pós-Graduação e cumprir os requisitos exigidos para a aprovação
de novos cursos de stricto sensu. À medida que os documentos são revistos e como
transmissores de discursos capazes de expressar as traduções institucionais, os processos e as
necessidades também vão ficando mais claros para a equipe gestora. Esse também pode ser
um indício que explica por que a Pós-Graduação é a mais desconhecida para o S1, ainda que
pese o pouco tempo que exerce a função. O fomento às atividades de pesquisa vem sendo o
fio de Ariadne que conduz as estratégias dos gestores e a tradução da política em meio aos
labirintos e às encruzilhadas, buscando implantar a ambiência da pesquisa para alcançar a
Pós-Graduação.
O discurso escrito sistematizado no Regimento Geral (2015) expressa uma das formas
de tradução da política. Ao dar visibilidade à pesquisa atrelada ao acompanhamento dos
gestores da Pós-Graduação, desenvolve-se um conjunto de diferentes artefatos e recursos
materiais controladores de sentidos do social e das estratégias discursivas manifestadas nos
micro-espaços. Há um movimento de constante fabricação do discurso institucional (BALL;
MAGUIRE; BRAUN, 2012); nesse caso, do IFC, com suas peculiaridades. Para responder às
políticas, o foco central tende a ser a organização interna cuja infraestrutura é uma das
variáveis a ser consideradas.
Esse movimento de produção e de ampliação dos textos institucionais pode ser
considerado um indicativo de que, à medida que o IFC se organiza nessa nova
institucionalidade, vai agregando também elementos da identidade no processo de travessia de
escola técnica para Instituto Federal, com ampliação de todas as dimensões técnicas,
administrativas, pedagógicas, científicas. Trata-se de um modo peculiar de traduzir a política.
Inicialmente, os documentos foram produzidos considerando situações de certo modo,
142
hipotéticas, pois não representavam o caminho até então percorrido. Era um lançar-se ao
novo. Pode-se dizer um olhar que buscava atender às novas demandas legais requeridas, uma
forma de tradução produzida por um conjunto de práticas discursivas (BALL; MAGUIRE;
BRAUN, 2012) que visam atender demandas pensadas em esferas externas, como, por
exemplo, as políticas nacionais vinculadas à rede de influências.
Considerando que a Lei de Criação dos Institutos foi sancionada em 20 de dezembro
de 2008, quando o ano letivo já havia sido concluído, encerravam-se também as escolas
técnicas e agrotécnicas que, no ano de 2009, eram os recém-nascidos Institutos Federais. No
papel, sob o ponto de vista legal, essas instituições ―[...] possuem natureza jurídica de
autarquia, detentoras de autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-
pedagógica e disciplinar [...]‖ (BRASIL, 2008b, p. 1). O discurso da alteração da identidade e
das peculiaridades estava resolvido, mas o perfil dos atores que lá estavam não mudou por
decreto. É necessário um tempo de amadurecimento que, aos poucos, também é acrescido
pela experiência que vai sendo construída, o que intensifica o significado das falas dos
gestores que trazem à tona essas questões.
No plano da produção de textos, é possível almejar uma nova identidade; no plano da
produção dos discursos falados também, mas articular o dito e o escrito, no âmbito da prática,
lidando com resistências e tensionamentos, implica ser ―outro‖, adquirindo uma nova
identidade e envolvendo outros fatores como a história construída, discutida no capítulo
quatro desta tese. A cultura institucional instalada e as relações de poder passam a ser outras.
Transitar da produção de texto para a prática requer desenvolver estratégias discursivas
―fabricadas‖ para traduzir em ações o que está posto no texto.
Ao explicitar os motivos que o levaram a aceitar o desafio da gestão, S7 esclareceu
que foi indicado pelos superiores por haver cursado Pós-Graduação, como bolsista com
dedicação exclusiva, mas também ―[...] porque vi que no nosso campus, apesar de termos
servidores que fizeram Mestrado, Doutorado, mesmo esses servidores, professores, não
tinham toda uma vivência de pesquisa muito intensa” (S7). S6 considera que foi convidado
para a gestão de pesquisa por três motivos: o primeiro por ser ―[...] um dos professores que
mais faz pesquisa aqui‖. S6 ressalta que vem trabalhando com projetos de grande porte no
CNPq e na FAPESC desde 2012, e, portanto, anterior ao seu ingresso na instituição. O
segundo motivo “[...] é a retribuição financeira, e o terceiro, a contribuição para o
desenvolvimento da pesquisa no campus, que acredito ser relativamente, reduzido.” (S6).
Ao ingressar no IFC em 2014, S5 possuía experiência como professor de educação
superior em uma Universidade e já havia prestado concurso anterior para ingresso no IFC.
143
Entre os anos de 2008 e 2012, apesar de manter o vínculo com a universidade, desenvolveu
suas atividades de docência durante um ano como professor cedido ao IFC. Nesse período, ele
elaborou um projeto que foi aprovado junto à CAPES para alocação de “[...] professor
visitante sênior. [...] Eu sempre trabalhei voltado à pesquisa”. Ele considera ainda que “[...]
a pesquisa no campus é uma das questões estratégicas da implantação de cursos lato e stricto
sensu dessas áreas”, referindo-se aos projetos enviados à CAPES na área de Produção e
Sanidade Animal e que teve a proposta recentemente aprovada50
como primeiro curso de
stricto sensu da instituição.
Nos depoimentos dos gestores, observa-se o contexto situacional no qual eles se
encontram, as condições materiais nas quais suas funções são exercidas, os problemas
particulares ou as potenciais possibilidades que se mostram para a pesquisa e a Pós-
Graduação em uma instituição que se assume, por decorrência da política, como Instituição de
Ensino Superior. Nessas condições, a política é traduzida. Nesse movimento, compreende-se,
aqui, que ―[...] a política cria o contexto, mas o contexto também precede a política‖ (BALL,
2012, p. 19). Significa dizer que as nuances do contexto local dos institutos criam
consideráveis diferenças nos processos de transição e de consolidação da identidade dessas
instituições. Assim, destacam-se, na Figura 12, os dilemas que compõem o dia a dia dos
gestores entrevistados, os quais vão revelando os modos de produzir e traduzir a política no
IFC.
50
A proposta do Curso de Sanidade Animal foi aprovada pela CAPES após a realização das entrevistas.
144
Figura 12 - Dilemas dos gestores na configuração da política no IFC
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Esses dilemas demonstram que, à medida que são inseridas ferramentas de gestão nas
instituições, são alteradas profundamente as dimensões do planejamento, a identidade
institucional e a identidade profissional. Os dilemas institucionais vividos pelos gestores
expressam-se pela necessidade de planejar em longo prazo, lidando com resistências e
disputas internas atreladas à exigência de compreender a política para responder não somente
a ela, mas também para lidar com a transição da identidade institucional. Em um processo
imbricado, unem-se os dilemas profissionais que exigem o trânsito entre a pesquisa, a
docência, o crescimento profissional, o desenvolvimento de habilidades requeridas pela
gestão e a contribuição no desenvolvimento da pesquisa e da Pós-Graduação. Assim, vão
sendo construídas também as novas subjetividades ancoradas nos pressupostos neoliberais
que levam a reorganizar os contextos para responder ao gerenciamento e à performatividade
entendida como ―[...] uma tecnologia, uma cultura e um modo de regulação que emprega
julgamentos, comparações como meios de incentivo e controle baseadas em recompensas e
sanções tanto materiais como simbólicas‖ (BALL, 2003, p. 216).
É o movimento de olhar para as necessidades, maximizando os recursos disponíveis,
captando novos por meio dos editais das agências de fomento e também materializando os
resultados. Nesse caso, os gestores também são professores com a atribuição de pensar, por
145
exemplo, no planejamento em longo prazo em uma escala maior e mais complexa do que a
conhecida sala de aula, o que requer ter o domínio de outras habilidades.
Esse também é um campo que envolve disputas internas e resistências quanto às novas
formas de controle implantadas e às novas atribuições que são delegadas aos
docentes/gestores como resultado do processo em curso. Essa é umas das faces do
gerencialismo, no qual os limites, as possibilidades de ação e os sentidos são determinados
pela estrutura (BALL, 1990). O controle organizacional e as ações individuais são projetados
na perspectiva técnica pautadas na racionalidade para gerar eficiência por meio do controle.
5.2 CONTRADIÇÕES DA POLÍTICA: DIRETRIZES, AVALIAÇÃO E REALIDADE EM
MOVIMENTO
Ao considerarem as especificidades e a trajetória do IFC quanto às diretrizes de
organização, oferta e avaliação, a maior parte dos entrevistados reafirma a diferenciação dos
institutos em relação às universidades quanto à realidade de trabalho, que abrange desde o
Ensino Médio/Técnico até a Pós-Graduação. A indicação do Mestrado profissionalizante por
parte da CAPES é um dos pontos destacados, pois, para os entrevistados, é uma forma de
induzir o crescimento de tais mestrados.
Os gestores também indicaram que as orientações das políticas na esfera federal, na
dimensão macro, são contraditórias e confusas, o que faz com que, muitas vezes, se tenha uma
grande mobilização para cumprir determinadas orientações que, em momento posterior, são
descartadas. Nesse sentido, S2 mencionou a proposta de Mestrado em rede elaborada com a
orientação da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica: “[...] a SETEC discutiu,
orientou e fez um aceno positivo para a abertura de cursos em rede, o nosso Instituto com
outro Instituto ofertando um mesmo curso. Então fizemos a proposta, enviamos para a
SETEC, que iria avaliar até o final do ano passado, mas aí mudou o governo, mudaram as
pessoas que estavam lá, e a proposta não foi nem avaliada”. Ao fazer referência às
avaliações dos projetos enviados à CAPES, a contradição também estava presente: “[...]
quando mandamos uma proposta em que havia professores de vários campi, isso foi um
aspecto negativo. Na pontuação da nossa proposta, isso é um ponto negativo, têm professores
de muitos locais, mas ao mesmo tempo eles querem que a gente faça um curso em rede, ou
seja, que aumenta ainda mais essa distância física” (S2).
No entendimento de S5, o Mestrado Profissional tem mais proximidade com a geração
de tecnologia e com a inserção dos discentes nas demandas do mercado de trabalho. “Ou seja,
146
no momento em que esses discentes, que têm atuação no mercado, estiverem vinculados a um
programa de pós-graduação no Instituto, automaticamente isso gera muita oportunidade em
termos de convênios com as empresas e, obviamente, oportunidade para os alunos do Ensino
Técnico e do Ensino Superior.” (S5). O que por outro lado, segundo esse entrevistado, requer
acentuada participação do corpo docente junto às empresas nas parcerias público-privadas. Ao
referir-se sobre os critérios de avaliação utilizados para avaliar os mestrados acadêmicos e os
profissionalizantes, ele destaca que: “Os critérios se assemelham ao Mestrado Profissional,
mas não são os mesmos. O Mestrado Profissional pressupõe uma produção mais voltada
para a produção de tecnologia, então, por exemplo, a questão da produção do artigo para
publicação, é só um dos produtos, mas que é o grande foco dos Mestrados Acadêmicos. No
Mestrado Profissional, é só mais um dos produtos, porque pressupõe a geração de patentes,
de processos, de produtos” (S5).
Para a CAPES, o Mestrado Profissional (MP)
[...] é uma modalidade de Pós-Graduação stricto sensu voltada para a capacitação de
profissionais, nas diversas áreas do conhecimento, mediante o estudo de técnicas,
processos, ou temáticas que atendam a alguma demanda do mercado de trabalho.
Seu objetivo é contribuir com o setor produtivo nacional no sentido de agregar um
nível maior de competitividade e produtividade a empresas e organizações, sejam
elas públicas ou privadas. (CAPES, 2014, p. s/p).
Esse direcionamento para o Mestrado Profissional aproxima os Institutos na
perspectiva das Ciências Aplicadas com maior vínculo aos setores produtivos, o que sugere
também uma identidade diferenciada da universidade como discutido em capítulo anterior e
mais próximo do perfil formativo desenvolvido pelas instituições antes da transformação
ocorrida em 2008.
A abrangência de atuação desde o Ensino Médio/Técnico até a Pós-Graduação é
entendida como entrave na atuação dos professores no stricto sensu com maior cobrança,
inclusive de publicação. S7 destaca a necessidade de uma política institucional para
reorganização das atividades: “Então, não tem como querer que um professor que atua no
Mestrado e tem três orientandos, dê vinte aulas, sendo que dez são no ensino técnico e cinco
na graduação e mais cinco na pós, entendeu. [...] Se você é de uma área que dá aula no
ensino técnico e entra na pós-graduação, você vai ter que se virar com essas aulas” (S7).
Aqui o entrevistado problematiza o fato de que as disciplinas do Ensino Técnico são
lecionadas por professores com formação mais específica, diferentemente da área de
humanas, por exemplo, que possibilita aos professores atuarem em várias disciplinas, apesar
das especificidades. ―Acho que isso é um ponto, a atuação em vários níveis, é complicado, eu
147
não consigo ver um professor atuando de maneira eficiente desde o Mestrado até o Ensino
Técnico; acho que ele vai ter que se desvincular em parte de uma das coisas. E também para
conseguir, por exemplo, publicar esses trabalhos que vão ser obtidos das dissertações, ele vai
ter que ter uma dedicação maior.” (S7). Esse pode ser um dos motivos pelos quais há
resistências quanto à implantação da Pós-Graduação nos campi, ou seja, ministrar aulas para
mais turmas significaria aumento de trabalho, condição fortemente negada por muitos
professores, o que não exclui a complexidade de se trabalhar em vários níveis.
No entanto, a fala de S7, quanto ao excessivo número de aulas alocadas aos
professores, parece não se confirmar quando se analisa, por exemplo, a quantidade de
professores e a quantidade de alunos, publicada no censo interno com 8.781 alunos e 808
docentes. Se considerado o Termo de Acordo de Metas e Compromissos (2010), com
vigência de doze anos, celebrado entre o Ministério da Educação, representado pela Secretaria
de Educação Profissional e Tecnológica e pelo então Reitor quanto à relação do número de
alunos por professor, fixada em 20 (vinte), observa-se que a média apresenta acentuada
discrepância a menos, pois, de modo geral, a média de alunos por professor fica
aproximadamente em 11 alunos.
A assinatura desse instrumento, mais do que um compromisso assumido, representa a
manutenção do Estado avaliador que prioriza o estabelecimento e o alcance das metas, como
mecanismos de pressão para os gestores e de resistências para os professores situando o
Estado como responsável por acompanhar, supervisionar e fiscalizar a execução. Mais uma
vez: ―É um processo transformacional que engloba um novo conjunto de valores e um novo
ambiente moral‖ (BALL, 2011, p. 217). Fica evidente o potencial de colaboração que os
docentes devem dar para o êxito institucional, pois, por meio de uma boa performance, poderá
ser alcançado o cumprimento das metas.
S4 ainda cita que o fato de existir a obrigatoriedade de atender no mínimo 50% das
vagas para o Ensino Médio dificulta as ações do IFC: “[...] lidar com aluno de Ensino Médio
é totalmente diferente, tem uma forma diferenciada de agir com esses alunos [...]. Boa parte
dos nossos campi ainda oferece internato, aquele Ensino Médio Integrado, ensino técnico. É
outra característica, e isso o pessoal, muitas vezes, não tem como comparar com
universidades quando tem curso superior, não quer saber se você tem número de
horas/aula... Compara, passa a régua e... Ou tem ou não tem” (S4).
Para o gestor, a obrigatoriedade de cumprir os mínimos exigidos por lei, quanto ao
atendimento das vagas para o Ensino Médio, afeta as ações institucionais cotidianas e
dificulta, muitas vezes, o atendimento das necessidades da população residente na região nas
148
quais os campi estão instalados. Isso, segundo ele, se reflete no impedimento da abertura de
novos cursos superiores: “[...] não há possibilidade de abrir para atender melhor a
população em função de que nós temos que atender, oferecer, no mínimo 50% das vagas para
Ensino Médio. E isso engessa. A vida do gestor fica bastante engessada. Às vezes seria
possível expandir muito mais, atendendo melhor, e até facilitar essa comparação com as
universidades, só que a gente fica naquele engessamento” (S4).
Esse depoimento revela que há um paradoxo instalado entre cumprir as metas
previstas na lei e o atendimento das demandas locais. A obrigatoriedade de cumprir o que foi
estabelecido em outros contextos interfere na organização da instituição. Há um novo modo
de governação (LINGARD; CREAGH; VASS, 2012) no Estado neoliberal que produz as
políticas baseadas nas evidências fornecidas pelos números, estabelecendo padrões e metas
para atingir os resultados. Desse modo, são criadas categorias que permitem elaborar
estatísticas, comparar dados e governar a distância com mais eficiência. A política de
avaliação da CAPES também utiliza as bases de dados que são continuamente alimentadas
pelas instituições (HOSTINS, 2014). Os indicadores quantitativos possibilitam controlar e
comparar, o que se desdobra em dados estatísticos. Para responder a essas políticas, as
instituições reinventam-se e fabricam a si próprias, concentrando esforços nas ações que
melhor respondem aos indicadores, o que interfere sobremaneira na vida institucional.
Outro gestor cita o Termo de Acordo de Metas e Compromissos: “[...] no Termo de
Acordo de Metas que foi assinado na criação dos Institutos, o nosso foco de ação é o
atendimento da região de atuação, o atendimento dos arranjos produtivos locais. E isso
realmente complica se formos comparar com as universidades [...]” (S4). De certo modo, o
Termo de Metas ratifica a Lei de Criação dos Institutos quanto à necessidade de contemplar
os mínimos exigidos nos cursos ofertados e à inserção em sintonia com as demandas para o
desenvolvimento local e regional. Em sua fala, esse gestor destaca sua preocupação em
relação à comparação com as universidades, porém não se pode esquecer que se tratam de
itinerários formativos distintos, com objetivos distintos.
A exigência de publicações, ou utilizando a expressão ―produtividade‖, citada por
diversos deles, é um entrave porque requer que se estabeleça uma cultura de pesquisa e
publicações dos resultados. As críticas sofridas pela CAPES51 quanto ao ritmo acelerado de
51
A partir de 1998, a sistemática de avaliação apresentou aprimoramento em termos de ―controle‖ e, ainda que
analisado por pares, passou a utilizar o sistema numérico de 1 a 7, com o objetivo de avaliar e classificar os
programas. As alterações nos padrões de avaliação evidenciam a lógica competitiva de mercado entre os
programas, cujos maiores números de ―produtos‖ garantiriam financiamentos e visibilidade entre os programas e
entre pesquisadores (BIANCHETTI, 2006; KUENZER; MORAES, 2005; HOSTINS, 2006). Os cursos não mais
149
publicações é reiterada por S7: “[...] a CAPES tem uma exigência, principalmente na questão
da produtividade, número de publicações, que acho um pouco exagerada e que não condiz,
necessariamente, com a qualidade da pós-graduação”. Nessa perspectiva, ao longo do
tempo, os programas e seus professores nas universidades iniciaram um ciclo de dependência
aos resultados das avaliações, o que, neste momento, também é um fator determinante para a
aprovação de propostas no âmbito do IFC. Se o resultado de uma avaliação é considerado
ruim, os programas por meio de seus professores necessitam readequar-se, seja por intermédio
do aumento da produção individual ou por outros mecanismos, a exemplo dos projetos de
pesquisa. Essas tecnologias de desempenho são formas de poder que utilizam julgamentos,
comparações e demonstrações, privilegiando versões específicas do que os programas e as
instituições devem ser por meio de comparativos quantitativos (HOSTINS, 2014).
Há uma intensificação no uso de palavras como rede, performance, produtividade,
qualidade, avaliação, inovação52 nos documentos oficiais, a exemplo do atual Plano Nacional
de Pós-Graduação (BRASIL, 2010a, 2010b) que expressam o novo ordenamento a ser
seguido para atingir o sucesso. A chamada de responsabilidade é pessoal, pois é a pessoa
quem deve ―comprometer-se‖ com sua instituição para que obtenha a visibilidade esperada
quanto à produtividade e à avaliação.
Os discursos são alterados conforme o jogo de poder, e a rede de interesses vai sendo
desenvolvida pelos muitos atores. Essas alterações provocam deslocamentos nos quais os
sentidos são construídos e as verdades se legitimam, criando estatutos de verdade e consensos
eram avaliados individualmente e sim como programas, mesmo que os conceitos fossem distintos. Os
indicadores expressavam níveis de competição entre os programas. ―O paradigma ligava financiamento para os
níveis de produtividade, ensino, desempenho institucional e padrões internacionais de qualidade alcançados em
cada instituição.‖ (HOSTINS, 2014, p. 2). O conceito 5 era e continua sendo o máximo para programas que
oferecem somente o Mestrado com alto nível de desempenho. O conceito 4, concedido aos programas com bom
desempenho. O conceito 3, destinado àqueles programas que apresentam os padrões mínimos considerados de
desempenho regular. Os conceitos 1 e 2 são destinados aos programas com desempenho de qualidade abaixo do
padrão mínimo esperado, implicando diretamente na não renovação e no reconhecimento dos cursos de Mestrado
e Doutorado. A elevação das exigências em relação ao que era referência de qualidade, acrescentado pelo
ingrediente competitividade entre os programas, estava clara no discurso oficial, mas o que ocorreu
paralelamente foi a diminuição drástica de recursos. Os critérios necessitavam ser reajustados para um nível de
exigência maior para que poucos tivessem os incentivos concedidos aos programas de excelência o que
caracteriza uma intencionalidade oculta na efetivação da dinâmica de avaliação. Essa lógica vem se
intensificando e mostrando-se cada vez mais agressiva do ponto de vista da precariedade do trabalho do
professor que, como pesquisador, se vê irremediavelmente ―obrigado‖ a produzir. O discurso da produtividade e
da qualidade instalado no período de 1990 em função do contexto nacional levaram os programas a se
adequarem, tornando-os competitivos entre si para fazer jus aos reduzidos custeios. O discurso pela qualidade de
excelência ofusca, por exemplo, a falta de recursos para financiamento e elege, na prática, somente alguns aptos
a recebê-lo. 52
O conceito de inovação, em geral, é correlacionado à pesquisa e ao desenvolvimento (P&D), porém é distinto
e mais amplo. Inovação implica não somente tecnologia, máquinas e equipamentos, mas vai além, contemplando
também mudanças incrementais, novas funcionalidades, bem como melhorias na gestão ou novos modelos de
negócios, associados à conquista ou à criação de novos mercados. (BRASIL, 2010a, p. 180).
150
na sociedade. ―No entanto, esses fluxos não são assimilados da mesma maneira pelas políticas
educacionais de Educação. Esta assimilação vai depender da história da política educacional
no país em questão e de outros fatores relacionados à política nacional.‖ (AKKARI, 2011, p.
14).
S6, por sua vez, considera que, na teoria, os institutos foram equiparados às
universidades, mas que, na prática, principalmente em relação à pesquisa, há distinção, pois
os projetos que vêm sendo aprovados para os institutos são de baixo valor. “[...] há uma
distinção na prática em relação a institutos e a universidade.” (S6). Para Ortranto (2012, p.
75): ―As diferenças entre os IFs e as universidades são tão profundas que cabe perguntar se é
justo que a avaliação seja a mesma‖. S8 afirma que: “[...] quanto ao processo de avaliação
dos cursos, não poderemos ser comparados às grandes universidades, que já estão há anos
com uma pesquisa bem avançada, laboratórios estruturados e um quadro de professores de
grande capacitação e experiência.” (S8). Sobre esse aspecto, as universidades atuam no
Ensino Superior desde sua criação, contando com quadros organizacionais estruturados e
larga experiência em pesquisa e extensão (ORTRANTO, 2012).
Esse fato também foi destacado por S1, mas enfatiza que a reitoria vem propondo
ações a exemplo da participação em editais externos e internos e elaboração de projetos para
equipar os laboratórios. Ao mesmo tempo, vem estimulando a qualificação dos professores e
dos técnicos administrativos, via editais para afastamento integral ou parcial como bolsista,
para cursar a Pós-Graduação. Como se percebe, a qualificação docente é uma das estratégias
para entrar na concorrida Pós-Graduação em que o ―[...] modelo gerencial de avaliação é mais
agressivo e aperfeiçoado‖ (MANCEBO; RIBEIRO, 2012, p. 39). O vínculo entre
financiamento e avaliação acirra a cultura do desempenho por meio de indicadores
estandardizados que desconsideram as peculiaridades institucionais, premiando ou punindo
conforme o resultado obtido em uma perspectiva gerencialista e de mercado e a recompensa
―é o pagamento por performance‖ (MANCEBO; RIBEIRO, 2012).
Nesse sentido, também consta no Termo as responsabilidades assumidas pelo IFC
quanto à disponibilização de infraestrutura necessária, a exemplo de recursos humanos,
financeiros e materiais que privilegiem cursos de Pós-Graduação stricto sensu a ―todos‖ os
servidores que não possuem título de Mestre ou Doutor. São várias frentes de investimento.
Essas ações são planejadas com o objetivo de facilitar a implantação de pós-graduações em
médio e longo prazo. S2 também concentra sua fala nas ações da reitoria quanto às avaliações
internas como forma de adequação para as avaliações externas. Os sistemas de avaliação
funcionam como alvos a serem atingidos porque permitem comparações entre os professores
151
e instalam a cultura de competitividade e performatividade. Desse modo, a cooperação é
substituída pela competição para atingir os objetivos; no caso do IFC, para identificar as
potencialidades e as fragilidades. Para Ball (2003), esses dispositivos de controle vêm sendo
utilizados com igual vigor entre as instituições por meio de basicamente três tecnologias
políticas: o mercado, o gerencialismo e a performatividade. Essas três tecnologias são
utilizadas em diferentes graus, porém são inter-relacionadas e atingem os professores.
