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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE O DESENHO INFANTIL COMO FACILITADOR NA ABORDAGEM HOMEOPÁTICA PEDIÁTRICA NO ÂMBITO DO SUS Por André Luiz Ribeiro Orientadora Prof. Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2010

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · O desenho e as etapas das crianças 10 1.2. A evolução do desenho infantil 13 ... 1.3. É possível interpretar os desenhos

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O DESENHO INFANTIL COMO FACILITADOR NA ABORDAGEM

HOMEOPÁTICA PEDIÁTRICA NO ÂMBITO DO SUS

Por André Luiz Ribeiro

Orientadora

Prof. Fabiane Muniz

Rio de Janeiro

2010

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O DESENHO INFANTIL COMO FACILITADOR NA ABORDAGEM

HOMEOPÁTICA PEDIÁTRICA NO ÂMBITO DO SUS

Apresentação de monografia à Universidade

Cândido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Arteterapia em

Educação e Saúde.

Por André Luiz Ribeiro

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela vida, a minha

querida família pelo apoio, amor e

carinho e a todos os mestres pelo

conhecimento e sabedoria.

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DEDICATÓRIA

Existe uma pessoa ímpar em minha vida,

sem a qual não poderia realizar meus

grandes sonhos: Minha Mãe.

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RESUMO

O desenho infantil, cada vez mais estudado e utilizado por diversas

áreas da ciência, é uma dentre várias maneiras que a criança tem para se

comunicar, refletir os próprios sentimentos, interesses e percepções do self e o

seu senso estético. A criança utiliza um verdadeiro repertório de signos

gráficos – nuvens, sol, flores, árvore, casa, variando de acordo com a idade e

as analogias formais carregadas de expressão, ao passo que o tema constitui

quase sempre um álibi, um pretexto para a utilização de uma forma, não sendo

o mais importante, por isso que ele tem que ser livre.

A Homeopatia é um sistema terapêutico complexo, vitalista, de

atenção integral à saúde, criado pelo médico alemão Samuel Hahnemann há

mais de dois séculos. Sua ação de faz notar em todo o organismo, não

havendo especificidade para determinada doença, pois o que é tratado é o

individuo como um todo. O tratamento homeopático consiste em escolher o

medicamento mais adequado para equilibrar a saúde do paciente.

A utilização do desenho livre durante a consulta homeopática

pediátrica no âmbito do SUS em Barra do Piraí/RJ é um excelente recurso que

auxilia o médico homeopata na identificação de sintomas objetivos,

conhecendo melhor o paciente através das representações imaginativas do

sujeito, de sua afetividade, seu comportamento interior e de seu simbolismo e,

consequentemente, obtêm-se resultados positivos na escolha do medicamento

homeopático mais apropriado para o seu pequeno paciente.

O tratamento homeopático baseia-se fundamentalmente no primeiro

princípio da homeopatia, que é a Lei dos semelhantes, no qual semelhante

cura semelhante. Logo, quanto mais se conhece o pequeno paciente, seu

modo de reagir e de adoecer, mais fácil será encontrar o medicamento

adequado para a cura do mesmo.

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METODOLOGIA

Foram utilizados os seguintes métodos: Pesquisa Bibliográfica e

Pesquisa Exploratória através de relatos de fatos ocorridos/observados durante

a consulta médica homeopática pediátrica, no âmbito do Sistema Único de

Saúde (SUS), em Barra do Piraí, no período de 2004 a 2009.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I - O Desenho Infantil 9

1.1. O desenho e as etapas das crianças 10 1.2. A evolução do desenho infantil 13 1.3. É possível interpretar os desenhos infantis? 16 1.4. O desenho na Arteterapia e a linguagem dos materiais 20 CAPÍTULO II - Homeopatia Pediátrica 23

2.1. A Homeopatia 23 2.2. A abordagem homeopática 25 2.3. A consulta homeopática pediátrica 27 CAPÍTULO III – A Experiência no SUS 30

3.1. A homeopatia no SUS 30 3.2. A experiência do atendimento homeopático pediátrico no SUS 31 3.3. Relato de casos 34

3.3.1. Caso 1 34 3.3.2. Caso 2 36

CONCLUSÃO 38

BIBLIOGRAFIA 39

ATIVIDADES CULTURAIS 41

ANEXOS 42

ÍNDICE 51

FOLHA DE AVALIAÇÃO 52

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INTRODUÇÃO

Os primeiros estudos sobre a produção gráfica das crianças datam

do final do século XX, relacionando-se, a princípio, com os primeiros trabalhos

da psicologia experimental. Os estudos sobre o desenho diversificaram-se

rapidamente, a ponto de áreas como a Psicologia, a Pedagogia, a Sociologia e

a Estética beneficiarem-se com essa contribuição. Na Pedagogia, as ideias de

Jean-Jacques Rousseau levaram à identificação de diferentes etapas no

desenvolvimento gráfico da criança. No tratamento psicanalítico, o desenho foi

introduzido em 1926, por Sophie Morgenstern. Atualmente, os estudos sobre o

desenho infantil beneficiaram-se da contribuição da obra de Piaget sobre a

psicologia infantil e prosseguem no sentido de uma elucidação dos

mecanismos da expressão infantil. Modo de expressão próprio da criança, o

desenho constitui uma linguagem que possui vocabulário e sintaxe.

A Homeopatia é uma especialidade médica que trata o indivíduo na

sua totalidade, física e mental. Durante a consulta homeopática, busca-se o

maior número de sintomas objetivos e característicos do paciente, para, então,

chegar ao medicamento mais similar a ele. Para Hahnemann, a homeopatia é

uma arte, isto é, a sensibilidade estética do homeopata é de grande valor para

captar o caminho que deve ser encetado naquilo que, no paciente, deve ser

curado ou simplesmente transformado no belo. Jung enxergava o valor dos

desenhos que contêm símbolos do inconsciente, percebendo que eles

poderiam ser úteis como agentes de cura.

Da conjugação das propostas de ambos, surge o viés de propor a

utilização do desenho, enquanto expressão lúdica, como meio facilitador para

a expressão do inconsciente de pacientes pediátricos, seus sentimentos, seu

caráter, sua personalidade, entre outros, nas abordagens homeopáticas em

ambientes de escassos recursos materiais e tecnológicos, notadamente no

âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), em Barra do Pirai /RJ.

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CAPÍTULO I

O DESENHO INFANTIL

“Antes eu desenhava como Rafael, mas precisei de toda uma existência para aprender a desenhar como as crianças.” 1

O desenho é uma das formas de expressão mais antigas da

humanidade. Utiliza-se o desenho como uma forma de comunicação desde a

pré-história. É uma representação gráfica de um objeto real ou de uma idéia

abstrata. O desenho infantil é quase sempre, a primeira grande obra das

crianças e através desta obra dizem muitas coisas de si mesmas. Os desenhos

infantis contêm uma originalidade e um frescor de concepção que é a própria

essência da infância. As crianças desde cedo são estimuladas pelos pais a

desenharem em casa e pelos professores nas escolas. Ampliando a sua

utilização, o desenho deveria também fazer parte das consultas médicas

pediátricas no âmbito do SUS, pois ele traduz o que a criança sente, pensa,

deseja, o que a faz adoecer e o que a deixa saudável.

