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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
APLICAÇÃO DO INTERDITO PROIBITÓRIO
NO INSTITUTO DA GREVE
Por: Sílvia de Fátima Ribeiro Gomes
Orientador
Prof. Jean Alves
Rio de Janeiro
2010
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
APLICAÇÃO DO INTERDITO PROIBITÓRIO
NO INSTITUTO DA GREVE
Apresentação de monografia à Universidade
Cândido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito do
Trabalho e Processo do Trabalho.
Por: Sílvia de Fátima Ribeiro Gomes
3
DEDICATÓRIA
Principalmente aos meus pais que
abdicaram sempre a vida deles em prol
da minha e que com tanta paciência e
carinho orientaram-me no caminho da
vida.
4
RESUMO
A presente monografia tem por objetivo analisar a possibilidade de
cabimento do interdito proibitório como instrumento para aplacar o exercício do
direito de greve e, para isso, este trabalho reúne elementos de análise quanto
à possibilidade de utilização desse instituto, instrumento de ordem civil para
evitar esbulho ou turbação na posse, quando a matéria é o instituto
constitucional de greve.
As ações de interdito proibitório impetradas com esta finalidade na
Justiça Comum iniciou-se nos anos 90, principalmente tendo como réus nestas
ações os Sindicatos dos Empregados dos Estabelecimentos Bancários. Isso
despoletou discussão sobre o cerceamento do exercício do direito de greve e
seus limites.
A competência para conhecer e julgar essas ações de interdito
proibitório era da Justiça Comum, apesar de tratar-se de matéria trabalhista,
sendo, por isso, conflituoso esse entendimento, principalmente após a Emenda
Constitucional nº 45 de 08 de dezembro de 2004.
O estudo busca também levantar os aspectos controvertidos, e
principalmente jurisprudencial, a fim de identificar a tendência que hoje
prevalece.
5
METODOLOGIA
Apesar do interdito proibitório estar sendo largamente utilizado em
matéria trabalhista desde os anos 90, havia entendimento pacificado de que a
competência seria da Justiça Comum, havendo, assim, restrita doutrina
bibliográfica a respeito do assunto.
As discussões mais acirradas só começaram a ser expostas a partir de
2008, o que impossibilitou larga consulta bibliográfica sobre a matéria.
Logo, o tipo de pesquisa predominantemente adotado na elaboração da
monografia sobre o tema proposto foi a webgrafia inclusive aos documentos
legislativos, doutrinários e jurisprudenciais anteriores e posteriores à
Constituição Federal e, em especial, à edição da Emenda Constitucional nº 45,
de 08 de dezembro de 2004.
Com a denúncia realizada pelos sindicatos brasileiros à Organização
Internacional do Trabalho (OIT) em 2009 sobre a utilização do interdito
proibitório no instituto constitucional de greve, prática que durante muito tempo
foi admitida pela Justiça Comum, e que agora tem sido admitida pela Justiça
do Trabalho, e com a edição da Súmula Vinculante nº 23 em dezembro de
2009, é de se supor que passará a haver maiores discussões sobre a matéria
e consequentemente mais doutrina expositiva sobre o assunto a partir de
agora.
Procurou-se nesse trabalho adotar o novo Acordo Ortográfico,
respeitando-se, entretanto, a ortografia original das citações.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I - Direito Constitucional de Greve
09
CAPÍTULO II - Interdito Proibitório
40
CAPÍTULO III – Jurisprudência
46
CONCLUSÃO 58
BIBLIOGRAFIA 73
WEBGRAFIA 75
ÍNDICE 78
FOLHA DE AVALIAÇÃO
79
7
INTRODUÇÃO
A utilização do interdito proibitório nos movimentos grevistas, cerceando
o exercício do direito de greve tem sido objeto de discussão.
Desde logo, cabe registrar que o direito de greve representa uma das
mais relevantes conquistas dos trabalhadores, como iremos ver durante a
exposição histórica e legal ao longo do trabalho. É por meio do exercício desse
direito que determinada categoria luta pela aquisição de melhores condições
de trabalho ou pela preservação de direitos existentes, quando estes são
ameaçados de violação ou até mesmo violados pelo empregador.
O estudo ora empreendido revela extraordinário alcance, tanto do ponto
de vista legal como também sociológico, visto que o direito de greve é um
direito fundamental, que além de possibilitar o pleito de condições de trabalho
melhores e mais dignas, é também direito imperioso para o desenvolvimento
do ser humano, contribuindo, perpendicularmente, da mesma forma com o
desenvolvimento de toda uma sociedade democrática.
Nos anos 90, começaram a aparecer as primeiras ações possessórias
de interdito proibitório na Justiça Comum, principalmente contra a categoria
bancária colocando em xeque o exercício do direito de greve.
Justifica-se, portanto, o desenvolvimento do presente estudo pela
necessidade de se esclarecer se é possível ou não a impetração de ações de
interdito proibitório em matéria trabalhista e, cabendo o seu emprego nesta
matéria, qual a competência para se julgar as ações envolvendo movimentos
grevistas.
8
Ao final será verificada qual a jurisprudência dominante sobre a matéria
e quais os limites do exercício do direito de greve.
O primeiro capítulo é exclusivamente dedicado ao exercício da greve:
traça o seu conceito e um resumo histórico sobre este instituto, com ênfase
nas greves da categoria bancária, alvo acirrado das ações de interdito
proibitório contra seus movimentos grevistas; além disso, esse capítulo traz
uma pesquisa breve sobre alguns países como Itália, França, Portugal e China,
dentre outros.
No segundo capítulo foi apresentado, exclusivamente, o instituto do
interdito proibitório e a competência para seu julgamento.
No terceiro e último capítulo foi realizado um confronto entre os dois
institutos, trazendo definição quanto a competência para julgar as ações de
interdito proibitório quando a matéria tratada é o exercício do direito de greve, e
foi abordado as principais posições jurisprudenciais sobre o assunto,
destacando-se a evolução ao longo da última década.
9
CAPÍTULO I
DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE
1.1 - A etimologia da palavra greve
O dicionário eletrônico em CD-ROM da Houaiss (2001) nos explica que
a palavra grève teve sua origem na França no ano de 1140 e que tinha por
significado “terreno de areia e cascalho à beira-mar ou à beira-rio” e que
etimologicamente foi originada do pré-latim “grava” que significava “areia,
cascalho”; “grève” foi designada como a área tornada praça defronte do
palácio da Municipalidade de Paris, Place de Grève (hoje chamada Place de
l'Hôtel-de-Ville), tendo recebido esse nome por causa dos gravetos trazidos
pelo rio Sena e que se acumulavam no local. Essa praça era ponto de reunião
de trabalhadores e operários sem emprego ou descontentes com as suas
condições de trabalho, tendo daí surgido a expressão “faire grève” (1805) que
significa “fazer greve” no sentido de “abstenção deliberada ao trabalho”.
O galicismo “greve” prevaleceu sobre a palavra “parede”, apesar de
ainda se encontrar presente na nossa legislação, como iremos ver, e inclusive
na gíria estudantil como “abstenção coletiva às aulas”.
A palavra parede aparece no artigo 197 inciso II no Código Penal
(Decreto-lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940); mas o artigo 722 da
Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943 que trata do lock-out e da greve,
bem como as Constituições posteriores e os lexicógrafos brasileiros preferiram
utilizar a palavra greve.
10
No artigo 2º da Lei 7.783 de 28 de junho de 1989, conhecida como Lei
da Greve, conceitua-nos o legítimo direito de greve como a suspensão coletiva,
temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a
empregador.
Greve deve ser compreendida como:
A paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das
atividades dos trabalhadores em face de seus
empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo
de exercer-lhes pressão, visando a defesa ou conquista
de interesses coletivos, ou com objetivos sociais mais
amplos. (DELGADO, 2001, p. 149)
Logo, devemos entender greve como uma paralisação das atividades
pelos empregados de forma a pressionar, legitimamente, o empregador a
aceitar as reivindicações e manter e/ou conceder melhoria nas condições de
trabalho. É a cessação voluntária e coletiva do trabalho, decidida por
assalariados para obtenção de benefícios materiais e/ou sociais, como
melhoria das condições de trabalho e direitos trabalhistas, respeitados os
serviços considerados essenciais.
Hoje, no Brasil, os serviços ou atividades consideradas essenciais, para
fins do exercício de greve, estão elencadas no art. 10 da Lei 7.783/89:
São considerados serviços ou atividades essenciais:
I - tratamento e abastecimento de água; produção e
distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
II - assistência médica e hospitalar;
III - distribuição e comercialização de medicamentos e
alimentos;
IV - funerários;
V - transporte coletivo;
VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII - telecomunicações;
VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas,
equipamentos e mate-riais nucleares;
11
IX - processamento de dados ligados a serviços
essenciais;
X - controle de tráfego aéreo;
XI - compensação bancária.
Verificamos que muitas greves ocorrem também com o único intuito de
garantir as conquistas já adquiridas com anos de luta, inclusive as obtidas em
outras greves, e que, porventura, estejam ameaçadas de supressão pelo
empregador.
A greve é ao mesmo tempo pressão para construir a
norma e sanção para que ela se cumpra. Por isso, serve
ao Direito de três modos sucessivos: primeiro como fonte
material; em seguida, se transformada em convenção,
como fonte formal; por fim, como modo adicional de
garantir que as normas efetivamente se cumpram.
(VIANA, 2007, p. 113)
A greve é reconhecida, hoje, como um direito, que além de ser fonte
jurídica material e formal, é ao mesmo tempo norma, sanção e garantia.
1.2 – Histórico de greve no Brasil
No Brasil, durante longas décadas, o exercício de greve foi considerado
como delito e, em outras situações, sequer houve previsão a respeito.
O Código Penal dos Estados Unidos do Brasil de 11 de outubro de 1890
proibia a greve. Os artigos 204 a 206 dispunha sobre os “crimes contra a
liberdade de trabalho”. É importante transcrevermos o artigo 206:
Art. 206. Causar, ou provocar, cessação ou suspensão
de trabalho, para impor aos operarios ou patrões
augmento ou diminuição de serviço ou salario:
Pena de prisão cellular por um a três mezes.
12
§ 1º Si para esse fim se colligarem os interessados:
Pena aos chefes ou cabeças da colligação, de prisão
cellular por dous a seis mezes.
§ 2º Si usarem de violencia:
Pena de prisão cellular por seis mezes a um anno, além
das mais em que incorrerem pela violencia.
Marechal Teodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório da
Republica dos Estados Unidos do Brasil em 1890, considerando que a redação
dos artigos 205 e 206 do Código Criminal pudesse dar lugar a dúvidas e
interpretações errôneas e com intuito de restabelecer a clareza indispensável,
sobretudo às leis penais, promulgou por meio do Decreto nº 1.162, de 12 de
dezembro de 1890, artigo 1º, alteração ao artigo 206, ficando ele assim
redigido:
Causar ou provocar cessação ou suspensão de trabalho
por meio de ameaças ou violencias, para impôr aos
operarios ou patrões augmento ou diminuição de serviço
ou salario:
Penas - de prisão cellular por um a tres mezes.
Verificamos que antes, pelo caput do artigo 206 do texto original do
Código Penal de 1890 que a greve era crime, mesmo sem violência. Com a
alteração do artigo 206 pelo Decreto 1.162 passou a ser crime somente se
ocorrer o uso de ameaça ou violência.
Logo, o Decreto 1.162 derrogou a orientação de criminalizar o exercício
de greve.
A Constituição de 24 de fevereiro de 1891 foi omissa a respeito da
greve, mas como fato de natureza social, as greves foram toleradas pelo
Estado durante a sua vigência.
13
No início do século XX, houve grande crescimento industrial e urbano,
originando o surgimento de bairros operários, formados em sua maioria por
imigrantes. Entretanto, as más condições de vida e de trabalho dos operários
eram agravadas pela falta de leis trabalhistas, que garantissem direitos como o
descanso semanal, as férias e a aposentadoria.
Por isso, as primeiras manifestações grevistas lutavam não só por
melhores condições de trabalho como também pela implantação de uma
sociedade, pelo menos teoricamente, mais igualitária.
Os baixos salários e o excesso de horas trabalhadas fizeram culminar
em maio de 1907 na cidade de São Paulo, a primeira greve geral do Estado de
São Paulo. Sob o comando de ativistas, operários de vários ramos da
indústria, funcionários das estradas de ferro e do Liceu de Artes e Ofícios,
paralisaram a cidade de São Paulo com uma greve que reivindicava jornada de
oito horas diárias de trabalho. O movimento estendeu-se para o interior do
Estado, tendo sido os piquetes, reprimidos com violência.
Em julho de 1917, outra grande greve teve início em São Paulo, na
maior tecelagem do país: o Cotonifício Crespi, e expandiu-se para outros
Estados, com a adesão, inclusive, de servidores públicos, sendo considerada a
primeira greve nacional.
Nesta manifestação era reivindicado a proibição de trabalho para os
menores de 14 anos, o fim da jornada noturna para as mulheres e para os
menores de 18 anos, e além das oito horas de trabalho diário, aumento salarial
e congelamento do preço dos alimentos.
Durante o movimento, o ativista José Martinez foi baleado e morto pela
polícia. Os empregadores consideraram a greve não como uma questão social,
mas como caso de polícia, entretanto, procurou-se a conciliação, e para
defender e representar os grevistas foi organizado um Comitê de Defesa
Proletária. Era o início da representatividade.
A organização dos trabalhadores resultou na fundação de associações
sindicais e de jornais operários, e nas décadas seguintes as organizações
14
operárias passaram a ser vistas como instâncias legítimas e representativas, o
que garantiu as negociações com os empregadores.
Foi criada, em 05 de novembro de 1929, a Associação de Funcionários
de Bancos do Rio, embrião da futura Federação dos Bancários do Brasil,
fundada em 17 de janeiro de 1930.
Na época, o Rio de Janeiro era a capital da República, e o objetivo era
estimular a organização da categoria em todos os estados e reunir os
bancários em uma única entidade.
Em 1931, a Federação dos Bancários do Brasil passou a chamar-se
Sindicato Brasileiro de Bancários, e o Decreto 19.770, de 19 de março,
regulamentou a sindicalização das classes patronais e operárias, impondo a
unicidade sindical.