S1 ainda enfatiza a necessidade de maior engajamento e organização dos professores
quanto à participação nos editais lançados. Muitas vezes, a justificativa para a não
participação é a falta de tempo para conciliar as atividades rotineiras de ensino e realizar os
levantamentos de materiais de laboratórios, por exemplo, o que poderia ser realizado ao longo
do ano para atendimento dos editais. O maior engajamento por parte dos professores é uma
chamada à responsabilização pelo desempenho institucional (BALL, 2003), pois cabe a ele
garantir a boa performance respondendo rapidamente aos desafios.
S2 cita o PDI e o foco nas ações que contemplam as metas lá estabelecidas. Para ele, a
baixa produção dos docentes é a principal dificuldade para, até o momento, o IFC não ter
aprovado os projetos de stricto sensu. Ele critica o valor exagerado da produção dos docentes
na avaliação realizada pela CAPES em detrimento, por exemplo, da “inserção social, que tem
uma pontuação muito pequena” (S2).
Ao fazerem referência às atuais políticas e aos novos modelos de avaliação que vêm
sendo praticados e tornando-se hegemônicos, Catani e Hey (2010) destacam que elas trazem
profundas consequências para a área da educação, pois, à medida que se premiam ou punem
os programas e os pesquisadores, enfatiza-se o aligeiramento das pesquisas e uma corrida
desenfreada por publicações. Nessa lógica, são priorizados os trabalhos em parcerias ou
pesquisas realizadas em várias frentes, a fim de acelerar a publicação dos resultados,
garantindo que o programa tenha o reconhecimento desejado, pois impacta diretamente no
reconhecimento do pesquisador. É nessa rede dinâmica, complexa e ―perversa‖, utilizando a
expressão de Ball (2012b), que se dissemina o exercício do poder pelo discurso interno às
práticas sociais. É o local permeado por interpretações e reinterpretações (enactment) que as
atuais políticas públicas de avaliação da Pós-Graduação brasileira estão inseridas.
De acordo com Sguissardi (2008), o fato de as instituições estarem continuamente
subordinadas às ações e às políticas de avaliação do modelo CAPES, como única agência
avaliadora, tem desdobramentos que vinculam universidades, e, nesse caso, os Institutos
[...] a um sistema de incentivos financeiros, que premia mais a produtividade do que
o processo de formação e produção, [que] tende a gerar neste campo – em princípio,
152
lócus privilegiado da criação da diversidade e da flexibilidade – uma cultura de
conformismo e, por que não dizê-lo, de uniformização associada a fenômenos já
bastante conhecidos como o neopragmatismo, o produtivismo acadêmico e a
competitividade quase-empresarial. (SGUISSARDI, 2008, p. 142).
S4 considera injusto ser avaliado como universidade: “[...] nós somos avaliados como
tais, similar às universidades, só que nós não temos as condições. Nós temos seis anos de
existência. Como é que nós vamos ter as mesmas condições de uma universidade que tem 20,
30, 40 anos, que já está estabelecida? Nós estamos agora conseguindo padronizar os
processos, nós fomos formados de cinco escolas agrotécnicas distintas” (S4). Para o
entrevistado, o fato de o IFC ter sido criado de cinco escolas agrotécnicas distintas com
formas diferenciadas de ação e de organização de processos “[...] gera muitos entraves, tanto
para a pesquisa, quanto para o ensino, quanto para a extensão” (S4). Nesses entraves,
acrescentar-se-ia, também, a dificuldade de construir uma identidade institucional. No
entanto, esse gestor considera que, apesar dos entraves e as fragilidades da instituição, as
avaliações, em geral, têm sido positivas e o impacto das ações desenvolvidas no IFC “[...]
vem mudando a realidade da população que vive em seu entorno, em termos de capacitação e
de grau de instrução” (S4).
Os depoimentos dos gestores sinalizam as pressões que estão sendo vivenciadas no
campo institucional para implantação da Pós-Graduação, quanto à política de avaliação da
CAPES na qual há predominância dos aspectos quantitativos sobre os qualitativos. São vários
dramas, mas o ―produtivismo acadêmico‖ respaldado pelo ―publique ou pereça‖
(BIANCHETTI; VALLE, 2014) é evidente e, de certo modo, está atrelado ao fato de as
avaliações padronizadas desconsiderarem a história institucional e suas peculiaridades quanto
aos seus traços constituintes. É o desempenho institucional que marca as possibilidades de
sucesso, porém essa responsabilidade ocorre por meio da personalização dos gestores e, por
decorrência, atinge os docentes. Por outro lado, há um esforço institucional para criar a
cultura e a ambiência da pesquisa, de modo que possa ocorrer a integração entre ensino,
pesquisa e extensão como respostas às políticas.
5.2.1 A exigência da verticalização
Como resultado da política, a verticalização está prevista na Lei de criação dos
Institutos (2008) e também no Acordo de Metas e Compromissos (2010). A ideia da
verticalização pauta-se na criação de cursos em áreas nas quais seja possível ofertar o
itinerário formativo desde o Ensino Médio/Técnico até a Pós-Graduação. Essa forma de
organizar a oferta, de certo modo, otimiza a utilização de recursos humanos e de
153
infraestrutura, um ponto, na maioria das vezes, nevrálgico nas instituições que requer
administração dos recursos. No texto da própria Lei, ao definir as finalidades e as
características, a verticalização é defendida sob esta óptica: ―[...] promover a integração e a
verticalização da educação básica à educação profissional e educação superior, otimizando a
infra-estrutura física, os quadros de pessoal e os recursos de gestão‖ (BRASIL, 2008, p. 1). A
integração em conjunto à verticalização conduz a um duplo movimento, pois a primeira inclui
o desenvolvimento de conteúdos contextualizados entre os conhecimentos técnicos e os
conhecimentos gerais, e a segunda refere-se à seleção dos componentes curriculares que
compõem os cursos (SILVA, 2009). ―A integração curricular pressupõe uma perspectiva
curricular que trate, pelo princípio da indissociabilidade – respeitando, porém, as
especificidades -, a relação entre conhecimentos gerais e tecnológicos ou específicos‖
(SILVA, 2013, p. 241).
Nessa perspectiva, há a possibilidade de que o aluno possa cursar toda a sua formação,
desde o Ensino Médio, na instituição, fato que também diferencia os Institutos da
Universidade quanto às possibilidades de oferta que transita entre as áreas técnicas que
estavam definidas nos antigos Colégios Agrícolas e Escolas Agrotécnicas e a nova
configuração do Instituto. É necessário avançar para outros níveis de ensino, o que
obviamente não pode ser realizado sem considerar a identidade que as instituições haviam
construído nos seus longos anos de atuação.
Para S3, as áreas potenciais que existiam nas escolas agrotécnicas e colégios agrícolas
que favoreceram a verticalização no primeiro momento são o carro chefe da verticalização:
“[...] o técnico em Agropecuária com o campo da Zootecnia, o campo da Produção Vegetal e
a parte agrícola, Produção Animal. Claro que tinha a parte de Alimentos, enfim, de sanidade
animal”. Dessas áreas potencias, logo após a criação do IFC, foram criados os cursos de
graduação em Agronomia e Veterinária, “[...] que são as áreas que hoje contam com o maior
número de doutores, com produção e que nos embasam, nos sustentam para poder apresentar
essas duas propostas de Mestrado em 2015”. As mesmas áreas potenciais foram citadas por
S2 que reconhece a verticalização como “uma política institucional [...] que cumprimos
bem”.
S3 destaca que há iniciativas dos campi visando dar continuidade aos cursos de
graduação na ideia da verticalização. “Enfim, o envolvimento da comunidade acadêmica
externa, interna, potenciais alunos, etc., tem transitado por diferentes caminhos, mas eu diria
... Sempre com um olhar para as questões que são demandadas a partir da região, aquilo que
o IFC tem pessoal, tem condições, tem estrutura de fazer‖ (S3). O depoimento desse gestor
154
marca uma potencial possibilidade de fortalecimento da identidade do instituto, pois nessa
perspectiva resgata sua identidade desde sua constituição. Na verticalidade, a história da
escola e dos colégios técnicos está embutida, a vocação original fortalece-se e encontra status,
pois vincula-se às necessidades regionais que, também, marcam a identidade do instituto:
“[...] aquilo que o IFC tem pessoal, tem condições, tem estrutura de fazer” (S3).
Quanto ao lato sensu, S1 destacou: “[...] a tendência é abrir exatamente cursos de
pós-graduação que estão vinculados à graduação”. S3 esclareceu que, após o
reconhecimento dos cursos, os coordenadores são estimulados a pensar sobre a possibilidade
de Pós-Graduação em trabalho de cooperação com a Pró-Reitoria. Nas diretrizes da política
de pesquisa e Pós-Graduação encontradas no PDI, há destaque para o suporte ―[...] à
formação, reorganização e consolidação de grupos de pesquisa que favoreçam a verticalização
da produção do conhecimento, buscando iniciativas inovadoras, de acordo com diferentes
demandas e expectativas, bem como a articulação entre as várias áreas do saber [...]‖ (IFC,
2014, p. 53). Essa é uma tática institucional que, como política, ao incentivar os grupos de
pesquisa que favoreçam a verticalização, otimiza recursos, produz conhecimento e atende
uma exigência legal.
São várias as formas pelas quais ocorre a abertura de cursos de Pós-Graduação lato
sensu nos diversos campi. Em alguns, as demandas são levantadas por meio de consulta
pública; em outros, em articulação do campus com as secretarias municipais da microrregião,
ou ainda mesmo sem ter os cursos consolidados como estratégia do IFC para marcar presença.
Essas são ações que denotam como a política é posta em prática e requer a elaboração de um
processo criativo e complexo por parte dos envolvidos (BRAUN et al., 2011). No entanto,
todo esse movimento, conforme a fala de S4, somente tem tido resultado positivo porque
“[...] o pessoal está empenhado, então segue essa necessidade de verticalização”, mesmo
fazendo referência ao comprometimento de um grupo de professores que tem participação
ativa nos processos de produção e de sistematização de propostas em cada campus.
Os cursos lato sensu são iniciativas de grupos de professores vinculados a
determinados cursos técnicos e de graduação e que requer atuação mais incisiva da Pró-
Reitoria no sentido de “[...] viabilizar essa cooperação entre os campi, [...] a verticalização é
uma consequência desse processo de consolidação dos próprios cursos técnicos e dos cursos
de graduação. A exceção talvez a essa regra seja um ou outro curso [...] mas que, por outro
lado, se encaixa nas políticas locais dos campi, de integração da escola, dos campi do IFC
com as redes de escolas municipais e estaduais” (S3). É a produção da própria
responsabilidade gerada pelo contexto institucional considerando as necessidades, as
155
limitações e as possibilidades (BRAUN; MAGUIRE; BALL, 2010). Isso expressa também as
diferentes possibilidades de cada lócus lidar com a tradução da política.
As palavras de S5 são no sentido do ―vir a ser‖, pois ele entende que a verticalização
“[...] é um caminho que ainda deva ser trilhado, embora, obviamente pela característica dos
Institutos de congregar o ensino técnico, a possibilidade dos cursos superiores e agora, mais
recentemente, essa possibilidade de cursos de Pós-Graduação, acho que esse caminho cria
uma série de oportunidades dentro do Instituto, e certamente ele deve ser visto como uma
grande oportunidade‖. Essa se configura uma grande oportunidade institucional, porque traz
em si não a negação da identidade originária, mas seu fortalecimento. Essa é uma tática
importante de resposta à política pois propõe a convergência e não o esfacelamento das
identidades, o que remete a Dubar (2005, p. 135) no sentido da provisoriedade, na qual ―[...] a
identidade nunca é dada, ela é sempre construída e deverá ser (re)construída em uma incerteza
maior ou menor e mais ou menos duradoura‖. Nesse sentido, é processo comum entre o eu e o
outro que pode ser também o institucional em relação ao vivido e ao explicitado.
S5 considera que, atualmente, há uma separação entre os níveis de ensino que, no
âmbito do Instituto, dificulta atitudes proativas no sentido de unir esforços. “Então, na
verdade, o caminho é juntar esforços para que isso esteja mais acoplado, uma coisa com a
outra, para possibilitar, de fato, a verticalização” (S5). A carência de integração entre os
níveis de ensino também foi citada por S6: “Particularmente, aqui existe certa divisão entre o
que é ensino de graduação e o que é Ensino Médio [...]. Aparentemente, existe uma
preferência de que os alunos aqui do Médio ingressem no ensino de graduação e tem a ver
com essa verticalização [...]. Em relação aos professores, no ensino, pelo menos aqui no
campus [...], eles são praticamente isolados. Tanto entre si... Não existe uma integração, no
ensino, entre os professores dos dois níveis” (S6). Isso expõe as dificuldades encontradas em
determinados campi quanto ao engajamento necessário para implantar cursos além daqueles
nos formatos tradicionais consolidados.
Ao referir-se aos cursos de licenciatura implantados no IFC, S3 faz referência à Lei de
criação - ―20% das vagas para licenciatura‖. Atualmente, são “[...] oito campi com cursos de
licenciatura. Em todos eles nós temos gente do campo da Educação atuando. Então, é outro
campo que se mostra forte, hoje estamos trabalhando, articulando com esse grupo para
apresentar uma proposta em 2016”. A área das licenciaturas como potencial para Pós-
Graduação também foi citada pelos gestores S7, S4 e S2. O fato de existir a obrigatoriedade
de oferecer cursos de licenciatura nos Institutos fez com que houvesse a necessidade do
ingresso de um corpo docente com formação na área de humanas e, por outro lado, houve
156
também a demanda para abertura de cursos de Pedagogia em alguns campi. Os gestores
reconhecem que a área é promissora em termos de oferta de Pós-Graduação, a exemplo de S4:
“[...] temos docentes com boas produções científicas dentro desse quadro [...], então eu acho
que nós temos que ofertar. Não tem como “Ah, restringir” por que nós somos oriundos de
escolas agrotécnicas. Se tem demanda, se a gente tem corpo docente, por que não atender
essa demanda? Temos que abrir essas fronteiras”.
No PDI (2014), dois mestrados - ―Produção e Sanidade Animal‖ e ―Produção vegetal‖
- estão planejados, inclusive com a previsão de oferecimento dos cursos em campi distintos.
No entanto, como pôde ser observado, vários gestores citaram o potencial de apresentar a
proposta de um stricto senso na área da educação em 2016. No PDI, nas Diretrizes da Política
de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, essa área está citada, mas não há previsão da oferta
em nenhum dos campi, fato que demonstra fragilidade nas ações integradas.
Para os gestores, há outras áreas que vêm apresentando crescimento: “[...] tanto do
ponto de vista de sua estrutura de pessoal como também do ponto de vista da produção
acadêmica, da titulação dos professores, é o campo, vamos chamar de uma maneira bem
abrangente, da Ciência da Computação. Temos Redes, Sistemas de Informação; enfim,
diversos cursos nessa área em diversos campi, praticamente todos os campi. Em alguns
campi mais consolidados, com grupos de pesquisa fortes, atuantes, grupos que estão em
processo de consolidação [...]. Nós entendemos que até 2017, 2018, poderemos ter nesse
campo também um grupo forte e que também vem das graduações, dos técnicos que foram
implantados em diferentes campi e que estão se consolidando” (S3).
Sobre a verticalização, os depoimentos dos gestores complementam-se, porém no
Planejamento Estratégico não há indícios de ações que considerem essa obrigatoriedade, o
que valida o argumento de S3 quando se refere à ausência de conexão entre os objetivos
previstos em lei, que necessitam ser atingidos pela instituição e as diretrizes que constam nos
documentos institucionais. Enquanto no planejamento estratégico, a oferta de cursos em todos
os níveis é um ponto considerado forte, a verticalização está contemplada no PDI ao tratar da
política de ensino e organização curricular, ―[...] cuja proposta se constrói através da
verticalização dos currículos, possibilitando o diálogo simultâneo e de forma articulada entre
educação básica e pós-graduação [...] (IFC, 2014, p. 35).
O discurso dos gestores possibilita inferir que as estratégias estão organizadas com o
objetivo de atender aos arranjos produtivos locais com vistas à verticalização, agregando as
oportunidades de ofertas formativas que surgem às demandas específicas nos locais onde há
campi instalados. Cada campus desenvolve sua estratégia, mas a principal é a de aproveitar o
157
potencial revelado nos cursos técnicos em cada local. Além dessa, as consultas públicas e a
articulação dos professores e gestores com as redes municipais e estaduais aproximam a
instituição das demandas locais e reforça sua identidade.
5.3 FRAGILIDADE DO DIÁLOGO E ARTICULAÇÃO DO PLANEJAMENTO ENTRE
SETORES
A união de escolas com diferentes trajetórias na gestão, ainda que o ensino técnico
seja o ponto em comum, como o ocorrido no caso da criação do IFC vem provocando
desdobramentos. Conforme sinalizado nos capítulos anteriores, enquanto os Colégios
Agrícolas estavam administrativamente vinculados à Universidade Federal, as Escolas
Agrotécnicas tinham mais autonomia e eram diretamente subordinadas ao Ministério. Nesse
contexto, o diálogo interno entre os gestores, funcionários e professores e a articulação dos
discursos e ações assume fundamental importância e se desdobra nos encaminhamentos que
vêm sendo institucionalmente realizados.
A fala de S3 ilustra a complexidade de tais desdobramentos: “[...] as exigências, as
rotinas que existiam para atender a demanda dos cursos técnicos é um caminho, é uma
realidade, aquilo que nos é cobrado, do ponto de vista de conhecimento, renovação de
conhecimento, de credenciamento, de renovação do credenciamento, com a discussão de
ensino superior, são outras. E às vezes parece que há dificuldade de conciliar essas duas
realidades [...] não conseguimos sair daquela situação e na frente da gente vem um nevoeiro
que não conseguimos ver mais adiante no horizonte, daquilo que é a educação superior,
daquilo que ela exige” (S3).
Para esse entrevistado, coabitam duas realidades com dificuldades de diálogo, entre o
que foi e o que pretende ser. Transitar entre o passado e o presente do vivido pelos sujeitos
aproxima-se da concepção histórica da produção do sentido. O saber é uma construção
histórica que produz verdade e, também, o espaço no qual o sujeito pode tomar posição para
falar de objetos de que se ocupam seus discursos. Essa teia de relações entre os elementos
históricos é fundamental para articulação entre o que se pensa, se diz ou se faz (FOUCAULT,
2014). No entanto, o gerencialismo na perspectiva neoliberal exige que se vá além da
responsabilidade institucional, inserindo a responsabilidade pessoal no âmbito das ações
proativas.
A fala desse gestor expressa ainda a falta de sintonia e de prioridades estabelecidas,
tanto internamente na gestão dos processos da reitoria, quanto nos próprios campi. É um
158
movimento que carece de sinergia e revelador de que a tradução da política e as ações são
pautadas nas disputas de poder quanto ao estabelecimento de prioridades envolvendo uma
rede de lugares distintos como espaço de exterioridade, um discurso normatizador que cada
vez mais se torna verdadeiro baseado nos valores dominantes. No entanto, até mesmo os
valores dominantes são impregnados de contradições nas alternâncias entre os vários
discursos e permitem ―[...] que aflorem as contradições, as diferenças, inclusive os
apagamentos, os esquecimentos; enfim, significa deixar aflorar a heterogeneidade que subjaz
a todo discurso‖ (FISCHER, 2001, p. 212). Por isso, é importante observar não somente as
instituições e o Estado, mas também as inter-relações entre eles que se efetivam com o uso de
tecnologias disciplinares que moldam as instituições educacionais para o cumprimento de
metas, o que consequentemente transforma a forma e os métodos do próprio Estado (BALL,
2013).
Ao referir-se sobre o envolvimento da comunidade acadêmica nas ações de
implantação da Pós-Graduação, S7 considera que é pontual e não atinge a totalidade de
professores de um curso. Envolve, na maioria das vezes, “[...] aquelas pessoas que já estão
com a produção científica maior”, com produção em determinada área que responde às ações
iniciais da Pró-Reitoria, muitas vezes sem o envolvimento direto da Coordenação de Pesquisa
do campus.
Para S3, há, nos campi, situações que internamente são geradoras de conflito, de
atritos entre grupos distintos, “[...] um processo de conflito interno... uma estrutura um pouco
amarrada nessa ideia ainda do médio-técnico, mas ao mesmo tempo, depois que transformou
em Instituto, praticamente dobrou, triplicou o número de professores, são professores novos
que vêm, de outras experiências, outras realidades,[...] e que vêm com uma outra visão, com
outras visões, [...] e me parece que não está havendo diálogo, está faltando articulação e
diálogo entre esses diferentes grupos. [...] são poucos os campi que conseguem avançar
nesse sentido, de estabelecer uma ação mais concreta, favorável [...] à avaliação de
graduação e pós-graduação. Outros vivem em constante atrito, [...] e sem conseguir
estabelecer uma unidade, cada um no seu quadrado, cada um no seu canto” (S3). Esse
depoimento pode ser interpretado com relação aos blocos de poder (FOUCAULT, 2013), que
instituídos nas organizações estabelecem os campos de disputas à medida que organizam,
separam e distribuem os diferentes espaços em relações conturbadas que interferem na
política. Se, por um lado, o aparato legal determina os encaminhamentos, por outro, ocorrem
as resistências e os choques de interesse que vão definindo lugares e quem efetivamente pode
se apropriar de determinado discurso.
159
Na dimensão do currículo, S6 ressalta a forma engessada de concebê-lo e executá-lo
na prática de modo dissociado entre ensino pesquisa e extensão, como importante limitador
interno para as ações institucionais, fato que ocorre também pela falta de diálogo e articulação
entre os setores, campi e reitoria. Outro fator marcante na fala de S3 é o conflito que ocorre
“[...] dentro da Reitoria, digamos, naquele órgão que deveria ser o gestor, a célula de
unidade dessa diversidade toda; porque até mesmo as políticas que saem daqui são
contraditórias, entre os Pró-Reitores, nos editais que são lançados. Você vê, até na
separação, muitas vezes das tarefas, parece que as coisas estão desintegradas, estão
desarticuladas [...]”. Esses conflitos que conduzem à desarticulação são explicados por
Foucault (2014) como lutas que estabelecem relações de forças e necessitam ser decifradas
para compreender as relações de poder. É preciso compreender ―[...] quem está na luta, a
respeito de que, como se desenrola a luta, em que lugar, com quais instrumentos e segundo
que racionalidade‖ (FOUCAULT, 2014, p. 342). Ou seja, as lutas são travadas também em
relação aos lugares ocupados por cada um.
As resistências são encontradas inclusive nos discursos dos professores e gestores dos
campi que originaram o IFC, que se negam a discutir as possibilidades de implantação da Pós-
Graduação. Sobre esse aspecto, S3 afirmou: ―Professor, não vamos falar de pós-graduação,
nós temos que resolver o nosso problema, digamos, de técnico e de graduação”. Há um
descompasso entre o que é necessário fazer e “[...] quem fala o que o campus quer ouvir, a
Pró-Reitoria da Administração, que fala do orçamento, do dinheiro, do ensino, que fala de
reconhecimento dos cursos, de técnicos e de graduação, projetos pedagógicos, avaliação,
etc... E a pesquisa e extensão, são aqueles caras doidos que chegam, chegaram agora, para
fazer, para dar mais trabalho para a gente, né... „Não, fica lá na Reitoria, fica lá, não
precisamos disso agora, nós precisamos cuidar do técnico e da graduação, a pós-graduação
deixa‟ [...]” (S3).
Aqui se observa uma dispersão entre o texto escrito e a prática. Enquanto no texto
escrito a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão está garantida; na prática, a
atividade de pesquisa requer a criação de uma cultura e de uma ambiência acadêmica que não
se implanta por decreto. Mesmo universidades já estabelecidas enfrentam essa dificuldade,
guardadas as proporções. Refiro-me, aqui, às resistências e às práticas culturais estabelecidas
em relação ao domínio das competências para a pesquisa. No caso do IFC, há de ter-se
cuidado para não cair no mero pragmatismo, sustentar apenas no saber fazer. Ter esse cuidado
―[...] significa compreender que o método de produção do conhecimento é um movimento do
pensamento que, no e pelo pensamento, parte da apreensão de um primeiro nível de abstração
160
composto pela ―[...] representação do real e tem como ponto de chegada formulações
conceituais cada vez mais abstratas‖ (KUENZER; MORAES, 2006, p. 181), o que implica em
aprofundamento.
O discurso dos gestores revela um movimento complexo entre o vivido e o pretendido,
com interesses distintos e resistências. São ações e reações que se influenciam mutuamente,
pois as diretrizes fixadas pela reitoria têm desdobramentos nas funções dos docentes em cada
um dos campi e estes, por sua vez, defendem seu ponto de vista. É a partir desse jogo de
palavras e de poder que seus efeitos atingem eficácia sobre aqueles aos quais se dirigem.
Esse movimento ocorre em via de mão dupla, tanto da reitoria para os campi como dos
campi para a reitoria. “A prioridade é o ensino”, ou “[...] eu não fiz concurso para
pesquisador”. Esse discurso ocorre “[...] em uma condição da Lei que nos coloca para fazer
ensino, pesquisa e extensão de forma indissociada [...]. É ensino, os outros, larga para o
lado. E esse discurso sai da alta gestão, sai da Reitoria. Está desintegrado, desarticulado. E
contrariando o próprio princípio da Lei que nos cria, que é o da indissociabilidade” (S3).
