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UNIVERSIDADE CÃNDIDO MENDES
PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A RAZÃO E A EMOÇÃO NA
ARTETERAPIA
Por: JACQUELINE DE SOUZA DOS SANTOS
Orientadora
Profª: Dayse Serra
RIO DE JANEIRO
2011
2
UNIVERSIDADE CÃNDIDO MENDES
PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
A RAZÃO E A EMOÇÃO NA
ARTETERAPIA
Apresentação de monografia à Universidade
Cândido Mendes como requisito parcial para
Obtenção do Grau de Especialista em
Arteterapia em Educação e Saúde.
Por: Jacqueline de Souza dos Santos
3
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus que me deu
forças para iniciar e finalizar mais
essa etapa tão importante da minha
vida e aos meus filhos Erick e Ellan.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus filhos,
e à João Paulo, totalmente responsável
por este tema.
5
RESUMO
Nos últimos anos, o avanço das neurociências possibilitou a construção
de hipóteses para a explicação das emoções, especialmente a partir dos
estudos envolvendo o sistema límbico. Que é responsável pelas emoções e
também comanda os sistemas endócrinos e os sistemas responsáveis pela
vida vegetativa. Por isso, quando não racionalizada as emoções recebidas
sobrecarregamos os órgãos viscerais e descontrolamos a produção hormonal
ficando suscetíveis a doenças psicossomáticas e ao enfraquecimento do
sistema imunológico.
De acordo com a Neurociência, a racionalização das emoções beneficia
os seres humanos proporcionando à compreensão dos fatos guardados na
memória, e aliados às ferramentas utilizadas na arteterapia podem produzir
sensações de anti-stress, tranqüilizante, analgésicos, equilibrador do sistema
cardiocirculatório e do metabolismo, entre outros.
Dessa forma, trabalhar a razão e a emoção na arteterapia consiste em
viabilizar o acesso ao inconsciente, trazendo à consciência, sensações de
desconforto que posteriormente, sendo expressos em material plástico, seja
desenho, pintura ou qualquer outro recurso podem ser compreendidos e
racionalizados, proporcionando cura interior e qualidade de vida ao indivíduo.
A Arteterapia pode se valer também de mitos, contos de fadas e
imaginação ativa. A arte é então um caminho para expressões psíquicas. Sua
prática ajuda o indivíduo a se conectar com o seu Eu interior e criador.
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METODOLOGIA
Este trabalho, basea-se em dados bibliográficos com embasamento na
publicação de livros, de material postado na web e vários teóricos como Marta
Relvas, Maria Cristina Urrutigaray, Nise Silveira.
E como principal contribuição para a aquisição de grande
fundamentação teórica - Jung.
Neste estudo, constatamos elementos de suma importância na
compreensão da arte como processo na sua utilização terapêutica.
Verificamos que a arte como Terapia é um processo dinâmico,
espontâneo e criativo onde ao representar simbolicamente os sentimentos e
emoções através da arte, os indivíduos aprendem a se conhecer.
7
Sumário
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A PSICOLOGIA E SUA ORIGEM 12
CAPÍTULO II
ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO SISTEMA LÍMBICO AO SISTEMA DAS EMOÇÕES 16
CAPÍTULO III
TRABALHANDO RAZÃO E EMOÇÃO NA ARTETERAPIA 45
CONCLUSÃO 65
BIBLIOGRAFIA 68
WEBGRAFIA 69
INDÍCE 70
8
INTRODUÇÃO A pesquisa apresentada aborda o tema sobre Razão e Emoção na
arteterapia para que se possa entender o que é e qual a sua melhor aplicação
em trabalhos arteterapêuticos.
A arteterapia vem ganhando espaço na prevenção e no tratamento das
doenças psíquicas apresentando-se como uma possibilidade expressiva de
amplo significado.
De acordo com a Neurociência, a racionalização das emoções beneficia
os seres humanos proporcionando à compreensão dos fatos guardados na
memória, e aliados às ferramentas utilizadas na arteterapia podem produzir
sensações de anti-stress, tranqüilizante, analgésicos, equilibrador do sistema
cardiocirculatório e do metabolismo, entre outros.
A influência da emoção não educada, atinge diversos órgãos e sistemas
do corpo humano. Pois sabemos que o Sistema Límbico é responsável pelas
emoções e também comanda os sistemas endócrinos e os sistemas
responsáveis pela vida vegetativa. Por isso, quando não racionalizada as
emoções recebidas sobrecarregamos os órgãos viscerais e descontrolamos a
produção hormonal ficando suscetíveis a doenças psicossomáticas e ao
enfraquecimento do sistema imunológico.
Dessa forma, trabalhar a emoção na arteterapia consiste em viabilizar o
acesso ao inconsciente, trazendo à consciência, sensações de desconforto que
posteriormente, sendo expressos em material plástico, seja desenho, pintura
ou qualquer outro recurso podem ser compreendidos e racionalizados,
proporcionando cura interior e qualidade de vida ao indivíduo.
Por outro lado, se é levado a separar a emoção da razão e adquirimos
conceitos equivocados sobre ambos. Porém, Antônio Damásio em seu livro “O
erro de Descartes”, esclarece que razão e emoção estão intimamente ligadas.
Quando nos deparamos diante das inúmeras e avançadas tecnologias
que invadem nossas vidas no dia a dia, podemos perguntar se num futuro não
muito distante, o ser humano não será dominado pelo excesso de
racionalidade, onde até o seu próprio coração, pulmões, cérebro ou outras
9
partes do corpo quaisquer, poderão ser sustentados ou até substituídas por
máquinas. Certamente, muitas profissões serão extintas como já está
ocorrendo, e outras surgirão em função das novas necessidades e tecnologias
que estão por vir. Será que nos tornaremos robôs ou quem sabe seres
humanos perfeitos, com longevidade invejável, tendo as indústrias
farmacêuticas e cosméticas a nossa disposição? Poderemos nos tornar
eternos jovens! Mas será tudo isso que nos tornará melhores e felizes? Cabe
perguntar: Como e onde estarão as nossas emoções? Será que se fará
necessário construirmos Usinas de Emoções, que de vez em quando teremos
que passar por lá para nos reabastecemos e podermos lembrar um pouco de
como vivíamos há tempos atrás?
A maioria dos homens acredita que a Emoção não deve preponderar
sobre a Razão, que ambas são incompatíveis e não podem caminhar juntas, e
que a preponderância da Razão é o segredo para o sucesso da vida pessoal e
profissional. Para estes será tolice sentir o corpo estremecer e o coração
acelerar diante de um acontecimento. A alegria de se emocionar com um
sorriso ou uma lágrima que vem de uma criança, de perceber a beleza do
nascer e do pôr do sol e da chuva fina caindo com seu frescor... Tudo isto não
passará de meras quimeras. Diante disso, percebemos que adquirimos um
conhecimento fragmentado que nos guiou por boa parte de nossas vidas, pois
crescemos acreditando que a razão e a e emoção são antagônicas.
Segundo Antonio Damásio, neurocientista, em seu livro “O erro de
Descartes”, a ausência de emoção e sentimentos, na verdade, destrói a
racionalidade ao invés de melhorar o processo de decisão. O homem pensa,
sente e age. Solucionar ou enfrentar os problemas que surjam na sociedade,
utilizando somente a razão, segundo algumas opiniões contrárias, com certeza
não será o melhor caminho para tornarmos o mundo em que viveremos mais
saudável e mais feliz.
Tudo isso, porque interpretamos equivocadamente o vocábulo Razão.
Pois ser racional na visão neurocientífica é verdadeiramente uma atitude
humana. A razão, na realidade é a emoção elaborada. A emoção é como uma
água retirada da natureza com todos os seus acúmulos, enquanto que a razão
10
é o filtro que vai a cada momento retendo as “impurezas” e tornando essa
emoção saudável e purificada. Podemos dizer ainda que a emoção é um
diamante bruto e a razão é quem a transforma em pedra preciosa.
As experiências emocionais, positivas ou negativas, são recebidas pelo
Sistema Límbico que não sabe distinguir o que é bom e ruim. Este envia em
aproximadamente 4 segundos uma mensagem ao córtex pré-frontal que é
quem interpretará se estas experiências são edificantes ou desastrosas. A
partir desse momento, a emoção transforma-se em sentimento e sentimento é
racional. As emoções como: raiva e medo são mecanismos de defesa que a
partir do momento que são racionalizadas passam a se transformar em amor,
ódio ou coragem e estes são decisões conscientes. As experiências
vivenciadas e acumuladas em nossas vidas dão-nos conhecimentos críticos e
renovadores, pois ficam armazenados no Hipocampo, responsável pela
memória de longa duração, que é uma estrutura do Sistema Límbico. Quando
refletimos e agimos racionalmente adquirimos bagagem para enfrentarmos
novas dificuldades ou novos desafios. Sendo assim, podemos afirmar que a
Razão deve ter ação direta na Emoção. Visto que, é a Razão, localizada no
cérebro na área pré-frontal, é responsável pela educação da Emoção
propriamente dita.
Dessa forma, quando vivenciamos, aprendemos; e com este
aprendizado vinculamos a Emoção com a Razão. Sem a Emoção elaborada e
educada pela Razão, ao contrário do que muitos pensam, nos tornaríamos
iguais. Porque as emoções são incontroláveis e fazem parte de um mecanismo
de defesa presente no Sistema Límbico do cérebro existente em todos os
animais, inclusive, nos irracionais. Pois nos tornamos diferentes, um dos outros
e das outras espécies de animais, exatamente pela intensidade de valores que
damos a cada informação captada e a cada resposta emitida. Ou seja, cada
um de nós capta, sente, reage ou transmite de forma diferente diante de
situações semelhantes e por isso, não há nada mais humano do que ser
racional.
Quando a neurociência dialoga com a psicanálise entendemos que o
nosso ID fica localizado no Sistema Límbico, sede das emoções e o
11
SUPEREGO no córtex pré-frontal, responsável pelo raciocínio. A vivência
emocional, sócio-cultural faz o diferencial entre os seres humanos e os demais
seres vivos. E o somatório destas mil facetas é o que enriquece e compõe o
colorido da diversidade, da pluralidade e da beleza individualizada de cada um
de nós.
Sabemos também que biologicamente os sistemas cerebrais tanto da
Emoção quanto da Razão estão intrinsecamente interligados. E que por mais
que uma pessoa pense que sua mente estará sendo treinada para a
racionalidade, esta jamais deixará de ser influenciada pela Emoção. Sendo
assim, podemos afirmar que existe um elo anatômico e funcional entre Corpo,
Razão e Emoção.
De acordo com Damásio, o erro de Descartes foi separar a emoção da
razão. Esse conceito foi cristalizado na cultura humana e durante muito tempo
formamos em todas as esferas sociais e profissionais conceitos errados.
Descartes acreditava que o corpo era separado da mente. A mente só
precisava do corpo para poder funcionar, fora isso, não havia nenhuma
conexão entre eles. Mas Damásio acredita justamente o contrário, que corpo e
mente estão intimamente conectados: a mente comanda o corpo inteiro, mas
são as sensações que o corpo manda para mente que induzem a mente
funcionar daquela maneira, contrapondo o dualismo cartesiano no qual a alma
(razão pura) é independente do corpo e das emoções.
A Emoção e a Razão traçarão sempre entre si, um eterno intercâmbio. E
o alcance do equilíbrio será maior, conforme o grau de desenvolvimento,
entendimento e aprendizado individual.
Quando pensamos com criatividade e aumentarmos nossas habilidades
para enfrentarmos as dúvidas e dificuldades da vida, conseguiremos dar maior
significado e qualidade de vida a humanidade. Então, Emoção e Razão
caminharão equilibradas e ponderadas. Para isso, deveremos estar aptos a
fazermos nossa transformação íntima, estando aptos e abertos para
recebermos novos conhecimentos, gerando renovação. E com isto, com toda
12
certeza, evitaremos o empobrecimento da espécie humana. Caberá a todos
descobrir o caminho saudável para tal objetivo.
Diante do exposto, é esperado que este estudo possa contribuir para o
trabalho arteterapêutico apresentando novas formas de alcançar pacientes com
dificuldade de verbalização.
CAPÍTULO I
A PSICOLOGIA E SUA ORIGEM
“ Nós poderíamos ser muito melhores se não quiséssemos ser tão bons.”
(FREUD)
O termo psicologia origina-se do grego psykhologuía, termo derivado
das palavras psykhé, "alma", e lógos, "palavra", "razão" ou "estudo") é a ciência
que estuda os processos mentais, sentimentos e comportamentos dos
indivíduos com a finalidade de auxiliá-los a uma melhor compreensão dos fatos
da vida, isto é, a psicologia estuda o que motiva o comportamento humano – o
que o sustenta, o que o finaliza e seus processos mentais, que passam pela
sensação, emoção, percepção, aprendizagem, inteligência.
A história da Psicologia se confunde com a Filosofia até meados do
século XIX. Sócrates, Platão e Aristóteles deram o pontapé inicial na instigante
investigação da alma humana. Para Sócrates (469/399 a.C.) a principal
característica do ser humano era a razão, aspecto que permitiria ao homem
deixar de ser um animal irracional. Platão (427/347 a.C.), discípulo de
Sócrates, concluiu que a razão no corpo humano era situada na cabeça,
representando fisicamente a psiqué, e a medula teria como função a ligação
entre mente e corpo. Já Aristóteles (387/322
a.C.), discípulo de Platão, entendia corpo e mente de forma integrada e
percebia a psiqué como o princípio ativo da vida.
13
A ênfase da psicologia da Idade Média era o conhecimento religioso,
sendo evidenciado neste tempo Santo Agostinho e São Tomás de Aquino que
seguiram os passos de Aristóteles.
Em 1649, René Descartes – filósofo francês – publica Paixões da Alma,
reafirmando a separação entre corpo e mente, pensamento que dominou o
cenário científico até o século XX. Alguns pesquisadores alegam que essa
hipótese assumida por Descartes foi um subterfúgio encontrado para continuar
suas pesquisas desenvolvidas a partir da dissecação de cadáveres, com o
apoio da Igreja e protegido contra a Inquisição.
Foi no período de 1832 a 1860, na Universidade de Leipzig-Alemanha,
que a psicologia separou-se da filosofia e através de trabalhos e experimentos
em psicofísica que ocorreram aproximadamente de 1860 a 1879, deram à
psicologia a condição de ciência, chamando-a de Psicologia Moderna.
Considera-se como fundador da Psicologia Moderna Wilhelm Wundt, por ter
criado, em 1879, o primeiro laboratório de psicologia na Universidade de
Leipzig, Alemanha.
De acordo com Ferreira et al (2005, p. 16), surgiram então, três correntes
teóricas: o Estruturalismo, o Funcionalismo e o Associacionismo.
No Estruturalismo Edward Titchener (1867/1927) se preocupa com a
consciência, com seus aspectos estruturais, percebendo a consciência, isto é,
seus estados elementares como estruturas do sistema nervoso central, as
sensações.
Segundo esta perspectiva, o objetivo da psicologia seria o estudo
científico da Experiência Consciente através da Introspecção.
O Funcionalismo elaborado por William James (1842/1910) teve a
consciência como sua grande preocupação, como funciona e como o homem a
utiliza para adaptar-se ao meio. O ambiente é um dos fatores mais importantes
no processo de desenvolvimento. Os funcionalistas queriam saber como a
mente funcionava e não como era estruturada.
