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UM MÉTODO GLOBAL PARA A VERIFICAÇÃO DA SEGURANÇA DE
COLUNAS E VIGAS CONTÍNUAS DE AÇO
Rodrigo Gonçalvesa e Dinar Camotim
b
a ICIST, CERIS, Departamento de Engenharia Civil, Faculdade de Ciências e Tecnologia,
Universidade Nova de Lisboa, 2829-516 Caparica b ICIST, CERIS, DECivil, Instituto Superior Técnico, Universidade de Lisboa,
Av. Rovisco Pais, 1049-001 Lisboa
Resumo. Apresenta-se um método de verificação da segurança que (i) se baseia em parâme-
tros que caracterizam o comportamento global da estrutura e (ii) é totalmente consistente com
o método de aplicação das curvas de encurvadura do EC3. Mostra-se que a abordagem pro-
posta, para além de evitar verificações desnecessárias, (i) fornece informações muito relevan-
tes acerca da eficiência estrutural do sistema e (ii) possibilita a sua otimização. São apresenta-
dos e discutidos vários exemplos, onde se comparam os resultados da aplicação do método
proposto com cargas de colapso obtidas com análises fisicamente e geometricamente não-
lineares, incluindo imperfeições geométricas e tensões residuais.
1. Introdução
A abordagem clássica para calcular a resistência à encurvadura de colunas e vigas de aço ba-
seia-se em curvas de encurvadura, as quais têm em conta todos os efeitos não-lineares rele-
vantes. Esta abordagem é seguida no Eurocódigo 3 (EC3) [1], através da utilização das cha-
madas “curvas europeias de encurvadura” [2-4].
Conforme será demonstrado neste artigo, a utilização das curvas de encurvadura para ele-
mentos inseridos em estruturas pode levar a resultados inesperados. Em particular, a esbelteza
normalizada pode atingir valores muito elevados, mesmo em casos aparentemente simples.
Este facto motivou os autores a desenvolver um método de verificação da segurança para co-
lunas [5,6] e vigas [7] baseado em parâmetros da estrutura e consistente com as curvas de en-
curvadura do EC3 (refira-se que uma abordagem preliminar deste tipo foi proposta em [8]).
De acordo com esta abordagem, objeto de análise e revisão no presente artigo, a resistência da
XI Congresso de Construção Metálica e Mista Coimbra, Portugal
2
estrutura é calculada com base na esbelteza da estrutura e nas curvas de encurvadura do EC3,
o que apresenta as seguintes vantagens:
(i) a resistência da estrutura resulta idêntica à que se obtém verificando cada elemento (bar-
ra) individualmente, utilizando as curvas de encurvadura do EC3;
(ii) o processo de verificação é muito mais racional;
(iii) é possível obter informação extremamente relevante acerca do comportamento da estru-
tura e efetuar uma otimização estrutural.
Na secção 3 aborda-se o caso de colunas inseridas em estruturas e na secção 4 o caso de
vigas contínuas. Em cada secção apresentam-se vários exemplos para ilustrar a aplicação da
abordagem proposta. Estes exemplos incluem comparações com cargas de colapso “exatas”,
calculadas através de análises com elementos finitos de barra semelhantes às efetuadas em
[10-12]: análises geometricamente e materialmente não-lineares (GMNL), incluindo imper-
feições geométricas e tensões residuais nas barras, adotando uma lei constitutiva elástica-
perfeitamente plástica para o aço (E = 210 GPa, = 0,3) e assumindo que não ocorre encur-
vadura local e por corte.
2. Colunas
2.1 A abordagem “tradicional”
De acordo com o EC3, a verificação à encurvadura de elementos uniformes à compressão (co-
lunas) é dada por
,,11
,
,
,
M
Rk
Rdb
Rdb
Ed
Rdb
NN
N
Nn
(1)
onde todos os valores devem ser tomados positivos, sendo NEd e Nb,Rd os valores de cálculo do
esforço axial atuante (de compressão) e da resistência à encurvadura do elemento, respetiva-
mente, é o coeficiente de redução para o modo de encurvadura relevante, M1 é o coeficiente
parcial de segurança relevante (o valor recomendado é 1,0) e NRk é o valor característico do
esforço axial resistente da secção. O coeficiente de redução é definido por
,,)2,0(12
1,
1,1min 2
22cr
Rk
N
N
(2)
onde é o fator de imperfeição para a curva de encurvadura relevante e Ncr é o valor crítico
de bifurcação do esforço axial.
