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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOPEDAGOGIA O PSICOPEDAGOGO E OS OBSTÁCULOS BÁSICOS QUE IMPEDEM O SUJEITO DE CRESCER NA APRENDIZAGEM POR: ADRIANA FURTADO CARVALHO ORIENTADOR: CARLOS ALBERTO CEREJA DE BARROS RIO DE JANEIRO 2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

PSICOPEDAGOGIA

O PSICOPEDAGOGO E OS OBSTÁCULOS BÁSICOS QUE IMPEDEM O

SUJEITO DE CRESCER NA APRENDIZAGEM

POR: ADRIANA FURTADO CARVALHO

ORIENTADOR: CARLOS ALBERTO CEREJA DE BARROS

RIO DE JANEIRO

2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

PSICOPEDAGOGIA

O PSICOPEDAGOGO E OS OBSTÁCULOS BÁSICOS QUE IMPEDEM O

SUJEITO DE CRESCER NA APRENDIZAGEM

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia.

RIO DE JANEIRO

2007

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A João Carlos sempre compreensivo e companheiro

de todas as horas.

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Dedico este trabalho a todos àqueles que usurpados

pelo sistema do seu direito ao conhecimento, ainda

têm a fibra e coragem para lutarem por ele.

Dedico, ainda e principalmente, a minha querida

mãe a qual mesmo distante sempre é o meu refúgio

nas horas mais difíceis.

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RESUMO

Esta monografia tem como objetivo identificar os desvios e os obstáculos

básicos do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro do

esperado pelo meio social. Construindo uma compreensão do sistema, não só

o indivíduo que aprende, mas a família, a escola a comunidade, focando a

análise nas histórias de vida e no processo de desenvolvimento de cada um. O

que reforça a importância da Psicopedagogia em estabelecer diretrizes para a

resolução dessas dificuldades e a responsabilidade do educador em

proporcionar o bom desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem.

PALAVRAS-CHAVES: aprendizagem, desenvolvimento, Psicopedagogia,

educador.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO I - PSICOPEDAGOGIA: HISTÓRIA, CONCEITUAÇÃO E

CAMPO DE ATUAÇÃO

09

CAPÍTULO II - O CONHECIMENTO 19

2.1 As dificuldades com a escrita 20

2.1.1 A escrita como aquisição do conhecimento 20

2.2 A Linguagem 21

2.3 Aspectos cognitivos 22

2.4 A dificuldade de aprendizagem 24

CAPÍTULO III - A AÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NA ESCOLA 26

CAPÍTULO IV - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 30

CAPÍTULO V - O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICO 37

5.1 Etapas do diagnóstico 40

5.1.1 Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S) 41

5.1.2 Entrevista de Anamnese 42

5.1.3 Sessões lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças) 43

5.1.4 Provas e testes 44

5.1.5 Síntese diagnóstica 49

5.1.6 Entrevista de devolução 49

CONCLUSÃO 50

BIBLIOGRAFIA 52

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INTRODUÇÃO

O psicopedagogo identifica as dificuldades e os transtornos que

impedem o estudante de assimilar o conteúdo ensinado em sala de aula. Para

isso, ele faz uso de conhecimentos da Pedagogia, da Psicanálise, da

Psicologia e da Antropologia. Analisa o comportamento do aluno, observando

como ele aprende. Promove intervenções em caso de fracasso ou de evasão

escolar. Além de trabalhar em escolas, esse profissional pode atuar em

hospitais, auxiliando os pacientes a manter contato com as atividades normais

de aprendizado. Pode trabalhar também em centros comunitários ou em

consultório, público ou particular, orientando estudantes e seus familiares.

O atual paradigma de competência repousa em uma ação humana

criativa, contextualizada, adequada à realidade, respaldada no conhecimento

científico e realizada com muita maturidade emocional.

Quando o foco pedagógico estiver no funcionamento cognitivo e suas

emoções, seria necessário pesquisar o que o paciente já aprendeu, como

articular os diferentes conteúdos entre si, como faz uso desses conhecimentos.

Sendo que na maioria das queixas escolares está focada na leitura,

escrita e matemática, em diferentes graus e séries. Daí a proposta da

pesquisa: investigar além da metodologia utilizada em sala de aula todos os

outros aspectos: orgânicos, cognitivos, emocionais, sociais e pedagógicos até

o diagnóstico possibilitando uma abordagem global do sujeito em suas

múltiplas facetas.

Aprender a lidar com o desconhecido, com o conflito, com o inusitado,

com o erro, com a dificuldade, transformar informação em conhecimento, ser

seletivo e buscar na pesquisa as alternativas para resolverem os problemas

que surgem são tarefas que farão parte do cotidiano das pessoas.

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A escola, no cumprimento da sua função social, deverá desenvolver

nas crianças e jovens que nela confiam a sua formação, competências e

habilidades para prepará-los para agir conforme as exigências da

contemporaneidade.

Como não há como se distanciar desta realidade, todos os

profissionais da educação sentem a necessidade de refletir sobre suas ações

pedagógicas no que diz respeito a conhecer e reconhecer a importância do

sujeito da aprendizagem, a entender o que pode facilitar ou impedir que se

aprenda.

Auxiliando a todos aqueles envolvidos com a questão do aprender,

surgiu a Psicopedagogia, ciência nova que se destina a buscar as causas dos

fracassos escolares e resgatar o prazer de aprender numa visão

multidisciplinar, podendo orientar as instituições escolares e seus profissionais

e atender a pais e alunos na perspectiva de transformar as relações com o

aprendizado.

E não é apenas o fator econômico que interfere quando a meta é

atingir o nível de escolaridade exigido pelo competitivo mercado de trabalho. A

transmissão da herança cultural não mais obedece aos velhos esquemas. O

processo de aprendizagem se inscreve na dinâmica da transmissão da cultura,

que constitui a definição mais ampla da palavra educação. Assim, tradição

familiar e novos modos de vida se chocam gerando conflitos entre gerações e

se tornando ponto de partida de dificuldades e fracassos escolares. É nesse

contexto de mudanças sociais que é produzida a dificuldade de aprendizagem

enquanto patologia.

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CAPÍTULO I

PSICOPEDAGOGIA: HISTÓRIA, CONCEITUAÇÃO E CAMPO DE ATUAÇÃO

A psicopedagogia surgiu na Europa, mais precisamente na França, em

meados do século XIX, onde a Medicina, Psicologia e a Psicanálise,

começaram a se preocupar com uma alternativa de intervenção nos problemas

de aprendizagem e suas possíveis correções de acordo com Bossa (2000,

p.37).

A corrente européia influenciou a iniciação psicopedagógica na

Argentina, e a mesma influenciou a identidade da psicopedagogia Brasileira.

Em nosso país a psicopedagogia surge aproximadamente nos anos 70,

a partir da necessidade de atendimento a crianças com distúrbios na

aprendizagem, consideradas inaptas dentro do sistema educacional

convencional, porém, os cursos na área só começam a se multiplicar na

década de 90.

E hoje a demanda pelos cursos aumentou muito, pois a

psicopedagogia contribui para uma maior reflexão sobre o processo de

aprendizagem e o desvio do mesmo.

Assim sendo a psicopedagogia nasceu da necessidade de uma melhor

compreensão do processo de aprendizagem e se tornou uma área de estudo

específica que busca conhecimento em outros campos e cria seu próprio objeto

de estudo (Bossa, 2000, p. 23). Trata do processo de aprendizagem humana:

seus padrões de desenvolvimento e a influência nesse procedimento.

A clínica psicopedagógica corresponde a um de seus campos de

atuação, cujo objetivo é diagnosticar e tratar os sintomas emergentes no

processo de aprendizagem. O diagnóstico psicopedagógico busca investigar,

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pesquisar para averiguar quais são os obstáculos que estão levando o sujeito à

situação de não aprender, aprender com lentidão e/ou com dificuldade;

esclarece uma queixa do próprio sujeito, da família ou da escola.

A psicopedagogia no Brasil há trinta anos, vem desenvolvendo um

quadro teórico próprio. “É uma nova área de conhecimento, que traz em si as

origens e contradições de uma atuação interdisciplinar, necessitando de muita

reflexão teórica e pesquisa” (Bossa, op. cit, p.13).

A Psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, o que adveio

de uma demanda – o problema de aprendizagem, colocando num território

pouco explorado, situado além dos limites da Psicologia e da própria

Pedagogia – e evolui devido à existência de recursos, para atender esta

demanda, constituindo-se assim, numa prática. Como se preocupa com o

problema de aprendizagem, deve ocupar-se inicialmente do processo de

aprendizagem. Portanto vemos que a psicopedagogia estuda as características

da aprendizagem humana: como se aprende, como esta aprendizagem varia

evolutivamente e está condicionada por vários fatores, como se produzem as

alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las. Este

objeto de estudo, que é um sujeito a ser estudado por outro sujeito, adquire

características específicas a depender do trabalho clínico ou preventivo (Idem,

p. 21).

A distinção entre o trabalho clínico e o preventivo é fundamental. O

primeiro visa buscar os obstáculos e as causas para o problema de

aprendizagem já instalado; e o segundo, estudar as condições evolutivas da

aprendizagem apontando caminhos para um aprender mais eficiente. Vejamos

a definição de Bossa (Idem, p.21) sobre os dois campos de atuação da

psicopedagogia: O trabalho clínico dá-se na relação entre um sujeito com sua

história pessoal e sua modalidade de aprendizagem, buscando compreender a

mensagem de outro sujeito, implícita no não-aprender. Nesse processo, onde

investigador e objeto-sujeito de estudo interagem constantemente, a própria

alteração torna-se alvo de estudo da Psicopedagogia. Isto significa que, nesta

modalidade de trabalho, deve o profissional compreender o que o sujeito

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aprende, como aprende e porque, além de perceber a dimensão da relação

entre psicopedagogo e sujeito de forma a favorecer a aprendizagem. No

enfoque preventivo a instituição, enquanto espaço físico e psíquico da

aprendizagem, é objeto de estudo da Psicopedagogia, uma vez que são

avaliados os processos didático-metodológicos e a dinâmica institucional que

interferem no processo de aprendizagem.

No exercício clínico, o psicopedagogo deve reconhecer seu processo

de aprendizagem, seus limites, suas competências, principalmente a

intrapessoal e a interpessoal, pois seu objeto de estudo é um outro sujeito,

sendo essencial o conhecimento e possibilidade de diferenciação do que é

pertinente de cada um.