O discurso dos entrevistados é um marcador explícito do modo como ocorrem as
resistências em uma cultura profissional estabelecida por valores e por compromissos que
moldam a atuação dos vários atores (BRAUN et al., 2011). O gestor nesta pesquisa é a voz
que ouço, mas também representa os outros atores à medida que sinalizam os vários lugares e
posicionamentos assumidos pelo grande grupo. O contexto, nesse caso o processo de
transição, assume fundamental importância e requer considerar as condições objetivas em
relação às interpretações subjetivas de cada um, reconhecendo que ambos se inter-relacionam
em um emaranhado de situações nas quais a intertextualidade se faz presente, tanto no
discurso escrito como no falado.
Ao fazer uma reflexão sobre o processo, S3 continua problematizando: “Será que
ensino precisa desconsiderar pesquisa e extensão?”. A essa pergunta, ele mesmo responde:
“Esse é um vício que talvez tenhamos herdado da academia tradicional brasileira, que a
pesquisa se faz dentro do laboratório, ou lá no campo, [...] a extensão você faz em um curso
de extensão; enfim, a ideia do estender, de levar... E não a compreensão de extensão como
um caminho de mão dupla. E o ensino se faz dentro das quatro paredes e com o monólogo do
professor. Essa percepção, dessas coisas como atividades muito distintas umas das outras,
faz com que não percebamos que a integração entre ensino, pesquisa e extensão deve se fazer
por meio do currículo, por meio da prática pedagógica, ensino com pesquisa, ensino por
meio da pesquisa, com o ensino por meio da problematização, e que o ideal é fonte de
informação para o ensino, para a pesquisa e para o aprendizado. Só que essa integração nós
161
ainda estamos buscando” (S3). No PDI, ―[...] a pesquisa é entendida como atividade
indissociável do ensino e da extensão e visa à geração e à ampliação do conhecimento,
estando necessariamente vinculada à criação e à produção científica e tecnológica [...]‖ (IFC,
2014, p. 52).
O depoimento desse gestor traz uma análise da cultura instalada no Ensino Superior,
fruto de práticas de segmentação e compartimentalização do conhecimento e do status que
cada atividade ocupa nesse contexto. Entra em choque com o discurso escrito no PDI, o que
reforça a fabricação do discurso oficial. Ao conceber o currículo e sua organização
disciplinarmente, há um campo de disputas que advoga pela classificação e pela
hierarquização dos saberes, o que vem de encontro com a perspectiva do currículo integrado
no qual se desenvolvem inter-relações entre os ―[...] objetivos de formas de conhecimento
diversas genuinamente articulados. [...]. Trata-se de uma concepção de currículo integrado
que valoriza as disciplinas individuais e suas inter-relações‖ (LOPES; MACEDO, 2011b, p.
131). Se a integração curricular realmente ocorresse no âmbito institucional, conforme
previsto no texto legal, “[...] essa percepção, dessas coisas como atividades muito distintas
umas das outras” (S3), não seria tão latente e possibilitaria o desenvolvimento da cooperação
entre os campos disciplinares, mas isso requer construir o entendimento sobre como as
disciplinas escolares formam na confluência de temas comuns (LOPES, 2006). É novamente
o contexto da prática como produtor de sentidos na circularidade das interpretações (BALL;
BOWE, 1992).
Ter autonomia para realizar escolhas individualmente é mais simples do que tê-la em
um conjunto de instituições que, de longa data, eram, até certo ponto, independentes, com
estrutura reduzida e práticas consolidadas. Sair dessa condição para formar um grupo que
inicialmente já teve uma expansão considerável e que, após dois anos tinha praticamente
dobrado de tamanho, tem implicações profundas em todos os aspectos organizacionais. Entre
as implicações destacadas pelos gestores está a dificuldade de diálogo e articulação entre as
ações, o que impacta na transição da identidade antiga para a nova com reflexos no
planejamento nos diversos níveis, o que fragiliza o alcance dos objetivos referentes à
implantação da Pós-Graduação. Ao invés da articulação e integração, tanto curricular como
organizacional, há fragilidades e disputas no contexto da prática.
162
5.4 ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO DA POLÍTICA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO IFC
Ao serem questionados sobre as políticas de Pós-Graduação desenvolvidas no âmbito
do IFC, as estratégias utilizadas e o envolvimento da comunidade acadêmica, os discursos dos
entrevistados ora se aproximam, ora se afastam. S1 fez relação com a Política Nacional de
Pós-Graduação e o movimento no sentido de “descentralizar-se dos grandes centros”, ou
seja, promover a interiorização. A instituição considera que as ações estão sendo
desenvolvidas para “[...] levar realmente a pós-graduação para mais perto das pessoas que
estão terminando, fazendo a graduação, que precisam se aperfeiçoar profissionalmente [...].
O fato de o IFC se propor a fazer esse tipo de trabalho, de propor cursos de pós-graduações
em áreas específicas e em regiões específicas, facilita o acesso das pessoas” (S1).
Ao fazer referência à oferta de cursos em ―áreas do conhecimento específicas‖ em
―regiões específicas‖, S1 considera os ―arranjos produtivos locais‖ como uma das diretrizes a
serem seguidas pela política do IFC. Há um alinhamento das políticas do micro e do macro
contexto, um consenso construído e pautado na ideia de que as ações mais próximas às
necessidades de uma determinada região revertem-se em melhoria da qualidade de vida, o que
não deixa de ser legítimo além de possibilitar ao IFC a construção de uma identidade
diferenciada das universidades, atuando em segmentos educacionais, sociais, culturais e
econômicos não contemplados por outras instituições.
Esses arranjos produtivos locais como dispositivo presente na lei de criação evidencia
uma política que, de certo modo, como discutido em capítulo anterior, vem na direção
contrária dos discursos das agências internacionais. Resta saber a quem interessa, quais os
reais objetivos, quando estão presentes ações que, por um lado, ao possibilitar o acesso,
privilegiam pessoas historicamente excluídas e, por outro, cria mecanismos que favorecem a
iniciativa privada, a exemplo do Programa Universidade para Todos (PROUNI)53
. Ball
(2012a) argumenta que estamos diante de um outro Estado, integrante de uma comunidade de
políticas globais que alterou seus modos de fazer políticas educacionais. A heterarquia é
53 É um programa do Ministério da Educação, criado pelo Governo Federal em 2004, que oferece bolsas de
estudo integrais e parciais (50%) em instituições privadas de educação superior, em cursos de graduação e
sequenciais de formação específica, a estudantes brasileiros sem diploma de nível superior. Podem participar os
estudantes egressos do ensino médio da rede pública ou da rede particular na condição de bolsistas integrais da
própria escola, estudantes com deficiência e professores da rede pública de ensino, no efetivo exercício do
magistério da educação básica e integrantes de quadro de pessoal permanente de instituição pública. Nesse caso,
não é necessário comprovar renda. Para concorrer às bolsas integrais, o candidato deve comprovar renda familiar
bruta mensal, por pessoa, de até um salário mínimo e meio. Para as bolsas parciais (50%), a renda familiar bruta
mensal deve ser de até três salários mínimos por pessoa. (Fonte: http://siteprouni.mec.gov.br/).
163
muito mais presente que a velha hierarquia atuante e protagonista do passado. É fluída, mas,
ao mesmo tempo, intencional e com efeitos planejados.
Manifesta-se, aqui, conforme o discurso de S1, a convergência entre as políticas
institucionais e as nacionais, pois os arranjos produtivos locais estão previstos na Lei Nº
11.892/2008, de criação dos Institutos, ao mencionar no artigo sexto suas finalidades e
características.
[...] orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos
arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no
mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural
no âmbito de atuação do Instituto Federal [...]. (BRASIL, 2008b, p. 1, grifos
nossos).
Como política do IFC, S4 fez referência às resoluções que regem a criação de cursos
da Pós-Graduação, tanto no lato como no stricto sensu. A submissão de propostas com vistas
à aprovação de Mestrado Profissional e as tentativas frustradas de não aprovação do Mestrado
Acadêmico podem ser entendidas sob dois aspectos: 1) Na Política Nacional de Pós-
Graduação, a indução do Mestrado Profissional é explícita. No atual PNPG, a própria agência
reconhece: ―Nos últimos anos, a CAPES patrocinou uma iniciativa com o potencial de mudar
em profundidade a situação, o perfil e a natureza do mestrado, a saber: a criação do mestrado
profissional, voltado para as áreas profissionais e aplicadas‖ (BRASIL, 2010a, p. 126). Esse
discurso evidencia a aproximação com as atuais políticas nacionais, mas também uma
mudança em relação ao discurso produzido na década de 1990, quando havia o temor de que o
Mestrado Profissional fosse de menor qualidade. 2) O ponto forte de atuação dos institutos é o
vínculo com as atividades de pesquisa e, consequentemente, da Pós-Graduação stricto sensu
no campo profissional, científico e tecnológico com mais proximidade aos arranjos produtivos
locais. No entanto, esse direcionamento da CAPES aos mestrados profissionais também é
uma forma de se aproximar dos consensos construídos em instâncias superiores, como
discutido ao longo desta tese.
Nesse sentido, o atual PNPG ―[...] condensa 20 anos de mudanças estruturais no
Brasil, que se adaptou uma vez mais aos supostos da economia mundial desenhada com os
contornos da predominância econômica e financeira colocando [...] em movimento um novo
paradigma de políticas públicas em que o social tornou-se uma mercadoria‖ (SILVA
JÚNIOR; KATO, 2012, p. 12), com a garantia de crescimento baseado na qualidade e na
inovação.
Como estratégia, S4 destaca a qualificação do corpo docente e a interação inter e entre
áreas para suportar um curso de Pós-Graduação. Ressalta o desenvolvimento de análises
164
institucionais para o atendimento dos critérios exigidos pela CAPES, como, por exemplo,
produção científica e qualificação docente. S2 vincula as políticas institucionais de Pós-
Graduação ao Planejamento Estratégico e ao Plano de Desenvolvimento Institucional onde
são encontradas as metas para a Pós-Graduação e a criação de cursos até 2018. A mudança
das propostas de Mestrado Acadêmico para Profissional e as sucessivas tentativas de
aprovação também está latente no seu discurso, inclusive a diferença anunciada por S2
possibilita tencionar o papel dos institutos que, com status de universidade, tende a lutar
contra o preconceito construído sobre as escolas técnicas que passaram a atuar em cursos
superiores. É nesse sentido que se abre a possibilidade de fazer a diferença no Brasil,
construindo um perfil e um itinerário formativo diferenciado das universidades brasileiras
com capacidade de atender às demandas mais específicas das populações até então excluídas.
Seria transcender o ensino técnico construindo bases para a implantação e a consolidação de
novas formas de atuação.
As orientações da CAPES induzem à elaboração de propostas de Mestrado
Profissional e, ao mesmo tempo, alinham-se às pretensões dos organismos internacionais. Há
um discurso justificador que aproxima o setor produtivo e o desenvolvimento de pesquisas
aplicadas que utiliza da avaliação para exercer acentuado ―[...] controle sobre fins e produtos,
para solidificar os modelos pretendidos e orientar, ao mesmo tempo, o mercado‖ (COSTA
JÚNIOR; BITTAR, 2012, p. 272).
Sob o ponto de vista de S2, o fato de o IFC ser uma instituição jovem amplia a
dificuldade de abertura e aprovação de novos cursos. As ações que vêm dando resultado na
Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação são “[...] aumentar o número de bolsas,
aumentar o número de pesquisadores, aumentar os recursos, começamos a trabalhar com
instituições, outras instituições públicas e também instituições privadas [...]. Embora
tenhamos uma ideia de planejamento institucional que nos leve a tentar cursos de Mestrado,
eles só serão obtidos e aprovados, à medida que fortalecermos ou continuarmos fortalecendo
a base, que é a produção científica” (S2).
A estratégia que vem dando resultados é o fortalecimento da pesquisa, com bolsas,
obrigatoriedade de publicações e participação em eventos. O calcanhar de Aquiles para
aprovação dos mestrados parece ser mesmo a baixa produção científica. Na outra ponta, os
critérios de avaliação da CAPES, ainda que pretendam ser qualitativos, em sua essência são
quantitativos e altamente excludentes, pois são contabilizados os produtos produzidos pelos
grupos de pesquisa e pelos programas.
165
Ao centrar as avaliações nas ferramentas de controle, produtividade e
performatividade, sobre os quais estão sujeitos atualmente os programas e os pesquisadores,
há evidência de pelo menos dois paradoxos: os autores que, por meio de suas produções
científicas, criticam o posicionamento da academia e a lógica produtivista e mercadológica, os
mesmos que estão irremediavelmente sujeitados a ela e sofrem as pressões. ―Esse é um dos
embates da Pós-Graduação com os órgãos de avaliação, pela intensa cobrança de
produtividade, num ritmo em que tudo tem de gerar produto.‖ (COSTA JÚNIOR; BITTAR,
2012, p. 269). Se o IFC quiser ter programas aprovados deverá necessariamente inserir-se
nessa lógica que, nesse PNPG, de acordo com Silva Júnior e Kato (2012), ancora-se em
categorias como avaliação, certificação em massa, internacionalização e indução a um novo
fazer científico que conduz a readequação dos programas em uma lógica de segmentação
focada em públicos específicos, com oportunidades distintas de formação. Assim os cursos
lato sensu atenderiam as empresas e as indústrias em espaços nos quais haveria menor
exigência técnica, enquanto os mestrados e os doutorados profissionais estariam vocacionados
aos espaços industriais e acadêmicos com maior exigência na pesquisa e na técnica.
Na percepção de S2, a estratégia institucional é o planejamento “[...] em que a
comunidade, na verdade, revela a demanda os anseios. [...]. As estratégias que estamos
utilizando agora para tentar conseguir isso vem desde a internacionalização, levar o nome do
IFC para fora [...], temos editais, por exemplo, para subsidiar a participação de docentes em
congressos, em eventos nacionais e internacionais, embora nesse ano os eventos
internacionais tenham sido suprimidos do edital por falta de recurso. [...]. Como estratégia
também há o lançamento de editais com recurso para publicação, estamos disponibilizando
recurso para os pesquisadores publicarem sua pesquisa, que também tem custo elevado”
(S2).
A internacionalização referida por esse gestor está presente em um dos objetivos do
PE: ―Estabelecer programa de parcerias nacionais e internacionais‖ (IFC, 2013, p. 27). No
PDI, há um item referente à internacionalização como competência da Pró-Reitoria de
Extensão (PROEX): ―[...] planejar o desenvolvimento de ações para internacionalização da
instituição e fomentar relações de intercâmbio e acordos de cooperação com instituições
estrangeiras. Para dar suporte a esses objetivos, a PROEX conta com a Assessoria de
Relações Internacionais (ARI) [...]‖ (IFC, 2014, p. 50). Ainda, conforme o documento, essa
Assessoria tem sua principal função concentrada na consolidação de acordos de cooperação
com universidades estrangeiras, bem como dar suporte a acadêmicos e a funcionários em
estágios internacionais e programas de intercâmbio. Ao fazer referência à integração
166
necessária entre as Pró-Reitorias no alcance dos objetivos, a Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-
Graduação e Inovação é considerada parceira no desenvolvimento de ações que resultam em
convênios de cooperação circunscritos às universidades internacionais por meio de visitas e
estágios de pesquisadores, participação de pesquisadores em Seminários de Pesquisa focado
em ações que possam resultar em publicações e eventos conjuntos.
A Pós-Graduação brasileira tem concentrado a produção do conhecimento científico e
tecnológico. É por essa via que, normalmente, se iniciam as parcerias, quando professores e
alunos têm experiências na formação e na pesquisa em instituições internacionais. Desse
modo, estabelecem-se os vínculos, inicialmente como consumidores da bibliografia seguidos
pelas relações com os centros de pesquisa e unidades onde vivenciaram suas experiências.
Nesse movimento, pode-se estabelecer a ―Cooperação Internacional Avançada‖ materializada
pelo desenvolvimento de projetos e pesquisas conjuntas. ―A construção de redes acadêmicas
apoiadas por editais financiadores direciona o desenvolvimento de pesquisas e de formação de
recursos humanos com centros de origem de formação no exterior‖ (MOROSINI, 2011, p.
98). Nesse contexto, a CAPES e o CNPq são as agências que apoiam tais atividades de
pesquisa e reconhecem a elegibilidade dos proponentes via editais, o que impele as
instituições a se adequarem às normas estabelecidas.
O discurso dos gestores, centrado nas ações da pesquisa, identifica que esse é o
caminho para a constituição da Pós-Graduação, uma vez que os indicadores da CAPES
privilegiam a produção científica e a consolidação dos grupos de pesquisa. Os gestores, em
suas falas, evidenciam a compreensão dos requisitos para a implantação da Pós-Graduação no
Instituto, anunciam as principais estratégias adotadas – fortalecimento dos grupos de pesquisa,
incentivos a publicações, lançamentos de editais específicos para bolsas de pesquisa,
incentivos para participação em eventos. No entanto, essas estratégias anunciadas não se
confirmam no documento do Planejamento Estratégico.
Para S3, ―[...] em termos de política, propriamente de pós-graduação, o que nós temos
escrito, os nossos documentos, é de apoiar, é de criar mecanismos de apoio aos grupos que
se destacam na produção acadêmica e assessorá-los na perspectiva de consolidação desse
grupo e a possibilidade de aproveitar e conseguir aprovar cursos de pós-graduação stricto
sensu [...]”. Ao elencar as ações desenvolvidas, ele destaca o diagnóstico dos grupos de
pesquisa existentes identificando os que têm maior produtividade e dentro deles os
pesquisadores mais produtivos. ―Até porque, pela nossa própria história, falta familiaridade
com Graduação, com Pós-Graduação e, especialmente, o stricto sensu, do ponto de vista
institucional, mas temos muitos doutores dentro da casa, isso faz com que tenhamos criado
167
grupos de pesquisa sem propriamente a identidade de um grupo de pesquisa, por mais
pessoas que se juntaram para dar conta de um edital ou de outro, mas não grupos de
pesquisa” (S3).
Manifesta-se, aqui, utilizando a expressão de Ball (2010a, 1994), a ―fabricação de
estratégias de gerenciamento‖ que os sujeitos produzem, no contexto da prática
organizacional, para responder às situações específicas. Ao exemplificar a situação, S3
enfatiza que grupos numerosos têm, muitas vezes, poucos pesquisadores produtivos e a
maioria improdutiva, o que é um problema do ponto de vista da produção científica e,
também, para a própria consolidação dos grupos. Esse movimento os impele a articularem-se,
criando espaços de manobra e oportunidades para responder aos critérios e à política de
acordo com seu próprio contexto, cada um caracterizado por uma complexa rede de
identidades e interesses (HOSTINS, 2014).
Embora no âmbito do IFC a aprovação dos programas de Mestrado Profissional
aprovados e recomendados pela CAPES seja recente, o discurso dos gestores é revelador de
algumas práticas institucionais e das pressões exercidas pelos órgãos reguladores. Se
considerados somente os cinco campi objeto deste estudo, conforme apresentado no capítulo
da metodologia, é possível constatar que somam 450 professores efetivos, o que representa
mais de 55% da força de trabalho docente institucional. Destes, há 160 doutores e 249
mestres. Assim, na instituição, há um grupo com alta titulação e, pelo menos em tese, é
possível afirmar que há recursos humanos disponíveis para atuar nas especializações e nos
mestrados.
Uma outra ação que, conforme S3, tem sido positiva é o aproveitamento de edital da
CAPES no qual a Pró-Reitoria aprovou projetos para professor visitante nacional sênior em
duas das três propostas (humanas e produção e sanidade animal). “[...] é um olhar externo,
um orientador, um estimulador, um provocador externo que vem para dentro, olha e nos
desafia a ver onde temos possibilidades, estimular e ver onde temos fragilidades, enfim [...].”
(S3).
Ao referir-se às políticas desenvolvidas pelo IFC, S5 faz destaque à Lei de criação dos
institutos na qual há previsão de implantação da Pós-Graduação. Ele destaca que a Lei
também prevê 50% das vagas para o Ensino Médio e outra parte delas para o Ensino Superior.
Contudo, S5 considera “[...] que, no âmbito do Instituto, as políticas voltadas para a Pós-
Graduação ainda precisam ser melhor definidas. Como nós, até o momento, não temos
nenhum curso stricto sensu, isso demonstra também que devemos dar atenção para esse
cenário, de forma a possibilitar que os grupos de pesquisa estabelecidos consigam alavancar
168
sua produção, para que num curto e médio prazo possam partir, também, para a pós-
graduação” (S5). O entrevistado considera estratégica também a atuação e o apoio da Pró-
Reitoria de Pesquisa e Inovação na elaboração de propostas, o que, de certo modo, vincula e
mobiliza a comunidade acadêmica tanto do Ensino Médio como do superior aos projetos.
S6, por sua vez, não reconhece a existência de uma política de Pós-Graduação no IFC,
mas cita ações que têm sido realizadas no sentido de implantar o Mestrado Profissional: “Eu
não sei se existe uma política do IFC voltada à pós-graduação. Se existe, eu desconheço. A
experiência que eu tenho na pós-graduação foi a ideia de implantar o curso de Mestrado
Profissional aqui no campus” (S6). Para ele, a proposta do Mestrado Profissional é um
incentivo da Reitoria em parceria com outros campi, assim como o investimento de setenta
mil reais para compra de equipamentos voltados à área do projeto como forma de
fortalecimento da infraestrutura. Já para S7, as políticas de Pós-Graduação no IFC são as
metas do Planejamento Estratégico nas quais há “[...] o objetivo de desenvolver cursos de
Mestrado e especializações nos campi [...] nossas políticas para implementação da pós-
graduação têm sido estimular a produção científica dos docentes” (S7).
O discurso dos gestores esclarece sobre as estratégias adotadas para vencer os
obstáculos produzidos pelas políticas nacionais e internacionais a que estão submetidos. A
busca dos meios para realizar um fim, nesse caso a implantação da Pós-Graduação, vai ao
encontro da política indutora do Mestrado Profissional imposta pela CAPES e alinhada às
políticas nacionais. Na Figura 13 a seguir, são apresentadas as principais estratégias e táticas
citadas pelos gestores na tradução das políticas.
169
Figura 13 - Estratégias e táticas do IFC na tradução das políticas
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
170
Ao observar a Figura 13, é possível perceber que as estratégias estão concentradas na
consolidação da pesquisa, nos estímulos à produção científica, na formação docente e na
verticalização que possibilita a implantação de cursos de Pós-Graduação lato e stricto sensu.
Algumas estratégias e táticas ainda estão vinculadas ao planejamento em médio e longo prazo
e é perceptível que, na fala dos gestores, a internacionalização, que foi citada somente na
forma de convênios, ainda é um caminho a ser construído, embora no PDI (2014) e no Acordo
de Metas (2010) tenha previsão do desenvolvimento de programas interinstitucionais de
ensino, pesquisa e extensão com instituições nacionais e internacionais. Além disso, a Política
de Pós-Graduação explícita no atual PNGP (2011) situa a internacionalização dos programas
e as formas diferenciadas de financiamento como uma necessidade para o desenvolvimento
das pesquisas.
Quanto à identidade institucional, os gestores sinalizaram sua fragilidade. Isso pode
ser constatado em alguns dos depoimentos, quando eles se referem à instituição como
―escola‖, ou, ainda, o reconhecimento da população em geral ao referir-se como ―Colégio
Agrícola‖ ou ―Escola Agrotécnica‖. Há um sentimento de pertença que necessita ser
construído por todos os que fazem parte dessa instituição. Por outro lado, as resistências e as
ausências, por parte de um grupo de professores, podem ser interpretadas como negação à
nova realidade, que, ao ampliar a esfera de atuação institucional, exige de cada um a
ampliação da esfera de atuação profissional, o que é um campo em intenso movimento.
Entre os embates, há também uma luta da instituição e dos gestores envolvidos no
sentido de fortalecer a identidade institucional pela via da Pós-Graduação e da pesquisa.
Como instituição recém-criada, o IFC tem muitos desafios a vencer e os depoimentos dos
gestores são esclarecedores no sentido de que, para responder às políticas, é necessário fazer
acordos, travar lutas em campos de disputas que se materializam na passagem entre o velho e
o novo modelo institucional. É o que Ball (2012a, 2012b) nomeia de encenação/representação
política (enactement). Uma das formas de produzir um discurso normativo é a produção dos
documentos que, como artefatos, sinalizam a direção política e mostram o que precisa ser
feito, como, por exemplo, a padronização dos processos destacado pelos gestores.
Entendidas desse modo, ―[...] as políticas tornam-se representáveis e traduzíveis
através de diferentes conjuntos de artefatos, experiências, recursos materiais e atividades em
serviço; são estas as microtecnologias e representações da política que servem como
formadores e controladores de significado no mundo social e material da escola (BALL, 2012,
p. 121, tradução nossa). As táticas envolvem o fazer institucional no qual entendimentos
compartilhados são construídos e expressam os modos de atuação e os papéis que os gestores
171
devem desempenhar, um movimento que não tem sido fácil do ponto de vista institucional.
São exemplos as dificuldades de diálogo entre os campi e a colaboração para elaboração de
propostas de especializações e mestrados interdisciplinares. A seguir, as interpretações e as
traduções da política no P.PORTO.
172
6 INTERPRETAÇÕES E TRADUÇÕES DA POLÍTICA NO P.PORTO
De acordo com o sinalizado no capítulo anterior, neste capítulo, especificamente
interesso-me por identificar as estratégias e as táticas adotadas pelo P.Porto com vistas à
implantação/consolidação da Pós-Graduação no contexto de reorganização como instituição
de Ensino Superior.