Considere-se um sistema estrutural com n colunas e sujeito a uma determinada combinação
de ações (ELU). O esforço axial da coluna i pode ser dado por iEdiEd
NN ,
, onde Ed é o va-
lor de cálculo do parâmetro de carga e iN é o esforço axial de referência na barra (correspon-
dente a = 1). Da mesma forma icricr
NN ,
, onde cr é o parâmetro crítico de carga, o que
permite relacionar as esbeltezas de duas colunas i e j da mesma estrutura através de
,/
/
,
,
,,
,,
jjRk
iiRk
jRkicr
jcriRk
j
i
NN
NN
NN
NN
(3)
o que implica que (Obs. 1) a coluna mais próxima de atingir NRk é a menos esbelta e, portan-
to, (i) para colunas com idênticos valores de NRk, a menos solicitada é a mais esbelta (em
particular, i com 0
,
iEdN ) e (ii) para colunas com NEd idênticos, a que possui o mai-
or valor de NRk é a mais esbelta. Estas conclusões mostram que, para estruturas, a esbelteza
normalizada de uma barra deixa de refletir a suscetibilidade à encurvadura, dado que 1
)1( apenas indica que, quando = cr, o esforço axial na barra é inferior (superior) a NRk.
Tema a definir pela Comissão Cientifica
3
O mesmo sucede com o conceito de comprimento de encurvadura, tradicionalmente utili-
zado para calcular Ncr. Em [6] mostra-se que Lcr se 0,
iEdN , mesmo em estruturas de
nós fixos — este resultado, apesar de parecer algo contraintuitivo, apenas reflete que o esfor-
ço axial nessa barra é muito reduzido quando = cr.
2.2 A esbelteza da estrutura
Define-se a “esbelteza da estrutura” através de
,,...,1,min,,
niN
N
i
iRk
Rk
cr
Rk
E
(4)
sendo Rk o valor do parâmetro de carga que corresponde a atingir pela primeira vez NRk (não
considerando os elementos à tração). Deve notar-se que (Obs. 2) em geral, E depende do
perfil de carregamento, mas possui um significado idêntico ao da esbelteza de colunas isola-
das, já que 1E
indica que Rk > cr e, portanto, que uma estrutura “ideal” (i.e., sem imper-
feições e apenas sujeita a esforço axial) encurva antes de atingir a primeira plastificação. Em
particular, tal como para uma coluna “ideal”, a resistência de uma estrutura “ideal” pode ser
obtida a partir de
.1
;1min,2,
E
ERkERkb
(5)
Utilizando os resultados anteriores é possível obter
,minminmin
,
,,
i
icr
iRki
i
iRk
EN
NN
N
N (6)
o que mostra que (Obs. 3) a esbelteza da estrutura é igual à menor esbelteza de todas as co-
lunas da estrutura. Deve notar-se que este resultado mostra que a utilização da esbelteza da
estrutura permite contornar os problemas associados à verificação de colunas com E
(recordar observação 1i).
2.3 A coluna “condicionante”
Para determinar a coluna “condicionante”, i.e., a coluna que condiciona a verificação à encur-
vadura da estrutura, começa-se por exprimir o fator de redução (21) através de
222
2,min,
. (7)
A substituição deste resultado na Eq. (11) conduz a
.,1,
,1
,,
,
,,
icr
iEd
cr
Ed
crcr
i
M
iRdb
iEd
iRdbN
Nnn
N
Nn
(8)
Assim, a coluna condicionante será a que possui o maior valor de nb,Rd,i. Notando que i é o
único parâmetro dependente de i, pode concluir-se que, se esta função for estritamente cres-
cente com , então nb,Rd,i é estritamente decrescente e (Obs. 4) a coluna condicionante é a
menos esbelta ( EC
min ). Recordando as observações 1 e 1i, conclui-se que (i) a coluna
condicionante é a mais próxima de atingir NRk e (ii) se todas as colunas possuírem o mesmo
valor de NRk, a mais solicitada (compressão) será a coluna condicionante, independentemente
do seu comprimento ou condições de apoio. Note-se que a condição EC constitui uma
motivação adicional para utilizar uma abordagem baseada na estrutura. Em particular, (Obs.
