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Apresentam-se os resultados de duas experiências: o esquartejamento da carcaça e otratamento da pele de um corço (Capreolus capreolus), com artefactos de quartzo, quartzito ecristal de rocha talhados para o efeito. As indústrias líticas do Paleolítico Superior portuguêsapresentam o recurso frequente a estas matérias-primas não siliciosas, diferenciando-se dasutilizadas no resto da Europa. Todavia, os estudos traceológicos aplicados a estes materiaissão na actualidade muito escassos, não existindo uma colecção de referência de vestígios deuso suficientemente ampla e que documente a reacção destas rochas ao contacto com materiaisde natureza diversa (animal, vegetal, mineral). De igual modo, não haviam sido até aopresente realizadas em Portugal experiências vocacionadas para o registo e caracterização dasalterações (i.e., marcas de corte) provocadas nos ossos de animais processados com artefactoslíticos. O desenvolvimento deste trabalho experimental interdisciplinar permitiu uma abordagemintegrada da Paleotecnologia lítica e da Arqueozoologia, encetando projectos futuroscom horizontes promissores.
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R E S U M O Apresentam-seos resultadosdeduas experincias: o esquartejamentoda carcaa e o
tratamentodapeledeumcoro(Capreolus capreolus),comartefactosdequartzo,quartzitoe
cristalderochatalhadosparaoefeito.AsindstriaslticasdoPaleolticoSuperiorportugus
apresentamorecursofrequenteaestasmatrias-primasnosiliciosas,diferenciando-sedas
utilizadasnorestodaEuropa.Todavia,osestudostraceolgicosaplicadosaestesmateriais
sonaactualidademuitoescassos,noexistindoumacolecoderefernciadevestgiosde
usosuficientementeamplaequedocumenteareacodestasrochasaocontactocommate-
riaisdenaturezadiversa(animal,vegetal,mineral).Deigualmodo,nohaviamsidoatao
presenterealizadasemPortugalexperinciasvocacionadasparaoregistoecaracterizaodas
alteraes(i.e.,marcasdecorte)provocadasnosossosdeanimaisprocessadoscomartefactos
lticos.Odesenvolvimentodestetrabalhoexperimentalinterdisciplinarpermitiuumaabor-
dagemintegradadaPaleotecnologialticaedaArqueozoologia,encetandoprojectosfuturos
comhorizontespromissores.
Um exemplo de abordagem experimental da interface Traceologia ltica/Arqueozoologia: esquartejamento e tratamento da pele de um coro (Capreolus capreolus) com artefactos de pedra lascada MARINADEARAJOIGREJA1 MARTAMORENO-GARCA2 CARLOSM.PIMENTA2
REVISTA PORTUGUESA DE Arqueologia. volume 10. nmero 2. 2007, p. 17-34
Marina de Arajo Igreja | Marta Moreno-Garca | Carlos M. Pimenta Um exemplo de abordagem experimental da interface Traceologia ltica/Arqueozoologia: esquartejamento e tratamento da pele de um coro (Capreolus capreolus) com artefactos de pedra lascada
REVISTA PORTUGUESA DE Arqueologia. volume 10. nmero 2. 2007, p. 17-3418
A B S T R A C T Thispaperpresentstheresultsoftwoarchaeologicalexperiments:butchering
andhideprocessingofaroedeerwithstonetoolsmadeonquartz,quartziteandrockcrystal.
ThePortugueseUpperPalaeolithicsequencepresentssomevariationintermof lithicraw
materialsexploitedwhencomparedtotherestofEuropestonetoolsarehighlycomposed
ofquartz,quartziteandrockcrystal.Use-wearstudiesonthesekindsofnonflintrocksare
veryscarce.Moreover,areferencecollectionthatdocumentsuse-wearfeaturesonthem,deri-
vedfromtheiruseonvariousmaterials(suchasanimal,vegetalormineral)isstillnotavaila-
ble.Equally,therewasnoexperimentalworkdoneinPortugaldealingwiththereplicationof
cutmarksonanimalbonesmadebystonetools.Thisexperimentalworkallowedanintegra-
tedapproachofPalaeolithicTechnologyandZooarchaeology,promisinginterestingfurther
projects.
1. A metodologia experimental e a Traceologia
Odesafiodoarquelogoconsisteemreconheceroscomportamentosdassociedadesdopassadointerpretandoainformaocontidanosvestgiosarqueolgicos.Partindodoobjectoatconstru-omentalqueoprecede,procura-se reconstituiro sentidodaactividade tcnicadas sociedadespassadas.Aabordagemexperimentaltemumpapeldeterminantenareconstituiodosprocessostcnicoshojedesaparecidos.Reproduzirosmodosdeproduoedeutilizaodosmateriaisarque-olgicosummtododeinvestigaocientficaquepermiteaaquisiodirectadeconhecimentoemprico.Aexperimentaofundamenta-senaobservaodeumfenmenoedassuaspropriedadesemcondiespreestabelecidas,eutilizadaparaconfrontardiferenteshiptesesqueservempararefutarouvalidarumateoria(BellintanieMonser,2003).Assim,aexperinciatemporobjectivoestabelecerumprimeirocontactocomaproblemticaestudada,realizandoumaexploraodasvari-veisqueincidemnoseudesenvolvimento.Asuaespecificidaderesidenapossibilidadede:
Testardemaneira isoladaouemsimultneodeterminadosparmetrosde formaacriarumabasededadosefamiliarizaroanalistacomaspropriedadesdedeterminadasmatrias--primas,instrumentos,tcnicas,gestos,etc.;
Separarou isolaro fenmenoestudadoda influnciadeoutros similaresquenosoessenciais;
Reproduzirvriasvezesoprocessoemcondiespredeterminadas,controladasedevida-mentemonitorizadas;
Modificar e combinarde formaplanificadadiferentesparmetrosdemodoaobterumdeterminadoresultadoprocurado.