6.1 DILEMAS DA TRANSIÇÃO DA IDENTIDADE DE PROFESSOR/PESQUISADOR
PARA GESTOR
A exemplo do movimento realizado no capítulo anterior e com a mesma
intencionalidade, o exercício de compreensão da transição da identidade de um professor e
pesquisador para o gestor requer que se conheça, ainda que minimamente, sua trajetória
acadêmica e profissional. Foi nesse sentido que busquei, nos limites da entrevista, conforme
sinalizado no capítulo 2, saber a formação e as experiências profissionais dos agora gestores
do P.Porto.
Ao contextualizar sobre a formação dos professores nos cursos de doutorados, de
modo geral, S1 esclareceu que as ―propinas‖54 pagas pelo doutoramento são altas em relação
àquelas praticadas nos mestrados, mas “houve programas públicos que financiaram o
pagamento desses Doutoramentos, programas com o apoio da União Europeia”, o que
evidencia as influências das políticas pensadas em contextos externos que direcionam as
ações institucionais internas. Para além do exposto por S1, com a vigência da Declaração de
Bolonha e a reorganização do Ensino Superior, de certo modo, também foi necessária mais
qualificação por parte dos professores.
À medida que foram convidados a exercer as funções gestoras ou assumindo
espontaneamente os desafios, eles se obrigaram a diminuir ou, ainda, conciliar a carga horária
em sala de aula, o que se traduz no alargamento das funções. Nesse sentido, são várias as
afirmações: “[...] desde o início [...] assumi um projeto que nós temos internamente
vinculado à ação de um sistema de gestão da qualidade, sobretudo, um referencial
internacional, a ISO 9001; e isso permitiu, de alguma forma, ter algum desafio, não era
elemento da gestão, era elemento, portanto, de uma docente [...]” (S3). “E, digamos que ao
longo deste tempo, fui assumindo algumas responsabilidades na Escola onde trabalho, [...] e
desempenhei responsabilidades de vários tipos” (S1); “[...] acabei por, muito cedo, me
tornar professor coordenador” (S2).
54
Expressão utilizada em Portugal para fazer referência ao pagamento de mensalidades.
173
De modo inverso, S4 afirmou que nunca teve ideia de entrar para a gestão, mas o fato
de ter feito doutoramento em outro país já o inseriu no âmbito das ligações com programas
internacionais. Quando concluiu o Doutorado, “[...] a primeira coisa que me colocaram à
frente foi a gestão de um curso que nós tínhamos, um único curso, no qual eu tinha a ensinar
e, portanto, a primeira coisa foi dizer: „agora que vieste do Doutoramento‟ „vais tu gerir esta
parte do curso‟ [...]” (S4). As entradas nas funções de gestão ainda ocorreram por conta do
ingresso em órgãos representativos, a exemplo do “[..] Conselho Técnico Científico [...]” dos
Departamentos nos quais são professores, como foi o caso de S6. Para S7, o desafio inicial
que o lançou para a gestão foi a coordenação de um Departamento: “[...] lançaram-me o
desafio de ficar a gerir um Departamento” (S7). S8 destacou que, como docente, sempre
esteve muito “ligado à atividade de pesquisa e desenvolvimento”, tanto nas aulas da
Graduação como nos cursos de Doutoramento nos quais atuou com acentuado enfoque na área
de desenvolvimento.
O ponto comum para esses gestores foi a entrada pela docência; no entanto, alguns,
após o ingresso na gestão, se identificaram com as atividades e procuraram fazer carreira em
outras funções, como pode ser constatado na fala de S5 quando ele enfatiza sua predisposição:
“É preciso perceber que nós não somos nomeados, nós somos eleitos e uma vez que somos
eleitos, somos nós que nos candidatamos, temos que nos candidatar” (S5). Todos os
entrevistados acumulam, no momento, pelo menos duas funções de gestão, quer sejam no
âmbito das Escolas/Institutos, ou nos órgãos centrais do P.Porto, além das atividades de
docência. Há casos que eles são exclusivamente gestores.
Alguns reforçam sua identificação com a sala de aula e com as pesquisas: “Devo dizer
com toda a franqueza que o meu maior gosto é ser professor, é a atividade letiva, a atividade
de pesquisa e, sobretudo, a relação entre essas duas atividades. [...] eu continuo sempre a ter
atividade letiva, a dar aulas, exatamente para nunca me esquecer de que o que eu gosto de
fazer é dar aulas e, portanto, que isso são tudo tarefas transitórias e que o fundamental não é
isso.” (S1); “[...] eu gosto muito de ser professor e as funções de gestão são uma enorme
chatice, para dizer a verdade, porque nos tiram o tempo para preparar aulas, para
desenvolver conteúdos formativos para os alunos e para investigar, que é uma coisa que eu
gosto muito e que cujo tempo é muito pouco, sobretudo, agora, com tantas tarefas de gestão”
(S6). Outros reconhecem que se identificam com a gestão como área profissional: ―Percebi
que tinha algumas características de gestor que me facilitavam a resolução de problemas”
(S7). “[...] minha função basicamente é da representação do órgão, o órgão é um órgão
174
crucial e, portanto, muitas vezes temos de exprimir a vontade do órgão, pode até não ser a
minha, mas é o que resulta, digamos, da vontade do órgão” (S2).
As afirmações de S2 e S7 demonstram que os núcleos se organizam de modo a ter
representatividade e marcar posições na tomada de decisões, pois estar na função também
representa um privilégio. Por outro lado, gerir a sala de aula é uma das dimensões da gestão
no micro espaço institucional; no entanto, para ser gestor em tempos de educação
administrada para a performance, com a maximização de lucros e de resultados, requer outras
habilidades que modificam também o perfil dos docentes. As atividades administrativas os
impelem ao olhar global e altamente inter-relacionado com os resultados ―[...] do tipo
produtivista e funcional [...]‖ (LIMA, 1997, p. 49).
Assim como os ingressos na gestão ocorrem por vários caminhos, os desafios que os
levaram a aceitar tais funções também podem ser de ordem pessoal ou profissional. S5
respondeu, por exemplo, de forma muito breve, com frases curtas a essa questão, mas uma
consulta rápida em seu currículo publicado na internet deixa claro que ele sempre esteve
ligado à gestão desde seu ingresso na instituição. Os motivos mais presentes citados pelos
gestores para aceitar as funções de gestão são os relativos ao crescimento e ao
reconhecimento institucionais e o comprometimento com a representação dos vários
segmentos, pois o Conselho Técnico Científico é um deles. “[...] achei que era a altura de me
dedicar a outras funções, mais diretamente dentro da Escola [...], que estava na altura de dar
também um contributo [...]” (S2); “Normalmente quando me põem um desafio à frente
costumo chegar ao fim, discuti-lo, desenvolvê-lo e concretizá-lo. Foi por aí que acabei por
estar ligado a uma gestão que tem a ver com direção de um departamento [...]” (S4).
Segundo S8, o fato de aceitar o desafio na gestão ocorreu por inúmeros fatores, “[...] mas
essencialmente o fato de eu entender que a minha experiência em termos de pesquisa e
desenvolvimento seria importante para tentar dinamizar a atividade de pesquisa dentro do
Politécnico do Porto [...], foi o fato de eu achar que nessas áreas seria possível introduzir
algumas mudanças significativas no Politécnico”.
Há os que mencionam o fato de adquirir experiência com a trajetória nas diversas
atividades, o que possibilitou “[...] de alguma forma, ter uma visão do todo em termos de
funcionamento dos processos organizacionais, da forma como as atividades que são
desenvolvidas dentro da Escola se articulam e, portanto, este é um sistema global” (S3); “A
motivação é tentar construir uma escola melhor, uma instituição melhor, mas que os desafios
tenham respostas, que as pessoas se sintam bem, que os estudantes possam aprender da
melhor forma possível de modo a desenvolver todo o seu potencial e, também, para que a
175
escola possa ser um centro de conhecimento de saber e de investigação, que é um dos nossos
principais desafios” (S5). Nos depoimentos desses dois gestores, o compromisso com a
instituição e com a educação são reveladores do modo como se responsabilizam pelo sucesso
institucional. É um compromisso pautado, também, na performance e nos resultados (BALL,
2004), que expressa como as políticas entram nos ambientes com diferentes tecnologias entre
elas nos perfis de liderança requeridos pelos gestores.
Ou, ainda: “Tarefas de gestão não é tanto por gosto que faço, mas é mais por,
digamos, por sentido institucional. Ou seja, por considerar que quando sou convidado, sou
desafiado para desempenhar determinadas tarefas, tenho obrigação de as realizar. Nunca,
acho que em nenhum caso, comecei a desempenhar essas funções com uma enorme vontade
em fazer [...], ainda que, na generalidade dos casos, depois a própria função, o próprio
cargo, vai gerando o entusiasmo. Portanto, não é uma vontade de desempenhar, mas depois
com o caminhar das coisas, a pessoa acaba por se entusiasmar com o que faz” (S1). Para S7,
as tarefas de gestão tiveram origem nos desafios. Inicialmente, pensava que não possuía
habilidades de gestor, mas, com o passar do tempo, “[...] percebi que tinha, digamos,
algumas características de gestor, não todas, mas algumas características que facilitavam a
criação de pontes entre as pessoas, resolução de problemas, as pessoas não se entendiam,
haviam problemas para resolver e eu conseguia, sem grande esforço, que as pessoas
tentassem ou levá-las a agir no sentido que é pretendido sem que tivesse que ter nenhuma
postura de coação perante as pessoas” (S7).
O sentido ético profissional e do pertencimento institucional são reforçados nos
depoimentos de S1 e S7 ao enfatizarem a responsabilidade com a instituição e o compromisso
em ser ponte. Afinal, os gestores são chamados a agir ativamente, como recursos cruciais que
articulam flexibilidade, iniciativa e trabalho em equipe (MAGUIRE; BALL, 2011). Para além
do exposto, o exercício das funções de gestor agrega também habilidades de mediador de
conflitos e está centrado nos processos que visam atingir os resultados, seja ele com o foco
nas pessoas ou nas ações, delineados nas políticas institucionais vinculadas também ao
movimento do mercado. As técnicas de gestão e as consultorias passam a fazer parte da
implementação cotidiana das ações buscando a flexibilidade adaptativa e, ao mesmo tempo,
respondendo ao que vem sendo apresentado, defendido e recomendado pelos organismos
internacionais na perspectiva do gerencialismo (LIMA, 1997).
Nesse sentido, ao falarem sobre suas atividades na presidência do Conselho Técnico
Científico, os sujeitos destacam ser um “privilégio” (S4) estar em um órgão representativo e
deliberativo no contexto do P.Porto. Para S2: “Depois da última reforma legislativa, as
176
competências do(s) Conselho(s) Técnico(s) Científico(s) viram-se diminuídas; enfim, de
competências de gestão só se pode falar num sentido muito lato de gestão, digamos, de
direção científica da escola, talvez nesse sentido se possa falar”. Entretanto, tanto S2 como
S4 e S7 enfatizaram as atividades burocráticas, que passam tanto pelo estímulo às atividades
de pesquisa e formação docente, quanto pelas contratações e renovações contratuais que
ocorrem anualmente. De certo modo, S2 expressa desapontamento quanto à redução das
competências de gestão do Presidente no âmbito do CTC, o que pode ser considerado uma
diminuição do status no campo de influências e de manifestações de poder institucionais.
O que fica explícito é o movimento que põe em pauta o gerenciamento e a otimização
dos recursos humanos, materiais e atividades com preocupação central no atendimento das
atuais políticas no âmbito do P.Porto. Esses aspectos, conforme Castro (2011), envolvem a
qualidade organizacional que se traduz nos resultados e na eficiência. É o gestor que altera
seus discursos e suas ações para responder às exigências que trarão reconhecimento nos
planos pessoais e institucionais. Ou, ainda, na perspectiva de Ball: ―Os professores [...] são
solicitados a produzirem medidas, resultados ‗melhores‘ e desempenhos, o que é tido como
importante é o que realmente funciona‖ (BALL, 2003, p. 222, grifo do autor).
A maioria dos gestores está, de certo modo, em conflito porque percebe a gestão e as
atividades de docência como campos dispersos. No entanto, conforme S5, a maioria das
funções de gestão estão sujeitas à candidatura e à eleição pelos colegas, o que expressa
também uma intenção de ocupar cargos que, na hierarquia institucional, são socialmente
prestigiados, porque seus ocupantes representam uma categoria. Por outro lado, as afirmações
também deixam explícitas uma concepção de gestão pautada na perspectiva clássica racional
burocrática, que separa o ser docente do ser gestor como atividades impossíveis de conciliar,
pois esta lhe retira as possibilidades daquela quanto ao desenvolvimento de pesquisas e
publicações que levam ao reconhecimento científico para os docentes. “E esse é um grande
problema a quem está a desempenhar tarefas de gestão: o tempo não chega para tudo” (S6).
Na contramão dessas posições, a fala de S3 situa a gestão em uma outra perspectiva,
mais compatível com uma visão emancipatória e integrada das duas funções. Ou seja, uma
visão de processos integrados que são bem-vindos nas perspectivas de gestão contemporânea,
quando, ao falar de suas funções em várias atividades de gestão, ele destaca que essas
experiências permitiram, “[...] de alguma forma, ter uma visão do todo em termos de
funcionamento dos processos organizacionais, da forma como as atividades que são
desenvolvidas dentro da Escola se articulam e, portanto, este é um sistema global. E isso
levou-me, de alguma forma, a ter, portanto, mais apetência à gestão” (S3). Nesse sentido, o
177
gestor, o docente e o pesquisador andam muito próximos, ainda que as tarefas cotidianas da
gestão lhe consumam as energias (BALL, 2003) e exijam que os objetivos sejam alcançados
por meio da responsabilização pessoal do gestor e do docente.
Esse movimento realizado pelos gestores demonstra também que há uma cultura de
resultados que, no campo da micropolítica institucional (BALL, 1989), é baseada em
interesses de grupos heterogêneos nos quais a racionalidade e o planejamento situam as
organizações no campo da ―arena política‖ (COSTA, 1996). Os processos de tomada de
decisão são baseados em interesses e:
As organizações, concebidas como miniaturas dos sistemas políticos globais, são
percepcionadas, à semelhança destes, como realidades sociais complexas onde os
actores, situados no centro das contendas e em funções de interesses individuais ou
grupais, estabelecem estratégias, mobilizam poderes e influências, desencadeiam
situações de conflito, de coligação e de negociação tendo em conta a consecução dos
seus objectivos. (COSTA, 1996, p. 78, grifos do autor).
Em uma instituição com as características do P.Porto, o termo arena política e seu
significado auxilia na compreensão da gestão e dos seus dilemas, conforme exposto pelos
gestores, pois o fato de ser composto por unidades orgânicas, com histórias, identidades,
percursos e especificidades distintos, estabelece, na maioria dos casos, um caráter competitivo
e centrado nas ações das pessoas. Assim, é um campo que expressa jogos contínuos de
interesses, negociação, conflito e, sobretudo, o poder de alguns sobre os outros na tomada de
decisões. Na Figura 14, são apresentados os dilemas dos gestores
178
Figura 14 - Dilemas dos gestores na configuração da política no P.Porto
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Nesses dilemas profissionais e institucionais, o que se encontra são pessoas que
aderem às regras por motivações diferenciadas: por senso de responsabilidades, por
identificação, por respeito ao grupo ou à instituição, por compatibilidade pessoal com as
tarefas de gestão, por identificação com formas sistêmicas de leitura institucional, com a
necessidade de planejar em longo prazo. Por um caminho ou por outro, vemos sujeitos
encarnados em histórias reais e sentimentos procurando, a seu modo, construir com a
instituição suas estratégias e táticas de resposta à política. Todas essas formas de respostas
fabricam novas subjetividades (BALL, 2003) e como tais representam a grandeza que aquele
que produz algo considera como de qualidade ou valor, tanto individual como organizacional.
No entanto, o valor que o outro confere pelo que foi realizado também adquire importância e
caracteriza as relações de poder e os sistemas de recompensa. É a imagem de si, mas também
a imagem projetada pelo outro.
6.2 CONTRADIÇÕES DA POLÍTICA: DIRETRIZES, AVALIAÇÃO E REALIDADE EM
MOVIMENTO
Quando questionados sobre a política nacional de avaliação e a sua equiparação em
termos avaliativos às universidades, os gestores trouxeram à tona questões e dilemas que
expressam o movimento que vem sendo empreendido para responder às exigências e aos
179
desafios presentes no cenário português. Essa realidade está fortemente acoplada à ideia do
Estado Avaliador que a agenda internacional global (DALE, 2004) fixou no ―pacote‖ de
Bolonha. Para que os estudantes pudessem fazer uso da mobilidade, como anteriormente
sinalizado, era e continua sendo necessário que as instituições tivessem sistemas próximos de
créditos e que fossem reconhecidas como de qualidade.
As adequações efetuadas em larga escala no espaço europeu de Ensino Superior e sua
readequação provocaram aumento pela procura desse nível de ensino nas décadas anteriores
aos anos de 2000. Contudo, na contramão desse movimento, o financiamento estatal às
instituições não foi incrementado, impelindo-as a buscar outras fontes de subsistência mais
próximas da perspectiva do utilitarismo, no conhecimento imediatamente útil para a
sociedade, o que as situa na prestação de serviços, perspectiva também assumida pelos
gestores e fruto da organização institucional a qual estão vinculados, o que expressa seu
comprometimento quanto ao sucesso pretendido.
De modo geral, todos os gestores reconhecem a importância da avaliação externa e
obrigatória das instituições realizada pela A3ES55. Além desses procedimentos avaliativos
obrigatórios, há instituições pertencentes ao P.Porto que solicitam outras avaliações externas,
55
Na primeira versão da Lei de Bases (1986), havia artigos destinados à avaliação contínua do sistema
educativo, com ênfase na regulamentação e na utilização de instrumentos estatísticos. Somente na década de
1990, com a Lei Nº 38, de 21 de novembro de 1994, ocorreu a criação do Sistema Nacional de Avaliação, e, oito
anos depois, foi criado o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), por meio do Decreto-
Lei Nº 205, de 11 de julho de 1998. Em termos práticos, estavam sujeitas às avaliações todas as instituições de
ensino superior universitário, politécnico, públicas e não públicas que se submetiam aos quatro Conselhos
compostos, conforme a tipologia organizacional das instituições. Necessário se faz destacar que a primeira etapa
avaliativa foi realizada ainda nos anos de 1990, mas somente foram avaliadas as universidades públicas e a
Universidade Católica. Os Politécnicos e as outras instituições de Ensino Superior somente foram incluídos nas
avaliações na segunda etapa ocorrida no período relativo aos anos de 2000 e 2005 (ROSA; SARRICO, 2012).
Entretanto, com o objetivo de adequar a política do Ensino Superior português às exigências de Bolonha, quanto
à avaliação e à acreditação desse nível de ensino e também como forma de estar apto a competir com outros
países na ―sedução‖ de alunos, pesquisadores, empresas e outras instituições conceituadas, em substituição ao
sistema anterior, foi criada pelo Decreto-Lei N.º 369, de 5 de novembro de 2007, a Agência de Avaliação e
Acreditação do Ensino Superior (A3ES). Essa Agência é uma fundação de direito privado, independente do
poder público que tem a responsabilidade de realizar os procedimentos de avaliação e acreditação do Ensino
Superior, bem como de seus ciclos de estudos. Essa avaliação possibilita a inserção de Portugal no Sistema
Europeu de Garantia de Qualidade do Ensino Superior e os custos relativos aos serviços prestados por essa
agência na avaliação externa são custeados pelas instituições.
Essa acreditação é obrigatória e pode ser tanto de iniciativa das agências, quanto das instituições de Ensino
Superior. Os resultados de tais acreditações podem ser favoráveis em tempo não superior a oito anos, favoráveis
condicionados ou desfavoráveis e, em suma, se referem ao atendimento de requisitos mínimos de qualidade, o
que de certo modo funciona como dar a conhecer à comunidade que o curso é oficialmente reconhecido por um
órgão oficial, o que no contexto europeu, altamente competitivo, assume ainda maior amplitude. O âmbito de
atuação dessa Agência caracteriza-se pelo controle da qualidade do ensino oferecido pelas instituições
portuguesas no ensino superior e conduz a uma ―cultura de qualidade, como elemento de autonomia e
responsabilidade social‖ (MARQUES, 2010, p. 144). Essa qualidade pode ser entendida sob vários prismas,
entre eles, a gestão, a formação dos professores, adequação das matrizes curriculares, capacidade física instalada
e investigação.
180
que, dependendo da área de conhecimento, são consideradas estratégicas para o
reconhecimento no contexto internacional, a exemplo da Agência European Accreditation
Engineering Programmes – EUR-ACE. Há ainda gestores que consideram os critérios das
avaliações qualitativos, enquanto outros os consideram quantitativos. Mas, a maior ênfase nos
argumentos dos docentes refere-se às exigências da formação docente e ao impedimento legal
de oferecer o terceiro ciclo.
Sobre esse impedimento legal, S8 destacou: “[...] a um nível político, uma grande luta
que tem sido feita é no sentido do Politécnico não se ver limitado. Há uma divisão entre
universidade e politécnico e, do ponto de vista formativo, a maior limitação é não podermos
conceder o grau de Doutor”.
Ao referirem-se à Política para o Ensino Superior e aos procedimentos de avaliação e
acreditação externos realizados pela A3ES, “[...] parece-me essencial que existam essas
políticas. Para que possamos ter uma oferta de qualidade. Portanto, naturalmente que a
oferta tem que ser regulada [...] E, de fato, a acreditação dos cursos é realmente muito
essencial. Para que eles funcionem, naturalmente devem estar acreditados e as políticas, hoje
em dia, são restritivas [...]” (S6); “[...] considero muito bem não tenho nada a dizer sobre
estes aspectos além do mais nós além da A3ES temos outras avaliações voluntárias que
fazemos, [...] e fazemos de forma voluntária que não tem nada a ver com a A3ES então as
avaliações melhores obviamente contribuem para melhorarmos a nossa qualidade de ensino.
[...]. Até porque agora nós já temos o décimo segundo curso reconhecido por uma avaliação
voluntária. A A3ES é obrigatória, quisesse ou não quisesse, tinha de ter” (S5), em uma
evidente referência às agências de avaliação reconhecidas no espaço europeu de Ensino
Superior.
De modo geral, com a premissa de garantia de qualidade aferida por meio das
avaliações, a União Europeia com o Processo de Bolonha integra e diferencia
simultaneamente uma gama de sistemas e subsistemas nacionais baseados na criação de
sistemas de avaliação, conselhos e agências nacionais. É a lógica de mercado que orienta o
funcionamento de tais agências na prestação de serviços do ―tipo empresarial‖, atuando na
avaliação de instituições, cursos, programas e pesquisas que seguem “standards” utilizados
nas avaliações que devem ser seguidos por todas as agências. Para que seja possível essa
integração dos sistemas de avaliação, os indicadores utilizados necessitam ser mensuráveis e
comparáveis (LIMA; AZEVEDO; CATANI, 2008), o que impele as instituições às
adequações de modo a produzir respostas.
181
Quanto aos critérios de avaliação, os gestores destacam que, tanto as universidades
como os Politécnicos, são submetidos aos mesmos procedimentos, o que pode ser constatado
em uma consulta rápida aos ―Guiões de Apreciação e Manual de Avaliação publicizados na
homepage da Agência. Para S1, a avaliação é completamente qualitativa: “[...] essa avaliação
não é uma avaliação quantitativa, não tem nenhum elemento quantitativo, ou seja, é uma
avaliação qualitativa que faz recomendações se considerar que elas são necessárias e depois
o que faz é uma acreditação, que pode ser o prazo máximo de seis anos ou, se entender que
há elementos que não estão nas devidas condições, mas que só por si não justificam que o
curso seja descontinuado, pode fazer acreditações por menos tempo. Por exemplo, acreditar
apenas por três anos, dizendo que a instituição tem aqueles três anos para melhorar
determinado aspecto do curso. Pode ser três anos, pode ser um ano. Normalmente é um ou
três anos para, digamos, melhorar aspectos que a agência considere que não estão em
condições” (S1).
Sobre esse aspecto, especificamente, outro gestor discorda por considerar que, no final
do processo, é o item quantitativo que tem maior peso: “Numa balança, pelos relatórios que
depois nos chegam das instituições, das comissões de avaliação, são as duas coisas, mas
aqueles que determinam, definitivamente, a acreditação ou a não acreditação são os
quantitativos, são estes. Temos 45% e não 50% de docentes em tempo integral, portanto todo
o resto é fantástico, os estudantes têm boa formação, as condições para assegurar, os
laboratórios estão equipados, os estudantes estão envolvidos em investigação, publicam
artigos, às vezes, das investigações que fazem na Licenciatura – não é uma coisa assim muito
comum – mas, apesar de mostrarmos que com o corpo docente que temos, que é qualificado,
não cumprimos, acabamos por levar um sinal amarelo e temos que alterar, isso num termo de
corpo docente, se quisermos ver o curso acreditado. Portanto, no limite, são os quantitativos
que determinam a acreditação ou não” (S7).
Os Critérios de Qualificação de Pessoal Docente para a Acreditação de Ciclos de
Estudos (2013) que o gestor faz referência também são públicos. Na Tabela 9 a seguir, foi
organizada a composição mínima do corpo docente/investigador exigidos ao ensino
universitário e ao ensino politécnico para acreditação dos cursos.