A individualidade que é tão preservada na consulta homeopática,

também é encontrada nos desenhos infantis, pois cada criança é um mundo e

por mais que solicitem que várias delas desenhem um mesmo tema, jamais os

desenhos sairão iguais. A criança desenha por puro prazer. Até certa idade,

ela não é limitada pelas barreiras exteriores que nos são impostas, as

cobranças da família ou da sociedade. O que vale é a pura expressão pessoal.

O desenho da criança é feito de maneira mais inconsciente, sem a

preocupação do que os observadores irão pensar; daí seus desenhos serem

mais criativos; pois expressam suas idéias, pensamentos e emoções com uma

espontaneidade invejada por muitos artistas.

1 Picasso

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O que torna a arte expressiva é a manifestação do “eu”, e suas

reações subjetivas ao meio. À medida que a criança desenha, ela aprende,

pois assim ela organiza e concretiza seus pensamentos. Ao mesmo tempo em

que lhe dá autoconfiança por estar construindo e se expressando livremente.

1.1. O desenho e as etapas das crianças

De acordo com Piaget, o grafismo passa por momentos distintos:

• Realismo fortuito – É um jogo puro do exercício motor. São os rabiscos

ou garatujas (termo utilizado por Viktor Lowenfeld para nomear os rabiscos

produzidos pela criança) que são, na verdade, exercícios motores. Aqui a

expressão é o jogo simbólico: “eu represento sozinho”

• Realismo gorado – A criança começa a fechar a célula. Há o início da

relação forma-objeto. Os desenhos nesta etapa são justapostos.

• Realismo intelectual – A criança desenha cenas completas. Nessa

fase a criança desenha aquilo que sabe que existe no desenho a ser

representado (período de preparação)

• Realismo visual – A criança desenha cenas completas. Nessa fase se

preocupa com as proporções e as distâncias.

Jean Piaget chegou à conclusão que a criança pequena começa

espontaneamente a exteriorizar sua personalidade e suas experiências inter-

individuais, através da expressão gráfica, sem os obstáculos, as regras e as

noções estéticas sociais que ainda irá absorver.

Existe, de um lado, a realidade material e social a qual a criança

adapta-se e, consequentemente, às suas regras e meio de expressão. E,

existe também, o que é sentido, vivenciado e desejado consciente e

inconscientemente pelo eu. Ambos formam a expressão.

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Para Luquet existem quatro estágios:

1. Realismo fortuito – começa por volta dos dois anos e põe fim ao

período chamado rabisco. A criança que começou por traçar signos sem

desejo de representação descobre por acaso uma analogia com um objeto e

passa a nomear seu desenho.

2. Realismo fracassado – Geralmente entre três e quatro anos, tendo

descoberto a identidade forma-objeto, a criança procura reproduzir esta forma,

onde a criança vai modificando a sua intenção inicial à medida que vai

desenhando.

3. Realismo intelectual – Estendendo-se dos quatro aos 10-12 anos,

caracteriza-se pelo fato que a criança desenha do objeto não aquilo que vê,

mas aquilo que sabe. Nesta fase ela mistura diversos pontos de vista

(perspectivas)

4. Realismo visual – É geralmente por volta dos 12 anos, marcado pela

descoberta da perspectiva e a submissa às suas leis, daí um empobrecimento,

um enxugamento progressivo do grafismo que tende a se juntar as produções

adultas. Desenha o que vê.

Existem várias referências e classificações, porém de acordo com a

idade da criança podemos dizer que:

• Aos 18 meses a criança fará rabiscos sem parar, sem

sentido e desordenado, o traçado é mais ou menos arredondado,

conexo ou alongado e o lápis não sai da folha formando turbilhões. Será

divertido descobrir o mundo das cores e os traços. Mostrará a todos o

que fez, e é importante ser estimulada a continuar fazendo suas

produções artísticas. Sua coordenação motora é muito precária. É uma

etapa de auto-expressão. Sentirá curiosidade pelas paredes, chão,

revistas e tentará rabiscá-los de todas as formas.

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• Aos dois anos de idade, o rabisco passará a ser mais

controlado e já terá outro sentido; pois perceberá que existe uma

relação entre os rabiscos e os movimentos que ela faz coma mão. Irá

querer desenhar sem parar e usará mais de um lápis de cor para

preencher a sua folha. Os traços do seu desenho ocuparão partes antes

desocupadas do papel. A criança sentirá curiosidade e necessidade de

experimentar outros tipos de lápis e materiais. O vivenciamento

predominará sobre a expressão.

• Aos 30 meses de idade, a criança já será capaz de

controlar um pouco mais os movimentos de sua mão, e de, inclusive,

manejar o lápis. Seus traços serão mais firmes, já não sairão da folha. A

criança gozará de uma melhor coordenação e é ai que aparecerá o

desenho simbólico. Cada rabisco ou desenho que consiga fazer terá um

nome e um sentido para ela. Passa a ver a sua criação como algo real,

descrevendo o que desenhou e espera que entendam o que desenhou,

mesmo quando desenha um quadrado e este pode representar para ela

uma casa. Entre dois e três anos poderá haver comentário verbal do

desenho.

• A parir dos três ou quatro anos, o desenho da criança se

aproximará mais da realidade. Sentirá especial interesse em desenhar

seu papai ou sua mamãe, ou seu amiguinho, irmão ou outra figura

humana. O uso de cada cor terá um significado para ela. Há crianças

que já demonstram preferência por algumas cores. Essa é uma etapa

pré- esquemática. Necessidade de escrever e de comunicar-se com

outros.

• Aos cinco anos, começará a desenhar mais detalhes em

seus personagens e a utilizar mais cores adequadamente. Desenhará

pessoas com roupa, levando algum objeto. Já a partir dos seis anos,

seus desenhos terão por menores importantes como mão com cinco

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dedos, orelhas, cabelos diferenciados, pessoas sentadas etc. Também

se encontrará preparada para desenhar paisagens, flores no campo,

frutas nas árvores chaminés nas casas, rios e tudo que se proponha.

È claro que essas etapas servem apenas para orientação, uma vez

que cada criança é uma criança, com sua habilidade específica e seu próprio

tempo para desenvolvê-la e deverá ser respeitada e jamais forçada.

1.2. A evolução do desenho infantil

Os primeiros estudos sobre a produção gráfica das crianças datam

do final do século passado e estão fundados nas concepções psicológicas e

estéticas de então. É a psicologia genética, inspirada pelo evolucionismo e

pelo princípio do paralelismo da filogênese que impõe o estudo científico do

desenvolvimento mental da criança (Rioux, 1951) – Tereza Bordoni

As concepções de arte que permearam os primeiros estudos

estavam calcadas em uma produção estética idealista e naturalista de

representação da realidade. Sendo a habilidade técnica, portanto, um fator

prioritário. Foram poucos os pesquisadores que se ocuparam dos aspectos

estéticos dos desenhos infantis.

