63
Um casal romano em S. Lourenço do Mato (Ponte de Lima) CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA 1. Introdução Esta estação arqueológica 1 , que era desconhecida até à descoberta dos vestígios acima refe- ridos 2 , situa-se no lugar de Rebordelo, o mais oriental da pequena freguesia de S. Lourenço do Mato, a qual, por sua vez, é confinante com as freguesias de Calvelo, Friastelas, S. Julião de Freixo e Gaifar, todas pertencentes ao concelho de Ponte de Lima (Fig. 1). Precisando melhor a sua situação geográfica — 41 39’ 58” N; 0 34’ —W; 170 m de altitude — os vestígios arqueo- lógicos confinam-se a uma mancha agrícola localizada entre a Quinta de Arcelos e o lugar de Santa Marinha. Sinais de Romanização, que não são únicos no quadro da actual freguesia, pois também os há no adro da igreja paroquial, em Rabião e na Quinta de Arcelos (Almeida, 1997, I, p. 195-196). A Quinta de Arcelos é uma grande propriedade agrícola, murada, localizada, paredes- meias, com o espaço da igreja e o lugar de Rebordelo. É talvez um dos lugares mais antigos da freguesia, epicentro da primitiva paróquia, que um documento do Liber Fidei, datado de 1158, designava por ecclesia Sancti Laurentii de Arcelos (Liber Fidei, doc. 546) e assim conti- nuou até meados do séc. XIII, pois só em 1290, na Inquirição de D. Dinis, é que apareceu a actual designação: Freyguesia de Sam Lourenço de Mato. Na actualidade, esta propriedade, que se estende praticamente até ao lugar de Rebordelo, reparte-se por parcelas agrícolas e terre- nos de floresta, fazendo assim jus a uma ancestralidade que não encontra muito eco na sua casa de lavoura, adulterada por muitas e muitas intromissões, mas que conserva ainda, em plano de evidência, o brasão com as armas dos Pereiras. Os vestígios arqueológicos, que à 151 UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA) RESUMO A muito parcelar intervenção arqueológica efectuada em São Lourenço do Mato, concelho de Ponte de Lima, revelou a presença de quatro ocupações cronologicamente distintas, num espaço com naturais aptidões agrícolas. A primeira ocupação do sítio começou com indígenas castrejos no início da Romanização. Seguiram-se as ocupações de época romana, aqui representada por uma construção de apoio, celeiro-armazém, datada do Baixo-império. Sobre as ruínas desta estrutura foi posteriormente, durante o período visigótico, construído ma outra casa, esta de habitação. A última fase, está mal conhecida, mas parece corresponder ao modelo de ocupação que vem mencionado nas Inquirições de D. Afonso III. ABSTRACT The archaeological field work that was carried out to a limited extent at São Lourenço do Mato, Ponte de Lima, has revealed four different human occupations of a location featuring good natural conditions for agriculture. The site was first occupied by an indigenous group, during the earliest stage of the Roman period. Evidence of further Roman occupation was revealed by the remains of a late Roman support building, a warehouse or barn. During the Visigothic period, a house was built over the ruins of the Roman building. The final occupation stage is not very well defined, but seems to correspond to the settlement pattern referred in the Inquirições of King Afonso III.

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Um casal romano em S. Lourenço do Mato(Ponte de Lima)

❚ CARLOS A. BROCHADO DE ALMEIDA ❚

1. Introdução

Esta estação arqueológica1, que era desconhecida até à descoberta dos vestígios acima refe-

ridos2, situa-se no lugar de Rebordelo, o mais oriental da pequena freguesia de S. Lourenço do

Mato, a qual, por sua vez, é confinante com as freguesias de Calvelo, Friastelas, S. Julião de

Freixo e Gaifar, todas pertencentes ao concelho de Ponte de Lima (Fig. 1). Precisando melhor

a sua situação geográfica — 41 39’ 58” N; 0 34’ —W; 170 m de altitude — os vestígios arqueo-

lógicos confinam-se a uma mancha agrícola localizada entre a Quinta de Arcelos e o lugar de

Santa Marinha. Sinais de Romanização, que não são únicos no quadro da actual freguesia, pois

também os há no adro da igreja paroquial, em Rabião e na Quinta de Arcelos (Almeida, 1997,

I, p. 195-196).

A Quinta de Arcelos é uma grande propriedade agrícola, murada, localizada, paredes-

meias, com o espaço da igreja e o lugar de Rebordelo. É talvez um dos lugares mais antigos

da freguesia, epicentro da primitiva paróquia, que um documento do Liber Fidei, datado de

1158, designava por ecclesia Sancti Laurentii de Arcelos (Liber Fidei, doc. 546) e assim conti-

nuou até meados do séc. XIII, pois só em 1290, na Inquirição de D. Dinis, é que apareceu a

actual designação: Freyguesia de Sam Lourenço de Mato. Na actualidade, esta propriedade, que

se estende praticamente até ao lugar de Rebordelo, reparte-se por parcelas agrícolas e terre-

nos de floresta, fazendo assim jus a uma ancestralidade que não encontra muito eco na sua

casa de lavoura, adulterada por muitas e muitas intromissões, mas que conserva ainda, em

plano de evidência, o brasão com as armas dos Pereiras. Os vestígios arqueológicos, que à

151

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

RESUMO A muito parcelar intervenção

arqueológica efectuada em São Lourenço do Mato,

concelho de Ponte de Lima, revelou a presença de

quatro ocupações cronologicamente distintas,

num espaço com naturais aptidões agrícolas.

A primeira ocupação do sítio começou com

indígenas castrejos no início da Romanização.

Seguiram-se as ocupações de época romana, aqui

representada por uma construção de apoio,

celeiro-armazém, datada do Baixo-império. Sobre

as ruínas desta estrutura foi posteriormente,

durante o período visigótico, construído ma outra

casa, esta de habitação. A última fase, está mal

conhecida, mas parece corresponder ao modelo de

ocupação que vem mencionado nas Inquirições de

D. Afonso III.

ABSTRACT The archaeological field work that was

carried out to a limited extent at São Lourenço

do Mato, Ponte de Lima, has revealed four

different human occupations of a location

featuring good natural conditions for agriculture.

The site was first occupied by an indigenous

group, during the earliest stage of the Roman

period. Evidence of further Roman occupation

was revealed by the remains of a late Roman

support building, a warehouse or barn.

During the Visigothic period, a house was built

over the ruins of the Roman building.

The final occupation stage is not very well defined,

but seems to correspond to the settlement pattern

referred in the Inquiriçõesof King Afonso III.

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superfície se resumem a tegula, fazem supor

a existência de uma ocupação que, pelo

menos aparentemente tem a chancela da

Romanização.

Os vestígios arqueológicos, de crono-

logia afim aos atrás descritos, estão igual-

mente patentes nas freguesias limítrofes,

sobretudo em Calvelo, onde, para além do

já assinalado sítio de Santa Marinha, há

ainda a apontar os vestígios de época

romana situados no lugar do Ribeiro, na

Quinta de Mareces e na Quinta da Pousada,

os alti-medievais que se dispersam em

redor da igreja paroquial, sucessora que foi

de um antigo mosteiro, sem esquecer

outros mais antigos, como são os “castros

agrícolas” de Cadém e Valadares (Almeida,

1996/1997, p. 119-147).

Rebordelo, que também vem citado na

Inquirição de 1258 (PMH, Inq. III, p. 398-

-399), é um lugar de meia de dúzia de casas

de habitação que se distribuem por ambos

os lados da estrada nacional n.° 306. Em

redor de cada uma estão os quintais e junto a estes uma sucessão de campos de cultivo, dis-

postos em patamares, que a partir da encosta meridional do monte de S. Veríssimo, sítio onde

se encontra o pequeno lugarejo de Santa Marinha, orientam-se para Sul, isto é, para o vale

do Rio Neiva e da pequena linha de água que atravessa o lugar de Baralde (Gaifar), mas que

começa a ganhar corpo em Rebordelo.

Tal como ocorre em largas parcelas de território agrícola do Minho, também aqui os típi-

cos campos de cultivo, balizados por lateiros de vinha e ponteados de oliveiras e macieiras,

têm vindo a sofrer, nos últimos anos, profundas alterações à sua tradicional fisionomia.

Mais recentemente tem sido a aposta num novo tipo de vinhedos, que tem vindo a revoluci-

onar profundamente a geografia agrária do velho Entre-Douro-e-Minho. Em tempos mais

recuados, embora limitadamente, foram os pomares e mesmo os prados para forragens

que, do mesmo modo, conduziram ao desmantelamento dos tradicionais campos socalcados,

bem apertados por vezes, sustentados por valos de terra, quando o pendor era escasso e por

muros de pedra, os forra-valos, quando o desnível é bem mais pronunciado.

Estão estas duas situações bem documentadas no lugar de Rebordelo e de uma maneira

bem específica no sítio por onde se espalham os vestígios arqueológicos. A Norte da estrada

nacional n.° 306, no denominado Campo da Fonte ou Fontelo — sítio onde foi realizada a

segunda intervenção — o terreno foi outrora surribado e aplanado e de tal modo, que daí

resultaram campos de cultivo de uma razoável dimensão que foram ocupados com semen-

teiras de milho e batata e mesmo por um expressivo pomar de macieiras. A Sul desta mesma

estrada, nos terrenos onde efectuámos a primeira sondagem, a alteração fisionómica, isto é,

o alargamento dos antigos socalcos foi feita há uma escassa dezena de anos, sendo bem mais

recente o corte de umas carvalheiras e o arroteamento de uma área de monte, onde se fez a

plantação de um vinhedo, cuja armação, para já, é do tipo cordão simples (DRAEDM, 1989,

p. 120-121).

152

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 1 – Implantação cartográfica do sítio.

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As culturas típicas destes solos são o milho, o feijão, a batata, as ervas para forragens,

o vinho, o azeite e obviamente a fruta, sobretudo a maçã. A qualidade e a quantidade destes

produtos, necessariamente que deriva da forma como o agricultor semeia e trata das suas

sementeiras e árvores, mas tem, sobretudo uma estreita relação com a quantidade de água

disponível, a exposição solar, a boa drenagem dos terrenos e sobretudo com a específica com-

posição dos solos. Sendo estes compostos por cambissolos húmicos de influência atlântica,

a sua pedogenia “faz com que a generalidade dos solos derivados das rochas eruptivas tenham umaelevada permeabilidade, mas que sejam pobres em cálcio e deficientes em ácido fosfórico e potássioassimilável” (Almeida, 2003, p. 39). São, no geral, solos fáceis de trabalhar, embora necessi-

tem de correctivos, consoante o tipo de culturas a introduzir.

Se aplicarmos este tipo de caracterização à zona que agora estudamos, pode-se concluir

que o predomínio é dos solos de origem granítica, cuja potência arável pode chegar ao meio

metro de espessura ou mesmo mais, consoante as observações sejam feitas na parte mais ele-

vada dos terrenos ou mais para junto dos forra-valos ou muros de suporte. De qualquer modo

e de acordo com as sondagens efectuadas, o solo natural ou rocha-mãe, era exclusivamente

formado por saibros provenientes dos granitos em decomposição, cuja granulação facilita a

infiltração e drenagem das águas pluviais, quando estas são em demasia.

2. O Campo de Robordelo

As sondagens que aqui realizámos foram duas. A primeira foi efectuada nos terrenos

situados a Sul do traçado da estrada nacional n.° 306, mais concretamente, na parcela n.° 70

(Fig. 2). A segunda foi realizada no Campo da Fonte, parcela de terreno que corresponde ao

n.° 69 da planta topográfica da Transgás e que a Norte da já mencionada estrada, se encaixa

entre esta e um caminho vicinal, que serve algumas casas de habitação bem como os terre-

nos agrícolas.

153

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 2 – Implantação das sondagens na linha do gasoduto.

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2.1. Sondagem n.0 1

A intervenção arqueológica foi realizada no interior da vala de servidão ou, para sermos

mais precisos, na pista destinada aos tubos do gasoduto. O comprimento desta primeira son-

dagem atingiu quase a centena de metros, 96 m para sermos mais precisos. Tal extensão aca-

bou por determinar a sua divisão em duas valas distintas: Vala 1 e Vala 2. O limite entre as duas

foi o valo em talude construído há cerca de uma dezena de anos e que funcionava como suporte

do socalco mais alto. Ao mais elevado corresponde a Vala 1, ao mais baixo a Vala 2.

Se o comprimento variou em função da extensão dos campos, a sua largura, essa foi sem-

pre constante: 1,40 m. O epicentro, esse foi sempre definido pelo eixo da pista do gasoduto.

2.1.1 - Estratigrafia da Vala 1 Esta vala teve um comprimento total de 45m, distância que foi medida entre o poço-son-

dagem aberto junto à berma da estrada nacional n.° 306 — esta vala destinou-se a introdu-

zir o tubo que transporta o gás por debaixo da estrada nacional — e o muro do forra-valo que

marca o desnivelamento em relação ao campo de cultivo onde foi aberta a Vala 2 .

As camadas estratigráficas exumadas foram 8 e escalonavam-se da seguinte forma

(Fig.3):

1. Terra arável, de espessura, textura e coloração heterogénea. A sua espessura é maior na

parte meridional da vala, sobretudo nas imediações do forra-valo. É esta camada que

cobre a crista de um muro (Ml), que apesar de estar a nível de alicerces, não esconde a

sua filiação medieval. Em termos gerais diremos que se trata de uma camada inúmeras

vezes revolvida, sendo, por isso, perfeitamente normal, que, por exemplo, as cerâmicas

tenham procedência e cronologias distintas. Nesta camada, pode dizer-se, que há frag-

mentos de peças de olaria, muito recentemente produzidas nas oficinas que se esten-

dem ao longo da estrada que faz a ligação entre Barcelos e Prado, a par de outras indis-

cutivelmente romanas, sem esquecer a tegulae.

2. Terra castanho clara. Esta pequena bolsa, mais não é que a cova de uma árvore, seme-

lhante a outras tantas, de maior tamanho, que estão patentes na Vala 2.

3. Terra castanho amarelada. Trata-se de uma camada de abandono e de revolvimento de

todas as ocupações, mesmo das mais recentes. Ao selar, neste caso concreto, o que res-

tava do Ml, mostrou ser uma camada relativamente recente, facto que pode comprovar-

-se através do espólio, que é diversificado, mas mais pendular que o da camada que se

154

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 3 – Perfil estratigráfico da Vala 1.

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lhe sobrepõe. São numerosos os fragmentos de tegulae, de cerâmica com características

medievas, sendo já significativos os bocados de cerâmicas romanas. Nestas, o destaque

vai para três pequenos bocados de terra sigillata hispânica, dois dos quais pertence a uma

Drag. 37.

4. Terra de tonalidade amarelada. Esta camada, onde estão patentes a tegula, a tijoleira, o

imbrex e a cerâmica romana, é o que resta da ocupação relacionada com o muro M3.

É o que pode definir-se como um misto de ocupação e de destruição de um edifício de

época romana. A diluição deste estrato na camada superior, ficou a dever-se aos impon-

deráveis físicos próprios de um terreno em declive, que ficou mais vulnerável à medida

que o arranque das pedras do edifício romano foi acontecendo, até só restar o alicerce.

A cerâmica recolhida é toda ela de fabrico romano e consta essencialmente de cerâmica

comum, mas não pode ignorar-se a presença de terra sigillata hispânica (Drag. 15/17,

24/25, 27 e 37), de cinzentas finas, de bracarenses e de alguns bocados de vidro.