182
Tabela 9 - Composição mínima do corpo docente/investigador exigidos nos Ensinos Superior Universitário
e Politécnico
Docente / Investigador
1º ciclo 2º ciclo 3º ciclo
U P U P U P
Corpo docente próprio (docentes em
tempo integral) 60% 60% 75% 75% 75% -
Academicamente qualificado
(Grau de Doutor) 50% 15% 60% 40% 100% -
Especializado
(Doutores / especialistas nas áreas
fundamentais do ciclo de estudos)
50% 50% 50% 50% - -
Especializado
(Doutores especializados nas áreas
fundamentais do ciclo de estudos)
30% - 40% 20% 75% -
Fonte: Elaborada pela autora com base nos critérios de qualificação de pessoal docente para a acreditação de
ciclos de Estudos da A3ES.
Obs.: U – Universitário; P – Politécnico.
Os valores percentuais, conforme esclarecido no documento da A3ES, são calculados
sobre o total de docentes e considerados em ETI (Equivale a tempo integral) que se refere à:
―Percentagem de tempo dedicada por um docente a um determinado estabelecimento de
ensino, tomando como referência a dedicação prestada por um docente em regime de tempo
integral‖ (A3ES, 200-, p. 8). O que se observa na Tabela 9 é que, para o primeiro ciclo, as
exigências quanto ao regime de contratação do corpo docente são as mesmas. No entanto,
quanto à porcentagem de docentes com grau de Doutor, estão evidentes algumas
diferenciações com menores percentuais exigidos aos Politécnicos, o que apresenta também
implicações quanto à concepção da formação oferecida em cada um dos subsistemas.
Para amenizar o problema do tempo integral dos docentes, a estratégia é: “[...] o
docente leciona uma hora dos milhares de horas que o curso todo tem, mas aquela hora não
é tida em proporção das horas totais do curso, é tida em relação à porcentagem contratual
do docente, que não está 100%, mas conta estando a 100%. Conclusão... Não é preciso haver
muitos docentes em tempo integral a lecionar em um curso para, facilmente, o número de
doutorados e especialistas da área serem inferiores a 50%... E temos aqui um problema
grave. Andamos às vezes a contratar docentes em tempo parcial, com um currículo inferior
aos docentes a tempo integral que temos na instituição, para que o corpo docente do curso
cumpra os critérios da A3ES” (S7). A afirmação desse gestor evidência uma das táticas
utilizadas para atender aos critérios de avaliação e, ao mesmo tempo, ter os cursos
reconhecidos. Há uma adequação, um consenso construído e um conflito instalado. Ao
desenvolverem ―[...] diferentes lógicas de ação que, em muitos casos resultam de condições
internas e externas congruentes [...]‖ (BALL; MAROY, 2009, p. 110), cria-se, como nesse
caso, um conflito, pois, ao contratar professores com um currículo mais básico, do ponto de
183
vista formativo, também há implicações que, apesar de minimizadas, podem impactar na
formação dos alunos.
De acordo com Lima, Azevedo e Catani (2008), as avaliações ―de tipos administrado e
positivista‖ aproximam-se de uma tarefa técnica que diverge da concepção da produção do
conhecimento como processo. Assim, a cultura e a comunidade acadêmica, tanto quanto as
práticas democráticas, estão em posição oposta à cultura empresarial, ao novo gerencialismo e
à competitividade que conduz à fabricação das respostas às políticas.
Quanto à similaridade do processo de avaliação entre as universidades e os
politécnicos, os gestores confirmam que os Guiões para elaboração do relatório de
Avaliação/Acreditação e Ciclos de Estudo em Funcionamento (AACEF) (2012) são idênticos,
o que é facilmente constatado na homepage da Agência, apesar de estarem em documentos
distintos. Ao publicar documentos distintos para uma mesma finalidade, percebe-se uma
intencionalidade de marcar a separação entre os politécnicos e as universidades. Para a
autoavaliação das instituições (2014), há um único guião para os dois subsistemas, ou seja,
estão submetidos às mesmas regras.
Para responder às atuais exigências dos processos de avaliação, no âmbito do P.Porto,
há um Departamento que coordena esses processos na instituição. De modo geral, conforme
relatos dos gestores, para a acreditação, a instituição proponente elabora um relatório
minucioso sobre as capacidades de recursos humanos, físicos, investigação, entre outros, e o
submetem à A3ES que realiza a análise e acredita ou não os novos cursos. Até o presente
momento, as avaliações estão centradas nos ciclos de licenciatura e mestrados e também são
compostos de processos de autoavaliação dos cursos. “[...] a questão da autoavaliação
interna também nos obriga a refletir e eu acho extremamente importante, assim como a
avaliação externa” (S3). Após a apreciação dos relatórios, as comissões, que contam sempre
com um integrante estrangeiro, fazem visitas in loco. Entretanto, S8 destaca que, para além da
aprovação, é necessário “garantir sustentabilidade”. “Nós temos tido sucesso com a
aprovação de cursos, mas depois há exigências que nós temos que procurar garantir, ou seja,
não podemos perder a acreditação do curso”. Ou seja, uma atenção especial ao planejamento
calculado.
Os depoimentos de alguns gestores também sinalizaram as alterações que serão
realizadas nas avaliações a partir do próximo ano letivo. “[...] a Agência irá desenvolver um
processo que é também de avaliação das instituições, portanto, já não é apenas uma
avaliação dos cursos, mas será uma avaliação das instituições, do Politécnico do Porto,
como de todas as instituições” (S1); “E existe também um outro nível que o IPP agora é um
184
desafio que ainda está a abraçar, que é a questão da avaliação institucional, [...]. O
Politécnico do Porto está nesse caminho, faço parte também da comissão que está a criar o
sistema interno de garantia da qualidade do Politécnico, já desenvolvemos aqui o que eu
considero que é o esqueleto base em termos dos procedimentos a adotar em todas as
unidades orgânicas do Politécnico, tanto que vai ser transversal, e eu considero
extremamente importante para, novamente, aumentar a qualidade do ensino ministrado é que
este sistema venha a ser totalmente implementado e venha a estar depois certificado pela
agência que nós queremos atingir” (S3).
Todas essas iniciativas reforçam a perspectiva da política neoliberal de avaliação,
acreditação e demais políticas de gerencialismo na educação e na qualidade focada nas
regulações do Estado. Essas são respostas às políticas globais que demonstram como as ideias
políticas movem-se e, ―[...] apesar da interpretação e da modificação de produtos de políticas
no âmbito nacional e local [...], há claramente agora algo que podemos chamar de ‗política
educacional global‘‖ (BALL, 2012a, p. 115, grifo do autor) – um conjunto genérico de
conceitos, de linguagens e de práticas que é reconhecível em várias formas.
Além desse sistema interno de garantia de qualidade, no P.Porto, há o Manual de
Qualidade (0.1/2015) anteriormente citado e alinhado ao Regime Jurídico de Avaliação do
Ensino Superior – Lei Nº 38, de 16 de agosto de 2007, que responsabiliza as instituições a
desenvolver uma cultura de qualidade baseada em estratégias e procedimentos com o objetivo
de garantir a qualidade dos ciclos de estudos oferecidos, que também tem ligação com as
exigências de Bolonha. Mais do que isso, há uma adequação às auditorias realizadas pela
A3ES para certificação de procedimentos internos de garantia de qualidade nas instituições.
Nesse documento, as estratégias institucionais estão centradas em três grandes áreas, ensino e
aprendizagem, investigação e desenvolvimento e transferência de conhecimento com
detalhamento de ações. Conforme destacado anteriormente, os gestores, ainda que
professores, são também os gerentes na abordagem do ―Modelo Gerencialista‖ de Lima
(2002, p. 99, grifos do autor), pois, nesse modelo, se ―[...] propõe a flexibilidade adaptativa e
contingente, monitorizada pelas avaliações da qualidade e comandada pela gestão da
qualidade total‖, ou ainda, a avaliação ―[...] tende a verificar a realização dos objectivos
através do controlo do produto e não através dos processos‖ (SEIXAS, 2001, p. 217).
Com o objetivo de manter-se nas posições mais elevadas dos rankings de instituições
como primeira escolha dos cursos pelos alunos, há também uma estratégia de valorização dos
cursos de Mestrado com uma sequência que, após a conclusão da licenciatura, o aluno tenha
opção de prosseguir na sua área de formação e, assim, manter-se na instituição. Sobre isso,
185
vários gestores manifestaram-se: “A política é cada curso de licenciatura tem um curso de
mestrado” (S5); “Portanto, aqui o que temos é um grande investimento nas Licenciaturas, a
seguir um investimento muito grande nos Mestrados e ainda nas pós-graduações, mais do
que nos terceiros ciclos. Os terceiros ciclos estão em negociação” (S4); “Nós temos
Licenciaturas, os nossos Mestrados vêm na sequência das Licenciaturas. [...]. Portanto, um
dos nossos objetivos é que os nossos estudantes acabem a Licenciatura e pelo menos um
número considerável deles ingresse no Mestrado” (S6); “[...] procuramos ajustar a nossa
oferta formativa ao nível da Pós-Graduação, digamos, às exigências que nos são colocadas
pela sociedade no momento, que seja os Mestrados com cariz mais profissionalizantes, que
seja aqueles que são Mestrados de especialização” (S1).
A organização da oferta formativa em áreas subsequentes pode ser comparada à
verticalização que ocorre no IFC. Em ambas está relacionada à formação de uma identidade
na área da atuação institucional. Entretanto, enquanto no IFC é obrigatória, no P.Porto é um
modo de atrair alunos em algumas áreas, o que revela a lógica de mercado.
Em um contexto altamente competitivo como o do espaço comum europeu do Ensino
Superior, na conjuntura mais ampla e também na portuguesa, com a necessidade de privilegiar
as exigências da sociedade quanto à formação, há o desenvolvimento de táticas para que os
alunos se mantenham na instituição em mais de um ciclo, o que representa ganhos, pois os
alunos, como clientes, são muito disputados pelas instituições. Além dessa, há outra estratégia
que vem sendo utilizada: a de lançar pós-graduações que futuramente possam ser
transformadas em mestrados. A continuidade da oferta formativa também é uma forma de
otimizar a utilização de recursos humanos formando um corpo docente que atua em
determinadas áreas.
Nesse sentido, ao fazerem referência aos mestrados, os gestores destacaram: “[...] a
esse nível, o principal problema é, que, às vezes, falta de candidatos [...], por vezes criamos
aquilo que chamamos pós-graduações na tentativa de perceber se, com pós-graduação, há
número de candidatos suficiente para expansão ao Mestrado, para propor o processo” (S7);
“[...] existe um investimento muito grande nas pós-graduações de um ano por exemplo e que
depois podem vir a ser transformadas nos Mestrados de três anos [...]. E eu falo do modelo,
das horas, das ECTSs, e até de algumas unidades curriculares, que, depois, poderão ser uma
unidade curricular virada para o Mestrado. [...] as pós-graduações permitem, digamos, um
dinheiro direto à Escola melhor, do que às vezes a Licenciatura ou o Mestrado. [...] há aqui
também uma procura de saber o que o mercado quer para que internamente a Escola possa
186
investir nesse mercado [...]” (S4). Sobre esse aspecto, S8 completou: “Os nossos Mestrados
funcionam em regime pós-laboral para que as pessoas possam frequentar”.
Nessa lógica de oferta, identifica-se uma intencionalidade oculta, pois, ao propor a
Pós-Graduação, há um objetivo maior que é o que realmente interessa e que vem ao encontro
das afirmações de Lima quanto à administração da universidade. ―Isto significa que a
administração da universidade não é meramente instrumental e muito menos neutra; promove
valores, organiza e regula um contexto social em que se socializa e se é socializado, onde se
produzem e reproduzem regras e onde se exercem poderes‖ (LIMA, 2002, p. 110).
Considerando a existência dos dois subsistemas, há algumas situações nas quais os
gestores se sentem injustiçados e julgam que elas causam prejuízos às instituições,
nomeadamente a diferenciação do financiamento e a ausência de critérios claros quanto a essa
distribuição, o que, em certa medida, impacta negativamente nos investimentos destinados às
atividades de investigação. S1 ressalta o fato de que o financiamento das instituições não está
ligado às avaliações, mas reconhece que é desigual. “Aqui não há tanto, de fato, esta
associação entre a avaliação e o financiamento dos cursos. Essa associação não é feita.
Embora o financiamento, honestamente, não é igual para todas as instituições [...]” (S1);
“[...] há necessidade de financiamento pelo menos igual e que possa incrementar dentro do
Politécnico uma investigação, digamos, igual à da universidade” (S4); “Uma universidade
tem um financiamento que é bastante superior àquilo que é em um Instituto Politécnico. Mas,
muito pior do que isso, muito pior do que isso, é que dentro dos Institutos Politécnicos não há
um critério para financiamento” (S6).
O estudo sobre o financiamento do Ensino Superior português, realizado por Cerdeira
(2008), concluiu que o Estado português segue as tendências internacionais de ―partilha de
custos‖ com o estabelecimento de ―propinas‖ e de políticas que propiciaram o ingresso e
desenvolvimento do Ensino Superior privado desde a década de 1980, como reflexo das ―[...]
limitações impostas pela adesão de Portugal ao Euro e consequente necessidade de respeitar o
Quadro de Estabilização Orçamental da União Europeia‖ (CERDEIRA, 2008, p. 557). No
âmbito internacional, as políticas de financiamento são articuladas entre ―propinas‖,
empréstimos e apoio social, tendência também seguida por Portugal.
Os valores financiados pelo poder público em geral, foram inferiores a 50%, onerando
estudantes e famílias. Quanto à diferenciação do financiamento estatal destinado aos
politécnicos, a autora concluiu que a contribuição pública ―[...] é acentuadamente inferior ao
esforço privado constituído pelos custos dos estudantes‖ (CERDEIRA, 2008, p. 564), fato que
converge com a afirmação do gestor. Ao diminuir o financiamento estatal, aumenta-se a
187
mercadorização do Ensino Superior, pois eleva-se também a participação dos estudantes no
financiamento dos serviços públicos em evidente resposta às recomendações dos organismos
internacionais (CABRITO, 2011).
Se externamente o financiamento é desigual, a afirmação de S2 conecta o
financiamento interno do P.Porto destinado às escolas conforme o número de laboratórios e a
problemática do impedimento da oferta dos Doutoramentos: “[...] nós estamos submetidos,
por exemplo, às mesmas exigências de investigação e isso também resulta da política
paralela do IPP, das Escolas, que foi a criação de centros de investigação, até porque,
digamos, o financiamento que é concedido depende de termos centros de investigação. Só que
ter centros de investigação em Escolas que não têm Doutoramentos torna-se mais difícil, não
é? Porque muito dos membros desses centros de investigação, muitas atividades desses
centros de investigação são exatamente as que resultam e as que são feitas no âmbito de
programas de Doutoramento, [...] construíram-se aqui pelo menos dois centros de
investigação com investigadores também fora da Escola e, enfim, com já alguma produção”
(S2).
O direcionamento administrativo/gerencial efetivado por meio do financiamento
exemplifica as pressões vindas da gestão central quanto à criação de condições para responder
aos critérios de avaliação, mostrando o potencial da instituição quanto às atividades de
investigação. Nesse sentido, não somente os gestores, mas os professores estão subsumidos
aos ditames da produção que vinculados aos laboratórios e aos grupos de investigação
necessitam produzir, publicar, participar de eventos reconhecidos internacionalmente. Aqui
também está instalada a performance e a competição uma vez que chamados a atender os
objetivos políticos e estratégicos são responsabilizados pelo alcance do desempenho
institucional, prestando contas de sua produção (BALL; BAILEY, 2013) e competindo
internamente entre colegas e entre as escolas. A necessidade de respostas performáticas
evidencia-se, também, na instituição que luta pelo Doutoramento como uma possibilidade do
P.Porto atingir um status próximo das universidades.
Sobre as iniciativas institucionais vinculadas à produção científica, S8 ressaltou o
sucesso de “[...] um programa que nós fizemos para publicação de artigos em revistas de
elevada qualidade: significa que anualmente nós colocamos um orçamento na casa dos cem
mil euros nesse programa e financiamos os autores de artigos do Politécnico do Porto que,
no ano anterior, tenham publicado em revistas que estejam nos rankings da Reuters,
nomeadamente no Science Citation Index, no Social Science Citation Index e ainda no Arts
and Humanities Citation Index, porque também temos Escolas voltadas mais para as
188
vertentes artísticas e humanísticas e, portanto, usamos também esse ranking” (S8). A
evolução em termos de quantidade de publicações também foi citada por esse gestor: “[...] em
2011, quando começamos com 87 artigos, este último ano tivemos 245; quer em termos de
qualidade, porque alguns grupos tinham alguma prática já de publicação, fruto um pouco até
da própria fórmula, beneficiar a posição das revistas dentro do seu ranking por publicarem
em melhores sítios publicações de mais qualidade nesses grupos” (S8).
O aumento no volume de artigos publicados e os incentivos institucionais alocados
para os professores mais produtivos revelam a cultura da ―performatividade competitiva‖
(BALL, 2004a), com o objetivo de formar novos perfis profissionais vinculando as
recompensas ao desempenho. É um movimento contínuo que vai realizando pequenas
mudanças organizacionais de responsabilização. ―Isso envolve uma reelaboração das relações
entre o compromisso individual e a ação na organização [...]‖ (BALL, 2004a, p. 1118).
Os gestores ainda consideram que a atual diferenciação causa constrangimentos para
além das avaliações quanto às progressões na carreira e quanto à execução das próprias
atividades, inclusive no que se refere ao número mínimo de aulas fixado nos respectivos
Estatutos das Carreiras Docentes que, para as universidades, é entre 6 e 9 horas e, para os
politécnicos, é entre 6 e 12 horas de aula. S2 classifica a situação como “[...] um bocadinho
esquizofrênica, de fato, porque nós estamos sujeitos, ao nível da avaliação, no fundo, a
exigências muito parecidas, tão idênticas, com a universidade, mas depois, ao nível da
formação, é nos dado o Mestrado [...]” (S2).
A cultura da qualidade (MARQUES, 2010) exigida às instituições Europeias nos
processos avaliativos, de acordo com Amaral e Magalhães (2010), traz também a ampliação
do conceito de stakeholders no Ensino Superior. Os autores explicam a diferenciação desse
conceito da sua origem no mercado para a transição que vem sendo utilizada nesse nível de
ensino:
O termo inglês stakeholder designa, tradicionalmente, aquele a quem se confia o
dinheiro dos vários apostadores até a definição de qual ou quais apostadores o
irá/irão receber. É, assim, alguém de confiança, muitas vezes alguém considerado
imparcial por não ser um dos apostadores, ou cuja probidade garante que os valores
depositados serão devidamente acautelados. Na sua utilização corrente no ensino
superior o significado é, porém, algo diferente: pessoa ou entidade com legítimo
interesse no ensino superior e que, como tal, adquire algum direito de intervenção.
Serão stakeholders os alunos, os pais, os empregadores, o Estado, a sociedade, as
próprias instituições de ensino superior (em relação ao sistema), etc.). (AMARAL;
MAGALHÃES, 2010, p. 7-8).
O ingresso desse conceito, ainda que de forma adaptada, no Ensino Superior, está
entre outros fatores ligados à massificação da sua oferta e ao consenso construído sob a ideia
da ineficiência do Estado Provedor. ―No plano regional, na UE [...] existem exigências de
189
ajuste e de convergência que derivam de acordos entre ministros, como a Declaração de
Bolonha‖ (BALL, 2004, p. 1115). Há, ainda, ―[...] o importante trabalho de ‗consultores‘
internacionais e de empresários políticos, que defendem e ‗transmitem‘ soluções políticas‖
(BALL, 2004, p. 1115, grifos do autor). No caso específico da avaliação, confia-se a uma
Agência externa a condução do processo, o que leva também ao ranqueamento institucional e,
no contexto português, a uma acirrada disputa entre politécnicos e universidades.
Assim, cabe às instituições organizar um conjunto de documentos que também se
traduzam nos currículos e que permitam às agências externas avaliar a qualidade que,
baseados em indicadores e uma vez ratificados, conferem um selo de garantia. Nesse sentido,
as práticas institucionais são reorganizadas e apequenadas para ―[...] seguir regras geradas de
modo exógeno e a atingir metas‖. A lógica de organização das instituições especializadas é
substituída por sistemas de gestão com o objetivo de conquistar ―desempenho, melhoria da
qualidade e eficácia‖ (BALL, 2004a, p. 1117). Os processos e as decisões são amparados em
modelos de gestão de qualidade importados do setor empresarial e trazem implicações, pois as
funções de gestão são consideradas na perspectiva administrativa e empresarial e não na
perspectiva pedagógica.
6.2.1 As polêmicas da oferta dos Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTESP)
No contexto de embates e disputas discutido nesta Tese, encontra-se o recente
Decreto-Lei Nº 43, de 18 de março de 2014, que criou os Cursos Técnicos Superiores
Profissionais (CTESP), caracterizados por formações curtas que não conferem grau.
Conforme o artigo segundo, são ministrados no âmbito de ―[...] todas as instituições de Ensino
Superior Politécnico, bem como as unidades orgânicas de ensino superior politécnico
integradas em instituições de ensino superior universitário‖ (PORTUGAL, 2014, p. 2075).
Ao, de certo modo, impor e, ao mesmo tempo, limitar aos domínios dos politécnicos a oferta
de tais cursos, a imposição desse mecanismo de regulação intensifica a diferenciação que vem
sendo palco de embates.
De modo geral, os gestores entrevistados estão receosos quanto às reais intenções
dessa política, porque consideram que não houve discussão, mas sim uma imposição
direcionada, situação que os deixa temerosos. “Tememos um bocado que o Ministério queira
que os Mestrados... Julgo que há pessoas, há políticos que querem que os Politécnicos
deixem de conferir o grau de Mestre, mas que é uma realidade que hoje em dia é muito difícil
ultrapassar, ou então criar uma figura de um Mestrado, deixar para os Politécnicos apenas
190
os Mestrados Profissionalizantes. Portanto, temos algum temor porque, enquanto, por um
lado, estamos a tentar ir aos Doutoramentos, por outro, há pessoas com o poder de decisão
ou potencial poder de decisão que estão colocados nos partidos mais fortes que querem, que
gostariam de ver uma divisão do sistema mais clara: as universidades com os Doutoramentos
e/ou com os Mestrados, até com as graduações e os Politécnicos, gostariam que ficassem...
Na realidade, o que gostariam são os cursos mais de nível técnico. [...]. É algo que nos é
recente, que estamos a apresentar as primeiras ofertas formativas, mas nasceu de uma
maneira um bocado torta... Eu acho que há, de fato, uma necessidade de formar profissionais
a esse nível para as empresas, mas a maneira como o Ministério impôs não foi a maneira
mais adequada” (S8).
Ao fazer referência à reforma política realizada no contexto português a partir de
2006, Heitor e Horta (2015) destacam as ações e tomada de posição governamental quanto à
promoção da especialização do sistema, o que de certo modo está conectado ao depoimento
de S8. Nesse sentido, os autores afirmam:
Uma maior diversidade institucional do ensino superior português foi prevista no
âmbito do processo político de reforma, com os institutos politécnicos centrados na
formação profissional/vocacional de curta duração e no 1º ciclo do ensino superior,
sendo previsível que a maioria das universidades centrem o seu crescimento em
programas de mestrado e doutoramento. (HEITOR; HORTA, 2015, p. 16).
Como pode ser observado, os institutos politécnicos deveriam ter seu foco na
formação profissional de curta duração, o que situa os Cursos Técnicos Superiores na
primeira opção de oferta formativa, seguida pelas licenciaturas. Os Mestrados e os
Doutoramentos sob essa perspectiva estão fora de âmbito de atuação dos institutos, o que
justifica os reiterados depoimentos dos gestores a respeito da pressão e das resistências que os
politécnicos maiores estão fazendo ao governo quanto à oferta dos doutorados.
Além da diversidade, o financiamento público para a ciência e tecnologia foi outra
ação da reforma com o objetivo de promover a diversificação do Ensino Superior quanto aos
graus acadêmicos:
[...] as reformas legais concretizadas entre 2006 e 2010 acentuaram a formação
vocacional e profissional do ensino politécnico, enquanto foi estimulado o ensino de
pós-graduação para as universidades. No caso das universidades, a actividade de
I&D foi reforçada em associação com a formação doutoral e pós-doutoral, que
serviu de instrumento principal da política de aprofundamento da diversificação do
ensino superior. (HEITOR; HORTA, 2015, p. 25).
Ao estabelecer um financiamento menor para investigação e desenvolvimento nos
politécnicos, obviamente há um reforço da diferenciação pretendida pelo governo português,
o que, de certo modo, explica as verbas que estão sendo alocadas para os equipamentos dos
191
laboratórios, fato citado por S7: “[...] uma verba interessante às instituições do ponto de vista
financeiro [...]”, que disponibilizada pelo governo agrada a muitas instituições, mas ainda se
mostra incapaz de seduzir outras. Uma parte da negação ao aceite de tais cursos por parte dos
gestores do P.Porto se deve também ao fato de que, até o momento, a instituição não vem
tendo problemas para preencher as vagas das licenciaturas na primeira fase de seleção. O local
que o P.Porto está instalado também é estratégico, porque, situado na região central (Polo
Universitário) de uma grande cidade, tem muito mais visibilidade do que aquelas instituições
instaladas nas periferias, onde o número de habitantes também é menor. Por esse motivo, há
instituições que aceitam com bons olhos, normalmente as instaladas nas periferias, o que não
acontece com os que estão nas regiões centrais, como é o caso do P.Porto.
