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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES NO BRASIL Por: Alice Monnerat de Oliveira Orientador Prof. Francis Rajzman Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

DAS MULHERES NO BRASIL

Por: Alice Monnerat de Oliveira

Orientador

Prof. Francis Rajzman

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

DAS MULHERES NO BRASIL

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Internacional e

Direitos Humanos

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha família e ao meu

namorado, Diego Alves.

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia à minha avó, à

minha mãe e às minhas irmãs.

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RESUMO

A presente monografia analisa a situação das mulheres e o esforço

internacional na busca pela igualdade de gênero. Busca também a comparação

entre os Tratados Internacionais e os avanços ocorridos no Brasil em relação

ao tema de Direitos Humanos das Mulheres.

A universalização dos Direitos Humanos e a efetivação de acordos

internacionais têm contribuído para as relações de gênero e provocado

mudanças em benefício da igualdade. Durante a década de 90, o tema da

igualdade de gênero esteve presente em todas as reuniões da ONU e, em

1993, ganhou força na área de Relações Internacionais com a Conferência dos

Direitos Humanos, quando foram reconhecidos os direitos humanos das

mulheres.

Apesar dessas mudanças ainda podemos enxergar uma enorme

distância entre as declarações formais de direito e a realidade prática brasileira.

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METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada através de livros e documentos históricos, além

de incluir dados estatísticos. Foram utilizadas, entre outras, as obras de Amini

Haddad Campos e Lindinalva Rodrigues Corrêa: Direitos Humanos das

Mulheres, a obra de Maria Amélia de Almeida Teles: O que são Direitos

Humanos das Mulheres, e a obra de Flávia Piovesan: Temas de Direitos

Humanos.

Além disso, a pesquisa também foi feita através de sites de importantes

Organizações Não Governamentais relacionadas ao tema, e através dos

diplomas internacionais das Conferências Mundiais que envolveram os Direitos

Humanos das Mulheres.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................09

CAPÍTULO I- ASPECTOS CONCEITUAIS E A QUESTÃO DO GÊNERO NO

CONTEXTO DOS DIREITOS HUMANOS ................................................................ 10

1.1. O conceito de gênero e o feminismo .................................................................. 10

1.2. O papel da mulher e a luta pelos direitos ao longo da história ........................... 11

1.3. Os Direitos Humanos e as suas gerações ......................................................... 18

1.4. Violência de gênero: a principal violação dos direitos humanos das

mulheres .................................................................................................................. 23

CAPITULO II - A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES

NO ÂMBITO DA ONU E DA OEA ............................................................................. 27

2.1. ONU: Direito Internacional e Direitos

Humanos...........................................................................................................27

2.2. A OEA e o sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos ........... 29

2.3 CEDAW e A Conferência de Viena .................................................................... 33

2.4 A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência

contra a Mulher (“Convenção de Belém do Pará”) .................................................... 36

CAPITULO III – OS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES NO BRASIL ............ 43

3.1. Dados sobre a situação das mulheres no Brasil ................................................ 43

3.2. O Direito brasileiro e a proteção internacional dos Direitos

Humanos...........................................................................................................45

3.3. Os avanços dos Direitos Humanos das Mulheres no Brasil .............................. 46

3.4.Desafios e Perspectivas.....................................................................49

CONCLUSÃO...............................................................................51

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA...................................................76

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ANEXOS.....................................................................................52

ÍNDICE........................................................................................80

FOLHA DE AVALIAÇÃO.............................................................81

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INTRODUÇÃO

A idéia de direitos humanos surge no decorrer do século XVIII, com a

formulação das “Declarações de Direitos” dos Estados Unidos da América e a

“Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” promulgada na França em

1789, que possuía um caráter de universalidade.

Durante o século XX, há necessidade de ampliação dessa idéia, que têm a

sua importância renovada devido, principalmente, às atrocidades cometidas

durante a Segunda Guerra Mundial. Assim, em 1948, foi elaborada pela

Organização das Nações Unidas (ONU), a Declaração Universal dos Direitos

Humanos. Com ela, os Direitos Humanos passam a ter reconhecimento

internacional.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 garantia também

os Direitos Humanos das Mulheres, fornecendo instrumentos de proteção e

promoção desses direitos.

A partir desse contexto de reconhecimento da importância do tema de

Direitos Humanos das Mulheres, a comunidade internacional tem realizado,

especialmente a partir dos anos de 1970, importantes Convenções sobre o

tema.

É interessante observar como essas Convenções e Tratados Internacionais,

exercem influência sobre as leis nacionais, provocando mudanças em benefício

do estabelecimento da igualdade de gêneros.

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CAPÍTULO I

ASPECTOS CONCEITUAIS E A QUESTÃO DO GÊNERO NO CONTEXTO

DOS DIREITOS HUMANOS

“ Homens e mulheres são magnificamente diferentes. Contudo, as diferenças jamais podem ser justificativas à desigualdade”

CAMPOS E CORRÊA (2008, p.109)

O presente capítulo busca analisar a questão do gênero no contexto dos

Direitos Humanos, reconhecendo a importância do movimento de mulheres na

contribuição para mudanças significativas tanto no cenário internacional quanto

nacional. Apresenta também uma breve explicação acerca da evolução dos

Direitos Humanos e as suas gerações, além de introduzir o conceito de

violência de gênero como exemplo de violação dos Direitos Humanos das

Mulheres.

1.1 O conceito de gênero e o feminismo

O conceito de gênero foi produzido a partir dos anos 1970 no campo das

ciências sociais e tem sido utilizado pelo movimento feminista na luta pela

igualdade, respeito às diferenças e o fim da discriminação. (Campos e Corrêa,

2008) O termo começou a ser utilizado na área por feministas norte-

americanas e inglesas para auxiliar na busca pelas causas da desigualdade

entre os sexos.

É importante destacar que o conceito de gênero não trata simplesmente

das diferenças biológicas e físicas entre os sexos feminino e masculino, mas é

elaborado socialmente de acordo com a construção histórica de cada

sociedade e a forma com que as diferenças sexuais são concebidas dentro

dela. Ou seja, gênero é a construção social do feminino e do masculino,

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diferentemente do conceito de sexo, que faz referência apenas ao conjunto de

fatores biológicos.

Do mesmo modo que se deve diferenciar gênero de sexo, não se pode

confundir o termo gênero com mulher. Gênero está ligado às relações sociais,

sendo elas entre mulheres ou entre homens, assim como as relações entre

mulheres e homens.

A partir desse conceito, a desigualdade pode ser entendida como uma

construção da sociedade que atende a interesses de determinados grupos. Ou

seja, a própria sociedade estabeleceu uma hierarquia de gênero na qual o sexo

feminino é apresentado como inferior. Nas palavras de Teles (2007), “é a

própria estrutura da sociedade e sua dinâmica que transformam as diferenças

sexuais em desigualdades sociais”.

Dessa forma, o feminismo utiliza o conceito de gênero no intuito de refutar

a idéia de que a natureza biológica da mulher por si só seria uma justificativa à

discriminação e à condição de subordinação da mulher.

Assim, a ação do movimento feminista e a introdução do conceito de

gênero nos estudos sobre o tema demonstram que a desigualdade e a

violência de gênero são o resultado da construção dos papéis sociais impostos

a homens e mulheres, e não fruto da natureza humana. Do mesmo modo, os

estudos de gênero mostram que não é suficiente a igualdade formal de direitos,

e que são necessárias medidas concretas para a superação da desigualdade e

da discriminação contra a mulher.

1.2. O papel da mulher e a luta pelos direitos ao longo da história

A importância atual do tema é uma evidência de que o papel das mulheres

na sociedade tem se transformado ao longo da história. Na Grécia a mulher

ocupava posição semelhante à do escravo, executando trabalhos manuais

desvalorizados pelo homem livre. Ser livre significava ser uma pessoa do sexo

masculino, não estrangeira e não escrava. Nessa sociedade, a função principal

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da mulher era a geração e a criação dos filhos, e a mulher não possuía acesso

à educação. Do mesmo modo, na civilização romana, estavam presentes a

sujeição e a discriminação da mulher. (Alves e Pitanguy 2007)

Apesar da cultura de inferioridade da mulher, há também indícios de

movimentos de resistência a essa condição. Por exemplo, no ano de 195 A.C.,

mulheres se dirigiram ao Senado Romano com o objetivo de reivindicar o

direito de utilização do transporte público, que constituía-se como um privilégio

masculino (Alves e Pitanguy, 2007).

Além disso, há exemplos na história em que as mulheres possuíam

posição semelhante ou até mesmo superior à dos homens na sociedade. No

caso das sociedades tribais da Gália, antes da invasão romana, a religião

predominante era o druidismo, Deus era feminino e a mulher era considerada a

única fonte de vida. Nesse contexto as mulheres eram juízas, faziam guerra,

participavam dos Conselhos Tribais, trabalhavam na agricultura e construíam

casas conjuntamente com os homens. Existiam, inclusive, na pré-história,

tribos lideradas por mulheres, que ficaram conhecidas como sociedades

matriarcais.

A hipótese da existência de sociedades matriarcais foi abordada em 1861

pelo suíço Jonhann Bachofen. Essas sociedades teriam existido na Europa e

na Ásia desde o ano de 35.000 a.C., até o ano de 4.000 a.C., quando começou

a ser introduzida a cultura de guerra e da sociedade patriarcal. Nas sociedades

matriarcais não existia a guerra, nem a opressão a homens ou mulheres.

(Campos e Corrêa, 2008)

Já na Idade Média, durante os primeiros séculos, a mulher possuía alguns

direitos garantidos pelos costumes e, inclusive por leis. Quase todas as

profissões eram acessíveis às mulheres, apesar de a remuneração ser inferior

a do homem. Quanto à questão da educação, durante o século XIV, há

registros de algumas mulheres que chegaram a freqüentar a universidade,

formando-se em Direito e Medicina. Mas, apesar da significativa participação

das mulheres na vida econômica e social da época, a representação simbólica

que prevaleceu foi a da mulher frágil. (Alves e Pitanguy, 2007)

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Além disso, ainda na Idade Média, se estendendo até o século XVI, a

mulher passou a ser considerada a fonte de todos os malefícios, sendo

perseguida na Europa e nas Américas no que ficou conhecido como o período

de “caça às bruxas”. Milhares de mulheres foram assassinadas e torturadas

(para cada dez bruxas contava-se um bruxo). De acordo com Alves e Pitanguy

(2007), essa perseguição seria um esforço de manutenção da posição de

sujeição da mulher na sociedade, já que a “bruxa” possuiria conhecimento para

atuar em áreas q escapavam ao domínio masculino. Além disso, segundo as

autoras Alves e Pitanguy (2007): “As milhares de mulheres queimadas não se

distinguiriam das demais por possuírem uma ‘natureza diversa’. Elas teriam,

tão-somente, exercido determinados malefícios que seriam inerentes a

qualquer mulher. Era, portanto a natureza feminina que ardia nas

fogueiras(...).”

No século XIV ocorrem profundas transformações econômicas e políticas:

o mercantilismo, a formação dos Estados Nacionais e a reintrodução do Direito

Romano. De acordo com o livro ‘O que é o feminismo’(2007), durante o período

renascentista, a situação da mulher sofre um retrocesso, e esta é afastada da

esfera pública. A reintrodução da legislação romana acarreta a redução de

direitos civis da mulher.

No ambiente de trabalho, gradativamente certas profissões passam a ser

consideradas de domínio masculino, e nesse período o trabalho da mulher

passa a ser depreciado. Mas isso não significa que as mulheres deixaram de

trabalhar, e sim que elas passaram a desempenhar atividades menos

qualificadas e de menor remuneração.