“Essa inter-relação de sujeitos, em que um procura conhecer o outro

naquilo que o impede de aprender, implica uma temática muito complexa”

(Ibidem, p. 23).

O psicopedagogo tem como função identificar a estrutura do sujeito,

suas transformações no tempo, influências do seu meio nestas transformações

e seu relacionamento com o aprender. Este saber exige do psicopedagogo o

conhecimento do processo de aprendizagem e todas as suas inter-relações

com outros fatores que podem influenciá-lo, das influências emocionais,

sociais, pedagógicas e orgânicas. Conhecer os fundamentos da

Psicopedagogia implica refletir sobre suas origens teóricas e entender como

estas áreas de conhecimento, são aproveitadas e transformadas num novo

quadro teórico próprio, nascido de sementes em comum.

A Psicologia e a Pedagogia são as áreas “mães” da psicopedagogia,

mas não são suficientes para embasar todo o conhecimento necessário. Desta

forma, foi preciso recorrer a outras áreas, como a Filosofia, a Neurologia, a

Sociologia, a Psicolingüística e a Psicanálise, no sentido de alcançar uma

compreensão multifacetada do processo de aprendizagem.

Nesse lugar do processo de aprendizagem coincidem um momento

histórico, um organismo, uma etapa genética da inteligência e um sujeito

associado a tantas outras estruturas teóricas, de cuja engrenagem se ocupa e

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preocupa a Epistemologia; referimo-nos principalmente ao materialismo

histórico, à teoria piagetiana da inteligência e a teoria psicanalítica de Freud,

enquanto instauram a ideologia, a operatividade e o inconsciente (Pain, 1985,

p.15).

O campo de atuação da psicopedagogia é focado no estudo do

processo de aprendizagem, diagnóstico e tratamento dos seus obstáculos,

sendo o psicopedagogo responsável por detectar e tratar possíveis obstáculos

no processo de aprendizagem; trabalhar o processo de aprendizagem em

instituições de indivíduos ou grupos e realizar processos de orientação

educacional, vocacional e ocupacional, tanto na forma individual ou em grupo.

As áreas de estudo se traduzem na observação de diferentes

dimensões no processo de aprendizagem: orgânico, cognitivo, emocional,

social e pedagógico.

“A interligação desses aspectos ajudará a construir uma visão

gestáltica da pluricausalidade deste fenômeno, possibilitando uma abordagem

global do sujeito em suas múltiplas facetas” (Weiss, 1992, p. 22).

A dimensão emocional está ligada ao desenvolvimento afetivo e sua

relação com a construção do conhecimento e a expressão deste através de

uma produção gráfica ou escrita. A psicanálise é a área que embasa esta

dimensão, trata dos aspectos inconscientes envolvidos no ato de aprender,

permitindo-nos levar em conta a face desejante do sujeito. Neste caso, o não

aprender pode expressar uma dificuldade na relação da criança com seu grupo

de amigos ou com a sua família, sendo o sintoma de algo que não vai bem

nesta dinâmica.

A dimensão social está relacionada à perspectiva da sociedade, onde

estão inseridas a família, o grupo social e a instituição de ensino. A Psicologia

Social é a área responsável por este aspecto. Encarrega-se da constituição dos

sujeitos, que responde às relações familiares, grupais e institucionais, em

condições socioculturais e econômicas específicas e que contextualizam toda a

aprendizagem. Um exemplo de sintoma do não aprender relacionado a este

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aspecto pode acontecer pelo fato do sujeito estar vivendo realidades em dois

grupos de ideologia e prática com muitas diferenças.

A dimensão cognitiva está relacionada ao desenvolvimento das

estruturas cognoscitivas do sujeito aplicadas em diferentes situações. No

domínio desta dimensão, devemos incluir a memória, a atenção, a percepção e

outros fatores que usualmente são classificados como fatores intelectuais. A

Epistemologia e a Psicologia Genética são as áreas de pano de fundo para

este aspecto. Encarrega-se de analisar e descrever o processo construtivo do

conhecimento pelo sujeito em interação com os outros objetos.

A dimensão pedagógica está relacionada ao conteúdo, metodologia,

dinâmica de sala de aula, técnicas educacionais e avaliações aos quais o

sujeito é submetido no seu processo de aprendizagem sistemática. A

Pedagogia contribui com as diversas abordagens do processo ensino

aprendizagem, analisando-o do ponto de vista de quem ensina.

A dimensão orgânica está relacionada à constituição biofisiológica do

sujeito que aprende. A medicina e, em especial, algumas áreas específicas

contribuem para o embasamento deste aspecto. Os fundamentos da

Neurolingüística possibilitam a compreensão dos mecanismos cerebrais que

subjazem ao aprimoramento das atividades mentais. Sujeitos com alteração

nos órgãos sensoriais terão o processo de aprendizagem diferente de outros,

pois precisam desenvolver outros recursos para captar material para processar

as informações.

A Lingüística é a área que atravessa todas as dimensões. Apresenta a

compreensão da linguagem como um dos meios que caracterizam o

tipicamente humano e culturais: a língua enquanto código disponível a todos os

membros de uma sociedade e a fala como fenômeno subjetivo, evolutivo e

historiado de acesso à estrutura simbólica.

Nenhuma dessas áreas surgiu para responder especificamente a

questões da aprendizagem humana. No entanto, fornecem meios para

refletirmos cientificamente e operarmos no campo psicopedagógico.

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A Psicopedagogia como área de estudo e de atuação, responsável

pela aprendizagem e suas dificuldades, tem importantes tarefas diante do

fenômeno da exclusão escolar de pessoas que apresentam dificuldades com a

aprendizagem.

A primeira delas diz respeito à necessidade da "dificuldade" no

processo de aprender; sem ela não há desequilíbrio e, conseqüentemente,

busca de equilíbrio para a aprendizagem.

A dificuldade só é motivo de preocupação quando é muito intensa e

freqüente, geradora de um obstáculo tão grande que impeça ou dificulte a

aprendizagem de alguém.

Mesmo nestes casos, a dificuldade não deve ser motivo de exclusão.

Sabemos que os grupos humanos são compostos por pessoas diferentes, com

graus de compreensão distintos e com áreas de mais dificuldades e de mais

facilidades, também diferenciadas.

A grande dificuldade, aquela obstaculizadora à qual nos referimos

antes, encaminha-nos para a segunda tarefa da Psicopedagogia neste estudo:

compreender o contexto no qual a exclusão ocorre e a ótica de mundo, de ser

humano e de educação que sustenta esta ação.

A exclusão e o tipo de dificuldade a ser excluída vai depender da

tendência educacional de determinado grupo, instituição, comunidade ou

cultura.

Em grupos que possuem uma visão multifacetada do ser humano, do

mundo e de ensino/aprendizagem, e que vêem cada faceta de forma separada,

descontextualizada e especializam-se em cada uma delas, a dificuldade pode

ser compreendida como uma dificuldade esperada pois, afinal de contas, temos

tantas facetas que temos o direito de não nos darmos bem em algumas delas.

A idéia de múltiplas inteligências, tão divulgada hoje em dia, tem este

modo multifacetado de ver o mundo, o ser humano e a aprendizagem; em

muitas interpretações, as dificuldades não são consideradas.

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Valoriza-se as facilidades, muitas vezes, em detrimento do crescimento

do sujeito em aspectos nos quais apresenta dificuldades.

A forma de incluir, neste modo de pensar, é através da valorização das

capacidades, o que pode desencadear uma visão fantasiosa do todo ou um

"faz de conta" sobre a dificuldade, como se ela não existisse ou não fosse

importante. Tal posição pode causar um comportamento de aprendizagem

regido pelo princípio do prazer e fugitivo da realidade, fazendo com que o

aprendiz não desenvolva condições de enfrentar dificuldades, nem aquelas

necessárias para seu crescimento.

A valorização de possibilidades, capacidades e facilidades é

fundamental em um processo de inclusão; porém, deverá ser verdadeira e

contrapor as dificuldades para que estas possam ser minimizadas ou

superadas.

Por outro lado, os grupos que possuem uma visão globalizadora do

processo de ensinar e aprender, dos seres humanos e do mundo podem

apresentar uma outra leitura da dificuldade de aprendizagem.

A globalização pode promover a aculturação, a idéia de que todos

devem pensar, ouvir, vestir, imaginar, escolher, necessitar das mesmas coisas

e, desta forma, pode fazer saltar aos olhos, muito rapidamente, aquele que se

diferencia.

A percepção da dificuldade de aprendizagem, por exemplo, faz com

que o grupo, a instituição, a comunidade ou a cultura se mobilizem para expelir

aquele que pode estar representando um corpo estranho, capaz de ameaçar o

funcionamento do todo.

O movimento de exclusão, nesta visão, é menos obscurecido do que

na situação anterior, mas parece ser mais cruel pois, em nenhum momento,

deixa espaço para a valorização da diferença. Ou o sujeito adapta-se à nova

palavra de ordem, permitindo a colonização, a aculturação, a

descaracterização etc. ou rebela-se, permitindo ser tratado como diferente e,

rapidamente, ser alvo de intervenções para que fique igual a todos.

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Apesar de uma visão globalizadora, incluir não significa, nesse caso,

um processo conjunto, e sim um trabalho solitário de crescimento individual e

de pequenos grupos para que, num segundo momento, conforme o

desempenho, o direito de estar com todos possa ser conquistado.

Neste mundo instantâneo, as crianças têm sido exigidas, forçadas no

seu crescimento e, apesar do esforço de Piaget, em toda sua obra, para

mostrar que a criança tem seu jeito próprio de ser e de se desenvolver, elas

têm sido tratadas como adultas em miniaturas.

O mundo do consumo oferece a elas roupas de adultos em miniatura,

para que se vistam; comidas dietéticas para que emagreçam depois de

comerem tantas guloseimas desnecessárias, que o próprio mundo as instiga

comer; linguagem empolada, excesso de explicação para que elas falem e

ajam, muitas vezes sem entender o que dizem e o que fazem; calçados de

salto alto para que aumentem alguns centímetros e, possivelmente, estraguem

suas colunas e sua postura; programas educacionais para que aprendam antes

o que estava previsto, pela própria idade, para ser aprendido depois; e assim

por diante.

