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Por uma política de (i)responsabilidade para Moçambique UMA ANÁLISE SOCIO-ECONÓMICA DOS SALÁRIOS E REGALIAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E DOS DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA Maputo, 14 de Maio de 2014

UMA ANÁLISE SOCIO-ECONÓMICA DOS SALÁRIOS E … · 2016-04-25 · os fins dos mandatos que assumem forma de Lei aguardando promulgação do Presidente da ... Nº de deputados População/deputado

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Por uma política de (i)responsabilidade para Moçambique

UMA ANÁLISE SOCIO-ECONÓMICA DOS SALÁRIOS E REGALIAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E DOS DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

Maputo, 14 de Maio de 2014

SALÁRIOS E REGALIAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E DOS

DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objectivo realizar uma pequena e sintética reflexão sobre os salários e regalias praticadas nas funções (órgão) do Presidente da República e dos deputados da Assembleia da República. O estudo enquadra-se nas últimas medidas aprovadas na Assembleia da República, que acrescentam regalias ao Presidente da República em final de mandato, a(o) Presidente da Assembleia da República e aos restantes deputados, muitos dos quais, também em final de mandato. A sociedade civil, através de várias organizações, manifesta indignação pelos procedimentos, valores envolvidos, tipos de benesses, oportunidade e justiça social da Lei em trâmite de promulgação. Estas organizações procuram, de forma organizada e no quadro da Lei e dos direitos democráticos, evitar que as leis 21/92, de 31 de Dezembro que estabelece os Direitos e Deveres do Presidente da República, bem assim a 31/2007 de 21 de Dezembro que estabelece o sistema de Previdência e Segurança Social do deputado. Além da Introdução, o texto tem cinco secções. Na segunda secção são apresentados alguns pontos prévios relativos ao trabalho e a princípio da gestão de recursos públicos. Na terceira secção, faz-se uma breve apresentação da metodologia utilizada. Na secção quatro, é feita uma breve análise do orçamento do Estado, nos aspectos concordantes com o objectivo do trabalho. Na quinta, apresentam-se os indicadores seleccionados para a análise dos salários dos deputados e do Presidente da República. A secção seis, procura estimar os valores que correspondem com as novas benesses em fase de promulgação pelo Presidente da República. A secção sete faz um resumo em jeito de conclusões e finalmente apresentam-se algumas sugestões ao Senhor Presidente da República. 2. PONTOS PRÉVIOS Antes da análise dos orçamentos e dos salários e benesses (mordomias) do Presidente da República e dos deputados, convém referir alguns aspectos de princípio. Primeiro: princípio da equidade/justiça social. Os salários praticados nos cargos referidos, não revelam alguma intenção de assegurar esse princípio. As relações entre os salários das funções em análise com os salários de várias profissões e com o salário mínimo e o rendimento médio por habitante (PIB per capita), são muito elevadas. Segundo: princípio da austeridade. A evolução dos salários dos funcionários tem sido rápida e o volume de salários do Estado representa, neste momento, quase 11% do total da riqueza gerada na economia moçambicana, uma das facturas mais elevadas do mundo. Em 2014, o aumento da massa salarial de funcionários público aumentou em 13%, acima do crescimento económico e mais de duas vezes a inflação esperada para este ano. Esta evolução, é similar ao aumento rápido dos gastos públicos do Estado, tanto em termos absolutos como em proporção do Produto Interno Bruto. Existe um evidente despesismo e incremento da dívida pública, atingindo níveis de elevado risco de sustentabilidade. Terceiro: princípio da transparência. As decisões sobre os salários, benesses e garantias após os fins dos mandatos que assumem forma de Lei aguardando promulgação do Presidente da República, não estão publicadas no portal da Assembleia, não foram debatidas em outros fora