No que diz respeito à educação, não há registros de que mulheres tenham

freqüentado universidades até meados do século XIX. E há também nesse

período uma defasagem entre o número de escolas masculinas e femininas, e

uma diferença quanto à qualidade de ensino. Por exemplo, o currículo das

escolas femininas enfatizava o ensino dos trabalhos domésticos e não

preparava para o ensino superior. Por esse motivo, os primeiros registros de

contestação feminina na história moderna se referem à luta pelo acesso à

educação e ao trabalho. (Alves e Pitanguy, 2007)

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Na América do século XVII, a igualdade de direitos para a mulher ainda

não era uma idéia aceita. Já o século XVIII é caracterizado pelas revoluções.

Um claro exemplo é a Independência dos EUA, que apesar de ressaltar a

igualdade em sua Declaração, ainda não faz nenhuma referência aos direitos

das mulheres. Mesmo na França, onde as mulheres participaram de forma

efetiva do processo revolucionário, não ocorrem conquistas políticas relativas à

igualdade de sexo. (Alves e Pitanguy, 2007)

Desde o século XIX, o papel das mulheres na vida social vem se

transformando e ocorreram muitos progressos no que se refere à igualdade de

gênero e aos direitos humanos das mulheres. Mas essa conquista de direitos

não ocorreu de uma hora para outra, sendo o resultado de um processo lento.

Nesse século, o sistema capitalista é consolidado e com isso, o

contingente feminino de mão-de-obra operária aumenta. Apesar de

compartilhar as mesmas condições de trabalho com os homens, as mulheres

recebiam um salário menor. Por exemplo, em Paris a média de salário feminino

era de 2,14 francos, enquanto o salário masculino era em média de 4,75

francos. De acordo com Alves e Pitanguy (2007), a justificativa para essa

diferença seria que, supostamente, as mulheres necessitavam menos salário já

que deveriam ter quem as sustentasse.

Ainda no século XIX, as mulheres trabalhadoras começaram a reivindicar

os seus direitos. Junto aos homens, e congregadas a organizações sindicais,

as mulheres participaram de greves e acabaram vítimas da repressão. O dia 8

de março (que mais tarde vem a ser intitulado o dia internacional da mulher) de

1857 foi um exemplo dessa repressão. Nesse dia, em Nova York, operárias

marcharam em protesto contra os seus baixos salários e por uma redução da

jornada de trabalho. Elas foram violentamente reprimidas pela polícia, presas e

feridas. Anos depois,em 1908, na mesma cidade e no mesmo dia 8 de março,

mulheres operárias novamente protestam exigindo melhores salários e o direito

ao voto. (Alves e Pitanguy, 2007)

O sufrágio universal foi conquistado no final do século XIX pelos homens

da classe operária. Porém nesse período ainda não estava incluído o sufrágio

feminino. A luta por esse direito movimentou até 2 milhões de mulheres no

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século XX (Alves e Pitanguy,2007), e de acordo com Ribeiro (2009), foi a

primeira grande conquista das mulheres. Esse movimento feminista de

denúncia da exclusão da mulher teve maior força nos Estados Unidos e na

Inglaterra. Segue algumas datas de quando as mulheres conseguiram

conquistar o direito de votar:

Quadro 1: Datas de obtenção do voto feminino: Nova Zelândia – 1893

Noruega - 1913

Portugal - 1931

Austrália - 1902

EUA – 1920

Brasil - 1932

Finlândia - 1906

Grã-Bretanha - 1928

França - 1945

As reivindicações das mulheres foram formalmente atendidas durante os

anos de 1930 e 1940. A partir deste período as mulheres podem votar e ser

votadas, ter acesso à educação e participar do mercado de trabalho. Pode-se

observar que a afirmação da igualdade de gênero e a participação da mulher

no mercado de trabalho acontecem num momento histórico em que os

homens, principalmente nos EUA e na Inglaterra, precisam ser liberados para

as frentes de batalha. Com o fim da guerra retoma-se a idéia de diferenciação

entre os sexos, e novamente o trabalho da mulher fora do ambiente doméstico

é desvalorizado. (Alves e Pitanguy,2007)

A partir da década de 1960, o movimento feminista ressurge e se expande,

passando a reivindicar, além da igualdade social, o direito à liberdade sexual e

reprodutiva. Além disso, o movimento feminista passa a questionar as raízes

culturais da desigualdade entre os sexos. Simone de Beauvoir com lançamento

de seu livro intitulado ‘O segundo sexo’ (1948), no qual a autora denuncia as

raízes culturais da desigualdade sexual, representa um marco para os

fundamentos dessa reflexão feminista que surge na década de 60.

Apesar dos avanços obtidos no que diz respeito à questão das

desigualdades de gênero, no Oriente Médio, por exemplo, a situação das

mulheres ainda é muito preocupante e caracterizada pela discriminação. A

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subordinação da mulher é baseada nos costumes e tradições muçulmanas, e

é, inclusive, justificada por lei. Alguns exemplos:

1. “a mulher só pode ter um marido, ao contrário do homem

que pode ter quatro mulheres ao mesmo tempo;

2. a mulher só pode pedir o divórcio em casos extremos,

ficando a custódia dos seus filhos para o pai, e o testemunho

do homem tem o dobro do valor do da mulher;

3. a herança da mulher é duas vezes inferior à do homem;

4. à mulher afegã, a desobediência equivale à morte;

5. à mulher afegã é absolutamente proibido qualquer tipo de

trabalho fora de casa, incluindo professoras, médicas,

enfermeiras, engenheiras etc;

6. à mulher afegã é proibido andar nas ruas sem a companhia

de um “nmahram” (pai, irmão ou marido);

7. à mulher afegã é proibido o estudo em escolas,

universidades ou qualquer outra instituição educacional;

8. à mulher afegã é obrigatório o uso do véu completo

(“burca”), sendo permitido chicotear, bater ou agredir

verbalmente as mulheres que não usarem a roupa adequada;

9. à mulher afegã é proibido viajar no mesmo transporte

público que os homens;” (Campos e Corrêa (2008, p 77-79),

retirado da Revista Notícias Magazine, 21 out,2001)

Já no continente asiático, podemos citar os casos do Japão e da China em

relação ao papel da mulher nessas sociedades. No Japão, o governo foi regido

por várias imperatrizes:

Quadro 2: Regência de Imperatrizes no Japão:

Nome Período de regência

Suiko 593-628

Kogyoku 642-645

Saimei 655-661

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Jito 686-697

Gemmei 707-715

Gensho(Yoro) 715-724

Koken 749-758

Shotoku 764-770

Meisho 1629-1643

Go-Sakuramashi 1762-1771

Fonte: Campos e Corrêa (2008, p.94)

Porém a partir de 1947, só é permitido o acesso dos homens à monarquia

japonesa. No caso da China, a emancipação feminina foi conquistada em 1949

após o estabelecimento da República da China. (Campos e Corrêa, 2008) Além

disso, a China apresenta uma situação interessante: em seu território resiste

até hoje uma das últimas sociedades matriarcais do mundo. Em Musuo, no

sudoeste da China, as mulheres são as gestoras e chefes de família. Nessa

sociedade, a violência verbal ou física é entendida como uma desonra.

Na África, a maioria das mulheres passou a ter direito de voto após a

independência de seus países, sendo que na África do Sul esse direito ainda é

restringido. A ONU, em 1952 firmou o acordo de Direitos Políticos da Mulher,

estabelecendo um instrumento de lei internacional a favor do voto feminino.

Com o aumento da divulgação dos temas relacionados aos direitos

humanos das mulheres, principalmente a partir de meados de 1970, a ONU

tem tomado importantes iniciativas sobre o tema. Vale destacar alguns dados

relativos às conquistas das mulheres entre 1945 e 1993:

• 1945: Na I Assembléia-Geral da ONU (nos EUA), o Conselho Econômico e Social estabeleceu uma subcomissão para tratar da Condição da Mulher no Mundo;

• 1948: O art. 2° da Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclama que “todos os seres humanos têm direitos e liberdades iguais perante a lei, sem distinção de nenhum tipo, seja raça, cor ou sexo”;

• 1954: A Assembléia-Geral da ONU reconheceu que as mulheres são “sujeitos de antigas leis, costumes e práticas” que estão em contradição com a Declaração, convocando os governos a aboli-las.

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• 1975: Reuniu-se, na Cidade do México, a Conferência Mundial do Ano Internacional da Mulher, patrocinada pela ONU. A Conferência debateu três temas centrais: igualdade entre os sexos, integração da mulher no desenvolvimento e promoção da paz. Foi um acontecimento inédito na luta pelos direitos da mulher.

• 1976-85: A ONU declarou os anos de 1976 a 1985 como a década da mulher;

• 1977: Foi elaborado um Plano de Ação Regional (PAR) para a integração da Mulher no Desenvolvimento Econômico e Social da América Latina e Caribe;

• 1980: Foi realizada a Conferência da Década da Mulher. Os governos são convocados para promover a igualdade de homens e mulheres perante a lei, igualdade de acesso à educação, à formação profissional e ao emprego, além de igualdade de condições de emprego, inclusive salário e assistência social;

• 1981: Entra em vigor a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher- CEDAW;

• 1984: Foi realizado estudo mundial da ONU sobre o papel da mulher no desenvolvimento, marcando, assim, o primeiro reconhecimento oficial da importância da mulher em todas as temáticas do desenvolvimento;

• 1985: Conferência Mundial do Final da Década da Mulher, em Nairóbi, Quênia. Adota-se, por unanimidade, o documento ‘Estratégias Encaminhadas para o Futuro do Avanço da Mulher’;

• 1990-1995: O Plano para a Mulher e Desenvolvimento é colocado em execução;

1993: Foi adotada, consensualmente, em plenário, pela Conferência Mundial dos Direitos Humanos, a Declaração e Programa de Ação de Viena- 25.06.1993, onde restava prescrito que os direitos humanos das mulheres e das meninas são inalienáveis e constituem parte integral e indivisível dos direitos humanos universais. (Campos e Corrêa, 2008, pg 41) 1.3 Os Direitos Humanos e as suas gerações

No item anterior foi abordado o papel da mulher e a luta pelos direitos

humanos, a partir de agora passaremos a analisar o desenvolvimento desses

direitos ao longo da história.

A idéia de direitos humanos começa a se desenvolver no decorrer dos

séculos XVII e XVIII, impulsionada pelas revoluções e pelos pensadores de três

países: Inglaterra, Estados Unidos e França, na conquista por direitos civis e

políticos que levaria esses países à modernidade. Essa etapa ficaria conhecida

como o primeiro ciclo de afirmação dos Direitos Humanos (ou primeira geração

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de Direitos Humanos), no qual a liberdade do indivíduo, e a possibilidade deste

viver sem a interferência do Poder estatal, a preservação da vida, e o direito à

propriedade passam a se apresentar como direitos fundamentais do indivíduo.

(Mondaini, 2008)

A afirmação dos direitos humanos nesse período reflete a constituição de

uma nova sociedade, ou seja, a transição entre a sociedade feudal e a

sociedade capitalista. Os documentos mais importantes em relação à

afirmação desses direitos são: o Bill of rights (1969) da Inglaterra, a Declaração

de Independência dos Estados Unidos (1776), e a Declaração Francesa dos

Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789.

A Revolução Francesa de 1789 é sem dúvida um marco da história

mundial em relação à afirmação dos Direitos Humanos. É a partir de então que

a questão ganha caráter universal, expandindo seus ideais para além dos

limites das fronteiras nacionais e influenciando as Constituições do século XIX.

