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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ENFERMAGEM DE RIBEIRÃO PRETO JOSÉ RENATO GATTO JÚNIOR O PROFESSOR-ENFERMEIRO E A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR: entre teorias pedagógicas e o gerencialismo Ribeirão Preto - 2018 -

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ENFERMAGEM DE …€¦ · de 2016. Certamente, posso dizer que não acredito em acaso, mas acredito no aveC ... Thalita, Rita, e todos os demais

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ENFERMAGEM DE RIBEIRÃO PRETO

JOSÉ RENATO GATTO JÚNIOR

O PROFESSOR-ENFERMEIRO E A DOCÊNCIA NO

ENSINO SUPERIOR: entre teorias pedagógicas e o

gerencialismo

Ribeirão Preto

- 2018 -

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JOSÉ RENATO GATTO JÚNIOR

O professor-enfermeiro e a docência no ensino superior: entre

teorias pedagógicas e o gerencialismo

Tese apresentada à Escola de

Enfermagem de Ribeirão Preto da

Universidade de São Paulo para a

obtenção do título de Doutor em

Ciências.

Linha de Pesquisa: Educação em

Saúde e Formação de Recursos

Humanos.

Orientadora: Profa. Dra. Sonia

Maria Villela Bueno

Coorientadora: Profa. Dra. Cinira

Magali Fortuna

Ribeirão Preto

- 2018 -

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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste

trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para

fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

Gatto Júnior, José Renato

O professor-enfermeiro e a docência no ensino superior: entre teorias

pedagógicas e o gerencialismo, 2018.

400 f.: il.; 30 cm.

Tese de Doutorado apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão

Preto/Universidade de São Paulo. Área de concentração: Enfermagem

Psiquiátrica.

Orientadora: Bueno, Sonia Maria Villela

Coorientadora: Fortuna, Cinira Magali

1. Docência. 2. Enfermagem. 3. Ensino Superior. 4. Gerencialismo. 5.

Socioclínica Institucional. 6. Análise Institucional.

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GATTO-JÚNIOR, José Renato. O professor-enfermeiro e a

docência no ensino superior: entre teorias pedagógicas e o

gerencialismo. Tese apresentada à Escola de Enfermagem de

Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo para a obtenção

do título de Doutor em Ciências.

Aprovado em 15 de outubro de 2018

Banca Examinadora

Profa. Dra. Cinira Magali Fortuna Estabelecimento: EERP/USP

Julgamento: APROVADO Assinatura: ___________________

Profa. Dra. Maria José Bistafa Pereira Estabelecimento: EERP/USP

Julgamento: APROVADO Assinatura: ___________________

Profa. Dra. Noeli Prestes Padilha Rivas Estabelecimento: FFCLRP/USP

Julgamento: APROVADO Assinatura: ___________________

Prof. Dr. Sébastien Pesce Estabelecimento: Université d’Orléans

Julgamento: APROVADO Assinatura: ___________________

Profa. Dra. Solange L’Abbate Estabelecimento: UNICAMP

Julgamento: APROVADO Assinatura: ___________________

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DEDICATÓRIAS

A Deus pela oportunidade de poder ter as energias necessárias para tomar o desafio

deste estudo, sempre sob sua orientação e amparado pela Espiritualidade Maior, que me

propiciou caminhos durante todo o percurso.

A minha família pelo apoio e crença em minha pessoa. Peço desculpas pelas ausências,

que foram sumamente necessárias, neste período, para que eu conseguisse alcançar mais

esta etapa em minha vida: Mãe, Pai, Tata, Vó Lica, Vô Lando (In Memoriam), Vó Cira,

Vô Tonho (In Memoriam), Gui e Isabela, Tio Carlinho, Cristina, Bruna, Miriam, Tio

Zoca (In Memoriam), Lucilene, Vivian, Letícia, Tio Toninho, Marisa, Lígia, assim

como seus companheiros e filhos.

A minha orientadora Soninha por acreditar em mim, na proposta do projeto que

desenvolvemos juntos, por saber lidar comigo da melhor forma em todos os momentos

de nossos encontros. Agradeço pela paciência, pela calma, pela serenidade, pela

amizade, pelo carinho, pelo entusiasmo e motivação que nos energiza e nos impulsiona

a dar passos cada vez maiores e, até um tanto ousados, sem os quais não teríamos

conquistado e aproveitado excelentes oportunidades para enxergar o mundo de outra

maneira: com humanização e humanidade, com ternura e afeto, com respeito e

responsabilidade, com compromisso e determinação... já que "tudo vale a pena, quando

a alma não é pequena" - frase de um poema de Fernando Pessoa que ela sempre usou

para nos proporcionar reflexões profundas e importantes, quando de sua companhia.

À Cinira Magali Fortuna, por seu acolhimento humano, me recebendo de braços abertos

em um momento que eu mais precisava não somente de orientação para o

desenvolvimento da tese, mas de um ombro amigo e de uma alma essencialmente

humana e acolhedora. Merci beaucoup!

Aos verdadeiros amigos, que me apoiaram, me suportaram e permaneceram ao meu

lado até o fim, relevando as coisas bobas do cotidiano que, às vezes, atravessam nossos

caminhos e, principalmente, me dando muita força: Adriana, Adrielle, Ana Paula

Silveira, Ana Paula Brilhante, Andressa, Cláudio Luiz (com Z), Dino, Edmar, Elaine,

Fabiana, Flávio, Gláucia, Heloísa, Ingrid, Julitte, Karen, Karemme, Leandra e Bim,

Luana, Maria Gabriela, Mariana, Maristel e Tom, Nilton, Ornella, Poliana, Priscila

(neta), Patrícia, Sidney, Simone, Thalita.

Ao Marcos Yuri, meu amor mais lindo, por ter tido paciência suficiente e carinho em

demasia comigo nesta caminhada, respeitando meus momentos de ansiedade, de

desespero, de euforia, de desânimo, de energia, de assertividade, de contradição, me

provocando mais reflexões sobre a vida e sobre mim mesmo!

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Ao Grupo Francisco de Assis, pela acolhida, pelas reflexões provocadas, no encontro e

no desencontro! Me refaço e continuo no caminho do bem, ajudando sem pregar a

minha verdade, mas propiciando que cada um encontre e viva sua própria verdade! Que

assim seja!

A todos os meus professores da educação básica e da educação superior que me

ajudaram também no caminho permanente da construção da professoralidade: Marlene e

Tereza (prezinho); Maria Teresa (1.ª série); Alba e Vanderli (2.ª série); Maria Alayde e

Maria Marçal (3.ª série); Santina (4.ª série); Regina, Vânia, Renato, Maria Isabel,

Tânia, Salete, Laura, Maria Antonieta, Ana Paula, Luciana, Kátia, Maria Aparecida,

Zeyne, Maria Isabel (5.ª a 8.ª séries do ensino fundamental); Cidinha, Geninha, Maria

Eugênia, Dirce, Francismácia, Denise, Marcela, Fátima, Meire, Júnior, Elísio, Fernanda,

Alessandra, Solange Lucano (in memoriam), Martins (1.ª a 3.ª séries do ensino médio);

Elisandra, Carlos Eduardo, Helena, Márcia, Maribel, Rosemary, Sidney, Sílvia,

Tarcísio, Vânia (idiomas inglês e espanhol); Ademilson, Adriana Miasso, Adriana

Katia, Alessandra, Andréa, Angelita, Antônia, Beatriz, Carla Ventura, Carlos, Cinira,

Cláudia, Cristina Almeida, Cristina Galvão, Edilaine, Evelin, Fernanda Góes, Fernanda

Ludmilla, Gabriela, Helena, Ione, Juliana Monteiro, Juliana Stefanelo, Leila, Luciana

Mara, Lucieli, Lucilene, Margarita, Maria Cândida, Maria Conceição, Maria Célia,

Maria José, Marlene, Marta Angélica, Milene, Namiê, Pedro, Renata Cristina, Ricardo

Alexandre, Ronildo, Rosalina, Rosane, Rosângela, Sílvia Matumoto, Sílvia Canini,

Sonia, Susana, Suzana e Thaís (Graduação em Bacharelado e Licenciatura em

Enfermagem); Esperanza, Luz Marina (intercâmbio graduação na Espanha); Sylvia,

Anna, Solina, Gerri, Brenda (intercâmbio graduação no Canadá); Adriana Katia, Ana

Márcia, Carla Ventura, Cinira, Fabiana Mamede, Fernanda Góes, Jacqueline, Lucilene,

Maria das Graças, Margarita, Maria Conceição, Maria José, Marlene, Marta Angélica,

Noeli, Regina Fiorati, Sandra Pillon, Sonia Bueno, Toyoko (Curso de Doutorado

Direto); Christine, Luana (idioma francês); Catherine, Hervé, Laurence, Noël, Samuel,

Sébastien (Intercâmbio pós-graduação na França), dentre muitos outros professores,

tal como a Zezé Bistafa, Maria do Carmo, Vânia, que fizeram, fazem e farão muita

diferença em minha professoralidade e formação como pessoa e profissional defensor

da Saúde e da Educação como Direito e combatente contra o Desmanche do Sistema

Único de Saúde (SUS) e da Educação Pública.

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AGRADECIMENTOS

À Sonia Maria Villela Bueno, por sua excelente orientação para minha formação

enquanto professor-pesquisador-pessoa durante o período de janeiro de 2014 a janeiro

de 2016.

Certamente, posso dizer que não acredito em acaso, mas acredito no aveC

Desde a graduação e creio que até depois na condição de alumnI

Será impossível esquecer aquilo que nos toca profundamente, condição sine qua noN

Para o despertar verdadeiro da humanidade dentro de nós. FoI

Exatamente assim que essa pessoa especial e maravilhosa se fez deviR

Em minha vida! Muito obrigado professora-amiga-companheira CinirA

Às Professoras Cinira Magali Fortuna, Leandra Andréia de Sousa e Maria Conceição B.

M. Souza, pelas ricas reflexões sobre o meu trabalho, antes, durante e depois.

Às Professoras Maria José Bistafa Pereira e Noeli Prestes Padilha Rivas, pelas

excelentes contribuições durante nosso dialógico exame de qualificação, e outros

inúmeros ricos momentos compartilhados pelo caminho.

Au Professeur Sébastien Pesce qui promptement m’a accueilli dès les premiers skypes,

où je ne parlais pas encore le français, et même ainsi m’a encouragé à continuer mes

études de français pour que je puisse bien profiter des expériences en France à

l’Université François Rabelais de Tours qui viendraient. Les expériences avec l’équipe

de Tours m’ont favorisées l’approfondissement dans le référentiel de l’Analyse

Institutionnelle et d’autres questions de l’Éducation. Alors, les questionnements et les

réflexions que Sébastien m’a posés, m’ont beaucoup aidé et je lui remercie beaucoup !

Às professoras Adriana e Fabiana que me ajudaram com muitas reflexões ao longo da

realização do meu trabalho, quanto às dificuldades no percurso de várias dimensões da

vida! Muito obrigado!

Agradecimento especial aos meus amigos mais próximos do grupo GEPAI, que me

provocaram mais reflexões sobre os caminhos da Análise Institucional e outros temas

que discutimos no grupo do WhatsApp, notadamente quanto às implicações do

pesquisador: Flávio, Luana, Karemme, Karen, Priscila, Poliana, Maristel, Gláucia,

Thalita, Rita, e todos os demais ingressantes recentes e anteriores que ainda não tive

oportunidade de maior proximidade.

Agradecimento aos amigos e parceiros do GEPEFOR, que me acolheram muito bem no

seio das discussões sobre a formação de professores, sobre a Educação, sobre a

docência, dentre outros assuntos correlatos. Muito obrigado por me fazerem sentir

partícipe do grupo e pela calorosa acolhida – isso me ajudou muito no aprofundamento

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das reflexões sobre a docência no ensino superior. Aqui não ousarei citar os nomes

porque é um grupo muito numeroso e correria o risco de deixar alguém de fora, mas

estendo minha gratidão por meio do nome da professora Noeli. Muitíssimo obrigado!

À Elaine Mara da Silva, por me provocar profundas reflexões durante a própria escrita

de seu projeto de doutorado e sua terna companhia, seja de perto (presencial), seja da

Colômbia por Skype (virtual). Seja quando eu estava no Brasil, seja quando eu estava

um tanto solitariamente na França, nos meses finais do intercâmbio. Pessoa espetacular

com quem, por meio das conversas, venho me transformando profundamente, com

especial ênfase na dimensão espiritual. Amiga que segue em meu peito, do lado

esquerdo sempre, com muito orgulho e muita honra!

À Leandra A. de Sousa, pela companhia, reflexões, risadas nos aprofundamentos sobre

o referencial da Pesquisa-ação, no curso de nosso querido Bob Dick. Agradeço os ricos

momentos de reflexão antes, durante e depois da minha entrada no doutorado. Obrigado

pelo ombro amigo, pelo ombro profissional, pelo ombro docente! Parceria que se

desvela e transborda!

À minha amiga Ana Paula que, de tão generosa, recebeu seu sobrenome Brilhante.

Acolhedora e humana, me apoiou espontaneamente desde o primeiro encontro em

Salamanca. Amizade à primeira vista! Muito obrigado pelas reflexões doutorantes.

Ao Professor Bob Dick, pelo apoio, disposição e entusiasmo com que nos contagiou ao

longo do curso de Pesquisa-ação, em 2015.

À minha querida amiga de muitas vidas Shirlene dos Reis, pessoa espontânea, lutadora,

que com sua perspicácia me ajudou muito nas reflexões sobre a vida, sobre a

universidade, sobre a docência, sobre a política... entre uma limpeza e outra... entre

cafés... a espiritualidade não deixava passar o menor detalhe! Que seja sempre

abençoada, minha querida amiga!

À minha adorada Solange L’Abbate, com quem não consigo ficar um minuto sem

refletir, nos diversificados momentos de encontro (Brasil, França, Ribeirão Preto, São

Paulo, Paris, Fortaleza...). Espero que esses encontros sejam muitos ainda. Muitíssimo

obrigado!

Ao CNPq, pelo apoio financeiro para que fosse possível não somente alcançar os

objetivos deste trabalho, mas também divulgá-lo nacional e internacionalmente.

À CAPES, por propiciar a possibilidade do intercâmbio sanduíche à Université

François-Rabelais de Tours.

À la merveilleuse équipe de chercheurs, formateurs, qui m’ont étonné et accueilli au

sein du Département de Sciences de l’Éducation et de la Formation avec leur unique

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personnalité, amitié, générosité : Sébastien, Hervé, Laurence, Samuel, Catherine, Noël

et Fabienne. Je vous remercie beaucoup pour l’excellente expérience étonnante !

À Gilles Monceau pour les réflexions pendant les cours d’Analyse Institutionnelle, les

réunions sur mon projet de doctorat et dans le Symposium Recherche Avec 2018, et

pour m’avoir aidé, notamment, sur la Nouvelle Gestion Publique. Merci beaucoup !

À Escola de Enfermagem pelo acolhimento desde à graduação em Bacharelado e

Licenciatura em Enfermagem.

À Universidade de São Paulo, por toda ajuda para que eu conseguisse alcançar meus

objetivos. Com especial destaque à equipe de Assistência Social do Campus de Ribeirão

Preto: Cláudia, Cleide, Fabiana, Márcia, Marília e Paulo. E todos os trabalhadores do

Restaurante Universitário, motoristas dos Circulares Internos e Bibliotecários.

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Ao desbravar mares (des)conhecidos

Jore saiu mar adentro em seu barquinho, construído e produzido com muita dificuldade

entre bricolagens das mais variadas formas, cores e texturas de madeira e dos mais

diversos materiais com os quais conseguiu fazer com que o conjunto se mantivesse

unido o suficiente para conseguir tomar a aparência e a função de um barco. Não se

pode furtar a dizer quanta água fora a que invadiu o barquinho e causou uma

multiplicidade de sentimentos... desespero, dúvida, angústia, medo, desesperança... que

no sufoco do instante, fizeram brotar a força e vitalidade para reconhecer que estas

situações, ora vistas como atrocidades, não passavam apenas de desafios inerentes ao

percurso tomado – já esperado. Os tombos foram concretos e abstratos – quando do

rompimento da liga de duas tábuas e a água ameaçava afundar o barco, quando da

topada com barcos a vapor e a motor e, inclusive os luxuosos cruzeiros marítimos, que

desbravavam e disputavam os mesmos mares, tendo, às vezes, saído um pouco antes e

um pouco na frente, mas que, muitas vezes, recuavam para exibir sua imponência sobre

às águas que, de certo modo, controlavam. Mas os tombos também foram abstratos,

uma vez que vários foram os momentos de descrença de que o barquinho todo

remendado pudera ousar sonhar com o aportar em outros continentes, dados os navios

integralmente sólidos, fortificados no mais fino metal, cujos detalhes foram pensados e

minuciosamente esculpidos – oferecendo à leitura externa uma visão de soberania,

domínio e autossuficiência – praticamente intocáveis e inabaláveis – isso frustrava e

causava certo medo de não o conseguir. Foi quando Jore percebeu o quanto estava se

desafiando a chegar em outras terras com poucos recursos, mas que para fazê-lo

precisaria colocar seu corpo e espírito em ação, investir na produção de estratégias,

usar a criatividade, a perspicácia, sua humanidade e precisou desenvolver um navio de

habilidades para conseguir navegar, contornar os atravessamentos e sonhar com o

chegar lá – isso o fez se conhecer melhor, seus limites, suas potências... enquanto os

navios a motor – simplesmente navegam por si sós, conduzindo seus tripulantes – já

possuem suas habilidades desapercebidamente implícitas, com pouco potencial de

produção criativa em percurso... apenas reproduzem, ciclicamente, os mesmos

caminhos de outrora para chegarem no mesmo lugar diferente...

José Renato Gatto Júnior (inverno de 2018).

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RESUMO

GATTO JÚNIOR, J. R. O professor-enfermeiro e a docência no ensino superior:

entre teorias pedagógicas e o gerencialismo. 2018. 400 f. Tese (Doutorado) – Escola

de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2018.

Essa tese pretende analisar as concepções e práticas pedagógicas de professores

universitários enfermeiros. Para tanto, foi realizada uma pesquisa socioclínica,

fundamentada nos pressupostos da Análise Institucional. Os dispositivos utilizados

foram o convite para a pesquisa, o diário de pesquisa, entrevistas, observações e análise

de documentos, restituições individuais dos dados, encontros coletivos para análise dos

dados, análise de demanda e encomenda e análise de implicações. Participaram de todo

o percurso investigativo desta pesquisa 13 professores-enfermeiros docentes de uma

universidade pública. Ainda, outros 5 professores-enfermeiros de cinco outros

estabelecimentos de ensino superior de quatro regiões do Brasil foram entrevistados

também. Os dados foram produzidos a partir de um conjunto de dispositivos analíticos

inter-relacionados e fundamentados na Análise Institucional. A análise de dados

aconteceu segundo momentos de transcrição, transposição e reconstituição em

movimentos contínuos, concomitantes e dinâmicos de produção, restituição e escrita. Os

resultados foram organizados a partir de três principais analisadores da docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro: relação tempo-dinheiro, discutir concepções e

práticas pedagógicas e resistência. Por meio desses analisadores, se produziram efeitos

que analisam a situação da docência no ensino superior e o professor-enfermeiro, em

que há fortes influências da perspectiva neoliberal sobre o trabalho docente,

impulsionando uma profissionalização docente que dá maior ênfase para atividades que

trazem dinheiro para a universidade e para os programas de pós-graduação e incentivo

na economia de tempo com as atividades não-geradoras de dinheiro, como as da

dimensão ensino. O modelo neoliberal tem provocado também que as concepções e

práticas pedagógicas se sustentem apenas se se alinharem a estes pressupostos, as

demais se desvanecem e não encontram sustentação. Os movimentos de resistência de

docentes-enfermeiros contra estas perspectivas neoliberais não têm produzido

dispositivos de resistência duradouros para enfrentar esta questão e vão sendo

assimilados aos poucos. Desse modo, concluímos que as escolhas dos docentes-

enfermeiros estão cada vez mais fundamentadas na perspectiva gerencialista que em

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referenciais ou pressupostos emancipadores/críticos/dialéticos oriundos de teorias

pedagógicas.

Palavras-chave: docência; enfermagem; educação superior; gerencialismo;

socioclínica; análise institucional.

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ABSTRACT

GATTO JÚNIOR, J. R. The nursing faculty and the teaching in higher education:

between pedagogical theories and management. 2018. 400 f. Thesis (Doctorate) –

Ribeirão Preto College of Nursing, University of São Paulo, Ribeirão Preto, 2018.

This thesis aims to analyze the pedagogical conceptions and practices of university

nursing faculty. For that, a socioclinic research was carried out, based on the

assumptions of the Institutional Analysis. The devices/apparatus used were the

invitation to the research, the research journaling, interviews, observations and

documentary analysis, individual data restitutions, collective meetings for data analysis,

order and demand analysis and analysis of implications. Thirteen nursing faculties from

a public university participated in this research. Still, another five nursing faculties from

five other higher education organizations from four regions of Brazil were interviewed

as well. The data were produced from a set of analytical devices/apparatus interrelated

and based on the Institutional Analysis. The data analysis occurred at moments of

transcription, transposition and reconstitution in continuous, concomitant and dynamic

movements of production, restitution and writing. The results were organized from three

main analyzers of teaching in higher education and the nursing faculty: time-money

relationship, discussing pedagogical conceptions and practices; and, resistance. Through

these analyzers, effects have been produced that analyze the situation of ‘teaching in

higher education and the nursing faculty’, in which there are strong influences of the

neoliberal perspective on the teaching work, impelling a faculty professionalization that

gives more emphasis to activities that bring money to the university and for the post-

graduation programs and incentivizes the economy of time with the activities non-

generative of money, like those of the teaching dimension. The neoliberal model has

also provoked that pedagogical conceptions and practices are sustained only if they are

aligned to these presuppositions; the others fade away and cannot find support to

continue to exist. The resistance movements of nursing faculty against these neoliberal

perspectives have not produced enduring devices/apparatus of resistance to face this

situation and are being gradually assimilated. Thus, we conclude that the choices of

nursing faculties are increasingly each time more based on the neoliberal managerial

perspective than it is on emancipatory/critical/dialectical references or presuppositions

derived from pedagogical theories.

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Key words: teaching; nursing; higher education; management; socioclinic; institutional

analysis.

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RESUMEN

GATTO JÚNIOR, J. R. El profesor-enfermero y la docencia en la educación

superior: entre teorías pedagógicas y el gerencialismo. 2018. 400 f. Tesis

(Doctorado) – Escuela de Enfermería de Ribeirão Preto, Universidad de São Paulo,

Ribeirão Preto, 2018.

Esta tesis pretende analizar las concepciones y prácticas pedagógicas de profesores

universitarios enfermeros. Para ello, se realizó una investigación socioclínica,

fundamentada en los presupuestos del Análisis Institucional. Los dispositivos utilizados

fueron la invitación para la investigación, el diario de investigación, entrevistas,

observaciones y análisis de documentos, restituciones individuales de los datos,

encuentros colectivos para análisis de los datos, análisis de demanda y orden y análisis

de implicaciones. Participaron de todo el recorrido investigativo de esta investigación

13 profesores-enfermeros docentes de una universidad pública. Además, otros 5

profesores-enfermeros de cinco otros establecimientos de enseñanza superior de cuatro

regiones de Brasil fueron entrevistados también. Los datos fueron producidos a partir de

un conjunto de dispositivos analíticos interrelacionados y fundamentados en el Análisis

Institucional. El análisis de datos ocurrió según momentos de transcripción,

transposición y reconstitución en movimientos continuos, concomitantes y dinámicos de

producción, restitución y escritura. Los resultados fueron organizados a partir de tres

principales analizadores de la docencia en la enseñanza superior y el profesor-

enfermero: relación tiempo-dinero, discutir concepciones y prácticas pedagógicas y

resistencia. Por medio de estos analizadores, se produjeron efectos que analizan la

situación de la docencia en la enseñanza superior y el profesor-enfermero, en el que hay

fuertes influencias de la perspectiva neoliberal sobre el trabajo docente, impulsando una

profesionalización docente que da mayor énfasis para actividades que traen dinero para

la universidad y los programas de postgrado y el incentivo en la economía de tiempo

con las actividades no generadoras de dinero, como las de la dimensión de la enseñanza.

El modelo neoliberal ha provocado también que las concepciones y prácticas

pedagógicas se sustenten sólo si se alinean a estos presupuestos, las demás se

desvanecen y no encuentran sustentación. Los movimientos de resistencia de docentes-

enfermeros contra estas perspectivas neoliberales no han producido dispositivos de

resistencia duraderos para enfrentar esta cuestión y siguen siendo asimilados poco a

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poco. De ese modo, concluimos que las elecciones de los docentes-enfermeros están

cada vez más fundamentadas en la perspectiva gerencialista que en referenciales o

presupuestos emancipadores/críticos/dialécticos oriundos de teorías pedagógicas.

Palabras-clave: docencia; enfermería; educación superior; gerencialismo; socioclínica;

análisis institucional.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Representação do Efeito Rosa dos Ventos sobre as Concepções e Práticas

Pedagógicas de Docentes-Enfermeiros ........................................................................ 227

Figura 2 - Representação da dialética dos três momentos do conceito de resistência.

Criado por Monceau (1997) e traduzido por Dobies e L'Abbate (2016). ..................... 279

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Porcentagem de observações por tipo de situação observada ................... 126

Gráfico 2 – Apresentação do estado civil dos participantes ........................................ 135

Gráfico 3 - Apresentação da religião dos participantes ............................................... 135

Gráfico 4 - Principal área de atuação no ensino de graduação em enfermagem ......... 136

Gráfico 5 - Apresentação do tempo (em anos) de atuação dos participantes na docência

no estabelecimento de ensino superior estudado quando do momento de entrevista ... 136

Gráfico 6 - Apresentação do tempo (em anos) de atuação na docência em

estabelecimento de ensino superior dos participantes nos momentos de novas entrevistas

...................................................................................................................................... 138

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Caminho da busca na literatura por trabalhos relacionados com o objeto de

estudo desta pesquisa ...................................................................................................... 46

Quadro 2 - Comparativo entre os tempos de defesa em três programas (Prog.) de pós-

graduação nos dois últimos regulamentos .................................................................... 204

Quadro 3 – Evolução do número de docentes (doc.) e funcionários (func.) da

Universidade estudada nos últimos 11 anos ................................................................. 207

Quadro 4 – Evolução do número de docentes por regime de trabalho no período de

2013-2016 ..................................................................................................................... 207

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES

ABRASCO Associação Brasileira de Saúde Coletiva

APSP Associação Paulista de Saúde Pública

BRICS o grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)

C. A. A. E. Certificado de Apresentação para Apreciação Ética

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEBES Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DCN Diretrizes Curriculares Nacionais

DILMA Dilma Vana Rousseff

DIY Do it yourself/Faça você mesmo

DOC Documento

EC Emenda Constitucional

EES Laboratoire Éducation Éthique et Santé (Université de Tours)

ERIC Education Resources Information Center

FHC Fernando Henrique Cardoso

FIES Fundo de Financiamento Estudantil

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LPP Laboratório de prática profissional

LULA Luiz Inácio Lula da Silva

MARE Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado

MDB Movimento Democrático Brasileiro

MEDLINE Medical Literature Analysis and Retrieval System Online/Sistema Online

de Busca e Análise de Literatura Médica

MeSH Medical Subject Headings

PDSE Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior (CAPES)

PEA Processo de Ensino-Aprendizagem

PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PPP Projeto político-pedagógico

PROFAE Projeto de Profissionalização de Trabalhadores da Área de Enfermagem

PROUNI Programa Universidade para Todos

PubMed Motor de busca de livre acesso à MEDLINE

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RDIDP Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa

REUNI Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das

Universidades Federais

RTC Regime de Turno Completo

RTP Regime de Turno Parcial

SAE Sistematização da Assistência de Enfermagem

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TSE Tribunal Superior Eleitoral

UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

UAM Universidad Autónoma de Madrid

USF Unidade de Saúde da Família

USP Universidade de São Paulo

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LISTA DE ANEXOS

ANEXO 1 - Último ofício de aprovação pelo Comitê de Ética ................................... 333

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LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE 1 - Roteiro para entrevista semiestruturada ............................................ 334

APÊNDICE 2 - Roteiro para observação das abordagens pedagógicas do professor . 334

APÊNDICE 3 - Roteiro para Análise Documental ..................................................... 334

APÊNDICE 4 - Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (últimas versões) .... 335

APÊNDICE 5 - Exemplo de quadros com elementos emancipatórios e quadros com

situações-limites ........................................................................................................... 339

APÊNDICE 6 - Exemplo de anotação durante um momento de restituição individual

...................................................................................................................................... 348

APÊNDICE 7 - Quadro analítico gerador do efeito rosa dos ventos .......................... 351

APÊNDICE 8 - Quadro analítico gerador de outros efeitos a partir das restituições

individuais .................................................................................................................... 383

APÊNDICE 9 - Quadro analítico de alguns efeitos do dispositivo de pesquisa ......... 391

APÊNDICE 10 - Quadro analítico integrador dos efeitos produzidos ........................ 394

APÊNDICE 11 - Quadro com todos os documentos analisados nesta pesquisa (alguns

com identificação ocultada) .......................................................................................... 397

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 29

INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 33

OBJETIVOS ............................................................................................................... 57

Objetivo geral ......................................................................................................... 57

Objetivos específicos .............................................................................................. 57

MARCO TEÓRICO E METODOLÓGICO .................................................................. 58

A universidade e a docência no ensino superior: uma breve retrospectiva ................ 58

A Universidade no Brasil e a docência universitária............................................. 61

O contexto dos anos 1990 e atual e o neoliberalismo no Brasil: a Institucionalização

do Pensamento Neoliberal no Estado Brasileiro ........................................................ 67

Um breve contexto sobre a Saúde no Brasil ............................................................... 77

A docência no Ensino Superior e o professor-enfermeiro .......................................... 84

O professor-enfermeiro na encruzilhada das instituições enfermagem, saúde e

docência no ensino superior ................................................................................... 98

As Concepções e Práticas Pedagógicas ............................................................... 105

Entre a Pesquisa Qualitativa e a Pesquisa Socioclínica Institucionalista ................. 107

Percurso metodológico, analítico e produção dos dados .......................................... 121

O desenvolvimento metodológico e os aspectos éticos atrelados ........................ 121

Breve caracterização dos participantes desta pesquisa ....................................... 134

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O cenário de estudo: breve contextualização (as referências foram omitidas

propositadamente para manter o sigilo e para não identificar o estabelecimento)

.............................................................................................................................. 138

O processo analítico ............................................................................................. 142

RESULTADOS, DISCUSSÃO E ANÁLISE DE IMPLICAÇÃO .............................. 145

UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DO QUE CONSISTE EM ‘ANALISAR A

IMPLICAÇÃO’ ........................................................................................................ 145

Um primeiro exercício de análise da minha implicação........................................... 148

Nascimento, família e status social ...................................................................... 149

A educação formal e o estudo de inglês ............................................................... 151

A questão da sexualidade ..................................................................................... 156

As perdas e a necessidade de sair da zona de conforto: início da graduação..... 157

A entrada na pós-graduação: doutorado direto................................................... 162

Analisando algumas características ..................................................................... 166

Um olhar sobre as implicações no desvelar desta pesquisa...................................... 167

Algumas reflexões sobre as implicações primárias e secundárias nesta pesquisa ... 175

ALGUNS DISPOSITIVOS PARA INSTITUCIONALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS

NEOLIBERAIS E DA NOVA GESTÃO PÚBLICA SOBRE A DOCÊNCIA NA

UNIVERSIDADE ESTUDADA .............................................................................. 177

RELAÇÃO TEMPO-DINHEIRO COMO ANALISADOR DA ‘DOCÊNCIA NO

ENSINO SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’ .................................... 186

Alguns efeitos do pensamento neoliberal e da nova gestão pública sobre os

docentes enfermeiros ............................................................................................ 186

O Efeito Checklist ................................................................................................. 188

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Efeito da livre-concorrência (competição e competitividade) ............................. 196

Efeito sanfona sobre o tempo na docência ........................................................... 203

Efeito de contenção (camisa de força) ................................................................. 214

DISCUTIR CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS COMO ANALISADOR DA

‘DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’ ...... 220

Alguns efeitos do pensamento neoliberal e da nova gestão pública sobre as

concepções pedagógicas de docentes enfermeiros ............................................... 220

Efeito Rosa dos Ventos sobre as Concepções e as Práticas Pedagógicas ........... 221

Efeito Peneira (cada vez mais seletiva) ................................................................ 271

RESISTÊNCIA COMO ANALISADOR DA ‘DOCÊNCIA NO ENSINO

SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’ .................................................... 278

Efeito Adaptação-Resistência ............................................................................... 278

Efeito Adoecimento-Resistência ........................................................................... 291

Efeito Alastramento-Resistência........................................................................... 295

CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 299

REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 308

APÊNDICES E ANEXOS ........................................................................................... 333

ANEXO 1 - Último ofício de aprovação pelo Comitê de Ética ................................... 333

APÊNDICE 1 - Roteiro para entrevista semiestruturada ............................................. 334

APÊNDICE 2 - Roteiro para observação das abordagens pedagógicas do professor .. 334

APÊNDICE 3 - Roteiro para Análise Documental ...................................................... 334

APÊNDICE 4 - Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (últimas versões) ..... 335

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APÊNDICE 5 - Exemplo de quadros com elementos emancipatórios e quadros com

situações-limites ........................................................................................................... 339

APÊNDICE 6 - Exemplo de anotação durante um momento de restituição individual 348

APÊNDICE 7 - Quadro analítico gerador do efeito rosa dos ventos ........................... 351

APÊNDICE 8 - Quadro analítico gerador de outros efeitos a partir das restituições

individuais .................................................................................................................... 383

APÊNDICE 9 - Quadro analítico de alguns efeitos do dispositivo de pesquisa .......... 391

APÊNDICE 10 - Quadro analítico integrador dos efeitos produzidos ......................... 394

APÊNDICE 11 - Quadro com todos os documentos analisados nesta pesquisa (alguns

com identificação ocultada) .......................................................................................... 397

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APRESENTAÇÃO

Densamente implicado com a docência desde a infância, me atrevo a estudar a

docência no ensino superior da carreira profissional em que me formei... é com esta

frase que convido o leitor para se preparar para a leitura de uma tese escrita por alguém

que querendo ser professor na educação básica desde a infância, se aventura por uma

carreira universitária em um curso de bacharelado e licenciatura em enfermagem,

atravessado tanto pelo desejo de ser docente como pelo desejo de ascensão social por

meio de uma carreira na área da saúde e que, em certo ponto, se fascina com perceber a

possibilidade de ser professor na universidade. Esta breve apresentação servirá para

introduzir o leitor para o percurso de leitura desta tese.

Para começar esta empreitada, convido o leitor à leitura desta tese, tendo como

base que ela foi construída no formato encomendado (introdução, objetivos, marcos

referenciais, percurso metodológico e analítico, resultados e discussão, considerações

finais, referências e listas de apêndices e anexos). Entretanto, o leitor perceberá que em

alguns momentos o texto tem um tom analítico, desde a introdução e os marcos

referenciais. Antes de prosseguir, cabe destacar o apoio do CNPq, com a bolsa de

demanda social processo n.º 147900/2014-0, a qual permitiu a inserção em vários

espaços, participação em vários eventos, publicações de textos e utilização de recursos

que facilitaram a produção e organização dos dados nesta pesquisa.

À introdução do trabalho, serão abordadas as principais problemáticas desta

pesquisa, a lacuna do conhecimento e as principais perguntas deste estudo, perpassando

pela enfermagem enquanto se constituindo uma profissão e carreira universitária,

percorrendo também o exercício da docência universitária em enfermagem e os

principais problemas e dilemas que se referem a esta pesquisa. Se perceberão os

objetivos na sequência da introdução. Adicionalmente, em vários momentos, encontrar-

se-ão explicações sobre conceitos e notas de rodapé para apoiar o leitor nessa travessia.

O marco teórico e metodológico percorrerá uma diversidade de referenciais

teóricos e metodológicos necessários para a produção, análise e interpretação dos dados

nesta tese. Começaremos por um olhar sobre a instituição universidade, relacionando,

de certa maneira, à docência no ensino superior, com olhar mais específico sobre a

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realidade brasileira. Entraremos, então, em uma breve apresentação do contexto da

saúde no Brasil para, então, entrarmos na questão da especificidade da docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro. Depois disso, apresentaremos os caminhos

desta pesquisa, seus fundamentos teóricos, metodológicos e analíticos, assim como

apresentaremos o cenário e os participantes desse estudo. Trata-se de um trabalho sobre

a docência no ensino superior, com foco no professor enfermeiro, que foi realizado por

meio de uma pesquisa socioclínica (vertente da Análise Institucional), o que significa

que as leituras sobre todos os referenciais e referências utilizadas na construção dessa

tese envolveu reflexões no sentido de deixar a escrita o mais proximamente da dialética

institucional1 (o instituído, as forças instituintes e o processo de institucionalização).

E onde é que eu me apresento? Acredito que faço uma apresentação sobre mim

no tópico resultados, discussão e análise de implicação. Aí, apresento minhas reflexões

com relação às minhas implicações histórico-existenciais (ideológicas), psicoafetivas

(libidinais) e estrutural-profissionais (organizacionais), destacando, em momentos, as

relações destas implicações com as escolhas feitas e os caminhos trilhados, que me

trouxeram até a produção desta tese. A análise de implicações é um dispositivo

importante na Análise Institucional que auxilia na compreensão das escolhas e a

perceber e valorizar alguns aspectos que são desconsiderados por outras modalidades de

pesquisa, tais como as características do pesquisador e dos participantes, suas

militâncias e apostas etc. Desse modo, neste tópico ainda, é apresentada a análise de

implicação dos integrantes desta pesquisa, realizada em dois encontros, por meio da

qual se pode perceber algumas importantes implicações para este estudo. Será possível

perceber as minhas implicações com as correntes pedagógicas que se fundamentam em

perspectivas dialéticas de produção de conhecimentos – é impossível não estar

implicado!

Continuando ainda nos resultados, apresentaremos uma discussão em relação a

alguns dispositivos utilizados para a institucionalização do pensamento neoliberal no

Estado brasileiro, alguns de seus efeitos sobre a universidade estudada, alguns efeitos

sobre os docentes-enfermeiros e sobre suas concepções e práticas pedagógicas. Esses

1 Na Dialética Institucional é a tríade que têm relevância sobre a instituição – o instituído, o instituinte e a institucionalização – isso será apresentado melhor no tópico percurso metodológico, analítico e produção dos dados.

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efeitos foram produzidos quando da utilização de três analisadores da instituição

docência no ensino superior e o professor-enfermeiro: relação tempo-dinheiro, discutir

concepções e práticas pedagógicas e resistência. A partir destes analisadores, os efeitos

produzidos foram: efeito checklist, efeito da livre-concorrência, efeito sanfona sobre o

tempo da docência, efeito de contenção, efeito rosa dos ventos sobre as concepções e

práticas pedagógicas, efeito peneira, efeito adaptação/resistência, efeito

adoecimento/resistência e efeito alastramento/resistência. Esperamos que a leitura

destes efeitos possa suscitar várias reflexões transformativas no leitor. Neste caminho,

as produções vão sugerindo que a docência no ensino superior, para o caso dos

professores-enfermeiros/docentes-enfermeiros sofre influência direta e indireta das

perspectivas gerencialistas, dando pistas de que as institucionalizações que acontecem

no Estado brasileiro (Nova Gestão Pública e gerencialismo), atualizando o Estado para

um sentido cada vez mais neoliberal, também disparam institucionalizações de mesmo

cunho ideológico sobre as universidades (via agências reguladoras e outros

dispositivos), e estas disparam ações sobre os docentes e suas concepções pedagógicas.

Portanto, abordaremos a instituição “docência no ensino superior” nesta

pesquisa a partir da Análise Institucional, por meio de três analisadores2 – relação

tempo-dinheiro, discutir concepções pedagógicas, e resistência, os quais possibilitaram

que essa instituição se desnudasse, revelando seus movimentos, suas atualizações. A

relação tempo-dinheiro permitiu a aproximação com a influência do dinheiro, do tempo,

do dinheiro-tempo na atualização do exercício da docência no ensino superior,

evidenciando os seus efeitos3. Ao discutir as concepções pedagógicas, pôde-se capturar

2 Com relação ao conceito de Analisador, trata-se de um “fenômeno social capaz de provocar, ou de impor, uma crítica, uma autocrítica, uma análise “selvagem” da situação. Raramente o analisador é um indivíduo ou um comportamento coerente, pois o próprio analisador está submetido às contradições do sistema que ele revela. Porém, como o analisador desconstrói as relações sociais institucionalizadas, obriga a tomar partido, a não mais esconder o que se é, a falar ou a agir para provar o que se é ou o que se diz. Ele revela as relações de poder dissimuladas sob a ideologia do bem comum e do consenso” (HESS; SAVOYE, 1993b, p.74). É aquilo que faz a(s) instituição(ões) falar(em), que permite desvelar a estrutura da organização, provocando-a e forçando-a a falar. Para a Análise Institucional “o substrato material, a infraestrutura organizacional da instituição, sua materialidade falam mais forte que os discursos articulados. Por isso é que são dissimulados pelo segredo, pela canalização da informação, pelas racionalizações ideológicas.” (LOURAU, 2014, p.301). 3 EFEITO: Para alguns autores, efeito é manifestação de um fenômeno que se repete e se produz frequentemente, dentro de algumas condições. Destacam ainda que conhecer estas manifestações correntes podem ajudar na análise do que está em curso ou do que está por vir (HESS; SAVOYE, 1993b). É nesse sentido que usaremos o termo EFEITO nesta pesquisa.

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algumas perspectivas instituídas e instituintes, e o processo de institucionalização de

concepções e práticas pedagógicas e suas influências e efeitos. Ao analisar a resistência,

foi possível localizar os movimentos e forças que dão o tom nas atualizações da

instituição em si, notadamente pela dinamicidade dos momentos ofensivos, defensivos e

integrativos da resistência.

Por fim, terminamos este texto com as considerações finais (não finais), onde

fazemos uma breve integração dos efeitos para a principal defesa nesta tese.

Suscintamente, defende-se a tese de que as concepções pedagógicas estão cada vez mais

embasadas em princípios gerencialistas e cada vez menos em referenciais de cunho

pedagógico, notadamente os dialéticos (pedagogias críticas e emancipatórias de fato).

Apenas para completar, após a referências, estão os anexos e apêndices deste

estudo.

Esperamos que esta tese possa contribuir para se refletir sobre estes processos

em que o professor-enfermeiro está submetido e a que se submete com relação à

profissionalização docente para o exercício da docência no ensino superior. Pedimos

desculpas antecipadamente pela linha um tanto ácida com que o texto foi escrito e que

tem bastante relação com as nossas implicações, maneiras de pensamento e de

expressão.

Boa leitura!

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INTRODUÇÃO

A enfermagem começa a se constituir como um ofício e tomar contornos de um

campo de atuação, notadamente, a partir dos esforços de Florence Nightingale, a qual

cuidou de soldados durante a guerra da Criméia. Desse modo, vê-se que esse campo de

atuação nasce a partir do desejo de cuidar do outro e também caracterizado pelos traços

femininos de uma mulher que irrompe os preceitos de uma sociedade fortemente

estabelecida aos moldes masculinos. Com esta empreitada, a protagonista da instituição

enfermagem moderna lança outros projetos no sentido da formação de pessoas que

prestariam os cuidados, buscando inscrever estas práticas de cuidados dentro do ofício

de enfermagem. Uma vez que o cuidado foi se constituindo relegado às mulheres, mães

(o traço feminino associado) e também religiosas e prostitutas (um senso religioso de

entrega, devoção, arrependimento, penitência), pode-se dizer que foi a partir dos

esforços de Nightingale que um processo de profissionalização do ofício do cuidado

começou a tomar corpo, inclusive com os ‘treinamentos’ sobre o cuidar que Nightingale

oferecia (NELSON; RAFFERTY, 2010).

A partir das influências de Nightingale, a enfermagem enquanto profissão se

espalha pelo mundo sob implementação e concepção das mais variadas formas

possíveis. No Brasil, a profissionalização começa oficialmente quando da criação das

‘escolas’ de enfermagem, as quais, principalmente, localizadas nos arredores das

faculdades de medicina, com a finalidade de formar pessoal qualificado para trabalhar

em hospitais, sendo a primeira Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras criada

em 1890, no Rio de Janeiro, com vistas a melhorar a qualidade dos hospitais militares

existentes (CARVALHO; CECCIM, 2012). O ensino de enfermagem no Brasil também

foi impulsionado pela necessidade de controle sanitário dos portos, pela necessidade de

controle de doenças endêmicas, dentre outros aspectos, que ansiavam por profissionais

preparados nesta direção (KLETEMBERG; SIQUEIRA, 2003). Desse modo, percebe-se

que os movimentos sanitaristas também compuseram o rol de influências sobre a

profissionalização em enfermagem.

As primeiras escolas de enfermagem geridas por enfermeiras tinham certa

preparação de seu corpo docente para atuação como formadores dos trabalhadores de

enfermagem pelo Brasil, sendo o ensino o principal foco, uma vez que se necessitava de

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força de trabalho, pois as religiosas estavam deixando os espaços de caridade em saúde,

onde atuavam antes mesmo da existência da profissão enfermagem (KLETEMBERG;

SIQUEIRA, 2003), isso se deve ao processo de implementação capitalista, em que os

hospitais deixam de ser lugares em que as pessoas iam para morrer e passam a ser um

lugar de recuperação da força de trabalho (SOBOLL, 2003).

É a partir da década de 1930, com a criação de universidades no Brasil, que

foram reunidos vários centros formadores de várias profissões existentes (incluindo a

enfermagem) e que estavam espalhados (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017). A partir

de então, mais escolas de enfermagem foram sendo criadas, inicialmente, ao redor de

faculdades de medicina e de hospitais. Aqui já se percebe, pelo menos, duas influências

sobre a profissão enfermagem, sobre a formação em enfermagem e sobre a docência no

ensino superior em enfermagem: a medicina e a lógica hospitalar, ambas com foco,

naquele momento, na doença e na cura do corpo físico e biológico.

Ao longo das próximas décadas, foram momentos de grandes disputas para a

atuação no campo da enfermagem, em que uma série de decretos e leis são postas em

marcha e que tocavam de certa maneira sobre o desenvolvimento da profissão de

enfermagem. O decreto n.º 22.257/1932 permitia que irmãs de caridade que tinham

comprovação de seis anos ou mais na prática de enfermagem que trabalhassem

legalmente em estabelecimentos hospitalares. O decreto n.º 23.774/1934 estendeu essa

possibilidade aos leigos que tivessem pelo menos cinco anos comprovados de atuação

na prática de enfermagem. O decreto n.º 8778/1946 buscou regulamentar a realização de

exames que habilitariam auxiliares de enfermagem e parteiras, desde que tivessem mais

de dois anos de experiência em estabelecimentos hospitalares. A lei federal 775/1949 é

a responsável por regulamentar o ensino de enfermagem, estabelecendo dois cursos: o

curso de enfermagem e o curso de auxiliar de enfermagem e a lei 2604/1955

complementa com a regulamentação do exercício profissional tanto do enfermeiro como

do auxiliar de enfermagem. Estas legislações sinalizam e oficializam a continuidade da

divisão social e técnica do trabalho na enfermagem, principalmente em duas categorias

(auxiliar de enfermagem e enfermeiro), o que pode ser a continuação do reflexo da

divisão no campo da enfermagem, iniciado por Florence Nightingale, com a questão das

nurses e lady-nurses.

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Entretanto, em 1966, com a criação do curso técnico em enfermagem para

atender às necessidades do processo de industrialização e de avanço tecnológico do país

e dos hospitais (BAGNATO, 1994), fica introduzido mais um elemento na divisão

social e técnica do trabalho de enfermagem (auxiliares, técnicos e o enfermeiro).

Nessa direção, uma preocupação também acompanhou essa divisão técnica e

social do trabalho em enfermagem – sabendo que o enfermeiro era formado nas escolas

de enfermagem (na maioria associadas a faculdades de medicina), e as outras categorias

em centros técnicos de formação quem eram os formadores de cada categoria

profissional de enfermagem?

Iniciando a resposta a esta indagação, até então, eram os enfermeiros

diplomados os responsáveis por toda a formação em enfermagem (nas escolas de

enfermagem/universidades e nos centros técnicos de formação), mas os quais não

tinham uma formação específica para ser professores. Nessa direção, uma das frentes

para formar enfermeiros com conhecimentos pedagógicos para lecionarem nos cursos

de formação das categorias profissionais auxiliar e técnico, foi a criação do curso de

licenciatura em enfermagem por meio do parecer n.º 837/1968 da Câmara de Ensino

Superior (MOTTA; ALMEIDA, 2003). Isso não foi o suficiente para a realidade

nacional e muitos enfermeiros sem licenciatura continuaram e continuam a formar os

profissionais auxiliares e técnicos de enfermagem.

Vale destacar também que a formação do enfermeiro foi se consolidando ao

longo dos anos em duas modalidades de graduação: os bacharelados e as licenciaturas.

Os bacharelados formam os enfermeiros para trabalhar na assistência, na gestão e na

educação em saúde/educação para a saúde, assim como para a pesquisa. As graduações

que formam o enfermeiro licenciado, após enfrentar alguns dilemas quanto a

nomenclatura do curso, em que alguns cursos optaram pelo nome ‘bacharelado e

licenciatura em enfermagem’ com apenas uma entrada na universidade, outros cursos o

ingressante entra pelo bacharelado e opta pela inclusão da licenciatura (ou vice-versa),

dentre vários arranjos que têm sido feitos para garantir a formação do enfermeiro

licenciado (MACHADO, 2008; CORRÊA; SORDI, 2018). Nessa direção, o enfermeiro

licenciado pode atuar na assistência, na gestão, na educação em saúde/educação para a

saúde e na sua especificidade formativa que é na docência nos cursos técnicos de nível

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médio, para a formação de recursos humanos de nível médio em enfermagem

(CORRÊA; SORDI, 2018).

Embora as licenciaturas formem para a docência em nível médio (obviamente

considerando a variedade pedagógico-formativa dos cursos que existem pelo Brasil) e

ofereçam alguns recursos gerais para a docência, a formação e o exercício da docência

no ensino superior em enfermagem (outro nível educacional) têm suas especificidades e

complexidades próprias, exigindo contínua formação e dedicação para trabalhar neste

nível educacional específico (RODRIGUES; MENDES SOBRINHO, 2008). Entretanto,

são muitos os bacharéis que assumem a docência no ensino superior (LAZZARI et al.,

2015), após terem realizado uma pesquisa no mestrado e outra pesquisa no doutorado,

costumeiramente, sem estudos aprofundados da cientificidade da docência e dos saberes

pedagógicos (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Ainda, na década de 1980, houve o Projeto Larga Escala, buscando a

profissionalização daquelas pessoas trabalhando como atendentes de enfermagem e foi

implementado em momento em que a área da saúde sofria muitas transformações (os

movimentos da reforma sanitária, de reforma psiquiátrica, questionamentos no sentido

da saúde como direito, dentre outros) (BASSINELLO; BAGNATO, 2009) – isso ainda

antes da criação do SUS. E depois, por volta dos anos 2000, foi implementado o Projeto

de Profissionalização de Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE), em que

foram ofertados cursos de auxiliar de enfermagem, de técnico de enfermagem e

inclusive de especialização em Formação Pedagógica em Educação Profissional de

Nível Técnico para a saúde para os enfermeiros bacharéis que lecionavam no ensino

técnico (GÖTTEMS et al., 2007). Isso sinaliza a preocupação que começou a ser

levantada quanto à necessidade de formação pedagógica dos docentes que formavam os

outros membros da equipe de enfermagem.

No tocante da formação para a docência no ensino superior, pode-se citar a

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), cuja criação

se deu por meio do decreto n.º 29.741 de 1951, e cujas atividades mais relacionadas

com assuntos universitários, com a pós-graduação em nível superior, com a política

nacional de pós-graduação, com a promoção de atividades relacionadas com a

capacitação de pessoal de nível superior, dentre outros, foram celebradas por meio do

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decreto n.º 74.229 de 1974 (CAPES, 2018). Nessa direção, cabe destacar, ainda, que foi

por volta dos anos 1970-1980 que foi incentivada pelas universidades e pelas agências

de fomento à pesquisa a pós-graduação (mestrado e doutorado) dos docentes

formadores em enfermagem, a partir de que a pós-graduação começa a disparar e a

consolidar a enfermagem como ciência no cenário nacional (SCOCHI et al., 2013).

Aqui outro sinalizador importante que também vai influenciar a conformação da

enfermagem brasileira e, principalmente, a docência no ensino superior em

enfermagem: a formação em pesquisa como requisito para qualificação do docente do

ensino superior em enfermagem.

Por volta deste mesmo período no Brasil (1970-1990), se organizavam também

os movimentos questionadores do regime militar que produzira, principalmente sobre as

parcelas mais vulneráveis da população, a intensificação das desigualdades sociais e a

ânsia pelo retorno da democracia. Desse modo, os movimentos mais destacáveis para o

período foram o Movimento Constitucionalista e a Reforma Sanitária. Por meio do

primeiro, influenciado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, os embates

travados permearam a elaboração da Constituição da República Federativa do Brasil em

1988 (BRASIL, 1988), na qual se conseguiu contemplar a saúde como direito universal

e já sinalizava a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). No ano de 1990, por meio

da lei orgânica n.º 8.080 /1990 (BRASIL, 1990), anuncia-se a implementação do SUS

em todo território nacional. Assim, o SUS passa a ser um marco regulatório para a

formação de profissionais de saúde e ao mesmo tempo sofrendo diversos

atravessamentos, principalmente aqueles advindos dos interesses privados e do

movimento dos planos de saúde privados, contra sua definitiva consolidação como uma

política de Estado para garantir o direito universal humano à saúde por meio da

participação direta da sociedade em sua construção, implementação, revisão e

consolidação (CECCIM; CARVALHO, 2005; PIZZINATO et al., 2012; PAIM, 2013;

DAMIANCE et al., 2016; MACHADO et al., 2016). Percebe-se, então, a possibilidade

de dar continuidade à construção de um Estado Democrático de Bem-Estar Social, em

que os direitos humanos passam a ser o cerne de suas ações e objetivos últimos para a

vida em sociedade (LOPES, 2014).