Luquet (1927- França) falava dos “erros” e “imperfeições” do

desenho da criança que atribui a “inabilidade” e “falta de atenção”, além de

afirmar que existe uma tendência natural e voluntária da criança para o

realismo.

Sully vê o desenho da criança como uma “arte embrionária” onde

não se deve entrever nenhum senso verdadeiramente artístico, porém, ele

reconhece que a produção da criança contém um lado original e sugestivo.

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Sully afirma ainda que as crianças são mais simbolistas do que realistas em

seus desenhos (Rioux, 1951).

No final do século XIX, os psicólogos descobrem a originalidade dos

desenhos infantis e publicam as primeiras “notas” e “observações” sobre o

assunto. De certa forma eles transpõem para o grafismo a descoberta

fundamental de Jean Jacques Rousseau sobre a maneira própria de ver e de

pensar da criança.

As concepções relativas à infância modificaram-se

progressivamente. A descoberta de leis próprias da psique infantil, a

demonstração da originalidade de seu desenvolvimento, levaram a admitir a

especificidade desse universo.

Modo de expressão próprio da criança, o desenho constitui uma

língua que possui vocabulário e sintaxe. Percebe-se que a criança faz uma

relação próxima do desenho e a percepção pelo adulto. Ao prazer do gesto

associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar a sua marca.

O desenvolvimento progressivo do desenho implica mudanças

significativas que, no início, dizem respeito à passagem dos rabiscos para

construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros símbolos.

Isto é possível graças às interações da criança com o ato de desenhar e com

os desenhos de outras pessoas. Na garatuja a criança tem como hipótese que

o desenho é simplesmente uma ação sobre uma superfície, e ela sente prazer

ao constatar os efeitos visuais que essa ação produziu. No decorrer do tempo,

as garatujas, que refletiam sobretudo o prolongamento de movimentos rítmicos

de ir e vir, transformam-se em formas definidas que apresentam maior

ordenação, e podem estar se referindo a objetos naturais, objetos imaginários

ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da garatuja para o desenho de

formas mais estruturadas, a criança desenvolve a intenção de elaborar

imagens no fazer artístico.

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Começando com símbolos muito simples, ela passa a articulá-los no

espaço bidimensional do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra

superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes

no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso, incorporando

esse conhecimento em suas próprias produções.

No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho

serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da

simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos

de representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese

de que o desenho serve para imprimir o que se vê.

É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria

individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação,

reflexão e sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras

simbólicas de outras crianças e adultos.

O desenho está também intimamente ligado com o desenvolvimento

da escrita. Parte atraente do universo adulto, dotada de prestígio por ser

“secreta”, a escrita exerce uma verdadeira fascinação sobre a criança, e isso

bem antes de ela própria poder traçar verdadeiros signos. Muito cedo ela tenta

imitar a escrita dos adultos. Porém, mais tarde, quando ingressa na escola

verifica-se uma diminuição da produção gráfica, já que a escrita (considerada

mais importante) passa a ser concorrente do desenho.

O desenho como possibilidade de brincar, de falar, de registrar,

marca o desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho

assume um caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que

são bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais

de temperamento e sensibilidade.

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Quanto mais a criança desenhar, ela se aperfeiçoará, e mais

benefícios se notarão no seu desenvolvimento. Como dito anteriormente, o

desenho evolui paralelamente ao desenvolvimento da criança. Ele facilita e faz

evoluir a criança na:

• Psicomotricidade fina

• Escrita e a leitura

• Confiança em si mesma

• Exteriorização de suas emoções, sentimentos e sensações

• Comunicação com os demais e consigo mesma

• Criatividade

• Formação de sua personalidade

• Maturidade psicológica

1.3. É possível interpretar os desenhos infantis?

O especialista deve levar em conta a condição biográfica e familiar

da pessoa que desenhou, bem como sua história pessoal, que servirá como

marco de referência de quem está fazendo o desenho. Cabe lembrar que o

desenho é importante, mas não define tudo. É uma expressão de sentimento e

de desejos que podem ajudar, a saber, por exemplo, como se sente a criança

a respeito da sua família (amada? Rejeitada?), na sua escola (escolhida?

Preterida?) etc., dados estes muito importantes para serem utilizados na

consulta homeopática pediátrica.

Através dos desenhos das crianças, podem-se observar detalhes

que para uma pessoa adulta pode passar despercebido. O desenho pode ser

na infância, um canal de comunicação entre a criança e seu mundo exterior. A

primeira porta que a criança abre o seu interior

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Existem algumas pistas que orientam a interpretação dos desenhos,

tais como:

• Posição do desenho – Todo desenho na parte superior do

papel, está relacionado com a cabeça, o intelecto, a imaginação, a

curiosidade e o desejo de descobrir coisas novas, A parte inferior do

papel nos informa sobre as necessidades físicas e materiais que pode

ter a criança. O lado esquerdo indica pensamentos que giram em torno

do passado, enquanto o lado direito, ao futuro. Se o desenho se situa no

centro do papel, representa o momento atual.

• Dimensões do desenho – Os desenhos com formas

grandes mostram certa segurança, enquanto os de forma pequena

parecem ser feitos por crianças que normalmente precisam de pouco

espaço para se expressar. Podem também sugerir uma criança

reflexiva, ou com falta de confiança.

• Traços do desenho – Os contínuos, sem interrupções,

parecem denotar um espírito dócil, enquanto o apagado ou falhado,

pode revelar uma criança um pouco insegura e impulsiva.

• A pressão do desenho – Uma boa pressão indica

entusiasmo e vontade. Quanto mais forte seja o desenho, mais

agressividade existirá, enquanto as mais superficiais demonstram falta

de vontade ou fadiga física.

• As cores do desenho – O vermelho representa a vida, o

ardor, o ativo; o amarelo, a curiosidade e a alegria de viver; o laranja, a

necessidade de contato social e público, impaciência; o azul, a paz e a

tranqüilidade; o verde, certa maturidade, sensibilidade e planejamento; o

negro representa o inconsciente; o marrom, a segurança e

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planejamento. É necessário acrescentar que o desenho de uma só cor,

pode denotar preguiça ou falta de motivação.

• Árvore – Refere-se ao físico, emocional e intelectual da

criança. Quando o tronco da árvore é alto e largo, revela que seu filho

tem muita força na superação dos problemas. Quando o tronco for

pequeno e estreito, revela vulnerabilidade às complicações. Se houver

excessos de folhas, a criança tem grandes ocupações, talvez em

excesso. Se houver poucas folhas e galhos, a criança está triste.

• Casa – Desenho de uma casa grande demonstra grande

emotividade, se for uma casa pequenina é uma criança retraída.

• Barco – Desenhar barco significa que a criança adapta-se

facilmente a imprevistos. Barcos grandes revelam que a criança não

gosta de mudanças e aprecia ter controle da situação, se for barco

pequeno ela é sensível e tem grande intuição.

