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Um casal romano em S. Lourenço do Mato(Ponte de Lima)
❚ CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA ❚
1. Introdução
Esta estação arqueológica1, que era desconhecida até à descoberta dos vestígios acima refe-
ridos2, situa-se no lugar de Rebordelo, o mais oriental da pequena freguesia de S. Lourenço do
Mato, a qual, por sua vez, é confinante com as freguesias de Calvelo, Friastelas, S. Julião de
Freixo e Gaifar, todas pertencentes ao concelho de Ponte de Lima (Fig. 1). Precisando melhor
a sua situação geográfica — 41 39’ 58” N; 0 34’ —W; 170 m de altitude — os vestígios arqueo-
lógicos confinam-se a uma mancha agrícola localizada entre a Quinta de Arcelos e o lugar de
Santa Marinha. Sinais de Romanização, que não são únicos no quadro da actual freguesia, pois
também os há no adro da igreja paroquial, em Rabião e na Quinta de Arcelos (Almeida, 1997,
I, p. 195-196).
A Quinta de Arcelos é uma grande propriedade agrícola, murada, localizada, paredes-
meias, com o espaço da igreja e o lugar de Rebordelo. É talvez um dos lugares mais antigos
da freguesia, epicentro da primitiva paróquia, que um documento do Liber Fidei, datado de
1158, designava por ecclesia Sancti Laurentii de Arcelos (Liber Fidei, doc. 546) e assim conti-
nuou até meados do séc. XIII, pois só em 1290, na Inquirição de D. Dinis, é que apareceu a
actual designação: Freyguesia de Sam Lourenço de Mato. Na actualidade, esta propriedade, que
se estende praticamente até ao lugar de Rebordelo, reparte-se por parcelas agrícolas e terre-
nos de floresta, fazendo assim jus a uma ancestralidade que não encontra muito eco na sua
casa de lavoura, adulterada por muitas e muitas intromissões, mas que conserva ainda, em
plano de evidência, o brasão com as armas dos Pereiras. Os vestígios arqueológicos, que à
151
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
RESUMO A muito parcelar intervenção
arqueológica efectuada em São Lourenço do Mato,
concelho de Ponte de Lima, revelou a presença de
quatro ocupações cronologicamente distintas,
num espaço com naturais aptidões agrícolas.
A primeira ocupação do sítio começou com
indígenas castrejos no início da Romanização.
Seguiram-se as ocupações de época romana, aqui
representada por uma construção de apoio,
celeiro-armazém, datada do Baixo-império. Sobre
as ruínas desta estrutura foi posteriormente,
durante o período visigótico, construído ma outra
casa, esta de habitação. A última fase, está mal
conhecida, mas parece corresponder ao modelo de
ocupação que vem mencionado nas Inquirições de
D. Afonso III.
ABSTRACT The archaeological field work that was
carried out to a limited extent at São Lourenço
do Mato, Ponte de Lima, has revealed four
different human occupations of a location
featuring good natural conditions for agriculture.
The site was first occupied by an indigenous
group, during the earliest stage of the Roman
period. Evidence of further Roman occupation
was revealed by the remains of a late Roman
support building, a warehouse or barn.
During the Visigothic period, a house was built
over the ruins of the Roman building.
The final occupation stage is not very well defined,
but seems to correspond to the settlement pattern
referred in the Inquiriçõesof King Afonso III.
superfície se resumem a tegula, fazem supor
a existência de uma ocupação que, pelo
menos aparentemente tem a chancela da
Romanização.
Os vestígios arqueológicos, de crono-
logia afim aos atrás descritos, estão igual-
mente patentes nas freguesias limítrofes,
sobretudo em Calvelo, onde, para além do
já assinalado sítio de Santa Marinha, há
ainda a apontar os vestígios de época
romana situados no lugar do Ribeiro, na
Quinta de Mareces e na Quinta da Pousada,
os alti-medievais que se dispersam em
redor da igreja paroquial, sucessora que foi
de um antigo mosteiro, sem esquecer
outros mais antigos, como são os “castros
agrícolas” de Cadém e Valadares (Almeida,
1996/1997, p. 119-147).
Rebordelo, que também vem citado na
Inquirição de 1258 (PMH, Inq. III, p. 398-
-399), é um lugar de meia de dúzia de casas
de habitação que se distribuem por ambos
os lados da estrada nacional n.° 306. Em
redor de cada uma estão os quintais e junto a estes uma sucessão de campos de cultivo, dis-
postos em patamares, que a partir da encosta meridional do monte de S. Veríssimo, sítio onde
se encontra o pequeno lugarejo de Santa Marinha, orientam-se para Sul, isto é, para o vale
do Rio Neiva e da pequena linha de água que atravessa o lugar de Baralde (Gaifar), mas que
começa a ganhar corpo em Rebordelo.
Tal como ocorre em largas parcelas de território agrícola do Minho, também aqui os típi-
cos campos de cultivo, balizados por lateiros de vinha e ponteados de oliveiras e macieiras,
têm vindo a sofrer, nos últimos anos, profundas alterações à sua tradicional fisionomia.
Mais recentemente tem sido a aposta num novo tipo de vinhedos, que tem vindo a revoluci-
onar profundamente a geografia agrária do velho Entre-Douro-e-Minho. Em tempos mais
recuados, embora limitadamente, foram os pomares e mesmo os prados para forragens
que, do mesmo modo, conduziram ao desmantelamento dos tradicionais campos socalcados,
bem apertados por vezes, sustentados por valos de terra, quando o pendor era escasso e por
muros de pedra, os forra-valos, quando o desnível é bem mais pronunciado.
Estão estas duas situações bem documentadas no lugar de Rebordelo e de uma maneira
bem específica no sítio por onde se espalham os vestígios arqueológicos. A Norte da estrada
nacional n.° 306, no denominado Campo da Fonte ou Fontelo — sítio onde foi realizada a
segunda intervenção — o terreno foi outrora surribado e aplanado e de tal modo, que daí
resultaram campos de cultivo de uma razoável dimensão que foram ocupados com semen-
teiras de milho e batata e mesmo por um expressivo pomar de macieiras. A Sul desta mesma
estrada, nos terrenos onde efectuámos a primeira sondagem, a alteração fisionómica, isto é,
o alargamento dos antigos socalcos foi feita há uma escassa dezena de anos, sendo bem mais
recente o corte de umas carvalheiras e o arroteamento de uma área de monte, onde se fez a
plantação de um vinhedo, cuja armação, para já, é do tipo cordão simples (DRAEDM, 1989,
p. 120-121).
152
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 1 – Implantação cartográfica do sítio.
As culturas típicas destes solos são o milho, o feijão, a batata, as ervas para forragens,
o vinho, o azeite e obviamente a fruta, sobretudo a maçã. A qualidade e a quantidade destes
produtos, necessariamente que deriva da forma como o agricultor semeia e trata das suas
sementeiras e árvores, mas tem, sobretudo uma estreita relação com a quantidade de água
disponível, a exposição solar, a boa drenagem dos terrenos e sobretudo com a específica com-
posição dos solos. Sendo estes compostos por cambissolos húmicos de influência atlântica,
a sua pedogenia “faz com que a generalidade dos solos derivados das rochas eruptivas tenham umaelevada permeabilidade, mas que sejam pobres em cálcio e deficientes em ácido fosfórico e potássioassimilável” (Almeida, 2003, p. 39). São, no geral, solos fáceis de trabalhar, embora necessi-
tem de correctivos, consoante o tipo de culturas a introduzir.
Se aplicarmos este tipo de caracterização à zona que agora estudamos, pode-se concluir
que o predomínio é dos solos de origem granítica, cuja potência arável pode chegar ao meio
metro de espessura ou mesmo mais, consoante as observações sejam feitas na parte mais ele-
vada dos terrenos ou mais para junto dos forra-valos ou muros de suporte. De qualquer modo
e de acordo com as sondagens efectuadas, o solo natural ou rocha-mãe, era exclusivamente
formado por saibros provenientes dos granitos em decomposição, cuja granulação facilita a
infiltração e drenagem das águas pluviais, quando estas são em demasia.
2. O Campo de Robordelo
As sondagens que aqui realizámos foram duas. A primeira foi efectuada nos terrenos
situados a Sul do traçado da estrada nacional n.° 306, mais concretamente, na parcela n.° 70
(Fig. 2). A segunda foi realizada no Campo da Fonte, parcela de terreno que corresponde ao
n.° 69 da planta topográfica da Transgás e que a Norte da já mencionada estrada, se encaixa
entre esta e um caminho vicinal, que serve algumas casas de habitação bem como os terre-
nos agrícolas.
153
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 2 – Implantação das sondagens na linha do gasoduto.
2.1. Sondagem n.0 1
A intervenção arqueológica foi realizada no interior da vala de servidão ou, para sermos
mais precisos, na pista destinada aos tubos do gasoduto. O comprimento desta primeira son-
dagem atingiu quase a centena de metros, 96 m para sermos mais precisos. Tal extensão aca-
bou por determinar a sua divisão em duas valas distintas: Vala 1 e Vala 2. O limite entre as duas
foi o valo em talude construído há cerca de uma dezena de anos e que funcionava como suporte
do socalco mais alto. Ao mais elevado corresponde a Vala 1, ao mais baixo a Vala 2.
Se o comprimento variou em função da extensão dos campos, a sua largura, essa foi sem-
pre constante: 1,40 m. O epicentro, esse foi sempre definido pelo eixo da pista do gasoduto.
2.1.1 - Estratigrafia da Vala 1 Esta vala teve um comprimento total de 45m, distância que foi medida entre o poço-son-
dagem aberto junto à berma da estrada nacional n.° 306 — esta vala destinou-se a introdu-
zir o tubo que transporta o gás por debaixo da estrada nacional — e o muro do forra-valo que
marca o desnivelamento em relação ao campo de cultivo onde foi aberta a Vala 2 .
As camadas estratigráficas exumadas foram 8 e escalonavam-se da seguinte forma
(Fig.3):
1. Terra arável, de espessura, textura e coloração heterogénea. A sua espessura é maior na
parte meridional da vala, sobretudo nas imediações do forra-valo. É esta camada que
cobre a crista de um muro (Ml), que apesar de estar a nível de alicerces, não esconde a
sua filiação medieval. Em termos gerais diremos que se trata de uma camada inúmeras
vezes revolvida, sendo, por isso, perfeitamente normal, que, por exemplo, as cerâmicas
tenham procedência e cronologias distintas. Nesta camada, pode dizer-se, que há frag-
mentos de peças de olaria, muito recentemente produzidas nas oficinas que se esten-
dem ao longo da estrada que faz a ligação entre Barcelos e Prado, a par de outras indis-
cutivelmente romanas, sem esquecer a tegulae.
2. Terra castanho clara. Esta pequena bolsa, mais não é que a cova de uma árvore, seme-
lhante a outras tantas, de maior tamanho, que estão patentes na Vala 2.
3. Terra castanho amarelada. Trata-se de uma camada de abandono e de revolvimento de
todas as ocupações, mesmo das mais recentes. Ao selar, neste caso concreto, o que res-
tava do Ml, mostrou ser uma camada relativamente recente, facto que pode comprovar-
-se através do espólio, que é diversificado, mas mais pendular que o da camada que se
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ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 3 – Perfil estratigráfico da Vala 1.
lhe sobrepõe. São numerosos os fragmentos de tegulae, de cerâmica com características
medievas, sendo já significativos os bocados de cerâmicas romanas. Nestas, o destaque
vai para três pequenos bocados de terra sigillata hispânica, dois dos quais pertence a uma
Drag. 37.
4. Terra de tonalidade amarelada. Esta camada, onde estão patentes a tegula, a tijoleira, o
imbrex e a cerâmica romana, é o que resta da ocupação relacionada com o muro M3.
É o que pode definir-se como um misto de ocupação e de destruição de um edifício de
época romana. A diluição deste estrato na camada superior, ficou a dever-se aos impon-
deráveis físicos próprios de um terreno em declive, que ficou mais vulnerável à medida
que o arranque das pedras do edifício romano foi acontecendo, até só restar o alicerce.
A cerâmica recolhida é toda ela de fabrico romano e consta essencialmente de cerâmica
comum, mas não pode ignorar-se a presença de terra sigillata hispânica (Drag. 15/17,
24/25, 27 e 37), de cinzentas finas, de bracarenses e de alguns bocados de vidro.
5. Terra castanho amarelada. É a vala de fundação do muro medieval (M1).
6. Só patente na Vala 2.
7. Terra castanho escura, com tonalidades amareladas. Esta camada é uma antiga cober-
tura vegetal, anterior à implantação das estruturas habitacionais de época romana, pois
foi cortada pela vala onde foi fixado o alicerce do muro M3, que é o que resta do edifício
de época romana. Cobriu o pouco que resta da ocupação castreja, fortemente violada e
destruída com a abertura do alicerce do M1, que é de época medieval. O espólio encon-
trado é todo ele constituído por fragmentos cerâmicos de época romana.
8. Terra cinzento escura. Trata-se de uma pequena quantidade de terra cinzenta, muito
localizada e que comporta muitas cinzas e alguns carvões. É o que resta da ocupação cas-
treja que deu início à ocupação do sítio. A sua destruição ocorreu com a construção do
muro de uma estrutura medieval, aqui patenteada pelo M 1. No espólio recolhido há real-
çar a presença de dois pequenos fragmentos de cerâmica castreja.
9. Saibro amarelo, granuloso, não muito consistente. É o solo base onde foram cavados os
alicerces dos muros medievais (M1), romano (M2) e onde naturalmente se inseriram as
raízes das árvores que estão na origem das diversas covas patentes na Vala 2.
2.1.2. Estratigrafia da Vala 2 Esta vala tem de 41 m de comprimento, entre a base do talude do forra-valo e o muro
semi-destruído que marcava a passagem do campo de cultivo para o terreno que, antes de se
ter transformado em vinha, havia sido terreno de monte.
As camadas estratigráficas exumadas são 4 e correspondem, de certo modo, às da vala 1.
1. Camada arável de espessura, textura e coloração heterogénea.
2. Terra castanho amarelada. É uma camada de revolvimento constituída por saibros e ter-
ras de cultivo misturadas. É bastante mais espessa na metade mais meridional da vala,
devido à terraplanagem que, décadas atrás, modificou a fisionomia deste socalco.
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UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
3. Terra castanho escura. A tonalidade mais cinzenta desta camada deve-se à presença de
cinzas e de alguns carvões, cuja origem não está devidamente esclarecida por causa da
exígua largura da sondagem e ao facto de ter sido interrompida com a construção do
muro de suporte ou forra-valo.
A título provisório, parece-nos que se trata de uma camada onde está patente a falta de
articulação entre os diversos elementos que a compõem. Por isso mesmo não provirá
propriamente de uma ocupação humana contínua, antes resultará da queima de ramos
de árvores e de arbustos, isto é, da limpeza que por vezes se fazia e ainda se faz no perí-
metro dos campos de cultivo e mesmo na berma das matas. Na que existia antes da sua
transformação em vinha, havia carvalhos e pinheiros. Como alguns dos carvões são pro-
venientes de ramos de carvalho, as deduções agora apresentadas poderão resultar bem
credíveis, mas não certamente com direito a exclusividade.
