57
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE” O BRINCAR E SUA IMPORTÂNCIA NA VIDA DA CRIANÇA Por: Márcia de Santana Moura Professor Orientador: Luiz Claúdio Lopes Alves Rio de Janeiro Junho / 2003

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE … DE SANTANA MOURA.pdf · intrínseco , o jogo corresponde a um impulso natural da criança , e neste sentido , satisfaz uma necessidade

  • Upload
    tranthu

  • View
    213

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

O BRINCAR E SUA IMPORTÂNCIA

NA VIDA DA CRIANÇA

Por: Márcia de Santana Moura

Professor Orientador: Luiz Claúdio Lopes Alves

Rio de Janeiro

Junho / 2003

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS - GRADUAÇÃO “ LATO SENSU “

PROJETO VEZ DO MESTRE

PSICOPEDAGOGIA TURMA 482

O BRINCAR E SUA IMPORTÂNCIA

NA VIDA DA CRIANÇA

Objetivos:

A criança e o seu brincar fazem parte desse estudo.

Através de uma abordagem multidisciplinar

estaremos objetivando estabelecer uma relação entre

as brincadeiras e o cotidiano infantil.

3

AGRADECIMENTOS

Aos professores e alunos que muito contribuíram para

a realização desse trabalho , especialmente todos

aqueles que acreditam que brincadeira é coisa séria.

4

DEDICATÓRIA

À todas as crianças da sala de Ludoterapia

da Associação Fluminense de Reabilitação e aos

alunos da Escola Municipal Francisco M. Brandão.

5

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 6

CAPÍTULO I 8

BRINCADEIRA E COISA SÉRIA (O BRINCAR NO CONTEXTO ESCOLAR). 8

CAPÍTULO II 15

O JOGO E SUA IMPORTÂNCIA NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA. 15

CAPÍTULO III 26

BRINCADEIRAS POPULARES 26

CAPÍTULO IV 36

O BRINCAR E A TERAPIA 36

CONCLUSÃO 49

BIBLIOGRAFIA 51

ANEXOS 53

ÍNDICE 56

6

INTRODUÇÃO

Este trabalho surgiu da certeza de que no mundo da criança o espaço para o

brincar é indispensável. A brincadeira é uma parcela importante na vida da criança,

ela adquire experiência brincando. As experiências tanto interna quanto externa

podem ser férteis para o adulto mas para a criança essa riqueza encontra-se

principalmente na brincadeira e na fantasia.

Os adultos contribuem , neste ponto , pelo reconhecimento do grande lugar

que cabe à brincadeira e pelo ensino de brincadeiras tradicionais , mas sem obstruir

nem adulterar a iniciativa própria da criança.

O fundamento básico desse trabalho é acreditar que o brincar é requisito

indispensável para o crescimento e desenvolvimento de nossas crianças. Preservando

o elemento lúdico , tão importante para alimentar a sensibilidade da criança e

condição primordial do desenvolvimento humano, buscamos proporcionar vivências

em que jogos, brincadeiras desempenham função social.

No primeiro capítulo vamos verificar que brincadeira para criança é coisa

séria. E onde a criança passa boa parte do seu tempo ? na escola, logo a escola tem

que se transformar num ambiente onde ela possa se sentir feliz , onde ela possa

aprender brincando e gostar de brincar de aprender.

A escola não pode se transformar num local onde ela vai por obrigação.

Acreditamos que a obrigatoriedade dificulta sua aprendizagem . Ela tem que gostar

de aprender coisas novas , e essa aprendizagem tem que ser algo natural, como então

articular o currículo escolar com o cotidiano das crianças ?

No segundo capítulo vamos passear por Piaget e Vygotsky e o que eles têm a

nos dizer a respeito dos jogos. Como o brinquedo se caracteriza em cada fase do

desenvolvimento ? Os jogos simbólicos podem ajudar as crianças a elaborar seus

conflitos cotidianos ? Permitem que elas realizem seus desejos ? Como esses autores

entendem a brincadeira ?

7

No terceiro capítulo vamos trazer de volta as brincadeiras populares e sua

importância na vida da criança . A parlenda , os jogos de adivinhação , as

brincadeiras de roda, é possível através dessas e de tantas outras brincadeiras

desenvolver o pensamento e o comportamento criativo ? E desenvolver a criatividade

da criança deve ser sempre a nossa grande preocupação enquanto educadores ?

Finalmente o quarto capítulo onde apresentamos o brincar como forma de

terapia e como uma oportunidade dada a criança de se libertar de sentimentos e

problemas. O que é ludoterapia ? Quais as contribuições da Psicanálise ?

Portanto, a criança e o seu brincar fazem parte desse estudo . Através de uma

abordagem multidisciplinar , estaremos objetivando estabelecer uma relação entre as

brincadeiras e o cotidiano.

8

CAPÍTULO I

Brincadeira é coisa séria

(O Brincar no contexto escolar)

9

O brinquedo é uma atividade que pode determinar o desenvolvimento infantil.

As experiências vividas pelas crianças nos jogos não desaparecem com o tempo,

evoluem. É muito comum que as crianças inventem personagens durante as suas

brincadeiras solitárias e coletivas.

A maioria das pessoas diria que as crianças brincam porque gostam de o

fazer, e isso é um fato indiscutível. As crianças tem prazer em todas as experiências

de brincadeira física e emocional. Podemos ampliar o âmbito de suas experiências

fornecendo materiais e idéias , mas as próprias crianças são capazes de encontrar

objetos e inventar brincadeiras com muita facilidade , e isso dá-lhes prazer.

Normalmente , é na escola que a criança passa boa parte do seu tempo , logo ,

a escola tem que se transformar num ambiente agradável , num ambiente onde a

criança se sinta feliz.

Porém , a escola coloca o ensino , ou melhor , os conteúdos programados de

forma tão cansativa , com certa obrigatoriedade , a criança tem que aprender por

obrigação , com isso negligencia o poder de aprender de uma outra forma , mais

natural .

Aprender através de outros meios, que não sejam os tradicionais como , por

exemplo , através de uma linguagem gestual , das imagens , da música , nos jogos ,

no brincar , assim , ler e escrever podem ser uma gostosa brincadeira desde que seja

apresentada de forma divertida , prazerosa .

Se uma criança dramatiza , desenha , modela , dança , canta ela vai ler e

escrever melhor. Essas atividades transportam alegria para a escola . Expõem e

apuram a sensibilidade existente em cada um , provocam a descontração , estimulam

a interação entre criança , jovens e adultos e valorizam diferentes processos culturais.

Não há , portanto , como negar a brincadeira papel significativo no projeto

educacional. Uma das maneiras de articular o currículo escolar como o cotidiano das

10

crianças é trabalhar exatamente , como já foi dito , com jogos e brincadeiras que

fazem parte de sua vida fora da escola .

O professor deve observar do que elas brincam na hora do recreio e

transformar suas atividades em assuntos de estudo. Sem tirar o seu caráter lúdico , é

evidente . Mas fazendo exatamente o contrário , que é tornar o ensino prazeroso.

O brinquedo é parte integrante da vida da criança . Ao brincar ela organiza

seu pensamento , faz uso da linguagem e da sua criatividade.

Através da brincadeira , ela se apropria de conhecimentos que possibilitarão

sua ação sobre o meio em que se encontra. É através da brincadeira que as crianças

manifestam a sua subjetividade.

A maioria das pessoas já devem ter reparado que em determinado momento

de sua vida as crianças são muito fantasiosas. Contam histórias fantásticas como se

fossem reais. Não estamos sugerindo aqui que a escola ensine a mentir, mas que

brinque com a imaginação, essa será uma valiosa experiência para a criança.

A visão da criança como ser integral é contraditória à visão

compartimentalizada do conhecimento , proposta pela escola , na sua prática . A

escola propõe horas determinadas para que sejam realizadas atividades de

coordenação motora , outras para trabalhar a expressão plástica , outras para brincar

sob a orientação do professor e outras sem a orientação do professor.

Essa segmentação do conhecimento não favorece a formação integral da

personalidade da criança nem das suas necessidades, os meios físico e social

contribuem de maneira determinante para o desenvolvimento (Maranhão, 2002,

p.54).

A brincadeira , o uso de formas e artes e a prática religiosa tendem , por

diversos mas aliados métodos , para uma unificação e integração geral da

personalidade. As brincadeiras servem de elo entre , por um lado , a relação do

11

indivíduo com a realidade interior , e , por outro lado , a relação do indivíduo com a

realidade externa ou compartilhada.

Cientes de que precisamos buscar meios para tornar eficiente e atraente a

relação ensino-aprendizagem , precisamos fazer com que os conteúdos

programáticos tenham aplicabilidade prática.