5. Terra castanho amarelada. É a vala de fundação do muro medieval (M1).

6. Só patente na Vala 2.

7. Terra castanho escura, com tonalidades amareladas. Esta camada é uma antiga cober-

tura vegetal, anterior à implantação das estruturas habitacionais de época romana, pois

foi cortada pela vala onde foi fixado o alicerce do muro M3, que é o que resta do edifício

de época romana. Cobriu o pouco que resta da ocupação castreja, fortemente violada e

destruída com a abertura do alicerce do M1, que é de época medieval. O espólio encon-

trado é todo ele constituído por fragmentos cerâmicos de época romana.

8. Terra cinzento escura. Trata-se de uma pequena quantidade de terra cinzenta, muito

localizada e que comporta muitas cinzas e alguns carvões. É o que resta da ocupação cas-

treja que deu início à ocupação do sítio. A sua destruição ocorreu com a construção do

muro de uma estrutura medieval, aqui patenteada pelo M 1. No espólio recolhido há real-

çar a presença de dois pequenos fragmentos de cerâmica castreja.

9. Saibro amarelo, granuloso, não muito consistente. É o solo base onde foram cavados os

alicerces dos muros medievais (M1), romano (M2) e onde naturalmente se inseriram as

raízes das árvores que estão na origem das diversas covas patentes na Vala 2.

2.1.2. Estratigrafia da Vala 2 Esta vala tem de 41 m de comprimento, entre a base do talude do forra-valo e o muro

semi-destruído que marcava a passagem do campo de cultivo para o terreno que, antes de se

ter transformado em vinha, havia sido terreno de monte.

As camadas estratigráficas exumadas são 4 e correspondem, de certo modo, às da vala 1.

1. Camada arável de espessura, textura e coloração heterogénea.

2. Terra castanho amarelada. É uma camada de revolvimento constituída por saibros e ter-

ras de cultivo misturadas. É bastante mais espessa na metade mais meridional da vala,

devido à terraplanagem que, décadas atrás, modificou a fisionomia deste socalco.

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UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

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3. Terra castanho escura. A tonalidade mais cinzenta desta camada deve-se à presença de

cinzas e de alguns carvões, cuja origem não está devidamente esclarecida por causa da

exígua largura da sondagem e ao facto de ter sido interrompida com a construção do

muro de suporte ou forra-valo.

A título provisório, parece-nos que se trata de uma camada onde está patente a falta de

articulação entre os diversos elementos que a compõem. Por isso mesmo não provirá

propriamente de uma ocupação humana contínua, antes resultará da queima de ramos

de árvores e de arbustos, isto é, da limpeza que por vezes se fazia e ainda se faz no perí-

metro dos campos de cultivo e mesmo na berma das matas. Na que existia antes da sua

transformação em vinha, havia carvalhos e pinheiros. Como alguns dos carvões são pro-

venientes de ramos de carvalho, as deduções agora apresentadas poderão resultar bem

credíveis, mas não certamente com direito a exclusividade.

O espólio, tal como a composição da camada, é, também ele, heterogéneo. Pouco nume-

roso, mostra haver um predomínio das cerâmicas medievais, mas sem esquecer a exis-

tência de outras de época romana.

4. Terra castanha com diversas covas de árvore.

2. As estruturas

São três os muros de edifícios detectados no interior da Vala 1 do Campo do Reboledo.

Na Vala 2 não foram detectados restos de construções, somente covas abertas no solo natu-

ral e que, na sua totalidade, estão relacionadas com árvores.

2.1. M1

Este muro apareceu a nível de alicerce. Dele restavam somente as pedras das fiadas

inferiores, algumas delas reaproveitadas de anteriores construções, dispostas sem grande

esmero, como aliás acontece nas construções onde o cuidado, quando o há, somente é assu-

mido na parede exterior quando esta começa a despontar fora da terra que enche o alicerce.

Cronologicamente é um muro de época medieval, mais especificamente da Baixa Idade

Média.

156

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 4 – Planta das estruturas da Vala 1.

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2.2. M2

Este muro apareceu somente no meio da vala de sondagem, razão porque não está docu-

mentado em nenhum dos perfis estratigráficos. Estruturalmente é um muro que não permite

mais conclusões que o acima referido. Tal como o anterior, conserva somente as primeiras

pedras do alicerce, mas o seu estado de conservação é bem pior que aquele.

2.3. M3

Trata-se de um muro que foi lambido em ambos os topos, mas que deve fazer parte de

um compartimento e este de uma estrutura mais vasta, isto é, de um edifício de época

romana. Tal como acontece com os edifícios de boa construção deste período, também este

possui pedras bem aparelhadas e picadas, dispostas em fiadas mais ou menos regulares. Ao

contrário dos outros muros, o alicerce deste e a própria parede têm a mesma qualidade da

parte que ficava fora da terra. Um tal tipo de construção só era possível, porque o alicerce foi

cavado mais largo que o normal, situação que é bastante usual em edifícios do Baixo-Impé-

rio desta região. Pelo menos estas são as ilações que se podem colher em construções com

idêntica cronologia, sitas na villa do Paço de Vila Cova-Barcelos, na sua congénere do Forte

de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira) e na villa suevo-visigótica da Quinta do Paço Velho da fre-

guesia da Facha, concelho de Ponte de Lima (Almeida, 2003).

2.4. As covas da Vala 2

São várias as covas detectadas nesta vala. Nada mais que 8, mas nem todas estão com-

pletas, já que as valas números 5, 6 e 7 têm um diâmetro maior que a largura da sondagem

(Fig.5). Como já foi referido, estas valas foram feitas pelas raízes das árvores que foram cres-

cendo naquele espaço.

3. O Campo da Fonte

Este terreno está situado no lado oposto ao Campo de Rebordelo. O que os separa é o

traçado da estrada n.° 306. Trata-se de um extenso terreno agrícola, em parte ocupado com

um pomar de macieiras e que se estende para norte, na direcção do lugar de Santa Marinha,

que desponta, um pouco para lá de um pequeno pinhal.

157

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 5 – Planta das covas detectadas na Vala 2.

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O primeiro vestígio, digno de nota, encontrado neste espaço foi um capitel de tipo

dórico guardado numa casa vizinha e que havia sido arrancado do solo, numa das muitas

lavragens realizadas no campo. No entanto uma observação mais cuidada ao terreno plantado

com macieiras haveria de revelar a presença de tegulae e nas paredes que circundam o campo

pelo lado norte, a pedra de construção com as marcas das construções de época romana, eram

elementos mais que convincentes para que as sondagens se estendessem para norte da

estrada nacional.

Os primeiros sinais, que neste terreno ainda havia estruturas soterradas, surgiram no

momento em que a vala para os tubos de transporte de gás foi aberta. Nesta altura recolhe-

ram-se cerâmicas de época romana e medieval, tegulae e imbrices e apareceu a crista de uma

muro. Perante a evidência de tais vestígios, tornou-se imperioso o alargamento, gradual, da

área de escavação, à medida que os sinais se iam convertendo em realidades mais palpáveis

e consistentes, isto é em muros e pavimentos.

A primeira medida adoptada foi a transformação da vala de sondagem num quadrado

de 3,5 x 3 m, a que se seguiu um outro de 3 x 3 m. A separá-los havia uma banqueta com 1 m

de largura. Os trabalhos viriam a concluir-se com um novo alargamento da área escavada, nas-

cendo assim o Q.4 com 9 x 6 m. Num cômputo final diremos que a área escavada acabou por

se cingir a 96 m2 (Fig. 12).

3.1. Estratigrafia

Iniciada a escavação do primeiro dos quadrados, logo ficou patente que ali havia dois tipo

de construção, praticamente sobrepostos, com a mais recente a aproveitar a pedra da constru-

ção anterior. O alargamento da área de escavação acabaria por determinar a existência de duas

estruturas. A mais antiga datando do Baixo Império e a mais recente já do período medieval.

158

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 6 – Perfil estratigráfico Este.

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1. Terra arável de espessura variável. O espólio constava de cerâmicas romanas e moder-

nas, sobretudo fragmentos de tegulae.

2. Camada heterogénea quanto à composição, textura e espólio, porque resulta de uma

série de revolvimentos a que não é estranho o facto de cobrir a crista de todos os muros

recenseados na área escavada. A heterogeneidade desta camada compreende-se pela

simples razão, que ao tom dominante, que é o castanho acinzentado, se associam os res-

tos da ocupação medieval e os saibros que provêm da derrocada e sobretudo do arran-

que propositado das pedras dos muros. Um dos mais atingidos foi, o muro de uma estru-

tura medieval que, em certos sítios, foi arrancado até à vala de fundação. Ficaram as

pedras miúdas, os bocados de tegulae e de imbrex e alguns fragmentos de cerâmicas

medievais, a par de outras que são indubitavelmente de fabrico romano.

3. Esta camada é uma bolsa de terra com pedra

miúda, feita no momento em que se retira-

ram as pedras do M1 e M3. O saque das

pedras é o longo resultado das lavragens e da

limpeza do solo arável. Não aparece no perfil.

4. Terra acastanhada, muito calcada, delibera-

damente compactada, que encostava aos

muros M3 e M4 (Fig. 12). Trata-se do piso,

bastante destruído pelo saque das pedras,

do compartimento de uma casa medieval

que sobre ele tivera ma outra camada de

ocupação, mas que aqui aparece generica-

mente misturada na 2 (Figs. 8 a 11). Não

aparece nos perfis.

159

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 7 – Perfil estratigráfico Este.

FIG. 8 – Vista das estruturas tardo-romanas e visigóticas.

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160

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 9 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.

FIG. 10 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.

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5. Terra cinzenta com restos de saibro e pedra. É uma camada de certo modo complicada

quanto à sua formação. Resulta da mistura de terras relacionadas com a anterior ocu-

pação, a 6, que é o resultado da destruição do M1 e do assentamento da casa medieval.

No fundo é muito a camada 6 adaptada com a construção do M3 que obrigou ao revol-

vimento de todo aquele espaço. Por esse facto é que a cerâmica é toda de fabrico romano.

6. Camada de destruição do M1. A terra é uma mistura de saibro, terra, pedra miúda e

muita tegulae fragmentada.

6A.Terra acastanhada. É a camada de enchimento após a construção do M1 de época

romana.

6B. Terra castanho-acinzentada. Basicamente é um misto de terras oriundas da ocupação

relacionada com o M1 romano. Aqui enchem a vala de fundação do M3 medieval.

7. Terra cinzenta que resulta da ocupação do edifício romano. No meio da terra havia bas-

tante tegulae e muitos fragmentos de cerâmica de utilização diária numa casa romana:

dolia, cântaros, bilhas, jarros, panelas, etc.

8. Piso do edifício romano. Foi feito a partir do solo de saibro natural que foi aplanado. Não

aparece nos perfis, porque foi quase totalmente destruído com os trabalhos da cons-

trução medieval e com as muitas covas e valas que foram ali abertas. Algumas destas

covas correspondem a silos onde foram metidos os fundos de dolia (Figs. 9, 10 e 11).

161

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 11 – Vista geral das estruturas tardo-romanas e visigóticas.

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9. Corresponde a uma pequena cova aberta no saibro natural (Fig. 7).

10. Saibro. Solo geológico.

3.2. As estruturas

Os muros encontrados neste espaço correspondem a dois edifícios. O mais antigo é

romano, o outro é medieval.

3.2.1. O edifício romano Desta estrutura descobriram-se dois muros — M1 e M2 — e a vala de um terceiro (Fig. 12).

Os demais muros estão em terreno não escavado. Dos dois o melhor conservado é o M1.

Foi construído com pedra relativamente bem aparelhada e picada, com os interstícios tapados

com lascas e o meio cheio com pedra mais miúda misturada com muito barro (Figs. 8 e 13).

Resultou uma construção sólida, desde o alicerce, que foi reforçado com pedras de maior porte,

a fazer de travamento. A sua própria largura, a rondar os 0,46 m, reforça a ideia que se tra-

tava de um edifício sólido, o suficiente para aguentar um telhado de pesadas tegulae assentes

em madeiramento, presumimos nós, de carvalho.

Pelo que se descobriu, este edifício teria mais que um compartimento, funcionando este

como celeiro-armazém.

162

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 12 – Planta do edifício tardo-romano e visigótico.

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3.2.2. O edifício alto-medieval Dos dois edifícios este é o que está mais destruído, pois somente restam parcelas de dois

muros (M3 e M4) de um conjunto que pelo menos teria quatro (Fig. 12).

Estruturalmente é uma construção muito mais fruste que a anterior, feita com pedra mal

colocada (Figs. 10 e 11), muito dela reaproveitada dos muros do edifício de época romana.

Como está muito destruído, ao contrário do anterior, não sabemos verdadeiramente qual foi

a sua função. As muitas cinzas, algumas bem incrustadas no piso da casa, permite imaginar

que se tratava da cozinha de uma pequena casa de habitação de época medieval.

4. O espólio arqueológico

O espólio arqueológico não é muito, mas mesmo assim devermos referir a existência de

um capitel dório em granito, alguns pregos que são os únicos representantes do grupo dos

metais, dois ou três pequenos fragmentos de vidro e naturalmente a cerâmica.

4.1. Vidro

Fragmentos de vidro foram recolhidos 4. Um no decurso das investigações de campo,

os demais nas valas de sondagem. Em qualquer dos casos são elementos muito escassos para

que se possa traçar um diagrama da verdadeira identidade.

Dos quatro, somente dois permitem avançar uma hipótese de classificação tipo-crono-

lógica. Um dos fragmentos tem coloração verde-clara e pertence a uma pequena taça. O outro

é o bordo de um frasco de definição tipológica imprecisa. Em qualquer dos casos a sua cro-

nologia parece apontar para o Baixo-Império.

163

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 13 – Pormenor do muro romano (M1).

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4.2. Cerâmica

O espólio cerâmico está distribuído pelos vários estratos, mas a maior incidência encon-

tra-se sobretudo camada 3 e menos abundantemente na 4. São aliás estas duas camadas aque-

las que mais relacionadas estão com as ocupações romanas do Baixo-Império e da Alta Idade

Média.

De acordo com os quadros anexos, a predominância está na cerâmica comum romana,

mas não é menos verdade que também é significativa a presença de cerâmica da Alta Idade

Média e mesmo de espaços cronológicos mais recentes, como é o caso da Baixa Idade

Média. Tal facto está, por exemplo, bem patente no estrato 2 de Rebordelo, onde, a par da

cerâmica comum romana com uma percentagem na ordem dos 67%, está a medieval e

mesmo a moderna. Significativa é a presença de cerâmica da Alta Idade Média, a qual cobre

um vasto espaço cronológico, que vai do período visigótico a estádios adiantados da Recon-

quista (Fig. 14). Trata-se essencialmente de cerâmica de pastas escuras, a variar entre o cinza

e o castanho, cozedura deficiente e bastante areia a servir de desengordurante. Imagem de

marca, para além das paredes a denotar o uso do torno lento, é a superfície exterior com defi-

ciente alisamento e normalmente decorada com linhas verticais, finas, feitas com um pente

ou uma vassoura, motivo que origina um alinhamento imperfeito a toda a largura do colo

e da pança. Sendo esta cerâmica basicamente de cozinha, demonstram-no os quase 100%

de fragmentos com fuligem. A forma mais comum é uma panela de colo vertical a rematar

num lábio plano e uma pança a tender para o rombóide. O fundo é plano e não mostra mar-

cas de reforço.