A primeira greve de bancários na história de São Paulo teve seu início
em Santos no dia 18 de abril de 1932. Eram os funcionários do Banespa que
reivindicavam melhorias salariais e melhores condições sanitárias. Apesar de
se considerar essa greve de 1932 vitoriosa, a conquista que marcou a década
de 30 foi a redução da jornada de trabalho para seis horas para os bancários
de São Paulo, em novembro de 1933.
Após mobilização nacional na campanha do "horário higiênico", é
assinado o Decreto-Lei nº 23.322 de 03 de novembro de 1933, regulando o
trabalho dos empregados dos bancos e casas bancárias em 6 horas diárias e
36 horas semanais. Pareceres médicos respaldaram a redução da jornada dos
bancários, vítimas principalmente, de neurose e tuberculose. Entretanto, o
artigo 7º excluía as pessoas que nos estabelecimentos exerciam funções de
direção, gerência, fiscalização, chefia e ajudantes de seção, bem como as que
desempenhavam cargos de confiança. Também foram excluídos os vigias e os
empregados que exerciam serviços externos permanentes.
Mas, apesar de todos esses movimentos grevistas, o Poder Constituinte
se omitia. A Constituição de 1934, de 16 de julho, também foi omissa a
respeito da greve.
15
A primeira greve nacional da categoria bancária no Brasil da qual se tem
notícia ocorreu em 06 de julho de 1934, com duração de três dias. Objetivava-
se, basicamente, a conquista de três direitos: aposentadoria aos 30 anos de
serviço e 50 de idade, estabilidade no emprego a partir de um ano trabalhado e
criação da caixa única de aposentadoria e pensões.
Transcorria o governo de Getúlio Vargas, a quem os trabalhadores
reiteradas vezes havia reivindicado a criação do Instituto de Aposentadoria e
Pensões dos Bancários (IAPB). Como resultado, apenas 3 dias depois do
início da greve, foi conquistada a estabilidade aos 2 anos e foi publicado o
Decreto-lei 24.615, em 9 de julho de 1934, nascendo assim o IAPB.
Art. 1º Fica criado, com a qualidade de pessoa jurídica e
sede na Capital da República, o Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Bancários, subordinado ao
Ministério do Trabalho Indústria e Comércio, por
intermédio do Conselho Nacional do Trabalho, e
destinado a conceder aos seus associados os benefícios
da aposentadoria, e aos herdeiros o da pensão.
Marco na história da categoria bancária, o IAPB serviu de exemplo para
outras instituições previdenciárias criadas posteriormente. Seus sucessores,
como o INPS, o IAPAS, e o atual INSS, passaram a incluir várias categorias
trabalhistas ao mesmo tempo.
Entretanto, com o advento da Constituição de 10 de novembro de 1937,
tanto o lock-out quanto a greve, em seu artigo 139, 2ª parte, foram declarados
recursos anti-sociais e nocivos ao trabalho e ao capital e incompatíveis com os
superiores interesses nacionais (artigo 139, 2ª parte).
O artigo 3º, inciso 22, do Decreto-lei n° 431, de 18 de maio de 1938, que
também versava sobre crimes contra ordem social e segurança do Estado,
tipificou o induzimento à greve como crime, no que diz respeito ao induzimento
de empregados à cessação ou suspensão do trabalho.
16
22) Induzir empregadores ou empregados à cessação ou
suspensão do trabalho.
Pena – 1 a 3 anos de prisão.
O artigo 81 do Decreto-lei n° 1.237, de 02 de maio de 1939, que
organizou a Justiça do Trabalho, previa punições em caso de greve:
Art. 81 Os empregados que, coletivamente e sem prévia
autorização do tribunal competente abandonarem o
serviço, ou desobedecerem a decisão de tribunal do
trabalho serão punidos com penas de suspensão ate seis
meses, ou dispensa, além de perda de cargo de
representação profissional e incompatibilidade para
exercê-lo durante o prazo de dois a cinco anos.
O Código Penal, de 7 de dezembro de 1940 previu crimes contra a
organização do trabalho que estão previstos do artigo 197 ao artigo 207.
Os artigos mais importantes nesse momento que deverão ser citados,
são os artigos 197 e 200 do Código Penal, in verbis, os quais têm definição e
penalização tanto para aqueles que cometem crime de atentado contra a
liberdade de trabalho como para aqueles que praticam a paralisação de
trabalho com violência e perturbação da ordem.
Atentado contra a liberdade de trabalho
Art. 197 - Constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça:
I - a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou
indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo
período ou em determinados dias:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa, além da
pena correspondente à violência;
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II - a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho,
ou a participar de parede ou paralisação de atividade
econômica:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além
da pena correspondente à violência.
Paralisação de trabalho, seguida de violência ou
perturbação da ordem
Art. 200 - Participar de suspensão ou abandono coletivo
de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra
coisa:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa, além da
pena correspondente à violência.
Parágrafo único - Para que se considere coletivo o
abandono de trabalho é indispensável o concurso de, pelo
menos, três empregados.
Em 1941, o Sindicato Brasileiro de Bancários passa a chamar-se
Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários do Distrito Federal.
Ao ser promulgada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1º
de maio de 1943, estabeleceu-se nos artigos 723 a 725 penas para os
grevistas. Os referidos artigos somente foram revogados em 07 de outubro de
1999 pela Lei 9.842.
Em seu artigo 723, a CLT estabeleceu pena de suspensão e inclusive
perda do cargo de representação profissional:
Art. 723 - Os empregados que, coletivamente e sem
prévia autorização do tribunal competente, abandonarem
o serviço, ou desobedecerem a qualquer decisão
proferida em dissídio, incorrerão nas seguintes
penalidades:
a) suspensão do emprego até seis meses, ou dispensa do
mesmo:
18
b) perda do cargo de representação profissional em cujo
desempenho estiverem;
c) suspensão, pelo prazo de dois anos a cinco anos,
do direito de serem eleitos para cargo de representação
profissional.
E o artigo 724 da CLT ainda estabeleceu multa para o sindicato que
ordenasse a suspensão do serviço, além de cancelamento do registro da
associação ou perda do cargo, se o ato fosse exclusivo dos administradores do
sindicato:
Art. 724 - Quando a suspensão do serviço ou a
desobediência às decisões dos Tribunais do Trabalho for
ordenada por associação profissional, sindical ou não, de
empregados ou de empregadores, a pena será:
a) se a ordem for ato de Assembléia, cancelamento do
registro da associação, além da multa de Cr$ 5.000,00
(cinco mil cruzeiros), aplicada em dobro, em se tratando
de serviço público;
b) se a instigação ou ordem for ato exclusivo dos
administradores, perda do cargo, sem prejuízo da pena
cominada no artigo seguinte.
E o artigo 725 da CLT, penalizava o piquete de convencimento àqueles
que ainda não tinham aderido a greve, inclusive ao estrangeiro que após
cumprir a pena seria expulso do país.
Aquele que, empregado ou empregador, ou mesmo
estranho às categorias em conflito, instigar a prática de
infrações previstas neste Capítulo ou houver feito cabeça
de coligação de empregadores ou de empregados
incorrerá na pena de prisão prevista na legislação penal,
sem prejuízo das demais sanções cominadas.
19
§ 1º - Tratando-se de serviços públicos, ou havendo
violência contra pessoa ou coisa, as penas previstas
neste artigo serão aplicadas em dobro.
§ 2º - O estrangeiro que incidir nas sanções deste artigo,
depois de cumprir as respectivas penalidades será
expulso do País, observados os dispositivos da legislação
comum.
Verifica-se que, apesar de muitos direitos terem sido conquistados
durante a primeira metade do Século XX, o exercício da greve ainda era
extremamente cerceado.
Com a entrada em vigor da CLT, houve também uma revogação
implícita do Decreto nº 23.322 que tratava da jornada de trabalho do
empregados bancários. Pela CLT, a jornada passou de 36 horas para 30 horas
semanais (artigo 224).
O Decreto-lei n° 9.070, de 15 de março de 1946, disciplinou, pela
primeira vez, a suspensão ou abandono coletivo do trabalho, passando a greve
a ser tolerada nas atividades acessórias, não obstante a proibição prevista na
Constituição de 1937. Contudo, nas atividades fundamentais, permanecia a
vedação. Segundo o artigo 10:
A cessação do trabalho, em desatenção aos processos e
prazos conciliatórios ou decisórios previstos nesta lei, por
parte de empregados em atividades acessórias, e, em
qualquer caso, a cessação do trabalho por parte de
empregados em atividades fundamentais, considerar-se-
á, falta grave para os fins devidos, e autorizará a rescisão
do contrato de trabalho.
Parágrafo único. Em relação a empregados estáveis, a
rescisão dependerá de autorização do tribunal, mediante
representação do Ministério Público.
Podemos depreender que o Decreto-lei nº 9.070/46 era parcialmente
inconstitucional porque permitia a greve nas atividades acessórias, enquanto a
20
Constituição de 1937 ainda em vigor a proibia terminantemente, sem qualquer
exceção.
Somente com a Constituição Federal de 18 de setembro de 1946, a
greve passa efetivamente a ser reconhecida como direito dos trabalhadores,
embora condicionando, conforme artigo 158, o exercício de greve à edição de
lei posterior: É reconhecido o direito de greve, cujo exercício a lei regulará.
Entretanto, como a Constituição Federal de 1946 determinava que a
greve deveria ser regulada por lei ordinária, inclusive quanto à suas restrições,
o Supremo Tribunal Federal entendeu que o Decreto-lei n° 9.070/46 não havia
sido revogado e que era compatível com a CF/46.
O Dia dos Bancários que é comemorado em 28 de agosto, surgiu de
uma grande assembleia realizada nesta data no ano de 1951. Decorria o
governo do general Eurico Gaspar Dutra. Nela os bancários de São Paulo
decretaram greve após ouvir contraproposta dos banqueiros que consideraram
inaceitável. A categoria reivindicava reajuste de 40%, salário mínimo
profissional e adicional por tempo de serviço. Embora bancários de outros
Estados tenham aceitado o acordo, os paulistas desprezaram-no, e
enfrentaram 69 dias de greve sob repressão do Departamento de Ordem
Política e Social (DOPS) e pressão, inclusive, de outros sindicatos da
categoria. Em 5 de novembro, a Justiça concedeu reajuste de 31%, pondo fim
à paralisação.
Em 05 de janeiro de 1953, a Lei 1.802 que definiu os crimes contra o
Estado e a Ordem Política e Social, revogou parcialmente o Decreto-lei n°
431/1938, tendo tipificado em seu art. 31 que:
Os crimes contra a organização do trabalho, definidos no
Título IV da Parte Especial do Código Penal de 1940,
quando cometidos em ameaça ou subversão da ordem
política ou social, serão processados de acôrdo com a
presente lei e punidos com as penas privativas da
liberdade, ali estabelecidas, com aumento de um têrço.
§ 1º A pena será aplicada em dôbro, quando se tratar de:
a) serviço oficial;
21
b) emprêsa ou serviço que implique atividade
fundamental à vida coletiva, como tal considerada, para
os efeitos desta lei, as relativas à energia, transporte,
alimentação e saúde;
c) indústria básica ou essencial à defesa nacional, assim
declarada em lei
Em 1957, durante o governo de Getúlio Vargas, a categoria bancária
conquistou, à nível nacional, a almejada jornada de seis horas de trabalho
diário para todos os funcionários, bem como a aposentadoria por tempo de
serviço.
Decorria o governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira quando na
campanha de 61, configurou-se nova paralisação nacional, a terceira da
categoria. A chamada “greve da dignidade” resultou em nada menos que 60%
de reajuste, fortalecendo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Empresas de Crédito (Contec), criada em 28 de julho de 1958, e a mobilização
para a aprovação da Lei 4.090, que instituiu o 13º salário, e que passaria a
vigorar a partir de 13 de julho de 1962.
Em 1º de junho de 1964, entrou em vigor a Lei do Direito de Greve, Lei
n° 4.330 que, além de revogar o Decreto-lei n° 9.070/46, regulou o direito de
greve na forma do artigo 158 da Constituição de 1946, prevendo, entretanto,
que a greve seria reputada ilegal nos seguintes casos, conforme inciso I a IV
do artigo 22:
I - Se não atendidos os prazos e as condições
estabelecidas nesta lei;
II - Se tiver objeto reivindicações julgadas improcedentes
pela justiça do Trabalho em decisão definitiva, há menos
de 1 (um) ano;
III - Se deflagrada por motivos políticos, partidários,
religiosos, sociais, de apoio ou solidariedade, sem
quaisquer reivindicações que interessem, direta ou
legitimamente, à categoria profissional;
22
IV - Se tiver por fim alterar condição constante de acôrdo
sindical, convenção coletiva de trabalho ou decisão
normativa da Justiça do Trabalho em vigor, salvo se
tiverem sido modificadas substancialmente os
fundamentos em que se apoiam.
O artigo 10 do mesmo diploma legal exigia ainda que a entidade sindical
notificasse o empregador sobre a greve com o prazo mínimo de 5 (cinco) dias
nas atividades acessórias e de 10 (dez) dias nas atividades fundamentais, e
não sem antes ter havido uma tentativa de conciliação entre as partes.
Entretanto, segundo o artigo 16, in verbis, seria de:
...72 (setenta e duas) horas o pré-aviso para a
deflagração da greve, nas atividades fundamentais e nas
acessórias, quando motivada pela falta de pagamento de
salário nos prazos previstos em lei ou pelo não
cumprimento de decisão, proferida em dissídio coletivo,
que tenha transitado em julgado.
Foram consideradas fundamentais, conforme o artigo 12, as atividades:
...nos serviços de água, energia, luz, gás, esgotos
comunicações, transportes, carga ou descarga, serviço
funerário, hospitais, maternidade, venda de gêneros
alimentícios de primeira necessidade, farmácias e
drogarias, hotéis e indústrias básicas ou essenciais à
defesa nacional.
As exigências para que a greve fosse considerada legal eram tantas que
a Lei 4.330/64 foi considerada extremamente restritiva, passando a ser
conhecida como “A Lei Antigreve” ou “A Lei do Delito da Greve”.
A Lei 4.330/64 regulamentou, por muito tempo, o
exercício do direito de greve, impondo tantas limitações e
criando tantas dificuldades, a ponto de ter sido
denominada por muitos juslaboristas como a lei do delito
da greve e não a lei do direito de greve (LAVOR, 1998, p.
695).