Espera-se, pelo visto, que as crianças se transformem em adultos e,

por isso, acelera-se o processo, principalmente em programas educacionais

particulares, fabricando uma série de problemas de aprendizagem que acabam

por serem medicados, tratados como doenças.

Por outro lado, a morosidade das mudanças educacionais permite que

se continue mantendo as dificuldades de aprendizagem como responsabilidade

dos indivíduos e, portanto, e que se considere que as pessoas que apresentam

distúrbios de atenção, de ação, de aprendizagem são doentes e precisam ser

"curadas", medicadas, independente da participação do contexto nesta

problemática.

A inclusão, neste contexto, é realizada através de artifícios que fazem

com que as crianças tenham a atenção, também, igual à do adulto, a ação

imobilizada e a aprendizagem aprisionada em uma única forma de processo.

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A visão consumista de mundo imprime, na sociedade, um movimento

de exclusão, de descarte e de valorização da praticidade, que acaba por

encobrir a necessidade humana de se apegar ao conhecido para poder

transformá-lo em algo novo.

Esta forma de ver o mundo é tão arraigada em nosso cotidiano que

consideramos natural usar e jogar fora, sem nos importarmos com o entulho

que este lixo vai formar e, voltando a incomodar a nós mesmos depois.

A naturalidade com que lidamos com a situação do descartável chega

também ao estilo de aprendizagem dos aprendizes. Aprende-se, utiliza-se e

descarta-se para que o novo conhecimento possa ser assimilado sem,

necessariamente, ser conectado ao anterior. Na melhor das hipóteses, é um

novo jeito de fazer história, se é que é possível fazê-la somente com rupturas.

A terceira tarefa, entre tantas outras, está relacionada às instituições

que convivem com este movimento de exclusão das dificuldades e das

diferenças, principalmente aquelas que estão próximas das dificuldades de

aprendizagem: a escola e a família.

A Psicopedagogia pode auxiliar no enfrentamento da exclusão e na luta

pela não exclusão através de pesquisas e produções científicas, orientação e

ação pontual sobre as situações já existentes e prevenção tanto no grupo

familiar, quanto escolar.

O psicopedagogo, portanto, precisa utilizar seu papel articulador para

auxiliar no enfrentamento das dificuldades que o processo de inclusão pode

trazer:

Entre as possíveis ações, a Psicopedagogia pode:

- propiciar a reflexão na escola, auxiliá-la a repensar seus valores e

crenças com relação à diversidade e à igualdade;

- auxiliar os pais a pensarem sobre as dificuldades de seus filhos e

perceberem se a insistência a respeito da inclusão não está atrelada à negação

da dificuldade;

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- conhecer o real potencial da criança a ser incluída e as possibilidades

que o meio possui para estimular este potencial;

- não focar na doença, e sim nas possibilidades do sujeito e do

contexto;

- auxiliar a escola a encontrar saídas metodológicas e avaliativas não

exclusivas;

- divulgar o ensino pela pesquisa, para que todos possam participar,

independente de suas dificuldades;

- indicar as possibilidades de adaptação de linguagens e materiais,

quando isto for necessário.

O novo olhar que a Psicopedagogia possibilita necessita também de

uma reflexão sobre o contexto sócio-político e sobre a diferença na sociedade.

É preciso repensar sobre o papel do profissional da saúde e da educação na

questão da inclusão.

O papel da Psicopedagogia e da Educação é o de instituir caminhos

entre os opostos que liguem o saber e o não saber, o acesso ao conhecimento

e a falta desse acesso, a facilidade e a dificuldade, a rapidez e a lentidão e

outros opostos que possam se apresentar em um processo de aprendizagem.

Estas ações devem acontecer no âmbito do indivíduo, do grupo, da

instituição e da comunidade, visando a aprendizagem e, portanto, é também

tarefa da Psicopedagogia.

O campo que se delineia é vasto; olhar a diferença sem perder a

dimensão da igualdade é um dos maiores desafios educacionais. A

Psicopedagogia, como uma das áreas responsáveis pela aprendizagem, tem

muito a aprender e muito a contribuir.

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CAPÍTULO II

O CONHECIMENTO

Antes de se falar do objeto de estudo da psicopedagogia, o ser

cognoscente e da construção do sujeito como tal, faz-se necessário refletir um

pouco sobre o conhecimento propriamente dito, "matéria" e "substância" do ato

cognitivo.

Na forma mais comum de entender o aprendizado, este era visto como

uma apoderar-se dos conhecimentos disponíveis, oferecidos pela sociedade à

criança através da escola, da sociedade e da Igreja. Esse conhecimento,

ofertado sobre a bandeja e do qual os mais aptos servir-se-iam fartamente, de

onde surgia? Quem produzia tão valiosas informações que somente os mais

privilegiados eram capazes de absorver?

Num primeiro momento da civilização, eles provinham dos deuses,

místicos e inspirados em geral, transmitiam-no ao povo. Mas, é importantíssimo

ressaltar, faziam-no em forma de poesia. O poeta, inspirado, produzia, de

acordo com a tradição, em estado de êxtase ou transe, os conhecimentos

revelados do alto. Essa transmissão era obrigatoriamente oral e a forma de

versos permitira uma melhor memorização.

A arte religiosamente inspirada era a forma de produção de

conhecimento das sociedades ágrafas. Eram os inspirados que afirmavam,

diante da tribo a origem divina das tradições, das ferramentas e utensílios, das

técnicas de plantio e colheita, dos costumes, dos cuidados sanitários, das

funções e papéis sociais e de gênero. E tudo se fazia para que sempre se

fizesse igual, como fora estabelecido nas prístinas eras douradas, quando os

deuses ainda conviviam entre os homens.

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2.1 As dificuldades com a escrita

Apesar do permanente esforço de não mudar as tradições, as

condições de produção e progresso material levaram a mudanças práticas e

concretas, de modo que, à margem do conhecimento oficial e estratificado

começam a surgir novas técnicas para suprir novas necessidades. Entre elas a

de registrar: dados, contagens, estoques, poemas, idéias.

Num processo que toma aproximadamente três milênios, o ser humano

do Oriente Próximo (hoje chamado de Oriente Médio) chega à escrita

alfabética. Poucos a dominam, mas existe uma modificação na forma de

produção e registro do pensamento. O momento inspirado da revelação divina

já não precisa ser deixado intacto na memória, ele pode ser registrado por

escrito e relido, consultado. Pode-se pensar sobre ele, construir novos

conhecimentos sobre os conhecimentos difundidos, e, esse pensamento é

abstrato, ou pelo menos pode sê-lo, na medida em que se utilizam símbolos, o

que permite construir sobre o já construído.

Esta é a dificuldade da escrita, que fecundou a história humana de um

modo irreversível e da qual talvez ainda no início. Por que, depois de cinco

milênios de escrita alfabética estaríamos no início desta dificuldade. Por que

somente agora estamos começando a poder pensar a aprendizagem como um

processo de produção do conhecimento por parte do ser cognoscente e não de

aquisição do conhecimento.

2.1.1 A escrita como aquisição do conhecimento

A questão do objeto da Psicopedagogia se relaciona com a maneira

como entendemos o conhecimento e a própria escrita: se como dádivas divinas

a serem compartilhadas com os que aprendem, se como resultado de um

processo produtivo. No primeiro caso, o objeto de estudo da Psicopedagogia

se resumiria àquilo que a autora nos diz ter sido sua primeira abordagem: uma

terapia para superar as dificuldades de aquisição do conhecimento.

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Entretanto, se entendermos o conhecimento como um processo

contínuo, tal como tende a fazê-lo hoje a filosofia da ciência, não se pode

esperar que a Piscopedagogia seja uma terapia para as dificuldades de

aquisição do domínio dos códigos ou linguagens que permitem a produção do

conhecimento, mas é necessário situá-la num patamar mais alto, obtendo-se

assim uma visão mais ampla. Nesse caso, entenderemos a Psicopedagogia

como a área de estudo interdisciplinar, abrangendo diferentes áreas do

conhecimento, e cujo campo de atuação seria identificado pelo processo

ensino/aprendizagem (Andrade, 1998: 33), e que tem por objeto de estudo o

ser cognoscente (Silva, 1998: 51).

2.2 A Linguagem

Maria Cecília Almeida e Silva (1998: 34-35) afirma que, no início, o

processo de conhecer passa obrigatoriamente pelas fases de: perceber,

discriminar, organizar, conceber, conceituar e enunciar. Num primeiro momento

isso se dá pelo contato direto com a experimentação da realidade e

posteriormente através da simbolização. Por volta dos dois anos, a criança

começa a substituir a ação de contato direto com os objetos por símbolos, que

podem ser imagens, palavras, formas, gestos, sons etc.. O domínio de

qualquer linguagem exige um aprendizado, sendo que boa parte desse

aprendizado é realizada através do convívio social e da socialização.

Aqui é preciso considerar que a organização do que se percebe, a

discriminação, organização, conceituação e enunciação da realidade só se dá

através da linguagem. No caso da socialização infantil, mais provavelmente

através da linguagem oral, e, posteriormente, se for o caso através da escrita.

Mas a linguagem não é um instrumento neutro do qual a criança se utiliza para

organizar-se internamente e organizar sua percepção. A linguagem é um filtro e

controle social. As palavras existem ou não, podem ou não ser ditas,

condicionam a organização do que é percebido, de modo que o que o indivíduo

vê como real, passa, obrigatoriamente pelos filtros sociais da linguagem.

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Na lingüística moderna, entretanto, a tendência dominante tem sido

considerar a língua como organizadora da estrutura conceitual do universo e já

se tornou lugar-comum afirmar que ela é "o molde do pensamento", ou "o

instrumento de análise ou recorte da realidade", para quem a língua é o órgão

construtor do pensamento .

Assim sendo, na dimensão da práxis vital, o homem cognoscente

desenvolve, para existir e sobreviver, mecanismos não-verbais de

diferenciação e de identificação: dentro do próprio grupo social a que pertence,

o indivíduo estabelece e articula traços de diferenciação e de identificação. A

partir deste é que ele se torna capaz de discriminar, reconhecer e selecionar,

por entre os estímulos do universo amorfo e contínuo do "real", as cores, as

formas, as funções, os espaços e tempos necessários à sua sobrevivência.

(Blikstein, 1983: 60).

Os traços adquirem valores positivos e meliorativos ou negativos e

pejorativos, transformando-se assim em traços ideológicos, os quais vão

configurar os corredores semânticos ou isotopias. Os corredores semânticos

formam os "óculos sociais" que vão dirigir a percepção e a cognição. É através,

pois dos estereótipos de percepção que vemos a realidade.