(Campos e Corrêa, 2008)

Porém, apesar dos avanços trazidos pela Revolução Francesa e pela

Declaração dos Direitos Humanos e do Cidadão, de acordo com Teles (2007),

a igualdade entre os sexos até então foi desconsiderada. A Declaração referia-

se de fato ao homem, ou seja, à pessoa do sexo masculino, e as mulheres não

tiveram os seus direitos reconhecidos.

Durante a Revolução destaca-se a participação de Marie Gouze, ou

Olympe de Gouges, seu pseudônimo. Olympe participou ativamente da

revolução, mas percebeu que a Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão não se estenderia às mulheres. Feminista revolucionária, mobilizou

milhares de mulheres na defesa pela igualdade de direitos. Em 1791 elaborou

a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. Por desafiar a autoridade

masculina e questionar a relação homem-mulher, Olympe de Gouges foi

ridicularizada e condenada à morte na guilhotina em 1793. (Teles, 2007)

No século XIX, as propostas socialistas, numa crítica à “nova ordem”

burguesa, incentivam a ampliação do conceito de Direitos Humanos. Assim,

nasce o segundo ciclo de afirmação, que se estende até o início do século XX,

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e é caracterizado pelo reconhecimento dos direitos ao trabalho, à saúde e à

educação. (Teles,2007)

A Constituição Política dos Estados Unidos Mexicanos de 1917, e a

Constituição alemã elaborada em 1919 na cidade de Weimar, refletem as

reivindicações dessa segunda geração e incluem os direitos trabalhistas no

conjunto de direitos fundamentais.

Além disso, a Constituição de Weimar inova também na questão da

igualdade de gênero, já foi o primeiro documento a reconhecer a igualdade

jurídica entre marido e mulher.

Na segunda metade do século XX nasce o terceiro ciclo de afirmação dos

Direitos Humanos. De acordo com Mondaini (2008), “este terceiro ciclo é a

expressão da revolta e do inconformismo diante da percepção de que o caráter

universal contido na tradição dos direitos humanos não havia ainda sido

concretizado de fato”. Essa revolta e inconformismo citados pelo autor eram o

resultado da exclusão social ainda presente na sociedade, como por exemplo,

em relação à negros, mulheres e homossexuais. Ainda nas palavras de Marco

Mondaini, “resumidamente, todos seriam iguais perante a lei, com a exceção

de tais grupos”.

Além disso, devido às atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra

Mundial (1939-1945), cresce ainda mais a necessidade de ampliação da idéia

de Direitos Humanos, que tem a sua importância renovada. Em 1945, é

fundada a Organização das Nações Unidas, com o objetivo de “manter a paz e

a segurança no mundo, fomentar relações cordiais entre as nações, promover

progresso social, melhores padrões de vida e direitos humanos”(Disponível em:

http://www.onu-brasil.org.br/). E, em 10 de dezembro de1948, é aprovada pela

Assembléia Geral das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos

Humanos, que estabelece que:

“ArtigoI. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

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21

ArtigoII. 1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.” (Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/)

Essa Declaração viria a ser o documento de maior relevância da história

do desenvolvimento dos Direitos Humanos, já que inova por estabelecer a

universalidade e a indivisibilidade desses direitos. Universalidade por estender

esses direitos a todos os seres humanos, e indivisibilidade por entender os

direitos humanos como o conjunto de direitos civis, políticos, econômicos,

sociais e culturais.

Além das três gerações de direitos humanos já citadas, há ainda autores

que defendem a existência de uma quarta e uma quinta geração. A quarta

geração estaria ligada à bioética e ao biodireito, ou seja, à manipulação do

material genético do indivíduo e de embriões e genes humanos, e à produção

de alimentos transgênicos. Já a quinta geração existiria em razão da sociedade

globalizada, com intensa circulação de capitais, bens, serviços, tecnologias e

informações. (Ribeiro, 2009)

É nesse contexto de evolução da idéia de Direitos Humanos que se

evidencia, em meados do século XX, o surgimento do Direito Internacional dos

Direitos Humanos, com a preocupação de prevenir violações através de um

sistema de proteção internacional de direitos humanos. Essa proteção torna-se

possível através da realização de tratados internacionais (Piovesan, 2009).

Abaixo podemos conferir os instrumentos internacionais de Direitos

Humanos ratificados pelo Brasil:

Instrumentos

Internacionais

Data da Adoção Data da Ratificação

Carta das Nações

Unidas

Adotada e aberta à

assinatura pela

21/09/1945

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22

Conferência de S.

Francisco em

26/06/1945

Declaração Universal

dos Direitos Humanos

Adotada e Proclamada

pela Res.217 A (III) da

Assembléia-Geral das

Nações Unidas em

10/12/1948

10/12/1948

Pacto Internacional Dos

Direitos Humanos

Adotada pela Resolução

2.200-A (XXI) da

Assembléia-Geral das

Nações Unidas em

16/12/1966

24/01/1992

Convenção sobre a

Tortura e outros

Tratamentos ou Penas

Cruéis, Desumanos ou

Degradantes

Adotada pela Resolução

n.39/46, da Assembléia-

Geral das Nações

Unidas em 10/12/1984

28/09/1989

Convenção sobre a

Eliminação de Todas as

Formas de

Discriminação contra a

Mulher

Adotada pela Resolução

34/180 da Assembléia-

Geral das Nações

Unidas em 18/12/1979

01/02/1984

Convenção sobre a

Eliminação de Todas as

Formas de

Discriminação Racial

Adotada pela Resolução

2.106-A da Assembléia-

Geral das Nações

Unidas em 21/12/1965

27/03/1968

Convenção sobre os

Direitos da Criança

Adotada pela resolução

L.44(XLIV) da

Assembléia-Geral das

Nações Unidas em

20/11/1989

24/09/1990

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23

Convenção Americana

de Direitos Humanos

Adotada e Aberta à

assinatura na

Conferência

Especializada

Interamericana, em São

José da Costa Rica, em

22/11/1969

25/09/1992

Convenção

Interamericana para

Prevenir, Punir a Tortura

Adotada pela

Assembléia-Geral da

Organização dos

Estados Americanos em

09/12/1985

20/07/1989

Convenção

Interamericana para

Prevenir, Punir e

Erradicar a Violência

contra a Mulher

Adotada pela

Assembléia-Geral da

Organização dos

Estados Americanos em

06/06/1994

27/11/1995

Fonte: Campos e Corrêa, 2008, pg 739

1.4 A violência de gênero: uma violação dos direitos humanos das mulheres

Com o processo de especificação do sistema de proteção dos direitos

humanos, o sujeito de direito passa a ser visto em suas peculiaridades. Isso

significa que determinados sujeitos de direito, quando da violação de seus

direitos humanos, exigem uma resposta específica. Seguindo essa lógica, as

mulheres devem ser entendidas de acordo com as particularidades da sua

condição social.

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Conforme afirma Teles (2007), a principal violação dos Direitos Humanos

das mulheres é a prática da violência de gênero, que atravessa limites

geográficos e constitui-se como um fenômeno bastante generalizado. Segundo

a autora, este trata-se do fenômeno mais democraticamente distribuído da

sociedade.

Pesquisas realizadas durante a década de 90 sobre a violência contra a

mulher revelam que: no Brasil, Chile, Colômbia, El Salvador, Venezuela, Israel

e Cingapura é comum que a violência seja aprovada quando ocorre a

infidelidade feminina; já no Egito, Nicarágua e Nova Zelândia, a mulher deve

ser punida quando não cuida da casa e dos filhos; a recusa da mulher em ter

relações sexuais é motivo de violência nesses países e também em Gana e

Israel. Por fim, a desobediência de uma mulher ao seu marido justifica a

violência em países como Egito, Índia e Israel. (Fonte: The Johns Hopkins

University School of Public Health, 1999.))

O Conselho Social e Econômico das Nações Unidas (1992) define a

violência de gênero como sendo: “qualquer ato de violência baseado na

diferença de gênero, que resulte em sofrimento e danos físicos, sexuais e

psicológicos da mulher; inclusive ameaça de tais atos, coerção e privação da

liberdade seja na vida pública ou na privada”. Campos e Corrêa (2008)

sustentam que “a violência de gênero seria, portanto, a face mais cruel e visível

da desigualdade entre mulheres e homens”. Essa violência possui raízes nas

desigualdades entre os sexos e nas relações sociais de domínio baseadas no

gênero, nas quais a mulher possui uma condição geral de subordinação e

inferioridade.

Campos e Corrêa (2008, pág 159), definem que:

“A violência praticada contra as mulheres é conhecida como violência de gênero porque se relaciona à condição de subordinação da mulher na sociedade, que se constitui na razão implícita do número estarrecedor de casos de agressões físicas, sexuais, psicológicas, morais e econômicas

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(patrimoniais), perpetrados em desfavor de mulheres, revelando a incontestável desigualdade de poder entre homens e mulheres, sobretudo nas relações domésticas e familiares.”

A coleta de dados relativos aos casos de violência de gênero é precária, já

que muitas mulheres não apresentam denuncia. Mesmo assim os números são

alarmantes e representam um alerta para a importância do tema. Estatísticas

divulgadas em relatório pela Anistia Internacional em 05.03.2004 revelam que:

1-69% das mulheres do mundo já foram agredidas ou

violadas;

2-Nos EUA, uma mulher é espancada por seu marido ou

parceiro a cada 15 segundos em média, enquanto uma é

estuprada a cada 90 segundos;

3-Na Inglaterra, duas mulheres são mortas por semana por

seus parceiros;

4-Na França, 25 mil mulheres são violentadas a cada ano;

5-Mais de 70% das mulheres vítimas de assassinato são

mortas por seus parceiros;

6-No Egito, 35% das mulheres foram espancadas pelos

maridos em algum momento do casamento;

7-Na Bolívia, 17% das mulheres com 20 anos ou mais foi

vítima de violência física nos últimos 12 meses

De acordo com as estatísticas apresentadas acima, na maior parte dos

casos de violência de gênero, o abuso sofrido pela mulher é cometido pelo

próprio companheiro. Essas agressões podem ser: maltrato físico; psicológico;

ou relação sexual forçada. Segue abaixo uma pesquisa realizada entre 1991e

1998 que aponta dados sobre agressão física contra a mulher praticada por

seus parceiros em diferentes países:

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Quadro 3:Proporção de mulheres que já foram agredidas fisicamente por

um parceiro íntimo (%):

País Ano Tamanho da Amostra

Canadá 1991-1992 12300 29% Egito 1995-1996 7121 34% Nicarágua 1998 8507 28% Paraguai 1995-1996 5940 10% Filipinas 1993 8481 10% África do Sul 1998 10190 13% Suíça 1994-1996 1500 21% Estados Unidos 1995-1996 8000 22%

Fonte: OMS, Intimate Partner Violence Facts, disponível em http://www.who.int/violence_injury_prevention/violence/world_report/factsheets/en/ipvfacts.pdf, acesso em 02/03/2012

A violência física inclui qualquer agressão física ao corpo da mulher, já a

violência psicológica é aquela que causa dano emocional à mulher, diminuindo

a sua auto-estima, degradando ou controlando as suas ações através de

ameaças, agressões verbais, constrangimentos, humilhações, chantagem etc.

A violência sexual é uma forma de violência de gênero, e é entendida como

qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, manter ou a participar

de relação sexual forçada, mediante intimidação, ameaça ou uso da força.