Temos de relacionar alguns conteúdos com vivências , de forma que as

crianças possam desenvolver algumas potencialidades , descobrindo aplicações para

o que precisam aprender ( Maranhão , 2002 , p.46 )

De modo geral , é preciso recuperar o verdadeiro sentido da palavra escola :

lugar de alegria, prazer intelectual, satisfação . É preciso também repensar a

formação do professor para que reflitam cada vez mais sobre a sua função e

adquiram cada vez mais competência , não só em busca do conhecimento teórico ,

mas numa prática que se alimentará do desejo de aprender cada vez mais para poder

transformar.

Com a sua atuação , professor , junto às crianças , assumindo na sua prática

o papel de dinamizador de situações em que o conhecimento circule e possa ser

socialmente construído , o que buscamos é formar crianças que não percam-nos

percalços do caminho a sua própria voz .

O jogo é , pois um quebra-cabeça... Não é , como se pensava , simplesmente

um método para aliviar tensões. Também não é uma atividade que prepara a criança

para o mundo , mas é uma atividade real para aquele que brinca. Verdadeiramente ,

brincamos , envolvemo-nos com paixão no jogo , sem precisarmos , em absoluto ,

saber o que ele significa ( Friedmann , 1998 , p.20 ) .

A tarefa é difícil , mas possível . A realidade pode e deve tornar-se a base e a

própria fonte do prazer ao mostrar a contradição entre o dever , a alegria presente e a

aspiração de buscar e aprender sempre.

12

Nada será feito em favor do aluno se os professores não se interessarem

diretamente por sua própria formação e se não levarem em conta suas próprias

aptidões e suas capacidades , se não se tornarem livres e criativos para buscar seu

crescimento pessoal .

1.1 – O Brincar como recurso pedagógico

Segundo Rizzi , sempre foi desejo dos professores poder criar na sala de aula

uma atmosfera de motivação que permitisse aos alunos participar ativamente do

processo ensino-aprendizagem.

O brincar é uma atividade normal do ser humano , ainda de acordo com Rizzi,

ao brincar a criança fica tão envolvida com o que está fazendo , que coloca na ação

seus sentimentos e emoções.

O ato de brincar é tão antigo quanto o próprio homem , pois este sempre

manifestou uma tendência lúdica, isto é , um impulso para o jogo . Alguns autores

vão além , afirmando que o brincar não se limita apenas ao próprio homem , pois já

era praticado por alguns animais.

Para Piaget (1971) , a atividade lúdica dos animais é de origem reflexa ou

instintiva (lutas , perseguições , etc.). Nas espécies superiores , como o chimpanzé ,

que se diverte a fazer a água correr , a juntar objetos ou a destruí-los , a dar

cambalhotas e a imitar os movimentos de marcha etc. , e na criança , a atividade

lúdica supera amplamente os esquemas reflexos e prolonga quase todas as ações , o

brincar ultrapassa a esfera da vida humana ( Piaget , 1971 , p.146) .

Sendo parte integrante da vida em geral , o brincar tem uma função vital para

o indivíduo, não só para distensão e descarga de energia , mas principalmente como

forma de assimilação da realidade .

13

O espaço reservado ao brincar , seja qual for a forma que assuma , é como se

fosse um mundo temporário e fantástico , dedicado à prática de uma atividade

especial , dentro do mundo habitual e rotineiro do cotidiano .

Segundo Rizzi , o jogo é uma atividade que tem um valor educacional

intrínseco , o jogo corresponde a um impulso natural da criança , e neste sentido ,

satisfaz uma necessidade interior , pois o ser humano apresenta uma tendência

lúdica.

Jogar educa , assim como viver educa: sempre sobra alguma coisa , mas além

desse valor educacional , que lhe é inerente , o jogo tem sido utilizado como recesso

pedagógico ( Leif , 1978 , p. 11) .

A situação de jogo mobiliza os esquemas mentais : sendo uma atividade física

e mental , o jogo aciona e ativa as funções psiconeurológicas e as operações mentais,

estimulando o pensamento.

Segundo Rizzi , brincando e jogando ela aplica seus esquemas mentais à

realidade que a cerca , apreendendo-a e assimilando-a . Brincando a criança reproduz

as suas vivências , transformando o real de acordo com seus desejos e interesses,

através do brinquedo ela expressa , assimila e constrói a sua realidade.

Como vemos , alguns dos grandes educadores do passado já reconheciam o

valor pedagógico do jogo e das brincadeiras , e tentavam aproveitá-lo como agente

educativo , diz Rizzo .

Segundo Jacquim o jogo é para a criança a coisa mais importante da vida . o

jogo , as brincadeiras no geral , é para o educador , um excelente meio de formar a

criança. Por essas razões , todo o educador , pai ou mãe , professor , dirigente de

movimento educativo , deve não só fazer jogar como utilizar a força educativa do

jogo ( Jacquim ,1963,p.7).

14

O êxito do processo ensino-aprendizagem depende , em grande parte , da

interação professor-aluno , sendo que neste relacionamento , a atividade do professor

é fundamental. Ele deve ser , antes de tudo , um facilitador da aprendizagem, criando

condições para que a criança explore seus movimentos , manipule materiais, interaja

com seus companheiros e resolva situações-problema , finaliza Rizzi.

O homem necessita ser essencialmente livre para fazer escolhas .E será

através do desenvolvimento da própria pessoa , e somente assim é que poderá

alcançar a auto-realização . É aperfeiçoando a personalidade que o indivíduo atinge a

plenitude da vida.

No mundo de hoje , de experiências constantes e renovadas , para que o aluno

possa tornar-se pessoa , segundo Rogers , é preciso que o processo educativo perceba

e esteja voltado para o fato de ser o homem fonte de todos os atos. Baseado neste

quadro o processo de aprendizagem deverá necessariamente estar centralizado no

aluno.

15

CAPÍTULO II

O Jogo e sua importância

no desenvolvimento da criança

16

O jogo e a sua dinâmica são processos importantes para serem utilizados em

qualquer fase da vida da criança . As atividades lúdicas irão favorecer o

desenvolvimento de várias habilidades : motoras , intelectuais , atitudes morais, além

de dar oportunidade e a abrir espaço para o desenvolvimento da criatividade , a

expressão e a integração social .

Com Piaget , podemos pensar sobre os diferentes processos que estão em jogo

na aquisição do conhecimento social. Ele oferece também uma outra lição:

elaborações cognitivas ocorrem em um contexto de relações simétricas , onde o

pensamento não está limitado pelo poder hegemônico.

Na vida da criança , é exatamente na sua relação com outras crianças que está

condição é mais freqüentemente encontrada , de forma que elaborações cognitivas

construtivas no desenvolvimento das representações sociais vão ocorrer mais

claramente na análise da interação da criança com os seus iguais, em situações em

que elas estão livres para inventar , para criar , brincar.

Conforme Vigotsky , a teoria do desenvolvimento está mais afinada com

preocupações psicossociais. Para os desenvolvimentistas , Vigotsky é considerado

como alguém que forneceu uma teoria social da cognição , que pode superar as

presumíveis deficiências sociais de outras formas de teorização sobre cognição.

Não há espaço nesse ensaio para desenvolver uma apreciação sistemática da

relevância do trabalho de Piaget e Vigotsky para uma psicologia do

desenvolvimento, vamos apenas fazer um esboço sobre o trabalho desses dois

teóricos , mas precisamente sobre o que cada um pensa a respeito da importância dos

jogos na vida das crianças e no processo ensino-aprendizagem.

2.1 – Piaget e seus estágios de desenvolvimento

17

Podemos conceituar o desenvolvimento , conforme Piaget , como um

processo de equilibração progressiva que tende para uma forma final , qual seja a

conquista das operações formais .

O equilíbrio se refere à forma pela qual o indivíduo lida com a realidade na

tentativa de compreendê-la , como organiza seus conhecimentos ( ou esquemas ) em

sistemas integrados de ações ou crenças , com a finalidade de adaptação.

Ao longo de sua vida Piaget observou que existem formas diferentes de

interagir com o ambiente , nas diversas faixas etárias . A estas maneiras típicas de

agir e pensar , ele denominou estágio ou período.

Assim sendo , podemos dizer , que a determinados tipos de aquisições

mentais e de organização destas aquisições que condicionam atuação da criança em

seu ambiente. A criança irá , pois , à medida que amadurece física e

psicologicamente , que é estimulada pelo ambiente físico e social , construindo sua

inteligência

O crescimento orgânico , a maturidade neurológica e fisiológica geral seja um

dos determinantes fundamentais do desenvolvimento psicológico , mas este não será

dado à criança. Ela é quem irá construir seu crescimento mental.

A criança é vista como agente de seu próprio desenvolvimento. Ela irá

construí-lo a partir dos quatro determinantes básicos: maturação , estimulação do

ambiente físico , aprendizagem social e tendência ao equilíbrio , e este processo é

observado em todas as crianças.

Segundo Piaget , o desenvolvimento da inteligência está voltado para o

equilíbrio , a inteligência é adaptação ao ambiente. Dessa forma podemos entender a

importância do brincar para o desenvolvimento da criança.