5) em vez de verificar apenas a coluna condicionante, pode “verificar-se a estrutura” com
XI Congresso de Construção Metálica e Mista Coimbra, Portugal
4
,,,12
1
,
,
,
E
E
M
RkE
Rdb
Rdb
Ed
Rdbn
(9)
sendo é calculado com E e o valor de associado à coluna condicionante. Note-se que,
se for estritamente crescente, esta abordagem, apesar de requerer apenas uma verificação, é
exatamente equivalente à verificação elemento a elemento.
A Fig. 1 representa as funções para cada curva do EC3 e para a curva da coluna “ideal”.
Para as primeiras é estritamente crescente e, portanto, as observações 4 e 5 são válidas se
uma única curva for utilizada. Se várias curvas forem utilizadas é possível que a coluna con-
dicionante não seja a que possui a menor esbelteza — em [6] são fornecidos gráficos que au-
xiliam a tarefa de identificar a coluna condicionante nestes casos. De qualquer forma, note-se
que a Fig. 1 mostra que, em geral, as colunas com E não necessitam ser verificadas.
Fig. 1: Variação de com a esbelteza normalizada.
Numa estrutura eficientemente dimensionada, todas as colunas são condicionantes e satis-
fazem nb,Rd,i = 1. Os conceitos introduzidos podem ser utilizados para atingir esta condição
(aproximadamente, dado que é naturalmente impossível garanti-la para todas as colunas e to-
das as combinações de ações). Assim, após um pré-dimensionamento, deve procurar-se modi-
ficar NRk,i de modo a obter valores de nb,Rd,i mais próximos de 1. Os gráficos da Fig. 2 podem
ser utilizados para o efeito, dado que representam os valores de nRk,i = NEd,i/NRk,i e i que ga-
rantem nb,Rd,i = 1, em função de ncr, para M1 = 1,0. Um valor de nRk,i acima (abaixo) da curva
considerada corresponde a um dimensionamento contra a (do lado da) segurança, enquanto
para o gráfico de i se verifica o inverso. Como é lógico, a alteração das secções transversais
pode requerer uma nova verificação, nomeadamente se (i) cr seja alterado significativamente
ou (ii) as curvas de encurvadura aplicáveis se alterem.
Fig. 2: Variação de nRk,i e de i
com ncr (para nb,Rd,i = 1).
Tema a definir pela Comissão Cientifica
5
2.4 Exemplos numéricos
Em [5,6] foram realizados estudos paramétricos relativos a três sistemas estruturais planos
com pouca redundância, para aferir o desempenho da abordagem proposta. Os resultados
(cargas de colapso GMNL) encontram-se resumidos nos gráficos da Fig. 3, tendo sido obtidos
utilizando o programa ABAQUS [9]. Todas as barras são constituídas por secções HEB 300
S235, sem raios de transição banzo-alma, e sujeitas à flexão em torno do eixo forte (os deslo-
camentos para fora do plano foram impedidos). Os comprimentos das barras e a relação P1/P2
foram variados de modo a obter uma gama alargada de valores de E , totalizando 328 casos.
Os gráficos mostram também a curva da estrutura “ideal” e a curva b do EC3, que se aplica a
todos os casos considerados. Estes resultados mostram que, como seria de esperar, as cargas
de colapso situam-se entre a curva b e a curva da estrutura “ideal”. Apenas dois valores se si-
tuam ligeiramente abaixo da curva b para a estrutura 1 e para E < 0,2, o que pode ser justifi-
cado pelo facto de não ter sido considerado o endurecimento do material. Assim, pode con-
cluir-se que a utilização da abordagem proposta, em conjunto com a curva b, conduz a estima-
tivas da resistência da estrutura do lado da segurança. No entanto, observa-se uma dispersão
considerável e, portanto, em alguns casos, a curva b fornece resultados algo conservativos.
Fig. 3: Resultados do estudo paramétrico relativo a três estruturas planas.