23
O parágrafo único do artigo 20 da Lei n° 4.330/64 dispunha que a greve
lícita suspendia o contrato de trabalho, e que o pagamento dos dias de
paralisação ficava a cargo do empregador ou da Justiça do Trabalho, desde
que deferidas, total ou parcialmente, as reivindicações formuladas pela
categoria profissional:
A greve licita não rescinde o contrato de trabalho, nem
extingue os direitos e obrigações dêle resultantes.
Parágrafo único. A. greve suspende o contrato de
trabalho, assegurando aos grevistas o pagamento dos
salários durante o período da sua duração e o cômputo
do tempo de paralisação como de trabalho efetivo, se
deferidas, pelo empregador ou pela justiça do Trabalho,
as reivindicações formuladas pelos empregados, total ou
parcialmente.
Em 1966, durante o governo militar foi instituído o Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço (FGTS), terminando com a estabilidade no emprego, e
foi ainda criado o Instituto Nacional da Previdência Social (INPS), que reunia
diversos institutos previdenciários, e com a unificação foi extinto
definitivamente naquele mesmo ano o IAPB, criado em 9 de julho de 1934.
A Constituição de 24 de janeiro de 1967, em seu artigo 158, inciso XXI,
combinado com o artigo 157, parágrafo 7º, assegurou o direito de greve aos
trabalhadores do setor privado, proibindo-a, contudo, em relação aos serviços
públicos e às atividades essenciais.
Art.157, § 7º - Não será permitida greve nos serviços
públicos e atividades essenciais, definidas em lei.
Art.158. A Constituição assegura aos trabalhadores os
seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei,
visem à melhoria, de sua condição social:
XXI - greve, salvo o disposto no art. 157, § 7º.
24
Além disso, competia aos Juizes Federais processar e julgar os crimes
contra a organização do trabalho, ou decorrentes de greve, conforme artigo
119, inciso VII.
A morte do estudante Edson Luís de Lima Souto, em protesto estudantil
no Rio de Janeiro, no dia 28 de março de 1968, com apenas 18 anos de idade,
mobilizou estudantes e populares que, com o apoio da Igreja Católica,
realizaram a Passeata dos Cem Mil. Edson foi o primeiro estudante
assassinado pela Ditadura Militar e sua morte marcou o início de um ano
turbulento de intensas mobilizações contra o governo que, por fim, decretou,
passando por cima do diploma constitucional, o Ato Institucional nº 5, chamado
de AI-5, que institucionalizou a repressão. O AI-5 foi o quinto de uma série de
Atos que deu ao regime militar brasileiro poderes absolutos, e que teve como
primeira consequência o encerramento do Congresso Nacional por quase um
ano. Dentre outras determinações do AI-5, havia a possibilidade do Poder
Executivo estabelecer, a seu livre critério, "outras restrições ou proibições ao
exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados" (Artigo 5º,
parágrafo 1º).
A ditadura militar oprimiu os movimentos sindicais. Grande parte dos
integrantes das lideranças sindicais foi presa ou assassinada durante a
ditadura militar.
Apesar dos tempos conturbados, a Emenda Constitucional nº 01, de 17
de outubro de 1969, manteve inalterados os artigos 119, inciso VII e artigos
157, parágrafo 7º, e 158, inciso XXI da Constituição de 1967 somente
renumerando-os, respectivamente, como artigos 125, inciso VI, 162 e 165,
inciso XX, permanecendo, entretanto a mesma orientação: assegurou o direito
de greve, mas proibiu, contudo, o seu exercício pelos servidores públicos e nas
atividades essenciais.
É apenas a partir de 1974 que o movimento sindical bancário volta a se
rearticular, em especial no ABC paulista. Começa a luta no final dos anos 70
para criação de uma nova estrutura sindical.
25
Em 13 de outubro de 1978, o presidente Ernesto Geisel, promulga a
Emenda Constitucional nº 11, cujo artigo 3º revogava todos os atos
institucionais e complementares, no que fossem contrários à Constituição
Federal, inclusive o AI-5:
Art. 3º - São revogados os Atos institucionais e
complementares, no que contraria a Constituição Federal,
ressalvados os efeitos dos atos praticados com bases
neles, os quais estão excluídos de apreciação judicial.
Ao contrário do turbulento final dos anos 70, quando as iniciativas de
paralisação não prosperam, a década de 80 inciou com um novo processo de
participação e conquistas para as categorias, uma trajetória contínua até 1983,
quando acontece a intervenção nos sindicatos.
Em 1980, uma greve que durou 41 dias, marcou o reinício das
manifestações de massa contra o regime militar, delineando-se, a partir daí,
uma nova estratégia de ação sindical e política no Brasil pelos metalúrgicos do
ABC paulista.
Em 1983, nasce a Central Única dos Trabalhadores (CUT), com ativa
participação dos bancários – um ano antes, a categoria já havia conseguido
unificar sua data-base nacionalmente.
Em 21 de julho de 1983, o ministro do trabalho Murilo Macedo determina
intervenção nos sindicatos. E menos de um mês depois, em 19 de agosto,
diretores sindicais são cassados, passando-se a realizar as assembleias em
outros locais, mas os interventores chamavam a polícia.
A luta pelo fim da intervenção nos sindicatos cresce e se espalha em
atos de protesto que sensibilizam a sociedade e contam com a presença de
sindicalistas, trabalhadores e personalidades públicas. Naquele ano, a
campanha vai a dissídio no TRT, pois os interventores não podem respaldar o
oferecido pelos banqueiros sem o aval dos empregados em assembleia.
26
A intervenção dura 20 meses. Em 1985, os Sindicatos voltam às mãos
dos bancários
A década de 80 também reserva para a história aquela que foi
considerada como a maior greve de bancários do Brasil, a primeira pós-64,
realizada em 10 de setembro de 1985.
A campanha salarial nacional de 1985 foi estruturada de forma a
mobilizar a opinião pública sobre a situação vivida pelos bancários e mostrar
os banqueiros como inimigos públicos.
No Dia Nacional de Luta, 28 de agosto, o Brasil inteiro viu os bancos
fecharem suas portas e os bancários nas ruas, em protesto. Em São Paulo, 30
mil bancários saíram em passeata, na maior manifestação realizada pela
categoria. Os bancários realizaram uma greve histórica: entre os dias 10 e 12
de setembro, fazendo com que, São Paulo, o maior centro financeiro do País
permanecesse de portas fechadas.
Em 1987, foram reconhecidos como bancários também os funcionários
da Caixa Econômica Federal (CEF), anteriormente tratados como
economiários.
O direito de greve só foi reconhecido e consequentemente assegurado
de forma mais ampla com o advento da Carta Magna de 1988, onde se
garantiu aos trabalhadores privados o direito de greve, cabendo a eles
decidirem sobre a oportunidade do exercício da greve e sobre os interesses
que devem por meio da greve defender, conforme artigo 9º.
Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos
trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e
sobre os interesses que devam por meio dele defender.
§ 1º - A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e
disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis
da comunidade.
27
§ 2º - Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às
penas da lei.
Já com relação à greve do funcionalismo público, originalmente o artigo
37, inciso VII limitou o exercício do direito de greve a ser definido em lei
complementar. Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 19 de 04 de junho
de 1998 alterou este entendimento: o direito de greve será exercido nos termos
e nos limites definidos em lei específica.
Em 1989, a Lei da Greve, Lei nº 7.783 de 28 de junho, chega para
regulamentar o artigo 9º da Constituição para os trabalhadores privados,
revogando assim, a Lei 4.330/64.
O diploma dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as
atividades essenciais, e regula o atendimento das necessidades inadiáveis da
comunidade. Basicamente, ela procura dar configuração social e pacífica à
atividade grevista.
À luz da legislação brasileira, a greve é considerada uma suspensão
coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de
serviços a empregador (artigo 2º da Lei 7.783/89).
A Lei nº 7.783/89 também dispõe, como já visto, sobre as atividades
essenciais e regula o atendimento das necessidades primordiais da sociedade.
A lei não versa sobre os dias parados, nem sobre a contagem do tempo
de serviço durante a greve, o que pode ser considerado um retrocesso mesmo
se comparado a previsão da “Lei do Delito de Greve”. Apenas trata da
suspensão do contrato do trabalho (artigo 7º), devendo as relações
obrigacionais do período serem regidas por acordo, convenção, laudo arbitral
ou decisão da Justiça do Trabalho.
A Lei de Greve também não trata sobre legalidade ou ilegalidade na
greve, no entanto, usa o termo “abuso de direito”, replicando previsão do artigo
9º, parágrafo 2º da Constituição Federal de 1988.
28
Em 1992 é fundada a Confederação Nacional dos Bancários, que em
2006 será substituída pela Confederação Nacional do Trabalhadores do Ramo
Financeiro (Contraf-CUT).
A Participação nos Lucros e Resultados só foi conquistada em 1995.
No âmbito do sistema financeiro, interditos proibitórios começaram a ser
impetrados a partir de 1994, durante uma greve ocorrida no Itaú. Pela primeira
vez o interdito proibitório foi utilizado com intuito de reabrir as agências
bancárias e acabar com o movimento grevista. Começa, então, o uso dos
interditos proibitórios contra o direito grevista da categoria bancária. Com isso,
outros bancos passaram a utilizar-se desse instrumento contra o direito de
greve.
Tudo isso aconteceu num período em que o movimento sindical se viu
pressionado por dificuldades decorrentes do aumento do desemprego.
O final do Século XX foi marcado pela forte internacionalização da
economia e pelas privatizações ocorridas no governo de Fernando Henrique
Cardoso (1994 a 2002). Como consequência da tentativa de controlar a
inflação, empresas fecharam e o desemprego aumentou.
1.3 - Direito Comparado
A greve tem sido, de uma forma geral, admitida e, até mesmo, elevada
à condição de prerrogativa inerente à cidadania.
Ao longo da história, a greve era vislumbrada como um delito em
relação aos trabalhadores livres, tal qual ocorria no Direito Romano.
É somente em 1948, que na Itália, passa-se a reconhecer a greve como
um direito.
A Costituzione della Repubblica Italiana reconheceu a licitude dos
movimentos grevistas ao prever que o direito de greve exercita-se no âmbito
29
das leis que o regulam, conforme artigo 40: “Il diritto di sciopero si esercita
nell'ambito delle leggi che lo regolano”, devendo a comunicação ser feita com,
no mínimo, 10 dias de antecedência.
Os sindicatos, naquele país, são ideológicos: há greves
reivindicatórias assim como políticas (de protesto, de
solidariedade, etc.). (ROBOREDO, 1996, p. 28)
Na França, o Código Napoleônico, originalmente chamado de Code Civil
des Français, outorgado por Napoleone di Buonaparte (1769-1821), entrou em
vigor em 21 de março de 1804, prevendo punição com prisão e multa ao
trabalhador que fizesse greve. Em 1864, a legislação descriminalizou a simples
coalizão, mas o direito de paralisação coletiva do trabalho só foi previsto na
Constituição de 1946, em 27 de outubro:
Le droit de grève s'exerce dans le cadre des lois qui le
réglementent.
Esse direito, posteriormente, foi reafirmado no preâmbulo da
Constituição de 1958, de 4 de outubro, ao confirmar os direitos mencionados
no preâmbulo da Constituição de 1946.
O ordenamento jurídico na França assegura o direito de greve também
ao servidor público civil, ao pessoal das empresas públicas e às empregados
das empresas encarregadas do serviço público, exigindo-se, entretanto,
comunicação prévia de cinco dias. Ao governo francês é concedida a liberdade
de requisição de trabalhadores para prestar serviços durante a greve, inclusive
designação nominal. Nas Forças Armadas, na magistratura e na polícia a
greve é proibida.
O artigo L.521-1 do Code du Travail (Código do Trabalho Francês) prevê
que a greve não extingue o contrato de trabalho, salvo no caso de falta grave
imputável ao assalariado:
La grève ne rompt pas le contrat de travail, sauf faute
lourde imputable au salarié.
30
A Constituição da República Portuguesa de 1976 em seu artigo 57 –
direito à greve e proibição do lock-out - reconhece o direito de greve, in verbis,
competindo aos trabalhadores definir o âmbito dos interesses que serão
defendidos:
Art. 57. Direito à greve e proibição do lock-out
1. É garantido o direito à greve.
2. Compete aos trabalhadores definir o âmbito de
interesses a defender através da greve, não podendo a lei
limitar esse âmbito.
3. A lei define as condições de prestação, durante a
greve, de serviços necessários à segurança e
manutenção de equipamentos e instalações, bem como
de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à
satisfação de necessidades sociais impreteríveis.
4. É proibido o lock-out.
Tal qual no Brasil, em Portugal também não é permitido o lock-out.
A Lei da Greve em Portugal era a Lei nº 65/77 de 26 agosto. Entretanto,
esta lei foi revogada pelo art. 21 – Norma Revogatória - da Lei nº 99/2003 de
27 de agosto, in verbis, que aprovou o Código do Trabalho português, que
entrou em vigor em 1º de dezembro de 2003:
1 - Com a entrada em vigor do Código do Trabalho são
revogados os diplomas respeitantes às matérias nele
reguladas, designadamente os seguintes:
V.
e) Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto (lei da greve);
V.
Então, com a instituição do Código do Trabalho em Portugal, a greve
passou a ser regulada por este diploma.
No artigo 591 encontramos a normatização do Direito à Greve, que nos
diz que o direito à greve é irrenunciável, garantindo ainda, no artigo 594 a
31
organização de piquetes para desenvolver actividades tendentes a persuadir
os trabalhadores a aderirem à greve, por meios pacíficos, sem prejuízo do
reconhecimento da liberdade de trabalho dos não aderentes.
Entretanto, para que a greve seja deflagrada exige-se um aviso prévio
de no mínimo 5 (cinco) dias úteis, sendo de 10 (dez) dias úteis nos casos dos
serviços considerados essenciais.
Interessante o artigo 597 que trata dos efeitos da greve: o período de
suspensão não pode prejudicar a antiguidade e os efeitos dela decorrentes,
nomeadamente no que respeita à contagem de tempo de serviço.
Nas atividades essenciais, o artigo 598 do Código do Trabalho
português, que normatiza as obrigações durante a greve, determina o
funcionamento dos serviços mínimos nas seguintes atividades:
a) Correios e telecomunicações;
b) Serviços médicos, hospitalares e medicamentosos;
c) Salubridade pública, incluindo a realização de funerais;
d) Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento
de combustíveis;
e) Abastecimento de águas;
f) Bombeiros;
g) Serviços de atendimento ao público que assegurem a
satisfação de necessidades essenciais cuja prestação
incumba ao Estado;
h) Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de
caminho de ferro e de camionagem, relativos a
passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis
e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as
respectivas cargas e descargas;
i) Transporte e segurança de valores monetários.