O espólio, tal como a composição da camada, é, também ele, heterogéneo. Pouco nume-
roso, mostra haver um predomínio das cerâmicas medievais, mas sem esquecer a exis-
tência de outras de época romana.
4. Terra castanha com diversas covas de árvore.
2. As estruturas
São três os muros de edifícios detectados no interior da Vala 1 do Campo do Reboledo.
Na Vala 2 não foram detectados restos de construções, somente covas abertas no solo natu-
ral e que, na sua totalidade, estão relacionadas com árvores.
2.1. M1
Este muro apareceu a nível de alicerce. Dele restavam somente as pedras das fiadas
inferiores, algumas delas reaproveitadas de anteriores construções, dispostas sem grande
esmero, como aliás acontece nas construções onde o cuidado, quando o há, somente é assu-
mido na parede exterior quando esta começa a despontar fora da terra que enche o alicerce.
Cronologicamente é um muro de época medieval, mais especificamente da Baixa Idade
Média.
156
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 4 – Planta das estruturas da Vala 1.
2.2. M2
Este muro apareceu somente no meio da vala de sondagem, razão porque não está docu-
mentado em nenhum dos perfis estratigráficos. Estruturalmente é um muro que não permite
mais conclusões que o acima referido. Tal como o anterior, conserva somente as primeiras
pedras do alicerce, mas o seu estado de conservação é bem pior que aquele.
2.3. M3
Trata-se de um muro que foi lambido em ambos os topos, mas que deve fazer parte de
um compartimento e este de uma estrutura mais vasta, isto é, de um edifício de época
romana. Tal como acontece com os edifícios de boa construção deste período, também este
possui pedras bem aparelhadas e picadas, dispostas em fiadas mais ou menos regulares. Ao
contrário dos outros muros, o alicerce deste e a própria parede têm a mesma qualidade da
parte que ficava fora da terra. Um tal tipo de construção só era possível, porque o alicerce foi
cavado mais largo que o normal, situação que é bastante usual em edifícios do Baixo-Impé-
rio desta região. Pelo menos estas são as ilações que se podem colher em construções com
idêntica cronologia, sitas na villa do Paço de Vila Cova-Barcelos, na sua congénere do Forte
de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira) e na villa suevo-visigótica da Quinta do Paço Velho da fre-
guesia da Facha, concelho de Ponte de Lima (Almeida, 2003).
2.4. As covas da Vala 2
São várias as covas detectadas nesta vala. Nada mais que 8, mas nem todas estão com-
pletas, já que as valas números 5, 6 e 7 têm um diâmetro maior que a largura da sondagem
(Fig.5). Como já foi referido, estas valas foram feitas pelas raízes das árvores que foram cres-
cendo naquele espaço.
3. O Campo da Fonte
Este terreno está situado no lado oposto ao Campo de Rebordelo. O que os separa é o
traçado da estrada n.° 306. Trata-se de um extenso terreno agrícola, em parte ocupado com
um pomar de macieiras e que se estende para norte, na direcção do lugar de Santa Marinha,
que desponta, um pouco para lá de um pequeno pinhal.
157
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 5 – Planta das covas detectadas na Vala 2.
O primeiro vestígio, digno de nota, encontrado neste espaço foi um capitel de tipo
dórico guardado numa casa vizinha e que havia sido arrancado do solo, numa das muitas
lavragens realizadas no campo. No entanto uma observação mais cuidada ao terreno plantado
com macieiras haveria de revelar a presença de tegulae e nas paredes que circundam o campo
pelo lado norte, a pedra de construção com as marcas das construções de época romana, eram
elementos mais que convincentes para que as sondagens se estendessem para norte da
estrada nacional.
Os primeiros sinais, que neste terreno ainda havia estruturas soterradas, surgiram no
momento em que a vala para os tubos de transporte de gás foi aberta. Nesta altura recolhe-
ram-se cerâmicas de época romana e medieval, tegulae e imbrices e apareceu a crista de uma
muro. Perante a evidência de tais vestígios, tornou-se imperioso o alargamento, gradual, da
área de escavação, à medida que os sinais se iam convertendo em realidades mais palpáveis
e consistentes, isto é em muros e pavimentos.
A primeira medida adoptada foi a transformação da vala de sondagem num quadrado
de 3,5 x 3 m, a que se seguiu um outro de 3 x 3 m. A separá-los havia uma banqueta com 1 m
de largura. Os trabalhos viriam a concluir-se com um novo alargamento da área escavada, nas-
cendo assim o Q.4 com 9 x 6 m. Num cômputo final diremos que a área escavada acabou por
se cingir a 96 m2 (Fig. 12).
3.1. Estratigrafia
Iniciada a escavação do primeiro dos quadrados, logo ficou patente que ali havia dois tipo
de construção, praticamente sobrepostos, com a mais recente a aproveitar a pedra da constru-
ção anterior. O alargamento da área de escavação acabaria por determinar a existência de duas
estruturas. A mais antiga datando do Baixo Império e a mais recente já do período medieval.
158
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 6 – Perfil estratigráfico Este.
1. Terra arável de espessura variável. O espólio constava de cerâmicas romanas e moder-
nas, sobretudo fragmentos de tegulae.
2. Camada heterogénea quanto à composição, textura e espólio, porque resulta de uma
série de revolvimentos a que não é estranho o facto de cobrir a crista de todos os muros
recenseados na área escavada. A heterogeneidade desta camada compreende-se pela
simples razão, que ao tom dominante, que é o castanho acinzentado, se associam os res-
tos da ocupação medieval e os saibros que provêm da derrocada e sobretudo do arran-
que propositado das pedras dos muros. Um dos mais atingidos foi, o muro de uma estru-
tura medieval que, em certos sítios, foi arrancado até à vala de fundação. Ficaram as
pedras miúdas, os bocados de tegulae e de imbrex e alguns fragmentos de cerâmicas
medievais, a par de outras que são indubitavelmente de fabrico romano.
3. Esta camada é uma bolsa de terra com pedra
miúda, feita no momento em que se retira-
ram as pedras do M1 e M3. O saque das
pedras é o longo resultado das lavragens e da
limpeza do solo arável. Não aparece no perfil.
4. Terra acastanhada, muito calcada, delibera-
damente compactada, que encostava aos
muros M3 e M4 (Fig. 12). Trata-se do piso,
bastante destruído pelo saque das pedras,
do compartimento de uma casa medieval
que sobre ele tivera ma outra camada de
ocupação, mas que aqui aparece generica-
mente misturada na 2 (Figs. 8 a 11). Não
aparece nos perfis.
159
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 7 – Perfil estratigráfico Este.
FIG. 8 – Vista das estruturas tardo-romanas e visigóticas.
160
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 9 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.
FIG. 10 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.
5. Terra cinzenta com restos de saibro e pedra. É uma camada de certo modo complicada
quanto à sua formação. Resulta da mistura de terras relacionadas com a anterior ocu-
pação, a 6, que é o resultado da destruição do M1 e do assentamento da casa medieval.
No fundo é muito a camada 6 adaptada com a construção do M3 que obrigou ao revol-
vimento de todo aquele espaço. Por esse facto é que a cerâmica é toda de fabrico romano.
6. Camada de destruição do M1. A terra é uma mistura de saibro, terra, pedra miúda e
muita tegulae fragmentada.
6A.Terra acastanhada. É a camada de enchimento após a construção do M1 de época
romana.
6B. Terra castanho-acinzentada. Basicamente é um misto de terras oriundas da ocupação
relacionada com o M1 romano. Aqui enchem a vala de fundação do M3 medieval.
7. Terra cinzenta que resulta da ocupação do edifício romano. No meio da terra havia bas-
tante tegulae e muitos fragmentos de cerâmica de utilização diária numa casa romana:
dolia, cântaros, bilhas, jarros, panelas, etc.
8. Piso do edifício romano. Foi feito a partir do solo de saibro natural que foi aplanado. Não
aparece nos perfis, porque foi quase totalmente destruído com os trabalhos da cons-
trução medieval e com as muitas covas e valas que foram ali abertas. Algumas destas
covas correspondem a silos onde foram metidos os fundos de dolia (Figs. 9, 10 e 11).
161
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 11 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.
9. Corresponde a uma pequena cova aberta no saibro natural (Fig. 7).
10. Saibro. Solo geológico.
3.2. As estruturas
Os muros encontrados neste espaço correspondem a dois edifícios. O mais antigo é
romano, o outro é medieval.
3.2.1. O edifício romano Desta estrutura descobriram-se dois muros — M1 e M2 — e a vala de um terceiro (Fig. 12).
Os demais muros estão em terreno não escavado. Dos dois o melhor conservado é o M1.
Foi construído com pedra relativamente bem aparelhada e picada, com os interstícios tapados
com lascas e o meio cheio com pedra mais miúda misturada com muito barro (Figs. 8 e 13).
Resultou uma construção sólida, desde o alicerce, que foi reforçado com pedras de maior porte,
a fazer de travamento. A sua própria largura, a rondar os 0,46 m, reforça a ideia que se tra-
tava de um edifício sólido, o suficiente para aguentar um telhado de pesadas tegulae assentes
em madeiramento, presumimos nós, de carvalho.
Pelo que se descobriu, este edifício teria mais que um compartimento, funcionando este
como celeiro-armazém.
162
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 12 – Planta do edifício tardo-romano e visigótico.
3.2.2. O edifício alto-medieval Dos dois edifícios este é o que está mais destruído, pois somente restam parcelas de dois
muros (M3 e M4) de um conjunto que pelo menos teria quatro (Fig. 12).
Estruturalmente é uma construção muito mais fruste que a anterior, feita com pedra mal
colocada (Figs. 10 e 11), muito dela reaproveitada dos muros do edifício de época romana.
Como está muito destruído, ao contrário do anterior, não sabemos verdadeiramente qual foi
a sua função. As muitas cinzas, algumas bem incrustadas no piso da casa, permite imaginar
que se tratava da cozinha de uma pequena casa de habitação de época medieval.
4. O espólio arqueológico
O espólio arqueológico não é muito, mas mesmo assim devermos referir a existência de
um capitel dório em granito, alguns pregos que são os únicos representantes do grupo dos
metais, dois ou três pequenos fragmentos de vidro e naturalmente a cerâmica.
4.1. Vidro
Fragmentos de vidro foram recolhidos 4. Um no decurso das investigações de campo,
os demais nas valas de sondagem. Em qualquer dos casos são elementos muito escassos para
que se possa traçar um diagrama da verdadeira identidade.
Dos quatro, somente dois permitem avançar uma hipótese de classificação tipo-crono-
lógica. Um dos fragmentos tem coloração verde-clara e pertence a uma pequena taça. O outro
é o bordo de um frasco de definição tipológica imprecisa. Em qualquer dos casos a sua cro-
nologia parece apontar para o Baixo-Império.
163
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 13 – Pormenor do muro romano (M1).
4.2. Cerâmica
O espólio cerâmico está distribuído pelos vários estratos, mas a maior incidência encon-
tra-se sobretudo camada 3 e menos abundantemente na 4. São aliás estas duas camadas aque-
las que mais relacionadas estão com as ocupações romanas do Baixo-Império e da Alta Idade
Média.
De acordo com os quadros anexos, a predominância está na cerâmica comum romana,
mas não é menos verdade que também é significativa a presença de cerâmica da Alta Idade
Média e mesmo de espaços cronológicos mais recentes, como é o caso da Baixa Idade
Média. Tal facto está, por exemplo, bem patente no estrato 2 de Rebordelo, onde, a par da
cerâmica comum romana com uma percentagem na ordem dos 67%, está a medieval e
mesmo a moderna. Significativa é a presença de cerâmica da Alta Idade Média, a qual cobre
um vasto espaço cronológico, que vai do período visigótico a estádios adiantados da Recon-
quista (Fig. 14). Trata-se essencialmente de cerâmica de pastas escuras, a variar entre o cinza
e o castanho, cozedura deficiente e bastante areia a servir de desengordurante. Imagem de
marca, para além das paredes a denotar o uso do torno lento, é a superfície exterior com defi-
ciente alisamento e normalmente decorada com linhas verticais, finas, feitas com um pente
ou uma vassoura, motivo que origina um alinhamento imperfeito a toda a largura do colo
e da pança. Sendo esta cerâmica basicamente de cozinha, demonstram-no os quase 100%
de fragmentos com fuligem. A forma mais comum é uma panela de colo vertical a rematar
num lábio plano e uma pança a tender para o rombóide. O fundo é plano e não mostra mar-
cas de reforço.
O estrato 3 é aquele que mais cerâmica possui. A quase totalidade é constituída por
cerâmica romana (Fig. 15). Nesta, somente uma pequena percentagem é constituída por terrasigillata hispânica, dois fragmentos de cerâmica pintada e parte de um bordo que pode ser
englobado no grupo das cerâmicas bracarenses (Fig. 19). A restante é cerâmica comum.
Uma análise, mesmo que ligeira, mostra que a maioria da cerâmica aparece fortemente
164
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 14 – Estrato 2: distribuição cronológica do material cerâmico.
C. Moderna: 3%
C. Comum Romana: 67%
C. Medieval: 10%
C. Visigótica: 20%
fragmentada, sendo normalmente constituída por bocados de panças e de outras partes de
vasos cerâmicos. Só uma pequena parcela é que é constituída por bordos, fundos e asas (Fig.
16) e é através deles que é possível descortinar uma boa parte das formas que funcionavam
no dia a dia daqueles moradores. Nestas, pode-se dizer, que estão presentes praticamente
todas as formas que normalmente existiam numa casa de campo daquele tempo, mormente
aquelas que funcionavam numa cozinha (Fig. 16). Prova-o a larga percentagem de cerâmica
com evidentes sinais de fuligem (Fig. 17), valores que afinal se repetem nas camadas de ocu-
pação (Fig. 20) e nas formas mais representadas. As formas mais presentes são as panelas,
os potes, os pratos e as frigideiras, afinal aqueles recipientes com mais uso na cozinha, tal
como as bilhas, os oinokoés, as taças, os cântaros e os alguidares o são numa casa, em vir-
tude da sua múltipla função (Fig. 18).
165
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 15 – Estrato 3: distribuição cronológica do material cerâmico.
C. Romana: 95%
C. Visigótica: 5%
FIG. 16 – Cerâmica: tipo de fragmentos.
Asas: 1%
Restantes: 90%
Fundos: 4%
Bordos: 5%
166
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 17 – Cerâmica: presença ou ausência de fuligem.
Fuligem: 63%
Sem fuligem: 37%
FIG. 18 – Cerâmica distribuição tipológica.
Panela: 24%
Bilha: 11%
Pote: 7%
Oinokoé: 7%
Prato: 7%
Taça: 7%
Copo: 7%
Peso de Tear: 4%
Pratel: 4%
Cântaro: 4%
Alguidar: 4%
Dolium: 14%
No vasto leque de cerâmicas comuns de época romana aqui representadas, chamam a
atenção os produtos fabricados com pastas beijes, depuradas, bem cozidas e com engobes e
aguadas que cobrem, por inteiro, a superfície exterior (Fig. 21). Estes engobes revestem, sobre-
tudo, os pratos e os vasos destinados aos líquidos que se destinavam a ser usados na mesa.
Nem sempre são engobes de boa qualidade, por vezes são espessos, mas mesmo assim não
escondem o brilho das finas partículas de mica que impregnam as pastas. Quando a quali-
dade decai, então o engobe não passa de uma simples aguada. A cor típica é o castanho aver-
melhado, muito desbotado, sobretudo devido à má qualidade dos produtos e às condições de
jazida.
A lista ficará completa se lhes juntarmos os dolia, os mais que usuais recipientes de
armazenamento de cereais e líquidos que constituem uma boa parte do espólio encontrado
nas camadas estratigráficas do Campo da Fonte. O rol fica completo com os pesos de tear, que
acabam por corroborar a presença de uma actividade mais que milenar.
167
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 20 – Estrato 3: presença ou ausência de fuligem na cerâmica.
Sem fuligem: 69%
Fuligem: 31%
C. Comum Romana T. Sigillata C. Pintada C. Bracarense
300
250
200
150
100
50
0
FIG. 19 – Estrato 3: distribuição por fabricos.
5. As ocupações de Reboledo/Campo da Fonte
São escassas as ilações que podemos tirar dos muros encontrados e do espólio recolhido
nas várias camadas arqueológicas registadas. Mais coerente parece ser a diacronia do sítio
com quatro momentos distintos e bem diferenciados.
5.1. Ocupação castreja
A única informação que temos desta ocupação resulta do facto de havermos encontrado
alguns pequenos fragmentos de cerâmica castreja e de estes estarem relacionados com uma
pequeníssima amostra estratigráfica na vala aberta no Campo de Rebordelo.
A presença de cerâmicas e de restos arquitectónicos fora dos contextos arqueológicos tra-
dicionais, isto é, dos castros, já não espanta. Depois da descoberta de uma casa castreja em
terrenos agrícolas da freguesia da Facha (Almeida, 1990, p. 58-61), posteriormente reforçada
com um outro exemplo no lugar de Prazil da mesma freguesia (Almeida, 1990, p. 68-69),
o fenómeno deixou de ser uma raridade para se transformar numa certeza, já muito bem fun-
damentada. O arroteamento dos campos de meia encosta aconteceu nos primeiros tempos
da Romanização, sendo seus autores, agricultores indígenas que gradualmente abandonaram
o aconchego das muralhas dos castros para instalarem-se em terreno aberto (Almeida, 2003).
Estas descobertas, ocorridas na década de 80 do século passado, vieram a multiplicar-se na
década seguinte, ocorrendo sempre em espaços análogos aos acima descritos. Vestígios cas-
trejos deste tipo foram então descobertos em Boudilhão (Moreira de Lima) (Almeida, 1990,
p. 175), na Quinta de Santa Luzia da freguesia de Covas (Vila Nova de Cerveira) (Almeida,
2000, p. 26-28), no Paço de Vila Cova (Almeida, 1997, I, p. 195-196), na Casa do Adro de
Encourados (Almeida, 1997, II, p. 38-39), ambas no concelho de Barcelos, sem esquecer
outras latitudes, como é o caso da Agra do Relógio, freguesia de S. Paio de Antas e da Villa
Menendi (Apúlia) no concelho de Esposende (Almeida, 1998, p. 20, 26, 27), para não falar
em mais de uma dúzia de sítios de descoberta bem recente.
168
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 21 – Cerâmica comum romana: presença ou ausência de engobe.
Sem engobe: 66%
Engobe: 34%
Tal como aconteceu naqueles sítios e só citamos os mais divulgados, também aqui a
ocupação destas terras terá começado com uma família de lavradores indígenas oriunda de
um dos castros da região — os mais próximos são S. Cristovão em S. Julião de Freixo, Cas-
tro Seco em Vilar das Almas, Alto das Covas (Cadém) e Valadares em Calvelo (Almeida,
1997, I, p. 60-62).
Construíram uma casa à maneira tradicional — tal facto está comprovado na Quinta do
Paço da freguesia da Facha (Ponte de Lima) e na Quinta do Paço de Vila Cova (Barcelos) —
serviram-se dos vasos cerâmicos que fabricavam e conheciam da sua vivência quotidiana e
naturalmente que se aplicaram as mesmas técnicas e sementes que haviam utilizado quando
viviam no aglomerado populacional sediado no interior de um espaço amuralhado. A novi-
dade estava, precisamente, no facto do número de agricultores tender para o crescimento ace-
lerado e de, pela primeira vez, começar a assistir-se no futuro Entre-Douro-e-Minho a um
fenómeno que viria a tornar-se numa das suas principais bandeiras futuras: o princípio da
dispersão habitacional.
A instalação de um casal de agricultores indígenas neste sítio tinha todas as garantias
de uma compensação económica imediata e de um sucesso futuro garantido. As terras esco-
lhidas situavam-se numa zona de várzea com bons solos agrícolas, bem drenados por força
de um pendor natural que canalizava para a linha de água, que corria a Sul e todas as escor-
rências que brotavam das nascentes localizadas nas imediações do actual lugar de Santa Mari-
nha e nos períodos de invernia, as águas provenientes das chuvas. A curta distância ficava a
floresta com os seus carvalhos, sobreiros e talvez castanheiros. Mais para a encosta ficava o
domínio do pastoreio e das lenhas arbustivas, isto é, do saltus. Com tais condições, o mais natural é que a exploração agrária daquela família indígena
tivesse sucesso e desse origem a um domínio maior, algo como um casal ou uma quinta,
muito dificilmente uma villa, caso aqui o termo seja aplicado no sentido clássico do termo.
5.2. A ocupação romana
A ocupação romana está aqui representada através de alguns muros e de cerâmicas. No
Campo de Rebordelo há somente um muro, de boa qualidade técnica e com uma cronologia
que ronda o Alto Império. No vizinho Campo da Fonte são dois os muros, mais a vala de um
terceiro, que permitem ajuizar, em conjunto, a presença de uma construção que tinha, pelo
menos, dois compartimentos. A função não foi certamente a mesma, tão pouco a cronolo-
gia. A pequenez do espaço escavado no Campo de Rebordelo não favorece grandes inter-
pretações sobre a funcionalidade do muro. A maneira como foi construído, associada à cerâ-
mica, permite supor que estamos perante parte de um edifício que servia de morada a uma
família de agricultores já Romanizados, muito naturalmente os sucessores dos primeiros cas-
trejos que haviam-se instalado naquele ponto. Em favor desta hipótese está, sobretudo, o facto
da ocupação romana ter-se sobreposto ao primitivo espaço habitacional castrejo e de, no
Campo da Fonte, os vestígios serem de natureza bem diferente.
Em abono de uma cronologia em tomo do Alto Império estão, sobretudo, as cerâmicas
recolhidas na Vala 1 e 2. Entre elas destacamos alguns fragmentos de terra sigillata hispânica
das formas Drag. 15/17 e 37, dois pequenos fragmentos de vidro verde musgo e verde claro com
tonalidades amareladas e uma boa dose de fragmentos de bilhas, oinokoés, potes e pratos
cobertos com aguadas e engobes de coloração castanho avermelhado, bem como restos de tijo-
leira, de tegulae e de imbrex. O lote ficará completo com a junção de alguns fragmentos de cerâ-
mica bracarense, a par de outras cuja pasta, bem depurada e, tem uma coloração beije.
169
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
Tendo presente a tipologia, as características e diversidade das cerâmicas romanas, não
custa sustentar que aquele muro faz parte da casa de um fundus — a dimensão do espaço
agrário disponível, sugere uma propriedade de média dimensão, algo como uma quinta da
actualidade — que foi levantada sobre os alicerces de uma velha casa castreja construindo-
-se uma nova casa de habitação, mais ampla, mais funcional e naturalmente adaptada a gos-
tos que já então imperavam: uma casa à maneira romana. Nessa direcção apontam as cerâ-
micas e de um modo muito especial, os muitos bocados de tijoleira de pavimento que encon-
tramos nas camadas estratigrafadas.
Se todas as estruturas, das habitacionais (pars urbana) à componente agrícola (pars fruc-tuaria) desta quinta do Alto-Império, se localizavam no espaço do Campo de Rebordelo, é
coisa que desconhecemos. O que com mais consistência se nos apresenta, é que no Campo
da Fonte há restos de uma estrutura que fazia parte da pars fructuaria de uma villa ou mesmo
de uma quinta. A parte escavada corresponde ao celeiro, que também podia ser adega (Figs.
10 e 11), enquanto as divisões, somente afloradas, podiam comportar outros serviços neces-
sariamente integrantes numa estrutura agrícola, como são os currais, as lojas para armaze-
namento de alfaias, de carros, lenhas e palhas para os animais.
O elemento mais característico e que na realidade define e confirma esta função, são as
covas subcirculares que foram propositadamente abertas no piso de saibro natural (Figs. 11
e 12) que foi expressamente cortado e aplanado. Foi nestas covas que foram assentes os fun-
dos dos dolia — numa das covas foram recolhidos fragmentos de dolium — que guardavam
líquido e cereais. Nos líquidos podemos suspeitar já da presença do vinho, sabido que é haver
nas proximidades, por exemplo no castro da Carmona em Balugães, lagares que funciona-
ram por aquela altura (Almeida, 1990, p. 131-146, 1997, p. 70). Os cereais, esses sempre fize-
ram parte da dieta alimentar das populações indígenas, antes e durante a Romanização. Aliás
se fizermos um, mesmo que breve levantamento de locais já escavados e onde se documen-
tam sinais de celeiros, diremos que todos eles repetem um esquema análogo: edifício com
muros em pedra e chão em terra calcada e aplanada onde foram cavados os buracos, sendo
a localização na proximidade da casa de habitação. Exemplos análogos a este podem ser colhi-
dos na Agra do Relógio, freguesia de S. Paio de Antas, concelho de Esposende e na Vila do
Paço de Vila Cova, concelho de Barcelos (Almeida, 1997, p. 178).
Que no Campo da Fonte estava localizada a pars fructuaria de uma estrutura agrária,
disso não temos dúvidas. O que não está tão alicerçada é a certeza que nas imediações esti-
vesse a estrutura da casa do dominus. É certo que foi por ali que apareceu um capitel de estilo
dório. Este, por sua vez, aponta para a existência de um espaço de circulação que comunica
com um impluvium ou, em hipótese bem mais comezinha, pertencer à colunata de um
pequeno pórtico ou do alpendre de uma casa.
Mais que uma villa, esta exploração agrária nunca terá passado de uma quinta ou her-
dade de média dimensão, caso queiramos ter presente a realidade estrutural das explorações
agrícolas de uma região, fortemente condicionada pelo clima e pela morfologia. Caso quei-
ramos ressuscitar conceitos bem mais actuais, então esta exploração terá balançado entre um
casal e uma quinta. Se a sua dimensão, mesmo em descontinuidade, não atingiu cifras pró-
ximas dos 50 hectares, estaremos então a falar dos restos de um celeiro que pertencia a um
casal. Acima desses valores já estaríamos a falar de quintas e se eles ultrapassassem os 250
hectares então a referência certa seria a villa (Alarcão, 1996; Martins, 1995, p. 73-114; Pérez
Losada, 1987, p. 79-110, 1996). No caso vertente e tendo presente o tipo de paisagem agrá-
ria, a dimensão do espaço que era passível de ser arroteado e agricolamente aproveitado, pode-
remos então deduzir que os vestígios agora descobertos, muito dificilmente serão de uma
villa, só com reservas poderão ser atribuídos a uma quinta, sendo seguramente de um casal.
170
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
Atente-se na dimensão do celeiro, na quantidade de grão e de vinho que poderiam ali ser
armazenados e uma boa parte das dúvidas ficarão, certamente, desfeitas.
A sua cronologia, tendo em atenção um numisma, bastante maltratado mas que um
exame pericial atribui, com garantia, a Constantino Magno e sobretudo à maneira de cons-
truir as paredes — a cerâmica romana além de escassa tem o predomínio dos dolia — aponta
mica com fuligem e que para mais tem as características das produções que no período pós-
romano se divulgaram pela região litoral do Minho: potes e panelas, de colo vertical, pança
rombóide, pasta arenosa e superfície alisada, quase sempre decorada com um vassourado de
linhas verticais pouco uniformes (Fig. 24, 1 e 2).
A maioria destas cerâmicas registam-se em torno do edifício do Campo da Fonte, mas
também não são estranhas nas valas de sondagem efectuadas no vizinho Campo de Rebor-
delo. Só que aqui, por estarem fora de um contexto estratigráfico seguro e não haver estru-
turas pétreas que possam ser atribuídas àquele período, o mais natural é provenham de escor-
rimentos.
Independentemente da dimensão das estruturas, uma coisa é certa. A construção aqui
erguida, na vigência da ocupação suevo-visigótica, era bastante mais fruste, longe da quali-
dade técnica posta na edificação das paredes romanas. Basta olhar para a maneira como as
pedras, muitas delas recuperadas, foram dispostas nas paredes para se perceber quão dis-
tantes estavam os pedreiros daquela altura da qualidade construtiva do período anterior.
A começar pela deficiente qualidade do barro aplicado nas paredes e no pouco cuidado posto
no piso, que deixou de ser de saibro bem argamassado, para ser somente terra calcada.
Exemplos idênticos fomos encontrá-los nas ocupações da Agra do Relógio (S. Paio de Antas),
no Forte de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira) e naturalmente na Quinta do Paço de Vila Cova
(Barcelos) (Almeida, 2000 e 1997, I).
No tocante às cerâmicas podemos afirmar que começa a ser vulgar a identificação deste
tipo de produção em estações desta região que apresentam cronologias ocupacionais seme-
lhantes. Elas estão presentes no Forte de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira), na Quinta do Paço
de Vila Cova (Barcelos), nos povoados do Alto da Telha (Arcozelo), Vilarinho-Seara e Sabu-
gueiro-Poiares, na villa suevo-visigótica da Quinta do Paço Velho da Facha (Ponte de Lima),
na Agra do Relógio em S. Paio de Antas e mais recentemente no Campo do Pereiro da vila
de Forjães, freguesias que fazem parte do concelho de Esposende.
Todos estes sítios registam topónimos cuja origem é indiscutivelmente germana e
quando evoluírem as investigações no sentido de melhor precisar uma relação entre a topo-
nímia e a arqueologia, algumas surpresas bem interessantes irão surgir. Se muitos destes
topónimos são efectivamente do período das invasões germanas e não da Reconquista como
se pretendeu fazer crer, em certo tipo de investigação, então estaremos bem mais próximos
de traçar um quadro, mais completo, da fixação de povos germanos por alturas do século V
e VI d.C. Um quadro rural, para sermos mais precisos, porque não restam dúvidas que, salvo
raras excepções, estes topónimos acompanham os melhores solos agrícolas da região. Parece-
nos que os invasores germanos, quando resolveram acomodar-se ao campo, sabiam perfei-
tamente o que faziam e o que escolhiam.
5.4. A ocupação medieval
Atendendo à estratigrafia e às cerâmicas medievais das camadas mais superficiais, esta
ocupação parece ter uma datação coincidente com a Baixa Idade Média. Directamente rela-
cionado com estas cerâmicas, está o alicerce do muro M1, que tem um difícil enquadramento
tipológico, se atendermos à exiguidade da área escavada.
Conjugando os dados da arqueologia com a documentação medieval, é bem provável que
esta construção esteja relacionada com a herdade que as Inquirições de 1258 referem e que
pagava de fossadeira, pelo S. Miguel, dois dinheiros e uma galinha: “da erdade de Calvelo deDonas iiij. Dineiros. ltem, de Revordelo ij, dineiros e j. gallina”(PMH,Inq.).
172
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
6. Catálogo
Terra sigillata hispânica
Drag. 27 Pasta calcítica, de coloração vermelho clara. Engobe de cor laranja mate, espesso. Ade-
rente e pouco brilhante. SLM97 A3.
Drag. 37 Fragmento de pança decorada com círculos separados por motivos verticais. Pasta ver-
melho clara, relativamente fina e homogénea. Engobe vermelho alaranjado, espesso,
aderente e com brilho. SLM97 A3 (Fig.23, 5).
173
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 23 – Materiais cerâmicos: desenhos.
Cerâmica comum romana e de tradição romana
PratoBase discoidal, corpo troncocónico a rematar num bordo adelgaçado, boleado e inclinado
para o interior. Pasta castanho clara, com muitas partículas de mica. Engobe castanho
avermelhado que realça as partículas de mica. SLM97 A2.
Cerâmica bracarenseForma indeterminada. Pasta beije rosada, depurada. Vestígios de engobe castanho-ala-
ranjado nas estrias de uma decoração a guilhoché. SLM97 A3 (Fig. 23, 4).
Cerâmica pintadaPasta beije, depurada, com grãos de mica muito finos. Superfície exterior pintada com
linhas oblíquas de cor castanho avermelhado. SLM97 A3 (Fig. 23, 3).
PratoFundo plano. Pasta rósea, depurada, finos grãos de mica. Engobe castanho avermelhado,
espesso, aderente, sem esconder as finas partículas de mica. SLM97A3.
Paredes FinasPasta beije, depurada (Fig. 23, 1).
PratoBordo arredondado, convexo, inclinado para o interior. Pasta avermelhada, pouco homo-
génea e calibrada com finas partículas de mica. Engobe de coloração castanho claro.
SLM97 A3.
PanelaBordo soerguido, inclinado para o exterior. Lábio facetado e marcado exteriormente com
um leve canelura. Ombros arredondados. Pasta amarelo clara e cerne acinzentado, com
grãos de areia e paletas de mica como desengordurante. Superfície alisada, vestígios de
fuligem na parte exterior. SLM97, A3, 35 (Fig. 24, 3).
PanelaBordo soerguido, inclinado para o exterior. Lábio boleado. Ombros arredondados. Pasta
amarelada, com grãos de areia e paletas de mica como desengordurante. Superfície ali-
sada, vestígios de fuligem na parte exterior. SLM97, A3.
PoteColo de paredes côncavas e convergentes. Bordo curto, arredondado. Pasta castanho-
-escura, com grãos de areia e mica. Superfícies escurecidas e sinais de fuligem. SLM97,
A3, 127 e 209 (Fig. 24, 2).
CântaroParede oblíqua e fundo plano. Pasta amarelada, com finos grãos de mica e grãos de
quartzo de médio calibre. SML97, A3, 260 (Fig. 24, 4).
174
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
175
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
FIG. 24 – Materiais cerâmicos: desenhos.
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ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 25 – Materiais cerâmicos: desenhos.
OinokoéParte de um gargalo, fragmentado em duas metades. Pasta amarelada, com grãos de
mica e finos grãos de quartzo. Superfícies com indícios de aguada acastanhada. SLM97,
A3, 46 e 231.
PotinhoBordo boleado, virado para o exterior onde há sinal do arranque de uma asa. Pasta
rósea, homogénea, com partículas de cerâmica moída. Superfícies com engobe de colo-
ração castanho clara. SLM97, A3, 172.
TaçaBordo engrossado para o exterior. Parede arqueada. Pasta beije, homogénea, com finos
grãos de mica. Superfícies cobertas de um engobe castanho claro. SLM97, A3, 174 (Fig.
25, 4).
CopoColo e pança. Pasta castanho clara, depurada, com grãos, muito finos, de mica. Super-
fície exterior alisada. SLM97, A3 (Fig. 23, 6).
BilhaColo apertado, remate em bordo boleado virado para o exterior. Pasta castanho clara,
depurada e homogénea. Engobe castanho-escuro, aderente e espesso. SLM97, A3
(Fig. 23, 2).
TigelaCarena na passagem para a pança. Pasta rósea, com muitas partículas de mica. Super-
fícies cobertas com um engobe castanho avermelhado, com partículas de mica, muito
finas, a sobressaírem. SLM97, A4 (Fig. 24, 5).
Asa em fita com botão de prensãoProvavelmente de jarro. Pasta amarelo clara, com partículas finas de mica e pequenos
grãos de quartzo como desengordurante. Superfície com restos de aguada castanho
claro. SLM97, A3, 265.
Asa BilobadaPasta beije, fina, cerne cinza clara, com finos fragmentos de cerâmica moída. SLM97,
A3, 62.
Asa em roloPasta cinza clara, com grãos de quartzo e finas partículas de mica. Sinais de fuligem e
de queimado na ligação à parede interna do vaso. SLM97, A3, 113.
Asa BilobadaPasta castanho avermelhada, homogéneo e finos grãos de mica. SLM97, A3, 6.
Asa em fitaCom fundas caneluras. Pasta castanho avermelhada com finos grãos de mica. Superfí-
cie coberta por uma aguada de cor vermelha. SLM97, A2, 32.
177
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
TestoParedes convergentes a rematar em pega marcado superiormente com o corte de corda.
Pasta castanho amarelada, homogénea, corri grãos de quartzo e mica. SLM97, A3, 214.
PatelaForma subcircular feita a partir de um fragmento de tegula. Pasta amarelada, com cerâ-
mica moída como desengordurante. SLM97, A3, 100.
TegulaPasta amarelada, com cerâmica moída como desengordurante. SLM97, A3.
Peso de tearForma sub-circular com extremidades arredondas. Buraco circular. SLM97, A3.
Forma indeterminadaFundo plano. Pasta cinzenta, não muito cuidada, com partículas de mica. Interior marcado
por um ressalto e pelas estrias da roda. Superfície interior cinzenta e a exterior amarelo
clara com marcas de queimado na face exterior do fundo. SLM97, A3, 26 (Fig. 25, 1).
Forma indeterminadaFundo plano. Pasta rósea e cerne cinza claro com partículas de mica e grãos de quartzo
de médio calibre. Superfície exterior escurecida e com restos de fuligem. Vestígios de
comida agarrada na face interna, muito estriada. SLM97, A3, 186 (Fig. 25, 2).
Forma indeterminadaFundo plano. Pasta castanho acinzentada com finas partículas de mica e alguns grãos
de quartzo de médio calibre. Parede exterior sumariamente alisada a realçar a coloração
castanho avermelhada. SLM97, A3, 253 (Fig. 25, 3).
Forma indeterminadaFundo com inclinação côncava. Pasta castanho avermelhado e cerne cinza claro com
grãos de quartzo e mica como desengordurante. Superfícies amarelo sujo, à excepção
do exterior do fundo com uma forte tonalidade cinza por causa da acção do fogo. Face
interior muito marcada pelas estrias da roda de oleiro e por uma reentrância na ligação
da parede com o fundo. Sinais de fuligem na face exterior do fundo e restos de comida
no interior do mesmo. SLM97, A3, 185.
Forma indeterminadaFundo plano. Pasta escura com muitos grãos de quartzo e grãos de mica. Face exterior
castanho avermelhada, com sinais de fuligem na face exterior e muito queimada e
escurecida a interior. SLM97, A2, 44.
Forma indeterminadaFundo plano, com leve ressalto exterior. Pasta amarelada, com grãos de quartzo e finas
partículas de mica. Superfícies com tonalidades mais avermelhadas e grandes manchas
de fuligem na face exterior. SLM97, A3, 207.
178
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
Forma indeterminadaArranque de asa bilobada. Pasta cinzenta, cuidada, finos grãos de mica. Superfície cin-
zenta, mais escura que o cerne. SLM97, A3, 80.
PanelaPasta acastanhada com bastante areia. Superfícies queimadas. Decoração em linhas ver-
ticais não uniformes. Visigótica. SLM97, A3 (Fig. 24, 1).
Cerâmica medieval
AlguidarParede arqueada a rematar em bordo bem torneado cortado exteriormente quase na ver-
tical. Parede exterior marcada por uma canelura e dois tipos de decoração distintos: sulco
em meandro entre o bordo e a canelura e incisões subcirculares, oblíquas e paralelas.
Pasta castanho-acinzentada, arenosa. Superfícies enegrecidas e queimadas. SLM97,
A2, 63.
Forma indeterminadaFragmento de bojo com cordão decorado com dedadas. Pasta acastanhada com bastan-
tes grãos de mica e de quartzo. Superfícies acinzentadas. SLM97, A, Cov 1.
Forma indeterminadaFragmento de bojo decorado com um sulco profundo em meandro e um conjunto de
dedadas. Pasta castanha, arenosa. Superfícies cinzentas. SLM97, A2, Cov 1.
Vidros e ferros
VidroFragmento de fundo de taça. Coloração verde-clara com tonalidades amareladas. Bolhas
de ar. SLM97 A4.
Escória de ferroSLM97B COV9.
Escória de ferroSLM97 A3.
PregoFerro. Adiantado estado de desagregação. SLM97 A3.
PregoFerro. Adiantado estado de desagregação. SLM97B5.
179
UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)
Vale Sá: primeiros vestígios da ocupaçãohumana do Epipaleolítico na zona de Coimbra
❚ NELSON ALMEIDA ❚ VÍTOR DIAS ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚ PEDRO SOUTO ❚
No seguimento do acompanhamento
arqueológico dos trabalhos de instalação do
gasoduto nacional, detectou-se numa pri-
meira prospecção, uma estação que forneceu
algum material lítico, ao km 0+300 do ramal
industrial de Souselas, perto de Coimbra
(Fig. 1).
Depois de detectada esta ocupação de
Vale Sá, foi necessário proceder à realização
de uma sondagem dentro da área de serven-
tia administrativa da pista, na zona onde esta
passava mais perto da estação arqueológica.
Optámos por apenas abrir uma área de 1 m2
que denominámos S1 (Fig. 1).
Esta sondagem tinha por objectivo a caracterização estratigráfica da zona, com o intu-
ito de se procederem a trabalhos posteriores. Foi-nos assim possível encontrar o terraço de
areão alaranjado onde se desenvolveu uma ocupação humana num período que considera-
mos, a priori, atribuível ao Paleolítico superior e determinar a profundidade a que esta ocu-
pação se encontrava. Quanto ao material arqueológico exumado caracterizou-se pela escas-
181
VALE SÁ: PRIMEIROS VESTÍGIOS DA OCUPAÇÃO HUMANA DO EPIPALEOLÍTICO NA ZONA DE COIMBRA
RESUMO Perto de Coimbra, em Vale Sá (Souselas)
foi detectada uma ocupação humana pertencente
a uma época da pré-história antiga pouco
conhecida em Portugal. As sondagens realizadas
no eixo da vala de implantação
do gasoduto permitiram confirmar que a zona
central da estação se encontrava fora da pista
do gasoduto. A intervenção realizada no eixo
do traçado revelou a presença de materiais
arqueológicos em posição secundária (indústria
lítica e seixos apresentando indícios de alteração
térmica). Uma posterior intervenção na área,
realizada por Miguel Almeida e Thierry Aubry,
permitiu identificar uma estrutura de combustão
e datá-la do Epipaleolítico. A localização da estação
de Vale Sá exemplifica um daqueles momentos
em que todo o esforço dispendido
em longos quilómetros de prospecção infrutífera
é recompensado.
ABSTRACT A human occupation dating from
early prehistory was identified at Vale Sá
(Souselas), near Coimbra; this period is not
very well known in Portugal. The sondages
of the pipeline lot seemed to confirm that the
central area of the site was located away from
the projected pipeline ditch. Archaeological
materials (lithic artifacts and pebbles showing
signs of heat exposure) were found in secondary
position. Further work by Miguel Almeida
and Thierry Aubry at the site led to the
identification of a hearth, dating from the
Epipalaeolithic. Locating the Vale Sá site was
a rewarding moment, a compensation for the
many miles of fruitless survey!
FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 235,
Esc.1:25 000.
sez de peças encontradas, sobressaindo desde logo a possibilidade de nos encontrarmos
numa zona já afastada do local de ocupação inicial. Este material arqueológico estaria, pos-
sivelmente, em posição secundária.
Além desta primeira sondagem, realizamos uma segunda no interior da pista, na área
onde os trabalhos de colocação do tubo iriam atingir maior profundidade (Fig. 3). A reali-
zação desta segunda sondagem assentava na necessidade de definir se a área de expansão
da estação se prolongava até à pista. O conhecimento da estratigrafia da zona, conseguido
na sondagem S1, permitiu-nos iniciar os trabalhos com uma decapagem mecânica que leva-
mos até cerca de 70 cm de profundidade, numa área de cerca de 3 x 2 m. Após este traba-
lho concluído implantamos uma quadrícula de 3 x 1 m coincidindo, no sentido do compri-
mento, com a área de passagem da conduta. Prosseguimos com a escavação manual da son-
dagem, recorrendo para isso à remoção de níveis artificiais de 10 cm.
Tal como já tínhamos confirmado na sondagem
S1, a maior concentração de material arqueológico
apareceu no topo do estrato de areão alaranjado. No
entanto, a área desta primeira sondagem não nos
permitiu tirar conclusões sobre a distribuição dos
materiais arqueológicos, lacuna que pretendíamos
182
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 2 – Localização das sondagens realizadas em relação ao traçado do gasoduto.
FIG. 3 – Aspecto da sondagem 2 após a remoção
da camada C.
FIG. 4 – Vista geral do corte sul da sondagem 2.
resolver com a abertura desta sondagem. A sondagem S2 apesar dos seus três metros qua-
drados de área sempre nos permitiu retirar maior informação. O material arqueológico
define-se de forma dispersa seguindo, no entanto, a orientação de possíveis linhas de água
que terão contribuído para essa dispersão e que apareceram na forma de ténues sulcos, à
superfície do terraço (Fig. 4)
A sondagem S2 confirmou assim a posição secundária do material arqueológico, facto
já indicado por uma primeira observação do material lítico realizada pelo Doutor Thierry
Aubry, através de estado de erosão desse material.