2.3 Aspectos Cognitivos

O ambiente familiar não é o único fator facilitador da aprendizagem,

mas desempenha, sem dúvida alguma, um importante papel.

Influenciando no desenvolvimento da cognição, do comportamento, da

sociabilidade e da motivação, o ambiente familiar desenvolve no sujeito sua

relação com o saber e suas características como aluno.

Dentre as condições, presentes no ambiente familiar, tidas como

facilitadoras para a aprendizagem, destacam-se, além do já citado: a

disponibilidade de brinquedos/jogos compatíveis com o nível de

desenvolvimento da criança e que potencializem habilidades cognitivas e

aprendizagem de conteúdos relevantes; a presença de livros ou outros

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materiais de leitura e consulta; espaços próprios onde a criança possa realizar

adequadamente essas atividades, etc. No entanto, apenas a presença desses

recursos materiais não é o suficiente para promover um bom relacionamento

com a aprendizagem.

Um ambiente familiar que contribui positivamente no processo de

aprendizagem de seus membros, além de recursos materiais, oferece

segurança, calma, e inclui adultos com disponibilidade para interagir com as

crianças, ou seja, capazes de funcionar como mediadores entre elas e os

estímulos. Segundo Maturano (1999) é através de seu envolvimento que os

pais fornecem recursos emocionais essenciais ao desenvolvimento de um

senso de competência. Esse envolvimento se traduz em atitudes de assistência

ao desenvolvimento da criança, de encorajamento e reconhecimento aos seus

esforços de autonomia – exigindo que esta resolva seus problemas, mas

mantendo-se disponíveis para dar assistência, caso precise – e a promoção de

atividades sociais e culturais enriquecedoras. De uma forma mais simples, é

praticar atividades como ler para a criança, brincar, passear, conversar com

ela, ajudar em suas tarefas e interessar-se por seu mundo. O compartilhar

dessas atividades lúdicas e as conversas entre pais e filhos, propiciam o

desenvolvimento cognitivo e lingüístico que contribuem diretamente no

processo de aprendizagem formal.

Um outro aspecto no ambiente familiar que contribui positivamente no

processo de aprendizagem, diz respeito às regras e rotina. É importante que a

criança seja cercada de constante (rotina), pois isso dará uma noção de limite e

uma segurança à criança. Em decorrência de regras claras e da exigência de

seu cumprimento, a criança aprende que há relações predizíveis entre suas

ações e as conseqüências das mesmas.

Ainda com relação aos aspectos que influenciam a formação de uma

dificuldade de aprendizagem devemos considerar também o contexto escolar.

Segundo Louro (2003), a própria escola produz diferenças. Desde o

início da sua história a escola exerceu uma ação distintiva fora e dentro dela.

Fora, separando os que tinham dos que, à ela, não tinha acesso; e dentro,

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através de classificações e hierarquizações. “A escola que nos foi legada pela

sociedade ocidental moderna começou por separar adultos de crianças,

católicos de protestantes. Ela também se fez diferente para os ricos e para os

pobres e ela imediatamente separou os meninos das meninas” (Louro, 2003.

p.57).

A escola dita o que cada um pode, ou não, fazer. Separa os meninos

das meninas, os grandes dos pequenos; através de seus símbolos aponta

aqueles que devem ser imitados, etc. Dessa forma, sutil, produz o aprendizado

de uma postura que culmina na constituição de identidades escolarizadas.

Nesse processo, os sujeitos não são receptores passivos, eles se envolvem e

são envolvidos respondendo, reagindo, recusando ou aceitando-o inteiramente,

de acordo com a modalidade de aprendizagem que herdou de sua família.

2.4 A dificuldade de aprendizagem

A aprendizagem é um processo que se inicia bem cedo. A criança

aprende a falar, andar, pensar, enfim, tem aquisições que lhe permitem estar

em contato e se relacionar com o outro. É um processo de construção que vai

ocorrendo a partir da interação permanente dela com tudo que a cerca. Assim,

a aprendizagem inicia-se antes mesmo da fase escolar. Quando a criança

chega a escola já possui uma história que pode ser composta por uma

integração harmoniosa entre seu pensar, sentir, falar e agir, e, neste caso, a

busca e a construção do conhecimento se dá de forma natural e espontânea.

Quando começam a aparecer situações que desestabilizam esta

harmonia, e a criança não tem problemas orgânicos, pode-se pensar que estão

se instalando dificuldades na aprendizagem (Weiss, 1992), que algo não está

bem no seu pensar, na sua expressão, na sua relação com o mundo. Descobrir

e aprender deve ser prazeroso, senão alguma coisa está errada.

Embora o aprender seja um processo natural, ele tem uma grande

complexidade, pois envolve processos de pensamentos, emoções, memória,

percepção, conhecimentos prévios (história e experiências pessoais), etc.

Muitas vezes a criança pode estabelecer uma relação de medo, ansiedade e

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angústia com a aprendizagem, recusando-se a aprender. Nesse caso o

"aprender" pode significar "crescer" e crescer significa perder um lugar

conquistado e seguro na família, preferindo de forma inconsciente, permanecer

com comportamentos regredidos, sem se apropriar dos novos conhecimentos

que lhe são oferecidos. Portanto, a aprendizagem é um processo dependente

de aspectos afetivos - emocionais, cognitivos e sociais que acontecem

simultaneamente. Quando ocorre um problema num desses aspectos, é como

se houvesse um impedimento de realizar um investimento de "energia", por

parte da criança, para as aquisições escolares.

Sabe-se que o problema de aprendizagem traz sofrimento para a

criança e/ou adolescente, e este, pode ser traduzido por comportamentos de

desinteresse, desatenção e irresponsabilidades. Quando isto ocorre não

adianta apenas pensar no reforço ou aulas particulares. A identificação das

causas que estão gerando essas dificuldades requer uma intervenção

especializada. O psicopedagogo é o especialista que, com base no

conhecimento do processo de aprendizagem, consegue detectar o que pode

estar influenciando negativamente o desenvolvimento escolar, ou que

mecanismos a criança está usando que podem estar dificultando o seu

aprender. Essa investigação requer não só uma análise do processo de

aprendizagem da criança, como também do contexto familiar, escolar e social

em que está inserida. A partir dessa investigação é possível entender a causa

que está impedindo suas aquisições escolares, e assim traçar um plano de

intervenção que a possibilite sair da situação de quem não aprende.

Segundo Fernández (1994) a libertação da "inteligência aprisionada",

somente poderá ocorrer através do encontro com o perdido prazer de

aprender. E ao psicopedagogo caberá possibilitar esse encontro através do

olhar e da escuta psicopedagógicos, que ocorrerá a partir da auto-análise das

suas próprias dificuldades e possibilidades no aprender.

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CAPÍTULO III

A AÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NA ESCOLA

A atuação do Psicopedagogo na instituição visa a fortalecer-lhe a

identidade, bem como buscar o resgate das raízes dessa instituição, ao mesmo

tempo em que procura sintonizá-la com a realidade que está sendo vivenciada

no momento histórico atual, buscando adequar essa escola às reais demandas

da sociedade.

Durante todo o processo educativo, procura investir numa concepção

de ensino-aprendizagem que:

Fomente interações interpessoais;

Incentive os sujeitos da ação educativa a atuarem considerando

integradamente as bagagens intelectual e moral;

Estimule a postura transformadora de toda a comunidade educativa

para, de fato, inovar a prática escolar; contextualizando-a;

Enfatize o essencial: conceitos e conteúdos estruturantes, com

significado relevante, de acordo com a demanda em questão;

Oriente e interaja com o corpo docente no sentido de desenvolver mais

o raciocínio do aluno, ajudando-o a aprender a pensar e a estabelecer

relações entre os diversos conteúdos trabalhados;

Reforce a parceria entre escola e família;

Lance as bases para a orientação do aluno na construção de seu

projeto de vida, com clareza de raciocínio e equilíbrio;

Incentive a implementação de projetos que estimulem a autonomia de

professores e alunos;

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Atue junto ao corpo docente para que se conscientize de sua posição

de “eterno aprendiz”, de sua importância e envolvimento no processo de

aprendizagem, com ênfase na avaliação do aluno, evitando mecanismos

menores de seleção, que dirigem apenas ao vestibular e não à vida.

Nesse sentido, o material didático adotado, após criteriosa análise,

deve ser utilizado como orientador do trabalho do professor e nunca como o

único recurso de sua atuação docente.

Com certeza, se almejamos contribuir para a evolução de um mundo

que melhore as condições de vida da maioria da humanidade, nossos alunos

precisam ser capazes de olhar esse mundo real em que vivemos, interpretá-lo,

decifrá-lo e nele ter condições de interferir com segurança e competência.

Para tanto, juntamente com toda a Equipe Escolar, o Psicopedagogo

estará mobilizado na construção de um espaço concreto de ensino-

aprendizagem, espaço este orientado pela visão de processo, através do qual

todos os participantes se articulam e mobilizam na identificação dos pontos

principais a serem intensificados e hierarquizados, para que não haja ruptura

da ação, e sim continuidade crítica que impulsione a todos em direção ao saber

que definem e lutam por alcançar.

Considerando a escola responsável por parcela significativa da

formação do ser humano, o trabalho psicopedagógico na instituição escolar,

que podemos chamar de psicopedagogia preventiva, cumpre a importante

função de socializar os conhecimentos disponíveis, promover o

desenvolvimento cognitivo e a construção de normas de conduta inseridas num

mais amplo projeto social, procurando afastar, contrabalançar a necessidade

de repressão. Assim, a escola, como mediadora no processo de socialização,

vem a ser produto da sociedade em que o indivíduo vive e participa. Nela, o

professor não apenas ensina, mas também aprende. Aprende conteúdos,

aprende a ensinar, a dialogar e liderar; aprende a ser cada vez mais um

cidadão do mundo, coerente com sua época e seu papel de ensinar, que é

também aprender. Agindo assim, a maioria das questões poderão ser tratadas

de forma preventiva, antes que se tornem verdadeiros problemas.