Aabordagemexperimentalnoummtodocientficorecente.Desdeosprimeirosestudosde indstriasdepedra lascadaqueseprocuroureproduzirosobjectosqueseestudavam.Estasindstriasforamdosprimeiroselementosarqueolgicosdeculturamaterialapotenciarodesen-volvimentodanoodecadeiaoperatriaedesistema,comoformadeultrapassaroestdiodatipologiaeprocurar,atravsdosobjectosestudados,asformasdecomportamentodaquelesqueosfabricaram.Desdeentoaexperimentaonosecontentaemreproduzirosobjectos,procurandoreconstituirosprocessostcnicosidentificveis,mastambmassuascomponentesconceptuaisecognitivas, fsicas e socioculturais. Com efeito, atravs das tcnicas, as culturas e sociedadesmarcamassuasproduesdeespecificidades.
Um exemplo de abordagem experimental da interface Traceologia ltica/Arqueozoologia: esquartejamento e tratamento da pele de um coro (Capreolus capreolus) com artefactos de pedra lascada
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AnoodesistemaumutenslioconceptualindispensvelemArqueologia(Geneste,1991).Elapermiteorganizaroselementosvisveisemdiferentesnveissegundoumalgicatcnicaquepermitereconstituiroselementosquefaltamapartirdosqueexistem.
Nestedomnioaexperimentaotemumpapelfundamentalnaabordagemdosprocessostcnicoshojedesaparecidos,permitindotestarerecriardeformacontroladaashiptesesepressu-postostericossobreosmodosdeproduoedeutilizaodosmateriaisarqueolgicos.
Por outro lado, a Traceologia um campo autnomo de investigao que consiste noestudodafunoedomododeutilizaodosartefactosarqueolgicosatravsdaanlisedasmodificaesdosbordosedassuperfcies,formadaspelocontactoentreoartefactoeomaterialtrabalhado(Semenov,1973;Keeley,1980).Duranteocontacto,osbordosesuperfciessofremmodificaesdenaturezamecnicaedeordemqumicavisveisescalamicroscpica.Acadamaterialtrabalhadoeactividadeefectuadacorrespondemvestgiosdeusobemcaractersticos,igualmenteperceptveisaomicroscpio.Osestigmasdeutilizaoconservadosnoobjectoteste-munhamogestoefectuadoeaactividadequelheestsubjacente.Ainterpretaodafunoedasmodalidadesdeutilizaodosmateriaisarqueolgicosrealizadacombasenosvestgiosdeusoobtidospelaexperimentaoondesoreproduzidasasactividadespressupostamenteefec-tuadas.Apesardoseudesenvolvimentoescalainternacional(Plisson,1985;Knutsson,1989;Hurcombe, 1992; Gibaja e Carvalho, 2005; Clemente, 1997; Philibert, 1993; Derndarsky eOcklind,2001)aTraceologiaaindaumadisciplinainexistenteemPortugal,damesmaformaqueoestudodasmarcasresultantesnosmateriais (i.e.,osso)sobreosquaisaspeas lticasforamutilizadas.
Osestudostraceolgicosaplicadosaoquartzito,quartzoecristalderocha,soactualmentemuitoescassoseapenasrelativosaumnmerolimitadodepeas(Beyries,1982;Mansur,1983;Plisson,1985;Knutsson,1986,1988a,1988b,1989;Sussman,1988;Hurcombe,1992;Philibert,1993;Clemente,1997;DerndarskyeOcklind,2001).Estefactodeve-sesdificuldadesdeobserva-oespecificamentelevantadasporestetipodematrias-primas:umagranulometriagrosseiraeumagrandevariedadepetrogrfica, tendoporconsequnciaumavariaomais importanteemtermosdecomportamentodasrochasemrelaoformaodevestgiosdeuso.Asdificuldadesna leitura dos vestgios de uso ligadas especificidade destas matrias-primas levaram a quetenhamsidodesenvolvidastcnicasdeanlisebaseadasemequipamentosdiversos(SEM3,DIC4,CLSM5,etc.),mascujosresultadoseamostrasestudadassolimitadas(Knutsson,1986;BankseKay,2003;DerndarskyeOcklind,2001).
Actualmente,nosedispedeumacolecoderefernciasuficientementeampladevestgiosdeusonestasmatriasquepermitadocumentar:1)asuareacoaocontactocommateriaisdenaturezadiversa;2)otipodevestgiosdeusoproduzidos.Acriaodeumacolecoderefernciaatravsdaexperimentaoconstitui,destemodo,umaferramentadeanlisefundamental.
neste contexto que o conjunto de experimentaes efectuadas, de natureza didctica eexploratria,seintegra.
2. Programa experimental
Enquadramento
Asduasexperinciasaquiapresentadasoesquartejamentodacarcaadeumcoro(Capre-olus capreolus)eotratamentodapele,comrecursoaartefactosemquartzito,quartzoecristalde
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rocha talhados experimentalmente , integram-se no mbito de um projecto de investigaoconsagradoreproduodeactividades(deaquisio,tratamentoetransformao)inerentesaomododevidadaspopulaeshumanaspr-histricasnoactualterritrioportugus6.Ostraba-lhosforamefectuadosnasinstalaesdoInstitutoPortugusdeArqueologiaemLisboa,tendosidoobjectoderegistofotogrfico(J.P.Ruas)ecinematogrfico(F.Almeida,C.Pimenta),contandocomacolaboraodeinvestigadoresdoprogramaCIPAnasreasdaPaleotecnologiaLticaedaArqueozoologia7.