Materiais
O material exumado divide-se em seixos com vestígios de alterações térmicas por
combustão e materiais líticos de pedra lascada (artefactos, resto de talhe). Foram encon-
tradas cerca de duas dezenas de peças. A matéria-prima utilizada é heterogénea assentando,
no entanto, principalmente em sílex. Durante as sondagens apareceram materiais de
quartzo, quartzito e de vários tipos de sílex (Figs. 5 e 6).
Pelas características do material exumado, optamos por atribuir cronologicamente esta
ocupação ao Paleolítico superior (possivelmente ao período Gravettense). Esta atribuição foi
colocada com muitas reservas tendo em conta a parca quantidade de material exumado.
Corte estratigráfico
A sondagem 2 possibilitou-nos a definição do corte estratigráfico da zona em estudo
(Fig. 4). A escavação realizou-se já dentro de um caminho público. O material utilizado para
construir este caminho corresponde à primeira camada arqueológica (camada A). Esta é cons-
tituída por um sedimento arenoso de cor alaranjada com variações laterais de cor. Na son-
dagem n.0 1 esta camada era substituída por uma camada de terra vegetal com grande con-
centração de matéria orgânica. A camada seguinte (camada B) apresenta uma cor castanha
muito escura, quase preta, sendo formada por um sedimento argiloso de granulometria
fina. Este sedimento dá lugar a outro argilo-arenoso de cor mesclada cinzenta alaranjada
183
VALE SÁ: PRIMEIROS VESTÍGIOS DA OCUPAÇÃO HUMANA DO EPIPALEOLÍTICO NA ZONA DE COIMBRA
FIG. 5 – Núcleo em Sílex. FIG. 6 – Matéria-prima predominante na estação de Vale Sá:Núcleo em sílex (canto superior esquerdo), lascas em sílex
e lasca em quartzo leitoso (canto inferior direito).
(camada C). A maior concentração de materiais apareceu nesta camada (Fig. 7). O último
estrato por nós detectado apresentou poucos materiais arqueológicos. O sedimento de tran-
sição argilo-arenoso perde a sua componente plástica e argilosa mais fina, dando lugar a um
sedimento mais arenoso e alaranjado (camada D). Este último estrato deverá corresponder
a um antigo terraço.
Após a nossa intervenção esta estação foi escavada ao abrigo de um Plano Nacional de
Trabalhos Arqueológicos. As sondagens realizadas permitiram definir uma estrutura de
combustão. Através desta estrutura de combustão foi possível datar esta ocupação. As data-
ções conseguidas vieram a revelar que a associação cronológica que havíamos atribuído com
algumas reservas se revelou errónea, sendo possível definir um horizonte Epipaleolítico
para esta ocupação. Os novos dados que este local proporcionou vieram dar alguma luz
sobre um período da nossa História praticamente desconhecido, tanto nesta região como no
restante território nacional, contribuindo para um melhor conhecimento da cultura material
e do modelo de habitat, destes homens que viveram no período de transição entre o Paleolí-
tico e o Neolítico.
184
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 7 – Vestígios arqueológicos detectados no topo da camada D.
Sondagens arqueológicas de diagnóstico em Terlamonte
❚ NELSON ALMEIDA ❚ VÍTOR DIAS ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚ PEDRO SOUTO ❚
Durante os trabalhos de prospecção do
traçado correspondente ao lote 5 (Portale-
gre/Guarda) detectámos, dentro dos limites
da pista, alguns fragmentos de cerâmica de
construção romana. Como estes fragmentos
cerâmicos além de escassos estavam erodi-
dos, decidimos prospectar a encosta envol-
vente, fora da área da de passagem do gaso-
duto. Esta prospecção da área envolvente
levou-nos a confirmar a presença de vestígios
romanos a cerca de 250 m do limite da pista,
num local conhecido por Terlamonte (Fig. 1).
Uma vez que o traçado do lote 5 inter-
secta esta zona potencialmente favorável à
ocorrência de vestígios arqueológicos, decidimos proceder à realização de sondagens pre-
ventivas no eixo da pista, no local onde esta última passa mais perto da estação romana.
O número de sondagens realizadas foi de nove, distribuídas ao longo do eixo da pista
(Fig. 2), com um intervalo regular de 50 m. Apenas as sondagens S2 (a 40 m da S1) e S9
(a 25 m da S2) não respeitaram este espaçamento. Optamos por implantar sondagens de um
metro quadrado como área para as sondagens arqueológicas, uma vez que em muitos sítios
da zona o afloramento granítico se encontra à superfície, indiciando uma potência de solos
diminuta. Para a realização desta intervenção fomos auxiliados pelo arqueólogo Vítor Dias
e Pedro Souto, que constituem a segunda equipa da Transgás, naquela altura a acompanhar
o Lote 6 (Fig. 3).
185
SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS DE DIAGNÓSTICO EM TERLAMONTE
RESUMO O acompanhamento de grandes obras
não tem só por finalidade a localização de sítios
arqueológicos. Outra faceta de qualquer trabalho
de acompanhamento corresponde à minimização
de situações de risco potencial para o
património. Neste artigo apresentamos uma
destas situações, onde a intervenção arqueológica
não levou à detecção de vestígios mas veio
garantir a sua ausência. Desta forma ficou
patente que o traçado do gasoduto, nesta zona,
não punha em perigo qualquer sítio
arqueológico, sendo possível prosseguir com
os trabalhos.
ABSTRACT The follow-up of major public works
by archaeologists does not only aim at the
identification of archaeological sites.
The mitigation of possible damage to cultural
heritage is another purpose of any follow-up
mission. In the case presented in this paper,
archaeological field work hasn’t revealed any
remains, but confirmed their absence, thus
proving that the construction of a pipeline
in this area was not a threat to archaeological
sites, and allowing the works to be carried on.
FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 235,
Esc. 1:25 000.
186
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 2 – Localização das sondagens no traçado do gasoduto.
FIG. 3 – Aspecto dos trabalhos de escavação.
As sondagens realizadas nesta área revelaram uma potência estratigráfica variando
entre os 65 cm de profundidade na S7 e os 0-5 cm nas sondagens S5 e S6, onde o afloramento
rochoso se encontrava praticamente à superfície (Figs. 4 e 5). Todas as sondagens foram con-
cluídas com a chegada à rocha granítica de base. Apenas na sondagem S3 o afloramento não
foi atingido, uma vez que esta sondagem veio a revelar a presença de uma linha de água fós-
sil, verificando-se uma acumulação de sedimentos muito superior ao registado nas restan-
187
SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS DE DIAGNÓSTICO EM TERLAMONTE
FIG. 5 – Vista geral da sondagem n.0 2. Nesta sondagem, como nas sondagens n0s 3 e 7, a potência estratigráfica era maior, não
aparecendo, no entanto, qualquer tipo de estrutura.
FIG. 4 – Vista geral da sondagem n.0 1, onde se pode verificar que o afloramento granítico se encontra quase à superfície.
tes áreas. Terminou-se esta sondagem quando se chegou à camada 4, constituída por um
areão grosseiro estéril em materiais arqueológicos (Fig. 6). O espólio arqueológico recolhido
no conjunto das 9 sondagens reduziu-se à presença de dois fragmentos de cerâmica erodi-
dos na S3 e um fragmento na S 1. Não foram detectados quaisquer vestígios de estruturas.
Os trabalhos de prospecção, que alargámos a uma extensa área em redor da pista, per-
mitiram-nos detectar a presença de estruturas romanas e o seu padrão de distribuição.
Encontramo-nos perante uma ocupação descontínua de pequenos focos separados entre si
por áreas onde não existem vestígios romanos.
Os resultados destas sondagens confirmaram o que anteriormente se previa, devido à
não detecção de qualquer tipo de estrutura nem concentrações de material arqueológico que
poderiam indicar a sua presença, em locais contíguos às sondagens.
Esta situação exemplifica outra faceta destes trabalhos de acompanhamento, não só diri-
gido para a localização de sítios arqueológicos mas também para a minimização de situações
de risco potencial para o património. Desta forma ficou patente que o traçado do gasoduto
nesta zona não punha em perigo qualquer sítio arqueológico, sendo possível prosseguir
com os trabalhos. A posterior abertura da vala veio abonar, mais uma vez, os resultados das
sondagens.
188
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 6 – Corte estratigráfico da Sondagem n.0 3. Camada 1: Sedimento de cor castanha clara, com alguma matéria orgânica;
Camada 2: Sedimento semelhante ao da camada 1 mas mais argiloso e com menos matéria orgânica; Camada 3: Sedimento
argiloso de cor castanho acinzentado, dentro do qual aparecem depósitos lenticulares de areão grosseiro; Camada 4:
Sedimento argiloso com grande quantidade de areão.
Vale Pincel 2: história de uma incursão acidental
❚ NELSON ALMEIDA ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚
A intervenção realizada no sítio Vale
Pincel 2 (Fig. 1) deveu-se ao acompanha-
mento das obras a cargo da Transgás Atlân-
tico, empresa que estava a construir o ter-
minal de gás natural e respectivos depósitos
de armazenamento, no Porto de Sines. A
construção deste terminal interferiu com a
esteira de transporte de carvão que abastecia
a central de produção de energia eléctrica
situada nesta zona. Tornou-se imprescindí-
vel, para a continuação das obras de cons-
trução do terminal de gás natural, a alteração
do traçado da esteira de transporte. A equipa
de arqueologia da Transgás foi contactada
para proceder à prospecção e acompanhamento das obras de construção da esteira em Março
de 2000. Iniciamos os trabalhos com a obra já a decorrer.
O traçado alternativo da esteira atravessava uma área de eucaliptal e foi por nós pros-
pectados, por razões que nos foram alheias, já numa fase dos trabalhos em que se procedia
à desmatação de toda esta área. Desta prospecção foi possível verificar que numa das áreas
do traçado existia abundante material cerâmico (Fig. 2) e algum material lítico. A área de dis-
persão de material abarcava cerca de 5 hectares, ultrapassando em muito a área do corredor
previsto para a construção da esteira e o próprio eucaliptal, por onde esta última passava.
189
VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL
RESUMO Nem sempre os trabalhos arqueológicos
são pensados com a antecedência necessária,
sendo necessário aos arqueólogos trabalhar
em situações limite. A intervenção realizada no
sítio Vale Pincel 2 é uma dessas situações.
Foi necessário conseguir um diagnóstico urgente
da realidade arqueológica, conciliar as opiniões
de todas as entidades intervenientes e,
fundamentalmente, tomar as medidas
de minimização necessárias para que o
património arqueológico não fosse prejudicado
neste processo. Este episódio teve como epílogo
positivo o facto de centrar as atenções num local
de grande importância arqueológica, que se
encontrava algo esquecido.
ABSTRACT Archaeologists are not always granted
enough time, and often have to work under very
difficult conditions. The field work at the Vale
Pincel 2 site was one of those situations.
An urgent archaeological diagnosis was required;
the views of all the organizations and institutions
involved had to be taken into account and, above
all, the adequate mitigation measures had to
be taken, in order to ensure the preservation
of the archaeological heritage. This episode’s
positive epilogue was the fact that it called
attention to a relevant archaeological site that
had been somewhat forgotten.
FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 526,
Esc. 1:25 000.
190
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 2 – Materiais cerâmicos mais representativos recolhidos durante a prospecção de superfície: 1-11 – Taças; 9 e 4 – Potes;
5 e 12 – Taças carenadas.
FIG. 3 – Movente e dormente de moinho manual encontrados na área preservada da estação arqueológica.
Na área que não tinha sido afectada pelo plantio de eucaliptos foi possível verificar a presença
abundante de materiais arqueológicos, nos quais se incluíam um grande número de dor-
mentes e moventes de mós manuais (Fig. 3). Tendo em conta os resultados da prospecção de
superfície mandámos parar imediatamente as obras na área da estação arqueológica.
De forma a ter uma melhor compreensão da realidade arqueológica com a qual estáva-
mos a lidar optou-se por fazer uma sondagem de diagnóstico, logo no dia seguinte, no cen-
tro do traçado previsto para a passagem da esteira de transporte.
Esta sondagem permitiu-nos definir três camadas arqueológicas distintas nesta área (Fig.
4). A diferença entre a camada 1 e a camada 2 assenta apenas na quantidade de matéria orgâ-
nica existente na primeira, uma vez que o tipo de sedimento que as constituiu é o mesmo.
O material arqueológico encontrava-se distribuído indiscriminadamente desde a superfície
da sondagem notando-se no entanto, uma maior concentração na base da camada 2 (Fig. 5).
A camada 3 apresenta-se já estéril em materiais arqueológicos. Posteriormente, verificou-se
que esta estratigrafia se repetia em todos os cortes analisados variando, todavia, em termos
de espessura das camadas e de tonalidade dos sedimentos.
Os dados recolhidos nesta sondagem, conjugados com os resultados da prospecção, leva-
ram-nos a contactar o Instituto Português de Arqueologia. A consulta da base de dados deste
191
VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL
FIG. 4 – Corte estratigráfico da Sondagem n.0 1. Camada 1: Terra vegetal arenosa de cor cinzenta clara contendo materiais
arqueológicos (cerâmica); Camada 2: Terra arenosa de cor cinzenta acastanhada com concentração de materiais
arqueológicos (Indústria lítica e cerâmica); Camada 3: Terra arenosa de cor cinzenta clara estéril em termos arqueológicos.
Instituto permitiu-nos verificar que este local já tinha sido referenciado. Ficamos a saber que
se tratava do povoado neolítico de Vale Pincel 2, localizado pela equipa do Museu de Arqueo-
logia e Etnografia de Setúbal (Ferreira, Tavares da Silva, Lourenço e Sousa, 1993). Na posse
destes dados optou-se por marcar uma reunião com os responsáveis da Transgás Atlântico:
Eng. Stephan Huisman e Eng. João Torneiro, do Instituto Português de Arqueologia:
Dr. António Faustino e com o Dr. Carlos Tavares da Silva e Dra. Joaquina Soares do Museu
de Arqueologia e Etnografia de Setúbal, responsáveis científicos pela estação. Como resultado
desta reunião chegou-se as seguintes conclusões:
1. A área afectada pela obra de construção da esteira de transporte correspondia a uma área
densamente ocupada por eucalipto.
2. O plantio deste eucaliptal teria sido precedido de uma preparação do terreno, recorrendo
a uma lavra profunda (cerca de um metro).
3. O estrato arqueológico, segundo o Dr. Carlos Tavares da Silva e Dra. Joaquina Soares, e
como se pôde comprovar na sondagem por nós realizada, estaria situado entre os cin-
quenta e sessenta centímetros de profundidade.
4. Como conclusão lógica dos pontos anteriores, o estrato arqueológico, na área ocupada
por eucaliptos, teria sido irremediavelmente afectado, perdendo-se o seu valor científico.
Ficou definido que se procederia ao acompanhamento do arranque das raízes dos euca-
liptos de forma a verificar se ainda existia alguma área conservada.
