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UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA REGIONAL DE CHAPECÓ Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais Michel de Oliveira Bráz A TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL Chapecó – SC, 2008

UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA REGIONAL DE CHAPECÓ …

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UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA REGIONAL DE CHAPECÓPrograma de Pós-Graduação em Ciências Ambientais

Michel de Oliveira Bráz

A TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE

SAUDÁVEL

Chapecó – SC, 2008

ii

UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA REGIONAL DE CHAPECÓPrograma de Pós-Graduação em Ciências Ambientais

A TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE

SAUDÁVEL

Michel de Oliveira Bráz

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Comunitária Regional de Chapecó, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências Ambientais.

Orientadora Profª. Drª. Silvana Terezinha Winckler

Chapecó – SC, maio, 2008

iii

FICHA CATALOGRÁFICA

344.046 Bráz, Michel De Oliveira. B827t A tributação ambiental como instrumento de implementação do direito ao meio ambiente saudável / Michel De Oliveira Bráz. – Chapecó, 2008.

167 p. Dissertação (Mestrado) – Universidade Comunitária Regional de Chapecó, 2007. Orientador: Profª. Silvana Terezinha Winckler.

1. Direito ambiental. 2. Proteção Ambiental. 3. Direito Tributário. I. Winckler, Silvana Terezinha. II. Título

CD 344.046

Catalogação Daniele Lopes 14/1989 Biblioteca Central Unochapecó

iv

UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA REGIONAL DE CHAPECÓPrograma de Pós-Graduação em Ciências Ambientais

A TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL

Michel de Oliveira Bráz

Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do grau de

Mestre em Ciências Ambientaissendo aprovado em sua forma final.

_______________________________________Silvana Terezinha Winckler, Doutora

Orientadora

Banca Examinadora

_________________________________Ubaldo Cesar Balthazar, Doutor

__________________________________Claudio Alcides Jacoski, Doutor

Chapecó, 06 de maio de 2008.

v

DEDICATÓRIA

À minha esposa Patrícia e aos meus pais, agradeço pelo imenso apoio e incentivo em todas as etapas do curso, sempre com compreensão e carinho, peças fortalecedoras, pois tornaram possível esta pesquisa.

vi

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus, por toda saúde, paciência, inteligência e garra que

me tornou capaz de concluir esta árdua dissertação de Mestrado.

Ao Professores Ubaldo César Balthazar, Arlene Renk e Cláudio Alcides Jacoski,

pela atenção dedicada e contribuições por oportunidade dos debates na Banca de defesa da

Dissertação.

Aos Professores Cláudio Jacoski e Arlene Renk pelas análises e sugestões na

qualificação do projeto de pesquisa.

Às Professoras Gilza Maria de Souza Franco e Rosiléa Garcia França,

coordenadora e ex-coordenadora, respectivamente, do Programa de Pós-Graduação em

Ciências Ambientais, e a todos os seus membros, pelas experiências passadas como forma de

aprendizado.

Aos meus queridos amigos da 2ª Turma do Mestrado em Ciências Ambientais, por

todos os momentos de alegria, trocas de experiências e preocupações com todos os

compromissos que surgiram no transcorrer do curso.

E, por último, e de forma diferenciada, à Professora Silvana Terezinha Winckler,

pela paciência, compreensão, preocupação, instrução e o tempo dispensado na orientação de

minha dissertação.

vii

RESUMO

BRÁZ, Michel De Oliveira. A Tributação Ambiental como Instrumento de Implementação do Direito ao Meio Ambiente Saudável (Mestrado). Universidade Comunitária Regional de Chapecó - UNOCHAPECÓ, 2008. 165p.

A sociedade moderna, caracterizada pelo capitalismo, é, infelizmente, também caracterizada por uma degradação ambiental e implicações nos ecossistemas nunca antes vista, que chega ameaçar não só a biodiversidade, mas também a própria manutenção da vida. Nesta conjectura, a proteção ao meio ambiente coloca-se como tema primordial a ser considerado pelos Estados, mercado e sociedade. Além destes problemas ambientais, não podemos olvidar que a desigualdade social, influenciada necessariamente pela má distribuição de renda, atinge diretamente o meio ambiente por intermédio de uma distribuição desigual dos riscos ambientais, onde as degradações se apresentam como fonte de renda para estas pessoas carentes. A partir daí, o Direito, com suas múltiplas disciplinas e temáticas, instituiu inúmeros instrumentos de proteção ambiental, os quais, com o passar dos anos, se apresentaram com uma eficácia reconhecida e atuante, através da imposição de sanções penais, pecuniárias e administrativas. Porém, infelizmente, não foram suficientes a ponto de proteger o Meio Ambiente. Paralelamente às preocupações legais, foram criadas, em nível internacional, normas administrativas de controle ambiental, como conceito de gestão de qualidade ambiental, utilizadas na certificação do sistema de gerenciamento ambiental de organizações. Porém, de igual sorte, não estabeleceram nenhum requisito de desempenho ambiental, além da conformidade às legislações ambientais aplicáveis e o compromisso com a melhoria contínua do meio ambiente. O Estado, adotando um novo perfil intervencionista, na busca de estabelecer outras formas de atingir o preceito fundamental de preservação ambiental, concebeu a utilização do Direito Tributário como veículo à implementação de políticas públicas e sociais voltadas à preservação do meio ambiente. Nasceu, assim, o Direito Tributário Ambiental. Considerando-se a problemática ambiental mundial, um dos temas de ponta em pesquisa no campo do Direito Tributário é como este pode servir de instrumento para o Estado na tentativa de minimização das condutas lesivas ao meio ambiente e na busca pelo desenvolvimento sustentável. Neste contexto, procura-se abordar as tendências do Direito Tributário e como este pode servir de instrumento para proteção ao meio ambiente, enfatizando a experiência, tendência e perspectiva da adoção de instrumentos tributários ambientalmente orientados no Brasil e alguns exemplos no exterior.

Palavras-chave: Estado Democrático de Direito Ambiental. Sistemas de Gestão Ambiental. Direito Tributário. Tributos Ambientais.

viii

ABSTRACT

BRÁZ, Michel De Oliveira. The Environmental Taxation as an instrument of implementation from Law to the Healthy Environment (Master’s Degree). Communitarian Regional University of Chapecó - UNOCHAPECÓ, 2008. 165p.

The modern society, characterized by capitalism, is, unfortunately, also characterized by an environmental degradation and implications in the ecosystems that have never seen before; what it comes threatening not just the biodiversity, but also the maintenance of life. In this conjecture, the protection to the environment is the fundamental theme to be considered by the States, market and society. Besides these environmental problems, we cannot forget that the inequality social, influenced by bad distribution of revenue, affects directly the environmental through the medium of an unequal distribution of the environmental risks, where the degradations show up as a source of revenue to these wanting people. From that reason, The Law, with its multiple disciplines and themes, established innumerable instruments of environmental protection, which, in spite of spending the years, they have showed up with an efficacy recognized and active, through the imposition of penal, financial and administrative sanctions. However, unfortunately, they have not been enough about to protect the environment. Side by side to the legal preoccupations, it was created, in international level, administrative rules from environmental control, as concept of management from environmental quality, used in the certification of the system in the environmental management of the organizations. However, they have not established a requirement to the environmental performance, beside the accordance to the applicable environmental legislation and the commitment with the constant improvement of the environmental. The State, adopting a new interference profile, in search to determine other manners to reach the fundamental command of the environmental preservation, it has granted the use of the Tributary Law like vehicle to implementation of the public and social politics turned to the preservation of the environment. From that reason it was created the Tributary Environmental Law. Considering the world wide environmental problematic, the mainly theme in research in Tributary Law is how it can be helpful as an instrument to the State in the attempt of minimizing of the harmful conducts to the environment and the search for the sustainable development. In this context, it is tried to board the tendencies of the Tributary Law and since this one can serve of instrument to the protection of the environment, emphasizing the experience, tendency and perspective of adoption of tributary environmental instruments orientated in Brazil and some other examples abroad.

Keywords: Democratic State of Environmental Law. System of Environmental Management. Tributary Law. Environmental Tributes.

ix

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas TécnicasCEBDS - Conselho Empresarial de Desenvolvimento SustentávelCF – Constituição FederalCF/88 – Constituição Federal de 1988CNUMAD - Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e DesenvolvimentoCONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente CQT - Controle de Qualidade TotalCTN – Código Tributário NacionalCSA - Associação Canadense de NormasECO 92 - Conferência do Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações UnidasEMAS - Plano de Ecogestão e AuditoriaFIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de JaneiroGATT - Acordo Geral sobre Tarifas e ComércioIBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais RenováveisIBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e EstatísticaICC - Câmara do Comércio InternacionalICMS – Imposto Sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de ComunicaçãoIEC - Comissão Internacional de EletrotécnicaII – Imposto de ImportaçãoIE – Imposto de ExportaçãoIOF – Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativa a Títulos ou Valores MobiliáriosIPI – Imposto sobre Produtos IndustrializadosIPTU – Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana;IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos AutomotoresIR – Imposto de Renda e Proventos de Qualquer NaturezaISO - Organização Internacional de NormalizaçãoISSQN – Imposto sobre Serviços de Qualquer NaturezaITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e DoaçãoITR – Imposto sobre a Propriedade Territorial RuralMMA – Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia LegalOMC - Organização Mundial de ComércioONG – Organização Não-GovernamentalONU – Organização das Nações UnidasPMDA - Programa de Melhoria de Desempenho AmbientalPNSB - Pesquisa Nacional de Saneamento BásicoRIO 92 - Conferência de Desenvolvimento e Meio Ambiente das Nações UnidasSAGE - Grupo Assessor Estratégico sobre Meio AmbienteSCC - Conselho de Normas do CanadáSEMA - Secretaria Especial do Meio AmbienteSGA – Sistema de Gestão AmbientalSISNAMA - Sistema Nacional do Meio AmbienteTC 207 – Comitê Técnico 207UNCED - Conferência do Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações UnidasUV-B – Raios ultravioletaWICEM - Conferência Mundial de Gestão Ambiental das Indústrias

x

Desenvolvimento Sustentável:

“desenvolvimento que atende às necessidades

do presente sem comprometer

a capacidade de as futuras gerações

atenderem às suas necessidades.”

World Commission on Environment and Development

Brundtland Commission, 1987

xi

“Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial

à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e a coletividade

o dever de defendê-lo e preservá-lo

para as presentes e futuras gerações.”

Constituição da República Federativa do Brasil

de 5 de outubro de 1988.

xii

SUMÁRIO

1.1 A conceituação do Estado ....................................................................................................... 6

1.2 A origem do Estado Moderno e suas configurações ............................................................... 9

1.2.1 A teoria da sociedade de risco e a questão ambiental ................................................. 35 1.2.2 Características do Estado de Direito Ambiental ......................................................... 37

2.1 O Meio Ambiente .................................................................................................................. 39

2.1.1 A degradação ambiental e a preocupação com sua conservação ................................ 40 2.1.2 Alguns problemas ambientais ..................................................................................... 48

2.1.2.1 Deficiência dos recursos hídricos ........................................................................ 52 2.1.2.2 Fontes energéticas ................................................................................................ 54 2.1.2.3 Desperdício de matéria-prima ............................................................................. 56 2.1.2.4 Poluição ............................................................................................................... 57

2.2 Sistema de gestão ambiental .................................................................................................. 61

2.2.1 A origem do sistema de gestão ambiental .................................................................. 62 2.2.2 Sistema de gestão ambiental ....................................................................................... 67 2.2.3 Elementos básicos do sistema de gestão ambiental .................................................... 71 2.2.4 Gestão ambiental e a ISO 14000 ................................................................................ 73 2.2.5 Avaliação ambiental inicial ........................................................................................ 78 2.2.6 Auditoria ambiental .................................................................................................... 80

3.1 Os Tributos Ambientais ......................................................................................................... 83

3.1.1 Do Sistema Tributário Nacional ................................................................................. 87 3.1.2 Conceito e natureza jurídica dos tributos ambientais ................................................. 88 3.1.3 A extrafiscalidade dos tributos ambientais ................................................................. 90 3.1.4. Espécies tributárias ambientais .................................................................................. 93

3.1.4.1 Impostos Ambientais ........................................................................................... 95 3.1.4.2 Taxas Ambientais ................................................................................................ 96 3.1.4.3 Contribuição de Melhoria Ambiental .................................................................. 98 3.1.4.4 Empréstimo Compulsório Ambiental ................................................................ 100 3.1.4.5 Contribuições Especiais Ambientais ................................................................. 102

3.2 Competência tributária ........................................................................................................ 104

3.2.1 Classificação da competência tributária ................................................................... 106

3.3 Limitações ao poder de tributar ........................................................................................... 110

3.3.1 Princípios e normas de limitação do poder de tributar ............................................. 111 3.3.1.1 Princípio da legalidade tributária e tipicidade ................................................... 111 3.3.1.2 Princípio da anterioridade da lei tributária ........................................................ 114 3.3.1.3 Princípio da irretroatividade da lei tributária ..................................................... 117 3.3.1.4 Princípio da isonomia ou igualdade tributária ................................................... 117 3.3.1.5 Princípio da capacidade contributiva ................................................................. 119 3.3.1.6 Princípio da vedação de tributo confiscatório ................................................... 122 3.3.1.7 Princípio da progressividade ............................................................................. 124 3.3.1.8 Princípio do Poluidor-Pagador frente o Direito Tributário ............................... 126

3.5 Tributos ambientais no Brasil .............................................................................................. 129

xiii

3.5.1 Alguns exemplos de tributos ambientais brasileiros ................................................ 132 3.5.1.1 Tributos ambientais da União ............................................................................ 134 3.5.1.2 Tributos ambientais dos Estados e Distrito Federal .......................................... 140 3.5.1.3 Tributos ambientais dos Municípios .................................................................. 142

3.6 Tributação ambiental no estrangeiro – Alguns exemplos ................................................... 146

INTRODUÇÃO

O efeito destrutivo exercido pela sociedade industrial sobre a natureza é bem

conhecido e inquestionável. No entanto, a partir da década de sessenta iniciou-se a

conscientização sobre a necessidade de conservação da biodiversidade existente em nosso

planeta, sendo que o avanço científico fomentou alguns movimentos institucionais que

resultaram na realização da Conferência de Estocolmo, em 1972, na busca de sistematizar as

medidas de proteção ambiental em nível global.

Assim como nos demais países em franco desenvolvimento, no Brasil, após a

Conferência de Estocolmo, o governo militar optou por manter o crescimento econômico sem

restrições por parte de uma política ambiental, criada a partir de uma pressão externa. O que

importava era o desenvolvimento País; as conseqüências da industrialização, inclusive as

ambientais, seriam revistas e tratadas em outro momento.

Destarte, o primeiro ato da política ambiental brasileira foi celebrado pelo

presidente Emílio G. Médici, em 30 de outubro de 1973, através do Decreto 73.030, instituindo

a Secretaria Especial do Meio Ambiente – SEMA, tendo como atribuição principal a

formulação da política oficial para o meio ambiente, articulando as normas existentes: o Código

de Águas; o Código Florestal; o Código de Caça; o Código de Pesca; a Política Nacional de

Saneamento; o Código de Mineração e o Estatuto da Terra.

Outro marco importante na evolução da legislação relacionada ao meio ambiente se

deu com a Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, criando a Política Nacional do Meio

Ambiente, o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA e o Conselho Nacional do

Meio Ambiente – CONAMA.

2

Posteriormente, neste mesmo intuito de preservar os recursos naturais, a

Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988 estabeleceu que “todos têm

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à

sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (CF, art. 225).

Todavia, em que pese o esforço despendido pelo Poder Público sobre as questões

ambientais, até o final da década de 90 não houve qualquer decisão governamental com vistas à

proteção da qualidade ambiental. A legislação em vigor (inclusive a Lei n. 6.938/91, que

instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente) cumpria apenas uma função retórica, sem

eficácia reconhecida.

Em 1992, no Rio de Janeiro, com a presença de 178 países, ocorreu a Conferência

das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, introduzindo, no cenário

internacional, os princípios do desenvolvimento sustentável e do poluidor-pagador, não

obstante o primeiro já encontrar-se incerto no texto constitucional brasileiro.

A celebração dos diversos documentos internacionais, bem como a inserção do

meio ambiente na tutela dos direitos constitucionais, dão o tom de que a proteção ao meio

ambiente coincide com a idéia de dignidade da pessoa humana, supedâneo das democracias

modernas, como direito fundamental e absoluto da vida humana, como forma de harmonia

entre valores.

Destaca-se, então, a importância do direito ao meio ambiente saudável, como ponto

primordial para o próprio bem-estar da sociedade. E mais, em sendo o respeito ao meio

ambiente, em última instância, o respeito à própria vida, sua implementação faz-se

imprescindível para o gozo dos demais direitos humanos, superando, inclusive, os ideais

individualistas.

Com a configuração constitucional do conteúdo do direito fundamental ao meio

ambiente, ecologicamente equilibrado, nasceu a obrigação positiva dos poderes públicos no

sentido de adotar políticas que garantam sua concretização, ou seja, uma função ambiental da

administração, sem olvidar a importância econômica do bem ambiental.

De tal feita, a proteção do meio ambiente, pela dinâmica imposta pela sociedade

capitalista e consumista, remete a um sopesamento e compatibilização do desenvolvimento

3

econômico com a utilização racional e eqüitativa dos recursos naturais, mantendo-se o meio

ambiente de forma ecologicamente equilibrado, preservando-o para as futuras gerações. Tal

solução tem sido uma tarefa árdua e de extrema dificuldade para os agentes do Direito.

A par disso, o Direito, com suas múltiplas disciplinas e temáticas, instituiu

inúmeros instrumentos de proteção ambiental, os quais se apresentaram com uma eficácia

reconhecida e atuante, através da imposição de sanções penais, pecuniárias e administrativas.

Porém, infelizmente, não foram, como de fato não o são, suficientes a ponto de proteger nossa

biodiversidade.

Paralelamente às preocupações legais com os danos ambientais, com a imposição

de sanções penais e administrativas, foram criadas, em nível internacional, normas

administrativas de controle ambiental, como o conceito de gestão de qualidade ambiental,

utilizadas na certificação do sistema de gerenciamento ambiental de organizações (ISO 14000).

Estas normas, todavia, não estabelecem nenhum requisito de desempenho

ambiental, além da conformidade às legislações ambientais aplicáveis e o compromisso com a

melhoria contínua, mas contribuem para o estabelecimento de um sistema de gerenciamento

ambiental. Em outras palavras, o Sistema de Gestão Ambiental, indicado nas normas ISO

14000, baseia-se apenas no aprimoramento contínuo com estabelecimento de objetivos e metas,

como aperfeiçoamento das relações com o meio ambiente.

Entretanto, considerando que a eficácia das sanções penais e administrativas, bem

como as certificações administrativas não atingiram o desempenho ambiental esperado, o

Estado buscou criar outras formas de atingir o preceito fundamental de preservação ambiental,

adotando um perfil intervencionista, utilizando-se do Direito Tributário como veículo à

implementação de políticas públicas e sociais voltadas à conservação do meio ambiente.

Nasceu, assim, o Direito Tributário Ambiental.

O Estado, utilizando-se dos inúmeros instrumentos tributários em benefício do meio

ambiente, alcança dois objetivos distintos: no primeiro, de cunho eminentemente fiscal, utiliza-

se do tributo como instrumento meramente arrecadatório, gerador de recursos para atuação do

Estado em benefício do meio ambiente, por intermédio de obras públicas, aparelhamento dos

órgãos de proteção ambiental, dentre outros; já em relação ao segundo objetivo, o tributo, por

sua vez, funciona como instrumento extrafiscal, servindo de estímulo ao contribuinte para que

adote uma postura benéfica ao meio ambiente, através de estímulos e incentivos tributários.

4

Com a instituição destes tributos ecológicos ou ambientais, nasce a relação jurídica

entre o Direito Tributário e o Direito Ambiental, na qual a ecotributação se apresenta como

instrumento alternativo de implementação de políticas econômicas e ambientais, induzindo

comportamentos benéficos ao meio ambiente, através de intervenções no meio social e

econômico, por intermédio de estímulos ou incentivos, bem como por desestímulos, excluindo

eventuais penalidades pecuniárias.

Experiências nacionais e, principalmente, internacionais, dão conta de que a

implementação destes incentivos tributários na proteção do meio ambiente pode trazer

resultados eficazes. A adoção de medidas tributárias, mormente de incentivos (subsídios,

subvenções, alíquotas reduzidas ou zero, isenções, imunidades, diferimentos, não-incidência)

serve para a implementação de políticas públicas desenvolvimentistas e preservacionistas,

concomitantemente.

Neste ínterim, diante da escassez de obras que abordem o tema, a pesquisa visa

contribuir na construção de uma doutrina que dê conta dos fundamentos desta modalidade de

intervenção estatal nas questões ambientais, lhe dando sistematicidade, identificando seus

limites em relação às outras disciplinas, o regramento jurídico pátrio, etc.

Em outras palavras, a partir da conceituação do Estado e sua evolução histórica, até

o reconhecimento da questão ambiental como garantia transindividual, e a criação de políticas

ambientais administrativas que controlem e aperfeiçoem no desempenho ambiental das

empresas, denominado sistemas de gestão ambiental, para, finalmente, demonstrar a

importância e a possibilidade de utilização da ecotributação à concretização positiva dos

objetivos constitucionais, dentre os quais se insere a preservação ambiental e seus viés de

melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

A transversalidade do tema abordado, com elementos da sociologia, da ecologia e

do direito, neste último encontrando-se o direito econômico, o direito tributário e o direito

ambiental, corroborado à limitação de literatura nacional a respeito da matéria, fez nascer o

interesse pelo trabalho, analisando-se a estrutura do regramento jurídico brasileiro e a

possibilidade do Estado, por intermédio do Direito Tributário, instituir instrumentos tributários

em benefício do meio ambiente.

5

Neste contexto, essa dissertação pretende contribuir para a elucidação da relação

entre o Estado de Direito Ambiental, os Sistemas de Gestão Ambiental e o próprio Direito

Tributário, à luz do reconhecimento e efetivação do direito ao ambiente saudável.

Para cumprir tal desiderato, a dissertação foi dividida em três capítulos. O primeiro

aborda as formas de Estado, partindo do Estado Liberal, contemplando o Estado Social, o

Estado de Direito e o Estado Democrático de Direito, até o Estado de Direito Ambiental,

ressaltando os direitos de solidariedade e o direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado das presentes e futuras gerações.

O segundo capítulo é dedicado aos sistemas de gestão ambiental existentes em nível

internacional, analisando sua natureza jurídica, definição, objetivos, conteúdo, características e

implementação para fins de combate à degradação ambiental, bem como proporcionando

vantagens econômicas à própria empresa, através da redução de custos.

No capítulo terceiro, analisa-se a possibilidade de utilização de instrumentos

econômicos e fiscais na implementação do direito ao meio ambiente saudável, abordando os

princípios jurídicos tributários aplicáveis à instituição de tributos ambientais, as demais

limitações ao poder de tributar, quais os tributos que podem ser utilizados em prol do meio

ambiente, as experiências de alguns países em relação à tributação ambiental, bem como

algumas experiências vividas no Brasil.

Para tanto, foi desenvolvida pesquisa bibliográfica, através de bibliografia nacional

e estrangeira, Constituição Federal do Brasil e demais legislações relacionadas ao Direito

Ambiental e Direito Tributário, bem como o estudo de algumas experiências de tributação

ambiental introduzidas no Brasil.

Em face da complexidade e amplitude do tema, não se pretende, tampouco seria

possível, abranger todas as nuances que envolvem os tributos ambientais. Por tal arte, o objeto

deste trabalho busca demonstrar a possibilidade do Estado criar instrumentos econômicos e

fiscais no afã de concretizar o direito da sociedade ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, preservando-o

para as presentes e futuras gerações.

6

CAPÍTULO I

ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO AMBIENTAL

O presente capítulo trata do Estado Democrático de Direito Ambiental, iniciando

pela sistematização da evolução do Estado Moderno. Serão abordadas as nuances que

envolveram o Estado Absoluto, passando pelo Estado Liberal e o Estado Social, para,

posteriormente, atingir o Estado Democrático de Direito, com vistas à garantia dos direitos

fundamentais (direitos humanos), para a compreensão, no decurso histórico, como foram

desenvolvidas as idéias vinculadas à implementação de políticas públicas, com o fim de se

obter a concretização, primeiramente, dos direitos sociais como garantia dos direitos

fundamentais, e, ulteriormente, das questões ambientais, reconhecidos como direitos humanos

de terceira dimensão, conhecidos como direitos de solidariedade, meta ou transindividuais.

1.1 A conceituação do Estado

Antes de realizar uma incursão pela evolução do Estado, faz-se necessário

conceituá-lo. Sobre a conceituação do Estado, Dalmo de Abreu Dallari (2001) leciona que são

muitos os conceitos, formulados com grande diversidade por todos que o têm em profundidade

estudado, razão pela qual se mostra necessária precisa fixação, de modo a evidenciar possíveis

divergências resultantes de concepções diversas.

7

Em complemento, Dallari (2001) registra, para fins de permitir a constatação da

amplitude destas divergências, dois extremos opostos. De um lado, que atribui ao Estado a

condição de principal organizador de todas as sociedades, se apresentando como o componente

necessário da sociedade humana, tendo existido desde que surgiu o primeiro agrupamento de

homens, perdurando enquanto existir a humanidade. De outro lado, em outro extremo, concebe

o Estado como realidade histórica, dotada de características certas e determinadas, todas

indispensáveis, bastando que falte uma delas ou que não possa ser claramente identificada para

que se negue a uma sociedade a condição de Estado.

Hans Kelsen (1998) registra que o Estado é uma sociedade politicamente

organizada, porque é uma comunidade constituída por uma ordem coercitiva e esta ordem é o

direito. Manuel Gonçalves Ferreira Filho (1995), por sua vez, esclarece que o Estado

compreende uma ordem jurídica relativamente centralizada, limitada no seu domínio espacial e

temporal de vigência, soberana e globalmente eficaz.

O Estado apresenta-se como uma entidade jurídico-social soberana, constituída pelo

povo, sob o governo exercido sobre o espaço delimitado. Visto como instituição compreende os

elementos fundamentais indicados (povo, território e governo), cuja conceituação, por envolver

ramos diversos das ciências, varia conforme a posição do observador (CENEVIVA, 2003).

Por fim, indispensável o conceito objetivo dado por Dallari (2001, p. 49), ao

afirmar que o Estado é a “[...] ordem jurídica soberana, que tem por fim o bem comum de um

povo situado em determinado território”. Esta busca pelos direitos sociais vem identificar e

marcar a evolução do Estado Contemporâneo.

Por óbvio, não se pretende trabalhar com as formas primitivas de Estado, mas como

seu conceito contemporâneo, em Estado Absolutista e Estado de Direito.

O Estado Absolutista é marcado pelo domínio total do soberano, no qual está

centralizado o poder de administrar a população. Diante da necessidade de limitação desse

poder, surge o Estado de Direito. Segundo Souza Júnior (2002) a expressão “Estado de

Direito”1 significa a submissão do poder do Estado a uma ordem jurídica que garante os

direitos fundamentais das pessoas, conquista da tradição liberal diante do absolutismo. A

adjetivação “social” revela, por sua vez, que se acrescentam novos conteúdos a esses direitos e

1 O Estado de Direito não quer dizer que todo o Estado deve ser ‘Estado de Direito’ mas que deve atuar com sujeição aos princípios jurídicos fundamentais, respeitar os direitos individuais e, “em especial, a liberdade, ou seja, ‘saber se as normas jurídicas impetrantes num determinado país submetem ou não o Estado’.” (MACEDO; FERRARI, 2005, p. 17).

8

que toda a estruturação jurídica do poder é adaptada às novas condições da sociedade

contemporânea.

Regina Maria Macedo e Nery Ferrari (2005) afirmam que no século XX, os Estados

sofreram conseqüências de crises políticas, econômicas e ideológicas, sendo que na evolução

das instituições políticas é fundamental uma percepção de Estado de Direito para que se possa

compreender o status angariado pelo Estado:

O Estado de Direito nada mais é do que um sistema normativo com base nos pressupostos filosóficos e políticos da democracia liberal, tendo como princípios o império da lei, a separação dos poderes, a legalidade da administração e os direitos e garantias individuais.

Na mesma linha situa-se o posicionamento de José Afonso da Silva (1999) ao

afirmar que o Estado de Direito traz de forma intrínseca um conceito liberal, cujas

características básicas foram: (a) submissão ao império da lei, que era a nota primária de seu

conceito, sendo a lei considerada como ato emanado formalmente do Poder Legislativo,

composto de representantes do povo, mas do povo-cidadão; (b) divisão de poderes, que separe

de forma independente e harmônica os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, como

técnica que assegure a produção das leis ao primeiro e a independência e imparcialidade do

último em face dos demais e das pressões dos poderes particulares; (c) enunciado e garantia dos

direitos individuais. Essas exigências continuam a ser postulados básicos do Estado de Direito,

que configura uma grande conquista da civilização liberal2.

2 A concepção liberal do Estado de Direito servira de apoio aos direitos do homem, convertendo os súditos em cidadãos livres, consoante nota Verdú, a qual, contudo, se tornara insuficiente, pelo que a expressão “Estado de Direito” evoluíra, enriquecendo-se com o conteúdo novo. Houve, porém, concepções deformadoras do conceito de Estado de Direito, pois é perceptível que seu significado depende da própria idéia de que se tem do Direito. Por isso, cabe razão a Carl Schmitt quando assinala que a expressão ‘Estado de Direito’ pode ter tantos significados distintos como a própria palavra “Direito” e designar tantas organizações quanto as que se aplica à palavra “Estado”. Assim, acrescenta ele, há um Estado de Direito feudal, outro estamental, outro burguês, outro nacional, outro social, além de outros conformes com o Direito natural, com o Direito racional e com o Direito histórico. Disso deriva a ambigüidade da expressão Estado de Direito, sem mais qualificativo que lhe indique conteúdo material. Em tal caso a tendência é adotar-se a concepção formal do Estado de Direito à maneira de Forsthoff, ou de um Estado de Justiça, tomada a justiça como um conceito absoluto, abstrato idealista, espiritualista, que, no fundo, encontra sua matriz no conceito hegeliano do Estado ético, que fundamentou a concepção do Estado fascista: ‘totalitário e ditatorial em que os direitos e liberdades humanas ficam praticamente anulados e totalmente submetidos ao arbítrio de um poder político onipotente e incontrolado, no qual toda a participação popular é sistematicamente negada em benefício da minoria [na verdade, elite] que controla o poder político e econômico’. Diga-se logo, que o Estado de Justiça, na formulação indicada, nada tem a ver com Estado submetido ao Poder Judiciário, que é um elemento importante do Estado de Direito. Estado submetido ao juiz é Estado cujos atos legislativos, executivos, administrativos e também judiciais ficam sujeitos ao controle jurisdicional no que tange à legitimidade constitucional e legal. É também uma abstração confundir Estado de Direito com uma visão jusnaturalista do Estado. Por outro lado, se se concebe o Direito apenas como um conjunto de normas estabelecidas pelo Legislativo, o Estado de Direito passa a ser Estado de Legalidade, ou Estado legislativo, o que constitui uma redução deformante. Se o princípio da legalidade é um elemento importante do conceito de Estado de Direito, nele não se realiza completamente. (SILVA, 1999, p. 117-118).

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O Estado Moderno, nesta sua evolução, apresenta as seguintes classificações:

Estado Absoluto, Estado Liberal de Direito, Estado Social de Direito, Estado Democrático de

Direito (STRECK; MORAIS, 2000).

A seguir examinar-se-á cada uma delas dessas classificações.

1.2 A origem do Estado Moderno e suas configurações

O Estado Moderno3, segundo Saldanha (1987), tem sua origem a partir do

Humanismo e do Renascimento. É fruto das profundas mudanças do pensamento e das

estruturas ocorridas nos séculos XVI e XVII. Moderno é entendido como pós-medieval. O

Estado moderno teria começado com Napoleão Bonaparte, instituindo uma poderosa estrutura

administrativa para o Estado.

O Estado moderno evoluiu em três estágios: absolutista, liberal e social.

Concomitantemente ao surgimento do Estado Moderno, nasceu o ideário do Estado

Absolutista, especialmente da Monarquia Absolutista, na França, a partir da concepção de que a

política do Estado devia ser separada da religião, da teologia, enfim, de qualquer doutrina.

Neste contexto, o Estado Absolutista apresentou-se como um paradoxo político no

mais amplo sentido da expressão, pois o monarca era a fonte maior da Lei embora não estivesse

sujeito a qualquer limitação legal na imposição aos súditos da fiel observância das leis.

Norberto Bobbio (1992) leciona que o princípio não significava que o poder do

príncipe era sem limites, porquanto leis positivas, isto é, as leis postas pela própria vontade do

soberano, o qual não está submetido às leis por ele próprio estabelecidas porque ninguém pode

dar leis a si mesmo.

3 A expressão “Estado Moderno” é utilizada para caracterizar estruturas em que o governo, de modo direto ou indireto, obedece a regras escritas ou consuetudinárias, que determinam seu funcionamento e resguardam as pessoas de direito privado da interferência indevida do Poder Público. Referir Estado Moderno é modo de definir o Estado de Direito, em que a escolha dos governantes é feita pelo povo, através do voto direto ou indireto, sendo os candidatos apresentados por partidos políticos.

10

Assim, o Estado absoluto se caracteriza por um governo imperial ou monárquico no

modo de exercer o poder. Há uma concentração e centralização do poder nas mãos do monarca,

com um poder soberano e unitariamente qualificado.

No Estado Absoluto, o ordenamento jurídico abandonou o direito costumeiro em

favor do direito positivo e escrito, começando com as ordenações e consolidando-se com as

revoluções liberais. O movimento absolutista, de acordo com Padovani e Castagnola (1972),

encontra eco no movimento do Empirismo, na Inglaterra, cujos expoentes foram Francisco

Bacon, Hobbes, Hume, Berkeley e Locke. Onde Locke tece críticas ao absolutismo estatal

desenvolvendo uma teoria de Estado sob a orientação da divisão dos poderes e uma tendência

ao liberalismo garantista da propriedade privada.

A teoria política do absolutismo teve origem com Maquiavel e Hobbes. A ordem

política era dominada pela idéia jurídica do direito divino dos reis, como fundamento para

manutenção de um Estado inteiriço, comandado por uma pessoa. Alguns intelectuais,

inconformados com esta afirmação, começaram a contradizê-la, afirmando que o poder afirma-

se sobre instâncias de controle, como o parlamento, por exemplo.

Para Saldanha (1987) Maquiavel foi o primeiro renascentista a utilizar a palavra

Estado num novo sentido, pressentindo a passagem da organização feudal para a constituição

de monarquias soberanas, elaborando uma teoria de como se formulam os Estados Modernos.

De acordo com Mounin (1984), o Estado não tem a função de proteger ou assegurar

a felicidade e a virtude, como queria Aristóteles, mas, a finalidade do poder. Não existem

Estados ideais, como queria Platão, porque eles são organizados segundo a natureza humana. E

esta, em relação ao outro, à convivência, à obediência, e às relações sociais, regulada pela lei

do mais forte. Somente o temor regula a natureza da convivência humana.

Nesta mesma linha de idéias, Hobbes, pressupondo a natureza destrutiva do

homem, cumulada ao seu desejo de poder, riqueza e propriedade, afirma que os

homens arruínam-se uns aos outros, fazendo-se necessário o estabelecimento de acordos e

contratos entre si.

Na Idade Média feudal, a estrutura da sociedade se compunha basicamente de três

ordens: a nobreza, o clero e o povo, representado pelos senhores feudais, onde os servos sequer

eram considerados parte do povo.

11

Segundo Comparato (2007), a sociedade medieval européia era composta,

basicamente, de três elementos (status, Stände, étates), isto é, de grupos sociais dotados de um

estatuto jurídico próprio, ligado à condição pessoal de seus integrantes. Eram eles a nobreza, o

clero e o povo. Os dois primeiros possuíam privilégios hereditários e o terceiro tinha como

única vantagem o “status libertatis”, isto é, o fato de que os seus componentes não se

confundiam com a multidão dos servos de todo o gênero.

A partir do século XIII, no entanto, o desenvolvimento da atividade comercial das

cidades e o aparecimento do capitalismo mercantilista representaram o início de uma

transformação radical das sociedades européias, impondo um ponto final àquela estrutura de

Estado.

A burguesia, concentrada nas cidades, foi a principal protagonista desse processo

histórico. Apesar da importância econômica que conquistavam, os burgueses continuavam

excluídos do poder político. Um movimento crítico da sociedade, de caráter filosófico, político

e econômico surgiu, contrário à ordem feudal e aos estados centralizadores, que perdurou

durante vários séculos, afirmando a liberdade total do indivíduo e propugnou a limitação

radical dos poderes do Estado.

As características fundamentais desse movimento, além da restrição das atribuições

do Estado, foram a defesa da livre concorrência na área econômica e a definição dos direitos

fundamentais do indivíduo, entre os quais a liberdade de idéias e de crenças e a sua livre

expressão. Em outras palavras, caracterizou-se pela difusão da idéia de direitos fundamentais,

da separação de poderes, bem como do império das leis, próprias dos movimentos

constitucionalistas que impulsionaram o mundo ocidental a partir da Magna Carta de 1215

(MONTESQUIEU, 1996).

A insatisfação das lideranças nacionais européias com o Estado absoluto resultou

no Estado Liberal. A burguesia, como já dito, crescente e cada vez mais rica, estava insatisfeita

com o poder soberano. A realidade social da época demonstra uma crescente secularização da

cultura e um crescimento populacional urbano que modifica o modo de vida de muitos povos,

alterando valores e concepções religiosas, especialmente após a Reforma Luterana.

O movimento, que adquiriria sua mais acabada expressão no liberalismo,

converteu-se na ideologia em que a burguesia se apoiou para assumir o controle do Estado a

12

partir das últimas décadas do século XVIII, e depois impregnou profundamente os princípios

políticos das sociedades modernas. Nasceu, assim, o Estado liberal.

O surgimento do Estado Liberal, negando a concentração do poder, se deu com as

várias revoluções liberais ocorridas nos séculos XVII e XVIII, entre elas a revolução inglesa de

1688, a independência dos Estados Unidos da América do Norte em 1776 e a Revolução

francesa, de 1791. Nasceu, assim, um Estado fundado na separação dos poderes e no

reconhecimento de garantias e direitos individuais.

O Estado Liberal surge como uma reação ao Estado Nacional. Tal reação teve o seu

início na Inglaterra, onde o processo de unificação do Estado desenrolou-se com maior

antecedência, e esteve caracterizado pelo esforço em limitar o poder político e responsabilizar:

[...] seus detentores, por meio de freios jurídicos positivos e institucionais, a partir de uma Constituição escrita, num quadro político que conferem ao Estado, “soberania” diante dos grupos integrantes da comunidade e diante de qualquer sanção religiosa ou de outra natureza, provinda do exterior (SOUZA JÚNIOR, 2002, p. 22).

O Estado Liberal nasce sob a crescente necessidade da industrialização (capital) e

da burguesia (donos do capital) terem um código social menos rígido para o desenvolvimento

das relações de produção. Portanto, era necessário um aparato jurídico político que garantisse e

validasse o pensamento liberal. A idéia de liberdade traz consigo o conceito de democracia e

da divisão dos poderes.

Pode-se afirmar, então, que são características básicas do Estado Liberal a não

intervenção na economia, a vigência do princípio da igualdade formal, adoção da Teoria da

Divisão dos Poderes de Montesquieu4, a supremacia da Constituição como norma limitadora do

poder governamental e, por fim, a garantia de direitos individuais fundamentais.

Em outras palavras, o Estado Liberal se caracterizou, principalmente, a partir da

idéia de divisão entre o público e o privado, separando os direitos ligados à sociedade, tais

como a cidadania, segurança jurídica, representação política, etc., e os direitos individuais do

cidadão essenciais à vida, à liberdade, à propriedade, dentre outros. Esta separação, outrossim,

4 No tocante à Teoria da Separação dos Poderes de Montesquieu, adotada pelo Estado Liberal, José de Albuquerque Rocha observa que o objetivo de Montesquieu ao idealizar os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, era preservar os privilégios da sua própria classe, a nobreza, ameaçada tanto pelo rei, que almejava recuperar sua influência nacional, quanto pela burguesia, que dominando o poder econômico, intentava o poder político. Elaborou, então, sua teoria que repartia o poder entre a burguesia, nobreza e realeza, afastando, deste modo, a possibilidade da burguesia em crescimento ser a sua única detentora. (ROCHA, 1995, p. 128).

13

era garantida por intermédio do Estado que, lançando mão do império das leis, garantia a

certeza das relações sociais por meio do exercício estrito da legalidade.

Segundo Cattoni (2002), no Estado Liberal compete ao Estado garantir a certeza

nas relações sociais, através da compatibilização dos interesses privados de cada um com o

interesse de todos, mas deixar a felicidade ou a busca da felicidade nas mãos de cada indivíduo.

De fato, no Estado Liberal, o princípio da isonomia ou igualdade de todos perante

da lei ainda é consagrado, porquanto: “são iguais no sentido de todos se apresentarem agora

como proprietários, no mínimo, de si próprios, e, assim, formalmente, todos devem ser iguais

perante a lei, porque proprietários, sujeitos de direito, devendo-se pôr fim aos odiosos

privilégios de nascimento” (CARVALHO NETTO, 1999).

Tal pensamento elevou a dignidade pessoal do indivíduo à de sujeito de direitos,

mormente, com a realização de contratos de compra e venda de sua força de trabalho.

Desta forma, os indivíduos, para terem seus direitos protegidos, não poderiam ficar

à mercê da rebeldia de inspiração pessoal. A liberdade civil, propriamente entendida, consiste

em proteger os direitos dos indivíduos, pela força unida da sociedade; e a sociedade não se

pode manter, e por conseqüência não pode dar proteção, sem haver obediência a algum poder

soberano (MONTESQUIEU, 1996).

Segundo Bonavides (2001), constrói-se a idéia de liberdade do homem perante o

Estado, avançando para uma participação total e indiscriminada do homem livre, com base na

concepção burguesa de ordem política, ou seja, democrática. Eram os ideais da liberdade

burguesa contra os ideais do absolutismo, o indivíduo contra o Estado, rumo ao sufrágio

universal e à democracia, com vistas à liberdade plena, dignificadora da pessoa humana.

O pensamento burguês se intensificou e venceu o Estado absolutista até então

vigente, materializando os ideários de liberdade do homem ao ápice da ordem política,

indispensável à manutenção do poder político, estendendo-se às demais classes sociais.

Além das liberdades individuais (direitos de primeira geração ou dimensão), a

necessidade de separação dos poderes ganhou força como garantia à proteção dos direitos da

liberdade, em detrimento ao abuso do poder estatal, em razão do exercício fracionado e

simultâneo das funções administrativas, legislativas e judiciais.

14

Houve uma grande ampliação na atuação do homem individual dentro do

organismo social e uma forte limitação na atuação estatal, que deveria se ocupar apenas da

política e da segurança, além de garantir o livre exercício dos direitos individuais aos quais não

se opunha nenhuma limitação (LAURO, 2005).

Os iluministas se preocupam com as ações dos homens, no sentido de que possam

agir menos pela coação e mais pela correção. Assim, o Estado liberal postula sua redução ao

mínimo possível. Os sistemas jurídicos codificados e as Constituições deram à organização do

Estado, uma distribuição de poderes, cujo fundamento era o amor à norma escrita, considerada

melhor do que a norma costumeira.

A Constituição passou a ser concebida como uma ordenação normativo-sistemática

da comunidade política, modelada no princípio da separação dos poderes e em obediência às

garantias fundamentais do indivíduo (liberdade plena), assegurando ao indivíduo, além de

outras prerrogativas, a segurança jurídica, em toda a sua plenitude.

Acerca da natureza jurídica da Constituição no Estado Liberal, J. J. Canotilho

(1999) a define como uma ordenação sistemática e racional da comunidade política através de

um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os limites do

poder político.5

Entretanto, não podemos olvidar que, em que pese o Estado se tornar liberal e

burocrático, estabelecendo o império da lei e a segurança jurídica, instituindo o Estado de

Direito, assegurando o direito à liberdade do indivíduo e a separação dos poderes, permaneceu

oligárquico na medida em que os pobres e as mulheres não votavam.

Esta Constituição, além de ressaltar os direitos individuais, assegurando, inclusive,

a segurança jurídica e a separação dos poderes, transporta a dois momentos essenciais da

história propriamente dita, pois ao mesmo tempo em que rompeu com a ordem histórico-natural

do Estado, foi elaborada por um novo poder, denominado Constituinte, definindo os esquemas

e projetos de uma nova ordem racionalmente construída. (CANOTILHO, 1999)

5 Conforme Canotilho (1999), esse conceito de Constituição pode ser desdobrado de forma a captar as dimensões fundamentais que o incorpora, ou seja, (a) ordenação jurídico-política plasmada num documento escrito; (b) declaração, nessa carta escrita, de um conjunto de direitos fundamentais e do respectivo modo de garantia; (c) organização do poder político segundo esquemas tendentes a torná-lo um poder limitado e moderado.

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A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 é ponto de referência

de que o Estado deve ter uma Constituição cuja essencialidade é justamente a separação dos

poderes com a finalidade de garantir o Estado de Direito.

Na perspectiva do paradigma do Estado Liberal de Direito, todo aparato de

garantias das liberdades individuais conta com o alicerce constitucional. A Constituição escrita

passa a configurar, desde a Independência Americana e a Revolução Francesa, um pacto

político que representa esquemática e fundamentalmente o Estado burguês de direito.

O Estado, diante da separação dos poderes, também se organiza politicamente,

estabelecendo as competências de cada um dos poderes, sendo que cabe ao Poder Legislativo a

supremacia na elaboração das leis, fonte do Direito; ao Poder Judiciário, embora não

reconhecido por Locke como um poder independente, cabe, por sua vez, quando provocado,

através dos respectivos procedimentos, aplicar a lei ao caso concreto; ao Poder Executivo,

finalmente, incumbe a tarefa de implementar o Direito, garantindo a certeza e a segurança

jurídicas e sociais, internas e externas, na paz e na guerra (CATTONI, 2002).

Entretanto, o Poder Legislativo não pode ser arbitrário sobre a vida e a fortuna das

pessoas, uma vez que, sendo um poder formado essencialmente pelo conjunto dos membros da

própria comunidade, não pode constituir poder maior do que essas pessoas. O Poder

Legislativo, outrossim, não pode atuar através de decretos extemporâneos e arbitrários,

devendo exercer sua função através de leis promulgadas, fixas e por juízes autorizados. As leis

devem ser escritas e claras para que não causem incerteza na sua interpretação e aplicação.