18

Piaget faz referência ao brinquedo em termos de evolução social e da

inteligência , mostrando como ele se caracteriza , basicamente , em cada período do

desenvolvimento.

No período sensório-motor , onde a interação social da criança é bastante

limitada , predomina o brinquedo isolado , mais de caráter exploratório , onde a

criança parece explorar as potencialidades dos objetos , sem necessidade de se

acomodar a eles. Nessa fase, a criança desenvolve seus sentidos , seus movimentos ,

seus músculos , sua percepção e seu cérebro.

Olhando , pegando , ouvindo , apalpando , mexendo em tudo que encontra a

seu redor , ela se diverte e conquista novas realidades. Em sua origem sensório-

motora , o jogo para ela é pura assimilação do real ao eu e caracteriza as

manifestações de seu desenvolvimento.

Os esquemas que não são utilizados com finalidade adaptativa ( mas que

permanecem no repertório comportamental do sujeito ) podem ser repetidas pelo

simples prazer que provocam no sujeito , prazer este provocado , talvez , por um

sentimento de eficiência ou poder ( no sentido de dominar um determinado objeto ) .

Dessa forma , já podemos perceber um caráter lúdico no segundo subestádio

do período sensório-motor ( entre um e quatro meses de idade ) , quando o bebê

executa as reações circulares primárias , que vão incluir um elemento adaptativo , no

sentido que dão ao bebê uma forma de explorar a si próprio e ao ambiente

circundante , mas que incluem também um elemento lúdico , quando repetidas

muitas vezes , o que se manifesta pelo sorriso ou até mesmo pelo riso , no caso do

bebê mais desenvolvido.

É por volta dos dois anos , fase simbólica , que a criança passa a se definir e a

se estruturar como o diferenciador dos animaizinhos. Os animais mais desenvolvidos

do mundo não ultrapassam essa fase. É uma das mais importantes para a vida da

criança em todos os aspectos.

19

Além dos movimentos físicos , ela passa a exercitar intencionalmente

movimentos motores mais específicos , utilizando para isso as mãos. Adora rasgar ,

pegar o lápis , mexer com as coisas , encaixar objetos nos lugares , montar e

desmontar coisas , dando aos exercícios uma intenção inteligente e uma evolução

natural de sua coordenação.

Os exercícios motores dos músculos amplos e finos passam a ser dirigidos e

aplicados segundo uma ordem intencional , provocando-lhe manifestações

psicomotoras. Essas manifestações são expressões de puro simbolismo, representado

na mente.

Ela brinca de casinha , motorista , cavalo de pau , dança, tudo isso como

forma de expressão do mundo que vive , que viu e interiorizou.

O jogo simbólico , do qual a brincadeira de boneca é um exemplo típico ,

oferece à criança não só a oportunidade de atualizar seus instintos maternais ou de

aprender normas culturais de desempenho de papéis femininos , mas também , e

principalmente , oferece a oportunidade de elaborar os conflitos cotidianos por ela

vivenciados ou de realizar seus desejos insatisfeitos.

À medida que desempenha o papel de mãe , poderá trabalhar mentalmente as

angústias , alegrias , enfim , tudo que faz parte de sua experiência no contato com sua

mãe real.

Admite-se que o brinquedo represente certas realidades . Uma representação é

algo presente no lugar de algo . Representar é corresponder a alguma coisa e permitir

sua evocação , mesmo em sua ausência.

O brinquedo coloca a criança na presença de reproduções : tudo que existe no

cotidiano , a natureza e as construções humanas . Pode-se dizer que um dos objetivos

do brinquedo é dar à criança um substituto dos objetos reais, para que possa

manipulá – los ( Kishimoto , 1999 , p.18 ).

20

Precisamos entender a forma de pensamento da criança para podermos

proporcionar a ela os momentos lúdicos necessários , as brincadeiras que ajudarão a

crescer e nos auxiliarão a compreendê-las melhor.

Segundo Piaget , por volta dos quatro anos , aproximadamente , a criança

entra na fase intuitiva , nesse período ela transforma o real em função das múltiplas

necessidades do eu. Os jogos passam a Ter uma seriedade absoluta na vida das

crianças e um sentido funcional e utilitário.

Os jogos de que elas mais gostam são aqueles em que seu corpo está em

movimento. Elas ficam contentes quando podem movimentar-se , e é essa

movimentação do corpo que torna seu crescimento físico natural e saudável .

Da mesma forma que correr, pular , nadar , arremessar são exercícios que

estimulam o desenvolvimento dos músculos amplos , atitudes como pegar , rasgar,

rabiscar , desenhar, pintar, costurar, modelar, amassar desenvolvem e estimulam os

movimentos finos necessários e obrigatórios para o processo de alfabetização que irá

ocorrer.

Segundo Piaget ( 1971 ), quando brinca , a criança assimila o mundo à sua

maneira , sem compromisso com a realidade , pois sua interação com o objeto não

depende da natureza do objeto , mas da função que a criança lhe atribui

(Kishimoto,1999,p.59 ) .

Na fase da operação concreta , ( 6-8 a 11-12 anos aproximadamente ) , a

criança incorpora os conhecimentos sistematizados , toma consciência de seus atos e

desperta para um mundo em cooperação com seus semelhantes.

Observa-se um marcante declínio do egocentrismo intelectual e um crescente

incremento do pensamento lógico. Isto é , em função da capacidade , agora

adquirida, de formação de esquemas conceituais , de esquemas mentais verdadeiros,

a realidade passará a ser estruturada pela razão e não mais pela assimilação

egocêntrica , como ocorria na fase anterior.

21

É interessante observar os pontos mais significativos de seu

desenvolvimento. Os exercícios físicos funcionais ao desenvolvimento transformam-

se , aos poucos , em práticas esportivas pois passam a compreender finalidades , por

meio de esforços conjuntos.

Nessa fase os jogos transformam-se em construções adaptadas , exigindo

sempre mais o trabalho efetivo e participativo no processo de aprendizagem , que

começa a sistematizar o conhecimento existente. Nessa idade a criança começa a

pensar inteligentemente , com certa lógica . Começa a entender o mundo mais

objetivamente e a Ter consciência de suas ações , discernindo o certo do errado .

Com a capacidade de lidar com operações como a conservação , a

classificação e a seriação , a criança no estágio operacional concreto finalmente

desenvolveu um sistema completo e muito lógico de pensamento . Esse sistema , no

entanto , ainda está ligado a realidade física . A lógica basea-se em situações

concretas que podem ser organizadas , classificadas ou manipuladas ( Woolfolk,

2000 , p.45 ) .

Na fase operacional –formal , ( 11 anos em diante ) , os jogos tornam-se ainda

mais atraentes aos jovens. Os jogos caracterizam-se como atividades adaptativas ao

equilíbrio físico pois realizam o aperfeiçoamento dos músculos tão comuns e

apreciados e engendram princípios de descobertas , de julgamento , de criatividade

possibilitando o surgimento de relações sociais.

Se no período das operações concretas , a inteligência da criança manifesta

progressos notáveis , apresenta por um lado , ainda algumas limitações. Talvez a

principal delas , que está implícita no próprio nome , relaciona-se ao fato de que

tanto os esquemas conceituais como as operações mentais realizadas se referem a

objetos ou situações que existem concretamente na realidade.

Na adolescência , esta limitação deixa de existir , e o sujeito será então capaz

de formar esquemas conceituais abstratos ( conceituar termos como amor , fantasia ,

22

justiça , esquema , democracia , e realizar com eles operações mentais que seguem os

princípios da lógica formal , o que lhe dará , sem dúvida , uma riqueza imensa em

termos de conteúdo e de flexibilidade de pensamento .

Com isso adquire capacidade para criticar os sistemas sociais e propor novos

códigos de conduta , discute os valores morais de seus pais e constrói os seus

próprios(adquirindo , portanto , autonomia) , torna-se capaz de aceitar suposições

pelo gosto da discussão , faz sucessão de hipóteses que expressa em proposições para

depois testá-las.

Torna-se consciente de seu próprio pensamento , refletindo sobre ele a fim de

oferecer justificações lógicas para os julgamentos que faz , lida com relações entre

relações etc.

Do ponto de vista piagetiano , pode-se dizer que , ao adquirir as capacidades

acima mencionadas , o indivíduo atingiu sua forma final de equilíbrio , e é ,

justamente em função destas possibilidades mentais que Piaget chegou a conceber

uma teoria tão complexa .

A teoria de Piaget é particularmente interessante para saber dar a devida

importância ao estudo do jogo e à relação deste estudo com a aprendizagem . O jogo

é um fenômeno mental , e , como tal , expressa ou gera habilidades cognitivas .

Parece pertinente lembrar que , para chegar a estas descrições , Piaget ( e

também seus colaboradores) registrou os jogos espontâneos de seus filhos , como

também aqueles praticados por crianças nas escolas maternais e nas ruas , totalizando

perto de mil observações . Daí a importância de novos estudos sobre a importância

do brincar não só na aprendizagem mas também no cotidiano das crianças.