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O termo prevenção como referente à atitude do profissional no sentido

de adequar as condições de aprendizagem de forma a evitar

comprometimentos nesse processo, Partindo da criteriosa análise dos fatores

que podem promover, como dos que têm possibilidade de comprometer o

processo de aprendizagem, a Psicopedagogia Institucional elege a metodologia

e/ou a forma de intervenção com o objetivo de facilitar e/ou desobstruir tal

processo, o que vem a ser sua função precípua, colaborando, assim, na

preparação das gerações para viver plenamente a complexidade característica

da época. Sabemos que o aluno de hoje deseja que sua escola reflita a sua

realidade e o prepare para enfrentar os desafios que a vida social apresenta,

portanto não aceita ser educado com padrões já obsoletos e ultrapassados.

A psicopedagogia trabalha e estuda a aprendizagem, o sujeito que

aprende, aquilo que ele está apontando como a escola em seu conteúdo

sociocultural. É uma área das Ciências Humanas que se dedica ao estudo dos

processos de aprendizagem. Podemos hoje afirmar que a Psicopedagogia é

um espaço transdisciplinar, pois se constitui a partir de uma nova

compreensão acerca da complexidade dos processos de aprendizagem e,

dentro desta perspectiva, das suas deficiências.

Surgiu da necessidade de melhor compreensão do processo de

aprendizagem, comprometida com a transformação da realidade escolar, na

medida em que possibilita, mediante exercício, análise e ação reflexivas,

superar os obstáculos que se interpõem ao pleno domínio das ferramentas

necessárias à leitura do mundo e atuação coerente com a evolução e

progresso da humanidade, colaborando, assim, para transformar a escola

extemporânea, que não está conseguindo acompanhar o aluno que chega a

ela, em escola contemporânea, capaz de lidar com os padrões que os alunos

trazem e de se contrapor à cultura de massas predominante, dialogando com

essa cultura.

Educação e Psicologia, como também Psicanálise, Lingüística e

Filosofia, dentre outras, se unem para participar na solução de problemas que

possam surgir no contexto educativo; todas passam a levar em conta esse

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contexto, os fins da educação e a problemática dos meios para realizá-la,

elevando o aluno à categoria de sujeito do conhecimento, envolvendo na

solução as estratégias pedagógicas adequadas, considerando liderança,

diálogo, visão, pensamento e ação como pilares de sustentação de uma

organização dinâmica, situada, responsável e humana.

Há necessidade de, não apenas conhecer a ação, mas orientá-la,

integrando o trabalho de acompanhamento de procedimentos didáticos à

resolução de problemas de adaptação escolar, que podem ser caracterizados

como aqueles que emergem da relação, da interação entre as pessoas e entre

elas e o meio, surgindo em função de desarmonias entre o sujeito e as

circunstâncias do ambiente. Essas desarmonias podem até adotar

modalidades patogênicas ou patológicas, que requerem encaminhamentos

específicos que podem extrapolar o espaço escolar.

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CAPÍTULO IV

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Durante muito tempo, a criança com dificuldades de aprendizagem, era

encaminhada a um especialista para confirmar sua “normalidade”. Conforme

fosse o resultado desse diagnóstico, a criança era encaminhada para classes

ou escolas especiais que ofereciam um ensino diferenciado, contudo todo esse

processo de deslocamento conseqüentemente também vinha de encontro com

um processo de desmotivação por parte da criança, tendo em vista ser

necessário um novo processo de adaptação a uma nova estrutura educacional,

a novas relações humanas com os colegas, enfim, a todo um retrocesso do

intuito de sanar a dificuldades apresentadas pelo aluno.

Apesar do conceito de dificuldades de aprendizagem apresentar

diversas definições e ainda ser um pouco ambíguo, é necessário que tentemos

determinar à que fazemos referência com tal expressão ou etiqueta

diagnóstica, de modo que se possa reduzir a confusão com outros termos tais

como “necessidades educativas especiais”, “inadaptações por déficit

socioambiental” etc.,.

Podemos assinalar como elementos de definição mais relevantes:

A criança com transtornos de aprendizagem tem uma linha desigual em

seu desenvolvimento. Seus problemas de aprendizagem não são causados por

pobreza ambiental. Os problemas não são devidos a atraso mental ou

transtornos emocionais.

Em síntese, só é procedente falar em dificuldades de aprendizagem

quando fazemos referência a alunos que:

Têm um quociente intelectual normal, ou muito próximo da

normalidade, ou ainda, superior. Seu ambiente sóciofamiliar é normal. Não

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apresentam deficiências sensoriais nem afecções neurológicas significativas.

Seu rendimento escolar é manifesto e reiteradamente insatisfatório.

O que podemos observar, de modo geral, em alunos com dificuldades

de aprendizagem incluem problemas mais localizados nos campos da conduta

e da aprendizagem, dos seguintes tipos:

Atividade motora: hiperatividade ou hipoatividade, dificuldade de

coordenação….., Atenção: baixo nível de concentração, dispersão…, Área

matemática: problemas em seriações, inversão de números, reiterados erros

de cálculo …, Área verbal: problemas na codificação/ decodificação simbólica,

irregularidades na lectoescrita, disgrafías …, Emoções: desajustes emocionais

leves, baixa auto-estima …, Memória: dificuldades de fixação …,

Percepção: reprodução inadequada de formas geométricas, confusão

entre figura e fundo, inversão de letras …,

Sociabilidade: inibição participativa, pouca habilidade social,

agressividade.

Assume-se com todos os conhecimentos, com toda dedicação, os

princípios da normalização e individualização do ensino, optando pela

compreensão ao invés da exclusão. Esta é uma visão que tenta superar a

concepção patológica tradicional dos problemas escolares que se apóia em

enfoques clínicos centrados nos déficits dos alunos e em tratamentos

psicoterapêuticos em anexo aos processos escolares.

Sabe-se que este é um processo complexo em que estão incluídas

inúmeras variáveis: aluno, professor, concepção e organização curricular,

metodologias, estratégias, recursos. Mas, a aprendizagem do aluno não

depende somente dele, e sim do grau em que a ajuda do professor esteja

ajustada ao nível que o aluno apresenta em cada tarefa de aprendizagem. Se o

ajuste entre professor e aprendizagem do aluno for apropriado, o aluno

aprenderá e apresentará progressos, qualquer que seja o seu nível.

Segundo Perrenoud (2001) pode-se duvidar que, mesmo em uma

classe tradicional em que se pratica o ensino frontal, que o professor se dirija

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constantemente a todos os alunos, que cada um deles receba a mesma

orientação, as mesmas tarefas, os mesmos recursos. E, coloca três motivos

para isto:

O professor interage seletivamente com os alunos e, por isso, alguns

têm, mais que outros, a experiência de serem ouvidos ou questionados,

felicitados ou repreendidos. Pergunta ele: quanto à comunicação não verbal,

como ela poderia ser padronizada?

Mesmo nessas classes tradicionais, muitas vezes o trabalho é

realizado em grupos, e o professor circula como um recurso para atender os

alunos.

A diversidade dos ritmos de trabalho pode levar ao enriquecimento ou

ao empobrecimento das tarefas. Assim, sempre há aqueles que terminam

primeiro e têm tempo para brincar, ler, enquanto outros demoram para terminar

e é preciso esperá-los.

Se considerarmos o currículo real como uma série de experiências,

chegaremos, grosso modo, a uma conclusão evidente: o currículo real é

personalizado, dois indivíduos nunca seguem exatamente o mesmo percurso

educativo, mesmo se permanecerem de mãos dadas durante anos".

Quando professores e educadores têm uma reflexão psicopedagógica

é mais fácil analisar o porquê do seu aluno não aprender e quais os fatores que

levam o aluno a ter dificuldades no processo de aprendizagem. Muitas das

vezes os mesmos tendem a procurar um culpado para isso tudo, e o maior

crucificado é o meio familiar em que o aluno vive por sua postura e

comportamento. Sempre há uma desculpa dos fatores que levam o aluno a ter

dificuldades. Preguiça, lentidão ou apenas falta de atenção ou de interesse são

algumas delas, que muitas das vezes são usadas pelos educadores como

forma de tirar de suas costas a responsabilidade, no entanto, essas desculpas

tendem a contribuir para o agravamento dessas dificuldades, deixando o aluno

cada vez mais desmotivado a apreender.

O que Perrenoud deixa claro, é que individualização de itinerários

educativos é possível para os professores, pois ao invés de uma

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individualização deixada ao acaso, "pode ser feita uma individualização

deliberada e pertinente dos percursos educativos às diferentes características,

às possibilidades, aos projetos e às necessidades diferentes dos

indivíduos".(obra citada)

Alunos que reprovam vários anos na mesma série são mais comuns do

que se pode imaginar. Essas crianças sentem que a escola não foi feita para

eles e se evadem. Segundo Freire (1999, p.35), “os alunos não se evadem da

escola, a escola é que os expulsa”. Quem realmente falhou, o aluno ou a

escola? Esses alunos reprovados retornarão no ano seguinte?

Uma criança curiosa que está descobrindo o mundo e suas

possibilidades não progrediu nada em um ano, dois ou três. . . Isto nos faz

questionar o atual sistema de ensino, pois, parece-nos que busca uma

produção em série e com isso apenas evidencia as diferenças sem nada fazer

por elas.

Vários autores, como Sara Pain, Alicia Fernández, Maria Lucia Weiss,

chamam atenção para o fato de que a maior percentual de fracasso na

produção escolar, de crianças encaminhadas a consultórios e clínicas,

encontram-se no âmbito do problema de aprendizagem reativo, produzido e

incrementado pelo próprio ambiente escolar. (Weiss et. al, 1999, p.46)

É importante considerar que a escola deve valorizar os muitos saberes

do aluno, e que seja oportunizado a ele demonstrar suas reais potencialidades.

A escola tem valorizado apenas o conhecimento verbal e matemático, deixando

de fora tantos conhecimentos importantes para sociedade.

O sentimento de pertença deve ser estimulado, alguém acuado, jamais

vai demonstrar as potencialidades que possui. Tornando o ambiente escolar

acolhedor, aceitando a criança como ela é, oferecendo meios para que se

desenvolva, já é uma garantia de dar certo o trabalho em sala de aula.

É necessário que os profissionais da educação adotem uma postura

ética em relação ao aluno, que assim como eles convivem em uma sociedade

excludente.

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Portanto, diversificar as situações de aprendizagem é adaptá-las às

especificidades dos alunos, é tentar responder ao problema didático da

heterogeneidade das aprendizagens, que muitas vezes é rotulada de

dificuldades de aprendizagens.