O estrato 3 é aquele que mais cerâmica possui. A quase totalidade é constituída por

cerâmica romana (Fig. 15). Nesta, somente uma pequena percentagem é constituída por terrasigillata hispânica, dois fragmentos de cerâmica pintada e parte de um bordo que pode ser

englobado no grupo das cerâmicas bracarenses (Fig. 19). A restante é cerâmica comum.

Uma análise, mesmo que ligeira, mostra que a maioria da cerâmica aparece fortemente

164

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 14 – Estrato 2: distribuição cronológica do material cerâmico.

C. Moderna: 3%

C. Comum Romana: 67%

C. Medieval: 10%

C. Visigótica: 20%

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fragmentada, sendo normalmente constituída por bocados de panças e de outras partes de

vasos cerâmicos. Só uma pequena parcela é que é constituída por bordos, fundos e asas (Fig.

16) e é através deles que é possível descortinar uma boa parte das formas que funcionavam

no dia a dia daqueles moradores. Nestas, pode-se dizer, que estão presentes praticamente

todas as formas que normalmente existiam numa casa de campo daquele tempo, mormente

aquelas que funcionavam numa cozinha (Fig. 16). Prova-o a larga percentagem de cerâmica

com evidentes sinais de fuligem (Fig. 17), valores que afinal se repetem nas camadas de ocu-

pação (Fig. 20) e nas formas mais representadas. As formas mais presentes são as panelas,

os potes, os pratos e as frigideiras, afinal aqueles recipientes com mais uso na cozinha, tal

como as bilhas, os oinokoés, as taças, os cântaros e os alguidares o são numa casa, em vir-

tude da sua múltipla função (Fig. 18).

165

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 15 – Estrato 3: distribuição cronológica do material cerâmico.

C. Romana: 95%

C. Visigótica: 5%

FIG. 16 – Cerâmica: tipo de fragmentos.

Asas: 1%

Restantes: 90%

Fundos: 4%

Bordos: 5%

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166

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 17 – Cerâmica: presença ou ausência de fuligem.

Fuligem: 63%

Sem fuligem: 37%

FIG. 18 – Cerâmica distribuição tipológica.

Panela: 24%

Bilha: 11%

Pote: 7%

Oinokoé: 7%

Prato: 7%

Taça: 7%

Copo: 7%

Peso de Tear: 4%

Pratel: 4%

Cântaro: 4%

Alguidar: 4%

Dolium: 14%

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No vasto leque de cerâmicas comuns de época romana aqui representadas, chamam a

atenção os produtos fabricados com pastas beijes, depuradas, bem cozidas e com engobes e

aguadas que cobrem, por inteiro, a superfície exterior (Fig. 21). Estes engobes revestem, sobre-

tudo, os pratos e os vasos destinados aos líquidos que se destinavam a ser usados na mesa.

Nem sempre são engobes de boa qualidade, por vezes são espessos, mas mesmo assim não

escondem o brilho das finas partículas de mica que impregnam as pastas. Quando a quali-

dade decai, então o engobe não passa de uma simples aguada. A cor típica é o castanho aver-

melhado, muito desbotado, sobretudo devido à má qualidade dos produtos e às condições de

jazida.

A lista ficará completa se lhes juntarmos os dolia, os mais que usuais recipientes de

armazenamento de cereais e líquidos que constituem uma boa parte do espólio encontrado

nas camadas estratigráficas do Campo da Fonte. O rol fica completo com os pesos de tear, que

acabam por corroborar a presença de uma actividade mais que milenar.

167

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 20 – Estrato 3: presença ou ausência de fuligem na cerâmica.

Sem fuligem: 69%

Fuligem: 31%

C. Comum Romana T. Sigillata C. Pintada C. Bracarense

300

250

200

150

100

50

0

FIG. 19 – Estrato 3: distribuição por fabricos.

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5. As ocupações de Reboledo/Campo da Fonte

São escassas as ilações que podemos tirar dos muros encontrados e do espólio recolhido

nas várias camadas arqueológicas registadas. Mais coerente parece ser a diacronia do sítio

com quatro momentos distintos e bem diferenciados.

5.1. Ocupação castreja

A única informação que temos desta ocupação resulta do facto de havermos encontrado

alguns pequenos fragmentos de cerâmica castreja e de estes estarem relacionados com uma

pequeníssima amostra estratigráfica na vala aberta no Campo de Rebordelo.

A presença de cerâmicas e de restos arquitectónicos fora dos contextos arqueológicos tra-

dicionais, isto é, dos castros, já não espanta. Depois da descoberta de uma casa castreja em

terrenos agrícolas da freguesia da Facha (Almeida, 1990, p. 58-61), posteriormente reforçada

com um outro exemplo no lugar de Prazil da mesma freguesia (Almeida, 1990, p. 68-69),

o fenómeno deixou de ser uma raridade para se transformar numa certeza, já muito bem fun-

damentada. O arroteamento dos campos de meia encosta aconteceu nos primeiros tempos

da Romanização, sendo seus autores, agricultores indígenas que gradualmente abandonaram

o aconchego das muralhas dos castros para instalarem-se em terreno aberto (Almeida, 2003).

Estas descobertas, ocorridas na década de 80 do século passado, vieram a multiplicar-se na

década seguinte, ocorrendo sempre em espaços análogos aos acima descritos. Vestígios cas-

trejos deste tipo foram então descobertos em Boudilhão (Moreira de Lima) (Almeida, 1990,

p. 175), na Quinta de Santa Luzia da freguesia de Covas (Vila Nova de Cerveira) (Almeida,

2000, p. 26-28), no Paço de Vila Cova (Almeida, 1997, I, p. 195-196), na Casa do Adro de

Encourados (Almeida, 1997, II, p. 38-39), ambas no concelho de Barcelos, sem esquecer

outras latitudes, como é o caso da Agra do Relógio, freguesia de S. Paio de Antas e da Villa

Menendi (Apúlia) no concelho de Esposende (Almeida, 1998, p. 20, 26, 27), para não falar

em mais de uma dúzia de sítios de descoberta bem recente.

168

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 21 – Cerâmica comum romana: presença ou ausência de engobe.

Sem engobe: 66%

Engobe: 34%

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Tal como aconteceu naqueles sítios e só citamos os mais divulgados, também aqui a

ocupação destas terras terá começado com uma família de lavradores indígenas oriunda de

um dos castros da região — os mais próximos são S. Cristovão em S. Julião de Freixo, Cas-

tro Seco em Vilar das Almas, Alto das Covas (Cadém) e Valadares em Calvelo (Almeida,

1997, I, p. 60-62).

Construíram uma casa à maneira tradicional — tal facto está comprovado na Quinta do

Paço da freguesia da Facha (Ponte de Lima) e na Quinta do Paço de Vila Cova (Barcelos) —

serviram-se dos vasos cerâmicos que fabricavam e conheciam da sua vivência quotidiana e

naturalmente que se aplicaram as mesmas técnicas e sementes que haviam utilizado quando

viviam no aglomerado populacional sediado no interior de um espaço amuralhado. A novi-

dade estava, precisamente, no facto do número de agricultores tender para o crescimento ace-

lerado e de, pela primeira vez, começar a assistir-se no futuro Entre-Douro-e-Minho a um

fenómeno que viria a tornar-se numa das suas principais bandeiras futuras: o princípio da

dispersão habitacional.

A instalação de um casal de agricultores indígenas neste sítio tinha todas as garantias

de uma compensação económica imediata e de um sucesso futuro garantido. As terras esco-

lhidas situavam-se numa zona de várzea com bons solos agrícolas, bem drenados por força

de um pendor natural que canalizava para a linha de água, que corria a Sul e todas as escor-

rências que brotavam das nascentes localizadas nas imediações do actual lugar de Santa Mari-

nha e nos períodos de invernia, as águas provenientes das chuvas. A curta distância ficava a

floresta com os seus carvalhos, sobreiros e talvez castanheiros. Mais para a encosta ficava o

domínio do pastoreio e das lenhas arbustivas, isto é, do saltus. Com tais condições, o mais natural é que a exploração agrária daquela família indígena

tivesse sucesso e desse origem a um domínio maior, algo como um casal ou uma quinta,

muito dificilmente uma villa, caso aqui o termo seja aplicado no sentido clássico do termo.

5.2. A ocupação romana

A ocupação romana está aqui representada através de alguns muros e de cerâmicas. No

Campo de Rebordelo há somente um muro, de boa qualidade técnica e com uma cronologia

que ronda o Alto Império. No vizinho Campo da Fonte são dois os muros, mais a vala de um

terceiro, que permitem ajuizar, em conjunto, a presença de uma construção que tinha, pelo

menos, dois compartimentos. A função não foi certamente a mesma, tão pouco a cronolo-

gia. A pequenez do espaço escavado no Campo de Rebordelo não favorece grandes inter-

pretações sobre a funcionalidade do muro. A maneira como foi construído, associada à cerâ-

mica, permite supor que estamos perante parte de um edifício que servia de morada a uma

família de agricultores já Romanizados, muito naturalmente os sucessores dos primeiros cas-

trejos que haviam-se instalado naquele ponto. Em favor desta hipótese está, sobretudo, o facto

da ocupação romana ter-se sobreposto ao primitivo espaço habitacional castrejo e de, no

Campo da Fonte, os vestígios serem de natureza bem diferente.

Em abono de uma cronologia em tomo do Alto Império estão, sobretudo, as cerâmicas

recolhidas na Vala 1 e 2. Entre elas destacamos alguns fragmentos de terra sigillata hispânica

das formas Drag. 15/17 e 37, dois pequenos fragmentos de vidro verde musgo e verde claro com

tonalidades amareladas e uma boa dose de fragmentos de bilhas, oinokoés, potes e pratos

cobertos com aguadas e engobes de coloração castanho avermelhado, bem como restos de tijo-

leira, de tegulae e de imbrex. O lote ficará completo com a junção de alguns fragmentos de cerâ-

mica bracarense, a par de outras cuja pasta, bem depurada e, tem uma coloração beije.

169

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

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Tendo presente a tipologia, as características e diversidade das cerâmicas romanas, não

custa sustentar que aquele muro faz parte da casa de um fundus — a dimensão do espaço

agrário disponível, sugere uma propriedade de média dimensão, algo como uma quinta da

actualidade — que foi levantada sobre os alicerces de uma velha casa castreja construindo-

-se uma nova casa de habitação, mais ampla, mais funcional e naturalmente adaptada a gos-

tos que já então imperavam: uma casa à maneira romana. Nessa direcção apontam as cerâ-

micas e de um modo muito especial, os muitos bocados de tijoleira de pavimento que encon-

tramos nas camadas estratigrafadas.

Se todas as estruturas, das habitacionais (pars urbana) à componente agrícola (pars fruc-tuaria) desta quinta do Alto-Império, se localizavam no espaço do Campo de Rebordelo, é

coisa que desconhecemos. O que com mais consistência se nos apresenta, é que no Campo

da Fonte há restos de uma estrutura que fazia parte da pars fructuaria de uma villa ou mesmo

de uma quinta. A parte escavada corresponde ao celeiro, que também podia ser adega (Figs.

10 e 11), enquanto as divisões, somente afloradas, podiam comportar outros serviços neces-

sariamente integrantes numa estrutura agrícola, como são os currais, as lojas para armaze-

namento de alfaias, de carros, lenhas e palhas para os animais.

O elemento mais característico e que na realidade define e confirma esta função, são as

covas subcirculares que foram propositadamente abertas no piso de saibro natural (Figs. 11

e 12) que foi expressamente cortado e aplanado. Foi nestas covas que foram assentes os fun-

dos dos dolia — numa das covas foram recolhidos fragmentos de dolium — que guardavam

líquido e cereais. Nos líquidos podemos suspeitar já da presença do vinho, sabido que é haver

nas proximidades, por exemplo no castro da Carmona em Balugães, lagares que funciona-

ram por aquela altura (Almeida, 1990, p. 131-146, 1997, p. 70). Os cereais, esses sempre fize-

ram parte da dieta alimentar das populações indígenas, antes e durante a Romanização. Aliás

se fizermos um, mesmo que breve levantamento de locais já escavados e onde se documen-

tam sinais de celeiros, diremos que todos eles repetem um esquema análogo: edifício com

muros em pedra e chão em terra calcada e aplanada onde foram cavados os buracos, sendo

a localização na proximidade da casa de habitação. Exemplos análogos a este podem ser colhi-

dos na Agra do Relógio, freguesia de S. Paio de Antas, concelho de Esposende e na Vila do

Paço de Vila Cova, concelho de Barcelos (Almeida, 1997, p. 178).

Que no Campo da Fonte estava localizada a pars fructuaria de uma estrutura agrária,

disso não temos dúvidas. O que não está tão alicerçada é a certeza que nas imediações esti-

vesse a estrutura da casa do dominus. É certo que foi por ali que apareceu um capitel de estilo

dório. Este, por sua vez, aponta para a existência de um espaço de circulação que comunica

com um impluvium ou, em hipótese bem mais comezinha, pertencer à colunata de um

pequeno pórtico ou do alpendre de uma casa.

Mais que uma villa, esta exploração agrária nunca terá passado de uma quinta ou her-

dade de média dimensão, caso queiramos ter presente a realidade estrutural das explorações

agrícolas de uma região, fortemente condicionada pelo clima e pela morfologia. Caso quei-

ramos ressuscitar conceitos bem mais actuais, então esta exploração terá balançado entre um

casal e uma quinta. Se a sua dimensão, mesmo em descontinuidade, não atingiu cifras pró-

ximas dos 50 hectares, estaremos então a falar dos restos de um celeiro que pertencia a um

casal. Acima desses valores já estaríamos a falar de quintas e se eles ultrapassassem os 250

hectares então a referência certa seria a villa (Alarcão, 1996; Martins, 1995, p. 73-114; Pérez

Losada, 1987, p. 79-110, 1996). No caso vertente e tendo presente o tipo de paisagem agrá-

ria, a dimensão do espaço que era passível de ser arroteado e agricolamente aproveitado, pode-

remos então deduzir que os vestígios agora descobertos, muito dificilmente serão de uma

villa, só com reservas poderão ser atribuídos a uma quinta, sendo seguramente de um casal.

170

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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Atente-se na dimensão do celeiro, na quantidade de grão e de vinho que poderiam ali ser

armazenados e uma boa parte das dúvidas ficarão, certamente, desfeitas.

A sua cronologia, tendo em atenção um numisma, bastante maltratado mas que um

exame pericial atribui, com garantia, a Constantino Magno e sobretudo à maneira de cons-

truir as paredes — a cerâmica romana além de escassa tem o predomínio dos dolia — aponta

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mica com fuligem e que para mais tem as características das produções que no período pós-

romano se divulgaram pela região litoral do Minho: potes e panelas, de colo vertical, pança

rombóide, pasta arenosa e superfície alisada, quase sempre decorada com um vassourado de

linhas verticais pouco uniformes (Fig. 24, 1 e 2).

A maioria destas cerâmicas registam-se em torno do edifício do Campo da Fonte, mas

também não são estranhas nas valas de sondagem efectuadas no vizinho Campo de Rebor-

delo. Só que aqui, por estarem fora de um contexto estratigráfico seguro e não haver estru-

turas pétreas que possam ser atribuídas àquele período, o mais natural é provenham de escor-

rimentos.

Independentemente da dimensão das estruturas, uma coisa é certa. A construção aqui

erguida, na vigência da ocupação suevo-visigótica, era bastante mais fruste, longe da quali-

dade técnica posta na edificação das paredes romanas. Basta olhar para a maneira como as

pedras, muitas delas recuperadas, foram dispostas nas paredes para se perceber quão dis-

tantes estavam os pedreiros daquela altura da qualidade construtiva do período anterior.