Objectivos
Paleotecnologia
Ospoucos estudos traceolgicos disponveis para o quartzito, quartzo, cristal de rocha eoutrasrochasbaseiam-senaaplicaodametodologiautilizadanoestudodemateriaisemslex(Keeley,1980).Noentanto,senocasodoslexosvestgiosdeusosobemvisveisefacilmenteinterpretveisaomicroscpico,omesmonoacontececommateriaiscujatextura,contedomine-ralgicoepropriedadesfsico-mecnicasdefracturasomenospropciosconservaodeestig-masdeutilizao,comoacontecenocasodoquartzoedoquartzito.Comefeito,ascaractersticasinerentes a cadamatria-prima tm um papel fundamental na formao dos vestgios de usomacroemicroscpicosnassuperfciesdosutenslioslticos.Vriasexperimentaesdemonstra-ramquerochascomoocristalderocha,ouoslexdegrofinotendemafracturar-sefacilmente,enquantooutras, comooquartzitoeo riolite,no favorecema formaode levantamentosdeimpacto,equedeterminadostiposdequartzitosopoucoounadamarcadospelaformaodepolidos(Plisson,1985;Clemente,1997;PignatePlisson,2000).Assim,oprogramaexperimentalteveporobjectivoconstituirumacolecoderefernciadevestgiosdeusoemartefactosfabrica-dosemquartzito,quartzoecristalderocha,queservirdematerialdecomparaocomosconjun-tosarqueolgicos.Nohouveporissoqualquerpreocupaoemefectuarasoperaesdeformaabsolutamente realista nem to-pouco em reproduzir os gestos pressupostamente efectuadospelassociedadespassadas.
Arqueozoologia
Outracomponenteessencialdestasexperinciasconsistiuemdocumentarasmodificaesdassuperfciessseas(marcasdecorte)resultantesdautilizaodosartefactoslticos,numapers-pectivadeinterfaceutenslioslticos/ossos(WalkereLong,1977;dErricoetal.,1982-1983;Ship-man et al., 1984; dErrico e Giacobini, 1986; vanWijngaarden-Bakker, 1990; Selvaggio, 1994;Laroulandie, 2001). Com efeito, o esquartejamento da carcaa comutenslios lticos origina aformaodemarcasdecortenassuperfciessseas,cujamorfologia,orientao,frequnciaeloca-lizaoanatmicaindicamotipodeoperaoefectuada(desarticulao,cortedetendes,descarne,etc.).Estetipodemodificaesemrestosdefaunaarqueolgica,almdeatestaremaintervenoantrpica,revelatambmocarctertcnicodasoperaesefectuadas.
rocha talhados experimentalmente , integram-se no mbito de um projecto de investigaoconsagradoreproduodeactividades(deaquisio,tratamentoetransformao)inerentesaomododevidadaspopulaeshumanaspr-histricasnoactualterritrioportugus6.Ostraba-lhosforamefectuadosnasinstalaesdoInstitutoPortugusdeArqueologiaemLisboa,tendosidoobjectoderegistofotogrfico(J.P.Ruas)ecinematogrfico(F.Almeida,C.Pimenta),contandocomacolaboraodeinvestigadoresdoprogramaCIPAnasreasdaPaleotecnologiaLticaedaArqueozoologia7.
Objectivos
Paleotecnologia
Ospoucos estudos traceolgicos disponveis para o quartzito, quartzo, cristal de rocha eoutrasrochasbaseiam-senaaplicaodametodologiautilizadanoestudodemateriaisemslex(Keeley,1980).Noentanto,senocasodoslexosvestgiosdeusosobemvisveisefacilmenteinterpretveisaomicroscpico,omesmonoacontececommateriaiscujatextura,contedomine-ralgicoepropriedadesfsico-mecnicasdefracturasomenospropciosconservaodeestig-masdeutilizao,comoacontecenocasodoquartzoedoquartzito.Comefeito,ascaractersticasinerentes a cadamatria-prima tm um papel fundamental na formao dos vestgios de usomacroemicroscpicosnassuperfciesdosutenslioslticos.Vriasexperimentaesdemonstra-ramquerochascomoocristalderocha,ouoslexdegrofinotendemafracturar-sefacilmente,enquantooutras, comooquartzitoeo riolite,no favorecema formaode levantamentosdeimpacto,equedeterminadostiposdequartzitosopoucoounadamarcadospelaformaodepolidos(Plisson,1985;Clemente,1997;PignatePlisson,2000).Assim,oprogramaexperimentalteveporobjectivoconstituirumacolecoderefernciadevestgiosdeusoemartefactosfabrica-dosemquartzito,quartzoecristalderocha,queservirdematerialdecomparaocomosconjun-tosarqueolgicos.Nohouveporissoqualquerpreocupaoemefectuarasoperaesdeformaabsolutamente realista nem to-pouco em reproduzir os gestos pressupostamente efectuadospelassociedadespassadas.
Arqueozoologia
Outracomponenteessencialdestasexperinciasconsistiuemdocumentarasmodificaesdassuperfciessseas(marcasdecorte)resultantesdautilizaodosartefactoslticos,numapers-pectivadeinterfaceutenslioslticos/ossos(WalkereLong,1977;dErricoetal.,1982-1983;Ship-man et al., 1984; dErrico e Giacobini, 1986; vanWijngaarden-Bakker, 1990; Selvaggio, 1994;Laroulandie, 2001). Com efeito, o esquartejamento da carcaa comutenslios lticos origina aformaodemarcasdecortenassuperfciessseas,cujamorfologia,orientao,frequnciaeloca-lizaoanatmicaindicamotipodeoperaoefectuada(desarticulao,cortedetendes,descarne,etc.).Estetipodemodificaesemrestosdefaunaarqueolgica,almdeatestaremaintervenoantrpica,revelatambmocarctertcnicodasoperaesefectuadas.
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Protocolo experimental
Paleotecnologia
Foram fabricadosutenslios lticos emquartzito, quartzo e cristalde rocha (sobre lasca elamela)eaindasuportesbrutosdedebitagemcomvistaaefectuardiferentestiposdeaces:corte,raspagem,perfurao.Osbordosesuperfciesdossuporteslticosforamfotografadosaomicros-cpioantesdarespectivautilizao.
Otratamentodacarcaaedapelefoiefectuadocomestasmatriasemestadofresco.Algu-masoperaesnombitodotratamentodapeleforamrealizadascomadiodematriasabrasi-vas(ocreecinzas).Paracadaoperaoefectuadaregistou-seotempodeutilizaodecadapea.Osutensliosforamposteriormentelimposcomdetergenteecomlcoolefotografadosapsasuautilizao,sendocolocadosemsacosindividuaiscomumafichadedadosrelativaaotipodeopera-oegestoefectuado,zonautilizadaetempodeuso.
