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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA UNB FACULDADE DE EDUCAÇÃO FE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PPGE DOUTORADO EM EDUCAÇÃO A AVALIAÇÃO PARA AS APRENDIZAGENS, INSTITUCIONAL E EM LARGA ESCALA EM CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES: LIMITES E POSSIBILIDADES DE INTERLOCUÇÃO SÍLVIA LÚCIA SOARES Brasília-DF Novembro de 2014

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA UNB FACULDADE DE …repositorio.unb.br/bitstream/10482/17738/1/2014_SílviaLúciaSoares... · minhoca, uma concha de caramujo, o vôo dos urubus, os pulos

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UNIVERSIDADE DE BRASLIA UNB

FACULDADE DE EDUCAO FE

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO PPGE

DOUTORADO EM EDUCAO

A AVALIAO PARA AS APRENDIZAGENS, INSTITUCIONAL E EM LARGA

ESCALA EM CURSOS DE FORMAO DE PROFESSORES: LIMITES E

POSSIBILIDADES DE INTERLOCUO

SLVIA LCIA SOARES

Braslia-DF

Novembro de 2014

SLVIA LCIA SOARES

A AVALIAO PARA AS APRENDIZAGENS, INSTITUCIONAL E EM LARGA

ESCALA EM CURSOS DE FORMAO DE PROFESSORES: LIMITES E

POSSIBILIDADES DE INTERLOCUO

Tese apresentada Faculdade de Educao da

Universidade de Braslia, como requisito parcial

para obteno do ttulo de Doutora em Educao,

linha de Pesquisa: Profisso Docente, Currculo e

Avaliao PDCA.

Eixo de Interesse: Avaliao das aprendizagens

Orientadora: Prof. Dr. Benigna Maria de Freitas

Villas Boas

Grupo de Pesquisa: Grupo de Estudos e Pesquisas

em Avaliao e Organizao do Trabalho

Pedaggico GEPA

Braslia-DF

Novembro de 2014

FOLHA DE FICHA CATALOGRFICA

Soares, Slvia Lcia. A avaliao para as aprendizagens, institucional e em larga escala

em cursos de formao de professores: limites e possibilidades de interlocuo. 2014. 318 f.

Tese (Doutorado em Educao) Faculdade de Educao Universidade de Braslia UnB,

Braslia DF.

SLVIA LCIA SOARES

A AVALIAO PARA AS APRENDIZAGENS, INSTITUCIONAL E EM LARGA

ESCALA EM CURSOS DE FORMAO DE PROFESSORES: LIMITES E

POSSIBILIDADES DE INTERLOCUO

Defesa de Tese de Doutorado apresentada seguinte Banca Examinadora:

Braslia, _____/ _____/ 2014

Prof Dr. Benigna Maria de Freitas Villas Boas

Orientadora FE/UnB

Prof Dr Olenir Maria Mendes

Membro externo - UFU

Prof. Dr. Prof. Dr. Ricardo Gauche

Membro Externo UnB/IQ

Prof. Dr. Cristiano Alberto Muniz

Membro Interno UnB/FE

Prof Dr Eva Wairos Pereira

Membro Interno UnB/FE

________________________________________________________________________

Prof Dr Maria Emlia Gonzaga de Souza

Membro Suplente UnB/FE

Dedico este trabalho a minha irm Rita Helena, que, na

luta pela vida, tem demonstrado coragem, determinao

e f e conseguido nos mostrar que a vida muito curta.

Ento quebre as regras, perdoe rapidamente, beije

lentamente, ame de verdade, ria descontroladamente. E

valorize tudo que h de bom e tudo que lhe faz sorrir.

[...] no deixes que a vida passe em branco, e que

pequenas adversidades sejam a causa de grandes

tempestades Fernando Pessoa.

E a Maria Helena Burato, amiga-irm, companheira fiel

e constante em minha vida e que, em situao similar,

tem mostrado fora e persistncia. O correr da vida

embrulha tudo. A vida assim: aperta e da afrouxa,

sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente

coragem Joo Guimares Rosa.

AGRADECIMENTOS

Aos trs grandes homens de minha existncia: Jos Flvio Rabelo Adriano, Vitor

Soares Rabelo Adriano, Henrique Soares Rabelo Adriano.

A minha me, Lcia Gonalves da Cunha, pela dignidade e o poder de luta.

s minhas irms e meus irmos, pela permanente amorosidade e por tudo o que

representam para mim.

Professora Dr. Benigna Maria de Freitas Villas Boas, o lume imprescindvel

nesta caminhada.

A todos os meus amigos e minhas amigas de todas as horas, em especial a

Elisngela Teixeira Gomes Dias e Simone Gontijo, companheiras de percurso e de afetos.

A Maria Emlia, por despertar esperanas e descortinar possibilidades.

Aos estudantes da turma da disciplina Avaliao Escolar, companheiros de trocas

e aprendizagens.

No sou nem otimista, nem pessimista. Os otimistas so

ingnuos, e os pessimistas amargos. Sou um realista

esperanoso. Sou um homem da esperana.

Ariano Suassuna

A educao se divide em duas partes: educao das

habilidades e educao das sensibilidades. Sem a

educao das sensibilidades, todas as habilidades so

tolas e sem sentido. Os conhecimentos nos do meios

para viver. A sabedoria nos d razes para viver.

Quero ensinar as crianas. Elas ainda tm olhos

encantados. Seus olhos so dotados daquela qualidade

que, para os gregos, era o incio do pensamento: a

capacidade de se assombrar diante do banal.

Para as crianas, tudo espantoso: um ovo, uma

minhoca, uma concha de caramujo, o vo dos urubus,

os pulos dos gafanhotos, uma pipa no cu, um pio na

terra. Coisas que os eruditos no veem.

Joo Ubaldo Ribeiro

H escolas que so gaiolas e h escolas que so asas.

Escolas que so gaiolas existem para que os pssaros

desaprendam a arte do voo. Pssaros engaiolados so

pssaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode

lev-los para onde quiser. Pssaros engaiolados

sempre tm um dono. Deixaram de ser pssaros.

Porque a essncia dos pssaros o voo.

Escolas que so asas no amam pssaros engaiolados.

O que elas amam so pssaros em voo. Existem para

dar aos pssaros coragem para voar. Ensinar o voo,

isso elas no podem fazer, porque o voo j nasce dentro

dos pssaros. O voo no pode ser ensinado. S pode ser

encorajado.

Rubem Alves

RESUMO

A presente pesquisa buscou analisar a formao de estudantes dos cursos de Licenciaturas

(Letras, Matemtica e Pedagogia) para desenvolverem os trs nveis da avaliao das

aprendizagens, institucional e em larga escala, considerando como os saberes construdos nos

processos formativos repercutem na construo da prtica avaliativa de professores em

formao, de maneira a traduzi-los, reorient-los, ressignific-los. A pesquisa baseou-se em

dados obtidos por meio de entrevistas com coordenadores de curso, com os professores de

Didtica e das disciplinas que tratam sobre a avaliao, de questionrios aplicados aos alunos

e da observao das aulas da disciplina Avaliao Escolar, no decorrer do segundo semestre

do ano de 2013. Os dados empricos, articulados com os pressupostos terico-metodolgicos

e com a anlise documental, nos possibilitaram analisar, no real-concreto, a organizao dada

aos conhecimentos sobre a avaliao e a reao dos estudantes em formao frente s

aprendizagens relacionadas ao tema. Metodologicamente, optamos pelo materialismo

histrico-dialtico, por considerar que os elementos enfatizados na pesquisa transcendem a

dimenso quantificvel do fenmeno, e pela tcnica de anlise de contedo para interpretao

dos dados gerados, o que possibilitou a construo de categorias e eixos temticos que foram

colacionados com as demais informaes obtidas. Para realizao da pesquisa, foram eleitas

trs categorias presentes na dialtica: totalidade, contradio e mediao, que se constituram

em instrumentos de compreenso da avaliao na realidade social concreta, agindo como

intrpretes do real e nos auxiliando na captao da mutabilidade e do dinamismo imanentes ao

fenmeno avaliativo. A pesquisa se estruturou nas seguintes categorias conceituais, obtidas no

recorte terico-prtico do nosso objeto de estudo: avaliao, formao de professores,

avaliao externa e as aprendizagens sobre a avaliao. A articulao entre as categorias

metodolgicas e conceituais assegurou a interlocuo da dimenso normativa da avaliao (o

previsto), da dimenso no normativa descritiva (o dito) e da dimenso pedaggica (o feito) e

a busca de estabelecimento das bases tericas que as ancoraram. A pesquisa foi realizada em

uma instituio de ensino superior, pblica, federal, que oferece os cursos de Licenciatura em

Letras, Matemtica e Pedagogia. A anlise evidenciou que nos cursos de formao de

professores as aprendizagens dos estudantes esto circunscritas perspectiva tcnica de

avaliao, centrada em instrumentos como provas, trabalhos e seminrios, sendo a avaliao

concebida como mera verificao da aprendizagem. Embora os professores considerem a

importncia da avaliao nos espaos de formao, ocorre ainda uma evidente secundarizao

na abordagem da temtica, pois no se percebe uma delimitao precisa para os saberes da

avaliao na organizao pedaggica do curso e das disciplinas. A perspectiva crtica de

avaliao aparece raramente nos planos de curso, nas disciplinas e nas prticas vivenciadas

nos cursos de formao do docente. Os testes de avaliao coexistem sem dialogar entre si e

falta espao, na instituio, para discusses comprometidas com a melhoria do processo

avaliativo. Tais fatos, contudo, no podem impedir ou impossibilitar mudanas significativas

no processo do ensino e das aprendizagens sobre a avaliao no contexto da formao de

professores, pois deve ser oportunizada ao estudante a ampliao conceitual e metodolgica

do processo avaliativo. O ensino sobre a avaliao nos cursos de formao precisa transcender

as aprendizagens e abranger tanto os fatores intra como extraescolares. Assim, a avaliao no

pode ser concebida apenas como um resultado, mas como categoria integrante da formao,

de modo a proporcionar ao futuro docente reflexes mais significativas e vivncias avaliativas

diversificadas, para que as considere posteriormente, como possibilidades em sua prpria

prtica profissional.