O Associacionismo foi apresentado por Edward Thorndike (1874/1949).
Seu ponto de vista era de que o homem aprende por um processo de
associação de idéias gradativas, da mais simples para a mais complexa
(FERREIRA et al. 2005, p. 17).
14
No início do século XX, surgiram outras correntes teóricas que
ampliaram a linha de correntes psicológicas que hoje conhecemos.
O Behaviorismo que surgiu nos EUA com John B. Watson (1878/1958), e
tornou-se conhecido pela teoria S-R, ou seja, para cada resposta
comportamental existe um estímulo. O foco de estudo é o comportamento
observável, e o condicionamento é o método utilizado por esta escola. Traz do
funcionalismo a aplicação prática da psicologia; o seu foco está na
aprendizagem (SÉRIO, 2005, p. 02).
Em meados do século XX, vários autores escreveram sobre o
pensamento, e a cognição. Estes estudiosos acreditavam que ocomportamento
pode ser entendido também a partir da cognição. Foi observado que o
aprendizado pode existir sem a necessidade de condicionamento
emlaboratório, mas pela observação
e elaboração do que foi visualizado. Assim, estava sendo criada uma divisão
no behaviorismo: a Psicologia Cognitiva, chamada de a primeira grande força
da psicologia (Op. cit.).
O Gestaltismo que surgiu na Europa, mais precisamente na Alemanha,
com Wertheimer, Köhler e Koffka, entre 1910 e 1912 e nega a fragmentação
das ações e processos humanos, postulando a necessidade de se
compreender o homem como uma totalidade, resgatando as relações da
Psicologia com a Filosofia.
Ele se detém nos campos da percepção e na visão holística do homem e
do mundo. Critica principalmente o Estruturalismo, chamado de psicologia do
"tijolo de argamassa", pois via a mente humana dividida em estruturas. O lema
da gestalt é: o todo é mais que a soma das suas partes (ENGELMANN,
2002,p.01).
A Psicanálise, teoria elaborada por Sigmund Freud (1856/1939), foi
caracterizada fundamentalmente por investigar o inconsciente, ganhando
contornos da sexualidade, principalmente as pulsões da sexualidade infantil
(LUSTOSA, 2003, p. 01).
Freud acreditava que os problemas dos indivíduos se originavam da
inaceitação cultural, sendo assim reprimidos seus desejos inconscientes e suas
fantasias de natureza sexual. O método básico da Psicanálise é a interpretação
da transferência e da resistência com a análise da livre associação, isto é, o
15
paciente é solicitado a dizer tudo o que lhe vem à mente, geralmente, o analista
simplesmente escuta, fazendo comentários somente quando no seu julgamento
profissional visualiza uma crescente oportunidade para que o paciente torne
consciente os conteúdos reprimidos que são supostos, a partir de suas
associações. Escutando o paciente, o analista tenta manter uma atitude
empática de neutralidade. Uma postura de não-julgamento, visando a criar um
ambiente seguro (LUSTOSA, 2003, p. 02).
Atualmente a Psicanálise se apresenta de várias formas, que são a
psicanálise ortodoxa, a psicanálise nova (ou neopsicanálise) e a psicologia de
orientação analítica (utilizada não só por psicanalistas formados, mas também
por psicólogos não especializados), todas com algumas peculiaridades. É a
segunda grande força de psicologia (Op. cit.).
A Psicologia Humanística não é na verdade uma escola de pensamento,
mas sim um aglomerado de diversas correntes teóricas. Em comum elas têm o
enfoque humanizador do aparelho psíquico, em outras palavras elas focalizam
o homem como detentor de liberdade e escolha, sempre no presente. Foi
fundada por Abraham Maslow, porém a sua história começa muito tempo
antes. A Gestalt foi agregada ao humanismo pela sua visão holística do
homem. A psicanálise incorporou seus profissionais psicanalíticos como Carl
Rogers, que apresentou três conceitos: a congruência, a empatia e a aceitação
incondicional e Erik Erikson que acreditava que o homem sempre iria se
desenvolver, não parando na primeira infância (TASSARA; DAMERGIAN,
1996, p. 03).
Maslow trouxe, para a psicologia que havia fundado, estes autores
citados acima, agregando, ainda seus estudos sobre a pirâmide de
necessidades humanas.
Para ele, as necessidades fisiológicas precisam ser saciadas para que
se precise saciar as necessidades de segurança. Estas, se saciadas, abrem
campo para as necessidades sociais, que se saciadas, abrem espaço para as
necessidades de auto-estima. Se uma destas necessidades não está saciada,
há a incongruência. Quando todas estiverem de acordo, abre-se espaço para a
auto-realização, que é um aspecto de felicidade do indivíduo. Esta é hoje a
terceira grande força dentro da psicologia.
16
A Psicologia Transpessoal surge da insatisfação de Maslow com sua
própria teoria, pois lhe faltava o fato de o homem ser um ser espiritualizado.
Para ele era importante a espiritualidade e as características da
consciência alterada, teoria de Stanislav Grof.
Assim, Maslow cria então, com ajuda de outros psicólogos, a Psicologia
Transpessoal, tomando como base os estudos de Carl C. Jung sobre aspectos
transcendentais da consciência. Como Carl G. Jung era um estudioso dos
aspectos transcendentais da consciência, foi tomada sua teoria para incorporar
a Psicologia Transpessoal. Esta teoria estuda os vários níveis de consciência,
que vão do mais obscuro, a sombra, até o mais alto grau de consciência, a
transpessoal. Por ter seu foco na consciência e seus aspectos, é também
chamada de Psicologia da Consciência (FERREIRA et al. 2005, p. 20).
Hoje, no século XXI, os conhecimentos produzidos pela Psicologia, a
complexidade e capacidade de transformação do ser humano acabaram por
ampliar em grande medida seu escopo de conhecimento e de atuação.
CAPÍTULO II
ANTECEDENTES HISTÓRICOS: DO SISTEMA LÍMBICO AO
SISTEMA DAS EMOÇÕES:
A partir do Renascimento – período marcado, entre outros aspectos, por
um substantivo progresso da anatomia humana – desenvolveram-se os
estudos morfológicos, tipificados por uma fecunda composição entre ciência e
arte, os quais permitiram a descrição de diferentes estruturas orgânicas, entre
as quais o cérebro e os demais constituintes do sistema nervoso central (SNC)
e periférico (SNP). Tal contexto foi um dos responsáveis pelo ulterior interesse
em compreender a representação dos processos cognitivos e das emoções no
cérebro, temática que ganhou especial impulso a partir dos séculos XVIII e XIX,
especialmente após os trabalhos de Gall, Broca e Papez.
Franz Joseph Gall descreveu a morfologia do cérebro e das principais
estruturas nervosas, o que facultou um significativo avanço na diferenciação de
17
porções importantes do cérebro, caracterizando algumas de suas funções
específicas, passando a ser conhecido como “o autor da verdadeira anatomia
do cérebro”. O primeiro “mapeamento” das funções cerebrais foi proposto por
Pierre Paul Broca, realizado a partir da observação de pacientes com danos
cerebrais. Broca identificou o lobo límbico (limbo = margem), o qual
compreende um anel composto por um contínuo de estruturas corticais
situadas na face medial e inferior do cérebro.
Um grande impulso para o estabelecimento de hipóteses sobre as bases
neurais das emoções deu-se a partir da descrição do caso Phineas Gage, um
operário que sobreviveu à ocorrência de grave dano cerebral, conseqüente a
um sério acidente de trabalho. Após uma explosão acidental, Gage teve sua
cabeça atravessada por uma barra de ferro, a qual penetrou através da região
maxilar esquerda, atingindo profundamente seu lobo frontal ipsilateral. Gage
não perdeu a consciência, apesar de seu lobo frontal estar lesado. Após
algumas semanas, o operário desejou retornar ao trabalho, mas não obteve
permissão do seu chefe, em razão de sua grande mudança comportamental.
Antes do acidente, Gage era um trabalhador capaz e eficiente, com uma mente
bem equilibrada, sendo visto como um homem astuto, inteligente e talentoso.
Após o evento mórbido, tornou-se indeciso, demonstrando indiferença,
falsidade, deslealdade e desleixo. Mostrava-se ainda impaciente e inábil para
estabelecer qualquer plano para o futuro.
O interesse pela compreensão dos processos mentais e cerebrais
também pode ser identificado nas investigações pioneiras desenvolvidas, no
século passado – pelo fisiologista e psicólogo vienense Sigmund Exer, pelo
psicanalista Sigmund Freud e pelo médico francês Israel Waynbaum –, nas
quais começou a se desenhar um conhecimento sobre redes neuronais e
possíveis estruturas que comporiam os circuitos emocionais.
Nesse movimento, temporalmente situado na transição do século XIX
para o XX, foram propostas as primeiras teorias neuropsicológicas das
emoções, cabendo destaque às concepções de William James e Carl Lange –
para os quais a experiência emocional subjetiva seria conseqüente às
manifestações fisiológicas e comportamentais (ou seja, se fica alegre porque
18
se sorri...) – bem como às idéias de Walter Cannon e de Phillip Bard – que
formularam que o SNC causava tanto a experiência subjetiva quanto as
manifestações fisiológicas e comportamentais.
Substantivo avanço para a compreensão dos fenômenos neurobiológicos
relacionados à emoção foi alcançado por Joseph Papez, anatomista
estadunidense que deslocou o olhar de uma perspectiva de centros
emocionais, substituindo-a por uma concepção de sistema. De fato,
inicialmente se acreditava que o lobo límbico descrito por Broca estaria
relacionado ao olfato, mas Papez demonstrou que suas diferentes porções
estavam unidas e coordenadas entre si, formando um circuito, o qual incluía o
córtex cingulado, o hipocampo, o hipotálamo e os núcleos anteriores do tálamo.
Evidências experimentais ulteriores permitiram a revisão das estruturas
pertencentes ao circuito proposto por Papez, surgindo, assim, o conceito de
sistema límbico (SL) – retomando o termo criado por Broca ao descrever o lobo
límbico –, o qual envolveria as estruturas relacionadas às emoções. O SL
passou a ser caracterizado como o circuito neuronal relacionado às respostas
emocionais e aos impulsos motivacionais, já tendo sido incluídas em seu bojo
estruturas como hipotálamo, amígdala, núcleos da base, área pré-frontal,
cerebelo e septo (o hipocampo, inicialmente inserido, não parece ter
participação decisiva nos mecanismos neurais das emoções, tendo papel, na
consolidação da memória, incluída aquela de conteúdo emocional, daí estar
relacionado – ainda que não seja pertencente – ao SL). De modo similar, o
grupo de núcleos anteriores do tálamo não está confirmado como elemento
substantivo na neurobiologia das emoções. Com efeito, ainda não existe um
perfeito acordo sobre os componentes do SL. Embora a denominação “sistema
límbico” ainda seja usada para designar componentes envolvidos nos circuitos
cerebrais das emoções, tal categorização vem sofrendo críticas em diversos
graus. Como exemplo, cita-se a inclusão de várias estruturas anatômicas no
seu bojo, sem que haja clara concordância entre os autores; de fato, a maioria
dos investigadores inclui, no SL, o giro do cíngulo, o giro para-hipocampal, a
amígdala, o hipotálamo e a área de septo. Outras estruturas como cerebelo,
tálamo, área pré-frontal e hipocampo nem sempre são tidas como pertencentes
19
ao SL, ainda que esses elementos possuam relações diretas com os processos
emocionais e as respostas autonômicas. Tal fato indica que não há critérios
amplamente aceitos para se decidir sobre a constituição do SL. Ademais, a
própria idéia de um único sistema das emoções vem sendo colocada em xeque
na medida em que têm sido identificados diferentes circuitos e áreas do SNC
que se correlacionam aos díspares estados denominados emoções. Desse
modo, no presente manuscrito, incluir-se-ão nas discussões sobre o SL as
estruturas consensualmente reconhecidas pelos diferentes autores, bem como
aquelas que se relacionam diretamente às emoções.
Assim, em substituição – ou ampliação – à idéia do SL, deve-se propor a
concepção dos sistemas das emoções, os quais albergam os díspares circuitos
e as redes neuronais correlacionáveis aos estados tipificados como emoção.
2.1 - ESTRUTURAS RELACIONADAS ÀS EMOÇÕES
Os “sistemas das emoções” – ao menos como vêm sendo
entendidos recentemente – parecem estar organizados em rede;
nestas não existem componentes morfofuncionalmente regulatórios
mais pronunciados, ou seja, todos os elementos exercem papéis
regulatórios semelhantes entre si. Pode-se, então, compreender que
tais sistemas dependem da integração de seus componentes de uma
forma complexa, não-hierárquica, a qual necessita ainda ser mais
bem explicada.
Estruturas que compõe o circuito de Papez
• Giro de Cíngulo:
Está intimamente relacionado á depressão, à ansiedade e á agressividade, observando em humanos, lentidão mental em casos de lesão
dessa estrutura. Auxilia na determinação dos conteúdos da memória,
20
observando-se significativo aumento de sua atividade quando as pessoas
recorrem à mentira.
• Giro para-hipocampal:
Apresenta-se relacionado ao armazenamento da memória; de fato,
processos lesivos aí localizados produzem amnésia retrógada isolada, com
preservação da capacidade de armazenar novas memórias explícitas.
• Hipotálamo:
É a estrutura importante nos fenômenos da emoção e do
comportamento. Estimulações elétricas de várias áreas do hipotálamo do gato
permitiram um verdadeiro mapeamento emocional, desencadeando atitudes de
ataque, defesa, pânico, raiva etc. Verificou-se também que lesões do núcleo
ventral medial do gato tornam o animal extremamente agressivo e perigoso.
Interessantes são as experiências relacionando o córtex e o hipotálamo com
certas formas de raiva. Quando se retira o córtex de um gato, ele tem crises de
raiva que aparecem espontaneamente ou após estímulos que, no animal
normal, não causam nenhuma alteração no comportamento. Conforme
demonstrou Bard, se, nestes animais, secciona-se a parte posterior do
hipotálamo, estas manifestações desaparecem. O córtex exerce uma ação
frenadora sobre o hipotálamo que, quando liberado, funciona como agente de
expressão das manifestações viscerais e somáticas que caracterizam a raiva.
A maioria das modificações de comportamento observadas em
experiências com hipotálamo de animais já foi observada no homem em
experiências realizadas durante o ato operatório, ou como conseqüência de
traumatismos, tumores, lesões vasculares ou infecções desta região. Parece,
pois , fora de dúvida que as manifestações emocionais, são pelo menos e
parte, coordenadas e integradas em nível hipotálamo. Não há, entretanto,
evidência de que os aspectos subjetivos de emoção se passam no hipotálamo,
ou sej, que se pode “sentir” emoção em nível hipotálamo. Ao que parece, isto
depende basicamente do córtex, e o hipotálamo coordena principalmente as
manifestações periféricas da emoção.
21
O cérebro emocional que controla a fisiologia dos batimentos cardíacos, da
respiração, da pressão sanguínea, do apetite, do sono, do desejo sexual, da secreção dos
hormônios e do sistema imunológico.
O cérebro cognitivo que é responsável pelo pensamento, pela concentração, pela
atenção, pelo controle dos instintos, dos impulsos, pelos comportamentos morais, pelos
movimentos voluntários e pela linguagem.