Não existe ensinar sem aprender e com isto eu quero dizer mais do

que diria se dissesse que o ato de ensinar exige a existência de quem ensina e

de quem aprende. (Freire, 1993).

Essa necessidade da existência de quem ensina e de quem aprende é

fator importantíssimo no processo educacional, pois é através dessa

consciência que ambos, educador e aluno constroem vínculos indispensáveis

para a aprendizagem.

É inegável que o processo ensino-aprendizagem é um processo

construído sociointeracionalmente, entre ensinante-aprendente-meio, a fim de

que todos os componentes possam desfrutar do processo cognitivo, que é o

processo de aprendizagem.

A interação entre o mestre e o estudante é essencial para a

aprendizagem, e o mestre consegue essa sintonia, levando em consideração o

conhecimento das crianças, fruto de seu meio. (Freinet, 2002).

Muitos dos problemas enfrentados na escola, entre eles a indisciplina e

a dislexia provêm de várias situações sócioafetivas não resolvidas no decorrer

dos anos. É uma série de sentimentos que vivenciam no meio e que se

refletem na aprendizagem, às vezes, positivamente e, às vezes,

negativamente.

A aprendizagem está diretamente relacionada à conduta. É

aprendendo que reformulamos nossa maneira de atuar no mundo e sobre ele.

(Soares, 2003).

O educador enquanto mediador do processo ensino-aprendizagem,

bem como protagonista na resolução e estudo das dificuldades de

aprendizagem deve obter orientações específicas para que desenvolva um

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trabalho consciente e que promova o sucesso de todos os envolvidos no

processo.

Dizer que a escola não oferece condições satisfatórias para o

desenvolvimento de um trabalho que atenda as necessidades e dificuldades de

cada aluno é, com certeza, revelar-se acomodado, pois para que aconteça a

superação das dificuldades no ensino é necessário um ingrediente especial

que é a condição humana; sendo os subsídios materiais apenas recursos

dispensáveis. A escola é sim um espaço privilegiado para o bom

desenvolvimento da aprendizagem, pois através dela o aluno pode ter um

convívio direto com novas perspectivas de conhecimentos e diferentes contatos

com indivíduos ímpares.

Quanto a nós, embora possamos considerar um conjunto de fatores,

como o são a motivação e auto-estima do aluno e o envolvimento dos pais,

entre outros, será a qualidade do ensino ministrado que fará a diferença. A

paciência, o apoio e o encorajamento prestado pelo professor serão com

certeza os impulsionadores do sucesso escolar do aluno, abrindo-lhe novas

perspectivas para o futuro. (Correia, 2005)

Vivemos num momento em que o acorde para as necessidades do

aluno vem à tona. Surge no espaço pedagógico a reflexão de que a escola não

pode ser apenas transmissora de conteúdos e conhecimentos, muito mais que

isso, a escola tem a tarefa primordial de “reconstruir” o papel e a figura do

aluno, deixando o mesmo de ser apenas um receptor, proporcionando ao aluno

que seja o criador e protagonista do seu conhecimento. Levar o aluno a pensar

e buscar informações para o seu desenvolvimento educacional, cultural e

pessoal é uma das tarefas primordiais e básicas da educação. Para isso se

fazem necessárias medidas urgentes e precisas.

As dificuldades de aprendizagem devem ser levadas em conta, não

como fracassos, mas como desafios e serem enfrentados, e ao se trabalhar

essas dificuldades, trabalha-se respectivamente a dificuldades existentes na

vida, dando oportunidade ao aluno de ser independente e de reconstruir-se

enquanto ser humano e indivíduo.

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Segundo Paulo Freire (2003), o espaço pedagógico é um texto para ser

constantemente “lido”, interpretado, “escrito” e “reescrito”. Essa leitura do

espaço pedagógico pressupõe também uma releitura da questão das

dificuldades de aprendizagem.

Infelizmente, a aprendizagem, em algumas instituições continua

seguindo o modelo tradicionalista, onde é imposta e não mediada, criando uma

passividade entre aquele que sabe e impõe e aquele que obedece calado.

É necessário levar em conta também os efeitos emocionais que essas

dificuldades acarretam, se faz necessário para a criança um suporte humano e

apoiador para que a mesma possa se libertar do que a faz ter dificuldade.

É louvável dizer que só conseguiremos mediar as dificuldades de

aprendizagem, quando lidarmos com nossos alunos de igual para igual;

quando fizermos da aprendizagem um processo significativo, no qual o

conhecimento a ser aprendido e apreendido faça algum sentido para o aluno

não somente na sua existência educacional como também na sua vida

cotidiana.

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CAPÍTULO V

O DIAGNÓSTICO PSICOPEDAGÓGICO

A não aprendizagem na escola é uma das causas do fracasso escolar.

Segundo Weiss (idem, p.16) considera-se fracasso escolar uma resposta

insuficiente do aluno a uma demanda da escola. A questão do fracasso escolar

na perspectiva psicopedagógica clínica deverá ser analisada considerando-se

as relações existentes entre a produção escolar, o contexto sócio-cultural, a

estrutura orgânica e a estrutura interna do sujeito. Weiss (idem, p. 22) ainda

afirma que a aprendizagem normal se dá de forma integrada no aluno, no seu

pensar, sentir, falar e ouvir.

O diagnóstico é em si uma investigação que segue parâmetros

definidos pelo psicopedagogo para buscar as causas de uma queixa do sujeito,

da família ou da escola. O foco do diagnóstico é o obstáculo no processo de

aprendizagem. O objetivo do diagnóstico não é a inclusão do sujeito em uma

categoria do não aprender, mas obter uma compreensão global da sua forma

de aprender e dos desvios que estão ocorrendo neste processo que leve a um

prognóstico e encaminhamento para o problema de aprendizagem. Procura-se

organizar os dados obtidos em relação aos diferentes aspectos envolvidos no

processo de aprendizagem de forma particular, pertencentes somente àquele

sujeito investigado.

Nesta perspectiva, estamos submetendo o diagnóstico

psicopedagógico ao método clínico (Idem, p.28).

Entendemos método clínico como um método de conversação livre

com a criança sobre um tema dirigido pelo interrogador, que segue as

respostas da criança, que lhe pede que justifique o que diz, explique, diga por

que, que lhe faz contra-sugestões, etc. Segue-se a criança em cada uma de

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suas respostas. Sempre guiado por ela, faz-se com que ela fale cada vez mais

livremente. Assim, acaba-se por obter, em cada um dos domínios da

inteligência um procedimento clínico de exame, análogo ao que os psiquiatras

adotaram como meio de diagnóstico.

Ao realizar as experiências com as crianças, deve-se procurar seguir

determinados passos, tendo objetivos a serem alcançados, no sentido de

compreender como as crianças percebem determinados fenômenos e quais

são suas teorias a respeito. A partir destes estudos, é possível refletir sobre

como se processa a aprendizagem e o que se pode propor para tal.

Esta forma de atuar na clínica psicopedagógica possibilita ao terapeuta

levantar hipóteses provisórias que poderão ser testadas continuamente ao

longo do diagnóstico até chegar a uma hipótese final, que resultará no relato de

devolução para a família.

A dificuldade percebida pelo indivíduo, pela escola, família e grupo

social é o sintoma, ou seja, “o que emerge da personalidade em interação com

o sistema social em que está inserido o sujeito” (Weiss, op. cit. 1992, p. 28).

Podemos dizer que um obstáculo apresentado em uma situação pode não

aparecer em outro contexto diferente.

A partir da constatação de um desvio no processo de aprendizagem, é

necessário que se formule a pergunta: “desvio em relação a quê?” Esta

parametrização é fundamental no processo diagnóstico, pois irá definir a

qualidade e a quantidade deste desvio e sua importância no desenvolvimento

escolar. Depois de analisado o desvio, é possível planejar o diagnóstico.

Para começar o processo diagnóstico o terapeuta precisa considerar

dois grandes eixos de análise que devem interagir de forma dialética: o

horizontal (a-histórico) e o vertical (histórico). No eixo horizontal, explora-se

basicamente a situação do presente, buscando as causas que existem em

paralelo no tempo como sintoma. No eixo vertical, ou seja, histórico, procura-se

entender a construção geral do indivíduo contextualizando no tempo.

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Em um diagnóstico, um dos pontos mais importantes é a competência

e sensibilidade do terapeuta em explorar todas as dimensões, ou aspectos

como denomina Weiss, aplicando-as aos dois eixos principais.

Tratando o sintoma como um desvio de aprendizagem, é necessário

que o foco não esteja somente no sujeito, mas também nas suas relações com

seu grupo social, instituição e objeto de aprendizagem.

Para Weiss (op. cit.), o objetivo principal do diagnóstico

psicopedagógico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no Modelo de

Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro

do esperado pelo meio social. Para conhecer esse Modelo de aprendizagem é

necessária a análise dos dados colhidos com a escola, a família e o sujeito na

perspectiva dos dois eixos descritos acima.

Da integração de dados obtidos surge o prognóstico e o conteúdo para

a formulação da hipótese final para a entrevista de devolução diagnóstica. A

relação sujeito-terapeuta é também de fundamental importância para o

processo diagnóstico. A qualidade e a validade do diagnóstico dependerão

dessa relação.

Tudo na comunicação entre estes dois sujeitos deverá ser analisada

durante o diagnóstico: a fala, os gestos, os silêncios, a linguagem corporal, etc.

Como Modelo de Aprendizagem entende-se “o conjunto dinâmico que

estrutura os conhecimentos que o sujeito já possui, os estilos usados nessa

aprendizagem, o ritmo e áreas de expressão da conduta, a mobilidade e o

funcionamento cognitivos, os hábitos adquiridos, as motivações presentes, as

ansiedades, defesas e conflitos em relação ao aprender, as relações vinculares

com o conhecimento em geral e com o objeto de conhecimento escolar, em

particular, e o significado da aprendizagem escolar para o sujeito, sua escola e

sua família” (Weiss, 2000, p.32).

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5.1 Etapas do diagnóstico

O diagnóstico psicopedagógico é composto de várias etapas que se

distinguem pelo objetivo da investigação em um dos eixos e dimensões

apresentadas.