Durante este acompanhamento não foi localizada nenhuma área conservada, o que é
perfeitamente perceptível não só pelas lavras realizadas para o plantio, como pela densidade
e distribuição das raízes dos eucaliptos que inviabilizam a preservação de qualquer estrato
192
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 5 – Materiais cerâmicos mais representativos recolhidos na camada 2 da sondagem n.0 1: 1-7 – Potes; 3, 4 e 8 – taças; 9 –
Fragmento de bojo com decoração.
arqueológico (Fig. 6). De forma a verificar este facto, em cada zona de arranque de raízes, pro-
cedeu-se à realização de uma limpeza de corte. O acompanhamento arqueológico ficou con-
cluído com o desenho e fotografia dos seis cortes resultantes deste trabalho. O Museu de
Arqueologia e Etnografia de Setúbal, na pessoa da Dra. Joaquina Soares, procedeu também
ao levantamento fotográfico e gráfico destes cortes.
O processo realizado em Vale Pincel 2, teve um início atribulado, visto não ter sido feito
todo o trabalho de preparação que antecede o início de qualquer obra. Em consequência deste
facto, o acompanhamento iniciou-se com os trabalhos já avançados, sendo a equipa de
arqueologia confrontada com o problema da obra interceptar uma estação arqueológica
importante, facto que é de lamentar. Nesta situação, a equipa de arqueologia serviu de elo de
ligação com os arqueólogos que trabalham na zona. Durante os contactos realizados com
estes investigadores foi necessário conciliar pontos de vista algumas vezes discordantes.
Porém, todo este trabalho permitiu confirmar que não existiu perigo para o património
arqueológico inerente aos trabalhos da Transgás Atlântico. Por outro lado, permitiu alertar a
consciência dos investigadores na área para a necessidade de se procederem a trabalhos
arqueológicos, na parte conservada desta estação, de indubitável importância para a com-
preensão do fenómeno neolítico quer a nível regional quer no âmbito nacional. Esta neces-
sidade foi percebida e levou à elaboração de uma candidatura do local ao Plano Nacional de
Trabalhos Arqueológicos.
BIBLIOGRAFIA
FERREIRA, C. J.; TAVARES da SILVA, C.; LOURENÇO, F. S.; SOUSA, P. (1993) - O património arqueológico do Distrito de
Setúbal. Subsídios para uma Carta Arqueológica. Setúbal: Associação de Municípios do Distrito de Setúbal.
193
VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL
FIG. 6 – Aspecto dos cortes após o arranque das raízes dos eucaliptos e respectiva limpeza.
Resultados das sondagens arqueológicas realizadas na Herdade de Monte Novo do Sul(Alcácer do Sal)
❚ VÍTOR DIAS ❚ PEDRO SOUTO ❚
Introdução
As sondagens arqueológicas realizadas na Herdade de Monte Novo do Sul enquadram-
se no âmbito do protocolo estabelecido entre o IPA e a TRANSGÁS S. A., no sentido de pro-
mover a salvaguarda dos sítios arqueológicos já conhecidos, bem como, dos sítios eventual-
mente detectados durante a construção do gasoduto nacional e referem-se a trabalhos reali-
zados no ano de 2002, durante o acompanhamento arqueológico do Gasoduto Setúbal/Sines.
O trabalho desenvolvido surge na sequência de prospecções realizadas ainda antes da
obra ter o seu início. Os vestígios cerâmicos que conseguimos visualizar encontravam-se pró-
ximo da zona de afectação originada pela anterior implantação do oleoduto, mais precisa-
mente no local seleccionado para a perfuração que permitiu a travessia do rio Sado1. Foi pos-
sível recolher à superfície, diversos fragmentos cerâmicos de fabrico manual, cujas caracte-
rísticas indiciavam uma cronologia próxima do Neolítico.
Ao constatarmos as potencialidades do local até então inédito na bibliografia científica,
apesar deste apresentar sinais evidentes de florestação, e de se localizar nas imediações da
195
RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)
RESUMO O presente artigo expõe os resultados
de sondagens arqueológicas concretizadas no ano
de 2002 em Monte Novo do Sul, na sequência
das obras do gasoduto Sines-Setúbal. Identificado
em prospecções realizadas antes do início dos
trabalhos de implantação da rede de gás, este sítio
foi alvo de intervenção arqueológica com o intuito
de avaliar o estado de conservação, confirmar
a cronologia e a natureza da ocupação humana.
Materializamos a localização e descrição da
estação arqueológica tal como, o respectivo
enquadramento histórico, abordando de seguida
a metodologia utilizada e os resultados da
intervenção. Os materiais recolhidos resumem-se
a artefactos líticos e fragmentos cerâmicos
com características técnicas e formais, cultural
e cronologicamente atribuídas ao Neolítico.
As consideráveis alterações pós-deposicionais
condicionaram a distinção e caracterização
tecnológica e morfológica, todavia, são evidentes
as semelhanças com os materiais encontrados
nos habitats de ar livre identificados nas
imediações de Comporta.
ABSTRACT This document shows the results of test
excavations in Monte Novo do Sul associated to the
construction of Sines-Setubal gas conduct during
2002. The survey work performed previously to
the gas conduct construction has early enabled to
identify Monte Novo do Sul as an archaeological
place. Therefore, this area was subject of an
archaeological intervention in order to evaluate the
area’s conservation state, and confirm the chronology
and nature of human occupation. This paper stars
to locate and define the archaeological area according
to its historical background, and then to describe the
methodology used and the results withdrawn from
the archaeological intervention. The pieces found
and collected were grouped in two main categories,
namely, lithic artefacts and ceramic fragments.
Both categories shared special features such as
technical, morphological, cultural and chronological
that could be associated to the Neolithic period.
Although several post-depositional disturbances have
prevented a proper technical and morphological
characterization, there is an evident resemblance
with the artefacts found in the vicinity of Comporta.
pista onde havia já sido implantada a vala do oleoduto, considerámos este sítio com elevado
potencial arqueológico.
O fácil contacto visual com a estação arqueológica de Abul, localizada na margem
oposta, a proximidade de Alcácer do Sal, da cidade de Tróia e dos vários habitats Neolíticos
de ar livre localizados por Carlos Tavares da Silva na região de Comporta2 reforçou a neces-
sidade de tomar medidas de minimização adequadas para o local.
Depois de exposta a situação à equipa de projecto da Transgás S. A. prontamente acor-
damos a necessidade de conciliar o desenvolvimento da obra, com este sítio de interesse
arqueológico considerável. Assim que tomámos conhecimento do cronograma das obras a
realizar no local, coordenámos sondagens arqueológicas com o objectivo de avaliar o estado
de conservação da estação, confirmar a cronologia e natureza da sua ocupação.
A intervenção arqueológica foi concretizada antes da abertura de pista do traçado, e con-
tou com a participação dos signatários e das arqueólogas Maria Adelaide Costa Pinto e Ana
Filipa Castro Rodrigues.
Localização e descrição da estação arqueológica
Localizado na margem esquerda do rio Sado3, o Monte Novo do Sul é um pequeno espo-
rão arenoso com visibilidade cartográfica significativa que se expande em direcção a esta
importante via de comunicação. Encontra-se a uma distância sensivelmente idêntica entre a
cidade romana de Tróia e o castelo de Alcácer do Sal, sendo possível visualizar com grande
196
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 1 – Enquadramento geográfico das sondagens arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul. Base cartográfica CMP à
escala 1/25.000, folhas 466, 467, 475, 476, I.G.E., 2.a edição, 1978. Projecção UTM, datum Europeu, Elipsóide Internacional.
facilidade na margem oposta a famosa
estação de Abul. Integrado administrati-
vamente na freguesia de Comporta, con-
celho de Alcácer do Sal e distrito de Setú-
bal, apresenta a altitude de 6,45 m4 e as
seguintes coordenadas geográficas: P -
139753.89 de latitude N e M - 46850.43
de longitude W.
O acesso à estação pode ser concre-
tizado a partir da estrada nacional n.0 253
que liga Alcácer do Sal a Comporta,
sendo necessário seguir em direcção ao
rio Sado junto do km 11. O sítio eviden-
cia-se pela proximidade com o rio e pelo
carácter arenoso do seu contexto geoló-
gico. Esta proximidade é manifestada
inclusive na pouca diferença altimétrica
registada entre a cota de onde são oriun-
dos os materiais cerâmicos e o nível das
águas do Sado. A sua localização deixa
poucas dúvidas quanto às motivações
marítimas dos seus ocupantes.
Situado numa zona de solos areno-
sos caracterizados por terrenos moder-
nos ceno-antropozóicos, do Plistocénico,
Pliocénico e Holocénico5 onde predomi-
nam os aluviões e as dunas e areias de
duna6. Regista solos Podzois sem e com
Surraia de areias ou arenitos7 com capa-
cidade de uso situada na classe A8.
A cobertura vegetal actual é com-
posta por giestas e vegetação rasteira
abundante, sendo notórios os vestígios
de uma arborização recente de pinheiro
entretanto abatidos.
O relevo da região é marcado pela imponência do rio Sado que confere ao amplo vale
condições excepcionais de visibilidade condicionando em simultâneo de forma indelével toda
a orografia da região.
Enquadramento histórico
A zona onde se localiza Monte Novo do Sul apresenta uma quantidade de achados
arqueológicos de valor tão assinalável para o fluir histórico da região e do actual território naci-
onal, que faz do enquadramento histórico-arqueológico de Monte Novo do Sul uma tarefa
onde corremos o risco de nos alongar em demasia. No entanto, seria de todo descabido não
referir, ainda que de forma muito abreviada, algumas das estações arqueológicas mais céle-
bres da arqueologia nacional.
197
RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)
FIGS. 2 e 3 – Enquadramento foto-cartográfico de Monte Novo do Sul.
Como as olarias são de crucial importância para o entendimento da presença e ocupa-
ção humana no vale do Sado, optamos também por retratar sumariamente a abordagem cerâ-
mica9 sob pena de omitir uma das componentes mais significativas da informação arqueo-
lógica que se encontra associada a este importante curso de água.
Sem ignorar a necessidade deste equilíbrio, a importância patrimonial desta região
torna imperioso um enquadramento arqueológico que embora sucinto refira não só, a região
composta pelo rio Sado, mas também, o vizinho vale do Tejo, a Costa Alentejana e o Algarve.
A comparação das dinâmicas de produção cerâmica destas quatro regiões permite uma
melhor compreensão dos circuitos e fenómenos comerciais. Apresentamos assim uma breve
e ligeira correlação dos dados alcançados até ao momento, numa longa viagem cronológica
e espacial, de forma a contextualizar a importância e o alcance das ilações obtidas para a com-
preensão da história da região e das comunidades litorais abaixo do Tejo lembrando que o
gasoduto que acompanhamos se estende de Setúbal a Sines.
Localizado na margem sul do Sado, Monte Novo do Sul regista uma notável proximidade
geográfica de estações arqueológicas tão famosas como a cidade romana de Tróia, as diver-
sas olarias existentes nos estuários do Tejo10 e Sado11, a estação fenícia de Abul12 ou o castelo
de Alcácer. Exemplos tão sintomáticos como os expostos, e com resultados tão extraordiná-
rios sobre a continuidade e permanência de ocupação neste vale13 dispensam qualquer tipo
de apresentação. Se nos deslocarmos para sul encontramos outra zona de produção cerâmica
igualmente importante como é o caso da Costa Alentejana14. Nesta região podemos destacar
a grandiosidade de Miróbriga, a importância de Vale Pincel, ou o excelente porto e ancora-
douro da Ilha do Pessegueiro.
A investigação arqueológica no território que referimos é indissociável do contributo de
nomes como Luís Raposo, Carlos Fabião, Carlos Tavares da Silva, Joaquina Soares, Luísa Fer-
rer Dias ou Antónia Coelho Soares. Nos anos oitenta, estes investigadores ampliaram con-
sideravelmente a área geográfica sujeita a reflexões sobre a produção cerâmica sendo con-
templadas as zonas dos vales do Tejo e Sado, Sines e Ilha do Pessegueiro15.
Nestes estudos a abordagem tecnológica ocupa um lugar central e permitiu definir
com precisão tipos de argila e grupos de cerâmica de origem diversa. O quadro eminente-
mente tecnológico tem em si mesmo uma intenção cronológica e preocupações quanto à ori-
gem das peças, pois consegue proporcionar indicações que sugerem normais proximidades
cronológicas e centros de produção com características comuns.
As preocupações com a produção cerâmica local regional ou importada, desenvolvidas
na década de 70 adquirem neste contexto, uma dimensão espacial significativa e alcançam
uma consagração confirmada graças aos estudos dos estudiosos já citados. Na década seguinte
as orientações metodológicas nacionais continuaram a desenvolver estes conceitos.
É nos anos noventa que graças aos trabalhos de Nolen e Carlos Tavares da Silva o
Algarve surge como mais uma região produtora associando-se às já conhecidas16.
O caso algarvio apesar do distanciamento geográfico apresenta vários paralelos de voca-
ção marítima semelhantes à região que retratámos, e testemunhos de igual forma revelado-
res de um intenso tráfego comercial de origem mediterrânea17 que se evidenciam também
em Abul ou Alcácer do Sal.
É curioso constatar que a localização marítima das três regiões (Algarve, Tejo e Sado),
apesar de condicionar fortemente a produção cerâmica despoletou todavia desenvolvimen-
tos distintos, que não resistimos a focar.
O contacto privilegiado com as rotas marítimas criou segundo Jeannette Nolen uma pro-
dução pouco profissional em Torre de Ares enquanto que na villa do Alto do Cidreira se pas-
sou precisamente o oposto. Esta autora deu a conhecer à comunidade científica o lote de peças
198
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
de Torre de Ares. Tendo consciência das dificuldades que teria em relação às informações que
poderia atingir sobre os materiais, cronologia, origens e relações comerciais18, conseguiu no
entanto, interessantes deduções sobre o panorama dos fabricos locais ou regionais, as impor-
tações e a origem das peças importadas. Apesar das condições naturais para a produção cerâ-
mica se manifestarem favoráveis, (a abundância de barreiros e madeira permitiria produzir
em quantidade) a produção parece ter servido basicamente para abastecer a clientela local nas
suas necessidades diárias. Ainda no Algarve, na Quinta do Marim, Olhão, a vocação marítima
dos sítios localizados próximo do mar mantém-se.
No vale do Tejo os dados não são conclusivos em relação à produção e consumo, mas sufi-
cientes para Nolen no seu estudo poder constatar a exclusão quase total de comércio terrestre
interior, também contrastante com o frequente uso das rotas marítimas. A autora salienta ainda
o reduzido número de fabricos do Alto Alentejo e a abundância de sigillata clara A. Associando
a estes factos a raridade da sigillata hispânica, tudo parece indicar um abastecimento priori-
tariamente marítimo e pouca abertura às vias comerciais terrestes (Nolen, 1988, p. 61, 64). Inês
Vaz Pinto ao abordar esta questão considera que no estudo sobre a villa do Alto do Cidreira, a
continuidade de ocupação corresponde a uma cronologia lata devido à ausência de estratigrafia
provocada pela erosão e excessivas lavras, salientando desta investigação a tipologia de formas
e a sua análise funcional. Abundando os almofarizes e alguidares ao contrário da escassez de
bilhas e jarros19.
O vizinho vale do Sado, que, por razões geográficas óbvias, é o que mais nos interessa,
manifesta fenómeno produtivo semelhante, o que dada a proximidade espacial e caracterís-
ticas hidro-topográficas, não surpreende. Para além do reforço desta prática, o estudo com-
parado das regiões vizinhas permitiu inferir com maior segurança sobre a difusão local das
cerâmicas em locais com grande dinamismo na produção.
A oportunidade de investigar contextos habitacionais, como é o caso do castelo de Alcá-
cer do Sal, também investigado na sequência de uma escavação de emergência, tornou pos-
sível confirmar uma longa sequência estratigráfica compreendendo a ocupação deste sítio
entre os finais do Neolítico20 e o período medieval-moderno. Salientamos que a Idade do Ferro
é caracterizada por uma cultura mediterrânea orientalizante21, quando os restantes sítios da
zona registam maiores contactos com a Meseta. A produção local de forte tendência expor-
tadora domina o consumo local, sendo esporádicos os casos de cerâmica importada (geral-
mente de pasta branca).
Não poderíamos deixar de referir o importante contributo dado por Carlos Tavares da Silva
e Mayet através da investigação desenvolvida no centro de produção de ânforas do Pinheiro22.
Foi precisamente nesta herdade de generosas dimensões (Herdade do Pinheiro) que se inicia-
ram os trabalhos de implantação do gasoduto Sines-Setúbal. Os autores conseguiram definir
nesta olaria dois tipos de pastas não-calcárias utilizadas na produção de ânforas23.
A cerâmica encontrada na fábrica de salga localizada na Praça do Bocage, em Setúbal,
reforça a importância destes centros produtivos e as proporções do seu dinamismo industrial.
Será curioso constatar que a unidade fabril de salga do Creiro Arrábida, datada entre os
meados/terceiro quartel do século I d.C., e finais do mesmo século, deixa de laborar sendo
abandonada precisamente na mesma altura em que surgem as fábricas de salga da Praça do
Bocage e da Travessa de Frei Gaspar, localizadas na cidade de Setúbal. Coelho-Soares é de opi-
nião que o período da primeira ocupação desta fábrica terá funcionado como serviço de
apoio à navegação costeira24.
Com vocação marítima semelhante, a Ilha do Pessegueiro foi um importante porto de
apoio à navegação costeira graças às excelentes condições de abrigo, desembarcadouro e fun-
deadouro que proporcionava25.
199
RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)
A costa alentejana apresenta também dois grandes grupos de pasta distinguidos pela cor.
A pasta avermelhada do Sado e uma pasta de cor branca. Dos trabalhos desenvolvidos na Ilha
de Pessegueiro, os investigadores definiram duas fases de ocupação, a primeira correspondendo
à Idade do Ferro, e a segunda subdividida em três, identificada com a época romana imperial26.
Monte Sardinha, em Santiago do Cacém, reforça a existência destes principais grupos
de pastas. Courela dos Chãos, em Sines, vê repetida a abundância das pastas brancas da Ilha
do Pessegueiro.
Segundo Carlos Tavares da Silva, a hipótese lançada por Leite Vasconcelos e Scarlat Lam-
brino da Ilha do Pessegueiro corresponder à ilha de Poetanion, referida na Ora Marítima de
Avieno, faz sentido e sai reforçada pelas intervenções arqueológicas aí realizadas por este estu-
dioso juntamente com Joaquina Soares e Luísa Ferrer Dias (Silva, Soares e Dias, 1980-
-81, p. 245).
O estudo dos fabricos e das formas com perfis completos comprova ser fundamental para
perceber a morfologia e aspectos tecnológicos de qualquer região produtora. A exploração da
temática das formas e dos fabricos, apresentando igualmente dados quantitativos passíveis de
comparação tem permitido acrescentar à região do Sado e da Costa Alentejana, informações
complementares quanto à proveniência dos fabricos, utilizando como critérios fundamentais
o tipo de argilas, os acabamentos, a análise quantitativa e a comparação. A aplicação conjunta
dos critérios funcional e tecnológico como elemento orientador da investigação para novos
caminhos tem obtido proveitosos aperfeiçoamentos, pois diferentes características técnicas de
recipientes aparentemente semelhantes poderão condicionar a sua função.
A frequência com que são realizados trabalhos sobre esta temática é fundamental para
a resolução de novas e velhas questões. A comparação é urgente e insubstituível. A verdadeira
dimensão destas problemáticas só será compreendida a uma escala forçosamente regional.
Por esta razão abordamos o vale do Tejo, a Costa Alentejana e a região Algarvia, tanto mais
que o entendimento global de estações como Abul e o castelo de Alcácer do Sal deve ser com-
preendido numa escala comercial mediterrânica.
O contributo destes estudos é crucial para entendermos a riqueza patrimonial desta
região. Consideramos que esta temática deve alcançar uma dimensão regional no que diz res-
peito ao entendimento da produção, consumo e distribuição cerâmica e depois ser compre-
endida a uma escala nacional. Por isso, focamos igualmente regiões aparentemente muito
distantes mas que se complementam comercialmente, para que melhor se entenda a impor-
tância destes achados e desta região produtora no actual território nacional.
É necessário que mais trabalhos com indicadores morfológicos, cronológicos, tecnoló-
gicos e funcionais sejam publicados, de forma a possibilitar analogias que proporcionem futu-
ras sínteses regionais. O nosso modesto contributo apesar de não acrescentar nada de sig-
nificativo ao quadro científico exposto, insere-se nesta dinâmica de investigação regional e
supra-regional da produção cerâmica e lítica.
Metodologia e resultados da intervenção arqueológica
Como já referimos o objectivo desta intervenção pretendeu simultaneamente responder
às dúvidas suscitadas pelo estado de conservação do sítio e alcançar indicadores cronológi-
cos, que reforçassem a cronologia apontada pelos materiais recolhidos à superfície.
A localização das sondagens (1 m x 1 m) pretendeu ser representativa do que se poderia
encontrar, e proporcionar informações que permitissem salvaguardar as zonas ainda preser-
vadas da intervenção das máquinas. Para isso, localizamos duas sondagens no alinhamento
200
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
da vala; 1 na zona que corresponde ao local da
perfuração, e uma última afastada 6 metros
do eixo da vala, localizada no centro do pro-
montório, com o intuito de contemplar uma
área que permitisse assegurar que nenhuma
estrutura importante de teor arqueológico
fosse afectada.
Os trabalhos tiveram início com a lim-
peza da área envolvente e posterior materiali-
zação da área a sondar, estando todas as son-
dagens localizadas no eixo central da pista,
(correspondente à zona de abertura da vala)
distanciadas 6 m umas das outras. A excepção
foi a sondagem n.0 4, que intencionalmente
deslocamos no sentido SE. As quadrículas
foram identificadas por letras e algarismos
árabes. O ponto de referência altimétrica que
adoptamos foi o implantado pelo vértice 0148,
que corresponde ao km 58+523.90 do traçado
do gasoduto, e cujo valor da cota em relação
ao nível do rio Sado é de 5,18 m.
Prosseguimos com a decapagem manual
das unidades estratigráficas na sequência
inversa à sua deposição, até atingir os níveis
estéreis correspondentes aos depósitos aluvi-
onares do rio, não perturbados pela actividade
antrópica. O registo da estratigrafia consistiu
no desenho à escala 1/20 de um dos cortes de
cada sondagem e numa descrição sumária de
cada unidade.
O levantamento gráfico incluiu o registo
fotográfico, o registo individual das EU’s e a
implantação cartográfica das sondagens.
A recolha de espólio arqueológico foi
exaustiva, separando-se no campo por uni-
dades estratigráficas os materiais cerâmicos
e líticos encontrados.
201
RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)
FIG. 4 – Representação esquemática das sondagens
arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul.
FIG. 5 – Perfis estratigráficos das sondagens arqueológicas
realizadas em Monte Novo do Sul. Camada 1: Camada de
remeximento recente de cor cinzento escura; Camada 2:
Camada cinzento amarelada; Camada 3: Camada castanha
escura. Camada 4: Camada de areias finas claras; Camada 5:
Raíz apenas presente na sondagem n.0 3; Camada 6:
Mancha indeterminada de cor mais escura registada
somente na sondagem n.0 3.
Os resultados das sondagens foram conclusivos quanto ao índice de perturbação do local
e no que diz respeito à quantidade e qualidade dos materiais encontrados. Os 45 fragmen-
tos cerâmicos27 encontrados localizaram-se em todas as sondagens nas duas primeiras uni-
dades estratigráficas e apresentavam-se muito fragmentados e dispersos, num contexto onde
a ocorrência de raízes é generalizada. Registamos a mesma localização nos dois fragmentos
de machado e no martelo recolhidos respectivamente nas sondagens n.os 2, 3 e 128.
Em todas as sondagens apenas as unidades estratigráficas superficiais registaram a
presença de artefactos. Concluímos pois, que a ocupação aqui presente se localizaria a cotas
não inferiores a 40/50 cm. A possível afectação do local aquando da florestação de pinheiro
adquire assim contornos mais credíveis e explicaria o carácter fragmentado e disperso dos
vestígios cerâmicos. Se acrescentarmos a estes dados, os resultados obtidos na sondagem n.0
4, onde os fragmentos cerâmicos se resumem a 3, facilmente constatamos que a maior con-
centração de materiais se localiza para NW em direcção à zona sujeita à intervenção já con-
sumada pela implantação do oleoduto.
Relembramos que a própria metodologia utilizada para a abertura de pista altera subs-
tancialmente as características topográficas das áreas intervencionadas. Se associarmos a isto,
os trabalhos de remoção de terras necessários à perfuração realizada para a travessia do rio
Sado, parece-nos claro que a actual paisagem se encontra muito alterada e não corresponde
a uma evolução provocada por agentes naturais.
202
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
FIG. 6 – Fragmentos cerâmicos encontrados durante as sondagens diagnóstico realizadas em Monte Novo do Sul. 1 – Bordo
extrovertido, lábio biselado com parede direita, forma esvasada e pasta com inclusões de media dimensão; 2 – Bordo
introvertido, lábio boleado, forma envasada; 3 – Bordo extrovertido, lábio boleado, forma esvasada; 4 – Bordo extrovertido,
lábio direito, forma cilindrica; 5 – Bordo introvertido, lábio boleado, forma envasada; 6 – Bordo introvertido, lábio boleado de
forma envasada.
203
RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)
FIG. 7 – Líticos encontrados durante as sondagens diagnóstico realizadas em Monte Novo do Sul. 6 – fragmento de machado de
anfibolite; 7 – fragmento de machado de anfibolite; 8 – seixo talhado; 9 – fragmento de machado de anfibolite; 10 – martelo de
anfibolite ; 11 – seixo talhado.
Em suma, os resultados da sondagem diagnóstico realizada na Herdade de Monte Novo
do Sul são reveladores da presença humana, mas indiciam igualmente fortes perturbações
à estratigrafia do sítio. A exígua quantidade de achados, o seu carácter fragmentado e disperso
não deixa dúvidas quanto ao acentuado remeximento de terras realizado no local.
Integração cronológico-cultural
Os artefactos oriundos desta intervenção arqueológica resumem-se a materiais líticos e
cerâmicos de fabrico manual. Analisámos o lote cerâmico através das características das pas-
tas e da sua morfologia, aplicando um critério tecnológico e morfológico na distinção e
caracterização dos fragmentos cerâmicos, com o objectivo de possibilitar a comparação de
categorias e tipos morfológicos. Julgamos ser possível desta maneira no futuro perspectivar
os contornos de uma evolução de formas.
As pastas foram inicialmente separadas recorrendo à ajuda de uma lupa manual
segundo os critérios de definição de um tipo de fabrico, ou seja, dividimos os fragmentos
tendo em conta a natureza, percentagem e proporções relativas dos diferentes tipos de ele-
mentos não-plásticos, textura e cozedura.
As diferentes características das pastas por nós seleccionadas originaram a designação
de 3 grupos de fabrico denominados com as letras A, B e C29. Confirmaram-se afinidades
mineralógicas e naturais diferenças granolumétricas, mas pouco significativas.
Os 203 fragmentos cerâmicos30 apresentam pastas de fabrico geralmente grosseiras,
com inclusões grosseiras e médias, destacando-se a presença abundante de mica numa
grande percentagem de exemplares31.
QUADRO I
Quadro comparativo da dimensão dos elementos não-plásticos entre a argila e o seixo.
SEIXO AREÃO AREIA SILTE ARGILA
Muito Grosseira Média Fina Muito Grosseiro Médio Fino Muitogrosseira Fina Fino
5 10 18 35 60 120 230 Mesh 0,0 0,0156
4,00 2,00 1,00 0,500 0,250 1,125 0,0625 +5 +6 0,0078 0,0039 mm
-2 -1 -0 +1 +2 +3 +4 + 7 +8
Tucker, M. - Techniques in sedimentology. Blackwel Science. London, 1995.
Apesar do elevado índice de fragmentação da cerâmica encontrada foi possível identifi-
car a morfologia de 6 bordos. As técnicas decorativas encontram-se pouco representadas
reforçando o carácter utilitário da cerâmica e a possível natureza laboriosa do sítio. Regista-
mos somente as técnicas de alisamento e polimento.
O estado fragmentado das peças e a sua pequena dimensão tornou improvável alcançar
perfis completos. Debatemo-nos assim com a dificuldade de definir formas ou variantes
representativas de determinada categoria e/ou tipo morfológico. Igual dificuldade sentimos
na classificação donde derivam as ilações de ordem funcional e cultural.
Tendo em conta as características qualitativas e quantitativas deste universo cerâmico,
optamos por não apresentar o inventário dos fragmentos nem aprofundar as variáveis quan-
titativas devido à escassez de informação morfológica, decorativa e funcional.
Estes fragmentos de acordo com as características técnicas, formais e decorativas inse-
rem-se cultural e cronologicamente no Neolítico. Registam paralelos semelhantes em habi-
204
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
Não excluímos a possibilidade de este sítio poder também corresponder a um porto de
abrigo temporário com características sazonais, ocupado ocasionalmente de forma irregular
por comunidades piscatórias fixadas nas imediações do vale. A ancestral navegabilidade do
Sado e a intensa actividade comercial amplamente documentada corroboram a hipótese de
muitos dos esporões de areia deste rio com condições naturais para ancoradouro terem ser-
vido como porto de abrigo para muitos pescadores e marinheiros.
Em suma, encontramo-nos na presença de uma estação arqueológica que amplia o
número de habitats de ar livre já identificados no vale do Sado e que não acrescenta muita
informação à produção cerâmica e lítica. O grande contributo deste habitat reside na altera-
ção da realidade numérica. Podemos reforçar a presença humana modificando a perspectiva
sobre a rede de povoamento e densidade populacional na margem esquerda do rio Sado
durante o Neolítico.
Apesar das provas desta presença se encontrarem fora do seu contexto original e ficar-
mos sem hipótese de melhor perceber que género de ocupação ali se instalou, a referência
à presença humana ainda que esporádica, naquele local é uma realidade.
A área de intervenção correspondente à implantação do gasoduto Sines-Setúbal é uma das
zonas do país onde mais se conhece do potencial do património arqueológico. Curiosamente
poderemos dizer que este conhecimento se encontra estreitamente ligado às inúmeras inter-
venções de teor industrial e ao elevado índice de afectação que provocam no património
arqueológico, que exigiram medidas de minimização compatíveis para a sua salvaguarda.
Esta intervenção arqueológica enquadra-se neste contexto de convivência entre desen-
volvimento industrial/energético e conhecimento científico. Indispensável e urgente esta con-
ciliação apesar de nem sempre se confirmar feliz, deve ser fomentada, por proteger um
património não renovável e ser sinónimo de um modelo de progresso sustentado típico das
sociedades culturalmente mais desenvolvidas.
NOTAS
1 Cfr. Anexo: Enquadramento geográfico das sondagens arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul e fotografias n.0s 1 e 2.2 Destacamos os sítios denominados por Barrosinha, Celeiro Velho, Malhada Alta, Pontal, Possanco e Sapalinho todos localizados em
Comporta. Cfr. Silva et al., 1993 , p. 34, 52, 67, 75, 90, 94 e 99, com fragmentos cerâmicos semelhantes aos identificados em Monte Novo
do Sul.
3 Gasoduto Sines/Setúbal: km 58.593.
4 Cfr. Carta Militar de Portugal, n.0 467, esc. 1/25 000, 1972.
5 Cfr. Carta Geológica de Portugal, esc. 1/1000 000, 1968.
6 Cfr. Carta Geológica de Portugal, 39-A, Águas de Moura, esc. 1/50 000, 1972.
7 Cfr. Carta dos Solos de Portugal, 466, 1/50 000, 1961.
8 Cfr. Carta de Capacidade de Uso do Solo, esc. 1/1000 000, 1980.
9 Referimos preferencialmente a época romana por ser neste período histórico que a produção cerâmica desta região adquire maior dimen-
são. Não ignoramos no entanto, a importância de outros períodos cronológicos para o completo entendimento do fenómeno de conti-
nuidade e permanência da ocupação humana nesta região.
10 Citamos como exemplo a villa do Alto do Cidreira, os fornos de ânforas de Garrocheira, a Quinta do Rouxinol, o Porto do Sabugueiro, ou
Zambujalinho.
11 Tal como no caso anterior optamos por citar apenas alguns dos sítios arqueológicos, privilegiando a representatividade geográfica e a impor-
tância dos resultados: Alcácer do Sal, cfr. Silva, Beirão, Soares, Dias e Coelho Soares, 1980-198l, p. 149-218; Olaria de ânforas do Pinheiro
marco crucial na produção cerâmica romana dos vales do Tejo e Sado e na caracterização desta zona do país como importante centro pro-
dutor cerâmico, Praça do Bocage, cfr. Silva e Coelho Soares, 1980-81, p 249-284; Creiro, cfr. Silva e Coelho Soares, 1987, p. 221-237.
206
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
12 Com posterior ocupação romana também associada à produção cerâmica.
13 Silva, Soares, Beirão, Ferrer Dias e Coelho Soares, 1980-81, p. 149-218.
14 Recordamos que o gasoduto que esteve na origem desta intervenção se estende desde Sines até Setúbal. Poderemos destacar a título de
exemplo na Costa Alentejana as estações da Ilha do Pessegueiro, cfr. Silva e Soares, 1993; Silva, Soares e Dias, 1980-81; Silva, Soares, Dias
e Coelho Soares, 1984, Courela dos Chãos cfr. Coelho-Soares, 1987, e Monte Sardinha cfr. Ferrer Dias e Viegas.
15 Grosso modo a área correspondente ao traçado do actual gasoduto Sines-Setúbal.
16 Cfr. Nolen, 1994; Silva, Soares e Coelho-Soares (1992).
17 Essencialmente de origem Bética como é o caso dos dolios que dominam o mercado de Balsa (Nolen, 1999, p. 135).
18 Desde a descoberta de Torre de Ares por F. Martins de Andrade e Estácio da Veiga ainda em pleno século XIX, que se multiplicaram as
escavações neste local. Apesar disso, os registos limitam-se a sumários artigos sobre o espólio encontrado (Nolen, 1994, p. 5).
19 Cfr. (Pinto, 1999, p. 54-5).
20 Esta fase é caracterizada pela taça carenada afim da do Possanco (Comporta), Vale Pincel II (Sines), Cabeço da Mina (Torrão do Alentejo),
Caramujeira (Lagoa), e Papauvas (Huelva), (Silva et al., 1980-81, p. 209).
21 Dividida em três períodos, um de evolução sidérica (VII-VI a.C.), e os restantes respectivamente de influência púnica com elementos helé-
nicos (IV-III a.C.) e influência itálica (II-I a.C.) (Silva et al., 1980-81, p. 213).
22 Para a investigadora Inês Vaz Pinto este trabalho apresenta uma evolução morfológica de peças apreciável. Durante o Alto Império, pre-
dominam a ânfora Dressel 14, as tigelas e panelas, sendo poucos os exemplos de pratos e formas fechadas, e ainda mais raros os algui-
dares e almofarizes. A partir do século III, a ânfora mais representada é a Almagro 51 C, as panelas mudam de forma ficando mais altas
e mais fundas, as tigelas cedem quantitativamente o lugar aos pratos. No século IV, as panelas continuam a metamorfose iniciada, trans-
formando-se em formas fechadas e os alguidares adquirem uma representatividade nunca alcançada. O século V manifesta-se por uma
raridade de formas abertas (Pinto, 1999, p. 53).
23 Com uma proveniência geográfica distinta, foi atribuída à pasta de cor alaranjada a designação de Sado-montante, e à pasta de tons beije
Sado-jusante/Tejo (Pinto, 1999, p. 53).
24 Cfr. (Coelho-Soares, 1987, p. 236-237).
25 As condições de fundeadouro variavam entre os 5, 6 e 7 metros ao máximo da baixa-mar. Os meses compreendidos entre Abril e Outubro
seriam os melhores para navegar na faixa atlântica (Silva et al., 1993, p. 20-25).
26 Fase I: estabelecimento da Idade do Ferro; Fase II: o estabelecimento da época romano imperial; Fase II A: fundação do entreposto comer-
cial na Segunda metade do século I; Fase II B: diversificação económica, actividade comercial e produção de salgas no século II; Fase II
C: especialização na produção de salgas de peixe nos séculos III e IV (Silva et al., 1993, p. 83-86).
27 Apenas 6 apresentavam forma. Correspondem a fragmentos de reduzida dimensão nem todos capazes de transmitir informação quan-
to ao seu diâmetro.
28 Cfr. Anexo: desenho dos materiais.
29 O elevado índice de fragmentação das peças e o rolamento a que foram sujeitas aumentaram o grau de afinidade dos fragmentos cerâ-
micos tornando a dimensão das inclusões o elemento crucial para a definição dos grupos. Estes variam entre areias muito grosseiras (A),
grosseiras (B) e médias (C). Quanto ao tratamento da superfície resume-se ao alisamento sendo esporádicos os exemplares com poli-
mento. As cores variam entre o laranja, o castanho e o cinzento com diferentes tonalidades e intensidade.
30 Incluímos de igual modo os fragmentos recolhidos à superfície, que são em maior número do que os recolhidos em contexto de escavação.
31 Cfr. Tabela de valores utilizada para o enquadramento da frequência e percentagem dos elementos não plásticos. Quadro comparativo da
dimensão dos elementos não plásticos entre a argila e o seixo.
32 Cfr. Silva et al.; 1993, p. 34, 52, 67, 75, 90, 94 e 99.
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207
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208
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
Anexo
Protocolo
Outorgantes
1.0 – INSTITUTO PORTUGUÊS DO PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO E ARQUEOLÓGICO*,
adiante designado abreviadamente por IPPAR, com sede no Palácio Nacional da Ajuda,
representado pelo seu Presidente, Prof. Arquitecto Nuno dos Santos Pinheiro, como 1.0
outorgante
e
2.0 – TRANSGÁS, Sociedade Portuguesa de Gás Natural, S.A., adiante designada abreviada-
mente por TRANSGÁS, com sede na Av. da República, 35 – 7.0 em Lisboa, representada pelo
seu Presidente, Dr. José Manuel Elias da Costa, como 2.0 outorgante.
Considerando que:
Os vestígios arqueológicos constituem uma parte integrante do Património Cultural Portu-
guês e um recurso cultural, não renovável, essencial para a História da Humanidade;
A importância da preservação e valorização desse património tem sido reconhecida em
vários documentos internacionais, no âmbito da UNESCO e do Conselho da Europa e pela
legislação nacional;
A necessidade de conciliar a preservação do património arqueológico com o desenvolvi-
mento económico tem sido urna preocupação dos governantes e instâncias europeias, tra-
duzida na promoção de várias iniciativas no sentido de minimizar os efeitos das grandes
obras públicas e privadas;
A construção de redes de gás natural, em vários países europeus, tem demonstrado que este
tipo de infraestruturas poderá ter um impacto muito significativo sobre o património arqueo-
lógico e destruir, irremediavelmente, inúmeros vestígios e informações de grande interesse
histórico, se não for acompanhada por equipas de arqueólogos, nas suas várias fases.
Em Portugal as prospecções arqueológicas efectuadas em áreas abrangidas por outros empre-
endimentos de traçado linear, como é o caso de estradas e autoestradas, no âmbito de estu-
dos de impacte ambiental, tem revelado, em todas as regiões do país, inúmeros vestígios
arqueológicos, até então desconhecidos, que, se tais trabalhos não tivessem sido realizados,
teriam sido irremediavelmente destruídos.
O IPPAR é a entidade da tutela especialmente habilitada para a implementação e aplicação de
uma política de levantamento, estudo, salvamento e divulgação do património arqueológico.
O IPPAR enquanto organismo público vocacionado para a preservação do património arqueo-
lógico nacional e a TRANSGÁS, enquanto concessionária do serviço público de importação,
transporte e fornecimento de gás natural, consideram de mútuo interesse o estabelecimento,
nos termos da Lei 13/85 de 6 de Junho e Decreto-Lei n.0 106-F/92, de 1 de Junho, de formas
de colabora9ao que permitam harmonizar, na medida do possível a necessidade económica
de instalação, em Portugal, de urna rede de gás natural, com o imperativo cultural e moral
de registar e salvar o património arqueológico do país.
211
ANEXO
Com esse objectivo celebram o presente protocolo que se rege pelas cláusulas seguintes:
Primeira
A TRANSGÁS e o IPPAR apoiarão a constituição de urna equipa técnica de Arqueologia,
permanente, que acompanhará cada frente de trabalho de construção do gasoduto,
dotada dos meios indispensáveis, cabendo-lhe a rea1ização da prospecção prévia das
áreas críticas indicadas no Estudo de Impacte Ambiental o acompanhamento da frente
de trabalho de construção do gasoduto, e o registo, recolha, estudo e publicação de
todos os vestígios arqueológicos que vierem a ser encontrados.
1. Cada equipa será constituída por um Arqueólogo, com larga experiência de trabalhos
deste tipo, e por um Assistente de Arqueólogo, a contratar expressamente para este pro-
grama de intervenção arqueológica pela TRANSGÁS, de entre técnicos indicados pelo
IPPAR e será dotada de uma viatura, equipamento e material necessários ao exercício das
suas funções (de acordo com a lista anexa).
2. São funções de cada equipa realizar as acções necessárias de modo a assegurar registo,
recolha e estudo de todos os vestígios arqueológicos que vierem a ser encontrados nas
várias fases dos trabalhos.
Segunda
A TRANSGÁS compromete-se a:
1. Entregar antecipadamente a equipa de Arqueologia e manter actualizada toda infor-
mação disponível, cartográfica e de outra natureza, sobre a localização do gasoduto e das
instalações anexas e a relativa ao planeamento dos trabalhos.
2. Custear financeiramente, na totalidade, a constituição e funcionamento das equipas de
Arqueologia, (…) bem como prover à aquisição do equipamento e material (…).
a) Para a equipa de Arqueologia, a TRANSGÁS contratará técnicos propostos pelo IPPAR,
em regime de prestação de serviços, que não façam parte dos quadros do IPPAR.
b) Os técnicos contratados responderão disciplinarmente perante a TRANSGÁS e tecnica-
mente perante o IPPAR, nos termos da legislação em vigor.
c) O equipamento que for adquirido no âmbito deste protocolo reverterá para o IPPAR após
o termo do mesmo.
3. Patrocinar a divulgação dos dados arqueológicos recolhidos através de publicação de
carácter científico, destinada ao público, e de exposições de carácter museológico.
Terceira
Compete ao IPPAR:
1. Promover a constituição da equipa de Arqueologia referida em 2.
212
ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO
2. Assegurar a coordenação técnica dos trabalhos das equipas, disponibilizando para o
efeito, um dos seus técnicos superiores.
3. Garantir a execução em tempo útil dos trabalhos programados, em conformidade com
o plano de trabalhos da obra.
4. Enviar com a maior celeridade possível a TRANSGÁS indicações sobre medidas de pro-
tecção que deverão ser tomadas em relação a vestígios arqueológicos que o justifiquem
por forma a que a concretização dessas medidas não provoque perturbações ao desen-
rolar da execução do projecto, conforme os planos de trabalho estabelecidos.
5. Assegurar a elaboração de relatórios semestrais, devidamente documentados, referen-
tes aos trabalhos da equipa de Arqueologia, de que enviará um exemplar à TRANSGÁS.
Quarta
A gestão deste protocolo será feita por urna Comissão Coordenadora, constituída por um
representante do IPPAR e um representante da TRANSGÁS, a qual reunirá sempre que
necessário e pelo menos urna vez por semestre, com o objectivo acompanhar o seu cum-
primento e resolver eventuais dificuldades relacionadas com termos do mesmo.
Destas reuniões se lavrará acta, a apresentar à Direcção das duas entidades outorgantes.
Quinta
O presente protocolo terá efeitos até ao final do prazo previsto para a instalação pela
TRANSGÁS dos gasodutos de alta pressão e respectivos ramais.
Sexta
Eventuais alterações que vierem a ser aconselhadas pela desenrolar dos trabalhos devem
ser apresentadas e discutidas pela Comissão Coordenadora que os submeterá à apro-
vação das duas entidades abrangidas por este protocolo.
Lisboa, 24 de Março de 1994
* Ao abrigo do Decreto-Lei n.0 117/97, de 14 de Maio, que cria e define a orgânica do Instituto Português de Arqueologia, no seu Artigo
26.0, o “IPA sucede ao IPPAR nos direitos e obrigações de que, no quadro das competências previstas no presente diploma, este era
titular, por lei, contrato ou outro título, sem necessidade de quaisquer formalidades, exceptuados os registos, para os quais constitui
título bastante o presente diploma”. Sendo assim, a partir desta data, o Instituto Português de Arqueologia assumiu, no presente Pro-
tocolo, a posição de 1.0 Outorgante,
213
ANEXO