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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL MOVIMENTOS E ACTIVIDADES DOS GOLFINHOS-ROAZES (TURSIOPS TRUNCATUS) NA ZONA TERMINAL DO ESTUÁRIO DO SADO E POSSÍVEIS INFLUÊNCIAS ECOLÓGICAS Maria Cecília Vilhena Ferreira MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA 2010

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS …repositorio.ul.pt/bitstream/10451/2329/1/ulfc090522_tm_M_Cecilia... · movimento e nas actividades destes animais na zona terminal

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL

MOVIMENTOS E ACTIVIDADES DOS GOLFINHOS-ROAZES

(TURSIOPS TRUNCATUS) NA ZONA TERMINAL DO ESTUÁRIO DO SADO

E POSSÍVEIS INFLUÊNCIAS ECOLÓGICAS

Maria Cecília Vilhena Ferreira

MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA

2010

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL

MOVIMENTOS E ACTIVIDADES DOS GOLFINHOS-ROAZES

(TURSIOPS TRUNCATUS) NA ZONA TERMINAL DO ESTUÁRIO DO SADO

E POSSÍVEIS INFLUÊNCIAS ECOLÓGICAS

Maria Cecília Vilhena Ferreira

Dissertação orientada por:

Prof. Doutor Francisco Andrade – DBA / FCUL

Prof. Doutor Manuel Eduardo dos Santos – ISPA - Instituto Universitário

MESTRADO EM ECOLOGIA MARINHA

2010

ÍNDICE

Índice

Agradecimentos ............................................................................................................... i 

Resumo .......................................................................................................................... iii 

Abstract ...........................................................................................................................iv 

1. Introdução ................................................................................................................... 1 

1.1. Caracterização geral da espécie .......................................................................... 1 

1.1.1. A comunidade residente de golfinhos-roazes do estuário do Sado .............. 3 

1.2. Padrões de movimento e utilização do habitat .................................................... 4 

1.2.1. Ciclo de marés ............................................................................................... 5 

1.2.2. Hora do dia e estações do ano ...................................................................... 6 

1.2.3. Estudos sobre movimentos e utilização do habitat na comunidade de

golfinhos-roazes do estuário do Sado ..................................................................... 8 

1.3. Objectivos ............................................................................................................ 9 

2. Materiais e métodos ................................................................................................. 10 

2.1. Área de estudo ................................................................................................... 10 

2.1.1. Marés ........................................................................................................... 11 

2.1.2. Caracterização hidrológica do estuário do Sado ......................................... 12 

2.2. Metodologia de recolha de dados ...................................................................... 12 

2.3. Análise de dados ................................................................................................ 18 

2.3.1. Utilização do habitat .................................................................................... 18 

2.3.2. Número de golfinhos em relação à actividade dominante aparente ........... 19 

2.3.3. Influência do estado da maré e hora do dia no número de golfinhos .......... 19 

2.3.4. Influência da fase da maré e da hora do dia no tipo de movimento e na

actividade dominante aparente ............................................................................. 19 

2.3.5. Influência de variáveis ambientais no movimento e na actividade dos

golfinhos ................................................................................................................ 20 

3. Resultados ................................................................................................................ 21 

3.1. Esforço de amostragem ..................................................................................... 21 

3.2. Distribuição de actividades ................................................................................ 23 

ÍNDICE

3.2.1. Número de golfinhos em relação à actividade dominante aparente ........... 23 

3.3. Utilização do habitat ........................................................................................... 24 

3.4. Ciclo de marés ................................................................................................... 26 

3.4.1. Número de golfinhos em relação ao estado da maré .................................. 26 

3.4.2. Tipo de movimento em relação à fase da maré .......................................... 27 

3.4.3. Actividade dominante aparente em relação à fase da maré ....................... 28 

3.5. Hora do dia ......................................................................................................... 29 

3.5.1. Número de golfinhos em relação à hora do dia ........................................... 29 

3.5.2. Tipo de movimento em relação à hora do dia ............................................. 30 

3.5.3. Actividade dominante aparente em relação à hora do dia .......................... 31 

3.6. Tipo de movimento em relação à fase da maré por hora do dia ........................ 32 

3.7. Influência de variáveis ambientais no movimento e actividade dos golfinhos ... 33 

4. Discussão ................................................................................................................. 36 

4.1. Utilização do habitat ........................................................................................... 36 

4.2. Actividade dominante aparente .......................................................................... 37 

4.3. Movimento .......................................................................................................... 39 

4.4. Limitações deste estudo .................................................................................... 41 

4.5. Sugestões para estudos futuros ........................................................................ 41 

5. Bibliografia ................................................................................................................ 43 

ANEXO ......................................................................................................................... 53 

AGRADECIMENTOS

Agradecimentos

Durante a realização deste trabalho, foram várias as pessoas que, de uma forma ou

de outra, deram o seu contributo e às quais apresento o meu agradecimento:

Ao Prof. Doutor Francisco Andrade, por ter aceite a orientação deste trabalho e pelo

interesse e disponibilidade demonstrados durante todo este percurso.

Ao Prof. Doutor Manuel Eduardo dos Santos, pela oportunidade que me deu de

trabalhar com estes golfinhos, há três anos e com um objectivo de estudo totalmente

diferente deste, mas que me permitiu chegar até aqui.

Ao Prof. Doutor Henrique Cabral, pela ajuda que me deu no tratamento estatístico dos

dados e pela disponibilidade que sempre demonstrou em ajudar-me.

Ao Prof. Doutor João Maroco, pela ajuda nas análises multivariadas realizadas.

À Tânia Ferreira, por todas as dicas de ArcMap e pela ajuda na construção dos

mapas.

A todas as pessoas que contribuíram com o envio de bibliografia, palavras de apoio e

incentivo e toda a ajuda prestada durante este percurso, e ao Jorge Forte Faria pela

imensa ajuda que me deu com o ROV (quando o tema de mestrado era outro…).

À Erica, pela amizade e incentivo e por todo o apoio nos últimos tempos.

À Patrícia, pela amizade e boa disposição nas nossas muitas horas no cubículo, e

pelas sugestões à versão (quase) final da tese; à Joana, pela amizade e ajuda,

mesmo à distância; e à Rita e ao Miguel, pelo apoio e amizade sempre demonstrados.

Obrigada a todos pelas longas horas no Sado a “fazer ciência”.

À Mariana, o meu obrigada do fundo do coração, pelas correcções e sugestões a um

manuscrito desta tese, pela amizade e pelo apoio, e pelas palavras certas nos

momentos certos.

A todos os meus amigos, por saberem sempre quando precisava de esquecer a tese

sem ser necessário dizer: obrigada por me desencaminharem.

Aos meus Pais, que são a minha fonte de inspiração, por terem possibilitado, em todos

os aspectos, a realização desta tese. Obrigada por me apoiarem de forma incansável,

por me incentivarem sempre a fazer aquilo que mais gosto e nunca me deixarem

desistir. Quaisquer palavras não serão suficientes para vos agradecer por tudo o que

Cecília V. Ferreira i

AGRADECIMENTOS

Cecília V. Ferreira ii

sempre fizeram por mim. Vocês são o espelho de quem eu quero ser, e este trabalho

é dedicado a vocês.

À minha Irmã, por todo o apoio e palavras de incentivo, sempre e desde sempre,

obrigada por acreditares sempre em mim; e ao Cali, pelos abraços e pela boa

disposição que tanto me anima.

À minha família, que me incentiva e me apoia incondicionalmente. Aos meus tios e

primos e à minha avó Lígia, obrigada pela preocupação, interesse e incentivo

constantes. Obrigada à minha avó Albertina, que nunca compreendeu muito bem este

meu fascínio pelos “peixes” mas nunca deixou de me apoiar na minha escolha.

E ao Nuno, por ter dado um sentido novo e especial a este ano. Obrigada pelo

carinho, apoio, amizade, paciência, compreensão e amor. Obrigada por todos os

momentos.

RESUMO

Resumo

A comunidade de golfinhos-roazes do estuário do Sado é uma das poucas

comunidades residentes de golfinhos na Europa, sendo a única em Portugal

Continental. Pretende-se neste trabalho estudar as possíveis influências ecológicas no

movimento e nas actividades destes animais na zona terminal do estuário.

A recolha de dados foi efectuada a partir de um ponto de observação em terra

ao longo de 18 dias entre Agosto e Novembro de 2009. Em 206.5 horas de

observação, os golfinhos-roazes foram avistados na área de estudo durante 34.7

horas, correspondentes a 71 scans positivos (scans com golfinhos presentes)

utilizados para tratamento estatístico. A análise dos dados foi realizada recorrendo a

testes de Kruskal-Wallis, estatística ACTUS2, regressão logística e análise

discriminante.

As actividades mais frequentemente observadas foram a deslocação (75%) e a

alimentação (19%). A regressão logística revelou que a altura da maré é a variável que

mais influencia o movimento dos golfinhos-roazes. Pelo menos nesta época do ano, os

golfinhos-roazes entram no estuário mais frequentemente no período enchente da

maré, abandonando a área de estudo ao final da tarde durante o período vazante. O

número mediano de golfinhos na zona terminal do estuário variou significativamente

com o ciclo de marés, atingindo o máximo 3 horas após a baixa-mar.

Estes resultados parecem sugerir que os golfinhos utilizam as correntes de

maré para se deslocarem entre as águas costeiras e o interior do estuário, poupando

assim energia com o movimento. Por outro lado, poderão aproveitar-se da

previsibilidade das marés e dos movimentos passivos das suas presas, que facilitarão

a sua captura. O canal Sul foi o mais frequentado pelos golfinhos, onde foram

observados episódios de alimentação, tendo evitado o canal Norte. Este estudo

denota assim a importância do estuário para estes animais, sendo essencial que se

implementem novas medidas de protecção deste habitat.

Palavras-chave: Golfinho-roaz; Tursiops truncatus; Sado; movimentos; actividades;

regressão logística.

Cecília V. Ferreira iii

ABSTRACT

Abstract

The bottlenose dolphin community of the Sado estuary is one of the few

resident communities of dolphins in Europe and the only one in mainland Portugal. The

aim of this work is to study the possible ecological influences on bottlenose dolphins’

movement and activities near the mouth of the estuary.

Observations were carried out from an observation point on land over 18 days

between August and November of 2009. During 206.5 hours of observation effort,

dolphins were present in the study area for 34.7 hours, and a total of 71 positive scans

were used for statistical analysis. Data analysis was done using Kruskal-Wallis tests,

ACTUS2, logistic regression and discriminant analysis.

Travelling (75%) and feeding (19%) were the most frequently observed

activities. Logistic regression results showed that tidal height was the variable that

influenced dolphins’ movements the most. At least in this time of year, bottlenose

dolphins enter the estuary more frequently during the flood tide, leaving the study area

in the afternoon during the ebb tide. The median number of dolphins varied significantly

with the tidal cycle, with more dolphins being sighted 3 hours after low water.

These results seem to suggest that bottlenose dolphins use the tidal currents to

move between the coastal waters and the estuary, thus saving energy with movement.

On the other hand, they may take advantage of the predictability of their prey’s

movements, which facilitates capture. The South channel was the most frequently used

by these dolphins, where several feeding episodes were observed; an avoidance of the

North channel was also observed. This study denotes the importance of the estuary to

these animals, and the implementation of new protection measures is essential.

Keywords: Bottlenose dolphin; Tursiops truncatus; Sado; movements; activities;

logistic regression.

Cecília V. Ferreira iv

INTRODUÇÃO

1. Introdução

1.1. Caracterização geral da espécie

O golfinho-roaz, Tursiops truncatus (Montagu, 1821), é uma espécie

pertencente à família Delphinidae e uma das espécies de cetáceos mais bem

estudada. Tem uma distribuição geográfica cosmopolita, podendo ocorrer em águas

temperadas e tropicais (Klinowska, 1991; Jefferson et al., 2008; Wells & Scott, 2009).

Os limites de distribuição desta espécie parecem estar relacionados com a

temperatura, de forma directa ou indirectamente devido à distribuição de presas (Wells

& Scott, 1999).

Conhecem-se para esta espécie dois ecótipos distintos: um costeiro e um

pelágico (Klinowska, 1991; Wells & Scott, 2009). As populações costeiras ocorrem em

habitats como baías, lagoas, estuários e rios (Klinowska, 1991; Hammond et al.,

2008), e as pelágicas em águas offshore, perto de ilhas oceânicas e ao longo da

plataforma continental (Wells & Scott, 2009); muitas das populações costeiras ocupam

de forma residente estuários ou faixas restritas da zona costeira devido à elevada

riqueza alimentar que aí se encontra disponível (Klinowska, 1991).

Apresenta um corpo robusto de tamanho médio com uma coloração dorsal e

lateral que pode variar entre cinzento e preto, sendo quase branca (por vezes rosada)

na zona ventral (Jefferson et al., 2008; Wells & Scott, 2009). O indivíduo adulto mede

entre 1.9 e 3.8 m, existindo no entanto uma grande variação entre populações. O peso

máximo ronda 650 kg (Jefferson et al., 2008). Apesar de os machos poderem ser

ligeiramente maiores do que as fêmeas, não existe um dimorfismo sexual evidente

(Connor et al., 2000; Jefferson et al., 2008).

Os golfinhos-roazes são predadores generalistas (dos Santos, 1998; Wells &

Scott, 2009). Alimentam-se de várias espécies de cefalópodes e peixes (Connor et al.,

2000) apesar de aparentarem ter uma preferência por presas pertencentes às famílias

Mugilidae, Scombridae e Sciaenidae (Wells & Scott, 2009). Também os peixes

produtores de sons parecem ser escolhidos pelos golfinhos, pensando-se que os sons

emitidos pelas presas podem auxiliá-los na sua localização (dos Santos, 1998).

Apresentam estratégias de caça bastante diversificadas: caçam individualmente ou em

grupo, e apresentam um vasto repertório de comportamentos durante a alimentação

que estará adaptado às estratégias que as próprias presas desenvolvem para

evitarem ser detectadas e capturadas (Connor et al., 2000).

Cecília V. Ferreira 1

INTRODUÇÃO

Relativamente à estrutura social, o golfinho-roaz apresenta um padrão de

associação fluido e dinâmico do tipo fissão-fusão (Connor et al., 2000; Jefferson et al.,

2008), em que os indivíduos se associam em pequenos grupos cuja composição e

comportamento mudam frequentemente, por vezes numa base temporal muito curta; a

composição dos grupos pode variar de acordo com factores como o sexo, grau de

parentesco e estado reprodutivo, entre outros (Connor et al., 2000).

A longevidade varia entre os sexos, atingindo os machos mais de 40 anos e as

fêmeas mais de 50 anos. A maturação sexual nas fêmeas surge entre os 5 e os 10

anos de idade, ocorrendo mais tardiamente nos machos, entre os 8 e os 12 anos

(Connor et al., 2000). Tipicamente existe um pico de nascimentos entre a Primavera e

o início do Verão, podendo ocorrer um segundo pico no Outono dependendo da

localização geográfica (Jefferson et al., 2008; Scott et al., 1990). Apresentam um

período de gestação de cerca de 12 meses, e a amamentação dura até a cria atingir

cerca de 1 ano (Wells & Scott, 2009), podendo prolongar-se por vários anos (Mann et

al., 2000; Wells & Scott, 2009); no entanto, já foi encontrado alimento sólido em

conteúdos estomacais de crias com 4 meses de idade (Wells & Scott, 2009). O maior

crescimento ocorre durante os dois primeiros anos de vida (Wells & Scott, 2009). As

crias permanecem com as mães num período que pode ir dos 3 aos 6 anos após o

nascimento (Wells & Scott, 2009), e podem continuar a ser acompanhadas durante a

gravidez seguinte (Mann et al., 2000; Wells & Scott, 2009).

Os golfinhos-roazes produzem sons que se podem agrupar em três categorias:

assobios (sons tonais de banda estreita que se pensa terem funções comunicativas),

estalidos (com banda larga e de curta duração utilizados na ecolocalização) e sons

pulsados (sons mais complexos e variáveis associados à expressão de emoções e à

comunicação). A ecolocalização é, no entanto, um dos mais especializados processos

sensoriais nos odontocetos, em que o animal, ao emitir um estalido, obtém informação

sobre o meio que o rodeia através da interpretação mental do eco que recebe (dos

Santos, 1998).

A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) atribui a esta

espécie a categoria Least Concern no Livro Vermelho de Espécies Ameaçadas,

estimando-se um total de 600.000 animais em todo o mundo (Hammond et al., 2008).

Esta espécie está também incluída no Apêndice II da Convenção CITES (Convenção

sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagem

Ameaçadas de Extinção) e no Anexo II da Directiva Habitats (Rede Natura 2000).

Cecília V. Ferreira 2

INTRODUÇÃO

1.1.1. A comunidade residente de golfinhos-roazes do estuário do Sado

A comunidade de golfinhos-roazes do estuário do Sado é uma das poucas

comunidades residentes de golfinhos na Europa, sendo a única em Portugal

Continental. O tamanho desta comunidade tem vindo a decrescer ao longo das últimas

décadas: em 1987 estimavam-se pelo menos 40 indivíduos neste grupo (dos Santos &

Lacerda, 1987), número que decresceu até aos actuais 24 indivíduos, o mais baixo

registado até à data. Destes 24 animais, a maioria já é adulta, contando a comunidade

com apenas 2 crias e 3 subadultos (Augusto et al., in press). Esta comunidade habita

uma zona fortemente impactada devido à proximidade a um grande centro urbano,

identificando-se como principais ameaças à sua sobrevivência a degradação da

qualidade da água, a pesca, a poluição acústica e o tráfego marítimo (Silva, 2008).

A primeira referência bibliográfica a esta comunidade data de 1863 e é da

autoria do naturalista Bocage (dos Santos & Lacerda, 1987). No entanto, os primeiros

estudos realizados sobre esta comunidade só foram iniciados em 1980 com os

trabalhos de Teixeira & Duguy (1981), Hussenot (1982), dos Santos (1985) e dos

Santos & Lacerda (1987).

Mais recentemente, têm sido realizados estudos sobre comportamento

(Harzen, 1995; Carvalho, 2000; Gaspar, 2003; Augusto, 2007; dos Santos et al.,

2007), acústica (dos Santos, 1998; Couchinho, 1999; Brito, 2001; dos Santos et al.,

2005), utilização do habitat (Freitas, 1995; Harzen, 1998; Nunes, 2001; Cândido, 2003)

e avaliação de impactos antropogénicos (Cascão, 2001; Luís, 2008; Silva, 2008).

O estuário do Sado apresenta-se como um habitat de extrema importância para

estes golfinhos, que dele dependem do ponto de vista alimentar devido à sua elevada

riqueza biológica. Estão descritas 3 zonas preferenciais de alimentação: a extremidade

da península de Tróia, a zona junto à Caldeira de Tróia e o Canal da Comporta

(Freitas, 1995; Cândido, 2003). São suas presas confirmadas a enguia (Anguilla

anguilla [Linnaeus, 1758]), as tainhas (Mugil cephalus Linnaeus, 1758; Liza sp. e

Chelon labrosus [Risso, 1827]), o polvo-comum (Octopus vulgaris Cuvier, 1797) e o

choco (Sepia officinalis Linnaeus, 1758) (dos Santos et al., 2007).

Devido a esta dependência do estuário, os golfinhos apresentam um elevado

número e variedade de lesões cutâneas, desconhecendo-se a sua origem; pensa-se,

no entanto, que estas lesões possam estar relacionadas com a degradação do habitat

(Harzen & Brunnick, 1997).

Cecília V. Ferreira 3

INTRODUÇÃO

As ameaças à sobrevivência desta comunidade levaram a que, em 2009, se

procedesse à escrita e implementação de um Plano de Acção para a salvaguarda e

monitorização da população de Roazes do estuário do Sado (Sequeira et al., 2009).

Este Plano inclui um conjunto de acções e medidas que tentarão facilitar a recolha de

informação actualizada sobre esta comunidade e a interacção entre as várias

entidades que actuam no estuário, para que possam ser tomadas decisões que

melhorem a qualidade do estuário do Sado e, a longo prazo, protejam esta

comunidade ameaçada de golfinhos.

1.2. Padrões de movimento e utilização do habitat

O movimento dos animais é um processo ecológico que determina a estrutura

espacial e demográfica das populações (Wiens, 2000), tendo evoluído como uma

resposta às características bióticas e abióticas do ambiente em que vivem (Stevick

et al., 2002). As causas que condicionam o movimento dos mamíferos marinhos estão

relacionadas com a necessidade de realização de determinadas actividades em

determinado local e numa escala temporal específica, bem como a maximização da

utilização de recursos de um determinado habitat; por outro lado, relacionam-se

também com a necessidade de se deslocarem para longe de locais que possam impor

riscos à sua sobrevivência, como a existência de predadores, doenças ou locais com

condições físicas prejudiciais (Stevick et al., 2002).

Compreender o padrão de movimento dos animais no tempo e no espaço é

fundamental para o estudo da sua ecologia, permitindo o estabelecimento e

implementação de estratégias eficazes de conservação e gestão de recursos (Pittman

& McAlpine, 2003).

Na revisão da literatura feita por Klinowska (1986) relativamente a ritmos

diurnos de várias espécies da Ordem Cetacea, a autora menciona que estes animais,

que se caracterizam por tantas adaptações à vida no meio aquático, parecem

depender totalmente do ambiente que os rodeia na organização das suas rotinas

diárias, avançando com a explicação de que não ter uma rotina diária definida, como é

característico de outros grupos de animais, poderá ter sido a forma mais vantajosa de

sobreviver num ambiente aquático. No entanto, a autora encontrou referência a várias

“rotinas” diárias em espécies desta Ordem, diferentes consoante o local e a espécie

estudados.

Cecília V. Ferreira 4

INTRODUÇÃO

Desde então vários estudos têm sido realizados em populações de diversas

espécies de cetáceos que habitam ambientes costeiros, uma vez que existe uma

maior facilidade de encontrar e estudar animais que utilizam normalmente habitats

mais “confinados” e de mais fácil acesso, como é o caso de estuários e baías. Apesar

da maioria destes trabalhos ter como objecto de estudo o golfinho-roaz, existem

trabalhos sobre outras espécies de cetáceos.

Os padrões diurnos de movimento e uso do habitat parecem estar relacionados

com um número diverso de factores, dependentes da ecologia do habitat, que fazem

variar os padrões comportamentais dos golfinhos. Estes factores incluem o ciclo de

marés (e.g. Shane, 1990a; Irvine et al., 1981) bem como a hora do dia (e.g. Gregory &

Rowden, 2001) e a fisiografia do habitat (e.g. Ingram & Rogan, 2002).

1.2.1. Ciclo de marés

O movimento dos golfinhos tem uma associação variável com as correntes de

maré, dependendo da localização geográfica do habitat em que são estudados: podem

afectar directamente o comportamento, ao ajudar ou impedir a deslocação dos

animais, e indirectamente influenciando os movimentos das suas presas (Shane,

1990a). Os estudos já realizados sobre este assunto mostram efectivamente algum

tipo de associação, embora as razões sejam, em muitos casos, meramente

especulativas.

Em Sanibel Island, Florida, os golfinhos-roazes movimentam-se

significativamente mais contra do que a favor da maré (Shane, 1990a), tendo sido

observado um comportamento semelhante em Port Aransas, Texas (Shane, 1990b),

Ensenada De La Paz, México (Acevedo, 1991) e no estuário de Shannon, Irlanda

(Berrow et al., 1996). Em Sarasota, Florida (Irvine et al., 1981), os golfinhos foram

observados a movimentar-se maioritariamente a favor da maré, comportamento que

também foi observado em Cardigan Bay, West Wales (Gregory & Rowden, 2001) e em

New South Wales, Austrália (Fury, 2008).

Mendes et al. (2002) realizaram um estudo para perceber qual o efeito de uma

frente de maré existente em Moray Firth, Escócia, na abundância de golfinhos-roazes.

Realizaram para tal observações a partir de terra, em 1994 para investigar a relação

entre o ciclo de marés e a abundância de golfinhos e em 2000 para caracterizar

espacial e temporalmente a frente de maré. Os autores avistaram mais golfinhos

Cecília V. Ferreira 5

INTRODUÇÃO

durante o período enchente da maré, tendo sugerido que os animais se associam à

zona superficial da frente de maré e que esta pode influenciar o comportamento das

suas presas, que se poderão acumular perto dessa frente.

Outras espécies de cetáceos que apresentam uma associação com as

correntes de maré incluem o boto, Phocoena phocoena (Bay of Fundy, Canadá:

Johnston et al., 2005; North Devon, Reino Unido: Goodwin, 2008; e Wales, Reino

Unido: Pierpoint, 2008), o boto-cinza, Sotalia guianensis (Baía de Sepetiba, Brasil:

Flach et al., 2008; e Baía de Babitonga, Brasil: Cremer et al., 2009) e o golfinho-

comum, Delphinus delphis (Bay of Plenty, Nova Zelândia: Neumann, 2001).

Alguns destes estudos abordam as razões para esta associação com as

marés. Os autores associam o movimento dos animais essencialmente à alimentação

e à busca de presas. No caso em que os animais se movimentam contra a maré, foi

sugerido que este movimento contra-corrente se trata de uma estratégia de caça, na

medida em que, uma vez que as suas presas se movimentam essencialmente com a

maré, os golfinhos movimentam-se na direcção das suas presas (Shane, 1980;

Acevedo, 1991), apesar dos maiores custos energéticos que advêm de um movimento

contra uma forte corrente (Shane, 1980). Por outro lado, o movimento a favor da maré,

ou quando as correntes são mais fracas, permite a redução dos custos energéticos

associados à deslocação (Gregory & Rowden, 2001).

1.2.2. Hora do dia e estações do ano

Várias espécies de cetáceos apresentam padrões de movimento e

comportamento que se podem relacionar com a hora do dia (Klinowska, 1986). A hora

do dia, tal como as estações do ano, podem condicionar o movimento dos golfinhos ao

influenciarem directamente o movimento das suas presas.

Hansen (1990) registou, em dois locais na Califórnia, que o tamanho médio de

grupo de golfinhos-roazes atingiu o seu máximo durante o período da manhã. Em

Galveston Bay, Texas, durante os meses de Verão, Bräger (1993) evidenciou a

existência de um padrão diurno no comportamento dos golfinhos: a frequência de

alimentação apresentou-se com um pico principal durante a manhã e um pico

secundário mais baixo ao final da tarde; a frequência de socialização aumentou

quando a alimentação diminuiu, tendo apresentado um pico durante a tarde; os

animais foram observados em deslocação principalmente ao final da tarde,

Cecília V. Ferreira 6

INTRODUÇÃO

correspondente ao regresso à baía. Durante os meses de Outono em que estes

animais foram estudados, este padrão alterou-se, havendo uma diminuição da

frequência de socialização e deslocação, com a alimentação a ocorrer ao longo de

todo o dia. O autor refere semelhanças nestes padrões com aqueles observados

noutros locais no Texas, apesar dos diferentes métodos de recolha de dados. Em

contraste, um estudo realizado por Shane (1990a) em Sanibel Island, Florida, mostra

que os comportamentos relacionados com a alimentação foram mais comuns durante

a manhã, tendo a socialização apresentado um pico ao final do dia e a deslocação

durante a tarde. A autora detectou também o aumento da alimentação e a diminuição

da deslocação na transição do Verão para o Outono.

Algumas espécies apresentam um padrão circadiano bastante rígido e

previsível, como é o caso do golfinho-rotador (Stenella longirostris). Os animais desta

espécie estudados no Hawaii deslocam-se ao final do dia para zonas offshore para se

alimentarem, no período nocturno, a profundidades de cerca de 100 m; iniciam depois

um movimento contrário em direcção a baías protegidas onde permanecem durante o

dia, geralmente em repouso (Norris & Dohl, 1980). Comportamento semelhante é

observado nos golfinhos-rotadores estudados no Arquipélago de Fernando de

Noronha, Brasil (Silva & Silva-Jr, 2009).

O golfinho-de-Heaviside (Cephalorhynchus heavisidii) estudado em Agterbaai,

África do Sul, apresentou também um padrão marcado de movimento onshore-

offshore ao longo do dia. Estes animais permaneceram mais próximo de costa durante

a manhã, iniciando depois um movimento offshore em direcção a zonas de maior

profundidade (Elwen et al., 2006).

O boto-cinza (Sotalia guianensis) estudado na Baía Norte, Brasil, apresentou

uma variação no padrão do comportamento ao longo do dia, verificando-se uma

tendência inversa nas frequências de deslocação e na alimentação, com um

decréscimo progressivo da alimentação e um aumento progressivo da deslocação ao

longo do dia (Daura-Jorge et al., 2005). Na Baía de Sepetiba, Brasil, Flach et al. (2008)

estudaram também o boto-cinza, tendo detectado durante a manhã uma frequência

mais elevada de comportamentos relacionados com a alimentação, enquanto no

período da tarde houve uma maior frequência dos comportamentos de repouso e

socialização.

Cecília V. Ferreira 7

INTRODUÇÃO

1.2.3. Estudos sobre movimentos e utilização do habitat na comunidade de golfinhos-roazes do estuário do Sado

Os movimentos dos golfinhos-roazes residentes na região do Sado foram já

abordados no passado, de forma mais ou menos detalhada, tendo sido estudada a

relação com o ciclo de marés e com a hora do dia. Não foram, no entanto,

determinados os factores passíveis de influenciar o movimento e actividades dos

animais, nem exploradas a fundo as razões para tal influência.

Dos Santos & Lacerda (1987) não assinalaram qualquer relação entre o

movimento dos grupos de golfinhos e as marés a partir da análise dos seus dados.

Dois estudos realizados posteriormente por Harzen (1998, 2002), com dados

recolhidos em vários períodos entre Junho de 1986 e Dezembro de 1993, mostraram

que os golfinhos aparentam entrar no estuário durante a manhã e com a maré

enchente, alimentando-se nessa corrente de entrada; com a maré vazante e durante a

tarde, os animais movimentaram-se gradualmente para fora da área de estudo.

Nunes (2001), por sua vez, não detectou qualquer relação entre as marés e o

sentido de deslocação dos golfinhos, apesar de notar a aparente preferência pela

maré vazante para as actividades de alimentação.

No que diz respeito à utilização deste habitat, os golfinhos são observados

durante todo o ano no estuário do Sado e na zona marinha adjacente, utilizando mais

frequentemente o canal Sul e a foz (dos Santos & Lacerda, 1987; Harzen, 1998).

Trata-se de uma importante área de alimentação para estes animais (dos Santos &

Lacerda, 1987; Nunes, 2001), que utilizam uma grande variedade de técnicas de caça,

dependentes da zona do estuário em que se encontram (dos Santos & Lacerda, 1987).

Um estudo realizado por Cândido (2003) utilizou um sistema de informação

geográfica para realizar uma análise individual de comportamentos associados aos

movimentos e à utilização espacial do estuário e da zona marinha adjacente. Este

trabalho permitiu estimar áreas vitais dos indivíduos estudados, e determinou como

centros de actividade para a maioria dos animais observados a zona da Caldeira de

Tróia e a extremidade da península de Tróia.

Cecília V. Ferreira 8

INTRODUÇÃO

Cecília V. Ferreira 9

1.3. Objectivos

O objectivo principal deste trabalho é analisar a influência de factores

ecológicos no movimento dos golfinhos-roazes na zona terminal do estuário do Sado.

A utilização do habitat pelos golfinhos-roazes será analisada em relação à

actividade comportamental, e serão determinadas as actividades dominantes dos

golfinhos em relação ao ciclo de marés e à hora do dia, para além da quantificação do

tempo total despendido nas várias actividades que compõem o seu repertório

comportamental.

Serão aplicadas metodologias de análise multivariada (regressão logística e

análise discriminante) que permitam identificar as influências de diferentes variáveis

ambientais quasi-independentes no movimento e comportamento dos golfinhos-

roazes.

MATERIAIS E MÉTODOS

2. Materiais e métodos

2.1. Área de estudo

O estuário do Sado localiza-se na região ocidental de Portugal Continental

(figura 1), junto à cidade de Setúbal. É o segundo maior estuário português e constitui

uma das zonas húmidas mais importantes do país. Estende-se no sentido NW-SE ao

longo de cerca de 45 Km (Sequeira et al., 2009) e apresenta uma área aproximada de

180 Km2 (Cabral, 2000) desde a foz (38°29' N, 8°55' W) até ao limite de influência da

maré, a cerca de 25 Km a montante de Alcácer do Sal (Cândido, 2003). A principal

contribuição de água doce provém do rio Sado, com caudais que variam entre 1 m3 s-1

no Verão e 1800 m3 s-1 no Inverno (Martins et al., 2002).

Na zona a montante do estuário, junto a Alcácer do Sal, atinge-se a largura

máxima encontrada, cerca de 5 Km. Ocorre depois um estreitamento a jusante, na foz,

onde a largura é de cerca de 1,5 Km (Sequeira et al., 2009). O contacto com o mar

faz-se neste local, e a profundidade chega a atingir 50 m junto à margem do Outão

(dos Santos, 1998).

A zona intermédia do estuário apresenta um conjunto de bancos de areia

intertidais que divide esta zona em dois canais. O canal Norte localiza-se junto à

cidade de Setúbal, na margem norte, onde se situam as principais indústrias da região

e que funciona como canal de navegação de acesso ao Porto de Setúbal. Este canal

apresenta uma profundidade máxima de 15 m e os sedimentos são mais envasados

(Cabral, 2000). O canal Sul localiza-se junto à península de Tróia e atinge 25 m de

profundidade. Neste canal, os sedimentos são diversos e encontram-se distribuídos

em manchas, sendo a areia fina e a vasa os tipos predominantes (Cabral, 2000).

O estuário do Sado apresenta uma elevada importância ecológica devido à sua

riqueza biológica e de habitats, razão pela qual está incluído em vários documentos

legais que lhe conferem estatutos de conservação. Assim, parte do estuário do Sado

está definida desde 1980 como Reserva Natural (Decreto-Lei n.º 430/80, de 1 de

Outubro). No âmbito da Rede Natura 2000, foi definido o Sítio de Importância

Comunitária “Estuário do Sado” (PTCON0011) ao abrigo da Directiva Habitats

(Resolução do Conselho de Ministros n.º 142/97, de 28 de Agosto) e uma Zona de

Protecção Especial inserida na Directiva Aves (Decreto-Lei n.º 384-B/99, de 23 de

Setembro). O estuário está ainda definido como Zona Húmida de Importância

Internacional (PT023) na Lista de Sítios da Convenção de RAMSAR.

Cecília V. Ferreira 10

MATERIAIS E MÉTODOS

Figura 1. Localização do estuário do Sado e área marinha adjacente, com indicação das áreas correspondentes à Reserva Natural do Estuário do Sado, ao Parque Natural da Arrábida e ao Parque Marinho Professor Luiz Saldanha (mapa de base obtido do website do Instituto Geográfico Português; informação digital relativa à batimetria disponibilizada online pelo Instituto Hidrográfico; informação digital relativa às áreas protegidas retirada do Atlas do Ambiente Digital, disponibilizado online pela Agência Portuguesa do Ambiente).

A área de estudo do presente trabalho consistiu na zona terminal do estuário

do Sado, aproximadamente desde a Caldeira de Tróia até à foz, incluindo ainda parte

do canal Norte e da zona costeira adjacente ao estuário (ver figura 4, capitulo 2.2).

2.1.1. Marés

As marés em Portugal continental são semi-diurnas, verificando-se

aproximadamente duas preia-mares e duas baixa-mares em cada dia (Hidrográfico,

2009); as alturas das baixa-mares e das preia-mares variam de dia para dia, resultado

da alteração de posição do Sol e da Lua um em relação ao outro (Nybakken &

Bertness, 2005). O intervalo de tempo entre uma preia-mar e a baixa-mar seguinte é

de, em média, 6h 13m (Hidrográfico, 2009). A alternância entre marés vivas e marés

mortas ocorre aproximadamente de 15 em 15 dias; em Portugal continental, e de um

Cecília V. Ferreira 11

MATERIAIS E MÉTODOS

modo geral, a amplitude de maré varia entre 1.50 m em marés vivas e 0.70 m em

marés mortas em relação aos níveis médios (Hidrográfico, 2009). A previsão da hora e

altura das marés em Portugal está disponível para consulta online no website do

Instituto Hidrográfico.

2.1.2. Caracterização hidrológica do estuário do Sado

O estuário do Sado, em particular a sua foz, apresenta-se como uma zona de

forte influência das correntes de maré. No estuário existem dois vórtices principais: um

ciclónico, centrado no início dos bancos de areia, e um anti-ciclónico centrado mais a

montante do estuário, na região da Setenave. A corrente residual é mais forte junto da

foz e em particular na zona da Califórnia (junto à Caldeira de Tróia), onde os dois

vórtices se encontram. Os bancos de areia intertidais impedem que o mesmo aconteça

no canal Norte, que tem assim correntes mais fracas (Neves, 1985 in Rodrigues &

Quintino, 1993). No canal de navegação forma-se um jacto e dois vórtices adjacentes.

O vórtice ciclónico localiza-se na zona do Cambalhão e é de maiores dimensões,

apresentando também maiores velocidades. Estes dois vórtices põem em evidência a

entrada da água no estuário pelas zonas junto a terra (INAG/MARETEC, 2001). Estes

fluxos são importantes uma vez que os fenómenos de upwelling e downwelling

associados contribuem para a mistura das massas de água e o movimento de

nutrientes para a superfície (Robinson, 2010).

2.2. Metodologia de recolha de dados

A recolha de dados foi feita a partir de um ponto de observação em terra, na

margem Norte do estuário do Sado (Forte de S. Filipe: 38° 31.040'N, 8° 54.583'W), a

114 m de altitude. Este local foi escolhido por permitir um amplo campo de visão que

compreende os canais Norte e Sul do estuário bem como a foz e parte da área

marinha adjacente (figura 2).

Cecília V. Ferreira 12

MATERIAIS E MÉTODOS

Cecília V. Ferreira 13

Figura 2. A – Campo de visão da área de estudo a partir do local de observação; B – Recolha de dados com recurso a binóculos e telescópio e preenchimento

da ficha de amostragem.

O período de amostragem decorreu entre Agosto e Novembro de 2009,

abrangendo apenas o período diurno (o início e o fim da amostragem em cada dia

variou ao longo do período de amostragem, no entanto as observações iniciaram-se

entre as 6h30 e as 8h30 e terminaram entre as 17h e as 20h).

A metodologia de recolha de dados utilizada foi a amostragem de grupo focal

(Mann, 1999), tendo sido considerado como grupo o conjunto de animais envolvidos

na mesma actividade aparente num raio de 200 m (dos Santos et al., 2007).

Foram feitos scans à área de estudo com o auxílio de binóculos Helios

Naturesport 7x50 mm a cada 30 minutos, tendo cada scan a duração de 10 minutos.

Os scans em que não havia avistamento de golfinhos foram anotados como scans

negativos e o procedimento era repetido 30 minutos depois.

Quando era avistado um grupo de golfinhos-roazes, a observação tinha a

duração de 10 minutos, recorrendo a um telescópio Bresser Optics 25-75x100 mm. A

posição aproximada de cada avistamento foi marcada num mapa da área de estudo,

recorrendo para tal a bóias de navegação existentes no estuário, localização de

bancos de areia e marcos proeminentes em terra (como edifícios) facilmente

visualizados do ponto de observação. Esta posição aproximada apresenta um erro

associado, uma vez que não foi possível determinar exactamente a posição geográfica

dos animais; no entanto, tentou minimizar-se este erro utilizando diversas

A

B

MATERIAIS E MÉTODOS

conhecenças presentes no estuário. Durante estes scans positivos, se os animais se

movimentassem para locais não visíveis do ponto de observação, o observador

dirigia-se para um ponto secundário no Forte de S. Filipe de onde fosse possível

avistar o grupo. Após a marcação da posição do avistamento, a observação era

realizada durante 10 minutos, findos os quais se registava numa ficha de amostragem

(em anexo) a hora do avistamento, estado da maré, quadrante, direcção aparente de

deslocação, tamanho de grupo e actividade dominante aparente, entre outras. Os

dados recolhidos em cada dia foram introduzidos em folhas de cálculo no software

Microsoft® Excel© no final de cada dia de amostragem. De seguida explicita-se a forma

como foi caracterizada cada uma destas variáveis.

Estado da maré

De forma a acompanhar o movimento e actividade dos animais com a evolução

da maré, foi atribuída, a cada scan, uma categoria do estado da maré em função da

hora de baixa-mar anterior à primeira observação, recorrendo à designação BM (de

Baixa-Mar), e uma única categoria com a designação PM (de Preia-Mar). As

categorias BM e PM foram definidas como o intervalo de tempo compreendido entre

os 15 minutos anteriores e os 15 minutos posteriores à hora tabelada para cada uma

das marés. Ao contrário das outras categorias, estas tiveram a duração de 30 minutos,

correspondente à duração do período de estofo da maré, em que ocorre a inversão do

sentido da maré e a intensidade da corrente é praticamente nula, não se verificando

alteração na altura. Durante a maré enchente, as categorias seguintes à categoria BM,

com a duração de 1 hora e a designação BM+x (em que x corresponde ao número de

horas depois da baixa-mar), foram obtidas a partir da anterior tendo como limite

inferior o limite superior da categoria que a precede. Durante a maré vazante, e após a

categoria PM, atribuiu-se a designação BM-x, obtidas igualmente a partir da categoria

anterior utilizando como limite inferior o limite superior da categoria que a antecede.

Utilizaram-se ainda as designações “enchente”, quando os indivíduos foram

observados durante o período enchente da maré (período entre uma baixa-mar e a

preia-mar seguinte), e “vazante”, quando os indivíduos foram observados durante o

período vazante da maré (período entre uma preia-mar e a baixa-mar seguinte).

Incluíram-se na designação “enchente” as observações realizadas desde a hora

tabelada de baixa-mar (exclusive) até à hora de preia-mar, e na designação “vazante”

as observações realizadas desde a hora tabelada de preia-mar (exclusive) até à hora

de baixa-mar seguinte.

Cecília V. Ferreira 14

MATERIAIS E MÉTODOS

Cecília V. Ferreira 15

A figura 3 ilustra estas designações.

Figura 3. Designações da evolução do estado da maré ao longo de meio ciclo de maré.

Quadrante

A figura 4 mostra a divisão da área de estudo em 11 quadrantes, determinada

pela existência de bóias de auxílio à navegação, marcos em terra e a localização de

bancos de areia. Encontram-se assinalados na figura o Ponto de Observação (+) e os

seguintes marcos em terra: Outão (a cor de rosa), Hotel Aqualuz Troiamar em Tróia (a

roxo) e Casa na Caldeira de Tróia (a verde). As bóias de navegação utilizadas

incluíram a Baliza nº 5 (a vermelho) e a Bóia João Farto (a amarelo). A azul claro

encontra-se marcada a localização do cais dos Fuzileiros na margem de Tróia. As

cruzes vermelhas no canal Sul mostram a localização das bóias nº 2 e nº 4.

A divisão da área de estudo em quadrantes foi realizada da seguinte forma:

Quadrante A – delimitado pelo alinhamento com o Outão; o quadrante A1 foi

considerado como a área entre o Ponto de observação e o Outão, e como quadrante

A2 a área a SW do Outão;

Quadrante B – delimitado a montante pelo alinhamento com a Baliza nº 5 e a jusante

pelo alinhamento com o Outão; a divisão nos quadrantes B1 e B2 foi feita mediante

uma linha traçada entre o Outão e a Baliza nº 5;

BMBM+1

PM

BM+2

BM+3

BM+4

BM+5BM+6 BM-6

BM-5

BM-4

BM-3

BM-2

BM-1 BM

ENCHENTE VAZANTEV

MATERIAIS E MÉTODOS

Quadrante C – delimitado a montante pelo alinhamento com o Hotel Aqualuz Troiamar

e a jusante pela Baliza nº 5; traçou-se uma linha entre a Baliza nº 5 e o Hotel Casino

para obter os quadrantes C1 e C2;

Quadrante D – delimitado a montante pelo alinhamento com a Casa na Caldeira e a

jusante com o Hotel Casino; a posterior delimitação nos quadrantes D1 e D2 foi feita

mediante uma linha traçada entre a Bóia João Farto e o pórtico azul na margem Norte

do estuário;

Quadrante E – quadrante a montante do quadrante D; o quadrante E1 é delimitado

por uma linha traçada entre a Bóia João Farto e o pórtico azul na margem Norte do

estuário; e os quadrantes E2N e E2S foram obtidos a partir de um eixo alinhado com

os bancos de areia que dividem o estuário no canal Norte (junto a Setúbal) e canal Sul

(junto à Península de Tróia).

Figura 4. Mapa da área de estudo com divisão nos quadrantes de amostragem.

Direcção aparente de deslocação

A direcção aparente de deslocação foi definida como “UP” quando o grupo se

encontrasse em deslocação para o interior do estuário (sentidos Nordeste e Sudeste),

“DOWN” quando o movimento fosse no sentido de saída do estuário (sentidos

Cecília V. Ferreira 16

MATERIAIS E MÉTODOS

Noroeste e Sudoeste), ou “IND” (indeterminado) se o grupo aparentava um movimento

sem direcção definida.

Tamanho de grupo

Durante um scan positivo, o número de indivíduos do grupo foi contabilizado,

sempre que os animais vinham à superfície, como o número de animais à superfície

num dado instante. Quando se obtinham várias contagens diferentes do número de

animais durante um scan, considerou-se, de entre todas as contagens, o número

mínimo de animais contabilizado à superfície.

Actividade dominante aparente

A definição no campo da actividade dominante aparente em que os golfinhos

se encontravam envolvidos foi baseada em comportamentos observados, tais como a

direcção e a velocidade de natação e a duração dos mergulhos, bem como o contacto

físico entre indivíduos e a presença de presas (Bearzi et al., 1999).

Com base na literatura, foram utilizadas quatro categorias comportamentais

para determinar a actividade dominante aparente (dos Santos, 1998; Cândido, 2003;

Constantine et al., 2004; Lusseau, 2006):

Deslocação – Os animais emergem próximos uns dos outros, num só grupo compacto

ou em várias unidades separadas dispostas, geralmente, ao longo de um eixo de

deslocação. A deslocação do grupo é rápida e a direcção bastante marcada. As

submersões são normalmente curtas, embora possa registar-se a ocorrência de

mergulhos prolongados, de duração relativamente constante (Lusseau, 2006), que

alternam com sequências de ventilação. São raros outros comportamentos à

superfície para além de saltos (dos Santos, 1998);

Alimentação – Os animais encontram-se envolvidos em actividades de captura e

consumo de presas, evidenciadas pela presença de presas à superfície e técnicas de

caça como natação em círculo (Constantine et al., 2004). Os mergulhos têm duração

variável e não são sincronizados (Cândido, 2003);

Socialização – Os animais encontram-se junto à superfície, não sendo detectada a

presença de presas. Podem ocorrer diversos tipos de interacções entre os indivíduos,

Cecília V. Ferreira 17

MATERIAIS E MÉTODOS

como saltos sincronizados e contacto físico (dos Santos 1998), e os intervalos de

mergulhos são de duração variável. Ocorrem pequenos sub-grupos espalhados

(Lusseau, 2006). Pode ter um papel social e/ou reprodutor (Constantine et al., 2004);

Repouso – Os animais deslocam-se muito próximos uns dos outros, com movimentos

lentos e formando uma só unidade que se desloca praticamente imóvel à superfície

(dos Santos, 1998).

2.3. Análise de dados

A estatística descritiva e os testes estatísticos foram realizados recorrendo aos

programas Microsoft® Excel©, PASW Statistics versão 18.0 e ACTUS2 (Estabrook &

Estabrook, 1989). O nível de significância (α) adoptado em todos os testes foi de 5%.

A normalidade dos dados foi testada, quando necessário, recorrendo ao teste

de Shapiro-Wilk (Zar, 2009), rejeitando-se a hipótese nula de normalidade dos dados

sempre que o valor de p obtido foi inferior ao nível de significância adoptado

(p < 0.05).

2.3.1. Utilização do habitat

A estatística de simulação ACTUS2 foi utilizada para comparar a utilização de

cada quadrante da área de estudo em relação à actividade dominante. Esta análise

utiliza tabelas de contingência que não poderiam ser analisadas recorrendo à

estatística de χ2 por não cumprirem os seus pressupostos (ou seja, tabelas com várias

células com frequências baixas (< 5) ou com valor nulo) (Almada & Oliveira, 1997).

Assim, o ACTUS2 simula 10000 tabelas de contingência de valores esperados e

devolve os valores de χ2 e de p associados, bem como as células em que os valores

observados diferem significativamente dos esperados, à semelhança do que se obteria

num teste a posteriori.

Foi analisada uma tabela de contingência que continha a frequência de scans

positivos registados durante o período de amostragem em cada quadrante para cada

uma das actividades consideradas. Não se utilizaram dados relativos ao repouso por

apresentarem uma frequência muito baixa.

Cecília V. Ferreira 18

MATERIAIS E MÉTODOS

2.3.2. Número de golfinhos em relação à actividade dominante aparente

A normalidade dos dados foi testada através do teste de Shapiro-Wilk. Uma

vez que os dados não seguem uma distribuição normal, foi realizado um teste não

paramétrico de Kruskal-Wallis para determinar a existência de diferenças

estatisticamente significativas no número mediano de golfinhos em relação à

actividade dominante em que os animais se encontravam envolvidos. Não se

utilizaram nesta análise os scans em que os animais foram registados como estando

em repouso, pela sua baixa frequência.

2.3.3. Influência do estado da maré e hora do dia no número de golfinhos

Uma vez que os dados não apresentam uma distribuição normal, foi aplicado

um teste não paramétrico de Kruskal-Wallis para determinar se existem diferenças

estatisticamente significativas no número mediano de indivíduos em relação ao estado

da maré bem como à hora do dia. Quando o resultado foi estatisticamente significativo,

aplicou-se um teste de comparações múltiplas de Dunn (Zar, 2009). Utilizou-se o

número mediano de golfinhos para comparabilidade com Mendes et al. (2002).

Utilizaram-se as 14 categorias adoptadas para o estado da maré (ver capítulo

2.2), tendo sido calculado o número mediano de golfinhos registado em cada estado

de forma a acompanhar a abundância de animais ao longo de meio ciclo de maré (de

uma baixa-mar à seguinte). Relativamente à hora do dia, os scans positivos foram

atribuídos a uma categoria horária, de duração igual a 1 hora, tendo sido depois

calculado o número mediano registado em cada hora.

2.3.4. Influência da fase da maré e da hora do dia no tipo de movimento e na actividade dominante aparente

Foram criadas tabelas de contingência que foram posteriormente analisadas

recorrendo ao programa ACTUS2.

Para determinar a influência da fase da maré no tipo de movimento e na

actividade dominante aparente, agruparam-se os scans positivos em quatro classes de

fase da maré: baixa-mar; enchente; preia-mar e vazante. A classe “baixa-mar” agrupou

as categorias BM-1, BM e BM+1; a classe “enchente” incluiu as categorias BM+2,

Cecília V. Ferreira 19

MATERIAIS E MÉTODOS

Cecília V. Ferreira 20

BM+3, BM+4 e BM+5; a classe “preia-mar” agrupou as categorias BM+6, PM e BM-6;

e por fim a classe “vazante” incluiu as categorias BM-5, BM-4, BM-3 e BM-2.

Para determinar a influência da hora do dia no tipo de movimento e na

actividade dominante aparente, os scans positivos registados ao longo do dia foram

agrupados nas seguintes classes: [8h – 12h[; [12h – 16h[; [16h – 20h].

2.3.5. Influência de variáveis ambientais no movimento e na actividade dos golfinhos

Realizou-se uma regressão logística, como descrito por Maroco (2010), para

analisar o efeito conjunto de diversas variáveis ambientais na direcção aparente de

deslocação dos golfinhos, codificada para cada categoria de direcção dominante. As

variáveis ambientais quasi-independentes incluíram hora do dia, estado da maré,

altura da maré e amplitude da maré.

A altura da maré foi calculada recorrendo a informação constante do website

do Serviço Hidrográfico e Oceanográfico da Marinha Francesa (SHOM) para o porto

de Setúbal (disponível no endereço http://www.shom.fr/ann_marees/cgi-

bin/predit_ext/choixp?opt=1&zone=1&port=SETUBAL).

A variável dependente – direcção dominante aparente – foi convertida para o

sistema binário, tendo sido atribuído 0 (zero) ao movimento de entrada no estuário

(UP) e 1 ao movimento de saída (DOWN). A categoria IND foi retirada da análise por

ser pouco representativa.

A regressão logística foi realizada no software PASW Statistics v.18.0.

Realizou-se também uma análise discriminante para identificar qual ou quais

das variáveis ambientais em estudo (hora do dia, estado da maré, altura da maré e

amplitude de maré) permitem diferençar significativamente as actividades dominantes

dos golfinhos (deslocação [D] e alimentação [A]).

Nesta análise, a variável dependente – actividade dominante aparente – foi

codificada da seguinte forma: D = 1; A = 2. Os dados relativos às actividades

Socialização e Repouso não foram utilizados por serem insuficientes para a realização

da análise.

Esta análise foi realizada no software PASW Statistics v.18.0.

RESULTADOS

3. Resultados

3.1. Esforço de amostragem

A recolha de dados realizou-se ao longo de 18 dias entre os meses de Agosto

e Novembro de 2009, tendo-se observado golfinhos-roazes em 78% dos dias

amostrados. Das 206.5 horas de esforço total de amostragem (430 scans realizados à

área de estudo), 34.7 horas foram em presença de golfinhos na área de estudo, das

quais resultaram 71 scans positivos (scans com a presença de golfinhos). Os períodos

de amostragem tiveram uma duração média de 11.5 h (± 1.3 h).

A tabela 1 mostra o sumário do esforço de amostragem em cada dia ao longo

do período de amostragem.

Tabela 1. Tempo, em horas, de esforço total de amostragem, número de scans e de scans positivos durante o período de amostragem. Os dias marcados a negrito e itálico referem-se a dias sem observação de golfinhos.

DIA DURAÇÃO DO ESFORÇO (h) SCANS SCANS

POSITIVOS

01-Ago-09 12.5 26 6 04-Ago-09 13.5 27 8 07-Ago-09 13.0 27 6 09-Ago-09 12.5 26 4 11-Ago-09 12.5 27 3 13-Ago-09 12.0 25 0 19-Ago-09 12.0 25 3 22-Ago-09 12.0 25 0 27-Ago-09 12.0 25 2 30-Ago-09 12.5 26 7 12-Out-09 10.7 22 8 14-Out-09 11.0 23 6 16-Out-09 10.5 22 9 23-Out-09 11.0 23 3 24-Out-09 11.0 23 0 27-Out-09 10.0 21 0 29-Out-09 9.0 19 2 19-Nov-09 8.8 18 4

TOTAL 206.5 430 71

Cecília V. Ferreira 21

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 22

No que diz respeito ao tempo de observação de golfinhos em relação ao ciclo

de marés e à hora do dia, as figuras 5 e 6 mostram, respectivamente, a distribuição

dos scans positivos pelas categorias definidas para o estado da maré e pelas horas do

dia, sendo visível uma maior presença de golfinhos durante o período enchente da

maré e no período da manhã.

Figura 5. Percentagem de scans positivos registados em cada classe definida para o estado da maré.

Figura 6. Percentagem de scans positivos registados ao longo do dia.

05

1015202530354045

Baixa-mar Enchente Preia-mar Vazante

% S

cans

posi

tivos

Estado da maré

0

5

10

15

20

25

8h00-12h00 12h00-16h00 16h00-20h00

% S

cans

posi

tivos

Hora do dia

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 23

3.2. Distribuição de actividades

A figura 7 representa a percentagem de tempo empregue pelos animais em

cada uma das actividades consideradas durante o período de amostragem. Os

indivíduos despenderam a maioria do tempo em deslocação (75%), seguindo-se a

alimentação e a socialização. A categoria comportamental repouso foi apenas

observada em 3 ocasiões (durante a manhã, entre as 8h e as 10h), e por essa razão

não foi utilizada nas análises subsequentes.

Figura 7. Distribuição de actividades dos golfinhos-roazes durante o período de amostragem.

3.2.1. Número de golfinhos em relação à actividade dominante aparente

Realizou-se um teste de Kruskal-Wallis para avaliar a existência de diferenças

significativas no número mediano de golfinhos em relação à actividade em que os

indivíduos se encontravam envolvidos (figura 8). O teste não revelou diferenças

estatisticamente significativas (χKW2 (2) = 2.46; p > 0.05; n = 68).

75%

19%

6%

Deslocação

Alimentação

Socialização

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 24

Figura 8. Distribuição do número mediano de golfinhos em relação à actividade dominante aparente. As diferenças não foram estatisticamente significativas

(χKW2 (2) = 2.46; p > 0.05; n = 68). O marcador azul representa a mediana, e os

extremos inferior e superior da caixa representam, respectivamente, o 1º e o 3º Quartil. As barras inferiores e superiores representam os valores mínimo e máximo, respectivamente, não se observando outliers.

3.3. Utilização do habitat

Os quadrantes mais utilizados pelos golfinhos-roazes foram os quadrantes

E2S, C1 e B2 (E2S: 29.4%, C1 e B2: 16.2%), não tendo sido avistados animais nos

quadrantes A1 e A2 durante o período de amostragem. Nos quadrantes E1 e E2N, que

correspondem essencialmente ao canal Norte do estuário, foram registados golfinhos

em apenas 3% do total de scans positivos (tabela 2).

D A S

Actividade dominante aparente

0

2

4

6

8

10

12

Núm

ero

med

iano

de

golfi

nhos

Deslocação Alimentação Socialização

RESULTADOS

Tabela 2. Percentagem de scans positivos registados em cada quadrante.

QUADRANTE % SCANS POSITIVOS

A1 0 A2 0 B1 11.8 B2 16.2 C1 16.2 C2 7.4 D1 5.9 D2 10.3 E1 1.5

E2N 1.5 E2S 29.4

Todos os quadrantes da área de estudo foram utilizados durante a deslocação

(excepto os quadrantes A1 e A2), e foi nos quadrantes D1, D2 e E2S que se

registaram as maiores frequências de alimentação; a socialização foi apenas registada

na zona da foz do estuário, junto à baliza nº 5 (figura 9). A análise realizada no

ACTUS2 não mostrou diferenças estatisticamente significativas (embora próximo

disso) na distribuição das actividades pelos vários quadrantes (χ2 = 25.57; df = 20;

p = 0.058), apesar da frequência de alimentação observada no quadrante E2S se ter

revelado significativamente superior ao esperado (tabela 3).

Cecília V. Ferreira 25

RESULTADOS

Figura 9. Localização das posições aproximadas dos golfinhos-roazes registadas para cada actividade observada.

Tabela 3. Tabela de contingência – frequência de avistamento por actividade dominante em cada quadrante. Assinalada a vermelho está a célula com valor significativamente superior (↑) ao esperado (χ2 = 25.57; df = 20; p = 0.058).

QUADRANTE / ACTIVIDADE A1 A2 B1 B2 C1 C2 D1 D2 E1 E2S E2N

Deslocação 0 0 6 11 8 5 2 5 1 12 1

Alimentação 0 0 0 0 1 0 2 2 0 8 ↑ 0

Socialização 0 0 2 0 2 0 0 0 0 0 0

3.4. Ciclo de marés

3.4.1. Número de golfinhos em relação ao estado da maré

O teste de Kruskal-Wallis revelou diferenças estatisticamente significativas no

número mediano de golfinhos em relação ao estado da maré (χKW2 (13) = 25.45;

p < 0.05; n = 71). De acordo com o teste de comparações múltiplas de Dunn, a

Cecília V. Ferreira 26

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 27

categoria BM+3 é a que apresenta uma distribuição significativamente diferente das

restantes (BM, BM+1, PM, BM-5, BM-4, BM-3 e BM-1) (p < 0.05), atingindo-se nesta

categoria o número mediano de golfinhos máximo (figura 10).

Figura 10. Distribuição do número mediano de golfinhos em relação ao estado da maré. As distribuições com letras diferentes são estatisticamente significativas de

acordo com o teste de Kruskal-Wallis (χKW2 (13) = 25.45; p < 0.05; n = 71)

seguido das comparações múltiplas de Dunn. O marcador azul representa a mediana, e os extremos inferior e superior da caixa representam, respectivamente, o 1º e o 3º Quartil. As barras inferiores e superiores representam os valores mínimo e máximo, respectivamente, não se observando outliers.

3.4.2. Tipo de movimento em relação à fase da maré

Registou-se maior frequência de movimentos de entrada no estuário (UP) na

baixa-mar e no período enchente da maré (75% e 62%, respectivamente), tendência

que se inverte na preia-mar e durante a maré vazante (figura 11). A análise realizada

com o ACTUS2 mostrou diferenças estatisticamente significativas na distribuição de

frequência de movimentos em relação à fase da maré (χ2 = 9.88; df = 3; p < 0.05)

(tabela 4).

BM BM+1 BM+2 BM+3 BM+4 BM+5 BM+6 PM BM-6 BM-5 BM-4 BM-3 BM-2 BM-1

Estado da maré

0

2

4

6

8

10

12

Núm

ero

med

iano

de

golfi

nhos

b

a a

a

a

a

aa

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 28

Figura 11. Percentagem de scans positivos registados durante as quatro classes da fase da maré em relação aos dois tipos de movimento registados – UP e DOWN.

Tabela 4. Tabela de contingência – frequência de scans positivos por tipo de movimento em cada fase da maré. A análise desta tabela de contingência revela que a hipótese de independência entre linhas e colunas deve ser rejeitada (χ2 = 9.88; df = 3; p < 0.05).

TIPO DE MOVIMENTO / FASE DA MARÉ UP DOWN

Baixa-mar 12 4

Enchente 18 11

Preia-mar 3 5

Vazante 4 12

3.4.3. Actividade dominante aparente em relação à fase da maré

A figura 12 mostra que os golfinhos exibiram comportamentos de alimentação

mais frequentemente durante a baixa-mar e a preia-mar (cerca de 30% e 40%

respectivamente), tendo socializado ligeiramente mais durante o período enchente da

maré (cerca de 11%). Estas diferenças não foram, no entanto, significativas (χ2 = 9.10;

df = 6; p > 0.05).

0,0

20,0

40,0

60,0

80,0

100,0

Baixa-mar Enchente Preia-mar Vazante

% S

cans

posi

tivos

Fase da maré

UP

DOWN

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 29

Figura 12. Percentagem de scans positivos registados durante as quatro classes da fase da maré consideradas em relação à actividade dominante.

3.5. Hora do dia

3.5.1. Número de golfinhos em relação à hora do dia

O teste de Kruskal-Wallis não mostrou diferenças estatisticamente

significativas no número mediano de golfinhos em relação à hora do dia

(χKW2 (11) = 11.74; p > 0.05; n = 71) (figura 13). O número mediano de golfinhos

registado foi 4, não sendo assinalável um padrão de abundância ao longo do dia.

0,0

20,0

40,0

60,0

80,0

100,0

Baixa-mar Enchente Preia-mar Vazante

% S

cans

posi

tivos

Fase da maré

Deslocação

Alimentação

Socialização

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 30

Figura 13. Distribuição do número mediano de golfinhos em relação à hora do dia. As

diferenças não foram estatisticamente significativas (χKW2 (11) = 11.74;

p > 0.05; n = 71) O marcador azul representa a mediana, e os extremos inferior e superior da caixa representam, respectivamente, o 1º e o 3º Quartil. As barras inferiores e superiores representam os valores mínimo e máximo, respectivamente, não se observando outliers.

3.5.2. Tipo de movimento em relação à hora do dia

A figura 14 representa a frequência do tipo de movimento registado em cada

período diário considerado. Os animais foram observados a entrar no estuário (UP)

com maior frequência entre as 8h00 e as 12h00 (cerca de 70%), tendo-se observado o

movimento inverso entre as 16h00 e as 20h00 (DOWN: cerca de 70%). A análise no

ACTUS2 revelou que estas diferenças são estatisticamente significativas (χ2 = 9.83;

df = 2; p < 0.05) (tabela 5).

8h -

9h

9h -

10h

10h

- 11h

11h

- 12h

12h

- 13h

13h

- 14h

14h

- 15h

15h

- 16h

16h

- 17h

17h

- 18h

18h

- 19h

19h

- 20h

Hora do dia

0

2

4

6

8

10

12

Núm

ero

med

iano

de

golfi

nhos

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 31

Figura 14. Percentagem de scans positivos registados em cada um dos três períodos diurnos considerados em relação aos dois tipos de movimento.

Tabela 5. Tabela de contingência – frequência de scans positivos por tipo de movimento durante os três períodos diurnos considerados. Assinalada a vermelho está a célula com valor significativamente inferior (↓) ao esperado (χ2 = 9.83; df = 2; p < 0.05).

TIPO DE MOVIMENTO / HORA DO DIA UP DOWN

8h00 – 12h00 22 8 ↓

12h00 – 16h00 10 11

16h00 – 20h00 5 13

3.5.3. Actividade dominante aparente em relação à hora do dia

A figura 15 representa a frequência de ocorrência de cada uma das

actividades consideradas ao longo do dia. A deslocação foi a actividade mais

frequentemente observada nos três períodos do dia considerados (frequência média:

74%). A alimentação registou a frequência máxima entre as 16h e as 20h, e a

socialização foi mais frequente entre as 12h e as 16h, não tendo sido registada ao fim

da tarde. O teste realizado no ACTUS2 mostrou que estas diferenças não são

estatisticamente significativas (χ2 = 6.21; df = 4; p > 0.05).

0,0

20,0

40,0

60,0

80,0

100,0

8h00 - 12h00 12h00 - 16h00 16h00 - 20h00

% S

cans

posi

tivos

Hora do dia

UP

DOWN

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 32

Figura 15. Percentagem de scans positivos registados durante os três períodos diurnos considerados em relação à actividade dominante registada.

3.6. Tipo de movimento em relação à fase da maré por hora do dia

A figura 16 representa o resumo do tipo de movimento dos golfinhos na área

de estudo em função da hora do dia e da fase da maré. Destaca-se o movimento de

entrada a favor da maré (UP/enchente) durante os períodos da manhã (8h – 12h) e

meio-dia (12h – 16h), invertendo-se este padrão no período da tarde (16h – 20h),

período em que os animais são avistados mais frequentemente a sair do estuário

novamente a favor da maré (DOWN/vazante).

Figura 16. Percentagem de scans positivos registados para cada tipo de movimento em função da hora do dia e da fase da maré.

0,0

20,0

40,0

60,0

80,0

100,0

8h - 12h 12h - 16h 16h - 20h

% S

cans

posi

tivos

Hora do dia

Deslocação

Alimentação

Socialização

0,0

10,0

20,0

30,0

40,0

50,0

60,0

70,0

Enchente Vazante Enchente Vazante Enchente Vazante

8h - 12h 12h - 16h 16h - 20h

% S

cans

posi

tivos

Fase da maré / hora do dia

UP

DOWN

RESULTADOS

3.7. Influência de variáveis ambientais no movimento e actividade dos golfinhos

A regressão logística revelou que o estado da maré (χWald2 (1) = 3.378;

p = 0.066) e a amplitude da maré (χWald2 (1) = 0.343; p = 0.558) não apresentaram um

efeito estatisticamente significativo sobre o Logit da probabilidade de saída do

estuário. Em contraste, as variáveis hora do dia (βHora do dia = 0.323; χWald2 (1) = 9.814;

p = 0.002; OR = 1.381) e altura da maré (βAltura da maré = 1.523; χWald2 (1) = 8.833;

p = 0.003; OR = 4.585) apresentaram um efeito estatisticamente significativo. Da

análise do odds ratio conclui-se que a maior influência provém da altura da maré:

quando a maré sobe 1 m, a probabilidade dos golfinhos saírem do estuário aumenta

4.5 vezes. A tabela 6 resume os coeficientes de regressão logística, bem como a sua

significância no modelo.

Tabela 6. Coeficientes Logit do modelo de regressão logística da variável “Tipo de movimento” em função da Hora do dia, Altura da maré, Estado da maré e Amplitude da maré.

Parâmetro df β χWald2 p-value Odds ratio (OR)

Hora do dia 1 0.323 9.814 0.002 1.381

Altura da maré 1 1.523 8.833 0.003 4.585

Estado da maré 1 -0.185 3.378 0.066 0.831

Amplitude da maré 1 -0.333 0.343 0.558 0.717

Constante 1 -0.668 11.664 0.001 0.001

Cecília V. Ferreira 33

RESULTADOS

Figura 17. Representação gráfica do resultado da regressão logística para a variável altura da maré em relação à probabilidade prevista do tipo de movimento associado. As rectas correspondem às rectas de regressão para cada tipo de movimento. Da análise destas rectas pode dizer-se que quando a altura da maré é baixa a probabilidade de entrada no estuário é maior do que a probabilidade de saída.

A análise discriminante extraiu 1 função discriminante, e os coeficientes

estandardizados das variáveis na função discriminante são apresentados na tabela 7.

A tabela 8 representa o resumo da análise discriminante, onde se verifica que esta não

permitiu identificar quais as variáveis ambientais que discriminam significativamente as

duas actividades em estudo (p > 0.05).

Tabela 7. Coeficientes estandardizados das variáveis ambientais consideradas.

Variáveis Função 1

Hora 0.831

Estado da maré 0.356

Altura da maré -0.447

Amplitude da maré 0.136

Eigenvalue 0.024

Cecília V. Ferreira 34

RESULTADOS

Cecília V. Ferreira 35

Tabela 8. Tabela-resumo da análise discriminante.

Função Lambda de Wilks χ2 df p-value

1 0.977 1.373 4 0.849

DISCUSSÃO

4. Discussão

As observações realizadas a partir de terra permitem monitorizar os

movimentos e comportamento dos animais e têm como principais vantagens não

interferir com o comportamento dos animais (Würsig & Jefferson, 1990; Berrow et al.,

1996) e permitir um campo de visão alargado sobre a área de estudo (Berrow et al.,

1996), apresentando, por outro lado, custos de execução relativamente baixos (Würsig

& Jefferson, 1990) quando comparados com os da observação a partir de uma

embarcação. O principal inconveniente deste tipo de observação prende-se com a

distância do observador ao objecto de estudo. Esta distância deve ser tida em

consideração quando se determina a espécie, o número de indivíduos presente na

área e o padrão comportamental apresentado (Elwen et al., 2009), uma vez que pode

conduzir a determinações incorrectas destas variáveis; neste tipo de observação é

quase impossível o reconhecimento individual dos animais devido à distância entre o

observador e o animal (Würsig & Jefferson, 1990).

Os resultados deste trabalho mostram que o estuário do Sado é um importante

habitat para a comunidade de golfinhos-roazes. Durante o período de amostragem,

estes animais foram avistados em 78% dos dias amostrados, frequência que traduz

assim o carácter residente desta comunidade, que utiliza o estuário quase

diariamente. É preciso admitir que nos 22% dos dias remanescentes poderá ter

ocorrido alguma presença não detectada, por exemplo no período nocturno.

4.1. Utilização do habitat

Detectaram-se alguns padrões de utilização da área de estudo em relação às

diversas actividades observadas, apesar do teste estatístico realizado não ter

permitido encontrar diferenças estatisticamente significativas. Estes padrões vão de

encontro ao obtido noutros estudos de utilização deste habitat (Freitas, 1995; dos

Santos, 1998; Harzen, 1998; Nunes, 2001; Augusto, 2007).

De um modo geral, observou-se uma preferência pelo canal Sul e zona da foz

do estuário, enquanto no canal Norte foram observados golfinhos em apenas 3% dos

scans realizados, tratando-se estas observações de animais em deslocação. Apesar

da área de estudo deste trabalho não incluir a totalidade do estuário, este evitamento

do canal Norte foi já evidenciado em vários estudos realizados anteriormente (Harzen,

1998; Nunes, 2001; Cândido, 2003; Augusto, 2007).

Cecília V. Ferreira 36

DISCUSSÃO

O canal Norte, junto à cidade de Setúbal, sofre o impacto directo de diversas

actividades humanas que se estabeleceram nessa margem: é este o canal de acesso

ao porto de Setúbal, bem como aos portos de pesca e de recreio, apresentando assim

níveis bastante elevados de poluição acústica (Ferreira et al., 1996; dos Santos, 1998;

Luís, 2008), para além da poluição química da água decorrente da existência de

efluentes domésticos e industriais que descarregam neste canal. Apesar disso, este

canal apresenta uma elevada abundância de espécies ícticas (Lopes da Cunha, 1994),

nomeadamente as tainhas (uma das presas confirmadas destes golfinhos; dos Santos

et al., 2007), o que poderá explicar as pontuais incursões dos golfinhos a esta zona

para se alimentarem destes peixes. Outros estudos realizados apontam para uma

situação semelhante em anos recentes, com Augusto (2007) a detectar a presença de

menos grupos nas zonas correspondentes ao canal Norte do estuário.

Relativamente à restante área de estudo, a sua utilização foi também selectiva

no que diz respeito ao comportamento, tendo os golfinhos demonstrado uma

preferência pelo canal Sul para a alimentação; foram observados comportamentos de

socialização apenas na zona da foz do estuário.

4.2. Actividade dominante aparente

Os golfinhos residentes no estuário do Sado utilizam este habitat

extremamente produtivo nas suas rotinas diárias, nomeadamente para a alimentação.

Esta actividade foi a segunda mais frequentemente observada durante o período de

amostragem (19%), antecedida pela deslocação (75%). O número mediano de

golfinhos foi, no entanto, independente da actividade dominante, como foi também

observado por Augusto (2007).

A maior frequência de deslocação registada na área de estudo (75%) em

comparação com as restantes actividades pode ser explicada pelo facto da zona da

foz do estuário (a área de estudo) ser uma zona de ligação entre o estuário e a zona

marinha adjacente. Augusto (2007) registou um maior número de grupos em

deslocação em comparação com a alimentação e a socialização, o que está de acordo

com o cenário apresentado no presente estudo.

Como já foi referido, a actividade de alimentação foi essencialmente observada

no canal Sul do estuário; outros autores detectaram um padrão semelhante (Nunes,

2001; Augusto, 2007), sendo o canal Sul, e em particular a zona da Caldeira de Tróia,

Cecília V. Ferreira 37

DISCUSSÃO

reconhecido como uma zona preferencial de alimentação para estes golfinhos

(Cândido, 2003), sendo uma zona extremamente rica em macroinvertebrados e

espécies ictícas (Lopes da Cunha, 1994; Cabral, 1999). É de notar que esta frequência

de alimentação apenas inclui a percentagem de scans em que os golfinhos foram

observados a alimentar-se à superfície ou exibiram comportamentos associados à

alimentação. Na eventualidade de um golfinho realizar um mergulho profundo e longo

para procurar uma presa, esse comportamento poderá ser interpretado como

deslocação se não existirem outros comportamentos que indiquem que se trata

efectivamente de um episódio de alimentação, o que poderá conduzir a uma incorrecta

atribuição da actividade dominante em que o animal se encontra. Por outras palavras,

o valor de 19% reportado é, muito provavelmente, uma estimativa por defeito.

Os períodos de baixa-mar e preia-mar foram aqueles em que se registou maior

frequência de alimentação, apesar da análise com o ACTUS2 não ter revelado

diferenças estatisticamente significativas na actividade dos animais em relação à fase

da maré. Este resultado contradiz o observado por Hanson & Defran (1993) na sua

área de estudo na costa da Califórnia, EUA, em que os golfinhos-roazes foram

observados a alimentar-se com maior frequência em períodos de enchente e vazante,

em que as correntes são mais fortes, podendo esta estratégia estar relacionada com o

movimento das suas presas nesse local, sendo várias as espécies que acompanham

as correntes para se movimentarem (Gibson, 2003).

A socialização foi apenas observada na zona da foz do estuário e em 6% dos

scans realizados, e esta baixa frequência é semelhante à registada por Augusto

(2007), que apenas observou comportamentos de socialização em 8% das suas

amostras.

Durante o período de amostragem, foram observados animais em repouso em

apenas 3 scans positivos, e estes foram registados durante o período da manhã (entre

as 8h e as 10h) e apenas em dias de semana. Este padrão pode ser explicado pelo

facto de serem alturas em que o estuário apresenta um menor tráfego marítimo

(principalmente no respeitante a embarcações de recreio), factor passível de perturbar

os golfinhos durante o repouso. Estudos anteriores revelam um padrão semelhante,

com Harzen (1998) a detectar uma frequência muito baixa de repouso nas suas

observações (apenas 0.2%), ao passo que Nunes (2001) e Augusto (2007) não

observaram animais nesta categoria comportamental.

Cecília V. Ferreira 38

DISCUSSÃO

4.3. Movimento

A abundância e o movimento de espécies de cetáceos parecem ser

influenciados principalmente pela disponibilidade temporal e espacial de alimento, que

pode ser secundariamente influenciada por características oceanográficas (Davis

et al., 1998). Será razoável considerar que, tendo em conta as características do

estuário do Sado que o tornam num habitat tão rico do ponto de vista ecológico e tão

importante para os golfinhos-roazes nas suas rotinas diárias, os movimentos destes

animais estarão principalmente relacionados com a eficaz obtenção de alimento, para

além da poupança de energia subjacente a um movimento a favor das correntes, em

que os animais não despendem energia enquanto se movimentam entre áreas. Por

outro lado, as correntes de maré são fenómenos mais ou menos previsíveis no tempo

e no espaço, e os golfinhos poderão aproveitar-se desse facto para maximizarem o

seu esforço de movimentação, regulando assim os seus movimentos de acordo com

as correntes.

As análises estatísticas realizadas neste trabalho mostraram que, durante o

período de amostragem, os golfinhos foram observados mais frequentemente a

deslocar-se a favor da maré (entrada no estuário durante o período enchente da maré

e saída durante a vazante). O número mediano de golfinhos atingiu um máximo

durante o período de maré enchente, à semelhança do observado por Mendes et al.

(2002) em Moray Firth, Escócia. Neste local, os autores caracterizaram uma frente de

maré e detectaram que os golfinhos são mais abundantes durante o período de maré

enchente, distribuindo-se preferencialmente na região frontal da frente de maré,

possivelmente devido à distribuição ou comportamento das suas potenciais presas. De

facto, fenómenos hidrográficos como frentes de maré e eddies apresentam elevada

produtividade biológica (Kimura et al., 1997), e em vários locais do mundo os

golfinhos-roazes distribuem-se mais abundantemente na entrada de estuários e baías

onde existem fortes correntes (e.g. Irvine et al., 1981; Ballance, 1992; Wilson et al.,

1997). No caso do estuário do Sado, que apresenta na sua foz dois vórtices, é

possível que também ocorra uma influência deste tipo de fenómeno no

comportamento dos golfinhos, mas sem conhecer melhor estes fenómenos e a sua

relação com as várias espécies que lá ocorrem, nomeadamente as presas dos

golfinhos e os próprios golfinhos, não é possível tirar qualquer conclusão sobre a sua

importância para os animais. Por outro lado, os movimentos e a distribuição dos

animais podem também estar ligados à batimetria, tendo sido evidenciado em Moray

Firth, Escócia, que a maior ocorrência de comportamentos de alimentação em zonas

com gradientes acentuados pode dever-se, por um lado, à maior concentração de

Cecília V. Ferreira 39

DISCUSSÃO

presas nessas zonas, e por outro à maior facilidade de captura dessas mesmas

presas (Hastie et al., 2004). A foz do estuário do Sado apresenta um acentuado

declive (Martins et al., 2002) que poderá ser importante para os processos de

enriquecimento orgânico e recirculação desta zona de ligação entre o interior do

estuário e as águas costeiras adjacentes.

À semelhança do que se observa noutros locais, os movimentos de entrada e

saída dos golfinhos do estuário do Sado são influenciados principalmente pela maré,

como mostram os resultados da regressão logística realizada. Neste trabalho, os

golfinhos foram observados a entrar no estuário com a enchente em cerca de 65% dos

scans positivos, invertendo-se este padrão durante a vazante, quando os golfinhos

foram observados a abandonar a área de estudo com maior frequência. Este padrão

foi também observado em locais como Sarasota, Florida (Irvine et al., 1981), Cardigan

Bay, West Wales (Gregory & Rowden, 2001) e New South Wales, Austrália (Fury,

2008).

Os movimentos destes golfinhos no estuário do Sado poderão ser cruzados

com os movimentos de algumas das suas presas. As tainhas (família Mugilidae) foram

confirmadas como presas dos golfinhos neste local (dos Santos et al., 2007), sendo,

aliás, um conjunto de espécies universalmente capturadas pelos golfinhos-roazes (e.g.

Irvine et al,. 1981; Shane, 1990a; Díaz López, 2006). No estuário do rio Mira, onde

foram estudadas por Almeida (1996), as tainhas (Liza ramada) movimentaram-se

essencialmente a favor das marés. A verificar-se o mesmo cenário no estuário do

Sado, os movimentos de entrada com a enchente e saída com a vazante dos

golfinhos-roazes poderão estar relacionados com este movimento previsível das

tainhas, o que poderá maximizar a sua captura.

Apesar de menos acentuada, a influência da hora do dia no movimento dos

golfinhos não pode ser negligenciada. De facto, os animais foram avistados a entrar no

estuário com maior frequência durante a manhã (cerca de 70% dos scans positivos),

tendo abandonado a área de estudo ao final da tarde. Este padrão pode estar também

relacionado com o movimento das tainhas, espécie que no estuário do rio Mira

pareceu ter uma maior taxa de consumo de alimento durante o dia, reduzindo durante

a noite (Almeida, 2003). Nestes períodos de alimentação, as tainhas poderão ser mais

facilmente vistas pelos golfinhos devido ao seu movimento junto à superfície, o que

poderá facilitar a sua captura.

O número mediano de golfinhos não apresentou diferenças estatisticamente

significativas em relação à hora do dia. Esta comunidade apresenta um efectivo

Cecília V. Ferreira 40

DISCUSSÃO

populacional bastante reduzido (Augusto et al., in press), o que, aliado ao facto de este

se tratar de um habitat com uma grande abundância de espécies das quais os

golfinhos se alimentam, contribui para uma diminuição da competição entre indivíduos,

favorecendo assim a existência de grupos maiores e de abundância não variável ao

longo do tempo e nas várias actividades (Augusto, 2007).

Por outro lado, ficam por explicar as razões que levam os golfinhos a

abandonar a área de estudo ao final do dia. O estuário do Sado, que oferece

protecção contra potenciais predadores e que no período nocturno se apresenta como

um habitat calmo em termos de ruído subaquático, é assim preterido em relação às

águas costeiras, onde os animais permaneceram à noite, pelo menos aparentemente,

durante o período de amostragem. É relevante assinalar que não há registos de

utilização nocturna regular de estuários por golfinhos residentes, talvez devido às

dificuldades de observação neste período.

4.4. Limitações deste estudo

As observações realizadas a partir de terra para trabalhos desta natureza

podem ser aperfeiçoadas recorrendo ao uso de um teodolito, um equipamento que

permite obter posições geográficas dos animais ou grupos de animais (Würsig et al.,

1991). Neste trabalho não foi possível utilizar esse equipamento nem foi possível fazer

observações com cruzamento de azimutes por vários observadores, pelo que as

localizações aqui apresentadas deverão ser consideradas com alguma reserva, não

devendo ser utilizadas em estudos em que se pretenda estabelecer relações entre a

ocorrência de golfinhos e a distribuição fina de parâmetros ambientais, uma vez que

as localizações terão um erro associado que, no caso desses estudos, não pode ser

negligenciado. Não existem também informações relativas a utilização do habitat

durante o período nocturno nem foi possível recolher dados ao longo das estações do

ano para uma análise sazonal dos movimentos e actividades.

4.5. Sugestões para estudos futuros

Tendo em conta as limitações deste estudo apresentadas anteriormente,

sugere-se que em trabalhos futuros seja incorporado um teodolito nos métodos de

amostragem, de forma a permitir determinar, com maior exactidão, a localização dos

animais e assim abrir portas para novos estudos de utilização do habitat,

Cecília V. Ferreira 41

DISCUSSÃO

Cecília V. Ferreira 42

nomeadamente relacionados com movimentos e utilização do espaço em relação a

variáveis ambientais como a profundidade, o tipo de sedimento, a batimetria, a

temperatura da água e correntes, entre outras.

Sugere-se a continuação deste trabalho de forma a obter dados ao longo de

todo o ano, o que poderá permitir a distinção de padrões de movimento e actividade

em relação à estação do ano. Trata-se de uma variável ambiental que noutros locais

influenciou o comportamento (e.g. Bräger, 1993; Hanson & Defran, 1993) e a utilização

do habitat (Fury, 2008), pelo que seria interessante verificar se no estuário do Sado

ocorre uma influência semelhante e procurar explicar as razões para tal relação. De

forma a melhor compreender os movimentos dos golfinhos no estuário do Sado, seria

muito útil obter informação detalhada sobre os padrões de distribuição e movimento

das suas presas (confirmadas e potenciais) e as suas migrações em relação ao ciclo

de marés. Esta informação poderia então ser cruzada com a dos movimentos dos

golfinhos, permitindo assim a comparação entre as distribuições das presas e dos

seus predadores.

Este tipo de investigação poderá também beneficiar imensamente se for

complementado por metodologias de monitorização acústica passiva, que poderiam

permitir ultrapassar as óbvias limitações causadas pelos períodos nocturno ou de

baixa visibilidade, expandindo no tempo e no espaço a detecção de golfinhos nesta

zona de entrada e saída do estuário.

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ANEXO

FICHA DE AMOSTRAGEM UTILIZADA PARA A RECOLHA DE DADOS.

I - Ficha de amostragem utilizada para a recolha de dados.

DATA BM METEO OBSERVADORES INÍCIO ESFORÇO PM AVISTAMENTOS

FIM

HORA ESTADO DA MARÉ QUADR. LOCAL

DIRECÇÃO APARENTE DE DESLOCAÇÃO

TAMANHO GRUPO

ACTIV. DOMINANTE APARENTE

PRESENÇA DE EMBARCAÇÕES OBSERVAÇÕES (BEAUFORT,

COMPORTAMENTO, ...) NÚMERO TIPO

:

:

:

:

:

:

:

:

:

:

Cecília V. Ferreira 54