32
Como pode-se verificar, alguns itens do rol diferem em muito do rol
presente na Lei de Greve brasileira.
Curiosamente e diferentemente do que ocorre no Brasil (art. 10 inciso XI
da Lei 7.783/89), no rol acima mencionado não se vislumbra que o setor
bancário, e em especial os serviços de compensação bancária sejam ditos
como essenciais em Portugal, não sendo, portanto, necessário assegurar
serviço mínimo.
De qualquer forma, conforme previsto no artigo 541 do Código do
Trabalho português, caberão às convenções colectivas de trabalho regularem
sobre: a definição de serviços mínimos e dos meios necessários para os
assegurar em caso de greve, e segundo o artigo 599 a definição dos serviços
mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da
proporcionalidade.
É muito importante ressaltar o artigo 689 do mesmo Código que
caracteriza como:
...contra-ordenação muito grave todo o acto do
empregador que implique coacção sobre o trabalhador no
sentido de não aderir à greve ou que o prejudique ou
discrimine por motivo de aderir ou não à greve, bem como
a violação do disposto nos artigos 596 e 605.
Sendo, assim, é nulo e de nenhum efeito todo o acto que implique
coacção, prejuízo ou discriminação sobre qualquer trabalhador por motivo de
adesão ou não à greve, segundo o artigo 603 que proíbe discriminações
devidas à greve.
Da mesma forma, a greve declarada ou executada de forma contrária à
lei faz incorrer os trabalhadores grevistas no regime de faltas injustificadas, e
tal disposição não prejudica a aplicação, quando a tal haja lugar, dos princípios
gerais em matéria de responsabilidade civil, conforme previsão do artigo 604.
33
Já a Constituição alemã - Grundgesetz für die Bundesrepublik
Deutschland - é omissa no que diz respeito ao direito de greve, mas garante o
direito de associação.
A doutrina alemã estabeleceu diversos princípios gerais sobre a matéria,
entre eles o Princípio do Dever de Neutralidade do Estado nos Conflitos
Sociais. O sistema trabalhista alemão se caracteriza mais pela colaboração do
que pelo conflito, sendo meramente casuais os episódios de radicalização dos
movimentos.
A Espanha assegura a greve como direito fundamental do trabalhador,
consoante o item 2 do artigo 28 da Constituição de 27 de dezembro de 1978,
in verbis, e garante ainda a manutenção dos serviços essenciais:
Se reconoce el derecho a la huelga de los trabajadores
para la defensa de sus intereses. La ley que regule el
ejercicio de este derecho estabelecerá las garantías
precisas para asegurar el mantenimiento de los servicios
esenciales de la comunidad.
Em sua essência, a redação da norma constitucional espanhola é
idêntica à do art. 9º da nossa Constituição Federal de 1988.
O ordenamento jurídico espanhol reconhece também o exercício do
direito de greve aos funcionários públicos, mas há proibição em relação aos
membros das Forças Armadas e dos corpos de segurança.
O direito à ação coletiva foi reconhecido pelo Tribunal Europeu, como
um dos elementos do direito sindical estabelecido na Convenção Europeia dos
Direitos do Homem (CEDH), datada de 4 de Novembro de 1950, que em seu
artigo 11 trata da liberdade de reunião e de associação.
A Carta Social Europeia, datada de 1961, dispõe no artigo 6º – o direito
a negociação coletiva -, n. 4 que, com o fim de assegurar o exercício efetivo do
direito de negociação coletiva, as Partes Contratantes reconhecem:
V o direito dos trabalhadores e dos empregadores
recorrerem à ações coletivas em caso de conflitos de
34
interesse, incluindo o direito de greve, ressalva as
obrigações que possam surgir de um acordo coletivo
anteriormente celebrado.
Com base no artigo 6º da Carta Social Europeia e nos pontos 12 a 14
da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores,
foi editado o artigo 28 na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,
prevendo, assim, que os trabalhadores e as entidades patronais, ou as
respectivas organizações, têm, de acordo com o direito comunitário e as
legislações e práticas nacionais, o direito de negociar e de celebrar
convenções colectivas, aos níveis apropriados, bem como de recorrer, em
caso de conflito de interesses, a ações coletivas para a defesa dos seus
interesses, incluindo a greve.
A expressão “aos níveis apropriados” remete para os níveis previstos
pelo direito comunitário ou pelas legislações e práticas nacionais, o que poderá
incluir o nível europeu sempre que a legislação comunitária europeia o preveja,
é o que a leitura dos artigos 138 e 139 do Tratado da Comunidade Europeia
nos diz.
O artigo 136 dispõe que a Comunidade e os Estados-membros, tendo
presentes os direitos sociais fundamentais terão por objetivo a promoção do
emprego e as melhorias das condições de vida e de trabalho.
No artigo 137 são enumeradas várias ações, dentre elas, melhoria do
ambiente de trabalho, e proteção dos trabalhadores em caso de rescisão,
porém curiosamente no item 5 deste mesmo artigo há uma ressalva
importante: O disposto no presente artigo não é aplicável às remunerações, ao
direito sindical, ao direito de greve e ao direito de lock-out. Não bastasse essa
ressalva, o próprio artigo 136 diz que no desenvolvimento das ações deverá
ser considerado as práticas sociais.
E os Estados-membros da Comunidade Europeia encontram-se
reticentes em permitir que relevantes matérias trabalhistas possam vir a ser
regidas pelo direito comunitário da União Europeia. Logo, a ressalva do artigo
35
137 não permite que a Comunidade interfira em matérias como o direito de
greve.
Em 1º de maio de 1886, uma greve operária em Chicago, nos Estados
Unidos, desencadeou uma repressão brutal da polícia contra os trabalhadores
e resultou na morte de alguns deles. Esta greve tinha como objetivo o
estabelecimento de uma jornada de trabalho de oito horas (contra as 13 horas
habituais). A partir daí, o dia 1º de maio transformou-se no símbolo da luta dos
trabalhadores e, posteriormente, em muitos países, no feriado do Dia do
Trabalho.
Algumas localidades americanas proíbem o exercício da greve de todos
os funcionários públicos, nos termos da legislação, como é o caso da Lei de
Taylor em Nova Iorque. Outras jurisdições impõem proibições à greve apenas
em certas categorias, principalmente naquelas consideradas essenciais para a
sociedade, como a polícia e os bombeiros. Curiosamente, alguns
trabalhadores têm, por vezes, contornado estas restrições sob a falsa alegação
de incapacidade para o trabalho devido a gripe azul, assim chamada por causa
da cor dos uniformes dos policiais. O termo gripe vermelha por vezes tem sido
utilizado para descrever esta ação, quando a mesma é efetuada pelos
bombeiros.
Alguns Estados, como Michigan, Iowa e Flórida não permitem, por
exemplo, que os professores de escolas públicas façam greve.
A Constitución Politica de los Estados Unidos Mexicanos de 31 de
janeiro de 1917 foi a primeira constituição a incluir os direitos sociais.
A Constituição do México, no inciso XVII do artigo 123 assegura tanto o
direito de greve, como também a paralisação do trabalho pelo empregador no
México:
Las leyes reconocerán como un derecho de los obreros y
de los patronos, las huelgas y los paros.
Entretanto, continua o artigo 123: as greves devem ter por objeto “el
equilibrio entre los diversos factores de la producción, armonizando los
36
derechos del trabajo con los del capital”. E o artigo 123 ainda afirma que as
greves serão consideradas ilícitas:
_ unicamente cuando la mayoría de los huelguistas
ejerciera actos violentos contra las personas o las
propiedades, o en caso de guerra, cuando aquéllos
pertenezcan a los establecimientos y servicios que
dependan del Gobierno.
Além disso, o artigo 123 da Constituição assegura inclusive o exercício
do direito de greve no serviço público, desde que tenha ocorrido comunicação
prévia de 10 (dez) dias à Junta de Conciliação e Arbitragem, conforme inciso
XVIII, in verbis:
En los servicios públicos será obligatorio para los
trabajadores dar aviso, con diez días de anticipación, a la
Junta de Conciliación y Arbitraje, de la fecha señalada
para la suspensión del trabajo.
A paralisação pelo empregador no México depende de autorização
prévia do Estado, conforme inciso XIX do mesmo artigo, e somente é
considerada lícita quando é necessário suspender o trabalho por excesso de
produção:
Los paros serán lícitos únicamente cuando el exceso de
producción haga necesario suspender el trabajo para
mantener los precios en un límite costeable, previa
aprobación de la Junta de Conciliación y Arbitraje.
Em países de origem marxista-leninista, tais como na República Popular
da China, a greve é ilegal e visto como contra-revolucionária.
Desde que esses governos reivindicaram para si a representação da
classe trabalhadora, tem sido argumentado que os sindicatos e as greves são
desnecessárias. Em 1976, a China assinou o Pacto Internacional sobre
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que garantia direitos aos sindicatos,
37
bem como o direito de greve, porém oficiais chineses declararam que não
tinham interesse em permitir tais liberdades.
A Constituição Chinesa de 04 de dezembro de 1982 nada fala
explicitamente sobre a possibilidade ou proibição de greve, mas curiosamente
o artigo 42 em seu discurso socialista diz que os cidadãos da República
Popular da China têm o direito e o dever de trabalhar, sendo o trabalho um
dever de que se pode orgulhar todo o cidadão capaz, cabendo ao Estado criar
as condições propícias ao emprego, reforçar a proteção ao trabalho, melhorar
as condições de trabalho e, baseando-se no crescimento da produção,
aumentar as remunerações e os benefícios sociais.
Em junho de 2008, entretanto, o governo municipal de Shenzhen, no sul
da China, apresentou projeto de regulamentação do trabalho, que se
implementado, poderá restabelecer o direito de greve aos trabalhadores
chineses.
1.4 – A Organização Internacional do Trabalho e a previsão internacional
do instituto da greve
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é órgão internacional de
defesa dos direitos sociais e trabalhistas, fundado em 1919, com o Tratado de
Versailles, com o objetivo de promover a justiça social.
As principais normas produzidas pela OIT são as Recomendações e as
Convenções: as primeiras, são instrumentos opcionais, que tratam dos
mesmos temas que as convenções, e estabelecem orientações para a política
e a ação nacional; as segundas, são tratados internacionais sujeitos a
ratificação pelos países membros, e uma vez ratificadas devem ser aplicadas
pelo Estado Membro.
Após a Declaração da Filadélfia, em 1944, e da Reunião de Paris, em
1945, foram firmadas as considerações que instituíram os preceitos basilares
da constituição jurídica da OIT passando a ser uma pessoa jurídica de direito
38
internacional, vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU),
especializada em promover, no campo social, as ações que considerava
válidas na defesa dos direitos humanos e trabalhistas.
Verifica-se que a OIT não possui convenção específica a respeito do
direito de greve, mas a doutrina vem firmando posicionamento de que o tema é
contemplado implicitamente nas Convenções n°s 87 e 98 que dispõem sobre
liberdade sindical e negociação coletiva, respectivamente, restando
demonstrado que a posição deste órgão é no sentido de permitir inclusive a
greve do servidor público civil, vedando-a somente no que tange àqueles que
atuam como órgãos do Poder Público.
No Brasil, a Organização Internacional do Trabalho mantém
representação desde 1950, com programas e atividades que têm refletido os
objetivos da Organização ao longo de sua história, entretanto o Brasil não
ratificou, até o momento, a Convenção 87, que trata da liberdade sindical e
proteção do direito de sindicalização.
Na ordem jurídica internacional, o direito de greve não é protegido de
forma explícita. O artigo XX, nº 1, da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, assinada em 1948, contempla implicitamente o direito de greve,
assim dispondo que todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e
associação pacífica”; e estabelece no nº 4 do artigo XXIII, que “todo ser
humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de
seus interesses.
Torna-se importante mencionar o Verbete nº 394 do Comitê de
Liberdade Sindical, pois além de restringir o direito de greve também dá-nos o
conceito de serviços essenciais:
O direito de greve só pode ser objeto de restrições,
inclusive proibição, na função pública, sendo funcionários
públicos aqueles que atuam como órgãos do poder
público, ou nos serviços essenciais no sentido estrito do
termo, isto é, aqueles serviços cuja interrupção possa por
39
em perigo a vida, a segurança ou a saúde da pessoa, no
todo ou em parte da população.
Nessa conformidade, só há restrição do direito para aqueles que atuam
exercendo parcela da soberania do Estado ou nos serviços tidos como
essenciais.
A Resolução n° 2.200-A, de 16 de dezembro de 1966, adotada na XXI
Assembleia Geral da ONU, que instituiu o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais, em seu artigo 8º, alínea “d”, assegura o
direito de greve exercido em conformidade com as leis de cada país signatário.
Art. 8º Os Estados Partes do presente Pacto se
comprometem a garantir:
d) o direito de greve exercido em conformidade com as
leis de cada país.
A Contraf-CUT, o Sindicato dos Bancários de São Paulo e a Federação
dos Bancários da CUT de São Paulo (Fetec-SP), realizaram no dia 24 de
agosto de 2009, o Seminário "Interdito Proibitório x Direito de Greve", que
reuniu dirigentes sindicais de várias categorias de trabalhadores, o presidente
da OAB nacional e representantes do Tribunal Superior do Trabalho, Ministério
Público do Trabalho e Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho (Anamatra), além de parlamentares - que foram unânimes em
condenar o uso do interdito proibitório contra as mobilizações dos
trabalhadores, considerado uma afronta ao Direito Constitucional de Greve.
Após as palestra e os debates, o presidente da Contraf-CUT, Carlos
Cordeiro, informou que a entidade iria intensificar a luta para garantir o direito
de greve, imprescindível para a defesa dos direitos dos trabalhadores, e que
iria formalizar denúncia sobre o abuso dos interditos proibitórios por parte dos
bancos e da Justiça junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Sendo assim, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Força
Sindical, a Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), a União Geral
dos Trabalhadores (UGT), a Nova Central e a Central dos Trabalhadores e
40
Trabalhadoras do Brasil (CTB) protocolaram, no dia 03 de novembro de 2009,
na Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, uma denúncia
contra três práticas antissindicais que são correntes no Brasil, e dentre essas
práticas está a questão do uso do interdito proibitório para inviabilizar greves e
mobilizações.