(Marta Relvas, 2009. P.103)
• Tálamo:
Lesões e estimulações do núcleo dorso-medial e os núcleos anteriores
do tálamo já foram correlacionadas com alterações de reatividade emocional
no homem e em animais. Ao que parece, entretanto, a importância destes
núcleos na regulação do comportamento emocional decorre de suas conexões.
O núcleo dorso medial liga-se ao córtex do giro do cíngulo, fazendo parte de
circuitos do sistema límbico. As funções mais conhecidas relacionam-se com
sensibilidade, motricidade, comportamento emocional e ativação do córtex
cerebral.
• Hipocampo:
O hipocampo é uma formação arquiencefálica desenvolvida no homem.
O papel do hipocampo na regulação do comportamento emocional foi
inicialmente apontado por Papez que chamou a atenção para o aumento da
reatividade emocional causada por lesões do hipocampo é a sua participação
no fenômeno da memória. Além disto, o hipocampo participa da regulação de
atividades viscerais e endócrinas, destacando-se o seu papel na secreção do
ACTH.
Do que foi exposto, verifica-se que as áreas encefálicas relacionadas
com o comportamento emocional ocupam territórios muito amplos do
telencéfálico e do diencéfalico, nos quais encontram-se estruturas que integram
o sistema límbico, área pré-frontal e o hipotálamo. Além de sua participação
nos fenômenos emocionais, estas áreas relacionam-se também com
comportamento ligado às necessidades básicas do organismo, tais como: a
sede, a fome e o sexo, importantes para a preservação do indivíduo e da
espécie. Cabe acentuar também o papel destas áreas na regulação das
22
atividades viscerais por meio do sistema nervoso autônomo. Verificou-se assim
que estimulações elétricas em várias áreas do hipotálamo, da área pré-frontal
ou do sistema límbico determinam manifestações viscerais diversas, tais como:
salivação, sudorese, dilatação pupilar, modificações do ritmo cardíaco ou
respiratório. O fato de que as mesmas áreas encefálicas que regulam o
comportamento emocional também regulam o sistema nervoso autônomo
torna-se mais significativo se considerarmos que as emoções se expressam
em grande parte pelas manifestações viscerais (choro no homem, aumento de
salivação e eriçar os pelos) e são geralmente acompanhados de alterações de
pressão arterial, do ritmo cardíaco ou ritmo respiratório. Torna-se mais fácil
entender, também, que muitos distúrbios emocionais graves resultam em
afecções viscerais, sendo um exemplo clássico o caso das úlceras gástricas e
duodenais.
Estruturas que não pertence ao circuito de Papez
• Amigdala:
É atividade em situações com marcante significado emocional. Como
encontros agressivos ou de natureza sexual: está Também relacionada aos
aprendizados emocionais e ao armazenamento de memórias afetivas, a
amígdala é responsável pela formação da associação entre estímulos e
recompensas.
• Septo:
O septo relaciona-se à raiva, ao prazer e ao controle neurovegetativo.
Demontrou-se em animais, que por comportamento bilateral da área sepatal
provoca “raiva septal”, caracterizada por hiperatividde emocional ferocidade e
ira diante d situações que geralmente não alteram o comportamento animal.
Pode-se observar alterações na pressão e do ritmo respiratório quando a área
septal é estimulada. Experiências de auto-estimulação realizadas em ratos
permitiram a localização de “áreas de prazer” no cérebro, dentre as áreas
estimuladas com tais freqüências destacam-se a área septal as regiões
23
pecorridas pelo feixe prosencefálico medial. Essa hipótese foi, confirmada em
pacientes humanos.
• Área pré-frontal:
A área pré-frontal vem sendo considerada a “sede da personalidade”.
Ainda há muitas especulações em torno dessa região, mas por meio da
interpretação de dados experimentais e clínicos, nota-se que essa estrutura
participa na tomada de decisões e na adoção de estratégias mais adequadas à
situação física e social.
A área pré-frontal corresponde à parte não motora do lobo frontal,
ocupando a porção anterior deste lobo. Estruturalmente é constituída de
neocórtex no que difere das áreas corticais que integram o sistema límbico.
A área pré-frontal tem importantes conexões com núcleo dorso-medial do
tálamo, recebendo e enviando fibras a este núcleo. Fulton e Jacobsen
estudaram os efeitos da ablação desta área sobre o comportamento de
chimpanzés. Observaram que os animais operados não manifestavam mais as
características de reações de descontentamento quando frustrados. Além
disso, havia uma certa deficiência psíquica dos animais. Com base nestas
experiências, Egas Moniz e Almeida Lima, dois cirurgiões portugueses,
fizeram, pela primeira vez, a lobotomia pré-frontal para o tratamento de doentes
psiquiátricos com quadros de depressão e ansiedade. A operação consiste em
uma secção bilateral da parte anterior os lobos frontais, passando adiante dos
cornos anteriores dos ventrículos laterais. Sabe-se, hoje, que os resultados
devem-se à secção das conexões da área pré-frontal com o núcleo dorso-
medial do tálamo. Esta cirurgia melhora os sintomas de ansiedade e depressão
dos doentes que entram em um estado de “tamponamento psíquico”, ou seja,
deixam de reagir a circunstâncias que normalmente determinam alegria ou
tristeza. Uma conseqüência indesejável e imprevisível da lobotomia frontal é
que muitos doentes após a cirurgia mostram uma deficiência intelectual grave.
24
• Cerebelo:
Atualmente, tem–se reconhecido que este órgão tem funções mais
amplas do que as puramente motoras, atuando em diversos processos
cognitivos. O dano cerebral está associado a disfunções em tarefas executivas,
de aprendizagem, memória processual e declarativa, processamento de
linguagem e funções visuais e espaciais, além de disfunções na personalidade,
no afeto e na cognição. A hipótese que deriva do modelo anatômico é de que o
rompimento do circuito neural que conecta o cérebro com as áreas associadas
e paralímbicas impede a modulação cerebelar das funções cognitivas
relacionadas, provocando alterações nos subsistemas e produzindo déficits de
conduta. Foi proposto um esquema dos diferentes tipos de atividades não
motora, que poderiam modular-se por distintas regiões cerebelares. No caso da
cognição e da emoção. Descrevem-se as regiões cerebelares mais antigas.
Como o lóbulo flóculo-nodular, o verme, o núcleo fastigial e o núcleo globoso,
os quais podem ser considerados equivalentes a um cérebro límbico, sendo
responsáveis pelos mecanismos primitivos de preservação, com manifestações
de luta, emoção, sexualidade e possívelmente, de memória emocional. Os
hemisférios laterais cerebelares e os núcleos denteados e emboliformes
parecem ser responsáveis pela modulação do pensamento, planificação,
formulação de estratégias, aprendizagem memória e linguagem, características
só identificadas nos mamíferos. Desse modo, o cerebelo vem sendo
considerado um poderoso coordenador, capaz de contribuir tanto para as
habilidades Motores sensoriais e cognitivas, graças às conexões que
estabelece com regiões encefálicas responsáveis pela execução dessas
funções.
2.2 – AS BASES NEURAIS DAS EMOÇÕES
• PRAZER E RECOMPENSA:
As emoções mais “primitivas” e bem estudadas pelos neurofisiologistas
com a finalidade de estabelecer suas relações com o funcionamento cerebral
25
são a sensação de recompensa (prazer, satisfação) e de punição (desgosto,
aversão), tendo sido caracterizado, para cada uma delas, um circuito encefálico
específico.
O “centro de recompensa” está relacionado, principalmente, ao feixe
prosencefálico medial nos núcleos lateral e ventromedial do hipotálamo,
havendo conexões com o septo, a amígdala, algumas áreas do tálamo e os
gânglios da base. Já o “centro de punição” é descrito com localização na área
cinzenta central que rodeia o aqueduto cerebral de Sylvius, no mesencéfalo,
estendendo-se às zonas periventriculares do hipotálamo e tálamo, estando
relacionado à amígdala e ao hipocampo e, também, às porções mediais do
hipotálamo e às porções laterais da área tegmental do mesencéfalo.
Para alguns pesquisadores a sensação de prazer pode ser distinguida
pelas expressões faciais e atitudes do animal após sua exposição a um
estímulo hedônico; tais expressões são mantidas mesmo em indivíduos
anencefálicos, sugerindo que o “centro de recompensa” deva se estender até o
tronco cerebral. Acredita-se que emissões aferentes do núcleo acumbens em
direção ao hipotálamo lateral e ventral, globo pálido e estruturas conectadas
nessa mesma região cerebral estejam envolvidas nos circuitos cerebrais
hedônicos.
Em investigações com animais de experimentação (ratos), demonstrou-
se que estímulos na área septal, controlados pelo animal, acarretavam uma
situação de deflagração recorrente do estímulo, indicando uma possível
correlação com o desencadeamento de prazer. Essa conclusão, entretanto,
não é tão simples: por exemplo, na década de 1960, Robert Heath aplicou 17
eletrodos no encéfalo de um paciente com o intuito de descobrir a localização
de uma epilepsia grave. O que o pesquisador pôde observar foi que a
estimulação de áreas específicas, de acordo com a implantação dos eletrodos,
gerava diferentes tipos de sensações. O paciente em questão estimulava com
maior freqüência um sítio do tálamo medial que, embora provocasse uma
sensação de irritação, lhe causava a sensação iminente de evocar uma
memória, fazendo com que ele repetisse o procedimento na tentativa de trazer
a memória à mente, ou seja, com o objetivo de obter uma recompensa com a
26
estimulação repetida. Estudos posteriores realizados em símios demonstraram
a participação do feixe prosencefálico medial nos estímulos apetitivos, sendo
possível caracterizar, inclusive, uma certa expectativa de prazer. Esse feixe e
as regiões por ele integradas (área tegmentar ventral, hipotálamo, núcleo
acumbens, córtex cingulado anterior e córtex pré-frontal) compõem o circuito
denominado sistema mesolímbico.
A dopamina parece ser fundamental na mediação dos efeitos de
recompensa. Neurônios dopaminérgicos projetam-se da área tegmentar ventral
do mesencéfalo para muitas áreas do encéfalo através do feixe prosencefálico
medial. Além disso, drogas que causam dependência química aumentam a
eficácia da dopamina e provocam sua liberação no núcleo acumbens,
demonstrando o papel desse neurotransmissor nos mecanismos de
recompensa e/ou prazer. Contudo, as investigações até então realizadas
permanecem com resultados ambíguos, principalmente no âmbito dos estudos
farmacológicos os quais indicam que os agonistas da dopamina aumentam a
taxa de auto-estimulação, enquanto os antagonistas diminuem essa mesma
taxa e dos estudos lesionais, que mostram que a secção do feixe
prosencefálico medial, por exemplo, não provoca redução significativa da auto-
estimulação, como seria de se esperar
• Alegria:
A indução de alegria resposta à identificação de expressões faciais de
felicidade, à visualização de imagens agradáveis e/ou à indução de
recordações de felicidade, prazer sexual e estimulação competitiva bem-
sucedida provocou a ativação dos gânglios basais, incluindo o estriado ventral
e o putâmen. Além disso, vale relembrar que os gânglios basais recebem uma
rica inervação de neurônios dopaminérgicos do sistema mesolímbico
intimamente relacionados à geração do prazer e do sistema dopaminérgico do
núcleo estriado ventral. A dopamina age de modo independente utilizando
receptores opióides e GABAérgicos no estriado ventral, na amígdala e no
córtex orbitofrontal algo relacionado a estados afetivos (como prazer sensorial),
27
enquanto outros neuropeptídeos estão envolvidos na geração da sensação de
satisfação por meio de mecanismos homeostáticos.
Descrições neuroanatômicas de lesões das vias cérebro-
pontocerebelares em indivíduos com riso e choro patológicos sugerem que o
cerebelo seja uma estrutura envolvida na associação entre a execução do riso
e do choro e o contexto cognitivo e situacional em questão; de fato, quando tal
estrutura está lesionada há transição incompleta das informações, provocando
um comportamento inadequado ao seu contexto.
Os gânglios basais também estão relacionados ao desgosto, sensação
comum nos enfermos com esquizofrenia e depressão. Em razão de suas
funções motoras, os gânglios basais parecem também estar envolvidos na
coordenação de respostas apropriadas ao estímulo original, tentando fazer com
que o organismo alcance o seu objetivo (adoção de comportamento de
aproximação ou de retraimento).
• Medo:
As relações entre a amígdala e o hipotálamo estão intimamente ligadas
às sensações de medo e raiva. A amígdala é responsável pela detecção,
geração e manutenção das emoções relacionadas ao medo, bem como pelo
reconhecimento de expressões faciais de medo e coordenação de respostas
apropriadas à ameaça e ao perigo. A lesão da amígdala em humanos produz
redução da emocionalidade e da capacidade de reconhecer o medo. Por outro
lado, a estimulação da amígdala pode levar a um estado de vigilância ou
atenção aumentada, ansiedade e medo.
Desde as descrições iniciais do SL, realizadas por Papez, acreditava-se
que o hipotálamo exercia papel crucial entre as estruturas subcorticais
envolvidas no processamento das emoções. Atualmente se reconhece que
projeções da amígdala para o córtex contribuem para o reconhecimento do
vivenciamento do medo e outros aspectos cognitivos do processo emocional.
28
A amígdala é uma estrutura que exerce ligação essencial entre as áreas
do córtex-cerebral, recebendo informações de todos os sistemas sensoriais.
Estas, por sua vez, projetam-se de forma específica aos núcleos amigdalianos,
permitindo a integração da informação proveniente das diversas áreas
cerebrais, através de conexões excitatórias e inibitórias a partir de vias corticais
e subcorticais. Os núcleos basolaterais são as principais portas de entrada da
amígdala, recebendo informações sensoriais e auditivas; já a via amigdalofugal
ventral e a estria terminal estabelecem conexão com o hipotálamo, permitindo
o desencadeamento do medo. A estria terminal está relacionada à liberação
dos hormônios de estresse das glândulas hipófise e supra-renal durante o
condicionamento.
Aferências sensoriais à amígdala são recebidas pelo núcleo lateral. As
aferências auditivas provêm do tálamo auditivo e do córtex auditivo e chegam
ao núcleo lateral da amígdala, estimulando-a nos processos de medo
condicionado (conforme descrito adiante). Tal fato é confirmado por estudos de
ressonância magnética funcional (fRMI) em humanos, nos quais, durante o
condicionamento, se observou atividade da amígdala e atividade correlata no
tálamo. Além do córtex e do tálamo auditivos, áreas ventrais do hipotálamo
projetam-se para os núcleos basolateral e basomedial da amígdala, havendo,
em casos de lesão dessas áreas, interferência na geração do condicionamento.
O núcleo central da amígdala é responsável pela interface com o sistema
motor, conseqüentemente lesões desse núcleo revelaram alterações na
expressão das respostas ao medo condicionado.
O papel da amígdala no desencadeamento do medo pôde ser mais bem
estudado durante as décadas de 1970 e 1980, quando foi descrita a técnica de
condicionamento pavloviano do medo. Essa técnica consistia em oferecer um
estímulo emocionalmente neutro, como a emissão de um tom sonoro (estímulo
condicionado), e associá-lo a um estímulo aversivo, como um choque elétrico
(estímulo incondicionado). Depois da aplicação repetida desses estímulos
associados, notou-se que o estímulo condicionado foi capaz de provocar
respostas observadas, tipicamente, na presença de perigo, como
comportamento de defesa (respostas de fuga ou luta), ativação do sistema
29
nervoso autônomo (alterações no fluxo sangüíneo e freqüência cardíaca),
respostas neuroendócrinas (liberação de hormônios hipofisários e supra-
renais), entre outros. Situações como exposição a sons fortes e súbitos, altura
elevada e estímulos visuais grandes não identificados que surgem na parte
superior do campo visual de modo repentino, produzem o chamado medo
incondicionado, presente em vários animais. Na espécie humana, o medo
incondicionado pode ser produzido, por exemplo, pela escuridão. O medo
condicionado, ou aprendido, é causado pela maioria dos estímulos, que se
tornam “avisos” de que situações ameaçadoras podem acontecer novamente.