Palavras-chave: Avaliao. Formao de professores. Avaliao externa. Avaliao

institucional. Aprendizagem da avaliao.

ABSTRACT

The objective of this research was to examine the formation of students of Undergraduate

(Letters, Mathematics and Pedagogy) to develop the three levels of evaluation and live with

them: learning, institutional and large scale, considering how the knowledge built in the

formative processes impacts on the construction of evaluation practice of teachers in training,

in order to translate them, redirect them, offering them new significance. The research was

based on data obtained through interviews with course coordinators, with teachers of

Didactics and other disciplines that deal with the theme evaluation, through the questionnaires

given to students, and from the observation of lessons of the subject School Evaluation,

during the second semester in 2013. Empirical data, articulated with the theoretical and

methodological assumptions and document analysis, allowed us to analyze, in real-concrete,

the organization given the knowledge about the evaluation and students' reaction to learning

in training ahead related to the theme. Methodologically, we chose the historical-dialectical

materialism, arguing that the elements emphasized in research beyond the quantifiable

dimension of the phenomenon, and the technique of content analysis to interpret the data

generated, which enabled the construction of categories and themes that were collated with

other information obtained. To conduct the survey, three categories present in the dialectic

were elected: totality, contradiction and mediation, that formed understanding of the

assessment instruments in concrete social reality, acting as interpreters of reality and helping

us in capturing the mutability and dynamism to the immanent evaluative phenomenon. The

research was structured in the following conceptual categories, obtained in theoretical and

practical cut of our object of study: assessment, teacher training, external evaluation, and

learning about the assessment. The articulation between the methodological and conceptual

categories ensured the dialogue of the normative dimension of evaluation (predicted), non-

descriptive normative dimension (said) and the pedagogical dimension (the feat) and the

pursuit of establishment of the theoretical foundations that anchored them. The survey was

conducted in a federal institution of superior education, public, which offers the Bachelor of

Arts, Mathematics and Pedagogy. The analysis showed that, in training courses for teachers,

student learnings are circumscribed to the technical evaluation perspective, focusing on

instruments such as tests, papers and seminars, and the evaluation was conceived as mere

verification of learning. Although teachers consider the importance of evaluation in the areas

of training, there is still an evident sidelined in the thematic approach, because it is not

perceived a demarcation for evaluation knowledge in pedagogical organization of the course

and disciplines. A critical evaluation perspective rarely appears in course plans, in the

disciplines and in practices experienced in the training courses of teachers. Evaluation tests

coexist without dialogue among themselves, and there is a lack of space in the institution for

discussion committed to improving the evaluation process. Such facts, however, cannot

prevent, nor become impossible, significant in the teaching and learning on the assessment in

the context of formation process changes, for it must be given the opportunity to student

conceptual and methodological expansion of the evaluation process. The teaching about

evaluation in training courses must transcend the learning and may cover both intra and extra-

curricular factors. Thus, it cannot be conceived only as a result, but as an integral category of

training, to provide the future teachers most significant reflections and diverse evaluative

experiences, so they could consider later as possibilities in their own professional practice.

Keywords: Evaluation. Teacher training. External evaluation. Institutional evaluation.

Learning evaluation.

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Sntese da catalogao das Teses e Dissertaes ................................................... 33 Quadro 2 - Sntese dos artigos analisados ................................................................................ 34 Quadro 3 - Nmero de estudantes matriculados nos cursos de Licenciaturas.......................... 49 Quadro 4 - Organizao do processo de identificao das categorias de anlise ..................... 55 Quadro 5 - Sntese das entrevistas 2013 ................................................................................ 55

Quadro 6 - Demonstrativo do nmero de estudantes entrevistados ......................................... 58 Quadro 7 - Demonstrativo das disciplinas pedaggicas do curso de Letras .......................... 112 Quadro 8 - Disciplinas pedaggicas optativas do curso de Letras ......................................... 113 Quadro 9 - Categorias de anlise das questes abertas do questionrio ................................. 117 Quadro 10 - Disciplinas pedaggicas ..................................................................................... 123

Quadro 11 - Categorias de anlise das questes abertas do questionrio ............................... 127

Quadro 12 - Disciplinas obrigatrias do Departamento de Planejamento e Administrao

PAD ........................................................................................................................................ 131

Quadro 13 - Disciplinas obrigatrias do Departamento de Mtodos e Tcnicas MTC ....... 131 Quadro 14 - Disciplinas obrigatrias do Departamento de Teoria e Fundamentos TEF .... 132 Quadro 15 - Sntese das respostas dos professores sobre o tratamento dado avaliao na

disciplina de Didtica ............................................................................................................. 134

Quadro 16 - Sntese da entrevista dos professores sobre a relevncia da disciplina que trata

sobre a avaliao no processo de formao de professores da Educao Bsica ................... 141

Quadro 17 - Categorias de anlise das questes abertas do questionrio ............................... 151 Quadro 18 - Sntese do depoimento dos alunos acerca das aprendizagens sobre a avaliao 157 Quadro 19 - Sntese da concepo de avaliao em larga escala dos professores de Didtica ........ 182

Quadro 20 - Sntese das respostas dos alunos sobre o entendimento dos alunos sobre a

avaliao institucional ............................................................................................................ 196

Quadro 21 - Sntese das respostas dos estudantes sobre a necessidade de participao em

atividades de avaliao institucional ...................................................................................... 204

Quadro 22 - Sntese do entendimento dos alunos sobre a avaliao das aprendizagens ........ 212 Quadro 23 - Sntese das respostas s entrevistas realizadas com os alunos na Educao Bsica ..... 238 Quadro 24 - Sntese das respostas s entrevistas realizadas com os gestores da Educao

Bsica ..................................................................................................................................... 241

Quadro 25 - Sntese das respostas s entrevistas realizadas com os professores da Educao

Bsica ..................................................................................................................................... 246 Quadro 26 - Sntese da avaliao da disciplina Avaliao Escolar pelos estudantes em

formao ................................................................................................................................. 262

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Articulao entre as categorias metodolgicas e conceituais da pesquisa ............... 48 Figura 2 - Organograma do Decanato de Graduao/2013 ...................................................... 51 Figura 3 - Representao metodolgica ................................................................................... 54 Figura 4 - A relao entre os nveis da avaliao educacional ............................................... 266

LISTA DE GRFICOS

Grfico 1 - Distribuio percentual do nmero de estudantes/semestre que participaram da

pesquisa .................................................................................................................................... 59 Grfico 2 - Distribuio percentual do nmero de estudantes da disciplina Avaliao Escolar

por curso de Licenciatura ......................................................................................................... 61 Grfico 3 - Distribuio percentual das disciplinas do curso de Letras ................................. 111

Grfico 4 - Os conhecimentos da avaliao estudados do condies para o estudante praticar

a avaliao no curso de Letras? .............................................................................................. 116

Grfico 5 - Os conhecimentos da avaliao estudados do condies para o estudante praticar

a avaliao no curso de Matemtica?......................................................................................127

Grfico 6 - Os conhecimentos da avaliao estudados do condies para o estudante praticar

avaliao no curso de Pedagogia?...........................................................................................116

Grfico 7 - Distribuio percentual dos instrumentos utilizados no processo avaliativo do

aluno..................................................................................................................................161

Grfico 8 - Devolutiva do professor s atividades avaliativas realizadas pelos alunos ......... 165 Grfico 9 - Instrumento de Avaliao que o estudante em formao pretende adotar em sua

prtica docente.. .....................................................................................................................168

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Demonstrativo do nmero de Instituies de Ensino ofertantes do curso de

Pedagogia..................................................................................................................................92 Tabela 2 - Resumo do fluxo curricular ................................................................................... 131

Tabela 3 - Istrumentos de avaliao utilizados predominantemente no processo avaliativo do

aluno........................................................................................................................161

Tabela 3 - Instrumento de avaliao que o estudante em formao pretende adotar em sua

prtica docente ...................................................................................................................... 1688

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas

ABP Aprendizagem Baseada em Problemas

AE Aprendizagem no Ensino

AI Avaliao Institucional

AIP Avaliao Institucional Participativa

ANEB Avaliao Nacional da Educao Bsica

ANFOPE Associao Nacional pela Formao dos Profissionais de Educao

ANPEDE Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao

ANRESC Avaliao Nacional do Rendimento Escolar

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

CANAS Centros de Aperfeioamento para o Magistrio

CAPES Fundao Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

CBEs Conferncias Brasileiras de Educao

CEPE Cmara de Ensino Pesquisa e Extenso

CESPE Centro de Seleo e de Promoo de Eventos da Fundao Universidade de Braslia

CF Constituio Federal

CIL Cursos de Licenciatura

Clad Centro Latino-Americano de Administrao para o Desenvolvimento

CNE Conselho Nacional de Educao

CNE/CP Conselho Nacional de Educao/Conselho Pleno

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

CONAES Comisso Nacional de Avaliao da Educao Superior

CONARCFE Comisso Nacional de Reformulao dos Cursos de Formao do Educador

CPA Comisso Permanente de Avaliao

CPA Comisso Prpria de Avaliao

DCNFP Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formao de Professores da Educao