Sobre o Poder Legislativo no Estado Liberal, leciona Locke (1963) como sendo o

Poder Legislativo derivado do povo por concessão ou instituição positiva e voluntária, o qual

importa em fazer leis e não em fazer legisladores, o Legislativo não terá o poder de transferir a

própria autoridade de fazer leis, colocando-a em outras mãos.

Ao Poder Executivo, por sua vez, segundo as lições de Grillo (1994), compete a

execução das leis dentro da sociedade, bem como a gestão da segurança e dos interesses

públicos fora da sociedade, assim como se dá nas guerras ou relações internacionais.

Os Poderes Legislativo e o Executivo não podem estar reunidos, quer na mesma

pessoa, quer no mesmo corpo da magistratura, pois não haverá liberdade, havendo ainda o

16

temor de que o monarca ou o senado estabelecem leis “tirânicas“ para executá-las tiranicamente

(MONTESQUIEU, 1996).

O equilíbrio marca a teoria da separação dos poderes de Montesquieu. Ao traçar os

limites do poder, a sua teoria serviu de justificativa, na França, para a convocação dos Estados

Gerais e receber na Constituição dos Estados Unidos da América do Norte, uma consagração

definitiva. Aliás, na Declaração dos Direito do Homem e do Cidadão, em 1789, o art. 16

estabelece que “toda a sociedade, em que não está assegurada a garantia dos direitos e nem

determinada a separação dos poderes, não tem constituição”.

O poder Legislativo, segundo Montesquieu, pode ser outorgado a um corpo

permanente. Num Estado livre, o povo deve ter o poder de legislar, através de seus

representantes, já que cada indivíduo livre possui o poder de governar a si mesmo. A

participação direta do povo na elaboração das leis é inconveniente porque impede o processo de

discussão. O povo é incapaz de exercer as funções de tomada de decisões, as quais, pela sua

natureza, devem ser tomadas pelo Executivo. O povo, entretanto, é capaz de escolher seus

representantes por meio da distinção de eleitores (RIBEIRO, 2001).

Na verdade, a teoria de separação dos poderes proposta por Montesquieu é um meio

de fragmentar o governo, fazendo com que as pessoas nos diversos cargos controlem-se umas

às outras, através de um respeito recíproco. A separação dos poderes é um problema político de

relação de forças. Aliás, Montesquieu sugere que, dentro de um mesmo poder, haja partilha de

atribuições. Suas idéias influenciaram a promulgação das Constituições de muitos países,

especialmente a dos Estados Unidos da América do Norte. Para Montesquieu, não importa

tanto quem exerce o poder, mas o modo como ele é exercido.

Na evolução do Estado, a separação dos poderes adotada por princípios políticos,

nos séculos XIX e XX, acabou enveredando por princípios jurídicos, como definição dos

órgãos e suas atribuições, graças ao princípio da positivação da norma.

Em relação ao Poder Judiciário, como já visto, Locke não previu um papel como

poder independente ao Judiciário. Este está atrelado ao poder Executivo. Somente mais tarde é

que o poder judiciário, com a estabilidade dos juízes, ganha certa independência.

O paradigma do Estado liberal de direito importa na liberdade de todos, ou seja,

todos devem ser livres, proprietários e iguais, num sistema alicerçado no império das leis, na

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separação de poderes e no enunciado dos direitos e garantias individuais, sem prejuízo da

segurança jurídica. O direito, nesse paradigma é visto como um sistema normativo no qual as

regras, gerais e abstratas, são válidas universalmente para todos os membros da sociedade.

É, pois, necessária a pluralidade dos poderes para manter sob controle a tendência natural de cada pessoa para abusar do poder. Estabelecer um mecanismo de cooperação e oposição dos poderes no Estado constitui o meio para garantir a liberdade ao povo (ZIPPELIUZ, 1997, p. 409).

Com a ascensão do capitalismo e do estado liberal, os direitos civis passaram a ser

protegidos, estabelecendo-se o Estado de Direito, mas ainda distante da democracia pretendida,

e mais longe ainda da justiça social. Em contrapartida, o capitalismo se afirma como o modo

dominante de produção, ao passo que o poder político deixou de pretender origens divinas.

Surgia a sociedade civil.

Com o reconhecimento da sociedade civil, abriu-se espaço à democracia,

principalmente a partir do momento em que a econômica deixou de ser controlada pelo Estado,

para depender cada vez mais da realização de lucros no mercado. Esse dado somou-se à ruptura

da legitimação divina dos governantes políticos, no século XVII, quando Hobbes formulou a

idéia revolucionária do contrato social, para uma simples delegação de poder aos dirigentes

políticos. Firmou-se, assim, a democracia liberal, para o fim de delegar ao próprio povo o poder

político para escolher seus governantes.

O Estado Liberal buscou privilegiar, em sua essência, a forma capitalista de

produção, não havendo qualquer compromisso com os aspectos sociais. Este descompromisso

foi agravado pela Revolução Industrial, culminando, posteriormente, com a Revolução Russa

de 1917, conduzindo os trabalhadores a se organizarem, como única alternativa de garantir

direitos.

18

O Estado Social6, caracterizado pela intervenção do Estado na economia, se

constitui na evolução da organização estatal após a formação do Estado Liberal, pela aplicação

dos princípios da igualdade material e da justiça social. Ele é uma conseqüência das críticas que

fazem os teóricos como Hegel, Engels, Marx, Althusser e outros sobre a organização do Estado

protetor da burguesia.

Althusser (1985), apoiando-se nos escritos de Marx e Lênin, mostra que o Estado,

desde seu nascedouro, foi concebido como instrumento nato de repressão, porquanto permitiu

às classes burguesas dominantes do século XIX sua dominação sobre a classe operária,

submetendo-a à extorsão da mais-valia.

Esclarece Althusser (1985) que o Estado é, antes de mais nada, o que os clássicos

chamaram de o aparelho de Estado. Este termo compreende: não somente o aparelho

especializado (no sentido estrito), cuja existência e necessidade reconhecemos pelas exigências

da prática jurídica, a saber: a política – os tribunais – e as prisões; mas também o exército, ou

intervém diretamente como forma repressiva de apoio em última instância (o proletariado

pagou com seu sangue esta experiência) quanto a polícia e seus órgãos ultrapassados pelos

acontecimentos; e, acima deste conjunto, o Chefe de Estado, o governo e a Administração.6 Por oportuno, há três apontamentos sobre questões de terminologia. O Estado Social, assim concebido, naturalmente não se confunde com os sistemas políticos de inspiração marxista. Com efeito, como adverte Bonavides, há algo, no ocidente, que o distingue, desde as bases, do Estado proletário ou comunista que o socialismo radical intenta implantar: “é que ele conserva sua adesão à ordem capitalista, princípio cardeal ao qual não renuncia”. Daí, a propósito, a explicação para opinião em geral difundida quanto a constituir o Estado Social “um meio termo entre a proposta socialista revolucionária e o liberalismo em crise”. Nesse caso, uma vez que o emprego do mesmo nome para designar objetos distintos é inaceitável, sob pena de frustração da função primordial da linguagem, aos sistemas políticos marxistas se deve reservar uma nomenclatura própria e exclusiva, como Estado Socialista, Estado Marxista ou Estado Comunista, a bem de espancar confusões semânticas. O Estado Social tem sido ainda, muitas vezes, assimilado aos chamados Estado-providência e Estado de Bem-Estar. Alguns autores utilizam as expressões como sinônimas. Contudo, o caráter providencial ou beneficente diz respeito, somente, à obrigatoriedade de o poder público fornecer um conjunto mínimo de bens e serviços considerados essenciais à dignidade da existência humana, como em matéria de saúde, educação, assistência e previdência, para o fim de liberar as classes pobres de uma alternativa inóspita; ou a constatação a título oneroso no mercado privado ou a dependência de instituições caridosas de eficácia incerta. O aspecto da providência liga-se, pois, essencialmente, à atividade estatal no campo da educação e da seguridade, que é apenas uma das dimensões da política intervencionista que se generaliza a partir da segunda década do século XX nos países ocidentais capitalistas. Por isso, Estado-Providência é uma categoria de abrangência limitada, que está para a categoria Estado Social como um círculo menor desenhado dentro de outro mais vasto. Na literatura política, o Estado Social já apareceu sob a denominação de Estado contemporâneo. De fato, é assim, entre nós, Pasold entendeu de nomear o novo modelo estatal que, ao menos no plano do discurso constitucional, surge na segunda década do século passado, em 1917, com a Constituição Mexicana, e, em 1919, com a Constituição Alemã (ou de Weimar). Todavia, a divergência, aqui, é apenas aparente simbólica. O Estado Contemporâneo de Pasold é justamente aquele que tem, como desígnio inerente à sua própria existência, uma função social a cumprir, qual seja, a realização prioritária dos valores fundamentais da pessoa humana (saúde, educação, trabalho, liberdade e igualdade), num ambiente jurídico-político em que se façam imperar os mecanismos típicos do regime democrático (eleições, plebiscitos e referendos). Não é, pois, nem o Estado liberal clássico, nem o Estado Socialista ortodoxo, mas o Estado Social da tradição ocidental, que exorta a fraternidade entre os homens sem lhes aniquilar a autonomia. Cabe averbar que, no mérito, a distância guardada do Estado Socialista tem conseqüências relevantes para a compreensão do Estado Social. Posicionado numa linha intermediária entre individualismo e coletivismo, o Estado Social parte de uma idéia de dignidade da pessoa humana que se assenta primeiramente no reconhecimento de um direito humano de autodeterminação, cuja contrapartida é o dever de autoresponsabilidade. Assim, se o Estado Social não tolera o abandono de cada qual à própria sorte, também não admite que o homem renuncie às responsabilidades que tem para consigo mesmo. A propósito do direito constitucional alemão, Benda cuidou de acentuar esse aspecto, observando que o Estado Social não implica a administração de um sistema de serviços de provisão absoluta, que libere o indivíduo de todas as preocupações e cuidados pessoais com a construção de seu próprio futuro existencial. (MARTINS NETO, 2005, p. 114-116).

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Reportando-se a Marx, Althusser (1985) afirma que a estrutura de toda sociedade se

alicerça no Direito e no Estado. A infra-estrutura é caracterizada pela grande massa proletária e

trabalhadora, enquanto que a superestrutura representa o capital. Há uma luta permanente de

classes entre a base trabalhadora, explorada e oprimida, e o capital.

Nesta linha Manuel Garcia-Pelayo (1982) conceitua o Estado Social como a

tentativa do Estado tradicional de moldar-se às condições sociais da civilização industrial e pós-

industrial, com seus novos e complexos problemas, bem como suas grandes possibilidades

técnicas, econômicas e organizativas para enfrentá-los. Não como adaptação de algo novo, mas

como uma mudança qualitativa de tendências surgidas no século XIX e começo do século XX.

Para se manter dominante, a superestrutura criou o Estado como aparelho

reprodutivo da infra-estrutura e o direito como um instrumento da manutenção da reprodução.

O Estado, para reproduzir e manter a ordem criou dois aparelhos específicos: o aparelho

repressivo, institucionalizado pelo sistema jurídico e representado pelas forças da polícia, do

exército e dos tribunais, de um lado, e o aparelho ideológico, este como instrumento de

formação da consciência: família, igreja, escola, sindicatos, meios de comunicação social e

outros (ALTHUSSER, 1985).

Enfim, o Estado Liberal deixou de lado as questões sociais, voltadas em benefício

do povo. Com isso, surgiu a necessidade de criação de um novo Estado, que, contrariamente ao

liberal, adentrasse inteiramente na vida dos homens, na busca de promover uma igualdade

social entre a classe trabalhadora e o capital.

O Estado Social surge, assim, a partir da mudança fundada na substituição do

liberalismo econômico pelo intervencionismo estatal, que ocorreu por meio de medidas

emergenciais e que propiciou a interação dos sistemas político e econômico. O Estado passa a

atuar sobre a sociedade, reestruturando-a e condicionando seu existir. De outro lado, a

sociedade, através de seus diversos grupos representativos, procura influir sobre a política

estatal, em favor dos interesses de tais grupos (SOUZA JÚNIOR, 2002).

Sob este ângulo, o Estado Social repudiou o liberalismo porque não favoreceu a

democracia integral, principalmente se se considerar que o Estado Liberal priorizou a

burguesia, ao passo que o voto universal, por exemplo, foi conquistado tardiamente, sem falar

na inexistência desse direito em relação às mulheres.

20

Habermas (1997), após descrever exaustivamente a gradativa polarização da esfera

social e da esfera privada que se consubstanciou no liberalismo, demonstra a necessidade de

transformação do Estado Liberal em Estado Social legitimado por um direito que preserve

iguais liberdades subjetivas de ação, concretizadas nos direitos fundamentais. O Estado é

necessário como poder de organização, de sanção e de execução, porque os direitos têm que ser

implantados, porque a comunidade de direito necessita de uma jurisdição organizada e de uma

força para estabilizar a identidade e porque a formação da vontade política cria programas que

têm que ser implementados.

O Estado Liberal de Direito se inspirou nos valores de liberdade propugnados pela

Revolução Francesa, onde a sua maior preocupação foi conferir ao indivíduo direitos contra

eventuais ingerências do Estado, sendo responsável pela consagração da primeira dimensão de

direitos fundamentais, na qual estão inseridos os direitos civis e políticos.

Os interesses sociais, todavia, não obtiveram resguardo constitucional no Estado

Liberal de Direito, havendo sido ignorados pelos governantes da época, sob o fundamento de

que o progresso conduziria a sociedade em direito à satisfação de suas necessidades,

independentemente de intervenções estatais. Dessa forma, o referido modelo praticamente

anulava a atuação do Estado, tornando-o omisso, pois somente dessa forma acreditava-se ser

possível o exercício dos direitos ligados à liberdade.

Assim, revestiu-se de legalidade a figura de um Estado inerte, despreocupado com

as questões sociais e com visão restrita da funcionalidade dos direitos fundamentais, os quais se

prestavam, até então, unicamente a proteger o indivíduo contra o Estado. Sobre a primeira

dimensão de direitos fundamentais, afirmou Paulo Bonavides (2004, p. 563):

Os direitos de primeira geração ou direitos da liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado. [...] São por igual direitos que valorizam primeiro o homem-singular, o homem das liberdades abstratas, o homem da sociedade mecanicista que compõe a chamada sociedade civil, da linguagem jurídica mais usual.

À concretização destes direitos sociais, contudo, não bastou apenas a abstenção

estatal na esfera das liberdades do indivíduo. Exigiu-se um Estado prestativo, o reconhecimento

dos interesses plurissubjetivos e, principalmente, dos direitos fundamentais do cidadão.

A par das colocações anteriores, depreende-se que fator determinante para a

mudança de visão de Estado está assentado na própria revolução industrial. Neste sentido,

21

destaca Dallari (2001) que a revolução industrial foi, na verdade, paradoxal. Ela só foi possível

porque o Estado não interferiu nas atividades econômicas. Mas enquanto ela se desenvolvia, e

por causa dela, foram sendo criadas as condições que iriam tornar imprescindível a intervenção

do Estado. Guiados por critérios exclusivamente econômicos, os detentores do capital

impunham condições degradantes aos economicamente fracos, acentuando-se os desníveis

sociais. Ao mesmo tempo, transferindo-se o eixo econômico para as cidades, foi sendo criada

uma sociedade predominantemente urbana, com a concentração de grandes massas proletárias,

necessitadas de auxílio para a obtenção do indispensável à sua própria sobrevivência.

Paralelamente, também os detentores do capital passaram a necessitar do Estado para que este

lhes proporcionasse, e aos seus empregados, determinados bens e serviços que os indivíduos ou

grupos privados não podiam ou não queiram oferecer. Tudo isso estimulou a ampliação e o

aprofundamento da participação do Estado na vida social.

O Estado, diante de tais reivindicações, vê-se compelido a assumir funções próprias

do setor privado, primando pela implementação de direitos sociais aos indivíduos. Contudo, a

partir de uma visão crítica da história política e econômica brasileira, Streck e Morais (2000, p.

71) defendem que o que ocorreu, na verdade, foi uma acumulação de capital por parte da classe

burguesa:

O intervencionismo estatal, condição de possibilidade para a realização da função social do Estado e caminho para aquilo que se convencionou chamar de Estado Social ou Estado de Bem-Estar Social, serviu apenas para acumulação de capital e renda para as elites brasileiras. Nesse sentido, é importante lembrar que esse “Estado intervencionista não é uma concessão do capital, mas a única forma de a sociedade capitalista preservar-se, necessariamente mediante empenho na promoção da diminuição das desigualdades socioeconômicas. A ampliação das funções do Estado tornando-o tutor e suporte da economia, agora sob conotação pública, presta-se a objetivos contraditórios: a defesa da acumulação do capital, em conformidade com os propósitos da classe burguesa, e a proteção dos interesses dos trabalhadores.

Nessa perspectiva, instituiu-se o Estado Social de Direito, preocupado não somente

com a liberdade, mas voltado a assegurar condições materiais mínimas à vivência com

dignidade, de modo a buscar a igualdade e amenizar os problemas decorrentes da massificação

social, ou seja, em relação à urbanização acelerada e, até mesmo, concentração desproporcional

de renda, etc.

O Estado Social de Direito consagrou direitos sociais, culturais e econômicos,

assegurando a todos os cidadãos uma renda mínima, alimentação, saúde, habitação, educação,

etc., direitos que se enquadram na segunda dimensão dos direitos fundamentais e se encontram

relacionados aos ideais de igualdade.

22

No entanto, no Brasil, a maior parte dos direitos reconhecidos pelo Estado Social

não passou de mera promessa, porquanto o Executivo foi incapaz de satisfazer e concretizar

essa justiça social. Essa incapacidade, aliada à inexistência de um aparato jurídico capaz de

tutelar e proteger os direitos coletivos, deu início a uma patente crise do Estado Social de

Direito, refletindo-se em uma crise do Executivo.

Sobre a crise do Estado Social de Direito, assinalou Almeida (2003) que, na

verdade, não surgiu de uma verdadeira transformação e rompimento com o Estado Liberal. É

um Estado onde se implantou uma política de proteção de alguns direitos sociais, mas sem

adaptar o seu sistema jurídico para a tutela dos interesses primaciais da sociedade, como os

decorrentes dos conflitos transindividuais. Não é verdadeiramente um novo Estado, mas um

remendo de Estado.

Viu-se, assim, que o Estado Social de Direito e de justiça social não passou de

simples promessa, por esbarrar na falta de efetivação7, sendo que a dignificação dos direitos

fundamentais do cidadão continua sendo um desafio ao Estado Contemporâneo.

A partir deste contexto, o ideário de implementação do Estado Democrático de

Direito, como garantia das condições básicas e gerais da sociedade humana, assegurando a

fraternidade ou solidariedade dos seres humanos, começa a se fazer presente, como tentativa de

correção de deficiências presentes no Estado Social.

Na passagem da Idade Média para a Moderna o monarca detinha um poder

absoluto, não ficando submetido às leis. Porém, os direitos não outorgados por si, denominados

imemoriais, deveriam ser reconhecidos e garantidos. O primeiro e um dos mais importantes

documentos dessa oposição foi a Grande Carta das Liberdades, assinada pelo Rei João Sem

Terra, em 1215, depois reiterada e confirmada várias vezes por sucessivos soberanos.

7 “Cabe perguntar-se em que situação se encontra atualmente o Estado social. Não se pode esquecer que o Estado social surge com a finalidade de corrigir as deficiências de segurança e de bem-estar, que expôs o Estado Liberal, com o objetivo de corrigir o predomínio do individualismo clássico e do absenteísmo estatal. Sua legitimidade se apóia precisamente em que é um Estado inspirado em princípios de solidariedade e justiça social. Mas o Estado social tem-se encontrado tanto com críticas procedentes de ideologias de esquerdas como de correntes mais conservadoras [...]. Os primeiros destacavam suas contradições, quer dizer consideravam que o Estado social não é mais que uma forma que adotou o capitalismo para encobrir as relações de dominação existentes na sociedade e para encobrir as relações de dominações existentes na sociedade e para obter novas formas para a aquisição de mais capital [...]. Por sua vez, a corrente neoliberal defende uma diminuição de impostos – estes são considerados como uma violação do direito de propriedade, uma vez que se projeta que a redução de impostos proporciona um aumento do investimento provado proporcionalmente, coisa que não tem ocorrido – uma privatização do setor público – com o objetivo da redução da carga tributária e porque e, principalmente, porque o Estado não tem que se ocupar da realização de políticas sócias, pelas quais se deve desmantelar as estruturas administrativas que funcionam neste âmbito. Entre a posição social e neoliberal, entre as vantagens que apontam os primeiros e as críticas e inconvenientes que destacam os segundos, entendemos, como Offe, que o Estado de bem-estar se transformou em uma estrutura irreversível, quer dizer, não cabe uma volta atrás nem seu desmantelamento” (MARTÍN, 2005, p. 81).

23

Posteriormente, em 1689, na Inglaterra, com o Bill of Rights, houve a vitória contra

a monarquia absoluta, instaurando-se a monarquia limitada por uma natural separação de

poderes entre as casas parlamentares, o rei e os juízes.

Na França, como forma de racionalismo político, em vez de direitos imemoriais os

franceses opõem ao rei direitos naturais, derivados da própria natureza humana, não outorgados

pelo soberano. Do mesmo modo, tanto os direitos imemoriais (Inglaterra), quanto os direitos

naturais (França), não sendo meras concessões do rei, não podem ser por ele revogados,

devendo ser apenas reconhecidos, declarados e garantidos.

Surgiram, assim, as primeiras declarações de direitos que, junto com a separação de

poderes, tornou-se parte indispensável das constituições escritas, como garantia dos direitos

fundamentais dos indivíduos. O uso da expressão, justamente, evidencia que os direitos

enunciados não são criados ou instituídos, mas meramente declarados, por serem direitos

preexistentes, que derivam da própria natureza humana: direitos naturais. Sendo individuais,

pois dirigidos a todos os cidadãos, são abstratos e universais e, via de conseqüência,

imprescritíveis e inalienáveis.

A mais famosa declaração de direitos, como já delineado anteriormente, foi editada

em 26 de agosto de 1789, na França, denominada Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão.

Hodiernamente, segundo Wolkmer (2003), os direitos humanos podem ser

classificados em cinco dimensões. Os direitos de primeira dimensão, pertinentes aos direitos

civis e políticos, aos direitos individuais à liberdade, à igualdade, à propriedade, à segurança e à

resistência as diversas formas de opressão, independentemente de qualquer ingerência do

Estado ou da vontade do monarca e seus agentes. Nos direitos da segunda dimensão estão

inclusos os direitos sociais, econômicos e culturais, fundados nos princípios da igualdade, ao

trabalho, à saúde, à educação e tem como titular o homem e sua individualidade. Os direitos da

terceira dimensão são os direitos metaindividuais ou transindividuais, coletivos e difusos,

direitos de solidariedade, seu titular não é mais o homem individual, mas a sociedade,

direcionada ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente sadio, à qualidade de vida, etc. A

quarta dimensão dos direitos estão vinculados à vida humana, como, por exemplo, a reprodução

assistida, aborto, eutanásia, transplantes de órgãos, engenharia genética, contracepção dentre

24

outros. Finalmente, são de quinta dimensão os “novos” direitos advindos das tecnologias de

informação (internet), do ciberespaço e da realidade virtual em geral.

O crescimento industrial e a concentração do capital levou o Estado a se deparar

com uma crise ambiental, onde a devastação do meio ambiente e a escassez dos recursos

naturais, até então reconhecidos como inesgotáveis, foi reconhecida e tornou-se uma

preocupação mundial. É nesse contexto que o homem se dá conta das potencialidades das

estruturas ecológicas como elementos de suporte da sociedade.

Para Rogério Gesta Leal e Jorge Renato dos Reis (2004), a idéia de Estado

Democrático de Direito está associada, necessariamente, à existência de uma Sociedade

Democrática de Direito, o que de uma certa forma resgata a tese de que o conteúdo do conceito

de democracia aqui se assenta na soberania popular (poder emanado do povo) e na participação

popular, tanto na sua forma direta como indireta, configurando o que podemos chamar de

princípio participativo, ou, em outras palavras; democratizar a democracia através da

participação significativa em termos gerais, intensificar a otimização das participações dos

homens no processo de decisão. Para tanto, a desificação da democracia à sociedade brasileira

implica, salvo melhor juízo, não si oportunidades materiais de acesso da população à gestão

pública da comunidade, mas fundamentalmente de fórmulas e práticas de sensibilização e

mobilização dos indivíduos e das corporações à participação, através de rotinas e

procedimentos didáticos que levem em conta as diferenças e especificidades de cada qual.

É aí que surge a chamada terceira geração de direitos, que reúne o direito a usufruir

de um meio ambiente equilibrado, o direito a ter uma qualidade de vida saudável, o direito ao

progresso, o direito à paz, o direito à autodeterminação dos povos, bem como a outros direitos

difusos, ou seja, direitos de grupos menos específicos de pessoas, não havendo necessariamente

entre elas um vínculo preciso, sendo conhecidos também como direitos de solidariedade ou

fraternidade, surgidos como uma exigência do terceiro mundo em face das profundas

desigualdades sociais (BOBBIO, 2005).

Os direitos de terceira geração foram reconhecidos após o término da Segunda

Guerra Mundial, assegurando a fraternidade ou solidariedade dos seres humanos entre si pela

implementação das condições gerais e básicas da sociedade humana em si mesma considerada,

na medida em que essas condições lhe sejam necessárias para prover a própria vida humana

com dignidade, o que faz com que sejam elas postas como direitos difusos de toda a

25

humanidade: poderes-deveres de todos os seres humanos para com todos os seres humanos,

direitos e obrigações da humanidade para consigo própria.

Esse processo resultou na evolução do estado liberal para o estado social de direito,

cuja plenitude jurídica é o estado democrático de direito, a ser alcançado com a terceira geração

de direitos, no rumo de um estado de direito pleno. A conversão de todos os direitos

fundamentais, incluídos os políticos, em direitos humanos difusos e integrais, cuja titularidade

sujeite todos os indivíduos da espécie humana e cujo objeto apreenda todos os valores da

dignidade humana, produz os valores fundantes da espécie humana.

Em vista dos genocídios ocorridos na primeira metade do século XX, por regimes

totalitários (nazismo, stalinismo) e democráticos (destruição de cidades indefesas por bombas

atômicas, por exemplo), tais como, por exemplo, o massacre dos armênios, em 1915, buscou-se

garantir, agora, a humanidade contra a própria humanidade. Assim, os direitos humanos

internacionalizam-se, delimitando a soberania estatal mediante a criação de sistemas

normativos internacionais e supranacionais, no afã de preservar os direitos humanos e, ao

mesmo tempo, reconstruir paradigmas éticos para restaurar o respeito à dignidade da pessoa

humana.

Com a Constituição Federal de 1988, é reconhecido no Brasil o Estado

Democrático de Direito, a partir de um modelo social evoluído, consagrando os direitos

fundamentais de terceira geração, não apenas reconhecendo os direitos sociais básicos, mas

garantindo-os, colocando à disposição da sociedade diversos mecanismos de participação

popular.

A vigente ordem constitucional reconhece e concede tratamento jurídico

diferenciado a figuras coletivas intermediárias, consagrando a divisão tridimensional do

Direito, que, ao lado dos direitos públicos e privados, passa a dar tratamento autônomo e

diferenciado aos interesses transindividuais (CAPPELLETTI, 1994).

De efeito, não há que confundir-se direitos transindividuais com direitos públicos,

celeuma prejudicial à consagração da divisão tridimensional do Direito, pois os direitos

públicos necessitam de uma unanimidade social para a sua proteção, ou seja, o interesse

público não encontra rivais, em termos de supra-individualidade, o que não ocorre com os

direitos metaindividuais, que podem surgir de uma situação de alta conflituosidade.

26

Ao explicar a conflituosidade mínima que emana dos direitos públicos, destacou

Antônio Herman V. Benjamin (1995, p. 88-94):

Quem é que se atreveria a pregar, abertamente e até pela via judicial, o analfabetismo (a educação é "direito de todos e dever do Estado e da família"), o desemprego (o trabalho, antes mesmo de ser "direito social", é fundamento da República, como "valor social"), a insegurança (a segurança vem caracterizada como "direito de todos"), as enfermidades (a saúde também é "direito de todos e dever do Estado"), a destruição da família e a tortura?

Estes direitos exemplificados por Benjamin são direito difusos e coletivos,

adquiridos com o passar dos anos, a partir da evolução histórica do Estado. A mitigação destes

valores é expressamente vedado pelo Estado Democrático de Direito, porquanto implícitos do

próprio regramento jurídico pátrio.

A partir da difusão dos direitos humanos, reconhecidos como direitos difusos e

coletivos, surge a ação civil pública, regulamentada pela Lei 7.347, de 24 de julho de 1985,

tutelando os procedimentos a serem utilizados na defesa destes direitos, e, posteriormente, no

artigo 129, inciso III, da Constituição Federal de 19888, a qual foi elevada à categoria de

garantia fundamental ao indivíduo, se apresentando como instrumento proteção à tutela dos

direitos transindividuais ou difusos.

Por meio dessa ação, em virtude da legitimidade ativa processual que a lei lhes

confere, a gestão do bem comum e fiscalização do desempenho das funções estatais, se

apresentou de maneira mais eficaz, de modo a buscar a efetivação concreta do Estado Social e

Democrático de Direito e dos direitos fundamentais.

Não se pode olvidar, outrossim, que as conseqüências da globalização e as práticas

neoliberais dos governos tem sido um sério obstáculo à consecução dos objetivos fundamentais

previstos na Constituição Federal. O neoliberalismo é inerente à globalização econômica, cujas

conseqüências compromete, em alguns casos, a implementação das políticas públicas

indispensáveis a efetivação dos direitos fundamentais.

Para José Eduardo Faria (1996), a globalização da economia e o neoliberalismo

seriam responsáveis pelo fenômeno da desterritorialização da política, que faria com que o

Estado-nação não fosse mais considerado instância privilegiada de decisão e deliberação

nacionais.

8 Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: [...] III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

27

Com relação a esse assunto, manifestou-se Ingo Wolfgang Sarlet (2001), a partir de

trabalho desenvolvido por Boaventura Santos, que a fase que vive atualmente é marcada pela

afirmação do que se tem denominado de "consenso liberal", que, por sua vez, desdobra-se em

quatro outros "consensos": a) o consenso econômico neoliberal ou "consenso de Washington",

que se manifesta, em especial, na globalização econômica e suas conseqüências (liberalização

dos mercados, desregulamentação, privatização, cortes das despesas sociais, concentração do

poder nas empresas multinacionais, etc.); b) o consenso do Estado fraco, caracterizado, também

e aparentemente de forma paradoxal, pelo enfraquecimento e desorganização da sociedade

civil; c) o consenso democrático liberal, isto é, por uma concepção minimalista da democracia;

e d) o consenso do primado do Direito e dos Tribunais, que prioriza a propriedade privada, as

relações mercantis e o setor privado.

Neste mister, inclusive, Paulo Bonavides (2001) defende a existência de uma quarta

dimensão direitos fundamentais, na qual estariam compreendidos os direitos à democracia, à

informação e ao pluralismo, ou seja, a globalização política neoliberal caminha silenciosa, sem

nenhuma referência a valores. Mas nem por isso deixa de fazer perceptível um desígnio de

perpetuidade do status quo de dominação. Há, contudo, outra globalização política, que ora se

desenvolve, sobre a qual não tem jurisdição a ideologia neoliberal. Enfim, os direitos de quarta

geração compendiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos. Tão-

somente com eles será legítima e possível a globalização política.

Enfim, em virtude da evidenciação e reconhecimento dos interesses

transindividuais, a consagração da divisão tridimensional do Direito, com o reconhecimento

dos direitos metaindividuais e sua diferenciação dos direitos públicos e privados, corroborado à

instituição do Estado Democrático de Direito, por meio da Constituição Federal de 1988, a

globalização econômica vem sendo considerada como uma ameaça aos avanços jurídicos

obtidos por alguns países democráticos, uma vez que tem dado outros contornos ao significado

de soberania estatal.

Esses direitos de terceira geração exprimem componentes da dignidade humana,

cuja dignificação resulta nos valores fundantes da humanidade, razão pela qual se constituem

direitos difusos quanto à titularidade subjetiva e direitos de solidariedade quanto ao objeto. São

direitos humanos plenos e absolutos, de todos os sujeitos contra todos os sujeitos, para proteger

todos os bens que condicionam a vida humana, fixados em valores ou bens humanos,

28

patrimônio da humanidade, segundo padrões de avaliação que garantam a existência do ser

humano com a dignidade que lhe é própria.

São os direitos humanos por excelência, os quais estendem-se, inclusive, às

gerações vindouras. Todos os direitos humanos fundamentais se tornam, assim, direitos difusos,

cuja titularidade alcança todos os indivíduos integrantes da humanidade, indistintamente

considerados ou distinguidos em categorias ou partes sociais, ao mesmo tempo em que se

tornam direitos de solidariedade ou fraternidade humana, que, para garantir efetivamente a

liberdade e a igualdade dos seres humanos, encerram todos os valores fundantes da

humanidade.

A par disso, não se pode olvidar que o meio ambiente sadio, como qualidade de

vida, se apresenta como modalidade de direitos humanos, uma vez que não pode afastar a

relação existente entre ambiente e direitos humanos. A relação ambiente e direitos humanos

pode ser concebida sob a ótica da proteção ambiental, da promoção dos direitos humanos e da

positivação do direito humano ao ambiente ecologicamente equilibrado.

Sob a perspectiva da promoção dos direitos humanos, a proteção da qualidade

ambiental constitui pré-requisito à fruição dos direitos humanos, especialmente dos direitos à

vida e à saúde. Nesse sentido, a proteção ambiental representa condição essencial para garantir

o gozo efetivo dos direitos humanos. Essa visão parte do princípio de que não se pode fruir os

direitos humanos num ambiente ecologicamente desequilibrado, degradado ou poluído. Os

direitos à vida, à saúde e a um padrão adequado de vida são ameaçados pela degradação do

solo, pelo aquecimento global, pelo desflorestamento e pela exposição a produtos químicos

tóxicos, lixo perigoso, à água contaminada e à radiação ultravioleta. Numa perspectiva mais

holística, as condições ambientais determinam a extensão na qual determinada coletividade

humana goza os direitos básicos à vida, saúde, alimentação adequada, moradia, ao modo

tradicional de subsistência e à cultura. Aqueles que poluem ou destroem o ambiente não

cometem somente crimes ambientais, mas estão colocando em risco e violando também uma

série de direitos humanos (CARVALHO NETTO, 1999).

Desta forma, vê-se que a questão ambiental está alçada ao patamar de direitos

humanos, possuindo dimensão coletiva e exercidos conjuntamente por indivíduos agrupados

em grandes comunidades, inclusive povos e nações, ocupando-se das questões planetárias ou

29

globais com a paz, o desenvolvimento, a comunicação, o patrimônio comum e a assistência

comunitária.

Segundo Wolkmer (2003), os direitos de terceira dimensão são direitos meta-

individuais, coletivos, difusos e de solidariedade. Sua nota caracterizadora é a de que seu titular

não é mais o homem individual (tampouco regulam as relações entre os indivíduos e o Estado),

mas sim a proteção de categorias ou grupos de pessoas (família, povo, nação), não se

enquadrando nem no plano público nem no privado. Sob o aspecto subjetivo, caracterizam-se

pela indeterminação dos titulares dos interesses, pela ótica objetiva, pela sua indivisibilidade,

de modo que a sua efetivação ou violação a todos beneficiam ou a todos prejudicam, tendo em

vista que a sua satisfação ou lesão não se dá de modo fracionado para um ou para alguns dos

interessados.

Assim, o Brasil, partindo dessa premissa, proclamou o Estado Democrático de

Direito no art. 1º9 da Constituição Federal de 1988. Em complemento, o artigo 3º10 aponta como

objetivos fundamentais do Estado a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, para,

em seguida, o artigo 6º11 indicar os direitos sociais como sendo a educação, a saúde, o trabalho,

a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a

assistência aos desamparados.

Por fim, o artigo 20312, procurando dar efetividade aos direitos e aos valores

mencionados acima, determina que seja prestada assistência social a quem dela necessitar,

independentemente de pagamento de contribuição à seguridade social, explicitando seus

objetivos nos incisos I a V, entre os quais, a proteção à família, à maternidade, à infância, à

adolescência e à velhice, o amparo às crianças e aos adolescentes carentes, a promoção da

integração ao mercado de trabalho, a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de

9 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.10 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.11 Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.12 Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

30

deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária. E, para atingir tais objetivos, o

artigo 20413, de forma clara, prevê a atuação paralela das entidades beneficentes de assistência

social.

De efeito, após o reconhecimento do Estado Democrático de Direito, com a

abordagem relacionada à garantia dos direitos humanos, no plano transindividual ou difuso, por

várias constituições mundiais, inclusive a brasileira, esta terceira geração de direitos

fundamentais buscou englobar, particularmente, o direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, à qualidade de vida sadia e à preservação do patrimônio genético14.

Sobre o direito ao meio ambiente e aos demais direitos fundamentais da terceira

geração, disserta Bonavides (2004) que estes direitos tendem a cristalizar-se neste fim de século

enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um

indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero

humano, mesmo num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade correta. Os publicistas e os juristas já os enumeram com familiaridade,

assinalando-lhe o caráter fascinante do coroamento de uma evolução de trezentos anos dos

direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento,

à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.

13 Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social; II - participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.14 “No quadro da evolução dos direitos, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é considerado como de terceira geração. Sobre o assunto já se fez referência: “A categorização dos direitos em gerações não é assunto de fácil convencimento. É que os direitos acompanham o movimento das mais diversas sociedades. Alguns, como é o caso dos direitos humanos, em virtude de sua característica de universalidade, propagam seus efeitos de modo mais significativo, exigindo respeito de suas disposições por todas as nações que pretendam se desenvolver. Por este motivo, os direitos humanos são previstos em Tratados Internacionais. Assim, é possível considerar que a evolução dos direitos em gerações possui utilidade muito mais didática do reconhecimento histórico da inserção de certos direitos fundamentais em instrumentos normativos internacionais, do que uma evolução no sentido de aperfeiçoamento dos direitos, em que o mais recente substitui ou aprimora o mais remoto. A visão mais adequada em nosso modo de ver é que, mudando a sociedade e seus meios de produção, os direitos devem acompanhar essa mudança, o que não significa o abandono de conquistas passadas. Também não se pode olvidar que há certa unicidade dos direitos tidos como de primeira, segunda e terceira gerações. Isso acentua a crítica de que tais direitos não devem ser tratados de modo estanque. Com essa breve observação, modernamente, estratificam-se determinados direitos universais em primeira, segunda, terceira e até quarta geração. De primeira geração incluem-se os direitos civis e políticos consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, muito embora tal designação, conforme observa J. F. Rezek (Direito internacional público: curso elementar. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 211), somente veio a tomar força anos posteriores à aprovação da Declaração. Incluem-se nos direitos de tal geração: a vida, a liberdade e a segurança. Posteriormente, fundados em valores socialistas, os teóricos vislumbram outro grupo de direitos universais, mas voltados ao assistencialismo estatal, excluindo-se um pouco a visão individualista iniciada desde a Revolução Francesa quanto aos direitos do homem. Trata-se dos direitos de segunda geração, caracterizados pelos direitos ao trabalho, à assistência social e à igualdade social e outros. A geração de direitos seguinte, com semelhantes propósitos socializantes que inspiraram os de segunda, qual seja, a preocupação dos direitos das coletividades, visando seu desenvolvimento socioeconômico, deu esteio à consagração de direitos como à paz, ao meio ambiente e à co-propriedade do patrimônio comum ao gênero humano, os chamados direitos de terceira geração”. (NUNES, 2002, p. 41-57).

31

Ao se referir aos direitos fundamentais da terceira geração, Bobbio (1992, p. 6)

assinala que, “ao lado dos direitos, que foram chamados de direitos da segunda geração,

emergiram hoje os chamados direitos da terceira geração [...] O mais importante deles é o

reivindicado pelos movimentos ecológicos: o direito de viver num ambiente não poluído”.

Por isso mesmo, Canotilho (1995a) fala tanto sobre a juridicização da vertente

ecológica quanto sobre a ecologização da vertente jurídica. Com efeito, a juridicização da crise

ambiental e o reconhecimento da proteção do meio ambiente como um direito fundamental de

terceira geração faz com que muitos institutos jurídicos (preexistentes) sejam renovados e

muitos institutos jurídicos (novos) sejam criados dentro do ordenamento.

Para Alexy (1993), o direito ao meio ambiente é um exemplo de direito

fundamental como um todo, na medida em que representa um leque paradigmático das

situações suscetíveis de considerações em sede de normas tuteladoras de direitos fundamentais.

Nesse sentido, o direito ao meio ambiente como direito fundamental da terceira

geração pode referir-se ao direito do Estado: a) de omitir-se de intervir no meio ambiente

(direito de defesa); b) de proteger o cidadão contra terceiros que causem danos ao meio

ambiente (direito de proteção); c) de permitir a participação do cidadão nos procedimentos

relativos à tomada de decisões sobre o meio ambiente (direito ao procedimento); e finalmente,

de realizar medidas fáticas tendentes a melhorar o meio ambiente (direito de prestações de

fato).

O reconhecimento definitivo do direito ao meio ambiente como direito fundamental

da terceira geração já foi feito pelos ordenamentos jurídicos de vários Estados. Nesse sentido,

importa observar que, no sistema constitucional brasileiro, o art. 225, caput, da Constituição

Federal impõe o entendimento de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é

um dos direitos fundamentais. Daí por que o meio ambiente é considerado um bem de uso

comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.

Segundo Canotilho (1995b), a formulação do Estado de Direito Ambiental implica

definir um Estado que, além de ser um Estado de Direito, um Estado Democrático e um Estado

Social, deve também modelar-se como Estado Ambiental.

A concepção do Estado de Direito Ambiental, teve azo a partir da crise ambiental

decorrente do processo civilizatório moderno e o desenvolvimento da humanidade. A proteção

32

ambiental, nas últimas décadas, tem-se tornado uma tarefa inevitável do Estado

contemporâneo, que deve criar condições para a preservação e fruição de bens ambientais,

permitindo mesmo a caracterização deste como um Estado Pós-Social ou um Estado

Ambiental.

A propósito, assinala Leite (2000) que é inegável que atualmente estamos vivendo

uma intensa crise ambiental, proveniente de uma sociedade de risco, deflagrada,

principalmente, a partir da constatação de que as condições tecnológicas, industriais e formas

de organização e gestões econômicas da sociedade estão em conflito com a qualidade de vida.

Parece que esta falta de controle da qualidade de vida tem muito a ver com a racionalidade do

desenvolvimento econômico do Estado, que marginalizou a proteção do meio ambiente.

Verifica-se, nessa perspectiva, que a crise ambiental contemporânea configura-se,

essencialmente, no esgotamento dos modelos desenvolvimentistas levados a efeito nas últimas

décadas, que, a despeito dos benefícios científicos e tecnológicos daí decorrentes, trouxeram a

devastação do meio ambiente e a escassez dos recursos naturais em nível planetário,

manifestadas principalmente por acontecimentos globais como o aumento da temperatura

média do planeta, com o derretimento das geleiras nos pólos; a emissão de gases de efeito

estufa, proveniente da queima de combustíveis fósseis; desequilíbrios climáticos, ocasionando

enchentes e ciclones cada vez mais potentes; proliferação de algas tóxicas; dentre outros cada

vez mais constantes e danosos ao meio ambiente.

Sobre o assunto, Odum (1997, p. 811) leciona que “até a data, e no geral, o homem

atuou no seu ambiente como um parasita, tomando o que dele deseja com pouca atenção pela

saúde do seu hospedeiro, isto é, do sistema de sustentação da sua vida”.

No entanto, essa crise ambiental não se restringe apenas aos aspectos físicos,

biológicos e químicos das alterações do meio ambiente, mas uma crise de valores, culturais e

espirituais, que aflige toda a civilização moderna.

Nesse sentido, a superação da crise ambiental implica não apenas conciliar o

desenvolvimento econômico-social com a proteção do meio ambiente, isto é, garantir o

chamado desenvolvimento sustentável, mas, sobretudo, promover “uma verdadeira mudança de

atitude da civilização e dos seus hábitos predatórios que comprometem não só o futuro das

próximas gerações mas o próprio equilíbrio do planeta” (PORTANOVA, 2000, p. 242).

33

Em síntese, a crise ambiental em comento reside além dos conceitos até então

conhecidos, restritos à definição do homem e do seu espaço na natureza, bem como sua relação

com o meio ambiente, em um sopesamento de interesses econômicos e ecológicos, sob pena de

a degradação ambiental tornar-se ameaça (endêmica ou epidêmica) à qualidade de vida humana

e à exclusão do futuro.

Diante dessa crise ambiental, o Estado tem repartido com a sociedade a

responsabilidade pela proteção ambiental, deixando esta de pertencer ao domínio

exclusivamente público, para atingir também o domínio privado. Ou seja, o dever de proteger o

meio ambiente sempre foi exclusivo do Estado, passando, a partir da consagração do Estado

Democrático de Direito e o reconhecimento dos direitos metaindividuais ou transindividuais, a

tomar dimensões coletivas, distribuídos entre o poder público e privado.

Isso implica no surgimento de um novo Estado e de uma nova cidadania, que têm

plena consciência da devastação ambiental, planetária e indiscriminada, provocada pelo

desenvolvimento, aspirando assim a novos valores como a ética pela vida, o uso racional e

solidário dos recursos naturais, o equilíbrio ecológico e a preservação do patrimônio genético.

José Afonso da Silva (2000), a propósito, assevera que o problema da tutela jurídica

do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que sua degradação passa a ameaçar

não só o bem-estar, mas a qualidade da vida humana, se não a própria sobrevivência do ser

humano. O que é importante é que se tenha consciência de que o direito à vida, como matriz de

todos os direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no

campo de tutela do meio ambiente. Cumpre compreender que ele é um fator preponderante, que

há de estar acima de quaisquer outras considerações como as de desenvolvimento, como as de

respeito ao direito de propriedade e como as de iniciativa privada.

Essa preocupação, ressalte-se, há de ser com a proteção do patrimônio ambiental

global, isto é, considerado em todas as suas manifestações (meio ambiente artificial, meio

ambiente cultural, meio ambiente natural e meio ambiente social).

Neste compasso, a formação do Estado de Direito Ambiental converge,

necessariamente, para mudanças profundas nas estruturas da sociedade organizada, de modo a

apontar caminhos e oferecer alternativas para a superação da atual crise ambiental, preservando

os valores que ainda existem e recuperando, na medida do possível, os bens ambientais que

deixaram de existir.