O que se percebe é que houve uma imposição da gestão central para a implantação
desses cursos no âmbito dos Politécnicos. Não é possível optar, mas é ncessário cumprir. Esse
Decreto também pode ser entendido como um mecanismo para reforçar a distinção entre os
Politécnicos e o ensino superior universitário. Conforme as afirmações dos gestores S1 e S2,
essa política intensifica uma possível desvalorização do ensino politécnico, “[...] foi uma
política que apareceu como imposta [...] a esses cursos, porque eles pareciam, podemos
dizer, uma maneira de desvalorizar o próprio Ensino Politécnico [...]. Se estes cursos não
forem vistos como cursos menores, como cursos que vêm para aqui porque mais ninguém os
quer, [...] podemos perfeitamente conciliar” (S2). “[...] também percebo que com isto se quis
reforçar as diferenças entre o Ensino Politécnico e o universitário” (S1).
Se a ideia inicial era a de situar o ensino politécnico no pragmatismo, centrado no
atendimento das necessidades regionais, hoje não há mais possibilidade de pensá-lo dessa
forma em termos de subsistemas. Assiste-se à regionalização de universidades e, da mesma
forma, à centralização de politécnicos (URBANO, 2011a, 2011b), o que causa sobreposição
das áreas de atuação. Para S6, essa oferta formativa, “[...] que apareceu ano passado, causou,
inicialmente, muita polêmica, quer nos Politécnicos, quer na sociedade em geral, porque
alguns Politécnicos eram a favor da implementação deste nível de oferta formativa e outros
Politécnicos eram contra à implementação e, portanto, gerou muita discussão, muita
polêmica em relação a isso”. A problemática fundante continua sendo a de um Ensino
Superior que nos últimos anos vem sofrendo com a redução de alunos nesse nível, o que
provoca acirramento das disputas de várias ordens entre as instituições.
Nas diversas áreas do conhecimento que o P.Porto atua, há gestores contrários (3) e os
que até percebem alguns pontos positivos (4). No entanto, esse fato também está relacionado
à área de conhecimento e à região nas quais as unidades estão instaladas, o que proporciona
192
certa liberdade de escolha e, ao mesmo tempo, propicia a oportunidade de aproveitar os
incentivos financeiros que S8 destacou: “Há, neste momento, um concurso para
financiamento, que está aberto para criar as condições, até laboratoriais, para que esses
cursos possam funcionar em termos de equipamentos [...] sendo esta uma nova oferta
formativa, implica mesmo usar esses laboratórios e, portanto, vamos usar esse financiamento
para apresentar aqui uma proposta para esses cursos funcionarem” (S8).
A oferta dos CTESP pelos Institutos/Escolas está dividida entre os que não oferecem
(2), os que têm cursos aprovados, mas no momento não estão oferecendo (1), e os que estão
oferecendo (5). Os argumentos dos gestores contrários são de várias ordens: “[...] essa
política é completamente desarticulada às necessidades do país” (S5). No entanto, S5
reconhece que, na sua instituição, há vários aprovados que poderão vir a ser ofertados
futuramente, expressando uma possibilidade de oferta, caso haja necessidade. Para outro
entrevistado, “[...] parece-me que o Ministério de repente achou que o Politécnico podia dar
cursos de segunda, ou seja, cursos secundários para o Ensino Superior. Se somos Ensino
Superior, por que é que agora temos que dar cursos em um nível que não é o nosso nível? E
por que é que isso não aconteceu com a universidade?” (S4). Há, ainda, outro gestor que
afirma: “A Escola não esteve mesmo virada para aceitar tal estratégia. [...] se criarmos
TESPs, estaríamos a formar os auxiliares da nossa profissão – sendo que os nossos
estudantes já têm dificuldades de verem reconhecidas suas competências ao entrarem no
mercado de trabalho e vê-las valorizadas com vista salarial – e, portanto, estamos, no limite,
a criar um profissional menos graduado naquela área, que vai aceitar trabalhar com um
salário menor e os outros estudantes do primeiro ciclo ainda vão ter mais dificuldade em
arranjar emprego. E, portanto, quanto aos TESP, foi um rotundo não [...] sentimos que era
uma tentativa de colocar os Politécnicos em um lugar cada vez mais afastado daquilo que é o
Ensino Superior e deve ser o Ensino Superior, afastado daquilo que são os princípios
orientadores do Ensino Universitário” (S7).
Os posicionamentos desses gestores expressam também a realidade vivida em Portugal
quanto à crise econômica instalada nos últimos anos e seus reflexos quanto à redução do
financiamento e cortes orçamentários, que afetou as instituições de Ensino Superior,
nomeadamente os Politécnicos. Somam-se, ainda, as altas taxas de desemprego atuais e a
incapacidade de absorver os recém-licenciados nos postos de trabalho. Essa situação,
conforme discutido em capítulo anterior, tem obrigado muitos a buscarem o emprego em
outras áreas ou também em outros países. São exemplos dessa situação os noticiários
193
veiculados pela imprensa quanto ao desemprego, os quais anunciam a taxa superior aos 12%
no primeiro trimestre de 201656.
Em um contexto mais amplo, no plano das políticas globais que provocaram o
enxugamento do Ensino Superior, a diversificação da oferta e a entrada de critérios das
instituições privadas no funcionamento das instituições públicas vem afetando as lógicas de
organização. Para responder às exigências do mercado que vão mudando ao longo do tempo,
as instituições organizam-se de acordo com as condições internas e exigências externas, pois
estão sujeitas à ação regulatória do mercado (BALL; MAROY, 2009).
Ao responder a essa questão, S1 ainda situa esse nível formativo tanto no Quadro de
Qualificação Europeu quanto no sistema educativo nacional português: “Nós temos uma
ordenação das qualificações em Portugal que é semelhante ao da Europa e, se quisermos a
nossa licenciatura, é o nível seis de qualificação europeu e nacional, o mestrado é o nível
sete e o Doutoramento, o nível oito. E há, em quase todos os países da Europa, um nível que
está entre o secundário e o nível seis da licenciatura, que é o nível cinco de qualificação.
[...]esse nível cinco são formações, normalmente em um ou dois anos, depois de concluído o
Ensino Secundário. E isso existe em muitos países da União Europeia. Em Portugal, também
existia esse nível, embora com pouquíssimo impacto, que eram os chamados CETs – Cursos
de Especialização Tecnológica, que não eram realizados no Ensino Superior”.
Nessa conjuntura, esse Decreto passa esse nível formativo para o contexto do ensino
superior e, dentro dele, nomeadamente no politécnico. A razão para que em algumas unidades
se ofertem tais cursos no âmbito do P.Porto reside no fato de que, atualmente, “[...] o grande
bloqueio no percurso escolar dos nossos jovens, neste momento se situava entre o Ensino
Secundário e o Ensino Superior. Portanto, onde nós perdíamos mais alunos, era na transição
entre o Ensino Secundário e o Ensino Superior, e essa perda de alunos não é tanto, por falta
de capacidade das instituições de ensino superior” (S1). Ou seja, as instituições têm
condições de receber mais alunos do que normalmente recebem. Além disso, um dos cinco
objetivos da União Europeia para 2020, definidos na Estratégia para um Crescimento
Inteligente, Sustentável e Inclusivo (2010), é que se tenha pelo menos 40% de jovens na faixa
etária entre 30 e 34 anos com Ensino Superior. No contexto português, os CTESP podem ser
considerados uma estratégia para atrair jovens a esse nível de ensino, que, ao cursarem no
ambiente de ensino superior, transformam-se em futuros alunos potenciais aos cursos de
licenciatura, porém os resultados ainda são uma incógnita.
56
Informação publicada no Instituto Nacional de Estatística. Disponível em: <https://www.ine.pt/>. Acesso em:
10 maio 2016.
194
Outro objetivo do documento - Estratégia Europa 2020 - é que se tenha 75% da
população com idade entre 20 e 64 anos empregada. Para alcançar os objetivos, no próprio
documento, são elencadas sete ―iniciativas emblemáticas‖. Entre elas:
―Juventude em movimento‖ para melhorar os resultados dos sistemas de ensino e
facilitar a entrada dos jovens no mercado de trabalho.
―Agenda para novas qualificações e novos empregos‖ para modernizar os mercados
de trabalho e capacitar as pessoas desenvolvendo as suas qualificações ao longo da
vida, com vista a aumentar a participação no mercado de trabalho e a estabelecer
uma melhor correspondência entre a oferta e a procura de mão-de-obra,
nomeadamente através de uma maior mobilidade dos trabalhadores. (COMISSÃO
EUROPEIA, 2010, p. 7, grifos do autor).
Nessas duas iniciativas, observa-se a intenção de facilitar a entrada dos jovens no
mercado de trabalho, aumentando a correspondência entre oferta e procura de mão-de-obra,
na perspectiva do desenvolvimento de qualificações ao longo da vida, que se reporta aos
objetivos de Bolonha. Para cada iniciativa emblemática fixada, há objetivos para a União
Europeia e para os Estados-Membros que, em suas políticas, devem contemplar ações para o
alcance das metas fixadas. Destaca-se, aqui, um objetivo para cada iniciativa: Para ―Juventude
em movimento‖ - ―Aumentar a abertura e a relevância dos sistemas de ensino mediante a
criação de quadros nacionais de qualificações e orientando melhor a aprendizagem para as
necessidades do mercado de trabalho‖ (COMISSÃO EUROPEIA, 2010, p. 16). Para ―Agenda
para novas qualificações e novos empregos‖ – ―Dar um forte impulso à aplicação do Quadro
Europeu de Qualificações, através da aplicação dos quadros nacionais de qualificações‖
(COMISSÃO EUROPEIA, 2010, p. 22). Aqui se tem mais um exemplo da rede de influências
(BALL, 2012a) que penetra na organização das políticas nacionais e, ao mesmo tempo,
conecta as várias iniciativas entre os discursos escritos na Estratégia Europa 2020 e no
Quadro Europeu de Qualificações.
Os argumentos de S6, que é favorável ao oferecimento dos CTESP, estabelece vínculo
com a aceitação em outros países europeus e com a juventude: “[...] eu vejo aqui três ordens
de razão. A primeira, são cursos com uma enorme procura por parte das empresas; depois,
são cursos que têm um histórico noutros países de enorme aceitação no mercado e, depois, é
esta questão das expectativas diferentes [...] é porque não querem: por opção, porque não
querem continuar a estudar, outros não querem barra, não podem, não dispõem de recursos
financeiros para isso e outros porque podiam, queriam, mas não conseguiram entrar no
Ensino Superior, porque os exames de ingresso no Ensino Superior são uma grande
dificuldade aos estudantes que acabam o 12º ano. [...] é uma possibilidade muito mais
atrativa um curso técnico profissional” (S6).
195
Esses cursos situados no nível cinco do Quadro Europeu de Qualificações para a
aprendizagem ao longo da vida, no discurso oficial, têm o objetivo de aumentar o número de
cidadãos com qualificações superiores, tornando-os mais competitivos no mercado de
trabalho, além de atrair novos públicos para o Ensino Superior. Para que possa ocorrer a
proposição de novos cursos pelas instituições, é necessário que sejam consultadas as entidades
empregadoras, as associações empresarias ou socioprofissionais atuantes na região em que
estão situados os Institutos Politécnicos (PORTUGAL, 2014), o que guarda forte relação à
formação profissional.
Nesses cursos, podem ingressar aqueles que já concluíram o ensino secundário e os
maiores de 23 anos aprovados nas provas destinadas a avaliar a capacidade para frequência no
Ensino Superior. Além desses, também podem se candidatar aqueles que concluíram todas as
disciplinas dos décimo e décimo primeiro ano, porém sem concluir o ensino secundário ou
que apresentem habilitação legal equivalente após aprovação na prova de capacidade. As
possibilidades de ingresso também se estendem aos possuidores de diploma de Ensino
Superior, especialização tecnológica ou técnico superior profissional que pretendam se
requalificar.
A organização curricular dos CTESP estende-se a quatro semestres letivos e 120
créditos distribuídos entre componentes de formação geral e científica, técnica e contexto de
trabalho, com maior carga horária destinada ao componente técnico. No componente contexto
de trabalho, devem ser cumpridos no mínimo trinta créditos. Ainda é necessário destacar que
tais cursos estão sujeitos a avaliações externas e autoavaliações. Sobre o componente técnico
ou profissional, S3 considera interessante a perspectiva de oferta desses cursos porque “[...]
tem um caráter altamente profissionalizante e, portanto, podemos dizer, nessa perspectiva,
um estudante, de um curso técnico superior profissional querer ficar exatamente para esse
nível e, portanto, vai ser um técnico altamente especializado sem ter um nível superior” (S3).
Esse é mais um exemplo de que, no ciclo das políticas, ocorre o lançamento de
problemas que os gestores são desafiados a resolver e, portanto, nesse caso específico, as
táticas também estão presentes. Todos os gestores pertencentes às Escolas e aos Institutos que
oferecem os CTESP revelaram peculiaridades sobre as ações. O fato de ser necessário
consultar órgãos da indústria e associações para abrir a oferta possibilitou que os cursos
oferecidos pela instituição, apesar de lecionados pelos professores da casa, não estejam
locados no espaço do Ensino Superior. “Estes cursos nós não temos, costumamos dizer,
dentro de portas, ou seja, não estão dentro do campus. Nós temos estes cursos técnicos
superiores profissionais a funcionar em parceiros.” (S3). Este fato pode ser interpretado
196
como uma possibilidade de mostrar aos alunos, os professores e as metodologias que são
utilizadas no Ensino Superior, desde que ministradas em outros ambientes nos quais a maior
atenção é voltada ao lugar no qual é oferecido, deixando o P.Porto na penumbra.
Uma outra tática utilizada por todas as unidades que oferecem os CTESP é o
alinhamento, se não com todos, com pelo menos um curso superior que se reverte em
benefício ao aluno que continuar a estudar. Desse modo, após cursar o CTESP, em dois anos,
e vindo a escolher o curso superior alinhado, o estudante poderá, por meio dos mapas de
acreditação de competências, validar seus créditos, o que reduz o tempo de término da
licenciatura, conforme a explicação de S1, mas que também foi citada por S2 e S3: “[...]
asseguramos que haja sempre pelo menos uma licenciatura que tenha pelo menos 45 créditos
assegurados. A cada ano curricular, na Europa, corresponde a 60 créditos... Pelo menos...
Em alguns casos tem mais [...] pelo menos um curso em que tem, seguramente, três quartos
de um ano letivo garantido, mas há casos em que tem mais, dentro dos perfis dos cursos [...].
Significa que o aluno que seguiu para a licenciatura, digamos que tenha uma parte, quanto
ao certificado do curso, garantida se continuar na nossa instituição, se for para outra, terá
que fazer o pedido e dependerá da decisão dessa instituição” (S1).
Outro ponto a destacar é o de que são as instituições que elaboram os critérios para
validar os créditos dos alunos formados nos CTESP, que poderão ir para outras instituições, a
exemplo da universidade, o que provoca também uma diferenciação quanto a tais critérios e
políticas de captação de alunos. “[...] admito que haja outras instituições que têm mais
dificuldade em ter alunos e que façam, digamos, que tenham políticas mais agressivas de
captação desses alunos e que se possa verificar. Não sou nada adepto” (S1). Para esse gestor,
a opção de continuar ou não na instituição deve ser do aluno, porque, na sua concepção, a
mobilidade entre instituições diversas também é um fator que agrega na formação, pelo fato
de possibilitar conhecer diferentes lógicas formativas e culturas organizacionais.
Apesar de contrário aos CTESP, o gestor S4 admite que pode ser uma aposta
interessante no sentido de que, “[...] às vezes, os alunos saem do 12º ano e estão um
bocadinho indefinidos em relação a uma área e acho que um investimento, por exemplo, num
grau zero, já no Ensino Superior, parece-me importante e interessante, até porque nós temos
todas as valências, em termos de equipamentos, espaços, docentes e o aluno que tenha
dúvidas na área que possa, de repente, ter um primeiro ano que lhe permita perceber o que é
o Ensino Superior e, ao mesmo tempo, começar a clarificar ideias sobre a área em específico,
parece-me que sim, parece-me coerente e tinha todo o interesse em estar incluído dentro de
uma oferta formativa dos Politécnicos, assim como na universidade, se calhar”.
197
Certamente como política recente, essa oferta formativa ainda é vista com reserva por
boa parte dos gestores, porque não há clareza sobre as reais intenções que subjazem à
proposta. Outro fator a considerar é o de que os primeiros alunos ainda estão em processo
formativo, o que demandará estudos e investigações para problematizar e, quiçá, comprovar a
eficácia da ocupação dos postos de trabalho intermediários no campo da profissionalização.
No entanto, para Gomes (2016, p. 1), ―[...] é urgente oferecer e prestigiar esta nova via de
ensino superior mais próxima da vida profissional e das necessidades do mercado de trabalho
das regiões‖. Para o autor, a oferta desses cursos, entre outras possibilidades, auxilia na
reorientação profissional daqueles que possuem título do Ensino Superior que pretendem se
requalificar, ajustando-se às necessidades profissionais relevantes na sua região.
Para além de toda a problemática que envolve a oferta dos cursos de formação
intermediária, parece haver um movimento que, no discurso oficial, quer reaproximar os
politécnicos das suas origens, quando ofereciam o ensino técnico profissionalizante. Se em
determinado momento a formação oferecida nos politécnicos foi elevada ao nível superior
para responder às demandas sociais e econômicas crescentes que a universidade não
conseguia responder com o acesso ao Ensino Superior, atualmente novamente o politécnico é
chamado para responder outra demanda, o que, para os gestores, ao ser direcionado, expressa
uma tentativa de barrar seu crescimento.
6.3 FRAGILIDADES DO DIÁLOGO E ARTICULAÇÃO DO PLANEJAMENTO ENTRE
SETORES
Pesquisar sobre a realidade em movimento das instituições é por si só um ato de
extrema complexidade, principalmente quando se está a falar de uma instituição heterogênea
com várias áreas de atuação no campo da formação, como é o caso do P.Porto. De igual
complexidade, é a história de nascimento e de desenvolvimento das instituições, as quais
tenho tentado compreender com o estudo intenso da legislação, em diálogo com as produções
que versam sobre esse tema. Nos limites deste estudo, há ainda um terceiro que nomeio aqui
como o do ouvido atento nas entrevistas com os gestores sobrecarregados de atividades e que
deixam aflorar, em suas falas, as tensões, as resistências e as disputas características de
instituições com trajetórias distintas.
O campo de resistências dá-se também pela negação de algumas tendências
observadas nas políticas, como, por exemplo, a estratégia de fazer parcerias com
universidades para além do território português na oferta de doutoramentos. Nesse sentido,
198
um gestor expressa a negativa dos encaminhamentos orientadores da gestão central na escola
que atua:“[...] não há uma política para o fazer porque nós não queremos ser vistos como
uma instituição que os alunos procuram para fazer o Doutoramento. Já é bem bom que nos
procurem para as Licenciaturas e Mestrados, já não é fácil [...]” (S5). Esse é um exemplo de
uma instituição que se impõe pela negação. Há um impedimento legal para a não oferta do
Doutoramento, mas não é isso que está em causa. O que conta é o não querer institucional
(LIMA, 2009).
No Planejamento Estratégico do P.Porto, referente ao período compreendido entre
2014 e 2018, há o Eixo Estratégico de Governação e Gestão Estratégica que prevê, em um dos
seus objetivos operacionais, a partilha e a valorização de serviços e competências existentes
no P.Porto. Na base está a necessidade de diálogo e de colaboração entre gestores e
professores das diversas unidades. Esse ponto também aparece nas falas de alguns gestores ao
expressarem que o diálogo nem sempre tem sido fácil e que, por vezes, ocorre o
distanciamento entre a gestão central e a gestão das escolas/institutos. “Ao nível do
Politécnico, nós temos algumas preocupações que me parecem relevantes. Uma é reforçar a
interligação entre as várias escolas que compõem o universo do Politécnico.” (S1). Sobre a
autonomia das Escolas/Institutos, S8 considerou: “Nós temos um modelo estatutário que, às
vezes, nos dificulta um bocado, que é um modelo em que há autonomia nas Escolas e temos
trabalhado também em termos de estrutura organizacional para tentarmos ver se
conseguimos criar serviços partilhados, portanto, tentar otimizar, evitar que tenhamos as
mesmas estruturas em todas as Escolas [...]”.
Na dimensão organizacional e do diálogo entre o P.Porto e as Escolas, S2 esclarece
que, “[...] muitas vezes, as relações entre as escolas e o IPP também não são muito fáceis”;
“[...] o próprio modelo legislativo por si não facilita as coisas porque atualmente acontece
que o presidente do IPP e os Pró-Presidentes têm um papel absolutamente preponderante, é
eleito indiretamente” (S6). Referindo-se às alterações organizacionais que agora são
representativas, ele ainda afirma: “[...] não foi uma boa alteração, antes, como digo, o
presidente era eleito diretamente. Pelo menos, portanto, de quatro em quatro anos tinha de
vir aqui à escola dar conta das coisas, agora, nós nem somos ouvidos diretamente nisso, nós
escolhemos representantes para o Conselho Geral, que elegem o presidente do IPP. [...]. Isso
distanciou um bocadinho as Escolas do IPP, digamos, e nunca houve uma tradição de muita
integração. Por exemplo, há escolas muito ambiciosas de sua independência e autonomia,
porque as outras Escolas são mais recentes; e costuma ficar aqui a imagem da família, mas
não sei se esse espírito de verdadeira família será aqui muito adequado” (S2).
199
Há um campo de disputas em constante ebulição que tem seus reflexos na cooperação,
ou na falta dela. Nesse sentido, a colegialidade entre os atores é utópica, uma vez que o
gerencialismo também leva ao constante controle do outro e peso de medida para manter-se
no campo das disputas hegemônicas (LIMA, 2010). Nessa arena, as atividades que estão
sendo estimuladas entre as escolas/institutos passam pela promoção de “[...] soluções,
dispositivos, em que estejam presentes em várias das escolas. Podem ser cursos, projetos de
investigação, projetos de extensão, mas procurando envolver várias escolas (S1). Quanto à
colaboração, S2 destaca que já foi convidado por outras escolas para colaborar em cursos,
mas que considera “[...] ir e vir para dar duas aulas por semana não é coisa assim muito
atrativa [...]” (S2).
Avançando um pouco mais na discussão, S3 afirma que os docentes de sua instituição
“são receptivos” e que esta é uma tendência no P.Porto. “Sim, eu acho que a tendência é
crescente nesse sentido, agora, nós fizemos o trabalho de casa de identificar os saberes, onde
eles estão, e acredito, é minha convicção, que o nosso crescimento, o nosso IPP, a partir
deste momento, vai ser muito na criação da oferta formativa que cruza os saberes, naqueles
espaços... Eu acho que deve usar menos espaço para formações puras, vamos imaginar que
este mapeamento sobre áreas do saber nos permite nos conhecermos melhor internamente e
que vai potenciar o trabalho em rede, nomeadamente na questão da criação das ofertas
formativas [...]” (S3). A exemplo de outras questões, esse gestor expressa sua visão integrada
dos processos institucionais. Novamente, ganham lugar de destaque a racionalidade técnica,
os jogos de interesse, os conflitos e o ―convite‖ para que os professores colaborem para o
sucesso institucional por meio da responsabilização pessoal. Essa participação em termos de
interesse pode ser pensada em conjunto com Morgan (2008) e ser de três ordens. Há os
―interesses das tarefas‖ a desempenhar como a docência e a pesquisa; há os ―interesses da
carreira‖, ou seja, quais benefícios tais atividades em cooperação podem render quanto às
aspirações futuras, que se liga aos interesses ―extra-muro‖, para além das atividades
imediatamente realizadas que configuram modos peculiares de ação individual e, nesse caso,
também institucional.
6.4 ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO DA POLÍTICA DE PÓS-GRADUAÇÃO NO
P.PORTO
Seguindo as ideias anteriormente apresentadas neste trabalho, em diálogo com a
perspectiva dos estudos de Stephen Ball e seus colaboradores, de que as políticas se
constituem de um espaço multifacetado que pressiona, principalmente os gestores
200
institucionais a responder às exigências criando espaços de manobra, nos quais as ações
ganham vida, independentemente do contexto que se encontram, nos limites deste trabalho no
Brasil ou em Portugal, estão longe de serem neutros. São fundamentalmente espaços de
disputas e negociações que ocorrem em vários níveis internos e externos às instituições. É um
olhar mais centrado na política de uso, ou seja, nas práticas, nos discursos e nas técnicas e
procedimentos inter-relacionados (BALL, 2013a). Nessa perspectiva, as falas dos gestores, no
cruzamento dos documentos institucionais, inserem-se como elemento essencial de análise.
Nesse contexto, o maior impedimento considerado pelos gestores foi o referente ao
impedimento de ofertar o terceiro ciclo. Sobre esse aspecto, S8 fez referência às ações que
vêm sendo desenvolvidas: ―Nós temos começado a resolver este problema fazendo acordos
com universidades espanholas, nesse momento nós temos seis Doutoramentos em conjunto
com universidades espanholas; mas, por outro lado, temos tentado fazer uma luta que
implica envolver o Ministério, implica envolver também a Assembleia da República, no
sentido que os Politécnicos possam, de modo similar ao que acontece nos Institutos Federais,
conceder o grau de Doutor.[...]. É uma luta muito complicada. As universidades, por outro
lado, têm um apoio forte, não há como dizer que não” (S8).