A começar pela deficiente qualidade do barro aplicado nas paredes e no pouco cuidado posto

no piso, que deixou de ser de saibro bem argamassado, para ser somente terra calcada.

Exemplos idênticos fomos encontrá-los nas ocupações da Agra do Relógio (S. Paio de Antas),

no Forte de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira) e naturalmente na Quinta do Paço de Vila Cova

(Barcelos) (Almeida, 2000 e 1997, I).

No tocante às cerâmicas podemos afirmar que começa a ser vulgar a identificação deste

tipo de produção em estações desta região que apresentam cronologias ocupacionais seme-

lhantes. Elas estão presentes no Forte de Lobelhe (Vila Nova de Cerveira), na Quinta do Paço

de Vila Cova (Barcelos), nos povoados do Alto da Telha (Arcozelo), Vilarinho-Seara e Sabu-

gueiro-Poiares, na villa suevo-visigótica da Quinta do Paço Velho da Facha (Ponte de Lima),

na Agra do Relógio em S. Paio de Antas e mais recentemente no Campo do Pereiro da vila

de Forjães, freguesias que fazem parte do concelho de Esposende.

Todos estes sítios registam topónimos cuja origem é indiscutivelmente germana e

quando evoluírem as investigações no sentido de melhor precisar uma relação entre a topo-

nímia e a arqueologia, algumas surpresas bem interessantes irão surgir. Se muitos destes

topónimos são efectivamente do período das invasões germanas e não da Reconquista como

se pretendeu fazer crer, em certo tipo de investigação, então estaremos bem mais próximos

de traçar um quadro, mais completo, da fixação de povos germanos por alturas do século V

e VI d.C. Um quadro rural, para sermos mais precisos, porque não restam dúvidas que, salvo

raras excepções, estes topónimos acompanham os melhores solos agrícolas da região. Parece-

nos que os invasores germanos, quando resolveram acomodar-se ao campo, sabiam perfei-

tamente o que faziam e o que escolhiam.

5.4. A ocupação medieval

Atendendo à estratigrafia e às cerâmicas medievais das camadas mais superficiais, esta

ocupação parece ter uma datação coincidente com a Baixa Idade Média. Directamente rela-

cionado com estas cerâmicas, está o alicerce do muro M1, que tem um difícil enquadramento

tipológico, se atendermos à exiguidade da área escavada.

Conjugando os dados da arqueologia com a documentação medieval, é bem provável que

esta construção esteja relacionada com a herdade que as Inquirições de 1258 referem e que

pagava de fossadeira, pelo S. Miguel, dois dinheiros e uma galinha: “da erdade de Calvelo deDonas iiij. Dineiros. ltem, de Revordelo ij, dineiros e j. gallina”(PMH,Inq.).

172

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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6. Catálogo

Terra sigillata hispânica

Drag. 27 Pasta calcítica, de coloração vermelho clara. Engobe de cor laranja mate, espesso. Ade-

rente e pouco brilhante. SLM97 A3.

Drag. 37 Fragmento de pança decorada com círculos separados por motivos verticais. Pasta ver-

melho clara, relativamente fina e homogénea. Engobe vermelho alaranjado, espesso,

aderente e com brilho. SLM97 A3 (Fig.23, 5).

173

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 23 – Materiais cerâmicos: desenhos.

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Cerâmica comum romana e de tradição romana

PratoBase discoidal, corpo troncocónico a rematar num bordo adelgaçado, boleado e inclinado

para o interior. Pasta castanho clara, com muitas partículas de mica. Engobe castanho

avermelhado que realça as partículas de mica. SLM97 A2.

Cerâmica bracarenseForma indeterminada. Pasta beije rosada, depurada. Vestígios de engobe castanho-ala-

ranjado nas estrias de uma decoração a guilhoché. SLM97 A3 (Fig. 23, 4).

Cerâmica pintadaPasta beije, depurada, com grãos de mica muito finos. Superfície exterior pintada com

linhas oblíquas de cor castanho avermelhado. SLM97 A3 (Fig. 23, 3).

PratoFundo plano. Pasta rósea, depurada, finos grãos de mica. Engobe castanho avermelhado,

espesso, aderente, sem esconder as finas partículas de mica. SLM97A3.

Paredes FinasPasta beije, depurada (Fig. 23, 1).

PratoBordo arredondado, convexo, inclinado para o interior. Pasta avermelhada, pouco homo-

génea e calibrada com finas partículas de mica. Engobe de coloração castanho claro.

SLM97 A3.

PanelaBordo soerguido, inclinado para o exterior. Lábio facetado e marcado exteriormente com

um leve canelura. Ombros arredondados. Pasta amarelo clara e cerne acinzentado, com

grãos de areia e paletas de mica como desengordurante. Superfície alisada, vestígios de

fuligem na parte exterior. SLM97, A3, 35 (Fig. 24, 3).

PanelaBordo soerguido, inclinado para o exterior. Lábio boleado. Ombros arredondados. Pasta

amarelada, com grãos de areia e paletas de mica como desengordurante. Superfície ali-

sada, vestígios de fuligem na parte exterior. SLM97, A3.

PoteColo de paredes côncavas e convergentes. Bordo curto, arredondado. Pasta castanho-

-escura, com grãos de areia e mica. Superfícies escurecidas e sinais de fuligem. SLM97,

A3, 127 e 209 (Fig. 24, 2).

CântaroParede oblíqua e fundo plano. Pasta amarelada, com finos grãos de mica e grãos de

quartzo de médio calibre. SML97, A3, 260 (Fig. 24, 4).

174

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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175

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

FIG. 24 – Materiais cerâmicos: desenhos.

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176

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 25 – Materiais cerâmicos: desenhos.

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OinokoéParte de um gargalo, fragmentado em duas metades. Pasta amarelada, com grãos de

mica e finos grãos de quartzo. Superfícies com indícios de aguada acastanhada. SLM97,

A3, 46 e 231.

PotinhoBordo boleado, virado para o exterior onde há sinal do arranque de uma asa. Pasta

rósea, homogénea, com partículas de cerâmica moída. Superfícies com engobe de colo-

ração castanho clara. SLM97, A3, 172.

TaçaBordo engrossado para o exterior. Parede arqueada. Pasta beije, homogénea, com finos

grãos de mica. Superfícies cobertas de um engobe castanho claro. SLM97, A3, 174 (Fig.

25, 4).

CopoColo e pança. Pasta castanho clara, depurada, com grãos, muito finos, de mica. Super-

fície exterior alisada. SLM97, A3 (Fig. 23, 6).

BilhaColo apertado, remate em bordo boleado virado para o exterior. Pasta castanho clara,

depurada e homogénea. Engobe castanho-escuro, aderente e espesso. SLM97, A3

(Fig. 23, 2).

TigelaCarena na passagem para a pança. Pasta rósea, com muitas partículas de mica. Super-

fícies cobertas com um engobe castanho avermelhado, com partículas de mica, muito

finas, a sobressaírem. SLM97, A4 (Fig. 24, 5).

Asa em fita com botão de prensãoProvavelmente de jarro. Pasta amarelo clara, com partículas finas de mica e pequenos

grãos de quartzo como desengordurante. Superfície com restos de aguada castanho

claro. SLM97, A3, 265.

Asa BilobadaPasta beije, fina, cerne cinza clara, com finos fragmentos de cerâmica moída. SLM97,

A3, 62.

Asa em roloPasta cinza clara, com grãos de quartzo e finas partículas de mica. Sinais de fuligem e

de queimado na ligação à parede interna do vaso. SLM97, A3, 113.

Asa BilobadaPasta castanho avermelhada, homogéneo e finos grãos de mica. SLM97, A3, 6.

Asa em fitaCom fundas caneluras. Pasta castanho avermelhada com finos grãos de mica. Superfí-

cie coberta por uma aguada de cor vermelha. SLM97, A2, 32.

177

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

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TestoParedes convergentes a rematar em pega marcado superiormente com o corte de corda.

Pasta castanho amarelada, homogénea, corri grãos de quartzo e mica. SLM97, A3, 214.

PatelaForma subcircular feita a partir de um fragmento de tegula. Pasta amarelada, com cerâ-

mica moída como desengordurante. SLM97, A3, 100.

TegulaPasta amarelada, com cerâmica moída como desengordurante. SLM97, A3.

Peso de tearForma sub-circular com extremidades arredondas. Buraco circular. SLM97, A3.

Forma indeterminadaFundo plano. Pasta cinzenta, não muito cuidada, com partículas de mica. Interior marcado

por um ressalto e pelas estrias da roda. Superfície interior cinzenta e a exterior amarelo

clara com marcas de queimado na face exterior do fundo. SLM97, A3, 26 (Fig. 25, 1).

Forma indeterminadaFundo plano. Pasta rósea e cerne cinza claro com partículas de mica e grãos de quartzo

de médio calibre. Superfície exterior escurecida e com restos de fuligem. Vestígios de

comida agarrada na face interna, muito estriada. SLM97, A3, 186 (Fig. 25, 2).

Forma indeterminadaFundo plano. Pasta castanho acinzentada com finas partículas de mica e alguns grãos

de quartzo de médio calibre. Parede exterior sumariamente alisada a realçar a coloração

castanho avermelhada. SLM97, A3, 253 (Fig. 25, 3).

Forma indeterminadaFundo com inclinação côncava. Pasta castanho avermelhado e cerne cinza claro com

grãos de quartzo e mica como desengordurante. Superfícies amarelo sujo, à excepção

do exterior do fundo com uma forte tonalidade cinza por causa da acção do fogo. Face

interior muito marcada pelas estrias da roda de oleiro e por uma reentrância na ligação

da parede com o fundo. Sinais de fuligem na face exterior do fundo e restos de comida

no interior do mesmo. SLM97, A3, 185.

Forma indeterminadaFundo plano. Pasta escura com muitos grãos de quartzo e grãos de mica. Face exterior

castanho avermelhada, com sinais de fuligem na face exterior e muito queimada e

escurecida a interior. SLM97, A2, 44.

Forma indeterminadaFundo plano, com leve ressalto exterior. Pasta amarelada, com grãos de quartzo e finas

partículas de mica. Superfícies com tonalidades mais avermelhadas e grandes manchas

de fuligem na face exterior. SLM97, A3, 207.

178

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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Forma indeterminadaArranque de asa bilobada. Pasta cinzenta, cuidada, finos grãos de mica. Superfície cin-

zenta, mais escura que o cerne. SLM97, A3, 80.

PanelaPasta acastanhada com bastante areia. Superfícies queimadas. Decoração em linhas ver-

ticais não uniformes. Visigótica. SLM97, A3 (Fig. 24, 1).

Cerâmica medieval

AlguidarParede arqueada a rematar em bordo bem torneado cortado exteriormente quase na ver-

tical. Parede exterior marcada por uma canelura e dois tipos de decoração distintos: sulco

em meandro entre o bordo e a canelura e incisões subcirculares, oblíquas e paralelas.

Pasta castanho-acinzentada, arenosa. Superfícies enegrecidas e queimadas. SLM97,

A2, 63.

Forma indeterminadaFragmento de bojo com cordão decorado com dedadas. Pasta acastanhada com bastan-

tes grãos de mica e de quartzo. Superfícies acinzentadas. SLM97, A, Cov 1.

Forma indeterminadaFragmento de bojo decorado com um sulco profundo em meandro e um conjunto de

dedadas. Pasta castanha, arenosa. Superfícies cinzentas. SLM97, A2, Cov 1.

Vidros e ferros

VidroFragmento de fundo de taça. Coloração verde-clara com tonalidades amareladas. Bolhas

de ar. SLM97 A4.

Escória de ferroSLM97B COV9.

Escória de ferroSLM97 A3.

PregoFerro. Adiantado estado de desagregação. SLM97 A3.

PregoFerro. Adiantado estado de desagregação. SLM97B5.

179

UM CASAL ROMANO EM S. LOURENÇO DO MATO (PONTE DE LIMA)

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Vale Sá: primeiros vestígios da ocupaçãohumana do Epipaleolítico na zona de Coimbra

❚ NELSON ALMEIDA ❚ VÍTOR DIAS ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚ PEDRO SOUTO ❚

No seguimento do acompanhamento

arqueológico dos trabalhos de instalação do

gasoduto nacional, detectou-se numa pri-

meira prospecção, uma estação que forneceu

algum material lítico, ao km 0+300 do ramal

industrial de Souselas, perto de Coimbra

(Fig. 1).

Depois de detectada esta ocupação de

Vale Sá, foi necessário proceder à realização

de uma sondagem dentro da área de serven-

tia administrativa da pista, na zona onde esta

passava mais perto da estação arqueológica.

Optámos por apenas abrir uma área de 1 m2

que denominámos S1 (Fig. 1).

Esta sondagem tinha por objectivo a caracterização estratigráfica da zona, com o intu-

ito de se procederem a trabalhos posteriores. Foi-nos assim possível encontrar o terraço de

areão alaranjado onde se desenvolveu uma ocupação humana num período que considera-

mos, a priori, atribuível ao Paleolítico superior e determinar a profundidade a que esta ocu-

pação se encontrava. Quanto ao material arqueológico exumado caracterizou-se pela escas-

181

VALE SÁ: PRIMEIROS VESTÍGIOS DA OCUPAÇÃO HUMANA DO EPIPALEOLÍTICO NA ZONA DE COIMBRA

RESUMO Perto de Coimbra, em Vale Sá (Souselas)

foi detectada uma ocupação humana pertencente

a uma época da pré-história antiga pouco

conhecida em Portugal. As sondagens realizadas

no eixo da vala de implantação

do gasoduto permitiram confirmar que a zona

central da estação se encontrava fora da pista

do gasoduto. A intervenção realizada no eixo

do traçado revelou a presença de materiais

arqueológicos em posição secundária (indústria

lítica e seixos apresentando indícios de alteração

térmica). Uma posterior intervenção na área,

realizada por Miguel Almeida e Thierry Aubry,

permitiu identificar uma estrutura de combustão

e datá-la do Epipaleolítico. A localização da estação

de Vale Sá exemplifica um daqueles momentos

em que todo o esforço dispendido

em longos quilómetros de prospecção infrutífera

é recompensado.

ABSTRACT A human occupation dating from

early prehistory was identified at Vale Sá

(Souselas), near Coimbra; this period is not

very well known in Portugal. The sondages

of the pipeline lot seemed to confirm that the

central area of the site was located away from

the projected pipeline ditch. Archaeological

materials (lithic artifacts and pebbles showing

signs of heat exposure) were found in secondary

position. Further work by Miguel Almeida

and Thierry Aubry at the site led to the

identification of a hearth, dating from the

Epipalaeolithic. Locating the Vale Sá site was

a rewarding moment, a compensation for the

many miles of fruitless survey!

FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 235,

Esc.1:25 000.

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sez de peças encontradas, sobressaindo desde logo a possibilidade de nos encontrarmos

numa zona já afastada do local de ocupação inicial. Este material arqueológico estaria, pos-

sivelmente, em posição secundária.

Além desta primeira sondagem, realizamos uma segunda no interior da pista, na área

onde os trabalhos de colocação do tubo iriam atingir maior profundidade (Fig. 3). A reali-

zação desta segunda sondagem assentava na necessidade de definir se a área de expansão

da estação se prolongava até à pista. O conhecimento da estratigrafia da zona, conseguido

na sondagem S1, permitiu-nos iniciar os trabalhos com uma decapagem mecânica que leva-

mos até cerca de 70 cm de profundidade, numa área de cerca de 3 x 2 m. Após este traba-

lho concluído implantamos uma quadrícula de 3 x 1 m coincidindo, no sentido do compri-

mento, com a área de passagem da conduta. Prosseguimos com a escavação manual da son-

dagem, recorrendo para isso à remoção de níveis artificiais de 10 cm.

