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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A IMPORTÂNCIA DE MACHADO DE ASSIS NO CENÁRIO DA LITERATURA BRASILEIRA Por: Paulo Roberto Cristo de Oliveira Orientador Profª Mary Sue Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A IMPORTÂNCIA DE MACHADO DE ASSIS NO CENÁRIO DA

LITERATURA BRASILEIRA

Por: Paulo Roberto Cristo de Oliveira

Orientador

Profª Mary Sue

Rio de Janeiro

2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A IMPORTÂNCIA DE MACHADO DE ASSIS NO CENÁRIO DA

LITERATURA BRASILEIRA

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Docência no

Ensino Superior.

Por: Paulo Roberto Cristo de Oliveira.

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AGRADECIMENTO

...a todos os professores do Curso

Docência no Ensino Superior, do

Projeto A Vez do Mestre,

especialmente à Professora Mary Sue,

minha orientadora, agradeço as

maravilhosas aulas que embasaram

este humilde trabalho.

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DEDICATÓRIA

...À minha esposa Oneide, musa

inspiradora de todas as horas, dedico esta

monografia que bem traduz a minha

paixão pelo maior escritor brasileiro de

todos os tempos.

RESUMO

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A paixão por Machado de Assis agasalhou-se no meu coração quando

os memoráveis anos 50, anos dourados como dizem os saudosistas,

transcorriam serenos como a água da cascata.

Conquanto moleque travesso e rueiro, com pouco mais de 10 anos, lia

ardorosamente as obras de Machado de Assis. Fascinava-me o seu jeito

clássico de escrever. Linguagem camoniana. Apaixonei-me também pela

encantadora Língua Portuguesa, comparada a uma flor pelo eterno Olavo

Bilac.

Passaram-se os anos. Tornei-me Professor de Língua Portuguesa e

Literatura. Arquitetei minha biblioteca. Fiz a pós-graduação em DOCÊNCIA

NO ENSINO SUPERIOR. Elaborei esta monografia cantando a genialidade do

maior escritor brasileiro. Estou perdidamente feliz ! ! !

METODOLOGIA

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6Ao cabo de acurada pesquisa nas obras e revista elencadas na

Bibliografia (constantes de minha Biblioteca particular), elaborei este trabalho

visando enfatizar a importância de MACHADO DE ASSIS no cenário da

Literatura Brasileira. Dei particular importância aos dados biográficos deste

gênio, posto que os mesmos formam, com a obra em si, um par perfeito, unido

PER OMNIA SECULA SECULORUM.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

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7CAPÍTULO I 10

1. Machado de Assis: Do Morro do Livramento

à Academia Brasileira de Letras

CAPÍTULO II 12

2. O jornal e a repartição pública: degraus de ascensão

CAPÍTULO III 13

3. E foram felizes para sempre

CAPÍTULO IV 14

4. A Carolina

CAPÍTULO V 15

5. Lar, doce lar

CAPÍTULO IV 16

6. Machado, um cidadão comum como tantos

CAPÍTULO VII 17

7. Machado de Assis: apogeu e Morte

CAPÍTULO VIII 22

8. Textos Selecionados

CAPÍTULO IX 37

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89. Um périplo encantador através do mundo

machadiano

CONCLUSÃO 53

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 61

ANEXOS 55

ÍNDICE 62

FOLHA DE AVALIAÇÃO 64

INTRODUÇÃO

Lá pelos idos dos anos 50, em Belém do Pará, no Externato São

Benedito, dirigido pela famosa Professora Antônia Virgolino Reymão, conheci

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9Joaquim Maria Machado De Assis. Estava eu na quarta série do curso primário.

Meu professor, José do Egito, era filho da diretora. Rapaz inteligente e

razoavelmente culto, estudara no Colégio Marista onde concluíra os estudos

secundários.

Todos os dias, José do Egito iniciava a aula com um ditado. Abria a

esmo a Antologia Nacional. Eu adorava quando a página escolhida versava

sobre algum texto selecionado do monumental Machado de Assis.

Era o ano de 1958. Acredito que minha paixão pela encantadora Língua

Portuguesa experimentou sua aurora naquele gostoso e inesquecível ano.

Tinha eu 11 risonhas primaveras. Que Monteiro Lobato me perdoe, lia-o

vorazmente, mas Machado era o meu preferido. Dicionário ao alcance das

mãos, devorava suas obras como um servo, incondicionalmente fiel ao seu

senhor.

Pois bem, é sobre esse gênio da Literatura Brasileira, olhar penetrante e

sensibilidade aguçada, em particular, e da Literatura Universal, no geral, que

iremos falar, enfatizando curiosas e rocambolescas passagens de sua vida,

bem assim a sua imensurável importância no cenário da Literatura Brasileira.

Repousa em paz, “Machadinho”, com a certeza de que tens vaga cativa

nos corações de todos os brasileiros!!! Tua campa é um santuário, para onde

deveriam peregrinar todos os brasileiros sedentos de cultura e de um lugar ao

sol no Planeta Machadiano.

CAPÍTULO I

MACHADO DE ASSIS: DO MORRO DO LIVRAMENTO À

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS

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Machado de Assis, o hoje famoso romancista, não nasceu nem famoso

nem romancista. Nasceu Joaquim Maria simplesmente, moleque de morro,

franzino e doentio, certamente moreno. Filho do mulato Francisco José de

Assis, pintor de paredes, e da portuguesa Maria Leopoldina, Joaquim Maria

nasceu em 1839, no dia 21 de junho.

Ainda menino pequeno, fica órfão de mãe. O pai casava-se novamente e

a madrasta, Maria Inês, contraria a lenda das madrastas: substitui em cuidados

e carinhos a mãe verdadeira e mesmo o pai, que também morreu logo depois.

O menino cresceu, assim, ao lado de Maria Inês, lavadeira e doceira, cujas

balas e doces Machado se encarregava de vender na porta dos colégios que

não podia freqüentar.

Até aí, nada que prenunciasse a glória futura. Nada que fizesse ver no

moleque baleiro o futuro fundador e presidente perpétuo da respeitabilíssima

Academia Brasileira de Letras. Até aí, apenas a vida difícil que qualquer

menino pobre do Rio de Janeiro levava nos idos de 1840.

Para ele, nada de escola que, na época, era privilégio dos bem nascidos

da vida, dos que tinham pai doutor, fazendeiro, ou, pelo menos, funcionário

público. Da escola mesmo, só algumas aulas numa escolinha da redondeza,

aulas de primeiras letras, do bê-a-bá, da conta do mais e do menos. O resto

viria depois, fora do tempo e fora da escola, com muito esforço de Machado, e

um pouco de ajuda do padre Silveira Sarmento.

A biografia de Machado é sóbria como suas poucas fotografias, que

sempre mostram uma figura composta e bem vestida, de óculos sem aro, de

barbicha, costeletas discretas e penteadas, de terno e colete. Tudo em cores

sóbrias, como convinha àquela época.

Rígido como estas fotografias é o que se conhece da vida de Machado,

o “Machadinho” para os amigos íntimos: nem grandes travessuras de criança,

nem grandes aventuras de rapaz, nem mesmo grandes amores. Paixão grande

de verdade, só por Carolina, recebida como esposa em matrimônio

sacramentado. Vida perfeita, portanto, para uma biografia de escola, onde

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11boêmios e não boêmios ganham asas de anjo, onde todos ficam bem-

comportados, obedientes, estudiosos.

Mas, com Machado, talvez não seja preciso ocultar deslizes e amenizar

pecados da juventude. Se os teve, ficaram esquecidos. Até os dezesseis anos,

quando conseguiu publicar seu primeiro trabalho, Machado viveu em “brancas

nuvens” ou, melhor dizendo, no cinzento amargo de um menino pobre que

cedo decidiu ser escritor.

.

CAPÍTULO II

O JORNAL E A REPARTIÇÃO PÚBLICA:

DEGRAUS DE ASCENSÃO

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Já se sabe que Machado era pobre, de nascimento pobre, de família

pobre, de família pobre. Os padrinhos ricos e influentes que o batizaram logo

se afastaram da cena. Bem cedo, portanto, Machado teve de cuidar da própria

vida, de trocar a incerta e flutuante venda de doces por empregos mais seguros

e, quando possível, melhor remunerados. Inteligente e esforçado, mesmo sem

ter freqüentado escolas regulares, Machado conseguiu aproximar-se de

intelectuais e jornalistas, que lhe deram as primeiras oportunidades de sua

vida.

A proteção de um padrinho que ele não tivera na infância apareceu aos

dezesseis anos: Paula Brito, dono de uma tipografia e livraria, que publicou um

soneto de Machado na Marmota Fluminense. O poema, que nem é dos

melhores, chama-se “Ela”. Dois anos depois, o mesmo Paula Brito contratou

seu protegido para trabalhar em sua loja: Machado corrigia originais, fazia

revisão de textos e, nas horas vagas, trabalhava como caixeiro, vendendo

livros.

A presença constante de Machado no ambiente da livraria facilitou-lhe

os contatos úteis com gente importante. E foi esta gente, por sua vez, que lhe

abriu novas portas, dando-lhe oportunidade de continuar a publicação de seus

escritos em vários jornais e revistas. Machado vai temperando a mão e

acertando o passo. Começa a germinar o futuro autor de Memórias Póstumas.