34

Em outras palavras, no Estado Democrático de Direito busca-se a instituição de um

novo paradigma de desenvolvimento, fundado na solidariedade social, capaz de conduzir à

proteção (concreta) do meio ambiente e à promoção (efetiva) da sadia qualidade de vida.

Como se vê, as funções do Estado de Direito Ambiental são mais abrangentes do

que as do Estado Social, no sentido de que incorporam novos valores, além daqueles

relacionados à liberdade individual ou igualdade social, como a defesa e a proteção do meio

ambiente, reconhecendo-a como essencial à vida humana, promoção da qualidade de vida, da

ética ambiental, da educação ambiental, da gestão ambiental participativa dos indivíduos e da

democracia ambiental.

Essas funções, ampliadas a partir da concepção do Estado Democrático de Direito,

refletem-se diretamente no ordenamento jurídico, que deverá voltar-se à confirmação desse

novo Estado, com características inovadoras, viabilizando-o e garantindo-o mediante a máxima

efetividade de suas normas.

A par disso, convém relembrar que o Direito evolui com a própria sociedade. Essa

evolução social, que culminou com o surgimento do Estado de Direito Ambiental, provocará

também mudanças nos institutos e nas categorias jurídicas, com a renovação dos direitos

preexistentes e a emergência dos novos direitos.

As funções do Estado de Direito Ambiental se realizam, principalmente, através de

medidas (concretas) que visam a estimular e a provocar o exercício das condutas (participativa

e solidária) desejadas para alcançar o fim ambiental do Estado. A função repressora, típica do

Estado Liberal, cede lugar à função promotora, característica do Estado Social, que deve ser

ampliada no Estado Ambiental.

No Estado de Direito Ambiental, todos, sem qualquer distinção, como o era no

Estado Liberal ou no Estado Social, são considerados cidadãos, detentores de direitos e

obrigações também ampliados, sem qualificações jurídicas específicas que o insiram em

determinado grupo social.

Pureza (1997) observa que o Estado Ambiental é um quadro de mais sociedade,

mais direitos e deveres individuais e mais direitos e deveres coletivos e menos Estado e menos

mercantilização. Neste novo contexto, não é prioritário o doseamento entre público e privado,

35

mas sim o reforço da autonomia (logo, dos direitos e das responsabilidades) individual e social

frente à mercantilização e à burocratização.

Insere-se, também, entre as funções do Estado de Direito Ambiental, a redefinição

do direito de propriedade sobre os recursos naturais, ampliando-o para uma função social

ambiental, privilegiando o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a qualidade

de vida das pessoas.

1.2.1 A teoria da sociedade de risco e a questão ambiental

A crise ambiental tem sido objeto de incessantes e calorosos estudos e debates na

busca de solução deste problema, sob um enfoque sociológico do risco, escapando da técnica e

da racionalidade jurídica tradicional, reconhecendo novas tendências e peculiaridades do bem

ambiental a ser protegido pelo Estado, Direito e Sociedade.

Segundo Leite (2003), a teoria da sociedade de risco, característica da fase seguinte

ao período industrial clássico, representa a tomada de consciência do esgotamento do modelo

de produção, sendo esta marcada pelo risco permanente de desastres e catástrofes. Acrescente-

se o uso do bem ambiental de forma ilimitada, pela apropriação, a expansão demográfica, a

mercantilização, o capitalismo predatório – alguns dos elementos que conduzem a sociedade

atual a situações de periculosidade e de crise ambiental.

A teoria da sociedade de risco, característica da fase seguinte ao período industrial

clássico, representa a tomada de uma consciência diversa daquela até então difundida e

marcada essencialmente pelo risco premente de desastres e catástrofes de natureza ambiental.

A sociedade de risco é aquela que, em função de seu contínuo crescimento

econômico, pode sofrer a qualquer tempo as conseqüências de uma catástrofe ambiental. Nota-

se, portanto, a evolução e o agravamento dos problemas, seguidos de uma evolução da

sociedade (da sociedade industrial para a sociedade de risco), sem, contudo, uma adequação

dos mecanismos jurídicos de solução dos problemas dessa nova sociedade. Há consciência da

existência dos riscos, desacompanhada, contudo, de políticas de gestão, fenômeno denominado

de irresponsabilidade organizada (LEITE, 2003).

36

Malgrado a evolução da racionalidade sócio-jurídica em face do ambiente, tem-se

que a sociedade contemporânea, sobretudo diante das exigências de ordem econômica, convive

com inúmeros fatores de risco de diversas origens, sobretudo de cunho ambiental. Vive-se

numa sociedade de risco, para utilizar a expressão cunhada em Ulrich Beck (LEITE; AYALA,

2002).

Segundo Sebastião (2007), a sociedade atual, outrora acostumada com a

previsibilidade das situações sociais, políticas e ecológicas (sociedade industrial), convive

agora com a insegurança constante de novas e imprevisíveis ameaças cujas soluções são

cobradas insistentemente de um Estado que não há conta em saná-las (sociedade de risco).

Em função do crescimento econômico mundial, a sociedade de risco se caracteriza

pela evolução e o agravamento dos problemas ambientais e pela inadequação dos mecanismos

jurídicos existentes para a solução dos problemas dessa nova sociedade. Há, assim, a

consciência da existência dos mais diversos riscos, porém, não existem instrumentos ou

políticas de gestão, tão complexos e avançados, capazes de controlar e disciplinar esse

desenvolvimento.

Giddens (2002) diz que o risco é a expressão característica de sociedades que se

organizam sob a ênfase da inovação, da mudança e da ousadia. Nessas afirmações, questiona-se

a própria prudência e cautela da ciência em lidar com as inovações tecnológicas e ambientais,

que, mesmo trazendo benefícios, estão causando riscos sociais não mensuráveis, vitimando não

só a gerações presentes, como também as futuras gerações.

A partir destas situações de riscos, o meio ambiente passou a ser analisado de uma

forma diferente, superando o modelo jurídico tradicional e demandando uma efetiva proteção

jurídica do meio ambiente.

Ayala (2003, p. 137) destaca que o sistema jurídico protetivo deve ser apreciado

como um elemento fundamental: “[...] nas opções, e seleção das medidas de controle dos riscos,

porque a qualidade global, e o anonimato potencial expõem o desenvolvimento da vida a

estados de insegurança, cujo momento e duração não podem ser cientificamente determinados

com a certeza suficiente”.

De efeito, percebe-se, claramente, que há necessidade de o Estado melhor se

organizar e facilitar o acesso aos canais de participação, gestão e decisão dos problemas e dos

37

impactos oriundos da irresponsabilidade política no controle de processos econômicos de

exploração inconseqüente dos recursos naturais em escala planetária.

Embora o ordenamento jurídico-ambiental brasileiro possua instrumentos que não

se limitam ao controle da produção e da proliferação de riscos, ressalta-se a necessidade de

afastar o Direito Ambiental da racionalidade da irresponsabilidade organizada e desvinculá-lo

da intenção do exercício de uma função meramente simbólica (FERREIRA, 2003). Apenas

com o reconhecimento dos riscos da atualidade, o que pressupõe que sejam eles trazidos a

público, o Direito Ambiental poderá ser alicerçado sobre novas bases que viabilizarão a efetiva

utilização de seus instrumentos como forma de salvaguardar o meio ambiente ecologicamente

equilibrado para as gerações presentes e futuras.

Essa complexidade da atual sociedade está diretamente vinculada à conformação do

Estado à ficção do Estado de Direito Ambiental, que visa a criar e disponibilizar os meios mais

eficazes à proteção do meio ambiente, obrigando as instituições a avaliar e limitar a extensão

dos danos e riscos ambientais (HERMITTE, 2005).

1.2.2 Características do Estado de Direito Ambiental

As características do Estado Ambiental são totalmente diferenciadas em relação ao

Estado Liberal e ao Estado Social, que o precederam. No Estado Liberal e no Estado Social as

principais instituições são o mercado e o Estado, respectivamente. No Estado Ambiental, por

sua vez, a instituição principal é o próprio meio ambiente. Ao passo em que o sujeito de direito

no Estado Ambiental é todo ser humano, no Estado Liberal é o burguês e no Estado Social é o

trabalhador.

Além disso, como já visto, a finalidade do Estado Liberal era a liberdade e a do

Estado Social era a igualdade. Já o Estado Ambiental tem uma finalidade mais ampla: a

solidariedade e fraternidade, mais abrangentes do que a esfera individualista própria do Estado

Liberal. Além disso, não se pode olvidar que os direitos fundamentais do Estado Ambiental são

de terceira geração (direitos difusos), enquanto os do Estado Liberal são da primeira geração

(direitos individuais) e os do Estado Social são da segunda geração (direitos sociais).

38

Como se observa, o Estado Ambiental apresenta características que lhe conferem

funções (ampliadas) do Estado Liberal e do Estado Social, considerando, sobretudo, a

preservação do meio ambiente e a promoção da qualidade de vida, como valores fundantes de

uma democracia e de uma nova forma de cidadania (participativa e solidária).

A partir do reconhecimento do Estado de Direito Ambiental, com vistas à

preservação do Meio Ambiente, coube ao Estado, com força nos princípios da fraternidade e

solidariedade, a função de criar instrumentos capazes de salvaguardar o meio ambiente

ecologicamente equilibrado para as gerações presentes e futuras.

Neste ínterim, paralelamente à criação de instrumentos legislativos de caráter penal

e sancionatório, entidades não-governamentais, a partir dos problemas ambientais existentes e

da conscientização preservacionista, ou seja, de que os recursos naturais seriam esgotáveis,

buscaram criar mecanismos alternativos no afã de atingir o preceito fundamental de

preservação ambiental, dando azo ao Sistema de Gestão Ambiental.

.

CAPÍTULO II

QUALIDADE DO MEIO AMBIENTE E SISTEMAS DE GESTÃO

AMBIENTAL

Neste capítulo, serão abordadas algumas questões relacionadas ao Meio Ambiente,

essencialmente no tocante à preocupação do Estado e entidades não-governamentais com sua

conservação. Inicialmente, será abordada a evolução da preocupação ambiental, os principais

desastres ecológicos ocorridos nos últimos anos, alguns movimentos ambientais e os

respectivos instrumentos confeccionados a partir destes encontros. Posteriormente, serão

tecidos comentários sobre alguns problemas ambientais que afligem a biodiversidade. Por fim,

serão analisados os instrumentos de gestão ambiental existentes, criados a partir dos problemas

ambientais existentes e da respectiva conscientização ambiental, como forma alternativa de

solução ao enfrentamento da degradação ambiental mundial.

2.1 O Meio Ambiente

A qualidade do meio ambiente foi elevada à condição de direito fundamental pela

Constituição Federal de 1988, o que, conforme discorreu-se no capítulo anterior, coloca o

Brasil no rol dos Estados que assumem o desafio de enfrentar as problemáticas ambientais

lançando mão dos mais variados instrumentos, sejam de natureza sancionatória, sejam eles de

“comando e controle” ou econômicos.

2.1.1 A degradação ambiental e a preocupação com sua conservação

Os principais objetivos da sociedade contemporânea se afirmaram no crescimento

econômico, tendo sido este colocado no centro das preocupações. As questões ambientais, por

sua vez, têm sido colocadas em um segundo plano, quando não ignoradas.

A preocupação da sociedade moderna se restringia ao crescimento econômico,

pouco importando a questão ambiental, principalmente porque se pensava que a natureza era

uma fonte inesgotável de recursos. Especificamente no Brasil, o início da influência do homem

sobre o meio ambiente começou com a chegada dos portugueses. Os indígenas que aqui

habitavam (estimados em oito milhões), antes da ocupação do território brasileiro, sobreviviam

basicamente da exploração de recursos naturais, de forma sustentável (WALLAVER, 2000).

Com a exterminação de grande parte dos índios pelos portugueses, em que pese o

número de habitantes do Brasil ter sido reduzido para três milhões no início do século XIX, foi

nesse período que começaram as intensas devastações do nosso território. À época, o

catolicismo pregava que os recursos naturais eram infindáveis. Infelizmente, essa cultura tem

passado de geração em geração e até os dias de hoje (WALLAVER, 2000).

Com as Revoluções Francesa e Industrial, aliado à descoberta do petróleo nos

Estados Unidos, em 1857, a humanidade saltou para uma nova fase: o mundo industrializado,

trazendo consigo, além da destruição das reservas naturais, a poluição.

Esta industrialização deu azo à divisão da sociedade em duas classes econômicas:

os que espoliavam e os que eram espoliados. Os que espoliavam eram aqueles que acumulavam

capital e conhecimento, os espoliados eram aquelas pessoas que viviam no estado mais precário

possível, diante da falta de recursos e condições de sobrevivência pela intensificação da

demanda por recursos naturais pelas indústrias e a geração de resíduos industriais.

Em face da inexistência de condições de dignas de sobrevivência dos espoliados,

aliado ao crescimento e concentração populacional desordenado nos centros urbanos, a

sociedade carente começou a utilizar-se desordenadamente dos recursos naturais existentes,

causando a degradação de áreas agricultáveis e de recursos hídricos e, com isso, aumentando a

pobreza.

Com o passar dos tempos, principalmente a partir das Revoluções Industrial e

Francesa, além do movimento industrialista, houve uma degradação ambiental sem

precedentes, totalmente incontrolável, fazendo com que a Europa Ocidental, primeiramente,

começasse a se preocupar com a questão.

Esta preocupação, com o passar dos anos, cresceu em nível mundial, sendo que a

abordagem de controlar ou influenciar os impactos das atividades industriais na saúde humana

e no meio ambiente sofreu uma transição significativa. Inicialmente, na década de sessenta, os

esforços concentraram-se no desenvolvimento das estruturas legislativas e regulamentares,

reforçados por uma estrutura de licenciamento ambiental.

A consciência de que o ser humano afetou a biosfera de forma radical, provocando conseqüências que podem pôr em risco a sua própria vida, vem-se construindo desde a década de 70. Começando pelos impactos localizados, como poluição de rios e córregos ou do ar de certas cidades, ou extração, até o esgotamento, de minerais e recursos não renováveis, passou-se à consciência dos impactos em escala mundial, como a deterioração da camada de ozônio, o aquecimentos global do planeta, o aumento do nível dos oceanos, ou os riscos de grande alcance de resíduos nucleares (FOLADORI, 2001, p. 101)

A indústria, a partir daí, começou a investir significativamente em soluções que

atendessem as regulamentações legislativas, editadas no afã de obstar, quiçá impedir a

ocorrência de degradações ambientais pelas empresas industriais. Tais normas, alicerçadas em

condicionantes ambientais, cada vez mais rigorosa e atenciosa à questão ambiental, buscava

atender ao comando-controle exercido pelo Estado.

Foi apenas na segunda metade deste século, no entanto, que um grupo de cientistas, reunidos no chamado Clube de Roma, na década de 60, utilizando-se de modelos matemáticos, preveniu dos riscos de um crescimento econômico contínuo, baseado em recurso naturais não-renováveis. Seu relatório Limits to Growth (Limites ao Crescimento), publicado em 1972, foi um sinal de alerta que incluía projeções, em grade parte não cumpridas, mas que teve o mérito de conscientizar a sociedade para os limites da exploração do planeta (VALE, 2000, p. 2).

Com efeito, o processo de desenvolvimento dos países se realiza, basicamente, às

custas dos recursos naturais vitais, provocando a deterioração das condições ambientais em

ritmo e escala até ontem desconhecidos. A paisagem natural da Terra está cada vez mais

ameaçada pelas usinas nucleares, pelo lixo atômico, pelos dejetos orgânicos, pela “chuva

ácida”, pelas indústrias e pelo lixo químico. Por conta disso, em todo o mundo, o freático é

contaminado, a água se torna escassa, a área florestal diminui, o clima sofre grandes alterações,

o ar se torna irrespirável e o patrimônio genético se degrada (MILARÉ, 2005).

Enfim, tendo em vista que o desenvolvimento dos países se balizava na

deterioração dos recursos naturais, de forma totalmente desordenada e predatória, as principais

nações mundiais decidiram se reunir em um evento específico neste mister, de forma a

estabelecer rédeas à degradação ambiental, com vistas à exploração sustentável dos recursos

naturais.

O primeiro evento que albergou a questão ambiental, em âmbito internacional, foi a

Conferência das Nações Unidas de 1972 (Conferência de Estocolmo), quando uma comissão

independente foi criada: a Comissão Mundial de Desenvolvimento e Meio Ambiente

(Brundtland Comission), encarregada da tarefa de reavaliar o meio ambiente no contexto de um

desenvolvimento equilibrado, ou seja, a criação de uma nova carta ou declaração universal

sobre a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável.

Esta Comissão, no exercício de suas funções, publicou o relatório denominado

Nosso Futuro em Comum, de 1987, introduzindo o termo “desenvolvimento sustentável”,

incitando as indústrias a desenvolverem sistemas de gestão ambiental eficientes. O relatório foi

assinado por mais de 50 líderes mundiais, que agendaram uma conferência geral para discutir a

necessidade do estabelecimento de ações a serem implementadas. Este relatório é considerado

um marco no trato da proteção do meio ambiente.

A década de 80 se encerrou com uma globalização das preocupações com a conservação do meio ambiente. Dois claros exemplos dessa preocupação global são o protocolo de Montreal, firmado em 1987, que bane toda uma família de produtos químicos (os cloro-fluor-carbonos ou CFC’s) e estabelece prazos para sua substituição, e o relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, instituída pela Assembléia Geral das Nações Unidas. Este último, também chamado Relatório Brundtland em razão do nome de sua coordenadora, foi publicado em 1987 sob o título de Nosso Futuro Comum e permitiu disseminar, mundialmente, o conceito de Desenvolvimento Sustentável. (VALLE, 2000, p. 3)

Posteriormente, aproximadamente 20 anos após a Conferência de Estocolmo, a

Organização das Nações Unidas decidiu organizar a Conferência sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento das Nações Unidas - UNCED, também conhecida como RIO 92, realizada no

Rio de Janeiro, em 1992. Participaram do evento líderes de governos, próceres comerciais,

representantes de mais de cinco mil organizações não-governamentais, jornalistas

internacionais e grupos privados de várias partes do planeta que se reuniram em prol do meio

ambiente, buscando a transformação do globo e delimitando as diretrizes a serem tomadas em

direção ao desenvolvimento sustentável.

A humanidade se encontrava em momento de definição histórica, partindo da

unificação das Alemanhas (Ocidente e Oriental), defrontando-se com a perpetuação das

disparidades existentes entre as nações, com o agravamento da pobreza, da fome, das doenças e

do analfabetismo, sem falar na deterioração desproporcional da biodiversidade do planeta.

As metas da Conferência do Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas

eram, em linhas gerais, a integração do homem ao meio ambiente, satisfazendo suas

necessidades básicas de maneira equilibrada e sustentável, elevando o nível de vida de todos,

obtendo, conseqüentemente, um ecossistema protegido e gerenciado, com vistas à melhoria da

vida humana no presente e para o futuro.

O sucesso da RIO 92 foi inconcusso, havendo um consenso global entre os mais

diversos ramos da sociedade civil e inclusive governos, empresas, organizações não-

governamentais, sobre as questões ambientais, na cooperação de todos na busca da resolução

dos problemas ambientais cruciais à vida no planeta. Foi criada a Agenda 21.

A Agenda Global, assinada por 179 chefes de Estado e de Governo, representou um

caminho universal a ser seguido. A Agenda 21 Brasileira, fruto da participação de mais de 40

mil pessoas, representantes dos mais diversos segmentos da comunidade brasileira, lançou o

Brasil no cenário internacional.

A Agenda 21 buscou traçar as diretrizes a serem seguidas na busca do

desenvolvimento sustentável, disciplinando matérias relativas ao combate à pobreza, mudança

dos padrões de produção e de consumo, condições de saúde humana, proteção dos ecossistemas

e atmosfera, conservação da biodiversidade, proteção dos oceanos e diversos recursos hídricos,

educação ambiental, etc.

A par disso, na busca de promover uma participação completa de todos, inclusive,

das corporações comerciais e industriais, no processo de discussão e decisão final sobre o

assunto, o Secretário-Geral da UNCED constituiu um líder industrial suíço para ser seu

conselheiro nas questões comerciais, o qual, estabeleceu o Conselho Empresarial de

Desenvolvimento Sustentável - CEBDS15.

15 “É o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades” (Relatório Brundtland – Nosso Futuro Comum, da Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento – ONU).

Este Conselho publicou um relatório importante intitulado “Mudança de Rumo”,

bem como decidiu aproximar-se da ISO16 para discutir o desenvolvimento de padrões

ambientais. Paralelamente a isso, a Câmara do Comércio Internacional (ICC) desenvolveu a

Carta Empresarial de Desenvolvimento Sustentável em 1990, que foi lançada na Segunda

Conferência Mundial de Gestão Ambiental das Indústrias - WICEM, contendo 16 princípios de

gestão ambiental.

A introdução de novos conceitos, como Certificação Ambiental, Atuação Responsável e Gestão Ambiental, tende a modificar a postura reativa que marcava, até recentemente, o relacionamento entre as empresas, de um lado, e os órgãos de fiscalização e as ONG’s atuantes na questão ambiental, de outro. Uma nova postura, baseada na responsabilidade solidária, começa a relegar a um segundo plano as preocupações com multas e autuações que vão sendo substituídas por um maior cuidado com a imagem da empresa. (VALLE, 2000, p. 4)

Destarte, concomitantemente à Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento de Estocolmo, em 1972, reafirmando a Declaração da

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, buscou-se a cooperação entre

os Estados, os setores-chave da sociedade e os indivíduos, com vistas à conclusão de acordos

internacionais que respeitem os interesses de todos e protejam a integridade do sistema global

do meio ambiente e desenvolvimento, reconhecendo a natureza interdependente e integral da

Terra, ocasião em que foi editada a Carta da Terra.

Neste documento, são proclamados 27 princípios, com vistas à qualidade ambiental,

disciplinando, resumidamente, que para haver desenvolvimento sustentável e atendermos as

necessidades das gerações presentes e futuras, temos que estar em harmonia com a natureza;

Que os Estados têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos; Que devemos lutar

para erradicar a pobreza e reduzir as disparidades; Que os Estados devem cooperar para a

conservação, proteção e restauração da saúde e da integridade do ecossistema terrestre; Que os

países em desenvolvimento e aqueles ambientalmente mais vulneráveis devem receber atenção

especial; Que os países desenvolvidos reconhecem a responsabilidade que têm em vista das

pressões exercidas por suas sociedades sobre o meio ambiente; A adoção de legislação

ambiental eficaz, assim como da avaliação de impacto ambiental para atividades que possam

vir a ter impacto negativo no meio ambiente; A adoção do princípio da precaução para proteger

o meio ambiente; Que as populações indígenas têm um papel fundamental na gestão do meio 16 A Organização Internacional para Normalização (ISO) é uma fundação mundial composta por 130 membros de entidades nacionais de normalização, tendo um membro de cada país associado. É uma organização não-governamental criada em 1947, sediada na Suíça, cuja missão é promover o desenvolvimento da normalização mundial, com o objetivo de facilitar o comércio internacional de bens e serviços e desenvolver a cooperação de atividades científicas, tecnológicas e econômicas. O trabalho da ISO resulta em consensos internacionais, os quais são publicados como normas e outros documentos internacionais (SANTOS, 2006).

ambiente em virtude de seus conhecimentos e práticas tradicionais e, que a guerra é, por

definição, contrária ao desenvolvimento sustentável.

Enfim, desde a década de 80, boa parte das indústrias vêm reconhecendo que a

questão ambiental é preocupante, fazendo com que atitudes proativas e a execução de

programas de gestão ambiental, possam, ao mesmo tempo, vincular sua imagem à proteção

ambiental com vista à intensificação e aumentos dos lucros e a competitividade, além de

prevenção em face de proposições legislativas acerca de sua adequação ao trato das questões

ambientais.

Neste sentido, esclarece Juchem (1995):

Normas de gestão e qualidade ambiental também passam a ser editadas, com vistas à criação de padrões de segurança e proteção ambiental e à implantação de controles para a gestão de resíduos, para a integridade dos produtos na produção e na utilização, para a garantia de saúde de funcionários, para a minimização de riscos e perdas com acidentes, para a gestão de passivos ambientais e para a prevenção e gestão de crises. Da mesma forma, sistemas de auditoria ambiental passam a ser concebidos e implantados nas empresas como forma de assegurar e demonstrar o cumprimento das políticas e objetivos ambientais destas.

Além dos “produtos verdes”17, também têm sido produzidas inúmeras ferramentas

de gestão ambiental, como auditoria ambiental e os diversos sistemas de gestão ambiental, os

quais começaram como iniciativas voluntárias dentro das empresas e que, agora, afetam as

políticas e regulamentações governamentais em nível mundial.

Em que pese a implementação de sistemas de gestão ambiental em empresas ainda

permaneça voluntária, várias organizações mundiais estimam não somente os benefícios

financeiros, com a identificação e redução de desperdícios, marketing, eficiência da produção,

mas também os riscos de acidentes ambientais, incapacitação na obtenção de créditos bancários

ou investimentos públicos e privados, perda de mercado e, também, os créditos de carbono18.

Atualmente, o ramo industrial está aderindo ao desenvolvimento de padrões no

campo ambiental, principalmente daqueles estabelecidos e credenciados pela ISO. A

preocupação com o meio ambiente, felizmente, tem afetado indústrias em todo o mundo,

inclusive, blocos internacionais, como a União Européia, por exemplo, onde alguns acordos

17 Os “produtos verdes” são aqueles produzidos a partir da consciência ambiental, tais como alimentos orgânicos, produtos reclicados e recicláveis, carros menos poluidores, equipamentos elétricos com menor consumo de energia, detergentes biodegradáveis, serviços de coleta seletiva de lixo, etc.18 Os créditos de carbono ou redução certificada de emissões são certificados emitidos quando ocorre a redução de emissão de gases do efeito estufa, onde uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) corresponde a um crédito de carbono, que pode ser negociado no mercado internacional, ou seja, um valor monetário a poluição.

internacionais de exportação e importação têm exigido que as empresas sejam certificadas pela

ISO 1400119.

Todavia, como cediço, desde o início do século XXI, a sociedade passa a assumir

sua responsabilidade pelo uso predatório dos recursos naturais. O desenvolvimento sustentável,

infelizmente, como forma de redimir danos causados ao meio ambiente, ainda é um caminho

muito longo, envolvendo a revisão de conceitos (tecnologias limpas, mudanças de padrões de

produção e de consumo, reciclagem, reaproveitamento, etc.), sem falar na mudança de

comportamentos e de procedimentos, bem como tempo e dinheiro, os quais nem sempre estão à

disposição para essa finalidade.

Foladori (2001) leciona que os elementos que compõem o conceito de

desenvolvimento sustentável vão além da preservação ambiental específica, como a

racionalização dos recursos hídricos e energéticos, ou o desenvolvimento de técnicas

substitutivas do uso de bens não-renováveis ou, ainda, o adequado manejo de resíduos.

Adentra, também, nas questões sociais (a pobreza, o desemprego e o crescimento

populacional), onde a deterioração do meio ambiente está indiscutivelmente interligada a estes

fatores. Nenhum destes problemas fundamentais pode ser resolvido de forma isolada, na busca

de parâmetros ditos como aceitáveis, visando a convivência do ser humano numa base mais

justa e equilibrada.

Desta forma, a propagação da idéia do Desenvolvimento Sustentável, divulgando a

necessidade de se buscar uma nova forma de organização atentando para o aspecto de que a

pobreza e a degradação ambiental caminham paralelos é auspiciosa, a despeito de sua

vaguidade. As discussões sobre a crise ambiental tem evoluído em nível global no sentido que

mostra que a lógica da atual forma de organização do sistema econômico baseada em escolhas

do mercado voltadas apenas para o lucro financeiro é insuficiente para a melhoria das

condições de vida dos habitantes e do próprio planeta. O crescente número de pobres e de

desempregados é apenas mais uma face da insustentabilidade desse sistema (FOLADORI,

2001).

19 A ISO 14001 é uma norma de gerenciamento e não uma norma de produto ou de performance. É um processo de gerenciamento das atividades da companhia que têm impacto no ambiente. São utilizados processos para identificar todos os impactos ambientais, podendo ser utilizada em qualquer tipo de organização, industrial ou de serviço, de qualquer porte, de qualquer ramo de atividade. Além disso, a ISO 14001 reforça o melhoramento da proteção ambiental pelo uso de um único sistema de gerenciamento permeando todas as funções da organização. Enfim, é um processo que contém os elementos importantes do gerenciamento de uma empresa para identificar os aspectos significativos relativos a meio ambiente que a empresa pode influenciar e controlar.

Reverter tal situação é o grande desafio do Estado Contemporâneo. Para se atingir

uma sociedade mais sustentável, além de aumentar a renda dos menos favorecidos (pobres e

desempregados), deve-se mudar o consumismo mundial, altamente demandante de recursos

naturais, sob pena do planeta entrar rapidamente em colapso devido à exaustão destes recursos.

A gestão ambiental brasileira, além de colegiada e participativa, se organizou de

forma sistêmica para assegurar a sinergia e a integração absolutamente indispensáveis à atuação

dos três níveis de poder, levando em conta o regime presidencialista de governo e o sistema

federativo de organização do Estado.

Nesta busca incessante por soluções, surge o Direito Ambiental, procurando trazer ao mundo jurídico a solução de uma crise de paradigmas ideológicos acerca de progresso e desenvolvimento, cujo objetivo primordial resume-se à necessidade de se implementar, na prática, a proteção ambiental jurídica de uma maneira geral e, em especial, por meio do chamado Direito Ambiental (LEITE, 2000, p. 447).

Desde a Constituição Federal de 1988, dotada de um capítulo específico sobre meio

ambiente, a capacidade organizacional do Estado e a estrutura do Poder Executivo têm

evoluído de maneira expressiva, sobretudo diante da necessidade de aperfeiçoar o parelho

estatal para a implementação da moderna legislação ambiental que o País tem sido capaz de

construir. Nesse período foi criado o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente - IBAMA, o

Ministério do Meio Ambiente - MMA e Secretarias do Meio Ambiente dotadas de órgãos e

entidades executivas em praticamente todos os estado da Federação, além de um número

crescente de órgãos municipais.

A par disso, foram criadas inúmeras outras políticas de comando e controle com o

poder de frear a devastação ambiental. Como visto no capítulo antecedente, o Estado

Democrático de Direito evoluiu para atingir, também, as questões ambientais, sendo

reconhecido, inclusive, como Estado Democrático de Direito Ambiental.

Com vistas à questão ambiental, o Estado buscou lançar freios à degradação

ambiental, editando inúmeras normas legais, dentre as quais, podemos destacar, a título de

exemplificação, a Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/98), criminalizando o dano

ambiental. Contudo, em face da dimensão do Brasil, depositário do maior ativo ambiental do

planeta, não pode se contentar com políticas apenas restritivas, porque tão importante quando

reduzir o passivo ambiental deve ser o primordial objetivo de promover o uso sustentável dos

recursos naturais.

Juntamente com a fiscalização e a punição da degradação ambiental, tornou-se

fundamental trabalhar com outro conceito de gestão. Sem a sustentabilidade do

desenvolvimento, as medidas de comando e controle tenderão ao fracasso, como tem ocorrido

na maioria dos casos. A ênfase colocada nas estratégias de comando e controle, cuja aplicação

continua sendo imprescindível, mas exercida ainda fora de um contexto de sustentabilidade,

acabou estabelecendo um sistema de gestão de contorno cartorial, baseado quase que

exclusivamente no licenciamento ambiental.

Em outras palavras, a gestão se resume ao licenciamento ou à outorga, fazendo com

que o procedimento terminasse no ponto em que deveria estar começando: a expedição da

licença ou a concessão de outorga. Este é o maior desafio da gestão ambiental brasileira. Torna-

se necessário unificar o sistema de licenciamento, outorga, monitoramento e controle; trabalhar

com base de dados integrados e georreferenciados, com bancos e sistemas de informação que

conversem entre si.

Neste contexto, a gestão ambiental brasileira não pode continuar restrita às

atividades de controle e fiscalização, com vistas apenas à punição do agente ou, até mesmo,

pela reparação do dano ambiental. Torna-se necessário adotar uma abordagem integral da

política ambiental, tendo como prioridade o desenvolvimento sustentável e a inclusão da

variável ambiental no planejamento estratégico do País.

Esta nova concepção implica atualizar e concretizar o papel do Estado Democrático

de Direito Ambiental, dando continuidade a iniciativas que, embora embrionárias, já começam

a ser adotadas através da utilização de instrumento econômico que introduzem a

sustentabilidade nas políticas de desenvolvimento.

2.1.2 Alguns problemas ambientais

Os grandes problemas ambientais ultrapassam as fronteiras nacionais e são tratados

de forma global, pois afetam a vida de todos no planeta. Várias ações estão sendo levadas a

efeito em face destas degradações, dentre as quais, por exemplo, estão as barreiras comerciais

impostas à importação de produtos resultantes de processos prejudiciais ao meio ambiente;

incentivos e benefícios comerciais e tributários às empresas “ambientalmente” corretas, etc.

Isto traz à baila três amplas mudanças, ocorridas das últimas décadas, que

influenciaram significativamente as questões ambientais mundiais, no tocante a relação do

homem com o meio ambiente: em primeiro lugar, a explosão demográfica; em segundo, a

revolução científica e tecnológica, que aumentou o poder do homem de manipular a natureza e

sua capacidade de causar impacto sobre o mundo à sua volta; em terceiro, a mudança de

pensamento sobre a relação do homem com o meio ambiente, infelizmente para pior, à medida

que a humanidade cede às fortes pressões para recusar a responsabilidade pelas conseqüências

futuras de seus atos atuais (AL GORE, 1993).

Dias (2007, p. 7) relaciona os principais acidentes ambientais ocorridos no século

XX:

Ano Descrição

1947 Navio carregado de nitrato de amônia explode no Texas, causando mais de 500 mortes e deixando 3.000 feridos.

1956 Contaminação da baía de Minamata, Japão. Foram registrados casos de disfunções neurológicas em famílias de pescadores, gatos e aves. A contaminação acontecia desde 1939 devido a uma companhia química instalada às margens. Moradores morreram devido às altas concentrações de mercúrio, que causavam a chamada “doença de Minamata”.

1966 Na cidade de Feyzin, França, um vazamento de GLP causa a morte de 18 pessoas e deixa 65 intoxicadas.

1976 No dia 10 de julho, em Seveso, cidade italiana perto de Milão, a fábrica Hoffmann-La Roche liberou densa nuvem de um desfolhante conhecido como agente laranja, que, entre outras substâncias, continha dioxina, altamente venenosa. Em torno de 733 famílias foram retiradas da região.

1978 Na cidade de San Carlos, Espanha, caminhão-tanque carregado de propano explode causando 216 mortes e deixando mais de 200 feridos.

1984 No dia 2 de dezembro, um vazamento de 25 toneladas de isocianato de metila, ocorrido em Bhopal, Índia, causou a morte de 3.000 pessoas e a intoxicação de mais de 200.000. O acidente foi causado pelo vazamento de gás da Fábrica da Union Carbide.

1984 Em Sam Juanico, México, incêndio de GLP seguido de explosão causa 650 mortes e deixa 6.400 feridos.

1986 No dia 26 de abril, um acidente na usina de Chernobyl, na antiga URSS, causado pelo desligamento do sistema de refrigeração com o reator ainda em funcionamento, provocou um incêndio que durou uma semana, lançando na atmosfera um volume de radiação cerca de 30 vezes maior que o da bomba atômica de Hiroshima. A radiação espalhou-se, atingindo vários países europeus e até mesmo o Japão.

1986 Em Basiléia, Suíça, após o incêndio em uma indústria foram derramadas 30 toneladas de pesticidas no Rio Reno, causando a mortandade de peixes ao longo de 193 km.

1989 Na madrugada de 24 de março de 1989, o navio-tanque Exxon-Valdez, ao se desviar de um iceberg, bateu num recife e a seguir encalhou no estrito do Príncipe William, no Alasca. O rombo aberto no casco deixou vazar cerca de 44 milhões de litros de petróleo. O vazamento de óleo, o pior da história dos EUA, atingiu uma área de 260Km2, poluindo águas, ilhas e praias da região. Morreram milhares de animais – peixes, baleias e leões-marinhos.

Estas degradações ambientais influenciaram na criação de instrumentos ou

mecanismos capazes de contribuir na preservação do meio ambiente, voltados especialmente às

indústrias, potencialmente ofensivas ao ecossistema. A partir daí, foram criados os sistemas de

gestão, ambiental e ecológica.

Segundo Capra (1995), a Gestão Ambiental é uma corrente que vê o mundo como

uma máquina de natureza eminentemente antropocêntrica. A Gestão Ecológica, por sua vez,

seria uma linha de pensamento de caráter profundo, holístico e sistêmico, vendo o mundo como

um organismo vivo, reconhecendo o valor intrínseco de todos os seres vivos com uma

preocupação ambiental às gerações futuras, substituindo a ideologia do crescimento econômico

pela idéia da sustentabilidade ecológica.

Felizmente, a responsabilidade social das indústrias e empresas frente às questões

ambientais, como paradigma de sustentabilidade das reservas naturais, tem-se intensificado, se

apresentando como responsável pelas mudanças percebidas. A responsabilidade social

fundamenta-se na liberdade que a sociedade concede à empresa para existir, e o pagamento

dessa liberdade é a contribuição da empresa para com esta mesma sociedade.

Os empregados qualificados de uma empresa tendem a permanecer mais tempo nela

se esta apresentar uma imagem ambiental favorável. Trata-se então de uma ferramenta de

Recursos Humanos que favorece a manutenção de um bom quadro de pessoal. Existem

empresas, inclusive, que utilizam como propaganda o fato de proporcionarem treinamento em

questões ambientais a seus empregados, mostrando ao público que dispõe de pessoal

competente e responsável que cuida do meio ambiente (NORTH, 1997).

Segundo Maimon (1996), a qualidade ambiental está sendo cada vez mais exigida

das empresas industriais, nacionais ou internacionais, como pressuposto de qualidade de seus

produtos e serviços, porquanto estão sendo cada vez mais pressionadas por acionistas e público

externo, como das empresas que exportam ou dependem de empréstimos de bancos

internacionais.

No mesmo sentido, Tibor & Feldman (1996) afirmam que as empresas estão

colocando a Gestão Ambiental a serviço da eficiência operacional, além de diferenciar seus

produtos, ou gerando uma produção de melhor qualidade e oferecendo melhores serviços, ou

projetando produtos ecologicamente aceitáveis. Desta forma, vê-se que as empresas estão

contabilizando lucros onde antes só viam custos, ou seja, estão percebendo que maior qualidade

como um todo significa incluir Sistemas de Gestão Ambiental que garantam melhor qualidade

de vida a todos, seja interna ou externamente à empresa.

Estas ações de justificam a partir do conceito de que a atividade industrial é

responsável por expressiva parcela dos problemas globais incidentes no meio ambiente. Por tal

razão, as nações e a sociedade em geral buscam reverter o acelerado processo de degradação

dos recursos naturais em nível planetário, que também tem como causas a explosão

demográfica e as precárias condições de vida de grande parte da população, especialmente nos

países subdesenvolvidos.

Vários são os problemas ambientais que produzem impactos negativos à

humanidade, dentre os quais, o aquecimento global, a perda da biodiversidade, a destruição da

camada de ozônio, o efeito estufa, a escassez e poluição das águas, inclusive dos oceanos, a

superpopulação humana, a utilização e desperdício dos recursos naturais não renováveis, o uso

inadequado e a degradação dos solos agricultáveis, o consumismo exacerbado e o aumento

excessivo de lixo, etc.

Em vista destes problemas ambientais, surgem vários documentos internacionais,

reconhecendo o meio ambiente como essencial à sobrevivência do Planeta, conclamando a

participação da sociedade mundial à promoção de um mundo mais saudável, desenvolvido de

maneira sustentável, com ênfase às questões ambientais.

Paralelamente a isso, criou-se programas de melhoria de desempenho ambiental,

com ênfase na otimização dos recursos naturais, pelos mais diversos seguimentos industriais,

com vistas à preservação e conservação dos recursos hídricos, minimização dos resíduos e

lixos, das fontes de energia não renováveis, etc., denominado Programa de Melhoria de

Desempenho Ambiental - PMDA.

Por intermédio do PMDA, com ênfase na redução do desperdício e da poluição, as

empresas podem promover a melhoria dos seus processos produtivos e, conseqüentemente, do

uso racional dos recursos naturais, transformando-se, assim, em agentes multiplicadores das

boas práticas ambientais.

Dentre os recursos naturais, há que se destacar aqueles que são considerados não-

renováveis, formados em épocas geológicas anteriores à atual, como é o caso dos combustíveis

fósseis (petróleo), do carvão mineral e dos minérios em geral. O uso destes recursos deve ser

feito sempre com parcimônia, sendo que a procura de recursos alternativos faz-se necessário

para a substituição desta fonte de energia.

Quanto aos recursos naturais que se renovam naturalmente (solo, água, plantas e

animais, energia solar, eólica e de maré, entre outros) devem igualmente ser utilizados de forma

correta, sempre se respeitando o seu potencial de exploração, de acordo com a prática do uso

sustentável do recurso.

Antes, porém, de tratar os sistemas de gestão ambiental e, principalmente, a

tributação ambiental como instrumento de desempenho ambiental, faz-se necessário

exemplificar alguns problemas ambientais que demandam a gestão ambiental no Brasil e no

mundo.

2.1.2.1 Deficiência dos recursos hídricos

Mais da metade dos rios do mundo diminuíram seu fluxo e estão contaminados,

ameaçando a saúde das pessoas. Esses rios se encontram tanto em países pobres quanto ricos.

Os rios ainda sobreviventes são o Amazonas e o Congo. A Bacia do Amazonas é o maior filão

de água doce do planeta, correspondendo a 1/5 da água doce disponível. Não é à toa que há um

interesse mundial na proteção dessa região.

Apenas 2% da água do planeta é doce, sendo que 90% está no subsolo e nos pólos.

Cerca de 70% da água consumida mundialmente, incluindo a desviada dos rios e a bombeada

do subsolo, são utilizadas para irrigação. Aproximadamente 20% vão para a indústria e 10%

para as residências.

Atualmente a água já é uma ameaça a paz mundial, pois, muitos países da Ásia e do

Oriente Médio disputam recursos hídricos. Relatórios da ONU apontam que um bilhão de

pessoas não tem acesso a água tratada e com isso quatro milhões de crianças morrem devido a

doenças como o cólera e a malária (DIAS, 2000). A expectativa é de que nos próximos 25 anos

2,76 bilhões de pessoas sofrerão com a escassez de água.

Esta distribuição irregular da água, com o mau uso e a poluição dos recursos

hídricos, nos próximos anos, ocasionará o comprometimento da vida das futuras gerações, caso

não sejam combatidos imediatamente, sob pena de um colapso mundial, inviabilizando

sociedades e até mesmo nações. Além disto, não se pode olvidar que a água em quantidade e

qualidade não adequadas é fator de saúde pública, pois pode transmitir várias doenças.

O grande problema referente à questão da água é a sua crescente demanda, ao

mesmo tempo em que há o declínio de sua qualidade. A água doce é um recurso renovável

desde que seja usada de maneira adequada e cuidadosa, respeitando totalmente o ciclo

hidrológico. Ocorre que o crescimento populacional e a crescente demanda por energia e

alimentos estão acabando com os suprimentos de água doce (CORSON, 1996).

A água, embora seja um recurso natural renovável, é um recurso finito, dado que os

processos naturais de renovação (evaporação e evapotranspiração, condensação, precipitação e

filtragem no solo), em virtude da ação predatória do homem, em muitos lugares, estão sendo

mais lentos do que os processos humanos que promovem sua deterioração, ao passo que

processos artificiais de purificação da água servida são muito dispendiosos e onerosos.

A água, sendo essencial à vida, constitui um dos bens mais preciosos à disposição da humanidade. Por ser um bem já escasso em muitas regiões, requer racionalidade e parcimônia em sua utilização. A contaminação das águas é, portanto, uma das maiores preocupações dos ecologistas e de todos aqueles que necessitam utilizar a água como insumo em atividades econômicas. (VALLE, 2000, p. 32)

Note-se a necessidade de melhoria dos processos industriais que utilizam como

matéria-prima a água, como elemento de refrigeração, de geração de vapor e, sobretudo, como

lavagem de máquinas e equipamentos, as quais, muitas vezes, sofrem alterações em suas

características físico-químicas, tornando-se agente poluidor dos solos e dos mananciais.

A produção industrial, como cediço, consome água abundante e

desproporcionalmente. Logo, ao adotar um sistema de gestão ambiental, com ênfase à redução

da poluição e desperdícios, corroborado à otimização dos recursos naturais e,

conseqüentemente, dos recursos tecnológicos, as perdas serão mínimas, revertendo-se em

lucros.

A racionalização do uso da água nas atividades promovidas pelo homem é um primeiro passo para reduzir os riscos de contaminação hídrica. Se forem menores os volumes de água utilizados e descartados pelas atividades de mineração, agricultura, indústria e serviços, menores serão naturalmente as necessidades de tratamento e de seu recondicionamento às condições originais de pureza. Essa racionalização deve incorporar outros dois conceitos, além da minimização das quantidades utilizadas: o conceito da reutilização da água, que pode ser usada várias vezes antes de ser finalmente descartada, e o conceito da segregação de seus vários fluxos, não permitindo que se misturem, por exemplo, as águas pluviais com os esgotos sanitários e com águas de processos industriais. (VALLE, 2000, p. 32)

O futuro do sistema industrial mundial se molda às questões ambientais e, em

relação à água, propriamente, o tratamento dos efluentes líquidos e a redução da poluição dos

mananciais hídricos por substâncias químicas e tóxicas. Felizmente essa é uma realidade que

não para de crescer.

2.1.2.2 Fontes energéticas

Inicialmente, convém esclarecer que a geração de energia, essencialmente no

Brasil, onde as hidroelétricas respondem pela maior parcela da produção de energia, é

altamente impactante ao meio ambiente, além das dificuldades e dos custos crescentes para a

sua obtenção.

As hidroelétricas promovem impactos ambientais adversos, desde a construção até

o enchimento dos reservatórios, ocasionando a perda de biodiversidade e dos solos, acarretando

alterações significativas em termos sociais (remanejamento de comunidades inteiras),

econômicos e culturais.

A energia é essencial para a realização das mais diversas atividades humanas – tais

como transporte, aquecimento, processos industriais – e pode ser gerada a partir de fontes

renováveis ou não-renováveis de recursos.

Atualmente, a maior parte da energia utilizada, mais precisamente cerca de 88% da

energia comercial, provém dos combustíveis fósseis – petróleo, gás, carvão –, que não são

renováveis, pois são os restos de animais e vegetais que viveram há milhões de anos

(LOMBORG, 2002). Não bastasse esse elevado número, a Conferência Mundial de Energia,

realizada no ano de 1989, projetou um aumento de demanda da energia mundial de 75% em

torno do ano de 2020 – se o crescimento demográfico e o econômico global permanecerem

nesses níveis –, sendo que o fornecimento continuará a ser predominantemente de combustíveis

fósseis (PENNA, 1999).

De efeito, o homem, para o exercício de suas atividades, necessita cada vez mais de

energia e em quantidades cada vez maiores no processo de desenvolvimento, justificando-se,

principalmente, a partir do desenvolvimento tecnológico, sem que sejam avaliadas as

conseqüências.

A partir daí, a utilização de energia de maneira racional, como princípio de

sustentabilidade da própria energia que se utiliza e, também, como modo de diminuir o custo de

produção, se apresenta essencial à conservação do meio ambiente e, ao mesmo tempo,

promovendo o aumento dos lucros. O uso racional poderá evitar a construção de novas

barragens, que causam grandes impactos ambientais, apenas pela minimização dos

desperdícios.

Bjorn Lomborg (2002, p. 165-166) afirma:

Se a tecnologia permanecesse constante e continuássemos usando apenas combustíveis fósseis, um dia ficaríamos sem energia. Mas o fato é que a tecnologia não permanece constante e os combustíveis fósseis não são a nossa única ou principal fonte de energia a longo prazo. Primeiro, os dados históricos mostram que temos nos tornado cada vez mais exímios em encontrar, extrair e utilizar combustíveis fósseis, ultrapassando mesmo o aumento do consumo. Segundo, sabemos que a energia solar disponível excede de longe as nossas necessidades de energia, e ela provavelmente estará disponível a preços competitivos dentro de 50 anos.

Hamish McRae (1998) também defende que não há uma crise global de energia e

entende que, se há crise, é apenas em pontos específicos, configurando problemas regionais,

porquanto, segundo seu entendimento, à exceção do petróleo, existem carvão e gás em

quantidade, porque a maior parte da energia do mundo virá de combustíveis fósseis, pelo

menos a maior parte da energia do mundo virá de combustíveis fósseis pelo menos por mais 25

anos, e talvez por mais cem.

Pode-se economizar energia apenas reduzindo o desperdício, aumentando a

eficiência dos equipamentos ou utilizando energias naturais não impactantes, tais como a

energia solar ou eólica, as quais não promovem quaisquer tipos de degradação.

A otimização e conscientização na utilização de energia elétrica, com a utilização

de máquinas e equipamentos modernos, com melhor desempenho pela economia de energia,

corroborado a aplicação de programas institucionalizados, auxiliam o empresário a diminuir

seus custos operacionais, aumentando, conseqüentemente, sua competitividade e auxiliando a

conservação dos recursos naturais.

2.1.2.3 Desperdício de matéria-prima

Em relação às matérias-primas, seu uso, de maneira racional e equilibrada, sem

desperdício, pode aumentar sua eficiência, com o aumento da produção e redução dos seus

custos. Na construção civil, estima-se que cerca de 30% do material de construção utilizado em

uma obra é desperdiçado. Isto significa que, a cada três prédios que se constroem, pode-se

construir um quarto edifício, cujos custos de produção são repassados ao consumidor, onerando

significativamente a obra.

De igual sorte, são enormes os desperdícios na exploração da madeira, onde são

aproveitados, em alguns casos, apenas 20% do que foi originalmente extraído da floresta. Esse

processo produtivo não vai muito adiante à medida que existe concorrência e algumas empresas

passam a produzir com melhor qualidade e menor preço. Esse fator faz reduzir o uso ineficiente

da matéria-prima, pela necessidade de se baixar o preço de custo para se manter vivo no

negócio. Por outro lado, à medida que a matéria-prima escasseia, os custos se elevam e os

negócios podem inviabilizar-se.

Enfim, qualquer atividade humana, empresarial ou não, deve investir em melhoria

de desempenho e otimização dos recursos utilizados, essencialmente no tocante às sobras e

rejeitos, no afã de redução do desperdício de matéria-prima.

Além do desperdício de matéria-prima, propriamente dita, as sobras geradas por

uma empresa podem ser a matéria-prima de outro processo industrial. Pode-se desenvolver um

setor específico na própria unidade geradora ou vender a outras empresas. As matérias-primas

mais utilizadas e de maior percepção da população, tais como madeira, pneus, petróleo e

minérios, e aplicando-se procedimentos de sustentabilidade, não só redundarão em economia,

mas, principalmente, na redução dos impactos ambientais.

A grande maioria dos exemplos citados é constituída por produtos que são utilizados em residências, oficinas mecânicas, laboratórios e consultórios médicos, postos de serviço, tinturarias, oficinas de pintura, escritórios, hotéis, escolas, repartições públicas e estabelecimentos comerciais em geral. Por isso, o controle de sua disposição, mesmo que venha a ser regulamentado por lei, somente será eficaz se contar com a compreensão e a participação ativa de toda a sociedade. Deve-se ter em conta que até mesmo as grandes indústrias podem descartar esses resíduos, de acordo com a legislação atual, junto com seus resíduos comuns, gerados em seus escritórios, refeitórios etc. Esses produtos são, em grande parte, recuperáveis, ou contêm materiais nocivos que podem ser tecnicamente extraídos e reutilizados. É o caso das lâmpadas, pilhas e dos óleos lubrificantes, todos já tratados corretamente na maioria dos países industrializados. (VALLE, 2000, p. 30)

A par do desperdício de matéria-prima, não se pode olvidar a produção de resíduos,

resultantes de processos de diversas atividades da comunidade de origem, tais como industrial,

doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços, etc. Quanto maior a produção de

resíduos, maior o desperdício de matérias-primas e o potencial de poluição do meio ambiente.

Ademais, não se pode olvidar que, quanto maior o potencial de poluição, menor será o poder de

competição no setor produtivo, porquanto os resíduos são perdas nos processos.

Portanto, considerando que a geração de resíduos é inevitável, é importante que

tanto os empresários quanto a população em geral tenham a consciência do não-desperdício,

adotando medidas de fácil aplicação e que podem resultar em geração de emprego e renda,

assim como diminuição de custos.

2.1.2.4 Poluição

Outro ponto que merece comentário diz respeito à ausência ou deficiência dos

serviços de esgotamento sanitário, pois o acesso adequado a este sistema de saneamento é

essencial para controle e redução de doenças. Saneamento básico, associado a outras

informações ambientais e socioeconômicas, incluindo outros serviços de saneamento, saúde,

educação e renda, é um bom indicador universal de desenvolvimento sustentável, como

caracterização da qualidade de vida.

Juntamente ao saneamento básico, o acesso à água tratada e sua utilização de

maneira sustentável (sem desperdício) são fundamentais à melhoria das condições de saúde e

higiene da população. A falta de água e seu desperdício podem resultar na poluição do meio

ambiente e na perda da biodiversidade.

De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico - PNSB, realizada pelo

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, em meados do ano de 1989, a disposição

final de lixo nos municípios brasileiros se dividia em 76% em lixões; 13% em aterros

controlados e 10% em aterros sanitários; e, 1% passa por tratamento (compostagem, reciclagem

e incineração).

Segundo o IBGE, 76% do lixo é jogado a céu aberto sendo visível ao longo de

estradas e também é carregado para represas de abastecimento durante o período de chuvas.

Embora muito esteja sendo feito nesta área em nível mundial, ainda são poucos os materiais

aproveitados no Brasil, onde é estimada uma perda de cerca de quatro bilhões de dólares por

ano. Mas, há indícios de melhora no país onde se tem como melhor exemplo as latas de

alumínio, cuja produção é 63% reciclada (COZETTI, 2001). O lixo industrial apresenta índices

maiores de reciclagem. De acordo com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro

- FIRJAN, no estado do Rio de Janeiro 70% das indústrias reciclam seus dejetos (BRANDÃO,

2002).

Já no ano de 2000, quando o IBGE realizou a PNSB, felizmente, revelou uma

tendência de melhoria da situação de destinação final do lixo coletado no país nos últimos anos.

Em 2000, o lixo produzido diariamente no Brasil chegava a 125.281 toneladas, sendo que

47,1% era destinado a aterros sanitários, 22,3% a aterros controlados e apenas 30,5% a lixões,

ou seja, mais de 69% de todo o lixo coletado no Brasil estaria tendo um destino final adequado,

em aterros sanitários e/ou controlados.

Todavia, em número de municípios, o resultado não é tão favorável: 63,6%

utilizavam lixões e 32,2%, aterros adequados (13,8% sanitários, 18,4% aterros controlados),

sendo que 5% não informou para onde vão seus resíduos.

Os números da pesquisa permitem, ainda, uma estimativa sobre a quantidade

coletada de lixo diariamente: nas cidades com até 200.000 habitantes, são recolhidos de 450 a

700 gramas por habitante; nas cidades com mais de 200 mil habitantes, essa quantidade

aumenta para a faixa entre 800 e 1.200 gramas por habitante.

Estes indicadores, por si só, são suficientes para demonstrar a relação entre a

quantidade de lixo produzido e quantidade de lixo coletado e, conseqüentemente, como

informação capaz de proteger o meio ambiente, pois resíduos não coletados ou dispostos em

locais inadequados acarretam a proliferação de vetores de doenças e, ainda, podem contaminar,

principalmente, o solo e os diversos corpos d’água existentes.

O destino adequado do lixo é essencialmente à proteção ambiental, disposição final

do lixo em aterros sanitários, sua destinação a estações de triagem, reciclagem e compostagem,

bem como sua incineração através de equipamentos e procedimentos próprios para este fim.

Por destino final inadequado compreende-se seu lançamento, em bruto, em vazadouros a céu

aberto, vazadouros em áreas alagadas, locais não fixos e outros destinos. A disposição do lixo

em aterros controlados também foi considerada inadequada, principalmente pelo potencial

poluidor representado pelo chorume, que não é controlado neste tipo de destino, embora se

apresente como uma forma menos poluidora.

O acesso ao serviço de coleta de lixo é fundamental para a proteção das condições

de saúde, através do controle e redução de vetores e, por conseguinte, das doenças a eles

relacionadas. A coleta do lixo e a disposição em lugares adequados traz significativa melhoria

para a qualidade ambiental do entorno imediato das áreas beneficiadas, porém, ainda não é

capaz de eliminar efeitos ambientais nocivos decorrentes da inadequada destinação do lixo, tais

como a poluição do solo e das águas, através do chorume. O tratamento do lixo coletado é

condição essencial para a preservação da qualidade ambiental e da saúde da população.

A contaminação dos solos é hoje um tema de grande relevância nas grandes aglomerações urbanas pela dificuldade de disposição adequada dos seus resíduos, gerados em quantidades crescentes. Essa contaminação é agravada pela proliferação dos chamados lixões, aterros clandestinos e vazadouros, e pela saturação dos aterros sanitários, operados muitas vezes além de suas capacidades de projeto. (VALLE, 2000, p. 35)

Associado a outras informações ambientais e socioeconômicas, incluindo serviços

de abastecimento d’água, saneamento ambiental, saúde, educação e renda, é um bom indicador

de desenvolvimento humano. Trata-se de indicador muito importante, tanto para a

caracterização básica da qualidade de vida da população residente num território e das

atividades usuárias dos solos e das águas dos corpos receptores, quanto para o

acompanhamento das políticas públicas de saneamento básico e ambiental.

A dimensão ambiental dos indicadores de desenvolvimento sustentável diz respeito

ao uso dos recursos naturais e à degradação do ambiental, e está relacionada aos objetivos de

preservação e conservação do meio ambiente, considerados fundamentais ao benefício das

gerações futuras. Estas questões aparecem organizadas nos temas atmosfera, terra, oceanos,

mares e áreas costeiras, biodiversidade e saneamento.

A poluição produz efeitos degradantes ao meio ambiente. Dentre os quais, pode-se

destacar, os danos à camada de ozônio, que absorve a maior parte dos raios ultravioleta (UV-

B), nocivos do ponto de vista biológico, provocando profundos efeitos sobre a saúde humana,

dos animais, das plantas e dos microorganismos.

Além disso, os raios ultravioleta são capazes de afetar a vida marinha, os ciclos

biogeoquímicos e a qualidade do ar. A eliminação de substâncias destruidoras da camada de

ozônio e sua substituição por substâncias menos nocivas conduzirão à reconstituição da camada

de ozônio e à utilização de produtos menos agressivos ao meio ambiente.

Outro ponto impactante ao meio ambiente se refere à poluição do ar, principalmente

nos grandes centros urbanos e industriais, com conseqüências dramáticas sobre a saúde da

população, especialmente respiratórias. Automóveis e indústrias são as principais fontes de

poluição atmosférica dos centros urbanos.

A contaminação do ar pode ocorrer a partir de fontes fixas, como as chaminés das indústrias, ou de fontes móveis, representadas por veículos, obras de construção civil, atividades de mineração etc. As condições meteorológicas e a topografia exercem grande influência sobre a intensidade e as características desse tipo de contaminação. Velocidade e direção dos ventos, índices pluviométricos, variações de pressão e outros fatores podem contribuir para reduzir ou aumentar os efeitos da presença de contaminantes no ar em uma dada região. É a emissão de poluentes, nos seus vários tipos, entretanto, que vai definir as características do ar de uma área em um determinado momento, em função de suas concentrações, composições químicas, toxicidade etc. (VALLE, 2000, p. 36)

A par disso, não se pode olvidar o aumento gradativo da ministração de agrotóxicos

na produção de alimentos, como forma de controle de pragas, doenças e ervas daninhas.

Agrotóxicos podem ser persistentes, móveis e tóxicos no solo, na água e no ar. Tendem a se

acumular no solo e na biota, e seus resíduos podem chegar às águas de superfície por

escoamento, e às subterrâneas por lixiviação.

Elas têm sido a forma mais usada para a conversão de florestas em áreas

agropastoris. Porém, a freqüência de ocorrência de focos de calor pode ser utilizada como

indicador do avanço das atividades agropecuárias e áreas antrópicas sobre as regiões com

vegetação nativa, desde que associados a outros indicadores.

2.2 Sistema de gestão ambiental

A saúde e o bem-estar da população e do meio ambiente dependem, exatamente, do

que as pessoas fazem hoje e do que farão amanhã. O homem, para sobreviver, depende do meio

ambiente. Se a degradação ambiental continuar, dentro de poucos anos a questão ambiental será

irreversível e a população mundial sofrerá as conseqüências. Desta forma, faz-se necessário

repensar o modo de vida, trabalho e lazer da humanidade, ou seja, o modo de produção e

consumo.

A indústria pode ser a fonte de alguns dos mais sérios problemas ambientais locais

e internacionais, particularmente daqueles relacionados à poluição do ar, da água e do solo, mas

não é a única, porquanto o próprio consumo humano também gera conseqüências degradantes

ao meio ambiente. Esses problemas podem ter impactos imediatos ou graduais na saúde

humana, principalmente porque a poluição pode viajar pelo ar, rios e lençóis subterrâneos de

um país para outro, causando sérias mudanças na qualidade de vida das pessoas.

A partir da década de 1960 surgem os primeiros movimentos sociais pela

preservação do meio ambiente cujo impacto sobre a opinião pública foi significativa. A partir

de então, o tema ambiental tem sido fortemente debatido, sob a análise de muitas áreas do

conhecimento: Biologia, Química, Geografia, Economia, Engenharia e, muito mais fortemente

a partir da década de 1990, Gestão (MOURA, 2000).

Segundo Donaire (1999, p.15), "no princípio as organizações precisavam

preocupar-se apenas com a eficiência dos sistemas produtivos", gerar um lucro cada vez maior,

padronizar cada dia mais o desempenho dos funcionários. Essa visão industrial que as

organizações idealizavam foi tornando-se, ao longo dos anos, cada vez mais enfraquecida.

A comunidade empresarial se deu conta de que os padrões de produção e consumo

correntes são insustentáveis. Ao mesmo tempo entendeu que, para manterem-se funcionando,

suas empresas terão que integrar componentes ambientais às suas estratégias comerciais e seu

planejamento de longo prazo. Isto é essencial para aproveitar oportunidades de negócios,

competir com outras organizações que levem o meio ambiente em consideração, e oferecer

mais informações sobre o seu desempenho ambiental, melhorando as expectativas das partes

interessadas, como acionistas, fornecedores, consumidores, entre outros.

Uma estratégia ambiental adequada, expressa numa política ambiental, obviamente,

é o marco inicial para que as empresas integrem seus aspectos ambientais às suas operações.

Felizmente, parte para essa corrente, sendo que a bandeira ambiental tem sido levantada por

inúmeras empresas, cuja produção leva em conta a proteção do meio ambiente, ao menos de

forma sustentável.

As ferramentas para assegurar atenção sistemática e atingir a política ambiental e os

objetivos ambientais incluem, entre outras, sistema de gestão ambiental e auditorias ambientais,

as quais auxiliam no controle e aperfeiçoamento do desempenho ambiental de acordo com a

política ambiental da companhia.

Ferramentas adicionais também estão à disposição, como metodologias para

avaliação do ciclo de vida dos produtos, programas de rotulagem ambiental e métodos para

avaliação de desempenho. Esses instrumentos têm sido reputados, em vários países, como

convenientes para que as organizações adotem um sistema de gestão ambiental e o usem com

livre arbítrio, sem pressão legislativa.

Ao mesmo tempo, organizações nacionais e internacionais vêm adotando esses

instrumentos como ferramentas úteis. Ao aplicar esses instrumentos, muitas companhias e suas

partes interessadas têm demandado maior clareza de detalhes para elaborar e implementar

sistemas de gestão ambiental e entender os conceitos de auditorias desses sistemas.

Surgiu a necessidade de um campo de atuação nivelado em relação a esses

aspectos, que, por sua vez, requer um novo aprendizado não só dos dirigentes empresariais,

mas de todos os atores do processo produtivo (colaboradores internos, fornecedores,

terceirizados, vendedores e compradores).

2.2.1 A origem do sistema de gestão ambiental

Na Europa, a partir da década de 70, iniciou-se a discussão sobre alternativas para

reduzir os efeitos das atividades industrias sobre o meio ambiente. O assunto foi se tornado

ponto de destaque na pauta de governos de muitos países. A primeira discussão, em nível

mundial, das questões ambientais foi marcada pela Conferência de Estocolmo, em 1972.

Desde a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, realizada em

Estocolmo em 1972, o meio ambiente, e em especial sua relação com o setor industrial,

transformou-se em tema cada vez mais importante de política pública e de estratégia de

negócios.

Mas a Conferência de Estocolmo foi somente o "estopim" para a grande evolução

comportamental que estava por surgir. A partir desse momento as práticas ambientais teriam

que fazer parte das responsabilidades sociais das empresas.

Nos anos 80, os conceitos de proteção ao meio-ambiente começaram a se expandir.

Alguns acidentes (como em Bhopal e Alasca) contribuíram para as mudanças nas políticas

oficiais de meio-ambiente e no comportamento de parte da sociedade. Nesta década, surgiram,

em alguns países, os partidos “verdes”, defensores dos seres vivos e do meio em que vivem.

A discussão sobre o meio-ambiente começou a deixar de ser um tema isolado para

se incorporar em vários setores, principalmente na indústria química (indústrias petroquímicas,

indústrias de celulose e papel, indústrias de alimentos). As questões de meio-ambiente,

segurança e saúde passavam a ser tratadas em nível de assessoria especializada dentro das

empresas.

Peter Drucker (1989), sobre o tema, lecionava que cada vez mais a consciência

ecológica e as políticas ecológicas deveriam transcender as fronteiras nacionais, porquanto as

maiores ameaças ao meio ambiente são globais. Impedir a destruição do ecossistema da qual

depende a sobrevivência da humanidade é, portanto, uma tarefa global comun. Enfrentá-la

como se fosse um problema nacional é uma atitude insuficiente, embora, obviamente, uma boa

dose de implementação nacional, e até mesmo local, será necessária.

As Nações entram com força nessa evolução em 1992 com a Conferência das

Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - CNUMAD, denominada

informalmente como RIO 92. A conferência representou o auge do movimento a favor da

sustentabilidade ambiental.

Como resultado direto dessa conferência, dentre outros aspectos, foi criado o

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA. Foi também nessa época que

grande parte dos países industrializados criou ministérios, secretarias e agências de meio

ambiente.

Outro resultado da Conferência de Estocolmo foi a criação da Comissão Mundial

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. O relatório publicado pela comissão em 1987,

conhecido também por Relatório Brundtland, promoveu importantes considerações sobre a

matéria ambiental. Além de consagrar a expressão “desenvolvimento sustentável”, o relatório

estabeleceu, com muita clareza, o importante papel que as empresas devem ter na gestão

ambiental.

De igual sorte, foi o responsável pela organização da Conferência das Nações

Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, em junho de 1992, e pelo

reconhecimento da importância da gestão ambiental corporativa em nível intergovernamental.

Até final da década de 80 e início da de 90, a gestão ambiental era em grande parte tratada caso a caso. As melhorias ambientais eram resultado de regulamentações com base no desempenho, após uma série de questões mais ou menos distintas. Isso é especialmente válido na América do Norte. Por exemplo, com a identificação de substâncias perigosas, aprovou-se uma legislação que limita o uso e o descarte ou determina como tais substâncias devem ser manipuladas ou controladas. Na maioria dos casos, as organizações observaram essa legislação, administrando-a como item de custo nos negócios. O ambiente foi tratado caso a caso, geralmente por equipe técnica e jurídica responsável pelas questões regulamentadoras (HARRINGTON, 2001, p. 27-28).

Quando entenderam melhor os efeitos da gestão do meio ambiente, os agentes

reguladores começaram a considerar o meio ambiente de forma sistemática, integrando as

questões ambientais a um processo mais amplo de tomada de decisão, as empresas começaram

a tratá-las como questões de natureza estratégica.

As empresas têm adotado uma série de respostas aos desafios ambientais, com a

integração da gestão ambiental na administração geral da empresa por meio do sistema de

gestão ambiental. Durante os últimos vinte anos a adoção de sistemas de gestão ambiental pelas

empresas tem sido estimulada pelas entidades governamentais e não-governamentais.

Isso começou a ocorrer num período em que as empresas, cada vez mais, se

dirigiam para os mercados internacionais. Considerando-se que o nível de legislação ambiental

e a simples, porém importante, presença desta legislação variam significativamente de país para

país, fica claro para muitas empresas que administrar as questões ambientais como item de

custo nos negócios colocava-as em desvantagem competitiva.

Foi necessário encontrar maneiras para mitigar o custo e transformar a desvantagem

em vantagem. As organizações descobriram logo que isso não era, na verdade, difícil de

alcançar. O importante era reconhecer que a gestão ambiental tinha de ascender na escala das

prioridades corporativas.

O aumento do custo das obrigações ambientais levou companhias na América do

Norte e na Europa a desenvolverem auditorias ambientais como ferramentas de gerenciamento,

para identificar problemas ambientais e para monitorar o desempenho ambiental da companhia,

de maneira similar à do balanço financeiro, usado para medir o desempenho financeiro.

Dessa nova postura e conscientização, surgiu o conceito de Sistema de

Gerenciamento Ambiental, formalizado pela British Standard Institution na norma BS 7750 -

Specification for Environmental Management Systems20. O sistema proposto para o

gerenciamento ambiental está baseado em conceitos de gestão já definidos na norma BS 7750,

que deu origem à série de normas ISO 900021. Os conceitos de gestão da qualidade podem ser

ampliados a fim de englobar as questões ambientais. As normas da série ISO 1400022 para

Sistemas de Gestão Ambiental estão baseadas na BS 7750 e, em nível mundial, estão sendo

utilizadas para a finalidade de certificação do sistema de gerenciamento ambiental de

organizações. Estas normas não estabelecem nenhum requisito de desempenho ambiental, além

da conformidade às legislações ambientais aplicáveis e o compromisso com a melhoria

contínua, mas contribuem para o estabelecimento de um sistema de gerenciamento ambiental.

Além disso, os conceitos do Controle de Qualidade Total - CQT, apesar de

originalmente direcionados na elaboração e aperfeiçoamento da eficiência dos processos

comerciais, têm sido cada vez mais aplicados nas questões de gestão ambiental.

Com efeito, a auditoria ambiental foi desenvolvida nos anos 70 e 80 em resposta ao

crescente custo de não cumprir a legislação de saúde e segurança ambiental em países

altamente regulados, como EUA, Canadá e Europa Ocidental. Uma auditoria de conformidade

monitora o cumprimento das leis e regulamentações e é utilizada para identificar as

20 A norma BS 7750 foi emitida em 1994 no Reino Unido com o objetivo de fornecer para as organizações uma ferramenta que garanta o cumprimento de compromissos assumidos na política ambiental corporativa. É uma norma de certificação voluntária que especifica requisitos para o sistema de gerenciamento ambiental. Segundo a BS 7750, a organização deve definir procedimentos para registrar todos os requisitos e códigos legislativos e regulatórios aplicáveis aos aspectos ambientais de suas atividades, produtos e serviços. Entretanto, esta não estabelece critérios para o desempenho ambiental, sendo assim, torna-se aplicável a qualquer tipo e estrutura de organização.21 A série ISO 9000 é uma concentração de normas que formam um modelo de gestão da qualidade para organizações que podem, se desejarem, certificar seus sistemas de gestão através de organismos de certificação.22 A série de normas ISO 14000 é uma contribuição da International Organization for Standardization (ISO) ao campo do gerenciamento ambiental. Esta série de normas possui duas abordagens de avaliação: avaliação da empresa e avaliação do produto.

vulnerabilidades ambientais e os problemas de um local ou empresa antes que qualquer

investimento seja feito.

Os resultados desta auditoria de pré-aquisição podem afetar o nível de

investimento, o preço de compra, futuros investimentos e custos de operação relacionados ao

local, ou até a decisão final sobre o investimento. Hodiernamente, o termo auditoria ambiental,

muitas vezes, é utilizado como sinônimo de avaliação ambiental ou auditoria do sistema de

gestão ambiental. A Avaliação Ambiental é realizada para identificar riscos, problemas e

oportunidades ambientais quando o sistema de gestão ambiental está sendo aplicado.

De efeito, a década de 90 caracteriza-se pela globalização dos conceitos. No início

da década houve maior divulgação das normas que apresentam requisitos para sistema de

gerenciamento da qualidade (maior divulgação das normas da série ISO 9000). Também neste

início dos anos 90, alguns encontros e conferências internacionais, conforme abaixo, têm

pautado os problemas ambientais como relevantes:

• Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (RIO 92)23 (1992 - Rio de Janeiro);

• Conferência Mundial sobre Direitos Humanos (1993 - Viena);

• Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (1994 - Cairo);

• Encontro Mundial sobre Desenvolvimento Social (1995 - Copenhagen);

• Conferência sobre os Assentamentos Humanos (Habitat II)24(1996 - Istambul).

O setor industrial começa também a considerar o enfoque global no que tange a

proteção ambiental. A indústria é responsável pelos efeitos ambientais de seus processos e

produtos (desde a obtenção da matéria-prima até a disposição final dos resíduos).

Nos últimos anos tem crescido a preocupação da sociedade com o meio-ambiente,

outros requisitos de “clientes” da organização vêm sendo incorporados ao negócio principal.

As empresas, cujos processos produtivos possuem impacto ambiental mais significativo e que

23 O plano de ação estabelecido durante a RIO 92 foi a Agenda 21. É um plano de ação que abrange diversos setores da sociedade em seus 4 capítulos: 1. Dimensões econômicas e sociais (cooperação internacional, combate à pobreza, mudança nos padrões de consumo, dinâmica populacional, integração meio-ambiente e desenvolvimento, etc.) 2. Conservação e gerenciamento dos recursos para o desenvolvimento (proteção dos recursos naturais e gestão ecologicamente apropriada dos resíduos das atividades humanas) 3. Fortalecimento do papel dos principais grupos sociais (mulheres, crianças e jovens, povos nativos, ONGs, trabalhadores, empresários, comunidades científica, agricultores, etc.) 4. Meios de implementação (recursos financeiros, tecnologia, educação, capacitação, informação e arranjo institucional internacional, etc.) 24 Na conferência de Istambul foi elaborada a Agenda do Habitat, seu conteúdo é o seguinte: 1. Habitação adequada para todos; 2. Desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos em um mundo em processo de urbanização; 3. Capacitação e desenvolvimento institucional; 4. Cooperação e coordenação internacionais; 5. Implementação da Agenda do Habitat (aplicação nos níveis nacionais, internacionais; autoridades locais e sociedade civil e avaliação dos resultados).

sofreram ações mais contundentes dos órgãos de controle ambiental, aceleraram o processos de

adequação do sistema de gerenciamento ambiental existente de acordo com a legislação

vigente. Paralelamente, e ainda em processo de divulgação no Brasil, as normas da série ISO

14000 atentam para a necessidade de um Sistema de Gerenciamento Ambiental com a

determinação de metas e objetivos (assim como a revisão destes) pela organização. Este

sistema, adotado pela organização, deve ter como objetivos atender as exigências legais e

definir e manter sua vantagem competitiva.

O termo gestão (ou gerenciamento) ambiental engloba um conjunto de rotinas e

procedimentos que permite a uma organização administrar adequadamente as relações entre

suas atividades e o meio ambiente que as abriga, atentando para as expectativas das partes

interessadas (REIS, 1996).

Para Backer (1995), gestão ambiental é uma estratégia de negociação permanente,

na qual os objetivos dos grupos e das pessoas com interesses parcialmente opostos, tanto dentro

como fora da empresa, devem ser analisados, pesados e se possível relacionados a um modelo

de equilíbrio do ecossistema, que deve ser forjado pelo responsável da empresa, em pessoa.

Para tanto, é necessária uma ferramenta de análise e síntese que lhe permita identificar as

prioridades da sua política e os objetivos ecologistas que ele pode ou quer estabelecer.

O Sistema de Gestão Ambiental indicado nas normas ISO 14000 baseia-se no

aprimoramento contínuo com estabelecimento de objetivos e metas, revisão destes e ações

preventivas e corretivas para acidentes e emergências. Levando, assim, a organização a um

processo de aperfeiçoamento de suas relações com o meio ambiente. Não existe inconsistências

com a série ISO 9000, já que ambas baseiam-se na mesma filosofia (REIS, 1996).

2.2.2 Sistema de gestão ambiental

Como já dito, diversas organizações, preocupadas com a questão ambiental, na

busca de um desempenho ambiental correto, controlando os impactos de suas atividades,

produtos ou serviços no meio ambiente, levando em consideração sua política e seus objetivos

ambientais, buscou instituir medidas destinadas a estimular a proteção ao meio ambiente.

Segundo Barbieri (2004), os termos administração, gestão do meio ambiente, ou

simplesmente gestão ambiental são entendidos como as diretrizes e as atividades

administrativas e operacionais, tais como, planejamento, direção, controle, alocação de recursos

e outras realizadas com o objetivo de obter efeitos positivos sobre o meio ambiente, quer

reduzindo ou eliminando os danos ou problemas causados pelas ações humanas, quer evitando

que eles surjam.

Estas organizações têm efetuado análises ou auditorias ambientais a fim de avaliar

seu desempenho ambiental. No entanto, por si sós, tais análises e auditorias podem não ser

suficientes para proporcionar a uma organização a garantia de que seu desempenho não apenas

atende, mas continuará a atender aos requisitos legais e aos de sua própria política. Para que

sejam eficazes, é necessário que esses procedimentos sejam conduzidos dentro de um sistema

de gestão estruturado e integrado ao conjunto das atividades de gestão.

As Normas Internacionais de gestão ambiental têm por objetivo prover às

organizações os elementos de um sistema de gestão ambiental eficaz, passível de integração

com outros requisitos de gestão, de forma a auxiliá-las a alcançar seus objetivos ambientais e

econômicos. Este sistema permite avaliar a eficácia dos procedimentos destinados à definição

de uma política ambiental sustentável.

Convém observar, outrossim, que estas normas não estabelecem requisitos

absolutos para o desempenho ambiental além do comprometimento, expresso na política, de

atender à legislação e regulamentos aplicáveis e com a melhoria contínua. Assim, duas

organizações que desenvolvam atividades similares, mas que apresentem níveis diferentes de

desempenho ambiental, podem, ambas, atender aos seus requisitos.

A adoção e implementação, de forma sistemática, de um conjunto de técnicas de

gestão ambiental pode contribuir para a obtenção de resultados ótimos para todas as partes

interessadas, porém, não garantirá todos os resultados ambientais almejados. Para atingir tais

objetivos ambientais, convém que o sistema de gestão ambiental estimule as organizações a

considerarem a implementação da melhor tecnologia disponível, quando apropriado e

economicamente exeqüível. Além disso, é recomendado que a relação custo/benefício de tal

tecnologia seja integralmente levada em consideração.

Esta norma ambiental compartilha princípios comuns de sistemas de gestão com a

série de Normas NBR ISO 9000 para sistemas da qualidade. As organizações podem decidir

utilizar um sistema de gestão existente, coerente com a série NBR ISO 9000, como base para

seu sistema de gestão ambiental. Enquanto os sistemas de gestão da qualidade tratam das

necessidades dos clientes, os sistemas de gestão ambiental atendem às necessidades de um

vasto conjunto de partes interessadas e às crescentes necessidades da sociedade sobre proteção

ambiental.

Os sistemas de gestão ambiental podem ajudar dirigentes de organizações a

abordarem questões ambientais sistematicamente e a integrarem o cuidado ambiental como

uma parte normal de suas operações e estratégia comercial. Além da existência de inúmeros

requisitos legais sobre a questão ambiental, seu cumprimento é obrigatório, independentemente

da existência de sistemas de gestão.

Um sistema de gestão ambiental (SGA) requer a formulação de diretrizes, definição de objetivos, coordenação de atividades e avaliação de resultados. Também é necessário o envolvimento de diferentes segmentos da empresa para tratar das questões ambientais de modo integrado com as demais atividades corporativas. Um dos benefícios da criação de um SGA é a possibilidade de obter melhores resultados com menos recursos em decorrência de ações planejadas e coordenadas (BARBIERI, 2004, p. 137).

Destarte, além de ganhos financeiros, porquanto evita multas e passivos ambientais,

bem como uma maior transparência e confiança junto aos órgãos fiscalizadores e gestores de

meio ambiente, não há dúvidas acerca da melhoria da imagem da empresa frente aos próprios

consumidores.

Segundo Maimon (1996), pesquisas revelam que medidas de gestão ambiental

alteram a imagem da empresa para fins institucionais, e estão se constituindo cada vez mais

como prioridades em suas etapas futuras de gestão empresarial e de investimentos financeiros

nas empresas brasileiras. Exemplos recentes de desastres ecológicos envolvendo a maior

empresa do Brasil e uma das maiores do mundo do setor petrolífero, a Petrobrás, provocam

mudanças de estratégias e de sua alta administração, visando torná-la uma empresa de

excelência em gestão ambiental integrada.

A existência de um sistema de gestão ambiental está se tornando uma necessidade

às industriais, seja no tocante à proteção ambiental ou, até mesmo, em virtude do aumento da

conscientização da comunidade sobre o meio ambiente, além das exigências comerciais,

internas ou externas, bem como evitando-se risco de acidentes resultando em publicidade

negativa e conseqüente prejuízo à imagem da organização.

Diante dessa abordagem, as questões ambientais passaram a ser relacionadas

diretamente com o processo produtivo. A poluição dos recursos naturais, através da geração de

resíduos e emissões, representa desperdício de insumos e matérias-primas, além da perda de

competitividade, frente à conscientização ambiental mundial.

Assim, surgiram as normas internacionais, principalmente as da série ISO14000,

onde estão estabelecidos requisitos para implementação de sistemas de gestão ambiental nas

empresas. Esses requisitos passaram a ter importância no comércio internacional, fazendo com

que grandes empresas exportadoras passassem a implementar estes sistemas de gestão. As

pequenas empresas fornecedoras passaram também a sofrer exigências quanto à gestão dos seus

aspectos ambientais.

A norma ISO 14000 define Sistema de Gestão Ambiental - SGA como “a estrutura

organizacional, as responsabilidades, práticas, procedimentos, processos e recursos para

implementar e manter a gestão ambiental” (ISO 14000, 1996). Pode-se interpretar como

atuação integrada da todas as atividades da empresa com a política ambiental.

A Organização Internacional para Normalização (ISO) é uma fundação mundial

composta por 130 membros de entidades nacionais de normalização, tendo um membro de cada

país associado. É uma organização não-governamental criada em 1947, sediada na Suíça, cuja

missão é promover o desenvolvimento da normalização mundial, com o objetivo de facilitar o

comércio internacional de bens e serviços e desenvolver a cooperação de atividades científicas,

tecnológicas e econômicas. O trabalho da ISO resulta em consensos internacionais, os quais são

publicados como normas e outros documentos internacionais (SANTOS, 2006).

Alexander (1996) salienta a definição de Sistema de Gerenciamento Ambiental -

SGA como parte do sistema global de gerenciamento que inclui estrutura organizacional,

atividades de planejamento, responsabilidades, práticas, procedimentos, processos e recursos

para desenvolvimento, implementação, revisão e manutenção da política ambiental.

Política ambiental é definida na ISO14001 como uma declaração da organização de

suas intenções e princípios em relação ao desempenho ambiental global, que provê uma

estrutura para ação a para o estabelecimento de objetivos e metas ambientais. A administração

da empresa deve definir sua política ambiental e assegurar que esta contempla o

comprometimento com a melhoria contínua e com a prevenção da poluição (HAKLIK, 1997).

Desta forma, a implementação de procedimentos de gestão ambiental é fundamental

para que as empresas ganhem competitividade, tanto para a sua sobrevivência no mercado

global, quanto para controle dos aspectos ambientais, garantindo a sustentabilidade do processo

de desenvolvimento e, conseqüentemente, a melhoria da qualidade ambiental e de vida da

população.

A implantação de Sistema de Gestão Ambiental numa empresa garante a redução

de cargas poluidoras geradas, porque envolve a revisão do processo produtivo com vistas à

melhoria contínua do desempenho ambiental da organização, resultando em redução de

desperdícios de matérias-primas e insumos e das emissões de poluentes e resíduos. A

certificação desses sistemas é um mecanismo que permite ser formalizada a internalização dos

sistemas e dos instrumentos previstos nas políticas ambientais das organizações.

Em outras palavras, esta certificação significa que o Sistema de Gerenciamento

Ambiental da Empresa foi avaliado por uma entidade independente, reconhecida por um

organismo nacional de acreditação25, certificando que a empresa está de acordo com os

requisitos da norma ISO 14001. O certificado tem validade de três anos, podendo ser renovado.

Além disso, a cada seis meses o sistema é auditado para verificar se ele continua a atender aos

requisitos da norma. O certificado poderá não ser revalidado se a empresa deixar de cumprir os

requisitos.

2.2.3 Elementos básicos do sistema de gestão ambiental

Os Sistemas de Gestão Ambiental serão diferentes para diferentes tipos de

organizações, dependendo da natureza, tamanho e complexidade das atividades, produtos e

serviços de cada uma. Os elementos básicos do sistema de gestão ambiental incluem,

principalmente, uma política ambiental expressando o compromisso da direção da empresa de

incorporar a gestão ambiental.

Compreende-se a política ambiental como sendo uma declaração pública das

intenções e princípios de ação da empresa em relação ao meio ambiente. A declaração deve

orientar a definição dos objetivos gerais que a organização quer alcançar.

25 Acreditação é um procedimento pelo qual uma autoridade nacional dá reconhecimento formal de que uma entidade é competente para conceder a certificação. No Brasil o INMETRO é o órgão acreditador.

Um programa ambiental define as responsabilidades dos colaboradores internos e

aloca os recursos humanos e financeiros necessários para a sua implementação. Além disso, o

programa deve levar em consideração os aspectos ambientais da organização, uma visão geral

das exigências legais e outros requisitos aplicáveis, construindo uma estrutura organizacional

estabelecendo tarefas, delegando funções e definindo responsabilidades para implementar as

ações necessárias.

A integração da gestão ambiental às atividades industriais inclui procedimentos

para incorporar as medidas ambientais em outros aspectos das operações da empresa, tais como

a saúde e segurança ocupacional, compras, desenvolvimento de produtos, associações e

aquisições, marketing, finanças, etc.

Os procedimentos ambientais abrangem diversos setores, tais como controles

operacionais, cálculo de riscos e planos de ação de emergência, evitando possíveis catástrofes,

monitoramento, medição e manutenção de registros para documentar e monitorar os resultados

de ações e programas específicos, assim como os efeitos globais das melhorias ambientais e,

principalmente, ações corretivas e preventivas para eliminar causas reais ou potenciais de não-

cumprimento dos objetivos, metas, critérios e especificações.

O sistema de gestão ambiental, em termos funcionais, afeta todas as atividades

comerciais produtivas e administrativas da empresa, controlando a poluição e produção mais

limpa, englobando, também, questões protetivas relacionadas ao trabalhador, no que pertine a

prevenção ou diminuição dos acidentes, assim como a prevenção de danos ambientais de longo

prazo causados pelas atividades ou produtos da empresa.

Além da produção, necessariamente dita, o sistema de gestão trará reflexos às

finanças da empresa, porquanto a obtenção de financiamentos, com taxas favoráveis,

atualmente, depende da demonstração de que a empresa controla riscos, inclusive os

ambientais, sem falar nas exigências na embalagem dos produtos comercializados, tipos de

materiais e reciclagem dos produtos impõem novas demandas de distribuidores em grandes

mercados internacionais.

Por outro lado, os critérios ambientais devem ser considerados no desenho do

produto para atingir as exigências do público, requisitos legais, padrões nacionais

internacionais ou para assegurar que os produtos tenham aspectos e impactos ambientais

mínimos, por meio do seu ciclo de vida, da forma e do uso de matéria-prima, por intermédio da

manufatura e distribuição, uso do produto e disposição final.

2.2.4 Gestão ambiental e a ISO 14000

A série ISO 1400026 foi escrita pelo Comitê Técnico 207 (TC 207), criado pela

Organização Internacional de Normalização – ISO, definindo os elementos de um sistema de

gestão ambiental, a auditoria de um sistema de gestão ambiental, a avaliação de desempenho

ambiental, a rotulagem ambiental e análise de ciclo de vida.

A ISO 14001 é uma norma de gestão ambiental que busca assegurar o compromisso

das organizações em reduzir os negativos efeitos ambientais (ABNT, 2004). Borges (2001)

exemplifica que na Aracruz Celulose foram necessários ajustes tais como a implantação de uma

nova política de meio ambiente, qualidade, saúde e segurança; diretrizes específicas para todos

os departamentos no que diz respeito à adequação da legislação ambiental; avaliação dos

aspectos ambientais de todas as atividades da empresa, procedimentos para uma avaliação

interna da gestão ambiental e a realização de duas auditorias internas anuais. A autora ainda

enfatiza que, embora a obtenção deste certificado seja opcional, ele abre perspectivas de

negócios e financiamento e, muitas vezes, faz parte das exigências impostas pelo mercado.

Esta série é bastante abrangente e, atualmente, possui somente uma norma que pode

ser aplicada com o objetivo de certificação ou registro do sistema de gestão ambiental por uma

organização externa, a ISO 14001 - Sistemas de gestão Ambiental - Especificação e diretrizes

para uso. A norma ISO 14001 foi formalmente emitida em Outubro de 1996.

A Organização Internacional de Normalização (ISO) começou a desenvolver a série

ISO 14000 de normas voluntárias sobre sistemas de gestão ambiental em 1991. E, embora as

primeiras normas da série tenham sido publicadas somente em 1996, muitas organizações têm

implementado o sistema utilizando os projetos desde meados de 1995, e alguns documentos de

base, como o BSI 7750 ou a regulamentação voluntária do Plano de Ecogestão e Auditoria -

EMAS da Comunidade Européia, desde 1992.

26 A série de normas ISO 14000 é uma contribuição da International Organization for Standardization (ISO) ao campo do gerenciamento ambiental. Esta série de normas possui duas abordagens de avaliação: avaliação da empresa e avaliação do produto.

As normas de sistema de gestão ambiental da ISO possuem várias origens inter-

relacionadas. Primeiro, o Conselho Mundial de Empresas para o Desenvolvimento Sustentável,

formado para fornecer informações comerciais à Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento - UNCED, realizada no Rio de Janeiro em 1992, foi útil para

promover normas de consenso industrial como meio de melhorar o desempenho ambiental.

Como conseqüência da RIO 92, a Conferência das Nações Unidas de Meio

Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, foi proposta a criação de

um grupo especial na ISO para elaborar normas relacionadas com o tema Meio Ambiente. Em

março de 1993 instalou-se o comitê técnico ISO/TC207 – Gestão Ambiental, com a

participação de cerca de 56 países, responsável por elaborar a série de normas ISO 14000 inter-

relacionando-se com o comitê que elaborou as normas de Gestão da Qualidade (série ISO

9000) (MOREIRA, 2001).

Segundo, normas técnicas e gerenciais foram debatidas nos encontros preparatórios

para a cúpula do Rio. Terceiro, normas voluntárias foram deliberadas na Rodada Uruguai do

Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT). O estabelecimento de um novo acordo no

final de 1993 e a criação da Organização Mundial de Comércio (OMC) em 1995 fortaleceram

os recursos dos membros do GATT/OMC para resolver disputas referentes às normas

internacionais. Quarto, determinadas empresas, frustradas por terem de fazer negócios

internacionais onde não existem normas e cada vez mais pressionadas por governos e grupos de

ambientalistas e de consumidores, buscavam as normas como meio de estar em conformidade

com um critério aceito.

Em junho de 1991, com o estímulo do Conselho Mundial de Empresas para o

Desenvolvimento Sustentável, a ISO e a Comissão Internacional de Eletrotécnica - IEC

estabeleceram, juntas, o Grupo Assessor Estratégico sobre Meio Ambiente - SAGE. Esse grupo

tinha duas funções: fornecer informações sobre o papel potencial das normas internacionais

para o processo da UNCED e desenvolver recomendações para os Conselhos de Gestão

Técnica da ISO e da IEC, sobre o desenvolvimento ou não de normas internacionais nessa área.

As deliberações do SAGE duraram até dezembro de 1992, quando submeteram

recomendações e relatório à ISO e à IEC. O SAGE recomendou que a ISO estabelecesse um

novo comitê técnico para desenvolver normas relacionadas a sistemas de gestão ambiental,

auditoria ambiental, avaliação de desempenho ambiental, análise de ciclo de vida, rotulagem

ambiental e aspectos ambientais de normas sobre produtos.

Em janeiro de 1993, ficou decidido que a ISO iria empreender essa tarefa. O

Conselho de Gestão Técnica da ISO aprovou as recomendações do SAGE e estabeleceu um

novo comitê técnico, o TC 207, para administrar o desenvolvimento dessas normas. Em março

de 1993 a direção do secretariado do TC 207 foi entregue ao Conselho de Normas do Canadá -

SCC. A Associação Canadense de Normas - CSA assumiu a tarefa de administrar o

secretariado em nome do Conselho. Em junho daquele ano, o primeiro encontro plenário do TC

207 realizou-se, em Toronto.

Naquele encontro, foi desenvolvido um plano de trabalho que incluiu a criação de

seis subcomitês e 18 grupos de trabalho. Os secretariados dos subcomitês e os grupos de

trabalho também foram estabelecidos e o trabalho iniciado imediatamente. Durante os dois anos

seguintes, os grupos de trabalho reuniram-se quatro vezes ao ano e no terceiro encontro

plenário, em Oslo, Noruega, em junho de 1995, seis documentos alcançaram o nível de projeto

de norma internacional.

A família de normas ISO 14.000 aborda a gestão ambiental, auditoria ambiental, avaliação do desempenho ambiental, avaliação do ciclo de vida do produto, rotulagem ambiental e aspectos ambientais em normas de produtos. As três primeiras séries são normas para a organização, enquanto as demais são para produtos e processos. (BARBIERI, 2004, p. 143)

Todavia, existem outros documentos que compõe a série:

Número de Série

ISO

Status Título

14001 Publicada Sistemas de Gestão Ambiental – Especificação e diretrizes para uso

14004 Publicada Sistemas de Gestão Ambiental – Diretrizes gerais sobre princípios, sistemas e técnicas de apoio

14010 Publicada Diretrizes para auditoria ambiental – Princípios gerais

14011 Publicada Diretrizes para auditoria ambiental – Procedimentos de auditoria – Auditoria de sistemas de gestão ambiental

14012 Publicada Diretrizes para auditoria ambiental – Critérios de qualificação para auditores

14015 Anteprojeto Avaliação ambiental de locais e organizações14020 Final de projeto

Norma internacional

Rótulos e atestados ambientais – Princípios gerais

14021 ProjetoNorma internacional

Rótulos e atestados ambientais – queixas autodeclaradas

• Termos e definições (antiga 14021)

• Símbolos (antiga 14022)• Teste e verificação (antiga 14023)

14024 ProjetoNorma internacional

Rotulagens e atestados ambientais – Rotulagem ambiental tipo I

14025 Documento de trabalho

Rotulagens e atestados ambientais – Rotulagem ambiental tipo III

14031 ProjetoNorma internacional

Avaliação de desempenho ambiental

14032 Documento de estudo

Avaliação de desempenho ambientalEstudos de caso

14040 Publicada Análise de ciclo de vida – Princípios e diretrizes14041 Final de projeto

Norma internacional

Análise de ciclo de vida – Definição de escopo e análise do inventário

14042 Anteprojeto Análise de ciclo de vida – Avaliação de impacto14043 Anteprojeto Análise de ciclo de vida – Interpretação14050 Final de projeto

Norma internacional

Vocabulário de gestão ambiental

Guia 64 Publicada Guia para a inclusão de aspectos ambientais em normas sobre produtos

ISO 14061 Publicada Guia para orientar organizações florestais no uso das normas ISO 14001 e 14004

A ISO 14001 é o único padrão normativo sobre sistema de gestão ambiental. Por

outro lado, a ISO 14004 é um padrão informativo que orienta a implementação da ISO 14001.

A ISO 14004 é de grande ajuda para as organizações com pouca ou nenhuma experiência com

sistemas de gestão ambiental.

Segundo a ABNT (2004), “As normas de gestão ambiental têm por objetivo prover

as organizações de elementos de um sistema de gestão ambiental (SGA) eficaz que possam ser

integrados a outros requisitos de gestão, e auxiliá-las a alcançar seus objetivos ambientais e

econômicos”.

É importante observar que a ISO 14001 é uma norma de gestão ambiental, não de

desempenho ambiental. Define os elementos-chaves que constroem um sistema de gestão

ambiental sem definir com precisão o modo como devem ser organizadas ou implementados.

Isso permite a cada organização adaptar o sistema à suas necessidades particulares.

A norma especifica os requisitos para que um sistema da gestão ambiental capacite

uma organização a desenvolver e implementar política e objetivos que levem em consideração

requisitos legais e informações sobre aspectos ambientais significativos. Pretende-se que se

aplique a todos os tipos e portes de organizações e para adequar-se a diferentes condições

geográficas, culturais e sociais. O sucesso do sistema depende do comprometimento de todos os

níveis e funções e especialmente da alta administração. Um sistema deste tipo permite a uma

organização desenvolver uma política ambiental, estabelecer objetivos e processos para atingir

os comprometimentos da política, agir, conforme necessário, para melhorar seu desempenho e

demonstrar a conformidade do sistema com os requisitos da norma. A finalidade geral desta

norma é equilibrar a proteção ambiental e a prevenção de poluição com as necessidades

socioeconômicas (ABNT, 2004).

Permite, assim, que cada organização estabeleça seus próprios objetivos e metas de

desempenho, levando em consideração os requisitos reguladores nacionais, estaduais e

municipais, bem como requisitos organizacionais adicionais, e ainda permaneça em

conformidade com a ISO 14001 e capaz de atuar em diferentes níveis e lugares do mundo.

Donaire (1999, p.102) afirma que o “desempenho de uma organização está

fortemente associado à qualidade de seus recursos humanos” e que "se uma empresa pretende

implantar a gestão ambiental em sua estrutura organizacional, deve ter em mente que seu

pessoal pode transformar-se na maior ameaça ou no maior potencial para que os resultados

sejam alcançados". Frente à inexistência de treinamentos formais regulares, o autor sugere que

as organizações devem desenvolver seus próprios esquemas de treinamento na área ambiental.

A inclusão da variável ambiental nos programas de treinamento já existentes na organização

proporciona a forma mais adequada para que os funcionários percebam a questão ambiental

como importante para o processo de tomada de decisão.

Assim, o sucesso do sistema depende do comprometimento de todos os níveis e

funções, especialmente da alta direção. Contudo, a adoção dessa Norma não garantirá, por si só,

resultados ambientais ótimos (MOREIRA, 2001).

De acordo com Porter (1999), as normas ambientais elaboradas de forma adequada

são capazes de desencadear inovações que reduzem os custos totais de um produto ou

aumentam seu valor. Essas inovações permitem que as empresas utilizem uma gama de

insumos de maneira mais produtiva – abrangendo matéria-prima, energia e mão de obra –

compensando, assim, os custos da melhoria do impacto ambiental.

Ressalta-se que a norma é de caráter voluntário, porém percebe-se que tem sido

cada vez mais freqüente a imposição do mercado pela adoção da ISO14001 pelas empresas,

fazendo com que a certificação seja a entrada para as transações comerciais, principalmente por

corporações exportadoras, que necessitam de padrões que auxiliem na racionalização do

processo de comércio internacional.

2.2.5 Avaliação ambiental inicial

A avaliação ambiental inicial fornece a base para o sistema de gestão ambiental,

uma vez que informações sobre emissões, lixo, problemas ambientais potenciais, ocorrência

anteriores de acidentes, questões de saúde, sistemas de gestão serão obtidas e analisadas, bem

como as leis e regulamentações aplicáveis.

Os empresários têm, geralmente, um conhecimento limitado dos aspectos e

impactos ambientais de suas atividades e produtos no meio ambiente, e do meio ambiente em

suas atividades e produtos. Esse conhecimento é a base de um programa ambiental. Ele habilita

a empresa a concentrar-se nos assuntos mais importantes.

A Avaliação Ambiental Inicial não é um requisito imperativo das normas ISO

14001, para estabelecer Sistemas de Gestão Ambiental, porém é uma etapa importante a ser

cumprida. Sua execução envolve diversos passos, que vão do planejamento ao relatório final,

passando por várias etapas de desenvolvimento.

O primeiro passo na realização da Avaliação Ambiental Inicial é definir os

objetivos, planejar e organizar a avaliação. O principal objetivo deve ser a obtenção de

informações básicas para permitir a preparação e o desenvolvimento de um programa de

gestão.

O enfoque e detalhes da avaliação dependerão dos recursos disponíveis,

principalmente tempo, e possivelmente da abrangência do programa ambiental a ser proposto.

Se apenas parte da operação (um departamento ou divisão) for incluída, então a avaliação pode

ser mais limitada. De qualquer forma, ela não deve restringir-se somente à área física em

questão, já que é importante também cobrir todas as atividades que possam ter um impacto

direto ou indireto na área.

Se os recursos forem escassos, a melhor opção pode ser a realização de breve

análise crítica das principais áreas de interesse potencial e a concentração dos esforços iniciais

nas áreas que contenham os maiores riscos, deixando as áreas de menor interesse para datas

posteriores.

É importante que a avaliação tenha o apoio completo e irrestrito de toda a empresa,

incluindo os administradores e funcionários, para assegurar a cooperação durante a fase de

coleta de informações e para proporcionar autoridade à equipe de avaliação, encarregada da

colheita das informações para a implantação do sistema de gestão ambiental.

Enfim, para a realização da avaliação ambiental inicial é necessária a elaboração

prévia de um protocolo de verificação que possibilite o levantamento dos dados empresariais,

com eficiência, no menor espaço de tempo possível. A partir daí, serão realizadas entrevistas e

observações nos locais destinados a verificação e discussão dos aspectos ambientais a serem

considerados.

Algumas informações essenciais devem ser adquiridas e consideradas antes que os

aspectos operacionais da organização sejam avaliados, analisando a legislação ambiental

federal, estadual, municipal e, também, internacional, em relação aos países para os quais são

exportados os produtos e, em sendo o caso, dos resíduos da empresa.

Tal análise faz-se necessária para identificar as principais exigências legais, não os

detalhes absolutos da legislação, tais como licenças e autorizações relativos a instalação ou

processos de escoamento de água processada, doméstica ou pluvial, emissão de gases, depósito

de materiais e resíduos, etc.

A avaliação ambiental inicial se dá através de questionários e listas específicas

neste mister, devendo ser atualizadas e revisadas constantemente, para fins de averiguar e

analisar profundamente as nuances que envolvem a empresa e sua atividade social. Serão

necessárias entrevistas para se obter informação não disponível na documentação e para

aprender como a empresa é administrada na prática.

Finalmente, será confeccionado um relatório contendo informações claras e as

respectivas peculiaridades e exigências no desenvolvimento do programa de gestão ambiental,

devendo identificar as preocupações ambientais e as áreas problemáticas e, se possível,

priorizar riscos ambientais e possíveis impactos, fornecendo, conseqüentemente, as

informações básicas necessárias ao desenvolvimento de um programa de melhoria de

desempenho ou implantação de um sistema de gestão ambiental.

A política ambiental conduzirá à determinação de objetivos e metas ambientais da

empresa, baseada na informação obtida com a avaliação inicial. Com os objetivos e metas

estabelecidos, o plano de ação será destinado à correção dos problemas ambientais mais

importantes que foram aí identificados.

2.2.6 Auditoria ambiental

O sistema de gestão ambiental está intimamente ligado à auditoria ambiental. O

SGA depende da auditoria para poder evoluir na perspectiva de melhoria contínua. Ao se

implementar um sistema de gestão ambiental, automaticamente implementa-se a auditoria

ambiental periódica. Assim, é necessário o conhecimento da auditoria ambiental como

instrumento de gestão ambiental que irá gerir o SGA.

De acordo com a NBR ISO 14010 (ABNT, 1996), auditoria ambiental é o processo

sistemático e documentado de verificação, executado para obter e avaliar, de forma objetiva,

evidências de auditoria para determinar se as atividades, eventos, sistema de gestão e condições

ambientais especificados ou as informações relacionadas a estes estão em conformidade com os

critérios de auditoria, e para comunicar os resultados deste processo ao cliente.

Segundo Barbieri (2004, p. 189):

As auditorias ambientais são instrumentos de múltiplos propósitos e um dos mais antigos que se conhece. Auditoria entendida como exame, conferência ou apuração de fatos já era empregada há muito tempo e existem relatos de seu uso na antiguidade, como atestam diversos textos sobre auditoria contábil. Boynton e Kell mostram que as autoridades do antigo Egito, da Grécia e de Roma usavam verificações independentes sobre registros de cobranças de impostos e pagamento autorizados.

Mais adiante, esclarece o mesmo autor:

No início, as auditorias ambientais buscavam basicamente assegurar a adequação das empresas às leis ambientais dentro de uma postura defensiva, ou seja, elas procuravam identificar possíveis problemas relacionados com multas, indenizações e outras penalidades ou restrições contidas nas diversas leis federais, estaduais e locais. Muitas organizações começaram a realizar auditorias voluntárias e os órgãos governamentais passaram a estimular tal prática. Ao final da década de 1980, já existia uma razoável experiência internacional sobre esse instrumento, que em grande parte se beneficiou dos avanços em outros tipos de auditoria como a contábil e a de qualidade (p. 189)

Neste contexto, existe a auditoria interna, que nada mais é do que uma auto-

avaliação do Sistema de Gestão Ambiental realizada pelo próprio pessoal da organização ou

por profissionais contratados. O objetivo dessa auditoria é o aperfeiçoamento do SGA e, por

extensão, do desempenho ambiental da organização.

A ISO 14010 é de natureza genérica. Estabelece quatro princípios aplicáveis a todos

os tipos de auditorias ambientais. É compatível com as normas da declaração de Política de

Auditoria Ambiental da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, de dezembro de

1995, e com as Regulamentações de Auditoria e Gestão Ambiental da União Européia, de

junho de 1995.

A ISO 14011, por sua vez, descreve o procedimento para conduzir uma auditoria

ambiental no sistema de gestão ambiental organizacional. A Seção 4 da ISO 14011 (“Objetivos,

funções responsabilidades da auditoria do sistema de gestão ambiental”), oferece orientação

sobre como estabelecer objetivos para uma auditoria de sistema de gestão ambiental e define as

funções e responsabilidades dos auditores, clientes e auditados.

Finalmente, a ISO 14012 oferece diretrizes relativas às qualificações mínimas

necessárias aos auditores ambientais. Enquanto apresenta requisitos gerais não específicos aos

diferentes tipos de auditorias ambientais, refere-se de modo geral à qualificação de auditores de

sistema de gestão ambiental.

Paralelamente às preocupações legais com os danos ambientais, com a imposição

de sanções penais e administrativas, foram criadas, em nível internacional, normas

administrativas de controle ambiental, como o conceito de gestão de qualidade ambiental,

utilizadas na certificação do sistema de gerenciamento ambiental de organizações (ISO 14000).

Todavia, assim como a imposição de sanções penais e administrativas, as normas

de certificação (ISO), o sistema de gestão ambiental, em que pese o esforço despendidos pelas

empresas que implementaram o SGA, não estabeleceu nenhum requisito de desempenho

ambiental, além da conformidade às legislações ambientais aplicáveis e o compromisso com a

melhoria contínua.

Reconhecendo a ineficácia das medidas penais e administrativas, bem como os

sistemas de gestão ambiental como fatores de desempenho ambiental, o Estado, buscando criar

forma alternativa para atingir o preceito fundamental de preservação ambiental, adotando um

perfil intervencionista, utilizando os inúmeros instrumentos tributários existentes no

ordenamento jurídico brasileiro em benefício do meio ambiente, nascendo, assim, a tributação

ambiental.

CAPÍTULO III

TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL

Após analisar a evolução do Estado, chegando ao Estado Democrático de Direito

Ambiental, com suas disciplinas e temáticas, bem como os instrumentos administrativos de

controle e gestão ambiental, diante da degradação ambiental em nível mundial, o presente

capítulo, ao tratar da tributação ambiental, propriamente dita, abordará os princípios e demais

regras de direito tributário aplicáveis à conservação do meio ambiente. Esta análise, à luz da

tributação ambiental, permitirá um detalhamento maior de suas especificidades, a fim de que se

possa realmente verificar a possibilidade de um modelo de tributação ambiental a ser aplicado

no Brasil.

Em seguida, serão tratadas as espécies tributárias existentes no Direito Tributário

brasileiro que poderão vir a ser utilizadas na proteção do meio ambiente.

Finalmente, analisar-se-á a experiência brasileira com a tributação ambiental,

buscando conhecer as tentativas de instituição desses instrumentos fiscais e, especialmente,

extrafiscais, bem como algumas experiências tributárias ambientais no estrangeiro.

3.1 Os Tributos Ambientais

O homem é um ser eminentemente social. A vida em sociedade implica

necessidades de ordem coletiva que, por suas características e até magnitude, não se ajustam a

serem atendidas isoladamente pelo homem ou pequenos grupos privados, de forma a exigir um

poder público investido de autoridade suficiente para desenvolver estas atividades em proveito

geral.

Esse poder é o Estado, que corresponde a uma sociedade politicamente organizada,

sobre uma base territorial determinada e com um governo capaz de manter e prover o bem-estar

coletivo.

O Estado Moderno, como visto, nasceu absolutista e durante alguns séculos todos

os defeitos e virtudes do monarca absoluto foram confundidos com as qualidades do Estado.

Isso explica por que já no século XVIII o poder público era visto como inimigo da liberdade

individual, e qualquer restrição ao individual em favor do coletivo era tida como ilegítima. Essa

foi a raiz individualista do Estado Liberal. Ao mesmo tempo, a burguesia enriquecida, que já

dispunha do poder econômico, preconizava a intervenção mínima do Estado na vida social,

considerando a liberdade contratual um direito natural dos indivíduos (DALLARI, 2001).

Desse modo, os Estados nacionais que surgiram e se consolidaram entre os séculos

XVII e XVIII assim o fizeram sob a roupagem do Estado Liberal, calcado no individualismo e

na ínfima intervenção estatal, sem observar o princípio da separação dos poderes e a vigilância

da ordem social e de proteção contra ameaças externas.

No entanto, os paradigmas de liberdade e igualdade não deram conta das profundas

desigualdades provocadas pelo Estado Liberal, que passou a perder força e a dar lugar,

sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, ao chamado Estado Social, Estado do Bem-Estar

ou Estado Providência (DI PIETRO, 1999).

Muda, assim, a feição do Estado, passando a adotar um perfil intervencionista na

economia e trazendo para si a prestação de serviços públicos antes não desempenhados:

Já não se trata portanto, da revolução de uma classe, como vinha acontecendo em épocas políticas antecedentes, mas daquilo que poderá vir a ser talvez a última das revoluções: a revolução final pelo estabelecimento de um poder democrático legítimo. Com o movimento político de todas as classes, sela-se o pacto da convergência e solidariedade econômica e social, resultante de uma revolução sem sangue, nascida do consenso, da realidade e dos fatos, e assentada sobre um constitucionalismo social, que não precisa de dogmas, de teorias ou de frases; um constitucionalismo que se prende menos ao poder constituinte formal que aos poderes constituintes materiais. (BONAVIDES, 2001, p. 232).

O Estado Social, no final do século XX, deu claras demonstrações de crise, em

virtude do gigantismo das Administrações Públicas, tornando-as lentas e burocráticas,

obrigando a uma reestruturação do Estado. Nasceu, assim, o Estado Contemporâneo27, abrindo-

se as portas para o capital privado e a criação de agências reguladoras da atividade privada,

desnacionalizando o mercado, dando origem à globalização.

Todavia, para a manutenção da ordem e promoção do bem-estar coletivo, o Estado

Contemporâneo necessita de recursos pecuniários e de disciplina na sua aplicação, exercendo

assim uma atividade financeira.

No caso brasileiro, o art. 3º da Constituição Federal de 198828 especifica quais

seriam as metas a serem atingidas pelo Estado. Esta atividade política, todavia, segundo

Balthazar (2001, p. 21), não pode ser posta em prática sem os recursos financeiros

correspondentes, uma vez que o Estado possui necessidade de arrecadar um considerável

volume de recursos materiais para realizar suas atividades institucionais, sem os quais se torna

inviável o funcionamento da máquina.

Ricardo Lobo Torres (1995) define a atividade financeira do Estado como o

conjunto de ações que o mesmo empreende para a obtenção da receita e a realização dos gastos

para o atendimento das necessidades públicas.

Para cumprir com seus deveres, o Estado utiliza de recursos financeiros da

sociedade civil, gerando um ciclo denominado política fiscal. Tal política determina sobre o

que, onde e quanto o Estado precisa arrecadar para dispor desta quantia. De maneira geral, a

política fiscal de um país compreende o estudo das despesas e receita geridas pelo governo na

sua função de administrador da nação. Existem duas formas de ingressos de recurso na conta

governamental: receitas públicas originárias, advindas diretamente do patrimônio e receitas

públicas derivadas, obtidas mediante o exercício de soberania do Estado, através de penalidades

e, principalmente, tributos. Para arrecadar estas receitas, o Estado define um conjunto de

princípios, limitações e procedimentos administrativos que regem seu poder de tributação

(JOÃO, 2004).

27 Enquanto fenômeno típico da sociedade contemporânea, a globalização proporciona uma releitura do Estado Moderno, na medida em que desnacionaliza o mercado, permitindo a instalação de conglomerados empresariais multinacionais em torno de atividades economicamente produtivas. A mídia começa a desempenhar papel fundamental em face da agilidade do acesso a informações, que passa a ser em tempo real. Os problemas econômicos, sociais e ecológicos exigem atenção em escala mundial, lançando-se mão cada vez mais de mecanismos de ordem internacional para o estabelecimento de regras de conduta e para solução de controvérsias, o que finda por fortalecer as instituições de Direito Internacional (SEBASTIÃO, 2007, p. 61).28 “Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

Conforme visto, o início do século XX vivia, historicamente, o Estado de Direito,

em que as preocupações passaram a dizer respeito ao bem-estar do cidadão e não mais à

produção desenfreada. Posteriormente, na década de setenta, surge a terceira dimensão de

direitos, em que se inclui a preocupação com as questões ambientais, o que demonstra o

desenvolvimento social de uma consciência conservacionista.

A partir de então, verifica-se com mais freqüência a atuação estatal na

implementação de políticas públicas ambientais. O Estado Ambiental vê surgirem as primeiras

iniciativas do uso dos tributos para fins extrafiscais, ou seja, com o objetivo de inibir ou alterar

consumos e condutas nocivas à sociedade, especificamente relacionados à preservação e

conservação do meio ambiente.

Neste contexto, se verifica a necessária interseção entre tributação e meio ambiente,

tendo em vista, de um lado, a natureza do bem ambiental que, enquanto macrobem, é um bem

de interesse público, afeto à coletividade, representativo de interesses difusos; e de outro lado,

tem-se o preceito inspirador da tributação a indicar que todos devem contribuir para os gastos

públicos, desde que obedecido um conjunto de princípios constitucionalmente indicados

(SEBASTIÃO, 2007).

Sebastião (2007, p. 228) afirma que:

Tributos e meio ambiente têm, então, entre si, uma relação de correspondência no que concerne à própria atividade financeira do Estado, ou seja, na administração das receitas e despesas. Aqui, em especial, nas despesas relativas à prevenção, conservação e restauração do meio ambiente, chama o Estado também o particular a participar na concretização de seu dever público, de ordem constitucional, colaborando não só através de comportamentos ecologicamente corretos, mas também proporcionando o numerário necessário ao cumprimento do desiderato.

Na criação de condições para o mercado funcionar com respeito pelo ambiente, as

finanças públicas e, em especial, os tributos, constituíram um meio de ação bastante promissor,

principalmente a partir do momento em que as sanções penais e administrativas, bem como os

sistemas de gestão ambiental não atingiram a eficácia pretendida, no trato das questões

ambientais.

3.1.1 Do Sistema Tributário Nacional

A Constituição Federal é riquíssima em dispositivos atinentes à disciplina tributária

e ao regramento do meio ambiente, o que possibilita a implementação de uma política de

tributação ambiental bastante ampla. Em sentido amplo, a tributação é uma atividade

abrangente, compreensiva não apenas da instituição de tributos, mas também da sua

arrecadação e da fiscalização de seu recolhimento, as quais constituem tarefas eminentemente

administrativas (COSTA, 2005).

Sistema, em sentido amplo, segundo as palavras de Geraldo Ataliba (1968), é o

conjunto ordenado e sistemático de normas, construído em torno de princípios coerentes e

harmônicos, em função de objetivos socialmente consagrados. Logo, nos sistemas há

conjugação harmônica de elementos, e não, a sua soma. Os sistemas normativos são formados

pela composição hierárquica e sistemática das normas que o integram, com fundamento e

validade na Constituição.

O Sistema Tributário Nacional, por sua vez, são as normas que regem o regime

tributário em sua compostura tecnicista, notadamente pelo estabelecimento de conceitos, tais

como os de legislação tributária, obrigação tributária e seus elementos constituintes, quais

sejam, fato gerador, sujeitos ativo e passivo, crédito tributário e as suscetibilidades a que este

está sujeito, isto é, constituição pelo lançamento, suspensão de sua exigibilidade, extinção e

exclusão (NUNES, 2005).

Desta forma, no ordenamento jurídico brasileiro, é a Constituição Federal que

estabelece as regras de competência, assim, entendida como a aptidão, a faculdade, de que são

dotadas as pessoas políticas (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) de legislar para

produção de normas sobre tributos, bem como todas as nuances que envolvem a questão

tributária.

Enfim, o sistema tributário nacional estabelece as normais gerais aplicáveis à

exigência de tributos ambientais, havendo apenas adaptações dos conceitos das espécies

jurídicas, as quais não revelam, imediatamente, características de fato econômico de modo a

lograr-se a aplicação do princípio da capacidade contributiva e, assim, compatibilizá-las com a

exigência de “tributos ecológicos”.

3.1.2 Conceito e natureza jurídica dos tributos ambientais

O vocábulo tributo, segundo Paulo de Barros Carvalho (2007), comporta diversas

acepções, como “quantia em dinheiro”, como “relação jurídica”, como “norma jurídica

tributária”, como “prestação correspondente ao dever jurídico do sujeito passivo” e como

“direito subjetivo de que é titular o sujeito ativo”.

Assim, o tributo, enquanto norma jurídica em sentido estrito, é logicamente

estruturado em hipótese e conseqüência. A hipótese, ou suposto, ou antecedente, contém a

descrição de um fato que, uma vez ocorrido no mundo fenomênico, ensejará a relação jurídica,

de natureza tributária, prescrita no conseqüente, mandado ou estatuição (CARVALHO, 2007).

Geraldo Ataliba (1991), influenciando, inclusive, na própria conceituação de

tributo, explica que o comando da norma jurídica tributária (“entregue a importância x de

dinheiro ao Estado”) não se identifica com as situações contratuais (onde há o concurso da

vontade livre das partes – o tributo é uma obrigação ex lege), nem com indenização por dano,

tampouco com a sanção (multa) por ato ilícito.

O tributo, segundo a exegese do art. 3º do Código Tributário Nacional, “é toda

prestação pecuniária, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção

de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade plenamente vinculada”. Ou, nas

palavras de Amaro (2007, p. 25), “tributo é a prestação pecuniária não sancionatória de ato

ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse

público”.

A natureza jurídica de uma coisa é a sua própria essência, é a sua razão de ser. Por

sua vez, a natureza jurídica do tributo, ou seu atributo essencial, é determinada pelo fato

gerador da respectiva obrigação (art. 4º do CTN29).

Segundo o Código Tributário Nacional, os tributos são os impostos, taxas e

contribuições de melhoria (art. 5º). Sendo a natureza jurídica do tributo determinada pelo seu

fato gerador, não podem os tributos pretender criar, por exemplo, uma taxa com fato gerador

específico de imposto mesmo que se venha a dar o nome de taxa. É irrelevante a denominação

29 “Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação”.

que se dá ao tributo. Ele será imposto se o seu fato gerador for específico de imposto, será de

taxa se o seu fato gerador for relativo a taxa e assim respectivamente.

Portanto, a natureza jurídica do tributo constitui-se especificamente no seu fato

gerador, ou seja, no seu objeto nuclear, seu elemento essencial, e que vai dar origem à

obrigação tributária. No tocante ao tributo ambiental, propriamente dito, seu objetivo é, sem

dúvida, desencorajar o uso de recursos naturais não renováveis e diminuir a emissão de

poluentes, visando sempre à adoção de medidas não poluidoras (FREITAS NETO; BUENO;

COSTA, 2006).

Nesse sentido, a expressão tributação ambiental pode ser, à primeira vista,

conceituada, como o faz Costa (2002) como o emprego de instrumentos tributários para

orientar o comportamento dos contribuintes em benefício do meio ambiente, bem como para

gerar os recursos necessários à prestação de serviços públicos de natureza ambiental.

Em termos econômicos, o objetivo de um tributo ambiental é atribuir um preço ao

que anteriormente não o tinha, o ambiente. Assim, ele representa uma importante variável de

decisão para a gestão do ambiente e para a avaliação do impacto da atividade humana sobre o

ecossistema.

Ferraz (2003a) ensina que os ditos green taxes, tributos ecologicamente orientados,

são aqueles que influenciam na decisão econômica de modo que se torne mais interessante a

opção ecologicamente mais adequada. Nada mais devem fazer do que refletir a realidade dos

custos da atividade ecologicamente desorientada. Na atividade econômica, as decisões são

orientadas pelo binômio custo/benefício e assim, ainda que não seja critério exclusivo, o custo é

critério de extrema relevância nas relações diárias, não apenas do empresário, mas de todos. Se

os custos da degradação ambiental não forem refletidos nos preços, as decisões econômicas

nunca serão ecologicamente corretas. A função do tributo ambiental é precisamente esta:

internalizar os custos ambientais, isto é, trazer para o custo de cada bem ou mercadoria o custo

que seu consumo representa em termos ambientais.

Os “tributos verdes” são designados tecnicamente como tributos ambientais.

“Tributos verdes” é a expressão leiga que se refere a tributos que têm uma motivação

ambiental. Existem em um sentido amplo ou estrito. Amplo quando um tributo ordinário, que

integra permanentemente o sistema tributário, é adaptado de forma a servir aos esforços de

proteção ambiental em face da utilização direta do meio ambiente; e estrito quando for tributo

novo cobrado em razão do uso do meio ambiente pelos agentes econômicos em virtude de atos

ou situações apenas indiretamente a ele conexos (OLIVEIRA, 2002).

Deve-se frisar que o tributo ambiental é também instrumento de realização da

justiça, já que por meio dele não só se impede a imposição unilateral de custos sociais por

alguns membros da sociedade (os poluidores) a todos os demais, como também se garante que

as condições de igualdade sejam reais e efetivas, na medida em que contribui para o

funcionamento eficiente do mercado e para o equilíbrio da concorrência.

Sob outro prisma, a concessão de incentivos fiscais, além de garantir o fim imediato

almejado (preservação do meio ambiente), desperta, por meio de um incentivo econômico, a

consciência sobre a questão ambiental (fim mediato), o que se faz claro nas lições de José

Marcos Domingues de Oliveira (2003), onde os tributos ambientais podem ter uma função

fiscal (o que corresponde ao sentido positivo do poluidor pagador) e uma função extra-fiscal

(que corresponde ao sentido seletivo do princípio), não obstante serem eles basicamente

regulatórios, porque seu principal objetivo é a mudança de atitude dos contribuintes (empresas

e consumidores); em outras palavras, preocupam-se fundamentalmente em produzir ou ensejar

a conscientização ambiental.

As vantagens da utilização de tributos ambientais com feição ambiental em relação a esse sistema consistem no fato de que aqueles, primeiramente, estimulam o comportamento individual que se direciona a uma postura ambientalmente correta, justamente porque estão interferindo no bolso do contribuinte, que prefere adotar comportamentos menos agressivos ao meio ambiente. Por outro lado, a implantação de um sistema de tributos ambientais não exige infra-estrutura e fiscalização do aparelhamento administrativo tão custosas quanto as necessárias para se realizar toda a atividade de polícia administrativa neste âmbito (COSTA, 2005, p. 323)

Todavia, para que se possa compreender exatamente o conceito e abrangência do

tributo ambiental, deve-se levar em conta que é a finalidade que levou à criação do tributo, e

não o seu fato gerador, que permite qualificá-lo como ambiental. Assim, pode-se classificar

como tributo ambiental aquele cujo fato gerador não expresse diretamente um ato de

degradação ambiental. Da mesma forma que se pode negar a característica de ambiental a um

tributo que, embora incida sobre o dano ambiental, vise a objetivos não ambientais.

3.1.3 A extrafiscalidade dos tributos ambientais

Como já dito, historicamente, a finalidade dos tributos era apenas arrecadatória. No

entanto, a tributação pode exercer importante papel na atividade econômica tendo em vista o

custo que ela representa ao empresariado. Desta forma, os tributos podem ser utilizados como

instrumento de regulação econômica indireta. Neste sentido, os tributos são extrafiscais30.

Os tributos ambientais, segundo Braga e Castro (2006), podem ter duas funções,

fiscal ou extrafiscal, embora eles sejam basicamente regulatórios uma vez que seu objetivo

principal é a mudança de atitude dos contribuintes (fim mediato). A finalidade dos tributos

ambientais é internalizar os custos ambientais, isto é, trazer para cada bem ou serviço o custo

que o seu consumo representa em termos ambientais (fim imediato).

Braga e Castro (2006) esclarecem que os princípios da capacidade contributiva e do

poluidor-pagador, os quais serão abordados adiante, são incompatíveis entre si, porquanto

conjugá-los seria mitigar a finalidade da tributação ambiental:

Os princípios da capacidade contributiva e do poluidor-pagador [...] são assim diretamente incompatíveis, devendo este último, nos casos das incidências ambientais ora estudadas, prevalecer sobre o primeiro. Conjugá-los poderia mitigar a finalidade da tributação ambiental acima descrita, uma vez que o seu sujeito passivo é agente poluidor e não arcará com a carga tributária tendo em vista a sua capacidade econômica, mas tão-somente o grau de degradação ambiental de sua atividade.

Assim, os tributos ambientais abstraem, de forma direta, o princípio da capacidade

contributiva. O contribuinte não está obrigado a contribuir em função da sua capacidade

econômica sem que haja contaminação e dever de reparar o dano ou velar pelo princípio da

solidariedade.

Sobre o assunto, José Marcos Domingues de Oliveira (1999) considera a tributação

ambiental como exemplo de conciliação da extrafiscalidade com o princípio da capacidade

contributiva, explicando que o valor que deveria assumir com medidas mitigadoras ou

eliminadoras (equivalentes ao custo social da poluição), o industrial acumula como riqueza

marginal, índice de capacidade contributiva, no caso proveniente de uma conduta deletéria que

é de ser combatida pela tributação extrafiscal.

Desta forma, em sendo degradante ao meio ambiente o produto ou serviço,

independentemente da capacidade econômica do contribuinte, a imposição da carga tributária 30 A Extrafiscalidade é o emprego de instrumentos tributários para o atingimento de finalidades não arrecadatórias, mas, sim, incentivadoras ou inibitórias de comportamentos, com vista à realização de outros valores constitucionalmente consagrados. Afina-se com a noção de poder de polícia ou de polícia administrativa, conceituada como a atividade estatal consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse coletivo, e que repousa no princípio da supremacia do interesse coletivo sobre o individual, visando a impedir a adoção de condutas individuais contrastantes com o interesse público (COSTA, 2005, p. 321).

levará em conta tão somente a intensidade do dano ambiental havido. Não importam as

características do contribuinte, mas tão-somente as características do bem ou serviço a ser

tributado, que será graduado conforme seu índice de consumo dos recursos ambientais.

Portanto, na tributação ambiental, crê-se que a extrafiscalidade não reside na inibição à produção econômica em sentido amplo. Ao onerar determinada unidade produtora, deve pretender o direito não impedir nem inviabilizar a atividade econômica, mas racionalizá-la, isto é, forçá-la a níveis de produção e resultados condizentes com a noção de desenvolvimento sustentável. A intenção do legislador é atender ao interesse público primário de conservação do bem ambiental, diante de sua potencial escassez ou impossibilidade de renovação a curto prazo. Considerando-se que o afã industrial ou produtor normalmente é mais intenso do que a vontade de preservar ou de usar racionalmente o recurso natural, o tributo aparece não exatamente como um custo normal e inevitável da produção (o que daria ensejo à mera arrecadação fiscal), porém como um ônus passível de ser afastado, na medida em que o poluidor ajuste sua produção a níveis de sustentabilidade socialmente desejáveis. (NUNES, 2005, p. 113)

A concessão de estímulos ao contribuinte que preserva o meio ambiente através de

incentivos fiscais, isentando-o total ou parcialmente do pagamento de tributos ou permitindo-se

a dedução dos gastos com outros, é o melhor e mais eficiente instrumento de prevenção

ambiental. Nesta medida, pode-se verificar o alcance do princípio da capacidade contributiva às

hipóteses de tributação ambiental.

A extrafiscalidade, segundo Costa (2005), pode ser implementada mediante a

instituição e a graduação de tributos, a concessão de isenções e outros incentivos fiscais, como

a possibilidade de dedução de despesas efetuadas pelos contribuintes referentes a recursos

empregados na preservação do meio ambiente.

Se de um lado, portanto, o Estado cobra do poluidor, sob a forma de tributo, uma quantia baseada em sua atividade atentatória ao meio ambiente, por outro pode também incentivar atividades ou sistemas de produção ambientalmente corretos, o que, certamente, estimulará as demais empresas a implementar tecnologias “limpas” em seus processos produtivos. [...] os incentivos fiscais seriam uma forma de estimular os contribuintes a fazer algo que a ordem jurídica considere conveniente, interessante e oportuno, como por exemplo, criar mecanismos que poluam menos o meio ambiente. Isso é alcançado por intermédio da diminuição, ou até mesmo da supressão, da carga tributária. Esses incentivos, na extrafiscalidade ambiental, manifestam-se sob a forma de estímulo fiscal ou subsídios fiscais, os quais induzem e ensejam os contribuintes a diminuir a agressão ao meio ambiente (ARAÚJO, 2003, p. 31).

Enfim, a extrafiscalidade não visa impedir certa atividade, pois para isso existem as

multas e as proibições (poder de polícia), ou seja, o tributo não pode constituir sanção por ato

ilícito. Ela visa condicionar a liberdade de escolha do agente econômico, através da graduação

da carga tributária em função de critérios ambientais. A extrafiscalidade dos tributos ambientais

é, portanto, um grande instrumento ponderador do princípio da defesa do meio ambiente,

mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de

seus processos de elaboração e prestação e do livre-exercício da atividade econômica

(OLIVEIRA, 2002).

Todavia, no plano axiológico, Hugo de Brito Machado (2003) esclarece:

[...] não se pode estabelecer qualquer distinção entre a sanção e o denominado tributo extrafiscal proibitivo. Penalidade e tributo extrafiscal proibitivo, no plano axiológico, não se distinguem. Ambos são instituídos com a mesma finalidade. Ao instituir um tributo extrafiscal proibitivo, o legislador tem por fim desestimular uma atividade por considerá-la indesejável, tal como acontece ao instituir uma sanção. [...] no plano da lógica jurídica, o tributo distingue-se da penalidade pecuniária precisamente porque não decorre de ato ilícito, sendo, portanto, norma de valioso conteúdo didático.

Assim, a extrafiscalidade que deve orientar os tributos ambientais não se constitui

em uma sanção pela exaustão dos recursos ambientais, mas é certamente um fator que influi na

opção do contribuinte por esta ou aquela atividade lícita, ou seja, na decisão da prática de um

ato que a lei permite, sendo certo que, no regime democrático, o que a lei não veda está

permitido.

Neste caso, quando a atividade social a ser desempenhada pelo contribuinte for

efetivamente degradante, segundo a própria Lei n. 6.938/91, que criou a Política Nacional Do

Meio Ambiente, sequer deve ser autorizada ou, se eventualmente deferida, deverá ser

imediatamente suspensa.

Desta forma, segundo Braga e Castro (2006), os tributos surgem como um dos

mecanismos de maior eficiência na preservação do meio ambiente, proporcionando ao Poder

Público o direito de agir no combate às atividades impactantes, com o dever de estimular as

condutas não-poluidoras.

Portanto, o principal objetivo dos tributos ambientais é ser instrumento econômico

específico que desponta para demonstrar uma conduta compatível com o meio ambiente. A

existência deles é sintoma de que a produção deve ser reduzida como medida preventiva para

garantir a sua própria continuidade.

3.1.4. Espécies tributárias ambientais

Como já dito, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 5º, consagrou a divisão

tripartite dos tributos, ou seja, “os tributos são os impostos, taxas e contribuições de melhoria”.

De igual sorte, a Constituição Federal de 1988 prevê que a União, o Distrito Federal, os Estados

e os Municípios podem instituir impostos, taxas e contribuições de melhoria, o que estabelece

as três espécies principais de prestações pecuniárias que compõem o Sistema Tributário

Nacional31.

Destarte, a própria Constituição atribui ainda a competência à União para instituir

outro tipo de tributo, as Contribuições Especiais e os Empréstimos Compulsórios32. Embora

sejam todos tributos, os impostos, taxas e contribuições de melhoria diferem entre si. Tais

diferenças são ditadas, basicamente, pelo seu fato gerador.

A doutrina tem mantido (e o fez especialmente na vigência de textos constitucionais precedentes) acesa polêmica sobre a natureza, tributária ou não, de algumas prestações exigidas pelo Estado, designadamente os empréstimos compulsórios e certas figuras geralmente batizadas como contribuições. Tem-se discutido se, a par do imposto, da taxa e da contribuição de melhoria (arrolados no art. 5º do CTN como espécies de tributo), teriam ainda natureza tributária aquelas outras exações. E, quando admitida essa natureza, disputa-se também se elas seriam espécies distintas ou, ao contrário, se subsumiriam nalgum dos tipos nominados no citado artigo. (AMARO, 2007, p. 27)

Para a efetiva implementação de instrumentos tributários de caráter ambiental é

preciso obedecer aos fundamentos jurídicos da tributação, matéria de grande complexidade.

Um dos problemas concretos na aplicação do princípio do poluidor-pagador é a definição da

espécie tributária a ser assumida pelo instrumento econômico proposto. Esta questão é

31 Não quer isto dizer que a Carta Magna não considere tributos outras figuras financeiras, como o empréstimo compulsório e a contribuição parafiscal, pois o regramento constitucional reservado a elas é nitidamente tributário. Simplesmente a Constituição não quis reconhecer-lhes autonomia, na medida em que não dispõem de fatos geradores próprios, mas sim correspondentes aos do imposto ou da taxa, estes, sim, categorias ontologicamente distinguidas pelo Direito Tributário em função dos respectivos fatos geradores, critério cientificamente hábil a diferençar as espécies tributárias, como aliás, em boa hora, já fora reconhecido pelo Código Tributário Nacional (art. 4º) ao dispor que: “A natureza jurídica específica do tributário é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II – a destinação legal do produto da sua arrecadação”. Com olhos formalistas postos na letra da nossa mal redigida Constituição, a jurisprudência positivista do E. Supremo Tribunal reconhece autonomia às contribuições, malgrado admita que seus fatos geradores principais e respectivas bases de cálculo em nada difiram da dos impostos, dando as costas, assim, data venia, a inúmeras fraudes materiais à Carta, como se dá com a sonegação de participação de Estados e Municípios na respectiva arrecadação, o que vulnera o pacto federativo de 1988, a par de múltiplos bis in idem tributários que tornam caótico o hoje esfacelado sistema tributário nacional (DOMINGUES, 2007, p. 37-38).32 As contribuições não são, portanto, figuras totalmente distintas dos impostos e das taxas, delas retirando suas características específicas. Na verdade, sob o ponto de vista das espécies tributárias, tanto as contribuições especiais como os empréstimos compulsórios serão sempre impostos ou taxas, a depender das hipóteses de incidência adotadas em suas instituições, permanecendo perfeitamente válidas as previsões do artigo 4º do Código Tributário Nacional. Esse, aliás, o entendimento que desde logo defendemos, também adotado por Roque Antonio Carrazza e por Paulo de Barros Carvalho, dentre outros. Não há, portanto, cinco espécies tributárias mas apenas três (ou mesmo duas, como queria Becker, reduzindo a contribuição de melhoria a imposto ou taxa, conforme o caso), ainda que o Supremo Tribunal Federal tenha aparentemente se inclinado a adotar existência de cinco espécies. O motivo da confusão está em adotar critérios distintivos variados para identificar classificações e depois juntá-los sob uma única categoria. Explico. Aqueles que enxergam cinco espécies tributárias usam dois critérios distintos para classificar os tributos. De um lado, os distinguem pela hipótese de incidência, conforme seja ela vinculada ou não a uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, e identificam as espécies vinculadas das taxas e das contribuições de melhoria, e também a espécie não-vinculada do imposto. Por outro lado, adotando uma outra classe de critério distintivo, desta vez a vinculação do produto da arrecadação, identificam também duas categorias, uma delas com duas subespécies: a dos tributos cuja arrecadação não é necessariamente vinculada, com as duas subespécies das contribuições especiais e a dos empréstimos compulsórios (necessariamente restituíveis) (FERRAZ, 346-347).

usualmente omitida no debate acadêmico, particularmente entre os economistas, mas é de

fundamental importância para assegurar a validade jurídica dos tributos ambientais.

3.1.4.1 Impostos Ambientais

Sua existência não é vinculada a uma atuação ou atividade do Estado. É através da

instituição e cobrança de impostos que o poder de império do Estado se faz sentir em toda sua

plenitude, por isso mesmo, denominado tributo não-vinculado (CTN, art. 16).

Segundo Ferraz (2005), os impostos têm por característica distintiva sua não-

vinculação a atividade estatal específica relativa ao contribuinte e, por essa mesma razão, não

poderão ser exigidos distintamente de um ou outro contribuinte. Nos impostos, a exigência

somente poderá variar de acordo com o critério de discriminação constitucionalmente

estabelecido, de capacidade econômica do contribuinte (art. 145, § 1º33), sem possibilidade de

oscilações em acordo com qualquer outra variável, inclusive sua atividade (art. 150, II34).

Pela sua definição legal, o contribuinte recolhe o imposto sem receber qualquer

contraprestação estatal direta em troca. O seu pagamento independe de qualquer atividade

estatal específica em relação a quem paga. Esta espécie tributária se destina ao financiamento

das atividades gerais do Estado, como segurança, saúde pública, educação, etc., ou seja,

atividades que abrangem toda a coletividade.

O fato gerador do imposto é uma situação (por exemplo, aquisição de renda, prestação de serviços etc.) que não supõem nem se conecta com nenhuma atividade do Estado especificamente dirigida ao contribuinte. Ou seja, para exigir imposto de certo indivíduo, não é preciso que o Estado lhe preste algo determinado. A atuação do Estado dirigida a prover o bem comum beneficia o contribuinte, mas este frui das utilidades que o Estado fornece porque é membro da comunidade e não por ser contribuinte. (AMARO, 2007, p. 30)

33 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.34 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

No trato das questões ambientais, todavia, por afrontar o princípio da igualdade e

capacidade contributiva, segundo Ferraz (2005, p. 347-348), seria inconstitucional a criação de

impostos ambientais:

Uma cobrança de impostos diferenciada em função da maior ou menor adequação da atividade do contribuinte a parâmetros de preservação ambiental seria inconstitucional por ferir os princípios da igualdade e da capacidade contributiva. [...] Assim, não há espaço para cobrança de simples impostos com finalidade ambientalmente orientada no sistema constitucional brasileiro. Tais exigências somente poderão ocorrer sob a forma específica de contribuição de intervenção no domínio econômico (admitida sob essa forma a hipótese de incidência de imposto). (FERRAZ, 2005, p. 347-348)

Considerando que os impostos têm natureza eminentemente fiscal, cujo fruto da

arrecadação não pode ser vinculado a determinada atividade fiscal, não se pode criar impostos

com finalidade ambientalmente orientada.

3.1.4.2 Taxas Ambientais

As taxas35, disciplinadas nos artigos 7736 e 7837 do Código Tributário Nacional,

juntamente com as contribuições de melhoria, diferentemente dos impostos, são tributos

vinculados a uma atividade estatal, ou seja, a sua instituição e cobrança pressupõem uma

atividade do Estado beneficiando diretamente o contribuinte.

As taxas são tributos cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; ou, b) na prestação ao contribuinte, ou colocação à disposição deste, de serviço público específico e divisível (CF, art. 145, II; CTN, art. 77). (AMARO, 2007, p. 30/31)

Todavia, o serviço deve ficar à disposição do contribuinte, mesmo que ele não o

usufrua. A taxa é cobrada tanto se o uso do serviço pelo contribuinte é efetivo quanto potencial.

35 Segundo Ataliba (1991), a hipótese da taxa é uma atuação estatal diretamente (imediatamente) referida ao obrigado (pessoa que vai ser posta como sujeito passivo da relação obrigacional que tem a taxa por objeto). Na taxa, hipótese de incidência é o Estado prestar um serviço, expedir uma certidão, desempenhar atividade tendente a culminar por dar ou manter uma licença, autorização etc. que se liga a alguém, que é pela lei posto na situação de sujeito passivo do tributo. Do que se vê, para que se configure a taxa, basta a lei prever atuação estatal que tenha referibilidade a alguém (que poderá ser posto como sujeito passivo do tributo). Este tributo irá nascer com a referibilidade (no momento em que a atuação estatal se referir concretamente a alguém).36 Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.37 Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Além disso, as taxas, segundo o art. 145, § 2º, da Constituição Federal38 e parágrafo único do

art. 77 do Código Tributário Nacional, não poderão ter base de cálculo própria dos impostos.

As taxas podem ser classificadas como taxas de polícia e de serviços.

O poder de polícia a que se refere o art. 78 do CTN, nada tem a ver com a

segurança pública ou com a força policial propriamente dita. Refere-se ao poder atribuído à

Administração Pública para limitar os direitos individuais ou coletivos visando a manutenção

da ordem pública, verificando o cumprimento das normas pertinentes e conceder a autorização,

licença ou alvará, por exemplo. Os interesses coletivos se sobrepõem aos interesses individuais.

Assim, tem-se a polícia sanitária, a polícia de construções, a polícia de pesos e medidas, etc.

Há certos direitos cujo exercício deve ser conciliado com o interesse público, cabendo ao Estado policiar a atuação do indivíduo. A construção de um prédio ou a instalação de uma empresa devem obedecer às leis de zoneamento, de segurança etc. Cabe à administração pública verificar o cumprimento das normas pertinentes e conceder a autorização, licença ou alvará. Do mesmo modo, se um indivíduo deseja portar uma arma, ele deve solicitar a licença do Estado; querer viajar para o exterior, compete-lhe obter passaporte. (AMARO, 2007, p. 33)

Já em relação à taxa de serviços, têm como fato gerador uma atuação estatal

consistente na execução de um serviço público, específico e divisível, efetivamente prestado ou

posto à sua disposição do contribuinte (CTN, art. 77).

Em outras palavras, quanto aos serviços públicos que constituem fato gerador de

taxas: a) são utilizados efetivamente, quando usufruídos a qualquer título pelo contribuinte; b)

são utilizados potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à

disposição do contribuinte mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; c) são

específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade

ou de necessidade pública; e, d) são divisíveis, quando suscetíveis de utilização,

separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.

Na sistemática constitucionalmente estabelecida para a cobrança das taxas

encontra-se sempre o mesmo pressuposto: o interesse público tutelado sob a forma de

fiscalização ou de obrigatória prestação de serviço39. Por tais características, as taxas se prestam 38 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] § 2º - As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.39 Celso Antônio Bandeira de Mello (2003) considera o conceito de serviço público como jurídico positivo (em contraposição aos que seriam lógico jurídicos), para assim defini-lo: “Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinentes a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais -, instituído em favor dos interesses

perfeitamente à tarefa de proteção ambiental, podendo ser exigidas em função da atividade de

fiscalização ambiental como pela prestação obrigatória de serviços que tenham caráter

ambiental (FERRAZ, 2005).

Logo, os limites às taxas são constitucionalmente estabelecidos correspondentes ao

custo da atividade estatal de fiscalização ou de prestação de serviços, sendo admissíveis taxas

relativas à fiscalização da emissão de poluentes por veículos e indústrias, relativas à utilização

da água, à proteção do solo, da fauna, da flora, etc.

3.1.4.3 Contribuição de Melhoria Ambiental

Com relação às contribuições de um modo geral, Geraldo Ataliba as distingue das

taxas em face de um elemento intermediário entre a atuação estatal e o contribuinte, conforme

se verifica:

Nas contribuições, pelo contrário, não basta a atuação estatal. Só há contribuição quando, entre a atuação estatal e o obrigado, a lei coloca um termo intermediário, que estabelece a referibilidade entre a própria atuação e o obrigado. Daí o distinguir-se a taxa da contribuição pelo caráter, direto ou indireto, da referibilidade entre a atuação e o obrigado (1991, p. 147).

Quanto ao critério material da hipótese tributária da contribuição de melhoria,

entende Sacha Calmon Navarro Coêlho (1992) que o mesmo é composto por dois elementos: a

realização de obra pública e a valorização ou benefício para os imóveis sitos na área de

influência da obra. Em seu parecer, conseqüentemente, a base de cálculo equivalerá à quota do

custo relativa ao contribuinte, ou a correspondente valorização, especificamente considerada.

De efeito, assim como as taxas, a Contribuição de Melhoria é um tributo vinculado

a uma contraprestação estatal relativa à realização de uma obra pública que beneficie o

contribuinte pela valorização de um imóvel (limite individual), tendo como limite total a

despesa realizada.

Melhoria (melhora ou melhoramento) expressa a elevação de algo para um estado ou condição superior. É antônimo de pioria (piora ou pioramento). O vocábulo “melhoria” não se refere (salvo em linguagem metonímica) à obra em si; esta é a causa; aquela, a conseqüência: a melhoria decorre da obra. A valorização das propriedades adjacentes é

definidos como públicos no sistema normativo”. Concorreriam, nessa concepção de serviço público, dois elementos, um material (oferta de utilidade materiais) e o outro formal (regime jurídico), onde o segundo é que teria importância definitiva, por conferir caráter jurídico à noção de serviço público.

diretamente proporcional à melhoria que advenha da obra pública. A valorização é a medida da melhoria. À vista do engate necessário entre melhoria e valorização, onde esta inexistir, descabe, a nosso ver, a contribuição. O tributo não se legitima pela simples realização da obra. (AMARO, 2007, p. 46)

Segundo o art. 81 do CTN, a contribuição de melhoria: a) é instituída para fazer

face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária; b) tem como limite total

a despesa realizada; c) tem como limite individual o acréscimo que da obra resultar para cada

imóvel beneficiado.

De outro giro, deve ainda ser respeitado o limite individual da contribuição de

melhoria, pois não se pode cobrar, da pessoa que teve seu imóvel beneficiado pela obra pública,

importância superior ao aumento de valor que ela causou, sob pena de se desvirtuar o tributo,

transformando-o num imposto sobre a propriedade. Enfim, o parâmetro para fins de

determinação do quantum da exação é justamente a mais-valia do imóvel, decorrente da obra

pública (CARRAZZA, 2002).

O fundamento da contribuição de melhoria reside no princípio que condena o

enriquecimento sem causa. Adverte este princípio que o enriquecimento é injusto quando não

contempla com uma indenização aquele que lhe proporcionou a vantagem econômica. A

avaliação do imóvel deve ser elaborada antes e depois da mencionada obra, para que se possa

determinar precisamente a valorização que da obra decorreu.

Em outras palavras, a contribuição de melhoria é também vinculada à atividade

estatal específica relativa ao contribuinte, tratando-se, por sua vez, de excelente aplicação no

campo das ações ambientalmente orientadas40, levando à criação de parques e áreas de

preservação ambiental.

Segundo Ferraz (2005), o Poder Público ao decidir criar áreas de preservação

ambiental, como praças, parques e reservas, particularmente junto a aglomerações urbanas: a)

avaliaria a área e suas redondezas, como manda a lei relativa à contribuição de melhoria; b)

exigiria a contribuição correspondente à valorização dos imóveis circunvizinhos à área de

40 Veja-se, por exemplo, o caso ofertado pela criação de parques de preservação. A prática brasileira vem assistindo uma inversão nefasta. O Estado ao atender o interesse geral acaba por comprometer-se com indenizações vultosas na criação de parques. Via de regra o que ocorre é que o Estado estabelece a limitação à propriedade criando o parque, ou mesmo desapropriando a área com essa finalidade (direta ou indiretamente). Freqüentemente isso ocorre em áreas de escasso valor de mercado. Em momento posterior, como conseqüência da própria criação do parque (podemos imaginar um parque próximo de área urbana) há uma forte valorização dos imóveis que estão a sua volta. O particular limitado ou desapropriado de seu direito de propriedade exige justa indenização, que acaba por ser calculada de acordo com o parâmetro gerado pelas propriedades que se encontram em torno do parque, extremamente valorizadas pelo próprio parque, aumentando enormemente o valor da indenização devida por sua criação. O resultado prático é, sob o ponto de vista da economia pública, um desastre (FERRAZ, 2005, p. 349).

preservação (obra pública); c) indenizaria o proprietário do imóvel sobre o qual recai a

preservação obrigatória, pelo valor real do imóvel, com os recursos advindos dessa

arrecadação; d) teria condições de arcar com novas desapropriações semelhantes.

Neste sentido, José Marcos Domingues de Oliveira (1999, p. 66) afirma que:

A contribuição de melhoria é um tributo que, a par de seu potencial arrecadador (fiscal), pode transformar-se num elemento estimulador de grandes obras de profundo sentido ambiental (extrafiscal). Além do seu caráter utilitário, tais obras contribuem para a educação do povo, sendo que ignorância tem íntima conexão com a destruição do meio ambiente, por isso que a “educação ambiental” é tema de relevo nos colóquios sobre o meio ambiente.

No mesmo sentido, leciona Regina Helena Costa (1998, p. 306):

A contribuição de melhoria, outrossim, pode prestar-se à proteção ambiental. Pressuposto necessário para a sua exigência, a realização de obra pública que venha a provocar valorização imobiliária particular (CR, art. 145, III). Assim, se a obra pública voltar-se à preservação ambiental, como, por exemplo, a construção de parque, poder-se exigir uma contribuição de melhoria “verde”. A absorção dessa plus-valia pelo Poder Público, está atrelada ao custeio da obra, de modo que, em se tratando de meio ambiente urbano, a contribuição de melhoria pode revelar-se num expediente profícuo para fins urbanísticos.

Tem-se, então, que, se a contribuição de melhoria é apta ao atendimento de

políticas ambientais e urbanísticas, também o é para o implemento de outras políticas públicas,

portanto, com finalidade extrafiscal.

3.1.4.4 Empréstimo Compulsório Ambiental

A partir do art. 148 da Constituição Federal41 tem-se que, sempre mediante lei

complementar, a União detém competência para instituir empréstimos compulsórios, tanto para

atender a despesas extraordinárias em virtude de calamidade pública, guerra externa ou sua

iminência, quanto no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse

nacional, hipótese em que se deverá dar atendimento ao princípio da anterioridade tributária,

nos termos do art. 150, III, b, da Carta Política de 198842.

41 Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.42 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]; III - cobrar tributos: [...]; b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;

Sobre estas despesas extraordinárias, explica Coêlho (1992, p. 147):

Despesas extraordinárias são aquelas absolutamente necessárias, após esgotados os fundos públicos inclusive os de contingência. Vale dizer, a inanição do Tesouro há de ser comprovada. E tais despesas não são quaisquer, senão as que decorrerem da premente necessidade de acudir as vítimas das calamidades públicas sérias, tais como terremotos, maremotos, incêndios e enchentes catastróficas, secas transanuais, tufões, ciclones, etc. Nem basta decretar o estado de calamidade pública, cujos pressupostos são lenientes. De verdade, a hecatombe deve ser avassaladora, caso contrário se banalizaria a licença constitucional, ante acts of God que sempre ocorrem, sistematicamente, ao longo das estações do ano.

Pela exegese deste artigo, infere-se que o empréstimo compulsório é um tributo de

competência exclusiva da União Federal, que deve ser instituído por lei complementar, para

atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua

iminência, assim como no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante

interesse nacional. O fruto da arrecadação é vinculado à despesa que o originou.

O empréstimo compulsório é um ingresso de recursos temporário nos cofres do Estado, pois a arrecadação acarreta para o Estado a obrigação de restituir a importância que foi emprestada. Aqui, mais uma vez, deparamo-nos com o qualificativo da compulsoriedade [...]. Na locução “empréstimo compulsório” (que a doutrina também costuma designar como “empréstimo forçado”), o adjetivo quer expressar que o nascimento da obrigação de prestar (a título de empréstimo, embora) é determinado (forçado) pela lei, não sendo, pois, fruto da vontade dos sujeitos da relação jurídica. (AMARO, 2007, p. 50/51)

Acerca do empréstimo compulsório em virtude de guerra externa ou de sua

iminência, é imperiosa a observância de princípios do direito internacional público, uma vez

que conflitos sociais internos e apreciações subjetivas de contendas internacionais não

justificam a exigência do tributo. Nesta primeira matriz, que chamamos de emergencial, o

empréstimo compulsório embora sujeito ao princípio da legalidade (lei complementar) escapa

do princípio da anterioridade em face da urgência que reveste os motivos deflagradores da

competência para instituí-lo (COÊLHO, 1992).

No caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse

nacional, quando de sua instituição, deve ser obedecido o princípio da anterioridade, o que não

acontece nos casos de calamidade pública e guerra externa. Outrossim, a lei complementar que

instituir o empréstimo compulsório deverá fixar a forma e o prazo para a devolução do tributo,

que deverá ser necessariamente em dinheiro.

Acerca dos elementos caracterizadores e da natureza jurídica dos empréstimos

compulsórios, disserta Roque Antonio Carrazza (2002, p. 496):

É o momento de reafirmarmos que os empréstimos compulsórios são, em tudo e por tudo, verdadeiramente tributos. Tributos restituíveis, se quisermos, mas sempre tributo. Engastados no capítulo da Constituição que há nome “Do Sistema Tributário Nacional”, devem obedecer ao regime jurídico tributário, é dizer, aos princípios e normais que informam a tributação, entre nós. Demais disso, a Constituição, numa demonstração inequívoca de que eles são tributos, exibe que um dos dois tipos de empréstimos compulsórios (os empréstimos compulsórios no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional) obedeça ao princípio da anterioridade, que é, como frisamos em capítulo anterior, especificamente tributário (ao contrário, por exemplo, do princípio da legalidade, que se espraia sobre todo o campo jurídico, embora atinja, de modo incisivo, o campo tributário).

No trato das questões ambientais, os empréstimos compulsórios, diante da

vinculação obrigatória do valor de sua arrecadação à questão fundamentadora que criou o

tributo, apresenta-se como uma ferramenta importante nos casos de calamidade pública de

natureza ambiental e nos casos de investimentos públicos na esfera ambiental.

Neste sentido, Ferraz (2005) esclarece que os empréstimos compulsórios poderiam

ser interessantes instrumentos para viabilizar políticas públicas ambientais, tanto em função de

calamidades públicas (que pode ser de natureza ambiental), quanto para a realização de

investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional (que também pode ser

de natureza ambiental), tendo necessária aplicação dos recursos arrecadados nessas finalidades.

3.1.4.5 Contribuições Especiais Ambientais

As contribuições especiais são um tributo43 que ora se reveste de condições de taxa,

ora de impostos44. Porém, se trata de uma espécie totalmente autônoma de tributo de

competência, de regra, da União Federal. Desse modo, as contribuições são tributos vinculados

a uma atuação estatal específica, porém, de forma indireta ou mediata ao contribuinte

(SEBASTIÃO, 2007).

Geraldo Ataliba (1991) ensina que na contribuição medeia, entre a atuação e o

obrigado, uma circunstância, um fato intermediário. É mediante esse fato ou circunstância que

43 Há alguns autores que, sustentado não serem elas tributos, para além de utilizarem argumentos os mais variados possíveis, esquecem-se de um detalhe: não dizem o que seriam, ou, mais precisamente, qual seria o seu regime jurídico. De outro lado, entre os tributaristas que defendem a natureza tributária das Contribuições, há aqueles que as isolam dos demais tributos, colocando-as até como “tributos sui generis”, e outros, ainda, dividem-nas em Contribuições com natureza tributária e Contribuições que não seriam tributos, como é o caso de Ruy Barbosa Nogueira (FISCHER, 1999).44 Entre nós, a doutrina orientou-se por considerar a contribuição parafiscal como tributo, lecionando Becker que “as contribuições parafiscais não constituem uma natureza de tributo sui generis, mas tributo de natureza mista, porque, em determinados casos, são simples impostos com destinação determinada e, noutros, verdadeiras taxas” (ROSA JÚNIOR, 2005).

se estabelece a referibilidade entre a atuação estatal e o obrigado, o que nos leva a reconhecer

que essa referibilidade é mediata, em contraste com o que se passa na taxa.

A. Theodoro Nascimento (1984), examinando a contribuição parafiscal a partir da

Emenda Constitucional 01/69, considerou-a como imposto especial uma vez que no sistema

tributário brasileiro a parafiscalidade é imposto especial, consoativo ou corporativo, com

aquelas características que Sax e Tangorra assinalaram: exigido dos que compõem categorias

econômicas e profissionais para custear serviços que atendem necessidades especiais

experimentadas pelos grupos aos quais os contribuintes pertencem. A essa categoria tributária

que, sobreposta aos impostos gerais, ordinários, atinge grupos profissionais e econômicos que

tiram maior proveito de determinados serviços, criados para atender necessidades especiais

deles, o legislador brasileiro denominou de contribuição parafiscal.

As contribuições sociais são de competência privativa da União. Todavia, o

parágrafo 1º do art. 149 da CF, de 1988, permite que os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios possam instituir “contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em

benefício destes, de sistemas de previdência e de assistência social”. Assim, essas contribuições

referidas no mencionado dispositivo constitucional são de competência comum de todos os

entes políticos (ROSA JÚNIOR, 2005).

Excepcionalmente, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem instituir

contribuições sociais dos servidores para o sistema de previdência e assistência social, ao passo

em que, segundo o art. 149-A da Constituição Federal de 1988, inserido pela Emenda

Constitucional nº 39/2002, os Municípios e o Distrito Federal têm competência para instituir a

contribuição para custear os serviços de iluminação pública.

O art. 149, caput, da Constituição agrupa três figuras rotuladas como “contribuições”: contribuições sociais, contribuições de intervenção no domínio econômico, e contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, outorgando-as à competência da União, que deve utilizá-las como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas. (AMARO, 2007, p. 52)

A União Federal, exclusivamente, além da contribuição social cobrada dos

servidores para o sistema de previdência e assistência social, poderá instituir contribuições

sociais, ou seja, para a seguridade social (financiamento à saúde, previdência e assistência

social) e contribuições sociais gerais, financiando outros direitos sociais, tais como o salário

educação, SENAI, SENAC, etc., além das contribuições interventivas e corporativas.

No entanto, em relação às contribuições sociais, este rol não é taxativo porquanto,

segundo o § 4º do art. 195 da Constituição Federal45, a lei poderá instituir outras fontes

destinadas à seguridade social. São as chamadas contribuições residuais.

Luciano Amaro (2007, p. 53/54) leciona:

Esse rol não é exaustivo, pois o § 4º do mesmo dispositivo abre a possibilidade de a lei instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, determinando que, nessa hipótese, se obedeça ao disposto no art. 154, I. Esse parágrafo cria, no campo das contribuições para a seguridade social, uma disciplina análoga à da competência residual conferida à União para a criação de novos impostos (prevista no art. 154, I).

Mais especificamente à disciplina das contribuições sociais e de intervenção no

domínio econômico, a que se refere o art. 149 da Constituição Federal, é aplicável tanto no que

atine aos seus respectivos usos como instrumentos de controle da atividade econômica, bem

como ao objetivo de garantir direito a todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado

para as presentes e futuras gerações (NUNES, 2005).

Segundo Ferraz (2005, p. 350):

[...] a contribuição de intervenção no domínio econômico – CIDE, tem por característica própria a exigibilidade somente em determinado âmbito econômico, sem ofensa aos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, o que a torna particularmente adequada à tributação ambientalmente orientada, especialmente aquele com finalidade re-orientadora de comportamentos através da “internalização” de custos ambientais. Relativamente a essa figura do direito tributário brasileiro não cabem as objeções que se fazem apontando no tributo ambientalmente orientado uma violação ao princípio da igualdade (concretizado em matéria fiscal no critério de capacidade contributiva).

Enfim, as contribuições especiais podem ser utilizadas na implementação das

questões ambientais, principalmente porque a própria Constituição Federal de 1988 não

estabeleceu qualquer óbice neste sentido.

3.2 Competência tributária

45 Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: [...] § 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.

Diante da necessidade de se intervir na ordem social, inclusive no meio ambiente

visando, como já cediço, a sadia qualidade de vida de todos os cidadãos presentes e os futuros

também, o Estado (Poder Público) tem à sua disposição um rol de competências previamente

estabelecidas na Constituição Federal, que lhe garante o exercício de atividades das mais

variadas ordens. Por isso, vários são os instrumentos que essa figura soberana tem para cumprir

suas funções precípuas, em face do bem comum.

As regras tributárias, neste sentido, se apresentam como um instrumento

econômico, o qual, pelas suas características, acaba de toda sorte intervindo neste setor, por

meio de imposição fiscal, estimulando ou não comportamentos, ou até mesmo em decorrência

da aplicação de regras de incentivos, que a bem da verdade, também não deixam de determinar

comportamentos (SALIBA, 2005).

Contudo, para que esse exercício tributário seja de bom grado, em respeito à figura

federal democrática do Estado brasileiro, como reflexo da vontade do povo, ele deve ser

efetivamente realizado em decorrência de autorização constitucional, por meio de um poder,

comumente chamado de competência tributária, nos exatos e preciosos limites fundamentais do

“Direito Tributário Constitucional”, que é o conjunto de normas e princípios que vão regular

comportamentos fiscais nos diferentes níveis organizacionais.

[...] as competências recebidas pelos órgãos legislativos do país hão de ser desenvolvidas não só na conformidade das balizas expressas contidas no texto constitucional, como, ainda, hão de ser todos os preceitos assim emanados realizadores e respeitadores dos princípios constitucionais fundamentais. Entender de outra maneira é reduzir a Constituição a mera tábua de sugestão, simples rol de recomendações. É negar-lhe a vis de Lei Máxima, vigor de Carta Fundamental, eficácia de Suprema Lei do país. (ATALIBA, 1998, p. 43)

Sobre a competência, Farias (1999) esclarece que a autonomia das figuras

federativas é uma característica fundamental de um Estado Federado, pois nele, pressupõe-se a

repartição de competências para O exercício e também para o desenvolvimento de uma

atividade normativa. Esta distribuição constitucional de poderes constitui ponto nuclear da

noção de Estado Federal.

Não discrepando, Paulo de Barros Carvalho (2007, p. 236) esclarece que a

competência tributária é “uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes de que são

portadoras as pessoas políticas, consubstanciada na possibilidade de legislar para a produção de

normais jurídicas sobre tributos”.

A competência engloba, portanto, um amplo poder político no que respeita a

decisões sobre a própria criação do tributo e sobre a amplitude da incidência, não obstante o

legislador esteja submetido a várias limitações ao poder de tributar, como será visto adiante.

Assevera Aliomar Baleeiro (2000), que por meio da Constituição, a competência

tributária, com base no seu sistema rígido, é que vai discriminar as receitas dos três níveis de

governos do Estado Federal garantindo-lhe autonomia, retirando com isso, qualquer

possibilidade de acumulação ou concorrência de um com o outro. Por isso, é que sob os

auspícios do sistema constitucional tributário de 1988, depara-se com um quadro

discriminatório de fontes de receitas atribuído a cada ente político, para que numa

contraprestação possa implementar diversas atividades em prol da sociedade através de gastos

públicos, nos seus respectivos campos de incidência; com esse poder tributário detido, fica

restrito a cada um, o exercício de determinada tributação, considerando sempre uma

materialidade específica que pela sua regra, não poderá se misturar.

3.2.1 Classificação da competência tributária

Segundo Amaro (2007), existem três modalidades de competência tributária: a)

privativa (a competência de criar impostos é exercida com exclusividade por este ou aquele

ente político); b) residual (a competência atribuída exclusivamente à União Federal de instituir

impostos sobre situações não previstas na Constituição Federal); e, c) comum (competência

atribuída a todos os entes políticos, União Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios).

No mesmo sentido, Saliba (2005) leciona que ela pode se dar de três maneira, a

privativa, a comum e a residual. Prescrevem elas, mediante sua peculiar linguagem, que por

competência privativa deve-se entender aquela que garante uma determinada materialidade

tributária a um ente político, de modo discriminado; a comum, a competência que é atribuída –

mesma materialidade – a mais de um ente, de modo genérico; e, por residual, a competência

atribuída somente a uma pessoa – União – para a criação de impostos cuja materialidade não se

encontra expressamente prevista no texto constitucional.

Sobre tal classificação, Sacha Calmon Navarro Coêlho (1999) assevera que em

relação aos impostos, estes são enumerados pelo nome e discriminados na Constituição um a

um. São nominados e atribuídos privativamente, portanto, a cada uma das pessoas políticas,

enquanto as taxas e as contribuições de melhoria são indiscriminadas, são inominadas e são

atribuídas em comum às pessoas políticas. Vale dizer, os impostos têm nome e são numerus

clausus, em princípio. As taxas e as contribuições de melhoria são em número aberto, numerus

apertus, e são inumeráveis. Os impostos, em princípio, são enumerados porque, após a

Constituinte, outros podem ser criados com base da competência residual, excepcionalmente.

Logo, a Constituição Federal estabelece explicitamente a competência dos entes

políticos no tocante à instituição de tributos, pode ser privativa, comum ou residual.

Temos assim a competência tributária – ou seja, a aptidão para criar tributos – da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Todos têm, dentro de certos limites, o poder de criar determinados tributos e definir seu alcance, obedecidos os critérios de partilha de competência estabelecidos pela Constituição. A competência engloba, portanto, um amplo poder político no que respeita a decisões sobre a própria criação dos tributos e sobre a amplitude da incidência, não obstante o legislador esteja submetido a vários balizamentos [...]. (AMARO, 2007, p. 93)

Na verdade, no plano dos impostos da União, além de sua competência ordinária,

há, em caso de guerra, uma competência extraordinária, onde lhe é autorizado estabelecer

impostos que, ordinariamente, pertencem à competência dos outros entes políticos (art. 154, II).

Note-se, que o exercício da competência tributária é um atributo salutar para o bom

e fiel desenvolvimento do Estado Social e Democrático de Direito, e por isso, cabe a cada

pessoa política, no curso do federalismo implantado em nosso país, exercer de modo único sua

autonomia. Neste contexto, o poder de tributar praticado por meio de competências

previamente estabelecidas, resta de forma peculiar, que além de tratar de um desenvolvimento

público que não pode ser renunciado e que não perde seu valor jurídico fundamental, também é

indelegável, ou seja, outra pessoa política diversa daquela a quem a Constituição outorgou tal

poder, não pode exercê-lo (SALIBA, 2005).

A par destas considerações, faz-se necessário alguns comentários acerca desta

competência tributária, de acordo com o texto constitucional, considerando, para tanto, a

classificação privativa, residual e comum, de cada ente que compõem o Estado federal, nos

seus respectivos campos de tributação.

Neste mister, em relação à competência privativa tributária da União Federal, a

Constituição Federal fez questão de ressaltar, expressamente, quais tributos são de sua

competência tributária, nos termos dos artigos 15346, 15447.

Mas ainda não é só, o próprio texto constitucional autoriza a União Federal instituir

outras espécies tributárias, afora os impostos acima mencionados. Há a possibilidade de criação

de taxas e contribuições de melhoria, nos termos dos artigos 145, II e III48, 14849 e 14950, todos

da Constituição Federal de 1988.

A par disso, a União Federal, em sua competência residual, além dos impostos

residuais (CF, art. 154), pode criar outras contribuições destinadas à seguridade social, nos

moldes do artigo 195, § 4º, da Constituição Federal51.

No tocante à competência privativa tributária dos Estados e Distrito Federal, a

Constituição Federal, de igual sorte, apresenta um rol de competências que acaba levando em

consideração determinadas materialidades, nos termos do art. 155 da Constituição Federal52,

além dos tributos de competência comum, como as taxas e contribuições de melhoria (CF, art.

145, II e III), e das contribuições sociais para custeio do regime previdenciário (CF, art. 149, §

1º53).

46 Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.47 Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.48 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição; III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.49 Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.50 Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.51 Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: [...] § 4º A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.52 Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; III - propriedade de veículos automotores.53 Art. 149 [...] § Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.

Ademais, e não deixando de analisar o dispositivo acrescido pela Emenda

Constitucional n. 39, de 19 de dezembro de 2002, acrescentando o artigo 149-A à Constituição

Federal de 198854, foi colocado à disposição também do Distrito Federal, de modo exclusivo

para com seu campo de competência, o poder de criação de um tributo para custear seu

respectivo serviço de iluminação pública, intitulado como contribuição para o custeio desta

iluminação pública.

Finalmente, o artigo 156 da Constituição Federal55 estabelece a competência

tributária dos Municípios, e também, nada obstante a omissão constitucional no caput deste

artigo, ao Distrito Federal, considerando como justificativa para este último, o que dispõe o

artigo 32, § 1º56, que garante ao ente distrital as competências legislativas dos Estados e dos

Municípios, e também o artigo 14757, que na sua parte final, prescreve que ao Distrito Federal

cabem os impostos municipais, para legislarem.

Com efeito, levando-se em conta as regras outorgadas pela Constituição Federal aos

Municípios e também ao Distrito Federal, além dos impostos relacionados no artigo 156, há a

possibilidade de instituição de outros tributos, nos termos dos artigos 145, II e III, 149, § 1º e

149-A.

Enfim, vê-se que as pessoas políticas que compõem nossa federação (União

Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios) receberam Poderes Legislativos para

implementarem suas atividades, tanto na ordem ambiental, visando seu equilíbrio, quanto na

ordem tributária, com o intuito de intervir na sociedade por meio de imposição fiscal,

estimulando ou não comportamentos, ou até mesmo em decorrência da aplicação de regras de

incentivos.

54 Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.55 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.56 Art. 32. O Distrito Federal, vedada sua divisão em Municípios, reger- se-á por lei orgânica, votada em dois turnos com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços da Câmara Legislativa, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º - Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios.57 Art. 147. Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.

3.3 Limitações ao poder de tributar

Os tributos são criados conforme a competência tributária que a Constituição

Federal confere à União Federal, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. Por óbvio,

esta competência tributária outorgada aos entes políticos não é sem fronteiras. Estas vedações,

além de resguardarem os valores assegurados pela Constituição Federal, correspondem a um

conjunto dos princípios e normas, denominados pelo próprio texto constitucional como

limitações ao poder de tributar, os quais estão previstos nos artigos 150 a 152 da CF.

Porém, além das limitações ao poder de tributar previstas na Constituição, existem

várias imunidades tributárias que se encontram fora da seção das “Limitações do Poder

Tributar”, em outros capítulos da Constituição Federal, como o dos direitos e garantias

individuais, da seguridade social e da ordem econômica.

Ademais disso, a Constituição abre campo para a atuação de outros tipos

normativos (lei complementar, resoluções do Senado, convênios) que, em certas situações,

também balizam ou regulamentam o poder do legislador tributário na criação ou modificação

de tributos, o que significa que os limites da competência tributária não se resumem aos que

estão definidos no texto constitucional.

O exercício do poder de tributar supõe o respeito às fronteiras do campo material de incidência definido pela Constituição e a obediência às demais normas constitucionais ou infraconstitucionais que complementam a demarcação desse campo e balizam o exercício daquele poder. Requer a conformação com os princípios constitucionais tributários e a adequação, quando seja o caso, aos limites quantitativos (alíquotas ou mínimas) definidos na Constituição, em leis complementares ou em resolução do Senado. Pressupõe, ainda, a harmonia formal com os modelos constitucionais de produção do direito: tributos (em regra) criam-se por lei ordinária; alguns, porém, demandam lei complementar para serem validamente instituídos; alguns podem ter alíquotas alteradas por ato do Executivo, enquanto outros (que formam a regra) só podem ser modificados por lei, inclusive no que respeita às suas alíquotas. (AMARO, 2007, p. 106/107)

Enfim, as “limitações ao poder de tributar” integram o conjunto de traços que

demarcam o campo, o modo, a forma e a intensidade de atuação do poder de tributar, ou seja, a

definição da competência tributária completa-se com os demais preceitos que balizam o seu

exercício: a idoneidade do veículo instituidor do tributo (lei, e não simples decreto, por

exemplo), as normas sobre aplicação no tempo (por exemplo, a lei que institui o tributo não

pode ser retroativa), as normas de imunidade (por exemplo, o citado imposto municipal não

incide sobre a transmissão de imóveis a título de integralização de capital subscrito), etc.

A Constituição prevê a limitação da competência tributária dos entes políticos

também através de outras normas infraconstitucionais (lei complementar, resoluções do Senado

Federal, convênios), que também atuam no sentido de balizar o poder do legislador tributário

na criação ou modificação de tributos.

3.3.1 Princípios e normas de limitação do poder de tributar

A União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não têm

competência para instituir tributos ao seu bel prazer. A Constituição Federal, bem como outros

instrumentos legislativos (lei complementar, resoluções do Senado Federal, convênios) impõem

limitações à competência tributária destes entes. Costuma-se chamar “princípios”, por

comodidade didática, tais balizamentos.

De efeito, passa-se a abordar alguns princípios de direito tributário relevantes em

matéria ambiental. Embora outros princípios interessem à tributação ambiental, estudar-se-á

aqui aqueles de maior relevância: os princípios da legalidade, isonomia, capacidade

contributiva, tipicidade e progressividade, além do princípio do poluidor-pagador que, embora

não pertença ao campo do Direito Tributário, faz-se importante no trato dos tributos ambientais.

3.3.1.1 Princípio da legalidade tributária e tipicidade

Segundo Montesquieu (1996), as leis, no seu sentido mais amplo, são relações

necessárias que derivam da natureza das coisas e, nesse sentido, todos os seres têm suas leis; a

divindade possui sua lei; o mundo material possui suas leis; as inteligências superiores ao

homem possuem leis; os animais possuem suas leis; o homem possui suas leis.

O princípio da legalidade tributária, segundo o art. 150, I, da Constituição Federal58,

estabelece que é vedado exigir ou aumentar tributo sem que a lei o estabeleça. Este princípio

tem sustentáculo nos ideais de justiça e de segurança jurídica, valores que poderiam ser

esquecidos se à administração pública fosse permitido, livremente, decidir quando, como e de

quem cobrar tributos.

No discurso de Geraldo Ataliba (2003, p. 125):

Deveras, pelo princípio da legalidade afirma-se, de modo solene e categórico, que, sendo o povo o titular da coisa pública e sendo esta gerida, governada e disposta a seu (do povo) talante – na forma da Constituição e como deliberado por seus representantes, mediante solenes atos legais – os administradores, gestores e responsáveis pelos valores, bens e interesses considerados públicos são meros administradores, que, como tais, devem obedecer à vontade do dono, pondo-a em prática, na disposição, cura, zelo, desenvolvimento e demais atos de administração dos valores, bens e interesses considerados públicos (do povo).

Se houver, portanto, um tributo fora da lei, incluindo o ambiental, ele será nulo de

pleno direito. Para que exista e tenha eficácia, o tributo deverá sempre estar disciplinado em lei,

além de descrever todos os aspectos da norma jurídica tributária, deverá também conter, para

cada caso concreto, os critérios referentes ao ato administrativo do lançamento. Isso significa

dizer que o princípio da legalidade exige que a lei descreva, em pormenores, os procedimentos

a ser adotados pela Fazenda Pública no lançamento do tributo, bem como os respectivos

processos de recolhimento e fiscalização (ARAÚJO, 2003).

Em outras palavras, a legalidade tributária não se conforma com a mera autorização

de lei para cobrança de tributos; requer-se que a própria lei defina todos os aspectos pertinentes

ao fato gerador, necessários à quantificação do tributo devido em cada situação concreta que

venha a espelhar a situação hipotética descrita na lei. A lei deve definir, de modo expresso, as

situações tributáveis e os critérios de quantificação do tributo.

A legalidade tributária implica, por conseguinte, não a simples preeminência da lei, mas a reserva absoluta da lei, vale dizer, a necessidade de que toda a conduta da Administração tenha o seu fundamento positivo na lei, ou, por outras palavras, que a lei seja o pressuposto necessário e indispensável de toda a atividade administrativa. (AMARO, 2007, p. 112)

Por esta razão, não tem a autoridade administrativa o poder de decidir, no caso

concreto, se o tributo é devido ou quanto é devido. A obrigação tributária é uma decorrência

necessária da incidência da norma sobre o fato concreto, cuja existência é suficiente para o

nascimento daquela obrigação (CTN, art. 11459).58 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.59 Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

Tanto quanto o Direito Penal, o Direito Tributário registra, ao longo de sua evolução de sua evolução histórica, a luta indormida dos povos para submeter o poder dos governantes ao primado da legalidade. Os jus puniendi e o jus tributandi foram, antanhos, absolutos. Hoje, todavia, se repete por toda parte: nullun tributum, nulla poena sine lege. Assim o quer a consciência jurídica hodierna. [...] O Estado de Direito e legalidade na tributação são termos equivalentes. Onde houver Estado de Direito haverá respeito ao princípio da reserva de lei em matéria tributária. Onde prevalecer o arbítrio certamente inexistirá Estado de Direito. E, pois, liberdade e segurança tampouco existirão (COÊLHO, 2001, p. 194).

Segundo Modé (2006, p. 77-78), a aplicação do princípio da legalidade remete a

algumas conclusões importantes. A primeira delas é a de que se excluem do âmbito do Direito

Tributário algumas fontes de Direito como os acordos firmados entre particulares, incapazes de

instituírem ou alterarem determinação legal.

Além da Constituição Federal, o Código Tributário Nacional também exprime o

princípio da legalidade no art. 9760, estabelecendo que somente a lei pode instituir tributos ou

extingui-los, majorá-los ou reduzi-los. A definição do fato gerador da obrigação tributária e do

sujeito passivo, a fixação da alíquota e da base de cálculo são também matérias sob reserva da

lei, da mesma forma que a aplicação de penalidades tributárias, as hipóteses de suspensão da

exigibilidade ou de extinção do crédito tributário, bem como a isenção e a anistia e, finalmente,

as hipóteses de dispensa ou redução das penalidades.

Na esfera tributária, mais do que legalidade, vige o princípio da estrita legalidade

(ou da reserva absoluta da lei formal, quedando assim afastada a reserva relativa), pois, o

princípio da legalidade, no Direito Tributário, não exige, apenas, que a atuação do Fisco rime

com uma lei material (simples preeminência da lei). Mais do que isto, determina que cada ato

concreto do Fisco, que importe exigência de um tributo, seja rigorosamente autorizado por uma

lei (CARRAZZA, 2002).

Esta lei exigida pela Constituição Federal, de regra, é lei ordinária. Por exceção,

para alguns tributos, a Constituição requer lei complementar, é o caso, por exemplo, dos

empréstimos compulsório (art. 148) e dos impostos que podem ser criados pela União Federal

no exercício da chamada competência residual (art. 154).

60 Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas; VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

O princípio da estrita legalidade determina que a lei ordinária, fonte de produção,

por excelência, da norma tributária, tendo em vista que a Constituição exige lei complementar

para instituição de alguns poucos tributos, e somente a lei é que pode trazer todos os aspectos

atinentes à hipótese de incidência tributária. Todos os elementos essenciais do tributo devem

ser erigidos abstratamente pela lei para que se considerem cumpridas as exigências do princípio

da legalidade. Convém lembrar que são “elementos essenciais” do tributo os que, de algum

modo, influem na e no quantum da obrigação tributária (CARRAZZA, 2002).

Mesmo em relação aos tributos cujas alíquotas, nos casos narrados acima, podem

ser alteradas sem lei formal (Poder Legislativo), é preciso sublinhar que sua criação depende,

em todos os aspectos, de definição em lei (formal), mesmo quanto às alíquotas. Não pode a lei

criar o tributo sem lhe precisar a alíquota. A lei especificará a alíquota do tributo e,

posteriormente, poderá o Poder Executivo, nos casos excepcionados acima, alterar a alíquota já

fixada na lei.

Dessa forma, a realização de políticas ambientais visando à instituição de sistemas

de precaução, prevenção e reparação ambientais poderão ser custeadas pela tributação

ambiental, porém, somente após a criação de lei específica que a viabilize.

Como se pode perceber, a tributação ambiental tem de ter como fundamento o

princípio da legalidade tributária, pois esse princípio é a base do Estado Democrático de

Direito. A Constituição Federal atribui ao Poder Legislativo o poder de criar leis e estabelece o

dever do Poder Executivo, do Judiciário e da coletividade de obedecer a elas, executá-las e

aplicá-las.

3.3.1.2 Princípio da anterioridade da lei tributária

A Constituição veda cobrar tributos “no mesmo exercício financeiro em que haja

sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou” (art. 150, III, b). É o princípio da

anterioridade da lei tributária. Com a Emenda Constitucional nº 42/2003, foi inserida uma

alínea c neste dispositivo (art. 150, III), para vedar, ainda, que o tributo seja cobrado antes de

decorridos 90 (noventa) dias da data de publicação da lei que o instituiu ou aumentou

(denominada anterioridade nonagesimal).

Assevera Sacha Calmon Navarro Coêlho (2001, p. 195) que:

O princípio da anterioridade expressa a idéia de que a lei tributária seja conhecida com antecedência, de modo que os contribuintes, pessoas naturais ou jurídicas, saibam com certeza e segurança a que tipo de gravame estarão sujeitos no futuro imediato, podendo dessa forma organizar e planejar seus negócios e atividades.

Exercício financeiro é o período de tempo para o qual a lei orçamentária aprova a

receita e a despesa pública. Em regra, os orçamentos são anuais, coincidindo com o ano civil

(01/01 a 31/12). Além disso, a Constituição exige que a lei que crie ou aumente tributo seja

anterior ao exercício financeiro em que o tributo será cobrado e, além disso, se observe a

antecedência mínima de 90 (noventa) dias entre a data da publicação da lei que instituiu ou

aumentou o tributo e a data em que passa a aplicar-se.

Na verdade, o princípio da anterioridade está intimamente relacionado com o

princípio da segurança jurídica, já que visa evitar surpresas para o contribuinte no curso do

mesmo exercício financeiro.

No mesmo sentido, Coêlho (2001) esclarece que o princípio da anterioridade brota,

portanto, de outro, essencial ao Estado Democrático de Direito, que é o princípio da não-

surpresa, que, ao seu turno, comporta em seu seio a aspiração popular de se poder tomar prévio

conhecimento da disposição legal que implicará, em futuro próximo, uma obrigação tributária,

de forma que possa fazer um planejamento de seus desembolsos relativamente a suas

atividades. Em última palavra, é corolário da segurança jurídica.

A vontade do legislador ao estabelecer tal limitação ao poder de tributar foi

proteger o contribuinte contra a surpresa de alterações tributárias ao longo do exercício

financeiro, o que afetaria o planejamento das atividades dos contribuintes. À vista deste

princípio, o contribuinte sabe, ao início de cada exercício, quais as regras que irão vigorar ao

longo do ano em curso.

No entanto, alguns tributos, segundo o art. 150, § 1º da CF61, escapam à aplicação

do princípio da anterioridade, quais são: imposto de importação (II), imposto de exportação

(IE), o imposto sobre produtos industrializados (IPI) e o imposto sobre operações de crédito,

câmbio, seguro e operações com títulos e valores mobiliários (IOF).

61 § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.

Exceção restrita foi criada pela Emenda Constitucional nº 33/2001, em relação ao

ICMS, ao acrescentar o § 4º ao art. 155 da Constituição, ou seja, as alíquotas do ICMS sobre

combustíveis e lubrificantes com tributação monofásica prevista em lei complementar devem

ser definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal e podem ser reduzidas e

restabelecidas, não se lhes aplicados o art. 150, III, b. Mesma situação ocorre com a

Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE.

Para as contribuições para a Seguridade Social instituídas após a promulgação da

Constituição da República de 1988, vige a regra da anterioridade nonagesimal, pois apenas

noventa dias após a publicação da lei instituidora é que a exação poderá ser cobrada, nos termos

do art. 195, § 6º62 (SEBASTIÃO, 2007).

Há, ainda, outros tributos que não se submetem ao princípio da anterioridade. É o

caso do empréstimo compulsório por motivo de guerra externa ou de calamidade pública, pois,

dada a necessidade destes recursos, não se pode aguardar o exercício subseqüente para aplicar o

tributo. Todavia, o empréstimo compulsório criado para atender a investimento público urgente

e relevante deve obedecer o princípio da anterioridade, por disposição expressa do art. 148, II,

da Constituição Federal.

Em relação aos tributos ambientais, por sua vez, não poderá ser afastado o princípio

da anterioridade tributária, porquanto implícito do próprio ordenamento jurídico pátrio, em face

de alterações tributárias ao longo do exercício financeiro, o que afetaria o planejamento das

atividades dos contribuintes. À vista deste princípio, com força no princípio da segurança

jurídica, o contribuinte sabe quais os tributos devidos em cada exercício.

Verifica-se, dessa forma, que a tributação ambiental, por não possuir nenhuma

exceção explicitada na Constituição Federal, deve obedecer ao princípio da anterioridade, ou

melhor, qualquer tributo deve respeito a esse princípio, com exceção dos tributos elencados no

art. 150, § 1º, da Constituição Federal de 198863.

62 Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: [...] § 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b".63 Imposto sobre a importação de produtos estrangeiros; impostos sobre a exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; imposto sobre produtos industrializados; imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativo a títulos ou valores mobiliários; imposto lançado por motivo de guerra externa; empréstimos compulsórios para atender despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou de sua iminência.

3.3.1.3 Princípio da irretroatividade da lei tributária

A Constituição Federal predica, em seu art. 5º, XXXVI, que a lei nova não poderá

ser editada em prejuízo do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada. Disso

se retira que, como regra geral, a lei não retroagirá para atingir fatos pretéritos, salvo quando

for em benefício do cidadão (SEBASTIÃO, 2007).

A lei, como regra genérica, impessoal, preexistente, representa um instrumento que

traduz a segurança jurídica. Portanto, a aplicação retroativa só pode ocorrer quando for benéfica

e não ferir direito de terceiro. Daí a menção de que não prejudicará o direito adquirido, o ato

jurídico perfeito e a coisa julgada (GRUPENMACHER, 1997).

Em outras palavras, o princípio da irretroatividade das leis vem assegurar que a lei

tributária nova, que institua ou majore tributos não atinja fatos jurídicos tributários já

concretizados, mas apenas os que ainda estão por ocorrer. Caso contrário, tal lei será

considerada inconstitucional, nos termos do art. 150, III, a, da Constituição da República.

A lei tributária, mesmo em relação à criação de tributos ambientais, não poderá

retroagir atingindo fatos jurídicos já concretizados64.

3.3.1.4 Princípio da isonomia ou igualdade tributária

A igualdade de todos perante a lei abre o capítulo dos deveres individuais e

coletivos da Constituição (art. 5º, caput, CF), assegurando que todos são iguais e garante a

todos o direito à isonomia, principalmente entre homens e mulheres.

Na verdade, esse princípio é uma versão, para a área tributária, do princípio da

isonomia jurídica, garantido na Constituição Federal, em que “todos são iguais perante a lei”.

Ou seja, aqueles que se encontram em condições iguais devem ter tratamento isonômico da

entidade tributante (ARAÚJO, 2003).

64 Não obstante tal regra, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, a Súmula 584 vem desprezar tanto o princípio da anterioridade, como o princípio da irretroatividade ao enunciar: “Ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano base aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração”.

No campo tributário, especificamente, o art. 150, II, veda “tratamento desigual

entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em

razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da

denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”.

Em outras palavras, este princípio busca vedar a desigualdade entre os iguais e a

distinção com base na ocupação do contribuinte, buscando tratar igualmente os iguais e

desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade (princípio da capacidade

contributiva).

Este princípio implica, em primeiro lugar, que, diante da lei “x”, toda e qualquer pessoa que se enquadre na hipótese legalmente descrita ficará sujeita ao mandamento legal. Não há pessoas “diferentes” que possam, sob tal pretexto, escapar do comando legal, ou ser dele excluídas. Até aí, o princípio da igualdade está dirigido ao aplicador da lei, significando que este não pode diferenciar as pessoas, para efeito de ora submetê-las, ora não, ao mandamento legal (assim como não se lhe faculta diversificá-las, para o fim de ora reconhecer-lhe, ora não, benefício outorgado pela lei). Em resumo, todos são iguais perante a lei. (AMARO, 2007, p. 135)

A igualdade é uma garantia do indivíduo e não do Estado. Assim, se, diante de duas

situações que merecem igual tratamento, a lei exigir tributo somente na primeira situação, não

cabe à administração fiscal, com base no princípio comentado, tributar ambas as situações;

compete ao indivíduo compelido à obrigação tributária contestar tal cobrança com força neste

princípio constitucional. Não pode a analogia ser invocada pela administração para exigir o

tributo na situação não prevista (CTN, art. 108, § 1º65).

Enfim, hão de ser tratados com igualdade aqueles que tiverem igual capacidade

econômica, e com desigualdade os que revelem riquezas diferentes e, portanto, diferentes

capacidades de contribuir. É a partir de afirmações como essa que se encontram algumas

dificuldades em aplicar esse princípio para a tributação ambiental.

Jorge Jiménez Hernández (1998, P. 158) explica que:

[...] se o princípio da igualdade em âmbito tributário se traduz no respeito aos princípios da progressividade e capacidade econômica, e este último se interpreta de forma que situações economicamente iguais devem ser tratadas de igual maneira, os tributos ecológicos parecem descumprir este princípio, pois seus fatos geradores não observam esta equidade, já que oneram somente os atos econômicos contrários ao meio ambiente. O problema poderia ser verificado em casos em que contribuintes com idêntica capacidade econômica, como poderiam ser empresas com iguais rendimentos e igual patrimônio, sejam tributadas de diferente maneira, em virtude de um tributo ambiental.

65 Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: [...] § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.

Parece advertir-se no exemplo citado uma desigualdade de tratamento que desrespeita o princípio da igualdade.

Como já dito, tratar igualmente pessoas que possuem o mesmo poder econômico é

realizado por meio do princípio da capacidade contributiva, que é uma das manifestações do

princípio da igualdade. Entretanto, os tributos que possuem a poluição ambiental ou utilização

dos bens ambientais como hipótese de incidência tributária não guardam, necessariamente,

vínculo com a capacidade econômica do poluidor.

A tributação ambiental tem natureza extrafiscal, por realizar preceito consagrado

constitucionalmente, qual seja, a proteção ambiental. Esta última legitima a utilização da

poluição ou uso de recursos ambientais como fato jurídico tributário e coloca a capacidade

econômica como critério mínimo e máximo a fixação do valor da obrigação tributária.

Assim, a proteção ambiental constitui um interesse público relevante e, em

contrapartida, comportará o afastamento dos limites do princípio da isonomia tributária, tanto

para isentar ou beneficiar contribuintes que não agridem o meio ambiente, quanto para tributar

aqueles que provocam a perda de conteúdo desse direito fundamental.

3.3.1.5 Princípio da capacidade contributiva

O princípio da capacidade contributiva está expresso no art. 145, § 1º, da CF,

estabelecendo que, sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados

segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária,

identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte neste

mister.

O princípio da capacidade contributiva inspira-se na ordem natural das coisas: onde não houver riqueza é inútil instituir imposto, do mesmo modo que em terra seca não adianta abrir poço à busca de água. Porém, na formulação jurídica do princípio, não se quer apenas preservar a eficácia da lei de incidência (no sentido de que esta não caia no vazio, por falta de riqueza que suporte o imposto); além disso, quer-se preservar o contribuinte, buscando evitar que uma tributação excessiva (inadequada à sua capacidade contributiva) comprometa os seus meios de subsistência, ou o livre exercício de sua profissão, ou a livre exploração de sua empresa, ou o exercício de outros direitos fundamentais, já que tudo isso relativiza sua capacidade econômica. (AMARO, 2007, p. 138)

Este princípio tem semelhança com o princípio da igualdade, na medida em que, ao

adequar-se o tributo à capacidade dos contribuintes, deve-se buscar um modelo de incidência

que não ignore as diferenças (de riqueza) evidenciadas nas diversas situações eleitas como

suporte de imposição. E isso corresponde a um dos aspectos da igualdade, que é o tratamento

desigual para os desiguais.

Outrossim, a adequação do imposto à capacidade econômica do contribuinte

encontra, ainda, expressão no princípio da proporcionalidade, em face do qual o gravame fiscal

deve ser diretamente proporcional à riqueza evidenciada em cada situação impositiva. O

princípio da capacidade contributiva, conjugado com o da igualdade, direciona os impostos

para a proporcionalidade, mas não se esgota nesta.

O fato de a Constituição Federal referir-se à expressão “capacidade econômica”, ao

invés de “capacidade contributiva” não surpreende, pois, com isso, se pretendeu afastar as

criações jurisprudenciais, administrativas ou legais que, baseadas em presunções, ficções e

falseamentos, buscassem atingir fatos que não estivessem assentados em realidades

econômicas. Capacidade contributiva, então, somente se pode medir por meio das verdadeiras

forças econômicas do contribuinte (BALEEIRO, 2000).

Outro preceito que se aproxima do princípio da capacidade contributiva é o

princípio da progressividade, previsto para certos impostos, como o de renda. A

progressividade não é uma decorrência necessária da capacidade contributiva, mas sim um

refinamento desse postulado. A proporcionalidade implica que riquezas maiores gerem

impostos proporcionalmente maiores (na razão direta do aumento da riqueza). Já a

progressividade faz com que a alíquota para as fatias mais altas de riqueza seja maior.

Embora a Constituição (art. 145, § 1º) só se refira a impostos, outras espécies

tributárias podem levar em consideração a capacidade contributiva, em especial as taxas,

cabendo lembrar que, em diversas situações, o próprio texto constitucional veda a cobrança de

taxas em hipóteses nas quais não se revela capacidade econômica (por exemplo, art. 5º,

LXXVI66).

Enfim, o que se há de buscar é a harmonização do princípio constitucional de

respeito à capacidade econômica com os demais princípios constitucionais, o que deve ser

66 LXXVI - são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei: a) o registro civil de nascimento; b) a certidão de óbito.

cumprido não a critério da autoridade, mas nos termos da lei (que, advirta-se, deve, igualmente,

adequar-se aos princípios constitucionais).

No que tange à tributação ambiental, verifica-se que o seu papel principal é

estimular o desenvolvimento de atividade de proteção ambiental e desestimular condutas

poluidoras, conseqüentemente, a arrecadação assume papel secundário.

Os tributos ambientais, em qualquer espécie, não se fundamentam no princípio da

capacidade econômica. O contribuinte de um tributo ecológico não está obrigado a pagar

porque possua mais ou menos riqueza, mas porque poluiu e deve contribuir com base na

solidariedade coletiva sobre a função pública de preservar o meio ambiente. Esta concepção,

em que se embasa a configuração dos tributos ecológicos, é, em todos os aspectos, discrepante

da concepção tradicional, que situa o princípio da capacidade econômica como fundamento de

imposição tributária (HERNANDEZ, 1998).

Regina Helena Costa (1998) assevera ser inviável a aplicação do princípio para os

tributos vinculados (taxas e contribuições de melhoria) em razão de sua própria natureza, que,

por sua remuneratória dos serviços prestados pelo Poder Público, deve levar em conta os

respectivos custos e não, a capacidade contributiva dos indivíduos. Afirma que, de toda forma,

a igualdade não deixa de ser atendida, na medida em que todos os que usufruíram do serviço ou

suscitaram providências administrativas em razão de poder de polícia, no caso das taxas, são

chamados a custeá-los. Também entende que na contribuição de melhoria a mais-valia é gerada

pelo Estado, em nada se correlacionando com a capacidade contributiva do sujeito. Ainda

segundo a mesma autora, as contribuições sociais, por sua vez, carregam em seu bojo não o

princípio da capacidade contributiva, mas, o do benefício, no qual se vislumbra uma especial

despesa ou vantagem relativa ao contribuinte. Somente quando comportar natureza de imposto

é que se aplica o princípio às contribuições sociais.

Todavia, não obstante a não aplicação do princípio da capacidade econômica aos

tributos ecológicos, isso não quer dizer que a análise da capacidade contributiva do contribuinte

deva ser descartada. O princípio da capacidade econômica deve ser entendida, portanto, como

qualidade subjetiva do sujeito passivo da obrigação tributária ambiental. Assim, o fato gerador

se amoldará ao princípio do poluidor pagador, com aspectos extrafiscais, que deverão ser

valorados de acordo com as manifestações da capacidade econômica do contribuinte.

O fato gerador de um tributo ambiental, por exemplo, pode ser a emissão de

resíduos realizadas por uma empresa. Certamente, a realização de uma atividade econômica

permite delinear juridicamente o fato gerador, já que tal configuração jurídica denota força

econômica no sujeito passivo, seja através dos elementos patrimoniais de que dispõe da

atividade econômica, seja através da obtenção de renda fruto de tal atividade.

Soares (2001) sustenta que, com relação à fiscalidade ecológica, o montante do

tributo ambiental em sentido próprio deve ser definido em função do dano causado ao

continuum naturale, isto é, o critério de medida deve ser a capacidade contaminante. O

contribuinte, nesses casos, não é obrigado a pagar, porque detém mais ou menos riquezas, mas

porque obteve um benefício à custa de uma despesa social, degradando ou ameaçando degradar

o ambiente e, por isso, com base no princípio da solidariedade coletiva, deve contribuir para a

sua preservação. Assim, dois sujeitos titulares de uma capacidade contributiva igual, mas

responsáveis por montantes de poluição diferentes, podem ser gravados em intensidade diversa.

3.3.1.6 Princípio da vedação de tributo confiscatório

Confiscar é tomar para o Fisco, desapossar alguém de seus bens em proveito do

Estado. A Constituição garante o direito de propriedade (art. 5º, XXII, e art. 170, II67) e coíbe

(proíbe) o confisco, ao estabelecer a prévia e justa indenização nos casos em que se autoriza a

desapropriação (art. 5º, XXIV; art. 182, § 3º e 4º; art. 184). A Constituição admite, como pena

acessória, a perda de bens do condenado, na forma da lei (art. 5º, XLV e XLVI, b). O art. 150,

IV, veda a utilização do tributo com efeito confiscatório, ou seja, impede que, a pretexto de

cobrar tributo, se aposse o Estado dos bens do indivíduo.

É óbvio que os tributos (de modo mais ostensivo, os imposto) traduzem transferências compulsórias (não voluntárias, mas obrigatórias) de recursos do indivíduo para o Estado. Desde que a tributação se faça nos limites autorizados pela Constituição, a transferência de riqueza do contribuinte para o Estado é legítima e não confiscatória. Portanto, não se quer, com a vedação do confisco, outorgar à propriedade uma proteção absoluta contra a incidência do tributo, o que anularia totalmente o poder de tributar. O que se objetiva é evitar que, por meio do tributo, o Estado anule a riqueza privada. Vê-se, pois, que o princípio atua em conjunto com o da capacidade contributiva, que também visa a preservar a capacidade econômica do indivíduo. (AMARO, 2007, p. 144)

67 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] II - propriedade privada.

Algumas situações são expressivas na caracterização de confisco; por exemplo,

imposto que absorvesse toda a renda do contribuinte sem dúvida seria confiscatório; do mesmo

modo, o tributo que tomasse parcela substancial do patrimônio do indivíduo.

O princípio da vedação de tributo confiscatório não é um preceito matemático; é um

critério informador da atividade do legislador e é, além disso, preceito dirigido ao intérprete e

ao julgador, que, à vista das características da situação concreta, verificarão se determinado

tributo invade ou não o território do confisco.

Sacha Calmon Navarro Coêlho (2001), acerca desta dificuldade em definir o que

seja o tributo confiscatório, esclarece que o princípio é típico conceito que varia de acordo com

o tempo e o espaço, com o momento histórico e com a realidade econômico-financeiro de cada

país, servindo para estabelecer padrões suportáveis de imposição. Parece mais com um

princípio da razoabilidade na tributação.

Enquanto razoabilidade na tributação, o princípio do não-confisco se posta,

conforme ressaltado, como preceito introdutor de patamares ao poder estatal de tributal, com a

incumbência de minimizar os abusos porventura levados a efeito pela autoridade tributária.

Aliomar Baleeiro (2000, p. 564) informa que:

O problema reside na fixação de limites, excedidos os quais, esses objetivos, prometidos pela Constituição, estariam irremediavelmente feridos. Tribunais estrangeiros já se inclinaram por critérios empíricos, como o de 33% da renda, adotado pela Corte Suprema Argentina. Mas esse problema é fundamentalmente econômico. E, à luz da economia, fácil provar, até com a experiência, que, na tributação progressiva, se poderá atingir até quase 100% da renda – o que há fatos exemplos – sem destruir a propriedade, impedir o trabalho, desencorajar a iniciativa ou ultrapassar a capacidade contributiva.

A vedação do confisco, por sua vez, não pode ser afastada em relação aos tributos

ambientais, porquanto, segundo Modé (2006, p. 92):

A tributação ambiental, assim, ao internalizar os custos ambientais envolvidos, em relação a um dado produto ou a uma dada atividade econômica, deve limitar-se à não-invasão da propriedade ou da renda, sob pena de caracterizar efeito confiscatório.

A essa altura percebe-se, por conclusão, a ampla conexão do princípio em pauta

com aquele da capacidade contributiva, o qual ele densifica, pois os tributos, além de não

poderem ultrapassar a possibilidade econômica do contribuinte, não deverão em hipótese

alguma atingir o mínimo existencial, sob pena de enveredar pelo confisco. Derivam todos esses

preceitos, e isso é inexorável, do princípio estruturamente da igualdade tributária

(SEBASTIÃO, 2007).

Naturalmente, o princípio da vedação do confisco deve ser ponderado na instituição

de medidas extrafiscais voltadas à preservação do meio ambiente.

Entretanto, inobstante a vedação de criar figuras tributárias no afã confiscatório,

não se pode olvidar que, se o dano ambiental é significativo, de acordo com a Lei de Política

Nacional do Meio Ambiente, a atividade não deve sequer ser autorizada. Se autorizada, deverá

ser imediatamente suspensa.

3.3.1.7 Princípio da progressividade

Como já dito, o princípio da igualdade tributária poderá ser alcançado por meio da

progressividade, pois que, além de ser um instrumento de realização da capacidade

contributiva, auxilia no atingimento da almejada justiça fiscal. A progressividade compõe-se,

assim, como um sistema no qual a alíquota do imposto aumenta na medida em que aumenta o

montante tributável.

O princípio da progressividade está expressamente previsto na Constituição Federal

para o Imposto de Renda, o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana e o

Imposto sobre Propriedade Territorial Rural.

A progressividade do IPTU referida na Constituição (na redação original de seu art. 156, § 1º c/c o art. 182, § 4º, II) nada tinha que ver com a técnica a que se confere aquela denominação. O que a Constituição disciplinava, quanto ao IPTU, era seu aumento, ao longo dos anos, como “sanção”, no caso de propriedades que não cumprissem sua função social. Na Emenda Constituição n. 29/2000, preocupada com medidas de saúde pública, foi inserida disposição que alterou o art. 156 para facultar a progressividade do IPTU “em razão do valor do imóvel”, admitindo, ainda, que as alíquotas variem em função da “localização e do uso do imóvel” (art. 156, § 1º, I e II, da CF, na redação dada pelo art. 3º da Emenda). (AMARO, 2007, p. 148-149)

Para Geraldo Ataliba (1990), a progressividade é, não só compatível, como

requerida, por todos os impostos, dado que todos, por natureza, informam-se pela capacidade

econômica (art. 145, § 1º). Mais que isso: é exigida pelo requintadamente categórico e estrito

preceito do art. 150, II da Constituição Federal, que impõe tratamento desigual a situações

desiguais (evidentemente na medida dessas desigualdades).

Aplicando-se o princípio da progressividade nos tributos ambientais, suas

configurações serão orientadas para aumentar suas cargas tributárias na medida em que suas

bases de cálculo aumentarem. Dessa forma, quanto maior for a base de cálculo dos tributos

ambientais, maior será a intensidade da poluição ambiental ou da utilização dos recursos

naturais e, conseqüentemente, o princípio da progressividade estará realizando o princípio do

poluidor pagador, dando a cada um o que lhe é devido.

Percebe-se, pelo visto, que a progressividade reforça a extrafiscalidade do tributo

ambiental, pois que incentiva os contribuintes a deixarem de poluir ou reduzirem a

contaminação que exercem sobre o meio ambiente, a fim de reduzir o valor do tributo

ambiental a que são obrigados.

O princípio da progressividade está expressamente previsto na Constituição Federal

para o Imposto de Renda - IR, o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana –

IPTU e o Imposto sobre Propriedade Territorial Rural - ITR.

A progressividade é, não só compatível, como requerida, por todos os impostos,

dado que todos, por natureza, informam-se pela capacidade econômica (art. 145, § 1º). Mais

que isso: é exigida pelo requintadamente categórico e estrito preceito do art. 150, II da

Constituição Federal, que impõe tratamento desigual a situações desiguais (evidentemente na

medida dessas desigualdades) (ATALIBA, 1990).

A adoção dos tributos ambientais do tipo tradicional (imposição à produção e

consumo dos produtos específicos) pode permitir a manutenção de um adequado nível de

progressividade. Na verdade, nos estudos de ciências das finanças, há muito se demonstrou que

é possível realizar a progressividade também por meio de um uso especial de imposição

indireta, combinando à aplicação de detrações de imposto ou outros incentivos a ele coligados

em condições de compensar o caráter regressivo da retirada indireta com uma maior

progressividade dos impostos indiretos (AMARAL, 2004).

Sob o prisma ambientalístico, pode se justificar a implementação da

progressividade, por exemplo, nas normas de zoneamento urbano, estimulando a ocupação do

solo em classes homogêneas (áreas industriais, residenciais, comerciais) de modo que facilite o

controle das externalidades negativas, bem como no desconto sobre o valor do IPTU, para o

contribuinte que possuir residências equipadas para reduzir o consumo de água e de energia,

por exemplo, e em outras hipóteses congêneres, desde que munidas de propósitos

preservacionistas.

3.3.1.8 Princípio do Poluidor-Pagador frente o Direito Tributário

Inicialmente, convém destacar que o princípio do poluidor-pagador não se

apresenta como princípio tributário, porquanto não previsto na legislação tributária. Todavia,

considerando que a instituição de qualquer tributo com vistas à questão ambiental, deve pautar-

se neste princípio, fazendo-se necessário incluí-lo no rol de princípios que norteiam os “tributos

ambientais”.

Os recursos tributários devem atender a direitos fundamentais do cidadão, a direitos

fundamentais do cidadão – como a vida, a saúde, a habitação, a alimentação, dentre outros –

assim como a princípios tributários ambientais. O tributo ecológico tem que se conformar não

só com os princípios e as disposições legais que lhe são aplicáveis enquanto componente do

sistema fiscal, mas também com aqueles que se lhe dirigem em virtude de ser um instrumento

de política ambiental (SOARES, 2001).

A Constituição Federal brasileira abraçou o princípio do poluidor-pagador68

expressamente no § 3º do artigo 225: “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio

ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e

administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

O princípio do poluidor-pagador tem caráter universal, muito embora esta

nomenclatura induza, num primeiro momento, a idéia de “pagar para poluir”, ou seja, a

imposição de encargos financeiros sobre atividades poluidoras não é meio liberatório para a

prática de tais condutas.

O caráter preventivo do princípio, adaptado à ordem jurídica brasileira, sugere a interpretação de que as sanções – como, aliás, todas as sanções jurídicas – têm de fato caráter profilático. Todavia, as sanções são aplicadas depois do cometimento da infração à legalidade (não existe sanção sem fato antijurídico previamente definido).

68 “Pensamos que, em primeiro lugar, o princípio do poluidor-pagador busca evitar a ocorrência de danos ambientais, à medida que atua como estimulante negativo àquele potencial poluidor do meio ambiente. Todavia o princípio não pára por aí, já que, num plano irremediavelmente subseqüente à prevenção do dano, ainda que incide o princípio, só que tutelando as situações onde o dano ambiental já tenha ocorrido, ou seja, aplica-se também nos casos de reparação dos danos causados ao meio ambiente”. (FIORILLO; RODRIGUES; 1999, p. 120)

O efeito da sanção é a expectativa de que o agente não mais praticará o evento danoso. Essa ponderação é relevante para o tema da tributação ambiental, porque a interpretação liberal do § 3º do art. 225, da Constituição Federal, não autoriza, diretamente, a instituição de tributos de finalidade extrafiscal. [...] É necessário fazer-se interpretação sistemática do princípio com as normas gerais de Direito Tributário, sem se olvidar da função extrafiscal dos tributos, para, só assim, viabilizar a adoção de tributos ambientais inibidores da poluição (NUNES, 2005, p. 132).

A norma que comporta o princípio do poluidor-pagador faz deste uma locução

indeterminada, cabendo ao intérprete, no momento histórico conveniente, dar-lhe o sentido

próprio a atender suas finalidades básicas de correção e prevenção a danos ambientais.

Também o Direito Tributário, na medida em que se verter à política de proteção

ambiental, deverá abrir seus conceitos de modo a torná-lo indeterminados. Isso não significa

que os ideais de segurança jurídica devam ser abandonados. Para isso, a lei existe como

instrumento democrático de manifestação social. O Direito Tributário, como os outros ramos

do direito, opera também por conceitos indeterminados, que deverão ser preenchidos pela

interpretação complementar da Administração, pela contra-analogia nos casos de abuso do

direito e pela argumentação jurídica democraticamente desenvolvida (TORRES, 2000).

As medidas desprezadas ao princípio devem ser orientadas por essa finalidade, sem

que, prévia e necessariamente, deva-se saber que medidas são essas. É tarefa do Direito

contemporâneo ao fato concreto demonstrar qual instrumento se mostra mais eficaz à

efetividade do princípio do poluidor-pagador.

O princípio do poluidor-pagador possui, simultaneamente, uma finalidade

preventiva (portanto, no plano de uma educação ambiental que vise inibir a ação poluidora por

meio do aumento dos custos da produção) e um objetivo corretor da prática de condutas

atentatórias ao meio.

É inegável o relacionamento do princípio do poluidor-pagador com o repasse dos

custos das mazelas implantadas no meio ambiente pelo agente contaminador. Essa transferência

de ônus é chamada de internalização dos custos ambientais. Toda atividade econômica

industrial, como se viu, busca na natureza recursos que serão transformados e postos no

mercado. A venda dos produtos resulta no que se considera privatização dos lucros (DERANI,

1997).

Em outras palavras, para produzir, o empresário necessita apropriar-se de recursos

da natureza, privando outros dessa mesma apropriação. Isso não traria maiores conseqüências

se, contra o fato dessa apropriação (geração de bem-estar), não conspirasse outro fato: o de que

a exploração desequilibrada desses recursos prejudica todos (NUNES, 2005).

A razão desta afirmação é que todos herdarão um meio ambiente não sadio, ante a ação individual de alguém ou individualizada de um grupo que, para produzir, polui. Após a produção, o bem transformado é usado ou consumido. Os resíduos originados da produção também são lançados ao meio, privando novamente a coletividade de um ambiente hígido. Quem amealhou riqueza econômica nessa relação foi somente quem explorou o meio, transformou a natureza em produto e lançou o bem no mercado. As perdas geradas com a apropriação dos recursos e eventual agressão ao meio, quer com exploração desregrada da natureza, quer com o lançamento de resíduos decorrentes do consumo, são sofridas por todos. Essa fática equação gera o adágio: privatização dos lucros e socialização de perdas. (DERANI, 1997).

Enfim, quanto maiores forem as despesas na atividade empresarial, tais acréscimos

serão repassados para o preço final do produto. Em matéria fiscal, isso é bastante nítido, quase

intuitivo e automático; basta haver aumento de tributo para que este seja repassado ao custo do

produto. Com a tributação ambiental não seria diferente.

Assim, a imposição da assunção de ônus tributário por conta das externalidades

negativas69 poderá importar privação de tal produto para esse ou aquele setor, ou, quiçá,

inviabilizar uma determinada atividade empresarial. É necessário, portanto, haver um ponto de

equilíbrio, proporcionalização ao dano que a atividade gera no meio ambiente. Em suam, a

adoção de medidas tributárias deve ser proporcional à lesão ao meio. O encarecimento do

produto deve ser equilibrado à extensão do prejuízo que toda a coletividade sofre para sua

produção (NUNES, 2005).

A matéria da tributação ambiental está interligada à hipótese das externalidades

negativas, como fator de desequilíbrio no processo de desenvolvimento econômico, pois os

tributos incidirão sobre as atividades produtivas poluidoras, considerando-se que o dano

ambiental é uma perda social das mais graves, o que denota sua característica de externalidade

negativa.

Sobre o assunto, disserta Cristiane Derani:

[...] as leis que dispõem sobre a internalização dos custos ambientais encontram-se geralmente até o limite em que não se sobrecarrega o valor dos custos da produção, evidentemente porque levando a aplicação do princípio do poluidor-pagador até os seus limites, chegar-se-á à paralisação da dinâmica do mercado por uma elevação de preços impossível de ser absorvida nas relações de troca (1997, p. 159).

69 Considera-se negativas as externalidades, “quando uma atividade impõe custos não indenizados às pessoas. Nesse caso, o custo social de um bem (o custo com que todos arcam) excede o seu custo privado (o custo arcado pelos produtores do bem)”. São positivas as externalidades, “quando uma atividade cria benefícios para as pessoas, sem que essas precisem pagar por eles. Neste caso, o benefício social do bem (o benefício que todos recebem) supera o seu benefício privado (os benefícios daqueles que pagaram pelo bem)”. (WESSELS, 2002, p. 171)

Em verdade, trata-se de uma relação de custo-benefício que deve ser sentida pelo

poluidor. O simples repasse do tributo ao preço do produto provoca na outra ponta uma pena

cruel, porque permite a obtenção do bem por poucos, justamente aqueles que conseguem pagar

pelo mais alto custo do produto70. Destarte, não é que o poluidor esteja arcando com as perdas;

apenas estará direcionando seu produto para um mercado mais seleto do ponto de vista da

capacidade econômica.

Portanto, se há produção, esta deve se destinar a todos aqueles que dela necessitam.

Cuida-se, neste estágio, da verificação de que, se toda sociedade perde com as externalidades

negativas, eis que privada de um meio ambiente hígido e equilibrado, o empreendedor também

deve perder na mesma proporção. Isso, antes de qualquer coisa, é uma regra de mercado

tendente à manutenção do desenvolvimento econômico sustentável (NUNES, 2005).

3.5 Tributos ambientais no Brasil

No Brasil, desde o período colonial, o Estado patrocinou, induziu e, em alguns

casos, executou diretamente políticas de desenvolvimento exclusivamente voltadas para o

crescimento econômico. Este cenário colocou o Brasil entre as maiores economia do mundo,

mas, ao mesmo tempo, agravou os problemas sociais através da concentração da renda, além de

produzir um passivo ambiental de graves proporções, com a destruição das florestas, a

degradação das bacias hidrográficas, a poluição do ar e das águas.

Diante desse quadro, a sociedade brasileira não permaneceu indiferente destes

problemas ambientais, ao passo em que passou a exigir, através de organizações da sociedade

civil, mudanças no papel do Estado e, mais recentemente, à inclusão do conceito de

sustentabilidade nas estratégias do desenvolvimento nacional.

Apesar de a tributação voltada para os interesses ambientais representar um grande

avanço, a partir da comprovada experiência nos países desenvolvidos, a adoção de medidas

equivalentes ainda são tímidas no Direito brasileiro. A doutrina está apenas despertando para o

70 O aumento do preço de um produto potencialmente poluidor ou em processo de escassez não reduzirá o desejo em adquiri-lo, porém somente trará uma frustração, por elevar um produto, antes acessível, à disposição de uma oligarquia. A perversidade deste mecanismo já tem mostrado o quanto produtos antes livres e tomados como de natural acesso a qualquer pessoa, tornam-se produtos de luxo (DERANI, 1997, p. 112).

assunto, e as iniciativas de ordem legislativa fornecem ainda um enorme potencial, embora já

se conte com exemplares importantes (SEBASTIÃO, 2007).

Todavia, segundo Regina Helena Costa (2002), a implementação de um sistema de

tributos ambientais, recomendado pela Conferência da Organização das Nações Unidas para o

Meio Ambiente, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, deve atender a requisitos de eficiência

ambiental (resultados efetivos nessa área), eficiência econômica (não deve ser excessivamente

oneroso), simplicidade administrativa (não deve onerar a máquina administrativa) e repercussão

econômica positiva (para que não prejudique o ciclo de consumo no comércio interno e

internacional).

A análise dos instrumentos de política pública ambiental não pode se dar divorciada

dos conceitos e fundamentos que pautam o sistema econômico atual, informando e

determinando a lógica da utilização dos instrumentos fisco-ecológicos. Concebe-se, assim,

simultaneamente à própria juridicização do fenômeno ambiental, a utilização do Direito

Tributário como veículo eficaz à implementação das políticas públicas voltadas à sua

preservação.

Sabe-se que, há algum tempo, ainda que de uma forma incipiente, a natureza vem sendo objeto do interesse governamental. As primeiras e esporádicas ações estatais com relação ao meio ambiente, contudo, voltavam-se apenas para a tentativa de regulação da atuação dos particulares, impondo limites à fruição dos recursos naturais. A partir do fim dos anos 1960, em função do largo acirramento da preocupação com a questão ambiental a nível mundial, as políticas regulatórias e sancionatórias passaram a ser adotadas de uma forma mais ampla, no intuito de limitar ou impedir a degradação do meio ambiente. Vários fatores, porém, contribuíram para a necessidade de redimensionamento de tais políticas públicas ambientais, passando-se fortalecer a idéia, versada desde o início dos anos 1970, sobre a utilização de mecanismos econômicos e fiscal em prol do meio ambiente (TUPIASSU, p. 90).

No mesmo sentido, disserta Leite (2000, p. 450):

À primeira vista, pode parecer que a solução que se propõe encontra-se consubstanciada na instituição de tributos especificamente ambientais. Neste aspecto, é preciso considerar primeiramente que a eventual propositura de qualquer solução para a “crise ecológica” não se encontra única e exclusivamente no Direito Tributário. Porém, é necessário vencer a chamada crise lançando mão de todos os instrumentos políticos e jurídicos existentes.

Este entendimento ganhou força com o passar dos anos, baseado sempre na efetiva

utilização dos instrumentos econômicos na proteção do meio ambiente, surgindo, por sua vez,

como uma alternativa para o alcance do grau desejado de desenvolvimento sustentável, assim

como uma ampliação das necessidades de otimização das políticas regulatórias tradicionais,

permitindo a compatibilização do desenvolvimento com o direito a um meio ambiental

saudável.

Infere-se, portanto, que nosso regramento jurídico, além de autorizar a instituição

de tributos no afã de preservar o meio ambiente, a utilização de instrumentos econômicos neste

mister é uma obrigação estatal como forma alternativa à proteção ambiental, principalmente a

partir do momento em que o meio ambiente foi alçado como bem jurídico essencial à vida.

As políticas convencionais relativas à aplicação de medidas repressivas e

sancionatórias não se apresentaram de forma atuante e eficaz à proteção ambiental,

principalmente a partir das deficiências do Poder de Polícia:

Na verdade, a opção pela utilização de políticas tributárias se deve em grande parte aos insatisfatórios resultados das medidas repressivas e sancionatórias tradicionalmente adotadas. O exercício de polícia nem sempre apresenta resultados muito satisfatórios pois, em geral, além da falta de pessoal para a efetiva fiscalização, é mais vantajoso para o poluidor desafiar a administração pública e pagar as multas do que rever o seus sistema produtivo para diminuir a contaminação (VARGAS, 1998, p. 67).

Outrossim, não podemos olvidar que o Brasil tem uma carga tributária pesada e

injusta, uma fiscalização injusta, sem prejuízo de um rombo no orçamento. Porém, embora a

tributação ambiental seja ainda pouco utilizada, deve-se apostar na instituição de mecanismos

tributários que sirvam de instrumentos para a proteção ambiental sem a criação de novos

tributos ou mesmo sem o aumento da carga tributária já existente, adequando a natureza

jurídica dos tributos à variável ambiental.

Assim, na visão de Marcelo Figueiredo (2000), algum vislumbre de solução pode

repousar não na instituição de novos tributos e no aumento da carga tributária, mas em

mecanismos normativos de estímulo à preservação que convençam o empresariado nacional de

que preservar o meio ambiente seja um “bom negócio”71.

Do ponto de vista histórico, a proposta da criação de instrumentos econômicos (tributos e subsídios) para corrigir efeitos fora de mercado provocados pelo consumo ou pela produção de bens cujos autores não suportavam os custos (poluição), bem como os reflexos deste consumo e produção que também não eram pagos por aqueles que as usufruíam (consumidores e população em geral), pode ser associada aos trabalhos do professor Arthur Pigou, de Cambridge. Em 1920, ele publicou o Welfare Economics (“Economia do bem-estar”), “propondo a criação de um instrumento de regulação

71 Então, existem iniciativas. A criatividade do homem não tem limites. É preciso realmente incentivá-la, de tal maneira que o meio ambiente possa ser preservado, não com a oneração da carga tributária, repito, mas com instrumentos de política extrafiscal. Eu também acredito que o melhor mecanismo para a preservação ambiental e recuperação do meio ambiente seja a utilização dos chamados impostos indiretos, através do princípio da seletividade, como um dos mecanismos, podendo graduar a produção e o consumo através de incentivos, gradação de alíquotas, isenções, restituições, figuras premiais do direito tributário etc. (FIGUEIREDO, 2000, p. 82)

equivalente a um imposto a ser cobrado do poluidor, equivalente ao custo marginal do dano (taxa pigoviana ou taxa aceitável)” (LEITE, 2000, p. 452).

Todavia, quando se fala na utilização de tributos ambientais, faz-se necessário

divisar duas situações distintas possíveis: a primeira delas consiste na utilização do tributo com

um fim eminentemente fiscal, como instrumento gerador de recursos para atuação do Estado

em prol de um meio ambiente, funcionamento como meio arrecadatório-financiador da atuação

estatal em relação à preservação ambiental.

De um modo geral, os tributos são exigidos para o cumprimento de duas funções políticas. A primeira, e mais conservadora, é para manutenção da burocracia estatal, isto é, o custeio das despesas com a estrutura administrativa que faz funcionar o Poder do Estado. Isso implica a realização de despesas que vão desde simples contratações de terceiros ao pagamento de servidores que fazem a máquina do Estado locomover-se (NUNES, 2005, p. 93/94).

Outra situação possível é o emprego do tributo como forma “direta” ou “imediata”

de alcançar a proteção ambiental desejada, de tal modo que o seu ônus financeiro sirva de

estímulo a que o contribuinte adote uma determinada postura benéfica ao meio-ambiente. Aqui

o que se pretende com o tributo não é uma conduta do Estado (viabilizada com o dinheiro

angariado com a exação), mas uma conduta do próprio contribuinte.

[...] é caracterizada pela intervenção do Estado no domínio econômico com vistas ao atingimento de duas finalidades: i) realizar investimentos que visem o desenvolvimento econômico de determinados setores; ii) adequar o comportamento individual do sujeito passivo, com o fito do desenvolvimento coletivos em bases sustentáveis (NUNES, 2005, p. 94).

Assim, o Direito Tributário, em seu enfoque econômico financeiro, deve prover de

insumos o Direito Ambiental e, por conseguinte, a preservação ambiental.

3.5.1 Alguns exemplos de tributos ambientais brasileiros

Como se viu, a partir da juridicização do fenômeno ambiental, entre o Direito

Tributário e o Direito Ambiental, nasceu a “ecotributação”. Neste mister, o Direito Tributário

se apresenta como instrumento de implementação de políticas econômicas e ambientais,

atuando em sua função extrafiscal, ou seja, o Estado induzindo comportamentos através de

intervenções no meio social e econômico, tais como estímulos ou incentivos tributários.

Em outras palavras, a tributação ambiental leva os agentes a ações que visem a

redução da poluição e a racional utilização dos recursos naturais, ou seja, leva o agente a

realizar sua atividade buscando maior eficiência na proteção ao meio ambiente como também

maximiza seus lucros, recolhendo uma carga menor de tributos.

Outrossim, no que tange incentivos de cunho fiscal, tais medidas interventivas

servem como forma de implementação de políticas ambientais, não se consubstanciando

somente como forma de arrecadar tributos e gerar receitas, mas principalmente como

instrumento para a promoção de condutas ambientalmente desejáveis. O Estado, seja pela

imposição de tributos, seja pela concessão de subsídios, pode incrementar as políticas públicas

de preservação ambiental.

Essa prática surgiu na Europa, em meados da década de 80, e ganhou novos

contornos entre 1989 e 1994, quando incorporada à legislação de diversos países, como França,

Itália, Estados Unidos, entre tantos outros (CUNHA, 2004).

No Brasil, ganha força a tese da tributação ambiental, principalmente quando vista

pela lente dos incentivos, pois quase todos os tributos podem ser utilizados com essa conotação

de sanção positiva, premial. Entretanto, a maioria desses instrumentos ambientais tributários

depende de iniciativas legislativas municipais e estaduais, notadamente na mobilização de

parlamentares e autoridades executivas, além da sociedade civil, de forma a tornar a discussão

participativa e democrática, sob pena de esvaziar o conteúdo deste novo filão tributário

(ROCCO, 2004).

Assim, a utilização de instrumentos fiscos-ambientais foi experimentando um

contínuo crescimento, chegando aos tempos atuais como um dos principais meios de obtenção

de resultados positivos quanto à preservação da biodiversidade e dos recursos naturais. Notou-

se, ademais, que a implementação de tais políticas proporciona, além do incentivo à

preservação, a perfeita implementação do princípio poluidor-pagador; e mais ainda, a enorme

possibilidade de obtenção de um duplo dividendo, em razão, por exemplo, de sua ampla

harmonização com as políticas de emprego (TUPIASSU, 2006).

Neste contexto, partindo das nuances que envolvem a competência tributária,

buscou-se um levantamento, embora não exaustivo, das medidas fisco-ambientais já adotadas

no Brasil e daquelas passíveis de implementação.

3.5.1.1 Tributos ambientais da União

Na tributação sobre a produção e o consumo, os chamados impostos indiretos72

podem ser moldados, através de graduações de alíquotas, isenções e restituições, de forma a

estimular a fabricação e o consumo de produtos mais eficientes e menos poluentes e

desestimular a produção daqueles ineficientes e menos poluentes e desestimular a produção

daqueles ineficientes e poluidores, ou cujo processo produtivo cause poluição (SEBASTIÃO,

2007).

O Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, com força no princípio da

seletividade73, em razão da essencialidade dos produtos, pode ser utilizado como instrumento de

política ambiental por imperativo constitucional.

Então, pode-se dizer que não é uma questão de opção do legislador, mas um imperativo, uma imposição constitucional, decorrente do princípio da seletividade do IPI, que produtos industriais que estejam relacionados com a proteção do meio ambiente – equipamentos, máquinas, bens de consumo – sejam tributados minimamente, ou não tributos pelo IPI; que produtos que possam revelar esse sentido de proteção ao meio ambiente, digamos produtos ecologicamente corretos (materiais biodegradáveis, materiais que não possam causar danos à camada de ozônio, produtos que venham a ser fabricados com a reciclagem de resíduos industriais, por exemplo) haverão de ser tutelados por esse preceito da Constituição, que é posto a serviço de um objetivo extrafiscal, no caso o objetivo de proteção ecológica (SEBASTIÃO, 2007, p. 266).

O Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI deve incidir seletivamente, na

razão inversa da essencialidade do produto que, dentre outros critérios, deve levar em conta o

caráter essencial de preservação do meio ambiente.

A própria Constituição Federal indica parâmetros para a identificação da

essencialidade dos produtos e mercadorias sujeitos à tributação quando estabelece, em seu art.

7º, inciso IV74, que o salário mínimo deve atender às necessidades vitais básicas do trabalhador

72 Impostos indiretos são aqueles que se prestam, por sua natureza, à repercussão, podendo o ônus tributário ser transferido pelo contribuinte designado pela lei (contribuinte de direito) para outra pessoa que suportará, em definitivo, e ao final do processo econômico de circulação de riquezas, a carga tributária (contribuinte de fato) (ROSA Jr., 2005).73 Visa tributar mais fortemente produtos menos essenciais. Já produtos essenciais terão alíquotas menores. No IPI sua aplicação é obrigatória, para o ICMS e o IPVA sua aplicação é facultativa.74 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.

e de sua família, no que concerne, dentre outros elementos, à alimentação, saúde, lazer,

vestuário e higiene.

Não discrepando, Eduardo Botallo (2000, p. 71) leciona que:

Se a Constituição declara ser dever do Poder Público zelar pelo meio ambiente, se a Constituição declara que é direito de todos usufruir de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, não há dúvida de que tudo quanto, na área da economia de mercado, estiver relacionado com o propósito firmado por esses preceitos, haverá de ser essencial e, portanto, haverá de merecer a proteção da regra prevista no art. 153, § 3º, I, da Constituição, inclusive com a tutela do Judiciário.

Trata-se de compatibilização do critério da essencialidade utilizado pelo princípio

da seletividade tributária com o princípio da essencialidade do meio ambiente.

Exemplo desta interação entre estes princípios, tem-se a diferenciação de alíquotas

do Imposto sobre Produtos Industrializados estabelecida pelo Decreto Federal n. 755, de 1993,

em que para certos veículos movidos a gasolina as mesmas variavam entre 25% e 30%,

enquanto para aqueles movidos a álcool quedavam entre 20% e 25%. Embora essa

diferenciação originariamente objetivasse um maior consumo de álcool combustível para

incentivar a produção doméstica e reduzir a dependência brasileira da importação de petróleo, o

fato é que tal medida veio contribuir para a diminuição geral dos níveis de produção do ar nas

cidades, transformando-se, assim, em um incentivo ao consumo de combustíveis menos

poluentes (OLIVEIRA, 1999).

No mesmo sentido, a Medida Provisória n. 75, de 24 de outubro de 2002,

importante providência tributária de inspiração ecológica estava para ser criada, pois, de acordo

com sua Exposição de Motivos, objetivava estimular a reciclagem dos desperdícios, resíduos de

aparas de plástico, minimizando, com isso, os graves danos que causam ao meio ambiente,

instituindo um crédito presumido de Imposto sobre Produtos Industrializados para estes

produtos reciclados. Infelizmente, esta Medida Provisória foi rejeitada pelo Congresso

Nacional.

No âmbito do Imposto de Renda, a Lei Federal n. 5.106, de 1966, bem como, os

Decretos n. 93.607/86 e 96.233/88, autorizavam o abatimento, para pessoas físicas, de

importâncias empregadas em projetos de florestamento e reflorestamento. Até 50% de desconto

do valor do Imposto de Renda a pagar, mediante a comprovação de que o florestamento ou

reflorestamento tivesse servido de base à exploração econômica ou à conservação do solo e dos

regimes das águas, era permitido às pessoas jurídicas (ARAÚJO, 2003).

Segundo José Marcos Domingues de Oliveira (1999, p. 50):

Depois a legislação exigiu que os projetos florestais servissem não só ao desenvolvimento econômico, mas que “Também contribuíssem para a conservação da natureza através do florestamento ou reflorestamento” (Decreto 79.046/76); além disso, os projetos deveriam ser aprovados pelas autoridades florestais após apresentação de um “estudo de viabilidade ambiental” (Decreto 96.233/88 c.c Decreto 93.607/86). Pelo Decreto 93.607/86 determinou-se às agências de desenvolvimento encarregadas da administração dos incentivos fiscais que levassem em consideração os aspectos ambientais na análise dos projetos de que se trata e no acompanhamento dos seus resultados (art. 8º).

Apesar de sua versatilidade, o Imposto sobre a Renda ainda é timidamente utilizado

nos propósitos ecológicos, uma vez que pode autorizar outras espécies de deduções para

incentivar projetos de preservação ambiental (COSTA, 2000).

O Imposto Territorial Rural, por se consubstanciar na imposição sobre propriedade

imobiliária, desempenha relevante papel na seara da tributação ambiental principalmente no

que concerne ao princípio da função social da propriedade tão valorizado pela Constitucional.

Ao cumprir sua função social, deve também a propriedade atender a sua função ambiental

(SEBASTIÃO, 2007).

Para a propriedade rural, tal preceito é imperativo constitucional, na medida em que

o art. 18675 determina, dentre os requisitos de cumprimento da sua função social, a adequação

no uso dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente. Ademais, o § 4º do

art. 153 do Texto Constitucional76, admite a função extrafiscal do ITR, ao permitir que nele se

adotem alíquotas variáveis para desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, além

de não incidir sobre pequenas glebas rurais.

Além destes dispositivos, Oliveira (1999, p. 49-50) ressalta outros preceitos legais

nesta direção:

Ademais, está isenta de ITR a chamada reserva legal (de 20% a 50% das áreas rurais), onde o corte de árvores é proibido (Código Florestal, Lei 4.771, de 15.08.1971, alterada pela Lei 7.803, de 18.07.1989 e pela Medida Provisória, 1.605-30, de 19.11.1998; e Lei 8.847, de 28.01.1994). A Lei 9.393, de 19.12.1996, graduou

75 Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.76 VI - propriedade territorial rural; § 4º O imposto previsto no inciso VI do caput: I - será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas; II - não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel; III - será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal.

progressivamente o ITR em função inversa do “grau de utilização” das glebas rurais (art. 11).

De efeito, a Lei n. 8.171, de 1991, que instituiu a Política Nacional para a

Agricultura, também objetivou a proteção do meio ambiente, a promoção do seu uso racional e

o estímulo à recuperação ambiental arrolando, dentre os instrumentos governamentais

utilizáveis para tais fins, a tributação e os incentivos fiscais.

Há também hipóteses em que a legislação correspondente exclui da base imponível

do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – IPTU as áreas de floresta nativa e outras de

preservação permanente, determinadas por lei ou conservadas por iniciativa do próprio

contribuinte-proprietário, nos termos da Lei n. 9.393, de 1996.

Esta lei considera área tributável a área total do imóvel, retiradas: a) de preservação permanente e de reserva legal, previstas na Lei 4.771, de 15.09.1965 (Código Florestal), com a redação dada pela Lei 7.803, de 18.07.1989; b) de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declaradas mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, e que ampliem as restrições de uso previstas na alínea anterior; c) comprovadamente imprestáveis para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, declaradas de interesse ecológico mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, dentre outras (BORGES, 1998, p. 179-180)

Os Impostos de Importação e Exportação (II e IE), principalmente em razão da

possibilidade de variação das alíquotas, também podem servir como eficazes instrumentos de

política ambiental, se observada a preferência por produtos ambientalmente recomendados nas

transações comerciais (NUNES, 2005, p.164).

Enfim, além destes impostos, há ainda a possibilidade de instituição de outros

tributos, de competência da União Federal, dos quais se pode valer a tributação ambiental,

senão vejamos:

A União instituiu, com força na Lei 9.960/2000, fruto da conversão da Medida

Provisória 2.015-1, de 1999, a Taxa de Fiscalização Ambiental. No entanto, em sede de Ação

Direta de Inconstitucionalidade 2.178-8/DF, o Supremo Tribunal Federal deferiu pedido de

medida cautelar para suspender, até decisão final, a eficácia de diversos dispositivos da Lei,

apontando a falta de elementos essenciais para a exigência da exação, a saber: a) prever como

fato jurídico tributário, atividade exercida pelo administrado, e não, pelo Estado; b) ausência de

previsão dos sujeitos passivos, pois não foi especificado, em lei, quais as atividades

potencialmente poluidoras; e c) ausência de definição de alíquotas ou critério a ser utilizado

para o cálculo do valor devido, desrespeitando o princípio da isonomia ao dispensar o mesmo

tratamento a contribuintes de expressão econômica variada. No entanto, em face da relevância

da instituição de uma exação desse naipe, voltada para o atendimento de políticas públicas de

natureza ambiental, o Ministro Ilmar Galvão, enquanto Relator, sugere que nova lei seja

promulgada, desde que supridos os correspondentes vícios77.

Posteriormente, através da Lei n. 10.165, após sanar os vícios existentes na Lei

9.960/2000, foi instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, cujo fato jurídico

tributário é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro de Meio

Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, para controle e fiscalização das

atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.

Conforme já dito anteriormente, é possível, inclusive, a instituição de contribuições

de intervenção no domínio econômico, nos termos do art. 149 da Constituição Federal, voltada

para a defesa do meio ambiente, embora seja, ao contrário das demais espécies tributárias,

classificada diante da finalidade da cobrança, qual seja, intervir na atividade econômica privada

para regular a economia (SEBASTIÃO, 2007).

Segundo Ferraz (2003b), o fato é que a Contribuição para Intervenção no Domínio

Econômico relativas às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus

derivados, gás natural e seus derivados, e álcool combustível, cuja materialidade veio indicada

na Emenda Constituição 33/2001, tendo sido instituída pela Lei 10.336, de 2001, figura como o

primeiro tributo ambiental stricto sensu brasileiro.

Para a referida Contribuição, o art. 177, § 4º, da Constituição Federal78, com a

redação dada pela Emenda Constitucional 33/2001, estabeleceu a possibilidade de alíquota

77 Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 8º da Lei 9.960, de 28.01.2000, que introduziu novos artigos na Lei 6.938/81, criando a taxa de fiscalização ambiental (TFA). Alegada incompatibilidade com os arts. 145, 11; 167, IV; 154, I; e 150, 111, B, da Constituição Federal. Dispositivos insuscetíveis de instituir, validamente, o novel tributo, por haverem definido, como fato gerador, não o serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, pelo ente público, no exercício do poder de polícia, como previsto no art. 145, II, da Carta Magna, mas a atividade por esses exercida; e como contribuintes pessoas físicas ou jurídicas que exercem atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais, não especificadas em lei. E, ainda, por não haver indicado as respectivas alíquotas ou o critério a ser utilizado para o cálculo do valor devido, tendo-se limitado a estipular, a forfait, valores uniformes por classe de contribuintes, com flagrante desobediência ao princípio da isonomia, consistente, no caso, na dispensa do mesmo tratamento tributário a contribuintes de expressão econômica extremamente variada. Plausibilidade da tese de inconstitucionalidade, aliada à conveniência de pronta suspensão da eficácia dos dispositivos instituidores da FTA. Medida cautelar deferida. (BRASIL. Tribunal Pleno. Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 8º da Lei 9.960, de 28.01.2000, que introduziu novos artigos na Lei 6.938/81, criando a taxa de fiscalização ambiental (TFA). Alegada incompatibilidade com os arts. 145, II; 167, IV; art. 154, I; e 150, III, “b”, da Constituição Federal. ADI 2178 MC/DF. Rel. Min. Ilmar Galvão, 29 mar. 2000, DJ 12.05.2000, p. 019. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/geral/verPdfPaginado.asp?id=347469&tipo=AC&descricao=Inteiro%20Teor%20ADI%20/%202178%20-%20MC>. Acesso em: 03 abri. 2008)78 Art. 177. [...] § 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)

diferenciada por produto ou uso, e previu que, dentre as destinações dos recursos arrecadados,

se encontra o financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e

do gás.

Sobre a possibilidade de diferenciação de alíquotas da CIDE, sem ferir o princípio

da isonomia, disserta Ferraz (2003b, p. 101):

De fato, a primeira vista, não poderia ocorrer de produtos idênticos ou mesmo semelhantes serem diferenciados frente à tributação. Nenhuma influência haveria do uso do produto em sua alíquota. No entanto, num contexto ambiental, fica logo ressaltada a efetiva diferença existente entre produtos e o uso que se faz deles. [...] Exemplo mais complexo, vinculado ao uso, seria a diferenciação de alíquotas entre combustíveis destinados a atividades essenciais de atenção ao ser humano (destinatário final dos esforços de preservação), como o destinado aos geradores de energia para hospitais, e os destinados a atividades como as corridas de automóveis. Diferenciar tais situações é também aplicação do princípio da isonomia pois o diferencial adotado para distingui-las, o uso frente ao meio ambiente, é valor legitimamente indicado pela Constituição.

Some-se a isso que a referibilidade dessa contribuição interventiva torna-se clara

em face da destinação constitucionalmente determinada, na qual, além de subsidiar o transporte

de combustíveis, álcool combustível, gás natural e seus derivados, e derivados de petróleo, e

financiar programas de infra-estrutura de transportes, presta-se também a financiar projetos

ambientais relacionados com a indústria de petróleo.

Dessa forma, por imperativo constitucional, segmento da política de comércio

internacional, representada pela importação de combustíveis e derivados de petróleo, foi

associada à política ambiental. Por esse motivo, trata-se não somente de uma mera

possibilidade de uso de tributo como instrumento de regulação do comércio exterior, mas uma

necessária combinação desse uso com a promoção da proteção ao meio ambiente,

especificamente no que toca ao consumo de tais produtos (FERRAZ, 2003b).

Nesta figura tributária, outrossim, se faz presente o princípio do poluidor-pagador,

na medida em que pode internalizar o custo socioambiental do consumo de combustíveis, a sua

função fiscal ecologicamente orientada – destinação ambiental dos recursos – e sua

extrafiscalidade – diferenciação de alíquotas de acordo com o uso ambientalmente mais ou

menos adequado.

3.5.1.2 Tributos ambientais dos Estados e Distrito Federal

Dentro da competência impositiva dos Estados-membros, vários são os terrenos

aptos à implantação da tributação ambiental, a começar pelo Imposto sobre a Circulação de

Mercadorias e Serviços. Exemplo de imposto sobre o consumo, assim como Imposto sobre

Produtos Industrializados, se agregado ao princípio da seletividade em função da essencialidade

das mercadorias ou serviços e, por isso, pode eleger como essenciais aqueles que tiverem

correlação com a preservação ambiental. Novamente, verifica-se aqui a diferenciação de

alíquotas como importante ferramenta (SEBASTIÃO, 2007).

O chamado “ICMS Ecológico” não pressupõe qualquer alteração na atividade

tributante do Estado Federado, permanecendo inalterada a hipótese de incidência do referido

imposto, porém, a qualificação “ecológico” decorre de uma nova modalidade de rateio no

montante que os Estados repassam necessariamente aos Municípios, ou seja, os Municípios

com unidades de conservação, com uma política de distribuição de rendas e melhoria da

qualidade ambiental, sistemas de tratamento ou disposição final do lixo ou dos esgotos

sanitários, etc. têm uma participação maior no repasse dos valores atinentes ao ICMS pelo

Estado Federado (IRIGARAY, 2001).

José Marcos Domingues de Oliveira (1999) esclarece que, no Rio de Janeiro, por

exemplo, embora as operações internas serem tributos na ordem de 18% (dezoito por cento), de

acordo com a Lei Estadual 2.055/1993, a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias

e Serviços – ICMS pode ser reduzida para 12% (doze por cento), em operações com máquinas,

aparelhos, equipamentos e veículos destinados à implantação, ampliação e modernização ou

relocalização de unidades industriais ou agroindustriais e visem à defesa do meio ambiente.

Outra iniciativa importante em relação ao ICMS, segundo Sebastião (2007),

provém do Estado de Tocantins. Através da Lei 1.095/99, concedeu-se isenção do ICMS

incidente nas operações internas de saídas de papel usado, aparas de papel, papelão, sucatas de

metais ferrosos ou não ferroso, plásticos, resíduos de plásticos, vidros, cacos de vidros e aparas

de vidros, outros resíduos sólidos e efluentes, e lixo, desde que destinados à indústria de

reciclagem ou outro fim correlato; assim como nas operações de saída de produtos resultantes

da respectiva industrialização, recondicionamento e compostagem. Tal benefício é concedido

desde que preenchidas determinadas condições legais e exclusivamente a contribuintes

previamente cadastrados em programa estadual de coleta seletiva de lixo.

Também é viável a emprego do IPVA — Imposto sobre Propriedade de Veículos

Automotores na atividade ambiental. O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, editou a Lei n.

943/85, estabelecendo uma alíquota diferente para carros movidos à gasolina e à álcool, e mais

recentemente, o desconto de 75% no imposto para os carros com equipamento de gás natural

(ROCCO, 2004, p. 271).

Uma vez que os veículos automotores são grandes fontes geradoras de poluição, a

graduação de alíquotas do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, de acordo

com maior ou menor produção de gases tóxicos, é de grande valia na política preservacionista.

Assim, o IPVA pode ter alíquota mais baixa para os veículos automotores movidos por

combustível menos poluente, de modo que se incentive o consumo desse tipo de veículo e se

iniba a aquisição daqueles que não adotem o sistema preservacionista (SEBASTIÃO, 2007).

Do Estado do Rio de Janeiro, ainda, é paradigmática a Lei 943, de 26 de dezembro de 1985, estabelecendo que a alíquota do “imposto sobre a propriedade de veículos automotores” sobre os veículos movidos a álcool seria de 2%, enquanto que a referente aos veículos movidos a gasolina seria de 3%. (OLIVEIRA, 1999, P. 52)

Ademais, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens

ou Direitos – ITCMD pode ter serventia relacionada àqueles imóveis considerados como

produtivos ou de interesse ambiental, incluindo os patrimônios tidos como históricos ou

culturais, e ter suas alíquotas e/ou base de cálculos variáveis conforme sua importância

(NUNES, 2005, p. 164).

No que tange a taxas de competência tributária estadual, o Estado de Goiás, ao

instituir sua política florestal, através da Lei Estadual 12.596, de 1995, prevê (art. 18) a

cobrança de Taxa de Reposição Florestal, com regulamentação através do Decreto 4.593, de

1995. A Taxa de Reposição Florestal é exigida daqueles legalmente considerados como

“pequenos produtores”, ou seja, pessoas físicas ou jurídicas cadastradas junto ao órgão de

controle ambiental competente, que não efetuem plantio próprio e realizem extrativismo abaixo

dos limites legalmente estabelecidos79.

79 O art. 30 do Decreto 4.592/95, do Estado de Goiás, refere-se à “utilização, comercialização ou consumo de produtos ou subprodutos florestais em quantidade inferior a 12.000 st/ano (doze mil estérios por ano) de lenha ou 4.000 m.d.c/ano (quatro mil metros de carvão por ano)”.

Isto significa que, dos “pequenos produtores” é exigida taxa pelo exercício de poder

de polícia ambiental, de forma a custear os órgãos administrativos competentes do Estado de

Goiás, na execução da política florestal, como exemplo de tributação ambiental.

De outro norte, os que a lei considera “grandes consumidores” estão obrigados a

prover seu suprimento integral de produtos através da formação direta ou manutenção de

florestas próprias ou de terceiros, capazes de os abastecerem na composição de seu consumo

integral. Já aqui, pelo que observa, presente somente instrumentos de comando-e-controle.

Prevê, ainda, a concessão de incentivos ou isenções tributárias condicionados à apresentação

pelo interessado de prova de regularidade de sua situação junto ao órgão ambiental do Estado

(SEBASTIÃO, 2007).

Regina Helena da Costa (2002), exemplifica, ainda, que há a taxa pela prestação, ou

colocação à disposição do sujeito passivo, de serviço público de natureza ambiental no

Arquipélago de Fernando de Noronha, Distrito Estadual de Pernambuco, nos termos da Lei

10.403, de 19.12.1989, cujo fato gerador é “a utilização, efetiva ou potencial, por parte das

pessoas visitantes, da infra-estrutura física implantada no Distrito Estadual e do acesso e

fruição ao patrimônio natural e histórico do Arquipélago de Fernando de Noronha (art. 84)”.

3.5.1.3 Tributos ambientais dos Municípios

Os Municípios desempenham importante papel na política de preservação do meio

ambiente em face do trato dos assuntos de interesse local, principalmente a partir da

consideração de grande maioria da população nasce, cresce e se desenvolve, trabalha, enfim, se

relaciona com o meio.

No âmbito da competência tributária municipal, o Imposto sobre a Propriedade

Predial e Territorial Urbana – IPTU é a grande ferramenta tributária a serviço da conservação

ambiental. Isso porque, assim como a propriedade rural, a propriedade urbana também está

submetida ao princípio da função social da propriedade (SEBASTIÃO, 2007).

Em outras palavras, os Municípios, a partir da edição do Estatuto da Cidade (Lei n.

10.257, de 10 de julho de 2001), podem se valer do uso ambiental do IPTU — Imposto Predial

Territorial Urbano de acordo com a função social da propriedade, aplicando alíquotas

progressivas no tempo.

A forma de se dar efetividade a tal princípio parte da obediência aos artigos 156, §

1º e 182, §§ 2º e 4º80, da Constituição Federal de 1988, ou seja, atendendo às exigências

fundamentais da ordenação da cidade contidas no plano diretor, com a utilização do Imposto

mediante alíquotas progressivas vinculadas ao adequado aproveitamento do solo urbano pelo

proprietário contribuinte (progressividade no tempo), assim como em razão do valor do imóvel

(progressividade no espaço), sendo ainda permitida a adoção de alíquotas diferenciadas

relativamente à localização e o uso do imóvel urbano.

Segundo Folmann (2002), o Município detém o poder-dever de preservar o meio

ambiente e combater a poluição, podendo valer-se da Tributação Ambiental como um

importante e eficiente instrumento condicionador de condutas dos particulares, direcionando-as

em benefício do ambiente das cidades, promovendo o bem estar social na forma do disposto no

art. 225 da CF/88, ou seja, a sadia qualidade de vida no âmbito urbano, sendo o IPTU um

tributo potencial para tal fim.

Costa (2002) dá conta de que o Município de São Paulo, através do art. 17 da Lei

Municipal 10.365, de 1987, concede incentivo fiscal de IPTU a imóveis revestidos de

vegetação arbórea, declarada de preservação permanente ou perpetuada, nos termos do art. 6º

do Código Florestal. Consiste o incentivo fiscal no desconto de até 50% no pagamento do

imposto, aplicado de acordo com o índice de área protegida.

No Município do Rio de Janeiro, por sua vez, José Marcos Domingues de Oliveira

(1999, p. 52), informa que:

No plano local, tendo-se como exemplo o Município do Rio de Janeiro, é de lembrar que há no seu Código Tributário (Lei 691, de 24 de dezembro de 1984) dispositivo que “isenta de Imposto sobre a Propriedade Predial Territorial Urbana”: - terrenos e prédios de interesse ecológico ou relevantes para a “preservação permanente” ou “ambiental”; – áreas declaradas pelo Poder Público como “reservas florestais”; -

80 Art. 182 [...] § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. [...] § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

qualquer terreno de área superior a 10.000 metros quadrados “efetivamente cobertos por florestas”.

Também o Município de Curitiba oferece incentivos fiscais do Imposto Predial e

Territorial Urbano para os imóveis com cobertura vegetal relevante. E nem poderia ser

diferente, uma vez que Curitiba é internacionalmente conhecida como “capital ecológica”.

Desde 1986, através da Lei Municipal 6.819 (art. 6º)81, prevê-se, a título de estímulo, a isenção

do imposto imobiliário ou redução proporcional ao índice de área verde do terreno a beneficiar

os proprietários ou possuidores de terrenos integrantes do cadastro intitulado Setor Especial de

áreas verdes, desde que cumpridas as condições de preservação impostas por lei (SEBASTIÃO,

2007).

No mesmo sentido, a Lei Municipal 8.356, de 1993, estendeu este benefício

também em função da existência de associações vegetais nativas não cadastradas como bosque

de preservação permanente, bem como de árvores isoladas cuja proteção copada perfaça uma

área mínima de 40% da área total do imóvel, de árvores imunes de corte e de árvores da espécie

araucária angustifolia, nestas duas últimas hipóteses, até o limite de cinco árvores.

Segundo Figueiredo (2000), há, atualmente, diversas leis tributárias municipais

incentivadoras de condutas ecologicamente corretas, mencionando uma, advinda do Município

de Itapecerica da Serra-SP, que prevê a concessão de benefícios às indústrias não poluidoras.

Por esta lei de 1996, Lei 895, o Município concede isenção, por um período muito longo, do

IPTU e outros tributos, desde que as indústrias que forem se instalar no Município apresentem

um planejamento ambiental, que preservem e recuperem o meio ambiente degradado.

Por fim, o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN e as diversas

formas de se estimular as empreitadas na área ambiental com a redução de ônus e a concessão

de incentivos. O mesmo pode ser feito com as taxas e contribuições de melhoria, dependendo

da atividade a ser tributada.

Para se coadunar às finalidades do Direito Ambiental, as taxas que têm serventia

podem ser as de serviço, com a colocação ou disposição de serviços públicos de natureza

ambiental, e as taxas de Polícia, aplicadas no exercício de fiscalização e controle de atividades

que exijam licenciamento ambiental (COSTA, 2002).

81 Art. 6º A título de estímulo, gozarão de isenção do Imposto Imobiliário, ou redução proporcional ao índice de área verde do terreno, de acordo com a tabela constante do Anexo I desta lei, os proprietários ou possuidores de terrenos integrantes do Setor Especial de que trata a presente lei. Parágrafo único. Cessará a isenção para os proprietários ou possuidores que infringirem ao disposto nesta lei, implicando o fato no recolhimento do valor do imposto relativamente ao período de vigência da isenção.

Embora as taxas e a contribuição de melhoria sejam de competência tributária

comum às três esferas de governo, no âmbito de suas competências material e legislativa, é

patente que as mesmas se fazem mais presentes no âmbito municipal, do que no estadual ou

federal, em face do maior número de serviços prestados diretamente pelas administrações locais

ao munícipes, assim como em face da realização da grande quantidade de obras urbanas.

Para José Marcos Domingues de Oliveira (1999), em face do art. 77 do Código

Tributário Nacional, seriam admissíveis como fato jurídico tributário de taxas o licenciamento,

a fiscalização e a limpeza ou recuperação ambiental, desde que resguarda a equivalência com o

custo dos respectivos serviços.

Segundo Sebastião (2007), desde a vigência do novo Código Tributário Municipal,

a Lei Municipal 40, de 2001, o Município de Curitiba está apto à cobrança da Taxa de

Licenciamento Ambiental que tem como hipótese de incidência a atividade de vigilância,

controle e fiscalização ambiental, e para fins de base de cálculo, são levados em conta critérios

de complexidade da análise e impacto ambiental, por período determinado.

No âmbito da prestação de serviços públicos de caráter ambiental, a dramaticidade

do problema enfrentado pelos Municípios brasileiros, que é aquele relativo à gestão dos

resíduos sólidos, seus efeitos sobre o meio ambiente e o seu financiamento, é ressaltada por

Eduardo Bottallo (2000), pois o custo da atividade é altíssimo e onera fortemente os cofres dos

Municípios. E, para agravar essa situação, diretriz jurisprudencial firmada pelo Supremo

Tribunal Federal - STF tem declarado inconstitucional a taxa de coleta de lixo em termos que

inviabilizam, na prática, qualquer tipo de exação sobre essa atividade82.

No que tange à contribuição de melhoria, no âmbito dos tributos municipais, basta

revesti-las de cunho “ecológico”, a partir da valorização imobiliária provocada pela realização

de obra pública voltada à preservação ambiental.

Esclarece José Marcos Domingues de Oliveira (1999, p. 65):

82 A fim de ilustrar tais ponderações, menciona-se aqui ao menos um julgado do Supremo Tribunal Federal acerca da inconstitucionalidade da referida taxa: “Taxa de Limpeza Pública e Conservação de Vias e Logradouros Públicos – Agravo Regimental em Agravo de Instrumento. Taxa de Limpeza Pública e IPTU. Identidade de base de cálculo. Impossibilidade – Não se revela exigível a taxa de serviços urbano cuja base de cálculo tenha como amparo elementos que se identifiquem com o conteúdo da base de cálculo do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, de acordo com a vedação expressa contida no art. 145, § 2º, da CF/88. Agravo regimental a que se nega provimento. (Ag. Reg. em Ag. de Inst. 194.063-3 São Paulo – Rel. Min. Maurício Corrêa – Agte.: Município de São Paulo – Adv.: Francisco José de Macedo Costa – Agdo.: Denise Carmona Fernandes – Adv.: Hugo de Mello. ACÓRDÃO: Acordam os Ministros componentes da 2ª T. do STF, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 29.04.1997”.

A propósito, vale notar que a Lei 1.364, de 19.12.1988, do Município de Rio de Janeiro impõe contribuição de melhoria incidente sobre os proprietários de determinados imóveis valorizados por obras públicas tias como “arborização” de ruas e praças, “construção ou ampliação de parques, proteção contra erosão, aterros e outras obras de embelezamento”, incluída a hipótese de execução de projeto de “tratamento paisagístico”.

No mesmo sentido, afirma Édis Milaré (1999) que, por igual, poderia a lei prever a

cobrança de contribuição de melhoria ambiental de quantos se beneficiassem por obra pública

que tivesse contribuído para a melhoria da qualidade ambiental, como o saneamento de uma

praia, a canalização de esgoto, a despoluição de córrego ou rio da vizinhança.

As hipóteses de benefícios fiscais na área da tributação ambiental não se esgotam

aqui. Tudo depende da criatividade do legislador e da vontade política dos governantes de

empunharem a bandeira de proteção ao meio ambiente, lançando mão de todos os instrumentos

jurídicos possíveis.

3.6 Tributação ambiental no estrangeiro – Alguns exemplos

Em relação aos tributos ambientais, convém ressaltar que, em nível comunitário,

vigente em toda a União Européia, existe apenas um tributo, trata-se do imposto sobre o

dióxido de carbono e energia.

Este tributo tem natureza de imposto efetivamente, pois está desvinculado de

qualquer atuação estatal, cujo fato gerador é a extração ou fabricação de combustíveis para

motores e para a geração de energia elétrica no território da Comunidade, ou sua importação

para o território da União Européia.

O sujeito ativo da obrigação tributária, em que pese ser um tributo proposto pela

União Européia, são os Estados-membros competentes para gerir, fiscalizar e arrecadar o

tributo. O sujeito passivo, por sua vez, é aquele que coloca tais produtos a disposição do

consumidor, ou seja, quem extrai, fabrica, transporta, distribui ou vende tais produtos. De

qualquer forma, é o consumidor final que arca com o ônus do tributo, pois a carga tributária

incidente é inevitavelmente transferida ao preço final do combustível.

Em outros países, a adoção de tributos ambientais é prática sustentada por razões de

política ambiental, ou, simplesmente, eles utilizam os efeitos da tributação como instrumentos

de minimização da exploração inadequada do meio. São os chamados ecotaxes (COSTA,

1998).

De fato, nos países europeus da faixa ocidental, bem como nos Estados Unidos da

América, a instituição de tributos ambientais tem se apresentado bastante eficientes, através da

diminuição de atividades nocivas ao meio ambiente por conta das empresas poluidoras, na

medida em que se polui menos em razão do aumento de tributos, diminuindo,

conseqüentemente, as ações estatais relacionadas ao cumprimento das leis e tratados sobre meio

ambiente.

A tendência mundial é a utilização das espécies tributárias como instrumento estatal de ação no campo da prevenção ao equilíbrio ecológico. A ECO-92, sediada na cidade do Rio de Janeiro, dentre outras conclusões sobre os problemas ambientais, quanto à adoção de ecotaxes, concluiu que tais tributos deveriam: i) ser eficientes no plano da prevenção aos danos ambientais e exploração desequilibrada dos recursos naturais; ii) eficientes do ponto de vista econômico, isto é, possuírem baixo custo; iii) empreenderem poucos recursos administrativos para sua apuração; iv) não repercutirem negativamente no comércio interno e externo. (NUNES, 2005, p. 186)

Os países usam os tributos ambientais como um sistema de freios e contrapesos

para o equilíbrio ecológico por intermédio da tributação, ou seja, atividades mais poluidoras

podem ser tributadas com alíquotas mais severas, ao passo que atividades menos nocivas à

natureza recebem tratamento tributário mais brando.

Segundo Costa (1998, p. 300), a Alemanha tributa os produtos considerados

propiciadores de poluição pelo seu simples uso momentâneo. É o caso dos pratos, talheres e

copos descartáveis. Outros países, em vez de instituírem novos tributos, isentam dos já

existentes quem adotar medidas ecologicamente adequadas. Goza de tal benefício aquele que

colocar catalisadores nos veículos automotores. Ainda na Comunidade Européia, há estudos em

torno da tributação sobre atividades emissoras de gases poluentes, tais como o CFC e o anídrio

carbônico.

Além disso, Nunes apud Rosembuj (2005) leciona que, na Alemanha, na França e

da Holanda há a exigência de tributos em relação a quem polui as águas. Tal iniciativa é de

incentivo à depuração do meio ou desestímulo a produções degradantes, dentro de um limite de

poluição pré-estabelecido, denominado standard. Quanto mais o emissor dos efluentes se

aproxima do standard, maior será a redução de impostos que logrará.

Desde 1989, a França cobra uma exação parafiscal sobre a contaminação do ar.

O país que mais se destaca no uso de instrumento tributários para proteção do ar é a Suécia, que, na reforma tributária de 1990-1991, previu tributação sobre as emissões de CO2 decorrentes da queima de combustíveis fósseis, enxofre e carbono. Nem mesmo as grandes centrais elétricas ficaram de fora da reforma; ademais foi criado um tributo sobre emissões de óxido de nitrogênio (NUNES apud ROSEMBUJ, 2005, p. 188).

A legislação européia impõe, ainda, o dever legal de adotar-se medidas

acautelatórias para assegurar a eliminação de resíduos sem risco à vida humana.

A Dinamarca implementou reforma tributária entre 1994 e 1998, cujo objetivo foi a

diminuição da tributação marginal de todos os tipos de rendas, a extinção de lacunas fiscais e, o

que é mais importante, a transferência gradual da carga tributária incidente sobre a renda e o

trabalho para a poluição e o uso de recursos ambientais escassos (SEBASTIÃO, 2007).

Na Dinamarca, inclusive, existe um imposto específico sobre os resíduos industriais

e domésticos, ao passo em que foi instituído um imposto sobre materiais de construção, no afã

de estimular a reciclagem destes materiais.

A poluição sonora nos grandes centros europeus também é foco de medidas

ambientais tributárias. Conforme já se salientou, a França é experiente no assunto. A Holanda

também instituiu um tributo de natureza semelhante, calculado em razão do peso e de outras

características das aeronaves. A receita da arrecadação é destinada para equipar a sociedade

com isoladores de ruídos. O controle da poluição sonora por meio do tributo é forma bastante

discutível em relação aos efeitos práticos que gera (NUNES apud ROSEMBUJ, 2005).

Por outro lado, em relação à preservação dos espaços e paisagens naturais, estes

espaços, desde que pertencentes às pessoas jurídicas de direito público ou de interesse público

estão isentos de impostos imobiliários, assim como na transmissão destes bens a qualquer

título.

Conforme disserta Oliveira, a França tributa de forma mais elevada a propriedade

não edificada em relação ao imóvel construído. Também no setor rural a tributação é

diferenciada entre imóveis produtivos e não produtivos. A intenção, nesse caso, é melhorar os

índices de rendimento que o cultivo da terra pode propiciar, onde a receita deste imposto

destina-se à criação de espaços verdes.

Na Grã-Bretanha, por sua vez, as terras consideradas agrícolas não são tributadas

pelos impostos sobre a propriedade, nem a transmissão dos mesmos bens, em manifesto caráter

extrafiscal.

Como exemplos de tributação sobre produtos, tem-se a Dinamarca, Noruega e

Suécia, países que tributam a venda de pesticidas, não exatamente pelo fato da venda, mas por

se tratar de produto de impacto ao meio ambiente, em razão de sua constituição química.

Alemanha, França, Itália, Holanda e Noruega exigem tributos sobre óleos lubrificantes.

Dinamarca, Noruega, Holanda e Suécia fazem incidir impostos sobre embalagens não

recicláveis. Noruega e Holanda tributam combustíveis que em seu conteúdo contêm enxofre

(OLIVEIRA, 1999, p. 107).

De igual sorte, Alemanha, Itália e França exigem, das indústrias e importadores,

tributo sobre o uso de sacolas plásticas não biodegradáveis. Na Suécia, por sua vez, a receita

dos tributos sobre óleos minerais financia programas ambientalistas de recuperação de lagos

contaminados.

Como se vê, os países da Europa estão na vanguarda da utilização dos tributos

como instrumentos de defesa do meio ambiente. Não existe absoluto consenso sobre a

eficiência de tais medidas. Aliás, como se viu, a ênfase é tributar os outputs, isto é, as emissões

de poluentes no ar atmosférico e nas águas, ou gravar os produtos que trazem algum tipo de

ameaça ambiental. As tentativas de tributos os insumos (inputs: matéria-prima e energia)

passam pelas dificuldades dos efeitos em cascata que geram, além das dificuldades de

competição no mercado internacional, pois tal medida deveria ser conjunta, ou seja, adotada

por toda a comunidade internacional economicamente ativa (NUNES, 2005, p. 192)

Segundo Nunes (2005), nos Estados Unidos, existe um adicional ao imposto de

renda àquele que provocar danos ao meio ambiente, bem como se permite a dedução da base de

cálculo deste mesmo imposto a quem fizer doações de áreas com finalidades de preservação

ambiental; exige-se um imposto sobre as indústrias poluidoras químicas, como também carga

tributária especial sobre as empresas refinadoras de petróleo.

Leite apud Oliveira (2004, p. 453-454), resumidamente, aponta alguns tributos

ambientais existentes nos Estados Unidos da América, in verbis:

(1). Sobre a produção e consumo de produtos poluidores (químicos perigosos/derivados); (2) Isenção total ou parcial a produtos não poluidores ou menos

poluidores, ou reciclados ou recicláveis (p. ex.: restituição do imposto sobre vasilhames); (3) IR contempla um “adicional ambiental” e a dedutibilidade de doações de terrenos e matas com finalidade preservacionista; (4) Leis que criam incidências de impostos indiretos com receita vinculada sobre combustíveis (Oil Spill Liability Trust Fund), emissões de gases poluntes (Black Lung Disability Trust Fund), equipamentos de caça e pesca (Wild Life Restoration Fund); (5) Feebate = desconto de encargo, taxas municipais de lixo, imposto proibitivo sobre fósforos à base de fósforo branco/venenoso; (6) Impostos + taxas ambientais (custeio dos serviços públicos de licenciamento, fiscalização e limpeza ou recuperação ambiental – trade-off of permits – “direito de negociar limites de poluição” constantes de licenças administrativas de operação); (7) Lei do Imposto Federal de Renda: depreciação acelerada para instalações de controle de poluição reconhecidas (certified) por autoridade federal ou estadual; (8) Host fees – prestações públicas devidas à comunidade pela recepção de resíduos nas suas vizinhanças: NIMBY – Not in my backyard.

Em relação ao Canadá, leciona o mesmo autor:

Lei do IR prevê depreciação acelerada (50% ao ano) de bens adquiridos com a finalidade primária de prevenir, reduzir ou eliminar poluição de corpos d’água. (2004, p. 454)

Estes tributos destinam-se à constituição de um fundo reparador ao meio ambiente,

de caráter público, denominado superfund, cujos recursos são utilizados como instrumento de

políticas públicas ambientais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou sustentar a possibilidade de instituir tributos ambientais

como forma alternativa de preservação do meio ambiente, além daquelas medidas repressivas

ditadas pelo Direito Ambiental, bem como aquelas preventivas, constantes dos sistemas de

gestão ambiental, cujo fator de desempenho ambiental é controvertido.

Para tanto, o trabalho deixou claro que o desenvolvimento tecnológico e o avanço

científico das últimas décadas, na busca desmedida pelo lucro, levaram o homem ao limiar de

uma crise ambiental, a despeito dos benefícios que foram trazidos após a Revolução Industrial.

Os riscos advindos dessa sociedade capitalista revelaram um conflito entre o desenvolvimento e

a preservação. As conseqüências, principalmente ambientais, da industrialização,

principalmente ambiental, eram deixadas de lado, porquanto se acreditava que os recursos

naturais eram inesgotáveis.

A evolução do Estado foi fundamental no trato das questões ambientais. O Estado

Moderno, partindo do Estado Absolutista até o Estado Democrático de Direito, reconheceu os

direitos fundamentais, incluídos os ambientais, como direitos humanos difusos e integrais, cuja

titularidade sujeitou todos os indivíduos aos valores da dignidade humana, como valores

fundantes da própria espécie humana.

Ficou patente também que estes direitos são reconhecidos como os direitos

humanos de terceira dimensão, posto que essenciais à dignidade humana. São direitos humanos

plenos e absolutos, de todos os sujeitos contra todos os sujeitos, para proteger todos os bens que

condicionam a vida humana, fixados em valores ou bens humanos, patrimônio da humanidade,

segundo padrões de avaliação que garantam a existência do ser humano com a dignidade que

lhe é própria.

Neste contexto, a crise ambiental deu azo ao Estado Democrático de Direito

Ambiental, elevando o direito ao meio ambiente saudável ao patamar de direitos

metaindividuais ou transindividuais, ou seja, essenciais à vida no Planeta.

Foi demonstrado, por sua vez, que a Constituição Federal, albergando

expressamente os fundamentos do Estado Democrático de Direito Ambiental, em seu artigo

225, incumbiu ao Estado e a toda a coletividade o dever de defender e preservar o meio

ambiente para as presentes e futuras gerações.

A conscientização acerca da necessidade de preservação do meio ambiente ficou

bastante evidente a partir da década de setenta. Os desastres ecológicos ocorridos no último

século desencadearam uma preocupação generalizada da população, envolvendo o Estado,

entidades não-governamentais, nacionais e internacionais, e a própria sociedade. Neste sentido,

foram realizados movimentos ambientais no afã de encontrar alternativas que pudessem, ao

menos, minimizar os impactos ambientais, através do uso racional dos recursos naturais. Nascia

o conceito de “desenvolvimento sustentável”.

Neste mister, ficou claro que o conceito de desenvolvimento sustentável não se

limita apenas à preservação ambiental, através da racionalização dos recursos naturais. Vai

muito além, adentrando também nas questões sociais (a pobreza, o desemprego, o crescimento

populacional, etc.), porquanto intimamente ligadas às questões ambientais, não podendo haver

uma resolução destes problemas de maneira isolada.

A partir daí, na busca incessante por soluções, surge o Direito Ambiental,

procurando trazer ao mundo jurídico a solução de uma crise de paradigmas ideológicos acerca

de progresso e desenvolvimento, cujo objetivo primordial resume-se à necessidade de se

implementar, na prática, a proteção ambiental jurídica de uma maneira geral.

Entretanto, diante da dimensão territorial do Brasil e sua biodiversidade, as políticas

restritivas e sancionatórias do Direito Ambiental se apresentaram com eficácia limitada. A par

disso, a comunidade empresarial se deu conta de que os padrões de consumo corrente eram,

como de fato o são, insustentáveis, tornando-se fundamental trabalhar com outro conceito de

gestão, integrando as questões ambientais a um processo mais amplo de tomada de decisões,

tratando-as como questões de natureza estratégica.

Foram criadas, em nível internacional, normas administrativas de controle

ambiental, como o conceito de gestão de qualidade ambiental, utilizadas na certificação do

sistema de gerenciamento ambiental de organizações (ISO 14000), no afã de assegurar o

compromisso das organizações em reduzir os negativos efeitos ambientais.

Enfim, desde a década de 80, boa parte das indústrias vem executando programas

de gestão ambiental, vinculando sua imagem à proteção ambiental com vista à intensificação e

aumentos dos lucros e a competitividade, além de prevenção em face de proposições

legislativas acerca de sua adequação ao trato das questões ambientais, estimulando,

conseqüentemente, a proteção ao meio ambiente.

Porém, assim como na imposição de sanções penais e administrativas, os sistemas

de gestão ambiental não atingiram nenhum requisito de desempenho ambiental, além da

conformidade às legislações ambientais aplicáveis e o compromisso com a melhoria contínua.

O Estado adotou um novo perfil intervencionista com o objetivo de inibir ou alterar consumos e

condutas nocivas à sociedade, especificamente relacionados à preservação e conservação do

meio ambiente.

Calcada nos princípios do Direito Ambiental, do Direito Econômico e nos limites e

possibilidades do Direito Tributário, o Estado pode intervir no trato das questões ambientais

através da implantação de uma política tributária ambiental, traduzida na adoção concertada e

planejada de uma série de medidas fiscais e extrafiscais.

A relação entre o Meio Ambiente e ao Direito Tributário ficou bastante evidente no

decorrer do trabalho, em vista de sua interdependência comum. A atividade humana opera com

o meio ambiente visando ao desenvolvimento econômico, causando, muitas vezes,

conseqüências. Estas conseqüências podem ser traduzidas como externalidades, positivas ou

negativas, onde o Estado pode intervir de forma a estimular as positivas e combater as

negativas.

Neste ínterim, a tributação ambiental serve como excelente instrumento para

fomentar o desenvolvimento sustentável, priorizando a dignidade humana e o aprimoramento

social com o resguardo das questões ambientais, propriamente ditas.

Embora a tributação ambiental, no Brasil, encontre-se em fase embrionária, uma

vez que, como abordado no trabalho, as atuações neste campo, com a criação de alguns tributos

dessa natureza ou o estabelecimento de certos benefícios fiscais ainda têm sido tímidas, o

Direito Tributário pode atuar como um instrumento transformador na sociedade, ao servir como

instrumento do Estado para a intervenção no domínio econômico.

A experiência nacional vem se direcionando no sentido de usar o Direito Tributário

como instrumento para disciplinar a prática econômica, impondo uma maior responsabilidade e

ônus principalmente aos que se utilizam os recursos naturais em seu processo produtivo

gerando externalidades negativas, da mesma forma que estimula as condutas ambientalmente

mais desejáveis, trazendo para o custo de cada bem ou mercadoria o custo que seu consumo

representa em termos ambientais.

O tributo, como elemento econômico, aparece muito eficaz no trato das questões

ambientais quando comparados aos exemplos nacionais e internacionais. A adoção de medidas

tributárias, mormente aquelas de caráter extrafiscal (subsídios, subvenções, alíquotas reduzidas,

isenções, imunidades, por exemplo) servem para a implementação de políticas públicas

desenvolvimentistas e preservacionistas, concomitantemente.

Conclui-se que a tributação ambiental pode ser um instrumento efetivo de

complementaridade de políticas públicas de melhoria do meio ambiente, pela possibilidade de

indução a práticas sociais e econômicas adequadas à prevenção, preservação e recuperação da

qualidade do meio ambiente.

Foram abordadas as nuances que envolvem a instituição de tributos, partindo da

análise do Sistema Tributário Nacional, as competências tributárias, as limitações ao poder de

tributar do Estado, bem como as espécies tributárias existentes no regramento jurídico

brasileiro.

Desta análise, infere-se que a própria Constituição Federal faculta adequar os

tributos à proteção e à garantia de um meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado.

Partindo desta autorização e consciência ambiental, a própria União Federal, bem como alguns

Estados e Municípios, já iniciaram a adoção destas medidas, redundando em resultados

promissores.

A instituição de impostos ambientais, porém, seria inconstitucional por afronta aos

princípios da igualdade e capacidade contributiva, porquanto não se pode levar a efeito a

cobrança de impostos diferenciada, em função da maior ou menor adequação da atividade do

contribuinte a parâmetros de preservação ambiental.

A vinculação da receita obtida por meio dos impostos encontra vedação expressa na

Constituição Federal, entretanto, existindo a possibilidade de instituir impostos de maneira a

alcançar resultados positivos, desanimando as condutas contaminadoras e adotando tratamentos

fiscais estimuladores a empresas que adotem dispositivos antipoluidores, a vinculação da

receita do imposto não se faz necessária.

Porém, quando se fala da natureza extrafiscal dos impostos ambientais, a instituição

destes tributos não padecem de inconstitucionalidade, pelo contrário, servem como excelente

instrumento dinamizador das questões ambientais, como acontece, por exemplo, com o Imposto

sobre Produtos Industrializados – IPI, o Imposto de Renda – IR, o Imposto sobre a Propriedade

Territorial Rural – ITR, Imposto sobre a Propriedade Territorial e Predial Urbana – IPTU,

Imposto sobre Circulação de Mercadorias – ICMS, dentre outros.

No que se refere às taxas, percebe-se que assim como são utilizadas para outros

fins, podem ser adequadas no objetivo de preservação ambiental. A receita das taxas de serviço

público, proveniente do serviço ambiental prestado, bem como das taxas de poder de polícia,

atuando na fiscalização, licenciamento e controle da atividade particular exigindo o tributo,

pode ser vinculada à resolução de eventuais prejuízos ambientais ou indutora de atividades

menos poluidoras.

A contribuição de melhoria, de igual sorte, se mostrou eficaz através de exemplos

no Estado do Rio de Janeiro, como uma vantagem ao meio ambiente. Ao passo que, ao se

construírem obras públicas ligadas à preservação ambiental (parques e áreas de preservação

ambiental, por exemplo), seja exigido tal tributo dos contribuintes beneficiados com a obra,

desde que a arrecadação se vincule, senão à obra em si, ao meio ambiente.

As contribuições especiais e os empréstimos compulsórios, apesar não estarem

presentes no artigo 145 da Constituição Federal, tratam-se de tributos conforme aqui estudado.

Os empréstimos compulsórios, diante de sua natureza jurídica, podem se apresentar como uma

ferramenta importante nos casos de calamidade pública de natureza ambiental e nos casos de

investimentos públicos na esfera ambiental. As contribuições especiais, por sua vez,

proporcionam utilidades de suma importância pelo fato de poderem graduar sua intervenção de

acordo com a utilização ou degradação dos recursos ambientais.

Tem-se então, que a proteção ambiental via sistema tributário não visa excluir a

natureza do ciclo produtivo tornando-a inacessível. Pelo contrário, busca o estabelecimento de

um nível de proteção elevado, procurando a precaução, a prevenção e a correção dos ataques ao

ambiente, modificando as relações entre a sociedade e a natureza, a fim de melhorar a

qualidade de vida, gerando consciência e, em conseqüência, o desenvolvimento humano,

propondo a transformação do sistema produtivo e do consumismo em uma sociedade baseada

na solidariedade, afetividade e cooperação, ou seja, visando a justa distribuição de seus

recursos entre todos.

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