• Flores – Desenhar flores significa que é uma criança

alegre e feliz.

Essas pistas são apenas uma pincelada dentro do grande mundo

que é o desenho infantil, não deve generalizar, pois cada criança é um mundo

assim como as regras de interpretação do desenho infantil.

Os desenhos das crianças não só contam suas preferências e

opções pelas formas, as cores e as características dos seus traços, mas

também falam de suas experiências e preocupações. Em razão disso, a

interpretação do desenho infantil é utilizada por muitos psicólogos como

terapia. Como as crianças não podem – porque não sabem – explicar o que

sentem, o desenho pode ser uma grande ferramenta de apoio não só para os

psicólogos, mas também para os educadores, pediatras entre outros.

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Existem muitos problemas que podem ser mais bem identificados

através dos desenhos tais como: casos de violência, agressividade, de abuso

ou de maltrato, de temores, relações familiares, etc. É claro que para

interpretá-los é necessário uma formação especializada, já que muito do que

as crianças desenham também é fruto de sua imaginação e fantasia, ou uma

cópia do que viu em algum livro, em algum filme, ou na televisão. È importante

que a criança fale sobre a sua produção e todo cuidado é pouco na hora de

entender os desenhos das crianças.

Para Gregg Furth (2006), a sua postura na interpretação de um

desenho é, em geral, a de que nenhum ponto é indicativo definitivo sobre o

que está acontecendo na psique do paciente.

Através do desenho de uma criança é possível analisar seu caráter,

sua personalidade, temperamento e carências. Ainda pode também descobrir

e reconhecer as fases pelas quais a criança está a passar, suas dificuldades,

bem como seus pontos positivos.

MÉREDIEU (1974) ressalta que o meio em que a criança se

desenvolve é o universo adulto, e esse universo age sobre ela da mesma

maneira que todo contexto social, condicionando-a ou alienando-a. Querer

estudar as produções infantis fora da ganga das influências e pressões adultas

só pode levar a uma leitura falseada.

Benoit Matisse – pintor, desenhista e escultor francês, disse que

“criar é expressar o que tem dentro de si”; pois a criação é a reprodução das

emoções e sentimentos. Os desenhos falam por si mesmos, podem expressar

seus sofrimentos e angústias e para ajudá-las a superarem esses conflitos é

necessário empreender um laço de confiança com elas, escutá-las e buscar

entender o que querem nos dizer. Uma boa relação médico-paciente facilitará

esse processo.

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Para a criança, a arte é um meio de expressão, sua linguagem de

pensamento. Nos desenhos se detalham todas as transformações que sofre a

criança à medida que cresce e se desenvolve, resultando assim num grande

documento de análise e diagnóstico.

1.4. O desenho na Arteterapia e a linguagem dos materiais

Para PHILLIPINI (2009), o processo arteterapêutico é desenvolvido

através de modalidades expressivas e plásticas diversas, e a escolha

dependerá do processo criativo do cliente e da maneira como prefira

comunicar sua subjetividade. Assim, o desenho é uma possibilidade expressiva

que de um modo geral as crianças gostam muito ao contrário dos idosos, salvo

raras exceções, não se adaptam bem a esta linguagem e, por isso, resistem à

prática expressiva do desenho.

O paciente da Arteterapia não precisa saber desenhar, no entanto

cabe ao arteterapeuta ter um conhecimento básico dos principais recursos

gráficos, bem como dos elementos fundamentais do discurso visual, um

“alfabeto” composto por ponto, linha, traços, luz, sombra, perspectivas,

projeção, proporcionalidade e relações espaciais.

O desenho infantil deve ser expresso com liberdade e não com

obrigação. Valoriza-se o desenho espontâneo da criança e o seu processo de

criação. É importante observá-la enquanto faz o seu desenho.

As atividades gráficas e plásticas representam uma autêntica

linguagem para as crianças. As ensinarão a desenvolver suas habilidades

motoras, darão mais liberdade de expressão e enriquecerão seu mundo. O

contato com diferentes materiais estimulará suas idéias e sua expressividade.

Ela só pode produzir na medida em que lhe forneça instrumentos e materiais.

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O aparecimento do que se chama arte infantil foi condicionado pela

evolução das técnicas gráficas e plásticas, e pela difusão cada vez maior do

papel e do lápis, ocasionada pela baixa do custo de fabricação desses

produtos. Produto caro, o papel foi durante muito tempo reservado para uso

mais rentável; a criança não podia dispor dele livremente e tinha que se

contentar com outros suportes como a areia.

O auxilio de instrumentos e materiais novos modificaram

profundamente o estilo infantil. O aparecimento da caneta hidrográfica viu

surgir um tipo de grafismo muito particular, ao mesmo tempo em que uma

tendência à miscelânea, com certas crianças utilizando sistematicamente todas

as cores. O tamanho das folhas de papel também contribuiu para a linguagem

da expressão infantil.

O papel é tão importante como o lápis. Seu formato, tamanho, bem

como sua cor, irão determinar limites das crianças quanto ao desenho. A

textura determinará o tipo de lápis que a criança irá utilizar. As crianças sempre

reagirão de diferentes maneiras dependendo do tipo de material que utilizem.

Quando existe um interesse especial da criança pelo desenho,

pode-se orientá-la acerca de algumas técnicas, oferecendo-lhe diferentes

materiais para que os prove. A técnica, no que se refere ao domínio

instrumental, não necessita ser ensinada. Adquire-se com a prática e

experiência. A criança que gosta muito de desenhar, cada vez mais se sentirá

atraída por outros materiais, e assim irá crescendo neste mundo tão mágico

que é o desenho.

Tipos de materiais gráficos mais utilizados com as crianças:

• Lápis de cera – material de recursos plásticos limitados,

no entanto útil pelo baixo custo e pela possibilidade de ser usado por

crianças pequenas para os primeiros garranchos, devido seu manejo

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cômodo. Pode-se encontrar lápis de cera de distintas formas. Com

pontas finas ou arredondadas, e de todas as cores.

• Lápis de cor – material de infinitas possibilidades,

apresentando ampla gama de cores e “degradês” e também na forma

aquarelada que permite depois do desenho pronto que se use água no

pincel, para transformar o desenho em pintura. Permite boa definição e

configuração da linha e dos detalhes das formas trabalhadas, bem como

um bom trabalho de sombra, luz e contornos.

• Grafite – recurso gráfico simples, porém permite uma

ampla gama de experimentações e apresenta uma variedade de

diferenças na intensidade da cor negra, assinaladas por uma

numeração específica. O grafite 6B é macio e permite um traçado bem

intenso e visível.

• Canetas hidrocores – instrumento gráfico de muita

precisão, apresentando inúmeras cores de pigmentos muito fortes e

definidos. Facilita a configuração de detalhes e pode ser utilizado

também para pontilhados, tracejados e delimitações de contorno,

contudo não servem para cobrir de cor áreas maiores, pois é um

instrumento de ponta fina, podendo ser substituído, para esse fim, pelos

“pilot” que guardam as mesmas características, mas têm pontas mais

grossas e arredondadas.