CAPÍTULO III

E FORAM FELIZES PARA SEMPRE

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13Quase tão famosa quanto as personagens de seu marido é Carolina,

esposa de Machado, com quem ele se casou em 1869. Segundo dizem, foram

felizes para o resto da vida. Mas não foi fácil, para ele, casar-se com sua

amada. Ele ainda não era Machado, o escritor conhecido e festejado de alguns

anos depois. Mas também não era um joão-ninguém: trabalhava em jornais,

freqüentava rodas intelectuais e tinha seu emprego público. Mas era mulato,

pormenor imperdoável para a família de Carolina, portugueses

preconceituosos. Decididamente, Machado não era um bom candidato a

marido, pelo menos a marido de Carolina, irmã do poeta português Faustino

Xavier, que viera ao Brasil numa viagem cultural.

Depois das festas de recepção aos portugueses visitantes, Faustino

decide ficar aqui para sempre. Chama a família, vem a irmã solteira. Ela chega

ao Brasil e Machado chega-se a ela. Querem casar-se, mas a família da moça

se opõe. Machado briga contra a oposição, contra o preconceito. Ele conta com

aliados nas rodas ilustres do Rio de Janeiro de seu tempo. E, como num

romance romântico, o Amor vence: Joaquim e Carolina se unem, num

casamento tido por felicíssimo, que dura trinta e cinco anos. Em 1904, morre

Carolina, deixando sozinho por mais quatro anos o já famoso e ilustre Machado

de Assis, que dedica à esposa morta um de seus mais famosos sonetos: “A

Carolina”. Foi com esta poesia que Machado dedicou a ela seu livro Relíquias

de Casa Velha.

CAPÍTULO IV

A CAROLINA

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Querida, ao pé do leito derradeiro

Em que descansas dessa longa vida,

Aqui venho e virei, pobre querida,

Trazer-te o coração do companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro

Que, a despeito de toda a humana lida,

Fez a nossa existência apetecida

E num recanto pôs um mundo inteiro.

Trago-te flores, - restos arrancados

Da terra que nos viu passar unidos

E ora mortos nos deixa e separados.

Que eu, se tenho nos olhos malferidos

Pensamentos de vida formulados,

São pensamentos idos e vividos.

CAPÍTULO V

LAR DOCE LAR

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15Dizem que o casamento não modificou os hábitos de Machado. Antes,

fortaleceu-os: espírito caseiro, horror a agitações, casa simples e organizada. A

mulher, solícita, em tudo o auxiliava: desde costurar-lhe as roupas até servi-lhe

de secretária, passando a limpo originais, sugerindo aqui e ali uma mudança de

palavra, uma correção gramatical.

Carolina e Machado, ao que se diz, pertenciam àquela espécie rara de

casais felizes, daquela felicidade caseira que poucas personagens

machadianas tiveram. É por isso, talvez, que se costumava ver no casal Carmo

e Aguiar, do último livro de Machado, o Memorial de Aires, uma espécie de

retrato de seu próprio casamento. Publicado no mesmo ano em que Machado

de Assis morreu, o Memorial de Aires talvez seja uma homenagem póstuma a

Carolina.

CAPÍTULO VI

MACHADO, UM CIDADÃO COMUM COMO TANTOS

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16Machado fez de tudo. Foi operário de gráfica, revisor de editora,

vendedor de livros, jornalista e escriturário de repartição pública. A palavra, a

linguagem foram sempre seu ganha-pão.

Machado de Assis conheceu o direito e o avesso do trabalho de escritor:

sabia não só criar romances e contos e fazer crítica literária a obras alheias,

como também produzir um livro materialmente, na gráfica. Mas, em nossa

terra, sempre foi difícil para uma pessoa declarar-se escritor por profissão. Para

garantir sua sobrevivência, os escritores geralmente acumulavam empregos e

era no funcionalismo público que, o mais das vezes, iam encontrar a

tranqüilidade e segurança necessárias à produção da boa obra.

Machado não fugiu à regra. Fez carreira como jornalista e como

funcionário público. Chegou até mesmo a ser, em sua época, um homem de

renome: elogios, condecorações e promoções não lhe faltaram; foram o

tradicional coroamento de uma vida dedicada, em parte, à conquista de

respeito e prestígio social.

Também na imprensa, Machado fez de tudo: redigiu comentários

políticos; criticou e elogiou peças de teatro e romances alheios; escreveu

editoriais e anúncios; publicou folhetins, que preenchiam o ócio das damas

elegantes do século XIX. E, nas entrelinhas de tudo isso, redigiu o que de

melhor se produziu em nossa literatura no sobredito século.

CAPÍTULO VII

MACHADO DE ASSIS: APOGEU E MORTE

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17Decoro, compostura, respeito à autoridade, modéstia, timidez, espírito

conservador, hábitos rotineiros – tudo isso foi Machado de Assis na vida

particular e pública. Mas essas coisas não impediram que ele gostasse de

freqüentar também ambientes intelectuais, de ser amigo de grandes homens,

de pessoas famosas.

Parece que lhe fazia bem à alma ser reconhecido e aceito pela roda

mais intelectual e bem reputada do Rio de Janeiro. Quando moço, um banco

qualquer de praça servia de sede à Sociedade Petalógica (petalógica =

palavra derivada de peta, que significa mentira). Bem mais tarde, Machado

servia-se da sala sombreada de livros da Livraria Garnier, no Rio de Janeiro: lá,

de certa maneira, ele era o espetáculo – ia para ver, mas sem dúvida, também

para ser visto.

Havia na Garnier, a cadeira de Machado, onde, todas as tardes, ao sair

da repartição pública, ele se sentava para discutir literatura e outras coisas.

Mais tarde, ainda, alcançou a glória da Academia Brasileira de Letras,

que Machado ajudou a fundar e da qual foi aclamado presidente perpétuo.

Hoje, uma grande estátua de bronze de Machado guarda a entrada da

Academia que, em sua homenagem, chama-se também Casa de Machado de

Assis.

Machado morreu em 1908, numa situação muito diferente daquela em

que nasceu. Se sua origem foi obscura, seu falecimento foi notícia nacional.

Longe dos escassos parentes, morreu cercado de amigos, entre os quais

alguns de renome. Seu corpo, velado na Academia Brasileira de Letras, foi

homenageado por Rui Barbosa. Discurso de homenagem póstuma,

homenagem essa que se prolonga até hoje: Machado ainda permanece na

lembrança do público que o reencontra, quer nos capítulos diários de

telenovelas, quer em textos como o poema que Carlos Drummond de Andrade

escreveu para Machado, o qual se lê a seguir.

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A UM BRUXO, COM AMOR

Em certa casa da Rua Cosme Velho

(que se abre no vazio)

venho visitar-te; e me recebes

na sala trastejada com simplicidade

onde pensamentos idos e vividos

perdem o amarelo

de novo interrogando o céu e a noite.

Outros leram da vida um capítulo, tu leste o livro inteiro.

Daí esse cansaço nos gestos e filtrada,

uma luz que não vem de parte alguma

pois todos os castiçais estão apagados.

Contas a meia voz

maneiras de amar e de compor os ministérios

e deitá-los abaixo, entre malinas

e bruxelas.

Conheces a fundo a geologia moral dos Lobos Neves

e essa espécie de olhos derramados

que não foram feitos para ciumentos.

E ficas mirando o ratinho meio cadáver

com a polida, minuciosa curiosidade

de quem saboreia por tabela

o prazer de Fortunato, vivisseccionista amador.

Olhas para a guerra, o murro, a facada

como para uma simples quebra da monotonia universal

e tens no rosto antigo

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19uma expressão a que não acho nome certo

(das sensações do mundo a mais sutil):

volúpia do aborrecimento?

ou, grande lascivo, do nada?

O vento que rola do Silvestre leva o diálogo,

e o mesmo som do relógio, lento, igual e seco,

tal um pigarro que parece vir do tempo da Stoltz e do gabinete Paraná,

mostra que os homens todos morreram.

A terra está nua deles.

Contudo, em longe recanto,

a ramagem começa a sussurar alguma coisa

que não se entende logo

a parece a canção das manhãs novas.

Bem a distingo, ronda clara:

é Flora,

com olhos dotados de um mover particular

ente mavioso e pensativo;

Marcela, a rir com expressão cândida (e outra coisa);

Virgília,

cujos olhos dão a sensação singular de luz úmida;

Mariana, que os tem redondos e namorados;

e Sancha, de olhos intimativos;

e os grandes, de Capitu, abertos como a vaga do mar lá fora,

o mar que fala a mesma linguagem

obscura e nova de D. Severina

e das chinelinhas de alcova de Conceição.

A todas decifraste íris e braços

e delas disseste a razão última e refolhada

moça, flor mulher flor

canção de manhã nova...

E ao pé dessa música dissimulas (ou insinuas, quem sabe)

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20o torvo grunhir dos porcos, troça concentrada e filosófica

entre loucos que riem de ser loucos

e os que vão à Rua da Misericórdia e não a encontram.

O eflúvio da manhã,

quem o pede ao crepúsculo da tarde?

Uma presença, o clarineta,

vai pé ante pé procurar o remédio,

mas haverá remédio para existir

senão existir?

E para os dias mais ásperos, além

da cocaína moral dos bons livros?

Que crime cometemos além de viver

e porventura o de amar

não se sabe a quem, mas amar?

Todos os cemitérios se parecem,

e não pousas em nenhum deles, mas onde a dúvida

apalpa o mármore da verdade, a descobrir

a fenda necessária;

onde o diabo joga dama com o destino,

estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro,

que revolves em mim tantos enigmas.

Um som remoto e brando

rompe em meio a embriões e ruínas,

eternas exéquias e aleluias eternas,

e chegas ao despistamento de teu pencenê.