Tal como já tínhamos confirmado na sondagem

S1, a maior concentração de material arqueológico

apareceu no topo do estrato de areão alaranjado. No

entanto, a área desta primeira sondagem não nos

permitiu tirar conclusões sobre a distribuição dos

materiais arqueológicos, lacuna que pretendíamos

182

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 2 – Localização das sondagens realizadas em relação ao traçado do gasoduto.

FIG. 3 – Aspecto da sondagem 2 após a remoção

da camada C.

FIG. 4 – Vista geral do corte sul da sondagem 2.

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resolver com a abertura desta sondagem. A sondagem S2 apesar dos seus três metros qua-

drados de área sempre nos permitiu retirar maior informação. O material arqueológico

define-se de forma dispersa seguindo, no entanto, a orientação de possíveis linhas de água

que terão contribuído para essa dispersão e que apareceram na forma de ténues sulcos, à

superfície do terraço (Fig. 4)

A sondagem S2 confirmou assim a posição secundária do material arqueológico, facto

já indicado por uma primeira observação do material lítico realizada pelo Doutor Thierry

Aubry, através de estado de erosão desse material.

Materiais

O material exumado divide-se em seixos com vestígios de alterações térmicas por

combustão e materiais líticos de pedra lascada (artefactos, resto de talhe). Foram encon-

tradas cerca de duas dezenas de peças. A matéria-prima utilizada é heterogénea assentando,

no entanto, principalmente em sílex. Durante as sondagens apareceram materiais de

quartzo, quartzito e de vários tipos de sílex (Figs. 5 e 6).

Pelas características do material exumado, optamos por atribuir cronologicamente esta

ocupação ao Paleolítico superior (possivelmente ao período Gravettense). Esta atribuição foi

colocada com muitas reservas tendo em conta a parca quantidade de material exumado.

Corte estratigráfico

A sondagem 2 possibilitou-nos a definição do corte estratigráfico da zona em estudo

(Fig. 4). A escavação realizou-se já dentro de um caminho público. O material utilizado para

construir este caminho corresponde à primeira camada arqueológica (camada A). Esta é cons-

tituída por um sedimento arenoso de cor alaranjada com variações laterais de cor. Na son-

dagem n.0 1 esta camada era substituída por uma camada de terra vegetal com grande con-

centração de matéria orgânica. A camada seguinte (camada B) apresenta uma cor castanha

muito escura, quase preta, sendo formada por um sedimento argiloso de granulometria

fina. Este sedimento dá lugar a outro argilo-arenoso de cor mesclada cinzenta alaranjada

183

VALE SÁ: PRIMEIROS VESTÍGIOS DA OCUPAÇÃO HUMANA DO EPIPALEOLÍTICO NA ZONA DE COIMBRA

FIG. 5 – Núcleo em Sílex. FIG. 6 – Matéria-prima predominante na estação de Vale Sá:Núcleo em sílex (canto superior esquerdo), lascas em sílex

e lasca em quartzo leitoso (canto inferior direito).

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(camada C). A maior concentração de materiais apareceu nesta camada (Fig. 7). O último

estrato por nós detectado apresentou poucos materiais arqueológicos. O sedimento de tran-

sição argilo-arenoso perde a sua componente plástica e argilosa mais fina, dando lugar a um

sedimento mais arenoso e alaranjado (camada D). Este último estrato deverá corresponder

a um antigo terraço.

Após a nossa intervenção esta estação foi escavada ao abrigo de um Plano Nacional de

Trabalhos Arqueológicos. As sondagens realizadas permitiram definir uma estrutura de

combustão. Através desta estrutura de combustão foi possível datar esta ocupação. As data-

ções conseguidas vieram a revelar que a associação cronológica que havíamos atribuído com

algumas reservas se revelou errónea, sendo possível definir um horizonte Epipaleolítico

para esta ocupação. Os novos dados que este local proporcionou vieram dar alguma luz

sobre um período da nossa História praticamente desconhecido, tanto nesta região como no

restante território nacional, contribuindo para um melhor conhecimento da cultura material

e do modelo de habitat, destes homens que viveram no período de transição entre o Paleolí-

tico e o Neolítico.

184

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 7 – Vestígios arqueológicos detectados no topo da camada D.

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Sondagens arqueológicas de diagnóstico em Terlamonte

❚ NELSON ALMEIDA ❚ VÍTOR DIAS ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚ PEDRO SOUTO ❚

Durante os trabalhos de prospecção do

traçado correspondente ao lote 5 (Portale-

gre/Guarda) detectámos, dentro dos limites

da pista, alguns fragmentos de cerâmica de

construção romana. Como estes fragmentos

cerâmicos além de escassos estavam erodi-

dos, decidimos prospectar a encosta envol-

vente, fora da área da de passagem do gaso-

duto. Esta prospecção da área envolvente

levou-nos a confirmar a presença de vestígios

romanos a cerca de 250 m do limite da pista,

num local conhecido por Terlamonte (Fig. 1).

Uma vez que o traçado do lote 5 inter-

secta esta zona potencialmente favorável à

ocorrência de vestígios arqueológicos, decidimos proceder à realização de sondagens pre-

ventivas no eixo da pista, no local onde esta última passa mais perto da estação romana.

O número de sondagens realizadas foi de nove, distribuídas ao longo do eixo da pista

(Fig. 2), com um intervalo regular de 50 m. Apenas as sondagens S2 (a 40 m da S1) e S9

(a 25 m da S2) não respeitaram este espaçamento. Optamos por implantar sondagens de um

metro quadrado como área para as sondagens arqueológicas, uma vez que em muitos sítios

da zona o afloramento granítico se encontra à superfície, indiciando uma potência de solos

diminuta. Para a realização desta intervenção fomos auxiliados pelo arqueólogo Vítor Dias

e Pedro Souto, que constituem a segunda equipa da Transgás, naquela altura a acompanhar

o Lote 6 (Fig. 3).

185

SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS DE DIAGNÓSTICO EM TERLAMONTE

RESUMO O acompanhamento de grandes obras

não tem só por finalidade a localização de sítios

arqueológicos. Outra faceta de qualquer trabalho

de acompanhamento corresponde à minimização

de situações de risco potencial para o

património. Neste artigo apresentamos uma

destas situações, onde a intervenção arqueológica

não levou à detecção de vestígios mas veio

garantir a sua ausência. Desta forma ficou

patente que o traçado do gasoduto, nesta zona,

não punha em perigo qualquer sítio

arqueológico, sendo possível prosseguir com

os trabalhos.

ABSTRACT The follow-up of major public works

by archaeologists does not only aim at the

identification of archaeological sites.

The mitigation of possible damage to cultural

heritage is another purpose of any follow-up

mission. In the case presented in this paper,

archaeological field work hasn’t revealed any

remains, but confirmed their absence, thus

proving that the construction of a pipeline

in this area was not a threat to archaeological

sites, and allowing the works to be carried on.

FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 235,

Esc. 1:25 000.

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186

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 2 – Localização das sondagens no traçado do gasoduto.

FIG. 3 – Aspecto dos trabalhos de escavação.

As sondagens realizadas nesta área revelaram uma potência estratigráfica variando

entre os 65 cm de profundidade na S7 e os 0-5 cm nas sondagens S5 e S6, onde o afloramento

rochoso se encontrava praticamente à superfície (Figs. 4 e 5). Todas as sondagens foram con-

cluídas com a chegada à rocha granítica de base. Apenas na sondagem S3 o afloramento não

foi atingido, uma vez que esta sondagem veio a revelar a presença de uma linha de água fós-

sil, verificando-se uma acumulação de sedimentos muito superior ao registado nas restan-

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187

SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS DE DIAGNÓSTICO EM TERLAMONTE

FIG. 5 – Vista geral da sondagem n.0 2. Nesta sondagem, como nas sondagens n0s 3 e 7, a potência estratigráfica era maior, não

aparecendo, no entanto, qualquer tipo de estrutura.

FIG. 4 – Vista geral da sondagem n.0 1, onde se pode verificar que o afloramento granítico se encontra quase à superfície.

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tes áreas. Terminou-se esta sondagem quando se chegou à camada 4, constituída por um

areão grosseiro estéril em materiais arqueológicos (Fig. 6). O espólio arqueológico recolhido

no conjunto das 9 sondagens reduziu-se à presença de dois fragmentos de cerâmica erodi-

dos na S3 e um fragmento na S 1. Não foram detectados quaisquer vestígios de estruturas.

Os trabalhos de prospecção, que alargámos a uma extensa área em redor da pista, per-

mitiram-nos detectar a presença de estruturas romanas e o seu padrão de distribuição.

Encontramo-nos perante uma ocupação descontínua de pequenos focos separados entre si

por áreas onde não existem vestígios romanos.

Os resultados destas sondagens confirmaram o que anteriormente se previa, devido à

não detecção de qualquer tipo de estrutura nem concentrações de material arqueológico que

poderiam indicar a sua presença, em locais contíguos às sondagens.

Esta situação exemplifica outra faceta destes trabalhos de acompanhamento, não só diri-

gido para a localização de sítios arqueológicos mas também para a minimização de situações

de risco potencial para o património. Desta forma ficou patente que o traçado do gasoduto

nesta zona não punha em perigo qualquer sítio arqueológico, sendo possível prosseguir

com os trabalhos. A posterior abertura da vala veio abonar, mais uma vez, os resultados das

sondagens.

188

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 6 – Corte estratigráfico da Sondagem n.0 3. Camada 1: Sedimento de cor castanha clara, com alguma matéria orgânica;

Camada 2: Sedimento semelhante ao da camada 1 mas mais argiloso e com menos matéria orgânica; Camada 3: Sedimento

argiloso de cor castanho acinzentado, dentro do qual aparecem depósitos lenticulares de areão grosseiro; Camada 4:

Sedimento argiloso com grande quantidade de areão.

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Vale Pincel 2: história de uma incursão acidental

❚ NELSON ALMEIDA ❚ JOÃO MAURÍCIO ❚

A intervenção realizada no sítio Vale

Pincel 2 (Fig. 1) deveu-se ao acompanha-

mento das obras a cargo da Transgás Atlân-

tico, empresa que estava a construir o ter-

minal de gás natural e respectivos depósitos

de armazenamento, no Porto de Sines. A

construção deste terminal interferiu com a

esteira de transporte de carvão que abastecia

a central de produção de energia eléctrica

situada nesta zona. Tornou-se imprescindí-

vel, para a continuação das obras de cons-

trução do terminal de gás natural, a alteração

do traçado da esteira de transporte. A equipa

de arqueologia da Transgás foi contactada

para proceder à prospecção e acompanhamento das obras de construção da esteira em Março

de 2000. Iniciamos os trabalhos com a obra já a decorrer.

O traçado alternativo da esteira atravessava uma área de eucaliptal e foi por nós pros-

pectados, por razões que nos foram alheias, já numa fase dos trabalhos em que se procedia

à desmatação de toda esta área. Desta prospecção foi possível verificar que numa das áreas

do traçado existia abundante material cerâmico (Fig. 2) e algum material lítico. A área de dis-

persão de material abarcava cerca de 5 hectares, ultrapassando em muito a área do corredor

previsto para a construção da esteira e o próprio eucaliptal, por onde esta última passava.

189

VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL

RESUMO Nem sempre os trabalhos arqueológicos

são pensados com a antecedência necessária,

sendo necessário aos arqueólogos trabalhar

em situações limite. A intervenção realizada no

sítio Vale Pincel 2 é uma dessas situações.

Foi necessário conseguir um diagnóstico urgente

da realidade arqueológica, conciliar as opiniões

de todas as entidades intervenientes e,

fundamentalmente, tomar as medidas

de minimização necessárias para que o

património arqueológico não fosse prejudicado

neste processo. Este episódio teve como epílogo

positivo o facto de centrar as atenções num local

de grande importância arqueológica, que se

encontrava algo esquecido.

ABSTRACT Archaeologists are not always granted

enough time, and often have to work under very

difficult conditions. The field work at the Vale

Pincel 2 site was one of those situations.

An urgent archaeological diagnosis was required;

the views of all the organizations and institutions

involved had to be taken into account and, above

all, the adequate mitigation measures had to

be taken, in order to ensure the preservation

of the archaeological heritage. This episode’s

positive epilogue was the fact that it called

attention to a relevant archaeological site that

had been somewhat forgotten.

FIG. 1 – Localização do sítio arqueológico na C.M.P. n.0 526,

Esc. 1:25 000.

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190

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 2 – Materiais cerâmicos mais representativos recolhidos durante a prospecção de superfície: 1-11 – Taças; 9 e 4 – Potes;

5 e 12 – Taças carenadas.

FIG. 3 – Movente e dormente de moinho manual encontrados na área preservada da estação arqueológica.

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Na área que não tinha sido afectada pelo plantio de eucaliptos foi possível verificar a presença

abundante de materiais arqueológicos, nos quais se incluíam um grande número de dor-

mentes e moventes de mós manuais (Fig. 3). Tendo em conta os resultados da prospecção de

superfície mandámos parar imediatamente as obras na área da estação arqueológica.

De forma a ter uma melhor compreensão da realidade arqueológica com a qual estáva-

mos a lidar optou-se por fazer uma sondagem de diagnóstico, logo no dia seguinte, no cen-

tro do traçado previsto para a passagem da esteira de transporte.

Esta sondagem permitiu-nos definir três camadas arqueológicas distintas nesta área (Fig.

4). A diferença entre a camada 1 e a camada 2 assenta apenas na quantidade de matéria orgâ-

nica existente na primeira, uma vez que o tipo de sedimento que as constituiu é o mesmo.

O material arqueológico encontrava-se distribuído indiscriminadamente desde a superfície

da sondagem notando-se no entanto, uma maior concentração na base da camada 2 (Fig. 5).

A camada 3 apresenta-se já estéril em materiais arqueológicos. Posteriormente, verificou-se

que esta estratigrafia se repetia em todos os cortes analisados variando, todavia, em termos

de espessura das camadas e de tonalidade dos sedimentos.

Os dados recolhidos nesta sondagem, conjugados com os resultados da prospecção, leva-

ram-nos a contactar o Instituto Português de Arqueologia. A consulta da base de dados deste

191

VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL

FIG. 4 – Corte estratigráfico da Sondagem n.0 1. Camada 1: Terra vegetal arenosa de cor cinzenta clara contendo materiais

arqueológicos (cerâmica); Camada 2: Terra arenosa de cor cinzenta acastanhada com concentração de materiais

arqueológicos (Indústria lítica e cerâmica); Camada 3: Terra arenosa de cor cinzenta clara estéril em termos arqueológicos.

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Instituto permitiu-nos verificar que este local já tinha sido referenciado. Ficamos a saber que

se tratava do povoado neolítico de Vale Pincel 2, localizado pela equipa do Museu de Arqueo-

logia e Etnografia de Setúbal (Ferreira, Tavares da Silva, Lourenço e Sousa, 1993). Na posse

destes dados optou-se por marcar uma reunião com os responsáveis da Transgás Atlântico:

Eng. Stephan Huisman e Eng. João Torneiro, do Instituto Português de Arqueologia:

Dr. António Faustino e com o Dr. Carlos Tavares da Silva e Dra. Joaquina Soares do Museu

de Arqueologia e Etnografia de Setúbal, responsáveis científicos pela estação. Como resultado

desta reunião chegou-se as seguintes conclusões:

1. A área afectada pela obra de construção da esteira de transporte correspondia a uma área

densamente ocupada por eucalipto.