Todasasactividadesrealizadas,desdeotalhedosobjectossoperaespropriamenteditas,foramfotografadasefilmadas.
Osutensliosforamposteriormenteobservadoslupabinocular(20x,50x)eaomicrosc-pioOlympusBH(100x,200x),tendosidoosvestgiosdeusomaisrepresentativosfotografadoscomumacmaradigital(Nikoncoolpix4500)aeleacoplado.Oquartzo,quartzitoecristalderochasomatrias-primasquenecessitamdeequipamentopticoespecfico,devidogranulo-metriaetexturadestasrochas,descritomaisadiantenaseco4Anlisetraceolgicadosuten-slioslticos.
Arqueozoologia
Ocoroutilizadonaexperinciadeesquartejamentocominstrumentoslticosfoioexem-plarCIPAn.1903,umafmeasubadulta,comopesode21kg,provenientedeBritelo,PontedaBarca, cedidopeloParqueNacionaldaPenedadoGers (PNPG).Abatidoem31deMarode2006,deuentradanoLaboratriodeArqueozoologiaemJunhode2006.Manteve-secongeladoataodiaanteriorrealizaodasexperincias.Portersidopreviamentenecropsiadopelosservi-osdeveterinriadoPNPG,apresentavaaregioventralaberta,encontrando-sejparcialmenteesviscerado.
Umavezdesarticuladoedescarnadocomosinstrumentoslticos,procedeu-seaoproces-samentodacarcaasegundooprotocolohabitualseguidonesteLaboratrio(Moreno-Garcaet al., 2003). Finalmente, os ossos dosmembros anteriores e posteriores foram observadoslupabinocularOlympusSZ60(x10)comoobjectivoderegistareanalisarasmarcasresul-tantes.
OexemplarCIPAn.1056,umafmeasubadultacomopesode18,400kg,provenientedeEstrugueira,Gers, igualmente cedido pelo PNPG, forneceu a pele utilizada nesta experincia.Emboraoesqueletotenhasidopreparadoem19deMarode2002,asuapelefoiretiradaemantidacongeladacomaintenodeservirdebaserealizaodeumaexperinciacomoaquelaaqueagoraseprocedeu.
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3. Ensaio prtico
Talhe experimental dos utenslios em quartzito, quartzo e cristal de rocha
Foram debitados 33 suportes de pedra lascada em quartzo, quartzito e cristal de rocha(T.Aubry,F.Almeida)(Fig.1a).Oobjectivoerafabricarpeassuficientementegrandesparaseremutilizadascomamo.Asuacaracterizaotecno-tipolgicapodedescrever-sedoseguintemodo:
10suportesbrutosdedebitagemdetipolasca(5suportesemquartzoe5emquartzito)suficientementegrandesparaseremutilizadoscomamo;
6raspadeiras(2emquartzoe4emquartzito); 17lamelasemcristalderochaencabadaslateralmenteemdoiscabosdemadeira(7numcabodegrandesdimensese10numcabomaisfino)comresina.
Otempomnimodeutilizaodecadautensliofoide45minutos,excepodaslamelasencabadasnocabodemadeirademenoresdimenses(utenslion.2;Quadro1),quefoimaisprolongadoefrequente.
Fig. 1 EnsaioprticodotratamentodacarcaadocoroCIPAn.1903;a)Talhedosartefactoslticos;b)Carcaadecoro(Capreolus capreolus)c)Remoodacarnecomlascaemquartzo(artefacton.4;Quadro1);d)Remoodacarnecomlamelasencabadas(artefacton.2,Quadro1)(fotosdeJ.P.Ruas).
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Quadro 1. Inventrio dos suportes lticos utilizados no tratamento da carcaa
Operaesefectuadas
N.Inv. Suporteslticos desarticulao descarne remoodetendes remoodapele vestgiosdeuso
1 Cabo grande com lamelas em cristal de rocha x no
2 Cabo pequeno com lamelas em cristal de rocha x x x x sim
3 Lasca bruta em quartzo x no
4 Lasca bruta em quartzo x x x sim
5 Lasca bruta em quartzito x no
6 Lasca bruta em quartzito x sim
7 Lasca bruta em quartzito x x sim
8 Lasca bruta em quartzito x x no
Sequncia de esquartejamento da carcaa
OesquartejamentodocoroCIPAn.1903foiefectuadoemduasmanhssucessivas(Fig.1b).Aextracodapele,massamuscular,ocortedecarneetendesforamefectuadoscom8utensliosbrutosdedebitagem:quatroemquartzito,doisemquartzoedoiscomlamelasemcristalderochaencabadasemmadeira(Quadro1).
Aprimeiraoperaoconsistiunadesarticulaodosmembrosanterioresdocadvercomoutenslion.4 emquartzo (Fig. 1c).Umavezque aqueles no articulam com qualquerelemento sseo, sendo suportados por tecidomuscular (a escpula um osso flutuante), aseparaoprocessou-seatravsdarealizaodesucessivas incises transversais na carne pelaparte interna, sem contactar com qualquerosso. Em seguida, procedeu-se extraco dapeleutilizandoomesmoartefacto.
Prosseguiu-secomaremoodostecidosmusculares da pata anterior direita desde aescpulaatazonadop (metacarpoe falan-ges).Numaprimeiratentativa,usou-seouten-slion.8emquartzito,masasuaeficciareve-lou-se insatisfatria, retomando-seaoperaocomon.4.Foi aindaexperimentadooarte-facton.2queintegra10lamelasdecristalderochaencabadas,quesereveloumuitoeficaznaremoo da massa muscular que envolve aescpula na sua regio lateral (Fig. 1d) e quepermitiu a desarticulao deste osso com omero.Emseguida,efectuou-searemoodacarneaolongodordioedaulnaparaconcluircom a separao da pele que envolvia o p(metacarpoefalanges).Apsestaoperaofica-ram expostos na face posterior dometacarpo
Quadro 1. Inventrio dos suportes lticos utilizados no tratamento da carcaa
Operaesefectuadas
N.Inv. Suporteslticos desarticulao descarne remoodetendes remoodapele vestgiosdeuso
1 Cabo grande com lamelas em cristal de rocha x no
2 Cabo pequeno com lamelas em cristal de rocha x x x x sim
3 Lasca bruta em quartzo x no
4 Lasca bruta em quartzo x x x sim
5 Lasca bruta em quartzito x no
6 Lasca bruta em quartzito x sim
7 Lasca bruta em quartzito x x sim
8 Lasca bruta em quartzito x x no
Sequncia de esquartejamento da carcaa
OesquartejamentodocoroCIPAn.1903foiefectuadoemduasmanhssucessivas(Fig.1b).Aextracodapele,massamuscular,ocortedecarneetendesforamefectuadoscom8utensliosbrutosdedebitagem:quatroemquartzito,doisemquartzoedoiscomlamelasemcristalderochaencabadasemmadeira(Quadro1).