Além destas, Campos e Corrêa (2008) citam a violência patrimonial contra a

mulher,(que é descrita pela lei brasileira como sendo a retenção, subtração ou

destruição de bens, documentos, objetos etc por pessoa que tenha relação

com a vítima) e a violência moral que significa qualquer conduta que configure

calúnia, difamação ou injúria constantemente praticadas contra a mulher.

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CAPÍTULO II

A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES NO ÂMBITO

DA ONU E DA OEA

O tema de Direitos Humanos torna-se cada vez mais importante,

especialmente após a Segunda Guerra Mundial, como uma resposta às

atrocidades cometidas pelo nazismo. As violações praticadas contra os

indivíduos durante a Guerra alertaram para a necessidade de se criar normas e

princípios para garantir a dignidade humana, e para garantir a

responsabilização dos Estados quanto a tais abusos (Godinho,2006). De

acordo com Piovesan (2009), uma das principais preocupações desse

movimento foi a universalização e a internacionalização dos direitos humanos,

o que permitiu a formação de um sistema internacional de proteção desses

direitos.

2.1 ONU: Direito Internacional e os Direitos Humanos

Esse sistema internacional de proteção dos direitos humanos surge com o

nascimento da Organização das Nações Unidas, que:

“é uma organização internacional formada por países que se reuniram voluntariamente para trabalhar pela paz e o desenvolvimento mundiais.”(Disponível em: http://www.onu.org.br/conheca-a-onu/conheca-a-onu/ acesso em 19/03/2012)

Os instrumentos de proteção internacional dos Direitos Humanos utilizados

pela ONU são:

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• A Carta das Nações Unidas, que em seu primeiro artigo estabelece a

necessidade de se “desenvolver e encorajar o respeito aos direitos do

homem e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça,

sexo, língua ou religião”;

• A Declaração Universal dos Direitos do Homem, que de acordo com

Godinho (2006, pg11), “constitui o primeiro instrumento geral de direitos

humanos adotado por uma organização internacional”;

• Os Pactos e Tratados Internacionais: Destacam-se: o ‘Pacto Internacional

sobre os Direitos Civis e Políticos’ e o ‘Pacto Internacional sobre os Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais’ que inovam ao estabelecer obrigações

jurídicas para os Estados contratantes; e também a realização de Tratados

temáticos, que possuem temas específicos.

O desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos se

baseia no consenso internacional e no compartilhamento de uma consciência

ética por parte dos Estados no que se refere a questões de direitos humanos.

Surge desse modo, um sistema global de proteção desses direitos, que sob a

direção da Organização das Nações Unidas, apresenta instrumentos de âmbito

global e regional, como também de âmbito geral e específico. O sistema geral é

direcionado a qualquer pessoa, sendo caracterizado pela sua generalidade. Já

o específico, refere-se a sujeitos de direito específicos, com o objetivo de

proteger, por exemplo, as crianças, grupos étnicos minoritários, as mulheres

etc.

Esses sistemas se complementam e interagem com o sistema nacional de

proteção e instituem “mecanismos de responsabilização e controle

internacional acionáveis quando o Estado se mostra falho ou omisso

(Piovesan, 2009)” na implementação e garantia dos direitos humanos. Assim, o

Estado ao acolher o aparato de proteção internacional, passa a possuir

obrigações como a aceitação de monitoramento internacional para verificar se

os direitos humanos estão sendo respeitados em seu território. Contudo, a

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ação internacional é uma ação suplementar, ou seja, adicional, de proteção dos

direitos humanos.

É importante ressaltar que, além dos Estados, outros atores integram o

sistema internacional de proteção de direitos humanos, como por exemplo, as

organizações não-governamentais e até mesmo os próprios indivíduos. Estes

atores podem acionar os órgãos internacionais e denunciar as violações de

direitos humanos através de petições.

2.2. A OEA e o sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos

Além do sistema global de proteção de direitos humanos, existe o sistema

interamericano da Organização dos Estados Americanos (OEA), que se baseia

na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa

Rica) de 1969. Mas o ideal de criação de instrumentos internacionais de

proteção dos direitos humanos remete ao próprio estabelecimento da

Organização dos Estados Americanos. (Godinho, 2006)

A OEA foi criada em abril de 1948, em Bogotá (Colômbia), no intuito de

buscar a cooperação regional entre as nações do continente americano. A

Carta de Bogotá, que cria a OEA, inclui o respeito e a garantia dos direitos

humanos entre seus princípios básicos. Além disso, durante a mesma

Conferência que redigiu a Carta de Bogotá, foi aprovada a Declaração

Americana de Direitos Humanos, que possuía um caráter de recomendação

aos Estados, e continha uma lista de 27 direitos e 10 deveres. (Godinho, 2006)

Quadro 4:Países Membros da OEA:

Membros originais As seguintes nações se reuniram em Bogotá em 1948 para formar a OEA

Membros seguintes Depois se incorporaram os seguintes países

Argentina Barbados Bolívia Trindade e Tobago

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Brasil Jamaica Colômbia Grenada Costa Rica Suriname Cuba Dominica Chile Santa Lúcia Equador Antigua e Barbuda El Salvador São Vicente e Granadinas Estados Unidos Bahamas Guatemala Saint Kitts e Nevis Haiti Canadá Honduras Belice México Guyana Nicarágua Panamá Paraguai Peru República Dominicana Uruguai Venezuela

Fonte: http://www.cgu.gov.br/oea/sobre/paises/index.asp

acesso em 18/03/2012

O principal instrumento normativo do sistema americano de proteção dos

direitos humanos é a Convenção Americana de Direitos Humanos, também

conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, que foi assinada em San

José (na Costa Rica), em 1969, e entrou em vigor no ano de 1978. A

Convenção, a qual apenas os Estados-membros da OEA têm o direito de

aderir, assegura uma série de direitos fundamentais, tais como o direito à vida,

à liberdade, e a um julgamento justo, além de determinar que os Estados

devem alcançar a plena realização desses direitos. Dessa forma, cabe ao

Estado-parte assegurar o respeito e o exercício desses direitos através de

medidas legislativas, por exemplo. (Piovesan, 2009)

Cabe ressaltar que, na época em que a Convenção entrou em vigor,

muitos dos Estados da América Central e do Sul ainda eram governados por

ditaduras. Hoje, a maioria desses Estados já possui governos eleitos

democraticamente, o que favorece os avanços da proteção dos direitos

humanos na região, que atualmente já subscreveu os principais tratados de

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direitos humanos adotados pela ONU e pela OEA. Além disso, em geral, os

Estados latino-americanos possuem em suas Constituições cláusulas que

permitem a integração entre a ordem constitucional e a ordem internacional no

que diz respeito aos direitos humanos. Ou seja, os tratados relativos à proteção

dos direitos humanos possuem uma hierarquia privilegiada em relação aos

tratados tradicionais. (Piovesan, 2009)

A Convenção Americana de Direitos Humanos, diferentemente da

Declaração, possui caráter obrigatório para seus 24 Estados-parte

estabelecendo deveres para aqueles que a ratificaram. Assim, ao se tornar

parte da Convenção, o Estado aceita obrigatoriamente o monitoramento

internacional no que se refere aos direitos humanos em seu território Os

Estados componentes da OEA que não tomaram parte desse tratado

permanecem submetidos à Carta da Organização e à Declaração Americana

de Direitos Humanos. Dessa forma, percebe-se que o sistema interamericano

de proteção de direitos humanos baseia-se num regime duplo.

Para promover o monitoramento dos direitos humanos na região, foi criada

em 1959 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Essa Comissão é

instrumento dos dois regimes de proteção do sistema americano estabelecido

no âmbito da OEA, enquanto a Corte Interamericana de Direitos Humanos, a

qual será abordada mais adiante, compõe apenas o sistema baseado na

Convenção Americana. (Godinho, 2006)

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é composta por sete

membros de nacionalidades diferentes, de qualquer Estado-parte da OEA, que

devem eleitos na Assembléia Geral para atuar durante um mandato de quatro

anos, podendo ser reeleitos uma única vez. Cabe à Comissão promover e

proteger os direitos humanos, assim como elaborar estudos e recomendações

aos governos no sentido de que estes adotem medidas progressivas no quadro

de sua legislação interna. Ribeiro (2009) cita as seguintes atividades exercidas

pela Comissão:

• Conciliadora: entre um governo e grupos sociais que se sintam

atingidos;

• Assessoria: aconselhando governos que solicitem;

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• Crítica: informando a situação de tais direitos em determinado país-

membro para toda a comunidade;

• Promotora: estudos sobre tais direitos;

• Protetora: intervindo em casos urgentes para solicitar que um governo

cesse determinadas ações lesivas.

Além disso, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, qualquer

cidadão pode apresentar uma “petição individual” apresentando as violações as

quais foi submetido e requerendo providências. A Comissão julgará o mérito do

caso e se necessário apresentará uma solução, fazendo recomendações ao

Estado-parte.

Quanto à Corte Interamericana, esta foi criada pela Convenção Americana

em San José da Costa Rica e em relação aos Estados-membros da OEA,

possui uma competência consultiva, ou seja, mesmo os Estados que não

fazem parte da Convenção, podem solicitar o parecer da Corte. Porém, o

julgamento de casos é limitado aos Estados-parte da Convenção que

reconheçam tal jurisdição expressamente. Até 2005, dos 24 Estados-parte da

Convenção, 21 reconheceram a jurisdição da Corte. Estes são: Argentina,

Barbados, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana,

Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua,

Panamá, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela. (Piovesan, 2009)

A Corte é composta por sete juízes, de diferentes nacionalidades, eleitos

por um período de seis anos, com a possibilidade de extensão do mandato por

mais um período. As decisões da Corte são definitivas e podem incluir a

reparação e o pagamento de indenização à vítima. Porém, o sistema

americano ainda não possui um órgão para fiscalizar a execução das decisões

da Corte. Vale ressaltar ainda que, diferentemente da Comissão, o acesso à

corte não é permitido aos indivíduos e às ONGs, mas apenas à Comissão

Interamericana e aos Estados.

Podemos identificar como contribuição da Comissão e da Corte na

garantia dos direitos humanos na América, o auxílio na publicidade e a atuação

do sistema americano como um fator de pressão internacional que constrange

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e impulsiona os Estados a apresentar justificativas às violações dos direitos

humanos e estimula as reformas internas.

Em relação à defesa dos Direitos Humanos das Mulheres, no âmbito da

OEA, destaca-se a Comissão Interamericana de Mulheres (CIM). Esta

Comissão foi criada em 1928, durante a Sexta Conferência Internacional

Americana (realizada em Cuba) e foi o primeiro intergovernamental criado com

o objetivo específico de tratar das questões relativas às mulheres. A CIM

atuava na União Pan-Americana e, com o fim desta, foi incorporada à OEA. Os

seus objetivos são o de proteção e promoção dos direitos humanos das

mulheres nos países-membros da OEA.

2.3 CEDAW e A Conferência de Viena

Os principais documentos internacionais de proteção dos Direitos

Humanos das Mulheres são: a Convenção sobre a Eliminação de Todas as

Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW- Convention on the

Elimination of All Forms of Discrimination against Women), e a Convenção para

Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, que ficou conhecida

como a “Convenção de Belém do Pará”.

A realização da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de

Discriminação contra a Mulher (CEDAW) foi possível graças às iniciativas da

Comissão de Status da Mulher (CSW) da ONU, que foi criada em 1946, e

preparou uma série de tratados entre 1949 e 1972, que visavam à proteção dos

direitos da mulher, tais como: a Convenção dos Direitos Políticos das Mulheres

(1952); a Convenção sobre a Nacionalidade de Mulheres Casadas (1957); a

Convenção Sobre o Casamento por Consenso, Idade Mínima para Casamento

e Registro de Casamentos (1962). Além disso, a adoção da Convenção sobre

a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher foi

impulsionada pela proclamação do Ano Internacional da Mulher em 1975 e pela

realização da primeira Conferência Mundial sobre a Mulher que teve lugar no

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México também em 1975. A CEDAW, que foi aprovada pela ONU em 1979, e

entrou em vigor em 1981, foi o primeiro tratado internacional a dispor

amplamente sobre os direitos humanos das mulheres. Até junho de 2006, 183

países haviam aderido à Convenção. (Piovesan, 2009, p. 208)

O objetivo da referida Convenção é eliminar a discriminação e assegurar a

igualdade. Ou seja, os países que aderem à Convenção passam a ter a dupla

obrigação de erradicar a discriminação e também estimular estratégias de

promoção da igualdade. Além disso, a Convenção também reconhece os

direitos reprodutivos das mulheres e condena todas as formas de violência

contra a mulher, exigindo uma punição efetiva para o autor da violência contra

a mulher.

Para a CEDAW, a discriminação significa:

ArtigoI. “toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”. (Teles, 2007 p. 33)

Os Estados-partes, ao ratificar a Convenção sobre a Eliminação de Todas

as Formas de Discriminação contra a Mulher, assumem a obrigação

internacional de eliminar progressivamente a discriminação e assegurar a

igualdade, através da adoção de políticas igualitárias. Assim, os Estados

devem adotar medidas afirmativas para acelerar o processo de obtenção da

igualdade, havendo a possibilidade, inclusive, da realização de “políticas

compensatórias”, ou seja, os Estados têm a permissão de adotar medidas

temporárias para compensar desvantagens históricas e acelerar o processo de

obtenção da igualdade. Uma vez atingido o objetivo, tais medidas cessarão.

Um exemplo desse tipo de medida pode ser encontrado no caso brasileiro no

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qual as normas para a realização de eleições para o Poder Legislativo

determinam que no mínimo 20% das vagas de cada partido devem ser

preenchidas por mulheres. (Piovesan, 2009)

Para monitorar a implementação das medidas necessárias para se eliminar

a discriminação de gênero, os Estados-partes se comprometem a enviar

relatórios ao Comitê das Nações Unidas para demonstrar como estão sendo

protegidos os direitos das mulheres em seus territórios.

Em 1993 ocorre, convocada pela Organização das Nações Unidas, a

Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena, que é considerada um

marco para a área de Direitos Humanos. Participaram dessa Conferência

delegações de diversos países além de Organizações Não-Governamentais.

Durante a referida Conferência foi elaborado uma Declaração que afirmava

em seu primeiro parágrafo o caráter universal dos direitos humanos e das

liberdades fundamentais: “todos os direitos humanos são universais,

indivisíveis e interdependentes”. Além disso, a Declaração de Viena e o

Programa de Ação reconhecem que a violência de gênero é “...incompatível

com a dignidade e o valor da pessoa humana, e deve ser eliminada por meio

de medidas legais e pela ação cooperativa nos níveis nacional e internacional,

em áreas como o desenvolvimento econômico e social, a educação, a

maternidade sadia, a assistência de saúde e o apoio social”.

A Declaração de Viena contém um grande de número de referências à

questão da discriminação contra a mulher. Durante a Conferência o movimento

de mulheres se pautou no slogan “Os Direitos das Mulheres também são

Direitos Humanos” e conquistou avanços significativos, como por exemplo, a

inclusão na Declaração e Programa de Ação de Viena de que “os direitos

humanos das mulheres e das meninas são inalienáveis e constituem parte

integral dos direitos humanos universais”. (Campos e Corrêa, 2008 pg 144)

A importância da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena para

as mulheres foi, pela primeira vez, o reconhecimento em foro internacional, dos

direitos das mulheres como direitos humanos. Até então os Direitos das

Mulheres não tinham um capítulo específico no âmbito dos Direitos Humanos.

A Conferência reafirmou a importância do direito à igualdade de gênero e

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clamou pela ratificação universal da Convenção sobre a Eliminação de Todas

as Formas de Discriminação contra a Mulher.

Além disso, a Assembléia-Geral das Nações Unidas adotou em dezembro

de 1993, a Declaração sobre a Violência contra a Mulher, o primeiro

documento específico sobre o tema no mundo, que foi elaborado durante a

Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena. Nas palavras de Campos

e Corrêa (2008), “esse documento serviu como base para a Convenção

Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, e

foi o precursor ao definir a violência de gênero, englobando a violência física,

sexual e psicológica ocorrida co âmbito público e privado”.

2.4 A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a

Violência contra a Mulher (“Convenção de Belém do Pará”)

A Convenção de Belém do Pará representa um complemento à CEDAW,

além de ratificar e ampliar a Declaração e o Programa de Ação da Conferência

Mundial dos Direitos Humanos realizada em Viena em 1993.

A Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA),

preocupada com a situação das mulheres na América, e no intuito de dotar o

Sistema Interamericano de um Instrumento Internacional que contribua para

solucionar o problema da violência contra a mulher, aprova a Convenção

Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher,

conhecida como “Convenção de Belém do Pará”, por ter sido aprovada em

reunião que se realizou nessa cidade brasileira.

A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência

contra a Mulher (“Convenção de Belém do Pará”) foi aprovada na Assembléia

Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 9 de junho de 1994.

Nas palavras de Piovesan (2009, pg 217):“ a partir da Convenção de Belém do

Pará aprimoram-se, em definitivo, as estratégias para a proteção internacional

dos direitos humanos das mulheres”. Esta Convenção foi o primeiro tratado

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internacional de proteção dos direitos humanos a reconhecer que a violência

contra a mulher é um fenômeno generalizado.

A Convenção de Belém do Pará compõe o quadro de avanços legislativos

internacionais no que se refere à questão da eliminação da violência contra a

mulher, representando um complemento à Convenção sobre a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (1979), e ampliando a

Declaração e o Programa de Ação da Conferência Mundial de Direitos

Humanos de Viena (1993). Além disso, a Convenção de Belém do Pará é o

único instrumento jurídico internacional vinculante específico sobre violência

baseada em gênero.

A Convenção de Belém do Pará incorpora o conceito de gênero à definição

de violência contra a mulher, reconhecendo que a violência contra as mulheres

é uma ofensa à dignidade humana e uma manifestação de relações de poder

historicamente desiguais entre mulheres e homens. Descreve também as

várias formas de violência (física, sexual e psicológica), afirmando que esta

pode vir a ocorrer tanto no âmbito público como na esfera privada.

A referida Convenção reconhece que a violência contra a mulher significa

grave violação dos direitos humanos e define essa violência em seu artigo

primeiro como “qualquer ato ou conduta baseada no gênero que cause morte,

dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera

pública quanto na privada”. E estabelece que a violência pode ocorrer “no

âmbito da família ou na unidade doméstica, ou em qualquer relação

interpessoal, quer o agressor compartilhe, tenha compartilhado ou não da

mesma residência com a mulher, incluindo, entre outras formas, o estupro,

maus-tratos e abuso sexual” (Artigo 2°, Disponível em: Campos e Corrêa,

2008, p.171)

Em seus cinco capítulos, distribuídos em 25 artigos, a Convenção de

Belém do Pará, além de definir a violência contra a mulher, declara os direitos

protegidos, aponta para os deveres dos Estados e cria mecanismos

interamericanos de proteção com o propósito de proteger os direitos das

mulheres. Segue abaixo uma lista de direitos, deveres e mecanismos de

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proteção estabelecidos pela Convenção de Belém do Pará (Disponível em:

http://cidh.oas.org/Basicos/Portugues/m.Belem.do.Para.htm em 23/03/2012) :

Direitos protegidos pela Convenção de Belém do Pará:

-Toda mulher tem direito a ser livre de violência, tanto na esfera pública como na esfera privada. -Toda mulher tem direito ao reconhecimento, desfrute, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagrados em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos. Estes direitos abrangem, entre outros:

a. direito a que se respeite sua vida; b. direito a que se respeite sua integridade física, mental e moral; c. direito à liberdade e à segurança pessoais; d. direito a não ser submetida a tortura; e. direito a que se respeite a dignidade inerente à sua pessoa e a que

se proteja sua família; f. direito a igual proteção perante a lei e da lei; g. direito a recurso simples e rápido perante tribunal competente que a

proteja contra atos que violem seus direitos; h. direito de livre associação; i. direito à liberdade de professar a própria religião e as próprias

crenças, de acordo com a lei; e j. direito a ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e

a participar nos assuntos públicos, inclusive na tomada de decisões.

-Toda mulher poderá exercer livre e plenamente seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais e contará com a total proteção desses direitos consagrados nos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos. Os Estados Partes reconhecem que a violência contra a mulher impede e anula o exercício desses direitos. -O direito de toda mulher a ser livre de violência abrange, entre outros:

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a. o direito da mulher a ser livre de todas as formas de discriminação; e

b. o direito da mulher a ser valorizada e educada livre de padrões

estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação.

Deveres dos países integrantes da OEA, segundo a Convenção de Belém do

Pará:

-Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em:

a. abster-se de qualquer ato ou prática de violência contra a mulher

e velar por que as autoridades, seus funcionários e pessoal, bem

como agentes e instituições públicos ajam de conformidade com

essa obrigação;

b. agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punir a violência

contra a mulher; c. incorporar na sua legislação interna normas penais, civis,

administrativas e de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis;

d. adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha

de perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade;

e. tomar todas as medidas adequadas, inclusive legislativas, para

modificar ou abolir leis e regulamentos vigentes ou modificar práticas jurídicas ou consuetudinárias que respaldem a persistência e a tolerância da violência contra a mulher;

f estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher

sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos;

g. estabelecer mecanismos judiciais e administrativos necessários

para assegurar que a mulher sujeitada a violência tenha efetivo

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acesso a restituição, reparação do dano e outros meios de compensação justos e eficazes;

h. adotar as medidas legislativas ou de outra natureza necessárias à

vigência desta Convenção. -Os Estados Partes convêm em adotar, progressivamente, medidas específicas, inclusive programas destinados a:

a. promover o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus direitos humanos;

b. modificar os padrões sociais e culturais de conduta de homens e

mulheres, inclusive a formulação de programas formais e não formais adequados a todos os níveis do processo educacional, a fim de combater preconceitos e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a mulher;

c. promover a educação e treinamento de todo o pessoal judiciário e

policial e demais funcionários responsáveis pela aplicação da lei, bem como do pessoal encarregado da implementação de políticas de prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher;

d. prestar serviços especializados apropriados à mulher sujeitada a

violência, por intermédio de entidades dos setores público e privado, inclusive abrigos, serviços de orientação familiar, quando for o caso, e atendimento e custódia dos menores afetados;

e. promover e apoiar programas de educação governamentais e

privados, destinados a conscientizar o público para os problemas da violência contra a mulher, recursos jurídicos e reparação relacionados com essa violência;

f. proporcionar à mulher sujeitada a violência acesso a programas

eficazes de reabilitação e treinamento que lhe permitam participar plenamente da vida pública, privada e social;

g. incentivar os meios de comunicação a que formulem diretrizes

adequadas de divulgação, que contribuam para a erradicação da violência contra a mulher em todas as suas formas e enalteçam o respeito pela dignidade da mulher;

h. assegurar a pesquisa e coleta de estatísticas e outras informações

relevantes concernentes às causas, conseqüências e freqüência

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da violência contra a mulher, a fim de avaliar a eficiência das medidas tomadas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como formular e implementar as mudanças necessárias; e

i. promover a cooperação internacional para o intercâmbio de idéias e

experiências, bem como a execução de programas destinados à proteção da mulher sujeitada a violência.

Além disso, a Convenção inova ao facilitar o acesso à justiça através do

mecanismo de petições à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o

que representa uma garantia adicional de proteção dos direitos humanos. O

artigo 12 estabelece que qualquer pessoa, grupo de pessoas, ou entidade não-

governamental, pode apresentar à Comissão Interamericana de Direitos

Humanos petições que contenham denúncias de violência contra a mulher.

Essas petições devem ser apresentadas no caso de “esgotamento prévio dos

recursos internos”, ou seja, se ficar comprovado que os Estados-partes agiram

com negligência ou ineficácia em relação à questão. (Piovesan, 2009)

A importância da possibilidade de se apresentar os casos de violação dos

direitos humanos das mulheres à comunidade internacional reside na

existência de uma maior publicidade dos casos, o que leva ao constrangimento

do Estado violador desses direitos, que é compelido a apresentar justificativas

à sua prática. Além disso, a Comissão Interamericana poderá condenar o

Estado e determinar a adoção de medidas como, por exemplo, a fixação de

uma indenização aos familiares da vítima.

Além de detalhar os deveres dos Estados-parte para a prevenção,

erradicação e eliminação da violência contra a mulher (artigos 7° e 8°), a

Convenção estabelece, em seu artigo 10°, a obrigação dos Estados-parte de

apresentarem informes periódicos à Comissão Interamericana da Mulher (CIM),

comunicando as medidas que estes adotaram para prevenir e erradicar a

violência contra a mulher, bem como as medidas de assistência à mulher

vítima de violência.

Cabe ainda destacar a criação, em 2004, do Mecanismo de Seguimento

para Implementação da Convenção de Belém do Pará (MESECVI). O

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MESECVI é composto por especialistas no tema da violência contra a mulher e

tem como objetivo o monitoramento e o acompanhamento da implementação

dos compromissos assumidos. Em 2008 o MESECVI lançou o primeiro informe

hemisférico de avaliação da Convenção de Belém do Pará. O documento

avalia a atuação dos Estados em relação às obrigações assumidas com a

ratificação da Convenção de Belém do Pará e representa um importante

esforço para se conhecer a realidade da violência contra as mulheres.

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CAPÍTULO III

AS PRINCIPAIS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS RELATIVAS À

PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES E AS SUAS

CONSEQUÊNCIAS NO BRASIL

A comparação entre os avanços no plano internacional (obtidos através de

Conferências e Tratados) relativos aos Direitos Humanos das Mulheres, com

os avanços ocorridos no Brasil é de extrema relevância para as relações

internacionais para que possamos observar até que ponto o progresso no

plano internacional é capaz de impulsionar transformações internas.

3.1Dados sobre a situação das mulheres no Brasil

No Brasil, a violência doméstica é um grave problema. Pesquisas mostram

que 70% das mulheres assassinadas são mortas por seus ex ou atuais

parceiros. Um dado interessante é que, além de tudo, a violência doméstica

apresenta como conseqüência o prejuízo financeiro. De acordo com o BID

(Banco Interamericano de Desenvolvimento), uma em cada 5 mulheres que

faltam ao trabalho o fazem por terem sofrido agressão física. A violência

doméstica compromete 14,6% do PIB da América Latina, cerca de US$ 170

bilhões. No Brasil a violência doméstica custa ao país 10,5% do seu PIB.

(Piovesan, 2009)

Em 2001, foi realizada uma pesquisa pelo Núcleo de Opinião Pública da

Fundação Perseu Abramo e concluiu-se que, no Brasil, a cada 15 segundos

uma mulher é espancada por um homem. Um terço das mulheres admitiu já ter

sido vítima de alguma forma de violência física; 24% relataram ter sofrido

ameaças com armas; 22% falaram de agressões e 13% de estupro conjugal ou

abuso. (Campos e Corrêa, 2008)

A impunidade também é outro fator alarmante no Brasil. Estima-se que,

em 1990, no estado do Rio de Janeiro, nenhum dos dois mil casos de agressão

contra mulheres registrados em delegacias terminou na punição do acusado. A

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partir desses dados, podemos concluir que a realidade brasileira revela um

grave padrão de desrespeito aos direitos humanos das mulheres. (Piovesan,

2009)

Segue abaixo alguns dados recentemente coletados:

- Quatro em cada dez mulheres brasileiras já foram vítimas

de violência doméstica. O número consta do Anuário das

Mulheres Brasileiras 2011, divulgado pela Secretaria de Políticas para as

Mulheres do governo federal e Departamento Intersindical de Estatística e

Estudos Socieconômicos (Dieese).

(retirado de: http://www.brasil.gov.br/noticias/arquivos/2011/07/05/43-das-

mulheres-ja-foram-vitimas-de-violencia-domestica-segundo-anuario em

07/03/2012)

- Seis em cada 10 brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de

violência doméstica. (retirado de:

http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/index.php?option=com_content&view=

article&id=1975&catid=36 em 07/03/2012)

- O medo continua sendo a razão principal (68%) para evitar a denúncia

dos agressores. Em 66% dos casos, os responsáveis pelas agressões foram

os maridos ou companheiros. (retirado de:

http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/index.php?option=com_content&view=

article&id=1975&catid=36 em 07/03/2012)

- Brasil está entre os 25 países com maior taxa de assassinato de mulheres.

(retirado de:

http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/index.php?option=com_content&view=

article&id=1975&catid=36 em 07/03/2012)

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3.2 O Direito brasileiro e a proteção internacional dos Direitos Humanos

Antes de iniciarmos a análise específica acerca dos Direitos Humanos das

Mulheres no Brasil, apresentaremos um breve estudo sobre a incorporação,

pelo Estado brasileiro, dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

O Brasil, após o seu processo de democratização, deflagrado em 1985,

passou a ratificar importantes tratados internacionais relativos aos Direitos

Humanos. De acordo com Piovesan (2009), essas ratificações surgiram da

necessidade de reorganização da agenda internacional brasileira para que esta

fosse mais coerente com as transformações internas decorrentes do processo

de democratização, de forma a compor uma imagem positiva do Estado

brasileiro no contexto internacional.

Ainda em seu livro, Piovesan (2009) destaca a importância da

Constituição Brasileira de 1988 como símbolo de ruptura com o regime

autoritário, e como documento avançado acerca de direitos e garantias. Além

disso, a Constituição apresenta-se como um documento inovador ao incluir,

entre os direitos constitucionais, os direitos humanos enunciados nos tratados

internacionais de que o Brasil é signatário.

Resumindo, o Direito brasileiro combina dois regimes jurídicos: um

aplicável aos tratados de direitos humanos e outro aplicável aos tratados

tradicionais. Assim, é atribuída aos direitos humanos a hierarquia de norma

constitucional, ou seja, de direitos constitucionalmente garantidos e com

aplicabilidade imediata, enquanto que os outros tratados internacionais

apresentam hierarquia infraconstitucional e se submetem à sistemática da

incorporação legislativa (Piovesan, 2009).

Dessa forma, considerada a hierarquia constitucional dos Tratados de

Direitos humanos no Brasil, podemos levantar, de acordo com Piovesan

(2009), três hipóteses:

-Na primeira, o direito assegurado pelo Tratado internacional coincide com a

Constituição. Esse é o caso do artigo 5º, inciso III da Constituição de 1988:

“ninguém será submetido à tortura, nem à tratamento cruel, desumano ou

degradante”, que coincide com o artigo V da Declaração Universal de 1948.

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-Na segunda, o Tratado internacional integra, complementa e amplia o universo

de direitos constitucionais previstos. É o caso do artigo 4º da Convenção sobre

a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, que

admite a possibilidade de adoção pelos Estados de medidas temporárias e

especiais que objetivem acelerar a igualdade de fato entre homens e mulheres.

-Na terceira o Tratado internacional contraria um preceito de Direito interno.

Segundo Piovesan(2009), esta terceira hipótese é a que apresenta a maior

problemática, afinal, como solucionar um conflito entre a Constituição e

determinado Tratado Internacional de Direitos humanos? Nesse caso, como

solução ao conflito, adota-se o critério da escolha da norma mais favorável à

vítima, prevalecendo a norma mais benéfica ao indivíduo, titular do direito.

3.3. Os avanços dos Direitos Humanos das Mulheres no Brasil

Ao longo do século XX, as mulheres alcançaram vitórias expressivas,

conseguindo a abolição de alguns dispositivos legais discriminatórios e

aprovando novas leis que reconheciam direitos fundamentais e ampliavam as

suas garantias (Campos e Corrêa 2008).

A primeira dessas conquistas seria o direito ao voto, que foi alcançado em

1932. Em 1934, a Constituição democrática brasileira regulamentou o exercício

do trabalho pelas mulheres e estabeleceu a igualdade de salários e a proteção

da maternidade e à infância. Em seu artigo 113, dizia: “Todos são iguais

perante a lei. Não há privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento,

sexo, raça, profissão, própria ou dos pais, classe social riqueza, cargos

religiosos ou idéias políticas”. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1934)

Já no período pré-1988, o movimento de mulheres tinha por objetivo a

obtenção de conquistas no âmbito constitucional. Nesse intuito foi elaborada a

“Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes” contemplando as suas

principais reivindicações. O resultado disso foi a incorporação da maioria

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significativa dessas reivindicações no texto constitucional de 1988.

(PIOVESAN, 2009)

Além disso, as mulheres brasileiras travaram notáveis batalhas no intuito

de abolir do Código Civil os dispositivos discriminatórios. Assim em 1988, com

a nova Constituição Federal, que incluía algumas das mais importantes

demandas do movimento organizado de mulheres, foi concretizado um novo

Código Civil, atrelado aos princípios da igualdade.

Falú (2006), diretora do Escritório Regional para o Brasil e os Países do

Cone Sul, do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher

(Unifem, criado em 1974), afirma que na esteira da promulgação da

Constituição de 1988, o país ratificou importantes tratados internacionais e

elaborou diversas leis que constituíram avanços institucionais importantes, e

caracterizam o compromisso das políticas do Estado com as questões de

gênero. Assim, segundo ela, é inegável que tenha ocorrido progressos

consideráveis em relação aos direitos das mulheres no Brasil (avanços estes,

que podem ser creditados ao movimento de mulheres), porém, ainda existem

enormes desigualdades.

Como exemplo desses avanços, podemos citar a Convenção

Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher

(“Convenção de Belém do Pará”de 1994), que foi ratificada pelo Brasil em

1995.

A partir disso é de suma importância ressaltar a implementação da Lei

Maria da Penha, que entrou em vigor em 22.09.2006 e dá cumprimento à essa

Convenção (“de Belém do Pará”) e à Convenção para a Eliminação de Todas

as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW,da ONU).

Cabe aqui se fazer um comentário à história da Lei Maria da Penha. Em

1998, o Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL-Brasil) e o

Comitê Latino-Americano do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher

(CLADEM-Brasil), em conjunto com Maria da Penha Maia Fernandes,

encaminharam à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, uma petição

contra o Estado brasileiro, que não estaria cumprindo com os compromissos

internacionais de proteção à vítima de violência doméstica.

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Maria da Penha era casada com o agressor Sr. Heredia Viveiros, e sofria

constantes agressões e ameaças. Em 1983 sofreu uma tentativa de homicídio

por parte de seu marido, que atirou em suas costas, deixando-a paraplégica.

Duas semanas após o ocorrido, Maria da Penha sofreu outra tentativa de

homicídio, quando seu marido tentou eletrocutá-la durante o banho. Foi

apurado que o Sr. Heredia Viveiros teria agido de forma premeditada, já que

semanas antes ele tentara convencer a vítima a fazer um seguro de vida em

seu favor. Além disso, Maria da Penha conseguiu provas de que seu marido

era bígamo e que, inclusive tinha um filho em seu país de origem, a Colômbia.

(CAMPOS E CORRÊA, 2008)

Passaram-se 15 anos e ainda não havia uma decisão final de condenação

pelos tribunais nacionais. O agressor permanecia em liberdade. Diante disto, a

CLADEM, a CEJIL e a vítima denunciaram a tolerância da violência doméstica

por parte do Estado brasileiro.

Em 2001, após 18 anos da prática do crime, a Comissão Interamericana

de Direitos Humanos, em decisão inédita, condenou o Estado brasileiro por

negligência e omissão em relação à violência doméstica e recomendou, dentre

outras medidas, o pagamento de uma indenização à vítima pelo Estado. Este

foi um caso de aplicação da Convenção de Belém do Pará, no qual a decisão

da Comissão Interamericana de Direitos Humanos fundamentou-se na

violação, pelo Estado, dos compromissos assumidos em virtude da ratificação

da Convenção. (PIOVESAN 2009)

Em 31 de outubro de 2002 houve a prisão do réu, e em 7 de agosto de

2006, foi adotada a Lei n. 11.340, também conhecida como Lei Maria da

Penha, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar

contra a mulher, estabelecendo medidas de prevenção, assistência e proteção

às mulheres em situação de violência. (Piovesan 2009)

Podemos concluir então, a partir do exemplo da criação da Lei Maria da

Penha, que os avanços obtidos no plano internacional são sim capazes de

provocar transformações internas significativas no Brasil, e que, os Tratados

internacionais de direitos humanos vêm a aprimorar e fortalecer o grau de

proteção dos direitos consagrados no plano normativo constitucional,

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contribuindo de forma decisiva para o reforço da promoção dos direitos

humanos. (PIOVESAN, 2009)

3.4. Desafios e Perspectivas

Como vimos no item anterior, as mulheres brasileiras conseguiram alcançar

diversos avanços na esfera de seus direitos humanos. Afinal, até 2006 o Brasil

ainda não dispunha de nenhuma legislação específica a respeito da violência

contra a mulher. Até então era aplicada a Lei n 9.099/95, que tratava de

infrações penais de menor potencial ofensivo, ou seja, a violência contra a

mulher não era considerada como uma grave violação aos direitos humanos.

(PIOVESAN, 2009)

Esse quadro mudou com a Lei Maria da Penha, cuja elaboração foi

impulsionada pelo sistema internacional de proteção aos Direitos Humanos. A

partir disso, Piovesan (2009) destaca sete inovações introduzidas pela Lei

n.11.340 (Lei “Maria da Penha”):

- Mudança de paradigma no enfrentamento da violência contra a mulher;

- Incorporação da perspectiva de gênero para tratar da violência contra a

mulher;

- Incorporação da ótica preventiva, integrada e multidisciplinar;

- Fortalecimento da ótica repressiva;

- Harmonização com a Convenção Interamericana para prevenir, Punir e

Erradicar a Violência contra a mulher;

- Consolidação de um conceito ampliado de família e visibilidade ao direito à

livre orientação sexual;

- Estímulo à criação de bancos de dados e estatísticas.

Nas palavras de Piovesan (2009), na experiência brasileira, “(...) os

instrumentos internacionais constituem poderosos mecanismos para a

promoção do efetivo fortalecimento da proteção dos direitos humanos das

mulheres no âmbito nacional”.

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Porém, ainda segundo Piovesan (2009), parte dos diplomas

infraconstitucionais adota uma perspectiva androcêntrica e discriminatória com

relação à mulher, atribuindo a homens e mulheres papéis sociais predefinidos e

adjetivando seus comportamentos sociais. Portanto ainda existe a necessidade

de eliminação dessas normas discriminatórias, e da construção de um novo

paradigma que incorpore a perspectiva de gênero.

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CONCLUSÃO

O objetivo do estudo foi a comparação entre os avanços relativos aos

Direitos Humanos das Mulheres nos planos nacional e internacional.

O estudo abordou também as iniciativas, no âmbito da Organização

das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos, destinadas a

promover a igualdade de gênero, e como estas iniciativas são recebidas e

aplicadas no Brasil.

Através da análise dos conceitos de Direitos Humanos, de gênero e,

sobretudo das estatísticas apresentadas, observamos a dificuldade em se

realizar, na prática, as medidas previstas nos Tratados Internacionais

ratificados pelo Brasil.

Por outro lado, também apresentamos os avanços e a inovação trazida

pela implementação da Lei Maria da Penha, que representou de forma

marcante a influência do sistema internacional de proteção aos direitos

Humanos no âmbito nacional após a condenação do Brasil por negligência no

caso da violência de gênero.

Assim, o mérito deste trabalho consistiu em demonstrar a influência

dos Tratados Internacionais no Direito interno brasileiro.

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ANEXOS

Índice de anexos

Anexo 1 >> A íntegra da Convenção de Belém do Pará ........................................... 53

Anexo 2 >> Lei Maria da Penha ............................................................................... 62

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ANEXO 1: A íntegra da Convenção de Belém do Pará

CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER,

“CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ”

(Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994, no Vigésimo Quarto Período Ordinário de Sessões da Assembléia Geral)

OS ESTADOS PARTES NESTA CONVENÇÃO, RECONHECENDO que o respeito irrestrito aos direitos humanos foi consagrado na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos e reafirmado em outros instrumentos internacionais e regionais; AFIRMANDO que a violência contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente a observância, gozo e exercício de tais direitos e liberdades; PREOCUPADOS por que a violência contra a mulher constitui ofensa contra a dignidade humana e é manifestação das relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens; RECORDANDO a Declaração para a Erradicação da Violência contra a Mulher, aprovada na Vigésima Quinta Assembléia de Delegadas da Comissão Interamericana de Mulheres, e afirmando que a violência contra a mulher permeia todos os setores da sociedade, independentemente de classe, raça ou grupo étnico, renda, cultura, nível educacional, idade ou religião, e afeta negativamente suas próprias bases; CONVENCIDOS de que a eliminação da violência contra a mulher é condição indispensável para seu desenvolvimento individual e social e sua plena e igualitária participação em todas as esferas de vida; e CONVENCIDOS de que a adoção de uma convenção para prevenir, punir e erradicar todas as formas de violência contra a mulher, no âmbito da Organização dos Estados Americanos, constitui positiva contribuição no sentido de proteger os direitos da mulher e eliminar as situações de violência contra ela, CONVIERAM no seguinte:

CAPÍTULO I

DEFINIÇÃO E ÂMBITO DE APLICAÇÃO

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Artigo 1 Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada.

Artigo 2 Entende-se que a violência contra a mulher abrange a violência física, sexual e psicológica:

a. ocorrida no âmbito da família ou unidade doméstica ou em

qualquer relação interpessoal, quer o agressor compartilhe, tenha

compartilhado ou não a sua residência, incluindo-se, entre outras

formas, o estupro, maus-tratos e abuso sexual;

b. ocorrida na comunidade e cometida por qualquer pessoa,

incluindo, entre outras formas, o estupro, abuso sexual, tortura,

tráfico de mulheres, prostituição forçada, seqüestro e assédio

sexual no local de trabalho, bem como em instituições

educacionais, serviços de saúde ou qualquer outro local; e

c. perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que

ocorra.

CAPÍTULO II

DIREITOS PROTEGIDOS

Artigo 3 Toda mulher tem direito a ser livre de violência, tanto na esfera pública como na esfera privada.

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Artigo 4 Toda mulher tem direito ao reconhecimento, desfrute, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagrados em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos. Estes direitos abrangem, entre outros:

a. direito a que se respeite sua vida; b. direito a que se respeite sua integridade física, mental e moral; c. direito à liberdade e à segurança pessoais; d. direito a não ser submetida a tortura; e. direito a que se respeite a dignidade inerente à sua pessoa e a que

se proteja sua família; f. direito a igual proteção perante a lei e da lei; g. direito a recurso simples e rápido perante tribunal competente que a

proteja contra atos que violem seus direitos; h. direito de livre associação; i. direito à liberdade de professar a própria religião e as próprias

crenças, de acordo com a lei; e j. direito a ter igualdade de acesso às funções públicas de seu país e

a participar nos assuntos públicos, inclusive na tomada de decisões.

Artigo 5 Toda mulher poderá exercer livre e plenamente seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais e contará com a total proteção desses direitos consagrados nos instrumentos regionais e internacionais sobre direitos humanos. Os Estados Partes reconhecem que a violência contra a mulher impede e anula o exercício desses direitos.

Artigo 6 O direito de toda mulher a ser livre de violência abrange, entre outros:

a. o direito da mulher a ser livre de todas as formas de discriminação; e

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b. o direito da mulher a ser valorizada e educada livre de padrões

estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação.

CAPÍTULO III

DEVERES DOS ESTADOS

Artigo 7 Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em:

a. abster-se de qualquer ato ou prática de violência contra a mulher

e velar por que as autoridades, seus funcionários e pessoal, bem

como agentes e instituições públicos ajam de conformidade com

essa obrigação;

b. agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punir a violência

contra a mulher; c. incorporar na sua legislação interna normas penais, civis,

administrativas e de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis;

d. adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha

de perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade;

e. tomar todas as medidas adequadas, inclusive legislativas, para

modificar ou abolir leis e regulamentos vigentes ou modificar práticas jurídicas ou consuetudinárias que respaldem a persistência e a tolerância da violência contra a mulher;

f estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher

sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos;

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g. estabelecer mecanismos judiciais e administrativos necessários

para assegurar que a mulher sujeitada a violência tenha efetivo acesso a restituição, reparação do dano e outros meios de compensação justos e eficazes;

h. adotar as medidas legislativas ou de outra natureza necessárias à

vigência desta Convenção.

Artigo 8 Os Estados Partes convêm em adotar, progressivamente, medidas específicas, inclusive programas destinados a:

a. promover o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus direitos humanos;

b. modificar os padrões sociais e culturais de conduta de homens e

mulheres, inclusive a formulação de programas formais e não formais adequados a todos os níveis do processo educacional, a fim de combater preconceitos e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a mulher;

c. promover a educação e treinamento de todo o pessoal judiciário e

policial e demais funcionários responsáveis pela aplicação da lei, bem como do pessoal encarregado da implementação de políticas de prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher;

d. prestar serviços especializados apropriados à mulher sujeitada a

violência, por intermédio de entidades dos setores público e privado, inclusive abrigos, serviços de orientação familiar, quando for o caso, e atendimento e custódia dos menores afetados;

e. promover e apoiar programas de educação governamentais e

privados, destinados a conscientizar o público para os problemas da violência contra a mulher, recursos jurídicos e reparação relacionados com essa violência;

f. proporcionar à mulher sujeitada a violência acesso a programas

eficazes de reabilitação e treinamento que lhe permitam participar plenamente da vida pública, privada e social;

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g. incentivar os meios de comunicação a que formulem diretrizes adequadas de divulgação, que contribuam para a erradicação da violência contra a mulher em todas as suas formas e enalteçam o respeito pela dignidade da mulher;

h. assegurar a pesquisa e coleta de estatísticas e outras informações

relevantes concernentes às causas, conseqüências e freqüência da violência contra a mulher, a fim de avaliar a eficiência das medidas tomadas para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como formular e implementar as mudanças necessárias; e

i. promover a cooperação internacional para o intercâmbio de idéias e

experiências, bem como a execução de programas destinados à proteção da mulher sujeitada a violência.

Artigo 9 Para a adoção das medidas a que se refere este capítulo, os Estados Partes levarão especialmente em conta a situação da mulher vulnerável a violência por sua raça, origem étnica ou condição de migrante, de refugiada ou de deslocada, entre outros motivos. Também será considerada sujeitada a violência a gestante, deficiente, menor, idosa ou em situação sócio-econômica desfavorável, afetada por situações de conflito armado ou de privação da liberdade.

CAPÍTULO IV

MECANISMOS INTERAMERICANOS DE PROTEÇÃO

Artigo 10

A fim de proteger o direito de toda mulher a uma vida livre de violência, os Estados Partes deverão incluir nos relatórios nacionais à Comissão Interamericana de Mulheres informações sobre as medidas adotadas para prevenir e erradicar a violência contra a mulher, para prestar assistência à mulher afetada pela violência, bem como sobre as dificuldades que observarem na aplicação das mesmas e os fatores que contribuam para a violência contra a mulher.

Artigo 11 Os Estados Partes nesta Convenção e a Comissão Interamericana de Mulheres poderão solicitar à Corte Interamericana de Direitos Humanos parecer sobre a interpretação desta Convenção.

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Artigo 12 Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou qualquer entidade não-governamental juridicamente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, poderá apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos petições referentes a denúncias ou queixas de violação do artigo 7 desta Convenção por um Estado Parte, devendo a Comissão considerar tais petições de acordo com as normas e procedimentos estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no Estatuto e Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para a apresentação e consideração de petições.

CAPÍTULO V

DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 13 Nenhuma das disposições desta Convenção poderá ser interpretada no sentido de restringir ou limitar a legislação interna dos Estados Partes que ofereça proteções e garantias iguais ou maiores para os direitos da mulher, bem como salvaguardas para prevenir e erradicar a violência contra a mulher.

Artigo 14 Nenhuma das disposições desta Convenção poderá ser interpretada no sentido de restringir ou limitar as da Convenção Americana sobre Direitos Humanos ou de qualquer outra convenção internacional que ofereça proteção igual ou maior nesta matéria.

Artigo 15 Esta Convenção fica aberta à assinatura de todos os Estados membros da Organização dos Estados Americanos.

Artigo 16 Esta Convenção está sujeita a ratificação. Os instrumentos de ratificação serão depositados na Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos.

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Artigo 17 Esta Convenção fica aberta à adesão de qualquer outro Estado. Os instrumentos de adesão serão depositados na Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos.

Artigo 18 Os Estados poderão formular reservas a esta Convenção no momento de aprová-la, assiná-la, ratificá-la ou a ela aderir, desde que tais reservas:

a. não sejam incompatíveis com o objetivo e propósito da Convenção; b. não sejam de caráter geral e se refiram especificamente a uma ou

mais de suas disposições.

Artigo 19 Qualquer Estado Parte poderá apresentar à Assembléia Geral, por intermédio da Comissão Interamericana de Mulheres, propostas de emenda a esta Convenção. As emendas entrarão em vigor para os Estados ratificantes das mesmas na data em que dois terços dos Estados Partes tenham depositado seus respectivos instrumentos de ratificação. Para os demais Estados Partes, entrarão em vigor na data em que depositarem seus respectivos instrumentos de ratificação.

Artigo 20 Os Estados Partes que tenham duas ou mais unidades territoriais em que vigorem sistemas jurídicos diferentes relacionados com as questões de que trata esta Convenção poderão declarar, no momento de assiná-la, de ratificá-la ou de a ela aderir, que a Convenção se aplicará a todas as suas unidades territoriais ou somente a uma ou mais delas. Tal declaração poderá ser modificada, em qualquer momento, mediante declarações ulteriores, que indicarão expressamente a unidade ou as unidades territoriais a que se aplicará esta Convenção. Essas declarações ulteriores serão transmitidas à Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos e entrarão em vigor trinta dias depois de recebidas.

Artigo 21

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Esta Convenção entrará em vigor no trigésimo dia a partir da data em que for depositado o segundo instrumento de ratificação. Para cada Estado que ratificar a Convenção ou a ela aderir após haver sido depositado o segundo instrumento de ratificação, entrará em vigor no trigésimo dia a partir da data em que esse Estado houver depositado seu instrumento de ratificação ou adesão.

Artigo 22 O Secretário-Geral informará a todos os Estados membros da Organização dos Estados Americanos a entrada em vigor da Convenção.

Artigo 23 O Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos apresentará um relatório anual aos Estados membros da Organização sobre a situação desta Convenção, inclusive sobre as assinaturas e depósitos de instrumentos de ratificação, adesão e declaração, bem como sobre as reservas que os Estados Partes tiverem apresentado e, conforme o caso, um relatório sobre as mesmas.

Artigo 24 Esta Convenção vigorará por prazo indefinido, mas qualquer Estado Parte poderá denunciá-la mediante o depósito na Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos de instrumento que tenha essa finalidade. Um ano após a data do depósito do instrumento de denúncia, cessarão os efeitos da Convenção para o Estado denunciante, mas subsistirão para os demais Estados Partes.

Artigo 25 O instrumento original desta Convenção, cujos textos em português, espanhol, francês e inglês são igualmente autênticos, será depositado na Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos, que enviará cópia autenticada de seu texto ao Secretariado das Nações Unidas para registro e publicação, de acordo com o artigo 102 da Carta das Nações Unidas. EM FÉ DO QUE os plenipotenciários infra-assinados, devidamente autorizados por seus respectivos governos, assinam esta Convenção, que se denominará Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, “Convenção de Belém do Pará”. EXPEDIDA NA CIDADE DE BELÉM DO PARÁ, BRASIL, no dia nove de junho de mil novecentos e noventa e quatro.

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ANEXO 2: LEI MARIA DA PENHA

Presidência da República Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006.

Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

Art. 3o Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

§ 1o O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no

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sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 2o Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.

Art. 4o Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

TÍTULO II

DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

Art. 6o A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos.

CAPÍTULO II

DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

CONTRA A MULHER

Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

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I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

TÍTULO III

DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

CAPÍTULO I

DAS MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO

Art. 8o A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:

I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação;

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II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;

III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;

IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher;

V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres;

VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher;

VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;

VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia;

IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.

CAPÍTULO II

DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

Art. 9o A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.

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§ 1o O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal.

§ 2o O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:

I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta;

II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.

§ 3o A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.

CAPÍTULO III

DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL

Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida.

Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências:

I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;

II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;

III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;

IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;

V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.

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Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:

I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada;

II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;

III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;

IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários;

V - ouvir o agressor e as testemunhas;

VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;

VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.

§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:

I - qualificação da ofendida e do agressor;

II - nome e idade dos dependentes;

III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.

§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.

§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.

TÍTULO IV

DOS PROCEDIMENTOS

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CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 13. Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei.

Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária.

Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado:

I - do seu domicílio ou de sua residência;

II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;

III - do domicílio do agressor.

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.

CAPÍTULO II

DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

Seção I

Disposições Gerais

Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas:

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I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;

II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;

III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.

Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.

§ 1o As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.

§ 2o As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.

§ 3o Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.

Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.

Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.

Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor.

Seção II

Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor,

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em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1o As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

§ 3o Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

Seção III

Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida

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Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:

I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos.

Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;

II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;

III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;

IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.

CAPÍTULO III

DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher.

Art. 26. Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário:

I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, entre outros;

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II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas;

III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

CAPÍTULO IV

DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA

Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.

Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.

TÍTULO V

DA EQUIPE DE ATENDIMENTO MULTIDISCIPLINAR

Art. 29. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem a ser criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser integrada por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde.

Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes.

Art. 31. Quando a complexidade do caso exigir avaliação mais aprofundada, o juiz poderá determinar a manifestação de profissional especializado, mediante a indicação da equipe de atendimento multidisciplinar.

Art. 32. O Poder Judiciário, na elaboração de sua proposta orçamentária, poderá prever recursos para a criação e manutenção da equipe de atendimento multidisciplinar, nos termos da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

TÍTULO VI

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

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Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.

Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput.

TÍTULO VII

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 34. A instituição dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher poderá ser acompanhada pela implantação das curadorias necessárias e do serviço de assistência judiciária.

Art. 35. A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências:

I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar;

II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar;

III - delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médico-legal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar;

IV - programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar;

V - centros de educação e de reabilitação para os agressores.

Art. 36. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão a adaptação de seus órgãos e de seus programas às diretrizes e aos princípios desta Lei.

Art. 37. A defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos nesta Lei poderá ser exercida, concorrentemente, pelo Ministério Público e por associação de atuação na área, regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil.

Parágrafo único. O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando entender que não há outra entidade com representatividade adequada para o ajuizamento da demanda coletiva.

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Art. 38. As estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher serão incluídas nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema de Justiça e Segurança a fim de subsidiar o sistema nacional de dados e informações relativo às mulheres.

Parágrafo único. As Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal poderão remeter suas informações criminais para a base de dados do Ministério da Justiça.

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no limite de suas competências e nos termos das respectivas leis de diretrizes orçamentárias, poderão estabelecer dotações orçamentárias específicas, em cada exercício financeiro, para a implementação das medidas estabelecidas nesta Lei.

Art. 40. As obrigações previstas nesta Lei não excluem outras decorrentes dos princípios por ela adotados.

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Art. 42. O art. 313 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV:

“Art. 313. .................................................

................................................................

IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” (NR)

Art. 43. A alínea f do inciso II do art. 61 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 61. ..................................................

.................................................................

II - ............................................................

.................................................................

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;

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........................................................... ” (NR)

Art. 44. O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 129. ..................................................

..................................................................

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.

..................................................................

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.” (NR)

Art. 45. O art. 152 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 152. ...................................................

Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.” (NR)

Art. 46. Esta Lei entra em vigor 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação.

Brasília, 7 de agosto de 2006; 185o da Independência e 118o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Dilma Rousseff

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 8.8.2006

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de Normas. Curitiba: Juruá, 2008.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO..................................................................................................09

CAPÍTULO I- ASPECTOS CONCEITUAIS E A QUESTÃO DO GÊNERO NO

CONTEXTO DOS DIREITOS HUMANOS ................................................................ 10

1.3. O conceito de gênero e o feminismo .................................................................. 10

1.4. O papel da mulher e a luta pelos direitos ao longo da história ........................... 11

1.3. Os Direitos Humanos e as suas gerações ......................................................... 18

1.4. Violência de gênero: a principal violação dos direitos humanos das

mulheres .................................................................................................................. 23

CAPITULO II - A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES

NO ÂMBITO DA ONU E DA OEA ............................................................................. 27

2.1. ONU: Direito Internacional e Direitos

Humanos...........................................................................................................27

2.2. A OEA e o sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos ........... 29

2.3 CEDAW e A Conferência de Viena .................................................................... 33

2.4 A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência

contra a Mulher (“Convenção de Belém do Pará”) .................................................... 36

CAPITULO III – OS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES NO BRASIL ............ 43

3.1. Dados sobre a situação das mulheres no Brasil ................................................ 43

3.2. O Direito brasileiro e a proteção internacional dos Direitos

Humanos...........................................................................................................45

3.3. Os avanços dos Direitos Humanos das Mulheres no Brasil .............................. 46

3.4.Desafios e Perspectivas.....................................................................49

CONCLUSÃO...............................................................................51

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA...................................................76

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80

ANEXOS.....................................................................................52

ÍNDICE........................................................................................79

FOLHA DE AVALIAÇÃO.............................................................81