Portanto , segundo Piaget , o jogo tende , por vezes , à repetição de estados de

consciência penosos , não é para conservá-los na qualidade de dolorosos , mas sim

para torná-los suportáveis e mesmo quase agradáveis , assimilando – os à atividade

de conjunto do eu.

23

Em suma , pode-se reduzir o jogo a uma busca de prazer , mas com a

condição de conceber essa busca como subordinada , ela mesma , à assimilação do

real ao eu: o prazer lúdico seria assim a expressão afetiva dessa assimilação.

2.2 – Vygotsky: E a questão social

Vygotsky entende a brincadeira como uma atividade social da criança . Situa

o início do processo imaginativo dela em torno dos três anos de idade. Ela satisfaz

algumas de suas necessidades usando o brinquedo.

Através do brinquedo , a criança estabelece suas relações com a vida real. Ela

vai experimentar sensações que já conhece e vai desenvolvendo regras de

comportamento que imagina serem concretas.

Na perspectiva Vygotksiana o desenvolvimento das funções intelectuais

especialmente humanas é medido socialmente pelos signos e pelo outro. Ao

internalizar as experiências fornecidas pela cultura , ela constrói e reconstrói

individualmente os modos de ação realizados externamente e aprende a organizar os

próprios processos mentais.

O indivíduo deixa , portanto , de se basear em signos externos e começa a se

apoiar em recursos internalizados ( imagens , representações mentais , conceitos etc.)

(Rego,1995,p. 62) .

De acordo com Vygotsky , precisamos Ter certeza de que o desenvolvimento

da criança não precisa ou não tem de coincidir com a sua própria aprendizagem ou

com o seu potencial de aprender.

Segundo Vygotsky , não existe brinquedo sem regras . A situação imaginária

de qualquer forma de brinquedo já contém regras de comportamento , embora possa

não ser um jogo com regras formais estabelecidas a prioridade.

24

A criança imagina-se como mãe e a boneca como criança , e , dessa forma ,

deve obedecer as regras de comportamento no brinquedo. Pelo uso do brinquedo , ela

aprende a agir de forma cognitiva. É com a brincadeira que a criança reproduz a

realidade, ao brincar ela imita seu cotidiano.

A aprendizagem e o desenvolvimento estão inter-relacionados desde o

primeiro dia de vida da criança ( Vygotsky , l991 , p. 95) . O brinquedo é uma

atividade que determina o desenvolvimento infantil. Ele cria uma zona de

desenvolvimento proximal da criança . E o que significa isto ? No brinquedo ela

sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade , além de seu

comportamento diário.

É por isso que , o professor das classes iniciais não pode desprezar este

valioso recurso. Quando dramatizam uma ida ao supermercado , por exemplo , elas

assumem papéis que não são os seus cotidianamente : arrumam mercadorias ,

escolhem o que vão comprar , recebem dinheiro e dão troco , discutem o valor dos

produtos.

Se vão representar um enredo sobre animais , o jogo exige que se comportem

como os personagens . É este ir além do seu patamar real que fornece a estrutura

básica para os avanços no seu desenvolvimento.

Como a natureza da criança tende à ação a instrução deveria levar em conta

seus interesses e suas atividades espontâneas . Por isso , considerava que o trabalho

manual , os jogos , os brinquedos , tinham uma função educativa básica. É através

dos jogos e brinquedos que a criança adquire a primeira representação do mundo , e ,

é por meio deles , também , que penetram no mundo das relações sociais , criando

um senso de iniciativas e auxílio mútuo ( Rizzi e Haydt , 1998 , p. 14).

Segundo a pedagogia da ação , a criança para se desenvolver deveria agir e

produzir sempre . Ela precisa se movimentar o tempo inteiro. Essa necessidade de

25

criar , de movimentar , de jogo produtivo deveria encontrar seu canal de expansão

através da educação.

Não podemos considerar Vygotsky um estudioso do desenvolvimento

infantil, ele estudou as etapas do crescimento da criança porque seria o meio teórico

necessário para entender os processos humanos superiores. Ele entendia que o

pesquisador precisava observar a criança brincando , aprendendo . Uma teoria

abstrata não seria satisfatória para captar os momentos de transformação . Sua

preocupação maior está no fato de que a atividade humana pode transformar a

natureza e a sociedade ( Maranhão,2001 ,p.31).

Na base do processo misterioso da vida , está a dimensão lúdica , o jogo.

Segundo alguns estudiosos o que define o jogo é o seu caráter profundamente

estético , a criatividade nasce do ato lúdico e vive no domínio da imaginação.

Brincar mostra-se ,assim , um caminho que pode contribuir ,e muito , no

desenvolvimento das crianças porque está em sua raiz. É no brincar , portanto , que

se encontra a fonte e o fortalecimento da sua capacidade de criação , bem como o

prazer e a alegria de viver..

26

CAPÍTULO I I I

Brincadeiras Populares

27

“Um ,dois, feijão com arroz

três quatro , feijão no prato

cinco seis , no fim do mês

sete oito , comer biscoito

nove dez , comer pastéis.”

Quantos não serão as pessoas a sentirem uma saudade gostosa ao ler esses

versos? Muitas , certamente . E que , talvez , fiquem tentados a interromper esta

leitura para recordar . Recordar-se de quantas vezes tiraram o pique , recitando :

“Uni duni tê

salamê minguê

um sorvete colorê

o escolhido foi você”

Será que estamos preocupados aqui em reviver o passado ? Em ressuscitar o

que estava adormecido na memória ? Não se trata disso ou apenas disso . O que

estamos pretendendo mesmo é falar de cultura.

Numa concepção atual , não podemos mais pensar em cultura no singular .

São tantas as culturas quantos são os povos , as etnias e os aglomerados humanos .

São tantas as culturas quantas são as formas de expressão , os valores e os costumes

produzidos pelos diversos grupos sociais.

Se bem que nem sempre seja concedido às diferentes culturais o mesmo valor

social. A escola é , por excelência , um local de tensões. Ali se encontram e se

misturam representantes de culturas e gerações distintas : os professores e os alunos.

E nem sempre os saberes trazidos por estes andam de mãos dadas com o ensino

oferecido.

Acontece que a sabedoria popular não encontra nem vez nem voz nos

programas curriculares , quando aparecem (geralmente em festas e comemorações) ,

28

as manifestações vindas do povo são tratados de maneira estereotipada , como algo

exótico e extravagante , até mesmo caricato .

O papel da escola , enquanto instância socializadora , é o de criar as melhores

condições para que a cultura floresça em seu interior , sob a ótica da pluralidade. É

fazer com que diferentes tradições sociais encontrem espaço próprio para serem

exercidas sem supremacias ou discriminações de qualquer espécie.

É possibilitar ao aluno manifestar-se de acordo com a sua herança cultural ,

ao mesmo tempo em que se apodera das experiências de outros grupos humanos.

Acreditamos que a mediação do professor representa para muitos de seus alunos a

única possibilidade de ultrapassar as fronteiras de seu universo de conhecimentos .

Através das brincadeiras , por exemplo.

Será que as crianças ainda brincam de roda ? Ainda se pula amarelinha ? O

pião continua entre os brinquedos preferidos pelos meninos? É verdade que muita

coisa mudou ao longo do tempo . As diversões infantis são hoje influenciadas ,

significativamente , pelos recursos da multimídia e as crianças também não dispõem

mais da rua como espaço privilegiado para desenvolver suas brincadeiras.

Contudo , a magia dos jogos herdados das gerações mais velhas não

desaparecem e nas praças e pátio das escolas , em qualquer lugar onde se reunam ,

crianças e jovens brincam como seus pais e seus avós brincavam.

As tradições populares brasileiras têm origem antiga e trazem influência dos

povos formadores da nossa cultura . Elas viajaram , através dos tempos e dos

espaços, carregando os costumes e a linguagem dos nossos antepassados. Ouvidas,

contadas e cantadas , essas tradições nos chegaram e se incorporaram ao nosso

cotidiano.

Qual será o futuro das brincadeiras e da cultura popular ? desaparecer

engolida pela tecnologia moderna ou ser preservada no seio da população como parte

do nosso patrimônio folclórico ? Acreditamos que a escola pode ser uma das

29

instituições voltadas para resgatar e valorizar as manifestações que , de boca em

boca, vão constituindo a sabedoria cultural dos brasileiros.

Para tanto, os professores necessitam , antes de tudo , conhecer ( conhecer

para reconhecer) a memória de seu povo . Existem obras publicadas que apresentam

pesquisas ricas e bem completas sobre o assunto . Existe a comunidade , onde a

cultura está viva . E estão aí as crianças que brincam , basta olhar.

3.1 – Parlenda

A parlenda é uma manifestação que faz parte do folclore de vários países .

Trata-se de um conjunto de palavras recitadas ritmicamente que acompanham um

jogo , brincadeira ou movimento corporal.

A parlenda passa de boca em boca e sua origem se perdeu no tempo. É de

domínio do povo. Algumas são usadas pelos adultos para brincar com crianças

pequenas :

“Serra , serra , serrador

quantas tábuas já serrou?

Vinte e cinco , sim senhor.”

Outras alimentam crendices populares como , por exemplo , cantar enquanto

mexe na panela ,para arrebentar pipoca :

“Rebenta pipoca

Rebenta pipoca

Rebenta bem

Rebenta que chegue

Prá mim também

Se sobrar piruá

Que me importa me lá”

30

Mesmo com o advento da tecnologia e de outros tipos de jogos , a parlenda

continua agradando às crianças . E se a família não dedica mais tanto tempo à sua

transmissão , por que a escola não pode assumir este papel?

3.2 – Trava-línguas

O trava-línguas é um tipo de brincadeira oral composta de palavras cujos sons

se repetem ou são de difícil pronúncia . O jogo é falar os trava-línguas bem depressa,

sem errar:

“Olha o sapo dentro do saco

O saco com o sapo dentro,

O sapo batendo papo

E o papo soltando vento”

3.3 – Jogos de adivinhação

Neste tipo de atividade as crianças estarão trabalhando a linguagem oral ,

estimulando a percepção , o senso de observação , a integração do grupo.

Temos então variações de jogos como:

-Adivinhe o que mudou de lugar?

-Adivinhe o que tem na caixa?

-Adivinhe no que estou pensando ?

E tantas outras que poderão ser criadas.

3.4 – Brincadeiras de roda

“ciranda , cirandinha

vamos todos cirandar!

Vamos dar a meia volta,

31

Volta e meia vamos dar”

A brincadeira de roda leva as crianças a mexerem com o corpo , a

apresentarem as situações sugeridas pela letra. Podemos desenvolver as áreas

afetivas, social, e a cognitiva , principalmente no que diz respeito à linguagem

escrita, a linguagem oral , aspectos gramaticais , como: aumentativo, diminutivo ,

grau normal , adjetivos (Maranhão,2001,p.111).

3.5 – Bola na rede

O futebol ainda é um dos esportes mais populares no Brasil. É um tema que

está diariamente nos meios de comunicação social (rádio, jornal , televisão e revista)

e que anima as conversas nas praças , bares e esquinas .

Torcedores vibram e sofrem com paixão nas campanhas de seus clubes e as

galeras agitam as partidas com charangas , cornetas e bandeiras . Os craques tornam-

se ídolos consagrados e são adorados pelos fãs.

Merece destaque o fato de que existe uma linguagem futebolística que se

expandiu para vários momentos da comunicação social. Expressões como driblar,

comprar o passe , tirar de letra, bola pra frente , tirar o time de campo , para citar

apenas algumas , fazem parte do vocabulário até mesmo daqueles que dizem nada

entender de futebol.

É por tudo isso que o futebol pode tornar-se um assunto interessante para

aqueles que aprendem a ler e a escrever

Uma das tarefas fundamentais da escola é ampliar o universo cultural dos

alunos. Este papel adquire ainda mais relevância quando se trata de um projeto

voltado para as classes populares que , pelas suas condições sócio-econômicas , têm

pouca ou nenhuma chance de viajar , visitar museus , conhecer obras de arte ,

consultar livros e freqüentar galerias e exposições

32

Além do futebol , é claro que as crianças conhecem muitos outros jogos :

aprendem na comunidade , os que são praticados na escola , os que conhecem através

de reportagens e notícias.

Encontramos as manifestações populares de todos os povos através dos

tempos. Seja na pintura , nos símbolos desenhados , nos corpos dos indígenas, no

som da flauta mágica , nas diabruras do menino Maluquinho , num programa de

televisão. E o que tem isso tudo a ver com as crianças e a sala de aula ?

Será que se espera que os professores acumulem ainda mais preocupações

além de ensinar a leitura , escrita e a fazer contas ? Mas serão mesmo apenas

encargos a mais ? Não. Se trata de ampliar para os alunos as possibilidades de

compreender e atuar sobre a realidade , expressando –se por meio de diferentes

linguagens.

3.6 – Feijão Queimou

Esta brincadeira deve ser feita em lugar aberto , longe de qualquer coisa que

as crianças possam bater . Se possível , em lugar que eles não se machuquem ao cair.

As crianças fazem um circule de mãos dadas , mas sem fechar . A primeira

criança que tem uma das mãos livres será o cabeça e irá conduzir a fila . Para

começar ,ela irá dizer:

Cabeça: - feijão queimou !

Todos: - quem queimou ?

Cabeça :- foi a vovó!

Todos: - dá uma volta ?

Cabeça :- eu dou !

33

O cabeça do grupo puxa a fileira e passam todos por baixo das mãos da

primeira dupla do outro lado da fila . Quando passarem todos , a segunda criança vai

ficar de costas com os braços cruzados sobre o peito . Nenhuma criança poderá soltar

os braços , para não arrebentar a corrente.

Começa tudo de novo repetindo o refrão e o cabeça puxa a fila para passar

entre a Segunda e a terceira criança . Depois entra a terceira e a Quarta . Assim ,

segue até que todos passem e fiquem na mesma posição: de costas com os braços

cruzados sobre o peito.

Enfim , é uma brincadeira que vai desenvolver habilidades básicas como :

orientação espaço-temporal , o próprio corpo , coordenação motora , valores e

convivências.

3.7 – Garçom equilibrista e corrida

Com objetos variados , são chamados de estafeta , ou seja , a criança sai

correndo alcança o objetivo e volta para que o segundo da fila possa sair e dar

continuidade à brincadeira. A princípio , procure não colocar objetos que caiam da

bandeja com tanta facilidades , para que elas entendam bem como é o jogo .

Faça uma fila só e ensine os procedimentos . Depois divida o grupo em dois ,

para fazer uma competição entre as duas fileiras . A fila que chegar antes , será a

vencedora.

Essas brincadeiras são de domínio popular . Foram passadas de gerações para

gerações e podem ser ainda muito úteis no dia a dia da criança . Brincando ela

cresce, se desenvolve , adquire valores morais , aprende a trabalhar em grupo , a lidar

com a perda , a se socializar.

Os professores podem usar todas essas brincadeiras na escola , cada atividade

deve ser adaptada conforme o nível e grupo que ele tem.

34

A infância é , portanto , a aprendizagem necessária à idade adulta. Estudar na

infância somente o crescimento , o desenvolvimento das funções , sem considerar o

brinquedo , seria negligenciar esse impulso irresistível pelo qual a criança modela

sua própria estátua . Não se pode dizer de uma criança que ela cresça apenas , seria

preciso dizer que ela se torna grande pelo jogo. Pelo jogo ela desenvolve as

possibilidades que emergem de sua estrutura particular , concretiza as

potencialidades virtuais que afloram sucessivamente à superfície de seu ser, assimila-

se e as desenvolve , une-as e as combina , coordena seu ser e lhe dá vigor (Chateau ,

1908 , p. 14 ).

Segundo Winnicott (1941) , o brincar possui tudo em si . A criança traz para

dentro dessa área da brincadeira objetos ou fenômenos oriundos da realidade externa,

usando – os a serviço de alguma amostra derivada da realidade interna ou pessoal.

Sem alucinar , a criança põe para fora uma amostra do potencial onírico e vive com

essa amostra num ambiente escolhido de fragmentos oriundos da realidade externa.

O brincar é inerentemente excitante e precário . Essa característica não

provém do despertar instintual , mas da precariedade próprio ao interjogo na mente

da criança do que é subjetivo, quase alucinação , e do que é objetivamente percebido,

realidade concreta ou compartilhado ( Winnicott , 1971 , p.77) .

Sem dúvida o brincar da criança é um exercício . Mas no espírito da criança

que brinca , é antes de mais nada uma prova de sua personalidade e uma afinação de

si. O jogo é antes de tudo um teste de personalidade , ele pode às vezes parecer

válvula de escape , dando vazão a tendências represadas .

Segundo Chateau , o jogo para criança é , em primeiro lugar , brincadeira , é

também uma atividade séria em que o faz-de-conta , as estruturas ilusórias, o

geometrismo infantil , a euforia têm importância considerável .

O brincar representa o trabalho da criança . Como o adulto se sente forte por

suas obras , a criança sente-se crescer com suas proezas lúdicas. Uma criança que

35

não quer brincar é uma criança cuja personalidade não se afirma , que se contenta

com ser pequena e fraca, um ser sem determinação, sem futuro (Chateau, l908, p.29).

36

CAPÍTULO IV

O Brincar e a Terapia

37

A terapia é uma oportunidade que se oferece à criança de poder crescer sob

melhores condições . Sendo o brinquedo seu meio natural de auto-expressão , lhe é

dada a oportunidade de, brincando, expandir seus sentimentos de tensão, frustração,

medo, espanto, confusão, insegurança, agressividade .