O estribeiro Oblivion

bate à porta e chama ao espetáculo

promovido para divertir o planeta Saturno.

Dás volta à chave,

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21envolves-te na capa,

e qual novo Ariel, sem mais resposta,

sais pela janela, dissolves-te no ar.

(Carlos Drummond de Andrade, Reunião, José Olympio, 6ª edição, 1974, pág.

237).

CAPÍTULO VIII

TEXTOS SELECIONADOS

DOM CASMURRO

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22 D. Casmurro foi publicado em 1900 e é um dos romances mais

conhecidos de Machado. Narra em primeira pessoa a estória de Bentinho que,

por circunstância várias, vai se fechando em si mesmo e passa a ser conhecido

como Dom Casmurro. Sua estória é a seguinte:

Órfão de pai, criado com desvelo pela mãe (D. Glória), protegido do

mundo pelo círculo doméstico e familiar (tia Justina, tio Cosme, José Dias),

Bentinho é destinado à vida sacerdotal, em cumprimento a uma antiga

promessa de sua mãe.

A vida do seminário, no entanto, não o atrai, já de namoro com Capitu,

filha dos vizinhos. Apesar de comprometido pela promessa, também D. Glória

sofre com a idéia de separar-se do filho único, interno no seminário. Por

expediente de José Dias, o agregado da família, Bentinho abandona o

seminário e, em seu lugar, ordena-se um escravo.

Correm os anos e com eles o amor de Bentinho e Capitu. Entre o

namoro e o casamento, Bentinho se forma em Direito e estreita a sua amizade

com um ex-colega de seminário, Escobar, que acaba se casando com Sancha,

amiga de Capitu.

Do casamento de Bentinho e Capitu nasce Ezequiel. Escobar morre e,

durante seu enterro, Bentinho julga estranha a forma pela qual Capitu

contempla o cadáver. A partir daí, os ciúmes vão aumentando e precipita-se a

crise. Á medida que cresce, Ezequiel se torna cada vez mais parecido com

Escobar. Bentinho, muito ciumento, chega a planejar o assassinato da esposa

e do filho, seguido pelo seu suicídio, mas não tem coragem. A tragédia dilui-se

na separação do casal.

Capitu viaja com o filho para a Europa, onde morre anos depois.

Ezequiel, já moço, volta ao Brasil para visitar o pai, que apenas constata a

semelhança entre o filho e o antigo colega de seminário. Ezequiel volta a viajar

e morre no estrangeiro. Bentinho, cada vez mais fechado em usas dúvidas,

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23passa a ser chamado de casmurro pelos amigos e vizinhos e põe-se a escrever

a história de sua vida (o romance).

Dois dos primeiros trechos que vamos ler (“O Papa” e “Um Substituto”)

mostram dois planos (um de José Dias e outro de Escobar) para tirar Bentinho

do seminário. A seguir, o capítulo “A Saída” narra o abandono definitivo da

carreira sacerdotal, e os três últimos fragmentos (“O Enterro”, “Olhos de

Ressaca” e “O Discurso”) relacionam-se ao episódio da morte de Escobar,

quando os ciúmes de Bentinho vão ganhando corpo.

CAPÍTULO I

DO TÍTULO

Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei num

trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu.

Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da lua e dos ministros, e

acabou recitando-me versos. A viagem era curta, e os versos pode ser que não

fossem inteiramente maus. Sucedeu, porém, que, como eu estava cansado,

fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou para que ele interrompesse a

leitura e metesse os versos no bolso.

-- Continue, disse eu acordando.

-- Já acabei, murmurou ele.

-- São muito bonitos.

Vi-lhe fazer um gesto para tirá-los outra vez do bolso, mas não passou

do gesto; estava amuado. No dia seguinte entrou a dizer de mim nomes feios,

e acabou alcunhando-me Dom Casmurro. Os vizinhos, que não gostam dos

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24meus hábitos reclusos e calados, deram curso à alcunha, que afinal pegou.

Nem por isso me zanguei. Contei a anedota aos amigos da cidade, e eles, por

graça, chamam-me assim, alguns em bilhetes: "Dom Casmurro, domingo vou

jantar com você.” - "Vou para Petrópolis, Dom Casmurro; a casa é a mesma da

Renânia; vê se deixas essa caverna do Engenho Novo, e vai lá passar uns

quinze dias comigo.” – “Meu caro Dom Casmurro, não cuide que o dispenso do

teatro amanhã; venha e dormirá aqui na cidade; dou-lhe camarote, dou-lhe chá,

dou-lhe cama; só não lhe dou moça."

Não consultes dicionários. Casmurro não está aqui no sentido que eles

lhe dão, mas no que lhe pôs o vulgo de homem calado e metido consigo. Dom

veio por ironia, para atribuir-me fumos de fidalgo. Tudo por estar cochilando!

Também não achei melhor título para a minha narração - se não tiver outro

daqui até ao fim do livro, vai este mesmo. O meu poeta do trem ficará sabendo

que não lhe guardo rancor. E com pequeno esforço, sendo o título seu, poderá

cuidar que a obra é sua. Há livros que apenas terão isso dos seus autores;

alguns nem tanto.

CAPÍTULO II

DO LIVRO

Agora que expliquei o título, passo a escrever o livro. Antes disso,

porém, digamos os motivos que me põem a pena na mão.

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25Vivo só, com um criado. A casa em que moro é própria; fi-la construir de

propósito, levado de um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo, mas vá

lá. Um dia, há bastantes anos, lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a casa

em que me criei na antiga Rua de Mata-cavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e

economia daquela outra, que desapareceu. Construtor e pintor entenderam

bem as indicações que lhes fiz: é o mesmo prédio assobradado, três janelas de

frente, varanda ao fundo, as mesmas alcovas e salas. Na principal destas, a

pintura do tecto e das paredes é mais ou menos igual, umas grinaldas de flores

miúdas e grandes pássaros que as tomam nos bicos, de espaço a espaço. Nos

quatro cantos do tecto as figuras das estações, e ao centro das paredes os

medalhões de César, Augusto, Nero e Massinissa, com os nomes por baixo...

Não alcanço a razão de tais personagens. Quando fomos para a casa de Mata-

cavalos, já ela estava assim decorada; vinha do decênio anterior. Naturalmente

era gosto do tempo meter sabor clássico e figuras antigas em pinturas

americanas. O mais é também análogo e parecido. Tenho chacarinha, flores,

legume, uma casuarina, um poço e lavadouro. Uso louça velha e mobília velha.

Enfim, agora, como outrora, há aqui o mesmo contraste da vida interior, que é

pacata, com a exterior, que é ruidosa.

O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na

velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o

que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me

faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas

que perde; mais falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo. O que aqui está é, mal

comparando, semelhante à pintura que se põe na barba e nos cabelos, e que

apenas conserva o hábito externo, como se diz nas autópsias; o interno não

agüenta tinta. Uma certidão que me desse vinte anos de idade poderia enganar

os estranhos, como todos os documentos falsos, mas não a mim. Os amigos

que me restam são de data recente; todos os antigos foram estudar a geologia

dos campos-santos. Quanto às amigas, algumas datam de quinze anos, outras

de menos, e quase todas crêem na mocidade. Duas ou três fariam crer nela

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26aos outros, mas a língua que falam obriga muita vez a consultar os dicionários,

e tal freqüência é cansativa.

Entretanto, vida diferente não quer dizer vida pior, é outra cousa a certos

respeitos, aquela vida antiga aparece-me despida de muitos encantos que lhe

achei; mas é também exato que perdeu muito espinho que a fez molesta, e, de

memória, conservo alguma recordação doce e feiticeira. Em verdade, pouco

apareço e menos falo. Distrações raras. O mais do tempo é gasto em hortar,

jardinar e ler; como bem e não durmo mal.

Ora, como tudo cansa, esta monotonia acabou por exaurir-me também.

Quis variar, e lembrou-me escrever um livro. Jurisprudência, filosofia e política

acudiram-me, mas não me acudiram as forças necessárias. Depois, pensei em

fazer uma "História dos Subúrbios" menos seca que as memórias do Padre

Luís Gonçalves dos Santos relativas à cidade; era obra modesta, mas exigia

documentos e datas como preliminares, tudo árido e longo. Foi então que os

bustos pintados nas paredes entraram a falar-me e a dizer-me que, uma vez

que eles não alcançavam reconstituir-me os tempos idos, pegasse da pena e

contasse alguns. Talvez a narração me desse a ilusão, e as sombras viessem

perpassar ligeiras, como ao poeta, não o do trem, mas o do Fausto: Aí vindes

outra vez, inquietas sombras...?

Fiquei tão alegre com esta idéia, que ainda agora me treme a pena na

mão. Sim, Nero, Augusto, Massinissa, e tu, grande César, que me incitas a

fazer os meus comentários, agradeço-vos o conselho, e vou deitar ao papel as

reminiscências que me vierem vindo. Deste modo, viverei o que vivi, e

assentarei a mão para alguma obra de maior tomo. Eia, comecemos a

evocação por uma célebre tarde de novembro, que nunca me esqueceu. Tive

outras muitas, melhores, e piores, mas aquela nunca se me apagou do espírito.

É o que vais entender, lendo.

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27CAPÍTULO XCV

O PAPA

A amizade de Escobar fez-se grande e fecunda; a de José Dias não lhe

quis ficar atrás. Na primeira semana disse-me este em casa:

--Agora é certo que você vai sair já do seminário.

--Como?