Quando se estimula a criança a desenhar, estará ajudando para

que desenvolva sua percepção, emoção e inteligência. A criança contará

com mais meios para expressar-se e adquirirá mais prática e experiências.

A potencialidade criativa que tem uma criança é enorme, mas nem sempre

se reconhece isso a não ser que lhes ofereçam a oportunidade de colocá-

las em prática.

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CAPÍTULO II

A HOMEOPATIA PEDIÁTRICA

“Podemos escolher o que semear, mas somos obrigados a colher o que plantamos.” 2

2.1. A Homeopatia

A homeopatia é uma ciência médica que está fundamentada há

mais de 200 anos. Foi fundada pelo médico alemão Samuel Hahnemann e

possui quatro princípios fundamentais:

1. Lei dos semelhantes – o medicamento capaz de curar

uma doença ou um sintoma, também deve ser capaz de provocar

sintoma semelhante em uma pessoa sadia.

2. Experimentação no homem são – o medicamento para

ser considerado homeopático deve ter sido testado em voluntários

sadios e provocado sintomas nos mesmos. O medicamento

homeopático é preparado a partir de matéria-prima dos reinos animal,

vegetal ou mineral.

3. Dose mínima – menor quantidade, mínimo de energia ou

medicamento que acionou processo de cura no paciente.

4. Remédio único – individualizar pacientes e medicar com

único medicamento por vez. É a homeopatia unicista.

2 Ditado chinês

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O homeopata se preocupa antes de tudo em captar os sintomas que

revelam a forma como funciona aquele pequeno ser ou aquele adolescente

que está a sua frente. Aspectos esses que os pais nem se dão conta que

afetam a filha ou acham que não tem nada a ver com a doença do filho.

Cada indivíduo é um todo moral, físico e psíquico, em que as

diferentes “partes” estão intimamente relacionadas, em uma interação

permanente entre si, com o meio e com os outros indivíduos. preciso tratar o

“todo” para que nenhuma “parte” adoeça.

É importante “individualizar” o doente, dando-lhe uma importância

maior que à doença propriamente dita. A doença é a mesma, porém os

“doentes” são diferentes e suas peculiaridades permitirão ao homeopata

decidir-se por um ou outro medicamento.

Logo, o que realmente precisamos é conhecer o mais

detalhadamente possível “quem” está apresentando a doença.

O ser humano em estado de saúde mantém uma homeostase entre

os seus diferentes órgãos, funções e com o meio. Atribui-se a esta

homeostase uma determinada energia ou força, chamada de energia vital.

Quando os agentes agressivos de qualquer natureza atuam sobre essa

energia vital, desequilibrando-a, surge então a doença.

Sendo assim, a doença é a exteriorização ou a manifestação,

através dos sintomas, do esforço que a energia vital está realizando para voltar

à saúde. As curas são possíveis, devido a uma reação da energia vital

estimulada pelos medicamentos homeopáticos.

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2.2. A Abordagem Homeopática

O objetivo da consulta homeopática é a seleção correta de um só

medicamento, se possível, capaz de reequilibrar a energia vital do paciente.

Para LINHARES (2000), esta seleção tem como alicerce os seguintes

requisitos:

1. Interrogatório;

2. Observação;

3. Conhecimento da Matéria Médica;

4. Domínio do Repertório;

5. Conhecimento de patologia;

6. Arte médica

Interrogar um enfermo deve ser compreendido num sentido mais

amplo e não ser apenas um simples “questionar”. Estão incluídos também a

observação, a compreensão e o exame clínico. A consulta adquire a forma de

um “quebra cabeça” e constituem uma imagem ao final da consulta (o nome do

medicamento). Para obter um resultado bom e rápido deve-se, como num

“quebra-cabeça” e como recomenda Hahnemann no seu Organon, parágrafo

153, isolar os elementos (sintomas) mais chamativos, originais, inusitados e

pessoais. Estes elementos definem de forma bastante concisa como deve ser

a técnica da consulta homeopática e, apesar de terem sido escritos em 1810,

são absolutamente atuais.

A consulta médica tem como objetivo a comunicação de

informações: interrogar é receber mensagens, é praticar a semiologia.

“A semiologia é a ciência dos sinais. A maior parte das ciências se

baseiam em uma determinada semiologia, que resulta da observação de sinais

próprios ao seu objeto. Existe portanto, uma semiologia médica ou o estudo de

sinais que podem levar a um diagnóstico, ou seja: converter sintomas em

sinais.” (Dr. Demarque: Semiologia Homeopática, Ed. Le François).

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Durante a consulta homeopática, o médico deve ter um papel ativo,

mesmo que se confine durante um tempo numa atitude passiva. Deve-se ter

em mente o objetivo procurado (diagnóstico do remédio) e os meios

disponíveis para atingi-lo.

A consulta homeopática obedece às mesmas regras que toda

consulta médica tem, com objetivo de recolher o maior número de sintomas

possíveis que permitem estabelecer um diagnóstico. Pode ocorrer em dois

tempos: primeiro a análise, para isolar e fazer um repertório dos elementos que

motivam a consulta, em seguida a síntese, para procurar os remédios

correspondentes aos sintomas recolhidos.

Constantino Hering resumiu em quatro palavras o que deveria ser a

consulta homeopática: escutar, escrever, interrogar, coordenar (hierarquizar e

valorizar os sintomas), devendo ser acrescentado: observar, examinar e

prescrever.

É, sobretudo, no observar, no escutar e no interrogar que o

homeopata imprimirá à consulta seu selo pessoal.

A observação dos sinais exteriores, o aspecto geral, a atitude, os

meios de expressão do doente são informações preciosas que convém notar.

O vestuário, a mímica, o comportamento, as palavras escolhidas para se

exprimir formam mais um conjunto que pontos isolados.

Saber escutar com atenção e paciência, é uma das faculdades que

um médico homeopata deve aprender a desenvolver. Não se deve interromper

um doente desde as primeiras palavras, pois ele vem à consulta para ser

cuidado, mas também para ser escutado.

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2.3. A consulta homeopática pediátrica

O objetivo da consulta é a melhora do estado da criança e para que

isto ocorra, diferentes meios podem ser usados, separada ou

simultaneamente: conselhos aos pais e à criança, prescrição medicamentosa

ou, às vezes, psicoterapia. A consulta homeopática, integrando todos estes

elementos, tem especificamente por objetivo diagnosticar o medicamento do

pequeno paciente e ajudá-lo a reequilibrar sua energia vital. Esta pesquisa do

medicamento, correspondente à maneira de reagir de cada individuo, dá uma

importância primordial aos sintomas característicos que lhe são próprios, e que

assinalam, em um quadro nosológico, sua maneira pessoal de reagir a uma

agressão que pode ser física, tóxica, traumática ou psíquica ou ter múltiplas

causas.

A primeira etapa da consulta é o interrogatório, evidentemente mais

delicado nos bebês e nas crianças menores do que nas crianças maiores ou

em um adulto. Deve ser o menos direto possível. È preciso deixar a mãe e seu

filho falarem sua própria linguagem e, sobretudo, não sugerir respostas. As

perguntas são feitas de maneira a obter uma resposta sob forma de uma frase

completa e não de um simples “sim” ou “não”. A consulta deve começar com

os pais acompanhados de seu filho, depois sozinhos e por fim, a criança deve

ser ouvida sozinha, sem a presença dos pais. A observação constitui o

episódio fundamental da consulta. Ela começa na sala de espera, continua no

caminho do consultório e, sobretudo, no próprio consultório.

Ao longo do exame ela fornece preciosas indicações sobre o

comportamento da criança: calma, agitada, ansiosa, medrosa, independente

ou grudada na mãe, que se esconde atrás da sua poltrona, fica sentada no

colo ou, ao contrário, exploradora, irrequieta, mexendo em tudo. A observação

permite, também, avaliar sua atitude ao responder as perguntas, sua maneira

de desnudar (sozinha ou com ajuda, consentindo ou reticente) e seu

comportamento durante o exame.

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Deve-se explorar também a imaginação dos pequenos, de como ele

brinca, desenha, seus jogos prediletos, brinquedos ou das estórias que mais

gosta.

Segundo DIAS (2000), a abordagem da anamnese em pediatria

pode seguir muitas vezes o mesmo “roteiro” da dos adultos, não esquecendo

que existe uma terceira pessoa através da qual se recebe as informações, seja

ela a mãe, a avó, o pai, a babá ou até mesmo das professoras e dificilmente

do próprio paciente, dependendo da faixa etária.

É importante questionar “porque adoeceu?”, compreender o que

realmente está acontecendo com este pequeno ser, e entender o que pode ser

considerado como sintoma homeopático e o que há para se curar.

A criança interage com seu meio apresentando diferentes reações,

cada uma delas deverá ser cuidadosamente considerada para que a

prescrição seja realmente necessária e adequada.

São considerados sintomas homeopáticos nas crianças as

características apresentadas que não correspondem à faixa etária esperada ou

que estejam exacerbados, ambos a ponto de comprometer o desenvolvimento

psicomotor da criança e seu relacionamento com o meio. Sendo assim, muitas

vezes os traços de personalidade são selecionados como sintomas

homeopáticos.

No decorrer do crescimento da criança, de seu desenvolvimento

psíquico, motor e social, é possível perceber seus sintomas mentais com maior

clareza, não somente aqueles observados e relatados por seus familiares, mas

também os observados pelo médico durante a consulta. Além, claro, dos

sintomas gerais, bem modalizados, que são sempre de grande importância no

decorrer de toda a vivência com o paciente, e dos sintomas locais percebidos

durante o exame físico.

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Para que ocorra uma boa consulta em homeopatia pediátrica é

importante conhecer o valor do sintoma. O sintoma deve ser: exagerado,

excessivo, impróprio, desproporcional, aquilo que é de fato “sui generis”, raro

estranho e peculiar. Uma queixa passa a ser sintoma, quando esta interfere

com a qualidade de vida da criança. Nas crianças maiores, que já verbalizam,

a abordagem pode ser feita diretamente com elas, sem autoritarismo ou

onipotência. Buscar saber o que sentiu e reagiu em determinadas situações.

Para entender melhor o mundo infantil, na anamnese das crianças a

partir de três anos, são instrumentos valioso o papel e o lápis de cor ou de

cera. O desenho apresentará outro tipo de linguagem: a do sentimento

retratado. Sendo importante que a própria criança explique o seu desenho.

Deve-se buscar elementos que possam ajudar a conhecer o

pequeno paciente, com informações de seu comportamento na escola através

de relatórios escolares, desenho e dramatizações, pois contam de seu mundo

interior, seus rabiscos falam muito de seus conflitos. Entrevistas com pessoas

do convívio, como avós, tias e outros também ajudam na consulta conhecer

melhor o paciente, sem esquecer que a palavra da criança é fundamental.

Brunini (2004) ressalta a importância de o homeopata pediátrico

discernir durante a consulta: sintoma da criança X sintoma da família, atentar

para coisas que não são faladas, mas observadas durante a consulta como

exemplo a criança real (observada) X a criança ideal (falada). Utilizando o

desenho e os brinquedos durante a consulta facilitará a perceber este

desencontro das informações, pois a criança se mostra do jeito que ela

realmente é.

A redação da receita é a ultima parte da consulta, é feita após a

seleção dos sintomas e a escolha do medicamento que cobrirá a totalidade

destes sintomas, a este medicamento mais similar ao paciente, dá-se o nome

de simillimum.

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CAPÍTULO III

A EXPERIÊNCIA NO SUS

"Para o otimista, cada nova complicação é uma nova oportunidade. Para o pessimista, cada nova oportunidade é uma nova complicação..." 3

3.1. A Homeopatia no SUS

O Sistema Único de Saúde - SUS foi criado pela Constituição

Federal de 1988 e regulamentado pelas Leis nº 8.080/90 (Lei Orgânica da

Saúde) e nº 8.142/90, com a finalidade de alterar a situação de desigualdade

na assistência à saúde da população, tornando obrigatório o atendimento

público a qualquer cidadão, visando garantir assistência integral e totalmente

gratuita.

O processo de descentralização do Sistema Único de Saúde

permitiu que estados e municípios brasileiros se tornassem mais autônomos

na definição e execução de suas políticas de saúde. Nesse contexto, o

processo de implantação da Homeopatia nos serviços públicos de saúde e a

oferta do atendimento médico homeopático cresceram no SUS. De acordo com

dados do DATASUS, até novembro de 2005, os estados do Sudeste com

maior número de municípios oferecendo assistência homeopática eram São

Paulo (38 municípios), Rio de Janeiro (21 municípios, dentre os quais o

município de Barra do Pirai) e Minas Gerais (11 municípios).

Apenas 110 dos mais de 5.563 municípios brasileiros utilizam hoje a

homeopatia na rede pública, mesmo após a especialidade médica,

reconhecida pelo Conselho federal de Medicina em 1980, ter sido acolhida

como política de saúde no Brasil através da Portaria n° 971, publicada em 03

de maio de 2006, pelo Ministério da Saúde, que instituiu a Política Nacional de

3 Içami Tiba

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Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde –

um marco na democratização da saúde, pois faculta à população o direito de

optar pela terapêutica que lhe melhor convir.

Infelizmente, ainda são precárias as condições de atendimento no

SUS, com escassez de recursos materiais e humanos. È preciso ser criativo

para fazer a diferença.

3.2. A experiência do atendimento homeopático pediátrico no SUS

Em setembro de 2004, iniciei o atendimento médico homeopático no

SUS na cidade de Barra do Piraí-RJ, após a realização de concurso público

para uma única vaga de médico homeopata. São atendidos pacientes de todas

as idades, sendo aproximadamente trinta porcento do total de atendimentos o

percentual de crianças. Apesar das dificuldades enfrentadas devido à falta de

investimento em recursos materiais e tecnológicos e também o não

fornecimento do medicamento homeopático gratuitamente à população,

busquei oferecer um atendimento diferenciado através da realização de

atividades lúdicas com brinquedos e materiais diversos para desenhos com

crianças a partir de três anos de idade, utilizando estas atividades como

facilitadoras na busca dos sintomas objetivos e, consequentemente, ajudando

na escolha do medicamento homeopático.

Em 2008, no congresso brasileiro de homeopatia em São Paulo,

apresentei um trabalho cujo tema era O LÚDICO COMO FACILITADOR NA

ABORDAGEM HOMEOPÁTICA PEDIÁTRICA NO SUS, baseado nessa

experiência realizada no SUS, em Barra do Piraí, desde 2004. O objetivo deste

trabalho era propor a metodologia da atividade lúdica durante a abordagem

homeopática pediátrica no SUS, tendo em vista que esta proposta nos

consultórios particulares é amplamente difundida e utilizada.

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A metodologia apresentava quatro fases que até hoje são utilizadas:

• Fase 1: Marcação da consulta – demanda espontânea ou

através de encaminhamento.

• Fase 2: Tempo de consulta – 60 minutos para os

atendimentos de primeira vez e 30 minutos para os subsequentes.

• Fase 3: Realização da primeira parte da consulta: escutar,

anotar e observar. O homeopata observa o paciente desde o momento

em que entra no consultório e utiliza, como ferramenta na busca do

maior número de sintomas objetivos, as atividades lúdicas, através de

brinquedos, lápis de cor e de cera, caneta hidrocor e papel de cores e

tamanhos diferentes expostos no consultório, para que a criança

escolha a atividade que irá executar.

• Fase 4: Avaliação da atividade realizada, deixando a

criança expressar suas ideias, interpretações, atitudes, sentimentos e

seu mundo interior de forma livre, e posteriormente dando continuidade

às outras etapas da consulta: interrogar, examinar, repertorizar,

diagnosticar e medicar.

Com a utilização desta proposta obtive os seguintes resultados, que

foram apresentados no trabalho:

• Melhor relação médico-paciente.

• Maior adesão ao tratamento e incentivo ao seu retorno.

• Melhor observação da criança durante a consulta.

• Participação ativa da criança na consulta.

• A utilização do lúdico como estratégia na educação em saúde.

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Na conclusão, constatou-se que esta metodologia contribuiu

substancialmente na busca do medicamento de todas as crianças atendidas

nessa unidade do SUS, variando de acordo com a individualidade de cada

uma.

Percebeu-se uma melhor abordagem e conhecimento do pequeno

paciente, que ao sentir-se inserido no contexto da consulta, fica mais à

vontade para contar sua história de dor, amor (ou desamor), brincando,

desenhando, podendo fazer tudo isso de forma mais espontânea e prazerosa,

deixando transparecer quem ele realmente é.

Após a realização deste trabalho, senti a necessidade de ampliar

meu olhar e meus conhecimentos para melhor aproveitamento de todo esse

material que obtenho durante as consultas homeopáticas pediátricas.

Em janeiro de 2009 iniciei o curso de especialização de Arteterapia

em educação e saúde, que além da ajuda através do conteúdo programático,

pude contar com a riqueza dos recursos humanos de diferentes áreas de

atuação: uma verdadeira troca interdisciplinar.

Desde então, passei a explorar mais os desenhos infantis utilizando

a linguagem dos diferentes materiais, que por si só já nos dizem muita coisa.

A escolha da cor e do tamanho do papel, o tipo de caneta ou lápis

que usa pra desenhar, a posição da folha (deitada ou em pé), os traços fracos

e fortes, o preenchimento da folha e principalmente o que diz o desenho e

como foi o seu processo criativo, pois este é muito valorizado na Arteterapia e

só é possível através da observação.

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3.3. Relato de casos

Foram registrados diversos casos de pacientes que constatam a

importância da utilização do desenho durante a consulta homeopática

pediátrica no SUS. Segue abaixo dois casos selecionados a título de

ilustração:

3.3.1. Caso 1

IJJ,10 anos, sexo feminino, veio ao consultório acompanhada de

sua mãe em 2006, com queixa de prisão de ventre, história de ambiente

confuso em casa devido à relação dos pais estar em crise e ainda rotulada

pela mãe como chorona, meiga, vaidosa e egoísta. Observei que durante a

consulta, ao se aproximar da mãe querendo carinho, a mesma a afastava,

reclamando que ela era enjoada e grudenta.

Não quis desenhar na primeira consulta, apenas brincou com os

brinquedos, principalmente as bonecas. Após a seleção dos sintomas foi

prescrito o medicamento homeopático Pulsatilla nigricans 30 ch. Nas consultas

posteriores fez desenhos coloridos, com vários corações, árvore com base

estreita, casa, sol à esquerda com raios pequenos e flores coloridas.4

Melhorou da prisão de ventre e diminuiu bastante o choro. Ao

comparar os desenhos, constatou-se que em nenhum deles tinha figura

humana e ao ser questionada sobre este fato na consulta individual, a mesma

respondeu que se sentia carente, sozinha e que a mãe não ligava pra ela. Foi

confirmado então o medicamento homeopático; pois a Pulsatilla nigricans

(reino vegetal) é considerada a “carente” e tem como núcleo do medicamento

o abandono. A dose do medicamento homeopático foi aumentada para 200 ch.

4 Anexo 1

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BRUNINI (1997) afirma que o afeto é o tema principal destas

crianças, sendo que neste aspecto são de uma “fome insaciável”: por mais

carinho que uma criança PULSATILLA receba, sempre acreditará que não é o

suficiente, quer mais, adoece por não receber todo o carinho que acredita ser

merecedora, e se você não cobri-la de atenções, sente-se infeliz, abandonada

com um alto grau de sensibilidade afetiva. È ciumenta e egoísta.

De acordo com Nicole Bédard, em sua obra “Como interpretar os

desenhos das crianças”, a casa representa as emoções vividas a partir do

ponto de vista social e a criança que desenha uma casa muito grande revela-

nos que está vivendo uma fase mais emotiva que racional; O sol quando à

esquerda do papel (representa passado e também o vínculo com a mãe), pode

representar a influência de uma mãe independente que age sem levar muito

em consideração os demais, raios pequenos revelam uma mãe não tão

envolvente; A árvore com base estreita revela uma criança de saúde frágil; A

criança que desenha flores deseja agradar. Se o fizer de maneira repetitiva,

demonstra que necessita de certa segurança e talvez seu ego tenha

necessidade de ser alimentado (sempre terá que se ocupar das flores: regá-

las, podá-las etc.).

O foco na proposta de utilizar o desenho na busca do medicamento

homeopático não está na interpretação deles, pois para tal é necessário ter

capacitação profissional, mas sim no relato do paciente sobre o seu desenho,

na sua expressão e sentimento durante o processo de realização. Para isto é

necessário a observação e a escuta atenta, etapas fundamentais durante a

consulta homeopática.

Drª Margaret Tyler dizia que quanto mais velha ficava, menos

anotação de sintomas fazia.

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O grafismo infantil é sobretudo narrativo e figurativo. Assim que

descobre a possibilidade de representar o real por meio de signos, a criança

contenta-se geralmente em desenhar objetos e não recorre com frequência à

abstração. Seus desenhos narram, procuram transmitir uma mensagem. O

“inconsciente” fala por meio do desenho.

“O desenho é uma representação, isto é, ele supõe a construção de

uma imagem bem distinta da própria percepção.” 5

3.3.2. Caso 2

CRS, 9 anos, sexo feminino, veio na primeira consulta em 2005,

acompanhada de sua mãe, com queixa principal de alergia respiratória,

sempre gripada. Fez uso de várias medicações ao longo de dois anos e em

2007, na consulta com a avó paterna, esta relatou que a neta melhorou 99%

após o início do tratamento homeopático. Diz: “Ela é outra criança agora...”,

inclusive não veio com a mãe na consulta porque a mesma estava

trabalhando, motivo este de adoecimento antes do tratamento; pois não podia

ficar longe da mãe. Passado alguns meses, a mãe retornou com a menor na

consulta de rotina e informou que a paciente havia ficado muito doente e

inclusive teve que utilizar antibiótico.

Observei que ao entrar no consultório a menor estava com olhar

triste, calada e como sempre fazia desenhos, pegou o material exposto e

começou a desenhar enquanto eu conversava com a mãe. Percebi que algo

acontecia e indaguei várias vezes à mãe se havia ocorrido algum fato diferente

que pudesse desencadear o adoecimento da menor e a mesma sempre

negando.

5 Piaget

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Após terminar de desenhar pedi para ver o desenho e só em olhá-lo

pude perceber a diferença dos anteriores que eram sempre alegres, com cores

vivas, com sol sorridente, flores coloridas, árvores com frutos e frases do tipo:

“te amo muito e beijos da C” 6.

Em seguida, pedi a ela que falasse sobre o desenho, com duas

nuvens grandes, um sol preto no centro da folha e uma árvore marrom sem

frutos e sem cor, no lado esquerdo uma menina sozinha que ela disse ser ela e

no outro lado da folha (à direita), em baixo, um boneco (o médico). A mãe não

aparecia porque havia brigado com o pai, a mesma mãe ficou sem graça e

disse que havia discutido com o pai na frente da criança e falaram em

separação. No dia seguinte à briga a menor adoeceu. Foi através do desenho

que constatei o que realmente desencadeara o adoecimento dela, uma vez

que a mesma já se encontrava bem e fazia o tratamento de manutenção. Foi

feito orientação a mãe para acompanhamento com psicoterapia e ainda

iniciado tratamento homeopático com a mãe.

BÉDARD (1998) entende que quando o sol está localizado em

pleno centro do desenho representa o próprio indivíduo. Neste caso, estamos

diante de uma criança que quer ser independente e que acredita ter certa

responsabilidade por sua mãe e por seu pai. Talvez se trate de uma família

desarticulada, porém, ela possui o caráter e o potencial necessário para fazer

frente à situação.

Para MEREDIEU (1974) a interpretação de um desenho – isolado

do contexto em que foi elaborado e da série dos outros desenho entre os quais

se inscreve – é portanto nula. Ocorre com o desenho o mesmo que acontece

com a imagem cinematográfica, que recebe seu sentido das imagens que a

precedem e seguem: determinado pormenor só se torna pertinente

retrospectivamente, pela repetição do mesmo tema ou redundância formal.

6 Anexo 2

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CONCLUSÃO

Neste trabalho analisamos a utilização do desenho infantil como

ferramenta durante a consulta homeopática pediátrica realizada no SUS, visto

que o desenho representa, em parte, a mente consciente, mas também, e de

uma maneira mais importante, faz referência ao inconsciente. Para nós, o que

interessa é o simbolismo e as mensagens que o desenho nos transmite,

através da leitura da criança, como ele é feito, o material utilizado, não

importando a sua perfeição estética.

Destarte, para alcançarmos o nosso objetivo é recomendável deixar

que a imaginação da criança manifeste-se com toda a liberdade. Não é

conveniente obrigá-la a desenhar. Deve ser um ato de prazer. Assim também

ocorre na consulta homeopática pediátrica, não devemos extorquir as

informações, devemos deixar o paciente falar livremente, por isso a

necessidade de interrogar com perguntas abertas. A criança não pode sentir-

se pressionada. A relação médico-paciente deve ser natural e harmoniosa,

permitindo assim que a criança realmente se mostre como ela é, o que

facilitará na busca do medicamento mais similar a ela.

Constatamos através dos relatos de casos em que foi utilizado o

desenho infantil na consulta homeopática como facilitador da expressão

emocional que houve uma facilidade na escolha e confirmação do

medicamento homeopático adequado ao tratamento infantil, além dos

elementos inconscientes que emergem do desenho infantil terem auxiliado na

identificação de problemas/dificuldades existentes no núcleo familiar do

paciente, possibilitando estender o tratamento aos demais integrantes de sua

família e buscar ajuda de outros profissionais.

Concluímos, pois, ser muito positiva a utilização do desenho infantil

nas abordagens homeopáticas pediátricas em ambientes de escassos

recursos materiais, no âmbito do SUS.

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BIBLIOGRAFIA

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1980, 1ª ed.

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XXIX CONGRESSO BRASILEIRO DE HOMEOPATIA, São Paulo – SP, 17 a

21 de setembro de 2008. Apresentação do trabalho em Pôster: “O lúdico

como facilitador na abordagem homeopática pediátrica no SUS” – André

Luiz Ribeiro.

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ATIVIDADES CULTURAIS

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ANEXOS

Índice de anexos

Anexo 1 >> desenhos do caso 1

Anexo 2 >> desenhos do caso 2

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ANEXO 1

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ANEXO 2

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I - O Desenho Infantil 9

1.1. O desenho e as etapas das crianças 10 1.2. A evolução do desenho infantil 13 1.3. É possível interpretar os desenhos infantis? 16 1.4. O desenho na Arteterapia e a linguagem dos materiais 20 CAPÍTULO II - Homeopatia Pediátrica 23

2.1. A Homeopatia 23 2.2. A abordagem homeopática 25 2.3. A consulta homeopática pediátrica 27 CAPÍTULO III – A Experiência no SUS 30

3.1. A homeopatia no SUS 30 3.2. A experiência do atendimento homeopático pediátrico no SUS 31 3.3. Relato de casos 34

3.3.1. Caso 1 34 3.3.2. Caso 2 36

CONCLUSÃO 38

BIBLIOGRAFIA 39

ATIVIDADES CULTURAIS 41

ANEXOS 42

ÍNDICE 51

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes

Pós-Graduação “Lato Sensu” Projeto A Vez do Mestre

Título da monografia: O desenho infantil como facilitador na abordagem homeopática pediátrica no âmbito do SUS Autor: André Luiz Ribeiro Turma: I 036 Matrícula: I101362 Data da entrega: 28/02/2010 Avaliado por: Profª Fabiane Muniz Conceito: _____