que não a Assembleia. As informações existentes foram veiculadas pelos órgãos de informação e obtidos através de acessos não formais à informação. O princípio da transparência está ferido. Quarto: princípio da ética. Os funcionários são servidores dos cidadãos, pagos pelos impostos dos moçambicanos e deveriam manter um profundo respeito na utilização dos recursos. Este princípio é ainda mais afincado, porque cerca de 50% dos gastos do Estado (decresceu para cerca de 45% nos últimos dois anos), são suportados pelos impostos dos cidadãos de outros países no âmbito de uma cooperação solidária. Quinto: princípio da seriedade. Não parece muito sério, o aproveitamento do fim dos mandatos e portanto em período eleitoral, os deputados decidirem sobre as suas próprias condições pós mandatos. Reformas avultadas e outras regalias muito diferentes daquelas praticadas aos cidadãos, acrescenta injustiça e transmite um sentimento de oportunismo descarado. Sexto: princípio da moralização da política e dos políticos. Existem vozes, em vários países, sobretudo a partir dos centros do poder, que afirmam que as críticas aos salários e mordomias dos cargos dirigentes, incluindo dos deputados, constituem abordagens demagógicas/populistas. Em contra partida, são apresentados argumentos que se resumem no que se pode assumir como o da moralização dos actos e dos actores políticos. 3. METODOLOGIA O estudo adoptou a seguinte metodologia:

• Análise dos salários dos deputados, comparando com o salário mínimo e com o rendimento médio per capita em Moçambique.

• Comparação dos indicadores referidos no ponto anterior, com outros países, procurando apresentar informações de pelo menos um país da SADC e de dois ou três da Europa (Sul e Norte da Europa) e dos Estados Unidos.

Considerando serem realidades económicas muito diferentes, procurou-se transformar os dados estatísticos absolutos em unidades de medida comparáveis, para que as análises fossem ajustadas às condições dos países comparados. No lugar dos valores absolutos, deu-se preferência por valores relativos, comparando principalmente com os rendimentos per capita e com o salário mínimo e de algumas profissões conforme as tabelas salariais das respectivas carreiras profissionais. O estudo faz uma primeira apresentação sobre a evolução dos gastos públicos da Presidência da República e dos gabinetes dos governadores e assembleias provinciais. O quadro dos gastos da função pública, compara-se o número de ministérios e de deputados entre vários países. Devido à escassez de informação, nem sempre foi possível comparar, para todos os indicadores, valores referentes aos mesmos países. Em alguns casos, as comparações e as unidades de medidas são globais, o que não permite, análises mais “minuciosas”. É também necessário que o leitor, analise alguns indicadores com ponderação, considerando, uma vez mais as diferenças das realidades. Os resultados que comparam os salários dos deputados e do Presidente da República com outras variáveis (PIB per capita, salários mínimos e de outras profissões), surgem subavaliados na medida em que não incluem outras formas de rendimento, como por exemplo, casa, empregados domésticos e motoristas de casa, viaturas, assistência médico-medicamentosa no país e no estrangeiro, benefícios fiscais na importação de viaturas, despesas de representação, ajudas de custo, reformas, subsídios de reintegração, entre outras. Estas benesses, podem representar, em alguns casos, mais do dobro do salário base.

Podem existir ainda outras fontes de rendimento não directamente tangíveis e obtidas por acesso privilegiado de informação, por prática de peculato (utilização, desvio ou apropriação de um bem público para fins pessoais ou de terceiros), obtenção de rendas (rent seeking), corrupção, entre outras. Para casos específicos, a metodologia e formas de cálculo são referidos no texto no respectivo local da análise. Para efeitos de conversão entre o metical e o dólar americanos foi utilizado o câmbio de 30MZN/USD. Os cálculos de eventuais previsões foram realizados apenas considerando o valor actual e, portanto, sem o agravamento dos valores das benesses, seja pelo efeito dos preços como da inflação, de actualizações salariais e de outros eventuais agravamentos) Por respeito ao princípio da precaução, os cálculos foram realizados com base em valores conservadores (por exemplo no caso das isenções fiscais na importação de viaturas) e considerando os salários mais baixos dos deputados, entre outros casos. 4. ORÇAMENTO DO ESTADO A despesa do orçamento do Estado na Presidência da República e nas assembleias (da república e provinciais) cresceu a ritmos elevados conforme se pode observar nos gráficos abaixo.