Bsica

DEAES Diretoria de Estatsticas e Avaliao da Educao Superior

DF Distrito Federal

DPE Desenvolvimento Psicolgico e Ensino

EB Educao Bsica

EF Ensino Fundamental

EI Educao Infantil

EJA Educao de Jovens e Adultos

EM Ensino Mdio

ENADE Exame Nacional de Desempenho do Estudante

ENDIPE Encontro Nacional de Didtica e Prtica de Ensino

ENEM Exame Nacional do Ensino Mdio

FE Faculdade de Educao

FEDF Fundao Educacional do Distrito Federal

FE-UnB Faculdade de Educao

FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao

FUNDEF Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorizao do Magistrio

GPAL Grupo Permanente de Acompanhamento das Licenciaturas

HEM Habilitao Especfica de Magistrio

IBICT Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e em Tecnologia

IDD Indicador de Diferena Entre os Desempenhos Observados e Esperados

IDEB ndice de Desenvolvimento da Educao Bsica

IEA International Association for the Evaluation of Educational Achievement

IES Instituies de Ensino Superior

IFETs Institutos Federais de Educao

IL Instituto de Letras

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

LET Departamento de Lnguas Estrangeiras e Traduo

LIBRAS Lngua Brasileira de Sinais

LIP Departamento de Lingustica, Portugus e Lnguas Clssicas

MEC Ministrio da Educao

MI Mdio Inferior

MM Mdio Mnimo

NDE Ncleo Docente Estruturante

NEAL Ncleo de Estudos e Acompanhamento das Licenciaturas

NEs Necessidades Educativas Especiais

OCDE Organizao de Cooperao e Desenvolvimento Econmico

OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico

OEB Organizao da Educao Brasileira

ONU Organizaes das Naes Unidas

PA Projeto Acadmico

PAR Plano de Aes Articuladas

PAS Programa de Avaliao Seriada

PCNs Parmetros Curriculares Nacionais

PDCA Profisso Docente, Currculo e Avaliao

PDE Plano de Desenvolvimento da Educao

PDRAE Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado

PEDEAD Curso de Pedagogia a Distncia

PhD Doctor of Philosophy

PIE Curso de Pedagogia para o Incio de Escolarizao

PMCTE Plano de Metas Compromisso de Todos pela Educao

PNEE Portadores de Necessidades Educativas Especiais

PPP Projeto Poltico-Pedaggico

PUC-Rio Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro

REUNI Plano de Reestruturao e Expanso das Universidades Federais

REUNI Programa de Apoio a Planos de Reestruturao e Expanso das Universidades

SAEB Sistema de Avaliao da Educao Bsica

SBEM Sociedade Brasileira de Educao Matemtica

SCIELO Scientific Electronic Library On-line

SEE-DF Secretaria do Estado de Educao do Distrito Federal

SIADE Sistema de Acompanhamento de Demandas Escolares

SINAES Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior

SR Sem Rendimento

SS Superior

TCC Trabalho de Concluso de Curso

TEL Departamento de Teoria Literria e Literaturas

UAB Universidade Aberta do Brasil

UCB-DF Universidade Catlica de Braslia

UFG Universidade Federal de Gois

UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

UnB Universidade de Braslia

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

USAID United States Agency for International Development

USP Universidade de So Paulo

SUMRIO

INTRODUO ........................................................................................................................ 18

Captulo 1 A TODA HORA ROLA UMA HISTRIA ........................................................... 25

1.1 Desmistificando a realidade: origem do problema de pesquisa ..................................... 26 1.2 Objetivos ........................................................................................................................ 40 1.3 O caminho percorrido e o jeito de caminhar .................................................................. 42

1.3.1 As categorias de anlise ......................................................................................... 45

1.4 O campo e o contexto da pesquisa ................................................................................. 49 1.5 A materialidade do movimento do real: coleta e anlise de dados ................................ 53

Captulo 2 A INTERLOCUO ENTRE O CONTEXTO HISTRICO DA FORMAO

DE PROFESSORES E DA AVALIAO: O DILOGO POSSVEL .................................. 66

2.1 A tessitura sociopoltico-conceitual entre estado neoliberal, polticas e avaliao ....... 67 2.2 As polticas pblicas, as polticas educacionais, a avaliao e a formao de

professores: polticas pblicas que se cruzam ...................................................................... 72 2.3 Caminhando pela histria: as nuances das polticas de formao de professores e de

avaliao educacional ........................................................................................................... 79 2.4 A interlocuo entre regulao, avaliao e formao de professores .......................... 96

Captulo 3 SABERES SOBRE A AVALIAO: AVALIA-SE PARA APRENDER,

APRENDE-SE PARA AVALIAR ......................................................................................... 105

3.1 O saber e o conhecimento: possveis diferenas .......................................................... 106

3.2 Os saberes sobre avaliao nos cursos de Letras, Matemtica e Pedagogia ................ 110

3.2.1 Curso de Letras .................................................................................................... 110

3.2.2 Curso de Matemtica ........................................................................................... 122 3.2.3 Curso de Pedagogia ............................................................................................. 129

3.2.4 Professores de Didtica........................................................................................ 134 3.2.5 Professores das disciplinas que tratam sobre a avaliao .................................... 137 3.2.6 Avaliao escolar (MTC) .................................................................................... 138 3.2.7 Estratgias para Avaliao: Sujeito com Necessidades Educativas Especiais e suas

Subjetividades (MTC) .................................................................................................... 139 3.2.8 Medidas Educacionais (PAD).............................................................................. 139 3.2.9 Avaliao das Organizaes Educativas (PAD) .................................................. 140

3.3 O olhar dos coordenadores dos cursos sobre o lugar da avaliao nos cursos de

formao de professores ..................................................................................................... 146 3.4 O olhar do estudante em formao .............................................................................. 150

3.4.1 A avaliao como sinnimo de prova .................................................................. 151

3.4.2 A avaliao como medida .................................................................................... 153 3.4.3 A avaliao como forma de aprendizagens ......................................................... 155 3.4.4 O estudado e o vivido nos cursos de licenciatura do condies ao futuro docente

de praticar a avaliao? .................................................................................................. 157

3.5 Os possveis impactos das experincias avaliativas na organizao da prtica

pedaggica do futuro docente ............................................................................................. 160

Captulo 4 A APRENDIZAGEM DA AVALIAO EM SEUS TRS NVEIS NOS

CURSOS DE FORMAO DE PROFESSORES PARA ATUAREM NA EDUCAO

BSICA ................................................................................................................................. 172

4.1 A avaliao em larga escala ......................................................................................... 173

4.1.1 Conversando com os sujeitos da pesquisa sobre a avaliao em larga escala ..... 177 4.1.1.1 Coordenadores de curso ................................................................................ 178

4.1.1.2 Professores de Didtica e das disciplinas que tratam da avaliao ............... 181 4.1.1.3 Os estudantes em formao ............................................................................... 184

4.2 A avaliao institucional .............................................................................................. 186

4.2.1 Conversando com os sujeitos da pesquisa sobre a avaliao em larga escala ..... 191 4.2.1.1 Coordenadores de curso ................................................................................ 191

4.2.1.2 Professores de Didtica ................................................................................. 194

4.2.1.3 Os estudantes em formao .......................................................................... 196

4.1 A avaliao para as aprendizagens .............................................................................. 208

Captulo 5 A INTERLOCUO ENTRE OS NVEIS DE AVALIAO NAS DIMENSES

NORMATIVA, NO NORMATIVA E PRTICA .............................................................. 219

5.1 Dimenso normativa da avaliao ............................................................................... 220 5.2 Dimenso no normativa da avaliao: conceito de avaliao em seus trs nveis na

fala dos sujeitos .................................................................................................................. 231 5.3 Dimenso prtica da avaliao (as vivncias e experincias da aprendizagem sobre a

avaliao) ............................................................................................................................ 233 5.4 A compreenso por meio da interveno no real ......................................................... 236

5.4.1 Roteiro de perguntas e respostas de visita escola ............................................. 237

5.4.1.1 Para o Professor ............................................................................................ 237

5.4.1.2 Para o Gestor ou Coordenador ou Supervisor ou Orientador Educacional .. 238 5.4.1.3 Para os Alunos .............................................................................................. 238 5.4.2 Unidade I ............................................................................................................. 253

5.4.3 Unidade II ............................................................................................................ 258 5.4.4 Unidade III ........................................................................................................... 259 5.4.5 A avaliao da disciplina Avaliao Escolar pelos estudantes em formao ...... 262

5.5 Os nveis de avaliao e a formao de professores: possveis e necessrias

interlocues ....................................................................................................................... 266

CONSIDERAES FINAIS ................................................................................................. 270

REFERNCIAS ..................................................................................................................... 285

APNDICE A - ROTEIRO PARA A ANLISE DOCUMENTAL ..................................... 308

APNDICE B ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS COORDENADORES DOS

CURSOS DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA, LETRAS E MATEMTICA ............ 309

APNDICE C - PROTOCOLO PARA REGISTRO DE OBSERVAES - DIRIO DE

CAMPO .................................................................................................................................. 310

APNDICE D ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS PROFESSORES DE DIDTICA

E DE OUTRAS DISCIPLINAS QUE TRATEM DA AVALIAO ................................... 311

APNDICE E ROTEIRO DA ENTREVISTA COM O(A) PROFESSOR(A) DA

DISCIPLINA AVALIAO ESCOLAR .............................................................................. 312

APNDICE F QUESTIONRIO PARA OS ALUNOS .................................................... 313

APNDICE G CARTA DE APRESENTAO ................................................................. 317

APNDICE H - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................. 318

APNDICE I - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA

GRAVAO DE ENTREVISTA ......................................................................................... 319

ANEXO 1 PLANO DE CURSO DA DISCIPLINA AVALIAO ESCOLAR ............... 320

Curso de Pedagogia ................................................................................................................ 320

ANEXO 2 CRONOGRAMA DA DISCIPLINA AVALIAO ESCOLAR .................... 323

ANEXO 3 - FICHA de ACOMPANHAMENTO DA UNIDADE ________ ....................... 325

ANEXO 4 - FICHA DE AVALIAO DOS MEMBROS DO GRUPO ............................. 327

ANEXO 5 - FICHA DE AVALIAO DOS MEMBROS DO GRUPO ............................. 328

18

INTRODUO

Esta tese se vincula linha de pesquisa Profisso Docente, Currculo e Avaliao

(PDCA). Trata-se de um estudo no campo da avaliao, no contexto da formao de

professores para a Educao Bsica, tendo como objeto a avaliao das aprendizagens,

institucional e em larga escala em cursos de formao de professores: limites e

possibilidades de interlocuo.