Através das brincadeiras espontâneas e das dirigidas , brincando e jogando,

elas apreendem e aprendem o mundo que as cerca , incorporando as competências

necessárias para o seu desenvolvimento .

Brincando a criança estabelece suas relações com a vida real. Ela experimenta

sensações que já conhece e vai desenvolvendo regras de comportamento que imagina

serem corretas.

4.1 – Ludoterapia

Segundo Axline ( 1941) , a ludoterapia é baseada no fato de que o jogo é o

meio natural de auto- expressão da criança . É uma oportunidade dada a criança de se

libertar de seus sentimentos e problemas através do brinquedo , da mesma maneira

que , em certas formas de terapia para adultos , o indivíduo resolve suas dificuldades

falando .

A ludoterapia , quanto à forma , pode ser diretiva , isto é , o terapeuta pode

assumir a responsabilidade de orientação e de interpretação , ou não-diretiva :a

responsabilidade e a direção são deixadas às crianças .

A terapia não-diretiva é baseada no pressuposto de que o indivíduo tem

dentro de si mesmo não só a capacidade de resolver problemas satisfatoriamente ,

mas também esse impulso de crescimento que faz o comportamento maduro mais

satisfatório do que o comportamento imaturo.

Estamos colocando a terapia não diretiva em destaque pois é está que nos

interessa. Ela permite ao indivíduo ser ele mesmo , aceitar-se completamente , sem

38

avaliação ou pressão para mudança: reconhecer e esclarecer as atitudes emocionais

expressas pela reflexão do que o paciente expressou.

Segundo Axline, é por esse processo de terapia que se oferece ao indivíduo a

oportunidade de ser ele mesmo, de aprender a se conhecer , de traçar seu próprio

curso abertamente e às claras , de rodar o calidoscópio por assim dizer , de maneira

que ele forma um desenho mais satisfatório para sua vida .

Quando a criança atinge uma certa estabilidade emocional percebe sua

capacidade emocional , percebe sua capacidade para se realizar como um indivíduo,

pensar por si mesma , tomar suas próprias decisões , torna-se psicologicamente mais

madura e assim sendo tornar-se pessoa.

Tornar-se pessoa significa libertar-se das teias internas, tornar-se capaz de um

contato verdadeiro com o outro , não fazer jogos , não usar máscaras , não se

satisfazer com o simples ajustamento , mas tender a criar novas idéias e coisas , ser

cooperativo , receptivo e amoroso.

A ludoterapia é uma experiência única para a criança , descobrir de repente

que as sugestões , as ordens , recriminações , restrições, críticas , desaprovações,

ajudas dos adultos desapareceram. Tudo isso é substituído pela aceitação completa e

pela situação permissiva que lhe possibilita ser ela mesma.

O brinquedo auxilia o processo porque é o meio natural de auto-expressão da

criança. É o material geralmente concedido à criança como propriedade sua . Brincar

livremente é uma expressão do que ela quer fazer , assim ela pode orientar seu

mundo.

O terapeuta não deve dirigir o brinquedo de forma alguma , ele coloca nas

mãos da criança o que lhe pertence , nesse caso o brinquedo e o seu uso não diretivo .

Quando ela brinca livremente e sem ser dirigida está expressando sua personalidade.

39

De acordo com Axline , o terapeuta deve desenvolver um amistoso e cálido

relacionamento com a criança de modo que logo se estabeleça o rapport (bom

entendimento entre paciente e terapeuta).

O terapeuta está sempre alerta para identificar os sentimentos que a criança

está expressando e para refletí-los para ela , de tal forma que adquira conhecimento

sobre seu comportamento. A responsabilidade de escolher e de fazer mudanças é

deixada à criança.

O terapeuta estabelece somente as limitações necessárias para fundamentar a

terapia no mundo da realidade e fazer a criança consciente de sua responsabilidade

no relacionamento. A hora da terapia é a hora da criança. A sala de ludoterapia pode

ser bem equipada mas também pode ser um cantinho do colégio mostrando que esta

técnica pode ser utilizada com pequeno orçamento e espaço. A sala de ludoterapia é

um lugar de crescimento.

A psicoterapia se efetua na sobreposição de duas áreas do brincar, do paciente

e a do terapeuta. A psicoterapia trata de duas pessoas que brincam juntas. Em

conseqüência , onde o brincar não é possível , o trabalho efetuado pelo terapeuta é

dirigido então no sentido de trazer o paciente de um estado em que não é capaz de

brincar para um estado em que o é (Winnicott ,1975 , p. 59).

A brincadeira é extremamente excitante. Compreenda-se que é excitante não

primariamente porque os instintos se acham envolvidos , isso está implícito. A

importância do brincar é sempre a precariedade do interjogo entre a realidade

psíquica pessoal e a experiência de controle de objetos reais (Winnicott, 1975, p. 71)

.

Cada relação terapeuta-cliente é um encontro único e irrepetível e, portanto ,

impensável como sujeito a um método ou sistema qualquer.

Do ponto de vista formal , observa-se que a conduta da criança é dirigida por

um sistema motivacional inerente e por um sistema de regulação que atribui valores

40

positivos ou negativos às experiências , e que através do seu feedback mantém o

organismo na direção certa para satisfação de suas necessidades.

Do ponto de vista psicológico , a realidade é basicamente o mundo privado

das percepções da criança. Só existe o que faz parte dela , o que é , criado por ela . A

criança percebe a sua experiência como realidade.

A realidade é para ela o que faz parte do seu campo perceptual. A criança

mais do que ninguém está potencialmente mais capacitada a conscientizar-se do que

a realidade representa para ela , já que assume completamente seu esquema o

referencial interno

Tem uma tendência ou impulso básico a atualizar o seu organismo. Interage

com a realidade seguindo a sua tendência básica de atualização. A conduta é

basicamente o esforço intencional do organismo por satisfazer suas necessidades de

atualização.

A realidade é para o indivíduo a sua percepção da mesma , sem entrar no

problema do que constitui realmente a realidade , a menos que se preocupe com

questões filosóficas. A criança pode ser levada ao colo por uma pessoa amiga,

afetuosa . Se perceber esta experiência como estranha , ameaçadora , a sua conduta

será determinada por sua percepção e não pela realidade ou estímulo externo .

Certamente , a relação com o meio ambiente é uma relação transacional , se a

continuidade desta experiência contradiz a percepção inicial , ocorrerá a tempo uma

mudança na percepção.

A experiência criativa pode e deve ocorrer sem expectativas , planejamentos ,

previsões, objetivos ou metas . Quando a criança farta-se de alguma experiência ,

tornando-se entediada , está pronta a voltar-se para alguma outra , provavelmente

forte de maior prazer.

41

As etapas e escolhas expressam-se espontaneamente de dentro para fora. A

pura existência de um bebê ou uma criança saudável , implica num interesse , numa

curiosidade casual e espontânea , numa atividade exploratória , especulativa.

Mesmo quando não se considera a criança motivada, expressiva , espontânea,

competitiva , por uma deficiência de qualquer espécie , o que se observa é que ela

tende a submeter-se à prova suas potencialidades ,realizá-las: encontra-se também

absorvida, fascinada e interessada , experimentando , especulando e manipulando o

mundo.

E é por isso que ressaltamos mais uma vez que os bons pais , professores,

terapeutas deveriam agir na prática compreendendo que a tolerância , a amabilidade,

o respeito pelo medo , a compreensão das forças regressivas e defensivas são

necessárias para que o desenvolvimento não se transforme numa ameaça esmagadora

em lugar de uma perspectiva agradável.

A criança saudável , no seu modo espontâneo de ser , de dentro para fora,

vivendo em função de seu potencial interno , é capaz de explorar o mundo com

interesse e curiosidade , podendo assim expressar as suas potencialidades.

O trabalho de virgínia Axline com crianças é muito rico e podemos aprender

muito com ele. Aqui fizemos apenas um esboço de suas idéias sobre a técnica de

ludoterapia usada em tratamento de crianças com distúrbios emocionais.

4.2 – A Psicanálise

Desde sua descoberta por Sigmund Freud , a psicanálise tem tido larga

influência sobre a psicologia, a educação , a medicina e a psiquiatria.

É uma corrente que se fundamenta sobre a teoria do recalcamento (repressão

de necessidades) , significando , também , método de exploração do psiquismo

humano e terapêutico para certas neuroses.

42

Freud inaugurou um tempo de maior respeito pelo ser humano e sua

liberdade. Com o caminho aberto por ele , começou a derrubada de velhos mitos: a

vida da criança não é um paraíso , a mãe nem sempre sabe lidar com o filho , nem

todo adulto é maduro emocionalmente , o homem não é dono absoluto do seu

destino, pois as forças inconscientes que nos movem fogem do nosso próprio

controle.

Mas Freud não só derrubou mitos , como ainda abriu perspectivas , pois suas

conclusões mostram que todos podemos ser muito mais alegres , sadios e criativos.

Para a psicanálise , tanto o que é incompreensível quanto o que é bem

compreendido à luz da vida cotidiana merecem igualmente que se interprete. O

método psicanalítico não se vale da lógica cotidiana , da proporção entre motivo e

ação.

A interpretação psicanalítica visa demonstrar o processo que torna possível

uma idéias ou ação , a lógica da concepção. Não a lógica superficial do que já foi

concebido. Lógica da concepção , lógica das emoções , lógica inconsciente são

nomes da mesma coisa: mostram o como , não se detêm no porquê.

Além disso , a interpretação parte da noção de que há sempre inúmeros

sentidos , e não um só sentido verdadeiro. A noção-chave do vasto edifício

conceitual que é a psicanálise é , seguramente , a de insconsciente.

Através dos sonhos , dos atos falhos , da transferência , dos sintomas , Freud

procurou mostrar que vivemos entre o que conscientemente pensamos e sentimos e o

que inconscientemente desejamos. Daí termos muitos conflitos , muitas situações

internas contraditórias.

Com os adultos podemos trabalhar essas questões através da fala , o terapeuta

vai pontuando o discurso do paciente , mas como esse trabalho é possível com

43

crianças ? A criança vai apresentando o seu cotidiano, as suas dúvidas, incertezas,

medos , angústias , inseguranças através do brincar.

É possível criar um espaço onde brincando ela vai recriando o seu mundo e

nos mostrando o caminho para compreendê-la e respeitá-la.

Na psicanálise de crianças muito pequenas , esse desejo de comunicar-se

através das brincadeiras é empregado em lugar da fala dos adultos . A criança de três

anos de idade tem uma grande crença , segundo alguns autores , na nossa capacidade

de compreensão , de modo que o psicanalista conhece enormes dificuldades para

corresponder ao que ela dele espera.

Não poderia haver maior estímulo para o analista em busca de uma

compreensão mais profunda do que a aflição da criança perante o nosso fracasso em

entendermos o que ela ( confiante de início) comunica através de suas brincadeiras.

Uma criança brincando pode querer mostrar pelo menos , uma parte tanto do

seu interior como do exterior a pessoas escolhidas por ela no seu meio ambiente. A

brincadeira pode ser uma prova de fraqueza e probidade sobre a própria pessoa.

Isso pode-se converter , nos primeiros anos , no caso oposto , visto que o

brincar , como o falar , foi-nos concedido , como é costume dizer para ocultar os

nossos pensamentos , se é os pensamentos mais profundos que nos referimos.

O inconsciente reprimido deve-se manter oculto , mas o resto do inconsciente

é algo com que cada indivíduo quer travar conhecimento e as brincadeiras , tal como

os sonhos , servem à função de auto-revelação e de comunicação com o nível

profundo.

Brincando as crianças vão expressando seus sentimentos , pensamentos,

sonhos e esperanças , novos horizontes abrirão-se em cada um desses pequeninos.

Alguns superarão seus pavores e ansiedades lutando contra o mundo , que por muitas

vezes lhes é insuportável.

44

Se , de fato , queremos aproximar-nos da verdade , cabe-nos olhar

profundamente cada ser humano para compreender as razões do seu comportamento.

Freud faz uma relação entre o brincar e a pulsão de domínio. Ele descreve o

brincar de uma criança de dezoito meses . Segundo Freud , quando a mãe se afasta

por algumas horas , a criança , mesmo estando em companhia de outros adultos,

elege o brincar sozinha.

O jogo consiste em jogar e, às vezes, trazer de volta, um carretel, por

exemplo, amarrado num cordão, através da grade de sua cama. Quando faz

desaparecer o carretel, pronuncia um (o-o-o-), e quando puxando o cordão o faz

aparecer, pronuncia um(dá). Estas palavras seriam equivalentes a “fora”, “se foi” (o-

o-o-) e “tá aqui, a “tenho” (dá) (Fernández , 2001, p.128) .

A tensão dolorosa , gerada pela experiência inevitável da presença e ausência

do objeto amado , por um jogo no qual ele mesmo maneja a ausência e a presença

como tais , e deleita-se , além disso , em governá-las ( Fernández, 20001,p.128).

Segundo Fernández , o jogo de arremessar e recolher , fazer desaparecer e

fazer aparecer , esteve precedido por outras situações , nas quais a criança

arremessava objetos pequenos e parecia sentir grande prazer em jogá-los.

Conforme Winnicott , está modalidade lúdica pode ser observada com

frequência nas crianças pequenas saudáveis : usar , primeiro a agressividade para

expulsar , para derrubar. Como vimos , o brincar é uma forma de comunicação na

psicoterapia.

O natural é o brincar . O brincar é extremamente excitante . É possível , de

acordo com Winnicott , descrever uma seqüência de relacionamentos sobre o

processo de desenvolvimento , examiná-los , e ver a que lugar pertence o brincar.

45

No estado de confiança que se desenvolve quando a mãe pode desempenhar-

se bem dessa difícil tarefa (não se for incapaz de fazê-la) , o bebê começa a fruir de

experiências baseadas num casamento da onipotência dos processos intrapsíquicos

com o controle que tem do real.

A confiança na mãe cria aqui um playground intermediário , onde a idéia da

magia se origina , visto que o bebê , até certo ponto , experimenta onipotência.

Winnicott chama isso de playground porque a brincadeira começa aqui.

O playground é um espaço potencial entre a mãe e o bebê , ou que une mãe e

bebê. O estádio seguinte é ficar sozinho na presença de alguém . A criança está agora

brincando com base na suposição de que , a pessoa a quem ama e que , portanto , é

digna de confiança , e lhe dá segurança , está disponível e permanece disponível

quando é lembrada, após Ter sido esquecida. Essa pessoa é sentida como se

refletisse de volta o que acontece no brincar ( Winnicott , 1975 , p.71) .

No estádio seguinte é a mãe que passa a brincar com o bebê. Mais cedo ou

mais tarde, entretanto ela introduz seu próprio brincar e descobre como varia a

capacidade dos bebês de aceitar ou não a introdução de idéias que não lhes são

próprias. Dessa maneira , está preparado o caminho para um brincar conjunto num

relacionamento .

De acordo com Winnicott , é fácil perceber que as crianças brincam por

prazer, é muito mais difícil para as pessoas verem que as crianças brincam para

dominar angústias , controlar idéias ou impulsos que conduzem à angústia se não

forem dominados.

A angústia é sempre um fator na brincadeira infantil e , freqüentemente, um

fator dominante . A ameaça de um excesso de angústia conduz à brincadeira

compulsiva , ou à brincadeira repetida , ou a uma busca exagerada dos prazeres que

pertencem à brincadeira , e se a angústia for muito grande , a brincadeira redunda em

pura exploração de gratificação sensual ( Winnicott , l975,p.162) .

46

Não é este o lugar adequado para demonstrar a tese de que a angústia está

subjacente na brincadeira infantil. Contudo , o resultado prático é importante , dado

que, enquanto as crianças brincam por prazer , pode-se lhes pedir que parem de

brincar , ao passo que a brincadeira lida com esses sentimentos de angústia ou de

ansiedade , não podendo desviar dela as crianças sem lhes causarmos aflição,

angústia real ou novas defesas contra a mesma.

Melanie Klein ( 1932) , também apresenta estudos sobre o brincar , porém, na

medida em que estudava a brincadeira , mantinha seu interesse centrado quase que

inteiramente no uso desta .

O terapeuta busca a comunicação da criança e sabe que geralmente ela não

possui um domínio da linguagem capaz de transmitir as infinitas sutilezas que podem

ser encontradas na brincadeira por aqueles que as procuram .

Contudo , Klein (1932) , está mais preocupada com a utilização do conteúdo

da brincadeira do que em olhar a criança que brinca e escrever sobre o brincar como

uma coisa em si .

O professor visa ao enriquecimento. O terapeuta interessa-se especificamente

pelos próprios processos de crescimento da criança e pela remoção dos bloqueios ao

desenvolvimento que podem Ter-se tornado evidentes .

É bom recordar que o brincar é por si mesmo uma terapia . Conseguir que as

crianças possam brincar e em si mesmo uma psicoterapia que possui aplicações

imediata e universal , e inclui o estabelecimento de uma atitude social positiva com

respeito ao brincar.

Essa atitude deve incluir o reconhecimento de que o brincar é sempre possível

de tornar-se assustador . Os jogos e sua organização devem ser encarados como parte

de uma tentativa de prevenir o aspecto assustador do brincar.

47

É no brincar , e talvez apenas no brincar , que a criança ou o adulto fruem

sua liberdade de criação . Esse brincar tem que ser espontâneo , e não submisso ou

aquiescente, se é que se quer fazer psicoterapia .