Após essa descoberta, foi possível a associação desses comportamentos à
amígdala, uma vez que lesões nessa estrutura interferiam na aquisição e na
expressão do medo condicionado.
A investigação da amígdala por meio de exames de imagem, como
tomografia por emissão de pósitrons (PET) e fRMI, permitiu concluir que tal
estrutura é ativada mesmo quando o indivíduo analisado não está submetido
diretamente a uma situação que lhe provoque medo. Além disso, observou-se
que a amígdala não é ativada apenas em processos que envolvem a sensação
de medo, mas também durante situações mais positivas, como, por exemplo,
durante o reconhecimento de expressões faciais de alegria, levando à
conclusão de que a amígdala está envolvida na resposta a estímulos de
importância emocional, independentemente de seu contexto agradável ou
desagradável.
Para o aprendizado do condicionamento do medo, as vias que
transmitem a informação do estímulo convergem no núcleo lateral da amígdala,
de onde parte a informação para o núcleo central. Este, por sua vez,
estabelece conexão com o hipotálamo e substância cinzenta periaquedutal no
tronco cefálico, evocando, por fim, respostas motoras somáticas. A
participação, nesse processo, dos núcleos basolaterais da amígdala pôde ser
confirmada a partir da observação, em estudos de investigação dos receptores
NMDA no cérebro receptores associados à aquisição, reconsolidação e
extinção de memórias. Verificou-se que os núcleos amigdalianos eram o local
primário de ação das drogas que agem sobre os receptores NMDA, ou seja,
30
potencializando (drogas agonistas) ou extinguindo (drogas antagonistas) a
memória associada ao medo condicionado.
Além do importante papel da amígdala na geração do medo, esse
processo também parece ser dependente dos sistemas serotoninérgico,
noradrenérgico e GABAérgico centrais, na medida em que se reconhece que o
mecanismo de ação dos fármacos antidepressivos e ansiolíticos depende de
interferências na condução habitual dessas vias, ao alterar a concentração de
seus receptores.
Deve-se também mencionar o papel do lobo temporal na neurobiologia
do medo. Lesões nessa localização produzem alterações no comportamento
social e emocional dos animais, tais como aquisição de postura dócil por
animais selvagens e ferozes, perda do medo, curiosidade extrema,
esquecimento rápido, tendência a colocar tudo na boca e impulso sexual
extremamente intenso (síndrome de Klüver-Bucy). Embora distúrbios
semelhantes sejam raros em seres humanos, as pessoas afetadas reagem de
forma similar aos símios – quadro caracterizado por apatia, letargia e
insensibilidade emocional.
• Raiva:
Uma das primeiras estruturas associadas à raiva foi o
hipotálamo, em decorrência de estudos realizados na década de
1920, nos quais se descreveram manifestações de raiva em
situações não condizentes, após a remoção total do telencéfalo.
Entretanto, esse mesmo comportamento não era observado
quando a lesão se estendia até a metade posterior do hipotálamo,
levando à conclusão de que o hipotálamo posterior estaria
envolvido com a expressão de raiva e agressividade, enquanto o
telencéfalo mediaria efeitos inibitórios sobre esse comportamento.
A raiva é manifestada basicamente por comportamentos
agressivos, os quais dependem do envolvimento de diversas
31
estruturas e sistemas orgânicos para serem expressos. Além disso,
esse comportamento também admite variações de acordo com o
estímulo que o evoca. Sendo assim, podem-se descrever dois
comportamentos classicamente estudados em animais: a agressão
predatória, que tem por objetivo a obtenção de alimento, e a
agressão afetiva, cujo propósito é a exibição para animais ou fêmeas
ao redor. Durante a década de 1960, John Flynn identificou que esses
comportamentos agressivos eram provocados pela estimulação de
áreas específicas do hipotálamo, localizadas no hipotálamo lateral e
medial, respectivamente.
O comportamento típico de agressão predatória pode ser
verificado após estimulação do hipotálamo lateral, o qual possui
eferências na área tegmentar ventral através do feixe prosencefálico
medial. Em contrapartida, a secção desse feixe neuronal não elimina
tal comportamento em sua totalidade, indicando a possibilidade de
que o hipotálamo não seja a única estrutura associada à geração
desse padrão comportamental. A agressão afetiva, por sua vez, é
provocada por estimulação da substância cinzenta periaquedutal pelo
hipotálamo lateral, por intermédio do fascículo longitudinal dorsal.
A raiva, assim como o medo, é uma emoção relacionada às
funções da amígdala, em decorrência de conexões com o hipotálamo
e outras estruturas. A estimulação elétrica dos núcleos basolaterais
da amígdala ativa o hipotálamo e os núcleos do tronco encefálico,
provavelmente através da via amigdalofugal ventral, produzindo
comportamento típico de agressão afetiva. Por outro lado, a
estimulação dos núcleos corticomediais provoca eferências inibitórias
ao hipotálamo através da estria terminal, reduzindo a agressão
predatória.
Sander et al. realizaram um estudo com o objetivo de
identificar as áreas cerebrais envolvidas no processamento da raiva,
32
utilizando a fRMI. O estímulo recebido pelos participantes eram vozes
furiosas ou neutras, simultaneamente, devendo-se optar por qual
delas escutar. Os resultados do estudo mostraram que a amígdala
direita e os sulcos temporais superiores bilaterais responderam ao
reconhecimento da raiva, independentemente de quando a voz que
denotava raiva era escolhida ou não; entretanto, o córtex
orbitofrontal e o cúneo (no córtex occipital medial) mostraram maior
ativação quando a voz furiosa era escolhida do que quando era
descartada, indicando possível associação dessas áreas no
processamento neural do reconhecimento da raiva. Além desse
estudo, há outras descrições da associação de lesões do córtex
orbitofrontal a comportamentos inapropriados, como impulsividade,
raiva, pouca expressão de felicidade e características de distúrbio de
personalidade duplax.
Recente investigação realizada por Suslow et al. demonstrou,
também utilizando exames de imagem (fRMI), a ativação bilateral da
amígdala durante a visualização de faces amedrontadas, ao passo
que a observação de figuras que mostravam expressões faciais
enfurecidas provocaram estimulação unicamente da amígdala direita.
Tal fato, além de concordar com estudo anteriormente descrito, torna
possível reforçar que a amígdala esteja associada à percepção de
expressões faciais de ameaça e que suas conexões com as demais
estruturas corticais e subcorticais permita estabelecer uma resposta a
essa ameaça.
Além dos componentes estruturais, há estudos envolvendo a
participação de neurotransmissores na modulação da raiva e
agressão. A serotonina é um dos neurotransmissores implicados
nessa regulação, o que pode ser facilmente sugerido, uma vez que se
conhece a localização de neurônios serotoninérgicos na rafe do tronco
encefálico, no feixe prosencefálico medial, no hipotálamo e em outras
estruturas límbicas associadas. Essa associação pode ser reforçada
33
por estudos realizados com camundongos no caute para os
receptores 5-HT1B. Esses receptores específicos estão localizados nos
núcleos da rafe, amígdala, substância cinzenta periaquedutal e
gânglios da base.
A raiva parece ser modulada principalmente pelo núcleo
acumbens e por intermédio dos sistemas dopaminérgico e
glutamatérgico, uma vez que antidepressivos dopaminérgicos e
psicoestimulantes são potencializadores da raiva e os antipsicóticos e
estabilizadores do humor podem exercer efeitos depressores sobre a
raiva.
• Reações de luta e fuga:
A conexão direta entre o hipotálamo e o sistema nervoso
autônomo (SNA) se dá, possivelmente, mediante projeções
hipotalâmicas para regiões do tronco encefálico, destacando-se o
núcleo do trato solitário. Além dessas vias eferentes, o nervo vago
(NC X), um dos principais elementos do SNA (porção
parassimpática), representa ainda um importante componente
aferente, ativando áreas cerebrais superiores: suas projeções
aferentes ascendem ao prosencéfalo através do núcleo parabraquial e
locus ceruleus, conectando-se diretamente com todos os níveis do
prosencéfalo (hipotálamo, amígdala e regiões talâmicas que
controlam a ínsula e o córtex orbitofrontal e pré-frontal).
Dessa forma, o nervo vago destaca-se na participação da
resposta integrada (cognição-emoção), porque, além de estimular
áreas encefálicas, produz reações orgânicas fisiológicas diretas (as
aferências vagais determinarão respostas específicas, inibitórias ou
excitatórias em vários tecidos e sistemas corporais) e também
indiretas, por meio da estimulação paralela de outros nervos que se
originem próximo ao centro vagal no sistema nervoso central.
34
O SNA está diretamente envolvido nas denominadas
“situações de luta e/ou fuga” e imobilização. Tais ocorrências estão
intrinsecamente relacionadas a um mecanismo de neurocepção, que
se caracteriza pela capacidade de o indivíduo de agir conforme sua
percepção de segurança ou ameaça a respeito do meio onde ele se
encontra. Essa percepção pode ser dada, por exemplo, pelo tom da
voz ou pelos movimentos e expressões faciais da pessoa ou do
animal com quem ele se comunica.
Toda vez que a pessoa percebe o meio ambiente como
“seguro”, ela dispõe de mecanismos inibitórios que atuam sobre as
estruturas límbicas que controlam comportamentos de luta-fuga,
como as regiões lateral e dorsomedial da substância cinzenta
periaquedutal. Tal mecanismo pode ser exemplificado pelas projeções
neurais do giro fusiforme e sulco temporal superior em direção à
amígdala (mais precisamente o núcleo central amigdaliano), inibindo-
a. Dessa forma, a amígdala não exerce seu papel normal, ou seja, a
estimulação dessas vias na substância cinzenta periaquedutal.
Concomitantemente, após o processamento de todas as informações,
o córtex motor (onde se destacam as áreas frontais) comanda a
ativação de vias corticobulbares na medula (núcleos fonte dos pares
cranianos NC V, VII, IX, X e XI), que ativam os componentes
somatomotor (músculos da face e da cabeça) e visceromotor
(coração, árvore brônquica) dos mecanismos fisiológicos para o
contato social.
Ao contrário, toda vez que a pessoa percebe o meio ambiente
como “ameaçador”, a amígdala estará livre para desencadear
estímulos excitatórios sobre a região lateral e dorsolateral da
substância cinzenta periaquedutal, que então estimula as vias do
trato piramidal, produzindo respostas de luta e/ou fuga. Além disso,
há casos em que a pessoa responde a tais situações como se
estivesse paralisada; essa resposta decorre da estimulação da região
35
ventrolateral ao aqueduto cerebral (Sylvius), que também estimula
as vias neurais do trato corticoespinal lateral (piramidal). É
interessante ressaltar que essas reações ocorrem paralelamente a
uma resposta autonômica simpática, por nervos originados dos
gânglios paravertebrais, e parassimpática (nervos III, VII, IX e X),
bem como sua porção sacral, representada pelos nervos sacrais de
S2 a S4, permitindo, assim, a inervação de vasos sangüíneos e
musculatura lisa de órgãos de diferentes sistemas em todo o
organismo. Em situações de luta-fuga ocorre elevação da freqüência
cardíaca e da pressão arterial; de outro modo, nas situações de
imobilização ocorre intensa bradicardia e queda da pressão arterial.
• Tristeza:
A tristeza e a depressão podem ser vistas como “pólos” de um
mesmo processo a primeira considerada “fisiológica”, e a segunda,
“patológica” estando, por conta disso, relacionadas em termos
neurofisiológicos. É cada vez mais freqüente a descrição da
correlação entre disfunções emocionais e prejuízos das funções
neurocognitivas. De fato, a depressão associa-se a déficits em áreas
estratégicas do cérebro, incluindo regiões límbicas. Não obstante os
fatores emocionais relacionados, há vários determinantes biológicos
implicados no seu desenvolvimento; observam-se alterações
ocorridas no sistema imunológico.
Estudos contemporâneos demonstraram que a realização de
atividades que evocam esse sentimento relacionam-se à ativação de
áreas centrais, como os giros occipitais inferior e medial, giro
fusiforme, giro lingual, giros temporais póstero-medial e superior e
amígdala dorsal, ressaltando-se, também, a participação do córtex
pré-frontal dorsomedial. Ademais, em indivíduos normais observou-
se, por meio de exames de tomografia por emissão de pósitrons
(PET), que a indução da tristeza relaciona-se: 1) à ativação de
36
regiões límbicas - porção subgenual do giro do cíngulo e ínsula
anterior; 2) desativação cortical – córtex pré-frontal direito e parietal
inferior; e 3) diminuição do metabolismo da glicose no córtex pré-
frontal. Do mesmo modo, no estudo realizado por Phan et al.
identificou-se importante ativação do córtex cingulado subcaloso
(especialmente na região cingulada anterior subgenual/ventral) após
a indução de tristeza nos indivíduos estudados; já nos pacientes com
depressão clínica notou-se hipometabolismo ou hipoperfusão no
córtex cingulado subcaloso.
Com o objetivo de avaliar os sistemas neuroquímicos
envolvidos nos processos emocionais, Zubieta et al. realizaram um
estudo, em humanos, observando que, por meio da estimulação e da
manutenção de um estado de tristeza, desenvolve-se uma inativação
da neurotransmissão no giro cingulado rostral anterior, no pálido
ventral, na amígdala e no córtex temporal inferior. Correlaciona-se
aumento nas taxas de sentimentos negativos e redução nas taxas de
sentimentos positivos, confirmando o papel dos receptores mu-
opióides na regulação fisiológica das experiências afetivas em
humanos.
2.3 - EMOÇÃO E RAZÃO:
O cérebro possui a capacidade de exibir
imagens e de ordenar essas imagens
em um processo chamado
pensamento.
(Marta Relvas, 2009. P. 110).
As informações que chegam ao cérebro percorrem um determinado
trajeto ao longo do qual são processadas. Em seguida, direcionam-se para as
estruturas límbicas e paralímbicas, pelo circuito de Papez, ou por outras vias,
37
para adquirirem significado emocional, dirigindo-se, ato contínuo, para
determinadas regiões do córtex cerebral, permitindo que sejam tomadas
decisões e desencadeadas ações processos relacionados à autonomia.
As imagens certamente provocam, em sua maioria, ativação do córtex
visual occipital (giro occipital e giro fusiforme), porém a amígdala também
recebe quantidade substancial de estímulos provenientes das áreas temporais
associadas à visão, participando na formação de memórias através dos
circuitos hipocampais ou dos circuitos estriatais. Tal fato decorre do papel
especializado da amígdala no processamento de insinuações emocionais
visualmente relevantes, sinalização do medo e aversão ou outras evidências. A
ativação da amígdala pode estar primariamente envolvida na emissão de um
alerta para ameaças provenientes da percepção obtida pelo córtex occipital.
Como demonstrado por Abu-Akel, a integração de carga afetiva aos
processos cognitivos ocorre, provavelmente, no complexo córtex orbitofrontal
(COF) / córtex pré-frontal ventromedial (CPFVM). De acordo com esse
pesquisador, as impressões sensoriais (como visão, audição e outras
informações somatossensoriais) convergem, através do COF, para o CPFVM,
de onde a informação sintetizada é levada às regiões do córtex pré-frontal
dorsomedial e córtex pré-frontal ínfero-lateral para a tomada das decisões.
Lesões no CPFVM causam prejuízo na capacidade de tomar decisões,
geralmente caracterizado por inabilidade de adotar estratégias de
comportamento adequadas às conseqüências de atitudes tomadas, levando à
impulsividade. O CPFVM e o COF mantêm importante relação com a amígdala
e ambos contribuem para a tomada de decisões, embora os mecanismos pelos
quais isto ocorra sejam distintos. Acredita-se que essas regiões corticais
recebam aferências da amígdala as quais representem o valor motivacional
dos estímulos integrando-os e promovendo uma avaliação do comportamento
futuro que será adotado.
Embora a amígdala não estabeleça conexão direta com o córtex lateral
pré-frontal, ela se comunica com o córtex cingulado anterior e o córtex orbital,
os quais estão envolvidos nos circuitos da memória, tornando possível a
justificativa de alguns autores de que a amígdala participa na modulação da
38
memória e na integração de informações emocionais e cognitivas,
possivelmente atribuindo-lhes carga emocional, possibilitando a transformação
de experiências subjetivas em experiências emocionais. Lesões no córtex pré-
frontal medial rostral levam à expressão inapropriada das emoções nos
comportamentos sociais e ao prejuízo na tomada de decisões pessoalmente
vantajosas. Estudos de neuroimagem demonstram que processos executivos
são mediados pelo lobo frontal, particularmente o córtex cingular anterior (CCA)
e o córtex pré-frontal (CPF). De acordo com essas investigações, o CPF medial
está envolvido na associação do aspecto cognitivo ao emocional, sendo
responsável pela avaliação e/ou interpretação cognitiva das emoções.
Mais recentemente foi descrito que o CCA e o córtex pré-frontal
dorsolateral (CPFDL) detêm as bases neurais da performance de tarefas
concomitantes de execução central; torna-se, assim, possível a realização de
duas tarefas simultâneas, como dirigir e falar ao celular. Os resultados mostram
que os processos cognitivos são modulados pelo CCA no mesmo hemisfério. O
CCA é provavelmente posicionado para conectar informações dentro do
cérebro; dessa forma, ele inclui conexões recíprocas importantes para o
sistema motor e o sistema das emoções. O CPFDL participa de situações
executivas, como coordenação de processos cognitivos concorrentes e
atenção seletiva para informações de tarefas relevantes. Postula-se que a
inteligência geral nos humanos seja resultado de uma integração funcional
entre o sistema de alerta baseado no CCA e o sistema executivo baseado no
CPFDL.
Outra estrutura importante na integração emoção/razão é a ínsula, a qual
é ativada durante a indução de recordações de momentos vividos por um
indivíduo, as quais provoquem uma sensação específica, seja de felicidade,
tristeza, prazer, raiva ou qualquer outra. Entretanto a ínsula não é ativada
quando a mesma sensação é provocada no mesmo indivíduo por um filme, por
exemplo, sugerindo que tal estrutura esteja envolvida nos aspectos de
avaliação, experimentação ou de expressão de uma emoção gerada
internamente.
39
É possível considerar que a tomada de decisões torna-se diretamente
dependente da associação emocional realizada pelo indivíduo ao vivenciar
determinadas situações cotidianas. Além disso, o emprego de tal informação
adquirida depende de respostas motoras como, por exemplo, correr, sorrir ou
comer e de respostas autonômicas, como elevação ou redução da freqüência
cardíaca, ou ainda aumento da peristalse intestinal. Tais respostas
autonômicas são diretamente influenciadas pelo hipotálamo e este, por sua
vez, age mediante o processamento de todas as informações que chegam ao
cérebro.
2.4 – A DIFICULDADE DE LIDAR COM A EMOÇÃO:
O ser humano é eminentemente emocional, e essa energia é a propulsora de sua vida.
As emoções são expressões naturais humanas. Elas não são positivas
ou negativas. A consciência emocional e o comportamento do indivíduo é que
podem ser classificados como positivos ou negativos para ele e para o
ambiente.
Portanto, uma pessoa pode viver expressando suas emoções de forma
mais assertiva, ou seja, sabe impor-se sem se indispor. Pode também
expressar suas emoções de forma reativa, aparecendo pela intempestividade
(agressão destrutiva) ou pela passividade (subordinação ao outro). Tudo
depende da forma como aprendeu a conviver com elas, isto é, da educação
afetiva que recebeu desde pequena e que, quando não tem consciência do que
faz consigo, a perpetua indefinidamente, sem perceber se sua conduta afetiva
lhe está auxiliando a viver ou lhe atrapalhando e a aprisionando em modelos
desatualizados de relacionamentos.
O que geralmente ocorre nas empresas, assim como na família, na
escola, num relacionamento amoroso, numa amizade e em todo grupo social
no qual o indivíduo se insere é a percepção, mesmo que inconsciente, das
regras de viver (de pensar, de sentir, de falar e de agir) em suas relações, o
que pode ser chamado de cultura, que transparece em suas atitudes. Em geral,
40
o indivíduo normal percebe o que se espera dele no ambiente social. Ele sente
essas cobranças e compara-as com suas expectativas e questões internas.
Além disso, todo grupo tem seu código (suas normas) de como
expressar ou não as emoções. Só que não se pode evitar sentir medo, alegria,
tensão, inveja, ciúme, angústia, ansiedade, tristeza, raiva e todos os outros
sentimentos. Ao negar-se ou evitar-se o que se sente, começam os maiores
problemas de falta de consciência interna, de relacionamento interpessoal, de
aceitação e compreensão dos outros. Pode-se citar o exemplo muito escutado
na ideologia gerencial das organizações de que um bom profissional não
desanima, não tem tristeza e depressão e está sempre sorrindo e otimista. Em
geral, há também uma expectativa não manifesta de que este profissional não
deva questionar as práticas e políticas organizacionais, uma vez que essa
atitude pode representar, em algumas instituições, ingratidão com a empresa e
falta de equilíbrio interno. Essas expectativas profissionais geram muitas
contradições nas subjetividades e nas intersubjetividades, negando os conflitos
nas relações de trabalho que daí são originados.
Como se pode aumentar o envolvimento de pessoas em seus trabalhos
se não é possível expressar suas idéias que questionam as práticas de gestão
impostas? Como é possível estar o tempo todo bem internamente? Existe
algum ser humano assim? Como administrar o sofrimento no trabalho? É
possível torná-lo criativo?! O problema é que essas questões ainda não são
problematizadas a ponto de terem relevância nas reflexões sobre os problemas
de gestão e na busca de alternativas nos processos de tomada de decisões e
resolução de conflitos.
Aprender a expressar “adequadamente” as emoções é um desafio e
uma “arte”, pois não podem ser evitadas, mas pode ser minimizado o seu
efeito doloroso momentaneamente. Pode-se crescer muito neste percurso
adquirindo-se segurança, autonomia, leveza, expansão da vida interior,
respeito social e capacidade cada vez maior de experimentar o prazer.
Torna-se necessário aprender a trabalhar as emoções internamente, na
relação interpessoal e intergrupal em qualquer ambiente para se viver melhor.
41
É preciso saber conhecer-se, compreender-se e aceitar-se, buscando
não exigir a perfeição de si próprio, transpondo o mesmo movimento para as
relações com as outras pessoas. É preciso também buscar aceitar as pessoas
como elas se apresentam (o que não significa concordar com suas ideologias e
ações), sabendo impor os limites para as relações sobreviverem e crescerem,
sem delas exigir a perfeição que corresponde às expectativas que alguns
exigem de si mesmos e que são refletidas numa rejeição ao comportamento do
outro.
2.5 – A DIFICULDADE DE LIDAR COM A RAZÃO:
Quanto ao desenvolvimento do imaginário humano, é importante
entender e aprender a lidar com a razão coercitiva, que muito aprisiona a
inteligência.
Algumas crenças que são aprendidas nessa cultura incentivam a
fragmentação do imaginário e impedem o crescimento pessoal e dos
relacionamentos.
Aprende-se a pensar de uma forma binária, dualista, em que se divide
o mundo em duas esferas: a do bem e a do mal. Dessa maneira, incentiva-se a
postura mais infantil e egocêntrica, pois se acredita que, diante do sofrimento, o
inimigo está sempre presente. Nesse caso, o culpado é sempre e só o outro.
Diminui-se o entendimento da situação vivida, pois não se busca a co-
responsabilidade nas relações sociais.
Assim, estimula-se outra maneira de pensar: a de que o outro se deva
relacionar consigo da mesma maneira que é tratado. A maneira egocêntrica de
o indivíduo posicionar-se em suas relações, buscando satisfação imediata de
suas vontades, dificulta que assuma uma postura mais madura e menos
infantil. Isso também se relaciona com a dificuldade de aceitação do espaço
alheio, suas singularidades e do não-controle das situações. Por outro lado, a
capacidade de um indivíduo lidar com imagens contraditórias de si e do outro,
imagens positivas e negativas que constrói, desconstrói e reconstrói ao longo
42
da vida é que lhe possibilita o desenvolvimento da segurança e maturidade
pessoal.
Outra crença que dificulta a expansão do imaginário é a de que, para se
manterem bons relacionamentos, é fundamental a uniformidade de idéias e
expressões.O problema é querer ser criativo quando só se convive com
aqueles que estimulam a mesma reprodução de mundo, de maneira de pensar,
de expressar-se e de agir. Nesses casos, diante da heterogeneidade de
expressões, o comportamento reativo e defensivo é acionado, sem perceber o
quanto se perde no não-questionamento de suas próprias convicções.
A educação repressora dos sentidos (cognitivos e afetivos) estimula
os preconceitos e estereótipos que dificultam a abertura a novas experiências
e idéias. A dificuldade em lidar com as mudanças no ambiente pode
representar a insegurança e a intolerância a suas próprias inovações e ao
apego a modelos mentais (formas de entender o mundo) que levam à
conformidade, à falta de perspectiva, à reprodução de ações insatisfatórias e à
revolta. No aparecimento de raciocínios distorcidos, as pessoas geralmente
utilizam generalizações exageradas, rotulagem destrutiva, leitura de
pensamentos alheios, estipulam regras de como o outro deveria agir e
aumentam a importância de um acontecimento.
Diante da adoção dessa postura reativa e defensiva, é preciso
solidificar os modelos mentais que se sustentam. Aprende-se a crença de que
a solução para os problemas pessoais está em mudar o outro, coagindo-o,
ameaçando-o, atribuindo-lhe culpas e remorsos. Assumir responsabilidade
perante suas escolhas não é um processo fácil de ser aprendido. Muitas vezes
se opta por coerções a outrem na busca de alívio emocional, o que só
intensifica a tensão interna.
Por outro lado, existe a exigência da perfeição de si e do outro. Esse
processo de exigência pode tornar-se muito doloroso pela falta de
compreensão e tolerância consigo e com os outros, em vez de se buscar o
aperfeiçoamento em suas ações.
43
Como ser perfeito ou querer que o outro o seja se não é possível
expressar o que se sente, pois externar as emoções é sinal de fraqueza? Neste
sentido, fica complicado atingir os ideais de crescimento sociais, uma vez que
não é possível conhecer-se, expandir-se e transformar-se. Emoção significa
movimento para fora. Ela assim o pede. O movimento de expressão emocional
permite o indivíduo diminuir a alienação pessoal, ser mais coerente e
persuasivo. Mas não basta apenas a pura catarse emocional. Há situações em
que é melhor nem haver a catarse, pois existem outros sofrimentos
acumulados a serem descarregados em alvos inapropriados. O importante é
expressar-se, questionando seu modo de perceber e o do outro, lembrando-se
do objetivo que existe em comum para não se perder o foco das comunicações
e a responsabilidade de cada um nesse trajeto.
Existe uma crença nessa cultura de que o erro é um fato abominável em
todas as circunstâncias. A forma como se encara o erro é muito penosa,
impedindo a criatividade e o crescimento das pessoas.
Ao mesmo tempo, incentiva-se o pensamento de subestimação e a
postura de retirada das relações sociais: Não vou fazer o que quero, pois,
certamente, alguém já pensou isso e fará melhor que eu.
A retirada das relações sociais é a maior frustração que alguém se pode
impor e, ao mesmo tempo, enfraquece a subjetividade e mina a energia do
organismo.
Como não se aprende a lidar com as emoções e principalmente com o
sofrimento, ensina-se a postura de orgulho e a reatividade. O excesso de
valorização de si mesmo é ensinado como demonstração de quem possui amor
próprio e, conjuntamente, a subestimação dos referenciais alheios. Essa
atitude pode representar inconscientemente a dúvida em si, a inveja por
alguns, e o resultado é que quase sempre afasta os outros.
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2.6 – RAZÃO OU EMOÇÃO - QUEM MANDA EM NÓS?
O grande filósofo Hume dizia que precisamos de paixões para motivar nossas ações. Concordamos com Hume, pode-se afirmar que creditamos boa
parte do progresso da humanidade à nossa imperiosa necessidade de
satisfazer nossas básicas necessidades emocionais, além de segurança,
diversão, conforto, facilidades para o convívio etc. A internet, por exemplo,
pode ser vista como um recurso criado pela razão para aproximar as pessoas,
permitir que troquem informações, independente de sua particular situação
espacial. É a razão sendo usada para providenciar recursos de contato entre
pessoas.
No entanto, é preciso reconhecer que a razão pode ir um pouquinho
além do que propunha Hume. Acreditamos que seja possível encontrar um
lugar para a razão de tal forma que esta consiga mudar um pouco daquilo que
desejamos. É possível, inclusive, dizer que boa parte do progresso da
humanidade se deve à restrição de certos impulsos emocionais, em virtude de
uma troca racional deles por outras formas de satisfação.
A razão intervém quando se trata de estabelecer quais são os deveres,
quando se trata de lembrá-los na hora certa de conter um forte desejo. Porém,
por detrás dos ditames da razão, permanece a emoção.
Quando, em uma dada situação, deixa-se o emocional ganhar, o
comportamento da pessoa é orientado em direção a conveniências emocionais
momentâneas. Seleciona-se atitudes e alternativas que tenham potencial de
benefício imediato para a pessoa e seus familiares, mesmo que possam
significar péssimas opções para eles no futuro. Se fossem parceiras as atitudes
deveriam ser selecionadas não apenas por sua eficácia global, mesmo que
estas atitudes sejam, a curto prazo, desagradáveis ou constrangedoras.
Outra forma de abuso emocional ocorre quando este tenta “usar” o
racional para providenciar suporte para intenções inconvenientes. Neste caso,
o racional estará sendo “servo” dos motivos emocionais, e as soluções podem
parecer ganhar certa justificação, pois este racional estaria sendo usado para
45
suportar uma decisão emocional equivocada. Esta situação recebe o nome de
racionalização: é o uso de “desculpas racionais” para fugir (ou evitar) da
solução de certos problemas de grande significado emocional.
No que se refere ao dualismo razão e emoção, as emoções são
importantes para a racionalidade. Na relação entre sentimento e pensamento, a
faculdade emocional guia as nossas decisões a todo o momento, atuando de
mãos dadas com a mente racional e capacitando ou incapacitando o próprio
pensamento. Da mesma forma, o cérebro pensante exerce um papel de
administrador de nossas emoções, a não ser naqueles momentos em que lhe
escapa o controle, e o cérebro emocional torna-se licensioso.
Conforme fala-nos Goleman, “ em certo sentido, temos dois cérebros,
duas mentes e dois tipos diferentes de inteligência: racional e a emocional”
Nosso desempenho ao longo da vida é determinado tanto pelo QI como
também pela inteligência emocional. Isso resolve a antiga concepção de
antagonismo existente entre razão e emoção, e faz-se necessário encontrar o
equilíbrio inteligente entre ambas.
O antigo paradigma defendia um ideal de razão livre do peso da emoção.
O novo paradigma incita o ser humano a harmonizar a cabeça e o coração.
CAPÍTULO III
TRABALHANDO RAZÃO E EMOÇÃO NA ARTETERAPIA
“A finalidade da arte não é agradar.
O prazer é aqui um meio;
Não é, neste caso, um fim.
A finalidade da arte é elevar.”
(Leda Miranda Huhne)
Jung e Freud, duas falas distintas sobre a psique (alma), cada qual
marcada pelo brilho de seus narradores, traçaram os pilares fundamentais para
46
o desenvolvimento da Psicologia profunda. Enquanto Freud toma a tragédia de
Édipo como referencial para a Psicanálise, Jung faz, na Psicologia Analítica,
algo de similar importância e significação, usando como referência, entre
outros, o mito do herói, em busca da ampliação da consciência.
Jung utilizou-se de vários recursos para compreensão da psique:
filosofia, alquimia, religião, mitologia, sonhos, literatura, artes em geral.
A relação entre a arte e Psicologia foi um dos principais temas do século
XX. A arte, com sua abrangente linguagem, não deixou de retratar
problemáticas socioculturais, existenciais, chegando mesmo, por intermédio, a
facilitar na reconstrução de épocas históricas em diferentes dimensões.
Técnicas novas e maneiras de adequá-las a esses diferentes espaços têm se
construído em permanente desafio.
Jung afirma que “apenas aquele aspecto da arte que existe no processo
de criação artística pode ser objeto da Psicologia, não aquele que constitui o
próprio ser da arte”. (O.C., vol. XV,97). Pode-se dizer que a arte como terapia,
na visãojunguiana, volta-se fundamentalmente, ao indivíduo, dando-lhe a
possibilidade de encontrar o acesso às fontes mais profundas da vida.
A arte tem, em sua manifestação, fatores psicológicos e é o fio condutor
que permite a apresentação das intenções e das emoções que provêm do mais
íntimo estado individual do sujeito.
Estudos mostram que o homem, muito antes de falar, já usava a arte
como linguagem para se comunicar; apoderou-se do fogo, criou utensílios
rudimentares para se expressar, desenhava no chão ou nas paredes de suas
cavernas, criou símbolos para se comunicar. A riqueza e a dimensão dessa
linguagem – artística, quer seja homem primitivo ou do homem moderno, vêm
do inconsciente coletivo, onde repousam ou se manifestam os arquétipos.
A Arteterapia propicia o desenvolvimento do processo de
individualização, ou seja, a realização da personalidade em sua totalidade;
reúne um conjunto de técnicas capazes de despertar e trazer à tona conteúdos
conscientes e inconscientes, necessários a evolução do ser, por meio de
47
vivências técnicas expressivas. Par alcançar este objetivo, utilizando-se de
pintura, modelagem, colagem, mosaico, expressão corporal e de todas as
possíveis formas de expressão não verbal do ser humano. A fim de promover o
acesso a conteúdos psíquicos, a Arteterapia pode se valer também de mitos,
contos de fadas e imaginação ativa. A arte é então um caminho para
expressões psíquicas. Sua prática ajuda o indivíduo a se conectar com o seu
Eu interior e criador.
A Arteterapia é um meio terapêutico e de diagnóstico em que terapeuta e
paciente desenvolvem uma relação interpessoal dinâmica, com limites e
objetivos específicos. Portanto, difere da arte tradicional no sentido em que é
enfatizado o processo criativo em detrimento do resultado final.
O importante no momento da criação é a pessoa não se preocupar com
a estética nem com o belo, pois não é esse o objetivo das técnicas
expressivas. Neste processos, é importante que as emoções e os sentimentos
contidos ou interiores cheguem à “tela”, de forma natural. O que se pretende
com Arteterapia é chegar ao mundo profundo do incosnciente.
As técnicas utilizadas são meios para facilitar a comunicação entre o
princípio organizador da psique (self) e o ego. Por meio da livre expressão
proposta pela Arteterapia, pode-se ter acesso inconsciente, que produz
símbolos espontaneamente, a fim de possibilitar as trasformações da energia
psíquica.
Os símbolos surgem no processo criativo, possibilitando a atuação da
função transcendente, que realiza a síntese entre os conteúdos conscientes e
inconscientes, a fim de transformar a dualidade em algo novo, unificado, que
transcende as partes. Assim, os símbolos ajudam a solucionar conflitos,
promovendo o redirecionamento e a transformação da energia psíquica, em
busca do equilíbrio, da harmonia e da evolução do ser.
Por meio das técnicas expressivas, o ser humano exercita o instinto
básico e inato da criatividade que é instintiva e possibilita abrir o canal para a
48
transformação do ser. É a capacidade de dar forma, tornar visível o invisível e
de representar a realidade subjetiva.
O ato de criar traz á tona o mundo interno e o transforma. Por meio da
representação, criam-se condições para a transformação, o simples ato de criar
é em si, terapêutico.
Assim para Deluze “todos os signos convergem para a arte; todos os
aprendizados, pela mais diversas vias, são aprendizados inconscientes da
própria arte. No nível mais profundo, o essencial está nos signos da arte”.
3.1 – ELEMENTOS ESTRUTURANTES DA PSIQUE:
A psique não é algo que começa e termina somente em seres
humanos e com isolamento do cosmo. Há uma dimensão na qual a psique e o mundo
interagem intimamente e se refletem reciprocamente.
Esta é a tese de Jung.
(STEIN, 2004.p.178)
A psique humana é ambígua, representa a totalidade amalgamada dos
contrários, sendo, ao mesmo tempo, inconsciente consciente, buscando o
equilíbrio desses opostos pela compreensão. “ A psique não é apenas o objeto,
mas também o sujeito de nossa ciência”, afirma Jung. (O.C., vol. XVIII, 277)
Jung entende psique como a expressão de um funcionamento psíquico
inconsciente, “ genérico, humano, que está na origem não só das nossas
representações simbólicas modernas, mas também de todos os produtos
análogos do passado da humanidade”.(O.C.,vol. XVI/1, 111). No entanto cada
ser humano tem sua forma natural de vida dentro de si, forma irracional e
racional essa forma de ser é preenchida com material imaginado apresentado
pelos símbolos.
As representações simbólicas remetem a psique a estados primitivos,
que se exprimem por meio de imagens mitológicas, possibilitando o
funcionamento conjunto entre o consciente, e aquilo que o perturba, com o
inconsciente, que mantém os conteúdos primitivos.
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A psique não é um recipiente de elementos recalcados e rejeitados pelo
consciente e depositados e depositados no inconsciente. O inconsciente é
autônomo, tem formas próprias que brotam de regiões profundas,
desconhecidas, que aos poucos, atingem a consciência (O.C., vol. XVI/1, 125).
Contudo, afirma Jung: “existem certas constantes que não são adquiridas
individualmente, mas existem a priori” (op. Cit, 206). É nesse sentido que se
utiliza do conceito de arquétipo, do grego arché (antigo) typon (marca) que são
padrões de imagens psíquicas do inconsciente comuns a toda humanidade.
Jung propõe que os arquétipos sirvam como ligações diretas entre a
psique e o mundo físico, considerando-os como arquétipos psicóides. Segundo
Samuels (1989, p. 125), Jung definiu psicóide como psique e matéria, que
estão contidas no mesmo e único mundo, mantendo contato permanente. Isso
significa, em última análise, que se edificam “em fatores irrepresentavéis e
transcendentais”. Define o autor dizendo que é “provável que a psique e
matéria sejam dois diferentes aspectos de uma mesma e única coisa. Neste
sentido, este conceito anula o diferencial entre matéria e psique.
• Inconsciente coletivo e inconsciente pessoal
O inconsciente cria uma imagem à qual a consciência responde,
impregnada tanto de ideia como de sentimento (O.C., vol. VII/2,289). Todo ser
humano é capaz de ascender a uma consciência mais ampla, razão pela qual
podemos supor que os processos inconscientes, sempre e em toda parte,
levam à consciência conteúdos, que uma vez reconhecidos, ampliam o campo
desta última. ( O.C. vol VII/2, 292).
Quanto mais Jung percebe a imensidão da psique, mais se depara com
a camada mais profunda, a qual denomina de inconsciente coletivo. A psique
coletiva, assim como a psique pessoal, contém pares de opostos, tais como: as
virtudes e os vícios, o “caráter moral do bem e o mal” e todas as demais
díades.
O ser humano é, a um só tempo, consciente e inconsciente. A
consciência corresponde a uma parcela da psique humana, sendo a outra,
50
conferida ao inconsciente que é, de acordo com Jung, a instância geradora da
consciência. Fazendo uma alusão metafórica, o inconsciente é como se fosse o
oceano e a consciência, uma pequena ilha que o cerca.
Segundo Jung, o inconsciente apresenta duas camadas: O inconsciente
pessoal e o inconsciente coletivo, ou suprapessoal. A camada mais superficial
do inconsciente se constitui de lembranças perdidas ou reprimidas, de
lembranças dolorosas e de percepções sensoriais que não ultrapassam o limiar
da consciência por falta de intensidade da energia psíquica, sendo denominada
inconsciente pessoal. (O.C., vol. VII/1). Jung deixa claro quão difícil á a
distinção dos conteúdos coletivos e pessoais, pois estão intimamente ligados.
Os conteúdos do insconsciente pessoal são reconhecidos em sonhos,
sintomas ou fantasias, calcadas em reminiscências pessoais, geralmente de
acolhimento ou desafeto de pai, mãe, amante etc. No entanto, o inconsciente
pessoal e a consciência “ brotam” do inconsciente coletivo, a camada mais
profunda da psique, onde estão contidas todas as predisposições do vir a ser
humano, na forma de arquétipos.
O inconsciente pessoal vai até onde se estendem as recordações infantis
mais remotas do indivíduo, enquanto o inconsciente coletivo representa a
sedimentação da experiência multimilenar e é portanto, uma figuração do
mundo. Com o passar do tempo, foram-se definindo certos traços nesta
figuração. Esses traços são denominados de arquétipos ou dominantes.
• Arquétipos:
Jung admite ter tirado o termo de Platão ( em grego, archetypon) , que “primeiro colocou em lugar celestes s ideias de todas as coisas, isto é, os
modelos originários ou “ Urbilden” (em alemão), considerados, mais reais do
que as próprias coisas.” (PIERI, 2002, P. 44)
Para aquilo que nos ocupa, a denominação (arquétipos) é precisa e
de grande ajuda, pois nos diz que, no concernente aos conteúdos do inconsciente
coletivo, estamos tratando de tipos arcaicos (grifo nosso) ou melhor - primordiais,
51
isto é, de imagens universais que existiram desde os tempos mais remotos.
( O.C., vol. IX/ 1 §5)
O arquétipo é uma aptidão inata para reproduzir, invariavelmente, as
mesmas ideias míticas. As fantasias que surgem a partir dos conteúdos do
inconsciente coletivo têm sua origem em imagens universais, primordiais, que
fazem parte da constituição psíquica de toda a humanidade, não se limitando à
esfera das reminiscências pessoais.
Os arquétipos para Jung constituem parte importante no
desenvolvimento da individualização e subjetivação. São construções do
inconsciente coletivo, do imaginário social, onde os maiores e melhores
pensamentos da humanidade são moldados sobre imagens primordiais ou
arquétipos. Os arquétipos são fundamentos de experiências vividas pelo
conjunto da humanidade e que se repetem constantemente.
Para a Drª. Nise da Silveira (1981, p.87),não importa qual seja a origem
do arquétipo, que vai funcionar como “nódulo de concentração de energia
psíquica em estado potencial, que, quando toma forma e se atualiza, produz a
imagem arquetípica”.
O conceito de arquétipo esclarece as possibilidades herdadas para
representar as formas estruturantes que dão origem a imagens semelhantes. A
noção de arquétipo sustenta a existência de um fundamento psíquico comum a
todos os indivíduos, possibilita a compreensão do por que do aparecimento, em
épocas e lugares distantes, de temas idênticos nas artes, na filosofia, nos
mitos, nos contos de fada, nos ritos religiosos e na produção do inconsciente.
De modo mais amplo, os arquétipos aparecem metaforicamente tanto nos
sonhos de pessoas comuns quanto nos delírios de psicóticos. O arquétipo dá
noção e atemporalidade.
Jung considerou que os arquétipos têm vida própria e independente. Os
conteúdos do inconsciente coletivo atraem a energia psíquica, ou libido, que se
52
dirige às profundezas da psique, ativando conteúdos arquetípicos. (O.C., vol.
VII/ 1 § 104).
• Imagens:
Imagem para Jung é uma representação da linguagem poética, que indiretamente se relaciona com a percepção do objeto externo. “ A imagem tem
o caráter psicológico de uma representação da fantasia e nunca de caráter
quase real da alucinação, isto é, nunca toma o lugar da realidade e sempre se
distingue da realidade dos sentidos por ser uma imagem interna”. (O.C. vol. VI,
§827). Pras Jung, as imagens deveriam ser consideradas dentro de um
contexto e não como algo que se explicaria por si só. Por imagem, refere-se
não apenas aos quadros mentais mas também a qualquer tipo de conteúdo
consciente e inconsciente.
A imagem interna é uma grandeza complexa que se compõe dos mais
diversos materiais e das mais diversas procedências. Não é um aglomerado, mas um produto
homogêneo, com sentido próprio e autônomo. A imagem é uma expressão concentrada da
situação psíquica como um todo e não simplesmente ou, sobretudo dos conteúdos inconscientes.
A imagem é, portanto, expressão da situação momentânea, tanto inconsciente quanto consciente.
Não se pode, pois, interpretar seu sentido só a partir da consciência ou só do inconsciente, mas
Apenas a partir de sua relação recíproca.
(0.C., vol. VI § 829)
Jung chamou de imagens primordiais as imagens que se expressam
como motivos mitológicos, ou seja imagens que parecem refletir os modos
universais de experiência e comportamentos humanos que , no mínimo, são
comuns a todos os povos e tempos.(O.C., Vol. VI § 832).
A imagem primordial é a expressão resumida e condensada do processo
vivo, isto é, contém energia. A imagem ordena e dá um sentido coerente à
percepção sensorial e interior do indivíduo. Jung escreve que o grau de eficácia
psicológica da imagem primordial apresentada pelo símbolo é determinado
53
pela atitude do indivíduo e ganha significado, sentimento e importância. ( O.C.,
vol. VI § 836).
A existência de imagens arquetípicas presentes em todas as culturas
humanas, expressam por meio da mitologia e da religião, foi proposta por Jung
(1964, p. 240), quando afirma: “Imagens são acessadas pelo inconsciente
individual por meio do inconsciente coletivo, são forças geratriz e motora de
padrões de atitude e comportamento do indivíduo”.
• Símbolo:
Os símbolos são organizadores da libido. A palavra símbolo deriva do grego symbállon, originalmente referia-se à parte quebrada de um dado ou
qualquer outro objeto cuja superfície encaixa-se perfeitamente ao outro
fragmento. Entende-se por símbolo aquilo que, por um princípio de analogia,
representa ou substitui outra coisa; ou aquilo que, por sua forma ou sua
natureza, evoca em um determinado contexto algum objeto ou ser ausente. Um
símbolo pode ser elemento cuja descrição é passível de muitas interpretações,
sejam elas relacionadas ao plano das ideias ou ao plano da realidade. (PIERI,
2002, P.458).
Na Psicologia junguiana, o símbolo pode ser empregado como idéia
consciente que representa e encerra a significação de outra inconsciente.
O inconsciente se manifesta sempre por um meio de símbolos, seja por
meio de sonhos, fantasias ou pela técnica da imaginação ativa. Mas é o ego
que permite a revelação do símbolo e também que este se desloque de uma
situação de “ou isso ou aquilo”, para a de “e”, ultrapassando os limites do
discurso lógico ou do senso comum. (SAMUELS,1998)
Os conteúdos simbólicos que atravessam a barreira entre o inconsciente
e o consciente vão ganhando significações a partir da tomada de consciência,
ou seja, quando o sujeito consegue, por meio das lembranças, das decifrações
e das interpretações, compreender os símbolos. Tais símbolos passam então a
significar algo delimitado pelo próprio ego.
54
Vê-se, portanto, que o símbolo é uma forma complexa que contém
imagens arquetípicas e que não se encerra em uma síntese para a
compreensão, podendo ultrapassar a capacidade de ser formulado por
conceitos. Para Jung,”o símbolo não seria racional, nem irracional, mas as
duas coisas ao mesmo tempo”.
A profusão de símbolos animais na religião e na arte de todos os tempos não acentua apenas a
importância do símbolo: mostra também o quanto é vital para o homem integrar em sua vida o
conteúdo psíquico do simbolismo, isto é, o instinto... Esses instintos por vezes nos parecem
misteriosos, mas guardam correlação com a vida humana: o fundamento da natureza humana
é o instinto.
(JUNG, 1964, p.239)
Segundo os postulados da Psicologia analítica, “a parte do símbolo que
não é acessível à razão está fazendo vibrar cordas ocultas do inconsciente”.
(op.Cit.) Os símbolos para os junguianos são expressões de coisas
significativas para as quais não há, no momento, formulação.
3.2 – PROCESSO DE SIMBOLIZAÇÃO:
• Self – Si mesmo:
O Self ou o Si mesmo é o centro ordenador da psique, o arquétipo do
centro e que, paradoxalmente, também engloba a totalidade psíquica. Ele é a
matriz, o lugar de onde se parte e também a meta a ser alcançada. É um
conceito prático e teórico, isto é, “engloba o experimentável”. ( O.C.,vol. VI §
902).
Para Jung, o Si-mesmo, como meta da vida do indivíduo, expressa a
unidade e a personalidade global. Assim, possui tanto aspectos conscientes
como inconscientes. O Si-mesmo aparece em forma de símbolos muninosos,
possuindo, portanto, propriedades ligadas à experiência com o divino. Neste
sentido, tudo o que estiver ligado à imagem de Deus pode ser atribuído aos
símbolos da totalidade.
Self é o orientador da psique, deve ser visto como fonte e dirigente do
impulso para a individuação, arquetipicamente torna-se o que se é.
55
Para Jung, o Si-mesmo é transcendente, isto é ele não é definido como
domínio psíquico nem está contido nele, situa-se além dele, é mais do que a
subjetividade da pessoa, e sua essência situa-se além do domínio subjetivo.
“O Si-mesmo forma a base para o que, no sujeito, existe de comum com
o mundo, com as estruturas do Ser”. (STEIN,1998, p.138)
• Anima / Animus:
Em seu livro Memórias, Sonhos e Reflexões, Jung conta a história de
como descobriu o arquétipo da anima. Sendo esta uma voz que era autônoma
e feminina e com seu próprio pensar interior, chamando-a de “a mulher em
mim”.
Anima e animussão termos latinos que indica a imagem da alma de uma
individualidade, masculina ou feminina.
A alma possui caráter feminino e não constitui pré disposição individual,
mas sim predisposição individual psíquica de natureza coletiva. Constitui um
complexo psíquico semi-consciente, com característica de “uma personalidade
interior”, cuja função natural é estabelecer a ligação entre a consciência e o
inconsciente.
De acordo com o princípio de complementaridade, a anima e o animus
são imagens da alma. A anima é a figura de caráter feminino que compensa a
consciência masculina; a figura compensadora na consciência feminina é de
caráter feminino que compensa a consciência masculina; a figura
compensadora na consciência feminina é de caráter masculino, designada pelo
nome de animus. Esses termos indicam imagens psíquicas associadas à “
processos psíquicos interiores, que estão ligados de maneira correlata à
atitude externa, por meio da persona.
O homem sente necessidade de relacionar-se com o mundo exterior,
tendo como alicerce a força da unidade interior. A anima é essa força para o
sexo masculino. Partindo dessa consciência, se há a utilização da imagem da
56
mulher como símbolo da sua própria alma, o homem tem a possibilidade de
lidar com essa imagem simbólica e vivenciar internamente a sua alma.
O primeiro ser feminino de que o homem recebe projeção da anima se
revela por meio da sua convivência com a mãe. Essa projeção vai sendo
substituída por outra mulher no decorrer do seu crescimento Mas, para que
haja maturidade em torno dos relacionamentos com outras mulheres, faz-se
necessário que a convivência entre mãe e filho tenha sido de qualidade. Se o
homem sente que a mãe teve sobre ele uma influência positiva, sua anima
contribuirá para revigorar sua masculinidade; se a figura materna exerceu
sobre ele uma influência negativa, poderá resultar em conseqüências
prejudiciais, logo, a anima refletida no homem tanto pode apresentar um
caráter positivo quanto negativo. No primeiro caso enxerga de uma forma
sensível o universo das artes, tem admiração pelo belo e pela natureza.
Quando negativa, a anima projeta sentimento de inquietação, tais como: medo
insegurança.
Não há homem algum tão exclusivamente masculino que não possua em si
algo de feminino. O fato é que precisamente os homens muito masculinos possuem
(se bem que oculta e bem guardada) uma vida afetiva muito delicada, que muitas
vezes é injustamente tida como feminina. O homem considera uma virtude reprimir da
melhor maneira possível seus traços femininos. Analogamente, a mulher, até há
pouco tempo, considerava inconveniente ser varonil.
( O.C., vol. VII / 2 § 297)
Referindo-se ao sexo feminino, há uma estrutura psicológica
correspondente em seu interior que algumas vezes, porém, se manifesta como
uma força masculina, denominadora animus. Esse arquétipo vai se
desenvolver em decorrências das experiências com o homem durante toda a
evolução da humanidade.
Homem e mulher possuem em si traços femininos e masculinos, muitas
vezes, reprimidos. A repressão desses traços quer que um ou noutro produz
acúmulo dessas tendências no inconsciente, por isso ambos são levados em
57
suas escolhas amorosas, a buscar aquele que corresponda melhor à
representação desses traços reprimidos, ou seja, aquele(a) que “acolha
prontamente a projeção de sua alma” (O.C., vol. VII/ 2/§297). Tanto anima
quanto animus são frequentemente projetados.
De outro modo, quando a imagem da alma, anima-animus, permanece
junto ao sujeito, não havendo distinção entre o eu e ela (imagem da alma), o
mesmo passa a projetar a persona em outro indivíduo, sendo, neste caso, do
mesmo sexo. Por exemplo, a transferência dos conteúdos introjetados do pai
no que se refere aos homens e dos conteúdos da mãe no que se refere às
mulheres.
O arquétipo do animus tem-se manifestado na mulher mais
intensamente, e o lado feminino da psique do homem pode ser mais bem
desenvolvido sem correr o risco de perder seu papel masculino. O feminino e o
masculino que habitam em nós, mesmo projetado de uma forma inconsciente,
podem servir de crescimento na construção da psique.
A anima produz caprichos, o animus produz opiniões, e ambos brotam
de um fundo obscuro do inconsciente. Enquanto a anima se personifica
singularmente, o animus se personifica como uma pluralidade, “ uma
assembléia de pais e outras autoridades, que formula opiniões incontestáveis e
racionais, por exemplo”. (O.C., vol. VII/ 2§ 332)
Anima e animus, figuras do fundo obscuro da psique, têm como
correlato do consciente a persona. “ São complexos autônomos que
constituem uma função psicológica do homem e da mulher. Sua autonomia
retém o pleno desabrochar de uma personalidade. Ao conscientizá-los,
podemos convertê-los em pontes que nos conduzem ao inconsciente” ( O.C.,
vol. VII/ 2§ 339). Para tal, cada um precisa experimentá-los em si mesmo.
Anima e animus são responsáveis pelas qualidades das relações com pessoas
do sexo oposto.
58
• CONSCIÊNCIA:
Para Jung, o campo da consciência pode, teroricamente, estender-se de
forma indeterminada, sendo impossível afirmar até onde vão os seus limites.
No entanto, empiricamente, este campo alcança sempre o seu limite ao tocar o
âmbito do desconhecido. O desconhecido, por sua vez, divide-se em dois
grupos: o do mundo ambiente e o do mundo interior, sendo este último o
inconsciente. (O.C, vol. IX / 2§1)
Jung grifa que a consciência emana de profundezas desconhecidas e,
portanto, não se cria a si mesma. Desconhecidas e portanto, não se cria a si
mesma. Desperta gradualmente na infância e , no decorrer da vida, “desperta
cada manhã, saindo das profundezas do sono, de um estado de inconsciente”.
(JUNG, 2002, p.353)
Em tipos Psicológicos ( O.C., vol. VI §535 – 536) Jung escreve: “ a
consci~encia é a função ou atividade que mantém a relação dos conteúdos
psíquicos com o ego. O desenvolvimento progressivo da consciência ao longo
da vida, ou seja, o surgimento do Si-mesmo na estrutura psicológica e na
consciência é contínuo e está ao alcance de todos, em qualquer fase de sua
vida, seguindo vários estágios de crescimento.
• EGO:
Para Jung, o ego é um “complexo de ideias que constitui o centro da
área da consciência”. É o pré-requisito para o pensamento, o sentimento e o
agir consciente, caracterizado por um alto grau de continuidade e identidade
consigo próprio. O ego, o “eu” é uma parte da psique que, por sua vez, pode
ser comparada a uma esfera como uma zona brilhante na superfície,
representando a consciência. O ego é o centro desta zona, portanto, o centro
da consciência e possui a função de fazer com que o indivíduo realize a sua
totalidade. Para tal, é necessário que ele ilumine o sistema inteiro, tornando
consciente a totalidade da psique, favorecendo o impulso interior de
crescimento. (VON FRAZ, 2002, p.161 -162)
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Jung prossegue o texto, ressaltando que a relação de qualquer conteúdo
psíquico com o eu é condição para detectar se o conteúdo é consciente ou
não, definindo o ego como um sujeito a quem os conteúdos psíquicos são
apresentados. Portanto, a função do ego seria fazer com que a psique - ao
apresentar seus conteúdos a ele – se torne consciente.
O ego é constituído de duas bases, sendo uma somática e a outra
psíquica. A base somática é constituída por fatores conscientes e
inconscientes. De forma semelhante, na base psíquica, “O ego se assenta, de
um lado, sobre o campo da consciência global e, do outro, sobre a totalidade
dos conteúdos insconscientes”. (O.C., vol. IX /2§4)
O ego é um fator consciênte por excelência, apesar do caráter
relativamente desconhecido e inconsciente de suas bases. Além disso,
constituiu uma aquisição empírica da existência individual. (O.C., vol. IX/ 2§5)
Jung evidencia que o ego – a personalidade consciente – não coincide
com a personalidade global, sendo necessário distinguir um do outro. Daí a
proposta da denominação do Si-mesmo para referir-se à personalidade global
que existe realmente, mas que não pode ser captada em sua totalidade, e á
qual o ego se subordina, em uma relação na qual o ego é a parte e o Si-mesmo
o todo.
Jung diz que o processo de assimilação do inconsciente se manifesta de
duas formas antagônicas: supervalorizando o ego ou tornando-o impotente.
Evidenciamos que tanto a supervalorização quanto a impotência estão
disfarçadas. A primeira oculta em sentimento de inferioridade e intenso
abandono, enquanto que a segunda esconde uma vontade de pot~encia, isto
é, a capacidade de ter consciência de si mesmo. (O.C., vol. VII /2§224)
• SOMBRA:
Centro do Inconsciente pessoal, o núcleo material que foi reprimido da
consciência.
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A sombra inclui: elementos psíquicos e coletivos, tendências, desejos,
memórias e experiências que são rejeitadas pelo indivíduo como incompatíveis
com a persona. Quanto mais forte for nossa persona e mais nos identificarmos
com ela, mais repudiaremos outras partes de nós mesmos.
A sombra representa aquilo que consideramos inferior em nossa
personalidade e também aquilo que negligenciamos e nunca desenvolvemos
em nós mesmos.
Em sonhos, a sombra freqüentemente aparece com animal, vagabundo
ou qualquer categoria de figura sentida como inferior.
Principal tendência é a PROJEÇÃO. Se o material da sombra for trazido
a consciência, ele perde muito de sua natureza amedrontadora e escura. A
sombra é mais perigosa quando não é reconhecida, neste caso é provável o
uso da projeção ou deixar-se dominar pela sombra sem perceber.
Quanto mais o material da sombra é reconhecido, menos ele pode
dominar. Entretanto, a sombra é uma parte integral da nossa natureza e nunca
pode ser simplesmente eliminada.
É preciso reconhecer a força da sombra e integrá-la ao todo.
A sombra não é totalmente negativa – ela é depósito de considerável
energia instintiva, espontaneidade, vitalidade, é a fonte principal de nossa
criatividade.
Sombra , quanto mais for reprimida, mais se tornará espessa e negra. A
Sombra é uma espessa massa de componentes diversos, aglomerando desde
pequenas fraquezas, aspectos imaturos ou inferiores, complexos reprimidos,
até forças verdadeiramente maléficas, negrumes assustadores. Mas também
na sombra poderão ser discernidos traços positivos: qualidades valiosas
que não se desenvolveram devido a condições externas desfavoráveis ou
porque o indivíduo não dispôs de energia suficiente para levá-la adiante,
quando isso exigisse ultrapassar convenções vulgares.
(SILVEIRA, 1996. P. 97)
61
A sombra é considerada por Jung como um arquétipo que polariza as
energias positivas e negativas. As energias negativas referem-se a aspectos
obscuros, ameaçadores e indesejáveis da personalidade. As positivas contém
qualidades vitais que são adicionadas à vida e a fortalecem.
• PERSONA:
O termo persona origina-se do teatro grego antigo e significa máscara. É um arquétipo associado ao comportamento humano que permite o contato
com o mundo exterior. É necessário à adaptação do indivíduo ás exigências do
meio social onde vive. Persona na qualidade de arquétipo é própria de todo ser
humano.
Ela é uma soma de fatores psíquicos, comprende-se como sendo uma
totalidade de imagens. Todos os fatores que não condizem com a imagem
ideal são rejeitados, esquecidos ou reprimidos, constituindo a sombra. Já a
persona é uma maneira de adaptação onde o indivíduo se distancia de sua
essência em detrimento de sua imagem ideal. Esta imagem ou o segmento
adaptativo da psique é definido por Jung como sendo a persona. Esta tem por
finalidade expressar uma individualidade, convencendo os
espectadores/pessoas do relacionamento social e o próprio ator/pessoa de que
assim o é.
Como todo arquétipo, a persona possui o seu lado positivo e negativo. O
primeiro se refere à adaptação social e o segundo remete a fixação da persona
em um determinado papel social, impedindo o desenvolvimento adaptativo. Por
vezes, esse papel pode chegar ao ponto de hipocrisia, falsidade, fingimento, de
tal sorte que as pessoas, que convivem com alguém que possui uma persona
desse tipo, podem ter uma desagradável surpresa, quando perceberem que
tudo não passa de ilusão.
Assim como no teatro, é também no palco da vida, onde a persona se
afirma como individualidade, encobrindo e protegendo o real indivíduo que é o
ator.
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Este arquétipo, contém imagens específicas e pessoais, nota-se também
imagens gerais e impessoais presentes no inconsciente coletivo.
Segundo Jung, é de fácil compreensão que, por meio “da persona, o
homem quer parecer isto ou aquilo, ou então se esconde atrás de uma
máscara ou até mesmo constrói uma persona definida, a modo de muralha
protetora”. (O.C., vol. VII/2§269)
Em Tipos Psicológicos, vol.VI das obras completas Jung expõe as
dificuldades com a persona:
A persona é, pois um complexo funcional que surge por razões de
adaptação ou de necessária comodidade, mas não é idêntico a individualidade.
O complexo funcional da persona diz respeito exclusivamente á relação com os
objetos externos (O.C., vol. VIII/1§755). Quando o indivíduo tem consciência de
que existe relação entre o eu e a persona consciência de que existe a relação
entre o eu e a persona, isso lhe possibilita relacionar-se melhor com seus
conteúdos internos e com o mundo externo. Pode-se ainda dizer que está
consciente do seu processo de individuação. Enquanto, se o eu se identificar
com a persona, perde a capacidade de perceber o que ele realmente é, isto é,
diferente do que aparenta ou quer ser e, nesse caso, dizemos que fica tomado
pelo arquétipo da persona.
Ao lidar constantemente com o mundo exterior, o eu vai fabricando
defesas para viver. A parte positiva da persona serve, portanto para solar o
homem e protegê-lo.
• COMPLEXOS:
O termo “complexo” foi usado por Bleuler (1857) para designar certos
diagnósticos na psquiatria. A partir de 1900, Jung introduziu a noção de
“complexo de acento emocional” para fenômenos dos “agrupamentos de ideias
de acento emocional no inconsciente”; posteriormente denominados
“complexos”.
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O ponto de partida para a formação desses conceito na obra de Jung
foi o processo associativo. Juntamente com Bleuler, ele realizou estudos
experimentais sobre associação de palavras, descobrindo efeitos geralmente
produzidos á revelia do sujeito, de forma incontrolável e perturbadora.
Percebeu a partir da reação das pessoas que determinadas palavras indicam a
existência de “ complexos de elevada carga emocional”, que consistiam em
conjuntos de representações fortemente ligadas entre si, em torno e um núcleo
de elevada carga afetiva, associando à lembrança de experiência de vida,
geralmente inconsciente e particularmente marcante.
Segundo Jung, os afetos podem durar por tempo indeterminado, pois
quando a experiência sai da consciência , o registro afetivo do complexo passa
a manifestar-se por meio de distúrbios característicos e ocasionalmente, em
alusões disfarçadas, nos sonhos. Os complexos estão sempre prontos a
reaparecer, a partir de estímulos semelhantes. A este fator, Jung denominou
“sensibilidade do complexo”. (O.C., vol. III§87)
O ego pode ser dominado por qualquer dos complexos que formam a
cadeia de relacionamentos do indivíduo, desde seu nascimento com a mãe, o
pai os irmãos, no seio da família e na sociedade em geral. Aí poderão ocorrer
fenômenos de irregularidades no processo de individualização, pelo fato de o
indivíduo, por exemplo não conseguir crescer psiquicamente, criando a figura
do puer-aeternuns, isto é, permanece eternamente uma criança a demandar
cuidados de terceiros pelo resto da vida, incapaz de se comandar por ele
próprio. Outro exemplo de irregularidade é a figura o Trickester, o arquétipo do
embusteiro, o “bobo da corte”, em suma, aquele que não se adapta às regras
da sociedade organizada.
3.3 – TIPOLOGIA JUNGUIANA E FUNÇÕES PSÍQUICAS
Segundo Philippini (2008), o universo junguiano em arteterapia aponta o
caminho que se deve seguir para o entendimento universal da produção
simbólica e que também se deve considerar que os pontos cardeais que
indicam a caminhada pelas profundezas das singulares áreas psíquicas estão
registrados na tipologia junguiana.
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Nesta tipologia, identifica - se quatro funções psíquicas básicas que são:
pensamento, sentimento, sensação e intuição. Normalmente, observa- se a
predominância de uma destas funções, ou seja: a função superior no
comportamento de cada pessoa em detrimento da funcionalidade das outras. A
estas funções psíquicas, Jung correlacionou aos quatro elementos básicos da
natureza: ar, água, fogo e terra e a dois movimentos básicos para a orientação
da energia psíquica: movimento predominante para o mundo externo,
extrovertido, e movimento predominante para dentro, introversão.
As funções racionais (pensamento, sentimento) e irracionais (intuição e
sensação) excluem-se mutuamente no seu exercício: pensamento e
sentimento se opõem, assim como sensação e intuição. Cada pessoa utiliza de
preferência uma função que se torna dominante, deixando a sua função oposta
numa indiferenciação próxima do inconsciente. Sendo que no cotidiano, as
pessoas não só recebem informações, mas precisam agir em função dessas
informações.
A identificação da preferência pelo grupo ou pelo indivíduo de funções
racionais ou irracionais fornece pistas para se detectar qual será a função
superior, isto é, qual da função que é utilizada melhor ou mais freqüentemente
e a função auxiliar que a complementa e ajuda na sua expressão. A terceira
função tem um desenvolvimento rudimentar e a quarta permanece num estado
mais ou menos inconsciente. Essas funções opostas às preferidas pelos
indivíduos denominam-se função inferior que resiste à integração dentro da
consciência mais ampla e é fonte de desconforto e dificuldades da pessoa.
Conhecer a dinâmica dos tipos psicológicos compreendendo-se a forma
como cada individuo se posiciona no mundo, é a ferramenta necessária para
se criar meios de se respeitar as características de cada indivíduo dentro do
círculo que se atua na sociedade.
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4. CONCLUSÃO:
A Razão e a Emoção são sentimentos indissociáveis. É necessário
encontrar o equilíbrio entre ambas. Harmonizar a cabeça e o coração.
Para enfrentarmos o mundo da informação, não basta, simplesmente,
encará-lo com a razão. O melhor caminho para as convivências sociais do
mundo atual é unir razão e emoção, para que se construa o alicerce à
construção do conhecimento e da aprendizagem significativa.
Vários foram os pensadores e filósofos que, desde a Grécia Antiga,
postularam uma suposta dicotomia entre razão e emoção. Quando Platão
definiu como virtude a liberação e troca de todas as paixões, prazeres e valores
individuais pelo pensamento, considerado, por ele, um valor universal e ligado
à imutabilidade das formas eternas (Silva, 2002), e quando Descartes criou a
tão conhecida e famosa afirmação na história da filosofia - "Penso, logo existo"-
sugeriam a possibilidade de separação entre razão e emoção ou, o que seria
mais adequado, assumiram implicitamente uma hierarquia entre tais instâncias
do raciocínio humano, em que o pensamento tem valor de excelência.
Longe de terem sido esquecidas, essas premissas da filosofia
permanecem vivas até os dias atuais, muitas vezes traduzidas sob metáforas
que ouvimos freqüentemente na vida cotidiana: "não aja com o coração",
"coloque a cabeça para funcionar", "seja mais racional". Nessa perspectiva,
parece-nos que para uma pessoa tomar decisões corretas é necessário que ela
se livre ou se desvincule dos próprios sentimentos e emoções. Fica a
impressão de que, em nome de uma resolução sensata, deve-se desprezar,
controlar ou anular a dimensão afetiva. E não foi o que presenciamos no
decorrer deste trabalho.
Como vimos, temos no cérebro uma sede das emoções, que é o
sistema límbico. Nessa sede, as emoções são criadas e gerenciadas. São essas
emoções que direcionam o comportamento humano.
Essas duas vertentes, razão e emoção são sensações intensas que
quando em desequilíbrio pode dominar o individuo acarretando consequências
devastadoras. A emoção em alguns momentos fragiliza o ser humano de tal
66
forma que o afasta de seu lado racional. Escolher nem sempre é fácil, mexe
com sentimentos e histórias de vida que transcende a racionalidade, escolher
faz parte da vida e é necessária para uma mudança futura. Escolher com
maturidade e equilíbrio é necessário, uma mudança interna transformar idéias,
re-direciona, re-significa valores tão fortemente arraigados no individuo.
Para se obter um crescimento maior, se faz necessário esforço e
vontade em querer crescer, o que pode se pensar na realidade referente a
imagem ou melhor ao imaginário, como uma fotocopia do nosso inconsciente,
que ao ser focada transfere os desejos que muitas vezes vai além das
necessidades, em busca de uma satisfação completa, porém comprimida,
resultando na falta, seja relacionada a felicidade ou no prazer que o sujeito
corre atrás.
Toda mudança por menor que seja pode a priori causar desconforto.
Lidar com esse mundo dinâmico onde tudo é transitório não é uma tarefa fácil,
os seres humanos, em relação à mudança, as poucas modificações já é
sentida com um enorme peso. Cria-se ilusão em relação às pessoas, idéias
irreais e fantasiosas que acabam camuflando e mascarando, utiliza-se as
emoções como válvula de escape para justificar possíveis condutas irracionais
e tempestivas.
Em uma pesquisa realizada por Daniel Goleman afirma que o homem
deve 80% do sucesso na profissão e na vida à sua inteligência emocional e
apenas 20% à racionalidade. Porém, não há êxito emocional sem inteligência
racional.
No entanto, toda decisão racional tem influência da emoção. Cabe às
pessoas conhecerem a emoção inerente no processo decisivo para dominá-la
e separá-la no momento da escolha. Pode-se considerar que, se existisse a
decisão racional sem influência da emoção, seria uma decisão falsa, fria,
portanto duvidosa.
As emoções é que nos permitem traçar o mapa de nossa vida. Sem elas
viveríamos pouco, pois não tendo medo correríamos mais riscos, não nos
organizaríamos em sociedade, não nos preocuparíamos com a vida. A emoção
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na dose certa é um instrumento para a realização pessoal e conquista do
sucesso. É a nossa capacidade de autocontrole e de inter-relacionamento.
Se não dá simplesmente para apagar as emoções, o que pode ser feito é
dominá-las, controlá-las e assim minimizá-las.
Em certos casos, é necessário o processo terapêutico que vai servir de
recurso a fim de conectar essa pessoa ao seu equilíbrio.
Muitas vezes não se consegue falar a respeito dos conflitos pessoais,
então, a Arteterapia propõe recursos artísticos para que sejam projetados e
analisados todos esses processos, obtendo-se uma melhor compreensão de si
mesmo e de suas emoções.
Propiciando o desenvolvimento do processo de individualização, a
realização da personalidade em sua totalidade. Reunindo um conjunto de
técnicas capazes de despertar e trazer à tona conteúdos conscientes e
inconscientes, necessários a evolução do ser, por meio de vivências técnicas
expressivas. Par alcançar este objetivo, utilizando-se de pintura, modelagem,
colagem, mosaico, expressão corporal e de todas as possíveis formas de
expressão não verbal do ser humano. A fim de promover o acesso a conteúdos
psíquicos, a Arteterapia pode se valer também de mitos, contos de fadas e
imaginação ativa. A arte é então um caminho para expressões psíquicas. Sua
prática ajuda o indivíduo a se conectar com o seu Eu interior e criador.
As sessões de Arteterapia facilita o processo expressivo e imaginário das
pessoas, vindo de encontro ao conceito de simbologia criada por Jung.
Cabendo ao arteterapeuta, junto com o cliente que cria os símbolos,
contextualizar seu significado, considerando os aspectos dinâmicos pertinentes
à singularidade e historicidade de cada indivíduo.
68
BIBLIOGRAFIA
BEAR. M. F. CONNORS, B.W PARADISO, M.A. Neurociências. Desenvolvendo o Sistema Nervoso. 2ª Ed. Porto Alegre, RS. Artemed, 2002. BELLO, Susan. Pintando sua alma, método de Desenvolvimento da Personalidade Criativa. 3ª Ed. RJ: Ed Wak 2007. CARNEIRO, celeste, Arte, Neurociência e transcedência. RJ. Wak Ed, 2010. JUNG, Carl Gustav. Símbolos da transformação. Petrópolis:Vozes, 1989. KANDEL, E.R. SCHWARTZ, J.H. JESSEL, T.M. Princípos da Neurociência. PHIILIPPINI, Ângela. Cartografia da coragem. 4ª Ed. RJ. Wak Ed,2008. Reagle G. História da filosofia antiga: das origens a Sócrates. 3ª Ed. São Paulo: Loyola; 1999. RELVAS, Pires Marta; Neurociência e Transtornos de Aprendizagem. 4ª Ed. RJ, Ed. Wak, 2010. RELVAS, Pires Marta; Fundamentos Biológicos da Educação. 4ª Ed.RJ, Ed. Wak, 2009. SANTOS, Regina Sandra, Jung um caminhar pela psicologia analítica. Ed. Wak, RJ, 2008. SILVEIRA, Nise. Jung: Vida e Obra 20ª Ed. São Paulo: Paz e Terra. 2006. URRUTIGARAY, Cristina Maria; Arteterapia, A Transformação pessoal pelas imagens. 4ª Ed. RJ, Ed Wak, 2008.
69
WEBGRAFIA
http://www.suapesquisa.com/filosofia/
Acesso em 23/07/2010 – 22:05hs
http://www.textolivre.com.br/livre/15931-corpo-e-mente-razao-e-emocao
Acesso em 25/08/2010 – 14:06hs
Revista de Psiquiatria Clínica, Neurobiologia das emoções.http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101- Acesso em 09/10/10 - 23:00hs.
http://www.scielo.br/pdf/epsic/v2n2/a13v02n2.pdf
Acesso em 09/10/2010 – as 21:40hs
70
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS 3 DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 METODOLOGIA 6 SUMÁRIO 7 INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A psicologia e sua origem 12
CAPÍTULO II
ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO SISTEMA LÍMBICO AO SISTEMA DAS EMOÇÕES 16
2.1 - Estruturas relacionadas as emoções 19 2.2 – As bases Neurais das emoções 24 2.3 – Emoção e Razão 36 2.4 – Dificuldades de lidar com a emoção 41 2.5 – A dificuldade de lidar com a razão 44
CAPÍTULO III
TRABALHANDO RAZÃO E EMOÇÃO NA ARTETERAPIA 45 3.1 – Elementos estruturantes da Psique 48 3.2 – Processo de simbolização 54 3.3 – Tipologia Junguiana e Funções Psiquicas 63
CONCLUSÃO 65
BIBLIOGRAFIA 68
WEBGRAFIA 69
INDRODUÇÃO 70