Considerando a estratégia de fazer parcerias para oferta do 3º ciclo com universidades
de outros países, a proximidade da Espanha, especialmente com a cidade do Porto, é
estratégica, pois as taxas (propinas) praticadas em Portugal são mais atrativas do que as
praticadas em algumas universidades espanholas. O fato de oferecer esse ciclo nas
dependências do P.Porto, utilizando recursos humanos próprios e o diploma ser emitido por
uma instituição estrangeira, também é uma forma de pressão, que, por um lado, demonstra a
capacidade de oferta, e, por outro, põe em evidência a titulação que deixa de ser portuguesa, o
que impacta no quantitativo de formações e no alcance das metas. Nessa circunstância, o
P.Porto está no sentido inverso da política governamental que indica uma maior diferenciação
do sistema e a aposta nas universidades para oferta dos doutorados com aumento dos
investimentos em investigação e situando os politécnicos como instituições formadoras para
atendimento das demandas em educação profissional (HEITOR; HORTA, 2015).
As parcerias com outras universidades são bem vistas; no entanto, são apontadas
algumas limitações: “Qual é o problema nosso, eu diria, no aspecto menos positivo: é que o
Doutoramento, sendo uma parceria, na verdade, passa pela universidade estrangeira, por
que nós aqui em Portugal não podemos fazer e, portanto, nós colaboramos naquilo que é o
percurso [...]. O que é mais extraordinário é que nós, enquanto docentes do Ensino
Politécnico, podemos orientar doutorandos nas universidades, participar em júris de
201
Doutoramento, posso avaliá-lo. [...]. Objetivamente isso é um contrassenso. Eu posso
orientar, mas nós não podemos dar Doutoramentos. Isso não faz sentido! Naturalmente acho
que não faz” (S6).
Em tempos de acirramento de disputas entre instituições externas, nesse caso
politécnico e universidade, pelos alunos que como clientes são imprescindíveis, a fala do
gestor esclarece sobre pelo menos um dos motivos pelos quais a estratégia de formar parcerias
para além do território português vem conquistando relevância estratégica para o P.Porto. Este
quer avançar e ter a possibilidade de crescer em números e em nível de oferta, aquela quer
manter-se no lugar de destaque. “Mas, curiosamente, por exemplo, as universidades estão a
adotar alguns cursos que tradicionalmente eram cursos do Politécnico. [...] a distinção é
sempre usada pelas universidades quando se trata de retirar ou vedar algumas coisas ao
Politécnico, mas nunca é usada, digamos, de invadir aquilo que seria o território do
Politécnico.” (S2). “Muitos dos nossos alunos – e também docentes – fazem aqui o seu
percurso formativo e depois quando querem fazer um Doutoramento vão para a
universidade. Não me parece mal se o contrário pudesse acontecer. Agora, perdermos os
nossos alunos sem podermos captar outros, me parece menos lógico porque vivemos em um
mercado concorrencial.” (S6).
Mercado concorrencial é a palavra que define os argumentos dos gestores e expressa o
campo de disputas instalado na dualidade do Ensino Superior português. Como venho
discutindo no decorrer desta pesquisa, os encaminhamentos da política são respostas aos
documentos e determinações que circulam na rede de influências. Um exemplo desse
processo foi o documento elaborado pela OCDE (2008) que apresenta uma revisão das
políticas educacionais para educação superior que reforça a diferenciação dos dois
subsistemas com a universidade fortalecida na pesquisa e na oferta de pós-graduação e os
politécnicos centrados na oferta de cursos voltados à educação profissional.
A internacionalização, outro eixo que guarda proximidade entre a fala dos gestores e o
Planejamento Estratégico, também foi citada por todos e está sendo constantemente
implementada. Nesse sentido, são exemplos as seguinte afirmações quanto a essa política:
“Aumentar o número de estudantes internacionais” (S5); “[...] precisamos captar receita e
os estudantes internacionais, como muitas outras, são uma fonte de receitas” (S6); “Nós
temos imensos protocolos com universidades, com os Politécnicos europeus, mas também sul-
americanos e, portanto, recebemos muitos alunos e há pessoas daqui que vão lá e, portanto,
essa internacionalização foi uma nossa preocupação, sobretudo, nos últimos, diria, cinco
anos.” (S2).
202
Sobre a internacionalização a OCDE (2008, p. 15) recomenda: ―Em geral, a
internacionalização deve ser um componente integral de todas as instituições de ensino
superior, estimulando a mobilidade de estudantes do ensino superior e do pessoal académico e
reforçando as actividades científicas e académicas‖. No pacote de recomendações, havia ainda
a preferencialidade pelos parceiros para desenvolvimento de pesquisa em rede.
Como resposta e resistências ao cenário, se pela via da legislação há impedimento da
oferta do terceiro ciclo, a estratégia das parcerias com outras universidades, que não as
portuguesas, é tida como acertada pela maior parte dos gestores. Sobre esse aspecto: “Tem
sido feito, julgo eu, por umas razões. Uma, nos permite de alguma forma reforçar os nossos
laços internacionais que são cada vez mais importantes e, portanto, é uma forma de nos
posicionarmos internacionalmente, de marcarmos a nossa posição a um nível mais
internacional. Esse é um lado da questão e que é verdadeiro. Sendo muito honesto consigo,
há o outro lado da questão, que é assim: as universidades nacionais não estão interessadas,
nem disponíveis, para fazer isso conosco. Esta é a parte menos bonita de dizer, mas é
verdade. Ou seja, não é possível, neste momento, fazê-lo com universidades nacionais. E,
portanto, diria, simultaneamente há uma questão de necessidade, porque nós aqui não temos
esse mercado, não temos essa abertura nas nossas universidades” (S6).
Nesse sentido, S7 destaca o papel articulador fundamental que o ―gabinete de
internacionalização‖ vem realizando para as parcerias internacionais. Com a globalização e,
mais especificamente, no contexto pós Bolonha, as instituições investem em equipes para
divulgar seu potencial e conquistar parceiros para a produção de conhecimento, o
partilhamento, por meio de projetos. Essas parcerias proporcionam visibilidade às instituições
e as pessoas responsabilizadas pelos sucessos obtidos tendem a trabalhar em rede, tanto como
pesquisadores como fornecedores de serviços (BALL, 2012a). Ao esclarecer sobre as
estratégias que fazem parte das escolhas institucionais neste momento, S8 situou o Brasil
como país potencial: “Ao nível da internacionalização, a nossa aposta clara foi o Brasil. [...]
a realidade é que hoje a nacionalidade com mais estudantes, quer estudantes que vêm fazer
uma mobilidade de um semestre, quer estudantes que vêm para fazer o curso completo –
portanto, o regime de estudante internacional – neste momento são os brasileiros. [...].
Portanto, foi uma aposta que não foi só orientada pela questão da mobilidade estudantil. A
nossa aposta no Brasil envolve...nós estamos, no momento, a liderar três projetos de pesquisa
europeus, mas que envolvem instituições fora da Europa e que envolvem instituições do
Brasil”. Ele ainda destacou as boas relações institucionais com o Ministérios da Educação e
com o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTI) brasileiros que
203
possibilitam articular formações de mestrado e projetos conjuntos com os Institutos Federais
Brasileiros.
No entanto, Wielewicki e Oliveira (2010) alertam que, com o Processo de Bolonha e a
implementação da agenda de internacionalização das instituições Europeias, há uma ambição
pelas parcerias internacionais que funcionem como tentáculos para atender às demandas e aos
interesses da própria Europa. Ao induzir tais práticas por meio das políticas, o Estado
transforma-se em ―criador de mercados‖ (BALL, 2013a), pois muitos desses parceiros
também desenvolvem atividades lucrativas. São dois polos que exercem influência de modo
articulado. De um lado, são criadas oportunidades de atuação para o setor privado e, de outro,
alteram-se as formas e as modalidades de atuação do próprio Estado.
Nessa óptica, se a internacionalização é um ponto importante na rede de relações, para
uma instituição que almeja oferecer Doutoramentos, o investimento na formação docente e
sua relação com o desenvolvimento de investigações qualificadas, participação em eventos
internacionais e produção científica, também foi frequentemente enfatizado pelos gestores.
Quanto à formação: “[...] e não tendo a possibilidade de atribuir graus de Doutoramento,
isso significa que nos últimos anos houve a necessidade de reforçar a qualificação desse
corpo docente” (S1); “Esta presidência do IPP já há alguns anos adotou uma estratégia de
promoção da qualificação do corpo docente, conferindo algum apoio ao pagamento de
propinas, dispensa do serviço docente para que os docentes que estavam inscritos em
doutoramentos pudessem acabar seus trabalhos” (S7).
Quanto à investigação: “[...] resulta de parcerias internacionais, com instituições de
referência internacional, com centros de investigação internacionais, com empresas
multinacionais, etc. e, portanto, esta rede de parcerias não se constrói de um dia para o
outro” (S6). Além dessas ações, também estão sendo estimuladas a criação de revistas
científicas nas diversas áreas do P.Porto. Todo esse movimento em torno das atuais políticas
expressa um modo peculiar de tradução e, ao mesmo tempo, expõe as táticas para tentar
romper o que tem se mostrado como a maior limitação institucional marcada por todos os
gestores, exceto pela negação de tal pretensão por S5, ou seja, a impossibilidade de oferecer
Doutoramentos. Os gestores consideram injusta a diferenciação que se assenta em ser
politécnico ou universidade: “A questão da oferta formativa ao nível do doutoramento não se
pode restringir àquilo que é a etiqueta da instituição, se é um Politécnico ou se é uma
universidade. Tem que se basear em questões de qualidade [...]” (S6); “[...] acho que não é
pelo rótulo de ensino Politécnico ou Universitário que deveria ser vista essa questão do
204
acesso ao doutoramento, mas sim, pelas competências que estão internamente alojadas [...]
pela massa crítica, pelo conjunto de docentes que tem naquela área” (S3).
As táticas envolvem ações estratégicas no sentido de sair dos holofotes das discussões
no contexto português e, por outro, mostrando a capacidade por meio de parcerias com outras
instituições na Europa, mas também fora dela, a exemplo de instituições brasileiras. As falas
dos gestores são frequentemente marcadas pelo sentimento de discriminação quanto à
limitação da oferta do terceiro ciclo.
Nesse quadro, certamente as disputas e as argumentações crescerão, pois os maiores
politécnicos portugueses, a exemplo dos do Porto, Lisboa e Coimbra, vêm marcando forte
posicionamento nas decisões. Uma delas ocorreu recentemente com a desvinculação do
Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) por discordarem das
alterações aprovadas no Regime de Acesso e Ingresso no Ensino Superior, notadamente
referentes ao financiamento e limite nas ofertas de vagas. Em um excerto do texto da carta
publicada na página institucional, em 28 de fevereiro de 2015, lia-se: ―Entendemos, tal como
o expressamos, que esta proposta é gravosa dos critérios de qualidade que devem regular o
acesso ao ensino superior, tal como não respeita uma base objetiva reguladora da equidade e
da igualdade porque não é aplicável a todos os candidatos ao ensino superior [...]‖. Em um
dos títulos do Regulamento do Concurso Nacional de Acesso e Ingresso no Ensino Superior
Público para a Matrícula e Inscrição no Ano Letivo de 2016 -2017, publicado na Portaria Nº
199-B, de 20 de julho de 2016, encontra-se: ―Preferências regionais na candidatura ao ensino
superior politécnico‖ até o limite máximo de 50% das vagas para os candidatos provenientes
da região de atuação da instituição, o que limita a captação de alunos em um momento de
disputas acirradas pelos alunos pretendentes ao Ensino Superior.
No contexto de disputas e mudanças, ao realocar espaços e cursos, está em pauta a
maior concentração de equipamentos em locais estratégicos para a instalação de laboratórios
de investigação que sejam acreditados pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
“[...] hoje em dia, existem laboratórios do IPP amplamente reconhecidos. Laboratórios de
investigação já com uma dimensão apreciada, com reconhecimento e classificações
excelentes ao nível da FCT, portanto, isso é prova de que se faz, se tem feito investigação
com qualidade e projetos, de fato, de investigação com qualidade” (S6).
Nesse sentido, S1 avança ao afirmar que “[...] nós temos procurado desenvolver esta
área de investigação no Politécnico, sobretudo, procurando que ela esteja menos circunscrita
a algumas áreas onde tradicionalmente somos mais fortes, que é o caso das Engenharias, e
procurando, digamos, alargar as áreas em que isso se verifica, tentando ultrapassar algumas
205
limitações que se colocam ao sistema politécnico em Portugal” (S1); “[...] o Politécnico do
Porto tem conseguido algum sucesso na acreditação de financiamentos de projetos que lidera
projetos europeus, os nacionais também, mas, sobretudo, os europeus” (S8).
Na área de prestação de serviços, há outra iniciativa vinculada à inovação e ao
empreendedorismo, cuja estrutura: “[...] o Porto Design Factoring, está integrada numa rede
de design factoring mundiais. [...] a lógica é uma estrutura que consiga agregar... É
orientada para os estudantes, portanto, criando grupos de estudantes de áreas diferentes – os
projetos são sempre de áreas diferentes, precisa pelo menos três áreas diferentes envolvidas
– e projetos que sejam projetos de co-criação, portanto, de inovação aplicada, co-criação,
co-desenvolvimento. [...] cria grupos multidisciplinares de estudantes que vão responder a
desafios colocados por empresas. A lógica é sempre essa: as empresas lançam o desafio,
colocam um financiamento básico que o grupo vai gerir para tentar chegar à solução” (S8).
Essas iniciativas operam em várias frentes. Entre elas podem ser citadas a aproximação com
as empresas, notadamente na prestação de serviços, visibilidade, financiamento e
concentração de esforços por áreas multidisciplinares, além da visibilidade no contexto
internacional e nacional concorrencial e ao nível dos Ministérios, fato também destacado pelo
gestor.
Na reestruturação que culminou com a criação de umas das escolas voltada à hotelaria
e ao turismo, está o Hotel Escola que abriga uma estrutura na qual um dos objetivos é “fazer
formações que sejam pós-graduações Latu Sensu ou cursos de curta duração” (S8). Além
dessa estrutura, também houve uma aposta na “Porto Executive Academy. Portanto é uma
Escola de Negócios, novamente nós temos aqui, a lógica de cursos curtos para executivos,
para administradores. [...] nós pretendemos com este gênero de estruturas tentar modernizar
um pouco e também dar respostas às solicitações que era mais complicado responder” (S8).
As ações demonstram que há uma intencionalidade explícita de que a instituição seja
referência em algumas áreas do conhecimento e, ao mesmo tempo, captar novos clientes com
um perfil diferenciado em ambientes também diferenciados. Esses são elementos que retratam
a ênfase na diversificação e a marca de uma identidade que busca afirmação. São práticas
neoliberais de gestão que constroem e incentivam novas formas de captação de recursos para
competir com outras instituições nos novos mecanismos de mercado (BALL, 2012a).
Para responder à política institucional, é necessário colocá-las em cena, o que implica
o envolvimento dos atores, nesse caso, gestores que, ao desenvolver as atividades de leitura
dos textos institucionais produzidos, traduzem para suas práticas situadas no campo de ação
206
as subjetividades que se constroem na distância entre os textos oficiais e as ações cotidianas
(BALL; MAGUIRE; BRAUN, 2012).
Com essas alterações, nas argumentações dos gestores também são citadas as
vantagens “aumento da massa crítica” (S3); “racionalização de recursos” (S7);
“Comunicará melhor porque se temos escolas focadas em uma área de intervenção, mais
facilmente poderemos comunicar esta área. [...] ser bom em tudo é muito difícil [...].
Portanto, é melhor ser bom em uma ou duas coisas do que ser mais ou menos em cinco ou
seis” (S6). Para (S5), no entanto, os aspectos positivos são os referentes às outras escolas,
pois considera que a sua tem a área de atuação bem definida: “Só fortalece sobretudo para as
outras escolas, tornava-se mais difícil dar respostas às necessidades de formação, aos
estudantes, às necessidades de investigação porque não havia dimensão para isso [...]e, por
outro lado, permite a redução de custos que obviamente é importante” (S5).
S5 ainda destacou que as alterações quanto ao deslocamento de cursos não afetam a
escola na qual ele está, porque os cursos que passarão para o domínio dessa escola já faziam
parte da área de atuação e, em termos de alunos, também não vê ganhos expressivos, “mais
duzentos ou trezentos, não é isso, isso não tem significado” (S5). Aqui, retomo as ideias de
Sousa Santos (1993, 1999), Teodoro (2003, 2001) e Lima (2009) quanto ao centro e às
periferias no âmbito do Estado. Nas instituições também existem arenas centrais e periféricas,
onde alguns decidem e se impõem, e outros com menor influência nas negociações acatam,
ainda que de modo parcial, para atender interesses de reconhecimento social e econômico.
Nos limites deste estudo, algumas afirmações dos gestores S5 e S2 podem ser
consideradas centros de poder internos que buscam se autoafirmar pela influência central que
as escolas detêm. Assim, negam as políticas institucionais e trazem para si as
responsabilidades de gerenciamento e sucesso de suas unidades. São, portanto, manifestações
dos modelos gerencialistas ou, ainda, do paradigma da educação contábil que defendem a
racionalidade técnica, a adaptabilidade à mudança, a modernização da gestão e a inovação
como ferramentas para captar recursos externos como instituições de prestígio e isoladas das
outras. No entanto, as periferias do ponto de vista da gestão também são chamadas a executar
de modo eficaz as decisões tomadas na gestão central (LIMA, 2002, 2009), o que de certo
modo provoca tensões e disputas entre os vários núcleos de interesse.
De modo a sintetizar as evidências presentes nas falas dos gestores quanto à tradução
das políticas, na Figura 15 a seguir estão representadas as principais estratégias e táticas
utilizadas pelos gestores do P.Porto, as quais expressam o movimento institucional que se
estende desde a identidade, discutida no capítulo quatro.
207
Figura 15 - Estratégias e táticas do P.Porto na tradução das Políticas
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
208
Ao longo deste capítulo, foram apresentadas e discutidas, nos vários tópicos, as
contradições da política, diretrizes e avaliação, os CTESP, as fragilidades do diálogo e a
articulação entre os setores, bem como as estratégias de tradução da política de Pós-
Graduação. As falas dos gestores expõem as manobras e o campo de embate em constante
movimento que, forjados para responder às solicitações, utilizam o planejamento como
ferramenta de legitimação. Conforme constatado ao longo do texto, a arena institucional é
também o local que as informações se movimentam entre os atores e as estruturas de poder
político funcionando como instrumento de controle, de negociação e de persuasão, com
ênfase nos resultados e nas formas de governança (BALL, 2012; BARROSO, 2013).
Na Figura 15, esse movimento foi além dos tópicos discutidos, porque, à medida que
as ações estão no Planejamento Estratégico, há uma espécie de rede que se conecta
internamente e que mobiliza as pessoas para atingir os objetivos institucionais. Assim, o
reposicionamento estratégico, a internacionalização, os CTESP, a qualificação do corpo
docente, a investigação e a produção científica e a Pós-Graduação, Mestrado e Doutorado
estão interligados e desencadeiam um leque de ações que, conforme venho discutindo,
exercem pressão sobre o Estado Português no sentido de mostrar potencial. É o local no qual
as intencionalidades se materializam nas ações que projeta, resgatando a fala de um gestor: “a
aposta clara em ser uma grande instituição” também pautada na ―ideologia tecnocrática‖
que, de acordo com Seixas (2001, p. 209), ―[...] constitui a base das ideologias educativas
modernas da maioria dos países desenvolvidos, acentuando a importância da educação para a
competitividade económica nacional num mercado cada vez mais global‖.
As políticas educativas passaram a ser subordinadas às políticas econômicas e em
evidente articulação com o sistema produtivo. As principais variáveis passaram a ser a
reorganização e a centralidade dos currículos, a redução de custos, as avaliações internas e
externas e a introdução acentuada de ferramentas de gestão nos sistemas educativos (BALL,
1998). A transição do modelo de participação democrática para o modelo gerencial assegura o
lugar de destaque ao planejamento estratégico que, conforme visto, tem suas origens na gestão
empresarial. Esse movimento relaciona-se diretamente à autorregulação pessoal e
institucional como mecanismo de resposta.
―A gestão estratégica está, no entanto, também, associada às questões do controlo de
qualidade e da responsabilização ou prestação de contas‖ (SEIXAS, 2001, p. 220). Novos
atores assumem funções administrativas que, no campo das decisões, são mais fortes que a
estrutura acadêmica, o que em grande parte das vezes penaliza o exercício das funções
docentes vistas sob a óptica do modelo empresarial ocasionando sua proletarização (BALL,
209
1998). Na redução de custos, os serviços docentes integrais são reduzidos para dar lugar às
contratações temporárias, que precarizam o desenvolvimento das atividades docentes,
situação também citada pelos gestores.
O ―triângulo estratégico‖ (SEIXAS, 2001) - autonomia, financiamento e avaliação -
foram instrumentos emergentes em nível internacional sob a égide das orientações das
organizações internacionais. Tais organizações, ao produzirem documentos orientadores para
elaboração das políticas educativas, ―[...] configuram modalidades legítimas de definição dos
problemas e soluções contribuindo para a definição de um modelo de ensino superior
transnacional de mercado‖ (SEIXAS, 2001, p. 224). E ainda que existam divergências entre as
políticas propostas pelo Banco Mundial, UNESCO e OCDE, há uma inegável aproximação
entre tais agências referente ao aumento do financiamento privado no Ensino Superior público
e na partilha dos custos pelos estudantes por meio das propinas, no caso europeu.
Cria-se, assim, uma interdependência local ou regional, nos níveis político, econômico
e cultural que, com a globalização, são influenciados por acontecimentos mundiais. Nessa
agenda de alterações, o papel do Estado também foi redefinido conforme o ideário neoliberal
e a universidade foi chamada a estreitar relações com empresas multinacionais e agências de
investigação desenvolvendo, o que Seixas (2001) nomeia como ―indústria do ensino
superior‖, visando o desenvolvimento de produtos de inovação tecnológica e priorizando as
áreas de biotecnologia, telecomunicações e inteligência artificial que a aproximam das áreas
potenciais estratégicas para a competitividade nacional. A propriedade intelectual assume um
lugar de destaque e, mais do que isso, a mobilidade estudantil promove o fortalecimento de
mercados internacionais de Ensino Superior. A universidade historicamente orientada para o
conhecimento, mas não somente ela, é impelida a orientar-se para o mercado, o que provoca
sua crise e guarda estreita relação com o cenário deste estudo, centrado em um mercado
concorrencial.
210
7 CONSIDERAÇÕES
[...] em seus discursos, com lágrimas rolando pelo focinho,
falava na sabedoria de Napoleão, na bondade de seu coração,
no profundo amor que devotava aos animais de todos os lugares,
mesmo - e especialmente - aos infelizes animais que ainda viviam na
ignorância e na escravidão, em outras granjas.
(ORWELL, 2000, p. 30).
No exercício de compreensão que venho desenvolvendo ao longo desta trajetória
formativa, retomo a tese de que, na tradução das políticas, no contexto da prática, os
institutos constroem suas estratégias e táticas forjadas em redes de poder e disputas
sustentadas na luta pela construção/afirmação da identidade institucional no campo do Ensino
Superior, buscando reconhecimento nas atividades relacionadas à Pós-Graduação, pesquisa e
produção de conhecimento.
Os objetivos desta Tese foram:
Identificar as redes de influência e de produção de textos das políticas para o ensino
superior no contexto brasileiro e português, notadamente a partir da década de 1990.
Compreender no contexto das políticas para o Ensino Superior a constituição da
identidade do IFC no Brasil e do P.Porto em Portugal.
Identificar as estratégias e táticas adotadas pelas instituições, com vistas à
implantação/consolidação da Pós-Graduação e da pesquisa no contexto de
reorganização como instituições de Ensino Superior.
No primeiro objetivo, identifiquei as redes de influência, demonstrando como as ideias
se deslocam e são incorporadas pelas Nações ao produzirem seus textos da política,
nomeadamente a educacional referente ao Ensino Superior. A rede vai se compondo de forma
fluída, cujas fronteiras com as novas formas de governança são esmaecidas, dificultando a
identificação da origem de determinados consensos que assumem estatutos de verdade. Para
demonstrar a formação dessa rede, destaquei alguns organismos internacionais como o FMI,
Banco Mundial, OCDE, UNESCO, União Europeia, que têm em suas bases de origem
objetivos e papéis distintos, mas que atuam sob a mesma lógica favorecendo os interesses do
capital. Esse grupo de instituições está acoplada a outras instituições e se utiliza da circulação
dos documentos produzidos por experts que elaboram estudos e relatórios sob o ponto de vista
economicista.
211
A divulgação dessas ideias não ocorre gratuitamente. Para promover a disseminação
do ideário, esses organismos, extremamente ágeis, elaboram documentos tais como planos de
estabilização econômica, estudos de contexto, relatórios técnicos, avaliações externas, que
endereçadas aos países provocam alterações no percurso das políticas. Uma das formas que
vêm sendo utilizadas para apresentar e discutir tais documentos são as conferências, os
eventos que, normalmente, reúnem representantes dos países que assinam os acordos e levam
as recomendações aos seus governos nacionais. Entre as recomendações é possível perceber
que há dois tipos: aquelas que formam os consensos mais gerais em um perspectiva global; e
as regionais, momento no qual os organismos internacionais, por meio de suas secretarias,
olham com maior proximidade para os contextos regionais que vão se desenvolvendo em
tempos distintos, a exemplo de Brasil e de Portugal nas recomendações para elaboração das
políticas.
Uma vez divulgadas em seus destinos, as recomendações elaboradas pelos experts, sob
o ponto de vista economicista e geral da educação, necessitam ser adequadas, o que ocorre
com a interpretação na leitura inicial. Nesse movimento, vão sendo envolvidos novos atores
que pactuam as ideias, quer seja por interesses ou necessidades que envolvem, como discutido
ao longo desta pesquisa, pressões e negociações. Esse é um movimento no qual não há
ingenuidades, mas sim interesses articulados visando obter lucro e poder em superfícies
pavimentadas assimetricamente. Desse modo, na perspectiva neoliberal, o papel do Estado vai
sendo continuamente reduzido e redefinido em termos de financiamento e avaliação. É um
Estado perverso que se mantém ao longe, mas que acompanha tudo de muito perto por meio
dos indicadores preciosamente elaborados para gerar estatísticas, enfatizando os resultados
obtidos para estudos comparados na perspectiva global.
Retomando a ideia de rede e seus desdobramentos nas políticas nacionais, necessário
se faz considerar que a lógica da globalização precede de longa data as recomendações
divulgadas em escala global. Os organismos internacionais são compostos por representantes
dos Estados Membros que também articulam interesses, necessidades, relações de poder e
negociações em uma conexão que, longe de ser linear, produz um campo de disputas com
alternância de protagonistas. As grandes decisões são tomadas nos patamares mais altos, local
onde as influências e os embates são mais intensos, mas levam seus efeitos para outros
contextos.
Com a importação das ideias pensadas para contextos gerais, os Estados, aqui
nomeadamente Brasil e Portugal, traduzem em seus documentos, conforme destacado no
capítulo 3, as recomendações nos textos oficiais de suas reformas educacionais. De modo top
212
down, estes textos chegam às instituições e provocam novas traduções e representações para
responder aos desafios impostos. Esse processo altera a lógica de organização das instituições
e sua identidade.
Esse movimento foi e está sendo vivido tanto em Portugal, com as alterações
implementadas após a Declaração de Bolonha, quanto no Brasil, com as reformas efetuadas
na educação, especialmente nas políticas voltadas ao Ensino Superior capitaneadas pelos
organismos internacionais que influenciam a onda de reformas na elaboração das políticas
globais. Uma clara demonstração do efeito multiplicador das políticas pensadas em instâncias
maiores é a Declaração de Bolonha, que provocou a reorganização das universidades, com a
diversificação das instituições, o encurtamento do tempo de formação e a perspectiva de
mercado, que também tem se materializado aqui no Brasil, proposta em momento anterior
pelo Banco Mundial. Nos dois países, as Leis de Diretrizes e Bases representaram a tradução
oficial das recomendações internacionais no contexto da reforma seguidas por atos
normativos. Os dois Institutos, inseridos no âmbito do Ensino Superior, também sofreram os
desdobramentos que me conduziram ao segundo objetivo.
Nesse objetivo, busquei compreender, no contexto situacional, como as identidades
das duas instituições foram inicialmente constituídas e o movimento de alteração para chegar
à atual configuração, o que envolve desvelar a trajetória. Ainda que formadas em espaços e
tempos distintos, seus traços constitutivos são próximos. Ambas tiveram suas identidades
originárias definidas pelo campo de atuação na formação de base técnica e profissional na
preparação de mão de obra para absorção no mercado de trabalho, com as devidas
especificidades, mais voltadas à agropecuária ou à indústria e comércio.
Atualmente, as duas instituições (IFC e P.PORTO) estão inseridas no Ensino Superior
e buscam a afirmação da identidade apostando na pesquisa e na Pós-Graduação. Essas apostas
implicam em planejamento, produção de discursos institucionais, disputas, centros de poder e
alternâncias entre os pactos realizados e, muitas vezes, a negação como forma de resistência,
conforme destacado no decorrer do capítulo 4.
Este estudo evidencia que a agenda globalmente estruturada para as reformas na
educação na década de 1990 produziram efeitos nas políticas para o Ensino Superior, as quais
chegaram aos Institutos estudados, em tempos distintos, porém de maneira contundente,
interferindo na reorganização de suas identidades antes direcionadas prioritariamente para a
formação técnica. Por influências das políticas globais, tanto no contexto brasileiro como de
Portugal, foram estabelecidos a diversificação do Ensino Superior, o encurtamento do tempo
nas formações, o vínculo entre o desenvolvimento econômico e a educação, os discursos de
213
eficiência e qualidade, as regulações externas e, principalmente, as assessorias técnicas e
financeiras como garantias para a implantação das recomendações nas reformas efetuadas.
No Brasil, a década de 1990 foi impactante para as instituições, designadamente as
incluídas no Ensino Superior, com a redução de financiamentos estatais e a diversificação
desse nível de ensino, fruto da aplicação das políticas globais. O desinvestimento mostrava
seus efeitos no sucateamento das instituições, tanto em nível estrutural quanto de recursos
humanos. Nos anos de 2000, em um movimento político, de certo modo contrário à lógica que
vinha sendo desenvolvida, os encaminhamentos da política do governo Lula marcaram
decisivamente a identidade das instituições com a criação da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica em 2008.
Com uma política ideológica no viés social universal, foi injetado investimento estatal
no Ensino Superior, ampliando a oferta desse nível de ensino na rede pública, fato que alterou
profundamente a identidade das instituições e, nesse caso específico, o IFC que foi criado
como resultado dessa política. A união de cinco instituições com percursos e experiências
distintas, acrescida pelo alargamento das atribuições, passando a ofertar a Educação Superior
e Pós-Graduação, em uma estrutura verticalizada, implicou a completa reorganização sob
todos os aspectos. A falta de familiaridade com as novas atribuições gerou reações, pois se
desdobravam em mais trabalho e, agora, era necessário transitar entre a docência e a pesquisa.
Foi necessário investir na contratação de professores e infraestrutura, o que provocou aumento
súbito das funções da docência e gestão. Além disso, a utilização de ferramentas de gestão
também foram requeridas com mais ênfase. A urgência de elaborar o PE e o PDI revelaram
que havia a inexistência da cultura de planejamento e resultados em médio e longo prazos. A
leitura dos documentos possibilita encontrar vários indícios da falta de articulação entre as
ações, característico de uma instituição que vem dando seus primeiros passos nas experiências
mais elaboradas de gestão e que vai se constituindo nesse processo.
Além disso, os depoimentos dos gestores trazem a tona a fragilidade da identidade
institucional, as disputas, as resistências e as táticas utilizadas para superá-las. A diversidade
de perfis institucionais e docentes, a recente chegada à instituição e a permanência de culturas
individualizadas que estão enraizadas dificultam perceber as necessidades de abrangência e de
articulação, que, no campo da docência, da gestão e da pesquisa, para chegar a Pós-
Graduação, necessitam ser revistas para que se possa fabricar a resposta requerida pela
instituição no âmbito do Ensino Superior. Para que esse processo seja possível, os gestores
têm fundamental relevância no campo de suas atribuições.
214
No P.Porto, sua inserção no Ensino Superior ocorreu na década de 1970 e, situado em
um ambiente político que privilegia a competitividade, tem clareza sobre suas escolhas
identitárias quanto a ser uma grande instituição e desenvolve uma política diretamente
elaborada nesse sentido. Essa clareza pode ser percebida tanto na leitura atenta do PE e do
Manual de Qualidade como nos depoimentos dos gestores. De modo geral, eles expressaram a
concordância com a política institucional que vem sendo desenvolvida para afirmação da
identidade institucional, que conta inclusive com a alteração da identificação transitando de
IPP para P.Porto, na aquisição de infraestrutura física em locais demarcados por outras
instituições no Polo Universitário como forma de marcar presença, ser visível e competitivo
no espaço do Ensino Superior.
O reposicionamento estratégico assenta-se no objetivo de dar maior visibilidade à área
do conhecimento desenvolvida em cada uma de suas Escolas/Institutos, o que fortalece a
identidade institucional. Apesar de manifestações mais homogêneas por parte dos gestores
quanto aos encaminhamentos, as táticas e as fabricações estão presentes, e não somente elas,
mas também as resistências, os centros de poder e as periferias, o que vem gerando
negociações.
O movimento de análise empreendido no decorrer desta Tese possibilita perceber que
as instituições (IFC e P.PORTO) vivem momentos distintos, o que está irremediavelmente
vinculado à história nacional e institucional. No IFC, os depoimentos dos gestores sinalizam
que há, neste momento, uma disputa interna, ocasionada também pela diversidade de perfis
docentes entre o velho e o novo. No P.Porto, o atual movimento envolve instâncias maiores
materializadas pelo enfrentamento ao Estado na tentativa de remover as barreiras impostas
pela legislação.
No terceiro objetivo, por meio dos depoimentos dos gestores, busquei identificar as
traduções e as estratégias da política nas instituições. Considerando que cada instituição
desenvolve táticas conforme sua realidade, fui escaneado os registros dos quais resultaram os
quatro tópicos discutidos nos capítulos 5 e 6. Entre aproximações e distanciamentos
sinalizados ao longo do trabalho, quanto à influência das políticas globais nas Nações, as
características dos sistemas de ensino, políticas voltadas ao ensino superior e Pós-Graduação,
histórico das instituições e os modos peculiares de organização e gestão que impactam nas
identidades, foi possível identificar elementos comuns que, na perspectiva da educação
comparada, fazem sentido, porque consideram os contextos nos quais as ações ganham vida.
Enquanto o IFC, como instituição recém-criada, se concentra nas estratégias e táticas
que poderão lhe conduzir a implantação da Pós-Graduação por meio de uma agenda de
215
pesquisa, o P.Porto busca avançar na oferta de Doutoramentos, pois as especializações e os
mestrados são uma conquista de longa data. No entanto, ambas as instituições, ao fabricar
respostas no contexto da prática, lançam mão de estratégias e táticas comuns, como pode ser
observado na Figura 16, o que comprova que as ideias políticas se movimentam por meio da
rede de influências.
Figura 16 - Estratégias e táticas comuns ao IFC e P.Porto
Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.
Ainda que as estratégias e táticas comuns tenham intencionalidades distintas, a arena
institucional tem lugar de destaque. É nela e por meio dela que ocorrem as manobras, tanto no
IFC como no P.Porto. As ações concentram-se na pesquisa e aí se instala um círculo vicioso.
Para que o professor possa desenvolver atividades de pesquisa na Pós-Graduação, ele
necessita ser Doutor, desenvolver pesquisas, participar de eventos nacionais e internacionais,
publicar o resultado das pesquisas em revistas reconhecidas no rankings. Contudo, para o
desenvolvimento de pesquisas, esse mesmo professor necessita de infraestrutura. Como se
pode perceber uma tática leva a outra.
216
Sobre a infraestrutura educacional, são bem vindas as táticas que promovem a partilha
de recursos, sejam eles humanos, com a colaboração de professores dos diversos campi, na
oferta de cursos interdisciplinares ou em espaços que, a exemplo dos laboratórios, possam ser
também compartilhados, prioritariamente no desenvolvimento de pesquisas, que não podem
ser restringidas ao reconhecimento e mérito institucionais.
Para além da organização interna da instituição, em um mundo globalizado com
acentuadas características de competitividade, as instituições necessitam estar visíveis aos
concorrentes e aos parceiros, uma característica da cultura de resultados imposta pela agenda
global da educação. Assim, o desenvolvimento de projetos e pesquisas em rede assumem
relevância porque são fontes potenciais de recursos sempre vistos com bons olhos pelas
instituições. Nessa perspectiva, os grupos de pesquisa também vão realizando um movimento
de fortalecimento e aproximação com seus objetos de estudo, o que lhes confere uma
identidade única e reconhecida com as publicações dos resultados.
Como instituição recém criada, o IFC necessita lidar com desafios internos que
envolvem transitar entre o velho e o novo com culturas distintas que tentam se reafirmar.
Esses grupos distintos necessitam avançar no sentido de perceber que é necessário pensar,
planejar em longo prazo, para que, na atual conjuntura, os avanços conquistados não se
percam, com o novo cenário político que se desenha.
Em alguns depoimentos, os próprios gestores do IFC denunciam a ausência do
sentimento de pertença aos objetivos institucionais comuns considerando o campus onde
atuam como um centro de interesses próprio, situação que fragiliza a identidade institucional.
De certo modo, os agora gestores são ―estrangeiros‖ no sentido de estarem há pouco tempo na
instituição, desconhecerem a história e terem sido ―convidados‖ a participar na maioria das
vezes, por conta do vínculo com a pesquisa, formação e experiência, o que também fragiliza o
resgate da identidade formada antes da criação do IFC. E, então, fica um questionamento:
como construir/afirmar uma identidade institucional com grupos tão diversos e sob tão intensa
pressão por respostas e cumprimento de metas?
Nesse movimento, ao respeitar a verticalização investindo em áreas que marcavam a
identidade, a exemplo da agropecuária e afins, com mestrado profissional aprovado pela
CAPES, há evidências das táticas que são utilizadas para responder às exigências legais. No
entanto, há outras áreas, entre elas as humanidades, que, na nova institucionalidade, se
mostram potenciais e expressam os deslocamentos efetuados pelo grupo gestor.
Por outro lado, as exigências da CAPES impelem que alguns caminhos sejam trilhados
de modo muito próximo ao que as universidades têm feito, pois a regras são as mesmas. O
217
que fará a diferença serão provavelmente as nuances da formação oferecida ao agregar e não
esfacelar a identidade de origem. Esse é o possível fio de Ariadne.
No P.Porto, os gestores são pertencentes ao quadro de funcionários de longa data e
optam por concorrer aos cargos, o que evidencia também uma escolha profissional e um
conhecimento da trajetória percorrida. Cada um dos dois subsistemas têm diferentes
realidades, ou seja, no caso das universidades e dos politécnicos, o espaço de tensão é vivido
nos dois. Os politécnicos não somente se desenvolveram no sentido de se aproximar da
universidade, mas indo além do que estava previsto na legislação. Nesse movimento, os
politécnicos e especificamente o P.Porto se aproximou de algumas atividades que somente
eram desenvolvidas pela universidade, assim como a universidade ocupou o espaço dos
politécnicos em termos de formação. Há uma proximidade de contextos que vêm provocando
sombreamentos em um espaço de acirrada competitividade conforme assinalado nos
depoimentos dos gestores.
O elevado investimento em pesquisa e desenvolvimento vem provocando o
afastamento do que havia sido fixado na legislação e, então, lá também se instala uma crise de
identidade, quando pelos marcos regulatórios é imposta novamente ao P.Porto e aos
politécnicos uma retomada do perfil formativo do passado, o que neste momento acentua a
divisão dos dois subsistemas. Nesses espaços multifacetados, as táticas são as ferramentas que
impulsionam os atores gestores no âmbito da ação.
Na constituição/consolidação de suas identidades, em face das novas diretrizes da
política, os institutos estão inseridos no Ensino Superior com o alargamento de suas
atividades, o que fatalmente interfere na construção da identidade e atinge gestores e
professores. Nesse posicionamento, estes lidam com as disputas, as redes internas de poder,
os constantes embates e as necessidades de acordos e as latentes condições que precisam ser
criadas para ser reconhecida como uma instituição de pesquisa e Pós-Graduação aliada à
necessidade de fabricar uma imagem de compromisso desta com a política, decorrente dos
processos avaliativos externos. Nessa luta, estratégias e táticas vão sendo forjadas na
dificuldade de diálogo e de articulação entre as ações, na declaração de acordos, nas disputas
por áreas de domínio, na sobreposição de poderes, mas também na identificação de
possibilidades expressa nos desejos de convergência e não esfacelamento das identidades
originárias, de verticalização de currículos, de fortalecimento do olhar para as demandas
locais e interesses regionais, de consolidação da pesquisa e redes de pesquisa, de estímulos à
produção científica, de referencialidade em determinadas áreas de conhecimento e inovação
como estratégia de marcar presença, ser visível e competitivo no espaço do Ensino Superior.
218
Enfim, finalizo esta pesquisa em um momento que a educação brasileira vive uma
crise de identidade, que arrisco afirmar ser sem precedentes, com ameaças aos direitos
historicamente conseguidos que ouso nomear como política do desmonte, porque, entre outros
desdobramentos, a política que criou a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica corre sério risco de ser subsumida pela perspectiva mercadológica. Os atuais
encaminhamentos governamentais e a imposição ditatorial ideológica a que estamos
submetidos leva-me a crer que estamos diante de um processo que se posiciona de forma
muito mais agressiva e célere do que o neoliberalismo até então tinha manifestado. São novos
atores e interlocutores que se movimentam por meio da rede de influências e constroem
consensos, fabricando verdades disseminadas em discursos que ocultam as reais intenções,
inaugurando um campo de novas disputas.
219
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234
APÊNDICES
235
LISTA DE APÊNDICES
Apêndice A - Instrumento de coleta de dados: entrevista – IFC 236
Apêndice B - Instrumento de coleta de dados: entrevista – P.PORTO 237
Apêndice C - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) 238
236
Apêndice A - Instrumento de coleta de dados: entrevista – IFC
Nome do entrevistado: ......................................................................................................
Data: .................... Hora início: .............Hora conclusão: ..........................................
Esta pesquisa pauta-se na abordagem qualitativa e tem o objetivo de analisar as
políticas de Pós-Graduação para a Educação Tecnológica Brasileira e sua tradução pelos
gestores do Instituto Federal Catarinense (IFC).
1. Qual sua trajetória no IFC? (Quando e como começou, acompanhou a transição de Escola
Técnica para IFC, quais os motivos que o levaram a aceitar o desafio de coordenar a
implantação da Pós-Graduação).
2. Quais são as políticas de Pós-Graduação desenvolvidas no âmbito do IFC, o que se levou
em conta para sua produção, quais as estratégias (estratégias, procedimentos, ações) adotadas
para sua implantação e como a comunidade acadêmica está envolvida?
3. O que você poderia falar sobre a Política Nacional de Pós-Graduação e como o IFC vem se
organizando para responder às suas exigências? (tanto lato como no stricto sensu conforme o
PNPG).
4. As instituições que compõem a Rede Federal de Educação Científica e Tecnológica (Lei Nº
11.892/2008) são equiparadas às universidades notadamente em relação às exigências de
avaliação. Levando em conta a trajetória e as especificidades do IFC, como você avalia essa
questão e quais as condições materiais concretas do IFC para responder a tais exigências?
5. Como e quais ações estão sendo desenvolvidas para atender à exigência de verticalização
na formação conforme a Lei Nº 11.892/2008?
6. Como o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) foi desenvolvido, quais as ações
que permitem contemplar a implantação da Pós-Graduação e como elas estão sendo
executadas?
237
Apêndice B - Instrumento de coleta de dados: entrevista – P.PORTO
Nome do entrevistado: ......................................................................................................
Data: .................... Hora início: .............Hora conclusão: ..........................................
Esta pesquisa pauta-se na abordagem qualitativa e tem o objetivo de analisar as
políticas para o Ensino Superior Politécnico e sua tradução pelos gestores das unidades e sub-
unidades organizacionais do Instituto Politécnico do Porto.
1. Qual sua trajetória no IPP? (Quais os motivos que o levaram a aceitar o desafio de assumir
funções de gestão).
2. Quais são as políticas internas desenvolvidas no âmbito do IPP, o que se levou em conta
para sua produção, quais as estratégias (estratégias, procedimentos, ações) adotadas para sua
implantação e como a comunidade acadêmica está envolvida?
3. O que você poderia falar sobre a Política Nacional dos Cursos de Pós-Graduação e como o
IPP vem se organizando para responder às suas exigências? (Conforme o Plano Nacional de
Políticas para o Ensino Superior).
4. As instituições que compõem o Ensino Politécnico (Decreto-Lei Nº 38/2007) são
equiparadas às universidades notadamente em relação às exigências de avaliação. Levando
em conta a trajetória e as especificidades do IPP, como você avalia essa questão e quais as
condições materiais concretas do IPP para responder a tais exigências?
5. Como e quais ações estão sendo desenvolvidas para atender a exigência de Cursos Técnicos
Superiores Profissionalizantes (CTESP) conforme o Decreto-Lei Nº 43/2014?
6. Como o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) foi desenvolvido, quais as ações
que permitem contemplar a implantação dos cursos de mestrado e doutoramento e como elas
estão sendo executadas?
238
Apêndice C - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE
Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário, de uma pesquisa. Após ser
esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo,
rubrique todas as folhas e assine ao final deste documento, com as folhas rubricadas pela
pesquisadora, e assinadas por ela na última página. Este documento está em duas vias. Uma
delas é sua e a outra é da pesquisadora responsável. Em caso de recusa, você não será
penalizado(a) de forma alguma.
INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:
Título do Projeto: “ENTRE A POLÍTICA PROPOSTA, A POLÍTICA DO FEITO E A
POLÍTICA DE USO: UM ESTUDO DO IFC NO ÂMBITO DA PÓS-GRADUAÇÃO”
Pesquisador responsável:
Regina Célia Linhares Hostins - http://lattes.cnpq.br/3614416302948755
Telefone para contato: (47) 3261-1205
Pesquisador participante:
Idorlene da Silva Hoepers - http://lattes.cnpq.br/0701191397858274
Telefone para contato: (47) 3344-2388
A presente pesquisa tem por objetivo analisar as políticas de Pós-Graduação para a
Educação Tecnológica Brasileira e sua tradução pelos gestores do Instituto Federal
Catarinense (IFC). A definição pela temática deu-se a partir da nova institucionalidade
ocorrida em 2008, com a criação dos Institutos Federais, acrescida pelo fato de ainda não
haverem estudos voltados à compreensão da formação dessa nova identidade. Esta pesquisa
pauta-se na abordagem qualitativa e tem como instrumentos de coleta de dados, a análise
documental e a entrevista semiestruturada com os gestores desta instituição. O recorte
temporal de análise dá-se a partir dos anos de 1990 até os dias atuais. Para a análise
documental, serão utilizados documentos Internacionais, Nacionais e Institucionais, sobre o
tema em questão. As entrevistas serão realizadas com os gestores da Pós-Graduação no
âmbito da Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação Tecnológica e também com os
responsáveis por esses setores em cada um dos cinco campi que deram origem ao IFC.
Considera-se que o discurso do gestor é determinante no modo como a política é produzida no
contexto da prática. As análises serão realizadas conforme a análise do discurso sugerida por
Michel Foucault (2014) e o Ciclo de Políticas proposto por Stephen Ball e seus colaboradores
na década de 1990.
Você foi selecionado porque atende aos seguintes critérios de seleção dos participantes
da pesquisa: pertence ao grupo gestor responsável pela definição do Plano de Metas e ações
para a implantação da Pós-Graduação na Instituição, ou é responsável por esses setores em
cada um dos cinco campi que inicialmente deram origem ao IFC.
Sua participação não é obrigatória e a qualquer momento você poderá desistir de
participar e retirar seu consentimento. Se, durante a participação na pesquisa, você tiver
239
qualquer tipo de desconforto, ela poderá ser interrompida no momento, podendo ou não
continuá-la posteriormente. Além disso, a pesquisadora estará presente para esclarecer
eventuais dúvidas, assim como para dar suporte, na tentativa de minimizar possíveis
desconfortos durante o desenvolvimento da pesquisa.
Sua participação consistirá em responder algumas questões sobre as políticas públicas
de Pós-Graduação, sua relação com a educação tecnológica e as respostas do IFC às
exigências da política. As perguntas não serão invasivas à intimidade dos participantes. Todas
as informações obtidas por meio desta pesquisa serão gravadas, sigilosas e confidenciais.
Posteriormente à entrevista, as transcrições serão disponibilizadas para seu aceite ou recusa
sobre o seu conteúdo. Sua participação na pesquisa não será remunerada.
Os benefícios desta pesquisa referem-se aos resultados potenciais que este estudo pode
trazer à Instituição e seus gestores, notadamente para a reflexão e análise do seu Plano de
Desenvolvimento Institucional e das ações dele decorrentes no caminho de consolidação da
política de Pós-Graduação na Instituição.
Os resultados desta pesquisa serão apresentados aos gestores da instituição após a sua
conclusão, em data a ser agendada.
Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço dos
pesquisadores, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e a participação, agora ou a
qualquer momento.
Nome do Pesquisador: Regina Célia Linhares Hostins
Assinatura do Pesquisador: ________________________________________________
CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO SUJEITO
Eu, _____________________________________, RG_____________, CPF ____________
abaixo assinado, concordo em participar do presente estudo como sujeito. Fui devidamente
informado e esclarecido sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os
possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi-me garantido que posso
retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer penalidade.
Local e data: _______________________________________________________________
Nome: ____________________________________________________________________
Assinatura do Sujeito ou Responsável: ___________________________________________
Telefone para contato: ________________________________________________________
Pesquisador Responsável: _____________________________________________________
Telefone para contato: ________________________________________________________
Pesquisadores Participantes: ___________________________________________________
Telefones para contato: ______________________________________________________
240
ANEXOS
241
LISTA DE ANEXOS
Anexo A - Organograma da Reitoria - IFC 242
Anexo B - Organograma - P.PORTO 243
Anexo C - Escola Superior de Educação (ESE) 244
Anexo D - Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) 245
Anexo E - Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP) 246
Anexo F - Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (ESTSP) 247
Anexo G - Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo (ESMAE) 248
Anexo H - Escola Superior de Estudos Industriais e Gestão (ESEIG) 249
Anexo I - Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Felgueiras (ESTGF) 250
242
Anexo A - Organograma da Reitoria - IFC
243
Anexo B - Organograma - P.PORTO
244
Anexo C - Escola Superior de Educação (ESE)
245
Anexo D - Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP)
246
Anexo E - Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP)
247
Anexo F - Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (ESTSP)
248
Anexo G - Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo (ESMAE)
249
Anexo H - Escola Superior de Estudos Industriais e Gestão (ESEIG)
250
Anexo I - Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Felgueiras (ESTGF)