O brincar é inerentemente excitante e precário . Essa característica não

provém do despertar instintual , mas da precariedade própria ao interjogo na mente

da criança do que é subjetivo (quase alucinação ) e do que é objetivamente percebido

(realidade concreta ou realidade compartilhada ) , (Winnicott , l975, p.77) .

Neste capítulo tentamos fazer um estudo sobre a técnica de ludoterapia,

fundamentada na psicologia humanista-existencial , e um pequeno esboço sobre o

vasto campo da psicanálise. Apenas tentamos. O campo da psicanálise é muito rico e

complexo.

Minha experiência com ludoterapia tem mostrado que ela é um bom caminho

pois permite a criança se libertar de sentimentos que a tornam prisioneira de si

mesmo. A criança precisa ter a oportunidade de libertar-se da escuridão e descobrir

por si que poderá enfrentar as sombras e a luz do sol em sua vida.

Somos personalidades que crescemos e nos desenvolvemos como resultado

de todas as nossas experiências , relacionamentos , pensamentos e emoções. Somos

uma totalidade que , fazendo-se faz a própria vida .

Numa era como a nossa , tão conturbada , o homem deve estar equipado com

a capacidade de descobrir significados , descobrir por conta própria o que representa

para ele cada situação em particular , tudo isto somando-se para formar um cordão

único chamado vida humana.

Não é dever ou tarefa única da educação satisfazer-se e transmitir tradições,

valores e conhecimentos. É seu dever também dar relevância especial ao

desenvolvimento e refinamento daquela capacidade de descobrir , farejar o

significado implícito de uma situação em particular .

48

A educação deve aguçar e estimular a capacidade do homem ouvir a voz de

sua consciência. Somente quando o homem adquire esta capacidade está apto a

enfrentar todos os problemas de sua vida.

Uma pessoa segura do ponto de vista emocional enfrentará todos os riscos da

vida , de natureza social , ética , espiritual, biológica , com um firme senso da própria

realidade e identidade , assim como a dos outros .

A criança que brinca adquire confiança em si mesma , em sua capacidade de

crescimento , em seu potencial criativo . Brincando ela está trocando experiências

com o mundo que a cerca e nessa troca ela vai se desenvolvendo e se sentindo mais

feliz . Vivendo de uma forma harmoniosa ela vai adquirindo segurança na sua

capacidade de enfrentar seus medos , seus problemas , ela vai simplesmente se

conhecendo e conhecendo os outros .

Talvez haja mais compreensão e beleza na vida quando os raios ofuscantes do

sol foram suavizados pelos contornos da sombra. Talvez haja raízes mais profundas

numa amizade que sofreu tempestades e as venceu.

A experiência que nunca desaponta ou entristece , que nunca toca nos

sentimentos é uma vivência neutra com pequenos desafios e variações de cor.

Quando sentimos confiança e muita fé e acima de tudo esperança de que podemos

concretizar nossos objetivos , isto constrói dentro de nós um manancial de força,

coragem e segurança (Axline ,1964,p.283).

49

CONCLUSÃO

Concluímos que é possível fazer uma relação entre as brincadeiras e o

cotidiano das crianças. Após essa explanação verificamos que o brincar é muito

importante na vida delas. Seja na escola , seja na terapia , seja no seu dia-a-dia,

brincando ela vai vivenciando experiências , aprendendo com elas , vai crescendo,

amadurecendo.

Os jogos simbólicos podem ajudá-las a elaborar seus conflitos cotidianos.

Permitem que elas realizem seus desejos , é uma oportunidade dada a criança de se

libertar de seus sentimentos, medos, problemas, inseguranças.

Brincando elas liberam suas emoções , seus receios , suas angústias , e cabe

as pessoas que convivem com crianças observá-las , assim poderá conhecê-las

melhor , o que a fala numa terapia desvenda sobre a personalidade do adulto

analisado , o brincar tem o mesmo papel na vida das crianças.

O brincar é uma experimentação da vida . Através do brincar podemos

trabalhar também as frustrações ( a criança tem que aprender a lidar com perdas),

brincando ela pode falar de frustração , sucesso , e todos os sentimentos que ela não

pode expressar através da fala .

Portanto , conhecendo melhor nossas crianças poderemos colaborar para que

se transformem em adultos mais alegres, mais criativos , mais felizes enfim , pois

somos personalidades que crescemos e nos desenvolvemos como resultado de todas

as nossas experiências .

Crescemos sempre através dos nossos relacionamentos, pensamentos e

emoções, somos uma totalidade que, fazendo-se, como já foi dito várias vezes, faz a

própria vida.

O crescimento é, portanto, uma série de escolhas livres que o indivíduo faz

entre segurança e desenvolvimento. O meio pode atuar gratificando ou não as

50

necessidades básicas de segurança e ajudar ao indivíduo a perceber a opção para o

crescimento de forma mais atraente.

O objetivo deste trabalho foi realizar um estudo sobre a importância do

brincar na vida da criança em diferentes contextos. Mostramos que o brincar está

presente e faz parte do cotidiano da criança. Daí a importância de observá-la em

diferentes formas de brincar , pois ,apenas observando-as , poderemos descobrir

muitas coisas sobre o seu universo interior .

.

51

BIBLIOGRAFIA

ABERASTURY, A – A criança e seus jogos, 2ª Edição. Porto Alegre: Artes

Médicas, 1992.

AXLINE, Virginia – Ludoterapia. Rio de Janeiro: Agir, 1990.

FREUD, S. – Três ensaios sobre a teoria da sexualidade . In: Edição Standard

Brasileira das obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago, v.7,1978.

FRIEDMANN, Adriana – Brincar: crescer e aprender. São Paulo: Moderna , 1998.

JACQUIM,Guy – A educação pelo jogo. São Paulo : Flamboyant ,1963.

KLEIN, Melanie – Then Psycho-Analysis of Children, Edição rev. Londres: Hogarth

Press e Instituto de Psicanálise, 1949.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida (org.) – Jogo, Brinquedo ,Brincadeira e a Educação.

São Paulo : Cortez , 1999.

LEIF, Joseph – O jogo pelo jogo. Rio de Janeiro : Zahar , 1978.

MARANHÃO, Machado – Ensinar brincando: a aprendizagem pode ser uma grande

brincadeira. Rio de Janeiro: Wak, 2001.

PIAGET, Jean – Epistemologia Genética. Lisboa: Dom Quixote , 1972.

____________ - A formação do símbolo na criança: imitação, jogo, sonho, imagem

e representação. Rio de Janeiro: Zahar , 1971.

REGO, Teresa Cristina – Vygotsky: Uma perspectiva histórico-cultural da educação

de crianças. São Paulo: Ática , 1998.

52

RIZZI, Leonor e HAYDT,Regina – Atividades lúdicas na educação de crianças.

São Paulo : Ática , 1998.

ROGERS, C – Tornar-se pessoa. São Paulo: Martins Fontes , 1978.

SKINNER, B.F. – Tecnologia do ensino. São Paulo: EPU/EDUSP , 1972.

TAYLOR, C. – Criatividade: progresso e potencial. São Paulo : Ibrasa , 1976.

VYGOTSKY, L.S. - Pensamento e Linguagem. São Paulo : Martins Fontes , 1991.

WAJSKOP, Gisela – Brincar na pré-escola. São Paulo : Cortez , 1999.

WINNICOTT, D.W. – O brincar e a Realidade. Rio de Janeiro : IMAGO , 1975.

WOOLFOLK, Anita E. – Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,

2000.

53

ANEXOS

54

1. FOLHA DE ESTÁGIO

55

2. EVENTOS CULTURAIS

56

ÍNDICE

INTRODUÇÃO 6

CAPÍTULO I 8

BRINCADEIRA É COISA SÉRIA ( O BRINCAR NO CONTEXTO ESCOLAR ) 8

1.1. O brincar como recurso pedagógico 12

CAPÍTULO II 15

O JOGO E SUA IMPORTÂNCIA NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA 15

2.1. Piaget e seus estágios de desenvolvimento 16

2.2. Vygotsky e a questão social 23

CAPÍTULO III 26

BRINCADEIRAS POPULARES 26

3.1.Parlenda 29

3.2.Trava-línguas 30

3.3.Jogos de adivinhações 30

3.4.Brincadeiras de roda 30

3.5.Bola na rede 31

3.6.Feijão queimou 32

3.7.Garçom equilibrista e corrida 33

CAPÍTULO IV 36

O BRINCAR E A TERAPIA 36

4.1. A Ludoterapia 37

4.2. A Psicanálise 41

CONCLUSÃO 49

BIBLIOGRAFIA 51

ANEXOS 53

1. Folha de estágio 54

2. Eventos culturais 55

ÍNDICE 56

57

FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Pós- Graduação “ Lato Sensu “

Título do trabalho : O Brincar e sua importância na vida da criança

Data da Entrega: ____/______________ de 2003.

Auto Avaliação:

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

Observações finais:

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

____________________________________________________________________

Avaliado por :________________________________________Grau____________

_____________________, __________de _______________de __________