A proposio de tal objeto decorrente da evidncia do acelerado processo de

centralidade que a avaliao vem adquirindo, nos diversos mbitos do Estado. Todavia, como

declara Oliveira (2011, p. 16), no campo da educao que ela ganha proeminncia, visto

que o conhecimento passou a ser elemento-chave de acesso sociedade do conhecimento e

manipulao da informao como principal atividade da economia. Assim, ao mesmo tempo

em que a avaliao expande seus modelos e objetivos, assumindo outros significados,

inclusive no mbito educacional, nos cursos de formao de professores, o estudo sobre essa

categoria continua quase ausente ou abordado de maneira superficial. Tal fato paradoxal,

uma vez que esses cursos formaro futuros avaliadores.

Em decorrncia, evidencia-se que os docentes, quando no desempenho de suas

funes, apresentam despreparo para lidar com a avaliao em suas dimenses: poltica,

sociolgica e pedaggica. Parece oportuno afirmarmos que, no cenrio da formao de

professores o acesso aos conhecimentos sobre a avaliao continua efetivando-se de forma

fragmentada, dispersa e superficial. Com isso, comum depararmos com crticas e denncias

sobre tal evidncia.

Em virtude desta e de outras inmeras fragilidades, intensificaram-se nos ltimos

anos estudos e debates sobre o tratamento dado avaliao no processo formativo do docente,

como se pode verificar nos trabalhos apresentados por diversos autores, tais como Sordi e

Ldke (2009), Freitas, H. (2007), Calderano (2008), Gatti (2009), entre outros.

No entanto, embora j exista considervel produo cientfica, ainda no foram

evidenciadas mudanas realmente significativas nas polticas e, muito menos, na organizao

pedaggica da formao do professor. Em perodo mais recente, Freitas, H. (2007), ao

analisar o cenrio da formao de professores no Brasil, constata a ampliao do consenso da

urgncia de definio de uma poltica especfica, em nvel nacional, de formao de

professores, que contemple de forma articulada e prioritria a formao inicial, formao

continuada e condies de trabalho, salrios e carreira (FREITAS, H. 2007, p. 1204).

19

Reconhecemos, porm, que na definio dessa poltica, necessrio o rompimento com a

dicotomia existente entre as propostas polticas de formao e os interesses da sociedade civil.

Frente tmida evoluo poltica da formao, Freitas, H. (2007) contundente ao

afirmar que chegamos segunda metade da atual dcada sem proposies mais concretas, do

ponto de vista estatal, para a formao dos docentes. A autora tambm sintetiza a situao

atual da regulao por parte do Estado na formao, nos seguintes itens: i) Flexibilizao da

formao docente, mediante a institucionalizao dos programas emergenciais para formao

de professores; ii) Retomada da proposio dos Institutos Superiores de Educao e das

concepes que nortearam sua criao pela fundao dos IFETs (Institutos Federais de

Educao) e a ampliao dos polos da UAB; iii) Reconfigurao da formao inicial em

servio, a distncia.

Aos problemas enumerados, que denunciam a abordagem reducionista, aligeirada

e instrumental no processo de formao do professor, somam-se as lacunas existentes em

relao aos conhecimentos sobre a avaliao na organizao do trabalho pedaggico dos

cursos de Licenciaturas. Ademais, as prticas avaliativas vivenciadas pelo estudante em

formao continuam quase que exclusivamente centradas no professor, e os procedimentos

didticos adotados no oportunizam o repensar e o reconduzir suas prprias aprendizagens

(VASCONCELLOS, 1995).

E mais: se, por um lado, as polticas educacionais no favorecem modificaes na

prtica avaliativa, para Mendes (2006), por outro, academicamente, no tem havido esforos

em construir novas alternativas e maneiras de se avaliar. O que se observa que nos espaos

de formao prevalece ainda o aspecto somativo da avaliao voltado para mdias e

resultados ou uma preocupao excessiva em responder s demandas burocrticas imediatas.

Podemos, sem leviandade, afirmar que nesse contexto a avaliao est mais voltada para a

classificao do que para a melhoria dos processos de aprendizagens e, consequentemente, da

educao.

Outro agravante: a avaliao, nessa perspectiva, permanece desprovida de

significao social, poltica e pedaggica. Dessa forma, os cursos de formao de professores

ao negarem os condicionantes sociais, polticos e econmicos que influenciam e so

influenciados pela avaliao desconsideram a dimenso de historicidade que permeia e

sustenta a prtica pedaggica, em sentido amplo, e a prtica docente, em termos mais

especficos. Negam, portanto, em sua organizao pedaggica, a dinmica entre as condies

concretas da prtica educativa e a realidade social.

20

Para alm dessa questo, Mendes (2006) assevera que, por no atribuir

significados sociais a seus resultados, a avaliao educacional oculta os reais interesses da

sociedade capitalista e transforma-se em pilar de manuteno e perpetuao de um sistema

autoritrio, estratificado, hierrquico e extremamente desigual. Os dados, quando so

utilizados apenas para redimensionar as polticas pblicas, podem tambm, paralelamente, ser

utilizados para retroalimentar o processo de excluso social to recorrente na sociedade

capitalista.

Corroborando essa anlise, Freitas (2004) acrescenta que, na escola capitalista, a

avaliao no est desvinculada da forma de organizao da sociedade, que camufla traos de

desigualdades frente a jogos de interesses, onde o excluir e o subordinar tm sido funes

preferenciais da instituio escolar. O campo da avaliao, nesse contexto, estende-se como

mecanismo de eliminao/manuteno e apresenta-se como um produtor/legitimador da rgida

hierarquia que os procedimentos convencionais de avaliao ocultam, tais como:

(i) manuteno propriamente dita das classes dominantes em profisses nobres; (ii)

eliminao adiada ou manuteno provisria das classes populares em profisses

menos nobres; (iii) manuteno adiada ou excluso pura e simples das camadas

populares do interior da escola, ou seja, a evaso; (iv) eliminao propriamente dita

(privao), no sentido de impedir o ingresso das camadas populares na escola

(FREITAS, 2004, p. 152).

De fato, na sociedade atual, a avaliao tem-se transformado em forte instrumento

para garantir o cumprimento da funo social da escola e assegurar a conformidade, por meio

da motivao artificial do estudante, visto serem restritas as ligaes da escola com a vida.

Freitas (2004) argumenta ainda que a avaliao existente da escola est estreitamente

vinculada forma escolar constituda a partir dos objetivos escolares da sociedade capitalista.

Dessa forma, s seria possvel gerar uma nova concepo de escola e, consequentemente, da

avaliao, com a alterao desses objetivos.

O acirramento de inmeras contradies no campo da avaliao e da formao de

professores nos alerta que realizar um estudo abarcando a avaliao e a formao de

professores ao mesmo tempo no constituiu uma tarefa fcil. Alm da densidade e

complexidade do objeto, acrescenta-se a isso a dinamicidade prpria do processo educativo.

Ademais, os campos da avaliao e da formao de professores esto impregnados de

posies ideolgicas, polticas, sociais e culturais que constituem elementos determinantes de

seus sentidos e significados. Em virtude disso, a anlise dessa realidade no pode ser feita de

maneira reducionista; ao contrrio, por sua complexidade, exige a interpretao dos vrios

fatores que a determinam e so por ela determinados.

21

Em consonncia com essas constataes, entendemos que um estudo sobre a

formao de professores deve considerar os diversos condicionantes scio-histricos que

permeiam o processo formativo e que demarcam os diferentes paradigmas nele presentes. No

campo da avaliao no se faz diferente; convivemos tambm com diversas e antagnicas

vises. Por um lado, temos a viso da avaliao como instrumento de competio, composta

por esquemas preponderantemente objetivos, centrada nos valores numricos, atrelada a

resultados obtidos por meio de processos tcnicos literalmente descontaminados de contedos

axiolgicos. Por outro, situa-se a perspectiva da avaliao na lgica emancipatria, que

entrecruza os aspectos qualitativos com os quantitativos para gerar significados e requalificar

os conhecimentos tericos da rea. No entendimento de Lipovetsky (2011), somente nessa

perspectiva, a avaliao capaz de envidar esforos para a formao do homem onilateral1,

crtico, participativo e comprometido com a transformao.

O exposto evidencia a importncia do estudo realizado sobre a avaliao no

processo de formao de professores. No entanto, sabemos que, em um processo de pesquisa,

a escolha do objeto de estudo e os elementos que o determinam no se configuram como

aes neutras e desprovidas de intencionalidades por parte do pesquisador. Pelo contrrio,

ocorrem sob a gide de pressupostos polticos, ideolgicos, culturais, sociais e histricos.

Reconhecemos, tambm, que a natureza especfica da educao, da formao de professores e

da avaliao requer a escolha de tcnicas de estudo especialmente adequadas, do domnio de

conhecimentos diversos e de mtodos to dinmicos quanto a prpria realidade o .

Portanto, na complexidade da educao que analisamos a formao de

professores para desenvolverem os trs nveis de avaliao das aprendizagens, institucional

e em larga escala e com eles conviverem. A escolha de tal objeto decorreu da evidncia de

que aprender a avaliar uma condio fundamental para bem ensinar e bem realizar a

avaliao. essencial, tambm, para adquirir argumentos necessrios a fim de dialogar com

os resultados obtidos, atribuir-lhes significados pedaggicos e sociais, como ainda utiliz-los

1 V-se, portanto, que na teoria marxista o conceito de onilateralidade est embasado na relao entre a educao

mediadora e o trabalho, mas de forma contraposta relao ocorrida sob o contexto scio-histrico dominado

pela explorao do trabalho cuja educao est a servio do capital e da propriedade privada. Nesse contexto, o

trabalhador no tem vida prpria, aparece como propriedade de outro, de maneira que a alienao no se

explicita apenas na relao do trabalhador com os produtos de seu trabalho, mas tambm no prprio ato da

produo e nas prprias relaes sociais. Dessa forma, educao e atividade laboral, subjugadas pelo capital,

levam o homem a se perder de si mesmo. O processo de alienao configura o homem unilateral e incompleto

(LIPOVETSKY, 2011, p. 54).

22

como propulsores do redirecionamento da organizao do trabalho pedaggico da escola, em

sentido amplo, e da sala de aula, em particular.

Concorreu fortemente para a seleo do objeto de estudo a centralidade que a

avaliao vem adquirindo no campo das polticas sociais e a ampliao de sua interveno

para alm dos limites da sala de aula. Tal fato ocorre em razo de inmeras causas, entre as

quais a redefinio do papel do Estado no contexto atual das polticas neoliberais. O Estado,

antes provedor que procurava atender s demandas sociais como uma questo de direito, foi

transformando-se gradualmente no Estado neoliberal regulador2 das polticas, inclusive, das

educacionais.

O movimento da reconfigurao das funes do Estado passou a exigir a criao

de novos meios administrativos e de mecanismos que viessem garantir a melhoria da

eficincia e eficcia e, consequentemente, da regulao dos servios prestados (SOUSA et al.,

2000; SOUSA; OLIVEIRA, 2003, 2011). Dessa forma, foram implantados os sistemas de

avaliao para monitoramento das polticas pblicas, ocasio em que assumem uma posio

estratgica nas agendas governamentais e passam a ser utilizados como instrumentos de

controle e de acompanhamento dos empreendimentos da ao pblica. Em sntese, a avaliao

torna-se o eixo norteador do processo regulatrio do Estado.

No contexto indicado, observamos que a mudana do papel do Estado na

conduo das polticas pblicas e os sistemas de avaliao como formas de regulao se

tornaram objeto de estudo de diversos autores. Em relao ao papel do Estado, h os estudos

de autores como Anderson (1995), Gentili (1997), Faleiros (2000), Mszros (2005), Freitas

(2003; 2005; 2007; 2009; 2011), Clmaco (2005), e Behring e Boschetti (2008). Na

investigao do uso da avaliao como instrumento de efetivao da regulao, os estudos de

Souza e Oliveira (2003), Abdian (2010), Perroni (2003) e Barroso (2005) tm trazido valiosas

contribuies para a compreenso mais aprofundada da relao que se estabeleceu entre

avaliao Estado regulao3.

2 O Estado regulador pode ser caracterizado pela criao de agncias reguladoras independentes, pelas

privatizaes de empresas estatais, por terceirizaes de funes administrativas do Estado e pela regulao da

economia segundo tcnicas administrativas de defesa da concorrncia e correo de falhas de mercado em

substituio a polticas de planejamento industrial. Representou uma descentralizao do poder do Presidente da

Repblica e de seus Ministros (MATTOS, 2006). Disponvel em: . Acesso em: 16 fev. 2011.

3 Regular, no sentido amplo do termo, vocao de toda poltica pblica. Entretanto, regulao foi um termo

construdo no interior das polticas pblicas neoliberais, cuja eficcia maior no Brasil foi obtida na gesto de

Fernando Henrique Cardoso, para denotar uma mudana na prpria ao do Estado. O Estado no deveria

23

Na rea educacional, na avaliao de suas polticas, os instrumentos utilizados

configuram-se em exames avaliativos utilizados em todos os nveis: em larga escala, no

mbito nacional, estadual e municipal; em nvel institucional, realizados pela unidade de

ensino, por seu coletivo que a constitui; para as aprendizagens, efetivados prioritariamente em

sala de aula e sob a responsabilidade do professor (FREITAS, 2009). Destacamos que o Brasil

ainda no tem um sistema constitudo de avaliao da Educao Bsica. Ao contrrio, o que

se observa a existncia de testes diversos que no conseguem, em suas trajetrias, dialogar

entre si.

Sordi (2010, p. 147) denuncia que, com a aplicao de inmeros testes, o vis da

regulao sobre a qualidade da escola vem ocorrendo via controle dos profissionais, sendo

realizado por meio dos resultados obtidos pelos estudantes em tais avaliaes. Tal fato tem

sido constante nas polticas de cunho neoliberais4 que marcam um jeito de avaliar quase

sempre circunscrito a etapas de medio de desempenho (SORDI, 2010, p. 147). Tudo isso

se explica em nome da busca de uma suposta qualidade.

Na rea da formao de professores, lcus desta pesquisa, evidenciamos que a

noo de qualidade se encontra diretamente vinculada aos resultados obtidos nos exames em

larga escala. Vale reiterar que em cada divulgao do resultado para a sociedade dos exames

em larga escala (Prova Brasil, do ENEM e do ENADE) emerge a opinio de diversos

segmentos sociais, principalmente da mdia, atrelando o desempenho dos estudantes

qualidade da formao do professor. Concomitantemente aos dados obtidos, proliferam em

diferentes Estados do Brasil programas que visam premiar os professores pelo bom

desempenho de seus estudantes na avaliao. Segundo Freitas, H. (2007) encontra-se nessa

comparao a lgica de que a mensurao do desempenho do estudante diretamente

intervir no mercado, a no ser como um Estado avaliador (cf. DIAS SOBRINHO, 2002b). As polticas

regulatrias querem, em reas estratgicas, transferir o poder de regulao do Estado para o mercado, como parte

de um processo amplo marcado por vrias formas de produzir a privatizao do pblico. Isso inclui tanto a

instituio da regulao via mercado como seu complemento, a desregulao do pblico via Estado, para

permitir aquela ao de regulao do mercado (FREITAS, 2005, p. 912).

4 Neoliberalismo (neo) novo liberalismo. O termo refere-se a uma redefinio do liberalismo clssico,

influenciado pelas teorias econmicas. Foi cunhado em 1938, no encontro do Colloque Walter Lippmann, pelo

socilogo e economista alemo Alexander Rstow. Essa corrente caracteriza-se por pregar que o Estado

intervenha o mnimo na economia, mantenha a regulamentao das atividades econmicas e privadas num

mnimo e deixe agirem livremente os mecanismos do mercado (SILVA, 1999, p. 26). E [...] com o virar do

milnio, assiste-se a um recuo das teorias mais radicais do neoliberalismo e emergncia de propostas

alternativas no sentido de procurar um equilbrio entre o 'Estado' e o 'mercado', ou mesmo no sentido de superar

esta dicotomia pela reactivao de formas de interveno scio-comunitrias na gesto da coisa pblica

(BARROSO, 2005b, p. 741).

http://pt.wikipedia.org/wiki/Economia_neocl%C3%A1ssica

24

proporcional qualidade do trabalho do professor. Na verdade, o foco da avaliao no est

no redirecionamento das aes pedaggicas, mas na atribuio da culpa e da

responsabilizao do professor pelos baixos resultados. Para alm dessa compreenso,

entendemos que a qualidade da educao no pode ser desvinculada da qualidade da formao

de professores.

Vrios autores, como Schn (1992), Gatti (1992; 2009), Zeichener (1993),

Pimenta (1994; 1996; 1997), Brzezinski 1996, Catani (1997), Perrenoud (1997), Carvalho

(1988), Barreiro (1996), Pereira (2000), Castanho (2001), Silva e Sguissardi (2001), Tardif e

Lessard (2005), Veiga (2002; 2008), Libneo (2002), Barros Filho (2002), Alarco (2003),

Anastasiou e Alves (2004), Sordi (2009), tm discutido a formao de professores, buscando,

por meio de seus estudos, trazer elementos que possam contribuir para uma anlise mais

densa e consistente sobre sua qualidade. Alguns desses trabalhos procuram, por um lado,

explicitar as contradies presentes nessa rea e, por outro, discutir as concepes e as

tendncias que tm historicamente orientado os processos de formao de professor.

Frente ao papel de destaque que a avaliao adquiriu no contexto atual,

entendemos que, nos cursos de formao de professores, os conhecimentos a respeito no

devem restringir-se apenas avaliao realizada em sala de aula, ligada estritamente ao

desempenho do estudante. Como assevera Freitas (2007), a aprendizagem da avaliao

constitui um saber fundamental para que o professor venha a estabelecer a interlocuo entre

seus diferentes nveis: em larga escala, institucional e para as aprendizagens, a fim de tornar-

se capaz de dialogar com os dados obtidos nos diferentes nveis e atribuir-lhes significados

circunstanciais. Ademais, frente s novas demandas, torna-se imprescindvel que os cursos de

formao de professores implementem estudos sistematizados sobre as prticas de avaliao e

oportunizem reflexes mais densas e fundamentadas sobre sua lgica e implicaes na

realidade educacional (MONTEJANO, 2006; SORDI, 2005). As evidncias elencadas

revelam a necessidade e a urgncia de pesquisa sobre a avaliao no campo da formao de

professores para o desencadeamento de novos olhares avaliativos e de novas experincias no

processo de aprender a avaliar.

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CAPTULO 1 A TODA HORA ROLA UMA HISTRIA

A toda hora rola uma histria

Que preciso estar atento

A todo instante rola um movimento

Que muda o rumo dos ventos

Quem sabe remar no estranha

Vem chegando a luz de um novo samba

Sem rasgar a velha fantasia.

Paulinho da Viola, Rumo dos Ventos.

O caminho metodolgico escolhido parte da premissa de que a cincia um

construto humano, dinmico, complexo, cuja legitimidade ocorre por meio de prticas sociais

e culturais contextualizadas. Concretiza-se por meio da ao humana, que ir estabelecer seus

limites e determinar seu objeto, em uma relao complexa entre a realidade material e a

perspectiva humana que a configura. Portanto, no se refere apenas s questes

epistemolgicas e metodolgicas, mas tambm s questes da prxis5 e considera em seu

processo construtivo tanto a atividade humana social e histrica, como as dinmicas

processuais, plurais e contraditrias da realidade (BACHELARD, 1997). , portanto, a

construo humana do conhecimento.

Em sentido amplo, a cincia refere-se ao conhecimento organizado, sistematizado,

relativo a certas categorias de fatos ou fenmenos. Em sentido restrito, diz respeito

aquisio intencional e consciente do conhecimento de forma sistematizada, por meio da

aplicao do mtodo cientfico. De acordo com Galliano (1986), o conhecimento cientfico

5 Em Marx, o conceito de prxis refere-se atividade universal criativa e autocriativa por meio da qual o

homem cria (faz, produz) e transforma (conforma) seu mundo histrico a si mesmo (BOTTOMORE, 1998, p.

328). Ou seja, o movimento de articulao entre a teoria e a prtica, por meio da abstrao do pensamento,

visando a uma compreenso mais densa da prtica eivada da teoria.

Quanto prxis pedaggica, sabemos que prtica e prxis, embora sejam conceitos prximos, guardam tnues

diferenas. Analisando essa categoria com base na concepo marxista, podemos estabelecer que a prxis uma

atividade livre, universal, por meio da qual o homem cria, recria-se e transforma seu mundo humano e social. J

a prtica se constitui em uma das partes da prxis, tem carter imediato e utilitrio e est ligada s necessidades

imediatas (BOTTOMORE, 1997). Portanto, a prtica uma ao e basta-se em si, no precisa de

questionamento, reduz-se ao impensada, porm necessria. A prxis vai mais alm, necessita sempre das

reflexes e carece de uma fundamentao terica que lhe d sustentao. No tocante formao, a prxis, alm

de envolver referenciais tericos e metodolgicos da formao, envolve tambm uma proposta de formao que

lhe d sentido para alm do espao pedaggico e a contextualiza nos espaos sociais, econmicos e polticos

(FREITAS, 2006).

26

resulta de investigao metdica e sistemtica da realidade. Inferimos, portanto, que o

conhecimento cientfico advm da pesquisa.

1.1 DESMISTIFICANDO A REALIDADE: ORIGEM DO PROBLEMA DE PESQUISA

Entendemos a pesquisa como a capacidade de produzir um conhecimento que nos

auxilia na interpretao da realidade, oportunizando-nos ampliar nosso horizonte

interpretativo e, por conseguinte, nosso capital cultural. Podemos consider-la como um

caminho de mo dupla pelo qual o pesquisador estabelece uma relao dinmica com o objeto

que se constri e, nesse nterim, ocorrem inmeras transformaes, tanto no objeto estudado,

como no sujeito que o estuda. Pesquisar problematizar a realidade, estabelecer aes

interativas dialgicas com outras tantas possibilidades de compreenso dessa mesma

realidade. Portanto, a pesquisa s tem sentido quando produz e transforma os conhecimentos,

quando modifica nossa forma de ver, sentir e fazer o mundo. Assim, deve reunir o saber

experiencial construdo no cotidiano e no saber acadmico, proporcionando a ambos uma

prxis inovadora.

Na educao, a pesquisa tambm assume a capacidade de criar meios necessrios

ao estabelecimento de novas interaes, mediaes e modificaes de contextos que

envolvem os sujeitos de ensino com os sujeitos da aprendizagem (MEKSENAS, 2002, p.

22). Por ser a educao um fenmeno social amplo e inacabado, a investigao nessa rea

deve considerar os princpios da mutabilidade e do dinamismo a ela imanentes. De acordo

com Thiago de Mello, quem sabe aonde quer chegar, descobre o caminho e o jeito de

caminhar, o que explicita a relao a se estabelecer entre o pesquisador e o objeto a ser

estudado, visto que o mesmo se desvenda no percurso da caminhada.

Sendo assim, o problema de pesquisa a que nos propomos examinar emergiu

principalmente das diversas inquietaes que surgiram no decorrer de nossa vida pessoal e

profissional. Entre elas, ressalto a preocupao com o descuido de como a temtica da

avaliao vem sendo tratada no curso de Pedagogia e Licenciaturas e, consequentemente, na

formao do professor. Embora seja ideia corrente o entendimento da avaliao como um dos

pontos nevrlgicos do processo educativo e da formao de professores, o espao por ela

ocupado nos currculos de formao ainda deixa muito a desejar.

27

Todavia, em trs dcadas de exerccio, oito anos como professora dos anos

iniciais do Ensino Fundamental e os demais como professora de cursos de formao de

professores, temos observado muitos conflitos e diversas contradies na avaliao realizada

na educao, na escola e mais diretamente no processo ensino-aprendizagem dos anos iniciais

do Ensino Fundamental. H um considervel distanciamento entre o que se fala e que o que se

pratica na avaliao.

De antemo, esclarecemos que, por se tratar especificamente das experincias

vividas por esta pesquisadora, a descrio textual, neste trecho do estudo, ser realizada na

primeira pessoa do singular.

No decorrer de minhas experincias profissionais, evidenciei em diversos textos e

contextos a clareza de que aprender a avaliar uma condio fundamental para bem ensinar e

bem realizar a avaliao, como tambm para adquirir argumentos necessrios para dialogar

com os resultados obtidos. Nessas vivncias, constatamos que a falta de preparao

pedaggica normalmente acompanha os profissionais que passam a assumir responsabilidades

docentes. Com efeito, na maioria das vezes, os futuros professores inserem-se no campo da

formao, trazendo apenas saberes experienciais e profissionais6, porm nem sempre

acompanhados de saberes pedaggicos (SORDI, 2010).

Com base nas leituras realizadas e em minhas experincias pessoais e

profissionais, atuando como docente, coordenadora e pesquisadora em diferentes espaos de

formao de professores Escola Normal (1986/1994), Chefe da Seo de Magistrio da

extinta Fundao Educacional do Distrito Federal7 (1995-1997), Assessora do Departamento

de Pedagogia da Fundao Educacional do Distrito Federal FEDF (1997-1998), docente de

cursos de Licenciatura, em especial a de Pedagogia (1998 a 2010), e Ps-Graduao lato

sensu (2005-2011) , constatei as limitaes das aprendizagens sobre a avaliao no processo

de formao docente.

Minha preocupao com a questo da avaliao na formao docente foi ampliada

quando, em 1988, aps dezesseis anos de docncia na rede pblica de ensino do Distrito

6 A autora fundamentou-se em Tardif (2002). Para esse autor, os saberes docentes constituem-se em: saberes da

formao profissional como aqueles transmitidos pelas instituies de formao de professores; saberes

disciplinares, referentes aos saberes produzidos pela cincia da educao e aos saberes pedaggicos; saberes

curriculares, correspondentes aos discursos, objetivos e mtodos que se constituem em programas escolares; e

saberes experenciais, baseados no trabalho cotidiano e no conhecimento do meio.

7 A extino da Fundao Educacional do Distrito Federal foi determinada pelo Decreto n. 21.396, de

31/07/2000, que estabelece em seu Art. 1: Fica extinta a Fundao Educacional do Distrito Federal FEDF.

28

Federal, fui atuar na Faculdade de Educao da Universidade de Braslia - UnB, como

professora conveniada8, docente de algumas disciplinas, tais como: Didtica, Estgio

Supervisionado e Projeto III. Nesse perodo, juntamente com estudantes que cursavam a

disciplina Didtica, desenvolvemos uma pesquisa sobre Avaliao no curso de formao de

professores e o impacto desse processo avaliativo na atuao pedaggica do futuro

profissional. No perodo da investigao, os estudantes em formao observaram o

tratamento pedaggico dado ao processo avaliativo desenvolvido por dez professores que

atuavam nos cursos de Pedagogia e de Licenciatura em Letras, Matemtica, Fsica e Educao

Fsica. Na poca, os dados levantados mostraram que nos espaos de formao prevalecia

ainda o aspecto classificatrio da avaliao, voltado para mdias e resultados, o que respondia

s demandas burocrticas imediatas.

Posteriormente, minha inquietao quanto ao assunto se transformou em objeto de

estudo do curso de mestrado, no desenvolvimento da pesquisa O curso de Pedagogia:

rumos, certezas e incertezas. Terminei o mestrado em 2002 e continuei a atuar na formao

de professores, tanto na docncia como na coordenao de dois cursos de Pedagogia.

Primeiramente, atuei como coordenadora pedaggica do Curso de Pedagogia para o Incio de

Escolarizao PIE. Esse curso foi realizado em parceria com a Secretaria de Educao do

Distrito Federal e a Universidade de Braslia. O curso habilitou em nvel superior dois mil

professores em exerccio na Educao Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental da

rede pblica do Distrito Federal.

Em 2006, a mesma experincia foi implantada no Estado do Acre, em parceria

entre a Universidade pesquisada e a Secretaria de Educao do Estado, como curso de

Pedagogia a Distncia (PEDEAD), quando foram habilitados em nvel superior 1.391

professores da Educao Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Essas duas

experincias foram enriquecedoras e me auxiliaram a repensar minha trajetria profissional e,

ao mesmo tempo, aumentaram significativamente minhas preocupaes com as lacunas

epistemolgicas existentes no processo formativo de professores em relao avaliao.

Certamente, essa preocupao aumentou ante a necessidade de implantao de um processo

avaliativo diferente tanto no curso PIE, como no curso PEDEAD, visto serem cursos que

apresentavam caractersticas e aspectos inovadores, o que exigia um processo avaliativo que

8 Convnio de Cooperao Tcnica n 35/2000, firmado entre a Secretaria de Educao do Distrito Federal e a

Fundao Universidade de Braslia.

29

correspondesse a essas inovaes. Portanto, seria necessrio romper com a lgica avaliativa

classificatria e seletiva. A equipe pedaggica do curso no poderia permitir naquelas

circunstncias a adoo de processos tradicionais de avaliao, em que instrumentos de

carter autoritrio e descontextualizados do movimento de articulao entre a teoria e a

prtica da formao fossem a nica alternativa avaliativa. Como declara Villas Boas (2005),

[...] os professores desses cursos de formao, por serem professores em exerccio,

provocaram a necessidade da adoo de procedimento avaliativo que levasse em

conta essa caracterstica, de modo que eles no apenas estudassem sobre a

avaliao, como costumeiramente se faz, mas praticassem a avaliao que buscasse

superar a sua funo tradicional de dar nota e aprovar e reprovar o aluno, mantendo,

assim, a classificao, a seleo e a excluso (p. 292).

Por ser esta tambm a compreenso da equipe pedaggica do PIE, optamos pela

implantao do portflio como procedimento avaliativo das aprendizagens e pelos registros

reflexivos, no PEDEAD. No curso PIE9, a construo do portflio teve como objetivo permitir

a expresso das construes e das transformaes que o professor vive na realizao das aes

previstas e das atividades acordadas, com a vantagem de conter as reflexes e os registros

materiais que se organizam ao longo da prpria experincia formativa (MOTA; BATISTA,

2001). Nesse curso, a elaborao do portflio possibilitou o acompanhamento processual da

formao em sua totalidade, por meio da releitura da produo e do trabalho pedaggico

realizado no processo de formao, articulando-o com o cotidiano da sala de aula e da

formao.

No PEDEAD, embora a opo tivesse sido pelo registro reflexivo como

procedimento de avaliao, o processo em si no foi diferente do anteriormente vivido no

PIE. Inicialmente, essa nova forma de avaliar gerou muita insegurana nos estudantes em

formao; entretanto, medida que o curso foi avanando, sentiram-se mais familiarizados

com o processo avaliativo (VILLAS BOAS, 2006a). Esse procedimento avaliativo permitiu a

expresso das construes e das transformaes que o professor-estudante vivenciou na

9 Essa experincia se tornou objeto de pesquisa de Villas Boas (2005). A pesquisa teve como objetivo analisar o

uso do portflio como instrumento de avaliao no curso de formao de professores. Nessa investigao

discutiu-se sobre: a) as percepes dos mediadores sobre as reaes dos professores-alunos quanto ao uso do

portflio; e b) as percepes dos professores-alunos sobre a construo de seu portflio. Concluiu-se que, para

que o portflio faa parte da avaliao comprometida com a aprendizagem do professor-aluno e se apoie na

construo, reflexo, criatividade, parceria, autoavaliao e autonomia, deve inserir-se no trabalho pedaggico

que considere os mesmos princpios. A autora destaca ainda que a avaliao informal, a avaliao por colegas e a

autoavaliao no tm sido objeto de discusso e de vivncias no processo formativo do docente.

30

realizao das aes previstas e na construo do conhecimento. Caracterizou-se por

anotaes e reflexes dirias sobre o desenvolvimento das aprendizagens.

Em 2008, vivenciei outra experincia significativa, a participao no grupo de

pesquisa A produo acadmica sobre professores (as): estudo interinstitucional da

Regio Centro-Oeste10, que abordava e continua abordando os temas estudados, os

referenciais tericos, as metodologias e as concepes de educao e professor presentes em

um conjunto de dissertaes e teses selecionadas no mbito de seis Programas de Ps-

Graduao em Educao que participam da pesquisa. O estudo buscava enriquecer a

discusso sobre a formao, a prtica e a profissionalizao de professores a partir do trabalho

interinstitucional realizado, envolvendo pesquisadores das diferentes instituies que

participaram do projeto. Na fase de anlise dos resultados regionais, coube mesma equipe,

da qual eu fazia parte, sistematizar a anlise das concepes de professor predominantes no

conjunto dos trabalhos selecionados para o aprofundamento. A anlise dos resultados obtidos

culminou na publicao do livro Pesquisa sobre professores (as): mtodos, tipos de

pesquisa, temas, iderio pedaggico e referncias (SOUZA; MAGALHES et al., 2011).

De alguma forma, as experincias vividas reforaram ainda mais minha convico

de que no processo de formao a avaliao deveria ser tratada de forma abrangente e incluir

em seus temas/assuntos/contedos, tanto as questes ligadas estritamente ao processo ensino-

aprendizagem, como as da escola e do contexto social mais amplo. Assim, partimos do

pressuposto de que no h frmulas mgicas, receitas ou padres para o encaixe de uma

investigao. Nessa perspectiva, elegemos como objeto de estudo desta pesquisa a avaliao

para as aprendizagens11, institucional e em larga escala em cursos de formao de

professores: limites e possibilidades de interlocuo.

10 O estudo possuia um carter cooperativo que permitir agregar pesquisadores de vrias disciplinas e de

diversos contextos da regio, em um esforo de superar a fragmentao da produo dos trabalhos em educao

e de criar condies de pensar essa problemtica a partir da realidade regional e nacional e de suas articulaes

com a globalidade. No mbito da Faculdade de Educao, o estudo tem como objetivos: (i) identificar no

Programa de Ps-Graduao a produo acadmica sobre o professor, no perodo de 1999-2005; (ii) evidenciar

ao longo do perodo enfocado, sob uma perspectiva histrica, a presena maior ou menor dos diferentes temas

referenciais tericos, metodolgicos, conceptuais da educao, do professor, do processo de ensino-

aprendizagem nas dissertaes e teses sobre o professor, no referido Programa; (iii) contribuir para subsidiar

estudos e pesquisas sobre o tema, fornecendo dados para o trabalho dos orientadores desse Programa de Ps-

Graduao; (iv) detectar lacunas, apontando temas e referenciais tericos ausentes ou insuficientemente

explorados em uma dada realidade pesquisada. O grupo de pesquisa continua seus estudos, estando atualmente

na fase da anlise dos dados. O grupo tem produzido diversos artigos sobre o campo da formao de professores.

11 Nessa pesquisa, optamos pelo termo avaliao para as aprendizagens em contraponto avalio da aprendizagem. Essa escolha est referendada em Villas Boas (2014) ao explicar que a avaliao das

31

Reafirmamos que a ampliao do campo da avaliao impacta diretamente a

formao dos profissionais que atuam e viro atuar como docentes. Ento, como formar o

professor para lidar com essa nova realidade? Como os professores tm reagido ampliao e

presena constante da avaliao nos espaos polticos e pedaggicos? Como so tratados os

conhecimentos sobre a avaliao e seus nveis no processo formativo dos futuros docentes?

So muitas as perguntas e escassas as respostas. Tais problemticas tm

despertado preocupao e merecido investigaes por parte de alguns estudiosos como Sordi

(1998; 2009), Ldke e Salles (1997), Villas Boas (2000; 2008), Chaves (2001), Pereira

(2006), Mendes (2006), Calderano (2008), Gatti (2009), Barbosa (2011), entre outros. Esses

autores buscam, por meio da investigao, analisar a responsabilidade da formao na

ampliao da viso avaliativa dos futuros docentes. Com a inteno de contribuir com o

debate e visando colaborar com as ideias que podem concorrer para a qualidade da formao

dos docentes que iro atuar na Educao Bsica, apresentamos a questo norteadora desta

pesquisa: Como esto sendo formados os professores para desenvolverem os trs nveis de

avaliao para as aprendizagens, institucional e em larga escala?

Sem dvida, temos clareza quanto importncia da pesquisa na elaborao de

conhecimentos que venham contribuir para a ampliao conceitual do campo da avaliao e

da formao de professores. No obstante, percebemos a necessidade de realizar o

levantamento das pesquisas e artigos referentes produo terica sobre a avaliao e a

relao com a formao de professores, publicados nos ltimos dez anos, para constatarmos a

pertinncia desta investigao. Em virtude dao ineditismo uma das exigncias da pesquisa

de doutorado , precisvamos conhecer a essncia desses estudos para, a partir dela,

buscarmos acrescentar novos elementos discusso e analisar as tendncias, concepes e

dilemas que tm norteado o processo de avaliao em seus trs nveis, no processo formativo

do professor.

A reviso bibliogrfica foi organizada em trs momentos especficos: a)

catalogao das teses e das dissertaes; b) anlise dos artigos publicados na base de dados

Scientific Electronic Library On-line (Scielo) e na revista de Cincia da Educao

Educao & Sociedade; c) seleo de artigos apresentados e divulgados em dois congressos

aprendizagens carrega em si a ideia de movimento, de busca de aprendizagem pelos sujeitos educativos (professor e aluno) enquanto a avaliao da aprendizagem se ocupa do processo j ocorrido.

32

anuais da Educao: Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao

(ANPEDE) e Encontro Nacional de Didtica e Prtica de Ensino (ENDIPE).

No primeiro momento, realizamos uma consulta aos bancos de dados do Instituto

Brasileiro de Informao em Cincia e em Tecnologia (IBICT) e ao banco digital de teses e

dissertaes de cinco universidades: Universidade de So Paulo (USP), Universidade

Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),

Universidade Federal de Gois (UFG) e Universidade de Braslia (UnB), no perodo

compreendido entre os anos de 2002 e 2011. A escolha das universidades justifica-se pela

contribuio histrica dessas instituies na pesquisa em Educao e na investigao sobre a

avaliao e a formao de professores.

A realizao do levantamento bibliogrfico no foi um processo fcil. Pelo

contrrio, muitas dificuldades foram encontradas. Assim, com o intuito de auxiliar e at

mesmo facilitar a realizao de outros estudos dessa natureza, apontamos alguns entre os

obstculos identificados: (i) bibliotecas digitais de algumas universidades no organizadas por

temticas e ou por reas de pesquisa, o que prejudica o trabalho de reviso, pois ao consult-

las, obtm-se a relao dos estudos sobre o tema nos diversos cursos da universidade,

exigindo-se uma filtragem e anlise minuciosa dos objetivos gerais de cada um deles; (ii)

resumos muito sucintos, incompletos e at mesmo confusos, omitindo informaes relevantes.

Muitas vezes, os resumos no apresentam em sua organizao os objetivos previstos no

estudo nem a metodologia adotada; (iii) alguns trabalhos com descritores ou palavras-chave

que no correspondem ao assunto tratado; (iv) trabalhos catalogados no banco on-line de

forma incompleta, sem permitir o acesso ao resumo e ao download do texto; (v) muitos

artigos cientficos publicados em mais de uma revista. Isso exige ateno do pesquisador, pois

os trabalhos podem ser catalogados mais de uma vez. Essas dificuldades no chegaram a

impedir a realizao do trabalho, porm, tornaram-no mais moroso.

Em relao s teses e dissertaes, aps leitura minuciosa de seus resumos, tendo

como referncia nosso objeto de estudo, selecionamos os que abordavam a avaliao no

processo de formao de professores. Para esse exerccio, tomamos como base os nveis de

avaliao postulados por Freitas (2009): [...] avaliao em larga escala em redes de ensino

(realizada no pas, estado ou municpio); avaliao institucional da escola (feita em cada

escola pelo seu coletivo); avaliao das aprendizagens em sala de aula, sob a responsabilidade

do professor (FREITAS, 2009, p. 109).

No quadro 1, demonstramos o nmero de pesquisas selecionadas, de acordo com

as instituies envolvidas no levantamento:

33

Quadro 1 - Sntese da catalogao das Teses e Dissertaes

Fonte: Banco de Dados do Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e em Tecnologia (IBICT) e Banco

Digital de Tese e Dissertaes de cinco universidades: Universidade de So Paulo (USP); Universidade Estadual

de Campinas (UNICAMP); Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Universidade Federal de Gois

(UFG); Universidade de Braslia (UnB), Biblioteca de Teses e Dissertaes.

Dando prosseguimento reviso, partimos para a seleo dos artigos publicados

na base de dados Scientific Electronic Library On-line (SCIELO), por consider-lo um

importante instrumento de incentivo e de divulgao da produo acadmica. Posteriormente,

realizamos a seleo de artigos apresentados e divulgados em dois congressos anuais da

educao: Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao (ANPED) e

Encontro Nacional de Didtica e Prtica de Ensino (ENDIPE). Nesse exerccio foram

selecionados ao todo 56 artigos. Observamos que apenas quinze relacionavam a avaliao

com a formao, de maneira direta.

Mesmo assim, no podemos desconsiderar que, significativamente, a literatura

educacional recente e a realizao sistemtica de muitos estudos, movimentos e eventos tm

contribudo para a ampliao do debate sobre a avaliao e a complexidade desse campo. O

aumento de produo na rea se justifica por diferentes motivos: centralidade da avaliao nas

polticas pblicas, evidente ampliao das funes atribudas avaliao no contexto atual,

uso da avaliao como mecanismo de promoo e manuteno da excluso social, e muitos

outros.

Categorias

USP Unicamp UFMG UFG UnB TOTAIS

Dis

sert

a

es

Tes

es

Dis

sert

a

es

Tes

es

Dis

sert

a

es

Tes

es

Dis

sert

a

es

Tes

es

Dis

sert

a

es

Tes

es

To

tal

de

dis

sert

aes

To

tal

de

Tes

es

Avaliao das aprendizagens e

formao do professor 03 02 07 09 06 03 04 - 03 02 23 16

Avaliao institucional e

formao do professor 01 01 03 05 03 02 01 - 03 02 11 10

Avaliao em larga escala e

formao de professores 01 02 01 03 02 - 01 - 01 01 06 06

TOTAL PARCIAL 05 05 11 17 11 05 06 - 07 05 40 32

TOTAL GERAL DE TRABALHOS 72

34

Como resultado da reviso, apresentamos no quadro 2 a sntese dos trabalhos

analisados.

Quadro 2 - Sntese dos artigos analisados

Fonte: Base de Dados Scientific Electronic Library On-line (Scielo).

Dessa forma, aps o levantamento bibliogrfico, percebemos que das 72 pesquisas

analisadas, apenas dez abordavam a avaliao educacional articulada com a formao de

professores. Fato a ser ressaltado que a literatura educacional recente e a realizao

sistemtica de muitos estudos, movimentos e eventos tm contribudo significativamente para

a ampliao do debate sobre a avaliao e a complexidade desse campo. Entre os inmeros

trabalhos analisados, destacamos o de Bittencourt (2001), que investigou a avaliao

formativa no Ensino Superior, evidenciando que nessa rea a avaliao ainda se sustenta no

campo terico.

Na mesma perspectiva, Lus e Santiago (2001) realizaram uma pesquisa sobre as

repercusses dos processos formativos na prtica profissional dos futuros docentes, na

disciplina Avaliao das Aprendizagens, no curso de Pedagogia. Elegeram como sujeitos da

pesquisa trs estudantes de Pedagogia que cursavam a disciplina e que, ao mesmo tempo,

atuavam como docentes nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Para o levantamento dos

dados, realizaram a anlise do plano de ensino e observaram as aulas da disciplina, como

tambm as das turmas de Ensino Fundamental, nas quais as alunas eram docentes. Aps a

anlise dos dados colhidos, as autoras concluram que os saberes avaliativos vivenciados nos

processos formativos so referncias importantes na construo do saber-fazer docente. No

entanto, as transformaes nas prticas avaliativas no ocorrem de forma absoluta, mas em

pequenas mudanas que vo, aos poucos, sendo introduzidas no cotidiano pedaggico. Por

fim, ressaltaram a importncia de que os cursos de formao oportunizem aos futuros

professores reflexes sobre a avaliao, de modo a promover a ressignificao de seu campo

conceitual e de suas prticas.

CATEGORIAS ANPED ENDIPE SCIELO TOTAL

A avaliao em larga escala na formao de

professores 8 3 4 15

A avaliao institucional na formao do professor 9 2 3 14

A avaliao das aprendizagens na formao do

professor 12 8 7 27

TOTAL 29 13 14 56

35

A partir da anlise das teses e dissertaes produzidas em educao no Brasil, no

perodo compreendido entre 1990 e 1998, temos o trabalho de Romanoswki (2002). Nessa

pesquisa, a autora analisou 107 estudos, dos quais somente trs tinham a avaliao como

objeto de investigao. Posteriormente, em 2008, ela realizou outra pesquisa com foco na

avaliao das aprendizagens, desta vez em um curso de Pedagogia, na modalidade a distncia,

com o objetivo de examinar e analisar as alternativas prticas de avaliao utilizadas e

produzidas pelos estudantes em formao. Para o levantamento de dados, a autora considerou

os registros de professores avaliadores com base nos trabalhos produzidos pelos estudantes,

bem como nas observaes da prtica pedaggica virtual desses docentes. O estudo foi

desenvolvido no decorrer de uma unidade em ambientes de aprendizagem virtual, e a autora

concluiu que as prticas avaliativas vivenciadas pelos estudantes em formao tm forte

impacto na prtica pedaggica do futuro professor.

Outro estudo a ser comentado a tese de doutorado de Chaves (2003), que

abordou as concepes e prticas de avaliao das aprendizagens dos professores de Ensino

Superior e a repercusso dessas prticas em sala de aula. Nesse trabalho, foram analisadas as

prticas avaliativas de cursos de Direito, Histria, Letras, Engenharia Eltrica, Matemtica,

Engenharia Civil, Odontologia, Veterinria e Enfermagem. A investigao buscou identificar

os princpios que norteiam a prtica pedaggica e o processo avaliativo de um professor

universitrio. Verificou-se que a reflexo terica sobre as questes pedaggicas e sobre os

nveis de avaliao no tem sido foco das discusses na Universidade e, muito menos, na

formao do professor. Em sntese, a autora concluiu que a formao no tem a preocupao

de preparar os estudantes para resolver os problemas que a avaliao envolve nem os que ela

promove. E mais: no ensino universitrio, as mazelas avaliativas se fazem presentes e se

revestem de rituais e atitudes discriminatrias, uma vez que os professores dos cursos

pesquisados, em funo da ausncia de uma formao pedaggica, estavam pouco preparados

para lidar com as questes didtico-metodolgicas da avaliao.

O estudo sobre a avaliao dos estudantes no curso de formao tambm a

questo central da dissertao de Souza (2006). Ao analisar como os discentes de um curso de

Pedagogia compreendem e vivenciam a avaliao das aprendizagens, a autora tinha como

objetivo identificar os possveis focos de tenso nessas vivncias. Na pesquisa, constatou que

os sujeitos em formao se restringiram a entender a avaliao apenas no nvel das

aprendizagens e, por isso, no explicitam uma perspectiva mais sociolgica da avaliao. Os

estudantes apontam as contradies presentes entre a teoria e a prtica avaliativa vivenciada e

a superficialidade da discusso sobre a articulao entre avaliao, objetivos da instituio

36

formadora e o ensino em sua totalidade. O estudo evidenciou a necessidade da compreenso

da auto-organizao, da reflexo sobre a organizao do trabalho pedaggico da instituio e

do entendimento da relao avaliao/formao, como princpio importante para a formao

da conscincia crtica dos estudantes.

Outra pesquisa que traz importantes elementos para a reflexo sobre as prticas de

avaliao na formao de professores a tese de Mendes (2006). Esse estudo objetivou

identificar, nos cursos de Licenciatura, as aprendizagens sobre avaliao propiciadas aos

estudantes. Buscou-se ainda conhecer e discutir as condies favorveis para que os

estudantes das Licenciaturas se tornassem professores capazes de realizar a avaliao escolar.

Aps a anlise dos dados, a autora evidenciou que as aprendizagens dos estudantes esto

circunscritas perspectiva tcnica de avaliao, centrada em instrumentos como provas,

trabalhos e seminrios. Essa constatao revelou uma concepo de avaliao como mera

verificao da aprendizagem. Destacou tambm que a dimenso sociolgica no

contemplada nos cursos e que os futuros professores deixam de discutir as mltiplas funes

que pode assumir a avaliao como mecanismo de controle e de excluso. Os dados tambm

revelaram que a perspectiva crtica de avaliao aparece raramente nos planos de curso, nas

disciplinas e nas prticas vivenciadas nos cursos de formao do docente.

Menezes (2009), em sua diss