3. Vigas
3.1 A abordagem “tradicional”
Para elementos uniformes à flexão (vigas), a equação de verificação do EC3 para a encurva-
dura lateral por flexão-torção (LT) é
XI Congresso de Construção Metálica e Mista Coimbra, Portugal
6
,,11
,
,
,
M
RkLT
Rdb
Rdb
Ed
Rdb
MM
M
Mm
(10)
onde a simbologia é semelhante à adotada para colunas, ressalvando que MEd se refere ao
momento máximo atuante na barra. O coeficiente de redução é dado por
,,)(12
1,
1,
1,1min 2
0,222
cr
Rk
LTLTLTLTLTLT
LTLTLTLT
LTM
M
(11)
sendo que, (i) para o “caso geral” se utiliza = 1 e 2,00,
LT nas fórmulas, considerando-se
que para 4,0LT
(valor recomendado) se pode tomar 1LT
, e (ii) e para secções em I la-
minadas ou soldadas equivalentes, (cláusula 6.3.2.3), os valores recomendados são = 0,75 e
4,00,
LT . Neste último caso, o coeficiente pode ainda ser “modificado” LT,mod (incrementa-
do) para distribuições não-uniformes de momento.
Considere-se uma viga de múltiplos vãos, constituída por n segmentos uniformes, sujeita a
uma determinada combinação de ações (ELU). No segmento i o momento máximo atuante e o
correspondente momento crítico podem ser obtidos através de iEdiEd
MM ,
e icricr
MM ,
,
respetivamente, e a relação entre as esbeltezas normalizadas de dois segmentos resulta
./
/
,
,
,,
,,
,
,
jjRk
iiRk
jRkicr
jcriRk
jLT
iLT
MM
MM
MM
MM
(12)
Assim, à semelhança do caso das colunas, (Obs. 6) o segmento mais próximo de atingir MRk é
o menos esbelto e (i) para segmentos com MRk idênticos, o que possui o menor momento má-
ximo é o mais esbelto (em particular, iLT ,
com 0,
iEdM ), (ii) para segmentos com MEd
idênticos, o que possui o maior MRk é o mais esbelto. Mais uma vez, a esbelteza do segmento
individual deixa de refletir a sua suscetibilidade à encurvadura e 1LT
( 1LT
) apenas indi-
ca que, quando = cr, o momento máximo nesse segmento é inferior (superior) a MRk.
3.2 A esbelteza da viga
O conceito da esbelteza da estrutura pode ser alargado a vigas de vários vãos através de
.,...,1,min,,
,ni
M
M
i
iRk
Rk
cr
Rk
ELT
(13)
Tal como discutido na Secção 2.2, (i) a observação 2 permanece válida, (ii) para uma viga
“ideal”, 1,
ELT indica que Rk > cr e que, portanto, a viga é suscetível à encurvadura, e (iii)
pode definir-se um coeficiente de redução como o da Eq. (5). Para além do que foi referido,
tem-se também
min,.,
minLTiLTELT (14)
e assim (Obs. 7) a esbelteza da viga é igual à menor esbelteza de todos os seus segmentos.
3.3 O segmento condicionante
Exprimindo o coeficiente de redução na forma 2/LTLTLT torna-se possível reescrever a
Eq. (101) como
.,1,
,
,
1
,,
,
,,
icr
iEd
cr
Ed
crcr
iLT
M
iRdb
iEd
iRdbM
Mmm
M
Mm
(15)
Como o segmento condicionante será o que possuir o maior valor de mb,Rd,i, se LT for estri-
tamente crescente com LT
, conclui-se que (Obs. 8) O segmento condicionante é o menos es-
belto (CLT ,
=min,LT
=ELT ,
) e, tal como para colunas, (i) o segmento condicionante é o mais
próximo de atingir MRk e (ii) se todos os segmentos possuem o mesmo valor de MRk, o mais
Tema a definir pela Comissão Cientifica
7
solicitado é o condicionante, independentemente do seu comprimento, forma do diagrama de
momentos ou condições de apoio. Claramente, a verificação pode basear-se na viga completa,
sendo equivalente à verificação segmento a segmento desde que LT seja estritamente cres-
cente: (Obs. 9) em vez de verificar apenas o segmento condicionante, pode “verificar-se a
viga completa” com
.,,12
,
,
1
,
,
,
,
ELT
LT
ELT
M
RkeLT
Rdb
Rdb
Ed
Rdbm
(16)
sendo LT calculado com ELT ,
e o valor de LT associado ao segmento condicionante.
As funções LT para o método geral e para o método da cláusula 6.3.2.3 encontram-se re-
presentadas na Fig. 4, de onde se pode concluir que, para cada curva, são estritamente cres-
centes exceto (i) para LT = 0,4, no caso do método geral, e (ii) para o limite superior LT = 1,
para o método da cláusula 6.3.2.3. Assim, em geral, se apenas se utilizar uma curva de encur-
vadura, não é necessário verificar os segmentos com ELTLT ,
e, tal como no caso das colu-
nas, é possível efetuar uma otimização estrutural, modificando os valores de MRk destes seg-
mentos para obter valores de mb,Rd,i próximos do relativo ao segmento condicionante (que ide-
almente será próximo de 1). Esta tarefa pode ser executada com a ajuda dos gráficos da Fig. 5,
que representam os valores de mRk,i = MEd,i/MRk,i que garantem mb,Rd,i = 1, em função de mcr,
para M1 = 1,0: um valor de mRk,i acima (abaixo) da curva considerada corresponde a um di-
mensionamento contra a (do lado da) segurança. Conforme seria de esperar, a modificação
dos valores de MRk,i pode requerer uma nova verificação, nomeadamente se (i) cr seja altera-
do significativamente ou (ii) as curvas de encurvadura aplicáveis se alterem.
Fig. 4: Variação de LT com LT
.
Fig. 5: Variação de mRk,i com mcr (para nb,Rd,i = 1).
XI Congresso de Construção Metálica e Mista Coimbra, Portugal
8
3.4 Exemplos numéricos
Os exemplos apresentados nesta secção envolvem secções IPE e IPEA (sem raios de transição
banzo-alma), correspondendo a LT = 0,21 para o caso geral e LT = 0,34 para o método da
cláusula 6.3.2.3. As cargas de colapso (GMNL) são obtidas com o programa ANSYS [14].
Considera-se que os apoios impedem os deslocamentos vertical e lateral, bem como a rotação
de torção, mas não restringem o empenamento. Entre elementos adjacentes, o empenamento é
assumido contínuo, mesmo se a secção transversal variar.
3.4.1 Viga de dois vãos
Em primeiro lugar apresenta-se um estudo paramétrico da viga representada na Fig. 6, onde se
varia a relação entre os momentos de extremidade (parâmetro ) e entre os comprimentos dos
dois segmentos (parâmetro ). Introduz-se uma imperfeição geométrica lateral em cada seg-
mento igual a e0 = L/1000, conforme mostra a figura, mas em direções opostas em cada vão,
formando um “S” em planta, o que está em acordo com a forma do modo crítico de instabili-
dade. Note-se que, de acordo com a observação 8ii, o segmento condicionante encontra-se so-
licitado pelo maior momento: o segmento 1 para < 1; o segmento 2 para > 1.
O gráfico da Fig. 6 mostra os valores de LT obtidos com análises GMNL, a curva de en-
curvadura da viga “ideal”, as curvas do EC3 aplicáveis e a envolvente dos valores LT,mod ob-
tidos com a cláusula 6.3.2.3(2) do EC3 (no último caso optou-se por representar uma envol-
vente porque os valores dependem da relação entre os momentos de extremidade de cada
segmento). Estes resultados permitem extrair as seguintes conclusões:
(i) Para ELT ,
< 1,3 os resultados GMNL situam-se bastante acima das curvas a e b, mas
estão em excelente acordo com a envolvente LT,mod. Assim, a abordagem proposta for-
nece excelentes resultados se LT,mod for utilizado e resultados muito conservativos se
forem utilizadas as curvas a ou b.
(ii) Para ELT ,
> 1,3 os resultados GMNL mostram uma significativa resistência de pós-
encurvadura, em acordo com o reportado por outros autores para vigas com um único
vão (e.g., [15]). Contudo, conforme referido em [16], esta resistência tem pouca rele-
vância prática, dado que está associada a grandes deslocamentos e, portanto, deve ser
limitada à curva da viga “ideal”. É ainda de notar que os resultados GMNL estão dispostos ao longo de uma curva bem de-
finida. Apenas se registam duas exceções com resistências significativamente mais altas, mas
correspondem a casos algo “peculiares”, com = 2, = 0,3 e L1 + L2 = 20 m ou 40 m.
Fig. 6: Viga de dois vãos sujeita a momentos de extremidade.
Tema a definir pela Comissão Cientifica
9
3.4.2 Viga de três vãos
Considere-se agora a viga de três vãos da Fig. 7. Tal como no caso anterior, as imperfeições
geométricas são aplicadas em direções opostas em vãos adjacentes. A viga é inicialmente
constituída por perfis IPE 200 S235 e o respetivo diagrama de momentos encontra-se repre-
sentado na figura (diagrama “Inicial”). Como MRk é igual nos dois segmentos, pode imedia-
tamente concluir-se, da observação 8ii, que o segmento 3 será condicionante. Uma análise li-
near de estabilidade fornece cr = 1,901, o que permite obter 3,, LTELT
0,775, 1,LT
1,731
e 2,LT
0,995. Por outro lado, a análise GMNL fornece colapso = 1,047, o que quer dizer que
a viga está ligeiramente sobredimensionada.
Fig. 7: Viga de três vãos sujeita a forças verticais.
Os resultados da análise GMNL para o dimensionamento “inicial” encontram-se represen-
tados no gráfico da Fig. 7, em conjunto com a curva da coluna “ideal” e as curvas do EC3
aplicáveis. Muito embora sejam mostrados resultados para todos os segmentos (marcadores
“GMNL inicial”), recorde-se que a resistência do segmento condicionante (i) coincide com a
obtida com a abordagem baseada na estrutura (LT,E) e (ii) é a única que deve ser comparada
com as curvas do EC3, dado que para um segmento não-condicionante (NC) se tem necessari-
amenteCNCCLTNCLT
MM /,,
e, portanto, diminui com o momento aplicado.
Os resultados para o dimensionamento inicial mostram que o marcador para o segmento
condicionante coincide virtualmente com a curva LT,mod associada, demonstrando mais uma
vez que esta curva fornece valores precisos do coeficiente de redução. Contudo, o facto de os
segmentos 1 e 2 exibirem esbeltezas consideravelmente superiores a ELT ,
indica que estes se
encontram sobredimensionados — de facto, utilizando LT,mod, obtém-se mb,Rd,1 = 0,526 e
mb,Rd,2 = 0,676, valores bastante reduzidos, enquanto que para o segmento 3 se obtém antes
mb,Rd,3 = 0,960, o que revela um ligeiro sobredimensionamento.
As conclusões anteriores motivam uma otimização estrutural adotando secções mais “le-
ves” para os segmentos 1 e 2. Concretamente, deve reduzir-se o valor de MRk destes segmen-
tos, para obter esbeltezas mais próximas deELT ,
. Adotam-se secções IPEA 120 e 180 para os
segmentos 1 e 2, respetivamente, o que reduz a carga crítica para cr = 1,234 e conduz a es-
beltezas muito mais próximas: 1,LT
= 1,042, 2,LT
= 1,026 e 3,LT
= 0,947. Destes valores resul-
ta que o segmento 3 é, mais uma vez, o condicionante. O respetivo diagrama de momentos
encontra-se também representado na Fig. 7 (diagrama “final”).
Uma análise GMNL do novo dimensionamento conduz a colapso = 0,972 < 1, i.e., a viga
está agora ligeiramente contra a segurança e deve ser objeto de alteração. No entanto, os mar-
cadores individuais (“GMNL, final”, ver gráfico da Fig. 7) situam-se agora mais próximos
XI Congresso de Construção Metálica e Mista Coimbra, Portugal
10
uns dos outros, conforme requerido. O marcador do segmento condicionante está quase 10%
acima da curva “modificada”, o que mostra que, neste caso, esta curva subestima a resistên-
cia. Aliás, utilizando LT,mod obtém-se mb,Rd,1 = 1,020, mb,Rd,2 = 1,010 e mb,Rd,3 = 1,128, valores
que, embora bastante próximos (um dos principais objetivos da otimização), são superiores a
1,0 e, portanto, contra a segurança.
Podem ser adotadas variações do processo de otimização proposto. Por exemplo, utilizan-
do a curva “modificada” do segmento 3 e assumindo que o momento máximo é, aproximada-
mente, 44 kNm (o que carece de verificação posterior à alteração das secções), sabendo que
MRk = 49,27 kNm para um IPE 200 S235 (sem raios de transição banzo-alma), tem de ter-se
LT,mod = 44/MRk = 0,893, o que é conseguido com LT < 0,81. Torna-se assim necessário alte-
rar as secções dos segmentos 1 e 2 e calcular cr até atingir o limite requerido — tal ocorre,
por exemplo, quando os segmentos 1 e 2 são IPEs 140 e 180, respetivamente.
A alteração da classe do aço constitui uma opção bastante vantajosa para tornar o processo
de otimização mais expedito, dado que não modifica o valor de cr. Por exemplo, considere-
se que a viga se encontra carregada conforme mostra a Fig. 8 e que se adota aço S355 em to-
dos os vãos. Neste caso tem-se cr = 1,632, 1,LT
= 1,165, 2,LT
= 1,345 e ELTLT ,3,
1,023
(valores com significativa dispersão) e o segmento 3 é mais uma vez condicionante. Uma aná-
lise GMNL fornece colapso = 1,312, indicando que a viga está sobredimensionada e portanto é
necessário proceder a uma otimização. Os resultados GMNL do dimensionamento inicial, pa-
ra cada segmento, são fornecidos na figura (marcadores “GMNL, inicial”), conjuntamente
com as curvas de encurvadura relevantes. Conclui-se que as curvas LT,mod para o segmento
condicionante são, neste caso particular, muito precisas.
Fig. 8: Viga de três vãos sujeita a forças verticais: efeito da alteração da classe do aço.
A otimização é efetuada modificando a classe do aço dos segmentos 1 e 2, conforme indi-
cado por baixo do diagrama de momentos da Fig. 8, de forma a diminuir MRk. Com esta modi-
ficação não se altera o diagrama de momentos, cr e 3,LT
)(,ELT
. Contudo, para os segmen-
tos 1 e 2 obtém-se agora 1,LT
= 1,026 e 2,LT
= 1,095, valores muito mais próximos de ELT ,
.
Os resultados GMNL para o dimensionamento “final” estão representados no gráfico e pode
observar-se que se tornaram muito mais próximos (os marcadores dos segmentos 1 e 3 são
virtualmente coincidentes). Regista-se ainda que o marcador do segmento condicionante se
localiza agora ligeiramente abaixo da curva “modificada” correspondente.
Depois do procedimento efetuado, as resistências de cada segmento tornam-se mais próxi-
mas (as esbeltezas são semelhantes), mas uma análise GMNL permite concluir que a carga de
colapso ainda é bastante alta (colapso = 1,255), pelo que o processo de otimização deve ser
Tema a definir pela Comissão Cientifica
11
refinado — de facto, com a curva “modificada” obtém-se mb,Rd,1 = 0,783, mb,Rd,2 = 0,721 e
mb,Rd,3 = 0,785, valores bastante próximos, conforme pretendido, mas consideravelmente
abaixo do limite (1,0). Para otimizar a estrutura adota-se S235 em toda a viga, o que conduz a
colapso = 1,03 (satisfatório), apesar de as esbeltezas se afastarem ligeiramente (1,LT
= 0,948,
2,LT = 1,095,
3,LT = 0,832). Para aproximar estes valores é necessário alterar as secções
transversais, conforme foi já discutido.
4. Conclusões
Neste artigo mostrou-se que a abordagem proposta, baseada em parâmetros da estrutura, pode
ser aplicada para calcular, racionalmente e eficientemente, a resistência de colunas ou vigas
contidas em estruturas. Os aspetos principais desta abordagem são:
1. fornece uma resistência à encurvadura idêntica à obtida calculando a resistência de cada
elemento da estrutura e usando as curvas do EC3;
2. baseia-se em parâmetros que permitem aferir o comportamento estrutural.
Em particular, mostrou-se que a esbelteza da estrutura desempenha um papel fundamental na
caracterização do comportamento estrutural, na identificação da barra condicionante e no es-
tabelecimento de procedimentos de otimização. Os exemplos apresentados mostram o poten-
cial da abordagem proposta.
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