Gráfico 1 Despesas de funcionamento (âmbito central) a preços constantes de 2011

Fonte: OGE (vários anos). Considerando a grande diferença de valores, o que poderia tornar as representações pouco perceptíveis, optou-se por um segundo gráfico para a representação dos gastos dos gabinetes dos governadores e das assembleias provinciais.

Gráfico 2

Constituintes das despesas de funcionamento (âmbito provincial) a preços constantes de 2011

Fonte: OGE (vários anos).

-

200,000

400,000

600,000

800,000

1,000,000

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Milh

ares

de

MT

Presidência da República Agricultura e institutos autónomos Infra-estruturas Educação e escolas nacionais

-50,000

100,000 150,000 200,000 250,000 300,000 350,000 400,000

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Milh

ares

de

MT

Gabinete do Governador Assembleia Provincial

Nos gráficos 1 e 2, observa-se que as despesas na presidência, gabinetes de governadores e assembleias provinciais1, são as que mais cresceram de entre os sectores definidos como importantes representados (agricultura, base do desenvolvimento económico e social, e educação e infra-estruturas). Embora não esteja representado nos gráficos, as despesas no sector da saúde, tiveram reduções importantes nos últimos anos. É importante comparar alguns indicadores globais da estrutura do Estado e do número de deputados das assembleias nacionais de alguns países, o que está representado no gráfico 3 abaixo.

Gráfico 3 Número de ministérios

Fonte: vários sítios da internet. Moçambique possui 53 ministros e vice-ministros. Apresenta-se, no quadro abaixo, o número de deputados e o ratio população por deputado.

Gráfico 4

Número de deputados e mil habitantes por deputado

Nota: barras vermelhas: deputado por mil habitantes. Fonte: vários sítios da internet. O gráfico 4, revela que cada deputado moçambicano representa um menor número de cidadãos que dos restantes países, excepto para o Reino da Suécia. Isto é, Moçambique, possui, relativamente à população, um maior número de deputados, salvaguardando a Suécia. Estes

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!1 As Assembleias Provinciais são órgãos de soberania em Moçambique, consagradas na constituição de 2004. As primeiras eleições para estas assembleias foram realizadas em 28 de Outubro de 2009. O aumento das despesas com a Assembleias coincide com o início do seu funcionamento. As funções das assembleias provinciais são de fiscalização, controle e monitorização do governo provincial, entretanto vários sectores da sociedade Moçambicana questionam a sua utilidade e peso no orçamento do Estado (Pio, 2013).

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34

14 11

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Moçambique Africa do Sul Alemanha Suécia Espanha

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Moçambique Africa do Sul Alemanha Suécia Espanha

Por m

il ha

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Nº de deputados População/deputado

dados devem ser ponderados, considerando os diferentes sistemas de representatividade parlamentar nos países analisados (como por exemplo a existência de parlamentos regionais). 5. ANÁLISE DE SALÁRIOS DOS DEPUTADOS DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

E DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA 5.1 Salários de deputados Os salários dos deputados são comparados, no gráfico seguinte, com o salário mínimo na agricultura e na função pública (actualização de 2014).

Gráfico 5

Relação entre o salário anual dos deputados, incluindo total de suplementos e abonos/ PIB per capita de Moçambique

Fonte: World Fact Book para o PIB per capita e Tabela Salarial para os deputados. Pode verificar-se, no gráfico acima, a relação elevada entre os salários anuais dos deputados, incluindo suplementos e abonos, e o rendimento médio dos moçambicanos. O chefe de uma bancada aufere rendimentos 50 vezes superior ao do rendimento médio de um cidadão moçambicano. Cada deputado, tem rendimentos vinte e cinco vezes superior ao rendimento per capita do país. Comparando com os países abaixo representados, fica evidente a desproporção e os níveis de iniquidade de rendimento de que os deputados moçambicanos beneficiam.

Gráfico 6 Relação entre os salários dos deputados/PIB per capita de alguns países seleccionados

Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e World Fact Book para o PIB.

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30 25

0

10

20

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50

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Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

4 4 3

2

0

1

2

3

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EUA França Alemanha Espanha

Gráfico 7 Relação entre os salários dos deputados, incluindo suplementos e abonos/Salário mínimo na agricultura

Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e Ministério do Trabalho aprovada para 2014 para o salário mínimo. O ratio representado no gráfico acima, possui valores similares para o caso da administração pública, defesa e segurança. O salário de um deputado é 23 vezes superior ao salário mínimo na agricultura (de 2014). O chefe de bancada possui rendimentos 46 vezes superior ao salário mínimo na agricultura.

Gráfico 8 Salário de deputados, incluindo suplementos e abonos na saúde e educação/Profissões seleccionadas

Nota: categoria 1, corresponde ao salário mais baixo da categoria profissional e a categoria 4 corresponde ao salário mais elevado. Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e Ministério das Finanças para os salários de profissões seleccionadas. Observa-se que um deputado aufere um salário 3 vezes superior ao de um professor e investigador auxiliar (que devem possuir o grau de Doutor), 10 a 11 vezes mais que o salário de um docente com a categoria N3 (nível 3 - escola secundária), quatro vezes o salário de que um médico assistente de um hospital e entre 16 e 18 vezes o salário de um assistente técnico de saúde.

46

27 23

0

10

20

30

40

50

Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

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0

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Investigador Auxiliar Docente universitário-Professor Auxiliar

Docente N3 Médico de hospital assistente

Auxiliares técnicos de saúde

Categoria 1 Categoria 4

Gráfico 9 Custo médio de um Centro de Saúde T2 (a)/

Salário anual de deputado, incluindo total de suplementos e abonos (a)

Nota (a) Centro de saúde do tipo II (providencia serviços primários de saúde) – custo entre 700.000USD-800.000USD. inclui: (1) atendimento externo (saúde mulher e criança, consultas gerais, ginecologia); (2) diagnóstico (HIV, malária...); (3) maternidade humanizada; (4) 2 casas para pessoal; (5) tratamento de lixo; (6) electricidade; e, (7) abastecimento de água. Foi calculado, considerando um custo médio, entre 700 e 800 mil dólares (igual a 750 mil) USD, fonte: MISAU Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e informação por entrevista para o custo de centro de saúde. O quadro acima revela que o salário anual de 14 chefes de bancada, seriam suficientes para pagar, integralmente, e em apenas um pagamento, o valor da construção de um centro de saúde de Tipo 2. Este indicador, para o caso dos membros da comissão e deputados, seriam respectivamente 23 e 27 salários anuais. O gráfico abaixo revela que 0,7 salários anuais (cerca de 17 meses) de um deputado, seria suficiente para pagar o custo da construção de um centro de saúde de Tipo 2, supondo o valor actual líquido e que o investimento seria pago em 20 anos. O gráfico demonstra ainda que os salários incluindo total de suplementos e abonos, de um membro de uma comissão parlamentar e do chefe de bancada são respectivamente iguais 0,9 e 1,5 vezes ao custo anual de um centro de saúde de Tipo 2, supondo o valor actual líquido e que o investimento seria pago em 20 anos. Isto é, 8 meses do salário de um chefe de bancada, seriam suficientes para pagar o valor anual do investimento em um centro de saúde de Tipo 2. E, para um membro de uma comissão, seriam necessários 13 meses.

Gráfico 10 Salário anual de deputado, incluindo total de suplementos e abonos/

Custo médio anual de um Centro de Saúde T2 (a)

14

23 27

0

5

10

15

20

25

30

Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

Nota (a): calculado com base em 750 mil dólares por centro de saúde T2. Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e informação por entrevista para o custo de centro de saúde.

Gráfico 11 Salário de deputado anual, incluindo suplementos e abonos/Custo médio de uma sala de aula (a)

Nota (a): calculado com base em 12.000,00 USD por sala de aula para 25 estudantes. Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e informação por entrevista para o custo de uma sala de aula. O gráfico 11 revela que o salário médio anual de um deputado, incluindo suplementos e abonos, corresponde ao investimento em cerca de 2,3 salas de aula. O salário anual de um membro de uma Comissão e de um chefe de bancada, incluindo suplementos e abonos pagariam, respectivamente, a construção de 2,7 e 4,6 salas de aula.

Gráfico 12

Salário, incluindo total de suplementos e abonos/ custo médio anual de uma sala de aula (a)

Nota (a): calculado com base em 12.000,00 USD por sala de aula para 25 estudantes. O valor corresponde ao custo anual do investimento, ao valor actual (12.000,00 USD / 20 anos de vida útil da sala). Fonte: Tabela Salarial para os salários de deputados e informação por entrevista para o custo de uma sala de aula.

1.5

0.9 0.7

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

4.6

2.7 2.3

0

1

2

3

4

5

Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

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33 27

0

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60

Chefe da Bancada Membro da Comissão Deputado

Do gráfico 12 pode observar-se que o salário anual de um deputado, é suficiente para custear o investimento anual de 27 salas de aula. O mesmo indicador para um membro de comissão e chefe de bancada é de 33 e 55 respectivamente, isto é um salário anual de um chefe de bancada pagaria o investimento (1/20 o investimento total) de 55 salas de aula 5.2 Salários do Presidente da República

Gráfico 13 Salário do Presidente da República/PIB per capita

Fonte: http://www.meusalario.org/mocambique. O gráfico acima revela os salários dos presidentes, comparativamente com as médias dos rendimentos auferidos pelos cidadãos dos seus países. O Presidente de Moçambique, é aquele que, relativamente ao rendimento per capita, possui um salário mais elevado. Em termos absolutos, os salários auferidos são os seguintes, em dólares por ano: Moçambique (52.330); Estados Unidos da América (393.526); Zimbabwe (17.932); China (39.572); Coreia do Sul (161.395); e, Namíbia (121.895). 6. AVALIAÇÃO DOS CUSTOS DAS MORDOMIAS DOS DEPUTADOS E DO

PRESIDENTE DA REPÚBLICA 6.1 Dos deputados Para a maioria das benesses aprovadas, não estão definidos os montantes, nem os períodos de vigência. Para o cálculo dos valores das benesses, adoptaram-se alguns critérios/pressupostos, especificados ao longo do texto e em local correspondente ao respectivo assunto. Os cálculos foram realizados com base na legislação ou, em casos omissos, considerando gastos estimados mínimos. Tomou-se em consideração os encargos com os deputados que auferem o salário mais baixo na Assembleia da República.

48

8

36

5 5

18

0

10

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30

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60

Moçambique EUA Zimbabwe China Corea do Sul Namíbia

Não foram determinados gastos de difícil previsão (sem base fundamentada de estimação), como por exemplo, gastos de representação, gastos de funerais, viagens, entre outros. Estes gastos são, para alguns cargos parlamentares, superiores às benesses médias dos deputados com salários mais baixos, como por exemplo, no caso das despesas de representação (vários textos publicados em jornais).

Tabela 1 Encargos com um deputado após mandato, em MZN

Benesse Base e critérios de cálculo Cálculo Valor total actual

Valor anual actual

Subsídio de reintegração

75% do salário por cada ano de mandato

60.000,00 MZN x 75% x 12 meses x 5 anos de mandato 2.700.000,00 Um único

pagamento

Subsídio de aposentação 100% do salário 60.000,00 MZN/mês x 12 meses 720.000,00 720.000,00

Viatura (isenção de direitos)

1 viatura em cada 5 anos, considerando a isenção dos impostos

900.000,00 meticais de isenção de impostos (a) 900.000,00 180.000,00 (c)

Subsidio AMM Família de 5 pessoas Estimativa de 10.000,00 MZN por agregado familiar de deputado/ano (b)

10.000,00 10.000,00

TOTAL 910.000,00

Notas: (a) Valores aproximados, considerando uma viatura 4x4 (tipo de veículo adquirido pelos deputados em beneficio desta regalia), com benefício das isenções de impostos (20% direitos G; 35% Imposto de Consumo e 17% Imposto Circulação – IVA), sem considerar a viatura mais cara (Nissan Navara 2.5); existem cálculos (jornal Savana), que indicam um dispêndio de 1.020.987,00 meticais. (b) estimativa conservadora de uma despesa de 10.000,00 meticais/ano por agregado de cinco membros. (c) considerando uma viatura por legislatura (5 anos) – cálculos realizados apenas considerando o valor actual e, portanto, sem o agravamento dos valores, seja pelo efeito dos preços como da inflação e de outros eventuais agravamentos). Fonte: Cálculo do autor. Da tabela 1, pode observar-se que, um deputado aposentado de salário mais baixo e sem considerar as benesses de difícil valorização (que em alguns casos representa mais do que o estimado na tabela), aufere, em um ano, rendimentos em cerca de 910 mil meticais, aproximadamente 30 mil dólares. Para além dos 30 mil dólares, recebe-se o subsídio de reintegração de 2.700.000,00 meticais, o equivalente a 90 mil dólares, o que ganharia um trabalhador agrícola com o salário mínimo em aproximadamente 30 anos, considerando o salário mínimo actual. Se no lugar de se considerar um deputado com o menor salário for considerando um Presidente da Assembleia, os valores são bem diferentes. O jornal SAVANA de 9 de Maio de 2014, afirma que Mulémbwè poderá “levar mais para casa 25 milhões de meticais (cerca de 850 mil USD) mais a pensão de aposentação. E manterá, vitaliciamente, o seu vencimento”.

Considerando que apenas exista uma renovação de 30% dos deputados entre duas legislaturas, o que significa reformas de 75 deputados (250 deputados x 30% = 75 deputados), e tomando para cálculo o valor actual, as benesses por legislatura seriam de cerca de 30.000,00 USD x 75 = 2.250.000,00 de dólares americanos o equivalente a 67.500.000,00 meticais por ano. Após os mandatos, os deputados mantêm um rendimento mínimo de 30 vezes o rendimento per capita dos moçambicanos. Um simples cálculo dos eventuais valores acumulativos, sobre os rendimentos dos deputados após os mandatos e considerando a taxa de renovação de deputados de 30% entre legislaturas, pode afirmar-se que, aos valores actuais, daqui por vinte anos, as pensões representariam 9 milhões de dólares (2.250.000,00 USD por reformas em cada legislatura x 4 legislaturas em 20 anos), o suficiente para, neste período, se construírem 12 centros de saúde do Tipo 2 e 720 salas de aula para 25 alunos, isto é, salas para 18 mil estudantes (considerando 25 alunos por sala). 6.2 Do Presidente da República

Segundo o estudo do impacto orçamental das novas regalias do Presidente da República realizado pelo ministério das Finanças, as novas benesses deste órgão do Estado representa, por ano, o valor adicional de 46.121.500,00 MZN (quarenta e sei milhões, cento e vinte e um mil e quinhentos meticais). Este valor, ao câmbio de 30 MZN/USD, equivale a cerca de 1,537 milhões de dólares, isto é perto de 130 mil dólares por mês. Estes valores, equivalem-se a cerca de mil e quinhentas vezes o actual rendimento per capita de Moçambique. Se for considerado a reforma de mais de um Presidente, os valores duplicam ou triplicam, conforme seja dois, três ou mais presidentes reformados, isto é, 260 mil, 390 mil dólares, e assim sucessivamente, por mês. 7. RESUMO A gestão dos recursos públicos, no caso das remunerações do Presidente da República e dos deputados, agridem, de forma violenta, a materialização dos direitos humanos consagrados universalmente e também pela constituição de República (tais como o direito a educação, saúde e uma alimentação condigna), princípios da equidade e justiça social, da austeridade, da transparência e da ética do servidor público, as decisões são de duvidosa seriedade e não contribuem para a moralização da política e dos políticos. Os gastos do Estado atravessam um período característico de uma política orçamental expansiva com despesismo, onde os incrementos na presidência da república e nas assembleias e gabinetes dos governadores, são superiores aos verificados em outros sectores considerados prioritários (agricultura, educação, saúde e infra-estruturas). Moçambique possui uma orgânica governamental muito pesada (considerando o número de ministérios e os gastos em salários e outras despesas com os funcionários públicos) e ainda pelo número de deputados, comparativamente à população. Os valores em numerário das remunerações dos cargos estudados, são muito superiores aos rendimentos médios por habitante, e muito superiores aos valores destes indicadores quando comparados com outros países da região e de países com democracias consolidadas.

A comparação dos salários dos deputados, revela que seriam possíveis aumentos quantitativos significativos na oferta de serviços públicos aos cidadãos, como por exemplo em centros de saúde e escolas. Este raciocínio pode ser extensivo a outras comparações, o que remete para a utilização abusiva dos bens públicos para fins pessoais e profundamente desrespeitadora dos moçambicanos. Os valores das regalias do Presidente da República e dos deputados, após os mandatos, são muito superiores aos salários oficiais (regulamentados nas tabelas salariais). No caso do PR este valor equivale a 1.500 vezes o actual rendimento per capita dos moçambicanos. Esta constatação, reforça de forma inequívoca, as grandes penumbras de transparências nas remunerações dos cargos públicos estudados. As regalias, após os mandatos, manifestam as enormes desigualdades, injustiças e utilização abusiva dos bens públicos e portanto, constitui uma subtracção abusiva dos rendimentos dos cidadãos nacionais e estrangeiros dos países que cooperam com Moçambique. Finalmente e por respeito à ponderação e à cautela, os valores calculados são muito inferiores às benesses reais do PR e dos deputados. 8. SUGESTÕES Considerando o exposto, sugere-se:

• Que a reforma administrativa do Aparelho do Estado seja realizada urgentemente, de forma a reduzir custos e tornar a administração mais moderna, eficiente, eficaz, próxima dos cidadãos e que respeite os princípios enunciados no texto. Isto é, que sejam respeitados os princípios da equidade e justiça social, da austeridade, da transparência e da ética do servidor público e que a gestão pública dignifique a política e os políticos.

• A necessidade dos órgãos dirigentes do estado tomarem medidas que revelem respeito pelos bens públicos, pelos moçambicanos e que dignifiquem a política e os políticos.

• Que o Presidente da República, em defesa da dignidade do Estado e da sua própria honradez, não promulgue as propostas da Assembleia da República, o que agravaria o desrespeito pelos princípios enumerados.

• As organizações da sociedade civil subescritoras do presente comunicado, alertam que a promulgação das propostas sobre as novas e acrescidas regalias do Presidente da República e dos deputados, poderão provocar crescentes sentimentos de indignação na sociedade moçambicana, o que agravaria a actual instabilidade social e política.

• As organizações da sociedade civil, apelam ainda para que o discurso justificativo, não seja demagógico e manipulador, fazendo comparar de forma simplista, as benesses do PR e dos deputados com outras realidades bem diferentes. E, sobretudo, que as comparações sejam relativamente a países com bons exemplos de austeridade, equidade e justiça social, transparência e respeito pelos bens públicos e pelo cidadãos.