O presidente nacional da CUT, Artur Henrique, representou a Central na
audiência com Juan Somavia, diretor-geral da OIT, e explicou-lhe que a
liberdade sindical e de organização estava sendo ameaçada e inviabilizada por
um mecanismo que em nada tinha a ver com as relações trabalhistas: o
interdito proibitório.
CAPÍTULO II
INTERDITO PROIBITÓRIO
2.1 - Origem da palavra Interditctum e Interdicta Prohibitoria
A palavra interdictum tem sua origem no Direito Romano. Interdictum era
a ordem que o magistrado dava a uma pessoa, à solicitação de outra.
Recebia o nome de decreta quando a ordem era de fazer alguma coisa
ou recebia o nome de interdicta, em sentido restrito, quando a ordem era para
que a pessoa se abstivesse de fazer algo.
Interdicta Prohibitoria era a ordem dada no sentido de fazer o réu abster-
se na realização de determinada atividade que interferisse no justo gozo de
uma coisa, por exemplo.
2.2 – Direito Possessório
41
O Direito Real incide sobre uma coisa, corpórea ou não, regulando o
uso e gozo da mesma. São direitos reais: a superfície, a hipoteca, a anticrese,
o penhor, o direito do promitente comprador do imóvel, a habitação, o uso, o
usufruto, as servidões e a propriedade, conforme artigo 1.225 do Código Civil.
A propriedade é o mais amplo dos direitos reais, pois é o direito absoluto
de uso, gozo e disposição sobre um bem. É a submissão plena de uma coisa a
uma pessoa, é o direito que tem essa pessoa de usar, gozar e dispor, e de
reivindicar essa coisa de quem injustamente a possua ou detenha (art. 1.228,
CC).
O legislador no Livro IV, Título I do Código de Processo Civil tratou, dos
artigos 920 ao 933, dos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa, e
nos diz em seu Capítulo V quais ações são consideradas possessórias: Ação
de Manutenção de Posse, Ação de Reintegração de Posse e Interdito
Proibitório.
Logo, o Interdito Proibitório não está ligado ao Direito Real e sim à
Posse.
A posse é o exercício pleno ou não de um dos poderes inerentes à
propriedade. O artigo 1204 do Código Civil define bem: adquiri-se a posse
desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de
qualquer dos poderes inerentes à propriedade. E perde-se a posse quando,
embora contra a vontade do possuidor, um dos poderes inerente à propriedade
sobre o bem cessa (artigo 1.223, CC).
Na discussão se posse seria um fato ou direito, o jurista assim expõe a
matéria:
Normalmente a linguagem jurídica dispõe de
denominações distintas para os fatos geradores e para os
direitos produzidos, como se distinguem entre contrato e
crédito, ou entre tradição e propriedade. Já na posse,
uma só palavra é empregada para exprimir o fato
42
aquisitivo e o direito que dele decorre, o qual também se
chama de posse. (THEODORO JÚNIOR, 2007, p. 124).
Segundo a Teoria Subjetiva, conhecida também como a Teoria de
Savigny, a posse é definida como o poder direto ou imediato que tem a pessoa
de dispor fisicamente de um bem com a intenção de tê-lo para si e de defendê-
lo contra a intervenção ou agressão de quem quer que seja. Logo, para
Savigny, a posse só se configuraria pela união de corpus e animus, sendo a
posse o poder imediato de dispor fisicamente do bem, defendendo-a contra
agressões de terceiros.
Para a Teoria Objetiva ou de Ihering, posse é a exteriorização ou
visibilidade do domínio, ou seja, a relação exterior intencional, existente
normalmente entre o proprietário e sua coisa.
Para essa teoria, a posse é condição de fato da utilização econômica da
propriedade; o direito de possuir faz parte do conteúdo do direito de
propriedade; a posse é o meio de proteção do domínio; a posse é uma rota
que conduz à propriedade, reconhecendo, assim, a posse de um direito.
Alguns doutrinadores não aceitam nenhuma das duas teorias:
As teorias de Savigny e Ihering não são capazes de
explicar o fenômeno possessório à luz de uma teoria
material dos direitos fundamentais. Mostram-se
envelhecidas e dissonantes da realidade social
presente. Surgiram ambas em momento histórico no
qual o fundamental era a apropriação de bens sob a
lógica do ter em detrimento do ser. (FARIAS, 2007,
p. 33-34).
São elementos que constituem a posse: o corpus, identificado com o
exercício de atos materiais sobre a coisa, caracterizando assim a exterioridade
da propriedade; e o animus, visto como a intenção do possuidor de se
comportar como titular do direito a que correspondem os atos praticados.
Segundo esse elemento, a posse só poderia ser identificada quando existisse
a vontade de ter o bem para si.
43
São elementos constitutivos da posse: a) o corpus,
exterioridade da propriedade, que consiste no estado
normal das coisas, sob o qual desempenham a função
econômica de servir e pelo qual o homem distingue quem
possui e quem não possui; e b) o animus, que já está
incluído no corpus, indicando o modo como o proprietário
age em face do bem de que é possuidor. Com isso o
corpus é o único elemento visível e suscetível de
comprovação, estando vinculado ao animus, do qual é
manifestação externa. (DINIZ, 1995, p. 374).
Quão importante é o elemento animus para que se identifique a intenção
da pessoa ser reconhecida como possuidora de determinado bem.
2.3 - Os efeitos da posse e o interdito proibitório
Conforme podemos observar pela leitura do artigo 1.210 do Código Civil,
o possuidor, se tiver justo receito de ser molestado, tem direito a ser segurado
de violência iminente.
E qual seria a ação cabível nesse caso ? Interdito proibitório.
O Interdito Proibitório é considerado ação possessória devido ao o
pedido ser caracterizado pelo fato jurídico posse. Mas, o que determina o
caráter possessório de uma ação não é só o pedido, mas sim a causa petendi,
ou seja, os fundamentos do pedido do autor.
O artigo 932 do Código de Processo Civil define claramente o conceito
de Interdito Proibitório:
O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de
ser molestado na posse, poderá impetrar ao juiz que o
segure da turbação ou esbulho iminente, mediante
mandado proibitório, em que se comine ao réu
determinada pena pecuniária, caso transgredida o
preceito.
44
Logo, a ação de interdito proibitório não tem natureza de ação real
baseada na propriedade, tem como pedido e causa de pedir o esbulho ou a
turbação na posse.
A estrutura do interdito proibitório é de uma ação
cominatória, para exigir do demandado uma prestação de
fazer negativa, isto é, abster-se da moléstia à posse do
autor, sob pena de incorrer em multa pecuniária.
(THEODORO JÚNIOR, 2007, p. 148).
Admite-se a concessão de liminar na hipótese de ação de força nova
(CPC, art. 924 e 928), sendo cabível somente a tutela antecipada nas ações
de força velha (CPC, art. 273).
O interdito proibitório tem por finalidade principal atuar como ação
preventiva, de preceito cominatório, para evitar turbação ou esbulho iminente.
(NERY JÚNIOR, 2004, p. 1234).
A turbação distingue-se do esbulho porque com este, o possuidor vem a
ser privado da coisa que lhe é arrebatada, ao passo que na turbação, o
possuidor continua na posse dos bens, apenas ficando cerceado no seu direito
de posse sobre a coisa.
Logo, para que a ação impetrada tenha fundamento, dois requisitos têm
que estar presentes: a posse e haver fundado receio de que o autor
(possuidor) será molestado em sua posse por meio de turbação ou esbulho.
Há duas formas de impetrar a ação:
a) pelo rito comum, caso se trate de ação de força velha, podendo ser
pelo procedimento ordinário, sumário (CPC, art. 275, I) ou sumaríssimo (Lei
dos Juizados Especiais, art. 3º, IV);
b) rito especial, caso se trate de ação de força nova (CPC, art. 924).
45
2.4 - Principio da Fungibilidade dos Interditos Possessórios
O artigo 920 do Código do Processo Civil estabelece que a propositura
de uma ação possessória em lugar de outra não impede que o juiz conheça do
pedido e conceda a proteção que entender adequada, desde que os requisitos
para essa concessão estejam provados.
Essa possibilidade é regida pelo Princípio da Fungibilidade dos
Interditos Possessórios, que são: Manutenção de Posse, Reintegração de
Posse e Interdito Proibitório. Logo, a aplicação da fungibilidade é válida para
qualquer um dos três interditos.
Nos termos do artigo 933 do CPC, a completude do regramento das
ações de reintegração e manutenção de posse se aplica à figura do interdito
proibitório.
Verificada a consumação do dano temido, a ação
transforma-se ipso iure em interdito de reintegração ou de
manutenção, e, como tal, será julgada e executada.
(THEODORO JÚNIOR, 2007, p. 148).
É importante mencionar que deverá ser respeitado pelo juízo a causa de
pedir, uma vez que ela não poderá ser alterada.
Mas, é possível que o autor alegue ter havido turbação e peça a
manutenção de posse, mas no curso do processo o juiz verifique que aquelas
circunstâncias por ele descritas na petição inicial se caracterizem como receio
de perda devido a violência iminente, e ao final conceder o interdito proibitório
e não a manutenção de posse.
46
CAPÍTULO III
JURISPRUDÊNCIA
As ações de interdito proibitório envolvendo matéria referente à greve,
sempre foi julgada pela Justiça Comum, e mesmo após a Emenda
Constitucional nº 45/2004, a Justiça Comum insistia em declara-se competente
para a julgamento da matéria baseado em precedentes do Superior Tribunal
de Justiça.
Com a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho
realizada pela Emenda Constitucional 45/2004, e conforme previsto no artigo
114, II, da Carta Magna, todas as ações que envolvam exercício do direito de
greve deviam ser levados à Justiça do Trabalho, mesmo que para sua
resolução houvesse necessidade do juiz recorrer ao conhecimento de matéria
estranha à própria relação de trabalho, inclusive as ações possessórias que
tivessem por fundamento o movimento grevista.
Mas, essa situação perdurou até 2007, e alegando competência sobre a
matéria, a Justiça Comum não só concedia liminares às instituições bancárias,
como arbitrava multa altíssima ao Sindicato, bem como impedia o uso do
aparelho de som, proibia os piquetes e autorizava força policial.
47
Processo nº 0020919-79.1998.8.19.0000 (1998.002.07653) – Agravo de
Instrumento, julgado em 06/04/1999, desembargador Luiz Fux da 10ª Câmara
Cível do TJ-RJ:
Interdito Proibitório. Liminar. Greve de funcionários
bancários com a apoio do Sindicato da categoria.
Expedientes obstativos ao serviço. Legitimidade do
interdito proibitório para vencer as estrategias
vulgarmente conhecidas como "piquetes".
O direito de greve deve ser exercido em consonância com
o direito de agir, segundo o livre arbítrio, sob pena de
cometimento de constrangimento ilegal. Liminar mantida.
Agravo de Instrumento que correu na 3ª Câmara Cível do TJ-RJ,
processo nº 0010311-75.2005.8.19.0000 (2005.002.18288), desembargador
Ronaldo Rocha Passos:
Processual civil e constitucional. Ação de interdito
proibitório. Greve. Acesso as agências bancárias. EC n.°
45/04. Decisão que declinou de competência para a
justiça especializada. Agravo de Instrumento. Decisão
que se reforma. Emenda Constitucional n.° 45. A matéria
objeto da ação de interdito proibitório, tem cunho
meramente possessório, não adentrando a análise de
direitos trabalhistas, mesmo após a edição da EC
n°45/04. Portanto a competência é da Justiça Estadual.
Precedentes do STJ e deste TJRJ. Recurso provido, por
decisão monocrática.
Processo nº 0171382-15.2007.8.19.0001 (2007.001.167408-0) da 46ª
Vara Cível do TJ/RJ, distribuído em 02 de outubro de 2007, que teve como
autor da ação o Unibanco e como réu o Sindicato dos Empegados dos
Estabelecimentos Bancários do Município do Rio de Janeiro:
48
(V) Caracterização da situação de ameaça à posse.
Competência da Justiça Estadual pertinentemente às
ações possessórias. Legitimidade do interesse dos
requerentes na propositura da ação. Providência
autorizada judicialmente que não interfere com o regular
exercício do direito de greve do trabalhador. Preliminares
rejeitadas. Recurso, quanto ao mérito, improvido. (A.G. Nº
2003.002.18193, DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, REL.
DES. RONALD VALLADARES).
Em suma, DEFIRO A LIMINAR PRETENDIDA para que
sejam assegurados o livre funcionamento e acesso dos
funcionários, clientes e usuários às agências, assim como
manter os aparelhos de som a pelo menos cem metros de
distância dos estabelecimento bancários; ADVERTINDO
AO RÉU QUE O NÃO CUMPRIMENTO IMPLICA EM
MULTA DIÁRIA DE R$50.000,00 (cinqüenta mil reais).
Após a comprovação do cumprimento do item 1
diretamente no Cartório, cite-se e intime-se. Expeça-se o
devido mandado. Caso necessário, acione-se a POLÍCIA
MILITAR, ATRAVÉS DA COORDENADORIA MILITAR
DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
Entretanto, em 2007, a doutrina civilista, apesar de relutante, começou a
entender que a competência seria da Justiça do Trabalho:
(...), a ampliação da competência da Justiça do Trabalho,
desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de
2004, atrai o exame do interdito proibitório quando
relacionado ao exercício do direito de greve das
categorias profissionais. Se antes o julgamento competia
a Justiça Estadual, com a nova redação do art. 114, II, da
Constituição Federal, qualquer ato de ameaça a posse
49
dos bens do empregador e do direito de ir e vir de
empregados e veículos no exercício do direito de greve
será aferido pela Justiça do Trabalho. Não é raro que os
chamados "piquetes" impedem o acesso do público às
empresas e de trabalhadores que não tenham aderido à
paralisação. (FARIAS, 2007, p. 130).
E a partir de 2008 começou a haver acórdãos do Supremo Tribunal
Federal já orientando que os questionamentos de interdito proibitório oriundos
de movimento grevista era da competência da Justiça do Trabalho.