--Espere até amanhã. Vou jogar com eles que me chamaram, amanhã,

lá no quarto, no quintal, ou na rua, indo à missa, conto-lhe o que há. A idéia é

tão santa que não está mal no santuário. Amanha, Bentinho.

-- Mas é cousa certa?

--Certíssima!

No dia seguinte revelou-me o mistério. Ao primeiro aspecto confesso

que fiquei deslumbrado. Trazia uma nota de grandeza e de espiritualidade que

falava aos meus olhos de seminarista. Era não menos que isto. Minha mãe, ao

parecer dele, estava arrependida do que fizera, e desejaria ver-me cá fora, mas

entendia que o vínculo moral da promessa a prendia indissoluvelmente.

Cumpria rompê-lo, e para tanto valia a Escritura, com o poder de desligar dado

aos apóstolos. Assim que, ele e eu iríamos a Roma pedir a absolvição do

papa... Que me parecia?

-- Parece-me bem, respondi depois de alguns segundos de reflexão.

Pode ser um bom remédio.

--É o único, Bentinho, é o único! Vou já hoje conversar com D. Glória,

expondo-lhe tudo, e podemos partir daqui a dous meses, ou antes...

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28-- Melhor é falar domingo que vem; deixe-me pensar primeiro...

-- Oh! Bentinho! interrompeu o agregado. Pensar em quê? Você o que

quer... Digo? Não se amofina com o seu velho? Você o que quer é consultar a

uma pessoa.

Rigorosamente, eram duas pessoas, Capitu e Escobar, mas eu neguei a

pés juntos que quisesse consultar ninguém. E que pessoa, o reitor? Não era

natural que lhe confiasse tal assunto. Não, nem reitor, nem professor, nem

ninguém; era só o tempo de refletir, uma semana, no domingo daria a resposta,

e desde já lhe dizia que a idéia não me parecia má.

-- Não?

--Pois resolvamos hoje mesmo.

--Não se vai a Roma brincando.

--Quem tem boca vai a Roma, e boca no nosso caso é a moeda. Ora,

você pode muito bem gastar consigo... Comigo, não; um par de calças, três

camisas e o pão diário, não preciso mais. Serei como S. Paulo, que vivia do

ofício enquanto ia pregando a palavra divina. Pois eu vou, não pregá-la, mas

buscá-la. Levaremos cartas do internúncio e do bispo, cartas para o nosso

ministro, cartas de capuchinhos... Bem sei a objeção que se pode opor a esta

idéia; dirão que é dado pedir a dispensa cá de longe; mas, além do mais que

não digo, basta refletir que é muito mais solene e bonito ver entrar no Vaticano,

e prostrar-se aos pés do papa o próprio objeto do favor, o levita prometido, que

vai pedir para sua mãe terníssima e dulcíssima a dispensa de Deus. Considere

o quadro, você beijando o pé ao príncipe dos apóstolos; Sua Santidade, com o

sorriso evangélico, inclina-se, interroga, ouve, absolve e abençoa. Os anjos o

contemplam, a Virgem recomenda ao santíssimo filho que todos os seus

desejos, Bentinho, sejam satisfeitos, e que o que você amar na terra seja

igualmente amado no céu...

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29Não digo mais, porque é preciso acabar o capítulo, e ele não acabou o

discurso. Falou a todos os meus sentimentos de católico e de namorado. Vi a

alma aliviada de minha mãe, vi a alma feliz de Capitu, ambas em casa, e eu

com elas, e ele conosco, tudo mediante uma pequena viagem a Roma, que eu

só geograficamente sabia onde ficava; espiritualmente, também, mas a

distancia que estaria da vontade de Capitu é que não. Eis o ponto essencial.

Se Capitu achasse longe, não iria; mas era preciso ouvi-la, e assim também a

Escobar, que me daria um bom conselho.

CAPÍTULO XCVI

UM SUBSTITUTO

Expus a Capitu a idéia de José Dias. Ouviu-me atentamente. e acabou

triste.

--Você indo, disse ela, esquece-me inteiramente.

--Nunca!

--Esquece. A Europa dizem que é tão bonita, e a Itália principalmente.

Não é de lá que vêm as cantoras? Você esquece-me, Bentinho. E não haverá

outro meio? D. Glória está morta para que você saia do seminário.

--Sim, mas julga-se presa pela promessa.

Capitu não achava outra idéia, nem acabava de adotar esta. De

caminho, pediu-me que, se acaso fosse a Roma, jurasse que no fim de seis

meses estaria de volta.

--Juro.

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30--Por Deus?

--Por Deus, por tudo. Juro que no fim de seis meses estarei de volta.

--Mas se o papa não tiver ainda soltado a você?

--Mando dizer isso mesmo.

--E se você mentir?

Esta palavra doeu-me muito, e não achei logo que lhe replicasse. Capitu

meteu o negócio à bulha, rindo e chamando-me disfarçado. Depois, declarou

crer que eu cumpriria o juramento, mas ainda assim não consentiu logo; ia ver

se não haveria outra cousa, e eu que visse também por meu lado.

Quando voltei ao seminário, contei tudo ao meu amigo Escobar que me

ouviu com igual atenção e acabou com a mesma tristeza da outra. Os olhos, de

costume fugidios, quase me comeram de contemplação. De repente, vi-lhe no

rosto um clarão, um reflexo de idéia e ouvi-lhe dizer com volubilidade:

--Não, Bentinho, não é preciso isso. Há melhor, --não digo melhor,

porque o Santo Padre vale sempre mais que tudo, --mas ha cousa que produz

o mesmo efeito.

-- Que é?

--Sua mãe fez promessa a Deus de lhe dar um sacerdote, não é? Pois

bem, dê-lhe um sacerdote, que não seja você. Ela pode muito bem tomar a si

algum mocinho órfão, fazê-lo ordenar à sua custa, está dado um padre ao altar,

sem que você...

--Entendo, entendo, é isso mesmo.

--Não acha? continuou ele. Consulte sobre isto o protonotário: ele lhe

dirá se não é a mesma cousa, ou eu mesmo consulto, se quer; e se ele hesitar,

fala-se ao Sr. bispo.

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31Eu, refletindo:

--Sim, parece que é isso; realmente, a promessa cumpre-se, não se

perdendo o padre.

Escobar observou que, pelo lado econômico, a questão era fácil; minha

mãe gastaria o mesmo que comigo, e um órfão não precisaria grandes

comodidades. Citou a soma dos aluguéis das casas, 1:070$000, além dos

escravos...

--Não há outra cousa, disse eu.

--E saímos juntos.

--Você também?

--Também eu. Vou melhorar o meu latim e saio; nem dou teologia. O

próprio latim não é preciso; para que no comércio?

--In hoc signo vinces, disse eu rindo.

Sentia-me pilhérico. Oh! como a esperança alegra tudo. Escobar sorriu,

parecendo gostar da resposta. Depois ficamos a cuidar de nós mesmos, cada

um com os seus olhos perdidos, provavelmente. Os dele estavam assim

quando tornei de longe, e agradeci de novo o plano lembrado; não podia havê-

lo melhor. Escobar ouviu-me contentíssimo.

-- Ainda uma vez, disse ele gravemente, a religião e a liberdade fazem

boa companhia.

CAPÍTULO

A SAÍDA

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32

Tudo se fez por esse teor. Minha mãe hesitou um pouco, mas acabou

cedendo, depois que o Padre Cabral, tendo consultado o bispo. voltou a dizer-

lhe que sim, que podia ser. Saí do seminário no fim to ano.

Tinha então pouco mais de dezessete... Aqui devia ser o meio do livro,

mas a inexperiência fez-me ir atrás da pena, e chego quase ao fim do papel,

com o melhor da narração por dizer. Agora não há mais que levá-la a grandes

pernadas, capítulo sobre capítulo, pouca emenda, pouca reflexão, tudo em

resumo. Já esta página vale por meses, outras valerão por anos, e assim

chegaremos ao fim. Um dos sacrifícios que faço a esta dura necessidade é a

análise das minhas emoções dos dezessete anos. Não sei se alguma vez

tiveste dezessete anos. Se sim, deves saber que é a idade em que a metade

do homem e a metade do menino formam um só curioso. Eu era um

curiosíssimo, diria o meu agregado José Dias, e não diria mal. O que essa

qualidade superlativa me rendeu não poderia nunca dizê-lo aqui, sem cair no

erro que acabo de condenar; a análise das minhas emoções daquele tempo é

que entrava no meu plano. Posto que filho do seminário e de minha mãe,

sentia já, debaixo do recolhimento casto, uns assomos de petulância e de

atrevimento; eram do sangue, mas eram também das moças que na rua ou da

janela não me deixavam viver sossegado. Achavam-me lindo, e diziam-mo;

algumas queriam mirar de mais perto a minha beleza, e a vaidade é um

princípio de corrupção.

CAPÍTULO CXXII

O ENTERRO

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33A Viúva... Poupo-vos as lágrimas da viúva, as minhas, as da outra gente.

Saí de lá cerca de onze horas; Capitu e prima Justina esperavam-me, uma com

o parecer abatido e estúpido, outra enfastiada apenas.

--Vão fazer companhia à pobre Sanchinha; eu vou cuidar do enterro.

Assim fizemos. Quis que o enterro fosse pomposo, e a afluência dos

amigos foi numerosa. Praia, ruas, Praça da Glória, tudo eram carros, muitos

deles particulares. A casa não sendo grande, não podiam lá caber todos;

muitos estavam na praia, falando do desastre, apontando o lugar em que

Escobar falecera, ouvindo referir a chegada do morto. José Dias ouviu também

falar dos negócios do finado, divergindo alguns na avaliação dos bens, mas

havendo acordo em que o passivo devia ser pequeno. Elogiavam as

qualidades de Escobar, um ou outro discutia o recente gabinete Rio Branco;

estávamos em março de 1871. Nunca me esqueceu o mês nem o ano.

Como eu houvesse resolvido falar no cemitério, escrevi algumas linhas e

mostrei-as em casa a José Dias, que as achou realmente dignas do morto e de

mim. Pediu-me o papel, recitou lentamente o discurso, pesando as palavras, e

confirmou a primeira opinião; no Flamengo espalhou a notícia. Alguns

conhecidos vieram interrogar-me:

--Então, vamos ouvi-lo?

--Quatro palavras.

Poucas mais seriam. Tinha-as escrito com receio de que a emoção me

impedisse de improvisar. No tílburi em que andei uma ou duas horas, não

fizera mais que recordar o tempo do seminário, as relações de Escobar, as

nossas simpatias, a nossa amizade, começada, continuada e nunca

interrompida, até que um lance da fortuna fez separar para sempre duas

criaturas que prometiam ficar por muito tempo unidas. De quando em quando

enxugava os olhos. O cocheiro aventurou duas ou três perguntas sobre a

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34minha situação moral; não me arrancando nada, continuou o seu ofício.

Chegando a casa, deitei aquelas emoções ao papel; tal seria o discurso.

CAPÍTULO CXXIII

OLHOS DE RESSACA

Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis

despedir-se do marido, e o desespero daquele lance consternou a todos.

Muitos homens choravam também, as mulheres todas. Só Capitu, amparando

a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a outra, queria arrancá-la

dali. A confusão era geral. No meio dela, Capitu olhou alguns instantes para o

cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem

algumas lágrimas poucas e caladas...

As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as

depressa, olhando a furto para a gente que estava na sala. Redobrou de

carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o cadáver parece que a retinha

também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais

os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a

vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã.

CAPÍTULO CXXIV

O DISCURSO

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35--Vamos, são horas...

Era José Dias que me convidava a fechar o ataúde. Fechamo-lo, e eu

peguei numa das argolas; rompeu o alarido final. Palavra que, quando cheguei

à porta, vi o sol claro, tudo gente e carros, as cabeças descobertas, tive um

daqueles meus impulsos que nunca chegavam à execução: foi atirar à rua

caixão, defunto e tudo. No carro disse a José Dias que se calasse. No

cemitério tive de repetir a cerimônia da casa, desatar as correias, e ajudar a

levar o féretro à cova. O que isto me custou imagina. Descido o cadáver à

cova, trouxeram a cal e a pá; sabes disto, terás ido a mais de um enterro, mas

o que não sabes nem pode saber nenhum dos teus amigos, leitor, ou qualquer

outro estranho, é a crise que me tomou quando vi todos os olhos em mim, os

pés quietos, as orelhas atentas, e, ao cabo de alguns instantes de total silêncio,

um sussurro vago, algumas vozes interrogativas, sinais, e alguém, José Dias,

que me dizia ao ouvido:

--Então, fale.

Era o discurso. Queriam o discurso. Tinham jus ao discurso anunciado.

Maquinalmente, meti a mão no bolso, saquei o papel e li-o aos trambolhões,

não todo, nem seguido, nem claro; a voz parecia-me entrar em vez de sair, as

mãos tremiam-me. Não era só a emoção nova que me fazia assim, era o

próprio texto, as memórias do amigo, as saudades confessadas, os louvores à

pessoa e aos seus méritos; tudo isto que eu era obrigado a dizer e dizia mal.

Ao mesmo tempo, temendo que me adivinhassem a verdade, forcejava por

escondê-la bem. Creio que poucos me ouviram, mas o gesto geral foi de

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36compreensão e de aprovação. As mãos que me deram a apertar eram de

solidariedade; alguns diziam: "Muito bonito! muito bem! magnífico!" José Dias

achou que a eloqüência estivera na altura da piedade. Um homem, que me

pareceu jornalista, pediu-me licença para levar o manuscrito e imprimi-lo. Só a

minha grande turvação recusaria um obséquio tão simples.

CAPÍTULO IX

UM PÉRIPLO ENCANTADOR ATRAVÉS DO

MUNDO MACHADIANO

Como falar de uns olhos que pareciam conter todos os olhares? Em uma

crônica publicada em 11 de novembro de 1897, ele confessava: "Eu gosto de

catar o mínimo e o escondido. Onde ninguém mete o nariz, aí entra o meu,

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37com a curiosidade estreita e aguda que descobre o encoberto". Se você quiser

encarar esses olhos, é imperativo que entenda essa confissão.

A essência da obra de Joaquim Maria Machado de Assis não se

encontra na sua macro-estrutura, mas na micro-estrutura. Os detalhes, como

um gesto, um olhar, uma palavra aparentemente dita à toa, esparzidos ao

longo de suas narrativas têm de ser devidamente "pescados" e colecionados,

porque eles darão a chave para o entendimento de seus textos. Neles há um

permanente jogo entre essência e aparência. A "história" de superfície é só um

pretexto para discussões e denúncias de maior calibre. Existem o filosófico e a

análise psicológica profunda que anteciparam conceitos que mais tarde

Sigmund Freud teorizaria.

Machado não fez apenas a anatomia da sociedade patriarcal

escravocrata de seu tempo, mas a do psiquismo humano com seus infinitos

prismas.

Foi um esgrimista da palavra. Empunhando um estilo elegante e

requintado, ele desfere golpes fulminantes e precisos contra a hipocrisia, a

mediocridade, a vaidade, o egoísmo e a superficialidade que regem as

relações humanas. Uma das características mais obsessivas de sua obra é o

desvendamento da precariedade de nossa condição. As ridicularias cotidianas,

alimentadas pela arrogância e pela pretensão, contrastam com a crueza da

passagem do tempo e a iminência da morte. Exemplo disso é Marcela, a linda

cortesã que manipulava e extorquia homens, como fez com o ainda

adolescente Brás Cubas, em suas Memórias Póstumas. Ela se transformou

numa mulher de meia idade com o rosto desfigurado pelas seqüelas da varíola,

e chegou à velhice morrendo na indigência num leito miserável de hospital.

Não restara nem uma centelha do fausto da época de juventude; nem uma

pérola das muitas jóias que teve lhe valeu contra o avanço inexorável do

tempo.

Mas a "dedicatória/bofetada" que abre as mesmas Memórias Póstumas

de Brás Cubas, tecida de humor cáustico, formatada de modo a imitar o tom

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38leve, casual e familiar que costumam ter as dedicatórias, apresenta um

conteúdo ainda mais devastador:

Ao verme que primeiro roeu as frias

carnes do meu cadáver dedico como

saudosa lembrança estas

memórias póstumas.

O narrador escancara nossa condição de seres mortais e putrescíveis. A

morte nivela; portanto todas as presunções de ordem material que constroem

as diferenças de classe e de hierarquia são circunstanciais, vulgares,

transitórias. Especialmente aquelas calcadas nas aparências e no poder

econômico. Vivemos num mundo em que somos desencorajados a cultivar um

repertório de virtudes duradouro e inabalável que arquitete um caráter, não

irretocável, dado o limite do humano, mas positivo, no balanço final. Se

houvesse tal encorajamento, o espaço entre nascer e morrer estaria justificado,

e o viver teria alguma dignidade.

Mas Machado de Assis não concede a suas criaturas o poder de gerir,

conduzir, transformar a própria vida ou a alheia. A existência naufraga numa

lama gelada de equívocos, adiamentos, preguiças, vaidades, covardias,

egoísmo, futilidades e acomodações.

Os personagens cometem sempre o terrível equívoco de tornar o

essencial secundário e vice-versa. Isso promove a anulação da existência.

Suas obras não apresentam heróis. A esmagadora maioria, pode-se

dizer que quase a totalidade de seus personagens, não apresenta caracteres,

ainda que incidentais, exemplarmente positivos. Os personagens masculinos

são, em geral, medíocres, de inteligência estreita, valores rasos, e a aceitação

social de que desfrutam decorre do status que têm. É o caso de Brás Cubas

(Memórias Póstumas de Brás Cubas), de Rubião (Quincas Borba) e de

Bentinho (Dom Casmurro), afora muitos outros presentes em seus demais

romances e contos. As personagens femininas não são melhores: frívolas e

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39vaidosas, com interesses superficiais, detêm o domínio do jogo amoroso e da

manipulação do outro. Há poucas imagens de sedução mais contundentes do

que a passagem do conto “A Cartomante", em que Camilo torna-se amante de

Rita, a esposa de Vilela, seu melhor amigo.

(...) Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma

serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num

espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado.

Pequenos detalhes ou incidentes podem sintetizar psicologicamente

uma personagem. Veja-se no romance Esaú e Jacó o caso de Natividade,

esposa do Santos, com quem casara aos 20 anos. Belíssima, afeita aos

encontros sociais, ela passou dez anos casada sem filhos e sem evitá-los. Mas

aos 30 anos foi surpreendida por uma gravidez. Ela reagiu assim:

(...) Lá se iam bailes e festas, lá ia a liberdade e a folga. Natividade

andava já na alta roda do tempo; acabou de entrar por ela, com tal arte que

parecia haver ali nascido. Carteava-se com grandes damas, era familiar de

muitas, tuteava algumas. Nem tinha só esta casa de Botafogo, mas também

outra em Petrópolis; nem só carro, mas também camarote no Teatro Lírico, não

contando os bailes do Cassino Fluminense, os das amigas e os seus; todo o

repertório, em suma, da vida elegante. Era nomeada nas gazetas. Pertencia

àquela dúzia de nomes planetários que figuram no meio da plebe de estrelas.

O marido era capitalista e diretor de um banco.

No meio disso, a que vinha agora uma criança deformá-Ia por meses,

obrigá-Ia a recolher-se, pedir-lhe as noites, adoecer dos dentes e o resto? Tal

foi a primeira sensação da mãe, e o primeiro ímpeto foi esmagar o gérmen.

Criou raiva ao marido. A segunda sensação foi melhor. A maternidade,

chegando ao meio-dia, era como uma aurora nova e fresca. Natividade viu a

figura do filho ou filha brincando na relva da chácara ou no regaço da aia, com

três anos de idade, e este quadro daria aos trinta e quatro anos que teria então

um aspecto de vinte e poucos...

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40Foi o que a reconciliou com o marido.

Nenhuma mulher é obrigada a reagir bem à notícia de uma gravidez,

ainda que seja responsável por ela. Mas note-lhe os motivos: perda de

liberdade, deformação do corpo, enfim, frivolidades que a levaram a embirrar

com o esposo. Repare, sobretudo, no que promoveu sua reconciliação com

ele: ter filhos ao "meio-dia" da vida, aos 30 anos, a rejuvenesceria! Em nenhum

momento ela considera o fato em si: ter filhos, e a gravidade e conseqüências

do acontecimento, como a responsabilidade de tê-los, por exemplo; é mais um

evento social, só que de maior duração. Perceba também que ela imagina os

inconvenientes de ter a criança (noites mal dormidas, nascimento dos dentes),

mas quando percebe que o filho poderia rejuvenescê-la, procura enquadrar

essa possibilidade numa cena aprazível em que o personagem "bebê" está no

colo da ama, não no dela, a mãe. Ela delega-o à criada, transferindo de

antemão à serviçal os cuidados que ele acarretaria. Pois ela os teve, foram

gêmeos e brigaram desde o seu ventre até depois de sua morte.

Quanto ao marido, o Santos, já tinha sido pobre. Quando se casaram

não tinham nada, mas amealharam fortuna e desfrutavam de excelente

condição social. Veja a ironia fina com que demonstra a mesquinhez do

personagem e o gosto que ele tem pelo poder que ser rico acarreta, sobretudo

o de se colocar acima dos familiares que não tiveram a mesma sorte que eles.

Dos dous parentes pobres de Natividade morreu o pai em 1866, restava-

lhe uma irmã. Santos tinha alguns em Maricá, a quem nunca mandou dinheiro,

fosse mesquinhez, fosse habilidade. Mesquinhez não creio, ele gastava largo e

dava muitas esmolas. Habilidade seria; tirava-lhes o gosto de vir cá pedir-lhe

mais.

Os exemplos são numerosos e dariam um livro (ou uma coleção deles),

mas existem muitos outros aspectos relevantes em sua produção. O anticlímax

é um deles. O anticlímax consiste na técnica de se criar um conflito com

possibilidades de resolução aparentemente previsíveis e frustrar essa

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41previsibilidade, ou esfriando o conflito, ou dando a ele uma solução imprevista,

surpreendente. Importa lembrar que Machado de Assis herdou um público leitor

com expectativas extraídas da literatura romântica com seus sentimentalismos

e idealidades. A estrutura narrativa dos romances e novelas do período que

antecedeu o autor era, até certo ponto, previsível, especialmente a finalização

dos conflitos: ou se tinha o clássico "final feliz", ou o trágico, que

freqüentemente envolvia a loucura e/ou a morte. A opção por um desses dois

extremos era determinada, em geral, pela solução do conflito amoroso que era

nuclear no Romantismo: se houvesse conciliação amorosa, o final era positivo;

caso contrário, negativo.

Machado pertence cronologicamente ao Realismo, movimento que se

opõe ao Romantismo. Assim, o anticlímax era um dos modos de neutralizar o

olhar viciado no binômio "felicidade ou desgraça" dos leitores que herdou e de

estabelecer os princípios da nova escola, especialmente no que se refere ao

combate ao idealismo romântico. É de fundamental importância ressaltar que a

tarefa de contextualizar esteticamente o autor é delicada. Além de sua inclusão

cronológica no Realismo, não se pode ignorar que ele antecipou vários

aspectos do Modernismo. E há que se considerar, sobretudo, seu estilo

personalíssimo. Tudo isso o torna único, tão único que ele não teve discípulos

diretos. Machado de Assis fez mais, ele inaugurou perspectivas sobre o seu

tempo e lugar, bem como sobre o que é universal. A partir dele, temos muitos

autores que lhe emprestaram o olhar e o adaptaram incorporando-o às suas

obras, muitas vezes com talento e competência próprios, mas nenhum com sua

agudeza, sua finura.

Quando se lê Machado de Assis, é possível imaginá-lo desde o alto de

seu ver, assistindo ao terrível espetáculo do mundo; rindo-se dos esquetes

ilusórios de fugaz alegria que permitem ao ser humano tolerar o estar em cena.

Foca, implacável, com seu poderoso telescópio a degeneração moral daqueles

que são a gente que manda, ou que é invejada; a subserviência ora ressentida,

ora conformada que apequena ainda mais aqueles que obedecem. Machado

fulmina o maniqueísmo, ou seja, aquela visão de mundo que divide os seres

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42humanos entre bons e maus, sem categorias intermediárias. Prova disso é o

escravo Prudêncio, que servia a Brás Cubas desde a infância de ambos. O

pequeno era vítima constante da tirania de seu senhor; mas quando cresceu e

ganhou a alforria, teve ele mesmo seu escravo, e o tratava com os mesmos

requintes de crueldade com que fora tratado. Não para vingar-se dos maus-

tratos passados, mas porque a truculência não é um triste privilégio de classe

ou de etnia: ela é humana.

A perspectiva literária desse escritor, quer narre em primeira pessoa

(além de narrador, personagem) ou em terceira (apenas narrador), é suprema;

e em qualquer das duas hipóteses, pode-se sentir sua enérgica presença, pois

ele conversa com o leitor, instiga-o, ironiza-o, sacode-o, mas jamais o adula.

Mas não pense que Machado de Assis, adepto do niilismo, filosofia da

negação total de tudo, do pessimismo absoluto cósmico, era só fel. O humor é

seu principal recurso crítico. No conto "A Sereníssima República", por exemplo,

ele fabula uma república de aranhas, e a partir daí faz uma crítica sarcástica às

fraudes eleitorais e políticas de um modo geral. Aquela república resolveu fazer

um sistema de eleições. Para tanto, as aranhas teceram um saco para colocar

as bolas com os nomes dos candidatos a serem sorteados.

A eleição fez-se a princípio com muita regularidade; mas, logo depois,

um dos legisladores declarou que ela fora viciada, por terem entrado no saco

duas bolas com o nome do mesmo candidato. A assembléia verificou a

exatidão da denúncia, e decretou que o saco, até ali de três polegadas de

largura, tivesse agora duas; limitando-se a capacidade do saco, restringia-se o

espaço à fraude, era o mesmo que suprimi-la. Aconteceu, porém, que na

eleição seguinte, um candidato deixou de ser inscrito na competente bola, não

se sabe se por descuido ou intenção do oficial público. Este declarou que não

se lembrava de ter visto o ilustre candidato, mas acrescentou nobremente que

não era impossível que ele lhe tivesse dado o nome; neste caso não houve

exclusão, mas distração. A assembléia, diante de um fenômeno psicológico

inelutável, como é a distração, não pôde castigar o oficial; mas, considerando

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43que a estreiteza do saco podia dar lugar a exclusões odiosas, revogou a lei

anterior e restaurou as três polegadas.

A habilidade narrativa do autor é tamanha que gerou obras até hoje

polêmicas, como é o caso de Dom Casmurro, a principal delas. Até hoje

acadêmicos, estudantes e leitores comuns batem-se pela questão: Capitu traiu

ou não traiu Bentinho, como ele afirma no romance que o tem como foco

narrativo? Consta que houve até a simulação de um julgamento da

personagem promovido pelos estudantes de Direito da Faculdade de São

Francisco, ligada à Universidade de São Paulo. Ela foi absolvida por falta de

provas. Os dois grupos, o dos favoráveis à idéia de que houve o adultério e o

de seus opositores, discutem apaixonadamente, e também inutilmente, porque

a obra é um duplo perfeito. Ambas as possibilidades são defensáveis, mas

nenhuma delas cabais. De fato, essa nem é a principal questão do livro, e seria

preciso muitas resmas de papel para se entrar nesse assunto.

Machado de Assis é uma vastidão, um cosmo, um infinito jogo de

espelhos. Carlos Drummond de Andrade, em seu poema "A um Bruxo, com

Amor", belíssima homenagem ao autor, afirma: "Outros leram da vida um

capítulo, tu leste o livro inteiro". Quem não leu Machado de Assis, não leu

sequer uma linha.

Principais Obras

Obras da 1ª fase:

Poesia: Crisálidas (1864), Americanas (1875).

Conto: Contos Fluminenses (1869), Histórias da Meia-Noite (1873)

Romance: Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876),

Iaiá Garcia (1878).

Teatro: Queda Que as Mulheres Têm pelos Tolos (1861), Quase Ministro

(1864), Os Deuses de Casaca (1866).

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44Obras da 2º fase:

Romance: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba

(1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908).

Conto: Papéis Avulsos (1882), Histórias Sem Data (1884), Várias

Histórias (1896), Páginas Recolhidas (1899), Ocidentais, in Poesias Completas

(1901), Relíquias de Casa Velha (1906).

Teatro: Tu, Só Tu, Puro Amor...(1881).

Máximas Machadianas

• Houve uma coisa que fez tremer as aristocracias, mais do que os

movimentos populares; foi o jornal. (Crônica de 23/10/1859)

• A hipocrisia não tem um leito de flores no regaço da minha alma.

(Crônica de 7/7/1878)

• Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que

será corrigida também até a edição definitiva, que o editor dá de

graça aos vermes. (Memórias Póstumas de Brás Cubas)

• (...) A inveja não é senão uma admiração que luta (...) (Idem)

• Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da

nossa miséria. (Idem)

• Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas

apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire

forças para transpor a montanha e ir à outra vertente, onde há

batatas em abundância; mas se as duas tribos dividirem em paz

as batatas do campo não chegam a nutrir-se suficientemente e

morrem de inanição. A paz, nesse caso é a destruição; a guerra é

a conservação (...) Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor,

as batatas. (Quincas Borba)

Cronologias

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45

Carioca, nasceu a 21 de junho de 1839, na chácara do Livramento, cujos

donos, Joaquim Alberto de Sousa da Silveira e Maria José de Mendonça

Barroso, o apadrinharam. Deles herdou o duplo prenome: Joaquim Maria. Há

muito sua família servia às diversas gerações de proprietários da chácara. Seu

pai era mulato e trabalhava como “pintor decorador” de paredes; sua mãe não

era lavadeira, como muitos biógrafos afirmam, era alfabetizada devendo,

portanto, exercer funções domésticas mais amenas, como costura, bordado,

etc. Cogita-se que ela tenha ensinado as primeiras letras ao filho. Morreu

quando Machado tinha 10 anos, e seu pai casou-se com Maria José, que

parece ter sido uma madrasta carinhosa com o enteado.

Machado de Assis nunca freqüentou a escola regularmente. Alguns

dizem que foi até a metade da 2ª série do fundamental; outros, que nem isso.

Se não teve grandes oportunidades, dada sua origem humilde, teve fome: lia

tudo que lhe caía nas mãos, e com freqüência era visto no Gabinete Português

de Leitura, uma biblioteca com mais de 16 mil volumes. Assim foi construindo

um repertório autodidata e aos 15 anos já falava francês e trabalhava no jornal

Marmota Fluminense, de propriedade de Paula Brito. Nessa época publicou

seu primeiro poema, aliás lamentável, “A Palmeira”, em 1855.

Depois foi para a Imprensa Nacional como aprendiz de tipógrafo e teve

como chefe Manuel Antônio de Almeida, autor de Memórias de um Sargento de

Milícias. Há depoimentos de que não era um funcionário exemplar, pois sempre

era visto pelos cantos lendo, em vez de trabalhar.

Suas colaborações na imprensa eram cada vez mais freqüentes e aos

19 anos enveredou para a prosa e publicou seu primeiro conto, “Três Tesouros

Perdidos”, além da crítica literária e artigos polêmicos. Outras publicações

interessaram-se por seus escritos; os jornais Correio Mercantil, O Paraíba,

editado em Petrópolis, a revista O espelho e o Diário do Rio de Janeiro.

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46 Engajou-se na política estando ao lado dos Liberais, e participou de

algumas campanhas de colegas da imprensa. Sua militância firme e discreta

lhe valeu boa interação dos assuntos e da hierarquia política, uma das fontes

do irônico desprezo que lhes dispensaria quando na maturidade.

Aos 22 anos publicou sua primeira peça teatral, aos 25 o primeiro livro

de poemas. Foi poeta, cronista, contista, romancista, jornalista político,

repórter, polemista, epistológrafo e crítico de literatura e teatro. Além disso, foi

excelente tradutor, pois dominava vários idiomas (sempre os aprendendo

sozinho). Sua obra apresenta duas fases: a imatura, onde se percebe alguma

influência do Romantismo, notadamente na poesia; e a madura, onde as

características já vistas nesta matéria resplendem.

Em princípio, não parecia que o menino, que teve decerto de enfrentar o

preconceito de classe, já que era muito pobre, e o étnico, pois era mestiço,

teria muitas oportunidades de manifestar seu gênio. Sua inteligência

engenheira e seu talento foram maiores que as circunstâncias de época. Não

apenas o manifestou, como obteve reconhecimento ainda em vida e morreu

glorificado pelo público e pela crítica.

Foi casado durante 35 anos com Carolina Augusta Xavier Novais.

Moraram muito tempo numa casa na rua Cosme Velho, no bairro carioca do

mesmo nome. Apesar da ascensão profissional de Machado como escritor e

como funcionário público (foi diretor do Departamento de Obras Viárias do Rio

de Janeiro), nunca puderam comprar a casa e sempre viveram pagando

aluguel. Carolina faleceu em 1904 e o impacto de sua perda foi tremendo. Em

carta ao amigo Ramos Paz, de 15 de dezembro daquele ano, ele diz:

Meu caro Paz,

Obrigado pelas tuas palavras e pelo teu abraço. Ainda que de longe,

senti-lhes o afeto antigo, tão necessário nesta minha desgraça. Não sei se

resistirei muito. Fomos casados durante 35 anos, uma existência inteira; por

isso, se a solidão me abate, não é a solidão em si mesma, é a falta da minha

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47velha e querida mulher. Obrigado. Até breve, segundo me anuncias, e oxalá

concluas a viagem sem as contrariedades a que aludes.

Abraça-te

O velho amigo,

Machado de Assis

Faleceu em 29 de setembro de 1908.

Um narrador Mestiço Por José de Paula Ramos Júnior

A vida de Machado de Assis (1839 – 1908) é das mais surpreendentes

de quantas podem ser assim consideradas na história do Brasil. Mulato de

origem pobre, alcançou a celebridade e o respeito de seus contemporâneos.

Alto funcionário da burocracia imperial, fundador e presidente da Academia

Brasileira de Letras, jornalista e polígrafo excepcional, foi reconhecido em vida

como o maior artista brasileiro. A fama de Machado transcende a sua morte

física, perpetuando-se espiritualmente na obra que legou. Hoje e cada vez

mais, ele é internacionalmente reconhecido com um dos grandes contistas e

romancistas da literatura universal. Harold Bloom, por exemplo, importante

crítico literário norte-americano, professor das universidades de Yale e de

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48Colúmbia (Nova York), considera o autor de D. Casmurro um dos grandes

gênios literários e o maior artista negro de todos os tempos.

Em rigor, Machado de Assis não era negro, mas mulato. Essas noções

são muito vagas, pois dizer “negro” ou “mulato” não identifica a imensa

diversidade de referentes étnicos que os vocábulos podem evocar. Do ponto de

vista genético, os seres humanos, com toda sua diversidade, pertencem a uma

mesma espécie biológica. Nesse sentido, não há diferenciação racial, pois

raças humanas não existem. Contudo, o sucesso de Machado de Assis,

descendente de escravos, tem significado social dissonante num país

escravocrata, como foi oficialmente o Brasil até 1888, época em que o escritor

se encontrava em plena maturidade artística e superava sua humilde condição

original, numa sociedade marcadamente preconceituosa. Para essa sociedade,

as raças eram uma evidência. Segundo a etnologia européia do século XIX,

característica na obra de Gobineau, que foi assimilada pelas elites brasileiras,

era também considerada evidência a opinião de que há raças superiores e

inferiores. O elemento branco, caucasiano, ou seja, o europeu, era visto como

superior; asiático amarelo e o africano negro, inferiores; mulatos e cafuzos,

mestiços em geral , eram posicionados no ponto mais baixo dessa escala.

Duvida-se da possibilidade de uma nação de mestiços criar uma civilização.

O lugar social de onde o artista Machado de Assis inventa seu universo

ficcional pressupõe não só a experiência do processo problemático e

contraditório de ascensão a camadas superiores da sociedade elitista e

preconceituosa, mas também a trajetória intelectual contida nesse movimento.

Em outros termos, a formação intelectual de Machado (suas idéias, valores e

convicções) desenvolveu-se em meio às vicissitudes da vida prática, no campo

da luta cotidiana por respeito. Essa particularidade biográfica deu a ele a

possibilidade de entender como ninguém as estruturas da sociedade brasileira

e o comportamento de seus tipos humanos mais representativos. Machado de

Assis tornou-se fino investigador da interioridade psicológica individual e agudo

construtor de personagens complexas e fascinantes.

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49As personagens machadianas sintetizam comportamentos marcados

pela particularidade social brasileira do século XIX e pela universalidade

humana, na medida em que esta se configura, no espírito do artista, como

atualização e variação de certas constantes determinadas histórica e

culturalmente. Ou seja, a universalidade humana se revela, em suas

incontáveis manifestações, como categoria histórica que se efetiva na prática

individual e social, no interior desta ou daquela cultura. A observação

perspicaz, que, num processo de reflexão permanente, apreende a estrutura,

os movimentos e o sentido, ou sem-sentido, dos fenômenos sociais e

psicológicos, torna-se obra de arte ao ser transposta para a forma de discurso

ficcional, que inventa caracteres e situações enredadas, portadores de uma

considerável gama de significados inscritos no próprio discurso e que podem

ser apreendidos por meio da identificação dos mecanismos geradores de

sentido, como a ironia, alegoria, o paradoxo, a digressão, a enunciação

fragmentária e tantos outros, próprios do tratamento artístico machadiano da

linguagem verbal.

Conhecer o lugar social de onde o autor se pronuncia permite também

entender melhor a desencantada visão de mundo machadiana e, até mesmo, o

seu estilo evasivo, mas contundente. Para R. Magalhães Júnior, é evidente que

Machado detestava a sociedade em que vivia, mas como mulato assimilado

soube acomodar-se a ela sem renunciar ao pensamento crítico, que nunca

deixa de manifestar em sua obra. Assim, esta poderia ser de leitura

desagradável, não só para as camadas superiores, mas também para as

inferiores, pelas aniquilantes imagens construídas a propósito de umas e

outras, não fosse a elegância enganosa com que aborda as questões mais

delicadas e comprometedoras.

Não se deve confundir ficção com realidade, mas é necessário admitir

que a obra ficcional de Machado de Assis estabelece certas relações entre

ambas. Os contos e romances do autor não devem ser vistos como reflexos da

realidade, mas, mais propriamente, como construções de realidades ficcionais.

Estas, por sua vez, são discursos cifrados, que se abrem ao trabalho de

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50análise e se reintegram no de leitura crítica, que possa revelar um certo

conhecimento ou interpretação da realidade exterior neles contidos. Agora,

trata-se de um pronunciamento cujo âmbito de validade está em si mesmo, isto

é, no próprio discurso, uma vez que sua verdade refere-se aos elementos nele

circunscritos. No entanto, esse conhecimento imaginário nasce da observação

da realidade e convida a compará-lo a ela. Assim, o verossímil (a ficção

artística) torna-se medida para verificação do verídico (a vida real). E essa

medição é desfavorável ao segundo, uma vez que o instrumento de verificação

contém o desencanto em relação ao mundo, tal qual ele se apresentava em

sua configuração histórica. É o que se convenciona chamar de pessimismo

machadiano.

Toda a amargura contida nas páginas machadianas maduras, porém, é

apresentada de modo difuso, evasivo e bem humorado, que implica o efeito de

amortecimento da crítica ácida por meio de narradores não-confiáveis, que

sabem esquivar-se de situações embaraçosas mudando de assunto,

disfarçando-o ao fragmentá-lo fazendo piada, cometendo disparates, dando

saltos, buscando distrair o leitor e, geralmente, captar sua simpatia. Machado

inventa narradores aliciantes, que fisgam o interlocutor desavisado no anzol de

uma certa cumplicidade. Esse interlocutor é também uma categoria ficcional,

ou seja, trata-se de um suposto leitor, inserido na narrativa como personagem

a quem o enunciador (narrador) se dirige. É o chamado leitor (ou interlocutor)

incluso, a quem a enunciação digressiva interpela.

O narrador Machadiano parece acomodar-se aos valores e práticas

dominantes da sociedade inventada, assim como o homem Machado de Assis

houve de acomodar-se aos da sociedade real. Mas esse narrador, com seu

procedimento elusivo, age como hipócrita para encenar a hipocrisia das

relações sociais, de modo a desmascará-las.

Atribuído ao narrador machadiano, o vocábulo hipócrita contém o

significado usual, de fingido, enganador ou velhaco, mas também o de sua

origem grega hupokrités, ator de teatro, ou ainda, “o que dá uma resposta,

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51[espécie de] intérprete de um sonho, de uma visão; adivinho, profeta”. Na

antiguidade grega, a interpretação de sinais visava ao fim prático de orientação

para a vida do indivíduo e da cidade, e era fundamentada na peculiar devoção

dos gregos antigos. O discurso do narrador machadiano é manifestação da

imaginação artística da vida, um sinal que contém uma interpretação da própria

vida, sendo o espírito místico grego substituído pelo espírito cético e crítico de

mestiço brasileiro.

Com suas negaças, o narrador ilude o leitor desavisado (fictício ou real),

quando parece compartilhar seus valores e práticas, como o homem Machado

fez ou fingiu fazer na vida real. Por outro lado, não deixa de manifestar ao leitor

crítico (real) o desmascaramento da hipocrisia que permeia as relações sociais

(fictícias ou reais), cujo caráter ridículo e melancólico decorre da contradição

entre valores supostamente autênticos e práticas inautênticas (quer na ficção,

quer na realidade).

De certo modo, a obra literária de Machado de Assis imita os

movimentos do homem, mestiço assimilado, mas crítico, que, se

contemporizou com a sociedade detestável, também a satirizou radicalmente

em sua arte. Essa dialética de conformismo e resistência crítica pode ser

observada na narrativa machadiana, cuja natureza híbrida se explicita em

várias instâncias, como, por exemplo, na combinação de elementos “clássicos”

e “barrocos”: por um lado, elegância, sobriedade, clareza, concisão, realismo;

por outro, sinuosidade, desregramento, fragmentação ironicamente prolixa,

fantasia. Mas o narrador machadiano é a instância que revela de modo mais

claro a homologia que tentamos estabelecer entre a estratégia de vida e a

tática da arte de Machado de Assis. Assim como o homem, o narrador é,

também, miscigenado, espiritualmente mestiço na mistura de hipocrisia

malandra, com que dribla os preconceitos, ajustando-se aparentemente a eles,

e descaramento cruel, próprio da atitude filosófica cínica, que despreza as

convenções sociais e sua moralidade de fachada com um sorriso de

desencanto nos lábios.

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CONCLUSÃO

Se Portugal, senhor dos mares no século XV, teve a honra e Glória de

Possuir Eça de Queirós, o príncipe da adjetivação, a acanhada Ilha de Vera

Cruz, depois Brasil, em posição genuflexa, contemplou e reverenciou o maior

de seus escritores: Machado de Assis.

A genialidade desse homem, com saúde a inspirar cuidados e cabeça

faraônica, nos encanta.

Machado de Assis não cursou nenhuma faculdade, mas na vida ele foi

doutor, no dizer do poeta. Os gênios não precisam de diplomas para que a arte

faça deles a sua morada.

Sem embargos, Machado de Assis é um divisor de águas. Antes dele,

tínhamos uma literatura com semblante e alma lusitanos. Depois dele,

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53passamos a saborear uma literatura genuinamente brasileira, madura, digna

dos maiores aplausos, encantadora, modelar, arrojada.

Não podemos olvidar que a França seja o berço da cultura universal e

modelo de civilização para todos os povos que habitam o Planeta Terra. Nos

legou Flaubert, Balzac, La Fontaigne: ápice da genialidade humana de todos os

tempos. O Brasil nos deu de presente o incomparável Machado de Assis, prova

irrefutável de sua pujança artístico-literária.

Machado Assis está vivo. Os gênios não morrem. São eternos pelas

obras que deixaram. Machado de Assis, com certeza, é a prova mais

contundente de que a teoria existencialista de Sartre é procedentemente

procedente.

A luminosidade do espírito de Machado de Assis jamais se apagará.

Como outrora, como hoje, como no porvir, ela influenciará outras mentes

brilhantes para provar ao mundo que o seu hercúleo esforço não foi em vão.

Cônscio de sua genialidade, lutou contra tudo e contra todos para, per omnia

secula seculorum, inscrever o seu nome na placa inaugural da Academia

Universal de Letras. Obrigado, Machado de Assis por você existir!!!

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ANEXOS

Índice de anexos

Anexo 1

Anexo 2

Anexo 3

Anexo 4

Anexo 5

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ANEXO 1

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ANEXO 2

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ANEXO 3

ANEXO 4

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ANEXO 5

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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60

Cândido, Antônio – “Esquema de Machado de Assis” in Vários Escritos, São

Paulo, Duas Cidades, 1970.

Castelo, J. A. – Realidade e Ilusão em Machado de Assis, Comp. Ed. Nacional,

São Paulo, 1969.

Magalhães Jr., R. – Machado de Assis Desconhecido, 2ª ed., Rio de Janeiro,

Ed. Civil. Brasileira.

Meyer, Augusto – Machado de Assis, Livr. São José, Rio de Janeiro, 1959.

Pereira, Lúcia Miguel – Machado de Assis, Estudo Crítico e Biográfico, 3ª ed.,

Cia. Ed. Nacional São Paulo, 1946.

Pereira, Lúcia Miguel – Prosa de Ficção, de 1870 a 1920, Livraria José Olympio

Ed., Rio de Janeiro, 1950.

Proença, M. Cavalcanti – Vários ensaios sobre Machado, reunidos em Estudos

Literários, Col. Doc. Bras., Rio de Janeiro, José Olympio, 1969.

Schwartz, R. – Ao Vencedor, as Batatas, São Paulo, Duas Cidades, 1977.

ÍNDICE

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61

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I 10

1. Machado de Assis: Do Morro do Livramento

à Academia Brasileira de Letras

CAPÍTULO II 12

2. O jornal e a repartição pública: degraus de ascensão

CAPÍTULO III 13

3. E foram felizes para sempre

CAPÍTULO IV 14

4. A Carolina

CAPÍTULO V 15

5. Lar, doce lar

CAPÍTULO IV 16

6. Machado, um cidadão comum como tantos

CAPÍTULO VII 17

7. Machado de Assis: apogeu e Morte

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62CAPÍTULO VIII 22

8. Textos Selecionados

CAPÍTULO IX 37

9. Um périplo encantador através do mundo

machadiano

CONCLUSÃO 53

BLIBLIOGRAFIA CONSULTADA 61

ANEXOS 55

ÍNDICE 62

FOLHA DE AVALIAÇÃO 64

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63

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes

Título da Monografia: A importância de Machado de Assis no cenário da

Literatura Brasileira.

Autor: Paulo Roberto Cristo de Oliveira

Data da entrega: 27/01/2007

Avaliado por: Conceito: