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UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
Tecnologias e Competências dos Professores do Ensino Básico para o séc. XXI
Ana Isabel Ricardo Gonçalves Pedro
DOUTORAMENTO EM EDUCAÇÃO
TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
NA EDUCAÇÃO
2015
UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
Tecnologias e Competências dos Professores do Ensino Básico para o séc. XXI
Ana Isabel Ricardo Gonçalves Pedro
Este estudo foi financiado pela Fundação para Ciência e Tecnologia
(SFRH/BD/76608/2011)
Tese orientada pelo Professor Doutor João Filipe Lacerda Matos, especialmente
elaborada para a obtenção do grau de doutor em Tecnologias de Informação e
Comunicação na Educação
2015
Retratar em pouco mais duma página todas as pessoas que fazem parte deste percurso
é um trabalho exigente, árduo e, como a construção deste relato de investigação, desafiante.
Estas páginas, mais do que minhas, são também vossas.
Ao Professor Doutor João Filipe Matos, orientador deste trabalho, por todo o apoio,
inspiração e confiança inabaláveis. Mas acima de tudo, por acreditar sempre, em mim, no
trabalho e na educação.
À Professora Doutora Neuza Pedro, que iniciou este percurso comigo há alguns anos
num outro local, pelo seu otimismo e incentivo constantes. E por se ter transformado durante
estes anos numa amiga.
Ambos são um exemplo diário daquilo que quero ser.
À equipa do C2Ti, os que estão e os que estiveram – em especial ao Pedro, ao João,
ao Nuno e ao Rui - que suportaram por tantas vezes o trabalho sozinhos; que são incapazes de
dizer não a todas as minhas ideias desafiantes, que lhes trazem menos descanso e uma maior
preocupação; por tomarem conta de mim todos os dias e em tantas circunstâncias; por não me
deixarem desistir, mesmo nos momentos mais críticos; mas acima de tudo, pela amizade
construída. O vosso apoio, em todas as suas formas, foi fundamental para concluir esta
investigação e para me manter sã e feliz. Novos projetos esperam-nos.
À Luana e à Susana, as minhas outras Anas por vezes perdidas em linguagens
diferentes, que partilharam (e hão-de partilhar) noites e dias de conversa sobre educação,
vida, felicidade e desafios.
Ao Simão, à Eurídice, à Rita, à Marina, à Ana, à Teresa, ao Pedro e ao Luís, que
desde os catorze anos dividem sonhos, receios, ambições, desejos, pondo-me constantemente
em causa.
Ao Pedro, que deu um novo e amado significado à expressão Oh! Ana.
À Ana, à Carla e à Teresa, uma palavra especial, as três estão em mim e em tudo
aquilo que sou e faço.
Aos meus tios, que desempenharam um papel essencial na minha formação e
educação.
Em particular à minha tia Francelina, que me mostrou que era possível ensinar matemática
com o Monopólio e me mostrou desde cedo como educar.
À Lita, a minha irmã mais velha, por tudo.
Ao Ricardo, à Carolina, à Filipa, ao Santiago e ao Afonso, por me permitirem
partilhar com eles esta curiosidade infantil.
Por último, à mãe, ao pai e à avó, porque cada vez que me vejo e me ouço vos
reconheço. Cada um de vocês está totalmente presente no que sou.
“Todo o equilíbrio é determinado por um desequilíbrio. Esta é a fonte dos progressos
no desenvolvimento dos conhecimentos e o motor da investigação.”
Piaget, 1977
i
Índice
Resumo ...................................................................................................................................... v
Abstract ..................................................................................................................................... vi
Capítulo I – Introdução .............................................................................................................. 1
1.1 Apresentação e contextualização............................................................................... 2
1.2 Estrutura Interna da Investigação .............................................................................. 7
Capítulo 2 - Enquadramento Teórico ....................................................................................... 10
2.1 Abordagem e apresentação do conceito de Competência ....................................... 11
2.1.1 Competências profissionais docentes. ..................................................................... 20
2.1.2 Competências para o Século XXI. .......................................................................... 31
2.2 Desenvolvimento Profissional docente: Delimitação do constructo ....................... 39
2.2.1 O desenvolvimento profissional como um processo contínuo. ............................... 40
2.2.2 Características do Desenvolvimento Profissional. .................................................. 46
2.2.3 Contributos do Modelo Ecológico para o Desenvolvimento Profissional Docente.
49
2.3 Competências do século XXI e Desenvolvimento Profissional docente ................ 54
Capítulo 3 - Problema, questões de investigação e objetivos .................................................. 58
3.1 Objetivos de Investigação ....................................................................................... 61
Capítulo 4 – Metodologia ........................................................................................................ 66
Abordagem metodológica .................................................................................................... 67
4.1 Participantes ............................................................................................................ 76
4.1.1 Professores do 2º e 3º ciclo do Ensino Básico. ....................................................... 77
4.1.2 Stakeholders. ........................................................................................................... 82
4.2 Apresentação dos Instrumentos ............................................................................... 83
4.2.1. Escala de perceção de competências docentes para o século XXI. ....................... 85
4.2.1.1 processo de validação do instrumento. ............................................. 92
4.2.2 Guião de entrevista. ................................................................................................ 96
4.2.2.1. Processo de validação do instrumento............................................... 99
4.3 Procedimentos de recolha e análise de dados ........................................................ 101
Capítulo 5 – Análise e Discussão de Resultados ................................................................... 106
ii
5.1 Dimensões organizadoras da docência .................................................................. 108
5.2 Competências docentes para o século XXI ........................................................... 120
5.2.1. Dimensão Pedagógica. ....................................................................................... 122
5.2.2. Dimensão Profissional. ...................................................................................... 127
5.2.3. Dimensão Tecnológica. ...................................................................................... 134
5.2.4. Dimensão Relações Interpessoais e Institucionais. ............................................ 140
5.3 Referencial de competências docentes para o século XXI .................................... 146
Capítulo 6 – Conclusões ........................................................................................................ 156
Limitações da investigação e recomendações para trabalhos futuros ................................ 165
Referências Bibliográficas ..................................................................................................... 170
Lista de anexos ....................................................................................................................... 194
iii
Índice de figuras
Figura 1: Componentes da Competência ................................................................................ 18
Figura 2: Análise de Frameworks de Competências para o século XXI (Pedro et al. 2011) .. 35
Figura 3: Unesco ICT Framework for Teachers (2011) ......................................................... 37
Figura 4: Modelo Ecológico do Desenvolvimento Humano de Bronfenbrenner.................... 51
Figura 5: Relação entre questões de investigação e os campos teóricos e empíricos do estudo
.................................................................................................................................................. 76
Figura 6: Relação dos dados a recolher na população com objetivo central da investigação . 77
Figura 7: Distribuição de Agrupamentos por Direção Regional de Educação (MEC, 2013) . 78
Figura 8: Distribuição dos participantes por grupo etário ....................................................... 79
Figura 9: Distribuição dos participantes por grupo etário ....................................................... 80
Figura 10: Distribuição dos participantes por Grupo Disciplinar ........................................... 81
Figura 11: Valores Médios da Dimensão Pedagógica na escala de perceção de competências
docentes para o século XXI ................................................................................................... 122
Figura 12: Valores Médios da Dimensão Profissional na escala de perceção de competências
docentes para o século XXI ................................................................................................... 128
Figura 13: Valores Médios da Dimensão Tecnológica na Escala de perceção de competências
docentes para o século XXI ................................................................................................... 135
Figura 14: Valores Médios da Dimensão Relações Interpessoais e Institucionais ............... 141
Figura 15: Multidimensionalidade da docência e Desenvolvimento Profissional Docente .. 148
Figura 16: Referencial de competências para o século XXI ................................................. 151
Figura 17: TPACK Framework ............................................................................................. 160
iv
Índice de tabelas
Tabela 1: Referencial de Competências ................................................................................... 25
Tabela 2: Organização Design Metodológico Misto (adaptado de Creswell, 2010) .............. 73
Tabela 3: Distribuição dos participantes por Anos de Docência ............................................ 82
Tabela 4: Referenciais no domínio das XXI Century Skills ..................................................... 88
Tabela 5: Organização de itens por Dimensão........................................................................ 91
Tabela 6: Consistência interna da escala de perceção de competências (n=30) .................... 94
Tabela 7: Análise da Consistência interna das dimensões da escala de perceção de
competências ............................................................................................................................ 96
Tabela 8: Estrutura de guião de entrevista utilizado ............................................................. 100
Tabela 9: Análise da Consistência interna das dimensões da escala de perceção de
competências (n=2688) ......................................................................................................... 109
Tabela 10: Médias e desvios-padrão da escala de perceção de competências docentes para o
século XXI (n= 2688) ............................................................................................................. 110
Tabela 11: Categorização dos domínios organizadores da docência ................................... 113
Tabela 12: Presença de resposta dos Stakeholders para o domínio profissional ................. 114
Tabela 13: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Pedagógico ................ 115
Tabela 14: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Tecnológico ................ 117
Tabela 15: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Relações Interpessoais e
Institucionais .......................................................................................................................... 117
Tabela 16: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Pedagógico) 123
Tabela 17: Presença das competências docentes para o século XXI .................................... 125
Tabela 18: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Profissional) 129
Tabela 19: Presença das competências docentes para o século XXI .................................... 131
Tabela 20: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Tecnológico) 136
Tabela 21: Presença das competências docentes para o século XXI .................................... 138
Tabela 22: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Relações
Interpessoais e Institucionais) ............................................................................................... 142
Tabela 23: Presença das competências docentes para o século XXI .................................... 144
v
Resumo
Enquadrada no domínio de especialidade das tecnologias de informação e comunicação na
educação, esta investigação pretendeu produzir conhecimento sobre o desenvolvimento
profissional docente através da formulação de um quadro de referência de competências
técnico-pedagógicas necessárias ao professor do ensino básico do séc. XXI. Para isso,
aprofundou-se no campo teórico o conceito de competências (operacionalizadas em
competências docentes e competências para o século XXI), relacionando-o com o
desenvolvimento profissional docente. Seguindo uma abordagem metodológica mista,
estruturada a partir do paradigma pragmático, recolheram-se dados (i) aplicando a escala de
perceção de competências docentes para o século XXI a 2688 professores do 2º e 3º ciclo do
Ensino Básico e (ii) entrevistando cinco stakeholders do sistema educativo – representantes
de sindicato de professores, instituições de ensino superior formadoras de professores,
Ministério da Educação e Ciência e representantes de associações de pais. Os resultados
foram posteriormente cruzados, produzindo-se assim o referencial de competências para o
século XXI para o professor do 2º e 3º ciclo do Ensino Básico composto por 37
competências, organizadas em torno de quatro dimensões (pedagógica, profissional,
tecnológica e de relações interpessoais e institucionais). Por fim, procurou-se produzir
orientações para a utilização do referencial de competências como instrumento norteador de
desenvolvimento profissional docente.
Palavras-chave: Competências para o séc. XXI, desenvolvimento profissional docente,
professores de Ensino Básico, tecnologias.
vi
Abstract
Set within the specialized domain of information and communication technologies in
education, this investigation aimed to produce knowledge on the professional development of
educators by formulating a reference framework for the technical and pedagogical skills
needed by basic education teachers in the 21st century. In order to do so, we studied in depth
the theoretical viewpoint of the concept of competencies (defined into teaching competencies
and competencies for the 21st century), relating it to teachers’ professional development.
Following a mixed methodological approach, based on a pragmatic paradigm, data was
gathered (i) applying the scale of perception of teaching competencies for the 21st century to
2688 teachers of the 2nd and 3rd cycles of Basic Education and (ii) interviewing five
stakeholders of the educational system – union representatives, higher education institutions
of teacher training, the Ministry of Education and Science and representatives of Parents’
Associations. Results were later crossed and thus the reference framework for 21st century
competencies for teachers of the 2nd and 3rd cycle of basic Education was formed, composed
of 37 competencies organized around four dimensions: pedagogical; professional;
technological; interpersonal and institutional relations. Finally, we aimed to create guidelines
for the use of the reference framework of competencies as a tool for the professional
development of teachers
Keywords: Competencies for the 21st century, teachers professional development, Basic
Education teachers, technologies.
1
Capítulo I – Introdução
2
1.1 Apresentação e contextualização
Inserindo-se no domínio de especialidade das tecnologias de informação e
comunicação na educação, esta investigação tem como objetivo central a produção de
conhecimento sobre o desenvolvimento profissional docente, através da formulação de
um quadro de referência de competências necessárias ao professor do ensino básico do
séc. XXI, assumindo deste modo uma forte componente prospetiva.
Durante as últimas décadas, a atividade docente tem passado por modificações
significativas que têm acompanhado e inspirado as alterações verificadas no sistema
educativo demonstrando a relevância da interação mútua entre o contexto
socioeconómico, o sistema educativo e os seus atores (Nóvoa, 2003). Estas alterações
foram referidas igualmente por Jesus (2000) quando este salientou a necessidade de
pensar a docência simultaneamente a um nível macro e a um nível micro, focando quer
os aspetos relacionados com o contexto sociopolítico, social e cultural (nível macro),
quer os relativos às condições de trabalho, ao clima de sala de aula ou às alterações
curriculares (nível micro).
Em simultâneo com aquelas alterações, tem-se assistido a um desenvolvimento
crescente das tecnologias de informação e comunicação e do seu papel nas mais
variadas atividades sociais. Esta realidade tem sido objeto de estudo em áreas tão
diversas quanto a Sociologia, a Filosofia, a Psicologia ou as Ciências da Educação. A
este propósito, autores como Giddens (2002) e Castells (2002) têm vindo a sublinhar a
importância dos novos paradigmas de convivência social emergentes da crescente
presença das tecnologias nas práticas sociais, indo assim ao encontro de uma
necessidade de repensar o ensino e o desenvolvimento de competências profissionais
docentes (Niemi, 2002).
3
Nesta problemática está também presente a ideia de que se têm vindo a vincar as
diferenças nas linguagens usadas por professores por um lado e alunos por outro. Não
apenas têm reportórios distintos, derivados das diferenças entre as suas práticas, dos
diferentes contextos histórico-sociais e das suas comunidades de pertença (Matos &
Pedro, 2011) mas também organizam a sua experiência de formas muito distintas
identificando-se nesses processos a presença e o papel das tecnologias digitais. Esta
ideia ecoa naquilo que Prensky (2001) referiu há quase quinze anos quando, ao alertar
para a necessidade emergente de reequacionar os processos de organizar o ensino,
considerava que os 'imigrantes digitais' (em que se poderia incluir os professores)
estariam a ensinar os 'nativos digitais' (os alunos) com um enquadramento contextual
desadequado uma vez que estaria baseado em pressupostos, experiências e práticas de
natureza muito distinta. Encontra-se aqui também convergência com o que nos indicam
os resultados produzidos por Pedro, Wunch, Pedro e Matos (2010) que mostraram que
os alunos veem como necessário considerar, na formação docente a eleição de novas
ferramentas, novas competências e novos conteúdos.
Aquilo que é culturalmente distintivo nas práticas de docentes (adultos) e alunos
(crianças e jovens) resulta da imersão natural destes últimos em ambientes povoados
por tecnologias de informação e comunicação, como as tecnologias móveis, a difusão de
realidade aumentada ou a robótica educativa. Estes alunos não só nasceram num mundo
saturado de media e de tecnologia digital, estando sempre imersos em tecnologia digital
e sendo-lhes absolutamente natural recorrer ao telemóvel em qualquer situação, usar o
iPod ou mp3, Playstations ou plataformas Wii, não saindo com os pais sem levar a sua
DS’s ou PSP e utilizar o Twitter, o Facebook ou o Hi5 (Pedro et al., 2010). Uma
implicação importante da situação referida é que, ao assumir-se uma clara diferenciação
entre as práticas escolares e as não escolares (quer da parte dos alunos, quer da parte dos
4
professores) torna-se fundamental focarmo-nos na problemática do desenvolvimento
das competências necessárias para atuar nos contextos diversificados em que se
constituiu o mundo de hoje.
No quadro da problemática apresentada, identificou-se como problema, neste
estudo, a forma como as alterações e mudanças nas práticas sociais num mundo
fortemente tecnológico se relacionam com as competências docentes (com caráter
transversal), dentro e fora da sala de aula. A análise deste problema procura
contribuir para o desenvolvimento de uma nova abordagem ao conceito de profissão
docente à luz do desenvolvimento tecnológico atual numa lógica prospetiva, obrigando
a refletir sobre as necessidades decorrentes para este século, indo assim de encontro ao
salientado pela OECD (2011) quando refere a necessidade das escolas prepararem os
alunos para profissões ainda não criadas, tecnologias ainda não inventadas e problemas
ainda não formulados.
Entende-se ainda que, para criar condições que permitam uma reflexão
consciente e ponderada sobre o sistema educativo e a consequente intervenção no
mesmo, é essencial desenvolver uma compreensão da profissão docente como pólo
fundamental de qualquer processo educativo, reconhecendo e analisando as
modificações que esta profissão sofreu a par das mudanças ocorridas no sistema
educativo.
Efetivamente assiste-se a uma crescente diversidade nos papéis que são
atribuídos às instituições escolares, nomeadamente aos seus profissionais. Assume-se
com frequência que a escola não é apenas um local de ensino, mas também um local de
desenvolvimento de variadas competências psicossociais, culturais, educativas e
lúdicas. Esta situação tem trazido alterações significativas às formas de intervenção e de
participação dos atores envolvidos no processo educativo: os alunos são chamados a
5
passar cada vez mais tempo no espaço escolar (esgotando muitas vezes a sua motivação
para estar nele), enquanto os professores ensinam conteúdos científicos, educam social,
afetiva e emocionalmente os alunos, compensando frequentemente o lugar contentor e
estruturante da família. Factos como estes contribuem para um aumento significativo da
exigência de competências e conhecimentos que não fizeram parte da formação inicial
dos docentes e que, dificilmente, estes conseguem encontrar na formação contínua.
Constata-se, assim, que a sociedade atual ao trazer um conjunto de exigências e
alterações potencia a modificação da visão da docência quer pela sociedade, quer pelos
próprios intervenientes no processo.
Diversos relatórios da Comissão Europeia já em 1996 alertaram para a
obrigatoriedade de repensar o processo ensino-aprendizagem. Considerava-se que o
professor não podia ser encarado como o foco principal desse processo, i.e. como o
detentor e transmissor de conhecimento, devendo ser encarado por outro lado como
mediador da aquisição de competências por parte dos alunos.
Consequentemente, se reconhecemos que têm ocorrido mudanças e
transformações notáveis decorrentes do uso das tecnologias digitais e de alterações
sociais numa variedade de atividades relacionadas com o conhecimento e com as formas
como são encarados os problemas diários, teremos do mesmo modo que sugerir que
essas alterações tenham eco nas diferentes práticas escolares, dentro e fora da sala de
aula (Matos & Pedro, 2011).
Torna-se necessário deste modo contribuir para o repensar de uma conceção da
profissão docente, assente em novas dimensões tais como trabalho interdisciplinar e em
equipa, em competências como a responsabilidade, a autonomia pessoal e profissional, a
capacidade de inovação ou a criatividade. Ao refletir sobre novas possibilidades e novas
conceções, pensando como é que o conhecimento é gerado e aplicado, estaremos por
6
consequência a pensar nas necessidades decorrentes para este século, como salientado
por Schleicher (2011),
A generation ago, teachers could expect that what they taught would last their
students lifetime. Today, because of rapid economic and social change, schools
have to prepare students for jobs that have not yet been created, technologies
that have not been invented and problems that we don’t yet know will arise
(par.7).
Estas conceções vão igualmente ao encontro de perspetivas construtivistas da
aprendizagem e desenvolvimento humano, através da ideia de que o sucesso
profissional não se situa na reprodução de conhecimento, mas sim na capacidade de
adaptação do conhecimento adquirido a novas situações, que muitas vezes ainda não
foram pensadas.
Importa salientar, no entanto, que o desenvolvimento das tecnologias acelerou a
presença e a partilha de informação e comunicação, tornando desse modo fundamental
que em âmbito educativo ocorram as transformações pedagógicas, físicas e técnicas
necessárias para que haja uma adequação às alterações sociais (Muñoz, 2003).
No final do séc. XX diferentes relatórios (como o da OCDE, 1998) referiam que
o ensino de qualidade era visto como o objetivo primordial da educação, tendo de ter em
consideração competências internas e externas dos e aos sujeitos, “learners are expected
to build their own learning environments, using traditional information sources and
learning materials and modern communication and information technology.” (p.19).
Face a esta contextualização tornou-se evidente a importância da reflexão sobre um
conjunto de competências cruciais que promovessem e garantissem que os estudantes se
encontrassem aptos a obter sucesso pessoal, profissional, cultural e relacional no séc.
XXI.
7
Do mesmo modo, torna-se necessário assegurar que os professores desenvolvem
competências que garantam igualmente a adequação a trabalhar neste contexto. Isso
implica percecionar a docência como sendo caracterizada por vários fatores externos e
internos ao professor, nomeadamente critérios específicos de progressão na carreira,
multiplicidade de papéis desempenhados, alterações políticas e sociais constantes
(Esteves, 2009).
O foco desta investigação residiu assim no problema desenhado, problema que
emergiu do facto de se considerar que o conjunto de alterações vivenciadas na
sociedade durante os últimos anos tem sido um fator fulcral na exigência de novas
competências aos alunos, implicando consequentemente que, do mesmo modo, os
professores necessitem de desenvolver eles próprios um conjunto de novas
competências. Este estudo visou, desta forma, tecer contribuições para perspetivar o
desenvolvimento docente no século XXI, procurando-se para isso entender
competências como processos cognitivos que se mobilizam em situações específicas,
refletindo sobre a sua adequação às várias situações, ponderando igualmente sobre o
processo de desenvolvimento profissional do professor.
1.2 Estrutura Interna da Investigação
Contextualizando e salientando a pertinência da investigação, apresenta-se de
seguida a estrutura que sustenta esta investigação, procurando assim definir o percurso
desenvolvido na elaboração e construção deste estudo.
Composto por sete capítulos principais, este relatório inicia-se com o capítulo de
enquadramento teórico (capítulo 2) onde apresentamos conceitos em análise,
8
produzindo possíveis relações entre esses constructos, sustentando deste modo a
investigação desenvolvida, nomeadamente no que concerne ao problema, aos objetivos
e às questões de investigação, que por sua vez orientaram todo o processo investigativo.
Este capítulo sustenta-se fundamentalmente em torno de dois constructos,
Competências e Desenvolvimento Profissional Docente, visando suportar e orientar
teórica e conceptualmente a presente investigação. Estes conceitos são por sua vez
desenvolvidos de forma mais particular em Competências Docentes e Competências
para o século XXI, obedecendo assim à especificação da temática em estudo.
Abordar-se-á igualmente as relações entre estes constructos, procurando deste
modo clarificar possíveis relações entre conceitos e clarificando o papel que estes têm
no desenvolvimento do problema e das questões de investigação norteadoras do estudo
referidas no terceiro capítulo. Este capítulo organiza-se explicitando de que modos se
abordarão os objetivos de investigação, remetendo deste modo para a sua
operacionalização.
O capítulo seguinte refere-se à metodologia, salientando a abordagem
metodológica subjacente ao desenho do estudo, caraterizando a população a investigar e
os instrumentos desenvolvidos. Apresenta-se quer a ‘Escala de Perceção de
Competências Docentes para o Séc. XXI’, nomeadamente a sua construção e os
processos de pré-testagem subjacentes, quer por parte de especialistas quer por análise
estatística, apresentando os valores relativos à qualidade métrica; quer o Guião de
Entrevista a Stakeholders e respetivos processos de pré-testagem e validação. Integram-
se ainda informações relativas aos procedimentos de recolha de dados, aos processos de
amostragem realizados e aos métodos de análise usados.
No quinto capítulo apresenta-se detalhadamente os diferentes procedimentos de
análise de dados utilizados. Assente numa abordagem de investigação mista, os dados
9
recolhidos foram analisados concomitantemente à luz da teoria subjacente. Assim,
indicam-se os vários procedimentos de análise estatística a que os dados quantitativos
foram sujeitos bem como os respetivos resultados e simultaneamente apresenta-se os
dados qualitativos e a respetiva análise. De seguida, discute-se os resultados obtidos
relacionando-os com as questões de investigação delineadas. Esta discussão sustenta a
resposta ao problema norteador da investigação apresentando-se, como produto
emergente do estudo, o referencial de competências para o séc. XXI do professor do
Ensino Básico.
Por último, no sexto capítulo aborda-se as conclusões e implicações dos
resultados encontrados e do referencial de competências desenvolvido para o panorama
educativo português, articulando e integrando todos os aspetos desenvolvidos ao longo
da investigação e sinalizando igualmente as principais conclusões e implicações do
estudo. Neste mesmo capítulo são identificadas limitações à investigação, perspetivando
orientações para investigações futuras.
Finalmente é feita a apresentação das referências bibliográficas utilizadas para
suportar teórica e metodologicamente o estudo e dos anexos referidos nos diferentes
momentos do trabalho, nomeadamente a escala e o guião de entrevista utilizados e os
outputs produzidos no processo de testagem dos instrumentos e de análise de dados.
10
Capítulo 2 - Enquadramento Teórico
11
2.1 Abordagem e apresentação do conceito de Competência
Como em outras áreas sociais, a educação vive atualmente um forte período de
transformação e mudança, mas também de incerteza. Estas mudanças na área da
educação – decorrentes quer de variadas alterações da sociedade, quer de uma maior e
mais incidente utilização das tecnologias – têm levado à necessidade de encarar a
profissão docente de um ponto de vista mais abrangente do que no passado, refletindo
sobre a sua profissionalidade, os seus saberes e as suas competências.
Nóvoa em 2009 salienta a necessidade imediata de pensar a profissão docente
sobre o ponto de vista da sua profissionalidade, estabelecendo assim relações entre as
diferentes dimensões pessoais e profissionais dos professores. Estas dimensões
abrangem cinco fatores essenciais à identidade do docente, nomeadamente:
(i) o conhecimento – o trabalho docente consiste na aquisição,
construção e desenvolvimento de práticas pedagógicas e didáticas que
conduzam e levem os alunos a aprender;
(ii) a cultura profissional – no desenvolvimento da sua profissão, o
docente aprende outros saberes para além do pedagógico e do didático,
compreendendo deste modo as diferentes características da docência,
processo que ocorre simultaneamente à apreensão da cultura escolar
onde está inserido;
(iii) o tato pedagógico – ensinar implica uma relação intrínseca entre as
dimensões profissionais da docência e as dimensões das relações
pessoais dos sujeitos, levando assim à construção do conhecimento;
(iv) o trabalho em equipa – procurando potenciar o exercício profissional
docente, a organização dos professores em torno de comunidades de
12
prática reforça a colaboração e a partilha fundamentais ao processo de
ensino-aprendizagem;
(v) o compromisso social – à escola e ao professor é exigida a
compreensão da realidade social em que os alunos e a restante
comunidade educativa se inserem, indo desta forma para além das
fronteiras escolares. Esta assunção da pluridimensionalidade da docência
é fundamental para perspetivar a profissão sobre diferentes domínios e à
luz das alterações sociais.
Estamos atualmente perante uma realidade em Portugal em que os professores
são confrontados com novas tarefas, maior responsabilidade, necessidade de maior
profissionalismo e de domínio de uma maior diversidade de competências do que no
passado (Conceição & Sousa, 2012), o que leva a uma reflexão sobre as competências
necessárias ao desenvolvimento da profissão docente.
O conceito de competência tem sido objeto de conceções diversas, diferindo a
sua definição consoante os autores que o utilizam nos seus trabalhos (Barnés, 2008). A
este conceito, considerado complexo, têm sido associadas diferentes definições, muitas
vezes quase sinónimas de skill, atributo, aptidão, qualificação ou capacidade. Boterf
(2005) refere, por exemplo, que o conceito de competência foi por vezes associado, de
forma redutora, à utilização de saberes num dado contexto, a um conjunto de
capacidades ou a características dos sujeitos.
Em paralelo, assistimos a uma multiplicidade de transformações, desenvolvidas
no quadro de novos paradigmas de convivência social emergentes da crescente presença
das tecnologias no mundo social (Giddens, 2002; Castells, 2002) e de alterações sociais,
culturais, físicas ou económicas variadas. Torna-se por isso necessário analisar e
13
repensar o conceito de competência visto terem surgido novos desafios aos sujeitos e à
sociedade.
O debate sobre a definição do conceito de competência considera inicialmente a
necessidade de explicitar este constructo, especificando desde logo a divergência entre
competência e competências. Esta aparentemente simples distinção comporta diferentes
linhas conceptuais e consequentemente diferentes expectativas quanto ao significado
destas terminologias. Eraut (1997) situa essa distinção entre competência e
competências na capacidade do sujeito em elaborar e desenvolver atitudes face a uma
dada situação versus os conhecimentos que cada um tem sobre determinado objeto, “the
term competence, which is given a generic or holisitc meaning and refers to a person
overaal capacity, and the term competency is (…) simply to describe any piece of
knowledge or skill that might be constructer as relevant” (p. 179).
Esta mesma visão é partilhada por Ponte, Januário, Ferreira e Cruz (2000) que
referem que “competência no singular remete para um critério de qualidade. O professor
competente é aquele que tem as condições necessárias para que no desempenho
profissional corresponda às expectativas” (p.8). Esta distinção, baseada numa
diferenciação salientada por Alarcão (1998), foca igualmente que a competência
remeterá sempre para um nível holístico, isto é, uma visão integral e geral da situação
(difícil de aferir devido ao seu caráter). Distintamente, a ideia de competências, por
serem mais particularizadas e mais facilmente observáveis, remete para um nível
atomista.
A noção de competência profissional educativa do professor foi olhada, num
passado não muito distante, como um conjunto de microcompetências
acumuláveis, válidas por si só, independentemente do contexto do seu
desempenho e suscetíveis de, uma vez aprendidas, possuírem a capacidade de
14
transferência quase automática para a vida profissional. Este conceito reflete
uma perspetiva atomística, analítica, tecnicista e descontextualizada do
conhecimento e da atuação que teve a sua expressão em movimentos de raiz
positivista e que, em formação de professores, conheceu o seu ponto culminante
na convicção de que a formação por competências, com base em objetivos
operacionais, seria a resposta para a formação de professores competentes e
eficazes no seu desempenho (Alarcão, 1998, p. 48).
Deste modo, importa clarificar qual o entendimento do conceito de competência
que é assumido na presente investigação, definindo-o por si e em comparação com
conceitos referidos anteriormente, analisando-o a propósito da profissão docente e da
formação necessária a essa profissão (Esteves, 2009).
Perrenoud (1998), por exemplo, considera necessário distinguir competência de
capacidade, de forma a clarificar os conceitos. Para este autor, por capacidades entende-
se as operações e/ou atividades que não têm em consideração a especificidade da
situação, sendo por isso independentes do contexto. Relativamente às competências,
estas implicam a mobilização e integração de recursos cognitivos diversos, procurando
responder a situações concretas. Deste modo, as capacidades serão elementos
constitutivos das competências. Esta definição vai de encontro à de autores como Rué e
Martínez (2005) que entendem competência como a faculdade de mobilizar um
conjunto de recursos cognitivos e práticos – como conhecimentos, motivações, valores,
atitudes ou emoções – para solucionar pertinente e eficazmente uma situação ou
conjunto de situações, não podendo ser deste modo independente do contexto dos
intervenientes.
Serramona (2007) salienta, na mesma medida, que as competências, embora
associadas por vezes a diferentes conceções como capacidades ou habilidades, têm a sua
15
definição assente na síntese de conhecimentos atitudinais e comportamentais que
permitem atuar perante uma dada situação.
Se considerarmos a amplitude conceptual daquele constructo, compreendemos a
sua diferente utilização na investigação educacional. Optaremos desta forma pelo
entendimento de competência como a combinação de “habilidades práticas e cognitivas,
conhecimentos – conscientes e implícitos – motivações, valores éticos, visões, emoções
e outros aspetos de comportamento social que se combinam para influenciar as decisões
individuais e ações na vida profissional e pessoal” (Braslavsky, 2005, p.96).
A competência não será assim um estado, mas sim um processo contínuo
passível de alterações ao longo do desenvolvimento de cada sujeito, implicando deste
modo a capacidade de mobilização do saber, dentro de um dado contexto. No quadro do
reconhecimento dos fatores característicos de uma determinada situação, são colocados
em ação pelo indivíduo recursos diversificados tais como as operações de raciocínio, os
diferentes conhecimentos específicos, as memórias, as avaliações, as capacidades
relacionais ou os vários esquemas comportamentais (Tardif, 1996). Estamos
consequentemente perante a competência quando somos capazes de mobilizar de forma
adequada e consciente diferentes conhecimentos, selecionando-os e integrando-os face a
uma situação específica, entendendo os seus fatores contextuais.
Pode considerar-se que a delimitação daquele constructo situa a sua definição
essencialmente entre duas perspetivas diferenciadas: a atomística – mais
concomitantemente associada a uma perspetiva behaviorista, assentando num conjunto
de comportamentos a observar – e a holística, com cariz sociocognitivista, situando-se
no modo de realizar adequadamente uma dada ação, de responder a uma solicitação ou
resolver um problema (Costa, 2008). Ainda segundo este autor, a competência ao ser
individual e contextualizada, mas eminentemente formada e expressa no coletivo, sendo
16
assim “ligada a situações concretas nas quais se possa demonstrar, potenciando a sua
utilização noutros contextos pode melhorar-se e desenvolver-se num processo de
progressão contínua, dependente da participação ativa, reflexiva e autorregulada do
sujeito” (p. 56).
Esta visão de competência aproxima-se consequentemente das teorias
construtivistas que salientam que “qualquer adaptação intelectual inclui, em todos os
casos, um elemento de assimilação, ou seja de estruturação, através da incorporação da
realidade exterior em formas devidas à atividade do sujeito.” (Piaget, 1983, p.11). As
competências não serão assim saberes em si mesmos (Perrenoud, 2000), não podendo
ser entendidas se afastadas do contexto onde o professor está inserido. Torna-se
necessário, para que haja desenvolvimento, que se mobilizem e integrem recursos
existentes, através de operações mentais que permitam determinar e realizar uma dada
ação adaptada à situação concreta seguindo, pois, um processo de desenvolvimento
articulado em etapas de assimilação – acomodação – adaptação – equilibração (Piaget,
1983).
Ao considerarmos que o desenvolvimento ocorre através dos processos de
assimilação e de acomodação, cada sujeito assimila os inputs dados através do meio aos
esquemas mentais já existentes, que por sua vez os acomodam ao meio envolvente,
permitindo que neste processo dual contínuo ocorra desenvolvimento. A competência,
ao ser característica duma dada situação e mobilizando diferentes saberes, ocorre neste
continuum. Dá-se assim um processo adaptativo que acontece quando há transformação
do conhecimento já existente - face a uma determinada situação, cada pessoa perceciona
a realidade, coordenando esses saberes com os que já possui, que ao serem
transformados originam desenvolvimento. A aplicação do conhecimento e o colocar da
17
competência existente em ação, situam-se consequentemente ao nível da interação entre
o sujeito e o objeto, não podendo ser isolados do meio em que o indivíduo se encontra.
O conceito de competência não comporta, deste modo, um sentido meramente
tecnicista, como é salientado por autores como Alonso, Imaginário, Magalhães, Barros,
Castro, Osório & Sequeira (2002) que referem que este constructo aponta para a
“capacidade de agir e reagir de forma apropriada perante situações mais ou menos
complexas, através da mobilização e combinação de conhecimentos, atitudes e
procedimentos pessoais, num contexto determinado, significativo e informado por
valores” (p.9).
Boterf (2005) discute igualmente o valor da competência situando a capacidade
de integração num dado contexto concreto: “não há competência senão posta em ato, a
competência só pode ser competência em situação. Não preexiste ao acontecimento ou à
situação. Exerce-se num contexto particular. Toda a competência é finalizada (ou
funcional) e contextualizada” (p.51-52), existindo quando é demonstrada e quando o
sujeito tem a capacidade de colocar em ação as suas aptidões ou habilidades numa
atividade específica. A competência ocorre e é constituída, deste modo, na relação
dinâmica entre três vértices indissociáveis de um triângulo em que se combina três
saberes fundamentais: o saber agir, o querer agir e o poder agir.
18
Figura 1: Componentes da Competência
(Boterf, 2005)
Perante uma determinada situação ou acontecimento, cada sujeito estrutura
articuladamente os três saberes, remetendo para a sua competência nesse acontecimento
contextualizado. Assim, em situação é necessário saber agir, combinando e mobilizando
os recursos pertinentes à mesma, a partir da motivação pessoal para lidar com essa
mesma situação – isto é, o querer agir – sempre no quadro daquilo que o contexto
permite – o poder agir.
Estas definições vão igualmente ao encontro das diversas definições de
competência nos normativos portugueses e internacionais sobre educação,
nomeadamente no currículo do ensino básico e secundário, na Lei de Bases do Sistema
Educativo, na definição do perfil geral de desempenho profissional do educador de
infância e dos professores dos ensinos básico e secundário (regulamentado pelo
Decreto-Lei 240/2001) e na proposta de recomendação do Parlamento e Conselho
Europeu sobre as competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida (Comissão
Europeia, 2005).
Segundo a proposta do Conselho Europeu, por competência entende-se a
“combinação de conhecimentos, aptidões e atitudes adequadas ao contexto. As
19
competências essenciais são aquelas que são necessárias a todas as pessoas para a
realização e desenvolvimentos pessoais, para exercerem uma cidadania ativa, para a
inclusão social e para o emprego” (p.3).
Os perfis de competências nacionais dos docentes caracterizam, por um lado, o
desempenho profissional do professor e, por outro, as suas necessidades de
desenvolvimento profissional através da formação contínua e da aprendizagem ao longo
da vida (DL 240/2001).
Focando a definição do conceito abordado nos documentos normativos
portugueses e internacionais, a abordagem a este constructo assentou, no presente
estudo, numa perspetiva holística de desenvolvimento, alicerçada em quatro dimensões
regulamentadas pelo Perfil Geral de Desempenho Profissional do educador de infância e
dos professores dos ensinos básico e secundário (DL 240/2001) que se sobrepõem e se
encontram interligadas:
Dimensão profissional, social e ética – ligada ao desenvolvimento da sua
prática profissional num saber específico – utilizar face a uma ação
concreta saberes práticos, éticos e sociais diversificados. Implica a
perceção do seu desenvolvimento enquanto profissional nos aspetos
éticos deontológicos, relacionais e culturais;
Dimensão de desenvolvimento do ensino e aprendizagem – associada à
promoção de aprendizagens numa determinada área, fundamentando-as
científica e metodologicamente;
Dimensão de participação na escola e na comunidade – estrutura-se na
relação com a escola e a comunidade, remetendo a profissão para o
contexto onde está inserida;
20
Dimensão de desenvolvimento profissional ao longo da vida – a prática
profissional constrói-se através da reflexão fundamentada da mesma, do
seu desenvolvimento nela, na cooperação com outros profissionais e da
formação que ocorre neste processo.
Considerar a docência, à semelhança de Esteves (2009), como uma profissão
complexa, implica percecioná-la como sendo caracterizada por vários fatores externos e
internos ao professor, nomeadamente critérios específicos de progressão na carreira,
multiplicidade de papéis desempenhados, evolução dos sistemas de valores e das as-
pirações pessoais e alterações políticas e sociais constantes. Esta perceção implica
concomitantemente entender que cada professor, ao desempenhar a sua profissão,
enfrenta o desconhecido e a mudança obrigando-se a uma complexidade de atitudes e
comportamentos adaptativos face a situações diversificadas, remetendo para as
competências profissionais docentes.
Em síntese, a abordagem do conceito de competência adotado neste estudo
incide na visão deste constructo como um processo cognitivo complexo, em que cada
professor, no quadro de uma determinada situação, mobiliza e aplica conhecimentos,
aptidões e atitudes. Deste modo, a competência obriga a uma adaptação e a um processo
regulador da aprendizagem de cada sujeito, caracterizado pela própria construção de
conhecimento.
2.1.1 Competências profissionais docentes.
Entender o Sistema Educativo como “o conjunto de meios pelo qual se
concretiza o direito à educação, que se exprime pela garantia de uma permanente ação
21
formativa orientada para favorecer o desenvolvimento global da personalidade, o
progresso social e a democratização da sociedade” (Lei de Bases do Sistema Educativo,
2005), implica contribuir para o desenvolvimento pleno dos vários eixos que o
constituem: alunos, professores e comunidade.
As transformações ocorridas nas últimas décadas na docência e no sistema
educativo – por exemplo, saberes ensinados, organização de sala de aula, organização
orgânica da escola, criação de mega-agrupamentos – podem ser apontadas como causas,
mas também como consequências, das interações e das ações dos seus diversos atores
naquele sistema (Nóvoa, 2003). Estas alterações têm tornado inadiável a necessidade
permanente de refletir sobre o exercício da profissão docente, quer por parte da
sociedade, quer por parte dos próprios docentes.
Procurando promover novos paradigmas que respondam às várias alterações
ocorridas na área da educação, “a identificação de dimensões decisivas de prática
profissional pode ajudar a clarificar o que se espera do professor de cada nível de ensino
e área disciplinar” (Ponte et al., 2000, p.8), destacando-se, deste modo, o conceito de
competência profissional.
Como salientado anteriormente, assume-se nesta investigação que as
competências não podem ser consideradas e avaliadas independentemente do contexto,
do sujeito e da interação entre ambos (Alonso et al., 2002). As competências
profissionais não são, assim, saberes em si mesmos, mas elementos que se constroem
dinamicamente através do desenvolvimento pessoal e profissional e da vivência diária
do docente.
É para isso fundamental percecionar o conceito de competência profissional
abordando as competências genéricas, as características científicas, técnicas e
pedagógicas, mas também focando os vários atributos pessoais.
22
Para Estrela (2001), a definição e a caracterização da profissão docente remete
primeiramente para a explicitação da diferença entre os conceitos de profissionalismo,
profissionalidade e profissionalização. Se por profissionalismo docente se entende o
correto exercício de papéis e de competências profissionais inerentes à docência,
articulando os seus aspetos éticos e deontológicos, de forma a simultaneamente orientar
a profissionalidade inerente e a distinguir os comportamentos profissionais adequados
daqueles que não o são, a profissionalização está dependente da conceção de profissão
que cada professor assume.
Meirinhos (2011) refere que se considerarmos a docência como uma
classificação ocupacional, categorizada em standards técnicos e éticos e com
consequências nos papéis desempenhados e nas competências profissionais, os dois
conceitos (profissionalismo e profissionalidade) englobam conceções e práticas
baseadas em valores profissionais manifestados aquando do exercício docente e de
saberes teóricos, práticos e experienciais.
Percecionar a docência como profissão permite entender as suas várias
componentes, sejam estas externas ou internas ao desenvolvimento profissional e
pessoal do professor, reconhecendo assim a complexidade desta profissão. Esta ideia vai
de encontro ao salientado por Esteves (2009) que, citando Boterf (2003), refere que a
complexidade de algumas profissões, onde se insere a docência, se caracteriza pela
necessidade de enfrentar o desconhecido e a mudança permanente, sendo as profissões
complexas sempre pautadas pelo “aumento da complexidade dos problemas a tratar, o
carácter incerto do contexto de trabalho, as possibilidades oferecidas pelas novas
tecnologias e pelas novas formas de organização do trabalho, a evolução dos sistemas
de valor e das aspirações dos indivíduos” (Esteves, 2009, p. 43). Consequentemente, o
profissional será sempre aquele que numa determinada situação complexa, é capaz de
23
administrar e mobilizar uma série de saberes (Boterf, 2005) essenciais para que possa
assim existir desenvolvimento profissional: (i) Saber agir com pertinência; (ii) Saber
mobilizar num dado contexto; (iii) Saber combinar; (iv) Saber transpor; (v) Saber
aprender e Saber aprender a aprender e (vi) Saber empenhar-se.
Face a uma determinada situação, todos os profissionais devem ser capazes de
fazer o que está definido a priori, mas, da mesma forma, sobrepor-se ao solicitado, já
que a competência apenas se revela quando se está perante situações desafiantes,
antecipando a resolução da situação e sendo capaz de julgar a ação mais eficaz nesse
momento – Saber agir com pertinência – adequando a ação à situação específica, o que
remete para a mobilização de recursos. Ao acontecerem sempre numa ação e não
preexistindo a esta, as competências são decorrentes dum processo metacognitivo,
obrigando a uma combinação de conhecimentos, capacidades relacionais e cognitivas e
à compreensão do contexto – o Saber Combinar e o Saber Transpor. Estas competências
têm assim um carácter fundamentalmente profissional e pessoal, simultâneo ao social e
ao motivacional relacionado com os dois últimos saberes. Há, deste modo, uma
aproximação ao contexto social, ao sistema de valores do indivíduo, e do coletivo, e aos
significados sociais partilhados.
Eraut (1997) caracteriza competência profissional em duas dimensões distintas,
scope e quality.
The scope dimension concerns what a person is competent in, the range
of roles, tasks and situations for which their competence is established or
may be reliable inferred. The quality dimension concerns judgments
about the quality of that work on a continuum from being a novice, who
is not yet competent in that particular task, to being an expert
24
acknowledge by colleagues as having progressed well beyond the level of
competence (p. 167).
Segundo este autor, o termo competência remete para uma visão holística, em
que cada sujeito, perante uma determinada situação, analisa o todo e mobiliza
adequadamente os seus saberes, percecionando qualitativamente a relação entre a
situação e esses saberes. Esta visão, aplicada à docência, permite compreender em que
medida os professores possuem competências características da sua profissão.
Perrenoud (2000) salientou que os docentes não possuem apenas saberes, mas
também competências profissionais que não são redutíveis ao domínio dos conteúdos a
serem ensinados. É fulcral aceitar igualmente que, atendendo às alterações sociais e ao
processo de evolução das sociedades permeado consideravelmente pela tecnologia, é
exigido hoje aos professores que possuam competências variadas que não eram
recentemente consideradas como fundamentais (tais como por exemplo a gestão de
grande quantidade e densidade de informação oriunda de fontes cuja credibilidade é
necessário avaliar). São as competências docentes que permitem ao professor enfrentar
diferentes situações, realizar operações mentais complexas e realizar ações adaptadas às
situações vivenciadas. Esta associação de saberes que o professor tem, e necessita de
ter, está ligada às capacidades e habilidades que, perante situações complexas, permitem
fazer eclodir esquemas de pensamento capazes de mobilizar conhecimentos e recursos
pertinentes. Salienta-se igualmente que a definição de Perrenoud se aproxima do saber
docente desenvolvido por outros autores como Tardif, Lessard e Lahaye (1991), onde
esse conceito surge como um saber diferenciado que pressupõe uma mobilização de
conhecimentos provenientes de diferentes fontes e experiências dos professores.
A competência profissional é definida por Perrenoud (2000) em quatro aspetos
essenciais: (i) as competências não são saberes, capacidades, atitudes ou informações,
25
integrando, contudo, estes recursos; (ii) cada mobilização pertence, de uma única
maneira, a uma situação específica; (iii) a competência subentende o exercício de
atividades mentais complexas e, por último, (iv) as competências profissionais
constroem-se sempre em formação e em contexto de trabalho.
Procurando operacionalizar esta ideia, Perrenoud propôs um referencial de
competências organizado em torno de dez competências de referência que se
operacionalizam em competências específicas, como indicado na figura seguinte.
Tabela 1: Referencial de Competências
Competências
de referência Competências específicas
1-Organizar e
dirigir
situações de
aprendizagem
Conhecer, para determinada disciplina, os conteúdos a serem ensinados e a sua
tradução em objetivos de aprendizagem.
Trabalhar a partir das representações dos alunos.
Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à aprendizagem.
Construir e planejar dispositivos e sequências didáticas.
Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos de conhecimento.
2-Administrar
a progressão
das
aprendizagens
Conceber e administrar situações-problema ajustadas ao nível e às possibilidades
dos alunos.
Adquirir uma visão longitudinal dos objetivos de ensino.
Estabelecer laços com as teorias subjacentes às atividades de aprendizagem.
Observar e avaliar os alunos em situação de aprendizagem, de acordo com a
avaliação formativa.
Fazer balanços periódicos de competências e tomar decisões de progressão.
3-Conceber e
fazer evoluir os
dispositivos de
diferenciação
Administrar a heterogeneidade no âmbito de uma turma.
Abrir, ampliar a gestão da classe para um espaço mais vasto.
Fornecer apoio integrado, trabalhar com alunos portadores de grandes
dificuldades.
Desenvolver a cooperação entre os alunos e certas formas simples de ensino
mútuo.
4-Envolver os
alunos na sua
aprendizagem e
no seu trabalho
Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber. O sentido do
trabalho escolar e desenvolver na criança a atividade de autoavaliação.
Instituir e fazer funcionar um conselho de alunos (conselho de classe ou de escola)
e negociar com eles diversos tipos de regras e de contratos.
Oferecer atividades opcionais de formação, à la carte.
Favorecer a definição de um projeto pessoal do aluno.
26
5-Trabalhar
em equipa
Elaborar um projeto de equipa, representações de alunos.
Dirigir um grupo de trabalho, conduzir reuniões.
Formar e renovar uma equipa pedagógica.
Enfrentar e analisar em conjunto situações complexas, práticas e problemas
profissionais.
Administrar conflitos interpessoais.
6-Participar na
administração
da escola
Elaborar, negociar um projeto da instituição.
Administrar os recursos da escola.
Coordenar, dirigir uma escola com todos os seus parceiros (serviços escolares,
bairro, associações de pais, professores de língua e cultura de origem).
Organizar e fazer evoluir, no âmbito da escola, a participação dos alunos.
7-Informar e
envolver os
pais
Dirigir reuniões de informação e de debate.
Fazer entrevistas.
Envolver os pais na construção do saber.
8-Utilizar
novas
tecnologias
Utilizar editores de textos.
Explorar as potencialidades didáticas dos programas em relação aos objetivos de
ensino.
Comunicar à distância por meio da telemática.
Utilizar as ferramentas multimédia no ensino.
9-Enfrentar os
deveres e os
dilemas éticos
da profissão
Prevenir a violência na escola e fora dela.
Lutar contra os preconceitos e as discriminações sexuais, étnicas e sociais.
Participar na criação de regras de vida referentes à disciplina da escola, às sanções
e à apreciação da conduta.
Analisar a relação pedagógica, a autoridade, a comunicação em aula.
Desenvolver o senso da responsabilidade, a solidariedade e o sentimento de
justiça.
10-Administrar
a sua própria
formação
contínua
Saber explicitar as próprias práticas.
Estabelecer seu próprio balanço de competências e seu programa pessoal de
formação contínua.
Negociar um projeto de formação comum com os colegas (equipa, escola, rede).
Envolver-se em tarefas em escala de uma ordem de ensino ou sistema educativo.
Acolher a formação dos colegas e participar dela.
(Perrenoud, 2000)
Importa analisar de forma mais estruturada este referencial atendendo aos
elementos relevantes e estruturantes do mesmo e à sua utilização em diferentes
investigações na área da educação. Por exemplo, Sardo (2010), com o objetivo de
27
questionar professores sobre quais as competências que estes consideravam como
necessárias ao desenvolvimento da sua profissão, suportou teoricamente a sua
investigação naquele referencial. Os resultados do seu estudo mostraram algumas
diferenças significativas de perceção com base nas características dos professores (área
disciplinar, nível de ensino e género), tendo estes demonstrado uma perceção global
positiva em relação às competências dos seus pares e valorizado mais as competências
pedagógicas e relacionais do que as científicas. Já Conceição e Sousa (2012), tendo
igualmente por base aquele referencial teórico, identificaram, junto de professores de 3º
ciclo e Ensino Secundário, as competências que estes consideravam essenciais ao seu
papel. Os resultados do estudo evidenciaram que os docentes privilegiaram as
competências relativas ao domínio pedagógico.
O primeiro domínio de competências de referência ligado à gestão e à
organização de situações de aprendizagem remete-nos para os conhecimentos
científicos, didáticos e pedagógicos. A consciência desses saberes por parte do
professor, e a sua capacidade de adequação e de resposta perante as diferentes situações,
é fundamental ao processo ensino-aprendizagem. Assim, procura-se que cada docente
seja capaz de transferir os seus conhecimentos, adaptá-los e utilizá-los em situações
distintas – sendo aqui pertinente assinalar novamente a aproximação a Piaget (referida
no capítulo anterior). A responsabilidade pela construção do conhecimento é então dual,
quer do ponto de vista do próprio professor, que procura um processo contínuo de
desenvolvimento profissional, quer daquilo que irá proporcionar aos seus alunos.
A dimensão ‘administra a progressão das aprendizagens’ tem uma forte
componente construtivista, remetendo o professor para o papel organizador das
aprendizagens, sendo o aluno o autor e o produtor do seu próprio conhecimento. Os
28
docentes devem ser capazes de criar situações de aprendizagem que potenciem o
desenvolvimento dos alunos.
A diversidade pessoal, social e pedagógica de cada aluno justifica a necessidade
de desenvolvimento da terceira dimensão. A heterogeneidade e a dimensão das turmas
obrigam o professor a ser capaz de gerir situações diversificadas e complexas, sendo
esta resposta estruturada de acordo com diferentes saberes, interesses, recursos e
métodos de aprendizagem.
O quarto domínio está ligado de forma intrínseca à motivação dos alunos,
potenciando a sua aprendizagem e o desenvolvimento das suas competências e
conhecimentos. A diversidade de atividades, e a adequação destas às necessidades dos
alunos, pretende favorecer uma aprendizagem mais eficaz. Assinala-se igualmente,
como fator fundamental, a necessidade de negociação com os alunos, tornando-os assim
atores do processo ensino-aprendizagem.
A quinta dimensão remete para as responsabilidades da docência ligadas à
organização interna da profissão. Atendendo à diversidade e à complexidade das
situações escolares, é fundamental a criação de condições e de respostas adequadas a
esta realidade, recorrendo para isso ao suporte dos pares, o que consequentemente
privilegiará o desenvolvimento profissional docente e criará condições para um
ambiente pedagogicamente fortalecido.
O sexto domínio associa-se ao salientado por diferentes autores como Shulman
(1987) ou Nóvoa (2000) que referem a docência como multidimensional. Cada
professor deve ser capaz de relacionar as dimensões científicas, pedagógicas, didáticas,
relacionais e de gestão, procurando diversificar e coordenar os seus próprios saberes. A
potenciação dos recursos existentes trará igualmente vantagens ao processo de ensino-
aprendizagem.
29
O processo de ensino-aprendizagem, embora muitas vezes assente
fundamentalmente na díade professor-aluno, envolve em si mesmo considerar diferentes
fatores externos existentes nesta relação. Este facto justifica a necessidade do
desenvolvimento dum sétimo domínio relacionado com o envolvimento dos pais e
encarregados de educação. O sucesso do processo educativo apenas se consegue gerindo
eficazmente a comunicação com os pais e encarregados de educação, não isolando a
sala de aula e a escola nas suas práticas.
A oitava dimensão remete-nos para a existência de novos paradigmas de
convivência social emergentes da crescente presença das tecnologias. A implementação
destas no processo ensino-aprendizagem tornou-se fulcral ao seu. Constatamos que os
alunos têm acesso (em maior ou menor escala) a múltiplas ferramentas tecnológicas
(como, por exemplo, tablets, smartphones, computadores, consolas de jogos) sugerindo
necessidades diferentes daquelas que os jovens tinham há 10 anos e igualmente
diferentes das que terão os jovens que estarão na escola daqui a 10 anos. Esta situação
terá impacto, quer nas orientações curriculares que constituem a base dos currículos
oferecidos pela escola para a formação dos jovens, quer nas competências de utilização
da informação por parte dos professores (Matos & Pedro, 2011).
Uma das dimensões referidas no Perfil do Professor do Ensino Básico (Decreto-
Lei 240/2001) remete para os fatores éticos da profissão, aproximando-se assim ao nono
domínio do referencial de Perrenoud. A preocupação demonstrada por este fator prende-
se com a necessidade premente de gerir e analisar a relação pedagógica, a autoridade e a
comunicação em sala de aula, ao mesmo tempo que se aborda questões relativas à
gestão dos próprios comportamentos profissionais.
Por fim, a última dimensão do referencial remete-nos para questões relacionadas
com a formação contínua dos professores. Perrenoud salienta a necessidade do docente
30
ser um ator do seu próprio desenvolvimento profissional, estabelecendo estratégias de
formação a nível individual, e conjuntamente com os pares, de forma a potenciar o
enriquecimento e o desenvolvimento de competências e de saberes profissionais.
As investigações realizadas neste tema têm-se focado deste modo na análise do
conjunto de saberes, conhecimentos, capacidades e competências profissionais
docentes, fortalecendo a ideia da necessidade de não ser pertinente “caraterizar o
conhecimento profissional sem ter em conta o modo como este é aprendido e como é
usado” (Éraut, 1996, p. 19, cit. por Esteves, 2009).
Esteves refere também que, ao admitirmos que as competências profissionais
apenas se verificam nas ações profissionais contextualizadas, temos igualmente que
refletir sobre a adequação de currículos da formação inicial dos professores. A
desarticulação entre os diferentes saberes profissionais desenvolvidos na formação
inicial docente, e a sua aplicabilidade em contexto de trabalho, retira muitas vezes
relevância às competências que são adquiridas primeiramente. Este desfasamento pode
potenciar o desenvolvimento de professores menos competentes no desenvolvimento da
sua profissão e consequentemente no processo de ensino-aprendizagem.
Este aspeto está em total concordância com o referido por Schleicher (2011),
que alerta no relatório Building a High-Quality Teaching Profession [OECD] para a
importância de refletir sobre a geração e aplicação do conhecimento, devido às
necessidades atuais serem diferentes das do passado. As escolas têm assim a
responsabilidade de preparar os jovens para profissões ainda não criadas, tecnologias
não desenvolvidas ou para problemas que ainda não se sabe que existirão.
Estamos perante uma necessidade premente de reflexão sobre as competências
profissionais docentes, sendo estas competências entendidas como o exercício duma
atividade mental complexa característica a cada professor (ponto discutido no capítulo
31
anterior na aproximação à teoria construtivista de Piaget) que, no quadro de uma
determinada situação, mobiliza saberes, capacidades e atitudes profissionais,
construídas durante o seu desenvolvimento profissional.
2.1.2 Competências para o Século XXI.
Como referido anteriormente, as alterações vivenciadas a nível social nas
últimas duas décadas têm levado à necessidade de repensar os paradigmas subjacentes
ao processo de ensino-aprendizagem, sendo as tecnologias um fator fulcral nessas
mudanças. Tapscott (1998) e Prensky (2004; 2005; 2009), por exemplo, salientaram que
os alunos se encontram mais preparados do que os professores e os pais para utilizar as
tecnologias digitais, constituindo-se mesmo como impulsionadores do seu uso. Prensky,
em 2006, referiu também a emergência de entender que os alunos atuais não são iguais
aos das gerações anteriores, ao referir que eles,
are no longer little versions of us, as they may have been in the past. In fact,
they are so different from us, that we can no longer use either our 20th century
knowledge or our training as a guide to what is best for them educationally. (p.
1).
Este alerta já tinha sido dado por Jacques Delors (1996) no relatório elaborado
para a UNESCO no âmbito da Comissão Internacional sobre Educação para o séc. XXI.
A relevância em articular “o global e o local; o universal e o singular; a tradição e a
modernidade; as soluções a curto e a longo prazo; a indispensável competição e o
cuidado com a igualdade de oportunidades, o extraordinário desenvolvimento e
disseminação dos conhecimentos e as capacidades de assimilação por parte do homem”
32
(Delors, 1996, p. 14), implicam que o papel da escola seja evidenciado através da
preparação dos alunos para esta nova realidade, auxiliando-os a “entrar na vida, com
capacidade para interpretar os factos mais importantes relacionados quer com o seu
destino pessoal, quer com o destino colectivo” (Delors, 1996, p. 52). A Comissão
Europeia (2008) retomou esta preocupação ao sublinhar que “cada cidadão deverá estar
provido das competências necessárias para viver e trabalhar nesta nova sociedade da
informação” (p.2).
Assume-se, deste modo, que o desenvolvimento das tecnologias acelerou a
presença de informação e comunicação na sociedade e, consequentemente, na escola,
obrigando-a por isso a protagonizar transformações que a adeqúem às alterações sociais.
Esta perspetiva vai de encontro ao sublinhado por Morin (1999) que refere que, para se
educar dentro de uma sociedade em mutação, é fundamental auxiliar o processo de
desenvolvimento de competências: competências do conhecimento, do desenvolvimento
social e, por último, as competências de comunicação.
Trilling e Fadel (2009) consideram que a transformação genérica a que
assistimos no campo social terá inevitavelmente que ser transposta para a sala de aula,
ajustando os instrumentos de aprendizagem e a própria aprendizagem às necessidades
da sociedade atual, tendo implicações diretas nas competências desenvolvidas por
alunos e por professores.
Retoma-se assim o conceito de competência, encarado como um conjunto de
recursos cognitivos – capacidades, conhecimentos técnicos e teóricos, atitudes,
perceções e capacidades de compreensão – mobilizados para solucionar, pertinente e
eficazmente, um conjunto de situações, não existindo fora de um determinado contexto.
Esta perspetiva é abordada por diferentes entidades como a Partnership for 21-st
century-skills (2009), a ISTE (2008), a enGauge 21st Century skills (2009) ou a OCDE
33
que pretenderam balizar as competências a desenvolver numa época caraterizada pelas
alterações constantes e ajustamentos consequentes - as competências para o século XXI,
foram designadas naquelas obras de referência.
Segundo Silva (2009) o termo competência para o século XXI (ou XXI century
skills) quando utilizado em educação é vago, já que reúne em si competências
diversificadas de diferentes domínios (como competências práticas, transversais ou
técnicas), competências pessoais e competências não são específicas ao século XXI,
sendo a ênfase colocada nos processos cognitivos de análise e de aplicação do
conhecimento por parte dos alunos, em detrimento das próprias unidades de
conhecimento que detêm.
Contudo, apesar de poder ser considerado um conceito difuso, a necessidade de
corresponder às exigências da sociedade atual, em que a resolução de problemas, a
tomada de decisões, o trabalho em equipa, o profissionalismo, o sentido ético, a
liderança e a gestão de projetos, e o fazer uso das tecnologias digitais, levaram ao
desenvolvimento do conceito de competência para o século XXI (Trilling & Fadel,
2009). Segundo estes autores, há quatro forças que em conjunto convergem para novas
formas de aprendizagem: Knowledge work (relacionado com os conhecimentos
adquiridos e a sua aplicação), Thinking tools (processos cognitivos subsequentes a cada
sujeito), Digital lifestyles (relativo aos desenvolvimentos tecnológicos e às suas
implicações na sociedade) e Learning research (ligado ao desenvolvimento da
aprendizagem e das metodologias de pesquisa de informação), cada uma
desempenhando um papel fulcral para o desenvolvimento, tendo influência consequente
no processo de Ensino-Aprendizagem.
34
Alicerçando-nos na definição de competência anteriormente explicitada, importa
definir em que medida esse conceito se explicita no domínio das competências do
século XXI.
Sendo o termo competência compreendido como um constructo que envolve em
si mesmo conhecimento, capacidades e os processos cognitivos que suportam a
mobilização e a integração desses recursos diversos procurando responder a situações
concretas, a sua aplicação em contexto de sala de aula remete para o desenvolvimento
técnico e pedagógico por parte do professor. Desta forma, há sempre um envolvimento
destas duas dimensões em todas as competências docentes (Pedro, Matos, Pedro &
Abrantes, 2011).
Pedro et al. (2011) realizaram um estudo que consistiu numa meta-análise a 13
frameworks de competências para o século XXI, com base numa revisão de literatura a
partir de diferentes bases de dados. Os resultados evidenciaram um conjunto de
competências organizadas em diferentes domínios: competências digitais;
gestão/organização de informação; capacidade de pesquisa; planificação e resolução de
problemas; reflexividade; pensamento crítico, competências de comunicação;
colaboração; responsabilidade social; literacia, inovação; criatividade; produtividade e
e-business, salientando o aspeto prático, técnico, pedagógico e ético.
Como é possível analisar na imagem seguinte, as competências metacognitivas
identificadas são as mais referidas, estando presentes em 11 dos 13 referenciais
analisados. Os domínios relativos aos aspetos técnicos (como as ‘Digital Literacy
Skills’) surgem igualmente com grande frequência, sendo indicados em nove
documentos analisados. Com a mesma incidência estão ainda competências ligadas à
criatividade, à inovação e à comunicação.
35
Figura 2: Análise de Frameworks de Competências para o século XXI (Pedro et al. 2011)
36
Embora os frameworks analisados não sejam específicos para docentes, têm servido
como base da investigação realizada sobre as competências necessárias aos professores do
século XXI, quer numa dimensão mais técnica, quer numa dimensão pluridimensional.
Em 2008, a UNESCO publicou o ICT Competency Framework for Teachers (ICT-
CFT), documento revisto em 2011. Este referencial, apesar da sua forte componente
relacionada com as tecnologias e a sua utilização, estrutura-se em diferentes níveis de
progressão docente, especificando deste modo as competências que cada professor deve
desenvolver durante a progressão na sua profissão, simultaneamente ao desenvolvimento que
deve potenciar nos seus alunos. Assim, o referencial baseia-se em seis domínios de trabalho:
(i) Understanding ICT in education; (ii) Curriculum and assessment; (iii) Pedagogy; (iv)
ICT; (v) Organisation and administration; (vi) Teacher professional learning (UNESCO,
2011); organizados em três níveis de desenvolvimento profissional docente: Technology
Literacy; Knowledge Deepning e Knowledge Creation.
No primeiro nível, espera-se que os professores auxiliem os seus alunos a trabalhar de
forma mais eficiente, com o apoio das tecnologias, refletindo sobre o contributo destas para
esse processo. No segundo nível há uma maior associação ao desenvolvimento de
competências e de conhecimentos e à sua aplicação em contextos específicos, relacionando-
se assim com os processos metacognitivos. Por último, no terceiro nível procura-se que os
professores sejam atores do seu próprio desenvolvimento profissional, potenciando
simultaneamente a aquisição de conhecimentos nos seus alunos, tornando-os construtores
desse conhecimento.
37
Figura 3: Unesco ICT Framework for Teachers (2011)
À semelhança do Referencial anterior, em Portugal desenvolveu-se igualmente um
referencial de competências TIC. Este referencial, desenvolvido por Costa (2008) no âmbito
do Plano Tecnológico da Educação, procurou definir o modelo de formação e certificação de
competências TIC para pessoal docente e não docente do contexto português.
Organizado em três níveis de formação e certificação (Certificação de Competências
Digitais; Certificação de Competências Pedagógicas e Profissionais com TIC e Certificação
de Competências Avançadas em TIC na Educação) indica um conjunto de
macrocompetências necessárias para uma atuação competente dos professores (Costa, 2008):
Deter conhecimento atualizado sobre recursos tecnológicos e seu potencial de
utilização educativo;
Acompanhar o desenvolvimento tecnológico no que implica a responsabilidade
profissional do professor;
Executar operações com hardware e sistemas operativos (usar e instalar
programas, resolver problemas comuns com o computador e periféricos, criar e
gerir documentos e pastas, observar regras de segurança no respeito pela
legalidade e princípios éticos…);
38
Aceder, organizar e sistematizar a informação em formato digital (pesquisa,
seleciona e avalia a informação em função de objetivos concretos…);
Executar operações com programas ou sistemas de informação online e/ou off-
line (aceder à Internet, pesquisar em bases de dados ou diretórios, aceder a obras
de referência…);
Comunicar com os outros, individualmente ou em grupo, de forma síncrona
e/ou assíncrona através de ferramentas digitais específicas;
Elaborar documentos em formato digital com diferentes finalidades e para
diferentes públicos, em contextos diversificados;
Conhecer e utilizar ferramentas digitais como suporte de processos de avaliação
e/ou de investigação;
Utilizar o potencial dos recursos digitais na promoção do seu próprio
desenvolvimento profissional numa perspetiva de aprendizagem ao longo da
vida (diagnostica necessidades, identifica objetivos);
Compreender vantagens e constrangimentos do uso das TIC no processo
educativo e o seu potencial transformador do modo como se aprende.
À semelhança do referencial da UNESCO, o Referencial de Competências TIC
português apenas se foca na mobilização de competências transversais alicerçadas pelas
tecnologias. Contudo, apesar de considerarmos que estas devem ser encaradas como
fundamentais na reflexão sobre o desenvolvimento de competências para o século XXI para o
professor do Ensino Básico, não nos cingimos a elas. Entende-se que no domínio das
competências para o século XXI para os professores, as competências digitais, de gestão e
organização de informação, ligadas à metacognição, à comunicação e à colaboração e aos
aspetos éticos e sociais devem ser consideradas como fundamentais, abarcando assim as
diferentes dimensões práticas, técnicas, pedagógicas, científicas e éticas.
39
Importa assim refletir sobre quais as competências fundamentais no desenvolvimento
da profissão docente, considerando a multidimensionalidade da docência (áreas disciplinares,
anos de lecionação e níveis de ensino). A ideia de que ser professor constitui uma profissão
complexa, que requer empenho, dedicação e formação, remete para a análise de competências
tendo por base o sujeito como ser social, influenciado direta e indiretamente pelos diferentes
níveis de contextos que o rodeiam, seja a nível microssistémico, mesossistémico, passando
para um exossistémico ou macrossistémico (Broffenbrenner, 1996).
2.2 Desenvolvimento Profissional docente: Delimitação do constructo
Assumindo como um dos objetivos desta investigação a contribuição para uma
perspetiva de desenvolvimento profissional docente através da formulação do quadro de
referência de competências para o séc. XXI dos professores, torna-se fundamental explicitar o
conceito de desenvolvimento profissional.
Segundo Herdeiro e Silva (2011), as mudanças constantes da sociedade e das teorias
educacionais e pedagógicas levaram a uma emergência de visão do professor como
profissional em permanente desenvolvimento. Esta ideia foi igualmente desenvolvida por
Braz (2013) que refere o papel das transformações sociais no sistema educativo, já que estas
“têm conduzido à procura de uma nova identidade profissional, caminho que tem posto em
evidência uma relação acentuada entre o desenvolvimento profissional e o profissionalismo”
(p.63).
Moreira (1993), por seu lado, salientou a necessidade emergente do desenvolvimento
de modelos de formação contínua (e de desenvolvimento profissional docente) por estes
estarem relacionados diretamente com as mudanças ocorridas numa sociedade em mutação
40
acelerada. Torna-se deste modo necessário assumir uma necessidade de reconceptualização
do conceito de desenvolvimento profissional, abarcando dentro deste diferentes teorias,
saberes, práticas, estratégias e fatores, que em conjunto contribuam para uma perceção clara
de como se forma e desenvolve um professor.
O constructo desenvolvimento profissional terá assim de ser analisado e desenvolvido
abarcando dois moldes distintos, mas complementares: (i) o desenvolvimento profissional
como um processo contínuo e (ii) as características do Desenvolvimento Profissional. Esta
divisão permite conceptualizar o conceito de Desenvolvimento Profissional Docente nas suas
dimensões fundamentais. Por um lado possibilita uma análise do conceito enquanto processo
dinâmico, contínuo, pessoal, influenciado por fatores externos e internos ao docente e, por
outro, permite entender quais os saberes e domínios que o constituem e de que forma se
podem desenvolver. Um terceiro ponto neste desenvolvimento incidirá no papel do Modelo
Ecológico do Desenvolvimento Humano como contributo teórico para o conceito de
Desenvolvimento Profissional Docente.
2.2.1 O desenvolvimento profissional como um processo contínuo.
O conceito de desenvolvimento profissional docente não é claro, sendo alvo de uma
significância dúbia, o que tem incrementado a discussão sobre a temática. Meirinhos (2006)
salienta esta ideia ao referir que o termo “desenvolvimento profissional docente carece de
significado unívoco” (p. 31) entendendo assim que a referência ao desenvolvimento deve
considerar a evolução dos professores ao longo da sua carreira, de forma polissémica
(Imbermón, 1999; Brodeur, Deaudelin & Bru, 2005).
41
A inequívoca clareza do constructo é dificultada deste modo pela complexidade dos
termos que o envolvem pois se, por um lado, ao desenvolvimento se associam ideias relativas
à mudança, à aprendizagem ou à transformação, por outro, a ideia de profissional remete para
os conceitos de profissão, profissionalismo, profissionalidade e identidade profissional
(Almeida, 2012).
Oliveira-Formosinho (2009) sugere, por seu lado, uma conceptualização do
desenvolvimento profissional docente que assuma características distintas da formação
contínua, ao remeter para a ideia de educação permanente ao longo da vida, focando os
processos de desenvolvimento, os conteúdos adquiridos, as práticas elaboradas e os contextos
de aprendizagem existentes.
Opta-se nesta investigação por encarar o conceito de desenvolvimento profissional
docente como os processos de transformação que, decorrendo duma pluralidade de fatores,
surgem ao longo da carreira do professor, “entre os quais se contam os que se referem ao
desenvolvimento da pessoa do professor, numa perspectiva de life span, às actividades
organizadas de formação contínua e às actividades individuais de auto-promoção” (Estrela &
Estrela, 2006, p.75), não se estruturando assim apenas no domínio dos conhecimentos teóricos e
científicos, mas igualmente nos aspetos emocionais, atitudinais e relacionais dos docentes.
Morais e Medeiros (2007) salientam que todos os processos de desenvolvimento
profissional docente são interativos, inacabados e dependentes do próprio sujeito, estando
também dependentes do que o meio oferece e das relações que cada pessoa estabelece com o
que o rodeia. O conceito não se estrutura somente no domínio dos conhecimentos científicos,
mas igualmente nas atitudes, nas relações interpessoais e nas competências ligadas ao
processo pedagógico (Silva, 2002). Compreendem-se desta forma fatores de ordem interna e
externa ao professor, tendo no entanto carácter distinto.
42
Numa outra visão, algumas perspetivas consideram o desenvolvimento profissional
docente associado à ideia de transformação, que ocorre em dois níveis distintos (o sistémico –
associado aos contextos em que o professor está inserido, e o holístico que se refere a todas as
dimensões da atividade do professor). Deste modo, este conceito irá para além da ideia de
formação permanente, formação contínua ou desenvolvimento ao longo da vida (Day, 2001;
Eraut, 1994; Estrela & Estrela, 2006; Fullan, 1990; Imbernón, 1999; Almeida, 2012), sendo
um processo continuum que reúne em si todas as experiências de aquisição de conhecimentos
que o docente irá fazer ao longo da sua carreira.
Esta ideia é sustentada por Day (2001) ao afirmar que
o desenvolvimento profissional docente envolve todas experiências espontâneas de
aprendizagem e as atividades conscientemente planificadas, realizadas para beneficio,
direto ou indireto, do indivíduo, do grupo ou da escola e que contribuem através
destes para a qualidade da educação na sala de aula. É o processo através do qual os
professores, enquanto agentes de mudança, reveem, renovam e ampliam, individual e
coletivamente, o seu compromisso com os propósitos morais do ensino, adquirem e
desenvolvem, de forma crítica (juntamente com as crianças, jovens e colegas) o
conhecimento, as destrezas e a inteligência emocional, essenciais para uma reflexão,
planificação e práticas profissionais eficazes, em cada uma das fases de vida
profissionais (p.20).
Autores como Ponte (1998) salientam que o desenvolvimento profissional tem
igualmente associada a ideia de que a capacitação do professor para o exercício da sua
atividade profissional é um processo, envolvendo variadas etapas e consequentemente se
apresentará como incompleto, isto é, em construção. Os professores participarão, ao longo da
sua vida profissional, num processo de crescimento, quer pessoal, quer profissional que não
43
pode ser visto apenas como a soma da aprendizagem de conhecimentos e de competências em
ambientes formais ou não formais (Menezes & Ponte, 2006).
Refletir e analisar o desenvolvimento profissional implica, deste modo, reconhecer o
carácter específico da docência e o seu papel na atualidade. O professor terá sempre de
incorporar as suas várias experiências (de docência, de formação, de convivência) como
elementos constituintes da prática profissional, “construindo-a a partir das necessidades e
realizações que consciencializa, mediante a análise problematizada da sua prática pedagógica,
a reflexão fundamentada sobre a construção da profissão (…) ” (Decreto-Lei 240/2001, p.
5571). O desenvolvimento profissional resultará assim da articulação entre a formação
inicial, a indução e a formação em serviço, num quadro de aprendizagem ao longo da vida
(Nóvoa, 2007).
Encarando a prática da profissão docente como inerentemente ligada a um dado
contexto, o desenvolvimento profissional não poderá ser encarado como isolado do meio em
que o professor está inserido. Os contextos organizacionais desempenham um papel central
no desenvolvimento profissional. Mediante o grau de significância que lhes for atribuído, as
atividades e tarefas realizadas nos contextos organizacionais têm implicações nas práticas
docentes, que produzem mudança na forma de encarar a profissão e que levam a uma
alteração de atitudes e de expectativas (Eraut, 2012; Braz, 2013).
Ainda encarando o desenvolvimento profissional como um processo contínuo,
Huberman (1995) salientou que este conceito se operacionaliza em princípios que
reconhecem a importância de encorajar a aprendizagem ao longo da vida, mais
especificamente devido à necessidade do desenvolvimento profissional (i) ocorrer de forma
contínua, ao longo da vida; (ii) ser autogerido, resultando da articulação do trabalho entre o
professor e a escola; (iii) ser apoiado pelos vários polos do sistema (escola, professor,
comunidade educativa, etc.); (iv) ter interesse para a escola e para o professor; (v) originar
44
processos de autorreflexão e autorregulação, e (vi) não poder ser encarado como
independente do desenvolvimento pessoal, considerando assim as especificidades das
características pessoais.
Aquele autor distingue assim a noção de carreira – a trajetória do sujeito numa dada
organização – de desenvolvimento profissional, relativo à trajetória que envolve a atividade
profissional e a vida pessoal do professor, sendo que é da interação entre estes três eixos –
carreira, exercício profissional, dimensão pessoal - que resulta o Ciclo de Vida do Professor.
De acordo com Huberman (1995), o desenvolvimento profissional docente está
associado a cinco fases de carreira: a exploração, entrada na carreira (1-3 anos); a
estabilização, onde se dá a consolidação do repertório pedagógico (4-5 anos); a
diversificação/questionamento (7-25 anos); o conservadorismo, que pode ser vivido com
serenidade ou com um certo distanciamento afetivo (25-35 anos); e por último, o
desinvestimento (35-40 anos).
Nesta visão, a primeira fase corresponde ao início de carreira, altura em que o
professor se confronta a novidade das suas funções e das suas tarefas, confrontando as
situações com as expectativas que trazia da sua formação inicial. Desta fase podem advir dois
tipos de resposta dos docentes (podendo ambas existir em simultâneo), uma referente à
descoberta – onde as novas experiências podem levar ao sucesso e a uma identificação
profissional – e outra à sobrevivência que resulta do desajustamento de expectativas do
professor face à sua profissão.
Na fase de estabilização o professor tenderá a assumir um compromisso com a sua
profissão, assumindo definitivamente a sua identidade profissional. Espera-se ainda que haja
um acréscimo do sentimento de pertença e de competência e segurança na gestão do processo
de ensino-aprendizagem que levam por sua vez a uma maior confiança no desempenho
profissional.
45
Na terceira e na quarta fase Huberman salienta o movimento oscilatório existente nos
processos motivacionais. Durante estes dois períodos, o professor sente-se capaz de inovar e
de exercer funções de maior responsabilidade devido à confiança conquistada. Contudo, em
simultâneo existem momentos de questionamento gerados pela rotina e pelas normas
vigentes, que poderão originar reflexões sobre a adequação da carreira.
Huberman refere que os maiores níveis de desconforto profissional se encontram nos
professores durante os primeiros cinco anos de carreira voltando novamente a aumentar tais
sentimentos de desconforto após cerca de 16 anos no ensino. Estes valores justificam-se por
no período inicial da carreira os professores experienciarem os seus papéis, avaliando a sua
competência profissional, o que pode resultar em mal-estar. Já durante a fase dos 16 aos 26
anos de docência, vários professores tendem a por constantemente em questão a sua
profissão, vivendo com frequência sentimentos de desconforto resultante da monotonia do
quotidiano da sala de aula e da soma cumulativa de fracassos pessoais, sociais e profissionais.
Contudo, os professores que se encontram entre os 6 e os 15 anos de ensino, na segunda fase
identificada são os que consideram mais motivados, arrojados, por já terem dissipado os seus
medos iniciais e terem uma estabilidade e segurança profissional mais satisfatórias; sentindo
maior competência, segurança e autoconfiança profissional, devido em grande à relativização
dos insucessos.
Usando aquele modelo teórico como fundamento, Gonçalves (2009) analisou os
percursos profissionais de 42 professoras do 1ºCiclo do Ensino Básico do concelho de Olhão
através de entrevistas semiestruturadas com um cariz autobiográfico, procurando assim
identificar os traços caraterizadores da carreira identificados por Huberman. A análise aos
relatos das participantes na investigação salientou as cinco fases propostas, assinalando as
diversas características de cada momento da carreira docente.
46
Guskey (2002) refere, do mesmo modo, o desenvolvimento profissional como um
processo, gradual e complexo, que acontece quando o professor atribui significados às
aprendizagens que faz, conseguindo aplicá-las num contexto. Este percurso pode caracterizar-
se por alguma ansiedade, devido a receios que possam ser sentidos na implementação de
estratégias de ensino aprendizagem diferentes das anteriores, dificultando assim a alteração
das práticas docentes.
Entende-se consequentemente o desenvolvimento profissional docente como um
processo contínuo, caracterizado pela transformação e/ou evolução dos professores, não
sendo independente da trajetória pessoal e do contexto onde cada indivíduo está inserido.
Esse percurso é marcado pela segurança, ansiedade e incerteza características de cada
desenvolvimento, podendo ser potenciadas ou anuladas consoante o estádio em que cada
professor se encontra nas várias fases da carreira.
2.2.2 Características do Desenvolvimento Profissional.
Simultaneamente à conceção de desenvolvimento profissional docente como um
processo ao longo da vida, para uma perceção clara do conceito é necessário analisar os seus
diferentes domínios e a sua consequente operacionalização.
Embora alguns autores tendem a considerar o conceito de desenvolvimento
profissional como equivalente a formação contínua, Imbernón (2005) contraria essa
perspetiva referindo que o desenvolvimento profissional representa mais do que formação
profissional. Para o autor é necessário ter em consideração aspetos laborais, como a
remuneração, o ambiente de trabalho, a estabilidade ou a promoção, aspetos sociais e
pessoais. No mesmo sentido, Fullan (1990) refere uma diferenciação entre desenvolvimento
47
profissional e staff development, conceito este relativo a aspetos mais técnicos da
profissionalidade, como as crenças ou conhecimentos profissionais. Esta distinção é ainda
reforçada por autores como Estrela e Estrela (2006) ou Flores (2007) que salientam a ideia do
desenvolvimento profissional abarcar atividades de formação contínua, mas não se cingir a
estas.
Outros autores, como Howey (1985), referem que o desenvolvimento profissional
docente tem um carácter igualmente pessoal, alicerçado em diferentes dimensões que
contribuem para o enriquecimento do ser profissional: (i) dimensão pedagógica – relacionada
com atividades de ensino-aprendizagem; (ii) conhecimento e compreensão do próprio –
remetendo para a noção de autoconceito pessoal e profissional; (iii) desenvolvimento
cognitivo – relativa à aquisição de saberes, ao seu desenvolvimento e à adequação da sua
aplicação; (iv) desenvolvimento teórico e reflexivo sobre a sua prática profissional; (v)
desenvolvimento profissional através da investigação; e, por fim, desenvolvimento de
carreira.
Day (2001) entende, por sua vez, o desenvolvimento profissional como um processo
que envolve todas as experiências – planeadas ou espontâneas – que têm impacto no
professor, no grupo e na escola. Essas experiências tenderão a ser significativas e contribuir
para a melhoria das práticas de sala de aula e para o desenvolvimento do docente profissional
e pessoalmente.
A necessidade de refletir sobre domínios distintos dos científicos e dos pessoais é
salientada também por Korthagen (2009). Este autor refere a importância da reflexão no
desenvolvimento profissional docente, sendo esta alicerçada em seis níveis relacionados, e
que podem ser mobilizados intencionalmente, consoante a situação: o ambiente, relativo aos
alunos; o comportamento; as competências (numa dimensão profissional); as crenças; a
identidade pessoal e profissional; e, por fim, a missão, ligada aos ideais de cada professor.
48
Em consonância com as perspetivas anteriores está a visão de Krainer (2001), que
salienta que o desenvolvimento ocorre da interação de quatro atitudes e competências: a ação,
a reflexão, a autonomia e a colaboração, sendo a partir desta junção e complementaridade que
emergirão conhecimentos e práticas docentes adequadas às diferentes situações, sejam estas
individuais ou coletivas.
Hargreaves e Fullan (1992) referem três dimensões do desenvolvimento profissional
docente: os conhecimentos e as competências; a compreensão de si mesmo; e a mudança
ecológica. Estes domínios articulam-se, estabelecendo-se num conjunto comum a todos os
professores. Os conhecimentos e as competências referem-se à mobilização e adequação de
estratégias de ensino, passíveis de diversificação e de melhoria ao longo da carreira docente.
O desenvolvimento destes saberes (e da sua adequação e aplicação) é fundamental para a
progressão na e da carreira de todos os professores, motivando-os simultaneamente.
Uma segunda dimensão apontada por Hargreaves e Fullan (1992) refere-se à
necessidade de compreensão do próprio dum ponto de vista pessoal. As crenças e as atitudes
de cada um são fundamentais para a transformação e progressão do professor, não sendo
independentes da maturidade psicológica, do ciclo de vida e da carreira profissional. Assim,
este nível remete para uma estruturação clara da vida pessoal e profissional.
O terceiro domínio indicado por aqueles autores relaciona-se com o papel
desempenhado pelo meio, tendo este um caráter duplo: o contexto de trabalho (fatores
característicos da escola e do sistema educativo) e o contexto de ensino, que remete para a
cultura profissional do professor. Ambos os contextos são fundamentais para o
desenvolvimento profissional docente devido à influência que exercem nas práticas
pedagógicas.
O entendimento dos professores como atores do seu próprio desenvolvimento,
considerando os vários fatores em que estes estão envolvidos, abre a possibilidade de
49
equacionar o papel do modelo ecológico de Broffenbrenner (1996) à problemática do
desenvolvimento profissional docente, percecionando-o como um agente social que
influencia e é influenciado direta e indiretamente pelos diferentes contextos onde se encontra
inserido, a nível microssistémico, mesossistémico, exossistémico ou macrossistémico.
2.2.3 Contributos do Modelo Ecológico para o Desenvolvimento Profissional
Docente.
Como referido anteriormente, autores como Day (2001), Imbernón (2005) ou Ponte
(1998) entendem o desenvolvimento profissional docente como tendo associado em si mesmo
a ideia de que a capacitação do professor para o exercício da sua atividade profissional é um
processo dinâmico que envolve várias etapas, estando sempre em construção e imerso em
contextos específicos. Deste modo, assume-se que a aprendizagem do docente tem um forte
caráter situado em contextos profissionais, estando assim dependente dos ambientes
organizacionais e das condições nas quais os professores exercem a sua profissão (Herdeiro
& Silva, 2011).
O professor convive com as suas várias experiências (pessoais e profissionais) como
fatores essenciais ao seu desenvolvimento profissional, tornando-se assim ator do seu próprio
desenvolvimento e, neste processo, estão presentes diferentes dimensões das práticas em que
está envolvido, sejam-lhe estas externas ou internas. Encontramos deste modo uma
aproximação ao modelo ecológico do desenvolvimento humano de Bronfenbrenner (1993).
Este modelo insere-se num paradigma de contexto relativamente às teorias de
desenvolvimento humano, onde o conhecimento é entendido como uma construção social,
dependente da articulação das várias dimensões do sujeito, impossibilitando a perceção dos
50
indivíduos como independentes dos contextos onde se encontram. Para que ocorra
desenvolvimento, há uma contribuição de todas as variáveis envolvidas numa determinada
situação, que, no processo de influência mútua, levam a um progresso transformativo
(Pereira, 2012). O organismo humano deve então ser encarado como um todo funcional e
integrado, onde todos os processos (afetivos, cognitivos, emocionais e sociais) acontecem
simultânea e articuladamente, indo de encontro ao enunciado por Bronfenbrenner (1993)
“human beings are not only the partial products, but also the partial producers of their
environments” (p.6).
O modelo ecológico estabelece uma relação entre o meio e o desenvolvimento
humano, definindo a influência do contexto nas trajetórias evolutivas de cada sujeito e
considerando, em simultâneo, o papel do sujeito na construção daquele contexto. O meio e as
relações que cada pessoa estabelece com ele são assim fatores determinantes de
desenvolvimento, podendo condicioná-lo ou potenciá-lo.
A interação de cada pessoa com o ambiente é, desta forma, dual na medida em que a
adaptação é recíproca. Do mesmo modo que o sujeito é influenciado pelo meio, o meio é alvo
de influência do indivíduo, sendo ambos agentes dinâmicos do processo. Esta interação é
concebida “como uma série de estruturas encaixadas, uma dentro da outra, como um conjunto
de bonecas russas” (Bronfenbrenner, 1996, p.5), que contudo não se encontram fechadas,
nem obedecem a uma hierarquia estanque.
Do ponto de vista sistémico, o modelo ecológico carateriza-se pela reciprocidade
entre as partes, pela existência de flexibilidade e adaptação do sujeito ao meio, e vice-versa, e
pela interdependência e relação entre os diferentes níveis ambientais.
A ecologia do desenvolvimento humano é composta por quatro sistemas ou contextos
distintos, interrelacionados - Microssistema, Mesossistema, Exossistema e Macrossistema
(fig. 4), que integram cada pessoa no seu núcleo.
51
Figura 4: Modelo Ecológico do Desenvolvimento Humano de Bronfenbrenner
O Microssistema refere-se ao nível mais íntimo e imediato que se foca nas interações
mais próximas que o sujeito estabelece. Estas interações detêm um significado explícito para
cada pessoa. No segundo nível, o Mesossistema, situam-se as relações que cada um dos
espaços significativos estabelece entre si e entre si e o sujeito. Assim, quanto mais concretas
e ricas forem as interações entre os diferentes sistemas, mais eficaz e relevante será o
desenvolvimento.
O Exossistema situa-se num contexto mais vasto, que apesar de não ser alvo de
participação direta do sujeito é causador de influência no microssistema. Por último, o
Macrossistema integra os três sistemas anteriores, sendo constituído pelas crenças, valores e
ideologias da sociedade, que têm implicações diretas na forma de organização social e em
última instância no desenvolvimento pessoal e profissional de cada um.
52
A estes quatro níveis coexiste um quinto relativo ao Cronossistema que foca a
importância dos fatores temporais e do papel que estes desempenham na influência dos
acontecimentos e das transições que cada sujeito faz ao longo da sua vida.
Consequentemente, durante o processo de desenvolvimento, a inter-relação e a
interação do sujeito com os diferentes contextos com que interage leva à modificação de
características pessoais, levando a uma participação mais ativa e consciente nos vários
contextos em que se encontra (Pereira, 2012).
Num outro prisma, assinala-se também a relevância da articulação de quatro
conceitos-chave para o desenvolvimento humano: o processo, a pessoa, o contexto e o tempo,
sendo que estes conceitos têm igualmente uma relação direta com os níveis de
desenvolvimento de cada sujeito.
O processo refere-se a todas as interações que cada pessoa estabelece com outras
pessoas, com objetos e com símbolos do seu meio mais próximo. A pessoa salienta a
relevância dos fatores de ordem biológica do desenvolvimento e as características pessoais de
cada um, compreendendo deste modo três tipologias de características: as de estímulo
pessoal, responsáveis pela criação de expectativas; as de recurso, ligadas a aspetos
emocionais e cognitivos; e, as de força, relativas a fatores comportamentais e de
personalidade. Enquanto o contexto se refere ao ambiente que direta ou indiretamente
influencia o sujeito, o tempo, subdividido em microtempo (fase temporal em constante
desenvolvimento) e o Cronossistema remete para os processos de desenvolvimento e para os
seus padrões característicos.
O entendimento do sujeito como ator principal do seu próprio desenvolvimento, em
articulação sistemática e recíproca com o meio, contribui para o suporte deste modelo teórico
como fundamental para percecionar o desenvolvimento profissional. A compreensão de todos
os fatores internos e externos ao indivíduo será indicativa da medida em que ele se pode
53
desenvolver e de que forma esse desenvolvimento ocorrerá em articulação com o ambiente. O
sujeito nunca pode ser encarado como isolado do contexto onde se insere, “the surrounding
environment related to a societal framework (local, national and international) and/or
organisational context (family, friends, personal network, workplace) in relation to the
individual’s capacity plays a key role in development as a whole” (Christensen, 2010, p.
107).
A opção por este modelo como apoio à sustentação teórica neste estudo prende-se
com os contributos que o Modelo Ecológico pode trazer ao entendimento do
desenvolvimento profissional docente como característico dos professores, decorrente da
aprendizagem ao longo da vida e da carreira, suscetível às mudanças sociais e pessoais,
dependente da motivação intrínseca do próprio sujeito, estruturando-se no domínio dos
conhecimentos científicos, das atitudes, das relações interpessoais e nas competências ligadas
ao processo pedagógico.
Bronfenbrenner’s ecological theory of development has proven to be beneficial in
providing an insight into all the factors that play a role in the growth and
development of individuals. It also shows how all the factors are related to each other
and impact on the development cycle (Christensen, 2010, p. 103-104).
A transposição de cada um dos sistemas representados por Bronfenbrenner para o
contexto profissional dum professor compreende todas as dimensões presentes no sistema
educativo, seja num nível micro (o do próprio professor), num nível meso (referente por
exemplo aos colegas), no exossistema (ligado aos encarregados de educação) ou no
macrossistema (onde se localizam as alterações sociais e políticas). Deste modo, é através da
relação recíproca do professor com os vários sistemas que este se irá desenvolver. Esta ideia
encontra eco no Perfil geral de desempenho profissional do professor (Decreto-Lei
240/2001), que salienta o caráter social do docente. O mesmo pode ser encontrado em
54
diferentes estudos que referem a necessidade de encarar os professores como profissionais
complexos, que se desenvolvem num determinado contexto, influenciando e sendo
influenciados por este.
Assumindo, assim, as competências docentes como um conceito em desenvolvimento
quer de forma pessoal, quer profissional, estabeleceremos sempre uma ligação à noção de
desenvolvimento profissional, percecionando as relações entre estes conceitos.
2.3 Competências do século XXI e Desenvolvimento Profissional docente
Tendo por base o objetivo central desta investigação, importa debruçar-nos sobre a
relação entre os conceitos em evidência no estudo: competências (do século XXI) e
desenvolvimento profissional docente.
Considerar a docência, à semelhança de Esteves (2009), como uma profissão
complexa, implica percecioná-la como sendo caracterizada por vários fatores externos e
internos ao professor, nomeadamente critérios específicos de progressão na carreira,
multiplicidade de papéis desempenhados e alterações políticas e sociais constantes.
Esta perceção implica concomitantemente entender que, ao desempenhar a sua
profissão, cada professor enfrenta o desconhecido e a mudança obrigando-se a uma
complexidade de atitudes e comportamentos adaptáveis face a situações diversificadas. Como
referido em capítulos anteriores, Boterf (1997, citado por Esteves, 2009) perceciona seis
competências necessárias no desempenho de profissões complexas: i) saber agir com
pertinência; ii) saber mobilizar num dado contexto; iii) saber combinar; iv) saber transpor; v)
saber aprender e saber aprender a aprender e, por fim, vi) saber empenhar-se. Estas
competências são transpostas para a docência, possibilitando a reflexão sobre a profissão e
55
sobre as competências necessárias ao desempenho da mesma. Deste modo, ao articular
diferentes saberes docentes os professores estarão num processo de desenvolvimento
profissional e pessoal contínuo.
Consequentemente, para analisar e descrever quais as competências necessárias ao
professor do Ensino Básico para o séc. XXI tem que se considerar uma definição clara de
competência profissional, de desenvolvimento profissional e de competências para o século
XXI e as possíveis relações entre estes constructos. Entender, assim, competências como os
processos cognitivos que se mobiliza em situações específicas, refletindo sobre a sua
adequação, implica ponderar igualmente sobre o processo de desenvolvimento profissional
do professor e sobre a perceção deste em relação ao seu desempenho profissional.
Retomando Boterf, as competências profissionais resultam da mobilização e da
combinação de diversos saberes, recursos e atitudes num determinado contexto de trabalho.
No caso dos professores, quando estes atuam no seu campo profissional, aplicando os seus
conhecimentos (provenientes da articulação do sujeito com o meio), estão consequentemente
a desenvolver novas formas de utilização e de mobilização das competências já existentes e a
criar outras em simultâneo.
Costa (2008) salienta no estudo Competências TIC que, quando pensamos em
competências, não é aconselhável separar as dimensões técnicas e pedagógicas, atendendo às
características profissionais dos professores e às situações em que as suas práticas se
desenvolvem. Este autor salienta assim que as competências digitais dos professores devem
alicerçar-se num conjunto de fatores, nomeadamente “nas competências gerais, nos seus
conhecimentos prévios, de natureza científica e didática, adquirindo seu grau de
especificidade na situação pedagógica que medeiam” (p.57).
56
Juntamente à visão de Costa, Esteves (2003) refere que as crescentes exigências,
muitas das quais contraditórias, que se fazem atualmente ao sistema educativo dificultam a
construção clara de um perfil de competências profissionais (Leitão & Alarcão, 2006).
A visão destes autores – necessidade de multiplicidade de competências docentes –
vai ao encontro da que se adotou no que concerne à temática de competências para o séc.
XXI para o professor do Ensino Básico, aproximando-nos assim da abordagem utilizada pela
Partnership for 21-st century-skills (2009) e pela ISTE (2008) que entendem como
competências necessárias ao desenvolvimento no séc. XXI elementos como competências
metacognitivas, criatividade, competências digitais, técnicas, pensamento critico, de
comunicação ou cooperação e colaboração.
Autores como Midina Rivilla, Garrido e Romero (2011) salientam como saberes
fundamentais para a docência a competência em aprender, simultaneamente ao
desenvolvimento da utilização de ferramentas técnico-pedagógicas. Deste modo, há duas
dimensões de competências-chave no desenvolvimento da prática educativa: as competências
didático-pedagógicas e as competências técnico-didáticas, que incorporadas na prática
docente contribuem para o desenvolvimento profissional do professor. Como resposta a estas
mudanças, à globalização e às exigências da sociedade do século XXI, Leitão e Alarcão
(2006) defendem, por seu lado, um novo paradigma educativo centrado na valorização
humana e na pessoa como sujeito da sua própria educação, centrando-se assim no seu próprio
desenvolvimento profissional.
Parece ser neste momento consensual a necessidade de desenvolvimento de
competências docentes que concorram a aquisição de competências fundamentais aos alunos
e em simultâneo para um melhor sistema educativo (Comissão Europeia, 2008), sendo esta
necessidade fundamental para uma reflexão estrutural da profissão.
57
A finalizar, deve sublinhar-se que o entendimento da ideia de competência como um
constructo complexo, composto por conhecimentos, aptidões e atitudes pessoais e
profissionais mobilizadas numa determinada situação (pedagógica, didática, colaborativa ou
organizativa), considera necessariamente (i) a multidimensionalidade da docência, (ii) as
características pessoais do professor, (iii) as características do meio e (iv) a relação entre
estas variáveis. Essa interação contribui quer para o desenvolvimento do professor durante a
sua carreira, quer para uma maior reflexão e análise do professor sobre o seu
desenvolvimento, sendo, deste modo, uma relação iterativa. Percecionar competência como
um constructo modular complexo relativo a um conjunto de conhecimentos e capacidades
necessárias ao desenvolvimento de atividades específicas (Zabalza, 2007), subentende
também como necessária a reflexão sobre o processo de desenvolvimento profissional que
ocorre de forma natural e sequencial durante o desempenho da docência. Esta díade
fundamenta esta investigação, constituindo-se como campo teórico sustentador da construção
do referencial de competências para o séc. XXI do professor do Ensino Básico,
operacionalizado através de diferentes dimensões e domínios.
58
Capítulo 3 - Problema, questões de investigação e objetivos
59
É bastante consensual que as mudanças vividas numa variedade de esferas do
conhecimento – onde se inclui a educação – têm feito emergir desafios que levam à
necessidade fundamental de repensar a estrutura pedagógica dos sistemas educativos,
focando-se em particular nas necessidades que aquelas alterações trouxeram e trazem a
todos os intervenientes no sistema educativo, em particular aos professores.
Diferentes autores têm referido a importância crescente duma maior adequação
entre as exigências da sociedade do conhecimento e aquilo que é oferecido pela
estrutura escolar (Prensky, 2001; 2006 ou Trilling & Fadel, 2009), sendo este ajuste
justificado pelas exigências da própria sociedade. Trilling e Fadel (2009) salientam, por
exemplo, que apesar do desconhecimento do que será a sociedade nos próximos anos,
haverá um conjunto de competências fundamentais a desenvolver nos profissionais
atuais e nos futuros. Para aqueles autores, essas competências organizam-se em dois
conjuntos estruturais ligados por um lado à capacidade de adquirir e desenvolver
conhecimento e, por outro, à aplicação e adequação de competências relacionadas com a
resolução de problemas, com a comunicação e com o trabalho de equipa.
Partindo do pressuposto evidenciado e assumindo o caráter evolutivo e dinâmico
da profissão docente, parte-se para esta investigação encarando os professores como
polo fundamental do processo ensino-aprendizagem, refletindo consequentemente sobre
o seu desenvolvimento na profissão. Deste modo, a investigação assenta na procura de
(i) criação de condições que permitiam desenvolver uma compreensão da profissão
docente como elemento fundamental de qualquer processo educativo e, nesse quadro,
(ii) desenvolver uma reflexão sobre as competências necessárias ao desenvolvimento da
profissão docente no século XXI.
O enquadramento apresentado sugere consequentemente um problema
emergente que pode, em síntese, ser explicitado pela consideração do conjunto de
60
alterações vivenciadas na sociedade por via do seu desenvolvimento tecnológico que
sugerem o desenvolvimento de novas competências aos alunos cuja formação e
desenvolvimento é responsabilidade do sistema educativo, pelo que os professores (do
ensino básico) são confrontados com a necessidade de desenvolver eles próprios um
conjunto de novas competências; a questão chave deste estudo é: tendo por base as
alterações vivenciadas na sociedade por via do desenvolvimento tecnológico, que
competências para o século XXI os professores do ensino básico terão que
desenvolver?
Este problema será perspetivado através de (i) uma análise das conceções que os
elementos constitutivos do sistema educativo têm sobre a profissão docente e (ii) de
uma análise sobre o desenvolvimento profissional docente, conduzindo à formulação de
um quadro de referência de competências necessárias ao professor do séc. XXI.
O desenvolvimento de um quadro de referência implica a necessidade de
identificação, conceção e explicitação de um quadro conceptual que sustente o
referencial de competências dos professores (do Ensino Básico), através da
caracterização conceptual das relações entre as competências profissionais docentes
para o século XXI - que constitui assim o objetivo central deste estudo. Contudo, o
objetivo central deve ter uma operacionalização estruturante, que confira uma direção
central à investigação, delimitando simultaneamente as suas fronteiras de análise
(Coutinho, 2005).
Assim, como forma de estabelecer uma orientação focada para este estudo,
formula-se o seguinte conjunto de questões de investigação que desdobram o problema
formulado:
Q1: Que competências técnico-pedagógicas são necessárias ao professor do
Ensino Básico do séc. XXI?
61
Q2: Em que dimensões se operacionalizam as competências técnico-pedagógicas
do séc. XXI?
Q3: Como se organizam tais competências técnico-pedagógicas no quadro de
referência estruturador das práticas docentes no séc. XXI?
Q4: Em que medida as alterações sociais contribuem para o desenvolvimento do
quadro referencial e para a necessidade de desenvolvimento de competências para o
século XXI?
3.1 Objetivos de Investigação
Atendendo ao caráter desta investigação, procura-se delimitar o problema, o
objetivo central e as questões de investigação em objetivos específicos que suportem a
construção do referencial a desenvolver, sendo cada um destes objetivos desenvolvido e
operacionalizado num movimento contínuo e dual entre o campo empírico e o campo
teórico. Pretende-se deste modo relacionar os objetivos entre si, articulando-os ao
mesmo tempo com o quadro teórico abordado.
A multidimensionalidade da profissão docente tem sido alvo de um intenso
debate assente na conceptualização dos saberes profissionais inerentes ao
desenvolvimento e ao exercício da docência. A especificidade desta profissão encontra-
se assim intrinsecamente relacionada com o seu caráter diversificado.
Autores como Shulman (1987) ou Gauthier (2003) referem a diversidade de
saberes constituintes do ser-se professor. Se para Shulman é fundamental um diálogo
entre as dimensões científica, experiencial, investigativa e reflexiva, para Gauthier a
discussão prende-se entre os saberes disciplinares, os curriculares, os provenientes das
62
Ciências da Educação, os pedagógicos, os experienciais e os da ação. Os trabalhos
desenvolvidos por Esteves (2009) referem igualmente a complexidade da profissão
A conceção de multidimensionalidade é abordada igualmente no Perfil Geral de
Desempenho Docente (Decreto-Lei n.º 240/2001) que salienta a diversidade de saberes,
competências e meios que o professor deve desenvolver ao longo da sua carreira.
Assim, o primeiro objetivo específico da investigação prende-se com a análise da
multidimensionalidade da profissão docente e consequente identificação das
dimensões que a constituem. Através desta especificação procura-se sustentar
empiricamente a investigação, enquadrando do mesmo modo o referencial de
competências docentes.
Assumindo a multidimensionalidade da docência como fator característico e
essencial para a compreensão da profissão, importa que nos debrucemos também sobre
as competências necessárias ao desenvolvimento profissional do professor.
Diversos estudos têm sido feitos nesta temática, havendo uma forte tendência de
investigação no que concerne ao caráter construtivo das competências, caraterizadas por
serem um processo contínuo na vida do professor, suscetível de serem modificadas e
desenvolvidas ao longo da docência e características de um determinado contexto
(Alonso et al., 2002; Braslavsky, 2005; Jonnaert, 2002; Perrenoud, 2000). Assumindo
igualmente esta linha de investigação, a perceção do conceito de competência que se
assume, situa-se nesta visão. Deste modo, procura-se cingir a investigação quer nas
competências genéricas, nas características científicas, técnicas e pedagógicas, quer
focando os vários atributos pessoais.
A investigação no domínio das competências para o século XXI tem tido como
foco principal os futuros profissionais deste século, os alunos (ISTE, 2008; a enGauge
21st Century skills; Partnership for 21-st century-skills, 2009; Trilling & Fadel, 2009;
63
ou a OCDE), assinalando, como relevantes, competências de diferentes domínios
práticos, transversais e técnicos por um lado e, por outro, competências pessoais e não
específicas ao século XXI, com destaque nos processos cognitivos de análise e de
aplicação do conhecimento. Contudo, existem igualmente investigações neste domínio
que têm como foco principal o desenvolvimento de competências nos professores. Em
Portugal, os estudos de Conceição e Sousa (2012), Mesquita (2010) ou Sardo (2010)
basearam-se teoricamente na perspetiva de Perrenoud (2000), incidindo no
questionamento de professores no ativo ou futuros profissionais sobre quais as
competências que estes devem desenvolver. Sardo (2010) encontrou dados que indicam
uma perceção global positiva dos professores em relação às competências dos seus
pares, valorizando as competências pedagógicas e relacionais. Estes dados foram de
encontro aos obtidos por Conceição e Sousa (2012) e por Mesquita (2010) que
mostraram um maior enfoque nas competências pedagógicas por parte dos docentes.
Ao contrário das investigações anteriores, a opção neste estudo incidirá no
desenvolvimento da análise de competências para o século XXI dos professores, com
sustentação teórica diversificada. A identificação das competências técnico-
pedagógicas necessárias ao desenvolvimento da profissão docente, respeitando o
caráter multidimensional da docência é assim o segundo objetivo desta investigação.
Especificamente relacionado com o objetivo de investigação anterior encontra-se
o desenvolvimento dum referencial – constituído pelas competências necessárias,
identificadas através de revisão de literatura e confirmadas pelos dados obtidos
junto do campo empírico. Este terceiro objetivo procura estipular em que medida as
competências dos professores se organizam de acordo com o desenvolvimento da sua
profissão. Obedecendo aos normativos legais que regem a docência, nomeadamente o
Decreto-Lei 240/2001 e a Lei de Bases do Sistema Educativo, e ao Framework
64
estabelecido como delimitador da docência definido anteriormente, organizar-se-ão as
competências em quatro dimensões distintas: (i) Domínio profissional; (ii) Domínio
pedagógico; (iii) Domínio tecnológico e (iv) Domínio relações interpessoais e
institucionais.
Importa neste quadro adotar uma definição clara de Framework, sustentando o
referencial que se pretende desenvolver. Miles e Huberman (1994) definem este
conceito como uma estrutura que, gráfica ou textualmente, suporta a investigação,
define os conceitos-chave e as dimensões em desenvolvimento, fornecendo ao mesmo
tempo as possíveis relações entre variáveis de trabalho. Na mesma linha, Costa (2008)
aborda o conceito de referencial como um “modelo ou uma representação da realidade,
isto é, com um objecto com o qual podemos relacionar, comparar, a nossa actuação,
quer estejamos a falar de processos ou dos produtos dessa acção” (p. 54).
Tendo por base a visão do referencial como um modelo de estruturação
conceptual e de suporte à ação docente, pretende-se que o produto desenvolvido possa
por um lado auxiliar e orientar os professores no desenvolvimento da sua profissão e,
por outro, forneça dados que identifiquem esse mesmo desenvolvimento.
Complementarmente à identificação e à análise das competências necessárias ao
professor do século XXI, reconhece-se o caráter transformativo que as mudanças
tecnológicas tiveram na educação e na escola nas últimas décadas. Apesar da
diversidade de atividades de utilização das tecnologias em contexto de sala de aula por
parte dos professores (Fernandes, 2006; Alves, 2008; Pedro, 2011; Piedade, 2012), tem-
se tornado cada vez mais evidente que a utilização das tecnologias pode contribuir para
a alteração das práticas docentes.
Retomando, por um lado, a perceção de competência como um constructo
modular complexo composto por conhecimentos e capacidades mobilizadas perante
65
uma determinada situação e, por outro, o aspeto complexo da profissão docente,
subentende-se como fundamental (i) refletir sobre o processo de desenvolvimento
profissional e (ii) contribuir para perspetivar o desenvolvimento profissional
docente, assente no desenvolvimento do quadro de referência (Objetivo 4). Procura-
se assim aprofundar conceptualmente os tópicos abordados aquando da explicitação do
problema, produzindo deste modo conhecimento que sustente a reflexão sobre o
desenvolvimento profissional docente com importantes implicações sobre o sistema
educativo e a formação de professores.
66
Capítulo 4 – Metodologia
67
Assumindo a investigação como um processo dinâmico, não estanque, que
pretende ser um veículo construtor de conhecimento científico, torna-se necessário
desenvolver o processo investigativo considerando quer a formulação adequada e
rigorosa do problema de investigação, quer a sua operacionalização através duma
metodologia estruturada, objetiva e sistemática. O plano de investigação definido
representa deste modo “o elemento organizativo e o esquema global de orientação dos
trabalhos” (Almeida & Freire, 2003, p. 79), sendo fundamental como elemento
relacional dos vários elementos da investigação.
Assim, a opção por um determinado design metodológico está sempre
dependente da definição do problema e dos objetivos de investigação definidos,
implicando consequentemente a estruturação do processo de recolha e análise de dados
de acordo com o paradigma metodológico utilizado.
Desta forma, proceder-se-á neste capítulo a uma explicação e descrição da
metodologia utilizada na realização deste estudo. Organizar-se-á este capítulo tendo por
base o problema e as questões de investigação definidas, focando e justificando
inicialmente qual a abordagem metodológica selecionada para orientar a investigação.
Num momento posterior será feita a caracterização dos participantes, a apresentação dos
instrumentos e os procedimentos adotados para recolha e análise de dados.
Abordagem metodológica
As abordagens paradigmáticas na investigação em educação têm sido objeto de
uma ampla discussão, em especial no que concerne à existência e à pertinência dos
vários paradigmas. Este debate epistemológico, como salienta Coutinho (2011), centra-
68
se fundamentalmente na discussão sobre as vantagens e adequação dos paradigmas ditos
quantitativo e o qualitativo. Por seu lado, Pérez-Serrano (1998, citado por Coutinho,
2011) salienta a necessidade de romper com a rigidez na escolha de paradigmas,
encarando a necessidade de complementaridade e articulação entre eles para o
desenvolvimento da investigação. A visão de necessidade de rompimento com a lógica
dual dos paradigmas quantitativo e qualitativo encontra suporte em autores como
Johnson e Onwnegbuzie (2004) que salientam a ideia de existência de três paradigmas
de investigação, defendendo que a metodologia mista de investigação deve ser encarada
como o terceiro paradigma na investigação, dado que esta “is the third wave or the third
research movement, a movement that moves past the paradigm wars by offering a
logical and pratical alternative” (p.17). Creswell (2003; 2010) considera igualmente
que a investigação em educação pode categorizar-se essencialmente em três grandes
orientações metodológicas – abordagem quantitativa/experimental, abordagem
qualitativa e abordagem mista. Para este autor, a divisão em três orientações distintas
explica-se pela diversidade de processos metodológicos e de opções paradigmáticas
aquando do desenho da investigação.
Por exemplo, a metodologia qualitativa deve ser utilizada quando se procura
explorar e entender o significado de um dado comportamento ou problema,
compreendendo as questões e os procedimentos que emergem do ambiente e efetuando
a recolha de dados diretamente no contexto dos participantes na investigação. A análise
dos dados recolhidos é construída a partir das particularidades encontradas que são
entendidas como instâncias de fenómenos mais gerais. Esta abordagem aproxima-se
consequentemente dum paradigma construtivista, pela necessidade de estabelecer
explicações compreensíveis entre fenómenos, procurando compreender profundamente
uma dada realidade ou situação e construir teoria substantiva acerca dela.
69
Por outro lado, a metodologia quantitativa procura testar teorias, analisando as
relações entre variáveis mensuráveis. De forma mais concreta, nesta abordagem
entende-se os processos de testagem – que pretendem estabelecer explicações
compreensíveis entre diferentes fenómenos, aproximando-se do paradigma pós-
positivista – através do seu caráter interpretativo dos dados, cuja finalidade se associa à
compreensão profunda de uma determinada situação.
Por último, a abordagem mista, que combina ou associa métodos quantitativos e
qualitativos e envolve fundamentos específicos, utiliza e articula as abordagens
anteriores, assumindo deste modo a existência de uma dialética, dissonante e
complementar, entre aqueles dois tipos de métodos. Há assim uma aproximação ao
paradigma pragmático, cujo principal foco passa pelo problema de investigação e pelas
respostas a esse mesmo problema, recorrendo a várias abordagens metodológicas
(Creswell, 2010).
Autores como Tashakkori e Teddlie (1998) ou como Morgan (2007) referem a
importância de colocar o foco no problema de investigação, utilizando abordagens
investigativas pluralistas de forma a derivar conhecimento sobre essa mesma
problemática de investigação. Procura-se, desde o processo inicial de construção do
design investigativo, definir uma base lógica para a utilização combinada dos métodos
quantitativos e qualitativos, construindo desde logo o problema de investigação com
base nesta assunção.
Relativamente a esta abordagem, considera-se assim a complementaridade entre
as dimensões metodológicas quantitativas e qualitativas, englobando metodologias
diversificadas características de paradigmas quantitativos ou qualitativos. A
metodologia mista envolve deste modo as duas abordagens conjuntamente, sendo mais
do que a recolha e análise dos dois tipos de dados (Creswell, 2010). Em consonância
70
com esta ideia, o objetivo desta abordagem de investigação não passa por substituir as
abordagens quantitativa ou qualitativa, mas sim desenvolver uma outra perspetiva que
reúna os pontos fortes de ambas face a um dado problema de investigação.
Historicamente a investigação centrada no design misto de investigação inicia-se
por Campbell e Fiske (1959, cit. por Johnson, Onwnergbuzie & Turner, 2007) que
introduziram a ideia de triangulação vista como operacionalização múltipla de
desenvolvimento metodológico, sendo encarada como mais do que um processo de
validação de dados. O rompimento com o conceito de triangulação visto apenas como
um método de validar dados empíricos, trouxe um conjunto de novos procedimentos de
formulação de problemas e consequente operacionalização metodológica dos mesmos.
Denzin (1978), por exemplo, defende a ideia de várias tipologias de triangulação,
focadas em áreas tão distintas como a de revisão teórica (através da necessidade de
utilização de várias fontes), a triangulação de investigadores (recorrendo a
investigadores de áreas distintas) ou no próprio campo empírico (recorrendo à utilização
de múltiplos métodos de recolha de dados para analisar um dado problema).
A convergência das metodologias quantitativas e qualitativas como ponto central
num dado design metodológico encara-se como um processo contínuo a todo o
procedimento investigativo, iniciado desde o momento de revisão teórica, em que o
enquadramento teórico se sustenta através de investigações quantitativas e qualitativas,
passando pela formulação do problema de investigação, que deve entender na sua
formulação a ideia de abrangência metodológica, pelo plano de recolha de dados e, por
último, pela análise desses mesmos dados.
Coutinho (2005), na análise realizada à investigação na área das tecnologias de
informação e comunicação na educação desenvolvida entre 1985 e 2000, constata que
nos últimos anos a investigação empírica orientada para as metodologias mistas tem
71
aumentado. Os resultados daquele estudo mostraram igualmente que os investigadores
no domínio das tecnologias educativas têm centrado as suas investigações em campos
metodológicos mais flexíveis, “optando por planos de pesquisa plurimetodológicas sem
uma adesão clara a uma ou outra metodologia, a um ou outro paradigma, centrando a
atenção no problema” (p.11). Esses resultados estão em consonância com os
encontrados posteriormente por Matos, Pedro, Pedro e Cabral (2012; 2014) numa
análise às dissertações de mestrado e teses de doutoramento desenvolvidas na área das
tecnologias na educação entre 2005 e 2011 em Portugal, e que assinala a mudança na
predominância dos paradigmas de investigação eleitos neste domínio.
Collins, Onwnergbuzie e Sutton (2006) identificaram igualmente quatro motivos
para a utilização de uma metodologia mista: o enriquecimento de participantes, a
fidelidade de instrumentos, a integridade no tratamento de dados e o enriquecimento da
significância desses mesmos dados.
A esta conceptualização acrescentamos a visão defendida por Cohen, Manion e
Morrison (2007) através da metáfora ‘fitness to purpose’ (p. 78), assinalando deste
modo que são os propósitos do estudo que devem determinar a metodologia e o design
de investigação a desenvolver. Deste modo, o design metodológico de qualquer
investigação terá de passar pela adequação dos métodos, instrumentos e designs de
investigação ao problema de investigação definido. Os propósitos do estudo devem
determinar a metodologia e o design de investigação a desenvolver. Nesta perspetiva, a
abordagem à investigação deve ser assim (i) centrada no problema, visto o campo de
estudo ser vasto e complexo, coexistindo inúmeras variáveis externas e internas e (ii)
diversificada, adotando múltiplas perspetivas e combinando aspetos de cada um dos
paradigmas.
72
Assim, entendendo a educação como um campo de estudo abrangente e
multifacetado, no qual coexistem inúmeras variáveis que contribuem para a sua riqueza,
parece-nos relevante desenvolver a investigação sobre o problema formulado, com os
objetivos que foram explicitados. A diversidade e a complexidade das problemáticas na
educação exigem, deste modo, que a abordagem à investigação seja também ela
diversificada, adotando múltiplas perspetivas e combinando aspetos de cada um dos
paradigmas litigantes: “a precisão analítica do paradigma quantitativo, com a
autenticidade das abordagens sistémicas de cariz interpretativo” (Coutinho, 2011, p. 32).
Creswell (2010) indica três estratégias de investigação subjacentes aos métodos
mistos, nomeadamente: procedimentos sequenciais, relativos à procura de elaboração de
conclusões de um método com as de outro método, utilizando por exemplo métodos
qualitativos inicialmente como forma de explorar uma dada temática, usando num
segundo momento métodos quantitativos; procedimentos concomitantes, caracterizados
pela convergência de métodos para realizar uma dada investigação, recorrendo a uma
recolha de dados simultânea; e por fim, procedimentos transformativos, determinados
por uma abordagem teórica que perspetiva toda a investigação, sendo para isso
necessário recolher dados quantitativos e qualitativos, procurando assim responder às
questões definidas.
De forma sintética, na tabela seguinte explora-se a relação entre a tipologia de
investigação mista definida e a estratégia a utilizar no desenvolvimento metodológico
estruturado.
73
Tabela 2: Organização Design Metodológico Misto (adaptado de Creswell, 2010)
Tipologia Estratégia
Sequencial
Explanatória Recolha em primeiro plano de dados quantitativos;
desenvolvidos numa segunda fase através de dados qualitativos
Exploratória Recolha em primeiro plano de dados qualitativos;
desenvolvidos numa segunda fase através de dados quantitativos
Transformativa Dados qualitativos e quantitativos recolhidos em duas
fases distintas, sendo estas estruturadas a partir da perspetiva teórica
Concomitante
Triangulação Dados recolhidos ao mesmo tempo, sendo depois
comparados para perceber se há convergências, diferenças ou
combinações possíveis
Incorporada Dados recolhidos ao mesmo tempo, no entanto há
diferença de importância dos métodos, sendo que um dos métodos é
mais importante do que o outro
Transformativa Dados qualitativos e quantitativos recolhidos ao
mesmo tempo, sendo estas recolhas estruturadas a partir da perspetiva
teórica em que o investigador se situa
Considerando o objetivo fundamental deste estudo – a elaboração de um quadro
conceptual que suporte o desenvolvimento de um referencial de competências do
professor do Ensino Básico para o século XXI – a abordagem concomitante adequa-se
ao desenho metodológico. Devido ao seu carácter simultâneo, a recolha de dados é feita
conjuntamente, de forma a que a análise do problema de investigação seja abrangente,
considerando a sua multiplicidade de constituintes. A interpretação dos resultados é
efetuada mediante a incorporação e a integração dos resultados obtidos a partir dos
diferentes tipos de dados recolhidos (de natureza quantitativa e de natureza qualitativa).
Percebe-se, consequentemente, que nesta investigação se optou pela perspetiva
concomitante de triangulação, tendo sido elaborada uma recolha de dados simultânea,
74
dados esses que foram posteriormente comparados e articulados, percebendo assim
convergências entre os mesmos. A fusão dos dados recolhidos procurou extrair deles
resultados que permitam responder ao problema de investigação, abordando, integrando
e comparando as visões diversificadas dos participantes no estudo.
A argumentação colocada anteriormente sugere a necessidade de combinação
dos paradigmas que fazem apelo a dados empíricos de natureza quantitativa e
qualitativa, optando deste modo por uma metodologia mista, e pela multiplicidade de
métodos de recolha de dados, recorrendo à realização de entrevistas e questionários,
contribuindo assim para a qualidade da fundamentação empírica do estudo e para o
desenvolvimento do referencial de competências.
Johnson e Onwengbuzie (2004) referem esta ideia ao mencionarem que a
utilização de métodos quantitativos e qualitativos, de acordo com um determinado
framework definido pelo investigador, potencia a resposta adequada a um dado
problema de investigação, visto reunir os pontos fortes de ambas as abordagens
utilizadas. Deste modo, a utilização duma abordagem mista pretende responder
adequadamente à problemática de investigação, reunindo características metodológicas
distintas, aproximando-se assim do paradigma pragmático (Creswell, 2010).
Salientamos igualmente que esta investigação apresenta características da
abordagem de investigação descritiva, nomeadamente na necessidade de recolha de
dados que procurem descrever comportamentos, perceções e situações sob uma
determinada temática (Coutinho, 2005), neste caso as competências para o séc. XXI dos
professores do Ensino Básico.
Face ao problema de investigação formulado, que procura integrar na sua génese
“as informações sobre as tendências qualitativas e quantitativas do estudo” (Creswell,
75
2010, p. 153), a opção pela abordagem metodológica mista justificou-se pela
necessidade de obter respostas adequadas à problemática definida.
Salienta-se igualmente a relação entre campo teórico e campo empírico do
estudo como elemento fundamental para responder ao objetivo central da investigação,
operacionalizado através das questões de investigação. Deste modo, ao recorrer ao
questionamento de professores (através de questionários) e de stakeholders (através de
entrevistas) procurou-se responder à questão de investigação ‘Que competências
técnico-pedagógicas são necessárias ao professor do Ensino Básico do séc. XXI?’.
Consequentemente foi através da formulação deste quadro metodológico, em
articulação com uma análise oriunda do campo teórico, que se respondeu às restantes
questões de investigação, nomeadamente ‘Em que medida as tecnologias contribuem
para o desenvolvimento do quadro referencial?’, ‘Em que dimensões se
operacionalizam as competências técnico-pedagógicas do séc. XXI?’ e ‘Como se
organizam tais competências técnico-pedagógicas no quadro de referência estruturador
das práticas docentes no séc. XXI?’.
76
Figura 5: Relação entre questões de investigação e os campos teóricos e empíricos do estudo
4.1 Participantes
Tendo por base a abordagem metodológica escolhida para esta investigação,
procedeu-se ao desenho da recolha de dados junto de dois grupos de participantes
distintos. Esta opção fundamenta-se na necessidade de analisar dados provenientes dos
vários eixos do sistema educativo português, podendo assim comparar os resultados
encontrados, retirando daí convergências, diferenças e semelhanças (Creswell, 2010).
A abordagem mista adotada neste estudo possibilitou a utilização de diferentes
estratégias de recolha de dados, envolvendo quer a seleção de participantes específicos,
quer a amostragem aleatória. Este facto contribuiu para garantir a validade externa e
interna da investigação, através da utilização simultânea de métodos probabilísticos e
não probabilísticos (Teddlie & Yu, 2007).
77
Assim, e de forma a responder ao objetivo principal do estudo, a escolha do
campo empírico respeitou os seguintes critérios: (i) docentes do 2º e 3º ciclo do Ensino
Básico portugueses e (ii) stakeholders representativos dos diversos eixos da educação
em Portugal, especificamente elementos do Ministério da Educação e Ciência, da
Sociedade Civil e Diretores de Instituições de Ensino Superior. Pretendeu-se deste
modo desenvolver o processo investigativo, possibilitando coerência entre o problema,
o campo teórico e o campo empírico.
Figura 6: Relação dos dados a recolher na população com objetivo central da investigação
4.1.1 Professores do 2º e 3º ciclo do Ensino Básico.
Considerando a necessidade de recolher dados junto dos professores de Portugal
Continental, optou-se pela aplicação do instrumento (escala) a todos os docentes de 2º e
3º ciclo. Esta opção prendeu-se com a garantia de valorização da informação recolhida,
Referencial de competências dos professores (do Ensino Básico
Stakeholders
Responsáveis IES [contributos relativos à
formação inicial]
MEC [contributos sociopolíticos]
EE [contributos dos encarregados de
educação]
Sindicatos [contributos dos representantes dos
professores]
Professores
78
de forma a possibilitar posteriormente a generalização dos resultados encontrados.
Assim, de forma a atingir a totalidade dos professores portugueses, enviou-se a todas as
direções de agrupamentos de escolas o pedido de resposta ao questionário, solicitando
que o reencaminhassem para os respetivos docentes.
Aquando da recolha de dados para este estudo existiam 875 agrupamentos de
escola em Portugal Continental, distribuídos pelas cinco regiões educativas,
nomeadamente Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Centro, perfazendo
104625 professores, dos quais 28907 pertenciam ao 2º ciclo e 75718 ao 3º ciclo e
Ensino Secundário (GEPE, 2011). Realça-se que apesar da estrutura organizativa do
estatuto da carreira docente enquadre os professores do 2º e 3º ciclo no mesmo estatuto,
os grupos disciplinares encontram-se organizados de forma distinta, colocando os
professores de 3º ciclo juntamente com os de ensino secundário, inviabilizando a
possibilidade de especificar o número de docentes que leciona no 3º ciclo.
Figura 7: Distribuição de Agrupamentos por Direção Regional de Educação (MEC, 2013)
Nesta investigação participaram 2688 professores de 2º e 3º ciclo, sendo 2002
(74,5%) do sexo feminino e 686 do masculino (25,5%), distribuindo-se pelas cinco
regiões do país consistentemente com o número de escolas existentes nessas mesmas
regiões. Assim, foi no Norte e em Lisboa e Vale do Tejo que obtivemos mais respostas
(1065 e 818 respetivamente), seguido da região Centro com 495 professores. Sendo as
zonas do Alentejo e do Algarve as que têm menos professores a lecionar presentemente,
875 agrupamentos
45 - Algarve 99 - Alentejo 292 - LVT 161 - Centro 278 - Norte
79
foram igualmente as que tiveram uma menor representatividade, 172 docentes da região
do Alentejo e 138 do Algarve.
Figura 8: Distribuição dos participantes por grupo etário
Em relação à idade dos professores participantes, estes apresentaram uma
distribuição diversificada pelos cinco níveis referidos: Entre os 21 e os 30 anos – 26
professores; Entre os 31 e os 40 anos – 708; Entre os 41 e os 50 anos – 1105; Entre os
51 e os 60 anos – 805; e, por último com mais de 60 anos – 44 professores. Apresenta-
se no gráfico seguinte a distribuição por percentagens dos dados pelas faixas etárias.
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
Norte Centro Lisboa e
Vale do
Tejo
Alentejo Algarve
39,6
18,4
30,4
6,4 5,1
80
Figura 9: Distribuição dos participantes por grupo etário
Os participantes englobam professores com diferentes habilitações académicas,
embora uma larga maioria - 75,5% - seja licenciada (2031 professores). Assinala-se
igualmente que 555 docentes têm formação pós-graduada, dos quais 521 têm mestrado e
33 doutoramento. Por último 73 professores assinalaram que frequentaram o
Bacharelato e a opção Outro foi referida por 30.
Dado que se pretendia recolher dados junto de professores de 2º e 3º ciclo,
abordagem metodológica justificada pela regulamentação da profissão docente pelo
Ministério da Educação e Ciência [MEC], dos 2688 participantes nesta investigação 869
lecionam no 2ºciclo e 1819 no 3ºciclo. De forma a caraterizar os participantes,
procurou-se igualmente recolher informações sobre seu grupo disciplinar. Essa divisão
foi efetuada obedecendo igualmente à estruturação organizativa em 20 grupos
disciplinares do MEC.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Entre 21 e
30 anos
Entre 31 e
40 anos
Entre 41 e
50 anos
Entre 51 e
60 anos
Mais de 60
anos
1,0
26,3
41,1
29,9
1,6
81
Figura 10: Distribuição dos participantes por Grupo Disciplinar
Verifica-se através da análise do gráfico anterior que a maioria dos professores
pertence ao grupo de Línguas Estrangeiras, com 12,7%. Os grupos de Matemática e
Ciências, Matemática e Educação Física também se encontram representados de forma
assinalável. Relativamente aos grupos disciplinares de Música e Língua Inglesa não
houve qualquer docente que o identificasse como o seu grupo.
Procurou-se igualmente perceber em que medida os participantes da
investigação se organizavam relativamente ao número de anos de docência. Para isso
baseámo-nos nas categorias da teoria sobre o ciclo de vida profissional docente de
Huberman (1992). Assim, o Grupo 1, foi constituído pelos professores ‘Menos de 5
anos’ em exercício apresentando um total de 41 elementos, o Grupo 2 (Entre 5 a 10
anos de docência) apresentou um total de 200 elementos, o Grupo 3 (11 a 15 anos de
docência) com 459 elementos, o Grupo 4 (Entre 16 e 20 anos) com 667 professores e,
finalmente, o Grupo 5 (Mais de 20 anos) com 1321 elementos.
9,1 7,73,7 5,1 2,5
6,812,7
5,2 4,5 8,4 7,1 5,92,5 5,5
3,48,0
1,90,0
100,0
82
Tabela 3: Distribuição dos participantes por Anos de Docência
Anos de docência Nº elementos Percentagem
Menos de 5 anos 41 1,5
Entre 5 e 10 anos 200 7,4
Entre 11 e 15 anos 459 17,1
Entre 16 e 20 667 24,8
Mais de 20 1321 49,1
4.1.2 Stakeholders.
Atendendo ao objetivo central desta investigação, entendeu-se como essencial
recolher dados em vários setores do sistema educativo português, procurando assim
possibilitar um cruzamento de evidências relevantes para a construção do referencial de
competências do professor do ensino básico português.
Deste modo, optou-se por uma amostragem por conveniência (Cohen et al.,
2010; Creswell, 2010; Coutinho, 2011), garantindo assim que os participantes reuniam
as características necessárias à resposta ao problema de investigação definido. Este
processo de amostragem obedeceu a uma definição de critérios a priori baseados nos
objetivos de investigação, nomeadamente a garantia de que se recolheriam dados junto
de diferentes órgãos com responsabilidade no sistema educativo português.
Assim, a opção recaiu em cinco diferentes estruturas e respetivos
representantes: Ministério da Educação e Ciência (MEC); Associação de Pais; Diretores
de Instituições de Ensino Superior responsáveis pela formação inicial de professores do
Ensino Básico e, por último, Sindicatos de Professores.
83
4.2 Apresentação dos Instrumentos
Atendendo ao problema de investigação desenhado e ao seu carácter
metodológico misto, optou-se por desenvolver dois instrumentos para o processo de
recolha de dados, convergindo assim as metodologias qualitativas e quantitativas, de
forma a responder adequadamente à problemática em análise. Ao optar-se por uma
metodologia com este caráter, opção justificada anteriormente, é fundamental entender
os métodos de recolha de dados como diversificados e complementares e desenvolvidos
para responder aos objetivos desta investigação.
Deste modo, desenvolveu-se (i) uma escala psicométrica de self-report
organizada e disponibilizada no formato de um questionário online e (ii) um guião de
entrevista, tendo estas opções sido clarificadas através da formulação das questões de
investigação.
Mais especificamente, os métodos utilizados nesta investigação focaram-se nos:
docentes: nomeadamente na identificação de competências necessárias
ao desenvolvimento profissional docente no séc. XXI através da escala
de perceção de competências docentes para o século XXI;
stakeholders: com o objetivo de recolher conceções e opiniões
aprofundadas sobre o que se constitui como um professor
profissionalmente competente no séc. XXI e nas competências que estes
necessitam demonstrar (atual e futuramente).
No processo metodológico, a utilização de questionários e escalas é considerada
como pertinente quando se pretende obter e desenvolver conhecimento diversificado
(comportamentos, valores, atitudes, crenças ou opiniões) sobre características de uma
84
dada população (Hill & Hill, 2005). De encontro esta ideia associa-se a definição de
autores como Quivy e Campenhoudt (2008), segundo os quais um questionário:
consiste em colocar a um conjunto de inquiridos, (…), uma série de perguntas
relativas à sua situação social, profissional ou familiar, às suas opiniões, à sua
atitude em relação a opções ou a questões humanas e sociais, às suas
expectativas, ao seu nível de conhecimento ou de consciência de um
acontecimento ou de um problema, ou ainda sobre qualquer outro ponto que
interesse os investigadores (p.188).
A opção pela escala nesta investigação prendeu-se com a possibilidade de
recolher informação junto de um número elevado de participantes, trazendo
simultaneamente várias vantagens ao estudo. Assinala-se como principais vantagens a
possibilidade de quantificar de forma célere uma multiplicidade de dados, alcançando
em larga escala a população em estudo, a possibilidade de satisfação da exigência de
representatividade, a confidencialidade dos resultados, a uniformização e a sequência de
perguntas, e a diminuição de enviesamentos provocados pelo investigador.
No entanto, salienta-se igualmente que existem também algumas limitações,
como a ausência de auxílio imediato do investigador ou a possível reduzida taxa de
retorno.
Assumindo o problema e os objetivos de investigação definidos – construir um
referencial de competências para o séc. XXI do professor do Ensino Básico – optou-se
pelo desenvolvimento da escala de perceção de competências docentes para o séc. XXI
(Pedro & Matos, 2013) composta por duas partes distintas: parte I, onde se colocaram
um conjunto de questões relativas a dados de âmbito pessoal e profissional e parte II,
onde se listaram competências para o século XXI.
85
A escala desenvolvida foi disponibilizada em
http://c2ti.ie.ul.pt/questionarios/index.php/survey/index/sid/784988/lang/pt, ficando
deste modo disponível aos professores que participaram na investigação (Anexo A).
Relativamente às entrevistas realizadas, considera-se que através destas foi
possível obter visões diversificadas dos stakeholders considerados. A opção pela
entrevista enquanto técnica de recolha de dados por parte destes participantes assenta na
possibilidade de através deste método aceder às representações dos sujeitos sobre a
problemática em análise (Bell, 2004; Bogdan & Biklen, 1994; Estrela, 1990 ou Fontana &
Frey, 2003), permitindo igualmente o aprofundamento dos significados atribuídos às
experiências vivenciadas na primeira pessoa. A possibilidade de aceder às perceções dos
entrevistados sobre uma dada temática, permitindo simultaneamente o desenvolvimento
de conexões e relações entre conceitos, enriquecendo a investigação, é uma das
vantagens mais significativas da utilização deste método (Mack, Woodsong,
MacQueen, Guest & Namey, 2005).
Reforça-se ainda que a utilização simultânea destes dois métodos de recolha de
dados assentou na opção metodológica – metodologia mista de triangulação
concomitante – obedecendo deste modo à necessidade de resposta ao problema de
investigação desenhado.
4.2.1. Escala de perceção de competências docentes para o século XXI.
Atendendo à problemática de investigação, optou-se pela produção de uma
escala de importância, elaborada de raiz, que procura questionar os professores de 2º e
3º ciclo sobre a sua perceção na identificação de competências técnico-pedagógicas
86
necessárias ao desenvolvimento profissional dos professores no séc. XXI. A opção por
este método prendeu-se com o facto do mesmo trazer vantagens à investigação, tais
como a confidencialidade dos resultados ou a uniformização de formato de respostas
face à sequência de perguntas, ao mesmo tempo que se procurou abranger a totalidade
de professores do Ensino Básico português.
De forma a aceder a características descritivas dos participantes, o instrumento
incluiu uma folha-rosto, onde se questionaram os professores sobre alguns dados
pessoais-profissionais, como o sexo, a idade, o nível de ensino lecionado, o grupo
disciplinar onde se encontra integrado, os anos de serviço e a região do país onde se
encontra colocado. Contudo, não se pretendia analisar todos esses elementos no estudo,
não assumindo assim um caráter de variável.
O questionário envolveu quatro domínios: domínio profissional (DP), domínio
pedagógico (DPd), domínio tecnológico (DT) e domínio de relações interpessoais e
institucionais (DR), sendo que cada um destes resultou da revisão de literatura feita
sobre a temática em causa, tendo para isso sido analisados: (i) referenciais teóricos
relativos a competências para o século XXI, (ii) outros referenciais relativos a
competências profissionais de professores, (iii) a competências TIC e (iv) legislação
referente ao desenvolvimento profissional docente. Nesta análise procurou-se
desenvolver uma scoping literature review (Arksey & Omalley, 2005; Rumrill,
Fitzgerald & Merchant, 2010).
Segundo Davis, Drey & Gould (2009, cit. por Rumrill et al., 2010) os estudos
assentes numa investigação baseada em scoping literature review têm por objetivo
central a procura de linhas de desenvolvimento numa determinada temática. Deste modo
não têm um caráter sistemático e definido à partida, procurando analisar o âmbito em
que um determinado tema assenta. Ao contrário da revisão sistemática da literatura ou
87
da meta-análise, as bases de dados em que a investigação se sustenta têm diferentes
caráteres, podendo ser documentos formais, literatura específica da área, documentos
legais, estudos qualitativos ou quantitativos (Rumrill et al., 2010).
Desenvolvida em seis passos (identificação de questões de investigação;
identificação de trabalhos relevantes; seleção de trabalhos; esquematização; recolha,
sumarização e análise dos dados; procuras complementares) definem-se à partida
critérios de pesquisa que sustentem a investigação.
Assim, nesta investigação, e seguindo os passos anteriormente referidos, o
processo de seleção de documentos teve uma base diversificada, assumindo-se como
campo de pesquisa documentos legais, referenciais internacionais e investigação na
área.
No que concerne à análise dos referenciais teóricos relativos a competências do
século XXI, o processo de seleção assentou na aplicação de uma equação de pesquisa
com os seguintes descritores ou palavras-chave: 21st-century skills/ competences,
digital literacy/media literacy, skills/competences for tomorrow, new millennium
skills/competences, digital natives skills/competences, net-generation
skills/competences, organizados numa lógica conjuntiva (Pedro, Matos, Pedro &
Abrantes, 2011) e publicados posteriormente a 2005.
O corpus de dados ficou deste modo constituído por 13 referenciais, cujos dados
foram cruzados, originando os quatro domínios assinalados anteriormente. Este
cruzamento baseou-se nos princípios definidos anteriormente e sugeridos por Arksey e
Omalley (2005) ou por Rumrill et al. (2010).
88
Tabela 4: Referenciais no domínio das XXI Century Skills
Framework analisado Organização
Digital Transformation: a framework for ICT
literacy: A Report of the International ICT
Literacy Panel
Educational Testing Service (ETS)
Digital Competence for Lifelong Learning
Policy Brief
Institute for Prospective Technological
Studies
Standards for the 21st century learner American Association of School Librarians
America Association of school Librarians &
Association for Educational Communication
and Technology; Information Literacy
Standards for student learning
America Association of school Librarians &
Association for Educational Communication
and Technology
P21 Framework Definitions Document -
Partnership for 21st- century skills Partnership for 21-st century skills
PLA -Vienna Final recommendations on
digital competence report ICT PLA-Vienna
National Educational Technology Standards
(NETS-S) and Performance Indicators for
Students
The International Society for Technology in
Education
WP6 Digital Literacy and ICT Skills
Benchmarking in a Policy Perspective –
European Commission
Assessment Program Information and
Communication Technology Literacy 2008
Years 6 and 10
Ministerial Council for Education - Australia
enGauge 21st Century Skills: Literacy in the
Digital Age
North Central Regional Educational
Laboratory through the Metiri Group.
Department of Education 2008-2009 Colorado
Model Content Standards Review
The Colorado Model Content Standards
Organization for Economic Cooperation and
Development- 2005 OECD
Research: What it says about 1 to 1 learning Apple
Pedro et al. (2011)
Do mesmo modo, conduziu-se uma análise a documentos relativos a
competências profissionais docentes, nomeadamente a autores como Perrenoud (2001),
Sarramona (2007), Muñoz (2003), Esteves (2009) e a relatórios resultantes de projetos
como TEVAL II - Innovative Evaluation Model in Teaching and Training
Organizations (2007).
89
A revisão de literatura incidiu igualmente sobre referenciais internacionais e
nacionais relativos a competências TIC, como o referencial da UNESCO (2011), o
documento produzido no âmbito do projeto iTEC (Pedro, Matos, Pedro & Abrantes,
2011) ou o Estudo Competências TIC (Costa, 2009). Por último consultou-se
igualmente a legislação portuguesa indicadora do Perfil geral de desempenho
profissional do educador de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário
(Decreto-Lei nº 240/2001).
O questionário, organizado de acordo com uma self-report scale, estrutura-se
num conjunto de 59 itens referentes a diferentes ações, com quatro opções de resposta
de formato Likert, variando entre “Nada importante” e “Muito importante”. Em todos os
itens a cotação das respostas é feita pela atribuição de 4 à opção de resposta “Muito
importante” e a atribuição de 1 à opção de resposta “Nada importante”. Estes itens
organizaram-se em torno de quatro domínios:
Domínio Profissional (DP): Esta dimensão refere-se a aspetos relativos
às funções desempenhadas pelos professores na sua prática profissional.
Requer-se assim responsabilidade do professor na sua evolução enquanto
profissional, obrigando-o a percecionar-se enquanto profissional. Integra
igualmente os saberes necessários a mobilizar em função das ações
concretas decorrentes do desenvolvimento da sua prática profissional.
Esta dimensão refere-se à perceção que os professores têm da sua
competência, englobando a sensação de confiança que o professor tem na
sala de aula, a sensação de se sentirem válidos enquanto pessoas capazes
de realizar as tarefas que lhe são pedidas ou de resolver problemas
imprevistos. Nesta dimensão estruturam-se 20 itens, dos quais se dá
como exemplo a Q13 “Procurar situações e contextos informais de
90
aprendizagem e de desenvolvimento profissional” ou a Q21 “Criar e
gerir projetos que potenciem a colaboração e tornem acessíveis trocas de
conhecimento e de experiências entre docentes”
Domínio Pedagógico (DPd): Este domínio é relativo às atividades
desenvolvidas pelo professor na gestão da sala de aula, promovendo
deste modo aprendizagens significativas, no quadro de uma relação de
rigor científico e metodológico. A dimensão em causa considera as
práticas docentes na gestão de sala de aula, o apoio a alunos com
necessidades educativas especiais, o desenho de cenários potenciadores
da promoção de competências sociais e relacionais, a adequação de
atividades de aprendizagem à diversidade de interesses, estilos e
motivações dos alunos. Relativamente a este domínio, desenvolveram-se
18 itens, tais como Q5 “Promover o desenvolvimento de autonomia dos
alunos” ou a Q27 “Mobilizar diferentes estratégias de envolvimento dos
alunos nas atividades letivas”.
Domínio Tecnológico (DT): Envolve a capacidade de usar tecnologias
digitais, ferramentas de comunicação de forma segura e crítica, refletindo
sobre a sua adequação às várias atividades profissionais, de lazer ou de
comunicação. Este domínio considera desta forma o conhecimento sobre
novos modelos de aprendizagem e consequente integração das
tecnologias nestes, remetendo igualmente para o nível de proficiência no
uso das tecnologias do professor. Relativamente a esta dimensão,
elaboraram-se 11 itens, nos quais se assinala por exemplo a Q1
“Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e inovação
91
suportado pela utilização das tecnologias” ou a Q44 “Ter consciência
legal e ética na utilização de tecnologias”;
Domínio Relações Interpessoais e Institucionais (DR): Esta dimensão
refere-se aos fatores associados às interações pessoais e profissionais
desenvolvidas entre professores e entre estes e os órgãos de gestão
escolar e restante comunidade escolar. Nesta dimensão estão em
desenvolvimento aspetos relativos à organização do meio escolar e/ou à
gestão das relações entre o docente e os encarregados de educação,
funcionários escolares ou entre pares. Alguns exemplos desta dimensão
são possíveis de verificar nos itens seguintes: Q18 “Colaborar com todos
os intervenientes no processo educativo, favorecendo o desenvolvimento
de relações entre os vários agentes educativos” ou Q35 “Colaborar e
cooperar com a comunidade escolar”.
Tabela 5: Organização de itens por Dimensão
Dimensão Itens
Domínio Profissional 2; 7; 9; 12; 13; 17; 19; 20; 21; 30; 40; 41; 45; 47; 48; 51; 53;
55; 56; 59
Domínio Pedagógico 5; 10; 14; 15; 16; 22; 23; 25; 26; 27; 29; 38; 42; 46; 54; 57;
58
Domínio Tecnológico 1; 3; 4; 24; 32; 33; 35; 37; 39; 44; 49
Domínio Relações Interpessoais
e Institucionais 6; 8; 11; 18; 28; 31; 34; 36; 43; 50; 52
A opção por uma escala ordinal de quatro pontos justifica-se pelo facto desta
investigação pretender que os participantes situassem as competências enunciadas em
termos de importância das mesmas para si, sendo deste modo consciente a opção de não
92
existência de um valor entendido como intermédio (como aconteceria numa escala de
cinco pontos).
4.2.1.1 processo de validação do instrumento.
Esta escala foi desenvolvida por Pedro e Matos (no prelo) e apresenta uma
natureza auto-descritiva, sendo que a sua finalidade passa por avaliar a perceção dos
professores sobre quais as competências necessárias ao desenvolvimento da sua
profissão nos próximos 5 anos.
Como se referiu, o instrumento apresenta um formato de resposta do tipo Likert,
composto por 59 itens, com quatro posicionamentos de resposta possíveis assinalando o
grau de importância que se associa a cada item, aparecendo o valor de resposta
associado a “1- Nada Importante”, o valor 2 a “Pouco Importante”, o 3 associa-se a
“Importante” e, por último, o 4 a “Muito importante”.
Atendendo a que a escala utilizada foi desenvolvida para esta investigação,
procedeu-se aos vários passos de validação da mesma, de forma a garantir a sua
validade e consistência interna.
Num primeiro momento procedeu-se à validação por especialistas, sendo o
instrumento analisado por cinco especialistas na área das TIC na educação, educação e
formação de professores, todos eles docentes universitários e investigadores na área
deste estudo. Deste processo resultaram diferentes sugestões relacionadas com a
reestruturação da formulação das competências indicadas e a alteração de itens em
dimensões distintas.
93
Num segundo momento realizou-se um processo de pré-testagem, procedendo-
se à análise da consistência interna do instrumento, testada com base no Coeficiente
Alpha de Cronbach. Esta opção baseou-se no critério metodológico de fidelidade
(Almeida & Freire, 2008), segundo o qual se procura perceber qual o grau de
consistência evidenciado entre as respostas dos participantes e cada uma das dimensões
da escala.
A pré-testagem efetuou-se a 30 participantes com características semelhantes às
da população a estudar. Estes participantes foram escolhidos por conveniência através
de critérios definidos a priori (profissão e situação profissional), recorrendo para isso às
listagens de alunos dos Mestrados em Educação do Instituto de Educação da
Universidade de Lisboa. De forma a proteger a confidencialidade dos dados, foi pedida
autorização aos coordenadores dos mestrados em causa e os participantes tomaram
conhecimento dos objetivos das respostas.
Os dados encontrados revelam valores indicativos de uma elevada consistência
interna ( =0.96). Segundo Hill e Hill (2005), os valores do Alpha de Cronbach
perfeitos serão iguais a um, sendo que como é praticamente impossível a obtenção
destes resultados, valores acima de 0.70 são considerados favoráveis.
Analisando a tabela 6, constata-se que a retirada de qualquer item não iria
aumentar a consistência interna da escala, atendendo ao valor de 0,96 razão pela qual se
mantiveram todos os itens (Anexo B).
94
Tabela 6: Consistência interna da escala de perceção de competências (n=30)
Média da escala
Variância da
escala (se o item
for apagado)
Correlação item-
total (Corrigido)
Alpha de Cronbach (se
o item for apagado)
Q1 258,30 375,589 ,309 ,959
Q2 258,45 368,155 ,658 ,958
Q3 258,75 370,092 ,419 ,959
Q4 258,25 377,566 ,211 ,960
Q5 258,25 367,461 ,856 ,958
Q6 258,25 371,250 ,612 ,959
Q7 258,20 370,800 ,721 ,959
Q8 258,35 367,082 ,766 ,958
Q9 259,05 364,366 ,585 ,959
Q10 258,50 372,368 ,430 ,959
Q11 258,85 367,818 ,480 ,959
Q12 258,40 372,147 ,380 ,959
Q13 258,40 376,674 ,221 ,960
Q14 258,40 370,147 ,569 ,959
Q15 258,20 371,116 ,698 ,959
Q16 259,35 365,397 ,453 ,959
Q17 258,75 364,408 ,648 ,958
Q18 258,65 368,871 ,517 ,959
Q19 258,65 369,608 ,582 ,959
Q20 258,95 363,208 ,635 ,958
Q21 258,55 368,366 ,633 ,959
Q22 258,35 373,397 ,412 ,959
Q23 258,55 372,050 ,444 ,959
Q24 258,70 372,432 ,318 ,960
Q25 258,20 371,116 ,698 ,959
Q26 258,40 370,042 ,575 ,959
Q27 258,65 365,187 ,680 ,958
Q28 258,75 374,513 ,350 ,959
Q29 258,25 371,461 ,599 ,959
Q30 259,25 371,039 ,357 ,960
Q31 258,65 368,239 ,545 ,959
Q32 258,60 380,147 ,013 ,961
Q33 258,35 379,292 ,087 ,960
Q34 258,70 374,116 ,292 ,960
Q35 258,40 367,305 ,598 ,959
Q36 258,60 368,358 ,637 ,959
Q37 258,45 369,734 ,575 ,959
Q38 258,25 375,461 ,344 ,959
95
Q39 258,70 368,642 ,537 ,959
Q40 258,20 371,116 ,698 ,959
Q41 259,25 367,461 ,493 ,959
Q42 258,55 368,050 ,650 ,958
Q43 259,10 365,463 ,474 ,959
Q44 258,45 371,313 ,492 ,959
Q45 259,55 367,313 ,453 ,959
Q46 258,45 363,208 ,769 ,958
Q47 258,50 370,789 ,372 ,959
Q48 258,90 356,200 ,731 ,958
Q49 258,50 367,105 ,588 ,959
Q50 258,90 358,411 ,716 ,958
Q51 258,65 362,239 ,637 ,958
Q52 259,10 364,516 ,466 ,959
Q53 258,75 357,671 ,752 ,958
Q54 258,40 364,253 ,736 ,958
Q55 258,55 371,734 ,385 ,959
Q56 258,45 358,155 ,784 ,958
Q57 258,40 360,884 ,776 ,958
Q58 258,50 361,737 ,651 ,958
Q59 258,45 361,839 ,831 ,958
Analisando a tabela anterior verifica-se que retirar qualquer um dos itens não
teria impacto no alpha encontrado, tendo-se por isso optado pela manutenção de todos.
Realizou-se também o mesmo processo de análise da consistência interna para
cada uma das dimensões da escala, tendo todas estas apresentado valores de
consistência interna elevados, situados entre 0.754 e 0.916 (Anexo B).
96
Tabela 7: Análise da Consistência interna das dimensões da escala de perceção de
competências
Dimensões Itens de Cronbach
Domínio Profissional 2; 7; 9; 12; 13; 17; 19; 20; 21; 30; 40;
41; 45; 47; 48; 51; 53; 55; 56; 59 0,853
Domínio Pedagógico 5; 10; 14; 15; 16; 22; 23; 25; 26; 27;
29; 38; 42; 46; 54; 57; 58 0,916
Domínio Tecnológico 1; 3; 4; 24; 32; 33; 35; 37; 39; 44; 49 0,754
Domínio Relações Interpessoais e
Institucionais 6; 8; 11; 18; 28; 31; 34; 36; 43; 50; 52 0,850
A opção pelo acréscimo de dois itens à escala inicialmente desenvolvida deveu-
se aos comentários feitos pelos participantes do pré-teste à necessidade de acrescentar
duas competências que não tinham sido inicialmente consideradas.
4.2.2 Guião de entrevista.
Relativamente à opção metodológica pela entrevista, esta foi assumida devido ao
carácter misto desta investigação. Atendendo à necessidade de dualidade na recolha de
dados, isto é, a professores e a stakeholders, entendeu-se as entrevistas como método
apropriado para aproximação entre investigador e participantes, procurando envolver
estes últimos na recolha de dados de forma consistente e propositada. Deste modo,
optou-se pela possibilidade de, através da entrevista, se aprofundar uma determinada
temática junto dos participantes da investigação, permitindo que estes tenham espaço e
liberdade para desenvolver as suas respostas, explorando simultaneamente os diversos
aspetos que considerem relevantes (Quivy & Campenhold, 2008). A entrevista permite
97
assim aceder às representações dos sujeitos relativamente às questões em análise, mais
concretamente no que concerne o problema de investigação definido, possibilitando em
simultâneo explorar e esclarecer as posições e opiniões dos entrevistados (Estrela,
1990). Isto vai de encontro a autores como Bogdan e Biklen (1994) que mencionam por
exemplo que a “entrevista é usada para recolher dados descritivos na linguagem do
próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre
a maneira como os sujeitos interpretam aspetos do mundo” (p.134).
Ao recorrer à entrevista como forma de recolha de dados junto de stakeholders,
tendo por base a necessidade de perceção de conceções aprofundadas sobre o que se
constitui como um professor profissionalmente competente no séc. XXI e das
competências que estes necessitam (atual e futuramente), procurou-se primeiramente
obter um quadro conceptual a partir do qual se pudesse enquadrar as opiniões
formuladas (Clandinin & Connelly, 2000).
Embora se tenha justificado a opção pela utilização da entrevista anteriormente,
não deixa de ser necessário realçar que este método levanta igualmente algumas
preocupações a nível de validade, nomeadamente no que se refere a possíveis
assimetrias entre o entrevistador e o entrevistado, ou à elaboração das respostas por
parte do entrevistado, sujeito por vezes à interferência de diferentes fatores associados
aos processos de produção do discurso, dependentes de processos cognitivos ou
emocionais (Cortazzi, 1993).
Considerou-se para o desenvolvimento do guião de entrevista os procedimentos
referidos na literatura para construção destas estruturas (Bogdan & Biklen, 1994;
Estrela, 1990; Mack et al., 2005; Tuckman, 2000), procurando que estes fossem
constituídos por um conjunto de dimensões, operacionalizadas em questões
orientadoras, que dessem resposta ao objetivo central da investigação. As temáticas e os
98
objetivos da entrevista foram deste modo definidos a priori, permitindo assim criar
relações entre as categorias definidas aquando do design metodológico.
O guião desenvolvido estruturou-se em torno de duas dimensões, sendo cada
uma operacionalizada em questões orientadoras. O desenvolvimento destas categorias
possibilitou igualmente criar uma estrutura teórico-prática para o momento de análise de
dados posterior. Atendendo ao carácter semidiretivo da entrevista, a ordem enunciada
das dimensões foi indicativa, sendo adaptada mediante o decorrer da entrevista (Anexo
C):
Contextualização social e novo paradigma escolar: Nesta dimensão
pretendeu abordar-se questões relativas ao paradigma atual do ensino
básico português, assinalando fatores que pudessem contribuir para uma
possível alteração desse paradigma. Assinalaram-se igualmente questões
referentes ao papel do professor na escola.
Competências docentes para o séc. XXI: No que concerne esta dimensão,
procurou-se questionar os entrevistados sobre as competências
necessárias ao professor do século XXI, abordando a existência ou não
dessas competências nos professores atuais. Referiram-se também
aspetos relativos à formação inicial e contínua de professores,
salientando em que medida essa formação desenvolve nos professores
atuais e nos futuros docentes competências para o século XXI.
Alicerçou-se este domínio em torno das quatro dimensões definidas
como organizadoras da profissão docente - Profissional, Pedagógico,
Técnico e Relações Interpessoais e Institucionais.
99
4.2.2.1.Processo de validação do instrumento.
Procedeu-se a um conjunto de passos de forma a garantir a validade do guião de
entrevista utilizado, assumindo os processos de validação dum instrumento qualitativo
com o mesmo rigor dum instrumento de caráter quantitativo, indo deste modo ao
encontro das preocupações assinaladas por autores como Cohen et al. (2007), Coutinho
(2008) ou Creswell (2007) que mencionam a falta de rigor científico encontrado por
vezes em investigações qualitativas.
Num primeiro momento, e repetindo o processo feito para a escala utilizada,
enviou-se o guião de entrevista a dois especialistas na área das TIC na educação,
educação e formação de professores. Deste processo resultaram diferentes sugestões
relacionadas com a ordem das questões formuladas e a junção de algumas
características de análise.
Posteriormente, realizou-se um processo de pré-testagem, realizando-se uma
entrevista de teste num participante escolhido por conveniência pelas características
semelhantes aos stakeholders a entrevistar. Esta testagem permitiu antever possíveis
falhas do guião e controlar tempos. Decorrente desta entrevista acrescentaram-se duas
subcategorias às categorias definidas previamente (Tabela 8).
100
Tabela 8: Estrutura de guião de entrevista utilizado
Questões orientadoras Domínio de trabalho
específico
Contextualização
social e novo
paradigma escolar
- Será que o mundo social atual (com as
tecnologias que o constituem e medeiam) está
a ou pode obrigar a escola a mudar de
paradigma para uma coisa que podemos
chamar de ‘escola do século XXI’?
- Em que se mostra esse paradigma?
- Está de facto em desenvolvimento? Quais os
sinais que temos?
- Se ainda não detetámos os sinais, poderemos
antecipar que o paradigma de escola vai
certamente mudar? Porquê?
- Pedagógico
- Profissional
- Tecnológico
- Relações interpessoais e
institucionais
- Qual o papel do professor na escola do séc.
XXI?
- Pensando na formação inicial, devem ser
desenvolvidas outras competências docentes?
Competências
docentes para o séc.
XXI
- A serem desenvolvidas outras competências,
quais devem ser desenvolvidas na formação
inicial?
- Poderá justificar a necessidade daquelas
competências
- Relação daquelas competências com o que
entendem como ‘novo paradigma de escola’
- Pedagógico
- Profissional
- Tecnológico
- Relações interpessoais e
institucionais
- Que competências devem ser desenvolvidas
na formação contínua e ao longo do
desenvolvimento profissional docente?
- Poderá justificar a necessidade daquelas
competências
- Pedagógico
- Profissional
- Tecnológico
- Relações interpessoais e
institucionais
101
4.3 Procedimentos de recolha e análise de dados
Atendendo à necessidade de assegurar que toda o estudo seria pautado pelo
respeito das normas éticas e parâmetros de qualidade, durante o desenvolvimento do
estudo utilizou-se como referência standards internacionais, especificamente os da
American Education Research Association (AERA, 2002) e os da British Educational
Research Association (2011). Salienta-se por exemplo, neste campo: (i) a necessidade
de garantia de consentimento informado, (ii) o direito à decisão de participação ou não
na investigação, (iii) o direito à proteção da intimidade, (iv) o direito à proteção contra o
prejuízo dos participantes; (v) o direito a um tratamento justo e equitativo e, por fim,
(vi) o direito ao anonimato e confidencialidade (Tuckman, 2005) – normas e orientações
que suportaram o delineamento e operacionalização do estudo no campo empírico.
Tendo por base a necessidade de recolher dados junto de professores e
stakeholders, realizaram-se dois procedimentos distintos de aplicação de instrumentos.
Em relação aos questionários aplicados aos professores, num primeiro momento,
após conclusão dos processos de validação dos instrumentos e ao abrigo do despacho
N.º15847/2007 que regulamenta a aplicação de questionários em meio escolar, a escala
utilizada foi submetida em http://mime.gepe.min-edu.pt/, sendo posteriormente
autorizada pelo Ministério da Educação e Ciência a sua utilização.
Posteriormente a escala foi colocada online, de forma a que pudesse ser enviado,
através de email, o pedido a todas direções de agrupamento de Portugal Continental
para reencaminharem o url do questionário aos professores de 2º e 3º ciclo do seu
agrupamento. A base de dados dos agrupamentos de escola foi obtida num duplo
movimento, quer através da pesquisa nos sítios das antigas Direções Regionais de
Educação, quer através dos dados fornecidos pela Rede de Bibliotecas Escolares.
102
Deste modo, o processo de recolha de dados aos professores obedeceu
igualmente a dois momentos distintos. Numa primeira fase enviou-se um email às
direções dos agrupamentos solicitando que reencaminhassem o email a todos os
docentes de 2º e 3º ciclo do seu agrupamento. Após um mês decorrido e atendendo que
apenas tinham respondido ao pedido cerca de 1000 professores, foi enviado um pedido
semelhante à Rede de Bibliotecas Escolares (MEC), que reencaminhou o pedido através
do email institucional. O email enviado em ambos os momentos apresentava o projeto
de investigação e respetivos os objetivos, o número de registo no sistema de
monitorização de inquéritos em meios escolar, e a garantia de anonimato e
confidencialidade de todos os dados facultados.
O questionário online foi construído com recurso à aplicação Lime Survey,
alojada nos servidores do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Esta opção
justificou-se pela necessidade de utilização duma aplicação de acesso livre (mas
denotando o vínculo institucional do processo), que pudesse ser alojada em servidores
internos, garantindo a exportação de dados posterior para programas de tratamento
estatístico como o Excel e o SPSS. O processo de recolha de dados aos professores
através de questionário decorreu entre Fevereiro e Junho de 2013.
No que concerne ao processo de organização e tratamento de dados recolhidos,
numa primeira fase exportou-se os dados diretamente da aplicação Lime Survey para
Excel, eliminando submissões nulas e duplas submissões, de forma a poder proceder à
transferência desta base de dados para o Software SPSS, versão 21.
Relativamente às entrevistas realizadas, após o envio de um email aos
entrevistados com a especificação dos objetivos da investigação realizada e
consequentemente da entrevista a desenvolver, procedeu-se à sua marcação. Todas as
103
entrevistas foram presenciais e iniciadas pela garantia de confidencialidade dos dados
recolhidos e pela autorização de gravação por parte dos participantes.
Posteriormente procedeu-se à transcrição integral do material, realizando assim
uma pré-análise do corpo de texto (Robert & Bouillaguet, 2002). Complementarmente
estruturou-se o processo de análise de conteúdo às entrevistas realizadas.
Segundo Osgood, (1985, cit. por Vala, 1986) a análise de conteúdo pode
estruturar-se em torno de três possibilidades: (i) numa análise de ocorrências, onde se
identifica a frequência dos objetos, estabelecendo por exemplo os temas principais do
corpus de dados analisado; (ii) num processo de análise avaliativa, que possibilita
verificar que tipo de atitudes os sujeitos têm face a um determinado conceito; (iii) ou
uma análise associativa, onde se desenvolvem possíveis associações e se procura
encontrar uma estrutura de dados. Para este autor, qualquer que seja a estrutura de
análise de conteúdo desenvolvida é necessário: (i) delimitar os objetivos e definir um
quadro teórico orientador da pesquisa; (ii) constituir um corpus de dados; (iii) definir
categorias de análise; (iv) definir unidades de análise; e (v) quantificar os dados.
Segundo autores como Ghiglione e Matalon (2001) a delimitação dos objetivos
de investigação e do quadro teórico orientador da pesquisa por um lado e a constituição
de um corpus de dados, por outro, determinam a forma como se procede à análise de
conteúdo. Deste modo, existirão dois tipos de procedimentos base na análise de dados:
(i) procedimentos fechados, em que o quadro teórico define as categorias de análise,
sendo estas estruturadoras da análise; e (ii) procedimentos abertos, onde embora haja
uma linha orientadora de trabalho, se segue um quadro de análise sem nada fixado,
selecionando-se as evidências, as diferenças, as semelhanças e as transformações
encontradas durante a análise de dados.
104
Consequentemente obter-se-á estruturas de categorização de dados diferentes
consoante o tipo de análise que se desenvolver. Podendo o processo de categorização
ocorrer a priori, a posteriori ou como um misto de ambos (segundo Vala, 1986;
Ghiglione & Matalon, 2001; Huberman & Miles, 1994), sugere-se que este
procedimento seja definido pelo design metodológico da investigação. No caso do
presente estudo, e atendendo à sua natureza mista (onde se recolheram dados
quantitativos e qualitativos) incide-se num processo de codificação dos dados
qualitativos a priori, utilizando como categorias de análise as dimensões e as
competências encontradas no processo de scoping literature review.
No que concerne os processos de codificação, Ghiglione e Matalon (2001)
referem que quando se criam categorias a priori, a preocupação deve incidir na
constituição de classes equivalentes, procurando considerar todos os dados válidos.
Noutra esfera, nos processos de análise baseados em categorias a posteriori, a
preocupação deverá incidir na testagem da validade interna, já que os enviesamentos
feitos pelo investigador serão mais frequentes.
Nesta investigação procedeu-se, como referido, a um processo de categorização
a priori, analisando o corpus de dados proveniente das respostas dadas pelos
stakeholders à luz dessas categorias e das unidades de análise consequentes, dum ponto
de vista quantitativo, de forma a analisarmos a frequência de cada resposta. A adoção
deste sistema de análise em detrimento de outro onde se considerassem respostas de
carácter contextual deveu-se à opção pela abordagem mista concomitante, em que se
codificam os dados qualitativos simultaneamente à interpretação dos dados
quantitativos. Para isso seguiu-se as indicações de Creswell (2010) onde se salienta que,
numa abordagem mista concomitante, pode ocorrer quantificação dos dados
qualitativos, com vista à comparação entre ambas as tipologias, quantitativa e
105
qualitativa. Essa quantificação desenvolve-se, de acordo com o autor, através da criação
de códigos qualitativos e da posterior contagem destes no corpus de dados.
106
Capítulo 5 – Análise e Discussão de Resultados
107
Entendendo que as escolhas metodológicas feitas nesta investigação foram
guiadas pela natureza e pela formulação do problema definido, assumindo assim o
carácter pragmático do estudo, os resultados serão estruturados com vista à resposta da
problemática definida. Dada a natureza mista da investigação, a análise dos dados terá
um âmbito quantitativo e qualitativo, incidindo igualmente numa relação entre as duas
abordagens (Creswell, 2010). Esta análise segue assim uma estratégia concomitante, em
que simultaneamente à codificação nos dados qualitativos se procede a uma
interpretação dos dados quantitativos, permitindo deste modo uma comparação entre
ambas as tipologias (Creswell, 2010).
Desta forma, considerando as questões e os objetivos de investigação, estrutura-
se a análise dos resultados e respetiva discussão de acordo com o seguinte:
i. Inicialmente definem-se as quatro dimensões organizadoras da profissão
docente (5.1), salientando a multidimensionalidade da docência;
ii. Num segundo momento apresentam-se os dados estatísticos descritivos
encontrados em relação às competências docentes para o século XXI
complementados através das entrevistas realizadas aos stakeholders
(5.2).
iii. A articulação entre aqueles dados segue a estruturação definida pelos
princípios da metodologia mista (Creswell, 2010; Onwnegbuzie &
Combs, 2011), organizando-se as competências para o século XXI
definidas como fundamentais à docência, de acordo com as quatro
dimensões organizadoras da profissão (5.3).
A produção destes resultados estrutura-se de forma a contribuir para a produção
de conclusões sobre o referencial de competências docentes para o século XXI e
108
simultaneamente contribuir para o desenvolvimento de perspetivas sobre o
desenvolvimento profissional docente.
5.1 Dimensões organizadoras da docência
Entendendo como objeto central desta investigação a profissão docente, iniciou-
se o processo de análise de dados procurando sustentar a revisão de literatura efetuada
relativamente à multidimensionalidade da docência.
Num primeiro momento, e como explicitado no capítulo 4.3 – Apresentação dos
Instrumentos – procurou-se, através duma scoping literature review, definir as
dimensões constituintes da docência.
De acordo com os seis passos necessários a este tipo de revisão de literatura
(identificação de questões de investigação; identificação de trabalhos relevantes; seleção
de trabalhos; esquematização; recolha, sumarização e análise dos dados; procuras
complementares) chegou-se a quatro dimensões estruturantes:
Dimensão Pedagógica
Dimensão Profissional
Dimensão Tecnológica
Dimensão de Relações Interpessoais e Institucionais
A análise destas quatro dimensões, seguindo a estratégia concomitante de
análise de dados, estrutura quer a investigação, quer o referencial de competências do
século XXI do professor do Ensino Básico.
Abordando num primeiro momento a escala de perceção de competências
docentes para o século XXI e as respostas dadas pelos 2688 participantes importa
109
analisar os valores obtidos relativamente à análise da consistência interna para cada uma
das suas dimensões, reforçando assim os dados obtidos aquando da validação da escala
(e apresentados no capítulo anterior).
Tabela 9: Análise da Consistência interna das dimensões da escala de perceção de
competências (n=2688)
Dimensões Itens de
Cronbach
Domínio Profissional
2; 7; 9; 12; 13; 17; 19; 20; 21;
30; 40; 41; 45; 47; 48; 51; 53;
55; 56; 59
0,902
Domínio Pedagógico 5; 10; 14; 15; 16; 22; 23; 25; 26;
27; 29; 38; 42; 46; 54; 57; 58 0,892
Domínio Tecnológico 1; 3; 4; 24; 32; 33; 35; 37; 39;
44; 49 0,878
Domínio Relações
Interpessoais e Institucionais
6; 8; 11; 18; 28; 31; 34; 36; 43;
50; 52 0,848
Constata-se através da leitura da tabela anterior que os valores de consistência
interna são elevados, situando-se entre 0.848 e 0.902. Estes dados reforçam a
favorabilidade da relação entre os domínios da docência e os itens que se considerou
como seus constituintes. Segundo Hill e Hill (2005) os valores de de Cronbach
perfeitos serão iguais a um, contudo dada a diminuta possibilidade de obtenção destes
resultados consideram-se como altamente favoráveis os valores superiores a 0,70. No
caso dos resultados obtidos nas respostas dos 2688 participantes, realçam-se as
dimensões profissional e pedagógica como tendo os valores mais elevados – próximos
do valor absoluto 1 - 0,902 e 0,892 respetivamente.
110
Deste modo, considerando as quatro dimensões referidas e confirmadas
estatisticamente, importa analisar os dados descritivos decorrentes da análise de dados.
Globalmente os quatro domínios apresentam valores médios satisfatórios, acima dos
três pontos da escala (valor associado ao grau ‘Importante’), sendo que o valor de
resposta se pode situar entre o valor mínimo 1 (associado à opção de resposta "Nada
Importante”) e o valor máximo 4 (referente à opção de resposta “Muito Importante”).
Tabela 10: Médias e desvios-padrão da escala de perceção de competências docentes para o
século XXI (n= 2688)
Domínios Médias Desvio-padrão
Profissional 3,386 0,335
Pedagógico 3,550 0,318
Tecnológico 3,347 0,384
Relações Interpessoais e
Institucionais 3,380 0,360
Debruçando-nos de forma mais específica sobre cada um dos domínios
estudados, verifica-se que a dimensão mais assinalada pelos professores respondentes
prende-se com a parte pedagógica (média de 3,55 numa escala de quatro pontos). O seu
valor médio revela um grau de importância elevado, atendendo a que o valor em causa
se encontra próximo do valor máximo 4 (relativo à opção de resposta ‘Muito
importante’). Por outro lado, é o domínio Tecnológico (valor médio de 3,35) que releva
valores de importância mais reduzidos, embora próximos do valor 3 na escala,
associado à opção de resposta ‘Importante’.
Os valores encontrados na aplicação da escala estão em consonância com outros
estudos que salientam a importância dada pelos docentes a estas quatro dimensões.
Conceição e Sousa (2012), numa investigação que procurou identificar junto de 179
111
docentes as competências que estes julgavam essenciais ao desempenho da sua
profissão, realçaram (i) a valorização que os professores fazem das aprendizagens dos
seus alunos e a necessidade de domínio dos conteúdos científicos (Dimensão
Pedagógica), (ii) a construção e a planificação de dispositivos, sequências e materiais
didáticos, contribuindo para a administração da sua formação contínua, atualizando os
recursos cognitivos exigidos (Dimensão Profissional) e (iii) a necessidade de adaptação
a um mundo altamente tecnológico, introduzindo as tecnologias de informação e
comunicação nas suas práticas (Domínio Tecnológico). Contudo, na investigação
referida a Dimensão Relacional e Interpessoal não foi considerada pelos docentes
participantes como relevante ao seu desenvolvimento, mostrando que o “professor de
hoje ainda não se envolve no trabalho em equipa, competência que pressupõe uma nova
dinâmica, no sentido de elaborar projetos em equipa, dirigir um grupo de trabalho,
promover reuniões” (p. 97).
Retomando o caráter metodológico misto desta investigação, os dados obtidos
através da escala aplicada aos docentes são complementados e comparados com os
obtidos nas entrevistas efetuadas aos stakeholders. Deste modo, o guião de entrevista
foi construído em torno das dimensões contextualização social e novo paradigma
escolar e competências docentes para o séc. XXI, sendo esta última operacionalizada
através dos quatro domínios entendidos como organizadores da docência – Profissional,
Pedagógico, Técnico e Relações Interpessoais e Institucionais – e definidos aquando da
scoping literature review. Procedeu-se de seguida a uma especificação destas quatro
dimensões em categorias de análise, potenciando assim a leitura e a produção de
resultados.
A partir de cada domínio, relacionando simultaneamente o campo teórico com o
produto das entrevistas realizadas aos stakeholders, definiu-se 21 categorias que
112
pretendem discriminar cada dimensão, de forma a auxiliar no seu processo de
entendimento. Assim, cada categoria surgiu num movimento complementar feito
através da leitura dos dados obtidos nas entrevistas efetuadas com a leitura de
documentos orientadores sobre a temática em causa:
Domínio Profissional
Esta primeira dimensão, à semelhança do realizado na escala desenvolvida para
a investigação (fortalecendo assim a triangulação característica da metodologia mista do
estudo), contém os diferentes saberes profissionais da docência, sendo estes ligados aos
processos de autonomia profissional, de capacidade de gestão de riscos ou de tomada de
decisão. Complementarmente consideram-se do mesmo modo os processos relacionados
com os processos metacognitivos e reflexivos do professor e a sua necessidade de
atualização. Consideraram-se sete categorias para este domínio.
Domínio Pedagógico
Composta por oito categorias, a dimensão pedagógica operacionaliza-se nas
referências relativas aos saberes pedagógicos de cada professor e às competências
relativas à diversificação de estratégias pedagógicas e de gestão do currículo.
Consideraram-se igualmente características intrínsecas do docente como a sua
necessidade de atualização pedagógica.
Domínio Tecnológico
As categorias deste domínio compreendem os aspetos relativos à utilização das
tecnologias digitais, quer técnica, quer pedagogicamente. Assente em quatro categorias
de análise, estratificou-se esta dimensão, por um lado no conhecimento sobre modelos
de aprendizagem e integração das tecnologias nestes e, por outro, no nível de
proficiência no uso das tecnologias.
Domínio Relações Interpessoais e Institucionais
113
Nesta dimensão foram incluídas todas as referências aos fatores associados às
interações pessoais e profissionais desenvolvidas entre professores e entre estes e os
órgãos de gestão escolar e restante comunidade escolar. Composto por quatro
categorias, o domínio engloba ainda aspetos relativos à gestão de conflitos e à
responsabilidade social.
Tabela 11: Categorização dos domínios organizadores da docência
Domínio Categorias
Profissional
Pensamento crítico
Dimensão cívica
Gestão de riscos
Atualização profissional
Processos metacognitivos
Autonomia
Processos de tomada de decisão
Pedagógico
Gestão do currículo
Diversificação de estratégias pedagógicas
Atualização pedagógica
Conhecimento científico
Envolvimento dos alunos
Saber pedagógico
Transdisciplinaridade de saberes
Tecnológico
Fluência tecnológica
Consciência global
Utilização ética e legal das tecnologias
Utilização pedagógica das tecnologias
Relações Interpessoais e
Institucionais
Responsabilidade social
Trabalho de pares/colaboração
Gestão de conflitos
114
Definidas as categorias como ponto de desenvolvimento dos domínios em
estudo, procedeu-se a uma análise das respostas dos stakeholders, de forma a
percecionar o grau de importância de cada dimensão no quadro do referencial de
competências para o séc. XXI do professor do Ensino Básico.
Analisando a tabela seguinte, podemos constatar que, das sete categorias
definidas para a dimensão Profissional, apenas cinco foram referidas pelos
entrevistados, contudo em níveis de indicação distintos.
Tabela 12: Presença de resposta dos Stakeholders para o domínio profissional
Domínio Subcategorias
Stakeholders
Instituição
Ensino
Superior
(IES)
Associação
de Pais
(AP)
Ministério
da
Educação
e Ciência
(MEC)
Sindicato
de
Professores
(SP)
Escola
Superior
de
Educação
(ESE)
Profissional
Pensamento crítico
Dimensão cívica
Gestão de riscos
Atualização
profissional
Processos
metacognitivos
Autonomia
Tomada de decisão
Negociação
Indicação de referência por parte dos stakeholders
No domínio Profissional, os Stakeholders entrevistados indicaram como
categoriais essenciais ao desenvolvimento da docência os processos metacognitivos e a
necessidade de atualização profissional. Enquanto os processos metacognitivos foram
115
referidos por quatro dos entrevistados, nomeadamente pelos responsáveis da Instituição
do Ensino Superior, da Associação de Pais, do Sindicato de Professores e da Escola
Superior de Educação, a atualização profissional é mencionada por três elementos (IES,
AP e SP). Estas duas categorias, de ordem interna ao professor, remetem para os
processos de reflexão sobre as próprias práticas profissionais, alicerçando em si aspetos
quer reflexivos, quer avaliativos, salientando-se por exemplo a ideia do
“desenvolvimento de capacidades de ordem cognitiva, apoiando-se em domínios
razoavelmente estruturados e que ainda hoje são reconhecidos na sociedade como os
domínios em que nós nos organizamos (IES)”.
No que se refere às categorias definidas para o domínio Pedagógico, estas
registaram um nível de incidência assinalável, com cinco sendo mencionadas por três ou
mais entrevistados e apenas uma a não ser referida (Avaliação). Estes dados encontram-
se em consonância com os obtidos na escala de competências aplicada aos professores,
onde a dimensão Pedagógica foi a que obteve um valor médio superior (3,550 numa
escala de quatro pontos).
Tabela 13: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Pedagógico
Stakeholders
Domínio Subcategorias IES AP MEC SP ESE
Pedagógico
Gestão do currículo
Diversificação de
estratégias pedagógicas
Conhecimento científico
Avaliação
Atualização pedagógica
Envolvimento dos alunos
Saber pedagógico
Transdisciplinaridade de
saberes
Indicação de referência por parte dos stakeholders
116
A categoria Conhecimento científico foi indicada por quatro dos entrevistados
como parte integrante da profissão docente, salientando-se na mesma medida a
Transdisciplinaridade de saberes. Estes dois fatores ligados aos saberes científicos e
didáticos do professor ganham relevo se analisados em conjunto com os normativos
regulamentares da profissão docente, que assinalam na Dimensão de desenvolvimento
do ensino e da aprendizagem que o professor deve “utilizar, de forma integrada, saberes
próprios da sua especialidade e saberes transversais e multidisciplinares adequados ao
respectivo nível e ciclo de ensino”. Associados a estas categorias, mas com menor
incidência – três referências – apresentam-se a necessidade de atualização pedagógica, a
diversificação de estratégias pedagógicas e a gestão do currículo.
No domínio Tecnológico encontra-se a única categoria de análise indicada pela
totalidade de todos os stakeholders, a fluência tecnológica. Por outro lado, a consciência
global não é referida por nenhum dos entrevistados, embora dois deles salientem a
necessidade dos aspetos éticos e legais da utilização das tecnologias como componentes
fundamentais à profissão docente, como referido na tabela seguinte. Estes dados,
contudo, não encontram consonância com os provenientes dos instrumentos aplicados
aos professores, onde a dimensão Tecnológica foi a que revelou valores mais baixos de
concordância (média de 3,347, numa escala de quatro pontos).
117
Tabela 14: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Tecnológico
Stakeholders
Domínio Subcategorias IES AP MEC SP ESE
Tecnológico
Fluência tecnológica
Consciência global
Utilização ética e legal das
tecnologias
Utilização pedagógica das
tecnologias
Indicação de referência por parte dos stakeholders
A quarta dimensão alicerçou-se, na mesma medida que as anteriores, num
conjunto de documentos reguladores da docência. Este domínio estruturado a partir da
necessidade do professor desempenhar a sua profissão de forma integrada com as
atividades desenvolvidas na escola e na restante comunidade refere a importância do
trabalho colaborativo entre docentes, sendo esta categoria referida por quatro dos
entrevistados (Associação de Pais, Ministério da Educação e Ciência, Sindicato e Escola
Superior de Educação). Destaca-se por exemplo “as escolas, agrupamentos que já são
gigantescos e que poderão ter elas esta capacidade de, através de trabalho colaborativo,
através de comunidades de prática, promover esta troca de experiências (MEC)”.
Tabela 15: Presença de resposta dos Stakeholders para o Domínio Relações Interpessoais e
Institucionais
Stakeholders
Domínio Subcategorias IES AP MEC SP ESE
Relações
Interpessoais e
Institucionais
Responsabilidade social
Trabalho de
pares/colaboração
Colaboração com os
encarregados de educação
Gestão de conflitos
Indicação de referência por parte dos stakeholders
118
Em síntese, e respondendo ao primeiro objetivo de investigação – analisar a
multidimensionalidade da profissão docente e identificar as dimensões que a constituem
– ao cruzar os dados obtidos quantitativa e qualitativamente, é possível entender que as
quatro dimensões consideradas, aquando da scoping literature review, como
organizadoras da docência são comprovadas quer pelos professores, quer pelos
stakeholders entrevistados. Todos os domínios são tidos como importantes ao
desenvolvimento da profissão docente, apresentando estes genericamente valores
médios elevados – por parte dos docentes – e sendo referidos pelos cinco representantes
dos sectores educativos.
Estes resultados são reforçados se analisados em comparação com os
documentos legislativos reguladores da docência, como o decreto-lei 240/2001, que
estrutura a profissão em quatro domínios: (i) profissional, social e ético; (ii)
desenvolvimento do ensino e da aprendizagem; (iii) participação na escola e de relação
com a comunidade; e (iv) desenvolvimento profissional ao longo da vida. A
multidimensionalidade da profissão docente percebe-se assim como elemento central ao
desenvolvimento da própria profissão, confirmando a complexidade da docência
referida por diferentes autores (Esteves, 2009; Shulman, 1987; Mishra, Spiro &
Feltovich, 1996; Koehler& Mishra, 2009; Esteves, 2009; Koehler, Mishra & Cain,
2013).
Deste modo, entender a docência como tendo um caráter multidimensional,
assente em fatores externos e internos ao professor, possibilita percecionar a prática
docente como estruturada quer a partir da experiência do professor com o meio, quer a
partir das características profissionais, pessoais, pedagógicas e metodológicas do
docente. Shulman (1987) assinala esta ideia ao salientar a complexidade da profissão
docente devido à mobilização de saberes científicos, metodológicos e afetivos por parte
119
do professor quando este necessita de escolher e adaptar as suas práticas mediante os
níveis de compreensão e de interesse dos alunos.
O desenvolvimento de competências nos quatro eixos – pedagógico,
profissional, relações interpessoais e institucionais e tecnológico - confirmados pelos
resultados obtidos através do questionamento dos participantes na investigação
(docentes e stakeholders) é, assim, fundamental, visto que se considera que os
professores não estão isolados do meio onde se inserem, influenciando e sendo
influenciados pelo seu contexto.
Esta ideia encontra eco no Modelo Ecológico de Bronfenbrenner (utilizado
como elemento para sustentação teórica do desenvolvimento profissional docente) por
se entender que o contexto profissional dum professor compreende as dimensões do
sistema educativo desde o nível micro (do próprio professor), aos níveis meso (referente
por exemplo aos colegas), exo (ligado aos encarregados de educação) e macro (onde se
localizam as alterações sociais e politicas). Realça-se, contudo, que estes níveis terão
pesos diferentes na estruturação de carreira do professor, de acordo com o envolvimento
deste nas práticas escolares, sociais, pedagógicas e metodológicas.
Considera-se consequentemente que qualquer reflexão a produzir sobre a
docência, seja no campo das competências docentes ou no do desenvolvimento
profissional, deve considerar a multidimensionalidade da profissão como característica
fundamental à sua estruturação, facto igualmente indicado pelos resultados encontrados
através do questionamento dos 2688 professores e cinco stakeholders entrevistados.
120
5.2 Competências docentes para o século XXI
Identificar as competências técnico-pedagógicas necessárias ao desenvolvimento
da profissão docente - respeitando o caráter multidimensional da docência - é o segundo
objetivo desta investigação, sendo este analisado através da articulação entre os dados
provenientes da (i) escala de competências docentes para o século XXI aplicada aos
professores e das (ii) entrevistas realizadas aos stakeholders.
Optou-se por organizar a análise e a discussão de resultados seguindo as
considerações metodológicas da abordagem mista seguida neste estudo. Deste modo, os
dados serão analisados num movimento iterativo realizado entre os dados relativos aos
professores, provenientes da análise estatística dos resultados obtidos na escala de
competências docentes, e os relativos às entrevistas realizadas aos stakeholders (mais
concretamente, nas respostas obtidas à questão ‘Que competências devem ser
desenvolvidas na formação contínua e ao longo do desenvolvimento profissional
docente?’). Obedecendo quer à categorização realizada previamente, quer às
competências definidas na escala de perceção de competências docentes para o século
XXI, os dados provenientes das entrevistas efetuadas foram estruturados de acordo com
os 59 itens que constituem a escala.
Optou-se assim por uma análise de conteúdo passível de quantificação, de forma
a obedecer aos princípios definidos por Tashakori e Teddlie (1998) ou por Creswell
(2010) que salientam a importância da transformação dos dados nas investigações
desenvolvidas numa perspetiva metodológica mista concomitante. Deste modo,
procurou-se neste estudo quantificar os dados qualitativos obtidos junto dos
stakeholders, permitindo desta forma uma articulação com os resultados quantitativos
resultantes da análise da escala aplicada aos docentes.
121
Opta-se igualmente pela apresentação dos dados dimensão a dimensão,
possibilitando um entendimento mais percetível das competências entendidas como
relevantes para os decisores educativos entrevistados e para os docentes participantes no
estudo.
Sendo a escala de competências docentes para o século XXI (Pedro & Matos, no
prelo) uma self-report scale de quatro pontos (em que o 1 corresponde a Nada
Importante e o 4 a Muito Importante) é de notar que as respostas dos 2688 professores
apresentaram um valor médio de 3.425, com um baixo desvio-padrão (0.311),
demonstrando poucas divergências nos resultados em relação à média registada (Anexo
D). Estes valores demonstram uma média favorável, registando resultados entre o ponto
3 e o ponto 4 (Importante e Muito Importante, respetivamente), o que destaca a
importância dada genericamente às 59 competências identificadas.
Pretendeu-se, no entanto, analisar de forma mais detalhada quais as
competências que os docentes consideravam como significativas ao desenvolvimento da
sua profissão. Desta forma, optou-se como critério de seleção considerar todas as
respostas registadas com valor igual ou superior a 3,5 arredondado à casa decimal
(numa escala de 4 pontos, sendo o primeiro entendido como Nada Importante e o quarto
como Muito Importante).
Obedecendo à distinção através das quatro dimensões definidas no capítulo
anterior, apresenta-se os resultados obtidos relativamente às competências indicadas
pelos professores e pelos stakeholders como fundamentais ao seu desenvolvimento nos
próximos cinco anos.
122
5.2.1. Dimensão Pedagógica.
Iniciando a análise de resultados pelos dados obtidos na escala de perceção de
competências docentes (dados provenientes da resposta dos professores), constata-se
que na dimensão Pedagógica (Anexo D) os valores médios foram, à semelhança da
totalidade da escala, elevados, tendo-se registado valores superiores a 3,5 [assinalados
no gráfico] na maioria das competências deste domínio, como é possível ver na figura
seguinte.
Figura 11: Valores Médios da Dimensão Pedagógica na escala de perceção de
competências docentes para o século XXI
Analisando o gráfico, verifica-se que 12 das competências desta dimensão têm
valores médios iguais ou superiores a 3,5, sendo a questão 5 (“Promover o
desenvolvimento de autonomia dos alunos”) a que revela um valor médio superior, mais
concretamente com uma média de 3,82 e um desvio-padrão de 0.393. Contudo, as
questões 15 (“Criar situações de aprendizagem para os alunos desenvolverem
pensamento crítico e resolução de problemas”) e 22 (“Procurar atualização de
conhecimento científico”) apresentam igualmente valores médios elevados (3,77 de
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
4,00
Q5 Q10 Q14 Q15 Q16 Q22 Q23 Q25 Q26 Q27 Q29 Q38 Q42 Q46 Q54 Q57 Q58
3,82
3,423,27
3,77
3,15
3,763,48
3,61 3,48 3,433,71 3,68
3,443,56 3,57 3,69
3,51
123
média e 0,436 de desvio-padrão e média igual a 3,76 e desvio-padrão de 0.440,
respetivamente). Estas competências obtiveram valores próximos do máximo da escala
(Valor 4 - Muito Importante), assumindo-se desta forma a sua grande importância para
os professores participantes. Num polo oposto encontram-se as competências “Refletir
criticamente sobre economia global e respetivas consequências para a educação” (valor
médio de 3,15 e desvio-padrão 0,638) e “Utilizar métodos de avaliação inovadores”,
com uma média de respostas de 3,27 e respetivo desvio-padrão de 0,599, estando ambos
os valores próximos ao valor 3 – Importante - na escala.
Considerando estes valores, registaram-se como significativas para os docentes
as 12 competências identificadas na tabela seguinte.
Tabela 16: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Pedagógico)
Identificação
item na
escala
Competências
Q5 Promover o desenvolvimento de autonomia dos alunos
Q15 Criar situações de aprendizagem para os alunos desenvolverem pensamento crítico e
resolução de problemas
Q22 Procurar atualização de conhecimento científico
Q23 Identificar as diferenças pessoais dos alunos
Q25 Mobilizar diferentes estratégias de envolvimento dos alunos nas atividades letivas
Q26 Flexibilizar as práticas letivas perante a diversidade de situações e saberes prévios dos
alunos
Q29 Elaborar atividades de aprendizagem que estimulem os alunos
Q38 Utilizar diferentes estratégias de ensino
Q46 Criar, em contexto de sala de aula, situações de aprendizagem focadas na resolução de
problemas reais
Q54 Desenvolver estratégias pedagógicas diferenciadas
Q57 Desenvolver conhecimento didático adequado à área disciplinar
Q58 Gerir o currículo mediante as necessidades de cada turma
124
Os resultados indicam a importância dada pelos professores a questões relativas
à diferenciação de estratégias pedagógicas, com um caráter inovador, considerando quer
a diversidade dos alunos e dos seus níveis de aprendizagem, quer questões
motivacionais. Na mesma linha, os docentes realçaram igualmente aspetos ligados à
diversidade de metodologias de trabalho, de forma a contribuir para a criação e
produção de materiais e recursos didáticos.
Estes resultados estão em consonância com os obtidos por autores como
Conceição et al. (2012) que referem a valorização que o professor dá às aprendizagens
dos alunos, procurando trabalhar as representações destes e construindo e planificando
simultaneamente sequências didáticas inovadoras e facilitadoras de aprendizagem.
Obedecendo aos princípios de triangulação de dados defendidos pela abordagem
metodológica mista adotada neste estudo, os resultados provenientes da análise da
escala foram cruzados com os obtidos através da análise às entrevistas realizadas com
os stakeholders. Para que fosse possível harmonizar os dados quantitativos
(provenientes da escala de perceção aplicada aos professores) com os dados qualitativos
(produzidos por análise de conteúdo efetuada às cinco entrevistas realizadas), utilizou-
se como critério de análise – de acordo com os princípios explicitados no capítulo 4 – as
competências elencadas no instrumento aplicado aos docentes, sendo que como fator de
identificação para o referencial entendeu-se como competências essenciais as
mencionadas por três ou mais stakeholders.
Deste modo, a análise do domínio pedagógico, alicerçado em 17 itens, resultou
numa análise de frequências representada pela tabela seguinte:
125
Tabela 17: Presença das competências docentes para o século XXI
Competências
Stakeholders
IES AP MEC SP ESE
Promover o desenvolvimento de autonomia dos
alunos
Utilizar a avaliação como elemento regulador das
aprendizagens
Utilizar métodos de avaliação inovadores
Criar situações de aprendizagem para os alunos
desenvolverem pensamento crítico e resolução de
problemas
Refletir criticamente sobre economia global e
respetivas consequências para a educação
Procurar atualização de conhecimento científico
Identificar as diferenças pessoais dos alunos
Mobilizar diferentes estratégias de envolvimento
dos alunos nas atividades letivas
Flexibilizar as práticas letivas perante a diversidade
de situações e saberes prévios dos alunos
Aplicar metodologias de acompanhamento didático
dos alunos
Elaborar atividades de aprendizagem que estimulem
os alunos
Utilizar diferentes estratégias de ensino
Utilizar de forma integrada saberes da sua
especialidade e saberes transversais e
multidisciplinares
Criar, em contexto de sala de aula, situações de
aprendizagem focadas na resolução de problemas
reais
Desenvolver estratégias pedagógicas diferenciadas
Desenvolver conhecimento didático adequado à área
disciplinar
Gerir o currículo mediante as necessidades de cada
turma
Indicação de referência por parte dos stakeholders
126
Na dimensão pedagógica os participantes entrevistados mencionaram seis
competências como fundamentais ao desenvolvimento da profissão docente nos
próximos cinco anos, sendo que quatro desses itens apresentaram a concordância dos
cinco entrevistados: “Aplicar metodologias de acompanhamento didático dos alunos”,
“Utilizar de forma integrada saberes da sua especialidade e saberes transversais e
multidisciplinares”, “Desenvolver conhecimento didático adequado à área disciplina” e
“Gerir o currículo mediante as necessidades de cada turma”, sendo todos estas
competências relacionadas com os saberes científicos e metodológicos do professor.
Embora com uma menor incidência a criação de “situações de aprendizagem para os
alunos desenvolverem pensamento crítico e resolução de problemas” é apresentada
também como significativa, sendo que apenas o representante do Ministério da
Educação e Ciência não a identificou como fundamental. Assinala-se ainda a procura de
“atualização de conhecimento científico”, referida pelos representantes do Ministério da
Educação e Ciência, do Sindicato dos Professores e da Escola Superior de Educação.
Por outro lado, várias competências não são referidas por nenhum dos
entrevistados, não sendo deste modo entendidas como fulcrais ao desenvolvimento
profissional docente no referencial de competências a desenvolver, nomeadamente
questões relativas a estratégias pedagógicas (“Desenvolver estratégias pedagógicas
diferenciadas “) e aos processos avaliativos (“Utilizar a avaliação como elemento
regulador das aprendizagens” e “Utilizar métodos de avaliação inovadores”). Contudo,
por se ter optado pela não enumeração das competências aquando do questionamento
aos stakeholoders, a indicação dos itens foi feita por inferência das respostas dadas,
sendo expectável a inexistência de referência a algumas dos itens.
Deste modo e salientando o referido por Kibrick, Van es, e Warschauer (2010)
“in the context of 21st century teaching and learning, teachers are called on to re-
127
envision the goals of teaching and learning” (p. 160), abarcando uma necessidade de
diversificação de competências docentes de âmbito pedagógico que respondam às
exigências e transformações ocorridas na sociedade e, consequentemente, no processo
de ensino-aprendizagem e seus intervenientes (alunos e professores).
A demonstração da importância dada à dimensão Pedagógica por parte dos
docentes e por parte dos stakeholders acarreta assim um domínio de estratégias e
metodologias de ensino-aprendizagem capazes de (i) contribuir para uma melhoria de
aprendizagem por parte dos alunos, (ii) estabelecer estratégias inovadoras de ensino que
sejam em simultâneo motivadoras para os alunos e para os professores e (iii) permitir
uma atualização de conhecimento científico, metodológico e tecnológico que contribua
para o desenvolvimento profissional docente.
5.2.2. Dimensão Profissional.
Estruturando a análise da dimensão Profissional, à semelhança do realizado na
dimensão Pedagógica, através da sinalização das competências referidas pelos docentes
e pelos stakeholders, inicia-se este capítulo pela identificação dos dados obtidos na
escala aplicada aos professores.
Neste instrumento, o domínio Profissional é composto por 20 itens, dos quais
sete obtiveram valores médios iguais ou superiores a 3,5, sendo que estes valores
diferiram de forma mais acentuada do que no domínio Pedagógico, tendo-se obtido uma
maior discrepância de valores nas diferentes competências. De forma global, o valor
médio desta dimensão situou-se nos 3,386 (com um desvio-padrão de 0,335), valor
128
próximo do ponto 3 (Importante), que representa um grau de favorabilidade em relação
à importância significativo.
Figura 12: Valores Médios da Dimensão Profissional na escala de perceção de competências
docentes para o século XXI
Ao observarmos o gráfico anterior verifica-se que as competências assinaladas
como mais significativas para os professores são “Refletir sobre as próprias práticas
docentes”, com um valor médio de 3,76 (e respetivo desvio-padrão de 0,458) e “Ter
autonomia no domínio profissional” (média de 3,72 e desvio-padrão de 0,468). Ambas
estas questões encontram-se com valores próximos do ponto quarto da escala, referente
a Muito Importante. Realça-se igualmente a questão 40 “Procurar atualização de
conhecimento didático-pedagógico” e a 55 “Gerir e ser autónomo no desenvolvimento
do próprio percurso de desenvolvimento profissional”, ambas com uma média de 3,66
(desvio-padrão de 0,496 e 0,543, respetivamente), relacionadas com os aspetos relativos
com o desenvolvimento profissional e a sua perceção deste. Por outro lado, a
competência “Participar em atividades de gestão e administração da escola” (com um
valor médio de 2,73 e desvio-padrão 0,722) apresentou os valores mais baixos desta
dimensão e da escala na sua globalidade. Realça-se na mesma medida as competências
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
4,00
Q2 Q7 Q9 Q12 Q13 Q17 Q19 Q20 Q21 Q30 Q40 Q41 Q45 Q47 Q48 Q51 Q53 Q55 Q56 Q59
3,44
3,76
3,41 3,37
3,72
3,213,35 3,33
3,46
3,07
3,66
3,05
2,73
3,333,27
3,36 3,41 3,503,62 3,66
129
“Refletir criticamente sobre economia global e respetivas consequências para a
educação” (média 3,05 e desvio-padrão de 0,636) e “Gerir equipas” (valor médio de
3,07 e desvio-padrão de 0,634), sendo estas três competências relacionadas com
questões de foro extrínseco ao docente.
Assim, para o domínio Profissional registaram-se como significativas para os
professores as sete competências identificadas na tabela seguinte.
Tabela 18: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio
Profissional)
Identificação
item na
escala
Competências
Q7 Refletir sobre as próprias práticas docentes
Q13 Ter autonomia no domínio profissional
Q21 Autorregular-se no processo ensino-aprendizagem
Q40 Procurar atualização de conhecimento didático-pedagógico
Q55 Gerir e ser autónomo no desenvolvimento do próprio percurso de
desenvolvimento profissional
Q56 Refletir sobre as suas práticas pedagógicas
Q59 Reconhecer a dimensão cívica e formativa das suas funções enquanto professor
A partir das competências que emergem dos dados obtidos junto dos professores
identificam-se duas tendências na dimensão profissional, uma ligada aos processos
autorreflexivos dos docentes – onde se insere a autorregulação, a reflexão sobre as
práticas docentes e pedagógicas – e outra relativa à gestão do próprio desenvolvimento
profissional, operacionalizando-se através da procura de atualização de conhecimento
didático-pedagógico e da autonomia sobre esses mesmos processos.
Esta dupla preocupação demonstrada pelos docentes é congruente com dados
obtidos quer por investigações anteriores, quer em relatórios internacionais sobre a
130
docência. Leitão e Alarcão (2006) referem, neste sentido, a necessidade de construção
por parte dos professores da capacidade de mobilização de diferentes reportórios usados
no desempenho das funções docentes, assente na dimensão de reflexão e “apontando
para uma competência metacognitiva indutora de transformabilidade que apela
constantemente à (re)conceptualização do acto pedagógico” (p.67). Já Conceição e Silva
(2012) obtiveram resultados junto dos 179 professores questionados que indicaram que
os docentes entendiam como fundamental a administração da sua própria formação
contínua, procurando desse modo atualizar os recursos cognitivos e as metodologias de
trabalho necessários ao desempenho da docência.
À semelhança do realizado anteriormente, e tendo como base de análise as
competências elencadas e apresentadas no instrumento aplicado aos professores, os
dados obtidos junto das entrevistas realizadas aos cinco stakeholders permitem antever
que o domínio profissional foi estruturado em torno de 20 competências relativas a
funções desempenhadas pelos professores na sua prática, resultando numa análise de
frequências representada pela seguinte tabela:
131
Tabela 19: Presença das competências docentes para o século XXI
Competências Stakeholders
IES AP MEC SP ESE
Participar em projetos de escola
Refletir sobre as próprias práticas docentes
Lidar com situações relacionadas com a gestão de
riscos na relação educativa
Procurar situações e contextos informais de
aprendizagem e de desenvolvimento profissional
Ter autonomia no domínio profissional
Participar em comunidades que potenciem a
reflexão e o desenvolvimento profissional
Criar e gerir projetos que potenciem a colaboração
e tornem acessíveis trocas de conhecimento e de
experiências entre docentes
Refletir sobre o próprio pensamento (processos
metacognitivos)
Autorregular-se no processo ensino-aprendizagem
Gerir equipas
Procurar atualização de conhecimento didático-
pedagógico
Refletir criticamente sobre economia global e
respetivas consequências para a educação
Participar em atividades de gestão e administração
da escola
Participar em ações de formação contínua
Refletir sobre aspetos éticos e deontológicos
inerentes à profissão docente
Elaborar estratégias de partilha de recursos
Integrar conhecimentos multidisciplinares na
prática profissional
Gerir e ser autónomo no desenvolvimento do
próprio percurso de desenvolvimento profissional
Refletir sobre as suas práticas pedagógicas
Reconhecer a dimensão cívica e formativa das
suas funções enquanto professor
Indicação de referência por parte dos stakeholders
132
Nesta dimensão, das 20 competências analisadas os entrevistados referem seis
como essenciais no processo de desenvolvimento profissional docente (assume-se
novamente como critério de indicação a referência de três ou mais stakeholders). Quatro
dos pontos considerados como fundamentais tiveram a concordância dos cinco
participantes: “Refletir sobre o próprio pensamento (processos metacognitivos) ”,
“Procurar atualização de conhecimento didático-pedagógico”, “Participar em ações de
formação contínua” e “Refletir sobre as suas práticas pedagógicas”, sendo que todos
estes itens se relacionam com aspetos relativos a fatores internos ao professor e à sua
perceção de desenvolvimento profissional como um processo contínuo. No mesmo
sentido das características internas ao sujeito, embora com menor incidência, já que a
competência em questão foi referida por três dos cinco participantes (Associação de
Pais, Sindicato de Professores e Escola Superior de Educação), encontra-se a reflexão
sobre as próprias práticas docentes. Igualmente com três referências salienta-se ainda a
necessidade de “Ter autonomia no domínio profissional”, destacada pelos
representantes da Associação de Pais, do Ministério da Educação e Ciência e da Escola
Superior de Educação.
À semelhança do ocorrido na dimensão pedagógica, diferentes competências
não foram salientadas por nenhum dos entrevistados. Este facto pode ser justificado pela
opção da não enumeração das competências por parte da entrevistadora, aquando do
questionamento aos stakeholoders, de forma a não potenciar enviesamentos nas
respostas dadas nas entrevistas. Salienta-se, contudo, e atendendo ao carácter das
respostas dadas que as competências não enunciadas se relacionam com os fatores
externos ao desenvolvimento profissional do professor.
133
A análise dos dados provenientes do campo empírico considerado salienta assim
que quer os professores respondentes, quer os stakeholders entrevistados consideram
duas áreas de desenvolvimento de competências para o século XXI:
i. a primeira referente aos processos metacognitivos dos
professores, considerando a autorregulação das suas práticas
docentes, pedagógicas e metodológicas, dum ponto de vista
pessoal, mas considerando-se como parte integrante dum sistema
educativo e social mais vasto;
ii. uma segunda relativa à gestão que o professor deve realizar sobre
o seu desenvolvimento profissional, de forma a contribuir para
práticas pedagógicas mais estruturadas e para uma autonomia
sobre a sua formação que contribua para uma maior
consciencialização do seu desenvolvimento enquanto
profissional.
Esta dupla preocupação, demonstrada pelos dados obtidos junto do campo
empírico, funciona de forma estrutural ao desenvolvimento docente já que se considera
o professor como o centro do seu próprio desenvolvimento, capaz de exercer a sua
profissão de acordo com as suas várias experiências pessoais e profissionais. Neste
sentido, Kobalia e Garakanidze (2010) referem a necessidade do professor desenvolver
o seu autoconceito, de forma a ser capaz de refletir sobre si mesmo e sobre as suas
práticas, potenciando deste modo o seu desenvolvimento profissional.
Do mesmo modo, Perrenoud (2001) salienta como uma das 10 competências a
desenvolver por parte dos professores “a administração da própria formação contínua”,
já que esta ideia influencia as restantes competências consideradas. Ao entender o
desenvolvimento profissional como um processo contínuo, não sendo assim nenhuma
134
competência adquirida estanque, torna-se fundamental que através de processos
metacognitivos o professor seja capaz de atualizar e adaptar os seus conhecimentos face
às suas necessidades, desenvolvendo simultaneamente novas competências. Deste
modo, “saber analisar e explicitar a sua prática permite o exercício de uma lucidez
profissional que jamais é total e definitiva” (p.161). Igualmente na linha teórica de
Perrenoud, os dados obtidos por Mesquita em 2010 – numa investigação com futuros
professores de Educação Visual do Ensino Básico sobre a sua perceção de quais as
competências necessárias a um bom exercício da docência – mostraram um enfoque,
por um lado, nos aspetos relativos à autorregulação do processo ensino-aprendizagem e,
por outro, na necessidade de autonomia sobre a sua formação, permitindo um
desenvolvimento consciente, permanente e ajustado às exigências do docente.
Efetivamente, os dados obtidos junto dos docentes e dos stakeholders são
demonstrativos da necessidade de desenvolvimento de competências para o século XXI
de âmbito reflexivo e metacognitivo na dimensão profissional. O reconhecimento destes
domínios como essenciais à profissão professor estabelece o docente como ator do seu
próprio desenvolvimento, sendo este capaz de incorporar as suas várias experiências
(pessoais, pedagógicas, metodológicas, didáticas, formativas e profissionais) como
elementos estruturantes à sua prática.
5.2.3. Dimensão Tecnológica.
Entendendo a docência como multidimensional, debruçamo-nos agora sobre a
dimensão Tecnológica (elemento central a esta investigação devido ao papel
transformativo que as mudanças tecnológicas têm desempenhado na educação e na
135
escola) onde se consideraram as competências ligadas (i) ao conhecimento sobre novos
modelos de aprendizagem e consequente integração das tecnologias nestes e (ii) ao nível
de proficiência no uso das tecnologias por parte do professor. À semelhança das
dimensões anteriores, os resultados assentam na análise da escala de perceção aplicada
aos professores e na análise de conteúdo realizada às entrevistas efetuadas junto dos
stakeholders.
Deste modo, no que concerne à escala de perceção, no domínio Tecnológico o
valor médio registado situou-se nos 3,347, com um desvio-padrão de 0,384, valor
situado próximo do ponto três da escala de importância, relativo ao grau Importante,
sendo que, das 11 competências que compunham esta dimensão, três foram assinaladas
com valores médios iguais ou superiores a 3,5.
Figura 13: Valores Médios da Dimensão Tecnológica na Escala de perceção de competências
docentes para o século XXI
Debruçando-nos de forma mais detalhada nos dados descritos no gráfico anterior
constata-se que é a competência “Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e
inovação suportado pela utilização das tecnologias” que é assinalada como mais
importante no domínio Tecnológico (valor médio de 3,55 e desvio-padrão de 0,525). No
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
4,00
Q1 Q3 Q4 Q24 Q32 Q33 Q35 Q37 Q39 Q44 Q49
3,55 3,46 3,54
3,193,37
3,25 3,24 3,24 3,213,43 3,35
136
entanto a questão “Ser proficiente na utilização de ferramentas digitais e de aplicações
online” obteve igualmente valores médios elevados (3,54 e desvio-padrão de 0,525).
Contudo, estes valores apesar de serem superiores a 3,5 encontram-se muito próximos
do mesmo. No eixo contrário, as competências “Utilizar as tecnologias como forma de
comunicação com pais, alunos e outros agentes educativos” e “Utilizar as tecnologias
digitais como ferramenta para desenvolver pensamento crítico dos alunos” registam os
valores mais baixos desta dimensão. Realça-se que ambas as competências se
relacionam com fatores externos ao professor.
Neste domínio verificaram-se três competências significativas para os
professores.
Tabela 20: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Tecnológico)
Identificação
item na
escala
Competências
Q1 Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e inovação suportado pela
utilização das tecnologias
Q3 Possuir conhecimentos técnicos específicos para trabalhar com alunos com
necessidades educativas especiais
Q4 Ser proficiente na utilização de ferramentas digitais e de aplicações online
Analisando os dados obtidos junto dos professores participantes subentende-se a
resistência que estes ainda demonstram na utilização das tecnologias nas suas práticas
letivas. Competências relacionadas com o contributo das tecnologias no processo
ensino-aprendizagem ou com o reconhecimento destas como contributo para o
desenvolvimento de pensamento critico junto dos alunos não foram consideradas como
fundamentais ao desenvolvimento da prática docente. Estes resultados encontram-se em
consonância com os apresentados por Brás, Miranda e Marôco (2014) que salientam
137
que, apesar do imenso desenvolvimento tecnológico das últimas décadas, os professores
ainda apresentam resistências à alteração das suas práticas letivas. No mesmo sentido,
Paiva (2002) e Fernandes (2006) referem que a utilização das tecnologias por parte dos
professores incide na preparação de aulas, colocando para segundo plano o uso das TIC
na interação direta com os alunos. Do mesmo modo, Piedade em 2010 refere que a
utilização das tecnologias recai sobre a preparação das atividades letivas, na elaboração
de materiais didáticos, textos e documentos de suporte às atividades planeadas com os
alunos. Rodriguez, Almerich, Gargallo & Aliaga (2010) referem igualmente que os
professores demonstram carências a nível do desenvolvimento de competências na área
das tecnologias, focando-se de forma mais sistemática na integração das TIC no plano
pessoal e profissional, relativos à organização e gestão de tarefas, na planificação de
aulas e na produção de materiais.
Estes dados tornam-se preocupantes na medida em que a investigação mostra
que experiências letivas inovadoras e eficazes ocorrem quando os docentes são capazes
de desenvolver e estruturar nas suas práticas de ensino as tecnologias (Daly, Pachler &
Pelletier, 2009), considerando-se deste modo que o desenvolvimento de competências
TIC de âmbito pedagógico e tecnológico é fulcral ao suporte do processo de ensino-
aprendizagem (Balanskat, 2010).
De forma a complementar os dados obtidos junto dos professores, e obedecendo
aos princípios definidos pela metodologia mista norteadora desta investigação,
apresentam-se igualmente os resultados obtidos através da realização de entrevistas aos
stakeholders.
Neste campo definiram-se 11 competências técnico-pedagógicas relacionadas
com a utilização de tecnologias e de ferramentas de comunicação em contexto educativo
138
que após a análise de conteúdo efetuada resultaram nas frequências representadas de
seguida:
Tabela 21: Presença das competências docentes para o século XXI
Competências Stakeholders
IES AP MEC SSP EESE
Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e
inovação suportado pela utilização das tecnologias
Possuir conhecimentos técnicos específicos para
trabalhar com alunos com necessidades educativas
especiais
Ser proficiente na utilização de ferramentas digitais e
de aplicações online
Utilizar as tecnologias como forma de comunicação
com pais, alunos e outros agentes educativos
Reconhecer a tecnologia como presente nas práticas
dos alunos
Aplicar ferramentas digitais e de aplicações online
no processo ensino-aprendizagem
Conhecer e explorar modelos de utilização de
tecnologias
Refletir sobre os contributos da utilização das
tecnologias no processo ensino-aprendizagem
Utilizar as tecnologias digitais como ferramenta para
desenvolver pensamento crítico dos alunos
Ter consciência legal e ética na utilização de
tecnologias
Utilizar intencionalmente as tecnologias nas práticas
letivas e não letivas
Indicação de referência por parte dos stakeholders
Analisando os dados anteriores é possível verificar que a dimensão tecnológica
revelou uma maior discrepância nas respostas dadas pelos stakeholders, sendo que
apenas numa questão houve ausência de registo “Ter consciência legal e ética na
utilização de tecnologias”.
139
No polo oposto encontra-se a competência ligada diretamente ao domínio
técnico da utilização das tecnologias “Ser proficiente na utilização de ferramentas
digitais e de aplicações online” que registou a concordância de todos os participantes na
entrevista. Por outro lado com quatro incidências, não tendo sido referido pelo
representante dos pais encontra-se a afirmação “Utilizar intencionalmente as tecnologias
nas práticas letivas e não letivas”, que se associa, por um lado, a fatores de ordem
pedagógica e, por outro, aos processos reflexivos de ordem interna de cada professor.
Igualmente ligadas aos fatores pedagógicos são enunciadas por três vezes quatro
competências: “Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e inovação
suportado pela utilização das tecnologias ”; “Reconhecer a tecnologia como presente
nas práticas dos alunos”; “Aplicar ferramentas digitais e de aplicações online no
processo ensino-aprendizagem” e “Utilizar as tecnologias digitais como ferramenta para
desenvolver pensamento crítico dos alunos”.
Na análise de frequências resultante da análise de conteúdo às entrevistas
realizadas constata-se ainda que os aspetos relacionados com a utilização das
tecnologias para colaborar com outras estruturas educativas foram considerados apenas
por um dos entrevistados – sindicato dos professores.
Considerando os resultados obtidos por ambos os grupos de participantes desta
investigação obtemos um conjunto de competências tecnológicas que abarcam domínios
técnicos, pedagógicos, éticos e sociais. Esta multiplicidade de áreas na dimensão
tecnológica é destacada por diversos autores (Peralta & Costa, 2007; Coutinho, 2008;
Coutinho, 2011; Koehler & Mishra, 2009; Koehler, Mishra & Cain, 2013; Pedro et al.,
2011; Rodriguez et al., 2010; Rodriguez et al., 2013) que sustentam a necessidade de
construção de diferentes saberes, de forma a que haja uma integração efetiva das
tecnologias no processo ensino-aprendizagem, não dividindo assim o desenvolvimento
140
de competências TIC em duas perspetivas distantes e indissociáveis (competências
técnicas e competências pedagógicas), mas sim encarando este processo como um
movimento integrador entre as duas dimensões.
5.2.4. Dimensão Relações Interpessoais e Institucionais.
O último domínio em análise prende-se com as Relações interpessoais e
institucionais, onde se procurou percecionar a importância de competências
relacionadas com (i) interações pessoais e profissionais desenvolvidas entre professores
e entre estes e os órgãos de gestão escolar e restante comunidade escolar, (ii) aspetos
relativos à organização do meio escolar e (iii) gestão das relações entre o docente e os
encarregados de educação, funcionários escolares ou entre pares.
Do mesmo modo que nas três dimensões anteriores, a análise do papel
desempenhado por estas competências no desenvolvimento do professor para o século
XXI assentou em dados provenientes da aplicação da escala de perceção de
competências aplicada aos docentes e das entrevistas realizadas aos decisores políticos e
educativos.
Analisando primeiramente o instrumento aplicado aos professores, obteve-se
nesta dimensão um valor médio de 3,380 com um desvio-padrão de 0,360, valor mais
baixo das quatro dimensões consideradas. Composta por 11 itens, cinco registaram
valores iguais ou superiores a 3,5, tendo um dos itens um valor perto dos 4 pontos,
referente a Muito Importante.
141
Figura 14: Valores Médios da Dimensão Relações Interpessoais e Institucionais
Ao observar-se o gráfico anterior é possível verificar que a competência “Atuar
de forma socialmente responsável” regista um valor médio expressivo de 3,83 (com um
desvio-padrão de 0,399), encontrando-se assim próxima do valor máximo da escala
(valor 4 relativo a Muito Importante). Consideram-se ainda como significativas as
competências “Perspetivar o trabalho com pares como fator de enriquecimento da
profissão”, “Colaborar com todos os intervenientes no processo educativo, favorecendo
o desenvolvimento de relações entre os vários agentes educativos” e “Colaborar e
cooperar com a comunidade escolar” que obtiveram valores médios assinaláveis,
superiores a 3,5, valor definido como padrão de muita importância (3,55 de média e
desvio-padrão de 0,545, média de 3,5 e desvio-padrão de 0,549 e valor médio de 3,5 e
0,538 de desvio-padrão respetivamente). Contudo, as competências “Participar em
projetos nacionais e internacionais” e “Promover o envolvimento dos encarregados de
educação na estrutura da escola” registaram os valores médios mais baixos nesta
dimensão.
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
4,00
Q6 Q8 Q11 Q18 Q28 Q31 Q34 Q36 Q43 Q50 Q52
3,83
3,55
3,343,50
3,30
3,46
2,99
3,503,29 3,23 3,22
142
Relativamente a este domínio foram assinaladas pelos 2688 professores
participantes na investigação cinco competências significativas para o desenvolvimento
da sua profissão nos próximos cinco anos.
Tabela 22: Competências docentes para o século XXI assinaladas (Domínio Relações
Interpessoais e Institucionais)
Identificação
item na
escala
Competências
Q6 Atuar de forma socialmente responsável
Q8 Perspetivar o trabalho com pares como fator de enriquecimento da profissão
Q18 Colaborar com todos os intervenientes no processo educativo, favorecendo o
desenvolvimento de relações entre os vários agentes educativos
Q31 Identificar e respeitar as diferenças culturais dos alunos e restante comunidade
Q36 Colaborar e cooperar com a comunidade escolar
Analisando a tabela anterior realça-se (i) o facto de duas das competências
identificadas se referirem a aspetos éticos e culturais relativos à articulação do professor
com a comunidade envolvente e (ii) três das competências estarem relacionadas com o
trabalho cooperativo dos docentes e com a interação destes enquanto agentes da
comunidade educativa envolvente.
As transformações ocorridas na sociedade, por um lado, e o desenvolvimento
crescente das tecnologias de informação e comunicação (TIC), por outro, têm
contribuído para uma nova visão da docência e das competências que a constituem.
Neste sentido, competências ligadas à cooperação profissional, ao trabalho em equipa e
com as entidades educativas, ao envolvimento com os encarregados de educação e às
preocupações éticas e sociais são primordiais na função de se ser professor.
143
Nesta linha, Perrenoud (2001) na sua abordagem teórica relativa às dez novas
competências para ensinar foca quatro ligadas às relações interpessoais e institucionais:
trabalhar em equipa (a emergência de novos papeis para o professor exige formas de
cooperação com os colegas, onde se partilhem recursos, ideias ou práticas); participar na
administração da escola (a participação do professor na estrutura da escola possibilitará
o desenvolvimento de competências especificas relacionadas com a elaboração e
negociação de um projeto escola, a administração dos recursos desta ou com a sua
coordenação); informar e envolver os pais (o diálogo com os encarregados de educação
é fundamental para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem, sendo que
simultaneamente possibilita ao professor desenvolver competências especificas ligadas
à interação, ao diálogo e ao envolvimento); e enfrentar os deveres e os dilemas éticos da
profissão. O autor defende que a partir destas quatro competências o professor será
capaz de se desenvolver adequadamente, respondendo às necessidades apresentadas no
processo pedagógico.
Os dados encontrados junto dos docentes na presente investigação vão assim de
encontro aos apresentados por Conceição e Sousa (2012) que mostram, num estudo com
179 professores sobre as competências necessárias ao desempenho da profissão docente,
que os itens ligados a este domínio foram considerados os menos importantes,
mostrando que ainda não existe um efetivo envolvimento dos professores com os seus
pares e com a estrutura educativa da sua escola.
Torna-se igualmente necessário cruzar estes dados com os obtidos junto dos
stakeholders. Deste modo, nesta dimensão estruturaram-se dez competências
relacionadas com a organização do meio escolar e/ou a gestão das relações entre o
docente e os encarregados de educação, funcionários escolares ou entre pares. Após a
144
análise de conteúdo efetuada às entrevistas dos cinco participantes obteve-se a tabela de
frequências seguinte:
Tabela 23: Presença das competências docentes para o século XXI
Competências Stakeholders
IES AP MEC SP ESE
Atuar de forma socialmente responsável
Perspetivar o trabalho com pares como fator de
enriquecimento da profissão
Compreender as tendências dos valores e crenças do
mundo social
Colaborar com todos os intervenientes no processo
educativo, favorecendo o desenvolvimento de
relações entre os vários agentes educativos
Desenvolver a dimensão relacional e de
comunicação entre pares e restante comunidade
Identificar e respeitar as diferenças culturais dos
alunos e restante comunidade
Colaborar e cooperar com a comunidade escolar
Envolver-se na promoção da integração dos pais no
processo ensino-aprendizagem
Compreender o sistema de valores e crenças
característicos da comunidade
Promover o envolvimento dos encarregados de
educação na estrutura da escola
Indicação de referência por parte dos stakeholders
Esta última dimensão obteve o menor número de referências por parte dos
stakeholders aquando do questionamento relativo a que competências consideravam
necessárias o professor do ensino básico desenvolver no século XXI. Associando-se ao
desenvolvimento profissional docente apenas o item “Perspetivar o trabalho com pares
como fator de enriquecimento da profissão” foi referido pela totalidade dos decisores
educativos.
145
Prendendo-se este domínio com as relações interpessoais e institucionais onde se
compreendem os fatores associados às interações pessoais e profissionais desenvolvidas
entre professores e entre estes e os órgãos de gestão escolar e restante comunidade
escolar, os resultados obtidos para esta dimensão encontram-se em consonância com o
perfil de desempenho do professor do ensino básico (Decreto-Lei 240/2001).
Na mesma linha, Pedro et al. (2011) referem, a propósito do desenvolvimento de
um framework sobre competências técnico-pedagógicas para a sala de aula do futuro, a
necessidade de considerar “local and global societal issues and responsibilities in an
evolving digital culture and exhibit safe, legal and ethical behaviour” (p. 15) nas
práticas docentes, procurando assim desenvolver um conjunto de competências relativas
com a cidadania, a identidade digital, a responsabilidade social e a consciência ética.
Sintetizando, os valores encontrados em relação à escala de competências
docentes para o século XXI relativamente aos 2688 professores salientam valores
médios favoráveis no que concerne às competências indicadas, estando os valores mais
reduzidos associados a competências relativas a aspetos de ordem externa ao professor,
como a articulação deste com a gestão da escola ou com outros intervenientes ao
processo educativo. Por outro lado, as competências relativas à prática pedagógica do
docente apresentam médias elevadas, próximas do valor máximo, referente a quatro
pontos na escala - Muito Importante.
Estes resultados verificam-se igualmente aquando da análise dos dados
descritivos das dimensões, onde é possível percecionar a dimensão pedagógica da
docência como fator de relevo para a carreira de professor.
Os resultados vão assim de encontro aos resultantes de diferentes estudos que
têm focado que, apesar da necessidade de se considerar a multidimensionalidade da
docência como fator fundamental desta profissão permitindo uma conceção desta como
146
profissão complexa, os professores continuam a privilegiar as competências
pedagógicas como elemento estruturante no ser-se professor.
Já os resultados provenientes da análise de conteúdo às entrevistas realizadas
mostram que a multidimensionalidade da docência é considerada de forma mais
evidente e estruturada, havendo um equilíbrio entre domínios no que concerne ao
número de competências indicadas, com exceção da dimensão relações interpessoais e
institucionais (pouco considerada pelos stakeholders).
O cruzamento dos resultados obtidos no movimento de triangulação entre os
dados provenientes dos docentes e dos decisores políticos e educativos, resultou no
referencial de competências para o século XXI do professor do Ensino Básico
apresentado no capítulo seguinte e que é formado por um conjunto de 37 competências,
organizadas pelas quatro dimensões (DPd – 14; DP – 12; DT – 6; DR – 5).
5.3 Referencial de competências docentes para o século XXI
Considerando o terceiro objetivo desta investigação – desenvolver um quadro
referencial de competências – associado por sua vez a uma das questões de investigação
(“Como se organizam tais competências técnico-pedagógicas no quadro de referência
estruturador das práticas docentes no séc. XXI?”), debruçamo-nos sobre os resultados
produzidos pelo cruzamento dos dados provenientes da análise do instrumento
aplicados aos 2688 professores e aos cinco stakeholders entrevistados.
Os princípios da abordagem metodológica mista (assente na perspetiva
concomitante defendida por Creswell, 2010) adotados neste estudo remeteram para uma
análise integrada dos dados recolhidos, de natureza qualitativa e quantitativa. Este
147
movimento de triangulação permitiu a extração de resultados e, por consequência, a
construção e o desenvolvimento do referencial de competências para o século XXI do
professor do ensino básico.
De acordo com Figari (2006), o conceito de referencial refere-se às construções
organizadas e estruturadas – podendo representar aprendizagens, programas e/ou
competências – que servem de elemento de referência para determinada área. É, deste
modo, um modelo de referência, estruturado num plano conceptual e operacional, que
permite antecipar a ação, guiando-a e avaliando a qualidade da mesma (Costa, 2008).
Ainda de acordo com Figari, os referenciais são polissémicos, contendo em si diferentes
dimensões, tais como as institucionais, pedagógicas, económicas e profissionais,
podendo assumir assim funções teleológicas, normativas, científicas, metodológicas e
comunicacionais (Cavaco, 2012). A organização de um referencial é deste modo
desenvolvida a partir de um plano conceptual e teórico, assente em evidências práticas,
e que pretende estruturar elementos indicadores que possibilitem um enquadramento
face a dado tema.
Optou-se por uma organização não hierarquizada na estruturação do referencial,
permitindo assim que este instrumento seja um recurso normativo para o
enquadramento dos docentes face à sua profissão. Através do cruzamento de dados
obtivemos um conjunto de 37 competências estruturadas em torno das quatro dimensões
organizadoras da profissão docente.
A visão integradora dos domínios considerados – num movimento cíclico de
influência mútua – possibilita encarar o desenvolvimento de competências docentes
para o século XXI como um processo estruturado, onde o professor influencia e é
influenciado pelo seu meio profissional e social. Neste sentido, encontramos nos
resultados desta investigação competências transversais às dimensões pedagógica,
148
profissional, tecnológica e relacional, tais como competências metacognitivas, digitais,
técnicas, críticas, comunicacionais ou colaborativas.
Assim, apesar dos resultados serem apresentados no referencial por dimensão,
procura-se que a leitura do referencial obedeça a uma lógica de integração dos
domínios, onde se entende o professor no centro do seu próprio desenvolvimento, sendo
a sua profissão alicerçada em torno da multidimensionalidade, com uma influência
direta do meio.
Figura 15: Multidimensionalidade da docência e Desenvolvimento Profissional Docente
No segundo capítulo desta investigação evidenciámos como suporte teórico para
o desenvolvimento profissional docente o modelo ecológico de desenvolvimento
humano de Bronfenbrenner (1993). Ao se considerar o professor como um agente
central ao seu próprio desenvolvimento, sendo este capaz de compreender em que
medida as suas experiências pessoais e profissionais, e os fatores externos a si mesmo,
149
contribuem para que ocorra progressão, possibilita-se a perceção da complexidade da
docência (percetível através da multidimensionalidade).
Através da leitura e análise dos dados encontrados (que confirmaram a
multidimensionalidade da docência) colocamos o professor no centro do seu próprio
desenvolvimento, assente nas quatro dimensões estruturais da docência. De forma
complementar, e atendendo ao facto de se entender que o professor é influenciado e
influencia o meio onde se encontra inserido, os quatro domínios encontram-se em
convergência, numa relação dinâmica e interativa. Deste modo, as relações mútuas que
cada professor estabelece com o contexto são determinantes (i) para o seu
desenvolvimento profissional, (ii) para o desenvolvimento de competências já existentes
em cada um dos domínios e (iii) para a construção de novas competências.
Define-se assim um referencial de competências para o século XXI com um
caráter normativo, onde se pretende criar orientações para uma estruturação de aspetos
referentes ao desenvolvimento da docência não rígidas mas norteadoras duma
progressão profissional e pessoal. Para cada um dos quatro domínios apresenta-se
orientações de desenvolvimento de competências.
Como instrumento normativo, este referencial estrutura-se em torno de um
conjunto de princípios que se procura que sejam orientadores para a sua utilização:
i. De acordo com Cavaco (2012), as competências são de um domínio
operatório, revelando-se nas ações. Deste modo, as competências
referidas para cada dimensão devem ser entendidas como indicadoras da
mobilização de conhecimentos, atitudes e aptidões realizadas por cada
professor;
ii. o referencial tem um caráter flexível, já que não se pretende que seja um
instrumento de progressão de desempenho docente;
150
iii. apesar do caráter multidimensional adotado, considera-se que ter uma
visão integradora das quatro dimensões é mais enriquecedor para o
professor, já que todas as competências definidas acarretam em si
diferentes domínios, sejam estes técnicos, pedagógicos, profissionais ou
relacionais.
151
Figura 16: Referencial de competências para o século XXI
152
Por se entender como necessário criar uma resposta que identificasse elementos
norteadores do desempenho docente para o século XXI, respondendo assim às
exigências duma sociedade em transformação e considerando as especificidades da
realidade portuguesa e da docência, estruturou-se o referencial apresentado
anteriormente. O conjunto de competências indicadas, através do cruzamento de dados
obtidos junto dos professores e dos stakeholders, comporta assim orientações para o
desenvolvimento profissional docente.
Relativamente ao domínio Pedagógico, indica-se 14 competências para o século
XXI, estruturadas em torno do desenvolvimento de práticas pedagógicas inovadoras e
metodologias de trabalho potenciadoras de flexibilização de conteúdos, currículo e
estratégias de ensino-aprendizagem. Assinala-se igualmente a preocupação demonstrada
com fatores ligados à aproximação do mundo real, tornando assim as experiências
letivas e as aprendizagens realizadas contextualizadas face à realidade, diminuindo por
consequência o desfasamento entre a sociedade e a escola referido por diferentes autores
(Prensky, 2001; Coutinho, 2008; 2011; Matos & Pedro, 2011; Pedro et. al, 2012;
Kibrick et al., 2010; Schleicher, 2011; UNESCO, 2008; 2011; Aceto et al., 2014; Brás
et al., 2014).
Se analisarmos os dados obtidos neste domínio em comparação com os
referenciais de competências para o século XXI estruturados para os alunos ou para os
cidadãos em geral, podemos antever que existe uniformidade nos resultados obtidos
junto dos docentes e dos decisores políticos participantes. Assim, à semelhança do
encontrado nos trabalhos desenvolvidos por organizações como a Partnership for 21-st
century-skills (2009), a ISTE (2008), a enGauge 21st Century skills (2009) ou a OCDE,
os dados desta investigação indicam que a capacidade de pesquisa, a gestão e
organização de informação, o desenvolvimento de pensamento crítico ou a planificação
153
e resolução de problemas são apresentados como competências para o século XXI a
desenvolver nos professores do ensino básico.
No mesmo sentido, os dados obtidos na dimensão profissional evidenciam uma
preocupação com aspetos ligados a processos metacognitivos e reflexivos, fundamentais
para a autonomia pedagógica e a atualização do próprio conhecimento. Neste domínio
os resultados mostraram igualmente a importância de fatores relacionados com a gestão
de riscos e com o reconhecimento da dimensão cívica do professor.
Estas evidências encontram-se novamente em consonância com as competências
apresentadas como primordiais a desenvolver no século XXI, tais como a reflexividade,
o pensamento crítico, a responsabilidade social e a capacidade de pesquisa e de procura
de enriquecimento profissional autónomo.
Apesar do caráter integrador da docência (a inclusão de diferentes artefactos nas
práticas pedagógicas e letivas foi salientado, por exemplo, por Matos & Pedro em
2011), devido à natureza inovadora das tecnologias – com rápidas transformações,
mutáveis, complexas e com múltiplas utilizações – a necessidade de desenvolvimento
de novas aprendizagens por parte do professor tornou-se fulcral. Esta exigência coloca
assim as tecnologias como transversais ao processo de desenvolvimento docente e,
consequentemente, das suas competências.
Deste modo, uma utilização efetiva das tecnologias pode contribuir para a
construção de ambientes de aprendizagem motivadores, onde se desenvolvem
estratégias de trabalho inovadoras que rompem com as barreiras existentes entre a
educação formal e não formal, levando os professores a (i) desenvolver novas
estratégias de ensino-aprendizagem e a (ii) formar-se considerando novas competências
(UNESCO, 2011). Estes dados vão de igualmente aos encontrados no âmbito do projeto
iTEC, onde se procurou conceber a escola do futuro, desenvolvendo, testando e
154
validando para isso cenários motivadores de ensino e de aprendizagem para a sala de
aula do futuro, envolvendo professores, alunos e outros decisores políticos e que
salientou a necessidade formativa em novas competências por parte dos professores
(Lewin & McNicol, 2014).
Os dados encontrados nesta investigação evidenciam assim que os 2688
docentes e os decisores políticos e educativos questionados consideraram como
relevante para o desenvolvimento profissional docente entender a escola como um
espaço de enriquecimento e inovação suportado pela utilização das tecnologias,
reconhecendo consequentemente a tecnologia como algo necessariamente presente nas
práticas dos alunos. A utilização das tecnologias digitais como ferramenta para
desenvolver pensamento crítico dos estudantes foi igualmente referida como
competência estrutural ao desenvolvimento docente.
Simultaneamente, estes participantes consideraram como competências para o
século XXI, a desenvolver, conhecimentos de ordem técnica para aplicar na
estruturação do processo de ensino-aprendizagem.
Verifica-se novamente uma aproximação destes resultados com as competências
para o século XXI apresentadas em referenciais para alunos (encontradas no referencial
de instituições como Partnership for 21st century skills ou Institute for Prospective
Technological Studies), onde se considera primordial o desenvolvimento de
competências digitais, a construção de pensamento crítico e a sua potenciação nos
outros e a necessidade de inovar. No entanto, realça-se que os aspetos ligados à
responsabilidade social e ao caráter ético na utilização das tecnologias não foram
referidos nos dados desta investigação, colocando assim como fator secundário o
desenvolvimento de competências ligadas quer à identidade e cidadania digitais, quer à
consciência ética global e local.
155
Relativamente ao domínio de relações interpessoais e institucionais, os
resultados salientaram que os fatores relacionados com o trabalho colaborativo foram
indicados como essenciais a um professor competente para o século XXI, indo de
encontro ao estabelecido por diversos autores (Perrenoud, 2000; Esteve, 2009; Nóvoa,
2009) que referem que o trabalho entre pares pode funcionar como elemento
estruturador a um desenvolvimento profissional docente eficaz.
Podemos ainda verificar que as competências para o século XXI indicadas como
essenciais ao desenvolvimento docente nesta dimensão vão de encontro ao referido por
Perrenoud (2000) – no seu referencial de novas competências para ensinar – no que
concerne a colaboração com os diferentes intervenientes no processo educativo e a
cooperação com a restante comunidade escolar. Estas competências de comunicação e
de colaboração são do mesmo modo referenciadas nos frameworks de competências
para o século XXI analisados aquando da scoping literature review.
Em síntese, o referencial de competências para o século XXI dos professores do
Ensino Básico e Secundário aqui apresentado, construído num movimento triangular de
análise de dados realizado (i) a partir da revisão de literatura efetuada e (ii) a partir das
respostas dos participantes nesta investigação, enumera um conjunto de itens relativos à
capacidade do professor de, perante determinada situação, refletir, estruturar e agir,
mobilizando e combinando conhecimentos, atitudes e experiências, fundamentais ao
desenvolvimento de um processo de ensino-aprendizagem estruturado e potenciador de
crescimento e inovação para os alunos e, consequentemente, para a sociedade.
156
Capítulo 6 – Conclusões
157
Importa iniciar este capítulo refletindo sobre as principais conclusões a que se
chegou na investigação que agora termina. Efetivamente as quatro questões de
investigação que orientaram este trabalho foram respondidas através dum design
metodológico misto baseado no paradigma pragmático (Creswell, 2003, 2010; Johnson
& Onwengbuzie, 2004; Tashakkori & Teddlie, 1998), em que se recolheram, analisaram
e discutiram dados num movimento de triangulação que abarcou uma relação intrínseca
entre campo teórico e campo empírico.
Deste modo, o problema norteador desta investigação debruçou-se sobre as
competências para o século XXI que os professores do ensino básico necessitam de
desenvolver, respondendo assim às alterações e exigências vivenciadas na sociedade
durante os últimos anos. Procurou-se, através da análise deste problema, contribuir para
o desenvolvimento docente de forma prospetiva, estabelecendo fatores normativos
(operacionalizados através do referencial de competências) que possam contribuir para
um ensino mais eficaz e estruturado.
A investigação tem mostrado que existe uma influência direta entre a
competência docente e o sucesso académico e educativo dos alunos (Comissão
Europeia, 2013). Simultaneamente, diferentes estudos e relatórios (OECD, 2013; CE,
2013) têm-nos mostrado que as tecnologias podem ser uma ferramenta estrutural à
inovação pedagógica e ao sucesso do processo de ensino-aprendizagem, sendo o
docente um elemento essencial a esse processo. Entende-se neste sentido que o
professor é um elemento estrutural da mudança pedagógica e metodológica “não há
mudanças nas escolas sem professores e não há mudanças nestes últimos sem uma forte
aposta num modelo de formação e desenvolvimento profissional que entenda os
professores como colaboradores de tão desejada mudança” (Coutinho, 2011, p. 2).
158
Entender as competências docentes para o século XXI como fator estrutural para
a alteração de práticas letivas, contribuindo deste modo para a adequação da escola à
evolução tecnológica (Coutinho, 2011; Matos & Pedro, 2011; Patrocínio, Pedro &
Matos, 2014) apresenta-se como elemento a considerar na formação docente, inicial e
contínua.
Na análise desenvolvida pela Comissão Europeia (2013) a 27 países
relativamente à utilização das TIC na Educação, concluiu-se que apesar do
desenvolvimento efetivo no uso das tecnologias no processo educativo, há um conjunto
de obstáculos a ultrapassar com caráter de urgência para que possa ocorrer uma
integração efetiva das tecnologias no processo de ensino-aprendizagem: (i) condições
estruturais de ligação de rede; (ii) recursos educativos de qualidade disponíveis para
alunos e professores; (iii) espaços pedagógicos de aprendizagem adequados e
disponibilizados como elemento estrutural das escolas; (iv) modelos de avaliação
repensados e adequados a novas metodologias de trabalho; e (v) o desenvolvimento de
competências em TIC e para o século XXI que suportem novos modelos de trabalho.
Têm sido igualmente nesta linha as evidências encontradas pela investigação na
última década (BECTA, 2004; GEPE, 2009; Matos, 2004; OECD, 2009; Wang, 2002)
no que se refere à presença das tecnologias na formação docente, salientando que as
TIC ainda não se encontram integradas de forma sistemática na formação de
professores, seja esta inicial ou contínua, levantando a preocupação sobre a preparação
dos futuros professores para as necessidades da sociedade atual (Esteves, 2009) e
levando a um desfasamento entre os saberes adquiridos aquando da formação e os que
devem ser utilizados nas práticas profissionais.
Opta-se assim por analisar os resultados desta investigação como um contributo
para refletir sobre estratégias que concorram para o construção de competências
159
(identificadas pelos professores e pelos decisores políticos) a incluir na formação
docente, potenciando deste modo um desenvolvimento docente efetivo, assente nas
práticas do professor e considerando a relação deste com o meio onde se insere.
Neste sentido, torna-se necessário que novas estratégias de formação docente –
dado o desfasamento entre essa formação, as práticas docentes e as necessidades
apresentadas pelo contexto – tenham por base modelos teóricos sustentadores de um
desenvolvimento de competências efetivo e integrador (Coutinho, 2010; 2011). Deste
modo, procurando que o referencial de competências a que se chegou como produto
final nesta investigação seja considerado no desenho de cursos de formação docente,
seja esta inicial ou contínua, carece-se de enquadramento teórico que modele a
integração desse referencial de forma estrutural e integrada. Considerando esta
necessidade, sugere-se como possibilidade para uma sustentação teórica o modelo
TPACK (Mishra & Koehler, 2006; Koehler & Mishra, 2009; Koehler, Mishra & Cain,
2013) – Technological, Pedagogical, Content, Knowledge.
O modelo TPACK tem por base o trabalho desenvolvido por Shulman (1987),
onde se defende que o processo de ensino assenta numa combinação entre conteúdo,
conhecimento e pedagogia, cabendo ao professor adaptar os seus conhecimentos ao
nível de compreensão e interesse dos seus alunos. A este modelo, Mishra e os seus
colaboradores (2006; 2009; 2013) sugeriram a inclusão de um novo fator ligado às
tecnologias, integrando desta forma os três conhecimentos estruturais para o docente
que utiliza as tecnologias nas suas práticas letivas, metodológicas e educativas. A
intersecção do conhecimento do professor nestes três níveis (conhecimentos de
conteúdos curriculares, de métodos pedagógicos e de competências a nível tecnológico)
traduzir-se-á em práticas pedagógicas de integração de tecnologias com qualidade.
160
Figura 17: TPACK Framework
Koehler et al. (2013)
O sucesso de práticas pedagógicas eficazes assenta assim, segundo este modelo,
no desenvolvimento duma intersecção complexa entre os três domínios de
conhecimento, considerando o contexto onde o professor se insere: Pedagogical
Content Knowledge (relativo à capacidade de ensinar um determinado conteúdo
curricular); Technological Content Knowledge (referente à capacidade de selecionar
recursos tecnológicos adequados aos conteúdos curriculares); e, por último
Technological Pedagogical Knowledge (ligado ao saber usar recursos tecnológicos no
processo de ensino-aprendizagem). Este Framework possibilita deste modo um
entendimento relativo aos conhecimentos que cada professor necessita de desenvolver,
conhecimentos esses que, por funcionarem numa relação interativa, são considerados
intrínsecos e indissociados. Cada um desses conhecimentos, de forma individual ou
conjuntamente, desempenhará um papel estrutural no desenvolvimento docente
(Koehler et al., 2013), sendo que sempre que ocorrer uma alteração num destes fatores,
os restantes serão influenciados (Mishra et al., 2006).
161
A perceção desses conhecimentos por parte dos professores e dos formadores de
professores possibilitará um maior entendimento sobre (i) os diferentes níveis de
integração das tecnologias, (ii) as competências necessárias ao professor para uma
integração eficaz e (iii) o desenho de práticas pedagógicas motivadoras e inovadoras
(Pedro, Matos & Pedro, 2014).
Considera-se assim que futuras formações de professores (iniciais ou contínuas)
assentem as suas atividades de formação em metodologias e estratégias de trabalho que
contribuam para o desenvolvimento das competências para o século XXI apresentadas
no referencial aqui estruturado, nas suas quatro dimensões.
Os resultados desta investigação confirmaram a multidimensionalidade da
profissão docente, percecionada através de quatro dimensões estruturais às
competências fundamentais ao desenvolvimento profissional dos professores. Num
momento inicial, através de uma scoping literature review chegou-se aos quatro
domínios orientadores da docência (pedagógico, profissional, tecnológico e relações
interpessoais e institucionais) que foram igualmente certificados no campo empírico do
estudo, através das respostas obtidas junto dos participantes. O movimento contínuo e
dual entre campo empírico e o campo teórico salientou assim o caráter múltiplo da
docência enunciado em diferentes referenciais de competências docentes, tais como ICT
competency standards for teachers (UNESCO, 2011), onde se consideraram por
exemplo seis domínios organizativos da profissão. Contudo, no caso do referencial aqui
apresentado, optou-se pela manutenção das quatro dimensões, indo de encontro ao
definido pela literatura e pelos normativos legais que regulamentam a profissão em
Portugal.
Um outro objetivo estrutural a esta investigação referia-se à construção do
referencial de competências, considerando a perceção dos professores do 2º e 3º ciclo
162
do ensino básico e dos decisores políticos sobre quais os aspetos a considerar para um
professor competente no século XXI. Neste ponto, obtivemos junto de 2688 professores
e de cinco stakeholders resultados que evidenciaram 37 competências necessárias ao
professor atualmente e nos próximos cinco anos. Estes dados consideram a
multiplicidade de saberes e conhecimentos fundamentais ao professor, abarcando
aspetos reflexivos, metacognitivos, práticos, técnicos, sociais e intelectuais. Retomando
a noção de competência considerada nesta investigação – processo cognitivo complexo,
resultado da mobilização e aplicação de conhecimentos, aptidões e atitudes – entende-se
que embora se possa considerar que o cumprimento das 37 competências enunciadas
seja complexo e difícil de atingir, a relação intrínseca entre cada um dos fatores
considerados possibilita que estes funcionem como norteadores do desenvolvimento do
docente.
Realça-se igualmente que os dados apresentados anteriormente evidenciaram um
maior peso da dimensão pedagógica, tendo esta o maior número de competências
indicadas. Assim, pode concluir-se que é considerado essencial para o professor (i)
dominar e desenvolver os conteúdos das disciplinas que leciona, (ii) construir e produzir
materiais pedagógicos que contribuam para a aprendizagem dos seus alunos, (iii)
estruturar estratégias de ensino inovadoras que contribuam para uma maior motivação
(sugere-se por exemplo metodologias de trabalho como o mobile learning ou game
based learning) e (iv) refletir sobre os processos metacognitivos dos seus alunos.
No que concerne às restantes dimensões, os participantes do estudo
consideraram que o domínio profissional permanece como elemento estrutural ao
desenvolvimento docente, combinando diferentes saberes e contributos que, entendidos
como um todo e resultantes da interação do docente com o meio, possibilitarão uma
construção efetiva da noção de profissionalidade (Nóvoa, 2009).
163
Assumir como principio norteador desta investigação a forma como as
alterações e mudanças nas práticas sociais num mundo fortemente tecnológico se
relacionam com as competências docentes, implicou percecionar igualmente a
importância dada à dimensão tecnológica, sendo que os resultados indicaram que para
estes participantes, a utilização das tecnologias na estruturação das aulas e a
consciencialização do uso destas para a construção de conhecimento nos seus alunos, é
um elemento estrutural. Assinala-se assim o reconhecimento sobre o papel que as
tecnologias podem desempenhar como contributo para um processo de ensino-
aprendizagem de sucesso.
Por último, os resultados acerca da dimensão relativa às relações interpessoais e
interinstitucionais apresentaram valores, que apesar de serem entendidos com um grau
de importância relativo, salientam que as competências ligadas à colaboração e ao
trabalho entre pares, não são ainda consideradas como fundamentais. Estes resultados
revestem-se de uma maior preocupação se considerarmos que, numa sociedade
fortemente tecnológica onde se defende a colaboração como fator de sucesso e
progressão, os professores continuam a ser uma profissão com pouca visão acerca das
virtualidade e benefícios do trabalho colaborativo. Neste sentido, a existência de uma
dificuldade de colaboração evidenciará constrangimentos na criação de comunidades de
prática informais, onde se potencie o desenvolvimento docente. Entende-se que estas
comunidades podem funcionar como veículos de aprendizagem dos professores, onde
por um lado se discuta e reflita sobre práticas pedagógicas e metodológicas inovadoras
e, por outro, se troque experiências, recursos e estratégias (Lave & Wenger, 1991).
Considerando os dados enunciados anteriormente, torna-se consensual
considerar a necessidade de refletir sobre novas competências a desenvolver pelos
professores, procurando assim responder às necessidades apresentadas pela sociedade e
164
pelos alunos e, consequentemente, contribuir para um melhor sistema educativo. O
desenvolvimento deste paradigma educativo, centrado no professor e no aluno enquanto
agentes do seu próprio desenvolvimento (Leitão & Alarcão, 2006) representará uma
estruturação do processo de ensino-aprendizagem mais motivadora para os seus
intervenientes.
165
Limitações da investigação e recomendações para trabalhos futuros
Neste capítulo conclusivo, cabe-nos refletir sobre algumas das limitações
encontradas no desenvolvimento desta investigação, seja no processo de design
metodológico, na recolha de dados, na produção de resultados ou na discussão dos
mesmos.
Deste modo, inicia-se esta reflexão debruçando-nos primeiramente sobre o
design metodológico adotado. Tendo sido esta investigação desenvolvida com base num
paradigma pragmático (paradigma que sugere a necessidade de combinação dos
paradigmas que fazem apelo a dados empíricos de natureza quantitativa e qualitativa
com vista à resposta ao problema de investigação definido), operacionalizado através
duma abordagem metodológica mista, procedeu-se a um processo de recolha de dados
simultâneo, sendo estes posteriormente comparados e articulados, de forma a encontrar
convergências e articulações.
Contudo, a opção por uma abordagem metodológica com estas características
levanta constrangimentos que é necessário assinalar em dois níveis: (i) um primeiro
relativo aos processos de amostragem e (ii) um segundo referente à recolha e análise de
dados, pese embora tratar-se de dois processos dependentes um do outro. Creswell
(2010) salienta que os processos de amostragem concomitantes, os adotados nesta
investigação, por trabalharem sobre amostras probabilísticas (no caso dos dados
quantitativos) e sobre amostras por conveniência (nos dados qualitativos) podem
originar dificuldades na análise de dados. No entanto, apesar dos constrangimentos
provocados neste tipo de amostragem, defende-se que atendendo ao caráter prospetivo
do problema de investigação desenhado, era necessária uma abordagem metodológica
166
onde se analisasse dados de diferentes participantes, recorrendo a estratégias de recolha
de dados diversas.
Apresenta-se no entanto como limitação o facto de não ser possível generalizar
em extensão os resultados obtidos nesta investigação, já que apesar de se ter efetuado
uma amostragem aleatória junto dos professores, procedeu-se a uma amostragem por
conveniência nos stakeholders. Contudo, a riqueza de dados provenientes do
cruzamento de respostas destas duas populações suplanta a não generalização,
entendendo-se que se o referencial de competências como produto final do estudo só
poderia ser desenvolvido considerando a triangulação estabelecida.
Porém, acredita-se que o rigor adotado no desenho das diferentes etapas de
investigação, obedecendo aos passos estruturados por autores como Creswell (2010),
Tashakkori e Teddlie (1998) ou Johnson, Onwnergbuzie e Turner (2007) possibilitou
um design metodológico consistente, passível de ser replicado em estudos futuros.
Neste sentido, defende-se as considerações realizadas por Matos et al. (2014) quando
sugerem a necessidade de maior clareza e rigor metodológico nos estudos na área das
TIC na Educação, considerando:
i. caracterização e categorização das temáticas em que a investigação
incide;
ii. caracterização metodológica dos estudos e a análise da sua relação com a
natureza do problema formulado;
iii. opções metodológicas e respetiva fundamentação;
iv. relações conceptuais entre o problema, as opções metodológicas e a
natureza da evidência obtida para dar origem aos resultados que o estudo
descreve.
167
Ainda no domínio da abordagem metodológica, deve referir-se as limitações
relacionadas com o processo de recolha de dados. Tendo sido definido como objetivo de
trabalho nesta investigação recolher dados junto do maior número possível de
professores, optou-se por um questionamento online, enviando para as direções de
escola o pedido de resposta à escala de perceção de competências docentes para o
século XXI. Autores como Wright (2005) referem que a principal limitação neste tipo
de recolha se apresenta no que concerne à integridade e validade dos dados recolhidos,
visto estes não terem sido obtidos na presença do investigador. Contudo, procurou-se
reduzir este enviesamento através do envio do instrumento por canais internos à escola
(recorrendo ao email institucional de domínio min.edu) e mediante a inclusão, na
instrução de preenchimento, da referência à população a que se destinava o
questionário. Realçamos, todavia, que as vantagens associadas ao processo de recolha
de dados utilizado suplantaram as limitações consideradas, já que se conseguiu recolher
2688 respostas válidas. Ainda no que concerne à recolha de dados junto dos docentes,
assinalamos que a não presença do investigador no momento de resposta originou a que
houvesse um número significativo de respostas não validadas, por não cumprirem o
preenchimento de todos os itens.
Realça-se igualmente como dificuldade na consecução deste estudo as alterações
vivenciadas a nível da organização do sistema educativo português. Tendo este projeto
de investigação sido iniciado em 2011, experienciaram-se variadas modificações na
estrutura orgânica do Ministério da Educação e Ciência, refletindo-se na organização de
agrupamentos escolares, na recriação de direções regionais de educação, na
reformulação dos currículos do Ensino Básico e em novas orientações para a profissão
docente. Estas alterações levaram a uma consciente modificação do plano inicial de
recolha de dados, onde se pretendia analisar dados provenientes de professores,
168
stakeholders e alunos, tendo-se optado por retirar estes últimos do plano metodológico.
Considera-se contudo, que estudos futuros deviam debruçar-se sobre as perceções que
os alunos têm sobre as competências necessárias aos seus professores, replicando por
exemplo o estudo de Pedro et al. (2012).
No mesmo sentido, considera-se igualmente que futuros estudos deveriam
incidir sobre a operacionalização do referencial de competências a que se chegou,
indicando estratégias de trabalho que potenciem o desenvolvimento profissional
docente. Deste modo, levanta-se duas hipóteses de trabalho: uma ligada à formação
inicial docente e outra à formação contínua de professores.
No que concerne à formação inicial docente, considera-se que o referencial
apresentado pode ser sustentador do desenho de atividades formativas que relacionem o
contexto universitário com o contexto escolar, potenciando assim o que Nóvoa (2009)
defende como uma formação dentro da profissão. No outro espectro, defende-se que
estratégias de formação contínua, formais ou informais, desenvolvidas pelos Centros de
Formação de Professores, Universidades, Escolas Superiores de Educação ou pelos
próprios docentes, ao considerarem as competências para o século XXI como
norteadoras do seu desenvolvimento, podem estruturar práticas de ensino mais
motivadoras, inovadoras e eficazes.
Por se considerar que a escola necessita de sofrer mudanças radicais e estruturais
(por não responder às necessidades dos alunos), entende-se que as essas alterações
ocorram “com e pelos professores, com e pelas alterações das suas práticas” (Pedro,
2011, p. 328). Sugere-se por exemplo o desenvolvimento de ações de formação
informais, onde os professores, como agentes ativos, responsáveis e críticos, poderão
promover espaços e tempos para reflexão sobre a sua prática letiva e não-letiva. Se os
professores ponderarem, individual e coletivamente, acerca das suas prioridades,
169
objetivos, motivações, representações, práticas e comportamentos estarão a
desempenhar um importante papel metacognitivo que permitirá compreender quais as
atitudes a tomar face às novas necessidades e exigências encontradas.
A concluir, e reconhecendo o caráter sempre provisório das recomendações
emergentes de qualquer estudo, pode seguramente indicar-se como relevante a
necessidade de atender de forma mais consciente e intencional ao desenvolvimento
profissional dos professores utilizando para isso os instrumentos e meios desenvolvidos
na investigação. A operacionalização do referencial, produzido neste estudo, em linhas
orientadoras para a concretização de atividades formativas em que as tecnologias podem
ocupar um papel de acelerador, a par com outras orientações com sentido prospetivo,
permitirão definir trajetórias de desenvolvimento que possam teleologicamente ser
adotadas pelos docentes. A intencionalidade colocada neste estudo de abrir uma
reflexão consciente, trazendo docentes e stakeholders ao diálogo, enquadra-se na ideia
de que um professor é sempre o professor do futuro, o que o torna responsável central e
eminente pelo próprio futuro.
170
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Legislação consultada
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profissional do educador de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário.
Lei de Bases do Sistema Educativo, nº49/2005. Diário da República nº 166, I
Série-A. Ministério da Educação.
Lista de anexos
Anexo A: Escala de perceção de competências para o século XXI para professores do
Ensino Básico
Anexo B: Pré-teste da Escala de Perceção de Competências
Anexo C: Guião de Entrevista realizado a Stakeholders
Anexo D: Análise descritiva das dimensões da Escala de Perceção de Competências
Docentes
Anexo A
Escala de perceção de competências para o século XXI para professores do
Ensino Básico
Caro Professor,
Antes de mais agradecemos a sua disponibilidade para participar nesta investigação.
O objetivo central da investigação passa pela produção de conhecimento sobre o desenvolvimento
profissional docente, através da formulação de um quadro de referência de competências técnico-
pedagógicas necessárias ao professor do ensino básico do séc. XXI.
Os destinatários deste questionário são todos os professores de 2º e 3º ciclo do ensino básico de Portugal
Continental.
Informamos que todos os dados que fornecer serão apenas utilizados nesta investigação, sendo tratados
com rigor e seriedade. De igual modo, toda a informação recolhida é anónima e confidencial, solicitando-
lhe assim que não indique qualquer elemento que o identifique.
Por favor, certifique-se no final que submeteu o seu questionário.
Este inquérito encontra-se registado e aprovado pela Direção Geral de Educação, sob o
número 0365500001.
Grata pela disponibilidade,
Ana Pedro
Características gerais e profissionais
Primeiramente, pedimos-lhe que forneça alguns dados pessoais.
1. Sexo
Feminino
Masculino
2. Idade
Entre 21 e 30 anos
Entre 31 e 40 anos
Entre 41 e 50 anos
Entre 51 e 60 anos
Mais de 60 anos
3. Grau Académico
Bacharelato
Licenciatura
Mestrado
Doutoramento
Outro
4. Nível de ensino que leciona
2º Ciclo
3º Ciclo
5. Grupo disciplinar em que está integrado(a)
Matemática + Ciências Língua Portuguesa História e Geografia de Portugal Línguas Estrangeiras
Educação Visual e Tecnológica Educação Musical Português História
Geografia Matemática Ciências Naturais Física e Química
Educação Tecnológica Informática Artes Visuais Educação Física
Educação Moral e Religiosa Católica
6. Anos de Serviço
Menos de 5 anos
Entre 5 e 10 anos
Entre 11 e 15 anos
Entre 16 e 20 anos
Mais de 20 anos
7. Há quantos anos finalizou a sua formação inicial?
Menos de 5 anos
Entre 5 e 10 anos
Entre 11 e 15 anos
Entre 16 e 20 anos
Mais de 20 anos
8. Região do país onde lecciona
Norte
Centro
Lisboa e Vale do Tejo
Alentejo
Algarve
Competências docentes
Assinale em que medida perceciona as competências seguintes como importantes ao desenvolvimento da sua
profissão nos próximos 5 anos:
Nada
importante
Pouco
importante Importante
Muito
importante
1. Potenciar a escola como espaço de enriquecimento e inovação suportado pela
utilização das tecnologias
2. Participar em projetos de escola
3. Possuir conhecimentos técnicos específicos para trabalhar com alunos com
necessidades educativas especiais
4. Ser proficiente na utilização de ferramentas digitais e de aplicações online
5. Promover o desenvolvimento de autonomia dos alunos
6. Atuar de forma socialmente responsável
7. Refletir sobre as próprias práticas docentes
8. Perspetivar o trabalho com pares como fator de enriquecimento da profissão
9. Lidar com situações relacionadas com a gestão de riscos na relação educativa
10. Utilizar a avaliação como elemento regulador das aprendizagens
11. Compreender as tendências dos valores e crenças do mundo social
12. Procurar situações e contextos informais de aprendizagem e de
desenvolvimento profissional
13. Ter autonomia no domínio profissional
14. Utilizar métodos de avaliação inovadores
Nada
importante
Pouco
importante Importante
Muito
importante
15. Criar situações de aprendizagem para os alunos desenvolverem pensamento
crítico e resolução de problemas
16. Refletir criticamente sobre economia global e respetivas consequências para a
educação
17. Participar em comunidades que potenciem a reflexão e o desenvolvimento
profissional
18. Colaborar com todos os intervenientes no processo educativo, favorecendo o
desenvolvimento de relações entre os vários agentes educativos
19. Criar e gerir projetos que potenciem a colaboração e tornem acessíveis trocas
de conhecimento e de experiências entre docentes
20. Refletir sobre o próprio pensamento (processos metacognitivos)
21. Autorregular-se no processo ensino-aprendizagem
22. Procurar atualização de conhecimento científico
23. Identificar as diferenças pessoais dos alunos
24. Utilizar as tecnologias como forma de comunicação com pais, alunos e outros
agentes educativos
25. Mobilizar diferentes estratégias de envolvimento dos alunos nas atividades
letivas
26. Flexibilizar as práticas letivas perante a diversidade de situações e saberes
prévios dos alunos
27. Aplicar metodologias de acompanhamento didático dos alunos
28. Desenvolver a dimensão relacional e de comunicação entre pares e restante
comunidade
29. Elaborar atividades de aprendizagem que estimulem os alunos
30. Gerir equipas
31. Identificar e respeitar as diferenças culturais dos alunos e restante
comunidade
32. Reconhecer a tecnologia como presente nas práticas dos alunos
33. Aplicar ferramentas digitais e de aplicações online no processo ensino-
aprendizagem
34. Participar em projetos nacionais e internacionais
35. Conhecer e explorar modelos de utilização de tecnologias
36. Colaborar e cooperar com a comunidade escolar
Nada
importante
Pouco
importante Importante
Muito
importante
37. Refletir sobre os contributos da utilização das tecnologias no processo
ensino-aprendizagem
38. Utilizar diferentes estratégias de ensino
39. Utilizar as tecnologias digitais como ferramenta para desenvolver
pensamento crítico dos alunos
40. Procurar atualização de conhecimento didático-pedagógico
41. Refletir criticamente sobre economia global e respetivas consequências para a
educação
42. Utilizar de forma integrada saberes da sua especialidade e saberes
transversais e multidisciplinares
43. Envolver-se na promoção da integração dos pais no processo ensino-
aprendizagem
44. Ter consciência legal e ética na utilização de tecnologias
45. Participar em atividades de gestão e administração da escola
46. Criar, em contexto de sala de aula, situações de aprendizagem focadas na
resolução de problemas reais
47. Participar em ações de formação contínua
48. Refletir sobre aspetos éticos e deontológicos inerentes à profissão docente
49. Utilizar intencionalmente as tecnologias nas práticas letivas e não letivas
50. Compreender o sistema de valores e crenças característicos da comunidade
51. Elaborar estratégias de partilha de recursos
52. Promover o envolvimento dos encarregados de educação na estrutura da
escola
53. Integrar conhecimentos multidisciplinares na prática profissional
54. Desenvolver estratégias pedagógicas diferenciadas
55. Gerir e ser autónomo no desenvolvimento do próprio percurso de
desenvolvimento profissional
56. Refletir sobre as suas práticas pedagógicas
57. Desenvolver conhecimento didático adequado à área disciplinar
58. Gerir o currículo mediante as necessidades de cada turma
59. Reconhecer a dimensão cívica e formativa das suas funções enquanto
professor
Anexo B
Pré-teste da Escala de Perceção de Competências
Case Processing Summary
N %
Cases
Valid 30 100,0
Excludeda 0 ,0
Total 30 100,0
a. Listwise deletion based on all variables in the procedure.
Reliability Statistics
Cronbach's Alpha Cronbach's Alpha Based
on Standardized Items
N of Items
,960 ,963 59
Média da Escala
(se o item for
apagado)
Variância da
Escala (se o item for
apagado)
Correlação Item-
Total (Corrigido)
Alpha de Cronbach (se o
item for apagado)
Q1 258,30 375,589 ,309 ,959
Q2 258,45 368,155 ,658 ,958
Q3 258,75 370,092 ,419 ,959
Q4 258,25 377,566 ,211 ,960
Q5 258,25 367,461 ,856 ,958
Q6 258,25 371,250 ,612 ,959
Q7 258,20 370,800 ,721 ,959
Q8 258,35 367,082 ,766 ,958
Q9 259,05 364,366 ,585 ,959
Q10 258,50 372,368 ,430 ,959
Q11 258,85 367,818 ,480 ,959
Q12 258,40 372,147 ,380 ,959
Q13 258,40 376,674 ,221 ,960
Q14 258,40 370,147 ,569 ,959
Q15 258,20 371,116 ,698 ,959
Q16 259,35 365,397 ,453 ,959
Q17 258,75 364,408 ,648 ,958
Q18 258,65 368,871 ,517 ,959
Q19 258,65 369,608 ,582 ,959
Q20 258,95 363,208 ,635 ,958
Q21 258,55 368,366 ,633 ,959
Q22 258,35 373,397 ,412 ,959
Q23 258,55 372,050 ,444 ,959
Q24 258,70 372,432 ,318 ,960
Q25 258,20 371,116 ,698 ,959
Q26 258,40 370,042 ,575 ,959
Q27 258,65 365,187 ,680 ,958
Q28 258,75 374,513 ,350 ,959
Q29 258,25 371,461 ,599 ,959
Q30 259,25 371,039 ,357 ,960
Q31 258,65 368,239 ,545 ,959
Q32 258,60 380,147 ,013 ,961
Q33 258,35 379,292 ,087 ,960
Q34 258,70 374,116 ,292 ,960
Q35 258,40 367,305 ,598 ,959
Q36 258,60 368,358 ,637 ,959
Q37 258,45 369,734 ,575 ,959
Q38 258,25 375,461 ,344 ,959
Q39 258,70 368,642 ,537 ,959
Q40 258,20 371,116 ,698 ,959
Q41 259,25 367,461 ,493 ,959
Q42 258,55 368,050 ,650 ,958
Q43 259,10 365,463 ,474 ,959
Q44 258,45 371,313 ,492 ,959
Q45 259,55 367,313 ,453 ,959
Q46 258,45 363,208 ,769 ,958
Q47 258,50 370,789 ,372 ,959
Q48 258,90 356,200 ,731 ,958
Q49 258,50 367,105 ,588 ,959
Q50 258,90 358,411 ,716 ,958
Q51 258,65 362,239 ,637 ,958
Q52 259,10 364,516 ,466 ,959
Q53 258,75 357,671 ,752 ,958
Q54 258,40 364,253 ,736 ,958
Q55 258,55 371,734 ,385 ,959
Q56 258,45 358,155 ,784 ,958
Q57 258,40 360,884 ,776 ,958
Q58 258,50 361,737 ,651 ,958
Q59 258,45 361,839 ,831 ,958
Anexo C
Guião de Entrevista realizado a Stakeholders
O objetivo central da investigação passa pela produção de conhecimento sobre o
desenvolvimento profissional docente, através da formulação de um quadro de
referência de competências técnico-pedagógicas necessárias ao professor do ensino
básico do séc. XXI.
Questões orientadoras Domínio de trabalho
específico
Contextualização
social e novo
paradigma escolar
- Será que o mundo social atual (com as
tecnologias que o constituem e medeiam) está
a ou pode obrigar a escola a mudar de
paradigma para uma coisa que podemos
chamar de ‘escola do século XXI’?
- Em que se mostra esse paradigma?
- Está de facto em desenvolvimento? Quais os
sinais que temos?
- Se ainda não detetámos os sinais, poderemos
antecipar que o paradigma de escola vai
certamente mudar? Porquê?
- Qual o papel do professor na escola do séc.
XXI?
- Pensando na formação inicial, devem ser
desenvolvidas outras competências docentes?
Competências
docentes para o séc.
XXI
- A serem desenvolvidas outras competências,
quais devem ser desenvolvidas na formação
inicial?
- Poderá justificar a necessidade daquelas
competências
- Relação daquelas competências com o que
entendem como ‘novo paradigma de escola’
- Pedagógico
- Profissional
- Tecnológico
- Relações interpessoais e
institucionais
- Que competências devem ser desenvolvidas
na formação contínua e ao longo do
desenvolvimento profissional docente?
- Poderá justificar a necessidade daquelas
competências
- Pedagógico
- Profissional
- Tecnológico
- Relações interpessoais e
institucionais
Anexo D
Análise descritiva das dimensões da Escala de Perceção de Competências Docentes
Frequencies
Statistics
Dom_Prof Dom_Ped Dom_Tec Dom_Rel
N Valid 2688 2688 2688 2688
Missing 0 0 0 0
Mean 3,3858 3,5509 3,3474 3,3803
Median 3,3500 3,5882 3,2727 3,3636
Mode 3,25 3,88 3,18 3,18
Std. Deviation ,33530 ,31772 ,38352 ,36014
Variance ,112 ,101 ,147 ,130
Dom_Prof
Frequency Percent Valid Percent Cumulative Percent
Valid
1,00 1 ,0 ,0 ,0
1,25 1 ,0 ,0 ,1
1,65 1 ,0 ,0 ,1
2,10 1 ,0 ,0 ,1
2,25 1 ,0 ,0 ,2
2,30 2 ,1 ,1 ,3
2,35 2 ,1 ,1 ,3
2,40 3 ,1 ,1 ,4
2,45 1 ,0 ,0 ,5
2,50 6 ,2 ,2 ,7
2,55 4 ,1 ,1 ,9
2,60 8 ,3 ,3 1,2
2,65 14 ,5 ,5 1,7
2,70 13 ,5 ,5 2,2
2,75 19 ,7 ,7 2,9
2,80 19 ,7 ,7 3,6
2,85 42 1,6 1,6 5,1
2,90 46 1,7 1,7 6,8
2,95 65 2,4 2,4 9,3
3,00 118 4,4 4,4 13,7
3,05 112 4,2 4,2 17,8
3,10 141 5,2 5,2 23,1
3,15 143 5,3 5,3 28,4
3,20 121 4,5 4,5 32,9
3,25 159 5,9 5,9 38,8
3,30 152 5,7 5,7 44,5
3,35 151 5,6 5,6 50,1
3,40 133 4,9 4,9 55,0
3,45 124 4,6 4,6 59,6
3,50 117 4,4 4,4 64,0
3,55 140 5,2 5,2 69,2
3,60 127 4,7 4,7 73,9
3,65 116 4,3 4,3 78,2
3,70 100 3,7 3,7 82,0
3,75 109 4,1 4,1 86,0
3,80 80 3,0 3,0 89,0
3,85 85 3,2 3,2 92,2
3,90 75 2,8 2,8 94,9
3,95 57 2,1 2,1 97,1
4,00 79 2,9 2,9 100,0
Total 2688 100,0 100,0
Dom_Ped
Frequency Percent Valid Percent Cumulative Percent
Valid
1,00 1 ,0 ,0 ,0
1,88 1 ,0 ,0 ,1
2,00 1 ,0 ,0 ,1
2,06 1 ,0 ,0 ,1
2,18 1 ,0 ,0 ,2
2,41 2 ,1 ,1 ,3
2,47 3 ,1 ,1 ,4
2,53 1 ,0 ,0 ,4
2,59 1 ,0 ,0 ,4
2,65 2 ,1 ,1 ,5
2,71 5 ,2 ,2 ,7
2,76 10 ,4 ,4 1,1
2,82 9 ,3 ,3 1,4
2,88 13 ,5 ,5 1,9
2,94 31 1,2 1,2 3,1
3,00 86 3,2 3,2 6,3
3,06 69 2,6 2,6 8,8
3,12 93 3,5 3,5 12,3
3,18 89 3,3 3,3 15,6
3,24 105 3,9 3,9 19,5
3,29 146 5,4 5,4 24,9
3,35 134 5,0 5,0 29,9
3,41 136 5,1 5,1 35,0
3,47 144 5,4 5,4 40,3
3,53 185 6,9 6,9 47,2
3,59 173 6,4 6,4 53,6
3,65 167 6,2 6,2 59,9
3,71 164 6,1 6,1 66,0
3,76 176 6,5 6,5 72,5
3,82 187 7,0 7,0 79,5
3,88 194 7,2 7,2 86,7
3,94 183 6,8 6,8 93,5
4,00 175 6,5 6,5 100,0
Total 2688 100,0 100,0
Dom_Tec
Frequency Percent Valid Percent Cumulative Percent
Valid
1,00 1 ,0 ,0 ,0
1,55 1 ,0 ,0 ,1
2,00 4 ,1 ,1 ,2
2,09 1 ,0 ,0 ,3
2,18 1 ,0 ,0 ,3
2,27 9 ,3 ,3 ,6
2,36 10 ,4 ,4 1,0
2,45 18 ,7 ,7 1,7
2,55 21 ,8 ,8 2,5
2,64 28 1,0 1,0 3,5
2,73 37 1,4 1,4 4,9
2,82 65 2,4 2,4 7,3
2,91 127 4,7 4,7 12,0
3,00 263 9,8 9,8 21,8
3,09 279 10,4 10,4 32,2
3,18 283 10,5 10,5 42,7
3,27 220 8,2 8,2 50,9
3,36 204 7,6 7,6 58,5
3,45 185 6,9 6,9 65,4
3,55 170 6,3 6,3 71,7
3,64 138 5,1 5,1 76,8
3,73 132 4,9 4,9 81,7
3,82 165 6,1 6,1 87,9
3,91 150 5,6 5,6 93,5
4,00 176 6,5 6,5 100,0
Total 2688 100,0 100,0
Dom_Rel
Frequency Percent Valid Percent Cumulative Percent
Valid
1,00 1 ,0 ,0 ,0
1,36 1 ,0 ,0 ,1
1,55 1 ,0 ,0 ,1
2,00 2 ,1 ,1 ,2
2,09 4 ,1 ,1 ,3
2,18 4 ,1 ,1 ,5
2,27 1 ,0 ,0 ,5
2,36 9 ,3 ,3 ,9
2,45 9 ,3 ,3 1,2
2,55 13 ,5 ,5 1,7
2,64 27 1,0 1,0 2,7
2,73 41 1,5 1,5 4,2
2,82 58 2,2 2,2 6,4
2,91 100 3,7 3,7 10,1
3,00 180 6,7 6,7 16,8
3,09 209 7,8 7,8 24,6
3,18 269 10,0 10,0 34,6
3,27 256 9,5 9,5 44,1
3,36 255 9,5 9,5 53,6
3,45 222 8,3 8,3 61,8
3,55 229 8,5 8,5 70,3
3,64 205 7,6 7,6 78,0
3,73 162 6,0 6,0 84,0
3,82 150 5,6 5,6 89,6
3,91 143 5,3 5,3 94,9
4,00 137 5,1 5,1 100,0
Total 2688 100,0 100,0
Descriptives
Descriptive Statistics
N Minimum Maximum Mean Std. Deviation
Q1 2688 1 4 3,55 ,525
Q2 2688 1 4 3,44 ,554
Q3 2688 1 4 3,46 ,593
Q4 2688 1 4 3,54 ,525
Q5 2688 1 4 3,82 ,393
Q6 2688 1 4 3,83 ,399
Q7 2688 1 4 3,76 ,458
Q8 2688 1 4 3,55 ,545
Q9 2688 1 4 3,41 ,565
Q10 2688 1 4 3,42 ,571
Q11 2688 1 4 3,34 ,580
Q12 2688 1 4 3,37 ,564
Q13 2688 1 4 3,72 ,468
Q14 2688 1 4 3,27 ,599
Q15 2688 1 4 3,77 ,436
Q16 2688 1 4 3,15 ,638
Q17 2688 1 4 3,21 ,594
Q18 2688 1 4 3,50 ,549
Q19 2688 1 4 3,35 ,580
Q20 2688 1 4 3,33 ,617
Q21 2688 1 4 3,46 ,555
Q22 2688 1 4 3,76 ,440
Q23 2688 1 4 3,48 ,585
Q24 2688 1 4 3,19 ,613
Q25 2688 1 4 3,61 ,517
Q26 2688 1 4 3,48 ,550
Q27 2688 1 4 3,43 ,543
Q28 2688 1 4 3,30 ,566
Q29 2688 1 4 3,71 ,477
Q30 2688 1 4 3,07 ,634
Q31 2688 1 4 3,46 ,571
Q32 2688 1 4 3,37 ,555
Q33 2688 1 4 3,25 ,600
Q34 2688 1 4 2,99 ,629
Q35 2688 1 4 3,24 ,555
Q36 2688 1 4 3,50 ,538
Q37 2688 1 4 3,24 ,571
Q38 2688 1 4 3,68 ,483
Q39 2688 1 4 3,21 ,610
Q40 2688 1 4 3,66 ,496
Q41 2688 1 4 3,05 ,636
Q42 2688 1 4 3,44 ,543
Q43 2688 1 4 3,29 ,617
Q44 2688 1 4 3,43 ,564
Q45 2688 1 4 2,73 ,722
Q46 2688 1 4 3,56 ,528
Q47 2688 1 4 3,33 ,617
Q48 2688 1 4 3,27 ,585
Q49 2688 1 4 3,35 ,567
Q50 2688 1 4 3,23 ,577
Q51 2688 1 4 3,36 ,570
Q52 2688 1 4 3,22 ,672
Q53 2688 1 4 3,41 ,533
Q54 2688 1 4 3,57 ,521
Q55 2688 1 4 3,50 ,543
Q56 2688 1 4 3,62 ,511
Q57 2688 1 4 3,69 ,477
Q58 2688 1 4 3,51 ,565
Q59 2688 1 4 3,66 ,495
Valid N (listwise) 2688
Descriptive Statistics
N Minimum Maximum Mean Std. Deviation
geral 2688 1,00 4,00 3,4252 ,31098
Valid N (listwise) 2688
Descriptive Statistics
N Minimum Maximum Mean Std. Deviation
Q6 2688 1 4 3,83 ,399
Q8 2688 1 4 3,55 ,545
Q18 2688 1 4 3,50 ,549
Q11 2688 1 4 3,34 ,580
Q28 2688 1 4 3,30 ,566
Q31 2688 1 4 3,46 ,571
Q34 2688 1 4 2,99 ,629
Q36 2688 1 4 3,50 ,538
Q43 2688 1 4 3,29 ,617
Q50 2688 1 4 3,23 ,577
Q52 2688 1 4 3,22 ,672
Valid N (listwise) 2688
Os anexos referentes às restantes análises estatísticas estão disponíveis em:
https://meocloud.pt/link/861a3293-7cc1-4f18-89a4-
9f26d1ac7d8b/Anexos%20Doutoramento%20Ana%20Pedro/