2. O plantio deste eucaliptal teria sido precedido de uma preparação do terreno, recorrendo

a uma lavra profunda (cerca de um metro).

3. O estrato arqueológico, segundo o Dr. Carlos Tavares da Silva e Dra. Joaquina Soares, e

como se pôde comprovar na sondagem por nós realizada, estaria situado entre os cin-

quenta e sessenta centímetros de profundidade.

4. Como conclusão lógica dos pontos anteriores, o estrato arqueológico, na área ocupada

por eucaliptos, teria sido irremediavelmente afectado, perdendo-se o seu valor científico.

Ficou definido que se procederia ao acompanhamento do arranque das raízes dos euca-

liptos de forma a verificar se ainda existia alguma área conservada.

Durante este acompanhamento não foi localizada nenhuma área conservada, o que é

perfeitamente perceptível não só pelas lavras realizadas para o plantio, como pela densidade

e distribuição das raízes dos eucaliptos que inviabilizam a preservação de qualquer estrato

192

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 5 – Materiais cerâmicos mais representativos recolhidos na camada 2 da sondagem n.0 1: 1-7 – Potes; 3, 4 e 8 – taças; 9 –

Fragmento de bojo com decoração.

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arqueológico (Fig. 6). De forma a verificar este facto, em cada zona de arranque de raízes, pro-

cedeu-se à realização de uma limpeza de corte. O acompanhamento arqueológico ficou con-

cluído com o desenho e fotografia dos seis cortes resultantes deste trabalho. O Museu de

Arqueologia e Etnografia de Setúbal, na pessoa da Dra. Joaquina Soares, procedeu também

ao levantamento fotográfico e gráfico destes cortes.

O processo realizado em Vale Pincel 2, teve um início atribulado, visto não ter sido feito

todo o trabalho de preparação que antecede o início de qualquer obra. Em consequência deste

facto, o acompanhamento iniciou-se com os trabalhos já avançados, sendo a equipa de

arqueologia confrontada com o problema da obra interceptar uma estação arqueológica

importante, facto que é de lamentar. Nesta situação, a equipa de arqueologia serviu de elo de

ligação com os arqueólogos que trabalham na zona. Durante os contactos realizados com

estes investigadores foi necessário conciliar pontos de vista algumas vezes discordantes.

Porém, todo este trabalho permitiu confirmar que não existiu perigo para o património

arqueológico inerente aos trabalhos da Transgás Atlântico. Por outro lado, permitiu alertar a

consciência dos investigadores na área para a necessidade de se procederem a trabalhos

arqueológicos, na parte conservada desta estação, de indubitável importância para a com-

preensão do fenómeno neolítico quer a nível regional quer no âmbito nacional. Esta neces-

sidade foi percebida e levou à elaboração de uma candidatura do local ao Plano Nacional de

Trabalhos Arqueológicos.

BIBLIOGRAFIA

FERREIRA, C. J.; TAVARES da SILVA, C.; LOURENÇO, F. S.; SOUSA, P. (1993) - O património arqueológico do Distrito de

Setúbal. Subsídios para uma Carta Arqueológica. Setúbal: Associação de Municípios do Distrito de Setúbal.

193

VALE PINCEL 2: HISTÓRIA DE UMA INCURSÃO ACIDENTAL

FIG. 6 – Aspecto dos cortes após o arranque das raízes dos eucaliptos e respectiva limpeza.

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Resultados das sondagens arqueológicas realizadas na Herdade de Monte Novo do Sul(Alcácer do Sal)

❚ VÍTOR DIAS ❚ PEDRO SOUTO ❚

Introdução

As sondagens arqueológicas realizadas na Herdade de Monte Novo do Sul enquadram-

se no âmbito do protocolo estabelecido entre o IPA e a TRANSGÁS S. A., no sentido de pro-

mover a salvaguarda dos sítios arqueológicos já conhecidos, bem como, dos sítios eventual-

mente detectados durante a construção do gasoduto nacional e referem-se a trabalhos reali-

zados no ano de 2002, durante o acompanhamento arqueológico do Gasoduto Setúbal/Sines.

O trabalho desenvolvido surge na sequência de prospecções realizadas ainda antes da

obra ter o seu início. Os vestígios cerâmicos que conseguimos visualizar encontravam-se pró-

ximo da zona de afectação originada pela anterior implantação do oleoduto, mais precisa-

mente no local seleccionado para a perfuração que permitiu a travessia do rio Sado1. Foi pos-

sível recolher à superfície, diversos fragmentos cerâmicos de fabrico manual, cujas caracte-

rísticas indiciavam uma cronologia próxima do Neolítico.

Ao constatarmos as potencialidades do local até então inédito na bibliografia científica,

apesar deste apresentar sinais evidentes de florestação, e de se localizar nas imediações da

195

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

RESUMO O presente artigo expõe os resultados

de sondagens arqueológicas concretizadas no ano

de 2002 em Monte Novo do Sul, na sequência

das obras do gasoduto Sines-Setúbal. Identificado

em prospecções realizadas antes do início dos

trabalhos de implantação da rede de gás, este sítio

foi alvo de intervenção arqueológica com o intuito

de avaliar o estado de conservação, confirmar

a cronologia e a natureza da ocupação humana.

Materializamos a localização e descrição da

estação arqueológica tal como, o respectivo

enquadramento histórico, abordando de seguida

a metodologia utilizada e os resultados da

intervenção. Os materiais recolhidos resumem-se

a artefactos líticos e fragmentos cerâmicos

com características técnicas e formais, cultural

e cronologicamente atribuídas ao Neolítico.

As consideráveis alterações pós-deposicionais

condicionaram a distinção e caracterização

tecnológica e morfológica, todavia, são evidentes

as semelhanças com os materiais encontrados

nos habitats de ar livre identificados nas

imediações de Comporta.

ABSTRACT This document shows the results of test

excavations in Monte Novo do Sul associated to the

construction of Sines-Setubal gas conduct during

2002. The survey work performed previously to

the gas conduct construction has early enabled to

identify Monte Novo do Sul as an archaeological

place. Therefore, this area was subject of an

archaeological intervention in order to evaluate the

area’s conservation state, and confirm the chronology

and nature of human occupation. This paper stars

to locate and define the archaeological area according

to its historical background, and then to describe the

methodology used and the results withdrawn from

the archaeological intervention. The pieces found

and collected were grouped in two main categories,

namely, lithic artefacts and ceramic fragments.

Both categories shared special features such as

technical, morphological, cultural and chronological

that could be associated to the Neolithic period.

Although several post-depositional disturbances have

prevented a proper technical and morphological

characterization, there is an evident resemblance

with the artefacts found in the vicinity of Comporta.

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pista onde havia já sido implantada a vala do oleoduto, considerámos este sítio com elevado

potencial arqueológico.

O fácil contacto visual com a estação arqueológica de Abul, localizada na margem

oposta, a proximidade de Alcácer do Sal, da cidade de Tróia e dos vários habitats Neolíticos

de ar livre localizados por Carlos Tavares da Silva na região de Comporta2 reforçou a neces-

sidade de tomar medidas de minimização adequadas para o local.

Depois de exposta a situação à equipa de projecto da Transgás S. A. prontamente acor-

damos a necessidade de conciliar o desenvolvimento da obra, com este sítio de interesse

arqueológico considerável. Assim que tomámos conhecimento do cronograma das obras a

realizar no local, coordenámos sondagens arqueológicas com o objectivo de avaliar o estado

de conservação da estação, confirmar a cronologia e natureza da sua ocupação.

A intervenção arqueológica foi concretizada antes da abertura de pista do traçado, e con-

tou com a participação dos signatários e das arqueólogas Maria Adelaide Costa Pinto e Ana

Filipa Castro Rodrigues.

Localização e descrição da estação arqueológica

Localizado na margem esquerda do rio Sado3, o Monte Novo do Sul é um pequeno espo-

rão arenoso com visibilidade cartográfica significativa que se expande em direcção a esta

importante via de comunicação. Encontra-se a uma distância sensivelmente idêntica entre a

cidade romana de Tróia e o castelo de Alcácer do Sal, sendo possível visualizar com grande

196

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 1 – Enquadramento geográfico das sondagens arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul. Base cartográfica CMP à

escala 1/25.000, folhas 466, 467, 475, 476, I.G.E., 2.a edição, 1978. Projecção UTM, datum Europeu, Elipsóide Internacional.

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facilidade na margem oposta a famosa

estação de Abul. Integrado administrati-

vamente na freguesia de Comporta, con-

celho de Alcácer do Sal e distrito de Setú-

bal, apresenta a altitude de 6,45 m4 e as

seguintes coordenadas geográficas: P -

139753.89 de latitude N e M - 46850.43

de longitude W.

O acesso à estação pode ser concre-

tizado a partir da estrada nacional n.0 253

que liga Alcácer do Sal a Comporta,

sendo necessário seguir em direcção ao

rio Sado junto do km 11. O sítio eviden-

cia-se pela proximidade com o rio e pelo

carácter arenoso do seu contexto geoló-

gico. Esta proximidade é manifestada

inclusive na pouca diferença altimétrica

registada entre a cota de onde são oriun-

dos os materiais cerâmicos e o nível das

águas do Sado. A sua localização deixa

poucas dúvidas quanto às motivações

marítimas dos seus ocupantes.

Situado numa zona de solos areno-

sos caracterizados por terrenos moder-

nos ceno-antropozóicos, do Plistocénico,

Pliocénico e Holocénico5 onde predomi-

nam os aluviões e as dunas e areias de

duna6. Regista solos Podzois sem e com

Surraia de areias ou arenitos7 com capa-

cidade de uso situada na classe A8.

A cobertura vegetal actual é com-

posta por giestas e vegetação rasteira

abundante, sendo notórios os vestígios

de uma arborização recente de pinheiro

entretanto abatidos.

O relevo da região é marcado pela imponência do rio Sado que confere ao amplo vale

condições excepcionais de visibilidade condicionando em simultâneo de forma indelével toda

a orografia da região.

Enquadramento histórico

A zona onde se localiza Monte Novo do Sul apresenta uma quantidade de achados

arqueológicos de valor tão assinalável para o fluir histórico da região e do actual território naci-

onal, que faz do enquadramento histórico-arqueológico de Monte Novo do Sul uma tarefa

onde corremos o risco de nos alongar em demasia. No entanto, seria de todo descabido não

referir, ainda que de forma muito abreviada, algumas das estações arqueológicas mais céle-

bres da arqueologia nacional.

197

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

FIGS. 2 e 3 – Enquadramento foto-cartográfico de Monte Novo do Sul.

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Como as olarias são de crucial importância para o entendimento da presença e ocupa-

ção humana no vale do Sado, optamos também por retratar sumariamente a abordagem cerâ-

mica9 sob pena de omitir uma das componentes mais significativas da informação arqueo-

lógica que se encontra associada a este importante curso de água.

Sem ignorar a necessidade deste equilíbrio, a importância patrimonial desta região

torna imperioso um enquadramento arqueológico que embora sucinto refira não só, a região

composta pelo rio Sado, mas também, o vizinho vale do Tejo, a Costa Alentejana e o Algarve.

A comparação das dinâmicas de produção cerâmica destas quatro regiões permite uma

melhor compreensão dos circuitos e fenómenos comerciais. Apresentamos assim uma breve

e ligeira correlação dos dados alcançados até ao momento, numa longa viagem cronológica

e espacial, de forma a contextualizar a importância e o alcance das ilações obtidas para a com-

preensão da história da região e das comunidades litorais abaixo do Tejo lembrando que o

gasoduto que acompanhamos se estende de Setúbal a Sines.

Localizado na margem sul do Sado, Monte Novo do Sul regista uma notável proximidade

geográfica de estações arqueológicas tão famosas como a cidade romana de Tróia, as diver-

sas olarias existentes nos estuários do Tejo10 e Sado11, a estação fenícia de Abul12 ou o castelo

de Alcácer. Exemplos tão sintomáticos como os expostos, e com resultados tão extraordiná-

rios sobre a continuidade e permanência de ocupação neste vale13 dispensam qualquer tipo

de apresentação. Se nos deslocarmos para sul encontramos outra zona de produção cerâmica

igualmente importante como é o caso da Costa Alentejana14. Nesta região podemos destacar

a grandiosidade de Miróbriga, a importância de Vale Pincel, ou o excelente porto e ancora-

douro da Ilha do Pessegueiro.

A investigação arqueológica no território que referimos é indissociável do contributo de

nomes como Luís Raposo, Carlos Fabião, Carlos Tavares da Silva, Joaquina Soares, Luísa Fer-

rer Dias ou Antónia Coelho Soares. Nos anos oitenta, estes investigadores ampliaram con-

sideravelmente a área geográfica sujeita a reflexões sobre a produção cerâmica sendo con-

templadas as zonas dos vales do Tejo e Sado, Sines e Ilha do Pessegueiro15.

Nestes estudos a abordagem tecnológica ocupa um lugar central e permitiu definir

com precisão tipos de argila e grupos de cerâmica de origem diversa. O quadro eminente-

mente tecnológico tem em si mesmo uma intenção cronológica e preocupações quanto à ori-

gem das peças, pois consegue proporcionar indicações que sugerem normais proximidades

cronológicas e centros de produção com características comuns.

As preocupações com a produção cerâmica local regional ou importada, desenvolvidas

na década de 70 adquirem neste contexto, uma dimensão espacial significativa e alcançam

uma consagração confirmada graças aos estudos dos estudiosos já citados. Na década seguinte

as orientações metodológicas nacionais continuaram a desenvolver estes conceitos.

É nos anos noventa que graças aos trabalhos de Nolen e Carlos Tavares da Silva o

Algarve surge como mais uma região produtora associando-se às já conhecidas16.

O caso algarvio apesar do distanciamento geográfico apresenta vários paralelos de voca-

ção marítima semelhantes à região que retratámos, e testemunhos de igual forma revelado-

res de um intenso tráfego comercial de origem mediterrânea17 que se evidenciam também

em Abul ou Alcácer do Sal.

É curioso constatar que a localização marítima das três regiões (Algarve, Tejo e Sado),

apesar de condicionar fortemente a produção cerâmica despoletou todavia desenvolvimen-

tos distintos, que não resistimos a focar.

O contacto privilegiado com as rotas marítimas criou segundo Jeannette Nolen uma pro-

dução pouco profissional em Torre de Ares enquanto que na villa do Alto do Cidreira se pas-

sou precisamente o oposto. Esta autora deu a conhecer à comunidade científica o lote de peças

198

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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de Torre de Ares. Tendo consciência das dificuldades que teria em relação às informações que

poderia atingir sobre os materiais, cronologia, origens e relações comerciais18, conseguiu no

entanto, interessantes deduções sobre o panorama dos fabricos locais ou regionais, as impor-

tações e a origem das peças importadas. Apesar das condições naturais para a produção cerâ-

mica se manifestarem favoráveis, (a abundância de barreiros e madeira permitiria produzir

em quantidade) a produção parece ter servido basicamente para abastecer a clientela local nas

suas necessidades diárias. Ainda no Algarve, na Quinta do Marim, Olhão, a vocação marítima

dos sítios localizados próximo do mar mantém-se.