Desta forma, temos momentos de anamnese só com os pais ou com

toda a família para a compreensão das relações familiares e sua relação com o

Modelo de aprendizagem do sujeito; de avaliação da produção escolar e dos

vínculos com objetos de aprendizagem escolar; de pesquisa sobre os

processos de construção e desempenho das estruturas cognitivas (diagnóstico

operatório); de avaliação de desempenho em teste de inteligência e viso-

motores; de análise dos aspectos emocionais por meio de testes e sessões

lúdicas, de entrevistas com a escola ou outras instituições em que o nosso

sujeito faça parte; etc. Esses momentos podem ser estruturados dentro de uma

seqüência diagnóstica estabelecida a cada caso após os contatos iniciais.

Existem diferentes modelos de seqüência diagnóstica, como os que

trouxeram para a psicopedagogia a herança da clínica psicológica tradicional,

cujo diagnóstico é composto de anamnese (entrevista com a família buscando

conhecer a história do sujeito), testagem e provas pedagógicas, laudo

(relatório) e devolução ao paciente ou família, necessariamente nesta ordem,

ou como a da Epistemologia Convergente, em que a seqüência diagnóstica é

composta de uma Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA),

testes para averiguar a estrutura cognitiva e emocional, entrevista de

anamnese e elaboração do informe psicopedagógico para o sujeito e para a

família.

Será adotado como modelo para a prática clínica psicopedagógica o

desenvolvido por Weiss (idem), que é o utilizado pela autora deste trabalho na

sua prática no consultório. A seguir apresentamos as etapas que compõem o

modelo e o caracterizam:

1. Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S)

2. Entrevista de Anamnese

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3. Sessões lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças)

4. Complementação com provas e testes (quando necessário)

5. Síntese diagnóstica – Prognóstico

6. Entrevista de Devolução e Encaminhamento.

Estas etapas podem ser modificadas quanto a sua seqüência, e

maneira de aplicá-las, como, por exemplo, entrevistas separadas para casais

separados que não se relacionam amigavelmente; duas anamneses, uma no

início e outra antes da devolução, quando há necessidade de maior

investigação junto à família; primeira sessão com o sujeito, no caso de

adolescentes; sessões lúdicas com membros da família convocados, quando

há necessidade de analisar a relação entre estes sujeitos e suas implicâncias

no processo de aprendizagem.

No diagnóstico é importante que todas as regras de relacionamento,

horários e honorários sejam bem definidos desde o primeiro contato. Essas

regras devem ser claras e definidas em conjunto com o sujeito e sua família.

Por isso, é necessário o estabelecimento de um contrato com os pais e a

construção de um enquadramento com estes e com o sujeito. São aspectos

importantes do contrato e do enquadramento: estabelecimento de funções,

atividades e atitudes, previsão do número de sessões do diagnóstico e forma

de encerramento, definição de dias, horários e duração da sessão, definição do

local, honorários contratados e forma de pagamento.

Vamos apresentar mais detalhadamente cada etapa da seqüência

diagnóstica com o objetivo de clarificar o processo diagnóstico.

5.1.1 Entrevista Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S)

A E.F.E.S, como primeira entrevista, visa a compreensão da queixa

nas dimensões da escola e da família, a captação das relações e expectativas

familiares centradas na aprendizagem escolar, a expectativa em relação à

atuação do terapeuta, a aceitação e o engajamento do paciente e de seus pais

no processo diagnóstico, a realização do contrato e do enquadramento e o

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esclarecimento do que é um diagnóstico psicopedagógico (Weiss, idem, p.50)

Nesta entrevista pode-se reunir os pais e a criança ou até a família,

dependendo da disponibilidade. Fernandez (1994, p.126) acredita que

devemos ler “psicopedagogicamente” a produção ou dramatização de um

grupo numa E.F.E.S., posicionando-se em um lugar analítico, assumindo uma

atitude clínica, à qual será necessário incorporar conhecimentos, teoria e

saber, acerca do aprender. Ressalta ainda que o terapeuta, posicionando-se

em um lugar analítico permite ao paciente organizar-se e dar sentido ao

discurso a partir de um outro que escuta e não desqualifica, nem qualifica. A

atitude clínica pode ser resumida em escutar e traduzir, incorporando-se

conhecimentos sobre como se aprende e sobre o organismo, corpo,

inteligência e desejo, uma teoria psicopedagógica e saber sobre o aprender e o

não aprender. Para Weiss, (op. cit., p.41) durante este tipo de sessão, é

importante observar a relação entre a temática abordada, a dinâmica imposta

ao encontro e o produto de uma atividade que venha a ser realizada por qual

membro do grupo. Fernandez (op. cit., p. 131) também desenvolveu um guia

de atitudes a serem observadas pelo psicopedagogo neste tipo de sessão:

escutar e olhar; deter-se nas fraturas do discurso; observar e relacionar com

que aconteceu previamente à fratura; descobrir o esquema de ação

subjacente; buscar a repetição dos esquemas de ação; e interpretar a

operação, mais do que os conteúdos. Neste tipo de entrevista, é importante

que sejam colhidos dados relevantes para a organização de um sistema

consistente de hipóteses que servirá de guia para a investigação na próxima

sessão.

5.1.2 Entrevista de Anamnese

Como a E.F.E.S, a anamnese também é uma entrevista, com foco mais

específico, visando colher dados significativos sobre a história do sujeito na

família, integrando passado, presente e projeções para o futuro, permitindo

perceber a inserção deste na sua família e a influências das gerações

passadas neste núcleo e no próprio. Na anamnese, são levantados dados das

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primeiras aprendizagens, evolução geral do sujeito, história clínica, história da

família nuclear, história das famílias materna e paterna e história escolar. O

pré-requisito para análise deste tipo de sessão é o mesmo apresentado

anteriormente na E.F.E.S.

5.1.3 Sessões lúdicas centradas na aprendizagem (para crianças)

As sessões lúdicas centradas na aprendizagem são fundamentais para

a compreensão dos processos cognitivos, afetivos e sociais, e sua relação com

o Modelo de Aprendizagem 2 do sujeito. Segundo Fernandez (idem, p. 107), no

diagnóstico, o objetivo é tornar claro o significado da adoção de um Modelo de

Aprendizagem, diferindo-o do Modelo de Inteligência. A estrutura intelectual

busca um equilíbrio para estruturar a realidade e sistematizá-la através de dois

movimentos que Piaget definiu como assimilação e acomodação 3. A

aprendizagem é um processo que implica a Modalidade de Inteligência, um

organismo, o desejo, articulados em um determinado equilíbrio. Analisando a

modalidade de aprendizagem é como uma matriz, um molde, um esquema de

operar que vamos utilizando nas diferentes situações de aprendizagem

(Fernandez, 1994, p. 107).

A adaptação do organismo se dá através da ação sobre o meio por

intermédio dos esquemas motores, que são engendrados pelo funcionamento

desse organismo. As trocas se realizam graças a um processo de equilibração

progressivo responsável pela construção das estruturas mentais. Tal

equilibração se dá no interjogo das funções da adaptação: a acomodação que

modifica a estrutura do organismo e a assimilação, em que os objetos são

intergrados a essa estrutura (Fernandez, 1994, p. 32).

Modalidade de Inteligência em operação, podemos levantar hipóteses,

testar e tirar conclusões sobre a Modalidade de Aprendizagem do sujeito.

A atividade lúdica fornece informações sobre os esquemas do sujeito,

como organizam e integram o conhecimento em um nível representativo. A

observação desses esquemas pode levar à percepção de desequilíbrios entre

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as atividades assimiliativas e acomodativas, apontando para obstáculos no

processo de aprendizagem.

O que nos interessa chegar a compreender neste ponto é a

oportunidade que a criança teve para investigar (aplicar seus esquemas

precoces) e para modificar-se (por transformação dos seus esquemas), com

implicações posteriores dessas atividades no jogo e na imitação, o que leva à

constituição de símbolos e imagens.

Segundo Weiss (op.cit, p.72), é no processo lúdico que a criança

constrói seu espaço de experimentação, de transição entre o mundo interno e

externo. Neste espaço transacional dá-se a aprendizagem. Por este motivo,

torna-se tão importante no trabalho psicopedagógico. A avaliação pedagógica

pode ocorrer em situações criadas nas sessões lúdicas, observando-se nas

brincadeiras como o sujeito faz uso dos conhecimentos adquiridos em

diferentes situações escolares e sociais e como os usa no processo de

assimilação de novos conhecimentos.

Expressa assim sua opinião entre o brincar e a autodescoberta: É no

brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser

criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o

indivíduo descobre o eu.

Neste tipo de sessão, observa-se a conduta do sujeito como um todo,

colocando também um foco sobre o nível pedagógico, contudo deve-se ter

como postulado que sempre estarão implicados o seu funcionamento cognitivo

e suas emoções ligadas ao significado dos conteúdos e ações.

5.1.4 Provas e testes

As provas e testes podem ser usadas, se necessário, para especificar

o nível pedagógico, estrutura cognitiva e/ou emocional do sujeito. Podemos

lançar mão de provas e testagens específicas que irão fornecer um parâmetro

bem evidente a partir das respostas. O uso de provas e testes não é

indispensável em um diagnóstico psicopedagógico, representa um recurso a

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mais a ser utilizado quando avaliado necessário, devendo ser escolhido de

acordo com cada caso. Provas operatórias, testes psicométricos e técnicas

projetivas poderão ser selecionados de acordo com a necessidade de

confirmação de aspectos levantados nas hipóteses construídas ao longo das

sessões anteriores (E.F.E.S, sessões lúdicas centradas na aprendizagem,

anamnese, etc.).

Os testes psicométricos são atividades propostas ao sujeito com o

objetivo de medir e avaliar o seu Q.I. (coeficiente de inteligência), coeficiente de

atenção e memória. Os testes psicométricos são avaliados por uma medida

objetiva, cuja finalidade é analisar os resultados encontrados em comparação

com escalas de padrões, e assim enquadrar em percentis. Weiss (op. cit., p.

113) destaca que o mais importante para a clínica psicopedagógica não são os

resultados numéricos do Q.I., mas verificar como e quando o sujeito está

podendo usar sua inteligência.

Segundo Weiss (idem, p. 108), os testes mais usados na clínica

psicopedagógica são o CIA 8, WISC 9, RAVEN 10, por serem de fácil aplicação

e avaliação, possibilidade de análise operatória, análise qualitativa, de uso

parcial das provas, de realização de inquéritos após as respostas, de

possibilidade, boa observação do processo de realização.

Os testes projetivos, têm por objetivo investigar a dinâmica e a

estrutura da personalidade. Sua caracterização se dá por: S um estímulo

(material de teste) suficientemente ambíguo e indefinido para que o sujeito, ao

dar sua resposta, projete seus conteúdos internos; S uma intrusão que

proporciona ao sujeito liberdade de elaborar sua resposta da maneira que

escolher. Ao mesmo tempo em que tem a liberdade da escolha, é obrigado a

mostrar-se, através de sua conduta, seguindo a intrusão do teste; S uma

relação com o examinador, que permita a aplicação do teste, no qual o

testando está livre para dar a resposta escolhida, mas ao mesmo tempo vai ser

revelado na interpretação do clínico.

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O CIA 8 é a adaptação brasileira do “Escala de Inteligência Wechsler

para Adultos”. Mantém uma estrutura de subtestes semelhante ao WISC. Faixa

etária a que se destina é a partir do 15 anos.

O WISC 9 é a “Escala de Inteligência Wechsler para Crianças”

apresentada sob a forma de subtestes agrupados em verbais e de Execução.

Cada subtetste pretente avaliar um tipo de função e se estrutura por ordem

crescente de dificuldade. Os resultados brutos de cada subteste são

transformados em resultados ponderados através de tabelas do grupo de

idades em anos e meses do sujeito. A faixa etária que se destina é de 5 a 15

anos.

O teste das matrizes progressivas de RAVEN 10 consiste na busca do

complemento de um sistema de relações ou matrizes, com uma, duas ou mais

variáveis, devendo o sujeito deduzir relações ou correlações. É apresentado

em duas escalas que atendem a faixas etárias distintas: Escala Geral atende

de 12 a 65 anos e Escala Especial de 4 a 11 anos.

Como exemplo poderemos citar o C.A.T. 12, um dos testes projetivos

mais utilizados nas sessões destinadas a provas e testes. O C.A.T. consiste

em apresentar à criança uma série de dez lâminas com figuras, cada uma, com

situações diferentes para que conte o que está acontecendo, o que aconteceu

antes e o que pode acontecer depois. As lâminas relacionam temáticas que

põem em jogo significações universais de aprendizagem: alimentação,

comunicação e controle de esfíncteres (Fernandez, 1994, p. 223). Pode-se

observar através dos relatos das lâminas do C.A.T.: S Se a criança dá uma

estrutura ao relato. Se sabe dar-lhe um desfecho.

S Se pode designar um herói e fazê-lo passar por uma prova.

S Se pode elaborar um argumento e como o faz.

S Se pode analisar o tipo de tema escolhido em relação com as

significações do aprender.

As provas operatórias, segundo Weiss (op. cit., p. 102), têm como

objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas noções chaves do

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desenvolvimento cognitivo, destacando-se o nível de operatório do pensamento

da criança, ou seja, o nível da estrutura cognoscitiva com que opera. Os níveis

operatórios foram caracterizados por Piaget em quatro grandes etapas.

Vejamos no quadro abaixo a caracterização de cada uma delas para entender

os parâmetros que delineiam as provas operatórias, segundo Soares (2003,

p.71): As provas consistem em apresentar um material previamente organizado

para o sujeito e propor atividades em que pode ser observada sua estrutura

cognitiva em ação. Essa análise irá apresentar o nível operatório do sujeito e

sua correlação com uma faixa etária.

Os resultados são obtidos através da análise das respostas que podem

ser agrupadas da seguinte forma: S nível 1, indica ausência total da noção, ou

seja, não atingiu o nível operatório neste domínio; S nível 2, indica que as

respostas expressam instabilidade em relação ao tipo de operação

apresentado; S nível 3, indica a aquisição do nível operatório no domínio

testado.

A descrição destas provas pode ser encontrada em diversas obras

sobre a teoria piagetiana e originalmente nas obras de Piaget em que versa

sobre Epistemologia Genética. A aplicação deste tipo de teste segue uma

metodologia que consiste na aplicação de um interrogatório (método clínico)

com a finalidade de conhecer como o sujeito pensa, quais os juízos que faz e

como argumenta para justificar suas respostas.

Os testes apresentados, em geral, avaliam aspectos, na maioria das

vezes, descontextualizados da realidade imediata do sujeito, muitas vezes não

expressando uma situação real do seu sintoma. Além disso, são testes

destinados à utilização de psicólogos, que são adotados na clínica

psicopedagógica a partir de uma nova leitura adaptada do seu processo de

aplicação e dos seus resultados. Assim, segundo Weiss (op. cit., p. 100),

acreditamos que todos os momentos da prática diagnóstica devam ser

vivenciados em seus aspectos afetivos, cognitivos, corporais e pedagógicos,

incluindo-se uma visão genética.

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Como exemplo, podemos colher dados de origem emocional em uma

prova operatória, ou dados cognitivos em testes projetivos.

As observações sobre o funcionamento cognitivo do paciente não são

restritas as provas operatórias; elas devem ser feitas ao longo de todo o

processo diagnóstico. Na anamnese verifica-se com os pais como se deu esta

construção e as distorções havidas no percurso; nas diferentes sessões de

caráter lúdico, na avaliação dos testes analisam-se aspectos de caráter

cognitivo, como por exemplo: conservação do comprimento, superfície e

volume nas construções com sucata; outros dados da construção espacial no

Bender, RAVEN, WISC e CIA; aspectos de inclusão de classe na prova de

semelhança do WISC (Weiss, op. cit. p. 102).

Fernandez (op. cit., p. 193), considera que as provas psicométricas

provêem um variado espectro de material de utilidade na clínica. Citando

Manoni, fala de duas vertentes de grande valor para a clínica que podem ser

observadas: o indivíduo como sujeito do conhecimento, sujeito epistêmico, e

como sujeito do desconhecimento, desconhecimento de seu desejo, daquilo de

que o esquecimento, o ato falho, o sintoma, demandam e falam.

Pain (1985, p. 60) defende que as provas projetivas tratam de

desvendar quais são as partes do sujeito depositadas nos objetos que

aparecem como suporte da identificação e que mecanismos atuam diante de

uma instrução que obriga o sujeito a representar em situações estereotipadas e

carregadas emotivamente.

Para o diagnóstico psicopedagógico interessa concentrar a atenção na

eficácia e limitações dos recursos cognitivos empregados para organizar sua

descarga emotiva. Ainda segundo Pain, desta forma, pode-se registrar o modo

que a inteligência aborda o objeto, o reconhece e o associa à sua experiência,

o discrimina e o utiliza favoravelmente com sua necessidade.

Em relação às provas projetivas, Fernandez (op. cit., p. 219) considera

que a significação simbólica ocorre ao mesmo tempo em que é demonstrada a

capacidade de organização lógica. Afirma que o pensamento é só um, não há

um pensamento inteligente e outro simbólico, são entrelaçados; quando falta

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um deles a trama não se constrói. Toda simbolização, até o próprio sonho,

necessita de inteligência. Em um diagnóstico, devemos nos deter em: analisar

como os recursos cognitivos possibilitam a organização da projeção, a

expressão dramática do sujeito e a comunicação de suas angústias; observar o

tipo de leitura da realidade.

5.1.5 Síntese diagnóstica

A síntese diagnóstica é o momento em que é preciso formular uma

única hipótese a partir da análise de todos os dados colhidos no diagnóstico e

suas relações de implicância, que por sua vez aponta um prognóstico e uma

indicação. Esta etapa é muito importante para que a entrevista de devolução

seja consistente e eficaz.

5.1.6 Entrevista de devolução

A Entrevista de Devolução e encaminhamento é o momento que marca

o encerramento do processo diagnóstico. É um encontro entre sujeito,

terapeuta e família visando relatar os resultados do diagnóstico, analisando

todos os aspectos da situação apresentados, seguindo de uma síntese

integradora e um encaminhamento. Esta é uma etapa do diagnóstico muito

esperada pela família e pelo sujeito e que deve ser bem conduzida de forma

que haja a participação de todos, procurando eliminar as dúvidas ou pelo

menos discuti-las exaustivamente afastando rótulos e fantasmas que

geralmente estão presentes em um processo diagnóstico.

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CONLUSÃO

A dificuldade de aprendizagem é um tema que deve ser estudado

levando-se em conta todas as esferas em que o indivíduo participa (família,

escola, sociedade, etc...) Sabe-se que nunca há uma causa única para o

fracasso escolar e que também um aluno com dificuldade de aprendizagem

não é um aluno que tem deficiência mental ou distúrbios relativos, na verdade,

existem aspectos fundamentais que precisam ser trabalhados para obter-se um

melhor rendimento em todos os níveis de aprendizagem e conhecimento.

Quando falamos de aprendizagem e conhecimento não estamos nos referindo

somente a conteúdos disciplinares, mas também a conhecimento e

desenvolvimento vital que são tão importantes quanto.

Fica claro, como os vários fatores culturais influenciam o sistema

familiar e como este segundo grupo determina grandemente as relações de

seus membros com a cultura e com o saber. Temos, como conseqüência, um

ciclo onde a cultura impõe a necessidade de uma aprendizagem eficaz por

parte de seus membros e estes, por sua vez, sente a necessidade deste

aprendizado para poder ter a sensação de dominação dessa cultura. Aqueles

que não conseguem se adequar, ficam à margem, rotulados, e sofrendo as

conseqüências de uma identidade formada em cima de uma dificuldade (no

início ligada apenas a aprendizagem, mais tarde a todos os aspectos de sua

vida). A demanda pode se tornar insuportável para esse indivíduo promovendo

um fechamento ainda maior como opção a uma exposição a questões que este

não consegue, de forma alguma, dar respostas.

É importantíssimo ressaltar toda contribuição da Psicopedagogia,

promovendo uma análise mais aprofundada de tudo relativo à aprendizagem

proporcionando uma reestruturação e reinterpretação do verdadeiro fator que

leva às dificuldades de aprendizagem, reconhecendo-se que essas dificuldades

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fazem parte de um sistema bio-psico-social que envolve a criança, a família, a

escola e o meio social em que vive.

Enfim, não devemos tratar as dificuldades de aprendizagem como se

fossem problemas insolúveis, mas, antes disso, como desafios que fazem parte

do próprio processo da Aprendizagem, a qual pode ser normal ou não-normal.

Também parece ser consensual a necessidade imperiosa de se identificar e

prevenir o mais precocemente possível as dificuldades de aprendizagem, de

preferência ainda na pré-escola.

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BIBLIOGRAFIA

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