Aprimeiraoperaoconsistiunadesarticulaodosmembrosanterioresdocadvercomoutenslion.4 emquartzo (Fig. 1c).Umavezque aqueles no articulam com qualquerelemento sseo, sendo suportados por tecidomuscular (a escpula um osso flutuante), aseparaoprocessou-seatravsdarealizaodesucessivas incises transversais na carne pelaparte interna, sem contactar com qualquerosso. Em seguida, procedeu-se extraco dapeleutilizandoomesmoartefacto.
Prosseguiu-secomaremoodostecidosmusculares da pata anterior direita desde aescpulaatazonadop (metacarpoe falan-ges).Numaprimeiratentativa,usou-seouten-slion.8emquartzito,masasuaeficciareve-lou-se insatisfatria, retomando-seaoperaocomon.4.Foi aindaexperimentadooarte-facton.2queintegra10lamelasdecristalderochaencabadas,quesereveloumuitoeficaznaremoo da massa muscular que envolve aescpula na sua regio lateral (Fig. 1d) e quepermitiu a desarticulao deste osso com omero.Emseguida,efectuou-searemoodacarneaolongodordioedaulnaparaconcluircom a separao da pele que envolvia o p(metacarpoefalanges).Apsestaoperaofica-ram expostos na face posterior dometacarpo
Fig. 2 a)Remoodostendesdaparteposteriordometacarpodireitocomoartefacton.2,constitudopor10lamelasdecristalderochaencabadasemmadeiracomresina;b)Desarticulaodordio-ulnaedometacarpodireitonazonadoscarpaiscomoartefacton.1compostopor7lamelasdecristalderocha(fotosdeJ.P.Ruas).
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Fig. 3 EnsaioprticodotratamentodapeledocoroCIPAn.1056;a)Modeloetnogrficodetcnicaetrabalhodapele(populaessub-actuaisdeesquimsdaGroenlndia);b)Modeloreproduzidoutilizadonaexperincia;c)Moagemdoocre;d)Fixaodapelenaestrutura;e)Remoodosrestosdecarne;f)Aplicaodeocreecinzas;g)Remoodoplocomamo;h)Amaciamentodapele(fotosdeJ.P.Ruas).
ostendesqueasseguramaligaoentreoselementosdapata.Asuaremoofoipossvelatravsdautilizaosucessivadosutensliosn.os2,8e1.Primeiro,realizaram-secortestransversaisnazonaproximaleaolongodometacarpocomoutenslion.2(Fig.2a);emsegundolugar,comaajudadoutenslion.8, foipossvelsepar-losdadifisee,porltimo,comoutenslion.1,foramremovidosalturadasfalanges.Outenslion.1foiigualmenteusadonadesarticulaodordio-ulnacomometacarpo(Fig.2b).
Oprocessamentodomembroanterioresquerdofoirealizadoseguindoamesmasequncia,comanicavariantedeteremsidoutilizadososutensliosn.5en.6emquartzitoeon.3emquartzopararemovergrandepartedotecidomuscular.
Namanh seguinte efectuou-se a segunda fase de preparao que incidiu nosmembrosposteriores.Adesarticulaodapataesquerdafoifeitacomoutenslion.1,verificando-sequeestenoeraomaisapropriado, jqueduas lamelas sedesagregaramdocaboquase imediata-menteapsoprimeirocontactocomaparteproximaldofmur.Estaineficcia,podenoentantoestarrelacionadaquercomasdimensesdoprpriocaboquercom a pouca profundidade de insero das lamelas no seuinterior. Prosseguiu-se com o descarne dos dois membrosrecorrendoaoutenslioemquartziton.7eaon.2,quedenovosereveloucomoomaiseficaznadesarticulaodosdife-renteselementossseos.
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Tratamento da pele
AexperimentaorelativaaotratamentodapeledocoroCIPAn.1056realizou-sedurantequatrodiasapartirdedadosetnogrficosquedocumentamtodooprocesso tcnico,desdeasoperaesaosgestosefectuados:eliminaodosrestosdecarneaderidospele,adelgaamentocomsubstnciasabrasivas(ocreecinzas)paradiminuiodaespessura,eliminaodoploefasedeamaciamento(Robbe,1975).
Paraoefeito,foiconstrudaumaestruturademadeirademorfologiaquadrangularreforadanoscantos,demodoafixarapeleepermitirasuasecagememextenso.Estetipodeestruturaencontra-sedocumentadoempopulaessubactuaisdeesquimsdaGroenlndia(Robbe,1975)(Figs.3ae3b).
Osfragmentosdeocreforammodos,aproveitando-seaconcavidadenaturaldeumseixodequartzitocomodormenteeutilizando-seumfragmentodeseixoemquartzitocomomovente(Fig.3c).
Apelefoiprimeiroperfuradacomumalascaemquartzitomorfologicamentesimilaraumperfuradorefixadacomcordavegetalnaestruturademadeira(Fig.3d).Osuportecomapelefoiinstaladosobreumtampoemmadeiranocho,demodoafacilitararealizaodasdiferentesoperaes.
Foramutilizados16artefactosdepedralascada:cincolascasbrutasemquartzitoecincoemquartzo,quatroraspadeirasemquartzitoeduasemquartzo(Quadro2).