Mas, com isso, as empresas, e principalmente as instituições
financeiras, na maioria dos seus pleitos, passaram alegar abusos e a tentar
que aquela decisão de interdito proibitório tivesse ordem de definitiva. Mas, os
magistrados têm decidido pela perda do objeto e pela necessidade de se
analisar cada caso em concreto. Essa foi a decisão no processo TRT da 9º
Região (Paraná) nº 04145-2007-069-09-00-6, Acordão 37925-2008 da 4ª
Turma, que teve por relatora Márcia Rodrigues em 04 de novembro de 2008:
AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. FIM DO
MOVIMENTO GREVISTA. PERDA DO OBJETO. Não há
que se cogitar da existência de justo receio de turbação
iminente da posse - requisito para a concessão da tutela
inibitória pretendida - se o movimento grevista já se
encerrou. Correta a determinação de extinção do
processo sem resolução de mérito, pela perda do objeto
(artigo artigo 267, VI, do CPC).
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso
Extraordinário nº 579.648-RG/MG, que teve por relatora a ministra Cármen
Lúcia, em 10 de setembro de 2008, declarou que compete à Justiça do
Trabalho julgar ação de interdito proibitório em que se busca garantir o livre
acesso de funcionários e clientes às agências bancárias sob o risco de ficarem
50
retidos em virtude de movimento grevista. O julgado recebeu a seguinte
ementa:
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL.
JUSTIÇA DO TRABALHO X JUSTIÇA COMUM. AÇÃO
DE INTERDITO PROIBITÓRIO. MOVIMENTO
GREVISTA. ACESSO DE FUNCIONÁRIOS E CLIENTES
À AGÊNCIA BANCÁRIA: PIQUETE . ART. 114 INCISO
II, DA CONSITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO
TRABALHO.
1. A determinação da competência da Justiça do
Trabalho não importa que dependa a solução da lide de
questões de direito civil (Conflito de Jurisdição n. 6.959),
bastando que a questão submetida à apreciação judicial
decorra da relação de emprego. 2. Ação de interdito
proibitório cuja causa de pedir decorre de movimento
grevista, ainda que de forma preventiva. 3. O exercício do
direito de greve respeita a relação de emprego, pelo que
a Emenda Constitucional n. 45/2003 incluiu,
expressamente, na competência da Justiça do Trabalho
conhecer e julgar as ações dele decorrentes (art. 114,
inciso II da Constituição da República).
Em Recurso Extraordinário nº 578.149/MG, julgado em 19 de maio de
2009, que teve por relator o ministro Carlos Ayres Brito, interposto com
fundamento na alínea "a" do inciso III do artigo 102 da CF/88, contra acórdão
do TJ-MG, o STF declarou ser competência da Justiça do Trabalho julgar ação
de interdito proibitório cuja causa de pedir decorra de movimento grevista.
O Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de
Uberaba e Região, como parte recorrente, sustentou afronta ao artigo 9º e aos
51
incisos I e II do artigo 114 da Constituição Federal, merecendo acolhida o
recurso uma vez que a matéria em questão já tinha sido apreciada pelo
Plenário do STF, no julgamento do RE 579.648, que teve por relatora no
acórdão a ministra Cármen Lúcia.
No mesmo sentido, houve a decisão no Agravo de Instrumento nº
717.671/SP de 02 de fevereiro de 2009, que teve por recorrente o Sindicato
dos Empregado em Estabelecimentos Bancários de São Paulo, Osasco e
Região, sob a relatoria do ministro Menezes Direito, bem como o Agravo de
Instrumento nº 640.706/DF, de 18 de fevereiro de 2009, impetrado pelo
Sindicato dos Empregado em Estabelecimentos Bancários de Brasília, sob a
relatoria do ministro Celso de Mello.
Finalmente, em 02 de dezembro de 2009, o Plenário do Supremo
Tribunal Federal encaminhou proposta de Súmula Vinculante que foi acolhida
e aprovada sob o nº 23, colocando um ponto final na questão da competência
da Justiça do Trabalho para julgamento dessa matéria: a Justiça do Trabalho é
competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência
do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada. Foi
voto vencido, em parte, o ministro Marco Aurélio, que se manifestou no sentido
de que o texto ficasse adstrito a expressão “interdito proibitório”, objeto dos
precedentes.
Logo, não limitou-se o texto quando da edição da Súmula Vinculante nº
23 apenas ao interdito proibitório, outrossim, ocorreu ampliação às outras
ações possessórias como manutenção e reintegração de posse.
Outras decisões importantes ocorreram do decorrer de 2008 e 2009.
Uma delas foi conquistada pela Federação dos Bancários do Rio Grande do
Sul, que conseguiu liminar na 5ª Vara da Justiça do Trabalho de Porto Alegre a
qual determinava que:
52
...as instituições financeiras do Rio Grande do Sul se
abstenham de adotar procedimentos que impeçam o livre
exercício do direito de greve, permitindo o ingresso
pacífico dos dirigentes sindicais nos locais de trabalho, a
realização de manifestações pacíficas em frente aos
estabelecimentos bancários, principalmente em dias de
realização de greve, bem como permitindo que os
dirigentes sindicais efetuem, pacificamente, através de
conversas individuais ou coletivas, pessoalmente ou
mediante utilização de instrumentos de som(...), a
tentativa de convencimento dos trabalhadores para que
façam adesão à paralisação.
Decisão proferida no processo nº 80501-2005-071-09-00-2, Acórdão
07935-2008, que teve por relator Ubirajara Carlos Mendes, em 14 de março de
2008, referente à cessação das atividades e, por conseguinte, a diminuição da
receita do empregador, considerou que esta é elemento próprio e natural ao
exercício do direito constitucional de greve, por funcionar como recurso
propiciador da negociação:
EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E
TELÉGRAFOS (ECT). MOVIMENTO GREVISTA.
INTERDITO PROIBITÓRIO. PERDA DE OBJETO.
DANOS MATERIAIS POR PERDA DE RECEITA E
INDENIZAÇÕES SUPORTADAS. DANOS NÃO
RESSARCÍVEIS. AUSÊNCIA DE PROVA (ART. 333, I,
DO CPC). (V) É público e notório que o movimento
grevista que motivou a presente ação (deflagrado em
setembro de 2005) não mais persiste, implicando
ausência de interesse processual na continuidade do
feito, neste particular, por perda de objeto.
53
(V) A cessação das atividades e, por conseguinte, a
diminuição da receita, é elemento próprio e natural ao
exercício do direito constitucional de greve, pois funciona
como recurso propiciador da negociação. Arnaldo
Süssekind, tomando em conta o disposto no art. 188,
inciso I, do Código Civil, segundo o qual não constituem
atos ilícitos os praticados no exercício regular de um
direito reconhecido, afirma a respeito do tema: "...
significa que o dano causado ao empregador pela greve
pacífica, deflagrada em plena conformidade com as
disposições da mencionada Lei n.º 7.783, não gera a
responsabilidade civil da respectiva entidade sindical."
(Direito constitucional do trabalho. 2. ed. São Paulo:
Renovar, 2001, p.487).
Ainda que se aventasse a possibilidade de ressarcimento
de danos desta natureza, tal não importaria a procedência
do pleito, porquanto não foram eles comprovados nos
autos, em desacordo com o art. 333, I, do CPC. Não se
trata, como quer a Recorrente, de postergar para a
liquidação a mensuração dos danos, mas de se
comprovar sua própria existência, na fase apropriada.
Recurso ordinário a que se nega provimento.
Em Ferraz de Vasconcelos, a juíza Regina Maria Vasconcelos Dubugras
negou liminar de interdito proibitório no Processo nº 01105-2008-281-02-00-1
no dia 01 de outubro de 2008, uma vez que o banco apresentava como provas
fatos em abstrato e ocorridos em outras bases sindicais:
Interpõe o requerente Interdito Proibitório em face do
Sindicato dos Empregados nos Estabelecimentos
Bancários de Guarulhos e Região, afirmando que “tomou
conhecimento que existe uma movimentação por parte do
54
réu com o propósito de impedir o funcionamento das
agências e departamentos”, conforme tem demonstrado a
experiência através da colocação de associados nas
portas que dão acesso as agências bancárias, munidos
de faixas, panfletos e megafones, impedindo que os
funcionários adentrem ao seu local de trabalho.
Requer liminar para obrigar o réu a não praticar os atos
que estão a impedir a entrada de empregados, com a
imediata retirada de pessoas que se encontrem postadas
na frente do imóvel, permitindo o livre acesso de pessoas
que pretendam ingressar no prédio ou dele sair, sob pena
de multa.
Trata-se de pedido em abstrato, fundamentado em
experiência e publicações em fotos de agências de outras
localidades, sobretudo Rio de Janeiro e Brasília, bem
como recortes de jornais.
Determinada a constatação, conforme fls. 280/281, foi
certificado as fls. 282 que na agência específica não
havia qualquer anormalidade no local, e que os
funcionários adentravam a agência sem qualquer
obstáculo, que os clientes tinham trânsito livre, e que no
local não havia qualquer movimento grevista.
Em Campinas, o desembargador Lorival Ferreira dos Santos, no dia 01
de outubro de 2008, concedeu liminar em mandado de segurança, impetrado
pelo Sindicado dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Campinas
e Região, no Processo nº 01675-2008-000-15-00-0. Não tendo vislumbrado a
caracterização do justo receito de turbação ou esbulho na posse nas fotos e
reportagens relativas à manifestação da categoria bancária e devendo ser
assegurado o direito de exercício de greve nos limites previsto em lei, o
desembargador mandou suspender decisão liminar proferida no Interdito
55
Proibitório ajuizado pelo Banco Bradesco S/A, que tramitava na 1ª Vara do
Trabalho de Campinas, sob o nº 1.528-2008-001-15-00-6.
Decisão semelhante foi tomada, em 08 de outubro de 2008, pelo
desembargador Flávio Nunes Campos que concedeu liminar em mandado de
segurança, Processo nº 01698-2008-000-15-00-4/MS que transcorreu no TRT
da 15ª Região impetrado pelo Sindicato dos Empregados dos
Estabelecimentos Bancários e Financeiros de Limeira, cassando interdito
proibitório concedido em processo originário, para o Banco Santander S/A.
O juiz Alex Fabiano de Souza, em 09 de outubro de 2008, negou o
pedido de Liminar de Interdito Proibitório ao Banco ABN AMRO Real impetrado
contra o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários e do
Ramo Financeiro do Estado de Mato Grosso no processo nº
012.2008.001.23.00-2.
Em sua decisão, o juiz lembrou que “a greve é um direito social,
fundamental por natureza" e que:
Acaso se viesse a vedar aos sindicatos de enviar seus
ativistas para a porta dos locais de trabalho; se os
proibíssemos de montar faixas de estímulo à greve; se os
impedíssemos de usar equipamentos de amplificação da
voz, estaríamos, em verdade negando aos trabalhadores
lutar por melhores salários e condições de trabalho, na
medida em que a notória precarização do emprego no
Brasil não permite à grande massa de trabalhadores
resistir às ordens de seu empregador para que furem a
greve.
Juiz da 38ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, José Mateus Alexandre
Romano, no dia 28 de setembro de 2009 manteve sua decisão do dia 17 de
setembro contrária à concessão de interdito proibitório ao Itaú Unibanco, tendo
em vista que o movimento da categoria bancária é pacífico e ordeiro. Além
disso, o banco se comprometeu a não coagir ou pressionar os bancários em
56
greve a trabalhar. Caso o banco agisse com coação ao legítimo direito de
greve teria que pagar multa de R$ 10.000,00.
Com isto, o juiz reafirmou o pleno direito de os bancários fazerem greve,
desde que empreguem sempre meios pacíficos de convencimento. Essa
decisão também assegurou aos grevistas a possibilidade de fazer o movimento
paredista em frente às agências e distribuir panfletos dentro dos bancos.
O mais interessante, foi que, para tomar a sua primeira decisão
contrária ao interdito pretendido pelo Itaú Unibanco, o juiz José Mateus
Alexandre Romano não se contentou em ouvir as partes. Ele próprio percorreu
as agências do centro da cidade, para verificar com quem estava a razão.
Verificando que a greve era pacífica, negou a concessão do interdito
proibitório. O banco não queria que os grevistas ficassem à frente das
agências, mas não obteve êxito.
O despacho abaixo, assinado na sexta-feira 25 de setembro de 2009
pelo juiz Marcel da Costa Roman Bispo, da 20ª Vara do Trabalho do Rio de
Janeiro, é uma das inúmeras decisões concedidas pela Justiça em vários
Estados, negando pedido de interdito proibitório apresentado pelos bancos.
Em 07 de outubro de 2008, o juiz Helder Vasconcelos Guimarães, da 1ª
Vara do Trabalho de Divinópolis (MG) negou pedido liminar de interdito
proibitório que tinha sido impetrado pelo Banco Itaú contra o Sindicato dos
Trabalhadores do Ramo Financeiro de Divinópolis e Região. No texto de sua
decisão, o magistrado afirma que:
Temos que ressaltar que o direito de greve está
devidamente consagrado na Carta Magna, em seu art. 9º,
e no seu nascimento é certo que determinados
transtornos surjam para todos os envolvidos. É aceitável,
portanto, que os integrantes do sindicato profissional se
posicionem nas portas das agências bancárias, sem
57
adentrá-las, para que, no intuito de fortalecerem o
movimento paredista, tentem convencer os colegas a não
trabalharem.
Tal procedimento faz parte de qualquer contexto grevista
e certamente que, em face do requerente, não haveria de
ser diferente, mormente quando os bancários se
encontram em plena campanha salarial em todo o País.
Há de ser lembrado, outrossim, que a “simples adesão à
greve não constitui falta grave”, conforme já se posicionou
o Excelso Supremo Tribunal Federal em sua Súmula 316.
Portanto, piquetes e conversas nas portas das agências
do requerente, sem maiores consequências, são
perfeitamente admissíveis.
E com a adesão paulatina dos seus empregados ao
movimento, logicamente que transtornos para os clientes
e para alguns funcionários ocorrerão, o que é impossível
de se evitar porque estamos tratando nos autos de uma
greve, com toda a força e natureza do seu conceito
histórico e jurídico.
O juiz cível Luiz Fernando Boller, titular da 2ª Vara Cível da Comarca de
Tubarão (SC), no processo nº 075.08.013890-4 extinguiu ação de interdito
proibitório ajuizada pelo Banco Itaú. Para o magistrado:
As liminares reclamadas como um direito pelos
estabelecimentos bancários em ações de interdito
proibitório propostas na Justiça Estadual, não apenas se
destinam a assegurar o direito de posse, mas, sim, a
desmantelar todo o movimento grevista, frustrando a
manifestação associativa de seus empregados, o que,
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inclusive, tipifica o crime de frustração a direito
assegurado por lei trabalhista.
