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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Administração Sílvia Loyola Vieira da Silva Mapeamento Cultural: um Estudo de Arranjo Produtivo Local (APL) Belo Horizonte 2014

um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

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Page 1: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Administração

Sílvia Loyola Vieira da Silva

Mapeamento Cultural:

um Estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Belo Horizonte

2014

Page 2: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Sílvia Loyola Vieira da Silva

Mapeamento Cultural:

um Estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Dissertação apresentada à Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais

como requisito parcial para a obtenção do

título de Mestre em Administração.

Linha de Pesquisa: Gestão Estratégica de

Pessoas e Relações de Trabalho.

Orientadora: Prof.a Dr.

a Betania Tanure.

Belo Horizonte

2014

Page 3: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Silva, Sílvia Loyola Vieira da S586m Mapeamento cultural: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL) /

Sílvia Loyola Vieira da Silva. Belo Horizonte, 2014. 158f.: il.

Orientadora: Betania Tanure Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Administração.

1. Concentração industrial - Minas Gerais, Centro-Oeste. 2. Economia regional. 3. Administração de empresas. 4. Cultura organizacional. I. Tanure, Betania. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Administração. III. Título.

CDU: 658.114.5

Page 4: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Sílvia Loyola Vieira da Silva

Mapeamento Cultural:

um Estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Dissertação apresentada à Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais

como requisito para a obtenção do título de

Mestre em Administração.

Linha de Pesquisa: Gestão Estratégica de

Pessoas e Relações de Trabalho.

___________________________________________________________________________________________

Orientadora Profª. Dra. Betania Tanure (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)

______________________________________________________________________________________________

Prof. Dr. Roberto Patrus Mundim Pena (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)

________________________________________________________________________________________________

Prof. Dr. Álvaro Bruno Cyrino (Fundação Getúlio Vargas)

Belo Horizonte, 06 de março de 2014

Page 5: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, professora Dra. Betania Tanure. Pela capacidade de me desafiar a

fazer cada vez melhor. Sinto-me privilegiada de ter recebido sua indicação dos caminhos

com a inteligência e sabedoria que lhe é peculiar.

À SIFUMG – Sindicado das Indústrias de Fundição do estado de Minas Gerais –

representado por Afonso Gonzaga e Roseli Dias, que me permitiram a pesquisa e pelo

apoio junto aos empresários. A todos os profissionais que dedicaram seu tempo para

responder à pesquisa.

Aos amigos da Novociclo, em especial ao Marcus pelo incentivo e ao Bruno e à Mariana

pelo companheirismo, todo apoio e torcida. Vocês estiveram presentes do início ao fim

dessa pesquisa, nas discussões e construções que tivemos, constantemente revisitadas.

Ao professor Dr. Antônio Carvalho Neto, por ter-me ensinado, desde o primeiro contato

com o mestrado, o que é uma discussão rica. Isso me inspirou e incentivou a continuar a

busca por conhecimentos. Ao professor Dr. José Márcio de Castro pelos ensinamentos,

carinho e parceria que já vêm acontecendo há muitos anos e que se intensificaram com o

mestrado. Vocês detêm as qualidades de grandes educadores. Aos demais professores,

pelos conhecimentos compartilhados e à equipe do PPGA, Cristiano, Jaqueline e Paola,

que facilitaram a trajetória.

Aos meus colegas de mestrado, pela troca de experiências e companheirismo. Agradeço

especialmente às Lalás: Maria Flávia, Marina, Roberta e Yasmine. Vocês tornaram os dias

mais prazerosos, os almoços mais gostosos e ajudaram a tornar a jornada um caminho

conjunto.

À Glória Vieira Magalhães, pelo carinho e tempo dedicados a mim e ao projeto. Seu apoio

foi valioso. Ao Wellington, pelas sábias contribuições. Á Ana Luiza Albuquerque Cruz,

pela leitura crítica e companheirismo.

Aos meus queridos pais, Mário Lúcio e Georgina Vieira, e irmã, Marina Loyola, por

estarem sempre comigo, apoiando e incentivando. Em especial à minha mãe, por também

me passar ensinamentos de pesquisadora e de vida. Foram vocês que tornaram o mestrado

possível.

Page 6: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Ao meu marido Renato Beschizza, por sua dedicação, seu companheirismo e apoio, por

dividir comigo as ansiedades, alegrias e conquistas do mestrado e da vida e por deixar-me

tentar fazer o mesmo por ele.

Page 7: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

RESUMO

Assim como um mapa facilita a localização e o estudo de uma região, o mapeamento

cultural pode permitir a apreensão de características intrínsecas de uma sociedade. Este

estudo, de abordagem quantitativa, investiga a influência da cultura regional na cultura

organizacional em empresas organizadas em um Arranjo Produtivo Local (APL). Para a

realização do estudo foram utilizadas as cinco dimensões culturais propostas por Hofstede

(1991) e o seu questionário Values Survey Module 1994 (VSM-94). Ao contrário de outros

estudos que comparam dimensões culturais em uma mesma organização localizada em

diferentes regiões, propõe-se, o mapeamento cultural em organizações distintas, mas

pertencentes ao mesmo setor e território. A pesquisa foi realizada em 54 empresas do APL

do setor de fundição nos municípios de Cláudio, Divinópolis e Itaúna, na região centro-

oeste de Minas Gerais. Os resultados demonstram que, em comparação com estudos

anteriores realizados em Minas Gerais, por Tanure (2010), e no Brasil, por Tanure (2010) e

Hofstede (1991), duas dimensões mais diferenciam a cultura da região do APL: o índice de

masculinidade e a necessidade de controlar as incertezas. Buscou-se explicar a diferença

entre esses e os demais resultados por meio das características das empresas estudadas, da

própria natureza de APLs e por questões longitudinais, já que 10 anos separam a pesquisa

de Tanure (2010) da atual. Em relação ao índice de masculinidade, a divergência pode ser

explicada pela natureza cooperativa do APL. Já para o índice de necessidade de controlar

as incertezas, a diferença pode estar relacionada ao tamanho das empresas analisadas,

conforme constatado por Tanure (2010), que identificou uma correlação negativa entre o

tamanho da empresa e o referido índice.

Palavras-chave: Cultura. Cultura organizacional. Cultura brasileira. Cultura mineira.

Arranjo produtivo local - APL.

Page 8: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

ABSTRACT

As well as a map facilitates both the location and the studies of a region, the cultural

mapping can allow the capture of intrinsic characteristics of a society. This study, a

quantitative approach, investigates the influence of the regional culture on organizational

culture in cluster-organized companies. The five cultural dimensions proposed by

Hofstede(1991) and his Values Survey Module questionnaire 1994 (VSM-94) were used

for the undertaken of this study. Contrary to other studies which compare cultural

dimensions in the same organization located in different regions, this one is aimed at the

cultural mapping in diverse organizations that belong to the same district and territory. The

survey was conducted in 54 cluster companies on the smelting business in Cláudio,

Divinópolis and Itaúna, cities in midwest Minas Gerais. The results show that, in

comparison to former studies undertaken in Minas Gerais by Tanure (2010), and in Brazil

by Tanure (2010) and Hofstede (1991), two main traits distinguish the culture in the cluster

district: the masculinity index and the need uncertainty avoidance. This study aims at

explaining the difference between the results by means of the characteristics of these

companies, the nature of the clusters, and also of longitudinal issues, once the Tanure

(2010) study and the actual one are ten years apart. In relation to the masculinity rate, the

divergence can be explained by the cooperative nature of the cluster. As for the need for

uncertainty avoidance, higher in the cluster, the difference can be related to the size of the

analised companies, as it has been verified by Tanure (2010), who identified a negative

correlation between the size of the company and the referred rate.

Key Words: Culture. Organizational culture. Brazilian Culture. Culture of Minas Gerais.

Cluster companies.

Page 9: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Níveis de cultura......................................................................................... 31

Figura 2 - Os diferentes níveis de manifestação de uma cultura................................. 32

Figura 3 - Cubo de Duplo “S”....................................................................................... 43

Figura 4 - Traços culturais de interseções dos subsistemas........................................ 63

Figura 5 - O sistema de ação cultural brasileiro.......................................................... 65

Figura 6 - Produção brasileira de fundidos................................................................. 70

Figura 7 - Setores de atuação das empresas do APL de fundição de Divinópolis,

Cláudio e Itaúna..........................................................................................................

90

Figura 8 - Resultados do APL segundo as dimensões de Hofstede............................ 99

Figura 9 - Comparação dos resultados do APL de fundição com os resultados das

pesquisas de Hofstede (Brasil, 1991) e Tanure (Brasil e Minas Gerais, 2010) para a

distância de poder........................................................................................................

104

Figura 10 - Correlação entre distância do poder e escolaridade................................... 107

Figura 11 - Comparação dos resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e com os

resultados do APL fundição para o índice masculinidade......................................

110

Figura 12 - Índice de masculinidade por área............................................................. 112

Figura 13 - Relação entre o índice de masculinidade e idade do respondente............ 114

Figura 14 - Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e os

resultados obtidos no APL de fundição para a dimensão individualismo..............

116

Figura 15 - Relação entre o PIB per capita (2010) e o índice de individualismo....... 119

Figura 16 - Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e os

obtidos no APL de fundição em relação ao índice de necessidade de controle das

incertezas..............................................................................................................

121

Page 10: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

Figura 17 - Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e

os resultados do APL de fundição em relação ao índice orientação de curto versus

longo prazo..................................................................................................................

125

Page 11: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Principais perspectivas teóricas para o estudo da cultura.......................... 24

Tabela 2 - Resumo das relações entre as abordagens de Hofstede (1991) para as

cinco dimensões e as outras abordagens apresentadas no capítulo.............................

50

Tabela 3 - Principais características culturais nacionais e seus indicadores............... 62

Tabela 4 - Exemplo de uma classe e subclasse de acordo com a classificação do

grupo fundição, com base na Classificação Nacional de Atividades Econômicas

(CNAE).......................................................................................................................

69

Tabela 5 - Representatividade das PMEs na economia brasileira............................... 73

Tabela 6 - Classificação da pesquisa........................................................................... 88

Tabela 7 - Amostra coletada e representatividade dos respondentes das empresas

da abordagem presencial na própria empresa.............................................................

92

Tabela 8 - Total de questionários respondidos............................................................ 93

Tabela 9 - Cálculo do peso e margem de erro para os questionários........................ 95

Tabela 10 - Fórmulas descritas no Values Survey Module 1994 (VSM 94)............... 96

Tabela 11 - Categorização dos pesquisados por incidência de respostas.................... 98

Tabela 12 - Comparação entre os índices das cinco dimensões de percepção de

valor identificadas por Hofstede (1991) obtidos nas pesquisas de Hofstede (1991),

Tanure (2010) e pesquisa atual...................................................................................

100

Tabela 13 - Percentual de empresas de fundição por número de empregados em

Cláudio, Divinópolis e Itaúna.....................................................................................

123

Tabela 14 - Possíveis relações entre os fatores e os resultados das dimensões da

pesquisa atual..............................................................................................................

128

Page 12: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABIFA Associação Brasileira de Fundição

ANOVA Análise de Variância

APL Arranjo Produtivo Local

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas

EUA Estados Unidos da América

FEBRABAN Federação Brasileira de Bancos

FIEMG Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais

FJP Fundação João Pinheiro

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBM International Business Machines

IEL Instituto Euvaldo Lodi

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

MDIC Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

MG Minas Gerais

MET Ministério do Trabalho e Emprego

PIB Produto Interno Bruto

PNB Produto Nacional Bruto

PME Pequena e Média Empresa

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

RAIS Relação Anual de Informações Sociais

RCOMG Região Centro-Oeste de Minas Gerais

SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Page 13: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

SIFUMG Sindicato da Indústria da Fundição no Estado de Minas Gerais

SPILS Sistemas Produtivos e Inovativos Locais

TI Tecnologia da informação

VSM Values Survey Module

Page 14: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

SUMÁRIO1

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14

1.1 Objetivos .................................................................................................................. 21

1.1.1 Objetivo geral .......................................................................................................... 21

1.1.2 Objetivos específicos .................................................................................................. 21

2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 22

2.1 Cultura, cultura organizacional e cultura brasileira ........................................... 22

2.1.1 Cultura ..................................................................................................................... 22

2.1.2 Cultura organizacional ........................................................................................... 28

2.1.3 A pesquisa de Hofstede e suas interrelações com diferentes abordagens ............. 35

2.1.4 A cultura brasileira ................................................................................................. 52

2.1.5 O setor de fundição ................................................................................................. 68

2.2 Arranjos produtivos locais (APLs) ........................................................................ 71

3 METODOLOGIA ....................................................................................................... 85

3.1 Abordagem e classificação da pesquisa ................................................................ 85

3.2 Instrumento de coleta de dados ............................................................................. 86

3.3 Unidades empíricas de análise ............................................................................... 89

3.4 Estratégia de coleta de dados ................................................................................. 91

3.5 Estratégia de análise dos dados ............................................................................. 93

3.5.1 Cálculo das dimensões ............................................................................................ 95

1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo Ortográfico

assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no

Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com as normas ANPAD 2012.

Page 15: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

4 ANÁLISE DE DADOS ............................................................................................... 97

4.1 Categorização dos respondentes da pesquisa ............................................................ 97

4.2 Resultados obtidos no APL ......................................................................................... 98

4.2.1 Distância do poder................................................................................................. 101

4.2.2 Masculinidade X feminilidade .............................................................................. 109

4.2.3 Individualismo X coletivismo ................................................................................ 115

4.2.4 Necessidade de controlar as incertezas ................................................................ 120

4.2.5 Orientação curto prazo x longo prazo .................................................................. 124

4.3 Dimensões culturais do APL: possíveis explicações ................................................ 126

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 133

REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 138

APÊNDICES .................................................................................................................... 153

Page 16: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

14

1 INTRODUÇÃO

O conceito de cultura originou-se no âmbito das ciências sociais, principalmente no

campo da Antropologia e Sociologia (Hofstede, 2003). O entendimento do comportamento

humano sempre instigou os pesquisadores sobre cultura, os quais buscaram (e ainda

buscam) razões capazes de explicá-lo (Mascarenhas, 2002).

O interesse pela cultura organizacional ganhou ênfase principalmente por dois

motivos: declínio da produtividade norte-americana e aumento da competitividade

japonesa (Bertero, 1996; Silva & Zanelli, 2004). Enquanto as empresas norte-americanas

estavam em declínio, as empresas japonesas, em geral, estavam em ascensão, mantendo

sensível vantagem competitiva em relação às norte-americanas. O sucesso obtido no pós-

guerra indicava que a cultura empresarial japonesa apresentava condições de melhor

desempenho do que as norte-americanas (Bertero, 1996; Silva & Zanelli, 2004). Em busca

de explicações para a ocorrência desse fenômeno, o tema “cultura organizacional” passou a

ser observado não como um fenômeno imaterial e intangível, mas como explicação para

diferentes desempenhos entre empresas, a partir de sua nacionalidade. Dessa forma, havia

culturas favoráveis ou desfavoráveis ao bom desempenho organizacional (Bertero, 1996;

Silva & Zanelli, 2004).

Segundo Hofstede (1991), a cultura nas organizações disseminou-se de forma mais

intensa a partir do início da década de 1980, quando se popularizou o entendimento de que

os bons resultados de uma dada organização seriam consequência também das várias s

formas de pensar, sentir e agir do grupo de indivíduos que a compõem. De acordo com

Schein (2009), a cultura organizacional é importante, por influenciar o comportamento dos

indivíduos e a maneira como os fenômenos são percebidos. Por orientar e restringir o

comportamento do grupo, a cultura possui implicações significativas nas organizações,

com consequências concretas, a despeito de o conceito ser abstrato (Schein, 2009).

Page 17: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

15

A compreensão da cultura organizacional torna-se, então, um fator importante para a

gestão, pois a cultura influencia não só a maneira de trabalho de uma organização, mas

também as decisões estratégicas e a mobilização para produzir resultados (Fleury, 2009).

Segundo Tanure (2010), nenhuma prática de gestão, isoladamente, é, a princípio, superior

a outra, o que pode levar a melhores resultados organizacionais é a congruência entre

práticas de gestão, cultura nacional e cultura organizacional.

A cultura interfere no desempenho organizacional e, na visão das correntes

majoritárias em estudos organizacionais, pode ser controlada e manipulada pelos dirigentes

organizacionais para atingir os resultados almejados (Schein, 2009). Nessa busca por

melhores resultados, os gestores tentam desenvolver “o tipo certo de cultura” nas

organizações, de forma a sugerir o destaque de um valor que desejam ressaltar (Schein,

2009). Aplicado em contexto que se difere do quadro conceitual de Hofstede (1980), o

termo “cultura” é utilizado em “cultura da qualidade” ou “cultura do atendimento ao

cliente”, indicando a existência de uma crença segundo a qual uma cultura é melhor ou

mais forte do que outras para se conseguir a eficácia da organização (Schein, 2009).

Entretanto, não existe uma cultura certa ou errada, por se tratar de um fenômeno complexo,

resultado das relações, valores e significados e com influências do contexto e ambiente no

qual está inserida. O processo de mudança de cultura é de alta complexidade e não se

concretiza por meio de simples imposição dos gestores (Schein, 2009).

Apesar da infinidade de interesses sobre o tema “cultura organizacional”, não existe

consenso sobre o significado de cultura na literatura (Schein, 2009). Para Motta (1997, p.

16), “a cultura é um conceito antropológico e sociológico que comporta múltiplas

definições”. Bertero (1996, p. 35) afirma que a noção de cultura “nos atira no meio de um

emaranhado conceitual que se apoia em toda a literatura etnográfica e arqueológica”. No

entanto, não é objetivo deste trabalho abarcar os conceitos antropológicos do tema.

Page 18: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

16

As relações dos grupos nas organizações formam sistemas sociais fortes, revelando

fenômenos profundos e com certo grau de inconsciência (Schein, 2009). Esses fenômenos

culturais, inseridos em cenários e processos socialmente estruturados, são relevantes por

chamar a atenção para o fato de que os indivíduos interagem em diferentes esferas da

sociedade, levando-os a interpretações distintas dos fenômenos simbólicos, de acordo com

suas percepções, biografias, interesses e papéis. Os fenômenos culturais podem ser mais

bem compreendidos se forem analisados de acordo com o âmbito social estruturado nos

quais são produzidos e interpretados. Grupos sociais imersos em quadros socioculturais

distintos interagem de acordo com padrões distintos (Schein, 2009).

Sob essa perspectiva, Vasconcelos, Mascarenhas e Protil (2004) indicam que, em um

mesmo contexto, pode haver diferentes interpretações dos fenômenos sócio

organizacionais, formando o que denominam de “subculturas”, como aquelas relacionadas,

por exemplo, à cultura da área de produção ou à cultura da área comercial de uma empresa,

assim como fatores regionais e locais podem apresentar nuanças culturais dentro de um

mesmo país. A cultura possibilita que um grupo se fortaleça ou se desintegre, justamente

por expressar os valores e as crenças que os membros desse grupo partilham (Pires &

Macedo, 2006).

Outro recorte importante é o que inclui os conceitos associados à cultura nacional

como um dos elementos mais importantes da cultura organizacional (Mascarenhas, 2002),

supondo que cada indivíduo carregue uma programação mental constituída por

componentes da cultura nacional, que foram transmitidas desde seu nascimento por

diversos grupos sociais e posteriormente levados e reforçados pela organização onde

trabalha (Almeida, 2007). Dessa forma, a sociedade influencia a formação da cultura de

uma empresa (Mascarenhas, 2002). É essa a perspectiva também de Fleury (2009) para

quem as primeiras noções de cultura utilizadas pela Administração foram similares às

Page 19: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

17

utilizadas para a definição de cultura nacional. Essa abordagem encontra ressonância nas

postulações de Hofstede (1983), que considera um ponto-chave na Administração a

influência da cultura nacional na gestão por motivos políticos, sociológicos e psicológicos.

Em se tratando de cultura nacional, para Fleury (2009), Geert Hofstede é,

provavelmente, a referência mais significativa da conexão cultura nacional e cultura

organizacional. Pesquisas desenvolvidas pelo autor levaram a identificar cinco dimensões

que estruturam a cultura organizacional, a saber: a) a distância do poder; b) o grau de

individualismo ou de coletivismo; c) o grau de masculinidade ou feminilidade; d) a

necessidade de controle da incerteza; e) orientação a longo ou a curto prazo (Hofstede,

1991) e que serão aprofundadas e discutidas no referencial teórico.

Apesar das diferenças conceituais, os teóricos da cultura, em sua maior parte, a

relacionam aos valores e normas compartilhados pelos membros de um grupo (Goffee &

Jones, 1996). Esses valores manifestam-se por meio de símbolos, como mitos rituais,

histórias, lendas e linguagem característica, orientando os indivíduos de uma referida

cultura em sua forma de pensar, agir e tomar decisões (Pires & Macedo, 2006). Essa

consideração torna-se importante para esta dissertação que vai abordar cultura e arranjo

produtivo local, analisando também o recorte relações, poder e flexibilidade, traços

marcantes do sistema de ação cultural brasileiro de Tanure (2010). As relações de poder

baseiam-se na posse recursos de forma assimétrica o que podem gerar relações sociais com

tendências a ocultar a ambiguidade (Macêdo, 2002). A flexibilidade pode ser prercebida

por duas principais facetas: a adaptabilidade e a criatividade e também está permeada pelas

relações afetivas (Tanure, 2010).

A essência dos arranjos produtivos locais expressa a necessidade de

compartilhamento de uma série de fatores produtivos que podem ensejar sinergia aos

agentes econômicos participantes e, ao mesmo tempo, exige que tais agentes abram mão de

Page 20: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

18

alguns valores e conceitos próprios para fazer valer algumas decisões e ações coletivas.

Algumas questões se estabelecem: é possível que os participantes de um determinado

arranjo produtivo construam referenciais comuns de atuação e gestão além daqueles

ligados a indicadores de gestão? Ao optarem por acordos coletivos, estariam tais agentes

construindo uma cultura própria? A nova cultura é consequência da preeminência de

alguns atores sobre outros? Ou resulta de um processo simbiótico de culturas?

Não é somente a cultura regional que pode influenciar a cultura organizacional

(Hofstede, 1991). As diferenças regionais, étnicas, de classes sociais e religiosas estão na

origem de diferenças culturais dentro de um mesmo país com dimensões continentais como

o Brasil (Hofstede, 1991). A cultura das nações sofre influências advindas de outras

nacionalidades que constituíram sua base de formação, processo que vem sendo acelerado

pela globalização, o que contribui para o desenvolvimento de uma arquitetura produtiva na

qual se configuram redes de organizações em função dos fluxos mundializados (Carvalho,

2006). Este é um dos pilares, mas existem outros como o papel da liderança e outras

características como as setoriais, tipo e origem do capital e lógica de formação

predominante (Tanure, 2010).

Dentro do recorte epistemológico escolhido para este trabalho, cabe apontar a

articulação entre a cultura organizacional, de acordo com as pesquisas de Hofstede (1991)

e Tanure (2010) e o arranjo produtivo local de fundição dos municípios de Cláudio, Itaúna

e Divinópolis. APLs, de acordo com Lastres e Cassiolato (2003), são aglomerações

territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais - com foco em um conjunto

específico de atividades econômicas - que apresentam vínculos, mesmo que incipientes.

É comum em APLs a presença de instituições de apoio e de coordenação com o

objetivo de proporcionar suporte político e estratégico, favorecendo o desenvolvimento de

Page 21: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

19

ações voltadas para objetivos comuns. Essa interação entre os agentes é influenciada

também pela cultura (Scheffer et al., 2008).

Para Schein (2009), a formação da cultura organizacional constitui um processo que

obedece sequencialmente a um fluxo: valores do fundador, sua forma de divulgá-los e

externalizá-los e, novamente, internalizá-los pela introdução de pessoas que compartilham

determinada visão de mundo e de trabalho. Ao se constituir como um arranjo, quais traços

culturais seriam preponderantes e como serviriam para dar um código de interação entre os

membros, requisito fundamental para o êxito do empreendimento? A cultura de cada

organização irá prevalecer à cultura do grupo? Isso porque é preciso que os integrantes da

organização saibam como agir uns com os outros, considerando os diferentes níveis de

desenvolvimento em que cada unidade se encontra. Se uma cultura surge quando seus

membros passam a compartilhar conhecimentos e pressupostos para lidar com as questões

de adaptação externa e integração interna (Silva & Zanelli, 2004), como tal necessidade se

concretiza em um tipo de organização em que é mantida a independência das partes e a

interdependência de recursos, o que levaria a acordos de decisão e implementação?

Tais questões levam ao questionamento de novas formas de se criar uma cultura

interdependente que pode ser não apenas consequência de um emaranhado de várias

culturas, como pode ser espelhada nos agentes que melhor expressaram êxito adaptativo

aos seus negócios. Pode, ainda, ser o reflexo da própria cultura trazida pelos agentes

integradores das ações (órgãos governamentais e consultorias técnicas) que aportam os

seus próprios modelos mentais do que seria uma boa associação ou arranjo. E pode, ainda,

ser o resultado conjugado de todas essas especificidades.

Para entender como os fenômenos relacionados à cultura interpenetram nas empresas

do APL de fundição das cidades de Cláudio, Divinópolis e Itaúna, no estado de Minas

Page 22: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

20

Gerais, empreendeu-se a presente investigação, com consequente comparação dos achados

de pesquisa com os estudos de Hofstede (1991) e Tanure (2010).

De acordo com a Modern Casting (2012), o Brasil hoje é o sétimo maior produtor

mundial de produtos de fundição. Entretanto, vem perdendo participação no mercado nos

últimos anos. Segundo estimativas da Associação Brasileira de Fundição (ABIFA), a

produção de 2012 teve queda de aproximadamente 14% em relação ao ano anterior.

Observando os dados do (Brasil, 2013a) Ministério do Desenvolvimento, Indústria e

Comércio Exterior (MDIC), a exportação brasileira de produtos de fundição vem caindo à

ordem de 3,7% ao ano, nos últimos cinco anos, enquanto a importação vem aumentando

9,7% ao ano no mesmo período.

Em 2012, Minas Gerais foi responsável por 28% das exportações nacionais de

produtos fundidos do Brasil, sendo de 36% essa participação em 2008. Outro fato relevante

é que o produto exportado pelas empresas de Minas Gerais tem valor agregado (preço por

quilograma) inferior ao exportado pelo restante do Brasil e também abaixo do produto

importado (Brasil, 2013a).

Outros estados brasileiros produtores de fundição vêm reagindo mais rapidamente

que Minas Gerais em relação à competitividade internacional. Empresas localizadas no Sul

do país e no estado de São Paulo são as que mais se destacam tanto em toneladas quanto

em valor agregado e vêm crescendo em ritmo mais acelerado que as empresas mineiras

(ABIFA, 2013).

Interessa, assim, aos estudos organizacionais entender como tais associações - que

supõem a interação de múltiplos agentes, de diferentes segmentos e configurações, cada

qual com as suas especificidades - criam as bases necessárias para gerar valor. Uma dessas

bases é exatamente a cultura organizacional que, no caso das APLs, pode resultar em

traços que, não sendo específicos de cada agente, passam a constituir o fio a juntar

Page 23: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

21

empresas e órgãos diferenciados. Isso faz emergir a seguinte questão: quais são os traços

culturais que orientam as práticas organizacionais de empresas que compõem um APL?

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo geral

Identificar quais são os traços culturais comuns e as diferenças entre as organizações que

participam do APL de acordo com o modelo de Hofstede (1991) e a partir do recorte

poder, relações e flexibilidade.

1.1.2 Objetivos específicos

a) Comparar os achados da presente pesquisa com os resultados encontrados por

Hofstede (1991) e Tanure (2010).

b) Identificar quais são as principais dimensões culturais do APL a partir do recorte:

poder, relações e flexibilidade.

Page 24: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

22

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O referencial teórico está estruturado em três partes. A primeira delas abordará a

cultura organizacional sob o ponto de vista conceitual e histórico. A segunda parte tratará

da cultura organizacional brasileira e apresentará o sistema de ação cultural brasileiro

elaborado por Tanure (2010), modelo que será utilizado para a categorização na análise dos

dados. A terceira parte abordará as teorias sobre APLs e a relevância dessa forma de

organização para um estudo sobre cultura.

2.1 Cultura, cultura organizacional e cultura brasileira

2.1.1 Cultura

A palavra “cultura” tem sido usada com muitos significados diferentes (Tanure,

2010). Fleury (2009), Schein (2009) e Smircich (1983) argumentam que ainda não existe

consenso sobre o significado de “cultura”. Kroeber & Kluckhohn (1952) identificaram

mais de 164 diferentes definições para o termo. A dificuldade, para Barros Laraia (2001),

está no fato de que a compreensão exata do conceito de cultura está relacionada à

compreensão da própria natureza humana, uma reflexão inesgotável.

Para Geertz (1989, p. 14), as inúmeras definições sobre cultura ampliaram e,

simultaneamente, fragmentaram o conceito, fato que justificaria a sua redução para uma

dimensão, segundo palavras do autor, “justa” e que confirme a sua importância e não a sua

“debilidade”.

Page 25: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

23

A palavra cultura, de acordo com Thompson (1995), é derivada do latim e adquiriu

presença significativa em muitos idiomas europeus no início do período moderno. Usada

inicialmente para referir-se ao cultivo ou ao cuidado de algo, a partir do século XVI esse

sentido foi estendido para o processo do desenvolvimento humano (Thompson, 1995). No

final do século XVIII, o termo germânico kultur foi utilizado para simbolizar aspectos

espirituais de uma comunidade.

Entretanto, Tylor (1871), em uma concepção etnográfica, definiu o verbete inglês

culture como todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes

ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma

sociedade. Para esse autor, a cultura engloba todo o comportamento aprendido e tudo

aquilo que independe de uma transmissão genética, argumento que corrobora o

entendimento de Keesing (1990) de que qualquer criança humana normal pode ser educada

em qualquer cultura, se for colocada desde o início em situação conveniente de

aprendizado. Na mesma linha de pensamento, Kroeber (1917) afirmou que a cultura

distanciou o homem do mundo animal na medida em que seus instintos foram anulados

pelo processo evolutivo, permitindo que a sua ação resultasse de seus padrões culturais.

Nesse sentido, o homem está acima de suas limitações orgânicas, ou seja, em vez de

modificar o seu aparato biológico, o homem modifica o equipamento superorgânico

tornando-se, como consequência, capaz de romper as barreiras das diferenças ambientais e

transformar toda a terra em seu habitat (Kroeber, 1917).

Ao estudar as diferenças entre os conceitos de cultura, Keesing (1990) identificou

duas teorias: sistemas adaptativos e teorias idealistas. A teoria idealista da cultura,

conforme Keesing (1990), é subdividida em três abordagens: sistema cognitivo, sistema

estrutural e sistema simbólico. Linton (1945) e Cavedon e Fachin (2000) também

Page 26: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

24

apresentam a compreensão da cultura segundo as perspectivas sociológica e política. Essas

perspectivas e abordagens estão resumidas na Tabela 1.

TABELA 1

Principais perspectivas teóricas para o estudo da cultura

Perspectiva Abordagem Principais autores

Determinismo

biológico Capacidades determinadas biologicamente

Sistemas

adaptativos

Sistemas adaptativos. (padrões comportamentais

e sociais são aprendidos e transmitidos)

White (1949), Sahlins (1979),

Rappaport (1971), Vayda (1969)

Antropológica

(teorias

idealistas)

Sistema cognitivo (fenômeno observado) Tylor (1871), Kroeber (1917)

Sistema estrutural (pensamento estruturado em

regras inconscientes) Thompson (1995), Lévi-Strauss (2008)

Sistema simbólico (decodificação doo sistema

de comunicação – símbolos)

Geertz (1973), Schneider (1980),

Schein (1992, 1996, 2009)

Sociológica Linton (1945), Vallée (1985),

Godelier (1973), Condominas (2006)

Política Cavedon e Fachin (2000), Aktouf

(1993)

Psicológica Silva & Zanelli (2004)

Fonte: elaborado a partir de Aktouf (1993), Cavedon e Fachin (2000), Condominas (2006), Geertz (1973),

Godelier (1973), Kroeber (1917), Lévi-Strauss (2008), Linton (1945), Rappaport (1971), Sahlins (1979),

Schneider (1980), Silva e Zanelli (2004), Thompson (1995), Tylor (1871), Vallée (1985), Vayda (1969) e

White (1949).

O determinismo biológico pressupunha que algumas capacidades eram inerentes a

certas raças e que diferenças de comportamento existentes entre pessoas de sexos

diferentes eram determinadas biologicamente (Malott, 2007). As teorias com essa

compreensão datam do final do século XVIII e decorrer do século XIX e, entre alguns

exemplos, pode-se citar o entendimento de que questões relacionadas à raça e ao gênero

influenciavam a inteligência de indivíduos (Malott, 2007). A abordagem dos sistemas

adaptativos parte do princípio de que padrões comportamentais e sociais são aprendidos e

transmitidos (Rappaport, 1971; Sahlins, 1979; Vayda, 1969; White, 1949). A teoria

idealista da cultura, conforme Keesing (1990), é subdividida em três abordagens: sistema

cognitivo, no qual o fenômeno é observado; sistema estrutural, no qual o pensamento é

estruturado em regras inconscientes; sistema simbólico, no qual o sistema de comunicação

é composto de símbolos.

Page 27: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

25

Thompson (1995), autor que se intitula “formulador” da concepção estrutural da

cultura, dá ênfase tanto ao caráter simbólico dos fenômenos culturais quanto ao fato de tais

fenômenos estarem sempre inscritos em cenários sociais estruturados que produzem

formas simbólicas de interação que precisam ser destacadas e compreendidas no contexto

em que são interpretadas .

Para Lévi-Strauss (2008), a cultura é definida como um sistema simbólico resultante

de uma criação acumulativa da mente humana. Esse autor acrescenta que a cultura

estrutura o pensamento humano, dotando-o de em regras inconscientes que se organizam

em um conjunto de princípios que emolduram as manifestações de determinado grupo.

Geertz (1989) é outro autor pertencente à abordagem dos sistemas simbólicos,

conforme Thompson (1995). As principais preocupações relacionadas ao estudo da cultura

estão nas questões de significado, de simbolismo e de interpretação. O autor, partindo de

Max Weber, alerta para o fato de que o homem é um animal amarrado a teias de

significados que ele mesmo teceu e a análise dessas teias - que ele entende ser a cultura -

não é uma ciência experimental em busca de leis, mas uma ciência interpretativa à procura

do significado. O padrão de significados incorporados nas formas simbólicas permite a

comunicação e o compartilhamento de experiências, concepções e crenças entre os

homens, sendo o uso dos símbolos um traço distintivo da vida humana (Geertz, 1989). Por

esse motivo, Thompson (1995) adiciona que analisar cultura dentro dessa abordagem

exige, em primeiro lugar, a elucidação dos padrões de significados.

Estendendo o entendimento dos padrões de significados, é possível encontrar em

Schein (1996) a definição de cultura como um conjunto de suposições implícitas que são

compartilhadas e consideradas certas por um grupo. Os argumentos de Schein (1996)

baseiam-se em que as suposições implícitas determinarão como o grupo compreende,

pensa e reage em diversos ambientes. Adicionalmente, os membros dificilmente são

Page 28: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

26

conscientes da própria cultura até encontrarem uma diferente. Para Schein (2009), cultura é

entendida como um padrão de suposições básicas compartilhadas. Esse padrão foi

aprendido por um grupo à medida que a solução dos problemas de adaptação externa e de

integração interna passa a funcionar bem o suficiente para ser considerado válido e, por

isso, deve ser ensinado aos novos membros como o modo correto de perceber, pensar e

sentir-se em relação a esses problemas (Schein, 2009).

Cultura, na abordagem sociológica, dentro da perspectiva nacional, pode ser

compreendida como a configuração de condutas aprendidas e o resultado de um

comportamento cujos componentes e determinantes são compartilhados e transmitidos

pelos membros de uma sociedade (Linton, 1945). Godelier (1973) e Condominas (2006)

acreditam que existe a necessidade de não se considerar separadamente o que é uma

estrutura social e acrescentam a necessidade de separá-la daquilo que constitui a

experiência vivida dos membros de uma sociedade. Para eles, uma estrutura social é

circunscrita pelos sistemas de posicionamento na sociedade, regulamentos que disciplinam

as interações, bem como a história, o desenvolvimento e o futuro, inscritos na memória e

na evolução das pessoas e de suas relações. A experiência vivida pelos membros dessa

sociedade influencia as condutas e relações sociais.

De acordo com Almeida (2007), ao longo da vida o indivíduo passa por diversos

grupos sociais que modelam o seu comportamento social, seus valores morais, sua conduta

e relações com família, escola e organizações, que dependem do contexto sociocultural. Ao

entrar para uma organização, esse indivíduo, ao mesmo tempo, leva sua programação

mental e passa a compartilhar a cultura já desenvolvida pela organização (Almeida, 2007).

Cultura também pode ser compreendida como regras de interpretação da realidade,

sistemas de classificação nos grupos sociais que criam condições para o compartilhamento

de sentidos e representações comuns nos grupos sociais (Vasconcelos, Mascarenhas &

Page 29: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

27

Protil, 2004). São redes que se combinam e recombinam, gerando diferentes e novos

padrões (Vasconcelos, Mascarenhas & Protil, 2004).

Na perspectiva política, a cultura é entendida como um processo histórico que nasce

da interação entre as pessoas nas sociedades, nas organizações e nos grupos (Cavedon &

Fachin, 2000). Nessa perspectiva, Aktouf (1993) apresenta cultura como um complexo

formado pelos saberes, pelas crenças e pela arte, cujos elementos encontram-se em relação

dialética constante. Para esse autor, as relações são econômicas, sociais e simbólicas.

Finalmente, no aspecto psicológico, a cultura pode ser entendida como fonte de

expressão do inconsciente humano, formas de cognição que caracterizam diferentes

comunidades, símbolos compartilhados ou, ainda, como valores básicos que são

profundamente arraigados, influenciando e explicando os comportamentos e a forma de

agir dos indivíduos e grupos (Silva & Zanelli, 2004).

Embora possa não haver consenso em relação ao significado do conceito de cultura,

conforme descrito anteriormente, muitos pesquisadores, de acordo com Thompson (1995),

concordam que o estudo dos fenômenos culturais é uma preocupação de importância

central para as ciências sociais como um todo. O interesse é compartilhado por estudiosos

de diversas disciplinas, desde a Sociologia e Antropologia (que emergiu como disciplina

no final do século XIX) até a História e a Crítica Literária (Thompson, 1995).

Compartilha-se, neste trabalho, com o entendimento de Hofstede (2008), corroborado

por Tanure (2010), no qual a cultura é uma programação mental coletiva que diferencia

determinado grupo de outros. É a maneira de agir e pensar de um grupo no julgamento do

que é certo e errado, suas motivações e suas formas peculiares de relacionamento. Desta

forma, para os autores, a cultura é aprendida (Tanure & Gonzalez-Duarte, 2006). Hofstede

(1991) ressalta que se trata de um conjunto de valores, premissas e sentimentos adquiridos

desde a infância e que muitas vezes fazem parte de aprendizado inconsciente. Por isso, é

Page 30: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

28

difícil falar a respeito dos valores, já que eles não são totalmente perceptíveis do exterior.

Segundo o autor, é possível, entretanto, deduzi-los por meio do comportamento das

pessoas. Esse processo de dedução pode ser cansativo e ambíguo, uma vez que as respostas

não são, necessariamente, verdadeiras, pois o comportamento real costuma ser diferente do

verbal. Soma-se a isso a distinção entre valores desejáveis e desejados, isto é, como a

pessoa pensa que deveria ser e o que deseja para si (Hofstede, 1991). Estabelecidos os

diferentes prismas sob os quais pode-se conceituar a cultura, para o objeto deste trabalho é

importante dar relevo a um de seus desdobramentos: a cultura organizacional.

2.1.2 Cultura organizacional

A eficiência da gestão japonesa despertou, principalmente a partir de 1980, a atenção

do gerente ocidental, sobretudo o norte-americano, sobre a influência dos aspectos

culturais na obtenção de resultados, tendo em vista que a indústria dos Estados Unidos da

América (EUA) declinava no final dos anos 1970, ao passo que a japonesa consolidava a

liderança mundial em função do elevado padrão de qualidade que vinha imprimindo em

seus produtos, principalmente nos automóveis (Aktouf, 2003; Castro & Silva, 2012). É

nesse sentido que Vieira e Goulart (2007) refletem sobre a dimensão subjetiva dos

indivíduos nas organizações que, segundo as autoras, refletem sobre a dimensão objetiva,

qual seja, a produtividade.

A cultura é uma dimensão organizacional complexa, cujo entendimento demanda

tempo, paciência, reflexão e abertura a revisões (Bertero, 1996). O conceito de cultura

organizacional é intangível, mas pode ter consequências duras e tangíveis (Hofstede, 1991;

Tanure, 2010). Os estudos organizacionais da cultura dividem-se em três teorias: a teoria

convergente, a divergente e a que aceita as duas teorias como complementares. A teoria

convergente apareceu antes da intensificação da globalização, por volta da década de 1960.

Page 31: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

29

Por defender que o modelo gerencial poderia ser universal, admitia existir “a melhor forma

de administrar” (Hofstede, 1983). Os princípios de uma boa gestão existem

indiferentemente do ambiente da nação e, em eventuais casos de desvios, as práticas locais

deveriam ser alteradas (Hofstede, 1983).

A importação desses princípios de uma boa gestão originários de países

desenvolvidos foi nomeada pelo movimento modernista de “antropofagia organizacional”,

que pode ser observada tanto em empresas locais pressionadas pelo contexto econômico,

quanto em empresas estrangeiras que se instalam no país, conforme Fleury (2009). Essa

busca por conceitos universais pode ser facilmente percebida nos mercados em

desenvolvimento como o do Brasil (Caldas & Wood, 2000; Tanure, 2010). E é nesse

sentido que os americanos se destacam como a principal referência dos brasileiros em

inúmeros aspectos, apesar de serem povos distintos (Tanure, 2010). Porém, ambas as

formas (empresas locais e estrangeiras no país) de adoção de tecnologias acríticas podem

ser problemáticas, pois existem diferenças entre o contexto em que foram geradas e o

modo como estão sendo praticadas (Caldas & Wood, 2000). Essa é a percepção da teoria

divergente.

A teoria divergente ganhou relevância na década de 1970, com mais adeptos que a

teoria convergente. Demonstrou as diferenças entre os modelos de gestão dos países e

regiões e as respectivas consequências na liderança, processo de negociação, gestão de

pessoas, conflitos, entre outros. Fazem parte dessa corrente pesquisadores como Laurent

(1983), Trompenaars (1994) e Hofstede (1991). Na década de 1980, essa teoria foi

novamente colocada em debate, principalmente devido ao modelo de gestão japonês,

mencionado anteriormente. Apareceu, então, a terceira teoria, denominada convergente-

divergente, que admitia a existência das duas anteriores. Para os adeptos desta teoria, como

Child (2002), a diferença entre regiões são mais evidentes em relação aos valores, por

Page 32: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

30

exemplo, questões de como lidar com o poder ou sentimento de pertença do grupo. Outros

aspectos não relacionados a valores, como a estrutura da organização, sofrem pouca

influência da cultura local (Tanure, 2010). Essa é a abordagem mais integradora e segue a

lógica de “harmonizar o que é global com o que é local” (Tanure, 2010, p. 22).

A organização possui uma estrutura social diferente de uma nação, seja pelo fato de

seus membros terem tomado a decisão de se integrarem a ela ou por estarem envolvidos

somente durante o horário de trabalho, poderem abandoná-la (Hofstede, 1991). Entretanto,

pela programação mental do indivíduo, que também foi influenciada pela nação (grupo

regional, étnico, religioso, linguístico, etc.), as pesquisas sobre culturas nacionais são

parcialmente úteis para a boa compreensão da cultura organizacional (Hofstede, 1991).

A cultura organizacional pode ser entendida, para Robbins (1987), como um sistema

de significados comuns aos membros de uma organização que a diferencia das demais.

Para Pettigrew (1996), esse sistema de significados é aceito pública e coletivamente por

um dado grupo em um dado tempo, sendo esse sistema o suporte para que as pessoas

interpretem as suas próprias situações. Segundo Shrivastava (1985), é um conjunto de

produtos como mitos, rituais, linguagens, metáforas, símbolos, cerimônias, rituais, sistemas

de valores e normas de comportamento por meio do qual o sistema é estabilizado e

perpetuado. Em relação às palavras “estabilizado” e “perpetuado”, Aktouf (1993)

considera que a empresa pode ter ou ser uma cultura passiva de ser verificável ou não, ser

bem-sucedida ou não ou ainda manipulável e modificável por pessoas que desempenham

papéis de liderança. E é nesse sentido que o autor identificou que as empresas podem servir

como modelos a serem seguidos em virtude do poder que possuem de imprimir valores,

referências e símbolos. Segundo Pires e Macedo (2006) esses símbolos podem ser mitos

rituais, histórias, lendas e linguagem característica e podem orientar os indivíduos em sua

forma de pensar, agir e tomar decisões.

Page 33: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

31

Os argumentos apresentados anteriormente também são encontrados nas reflexões de

autores como Schein (1992), que conceitua cultura organizacional como modelo de

pressupostos básicos que determinado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu no

processo de aprendizagem para lidar com os problemas de adaptação externa e integração

interna. Por esse motivo, esses pressupostos são ensinados para os novos membros.

De acordo com Schein (1992, 2009), a cultura organizacional possui aspectos que

podem ser identificados mais facilmente do que outros. Para o autor, a dificuldade

encontrada para diferenciá-los contribui para a confusão essencial do conceito. Por esse

motivo, Schein (2009) apresenta um modelo que ilustra os níveis de cultura, conforme a

Figura 1. A camada externa, mais facilmente vista, é denominada “artefatos” e é

representada na organização pelas estruturas e processos visíveis. A segunda camada,

“crenças e valores expostos”, representa estratégias, metas e filosofias. A última camada,

mais profunda, abrange as suposições básicas, que são os valores fundamentais,

percepções, pensamentos, sentimentos e inconscientes.

Figura 1. Níveis de cultura. Fonte: Schein (2009, p. 24).

Artefatos

Crenças e valores

expostos

Suposições básicas

Estrutura e processos organizacionais visíveis

(difíceis de decifrar)

Estratégias, metas, filosofias (justificativas

expostas)

Crenças, percepções, pensamentos e sentimentos

inconscientes, assumidos como verdadeiros...

(fonte última de valores e ação)

Page 34: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

32

Hofstede (1991), por sua vez, apresenta um modelo de cultura que agrupa as

diferentes manifestações em quatro categorias: símbolos, heróis, rituais e valores,

representadas na Figura 2 e descritas a seguir.

Figura 2. Os diferentes níveis de manifestação de uma cultura. Fonte: Hofstede (1991, p. 23).

Assim como os artefatos propostos por Schein (2009), os símbolos representam, para

Hofstede (1991), a parte mais superficial da cultura, sendo composta de palavras, objetos,

figuras e gestos, reconhecidos somente pelos que partilham de determinada cultura. Os

símbolos são dinâmicos, aparecem e desaparecem com frequência e são facilmente

copiados por outros grupos. O segundo nível identificado por Hofstede (1991), mais

profundo que o anterior, engloba os heróis, que são pessoas ou personagens utilizados

como modelos de comportamento e podem ser vivas ou falecidas. O autor enfatiza que

heróis são formados por terem características altamente valorizadas por determinada

cultura.

O terceiro nível engloba os rituais, definidos como as atividades coletivas para atingir

fins desejados tais como o ato de cumprimentar ou realizar cerimônias. Normalmente, são

atividades supérfluas para determinados fins, mas podem ser considerados como essenciais

em certas culturas. Esses três primeiros níveis são visíveis ao observador externo e, por

isso, foram agrupados sob o termo “práticas”. Da mesma maneira que Schein (2009),

Page 35: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

33

Hofstede (1991) reconhece dimensões visíveis e invisíveis em seu modelo teórico. O

núcleo da cultura, para Hofstede (1991), é formado pelos valores e pela tendência a se

preferir um estado em detrimento de outro. Muitas vezes, os valores são inconscientes e

não são diretamente perceptíveis pelo exterior, podendo ser deduzidos apenas pela forma

de atuação das pessoas nas diversas situações. O processo de socialização, segundo

psicólogos e estudiosos das teorias do Desenvolvimento, se completa até cerca de 10 anos

de idade, quando então, de forma consciente e frequentemente, inconsciente, os valores já

estão internalizados e se tornam mais difícil de alterar (Hofstede, 1991).

De certa forma, pode-se entender de forma similar a formação da cultura em uma

organização. Os fundadores, que impõem seus valores e suposições ao grupo (Schein,

2009), imprimem sua visão de mundo, valores, crenças, criam modelos e definem as ações

que têm por objetivo o envolvimento do grupo (Estol & Ferreira, 2006). Os fundadores

também são os responsáveis pela escolha da missão básica, da leitura do contexto

ambiental e da seleção dos membros. Adicionalmente, são eles que influenciam as

respostas originais do grupo. No entanto, as crenças e os valores do fundador só serão

reconhecidos e compartilhados se conduzir o grupo ao sucesso. Se acontecer o oposto, o

grupo buscará outra liderança até conseguir êxito (Schein, 2009). Com o passar do tempo,

o grupo passa a reconhecer as crenças e os valores que levaram ao sucesso como

suposições não negociáveis. Essas postulações que conjugam êxito (ou fracasso)

empresarial relacionando-os à cultura que pode ser modificada (Schein, 2009) não são

consensuais.

Há uma discussão teórica no campo da análise da cultura organizacional que se

divide em duas correntes majoritárias. A primeira corrente entende a cultura como variável

ou algo que a organização tem e a segunda corrente a entende como uma metáfora

enraizada ou algo que a organização é (Castro & Silva, 2012). Para a corrente que a

Page 36: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

34

entende como variável, o conhecimento de diferentes tipos de culturas organizacionais é

importante para adaptar e transformar a organização com o intuito de torná-la mais

preparada para a competitividade Para Tanure (2010), mudança na cultura é um processo

longo e difícil, mas possível.

Fleury (2009) associa-se aos argumentos de Schein (2009) e Tanure (2010) por

entender a cultura organizacional como o conjunto de valores construídos na história da

organização, sendo resultante da adaptação interna e externa, com raízes profundas. De

acordo com a autora, a liderança da organização traz suas próprias premissas e suposições

sobre a estrutura do setor, como gerar receita no setor específico, quem são os

concorrentes, quais clientes querem e quais não querem atender, a melhor maneira de

motivar a equipe, o balanço ideal entre cooperação e competição, os comportamentos que

devem ou não ser encorajados, entre outros. Em síntese, Fleury (2009) considera que o

líder traz consigo a programação mental do ambiente no qual foi criado.

Entretanto, o líder não é o único a possuir uma programação mental. Nesse sentido,

Hofstede (1991) é quem menciona o fato de que o indivíduo pertence a vários grupos

simultaneamente: o grupo nacional, o regional, étnico, religioso, linguístico, relacionados

ao gênero e à geração, origem social, escolaridade, profissão, organização ou empresa onde

trabalha. Pertencer a diversos grupos pode levar a uma programação mental com

tendências a entrar em conflitos, tornando difícil a previsão do comportamento em

situações novas (Hofstede, 1991).

Goffee & Jones (1996) argumentam que sem cultura a organização fica sem valores,

direcionamento e propósito. Macêdo (2002) demonstra que as organizações exercem um

papel cada vez mais importante sobre as condutas dos indivíduos que delas participam, em

função da indução dos comportamentos, o que acontece pela transmissão de conteúdos

Page 37: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

35

como objetivos organizacionais, meios para alcançá-los, responsabilidades dos membros,

padrões de comportamentos ou conjunto de regras.

Dada possibilidade dos estudos de Hofstede (1991) ajudar na compreensão dos

fenômenos estudados, optou-se por um destaque particular ao autor. De fato, segundo

Ciochina e Faria (2008), Hofstede foi pioneiro ao relacionar culturas nacionais e culturas

organizacionais, estabelecendo novos parâmetros de análise e gerando matrizes conceituais

que aportaram novos olhares sobre a temática da cultura. E como o próprio Hofstede

(1991) admite que dentro de uma mesma nação possam conviver extratos diferentes de

cultura e padrões comportamentais, considerou-se que o recorte de um estudo que abrange

diferentes empresas, em uma mesma região geográfica, poderia ser útil para a análise do

objeto da pesquisa: padrões culturais de empresas ligadas pela modalidade “arranjo

produtivo local”. Adiante-se que, em tal arranjo, diferentes empresas – portanto, diferentes

culturas – se organizam em torno de algumas decisões coletivas cuja implementação

dependeria (ou não) da receptividade da cultura singular. Estender os estudos de Hofstede

(1991) a tais arranjos pode abrir novas formas de compreendê-los, o que se torna útil aos

estudos organizacionais, posto que cada vez mais as organizações se estruturam em redes

de cooperação ou competição, seja em forma de cooperativas, fusões, joint venture, ou

APLs.

Além disso, Hofstede (1991) incluiu o Brasil em seus estudos, construindo novas

bases para se entender a dinâmica cultural do país e, portanto, a dinâmica cultura da gestão.

2.1.3 A pesquisa de Hofstede e suas interrelações com diferentes abordagens

Hofstede (1991), pela capacidade de estruturar diferentes culturas a partir de cinco

dimensões, foi o autor escolhido para prover de eixo epistemológico a pesquisa e a análise

de dados da presente pesquisa. Tanure (2010) que, em conjunto com o autor desenvolveu

Page 38: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

36

relevante pesquisa sobre cultura no Brasil, insere-se no estudo como autora indissociável

do primeiro. Ambos, portanto, representam o núcleo deste trabalho. No entanto, outros

autores, por diferentes estudos e representações simbólicas, aparecerem, nos estudos

preliminares, como complementares ou reforçadores das investigações dos primeiros.

Ainda que não haja uma conexão temporal entre os autores, há certamente conexão com os

seus achados de pesquisa ou de estudos teóricos. Dentre esses autores, três correntes se

destacam: a primeira, representada por Handy (1987) que apresenta algumas conclusões

que podem enriquecer ou prover de matizes similares. A segunda corrente é representada

por Trompenaars (1994). E a terceira, Goffee & Jones (1996).

O trabalho de Hofstede, de 1980, é um dos mais citados na área da cultura, de

acordo com Tanure (2010). O autor realizou ampla pesquisa com profissionais de uma

mesma organização, a International Business Machines (IBM), em 50 países, visando a

revelar possíveis diferenças culturais entre as nações. Hofstede (1991) reconhece que pode

causar algum estranhamento a generalização dos resultados de um grupo tão particular de

empregados de um país como representativo da cultura nacional. No entanto, ressalta que o

estudo compara grupos com características similares, em que a nacionalidade é o único

fator que os diferencia. Isso torna fácil identificar a influência da nacionalidade nas

respostas.

Esses trabalhadores da IBM responderam a questões relativas aos seus valores. A

análise estatística revelou problemas comuns, com soluções diferentes pelos países para

quatro áreas que, segundo Hofstede (1991), cobriram categorias identificadas por Inkeles e

Levinson 20 anos antes, legitimando os resultados empíricos. Essas quatro categorias

representaram as dimensões identificadas por Hofstede (1991) que, posteriormente, incluiu

uma quinta.

Page 39: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

37

Hofstede (1991) identificou cinco dimensões, descritas a seguir. O benefício da

pesquisa para as organizações é a possibilidade de detectar a cultura pelas dimensões

podendo subsidiar a administração do comportamento dos indivíduos e desenvolvimento

empresarial (Mascarenhas, 2002). As dimensões identificadas por Hofstede (1991) são: a)

a distância de poder; b) o grau de individualismo ou de coletivismo; c) o grau de

masculinidade ou feminilidade; d) a necessidade de controlar as incertezas; e) orientação a

longo ou a curto prazo.

Cada uma dessas dimensões foi calculada de forma que o país de resultado mais alto

na pesquisa de 1980 obteve 100 e o mais baixo, zero. Por isso, o resultado da maioria das

sociedades está dentro dessa escala, apesar de serem possíveis valores superiores e

inferiores aos referidos (Hofstede, 1991).

A primeira dimensão, distância de poder, relaciona-se às formas de poder. O conceito

dessa dimensão de Hofstede (1983) está relacionado à maneira como as pessoas lidam com

o fato de que existe desigualdade entre elas. É a forma como aceitam e esperam

distribuições não igualitárias de poder. Em algumas sociedades é natural que uma pessoa

que teve sucesso em determinada área, como em esportes, política ou negócios busque

prestígio em outras. É o caso de um empresário buscar o poder político, um esportista

querer enriquecer, na busca de diminuir a incongruência entre as diversas formas de

desigualdade. Em outras sociedades, entretanto, o fato de uma pessoa ter determinado

poder em uma área e não ter em outra é positivo (Hofstede, 1991).

Em culturas com baixa distância de poder, a dependência dos subordinados aos seus

gestores é limitada, ou seja, existe uma relação de interdependência entre os líderes e

liderados, adotando-se uma liderança mais consultiva. Nessas culturas, a hierarquia é

apenas uma desigualdade de papéis estabelecida por conveniência. A diferença salarial

tende a ser menor. Nas sociedades com índices mais elevados, os liderados dependem mais

Page 40: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

38

dos líderes, raramente os contradizem abertamente e consideram-se diferentes por

natureza. As empresas centralizam o poder e esperam que os subordinados cumpram as

ordens (Hofstede, 1991).

No nível organizacional e na mesma direção de Hofstede (1991), Handy (1987)

também identificou como a relação de poder pode estar relacionada à cultura

organizacional. O diálogo entre esses autores é construído a partir da escolha do recorte

“mitos” para sustentar suas teorias. Enquanto Hofstede (1991) inclui nos “mitos” os

fundadores e heróis, Handy (1987) utiliza-se da mitologia grega para classificar culturas

nas quais preponderam ou o poder ou o papel ou a tarefa ou a pessoa. Outro aspecto a unir

os autores é o pressuposto de que a cultura organizacional pode ser “administrada”.

Handy (1987) desenvolveu um modelo da Teoria da Adequação Cultural, partindo do

princípio de que não existe cultura ruim ou errada, apenas adequada ou inadequada a

determinadas circunstâncias. Esse é o motivo pelo qual, de acordo com o autor referido, a

cultura deve ser administrada. O autor propôs um modelo com quatro tipos de cultura:

cultura do poder, cultura dos papéis, cultura da tarefa e cultura de pessoa, associando-as

aos deuses gregos.

No nível organizacional, a cultura do poder é representada por Zeus, rei dos deuses.

Essa cultura, de certa forma, relaciona-se ao que Hofstede (1991) denominou de “alta

distância de poder”. O Zeus, na visão de Handy (1987), é temido, respeitado e,

ocasionalmente, amado. As organizações com essa cultura têm uma estrutura em forma de

teia, com o poder concentrado no núcleo central. Apresentam poucos procedimentos e

regras e os funcionários valorizados são os que estão em volta da teia. Baseia-se em

relacionamentos (Handy, 1987).

Percebe-se, assim, complementaridade entre as postulações de Handy (1987) e

Hofstede (1991) quando o recorte é distância de poder. Os estudos de Handy (1987)

Page 41: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

39

evidenciam que tais distâncias não são fruto exclusivo da posição na hierarquia, mas dos

construtos mentais que valorizam ou o poder formal, ou as normas e procedimentos, por

um lado, e a busca de vitórias ou realizações pessoais, por outro. Assim, o grau de

distanciamento hierárquico advém do tipo de cultura instalado.

Retornando ao nível nacional, Trompenaars (1994) propôs modelo que, a partir de

duas dimensões, igualdade-hierarquia e orientações em relação às pessoas e tarefas, geram

quatro quadrantes representantes de quatro culturas empresariais que são a família, a Torre

Eiffel, o míssil guiado e a incubadora. A cultura familiar é o quadrante que está nos eixos

hierárquica e pessoas e é voltada ao poder. O uso da metáfora da família deve-se ao fato de

as relações serem próximas e diretas ao mesmo tempo em que hierárquica já que a

experiência e autoridade do pai são maiores que as dos filhos, resultando na cultura do

poder (Trompenaars, 1994).

A segunda dimensão indicada por Hofstede (1991) é o grau de individualismo ou

coletivismo. Refere-se ao papel do indivíduo e do grupo na sociedade. A maioria das

pessoas habita sociedades em que o interesse do grupo prevalece sobre o do indivíduo: são

as sociedades coletivistas. As pessoas são integradas em grupos fortes e coesos com um

sistema de lealdade inquestionável. Quando a relação é inversa, o interesse do indivíduo

prevalece sobre o do grupo, tem-se, então, as sociedades individualistas. Nessas sociedades

a família é formada apenas pelo núcleo - pai, mãe e possivelmente outros filhos -, enquanto

nas sociedades coletivistas a família é estendida a avós, primos, tios e até funcionários da

casa (Hofstede, 1991).

Um autor que eventualmente reforça essa dimensão de Hofstede (1991) é

Trompenaars (1994) que destaca que grande parte da pesquisa sobre esse tema foi

realizada nos Estados Unidos e influenciada pelas preferências culturais norte-americanas.

Vários pesquisadores partiram do consenso de que o universalismo é uma característica da

Page 42: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

40

modernização, de culturas mais complexas e desenvolvidas. Por outro lado, o

particularismo é uma característica de comunidades menores, nas quais todos conhecem

pessoalmente os demais. Trompenaars (1994) ressalta, então, que as vantagens de cada

preferência cultural precisam ser compreendidas. Para ele, as formas de gestão,

principalmente as relacionadas a negociações, processos decisórios e motivação, são

afetadas pelas preferências individualistas ou coletivistas (Trompenaars, 1994).

Tanure (2010) estende tal posição, propondo que o individualismo pode encorajar a

autoconfiança, gerando melhor senso de responsabilidade e uma corrente para mudanças

inovadoras estimuladas pela competição, por um lado. Por outro , pode enfatizar o ganho

pessoal, o egoísmo e oportunismo, situação que eventualmente ocasiona estresse e

conflitos (Tanure, 2010).

Em culturas coletivistas, as relações entre as pessoas tendem a ser mais harmoniosas

e fortes, ainda que, para isso, seja necessário evitar conflitos. Os resultados poderão derivar

de esforços de pessoas com diferentes habilidades e existe uma rede de suporte social.

Como contraponto, pessoas podem ter mais tendência a usufruir do esforço do outro.

(Trompenaars, 1994). A relação entre chefe e subordinado é vista numa perspectiva moral

podendo parecer uma extensão da família, com obrigações mútuas: proteção em troca de

lealdade (Hofstede, 1991). Além disso, poderá ocorrer perda de personalidade em favor do

grupo e mais dependência emocional. A fonte de motivação em culturas coletivistas pode

ser a consideração positiva; e o apoio dos colegas pode desempenhar papel ainda mais

relevante na motivação do que a própria remuneração. As relações fortes nas organizações

definem o panorama social compartilhado por seus membros, que criam significado e

propósito (Trompenaars, 1994).

Page 43: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

41

É o que também pensa Handy (1987), para quem as organizações coletivistas podem

ser o tipo de cultura do poder, representado por Zeus, com características como fidelidade

pessoal entre o gestor e o subordinado, com destaque para o paternalismo e personalismo.

Nas sociedades coletivistas, o processo seletivo busca uma pessoa que poderá

adaptar-se ao grupo, avaliando características além das competências técnicas. Algumas

vezes, pode-se optar por familiares de membros da organização, presumindo-se risco

reduzido em função de conhecimentos recíprocos e também pela preocupação dos

familiares em proteger a reputação da família. Nos negócios feitos em culturas coletivistas,

é importante a construção da confiança e de relacionamentos duradouros. As pessoas

devem se conhecer mutuamente antes de fazer negócio. A relação entre as pessoas e o grau

de personalismo dessas relações também foram pesquisados por Trompenaars (1994) que

definiu dois grupos: os particularistas e os universalistas, opostos entre si. As culturas

particularistas identificadas por Trompenaars (1994) relacionam-se com as culturas

coletivistas identificadas por Hofstede (1991). Para as culturas particularistas é necessário

tempo para aproximar do parceiro e evitar problemas futuros, considerando uma economia

de tempo. Busca-se gratificação por meio de relacionamentos, principalmente com o líder.

E quanto mais particularista, maior a tendência ao comprometimento com a organização

em troca de segurança, dinheiro, status social, reputação e apoio socioemocional

(Trompenaars, 1994). Na concepção de Trompenaars (1994), o julgamento particularista

foca a natureza excepcional das circunstâncias: uma pessoa deve apoiar um irmão ou

amigo independentemente do que dizem as regras, relacionando-se, por exemplo, à

indicação de familiares para as organizações (Hofstede, 1991).

Já nas culturas individualistas, as relações familiares no trabalho não são bem aceitas,

já que podem originar conflitos de interesse, chegando a ser proibidas por regras. Nas

sociedades individualistas é preciso praticar uma gestão individualizada com instrumentos

Page 44: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

42

como incentivos e bônus relacionados ao desempenho individual (Hofstede, 1991). Para

Trompenaars (1994), na cultura individualista as organizações são instrumentos

organizados para servir individualmente a seus proprietários, empregados e clientes. As

pessoas ingressam nas organizações pelos seus interesses individuais, com elos legais

regulamentados por contrato.

Na abordagem de Handy (1987), organizações individualistas são caracterizadas pela

cultura da pessoa, que é centrada no indivíduo, com orientações para que o grupo siga suas

próprias direções, com recompensas individuais.

Hofstede (1991) encontrou relação entre o grau de individualismo e a riqueza

nacional, identificada pelo Produto Nacional Bruto (PNB) per capita. Assim como

Trompenaars (1994) destacou, Hofstede (1991) não encontrou a relação de causalidade

direta em que as culturas individualistas geram mais riqueza. Se esse fosse o caso, a

relação também deveria ser positiva entre individualismo e crescimento econômico. Mas

Hofstede (1991) encontrou uma relação negativa: os países ricos e mais individualistas

tiveram menos desenvolvimento econômico que os coletivistas. Para exemplificar o

argumento, o autor citou o Japão que, no ano de 1989, teve crescimento mais rápido que os

Estados Unidos. A causalidade identificada por Hofstede (1991) foi a inversa: o aumento

da riqueza leva ao aumento do índice de individualismo. Isso porque, quando a riqueza de

uma sociedade aumenta, as pessoas passam a ter acesso a recursos que lhes permitem ser

mais independentes de seus grupos.

Em relação aos processos decisórios, as culturas coletivistas tendem a ver o grupo

como fim e as melhorias das capacidades individuais como meio de conseguir esse fim,

exatamente o inverso das culturas individualistas (Trompenaars, 1994). Os processos

decisórios coletivistas costumam ser mais demorados devido aos esforços de conquistar

todos na busca de consenso. Nas culturas individualistas o processo é mais rápido, pois

Page 45: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

43

pode ser centrado em uma ou em poucas pessoas. Ressalta-se, entretanto, que as

deliberações muito rápidas podem ser seguidas de atrasos significativos devido a

problemas de implementação. Nas culturas coletivistas, o resultado final tende a demorar

mais, porém é mais estável (Trompenaars, 1994).

Goffee & Jones (1996) propuseram um modelo cujos eixos indicam o grau de

sociabilidade e de solidariedade que formam quatro tipos de culturas organizacionais:

integrada em rede; comunitária, fragmentada; e mercenária, conforme Figura 3, a seguir:

Figura 3: Cubo de Duplo “S”

Fonte: Goffee e Jones (1998).

Iniciando pelos eixos, Goffee & Jones (1996) mencionam que a sociabilidade pode

ser definida como facilidade de relacionamento entre as pessoas em uma organização,

sendo sustentada por altos níveis de reciprocidade, cujo objetivo é ajudar o outro.

De acordo com Tanure (2010), a cultura brasileira possui altos índices de

sociabilidade, característica também identificada em estudos como o de Oliveira e

Machado-da-Silva (2001), que identificaram traços de personalismo, ou seja, ênfase nas

relações pessoais; “jeitinho”, que pode ser entendido, entre outros aspectos, como a

Page 46: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

44

tentativa de relacionar-se com pessoas que podem prestar apoio quanto for necessário e

receptividade ao estrangeiro, expresso pela receptividade a outras raças. Goffee & Jones

(1996) ressaltam, no entanto, que a amizade pode prejudicar as organizações na medida em

que os profissionais colocam as relações pessoas acima dos negócios e, eventualmente,

escondem a ineficiência de um amigo - ou fazem “vista grossa”, conforme Oliveira e

Machado-da-Silva (2001).

O segundo eixo, solidariedade, baseia-se na racionalidade, termo identificado por

Tanure (2010) como mais adequado para traduzir a ideia dos autores. Racionalidade pode

ser definida como a habilidade de uma comunidade para perseguir objetivos comuns de

forma rápida e efetiva, independentemente das relações pessoais (Goffee & Jones, 1996).

O primeiro tipo de cultura identificado por Goffee & Jones (1996), “integrada em

rede”, caracteriza-se por possuir sociabilidade alta e racionalidade baixa. Para possuir esse

caráter, é preciso tempo, já que, por definição, a sociabilidade é construída no decorrer do

tempo (Goffee & Jones, 1988).

Caracterizada pela baixa sociabilidade e baixa racionalidade, a organização

fragmentada é um tipo peculiar, de acordo com Goffee & Jones (1996), em virtude do

baixo conhecimento que os empregados possuem sobre o negócio da empresa para a qual

trabalham. Esses profissionais normalmente acreditam que trabalham para si e se

identificam apenas com a área ocupacional do seu trabalho. Em síntese, essa relação se

estende ao comportamento no trabalho onde as pessoas trabalham com portas fechadas ou

em casa, frequentando o escritório apenas quando necessário. Essa estrutura diminuiu as

chances de um trabalho em equipe.

Em oposição ao modelo fragmentado, Goffee & Jones (1996) citam a organização

comunitária, marcada pela alta sociabilidade e alta racionalidade. Essa tipologia

Page 47: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

45

normalmente é atribuída às organizações que se iniciaram como pequenas empresas

detentoras de grande sucesso e cujos fundadores permaneceram como donos.

Por último, a organização mercenária é caracterizada por Goffee & Jones (1998)

como a que possui sociabilidade baixa e racionalidade alta. Nessa tipologia, o lado

profissional dos empregados é praticamente o único fator considerado pela organização. Os

interesses individuais aceitos são apenas os que coincidem com os objetivos corporativos.

A terceira dimensão da pesquisa de Hofstede (1991) considera o grau de feminilidade

ou masculinidade de uma cultura. Diz respeito à expectativa de diferenciação dos papéis

masculinos e femininos. As sociedades que apresentam expectativas menores de distinção

entre os papéis são consideradas femininas. Nas culturas masculinas, os homens são mais

ligados a atividades externas, tendem a ser duros, firmes e competitivos e dão grande

relevância para sua carreira profissional. O papel da mulher é de sacrifício e cuidado com a

família. Os valores de culturas masculinas são mais competitivos, como autoafirmação e

agressividades, e os valores das culturas mais femininas são mais suaves como modéstia,

solidariedade, humanização do trabalho, seja ele exercido por homem ou mulher. Nas

culturas femininas a expectativa do papel a ser desempenhado pelos dois sexos é mais

similar.

Hofstede (2008), corroborado por Tanure (2010), ressalta que não existe relação

direta entre essa dimensão e o número de mulheres que trabalham fora de casa. Entretanto,

as mulheres que ocupam atividades gerenciais costumam apresentar valores mais

masculinos que os próprios executivos - como assertividade e competitividade.

A dimensão grau de masculinidade versus grau de feminilidade, identificada por

Hofstede (1991) dialoga com o modelo proposto por Goffee & Jones (1996) na medida em

que ambas propõem a influência das relações sociais na construção de uma cultura

corporativa. E é nesse sentido que os últimos autores escolhem “community”, ou seja,

Page 48: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

46

“comunidade”, em português, para definir cultura em uma palavra. Para eles, comunidades

são construídas a partir de interesses compartilhados e obrigações mútuas.

A quarta dimensão da pesquisa de Hofstede (1991) é a necessidade de controlar as

incertezas. Esta dimensão relaciona-se com a inquietude das pessoas diante de situações

desconhecidas ou incertas, ou seja, o nível de desconforto e ansiedade em lidar com as

incertezas do futuro e como a sociedade utiliza ferramentas para enfrentar tais situações

(Hofstede, 1991). Tanure (2010) diferencia incerteza de ansiedade. A ansiedade está

relacionada à impaciência, inquietação do espírito. Por não ter um objeto definido, não

pode ser confundida com medo. Já a incerteza “é uma experiência subjetiva, um

sentimento, que, no entanto, não é exclusivamente pessoal. Ele pode ser partilhado com

outros membros da sociedade” (Tanure, 2010, p. 65).

Para Tanure (2010), as formas de enfrentar a incerteza podem ser aprendidas,

transmitidas e reforçadas pela sociedade e nem sempre são racionais. Hofstede (1991)

identificou três mecanismos para lidar com as incertezas da natureza, com o

comportamento humano e com as forças que supostamente controlam nosso futuro:

tecnologia, leis e religião, respectivamente.

Culturas com índice mais alto de necessidade de controle da incerteza tendem a ser

mais expressivas, com sinais de inquietudes, emoções, agressividade. A agressividade vem

da necessidade de libertar essa ansiedade (Hofstede, 1991). Trompenaars (1994) relaciona

as culturas pela forma como expressam seus sentimentos: neutras ou afetivas. As afetivas

revelam sentimentos, com emoções que fluem facilmente. As manifestações são

acaloradas, vitais e animadas, com expressões faciais mais fortes.

Culturas com mais necessidade de controlar as incertezas apresentam traços do

índice desde o nascimento. Normalmente as famílias são mais protetoras e percebem

perigos constantes. Na escola, o professor deve trazer sempre respostas aos estudantes

Page 49: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

47

(Tanure, 2010). Procuram diminuir a ambiguidade, estruturam as organizações e relações

humanas de forma a tornar os acontecimentos claramente interpretáveis e previsíveis.

Demonstram repúdio pelos comportamentos e ideias desviantes, resistência à inovação.

São mais conservadores. Paradoxalmente, seus membros envolvem-se em comportamentos

arriscados como, por exemplo, iniciar uma luta com potencial opositor para reduzir a

ambiguidade. Existem numerosas leis, formais e informais, que controlam os direitos e

obrigações de empregadores e assalariados (Hofstede, 1991). Índices elevados são

encontrados no Japão, França, Alemanha (Tanure, 2010).

As sociedades com baixa necessidade de controlar as incertezas tendem a ser mais

calmas e relaxadas e são menos expostas a situações desconhecidas. As crianças são mais

autônomas, sendo que o professor não precisa ter todas as respostas. Propendem a ser mais

tolerantes com a quebra das regras, quando se trata de atender ao interesse da empresa

(Tanure, 2010). Na conceituação de Trompenaars (1994), as sociedades que demonstram

seus sentimentos de forma mais neutra não revelam o que estão pensando ou sentindo, as

emoções muitas vezes reprimidas, podem explodir ocasionalmente e a condução fria e

tranquila das situações é admirada. Assim é, por exemplo, na Suécia e nos Estados Unidos,

países com baixa necessidade de controlar as incertezas (Tanure, 2010).

Hofstede (1991) propôs uma relação entre a necessidade de controlar as incertezas e

o índice de masculinidade, correlacionando-os com os fatores motivacionais. Indicou a

possibilidade de sociedades com alta feminilidade e alta necessidade de controle de

incertezas estarem motivadas pela necessidade de segurança e de pertença.

A quinta dimensão identificada por Hofstede (1991) foi denominada orientação de

longo versus curto prazo e relaciona-se à questão temporal e à forma como a sociedade lida

com ela. Essa dimensão não está nas primeiras pesquisas do autor, em 1980. Foi

identificada posteriormente e Hofstede (1991) justificou a sua inclusão em função do

Page 50: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

48

enviesamento cultural dos próprios investigadores, que partilhavam de uma mentalidade

ocidental. Essa dimensão foi descoberta após a entrada no grupo de pesquisadores, de um

canadense radicado por muitos anos no oriente. Foi primeiramente nomeada com

referências a Confúcio2, por estar associada aos seus ensinamentos (Hofstede, 1991).

Perseverança, respeito pelo estatuto social de cada um no âmbito das relações sociais,

austeridade e o sentido da vergonha são valores da orientação para longo prazo,

contrapondo-se aos valores para curto prazo, que são: solidez e estabilidade pessoais;

dignidade; conservar a “fase”; respeito pela tradição; reciprocidade de favores, oferendas e

gentilezas. Culturas com orientação de longo prazo tendem a focar esforços na busca de

recompensas futuras enquanto as culturas com orientação de curto prazo tendem a esperar

resultados imediatos. As culturas asiáticas são, em geral, orientadas para o logo prazo e os

Estados Unidos são um exemplo de cultura orientada para o curto prazo (Hofstede, 1991).

Trompenaars (1994), ao referir-se à cultura organizacional, aborda a questão

temporal relacionando com a importância relativa dada pelas culturas ao passado, presente

e futuro associada à forma como planejamos, elaboramos e coordenamos as atividades.

Classificou, assim, comportamentos sequenciais ou sincrônicos. O primeiro refere-se ao

comportamento direto, em linha reta; já o sincrônico supõe realizar várias atividades ao

mesmo tempo. No comportamento sequencial, a pontualidade é valorizada.

Para os norte-americanos, na cultura sequencial, o futuro é curto prazo, algo que pode

ser controlado a partir do presente. Busca recompensas imediatas e pode ser visto pelas

culturas sincrônicas como agressiva e impaciente. O planejamento consiste em previsões e

os prazos são importantes, indicando o final de um elo e para manter o cronograma. Outros

2 Confúcio foi um pensador chinês de origem humilde, que viveu por volta do ano 500 a.C. Adquiriu fama

por seu gênio e sabedoria. Suas lições não tiveram conteúdo religioso, mas sim um conjunto de normas

práticas para o cotidiano, com quatro princípios essenciais: a) a estabilidade da sociedade baseia-se nas

relações de desigualdade entre as pessoas; b) a família é o protótipo de todas as relações sociais; c) a conduta

virtuosa em face dos outros consiste em não os tratar da forma como não gostaria que eles o tratassem; d)

conduzir a vida de forma virtuosa é tratar de adquirir conhecimento e competências, trabalhar arduamente,

não gastar mais do que o necessário, ser paciente e perseverante (Hofstede, 1991).

Page 51: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

49

exemplos de países sequenciais são Reino Unido e Alemanha. Na França, o passado tem

mais importância e é usado para a compreensão de presente e do futuro. Esse é um

exemplo de cultura sincrônica em que se valoriza o fim e não o caminho ou sequência

específicos para chegar ao fim. Em vez da eficiência de se atingir o objetivo da forma mais

rápida, como na cultura sequencial, busca-se a eficácia para desenvolver relações próximas

a longo prazo. No planejamento, a meta é importante, principalmente no que tange o fato

de ter caminhos alternativos para enfrentar os imprevistos. Além disso, possui forte

preferência por seguir o que ditam as relações. Outros países com cultura sincrônica são

Japão, Argentina, México e Brasil (Trompenaars, 1994).

Apesar de utilizar conceitos distintos, a cultura sequencial de Trompenaars (1994)

tem alguma relação com culturas orientadas mais a curto prazo nas dimensões identificadas

por Hofstede (1991), assim como sincrônicas e orientação mais a longo prazo. As culturas

sequenciais tendem a ter controle maior e, por isso, as projeções são mais a curto prazo,

acontecendo, da mesma forma, as recompensas. As culturas sincrônicas estão mais

preocupadas com a construção dos relacionamentos duradouros. A experiência passada, as

oportunidades presentes e as possibilidades futuras se estimulam.

A Tabela 2 apresenta, de forma resumida, a relação entre os conceitos de Hofstede

(1991) e os outros autores apresentados neste capítulo. Em alguns casos, embora não haja

associação direta entre os conceitos dos autores, é possível perceber que se trata de algum

tipo de relação, como outro recorte do mesmo conceito ou uma relação de

complementaridade.

Page 52: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

50

TABELA 2

Resumo das relações entre as abordagens de Hofstede (1991) para as cinco dimensões

e as outras abordagens apresentadas no capítulo

Dimensão de Hofstede (1991) e

significado

Outras abordagens

Distância de poder:

Maneira como as pessoas lidam

com o fato de que existe

desigualdade entre elas.

Handy (1987)

A Teoria da Adequação Cultural identifica quatro tipos de

organização. As culturas do poder é representada por Zeus.

Trompenaars (1994)

Identifica quatro organizações pelos eixos igualitária-hierárquica e

pessoa-tarefa. A cultura da família representa a cultura voltada ao

poder.

Individualismo X coletivismo:

Papel do indivíduo e do grupo na

sociedade

Trompenaars (1994)

Individualismo e coletivismo

Trompenaars (1994)

Universalistas relacionam-se com individualistas por se

concentrarem mais nas regras do que em relacionamentos; e

particularistas relacionam-se com coletivistas por se concentrarem

mais nos relacionamentos do que em regras.

Handy (1987)

A cultura do poder é mais voltada para relacionamentos e, por isso,

coletivista. Na cultura da pessoa, o indivíduo é o centro e a busca

por resultado é individual, relacionando-se com o individualismo.

Goffee & Jones (1996)

Identificam dois eixos: sociabilidade e solidariedade. As culturas

com alta sociabilidade relacionam-se com as coletivistas e as com

baixa sociabilidade, ao individualismo.

Masculinidade X feminilidade:

Expectativa de diferenciação dos

papéis dos homens e das

mulheres

Goffee & Jones (1996)

O eixo solidariedade relaciona-se com a dimensão, sendo que as

culturas com alta solidariedade relacionam-se com aquelas com

maior grau de feminilidade e as com baixa solidariedade com maior

grau de masculinidade.

Necessidade de controle da

incerteza:

Desconforto e ansiedade em lidar

com as incertezas do futuro

Trompenaars (1994)

Forma de expressão de sentimentos: neutras ou afetivas. As neutras

normalmente estão relacionadas com a baixa necessidade de

controlar as incertezas; e as afetivas, com as que apresentam maior

necessidade.

Orientação a longo X curto prazo:

Forma como a sociedade lida

com a questão temporal

Trompenaars (1994)

Comportamentos sequenciais que normalmente relacionam-se com

orientação a curto prazo ou sincrônicos normalmente relacionados

com longo prazo.

Fonte: elaborada pela autora, a partir de Hofstede (1991), Handy (1987), Trompenaars (1994) e Goffee &

Jones (1996).

Outra dimensão foi identificada por Hofstede em 2012: indulgência versus restrição3

(tradução nossa). Uma sociedade indulgente permite a diversão e o aproveitamento da

vida, especialmente ligados a lazer, diversão com amigos, consumo e sexo. É oposta à

3 Termo original: Indulgence versus Restraint.

Page 53: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

51

sociedade restritiva que regula a satisfação, na qual as pessoas sentem-se menos capazes de

desfrutar de suas vidas, regulando-as por meio de normas sociais (Hofstede, Hofstede,

Minkov & Vinken, 2013; The Hofstede Centre, 2013).

Apesar de as dimensões identificadas por Hofstede (1991) identificarem,

originalmente, grupos homogêneos em nível nacional, alguns autores sugerem que as

dimensões são também aplicadas em nível individual, sendo bons indicadores de

comportamento e de critérios para a distinção das pessoas (Almeida, 2007), podendo ser

aplicadas também para a categorização organizacional.

A cultura é estudada por diferentes perspectivas. No entanto, a descrição do

fenômeno, a despeito do vocábulo que o nomeia, é passível de similaridades. Foi o que se

propôs ao se recorrer a diferentes autores: explicitar que alguns fenômenos humanos

podem ser organizados de uma ou outra forma, mas identificam padrões de

comportamentos homogêneos. No presente estudo, os autores citados reforçaram a corrente

representada por Hofstede (1991) e Tanure (2010), fontes escolhidas como núcleo

conceitual. Embora outros autores tenham sido consultados, optou-se por relacionar os

aqui citados, por melhor representarem a possibilidade de diálogo entre diferentes estudos,

um dos objetivos do referencial teórico.

Estabelecidas as fontes para o entendimento da cultura a partir de Hofstede (1991) e a

complementaridade de outros autores que, sob outra linguagem ou meio de pesquisa,

evidenciaram achados comuns, capazes de estabelecer uma linguagem entre si, o capítulo

seguinte trata de abordar a cultura brasileira e suas conexões com a pesquisa empreendida.

O capítulo a seguir trata de circunscrever a pesquisa em seu próprio ambiente, assentando-

a nas peculiaridades nacionais, pesquisas ainda restritas no país.

Page 54: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

52

2.1.4 A cultura brasileira

Apesar de expressarem níveis complementares de um mesmo fenômeno, de acordo

com Motta e Caldas (1997), cultura organizacional e cultura brasileira estão seguindo

caminhos diferentes. Apesar de expressar níveis complementares de um mesmo fenômeno,

de acordo com Motta e Caldas (1997). Tanure (2010) é uma das autoras que considera a

cultura organizacional é influenciada pela cultura nacional. Em seu entendimento, a

empresa é um espaço sociocultural formado por vários pilares, um dos quais é a cultura da

sociedade que está inserida. Outro pilar é a liderança, que incorpora os valores, os desejos

e as marcas dos fundadores. Outras características, como as setoriais, tipo de origem de

capital e lógica de formação predominante, interagem de forma dinâmica e peculiar a cada

organização, também afetando a cultura.

O interesse da presente pesquisa está atrelado a uma forma de cooperação entre

empresas que, patrocinadas por órgãos governamentais e associações de classe, vem

tomando vulto na economia brasileira. Trata-se do que se denomina hoje Arranjo

Produtivo Local. Tal tipo de arranjo agrega empresas de um mesmo segmento (portanto,

dentro da mesma lógica de processo produtivo) em um dado espaço homogêneo

(localização geográfica restrita e localizada). Dessa forma, se mantêm inalterados alguns

fatores importantes (segmento da economia, cultura regional e cultura nacional)

possibilitando estudar a cultura em cada empresa e identificar se há influências de umas

empresas sobre as outras e se os traços da cultura nacional são os ordenadores da forma de

ser e pensar de cada uma delas.

Dessa forma, este capítulo traz informações sobre Brasil e, mais especificamente,

Minas Gerais e, a seguir, serão apresentadas as principais características do setor de

atuação do APL: fundição.

Page 55: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

53

Neste subitem são abordados as características e os traços brasileiros mais

preeminentes, trazendo as raízes históricas e tomando como referência as dimensões

elaboradas por Hofstede em seu estudo sobre cultura organizacional, mencionado

anteriormente.

O conceito de cultura nacional está relacionado a valores, sentimentos e crenças

compartilhados pelas pessoas de uma nação. Sua compreensão ajuda a entender o que está

oculto nos comportamentos dessas pessoas (Tanure, 2010). De acordo com Fleury (2009),

um dos pesquisadores que mais influenciaram os estudos culturais sobre o Brasil, sob o

ponto de vista sociológico, foi Roberto DaMatta. Complementarmente Holanda (1995)

apresenta elementos importantes para a compreensão da formação da sociedade brasileira

sob a égide do legado cultural da colonização portuguesa e os desdobramentos advindos

dos diversos arranjos desse processo histórico. Caldas e Wood (2000) corroboram essa

herança cultural ao citarem que a colonização portuguesa e a formação histórica brasileira

produziram uma mistura de traços culturais que apoiam a compreensão de comportamentos

sociais e organizacionais do Brasil.

Mas não só os portugueses tiveram relevância na cultura brasileira. Motta (1997)

entende a cultura nacional como resultante da miscigenação de três povos: os portugueses,

os africanos e os índios. No Norte, Centro-Oeste e Nordeste há a preponderância respectiva

da cultura mameluca, cabocla e sertaneja. Na compreensão dos autores, a região Sudeste

sofreu grandes influências de imigrantes europeus, não portugueses, e orientais,

principalmente japoneses e árabes. Na região Sul nota-se a influência de imigrantes de

ascendência europeia não portuguesa: alemães, italianos, poloneses e portugueses das Ilhas

dos Açores. Os autores ressalvam, ainda, que a cultura não é formada apenas por raças ou

etnias ou por sua combinação, mas por classes sociais, instituições e organizações que

também as produzem.

Page 56: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

54

O presente capítulo busca, assim, extrair alguns traços da cultura brasileira por meio

de diferentes autores: Motta (2008), Freitas (1997), Caldas Wood (2000), Tanure (2010),

Macedo (2002), Holanda (1995) , dentre outros.

Para Motta (2008, p. 19), a cultura brasileira é bastante diversa. O “fantasma ,do

corpo escravo” no discurso brasileiro pode ser fruto não somente passado escravocrata,

mas do processo de absorção dos colonos imigrantes, rejeitados tanto em sua terra natal

quanto na terra escolhida. Sofreram assim alguns padrões de escravidão imposta aos

africanos. Desse modo, a escravidão ganha espaço nas relações discursivas e sociais e o

discurso do escravo e do colono tem a tônica comum da busca da cidadania. O forte

sentido de desigualdade, segundo Freitas (1997), decorre dessas primeiras relações sociais

fundamentadas na força de trabalho escravo e na estratificação social. A família patriarcal

forneceu o modelo moral que regula as relações entre governantes e governados, definindo

as normas de dominação, conferindo a centralização de poder nas mãos dos governantes e

a subordinação aos governados.

Podem-se encontrar heranças desse passado escravocrata na primeira dimensão

identificada por Hofstede (1991), distância de poder, em que o Brasil apresentou alto

índice na referida pesquisa. A distância do poder é uma herança cultural brasileira de uma

economia primário-exportadora, baseada na grande propriedade, no trabalho escravo e na

produção de alimentos e matérias-primas para os centros mais avançados da economia

mundial, sendo o Brasil um país essencialmente rural (Carvalho, 2006). Caldas e Wood

(2000) ressaltam a tendência à dependência brasileira, herança de uma colonização

autoritária e paternalista.

Freitas (1997) considera difícil a definição de uma cultura brasileira, dadas as

diferenças regionais e de formação étnica. A despeito dessa dificuldade, procurou-se

decodificar como o brasileiro se representa socialmente, buscando vislumbrar uma unidade

Page 57: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

55

de traços que se resumem em cinco categorias: hierarquia, personalismo, malandragem,

sensualismo e sentido aventureiro.

Outra característica da alta distância de poder é que o relacionamento acompanha a

tradição familiar. Espera-se que as crianças sejam obedientes aos pais e aos mais velhos. A

independência não é encorajada e a criança recebe, em troca, ternura e atenção, formando

uma programação mental de dependência dos mais velhos. Esse é o mesmo caminho

traçado na escola, em que o processo educativo é centrado no professor (Tanure, 2010).

Nas organizações, os chefes também formam essa relação de troca com seus subordinados,

oferecendo proteção em troca de uma obrigação moral. Muitas vezes essa relação é

carregada de emoção (Tanure, 2010). É comum perceber-se dificuldade na separação entre

o que é racional e o que é emocional, sendo o último comumente influenciador de decisões

(Macêdo, 2002).

No contexto organizacional, as estruturas seguem um modelo fortemente piramidal e

integrado no nível hierárquico mais elevado. Isso pode ser interpretado como consequência

de uma forte concentração do poder e do personalismo, sendo um reflexo da desigualdade

existente na sociedade, o que é visto como natural. Os subordinados esperam que seus

líderes indiquem o caminho e o que deve ser feito. O chefe ideal é aquele autocrata

benevolente. A gestão participativa é vista com desconfiança, pois não é coerente com os

traços da distância do poder da cultura nacional. Embora os brasileiros demonstrem

emoções, tendem a evitar o conflito. Esses conflitos não são tratados de forma aberta e

direta, principalmente por quem está em posição de subordinação (Tanure, 2010).

De certa forma, Motta (1997) relaciona distância de poder e renda nacional, a questão

do gênero ligando a autoridade ao masculino e a sedução ao feminino, construtos que, na

visão do autor e de outros subsequentes, como Freitas (1997), marcam a cultura

organizacional brasileira.

Page 58: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

56

O caminho para a transformação dessa relação de poder nas empresas brasileiras é o

deslocamento da lealdade pessoal para a organizacional e prevalência dos traços de

flexibilidade, sobretudo para minimizar o traço paternalista. Além disso, a busca de um

papel mais ativo no processo decisório por parte dos liderados; e, de outro lado, o

encorajamento de assumir riscos e o reconhecimento compartilhado pelo chefe também

podem ajudar na transformação da relação de poder (Tanure, 2010).

A segunda dimensão é o grau de individualismo ou de coletivismo. Traços da

natureza coletivista brasileira podem ser encontrados mesmo antes da chegada dos

portugueses ao país. Caldeira, Carvalho, Marcondes e Paula (1997) relatam que a forma de

reforçar a união entre grupos diferentes e também manter o poderio do grupo só poderia

haver casamento com membros de outros grupos. Cada união criava uma nova relação de

parentesco e de aliança com outros grupos. Segundo esses autores, o grupo era o valor

mais alto que relacionava os membros da tribo. “O individualismo não fazia sentido para

eles” (Caldeira et al., 1997, p. 16).

Pode-se encontrar o coletivismo brasileiro no governo, por exemplo. Em culturas

coletivistas, o governo tende a ser mais dominante na economia e buscar o consenso social,

sendo que a ideia de igualdade sobrepõe-se à de liberdade, diferentemente de culturas

individualistas (Tanure, 2010). O individualismo está enraizado no protestantismo,

enquanto o coletivismo, no catolicismo (Tanure, 2010; Trompenaars, 1994).

Apesar de no Brasil a religião Católica não mais ser oficial - o Estado não era laico

até a Constituição da República de 1891 -, o Censo Demográfico realizado pelo Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, revelou que 64,6% da população

declararam pertencer a essa religião. No entanto, a hegemonia histórica do Catolicismo,

atribuída à herança advinda da colonização do país e ao seu status como religião oficial

Page 59: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

57

(IBGE, 2010), não impediu a diminuição de seus adeptos de 99,7% em 1872 para 91,8%

em 1970 e 64,6% em 2010.

Na sociedade brasileira os indivíduos tendem a ser integrados em grupos coesos e o

interesse do grupo prevalece sobre o do indivíduo, característica de culturas coletivistas

(Tanure, 2010). O processo decisório tende a um padrão mais espontâneo e improvisado,

caminhando em círculo, o que leva à lentidão no processo, pela busca de consenso e

participação (Macêdo, 2002).

Em culturas coletivistas, normalmente, a família é ampliada, incluindo avós, tios,

primos e empregados domésticos. Já em culturas individualistas ocorre o contrário: a

família é representada por pais e filhos. A ajuda mútua e a proteção da família mostram a

natureza coletivista brasileira. Esse traço brasileiro interage com as relações pessoais de

forma personalista (Tanure, 2010). Ao personalizar as relações, as pessoas se sentem mais

seguras e utilizam diversos mecanismos de defesa do ego como identificação e projeção

(Motta, 1997). Esse fato se replica nas organizações brasileiras, em que as promoções e

premiações normalmente seguem critérios de confiança, lealdade e antiguidade em

detrimento da produtividade e qualidade do serviço (Macêdo, 2002).

Nas organizações de culturas mais coletivistas, o processo de seleção busca tanto as

competências técnicas quanto a capacidade de inserção no grupo. A relação empregador -

empregado é de troca, na qual a empresa oferece proteção em troca de lealdade e é

importante que o sistema de gestão seja coerente com isso. As avaliações de resultados

buscam os benefícios dos grupos, mais que dos indivíduos. Nos negócios, é considerado

natural e ético tratar melhor os amigos, comportamento que os sociólogos chamam de

particularismo, característica similar ao personalismo. É importante que se estabeleça uma

relação de confiança - com a pessoa e não com a empresa - antes das transações

comerciais, como consequência dessa característica (Tanure, 2010).

Page 60: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

58

Em relação à terceira dimensão, que é o grau de masculinidade ou feminilidade, o

Brasil teve resultado intermediário, apresentando traços das duas classificações. Para Motta

(1997), a forma como os brasileiros são tratados nas organizações parece, de um lado,

basear-se em controles do tipo masculino como o uso da autoridade, e, de outro, do tipo

feminino, com o uso da sedução. Segundo Tanure (2010), pelo lado feminino encontra-se o

pacifismo brasileiro, o horror a soluções trágicas e violentas e a forte crença nos acordos

pacíficos; e, pelo lado masculino, encontra-se a valorização e procura por oportunidades de

crescimento como forma de atingir cargos mais altos.

O grau de feminilidade identificado por Hofstede (1991) e Tanure (2010) pode ser

explicado pelos argumentos de Holanda (1995) de que a cordialidade é a contribuição

brasileira para o mundo. Lhaneza no trato, hospitalidade e generosidade, virtudes

admiradas por estrangeiros, representam um traço definido do caráter brasileiro, oriundas

do meio rural e patriarcal. Não obstante, ainda de acordo com Holanda (1995), essas

virtudes não representam “boas maneiras” e “civilidade”. São, antes, expressões legítimas

de um fundo emotivo extremamente rico e transbordante. Ao mesmo tempo, a polidez do

“homem cordial” (Holanda, 1995, p. 147) é, de algum modo, a organização de sua defesa

ante a sociedade. Isso significa que o indivíduo detém-se na parte exterior, preservando

intactas sua sensibilidade e emoções e serve, quando necessário, como peça de resistência.

A polidez é, ainda, a “máscara” que o indivíduo usa para manter sua supremacia ante o

social e sua presença contínua e soberana na sociedade (Holanda, 1995, p. 147).

No domínio da linguística, a utilização de diminutivos serve para se familiarizar mais

com as pessoas ao mesmo tempo em que lhes conferem relevo. Nas relações comerciais,

para conquistar um cliente, o brasileiro tem necessidade de fazer dele um amigo (Holanda,

1995). Ainda de acordo com Holanda (1995, p. 149), até no campo religioso, dominado

Page 61: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

59

pelo “nosso velho catolicismo, tão característico”, o brasileiro permite intimidade com os

santos, em uma relação que beira o desrespeito.

A quarta dimensão, necessidade de controle da incerteza, teve inversão no Brasil,

comparando as pesquisas de Hofstede (1991) e Tanure (2010). Na última pesquisa, o

brasileiro mostrou-se mais preocupado com o presente do que com o futuro e não revelou

ansiedade com o que possa vir depois. O motivo dessa inversão pode ser interpretado,

principalmente, pela situação de grande instabilidade macroeconômica e altas taxas de

inflação vivenciadas no país antes da década de 1990. As medidas que foram adotadas pelo

governo para a estabilização resultaram em impactos diversos, inclusive nos valores

centrais da sociedade (Tanure, 2010).

Culturas com muita necessidade de controlar as incertezas tendem a revelar as

emoções mais claramente e buscam diminuir a ambiguidade a partir de leis formais e

informais que controlam os direitos e obrigações dos cidadãos (Hofstede, 1991). Nessas

culturas, preferem-se sempre situações em que exista uma resposta certa e, por isso, há

tendência ao conservadorismo e aversão à inovação (Hofstede, 1991). As formas de se

controlar as incertezas estão ligadas a tecnologia, às leis e às religiões.

A tecnologia está relacionada à forma que pode ser utilizada para, por exemplo,

prever condições da natureza. Em relação às leis, pode-se notar tendência em culturas

coletivistas de terem elevado grau de necessidade de controlar as incertezas e em ter muitas

regras implícitas ou baseadas na tradição. O modo particular de lidar com as muitas

incertezas no Brasil extrapola a regulação legal, aceitando canais extralegais. Os critérios

legais são ignorados e podem favorecer uma mobilidade social que reforça o personalismo,

presente com mais frequência em ambientes com mais ambiguidade (Tanure, 2010). A

aplicação da lei é reservada ao cidadão anônimo, isolado e sem relações, ressaltando a

importância social (Caldas & Wood, 2000).

Page 62: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

60

A terceira forma de controlar a incerteza é a religiosidade, vista principalmente como

instrumento para resolver os problemas cotidianos. O Brasil é regido pelo racionalismo

católico, mesmo tendo outros grupos religiosos distintos. Esse racionalismo é caracterizado

pela aceitação da realidade, mesmo se ela não é a desejada. A fé é para o presente, e não

para assegurar o futuro (Tanure, 2010). Na análise feita pelo IBGE (2010), a ocupação do

território nacional e as diversas correntes migratórias internacionais explicam a

predominância de determinados grupos religiosos em cada uma das regiões. Como

exemplo, a incidência de pessoas que professavam a religião candomblé é mais alta no

estado da Bahia, especialmente em Salvador e municípios próximos, e também no estado

do Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, a maior parcela de adeptos do catolicismo encontra-

se na região Nordeste, na região Sul e no estado de Minas Gerais, na região Sudeste

(IBGE, 2010).

Em geral, os brasileiros demonstram pouca ambição para avançar na carreira e

preferem cargos técnicos em detrimento de gerenciais e organizações maiores às menores.

Além disso, tendem a evitar a competição com os pares e preferem as decisões em grupo e

participativas. O desconforto em trabalhar com gestor estrangeiro soma-se à resistência à

mudança e ao pessimismo sobre os motivadores que orientam a empresa (Tanure, 2010).

Com relação à quinta dimensão, a orientação a longo ou a curto prazo, podem-se

notar no Brasil práticas administrativas coerentes com a orientação para longo prazo, como

garantia de emprego, foco na solução de problemas relacionados ao futuro, austeridade e

perseverança. O tempo para tecer as relações é uma característica que favorece essa

orientação (Tanure, 2010).

Em um resumo das características brasileiras, Oliveira e Machado-da-Silva (2001)

fizeram ampla revisão teórica sobre os traços culturais brasileiros e encontraram que o

brasileiro é orientado a curto prazo, o que se justifica, principalmente, pela ênfase dada a

Page 63: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

61

períodos curtos no planejamento. Entretanto, a orientação a longo prazo está baseada

também nos valores persistência, tenacidade na busca pelos objetivos, ordenação das

relações pelo estatuto social, busca da harmonia, hierarquia estável, complementaridade de

papéis e austeridade, conduzindo à poupança e, ainda, o sentimento de vergonha

favorecendo a rede de relações e o sentido de obrigação, de honrar compromissos

(Hofstede, 1991).

A Tabela 3 apresenta as principais características culturais encontradas por Oliveira e

Machado-da-Silva (2001). Esse autor apresentou uma possível síntese dos diferentes traços

descritos por diferentes autores, encontrando sete grandes categorias de características, às

quais incluiu alguns indicadores que as expressam.

Page 64: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

62

TABELA 3

Principais características culturais nacionais e seus indicadores

Características culturais nacionais Indicadores

Personalismo

Favoritismo

Paternalismo

Ênfase nas relações pessoais

Apropriação do público pelo privado

Igualdade moral e não jurídica

Protecionismo

Postura de espectador

Orientação pela autoridade externa

Governo como princípio unificador

Transferência de responsabilidade

Aversão à incerteza

Necessidade de regras

Evitar conflito

Afeição à paz e à ordem

Formalismo

Regras sem fundamentação nos costumes

Diferença entre a lei e a conduta concreta

Exagerado apego às leis

Legalismo

Jeitinho

Burlar uma norma preestabelecida

Fazer vista grossa

Arranjar um padrinho

Flexibilidade

Rapidez

Improvisação

Receptividade ao estrangeiro

Receptividade a outras raças

Hospitalidade

Gosto pelo que vem de fora

Importação de técnicas

Mais valorização do que vem de fora

Orientação para o curto prazo Ênfase no planejamento de curto prazo

Fonte: Oliveira e Machado-da-Silva (2001)4.

Já Tanure (2010) propõe uma interpretação mais ampla do sistema de ação cultural

brasileiro sintetizando-o a partir de quatro grandes subsistemas: a) institucional:

relacionado aos traços culturais segundo os quais todos são iguais e sujeitos às mesmas

regras e leis; b) pessoal: reconhecimento em função das relações pessoais ou do significado

de poder que têm; c) líderes: reúne os traços dos que detêm o poder; d) liderados: traços

dos subordinados (Tanure, 2010).

4 Para construir a Tabela 3, os autores basearam-se em: Lambert (1959), Riggs (1964, 1968), Campos (1966),

Guerreiro Ramos (1966), Leite (1969), Azevedo (1971), Hofstede (1980), Vieira, Costa e Barbosa (1982),

DaMatta (1983, 1985, 1986), Freyre (1984), Avelino Filho (1990), Gomes (1990), Serva (1990), Amado e

Brasil (1991), Barbosa (1992, 1996), Aidar et al. (1995), Holanda (1995), Ribeiro (1995), Vasconcellos

(1995), Machado (1996), Caldas (1997), Caldas e Wood Jr. (1997, 1998), Matheus (1997), Prates e Barros

(1997), Segato (1997), Prestes Motta e Alcadipani (1999), Castor (2000).

Page 65: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

63

As estratégias de articulação desses elementos é que dão suporte à operacionalização

do sistema. Desta forma, têm-se as interseções dos sistemas, representados na Figura 4:

Subsistemas

Institucional

Traços de igualdade entre

as pessoas

Pessoal

Traços de reconhecimento

em função das relações

pessoais

Líder

traços dos que detém o

poder

Concentração de poder Personalismo

Liderado

traços dos subordinados Postura de espectador Evitar conflito

Figura 4. Traços culturais de interseções dos subsistemas. Fonte: elaborada pela autora a partir de Tanure (2010).

No relacionamento dos subsistemas “institucional” e “líder”, pode-se perceber um

traço cultural e típico nas empresas brasileiras, que é a concentração de poder. Esse traço é

bem forte e, algumas vezes, disfarçado em comportamentos mais inclusivos. Ainda no

sistema “institucional”, relacionado ao sistema “liderado”, está outro traço: a postura de

espectador, que vem da prática autoritária do patriarca no meio rural. O mandonismo, o

protecionismo e a dependência são características presentes nessa atitude paternalista. Os

brasileiros foram orientados por autoridades externas e acostumaram-se ao desequilíbrio do

poder, inclusive a importação de modelos sem adaptação à cultura local, o que acabou

influenciando a atitude de espectador. Nas organizações essa característica manifesta-se

nos subordinados com baixa iniciativa, transferindo responsabilidade para o líder. Por sua

vez, o líder enxerga tal comportamento como preguiça e falta de segurança, mantendo um

controle mais rígido, sentindo-se poderoso e indispensável, criando um círculo vicioso

(Tanure, 2010).

A atitude de espectador pode ser acentuada pelo medo de errar, o que pode gerar um

comportamento paralisante, comprometendo os resultados da organização. Entretanto, se

Page 66: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

64

bem manejado pela liderança, pode ser um estímulo para o aperfeiçoamento e a busca da

autossuperação (Tanure, 2010).

Ao se relacionar o subsistema “pessoal” sob a perspectiva do subsistema “líder”, o

traço personalismo emerge com destaque para forte atração pessoal. Correlacionando o

subsistema “pessoal” com o “liderado” está o traço de evitar conflitos, que consiste em não

tratar os conflitos diretamente para não prejudicar o relacionamento nem criar

constrangimentos de forma a comprometer a harmonia do grupo (Tanure, 2010). Há

predominância do conteúdo emocional (Vieira, Crubellate, Silva & Silva, 2002). Essa

característica inspirou Buarque de Holanda (1975 como citado em Vieira et al., 2002) à

denominação do brasileiro como “homem cordial” e conceituou como típico brasileiro

aquele que tem aversão a qualquer tipo de ritualismos e somente aceita as relações sociais

com base pessoal. É um indivíduo personalista, que busca por prazeres imediatos e ignora

ideais comunitários e de longo prazo (Vieira et al., 2002).

As relações sociais e interpessoais são marcadas pela informalidade e pela busca de

proximidade e afeto. Não é muito clara a divisão entre o que é o espaço público e o espaço

privado indicado por Da Matta (1986), como a divisão entre a rua e a casa. Nesse

comportamento valoriza a expressão emocional e está mais ligado ao simples prazer da

troca do que à busca pelo alcance de metas (Motta, 1997).

Macêdo (2002) também encontrou essas evidências na pesquisa realizada por ela e

constatou que existe uma supervalorização de relações afetivas em detrimento de vínculos

organizacionais. Os laços afetivos são fortemente considerados, influenciando os

comportamentos, relacionamentos e decisões organizacionais.

Esses quatro traços (concentração de poder, personalismo, espectador e evitar

conflitos) também são sistêmicos e relacionam-se a partir dos eixos básicos “poder”,

Page 67: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

65

“relações pessoais” e “flexibilidade”, que são os articuladores do sistema. Essa dinâmica

está esquematizada na Figura 5.

Figura 5. O sistema de ação cultural brasileiro.

Fonte: Tanure (2010 p. 110)

A concentração de poder e o personalismo causam impactos diretos na organização

por meio da passividade, aceitação do autoritarismo, paternalismo nas relações, troca de

pequenos e imediatos favores. O resultado é o desenvolvimento de uma dependência moral

entre as pessoas, dificultando o questionamento e o rompimento da relação (Vieira et al.,

2002). O paternalismo pode apresentar-se em duas facetas: patriarcalismo (face supridora e

afetiva do pai) e patrimonialismo (face hierárquica e absoluta, impondo suas vontades aos

seus membros, que as aceitam tradicionalmente) (Tanure & Prates, 1996).

A partir das características de concentração de poder e postura de espectador, surge,

então, a ambiguidade. Muitas vezes as decisões não são claras e as regras são implícitas,

aumentando o poder das pessoas que tomam as decisões. A ambiguidade é a contrapartida

do subsistema lealdade às pessoas. A atração pessoal é um elemento de forte coesão social

e engloba também a atração, por pertencer a um grupo de prestígio. Mas esse sentimento

de pertença, ao mesmo tempo em que é um mecanismo de coesão, pode provocar

compartimentalização e estratificações. Exemplos são as demissões solidárias ou

Page 68: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

66

preenchimento de cargos em bloco. Os líderes que conseguem a lealdade do grupo, que

pode ser reforçada pelas incertezas e ambiguidades, têm, como contrapartida, a pressão do

grupo pela segurança. Essa característica faz o brasileiro ser um dos povos mais facilmente

mobilizáveis pelo líder (Tanure, 2010).

De forma geral, nas relações de poder existe desequilíbrio de forças entre as partes,

em que uma impõe sua vontade sobre a outra. Essas relações ocorrem nas relações sociais

e baseiam-se na posse de recursos, normalmente assimétricos, e que produzem efeito na

relação social com tendência a ocultar a ambiguidade e que abarcam conflitos de interesse

(Macêdo, 2002).

Como parte central dos subsistemas “institucional e pessoal” e “líder e liderado” está

a flexibilidade, traço muito marcante na cultura brasileira. As duas facetas principais da

flexibilidade são a adaptabilidade e a criatividade (Tanure, 2010). Caldas e Wood (2000)

ressaltam que a flexibilidade e a adaptabilidade constituem formas de disfarçar a

ambiguidade, de que no Brasil nada é o que parece ser e também pode ser algo a mais.

Tanto as empresas quanto as pessoas conseguem rapidamente adaptar-se a um contexto,

processos tecnológicos e mudanças de regra. A criatividade tem um elemento inovador e

acontece mesmo em situações de igualdade de fato e de direito. A flexibilidade também

está permeada pela afetividade (Tanure, 2010).

Caldeira et al. (1997) narram a relação entre a origem tropical brasileira e esse traço,

flexibilidade. Relatam que na floresta tropical brasileira havia ampla variedade de espécies

e dificuldade para cultivos uniformes e conservação da colheita. Esse cultivo uniforme era

comum na Idade Média, na Europa, exigindo organização dos habitantes pelas estações em

um ritmo determinado para evitar a fome. No Brasil, observar a natureza, conhecer os

hábitos dos animais e as plantas era mais importante que guardar comida. Mais que

estabelecimento sólido, era preciso mudar de lugar quando diminuía a fertilidade do solo

Page 69: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

67

ou quando era necessário buscar novos territórios de caça. Nesse cenário de flexibilidade,

pouco adiantava construir grandes casas, mas sim estar sempre preparado para um novo

cenário.

O sistema de ação cultural interage com a organização e sua busca por resultados, de

forma a criar e gerar impactos nos comportamentos. E pode até influenciar estruturas mais

profundas. A partir da forma própria de gerenciar, as empresas brasileiras podem

desenvolver uma competitividade global (Tanure, 2010).

Em um país que é baseado nos relacionamentos, os principais indicadores de sucesso

envolvem os interesses familiares satisfeitos, espírito esportivo e riqueza pessoal. Na

gestão organizacional, de um lado, tem-se a centralização do poder em que o líder, em

troca de estabilidade e apoio, consegue mobilizar as pessoas; e de outro, os subordinados,

que, por sua vez, têm medo de errar e arriscar. Uma vez que não arriscam, o líder

demonstra não conseguir confiar em sua equipe, aumentando seu poder. E diante de regras

ambíguas, as decisões ficam cada vez mais centradas em poucas pessoas (Tanure, 2010).

Os aspectos da cultura brasileira descritos influenciam as ações das organizações e do

próprio governo por meio de suas agências e no relacionamento com as organizações e

sociedade civil (Vieira et al., 2002).

A cultura brasileira tem caráter fragmentário e multifacetado, resultado das raízes

multirraciais do povo brasileiro (Vieira et al., 2002). Essa raiz também gerou o gosto pela

miscigenação, derivada da ausência do orgulho de raça do povo colonizador (Caldas &

Wood, 2000), que leva a duas reflexões: a) esse fato influencia o comportamento

permeável ao estrangeiro, que se torna referência para o brasileiro; b) o Brasil não pode ser

tratado como uma unidade. As diferenças regionais, étnicas, de classes sociais e religiosas

estão na origem de diferenças culturais dentro de um país com dimensões continentais

(Hofstede, 1991). Essas características dificultam a busca por aspectos distintivos, com

Page 70: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

68

suficiente grau de compartilhamento social, que pode permitir a identificação de uma base

cultural no país (Vieira et al., 2002).

Embora se identifiquem as limitações dos estudos sobre cultura nacional, o presente

capítulo buscou destacar os traços mais frequentes e homogêneos do que seria o caráter

brasileiro. Por isso, no próximo item serão apresentadas as características e o atual

contexto do setor do objeto de estudo do trabalho, fundição, essenciais para identificar a

razão da escolha do objeto de pesquisa.

2.1.5 O setor de fundição

Nos primórdios, na era da pedra lascada, um mineral

jogado por acaso em uma fogueira tornou-se líquido. Em

seguida, ao esfriar, tomou a forma do recipiente que o

continha. Pronto: descobriu-se o processo de fundição, que

durante milênios e milênios faria a riqueza da raça

humana” (Instituto Euvaldo Lodi - IEL/MG & Sindicato da

Indústria da Fundição no Estado de Minas Gerais -

SIFUMG, 2003, p. 5).

De acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE)5, a

fundição enquadra-se na indústria de transformação, divisão metalurgia, e abrange diversas

classes tais como o serviço de fundição de ferro e aço - para a produção de peças fundidas

de metais não ferrosos e suas ligas. O campo de estudo, portanto, insere-se em uma cadeia

de valor, cujo processo de fundição está à jusante do processo produtivo, conforme

exemplo na Tabela 4, a seguir (CNAE, IBGE, 2013).

5 Classificação oficialmente adotada pelo Sistema Estatístico Brasileiro para a produção de estatísticas pelo

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por tipo de atividade econômica e pela Administração

Pública na identificação da atividade econômica em cadastros e registros de pessoa jurídica,

Page 71: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

69

TABELA 4

Exemplo de uma classe e subclasse de acordo com a classificação do grupo fundição,

com base na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE)

CNAE 2.1 – Subclasses

Hierarquia

Seção C Indústrias de transformação

Divisão 24 Metalurgia

Grupo 245 Fundição

Classe 2451-2 Fundição de ferro e aço

Subclasse 2451-2/00 Fundição de ferro e aço

Fonte: elaborado segundo CNAE (2013).

Nota: o exemplo refere-se à classificação das fundições que trabalham com ferro e aço. Para aquelas que

beneficiam metais não ferrosos os códigos são diferentes.

A metalurgia, atividade industrial que abrange, entre outros grupos, a fundição,

ocupava a sexta posição no ranking de valor adicionado em 2010, com 6,0% de

participação nos resultados gerais na indústria brasileira. Em 2011 teve participação de

4,9% e caiu para a sétima posição no ranking (IBGE, 2011).

A fundição permite a produção de peças com grande variedade de formas e

tamanhos: sinos, âncoras, tubulações, implantes ortopédicos, bloco de motor a miniaturas.

A produção engloba peças cujo uso é de extrema responsabilidade como a utilização na

indústria aeronáutica e aeroespacial tais como as palhetas de turbina, bem como peças mais

simples, tais quais bancos de jardim e as que são utilizadas para tampar bueiros. A

produção pode ser unitária - exemplos: joias, implantes e peças artísticas - ou seriada,

voltada principalmente para as indústrias mecânica e automobilística (Soares, 2000).

O processo de fundição para fabricação de peças consiste em preencher um molde

com metal líquido. O molde corresponde às formas das peças a serem obtidas, com uma

cavidade para receber o líquido que será resfriado e solidificado (Soares, 2000).

O fato de a fundição produzir bens intermediários em diversos setores contribui,

direta e indiretamente, para o desenvolvimento do país. Para cada peça produzida ou para

Page 72: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

70

um conjunto delas há processos que são escolhidos para adequação às exigências dos

clientes, prazo e custos da produção (Soares, 2000). De acordo com Castro e Antonialli

(2005), a fundição e a siderurgia são importantes para o desenvolvimento econômico

mundial. O ferro e o aço contribuíram para que a Revolução Industrial se tornasse uma

realidade. E no estágio atual do desenvolvimento da sociedade ocidental é quase

impossível imaginar um mundo sem o uso de ferro fundido e de aço.

Entretanto, de acordo com os dados da ABIFA (2013), ilustrados na Figura 6, a

produção brasileira de fundidos estava em ascendência desde o ano 2000 e chegou ao

máximo da produção em 2008. Com a crise em 2009, aconteceu uma queda na produção

de 32% e recuperação nos dois anos seguintes, 2010 (41% de incremento) e 2011 (3% de

incremento), embora não conseguindo, ainda, atingir os patamares de 2008. Em 2012

aconteceu novamente uma retração da produção, o que pode demonstrar que o cenário

ainda não se estabilizou.

A Figura 6 mostra um grau de oscilação no setor de fundição entre 2000 e 2012.

Figura 6. Produção brasileira de fundidos.

Fonte: elaborada pela autora com base em ABIFA (2013).

Page 73: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

71

No setor de fundição brasileiro destaca-se Minas Gerais, que foi responsável por 28%

das exportações nacionais de produtos fundidos em 2012 (Brasil, 2013a). Outro fator que

se destaca no estado é a concentração de 75% das empresas de fundição na região centro-

oeste de Minas Gerais (Castro & Antonialli, 2005), localização do APL de fundição das

cidades de Cláudio, Divinópolis e Itaúna, objeto de estudo desta pesquisa.

Destaca-se assim a importância da escolha do APL de Fundição para o estudo. Trata-

se de um processo produtivo, de baixo valor agregado, que não exige base tecnológica

forte e que tem importante papel na economia mineira. Essas características fornecem o

contexto para a pesquisa empreendida.

O setor de fundição, na região estudada, optou por uma estratégia de cooperação por

meio do APL. Esse tipo de configuração pode introduzir um fator que pode influenciar a

cultura organizacional. A questão é complexa. De um lado, cada empresa possui a sua

cultura, de acordo com o referencial teórico, influenciada desde já pela cultura nacional e

regional. Por outro lado, a despeito de suas culturas peculiares, as empresas precisam

adotar determinados instrumentos e ferramentas de gestão, para viabilizar seu negócio.

Essas ferramentas podem requerer mudança na compreensão do “como” incorporar a ideia

do coletivo sem romper a cultura individual de cada empresa. O próximo capítulo visa a

descrever os APLs, permitindo esclarecer o seu modus operandi e sua influência na cultura

organizacional.

2.2 Arranjos produtivos locais (APLs)

Nas últimas décadas, uma nova maneira de as empresas se organizarem vem-se

desenvolvendo por meio da formação de redes que conseguem diversos ganhos de

competitividade, entre eles a flexibilização e a diversificação da produção,

Page 74: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

72

multifuncionalidade do trabalhador, investimentos em pesquisa e desenvolvimento e

articulação público-privada almejando a objetivos comuns (Scheffer et al., 2008).

Entre as novas maneiras como as empresas vem-se organizando, podem-se destacar

os arranjos produtivos locais (APLs), cujo conceito, de acordo com Lastres e Cassiolato

(2003), são as aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais - com

foco em um conjunto específico de atividades econômicas - que apresentam vínculos,

mesmo que incipientes. Geralmente esses arranjos envolvem a participação e a interação

de empresas - que podem ser desde produtoras de bens e serviços finais até fornecedoras

de insumos e equipamentos, prestadoras de consultoria e serviços, comercializadoras,

clientes, entre outros, - e suas variadas formas de representação e associação. Incluem-se

também aí diversas outras organizações públicas e privadas voltadas para a formação e a

capacitação de recursos humanos como escolas técnicas e universidades, bem como as de

pesquisa, desenvolvimento e engenharia, política, promoção e financiamento (Lastres &

Cassiolato, 2003).

Na década de 1980, o Ocidente acompanhou com interesse a evolução do just-in-

time, um sistema criado e adotado no toyotismo e que se baseou em alianças estratégicas e

relações de longo prazo entre empresas (Almeida, 2002). No mesmo período, surgiu na

Europa o fenômeno dos distritos industriais formados por pequenas e médias empresas

integradas por meio de duas possibilidades de organização baseadas: a) na divisão técnica

do trabalho interiorizada em grandes empresas; b) na divisão social do trabalho envolvendo

pequenas empresas em determinada área, que atuariam em conjunto em um mesmo

segmento particular da economia, típico dos centros industriais e artesanais da Europa

Ocidental, em um ambiente de cooperação e aprendizagem mútuas (Almeida, 2002).

Essa nova forma apoia o desenvolvimento de um papel mais ativo na economia das

pequenas e médias empresas (PMEs) que não mais se restringem à ocupação de nichos de

Page 75: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

73

mercado e subordinação às grandes empresas (Scheffer et al., 2008). O potencial das PMEs

na geração de empregos é um tema que assume importância crescente na economia

mundial (Cocco, Urani, Galvão & Silva, 2002) e ganhou destaque na economia brasileira.

Os motivos podem ser compreendidos pela análise dos números referentes às PMEs

brasileiras, que representam 20% do Produto Interno Bruto (PIB); são responsáveis por

60% dos empregos no país e englobam 99% dos estabelecimentos do país (Portal Brasil,

2013).

TABELA 5

Representatividade das PMEs na economia brasileira

As PMEs no Brasil O que isso representa

20% do PIB R$ 700 bilhões

99% das empresas 5,7 milhões de PMEs

60% dos empregos 56,4 milhões de empregos

Fonte: IBGE, Dieese, Sebrae Nacional, citado em Portal Brasil (2013)

Essa participação teve expressivo aumento a partir da chamada “Terceira Revolução

Industrial”, nos anos 1970 e 1980, ocasião em que as taxas de desemprego tecnológico e

estrutural cresceram muito, revalorizando o papel da pequena empresa. Em diversos países,

tanto desenvolvidos quanto subdesenvolvidos, os governos lançaram iniciativas para

estimular o empreendedorismo, buscando o surgimento e a sobrevivência das micro e

pequenas empresas. Assim, cresceu consideravelmente o número de incubadoras de

empresas, balcões de negócios e programas de financiamento (Almeida, 2002).

Essa configuração significa um novo destaque ao papel das PMEs na economia atual.

Na era fordista, caracterizada pela produção em escala, era a grande empresa a principal

protagonista da economia, incentivada por investimentos governamentais que

desconsideravam os seus efeitos predatórios sobre o espaço urbano (Almeida, 2002). Para

Silva (2002), a PME era vista como espaço de sonegação fiscal e representava uma espécie

Page 76: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

74

de subempreendimento, principalmente pelo crescimento na informalidade. O processo de

industrialização implantado no Brasil não foi capaz de promover um círculo virtuoso que

integrasse desenvolvimento econômico e bem-estar social.

A economia informal foi um mecanismo de sobrevivência para expressiva parte da

população, que perdeu suas posições em função da mudança do modelo econômico

sustentado em base tecnológica e microeletrônica. A capacidade das PMEs de absorver tais

impactos sociais levou-as a receberem atenção, pelo potencial de geração de emprego e

renda (Silva, 2002).

Além disso, as PMEs conseguem mais flexibilidade e capacidade de adaptação às

mudanças de mercado, embora enfrentem dificuldades para inovar e ter acesso ao crédito e

à tecnologia. Dado o seu fraco poder de alcançar as vantagens competitivas das grandes

empresas, como escala de produção, capacidade de investimento em inovação tecnológica

e capacidade de pressão política, tal tipo de empresa precisou repensar sua dinâmica de

inserção no mercado. Novas concepções relacionadas à proximidade geográfica,

cooperação e articulação entre empresas, associações patronais e de classe, centros de

ensino e pesquisa começaram a configurar o ambiente de operação das PMEs (Paula, 2004;

Pedrosa, 2005).

Na economia atual tem-se acesso a produtos de qualquer parte do mundo, graças à

evolução da logística de transporte e dos meios de comunicação. Esse fato pode levar à

suposição de que a localização da empresa tenha perdido importância no cenário

competitivo (Porter, 1998). No entanto, o que o autor observa é que as vantagens

competitivas sustentáveis a longo prazo são baseadas em condições locais e decorrem da

concentração de habilidades e conhecimento, instituições, concorrentes, negócios

correlatos. Proximidade cultural, geográfica e institucional conduz a acessos especiais a

rede de fornecedores e mão de obra, estabeleceu relações mais fortes com os stakeholders,

Page 77: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

75

têm acesso a melhores informações, incentivos e outros. A sofisticação com a qual as

empresas competem em determinada localidade é fortemente influenciada pela qualidade

do ambiente de negócio local (Porter, 1998).

Em reforço à posição de Porter, Paula (2004) destaca a relevância do local para o

desenvolvimento, pela maior facilidade de se buscarem elementos distintivos, reputação e

singularidades, fatores que tornam único um dado espaço geográfico. Lastres (2004)

identifica ainda outra vantagem: o conhecimento tácito de caráter localizado e específico

pode desempenhar papel primordial para o sucesso inovativo, sendo de difícil

transferência. A sinergia coletiva fortalece as chances de sobrevivência e crescimento, com

ganhos de vantagens competitivas particularmente para as PMEs.

O conjunto desses fatores - quais sejam: necessidade de competir em esferas mais

abrangentes, a possibilidade de mais competitividade pela cooperação entre players locais

e a distintividade e inovação - forneceu a base para uma nova arquitetura de negócios.

Atividades complementares, formação de mercados locais de trabalho e de bens e serviços

e ganhos em logística levaram ao desenvolvimento de arranjos produtivos nos quais

interagem, dentro de determinada cadeia de valor, atividades, negócios e transações entre

empresas (Lastres, 2004).

O foco descolou-se da empresa isolada para um conjunto de empresas localizadas em

um mesmo território, que passou a ser vislumbrado nas últimas três décadas como um

grande complexo produtivo. O fenômeno foi tratado como “arranjo” ou “sistema produtivo

e inovativo local”, utilizado pela Redesist6 no Brasil, “milieux” inovadores na França,

“distrito industrial” principalmente na Itália - herdeiros diretos de Marshall (1920), com

6 Rede de Pesquisa em Sistemas em Arranjos Produtivos e Inovativos Locais. Trata-se de “uma rede de

pesquisa interdisciplinar, formalizada desde 1997, sediada no Instituto de Economia da Universidade Federal

do Rio de Janeiro e que conta com a participação de várias universidades e institutos de pesquisa no Brasil,

além de manter parcerias com outras instituições da América Latina, Europa e Ásia”. Fonte: recuperado de:

<http://www.redesist.ie.ufrj.br/>.

Page 78: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

76

ênfase na dinâmica territorial da competição e cooperação - ou “cluster”, nos trabalhos de

Porter (Scheffer et al., 2008; Vale & Castro, 2010).

Na concepção de Porter (1998), clusters são concentrações geográficas de empresas e

instituições interconectadas em um segmento particular. É uma forma diferente de

organizar a cadeia de valor. Envolve diversas entidades, como fornecedores de

componentes e infraestrutura especializados, indústria de produtos complementares e que

utilizam tecnologias e habilidades simulares. Muitos clusters também incluem instituições

como governamentais e universidades. Essa forma de organização promove, ao mesmo

tempo, competição e cooperação entre as empresas cuja coexistência permite os ganhos de

eficiência, efetividade e flexibilidade.

Já a Redesist classifica os arranjos produtivos locais como “aglomerações territoriais

de agentes econômicos, políticos e sociais com foco em um conjunto específico de

atividades econômicas que apresentam vínculos mesmo que incipientes” (Cassiolato &

Lastres, 2003, p. 11).

Dentre as principais diferenças entre os clusters e os APLs estão a intensidade de

vínculos entre as empresas e participação das empresas privadas e as atividades

desenvolvidas, sendo que os APLs focam nas atividades produtivas e os clusters englobam

outras atividades como comércio e serviço (Mascena, Figueiredo & Boaventura, 2013).

Diversos atores atuam em conjunto: empresas produtoras de bens e serviços finais,

fornecedoras de insumos e equipamentos, prestadores de serviços de diferentes naturezas,

núcleos de distribuição e comercialização, consultorias especializadas, clientes, instituições

públicas e privadas voltadas para capacitações, desenvolvimento, financiamento, entre

outros. Esses atores formam uma rede importante de interações no campo dos negócios,

denominada sistemas produtivos e inovativos locais (SPILS), definidos como “aqueles

arranjos produtivos em que interdependência, articulação e vínculos consistentes resultam

Page 79: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

77

em interação, cooperação e aprendizagem, com potencial de gerar o incremento da

capacidade inovativa endógena da competitividade e do desenvolvimento local”

(Cassiolato & Lastres, 2003, p. 11).

Cassiolato e Lastres (2003) destacam que a cooperação entre as empresas pode

acontecer pelo intercâmbio sistemático de informações, por exemplo, produtivas,

tecnológicas, mercadológicas, não só com concorrentes, mas também com clientes e

fornecedores, pela interação por meio de programas de treinamento, feiras, cursos,

seminários e pela integração de competências que pode ocorrer, por exemplo, em projetos

conjuntos.

De acordo com Porter (1998), os clusters podem oferecer grandes benefícios. O

primeiro está relacionado ao aumento da competitividade por meio de uma cadeia de

fornecimento mais competitiva, especializada e com reduzidos custos de transações. E

também acesso a informações técnicas e de mercado propiciadas pelas relações pessoais

que fortalecem um fluxo de interações em todas as faces de negócio: tecnologias, acesso

integrado a instituições governamentais, acesso a programas de créditos, ações

coordenadas com empresas correlatas. Além disso, acrescentam-se aperfeiçoamento do

sistema comercial, melhorias contínuas por meio de investimentos compartilhados,

estímulo à alta performance, decorrente do conhecimento da concorrência e a possibilidade

de contratação conjunta de profissionais especialistas e experientes que aportam práticas

mais atualizadas de gestão e de incremento tecnológico (Porter, 1998).

O segundo benefício relaciona-se à possibilidade de introduzir inovações aptas a

sustentar o crescimento. Isso porque o relacionamento com diferentes agentes do cluster

ajuda as empresas a conhecerem as novas tecnologias disponíveis, a terem acesso a

componentes e equipamentos de última geração, além da disseminação de conceitos de

serviços e de mercado, da qual se obtêm mais informações. Visitas de benchmarking e

Page 80: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

78

contato face a face provocam o desejo de emulação e de implantação de práticas

inovadoras (Porter, 1998). Como resultante, as redes de cooperação vão-se transformando

e introduzindo mudanças regionais:

Ao longo do processo de transformação e desenvolvimento de uma região é possível

observar como as redes locais vão se adensando; como vão surgindo e se

multiplicando as conexões externas; a importância das redes pessoais condicionando

e afetando a criação de redes empresariais; as repercussões dessas redes pessoais; a

capacidade de inovação e o papel da ação empreendedora rompendo o status quo e

afetando a configuração das redes regionais (Vale, 2007, p. 75).

Por último, Porter (1998) menciona o estímulo da formação de novos negócios que

expandem e fortalecem o cluster. Esse processo é decorrente da atratividade que o cluster

exerce sobre outras empresas, que o fortalece em um sistema de retroalimentação contínua.

A formação de um cluster requer ações continuadas de pelo menos uma década e seu

surgimento pode decorrer tanto pela vocação local como pela demanda por produtos e

serviços singulares. Além desses motivos, clusters podem surgir a partir do estímulo à

inovação provocado por uma ou mais empresas, em um processo que se desencadeia o

crescimento de muitas outras (Porter, 1998).

Por conciliar o crescimento econômico com melhor perfil distributivo de renda, a

estratégia de cluster tem sido bem-sucedida em diversas partes do mundo (Castro &

Antonialli, 2005). Nos Estados Unidos, por exemplo, existem muitas empresas que se

beneficiam por constituírem clusters competitivos como: Vale do Silício, com

microeletrônica, biotecnologia e venture capital; Nova York, com os serviços financeiros,

publicidade e propaganda e multimídia; Minneapolis, com serviços e equipamentos

cardiovasculares (Porter, 1998).

Países mais pobres competem no mercado global de outra forma: ou pelo uso

intensivo de mão de obra barata ou pelo acesso a recursos naturais. É o que Porter (1998)

Page 81: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

79

concluiu e, embora sua obra já tenha mais de 15 anos, ainda continua válida, haja vista a

concentração de call centers na Índia (aproveitando a conjugação de expertise em

tecnologia da informação (TI), farta mão de obra e de custo mais baixo que o dos países de

alta tecnologia) e a concentração da indústria de confecção na China. Essas “formas de

competitividade espúrias (baixos salários; exploração intensiva e predatória de recursos

naturais; e manipulação de taxas de câmbio e juros têm limites claros e graves

consequências no longo prazo” (Lastres, 2004, p. 4). Para a autora, entre múltiplos efeitos

podem-se citar a transferência de empregos com consequente alto custo de serviços.

Um meio para superar esses riscos é investir na atuação coletiva, que caracteriza

clusters bem-desenvolvidos. A formação de cluster em sociedades em desenvolvimento

exige investimentos em educação e formação técnica e capacidade tecnológica, abrindo

acesso a mercados de capital e melhorando as instituições para facilitar o acesso a

mercados de capital e melhoria das instituições (Porter, 1998) em uma dinâmica em que o

governo deve assumir protagonismo relevante, tanto pelo incentivo a investimentos de

grandes empresas como pela atuação direta de agências estatais (Almeida, 2002). Dadas as

características das sociedades em desenvolvimento, tais atividades tendem a se

desenvolver nas redondezas das capitais pela centralização de infraestrutura, instituições e

fornecedores, o que não se verifica em regiões periféricas (Porter, 1998).

O modelo de desenvolvimento dos distritos industriais italianos fundados nas redes

de PMEs vem ganhando destaque como uma possível alternativa à superação do modelo

“fordista” de produção (Cocco et al., 2002). Um dos principais estudos realizados

envolvendo APLs e desenvolvimento regional foi o de Bagnasco (2002). Nesse estudo

analisou-se o contexto econômico, cultural e institucional das PMEs na Itália, que também

vivenciou a ascensão, em alguns casos, repentina das PMEs durante os anos de 1960 e

1970 em regiões que passaram de uma economia baseada em atividades agrícolas para uma

Page 82: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

80

economia industrial baseada em PMEs também em centros tradicionais da grande

indústria. Buscando compreender o motivo pelo qual algumas regiões desenvolveram mais

PMEs que outras, constatou-se que o diferencial estava nas influências culturais e sociais

como autossuficiência, formação polivalente, mobilidade e capital propícios para o

pequeno empreendedor, que contribuíram para a melhoria da capacidade de gestão,

qualificação técnica, confiança recíproca e bom clima social.

Em relação ao Brasil, Vieira et al. (2002) ressaltam que a dificuldade de se constituir

e consolidar instituições é um traço cultural, enquanto Caldas e Wood (2000) indicam

baixo grau de institucionalização dos organismos de controle e coordenação brasileira. As

agremiações, associações e outros tipos de grupo são constituídos de forma a abranger

maior quantidade de diferentes representações sociais, o que gera falha na definição das

fronteiras internas e externas desse grupo, acabando por representar todos e ninguém ao

mesmo tempo. Isso se deve ao fato de não conseguirem a articulação em torno de

interesses bem definidos, enfrentando dificuldades de desenvolvimento de grupos de

interesse politicamente representativos e poderosos. Esse é um traço que não se encontra

em sociedades com heranças do protestantismo, em que a impessoalidade nas relações

sociais conduz a relações calcadas no interesse comum (Vieira et al., 2002).

No entanto, a exemplo de outros países, o Brasil também desenvolveu os seus

clusters de negócios, ou APLs, que providenciaram arranjos cooperativos para a

competitividade com o objetivo de superar as dificuldades técnicas, organizacionais e de

volume de capital típicas de seu estágio de desenvolvimento. Esses arranjos desenvolvem

formas de aportes incrementais de pequenos capitais e acréscimos de novas competências e

capacidade produtiva, facilitando a mobilização de recursos financeiros e humanos e

viabilizando o desenvolvimento das atividades (Scheffer et al., 2008). Ajuda ainda,

segundo Cocco et al. (2002), a substituir o mercado informal em formal, absorvendo parte

Page 83: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

81

significativa da população excluída dos benefícios sociais, em função de sua baixa

qualificação e mobilidade social. Essa condição obriga o Estado a desenvolver políticas

públicas necessárias à emergência de atividades produtoras para essa população. O APL,

portanto, tem também conotação política.

Pesquisadores defendem que as políticas de desenvolvimento regional são relevantes

para uma combinação das condições econômicas, políticas, sociais e culturais. Esse apoio,

a partir de uma concentração produtiva em uma localidade, tende a encontrar mais

facilidades como instituições de apoio, proximidade de clientes e fornecedores e equipe

qualificada (Pedrosa, 2005).

No Brasil, a organização de PMEs está assumindo a forma dos APLs, que procuram

articular agentes como empresas, universidades, sindicatos e governo. Para Cocco et al.

(2002), o modelo de desenvolvimento de PMEs no Brasil não pode, por exemplo, replicar

o modelo italiano devido não apenas à sua grande dívida social, mas também pela tímida

atuação do governo central para atenuá-la (Cocco et al., 2002). Os estudos sobre o modelo

italiano, entretanto, destacam a necessidade de conhecer os aspectos socioculturais,

históricos e institucionais definidores das especificidades das regiões dos distritos

industriais. Assim, para a replicação de um modelo para outra região, é preciso

compreender as suas próprias características históricas e regionais.

O novo paradigma do desenvolvimento regional destaca importância aos aspectos

internos da região para viabilizar o processo de desenvolvimento sustentável, ao contrário

das abordagens tradicionais que focavam os fatores exógenos (Vale, 2004). Para cada

território é necessário um modelo próprio de desenvolvimento, considerando diversos

fatores como redes de atores locais, dotações naturais, infraestrutura, capital humano,

capital social, cultura empreendedora, poupança local, capacidade de atração de

investimentos, potencialidades e vantagens competitivas, proximidade de mercados. Não

Page 84: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

82

somente esses fatores, mas também as heranças culturais, o ritmo das mudanças, as

dificuldades e adesão dos agentes locais ocorrem de forma única, singular, inimitável em

cada território (Paula, 2004).

O certo é que a proximidade entre os agentes do APL, além de favorecer os custos

logísticos, favorece também o desenvolvimento de relacionamentos de maior

profundidade, que pode levar à redução de custos na transmissão de conhecimentos e de

transações. Desta forma, as PMEs desenvolvem mais vantagem competitiva ao atuarem em

conjunto em comparação com aquelas que operam isoladamente (Scheffer et al., 2008).

Embora cada arranjo produtivo varie de acordo com a dinâmica regional e local,

quatro elementos comuns estruturam os casos exitosos de organização coletiva de PMEs.

São eles: capital social, estratégias coletivas de organização da produção, estratégias

coletivas de mercado e articulação político-institucional. A articulação se dá com

instituições públicas e privadas responsáveis pelas políticas públicas e com as organizações

privadas de apoio às pequenas empresas. A relação entre capital social e articulação é

direta, ou seja, quanto maior o capital social acumulado pelo aglomerado de empresas,

melhor e mais eficiente será a articulação com as organizações e instituições (Teixeira,

Amaral Filho, Mayorga & Mayorga, 2006).

A capacidade inovativa e consequente possibilidade de aumento da competitividade

dependem da rede de relacionamentos e da forma como a informação é processada e

transformada em conhecimento. O ato de aquisição do conhecimento – cognição – é

resultado da percepção das informações, aprendizagens anteriores e raciocínio (Sordi &

Meireles, 2012). Esse processamento e a aquisição do conhecimento e todo o

desenvolvimento ou interação de um cluster ou arranjo produtivo podem ser influenciados

pela programação mental dos agentes envolvidos, que formam a cultura do território local/

Page 85: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

83

região. Desse modo, é necessário levar em consideração as diferenças regionais brasileiras,

como referem Cocco et al. (2002, p. 30):

Se as regiões brasileiras apresentam enormes diferenças entre si, o que se dirá das

cidades em nosso país... Uma característica comum entre elas é que a informalidade

permeia grande parte das relações produtivas, de modo que não podemos levar

adiante um estudo sobre desenvolvimento local em nossas cidades sem atentarmos

para este fato. Neste cenário, podemos afirmar de antemão que, apesar da aparente

uniformidade que a eleição de um elemento comum entre as cidades possa

representar, a informalidade no Brasil é um fenômeno extremamente heterogêneo,

por vezes ligado ao atraso, outras ao moderno, em determinadas ocasiões perverso e

degradante, em outras, inovador.

O grande desafio para promover o desenvolvimento das cidades é mobilizar um

sistema ancorado no próprio território ou na cidade. O desenvolvimento local requer a

produção organizada ao longo do território de forma a incluir os agentes, combinando

inovação, cooperação e competição.

Os APLs têm potencial para contribuir com o desenvolvimento local e regional

(Lastres, 2004). Isso porque conjuga múltiplos fatores necessários ao fortalecimento da

economia. Entre outros papéis, os APLs podem trazer diversos benefícios, em um esforço

de síntese das diferentes contribuições dos autores estudados, como: aumentam a

competitividade das empresas de pequeno e médio porte pela possibilidade de partilharem

recursos, conhecimento, tecnologia (Cassiolado & Lastres, 2003; Porter, 1998; Scheffer et

al., 2008); estimulam uma cultura de cooperação e de uso de serviços compartilhados

(Cassiolado & Lastres, 2003; Porter, 1998; Scheffer et al., 2008); exigem a organização do

setor público para facilitar a concessão de crédito e o acesso à formação de mão de obra

mais qualificada (Almeida, 2002; Cocco et al., 2002; Porter, 1998); reduzem a economia

informal integrando significativa parcela de trabalhadores à rede de proteção social (Castro

& Antonialli, 2005; Cocco et al., 2002; Lastres, 2004); atraem novos clusters de negócios

associados ao APL original (Cassiolato & Lastres, 2003; Porter, 1998); promovem a gestão

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84

de conhecimento e a inovação, antes concentradas nas grandes empresas (Lastres, 2004;

Paula, 2004; Porter, 1998; Sordi & Meireles, 2012; Vale, 2007); permitem a adoção de

práticas gerenciais que elevam a competitividade e a produtividade (Porter, 1998).

Estabelecido o campo da fundição e a importância das APLs, o interesse no estudo

que busca entender a formação, alteração ou funcionamento de culturas se justifica, já que

dos capítulos sobre cultura se depreende o seu papel e a sua importância na gestão.

Estudar um grupo de empresas que se comprometem a agir e pensar de forma

cooperativa, em um APL, mantendo seus diferenciais competitivos como um desafio de

pesquisa, pode gerar a necessidade de novas abordagens nos estudos sobre cultura

organizacional. Esse o propósito do presente trabalho.

Page 87: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

85

3 METODOLOGIA

Este capítulo apresenta a metodologia escolhida para a realização desta pesquisa.

Está organizado em abordagem, tipologia quanto aos meios, unidade empírica de análise,

instrumento e estratégia de coleta e de análise dos dados.

3.1 Abordagem e classificação da pesquisa

A abordagem desta pesquisa é quantitativa, de caráter descritivo. A pesquisa

descritiva demonstrou ser adequada para o presente estudo, por sua propriedade de expor

as características de determinada população ou de determinado fenômeno e “estabelecer

correlações entre variáveis e definir sua natureza” (Vergara, 2003, p. 47) ou, em outras

palavras, determinar a distribuição de determinado fenômeno em uma população, tendo

como resultado a confirmação de um fato (Greenwood, 1973). A abordagem quantitativa

foi escolhida por permitir a identificação dos principais traços culturais que orientam as

práticas organizacionais das empresas que participam do APL estudado, bem como a

correlação da cultura do APL com a cultura das mesmas. De acordo com Hair, Joseph,

Babin, Money & Samouel (2005), dados quantitativos são objetivos, não dependem da

opinião do pesquisador, e são mensurações em que números são usados diretamente para

representar a propriedade de algo, sendo, portanto, adequados para a análise estatística.

A abordagem quantitativa foi fundamentada no método survey, que teve origem nas

disciplinas sociais. O pesquisador observa, por meio de perguntas diretas e indiretas,

populações numerosas, submetidas a uma análise quantitativa. Quando a população é

muito numerosa, procede-se extraindo uma amostra. O uso desse método implica que os

dados só podem ser obtidos a partir do contato com os indivíduos envolvidos por meio de

Page 88: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

86

entrevistas e questionários. Os dados são sempre submetidos a uma análise quantitativa

(Greenwood, 1973).

O survey é um método de verificação empírica. Permite elaboração clara e rigorosa

de um modelo lógico, de forma a evidenciar o sistema de causa e efeito, e também permite

documentar processos causais mais elaborados. O survey é utilizado para entender a

população maior da qual foi selecionada a amostra e pode ser útil para examinar

cuidadosamente a importância de muitas variáveis. Os dados coletados podem ser fontes

permanentes de informações, sendo possível retornar aos dados e analisá-los à luz de novas

perspectivas teóricas (Greenwood, 1973).

Justifica-se ainda a pesquisa quantitativa pelo grande número de respondentes e pela

possibilidade de tratamento estatísticos dos dados.

3.2 Instrumento de coleta de dados

Para identificar as diferenças culturais nas empresas que fazem parte do APL,

utilizou-se como instrumento o questionário Values Survey Module 1994 (VSM-94),

desenvolvido pelo professor e pesquisador Geert Hofstede. O autor detém os direitos

reservados e cedeu o direito de aplicação para a pesquisadora brasileira Betania Tanure,

orientadora desta dissertação. A versão utilizada em português do Brasil foi traduzida por

Tanure, com autorização e validação por Hofstede. O questionário permite calcular os

índices para as cinco dimensões definidas por Hofstede (1991), a saber: distância do poder,

necessidade de controlar as incertezas, individualismo versus coletivismo, masculinidade

versus feminilidade e orientação a longo prazo versus curto prazo.

O instrumento contém ainda algumas questões para identificar características

demográficas tais como sexo, idade, educação, trabalho, nacionalidade atual e de

Page 89: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

87

nascimento. Hofstede (1994), no manual desenvolvido para o instrumento VSM 94 Values

Survey Module 1994 Manual, destaca que os resultados podem variar substancialmente

entre nacionalidades distintas, uma vez que cada país tende a seguir certos padrões de

pontuação. Entretanto, as características demográficas dos respondentes também podem

influenciar os resultados (Hofstede, 1994).

Novas versões do questionário foram lançadas em 2008 e 2010, sendo que, na última,

foi acrescentada a dimensão indulgência versus restrição (tradução nossa) (The Hofstede

Centre, 2013). Contudo, não será utilizada nesta pesquisa, pelo fato de a tradução do

questionário não ter sido feita e testada para português com a validação do Hofstede, que

possui os direitos autorais, e também por não existirem estudos no Brasil que permitam a

comparação.

Optou-se por utilizar a versão de 1994 e, para fins de comparações longitudinais com

pesquisas anteriores, conforme indicação de Hofstede (1994), incluíram-se cinco questões

utilizadas na versão VSM 82. Dessa forma, é possível comparar os resultados com

pesquisas anteriores baseadas no VSM 82, ao mesmo tempo garantindo as melhorias

propostas por ele. As questões acrescentadas são as de número 09, 10, 23, 24 e 25 do

questionário disponível no Apêndice A.

O questionário VSM foi originalmente concebido e aplicado na IBM em 72 países,

com o objetivo de comparar a cultura de cada um deles. Isso foi possível por meio da

aplicação do mesmo questionário na mesma empresa, porém em diferentes países (Minkov

& Hofstede, 2011a). No âmbito da presente pesquisa, o VSM foi aplicado para identificar

as dimensões culturais de um APL, considerando que as empresas que dele participam

estão na mesma região e atuam no mesmo setor de negócio, e compará-las com os

resultados de estudos anteriores já realizados no Brasil por Hofstede (1991) e por Tanure

Page 90: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

88

(2010) e em Minas Gerais por Tanure (2010). Sua utilização tem como objetivo, ainda,

verificar se existe uma convergência cultural entre as empresas que formam o APL.

Em outras palavras, Hofstede propõe uma análise em que o fator “empresa” é o

mesmo e o que muda é o fator “região/ país”. A presente pesquisa, por outro lado, mantém

constante o fator “região” e varia o fator “empresa”, de forma a identificar os traços

culturais que orientam as práticas organizacionais nas empresas que participam do APL.

Trata-se assim de um recorte que permite realçar os fatores culturais (regionais e

nacionais) em um mesmo segmento da economia (fundição) em uma sub-região (oeste de

Minas Gerais), dentro da região sudeste. Essa escolha metodológica se justifica ainda por

juntar o eixo cultural organizacional com o eixo cultura regional. O fato de diversificar

empresas pode ensejar novas interpretações sobre a temática. Primeiro, por se tratar de

empresas de pequeno e médio porte - diferentemente de estudos que focam grandes

empresas cuja cultura pode exercer forte influência sobre o indivíduo – os resultados

podem expressar mais especificamente os efeitos da cultura regional, mais do que os

efeitos da empresa. E assim, decalcar possíveis diferenças de resultados entre as pesquisas

anteriores e a presente pesquisa.

A Tabela 6 resume as escolhas metodológicas desta pesquisa.

TABELA 6

Classificação da pesquisa

Critério de classificação Escolha da pesquisadora com base na literatura

Abordagem Quantitativa

Quanto aos fins Pesquisa descritiva

Método Survey

Instrumento Questionário VSM 94

Fonte: elaborada pela autora.

Page 91: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

89

3.3 Unidades empíricas de análise

Para Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999), a expressão “unidade de análise”

refere-se à forma pela qual os dados são organizados para efeito de análise. Para esses

autores, a unidade de análise pode ser uma organização, um grupo, diferentes subgrupos

em uma comunidade ou determinados indivíduos.

A presente pesquisa teve como unidade empírica de análise o segmento de fundição

nos municípios de Divinópolis, Itaúna e Cláudio, localizadas na região centro-oeste de

Minas Gerais (RCOMG). De acordo com Castro e Antonialli (2005), a RCOMG apresenta

expressiva concentração de fundições, com representatividade de 75% das empresas de

Minas Gerais formando o APL.

A escolha das unidades de análise possibilitou avaliar a relação cultural entre as

empresas que fazem parte do APL e, assim, verificar se essa cultura constitui traços

comuns ao grupo estudado. Segundo Becattini (1989), como citado em Scheffer et al.,

(2008), o fato de empresas cooperarem em um mesmo setor de atividade e espaço regional

pode influenciar sua cultura organizacional. A escolha do objeto de estudo deveu-se à

facilitação de acesso da pesquisadora às empresas e ao interesse do Sindicato da Indústria

da Fundição no Estado de Minas Gerais (SIFUMG).

A proposta de pesquisa foi submetida e aceita pelo presidente do SIFUMG, que

também preside a Regional Centro-Oeste da Federação das Indústrias do Estado de Minas

Gerais (FIEMG) e é vice-presidente da Associação Brasileira de Fundição (ABIFA). A

carta com a autorização encontra-se no Anexo A. Na ocasião, a SIFUMG enviou à

pesquisadora a lista com todos os contatos das empresas que formalmente compõem o

APL. Trata-se de um APL reconhecido nacionalmente, e à época da pesquisa, vinha

Page 92: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

90

passando por processo de melhoria de seus produtos, processos e gestão, liderado pela

FIEMG.

Na época da coleta de dados, junho a setembro de 2013, o APL analisado era

composto de 106 empresas que fornecem produtos para diversos setores (Figura 7). Nela

pode-se observar que 74% de seus produtos são direcionados para o saneamento básico,

utensílios domésticos e máquinas, o que demonstra a importância do setor na economia.

Figura 7. Setores de atuação das empresas do APL de fundição de Divinópolis, Cláudio e

Itaúna. Fonte: elaborada pela autora, a partir de dados do SIFUMG.

A população-alvo do estudo são os profissionais que trabalham no APL de fundição

nos municípios de Divinópolis, Itaúna e Cláudio. Para Hair et al. (2005, p. 239), “a

população-alvo é o grupo completo de objetos ou elementos relevantes para o projeto de

pesquisa.”

Em função do número potencialmente alto de respondentes no APL e das limitações

de tempo e recursos desta pesquisa, optou-se por selecionar uma amostra que, ainda

segundo Hair et al. (2005), pode ser definida como um pequeno subconjunto representativo

da população que servirá para derivar conclusões sobre suas características.

27%

25%22%

8%

6%

5%2% 2% 1%

Saneamento Básico Utensílios Domésticos Máquinas

Móveis Automobilístico Peças de Reposição

Outros Placas Comemorativas Agricultura

Ferroviário Siderurgia

Page 93: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

91

A amostra foi composta pelas empresas que fazem parte do APL de fundição, com

duas abordagens. Na primeira abordagem as empresas foram selecionadas por

conveniência, com aplicação de questionários presencialmente, visando a submeter os

membros da amostra às mesmas condições de aplicação, eliminando variáveis como

interrupção no preenchimento, dúvidas sobre como responder e outras.

A segunda abordagem foi direcionada inicialmente para as 119 empresas também do

APL de fundição, indicadas pelo SIFUMG, e que foram reduzidas a 106 em função da

cessação de atividades de 13 delas. Para aumentar o índice de resposta dos questionários,

foram realizadas abordagens, por telefone, para as empresas que ainda não haviam

respondido, reforçando-se a importância da pesquisa. Obteve-se a adesão de 54 empresas

que foram analisadas em conjunto de forma a caracterizar o APL. Esse número equivale a

51% do total de empresas do APL e contempla 416 profissionais. A amostra é considerada

não probabilística. Amostras não probabilística são utilizadas quando não é possível ter

uma amostra tão definida para se obterem amostras probabilísticas. São utilizadas quando

não se conhece a probabilidade de um elemento da população ser escolhido para participar

da amostra e quando o objetivo do estudo não é fazer generalização dos resultados das

análises (Selltiz, 1975). É o caso do presente estudo.

3.4 Estratégia de coleta de dados

Foi garantido o sigilo dos nomes das empresas e de seus funcionários e ofereceu-se

aos proprietários a possibilidade de elaboração de um relatório específico de suas

empresas, o que minimizou a resistência dos respondentes. Os questionários foram

aplicados presencialmente pela pesquisadora e em sete empresas os sócios-diretores

Page 94: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

92

optaram por estender o questionário a mais respondentes da própria empresa e encaminhá-

los posteriormente à pesquisadora.

A amostra coletada nas empresas presencialmente está descrita na Tabela 7, que

contempla ainda o número de funcionários por empresa, o número de respostas obtidas e o

percentual relativo.

TABELA 7

Amostra coletada e representatividade dos respondentes das empresas da abordagem

presencial na própria empresa

Empresa N. de funcionários qde de respostas %

Empresa A 130 46 35%

Empresa B 39 30 77%

Empresa C 95 36 38%

Empresa D 100 37 37%

Empresa E 77 40 52%

Empresa F 85 40 47%

Empresa G 56 33 59%

Empresa H 109 31 28%

TOTAL 691 293 42%

Fonte: elaborada pela autora.

Para a segunda abordagem buscou-se o maior número de empresas e respondentes

possível, para permitir a caracterização do APL. Para tanto, uma versão eletrônica do

questionário disponível no Apêndice A foi elaborada e encaminhada por e-mail aos sócios

e principais gestores de 119 empresas informadas pelo SIFUMG. No estudo foram

incluídas as oito empresas cuja aplicação foi presencial (Tabela 7). Das 119 empresas, 13

haviam encerrado suas atividades. Assim, consideraram-se como a população total, 106

empresas. Após o envio dos e-mails, todas as empresas foram contatadas por telefone pela

pesquisadora para reforçar a importância da pesquisa e estimular o encaminhamento das

Page 95: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

93

respostas. Por fim, foi realizada uma abordagem presencial em evento organizado pela

FIEMG. O número de respostas obtidas por tipo de aplicação está na Tabela 8.

TABELA 8

Total de questionários respondidos

Etapa Qde de empresas Qde de respostas

A) Amostra da coleta aplicada na empresa 8 293

B) Amostra da abordagem eletrônica 46 123

C) Amostra total – Análise do APL (A + B) 54 416

Fonte: elaborada pela autora.

Segundo estatísticas oficiais da Relação Anual de Informações Sociais do Ministério

do Trabalho e Emprego RAIS/MTE (Brasil, 2013b), havia 4.569 pessoas ocupadas na

atividade de fundição de ferro e aço nos municípios de Cláudio, Divinópolis e Itaúna em

2012. Dessa forma, os resultados a partir da amostra de 416 respondentes apresentam

margem de erro de 4,6%. Esses valores atendem aos critérios propostos por Hofstede

(1994), que indica que o número mínimo de questionários a ser aplicado para o diagnóstico

de cultura é 20, pois abaixo desse valor a influência individual torna-se muito forte.

3.5 Estratégia de análise dos dados

Os dados foram coletados e analisados a partir dos elementos e categorias culturais

estabelecidos pelos autores Hofstede (1991) e Tanure (2010).

Portanto, foram utilizadas as categorias por eles estudadas, quais sejam: distância do

poder, individualismo x coletivismo, masculidade x feminilidade, necessidade de controle

da incerteza, orientação a curto x longo prazo, postura de espectador, personalismo,

tendência a evitar conflitos, paternalismo, lealdade às pessoas, medo de errar e

ambiguidade.

Page 96: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

94

Após a coleta dos dados quantitativos foi realizada a tabulação e, em seguida, os

cálculos estatísticos relativos aos objetivos do trabalho.

As empresas não foram equivalentemente representadas no conjunto dos dados. Das

54 pesquisadas, 11 contemplaram 361 respondentes e as demais 43 empresas, 55. Isso

significa que 11 empresas representaram 86,7% dos respondentes.

Tendo em vista que a amostragem inicial não foi realizada guardando a proporção

existente entre as empresas que compõem o setor APL, foi preciso usar pesos nas análises

que contemplam o conjunto para que cada empresa tivesse representatividade equivalente à

sua representatividade real, ou seja, proporcional ao tamanho do grupo. De outra forma, ao

se analisar o conjunto dos dados, as 11 empresas teriam uma influência maior, pelo número

de questionários respondidos, nos dados que as demais, o que não representa a realidade na

qual as demais empresas têm quantidade de funcionários bem maior que as 11 empresas.

Os pesos foram calculados considerando-se que segundo Brasil (2013a), havia 4.569

pessoas ocupadas na atividade de fundição de ferro e aço nos municípios de Cláudio,

Divinópolis e Itaúna em 2012. Conhecia-se o número de funcionários das 11 empresas com

maior representatividade, que somava 998. Assim calculou-se que a população das outras

empresas representa 3.571, fazendo a ponderação a partir dessa informação. A Tabela 9

explicita o cálculo do peso e margem de erro para os questionários, segundo o percentual

de participação das empresas pesquisadas.

Page 97: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

95

O peso está descrito na fórmula (1).

(

⁄ ) (1)

Sendo:

pi = peso do grupo i (“11 empresas” vs “demais empresas”)

ni = tamanho da amostra do grupo 1

n = tamanho total da amostra

Ni = população do grupo 1

N = população total

TABELA 9

Cálculo do peso e margem de erro para os questionários

população amostra Erro Representatividade Peso calculado

11 empresas 998 361 4% 22% 0,18

Demais empresas 3.571 55 13% 78% 6,38

APL 4.569 416 4,6% 100%

Fonte: elaborada pela autora.

3.5.1 Cálculo das dimensões

Para o cálculo das cinco dimensões, utilizaram-se as fórmulas da Tabela 10, a seguir,

descritas no VSM 94 Values Survey Module 1994 Manual (Hofstede, 1994). Tais fórmulas

permitem comparações com pesquisas realizadas anteriormente.

Page 98: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

96

TABELA 10

Fórmulas descritas no Values Survey Module 1994 (VSM 94)

Distância do Poder =

(%gerente 1 ou gerente 2 em Q24) - (%gerente 3 em Q23) + 25 média (Q16) - 15

Individualismo =

-43 média (Q1) + 76 média (Q2) + 30 média (Q5) - 27 média (Q10) – 29

Masculinidade =

30 média (Q4) + 60 média (Q5) - 39 média (Q7) - 66 média (Q9) +76

Necessidade de Controlar Incertezas =

60 + 40 média (Q15) - 30 média (Q21) - (%respostas 1 ou 2 em Q25)

Orientação para Longo Prazo =

45 média (Q11) - 30 média (Q12) - 35 média (Q13) + 15 média (Q14) + 67

Fonte: Hofstede (1994).

Os resultados da pesquisa, para o APL são discutidos no capítulo seguinte.

Page 99: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

97

4 ANÁLISE DE DADOS

O presente capítulo será desenvolvido em quatro seções. Na primeira, serão

sintetizadas as principais características dos respondentes do APL pesquisado. Na segunda

seção, serão apresentados os resultados obtidos no APL. Esses resultados são confrontados

com os índices encontrados por Hofstede (1991) e Tanure (2010), visando a estabelecer

comparações e possíveis explicações para diferenças eventualmente encontradas entre os

índices brasileiro e mineiro e o APL pesquisado. Na terceira seção, analisam-se os dados

das oito empresas pesquisadas individualmente, de forma a procurar conexões entre as

culturas individuais, isto é, de cada empresa, e os dados do conjunto. Em seguida, na

quarta e última seção, são oferecidas algumas conclusões a partir dos referenciais e dos

dados obtidos.

A escolha preferencial pelos autores Hofstede (1991) e Tanure (2010) se justifica

pelo fato de ambos terem estudado a cultura nacional com base nas mesmas dimensões e a

segunda ter estendido sua pesquisa ao estado de Minas Gerais, atualizando ainda os dados

sobre o Brasil.

4.1 Categorização dos respondentes da pesquisa

As pesquisas de Hofstede (1991) e Tanure (2010) consideram que determinados

traços ou características de uma dada organização ou região interferem nos resultados

obtidos em cada uma das dimensões por eles estudadas. Assim, para melhor caracterizar os

respondentes desta pesquisa, os dados levantados foram organizados de acordo com a sua

frequência. A Tabela 11 apresenta os principais dados dos respondentes.

Page 100: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

98

TABELA 11

Categorização dos pesquisados por incidência de respostas

Caracterização (%)

Sexo Masculino 70

Feminino 30

Idade Até 39 anos 70

Menos de 29 anos 39

Escolaridade

Ensino fundamental completo ou incompleto 35

Ensino médio completo ou incompleto 47

Graduação superior 16

Tempo de empresa Até 10 anos 75

Até dois anos 32

Função Gestor/sócios/diretores 36

Não gestores 64

Fonte: elaborada pela autora.

A Tabela 11 indica uma amostra predominante masculina (70%); com idade até 39

anos (70%); com tempo de empresa até 10 anos (75%); e escolaridade até o ensino médio

(82%, dos quais 35% possuem ensino fundamental completo ou incompleto).

Os dados indicam um grupo de respondentes caracterizado por pessoas mais velhas,

com mais tempo de empresa e de sexo predominantemente masculino.

A síntese dos dados de caracterização da amostra torna-se relevante na medida em

que representa um segmento (empresas de fundição de pequeno porte) e uma região

(centro-oeste mineiro). De acordo com RAIS/MTE (Brasil, 2013b), 97,7% das empresas de

fundição das cidades de Cláudio, Divinópolis e Itaúna/MG possuem menos de 250

empregados e 93% menos de 100. Sob esses prismas é que os dados deverão ser analisados

e, portanto, circunscritos.

4.2 Resultados obtidos no APL

Os resultados estão apresentados inicialmente por categoria estudada, entendendo-se

que quanto mais perto de 100 (em uma escala de zero a 100) mais presente é a dimensão

Page 101: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

99

no grupo estudado. Em cada polaridade das dimensões é destacado o significado do valor

mais próximo ou mais distante de 100. Por exemplo, na dimensão masculinidade x

feminilidade, quanto mais alto o índice, mais masculina é a cultura; e quanto mais baixo o

índice, mais feminina. A seguir, cada dimensão é correlacionada com algumas

características do grupo, comparando os resultados com aqueles obtidos pelos

pesquisadores Hofstede (1991) e Tanure (2010), no Brasil e em Minas Gerais. Os índices

gerais são descritos a seguir e posteriormente aprofundados, dimensão por dimensão.

Em relação à distância do poder, o índice foi de 56,3, representando certo equilíbrio

na aproximação/distância do poder. O índice de masculinidade foi de 16,6, demonstrando,

aceitação da igualdade de gêneros. A terceira dimensão, individualismo, apresentou

resultado de 32,5, indicando uma sociedade mais coletivista, já que quanto mais próximo

de 100 mais a sociedade é individualista. A necessidade de controle de incertezas atingiu

87,3, significando forte necessidade. Finalmente, a dimensão orientação curto versus longo

prazo exibe tendência à orientação a longo prazo, com o índice de 61,4.

Os diagramas da Figura 8 representam a demonstração gráfica dos resultados.

Distância do Poder = 56,3

Menos Distante Mais Distante

0 20 40 60 80 100

Masculinidade X Feminilidade = 16,6

Feminino Masculino 0 20 40 60 80 100

Individualismo X Coletivismo = 32,5

Coletivista Individualista 0 20 40 60 80 100

Necessidade de Controlar Incertezas = 87,3

Menor Maior

0 20 40 60 80 100

Orientação Curto Prazo x Longo Prazo = 61,4

Curto Prazo Longo Prazo

0 20 40 60 80 100

Figura 8. Resultados do APL segundo as dimensões de Hofstede. Fonte: elaborada pela autora.

Page 102: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

100

Os dados da pesquisa de campo, apresentados na Figura 8, permitem identificar

algumas características que se destacam de forma mais intensa por estarem mais próximas

dos extremos (zero e 100), quais sejam, masculinidade e feminilidade com 16,6 e

necessidade de controle da incerteza com 87,3. Tomados isoladamente, tais dados podem

indicar que as expectativas de papéis relativas ao gênero não são tão percebidas no grupo,

enquanto a necessidade de controlar as incertezas deveria se traduzir em um conjunto de

regras, formais ou informais, necessárias à organização do trabalho e à redução das

incertezas (Hofstede, 1991). Por outro lado, a orientação a curto prazo x longo prazo e

distância do poder ficaram próximas da média.

TABELA 12

Comparação entre os índices das cinco dimensões de percepção de valor identificadas

por Hofstede (1991) obtidos nas pesquisas de Hofstede (1991), Tanure (2010) e

pesquisa atual

Pesquisas Hofstede

(1991)

Tanure

(2010)

Tanure

(2010)

Pesquisa

Atual

Ano de realização das pesquisas 1980 a 1990 2001 a 2003 2001 a 2003 2013

Unidade de

análise

Dimensões

Brasil Brasil Minas

Gerais

APL de

fundição em

MG

1) Distância do poder 69 75 77 56

2) Masculinidade x feminilidade 49 55 51 17

3) Individualismo x coletivismo 38 41 44 33

4) Necessidade de controle de incertezas 76 36 41 87

5) Orientação curto x longo prazo 65 63 68 61

Fonte: elaborada pela autora.

A análise detalhada de cada uma das cinco dimensões comparada com os resultados

de pesquisas empreendidas por Hofstede (1991) e Tanure (2010) é apresentada nos

subitens a seguir e resumida na Tabela 12.

Page 103: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

101

Na pesquisa de Hofstede (1991) o índice mais elevado era o de necessidade de

controle de incertezas, seguido de orientação curto x longo prazo, distância do poder,

masculinidade e feminilidade e individualismo x coletivismo. A pesquisa Tanure (2010)

no Brasil, entre 2001 e 2003, encontra um resultado diferente no que se refere à

necessidade de controle da incerteza. Ressalte-se a condição econômica no Brasil antes e

após a década de 1990, que pode ter mudado a necessidade de controle. Essa dimensão é

exatamente a que recebe maior pontuação na pesquisa atual, mais alta até que os primeiros

estudos de Hofstede. A configuração geral dos resultados sugere a necessidade de

aprofundamento quanto aos motivos. Os itens a seguir desdobram cada uma das dimensões

estudadas no APL.

4.2.1 Distância do poder

Essa dimensão relaciona-se com a maneira como a sociedade lida com a existência

de desigualdade entre as pessoas (Hofstede, 1983) e está relacionada à “extensão em que as

pessoas acreditam que o poder e o status estão distribuídos desigualmente e elas aceitam

ou não essa distribuição desigual do poder como forma apropriada de organização dos

sistemas sociais” (Tanure, 2010, p. 29).

O índice do Brasil, de acordo com Hofstede (2003), para a distância do poder é de

69, acima do encontrado no APL (56,3). Os índices de distância do poder informam, em se

tratando de organizações, sobre o estilo de relacionamento entre líderes e liderados ou

entre chefias e subordinados (Hofstede, 2003). Ainda segundo esse autor, nos quadros de

grande distância do poder, os superiores e subordinados se consideram diferentes por

Page 104: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

102

natureza. E quanto maior o número de chefes, maior a distância do poder. Para o autor, em

sociedades com mais alto grau de especialização, a distância do poder tende a ser menor.

No caso do APL, há confirmação de tendência a uma maior distância do poder, mas

não no grau observado em pesquisas no Brasil e Minas Gerais - 75 na pesquisa de Tanure

(2010) para o Brasil e 77 para Minas Gerais.

No Brasil, esse índice é elevado, assim como na maioria dos países latinos. E pode

ser compreendido como uma herança do Império Romano, em que o povo se submetia à

autoridade de seu imperador (Tanure, 2010). Essa característica pode ser vista, por

exemplo, na tradição familiar de se respeitar os mais velhos e entender as diferenças como

algo natural, característica de uma realidade que deve ser aceita, por ser um dos princípios,

por exemplo, da religião católica, predominante no país. As pessoas estão de alguma forma

preparadas a não desafiarem o status quo, em razão da fé. De acordo com Tanure (2010),

em uma cultura de concentração de poder, como a do Brasil, torna-se mais claro quem

responderá pela decisão, mas nem sempre resta claro quem deve implementar o que foi

decidido. O índice de 56,3 nessa dimensão também indicou que no APL há concentração

de poder, embora, como já discutido, em índice mais baixo ao encontrado por Hofstede

(2003) e Tanure (2010). É preciso levar em consideração, ao discutir essa diferença, que o

APL se localiza em cidades pequenas ou médias. De acordo com o Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Fundação João Pinheiro (FJP) e Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) (Atlas do Desenvolvimento Humano, 2013),

Cláudio possui 25.771 habitantes, Divinópolis 213.016 e Itaúna 85.463. Por serem cidades

menores pode propiciar o estabelecimento de relações de convivência fora do ambiente do

trabalho, o que pode diminuir as distâncias entre hierarquias.

No âmbito em que prevalece a distância do poder, provavelmente, os subordinados

esperam que seus superiores lhes digam o que, como e quando fazer (Hofstede, 1991;

Page 105: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

103

Tanure, 2010). Em organizações com esse tipo de característica, normalmente as pessoas

têm receio de tomar iniciativas e correr riscos, afinal, estão acostumadas com os moldes de

relação autoritária e a desigualdade é percebida como natural. Ou seja, além da

concentração de poder, há uma forte relação de dependência do subordinado em relação ao

superior.

Em contraponto aos países latinos, estão os países nórdicos, onde existe um

sentimento generalizado de que o uso do poder deve ser legitimado. De forma contrária,

nas sociedades com maior distância de poder, a legitimidade do poder geralmente não é

desafiada. É importante destacar que o índice deve ser analisado em comparação com

outros resultados. A Grã-Bretanha, por exemplo, tem índice de 35, o que caracteriza baixo

grau de centralização e de dependência em relação aos superiores. Entretanto, para os

dinamarqueses, que têm índice 18, os ingleses são considerados mais autoritários e

centralizadores (Tanure, 2010).

O predomínio da distância do poder no APL corrobora estudos de Hofstede (1991),

que indicam que em contexto no qual há predominância de baixo nível de escolaridade e a

produção depende mais da força de trabalho do que do capital intelectual, o trabalho

manual tende a ser desvalorizado em relação ao administrativo. Esse pode ser o caso do

APL de fundição, caracterizado como artesanal, manual e rudimentar, com funcionários

com baixo nível de escolaridade, segundo a FIEMG (2013). Ilustra essa condição o fato de

muitos funcionários terem deixado de responder à pesquisa por não apresentarem

habilidades de ler ou compreender o que estava sendo pedido, conforme alegação de vários

proprietários.

A distância do poder no APL, menor do que a encontrada por Hofstede (1991) para o

Brasil (69) e por Tanure (2010) para o Brasil (75) e Minas Gerais (77) (Figura 9), indica a

necessidade de buscar novas explicações para o achado de pesquisa. A natureza de

Page 106: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

104

associação pode ser um dos fatores que podem ter levado a esse resultado. Os dados

documentais da história do APL estudado indicam um fenômeno local: pequenos

produtores que passaram a ser empregadores, mas desempenhando funções similares aos

dos seus empregados. Isto é, a expansão do negócio alçou-os da condição de empregado

para a de empregador, sem haver alteração, por exemplo, na sua escolaridade. É o que

mostra o histórico de associativismo do APL, em que vários empregados viraram

empresários (cooperados ou sócios) principalmente nos anos de 1985 e 1986, no município

de Cláudio. É o que apontam também Castro e Antonialli (2005), para quem o APL

transformou antigos colegas de trabalho em proprietários e sócios sem que se demarcasse

claramente a diferença social de cada um.

A figura 9 destaca os resultados de cada autor, por data e região. Em cor

diferenciada, são apresentados os resultados do APL estudado.

Figura 9. Comparação dos resultados do APL de fundição com os resultados das pesquisas

de Hofstede (1991) e Tanure (Brasil e Minas Gerais, 2010) para a distância de poder. Fontes: elaborada pela autora com base em Hofstede (1991) e Tanure (2010); pesquisa atual.

Nesse contexto, a distância entre o empregado e o patrão, que muitas vezes participa

do processo produtivo, é menor. Tanure (2010) também não encontrou diferenças

Page 107: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

105

significativas nos resultados em função do tamanho das empresas. O que ressalta aqui não

é o tamanho da empresa e sim a efetiva participação e contato direto do patrão com a

produção. Além disso, a cultura organizacional está fortemente relacionada ao sucesso

empresarial dos fundadores, cujos valores e crenças inspiram e passam a ser reconhecidos

e compartilhados pelos empregados (Estol & Ferreira, 2006; Schein, 2009). No caso do

APL, como muitas das empresas têm como proprietários ex-funcionários do processo

produtivo, a cultura da organização tende a refletir a valorização da produção e dos

funcionários diretamente ligados ao core business da empresa, além da proximidade do

patrão com seus antigos colegas de trabalho.

Tanure (2010) também pondera que nas culturas com maior distância do poder a

desigualdade entre as pessoas é vista como natural. Muitos funcionários do APL de

fundição podem não perceber essa desigualdade como algo natural, uma vez que seus

patrões tiveram origem semelhante às suas, como operadores do processo produtivo. A

autora acrescenta que pessoas habituadas aos moldes da relação autoritária têm receio de

correr riscos e de ter iniciativa. No caso do APL, ao se aventurar a constituir uma nova

empresa, o antigo funcionário toma uma iniciativa, passa a assumir o risco, mas continua

morando no mesmo espaço social dos seus empregados e convivendo com eles fora do

trabalho, o que pode justificar o fato de a dimensão distância do poder ser menor no APL

do que em Minas Gerais e Brasil.

A diferença na forma como os executivos brasileiros lidam com o poder é destacada

por Tanure (2010). Em uma pesquisa na qual diversos executivos foram questionados

sobre se “uma estrutura hierárquica é necessária principalmente para saber quem tem

autoridade sobre quem” (Tanure, 2010 p. 36), foram os brasileiros que apresentaram o

mais alto nível de concordância com a frase (Brasil, com 66%. Itália e França ficaram entre

Page 108: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

106

40 e 50%, Dinamarca, Bélgica, Grã-Bretanha e Holanda entre 30 e 40%, Suíça, Alemanha

e Suécia entre 20 e 30% e Estados Unidos com 18%).

Os APLs, no entanto, podem ser objeto de considerações específicas. De fato,

congregam organizações com baixa maturidade empresarial, como informa a FIEMG

(2013), que salienta como pontos fracos do APL de fundição a ineficiência da gestão e a

falta de controles gerenciais formais. Pode-se considerar, portanto, que no APL estudado a

formalização da autoridade pode não ser tão relevante quando comparada com o restante

do Brasil, o que também pode ajudar a entender o fato de a dimensão distância do poder no

APL de fundição ter sido inferior à do Brasil e de Minas Gerais.

Outra característica do APL, a rotatividade, deve ser levada em consideração na

análise dos resultados. Segundo Tanure (2010), o relacionamento profissional no Brasil

acompanha uma tradição familiar, em que o líder protege o liderado e, em troca, este

assume deveres morais perante aquele. Assim, seria de se esperar que os detentores do

poder nas empresas do APL assumissem seu papel de protetor, gerando deveres morais nos

subordinados. No entanto, essa relação pode não estar efetivamente acontecendo. Isso

porque, ainda segundo a FIEMG (2013), é intensa a rotatividade dos funcionários. Note-se

que, no público estudado, 32% têm menos de dois anos de empresa, embora 61% tenham

idade maior que 30 anos, o que pode indicar mudança de emprego. Esse fato pode ter

contribuído para o índice obtido, inferior à média brasileira e mineira, mas ainda com a

tendência a maior distância do poder por estar acima de 50.

Outra correlação encontrada foi entre a distância do poder e a escolaridade. Para isso,

utilizou-se análise de regressão, que calcula um coeficiente de determinação, indicado por

r2. De acordo com Gujarati (2000), o coeficiente de determinação mede a proporção ou a

porcentagem da variação total de um fator (variável dependente) explicada pelo modelo de

regressão, ou seja, por variações nas variáveis independentes. Esse coeficiente varia entre

Page 109: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

107

zero e um, sendo que, quanto mais próximo de um, mais forte é a relação entre as

variáveis. A Figura 10 mostra que houve forte correlação entre as variáveis, ou seja, quanto

mais escolaridade, maior a percepção de distância de poder. Hofstede (1991) argumenta,

ao contrário, que, quando a instrução aumenta, o índice de distância tende a diminuir.

Figura 10. Correlação entre distância do poder e escolaridade. Nota: 1) A resposta “outros” foi desconsiderada;

Fonte: elaborada pela autora.

Os dados do APL pesquisado não corroboram os dados encontrados por Hofstede

(1991). Foi entre os níveis mais instruídos que o índice de distância do poder se mostrou

mais elevado. Uma das explicações possíveis é que a escolaridade no Brasil é um dos

sinais de diferenciação social e que qualifica o indivíduo a julgar-se pertencente a

determinada classe social. Como nas empresas pesquisadas o nível de escolaridade baixa é

predominante, assim como a função laboral é baseada na força do trabalho, pode ser que

tais categorias se reconheçam como um conjunto e, portanto, não distingam as diferenças

de acordo com a escolaridade. São novamente os que detêm as mais altas escolaridades os

que mais percebem a distância de poder.

Page 110: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

108

Se, por um lado, a diferença entre os índices de Tanure (2010) e do APL podem ser

analisados sob a perspectiva da diferença entre Minas Gerais e as características do APL,

por outro pode-se também traçar uma perspectiva longitudinal entre as pesquisas, já que 10

anos as separam. A pesquisa de Tanure (2010) foi realizada entre 2001 e 2003 e a atual em

2013. Hofstede (1991) destaca que em culturas com menor distância do poder os

rendimentos são distribuídos de forma mais igualitária. Em sociedades com pequena

distância do poder, a classe média é mais numerosa que naquelas com grande distância do

poder.

Em relação a essa dimensão, notam-se no Brasil significativas mudanças quanto à

distribuição de renda. O índice Gini, uma das medidas de desigualdade de renda, vem

decrescendo continuamente, com os menores valores das últimas décadas pelo aumento da

renda entre os mais pobres e consequente melhora na distribuição de renda nos últimos

anos. Entre 2002 e 2009, a participação da classe C, que vem sendo chamada de nova

classe média, passou de 45,4 para 54,2%; a classe D, de 15,5 para 12,2%; a classe E de

26,1 para 16,5% (Scalon & Salata, 2012). Além disso, com base nos dados fornecidos pelo

IBGE (CNAE, IBGE, 2013), pode-se concluir que o índice de emprego no Brasil é alto, o

que significa mais possibilidades de mudança de emprego e, portanto, mudança das

relações e vínculos de trabalho. Pode ser um dado circunstancial que requererá

aprofundamento em novas pesquisas.

Resumindo, a diferenciação da distância do poder em relação aos resultados da

pesquisa de Tanure (2010) pode receber influências da própria constituição do APL de

fundição e da natureza das operações desse segmento da economia, caracterizado pelo uso

de mão de obra intensiva, de baixa qualificação e escolaridade. Além disso, a baixa

complexidade do processo produtivo, a necessidade de poucos investimentos para abrir

uma empresa e a dinâmica de seu funcionamento na região pesquisada fazem com que

Page 111: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

109

antigos empregados transformem-se em empregadores sem a devida preparação gerencial

(Castro & Antonialli, 2005). Outras razões envolvem a natureza do trabalho artesanal, a

ineficiência da gestão e de seus controles formais e a alta rotatividade dos funcionários

(FIEMG, 2013). Mudanças na configuração da sociedade brasileira e o contexto atual de

pleno emprego sugerem estudos longitudinais que possam fornecer um mapa analítico da

consequência da mudança do perfil de emprego e do empregado (Scalon & Salata, 2012)

sobre os índices encontrados por Hofstede (1991) e Tanure (2010) em suas pesquisas. A

próxima dimensão é masculinidade x feminilidade.

4.2.2 Masculinidade X feminilidade

Embora as sociedades possuam um número próximo de homens e mulheres, há

diferentes expectativas quanto ao papel que cada gênero desempenha. Quanto mais

acentuadas são as expectativas de diferenças entre os papéis associados a gênero, uma

sociedade poderá ser considerada mais masculina ou mais feminina (Tanure, 2010).

Segundo Hofstede (1991) homens e mulheres têm valores mais duros nas sociedades

masculinas e mais suaves nas femininas. Em sociedades mais masculinas, valores como

competição, agressividade, carreira profissional, valorização da renda, poder de decisão,

reconhecimento e desafio se destacam, em detrimento da qualidade de vida e dos

relacionamentos (Hofstede, 1991). A mulher deve se sacrificar pela carreira do marido.

Países como Venezuela, Itália, Suíça e Irlanda são exemplos de sociedades masculinas

(Hofstede, 1991).

Em sociedades mais femininas, por outro lado, a expectativa de papéis

desempenhados pelos sexos tem diferenças menos significativas que as masculinas. É o

que ocorre em países como Suécia, Noruega, Dinamarca e Finlândia, que são

Page 112: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

110

caracterizados por relações de trabalho amistosas e harmoniosas, gestão mais participativa

e valorização da qualidade de vida (Tanure, 2010).

Tanure (2010) encontrou os índices 55 e 51, respectivamente, para o grau de

masculinidade no Brasil e em Minas Gerais. Hofstede (1991) encontrou valor parecido

para o Brasil (49), não havendo, portanto, diferença significativa entre as duas pesquisas.

Esses resultados estão representados na Figura 11. Tanure (2010) ressalta que alguns

comportamentos mudaram no Brasil entre sua pesquisa e a de Hofstede (1991). Um

exemplo disso é a participação crescente das mulheres no mercado de trabalho. Os valores,

entretanto, não parecem ter mudado. Essas mulheres podem adotar o modelo masculino

para obter sucesso profissional e continuam se sentindo responsáveis pelo bem-estar da

família. No APL, estudada, o índice de masculinidade x feminilidade indicam uma forte

diferença comparativa, conforme figura 11.

Figura 11. Comparação dos resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e com os

resultados do APL de fundição para o índice masculinidade. Fontes: elaborada pela autora com base em Hofstede (1991), Tanure (2010); pesquisa atual.

O resultado acerca da dimensão mostra um conjunto de empregados caracterizados

pela feminilidade (17%) e representa uma diferença em relação aos estudos que

Page 113: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

111

embasaram a presente pesquisa. Na configuração do APL, empresas têm se originado do

associativismo. É o que propõem Castro e Antonialli (2005) que apontam para a forte

tendência ao trabalho cooperativo nas fundições de Cláudio. Um exemplo é o Programa de

Apoio à Competitividade de Arranjo Produtivo Local que ocorreu em 2012/2013 no APL

de fundição (FIEMG, 2013). O Programa foi criado por intermédio de uma parceria entre o

governo de Minas, o sistema FIEMG, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), o Serviço Brasileiro

de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais (SEBRAE-MG) e o Banco

Interamericano de Desenvolvimento (BID), com apoio do SIFUMG. Foram mais de 15

ações com participação coletiva, podendo contemplar todas as empresas do APL. Nos

APLs, empresas, inclusive concorrentes, se unem para o desenvolvimento coletivo.

Embora as atividades industriais sejam, em geral, marcadas pela masculinidade, no

APL de fundição os traços de feminilidade se revelaram. Segundo Hofstede (1991), as

culturas industrializadas masculinas têm vantagem competitiva, principalmente em

atividades que requerem eficácia, qualidade e rapidez. Já as femininas têm vantagens

relativas em serviços, fabricação adaptada às especificações do cliente e em atividades que

envolvem matéria viva. O processo produtivo nas empresas do APL ainda é, em grande

parte, artesanal (FIEMG, 2013), o que poderia também ser uma das razões de o APL ter

sido marcado pela feminilidade. É importante ressaltar que traços de feminilidade

identificam a cooperação e a solidariedade, em oposição aos masculinos, que privilegiam o

individualismo e a competição, conforme Hofstede (1991). Outro fator encontrado que

pode ter relação com a feminilidade é a baixa educação formal dos funcionários do APL, já

detalhada no item anterior. Segundo Tanure (2010), esse fator está relacionado a

sociedades femininas.

A dimensão predominantemente feminina sugere que, no APL, prevalecem

características como valorização de relações de trabalho amistosas e harmoniosas, com

Page 114: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

112

ajuda profissional e pessoal, criando oportunidade de cooperação e relacionamento. O

nível de estresse é mais baixo do que em culturas com superioridade masculina. Outra

característica que se destaca em sociedades mais femininas é o pacifismo (Tanure, 2010).

Assim, é importante refletir se a passividade e a tentativa de evitar conflitos, características

culturais brasileiras mencionadas por Oliveira e Machado-da-Silva (2001) e Tanure e

Prates (1996), influenciam o comportamento do grupo pesquisado, favorecendo um

eventual comodismo e atuação dentro da zona de conforto.

No ambiente empresarial, as culturas femininas valorizam a humanização do

trabalho, com recompensas que atendem às necessidades do indivíduo. Além disso, os

dirigentes mais valorizados são aqueles que conseguem a colaboração da equipe sem a

necessidade de se impor pela autoridade (Tanure, 2010).

Ao analisar a relação entre os resultados dessa dimensão com outras variáveis

levantadas na pesquisa, observa-se que o índice de masculinidade foi mais baixo

justamente nas áreas comerciais, entre os proprietários e o administrativo (Figura 12).

Figura 12. Índice de masculinidade por área. Fonte: elaborada pela autora.

O fato de as áreas – comercial, proprietário, administrativo e diretoria – responsáveis

pelas associações e por manter as relações com outras instituições e empresas terem o

Page 115: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

113

índice mais baixo que as demais pode ajudar a compreensão de que a natureza do APL

pode ter influenciado o resultado. Esse grupo apresentou o resultado menor que o das áreas

que se concentram nas atividades internas da empresa. Cabe ressaltar, que a área comercial

que representada na figura 12, se refere a equipe que faz a parte burocrática da

comercialização. No caso das empresas estudadas, a venda dos produtos, que em geral traz

valores mais competitivos, é realizada pelos representantes externos, que não são

funcionários da empresa.

Uma característica da cultura brasileira, de acordo com Oliveira e Machado-da-Silva

(2001), é o personalismo. Essa característica, que é muito associada ao paternalismo, ao

favoritismo e à ênfase nas relações pessoais, possui semelhança com os elementos da

dimensão feminina sugerida por Hofstede (1991). O paternalismo ou matriarcalismo são

representados por atitudes de proteção dos filhos ou, no contexto organizacional, dos

empregados. Nesse tipo de relação é importante questionar se a submissão do empregado

assemelha-se à da relação pai-filho, em que se pactua o respeito, ou a uma relação

superior-subordinado, expressando a hipossuficiência do trabalhador.

Ao relacionar a dimensão masculinidade/ feminilidade com a faixa etária dos

respondentes, obteve-se uma correlação moderada, com r2=0,6. Como já mencionado,

quanto mais próximo de um, maior é a correlação entre as variáveis. A Figura 13 ilustra

que, quanto menor a faixa etária dos respondentes do APL, mais alto é o índice de

masculinidade. Ou seja, os mais velhos tendem a ter características mais ligadas à

feminilidade.

Page 116: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

114

Figura 13. Relação entre o índice de masculinidade e idade do respondente. Fonte: elaborada pela autora.

Essa relação, destacada por Hofstede (1991, p. 129), ressalta que “a relação entre o

grau de masculinidade e a idade é bastante evidente e parece ser universal”. A conclusão

da pesquisa portanto, corrobora os pontos levantados por Hofstede (1991). O autor explica

que essa tendência deve seguir a pessoa ao longo da vida, sendo que, entre os jovens, os

interesses são mais técnicos, considerados mais masculinos. Já os interesses dos mais

velhos passam a ser mais sociais. Em se tratando de valores, os mais velhos são geralmente

melhores gestores de pessoas; e os mais jovens, melhores técnicos.

Na extensão de um estudo de natureza longitudinal a ascensão de uma mulher à

Presidência do país em 2011 deve merecer atenção diferenciada. Embora o gênero não

defina o estilo de gestão (um homem pode adotar gestão feminina ou uma mulher, estilo de

gestão masculina), o fato é que a sociedade brasileira elegeu uma mulher, o que também

representa símbolos e valores da cultura que, por sua vez, transborda para outros níveis e

status sociais. Entretanto, Hofstede (1991) ressalta que a progressão das mulheres na

política é mais fácil e rápida do que nos negócios. Assim, isso pode ser considerado uma

Page 117: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

115

influência, mas não é possível concluir que tenha produzido efeito concreto nos resultados

obtidos.

Em resumo, os resultados mais femininos desse índice no APL de fundição podem

estar associados à natureza específica de formação dos APLs (agrupamento com

cooperação e solidariedade), o que é reforçado pelo argumento de que os mais baixos

índices de masculinidade foram encontrados entre os proprietários. Outro fator que pode

ter influenciado o resultado é a baixa escolaridade dos profissionais do APL, conforme

descrito neste capítulo.

4.2.3 Individualismo X coletivismo

Para Hofstede (2003), a maioria das pessoas habita sociedades nas quais o interesse

do grupo prevalece sobre o interesse do indivíduo. O autor denominou essas sociedades de

coletivistas. Embora a palavra coletivismo possa ter conotações políticas, Hofstede (1991)

defende que a mesma não deve ser entendida como tal, pois não se refere ao poder do

Estado sobre o indivíduo, mas ao poder do grupo. Apenas pequena parte dos habitantes do

planeta vive em sociedades em que os interesses do indivíduo prevalecem sobre os

interesses do grupo. A essas sociedades, Hofstede (1991) denominou individualistas. Nessa

dimensão, quanto mais perto de 100, mais alto o grau de individualismo. Tanure (2010)

complementa a conceituação, distinguindo as sociedades individualistas das coletivistas,

em que a primeira é voltada para si mesma e a segunda, para os objetivos e metas comuns.

Apesar de todas as pesquisas mostrarem o perfil coletivista em função dos resultados

serem abaixo de 50, o resultado do APL demonstra um perfil mais coletivista em

comparação à pesquisa empreendida por Tanure (2010). O APL apresentou o resultado de

Page 118: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

116

33, enquanto a pesquisa de Tanure (2010) encontrou os índices de 41 e 44 para o Brasil e

Minas Gerais, respectivamente, e o resultado da pesquisa de Hofstede (1991) para o Brasil

foi de 38. Ressalte-se que valores próximos de zero indicam elevado grau de coletivismo.

A Figura 14 indica os resultados das pesquisas.

Figura 14. Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e os

resultados obtidos no APL de fundição para a dimensão individualismo. Fontes: elaborada pela autora com base em Hofstede (1991) e Tanure (2010); pesquisa atual.

Os índices encontrados nas pesquisas anteriores indicam que no Brasil as pessoas,

desde o nascimento, estão integradas em grupos fortes e coesos (especialmente

representados pela família expandida, incluindo tios, tias, avós e primos), que continuam a

proteger os seus membros em troca de lealdade (Tanure, 2010). Esse é um aspecto

importante também na dinâmica empresarial brasileira, em que se espera que um familiar

empregue outro ou que dê preferência para pessoas relacionadas ao seu núcleo social

(Tanure, 2010). Assim, no mundo dos negócios, e de modo particular no mundo de

negócios mineiro, como reflete Tanure (2010), é importante construir confiança e

relacionamentos duradouros para concretizar iniciativas comerciais.

Page 119: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

117

Na sociedade brasileira, a família sempre exerceu papel muito importante, em função

de sua estrutura paternalista, rural e autossuficiente. Isso permanece forte nos dias de hoje,

principalmente pela coesão interna e pela grande rede de parentes, incluindo os que o são

por afinidade e por compadrio, padrinhos e afilhados, muitos deles não consanguíneos.

Esta é uma contraposição à maioria das sociedades individualistas, em que a família é

formada pelo núcleo pai, mãe e filhos (Tanure, 2010). O grupo de pertença constitui a

identidade do indivíduo e a proteção contra as dificuldades da vida. Assim, o indivíduo

deve lealdade vitalícia ao seu grupo, desenvolvendo uma relação de dependência que é, ao

mesmo tempo, prática e psicológica. As características coletivistas interagem com a faceta

personalista brasileira, com ênfase nas relações pessoais. O personalismo influencia

fortemente o estilo brasileiro de gestão, fazendo uma mediação entre o coletivo e o

individual. Todos têm consciência de que possuem direitos iguais e estão sujeitos às

mesmas regras e leis (Tanure, 2010).

No nível pessoal, entretanto, os amigos estão acima da lei e têm direitos especiais. A

decisão é tomada em relação à importância ou necessidade da pessoa envolvida,

sobrepondo-se às necessidades da organização (Tanure, 2010). Outra consequência é que

se torna necessário estabelecer uma relação de confiança antes de qualquer transação

comercial e essa confiança é dada às pessoas e não a empresas ou entidades (Hofstede,

1991).

Em sociedades com essas características, as relações entre as pessoas tendem a ser

mais harmoniosas e fortes, com tendência a evitar conflitos. Os valores coletivistas que

mais se destacam são trabalho em equipe e cooperação. O interesse do grupo prevalece

sobre o do indivíduo. Nas organizações, isso pode refletir em aspectos funcionais e

disfuncionais. Sinergias podem derivar de esforços combinados de pessoas com

habilidades diferentes. Além disso, os funcionários podem desfrutar de uma rede de

Page 120: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

118

suporte social e são mais facilmente mobilizados pelo líder. Por outro lado, pode haver

perda de personalidade em favor do grupo ou organização, criando, assim, mais

dependência emocional para a organização ou uma tentativa de usufruir o resultado do

esforço dos outros. Os conflitos tendem a ser evitados para a manutenção da harmonia do

grupo (Hofstede, 1991).

O coletivismo também pode se caracterizar por promoções que seguem critérios de

confiança, lealdade, antiguidade e processos seletivos que envolvem a capacidade de

inserção do indivíduo no grupo. O relacionamento entre empregador e empregado é

semelhante às relações na família, com a empresa oferecendo proteção em troca de

lealdade, e as avaliações focam mais os benefícios para o grupo do que para os indivíduos

(Tanure, 2010). O fato de ser um APL com foco no desenvolvimento e ganhos coletivos, e

não apenas individuais, como já descrito, pode ter contribuído para um resultado mais

coletivista do que os apresentados em pesquisas anteriores em Minas Gerais e no Brasil.

Hofstede (1991) encontrou uma relação direta entre esse individualismo e a riqueza

nacional e faz algumas ponderações sobre a relação entre causa e efeito das variáveis. O

autor explica que, se o individualismo fosse a causa, o crescimento econômico deveria ser

maior nos países individualistas, o que não se comprovou, tendo sido encontrada,

inclusive, uma relação negativa: os países ricos mais individualistas mostram menos

desenvolvimento econômico do que os menos individualistas, como aconteceu com os

Estados Unidos (individualista) e o Japão (coletivista). A correlação mais forte entre

riqueza e as dimensões propostas por Hofstede (1991) foi a deste índice de individualismo

sendo que no APL essa situação se repetiu, já que tanto o índice quanto o PIB per capita

foram mais baixos em comparação com o Brasil e com Minas Gerais. Essa relação entre

riqueza e índice de individualismo também ocorreu no APL, conforme indicado na Figura

15:

Page 121: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

119

Figura 15. Relação entre o PIB per capita (2010) e o índice de individualismo. Notas explicativas: PIB per capita, calculado de 2010, última informação disponível. PIB per capita do APL

calculado pela soma do PIB de Cláudio, Divinópolis e Itaúna, dividido pelo número de habitantes dessas

mesmas cidades.

Fonte: elaborada pela autora com base em PIB per capita: Atlas do Desenvolvimento Humano (2013)

(PNUD, FJP, IPEA); índice de individualismo do Brasil e Minas Gerais de Tanure (2010); índice de

individualismo do APL calculado nessa pesquisa.

A Figura 15 ilustra que o índice de individualismo e o PIB per capita do APL são

mais baixos do que no Brasil e em Minas Gerais e que há relação direta entre as duas

variáveis, ou seja, quanto maior o PIB per capita, maior o individualismo, confirmando a

pesquisa de Hofstede (1991). O autor destaca que “a estreita relação entre riqueza e

individualismo é inegável, com o sentido da causalidade da primeira para a segunda”. Com

a evolução das sociedades e o aumento da riqueza, a tendência é que esse índice também se

torne cada vez mais alto.

O fato de o APL de fundição ter apresentado índice de individualismo mais baixo do

que em pesquisas anteriores, principalmente entre os proprietários, indica uma cultura mais

coletivista e pode estar associado à própria natureza e condição do APL como cluster. Na

concepção de Porter (1998), são concentrações geográficas de empresas e instituições

interconectadas em um determinado segmento, organizando a cadeia de valor de forma

Page 122: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

120

particular. A cooperação é esperada, inclusive entre concorrentes, apesar de não eliminar a

competição principalmente em termos de mercado, e a solução para alguns problemas pode

ser de forma coletiva. A coexistência da cooperação e competição permite os ganhos de

eficiência, efetividade e flexibilidade (Porter, 1998). É possível, portanto, estender o estudo

para identificar quais fatores contribuíram para o mais elevado índice de coletivismo

encontrado no APL: a) a dinâmica de funcionamento de um APL, que supõe: cooperação;

contratação de serviços compartilhados; distribuição e comercialização em comum; b)

renda per capita inferior às médias mineira e brasileira, o que requer laços mais fortes de

solidariedade no grupo, que precisa assegurar meios de autoproteção.

4.2.4 Necessidade de controlar as incertezas

De acordo com Hofstede (2003), o termo controle da incerteza, emprestado da

Sociologia Organizacional norte-americana, é uma necessidade presente em todas as

instituições humanas e em todas as sociedades. O autor destaca que, “como seres humanos,

temos de enfrentar o fato de não sabermos o que irá acontecer amanhã: o futuro é incerto e

temos que viver com esta realidade” (Hofstede, 2003, p. 132). Assim, continua o autor, os

indivíduos buscam formas de controlar a incerteza por meio da tecnologia, das leis e da

religião. A forma como as pessoas sentem e enfrentam essa incerteza depende de cada

cultura e fazem parte da programação mental de uma sociedade. O índice proposto por

Hofstede mede o grau de inquietude dos habitantes diante de situações desconhecidas ou

incertas (Hofstede, 1991). Para Tanure (2010), a necessidade de controle da incerteza se

expressa pela necessidade ou não de evitá-las com artifícios como a religião, as regras e as

tecnologias para realizar previsões. Na pesquisa de Hofstede (1991), o índice registrado

para o Brasil foi de 76. Já Tanure (2010) obteve 36 para o Brasil e 41 para Minas Gerais.

Page 123: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

121

No APL, o índice mostrou-se muito elevado, chegando a 87, o que revela forte necessidade

de controlar as incertezas, resultado acima das pesquisas anteriores de Hofstede (1991) e

Tanure (2010). A Figura 16 ilustra os resultados dessas pesquisas.

Figura 16. Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e os obtidos

no APL de fundição em relação ao índice de necessidade de controle das incertezas. Fontes: elaborada pela autora com base em Hofstede (1991) e Tanure (2010); pesquisa atual.

O resultado dessa dimensão – necessidade de controle das incertezas - foi o que mais

destoou dos resultados apresentados anteriormente no estado de Minas Gerais. O resultado

de 1980, de Hofstede, pode ser explicado, embora não se pretenda argumentar a respeito,

em virtude da instabilidade econômica e financeira que caracterizou o período pesquisado,

além da pouca maturidade das organizações políticas, ainda em processo de

democratização (Tanure, 2010). Os resultados encontrados por Tanure (2010) podem ser

interpretados à luz da estabilidade econômica e política conquistada pelo Brasil desde o

final dos anos 1980. Entretanto, não existe uma causa imediata que explique, inicialmente,

o alto índice de necessidade de controle de incertezas encontrado no APL, mais do que o

dobro do estado.

As sociedades com elevada necessidade de controlar as incertezas preferem situações

em que exista uma resposta certa e, por isso, há tendência ao conservadorismo e aversão à

Page 124: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

122

inovação (Hofstede, 1991). As famílias são mais protetoras e ficam constantemente atentas

a iminentes perigos. Em sociedades que também são coletivistas é comum que haja muitas

regras implícitas ou baseadas na tradição. Os indivíduos gostam de estar sempre ocupados

e de trabalhar duro como forma de conseguirem segurança, estima e relacionamento social.

Tendem a preferir cargos técnicos a gerenciais e a desenvolver suas carreiras em

organizações maiores. Normalmente consideram os gestores antigos melhores que os mais

jovens e evitam a competição entre os empregados. Além disso, podem apresentar traços

de resistência a mudanças e visão pessimista sobre os motivos que orientam a empresa,

apesar de sentirem admiração e serem leais a ela (Tanure, 2010).

Um fator que pode influenciar o índice é a alta rotatividade, representada pelo tempo

de casa dos respondentes, 61% possuem menos de 6 anos de casa. Castro e Antonialli

(2005) ressaltam vários fatores que podem ser relacionados ao conservadorismo e à

necessidade de controlar as incertezas no município de Cláudio. Ao descrever o segmento

de fundição na região de Cláudio, os autores indicam baixa inovação, falta de investimento

em pesquisa e desenvolvimento e indústria baseada na cópia de produtos de concorrentes

sem qualquer design próprio. Tal situação enseja um círculo vicioso em que não se inova

por não se dispor de tecnologia; não se dispõe de tecnologia porque não se tem mão de

obra qualificada; e o conjunto dessas condições enseja o baixo conhecimento técnico dos

princípios básicos de fundição, ineficiência na gestão empresarial e campo limitado de

visão e de estratégia dos proprietários. Por não dominarem nem a tecnologia do produto,

nem as inovações possíveis e o comportamento do mercado, os empresários sofrem com as

oscilações deste, o que faz aumentar a ansiedade e a necessidade de controlar as incertezas.

O resultado pode refletir o estágio rudimentar do segmento e a incapacidade gerencial dos

proprietários em controlar as ameaças e aproveitar as oportunidades comerciais e de

produção (FIEMG, 2013).

Page 125: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

123

Outro ponto relevante que pode ajudar a explicar a inversão desse índice em relação à

pesquisa de Tanure (2010) é o achado de uma correlação negativa entre o tamanho das

empresas e a necessidade de controlar as incertezas, ou seja, quanto maior a empresa,

menor a necessidade de controlar as incertezas. É importante observar que, de acordo com

dados do RAIS/MDIC (Brasil, 2013b), na Tabela 13, a maior parte das empresas do APL

em estudo é de pequeno porte.

TABELA 13

Percentual de empresas de fundição por número de empregados em Cláudio,

Divinópolis e Itaúna

N. de empregados Cláudio Divinópolis Itaúna TOTAL TOTAL Acumulado

0 Empregado 9,0% 2,8% 0,0% 5,4% 5,4%

De 1 a 4 10,4% 22,2% 26,9% 17,1% 22,5%

De 5 a 9 14,9% 19,4% 15,4% 16,3% 38,8%

De 10 a 19 9,0% 16,7% 26,9% 14,7% 53,5%

De 20 a 49 28,4% 16,7% 7,7% 20,9% 74,4%

De 50 a 99 23,9% 16,7% 7,7% 18,6% 93,0%

De 100 a 249 3,0% 5,6% 7,7% 4,7% 97,7%

De 250 a 499 1,5% 0,0% 7,7% 2,3% 100,0%

Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

Fonte: RAIS/MTE (Brasil, 2013b).

As empresas pesquisadas também apresentaram características similares, sendo que

22 informaram o número de funcionários que foi, em média, de 60 por empresa.

No tocante à religiosidade no Brasil, não houve mudança significativa da população

que se declarou adepta de uma religião entre os censos de 2000 e 2010, de 92,4 para

91,9%. Desse modo, a diferença significativa entre o índice obtido neste trabalho (87,3) e o

de Tanure (2010), de 36 para o Brasil e 41 para Minas Gerais, não pode ser explicada pelo

viés religioso.

Page 126: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

124

Em suma, os principais fatores que podem ter influenciado para um resultado tão

diferente do APL de fundição em 2013 e a pesquisa realizada em Minas Gerais por Tanure

(2010) podem estar ligados ao tamanho das empresas e também ao apego à tradição, no

que se refere ao modo de produção, à concorrência desleal (FIEMG, 2013) provocada por

empresas informais, à cópia, sem royalties, dos produtos de mercado e ao temor de crises

que possam levar a decréscimo de produção. Outros fatores que contribuíram para lidar

com a necessidade de controlar a incerteza, tais como o avanço tecnológico e as religiões,

não foram averiguados no presente estudo.

4.2.5 Orientação curto prazo x longo prazo

Diferentes culturas abordam a dimensão temporal de formas distintas em função da

importância relativa que conferem ao passado, ao presente e ao futuro (Tanure, 2010).

Nesses termos, a orientação para a vida ou para o trabalho pode ser tipificada como de

longo e de curto prazo (Tanure, 2010).

Na perspectiva de longo prazo, prevalecem a persistência, a tenacidade para atingir

objetivos, austeridade familiar, perseverança e autoridades, voltados para recompensas

futuras. Dessa forma, algumas condutas presentes visam a obter recompensas futuras e

constituem exemplos de valores. Os países que possuem índices mais altos dessa dimensão

são China, Hong Kong, Taiwan e Japão (Tanure, 2010). A orientação de curto prazo é

voltada para o passado e o presente e apoia comportamentos como respeito pela tradição,

solidez e estabilidade pessoais, reciprocidade de favores, oferendas e gentileza. Paquistão,

Nigéria, Grã-Bretanha e Estados Unidos são mais orientados para o curto prazo (Tanure,

2010).

Page 127: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

125

Essa dimensão obteve resultado 61 no APL, demonstrando tendência à orientação

mais a longo prazo. O resultado se aproxima dos valores encontrados por Hofstede (1991)

e Tanure (2010), 65 e 63, respectivamente, para o Brasil. O índice para Minas Gerais, na

pesquisa de Tanure (2010), foi de 68.

Figura 17. Comparação entre os resultados das pesquisas de Hofstede, Tanure e os

resultados do APL de fundição em relação ao índice orientação de curto versus longo

prazo. Fontes: elaborada pela autora com base em Hofstede (1991) e Tanure (2010); pesquisa atual.

Algumas práticas administrativas coerentes com a orientação a longo prazo são a

garantia de emprego, foco na solução de problemas relacionados ao futuro, relações

duradouras, austeridade, perseverança e respeito à tradição. O Brasil apresenta algumas

características que sustentam o resultado, seja pelo alto nível de adaptabilidade pessoal,

importância do status, dos relacionamentos e do tempo necessário para tecê-los. O que

pode ter diferenciado os índices brasileiros dos índices mais elevados dos países asiáticos

pode ter sido o fator persistência, que não é reconhecido como uma característica brasileira

(Tanure, 2010).

Page 128: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

126

Minas Gerais teve um índice mais alto que a maioria dos estados brasileiros na

pesquisa de Tanure (2010). Isso se atribui, por exemplo, à importância dada à persistência

e perseverança, que marcaram a economia mineira. Fundada na mineração, no garimpo e

na siderurgia, a cultura regional pode ter incorporado as dimensões temporais dos

investimentos do estado. É em Minas Gerais, por exemplo, que estão as empresas

siderúrgicas mais antigas do Brasil, embora tenham mudado de controle acionário ao longo

dos anos, como foi o caso Belgo-Mineira, Arcelor, Arcelor Mittal.

Um dos fatores que podem ter levado o índice do APL a ser ligeiramente inferior aos

índices brasileiro e mineiro pode estar relacionado à mão de obra. A demanda por

profissionais é alta, reduzindo o comprometimento dos empregados com o trabalho e

empresa, uma vez que conseguem facilmente trocar de empresa, levando as fundições a

buscarem programas de incentivo para diminuir a rotatividade (Castro & Antonialli, 2005).

Assim, o contrato de longo prazo e a estabilidade que sempre marcaram os setores de

mineração e siderurgia podem estar sendo substituídos pelas perspectivas de curto prazo

oferecidas pelas novas empresas e diversificação econômica da vocação do estado de

Minas Gerais.

4.3 Dimensões culturais do APL: possíveis explicações

Diversas são as diferenças entre os resultados encontrados na pesquisa atual no APL

de fundição de Cláudio, Divinópolis e Itaúna e os resultados de pesquisas anteriores,

principalmente de Tanure (2010), em Minas Gerais, a mais atual e desenvolvida no mesmo

estado do APL.

A maior diferença está na dimensão necessidade de controlar as incertezas, na qual o

resultado de Tanure (2010) foi 41 e do APL 87, representando uma inversão do resultado.

Page 129: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

127

A diferença no índice de masculinidade também foi alta, sendo o resultado para Minas

Gerais 51 e para o APL, 17. Distância de poder e individualismo também apresentaram

resultados diferentes entre as pesquisas, entretanto com diferença menor. Os valores mais

próximos ficaram para a orientação curto x longo prazo.

Nos itens anteriores, cada uma dessas dimensões foi analisada separadamente, de

acordo com o contexto da pesquisa; e vários fatores foram identificados como possíveis

causas dessas diferenças. Entre esses fatores estão os da própria natureza de APL e outros

clusters, as particularidades do APL em questão e fatores longitudinais e/ ou contextuais,

uma vez que se passaram mais de 10 anos entre as pesquisas.

Para efeito de síntese, buscou-se listar as explicações possíveis e vinculá-las aos

índices encontrados. Não se trata, evidentemente, de buscar nexos causais entre índices e

fatores internos ou conjunturais do APL, mas de registrar possibilidades de explicações

que podem ser objeto futuro de aprofundamento.

A Tabela 14 retrata, de um lado, as cinco dimensões estudadas e, de outro,

explicações conjunturais ou inferenciais decorrentes de informações da FIEMG, de Castro

e Antonialli (2005), e de outras fontes identificadas na Tabela. Procura-se, assim, levantar

aspectos descritores que possam ter influenciado os resultados da pesquisa e abrir novas

perspectivas de estudos complementares, expondo possíveis desigualdades regionais em

um país e em um estado com diversidade e dimensão singulares.

O cruzamento entre uma explicação possível e o índice de determinada dimensão é

representado por um “X”.

Page 130: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

128

TABELA 14

Possíveis relações entre os fatores e os resultados das dimensões da pesquisa atual

Dis

tân

cia

do

Po

der

Mas

culi

nid

ade

Ind

ivid

ual

ism

o

Nec

essi

dad

e d

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das

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cert

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Pra

zo d

e o

rien

taçã

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Fatores da natureza de APLs Relação de cooperação entre as empresas (Cassiolato & Lastres, 2003) X X

Fatores característicos do APL de fundição da RCOMG Constituição do APL por associações (Castro & Antonialli, 2005) X X X

Os próprios funcionários fundam novas empresas (Castro & Antonialli, 2005) X X

Baixo nível de escolaridade (Castro & Antonialli, 2005) X X

Natureza do trabalho artesanal (FIEMG, 2013) X

Ineficiência da gestão e de controles formais (FIEMG, 2013) X X

Alta rotatividade dos funcionários (FIEMG, 2013) X X

Tradição do setor ou práticas conservadoras do setor (Castro & Antonialli, 2005) X

Concorrência desleal (Castro & Antonialli, 2005) X

Tamanho das empresas (IEL/MG & SIFUMG, 2003) X

Fatores longitudinais e / ou conjunturais Ascensão da classe média (Scalon & Salata, 2012) X

PIB per capita da região (Atlas do Desenvolvimento Humano, 2013) X

Fonte: elaborada pela autora.

Embora não se pretenda esgotar as explicações possíveis com os descritores

levantados, estes podem ser úteis para a extensão de estudos similares ao presente ou

mesmo para embasar pesquisas de natureza qualitativa, no mesmo segmento ou em outros

APLs.

Vários fatores que se destacaram no APL podem ser explicados pelo modelo de

funcionamento das empresas de fundição, o qual há mais de 60 anos se instalou na região e

estabeleceu o conceito de associativismo. A expansão do setor levou funcionários a

tornarem-se pequenos empresários, multiplicando-se o número de empresas sem, no

entanto, incrementar inovações no setor. Esse modelo veio a ser o embrião do que mais

tarde formaria o APL de fundição (Castro & Antonialli, 2005).

Page 131: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

129

O modelo mais antigo de funcionamento do segmento de fundição no setor pode ter

sido o molde organizacional que veio a ser a base de outras empresas, de diferentes

segmentos. Assim, de certa forma, pode-se afirmar que o êxito de determinados valores

incutidos pelas empresas de fundição pode ter sido um influenciador do modelo adotado

por outras empresas. Cabe ressaltar, entretanto, que, apesar da alta rotatividade, os

funcionários tendem a trocar de empresas dentro do mesmo setor pela especialização

adquirida, ou seja, já estão há pouco tempo em uma empresa, mas mais tempo em

fundição.

A cultura do APL também pode ser comparada com a brasileira, tendo como corte

poder, relações pessoais e flexibilidade como articuladores do sistema cultural. Esse

sistema está estruturado em quatro subsistemas: líder – liderado; institucional – pessoal

(Tanure, 2010). No APL de fundição, o sistema líder – liderado pode ter uma relação

difusa. No Brasil, essa relação também é dinâmica, pela forma como surgiram e continuam

a surgir as novas empresas, tornando essa uma relação potencialmente volátil. Um liderado

pode abrir sua própria empresa e se tornar um concorrente do seu antigo líder e líder de

seus antigos pares. A gratidão e a lealdade ao antigo líder podem fortalecer a rede de

relacionamentos que foi estabelecida no APL, tornando-se, portanto, difícil, no contexto

brasileiro, a permanência de índices homogêneos nos diferentes segmentos e portes de

empresa.

Por outro lado, o subsistema institucional – pessoal também é dinâmico e relativo,

atuando de forma pessoal e impessoal. A flexibilidade torna-se o grande articulador desses

sistemas (Tanure, 2010). As interseções entre os sistemas destacam quatro traços culturais

brasileiros, descritos a seguir de forma comparativa com o APL.

A cultura de concentração de poder e postura de espectador reflete-se no

protecionismo e dependência, paternalismo e mandonismo. Nas empresas aparece em

Page 132: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

130

forma de baixa iniciativa, pequena capacidade de realização por autodeterminação e

transferência da responsabilidade para os líderes, atitudes que podem ser interpretadas

como preguiça e falta de segurança para assumir responsabilidades, levando o líder a se

sentir poderoso e indispensável, formando um círculo vicioso (Tanure, 2010). Assim, em

vez de interdependência entre agentes organizacionais (líderes e liderados), forma-se a

relação de dependência, em que um determina o que o outro deveria, por si mesmo, ser

capaz de fazer sem que fosse preciso a determinação superior.

Outro traço encontrado, qual seja, o personalismo e a evitação de conflito, fazem com

que a desigualdade de poder e a forte dependência criem potencial para geração de

conflitos que, no Brasil, requer a intermediação de terceiros para se chegar a um bom

termo nas negociações relativas a conflitos. Evita-se, assim, o constrangimento entre as

pessoas e para não comprometer a suposta harmonia do grupo, os conflitos não são

tratados diretamente (Tanure, 2010).

No APL, a distância do poder é menor que no Brasil e Minas Gerais e apresenta

também traços mais coletivistas. Isso pode levar a uma relação um pouco mais próxima

entre o líder e liderado. A baixa complexidade do processo produtivo faz com que alguns

empregados consigam levar avante empreendimento próprio, conduzindo consigo ex-

colegas que passam formalmente a ser seus empregados, mas continuam, ainda que em

outra perspectiva, a permanecer na mesma rede social externa ao trabalho. Exatamente

para manter o relacionamento social, a forma que encontram para lidar com essa situação

pode ser, justamente, a de evitar conflitos, característica feminina que apresentou índice

mais alto no APL comparado a outras pesquisas em Minas Gerais. Conforme indicado por

Tanure (2010) como característica brasileira, esse liderado está habituado desde a infância

com uma estrutura hierarquizada e o rompimento não é instantâneo. O processo decisório

poderia ser desenvolvido e exercitado de forma a evitar a formação da informalidade e

Page 133: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

131

concorrência desleal destacadas por FIEMG (2013) e consideradas prejudiciais para todo o

setor. Essa informalidade também pode levar a controles gerenciais falhos e ocasionar

sentimento de incerteza, explicando o elevado índice de necessidade de controlar as

incertezas no APL pesquisado.

Traços culturais fazem as ligações entre os subsistemas, evitando rupturas que são

paternalismo, medo de errar, ambiguidade e lealdade às pessoas. O paternalismo é

resultado da combinação da concentração de poder e do personalismo e está relacionado à

representação supridora e afetiva do pai pelo líder (Tanure, 2010). Em contraponto ao

paternalismo está o medo de errar, o que reforça a postura de espectador e a atitude de

evitar o conflito.

A ambiguidade, pela inversão de resultados da dimensão necessidade de controlar as

incertezas entre a pesquisa de Hofstede (1991) e Tanure (2010), levou esta autora a utilizar

a expressão ambiguidade no lugar de formalismo. Entretanto, no APL, essa dimensão está

mais ligada à tradição (Castro e Antonialli, 2005) e às incertezas do ambiente (ABIFA,

2013). Os controles gerenciais formais (FIEMG, 2013) ineficazes, também demonstram

que o formalismo não faz parte do contexto do APL de fundição e que o termo

ambiguidade parece ser mais adequado. As regras não são claras, deixando margem para

manobra, principalmente pelos que ocupam o poder (Tanure, 2010). Do outro lado da

ambiguidade está a lealdade às pessoas, que no APL pode ser representada pela teia de

relacionamentos; e mesmo concorrentes apresentam “espírito de cooperação entre os

empresários” (Castro & Antonialli, 2005, p. 59).

A flexibilidade é o grande traço articulador da sociedade relacional brasileira.

Apresenta duas principais características: adaptabilidade e criatividade. A adaptabilidade é

a agilidade de ajuste das empresas dentro de limites prefixados. A criatividade tem um

elemento inovador e está permeada pela afetividade (Tanure, 2010). Esses traços estão

Page 134: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

132

fortemente enraizados no Brasil e podem ser a opção para o aumento de competitividade e

performance do APL, utilizando-se principalmente as forças de se atuar em conjunto.

Os resultados, justamente pelas diferenças apresentadas, em comparação com

pesquisas de Hofstede (1991) e Tanure (2010), sugerem que há um universo de pequenos

empreendimentos em clusters caracterizados por baixa organização e competitividade

empresarial, dependentes de compartilhamento de recursos escassos, que precisam ser

considerados em suas especificidades. As pesquisas acadêmicas, até mesmo pelo

patrocínio de grandes empresas e financiamentos públicos, geralmente dão preferência a

estudos em grandes corporações, produzindo teorias ou sistematizando informações que

não se aplicam, no todo ou em parte, a regiões e empresas menos desenvolvidas e cujos

empregados podem até mesmo não dispor de recursos cognitivos para entenderem o que

deles se pede em uma pesquisa. São pontos a serem considerados, não necessariamente que

sustentem os resultados apresentados.

Page 135: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

133

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste capítulo serão abordadas as considerações finais, as limitações da pesquisa,

bem como as possibilidades e recomendações para estudos futuros com o mesmo tema e

recortes semelhantes. O término de um trabalho de pesquisa é, recorrentemente, o início de

outros trabalhos. A limitação de tempos, recursos, o recorte escolhido para análise,

impõem que o pesquisador defina a sua moldura, embora o quadro seja bem maior.

Optou-se por um estudo de natureza quantitativa que é o primeiro limite desse

trabalho. Para contornar esse limite, optou-se por explicitar os conceitos e conteúdos

associados a cada categoria proposta pelos autores que formaram o eixo do trabalho:

Hofstede (1991) e Tanure (2010). Por meio de estudos cruzados, procurar possíveis

interpretações para os achados de pesquisa, como às relacionadas ao processo de formação

do APL e a gênese associativa das empresas estudadas.

As diferenças entre os achados de pesquisa não invalidam as escalas utilizadas por

Hofstede (1991) e Tanure (2010). Ao contrário, pode indicar que o campo é fértil e está

aberto. Pode, por exemplo, indicar as diferenças entre os brasis: os do sul e os do norte; os

das capitais e aqueles do interior. Os que produzem patentes e produtos com alto valor

agregado e aqueles que sobrevivem entre a artesania e a indústria de ponta. O Brasil é um

país capaz de deter a mais avançada tecnologia na indústria de aeronaves de médio porte e

ainda conviver com condições sub-humanas de produção. A indústria da fundição, como a

estudada, é caracterizada pela informalidade, pelo pouco valor agregado, pelo sistema mais

rudimentar de produção (FIEMG, 2013). Pode-se pensar que políticas públicas que

incentivem a agregação de valor, que exijam capacidades e competências mais elevadas,

podem alterar os resultados alcançados nesta pesquisa. É o caso, por exemplo, da região de

São José dos Campos, apenas para citar um cluster, em que as universidades, os centros de

Page 136: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

134

pesquisa e a indústria de ponta produzem indicadores sociais e econômicos que inscrevem

o Brasil dentre os países mais desenvolvidos (Luz, Minari & Santos, 2010). Portanto, é

preciso correlacionar o estudo da cultura com os aspectos dinâmicos da sociedade, pois o

estudo da cultura, como bem propõe Schein (2009), precisa ir além do visível e avançar na

identificação de fenômenos que estão abaixo da superfície e que possuem impactos

significativos na gestão.

Este trabalho, apesar das limitações já apontadas, constitui uma contribuição da

academia às empresas cujo porte ou meio de produção não despertam interesse na maioria

dos pesquisadores. No caso particular, além do porte pequeno das empresas, a base

trabalhada foi um modelo de organização relativamente recente, o APL, que, assumindo

inicialmente a forma de distritos industriais, na década de 1980, na Europa, vem se

espalhando por vários países ou núcleos dentro de um mesmo país. Tal fenômeno se

explica tanto pela eficácia da estratégia do modelo de promover o fortalecimento de

empresas de um mesmo setor econômico por meio da cooperação entre elas para

incremento de sua competitividade, como por significar o único meio de sobrevivência

para pequenos empreendedores e pessoal de baixa qualificação, pouco apto a concorrer no

mercado regional, nacional e internacional.

Ao estudar a cultura organizacional em um APL, a presente pesquisa distinguiu-se,

de certo modo, de estudos que comparam dimensões culturais em uma mesma organização

localizada em diferentes regiões, seja no mesmo país ou não. Essa diferenciação se dá pelo

fato de que a presente pesquisa, apesar de não apresentar novidade em relação ao recorte

epistemológico, propõe a análise das dimensões culturais de uma “organização de

organizações”, ou seja, um conjunto formado por organizações que, apesar de pertencerem

ao mesmo setor - fundição -, são distintas e, portanto, possuem características específicas e

cultura organizacional própria. Ainda que, inicialmente, elas tenham sido concorrentes por

Page 137: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

135

atuarem no mesmo setor econômico e no mesmo território, as empresas possuíam objetivos

semelhantes capazes de unificar alguns procedimentos básicos por meio do APL.

Ao mesmo tempo em que possui diferenças, este estudo aproxima-se das demais

pesquisas pelo interesse comum em investigar a cultura organizacional e por entender que

investigações dessa natureza contribuem para orientar e ampliar a visão de gestores

empresariais sobre a realidade subjetiva das organizações em que atuam. Adicionalmente,

entende-se que a academia também é beneficiada com os achados de pesquisas e com as

novas perspectivas de estudo. Ainda que a cultura organizacional seja invisível e subjetiva,

como mencionado anteriormente, instrumentos científicos de pesquisa como o de Hofstede

(1994), auxiliam na mensuração e comparação entre índices, facilitando a compreensão e a

tomada de decisão em relação a determinados fenômenos organizacionais. É provável que

as estratégias e ferramentas de gestão de pessoas possam se beneficiar com os resultados

obtidos. Os treinamentos, os processos de seleção, a gestão de mudanças, devem levar em

conta que o discurso organizacional não pode ser o mesmo de empresas, por exemplo, que

se configuram pelo índice de masculinidade.

Como destaque, é importante mencionar a diferença significativa entre os resultados

da dimensão “necessidade de controle das incertezas”, que apresentou índice de 87,3 para a

presente pesquisa em contraponto aos estudos empreendidos por Tanure (2010), que

sugeriram índices de 36 para o Brasil e 41 para Minas Gerais. Para se obter resposta para

essa diferença, sugere-se que novos estudos sejam conduzidos. O resultado também pode

estar associado ao tamanho das empresas, relação destacada por Tanure (2010). Como

possível trilha, uma resposta pode estar no reconhecimento, ainda que não verbalizado, da

incapacidade de tais empresas de poderem reagir e buscar alternativas para as mudanças no

mercado. A combinação desse índice com “feminilidade”, pode representar um sinal de

alerta às empresas pesquisadas. Pode indicar o pacifismo em relação às condições atuais,

Page 138: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

136

por exemplo, a contratação por empreitada com metas de produção diária baseadas em

parâmetros antigos e que resultam, em funcionários terminarem o expediente a tempo de

trabalhar para o concorrente ou para si, em uma dinâmica onde novas empresas de

fundição surgem constantemente.

Ainda que pesquisas sobre cultura ofereçam os elementos para a compreensão dos

fatores “invisíveis”, mas “poderosos”, como menciona Schein (2009), é necessário

ressaltar que estudos como o presente possuem possibilidades e limitações e, por esses

motivos, precisam ser compreendidos dentro do panorama em que foram circunscritos.

A contribuição deste trabalho deve se somar a outras, passadas e futuras, para que as

questões organizacionais, notadamente complexas, sejam conduzidas com o entendimento

e responsabilidade que demandam. Sugerem-se comparações com novas pesquisas, pois,

durante o trabalho de campo, novas questões como “quais são os traços culturais que

orientam as práticas gerenciais das empresas do APL?”; “quais são os traços culturais que

fundamentam as práticas comerciais das empresas do APL e que favorecem a sua

competitividade?”; “em que medida a cultura regional e do setor de atuação (simbolizados

pelo APL) influenciam a cultura organizacional?”; “esse resultado se replicaria em outros

APLs de Minas Gerais como no polo de confecção de Divinópolis que, segundo FIEMG

(2013), é o maior do estado?”; “o resultado se replicaria em outras empresas que não fazem

parte do APL e estão na mesma região?”; “quais são os fatores que influenciam as culturas

das organizações do APL de fundição?” e “quais são as características das lideranças do

APL que estão conduzindo as empresas para mais competitividade?”

Adicionalmente, estudar um APL sob a égide das dimensões culturais de Hofstede

(1991) é especialmente interessante, por ser possível comparar os resultados com estudos

anteriores bem como avaliar como a própria natureza de cooperação do APL pode ter

influenciado o resultado da dimensão da masculinidade, que apresentou mais tendência à

Page 139: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

137

feminilidade em comparação com os estudos de Hofstede (1991) para o Brasil e de Tanure

(2010) para o Brasil e Minas Gerais. O resultado foi menor, ou seja, mais feminino,

exatamente para os responsáveis pelas negociações, associações, participação em

treinamentos/consultorias e manutenção de relações com instituições e empresas.

Os principais desafios gerenciais do setor analisado são baixa escolaridade e elevada

rotatividade da mão de obra, dependência de representantes que detêm o controle e

informações dos clientes, concorrência desleal, facilidade de produção informal das peças

pelos empregados, considerável perda de produção, defasagem tecnológica, despreparo

gerencial, cenário econômico instável para o setor desde a crise de 2008, entre outros.

Por último, a análise qualitativa poderia auxiliar na compreensão dos resultados,

especialmente das diferenças encontradas na comparação com os achados das pesquisas

anteriores e em algumas das questões que foram levantadas neste capítulo. Entendendo,

que as limitações, do mesmo modo que as recomendações, podem sugerir desafios, resta o

desafio para futuros estudos.

Por fim, é preciso voltar ao conceito inicial de cultura que se associa à ação, processo

ou efeito de cultivar a terra, resumindo as concepções de dicionários. Emprestado da

Agricultura, o termo ganhou vida própria, distanciando-se do conceito que lhe deu origem.

No entanto, assim como na agricultura, sua principal característica é o mecanismo

adaptativo. Assim como cada vegetal encontra um local que lhe é mais propício e suga da

terra ou vira-se para o sol para obter o seu desenvolvimento, também os indivíduos têm de

responder ao meio de acordo com mudança de hábitos, mais até que possivelmente por

resultar de uma evolução biológica. A cultura é também um mecanismo cumulativo porque

as modificações trazidas por uma geração passam à geração seguinte e vai se

transformando perdendo e incorporando outros aspetos procurando assim melhorar a

vivência das novas gerações. Este deve ser um dos propósitos da Administração.

Page 140: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

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Page 155: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

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APÊNDICES

Apêndice A - Questionário

Este questionário está sendo utilizado na pesquisa de mestrado de Sílvia Loyola Vieira da

Silva, aluna do Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Administração, da PUC-

Minas, cujo interesse é conhecer a influência da cultura regional na cultura organizacional.

Foi originalmente elaborado pelo Professor pesquisador Geert Hofstede (VSM-94©), que

cedeu o direito de aplicação no Brasil para a também professora pesquisadora Betania

Tanure, orientadora desta pesquisa.

As respostas são CONFIDENCIAIS, com acesso somente pela mestranda e sua

orientadora. Não é necessário identificar-se. O tempo necessário para preenchimento é de

aproximadamente 10 minutos.

Data de preenchimento: _____/ _____/ _____

Muito obrigada por sua contribuição!

Page 156: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

154

Por favor, pense em um trabalho ideal. Esqueça seu emprego atual.

Ao pensar e escolher o emprego ideal, marque a resposta que melhor representa o nível de

importância que teria para você cada situação proposta, segundo a escala abaixo:

1 Da máxima importância

2 Muito importante

3 De importância moderada

4 De pouca importância

5 De muito pouca ou nenhuma importância

M

áxim

a Im

po

rtân

cia

Mu

ito

im

po

rtan

te

Imp

ort

ânci

a

Mo

der

ada

Po

uca

im

po

rtân

cia

Mu

ito

po

uco

a

nen

hu

ma

imp

ort

ânci

a

1. Ter tempo suficiente para sua vida pessoal ou familiar 1 2 3 4 5

2. Ter boas condições físicas de trabalho (boa ventilação e iluminação, espaço

de trabalho adequado, distância da sua residência, tráfego, etc.) 1 2 3 4 5

3. Ter um bom relacionamento de trabalho com o superior direto 1 2 3 4 5

4. Ter segurança no emprego (no sentido de estabilidade) 1 2 3 4 5

5. Trabalhar com pessoas que cooperem bem umas com as outras 1 2 3 4 5

6. O superior direto consultar o subordinado antes de tomar uma decisão 1 2 3 4 5

7. Ter oportunidade de crescer 1 2 3 4 5

8. Ter elementos de variedade e de aventura no trabalho 1 2 3 4 5

9. Ter uma oportunidade de ganhar altos salários 1 2 3 4 5

10. Viver em uma área que você e sua família desejem 1 2 3 4 5

Em sua vida privada, qual a importância de cada um dos seguintes aspectos para você?

(Por favor, circule uma resposta em cada linha, também de acordo com a escala anterior)

Máx

ima

Imp

ort

ânci

a

Mu

ito

im

po

rtan

te

Imp

ort

ânci

a

Mo

der

ada

Po

uca

im

po

rtân

cia

Mu

ito

po

uco

a

nen

hu

ma

imp

ort

ânci

a

11. Constância e estabilidade pessoais 1 2 3 4 5

12. Austeridade (rigidez, seriedade) 1 2 3 4 5

13. Persistência (perseverança) 1 2 3 4 5

14. Respeito à tradição 1 2 3 4 5

1 Muito Raramente

2 Raramente

3 Algumas vezes

4 Frequentemente

5 Muito frequentemente

Mu

ito

Rar

amen

te

Rar

amen

te

Alg

um

as v

ezes

Fre

qu

ente

men

te

Mu

ito

freq

uen

tem

ente

15. Com que frequência você se sente nervoso ou tenso no trabalho? 1 2 3 4 5

16. Segundo sua percepção, e não de acordo com sua situação, analise com que

frequência os subordinados receiam expressar sua discordância com os

superiores 1 2 3 4 5

Page 157: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

155

Até que ponto você concorda ou discorda com cada uma das seguintes afirmações?

(Por favor, marque uma resposta em cada linha, de acordo com a escala abaixo)

1 Concordo totalmente

2 Concordo

3 Indeciso

4 Discordo

5 Discordo totalmente Co

nco

rdo

tota

lmen

te

Co

nco

rdo

Ind

ecis

o

Dis

cord

o

Dis

cord

o

tota

lmen

te

17. A maior parte das pessoas é confiável 1 2 3 4 5

18. É impossível ser um bom gerente sem ter respostas precisas para a maioria das

questões que os subordinados possam levantar a respeito de seu trabalho 1 2 3 4 5

19. Uma estrutura organizacional na qual subordinados têm dois chefes deve ser

evitada a todo custo 1 2 3 4 5

20. A competição entre empregados geralmente traz mais malefícios que benefícios. 1 2 3 4 5

21. As regras de uma empresa ou de uma organização não devem ser quebradas

nem mesmo quando o empregado acha que é para o bem da empresa 1 2 3 4 5

22. Se as pessoas fracassam na vida, a culpa geralmente é delas mesmas 1 2 3 4 5

As descrições abaixo se aplicam a quatro diferentes tipos de gerentes. Primeiramente,

leia todas estas descrições, por favor: Gerente 1 Geralmente toma suas decisões prontamente e as comunica a seus subordinados de forma clara

e firme. Espera que executem as decisões com lealdade e sem criar dificuldades.

Gerente 2 Geralmente toma suas decisões prontamente, mas, antes de seguir em frente, explica a seus

subordinados, dando-lhes as razões das decisões e respondendo a qualquer questão que possam

ter.

Gerente 3 Geralmente consulta seus subordinados antes de tomar uma decisão. Ouve conselhos, pondera-

os e então anuncia sua decisão. Espera, então, que todos trabalhem com lealdade no sentido de

implementar a decisão, estando ou não de acordo com as sugestões que deram.

Gerente 4 Geralmente convoca uma reunião com seus subordinados sempre que uma decisão importante

precisa ser tomada. Expõe o problema diante do grupo e estimula a discussão. Aceita o ponto de

vista da maioria como decisão.

Ger

ente

1

Ger

ente

2

Ger

ente

3

Ger

ente

4

23. Para os tipos de gerente descritos anteriormente, marque aquele sob as ordens de

quem você preferiria trabalhar. (Por favor, marque uma única resposta) 1 2 3 4

A partir de agora, responda as questões baseando-se na sua

experiência profissional.

Ger

ente

1

Ger

ente

2

Ger

ente

3

Ger

ente

4

Nen

hu

m

24. A qual dos quatro tipos de gerente anteriormente descritos você diria que

os superiores da sua organização mais se assemelham? 1 2 3 4 5

25. Quanto tempo mais você acha que continuará a trabalhar para a empresa ou organização para a qual você

trabalha atualmente?

( ) Dois anos no máximo

( ) Entre dois e cinco anos

( ) Mais do que cinco anos (mas, provavelmente, deixarei esta empresa

antes de me aposentar)

( ) Até me aposentar.

Page 158: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

156

26. Qual a idade da empresa onde você trabalha atualmente?

( ) Abaixo de 5 anos

( ) Entre 6 e 10 anos

( ) Entre 11 e 15 anos

( ) Entre 15 e 20 anos

( ) Entre 20 e 25 anos

( ) Entre 25 e 30 anos

( ) Entre 30 e 40 anos

( ) 40 anos ou mais

Informações a seu respeito que serão utilizadas exclusivamente para fins desta pesquisa:

27. Gênero: ( ) Masculino ( ) Feminino

28. Idade

( ) Abaixo de 20 anos

( ) Entre 20 e 24 anos

( ) Entre 25 e 29 anos

( ) Entre 30 e 34 anos

( ) Entre 35 e 39 anos

( ) Entre 40 e 49 anos

( ) Entre 50 e 59 anos

( ) 60 anos ou mais

29. Nacionalidade: ( ) Brasileira ( ) Outra. Especifique:____________________

30. Em que estado brasileiro você nasceu? ( ) Minas Gerais ( ) Outro. Especifique:______________

31. Em que estado brasileiro você mora atualmente?

( ) Minas Gerais ( ) Outro. Especifique:______________

32. Há quanto tempo você mora neste estado?

( ) menos de 9 anos

( ) de 10 a 18 anos

( ) de 19 a 28 anos

( ) mais de 29 anos

33. Por quanto tempo ocupa ou já ocupou função gerencial, na sua vida profissional?

( ) Nunca ocupei função gerencial

( ) Menos de 3 anos

( ) de 4 a 7 anos

( ) de 8 a 11 anos

( ) mais de 12 anos

34. Área em que trabalha atualmente (por favor, escolha apenas uma opção)

( ) Administrativa/Financeiro/Pessoal

( ) Comercial

( ) Diretoria Geral

( ) Sócio / proprietário e Diretoria da empresa

( ) Manutenção

( ) Produção

( ) Qualidade

( ) Expedição

( ) Outros. Especifique:

_____________________

Page 159: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

157

35. Há quantos anos está na empresa?

( ) menos de 2 anos

( ) de 3 a 6 anos

( ) de 7 a 10 anos

( ) de 11 a 14 anos

( ) de 15 a 18 anos

( ) de 19 a 25 anos

( ) mais de 26 anos

36. Qual sua escolaridade?

( ) Primeiro grau incompleto

( ) Primeiro grau

( ) Segundo grau incompleto

( ) Segundo grau

( ) Graduação. Qual?

___________________________

( ) Pós graduação Qual? ________________________

( ) Outros. Especifique:

_________________________

Page 160: um estudo de Arranjo Produtivo Local (APL)

158

Apêndice B – Autorização da Pesquisa