Quadro 2. Inventrio dos suportes lticos utilizados no tratamento da pele
Operaesefectuadas
N.Inv. Suporteslticos Perfurao Corte Remoo Adelgaamento Remoo Amaciamento Vestgios pele membros dacarne doplo deuso
1 Lasca bruta em quartzo x sim
1b Lasca bruta em quartzito x no
2 Lasca bruta em quartzo x sim
2b Lasca bruta em quartzito x no
3 Lasca bruta em quartzo x sim
4 Lasca bruta em quartzito x sim
5 Lasca bruta em quartzito x no
6 Lasca bruta em quartzito x sim
6b Lasca bruta em quartzito x x sim
7 Lasca bruta em quartzo x no
8 Lasca bruta em quartzo x no
9 Lasca bruta em quartzito x no
10 Lasca bruta em quartzito no
11 Lasca bruta em quartzito x no
12 Lasca bruta em quartzo x no
13 Lasca bruta em quartzo x no
Procedeu-se,numaprimeirafase,eliminaodosrestosdecarneaindaagarradospele,atravsdeacesdecortecomumapeabrutadedebitagememquartzito(n.11)ederaspagemcomraspadeirasemquartzo(n.2)equartzito(n.4,n.5,n.6b)(Fig.3e).Nesteprocesso,apelefoiregularmentehumedecidacomgua.
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Numasegundafase,impregnou-seapelecomsubstnciasabrasivas(umapastaresultantedamisturadeocrecomcinzas)tendosidoefectuadaumasegundaraspagemdemodoareduzirasuaespessuraeatorn-lamaismacia(Fig.3f).Nestaoperaoforamutilizadasumaraspadeiraemquartzo(n.3)eoutraemquartzito(n.6).
Aoperaoseguinteconsistiunaeliminaodoplo,porcorte,comduaslascasdequartzo(n.os7-8)(Fig.3g).Noentanto,rapidamenteseverificouqueautilizaodosutensliosnoeraeficazdevidoespessuraedensidadedopelo,tendo-seoptadopelasuaextracodeformamanual.Apelefoinovamentemolhada,demodoatorn-lamaisresistenteraspagemecoberta,maisumavez,comocreecinzas.Esteprocessofoirepetidopordiversasvezes.Umavezseca,foiretiradadaestruturaseccionando-seaspatascomaajudadeduaslascasbrutasemquartzito(n.os1e9).
Aetapafinaldesteprocessoconsistiunoamaciamento,feitoporfricoentreasmos(Fig.3h),seguidadenovaraspagemcomumaraspadeiraemquartzito(n.5);finalmente,aplicou-seumasubstnciagordurosadeorigemvegetal(leodercino).
4. Anlise traceolgica dos utenslios lticos
Mtodo
Omtododeanliseutilizadonoestudodosartefactosexperimentaissegueomesmoelabo-radoporL.H.Keeley(1980)apartirdostrabalhosanterioresdeS.A.Semenov(1973).
Noentanto,oquartzoeoquartzitosomatrias-primasquenecessitamdeequipamentopticoespecfico.Agranulometriaetexturadoquartzoedoquartzitomaisgrosseira,quereflectealuzdeformaintensa,nofacilitaaobservaodeeventuaisestigmasdeutilizaoaomicrosc-pio.ComoilustradopeloestudoinfrutuosodeSussman(1988),amicroscopiaemfundoclarotradicional,utilizadanoestudodoslexnoseadequaanlisedassuperfcieslisasdestetipodemateriaiseleituradosvestgiosdeuso.OsmelhoresresultadosforamobtidoscomautilizaodocontrasteinterferencialdetipoNomarski(DIC)queofereceumaresoluocomparveldamicroscopiaelectrnica(Plisson,1986;Knutsson,1988b;PignatePlisson,2000).Esteprocessoconsistenaprojecodoobjectoobservadotridimensionalmente(Fig.4).
Trata-sedeumsistemadeluzpolarizada(brancaoumonocromtica)quetemapropriedadedeconcentrarosfeixesdeluzdispersosnumsgraasaosprismassituadosnosplanosfocaisdaslentes,fornecendoumaimagemtridimensional,isentadoshalosdeluzquehabitualmenterodeiamoobjecto.
Aanlisedomaterialfoiassimefectuadacomummicroscpiopticocomluzreflectidaecampoescuro(OlympusBH,100xe200x)emcujasobjectivasfoifixadoocontrasteinterferencial(MPPlanOlympus).
Algumas das peas de maiores dimenses no puderam ser analisadas directamente aomicroscpio,peloque foinecessrioefectuar rplicasemresinaEpoxy apartirdonegativodosbordosutilizados.Utilizou-seColtene president light,umprodutodeimpressobasedesiliconeempreguepelosdentistase queofereceumagrandecapacidadederesoluoededetalhedasuper-fciereproduzida.Asamostrasforamposteriormenteobservadasefotografadasaomicroscpiocomumaumentode200x.
Constatou-se,alis,queasrplicasemresinapermitemumaleituradosbordosedassuper-fciescommelhorescondiesdeobservaoqueaspeasdirectamenteanalisadasaomicros-cpio.
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Resultados: descrio dos vestgios de uso experimentais
1. Vestgios de uso formados pelo tratamento da carcaa
De ummodo geral, todos os utenslios se revelaram eficazes no tratamento da carcaa.Oquartzoeocristalderochacujacapacidadecortantepermaneceuinalterveldemonstraramumamaiorprodutividadequandocomparadascomoquartzito,tantonocortedematriasmacias(dacarne,porexemplo)comonasmaisresistentes(tendes,articulaes).Aslamelasencabadasnocabomaispequeno(utenslion.2;Quadro1)emparticularrevelaram-seextremamenteeficazesedeutilizaoprolongada,quernocortedecarne,querdapeleouaindadostendes.