CONCLUSÃO
A Constituição de 1988, em seu artigo 9º, assegurou aos trabalhadores o
direito de greve, considerando-o direito fundamental.
Posteriormente, o Congresso Nacional aprovou a lei 7.783/85, conhecida
como Lei de Greve, que regulamenta esse direito, explicitando os limites da
greve e os direitos e deveres dos sindicatos de trabalhadores.
O interdito proibitório existe na legislação brasileira desde o início do
século XX, mas só começou a ser utilizado para inibir o direito de greve nos
anos 90, principalmente contra a categoria bancária.
Pode-se ver pelo histórico presente no Capítulo I deste trabalho como tem
sido a luta da categoria bancária ao longo do tempo e agora pode-se entender
o porquê das instituições financeiras terem passado a utilizarem-se do
59
subterfúgio do interdito proibitório para cercear os movimentos grevistas e
consequentemente o exercício constitucional de greve.
Os bancários nos seus primórdios foi a categoria que mais tinha poder
para pressionar os empregadores. Nota-se isso pela sua história e pelos
acontecimentos que nortearam a luta da categoria bancária, na maioria pela
força da greve. A diferença é que hoje a conquista histórica do direito de greve
pode ser cerceado pelo instrumento do interdito proibitório. Como já vimos, o
interdito proibitório passou a ser muito utilizado a partir de 1994 contra a greve
dos bancários.
Com a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho
realizada pela Emenda Constitucional 45/2004, especialmente no que se refere
à sua exclusiva atribuição para apreciar "as ações que envolvam exercício do
direito de greve", conforme previsto no artigo 114, II da Carta Magna, e com a
edição da Súmula Vinculante nº 23, todos os questionamentos jurídicos que
dele decorram deverão ser levados à Justiça do Trabalho, mesmo que para
resolução do processo haja necessidade da Justiça recorrer à conhecimento
de matéria estranha à própria relação de trabalho, inclusive à conhecimento de
matéria de ação possessória, instituto do Direito Civil, que tenha por
fundamento o movimento grevista.
Interditos proibitórios impetrados pelas instituições financeiras, cujo
fundamento jurídico tem em conta, simplesmente, a greve de seus
trabalhadores, estavam sendo lançados à vala das ações possessórias, com
atribuição de competência material à Justiça Estadual, sem que se
reconhecesse a devida importância do fato social que dá suporte ao instituto
da greve e que, por sua magnitude, merecia tratamento específico referente à
competência na nossa Constituição Federal. Esse conflito foi resolvido com a
Súmula Vinculante nº 23 que atribui a competência à Justiça do Trabalho.
O interdito proibitório visa garantir a posse de um bem, sendo
normalmente utilizado em questões civis. Anteriormente, o instrumento interdito
proibitório era utilizado mais na área rural. Posteriormente passou a ser
60
difundido e utilizado na área urbana e industrial, em fábricas, e ainda mais
acirradamente nas instituições financeiras, devido as renhidas lutas dos
bancários ao longo do Século XX, que fez com que a partir principalmente dos
anos 90 passassem os bancos brasileiros a utilizarem o interdito proibitório
como arma contra os movimentos grevistas na luta por direitos trabalhistas e
mais precisamente contra o Direito Constitucional de Greve.
A alegação dos bancos para utilizar esse mecanismo contra as greves,
nos anos 90 e que perdura até hoje, é que a presença de manifestantes
grevistas na frente das agências em que é colocado faixas nas portas
(algumas inclusive com intuito de esclarecer a população sobre o movimento)
são uma ameaça à posse do local.
O movimento grevista não tem qualquer intenção de tomar a posse da
agência bancária ou qualquer outra empresa. A intenção é melhorar a
condição dos trabalhadores, e em nenhum momento está presente ameaça à
posse.
O problema é que alguns juízos têm acatado a tese dos banqueiros,
justificando que o movimento grevista impede que o banco usufrua a posse da
agência, ou seja, o funcionamento da mesma. Isso vai diretamente contra o
direito de greve, que pressupõe a paralisação das atividades da empresa. Ora,
se não tiver paralisação, não existe greve. A razão de ser da greve é a
melhoria das condições por meio da paralisação como forma de pressionar o
empregador que muitas vezes não aceita sequer sentar para negociar sobre as
reivindicações.
A greve é um direito democrático e implica na possibilidade legítima de
impor prejuízos ao empregador como forma de pressão.
Para que a greve surta o efeito desejado, é essencialmente necessário
que prejuízos sejam sentidos não só pelo empregador como também pelos
usuários dos produtos e serviços e pela população de uma forma geral. Caso
isso não ocorra, a paralisação perde todo o seu sentido de ser, pois a
61
finalidade que é perseguida pelos empregados depende de causar incômodo e
prejuízo para ser alcançada.
Não podemos esquecer que hoje, o empresário tem uma força invisível:
a tecnologia. Muitas vezes, o pessoal da tecnologia, por sentirem-se
ameaçados, acabam cedendo as pressões do empregador, impactando
negativamente na adesão aos movimentos.
De qualquer forma, verificamos pela decisão do juiz Helder Vasconcelos
Guimarães que a categoria bancária ainda é tida como uma categoria
profissional forte e que consegue mobilizar um grande número de profissionais.
Esse desconforto causado aos empregadores, apesar de toda tecnologia, tem
origem na força da categoria que é derivada de grandes lutas históricas e
sociojurídicas conforme pudemos observar ao longo dessa pesquisa
monográfica.
Por causa dessa zona de desconforto, as empresas de iniciativa
privada, mais especificamente as instituições bancárias, não tendo como
embarreirar essas lutas, resolveram inovar e diversificar “criando” nos anos 90
a possibilidade de uso do interdito proibitório como instrumento inibitório ao
direito constitucional de greve.
De uma forma geral, as liminares deferidas nas ações de interdito
proibitório proíbem a aproximação dos dirigentes e delegados sindicais nas
agências, bem como dos funcionários que aderiram a greve e prevêem multas
que atingem valores excessivos em caso de descumprimento.
Segundo entendimento do magistrado Ben-Hur Claus em seu texto web
“O direito de greve e o interdito proibitório”:
Se a greve é uma garantia dos trabalhadores a ponto de
receber reconhecimento da própria Constituição Federal e
se a teoria jurídica admite tanto a realização de piquetes
pacíficos como a realização de ocupação pacífica do
estabelecimento do empregador como métodos legítimos
62
de exercício do direito de greve, não se pode, penso,
conceder interdito proibitório mediante simples alegação
do empregador de que há receio de turbação da posse,
sob pena de transformar-se o interdito proibitório numa
espécie de inibidor preventivo manipulado pelos
empregadores contra legítimos movimentos
reivindicatórios de trabalhadores em épocas de
negociação coletiva, inibição alcançada pela fixação de
multas capazes de coarctar qualquer ímpeto
reivindicatório, porquanto é sabida a fragilidade financeira
do movimento sindical em geral. (CLAUS, 2008, p. 2)
A aplicação de multas pecuniárias exorbitantes aos sindicatos é uma
ameaça ao direito de organização dos trabalhadores, pois os sindicatos têm
fontes de renda limitadas e não conseguem arcar com custos desse tipo, sob
pena de deixarem de existir.
Já as empresas, e mais especificamente as instituições financeiras, com
lucros anuais exorbitantes, é que deveriam ,além da condenação por litigância
de má-fé, serem severamente punidas quando recorressem ao Judiciário com
intuito de obter liminar de interdito proibitório com a falsa alegação de abuso
por parte do sindicato, porque o único intuito das empresas é frustar não só a
divulgação como todo o movimento grevista. E isso não deve ser admissível
num Estado Democrático de Direito como o Brasil.
Se o desejo do empregador é acabar com o movimento grevista, o
caminho deveria ser só um: a negociação. O ideal seria nem sequer precisar
chegar a esse impasse, pois empregados e empregadores têm 12 meses para
discutirem e fecharem uma negociação favorável para ambas as partes. Mas,
constata-se que o ideal verifica-se também utópico.
Os pedidos de liminares têm somente um intuito para o empregador:
desmantelar o movimento e sentar na mesa de “negociação” com uma
proposta para aprovação, a sua, e somente a sua.
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O interdito possessório, apesar de eu não considerar o meio adequado,
só teria sentido pela ameaça do direito à posse. Todavia, o direito dos
empregados de entrarem, aderirem à greve, ou não, não pode se tratado como
direito possessório.
Mesmo eu não concordando, mas supondo ser o interdito proibitório um
instrumento legítimo nessa matéria, verificamos pelo artigo 1.210 do Código
Civil que se faz necessário que haja violência para que o possuidor se sinta
ameaçado e tenha justo receio de ser molestado. Se a greve é pacífica e legal,
sem animus de violência por aqueles que fazem os piquetes no único intento
de conseguir só pelo convencimento a adesão em massa do maior número de
pessoas no movimento grevista, pode a Justiça simplesmente fazer o uso do
Interdito Proibitório aplacando o Direito Constitucional de Greve ?
Como vimos ao longo do trabalho, o que determina o caráter possessório
de uma ação não é só o pedido.
Os fundamentos do pedido do autor numa ação de interdito proibitório
envolvendo movimento grevista não é acabar com a ameaça de posse (pois
esta ameça não existe), é sim, de forma implícita, dirimir qualquer ação por
parte do sindicato e dos trabalhadores e acabar ou impossibilitar o Direito
Constitucional de Greve.
A maioria das greves, de inenarrável valor social, tem sido alvo de
decisões que não levam em consideração o fato ocorrido ou que
verdadeiramente está ocorrendo: luta do trabalhador pelos seus direitos
trabalhistas, que tem como principal objetivo obter do empregador melhores
condições de trabalho, entre elas a condição de suprir não só o seu próprio
sustento como também o de sua família, e ainda melhores condições ligadas
principalmente a saúde ocupacional, que ao fim também causa grandes
despesas ao Estado. O INSS considerou a LER do bancário como doença
ocupacional e classifica o recebimento do benefício como auxílio doença por
acidente de trabalho. É por essa e outras situações que o empregado luta. A
LER não tem cura, dependendo da gravidade pode um simples repouso ou
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mesmo operação cirúrgica diminuir a dor, mas a dor será ad eterna. Pergunta-
se: vislumbra-se na luta por melhores condições de trabalho alguma ameaça a
posse ?
É por essas e outras razões que demonstro total desagrado no uso do
interdito proibitório como instrumento que está claramente tendo seu uso
deturpado com o único intuito de inibir o direito constitucional de greve.
Se o magistrado verifica, ou por inspeções in loco ou pelas provas
apresentadas, que não há abusos e que a greve é pacífica e que está
amparada de legalidade, por que conceder interdito proibitório se nenhum
direito de posse do empregador está sendo lesionado ?
Reproduzo as palavras de Luiz Melíbio Uiraçaba Machado,
desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul citadas na obra
de Ricardo Motta Vaz de Carvalho:
O juiz não deve, nos litígios possessórios coletivos,
conceder ou não pedidos liminares: deve negociar, ir até
o conflito e no trato democrático buscar a solução dialogal
à pendência. Eis o novo: o Juiz sair de seu gabinete,
sentir o conflito, nele ingressar e juntamente com os
litigantes buscar solução à lide. (CARVALHO, 1997, p.
104).
O magistrado tem que ficar alerta para situações de denúncia
informando badernas durante a greve, pois algumas situações de arruaças são
iniciadas pelos próprios empregadores com intuito de colocarem-se como
vítimas e “sensibilizarem” a sociedade e a Justiça à respeito da greve.
Artimanhas são usadas e somente com inspeções pode o magistrado
concluir e convencer-se a respeito da greve e do deferimento ou indeferimento
do interdito proibitório, enquanto não se chegar a conclusão maior sobre o
impedimento de utilização do interdito no instituto constitucional de greve.
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Portanto, na greve, o animus não é de posse, pois em nenhum
momento a intenção do grevista é obter o bem, seja para si ou para outrem.
Tanto é assim que ao sindicato é dado livre acesso às empresas para falar da
campanha salarial e de melhores condições aos trabalhadores. Além desse
fato, alguns empregados comissionados, conscientes de que essa luta não é
só daqueles que estão efetivamente fazendo a greve, mas dele também que
por ameaça a perda de comissão sente-se obrigado a não aderir a greve,
disponibilizam a entrada na empresa aos sindicatos, por seus representantes,
com o propósito de não só dar ciência sobre as últimas notícias do movimento
grevista como também para tentar persuadir os trabalhadores, que ainda não
aderiram a greve, a aderirem, fortalecendo ainda mais o movimento. Esse é
um dentre outros direitos assegurados aos grevistas no artigo 6º, inciso I da Lei
de Greve.
Claro que se ocorrer abuso de direito que leve ao constrangimento ou
houver a ocorrência de ameaça ou violência deve a pessoa autora da
exacerbação responder inclusive pelo crime conforme previsto no Código
Penal.
Não pode o empregado grevista impedir o acesso ao trabalho nem
causar danos à propriedade do empregador– artigo 6º, parágrafo 3º. Quando
falamos em danos à propriedade, estamos nos referindo ao que antigamente
era praticado durante greves passadas que é denominado crime de
vandalismo previsto no artigo 163 do Código Penal nos crimes contra o
patrimônio. Se ocorreu tal fato, deve sim ser punido a pessoa que o fez.
Mas, o que nós vimos é a empresa entrar com interdito proibitório para
evitar a greve. Se está havendo constrangimento e ameaça porque não entram
com uma ação criminal ?
A resposta é simples: não está havendo constrangimento, ameaça ou
mesmo vandalismo que enseje impetrar uma ação criminal. Mas valem-se as
empresas da boa-fé do judiciário laboral que defere liminares acreditando na
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“ameaça” a posse quando se sabe que o único intuito das empresas é inibir ato
dos movimentos grevistas.
Não é minimamente estranho que apesar da força grevista, os
empregados fiquem-se somente pela ameaça? Será possível que o nº de
empregados em greve, “desejando a posse do bem”, não tenha força suficiente
para dominar 2 ou 3 funcionários dentro de uma empresa e fazer desde logo o
empregador sofrer as consequências do esbulho. Ora, tal não ocorre
simplesmente porque nunca foi ou será essa a intenção dos empregados. O
empregado não tem qualquer intenção explícita ou implícita de obter durante
ou ao final da greve a posse do bem.