No vale do Tejo os dados não são conclusivos em relação à produção e consumo, mas sufi-

cientes para Nolen no seu estudo poder constatar a exclusão quase total de comércio terrestre

interior, também contrastante com o frequente uso das rotas marítimas. A autora salienta ainda

o reduzido número de fabricos do Alto Alentejo e a abundância de sigillata clara A. Associando

a estes factos a raridade da sigillata hispânica, tudo parece indicar um abastecimento priori-

tariamente marítimo e pouca abertura às vias comerciais terrestes (Nolen, 1988, p. 61, 64). Inês

Vaz Pinto ao abordar esta questão considera que no estudo sobre a villa do Alto do Cidreira, a

continuidade de ocupação corresponde a uma cronologia lata devido à ausência de estratigrafia

provocada pela erosão e excessivas lavras, salientando desta investigação a tipologia de formas

e a sua análise funcional. Abundando os almofarizes e alguidares ao contrário da escassez de

bilhas e jarros19.

O vizinho vale do Sado, que, por razões geográficas óbvias, é o que mais nos interessa,

manifesta fenómeno produtivo semelhante, o que dada a proximidade espacial e caracterís-

ticas hidro-topográficas, não surpreende. Para além do reforço desta prática, o estudo com-

parado das regiões vizinhas permitiu inferir com maior segurança sobre a difusão local das

cerâmicas em locais com grande dinamismo na produção.

A oportunidade de investigar contextos habitacionais, como é o caso do castelo de Alcá-

cer do Sal, também investigado na sequência de uma escavação de emergência, tornou pos-

sível confirmar uma longa sequência estratigráfica compreendendo a ocupação deste sítio

entre os finais do Neolítico20 e o período medieval-moderno. Salientamos que a Idade do Ferro

é caracterizada por uma cultura mediterrânea orientalizante21, quando os restantes sítios da

zona registam maiores contactos com a Meseta. A produção local de forte tendência expor-

tadora domina o consumo local, sendo esporádicos os casos de cerâmica importada (geral-

mente de pasta branca).

Não poderíamos deixar de referir o importante contributo dado por Carlos Tavares da Silva

e Mayet através da investigação desenvolvida no centro de produção de ânforas do Pinheiro22.

Foi precisamente nesta herdade de generosas dimensões (Herdade do Pinheiro) que se inicia-

ram os trabalhos de implantação do gasoduto Sines-Setúbal. Os autores conseguiram definir

nesta olaria dois tipos de pastas não-calcárias utilizadas na produção de ânforas23.

A cerâmica encontrada na fábrica de salga localizada na Praça do Bocage, em Setúbal,

reforça a importância destes centros produtivos e as proporções do seu dinamismo industrial.

Será curioso constatar que a unidade fabril de salga do Creiro Arrábida, datada entre os

meados/terceiro quartel do século I d.C., e finais do mesmo século, deixa de laborar sendo

abandonada precisamente na mesma altura em que surgem as fábricas de salga da Praça do

Bocage e da Travessa de Frei Gaspar, localizadas na cidade de Setúbal. Coelho-Soares é de opi-

nião que o período da primeira ocupação desta fábrica terá funcionado como serviço de

apoio à navegação costeira24.

Com vocação marítima semelhante, a Ilha do Pessegueiro foi um importante porto de

apoio à navegação costeira graças às excelentes condições de abrigo, desembarcadouro e fun-

deadouro que proporcionava25.

199

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

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A costa alentejana apresenta também dois grandes grupos de pasta distinguidos pela cor.

A pasta avermelhada do Sado e uma pasta de cor branca. Dos trabalhos desenvolvidos na Ilha

de Pessegueiro, os investigadores definiram duas fases de ocupação, a primeira correspondendo

à Idade do Ferro, e a segunda subdividida em três, identificada com a época romana imperial26.

Monte Sardinha, em Santiago do Cacém, reforça a existência destes principais grupos

de pastas. Courela dos Chãos, em Sines, vê repetida a abundância das pastas brancas da Ilha

do Pessegueiro.

Segundo Carlos Tavares da Silva, a hipótese lançada por Leite Vasconcelos e Scarlat Lam-

brino da Ilha do Pessegueiro corresponder à ilha de Poetanion, referida na Ora Marítima de

Avieno, faz sentido e sai reforçada pelas intervenções arqueológicas aí realizadas por este estu-

dioso juntamente com Joaquina Soares e Luísa Ferrer Dias (Silva, Soares e Dias, 1980-

-81, p. 245).

O estudo dos fabricos e das formas com perfis completos comprova ser fundamental para

perceber a morfologia e aspectos tecnológicos de qualquer região produtora. A exploração da

temática das formas e dos fabricos, apresentando igualmente dados quantitativos passíveis de

comparação tem permitido acrescentar à região do Sado e da Costa Alentejana, informações

complementares quanto à proveniência dos fabricos, utilizando como critérios fundamentais

o tipo de argilas, os acabamentos, a análise quantitativa e a comparação. A aplicação conjunta

dos critérios funcional e tecnológico como elemento orientador da investigação para novos

caminhos tem obtido proveitosos aperfeiçoamentos, pois diferentes características técnicas de

recipientes aparentemente semelhantes poderão condicionar a sua função.

A frequência com que são realizados trabalhos sobre esta temática é fundamental para

a resolução de novas e velhas questões. A comparação é urgente e insubstituível. A verdadeira

dimensão destas problemáticas só será compreendida a uma escala forçosamente regional.

Por esta razão abordamos o vale do Tejo, a Costa Alentejana e a região Algarvia, tanto mais

que o entendimento global de estações como Abul e o castelo de Alcácer do Sal deve ser com-

preendido numa escala comercial mediterrânica.

O contributo destes estudos é crucial para entendermos a riqueza patrimonial desta

região. Consideramos que esta temática deve alcançar uma dimensão regional no que diz res-

peito ao entendimento da produção, consumo e distribuição cerâmica e depois ser compre-

endida a uma escala nacional. Por isso, focamos igualmente regiões aparentemente muito

distantes mas que se complementam comercialmente, para que melhor se entenda a impor-

tância destes achados e desta região produtora no actual território nacional.

É necessário que mais trabalhos com indicadores morfológicos, cronológicos, tecnoló-

gicos e funcionais sejam publicados, de forma a possibilitar analogias que proporcionem futu-

ras sínteses regionais. O nosso modesto contributo apesar de não acrescentar nada de sig-

nificativo ao quadro científico exposto, insere-se nesta dinâmica de investigação regional e

supra-regional da produção cerâmica e lítica.

Metodologia e resultados da intervenção arqueológica

Como já referimos o objectivo desta intervenção pretendeu simultaneamente responder

às dúvidas suscitadas pelo estado de conservação do sítio e alcançar indicadores cronológi-

cos, que reforçassem a cronologia apontada pelos materiais recolhidos à superfície.

A localização das sondagens (1 m x 1 m) pretendeu ser representativa do que se poderia

encontrar, e proporcionar informações que permitissem salvaguardar as zonas ainda preser-

vadas da intervenção das máquinas. Para isso, localizamos duas sondagens no alinhamento

200

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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da vala; 1 na zona que corresponde ao local da

perfuração, e uma última afastada 6 metros

do eixo da vala, localizada no centro do pro-

montório, com o intuito de contemplar uma

área que permitisse assegurar que nenhuma

estrutura importante de teor arqueológico

fosse afectada.

Os trabalhos tiveram início com a lim-

peza da área envolvente e posterior materiali-

zação da área a sondar, estando todas as son-

dagens localizadas no eixo central da pista,

(correspondente à zona de abertura da vala)

distanciadas 6 m umas das outras. A excepção

foi a sondagem n.0 4, que intencionalmente

deslocamos no sentido SE. As quadrículas

foram identificadas por letras e algarismos

árabes. O ponto de referência altimétrica que

adoptamos foi o implantado pelo vértice 0148,

que corresponde ao km 58+523.90 do traçado

do gasoduto, e cujo valor da cota em relação

ao nível do rio Sado é de 5,18 m.

Prosseguimos com a decapagem manual

das unidades estratigráficas na sequência

inversa à sua deposição, até atingir os níveis

estéreis correspondentes aos depósitos aluvi-

onares do rio, não perturbados pela actividade

antrópica. O registo da estratigrafia consistiu

no desenho à escala 1/20 de um dos cortes de

cada sondagem e numa descrição sumária de

cada unidade.

O levantamento gráfico incluiu o registo

fotográfico, o registo individual das EU’s e a

implantação cartográfica das sondagens.

A recolha de espólio arqueológico foi

exaustiva, separando-se no campo por uni-

dades estratigráficas os materiais cerâmicos

e líticos encontrados.

201

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

FIG. 4 – Representação esquemática das sondagens

arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul.

FIG. 5 – Perfis estratigráficos das sondagens arqueológicas

realizadas em Monte Novo do Sul. Camada 1: Camada de

remeximento recente de cor cinzento escura; Camada 2:

Camada cinzento amarelada; Camada 3: Camada castanha

escura. Camada 4: Camada de areias finas claras; Camada 5:

Raíz apenas presente na sondagem n.0 3; Camada 6:

Mancha indeterminada de cor mais escura registada

somente na sondagem n.0 3.

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Os resultados das sondagens foram conclusivos quanto ao índice de perturbação do local

e no que diz respeito à quantidade e qualidade dos materiais encontrados. Os 45 fragmen-

tos cerâmicos27 encontrados localizaram-se em todas as sondagens nas duas primeiras uni-

dades estratigráficas e apresentavam-se muito fragmentados e dispersos, num contexto onde

a ocorrência de raízes é generalizada. Registamos a mesma localização nos dois fragmentos

de machado e no martelo recolhidos respectivamente nas sondagens n.os 2, 3 e 128.

Em todas as sondagens apenas as unidades estratigráficas superficiais registaram a

presença de artefactos. Concluímos pois, que a ocupação aqui presente se localizaria a cotas

não inferiores a 40/50 cm. A possível afectação do local aquando da florestação de pinheiro

adquire assim contornos mais credíveis e explicaria o carácter fragmentado e disperso dos

vestígios cerâmicos. Se acrescentarmos a estes dados, os resultados obtidos na sondagem n.0

4, onde os fragmentos cerâmicos se resumem a 3, facilmente constatamos que a maior con-

centração de materiais se localiza para NW em direcção à zona sujeita à intervenção já con-

sumada pela implantação do oleoduto.

Relembramos que a própria metodologia utilizada para a abertura de pista altera subs-

tancialmente as características topográficas das áreas intervencionadas. Se associarmos a isto,

os trabalhos de remoção de terras necessários à perfuração realizada para a travessia do rio

Sado, parece-nos claro que a actual paisagem se encontra muito alterada e não corresponde

a uma evolução provocada por agentes naturais.

202

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

FIG. 6 – Fragmentos cerâmicos encontrados durante as sondagens diagnóstico realizadas em Monte Novo do Sul. 1 – Bordo

extrovertido, lábio biselado com parede direita, forma esvasada e pasta com inclusões de media dimensão; 2 – Bordo

introvertido, lábio boleado, forma envasada; 3 – Bordo extrovertido, lábio boleado, forma esvasada; 4 – Bordo extrovertido,

lábio direito, forma cilindrica; 5 – Bordo introvertido, lábio boleado, forma envasada; 6 – Bordo introvertido, lábio boleado de

forma envasada.

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203

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

FIG. 7 – Líticos encontrados durante as sondagens diagnóstico realizadas em Monte Novo do Sul. 6 – fragmento de machado de

anfibolite; 7 – fragmento de machado de anfibolite; 8 – seixo talhado; 9 – fragmento de machado de anfibolite; 10 – martelo de

anfibolite ; 11 – seixo talhado.

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Em suma, os resultados da sondagem diagnóstico realizada na Herdade de Monte Novo

do Sul são reveladores da presença humana, mas indiciam igualmente fortes perturbações

à estratigrafia do sítio. A exígua quantidade de achados, o seu carácter fragmentado e disperso

não deixa dúvidas quanto ao acentuado remeximento de terras realizado no local.

Integração cronológico-cultural

Os artefactos oriundos desta intervenção arqueológica resumem-se a materiais líticos e

cerâmicos de fabrico manual. Analisámos o lote cerâmico através das características das pas-

tas e da sua morfologia, aplicando um critério tecnológico e morfológico na distinção e

caracterização dos fragmentos cerâmicos, com o objectivo de possibilitar a comparação de

categorias e tipos morfológicos. Julgamos ser possível desta maneira no futuro perspectivar

os contornos de uma evolução de formas.

As pastas foram inicialmente separadas recorrendo à ajuda de uma lupa manual

segundo os critérios de definição de um tipo de fabrico, ou seja, dividimos os fragmentos

tendo em conta a natureza, percentagem e proporções relativas dos diferentes tipos de ele-

mentos não-plásticos, textura e cozedura.

As diferentes características das pastas por nós seleccionadas originaram a designação

de 3 grupos de fabrico denominados com as letras A, B e C29. Confirmaram-se afinidades

mineralógicas e naturais diferenças granolumétricas, mas pouco significativas.

Os 203 fragmentos cerâmicos30 apresentam pastas de fabrico geralmente grosseiras,

com inclusões grosseiras e médias, destacando-se a presença abundante de mica numa

grande percentagem de exemplares31.

QUADRO I

Quadro comparativo da dimensão dos elementos não-plásticos entre a argila e o seixo.

SEIXO AREÃO AREIA SILTE ARGILA

Muito Grosseira Média Fina Muito Grosseiro Médio Fino Muitogrosseira Fina Fino

5 10 18 35 60 120 230 Mesh 0,0 0,0156

4,00 2,00 1,00 0,500 0,250 1,125 0,0625 +5 +6 0,0078 0,0039 mm

-2 -1 -0 +1 +2 +3 +4 + 7 +8

Tucker, M. - Techniques in sedimentology. Blackwel Science. London, 1995.

Apesar do elevado índice de fragmentação da cerâmica encontrada foi possível identifi-

car a morfologia de 6 bordos. As técnicas decorativas encontram-se pouco representadas

reforçando o carácter utilitário da cerâmica e a possível natureza laboriosa do sítio. Regista-

mos somente as técnicas de alisamento e polimento.

O estado fragmentado das peças e a sua pequena dimensão tornou improvável alcançar

perfis completos. Debatemo-nos assim com a dificuldade de definir formas ou variantes

representativas de determinada categoria e/ou tipo morfológico. Igual dificuldade sentimos

na classificação donde derivam as ilações de ordem funcional e cultural.

Tendo em conta as características qualitativas e quantitativas deste universo cerâmico,

optamos por não apresentar o inventário dos fragmentos nem aprofundar as variáveis quan-

titativas devido à escassez de informação morfológica, decorativa e funcional.

Estes fragmentos de acordo com as características técnicas, formais e decorativas inse-

rem-se cultural e cronologicamente no Neolítico. Registam paralelos semelhantes em habi-

204

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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Não excluímos a possibilidade de este sítio poder também corresponder a um porto de

abrigo temporário com características sazonais, ocupado ocasionalmente de forma irregular

por comunidades piscatórias fixadas nas imediações do vale. A ancestral navegabilidade do

Sado e a intensa actividade comercial amplamente documentada corroboram a hipótese de

muitos dos esporões de areia deste rio com condições naturais para ancoradouro terem ser-

vido como porto de abrigo para muitos pescadores e marinheiros.

Em suma, encontramo-nos na presença de uma estação arqueológica que amplia o

número de habitats de ar livre já identificados no vale do Sado e que não acrescenta muita

informação à produção cerâmica e lítica. O grande contributo deste habitat reside na altera-

ção da realidade numérica. Podemos reforçar a presença humana modificando a perspectiva

sobre a rede de povoamento e densidade populacional na margem esquerda do rio Sado

durante o Neolítico.

Apesar das provas desta presença se encontrarem fora do seu contexto original e ficar-

mos sem hipótese de melhor perceber que género de ocupação ali se instalou, a referência

à presença humana ainda que esporádica, naquele local é uma realidade.

A área de intervenção correspondente à implantação do gasoduto Sines-Setúbal é uma das

zonas do país onde mais se conhece do potencial do património arqueológico. Curiosamente

poderemos dizer que este conhecimento se encontra estreitamente ligado às inúmeras inter-

venções de teor industrial e ao elevado índice de afectação que provocam no património

arqueológico, que exigiram medidas de minimização compatíveis para a sua salvaguarda.

Esta intervenção arqueológica enquadra-se neste contexto de convivência entre desen-

volvimento industrial/energético e conhecimento científico. Indispensável e urgente esta con-

ciliação apesar de nem sempre se confirmar feliz, deve ser fomentada, por proteger um

património não renovável e ser sinónimo de um modelo de progresso sustentado típico das

sociedades culturalmente mais desenvolvidas.

NOTAS

1 Cfr. Anexo: Enquadramento geográfico das sondagens arqueológicas realizadas em Monte Novo do Sul e fotografias n.0s 1 e 2.2 Destacamos os sítios denominados por Barrosinha, Celeiro Velho, Malhada Alta, Pontal, Possanco e Sapalinho todos localizados em

Comporta. Cfr. Silva et al., 1993 , p. 34, 52, 67, 75, 90, 94 e 99, com fragmentos cerâmicos semelhantes aos identificados em Monte Novo

do Sul.

3 Gasoduto Sines/Setúbal: km 58.593.

4 Cfr. Carta Militar de Portugal, n.0 467, esc. 1/25 000, 1972.

5 Cfr. Carta Geológica de Portugal, esc. 1/1000 000, 1968.

6 Cfr. Carta Geológica de Portugal, 39-A, Águas de Moura, esc. 1/50 000, 1972.

7 Cfr. Carta dos Solos de Portugal, 466, 1/50 000, 1961.

8 Cfr. Carta de Capacidade de Uso do Solo, esc. 1/1000 000, 1980.

9 Referimos preferencialmente a época romana por ser neste período histórico que a produção cerâmica desta região adquire maior dimen-

são. Não ignoramos no entanto, a importância de outros períodos cronológicos para o completo entendimento do fenómeno de conti-

nuidade e permanência da ocupação humana nesta região.

10 Citamos como exemplo a villa do Alto do Cidreira, os fornos de ânforas de Garrocheira, a Quinta do Rouxinol, o Porto do Sabugueiro, ou

Zambujalinho.

11 Tal como no caso anterior optamos por citar apenas alguns dos sítios arqueológicos, privilegiando a representatividade geográfica e a impor-

tância dos resultados: Alcácer do Sal, cfr. Silva, Beirão, Soares, Dias e Coelho Soares, 1980-198l, p. 149-218; Olaria de ânforas do Pinheiro

marco crucial na produção cerâmica romana dos vales do Tejo e Sado e na caracterização desta zona do país como importante centro pro-

dutor cerâmico, Praça do Bocage, cfr. Silva e Coelho Soares, 1980-81, p 249-284; Creiro, cfr. Silva e Coelho Soares, 1987, p. 221-237.

206

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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12 Com posterior ocupação romana também associada à produção cerâmica.

13 Silva, Soares, Beirão, Ferrer Dias e Coelho Soares, 1980-81, p. 149-218.

14 Recordamos que o gasoduto que esteve na origem desta intervenção se estende desde Sines até Setúbal. Poderemos destacar a título de

exemplo na Costa Alentejana as estações da Ilha do Pessegueiro, cfr. Silva e Soares, 1993; Silva, Soares e Dias, 1980-81; Silva, Soares, Dias

e Coelho Soares, 1984, Courela dos Chãos cfr. Coelho-Soares, 1987, e Monte Sardinha cfr. Ferrer Dias e Viegas.

15 Grosso modo a área correspondente ao traçado do actual gasoduto Sines-Setúbal.

16 Cfr. Nolen, 1994; Silva, Soares e Coelho-Soares (1992).

17 Essencialmente de origem Bética como é o caso dos dolios que dominam o mercado de Balsa (Nolen, 1999, p. 135).

18 Desde a descoberta de Torre de Ares por F. Martins de Andrade e Estácio da Veiga ainda em pleno século XIX, que se multiplicaram as

escavações neste local. Apesar disso, os registos limitam-se a sumários artigos sobre o espólio encontrado (Nolen, 1994, p. 5).

19 Cfr. (Pinto, 1999, p. 54-5).

20 Esta fase é caracterizada pela taça carenada afim da do Possanco (Comporta), Vale Pincel II (Sines), Cabeço da Mina (Torrão do Alentejo),

Caramujeira (Lagoa), e Papauvas (Huelva), (Silva et al., 1980-81, p. 209).

21 Dividida em três períodos, um de evolução sidérica (VII-VI a.C.), e os restantes respectivamente de influência púnica com elementos helé-

nicos (IV-III a.C.) e influência itálica (II-I a.C.) (Silva et al., 1980-81, p. 213).

22 Para a investigadora Inês Vaz Pinto este trabalho apresenta uma evolução morfológica de peças apreciável. Durante o Alto Império, pre-

dominam a ânfora Dressel 14, as tigelas e panelas, sendo poucos os exemplos de pratos e formas fechadas, e ainda mais raros os algui-

dares e almofarizes. A partir do século III, a ânfora mais representada é a Almagro 51 C, as panelas mudam de forma ficando mais altas

e mais fundas, as tigelas cedem quantitativamente o lugar aos pratos. No século IV, as panelas continuam a metamorfose iniciada, trans-

formando-se em formas fechadas e os alguidares adquirem uma representatividade nunca alcançada. O século V manifesta-se por uma

raridade de formas abertas (Pinto, 1999, p. 53).

23 Com uma proveniência geográfica distinta, foi atribuída à pasta de cor alaranjada a designação de Sado-montante, e à pasta de tons beije

Sado-jusante/Tejo (Pinto, 1999, p. 53).

24 Cfr. (Coelho-Soares, 1987, p. 236-237).

25 As condições de fundeadouro variavam entre os 5, 6 e 7 metros ao máximo da baixa-mar. Os meses compreendidos entre Abril e Outubro

seriam os melhores para navegar na faixa atlântica (Silva et al., 1993, p. 20-25).

26 Fase I: estabelecimento da Idade do Ferro; Fase II: o estabelecimento da época romano imperial; Fase II A: fundação do entreposto comer-

cial na Segunda metade do século I; Fase II B: diversificação económica, actividade comercial e produção de salgas no século II; Fase II

C: especialização na produção de salgas de peixe nos séculos III e IV (Silva et al., 1993, p. 83-86).

27 Apenas 6 apresentavam forma. Correspondem a fragmentos de reduzida dimensão nem todos capazes de transmitir informação quan-

to ao seu diâmetro.

28 Cfr. Anexo: desenho dos materiais.

29 O elevado índice de fragmentação das peças e o rolamento a que foram sujeitas aumentaram o grau de afinidade dos fragmentos cerâ-

micos tornando a dimensão das inclusões o elemento crucial para a definição dos grupos. Estes variam entre areias muito grosseiras (A),

grosseiras (B) e médias (C). Quanto ao tratamento da superfície resume-se ao alisamento sendo esporádicos os exemplares com poli-

mento. As cores variam entre o laranja, o castanho e o cinzento com diferentes tonalidades e intensidade.

30 Incluímos de igual modo os fragmentos recolhidos à superfície, que são em maior número do que os recolhidos em contexto de escavação.

31 Cfr. Tabela de valores utilizada para o enquadramento da frequência e percentagem dos elementos não plásticos. Quadro comparativo da

dimensão dos elementos não plásticos entre a argila e o seixo.

32 Cfr. Silva et al.; 1993, p. 34, 52, 67, 75, 90, 94 e 99.

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207

RESULTADOS DAS SONDAGENS ARQUEOLÓGICAS REALIZADAS NA HERDADE DE MONTE NOVO DO SUL (ALCÁCER DO SAL)

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ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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Anexo

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Protocolo

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Outorgantes

1.0 – INSTITUTO PORTUGUÊS DO PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO E ARQUEOLÓGICO*,

adiante designado abreviadamente por IPPAR, com sede no Palácio Nacional da Ajuda,

representado pelo seu Presidente, Prof. Arquitecto Nuno dos Santos Pinheiro, como 1.0

outorgante

e

2.0 – TRANSGÁS, Sociedade Portuguesa de Gás Natural, S.A., adiante designada abreviada-

mente por TRANSGÁS, com sede na Av. da República, 35 – 7.0 em Lisboa, representada pelo

seu Presidente, Dr. José Manuel Elias da Costa, como 2.0 outorgante.

Considerando que:

Os vestígios arqueológicos constituem uma parte integrante do Património Cultural Portu-

guês e um recurso cultural, não renovável, essencial para a História da Humanidade;

A importância da preservação e valorização desse património tem sido reconhecida em

vários documentos internacionais, no âmbito da UNESCO e do Conselho da Europa e pela

legislação nacional;

A necessidade de conciliar a preservação do património arqueológico com o desenvolvi-

mento económico tem sido urna preocupação dos governantes e instâncias europeias, tra-

duzida na promoção de várias iniciativas no sentido de minimizar os efeitos das grandes

obras públicas e privadas;

A construção de redes de gás natural, em vários países europeus, tem demonstrado que este

tipo de infraestruturas poderá ter um impacto muito significativo sobre o património arqueo-

lógico e destruir, irremediavelmente, inúmeros vestígios e informações de grande interesse

histórico, se não for acompanhada por equipas de arqueólogos, nas suas várias fases.

Em Portugal as prospecções arqueológicas efectuadas em áreas abrangidas por outros empre-

endimentos de traçado linear, como é o caso de estradas e autoestradas, no âmbito de estu-

dos de impacte ambiental, tem revelado, em todas as regiões do país, inúmeros vestígios

arqueológicos, até então desconhecidos, que, se tais trabalhos não tivessem sido realizados,

teriam sido irremediavelmente destruídos.

O IPPAR é a entidade da tutela especialmente habilitada para a implementação e aplicação de

uma política de levantamento, estudo, salvamento e divulgação do património arqueológico.

O IPPAR enquanto organismo público vocacionado para a preservação do património arqueo-

lógico nacional e a TRANSGÁS, enquanto concessionária do serviço público de importação,

transporte e fornecimento de gás natural, consideram de mútuo interesse o estabelecimento,

nos termos da Lei 13/85 de 6 de Junho e Decreto-Lei n.0 106-F/92, de 1 de Junho, de formas

de colabora9ao que permitam harmonizar, na medida do possível a necessidade económica

de instalação, em Portugal, de urna rede de gás natural, com o imperativo cultural e moral

de registar e salvar o património arqueológico do país.

211

ANEXO

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Com esse objectivo celebram o presente protocolo que se rege pelas cláusulas seguintes:

Primeira

A TRANSGÁS e o IPPAR apoiarão a constituição de urna equipa técnica de Arqueologia,

permanente, que acompanhará cada frente de trabalho de construção do gasoduto,

dotada dos meios indispensáveis, cabendo-lhe a rea1ização da prospecção prévia das

áreas críticas indicadas no Estudo de Impacte Ambiental o acompanhamento da frente

de trabalho de construção do gasoduto, e o registo, recolha, estudo e publicação de

todos os vestígios arqueológicos que vierem a ser encontrados.

1. Cada equipa será constituída por um Arqueólogo, com larga experiência de trabalhos

deste tipo, e por um Assistente de Arqueólogo, a contratar expressamente para este pro-

grama de intervenção arqueológica pela TRANSGÁS, de entre técnicos indicados pelo

IPPAR e será dotada de uma viatura, equipamento e material necessários ao exercício das

suas funções (de acordo com a lista anexa).

2. São funções de cada equipa realizar as acções necessárias de modo a assegurar registo,

recolha e estudo de todos os vestígios arqueológicos que vierem a ser encontrados nas

várias fases dos trabalhos.

Segunda

A TRANSGÁS compromete-se a:

1. Entregar antecipadamente a equipa de Arqueologia e manter actualizada toda infor-

mação disponível, cartográfica e de outra natureza, sobre a localização do gasoduto e das

instalações anexas e a relativa ao planeamento dos trabalhos.

2. Custear financeiramente, na totalidade, a constituição e funcionamento das equipas de

Arqueologia, (…) bem como prover à aquisição do equipamento e material (…).

a) Para a equipa de Arqueologia, a TRANSGÁS contratará técnicos propostos pelo IPPAR,

em regime de prestação de serviços, que não façam parte dos quadros do IPPAR.

b) Os técnicos contratados responderão disciplinarmente perante a TRANSGÁS e tecnica-

mente perante o IPPAR, nos termos da legislação em vigor.

c) O equipamento que for adquirido no âmbito deste protocolo reverterá para o IPPAR após

o termo do mesmo.

3. Patrocinar a divulgação dos dados arqueológicos recolhidos através de publicação de

carácter científico, destinada ao público, e de exposições de carácter museológico.

Terceira

Compete ao IPPAR:

1. Promover a constituição da equipa de Arqueologia referida em 2.

212

ARQUEOLOGIA NA REDE DE TRANSPORTE DE GÁS: 10 ANOS DE INVESTIGAÇÃO

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2. Assegurar a coordenação técnica dos trabalhos das equipas, disponibilizando para o

efeito, um dos seus técnicos superiores.

3. Garantir a execução em tempo útil dos trabalhos programados, em conformidade com

o plano de trabalhos da obra.

4. Enviar com a maior celeridade possível a TRANSGÁS indicações sobre medidas de pro-

tecção que deverão ser tomadas em relação a vestígios arqueológicos que o justifiquem

por forma a que a concretização dessas medidas não provoque perturbações ao desen-

rolar da execução do projecto, conforme os planos de trabalho estabelecidos.

5. Assegurar a elaboração de relatórios semestrais, devidamente documentados, referen-

tes aos trabalhos da equipa de Arqueologia, de que enviará um exemplar à TRANSGÁS.

Quarta

A gestão deste protocolo será feita por urna Comissão Coordenadora, constituída por um

representante do IPPAR e um representante da TRANSGÁS, a qual reunirá sempre que

necessário e pelo menos urna vez por semestre, com o objectivo acompanhar o seu cum-

primento e resolver eventuais dificuldades relacionadas com termos do mesmo.

Destas reuniões se lavrará acta, a apresentar à Direcção das duas entidades outorgantes.

Quinta

O presente protocolo terá efeitos até ao final do prazo previsto para a instalação pela

TRANSGÁS dos gasodutos de alta pressão e respectivos ramais.

Sexta

Eventuais alterações que vierem a ser aconselhadas pela desenrolar dos trabalhos devem

ser apresentadas e discutidas pela Comissão Coordenadora que os submeterá à apro-

vação das duas entidades abrangidas por este protocolo.

Lisboa, 24 de Março de 1994

* Ao abrigo do Decreto-Lei n.0 117/97, de 14 de Maio, que cria e define a orgânica do Instituto Português de Arqueologia, no seu Artigo

26.0, o “IPA sucede ao IPPAR nos direitos e obrigações de que, no quadro das competências previstas no presente diploma, este era

titular, por lei, contrato ou outro título, sem necessidade de quaisquer formalidades, exceptuados os registos, para os quais constitui

título bastante o presente diploma”. Sendo assim, a partir desta data, o Instituto Português de Arqueologia assumiu, no presente Pro-

tocolo, a posição de 1.0 Outorgante,

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ANEXO