Nosutensliosemquartzitoeemquartzo,ospolidosresultamessencialmentedocontactocomapele e a carne.Estes apresentamuma tramaaberta, comumbrilhomate eumaspectogorduroso(Figs.5a,5b,5c).Osvestgiosdeusorelativosaocortedecarnesopoucodesenvolvi-dos,tendosidonecessriorepetirasoperaespormaisde30minutos,talcomoacontecetambmnocasodoslex.Estaobservaojtinhasidofeitaporoutrosautores(Plisson,1985;Clemente,1997;Gibaja,2005).Estaspeassofrerampoucoslevantamentosdeimpactonosbordos,compa-rativamenteaocristalderocha.
Nocristalderochanofoidetectadoqualquertipodepolido,sendovisveisapenasalgumasestriasperpendiculares(Fig.5d)eapresenadelevantamentosdeimpactonasduasfacesdobordo,caractersticosdotipodegestoefectuado(i.e.,corte).
Fig. 4 Representaoesquemticadamicroscopiacomcontrasteinterferencial(DIC)(Davidson,2007).
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2. Vestgios de uso formados pelo tratamento da pele
Osutenslios utilizados nas primeiras operaes do trabalho da pele apresentampolidospoucodesenvolvidos,formadosnaszonasmaiselevadasdamicrotopografia.Apelemarcarelati-vamentebemosbordosesuperfciesdosutenslios.
Foramobtidospolidosempeasutilizadasnasoperaesde remoodos restosdecarne(Figs.6a,6b,6c)etambmnasoperaesdeadelgaamentoeamaciamentodapelecomocree
Fig. 5 Aspectodosbordosdosutensliosantesedepoisdoesquartejamentodacarcaa(200x).a)Polidoresultantedocortedepeleecarne;b)Polidoresultantedocortedecarne;c)Polidoresultantedocortedecarne;d)Estriasresultantesdadesarticulao(fotosdeJ.P.RuaseM.ArajodaIgreja).
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cinzas(Fig.6e).Estesdesenvolvem-senumatramaabertaousemicerrada,porvezesacompanha-dosdefinasestriasesulcosqueindicamadirecodomovimentoefectuado(Fig.6e).Aspeasquasenoapresentampraticamentevestgiosdeusomacroscpicos(levantamentosdeimpacto,arredondamento,etc.).Apenasasoperaesrealizadascomaadiodematriasabrasivas(ocreecinzas)nasfasesdeadelgaamentoedeamaciamentoprovocaramumarredondamentodobordovisvellupabinocular(Fig.6d).
Fig. 6 Aspectodosbordosdosutensliosantesedepoisdotratamentodapele(200x).a,b,c)Polidosresultantesdaremoodosrestosdecarne;d)Arredondamentodobordo(50x);e)Polidoresultantedoadelgaamentodapelecomocreecinzas(fotosdeJ.P.RuaseM.ArajodaIgreja).
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5. Anlise das marcas de corte observadas nos ossos
Mtodo
Comoreferidoacima,aobservaodasmarcasdecortefoirealizadacomajudadeumalupabinocularOlympusSZ60(x10),revelando-sesuficienteparaidentificarasualocalizaoeorienta-onosossos;todavia,mostrou-seineficienteparaseprocederdescrioecaracterizaodeta-lhada (seco,perfil eprofundidade)dasmarcas realizadas comasdiferentesmatrias-primas:quartzo,quartzito e cristalde rocha,quedever ser realizadanumasegunda fase recorrendomicroscopiaelectrnica(SEM)(Rose,1983;Cook,1986;Olsen,1988)erplicasemresina(dErricoetal.,1982-1983).
Resultados
Aobservaodosvdeosrealizadosemtemporealedasfotografiaspermitiuconcluirqueduranteaesfoladocoronohouvecontactoentreaspeaslticaseassuperfciessseas,resul-tando asmarcas existentes da desarticulao dos diferentes ossos que integram cada um dosmembros,daremoodasuacarneedaseparaodostendeslocalizadosnafaceposteriordosmetpodos.Umavezqueestasoperaesforamrealizadasemgrandepartecomoutenslion.2(Quadro1)terosidoaslamelasdecristalderochaasresponsveispelasmarcasobservadas.Reve-laram-semuitoeficienteseofactodeestaremdispostasnumcabofacilitouasuamelhorpenetra-onotecidomusculareoconsequentecontactocomoosso.
Predominamaspequenasincisestransversais(circa1cm)emrelaoquelasqueseobser-vamnoeixolongitudinaldosossos,evidenciandoogestorealizadoquernaremoodacarneaolongodasdifises,quernaseparaodosdiferenteselementossseosnaszonasdearticulao.Outenslion. 2 foi sempreutilizado formandoumngulo recto em relao ao eixo longitu-dinal dosmembros apendiculares(Fig.7),exceptonocasodaescpula.Destemodo,nosmembrosanterio-res observam-se incises transver-saissuperficiaisaomeiodadifisenas faces medial e lateral dosmeros,juntoazonaproximaldosrdiosnasuafacelateral,emvrioscarpaisenasfacesanterioreposte-rior dos metacarpos. Apenas nasescpulassovisveisumasriedeincises paralelas e compridas,junto da base da espinha, na suaparte lateral, efectuadasdurantearemoodotecidomuscularenvol-vente(Fig.8).
Salientam-se os cortes maisprofundos, localizados nametadeinferiordadifisedosmetacarpos,
Fig. 7 Remoodacarnedomembroanteriordireitocomoartefacton.2.Note-seogestoefectuadoeaposiodoutenslioemngulorectoemrelaoaomerodescarnado(fotosdeJ.P.Ruas).
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Fig. 8 Marcasdecorteefectuadasnaescpulajuntodabasedaespinha,nasuapartelateralcomoartefacton.2(fotosdeJ.P.Ruas).
Fig. 9 Incisestransversaisnafaceposterior-lateraldometacarpodireitoprovocadasaoretirarostendescomoartefacton.2(fotosdeJ.P.Ruas).
Fig. 10Incisessuperficiaisnafacelateraldoastrgaloesquerdorealizadasaodesarticularosossosdapatadorestodomembroposteriorcomoartefacton.2(fotosdeJ.P.Ruas).
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nasuafaceposterior,nazonadecontactocomosmetpodoslateraisauxiliares(Fig.9),realizadosaoremoverostendes.Aslamelasdecristalderochachegaraminclusiveaseccionaraquelesnasuazonaproximalmaisapontada.
Nosmembrosposterioresverifica-seomesmotipodeincisessuperficiaistransversaisnasdifisesdosfmures,tbias,metatarsosenafacemedialdoastrgalo(Fig.10).
6. Perspectivas de trabalho futuro
Estaexperinciaaprimeiradeumciclo.Obalanoquefazemospositivoeosresultadosobtidossuscitamjquestesquedeveroseraprofundadascomoprosseguimentodaabordagemexperimental.
AonveldaTraceologia,aausnciadevestgiosdeusoemdeterminadostiposdequartzitosenocristalderochalevantaanecessidadedeespecificarseestaausnciaestligadaaotipodeopera-oefectuada(determinadasoperaesenvolvemcontactosdemasiadobrevesentreoutenslioeomaterialtrabalhado)ouspropriedadesfsico-qumicasdasmatrias-primasquepodemterconse-qunciasnotipoenograudedesenvolvimentodosvestgiosdeuso.
Asexperinciasfuturasteroassimcomoobjectivotestarocomportamentodestasrochas,comcaractersticaspetrogrficasvariadas,peranteasmatriastrabalhadaseosgestosefectuados.Asexperinciasseroorientadasnosparaotratamentodecarcaasanimais,mastambmparaotrabalhodeoutrosmateriaiscomooosso,hastedecervdeo,vegetais,etc.,deformaaampliaracolecodereferncia.
A constituio de uma coleco de referncia de vestgios de uso nestasmatrias-primasreveste-sedeenormeimportncia.Serumaferramentafundamentalparaosestudostraceolgi-cosdeindstriaslticasactualmenteemcursoemPortugale,deumaformamaisabrangente,noqueconcerneaoestudodocomportamentodosgruposhumanosemrelaoaoaprovisionamentoegestodosdiferentesrecursoslticosdisponveisregionalmente.
Dopontodevistametodolgico,osresultadosmostramaindaquepossveldeterminarediferenciar,paraoquartzoeparaoquartzito,osvestgiosdeusoformadospelocontactocomasdiferentesmatriastrabalhadasatravsdaintegraodocontrasteinterferencialnasobjectivasdeummicroscpiotradicionalmenteutilizadoparaaanlisedoslex.Aeficciadestetipodeequipa-mentoleva-nosaquestionarporquetmsidodesenvolvidosmtodosdeanliseparaatraceologiadestasmatrias-primasbaseadosemaparelhosaltamentesofisticadosecomplexos(SEM,CLSM)cujos resultados so no entanto pouco satisfatrios (a julgar pelas imagens que os ilustram)(Knutsson,1986;DerndarskyeOcklind,2001),quandoamicroscopiadecontrasteinterferencialaqueofereceosmelhoresresultados.
Emrelaosmarcasvisveisnosossos,procurar-se-nasprximasexperinciasprocessarisoladamentediferentespartes esquelticas comutensliosdeuma smatria-prima, tentandocaracterizar atravs de microscopia electrnica as marcas de corte e de raspagem produzidassegundoamorfologiadobordodoartefactoutilizado.Destaforma,vislumbra-secomopossvelidentificarecaracterizarnosrestosarqueofaunsticosotipodematria-primaeascaractersticasmorfolgicasdoutensliolticoresponsvelpelasuaocorrncia.
Deigualmodo,contemplamosoalargamentodestestrabalhosexperimentaisanovassitua-esquepermitamencontrarrespostasaquestescomo:1)serqueumartefactolticoproduzmarcassimilaresnosossosdeumapresafrescaenaquelapreviamentesujeitaaalteraestrmi-cas?2)Serodiferentesasmarcasproduzidasnosossosdeexemplaresdeescalesetriosdistintos
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(adultos,subadultos,juvenis?3)Quemarcasproduzumamesmamatria-primaemossosdedife-rentesvertebrados(peixes,aves,mamferos)?
Porltimo,esperamosqueorecursomicroscopiaelectrnicaesrplicasemresina,explo-randoosreferenciaisevariveisenunciados,permitaumacompreensoeobservaesaprofunda-dasdosensaiosquepretendemosrealizar.
NOTAS1 LaboratoireESEP-UMR6636duCNRS 5RueduChteaudelHorloge,BP647 13094Aix-en-ProvenceFrana InvestigadoraassociadaaoCentrodeArqueologiadaFaculdade
deLetrasdeLisboa. [email protected] LaboratriodeArqueozoologia,InstitutoPortugusdeArqueologia,
Av.dandia1361300-300Lisboa [email protected];[email protected] ScanningElectronMicroscopy(MicroscpioElectrnico).4 DifferentialInterferenceContrast(MicroscpiodeContraste
Interferencial).5 ConfocalLaserScanningMicroscope(MicroscpiodeLaser
Confocal).6 Esteprogramaexperimentalintegra-senombitodeum
projectodeps-doutoramentointitulado Caracterizao
dos comportamentos tcnicos e econmicos do Paleoltico Superior em Portugal: abordagem traceolgica das indstrias lticas,financiadopelaFundaoparaaCinciaeTecnologia, quetemcomoobjectivodocumentarpelaTraceologiaaespecificidadeeavariedadefuncionaldasindstriaslticasdoPaleolticoSuperiorportugus.Esteperodo,nonossoterritrioapresentaalgumasdiferenasemrelaoaorestodaEuropanomeadamentenoquedizrespeitosmatrias-primasutilizadasecomposiodasindustriaslticas,apresentandoosconjuntosportuguesesorecursofrequenteamatriasnosiliciosascomooquartzo,oquartzitoeocristalderocha.
7 AgradecemosacolaboraodosnossoscolegasdoIPAAnaCristinaArajo,FranciscoAlmeida,ThierryAubryeCristinaGameiro.UmmuitoobrigadoaJosPauloRuaspeloexcelentetrabalhofotogrfico.
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