Podemos desde logo concluir que o interdito proibitório não seria a ação
própria tendo em vista que não está em causa quaisquer ameaça a posse da
empresa/instituição financeira, justo porque não está presente, em nenhum
momento, o animus de posse pelo sindicato ou pelos empregados, pois, se
assim fosse, podíamos até falar,- desculpando-me já pelo emprego da palavra
– em 'motim”, mas nunca em posse.
No caso de abuso de direito, pode caber quaisquer outra ação, inclusive
de dano, caso cometido algum contra o patrimônio do empregador durante a
greve que enseje indenização, ou mesmo ação criminal, se cometido algum
crime contra o patrimônio ou pessoa, mas nunca ação de interdito proibitório,
porque não está presente o animus de posse pelos empregados.
Devemos ter também atenção aos artigos 200 e 201 do Código Penal: o
que não pode ocorrer é paralisação com violência contra pessoa ou coisa ou
interrupção total em serviço público essencial. Não existe greve sem
paralisação, mas havendo violência pode caracterizar um dos crimes previstos
nesses artigos.
A paralisação é requisito primário para que estejamos perante o instituto
da greve, ou seja, tem que haver a suspensão coletiva temporária de
prestação de serviço a empregador. O que é necessário é que seja pacífica, ou
seja sem o emprego de violência e pré-avisada 72 horas, nas atividades
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essenciais e 48 horas nas demais, respectivamente artigos 13 e 3º da Lei
7.783/89, para que seja considerado legítimo o exercício desse direito.
Logo, greve em nenhum momento usurpa de posse o bem aos
empregadores. É um movimento legal e justo dos trabalhadores, em momento
de negociação do acordo coletivo de trabalho. Trata-se de um instrumento
reconhecido como arma à pressão desequilibrada dos empregadores contra os
direitos trabalhistas e contra a saúde dos seus empregados.
O abuso do interdito proibitório por parte dos bancos e da justiça deve-se
à visão patrimonialista que ainda impera nas classes dominantes brasileiras,
sendo preocupante a tentativa de, com o uso dos interditos proibitórios,
“criminalizar” os movimentos grevistas no Brasil.
Sempre, devido à todo histórico de lutas, principalmente durante a
ditadura militar, partimos do princípio de que na defesa de direitos trabalhistas
seríamos violentos. Mas, hoje, o que impera é a estrutura sindical que visa a
negociação permanente e organizada nos locais de trabalho. Infelizmente, nem
sempre isso é possível, pois os empregadores muitas vezes se negam a
negociação, o que não deixa de ser uma prática anti-sindical.
O uso deturpado do Interdito Proibitório acaba nos levando a pensar
também que a sua utilização nessa matéria seria uma prática anti-sindical,
porque atenta contra a prática fundamental de representação sindical,
impedindo reuniões em área pública e o direito à expressão do pensamento,
bem como permite o uso indevido da força policial. Tudo isso vai de encontro
ao Estado Democrático de Direito. A diferença é que é uma prática anti-sindical
que está sendo considerada por alguns juízos “legal”.
Greve se faz com mobilização, e se alguém quer fazer o uso do interdito
proibitório com o intuito de evitar a mobilização nos locais de trabalho, é
porque esse alguém, além de não querer que haja a greve, quer acabar com o
direito fundamental do Direito de Greve.
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Não podemos esquecer que hoje, o empresário tem uma força invisível
durante a greve: a tecnologia. Esse é um poder difícil de dominar, a não ser
que se pudesse contar com a greve do pessoal da tecnologia, que,
infelizmente, por sentirem-se ameaçados e com medo de represálias, acabam
cedendo as pressões do empregador.
E se não há negociação, e isso tem sido usual nesses últimos tempos por
parte dos empregadores, o único instrumento na mão do trabalhador é a
mobilização para a paralisação. Mas o fato do empregador evitar a negociação
para tentar vencer pelo cansaço já é de longo data. Entretanto, o que se nota é
que o efeito tem sido negativo aos empregadores e ao Estado: as greves têm
durado cada vez mais, o que acaba por afetar a economia de nosso país. A
greve pode ser evitada desde que haja negociação ao longo dos 12 meses que
antecedem a data-base., com a devida seriedade e serenidade que a situação
merece.
Ainda mais sério que os bancários fecharem as agências é o banqueiro
impedir o processo de negociação, que faz parte do direito de greve.
O empregador, muitas vezes, demite em massa, usando como desculpa a
modernização tecnológica, sem ao menos estudar junto ao sindicato outras
possibilidades possíveis. Nessas situações, o único instrumento da categoria,
com intuito de reverter a situação e impedir outras demissões é a mobilização,
que têm de uma forma geral ocorrido dentro dos transmites legais e seguindo
as etapas previstas na lei. Entretanto, a empresa vem e consegue uma liminar
impedindo a mobilização dos trabalhadores por meio do interdito proibitório.
“Uma andorinha não faz verão”: para mobilizar é preciso informar e até
convencer; são precisas várias “andorinhas” para se conseguir melhores
condições e a valorização da força dos trabalhadores na economia de nosso
país.
A necessidade de piquete é parte integrante da greve tendo por objetivo
a utilização de convencimento dos colegas que não aderiram ao movimento
grevista. O piquete nada mais é do que uma manifestação, que enquanto for
pacífica e ordeira estará protegida pela nossa Carta Magna. O próprio artigo 6º
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da Lei 7.783/89 permite o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir
ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve. Interessante seria que não
fosse necessário esse convencimento, pois uma vez decidido pela greve na
assembleia, mesmo discordando da decisão tomada pela maioria, deveriam
esses funcionários aderirem ao movimento com único intuito de fortalecê-lo, a
fim de se obter êxito na negociação com o empregador.
O jurista assim dita com relação aos não grevistas pejorativamente
denominados fura-greve:
Ao exercer o seu suposto direito, ele dificulta ou
inviabiliza o direito real da maioria.
(V) ao resistir à resistência revela dupla submissão. Ele
luta contra os que lutam por um novo e maior direito;
esvazia o sindicato, dificulta a convenção coletiva e fere o
ideal de pluralismo jurídico e político. (VIANA, 2007, p.
114).
Muitas das vezes é o empregador, utilizando-se de ameaças veladas –
assédio moral – que inibe a adesão de determinados empregados que
acovardam-se com medo de perda de uma comissão ou mesmo do emprego.
Outras vezes, esses mesmos empregados vão a assembleia votar
contra a greve, mas não porque seja esse seu pensamento, mas porque o
empregador “manda” e ele “obedece”. Quem em sã consciência não deseja ao
final obter melhores condições de trabalho ?
Uso de panfletos, faixas e carros de som, devem ser permitidos, pois a
própria Lei da Greve possibilita a livre divulgação do movimento (artigo 6º,
inciso II).
A Lei de Greve não trata sobre legalidade ou ilegalidade na greve, no
entanto, usa o termo “abuso de direito”, replicando previsão do artigo 9º,
parágrafo 2º da Constituição Federal de 1988.
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Obviamente que abusos não devem ser tolerados. O artigo 14 da Lei
7.783/89 constitui abuso de direito a inobservância das normas contidas na lei.
Ocorre abuso de direito quando há excesso do estabelecido em lei,
representando gênero, que inclui ilegalidade.
A determinação do artigo 14 que trata do abuso de direito serve para
ambos, empregado e empregador, mas o que é certo é que nunca vemos o
empregador ser punido por ter desrespeitado o artigo 6º, parágrafo 2º –
adoção de meios para constranger o empregado ao comparecimento ao
trabalho, bem como capazes de frustar a divulgação do movimento.
O empregador também deveria ser severamente punido quando oferece
fotografias como provas de fatos ocorridos em movimentos passados de forma
a obter do magistrado liminar de interdito proibitório.
Intenção de posse ou ameaça a posse do empregador jamais ocorreu
em movimentos grevistas. E para supostos abusos cometidos, o interdito
proibitório é o melhor instrumento ?
Nas instituições bancárias, os sindicatos têm por regra ficar dentro das
agências no local que hoje é denominado autoatendimento para não só
orientar os clientes e usuários de um modo geral, como também para inibir a
abertura da agência, protegendo-a de atos criminosos.
A abertura da agência com poucos funcionários e em condições
precárias, coloca em alto risco a segurança pessoal dos funcionários e
clientes, bem como do patrimônio. É leviana a instituição bancária que tenta
abrir uma agência nessas condições.
Muitas vezes para pressionar os empregados, o empregador se recusa a
sentar na mesa de negociação. A partir daí, a greve passa a constituir-se como
um legítimo instrumento para assegurar o eficaz direito de negociação coletiva.
E o empregador sabedor disso, tenta aplacar o direito desse exercício por meio
do interdito proibitório. Deve-se condenar o uso do interdito proibitório contra
71
as mobilizações dos trabalhadores por ser considerado uma afronta ao direito
constitucional de greve
No Brasil, as mobilizações e o convencimento são quase atos de legítima
defesa contra a pressão que os empregadores fazem contra os trabalhadores.
E dificilmente se vê punição a um empregador por prática anti-sindical.
Relatório divulgado dia 16 de dezembro de 2009 pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT) indica que 25,2% das mulheres e 43,2% dos
homens no Brasil trabalham mais de 44 horas por semana.
Segundo o estudo, a jornada semanal chega a ser de mais de 48 horas
para 13,7% das pessoas do sexo feminino e para 25,2% daquelas do sexo
masculino. A OIT alerta ainda que o número de horas semanais que as
mulheres dedicam aos afazeres domésticos supera os homens. Se for
considerada a dupla jornada, as mulheres trabalham em média cinco horas a
mais do que eles.
Para terem melhores condições de trabalho, como redução de jornada,
preservando não só a sua saúde e bem-estar, como também o de sua família,
muitas são as vezes que os trabalhadores têm que recorrer ao instituto da
greve para conquistar os seus direitos.
A nossa Constituição Federal estabelece que a ordem econômica está
adstrita à valorização do trabalho. Ao permitirmos o uso abusivo do interdito
proibitório, estaremos retroagindo e permitindo a desvalorização do trabalhador
e da sua força coletiva de luta, e menosprezando todos as pessoas que antes
de nós sofreram e inclusive morreram por lutas trabalhistas e sociais para que
hoje tivéssemos o mínimo para viver e sobreviver com a dignidade que uma
pessoa merece.
A dignidade da pessoa humana é o fim supremo de todo o
direito; logo, expande seus efeitos nos mais distintos
domínios normativos para fundamentar toda e qualquer
interpretação. É o fundamento maior do Estado brasileiro.
(SILVA NETO, 2005, p. 21).
72
Após muita luta, conseguimos a Lei 7783, de 1989, que não é cumprida
corretamente, uma vez que pode ser derrubada com base em um instrumento
legal que visa a proteção do patrimônio: interdito proibitório.
Direito Internacional, bem como a Comunidade Europeia
e demais organizações especializadas, como, em
particular, a OIT, não vêm dando à greve ainda a devida
importância (RAPASSI, 2005, p. 54).
A luta por uma nova estrutura sindical no Brasil passa também pela
democratização das relações de trabalho, e o momento ainda é de luta pela
ampliação de direitos, como a redução da jornada de trabalho, e a ratificação
da Convenção 158 da OIT. Infelizmente, estas conquistas não são possíveis
sem liberdade de organização sindical e direito de greve.
Durante a realização desse trabalho, foi noticiado que a Convenção 151
da OIT foi ratificada pela Senado no dia 30 de março do corrente ano. Esta
Convenção estabelece o princípio da negociação coletiva entre trabalhadores
públicos e os governos das três esferas (municipal, estadual e federal).
A ratificação demonstra grande avanço no direito de greve dos servidores
públicos, reivindicação sindical antiga que agora está sendo reconhecida.
No Brasil, já se vislumbra uma luz, pois o ministro Vantuil Abdala, do
Tribunal Superior do Trabalho, sugeriu a realização de um seminário reunindo
parlamentares, sindicatos e a Organização Internacional do Trabalho para que
o assunto seja difundido e discutido entre os magistrados.
Em minhas pesquisas, não localizei direito comparado que utilize o
interdito proibitório como instrumento contra o direito de greve. Será porque
não exista ou porque outros países não vêm a greve como uma ameaça a
posse? Realmente não tenho resposta para essa questão, mas fico a me
perguntar se a não existência do instrumento do interdito proibitório com
finalidade de impedir a greve seja simplesmente porque o direito individual de
possuir um bem não pode se sobrepor ao direito social de uma categoria de
73
trabalhadores. O que nos devemos perguntar é qual o direito que deve
prevalecer numa decisão: o direito de posse (direito individual, genérico e civil)
ou o direito coletivo de greve (direito social, especializado e trabalhista)?
Concluo que, se houver abuso de direito durante o exercício de greve,
pode caber, por exemplo, outra ação civil, como indenizatória por dano material
(em caso de vandalismo), ou mesmo ação criminal, se ocasionar dano ao
patrimônio e lesão a pessoa, mas nunca interdito proibitório porque o animus
de possuir o bem do empregador, para si ou para outrem, em nenhum
momento esteve, está ou estará presente.
BIBLIOGRAFIA
CARVALHO, Ricardo Motta Vaz de. A greve no serviço público. Rio de Janeiro:
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
DEDICATÓRIA 03
RESUMO 04
METODOLOGIA 05
SUMÁRIO 06
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I
DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE
1.1 - A etimologia da palavra greve 09
1.2 - Histórico de greve no Brasil 11
1.3 - Direito Comparado 28
1.4 - A Organização Internacional do Trabalho e a previsão internacional
do instituto da greve 37
CAPÍTULO II
INTERDITO PROIBITÓRIO
2.1 - Origem da palavra Interditctum e Interdicta Prohibitoria 40
2.2 - Direito Possessório 40
2.3 - Os efeitos da posse e o interdito proibitório 43
2.4 - Principio da Fungibilidade dos Interditos Possessórios 44
CAPÍTULO III
JURISPRUDÊNCIA 46
CONCLUSÃO 58
BIBLIOGRAFIA 73
WEBGRAFIA 75
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes
Instituto A Vez do Mestre
Título da Monografia: Aplicação do Interdito Proibitório no Instituto da Greve.
Autor: Sílvia de Fátima Ribeiro Gomes
Data da entrega: 06.04.2010
Avaliado por: Conceito: