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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA O FEDERALISMO FISCAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 Por: Paulo Cézar Teixeira Orientador Prof. Anselmo Souza Rio de Janeiro 2012

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO … · 1.2 Origens do pacto federativo 11 1.3 Sistema Tributário de outros países 14 1.3.1 Federalismo italiano 14 1.3.2 Federalismo

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O FEDERALISMO FISCAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Por: Paulo Cézar Teixeira

Orientador

Prof. Anselmo Souza

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O FEDERALISMO FISCAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Tributário.

Por: Paulo Cézar Teixeira

3

AGRADECIMENTOS

....aos amigos e parentes, clientes,

fornecedores, ao estágio, etc......

4

DEDICATÓRIA

.....dedica-se ao pai, mãe, amigo,

cônjuge, familiar, filho,.......

5

"Nada é tão poderoso

quanto uma ideia cuja hora chegou."

Vítor Hugo

6

RESUMO

Neste estudo bibliográfico é focalizado o Federalismo Fiscal brasileiro,

em sua evolução histórica até a Constituição de 1988, e as consequências

obtidas pela implantação das medidas ordenadas pela Carta Magna em termos

de distribuição dos direitos de recolhimento dos tributos e suas formas de

aplicação, nos níveis federal, estadual e municipal. São apresentadas algumas

propostas que, aprovadas, vêm sendo empregadas para executar a

redistribuição de renda entre os cidadãos, função social mais importante dos

tributos pagos pela população e também são feitas sugestões para que sejam

transformadas em documentos legais propostas que vêm sendo apresentadas

por estudiosos, com este mesmo objetivo.

7

METODOLOGIA

O embasamento teórico ficou por conta da seleção e estudo de trechos

de livros e artigos publicados em periódicos impressos ou divulgados pela rede

virtual, de nível jurídico e acadêmico, atuais, que foram resumidos, discutidos e

comentados no presente trabalho. Entre os principais autores podem ser

citados: Andréa Teixeira Lemgruber, Nelson Leitão Paes, Marcelo Lettieri

Siqueira, Mauro Santos Silva, Fernando de Holanda Barbosa e Luiz Gustavo

Lovato, entre outros.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO 10 CAPÍTULO I - Aspectos históricos 11 1.1 Conceitos 11 1.2 Origens do pacto federativo 11 1.3 Sistema Tributário de outros países 14 1.3.1 Federalismo italiano 14 1.3.2 Federalismo na Espanha 15 1.3.3 Federalismo nos Estados Unidos 16 1.3.4 Sistema tributário no Japão 17 1.3.5 Sistema tributário do Reino Unido 18 CAPÍTULO II – Evolução do Federalismo Brasileiro 19 CAPÍTULO III – Federalismo Brasileiro Pós-Constituição de 1988 23 3.1 Tributos Federais 23 3.2 Tributos Estaduais 24 3.3 Tributos Municipais 24 CAPÍTULO IV – Algumas propostas recentes 25 CONCLUSÃO 34 REFERÊNCIAS 35

9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO I - Aspectos históricos 11

CAPÍTULO II – Evolução do

Federalismo Brasileiro 18

CAPÍTULO III – Federalismo Brasileiro

Pós-Constituição de 1988 23

CAPÍTULO IV – Algumas propostas

recentes 25

CONCLUSÃO 33

REFERÊNCIAS 34

10

INTRODUÇÃO

O Federalismo Fiscal na Constituição de 1998 é o tema deste estudo

jurídico acadêmico, que irá portanto abordar a problemática que pode ser

resumido na seguinte questão: A competência para tributar e receber as

receitas públicas acha-se distribuída entre estados e municípios de forma

equânime e justa, ou apresenta aspectos que deveriam e poderiam ser

aperfeiçoados?

A justificativa para a realização do trabalho é que a análise da

autonomia dos municípios e estados antes e depois da Constituição de 1988,

realça a dupla face assumida pelo pacto federativo nas finanças públicas

atreladas à descentralização de políticas públicas, tornando qualquer dos entes

da Federação competente para a imposição de três tipos de tributos, o que

repercute de forma brutal na economia de pessoas físicas e jurídicas,

refletindo-se portanto na vida de cada cidadão e no desenvolvimento do País

como um todo.

O objetivo geral da pesquisa é estudar, de forma detalhada, os tributos

de competência federal, estadual e municipal. Os objetivos específicos são: 1)

analisar a evolução do endividamento dos estados; 2) destacar o Programa de

Reestruturação Fiscal e Financeira e a Lei de Responsabilidade Fiscal, no que

tange à centralização e descentralização.

A hipótese subjacente à questão é de que poderiam e deveriam ser

adotadas, pelo legislador, medidas visando à redução das desigualdades

regionais, constando de políticas, benefícios e incentivos fiscais, que trariam

em seu bojo os benefícios da estabilidade fiscal.

O trabalho se resume a analisar o pensamento de autores relevantes

no cenário jurídico nacional, no tocante ao pacto federativo sob a luz da

Constituição de 1988, comparada às normas vigentes anteriormente, no Brasil,

e às existentes no Direito de outros povos.

11

No Capítulo I serão revistos alguns aspectos históricos do Federalismo

Fiscal; no Capítulo II, estudaremos a evolução do processo; no Capítulo III,

serão analisadas as modificações implantadas pela Constituição de 1988 e,

no Capítulo IV, serão apresentadas e comentadas algumas experiências

recentes.

12

CAPÍTULO I

ASPECTOS HISTÓRICOS

1.1 - Conceitos

Não existe unanimidade quanto ao conceito mais adequado para o

termo Federalismo. No entanto, um conceito genérico define o pacto federativo

como a união de entes federados (estados, colônias ou regiões) detentores de

autonomia e submetidos a um poder central, geral, dotado de soberania. Pode

ou não existir a hierarquização do poder central para com os entes federados

e, na mesma lógica, a autonomia destes elementos pode ocorrer em vários

níveis, seguindo o que tiver sido disposto pela Constituição por eles adotada.

Entende-se por Constituição a Carta Magna que rege o funcionamento

da federação e as competências de suas partes formadoras: é o texto legal

que determina de que forma funciona o pacto federativo em função de uma

ordem jurídica estabelecida e aceita entre as partes.

1.2 - Origens do pacto federativo

O primeiro pacto surgiu na História Universal, segundo Lovato (2006),

quando as treze colônias inglesas na América do Norte se reuniram

(...) para se livrarem do jugo inglês, criaram os Estados Unidos da América, formalizado através da Constituição de 1787. (...) embora alguns autores apontem a Confederação Helvética, surgida em 1921, como o primeiro exemplo de aliança federativa entre Estados, reconhece-se geralmente que o Estado Federal moderno nasceu apenas em 1787, com o surgimento dos Estados Unidos da América.

Silva (2005), analisando a descentralização fiscal em seus três

aspectos de autonomia, cooperação e concorrência, relatou que, na

organização governamental federativa, o setor público utiliza-se de diversos

13

centros decisórios, combinando instrumentos operados pelo governo central e

outros administrados pelos governos subnacionais. A adoção do federalismo

fiscal abrange a distribuição de competências constitucionais fiscais entre os

diferentes níveis de governo, de forma que cada um, de modo autônomo, e na

medida de suas competências e capacidade de financiamento, venha a

construir desenhos institucionais capazes de disciplinar os procedimentos de

contribuição e gestão tributária, transferências fiscais, composição e dimensão

da despesa.

O processo de descentralização, característico do federalismo, é

comandado pela razão econômica central da otimização da relação existente

entre preferências dos agentes econômicos e o perfil do sistema fiscal,

gerando um ambiente de produção e consumo em que o sistema de preços

não é capaz de fornecer informações relativas às preferências dos indivíduos,

uma vez que as decisões alocativas do governo não são definidas pela lógica

das preferências reveladas nos espaços de mercado, isto é, do ponto de vista

normativo, o mecanismo ótimo de provisão de bens públicos considera as

preferências coletivas, ao passo que o mercado aloca em função das

preferências individuais.

A natureza dinâmica do federalismo fiscal faz com que ele adote

configurações variadas no decorrer do tempo e conforme o espaço. Este

processo é produto ainda da interação entre as regras institucionais e a

organização e dinâmica econômica do País. O conceito de instituições toma

por referência a proposição de North (1998, p. 7) segundo a qual:

(...) as instituições constituem as regras do jogo numa sociedade, mais formalmente, representam os limites estabelecidos pelo homem para disciplinar as interações humanas. Consequentemente, e em compensação, estruturam incentivos de natureza política, social e econômica.

Segundo Soláns (1977, p. 17), a configuração do federalismo seria

resultante da articulação entre as regras do jogo, ou etapa constitucional, e o

impacto dessas regras no sistema econômico, ou etapa funcional. As

alterações havidas em um desses elementos geram conseqüências sobre o

desenho federativo, o que pode resultar em transformações no quadro de

14

competências em escala nacional ou na capacidade fiscal para o atendimento

das demandas orientadas ao setor público em cada nível de governo ou

unidade federativa (SOLÁNS, 1977, apud SILVA, 2005).

As relações fiscais, cooperativas ou competitivas são viabilizadas por

três mecanismos:

• O primeiro, denominado vertical, refere-se às relações

estabelecidas entre os três níveis de governo: federal, estadual e

local - ou entre pelo menos dois desses segmentos;

• O segundo, definido como horizontal, está associado às relações

firmadas entre unidades federativas em um mesmo nível de

governo, ou seja, entre Estados ou entre municípios;

• por fim, tem-se o modelo misto, que articula diferentes níveis de

governo e diversas unidades federativas.

As formas de gestão federativa podem ser adotadas como decorrência

de imposição institucional ou como produto da livre decisão entre as partes,

com base no julgamento de que ações resultantes do esforço cooperativo ou

competitivo podem levar à otimização dos retornos esperados pelas unidades

federativas envolvidas no processo (SILVA, 2005).

1.3 – Sistema Tributário de outros países

1.3.1 – Federalismo italiano

A Itália, membro efetivo da Comunidade Européia, uma República

Parlamentarista, tem o direito de exercício de sua soberania. Internamente, o

País está dividido em regiões, e não em estados, e o sistema bicameral do

Congresso Nacional tem suas cadeiras determinadas conforme a população

de cada uma.

Segundo Werneck (2000), "a República se divide em Regiões,

Províncias e Comunas", sendo que somente as Regiões possuem autonomia

funcional e político-administrativa, conforme os limites estabelecidos na

15

Constituição. Não possuem governadores, mas são administradas diretamente

pelo Conselho Regional (Iegislativo), pela Junta (executivo) e seu presidente.

As Regiões são dotadas de competência para instituir tributos

previamente determinados pela Constituição, devidamente coordenados com

as finanças da República, das Províncias e das Comunas. Para reduzir as

desigualdades regionais e, "particularmente, para valorizar a Itália Meridional e

as Ilhas, o Estado destina, por lei, contribuições especiais para regiões

particulares" (BARBOSA et al., 1998).

As Províncias italianas são entidades autônomas que compõem a

Região e são compostas pelas Comunas, representando os interesses destas,

e cuja administração cabe ao Conselho Provincial, à Junta e ao Presidente e

Secretários de cada setor da administração. As Comunas, por sua vez, são

entes autárquicos territoriais dotados de personalidade jurídica, administrados

pelo Conselho Comunal, a Junta e o Síndico, e podem atuar conjuntamente na

forma de associação ou consórcio, a fim de realizar objetivos comuns

(BARBOSA et al., 1998).

1.3.2 – Federalismo na Espanha

Outro Estado Federado que merece atenção para fins de comparação é

o Estado Autonômico da Espanha, um regime de governo que, segundo Costa

(2000), consiste em uma Monarquia parlamentar com Monarquia Hereditária

Constitucional, cujo território é dividido em 70 comunidades autônomas,

governadas por um estatuto autônomo proveniente de uma Assembléia

Legislativa unicameral (BARBOSA et al., 1998).

As comunidades autônomas são estabelecidas de acordo com a região

em que se encontram, isto é, cada comunidade é composta por municípios de

uma mesma região, que possuem autonomia administrativa mas não

legislativa, estando limitados à formulação de regulamentos. Os municípios

acham-se submetidos à Província, "cuja função é a de executar as atividades

do governo central" (COSTA, 2000), sendo administrada por um Conselho

Provincial que também não possui autonomia legislativa, "mas pode

16

estabelecer regulamentos baseados na legislação das Cortes ou do

Parlamento Regional" (BARBOSA et al., 1998).

1.3.3 – Federalismo nos Estados Unidos

A estrutura federativa dos Estados Unidos é composta por sistemas

independentes de governos federal e estaduais. A Constituição norte-

americana delimita os poderes do governo federal, dando margem a uma

relativa autonomia dos estados. A décima emenda da Constituição estabelece

que os poderes não delegados especificamente ao governo federal, nem por

ela negados aos estados, podem ser perfeitamente exercidos por estes. Assim

sendo, as unidades da federação dispõem de ampla liberdade no que tange a

seus sistemas tributários (BARBOSA, 1998).

O poder de tributar é especificado de forma independente para os

governos federal e estadual: os estados estão autorizados a implementar uma

diversidade de impostos, tendo liberdade de instituição de base e alíquota,

desde que não entre em conflito com algumas provisões institucionais. Os

poderes de tributar dos governos locais, municípios e condados, vinculam-se

aos estados. Uma característica importante do sistema tributário americano é

que mais de uma esfera de governo pode utilizar a mesma base de tributação,

como ocorre, por exemplo, com o imposto de renda (BARBOSA, 1998).

A maioria dos governos estaduais arrecada impostos sobre a renda,

mas se trata aqui de um imposto sobre o consumo, representado pelo imposto

sobre vendas a varejo, a principal fonte de receita das unidades da federação.

Impostos seletivos, que incidem sobre a venda de determinadas mercadorias,

como gasolina, cigarros e bebidas alcoólicas, também são arrecadados por

todos os estados. Os municípios e condados dependem, basicamente, do

imposto sobre a propriedade (BARBOSA, 1998).

17

1.3.4 Sistema tributário do Japão

O Japão atual é uma monarquia constitucional parlamentarista, com um

sistema bastante centralizado. Todos os impostos ficam sob a legislação do

Congresso Nacional. Antes da Segunda Guerra Mundial essa centralização era

ainda mais forte, devido à inexpressiva autonomia dos governos locais

(BARBOSA et al., 1998).

A Constituição de 1947 reforçou o princípio básico de direitos

fundamentais e de governo democrático. Pela primeira vez, foi estabelecido o

princípio de um governo do povo e não do Império, como era considerado o

poder até então. Pela Lei de Autonomia Local, de 1974, foi criada uma

estrutura definitiva para os governos locais, com representatividade. A

Constituição não estabelece poderes residuais para os governos locais, como

acontece nas unidades federativas, principalmente nos Estados Unidos. A Lei

de Autonomia Local determina que o governo central deve especificar as

funções a serem exercidas pelos governos locais. A autonomia dos governos

locais funciona na forma de uma estrutura uniforme e com papéis bem

determinados pelo governo central. A Constituição garante o princípio de

"uniformidade de padrões de vida para todos os cidadãos", o que é semelhante

ao que ocorre pela Constituição da Alemanha (BARBOSA et al., 1998).

Aproximadamente 65% da receita tributária total é composta por

impostos nacionais, que são aqueles arrecadados pelo governo central. O

imposto de renda, de pessoas físicas e jurídicas, é o principal imposto

nacional. Os governos locais, que consistem basicamente de províncias e

municipalidades, também arrecadam impostos de renda de pessoas físicas e

jurídicas, conhecidos como impostos por habitante (BARBOSA et al., 1998).

Os impostos sobre propriedades apresentam uma participação

expressiva para estes governos, principalmente na receita tributária dos

municípios.

Os governos locais não têm autonomia para determinar base tributária e

alíquotas. A Lei do Imposto Local prescreve detalhadamente os impostos que

podem ser tributados pelo governo local, define a base tributária e determina

18

as alíquotas. Apesar desta relativa flexibilidade para alguns tipos de impostos,

qualquer ação dos governos locais tem que ser submetida à aprovação ou

depende de acordo informal com o governo central (BARBOSA et al., 1998).

1.3.5 Sistema tributário do Reino Unido

O sistema tributário no Reino Unido é bastante centralizado no Governo

central e os principais impostos, como o imposto de renda, o imposto sobre

valor adicionado (IVA) e as contribuições para seguridade social são de

competência do governo central. A Constituição do Reino Unido não concede

amplos poderes aos governos locais e, no que se refere à competência

tributária, pode ser dito que os governos locais, condados e distritos, tanto de

áreas rurais como urbanas têm vinculação somente com dois tipos de

impostos: o imposto nacional sobre a propriedade e o imposto local sobre a

propriedade (BARBOSA et al., 1998).

19

CAPÍTULO II

EVOLUÇÃO DO FEDERALISMO BRASILEIRO

O federalismo brasileiro caracterizou-se, desde o surgimento da

República, pela concentração excessiva do poder central, o que deixou o

regime no Brasil mais aproximado do federalismo econômico devido ao poder

exercido pelo Presidente da República.

No início da década de 1980 o Brasil entrou em uma época de

mudanças institucionais, que se acelerou na década de 1990, e que tende a

continuar se alterando nos próximos anos.

O regime federalista brasileiro, portanto, passa por uma fase de

mutação, com a transferência de responsabilidade da União para os estados e

municípios.

Nessas circunstâncias, é muito difícil projetar o nível de despesas de

cada nível do governo, e calcular a carga tributária necessária para equilibrar

as finanças de cada uma das esferas de governo: da União, dos estados e dos

municípios.

Segundo Barbosa et al. (1998),

Uma proposta de reforma tributária que se preocupe com a questão do federalismo tem que ser bastante flexível para acomodar as possíveis transformações nas atribuições de responsabilidades que possam vir a ocorrer nos próximos anos.

O sistema tributário brasileiro passou por duas reformas, desde que foi

instituído, pela Constituição de 1946: a primeira, na década de 1960 e a

segunda pela Constituição de 1988, que passou a vigorar a partir de março de

1989. No interregno, foi alterada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1965,

que vigiu a partir de janeiro de 1967 (BARBOSA et al., 1998).

Na tabela 1, a seguir, pode-se acompanhar as principais características

do sistema tributário nacional pela Constituição, desde sua implantação e suas

sucessivas alterações.

20

Tabela 1 – Evolução do Sistema Tributário Nacional

Constituição de 1946 e Emenda

Constitucional n. 5, de 1961

Emenda Constitucional n. 18 de 1965 (vigência a partir de janeiro

de 1967)

Constituição de 1988 (vigência a partir de março de

1989) 1. Federais 1.1. Imposto de Importação 1.2. Imposto de Consumo 1.3. Impostos Únicos 1.4. Imposto de Renda 1.5. Imposto sobre Transferência de Fundos para o Exterior 1.6. Imposto sobre Negócios de Sua Economia 1.7. Impostos Extraordinários 1.8. Impostos Especiais

1. Federais 1.1. Imposto de Importação 1.2. Imposto sobre Produtos Industrializados 1.3. Impostos Únicos 1.4. Imposto de Renda 1.5. Impostos Extraordinários 1.6. Imposto sobre Exportação 1.7. Imposto sobre Transporte e Comunicação 1.8. Imposto sobre Operações Financeiras 1.9. Imposto Territorial Rural

1. Federais 1.1. Imposto de Importação 1.2. Imposto sobre Produtos Industrializados 1.3. Imposto de Renda 1.4. Impostos Extraordinários 1.5. Imposto sobre Exportação 1.6. Imposto sobre Operações Financeiras 1.7. Imposto Territorial Rural 1.8. Imposto sobre Patrimônio

2. Estaduais 2.1. Imposto sobre Vendas e Consignações 2.2. Imposto sobre Transmissão – Causa Mortis 2.3. Imposto sobre Exportação 2.4. Imposto sobre Atos Regulados por Lei Especial 2.5. Impostos Especiais

2. Estaduais 2.1. Imposto sobre Circulação de Mercadorias 2.2. Imposto de Transmissão de Bens Intervivos e Causa Mortis

2. Estaduais 2.1. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços 2.2. Imposto de Transmissão Causa-Mortis e Doação 2.3. Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores 2.4. Adicional de Imposto de Renda sobre Rendas de Capital

3. Municipal 3.1. Imposto Territorial Rural 3.2. Imposto de Transmissão Intervivos 3.3. Imposto Predial e Territorial Urbano 3.4. Imposto de Indústria e Profissões 3.5. Imposto de Licença 3.6. Imposto sobre Diversões Públicas 3.7. Imposto sobre Atos de Sua Economia

3. Municipal 3.1. Imposto Predial e Territorial Urbano 3.2. Imposto sobre Serviços

3. Municipal 3.1. Imposto de Transmissão Intervivos 3.2. Imposto Predial e Territorial Urbano 3.3. Imposto sobre Serviços

Fonte: Barbosa et al. (1998).

21

A reforma de 1966, que entrou em vigor em 1967, acabou com o

imposto de vendas e consignações (IVC), um imposto em cascata que incidia

sobre o faturamento, e em seu lugar colocou o imposto sobre circulação de

mercadorias (ICM), um imposto do tipo valor adicionado. O imposto federal de

consumo foi transformado num imposto do tipo valor adicionado, o imposto

sobre produtos industrializados (IPI) (BARBOSA et al., 1998).

A reforma de 1966 extinguiu também impostos anacrônicos, como o

imposto do selo, e passou para a órbita federal impostos de política

econômica, como os impostos que incidem sobre o comércio exterior. Esta

reforma criou os impostos únicos sobre combustíveis, minerais, eletricidade e

telecomunicações, que tinham como objetivo financiar investimentos na infra-

estrutura do país (BARBOSA et al., 1998).

No início da década dos 70, no Governo Médici, começou-se o

desmonte da reforma de 1966 quando o imposto sobre o faturamento das

empresas foi recriado com a contribuição do PIS; daí por diante várias

distorções foram introduzidas, desfigurando o sistema tributário de 1966

(BARBOSA et al., 1998).

A segunda reforma tributária foi feita com a Constituição de 1988. Esta

reforma alargou a base do ICM, transformando-o no imposto sobre circulação

de mercadorias e serviços(ICMS), e extinguiu os diversos impostos únicos. A

Constituição de 1988 criou o imposto sobre grandes fortunas, que até hoje não

foi implementado, e permitiu que contribuições para a seguridade social

tivessem como fato gerador o faturamento das empresas (BARBOSA et al.,

1998).

Um fato marcante desta reforma foi a falta de equilíbrio no trato da

questão federativa, pois aumentou-se a transferência de recursos para os

estados e municípios, sem contrapartida na diminuição dos gastos da união

porque não transferiu-se encargos, contribuindo para agravar o problema do

déficit público. Todavia, o lado positivo da reforma da Constituição de 1988 foi

a descentralização do federalismo fiscal brasileiro, que já vinha ocorrendo

desde o início da década dos 80 como uma reação a centralização verificada

no regime militar de 1964 (BARBOSA et al., 1998).

22

O desequilíbrio financeiro criado pela reforma de 1988 deve ser corrigido

por uma nova reforma tributária que tenha como um dos objetivos conceder

maior autonomia fiscal aos estados e aos municípios, e torná-Ios

financeiramente independentes do governo federal. O Brasil, na verdade,

nunca funcionou na prática como um regime federalista pois a união sempre

exerceu um grande poder sobre os estados e os municípios das principais

capitais (BARBOSA et al., 1998).

A reação da sociedade brasileira nos últimos anos indica que há um

desejo de mudar este arranjo institucional, através de um sistema fiscal que

permita uma relação de poder menos assimétrica. Esta evolução, entretanto,

não pode deixar de lado a própria experiência acumulada no passado e as

tendências implícitas na configuração do sistema tributário brasileiro

(BARBOSA et al., 1998).

A distribuição dos impostos no regime federalista brasileiro, de acordo

com as Constituições e as Emendas Constitucionais aprovadas no período pós

guerra, trilhou o caminho da especialização, procurando dotar cada nível de

governo com competência sobre uma base tributária (BARBOSA et al., 1998).

O imposto de renda foi atribuído ao governo federal; o principal imposto

sobre propriedade, o imposto sobre propriedade territorial e urbana, foi

destinado aos municípios; o imposto sobre consumo foi dividido entre as três

esferas de governo, mas aos estados sempre coube a parte mais importante

deste tipo de imposto (BARBOSA et al., 1998).

Todavia, esta distribuição nunca foi capaz de prover recursos para que

houvesse um equilíbrio nos orçamentos de cada nível de governo, havendo

necessidade da criação de mecanismos de transferências de recursos

intergovernamentais, tanto horizontalmente entre mesmos níveis de governo,

como verticalmente entre esferas diferentes (BARBOSA et al., 1998).

23

CAPÍTULO III

FEDERALISMO BRASILEIRO

PÓS-CONSTITUIÇÃO DE 1998

No Brasil, cada nível de governo tem o direito de instituir os impostos

que lhe são atribuídos e que pertençam à sua competência privativa. A

Constituição define claramente a atribuição das competências tributárias a

cada esfera de governo, não havendo possibilidade de sobreposição de

competências em relação aos impostos e à maioria das contribuições. As taxas

são instituidas, assim, de acordo com a competência constitucional. No

entanto, é comum às três esferas de poder a competência para instituir taxas

(pelo exercício do poder de polícia e pela utilização de serviços públicos), para

contribuição de melhoria e contribuição para custeio da previdência e

assistência social de seus servidores (Lemgruber, 2002).

3.1 – Tributos federais

Competem à União os impostos sobre Importação (11), Exportação (lE);

Renda e Proventos de Qualquer Natureza (IR); Produtos Industrializados (IPI);

Operações de Crédito, Câmbio e Seguro ou relativas a Títulos ou Valores

Mobiliários (lOF); Propriedade Territorial Rural (ITR) e sobre Grandes Fortunas

(IGF). Esse último ainda não se encontra instituído, embora prevista sua

instituição a nível constitucional.

Além dos impostos acima referidos, cabe à União, exclusivamente,

instituir contribuições sociais e intervir no domínio econômico e de interesse de

categorias profissionais ou econômicas. Os demais níveis de governos

somente podem instituir uma única contribuição, a relativa ao custeio da

previdência social de seus funcionários.

As três bases de cálculo utilizadas para as contribuições são: folha de

pagamentos, lucro ou faturamento. No Brasil, são essas as bases que têm sido

empregadas para financiar a seguridade social. A arrecadação que incide

24

sobre a folha de pagamentos não tem sido suficiente para cobrir as despesas

da área da previdência social. Aliás, o Brasil, como tantos outros países no

mundo, também tem sentido os efeitos perniciosos do sistema de repartição

simples da previdência pública, levando o sistema a operar praticamente sem

qualquer sistema de poupança.

É importante notar que as contribuições sociais são receitas vinculadas,

isto é, toda a sua arrecadação só pode ser direcionada às áreas de saúde,

previdência e assistência social.

As principais contribuições instituídas pela União são as seguintes:

sobre a Folha de Pagamentos dos empregados; Financiamento da Seguridade

Social, tendo por base de cálculo o faturamento das empresas (COFINS);

Programa de Integração Social (PIS); Formação do Patrimônio do Servidor

Público (PASEP); sobre o Lucro Líquido das Empresas (CSLL); e

Movimentação Financeira (CPMF) com destinação específica para a saúde.

3.2 – Tributos Estaduais

Os Estados e o Distrito Federal têm competência para instituir impostos

sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte

Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações (ICMS); Propriedade de

Veículos Automotores (IPVA) e Transmissão Causa Mortis de bens imóveis e

Doação (ITCD) de qualquer bem ou direito.

3.3 – Tributos Municipais

Cabe aos Municípios dispor sobre os impostos incidentes sobre

Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU); Serviços de Qualquer

Natureza (ISS) e Transmissão Inter-vivos de Bens Imóveis (ITBI).

25

CAPÍTULO IV

ALGUMAS PROPOSTAS RECENTES

A economia brasileira é concentrada em duas regiões geográficas, o

Sudeste e o Sul do País. O estudo da desigualdade de rendas no Brasil indica

uma imensa desigualdade regional, e que não tem havido um padrão de

diminuição dessa desigualdade ou de convergência de rendas, apesar de

todas as assertivas oficiais otimistas. Observa-se, isto sim, um "nítido padrão

de estratificação ou polarização das regiões em grupos de renda per capita

distintos" (PAES; SIQUEIRA, 2008).

Para reduzir essas disparidades regionais, o governo brasileiro tem

adotado programas de desenvolvimento regional para as áreas mais carentes

do País, que recebem benefícios creditícios e tributários, que são:

• O Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO), do

Nordeste (FNE) e do Centro-Oeste (FCO);

• Os incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus, Amazônia

Ocidental e Áreas de Livre Comércio;

• Os Fundos Fiscais de Investimentos Regionais, Fundo de

Investimento da Amazônia (FINAM), do Nordeste (FINOR) e Fundo

de Recuperação Econômica do Estado do Espírito Santo (FUNRES),

e

• O Fundo de Desenvolvimento da Amazônia (FDA) e do Nordeste

(FDNE) (PAES; SIQUEIRA, 2008).

Este modelo de desenvolvimento regional gera ineficiências

econômicas, uma vez que promove investimentos em regiões não dotadas da

infra-estutura física necessária, na forma de transportes eficientes, redes de

energia elétrica e de comunicações etc. e de capital humano, representado por

mão-de-obra qualificada e com formação complementar.

O sistema vigente não consegue desenvolver um tipo de competição

saudável, devido aos benefícios tributários e creditícios implementados que

distorcem todo o processo de decisão dos investimentos privados, sendo

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muitas vezes visto pelos políticos dos estados "prejudicados" como uma

prática de "concorrência desleal". Como não se baseia na eficiência

econômica, o modelo não vem conseguindo seus objetivos de alterar a imensa

desigualdade regional a que as populações desassistidas se vêem submetidas.

Além dos fundos e incentivos criados para incentivar e auxiliar no desenvolvimento regional, o federalismo brasileiro estabeleceu duas transferências constitucionais das rendas do nível federal para os estados e municípios, respectivamente, que são o centro de sistema fiscal intergovernamental, cedendo recursos para as regiões menos desenvolvidas (PAES; SIQUEIRA, 2008).

Através do Fundo de Participação dos Estados (FPE), o governo federal

distribui 21,5% das receitas líquidas dos três impostos federais principais

(IRPJ, IRPF e IPI) aos Estados, com 85% dos fundos designados

especificamente para as três regiões mais pobres do país (o Norte, o Nordeste

e o Centro-Oeste). Dentro de cada grupo de regiões, 95% dos recursos do

FPE são alocados em uma base per capita eqüitativa e uma medida por renda

per capita e os 5% restantes com base na área geográfica.

A segunda forma também importante encontrada para o

compartilhamento de receitas é feita em grande parte através do Fundo de

Participação dos Municípios (FPM), pelo qual 22,5% das receitas líquidas dos

mesmos três impostos federais são distribuidos aos mesmos. O critério

principal de alocação é a relação direta com a população e inversa com a

renda, com 10% dos recursos distribuídos às capitais de Estado, 86,4% são

distribuídos entre os demais municípios de acordo com uma escala em que

uma fração mínima é fornecida às pequenas localidades (população com

menos de 10.188 habitantes) e uma máxima às cidades com uma população

superior a 156.216 habitantes e os 3,6% restantes compõem uma cota

adicional para os municípios mais populosos (PAES; SIQUEIRA, 2008).

Embora seja verdade que o FPE e o FPM têm promovido sensível

melhora na distribuição de recursos entre os Estados brasileiros, ainda

permanece inaceitável que cidadãos de locais menos favorecidos tenham à

sua disposição menos da metade dos recursos disponíveis para regiões mais

desenvolvidas.

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Assim sendo, como anotou Rezende (2003), uma reforma fiscal mais

eqüitativa precisa

ser acompanhada da revisão do federalismo fiscal brasileiro, de modo a recompor o equilíbrio federativo e estabelecer mecanismos eficazes para a cooperação intergovernamental na promoção e implementação de políticas nacionais de desenvolvimento, [...], bem como instituir novas regras voltadas para a redução das desigualdades regionais.

No trabalho focalizado sobre o federalismo brasileiro atual, Paes;

Siqueira (2008) propõem e analisam uma reforma fiscal que viria ao encontro

da equidade regional, por meio da equalização na distribuição das receitas

tributárias entre Estados, que viria trazer "maior equilíbrio socioeconômico" à

Federação.

Para tanto, desenharam uma proposta que, apoiada principalmente na

adoção do princípio do destino nas transações interestaduais e no fim dos

incentivos fiscais e fundos de desenvolvimento regionais (com o repasse

destes últimos recursos para os entes federados mais pobres para aplicação

em infra-estrutura e recursos humanos), busca tornar mais equânime a

distribuição dos recursos entre os entes federativos do Brasil.

A proposta de Paes e Siqueira (2008) tem como elemento principal a

substituição do princípio básico do sistema tributário brasileiro, desde seu

princípio de origem, principalmente no que tange ao ICMS, adotando-se

completamente o princípio do destino. Esta eliminação se daria em três etapas,

e os autores tomaram para simples exemplificação, como base, o ano de 2002.

Admitindo essa data como baseline, após três anos de preparação e estudo,

ou seja, em 2005, as alíquotas interestaduais seriam reduzidas em 25%,

caindo mais 25% em 2008 e sendo eliminadas definitivamente em 2012. Serão

consideradas duas possibilidades: a primeira englobando todos os Estados e a

segunda excetua da nova regra o Estado do Amazonas, onde fica localizada a

Zona Franca de Manaus, cuja produção é quase integralmente comercializada

com outros Estados (PAES; SIQUEIRA, 2008).

No Brasil o que vigora é o princípio da origem na tributação

interestadual, mas não em sua totalidade, uma vez que um porcentual da

arrecadação cabe ao Estado onde se situa a indústria e outro porcentual ao

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Estado de destinação dos produtos, um sistema que a literatura especializada

classifica como "misto" na falta de nomenclatura melhor.

Sendo assim, ao adotar o princípio misto (origem/destino), gera-se

problemas para os Estados exportadores, sendo uma das principais causas da

"guerra fiscal", além de tornar o ICMS um imposto sobre a produção, uma vez

que o consumidor repassa uma parte do imposto pago ao Estado onde o

produto foi fabricado. Nesse contexto, quem produz mais arrecada mais.

Paes e Siqueira (2008) então propõem que

A solução para diminuir a competição tributária, os custos das empresas e tornar mais igualitária a distribuição de receitas públicas é a adoção do princípio do destino, ou seja, todos os produtos consumidos em determinado Estado, sejam produzidos nele ou não, devem gerar receitas para o Estado consumidor. Os bens nele produzidos, mas destinados à exportação ou a outros Estados não deverão ser por ele tributados.

O principal obstáculo à adoção do princípio do destino é a oposição dos

Estados mais ricos da Federação, uma vez que tal princípio implica

redistribuição da receita, favorecendo os Estados importadores líquidos, que

são justamente os mais pobres. A perda de São Paulo, por exemplo, seria

superior a 10% da sua arrecadação total.

A segunda alteração proposta consiste na extinção dos programas de

desenvolvimento regional que receberam um montante total de recursos em

2002 de R$ 9,452 bilhões, distribuídos conforme a tabela 1.

Tabela 1 – Recursos para o desenvolvimento regional (% PIB)

Mecanismos

Recursos

(R$ milhões)

Recursos

(% PIB)

Fundos Constitucionais de Financiamento 3.168,00 0,24%

Incentivos Fiscais 1.086,46 0,08%

Zona Franca de Manaus 4.138,09 0,32%

Fundos de Desenvolvimento Regionais 1.100,00 0,08%

Fonte: Paes; Siqueira, 2008

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Todos os recursos especificados nos benefícios acima têm em comum o

fato de que, basicamente, "tratam de incentivos concedidos às empresas para

que estas se instalem em locais menos desenvolvidos" e, assim sendo, dão

margem ao surgimento de distorções nas decisões alocativas de investimento,

alterando as escolhas ótimas em função de um retorno artificialmente mais

elevado nos locais incentivados. A tributação não pode ser considerada o

instrumento mais adequado para definir a localização de investimentos

privados.

Deve-se ressaltar ainda que, estranhamente, uma grande parcela dos

recursos concedidos não fica nos locais mais pobres. Se, por um lado, ocorre

de fato a instalação de fábricas nestas regiões, o que em tese geraria mais

empregos e renda, por outro, a desoneração dos tributos, em particular do

IRPJ, vem beneficiar empresários que podem transferir os lucros para o seu

local de origem, que não necessariamente se situa em uma região menos

desenvolvida. Sendo assim, em todos estes mecanismos, uma parte

substancial dos recursos concedidos como isenção tributária ou incentivo fiscal

acaba retornando para regiões mais desenvolvidas (PAES; SIQUEIRA, 2008).

Na prática, o mecanismo de desenvolvimento regional utilizado pelo

Brasil não foi capaz de, até esta data, alterar substancialmente a distribuição

da renda entre os Estados federados, ao longo dos últimos 40 anos em que foi

aplicado, pois apesar dos inegáveis progressos das regiões Norte e Centro-

Oeste, a região mais pobre, o Nordeste, ficou cada vez mais para trás,

conforme se pode comparar na tabela a seguir.

Paes; Siqueira (2008) também destacam que grande parte dos

empreendimentos realizados nas regiões mais pobres não é feita apenas em

razão dos incentivos, mas também devido ao baixo custo da mão-de-obra local

e da baixa qualificação necessária ao empreendimento, o que tem como

corolário a perpetuação da pobreza, pois a renda segue extremamente baixa e

a necessidade de capacitação e educação contínua reduzida. Assim, não

surpreende o quadro apresentado na tabela acima.

A proposta defendida por esses autores é no sentido de se

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Tabela 2 – Distribuição de renda entre os estados brasileiros

Ano Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

1950 1,71% 14,47% 66,00% 16,10% 1,72%

1960 2,30% 14,53% 63,59% 17,26% 2,32%

1970 2,22% 11,92% 65,21% 17,04% 3,61%

1980 3,33% 12,17% 62,19% 17,29% 5,02%

1985 4,22% 13,83% 59,45% 17,11% 5,39%

1990 5,02% 14,06% 58,38% 15,96% 6,58%

1995 4,86% 13,65% 57,25% 17,35% 6,89%

2002 5,00% 13,50% 56,30% 17,70% 7,40%

Fonte: Azzoni (1997) e IBGE (2002), apud Paes; Siqueira, 2008.

(...) alterar completamente o mecanismo até o momento utilizado. Ao invés de reduzir a tributação ou fornecer crédito subsidiado para as empresas privadas, o dinheiro seria destinado aos Estados com arrecadação per capita mais baixa, que deveriam investir, necessariamente, em infra-estrutura básica e em educação e capacitação profissional. O objetivo é criar condições para que a escolha ótima da decisão de investir dos empresários recaia sobre a região menos desenvolvida, não por conta da redução de impostos ou pelo crédito subsidiado, mas pela existência de infra-estrutura adequada e mão-de-obra qualificada.

Após detalhada explicação de sua proposta, os autores concluem seu

trabalho afirmando que

Embora cientes da dificuldade política de se implementar uma reforma que promova perdas no curto prazo para alguns entes federativos, acreditamos que o quadro atual de desigualdade e pobreza, já estagnado há décadas, deve servir de fonte de pressão da sociedade para que tais modificações sejam finalmente promovidas. É necessário que o Brasil busque a atualização de seus modelos de política de desenvolvimento regional para atingir metas mais fortemente redistributivas e equalizadoras, a fim de tentar, na medida do possível, proporcionar a todo cidadão brasileiro condições de vida uniforme em todo o território nacional (p. 20).

Lembruger (2002) relatou que tem sido apresentadas algumas

experiências recentes que visam ao aprimoramento do modelo federativo do

País e comentou que uma das principais críticas feitas sobre a estrutura

federativa brasileira diz respeito à baixa coordenação entre as esferas de

governo. De um modo em geral, todos os órgãos arrecadadores atuam sobre a

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mesma capacidade contributiva do cidadão. A este cabe, geralmente prestar

informações, recolher tributos e acompanhar modificações de legislação dos

três níveis governamentais.

Em toda sua vida tributária pregressa, o legislador brasileiro não se

preocupou em desenvolver um sistema padronizado de livros e documentos

fiscais, datas de pagamento ou de cadastro. A complexidade da legislação e a

multiplicidade de fiscos tornou-se fator que onera substancialmente o custo

dos contribuintes, especialmente dos pequenos, transformando-se em um

motivo indutor de evasão fiscal.

A falta de uma base de dados integrada entre os fiscos tem significado multiplicidade de esforço por parte dos governos e, muitas vezes, privilegia os contribuintes mal intencionados. De modo em geral, não há fiscalização conjunta e nem a existência da "prova emprestada", onde um auto de infração devidamente lançado por um governo possa automaticamente servir em prol de outro governo (LEMGRUBER, 2002).

Na verdade, os últimos governos têm executado algumas ações

altamente relevantes de modo a aprimorar o sistema e a administração de

tributos no País. Para começar, pode ser citada a iniciativa do Governo Federal

de implantação do Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e

Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte

(SIMPLES). Esse sistema permite o pagamento de vários impostos e

contribuições (federais - no âmbito da SRF e do INSS, estaduais e municipais)

em um único documento, em uma única data e de forma simplificada para o

contribuinte (apenas aplicando uma determinada alíquota sobre a receita bruta

da empresa).

O resultado dessa experiência, em vigor desde 01/01/97, foi a adesão

de 1,7 milhão de contribuintes ao sistema (dados de 2002), sendo que 176 mil

são novos contribuintes, gerando expansão da base contributiva no País. Vale

notar que Estados e Municípios podem aderir ao sistema, sempre por opção

do governo subnacional, mediante assinatura de convênio (LEMGRUBER,

2002).

Outra experiência de caráter relevante que se encontra em andamento é

a criação do Sistema Nacional de Cadastro Unificado de Contribuintes, que

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tem por finalidade permitir o intercâmbio de informações entre os diversos

fiscos. Mais que isso, o contribuinte passará a possuir um único número de

inscrição, facilitando o cumprimento da obrigação tributária. Desse modo, será

possível desenvolver uma visão global do contribuinte, abrangendo todo o

universo de suas relações econômicas e jurídicas e envolvendo os dados da

Secretaria da Receita Federal, Instituto Nacional de Seguridade Social,

Estados, Distrito Federal e alguns Municípios.

O Brasil possui a característica única de possuir dois impostos sobre o

consumo e a circulação (IPI e ICMS), do tipo valor agregado, com bases que

às vezes se sobrepõem, e administrados por níveis diferentes de governo.

Esse argumento, em parte, também pode ser estendido ao ISS, que muitas

vezes se confunde com o ICMS. A situação toma-se mais delicada pelo fato de

que o ICMS, que representa cerca de 28% da carga tributária, tem adquirido

objetivos extra-fiscais de extrema relevância, especialmente no que tange à

atração de investimentos (LEMGRUBER, 2002).

A alternativa teórica mais cogitada para essa questão diz respeito à

consolidação dos três impostos em uma única base, possivelmente

administrada pelo governo federal, mas cuja arrecadação de\leria ser

transferida para os demais governos na mesma proporção das suas receitas

atuais com esses impostos.

Na prática, o Governo Federal enviou para o Congresso Nacional a

Proposta de Emenda Constitucional 175 (PEC 175) que, dentre outras coisas,

propõe a extinção do IPI e a criação do ICMS federal em seu lugar. Assim,

existiria uma única base de consumo (a do atual ICMS) e sobre ela incidiriam

duas alíquotas: uma de competência federal e, a outra, estadual. Essa

modificação visa apenas a um caráter qualitativo do sistema tributário nacional,

buscando ser neutra em termos de receitas arrecadadas. Além disso, a

alíquota do imposto (ou seja, a soma das alíquotas federal e estadual) deve

ser uniforme por mercadoria ou serviço em todo o País, o que visaria a diminuir

a atual prática de competição tributária entre os Estados (LEMGRUBER,

2002).

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É sempre importante relembrar que uma estrutura mais racional de

tributação sobre o consumo seria bastante desejável para a facilitação da

harmonização tributária entre o Brasil e seus principais parceiros de comércio,

especialmente os do Mercosul. Nesse sentido, vale a pena mencionar outra

iniciativa de relevante interesse para o País, que foi a realização do I Encontro

dos Administradores Tributários dos Países-membros do Mercosul e

Associados, um seminário que pode ser considerado o marco inicial do

processo de harmonização tributária na região (LEMGRUBER, 2002).

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CONCLUSÃO

Pode ser verificado com a realização desse estudo que o assunto é por

demais controverso, sendo muitas as opiniões entre os estudiosos a respeito

dos pontos mais complexos da legislação, no que tange às atribuições das três

esferas que compõem o governo no pacto federativo brasileiro, principalmente

quando o assunto se refere especificamente a impostos e tributos.

Diversas medidas têm sido postas em prática, com resultados mais ou

menos favoráveis, porém o assunto é merecedor de um amplo debate por

parte de todos os segmentos envolvidos, para que o federalismo brasileiro

encontre fórmulas mais eficazes para promover o desenvolvimento nacional de

uma forma mais equitativa, melhorando a distribuição de renda e trazendo

melhor qualidade de vida, principalmente aos habitantes das regiões menos

privilegiadas financeiramente.

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