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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES Dificuldade de Ensinagem : A questão da formação do professor Autora : Virginia Rocha de Souza Professora Orientadora : Maria Ester Oliveira Junho/2003

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

Dificuldade de Ensinagem : A questão da formação do professor

Autora : Virginia Rocha de Souza

Professora Orientadora : Maria Ester Oliveira

Junho/2003

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Virginia Rocha de Souza

Dificuldade de Ensinagem : A questão da formação do professor

Rio de Janeiro Junho / 2003

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE DIFICULDADE DE ENSINAGEM : A questão da formação do professor OBJETIVOS : Muitas vezes o aprendizado dos professores se restringe apenas aos cursos de habilitação . Outras vezes utiliza-se do grupo de estudos apenas com intenção de fazer com que o professor , participe . O objetivo deste trabalho é fazer com que o professor reconheça a importância da sua formação .

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AGRADECIMENTOS Aos meus pais , pelo apoio e compreensão , por terem me proporcionado o estudo e formação .

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DEDICATÓRIA Dedico essa monografia a todos os Professores , que tanto lutam por nossa Educação .

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RESUMO O propósito desta monografia é mostrar a importância da formação continuada dos professores . Fazer uma relevância deste assunto no aprendizado de novas técnicas e aperfeiçoamento . A formação é uma “arma” importante nas mãos do professor, que pode através dela dar ritmo, rima e até significados diferentes aos seus ensinamentos . A utilização destes recursos podem e devem ser trabalhados em sala de aula dando ao aluno um recurso a mais para a aquisição dos conhecimentos .

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METODOLOGIA Leitura e análise de alguns textos – Através da leitura destes textos selecionar os que melhor abrangem o conteúdo sugerido por estudiosos . Seleção de textos para utilizar na monografia – Com o objetivo de utilizar material adequado para exemplificar o trabalho evitando repetição de figuras de linguagem nos textos ou expressões de duplo sentido . Dissertação.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I 14 FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO 14

CAPÍTULO II 20 NOVAS COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS PARA ENSINAR 20

CAPÍTULO III 26 A PRÁTICA COMO OBJETO DE REFLEXÃO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES 26

CAPÍTULO IV 39 MODELOS DE ORGANIZAÇÃO DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL 39

CAPÍTULO V 40 QUAL O MELHOR MEIO ? 40

CAPÍTULO VI 44 O CICLO DE VIDA DOS PROFESSORES 44 CONCLUSÃO 52 ANEXOS 54 BIBLIOGRAFIA 58

ÍNDICE 59

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INTRODUÇÃO

"Quando se procede de uma classe social abastada tem-se duas possibilidades: ou

não olhar para nada ou participar de uma possível transformação da realidade" ( Walter

Salles, diretor de Central do Brasil )

Este talvez seja o mais importante papel da educação: transformar a nossa realidade

para acompanhar o processo de mudança que marca o mundo atual, sobretudo em um país

subdesenvolvido (embora industrializado) e considerado o campeão da desigualdade social.

Mas para que a educação alcance esta finalidade em nosso país, é necessário

refletirmos sobre ela.

Uma das perguntas que podemos fazer ao refletirmos sobre a educação neste final

de século é: a educação hoje serve para o adestramento ou para dar ao jovem uma correta

visão do homem e do mundo?

Atualmente a educação do ser humano é a atividade mais complicada que nossa

sociedade enfrenta. Trata-se de um daqueles problemas que nos encaminham para uma

situação quase paradoxal, semelhante àquela representada pelo princípio da incerteza de

Heisenberg, princípio básico da física microscópica ou das partículas, que significa que não

é possível se conhecer absolutamente, de forma simultânea, todos os aspectos de um

sistema, posto que os procedimentos ao nosso alcance para obter informações sobre

características físicas do sistema (sua posição no espaço) alteram outras (sua energia

cinética ou velocidade). Desta forma, a educação do ser humano faz necessário seu

profundo conhecimento, o que implica simultânea e infalivelmente uma influência em sua

personalidade.

O ensino é um processo interativo que jamais deve ser confundido com a simples

instrução, mais próxima do "adestramento". A educação é, por outro lado, uma função e um

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serviço no qual intervém uma multidão de fatores e atores, que de forma não sempre

consciente se põe a serviço do educando.

Uma outra consideração importante é que o caráter interativo desta elevada função

torna inevitável que o papel do educador ou do sistema educativo deve adaptar-se e

corrigir-se ao longo da evolução do jovem educando e de toda a humanidade. A sociedade

paleolítica educaria com metodologias muito mais próximas ao adestramento, porém sem

dúvida nenhuma haveria um núcleo básico que intentava ordenar e dar sentido, com um

mínimo de harmonia, à função de educar. Provavelmente, este núcleo se encontrava em um

código elementar ou relação social de subsistência, inspirada em uma mística interpretação

de seu universo limitado a sua caverna e arredores.

Diante disso, qual seria o papel que os métodos de ensino atuais desempenham no

processo educativo?

Antes mesmo de se falar sobre este ou aquele método, é necessário destacar que,

como dizia Platão (V A.C.) os vícios no método de ensino podem levar a uma falsa certeza

ou a um saber falso, que é pior que a própria ignorância. Na obra "As Leis", um dos

discípulos diz ao mestre: "Parece-me que receias entrar nessas questões por causa da

nossa ignorância". Ao que o mestre responde: "Muito mais recearia tratar com pessoas

que tivessem estudado tais coisas, porém mal. No caso, não é a ignorância das multidões a

mais perigosa, nem a mais temível, nem o maior dos males, mas estudar com métodos

viciosos é mal muito maior" (Leis 818s).

Em outras palavras, aprender mal é pior do que não aprender. As falsas "verdades"

causam mal maior do que a ignorância.

Um dos aspectos mais importantes para o sucesso de uma metodologia de ensino –

sobretudo nos dias atuais, diante da tão grande complexidade que é o viver principalmente

nas grandes cidades – é a simplicidade.

Essa simplicidade pode ser expressa pelo educador Pedro Poveda, que fez de sua

vida uma obra de fé no humanismo e na educação popular: "Dê-me uma vocação e eu lhe

darei uma escola, um método, uma pedagogia". Essa é a provocadora reflexão que Poveda

lançou aos professores de sua época e lança, ainda hoje, a todos aqueles que se envolvem

numa epopéia educativa.

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Para esse grande educador, mesmo carecendo de métodos adequados, de salas de

aula confortáveis ou recursos didáticos necessários, o processo pedagógico não chega a

estar comprometido se existir o fundamental: a vontade de ensinar e o gosto pela atividade

docente. Afinal, dizia ele, os grandes pedagogos nunca precisaram mais do que discípulos.

Mas e quanto ao professor e ao processo ensino-aprendizagem, o que se pode dizer?

Cláudio de Moura e Castro, em julho de 1999, num artigo da Revista Veja, dizia

que "a essência do aprendizado tem que ver com o professor, aquele que administra, que

testemunha, enriquece e dá vida a uma série de processos que levam o aluno a aprender".

Já para Bernardo Toro, pensador colombiano, ao falar de modernidade, ao professor deve-

se pedir hoje a "mágica de orientar o aluno em duas óticas ou direções: disciplina e

curiosidade".

Cada geração de educadores dá nova forma às aspirações que dinamizam o ensino

em sua época . A partir de 1950 a preocupação constante dos professores tem sido a

melhoria da qualidade de ensino, tendo em vista a preparação do cidadão para o exercício

pleno da democracia.

Um dos pontos em que esta aspiração tem se manifestado é o planejamento de

currículos para as escolas de lº e 2º graus. Nesse campo tem aparecido muitas propostas

que, em geral, não refletem apenas os progressos Educacionais mas incorporam idéias da

Psicologia e da Pedagogia sobre a natureza da aprendizagem.

No entanto, uma das dificuldades encontradas por quase todos os educadores que

tentam implantar um novo método de ensino é a formação dos professores.

Alguns atribuem à formação pedagógica a falta de flexibilidade do professor para se

adaptar às mudanças requeridas pela nova sistemática de ensino. Outros acrescentam a isto

a falta de conhecimento específico e atribuem à expansão desenfreada das Faculdades de

Filosofia a responsabilidade pela perda da qualidade do ensino.

Em geral, na escola de ensino Fundamental e média, as aulas são sempre discursos

totalmente elaborados, uma sucessão de decretos imutáveis, inquestionáveis e exatos.

Enquanto o professor ensina, ao aluno compete apenas observar e "aprender".

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Esse procedimento transforma o ensino em linha de montagem, em detrimento de

um trabalho mais criativo.

A formação do educador é de importância fundamental em qualquer proposta de

ensino pois, por melhor que possa ser o método, ele será totalmente inútil se o professor

não detiver recursos próprios para aplicá-lo.

De acordo com Morris Kline, "um professor medíocre com um currículo medíocre

fará um ensino medíocre, enquanto que um bom professor superará as deficiências de

qualquer currículo". A formação de bons professores é muito mais importante do que o

currículo. Tais professores terão flexibilidade para trabalhar em qualquer situação. Esta

formação implica não só no conhecimento de ciências humanas mas também em uma

sólida base na área específica. Se a formação específica não for adequada, o professor não

saberá julgar o que é importante em Matemática, nem desenvolver a capacidade de ensinar,

discutir textos ou mesmo escrevê-los para seus alunos.

Ao estruturar um curso de Licenciatura nos deparamos com duas grandes

dificuldades. Uma delas se refere à listagem dos conteúdos (disciplinas) que deverão

compor o currículo, a outra diz respeito à forma segundo a qual os professores deverão

ensinar essas disciplinas, isto é, quanto aos métodos recomendados para um curso que tem

por objetivo formar bons professores .

A listagem de conteúdos e sua respectiva seriação, quando se pensa em formar

professores competentes, não é uma tarefa fácil e não existe uma solução definitiva capaz

de, por si só, garantir uma formação de alta qualidade. Qualquer proposta envolve

discussões e reflexões. Portanto, a escolha de temas (ou disciplinas) para uma programação

de ensino (formação de professores) é subjetiva e consiste na seleção de coisas entre outras

igualmente verdadeiras.

Para muitos pesquisadores é necessário que se operem mudanças significativas em

diversos níveis :

Em primeiro lugar deve-se promover uma mudança de currículo. Os conteúdos dos

cursos devem ser modificados com introdução de novas disciplinas e eliminação de

algumas que tradicionalmente compõem os currículos dos cursos de Licenciatura.

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O segundo fator que deve ser considerado é a linguagem. Isto porque a tecnologia

moderna assim exige ou porque está havendo uma mudança de perspectiva , ou ainda

porque a disciplina agora deve ser ensinada para um grande número de estudantes muitos

deles desinteressados de qualquer tipo de aprendizagem.

O terceiro fator a ser considerado é o social. A experiência é um instrumento que

auxilia o indivíduo na leitura do mundo que o cerca. Por isso, deve fornecer condições para

aplicar, na vida diária, os conhecimentos adquiridos em situação escolar.

Nesse sentido, o ensino precisa também estar melhor integrado com as aplicações

atuais da ciência à indústria e à pesquisa, essas aplicações não devem ser tomadas apenas

como uma ilustração secundária durante as aulas, mas ser considerada como um veículo por

meio do qual o conteúdo deve ser ensinado.

O quarto fator considerado é o do método de ensino. Os pontos fundamentais que

devem ser respeitados pelos professores são:

I - A curiosidade e a motivação intrínseca são fundamentais para a aprendizagem.

A melhor maneira de aprender é aquela em que o aluno adquire o conceito e

encontra um procedimento que o conduz, por conta própria, à solução correta de problemas.

Assim, ele deve ser encorajado a pensar criticamente, a encontrar diferentes soluções para

um problema como também a investigar a validade das soluções encontradas.

II - As generalizações devem ser formadas a partir da análise de casos particulares

e depois aplicadas dedutivamente em busca de soluções gerais.

As generalizações assim obtidas devem ser demonstradas dedutivamente e

posteriormente aplicadas na resolução de novos problemas.

III - A axiomatização deverá ser a última etapa do processo de aprendizagem.

É importante criar um referencial significativo para a abstração de conceitos , isto

pode ser feito em três etapas: a concreta, a semiconcreta e a abstrata.

A utilização dessas três etapas no ensino deve possibilitar ao professor identificar e

atender diferenças individuais que caracterizam uma classe numerosa de estudantes.

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CAPÍTULO I

Formação dos Profissionais da Educação

Falar sobre a formação do profissional de educação requer lançar questões a cerca

do entendimento que se tem do ato de formar .Professor se forma? Forma-se professor?

Formação é dar forma? O que vem a ser dar forma? Que tipo de forma? Formação é colocar

numa forma? A quem interessa essa forma + ação? São questionamentos do dia-a-dia da

educação.

Educar não é reproduzir um modelo, e o homem é um ser em processo, em

permanente processo de construção. Essa formação envolve aspectos pessoais e

profissionais perpassando por valores, idéias e ideais.

O educador está inserido num contexto que é o mundo, ele está no mundo e precisa

situar-se nesse mundo. Quem vive no mundo está sujeito a conflitos que podem levá-lo a

cair no erro de subestimar a subjetividade em detrimento da objetividade.

A formação do docente tem início antes do ingresso nos cursos de preparação para o

magistério e prossegue durante o exercício da sua prática profissional. O que está sendo

ressaltado é a importância das experiências, simultâneas e posteriores aos cursos de

formação profissional.

Os estudantes já chegam aos cursos de formação profissional com conceitos e

representações sobre o papel do professor adquiridos ao longo de uma vida estudantil.

Os novos dispositivos legais sobre a formação inicial do educador (a criação dos

institutos superiores de educação e a possibilidade de portadores de diploma de ensino

superior, mediante freqüência a programas de formação pedagógica, transformarem-se em

docentes; a mudança na carga de prática pedagógica nos cursos de licenciatura, dentre

outras) colocam grandes questões no campo da formação do professor. (Nóvoa. Nova

Escola. p.13, maio. 2001).

A educação brasileira está permeada de situações/desafios que requerem uma

solução. Sem dúvida, a formação de professores é um problema que abrange os

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profissionais que atuam no ensino fundamental .Muito se reflete, mas o problema persiste .

Às vezes tem-se a ilusão de que a solução está bastante próxima, mas de forma espetacular,

o iceberg , no qual se transforma a formação, emerge para reaparecer com uma roupagem

(características, estilo e situações) que exige novas maneiras de vê-lo, refleti-lo e analisá-lo.

Faz-se necessário então reavaliar o processo para a busca de alternativas, que abram

caminho para novos estudos, novas pesquisas do tema. Mas tudo isso requer uma

contextualização do momento em que se vive, das necessidades e de tudo que permeia o

cenário da educação, para daí começar a construir um projeto de pesquisa que venha ao

encontro da a realidade, nunca desprezando a criatividade, a criticidade e a

intencionalidade.

Veiga (1998), apoiada nos estudos de kincheloe (1997), identifica quatro

paradigmas de formação de profissionais, no final do século XX:

O paradigma behaviorista, baseado num cientificismo cartesiano-newtoniano e na

psicologia behaviorista, articula o “bom senso”, a aprendizagem de conhecimentos

habilidades e competências, limitando-se à formação do professor e à instrumentalização

técnico-científica, na solução de problemas da prática. “Os professores são formados para

se transformarem em funcionários não reflexivos do Estado, burocratas, submissos”.

O paradigma personalístico fundamenta-se na teoria cognitiva psicológica e a

formação de profissionais da educação, vista mais como um processo de maturação do

adulto do que de preparação para as atividades de ensino, enfatiza o desenvolvimento

pessoal, priorizando a habilidade de reorganização das percepções e crenças sob o ensino

de comportamentos particulares e de conhecimentos específicos e habilidades.

O paradigma da formação profissional , orientada para a pesquisa numa

concepção de educação como ato político, “enfatiza o cultivo de habilidades da

investigação .

Se os três primeiros paradigmas apontam para a formação do “burocrata técnico

submisso e obediente às regras, desligado do contexto social” , assumir o último paradigma

citado (formação profissional) orientado para a pesquisa , abre perspectivas na formação do

educador necessário a nova pedagogia.

É justamente este último paradigma que vem sendo negado pelas políticas de

formação. Para se falar de formação é preciso elencar também a experiência, ação prática,

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informação, transformação, pois a formação se torna um problema evidente a partir do

retorno que a prática nos mostra e soma-se a ela a questão da transformação que é

recorrente de uma ação prática consciente e comprometida que tem sua base na formação.

Formação que não tem um fim, mas constitui-se em processo permanente

construído a partir da vivência da informação e do conhecimento. É algo bastante profundo,

pois envolve um querer vindo do interior de cada um indo além do termo mudança;

exigindo uma competência técnico-científica e uma competência comunicativa. A

ação/formação no exercício do magistério precisa acompanhar as mudanças e avanços que

o contexto exige, apropriando-se também das conquistas sociais, visualizando a dimensão

da reconstrução permanente das conquistas sociais, visualizando a dimensão da

reconstrução permanente.

Torna-se interessante fazer um paralelo entre a formação que é dada ao profissional

(aquilo que é apreendido durante o processo formativo formal) e o que este profissional faz

no dia a dia (sua experiência).Em que esse processo formativo formal contribui realmente

para uma verdadeira formação? Que ideologia está por trás de tal processo? Será também

justo colocar toda a responsabilidade do quadro caótico da educação somente à formação?

Quem convive no ambiente escolar, já deve ter escutado falas de pais tais como: “Existem

professores e professores”, “Já não se fazem professores como antigamente”, “No meu

tempo o professor sabia como trabalhar” ,“Eu não sei porque tanto curso, tanta

reciclagem e a cada dia os alunos sabem menos, gostam menos da escola”. Por sua vez os

alunos dizem: “O professor não dá aula, ele só pede para abrir a página do livro e fazer o

exercício do livro, isso eu faço sozinho em casa”, “Aquele professor é chato, mas ele sabe

a matéria e sabe dar aula”.

Até que ponto tais falas sinalizam e refletem uma avaliação da formação dos

professores? Percebe-se que existe uma quebra do modelo de “ formação pronta e acabada”

para um modelo de “ formação construído no dia a dia, processual, coletiva”. Isso é um

aspecto da questão da formação uma vez que rompe com os conceitos e modelos prontos e

parte para o desafio da continuidade exigindo outros requisitos em que não mais apenas a

teoria, e sim teoria aliada às práticas profissionais compõe o terreno da formação.

Conforme o artigo 61 da lei de Diretrizes e Bases da Educação ( 9394/96 ) :

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A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos

diferentes níveis e modalidades de ensino e as características de cada fase do

desenvolvimento do educando, terá como fundamentos:

X a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em

serviço;

X Aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de

ensino e outras atividades.

Tudo isso passa pela apropriação adequada do termo compreensão. Pois é preciso

por parte dos professores compreender que estamos vivendo uma situação tal que as

práticas se antecipam à teoria, exigem ser mais bem entendidas para então serem exercidas

.É um ponto importante para ser discutido pelos professores: “Em que teoria se ampara sua

prática?” Estará o sistema educacional permeado de práticas “soltas”, “cegas”, sem suporte

teórico? Neste ponto entra em cena o tempo e um sistema que impõe o que deve ser feito

através de capacitação, reciclagens, treinamentos em serviço, significando ordens a serem

cumpridas. A política atual, que enfatiza a formação em serviço, é decorrente, sobretudo

das políticas do Banco Mundial, que recomenda a capacitação no trabalho como forma de

evitar longos períodos de formação inicial dos professores.

A formação está intimamente ligada ao tempo-espaço em que se faz presente e

naturalmente os espaços mais importantes são a sala de aula e a escola. É nesse contexto

onde se dá todo o processo de formação construído coletivamente através da ação-

reflexão- ação, das práticas pedagógicas desenvolvidas nesse ambiente.

Quando se fala em formação continuada, ou formação permanente, não pode-se

entendê-la apenas como continuidade-remendo destinada a sanar falhas e suprir

insuficiências da formação formal recebida; ou para atender a novos requerimentos do

campo profissional, ou para acompanhar o estado das ciências concernidas, inclusive da

própria Pedagogia. Tudo isso permanecendo verdadeiro e útil, requer-se bem mais, do

coletivo dos educadores e de cada um deles, das associações profissionais e dos

movimentos e grupos dos educadores bem como do empenho de cada um requer-se a

produção científica num nível de mais estreita vinculação entre prática e teoria (Marques,

1992, p.199).

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Historicamente, os docentes desenvolveram identidades isoladas. Falta uma

dimensão de grupo, que rejeite o corporativismo e afirme a existência de um coletivo

profissional. Refiro-me à participação nos planos de regulação do trabalho escolar, de

pesquisa, de avaliação conjunta e de formação continuada, para a partilha de tarefas e de

responsabilidades. As equipes de trabalho são fundamentais para estimular o debate e a

reflexão. É preciso ainda participar de movimentos pedagógicos que reúnam profissionais

de origens diversas em torno de um mesmo programa de renovação do ensino.

A articulação entre o que acontece na sala de aula sendo objeto de reflexão conjunta

da escola cria um espaço rico de diagnóstico, avaliação e reestruturação de novas

possibilidades para uma formação que se caracteriza como continuada. O espaço-escola

torna-se, então, um espaço privilegiado, rico de possibilidades para ressignificação do

processo de formação. Mas é preciso que haja a partir daí um diálogo com outras instâncias

educativas, para o conhecimento de novas formas de educação do saber. Se as instituições

permanecerem fechadas em si mesmas de nada resolve. Existe uma dificuldade em aceitar,

compreender, adaptar e colocar em prática as práticas inovadoras. Fala-se muito em

globalização, formar o cidadão para o mundo. Como trabalhar esses aspectos, se na maioria

das vezes o professor desconhece, está confuso em relação às ideologias embutidas na

formação? Se ele desconhece que deve partir de cada “eu”, que deve ser responsável por

sua formação e nunca ficar apenas a mercê de planos centralizadores.

Há de se reconhecer o fato das políticas de formação que sob as determinações do

Banco Mundial privilegiam apenas a relação custo-benefício desvalorizando o profissional

e sua formação submetendo esses profissionais à questão de seu interesse. Dessa forma,

fica caracterizada a degradação a que estão submetidos os profissionais da educação.

Como fica o professor diante de indicativos que falseiam uma valorização e ainda

tem o apoio de muitos, e a desvalorização conferida ao profissional? Com condições

propícias encontra-se dificuldade no trabalho de formação dos professores, que quadro

sinaliza uma situação como esta, que tenta esconder o descaso dado à formação, em

detrimento de um aspecto econômico, tendo como pano de fundo os interesses do Banco

Mundial. É nesse contexto que a educação contínua aparece como meio mais barato e

eficaz de formar docentes.

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A formação do professor, pensada apenas como desenvolvimento de competências

substituindo a formação voltada para a aquisição de uma visão mais ampla e crítica da

educação, desenvolve um tipo de profissionalismo restrito e estreito.

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CAPÍTULO II

Novas competências profissionais para ensinar

Segundo Phillippe Perrenoud , ( Cap. IV do Livro “10 Novas Competências para

Ensinar” ) ; o desejo de saber e a decisão de aprender pareceram, por muito tempo, fatores

fora do alcance da ação pedagógica. Cada professor espera que seus alunos se envolvam no

trabalho, manifestem o desejo de saber e a vontade de aprender. A motivação é tida como

uma preliminar, cuja força não depende do professor.

A responsabilidade pelo desejo e pela vontade de aprender pouco a pouco se

inscreveu no ofício do professor, muitas vezes por não ter outra alternativa do que por

vontade de despertar vocações. A voga do “projeto pessoal do aluno” não deve iludir: os

professores sabem bem que muitos alunos quase não têm projeto e que é difícil propor-lhes

um.

Se a escola quisesse criar e manter o desejo de saber e a decisão de aprender,

deveria diminuir seus programas, de forma a integrar em um capítulo tudo o que permita

aos alunos dar-lhe sentido e ter vontade de se apropriar desse conhecimento. Os programas

são concebidos para alunos cujo interesse, desejo de saber e vontade de aprender são

supostamente adquiridos e estáveis. Quando estes pré-requisitos faltam a certos alunos, os

professores apostam na motivação extrínseca (sanção, nota ruim, perda de estima, ...).

Como envolver mais os alunos em sua aprendizagem e em seu trabalho? A

competência requerida é de ordem didática, epistemológica e relacional. Podem-se isolar

diversos componentes, que são outras tantas competências específicas:

ö Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, o sentido do

trabalho escolar e desenvolver na criança a capacidade de auto-avaliação.

ö Instituir e fazer funcionar um conselho de alunos e negociar com eles diversos

tipos de regras e contratos.

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ö Oferecer atividades opcionais de formação, à la carte.

ö Favorecer a definição de um projeto pessoal do aluno.

Quanto à formação de professores poderíamos pensar em:

ö Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, o sentido em seu

trabalho e desenvolver a capacidade de auto-regulação de suas ações práticas, avaliando-as

conceitualmente.

ö Estabelecer um contrato didático com os professores legitimando a relação com

o saber.

ö Oferecer opções de projetos para eles realizarem – a escolha do professor

acontece em função se seu conhecimento prévio (o que está mais próximo dele).

ö Favorecer a definição de um projeto pessoal do professor.

Em um programa de formação continuada os formadores dispõem de tempo para

conhecer as representações das práticas sociais do grupo que irá trabalhar, o que lhe

possibilita ajustar os dilemas e o projeto de formação às possibilidades de aprendizagem

dos participantes. Há uma perspectiva promissora em disparar um desejo pelo saber neste

grupo, pois os dilemas lançados consideram as competências atuais do professor,

colocando-o para pensar e tentar responder aos dilemas, apesar da dificuldade ou medo.

Ensinar é reforçar a decisão de aprender, sem agir como se ela estivesse tomada de uma vez

por todas. É não encerrar o aluno em uma concepção do ser sensato e responsável, que não

convém nem mesmo à maior parte dos adultos.

Ao professor é atribuído o importante papel de mediador, facilitador do processo de

aprendizagem, isto é, o de criar as condições necessárias e adequadas de exposição e

apropriação do conhecimento pelos alunos. O papel do professor não será menos

importante do que era no passado, mas implicará maiores responsabilidades :

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1. Organizar e dirigir situaçôes de aprendizagem

Conhecer, para determinada disciplina, os conteùdos a serem ensinados e sua

tradução em objetivos de aprendizagem

Trabalhar a partir das representações dos alunos

Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à aprendizagem

Construir e planejar dispositivos e seqüências didáticas

Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos de conhecimento

2. Administrar a progressão das aprendizagens

Conceber e administrar situaçôes-problema ajustadas ao nível e às possibilidades

dos alunos

Adquirir uma visão longitudinal dos objetivos do ensino

Estabelecer laços com as teorias subjacentes às atividades de aprendizagem

Observar e avaliar os alunos em situações de aprendizagem, de acordo com uma

abordagem formativa

Fazer balanços periódicos de competências e tomar decisões de progressão

Rumo a ciclos de aprendizagem

3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação

Administrar a heterogeneidade no âmbito de uma turma

Abrir, ampliar a gestão de classe para um espaço mais vasto

Fomecer apoio integrado, trabalhar com alunos portadores de grandes dificuldades

Desenvolver a cooperação entre os alunos e certas formas simples de ensino mútuo

Uma dupla construção

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4. Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho

Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, o sentido do trabalho

escolar e desenvolver na criança a capacidade de auto-avaliação

Instituir um conselho de alunos e negociar com eles diversos tipos de regras e de

contratos

Oferecer atividades opcionais de formação

Favorecer a definição de um projeto pessoal do aluno

5. Trabalhar em equipe

Elaborar um projeto em equipe, representações comuns

Dirigir um grupo de trabalho, conduzir reuniões

Formar e renovar uma equipe pedagógica

Enfrentar e analisar em conjunto situações complexas, práticas e problemas

profissionais

Administrar crises ou conflitos interpessoais

6. Participar da administração da escola

Elaborar, negociar um projeto da instituição

Administrar os recursos da escola

Coordenar, dirigir uma escola com todos os seus parceiros

Organizar e fazer evoluir, no âmbito da escola, a participação dos alunos

Competências para trabalhar em ciclos de aprendizagem

7. Informar e envolver os pais

Dirigir reuniões de informação e de debate

Fazer entrevistas

Envolver os pais na construção dos saberes

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8. Utilizar novas tecnologias

A informática na escola : uma disciplina como qualquer outra, um savoir-faire ou

um simples meio de ensino ?

Utilizar editores de texto

Explorar as potencialidades didáticas dos programas em relação aos objetivos do

ensino

Comunicar-se à distância por meio da telemática

Utilizar as ferramentas multimídia no ensino

Competências fundamentadas em uma cultura tecnológica

9. Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão

Prevenir a violência na escola e fora dela

Lutar contra os preconceitos e as discriminações sexuais, étnicas e sociais

Participar da criação de regras de vida comum referentes à disciplina na escola, às

sanções e à apreciação da conduta

Analisar a relação pedagógica, a autoridade e a comunicação em aula

Desenvolver o senso de responsabilidade, a solidariedade e o sentimento de justiça

Dilemas e competências

10. Administrar sua própria formação continua

Saber explicitar as próprias práticas

Estabelecer seu próprio balanço de competências e seu programa pessoal de

formação continua

Negociar um projeto de formação comum com os colegas (equipe, escola, rede)

Envolver-se em tarefas em escala de uma ordem de ensino ou do sistema educativo

Acolher a formação dos colegas e participar dela

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Ser agente do sistema de formação continua

Conclusão : A caminho de uma nova profissão ?

Um exercício estranho

Duas profissões em uma ?

Profissionalizar-se sozinho ?

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CAPÍTULO III

A prática como objeto de refexão na Formação

de Professores

"De onde provém o conhecimento?".

Do objeto, sem nenhuma interferência do sujeito? Ou é produzido no

sujeito que encontra em si próprio os critérios de validade?"".

(Sônia Kramer)

A formação do professor vem passando por mudanças de concepção nas duas

últimas décadas. A década de 90 é um palco de pontos comuns da tentativa de se construir

referenciais mais voltados para a formação continuada. Encara-se a formação como um

processo permanente, integrado no dia-a-dia dos professores e das escolas, constituindo

também um novo conceito de instituição escolar. Define-se assim, uma territorialidade

própria onde a autonomia, a responsabilidade e a identidade do professor demarcam novos

tempos e espaços. Os professores assumem um papel ativo, protagonistas de sua formação

na concepção, acompanhamento, regulação e avaliação. Poderíamos caracterizar esse

momento vivido na formação de professores como um processo no qual a identificação dos

problemas vividos alavanca as possibilidades de solução elaboradas pelos próprios sujeitos.

Trata-se, nesse caso, de um contexto em que a metacognição direciona o aspecto formador.

A definição de novos tempos e espaços formadores se concretiza em conquista de

tempos coletivos nas redes de ensino, espaços intencionalmente voltados para se pensar

coletivamente as práticas, os planejamentos, as situações vividas. Convive-se com reuniões

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semanais de ciclos, de séries, seminários semestrais e anuais, perspectivas interdisciplinares

de discussão, tempos anteriormente não contemplados na estrutura do tempo de trabalho do

professor. A nova concepção evidencia na assunção desse tempo como necessário à prática

profissional, novos espaços de formação. Por outro lado, quando esse tempo espaço ainda

não está formalizado, percebe-se a sua necessidade.

Outra grande característica dessa década na formação dos professores é uma

tentativa de articulação entre a vida social e a vida profissional, valorizando a construção da

identidade do profissional reflexivo. Sendo assim, os papéis que o sujeito representa na

vida cotidiana não se descolam, mas se entretecem nos fios no tecido, onde a prática e a

reflexão sobre ela, funcionam como a linha e o risco do bordado.

Segundo Nóvoa (1992) a mudança é de uma formação por catálogos, para uma

reflexão na prática, sobre a prática. Trata-se de um exercício vital, na medida que tem uma

dimensão interiorizada que exterioriza o olhar do autor sobre um fazer/refazer da prática

cotidiana.

Não se trata de uma reflexão sobre a prática...dos outros; mas de uma reflexão sobre

a prática, na prática. A autoria do professor alimenta a revelação de sua identidade

profissional. Uma identidade de dimensões pessoais e sociais.

Trata-se de pensar o fazer cotidiano, que coloca o saber sobre a vida na escola como

algo de extrema relevância para aqueles que vivem, encontram dificuldades, procuram

solucioná-las. Desenvolve-se um olhar retrospectivo, que traz à tona representações

múltiplas. SCHON(1992), e PÉREZ GÓMES(1992) ao concordarem com Nóvoa, ressaltam

a diferença de concepção de uma racionalidade técnica, herdada do positivismo, onde se

reforça a atividade instrumental, onde os princípios gerais e conhecimentos científicos

derivados da investigação externa ao profissional e à sua vivência deveriam orientar o

enfrentamento de problemas práticos, para uma racionalidade prática – reflexão na ação. A

redução da racionalidade prática a uma mera racionalidade instrumental acabou

contribuindo para que se aceitasse a definição externa à prática.

Reforçou também a hierarquia entre a produção de conhecimentos vinculada à

pesquisa daqueles autorizados à realização da pesquisa. Naquelas circunstâncias o

profissional envolvido perdia grande parte de sua possibilidade de autoria, o que dificultava

a construção de sua identidade profissional e mesmo a condição de tentar identificar

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soluções para os problemas enfrentados. Com o movimento que tenta superar esse enfoque

emerge uma concepção de formação do professor como um profissional reflexivo.

3.1 O dilema da ordem

É impossível estar preparado para tudo que pode acontecer numa classe. No campo

do saber, o professor pode encontrar-se nos limites daquilo que ele domina, pelo menos se

ele cria situações didáticas de riscos. Na ordem das relações intersubjetivas e das dinâmicas

de grupos, é absolutamente impossível prever tudo, salvo se for exercida uma repreensão

feroz. Sintetizando, nos encontramos, então, diante de duas estratégias igualmente

inconfessáveis. A primeira consiste em delimitar os conteúdos e as tarefas, as relações e as

regras do jogo de tal modo que nenhum imprevisto possa acontecer :

A diretora insiste muito para que tenhamos uma maneira de trabalhar muito

rigorosa, nunca com hesitação, com nenhum projeto que aborte… Por exemplo, durante um

curso, que não seja permitido que um anjo passe, que não seja dado tempo para que um

anjo passe, quatro ou cinco alunos que estão sobre a mesa… ou de pé sobre a cadeira ou de

pé na classe. O barulho, a agitação ou a bagunça ou a desordem começam muito rápido, se

um anjo passa. Eu, com a experiência que tenho, é preciso… quando o professor põe o pé

na sua classe, é preciso que o seu curso seja muito rigorosamente estruturado, que ele saiba

do primeiro até o último minuto aquilo que vai fazer. Se o curso termina cinco minutos

antes do fim da hora, eu tenho sempre um jogo para os ocupar de maneira agradável, até o

último minuto, porque se eles não estão ocupados até tocar o sinal do fim da aula, haverá

desordem. Não se pode esperar que este tipo de aluno vá permanecer calmo e se a gente diz

para eles : terminei minha aula, podem fazer o que quiserem nos cinco minutos restantes…

Ah não ! eu jamais vi os alunos ficarem calmos cinco minutos se eles não estiverem

ocupados pelo professor (fragmento de uma entrevista recolhida e relatada por Derouet,

1988).

Não permito que um anjo passe ! Não pode acontecer a menor falha que

desestabilize o sistema didático e a relação pedagógica. Com exceção das classes em que

reina uma harmonia preestabelecida, em que os alunos são preparados de antemão para a

causa do ensino, o controle social sem falha supõe uma violência simbólica considerável e

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um grande fechamento à vida para a diversidade de pessoas. Ninguém exporia com orgulho

o fato de que aferrolhar tudo para não ser tomado de surpresa, nem correr o risco de perder

o controle ou o poder.

A alternativa, evidentemente, é deixar que as coisas aconteçam e enfrentar os

acontecimentos da melhor forma possível, sabendo, nesse caso, que seremos regularmente

levados a ficar de lado não por incompetência, mas porque é difícil entender e decidir

constantemente de forma positiva diante do imprevisto. Quando um comediante improvisa

a partir de frases ou palavras que recolhe no momento junto aos espectadores, sua

perfórmance é admirada e alguns improvisos menos convincentes são perdoados. Com o

professor o contrato não é o mesmo : a família, os alunos, os colegas, a inspeção lhe

relembram a imagem de alguém que é considerado sabedor daquilo que faz. Imaginem, por

exemplo, um professor estagiário ou mesmo um professor mais experiente que, observado

por um formador ou um inspetor, assume sem hesitação o risco de uma tentativa de projeto

ou de uma situação aberta ; se ela dura pouco, dirá tranqüilamente que o sucesso nunca é

garantido, que o importante é tentar, que amanhã será melhor ? Não se poderia fixar tal

serenidade sem uma identidade, uma solidez e um domínio que se situam acima da média.

Poderia ser adiantada voluntariamente a hipótese de que certos professores estão

sempre do lado da radicalização ; outros estão do lado da improvisação com altos riscos,

mas a maioria oscila entre essas duas posturas, conforme os momentos da semana ou do

ano, os vôos, as partes do programa, o clima. Não é fácil uma imagem pública dar conta

dessas oscilações sem correr o risco de parecer incompetente. As duas estratégias levam o

professor a se sentir vulnerável : uma atitude tradicional, frontal, rígida, parece hoje voltar

as costas às pedagogias do projeto e à diferenciação de ensino ; diremos que ela não leva

em conta a realidade dos alunos, que fabrica o fracasso e a exclusão. Ao mesmo tempo, as

famílias e a opinião pública persistem em esperar dos professores atitudes ortodoxas, uma

planificação precisa de aprendizagem, uma autoridade sem falha. Como se fosse difícil

aceitar a parte de desordem, de negociação, de oportunismo indissociável das pedagogias

abertas (Perrenoud, 1994 a ; 1995 a).

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3.2 A parte da bricolage

Fazer milagres com aquilo que está ao alcance da mão suscita admiração se

falarmos de Robinson Crusoé ou de um faz-tudo genial. Os profissionais são, ao contrário,

considerados pessoas que dispõem dos instrumentos adequados para cumprir sua tarefa. O

que pensaríamos de um dentista ou de um cirurgião que procura, com um brilho de

excitação no olhar, um instrumento que lhe permitiria realizar bem feito seu trabalho. Ele

diz, ao contrário, à instrumentadora : Passe-me a pinça de Perkins nº 4. O professor não tem

uma instrumentadora. No entanto, espera-se também que ele tenha ao alcance da mão,

quase sempre, os meios de ensino e de avaliação que a ele convêm. Aqui também, duas

estratégias se apresentam :

• uma é se limitar a dar seus cursos utilizando os manuais padronizados, virando

as páginas no texto do saber, realizando os exercícios previstos ; esta maneira de fazer

convém para certas classes, mas provoca o fracasso entre muitas outras, porque o nível dos

alunos e sua relação com o saber não corresponde ao que imaginaram os autores dos

manuais que trabalham a partir de programas e de uma transposição didática satisfatória

para o espírito, mas que trabalham ligados a um tema epistêmico abstrato mais do que às

imposições da realidade, pela diversidade dos alunos, das condições de trabalho e de meio

ambiente institucionais e sociais (Perrenoud, 1993c) ;

• a outra estratégia, por sua vez imposta pela realidade das classes, é a de tornar

mais leves os programas (Perrenoud, 1990) ; de utilizar de maneira pragmática, ou às vezes

até oportunista, toda a sorte de meios de ensino. A coerência didática desses meios não é,

então, a principal preocupação do professor, que está sobrecarregado com outras

prioridades.

Colocar simplesmente o problema é correr o risco de parecer pouco criativo,

funcionário conformista, franco atirador, desejoso de reinventar a roda para seu prazer… O

verdadeiro profissional é aquele que reconhece os dilemas e aceita não poder responder

simplesmente ou uma vez por todos. É também aceitar se expor ao julgamento crítico

daqueles que consideram a dúvida uma fraqueza de caráter ou um sinal de incompetência…

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3.3 A solidão ambígua

Profissão individualista, dizem. O professor pode fazer o que quer uma vez fechada

a porta da sua classe. Será isso verdade e tão satisfatório quanto é dito ? Tanto não é uma

maneira de se proteger quanto uma aspiração a uma total autonomia ? O professor faz o

que quer tanto mais facilmente quanto quer, grosso modo, que a instituição e a sociedade

lhe prescrevem.

Paradoxalmente, o conformismo que os domina é dificilmente confessável. Quando

se está formado no bac+5 (bacharelado seguido de cinco anos de estudos universitários),

como não pretender ser um prático autônomo e criativo ? Cada professor deve-se dizer

Escuta a diferença e sugerir que não é nenhum agente anônimo de uma vasta máquina

burocrática, mas, ao contrário, um artesão, um artista independente. Ao mesmo tempo, seria

perigoso expor com tanta clareza os desvios precisos, identificáveis. Os professores que

pretendem fazer o que querem se resguardam de descrever mais concretamente suas

práticas. A administração lhes permite isso. Ela pode fechar os olhos por longo tempo

quanto a isso sem ser interpelada pelos usuários que apontam sobre desvios tangíveis no

programa, nas regras deontológicas, nos processos de avaliação.

A solidão da profissão docente aparece freqüentemente como escolhida e assumida

condição de autonomia, de criatividade ou de eficácia. Essa representação é reforçada por

aqueles que falam de seu ceticismo ou de suas reticências frente ao trabalho em equipe

pedagógica e geralmente a qualquer forma um pouco intensiva de cooperação profissional.

Como não ver que essas afirmações escondem também a refutação do confronto com os

outros, o temor de ter de se engajar mais no trabalho, de ser levado a mudar sua prática sob

a influência dos outros, o sentimento de que não será capaz de preservar sua identidade.

Trabalhar junto, numa profissão humana, é, já disse, " partilhar sua parte da loucura "

(Perrenoud, 1994 c). Fórmula certamente exagerada, se tomarmos loucura em sentido mais

pleno, mas que enfatiza que a relação pedagógica e a gestão de classe engajam

profundamente a pessoa do professor no que ele tem de mais íntimo, no que concerne à sua

identidade, à sua maneira de ser no mundo, a seus valores e atitudes menos negociáveis ou

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justificáveis em nome da razão. Gostos e cores, dizemos, não se discutem. Resta admitir

que numa prática profissional também existem gostos e cores !

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3.4 O aborrecimento e a rotina

" Será que eu vou morrer em pé, diante de um quadro-negro, com um giz na mão ?

" Essa frase de Huberman (1989) resume a interrogação que domina uma parte dos

professores engajados depois de dez anos ou mais no ciclo da vida profissional. Durante os

primeiros anos , o professor não se aborrece , ocupado demais em fazer " andar " as

classes em que atua. Após alguns anos mais tranqüilos, pode, para apimentar um pouco a

vida profissional, engajar-se num projeto da escola ou em alguma inovação. Também se

cansa e chega o momento em que o aborrecimento espreita, em que não se tem mais

energia e fé suficientes para remover montanhas.

É claro, alguns escapam às regularidades do ciclo de vida profissional e vivem uma

aventura pedagógica a cada instante. Acontece que a condição de professor média condena

a uma grande repetição. Sem dúvida, há rotina nas profissões, mesmo nas mais

qualificadas. No momento, na quadragésima consulta insignificante da semana, mais de um

médico se pergunta, sem dúvida, por que ele fez tantos anos de estudos para tratar de gripes

e reumatismos. Ao menos terá cada semana um problema novo a resolver, que mobilizará

toda sua sagacidade. Com os professores ocorre algo diferente ? Para que um problema

inédito seja fonte de renovação e de gratificação, é preciso estar pronto para acolhê-lo e

tratá-lo com curiosidade e seriedade. Numa classe, se o professor abrir bem os olhos, os

desafios não faltam. Também é necessário relevá-los, que valha a pena. Ora, a estrutura -

programas, horários, cursos segmentados, recortes disciplinares - leva antes a não provocar

senão os problemas passíveis de educação.

Um professor lúcido vive com um vago sentimento de remorso : ele sabe que a

situação de certos alunos não é desesperadora, que bastaria… Ora, com 25-30 alunos, um

programa longo, algumas horas espalhadas na semana para cada disciplina, outras classes

para o professor secundário, outras tarefas para o professor primário, não dá para sonhar.

Certo, um médico de cidade não pode administrar sozinho todo um hospital. Pelo menos

pode, se diagnostica casos que não estão ao seu alcance, enviá-los a outros profissionais.

Ele pode escolher os meios para tratar convenientemente os problemas da sua área. Ao

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contrário, a estrutura da profissão obriga os professores a se ocuparem de tudo um pouco e

de nada a fundo. O professor é um trocador de pratos, tão ocupado em correr de um para o

outro, que não pode se interessar longa e seriamente por cada um em particular.

O sentimento de rotina não está, pois, ligado à pobreza de problemas ; ela provém

de uma organização do trabalho que não permite realmente senão tratar dos problemas

padronizados e condena-o a viver com os outros, habitado pelo vago, mas desagradável

sentimento de que poderia fazer algo de bom se…

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3.5 A Inconfessável distância

A distância vai crescendo entre as normas dos especialistas e o que se pode fazer

verdadeiramente numa classe normal. Quanto mais os conhecimentos científicos se

desenvolvem sobre as situações de aprendizagem e de ensino, mais os professores são

condenados a atuar tendo a consciência de sua ignorância. Ensinar a subtração ou a

pontuação era, trinta anos atrás, um trabalho de bom senso pedagógico : o professor devia

saber corretamente subtrair ou pontuar e ser capaz de explicar claramente as regras e

técnicas elementares. Por que se tentou saber mais, além da curiosidade dos pesquisadores

? Porque essas operações aparentemente simples permanecem por longa duração e, por

vezes, definitivamente vagas para uma parte dos alunos ! Para ensinar a subtração ou a

pontuação àqueles que resistem a essas aprendizagens, é necessário compreender muito

melhor o que se passa - ou não - no seu espírito, em que consistem exatamente as operações

mentais visadas e como elas se constroem. A didática das disciplinas a esse respeito fez

bastante progresso para que seja difícil conservar essa ingenuidade (Develay, 1991, 1995 ;

Astolfi, 1992).

Nenhum profissional pretenderia estar a par de todos os desenvolvimentos de sua

arte. Existe, necessariamente, uma distância entre a pesquisa e a prática. Mas, no campo

didático e pedagógico, mudam-se os paradigmas, o cenário (Meirieu, 1989) ; já não é mais

suficiente dominar os conteúdos e a comunicação pedagógica ; é preciso assimilar muito a

psicologia cognitiva e a psicolingüística para saber, por exemplo, por quais operações se

produz um texto escrito de tal ou tal tipo e como se consegue o seu domínio. Nós vivemos

uma fase de crescimento da distância : uma parte das aquisições das ciências sociais e

humanas são recentes e não foram integradas na bagagem dos professores em exercício,

seja porque não estavam estabelecidas no momento de sua formação inicial, há dez, vinte

ou trinta anos, seja porque esses aportes foram por longo tempo ignorados (ou seja, o são

ainda !) pelos programas de formação inicial dos docentes.

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Além do mais, as redefinições do papel profissional colocam uma parte dos

docentes no caminho errado : suas razões de escolher esta profissão e suas competências

não coincidem mais com as novas exigências. Trata-se, agora, de dialogar, ou seja, de

negociar com os alunos, as famílias, as comunidades locais ; de desenvolver os projetos dos

estabelecimentos ; de trabalhar em equipe pedagógica ; de cooperar com outros

especialistas (psicólogos, assistentes sociais, médicos de prevenção, por exemplo). Tudo

isso não fazia parte do contrato inicial. A partir de agora, visa-se a uma outra cultura

profissional, a uma outra relação de mudança, a uma outra responsabilidade na escola

(Gather Thurler, 1993 ; 1994 a e b).

Na hierarquia da sala de aula, a distância aumentou igualmente entre o que um

docente médio sabe fazer e aquilo que se espera que ele saiba fazer. Por exemplo, construir

seqüências didáticas rigorosas e situações de aprendizagem que atinjam o aluno na sua zona

aproximada de desenvolvimento ; diferenciar sua ação pedagógica ; individualizar o

percurso de sua formação ; praticar uma observação formativa ; desenvolver métodos ativos

e atitudes cooperativas ; reforçar ou suscitar um projeto pessoal no aluno ; trabalhar sobre o

valor do trabalho escolar, das situações, dos saberes ; fazer da classe uma sociedade

multiétnica baseada na tolerância ; gerir a diversidade das culturas ou simplesmente das

famílias (Huberman, 1988 ; Perrenoud, 1995 a).

Ninguém usaria todas essas belas idéias ao pé da letra, e menos ainda as colocaria

em prática todos os dias. No entanto, hoje já não podemos mais ignorá-las como supérfluas.

De algumas utopias trazidas pelo movimento da Escola Nova no início do século, a

evolução da sociedade torna progressivamente uma necessidade. Se queremos levar 80% de

uma geração ao nível do Bac e preparar os jovens para a sociedade que os espera, o sistema

educativo não tem mais a escolha : a diferenciação do ensino ou a coexistência de culturas

devem ser as verdadeiras prioridades.

Nesse movimento, como confessar tranqüilamente : não sabemos fazer ou não se

está no ensino para isso ?

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3.6 A liberdade sem a responsabilidade

Caracterizada por um estado de semiprofissionalização (Perrenoud, 1994 b, 1994 f),

a profissão docente navega entre o respeito escrupuloso das determinações da instituição

(horários, programas, modalidades de avaliação, métodos didáticos) e a busca da

autonomia. A primeira postura libera a responsabilidade individual dos professores ; a

segunda contenta-se freqüentemente com aquilo que chamei uma " autonomia de

contrabando ", nas margens ou nos interstícios da instituição.

Os professores têm, em geral, dificuldade em explicar claramente a quem, na

realidade, prestam contas. À sua hierarquia ? Pareceria que se inclinam diante da inspeção e

do enquadramento. Aos seus alunos ? Eles seriam considerados ingênuos demagogos. Aos

familiares dos alunos ? Pareceriam estar favorecendo os usuários da escola mais ativos ou

mais elitizados. A seus colegas ? Quem acreditaria nele, tendo em vista o individualismo e

o respeito mútuo dos grupos que predominam nos estabelecimentos. À sua própria

consciência ? Sem dúvida, mas isso é suficiente ?

Do mesmo modo, fica bem difícil dar uma imagem nítida do tempo de trabalho dos

professores fora das suas horas de classe. Para manter o status quo, dito de outra forma, a

ausência de controle sobre seu tempo de preparação e de formação necessita de uma certa

obscuridade.

Há um black-out, igualmente, quanto à maneira pela qual os professores cooperam

com seus colegas, tratam os familiares dos alunos, negociam com os seus alunos,

administram sua formação continuada. Sobre todos esses pontos, a imprecisão artística é

globalmente protetora, a despeito dos preconceitos que não nos permitem desmentir

formalmente. Não nos interessa se alguns professores trabalham menos que os outros ; se

são intocáveis segundo o código penal ; se não atualizam seus conhecimentos didáticos ou

científicos ; ou se têm uma interpretação oportunista dos programas. Cada uma dessas

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afirmações provocará virtuosos protestos ou categóricos desmentidos, mas sem dados

precisos.

Sob esse ângulo, os professores não se empenham em se tornar visíveis porque, no

estado presente da profissionalização da sua profissão, eles são tentados a jogar dos dois

lados, de proteger sua liberdade sem se expor, em contrapartida, a uma verdadeira

avaliação. Cada ator social sonha, é claro, em desfrutar uma liberdade total com uma

impunidade total… E cada categoria profissional tem interesse em projetar uma cortina de

fumaça. A tecida pelos professores é muito densa.

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CAPÍTULO IV

Modelos de Organização da Formação Profissional

A discussão da formação de professores , tem assentado frequentemente no

problema dos modelos de organização da formação. Os pressupostos ideológicos da

formação são assim relegados para segundo plano. Desta forma, as implicações filosóficas

e políticas da formação são eclipsadas, sancionado-se os diversos contextos sociais e

educativos em que a formação ocorre. Alguns dos modelos de organização da formação

tem sido tomados como referência fundamentais neste domínio.

Formação Integrada. A formação integra componentes científicas e pedagógicas.

Existem muitas modalidades deste modelo. Predominou na formação de professores no

ensino secundário entre 1901 e 1930.

Formação Sequêncial. Variante da formação integrada. A formação científica

surge separada da formação pedagógica, embora esta seja dada na sua sequência.

Formação Dual. A formação científica e a formação pedagógica são encaradas

duas formações distintas, podendo ocorrer em momentos muito desfasados. Este modelo

predominou na formação dos professores do ensino secundário .

Formação em Exercício. Destinada a professores em exercício, a formação

pedagógica é feita nas próprias escolas, possibilitando uma articulação entre a teoria e a

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prática. Este modelo foi institucionalizado na formação dos professores no ensino

preparatório e secundário .

Formação em Serviço. Variante da formação formação em exercício. A formação

neste caso é realizada numa instituição superior.

A leitura meramente administrativa que tem sido feita destes modelos, tem omitido

as suas implicações filosóficas e políticas.

CAPÍTULO V

Qual o Melhor Meio?

Qual será o melhor meio de ensino? A exposição oral? O quadro ? O livro de textos

? O computador ? Existem muitas ideias feitas sobre o assunto. A exposição oral é hoje

identificada como um meio arcaico de ensino. Os recursos audiovisuais são já encarados

como uma solução de recurso, quando são comparados com os miraculosos prodígios

atribuídos ao ensino pela Internet.

Desde pelo menos o século XVI que a questão dos meios de ensino, provoca

crescentes e apaixonadas discussões. O peso crescente das tecnologias na sociedade não

explica tudo. O que está em jogo é de outra natureza, trata-se de descobrir o meio de ensino

que permita:

- Incrementar a qualidade do ensino que é oferecida aos alunos;

- Reduzir os custos do ensino que é prestado;

- Facilitar o acesso à educação da maioria dos indivíduos;

- Promover o desenvolvimento de novos elementos currículares.

Os meios utilizados na educação, ao longos dos tempos, tem suscitado posições

muito contraditórias. Juana M.Sancho Gil, partindo da relação dos educadores e dos

pedagogos face às tecnologias caracterizou estas posições em termos de tecnofília e

tecnofobia.

Os tecnofílicos sempre que surge uma nova tecnologia (artefacto, sistema simbólico

ou organizativo), descobrem logo uma nova solução para os problemas do ensino ou

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mesmo da humanidade. Os tecnofobos, pelo contrário, descobrem um novo meio de

alienação. Qualquer tecnologia que não seja a que se habituaram a usar desde pequenos, e

que não faça já parte integrante das suas vidas, representa um perigo para os valores que

compartilham na sociedade.

Ao longo da história da educação podemos encontrar inúmeras posições tecnofilicas

e tecnofobas, face às mesmas tecnologias.

Platão, no Fedro, desfazendo o pretenso carácter neutral das tecnologias, sustenta

que o uso da escrita conduziu os homens a desvalorizarem o exercício da memória,

passando a confiarem em algo que lhes é exterior, a escrita. Aquilo que para Platão era um

mal, foi encarado por outros como a libertação das limitações da memória dos indivíduos,

permitindo enormes avanços na acumulação e expansão do conhecimento.

A invenção da imprensa (1453), foi vista por muitos educadores como uma ameaça,

na medida que ao embaretecer o preço dos livros, facilitava o acesso ao saber. Ora, se o

aluno podia ler nos livros o que era ensinado pelos educadores, mais dia menos dia, estes

seriam dispensados. Nem todos pensavam da mesma maneira. Muitos viram na difusão dos

livros a libertação dos educadores das tarefas mais penosas e rotineiras de transmissão dos

saberes. A partir de 1820, um grande número de teóricos da educação descobriram na

própria produção massiva de livros a baixo custo e de ampla distribuição, um poderoso

meio de incrementar o progresso da humanidade.

O aparecimento do cinema e depois da rádio, despertou igualmente paixões

contraditórias. Para alguns não passavam de novos meios de diversão e alienação, cuja

única finalidade era o embrutecimento de largas massas da população. Os tecnofílicos,

como sempre, deliraram com estas inovações. Thomas Edison, em 1922, afirmava que o

cinema estava destinado a revolucionar o sistema educativo, e em poucos anos iria

substituir os livros. Dez anos depois, Darrow, apregoava que a educação pela rádio iria,

universalizar o acesso aos melhores professores.

A expansão da televisão, iniciada após a IIª. Guerra Mundial, desencadeou

igualmente posições contraditórias . Polémica aliás que persiste com grande vivacidade.

A difusão dos computadores pessoais e dos CD-ROM, na década de oitenta, e

depois da Internet nos anos noventa, foi acompanhada pela produção duma profusa

literatura a favor ou contra o seu emprego no ensino.

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Os tecnofílicos, tem insistido na ideia que estas tecnologias permitiram pela

primeira vez, numa escala anteriormente impensável, personalizar o ensino, contemplar

diferentes ritmos de aprendizagem, potenciar o desenvolvimento das capacidades de auto-

expressão do alunos, para além de lhes alargar os horizontes de informação a uma escala

planetária. Tudo isto num ambiente que pode ser muito divertido.

Os tecnofobos, denunciam por seu lado, o carácter repetitivo e superficial deste tipo

de ensino, onde frequentemente apenas se valoriza a diversão em detrimento da reflexão.

Ao individualizar a pesquisa e o processamento da informação, está igualmente a contribuir

para isolar os indivíduos. O resultado não foi a criação de uma sociedade de informação,

mas uma sociedade de multidões solitárias sequiosas de conhecimento.

Não é fácil decidir quem tem razão. Uma coisa não nos podemos esquecer: o

ambiente tecnológico em que se processa hoje o ensino, não tem paralelo com o passado.

As tecnologias de informação e comunicação deixaram de ser do domínio da ficção

científica, para se tornarem no suporte da maioria das actividades sociais e económicas. É-

nos impossivel imaginar a complexidade actual das nossas sociedades sem o recurso

sistemático a estas tecnologias. Razão que só por si justifica uma reflexão sobre o assunto

de todos os intervenientes no sistema de ensino. A escola não pode alhear-se da sociedade

em que está inserida, sob pena de não cumprir a sua missão.

A nossa questão inicial mantém-se em aberto: - Qual é o melhor meio de ensino?

As pesquisas mundiais neste domínio, como refere Carlos Castano, são quase

unânimes em reconhecer que não existe um meio de ensino mais eficaz do qualquer outro.

A maioria dos objectivos educativos pode ser conseguida através da instrução ministrada

por qualquer meio, ou por uma variedade de meios. Apenas quando se introduz uma nova

tecnologia no ensino, é possível registar uma melhoria no rendimento dos alunos, mas que

raramente ultrapassa os 15%. Passada esta fase inícial, o rendimento obtido volta a

assemelhar-se ao conseguido com outros meios. Constata-se também que não existe uma

relação privilegiada entre os meios de ensino e os diferentes tipos de tarefas de

aprendizagem. A maioria dos meios pode ser utilizada de uma maneira eficaz para

apresentar a informação dos mais distintos tipos de aprendizagem.

Estas constatações, embora não corroborem as teses dos tecnofilicos, também não

sustentam a posição de princípio dos tecnofobos. O que elas revelam é que a relação

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pedagógica não pode ser encarada como mera uma relação mecânica entre professor e o

aluno. Ela é uma criação que ambos constroem, e cujo resultado final depende muitissimo

mais do seu empenho e cooperação, do que das técnicas ou tecnologias empregues.

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CAPÍTULO VI

O Ciclo de vida dos Professores

- Será que existem fases no ensino?

- Que imagem os professores têm de si?

- Como a competência se desenvolve?

Estas são apenas três de muitas perguntas que suscitam outras milhares de

perguntas. O importante é – segundo Huberman – conservar a curiosidade viva.

Logo, a partir destas perguntas o autor irá estruturar as tendências gerais do ciclo da

vida dos professores. Deixa claro, antes de tudo, alguns pontos. Dentre estes o fato de que

estudos empíricos podem ser aplicados a uma maioria, mas nunca a uma totalidade.

Segundo, a questão de que algumas pessoas podem passar mais rápido, mais lento ou até

não passar por determinada fase. O terceiro referente ao conceito de carreira, visto –

obviamente – de modo mais restrito que vida, e, que além disso, deve ser vista como um

processo em si e não como uma série de acontecimentos aleatórios.

Tendo isto em vista, Huberman parte para a estruturação das fases da carreira

docente, dividindo-as da seguinte maneira:

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6.1 Fase de Entrada na Carreira

Apesar das diversas motivações esta fase apresenta-se de forma bastante

homogênea. Está fundamentada em dois pontos básicos; o primeiro seria o da

sobrevivência ligado ao choque com real; o confronto com a complexidade da situação

profissional; a percepção da distância entre os ideais e a realidade e a fragmentação do

trabalho – que diz respeito as situações críticas enfrentadas nas relações pedagógicas e com

relação à transmissão de conhecimentos. O segundo seria o da descoberta traduzindo o

entusiasmo dos iniciantes; a experimentação; a exaltação em lidar com a situações de

responsabilidade; o sentimento de pertencer à um grupo de docentes. Estes dois aspectos

são vividos em paralelo, e, é o segundo que permite a vivência do primeiro.

Encontra-se também nesta fase o que Huberman ressalta como exploração –

sistemática ou aleatória, fácil ou problemática, etc. – seria caracterizado pela investigação,

ou talvez a experimentação, o que para o docente iniciante estaria limitada aos poucos

estabelecimentos, às suas turmas, e, aos poucos papéis além do de professor responsável

por determinada classe. É nesta fase que a pessoa irá medir as conseqüências de um

comprometimento definitivo com a profissão.

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6.2 Fase da Estabilização

A fase da exploração ou das opções provisórias irão desembocar no estágio do

comprometimento definitivo a tomada de responsabilidades. É a fase da escolha da

identidade profissional, o momento de uma escolha subjetiva de comprometer-se

definitivamente e um ato administrativo – a nomeação oficial.

Concomitante ao momento da escolha, está presente a vivência do sentimento de

renúncia. No caso esta significaria abrir mão de todas as possibilidade. Está também

relacionada a transição da adolescência, em que tudo é possível, e o mundo é uma leque de

possibilidades; para a idade adulta, em que a necessidade de escolha urge, e com esta

surgem os compromissos carregados conseqüências e responsabilidade.

No que tange ao ensino, sua peculiaridade é o sentimento de pertencer – este

sentimento que aparece na fase de entrada na carreira se fortifica nesta Segunda fase

- e o de independência – caracterizado pela sensação de liberdade e emancipação. Por

isto mesmo, estabilizar aí significa acentuar seu grau de liberdade, as prerrogativas do

professor que se ajustam ao seu próprio funcionamento.

Já partindo de um parâmetro pedagógico a fase da estabilização tem como traço

característico o sentimento de competência pedagógica. Seria a sensação de confiança

associada a um descentramento, ou seja, o profissional passa a se preocupar mais com seus

objetivos didáticos do que consigo próprio. Sente mais ímpeto em enfrentar os desafios que

se apresentam. É a fase da consolidação e aperfeiçoamento de seu repertório – o encontro

com seu estilo.

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6.3 Fase da Diversificação

A partir desta fase os estudos já não são mais unívocos. Os percursos

individuais parecem divergir mais.

Todavia, pode-se dizer que a consolidação pedagógica levaria a uma tentativa de

garantir sua prestação e impacto na sala de aula. O professor nesta fase tende a se lançar em

uma pequena série de experiências, seja com o livro didático, modos de avaliação, etc.

Antes da estabilização, as incertezas tendiam a reprimir suas tentativas de diversificação, o

que não acontece nesta fase.

Dentre algumas teses, a ativista acredita que o desejo de maximizar a prestação,

levaria a uma maior consciência dos fatores em oposição, e, a efetivação desta

maximização à reformas mais conseqüentes – ataque as aberrações do sistemas.

Estes anseios de novos estímulos, novas idéias seria – implicitamente –

correspondente há um receio emergente de se cair na rotina.

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6.4 Fase de Pôr-se em Questão

Esta fase está solidamente inscrita nos estudos empíricos, mas revela-se difícil sua

apreensão. Contudo, Huberman chama atenção para o que chama de perfil-tipo,

caracterizado por um período em que as pessoas se põem em questão, mesmo sem saber

exatamente o que estão questionando.

Os sintomas variam de uma ligeira sensação de rotina até uma verdadeira crise

existencial. É a fase de múltiplas facetas o que torna difícil razão que dificulta uma

definição. Não se sabe ao certo o que leva há estes questionamentos, seja a monotonia na

sala de aula, os subseqüentes fracassos das experiências ou reformas estruturais, das quais o

docente participa. É a hora de fazer o balanço da carreira e encarar a hipótese, por vezes

com algum pânico, de se seguir outra carreira.

O “teor” destes questionamentos seria, por sua vez, mais elevado nos homens e

numa idade mais jovem. Já para as mulheres duraria menos tempo e estaria mais ligado aos

aspectos desagradáveis das condições de trabalho.

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6.5 Fase da Serenidade e Distanciamento Afetivo

Existem vários modos de se chegar a fase da serenidade, mas freqüentemente

está se dá na seqüência do questionamento. Huberman faz uso de um perfil-tipo para

caracterizar esta fase.

A característica fundamental, neste caso, seria um baixo nível de investimento e de

ambição, a contrariu sensu, a sensação de confiança e serenidade cresce. O professor tende

a se mostrar mais tolerante e mais espontâneo nas situações de sala de aula. É a

reconciliação do eu ideal com o eu real.

Outro aspecto importante desta fase é o distanciamento afetivo face aos alunos,

muitas vezes devido a diferença de gerações. Huberman usa alguns depoimentos de

professores:

“Agora, mantenho mais as distâncias. Passei a Ter uma compreensão mais lata das

coisas, ao mesmo que me tornei mais rigoroso face à sua conduta e ao seu trabalho” (p.272,

in: Huberman, p.43)

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6.6 Fase do Conservantismo e Lamentação

Huberman parte de uma amostra de Peterson, na qual os professores do ensino

secundário de 50-60 anos são caracterizados como particularmente resmungões (tradução

livre).

Os sintomas comuns desta fase seriam as diversas queixas sobre a evolução dos

alunos, atitude negativa para com a política educacional e com relação aos colegas de

trabalho mais jovens. O fato é que os problemas desta fase não aparecem de maneira tão

evidente. Os professores podem chegar a esta fase depois de um prolongado

questionamento face aos fracassos/sucessos no que diz respeito as reformas as quais se

opõe.

Além disto, pode ocorrer – contraditoriamente – de os professores mais

conservadores serem os mais jovem. Sobre esta relação de idade versus conservantismo, o

que fica claro, é que com a idade uma maior rigidez e dogmatismo aparecem com mais

força, adicionada uma maior resistência a inovações e uma certa nostalgia do passado.

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6.7 Fase do Desinvestimento

Esta é a fase da interiorizarão no final da carreira e está intrinsecamente ligada ao

fenômeno do recuo. O profissional passa a consagrar mais tempo para si próprio, aos seus

interesses exteriores à escola.

Huberman ressalta a falta de estudos empírico sobre esta fase, no entanto pode-se

dizer que no fim de carreira se supõe um desinvestimento progressivo. O docente começa a

vivenciar um descomprometimento (sic) progressivo. Assim, a exceção nesta fase de

desprendimento seria o enfoque que muitas vezes o professor dá para a importância de se

passar o testemunho para os mais jovens. Outra peculiaridade seria a focalização dada a

determinadas tarefas, turmas, etc.

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CONCLUSÃO

Utilizando os conceitos de Edgar Morin, podemos classificar a profissão de

professor como uma profissão complexa, onde a incerteza, a ambiguidade das funções são

o seu melhor traço definidor.

Para fazer face a esta dura realidade, o professor conta acima de tudo consigo

próprio, ele é, não apenas observador, como o ator insubstituível da relação pedagógica.

Contra a incerteza e as suas próprias carências, o conhecimento das "boas práticas" é neste

aspecto importante como referência teórica, mas é preciso dizê-lo que estas raramente são

transferíveis para outros contextos e outros atores.

É neste panorama complexo que hoje emerge o modelo dos "professores como

práticos reflexivos", os quais envolvidos num processo de construção e desconstrução de

saberes vão elaborando a sua própria concepção de profissão e das boas práticas.

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Diz-se muito em papel do professor como agente de transformação e mudança,

formador de caráter do espírito das novas gerações. Mas e ele o professor? Será que é

ouvido, será que tem sido trabalhado para isso? E o espaço para tal? Com que salários e

condições de trabalho convivem os professores? E que sistema educacional é esse que mais

parece “quebra-galho”, “tapa-buraco”, ou “operação remendo”, ficando a essência a

descoberto, não acudindo no ponto exato a situação? Papel político? O que pensa o

professor a respeito disso?

As reformas impostas precisam ser questionadas com embasamento, é preciso

buscar instrumentos que viabilizem passar para a ofensiva e criar um novo sentido ao papel

da formação e não consentir nessa submissão que a lógica de mercado impõe. Ir além do

conscientizar-se é na verdade um comprometimento, uma posição a ser criada do coletivo,

do grupo, do consenso para se refletir, repensar as metodologias e o processo da docência, é

não realizar práticas cegas. Ter sempre em mente o porquê e a quem vai beneficiar agir de

tal maneira. É criar uma contra-hegemonia, não por mera formalidade, mas visando a

construção de uma educação que contemple a classe trabalhadora e não esteja apenas a

serviço da classe dominante.

Também não se pode ignorar as transformações pelas quais o mundo passa.

Necessário se faz compreender o processo de globalização para levantar situações de

análise e busca da sintonia entre a instituição escola com outras organizações para resgatar

e construir uma sociedade menos injusta e mais democrática.

A pesquisa precisa ser resgatada para reduzir o distanciamento entre a ciência e a

cultura cotidiana.

Portanto, a formação é fundamental para desfazer o mito que se tem do educador

mero cumpridor de tarefas propostas pelo dia a dia. É preciso ter um educador ousado,

capaz de romper com as barreiras através de uma ação eficaz e efetiva, nunca desprezando

a discussão, a análise de problemas concretos da prática, utilizando para tal o bom senso;

fazendo um pouco do que o rio faz, ou seja, renovando constantemente suas águas.

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Bibliografia

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educação superior : Um estudo de caso .

ESPÍRITA , Brasil – Diretrizes para ensinar a criança , abril de 1971 .

MALPIGHI , Maria Thereza Galle – Assessora Pedagógica – Ih ! Não tô entendendo .

MARTIN , Tapweb Cíntia – Entrevista à Kátia Barão , agosto de 2000 .

MORRONE , Prof.ª Maria Lúcia – Projeto pedagógico : Processo e Produto na construção

coletiva do sucesso escolar – APASE – Suplemento Pedagógico .

PACHECO , José – Escola da Ponte , Vila das Aves .

POLITY , Elizabeth – Dificuldade de Ensinagem : que história é essa ? , Editora Vetor

editora Psico – Pedagógica Ltda , São Paulo , 2002 .

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ANEXOS

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I 14

Formação dos profissionais da Educação 14

CAPÍTULO II 20 Novas competências profissionais para ensinar 20

CAPÍTULO III 26 A prática como objeto de reflexão na Formação de Professores 26 3.1 O dilema da ordem 28

3.2 A parte da bricolage 30

3.3 A solidão ambígua 31

3.4 O aborrecimento e a rotina 33

3.5 A inconfessável distância 35

3.6 A liberdade sem a responsabilidade 37

CAPÍTULO IV 39 Modelos de organização da formação profissional 39

CAPÍTULO V 40 Qual o melhor meio ? 40

CAPÍTULO VI 44 O ciclo de vida dos professores 44

6.1 Fase de Entrada na carreira 45

6.2 Fase da Estabilização 46

6.3 Fase da Diversificação 47

6.4 Fase de Pôr-se em questão 48

6.5 Fase da Serenidade e distanciamento afetivo 49

6.6 Fase do Conservantismo e lamentações 50

6.7 Fase do Desenvestimento 51

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CONCLUSÃO 52

ANEXOS 54

BIBLIOGRAFIA 58

ÍNDICE 59