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Nesse caminho, não se pode furtar de mencionar que contribuiu muito para o

processo de redemocratização do país (sair desse momento de ditadura militar) os

movimentos de reforma sanitária, que sempre foram questionadores e bastante

politizados. Nessa direção, o que chamamos hoje de Saúde Coletiva, nasce a partir dos

esforços de estudiosos que discutiam e investiam fortemente para a construção de um

sistema público de saúde, notadamente os do campo da Saúde Pública e da Medicina

Preventiva. A partir de então, a ideia Saúde Coletiva começou a designar encontros,

debates, estabelecimentos, agrupamentos, dentre outros, que tinham a finalidade de

ampliar as discussões e construções dentro da área da saúde. Nesse sentido, a Saúde

Coletiva começa a se institucionalizar como um caminho promissor para a

ressignificação e reconfiguração daquilo que se tinha enquanto ‘saúde’ para a população

e trabalhadores brasileiros. Podemos dizer que os marcos fundadores dessa corrente, no

campo dos movimentos sociais, foram a criação da ABRASCO (1979) e a disseminação

de um artigo conceitualizando essa corrente da Saúde Coletiva (L'ABBATE, 2013b),

mas no campo epistemológico o conceito de saúde coletiva foi sendo produzido,

principalmente a partir da década de 1950, em que análises foram sendo feitas sobre os

modelos biologicista, preventivista, de medicina social e de saúde pública. Essa revisão

conceitual, certamente, propiciou um caminho fortuito para a consolidação

epistemológica do conceito de saúde coletiva, pautada no referencial dos condicionantes

e determinantes sociais da produção das condições de saúde-doença das populações,

assim como nas condições organizacionais dos serviços de saúde. Desse modo, a saúde

coletiva é apostada como um dos caminhos para revitalização do embate biológico e

social, e potencializadora de ricas interações para fazer avançar as dimensões

simbólicas, éticas e políticas no campo da saúde (NUNES, 1994).

Desde então, o movimento de Saúde Coletiva tem defendido o SUS como uma

política pública e de Estado, em que várias associações (Abrasco, APSP, CEBES, etc.)

têm se posicionado na defesa de sua manutenção e sua ampliação como um sistema que

busca a consolidação e real efetivação do direito universal à saúde. E esta afirmação da

Saúde Coletiva e do SUS vem sendo disseminada, sustentada por ações e movimentos

dessas associações, de trabalhadores, gestores, pesquisadores, estudantes e pela

sociedade civil organizada e consciente do papel do SUS e da Saúde Coletiva sobre a

realidade de vida da população brasileira (L'ABBATE, 2013b).

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Entretanto, durante o governo da aliança social-liberal uma mudança foi feita

nos rumos do Estado brasileiro, em que o ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, após

fazer uma imersão na Inglaterra, importa o modelo da new public management

(proposta que visa gerir o setor público com os princípios do setor privado) e o

implementa na Reforma do Estado Brasileiro4, com o nome de nova gestão pública,

notadamente pela vertente gerencialista. Assim, foi produzida uma emenda

constitucional à Constituição Cidadã – Emenda Constitucional n.º 19 de 04 de junho

1998 (EC 19/1998) (BRASIL, 1998), a qual começara a ser gestada desde 1995, quando

da nomeação de Bresser-Pereira como ministro. Essa visão porta princípios

gerencialistas de cunho neoliberal e, inclusive, um conjunto de estratégias ideológicas

para disseminar e impregnar estes princípios na vida em sociedade – a cultura do

management5 (PAULA, 2005; WOOD JR.; PAULA, 2006; PAULA, 2010). Percebe-se

que esta cartada vem justamente bater de frente com o Estado Democrático de Bem-

Estar Social que estava no caminho de se consolidar. Como ficam as construções e

4 Esta reforma ficou conhecida como Reforma Bresser-Pereira e compreendeu, principalmente, a separação das atividades fins do Estado em atividades exclusivas do Estado (legislações, fiscalizações, regulações etc.) e atividades não-exclusivas do Estado (Educação, Saúde, Segurança, Transporte etc.), o que abriu grande margem para especulação e financeirização destas atividades não-exclusivas do Estado (PAULA, 2010), o que notadamente desvirtua os princípios do Estado Democrático de Bem-Estar Social que outrora se quisera construir a partir da Constituição Cidadã (LOPES, 2014). Nessa reforma, as atividades exclusivas do Estado ficam sob responsabilidade dos funcionários de alto escalão e do governo, enquanto que as atividades não-exclusivas do Estado passam a ser reguladas por agências de controle e regulação (PAULA, 2010). 5 O management se diferencia consubstancialmente da perspectiva da administração por meio de seis traços ressaltados por Paula (2010): foco, medida de sucesso, uso eficiente de recursos, responsabilidade dos envolvidos, papel do administrador/manager, orientação geral. Enquanto a administração foca em objetivos gerais, o management foca em objetivos específicos; a administração mede o seu sucesso evitando erros e fazendo as coisas certas, enquanto o management o mede pelos resultados quantitativos ou quantificados; na perspectiva administrativa o uso eficiente dos recursos é tido como algo secundário, e na do management é objetivo primário; a responsabilidade dos envolvidos é mais definida com uma delegação mais limitada de tarefas, enquanto que o é mais difusa com maior delegação de tarefas na perspectiva do management; o administrador como árbitro e interpretador de regras, e o manager como protagonista e lutador por recursos; o fim da administração é burocratizar, enquanto do management é flexibilizar (PAULA, 2010, p.85). Dessa forma, a disseminação da perspectiva do management para sua efetiva introdução nas sociedades tem se dado por meio de vários dispositivos materiais e simbólicos, perpassando pelas formações no campo da administração (Escolas de Administração), pela criação de ‘empresas consultoras’ (apoio e manutenção dessas ideias), pela ‘guruzização’ de personalidades bem sucedidas na implementação da perspectiva do management (Gurus do management, tais como Bill Gates etc.) e, principalmente, pelas mídias veiculadoras e construtoras de opinião pública e de modismos gerenciais, compondo no todo algo que vem sendo nomeado “cultura do management” (PAULA, 2005; WOOD JR.; PAULA, 2006; PAULA, 2010; ITUASSU; TONELLI, 2014).

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conquistas sociais dependentes da visão do Estado Democrático de Bem-Estar Social?

Será que esta mudança no rumo de edificação do Estado Brasileiro as impactaria?

E como isso pode também ter afetado a docência no ensino superior em

enfermagem? Ora, a enfermagem é uma profissão da área da saúde e, com a criação e

implantação do SUS, começaram discussões sobre as necessárias transformações

curriculares que os cursos de formação na área da saúde precisariam implementar, uma

vez que, até então, os currículos eram norteados pela perspectiva da doença, do

biológico, da recuperação, pela perspectiva transmissora de conteúdos, dentre outros

princípios, influenciados principalmente pelo relatório Flexner (CARVALHO;

CECCIM, 2012), pelos resquícios da influência do método jesuítico, que se chama

atualmente de tendências tradicionais (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010;

BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017), na educação, dentre outros. Ou seja, aqui a

enfermagem fica atravessada pela consolidação do SUS e influenciada pelos modelos

formativos que respondiam às ideias flexnerianas.

Para continuar a responder esta questão, precisamos visitar também mais uma

reformulação pela qual sofreu a CAPES no ano de 1996. Nesse ano, a CAPES lança o

‘modelo CAPES de avaliação’, que se configura em uma avaliação dos programas de

pós-graduação, aos moldes americanos, com inúmeros indicadores quantitativos que

focam em estatísticas e na ‘produção científica’ como sinônimo de publicação de cada

vez maiores quantidades de artigos em revistas classificadas como A1-A2-B1. Será que

isto não pode induzir o desenvolvimento de um tipo de trabalho docente no ensino

superior? Especialmente, porque a CAPES, após a reforma gerencialista do Estado

brasileiro, foi colocada como agência reguladora da formação em pós-graduação e

também responsável pela acreditação e avaliação dos programas de pós-graduação no

Brasil (SGUISSARDI, 2013). Ou seja, a pesquisa também começa a influenciar os

caminhos da docência em enfermagem no Brasil. Enfim, até este momento não se tinha

nenhuma política indutora da profissionalização para a docência no ensino superior no

Brasil e acreditamos que esta da CAPES é um tipo de política que induz um tipo de

profissionalização docente para o ensino superior.

Contudo, ainda em 1996, a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional n.º 9.394/1996 (BRASIL, 1996c) foi promulgada e nela constou uma linha do

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texto que tocava na questão da ‘preparação’ para a docência no ensino superior por

meio de cursos de mestrado e doutorado. Entretanto, nesta legislação não se fala em

formação e sim em preparação para a docência em cursos de mestrado e doutorado.

Algumas pesquisas sobre a docência no ensino superior em geral têm mostrado que essa

‘preparação’ tem acontecido com ênfase quase exclusiva na pesquisa e a dimensão da

docência tem sido negligenciada (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010). Acho que aqui

cabe uma reflexão: parece que com relação à docência no ensino superior existe uma

ideia de que ‘sei fazer pesquisa e conheço um assunto pormenorizadamente. Logo, sei

ensiná-lo’. Isso nos sinaliza o quanto a pesquisa tem atravessado a discussão e a

transformação da docência no ensino superior, principalmente em carreiras em áreas de

formação que estão de certa maneira distantes dos conhecimentos e fundamentos da

área da educação, como é o caso da enfermagem.

Dado este contexto complexo, considerando que a implementação do SUS

começara a todo vapor, mesmo que tenha começado sofrendo um de seus primeiros

golpes com a EC 19/1998 (BRASIL, 1998), muitas foram as discussões sobre a

necessidade de transformação curricular para atender às necessidades transformativas

do SUS em implementação, ou seja, era preciso ajudar o SUS a se implementar,

constituir uma formação capaz de atender as necessidades de saúde da população e com

isso ampliar acesso, e ao mesmo tempo transformar os currículos dos cursos que

atuariam no SUS. Nessa direção, muitas discussões têm acontecido sobre a formação

dos profissionais da saúde, que buscasse identificar e superar os problemas e as

dificuldades encontrados, até o momento, na consolidação do SUS, especialmente no

tocante da formação de recursos humanos para a saúde (PEREIRA, 2003). Tem-se

observado que uma das chaves para alcançar a aplicação das diretrizes e princípios do

SUS é a revisão das metodologias de ensino-aprendizagem, dos modelos de formação,

até então utilizados, atentando, pois, para uma formação que pudesse visar aos

princípios e pressupostos do SUS (MOTTA et al., 2004). As discussões atinentes a este

assunto têm indicado como caminho uma formação em que teoria e prática se

entrelacem no percurso da aprendizagem, por meio de reflexões constantes da realidade

dos serviços de saúde e da comunidade, com articulações entre ensino-serviço-

comunidade, estimulando o estudante a elaborar críticas, buscar soluções adequadas

para a problemática vivenciada (CHIRELLI, 2002) e utilizar os conhecimentos

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construídos a favor da consolidação do SUS, ou seja, necessidade de maior aproximação

ensino-serviços.

Por isso, alguns cursos universitários da área da saúde têm buscado estratégias

de ensino-aprendizagem que atendam às diretrizes de formação necessária para a

consolidação do SUS, por meio da integração do trabalho e do ensino no processo de

aprendizagem de uma profissão (PARANHOS; MENDES, 2010), tendo também como

norte os pressupostos de uma formação de profissionais com competência crítica e

reflexiva, com autonomia, capazes de responder às problemáticas da saúde (BRASIL,

2001b).

Assim, tendo o SUS sido planejado e começado sua implementação na década

de 1990, havia movimentos favoráveis e contrários a esta empreitada. Essa foi a década

que buscou revisar as formações, buscando, em meio aos embates mais diversos,

articulá-las às necessidades de saúde, às necessidades de transformação que o recém-

nascido SUS precisava em vários âmbitos (organizacional, profissional, estrutural etc.).

Desse modo, os currículos precisavam ir para além de reformas de cunho conteudista,

era preciso reformar também os caminhos e fundamentos pedagógicos para se alcançar

o objetivo de transformar as formações em saúde e ao mesmo tempo transformar o

sistema de saúde, tudo em processo e dinamicamente acontecendo. Para tanto, era

preciso metodologias que articulassem não apenas os centros formadores com os locais

de assistência, mas também com os representantes das comunidades. Desse modo,

muitos projetos foram criados, dentre eles o da rede UNI (projetos atrelados à

aproximação ensino-serviço-comunidade) e o da rede IDA (projetos de integração

docente-assistencial), o que mais tarde vem a compor a rede Unida (UNI-IDA),

começando a sinalizar a necessidade de ultrapassar a dimensão profissional na

formação, para formações multi- e interprofissionais (CARVALHO; CECCIM, 2012).

Os anos 2000 foram os das formulações de diretrizes curriculares nacionais para

a formação dos profissionais, dentre os quais, a partir de 2001 começaram a lançar suas

diretrizes, com a maioria mencionando a formação voltada para o SUS, e cada área

profissional deu sua ênfase e seu posicionamento (CARVALHO; CECCIM, 2012). As

primeiras diretrizes da enfermagem foram lançadas no ano de 2001 (BRASIL, 2001b).

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De 2002 a 2005, muitos programas foram lançados para induzir as

transformações das formações para a realidade do SUS, uma vez que muita resistência

acontecia por parte de forças como a da saúde como mercadoria e bem privado, que

faziam resistência defensiva/ofensiva6, ora para manter o que havia enquanto formação

anterior voltada para perspectivas da doença e do corpo inerte/morto, ora para dissolver

aquilo que fora galgado durante o processo de institucionalização do SUS, assim como

produzir novas formas de resistência contra a ideia da saúde como direito universal

humano. Exemplos dos programas indutores do SUS foram o AprenderSUS7, o

EnsinaSUS8, o VER-SUS9, o Pró-saúde10, o Peps-SUS11, PET-Saúde12, o curso de

especialização Formação de Ativadores de Processos de Mudança na Educação

Superior de Profissionais de Saúde – da Fundação Oswaldo Cruz junto com a rede

UNIDA, dentre outros, ganhando apoio de movimentos estudantis, das secretarias

municipais de saúde, do movimento da Educação Popular (CARVALHO; CECCIM,

2012; LIMA et al., 2015).

Destas ações indutoras de mudança, destaca-se o curso de especialização

Formação de Ativadores de Processos de Mudança na Educação Superior de

Profissionais de Saúde, uma vez que fora direcionado para a formação do docente do

ensino superior, focalizando no processo de mudança necessário para atender as

demandas de implementação do SUS e de transformação da realidade dos currículos

formadores de profissionais da saúde, ao mesmo tempo em que apoiaria na

transformação dos cenários de saúde pelo país (LIMA et al., 2015). Embora esse curso

tenha sido uma excelente estratégia e tenha gerado contribuições fundamentais no

processo de formação de docentes universitários para as transformações curriculares

necessárias, ele não tomou um sentido mais ampliado, como por exemplo o de uma

política, portanto, acontecendo esporadicamente.

6 Estes conceitos estão apresentados no tópico ‘resistência como analisador da docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’. 7 O AprenderSUS tem seu foco na orientação do processo formativo em nível de graduação dos profissionais de saúde para a realidade do SUS. 8 Pesquisa sobre o ensino da integralidade em saúde para a realidade do SUS. 9 Vivências e Estágios para estudantes de graduação na Realidade do SUS. 10 Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde. 11 Polos de Educação Permanente em Saúde para o SUS. 12 Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde.

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Entretanto, é importante destacar que ao longo desse processo foram sendo

produzidos sentidos e significados particulares sobre o que é saúde, sobre o que é o

SUS. Nesse sentido, a mídia, os estudantes, os profissionais da saúde, os governantes e

políticos, os usuários do SUS, enfim, uma gama de atores sociais têm produzido pelo

menos quatro sentidos para o SUS: o SUS para pobres (visão assistencialista), o SUS

real (secretarias, gestores, governos, setor privado), o SUS formal (legislação) e o SUS

democrático (aquele que se deseja produzir com a participação da sociedade – por meio

de processos democráticos) (PAIM, 2011). Entretanto, o autor lembra da necessidade de

produzir movimentos com atores, processos e produtos que apoiem a institucionalização

do SUS formal e avance cada vez mais para um SUS democrático.

Cabe lembrar, também, que, por conta da reforma do Estado iniciada no governo

social-liberal e suas políticas relacionadas à educação superior, houve um crescimento

muito acelerado de abertura de centros formadores privados, de forte investimento do

capital financeiro e com um olhar sobre a educação como uma mercadoria

(RODRIGUES, 2007; BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017) e uma tendência a formar

profissionais para o mercado de trabalho liberal, com formações focadas nas ideias de

empresa, empreendedorismo, competição etc. O que vemos aqui é um possível levante

da resistência contrária aos ideais da reforma sanitária que pode ser originária do

movimento que coexistia durante a própria reforma sanitária, em que havia o desejo de

pôr em andamento lógicas de ver a saúde como uma mercadoria e com possibilidades de

alta lucratividade do setor empresarial da saúde (PAIM, 2013).

Nessa direção, é salutar destacar que durante os governos social-liberal (1995-

2003) os investimentos foram muitos na direção da implementação da reforma

gerencialista do Estado e várias ações se deram nesse sentido, em que se começou a

fortalecer o setor privado e inclusive tornar o setor público cada vez mais com aspectos

privados e privatizados (PAULA, 2005; 2010).

Findado o governo da aliança social-liberal, com a vitória da aliança popular-

nacional, uma nova vertente da Nova Gestão Pública começa a ser implementada, a

vertente societal. O governo do, então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva começa a

tentar frear os efeitos da Reforma do Estado de vertente gerencialista e passa a valorizar

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aspectos societais, embora não consiga durante os dois governos implementar reformas

sólidas para combater a perspectiva gerencialista (PAULA, 2010).

Fazendo um olhar um tanto mais específico, é possível ressaltar que o período

‘lulista’ (01-01-2003 a 31-08-2016) foi de grande movimento de conciliação de classes

sociais, o que chegara ao fim com o impeachment de Dilma Rousseff. Isso se expressou

pela nítida separação dos movimentos no Brasil de forma antagônica, movimentos pró e

contra os governos de esquerda, o que foi mais sentido por meio das apertadas eleições

de 2014. O grande problema que se associa ao ‘lulismo’ foi a falta de investimento em

políticas de Estado no sentido democrático e dos direitos humanos, para consolidação

de dispositivos que ampliassem e intensificassem a participação direta da sociedade nas

decisões dos rumos do país. Com o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, assumiu

o poder Michel Temer, o qual, logo de início, por um lado, começou a implementação

de medidas de refreamento às políticas e conquistas sociais e trabalhistas e, por outro

lado, começou a incentivar o setor privado, as privatizações e a venda dos patrimônios

públicos para empresas internacionais, o que representou um grande retrocesso nas

conquistas sociais e trabalhistas. O golpe contra a saúde e a educação foi o mais

expressivo, com a EC 95/2016, que congela o financiamento dessas áreas sociais,

impondo um teto máximo por vinte anos (BRASIL, 2016). Entretanto, essas medidas de

Temer se alinham com as que têm acontecido no cenário internacional, em que há um

forte investimento de organizações que representam o capital financeiro sobre a

neoliberalização da vida em sociedade (BRESSER-PEREIRA, 2002b; LAVAL, 2004;

PAULA, 2010; DOMINGUES, 2015; SINGER; LOUREIRO, 2016;

NEOCONSERVADORISMO, educação e privação de direitos, 2017; MANCEBO,

2017).

A partir daqui, tem-se já alguns elementos que, possivelmente,

influenciam/influenciaram a docência no ensino superior em enfermagem: as

influências jesuíticas; as influências flexnerianas; a necessidade de articulação dos

currículos para a formação para o SUS; a reforma gerencialista do Estado brasileiro; a

influência da pesquisa em enfermagem; a influência da preparação para a docência no

ensino superior por meio de cursos stricto sensu (mestrado e doutorado).

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Em meio a todos estes desafios complexos, contraditórios e conflitantes – apoiar

a consolidação do SUS, responder às exigências da CAPES quanto à produtividade

científica, transformar os currículos e a formação de profissionais enfermeiros, levante

do movimento da saúde e da educação como mercadorias, reforma gerencialista do

Estado, desejo de amenizar os efeitos gerencialistas e implementar um Estado

Democrático de Bem-Estar Social, dentre outros – como será que isso tem afetado a

docência no ensino superior em enfermagem? Como será que estão as concepções e

práticas pedagógicas na educação em enfermagem? Como isso impacta a formação para

o projeto de saúde desenhado na constituição – o SUS?

Portanto, neste trabalho, pressupõe-se que essas ideias e conceitos gerencialistas

e da cultura do management, assim como o que foi implementado enquanto reforma de

Estado (princípios neoliberais), têm impregnado a universidade pública e causado

efeitos importantes sobre a natureza da mesma, e possivelmente sobre a natureza da

docência, sobre as concepções pedagógicas e sobre a profissionalização docente e a

constituição da identidade docente– neste caso com foco no professor-enfermeiro.

Com a finalidade de percorrer a literatura e trazer em quais modalidades de

pesquisa tem-se abordado a docência no ensino superior em enfermagem e quais os

principais temas e contribuições que têm sido produzidas, fez-se uma busca na literatura

para se olhar mais especificamente para as produções sobre a docência no ensino

superior e o professor enfermeiro, o que ajudou a delimitar melhor a lacuna do

conhecimento a que esta pesquisa teve potencial de contribuição.

Com relação à ‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’, os

trabalhos serão apresentados de acordo com suas características, a partir de uma busca

seletiva na literatura por meio da Biblioteca Virtual em Saúde (SciELO), PubMed-

MEDLINE, ERIC, considerando-se o período de 2008 a 2018. O quadro 1 abaixo

demonstra o caminho das buscas.

Quadro 1 - Caminho da busca na literatura por trabalhos relacionados com o objeto de estudo desta pesquisa

Local de

busca

CAMINHO DA BUSCA Resultado

busca

Seleção

SciELO (ensino) OR (docentes) OR (docentes de enfermagem) OR

(nursing faculty) OR (docente de enfermería) AND (educação em

enfermagem) OR (nursing education) OR (educación en

enfermería)

446 17

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47

PubMed

MEDLINE

(("education"[Subheading] OR "education"[All Fields] OR

"teaching"[All Fields] OR "teaching"[MeSH Terms]) AND

("nursing"[Subheading] OR "nursing"[All Fields] OR

"nursing"[MeSH Terms] OR "nursing"[All Fields] AND

(higher[All Fields] AND ("education"[Subheading] OR

"education"[All Fields] OR "educational status"[MeSH Terms] OR

("educational"[All Fields] AND "status"[All Fields]) OR

"educational status"[All Fields] OR "education"[All Fields] OR

"education"[MeSH Terms])) AND (("1998/06/04"[PDAT] :

"2018/06/18"[PDAT]) AND "humans"[MeSH Terms])

8190 0

ERIC "NURSING EDUCATION" AND "NURSING FACULTY" AND

"HIGHER EDUCATION"

209 0

Fonte: Construído pelo autor a partir de dados dos gerenciadores de busca.

Foram selecionados 17 estudos que tratavam da docência no ensino superior e o

professor-enfermeiro. Os critérios usados para a escolha dos trabalhos foram quanto

àqueles que se alinhavam mais especificamente à docência no ensino superior em

enfermagem, sendo artigos originais advindos de pesquisa com dados empíricos.

Aqueles trabalhos que se limitaram a métodos de ensino, ou aqueles que se dirigiam à

docência em enfermagem de maneira indireta não foram escolhidos. Foram excluídos

artigos de revisão, ensaios, reflexões.

O primeiro estudo, uma pesquisa qualitativa, do tipo descritivo-interpretativo,

com uso de entrevistas e questionários e análise de conteúdo, abordou os obstáculos

didáticos na prática pedagógica do professor-enfermeiro. As principais categorias

produzidas foram: prática pedagógica do enfermeiro-professor (ingresso na docência;

formação pedagógica; características da prática pedagógica); obstáculos didáticos

(obstáculos didáticos e o professor; obstáculos didáticos e o aluno; obstáculos didáticos

e a instituição); o professor e o diálogo com os obstáculos (superação dos obstáculos

didáticos na perspectiva dos enfermeiros professores; contribuições da formação inicial

e da formação continuada; proposta de superação dos obstáculos na perspectiva dos

pesquisadores). A principal contribuição é destacar o consenso que o bacharelado não

fornece os elementos iniciais e pedagógicos para a carreira docente; saber apenas o

conteúdo não é suficiente para ser professor; ao ingressarem na carreira mal se

questionam sobre a profissão professor que passam a assumir; e por fim, desejam

romper com o paradigma tradicional de ensino (RODRIGUES; MENDES SOBRINHO,

2008).

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O segundo estudo, também uma pesquisa qualitativa, com uso da pesquisa-ação,

envolvendo discentes e docentes-enfermeiros, em que os dados foram coletados por

meio de questionários abertos com estudantes sobre o objeto de estudo ‘o ser

enfermeiro-docente’, encontros de sensibilização e socialização dos dados obtidos junto

aos estudantes com os docentes-enfermeiros e posterior tratamento dos dados por meio

da análise temática. Este estudo explicita o pensamento complexo como norteador das

reflexões, em que o papel do professor-enfermeiro é discutido diante do contexto

educativo, sua formação técnico-científica e a formação de habilidades interativas,

integradoras e articuladoras (BACKES et al., 2010).

O terceiro estudo, também de natureza qualitativa, utiliza questionários abertos e

análise de dados baseada no levantamento temático de Freire, sem explicitação de

referencial teórico. O estudo aborda as insatisfações e indicadores desfavoráveis na

docência em enfermagem na universidade. Com relação às insatisfações são

apresentadas em forma de categorias: a questão ética na relação com os pares, o excesso

de trabalho, reconhecimento e salário. Com relação aos indicadores desfavoráveis:

excesso de trabalho e falta de tempo, inclusive para lazer, disputas entre os pares para

galgar recursos. As principais contribuições concernem às condições em que acontece a

docência do professor-enfermeiro (CORRAL-MULATO et al., 2010).

O quarto estudo é também de natureza qualitativa, explicitando a afiliação à

perspectiva socioeducativa na perspectiva descritivo-interpretativa. Foi conduzido de

acordo com os preceitos da história oral e operacionalizado por meio de entrevistas

temáticas semiestruturadas. Foi utilizada a análise de conteúdo para o tratamento dos

dados. O objeto de estudo se refere ao significado da prática docente na constituição do

saber ensinar em enfermagem. As principais categorias apresentadas foram: a

necessidade de uma formação específica para exercer a docência, os saberes valorizados

pelos docentes nas práticas de ensinar, o sentido da experiência no exercício

profissional docente. A principal contribuição se destaca no sentido da ênfase dos

saberes dos docentes-enfermeiros baseados na praticidade e na experiência

(MADEIRA; LIMA, 2010).

O quinto estudo é de natureza quantitativa, caracterizando-se por estudo de

coorte transversal, no qual utilizou-se o instrumento validado Malash Burnout

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Inventory, junto com um questionário com variáveis sociodemográficas, laborais e de

morbidade referida. Os dados foram analisados por meio de análise estatística. Nessa

direção, o objeto de estudo concerne os fatores associados à síndrome de burnout em

professores-enfermeiros. A principal contribuição está relacionada à prevalência da

síndrome de burnout identificada em 94,7%, relacionada a cansaço emocional (49,5%),

despersonalização (33,7%) e falta de realização pessoal (56,8%). A principal

contribuição foi destacar a situação de vulnerabilidade à síndrome de burnout que os

docentes-enfermeiros estudados estão expostos (BAREÑO SILVA et al., 2010).

O sexto estudo, também de natureza quantitativa, caracterizando-se por um

estudo correlacional em três etapas (diagnóstico, intervenção e avaliação da

intervenção). Para análise dos dados, foi utilizada a porcentagem segundo a técnica Mc

Nemar. O objeto de estudo foram os valores dos docentes-enfermeiros durante o

exercício da docência. Apresenta fundamentação na teoria de valores de Schwartz. De

certa maneira, ao trabalhar os valores com os docentes em uma intervenção de cunho

formativo, os autores colocam a importância da formação docente para as questões de

valores e alertam que esta dimensão tem sido negligenciada (PALENCIA et al., 2011).

O sétimo estudo também é quantitativo, caracterizado como um estudo

transversal, com utilização de instrumento autoadministrado de avaliação de qualidade

de vida. Sugere análise de dados de forma comparativa entre os resultados dos três

locais estudados e a interpretação a partir de outros estudos com enfermeiros-docentes,

por meio de análise de conteúdo. O objeto de estudo é a qualidade de vida do

enfermeiro no trabalho docente. A principal contribuição se refere a apontar a

necessidade de aprofundar os estudos com relação à qualidade de vida do docente

enfermeiro e sua satisfação com relação ao ensino, com algumas sinalizações com

relação ao campo das relações sociais e do meio-ambiente (CONCEIÇÃO et al., 2012).

O oitavo estudo é de natureza qualitativa, do tipo descritivo-interpretativo,

consistindo de análise descritivo-interpretativa de casos, com entrevistas

semiestruturadas por videoconferência. O objeto de estudo é a ressignificação da

identidade profissional na transição do enfermeiro da assistência para o enfermeiro-

professor na universidade, formador de recursos humanos. Os principais achados se

relacionam com as experiências enquanto professor-enfermeiro e os incidentes críticos

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que apoiam e consolidam a transição identitária, uma vez que atribuem importância a

esses incidentes por ajudarem na contínua preparação para a docência (GONZÁLEZ;

FONT, 2012).

O nono estudo é de natureza qualitativa do tipo descritivo, exploratório e

analítico, com uso de observações não-participantes e entrevista semiestruturada,

gravação de vídeo, registro em diário de campo. Se identifica com referencial teórico

etnográfico, com análise de dados pelo método das comparações constantes. O objeto de

estudo é a expressão do conhecimento didático do conteúdo de um professor-

enfermeiro. As principais categorias trabalhadas foram trajetória de formação docente

(prática docente, formação pedagógica, socialização entre pares) e expressões de

conhecimento didático de conteúdo (domínio do conteúdo, organização e manejo do

grupo, avaliação da compreensão dos alunos). A principal contribuição do estudo é o

olhar sobre a trajetória docente e a importância da formação contínua para o exercício

da docência, articulando à necessidade de articulação com a consolidação do SUS

(BACKES et al., 2013).

O décimo estudo é de natureza quantitativa, do tipo transversal, com uso de

análise e síntese com histórico lógico, por meio de questionários com perguntas

fechadas e mistas. O objeto de estudo foi o conhecimento do docente-enfermeiro com

relação à elaboração de instrumentos avaliativos. O estudo foca em aspectos da

instrumentalidade didática. A principal contribuição é colocar em evidência a

importância da formação contínua para o professor-enfermeiro, principalmente para as

habilidades avaliativas (CORDERO MIRANDA et al., 2013).

O décimo primeiro estudo é de natureza qualitativa, embasado na teoria

fundamentada, com uso de entrevistas em profundidade e grupos focais, utilizando

também a análise por comparação constante, cujos participantes foram docentes e

discentes de enfermagem. O objeto de estudo é a conceptualização da qualidade da

docência em enfermagem. A principal contribuição desse estudo é propiciar o

aprofundamento das concepções sobre a qualidade da docência em enfermagem e

provocar reflexões nesta direção (MOSCOSO, 2013).

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O décimo segundo estudo é de natureza qualitativa, embasada no materialismo

histórico e dialético, com foco na categoria analítica processo de trabalho docente,

relacionado com concepções de trabalho e profissionalidade. Foram realizadas

entrevistas individuais semiestruturadas com docentes-enfermeiros. O material empírico

foi submetido à técnica de análise do discurso, com elaboração de categorias empíricas,

e organizadas em dois grupos de práticas – didáticas e organizativas. A principal

contribuição do estudo foi evidenciar a precariedade e intensificação do trabalho

docente em três modalidades de estabelecimento de ensino (privados, públicos e

mistos), referindo repercussões sobre as práticas didáticas e organizativas. Provoca,

ainda, a reflexão sobre o atual contexto de educação superior no Brasil, referindo que as

práticas estão cada vez mais pautadas em perspectivas mercadológicas, baixa

valorização do ensino e do acesso ao ensino de qualidade (LEONELLO; OLIVEIRA,

2014).

O décimo terceiro estudo, de natureza qualitativa com desenho descritivo-

interpretativo, fundamentado na teoria fundamentada nos dados, foi realizado com

enfermeiras-docentes-pesquisadoras, com uso de entrevistas semiestruturadas e análise

de conteúdo por meio do programa atlas ti. O objeto de estudo é a concepção sobre o

papel do enfermeiro-docente. Foram produzidas três categorias centrais da identidade

do professor: concepções, estratégias e sentimentos. Posteriormente, produziram-se

mais duas categorias: papel de pesquisador e processo de ensino-aprendizagem da

enfermagem. Os principais resultados se referem à constatação de que a construção da

identidade do professor-enfermeiro está entre a docência e a pesquisa, referindo a

necessidade de os profissionais docentes-enfermeiros acompanharem as exigências e

níveis de formação e inserção nos espaços acadêmicos assim como as outras profissões

e sinalizam como este campo de investigação é pouco explorado (GONZÁLEZ et al.,

2014).

O décimo quarto estudo é uma pesquisa exploratória de natureza qualitativa,

realizada com egressos de cursos de doutorado em enfermagem e recém-doutores.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com questões abertas, algumas realizadas

presencialmente e outras por videoconferência. A análise foi por meio de construção de

categorias temáticas. O objeto de estudo é o projeto de carreira científica e profissional

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de enfermeiros-docentes recém-doutores. As principais categorias produzidas foram:

iniciando a trajetória profissional; buscando a formação stricto sensu para a docência;

reconhecendo a vocação profissional; buscando a realização e valorização profissional;

planejando a carreira: enfrentando desafios e barreiras. As principais contribuições se

referem a colocar luz sobre o processo formativo em pós-graduação stricto sensu com

relação ao planejamento da carreira e também à questão do sofrimento e insatisfação

profissional. O estudo indica também que o principal motivo para seguir para a carreira

docente está relacionado à melhoria salarial e maior valorização profissional, mesmo

que referem que uma das dificuldades atuais é a contratação de professores como

temporários (GOMES et al., 2016).

O décimo quinto estudo, também de natureza qualitativa, se baseia na teoria

fundamentada construcionista. Utilizaram-se notas de campo e entrevistas

semiestruturadas. À análise, produziu-se categoria emergente, e codificações com

auxílio do atlas ti. O objeto de estudo é a vivência do papel docente clínico. Os

participantes foram enfermeiros-docentes da área clínica. A categoria emergente foi

conceito de docente clínico e os códigos foram: formador; apoio/ajuda; outorgador de

oportunidades; articulador teoria/prática; atributos e valores; presença e interação;

guia/orientador/motivador; valoração de trajetória laboral; ideia de modelo;

responsabilidade moral. A principal contribuição se refere à falta de clareza em relação

ao papel do professor clínico que acompanha os estudantes em experiências práticas,

indicando a polissemia da expressão (MANSILLA SEPÚLVEDA; RICOUZ MOYA,

2016).

O décimo sexto estudo é uma pesquisa descritiva e exploratória, de natureza

qualitativa, realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, com utilização da análise

de conteúdo na modalidade temática. O objeto de estudo é a constituição da identidade

do docente-enfermeiro com um olhar para o ingresso, a trajetória e a permanência na

profissão. Produziram-se três categorias temáticas: o ingresso na docência do ensino

superior em enfermagem; o processo de constituição identitária do docente em

enfermagem; identidade, trajetória e permanência na profissão docente. A principal

contribuição do estudo é que a identidade docente foi se constituindo no meio de

processos biográficos e relacionais, uma vez que não contavam com formação

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pedagógica a partir da qual conseguiriam avançar na identificação com a docência.

Outro dado relevante é que a formação pedagógica foi elemento fundamental para a

identificação com a profissão professor e para apoiar o professor em suas fragilidades

(FERNANDES; SOUZA, 2017).

O décimo sétimo estudo é uma pesquisa descritiva e exploratória, de natureza

qualitativa, realizada por meio de entrevistas semiestruturadas com professores-

enfermeiros. A análise foi realizada por meio da proposta operativa para análise de

dados qualitativos. O objeto de estudo foram as percepções e atitudes profissionais de

enfermeiros docentes, com foco na prática docente em sala de aula e em campos de

estágio. As principais contribuições do estudo buscam relacionar a experiência

profissional do enfermeiro com o fortalecimento da sua prática docente, ressaltando

também a necessidade de formação pedagógica para a docência. Apontam também a

ausência de espaços formativos pedagógicos para o docente universitário na área da

saúde, referindo forte tendência a repetir práticas de ensino aprendidas ao longo da

escolarização e formação profissional. O estudo também indica a necessidade de

investir em formação permanente dos docentes-enfermeiros, uma vez que foi indicada

como elemento que dá força à atuação docente (VENDRUSCOLO et al., 2018).

Com essa revisão, é possível perceber que a principal abordagem dos estudos

que tratam da ‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’ é a qualitativa,

embora haja alguns estudos de abordagem quantitativa. O principal enfoque tem estado

entre estudos descritivo-interpretativos, estudos descritivo-exploratórios, estudos

baseados na teoria fundamentada nos dados e estudos transversais. As principais formas

de ‘coleta de dados’ foram as entrevistas e os questionários e a principal forma de

tratamento e análise de dados foi a análise de conteúdo. Isso sinaliza de forma geral

como os estudos têm acontecido nesta direção.

A partir desta revisão seletiva, com relação à especificidade do objeto de estudo,

este tem-se apresentado de uma diversidade de maneiras e de focos diferentes,

perpassando pela prática pedagógica/docente, pelo ser enfermeiro (carreira/vivência),

identidade docente, saberes pedagógicos/docentes, processo de trabalho docente,

qualidade de vida, síndrome de burnout, insatisfações e indicadores desfavoráveis da

docência, dentre outros. As principais contribuições têm indicado a ampliação das

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discussões sobre a necessidade de formação específica para a docência no ensino

superior, a necessidade de romper com lógicas tradicionais de ensino, de se fazer um

olhar mais atento para o processo de trabalho, para as condições de trabalho, para a

carreira e trajetória profissional, para a qualidade da docência e como o docente-

enfermeiro tem constituído sua identidade profissional no ensino superior.

Com isso, percebe-se a importância e relevância de estudos sobre a docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro, uma vez que este objeto de estudo está em

construção e está sendo analisado por diferentes perspectivas. Nesse sentido, os estudos

analisados nesta revisão têm focado, em sua maioria, ora nas percepções, concepções,

expressões, conhecimentos dos docentes-enfermeiros sobre a docência no ensino

superior, sobre as abordagens pedagógicas, ora sobre a prática docente/pedagógica, em

que os dados são produzidos por instrumentos como a entrevista, os questionários e, às

vezes, por meio de observações, e são, principalmente, analisados longe dos

participantes por meio de análises de conteúdo, expressivamente na modalidade

temática. Aqui delimita-se uma importante lacuna quanto a inobservância de estudos

que além de tratarem das concepções e as práticas pedagógicas/docentes dos

professores-enfermeiros, que promovam processos de produção de dados por meio de

construção de variadas estratégias e instrumentos produtores de dados, que envolvam os

participantes cada vez mais na análise dos dados produzidos – o que se aproximaria

mais de abordagens que visam provocar transformações das mais diversas naturezas,

além da produção de conhecimentos e subjetividades. Percebe-se também a inexistência

de artigos que retratem a docência universitária em enfermagem que vem se produzindo

em relação com o contexto universitário, o contexto de Estado, buscando analisar se

e/ou como estas questões se influenciam ou não.

Esta pode ser uma das principais contribuições desta pesquisa, uma vez que se

busca analisar as concepções e práticas pedagógicas de docentes-enfermeiros, por meio

de referencial inovador para este objeto de estudo (a Análise Institucional, na sua

vertente socioclínica – como será apresentado no tópico referente aos marcos teóricos e

metodológicos), pois não se encontrou nenhum estudo que articulasse este referencial

com este objeto de estudo.

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Outro ponto fundamental que os estudos analisados nesta revisão não abordam é

a discussão de que a docência no ensino superior do professor-enfermeiro tem um

marco fundamental que se apresenta a partir da Constituição Federativa do Brasil de

1988, em que se iniciou a implantação do SUS. Este marco foi um disparador para se

repensar tanto os modelos de formação em saúde e em enfermagem (BRASIL, 2001b)

como as práticas pedagógicas na formação de profissionais de saúde. Portanto, os

estudos analisados não tocam nesta questão quando abordam a docência no ensino

superior em enfermagem. Um recente estudo, com foco na questão curricular e

formação de enfermeiros a partir das concepções de professores-enfermeiros evidencia a

necessidade de ampliar os olhares para a formação para o SUS (DAMIANCE et al.,

2016), mas não chega a analisar o desenvolvimento profissional docente para a

educação em enfermagem e para o SUS. Entretanto, uma tese recente discute, em seus

achados com professores de um curso de enfermagem, o compromisso com o SUS

enquanto um dos significados que os docentes-enfermeiros atribuíram com relação a

trabalharem em um estabelecimento público de ensino superior (BORBA, 2017). Nesse

sentido, esta tese implementou entrevistas e observações em espaços formativos,

individualmente com cada participante e utilizou-se da análise de conteúdo sobre os

‘dados coletados’, e não deixou explícito o referencial teórico-metodológico em que se

afilia.

Diante destas lacunas com relação ao objeto de estudo ‘docência no ensino

superior e o professor-enfermeiro’, e diante das lacunas metodológicas quanto a

articular cada vez mais intensamente concepções e práticas pedagógicas/docentes na

produção de dados, ao mesmo tempo que provoca transformações das mais diversas

naturezas, nos indivíduos, no grupo e no estabelecimento formador, e, considerando a

complexidade apresentada em relação a este objeto de estudo, muitos questionamentos

se produzem. Nesta direção, para esta pesquisa, questiona-se também como tem se

produzido a docência universitária do professor-enfermeiro? Que tipo de

profissionalização docente tem se institucionalizado? Qual a relação entre a

profissionalização do docente-enfermeiro com os caminhos político-ideológicos

escolhidos para a atual concepção hegemônica de universidade e a atual configuração

do Estado Brasileiro? Como a reforma do Estado de 1998 tem atingido a docência no

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ensino superior em enfermagem? E enfim, que identidade docente tem sido

induzida/produzida?

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OBJETIVOS

Objetivo geral

Analisar as práticas e as concepções pedagógicas de professores-enfermeiros da

educação superior de uma escola de enfermagem

Objetivos específicos

1. Analisar as concepções pedagógicas de docentes-enfermeiros;

2. Analisar as práticas pedagógicas de docentes-enfermeiros;

3. Analisar documentos referentes ao contexto da universidade.

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MARCO TEÓRICO E METODOLÓGICO

Neste tópico, estarão os principais marcos conceituais e procedimentais que

apoiaram esta pesquisa ao longo de toda sua produção, por meio da dinamicidade de

seus momentos de concepção, implementação, transcrição, transposição e

reconstituição.

A universidade e a docência no ensino superior: uma breve retrospectiva

Para falar sobre a docência no ensino superior, é preciso falar um pouco da

universidade e sua criação. É possível dizer que a universidade pode ser olhada como

uma instituição (no sentido próprio da Análise Institucional), desde seus instituídos,

seus movimentos instituintes e o processo de institucionalização (fundadora e

permanente).

O nascimento da ‘universidade’, tomando como pressuposto o mundo ocidental

judaico-cristão, acontece na idade média europeia, intimamente relacionado com os

interesses da Igreja em formar seus recursos humanos (BIANCHETTI; SGUISSARDI,

2017) – a isso podemos já considerar como a institucionalização fundadora da

universidade. Ainda que o termo ‘universidade’ designe a ideia de universal, ou mesmo,

universalidade para com os assuntos da humanidade, essa instituição13 nasce com

propósitos fechados nos interesses de manutenção do poder e hegemonia da Igreja.

Portanto, um dos primeiros movimentos de institucionalização da ‘universidade’ está

relacionado com a Igreja e tutelados por esta. Nessa direção, quando dos movimentos

instituintes que questionavam o poderio da Igreja, esta intensifica a criação de novas

13 Em relação ao termo INSTITUIÇÃO, Lourau (2014) ressalta sua polissemia, uma vez que o termo pode ser entendido enquanto as formas sociais estabelecidas e também os processos pelos quais a sociedade se organiza. O termo foi pensado, com relação ao que se emprega na Análise Institucional, por Cornélius Castoriadis, quem propôs a instituição como um processo dialético de oposição instituído-instituinte, cujo resultado desse embate, se perfaz na atualização constante da instituição em seu processo de institucionalização. O instituído sendo o momento de universalização, o instituinte – o momento da particularidade, ou seja, o que nega o universal, e a institucionalização – o momento da singularidade, ou seja, a negação da negação (HESS; SAVOYE, 1993a).

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universidades (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017), notadamente como uma das

formas de resistência defensiva14 e de manter o instituído até aquele momento.

Entretanto, com os movimentos reformistas e contrarreformistas (novos

movimentos instituintes), a ‘universidade’ passa a ter um número maior de tuteladores –

católicos, protestantes etc., mas ainda continua na perspectiva tutelar e na encomenda

prescritiva de ensino e de atuação. Nesse sentido, a criação e manutenção das

universidades acompanharam os movimentos da Igreja, seja a cisão, seja a expansão

para o Novo Mundo (a América) (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017).

Todavia, é no século XVI, que começa a findar o projeto de universidade

medieval e começa a institucionalização da universidade moderna (MAGALHÃES,

2006), justamente por conta dos movimentos instituintes reformistas (alemães, anglo-

saxônicos) e contrarreformistas (movimento jesuíta, por exemplo). No caso das colônias

espanholas e portuguesas, prevaleceu a influência hegemônica da Companhia de Jesus

(esta fundada por professores e estudantes da Université de Paris, liderados por Íñigo

López, ou mais bem conhecido como Inácio de Loyola), perdurando por mais de dois

séculos (MAGALHÃES, 2006).

É a partir de movimentos instituintes como o Renascimento, o Iluminismo, o

antropocentrismo, e também com o enfraquecimento do teocentrismo e a ascensão de

uma nova classe – a burguesia, que transformações profundas na instituição

universidade acontecem. Um exemplo destas questões é a Revolução Francesa que

agrega à ideia de universidade a questão da laicidade, mesmo que isso não significasse

que estas instituições deixariam de ser ainda tuteladas (BIANCHETTI; SGUISSARDI,

2017).

Contudo, é a partir do século XIX que as universidades vão apresentar processos

de institucionalizações diferenciados: as influenciadas pelo modelo napoleônico15 (ainda

tuteladas, dentro de um formato específico e direcionadas à profissionalização), as

14 Para compreensão do termo resistência defensiva vide o tópico ‘resistência como analisador da docência no ensino superior. 15 Influenciado pelo ideal francês do período de poder de Napoleão Bonaparte.

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influenciadas pelo modelo humboldtiano16 (focadas na pesquisa e prestações de serviços

diversos, e despreocupadas com os interesses do mercado) e as influenciadas pelo

modelo newmaniano17 (menos tuteladas, com foco na produção de conhecimentos

aplicáveis, e com pouco mais de exercício da autonomia). Ainda, nesse século,

começam a ser atribuídas outras responsabilidades à universidade, por exemplo, a de

“transformar o servo medieval em cidadão”, notadamente com a ascensão da burguesia

(BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017; p.27).

Influenciada pela lógica da divisão social do trabalho, a universidade se lança na

perspectiva das especializações, na preparação de pessoal qualificado para o trabalho,

dobrando-se aos interesses do mercado. Isso fica evidente, mais recentemente, com as

adequações e adaptações que demandou o pós-fordismo, o que impactou a raison d’être

da universidade, e uma nova universidade começa a se institucionalizar, com esta força

instituinte na direção do mercado (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017).

Nesse sentido, começa a institucionalização da universidade enquanto uma

organização social, perdendo de vista a universidade como uma instituição social18, em

que as universidades são intensamente geridas como organizações e empresas, num

modelo chamado de empreendedor-empresarialista (CHAUÍ, 2003; MAGALHÃES,

2006; BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017).

Em suma, os principais movimentos por que passou a instituição ‘universidade’

foi o de estar sob a tutela da Igreja para atender a estes objetivos e, quando do cisma,

das reformas e contrarreformas, dentre outros, vários movimentos instituintes daquilo

que se propunha enquanto universidade surgiram e buscaram legitimar-se. Quando da

16 Influenciado pelo alemão Friedrich Wilhelm Christian Karl Ferdinand von Humboldt, idealizador da Universidade de Berlim. 17 Influenciado pelo inglês John Henry Newman, criador da Universidade de Dublin. 18 Cabe destacar aqui que a autora entende a universidade como uma instituição social no sentido de que no seio da universidade estaria os esperados conflitos e contradições das mais variadas perspectivas de pensamento. Com relação ao que ela refere enquanto organização social, a autora se reporta àquelas que se assemelham com a lógica empresarial, dentro do modo de produção capitalista. A reflexão e a defesa da autora sobre a universidade como instituição social acontece para valorizar o aspecto do embate, da contradição, da argumentação que ele entende como o propósito maior da universidade. Apenas para destacar, esses termos são utilizados de forma diferente da instituição na Análise Institucional, a qual é entendida de maneira dinâmica, uma vez que é atualizada permanentemente a partir dos confrontos daquilo que já está lá (o instituído) e daquilo que questiona o instituído e busca transformá-lo (o instituinte) – e tudo isso se processo de forma dinâmica, atualizando as normas, as regras e institucionalizando um novo instituído, interminavelmente.

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criação do Estado-Nação, a universidade continua sob tutela, mas a partir de então sob a

tutela do Estado, uma vez que a universidade passa a ser incorporada aos serviços

oferecidos pelo mesmo (MAGALHÃES, 2006) – aqui já se nota uma importante

atualização na institucionalização da universidade, agora influenciada pela criação do

Estado-Nação.

Mais recentemente começam os processos de regulação das universidades

tuteladas pelo Estado. Isso será um pouco mais explorado no tópico sobre a

universidade no Brasil.

A Universidade no Brasil e a docência universitária

Os primeiros cursos de formação superior no Brasil começaram a existir apenas

com a vinda da coroa portuguesa para as terras brasileiras, fugidos das pressões

napoleônicas. Esses cursos eram bastante utilitaristas para suprir as necessidades da

coroa portuguesa (direito, engenharia naval, medicina, mineralurgia, dentre outros), o

que demonstra bastante influência da perspectiva napoleônica de universidade. Ainda,

há o surgimento de universidades católicas, graças à D. Maria I que desfez a expulsão

dos jesuítas, que Marquês de Pombal havia implementado (BIANCHETTI;

SGUISSARDI, 2017). Desse modo, o ensino estava tanto associado aos moldes

jesuíticos como ao modus parisiensis19, segundo os princípios da Ratio Studiorum20

(PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Desse modo, o modelo jesuítico vai estar presente ao longo de toda a

institucionalização da Educação brasileira, notadamente do ensino superior, inclusive

influenciando nas atuações docentes, e com fortes influências nos tempos atuais, mesmo

que atualmente não se imponham nenhum manual para o docente universitário seguir

(PIMENTA; ANASTASIOU, 2010). Nesse sentido, foi nessa briga de forças Igreja-

Estado, que a profissionalização docente começa a tomar corpo, notadamente porque

19 Modus Parisiensis era como ficou conhecido o modo de ensinar na Université de Paris, inventado pelos idealizadores da Companhia de Jesus (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010). 20 A Ratio Studiorum era um documento que continha pormenorizadamente a metodologia de ensino jesuítica e que servia de modelo a ser aplicado da mesma forma em todos os lugares sob a influência jesuítica (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

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este último criou as condições necessárias para tal, forçando a passagem da tutela dos

docentes das mãos da Igreja para as do Estado (NÓVOA, 1992).

Entretanto, só se pode falar em universidade no Brasil mais tardiamente,

notadamente no século XX quando da criação de três importantes e referentes

universidades brasileiras: a Universidade de São Paulo (1934), a Universidade do

Distrito Federal (1935) e a Universidade de Brasília (1962), cuja profecia inicial21 se

relacionava com a implementação de um modelo de universidade que se aproximasse

mais do modelo humboldtiano e se afastasse do modelo napoleônico, visando à

fomentação do pensamento crítico e reflexivo, em detrimento de propostas de cunho

finalista para a manutenção do status quo (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017).

Acompanhando estas influências, e sabido que a influência jesuítica se sobrepôs,

o exercício da docência, de forma geral, se baseou no senso comum do que se tratava

ensinar e se fundamentou nas práticas de exposição de conteúdos, leituras de textos,

memorizações, debates, provas, repetições, dentre outros, que, se não fossem

cumpridos, a punição era um meio de controle (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Nesse caminho, a institucionalização das universidades brasileiras foi um

processo de intensas disputas instituintes entre liberais e católicos, entre o público e o

privado, entre modelos de universidade focados na profissionalização (mercado) e a

universidade com atividades fins (ensino-pesquisa-extensão). Entretanto, havia sempre

uma preocupação com a formação de professores em todos os níveis e para todas as

carreiras, o que era evidenciado nos documentos, notadamente da Universidade de São

Paulo e da Universidade de Brasília. Falava-se na necessidade de superar certo

“autodidatismo” na docência no ensino superior e, por isso, havia muita insistência de

que as faculdades de educação (Filosofia e Letras, por exemplo) atuassem como

articuladoras dentro da constituição das universidades, uma vez que já se havia

evidenciado inúmeros professores atuantes na universidade sem devida formação para

iniciar a carreira docente (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017). Nesse sentido, essa

vontade de formação para a docência não saíra do discurso, pois a atuação docente

21 A profecia inicial é o primeiro instante da instituição, a partir do qual se lança um movimento de atualização constante da instituição e, nesse sentido, a instituição, ao se desenvolver tende a se burocratizar. E por estar em movimento de institucionalização por meio de atualizações constantes, a instituição se altera ou mesmo trai a profecia inicial de sua criação (HESS; SAVOYE, 1993b).

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manteve-se na metodologia da exposição e da memorização (PIMENTA;

ANASTASIOU, 2010). Ou seja, se olharmos pela lógica da Análise Institucional,

podemos dizer que no processo de institucionalização, o que teve maior força instituinte

foi esse modo de docência, de ensino e de aprendizagem baseados nas experiências

prévias de exposição de conteúdos e da memorização dos mesmos pelos estudantes.

Em 1951, a criação da CAPES vinha para dar esse suporte de reconstrução das

universidades a partir de dentro, tendo como movimento fundador a formação docente

para a atuação no ensino superior e também incentivar a pesquisa dentro da

universidade (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017), sendo a formação para a docência

a profecia inicial da criação da CAPES.

Entretanto, como toda instituição tende a se afastar da profecia inicial (do

instituído), com o advento do modelo CAPES de avaliação, como será retomado mais

adiante, a formação para a docência é desvirtuada e começa uma ênfase sobre a

avaliação quanto à pesquisa, ou melhor, para a formação de pesquisadores. Essa

avaliação começou a influenciar muito sobre os programas de pós-graduação

(KUENZER; MORAES, 2005; BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017), uma vez que a

CAPES é tornada em 1998 uma agência reguladora dos programas de pós-graduação no

país, começando, em nosso entendimento, a institucionalizar uma docência entendida

enquanto sinônimo de saber fazer pesquisa, esta entendida enquanto a forma de se

produzir conhecimento, de produzir o conteúdo do que será ensinado e transmitido para

a sociedade – o que pode ser um sinal de como a instituição pesquisa (hegemônica)

começa a atravessar o ser e fazer docente do professor universitário.

Aí começa o distanciamento entre a formação de professores e a formação de

pesquisadores e, como veremos adiante, na atualidade a força que a nova gestão pública,

inserida na reforma do Estado brasileiro, está tendo sobre alguns enquadramentos

performativos do fazer docente e da profissionalização docente na universidade (BALL,

2005; PAULA, 2010; SGUISSARDI, 2013).

Diferentemente dos outros níveis educacionais, a docência no ensino superior

tem suas características marcantes que a inscreve em um cenário um tanto mais

complexo, cabendo ressaltar que ela é também responsável pela formação das outras

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categorias profissionais, inclusive dos docentes dos outros níveis educacionais. Nessa

direção, é possível dizer que os motivos iniciais de fundação da instituição ‘docência no

ensino superior’ estavam relacionados com a atuação como professor em disciplinas,

mesmo que têm sido poucos os disparadores para iniciar e continuar esse processo de

profissionalização docente para o ensino superior (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

No Brasil, a menção sobre a preparação para a docência no ensino superior data

da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n.º 9394 de 20 de dezembro de 1996

(BRASIL, 1996c), em que se fala da preparação para a docência no ensino superior em

programas de pós-graduação stricto sensu (mestrado, doutorado). Entretanto, o foco da

formação stricto sensu é para a pesquisa e inclusive as avalições da agência reguladora

CAPES tem se voltado para esse fim exclusivamente, assim a ‘formação’ para a

docência no ensino superior, tanto a inicial como a contínua, ficam em um não lugar,

notadamente pelo intenso movimento do produtivismo acadêmico (PIMENTA;

ANASTASIOU, 2010; SGUISSARDI, 2013).

A docência tem sempre ficado à mercê, em que o máximo que houve, até este

momento, foram avaliações indiretas e quantificadas, em que se avalia os cursos onde

os professores lecionam, a qualidade e condições institucionais, os provões que

mostram a capacidade memorizativa dos estudantes, a produção científica dos docentes,

medida metricamente com parâmetros e critérios que focam o internacional em

detrimento do nacional, dentre outros. Alguns destes critérios podem ser vistos nos

revogados decretos 2026 de 20 de outubro de 1996, 3860 de 9 de julho de 2001, 5773

de 9 de maio de 2006 (BRASIL, 1996a; 2001a; 2006), os quais foram substituídos pelo

recente decreto 9235 de 15 de dezembro de 2017, o qual, além de não falar na formação

para a docência no ensino superior, ressalta ainda mais a formação de profissionais para

o mercado de trabalho, para a inovação e à competitividade e inclui a educação à

distância junto com o termo tutores (uma possível e estratégica forma de atualizar o

significado da docência no ensino superior, em substituição de docente/professor)

(BRASIL, 2017). Enfim, a formação para a docência no ensino superior, inicial e

contínua, fica desamparada por legislações e acaba não acontecendo ou de forma

instrumental e rápida.

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Nessa direção, autores apresentam uma análise, em que sinalizam algumas fases

da educação superior brasileira, propondo três fases a partir das décadas de 1980-1990

(SILVA JÚNIOR; SCHUGURENSKY, 2014). A fase 1 se refere ao movimento de

globalização impulsionado pelas influências do capital financeiro mundial, que induziu

a reforma do Estado Brasileiro, com auge em 1995 (SILVA JÚNIOR;

SCHUGURENSKY, 2014), também explicado pelo movimento gerencialista e da Nova

Gestão Pública (HOOD, 1991; PAULA, 2005; 2010; DASSO JÚNIOR, 2014), cujo

processo insere a educação como bem não exclusivo do Estado. A fase 2 (até 2007) se

destaca por um processo de criação e edição de várias legislações, das quais muitas

versam direta ou indiretamente sobre a educação superior: foco em pesquisas aplicadas,

formações aligeiradas inclusive com uso de tecnologias da informação e recursos à

distância para tal, implementação de avaliações regulatórias focadas na

performatividade e em resultados (SILVA JÚNIOR; SCHUGURENSKY, 2014), como

também destacado por Ball (2005), em que há um estreitamento intencional da

universidade com o setor empresarial. A fase 3 (aproximadamente até 2013) consistiu

em expandir a educação superior por meio de pelo menos três programas – a

Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), o Fundo de

Financiamento Estudantil (FIES), e o Programa Universidade para Todos (PROUNI),

dos quais o primeiro ajudou na expansão quantitativa e pouco qualitativa das

universidades públicas pelo país, o segundo e o terceiro ajudaram a alavancar a

expansão dos estabelecimentos de natureza privada (SILVA JÚNIOR;

SCHUGURENSKY, 2014). Outro autor completa com a fase 4 (do final do primeiro

mandato do governo Dilma até 2017, já no governo interino) que consiste num

movimento de adaptação do país à situação internacional de crise, em que se freia a

expansão das universidades públicas, com políticas de cortes e enxugamentos dos

estabelecimentos formadores, com forte incentivo para a utilização de educação à

distância, e valorização das demandas formativas do mercado capitalista de trabalho

(MANCEBO, 2017).

Nesse caminho, percebe-se o estreitamento ainda maior do REUNI com as

intenções do Banco Mundial e seus anseios globalizantes da proposta ‘universidade

mundial’, uma vez que representaria um grande negócio para investimentos e um

excelente mercado de formação para o mercado de trabalho. Foi apontado, ainda, que já

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se sinalizava a intenção de reduzir os centros de excelência (universidades em que há

pesquisa, por exemplo), reservando estes para áreas de interesse e investimento do

capital (tecnológicas, engenharias, por exemplo) e que o REUNI seguiu muito mais os

parâmetros globalizantes da universidade mundial em detrimento de um processo de

democratização do acesso à educação superior, ou seja, que consideraria as

necessidades da sociedade brasileira (SILVEIRA, 2015; BIANCHETTI; SGUISSARDI,

2017). Assim, pode-se ver o quanto houve uma expansão do ensino em quantidade, em

números de vagas e estabelecimentos, mas como será que ficou a condição de trabalho

para os docentes?

Enfim, reforça-se a ideia já apresentada da Nova Gestão Pública na reconstrução

do Estado Brasileiro (PAULA, 2010), o que nitidamente interfere no estatuto da

universidade, passando de instituição social para organização social (CHAUÍ, 2003), e

destaca-se a discussão do produtivismo acadêmico (SGUISSARDI, 2013) e da

performatividade que tem acometido a docência no ensino superior e sobre a

profissionalização gerencialista (BALL, 2005; FLORES, 2014). Contudo, há falta de

estudos empíricos que relacionam diretamente a Nova Gestão Pública e seus efeitos

sobre a docência universitária do professor-enfermeiro e que olhem para seus efeitos

também sobre as concepções pedagógicas – essa é uma possível lacuna que este estudo

procurou abordar.

Nessa direção, percebeu-se que apesar de alguns esforços da aliança nacional-

popular para amenizar os efeitos do Estado gerencialista, herdado da reforma Bresser-

Pereira, e iniciativas de expansão nas universidades públicas federais, nota-se forte e

intensificado resgate e continuidade do movimento gerencialista e subfinanciamento

e/ou interrupção na continuidade da expansão das universidades públicas federais, por

exemplo, no governo interino de Michel Temer (SILVA JÚNIOR; SCHUGURENSKY,

2014; MANCEBO, 2017). Assim, abordar-se-á, de forma breve, o gerencialismo a

seguir.

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O contexto dos anos 1990 e atual e o neoliberalismo no Brasil: a Institucionalização

do Pensamento Neoliberal no Estado Brasileiro

O pensamento político neoliberal e seus dispositivos de implementação

começaram a se consolidar efetivamente no Brasil a partir do breve governo de

Fernando Collor de Mello (1990-1992), pois este já houvera aderido às recomendações

do Consenso de Washington como caminho para resolução da ‘crise latino-americana’.

Um dos dispositivos utilizados para a implantação da perspectiva neoliberal no Brasil

foi o modelo de gestão conhecido como a Nova Gestão Pública com ênfase na vertente

gerencial. Este modelo de gestão gerencialista começou a ser implementado pela

Reforma do Estado Brasileiro a partir de 1995 pelo, então, ministro Luiz Carlos

Bresser-Pereira do Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado

(MARE) – cuja nomeação foi em 1994, no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Essa reforma de Estado se baseou, principalmente, em um movimento de

aproveitamento de conceitos e ideias do gerencialismo, provenientes da administração

do setor privado, tais como: seguir a referência do setor privado (enfoque empresarial):

redução de custos, eficiência, eficácia, clientelização dos cidadãos; a ideia de políticas

públicas formuladas pelo mercado; abandono das fórmulas burocráticas e assunção da

lógica da concorrência empresarial; separação da gestão e da política. Para

implementação dessas ideias, buscava-se o alcance de alguns elementos, tais como: a

profissionalização da gestão nas organizações públicas; desempenho medido por

padrões e medidas de avaliação com objetivos mensuráveis e claramente definidos;

ênfase no controle e nos resultados; introdução da competição no setor público; uso de

práticas de gestão do setor privado; e foco na disciplina e na perspectiva do gasto

quando da utilização dos recursos, buscando maior eficiência e economia (PAULA,

2005; 2010; DASSO JÚNIOR, 2014). Tudo isso, começou a ser implementado com a

Emenda Constitucional (EC) N.º 19 de 04 de junho de 1998 (BRASIL, 1998), em que se

legitimava a reforma gerencial.

A justificativa dada por Bresser-Pereira para a implantação da Reforma

Gerencial do Estado Brasileiro foi a necessidade de combate a três componentes

cruciais: o patrimonialismo22 e autoritarismo do Estado e da Gestão Pública Brasileira; a

22 Pode-se dizer, em linhas gerais, que o patrimonialismo é algo que se instaurou, no Brasil, ao longo da constituição da esfera pública, em que aceder às posições governamentais (ou aos cargos públicos) passou a ser visto como uma maneira de ascensão/mobilidade social e de obtenção de uma ocupação,

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crise do movimento nacional-desenvolvimentista e a ascensão do movimento

desenvolvimentista dependente e associado; e a influência das corporações financeiras

internacionais e do Consenso de Washington (PAULA, 2005; 2010).

Estes movimentos reformistas do Estado Brasileiro se passaram na década de

1990, e foi no governo de Fernando Henrique Cardoso, da aliança social-liberal, que se

conseguiu implementar mais efetivamente a reforma gerencialista, embasada,

principalmente, nas experiências originárias anglo-saxônicas de caráter neoliberal

(Inglaterra e Estados Unidos), por meio de mecanismos também de inspiração

neoliberal para controle estável da economia, em que as reformas eram orientadas para

o mercado. Nesse sentido, este processo gerencialista de reforma do Estado é

consensualmente entendido como um movimento-chave para alinhar o país com as

novas diretrizes do capitalismo financeiro internacional, fundamentado na ideologia

neoliberalista e na metodologia da nova gestão pública (PAULA, 2005; 2010).

Desse modo, para implementar essa reforma, Bresser-Pereira fez uma imersão

no Reino Unido para estudar de perto as características e procedimentos da Nova

Gestão Pública (o conjunto de dispositivos necessários para colocá-la em marcha no

Brasil), já que esta perspectiva nasce e se operacionaliza primordialmente no Reino

Unido, Estados Unidos e outras (ex)colônias de origem anglo-saxônica. Nesse caso, ele

estudou sobre o “movimento reinventando o Estado”, o qual fazia alusão à

complementaridade entre a disseminação da ideologia do que se denominava

management, por meio da impregnação das ideias de empreendedorismo, eficiência etc.,

e a implementação de reformas com metodologias gerencialistas (PAULA, 2005; 2010).

Foi no retorno de Bresser-Pereira ao Brasil que a EC de 1998 foi elaborada, a

partir da congregação de especialistas (12 personalidades) e a composição do Conselho

de Reforma do Estado. Este conselho se dedicou a explorar toda e qualquer questão

concreta, sobre o que se poderia atuar para cunhar a Reforma Gerencialista do Estado

Brasileiro. Esta EC foi aprovada pela Câmara dos Deputados, presidida pelo então

Presidente da Câmara, o deputado federal Michel Temer e, em seguida, aprovada pelo

esta vista como um bem a explorar individualmente e não como algo que estivesse a favor do bem comum/do interesse público (Schwartzman, 2007; Paula, 2010).

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Senado, presidido pelo então Presidente do Senado, o senador Antônio Carlos

Magalhães (PAULA, 2005; 2010).

A operacionalização desta reforma gerencial de Bresser-Pereira teve como

principal ponto de partida a separação entre aquelas atividades que continuariam como

exclusivas do Estado (a legislação, a regulação, a fiscalização, o fomento e a formulação

de políticas públicas) e aquelas que passariam a não mais serem exclusivas do Estado

(serviços com possibilidades competitivas – educação, saúde, assistência social,

científicos; e serviços de apoio – limpeza, vigilância, transporte etc.). Os serviços de

apoio se estabeleceriam por meio de licitações e contratos com terceiros (terceirização),

enquanto que os outros serviços também com possibilidades competitivas seriam

desempenhados pela livre-concorrência e iniciativa privada (privatização), e poderiam

ser desempenhados também pelas organizações sociais23 (PAULA, 2005; 2010).

Para as atividades que permanecessem como exclusivas do Estado, sua

organização e implementação aconteceria pela lógica de colegiados centralizadores de

decisões, e agências executivas e agências reguladoras. Os colegiados ficaram

responsáveis por produzir e avaliar as atividades políticas de dimensão governamental,

com forte centralização da decisão no Poder Executivo. As agências executivas ficaram

responsáveis pela implementação das políticas públicas, prestação de serviços e

atividades estatais e as agências reguladoras ficaram responsáveis pela fiscalização e

acompanhamento das empresas públicas e da prestação de serviços públicos pelas

empresas de natureza privada (PAULA, 2005; 2010).

Como se percebe, há forte influência do desejo de transferência de atividades

que, até então, eram exclusivas do Estado no âmbito de sua elaboração, implementação

e regulação, para a implementação pelo setor privado ou por organizações sociais. O

destaque e a justificativa sempre esteve sobre a questão da excelência, da qualidade

total, da efetividade e da eficiência, visando à melhoria na execução das atividades, e

com a regulação do mercado. Segundo Bresser-Pereira (2002a; b), não se queria

23 Aqui o termo ‘organizações sociais’ é tratado de uma maneira particular dentro da gestão pública, relacionado àquelas entidades de natureza privada, que surgem após a Reforma do Estado, com o intuito de gerir os recursos públicos e prestar serviços do ‘terceiro setor’, fazendo a ponte entre o setor público e o privado, no que se nomeia parceria público-privado. Difere também do termo utilizado por Chauí (2003).

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diminuir a interferência do Estado, dando mais abertura e espaço para o mercado, mas

se buscava a reconstrução do estado a partir desta feita e de maior responsabilização de

seus agentes (accountability), fortalecendo o Estado e, por consequência, o serviço

público, no sentido de torná-los adaptados ao capitalismo global e à democracia.

Entretanto, pesquisadores afirmam que as medidas implementadas pela Reforma

Gerencialista de Bresser-Pereira eram de cunho meramente neoliberal e que a roupagem

“Nova Gestão Pública”, de que essa perspectiva se utilizava, não passava de uma

nomeação diferente à Administração embasada nos modelos e modos de fazer do setor

privado e da cultura do management e seus princípios doutrinários de eficiência,

eficácia, empreendedorismo, dentre outros. Reforça-se aqui a ideia de que a

consolidação da NGP no mundo e, nesse caso no Brasil, não se deteve a um modo de

fazer baseado no convencimento, na argumentação, na consensualização explícita, ela

se adentrou subliminarmente no campo da disseminação e reforço simbólicos no meio

sociocultural, político e econômico, veiculado pelas mais diversificadas mídias – uma

ideologização da Nova Gestão Pública e do Management para ocuparem lugares

hegemônicos na aceitação popular (PAULA, 2005; WOOD JR.; PAULA, 2006;

PAULA, 2010; DASSO JÚNIOR, 2014; ITUASSU; TONELLI, 2014), um excelente

dispositivo construído por seus idealizadores.

No entanto, a Reforma Gerencialista de Bresser-Pereira, que visava,

principalmente, romper com a visão patrimonialista e tecnocrática do Estado Brasileiro

não foi muito bem-sucedida nesse sentido e, de certa forma, contraditória. O

patrimonialismo no Estado Brasileiro começa no Brasil Colônia e se baseava na ideia de

ocupação de cargos públicos a partir de posições sociais distintas que eram obtidas pela

posse a priori de bens e de fontes de riquezas, o que colocava uma dicotomia entre o

interesse público e o interesse pessoal (patrimonialismo tradicional). Perpassando pela

República Velha, pela Era Vargas e pelo Regime Militar, em que houve alta

profissionalização da burocracia pública de alto escalão, tem-se o que se denominou de

patrimonialismo moderno, em que os cargos eram negociados e mantidos por favores

políticos. Com maior influência no Regime Militar, pode-se falar que, pela ênfase dada

na profissionalização racional e técnica que os burocratas receberam, começou a se

consolidar um patrimonialismo burocrático, no sentido em que a economia passou a ser

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controlada pelos grupos funcionais e seus saberes técnicos e, logo mais, um

patrimonialismo político, em que os tecnocratas compravam sua participação política

por meio de seus prestígios e influências (PAULA, 2010). Assim, Bresser-Pereira,

justificava como necessidade de Reforma do Estado Brasileiro o rompimento com o

patrimonialismo e com a tecnocracia na burocracia pública (PAULA, 2010), mas

reforça em seu texto (BRESSER-PEREIRA, 2002b) sua aproximação com os

profissionais gestores de alto escalão ligados diretamente ao núcleo estratégico do

governo (aqueles que trabalham nos estabelecimentos e organizações ligados aos

serviços públicos exclusivos do Estado), os quais tiveram suas carreiras revalorizadas e

desenvolvidas, referindo como um problema que os outros cargos públicos (os dos

profissionais que ocupavam cargos de outras naturezas em segmentos pertencentes às

atividades não exclusivas do Estado) estavam sendo ocupados de forma ineficiente por

meio de concursos que selecionavam e aprovavam inúmeras pessoas que iam sendo

chamadas ao longo de anos, indicando que buscava romper com essa lógica,

implementando concursos anuais com a classificação apenas do número de vagas.

Segundo Paula (PAULA, 2010), a Reforma Gerencial tentou expulsar estes últimos da

responsabilidade do Estado. Mais uma vez, em seu texto, Bresser-Pereira (BRESSER-

PEREIRA, 2002b) traça alguns elogios aos gerentes e gestores públicos do alto escalão

para apoiarem um processo de reconstrução de um Brasil mais eficiente e democrático.

Enfim, na proposta de consolidação da Reforma Gerencialista Bresser-Pereira

não se conseguiu romper com a dicotomia entre a política e a administração e tampouco

se conseguiu a inserção de segmentos sociais para ampliar a participação social mais

efetiva na colocação das demandas sociais, acentuando-se mais ainda o poder autoritário

e centralizador do Estado Brasileiro. Além disso, reforçou o ideal tecnocrático

autoritário e neopatrimonialista, deixando nas mãos de uma elite burocrática a contínua

elaboração das políticas públicas. Quanto à participação social e popular nas decisões,

continuou prevalecendo a ideia de democracia representativa, restrita e limitada.

Entretanto, essa reforma gerencial conseguiu inculcar dispositivos e ideias neoliberais

no aparelho público do Estado (PAULA, 2005; 2010; DASSO JÚNIOR, 2014).

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Findado o governo da aliança social-liberal, com a vitória da aliança popular-

nacional, uma nova vertente da Nova Gestão Pública começa a ser implementada, a

vertente societal. O governo do, então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva começa a

frear a Reforma de vertente gerencialista e passa a valorizar aspectos da Reforma de

cunho societal (PAULA, 2010).

A vertente societal da Reforma do Estado tem suas raízes na perspectiva

movimentista (movimentos sociais, sindicais, esquerdistas, populares etc.), buscando

uma maior participação social/popular na administração pública, tendo como seu

momento de maior expressão o movimento constituinte e a consolidação da

Constituição Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 1988; PAULA, 2010). Essa

vertente se atinava com anseios por uma agenda política com maior participação direta

da sociedade, cogestão e participação dos cidadãos nas decisões públicas. Os valores

desta vertente se baseiam no desejo da expansão das capacidades humanas, potencial

produtivo e a participação cidadã por meio do desenvolvimento de políticas públicas

que busquem esse fim. Ela visa a lógica da democracia como reguladora do Estado e

não a lógica de mercado. Mas uma democracia participativa, deliberativa, fortalecendo

uma gestão social do Estado. Assim, alguns poucos dispositivos têm sido desenvolvidos

nesta direção, tais como os fóruns temáticos (para debate de problemas públicos),

conselhos gestores de políticas públicas (tanto consultivos como deliberativos),

orçamentos participativos (aumento da participação social na deliberação sobre o

orçamento).

Entretanto, ressalta-se que o grande empecilho para consolidar a vertente

societal tem sido a questão da formação dos gestores atuantes no serviço público, uma

vez que na própria formação básica há nítida hegemonia dos pensamentos gerenciais

que estruturam os currículos dos cursos de administração pelo país, formando e

doutrinando, técnica e padronizadamente, os gestores/administradores brasileiros. A

grande ênfase ideológica dos cursos de administração pelo país recai sobre a formação

de administradores de empresa e quase que nulamente sobre a formação para o

exercício da gestão de natureza pública. Isso tem dificultado uma articulação importante

para o trabalho na vertente societal que seria entre o conhecimento técnico e a crítica

social (formação política). O desafio da formação permanente dos gestores públicos se

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configuraria, então, em proporcionar movimentos de reflexão crítica sobre a integração

teórico-prática do exercício da gestão do setor público, com um olhar para além do

econômico, perpassando também pelas dimensões cultural, política etc. O gestor

público da vertente societal precisaria desenvolver algumas habilidades, especialmente a

de negociação entre a dimensão técnica e a política, as questões democráticas,

representativas e participativas (PAULA, 2010), tomando o bem público e a vida em

sociedade como parâmetro para suas decisões.

Nesta direção, apesar dos esforços do governo de Luiz Inácio Lula da Silva

(aliança nacional-popular) de criação de dispositivos voltados para a perspectiva

societal, a prevalência da cultura gerencial dos burocratas (autoritarismo e

patrimonialismo) e dos dispositivos cuidadosamente cunhados nos governos anteriores

dificultaram a criação, implementação ou consolidação de dispositivos societais para a

Reforma do Estado Brasileiro. O governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC)

destacara em sua proposta de organização do aparelho do Estado a sua divisão em

atividades exclusivas do Estado e atividades não exclusivas do Estado. O governo da

aliança nacional-popular não fizera proposta sobre o aparelho do Estado, apenas atuou

no incentivo das iniciativas locais organizativas de gestão públicas (PAULA, 2010).

Assim, percebe-se que o movimento gerencialista, cuja institucionalização

começou a partir do governo de Fernando Collor de Mello e tomou corpo nos seus dois

governos consecutivos, pode estar perdurando devido ao conjunto de dispositivos

construídos ao longo do tempo, perpassando desde a formação/formatação dos

administradores (formação básica), a reformatação dos administradores (treinamento)

atuantes durante o governo FHC, a implementação da reforma de caráter empresarial

(eficiência, eficácia, foco na economia, corte de gastos – uma verdadeira

‘empresarialização’ do Estado) aliadamente à cultura do management que vem sendo

disseminada e ideologizada pelos gurus do gerencialismo (brasileiros e estrangeiros) nas

mídias sociais, no telemarketing, nas mídias televisivas, dentre outras (PAULA, 2005;

WOOD JR.; PAULA, 2006; PAULA, 2010; ITUASSU; TONELLI, 2014). Segundo

Paula (2010), a vertente gerencialista organizou um plano de ação muito bem definido,

com objetivos alcançáveis e de fácil compreensão, o que facilitou sua execução – o que

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não aconteceu no governo da aliança popular-nacional que tinha o desejo de fazer

avançar a vertente societal (PAULA, 2010).

Paula (2010) destaca, por um lado, que apesar do desejo de FHC e Bresser-

Pereira de eficiência aliado ao controle social, esse desejo não se concretizou durante os

oito anos de governo, enfatizando e implementando apenas a dimensão gerencialista,

fortalecendo os burocratas de alto escalão do núcleo estratégico do governo. Por outro

lado, o governo LULA além de não propor uma reforma do Estado na direção societal,

nem conseguir amenizar a perspectiva gerencialista implementada, tampouco conseguiu

construir dispositivos permanentes de sustentação da vertente societal no Estado

Brasileiro (PAULA, 2010).

Vale destacar, ainda, que desde 2008, tem-se apercebido uma crise mundial do

capitalismo neoliberal, de maneira orgânica e geral, que afetara sobremaneira a América

Latina, cuja profundidade da crise se deu a partir de 2013. No caso do Brasil, na

dimensão política, essa crise se acentua com o impeachment da presidenta eleita Dilma

Rousseff e a manutenção de um governo ilegítimo (MANCEBO, 2017).

Assim, após o governo LULA e durante o governo DILMA, alguns indicadores

começaram a sinalizar que o movimento proposto por estes governos de

aliança/conciliação das classes havia chegado ao fim, sendo eles: os protestos em 2013;

reeleição apertada de Dilma Rousseff em 2014; desintegração da base governista; ajuste

fiscal privilegiador das elites da economia em 2015 (SINGER; LOUREIRO, 2016).

Nesse sentido, os dois mandatos de Luís Inácio Lula da Silva (LULA) e o

primeiro mandato de Dilma Rousseff, certamente priorizaram áreas e políticas sociais

compensatórias, o que melhorou as condições de vida, notadamente, dos setores sociais

mais vulneráveis. Todavia, deixaram a desejar quando da não implementação de uma

reforma estrutural do Estado no sentido societal, não conseguindo expandir os bens e

recursos de uso coletivo, não investiram suficientemente em infraestrutura, e, assim, não

conseguiram reagir diante da desindustrialização do país e o retorno da exportação de

produtos primários, refletindo o declínio da inserção do país no campo internacional,

não esquecendo que associado a esta situação está o fato do Estado ora reformado na

direção gerencialista e neoliberal que ocorrera no governo FHC. Vale ressaltar, também,

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que não houve investimento nas mídias de divulgação em massa, ficando nas mãos dos

oligopólios midiáticos a disseminação de informações, o que não contribuiu para um

processo de educação política para que a classe trabalhadora pudesse se organizar

melhor (BRESSER-PEREIRA, 2002b; PAULA, 2010; SINGER; LOUREIRO, 2016).

Entretanto, se faz jus destacar que embora as dificuldades dos governos de

esquerda, é possível afirmar que houve certo investimento em ações voltadas para o

social e o desenvolvimento de ações em que o Estado estava na centralidade das

decisões sobre as vidas das pessoas, havendo certo distanciamento dos processos de

financeirização das vidas das pessoas nesse período (DOMINGUES, 2015;

MANCEBO, 2017).

Com o impeachment de Dilma Rousseff, em 31 de agosto de 2016, por meio de

um golpe parlamentar-judicial-midiático, assume o poder presidencial Michel Temer, o

vice-presidente, do, então, Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) –

renomeado para Movimento Democrático Brasileiro (MDB), com aprovação unânime

pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 15 de maio de 2018 – o qual começa a

implementar sua política de ‘ponte para o futuro’, que visava intensificar a política de

Estado mínimo, em que vários cortes de investimentos foram implementados em

políticas sociais, aguçadamente na saúde e na educação, assim como um artifício muito

interessante para empresários e empregadores tal como os ajustes nas leis trabalhistas,

interferência na regulação do salário mínimo desvinculado da inflação, dentre outras

medidas que aguçam a rentabilidade dos capitalistas e, sobremaneira, diminui

drasticamente o poder de compra e de sobrevivência das classes menos favorecidas,

cada vez mais reféns deste movimento em construção. Se não bastasse, implementou

políticas de incentivo da participação do setor privado, dada a minimização do Estado e

também reforçou medidas que enfraquecerão o poder do Mercosul e dos BRICS (Brasil,

Rússia, Índia, China e África do Sul). Esse movimento “Uma ponte para o futuro”, tem

se estabelecido fortemente, dado sua consonância com setores conservadores e

capitalistas financeiros, e tem sido considerado um retrocesso nas conquistas sociais,

nos direitos e garantias, promovidos pelos governos de esquerda anteriormente eleitos

legitimamente pela população brasileira, inclusive retrocessos em conquistas realizadas

desde a Era Vargas (MANCEBO, 2017).

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Editores de uma importante revista nacional organizaram um editorial para

discutirem sobre a onda conservadora que tem pairado sobre o mundo nos últimos anos

e que tem repercutido na escolha e chegada no poder de pessoas com pensamentos e

comportamentos questionáveis no campo dos direitos humanos. No Brasil, têm havido

ataques aos direitos humanos e às conquistas sociais, e muitos movimentos têm sido

legitimados, tais como o da ‘Escola Sem Partido’, o do projeto da reforma da

previdência, dentre outros, que encaminham o país para um movimento de retrocessos a

momentos opressores ora vivenciados anteriormente (NEOCONSERVADORISMO,

educação e privação de direitos, 2017).

Nessa direção, esses editores e outros autores apontam que, na atualidade, tem-

se buscado exterminar com as ideias de direitos civis e sociais e iniciar uma espécie de

política que se autojustifica, coagida pelas demandas e exigências do desenvolvimento

econômico e social (BONAZZI, 1998; NEOCONSERVADORISMO, educação e

privação de direitos, 2017). Trata-se de um movimento ‘pós-democrático’ que não é

herdeiro do movimento liberal/liberalismo antecedente, uma vez que o ‘neoliberalismo’

busca “fazer do mercado tanto o princípio do governo dos homens como o do governo

de si [...] desenvolvimento da lógica do mercado como lógica normativa generalizada,

desde o Estado até o mais íntimo da subjetividade”. Isso significa que o neoliberalismo

busca uma transformação integral, tanto nos aspectos globalizantes (mundialmente),

quanto no tocante dos múltiplos aspectos dimensionais do ser humano (DARDOT;

LAVAL, 2016, p.33). Enquanto o liberalismo se restringe a um movimento de

determinar o limite da ação governamental, propondo a liberdade política e econômica,

visando a minimização das interferências do Estado – sendo essa sua principal essência,

em contrapartida, o neoliberalismo é um movimento totalmente diferente, buscando

estender os limites da ação governamental, transformando o papel do Estado, num

Estado intervencionista, Estado-empresa, num Estado interempresarial, cujo objetivo

último é a concorrência em sua acepção de inovação, em detrimento da clássica

concorrência pelo preço (DARDOT; LAVAL, 2016). Portanto, o neoliberalismo, não-

herdeiro do liberalismo, incita um movimento inclusive de empresarialização do

indivíduo, e a disseminação dessa ideologia, como anunciado já em relação à cultura do

management, condicionando os indivíduos a fazerem o que se espera deles.

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Nessa direção, em rumo de finalização dessa breve síntese, a grande questão do

neoliberalismo na Educação é que para esta perspectiva a escola/a educação é um bem

privado com valor essencialmente econômico, tendo que ser, portanto, rentável para as

empresas. Assim, os vários órgãos de fundação capitalistas que adotaram esta ideia

(Organização Mundial do Comércio, Organização para Cooperação e Desenvolvimento

Econômico, Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia,

dentre outros), estão utilizando seu poder financeiro para induzir mudanças nesta

direção, inclusive simbolicamente (LAVAL, 2004), assim como referido também por

Paula (2010) quanto à Cultura do Management.

Portanto, neste trabalho, pressupõe-se que essas ideias e conceitos gerencialistas

e da cultura do management, assim como o que foi implementado enquanto reforma de

Estado – atualização para um Estado Neoliberal, têm impregnado a universidade pública

e causado efeitos importantes sobre a natureza da mesma, sobre a natureza da docência

e sobre as concepções/práticas pedagógicas – neste caso com foco no professor-

enfermeiro.

Um breve contexto sobre a Saúde no Brasil

São muitas as forças instituintes que buscavam/buscam sua hegemonia no

cenário brasileiro, ao longo do processo de institucionalização da saúde no Brasil. Uma

delas, a mais tradicional, e que tem tido grandes períodos hegemônicos e movimentos

de resistência contra as tentativas de instituir a saúde de outra maneira é aquela em que

o ensino foca em doenças, no corpo inerte e seu funcionamento biológico, na

centralidade do hospital, com foco no conteúdo (com cargas horárias exorbitantes),

dando ênfase na transmissão cognitiva de informações, das quais o professor é um

especialista. Outro exemplo, são as forças instituintes que contribuíram para aquilo que

se chama atualmente de Saúde Coletiva, em que a saúde é vista de forma mais

ampliada, demandando e intensificando a participação da sociedade sobre as questões

pertinentes à saúde, à vida em si, portanto, privilegiando as necessidades sociais e a

integralidade da saúde que tenham potência de produzir saúde e vida, coletiva e

socialmente (CARVALHO; CECCIM, 2012).

No Brasil Colonial, as formações apenas aconteceram a partir de 1808, como já

mencionado, por conta da instalação da coroa portuguesa em terras brasileiras, para

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atender às necessidades da mesma, com a abertura de escolas médicas, cursos de

farmácia, odontologia, obstetrícia, em que as formações se baseavam em práticas de

laboratório ou mesmo o acompanhamento em serviços onde estes ofícios eram

realizados. Mas é apenas a partir do século XX que as forças instituintes na direção da

saúde pública começam a ascender no território brasileiro (CARVALHO; CECCIM,

2012).

Nos anos 1920, há um marco de relevância para a Saúde Coletiva, que é o

documento inglês ‘Relatório Dawson24’, um dos primeiros documentos que associa a

educação em saúde com um sistema de saúde e propõe a não exclusividade dos

hospitais na formação profissional, sugeria que o Estado fosse o gestor das políticas

públicas relacionadas com a saúde, e começa a sugerir uma forma de organização do

sistema de saúde regionalizada e hierarquizada, com profissionais generalistas naquilo

que poderia vir a ser chamado de atenção primária à saúde. Obviamente, que estas

recomendações do relatório encontraram muita resistência dos profissionais que

visavam a saúde na perspectiva liberal-privatista. Nesse período, também, já começara,

no Brasil, as investidas do movimento da Saúde Pública (Reforma Carlos Chagas), em

que se propunha um olhar para as necessidades de saúde da nação diante da formação

de profissionais da saúde, mas com pouco sucesso no campo da formação de

profissionais da saúde (CARVALHO; CECCIM, 2012).

Nos anos de 1940, com a influência do ‘Relatório Flexner25’ (escrito em 1910),

percebe-se o levante da resistência contra as formações na direção da Saúde Pública, em

favor do movimento liberal no Estado Brasileiro. Esse movimento disparou profundas

reformas nas formações, nos currículos, formatando-os em disciplinas

compartimentalizadas, para uma formação instrumental, hospitalocêntrica, focada nas

especializações, dentre outros aspectos (CARVALHO; CECCIM, 2012). Ou seja, nesse

período percebe-se o resgate da institucionalização da saúde em outra perspectiva, via

resistências defensivas do que por ora estava instituído, impedindo o avanço de forças

24 Escrito pelo médico real inglês Bertrand Edward Dawson, o qual influenciou na criação do sistema de saúde inglês. 25 Escrito pelo educador americano Abraham Flexner, em 1910, sobre a educação médica nos Estados Unidos, o qual retoma as formações em saúde centradas no hospital, no biologicismo, no corpo inerte e, fundamentalmente na ansiedade liberal de retomar sua hegemonia neste campo. Esse relatório provocou/legitimou várias transformações nas formações em saúde em vários lugares do mundo.

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instituintes no sentido da Saúde Coletiva. Nesse processo, começa a ficar claro que o

dispositivo “relatório” escrito por pessoas-chave pode servir para embasar decisões e

impulsionar/legitimar planos, etc.

O marco mundial dos anos 1950 é o da Saúde Pública, em que se coloca que o

meio para se transformar as reais práticas de saúde seria a transformação das finalidades

últimas dos cursos de formação em saúde, ou seja, era preciso aproximar as formações

das reais necessidades de saúde da população. Um dos disparadores disso foi o

Movimento Preventivista (CARVALHO; CECCIM, 2012), e outro marco instituinte

importantíssimo foi a Saúde Coletiva (L'ABBATE, 2013b). Esse movimento é

notadamente de resistência ofensiva quanto à manutenção das formações nos enquadres

tradicionais e também influenciadas/legitimadas pela perspectiva flexneriana.

Os anos 1960, houve abertura de departamentos, disciplinas e áreas de ensino no

campo da Saúde coletiva o que, por um lado, induziu um interessante movimento de

mudança na formação (CARVALHO; CECCIM, 2012) (algo a mais nessa direção

sendo institucionalizado), por outro lado, a reforma universitária de 1968, durante o

Regime Militar, que implementa a departamentalização, a criação de inúmeras

disciplinas (o que acabou por ocupar o total do tempo livre dos estudantes), foi uma das

tentativas de desarticulação dos pensadores e desmantelamento dos movimentos

estudantis (GHIRALDELLI JUNIOR, 2009).

Nos anos 1970, começa os movimentos relacionados com a saúde comunitária,

com a formação para a cidadania e, apesar de ter sido o auge da ditadura militar

brasileira, foi também momento em que vários pensadores, incluindo Paulo Freire e sua

pedagogia libertadora, se organizaram como força instituinte de resistência contra ao

pensamento militarista no poder. E o instituído enquanto saúde, buscava se reafirmar

por meio de programas e ações que davam intensidade à visão do corpo humano

destituído de emoções, apenas o físico que deveria ser corrigido e adequado às

necessidades – entra como exemplo a Educação Física do movimento, do corpo

saudável, em que a escuta e o diálogo eram dispensáveis (CARVALHO; CECCIM,

2012).

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Foi ainda na década de 70, que ficou nítida a influência do setor empresarial

sobre os rumos da saúde brasileira, em que se buscava institucionalizar perspectivas de

saúde que se aproximavam com a lógica de mercadorias, que aumentariam e manteriam

a lucratividade do setor empresarial da saúde (PAIM, 2011). Por isso, era urgente uma

reforma nos modelos de ensino como caminho para a institucionalização de outra

perspectiva de saúde, focada na produção de vida. Entretanto, até este momento o que

foi possível alcançar foi uma clínica individualista, focada na doença, uma Saúde

Pública focada no preventivismo (prevenção, promoção e reabilitação), sem tocar na

questão da integralidade, que era contributo essencial da Saúde Coletiva (CARVALHO;

CECCIM, 2012).

Na década de 1980, as forças instituintes que criticavam as formas assistenciais,

os tipos profissionais, os modelos formativos e a maneira como vinha acontecendo o

desenvolvimento social, começaram a colocar em prática ações, planos para a

institucionalização de uma lógica mais integrada, buscando associar cada vez mais os

centros formadores aos serviços de saúde. Nesse ensejo, alguns dos dispositivos foram:

a rede de Integração Docente-Assistencial, algumas residências multiprofissionais que

foram lançadas nesse período, a VIII Conferência Nacional de Saúde, a Constituição

Cidadã de 1988, que possibilitaram o impulso para começar a institucionalização do

Sistema Único de Saúde (SUS) (CARVALHO; CECCIM, 2012).

Tendo o SUS sido planejado na década anterior, na década de 1990, ocorreu os

movimentos para institucionalização do mesmo, com movimentos instituintes

favoráveis e contrários a esta empreitada. Essa foi a década que buscou revisar as

formações, buscando, em meio aos embates instituído-instituintes mais diversos,

articulá-las às necessidades de saúde, às necessidades de transformação que o recém-

nascido SUS precisava em vários âmbitos (organizacional, profissional, estrutural etc.).

Assim, os currículos precisavam ir para além de reformas de cunho conteudista, era

preciso reformar também os caminhos e fundamentos pedagógicos para se alcançar o

objetivo de transformar as formações em saúde e ao mesmo tempo transformar o

sistema de saúde, tudo em processo e dinamicamente acontecendo. Para tanto, era

preciso metodologias que articulassem não apenas os centros formadores com os locais

de assistência, mas também com os representantes das comunidades. Desse modo,

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muitos projetos foram criados, dentre eles o da rede UNI (projetos atrelados à

aproximação ensino-serviço-comunidade) e o da rede IDA (projetos de integração

docente-assistencial), o que mais tarde vem a compor a rede Unida (UNI-IDA), o que

começava a sinalizar a necessidade de ultrapassar a dimensão profissional na formação,

para formações multi- e interprofissionais (CARVALHO; CECCIM, 2012).

Os anos 2000 foram os das formulações de diretrizes curriculares nacionais para

a formação dos profissionais, dentre os quais, a partir de 2001 começaram a lançar suas

diretrizes, com a maioria mencionando a formação voltada para o SUS, e cada área

profissional deu sua ênfase e seu posicionamento (CARVALHO; CECCIM, 2012).

De 2002 a 2005, muitos programas foram lançados para induzir as

transformações das formações para a realidade do SUS, uma vez que muita resistência

acontecia por parte de forças instituintes da saúde como mercadoria e bem privado, que

faziam resistência defensiva/ofensiva, ora para manter o que havia enquanto formação

anterior voltada para perspectivas da doença e do corpo inerte/morto, ora para dissolver

aquilo que era galgado durante o processo de institucionalização do SUS. Exemplos dos

programas instituintes do SUS eram o AprenderSUS, o EnsinaSUS, o VER-SUS, o Pró-

saúde, o curso de especialização Formação de Ativadores de Processos de Mudança na

Educação Superior de Profissionais de Saúde – da Fundação Oswaldo Cruz, dentre

outros, ganhando apoio de movimentos estudantis, das secretarias municipais de saúde,

do movimento da Educação Popular (CARVALHO; CECCIM, 2012; LIMA et al.,

2015).

Entretanto, é importante destacar que ao longo desse processo foram sendo

produzidos sentidos e significados particulares sobre o que é saúde, sobre o que é o

SUS. Quanto ao entendimento do que é o SUS, a mídia, os estudantes, os profissionais

da saúde, os governantes e políticos, os usuários do SUS, enfim, uma gama de atores

sociais têm produzido pelo menos quatro sentidos: o SUS para pobres, o SUS real, o

SUS formal e o SUS democrático (PAIM, 2011).

O SUS para pobres concerne à ideia de sistema de saúde baseado na proteção

social e que, portanto, deve atender os mais necessitados, com certo senso caritativo e

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assistencialista, justificando uma assistência para os mais simples e se afastando da

ideia de cidadania (PAIM, 2011).

O SUS real se vê submetido às secretarias e aos ministérios e, nesse sentido,

direta e indiretamente influenciado pela lógica de governo, o que o expõe fortemente

aos interesses do setor privado (PAIM, 2011), notadamente pela participação dos

burocratas de alto escalão, que tiveram sua formação administrativa voltada para o setor

privado, desde a reforma Neoliberal do Estado Brasileiro (PAULA, 2005; 2010).

O SUS formal é aquele das legislações nacionais, estaduais e municipais, o qual

está longe de se concretizar, prevalecendo os dois primeiros mencionados (PAIM,

2011).

E, por fim, o SUS democrático está relacionado com o desejo de implementar

um sistema de saúde que represente todos os cidadãos brasileiros, assegurando-os o

direito à saúde, ao mesmo tempo que se busca incluir a institucionalização do SUS cada

vez mais nas necessárias reformas sociais mais amplas, possibilitando que ele possa

influir ainda mais nos processos de determinação social da saúde e da doença. Para

tanto, é preciso formar atores sociais engajados na perspectiva da reforma sanitária

(PAIM, 2011).

Percebe-se que há concepções do SUS instituídas e que têm potência sobre o

processo de institucionalização do mesmo, tal como a visão do SUS para pobres e do

SUS real. Entretanto, o autor lembra da necessidade de produzir forças instituintes com

atores, processos e produtos que apoiem a institucionalização do SUS formal e avance

cada vez mais para um SUS democrático (PAIM, 2011).

Entretanto, a partir do levante conservador de âmbito mundial

(NEOCONSERVADORISMO, educação e privação de direitos, 2017), inclusive no

Brasil com o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 e ascensão de Michel Temer do,

então, PMDB ao poder (MANCEBO, 2017), como já apresentado nesta tese, várias

foram as investidas sobre as áreas sociais, em que o SUS está inscrito. Assim, houve

ataques nas linhas de financiamento do SUS, notadamente pela Emenda Constitucional

95 de 16 de dezembro de 2016, que estagna o investimento nas áreas sociais por 20

anos, especialmente em momento no qual país sofre crise social e econômica, com

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ressurgimento de doenças e insurgência de novas doenças, infletindo um aumento

gradual das pessoas que buscam o SUS num contexto em que este está cada vez mais

vulnerável devido aos cortes financeiros. Ao mesmo tempo, aliados se reúnem com o

setor privado da saúde liderados pela Federação Brasileira de Planos de Saúde

(FEBRAPLAN) para discutirem sobre um Sistema Nacional de Saúde, que engloba e dá

maior ênfase para o setor privado da saúde, uma vez que nesses 30 anos de SUS,

enquanto houve muita dificuldade para consolidação do mesmo, o setor privado e das

privatizações cresceu muito (PAIM, 2013), inclusive o movimento de financeirização da

saúde tem se sobressaído cada vez mais nos últimos anos (SESTELO et al., 2017),

inclusive atacando o sentido ampliado de saúde, desconstruindo o SUS e as políticas

sociais intimamente relacionadas, notadamente com os diversos movimentos e

construtos feitos e assinados pelo governo interino (DONIEC et al., 2018).

Enfim, nos últimos anos, percebe-se um forte movimento instituinte da saúde

como mercadoria ou como passível de movimentações financeiras, o que encontra força

no momento político de crise do capitalismo neoliberal que o Brasil e o mundo vive.

Mesmo assim, despertou-se o movimento de resistência dos aliados da perspectiva da

saúde como um direito e várias entidades, associações e organizações têm se

manifestado em favor do direito constitucional à saúde e em defesa da democracia

participativa. Trata-se de um jogo muito complexo, em que as forças instituintes e o

instituído são vários, e estão buscando legitimação e institucionalização de suas

perspectivas. Nesse ensejo, a instituição saúde, assim como a enfermagem, a docência

no ensino superior e o professor-enfermeiro, vão sofrendo atualizações constantes e

permanentes, de uma forma tão rápida que pode até escapar aos sentidos com muita

facilidade. E diante da constatação da atualização do Estado para um Estado Neoliberal,

buscaremos refletir também o quanto esta atualização está disparando atualizações na

instituição docência no ensino superior do professor enfermeiro, quais os efeitos sobre

os docentes, suas práticas e suas concepções pedagógicas. Nesse sentido, buscaremos

apontar ao longo desta tese algumas contribuições da Análise Institucional com relação

à instituição Estado, uma vez que esta considera o Estado como uma das formas de

controle que atravessa a vida e forma de viver em sociedade e todas as modalidades

político-ideológicas que propõem caminhos para a sociedade sempre se curvam ao

Estado, muitas vezes, deixando de lado seus princípios. Portanto, sendo a análise

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institucional uma espécie de teoria crítica do social, Lourau discute a dissolução da

instituição Estado (LOURAU, 2004a).

A docência no Ensino Superior e o professor-enfermeiro

Abordar-se-á a instituição ‘docência no ensino superior’ a partir da análise

institucional (o instituído, o instituinte, e a institucionalização) e da sua vertente

socioclínica (esta corrente de pensamento será explicitada no tópico entre a pesquisa

qualitativa e a pesquisa socioclínica institucionalista). No entanto, começaremos por

apresentar o conjunto de teorias que buscam inscrever e conhecer a natureza da

docência no ensino superior e seus assuntos correlatos. Dessa maneira, será preciso

repassar as principais teorias sobre a docência no ensino superior, embora de forma

muito breve, com o intuito de apenas contextualizar o objeto de estudo e sua

complexidade.

Para abordar a docência no ensino superior, muitos pesquisadores têm se inscrito

em diversas modalidades de pesquisa e tipos de aproximação que são complementares e

vão dando pistas sobre a natureza complexa do exercício da docência na Educação

Superior. Das abordagens mais comuns para desvelar a natureza da docência na

Educação Superior, destacamos a título de exemplificação, os saberes docentes, a

profissionalização docente, a aprendizagem pedagógica compartilhada, a condição

docente, o mal-estar docente, dentre outras.

Os saberes docentes têm sido estudados por muitos pesquisadores e têm

oferecido algumas pistas sobre a natureza da docência no Ensino Superior e sua

especificidade e, de certa forma, anunciando alguns contornos quanto a essa modalidade

de atuação profissional. É destacado que a natureza da docência do ensino superior se

difere consubstancialmente da natureza da docência em outros níveis e modalidades

educacionais, uma vez que o professor universitário, no Brasil, atua na tríade do ensino-

pesquisa-extensão, segundo a LDB 8384 de 1986 (BRASIL, 1996c), sendo, portanto,

professor e pesquisador (SOARES, 2008).

São variadas as abordagens dos saberes docentes, mas principalmente

contemplam os saberes pedagógicos, os saberes específicos e os saberes da experiência,

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e algumas subcategorias (PIMENTA, 2012; TARDIF, 2014). Mais especificamente, os

saberes da experiência se referem àqueles que são produzidos no cotidiano do exercício

profissional docente e que vão dando o tom à docência. Os saberes específicos se

referem aos conhecimentos específicos do campo do saber em que o professor tem

domínio, tais como a Matemática, o Direito, a Enfermagem, dentre outros. Os saberes

pedagógicos se afastam do reducionismo da ideia de didática, ou de técnicas de ensino,

mas também as considera ao tomar a prática formativa para a docência como matéria-

prima fundamental para a produção dos saberes pedagógicos que dependem do contexto

das práticas sociais (PIMENTA, 2012).

Tardif contribui para essa discussão, considerando os saberes docentes de outra

maneira, de certa forma relacionada, em saberes pessoais dos professores, saberes

provenientes da formação escolar anterior, saberes provenientes da formação

profissional para o magistério, saberes provenientes dos programas e livros didáticos

usados no trabalho, e saberes provenientes de sua própria experiência na profissão, na

sala de aula e na escola (TARDIF, 2014). De certa forma, se referem aos saberes que

vão se constituindo no tempo, no contexto e na pessoalidade do professor, tomando por

base a história de vida, a sociedade, os estabelecimentos escolares. Nesta pesquisa,

acredita-se também na importância de olhar os saberes também pela perspectiva

institucionalista, que vão se constituindo e se atualizando.

Há também discussão muito interessante sobre o termo formação. Uma das

perspectivas (em hegemonização), está relacionada com algo dado a priori, em que a

formação deve anteceder a um determinado exercício profissional, dando as diretrizes

formativas para a formatação do profissional desejado, necessitando antecipar e

delimitar bem os saberes a serem passados. Outra perspectiva, valoriza o devir (o

movimento de sempre vir a ser, de tornar-se), em que a profissão vai se constituindo/ se

instituindo para além dos espaços formais, em territórios múltiplos e complexos

(CUNHA, 2015). Nesta perspectiva, os saberes docentes se constroem em

diversificados lugares e tempos de acordo com os sujeitos, não se detendo apenas aos

espaços formais, como por exemplo o da universidade, nem tampouco informados

apenas pela teoria, ressaltando a importância contextual e das experiências, em

movimento (CUNHA, 2015).

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No tocante à construção da identidade docente, tem-se discutido que a

perspectiva dominante cristaliza a identidade docente na direção prescritiva e

instrumental, visto a partir das expectativas de estudantes universitários que advêm das

variadas carreiras universitárias (PIMENTA, 2012), o que poderíamos também

relacionar com uma identidade docente empresarial, que tem sido cunhada no processo

do profissionalismo gerencialista (SACHS, 2003), ou seja, voltado para atender aos

anseios neoliberais, capitalistas e mercadológicos, imbuído dos ideais gerencialistas ou

da nova gestão pública (PAULA, 2010). No sentido gerencialista, a identidade se

conforma em um cenário de prestações de contas e responsabilização/acreditação dos

profissionais docentes (accountability), os quais são avaliados por meio de critérios

quantitativos, estatisticamente mensuráveis, em que os rankings passam a ter papel

fundamental de retroalimentação e manutenção, senão legitimação, desta perspectiva

(SACHS, 2003; PAULA, 2010).

Em outra direção, alguns autores têm contribuído para pensar a identidade

docente em uma orientação democrática, em que há colaboração e cooperação entre

variados atores do cenário educativo, em que os objetivos educacionais e do trabalho

docente são vistos de forma mais ampliada, visando à construção de uma sociedade

mais justa, democrática. Assim, essa identidade incorpora movimento e movimentação,

chamada de identidade ativista (SACHS, 2003). Nessa direção, a identidade não é vista

como algo fixo, mas sim como algo construído e em construção, uma vez que parte do

pressuposto do sujeito como alguém historicamente situado e inacabado (PIMENTA,

2012; FREIRE, 2014).

A identidade profissional, portanto, é construída:

A partir da significação social da profissão; da revisão constante dos

significados sociais da profissão, da revisão das tradições. Mas

também da reafirmação de práticas consagradas culturalmente e que

permanecem significativas. Práticas que resistem a inovações porque

prenhes de saberes válidos às necessidades da realidade. Do confronto

entre as teorias e as práticas, da análise sistemática das práticas à luz

das teorias existentes, da construção de novas teorias. Constrói-se,

também, pelo significado que cada professor, enquanto ator e autor,

confere à atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores,

de seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida, de suas

representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do

sentido que tem em sua vida o ser professor. Assim como a partir de

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sua rede de relações com outros professores, nas escolas, nos

sindicatos e em outros agrupamentos (PIMENTA, 2012, p.20).

Ainda, nesta direção, Nóvoa coloca como condição sine qua non para o processo

de constituição da identidade docente, o desenvolvimento pessoal (como pessoa em

vida), o desenvolvimento profissional e também o desenvolvimento institucional26.

Quanto ao desenvolvimento institucional, segundo o autor, se refere às condições e

condicionantes dos estabelecimentos universitários e as transformações pelas quais estes

passam, que possuem grande influência no processo de construção da identidade

docente (NÓVOA, 1992). Este nosso estudo, na visão da Análise Institucional, tem a

possibilidade de olhar para a identidade profissional como algo que vai se atualizando a

partir dos movimentos das várias lógicas que buscam sua institucionalização.

Em tentativa de associar essa reflexão com os pressupostos da Análise

Institucional, poderia se dizer que a identidade docente vai se atualizando conforme se

atualiza os pressupostos, ações e atitudes da instituição universidade, como esta vai

sendo produzida/entendida ao longo de sua existência. Nessa direção, a identidade

docente é cambiante, está em construção, muda, se transforma, pois está relacionada

com o sujeito situado na história (PIMENTA, 2012).

Após algumas reflexões iniciais sobre saberes docentes e construção da

identidade docente, é necessário falar sobre o processo em que se dão estas construções,

a profissionalização docente. Para tal, é preciso antes trabalhar alguns termos para

colocar o quadro a partir do qual se abordará este assunto. Assim, far-se-á uma breve

conceptualização dos termos profissionalização, profissionalismo e profissionalidade.

Em linhas gerais, o termo profissionalização se refere ao processo pelo qual a

profissão vai se constituindo inscrita em suas várias dimensões e instâncias (social,

política etc.). A profissionalidade está relacionada ao conteúdo da profissão e suas

especificidades, o que circunscreve esta como uma profissão, seus valores, suas crenças,

suas atitudes, seus atributos, dentre outros. Por sua vez, o profissionalismo está

associado ao exercício da profissão, à sua implementação, à sua prática

26 Aqui Nóvoa (1992) trata instituição como sinônimo de estabelecimento/organização, ou seja, em sentido diferente daquele da Análise Institucional.

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(HARGREAVES, 1994; IMBERNÓN, 1994; HOYLE, 1995; HARGREAVES;

GOODSON, 1996; MENDES, 1996; HARGREAVES, 2000; ESTRELA, 2001;

FLORES, 2004; CROOK, 2008; SOARES, 2008; GEWIRTZ et al., 2009; IMBERNON

MUÑOZ; CANTO HERRERA, 2013; GIMENO, 2014).

Outros autores utilizam o termo desenvolvimento profissional docente para se

referir ao processo de profissionalização docente. Nesse sentido, se destaca a

importância de os professores terem consciência da necessidade de continuar a se

desenvolver profissionalmente, por meio da autoformação, heteroformação e

interformação, pois acredita-se que o processo formativo do docente tem que valorizar a

dimensão contextual, visando não somente a reflexão, mas as transformações

pertinentes e necessárias, se afastando de vez dos tradicionais cursos de

aperfeiçoamento individualistas e individualizados (GARCÍA, 1999).

Para pesquisadoras da área, o termo que melhor se refere a este processo quando

se fala da docência no ensino superior é profissionalização continuada, uma vez que se

dá processualmente e contextualizadamente, durante o exercício profissional docente,

demandando ações específicas dos estabelecimentos universitários nesta direção

(PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Outros autores preferem falar em professoralidade, ao considerar a pessoalidade

do professor no processo de profissionalização, uma vez que na trajetória de

constituição da identidade profissional, a dimensão pessoal tem muita relevância, assim

como a interação com pares e a fundamentação nas experiências como professor tanto

no estabelecimento atual como nos outros estabelecimentos pelos quais passou – o que

prescinde da ideia de formação pedagógica que se dá no contexto e na grupalidade,

construindo o conhecimento pedagógico de maneira compartilhada. Referem ainda a

importância de colocar ênfase na aprendizagem pedagógica docente compartilhada e em

rede quando se fala da especificidade da docência no ensino superior e da necessária

disponibilidade docente em entender-se num movimento de permanente constituição

como professor (ISAIA; BOLZAN, 2004; ISAIA; BOLZAN, 2007; BOLZAN, 2009;

ISAIA et al., 2009; BOLZAN; ISAIA, 2010). Essa perspectiva nos parece mais potente

para olhar para a instituição docência no ensino superior a partir da dialética

institucional e dos dispositivos próprios da Análise Institucional, tais como a análise de

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demanda e encomenda, análise de implicações, uma vez que permite olhar para o

instituído, para as forças instituintes e o próprio processo de institucionalização. Mas

também não se pode negar que é uma dentre várias perspectivas que buscam

legitimidade para institucionalizar-se quanto à docência no ensino superior.

Nessa direção, muitas são as evidências da influência do gerencialismo sobre o

profissionalismo docente, transformando os sentidos e significados, quase que

imperceptivelmente do termo profissionalismo, inculcando a lógica de que as profissões

são gestadas a partir de fora (exogenamente) e, portanto, delineadas a partir de fora e a

priori, concorrendo com a lógica de profissão enquanto devir, enquanto algo em plena

transformação e atualização, uma vez que passa a seguir critérios propulsores de uma

cultura da performatividade e das mensurações quantitativas, do gerencialismo

(SACHS, 2003; BALL, 2005; FLORES, 2014). Isso nos leva a questionar se ao

tomarmos a profissão por esta perspectiva que a prevê a priori, e ao compararmos com

o processo pelo qual as profissões foram surgindo, se criando, se recriando e se

reinventando – talvez concordemos com a ideia de Ball de que isso seria anunciar o fim

da profissão. Aqui, possivelmente, podemos nos remeter à ideia dos editores,

mencionados anteriormente, para exemplificar a mudança de direção na formação

universitária, que a cada vez mais deixa de ser integral para a formação do ser humano,

portanto, complexa e inacabada, e passa a ser cada vez mais pensada, objetivada a

priori a partir das necessidades profissionais do mercado capitalista de profissões

liberais – ou seja, uma formação para cumprir metas pré-estabelecidas

(NEOCONSERVADORISMO, educação e privação de direitos, 2017).

Ainda, neste contexto, alguns pesquisadores sobre a docência no ensino superior,

ressaltam que, dada a especificidade da docência neste nível educacional, esta se faz no

cotidiano e no contexto em que os docentes estão inseridos, propondo que a

aprendizagem pedagógica precisa acontecer do seio do compartilhamento e das trocas

com os pares, ou seja, uma aprendizagem pedagógica compartilhada, em que cada um

com sua professoralidade contribui para a aprendizagem pedagógica para superar as

dificuldades, problemas contextuais. Estes autores propõem, para tanto, a ideia de

professoralidade, se aproximando da perspectiva de que o professor não é apenas um

profissional e não deve se desenvolver apenas no sentido de constituir uma profissão,

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uma vez que ele também é uma pessoa e sua pessoalidade contribui

consubstancialmente para a construção permanente de sua identidade docente e de seus

saberes pedagógicos no seio de seu grupo, de seu contexto, de seu tempo (ISAIA;

BOLZAN, 2004; ISAIA; BOLZAN, 2007; BOLZAN, 2009; ISAIA et al., 2009;

BOLZAN; ISAIA, 2010).

Entretanto, um estudo recente com professores da educação básica revela um

movimento de insegurança e perda das certezas em que os professores costumavam se

sustentar para o exercício da docência, notadamente a partir dos últimos avanços e

transformações tecnológicas que o mundo vem processando nos seus diversos cenários.

A condição do trabalho docente tem estado cada vez mais complexa, em um cenário em

que os docentes são postos à prova a todo instante e convidados a assumirem tarefas

cada vez mais complexas, assim como um aumento exorbitante de papeis que se

acumulam no exercício da docência, notadamente em momento em que o mundo vive

uma grande aceleração, deixando o profissional docente em situação de instabilidade

constante (AUAREK, 2014).

Nesse sentido, o autor completa, ainda, que os professores começam a se

questionar sobre o que são de fato, uma vez que se sentem, muitas vezes como outros

profissionais, psicólogos, assistentes sociais etc. Ele argumenta que se trata de um

movimento de ressignificação das identidades docentes, numa contemporaneidade que

provoca e convoca seres com habilidades fluídicas e líquidas27, ressaltando a

importância de considerar esse aspecto quando do estudo da condição docente

(AUAREK, 2014).

27 Auarek (2014) se baseia em Bauman especialmente quanto à habilidade líquida. Este último utiliza-se dos conceitos da Física quanto a solidez e liquidez, comparando com os elementos que sofrem maior ou menor, respectivamente, condicionamentos para estar na forma líquida. O autor utiliza a água como exemplo de fluidez, dada sua característica de se transformar entre os estados sólido, líquido e gasoso (Bauman, 2001). A questão central da obra diz respeito ao momento da modernidade líquida – como designada pelo autor, em que as identidades dos sujeitos estão a todo instante se transformando, devido às instabilidades frequentes. Aqui, aproveitamos para relacionar com o conceito de dialética institucional que, dentro da Análise Institucional, propõe um olhar sobre as instituições enquanto um jogo dinâmico entre aquilo que está instituído, aquilo que questiona o instituído e que se produz instituinte e o próprio processo de institucionalização, que porta suas características peculiares. Essa liquidez/fluidez que refere Bauman (2001) tem profícuas possibilidades de analogias com a dialética institucional, em nosso ponto de vista.

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Percebe-se que no caso da Educação Superior, a condição docente não está tão

divergente do que é referido por Auarek (2014) com relação aos docentes da educação

básica, uma vez que a condição docente na educação superior com suas especificidades

também vem sendo bombardeada por essa velocidade de transformação, em que os

conhecimentos se atualizam constantemente, assim como as exigências e atribuições

docentes. Esse aspecto é destacado por autores que estudaram a questão da sedução em

que são envolvidos os docentes para caminharem por trajetos que são cada vez mais

gerencialistas, em que por um lado imputa-se a precarização do trabalho docente na

universidade e, por outro, um movimento de prazer-sofrimento, em que o prazer

efêmero (breves momentos) causado pelas avaliações da efetividade e da excelência

está relacionado com a própria manutenção do processo gerencialista no cerne da

universidade (RUZA; PINTO E SILVA, 2016).

Além do mais, no mundo e também no Brasil, especialmente a partir da década

de 1990, houve uma extensa expansão do ensino superior na escala quantitativa, o que

aconteceu desproporcionalmente na dimensão qualitativa. Por um lado, apresenta novos

desafios para pensar a universidade que se construíra até os anos 1990, pautada num

elitismo dominante, uma vez que começam a ingressar na universidade pessoas oriundas

de outras esferas e grupos marginalizados pela sociedade. Outro ponto da condição, ou

mesmo, condicionamento docente, se refere ao intenso processo de implementação e

disseminação da perspectiva gerencialista pelo mundo, a partir das ideias da New Public

Management (Nova Gestão Pública), nascida na Inglaterra e apropriada primariamente

pelos países de colonização anglo-saxônica, que dão suporte teórico e estrutural para o

modelo neoliberalista de Estado e de sociedade. Nesse caminho e para a consolidação

dessa lógica, é fundamental a institucionalização da universidade-empresa, cuja

encomenda toca na produção de pessoas, objetos, tecnologias, conhecimentos

utilitaristas, precisos, instrumentais que se encaixam perfeitamente à consolidação e

manutenção da lógica neoliberal (PAULA, 2005; SOARES, 2008; PAULA, 2010;

SANTOS, 2011). Desse modo, a condição docente no ensino superior fica compelida a

responder a essa lógica, uma vez que cada vez mais outros dispositivos de regulação são

implementados, contendo o professor, por meio de avaliações quantitativas, em que o

senso de equilíbrio é o estímulo à competitividade na entrega de produtos

quantificáveis, respondendo à supremacia das falácias da eficácia, eficiência,

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produtividade – característicos do pensamento empresarial (PAULA, 2005; 2010;

SANTOS, 2011), que, possivelmente, têm impulsionado a construção de identidades

docentes empresariais, profissionalizações docentes gerencialistas, saberes docentes

instrumentais na lógica de competências, o que vem, a nosso ver, institucionalizando

outras formas de ser e estar na docência (FELDFEBER, 2007; OLIVEIRA, 2007) que,

no caso da docência universitária em enfermagem, não coaduna com a formação de

profissionais de saúde preparados para atuação, implementação e consolidação do SUS.

Desse modo, os docentes do ensino superior se encontram em momento de muita

instabilidade na sua condição docente, justamente neste momento em que a

profissionalização encontra um forte movimento instituinte na direção da

institucionalização desta profissão, enquanto algo exogenamente direcionada por regras

baseadas no desempenho (performatividade), na acreditação/responsabilização

(accountability), em que as máximas se referem a responder eficientemente a

julgamentos fixos e determinados a priori. Este movimento gerencialista se faz

hegemônico diante de outras lógicas instituintes da profissionalização enquanto algo

pautado no devir, na incerteza, e na construção permanente (BALL, 2005).

Esse contexto de instabilidade tem causado o que na literatura se denomina o

“mal-estar docente”. Os estudos que têm se debruçado sobre o mal-estar docente,

concernem à preocupação quanto aos sentimentos produzidos durante o exercício da

docência. Trata-se de uma espécie de crise de identidade quando o professor se encontra

em situação complexa e contraditória durante sua atividade docente. Esse mal-estar

docente tem sido relacionado com as constantes e contínuas mudanças a que o trabalho

docente tem sido desafiado na contemporaneidade, notadamente causando conflitos de

ordem pessoal e interpessoal (com os pares, com os estudantes etc.), conflitos

profissionais (legitimação dos saberes docentes, suas práticas profissionais etc.), dentre

outros conflitos que denominaremos aqui de ideológicos, uma vez que estão

relacionados com a consecução ou não de determinados objetivos formativos, ou

mesmo, relacionando isso com a realização profissional, o que gera sentimento de

incompetência, incapacidade, despreparo profissional, dentre outros (MARCHESI,

2008; LIMA, 2013; LIMA; CARVALHO, 2013).

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Nesse sentido, a Análise Institucional (LOURAU, 2014) nos ajuda a olhar para

este acontecimento, quando olhamos para o docente da educação superior, uma vez que

no processo de institucionalização da universidade-empresa (RODRIGUES, 2007) ou a

commoditycidade (BIANCHETTI; SGUISSARDI, 2017), sob a égide da Nova Gestão

Pública/Gerencialismo (BALL, 2005; PAULA, 2005; 2010), acredita-se que um

movimento do tipo reação em cascata vai sendo disparado e outros aspectos vão sendo

institucionalizados também, buscando consonância. Nesse aspecto, a docência no ensino

superior, enquanto instituição, está em permanente atualização, em que forças

instituintes buscam legitimação para conseguir colocar seus preceitos em

funcionamento, questionando aquilo que, por ora, se instituíra enquanto docência.

Acredita-se que é na atualização permanente da instituição, no processo de

institucionalização, que se constroem e consolidam perspectivas da docência no ensino

superior. Por ventura, no momento atual, crê-se que com a forte e acelerada

institucionalização da universidade-empresa, como já foi referido, institucionaliza-se,

acompanhadamente, uma docência no ensino superior que responda a esta lógica.

Esse processo tem fundamental relevância na produção de mal-estares docentes,

pois coloca os docentes em conflitos identitários, ou seja, suas identidades começam a

ser questionadas pelo movimento instituinte e de institucionalização da universidade-

empresa, uma vez que são necessárias atualizações, nesta direção, também para

acompanhar esta mudança. Tem-se discutido que esta instabilidade tem causado

ansiedade, excessiva irritação, estresse e falta do senso de humor por parte dos docentes

(MARTINS, 2015). Soma-se a isso os conflitos na relação com os pares que surgem

nesse cenário de extrema competição, aguçados pela lógica do modelo CAPES de

avaliação, causando também distanciamentos e isolamentos profissionais e, de acordo

com um autor, isso causa um aumento da tensão e do desânimo (MARCHESI, 2008).

Toda essa cena se amplia e agrava ainda mais o mal-estar docente com o aumento

constante das exigências, das prestações de contas, das avaliações por produtividade, ou

seja, aspectos da performatividade que acompanha a lógica gerencialista.

Essa questão dá pistas sobre como a profissionalização do docente universitário

tem sido permeada por estas constantes, complexas contraditórias mudanças – o que nos

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permite olhar um pouco melhor para esse objeto de estudo com esta natureza a partir da

dialética institucional.

Nesse sentido, muitos pesquisadores que têm se debruçado sobre o estudo da

docência no ensino superior e sobre a universidade, têm mostrado algumas

inconsistências quando se olha para os saberes docentes e para o processo de

profissionalização docente (seja durante a pós-graduação, seja durante o exercício

docente em si – após a contratação, de maneira contínua) (PIMENTA; ANASTASIOU,

2010; PIMENTA; ALMEIDA, 2011; PIMENTA, 2012).

Alguns pesquisadores destacam que a formação em pós-graduação tem

acontecido sumamente voltada para a dimensão pesquisa, com a produção de

dissertações e teses, artigos científicos, participação em eventos científicos relacionados

com o campo de pesquisa, dentre outros. Assim, a preparação para o exercício da

docência no ensino superior com sua especificidade tem ficado secundarizada,

menosprezada ou, até mesmo, inexistente durante a formação em pós-graduação. Os

poucos momentos de formação pedagógica durante a pós-graduação como mais uma

oportunidade de continuar a formação para a docência, o que daria as primeiras

pinceladas pedagógicas para a formação inicial para o exercício da docência no ensino

superior e sua especificidade, não são o bastante e precisam fundamentalmente da

formação pedagógica permanente/contínua do docente universitário, que ocorre no local

específico de atuação docente, em que as necessidades imediatas são consideradas. Isso

é trazido aqui, porque a docência no ensino superior tem sua especificidade, com seu

caráter científico, epistemológico específico, suas regras próprias, o que difere

consubstancialmente do exercício da docência para os outros níveis educacionais

(PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Isso nos permite dizer que as formações outras (licenciaturas, cursos de

complementação pedagógica, dentre outros) também vão compondo cada vez mais

especificamente os saberes da docência, mas não podemos deixar de considerar o quão

importante é a formação permanente em ação para dar o tom nos saberes docentes,

notadamente os saberes pedagógicos, devidamente relacionados com as questões

contextuais. Alguns autores já propõem que a aprendizagem docente no ensino superior

e a construção dos conhecimentos pedagógicos são mais potencializados quando

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ocorrem de maneira contextualizada e compartilha entre os pares (BOLZAN, 2009;

ISAIA et al., 2009; BOLZAN; ISAIA, 2010).

Portanto, o que acaba de ser expressado acima vem no sentido de superar o

processo instituído para a formação permanente do docente universitário, que tem

acontecido de maneira empírica, em que os professores têm baseado sua prática

pedagógica em vivências, sejam aquelas quando da observação dos pares, repetindo a

instrumentalidade do fazer pedagógico, sejam aquelas nos processos educacionais

anteriores enquanto estudantes (educação básica, ou mesmo na educação superior),

muitas das vezes fundamentados em práticas expositivas influenciadas por correntes

pedagógicas tradicionais, tecnicistas28, ou ainda, escolanovistas29, baseadas em

princípios positivistas. Além do mais, é relatado também que os docentes têm baseado

suas aprendizagens docentes na observação dos pares, na intuição e na reprodução de

práticas tradicionais já exercidas nos estabelecimentos – revelando uma perspectiva

instrumental da docência (BENEDITO et al., 1996).

Quanto à questão da formação para a docência no ensino superior, uma

pesquisadora da área faz uma discussão interessante com relação aos termos espaço,

lugar e território, para contextualizar onde se encontra a formação da docência

universitária. Apesar da polissemia, a autora toma o termo ‘espaço’ como aquilo que

porta a potencialidade de que algo aconteça, exista. Desse modo, há vários espaços.

Quanto ao termo ‘lugar’, a autora refere que se trata de um espaço preenchido, que

possui ‘endereço’, reconhecido por algo, pois seres humanos atribuíram sentido e

significado ao espaço, tornando-o lugar, este, que é ocupado por pessoas que buscam a

28 O tecnicismo foi uma das tendências pedagógicas que tomou lugar no Brasil, especialmente durante o Regime Militar, em que existia um grande investimento na formação de profissionais técnicos para ocuparem cargos de forma rápida no acelerado processo de industrialização do país. Por responder às necessidades de formação rápida, essas formações se davam de maneira instrumental, focando no desenvolvimento de carreiras e profissionais que tinham profundo domínio técnico sobre as atividades necessárias para pôr em continuidade o processo de industrialização (FARIAS et al., 2011). 29 Esse termo se refere a uma tendência pedagógica relacionada ao movimento da Nova Escola (Escola Nova), que foi iniciado por John Dewey. Este movimento se deu em um momento histórico em que seu grande questionamento eram os modelos tradicionais de ensino, em que os professores se colocavam como centro do ensino. Assim, a ênfase da Escola Nova consistia em colocar o estudante no centro da aprendizagem. Desse modo, existe uma ênfase no processo cognitivo da aprendizagem, em que o cérebro recebe a maior parte de atenção com relação à aprendizagem. Essa forma de ver o processo de ensino aprendizagem têm muitas influências nos processos educacionais nos dias atuais (FARIAS et al., 2011).

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legitimação de algo. Quanto ao termo ‘território’, a autora refere que o mesmo é

consolidado a partir do reconhecimento do jogo de poderes e forças, por meio do qual se

conseguiu instituir aquele território. Nas palavras da autora: “O espaço se transforma

em lugar quando os sujeitos que nele transitam lhe atribuem significados. O lugar se

torna território quando se explicitam os valores e dispositivos de poder de quem atribui

os significados” (CUNHA, 2008, p.185).

Maria Isabel da Cunha faz uma análise da docência universitária a partir desse

jogo conceitual espaço-lugar-território, a partir de uma pesquisa que visa mapear o que

está em movimento relacionado com a formação para a docência no ensino superior,

ressaltando em sua análise que os espaços de formação para a docência universitária são

vários e variados, sendo mais fáceis de serem localizados, os quais se relacionam com

iniciativas dos estabelecimentos tanto na formação continuada de seus professores,

como em grupos de professores que se organizam nessa direção. Também refere que a

formação em pós-graduação também pode ser um espaço de formação para a docência,

quando incluem em sua pauta disciplinas, programas, atividades, etc. que se relacionam

com a formação para a docência universitária. A autora refere, com relação ao termo

‘lugar’ de formação para a docência universitária, que este será instituído à medida que

os interlocutores que têm ocupado esses espaços comecem a atribuir-lhes sentido e

significado, legitimando sua existência e sua pertinência. No tocante do ‘território’, a

autora comenta que só se institucionalizará quando os lugares já ocupados no tempo e

no espaço, reafirmem e legitimem sua existência e pertinência, estejam fortemente

contemplados na existência das instituições, por meio de legislações, por exemplo, e

que os efeitos sejam sentidos e reconhecidos pelos seus beneficiários (CUNHA, 2008).

Vemos aqui potencialidade de olhar para essa rica produção da autora a partir da

dialética institucional, uma vez que as forças atuantes na institucionalização da

instituição ‘docência no ensino superior’ são várias e percorrem diversas e divergentes

perspectivas (segundo os pressupostos e hipóteses que baseiam as decisões e ações).

Dessa maneira, acrescemos apenas que vários espaços, vários lugares e vários territórios

podem ser institucionalizados quando se fala da docência no ensino superior, pois várias

são as forças instituintes em detrimento daquilo que está instituído. Existem forças,

como já apresentado até este ponto, que olham para a docência a partir de referenciais

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de formação dialéticos, buscando processos de profissionalização tomando a

complexidade da docência como base (seus saberes, sua formação, a construção da

identidade, dentre outros), enquanto outros olham para a docência por meio de

referenciais que visam simplificá-la de forma positivista (competências docentes,

gerencialismo, avaliação por produtos quantificáveis, prestação de contas, dentre

outros). Acreditamos que todas estas perspectivas buscam construir espaços, lugares e

territórios para a formação para a docência universitária e é no jogo da dialética

institucional que as forças instituintes, o instituído, vão atualizando a instituição

‘docência no ensino superior’ ao longo de seu processo de institucionalização.

Desse modo, acreditamos que é possível olhar para a docência no ensino

superior como uma instituição, pois tem suas lógicas próprias e suas normas de

existência. Sem dúvida, é possível perceber as contribuições das teorias e perspectivas

de olhar para a docência no ensino superior para produzir esse campo de saber.

Contudo, o diferencial desta presente pesquisa está no ineditismo da utilização da

análise institucional para produzir dados sobre a docência no ensino superior do

professor-enfermeiro, apostando em novas possibilidades de olhar os processos de

institucionalização e analisar os efeitos produzidos.

Por um lado, é notável que existem fortes tendências a manter a docência no

ensino superior em um não-lugar, ou mesmo em um lugar oculto, indiscutível, em que

bastando o título de doutor, já lhe outorgaria o direito ao exercício da docência no

ensino superior, uma docência que se faz na intuição, na observação de pares, e que é

avaliada por indicadores quantitativos por meio de inúmeras prestações de contas

demandadas pela universidade-empresa, inculcando um profissionalismo gerencialista,

uma identidade empresarial, em que os encontros para discussão da docência e

formação pedagógica ou são não incentivados, ou trabalhados numa forma instrumental,

à distância e pouco contextualizada ou relacional (INSTITUÍDO).

Por outro lado, se percebe também um desejo de implementar uma docência

pautada na cientificidade do saber pedagógico, em um exercício da docência pensado,

crítica e conscientemente, fundamentado em referenciais pedagógicos (notadamente na

teoria dialética), em que a profissionalidade se constitui enquanto um devir, em

processo, pois a aprendizagem pedagógica do docente universitário, diferente da

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docência em outros níveis educacionais, tem-se revelado enquanto um caminho que

acontece de maneira compartilhada e contextualizada (INSTITUINTE).

E, por isso, alguns autores referem a importância de olhar para o

profissionalismo docente, considerando as mais variadas perspectivas e suas mais

variadas formas, já que são maneiras de conceber e de implementar o profissionalismo

docente que estão em movimento (FLORES, 2014), ou seja, é um processo de

institucionalização do profissionalismo docente ou da docência no ensino superior, e

isto contribui para pensarmos e inscrevermos a docência no ensino superior como uma

instituição. (INSTITUCIONALIZAÇÃO-INSTITUIÇÃO)

Desse modo, a instituição “docência no ensino superior” revela suas lógicas,

seus momentos instituídos e seus momentos instituintes, em uma institucionalização que

percorre diferentes perspectivas de profissionalização, de identificação com a docência,

de aprendizagem pedagógica nas mais variadas correntes, dentre outras questões, que

vão atualizando a instituição no tempo e no espaço, ou seja, é na dinamicidade da

prática social que potencialmente se constrói a docência no ensino superior, ora

capturada por lógicas duras, ora por lógicas transformantes.

O professor-enfermeiro na encruzilhada das instituições enfermagem, saúde e

docência no ensino superior

No caso da enfermagem, esta não fora uma carreira profissional até que da

criação das escolas de enfermagem, o que, em muitos casos, acabou acontecendo nos

arredores das faculdades de medicina, com a finalidade de formar pessoal qualificado

para trabalhar em hospitais, sendo a primeira Escola Profissional de Enfermeiros e

Enfermeiras criada em 1890, no Rio de Janeiro, com vistas a melhorar a qualidade dos

hospitais militares existentes (CARVALHO; CECCIM, 2012). A institucionalização do

ensino de enfermagem no Brasil também foi impulsionada pela necessidade de controle

sanitário dos portos, pela necessidade de controle de doenças endêmicas, dentre outros

aspectos, que ansiavam por profissionais preparados nesta direção (KLETEMBERG;

SIQUEIRA, 2003).

As primeiras escolas de enfermagem geridas por enfermeiras tinham muita

preparação de seu corpo docente para atuação como formadores do corpo de

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trabalhadores enfermagem pelo Brasil, sendo o ensino o foco de atuação dos

formadores, portanto, podendo inferir que a profecia inicial da docência universitária

em enfermagem no Brasil era o ensino e formação de recursos humanos para atuarem

sobre as necessidades sociais, uma vez que religiosos estavam deixando os espaços de

caridade em saúde (KLETEMBERG; SIQUEIRA, 2003).

Foi por volta dos anos 1970-1980 que foi incentivada a pós-graduação (mestrado

e doutorado) dos docentes formadores em enfermagem, a partir de que a pós-graduação

começa a disparar e a consolidar a enfermagem como ciência no cenário nacional

(SCOCHI et al., 2013).

Vale destacar também que a formação do enfermeiro foi se consolidando ao

longo dos anos em duas modalidades de graduação: os bacharelados e as licenciaturas.

Os bacharelados formam os enfermeiros para trabalhar na assistência, na gestão e na

educação em saúde/educação para a saúde. As graduações que formam o enfermeiro

licenciado, após enfrentar alguns dilemas quanto a nomenclatura do curso, em que

alguns cursos optaram pelo nome ‘bacharelado e licenciatura em enfermagem’ com

apenas uma entrada na universidade, outros cursos o ingressante entra pelo bacharelado

e opta pela inclusão da licenciatura (ou vice-versa), dentre vários arranjos que têm sido

feitos para garantir a formação do enfermeiro licenciado (MACHADO, 2008;

CORRÊA; SORDI, 2018). Nessa direção, o enfermeiro licenciado pode atuar na

assistência, na gestão, na educação em saúde/educação para a saúde e na sua

especificidade formativa que é na docência nos cursos técnicos de nível médio, para a

formação de recursos humanos de nível médio em enfermagem (CORRÊA; SORDI,

2018).

Embora as licenciaturas formem para a docência em nível médio (obviamente

considerando a variedade pedagógico-formativa dos cursos que existem pelo Brasil) e

ofereçam alguns recursos gerais para a docência, a formação e o exercício da docência

no ensino superior (outro nível educacional) têm suas especificidades e complexidades

próprias, exigindo contínua formação e dedicação para trabalhar neste nível educacional

(RODRIGUES; MENDES SOBRINHO, 2008).

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Entretanto, são muitos os bacharéis que assumem a docência no ensino superior

(LAZZARI et al., 2015), após terem realizado uma pesquisa no mestrado e outra

pesquisa no doutorado, costumeiramente, sem estudos aprofundados da cientificidade

da docência e dos saberes pedagógicos (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Os incentivos crescem aceleradamente para a dimensão pesquisa com relação ao

professor-pesquisador enfermeiro, a não ser para a questão do desenvolvimento

profissional docente (aprendendo a ser professor), pois são poucos ou inexistentes as

políticas e os programas que focam na formação para a docência universitária (LIMA et

al., 2016), embora um estudo de 1999 tenha sinalizado que os professores já

começavam a perceber a importância da formação pedagógica e, começado a procurar

cursos de formação nesta direção (ROZENDO et al., 1999), o que já começou a ser um

indicador interessante. Entretanto, acredita-se que na busca/luta por reconhecimento

enquanto ciência, a enfermagem tem se espelhado mais em modelos cientificistas,

tecnicistas e positivistas.

Todavia, um estudo mostra como tem sido a busca pela carreira docente por

parte dos enfermeiros doutores, evidenciando argumentos relacionados com a melhoria

salarial, ascensão e maior prestígio na profissão, possibilidade de continuidade na

atividade de pesquisa já iniciada, dentre outros aspectos. O interessante é que não se

percebe a preocupação com a formação pedagógica para a docência, havendo trechos

que sinalizam inclusive que a qualificação para a docência se refere a formação stricto

sensu, mestrado e doutorado, ou ainda que sinalizam a crença na vocação para a

docência (GOMES et al., 2016).

Um recente estudo, na apresentação de seus resultados, traz alguns trechos de

falas de docentes enfermeiros em início de carreira, em que se percebe a ênfase que o

enfermeiro dá para as técnicas/estratégias de ensino aprendizagem, e os autores do

estudo também reforçam esta questão, inclusive em alguns trechos deixando perceber

que valorizam as experiências com os pares no aprimoramento do exercício da docência

(VENDRUSCOLO et al., 2018). Outro estudo afirma que os docentes enfermeiros têm

reproduzido as práticas de ensino que aprenderam com seus professores na graduação, e

ressalta a integralidade entre a formação do professor, os saberes docentes e as práticas

pedagógicas, que ao acontece de maneira dialética, favorece a formação (MADEIRA;

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LIMA, 2007). Só não podemos esquecer que as experiências não refletidas, a

reprodução de práticas de ensino a partir das vivências com os pares, e de outras

vivências originárias das formações anteriores, não são suficientes para o exercício da

docência no ensino superior, apenas são parte integrante do processo e que podem ser

mobilizadas para a educação permanente ao longo da carreira (BENEDITO et al., 1996;

PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Entretanto, um dos trechos de um estudo (VENDRUSCOLO et al., 2018) e os

resultados de outros estudos (MADEIRA; LIMA, 2010; BACKES et al., 2013) revelam

certa disposição para aprender a ser docente e entendendo-o como um ser inacabado,

ressaltando a aprendizagem docente de forma compartilhada com os pares, tal como é

referido por autores que estudam especificamente a docência no ensino superior

(BOLZAN, 2008; BOLZAN, 2009; ISAIA et al., 2009).

Contudo, em revisão integrativa da literatura sobre a docência no ensino superior

e o professor enfermeiro, alguns autores discutem que os saberes dos docentes

enfermeiros estão relacionados com o caminhar entre a especialidade da área do docente

e os saberes pedagógicos, o que demanda tanto aprofundamentos nos conhecimentos

pedagógicos, como valorizar as experiências na construção da identidade docente. As

autoras acrescentam a necessidade de intensificar os conhecimentos sobre a relação

professor-estudante, assim como a preocupação com a formação inicial e a permanente

(LAZZARI et al., 2015).

Devido à multiplicidade de tarefas que assume o professor-enfermeiro e a

pluralidade de relações que assumem para proporcionar a estrutura e a condição de

ensino-aprendizagem para os futuros profissionais, o que envolve a necessidade de se

aproximar de espaços com relações complexas como campos de estágio (professores

enfermeiros e enfermeiros assistenciais) (FORBES, 2010; FERREIRA et al., 2012) com

vários profissionais, em que as compreensões de saúde, de profissão sumamente têm se

instituído em perspectivas tradicionais, o exercício da docência na área da saúde e, mais

especificamente, da enfermagem, se complexifica ainda mais, causando inúmeras

insatisfações e adoecimentos (CORRAL-MULATO et al., 2010). Ainda nesta direção,

um estudo concluiu que a prevalência de risco para Burnout entre um grupo de

professores enfermeiros estudados foi de 94,7%, com principais indicadores

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relacionados a cansaço emocional, despersonalização e falta de realização pessoal

(BAREÑO SILVA et al., 2010).

Dentre estas inúmeras funções e atividades desempenhadas pelos professores-

enfermeiros, é indicado como estressante a quantidade excessiva de atividades, as

cobranças e mensurações dos órgãos de fomento, muitas reuniões, participação em

comissões e bancas e muito tempo de orientação, assim como dar conta da vasta carga

horária formativa e suas diversas atividades que se relacionam direta e indiretamente

com o ensino, tais como preparar avaliações, planejamentos etc. (CORRAL-MULATO,

2010; FIGUEIREDO; AFONSO, 2010).

Esse cotidiano complexo e conturbado de tomada de decisões – as mais diversas

possíveis, dentre elas pedagógicas, organizativas, de gestão etc. – é um dos elementos

indicados pelos professores como potencializadores tanto de prazer como de sofrimento

(FERREIRA et al., 2009; FIGUEIREDO; AFONSO, 2010). Nessa direção, um estudo

quantitativo, realizado em três estabelecimento do nordeste brasileiro, indicou que a

qualidade de vida dos docentes enfermeiros é, de forma geral, boa, apenas discrepando

entre os estabelecimentos quanto aos indicadores relações sociais e meio ambiente

(CONCEIÇÃO et al., 2012).

Desse modo, já consta da literatura estudo que revela que nos diversificados

contextos em que a educação superior em enfermagem se processa (acadêmico,

empresarial e misto) têm havido intensificação das atividades organizativas e didáticas,

com algumas distinções relevantes: no contexto empresarial são as atividades de ensino

que são priorizadas em detrimento das de pesquisa (desconsideradas) e de extensão; no

contexto acadêmico os docentes se concentram nas atividades de pesquisa,

administrativas e no ensino de pós-graduação, em detrimento das atividades de

graduação e de extensão (pouco valorizadas), porém os docentes apresentaram angústia

tamanhas as cobranças por produtividade de artigos e as inúmeras prestações de contas

e produções de relatórios, além do forte estímulo para a internacionalização de seus

currículos; e no contexto misto o trabalho docente contemplava de certa forma aspectos

dos dois contextos anteriores, há foco na formação de graduandos, mas também

incentivo para realização de pesquisa (obrigação), porém com pouco tempo para realizar

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todas estas atividades sendo contratados em turno parcial, o que os obrigava a levar

trabalho para casa (LEONELLO; OLIVEIRA, 2014).

Os autores concluem, de forma geral, que têm havido intensificação e

precarização do trabalho do docente universitário enfermeiro e que são precisas

mudanças que valorizem a formação para a qualidade do ensino e das condições de

trabalho docente, o que veem como tarefa complexa diante de um movimento atual que

cada vez mais coloca a universidade em perspectivas empresariais e mercadológicas.

Sugerem como caminho uma profissionalização docente que vise um processo de

transformação social, reconhecendo-se e atuando sobre as práticas didáticas,

organizativas e considerando o contexto e a estrutura universitária, onde se desenvolve

o ensino superior em enfermagem (LEONELLO; OLIVEIRA, 2014).

Em meio a este cenário conturbado, a produção da identidade docente vai se

tecendo em meio a caminhos de profissionalização que se institucionalizam e se

atualizam constantemente, em meio às forças instituintes e às forças que buscam manter

o instituído com relação à docência universitária, com relação à universidade, com

relação à educação, com relação à saúde, dentre outras instituições que atravessam a

docência. Um estudo sobre a constituição da identidade docente do professor-

enfermeiro (FERNANDES; SOUZA, 2017), com relação ao ingresso, à trajetória e à

permanência na profissão, discute que, no caso das participantes da pesquisa, a

constituição da identidade oscilou entre influências de aspectos da biografia

(notadamente destacando o ingresso para a carreira docente com pouca ou nenhuma

formação pedagógica) e aspectos atrelado às relações com os pares, em que a identidade

foi sendo espelhada no exercício docente dos pares ou modelos considerados como

exitosos, e que foi se desenvolvendo ao longo do exercício docente. Neste estudo,

também foi relatado que a formação pedagógica também possibilitou cada vez mais a

identificação com o ser professor, e a enfrentar as dificuldades. Assim, as autoras

destacam também a partir dos dados é possível dizer que a constituição identitária das

professoras-enfermeiras que participaram desta pesquisa foi processual e experienciada

de forma única por cada um, no seio da dinamicidade e complexidade que envolve a

instituição ‘docência no ensino superior’.

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Por fim, resgatamos um estudo que defende a tese de que o tipo de

desenvolvimento profissional de docentes-enfermeiros, em âmbito universitário, pode

influenciar o exercício da docência, com possível consequência para a formação dos

enfermeiros (BORBA, 2017). Aqui acrescentamos a reflexão: se o tipo de

desenvolvimento profissional docente de professores-enfermeiros universitários tem

consequências diretas sobre a formação de enfermeiros, e ao considerarmos o Estado

(lembrando também que em 1998 começa a institucionalização do Estado Neoliberal no

Brasil) como instituição e sua participação na indução dos caminhos da universidade, e

considerando que a universidade tem papel importante no desenvolvimento profissional

docente e, estes, por sua vez têm como um dos seus papéis fundamentais a formação de

profissionais – que efeitos a institucionalização do Estado Neoliberal tem tido sobre a

universidade, sobre a docência no ensino superior (nesse caso com foco no professor-

enfermeiro), sobre as concepções pedagógicas e, por consequência, sobre a formação de

profissionais enfermeiros?

Este questionamento se dá tomando por base que nas últimas décadas tinha

havido um forte investimento da sociedade brasileira para a construção da sua

Constituição Cidadã e, o caso do foco desta pesquisa, também da consolidação de seu

sistema de saúde (o Sistema Único de Saúde) – a institucionalização do SUS como já

abordado – o qual possui uma proposta em que a saúde é tomada de forma ampliada,

considerando aspectos democráticos em sua construção e consolidação, e iniciativas de

políticas e programas indutores das formações dos profissionais de saúde nessa direção.

Portanto, trata-se de uma proposta de entendimento da saúde e de trabalho em saúde

alinhado com a produção de vida em sociedade e buscando cada vez mais a participação

da sociedade na instituição saúde, que se aproxima da perspectiva da Saúde Coletiva.

Nesse sentido, outro questionamento pertinente seria como é que projetos tão

divergentes e concorrentes (o do Estado Neoliberal e o da Constituição Cidadã) estão

interferindo na constituição da universidade pública, na profissionalização docente? Que

efeitos o Estado Neoliberal tem produzido, direta e indiretamente, sobre a

profissionalização docente e sobre as concepções e práticas pedagógicas?

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As Concepções e Práticas Pedagógicas

Tem-se mostrado que os professores enfermeiros estão cada vez mais

preocupados com suas práticas pedagógicas, em que os mesmos indicam que suas

abordagens precisam de mudança e que eles precisam de formação pedagógica

permanente para acompanhar os desafios da formação de profissionais para um cenários

cada vez mais ideológica e estruturalmente diversificado no campo da formação de

atores para o exercício da enfermagem (RODRIGUES; MENDES SOBRINHO, 2008;

RODRIGUES; CONTERNO, 2009; LAZZARI et al., 2015).

Quando questionados sobre suas práticas pedagógicas e as fundamentações, os

professores enfermeiros relatam basear-se não em apenas uma teoria, mas apresentam

uma miscelânea de concepções e abordagens que estão, sobremaneira, entre aspectos

advindos do movimento da Escola Nova, do Tecnicismo e da Pedagogia Tradicional,

em que mostram preocupação com formação que se afaste cada vez mais dos

tradicionalismos e que os estudantes possam desenvolver o pensamento crítico

(RODRIGUES; MENDES SOBRINHO, 2008).

E nesse sentido, um estudo sugere que o tipo de profissionalização ou

desenvolvimento profissional docente interfere no exercício da docência (BORBA,

2017), possivelmente sobre as práticas pedagógicas, o que nos permite questionar como

as questões organizacionais da universidade interferem ou não nas escolhas pedagógicas

e na sua implementação.

Neste estudo, para se aproximar várias vezes das concepções e práticas

pedagógicas (como propusemos nos objetivos deste estudo), utilizamos diversificados

dispositivos (a serem apresentados no tópico o desenvolvimento metodológico e os

aspectos éticos atrelados). Nesse sentido, cabe destacar que a análise institucional nasce

a partir de vários movimentos de análise de práticas sociais e, notadamente, práticas

profissionais (MONCEAU, 2012). Assim, utilizaremos neste estudo as concepções e as

práticas docentes, a partir do conceito de “prática profissional” dentro da perspectiva de

análise de práticas profissionais, que considera que as práticas profissionais vão se

constituindo a partir de contínuas atualizações que elas vão sofrendo, intimamente

relacionadas às implicações profissionais que os indivíduos travam cotidianamente,

comtemplando as falas, os escritos e as ações dos indivíduos. Para tanto, é preciso

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destacar que as implicações profissionais (níveis ideológico, libidinal e organizacional)

vão se atualizando nas interações com os pares e colegas de profissão, assim como a

partir das outras instituições que atravessam determinadas práticas profissionais

(MONCEAU, 2015). Assim, neste estudo as concepções e as práticas profissionais

docentes foram se atualizando ao longo da pesquisa desde a fase de análise de papel, a

qual compôs integralmente o desenvolvimento desta pesquisa de natureza socioclínica,

até os momentos finais de restituição dos resultados e análise de implicação, por meio

de constantes provocações e reflexões que os dispositivos analíticos suscitavam.

A título de apresentação, dentre as várias concepções que foram produzidas

neste estudo, destacam-se as influenciadas pelo modelo jesuítico (Ratio Studiorum) e

também pela teoria positivista: as Tendências Tradicionais (ênfase na exposição, na

memorização etc.), as Tendências da Escola Nova (centralidade do estudante na

aprendizagem, foco no cognitivo, quase não toca na relação de classes e sua implicação

na educação), as Tendências Tecnicistas (instrumentalismo, foco na técnica,

tecnocracia, influência da Ditadura Militar); na teoria dialética: Tendência Libertadora

(teoria de Paulo Freire de libertação dos oprimidos, negação dos conteúdos da cultura

dominante), Tendência Histórico-Crítica (a importância do conhecimento

historicamente sistematizado, do movimento de síncrese e síntese, da problematização,

da produção do saber elaborado relacionado com a prática social, representado por

Dermeval Saviani) (FARIAS et al., 2011; FREIRE, 2011; 2014; SAVIANI, 2014).

A Pedagogia Institucional não apareceu nesta pesquisa, uma vez que é pouco

conhecida no local de estudo. Entretanto, ela tem focado em processos de autogestão, de

análise das implicações (ideológicas, organizacionais e libidinais) na transversalidade

do grupo, o que suscita a não-diretividade (o saber docente e o saber dos estudantes, do

grupo), a autogestão (que papel o docente e os estudantes ocupam ou tomam

emprestado na estrutura libidinal do grupo) e a análise institucional (o docente, ao

mesmo tempo, segue e serve o instituído, e provoca movimentos instituintes e está

envolto no complexo movimento de institucionalização) (LOURAU, 2014). Vemos esta

perspectiva de olhar para a pedagogia como uma instituição, no seio da dialética

institucional (instituído, forças instituintes e o processo de institucionalização), suas

atualizações constantes, em nosso ver, convida aos docentes e estudantes a não se

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filiarem a tendências e correntes pedagógicas que se fecham em si, fato que não

permitiria o movimento de atualização institucional, que não propiciaria um olhar sobre

os momentos da resistência (defensivo, ofensivo e integrativo) nesse processo e que não

consideraria a análise das implicações.

Entre a Pesquisa Qualitativa e a Pesquisa Socioclínica Institucionalista

Fazer pesquisa é algo complexo por natureza, envolvendo uma série de

elementos que vão compondo o processo e os resultados. A escolha da natureza da

pesquisa vai acontecendo e se afinando ao longo da mesma, uma vez que existe íntima

relação com a forma de olhar e construir o próprio objeto de estudo, assim como com o

aprofundamento do referencial teórico que fundamenta toda a pesquisa. Começo esta

pesquisa, então, atravessado por várias lógicas encomendadas a priori, mesmo que não

tão claras quando do início da pós-graduação, cuja ênfase se recaía na dureza e na

rigidez metodológica do ato de pesquisar ou de fazer pesquisa. Durante minha

formação, principalmente no tocante da formação como pesquisador, ainda mesmo na

graduação – como o é de praxe no estabelecimento onde me formei, várias ideologias

(com destaque maior para a ideologia positivista), em um jogo ou mistura de

concepções foram sendo pulverizadas sobre os estudantes. Com isso, no enlouquecedor

tempo de formação, com o despejo de containers e containers de informações das mais

variadas naturezas e contextos sobre os estudantes, o que é naturalizado pela lógica da

era da informação, do consumo de informações, de estar up-to-date, cada um se agarra e

se segura naquilo que lhe pareceu, visualmente, atraente e útil para gerenciar os

próximos passos encomendados pelo produtivismo acadêmico.

Desse modo, esta pesquisa começou pelo método (acreditando que por

influência da ênfase tecnicista entalhada sobre os estudantes de enfermagem durante a

formação e, talvez ainda, pela ressonância hegemônica do método científico), e com

pouca preocupação ou compromisso mais sintonizado com um referencial teórico. De

certo modo, ao implementar a pesquisa (mais pelo método que pelo referencial teórico),

senti a necessidade de buscar mais aprofundamento teórico quando algumas questões

começaram a aparecer e a convocar a atenção, especialmente no momento em que já

tinha alguns dados de transcrições, anotações de observações e alguns documentos.

Influenciado por algumas disciplinas sobre a pesquisa qualitativa com fundamentações

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estruturalistas e disseminadoras das durezas de métodos para ‘quantificar’ os dados

qualitativos, seja por meio do uso de softwares, por meio de análises frias, calculistas e

distantes – o que, a meu ver, naquele momento destoavam do que eu tinha imaginado

para uma pesquisa qualitativa.

Nesta direção, esse incômodo me motivou a buscar com mais intensidade outros

caminhos e concepções do “qualitativo” que não precisasse de tantos recortes e

bricolagens nos dados e que pudesse, realmente se ocupar de questões atreladas a uma

produção dos dados em sua riqueza contextual, dando ênfase e muita importância ao

processo de produção dos mesmos por meio de caminhos indutivos e tendo como sua

raison-d’être a busca e a valorização do significado (BOGDAN; BIKLEIN, 2013). Ou

ainda, uma busca pelo “espírito humano”, pelo estudo dos seres humanos, suas

experiências, suas organizações sociais e sociedades etc., sendo uma perspectiva

construída por meio de discursos, reformulações, explicitações, teorizações, tomando

por base testemunhos, experiências ou fenômenos, buscando uma conceptualização do

objeto de estudo, ou seja, que trate o ‘espírito humano’ na sua busca dos sentidos e

significados para conhecer, interpretar, e talvez transformar, o mundo em que habita

(PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012).

Ainda nesse caminho, fui percebendo que a grande busca da abordagem

qualitativa era pelo significado e, para tanto, seria pertinente fazer um olhar sobre o

processo de pensamento humano, uma vez que o humano tem produzido uma história,

vive e se manifesta em um dado contexto, portanto, que eram nas interações

contextuais, ou seja, em situação que se produziam os significados (PAILLÉ;

MUCCHIELLI, 2012).

Esse pensamento, portanto, me impulsionou a rever a análise de natureza

qualitativa analogamente ao movimento que a humanidade sempre implementou em sua

trajetória história que é a de produção de significados, nomear as coisas, para que

tenham, cada vez mais, sentido na sua existência (PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012).

O contexto começa a saltar aos olhos, mas, até então, apesar de sentir que estava

implementando a “coleta”, o “processamento” e a análise dos dados de maneira um

tanto rígida, metódica, técnica e “dura”, também já estava começando a sentir dois tipos

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de desconforto: por um lado, uma vontade de querer endurecer e metodologizar cada

vez mais a abordagem de pesquisa, pois de certa maneira respondia melhor à

encomenda da instituição pesquisa hegemônica no estabelecimento de ensino em que

estava vinculado e isso me incomodava muito, me sentia analisado pelos participantes a

todo momento, considerando que eles eram também pesquisadores; por outro lado, tinha

certa resistência a implementar a pesquisa de forma endurecida, rígida, já percebendo o

atravessamento positivista em algumas escolhas que tinha feito até aquele momento.

Assim, começava a se transformar o modo como estava olhando para a importância do

ser humano na produção de significados, assim como para a importância do outro e, por

consequência, do contexto, na análise qualitativa, buscando por processos em que essa

tríade “o próprio/o outro/o mundo” fosse dinamicamente considerada a todo instante

(PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012).

O que ajudou também, neste processo, foi uma fundamentação teórica baseada

nos pensamentos freireanos. Nesse sentido, o seguinte trecho me tocava profundamente

e me convidava a rever a minha práxis como pesquisador, pois o pensar “não se dá fora

dos homens, nem num homem só, nem no vazio, mas nos homens e entre os homens, e

sempre referido à realidade [...] Um pensar crítico através do qual os homens se

descobrem em situação” (FREIRE, 2014, p.140-141).

A partir de então, as entrevistas individuais, as observações individuais de cada

participante nos cenários de suas práticas, assim como a análise de planos de aulas e

planos de disciplinas, todos estes dados e formas de produzi-los começaram a ser tão

pequenos diante de meus olhos para conseguir dar conta do objeto de estudo (docência

no ensino superior e o professor-enfermeiro), que me senti no dever de buscar um

contexto muito maior e as relações dos dados, até então produzidos, com as situações

que estavam se passando no contexto universitário, no país e no âmbito internacional.

Isso significa que já começava a ampliar a importância da contextualização, uma vez

que o sentido é apreendido por meio da confrontação dos fenômenos com seus

elementos contextuais, porque os fenômenos não podem existir em si mesmos, na

concepção qualitativa de pesquisa, da mesma forma que os elementos contextuais têm

íntima relação com as referências/os referenciais que portam os indivíduos (PAILLÉ;

MUCCHIELLI, 2012).

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Desde este ponto, percebi que o processo de compreensão, ou melhor, a

abordagem compreensiva poderia acontecer de outras maneiras também, cabendo, para

tal, a definição imediata de um referencial teórico que pudesse ao mesmo tempo dar o

tom às produções de dados, às contextualizações, às análises e às interpretações, dando

sentido e significado para o objeto de estudo que, por ventura, se produziria de ali por

diante COM os participantes. Neste caminho, e não por acaso, em 2014, tinha começado

a estudar sobre a Análise Institucional, a partir dos escritos de Baremblitt (1996) e de

outros autores também.

Entretanto, foi em 2016, que senti a necessidade de me aventurar um tanto mais

no referencial da Análise Institucional, a partir de autores fundantes, tais como René

Lourau e Georges Lapassade, os quais fundamentaram os caminhos iniciais da Análise

Institucional (LOURAU, 2014; LAPASSADE, 2016).

Ainda em 2016, tive a oportunidade de discutir os dados da pesquisa produzidos

até aquele momento com Gilles Monceau, professor francês como professor visitante

junto ao grupo de pesquisa da Professora Cinira Magali Fortuna, o qual foi orientado

por René Lourau e seguidor de seus pensamentos, fazendo a proposição de um caminho

de pesquisa chamado por ele de Socioclínica (MONCEAU, 2013). Em 2017, Monceau

retorna por um período maior como professor visitante no grupo de pesquisa e, neste

período, tivemos mais possibilidades de interação e de discussão, o que me possibilitou

perceber as características da socioclínica ao longo da produção e implementação desta

pesquisa.

Não obstante, ainda em 2017, após ter sido contemplado com bolsa do Programa

de Doutorado-Sanduíche no Exterior (PDSE-CAPES – Edital n.º 19/2016 e n.º de

processo 88881.133978/2016-01), fui para a França, no período de maio a julho, junto

ao Département de Sciences de l’Éducation et de la Formation de L’Université de

Tours, sob a supervisão do professor Sébastien Pesce, no Laboratoire Éducation

Éthique et Santé (EES), em que tive a possibilidade de tomar tempo e distância do que

tinha sido feito e produzido nesta pesquisa até aquele momento, para conseguir

aprofundar no conhecimento do referencial teórico da Análise Institucional e ao mesmo

tempo conseguir provocar mudanças e transformações necessárias no modo de conceber

a pesquisa, o objeto e os caminhos trilhados.

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Estes encontros foram cruciais para a desterritorialização necessária que

colocaria em marcha transformações que estavam sendo mantidas em latência, talvez

por certa insegurança e medo de adentrar em campo (des)conhecido. A viagem provoca

um estado inicial de confusão e a sensação de se estar perdido, estimulando um intenso

processo reflexivo e formativo com relação a tudo aquilo do que é não-familiar, nos

deixando, assim, disponíveis para se espantar com o não-familiar, o que dispara um

movimento de estar disponível “à la diversité des manières de voir et d’agir au contact

de l’ailleurs” (BRETON, 2017), situação que me pareceu bem similar à sensação que

estava sentindo ao longo da produção da pesquisa em si – essas reflexões foram

fundamentais para que eu conseguisse ter mais segurança e começar a ‘expulsar’, de

certo modo e dentro dos limites da compreensão humana, algumas influências de

correntes positivistas que estavam prevalentes nas escolhas e nas produções

metodológicas da pesquisa. Nesse sentido, também acredito que a viagem se aproxime

da ideia de um retorno (PESCE, 2017), mas como um retorno, uma visita constante a

minha representação da instituição à qual ‘viajei’ – nesse caso, um retorno à

representação da instituição “pesquisa” ou do “fazer pesquisa” que veio na minha

bagagem do Brasil, e que foi se atualizando simbolicamente na heteroinscrição

(inscrição que o outro tem no coletivo), na ecoinscrição (a inscrição do

ambiente/ambiência?) e na autoinscrição (inscrição de si, de participar de certos rituais)

– sugerindo que a viagem leva em conta o outro, o ambiente e o próprio.

Ainda, nesta reflexão, para a formação permanente de mim-mesmo, com e

contra os outros sujeitos e objetos, perpassando por projetos, trajetos, rejeitos, a viagem

(o ir até e o ir com) se faz presente, associada ao acompanhamento (accompagnement)

ou interacompanhamento, no seio do encontro e das trocas que produzem as buscas

pessoais, pelo reconhecimento daquilo que foi adquirido na experiência e nas

formalidades, em nos acompanhando e aprendendo solidária e solitariamente (PINEAU,

2015). Por isso, o acompanhamento de contrapartida do “mentor” – neste caso o

professor e a equipe responsável por receber-me no intercâmbio – se assemelha a uma

vigília atenciosa que acompanha o momento oportuno no vivo para agir (CORNU,

2015).

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A partir de então, comecei um movimento de transformar a pesquisa que eu

tinha começado a fazer para conhecê-la e, de certo modo, buscando uma coerência

metodológica com o referencial institucionalista, notadamente quanto ao princípio de

transformar para conhecer (MONCEAU, 2005; LOURAU, 2014). Isso foi me deixando

mais seguro quanto a esse caminho teórico-metodológico e sua coerência para repensar

a pesquisa em andamento. Isto custou várias idas e vindas com múltiplas entradas no

comitê de ética em pesquisa com seres humanos.

Assim, ao continuar esse movimento transformativo e também os estudos sobre

a Análise Institucional, fui percebendo o quanto ele contribuiria para a construção do

objeto de pesquisa, uma vez que permitiria acessá-lo de diferentes ângulos, em muitos

jogos de ir-e-vir, em que as reflexões a partir dos dados produzidos ao longo da

pesquisa nos permitiram ir do local ao geral e vice-versa. Nesse caminho, a Análise

Institucional enquanto um conjunto de manifestações ou tendências que se ocupam, de

maneiras diferentes, da análise das “instituições” (BAREMBLITT, 1996) foi tomando

corpo e, como já referido, a socioclínica foi se tornando o caminho mais propício.

Com isso, as estratégias utilizadas para “coleta” de dados (entrevistas,

observações participantes, análise documental), as quais trouxeram uma aproximação

bastante interessante e mais densa com o cenário, aportando alguns elementos de base,

sinalizando alguns analisadores, juntamente com os quais foi possível a criação de

novos dispositivos analíticos com potencial de causar provocações cada vez mais

apuradas sobre as concepções pedagógicas do professor-universitário-enfermeiro, sobre

o uso de seu tempo, as relações com o dinheiro, com a carreira, sobre movimentos e

momentos de resistência, assim como a possibilidade de um exercício inicial sobre as

implicações, ou seja, elementos que ajudaram a compor e recompor o objeto de estudo –

a docência no ensino superior e o professor-enfermeiro. Isso começou a sinalizar outros

aspectos e a construção/reconstrução de outros dispositivos que provocariam a

instituição educação a se revelar, a falar. Todavia, foi quando da observação atenta para

se captar a dialética institucional que o salto metodológico, analítico e interpretativo se

deu.

Cabe aqui ressaltar, antes de continuarmos, uma breve contextualização do

referencial da Análise Institucional, explicitando alguns de seus conceitos utilizados

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nesta tese, pois esta corrente de pensamento tem como premissa de que nada é natural,

tudo vem de um movimento em que tudo é instituído social e historicamente

(RODRIGUES, 1994). Nesse caminho, a própria corrente de pensamento da Análise

Institucional começa a ser gestada a partir de movimentos contestatórios em relação a

como funcionavam as organizações, notadamente nos anos de 1960, em que um dos

acontecimentos mais marcantes foi o de maio de 1968 na França (RODRIGUES, 2000),

em que estudantes e trabalhadores se organizaram contra uma onda conservadora que

pairava sobre a nação.

Apenas a título de situar alguns outros pontos no mundo, por volta desse período

acontecia nos Estados Unidos a luta dos negros pela igualdade de direitos civis, em que

grupos se organizaram e fizeram importantes enfrentamentos nesta direção com

liderança de Martin Luther King Jr, inclusive este também se opôs ao truculento

enfrentamento e na ênfase militarista dos americanos, notadamente na guerra do

Vietnam, que acontecia no mesmo período. É relevante destacar também que no dia 03

de abril de 1968 fez um discurso em apoio aos grevistas de Memphis e no dia seguinte

foi assassinado (MATTOS, 2006). E no Brasil, por exemplo, o auge da Ditadura Militar,

tendo um marco importante o assassinato do estudante Edson Luís de Lima Souto em

28 de março de 1968 e a instituição do AI-5, o mais duro de todos os atos institucionais

decretado em 13 de dezembro de 1968 (BRASIL, 1968). É possível perceber os intensos

movimentos de grupos que se passaram quase que sincronizadamente no ano de 1968, o

que possivelmente chamou à atenção de estudiosos e pesquisadores sociais.

É nesse ensejo, de grande onda de protestos iniciados com manifestações

estudantis para pedir reformas educacionais, o que ganhou apoio dos trabalhadores por

meio de uma greve que estremeceu o governo do general Charles De Gaulle, que os

pensadores e idealizadores da Análise Institucional tiveram inspiração para fazer suas

análises e proposições (RODRIGUES, 2000). Nessa direção, essa corrente de

pensamento vai tomando forma e características de seus idealizadores e tem sido

classificada por estudiosos como a Análise Institucional Socioanalítica, a

Sociopsicanálise Institucional, a Esquizoanálise e a Análise Institucional de inspiração

sociológica (BARBIER, 1985a), enquanto outros, a partir das influências desta corrente

no Brasil, destacam que as principais são a Análise Institucional e a Socioanálise

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(representadas pelos pensadores René Lourau e Georges Lapassade) e a Esquizoanálise

(representada por Gilles Deleuze e Félix Guatarri) (RODRIGUES, 1994;

BAREMBLITT, 1996; RODRIGUES, 2000).

Nesta tese, nos aproximamos mais das perspectivas propostas por René Lourau e

Georges Lapassade e, nesse sentido, é salutar dizer que ambos, embora tenham

trabalhado juntos nas intervenções, Lapassade de dedica mais ao estudo dos grupos em

relação com as instituições (LAPASSADE, 2016), enquanto que Lourau defende sua

Thèse d’État, contendo as fundamentações teórico-metodológicas da Análise

Institucional, a qual foi defendida em 1969 (LOURAU, 2014)– o ano seguinte aos

acontecimentos de maio de 1968 na França.

Assim, é primordial tratar do termo ‘instituição’ e como ele foi sendo gestado no

seio da Análise Institucional. Começamos entendendo-o como algo que não se pode

apreender pela observação, pois é dependente de um dinamismo contraditório próprio

do conceito, que depende do movimento histórico e temporal que lhe é imanente. Desse

modo, instituição, organização e estabelecimento portam significados diferentes, uma

vez que os dois últimos termos, intrinsecamente relacionados ao primeiro, se reportam

às edificações, às condições materiais que dão forma material às instituições, o que por

vezes, devido às cristalizações a que estamos vulneráveis e inclinados a produzir no

cotidiano, confundimos estes conceitos como sinônimos (LOURAU, 1993;

BAREMBLITT, 1996; NASCIMENTO; SCHEINVAR, 2012). Vale ressaltar ainda que

as instituições, nessa concepção, são produtoras e produzidas em processo, uma vez que

produzem seus atores e suas condições, ao passo que ela também é produzida por eles

(FORTUNA et al., 2014a).

Ainda nesta direção, René Lourau faz uma importante contribuição para o

conceito de instituição, ao analisá-lo por meio de um movimento dialético – a dialética

institucional, revelando três momentos do conceito de instituição, sendo esta entendida

como um jogo de forças e de movimentos dinâmicos e contínuos, expressos pelo

instituído (aquilo que já possui um conjunto de normas, regras e práticas e é o que está

universalizado); pelo instituinte (forças contrárias ao instituído, que busca o fim do

instituído, sendo momentos particularizados e contestadores); e pela institucionalização

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(um processo dinâmico, constante e intenso do dialético embate instituído-instituinte),

por meio da qual as instituições vão se atualizando (LOURAU, 2014).

No entanto, um pensador da área destaca ainda dois momentos da

institucionalização, enfatizando suas características relacionadas com a temporalidade, a

historicidade e com a duração, uma que se desenvolve logo e imediatamente após a

instituição ter sido fundada, buscando instaurar as normas e regras para perenizar essa

instituição, chamada de institucionalização fundadora, e outra que se segue a partir dos

contínuos movimentos dialéticos instituído-instituinte, a institucionalização

ordinária/permanente que vai aportando à instituição atualizações para suas novas

características. Isso se deve porque a institucionalização tem raízes processuais

intimamente interagindo tanto na dimensão teórica como na dimensão social, em que as

atualizações das instituições resguardam características das instituições originárias e

portam as justificativas que embasam e fundamentam ‘as instituições atualizadas’

(SAVOYE, 2007).

Essa dialética em tríade (instituído-instituinte-institucionalização), se diferindo

da dialética marxista dualista, ofereceram o contexto e as bases para a produção dos

dados, das análises e das interpretações nesta pesquisa tão logo passaram a compor a

alma desta pesquisa, permitindo uma ressignificação da pesquisa, especialmente quando

do retorno do intercâmbio na França.

Nessa direção e com essa preparação, começaram-se as revisões, os

aprofundamentos e a implementação da vertente socioclínica nesta pesquisa, com mais

clareza de que era este o caminho sendo trilhado a partir de 2017. A socioclínica foi

pensada a partir da socioanálise, elaborada por Gilles Monceau (MONCEAU, 2013),

para as intervenções que perduram por mais tempo – como é o caso desta pesquisa

(2015-2018), por exemplo.

Portanto, tendo um movimento de transformação dos meus pensamentos em

relação à instituição pesquisa e tendo trabalhado alguns conceitos da análise

institucional, me aventurei a prosseguir a pesquisa (já em andamento) com um enfoque

socioclínico, bastando para tal dar o tom teórico-metodológico pertinente. Nessa

direção, foi fundamental o texto de Fablet, pois a partir dele foi possível elucidar a ideia

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de socioclínica como uma vertente de pesquisa que utiliza diversificadas técnicas de

produção de dados, assim como diversificados modos de restituir os resultados em

encontros com os participantes. Ainda, no caso da instituição educação, a socioclínica

proporciona maneiras de apreensão das práticas educativas que resguardam a

especificidade das organizações e dos estabelecimentos estudados. Desse modo, os

dados produzidos com os participantes por meio das diversificadas técnicas (entrevistas,

observações e documentos) são organizados e apresentados em restituições.

Adicionalmente, o diário de pesquisa, do tipo de um diário de bordo, é uma ferramenta

muito importante ao longo de todo o processo investigativo. Desse modo, as variadas

maneiras como os participantes dão significação às suas ações na mesma organização

e/ou estabelecimento, seja por meio de discursos, escritos e nas atuações coletivas, torna

possível reconstituir as formas de funcionamento do estabelecimento e suas práticas

específicas (FABLET, 2004).

Fica evidente, então, a importância da construção de um dispositivo de pesquisa

composto por várias estratégias de produção de dados, análise e interpretação e

restituição, coerentes com a proposta da socioclínica. O dispositivo desta pesquisa foi

explorado no tópico ‘percurso metodológico, analítico e produção dos dados’.

Na continuidade, é fundamental explorar as características mais específicas da

socioclínica, as quais foram construídas a partir das características fundantes da Análise

Institucional, quais sejam: análise da encomenda e da demanda, autogestão da

intervenção, regra do tudo dizer ou da livre expressão, elucidação da transversalidade,

análise das implicações do pesquisador-praticante, construção ou elucidação dos

analisadores (MONCEAU, 2013; 2017). Nesse caminho, um pesquisador da análise

institucional (MONCEAU, 2013) propõe oito características para as abordagens

socioclínica:

“análise da encomenda e das demandas, participação dos sujeitos no

dispositivo, trabalho dos analisadores, análise das transformações que

ocorrem à medida que o trabalho avança, aplicação de modalidades de

restituição, trabalho das implicações primárias e secundárias, intenção da

produção de conhecimentos, atenção aos contextos e às interferências

institucionais” (p.93).

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Quanto à análise da encomenda e das demandas, é preciso fazê-las no seio do

coletivo de onde emanou a encomenda, a qual parte de um diagnóstico feito por quem

encomendou a análise. Com relação às demandas, estas vão sendo desveladas ao longo

do processo investigativo (MONCEAU, 2013). Nesta pesquisa, a encomenda não

necessariamente foi feita diretamente por um estabelecimento, mas foi feita. Ou seja, ao

me formar em enfermagem com licenciatura e ter sido exposto a uma diversidade de

situações educativas, textos da área da educação e ao vivenciar as dificuldades e dilemas

que a maioria dos meus professores apresentavam quanto ao “ser docente no ensino

superior e, muitas vezes, sem ter formação para a docência”, tudo isso foi muito

convidativo para explorar essa dimensão pedagógica do trabalho do professor-

enfermeiro, algo que não é muito atraente para uma pesquisa, algo que se encontra

dificuldade para publicar, notadamente na perspectiva hegemônica instituída de

universidade. Nesse sentido, a encomenda começou a se consolidar por este caminho,

despertando dentro de mim o desejo de problematizar um pouco mais o “ser docente-

enfermeiro na universidade e na enfermagem”.

Entretanto, é relevante dizer, sobretudo, que havia uma encomenda quanto a

fazer pesquisa, uma vez que o cenário de formação, em que estava inserido exalava

pesquisa, o fazer pesquisa e isso me foi contagiando e convidando para sair diretamente

da graduação e entrar no doutorado direto – a encomenda do “fazer pesquisa” e “tornar-

se pesquisador” sempre existiu indiretamente. Isso só fica claro com a análise de minha

implicação (isso foi mais bem explorado no tópico análise de minha implicação), ao me

reconhecer, metaforicamente, como “filho do produtivismo acadêmico”.

No tocante desta pesquisa, a análise de encomenda começa sutilmente a partir do

que chamo de “dispositivo do encontro sem objetivo explícito”. Neste encontro, quando

não é explicitado nem o objetivo do encontro e nem o objetivo da pesquisa,

simplesmente os participantes são convidados para fazerem uma leitura flutuante dos

quadros com ainda dados brutos, os mesmos começam a questionar a que responde esta

pesquisa, qual seria o objetivo da pesquisa, que caminho se espera para que os

participantes discutam os dados brutos, dentre outros (isto está mais bem explicado no

sexto dispositivo). Nesse sentido, a encomenda começa a ser buscada e se tornou

primordial para a continuidade da pesquisa. Entretanto, não se pode dizer que ela

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chegou a se explicitar tão claramente no grupo. Acredito que os próprios dados

produzidos falam por si só a respeito da encomenda indireta desta pesquisa, ou mesmo

da não proposição direta de encomendas como a desta pesquisa, uma vez que esta se

inscreve num lugar que não é atraente para a perspectiva hegemônica instituída com

relação à instituição pesquisa e à instituição docência no ensino superior em

enfermagem.

Ao se remeter à participação dos sujeitos no dispositivo de pesquisa, é inegável

que são consubstancialmente presentes desde o momento de concepção e

implementação da pesquisa, uma vez que foram também formadores ao longo de meu

processo formativo como enfermeiro licenciado, o que provocou certos

encaminhamentos, enquadramentos e escolhas para o processo participativo e a

construção do dispositivo de pesquisa em si. Ainda, o pesquisador destaca que há

inúmeras formas de se participar em uma pesquisa, traduzida em diversos modos

participativos, desde deixar-se ser entrevistado, ser observado e mobilizar-se para

sessões de grupos (MONCEAU, 2013). O autor ressalta também a negação à

participação como uma forma de participação, pois parte de implicações outras dos

participantes e inclusive do próprio pesquisador. Vê-se a não-participação como uma

forma de participação e que produz dados sobre o contexto e sobre as implicações

também, desde que isto componha o corpus da pesquisa, o que é primordial nas

perspectivas institucionalistas.

Nesta pesquisa, a participação vai se constituindo, partindo de modalidades do

tipo “ser entrevistado”, “ser observado”, “ofereço planos de disciplinas e de aula” para

participações em grupos de reflexão e de discussão dos dados produzidos. Ainda,

quando iniciados os grupos, a participação se intensifica um tanto mais quando os

participantes começam também a analisar o próprio dispositivo de pesquisa, o processo

de produção de conhecimentos, o propósito da pesquisa, e as possibilidades de utilizar

os resultados desta pesquisa para fundamentar as argumentações quando da participação

em outros colegiados decisores, ou seja, reafirmando a intenção de produção de

conhecimentos para determinados fins nascida no cerne do grupo como uma demanda.

Isto mostra, como se interpenetram as características da socioclínica, por exemplo, a

análise de encomenda e de demanda, a participação, intenção de produção de

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conhecimentos, perpassando pela análise de implicação, dentre outros, num intenso jogo

de interações entre si.

Quando os participantes começam outras modalidades de participação, como

referido, foi possível identificar analisadores que saltavam aos olhos quando do

encontro, os quais foram utilizados para aprofundar na análise da instituição “docência

no ensino superior e o professor-enfermeiro”. O dispositivo do “encontro sem objetivo

explícito” foi um grande disparador para que os analisadores pudessem ser percebidos e

posteriormente utilizados, assim como o dispositivo da viagem o fez. Desse modo, foi

possível a partir do encontro 2 (2.1 e 2.2), o trabalho com os analisadores que

apareceram e apoiaram no aprofundamento da análise da instituição “docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro”. Os analisadores que foram se desvelando

como potentes estimuladores para que a instituição docência no ensino superior pudesse

se colocar, sair da penumbra, e tomar corpo no seio do grupo e das análises realizadas

foram: a relação tempo-dinheiro como analisador, concepções pedagógicas como

analisador, e resistência como analisador. Todos estes analisadores servindo à tarefa de

fazer a instituição “docência no ensino superior e o professor-enfermeiro” falar e se

desnudar para que seus modos de existência e de organização pudessem ser

apercebidos.

Nesse caminho, cabe destacar que na Análise Institucional, o analisador é um

dispositivo potente que é capaz de fazer as instituições falarem, expressarem suas regras

próprias, seus modos de organização, suas contradições, no seio da dialética

institucional (o instituído, o instituinte e a institucionalização). Inclusive o efeito

analisador sobre a pesquisa pode ser assim descrito como uma maneira de se questionar

o sentido da pesquisa em si, o que significa que os dispositivos de pesquisas também

são colocados sob análise e produz dados que informam os caminhos e desvelam

concepções prévias implícitas (MONCEAU, 2013; 2017). Exemplos de dispositivos

analíticos que se tornaram analisadores de si mesmos e que deram indícios no sentido de

produção de dados nesta pesquisa foram o “convite” e o “encontro sem objetivo

explícito”.

Nesse sentido, a utilização de diversas modalidades de restituição foi crucial

para propiciar vários ângulos e perspectivas de se olhar e reolhar os dados produzidos.

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As restituições são utilizadas para proporcionar momentos em que os participantes

podem refletir sobre o que foi produzido, o que produz outras significações, sensos e

sentidos, inclusive sobre o próprio dispositivo de pesquisa (MONCEAU, 2013).

As restituições, nesta pesquisa, começaram ao final das observações

participantes, em que podíamos repassar algumas questões sobre o que tinha sido

observado, o que produzia outros dados complementares ao que havia sido observado

junto ao participante. Na sequência, a restituição individual dos quadros construídos

com os dados organizados em temas (e reorganizados em temas relacionados com

elementos emancipatórios e temas relacionados com situações-limite (DECKER, 2010;

FREIRE, 2014; 2016)), também foi muito intensa quanto a aprofundamentos na

intenção da produção de dados complementares e mais atualizados (conhecimentos

novos) com relação aos produzidos pelos dispositivos anteriormente utilizados, ou seja,

de certo modo provocou atualização também nas implicações dos participantes e do

próprio pesquisador. As restituições coletivas foram importantes para que alguns outros

aspectos aparecessem, inicialmente, na forma de denúncia da condição docente, assim

como o trabalho com as contradições e maneiras de resistência diferentes, na dialética

da resistência em seus momentos defensivo, ofensivo e integrativo (MONCEAU,

1997a; b). Nas restituições também ficou evidente uma demanda do grupo em relação às

expectativas de utilizarem os resultados desta pesquisa para fundamentarem suas

argumentações nos coletivos maiores, o que nos desafiava na aventurosa intenção de

produção de conhecimentos que pudessem subsidiar o grupo nas tomadas de decisão e

enfrentamentos com relação à docência no ensino superior.

A análise de implicação surge como uma demanda do grupo também quanto ao

dispositivo de pesquisa sendo utilizado para produção de dados e para análises, desde o

encontro 1 e renasce no encontro 2.2. A análise de implicação em suas dimensões

libidinal, organizacional e ideológica, inclusive sua abordagem de implicações

primárias e secundárias, ambas serão exploradas de forma mais abrangente nos tópicos

análise de minha implicação e análise de implicação nesta pesquisa (resultados). As

implicações ajudaram a permear as origens e tramas dos pensamentos, ações e atitudes

que os participantes e o pesquisador foram tecendo ao longo desta pesquisa, assim como

sinalizando outras instituições atravessantes.

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Por fim, é na observação e consideração dos contextos e interferências

institucionais que o salto analítico e interpretativo se produz, em que os efeitos dos

encontros produzem transformações e conhecimentos (MONCEAU, 2013), que por

meio do artifício da escrita, foi possível fazer a recomposição dos dados produzidos e

organizados para serem apresentados nesta tese.

Percurso metodológico, analítico e produção dos dados

O desenvolvimento metodológico e os aspectos éticos atrelados

Como se verá, o desenvolvimento metodológico será apresentado a partir dos

dispositivos analíticos que foram sendo construídos/produzidos ao longo de todo o

processo investigativo e de forma articulada tanto com o referencial teórico quanto com

sua maneira de produção de dados, uma vez que em pesquisas com intervenção, aquelas

entendidas enquanto um estar entre, inter-vir na produção dos dados, dos dispositivos

analíticos, das análises e das interpretações, pesquisador e pesquisandos se produzem e

se constituem ao longo da dinamicidade do processo investigativo (BARROS, 1994),

inclusive os momentos de observação e de intervenção acontecem concomitantemente,

ou seja, observar também é intervir, e que a intervenção e a produção de saberes

também acontecem ao mesmo tempo (NASCIMENTO; SCHEINVAR, 2008), segundo

os princípios da análise institucional.

Nessa direção, expressa-se que será utilizado o conceito de dispositivo analítico,

no sentido de compreender que na pesquisa socioclínica a análise é ampliada, buscando

tanto analisar os f atos e relações produzidos no coletivo como também analisar os

dispositivos utilizados para produção desses dados e os efeitos que emergem durante o

processo, ou seja, os processos analíticos também são provocados a partir do dispositivo

analítico elaborado (FORTUNA et al., 2014a).

Por meio desses dispositivos analíticos construídos para esta pesquisa

socioclínica, visou-se contribuir para um processo reflexivo sobre as ações, atitudes e

concepções dos docentes-enfermeiros, ao mesmo tempo em que elas eram

transformadas e produzidas pelos participantes, uma vez que, em pesquisas socioclínica,

os participantes são convidados a continuamente reelaborar os sentidos que conferem as

suas ações, atitudes e concepções, pois esta modalidade de pesquisa transforma os fatos

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para conhecê-los, expressando sua natureza de intervenção nas práticas, relações e

concepções (MONCEAU, 2005; FORTUNA et al., 2014a).

O leitor vai notar também que essa pesquisa sai de um lugar em que tudo é

pensado e elaborado a priori, para outras formas de produzir a pesquisas, em que a

dinamicidade, a criatividade e a espontaneidade do inédito e do espanto, foram

produzindo dados, reflexões e encaminhamentos para se pensar nos dispositivos

analíticos, inclusive provocando análises dos dispositivos implementados na produção

de dados e análises da encomenda e da demanda, em que vários momentos foram de

visitar os objetivos da pesquisa e ao mesmo tempo de produzir expectativas sobre os

resultados da pesquisa, notadamente nos espaços de restituição coletiva. Essa questão de

não seguir padrões, protocolos, passo-a-passo’s etc. é uma característica fundamental

das pesquisas socioclínica, inclusive podendo propiciar a criação de novos modos de se

pesquisar (FORTUNA et al., 2014a), buscando sair das reproduções e das mesmices

cíclicas.

Por isso, essa pesquisa tem momentos em que se processa com mais clareza uma

análise a partir de entrevistas, de observações e de análises documentais (planos de

aulas, de disciplinas, programas de disciplinas), o que é chamado de análise de papel

(LOURAU, 2014). Nesse sentido, acreditamos que esse momento de entrevistas,

observações e análise de planos de aulas e de disciplinas se assemelha tanto àquilo que

foi proposto enquanto análise de papel (LOURAU, 2014), como também da pesquisa

socioclínica, uma vez que a partir dela outros processos e dispositivos foram sendo

criados e recriados, com notável papel de intervenção desde as perguntas feitas na

entrevista, nos momentos de observação e sobre os documentos, os quais produziram

efeitos durante todo o percurso desta pesquisa.

Ainda, o leitor perceberá que existe uma iniciativa analítica própria durante a

apresentação dos dispositivos analíticos, acompanhados de reflexões sobre algumas

implicações e resultados produzidos a partir destes dispositivos. Alguns destes

resultados estarão apresentados ao longo do tópico resultados e discussão, outros estarão

apresentados aqui neste tópico. Sendo assim, começaremos a apresentar os dispositivos

analíticos produzidos nesta pesquisa.

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O primeiro dispositivo consistiu no uso da imersão no cenário de pesquisa e do

diário de pesquisa, o qual foi utilizado ao longo de toda a pesquisa para registro de

experiências e de reflexões a partir da imersão no campo de intervenção, cujas

anotações contribuíram sobremaneira para a produção cada vez mais elaborada dos

dados nesta pesquisa. É importante destacar que durante a fase de análise de papel, o

diário de pesquisa foi utilizado para a anotação e descrição das observações diretas dos

participantes da pesquisa. Outras observações, experiências e reflexões com relação ao

estabelecimento (principal cenário da pesquisa), com relação às instituições, com

relação às implicações e aos analisadores foram sendo feitas e anotadas para

complementar e dar o tom à continuidade do processo de produção de dados. Isso foi

possível por meio da “inter-venção” no cenário e imersão constante em múltiplos

espaços de decisão, os quais contribuíram com reflexões que produziram

aprofundamentos na análise e interpretação dos dados.

Nessa direção, o dispositivo diário de pesquisa, utilizado nesta pesquisa, se

aproximou de uma abordagem na qual o pesquisador escreveu sobre algo vivenciado em

um dado contexto sócio-histórico, permeado por suas implicações e pelos

atravessamentos institucionais, cujas anotações e trechos tiveram o intuito de restituição

escrita aos participantes (LOURAU, 1993; 2004b), inclusive os trechos foram

articulados com a produção do quarto dispositivo desta pesquisa, com restituições

individuais e coletivas, denotando também seu potencial de intervenção (HESS, 1988).

O segundo dispositivo provocador desta pesquisa, tratou-se do próprio convite

estendido a todos os professores-pesquisadores-enfermeiros do estabelecimento

escolhido (um estabelecimento de nível superior formador em enfermagem no Brasil).

Convidar professores-pesquisadores-enfermeiros de um renomado estabelecimento, cuja

encomenda atual é depositar seus esforços na produção de conhecimentos e atender à

encomenda hegemônica nacional do que é pesquisa e do que é produção de

conhecimentos, para participarem de uma pesquisa cujo objeto são suas concepções

pedagógicas, ou seja, um interesse contra-hegemônico, foi um dispositivo-termômetro

para se perceber o quanto a temática da docência afetava ou não o grupo de docentes e

seus interesses, deveres e responsabilidades dentro do estabelecimento formativo

(formativo tanto no sentido da profissão de enfermagem, como no da profissão de

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pesquisador). Desse modo, dos 106 docentes então vinculados ao centro formador,

foram convidados no dia 26 de fevereiro de 2015 para participar desta pesquisa apenas

84 que eram enfermeiros de formação, dos quais responderam apenas 22 professores e,

destes, responderam afirmativamente apenas 14, entre contato por e-mail e comunicados

a partir dos encontros pelos corredores do cenário de estudo (atualmente, o número de

docentes caiu para 88 – 2018). A partir das respostas afirmativas e já tendo o projeto

anteriormente aprovado pelo comitê de ética em pesquisa com seres humanos sob

parecer n.º 2.144.477 e C. A. A. E. n.º 37750214.9.0000.5393, dúvidas foram surgindo e

muitos movimentos com o comitê de ética foram sendo estabelecidos. Uma delas, por

exemplo, consistiu em saber se ao estar em um espaço (como uma unidade de saúde)

para observar um professor que acompanhava seus estudantes em estágio e, nesse caso,

o professor não é trabalhador do referido local e também os dados produzidos não se

referem diretamente ao local senão que às concepções pedagógicas dos professores

participantes – isso me gerou um pouco de ansiedade quanto a estar dentro dos preceitos

éticos e me motivou a buscar orientações com especialistas e técnicos que trabalhavam

no comitê de ética em pesquisa, sendo, desse modo, entendido que eu precisaria apenas

de uma anuência do responsável pelo local onde eu estaria desenvolvendo as

observações com os professores. Entretanto, é muito importante destacar que o

dispositivo convite, emana de uma encomenda que, por ventura, se manteve

implicitamente nas fundamentações iniciais desta pesquisa por um bom tempo do

percurso investigativo. Isto está mais elaborado no tópico análise de implicação nesta

pesquisa.

Nesse sentido, a partir dos dispositivos 1 e 2, o terceiro dispositivo foi

construído, então, por meio de entrevistas, observações participantes e análise

documental, o que chamaremos de momentos de análise de papel. Utilizou-se a sigla P

para representar os professores participantes deste momento da pesquisa e um número

referente à sequência e data de resposta afirmativa quanto à participação neste projeto

(P01, P02, P03, P04, P05, P06, P07, P08, P09, P10, P11, P12, P13).

As entrevistas foram utilizadas para, pelo menos, dois propósitos: o primeiro

consistiu em buscar uma aproximação às concepções pedagógicas por meio de

perguntas que abordavam, de forma geral, temas relacionados à docência, com potencial

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de disparar explicações sobre as escolhas pedagógicas, referenciais pedagógicos que

começaram a dar o tom às concepções pedagógicas de cada participante; o segundo

propósito foi disparar reflexões sobre as concepções pedagógicas no grupo participante,

colocando-os, possivelmente, em movimento de pensar sobre suas práticas pedagógicas,

buscando suas justificativas às escolhas feitas até aquele momento. As questões

utilizadas estão no APÊNDICE 1. O período em que as entrevistas foram realizadas

compreendeu de 10 de abril de 2015 a 22 de setembro de 2015 e totalizaram 10 horas e

13 minutos de áudio transcrito. Foram entrevistados 13 dos 14 participantes que

responderam afirmativamente para participarem desta pesquisa, em local escolhido por

cada participante e tendo a duração média de cada uma das entrevistas por volta de

47,15 minutos. Um dos participantes desistiu antes da entrevista.

As observações ocorreram no período de 31 de março de 2015 a 22 de junho de

2016, perpassando diversificadas situações de ensino-aprendizagem, totalizando

aproximadamente 104 horas de observação. Destas 43% foram realizadas em momentos

de discussão em pequenos grupos; 21% em imersões (parte do ciclo pedagógico30); 15%

em estágios; 12% em aulas expositivas; 6% em laboratórios; e 3% em aulas expositivo-

dialogadas. Mais especificamente, os cenários de observação consistiram em unidades

de saúde da família (USF), maternidade, hospitais, escola de nível médio, centros

especializados, além das dependências do próprio local de estudo. Para cada

participante, houve em média observação de três situações entre momentos em sala de

aula, momentos em estágios/imersões e momentos em laboratório, respeitando as

configurações das disciplinas em que os docentes lecionavam. As observações não

necessariamente se faziam na mesma disciplina de cada participante, podendo ser em

disciplinas de graduação diferentes em que estivesse lecionando naquele momento. Os

acertos quanto às datas, aos horários e aos locais das observações se fizeram pela

negociação entre participantes e pesquisador. As observações sempre me provocaram

reflexões no sentido da própria compreensão do que é a observação. Nesse sentido,

busquei me aproximar mais de uma perspectiva que considera a observação como um

momento “inter-venção”, ou seja, de estar entre e, portanto, atuando conjuntamente e

30 O ciclo pedagógico é um método de ensino-aprendizagem baseado nas pedagogias críticas e dialéticas, em que se aproveitam as experiências na realidade, as reflexões sobre elas, suas problematizações e potencialidades de transformações devido à inserção na prática social. Este método será explicado melhor no tópico de apresentação do local de estudo.

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me reconhecendo também na produção dos dados. Nessa direção, em muitos momentos

oportunos, foram utilizadas questões para ajudar a aclarar o que estava sendo feito, a

finalidade dos usos de alguma estratégia ou outra, sendo isso mobilizador de reflexões e

interferências no objeto de análise. Destaco que a própria presença nos momentos de

observação, mesmo que em situações de poucas interações diretas com os participantes

também é causadora de produções outras diferentes dos momentos de não-observação.

Desse modo, esta reflexão me apoiou a ter consciência de que não há como não intervir

no observado e que o dado produzido nasce do conjunto de “inter-venções” que se

passaram na situação observada. O quadro a seguir especifica melhor o tipo de situações

observadas durante este dispositivo analítico:

Gráfico 1 - Porcentagem de observações por tipo de situação observada

Contudo, é relevante destacar que, por um lado, o peso que as lógicas duras de

pesquisa têm sobre nós (aprendizes de pesquisadores), nos provocando posturas,

pensamentos e ações no “fazer” da pesquisa, em determinados momentos, nos deixa

imobilizados e angustiados no receio de estar produzindo dados sem uma formatação

desejada e desejável pela instituição hegemônica de pesquisa fortemente instituída no

cenário de estudo. Por outro lado, nos provoca certa busca por referenciais que ajudam a

desvelar as implicações do pesquisador, notadamente as implicações primárias e

secundárias (MONCEAU, 2008), e nos revela a necessidade de questionar as

encomendas implícitas, inclusive as de produção de escritas que respondem a

determinadas lógicas, causando efeitos, tal como o efeito Goody, pelo qual a escrita

43%

21%

15%

3%

12%

6%

Situações Observadas

Discussão em pequenos grupos

Imersões (ciclo pedagógico)

Estágio

Aula expositivo-dialogada

Aula expositiva

Laboratório de Prática

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pode encomendar o caminho, a análise e a produção dos dados nas pesquisas

(SAMSON, 2013). Estar atento a estas questões foi se tornando uma premissa ao longo

deste processo investigativo.

A análise documental, no momento de análise de papel, se baseou nos seguintes

pressupostos: análise preliminar, em que se analisou o contexto dos documentos, os

autores, sua autenticidade e confiabilidade, a natureza e lógica interna do texto, assim

como seus conceitos-chave; e a análise propriamente dita que buscou elementos que

contribuíssem para o corpus da pesquisa (CELLARD, 2017), tendo como base as

perguntas e dispositivos deste estudo, ao longo dos momentos analíticos (PAILLÉ;

MUCCHIELLI, 2012), que serão apresentados mais adiante. Neste sentido, neste

momento, os documentos analisados consistiram em planos de aula, planos de

disciplinas, programas de disciplina disponibilizados online (de livre acesso público),

anotações em cadernos, troca de e-mails com pares, diapositivos (slides). Os

documentos foram impressos e a abordagem de análise escolhida foi implementada. Na

etapa de análise, foram destacados trechos convergentes e divergentes, o quais foram

agrupados e contrastados durante a produção dos quadros analíticos individuais

(dispositivo 4). Os documentos eram cedidos pelos docentes quando dos momentos de

observações, ou por e-mail ou em outros momentos referidos pelos participantes.

Foram analisados 63 documentos ao todo, incluídos os novos documentos

analisados também e explicados no sétimo dispositivo analítico, e um quadro contendo-

os está no APÊNDICE 11. Ao longo do texto, a referência aos documentos será feita

pela sigla DOC, seguido do número do documento segundo a sequência do quadro.

O quarto dispositivo foi construído a partir de uma organização e análise iniciais

do material produzido com os participantes no momento de análise de papel

(entrevistas, observações e análise de documentos), tendo-se escolhido para

apresentação deste material a construção de quadros analíticos individuais (exemplo no

APÊNDICE 5). Os quadros construídos foram dois para cada participante: um contendo

uma apresentação dos temas convergentes (chamados provocativamente de elementos

emancipatórios, uma vez que durante as entrevistas os participantes falavam de

educação emancipatória, problematização, educação crítica para a emancipação, Paulo

Freire, dentre outros) e outro contendo temas divergentes (chamados provocativamente

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de situações-limites, pelo mesmo motivo), cuja análise buscou fundamentar-se,

portanto, na categoria emancipação de Freire (DECKER, 2010; FREIRE, 2014; 2016) e

também no conceito de situações-limites (FREIRE, 2014). Este material foi utilizado

como mais um dispositivo analítico e provocador de reflexões, pois foi feita uma

restituição individual com cada participante, momento em que se pôde produzir novos

dados. A ideia foi a de iniciar uma análise individual com os participantes, mas não

avançamos muito nesta direção nesse momento. Alguns participantes disseram, por

exemplo, "nós não vamos analisar os dados por você. Não dispomos desse tempo” P03

– fala de professora anotada em diário de pesquisa ao final de um momento de

observação, embora o convite tenha sido o de analisar com (‘comigo’ nesse primeiro

momento).

Como esse conjunto de dois quadros do quarto dispositivo foi entregue

individualmente para cada participante, impresso (e em alguns casos em formato .pdf

por e-mail), o dispositivo também disparou algumas reflexões, inclusive sobre o

conteúdo dos trechos de falas que haviam sido ditas nas entrevistas. Em alguns casos, os

participantes reescreveram os trechos, destacando um avanço reflexivo no sentido de

obter maior aproximação com concepções pedagógicas emancipatórias, ou mesmo,

justificando falas e trechos, ou ainda, refutando trechos de fala e ressignificando-os,

contextualizando-os. Outros utilizaram este momento como momentos de trocas sobre

pontos que estavam em reflexão quanto às concepções pedagógicas. A partir deste

dispositivo, foram sendo feitas reflexões e anotações complementares no diário de

pesquisa, integrando mais elementos constitutivos do objeto de pesquisa – a docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro.

O quinto dispositivo foi a viagem (Programa de Doutorado-Sanduíche no

Exterior da PDSE/CAPES – Edital n.º 19/2016 e n.º de processo 88881.133978/2016-

01). A viagem no sentido abordado por estes autores, os que me receberam no

intercâmbio é, ao mesmo tempo, provocadora de mudanças e também de

desterritorialização, ou seja, um convite a sair do lugar, numa busca de conhecer-se a si

mesmo a partir do ‘espanto’ causado quando mergulhado naquilo que difere do próprio,

sendo ao mesmo tempo parte integrante do processo desvelador do próprio. Este

dispositivo auxiliou no mergulho nas implicações como pessoa, como pesquisador e na

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produção dos caminhos da pesquisa e dos dados. O distanciamento do cenário de

estudos e, por certo momento, dos dados produzidos, ao mesmo tempo que envolto pelo

espanto causado pelo l’ailleurs (BRETON, 2017), foram um convite a olhar para a

pesquisa a partir de outro ponto de vista. O modo de fazer pesquisa, de ser e estar na

vida acadêmica e na sociedade francesa, certamente, contribuiu para que se pudesse

olhar para os propósitos, os procedimentos, referenciais e análises implementados até

este momento de outras maneiras, provocando o desejo de reconhecimento de que os

caminhos traçados estavam em consonância com a socioclínica institucional, que era

uma das peças que estavam faltando para essa tomada de decisão. Me aproximar do

conceito de ‘accompagnement’ foi o objetivo primário desta viagem, uma vez que os

dados da fase de análise de papel sinalizavam fortemente para o acompanhamento dos

estudantes ao longo do processo de ensino aprendizagem. Entretanto, o potencial

transformador da viagem foi encaminhando para um olhar mais abrangente sobre os

dados, colocando em evidência a questão do tempo, permitindo reolhares nesta direção.

Ao regressar ao Brasil, trouxe ideias para a continuidade que apenas conseguira

‘maturar’ quando da segunda desterritorialização causada pelo dispositivo 6.

O sexto dispositivo foi o “encontro sem objetivo explícito”. Este dispositivo se

constituiu espontaneamente dessa maneira impulsionado pelo movimento de

desterritorialização causado pelo dispositivo viagem. Foi um exercício de afastamento

dos dados e ao mesmo tempo de aproximação com os dados, que causou certa sensação

de segurança em relação ao domínio analítico e interpretativo dos dados produzidos, o

que sustentou uma semissegurança/semiconfiança para lançar esse primeiro encontro

com os participantes. Mesmo diante da explicitação de alguns participantes de que não

iriam analisar os dados brutos, esse dispositivo foi ousado no sentido de buscar um

movimento analítico dos dados brutos junto com os mesmos. Entretanto, o objetivo e a

proposta do encontro não estavam claros o suficiente para os participantes e, de certo

modo, para mim também não o estava. Desse modo, isso provocou outro movimento

por parte dos participantes, pois eles passaram a analisar o dispositivo-encontro com

mais ênfase do que analisar os próprios dados brutos, ou seja, este dispositivo

incentivou o grupo a fazer falar suas implicações, das que se pode citar um exemplo, tal

como, o resgate do papel do professor-pesquisador diante de um estudante ‘inseguro’ e

‘iniciante’ (alguns participantes sugeriram leituras, outros encaminhamentos para o

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delineamento dos próximos encontros, questionaram qual era o objetivo do estudo em

si). E, nesse sentido, iniciou-se um movimento de análise da encomenda e da demanda

(queriam saber a que respondia essa pesquisa e ao mesmo tempo registraram que

esperavam que os resultados desta pesquisa os pudessem ajudar a enfrentar as escolhas,

as dificuldades e os dilemas pedagógicos que o estabelecimento estava vivenciando. E

de certo modo proporcionaram um olhar a partir das instituições que os atravessavam

naquele momento (necessidade de ter um objetivo e uma dada lógica de organização do

encontro a priori que se aproxima do modelo tyleriano31, e também da perspectiva

positivista sobre a pesquisa), dentre outros. Nesse ponto, os participantes com suas

implicações aguçadamente mobilizadas começaram a fazer uma demanda para que os

dados pudessem ser apresentados de forma sintética para o grupo. A desterritorialização

causada por este ‘encontro sem objetivo explícito’ impulsionou à necessidade de iniciar

a escritura dos resultados, o próximo dispositivo a ser apresentado.

Antes, uma informação técnica importante sobre este sexto dispositivo, é que ele

começa com o agendamento do encontro. Para agendar o encontro, foi usada uma

ferramenta que permitiu que os participantes escolhessem datas e horários dentre um

período de tempo e que ao mesmo tempo não soubessem quem participaria do momento

do encontro, para evitar alguns problemas comuns nos grupos quanto a sua composição,

dissidentes etc. Para o primeiro encontro, houve uma coincidência de agendas de apenas

5 participantes no dia 02 de outubro de 2017 das 13h00 às 15h00, dos quais

participaram apenas 4 participantes, uma vez que um dos participantes teve um

imprevisto e veio até o local do encontro para informar que não conseguiria participar.

O encontro 1 contou com a participação de uma enfermeira professora-pesquisadora de

uma universidade pública, que atuou na observação desse grupo de reflexão, fazendo

anotações em um bloco de notas, as quais foram compartilhadas ao final do encontro –

essas anotações se referiam ao conteúdo discutido, às estratégias utilizadas, à postura do

pesquisador, à postura do grupo. Esta observadora tinha experiência em outros grupos

que utilizaram como referencial a Análise Institucional.

31 Ralph Winfred Tyler ficou conhecido no campo curricular por sua ênfase sobre os objetivos educacionais, sendo criticado por alguns que sugeriam que sua proposta se aproximava de perspectivas behavioristas, de ciências exatas, das ideias de Dewey etc. Contudo, foi um dos nomes importantes que deram lugar para os estudos curriculares (CORDERO ARROYO; GARCÍA GARDUÑO, 2004).

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O sétimo dispositivo foi a escrita dos resultados, impulsionada pelo ‘encontro

sem objetivo’. Com o surgimento de novas tecnologias digitais, criam-se outros usos e

outras tonalidades para a escrita (que tradicionalmente se inscreve num modelo linear,

ou mesmo o uso linear que é feito dela) a partir da integração de múltiplas habilidades

no desenvolvimento da escrita na era digital (LEWGOY; ARRUDA, 2003;

GONÇALVES; BARBOSA, 2015). Nesse sentido, a escrita de textos para compor uma

tese ainda é atravessada pela encomenda da disseminação impressa da mesma. Outra

questão que confere uma conformação específica à escritura dos resultados e da tese

como um todo, além das regras impostas pela encomenda da universidade instituída, o

que é seguido pelos programas de pós-graduação, trata-se também dos efeitos de

escrever uma tese seguindo uma certa linearidade de pensamento que aprisiona o

escritor aos limites impostos pelas regras e convenções, produzindo uma escrita tolhida

e formatada, impedida de expressar o emaranhado de interconexões e relações entre os

assuntos, dados, meios e fins, os quais extrapolam a própria característica linear que o

desenvolvimento da escrita pela humanidade inculcou no pensamento humano.

Entretanto, o exercício de escrever suscita mudanças, novas buscas, inclusive a

reescrita e o reolhar, na tentativa de produzir um texto que pudesse minimamente e o

mais fidedignamente continuar na produção dos acontecimentos. Nesse sentido, ao

impulso para a escrita dos resultados que emanou do dispositivo 6 (encontro sem

objetivo explícito), foi necessário buscar outros dados para fundamentar e

contextualizar os dados produzidos até este momento da pesquisa. Para tanto, novos

documentos disponíveis online para acesso público foram analisados (ver o quadro do

APÊNDICE 11).

O oitavo dispositivo, dessa maneira, consistiu na análise de novos documentos, o

que foi impulsionado pelo dispositivo anterior. Com a análise de outros documentos e já

tendo começado a escrita dos resultados, tudo isso, potencializou um aprofundamento

analítico e uma reorganização da apresentação dos dados – a escrita tem essa potência.

Isso trouxe um pouco mais de segurança e confiança para organizar uma apresentação

dos dados nos moldes da demanda do grupo que participou do primeiro encontro.

O nono dispositivo foram os encontros 2.1, 2.2, 3.1 e 3.2. Estes encontros

tiveram que ser diluídos em vários encontros por conta da agenda dos professores e a

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dificuldade de encontrar coincidências entre os participantes para os encontros. Todos

os encontros foram realizados nas dependências do local de estudo. Os encontros 2

abordaram o conteúdo dos dados analisados e organizados para apresentação para o

grupo, tratou-se de uma restituição feita em grupo e com posterior reflexão coletiva,

aqui sendo apresentados os três analisadores e discussão sobre os mesmos com os

participantes. Os encontros 3 consistiram em momentos de análise de implicação dos

envolvidos na pesquisa (pesquisador e participantes). Os participantes que não puderam

participar dos momentos do encontro 2, tiveram uma breve síntese do que foi

apresentado nestes encontros logo no início de cada encontro 3.

O encontro 2 foi organizado em dois momentos com dois grupos diferentes. O

encontro 2.1 contou com a presença de 2 participantes, dos 4 que haviam confirmado

presença – 2 participantes ausentes justificaram a ausência por terem tido compromissos

de última hora, e foi realizado no dia 9 de abril de 2018, das 9h00 às 12h00. O encontro

2.2 contou com a presença de 4 participantes e um que havia confirmado presença, mas

que não pôde comparecer. O encontro 2.2 foi realizado no dia 18 de abril de 2018, das

9h00 às 12h00. Desse modo, participaram 6 professores nos dois encontros que houve.

O encontro 2.1 contou com uma observadora diferente da do encontro 1, tratando-se de

uma enfermeira-pesquisadora, com experiência com pesquisas qualitativas, grupos,

pesquisa-ação, e ela atuou seguindo a mesma lógica do observador do encontro 1. Para

o encontro 2.2, a mesma observadora do encontro 1 foi convidada. Esse encontro se

desenvolveu com uma apresentação expositivo-dialogada sobre os dados, organizados

segundo os três analisadores da docência no ensino superior em enfermagem – relação

tempo-dinheiro, concepções pedagógicas, resistência – o que durou aproximadamente 1

hora e mais 1 hora e meia de discussão e síntese. Os objetivos dos encontros 2 eram ‘1-)

Apresentar uma síntese sobre os dados produzidos nesta pesquisa de doutorado; 2-)

Refletir sobre os dados em relação aos três analisadores: relação tempo-dinheiro como

analisador, concepções pedagógicas como analisador, resistência como analisador. ’.

O encontro 3 foi organizado em dois momentos com dois grupos diferentes para

alcançar o maior número de indivíduos e de coincidências de agenda. O encontro 3.1

aconteceu no dia 15 de maio de 2018 das 14h00 às 17h00, contando com 3

participantes, sendo que o quarto participante enviou e-mail avisando da

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impossibilidade de vir, pois tinha uma demanda com um estudante de pós-graduação e

prazos de entrega do trabalho final. O encontro 3.2 aconteceu no dia 24 de maio de 2018

das 9h00 às 12h00, tendo participado 2 participantes, uma vez que os outros três

confirmados, escreveram e/ou vieram até a sala do encontro para avisar que tiveram

intercorrências com a finalização de teses e dissertações de seus pós-graduandos e não

poderiam participar. Os participantes que não puderam participar dos dois encontros

anteriores (3.1 e 3.2) solicitaram se poderia haver mais um encontro – o encontro 3.3.

Contudo, apesar da demanda dos professores em participar, o encontro não aconteceu,

pois, ao utilizar o Doodle ®32 para marcarmos o encontro, pela primeira vez não houve

nenhuma coincidência de agendas.

O encontro 3 (3.1 e 3.2) contou com uma breve apresentação inicial – por volta

de 30 minutos – sobre o que consiste a análise de implicação, nas três dimensões

(libidinal, organizacional e ideológica), cujo objetivo foi “analisar a implicação com

base nos níveis libidinal, ideológico e organizacional” e foram usadas algumas questões

disparadoras, quais sejam: ‘Por que fiz enfermagem? Por que segui para a docência?

Por que vim participar desta pesquisa? ’. Após a exposição, os participantes tiveram

cerca de 40 minutos para refletirem e anotarem em folha de papel o que gostaria de

expressar quanto sua análise de implicação no grupo. Em seguida, os participantes

expuseram suas análises coletivamente, inclusive o pesquisador, discutindo e analisando

as implicações coletivamente. O pesquisador também analisou suas implicações nos

dois encontros, em que apenas a última pergunta disparadora fora pensada de maneira

diferente: ‘Por que escolhi esta temática de pesquisa? ’.

O décimo dispositivo foram as novas entrevistas realizadas com professores-

enfermeiros de outras regiões do país, como foco determinado já sobre os dados

produzidos ao longo destes outros dispositivos, mas também com abertura para o

inédito. Para as novas entrevistas (dispositivo 10) com outros professores-enfermeiros, a

sigla usada foi um PC e a sequência numérica de acordo com a resposta afirmativa para

participar do estudo (PC01, PC02, PC03, PC04, PC05). Estas novas entrevistas

serviram para o confronto dos dados já produzidos, até então, com novos dados de

outros contextos, fazendo falar outros aspectos, permitindo um movimento de

32 Doodle é uma ferramenta gratuita para usuários da Google que auxilia no agendamento de reuniões.

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intensificação das reflexões. Foram entrevistados professores-enfermeiros de

universidades públicas de quatro regiões do país (Norte, Nordeste, Sul e Sudeste). Estes

participantes foram abordados e convidados durante o 16.º Seminário Nacional de

Diretrizes para a Educação em Enfermagem (SENADEn) e as entrevistas foram

agendadas e realizadas com auxílio do Skype®, após a concordância e assinatura do

TCLE. As entrevistas foram conduzidas de junho a agosto de 2018, tendo duração

média de 60 minutos.

Todo o conjunto destes dispositivos foram permitindo o aprofundamento na

produção dos dados, das análises e das interpretações, em um período de tempo entre

2014 a 2018.

Breve caracterização dos participantes desta pesquisa

Neste tópico, é feita uma breve caracterização dos participantes desta pesquisa

com a finalidade de apresentação de algumas características fundamentais. O leitor vai

perceber que faltam citações neste trecho, as quais foram omitidas propositadamente

para manter em sigilo o local de estudo e seus participantes.

Responderam, afirmativamente, ao convite e participaram da fase exploratória

14 docentes-enfermeiros (uma desistência antes de finalizar a fase exploratória sem

autorização para utilização dos dados e uma desistência após a fase exploratória, com

autorização para utilização dos dados), restando até o fim da pesquisa 12 docentes-

enfermeiros. Destes 13 participantes, 8% são do sexo masculino e 92% são do sexo

feminino. Quanto ao estado civil, 69% são casados, 15% possuem união estável, 8% são

separados e 8% são solteiros. Quanto à crença, 69,2% são adeptos ao catolicismo,

15,4% são seguidores do espiritismo e 15,4% referiram acreditar em Deus.

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Gráfico 2 – Apresentação do estado civil dos participantes

Gráfico 3 - Apresentação da religião dos participantes

Dos participantes, 100% são doutores e 31% com livre-docência. Dentre os

participantes, a maioria dos participantes (92,3%) refere ter buscado formação

pedagógica por meio de: licenciatura em enfermagem, curso de pedagogia universitária,

curso de especialização em ativadores de mudança no ensino superior, assessorias

pedagógicas; curso normal (década de 1970); e 7,7% dos participantes referiram não

terem buscado formação pedagógica. Com relação à área de atuação no ensino, 38% dos

participantes atuam principalmente no ensino da atenção hospitalar (Urgência e

Emergência, Enfermagem Clínica, Administração em Enfermagem, Enfermagem

Psiquiátrica); 31% atuam principalmente no ensino da atenção primária em saúde

(Saúde Coletiva, Saúde da Mulher, Saúde Mental); e 31% atuam no ensino da educação

em enfermagem (educação profissional em enfermagem).

8%

69%

15%8%

Estado Civil

Solteiro Casado Un. Estável Separado

Catolicismo69%

Espiritismo16%

Crença em Deus15%

Religião

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Gráfico 4 - Principal área de atuação no ensino de graduação em enfermagem

Quanto ao tempo de atuação na docência no estabelecimento de ensino superior,

a média foi de 10 anos, e o gráfico, a seguir, mostra com mais detalhes esta informação:

Gráfico 5 - Apresentação do tempo (em anos) de atuação dos participantes na docência no

estabelecimento de ensino superior estudado quando do momento de entrevista

É importante relatar que durante os quatro anos e meio de pesquisa, dois dos

participantes se aposentaram e continuaram ativamente participando dos momentos da

pesquisa, referindo interesse em continuar refletindo sobre a docência no ensino

superior. Ainda, é relevante apresentar a informação de que dentre os participantes da

pesquisa, houve coordenadores de programas de pós-graduação em enfermagem,

participantes das comissões organizadoras de cursos de graduação, coordenação de

comissão organizadora de curso de graduação, inclusive pessoas que já foram chefes de

departamentos, presidentes e vice-presidentes de comissões de graduação.

Atenção Primária

31%

Hospitalar38%

Educação31%

Principal área de atuação no ensino

2

97 7

4 4

18

26

3 4

19 19

9

P01 P02 P03 P04 P05 P06 P07 P08 P09 P10 P11 P12 P13

Tempo de atuação na docência no estabelecimento de ensino superior

Tempo de atuação em anos

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Nos momentos de novas entrevistas, foram entrevistados 5 professores de quatro

regiões do país (Norte, Nordeste, Sul e Sudeste). O primeiro entrevistado – PC01 – (da

região norte) foi um professor de uma universidade pública, recém ingressante na

universidade como professor adjunto, com ingresso no estabelecimento em 2018 (5

meses), atua na área de gestão em saúde e saúde da mulher. A segunda entrevistada –

PC02 – (da região nordeste) foi uma professora de uma universidade pública, professora

titular, com ingresso no estabelecimento em 1989 (29 anos), atuando na área de

metodologia de ensino, gestão dos serviços de saúde – tendo atuado na coordenação de

pós-graduação de 2011 a 2015. A terceira entrevistada – PC03 – (da região sul) foi uma

professora de uma universidade pública, com ingresso no estabelecimento em 2015 (3

anos), atuando na área de ensino em enfermagem, formação profissional em saúde e em

enfermagem. A quarta entrevistada – PC04 – (da região sudeste) foi uma professora de

uma universidade pública, professora titular, com ingresso no estabelecimento em 1983

(35 anos), atuando na área de formação em enfermagem, saúde coletiva e metodologias

participativas de ensino e pesquisa – no momento atuando como coordenadora de pós-

graduação. A quinta e última entrevistada – PC05 – (da região nordeste) foi uma

professora de uma universidade pública e sua área de atuação é na saúde coletiva, tendo

ingressado como docente-enfermeira no estabelecimento de ensino atual em 2010 (8

anos) – atualmente está se doutorando em um estabelecimento de ensino superior da

região sudeste.

Como se pode ver, são três professores com ingresso recente nos

estabelecimentos formadores (PC01, PC03 e PC05) e dois professores com mais tempo

de profissão docente e de pesquisa (PC02 e PC04), estes dois últimos com atuação

inclusive na coordenação de programas de pós-graduação em enfermagem. O gráfico 6

apresenta resumidamente o tempo de atuação dos participantes dessa fase de novas

entrevistas.

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Gráfico 6 - Apresentação do tempo (em anos) de atuação na docência em estabelecimento de ensino

superior dos participantes nos momentos de novas entrevistas

O cenário de estudo: breve contextualização (as referências foram omitidas

propositadamente para manter o sigilo e para não identificar o estabelecimento)

Este estabelecimento de ensino superior foi criado na década de 1950, e tal como

as demais pelo Brasil, também foi anexada a uma faculdade de medicina. Desde então,

este estabelecimento vem desenvolvendo sua estrutura curricular buscando atender às

legislações vigentes para educação, e com as diretrizes curriculares nacionais para

graduação em enfermagem. Os cursos de graduação compreendem o bacharelado e a

licenciatura em enfermagem, com investimento numa formação de enfermeiros críticos

e reflexivos, com aprendizagem significativa, baseada nas diretrizes curriculares

nacionais pertinentes à formação de enfermeiros (BRASIL, 2001b) e também de acordo

com as políticas de formação de professores (BRASIL, 2002).

Os currículos deste estabelecimento têm sido organizados, em sua

essencialidade, disciplinarmente, tendo algumas disciplinas chamadas de "disciplinas

integradoras", mas tem sofrido frequentemente desintegração das poucas disciplinas que

resguardavam aspectos e potenciais integrativos. Parte destas poucas disciplinas

integradoras têm utilizado a problematização como um dos recursos metodológicos para

a formação de profissionais críticos, reflexivos, autônomos, ativos, comprometidos e

construtores permanentes de seus conhecimentos, de maneira contextualizada e com

0,5

29

3

35

8

PC01 PC02 PC03 PC04 PC05

Tempo de atuação na docência em estabelecimento de ensino superior

Tempo de atuação em anos

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potencial transformativo dos contextos de saúde onde os estudantes são acompanhados

em estágios e imersões. A principal metodologia destas disciplinas tem sido chamada de

ciclo pedagógico, constituídos de momentos de imersão na realidade, momentos de

construção de questões de aprendizagem, momentos de busca de informações,

momentos de construções e reconstruções de conhecimentos individual e coletivamente,

e momentos de avaliação e autoavaliação.

Os momentos de imersão na realidade contam com a mediação problematizadora

do professor diante das experiências, das observações, das atitudes e habilidades a

serem desenvolvidas em cada fase de formação do estudante. Neste momento, é

fundamental que o professor se desafie a instigar, junto com os estudantes, a curiosidade

pelo conhecimento, o desenvolvimento da autonomia, do pensamento crítico-reflexivo,

do comprometimento com a formação e com a possibilidade de ajudar na transformação

da realidade, e também de sua própria transformação no processo.

No momento de produção provisória de uma questão de aprendizagem, o

professor, por meio de uma mediação problematizadora, precisa instigar os estudantes a

questionarem cada vez mais complexamente os problemas extrínsecos e intrínsecos e

suas implicações, em um movimento permanente de confrontação dos esquemas de

conhecimento de cada indivíduo, com as novas experiências, conhecimentos e práticas,

com a finalidade de elaboração de uma questão de aprendizagem que possibilite de fato

a construção de conhecimentos, habilidades e atitudes, significativos para o grupo e,

possivelmente para o cenário de imersão, uma vez que o ensino e a aprendizagem são

entendidos nesta perspectiva como práticas sociais.

O momento de busca de informações exige também que os estudantes estejam

em um processo de aprendizagem de como buscar informações de forma mais

fidedigna, o que certamente deve ter-se iniciado em outras disciplinas e deve ser

continuado em todas as disciplinas que precisem utilizar este recurso, pois os estudantes

vão produzindo seus conhecimentos permanentemente ao longo de sua formação.

No momento de construção de uma síntese um pouco mais elaborada, busca-se a

construção coletiva de uma "resposta provisória" ao questionamento realizado pelo

grupo. Nesta situação, é preciso atenção especial do professor mediador para

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problematizar a leitura da literatura trazida pelos estudantes, que podem partir de

perspectivas diversas para analisar determinados problemas, auxiliando na

discriminação daquilo que é similar e diferente nos posicionamentos, e resgatando

sempre a realidade experimentada pelo grupo nas imersões à qual a produção de

conhecimentos está integrada, uma vez que estes conhecimentos produzidos são

potenciais para o campo de imersão, pois os estudantes fazem muitas imersões ao longo

deste tipo de disciplina.

Nos processos avaliativos e autoavaliativos, é preciso atenção às percepções dos

estudantes sobre seu processo de aprendizagem de conhecimentos, habilidades e

atitudes, nas dimensões individuais e grupais, assim como do papel do professor neste

processo. É, neste momento, também, que se reafirmam os compromissos e os

propósitos de formação e de atuação na disciplina. Visa-se um processo avaliativo

processual, contínuo e formativo, que ocorre durante todos os encontros e também pela

construção de um portfólio crítico-reflexivo individual, onde os estudantes vão

registrando suas dúvidas, inquietações, experiências, reflexões, e construções de novos

conhecimentos. Este instrumento é lido periodicamente pelos professores, que

continuam problematizando os textos para que os alunos continuem no processo crítico-

reflexivo de aprendizagem e analítico sobre os cenários e conteúdos sendo produzidos.

Essa proposta de ciclos pedagógicos se operacionaliza em pequenos grupos de

estudantes, e isto pode demandar a mobilização de recursos de cada professor, assim

como do corpo docente e da instituição de ensino. Esta questão coloca esta proposta

pedagógica como um grande desafio quando se pensa que há pouco incentivo para a

docência em comparação com os incentivos e estímulos para a produção científica.

Outra questão é a insuficiência do preparo político-pedagógico no cotidiano do docente

universitário, dificultando sua adesão/apropriação ou utilização adequada deste

referencial político-pedagógico.

Mesmo assim, percebe-se, por meio da estrutura curricular disciplinar e das

informações disponibilizadas em um sistema de informações acadêmicas desta

instituição, grande maioria de disciplinas, as quais ainda em modelos tradicionais de

ensino, mas com muito potencial para reformulações político-pedagógicas.

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Trata-se de um estabelecimento para a formação de enfermeiros, dividido em

departamentos desde sua criação, contando com número de 88 docentes até o último ano

do estudo (julho de 2018), trabalhando no regime de dedicação exclusiva. Todos os

professores são doutores (muitos já com pós-doutorado realizado principalmente no

exterior) e seguem paulatinamente os trâmites da carreira docente no local de estudo,

acompanhando os critérios para tal e também sendo incentivados pelos departamentos.

Os docentes estão vinculados aos departamentos e foram contratados para exercer a

docência em disciplinas específicas por meio de concurso público. Posteriormente, os

docentes são incentivados e estimulados a se credenciarem em programas de pós-

graduação e a produzirem conhecimentos em revistas de impacto, assim como são

estimulados à internacionalização de seus currículos, buscando status que os permita

serem bolsistas das agências de fomentos, trazendo recursos para universidade e para o

estabelecimento formador. Os programas de pós-graduação estão bem-conceituados de

acordo com avaliação realizada pela CAPES.

O estabelecimento conta com estrutura laboratorial, audiovisual, salas de aula,

auditórios, sala de computadores, centro de memória, salas de reunião, dentre outros,

adequados para abrigar por volta de 566 estudantes de graduação e 535 estudantes de

pós-graduação e seus 110 servidores públicos, além de seus docentes.

Os projetos pedagógicos dos cursos evidenciam preocupação com formação

baseada tanto na pedagogia histórico-crítica como na aprendizagem significativa e as

disciplinas têm assumido uma organização dos planos de disciplinas por saberes nas

dimensões conceitual, atitudinal e procedimental. Existe um total de 112 disciplinas de

graduação no estabelecimento, que são integradas pelo único critério de pré-requisitos,

uma vez que os próprios docentes e discentes reclamam que as disciplinas não se

conversam pela falta de tempo. Desse modo, pode-se dizer que se trata de um currículo

disciplinar.

O estabelecimento tem convênios com estabelecimentos nacionais e estrangeiros

com os quais estabelece relações internacionais, com mobilidade docente e discente

(graduação e pós-graduação).

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O estabelecimento possui suas instâncias decisórias, compostos por docentes

titulares, chefes de departamento e representações dos demais docentes e demais

categorias profissionais e estudantis, que são eleitos periodicamente de acordo com os

devidos regimentos e estatutos. Estas instâncias decisórias respondem diretamente ao

conselho universitário, que é a instância máxima decisória na universidade.

O processo analítico

Esta pesquisa resguardou algumas características do processo de escrita analítica

proposto por Paillé e Micchielli (2012), em que os autores referem que por meio da

escrita dos resultados se consegue avançar na análise e interpretação, por meio de três

momentos fundamentais: transcrição-tradução, transposição-rearranjo e reconstituição-

narração. Os quadros produzidos a partir de análises temáticas durante o momento de

transcrição/tradução foram compondo o corpus da pesquisa, com muito movimento de

escrita e reescrita sobre eles, buscando integrar as informações e recompor a análise, no

momento de transposição/rearranjo. Nesse movimento de rearranjo, três analisadores

apoiaram o processo de fazer a instituição ‘docência no ensino superior e o professor-

enfermeiro’ falar, se desvelar, por meio de encontros de reflexão com os participantes,

permitindo um movimento em que as interpretações foram se densificando,

notadamente com a narrativa final (escrita parcial da tese). Desse modo, os dados foram

organizados e apresentados nesta tese segundo os analisadores que os ajudaram a

produzir.

O momento da transcrição/tradução é um momento importante da pesquisa, pois

se trata daquele em que se produz uma determinada organização dos dados produzidos,

os quais passam a se arranjar de acordo com algumas regras que são próprias do

pesquisador (PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012) ou, como se diria na perspectiva

institucionalista, que na organização/análise dos dados as implicações do pesquisador

estarão presentes nas escolhas e formas como estes serão apresentados (MONCEAU,

2008).

O momento da transposição/rearranjo se constitui como aquele de grandes

construções/desconstruções/reconstruções, em que os dados brutos (textos transcritos,

anotações de campo, extratos de documentos, dentre outros) se ‘re-produzem’ em frases

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que os contemplam e os representam. Trata-se, assim, de momento crucial de

descontextualização/contextualização, de ir e vir com os dados, buscando sua relação

particularidade/universalidade/totalidade, colocando em destaque e rearranjando as

ideias, as perspectivas, os pontos de vista (e as vistas dos pontos). Assim, avança-se

com os dados de partida para dados de meio de caminho, por meio de leitura a partir do

referencial teórico-metodológico (PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012). Neste momento, as

restituições prestaram muito serviço ao processo de análise sob várias condições e

implicações.

O momento de reconstituição/narração se refere ao momento de escrita final da

tese e representa o momento em que se quer comunicar os resultados de uma pesquisa,

os quais respondem tanto aos aspectos inerentes da comunicação escrita quanto aos

pressupostos teóricos e metodológicos, assim como à lógica dos próprios dados da

pesquisa em si (PAILLÉ; MUCCHIELLI, 2012). Nesse ponto, acrescentamos a reflexão

sobre o efeito Goody, em que a escrita é atravessada pela encomenda e demandas da

instituição pesquisa, assim como de outras instituições (SAMSON, 2013).

A escrita, então, passa a ser a ferramenta central do processo analítico, uma vez

que ela demanda um artifício de articulação de ideias e de perspectivas e nos coloca em

um movimento constante de análise e ressignificações, buscando constatações cada vez

mais precisas para fundamentação dos dados produzidos, ou seja, a escrita faz emergir o

sentido. Desse modo, a análise por meio da escrita propicia a criatividade e a expressão

espontânea, dando lugar a uma análise viva, fluida e flexível, sendo, portanto,

permeável às multifaces da realidade e a sua complexidade (PAILLÉ; MUCCHIELLI,

2012).

Por isso, a análise pela escrita, em se apropriando do movimento de criatividade

e inventividade do pesquisador no processo de análise dos dados produzidos com os

participantes, busca se afastar de qualquer tipo de método, técnica ou organização dos

dados por quantificações, mensurações, padronizações etc. (PAILLÉ; MUCCHIELLI,

2012).

Este meio de produção de dados e análise pela escrita foi escolhido para esta

pesquisa por permitir a escrita/reescrita, ciclicamente ao longo de toda esta pesquisa, em

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que os três momentos desta abordagem (transcrição, transposição e reconstituição) se

perfizeram de forma integrada, contínua e espiralada (vai e volta), dando mais

visibilidades e permitindo que o movimento da instituição “docência no ensino superior

e o professor-enfermeiro” pudesse ser acompanhando o mais fluidicamente possível.

Desse modo, conforme os dados foram sendo produzidos com os participantes por meio

dos variados dispositivos analíticos já mencionadas, escritas foram sendo produzidas

sobre eles. Isso demandou novas leituras, novas “releituras” dos dados, de textos

científicos sobre os assuntos que foram aparecendo, dos textos já produzidos, o que

mobilizou reescritas, busca de mais constatações de outras naturezas documentais,

novas entrevistas com outros professores-enfermeiros, participação em eventos

científicos da área de educação em enfermagem, dentre outros, para compor uma escrita

que intensificou a análise por si só. Todos os dados produzidos e analisados foram

sendo integrados ao longo da(s) escrita(s).

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RESULTADOS, DISCUSSÃO E ANÁLISE DE IMPLICAÇÃO

Neste tópico, abordaremos os resultados provisórios desta inacabada tese,

organizados segundo os analisadores que os ajudaram a produzir, quais sejam: relação

tempo-dinheiro como analisador, discutir concepções pedagógicas como analisador, e

resistência como analisador. Entretanto, antes de discutir os dados a partir dos

analisadores que os produziram, será feita a tentativa de escrever sobre a análise de

implicação em duas direções: as implicações primárias e secundárias nesta pesquisa,

perpassando pelos níveis libidinal, ideológico e organizacional e um momento em que o

pesquisador faz um olhar mais aprofundado sobre suas implicações ideológicas,

libidinais e organizacionais.

UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DO QUE CONSISTE EM ‘ANALISAR

A IMPLICAÇÃO’

É importante começar esta discussão, resgatando alguns conceitos de implicação

utilizados nas correntes institucionalistas e que servirão de base para a constituição

deste texto.

Desse modo, é importante destacar que, na Análise Institucional, analisar as

implicações é fundamental para se conseguir desvelar tudo aquilo que foge à

compreensão e que dá o tom às decisões, às escolhas e aos desejos que movem os

indivíduos. Por isso, é necessário conduzir essa análise, fazendo um árduo exercício de

buscar as cristalizações e naturalizações que portamos, para não se correr o risco de

seguir tendências, em que não se acredita. Monceau (2008) acrescenta que a Análise

Institucional começa a conseguir analisar a instituição, provocando a análise de

implicação.

Nesse caminho, “a implicação não é um processo apenas psíquico, nem

inconsciente, mas de uma materialidade múltipla e variada, complexa e

sobredeterminada, ao mesmo tempo que é também um processo político, econômico,

social, etnológico etc., heterogêneo e que deve ser examinado em todas as suas

dimensões” (Baremblitt, 1996, p.153).

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Entretanto, é prudente fazer um discernimento importante quanto ao conceito de

implicação, pois muitas vezes este é tomado como sinônimo de engajamento

(MONCEAU, 2008), quando é analisado fora da dialética institucional (instituído-

instituinte-institucionalização). Assim, a implicação se conforma como um vetor dessa

dialética institucional, em que os práticos, imbuídos nos eventos cotidianos, manifestam

suas ações, voluntária ou involuntariamente (GUILLIER, 2003).

Em outras palavras, queira ou não, o indivíduo está implicado e esta implicação

se traduz na relação que ele estabelece com a instituição. Por isso, convém dizer que a

análise de implicação é um movimento de analisar como se está implicado e não se

existe ou não a implicação. Nesse caminho, o como se está implicado pode perpassar

por alguns tipos de implicação, tais como econômicas, ideológicas, organizacionais,

materiais, libidinais (MONCEAU, 2008).

No campo da pesquisa, a implicação:

diz respeito às relações que todos nós estabelecemos, consciente e

inconscientemente, com nosso objeto de estudo e/ou de intervenção, com

nosso campo epistemológico de referência, com nossa escrita e com as

demais instâncias que interferem nas condições de nosso trabalho, como a

remuneração, a carreira, e a instituição à qual pertencemos. A implicação

também se refere às dimensões afetivas da nossa vida pessoal e familiar e,

enfim, às nossas relações com a sociedade mais ampla na qual vivemos

(L'abbate, 2013a, p.386).

Apresenta-se, também, dois tipos de implicação, quando se fala de implicação

no campo da pesquisa, as implicações primárias e as secundárias. As implicações

primárias consistem naquelas que podem ser apercebidas durante os momentos de

intervenção (campo de intervenção), enquanto que as implicações secundárias se

referem àquelas que surgem a partir do campo de análise. As implicações secundárias

podem influenciar ou determinar o que sucederá no campo de intervenção

(MONCEAU, 2008).

Ainda, as implicações possuem níveis que são didaticamente destacados para

uma análise mais aprimorada. Estes níveis consistem em: nível psicoafetivo (libidinal),

nível histórico-existencial (ideológico) e nível estrutural-profissional (organizacional)

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(BARBIER, 1985b). Esta organização é apenas um modo de apresentar a implicação em

níveis, pois os níveis se interpenetram e se articulam de uma maneira bastante dinâmica.

Em relação ao nível psicoafetivo (libidinal), pode-se retomar, a título de

exemplo apenas, a ideia de transferência e contratransferência da psicanálise, mesmo

que para a Análise Institucional não se aceite essa diferença

transferência/contratransferência, uma vez que estes termos são entendidos como

“implicação” (LOURAU, 2014). Assim, o nível psicoafetivo ressalta as relações

libidinais entre o analista e o paciente. No caso da educação, é possível que nas relações

pedagógicas tenham muitas pulsões sádicas (por exemplo, o desejo de punir, de se sentir

superior e de causar sofrimento aos que estão sob sua autoridade), especialmente

escondidas nas autoridades científicas e pedagógicas, inclusive nas escolhas dos

dispositivos pedagógicos e de pesquisa institucional. O saber que se constrói a partir da

pesquisa pode ser motivado pelo desejo de saber, com motivação de origem genital

(preencher um vazio) e também oral (saber é alimento). Também é possível despertar

um desejo de paternidade (fazer renascer um grupo, constituir discípulos, dentre outros).

Nesse sentido, a análise de implicação perpassando pelo nível psicoafetivo, faz com que

se enxergue melhor e se consiga avançar para além da comunicação (BARBIER,

1985b).

O nível histórico-existencial (ideológico) da implicação consiste em uma busca

dos fundamentos e bases da existência. Assim, é preciso tomar emprestado dois

conceitos para conseguir analisar a implicação: o conceito de ethos e habitus

bourdieusianos:

“Ethos é o conjunto de princípios interiorizados que guiam a conduta do

indivíduo de forma inconsciente e que permite a adesão aos valores partilhados por

determinado grupo social” (Baptista, 2012, p.19).

Habitus é o produto do trabalho de inculcação e de apropriação necessário

para que estes produtos da história coletiva que são as estruturas objetivas

(por exemplo, a língua, a economia, etc.) consigam reproduzir-se sob a forma

de disposições duráveis, em todos os organismos (que podem ser chamados

de indivíduos) permanentemente submetidos aos mesmos condicionamentos,

logo, colocados nas mesmas condições materiais de existência (BOURDIEU,

1972, p.187).

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É importante considerar e analisar as implicações de nível histórico-existencial,

considerando o ethos e o habitus da classe de origem, uma vez que é provável que

pesquisadores advindos de classes sociais diferentes analisem os fatos sociais de

maneiras diferentes. Com isso, o pesquisador que não se atente a estas implicações pode

implementar interpretações forjadas, influenciadas pelo ethos de classe. Entretanto,

aquele que leva esta análise em consideração pode intensificar a busca no desvelamento

de tudo aquilo que torna uma classe submissa a outra (BARBIER, 1985b).

Para abordar o nível estrutural-profissional (organizacional) é preciso remeter-se

aos dois níveis já mencionados (psicoafetivo e histórico-existencial) para se conseguir

uma análise mais aprofundada, uma vez que todos estes níveis estão intimamente

relacionados e se transpassam, pois toda profissão possui relações de trabalho que são

marcadas por escolhas que emanam das implicações que fazem íntima relação com as

relações de classe e por questões libidinais. Um exemplo desta questão é a grande

relação com o dinheiro e com a busca de segurança pelas classes subordinadas, em que

a profissionalização se torna uma maneira de sair de uma situação de vida menos segura

para uma situação de vida mais segura (BARBIER, 1985b).

Um primeiro exercício de análise da minha implicação

É importante destacar que esta análise de minha implicação foi disparada e

intensificada por meio do afastamento do campo de intervenção e também pela típica

desterritorialização que o dispositivo viagem provocou – acho que foi aí que comecei a

ver como estava sobreimplicado nesta pesquisa, o distanciamento me ajudou a ‘derrubar

algumas paredes e a olhar para o horizonte ao redor’. A análise de minhas implicações

começou a ser escrita em meu portfólio individual de viagem, onde também foram

registrados todos os acontecimentos, vivências e reflexões durante o intercâmbio

sanduíche à Université de Tours em 2017. Assim, a análise de minhas implicações será

abordada a partir de alguns tópicos organizadores.

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Nascimento, família e status social

Nasci no dia 21 de julho de 1986 em uma pequena cidade chamada Pitangueiras,

no interior do estado de São Paulo. Atualmente, a cidade conta com aproximadamente

35 mil habitantes. Meus avós vieram de famílias de trabalhadores rurais, cujos pais

tinham terras, as quais foram sendo divididas entre os filhos das mais variadas maneiras.

Na família da avó paterna e do avô paterno, os pais dividiram as terras igualmente entre

os filhos e estes as utilizaram de diversos modos. O que minha avó paterna, descendente

de portugueses, recebeu de herança foi um grande terreno no qual ela construiu sua casa

onde reside até hoje. Quanto a minha avó materna, também descendente de portugueses,

seus pais tinham terras também, mas seus pais tinham a crença de que a herança era

apenas dos filhos homens. Entretanto, ela teve a “benevolência” de um irmão que

“comprou” sua parte, dando-lhe um terreno e construindo-lhe uma casa na cidade

(Pitangueiras), onde ela reside até os dias atuais. O avô materno, de descendência

italiana, teve uma história de perda da mãe quando tinha apenas quatro anos de idade, e

o pai alcoólatra perdeu as terras e tudo que tinham. Ele foi criado pelas irmãs até o final

da adolescência, quando se casou com minha avó. O avô paterno, também de

descendência italiana, cujos pais eram agricultores e trabalhadores do campo, chegando

a comprar um sítio, mas o qual foi tomado por golpistas, uma vez que o bisavô assinou

um documento sem ler. Perderam as terras e foram para a cidade criar os filhos. A

característica comum na minha descendência é a relação forte com a terra e com a

agricultura, a classe operária, os trabalhadores.

É muito interessante, mas tive contato mais próximo apenas com os irmãos e

irmãs das avós (materna e paterna), pois a família dos avôs eram pessoas distantes e

desunidas, enquanto que a das avós sempre organizavam festas e encontros familiares,

assim como se visitavam com frequência.

Foi nesse contexto familial que nasci e cresci. Minha mãe e minha avó paterna

sempre tiveram seus estranhamentos. Minha avó paterna se sentia uma “pequena

burguesa”, porque meu avô paterno tinha conseguido êxito em seu trabalho com

negociação e venda de laranjas dentro de uma empresa que existia à época, chegando a

abrir um comércio (um pequeno mercado) na cidade. Nesse sentido, ela não queria que

um de seus dois filhos se casasse com uma menina pobre (filha de uma costureira e de

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um servente de escola). Assim, o casamento de minha mãe e meu pai já não tinha

começado muito bem, e os conflitos foram se alastrando ao longo dessa convivência

difícil entre as duas, o que causou muitas brigas entre meu pai e minha mãe.

Nossa casa foi construída ao lado da casa de minha avó paterna, pois o terreno

foi comprado por ela de uma de suas irmãs que se mudou para outra cidade. Entretanto,

minha mãe trabalhou duro e também durante toda minha gestação para conseguir

participar mais significativamente na construção e acabamento da casa onde

moraríamos – ela inclusive trabalhou durante suas férias e também durante sua licença

maternidade. Por isso, teve que me deixar a maior parte do dia com minha avó paterna

durante um período de seis anos. Desse modo, tive grande parte da minha infância sob

influência dos costumes da avó paterna e com poucas inserções do lado da avó materna.

Minha avó paterna tinha orgulho de dizer, por isso, que era minha segunda mãe. Isso

pôde ter causado mais rivalidade entre minha mãe e ela, creio eu.

Quando eu tinha seis anos de idade, minha mãe, atribuindo as várias brigas entre

ela e meu pai ao fato de residir nas proximidades da casa de sua sogra, somado ao fato

de que meu pai ia muito a festas da empresa onde ele trabalhava e, na última festa,

voltou alcoolizado e bateu com o carro (um fusca), tendo que responder judicialmente e

tendo que pagar uma dívida não esperada, insistiu com meu pai para venderem a casa e

comprarem uma casa menor em outro lugar. Assim, venderam a casa e mudamos para

uma casa menor perto da casa de minha avó materna, podendo fazer uma reforma e

construir um salão na frente da casa, onde meus pais colocaram uma sorveteria.

Meu pai expressava muito ciúmes em relação a minha mãe e, desse modo,

minha irmã e eu presenciávamos muitas brigas dos dois. As brigas foram se

intensificando, especialmente quando a situação financeira começou a piorar – meu pai

pediu demissão do emprego de muito tempo, por conta de uma questão de falta de

reconhecimento profissional. Isso deixou as coisas tanto mais desfavoráveis, uma vez

que a renda diminuiu muito e as brigas intensificaram. O dinheiro era o que dava

segurança e certa estabilidade nas relações e nas condições de vida. Meu pai teve

dificuldade de encontrar outro emprego.

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Foi por volta desse período que meus pais se separaram, uma vez que houve

uma possível traição por parte de meu pai, o que dificultou ainda mais as relações

dentro de casa e as brigas ficaram mais agressivas – o que culminou no divórcio. Com o

divórcio de meus pais, minha mãe e eu fomos morar com meus avós maternos, e minha

irmã, já tendo sido casada e divorciada também, foi morar com meu pai e com os avós

paternos. Mas as coisas foram se complicando, porque quando dos 12 anos que eu tinha,

meu pai se recusava a pagar uma pensão alimentícia e minha mãe procurou a justiça

para conseguir que ele o fizesse. Isso foi muito forte para mim, passar por essa situação,

que de certa forma é uma certa recusa de assumir, pelo menos a responsabilidade de pai.

Com a separação dos meus pais, meu pai foi morar com outra mulher e eu

diminui bastante o contato com ele por conta disso, o que fez com que meus avôs

(materno e paterno) ocupassem o lugar da referência masculina em minha adolescência,

me aproximando muito deles – aos finais de semana estávamos sempre juntos fazendo

alguma coisa no quintal da casa onde eu tinha alguns animais (tartarugas, pavões,

coelhos, periquitos...).

Acredito que certa parte do sofrimento de não ver meus pais juntos foi, de certa

maneira, sufocada por uma dedicação intensificada aos estudos (minhas notas sempre

foram de 8 para cima em todas as matérias). Acho que tomei o caminho contrário ao

que a maioria toma, de autoflagelo, de afastamento das pessoas (mesmo que eu era um

tanto antissocial e pouco participativo nas festas e clubes), de desconcentração e esquiva

às questões educacionais. Talvez eu tenha acreditado mesmo que conseguiria mudar

essa situação por meio da educação, como diria Freire “a educação transforma o

mundo” – mesmo que naquele momento nem sonhava quem era Paulo Freire, por quem

me encantei devido sua militância na educação.

A educação formal e o estudo de inglês

Sempre estudei em escolas públicas e me implicava muito com minhas

professoras (especialmente as da educação infantil), tinha verdadeira veneração por

todas – as quais também sempre me elogiavam para minha mãe – “ai como queria ter

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30 José Renato na minha sala”. Apesar do elogio, hoje vemos como estavam

atravessadas por lógicas educacionais voltadas para os estudantes que tinham mais

facilidade para aprender e comportados em sala de aula, o que advinha tanto da

encomenda da instituição escolar daquele momento como também da encomenda de

formação de profissionais da educação que se formavam com este olhar. Ainda, antes

mesmo de entrar na educação formal, de certa forma já me interessava pela educação.

Um caso muito interessante que minha mãe me conta e de que me recordo vagamente

eram os momentos em que minha mãe estava ‘tomando a tabuada’ de minha irmã mais

velha, a qual estava com dificuldade de memorizá-la. E, de repente, quando minha mãe

perguntou já por algumas vezes uma multiplicação para minha irmã, e esta não

conseguia lembrar, eu respondi prontamente, aos 5 anos de idade.

Era um estudante tanto atencioso e dedicado como questionador e revoltado com

relação a injustiças, principalmente quanto aos métodos de ensino e de avaliações,

incluindo as incoerências que se mostravam a mim e isto me deixava bastante inquieto,

notadamente com os professores que não davam abertura para o diálogo.

Apesar de tudo, era um estudante bastante tímido e reservado, ruborizando a

qualquer que fosse o momento que os professores dirigiam a palavra a mim. Foi na

terceira série que consegui o primeiro incentivo para falar e para me calar ao mesmo

tempo. Tinha duas professoras, uma da parte de humanas e outra da parte de matemática

e ciências. Vivi uma dialética interessante, pois enquanto uma utilizava uma abordagem

amorosa e séria conosco, a outra se colocava de forma sisuda e brava. Todos amavam a

primeira, enquanto odiavam e temiam a segunda. De certa forma isso começou a

trabalhar em mim algumas características da aprendizagem, pois era um prazer as aulas

da primeira professora, enquanto era uma obrigação estar na aula da segunda. Tive um

pouco de dificuldade de aprender com a segunda, pois o sentimento de medo por vezes

tomava o lugar de minha atenção às explicações... até que não fui muito bem em uma

das provas, e ao ser questionado por meus pais eu criei coragem e disse que tinha medo

da professora. Só depois que meus pais conversaram com a professora e ela falou

comigo, que as coisas melhoraram.

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Era muito interessante minha relação com a nota – queria sempre tirar A ou 10.

Lembro que na quarta série, meu boletim ficou repleto de A’s e apenas um C,

exatamente no meio do boletim, em geografia. Depois da quinta à oitava séries, tive

dificuldades tremendas em geografia e história, mas sempre indo muito bem em língua

portuguesa, matemática, ciências e inglês.

Foi por volta desse momento, que tive uma oportunidade única e que abriu

muitas portas em minha vida. Aos 10 anos, abriram uma escola de inglês em minha

cidade e mesmo diante de algumas dificuldades econômicas que enfrentávamos, minha

mãe me perguntou se eu queria estudar inglês – segundo ela porque via o quanto eu era

dedicado aos estudos. Assim, comecei a fazer o inglês, mas em uma turma de estudantes

mais velhos (12-15 anos), pois não tinha turma de estudantes na minha idade. A

professora disse para minha mãe que faria um teste.

A situação em casa ficava cada vez pior – dificuldades financeiras e brigas de

meus pais – mas eu seguia profundamente dedicado aos estudos e, agora, na

aprendizagem de outra língua. Curiosamente, e acho que me dá uma pista quanto à

implicação com idiomas, logo após alfabetização, eu inventei uma língua, compondo

regras relacionadas com palavras invertidas do português, o que depois com o inglês,

acabei mesclando e criando outras regras. Nesse sentido, eu me aprofundava cada vez

mais no estudo do inglês, fazendo exercícios de outros livros que eu encontrava e queria

saber como falar outras palavras – era muito curioso. Foi no estudo do inglês que

consegui fazer outras reflexões importantes. Uma delas era quanto às diferenças de

classes sociais – era pobre e convivia com a elite da minha cidade no curso de inglês e,

muitas vezes, me pegava pensando porque os outros estudantes davam tantas desculpas

por não ter feito os exercícios, sendo que eram trazidos e levados de carro até a escola e

eu fazia tudo isso a pé, inclusive em dias chuvosos – ou seja, o meu questionamento

concernia quanto a não aproveitarem muito mais, dadas as “mordomias” e facilidades

que tinham. Conversavam sobre viajarem para os Estados Unidos e sobre as viagens

internacionais que já haviam feito, enquanto eu sempre me preocupava se conseguiria

me manter no curso, devido às dificuldades econômicas de minha família. Outra questão

foi quanto ao desejo despertado em mim para ser professor de inglês – e a minha

professora falava comigo sobre – isso me motivou mais ainda para estudar. Ser

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professor de inglês, para mim, naquele momento, era uma maneira de ter mais

segurança para minha existência.

Infelizmente, minha primeira frustração foi aos 14 anos, quando a escola de

inglês fechou, a partir da abertura de uma concorrente e, então, houve um rompimento

com minha professora querida e, ao mesmo tempo me bateu a insegurança se eu

conseguiria continuar o inglês na outra escola, uma vez que era mais cara, mas minha

mãe continuou sacrificando outras coisas e não abriu mão disso. Segui perseverante e

me destacando, em detrimento às adversidades em minha vida – separação dos meus

pais, mudança de casa e ambiência, dentre outros. Fui convidado para ser monitor no

laboratório dessa última escola, o que me iniciou à docência, isso a convite de outra

professora por quem me encantei também – a qual foi um divisor de águas na minha

aprendizagem do inglês, trazendo novas perspectivas e novos horizontes, valorizando o

que havíamos aprendido e nos incentivando a prestar exames de proficiência para

confirmarmos isso que ela dizia.

Nesse momento, estava no terceiro colegial e decidi desbravar outras cidades e

encaminhei currículos para escolas de idiomas e fui chamado de imediato em uma

escola em Sertãozinho para começar como monitor de laboratório e com poucas turmas

de nível básico e intermediário. Assim, concluí o terceiro colegial já trabalhando e

viajando – fiquei muito cansado, mas estava fazendo o que gostava. Depois desta

escola, trabalhei em mais uma, nesta, como professor e tinha várias turmas e meu

salário subira consubstancialmente – estava feliz e quase me construindo uma zona de

conforto.

O difícil é perceber o quanto essa questão da aprendizagem do inglês vai

capturando a gente, como a nossa sociedade se entrega a esta lógica, desvaloriza sua

própria cultura e aceita uma aculturação e dominação anglo-saxônica, inclusive

importando modelos ideológicos a serem implantados a qualquer custo na nossa

sociedade – poxa! Onde fica o lugar da criatividade? Será que não somos capazes de

inventar modelos próprios com a cara da nossa sociedade? Por que esse entreguismo e

rendição aos caprichos da cultura anglo-saxônica?! Claro, é preciso ver os atores, as

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ações, as recompensas e os investimentos que têm produzido e atualizado a instituição

“sociedade brasileira”.

Entretanto, acredito ser preciso resgatar uma outra questão que guardei dentro de

mim por muito tempo. Na quarta série, minha escola ficava muito longe de onde residia

e minha mãe pagava transporte (uma van que transportava vários estudantes para a

mesma escola), pois tanto ela como meu pai saíam para trabalhar e não conseguiriam

me levar à escola e, nesse momento, estávamos numa situação financeira razoável e este

transporte não era muito caro. Contudo, foi aí que comecei a sofrer bullying por alguns

meninos da minha classe, por conta da minha timidez e porque eu não gostava de jogar

futebol. Passei todo esse ano sendo perseguido por esses meninos – me empurravam,

me chamavam de homossexual (claro, com outras palavras). Alguns amigos e amigas

começaram a tentar intervir, mas não ajudou muito não. Teve uma vez que um dos

meninos chegou a retirar o órgão genital para fora dentro da van e me mostrar, falando

que era isso que eu gostava.

Isso se prolongou até o terceiro colegial, tendo apenas um curto período de

tempo de fôlego da sexta à oitava série, sendo reatado no primeiro colegial, quando

caímos na mesma sala de novo. Tentei até fazer amizade, buscando assuntos

convergentes, tal como a criação de coelhos que ambos tínhamos em comum, mas não

foi duradouro. Esse caso foi se complicando até que um dia, na aula de educação física,

eu estava tão irritado que eu enfrentei um dos meninos e o golpeei no rosto – tamanha

era a pressão dentro de mim, ainda com todas as outras preocupações. Depois deste dia,

a situação melhorou um pouco, mas deixou os professores da turma divididos – alguns

do meu lado quando contei que isso estava se passando desde a quarta série e outros do

lado do rapaz, que foi criado sem mãe e, literalmente, “jogado” pelo pai e irmãos (todos

homens). Enfim, hoje entendo um pouco melhor essa dialética, mas na época fiquei com

muita raiva daqueles que o defendiam.

A partir dessa situação, uma das minhas professoras, a de língua portuguesa,

começou a conversar comigo, me recebia em sua casa, procurava me ajudar a entender o

que estava acontecendo. Chegou a me perguntar sobre a minha sexualidade, sobre a

hipótese de eu ser homossexual – o que neguei veemente, naquele momento, pois dentro

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de mim, havia uma recusa inclusive de falar sobre esse assunto, o que cabe um subtítulo

para explorar, uma vez que ficou um pouco mais claro com o aprofundamento da

análise de implicação.

A questão da sexualidade

Quando nasci, fui o único menino nos dois lados da família (lado materno e lado

paterno), o que deixou meu pai, meus tios e meus avôs bastante atentos. Nesse sentido,

tive algumas experiências não muito agradáveis com relação à sexualidade...

Esse fato me constituiu uma pessoa que não podia nem sequer falar em sexo, em

órgãos sexuais e assuntos correlatos, vivia a minha vida sexual na adolescência de

forma absolutamente solitária, e, ainda na infância, sentia muita vergonha e me

incomodava muito as aulas que envolviam o estudo da sexualidade, dos sistemas

reprodutores masculino e feminino, assim como quando nas rodas de amigos as

conversas começavam a ir para esse lado – sempre me esquivava e me afastava. Analiso

este período como uma espécie de primeira autocastração que perdurou por toda minha

infância. Na adolescência ela também persistiu, mas acrescida da questão da

sexualidade e do bullying sofrido por colegas que me chamavam de homossexual. A

questão da homossexualidade e esse bullying, me fizeram castrar mais uma vez durante

esse período da adolescência. Via de longe meus amigos namorando, tendo seus

relacionamentos, “ficando uns com os outros” – como diriam à época, e eu sofria por

querer “não-querendo” vivenciar o mesmo. No ápice disso, direcionei minhas energias

novamente aos estudos. Isso só foi melhorar a partir dos encontros que fizeram

diferença em minha vida – encontros no sentido de convergência de estar e conviver

com pessoas que tinham outras vivências, com as que tive muitas conversas. Mais

especificamente, acredito que isso começara a se resolver por volta dos 22 anos quando

ingressei na universidade, saí de casa, e consegui me entender um pouco melhor. Mas

acredito, que tenha pesado muito também a ajuda da professora de língua portuguesa no

ensino médio ao me questionar sobre a minha sexualidade – o que já me deixou um

tanto atento para isso.

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Assim, a questão da sexualidade começou a aflorar por volta dos 17-18 anos e

com a ajuda de um grande amigo, com quem trabalhei em uma das escolas de idiomas e

com quem tive a liberdade de conversar sobre coisas que não conseguia com mais

ninguém. Eu o chamava de “gaymother”. A partir das conversas e reflexões, comecei a

me abrir e a me perceber em relação ao que me atraía sexualmente e fui desvelando a

minha homossexualidade. Aos 20 anos, tive meu primeiro relacionamento e, a partir daí,

aceitei-me enquanto homossexual, ainda que não abertamente e publicamente – foi às

escondidas. Foi no ingresso na graduação e início de um segundo relacionamento que

comecei a não me importar mais com a questão da “exposição” da homossexualidade,

tempo esse que já havia verbalizado para a família. Acho que foi como “tirar a tampa da

panela de pressão”, pois nada mais me incomodava. Minha vida foi dando um salto com

isso. E, como já mencionei, creio que foi durante o período universitário, com a saída de

casa, mudança de ares, convivendo com outras pessoas nas moradias estudantis que

comecei a me sentir cada vez mais “normal” quanto à orientação sexual. Inclusive, as

disciplinas, os conteúdos, as reflexões sobre sociedade, sobre ser humano, sobre saúde e

sobre enfermagem, sobre a sexualidade, sobre a psicologia da saúde e da educação,

dentre outras, tiveram uma contribuição importantíssima no desenvolvimento da minha

sexualidade e maior autoaceitação.

O ponto difícil de toda esta questão, foi aos 20 anos, quando contei para minha

mãe e para a avó paterna, esta última responsável por contar para meu pai, o qual teve

uma reação imediata desproporcional e agressiva, mas, depois de um tempo, ‘a poeira se

assentou’ e as relações se reequilibraram.

As perdas e a necessidade de sair da zona de conforto: início da graduação

Já como professor de idiomas há algum tempo, já começava a perceber o quanto

era explorado e a dificuldade para conseguir estabilidade por meio desta profissão,

mesmo que meu salário superava e muito a renda de todos os indivíduos da minha

família. Já começava a ficar insatisfeito, pois não conseguia sair de casa com a renda

que tinha – esse movimento começou a me despertar o interesse por fazer uma

faculdade, naquele momento, havia pensado em letras ou algo do tipo.

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Entretanto, no meio desse processo, tive a minha primeira perda. Em 2005, com

o falecimento do meu avô materno, minhas reflexões atravessadas por esse

acontecimento brusco me impulsionaram a querer ser médico. Para tanto, decidi

diminuir minhas turmas de inglês e comecei a fazer cursinho (trocando o pagamento dos

meus estudos com aulas de reforço de inglês para os estudantes da escola onde eu faria

o cursinho – proposta que fiz para as diretoras e que fora aceita). Com a minha provável

saída da escola de idiomas, meu chefe fez uma proposta encantadora, me convidando

para repensar a questão do cursinho, e eu ficaria como líder dos professores da escola e

me deu um prazo para pensar. Ao final do primeiro ano de cursinho, não conseguira

passar em nenhum vestibular de medicina, embora alguns por pouquíssimos pontos.

Isso me motivou a fazer mais um ano de cursinho, mas decidi usar minhas economias e

a escola me dera um bom desconto.

Não costumo acreditar muito em destino ou predestinação, mas fica cada vez

mais claro para mim a realidade das implicações e o poder que têm de influenciar

nossas escolhas e decisões. No segundo ano de cursinho, decidi prestar o vestibular da

Universidade de São Paulo (USP) para outro curso que não medicina, para que eu

conseguisse treinar a segunda fase dissertativa, pois a nota de corte para conseguir

passar para a segunda fase sempre era muito alta para medicina. Desse modo, preenchi

toda a ficha e deixei sem preencher o curso e quando fui entregar os documentos de

inscrição (não existia o sistema online ainda para isso), o agente me disse que eu não

tinha preenchido o curso e aí surgiu a dúvida – abri o caderno de cursos e procurei e

achei “licenciatura em enfermagem” e “bacharelado em enfermagem”. O agente me

explicou a diferença e eu escolhi a licenciatura por que se referia com a questão do

ensino, mesmo que eu tinha certa convicção de que eu não iria cursar, pois era somente

para treinar a segunda fase.

Entretanto, ocorreu que eu passei em primeiro lugar no curso de “licenciatura em

enfermagem” e tanto meus amigos como minha família e as pessoas do cursinho, me

questionaram e me incentivaram a começar a cursar, pois era um curso da USP – “como

assim eu não iria cursar, tendo passado em primeiro lugar?!” foi uma frase que escutei

muito.

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Comecei o curso e, como sempre, estudando muito e me destacando nas

disciplinas básicas, tirando 10 na maioria delas. Estranhamente, comecei com muita

repulsa às disciplinas da área da educação e me dedicando mais às biológicas, inclusive

comecei a iniciação científica com a professora de biologia celular e, em seguida, em

imunologia, disciplinas em que tive muito bom aproveitamento. Cabe destacar, neste

ponto, que teve um elemento crucial para que eu conseguisse me matricular e

permanecer ao longo do curso, que foram as bolsas e auxílios. Uma das bolsas mais

importantes foi a bolsa moradia, que consegui após passar por processo cuidadoso de

análise socioeconômica, realizado por assistentes sociais bastante atenciosas e

socialmente engajadas. Desse modo, residi nas moradias estudantis ao longo de toda

minha formação, passando anualmente pela seleção que manteria ou não a bolsa

moradia, o que me dava certo medo, pois não saberia se conseguiria continuar o curso

caso não tivesse a moradia. Outra bolsa que foi muito importante foi um auxílio que

recebi de R$ 250 mensais durante um ano por ter sido um dos melhores estudantes

advindos de escola pública – a coordenação do curso de enfermagem me chamou e disse

que era a primeira vez que esse tipo de bolsa tinha sido atribuída a um de seus

estudantes. Era pouco, mas foi fundamental para os gastos do primeiro ano. Depois

destas, consegui bolsas de cultura e extensão e bolsa de iniciação científica, assim como

bolsa de monitoria do pró-aluno.

Já no segundo ano do curso, eu descobri a possibilidade de cursar parte das

disciplinas no exterior e comecei a me candidatar às propostas em aberto na USP,

somente para aquelas que ofereciam bolsas de estudo com a maioria das despesas pagas.

Eu tinha um sonho de viajar para o exterior, nascido e despertado a partir da

convivência com meus colegas do curso de inglês. E por que não associar esse sonho

com uma ampliação do processo formativo em enfermagem?!

Desse modo, em 2011, me candidatei pela terceira vez, e foi para uma bolsa da

Universidad Autónoma de Madrid (UAM), na Espanha. Fiz provas escritas e de

compreensão auditiva em espanhol e, dos 90 estudantes da USP competindo para esta

bolsa, 20 foram selecionados para uma entrevista, dos quais 6 seriam contemplados com

a bolsa – e eu fui um desses seis. Eu não conseguia entender o sentimento dentro de

mim quando recebi a notícia! Aí, começou outra batalha – como a bolsa era da

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Universidad Autónoma de Madrid e o fomento do Grupo Santander, fui informado de

que receberia tudo (o cartão do banco Santander da Espanha, onde estariam já

depositadas as primeiras mensalidades da bolsa, o auxílio viagem, o auxílio instalação, e

receberia o voucher do seguro-saúde) quando da reunião que aconteceria no campus de

Cantoblanco, na Espanha. Me desesperei, porque não tinha dinheiro para a passagem,

muito menos para levar. Foi aí que tive a ideia de conversar com algumas pessoas de

minha cidade, os quais me deram uma bicicleta e uma televisão para que eu fizesse uma

rifa, por meio da qual consegui juntar cinco mil reais, pagar a passagem e entrar na

Espanha com um pouco de dinheiro até receber a bolsa. Esse foi mais um choque de

realidade que foi me pontuando as dificuldades pela qual estudantes de origem operária

enfrentavam na universidade, mesmo que pública.

Sair do país era um sonho que eu tinha desde quando ouvia a conversa dos meus

amigos nos cursos de inglês e espanhol, que vinham de realidades sociais outras, já

tendo vivenciado experiências de ir e vir para outros países. Desse modo, aproveitei

cada segundo, vivendo e convivendo muito longe de casa – assim tive que desenvolver

estratégias para enfrentar os problemas e dificuldades sozinho. Neste intercâmbio,

apenas cursei disciplinas, não tinha ainda a mentalidade de iniciação científica, tal como

outros estudantes selecionados comentavam que iriam fazer estágio em laboratórios,

convidar determinado professor para ajudá-los a pensar no trabalho de conclusão de

curso etc.

No retorno ao Brasil em fins de junho de 2011, passei as férias em casa e

recomecei as atividades do segundo semestre do quarto ano em agosto e continuei o

primeiro semestre do quarto ano em 2012, quando fiquei sabendo que não poderia

cursar as disciplinas do quinto ano no segundo semestre de 2012, tendo que ficar um

semestre inteiro esperando sem fazer nada. Nesse sentido, apareceu outra oportunidade

de ir para o Canadá, agora com bolsa paga pela minha universidade, na qual me inscrevi

e fui também selecionado junto com mais três bolsistas. Nessa empreitada, o foco

mudou um pouco a partir da especificidade do convênio com a universidade canadense,

em que não fomos para fazer disciplinas (isso envolveria pagamento por nossa parte),

assim, foi feito um acordo de que iríamos para fazer atividades de pesquisa que nos

ajudaria, por exemplo, com o trabalho de conclusão de curso, ou iniciação científica.

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Para tanto, tivemos a designação de professores-supervisores específicos para nossos

trabalhos em andamento. Ao término deste período (outubro de 2012 a março de 2013),

retornei ao Brasil e já comecei o último ano de meu curso, ao longo do qual, publiquei

um artigo em evento científico da área de Currículo, advindo da atividade de pesquisa

com a supervisora, o qual influenciou meu trabalho de conclusão de curso (GATTO

JÚNIOR et al., 2013).

Cabe ressaltar que durante a graduação, tinha começado com certa resistência a

fazer enfermagem, uma vez que meu desejo inicial era fazer medicina (ou devido às

influências histórico-existenciais do desejo de alcançar situações mais seguras na

sociedade) e eu comecei a fazer a enfermagem para ver como era. Entretanto, durante o

curso com minhas aproximações com a área da educação, o meu desejo de ser professor

é resgatado e isso me entusiasmou para continuar na formação que estava, mas com

novo objetivo de ser professor universitário (acho que o desejo de ser professor teve

também influência para ingressar direto no doutorado). Desse modo, me identifiquei

muito com a perspectiva das pedagogias críticas, lendo muitos livros de Paulo Freire, e

participando de discussões em grupos de pesquisa da área da educação, o que me

sinalizou algumas outras abordagens tão interessantes e provocantes quanto às de Freire,

tal como a pedagogia libertária e a pedagogia histórico-crítica (Dermeval Saviani), todas

fundamentadas na perspectiva dialética do conhecimento e contrárias aos movimentos

positivistas. Essa base foi dando certa sustentação para participar cada vez mais ativa e

engajadamente nos espaços decisórios do local onde me formava, debatendo com

professores as escolhas e procedimentos metodológicos e avaliativos, inclusive me

candidatando e ganhando as eleições para presidir o Centro Acadêmico da minha

faculdade na gestão de 2012. Foi aí que comecei a sentir certo grau de responsabilidade

diante das ações, pensamentos e atitudes quando diante da representação de uma

entidade – acho que acabei fazendo uma gestão aquém do que poderia por alguns

receios ou algo parecido.

Dadas estas implicações histórico-existenciais e inclusive a estrutural-

profissional em consolidação, não poderia deixar de ser militante do SUS, uma vez que

todo o seu projeto, ideologias, desenvolvimento se alinham integralmente com minhas

implicações histórico-existenciais da classe operária. Assim, além de me identificar

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muito com as propostas de Paulo Freire no campo da Educação, me identifiquei

sumamente com a saúde coletiva e notadamente com a manutenção e consolidação do

SUS, seus princípios, programas e estratégias, por acreditar também na saúde enquanto

um direito universal humano e opositor à lógica da Saúde como mercadoria. Isso me

impulsionou a começar a participar do SUS cada vez mais intensamente por meio de

suas conferências, sendo eleito delegado nas conferências municipal, regional, estadual

e nacional no ano de 2015, representando a região do Aquífero Guarani em Brasília e

acompanhando as discussões e votações das prioridades e propostas para a saúde,

notadamente me um ano difícil para o país, em que as eleições houvera deixado o país

dividido ao meio: ‘direita’ e ‘esquerda’, culminando com o impeachment de Dilma

Rousseff em 2016, assunção do mandato por Michel Temer, que começou um projeto

de desmanche coordenado do SUS, desde suas linhas de financiamento. Desse modo,

essa militância, de certa forma atravessará, por vezes, a escrita dos dados nesta

pesquisa.

A entrada na pós-graduação: doutorado direto

Acredito que meu ingresso na pós-graduação e, além do mais, no doutorado

direto, tenha fortes influências da perspectiva produtivista instauradas na pós-graduação

brasileira, principalmente a partir de 1996 com a institucionalização do modelo CAPES

de avaliação dos programas de pós-graduação e também apoiado nas perspectivas do

Estado neoliberal em edificação pela emenda constitucional 19/1998. Mas também,

como comentado por P12 em encontro de análise de implicação, que eu poderia “perder

a chance” (P12 – encontro para análise de implicações 3.1) de fazer o doutorado. É

complexo! Contribuiu também para me ajudar a perceber essa dimensão um trecho

analítico de um momento de novas entrevistas, em que a participante reflete sobre um

‘doutoramento precoce’ que têm acontecido:

[...] porque eu venho de uma geração de docentes que teve uma experiência

assistencial primeiro e que fez uma escolha depois né, mesmo que

concomitante tinha um vínculo, mas o estudante de hoje ele não tem vínculo

mais com a assistência né, ele tem vínculo com um outro fazer, eu não sei se

ele é bom, eu não sei se ele é ruim, eu não sei se ele vai ajudar ou não, mas

essa é uma nova geração que com 24 anos já tem o doutorado, já está

trabalhando na docência e não teve nenhuma outra experiência além dessa.

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Não sei se a gente poderia discutir isso assim né, talvez precisaria de algum

autor para nos ajudar porque, hã... não tenho- eu não tenho elementos para

avaliar. Acho que é uma outra realidade né, é como uma pessoa de 60 anos

avaliar um jovem de 18, é uma contra realidade né, nós não temos como ter

uma, uma, sei lá, uma opinião formada sobre isso. Agora, o que para mim é

mais importante de tudo isso, independente se ele teve ou não uma

experiência anterior, ou se ele fez uma escolha mais consciente, mais

madura ou não né, ou se ele foi levado por essa avalanche da formação que

ela de certa forma, ela é uma, ela é uma tendência, a pessoa acha que não

tem outra saída a não ser fazer depois mestrado, depois doutorado, depois

pós-doutorado e ser né, pesquisador e quando ela chega lá com seus 20 e

poucos anos, já pesquisador, já né, com um, com um certo status profissional

ela fica vazia porque ela não sabe exatamente onde ela chegou, ela não sabe

exatamente o que ela quer, por quê? Porque ela foi levada por essa

avalanche, por essa, por essa questão que a academia ela faz com a gente né

– trecho analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da

região sul do país – PC03.

Enfim, durante a pós-graduação tive uma diversidade de experiências que me

ajudaram a olhar melhor para as instituições pesquisa, enfermagem, docência,

principalmente. O próprio processo de produção metodológica da pesquisa, já começou

a me sinalizar algumas implicações (sobreimplicações), pois eu começo a pensar a

pesquisa ainda quando um graduando em vias finais de conclusão de seu primeiro curso

universitário, atravessado de desejos, fluxos, incentivos de um contexto em que a

sedução para ingressar o quanto antes na pós-graduação numa corrida lunática por uma

qualificação. É muito interessante como nos contagia a sede pela ascensão para

estatutos mais duráveis e mais confortáveis, notadamente nós que emergimos da classe

operária, uma vez que estes garantem certo prestígio e destaque remarcáveis dentre os

demais. Essa sedução provoca uma absorção quase que instantânea dos rótulos e

rotulações que a acompanha, misturando-se inseparavelmente, formando um uno

sedução-rótulos-rotulações – talvez pudéssemos apresentar esse uno como uma espécie

de captura, em que no jogo da sedução o conjunto de rótulos nutrem sistematicamente a

permanência e a aderência a este movimento subserviente às rotulações. Nessa trama,

percebo que começo a pesquisa pelo avesso, pela dimensão técnica, sem antes fazer um

aprofundamento teórico das fundamentações necessárias para tal (seria isto um certo

tecnicismo adquirido na minha profissão de enfermeiro?).

Entretanto, esta pesquisa, que agora tenho um pouco mais de segurança para

adjetivá-la de socioclínica e de natureza qualitativa, somente foi se constituindo como

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tal ao longo do processo. Assim, é salutar destacar como a processualidade é importante

para os múltiplos movimentos inerentes à aprendizagem enquanto produção de uma

pesquisa: aprendizagem dos fundamentos e práticas da pesquisa (filiações ideológicas e

metodológicas), aprendizagem do como produzir-se como pesquisador em um contexto

universitário que convida, relutantemente, ao mesmo tempo à aprendizagem de tornar-

se professor, quanto mais um projeto de doutorado que propõe a docência ao mesmo

tempo como objeto de aprendizagem e objeto de pesquisa. Nesta direção, a construção

do dispositivo de pesquisa foi amadurecendo durante e ao longo do processo fazer-

aprender-conhecer/conhecer-aprender-fazer pesquisa, nas interações com os sujeitos

participantes.

Esta pesquisa, então, começou a ser idealizada/planejada ao longo da formação

como enfermeiro licenciado, implicado com a docência desde a infância (relações

únicas e diferenciadas com professores ao longo da educação básica, brincadeiras que

remetiam à educação e à escola na infância, dentre outros), uma vez que para concluir

um curso de graduação no estabelecimento onde me formei existe uma encomenda – um

trabalho de conclusão de curso, como um requisito para a obtenção do grau de

enfermeiro. Mas também, o desejo pela docência – todavia não desconsiderando

também a necessidade de manutenção financeira no curso que era preponderante – me

levou a concorrer, ainda como estudante de graduação, e conseguir uma bolsa que

consistia em monitoria em alguma disciplina de graduação. Fui, então, monitor da

disciplina de didática por seis meses no ano de 2013, sob supervisão de minha

orientadora de trabalho de conclusão de curso. Ainda nesse caminho, ao ingresso na

pós-graduação em 2014, comecei também a expressar o meu desejo de estar mais junto

de minha orientadora nas disciplinas de graduação e de pós-graduação em que ela

lecionava, uma vez que todas se relacionavam com a dimensão pedagógica do trabalho

docente. De imediato, cumpri as exigências para poder ser monitor nas disciplinas de

graduação e o fui, oficialmente, no segundo semestre de 2014, primeiro e segundo

semestres de 2015 em três disciplina relacionadas com a didática. Entretanto, fui

monitor voluntário em todas as outras disciplinas em que ela lecionava, inclusive nas de

pós-graduação, após tê-las cursado como estudante de pós-graduação.

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Foram experiências enriquecedoras, pois minha orientadora e supervisora das

monitorias me instigara a participar de fato no planejamento das disciplinas, das aulas,

das atividades formativas e avaliativas, me mostrando os vários trâmites institucionais e

me permitindo experimentar e ‘experienciar’ de fato o exercício da docência e suas

implicações.

Outro ponto interessante, foi a participação nos espaços de decisão como

representante discente ao longo da graduação, que acaba inculcando no momento da

escolha metodológica, uma certa assunção de que docentes “não têm tempo para

participar de atividades fora das que têm programado em suas agendas”. Nesse sentido,

foi um pouco difícil entender, inicialmente, a divergência teórico-conceitual e

ideológica entre propor uma pesquisa-ação e utilizar-se de estratégias de pesquisa que se

associassem mais aos princípios etnográficos, pois estes satisfaziam momentaneamente

ao desejo de obter a participação dos docentes (vistos como extremamente ocupados),

causando-lhes menos incômodos possíveis e ao mesmo tempo o desejo de não furtar-me

às afiliações ideológicas impulsionadas pela identificação com os princípios da

pesquisa-ação a partir de minha implicação histórico-existencial no seio de uma família

de origem operária.

Estas reflexões foram se tornando cada vez mais inquietantes e angustiantes ao

longo da trajetória metodológica que foi se construindo e reconstruindo intensa e

incessantemente. A angústia se intensificava quanto mais eu me afiliava e me deixava

capturar, em muitos momentos imperceptivelmente, por lógicas positivistas

hegemonicamente cunhadas nos entornos dessa pesquisa, ou mesmo, por um

movimento constante e repetitivo da encomenda hegemônica de pesquisa, por vezes

materializada na fala, nos olhares, nos comportamentos, nas atitudes e, principalmente,

nos rituais da cultura institucional, como por exemplo, o incentivo à publicação, o

incentivo a aligeirar as defesas, associação do produtivismo acadêmico à manutenção da

bolsa de demanda social (a qual eu obtivera a partir do sexto mês do ingresso na pós-

graduação), o que sugeria, de certa forma, um convite a tornar a pesquisa e os dados

mais simples e mais práticos para serem publicados.

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Oportunamente, a Análise Institucional me foi apresentada, com mais

intensidade, pela professora Cinira Magali Fortuna em um momento em que assumiu a

coorientação de meu projeto quando minha orientadora Sonia Maria Villela Bueno

sofrera um problema de saúde e tivera que ser afastada das atividades acadêmicas (levei

muito tempo para perceber que tinha me colocado num processo de luto, diante desse

afastamento abrupto de alguém por quem tinha incomensurável admiração pela

pessoalidade e carisma. A Análise Institucional me ajudou a ampliar os olhares sobre o

objeto de estudo (especialmente durante o intercâmbio de Doutorado-Sanduíche à

Université de Tours com o professor Sébastien Pesce – o que detalho melhor no tópico

sobre procedimentos metodológicos, analíticos e produção de dados), me ajudando a me

afastar e me propondo um assoalho sobre o qual eu poderia pisar com um pouco mais de

segurança para produzir as análises, interpretações e escritas.

Desde então, sigo aprofundando as análises, as interpretações e a escrita da tese.

Analisando algumas características

À guisa de conclusão desta análise de minhas implicações, destacarei alguns

pontos que enxergo com relevância para esta pesquisa: origem operária e seus

fundamentos; os momentos de crise ou de grandes contradições; retorno e

ressignificação das memórias.

Nesse movimento, as contradições ou momentos de crise sempre me

provocavam reflexões e ressignificações sobre o vivido – isso proporcionou muitas

reflexões sobre questões que, até então, não tinham se apresentado a mim

explicitamente. Elas me desterritorializaram para perceber uma sociedade desigual,

organizadas em classes, em que havia diferenças de valores para as coisas e para a

utilização dos recursos do mundo. Esses momentos foram dando pistas e que, hoje, vejo

minha família de origem operária. Um exemplo desta natureza foi o contraste enquanto

estudava inglês com os filhos dos patrões.

Esses momentos de crise, forçosamente me tiravam da zona de conforto e me

impulsionaram para desafios cada vez maiores, tal como foi quando da perda de entes

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queridos e o vazio deixado me fazendo preenchê-lo com estudo e busca por uma

carreira na área da saúde. Mas também, a busca de condições de vida cada vez mais

confortáveis e menos inseguras foi também um intenso disparador na

profissionalização, marcado pela essência operária. Acho que aqui também caberia

pensar que dadas as condições de trabalho do enfermeiro na sociedade brasileira, o

pouco prestígio, também acabou impulsionando para a decisão de fazer o doutorado que

de certo modo me colocaria em possibilidade de melhorar os rendimentos e o prestígio –

professor doutor enfermeiro.

Encontrar-me na sexualidade também foi uma das crises por que passei e

resolver-me quanto a isso foi um processo, no qual os desafios e as conquistas tiveram

peso importante, me tornando mais seguro das escolhas, sabendo as justificativas e

argumentações para sustentá-las. Fica nítido no processo que a identificação com

profissões femininas, inicialmente com as professoras primárias e depois com o ingresso

e permanência no curso de enfermagem, foi um sinalizador quanto à orientação sexual

que estaria por se constituir.

Enfim, a análise de implicação (ideológico-organizacional-libidinal) foi

momento um tanto doloroso, pois resgatar algumas vivências com olhar mais apurado e

atento a detalhes (devido às novas leituras e outras experiências) me fez acessar

memórias, reinterpretando o vivido e estabelecendo algumas pistas do que produziram

em minha vida até este momento.

Um olhar sobre as implicações no desvelar desta pesquisa

No desenrolar dos encontros 3.1 e 3.2, a abordagem das implicações pelos

participantes, com relação às instituições ‘enfermagem’ e ‘docência no ensino superior’

(e também tangenciando a instituição ‘profissão’), se revelou mais explicitamente com

relação aos níveis histórico-existencial (ou ideológico) e estrutural-profissional (ou

organizacional), tocando sutilmente em algumas questões do nível psicoafetivo

(libidinal) – este, notadamente, quando um olhar sobre as implicações primárias e

secundárias. Tentaremos tratar as implicações de maneira mais integrada, pois foi assim

que se apresentaram na trama dos narrativas e falas produzidas pelos participantes, com

notável integralidade do jogo ideológico-organizacional-libidinal. Tentaremos abordar,

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também, as três principais instituições com que se preocupou nestes encontros, que

foram a profissão, a enfermagem e a docência no ensino superior, e mostrar alguns dos

atravessamentos a partir da análise feita pelos participantes nestes encontros. As

implicações do pesquisador e sua análise já foram apresentadas no tópico anterior.

Com relação à instituição ‘profissão’, foi possível perceber certas semelhanças

entre os participantes quanto às implicações histórico-existenciais, pois o foco era a

busca por condições de vida cada vez menos inseguras, em comparação com a condição

de vida dos pais (da família), os quais incentivavam na profissionalização como meio de

alcançar status e prestígios que lhes garantissem uma condição social melhor. O foco no

emprego ‘mais fácil’ de ser conseguido também foi citado, assim como a independência

financeira em relação à família. Os seguintes trechos exemplificam esta questão:

A escolha da profissão se deu sem muita reflexão acerca do que seria. Muito

jovem, 17 anos, tinha como projeto cursar uma faculdade – esse era o valor

transmitido pelos meus pais que, imigrantes, lutavam para nos dar boas

condições de vida e de inserção na sociedade. A escolha foi contingenciada

pela situação econômica de minha família que me levou a buscar a

universidade pública de minha cidade, de modo a não ter despesas, muitas

despesas para continuar os estudos. Tinha para mim que qualquer que fosse

o curso de minha escolha, me dedicaria ao máximo para ter uma profissão.

P03 – trecho de análise durante o encontro 3.2.

A questão econômica... ah, emprego! A questão econômica: emprego mais

fácil também foi um fator, porque na nossa época emprego não era fácil. P11

– trecho de análise durante o encontro 3.2.

E essa questão da sobrevivência, da gente que era de uma classe de pais

trabalhadores era muito forte. Minha mãe ainda falava, porque eu era muito

brava, “Olha você arruma um emprego senão você não vai conseguir casar.

Você não vai ter marido para te sustentar”. Então, enfermagem dava né. P12

– trecho de análise durante o encontro 3.2.

O trecho a seguir também mostra um pouco o intercruzamento das instituições

‘enfermagem’ e ‘profissão’ e o jogo das implicações ideológico-organizacional-libidinal

que se apresenta diante das escolhas:

Outra razão para minha escolha foi ter vivenciado a doença da minha vó,

pênfigo foliáceo ou fogo selvagem, e ajudar a minha mãe a cuidar dela em

casa. Depois, ela acabou sendo hospitalizada e faleceu no hospital em

decorrência de fratura no fêmur por queda no leito. Eu tinha 10 anos e fiquei

muito revoltada por perder a minha avó dessa maneira. Pensei que ela

deveria ter sido melhor cuidada. Depois aos 17 anos, perdi meu pai, após

uma hospitalização de seis meses com complicações de diabetes que levou à

amputação de parte do pé, insuficiência renal, infarto e etc. Nessa mesma

época, conheci uma enfermeira que era diretora [de um hospital

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universitário de uma universidade brasileira] ela era irmã mais velha de uma

amiga. Ela me apontou a possibilidade de eu fazer o curso de graduação em

enfermagem e de obter o meu sustento e mesmo independência financeira

que era uma preocupação da minha mãe, pois tínhamos 9 irmãos e ela era

viúva e dona de casa, e eu a filha número 5. P12 – trecho de análise

durante o encontro 3.1.

O trecho apresentado sinaliza alguns aspectos libidinais, tal como a perda de

entes queridos o que, possivelmente trouxe luto e, por consequência, um vazio que

precisaria ser preenchido, ao mesmo tempo acompanhado de revolta com relação ao

bem cuidar, que não foi visto por P12 no caso da hospitalização de sua avó – o que

poderia incitar o desejo de fazer melhor. Ao mesmo tempo, percebe-se o incentivo

materno e também das próprias condições familiares para a busca de mais segurança e

independência financeira (a busca pelo dinheiro), que caracteriza sua implicação

histórico-existencial e ao mesmo tempo pode sinalizar certa negação das condições de

vida dos pais (não passar pelo que passaram).

Ainda, quanto às escolhas profissionais, é possível destacar quanto ao nível

libidinal das implicações, a partir dos trechos seguintes, o quanto a família tinha um

peso sobre as escolhas, notadamente sobre a mulher, que à época convivia com

condição de submissão:

Minha família, e em especial meu pai, tinha um sonho de ter um filho que

seguisse a área da saúde e, nesse sentido, eu fui a escolhida. Na época, eu

aceitei realizar o seu desejo, mas tinha clareza que não era o meu. O que eu

gostaria de ter estudado era história, antropologia, mas meu pai não via

futuro para esta área. [...] a mulher não podia tomar algumas decisões

assim, sem... a família era muito forte né, aquilo que a família impunha, ne, e

era tudo uma coisa muito assim, eu vivi muito isso. Então, você fica

pensando o quanto isso depois vai influenciar na profissão. P08 – trecho de

análise durante o encontro 3.1.

Essa era a história daquela época, sair para fazer, não coloquei isso, mas

sair para fazer faculdade não era a perspectiva que se tinha para aquele

momento, para as mulheres. P07 – trecho de análise durante o encontro

3.1.

Entretanto, ao longo do desenvolvimento profissional, P08 foi reafirmando que

não era com a enfermagem que se identificava, dadas as tentativas e desencontros na

atuação, encontrando um eixo que resgatava o desejo anterior de formação na área de

humanidades, por meio da docência, tal como se expressa no seguinte trecho:

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imagina eu, com toda essa história de não querer ser enfermeira, meu

primeiro emprego foi na Santa Casa de misericórdia de [...], em que as

Freiras eram as enfermeiras que davam as ordens. Jesus! A hora que eu me

vi, que elas me puseram no centro cirúrgico para eu lavar parede, eu chorei

tanto, que eu falava assim “eu já não queria fazer enfermagem, ainda tenho

que lavar parede, como que é isso, eu não posso” pedi transferência na

primeira semana que eu fiquei no centro cirúrgico, “vou pedir

transferência”: me puseram na UTI, ai pronto, piorou a situação, pedi

demissão! Falei “não é isso que eu quero” vou fazer outra coisa... P08 –

trecho de análise durante o encontro 3.1.

As implicações histórico-existenciais também se manifestaram quando da

escolha da profissão em si, uma vez que a busca de profissões com maior prestígio

social, tal como a medicina que, de certo modo, insere o sujeito numa condição social

um tanto mais confortável e segura e, no campo da saúde, a medicina ocupa a

hegemonia nas relações de poder:

a Enfermagem não foi a minha primeira opção. Fui estimulada por um

médico, amigo da família, que cuidava de minha avó paterna, a fazer

medicina e, como ele queria me estimular, sempre me chamava para

acompanhar as consultas e os procedimentos que ele fazia, punção e etc...

porque a minha avó ficou acamada por um bom tempo. Enfim, assumi que

queria prestar medicina ao terminar o colegial, antigo ensino médio, me

inscrevi em várias faculdades, viajei por são Paulo, Minas Gerais e Paraná,

com o grupo de aspirantes a médico. Primeiro ano de vestibular sem

sucesso, fui fazer cursinho, mais um ano de estudo, diversas provas de

vestibular sem sucesso, fiquei muito decepcionada e voltei para minha terra

natal, com a intenção de fazer um curso de datilografia e começar a

trabalhar. [Risos]. [...] Não cheguei nem a me inscrever no curso de

datilografia, uma amiga veio com uma notícia que a faculdade de Bauru

havia aberto um curso de enfermagem e que o vestibular seria nos próximos

dias. Fui para Bauru acompanhada pelos meus pais e, enfim, consegui

passar no vestibular. Neste momento, a enfermagem foi a luz no fim do túnel

e nunca mais pensei em fazer medicina. P07 – trecho de análise durante o

encontro 3.1.

Entretanto, um trecho de P07 demonstra, que após o insucesso na tentativa de

entrar no curso de medicina, acabou optando por uma opção de profissionalização na

enfermagem e, ainda, escolhendo uma especialidade que lhe garantia, de certo modo,

um pouco mais de autonomia e liberdade quanto à hegemonia médica no setor saúde –

na área de enfermagem obstétrica, conforme analisado pelo participante no seguinte

trecho:

Eu pensando agora, por exemplo, quando eu estava estudando, fazendo

enfermagem, a obstétrica me chamava muita atenção, porque essa área da

obstetrícia parece que dá muita autonomia para o enfermeiro né. Aí, eu fui

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fazer, naquela época nem era especialização era habilitação em enfermagem

obstétrica, né, a gente fazia três anos da faculdade depois você escolhia...

[...] é não eram todas... aí, enfim, eu continuei trabalhando minha vida

inteira dentro, a minha vida profissional enquanto enfermeira na obstetrícia,

e aí, assim, é... a gente não tem muita clareza né, porque isso sempre foi uma

coisa que chamou muita atenção – a autonomia...fazer a própria assistência

ne. Enfim, eu acho que isso marca um pouco essa, essa escolha também né.

P07 – trecho de análise durante o encontro 3.1.

Em relação à instituição ‘docência’, ou ainda, ‘docência no ensino superior’, os

motivos do ingresso na docência foram vários, e do ponto de vista das implicações,

pode-se referir às análises feitas pelos participantes:

Busca por maior estabilidade e atuar para a melhor profissionalização dos

trabalhadores enfermeiros para atuarem no sistema de saúde a partir de

experiências pessoais:

Na época, exercia a profissão como enfermeira da secretaria municipal de

saúde de [...] e como docente em universidade privada. Estava, até certo

ponto, satisfeita com meu trabalho, no entanto o contrato na universidade

privada era algo instável e sempre pairava a dúvida se seria renovado.

Assim, em busca de maior estabilidade futura optei por tentar o trabalho

como docente aqui dentro, integral. Outro elemento fundamental dessa

escolha foi eu perceber a fragilidade da formação dos profissionais

enfermeiros quanto à adequação do desempenho as necessidades do campo

de atenção básica, o que me levou a investir em alguns processos de

formação e instrumentalização pedagógica, que posteriormente contribuíram

para minha atuação como docente. Também apostava no projeto de como

docente contribuir para o fortalecimento de elementos fundamentais para o

funcionamento do sistema de saúde, no qual estava imersa como enfermeira.

P03 – trecho de análise durante o encontro 3.2.

O desejo de ser docente desde antes da formação em enfermagem, também foi

um dos motivos para o ingresso na atuação como docente no ensino superior:

Então, por que eu segui a docência? Independente da escolha da

enfermagem eu seguiria para a docência, sempre tive grande satisfação em

reproduzir o que eu havia aprendido, sempre fiz grandes reflexões sobre o

que eu havia aprendido e ensinado no sentido de melhorar, aperfeiçoar para

sempre ensinar melhor. Então, sempre busquei saber mais, inclusive a

aplicabilidade de conhecimento para que meu aluno tivesse grande

possibilidade de compreender o que eu havia ensinado e que ele pudesse me

dar retorno disso para minhas reflexões e meu aperfeiçoamento. [...]. Então,

não foi estar na enfermagem que me trouxe para a docência eu já tinha

minhas tendências [Risos], desde o colégio eu já pensava em ser professor.

P11 – trecho de análise durante o encontro 3.2.

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O desejo de seguir ou resgatar uma vontade inicial – castrada pelo patriarca – de

se formar na área de humanidades, foi um dos motivos que encaminharam as

escolhas de P08 para a docência:

Fiz a opção na área de saúde mental, pois encontrei nessa área possibilidade

de trabalho com o olhar menos biologicista e que permitia transitar por

outras áreas de saber. Dentro do contexto da saúde, me inseri na docência,

primeiro como professor da área de saúde mental, com trabalhos em grupos

no qual entrei em contato com a psicanálise [...] e posteriormente a área da

educação. A área da educação abriu outras possibilidades para ampliar o

olhar para o papel do professor, sua formação pedagógica buscando leituras

da pedagogia crítica e outras que pudessem subsidiar o trabalho docente.

P08 – trecho de análise durante o encontro 3.1.

Quando da análise das implicações primárias e secundárias no campo da

pesquisa, nesta pesquisa os participantes começaram a fazer este movimento e

sinalizaram algumas das implicações de nível ideológico-organizacional-libidinal:

Um participante inclusive se aventura em analisar o quanto foi interessante

escrever e falar sobre as implicações, pois ajudou a reviver/revisitar e analisar as

implicações, referindo que ajuda a rever o caminho que foi seguido, conforme o trecho:

Eu por exemplo, que não queria fazer na área da saúde né, eu não queria, eu

acabei dentro da saúde encontrando algumas alternativas para aliviar um

pouco essa, né... aí, eu fui para uma área que me deu possibilidades de... é...

ir um pouco além né, mais na área de humanas ne, digamos assim, é

interessante. Eu já tinha pensado isso assim, já tinha feito essa análise mais,

é legal quando a gente escreve aqui, porque, aí, você vai retomando né, a

vida, o caminho, os caminhos que a gente foi, foi seguindo. P08 – trecho de

análise durante o encontro 3.1.

Outro participante destaca implicitamente como a relação professor-estudante,

entre o participante (professor) e o pesquisador (estudante de doutorado) se estabeleceu

no sentido de ser um dos motivos para a participação ser ajudar o estudante na

continuidade da formação de pós-graduação, tal como está no seguinte trecho:

Aceitei participar da pesquisa também pela pessoa do pesquisador, o

conheci como aluno de graduação, que se destacava na inquietação

mostrando compreender os processos de formação preocupado em ajudar e

apoiar colegas com mais dificuldades, desde então preocupado com o

processo formativo. Assim participar dessa pesquisa é uma forma de apoiar

o pesquisador que interessado em temática do meu interesse, e auxiliar na

continuidade de formação de um ex-aluno. P03 – trecho de análise durante

o encontro 3.2.

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Em outro trecho, P12 destaca o desejo de colaborar com a pessoa do

pesquisador, assim como o de aprimorar os conhecimentos na questão da docência,

como elementos que contribuíram para a participação nesta pesquisa:

Por que eu vim participar dessa pesquisa? Em primeiro lugar, para

colaborar com você, [fala o nome do pesquisador], mas também para buscar

respostas para minhas indagações sobre minha prática docente,

pesquisadora e enfermeira na [universidade em que trabalhou], me sentia

frustrada na carreira, queria voltar a ser enfermeira e estar cuidando das

pessoas e graças a Deus me aposentei nessa época. [Risos]. P12 – trecho de

análise durante o encontro 3.1.

Teve um dos participantes que apresenta uma demanda por meio de uma

expectativa em relação ao motivo porque veio participar desta pesquisa:

Porque a pesquisa? O tema da docência e do ensino de enfermagem me

instigou a participar deste momento também tenho a expectativa de

compreender os avanços e retrocessos que vivenciamos nos processos de

mudança de currículo e criação de novo curso na escola de enfermagem vem

tendo. P07 – trecho de análise durante o encontro 3.1.

Este trecho também sinaliza um desejo pelo saber, pelo conhecimento sobre as

mudanças, o que se refere, de certo modo com a implicação libidinal (saber alimenta).

Em outro trecho, a encomenda da universidade-empresa e seu produtivismo

acadêmico são trazidos à tona, quando se tocam no assunto da formação rápida de

doutores e também da insignificância do currículo após a aposentadoria:

E os alunos de graduação eu percebo que eles aprendem isso bem rápido,

sabe? [...] tem uma iniciação, mas não só ter iniciação eles têm que publicar,

eles têm que fazer isso, fazer aquilo para entrar na pós-graduação e depois

ter um emprego, ser professor e muitos terminam o doutorado e voltam sim,

para praticar, porque eles não tão conseguindo emprego como professor

universitário com doutorado, né. Voltam até fazer uma especialização para

se capacitar em alguma coisa. E não tem tempo de fazer bem feito e

aprender. P12 – trecho de análise durante o encontro 3.1.

Este trecho mostra um pouco que a universidade busca alcançar sua encomenda

de se espelhar no desenvolvimento de países do Norte, copiando modelos formativos e

de processos de gestão importados de países anglo-saxônicos, tomando isso como meta

a qualquer custo, negando sua própria história e existência assim como a do seu povo,

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colocando o outro (o estrangeiro) como parâmetro de qualidade. Neste ensejo, os atores

sociais, desapercebidos, entram nesse jogo e, muitas vezes, servem como um simples

número nas quantificações que qualificam quantitativamente as universidades nos

rankings. Ao sair dos processos formativos, alguns estudantes não têm perspectivas

profissionais e dificuldades de inserção, uma vez que tendo o título sem experiência

profissional, nem o setor privado e nem o público os qualificam muito bem

(REFLEXÃO EXTRAÍDA DE DIÁRIO DE PESQUISA, COMPLEMENTADA PELO

TRECHO DO PARTICIPANTE).

Tem lá o certificado no meu currículo [...] que agora, mais uns dias eu vou

tacar fogo em tudo. Em casa, já me falaram que não tem mais espaço, os

armários custam caro, vamos guardar outras coisas que são importantes.

P12 – trecho de análise durante o encontro 3.1.

O trecho apresentado pode sinalizar o que está sendo produzido com os

currículos dos docentes na universidade empresa, no produtivismo acadêmico, o que

denota o peso da análise deste participante ao dizer que todo aquele conteúdo de seu

currículo não tem importância e vai ser destruído – ora, só se destrói aquilo que não faz

bem, que incomoda, que não faz sentido.

Sem a pretensão de esgotar esta análise, pois há diversos modos de olhar para a

mesma, fica sinalizado que a participação nesta pesquisa foi motivada por pelo menos

dois aspectos ‘apoiar o pesquisador em sua formação’ e ‘conhecer um pouco mais sobre

a docência’. O primeiro aspecto desvela uma série de implicações, principalmente a

relação-professor-estudante, a identificação com a militância e características da

pessoalidade do estudante/pesquisador. O segundo aspecto denota principalmente o

desejo de profissionalização docente, uma vez que os participantes sinalizam isto como

critério de decisão para participar e continuar as reflexões sobre a docência.

Este último aspecto, e as peculiaridades de cada participante, estão em

consonância com o que foi apresentado ao longo desta tese quanto ao desenvolvimento

profissional docente, na dimensão da professoralidade (professor como profissional e

como pessoa) (ISAIA; BOLZAN, 2007; BOLZAN; ISAIA, 2010; BOLZAN;

POWACZUK, 2013), mas também considerando as influências dos estabelecimentos

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(NÓVOA, 1992) e aqui estamos sinalizando as influências das instituições (instituído,

forças instituintes e processo de institucionalização).

Algumas reflexões sobre as implicações primárias e secundárias nesta pesquisa

Com relação às implicações primárias e secundárias, em alguns momentos desta

pesquisa, o dispositivo de pesquisa foi colocado em análise pelos participantes, uma vez

que são também pesquisadores, inseridos nas mais diversas modalidades de pesquisa e

fazendo o exercício de se colocar como participante de uma pesquisa.

Um primeiro movimento dos participantes em relação ao dispositivo de pesquisa

começa com um participante que, antes mesmo de concluir o momento da análise de

papel (principalmente nos dispositivos 1, 2 e 3) sai da pesquisa com o discurso de que

seus dados não contribuiriam para a pesquisa e que poderiam enviesar o estudo –

quando se olha para isso, percebe-se alguns atravessamentos em relação ao papel que o

participante estava assumindo diante desta postura (o de pesquisador) e ao mesmo

tempo revela a preponderância de sua ideologia do que é ‘pesquisa’ sobre a ideologia de

pesquisa do próprio pesquisador responsável. De certa maneira, isso começa a sinalizar

a necessidade de evidenciar mais explicitamente os fundamentos e pressupostos da

pesquisa. Como já discutido no tópico ‘percurso metodológico, analítico e produção dos

dados’, esse fato influenciou e, de certa forma, causou um pouco de enrijecimento na

forma de continuar a pesquisa, quase que transitando para ideologia que não era de

identificação do pesquisador e nem tinha coerência para o objeto de estudo – o

positivismo científico. O seguinte trecho de reflexão do diário de pesquisa ajudou nessa

análise:

Uma questão interessante a ser destacada foi o caso de uma das participantes

que desistiu antes mesmo da entrevista e de ter passado um pouco mais de

tempo na pesquisa, alegando que os dados que eu obteria com ela poderiam

prejudicar os resultados da pesquisa, pois o caminho escolhido por mim não

conseguiria alcançar a sua “real prática pedagógica”, sugerindo que eu fizesse

mais observações em variadas disciplinas em que ela lecionava. Contra-

argumentei naquele instante, que se tratava de apenas um momento inicial de

vários para levantar pontos a serem mais bem explorados durante os

encontros coletivos, mas que haveria também uma restituição individual para

discutir o que produzimos enquanto dados no momento exploratório e que a

preocupação dela era pertinente, pois o questionamento dela começava a

apontar um modo de olhar para o pedagógico fundamentado na didática

instrumental (Pimenta e Anastasiou, 2010). Foi aproveitado o momento para

convidá-la a ficar um pouco mais na pesquisa e também usar seus

conhecimentos de pesquisa para provocar esse tipo de reflexão que era

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importante, mas ela optou por findar suas contribuições. Naquele momento,

ouvir isto de uma pesquisadora recente na instituição me provocou alguns

sentimentos: angústia de poder ter feito escolhas metodológicas erradas

(erradas na perspectiva da avaliação da participante); desconfiança da

lealdade e da veracidade dos argumentos utilizados para cancelar a

participação na pesquisa (o medo de se expor, por exemplo, pode ter

impulsionado essa decisão). Isso me provocou a “endurecer um pouco mais

as escolhas”, fazendo explicitar um pouco mais as implicações positivistas

que ainda estavam em ‘segundo plano’ (ANOTAÇÃO DO DIÁRIO DE

PESQUISA).

Outro momento, em que o dispositivo de pesquisa foi colocado em análise, foi

durante o primeiro encontro (o encontro sem objetivo), em que os participantes se

mostraram bastante inquietos para terem mais clareza e objetividade quanto ao objetivo

da pesquisa em si, deixando, por momentos, de discutir os dados apresentados para

discutir o objetivo e o delineamento metodológico da pesquisa.

Por fim, um último momento em que o dispositivo foi analisado, foi durante o

encontro 2.2, em que a preocupação passou a ser a amostragem dos participantes. A

preocupação era a representatividade do problema, uma vez que participavam 12

professores de um conjunto de 88, o que representaria, estatisticamente falando, 13,7%

dos professores do estabelecimento. A preocupação era que poderia ser que os

participantes que vieram para a pesquisa fossem aqueles que, de certo modo, já

estivessem mais envolvidos e, portanto, que outros menos envolvidos não participaram.

Isso sinaliza um olhar para a pesquisa, em que se trata o objeto de estudo como algo

passível de ser capturado a partir apenas dos padrões de repetição, e condicionado pelas

estatísticas e probabilidades.

Isso se o foco desta pesquisa tivesse sido os padrões de repetição, o que não é o

caso. Uma vez que se busca, nesta pesquisa, o inédito, o espontâneo, aquilo que

surpreende, por meio de variadas fontes de informação e de produção de dados

(documentos, imersões no campo de pesquisa, uso de diário de pesquisa para anotação

de acontecimentos, reflexões, inquietações, entrevistas, observações, composição e

organização dos dados produzidos com restituições individuais e coletivas). Nesta

pesquisa, o que se repete é entendido como superficial e generalizado, o diferente, o

específico e a produção das subjetividades é que nos ajuda olhar para os resultados de

uma pesquisa na sua complexidade, apoiando o processo interpretativo e de escrita. O

que se passa no microespaço são as eclosões do inédito, do novo, do inesperado, do

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aleatório e o que se percebe no macroespaço são as regularidades (BAREMBLITT,

1996). Desse modo, a potência da produção de inéditos está no trabalho com os

microespaços, em que forças instituintes podem se encontrar, por ora, em latência.

Entretanto, a título de se obter um olhar mais ampliado, outros documentos mais gerais,

outros estudos sobre o mesmo local de estudo, dentre outros, foram acessados para

suprir, de certo modo, essas demandas.

É interessante perceber como a produção dos dispositivos de pesquisa são

influenciados tanto pelas implicações do pesquisador como também pelas implicações

dos participantes, em um movimento constante de pensar-repensar as escolhas e modos

de produzir a pesquisa. Assim, foi possível ir percebendo algumas de nossas

implicações secundárias e trabalhando sobre elas, quando das escolhas feitas durante a

pesquisa – isso ora ajudou a repensar alguns caminhos e escolhas, ora ajudou a

encontrar maneiras de reafirmar posicionamentos ideológicos.

ALGUNS DISPOSITIVOS PARA INSTITUCIONALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS

NEOLIBERAIS E DA NOVA GESTÃO PÚBLICA SOBRE A DOCÊNCIA NA

UNIVERSIDADE ESTUDADA

Um estudo (MINTO, 2006), ao analisar as reformas do Ensino Superior no

Brasil, traça algumas características fundamentais para a compreensão da evolução

ideológica do ensino superior no Brasil. Ao tratar destas reformas desde o Golpe de

1964 (que instaurou uma ditadura militar elitista), o autor destaca a ênfase privatista

sobre a educação e, em especial, sobre a educação superior, o que perdurou e

influenciou todas as reformas praticadas nesse período sobre as questões universitárias.

Autores referendam que as reformas sobre o ensino superior acontecidas ao longo do

governo militar elitista foram continuadas e intensificadas em sua ideologia privatista,

antidireitos e anticonquistas sociais, de caráter utilitarista e voltada para a formação para

o mercado de trabalho capitalista, especialmente nos governos da aliança social-liberal

(MINTO, 2006; SILVA JÚNIOR, 2007).

Minto (2006) destaca, também, que nos anos 1990 e 2000, muitos substantivos

começaram a ser atribuídos ao ensino superior público, tais como, sucateamento,

mercantilização, precarização e muitas pesquisas feitas durante este período

denunciavam a partir de seus resultados os efeitos das políticas implementadas pelos

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governos da década de 1990 sobre a educação, retratando uma universidade em ruínas

(TRINDADE, 1999), a desconstrução da universidade (DIAS SOBRINHO; RISTOFF,

2000), o aspecto operacional da universidade (CHAUÍ, 1999).

Alguns autores expressam de forma contundente a prevalência dos ideais

neoliberais nas reformas que aconteceram nos governos da década de 1990, visando à

preparação de um arcabouço de sustentação para a consolidação de práticas e medidas

de controle estatais mais atinadas com o capitalismo global (PAULA, 2005; MINTO,

2006; SILVA JÚNIOR, 2007; PAULA, 2010).

Nessa direção, começaram certos marketings políticos para a consecução da

almejada privatização da universidade pública ou mesmo a mercantilização do ensino

superior brasileiro. O dispositivo da divulgação midiática insistente, da repetição de

notícias superficiais sobre a educação superior pública, elaborado pelo ministro da

Educação Paulo Renato Souza, do governo FHC, buscou por meio do convencimento

repetitivo da população, ganhar a opinião pública para conseguir implementar reformas

pretendidas (MINTO, 2006), e acreditamos que isto se alinha com a perspectiva

gerencialista que Bresser-Pereira vinha elaborando para a Reforma do Estado Brasileiro

(PAULA, 2005; 2010).

Assim, percebe-se que, após a preparação do terreno com ‘arados neoliberais’,

alguns dispositivos foram sendo construídos e solidificados para que o objetivo final

fosse alcançado de uma forma ou de outra. No caso da Educação Superior Brasileira,

um fato bastante interessante que ocorre a partir dos anos 1996/1997/1998 foi a

concepção do “modelo CAPES de avaliação” para avaliar aquilo que passa a ser a

menina dos olhos das universidades – os programas de pós-graduação e as produções

científicas dos docentes universitários. Esse movimento atribui à CAPES a função de

agência estatal reguladora, controladora, de acreditação e financiamento sobre a

produção científica dos docentes universitários, em que os discursos de padrões, de

índices, de instrumentos quantificáveis tomaram conta do processo de avaliação,

portanto, classificatória. Nesse modelo, a qualidade dos programas de pós-graduação e

suas produções científicas passaram a ser entendidas como ‘fazer cada vez mais pontos’

dentro dos preceitos e convencionalismos das tabelas e fichas de pontuação afixados por

cada comissão de áreas da CAPES, já que o art. 7º do decreto n.º 2026 de 10 de outubro

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de 1996 refere que “Cabe à CAPES a avaliação dos cursos de mestrado e doutorado,

que será realizada de acordo com critérios e metodologia próprios” (BRASIL, 1996b;

ALCADIPANI, 2011; SGUISSARDI, 2013; CAPES, 2016d).

Ao analisar o relatório da avaliação quadrienal da área de enfermagem na

CAPES, observa-se um processo de avaliação quantitativa ou quali-quantitativa,

visando quantificar a produção para a obtenção de números, chegando-se a uma

pontuação numérica para cada revista, livro, produções técnicas, dentre outros que

posteriormente auxilia na obtenção de uma nota para cada programa de pós-graduação

(valor de 0 a 7 pontos) por meio de uma ficha de avaliação. Neste documento, cita-se

também que os critérios utilizados foram debatidos em encontros com coordenadores

dos programas de pós-graduação brasileiros. O foco da avaliação são os artigos

publicados em periódicos classificados nos Qualis A1, A2 e B1; algumas

parametrizações quanto a defesas e tempos de defesa (cada vez mais estimulando

tempos menores de defesa pelo reforço positivo da melhor pontuação em relação ao

quantitativo de pós-graduandos), dentre outros (CAPES, 2017). Nessa direção, em

momento de novas entrevistas, uma participante faz uma importante reflexão sobre uma

característica particular que o produtivismo acadêmico, desencadeado pelo modelo

CAPES de avaliação, tem provocado sobre a produção de conhecimentos:

E aí a gente criou um sistema para dar ainda mais força à perversidade, nós

somos, nós criamos um sistema que é... de que para mim é de auto

escravização, é... a gente bota o chicote na mão mesmo, na mão assim nosso

e do colega e chicoteamos a nós mesmos e o colega, que é a cada, a gente

decidiu que a cada quatro anos, para corresponder ao ciclo da própria de

avaliação da CAPES, a cada quadriênio a gente faz a avaliação, quem fica e

quem permanece e quem não permanece, e tem alguns critérios. Critério é se

teve projeto no período, projeto de pesquisa no período, se teve

financiamento, se teve bolsa financiada, que aí pode ser PIBIC, pode ser

mestrado ou PIBIC, é... se teve projeto já falei, se teve orientação no

período, se é... ministrou disciplina no período, então são poucos critérios da

própria CAPES pra manter o professor como permanente, e o ápice da

doidice, da perversidade é ter feito 600 pontos, programa de mestrado se é...

tem publicação que som no mínimo 600 pontos no quadriênio, esses são os

critérios. Então, aí é e o mais engraçado é que fica todo mundo enlouquecido

para permanecer nessa fábrica de fazer maluco, entendeu? Então, em vez de

as pessoas se rebelarem, “não! ”, as pessoas ficam enlouquecidas fazendo

de tudo, inclusive, eu acho que utilizando de recursos não muito éticos para

se manter produtivo, é para garantir que fez 600 pontos. E aí cumprindo

requisito também, que é de orientação da CAPES, fica todo mundo doido

para não publicar em periódicos que sejam menor que B2, e aí como a gente

está pleiteando um doutorado, e para manter, até para manter essa nota 4,

é... a orientação é que a gente não publique em periódico inferior a B1. E aí

a pressão para ir para A, entendeu? Então não é fácil. [...] esse é um

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questionamento que... não é... algo que está na preocupação da maioria dos

docentes não. Eu percebo muito mais que as pessoas elas, na verdade, não

questionam e... causa enorme estranhamento quando alguém questiona,

entendeu? Estou vivendo um momento, mas aqui é de as pessoas seguires,

meio que cegamente, as determinações sem questionar que determinações

são essas. E muito menos questionar que produção é essa. Eu

particularmente acho que a grande parte do que a gente produz não serve

para nada, a não ser para rechear currículo Lattes, entendeu? Não vejo

muita preocupação do quanto é... preocupação sobre o impacto ou a

importância que a produção vai ter, por exemplo, na realidade, não vejo

preocupação com isso. Na verdade, a preocupação é vamos produzir porque

a gente precisa cumprir os critérios, nós precisamos desses pontos, porque

nós temos que ter doutorado, mas um doutorado para quê, entendeu? Não é?

Para que você quer doutorado? Doutorado, não existe essa preocupação,

esse questionamento, um doutorado para quê? Para servir a quem?

Entende? É... para [...] manutenção e reprodução de uma vaidade acadêmica

e porque convencionou-se que um curso que não tem pós-graduação ele não

avança. Mas não avança em que sentido? É assim, ele não avança porque a

gente não consegue financiamento, porque a gente não consegue

visibilidade, porque a universidade não co... entende? Então, no fundo no

fundo me parece que a preocupação é muito mais de dar a resposta a uma

demanda externa que é uma moeda de troca, certo? Se eu tenho pós-

graduação a universidade recebe mais, eu posso receber financiamento, e se

eu não estiver vinculado a uma pós-graduação, eu não posso pleitear a

minha chance de conseguir uma bolsa do CNPq [...] eu não vou conseguir

financiamento, entende? - trecho analítico de nova entrevista com

professora-enfermeira da região nordeste do país – PC02.

Outro ponto a considerar é a internacionalização que é usada como critério

dentro das fichas de análise, mas que é revisitada no momento de atribuição das

pontuações dos programas que ficaram no intervalo 6-7. Nesse momento, visa-se a

comparação dos programas com programas internacionais chamados de ‘excelência’ e

que, curiosamente, pertencem ou estão sediados em países de origem anglo-saxônica

(Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, Austrália) (CAPES, 2017).

Desse modo, não se pode esquecer que o modelo atual de pós-graduação foi

importado dos norte-americanos e consolidado em território nacional a partir do Parecer

977 de 03 de dezembro de 1965 (ALMEIDA JÚNIOR et al., 2005), o que já causava

preocupações quanto às pesquisas de natureza local e que são necessárias para o

desenvolvimento do país, em detrimento de pesquisas que apenas respondiam aos

interesses e moldes americanos de pós-graduação (SGUISSARDI, 2013). Não seria de

se estranhar, então, que as referências para ‘analisar e medir’ a produção de pós-

graduação brasileira fossem importadas do mundo anglo-saxônico, já que o modelo

contemporâneo de gestão e produção do Estado estava na perspectiva gerencialista,

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implementado por Bresser-Pereira durante o governo FHC, também fora embasado nos

referenciais ingleses.

Neste caminho, assim como apontado por pesquisadores da educação superior

brasileira (MINTO, 2006; SILVA JÚNIOR, 2007), em ressonância com o que

pesquisadores da nova administração pública denunciaram para a gestão pública

gerencialista e neoliberal (PAULA, 2005; 2010; DASSO JÚNIOR, 2014), percebeu-se a

chegada e instalação na universidade pública do ideal neoliberal, como referido por

Chauí (CHAUÍ, 2003) que a universidade se consolidava cada vez mais como uma

organização social (lógica empresarial) e se afastava cada vez mais de uma instituição

social. Discursos da eficiência, eficácia, corte de gastos, economia de recursos,

avaliação quantitativa por produtividade, empreendedorismo, internacionalização,

dentre outros, apareceram com grande veemência nas universidades públicas. Ainda,

Schwartzman (2001) destacava que os desejos eram de fazer com que as universidades

públicas alcançassem as prerrogativas do Banco Mundial e da UNESCO – começaram a

surgir cursos mais enxutos e rápidos (2 e 3 anos), oferecidos à distância e, sumamente, a

transferência (“abandono”) da responsabilidade pelos orçamentos às próprias

universidades (accountability?).

Nesse ponto, é possível recorrer à análise que um dos participantes desta

pesquisa fez. Neste caso, é um trecho analítico de uma das novas entrevistas que

desperta a reflexão para esta direção da encomenda internacional para a educação

superior no Brasil:

Nós temos um ensino no nosso país que ele é, hã... quase que 100%

financiado por recursos internacionais. Se a gente for pensar que, mais de

85% das estruturas de formação, hoje, universitárias no nosso país elas são

privadas e cerca de 15 a 17% são públicas, nós temos um contexto de

formação para o mercado. Então, a universidade brasileira, ou ela é

financiada por empresas grandes gestoras do ensino privado, que não são

brasileiras, nós sabemos que nós estamos na mão de 3 ou 4 grandes

empresas, ou nós temos 15% da nossa formação subsidiada pelo Estado e

que não é o Estado que subsidia, é a OECD, que são os organismos

internacionais né, que é a UNESCO, que são essas estruturas que a gente já

conhece vinculadas ao Banco Mundial, ou seja, o nosso ensino no país é

todo financiado por dinheiro internacional. O que acontece nesse sentido?

Nós estamos à mercê das legislações internacionais, inclusive do perfil

profissional do egresso, quem é o egresso que a estrutura internacional

quer? É um egresso que tenha experiência internacional, que fale mais de

uma língua, que domine uma série de práticas hã, virtuais né, técnicas e

estratégias virtuais, que seja uma pessoa que reconheça um laboratório de

pesquisa, porque eles querem pesquisadores né, que supram as necessidades

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de formação desse mercado internacional, que absorve quase todos nossos

excelentes profissionais aqui do Brasil – trecho analítico de nova entrevista

com professora-enfermeira da região sul do país – PC03.

Na universidade estudada é possível acompanhar como essas concepções

neoliberais começaram a se consolidar cada vez mais forte e claramente a partir do

‘discurso da crise’ da universidade iniciado mais enfaticamente entre o final da gestão

2010-2013 e a gestão subsequente de 2014-2017. Nesses momentos, a universidade

começa a passar por algumas reformas e contenções de gastos, tais como a instituição

do de programas de demissão para os servidores a partir de novembro de 2014 (DOC-

31; DOC-48), programas de redução da jornada de trabalho (DOC-48; DOC-49), a

reformulação do estatuto docente, em que houve certa flexibilização no tipo de

contratação e regime de trabalho, instituindo e regulamentando novos regimes, por

exemplo de 24 horas/semana em atividades de ensino-pesquisa-extensão, não sendo de

dedicação exclusiva e o regime de 12 horas/semana em atividades de ensino, não sendo

também de dedicação exclusiva, a partir de novembro de 2016 (DOC-26). Acredita-se

que esta divisão de regimes de dedicação à docência tão diversos pouco contribua para o

fortalecimento da carreira docente na universidade pública, fragmentando ainda mais a

atuação do corpo docente, que já tinha um plano de carreiras muito divido em questão

de poder de atuação nos espaços de decisão na universidade e assunção de funções e

cargos gerenciais.

Soma-se a esta questão, a mudança na política de contratações docentes na

universidade estudada. Em 2010, houve uma modificação numa resolução de 1999, a

qual tocava sutilmente na questão da contratação de pessoal e de contratos de prestação

de serviços. Assim, o reitor baixa outra resolução no mesmo ano (DOC-53), que começa

a disciplinar a contratação de docentes por prazo determinado, enunciando alguns casos

em que isso seria permitido, tais como, não existência de cargos para serem colocados

em concurso público, quando não se encontrassem doutores para um concurso público,

necessidade de substituição de docentes afastados, aposentados, dentre outras atividades

previstas. Em 2012, outra resolução foi baixada para continuar na regulação do processo

de contratação de professores por tempo determinado, regulamentando o tempo de

contratação e quando da abertura de editais para contratação de professores assistentes

(graduados, mestres ou doutores) (DOC-54).

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Na gestão de 2014-2017, especificamente em 2017, foi baixada uma resolução

(DOC-55), que altera a de 2010 e a de 2012, deixando a questão da contratação de

docentes por prazo determinados (temporários) um pouco mais regulamentada, quanto à

contratação do professor assistente, instituindo a ordem de abertura dos editais,

classificando as vagas para os possíveis candidatos em: I – apenas doutores; II –

doutores e/ou mestres; III – doutores, mestres e/ou graduados.

Dessa maneira, fica legitimada a terceirização parcial da atividade fim da

universidade, inicialmente relacionada com o ensino de graduação (docentes

contratados para dedicação de 12h ao ensino de graduação). Isso sinaliza um

movimento instituinte de nova perspectiva de contratação docente, que certamente

interfere nos processos pedagógicos, uma vez que estes cargos são itinerantes,

contribuindo muito pouco para a efetiva implementação curricular, dado que muitas

pesquisas já apontaram as deficiências pedagógicas no campo da docência universitária

de forma geral e também na enfermagem (NUNES, 1998; FARIA; CASAGRANDE,

2004; ISAIA; BOLZAN, 2004; PIMENTA; ANASTASIOU, 2010) quanto à formação

para o exercício da docência universitária, e considerando que nesse prazo de dois anos

máximos de contratação do docente temporário não está previsto nenhum movimento de

integração ou formação pedagógica para esta “inovadora” categoria docente.

Cabe destacar, também, que cresceu muito, neste período, o movimento de

accountability sobre os servidores não docentes com a instituição de ponto eletrônico,

responsabilização (inclusive financeira) por atividades realizadas que gerem ônus para a

universidade (ex.: multas de trânsito transferidas para a responsabilidade do pessoal

motorista) (DOC-48).

Ao analisar os investimentos em formação docente na universidade estudada nos

últimos 10 anos, por meio dos relatórios de gestão da Pró-Reitoria de Graduação,

percebe-se algumas características transitórias muito importante a serem mencionadas:

mudança de rota na perspectiva de formação permanente dos docentes universitários,

mudança do perfil do pró-reitor de graduação.

Na proposta de gestão 2006-2009, em que uma pedagoga e doutora em educação

era a pró-reitora de graduação, a proposta de formação permanente do docente

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universitário se fazia por meio de cursos de pedagogia universitária (em proposta

formativa) e cada vez mais descentralizados e específicos. Houve apoio de grupos

pedagógicos descentralizados que já tinham se constituído a partir de 2002, os quais

passaram a implementar, juntamente com a Pró-Reitoria de Graduação, cursos de

pedagogia universitária nos respectivos campi da universidade. O perfil da pró-reitora

de graduação se alinhava muito com a função assumida, pois a docência no ensino

superior tratava-se de objeto de estudo da pesquisadora durante sua carreira como

docente na universidade, o que é percebido pela excelente articulação teórico-prática

nas propostas implementadas e nos resultados apresentados em seu relatório de gestão

(DOC-27).

Na gestão de 2010-2013, houve mudança no perfil do pró-reitor de graduação,

em que uma médica e doutora em ciências assume a Pró-Reitoria de graduação. Apesar

de perfil diferente, a pró-reitora manteve a proposta de cursos de pedagogia

universitária e buscou trabalhar nessa mesma perspectiva durante sua gestão, mas já

começou a sinalizar uma possível mudança para a perspectiva instrumental da didática

nos últimos cursos/encontros sobre a pedagogia universitária, mesmo que se continuou

valorizando os grupos de apoio pedagógico descentralizados (DOC-28).

Foi, contudo, na gestão 2014-2017 que a mudança de paradigma na formação

permanente do docente universitário começou a se consolidar. Tratou-se da gestão de

um físico e doutor em física na área de ciências exatas, em que houve a criação de

outros grupos ‘didáticos’, não mais com o enfoque da pedagogia universitária, mas se

configurando como proposta de trabalhar na perspectiva da didática instrumental,

desenvolvida por meio de palestras generalizadas com especialistas em tópicos do

planejamento didático, acontecendo pontualmente em auditórios durante algumas horas.

Não se percebeu interconexão entre os temas trabalhados nas várias e variadas palestras

proporcionadas por esse novo grupo em sua gestão. O pró-reitor não reconheceu e não

contemplou os grupos de apoio pedagógico, anteriormente existentes, em sua proposta

de gestão e em seu relatório de gestão, apesar de continuarem (re)existindo/resistindo.

Em seu relatório, observa-se termos como eficiência, excelência, centros internacionais

de excelência, formação para o mercado de trabalho, dentre outros (DOC-29).

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Nesse sentido, vê-se a transição paradigmática sobre a docência na universidade

estudada também. De um lado, propostas advindas de resultados de pesquisas sobre a

docência no ensino superior e as teorias sobre o trabalho docente, do desenvolvimento

profissional docente, da construção da identidade docente, do conhecimento pedagógico

compartilhado, dentro de um referencial teórico emancipatório, fundamentado na teoria

histórico-crítica, como é observado no relatório da Pró-Reitoria de Graduação na gestão

de 2006-2009 (DOC-27). De outro lado, propostas pragmatistas e reducionistas sobre a

docência no ensino superior, voltados para perspectivas instrumentais da didática (foco

apenas nos elementos do planejamento didático), com propostas individualizantes da

profissionalidade docente e voltadas para a instrumentalidade e desconexão com os

contextos histórico-sociais e culturais da profissão docente, como fica mais evidente no

relatório da Pró-Reitoria de Graduação na gestão de 2014-2017 (DOC-29).

À análise coletiva dos dados, por meio do encontro coletivo 2.1, produziu-se o

seguinte trecho analítico que contribui para a esta reflexão:

a evolução das pró-reitorias de graduação, nessa perspectiva e o momento

em que nós estamos agora muito instrumental. Então assim, você aprende a

fazer uma aula, uma videoaula, você coloca seu material no Moodle, você

tem uma palestra. Então, isso também foi, parece que foi tirando do

professor aquele momento de alguns cursos de pedagogia universitária que

nós conseguíamos fazer, de unidade, dos professores se encontrarem, de

dividir as angustias, buscar caminhos juntos, né. Acho que isso tem piorado

muito, vejo que a gente não vai voltar tão cedo numa outra perspectiva. –

P07 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

Essa breve contextualização, sinaliza importantes modificações estruturais e

ideológicas por que vem passando o Estado, a universidade pública e a carreira e

trabalho docente na universidade estudada. Acredita-se que estas modificações têm

acontecido em função dos anseios neoliberais, da globalização que vêm se consolidando

mundialmente como caminho hegemônico para ressignificação da existência da

humanidade neste planeta na dimensão neoliberalista, fomentada pela cultura anglo-

saxônica. A instituição ‘universidade’ vem sendo atualizada a partir do sucesso de uma

institucionalização, cujas características particulares denotam a construção de uma

universidade-empresa – o que é, notadamente, influência da perspectiva gerencialista de

Estado também em institucionalização, cujas particularidades foram sendo apresentadas

ao longo deste texto. Tanto a institucionalização do Estado gerencialista (que se

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assemelha cada vez mais a uma empresa) como a da universidade-empresa (com uma

organização empresarial) têm causado fortes impactos sobre a profissionalização

docente (profissionalização gerencialista) e sua identidade docente (identidade

empresarial) (SACHS, 2003), o que pode ser confirmado a partir dos efeitos

encontrados nesta pesquisa, a partir dos analisadores da docência no ensino superior e o

professor-enfermeiro, que serão apresentados a seguir.

RELAÇÃO TEMPO-DINHEIRO COMO ANALISADOR DA ‘DOCÊNCIA NO

ENSINO SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’

Alguns efeitos do pensamento neoliberal e da nova gestão pública sobre os docentes

enfermeiros

Antes de se analisar alguns efeitos da implementação e consolidação ideológica

e estrutural do neoliberalismo produzidos sobre os docentes enfermeiros (participantes

deste estudo), se faz necessário a apresentação de alguns elementos contextuais

importantes. Primeiramente, é preciso lembrar que os enfermeiros em sua formação

básica, a não ser que ingressem em cursos de licenciatura em enfermagem, normalmente

não têm aproximações com referenciais pedagógicos para o exercício da docência, nem

de nível médio nem de nível superior (NUNES, 1998; FARIA; CASAGRANDE, 2004;

ISAIA; BOLZAN, 2004; PIMENTA; ANASTASIOU, 2010; SORDI, 2016) e mesmo

os enfermeiros licenciados também não têm formação específica para o exercício da

docência no ensino superior, dada sua especificidade e complexidade. Nesta direção, é

importante o acolhimento e a oferta de programas e processos formativos contínuos e

permanentes para a docência no ensino superior, não apenas para enfermeiros, mas para

todos os profissionais atuantes na docência deste nível. Contudo, ressalta-se que

processos formativos não são garantias de aprendizagens consolidadas sobre a

especificidade da natureza do trabalho do professor universitário e, portanto, entende-se

que os cursos de formação permanente para a docência no ensino superior são um dos

dispositivos para se alcançar esse objetivo. E a natureza permanente da formação

pedagógica do docente universitário se justifica no entendimento da universidade

enquanto um espaço que está também em constante transformação e o caráter científico

da dimensão pedagógica pode auxiliar no acompanhamento consciente das

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transformações que se quer produzir com a formação não apenas de profissionais, mas

de pessoas e cidadãos.

Entretanto, tem-se percebido que o investimento no desenvolvimento

profissional docente para o ensino superior tem acontecido influenciadamente pela

perspectiva neoliberal e seu conjunto de conceitos e dispositivos, enfatizando o

individualismo, a aprendizagem solitária, a ênfase na didática instrumental, a produção

de um profissional flexível e ajustável às necessidades da perspectiva de gestão

assumida pelo estabelecimento de ensino e cada vez mais com menos possibilidade de

argumentação pedagógica para manutenção das escolhas e projetos político-

pedagógicos. Já vem sendo discutido na literatura internacional como o termo

profissionalismo (neste caso pensando aqui o profissional docente) vem se modificando

ao longo do tempo em sentido e significado, notadamente para atender a anseios

neoliberais de enquadrar o ente profissional como algo passível de ser ordenado,

classificado, mensurado, a partir de algo externo e imposto, por meio de critérios

fechados e completos em relação ao que se prega como qualidade e ao que se reporta

como eficiente (BALL, 2005). Outros autores assumem a posição de que a universidade

vem sendo transformada de uma instituição moderna (englobando não somente

pesquisa, docência, mas também baseada em preceitos éticos, educativos e culturais) em

uma organização que responde intimamente aos anseios mercadológicos, capitalistas e

financeiros, que atua de forma a responder, pragmática e utilitaristamente, às demandas

do mercado, dos estudantes-clientes etc. (RODRIGUES, 2007; BIANCHETTI;

SGUISSARDI, 2017).

É em meio a todo esse contexto de institucionalização da perspectiva neoliberal

no Estado Brasileiro (notadamente explicado no marco teórico e metodológico) e, neste

caso, na universidade pública, por meio de seus vários dispositivos (nova gestão

pública, cultura do management, institucionalização das agências de controle e de

regulação, institucionalização de avaliações quantitativas sobre o trabalho docente,

flexibilização do regime de trabalho docente na universidade, dentre outros), que se

analisam os efeitos imediatos sobre o docente universitário, neste momento, com foco

em docentes universitários enfermeiros em um estabelecimento público de formação de

enfermeiros. Para alguns autores, efeito é manifestação de um fenômeno que se repete e

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se produz frequentemente, dentro de algumas condições, em que a análise atenta destas

manifestações correntes pode suscitar aquilo que está por vir ou por acontecer (HESS;

SAVOYE, 1993b), e, nesse caso, podendo dar pistas sobre o processo de

institucionalização da ‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’. Os

principais efeitos produzidos sobre a docência do enfermeiro ao longo desta pesquisa

(2014-2018) foram: efeito checklist, efeito da livre-concorrência (competição e

competitividade), efeito sanfona sobre o tempo na docência, efeito de contenção

(camisa de forças).

O Efeito Checklist

A partir dos dispositivos neoliberais que começaram a ser institucionalizados no

Estado Brasileiro a partir da Reforma Bresser-Pereira, aqueles que se referem mais

especificamente com o exercício da docência universitária advêm de reformas nos

mecanismos de controle e regulação direta e indiretamente da atuação docente na

universidade. Na contextualização deste estudo, observou-se a criação do ‘modelo

CAPES de avaliação’, que institucionalizou um modelo quantitativo de avaliação da

produção dos docentes credenciados em programas de pós-graduação e dos programas

de pós-graduação propriamente ditos. A metodologia escolhida para delinear a

avaliação é baseada em modelos classificatórios e somativos, e a modalidade de

divulgação e utilização dos resultados é a premiação pela autonomização dos programas

para gerirem diretamente seus recursos e a disponibilidade de recursos de diversas

naturezas para programas com notas cada vez maiores, principalmente os de nota 7

(CAPES, 2017). Essa metodologia avaliativa tem causado um efeito muito peculiar

sobre o exercício da docência no ensino superior e fica evidente como esse modelo de

pesquisa tem atravessado a docência universitária do professor-enfermeiro, induzindo

práticas gerencialistas para a produção de ‘conhecimentos’ dentro de um paradigma

quantitativista, que é avaliado por meio de escalas e índices e não pela qualidade em si

do que foi produzido e seu impacto direto para o desenvolvimento da sociedade

brasileira, da qualidade da profissão de enfermagem, que contribua para o processo de

consolidação da saúde como um direito universal do ser humano, contido em nossa

constituição e começado a ser implementado por meio da criação do SUS.

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Nesse sentido, uma professora entrevistada se posiciona a favor desse modelo de

pós-graduação induzido pela CAPES e fundamentado no Estado neoliberal, tomando

como verdade os rótulos de excelência, “bons professores” em relação àqueles que

atendem a estes critérios advindos de demandas internacionais sobre o ensino e sobre a

pós-graduação no país. A professora explica que esse modelo de ciência relacionado a

um mercado, ele surgiu desde a revolução industrial. Entretanto, sua análise se baseou e

tomou como ponto de partida as imposições do capital financeiro mundial, talvez

denotando a ideia de aceitação do que está dado e consolidado, talvez isso esteja, de

certa forma, relacionado com suas implicações. Ela produziu essa análise no seguinte

trecho de uma das novas entrevistas:

[...] é muito mais fácil a gente atirar pedra no telhado do vizinho, então eu

dizer que é o problema é a CAPES, o problema é o ministério que tão

criando né outras, cada vez mais indicadores, indicadores, indicadores de

excelência, eu não sei, na minha opinião se eu não tenho alguém que coma o

meu bolo de cenoura e diga assim: o teu bolo de cenoura hoje não ficou tão

bom porque faltou isso, isso, isso, eu nunca vou melhorar o meu bolo de

cenoura porque eu vou achar que ele está sempre bom. Então, se eu não

tenho alguém que me diga assim, olha a excelência docente hoje ela está

vinculada hoje à produção de artigo, à experiência internacional e a pós-

graduação, essa é a excelência docente. O professor é que escolhe estar lá

ou não, agora, quem escolheu estar lá, precisa estar lá, inteiro, né, não estar

lá, mas com o pensamento ainda do lado do mercado, do lado de cá,

achando que ah que a CAPES é culpada porque eu tenho que publicar um

artigo num A1, bom isso é um comércio, isso é um mercado? Isso é, isso é

um mercado, a ciência virou um mercado e já não é de hoje, a ciência virou

mercado no início do século XIX com a revolução industrial e com a segunda

guerra, quando os cientistas eram financiados para produzir algumas,

alguns insumos, não vamos nem falar dos instrumentos bélicos né. Desde lá

já é um mercado, qual é a nossa surpresa? A gente parece que se surpreende

as vezes com umas coisas que a gente já está careca de saber, é assim que é

né, a gente tem uma lógica de mercado sim influenciando o nosso fazer –

trecho analítico de nova entrevista com uma professora-enfermeira da

região sul do país - PC03.

Nessa mesma direção, outra participante também na modalidade de nova

entrevista, apresentou outra visão, tecendo uma crítica aos modelos de excelência, tal

como se observa no seguinte trecho analítico:

Eu acho que nós estamos nos espelhando num modelo de universidade,

enquanto pesquisa, né, assumindo a pesquisa como a centralidade do papel

da universidade e aí acaba sobrepondo ao ensino e a extensão. E aí é um

modelo que particularmente eu não conhecia, tomei ciência eu acho que

umas 2 ou 3 semanas e aí começa a fazer sentido, entendeu? Que é um

modelo de excelência, do que é excelência, excelência é aquilo que produz

conhecimento. Então, algumas universidades, por exemplo, vão assumindo

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algumas estratégias para buscar essa excelência na pesquisa e, portanto, ser

referência internacional, né, nesse ranqueamento das avaliações e vão

assumindo algumas questões. [...] eu acho que está na raiz do que é ser

professor, eu acho que a grande discussão é o que é ser professor da

universidade? O que é, qual é a nossa finalidade? A finalidade do nosso

trabalho: é realizar pesquisa? É produzir? É uma lógica perversa da

produtividade, é dum mercado da produção? Que vai adentrando ao espaço

da universidade, né. Então você precisa, existe um mercado que quer que

você publique e entra no espaço da universidade, então você vai produzir,

mas para crescer profissionalmente que é atender esse mercado que quer

que você produza. Então, as coisas não são tão soltas, né, existem interesses

que vem se articulando, interesse de um grande mercado da produção, que

quer que o professor pague caro para produzir e para conseguir crescer

profissionalmente ele precisa produzir. Então, é uma lógica muito perversa –

trecho analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região

nordeste do país – PC05.

Todavia, por meio da análise das fichas de avaliação do relatório de avaliação

quadrienal da área de enfermagem (2013-2016), foi possível perceber um movimento

dicotômico do tipo sim-não para a produção técnica, ou seja, realiza ou não tais

atividades e, caso realize, há ainda alguns indicadores (insuficiente, fraco, regular, bom

e muito bom) para ‘qualificar’ essa produção quantitativamente. Já no caso da produção

científica há grande ênfase relacionada com a publicação de artigos, notadamente de

Qualis A1-A2-B1, por meio de análises quantitativas. É referido como destaque dos

programas notas 7, a grande quantidade na produção de artigos A1 e A2, com ênfase na

direção da internacionalização, o que resultou como um dos principais indicadores da

nota alcançada (CAPES, 2015a; b; 2016a; b; c; d; 2017). É necessário ressaltar com

mais ênfase que é devido à nota do programa que os recursos são distribuídos e que a

maneira de os gerir acontece com maior ou menor autonomia. Dessa maneira, a

produção científica (naturalizada pelo modelo CAPES de avaliação) é um indicador

importante sobre a atuação do docente-pesquisador no âmbito de ensino superior que

impulsiona à angariação de mais recursos para o programa de pós-graduação da unidade

de ensino em que os docentes estão atrelados e isso significa entrar no movimento do

‘quanto mais, melhor’, dada a perspectiva implícita de concorrência estabelecida entre

os programas para alcançarem suas notas, pois quanto mais se produz, mais se pontua e

mais recursos são disponibilizados (relação produção-dinheiro). Tudo isso demanda

dedicação de tempo docente para a produção de artigos do tipo A1-A2-B1 e para

efetivar atividades de internacionalização (relação tempo-produção-dinheiro). Esse

tempo sai do tempo que poderia ser do ensino, ou da preparação para o ensino,

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reflexões, leituras etc. Isso sinaliza alguns aspectos de como a instituição pesquisa tem

atravessado a instituição ‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’. Cabe

dizer que um ensino verdadeiramente comprometido com a formação de profissionais

de enfermagem com senso de cidadania, críticos e participativos, demanda tempo de

investimento, uma vez que esta formação se relaciona com a produção de vida e toma a

complexidade da vida, o espontâneo e o imediato também como conteúdos de ensino-

aprendizagem, sendo portanto, diferente de processos de ensino baseados apenas nas

ações protagonistas do professor, que seleciona conteúdos fixos, instrumentos de

avaliação quantitativos, que avaliam ‘competências pré-estabelecidas’ encomendadas

pelo mercado de trabalho, não permitindo a criação e a invenção de novos modos de

fazer enfermagem durante a formação – apenas uma ‘re’produção daquilo que já está

dado a priori.

Quando se pensa na avaliação docente sob a perspectiva da docência, não existe

uma agência reguladora sobre produção docente no que se refere à implementação de

currículos inovadores, alinhados e funcionando coerentemente com as diretrizes

nacionais de formação de profissionais para o SUS, à implementação de disciplinas

alinhadas com os objetivos formativos e dos projetos político-pedagógicos dos cursos,

etc. Não se trata aqui, pois, de incentivar a existência de agências reguladoras sobre o

exercício da docência, de qualquer que seja a natureza, apenas se quer destacar que não

há um indicador que impulsione o exercício da docência para se qualificar cada vez

mais, e produzir resultados desejados sobre a formação de profissionais, pessoas e

cidadãos críticos e participativos, em ambiente dialético de construção de uma

democracia cada vez mais participativa e deliberativa. Tudo isso também demanda

muito tempo de estudo, planejamento, implementação e avaliação das atividades

docentes relacionadas com o ensino. Entretanto, não existe uma ‘recompensa’ para tal

investimento, que acaba se resumindo às iniciativas individualizadas e de pequenos

grupos, que vão se sucumbindo diante das imposições e limitações colocadas pelo

modelo neoliberalista em institucionalização na universidade, a partir da reforma do

Estado. Estas atividades acabam sendo empurradas para um espaço, que se denominar-

se-á de o espaço do checklist. O importante é cumprir estas atividades (cumpriu ou não

cumpriu), sem que a coerência das atividades de ensino realizadas/implementadas possa

ser averiguada ou mesmo discutida e valorizada. Neste ponto, é evidente o movimento

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atual na universidade estudada de tratar a docência (dimensão do ensino) como algo

didático e instrumental e o abandono da perspectiva da pedagogia universitária, que

buscava o questionamento sobre a constituição da identidade docente e do

desenvolvimento profissional docente dentro de perspectivas críticas e emancipatórias.

Vê-se também a despreocupação com a profissionalidade e a professoralidade de seus

docentes quando da repartição do regime de trabalho do docente, senão que para uma

profissionalidade que atenda primariamente aos anseios neoliberais, gerencialistas e

performistas (accountability). Essa análise foi traçada a partir dos seguintes

documentos: DOC-27; DOC-28; DOC-29; DOC-45; DOC-46; DOC-47; DOC-48;

DOC-50 (APÊNDICE 11). Esses documentos expressam, de forma geral, os dados

sobre palestras para docentes e pós-graduandos por meio de estatísticas sobre a

quantidade de palestras, quantidade de participantes nos auditórios lotados, etc.

Como a institucionalização da universidade está mais relacionada com

perspectivas neoliberais, visando à internacionalização da universidade, do controle da

educação superior pela iniciativa privada/mercado (direta, ou mesmo indiretamente via

organizações sociais), da nova gestão pública com a ênfase na mercadologização da

universidade e a mercantilização da educação, corte de gastos, economia de recursos,

dentre outras, os seus dispositivos também buscam coerência com esses princípios

neoliberais e, sendo assim, o dinheiro (o capital) se constitui como o principal incentivo

e direcionador das ações, pelo mecanismo estímulo-recompensa. Nessa direção, pode-se

inferir que a pós-graduação e a pesquisa geram mais dinheiro para a universidade e as

outras atividades geram gasto. Portanto, é preciso enxugar os gastos e isso significa

cortes nas atividades que geram gastos. Um exemplo desta situação no estabelecimento

estudado, é o começo de um discurso da necessidade de cortar vagas da graduação

(mesmo que não seja possível, há o discurso), ao passo que o número de pós-graduando

continua ascendente a cada ano. Segundo dados do relatório de avaliação institucional

2010-2014 do estabelecimento de ensino estudado, havia 595 estudantes de graduação e

491 estudantes de pós-graduação naquele momento (DOC-21). Em uma segunda

consulta no primeiro semestre de 2018 ao site do estabelecimento de ensino, percebe-se

a seguinte alteração, 570 estudantes de graduação e 537 estudantes de pós-graduação. E

em terceira e última consulta, no início do segundo semestre, 566 estudantes de

graduação e 539 de pós-graduação. Mesmo os incentivos às atividades relacionadas com

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a formação para a docência no ensino superior por meio de programas de estágio

oferecidos na universidade estudada, têm diminuído gradualmente, 50 bolsas em 2010,

60 em 2011, 104 em 2012, 91 em 2013, e 79 em 2014 (DOC-21). Nessa direção,

também foi percebido o entendimento do ensino na graduação, das 8 horas de dedicação

ao ensino como uma obrigação, em um trecho de momento de entrevista individual:

[...] a gente é obrigado, obrigado não, a gente tem que cumprir pelo menos 8

horas de graduação por semana, mais ou menos isso que a gente tem. Parece

que é pouco, mas a gente tem tanta atividade e vai consumido de tal maneira

e a gente não consegue ficar com 8 horas [...] P09 – trecho de entrevista

individual.

O que se quer destacar aqui é que, quanto às atividades de outra natureza, tais

como a docência, a extensão, dentre outras, o enfoque tem sido o de cumprimento de

tarefas, do checklist de atividades ‘obrigatórias’ que não geram dinheiro ou recursos

para a universidade, que não são valorizadas em seu aspecto qualitativo, sempre com o

intuito de economia de tempo, para que este seja dedicado às atividades que geram

dinheiro e recursos para os programas de pós-graduação e para a universidade – já que

essa é a lógica mercadológica em institucionalização – que possibilitem aumentar as

notas dos programas de pós-graduação ou mesmo que mantenham as notas 6-7 e suas

autonomias de gestão dos recursos, o que conduz a maiores chances de aprovação e

financiamento dos projetos de pesquisa de docentes credenciados em programas de

‘excelência’ (notas 6-7) pelas agências de fomento à pesquisa e também maiores

chances de publicação de artigos em revistas A1-A2-B1. A própria resposta negativa

para não participar desta pesquisa, alegando falta de tempo por parte de alguns

professores também sinalizam que participar de pesquisas de cunho pedagógico também

não traz contribuições sobre aquilo que é cobrado de fato. Inclusive, dos 106 docentes à

época do convite, dos quais 84 foram convidados, responderam ao e-mail apenas 22,

sendo apenas 14 afirmativamente.

Assim, o efeito checklist se corporifica na dicotomia: para a formação de

recursos humanos em nível de graduação (o que demanda maior esforço e dedicação na

dimensão ensino), o checklist se caracteriza pelo alcance do mínimo obrigatório por

meio de decisões individuais, coletivas e resoluções mais abrangentes, etc. Enquanto

que para a dimensão pesquisa e também para a formação em pós-graduação, existem os

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mínimos a serem alcançados (mesmo que estes estejam subindo cada vez mais e as

exigências um tanto mais duras e impositivas – vide DOC-63, em que se extinguem

alguns programas de pós-graduação nota 3), mas também existe um incentivo para que

estes mínimos sejam superados/ultrapassados, coerente com uma ‘cultura do quanto

mais, melhor’. Nessa direção, não há limites para a produção científica que gera

melhores pontuações para os programas de pós-graduação, mantendo-os na hegemonia

na área da enfermagem, mas há limites explícitos e implícitos para disposição de tempo

com aquilo que não gera pontuação e dinheiro para os programas, para a universidade –

o ensino de graduação, a extensão. Os seguintes trechos de análise realizada em

encontros coletivos para discussão dos dados confirmam esta questão:

E eu acho né, tem uma outra coisa que você estava falando, justamente do

que você está falando que eu tenho visto, quanto participante da COC o

tanto que isso tem influenciado até na grade curricular. E, a gente tem vivido

situações de professores que precisam ter um semestre livre para conseguir

produzir, e aí eles querem, pedem para que, a comissão de graduação faça

arranjos na grade para facilitar ter um semestre livre, sem olhar que aquilo

repercute na formação do aluno, repercute no sentido de aumento de carga

horária, de aumento... de ensino. Não estou dizendo que professor é

inconsequente, talvez ele não tenha... ele está tão envolvido nesse processo

que a gente está falando de produção de A1, de ter aluno de ter vários alunos

de pós. Os professores, não só, que acabam não se dando conta do impacto

negativo disso na formação do aluno. – P06 – trecho de análise durante o

encontro 2.1.

e aí nesse sentido quando você estava apresentando, vem muito claro uma

situação que nós estamos vivendo agora, que talvez não tenha aparecido

naquele momento que você estava coletando os dados, mas eu acho que é

reflexo de toda essa análise que você faz do trabalho docente. Que é o desejo

de muitos professores aqui, até por se sentir, é... nessa sobrecarga, esse

desejo de pensar que o que vai resolver a vida do professor dentro da

universidade é diminuir a graduação. Então, eu vou diminuir a aula com a

graduação. Ai, vem questões que vão para além da nossa unidade, muita

interferência que, que são as ideias que vão surgindo. Então assim eu vou

discutir os rumos da graduação, mas com foco em diminuir vagas, em fechar

curso, essa a escola não comporta dois cursos e vai nessa ideia que é isso

que vai resolver o problema do docente [...]. E aí quando a gente propõe né

“bom, então, vamos olhar o processo de trabalho docente”. Não é só a

graduação é a pós... inconversável – isso não entra em discussão e

principalmente porque tem programa nota sete, porque tem isso, porque tem

aquilo e tem financiamento. Então assim, graduação vai dar gasto,

graduação dá gasto, é... E essa visão de que está diminuindo docente, então,

tem que diminuir vaga, que não tem mais professor para dar conta do

número de alunos que tem na escola. E não pensa no todo inclusive no

próprio docente que vai significar para ele, diminuir vaga, diminuir aula, é...

carga horária. Como que fica o contratado? Que vai na perspectiva da

universidade de contratar docente, cada vez mais docentes, carga horária

menor com regime de trabalho que atenda a questão econômica da

universidade. – P07 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

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É muito sedutora e indutora esta lógica, uma vez que a ascensão na carreira foi

atrelada a essa lógica de produção e as avaliações para consecução de cargos e,

inclusive, para a manutenção do regime de trabalho pelo qual o professor ingressou no

estabelecimento estudado, pois a universidade compôs comissões assessoras que

avaliam os docentes quanto às dimensões ensino-pesquisa-extensão, com autonomia

para sugerir alteração do regime de trabalho dos docentes que forem entendidos como

improdutivos nessa lógica assumida.

Concluindo esta reflexão, durante um momento das novas entrevistas, uma

participante ao fazer uma reflexão comparando a docência no ensino superior de

estabelecimentos públicos e privados, destaca bem a ideia de que a ascensão na

carreira/na profissão do professor universitário (neste caso enfermeiros) está

intimamente relacionada à publicação, dentro da lógica do produtivismo acadêmico:

Tudo isso por conta do financiamento né, porque não há quem financie o

ensino no Brasil, ponto né, e a gente teve que deixar entrar essa, essa

absorção desse mercado internacional que, hã... por um lado ele alimenta o

capitalismo, ele ajuda né, o capitalismo porque ele tá oferecendo a formação

vinculada à necessidade do capitalismo, mas por outro lado eu acho que a

gente perde muito porque a gente perde a essência da universidade né, a

essência da docência, eu acho que a gente perde, que é aquela pessoa que

vive a universidade né, e esses professores eles não vivem a universidade,

porque eles têm uma demanda de trabalho que acaba sendo muito

materializada, muito objetivada né, e não há muito espaço para reflexão

nesses cenários e esse é um cenário de formação por hora/aula, ele recebe o

quanto ele trabalha, ele não recebe para pesquisar, ele não recebe para

fazer extensão, ele separa a extensão, o ensino e a pesquisa sim, porque ele

recebe por hora/aula. Então, se ele recebe por hora ensino né, ele não tem

interesse na pesquisa, e quem não pesquisa não publica, e quem não publica

não consegue ascender na profissão. Então, ele está numa ciranda, hã... que

é esmagadora, que é terrível né, e eu acho que ele está girando aí nessa roda

e se afogando, porque ele exatamente não sabe o que está fazendo, porque

ele não consegue nem pesquisar direito, nem dar o ensino direito e a

extensão ele desconhece, a extensão ele desconhece totalmente – trecho

analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região sul do

país – PC03.

E o seguinte participante, também durante um momento de novas entrevistas,

faz um olhar analítico para a situação da produção de conhecimento na academia,

desvelando, de certo modo, um tipo de impacto da pesquisa que não é alcançado, que é

o impacto social, uma vez que o impacto tem sido medido recentemente pelo número de

citações pelos pares, pela qualidade da revista, dentre tantos outros critérios

quantificáveis. O seguinte trecho analítico apresenta esta questão:

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é uma lógica de produtivismo, produzir mais do mesmo mais com o intuito de

pontuar do que com a relevância social, muitas vezes não dá um retorno

para os sujeitos que não, não tem um tópico de recomendações né, o que que

você pode sugerir. Porque o meio acadêmico é muito nocivo, só crítica por

crítica dos serviços de saúde, dos cenários, mas não contribui né assim de

forma efetiva, não produz evidências, produz evidência para a própria

academia, mas não produz, ele não... é... não transforma essas evidências

para os serviços, para os usuários. [...] É uma cultura estabelecida e um

círculo vicioso né, que é perpassado de orientador de geração a geração,

que é um círculo vicioso [...].-trecho analítico de nova entrevista com

professor-enfermeiro da região norte do país – PC01.

E, por fim, uma participante faz uma reflexão importante sobre o efeito que essa

cobrança de certo tipo de produção de conhecimento tem provocado sobre o ensino de

graduação. O seguinte trecho de análise durante uma das novas entrevistas mostra esta

questão:

E aí com isso, mas assim com essa fixação, e com essa exigência dos

professores para estarem em um programa de pós-graduação aumentar cada

dia, o que acontece, então realmente a graduação fica bastante a desejar.

Então muitas vezes é o mestrando, é o doutorando, muito jovem que às vezes

não tem nem experiência nenhuma na área do ensino, como professor, que

fica responsável, por grande parte da graduação – trecho analítico de nova

entrevista com professora-enfermeira da região sudeste do país – PC04.

Efeito da livre-concorrência (competição e competitividade)

Após apresentar o efeito checklist sobre as atividades docentes, o qual

impulsiona os docentes a tratarem aquilo que não é rentável nem para si nem para o

programa de pós-graduação como itens de um checklist que precisam ser feitos (e que

tem obrigatoriedade), mas de maneira tempo-econômica para que consiga se dedicar a

maior parte do seu tempo docente na produção daquilo que é rentável para si

(progressão na carreira, reconhecimento, aumento de salário) e também para a

pontuação do programa de pós-graduação, será apresentado o efeito complementar da

livre-concorrência.

Nessa direção, tem acontecido um movimento de colocar tanto os critérios e

legislações sobre o trabalho docente cada vez mais em consonância com os objetivos

neoliberais (atual encomenda da universidade e do Estado Brasileiro, assim como dos

organismos representantes do capital financeiro em nível mundial), atrelando-se a eles a

lógica produtivista. Assim, a progressão na carreira e o aumento de salário foram

atrelados à lógica produtivista, e seus objetivos já observavam com supremacia as

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atividades de pesquisa, inclusive o primeiro item a ser considerado na avaliação era

relativo à pesquisa e os outros também dão maior ênfase para a pesquisa – (DOC-32).

Com as reformas na universidade, relativas à criação do estatuto docente (DOC-26) e ao

regimento de comissão de avaliação docente (DOC-33), muitas palavras são

incorporadas à ideia de avaliação docente, tais como indicadores, didática etc. Dos

quatro itens considerados, por exemplo, para avaliação do projeto do docente

ingressante, três deles mencionam ou suscitam à pesquisa, apenas um se remete mais

especificamente à graduação, em termos de ‘carga’:

I – atividade didática na graduação [...]; II – orientação de estudantes de

graduação, conforme critérios estabelecidos pela Comissão de Graduação e,

quando pertinente, pelas Comissões de Pesquisa e Cultura e Extensão

Universitária; III – atividade de pesquisa [...]; IV – credenciamento para

atuação na pós-graduação [...] (trecho de DOC-33)

Nesta direção, percebe-se um incentivo maior para a produção de atividades que

poderão ser ‘estocadas’ em quantidades e tipos demandados para a consecução de

objetivos e critérios com a finalidade de obtenção/alcance de cargos e funções,

progressão na carreira (horizontal e vertical), aumento de salários, reconhecimentos

entre os pares (nacional e internacionalmente) e, principalmente, pontuação para o

programa em que se está credenciado como pesquisador. Isso tem provocado um efeito

de livre-concorrência entre os pares, tal como apareceu em trecho de análise em

entrevista individual:

não sei se é só aqui, mas é uma competição muito grande e muitas coisas

internas pelo poder, sabe, quem vai mandar, quem vai ter um cargo

comissionado etc. E eu não gosto muito disso, eu acho que isso atrapalha um

pouco o trabalho da gente. Então, eu, por exemplo, na comissão ***, eu não

tenho nada comissionado, eu sou... completo as minhas atividades, mas eu

não ganho nada com isso. Então, quase ninguém quer fazer isso. Em outras

coisas, as pessoas querem muito, porque tem dinheiro envolvido. Então, eu

acho que é difícil. E hoje, eu acho que o papel do professor universitário - o

papel não - o que se espera do professor universitário na [estabelecimento

formativo] é muito complicado – P12 – trecho de entrevista individual.

Essa questão da excessiva competição entre os pares, apareceu também durante a

implementação do primeiro encontro coletivo para análise e discussão:

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Outra coisa, acaba sendo uma competição tão grande entre os seus colegas

que você acaba não tendo amizades – P12 – trecho de análise durante o

encontro 1.

Entretanto, esse efeito de ‘livre-concorrência’ apresenta alguns dispositivos de

controle que acabam por direcionar os caminhos das escolhas, tendo o controle exercido

sobre o tempo do docente (ou o uso do tempo docente), que fica cada vez mais

‘apertado’ para a dedicação para a docência, e mais ‘frouxo’ para a dedicação para a

produção científica e internacionalização (enfim, atividades que rendem pontuações

para os programas de pós-graduação e atraem maiores financiamentos para as pesquisas

da universidade), assim como rende ao professor quantidades de produtos que lhe

servem para angariar cargos e melhores salários na universidade. Isso sugeriu que seria

necessário fazer um olhar especial para a questão do uso do tempo, uma vez que nos

parece oportuna para este caso e bastante semelhante a reflexão de Peter Pál Pelbart

com relação a um novo dispositivo que o poder tem construído para aprisionar os

indivíduos pelo controle do uso do tempo cronológico (PELBART, 1993) e, neste caso,

o poder neoliberal.

Como se pode notar, esta questão da ênfase da destinação do tempo docente ao

produtivismo acadêmico, assim como para a gerência deste produtivismo, perpassou a

maioria das entrevistas individuais. Percebe-se, pelos trechos a seguir, que a ênfase das

atividades docentes recaem sobre aquilo que gera pontuações e aquilo que é valorado na

universidade, ou seja, o tempo para fazer o que não é altamente valorado se torna

escasso:

Então, por exemplo, muitas questões que a gente precisa trabalhar, a gente

não tem uma infraestrutura muito adequada, a gente acaba tendo que fazer,

você acaba fazendo várias coisas que você poderia delegar, por exemplo,

que você poderia ter um suporte maior. Eu acho que nessas questões, a gente

tem alguns prejuízos para o desenvolvimento de todas essas atividades [...] o

processo de trabalho dificulta muito também. A gente tem muito retrabalho.

A gente tem, às vezes, várias comissões com várias pessoas fazendo coisas

que se sobrepõem. [...] Dá para fazer [planejamento de ensino], mas, por

exemplo, eu poderia criar algo muito novo e, às vezes você não tem o

momento tão livre para isso. Está tudo ali. Você tem os prazos para cumprir

e várias outras questões. Então, por conta disso, a gente vê que existem

algumas limitações. Então, eu faço o melhor, mas eu sei que esse melhor,

assim, pode ser que ele não me agrade tanto assim como eu gostaria – P01 –

trecho de entrevista individual.

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Mas eu acho que a gente, enquanto docente, é muito cobrado enquanto

produção científica mesmo. Então, a universidade [...] tem um objetivo

maior que é a formação, mas a gente é cobrado, mas no sentido de o quanto

a gente produz de novos conhecimentos – P02 – trecho de entrevista

individual.

A gente está até vendo até alguma outra possibilidade de tentar fazer isso

[investir na formação pedagógica], mas a nossa jornada de trabalho é muito

maluca, no sentido de investir nessas coisas – P03 – trecho de entrevista

individual.

Eu não tive a iniciativa de fazer novamente [o curso de pedagogia

universitária oferecido por instâncias da universidade] justamente por conta

da minha malha de trabalho. Que não permite que eu tire, pelo menos no

primeiro semestre, um dia inteiro para uma atividade externa, fica muito

complicado em ter esse compromisso. Às vezes, a depender do mês, sim, mas

ter isso como um compromisso mensal, na agenda não cabe. Porque você

tem as aulas, tem as reuniões da parte de gestão – eu estou em várias

comissões administrativas que acabam tendo reuniões em dias que eu não

estou em aulas. Então acaba inviabilizando muito – P04 – trecho de

entrevista individual.

Entendo também, que existe uma pressão por produtividade para esse

docente, então muitos são contratados pelo portfólio de pesquisas e se

concentram justamente em aprofundar essas pesquisas que já ocorreram

anteriormente. Porque é um pré-requisito também. E com isso em

determinado momento eu percebo que o centro do trabalho docente é a

própria carreira acadêmica dele. E não o ensino – P05 – trecho de

entrevista individual.

[...] essa carreira universitária é bastante trabalhosa... a universidade

privilegia alguns aspectos sim - a pesquisa ela... é o mais avaliado enquanto

produção – P07 – trecho de entrevista individual.

Então, assim, eu entendo que a carreira docente ela tem esses três pilares,

ensino, pesquisa e extensão, e deveria ser de uma forma mais equilibrada.

Hoje eu acho que ela ainda tem o pé maior na pesquisa – P08 – trecho de

entrevista individual.

E a gente sempre se cobra, eu vou tentar, mas por conta de muita atribuição,

a gente vai se especializando na nossa pesquisa, nos nossos temas de

pesquisa, vai se especializando nas nossas áreas [...] e quando vê a gente

não está se apropriando de referenciais pedagógicos – P09 – trecho de

entrevista individual.

não deveria ter muita divisão entre o ensino, a pesquisa, a extensão, algo

muito inerente. Às vezes aqui a gente sente um pouquinho de dificuldade,

porque a gente é muito exigido em alguns aspectos, que às vezes você não

consegue, vamos dizer, fortalecer os três papéis, você acaba escolhendo,

vamos dizer assim, focando no ensino, às vezes na pesquisa. A extensão a

gente vai fazendo, mas eu ainda acho que poderia ser maior, melhor

fortalecido, mas eu acredito que com o tempo seja possível acontecer isso –

P10 – trecho de entrevista individual.

Muito complicado na nossa vida na Universidade [...] devido à pesquisa, à

cobrança quanto ao nosso envolvimento na pesquisa e, principalmente, com

a divulgação do produto de nossas pesquisas, principalmente, em termos de

publicações extremamente exigentes, que demanda um tempo muito grande e

a grande cobrança da produção científica! [...] Então, o ensino fica bastante

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complicado, porque eu entendo que ele devia ser sagrado na Universidade.

E, particularmente, a graduação, que é a base de tudo, eu acho que, aí, que

deveria ter um grande investimento. E a docência, realmente, ter um tempo

maior para isso tudo. Mas, não é! O tempo maior não é destinado para o

ensino, particularmente da graduação, infelizmente. [...] Porque as

exigências da Universidade são outras! Não são voltadas ao ensino de

graduação. Faz, faz e faz... Então, eu acho que a Universidade devia ser

mais cuidadosa nesse sentido de realmente o docente investir seu tempo no

ensino de graduação, na base. Infelizmente, isso não ocorre e parece que

não é a tendência, futura. Aliás, eu acho que a tendência futura é o inverso

disso, é investir menos na graduação – P11 – trecho de entrevista

individual.

Um trecho analítico dos momentos de novas entrevistas também coaduna esta

falta de investimento na formação pedagógica do docente universitário enfermeiro, o

qual fica desamparado, notadamente os principiantes, e a maior parte das informações

compartilhadas é referente a editais de pesquisa, o que leva muitos professores a

utilizarem de seus recursos próprios para bancarem formações pedagógicas privadas,

para atenderem pontualmente esta questão. Entretanto, percebe-se também como a

instituição ‘pesquisa’ atravessa fortemente a ‘docência no ensino superior e o professor-

enfermeiro’:

É, até agora o que eu observei não tem né, assim, não tem oficinas, tem uma

professora com expertise em alguns processos pedagógicos como aula

invertida, mas ela ori- ela dá esse curso por fora, pago né caso o professor...,

mas não é uma política da universidade trabalhar com metodologias ativas.

Geralmente, a gente é que busca, não é uma política da universidade. [...].

Não porque, geralmente, é uma coisa muito empírica não é, assim, os

profissionais de saúde, na enfermagem até que... tem profissões que são

piores, por exemplo, o médico, a medicina né. Mas na enfermagem ainda é

muito empírica não é... os enfermeiros se autointitulam professor, mas sem

ter uma formação pedagógica e muitos, de artigos que eu já li, muitos

consideram que não é preciso essa formação pedagógica né. [...]. Uma coisa

que está tendo muito agora com a era do WhatsApp, que é uma coisa típica,

a coordenação passa edital por WhatsApp sabe? Não tem uma sistemática de

e-mail, de oficializar isso, e... e esse grupo do WhatsApp acontece de tudo,

todo tipo de informação, você perde editais, como eu já perdi editais de

PIBIC, porque eu não conheço a documentação, eu tinha que ir atrás, mas se

eu tivesse um curso introdutório né, falando sobre o que é que tem que ter,

como é que tem que passar pelo colegiado, seria mais fácil né. – trecho

analítico de nova entrevista com professor-enfermeiro da região norte do

país – PC01.

Esse efeito da livre-concorrência tem incentivado e impulsionado também

mecanismos de competição e a competitividade. Sguissardi (2013) já afirmava que a

competitividade, oriunda do meio empresarial, estava dentre os elementos que

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compunham o fenômeno chamado por ele de ‘produtivismo acadêmico’, ou seja, pode-

se dizer que ela é um dos dispositivos utilizados e que responde ao modelo de

produtivismo, que encaminha cada vez mais a universidade para os moldes neoliberais e

gerencialistas, tal como referido também como um dos principais objetivos do

neoliberalismo, a intensificação da mercadologização e mercantilização, por meio da

competição e da concorrência, de todos os aspectos e dimensões da vida humana

(LAVAL, 2004; DARDOT; LAVAL, 2016). Nesse sentido, esse efeito vem causando

também distanciamento entre os pares, como afirmado, com muito pesar, pelo seguinte

participante em entrevista individual:

Eu comparava muito tempo lá [outro estabelecimento] e aqui

[estabelecimento atual]. E por que é que aqui eu não tenho amigos? Da

minha disciplina? Não tem! Você tem colegas! Outros departamentos podem

ser diferentes, mas eu acho que é... – P12 – trecho de entrevista individual.

Essa questão da competição e concorrência também apareceu em trecho

analítico de um participante durante os momentos de novas entrevista, revelando

também um movimento pouco acolhedor com os ingressantes:

Assim, há um clima, não é um clima muito pesado de concorrência como

grandes instituições né, mas também não é um ambiente muito agregador

assim, não chega ninguém para lhe dizer assim ‘eu vou lhe passar o plantão

olha, você como doutor você tem essas oportunidades, PIBIC é... bolsa de

professor é... é uma bolsa de incentivo ao jovem doutor né que tem’ não é

passado nada. Aí, vai chegando, tem um e-mail da faculdade oficial que você

se cadastra e vem uma coisa da pró-reitoria, mas não tem quem oriente

diretamente no curso né. Não tem um acolhimento, sabe assim, não tem uma

apresentação do projeto pedagógico do curso sabe, não tem, você não

observa assim um acolhimento, a coordenadora chega assim: ‘olha vocês

estão nessa disciplina, gestão em saúde, foi chamado’ – eu fiquei em

primeiro lugar, ‘foi chamado o segundo lugar’, mas não sentam assim com a

gente para dizer ‘olha a inserção é essa, fica nessa atividade curricular, os

professores são esses, o cenário é esse’, não tem essa sistemática né, esse

acolhimento – trecho analítico de nova entrevista com professor-

enfermeiro da região norte do país – PC01.

Entretanto, para concluir esta reflexão sobre o efeito da livre-concorrência, em

momento de novas entrevistas, uma participante faz uma reflexão importante para a

condição dos programas de pós-graduação alocados fora das universidades mais bem

ranqueadas, cujos recursos são mais escassos e o professor tem se visto na

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responsabilidade de utilizar de recursos próprios para conseguir manter um programa e

na nota que obteve:

Porque hoje a pós-graduação no Brasil eu acho que tem sido de uma

perversidade que não tem tamanho! O professor que está na pós-graduação,

ele mantém a pós-graduação, no caso da minha instituição, basicamente com

recursos do professor da pós-graduação, não é? Porque a instituição não

apoia o professor para participar de eventos, a instituição, por falta de

recursos financeiros, não apoia a publicação. Então, para manter a pós-

graduação... e mais do que isso, não só manter, mas sobretudo, para ter

essa... para cumprir as determinações que são feitas pela CAPES, o

professor, hoje, de uma instituição como a minha, periférica é... pequena,

hã... basicamente, financia a manutenção dessa pós-graduação. E se a gente

for pensar, o que mantém uma pós-graduação é... é a, infelizmente, é a

publicação, eu digo infelizmente porque eu acho que a pós-graduação é para

mim, vai muito mais além disso né, de ser uma máquina de produzir artigo

né... A1, o artigo A ou enfim, é isso que a gente tem vivido hoje. [...] Um

curso numa universidade que tem muita dificuldade financeira,

especialmente nesse momento de crise, mas não foi muito diferente desde a

implantação do mestrado é que tem, nós fizemos a segunda avaliação para

valer agora é um mestrado relativamente novo, acho que foi criado em 2011,

se não me engano, portanto, é relativamente novo, tem 7 anos e nós fizemos

de verdade a segunda avaliação. E, nessa segunda avaliação, a gente

terminou nota 4, que foi fruto de um esforço absurdo do corpo docente, e

também do corpo discente, oprimido né, pela necessidade de aumentar a

nota, é... que você sabe, conhece muito bem qual que é o sistema, o sistema é

bruto né. E, aí, em função disso, uma pós-graduação, volto a repetir, por isso

a perversidade, a gente está sempre que nem o cachorro que sempre está

correndo atrás do próprio rabo, e você está sempre perseguindo um patamar

que parece que você nunca vai chegar. Essa é a situação de programas como

o nosso, quando você pensa que se aproxima, aí, a tal da métrica é que

aumenta, aí, você se aproxima, aí, a métrica aumenta e isso tudo saindo do

seu próprio bolso, porque aqui a gente paga para tudo, a gente paga para

publicar, a gente paga para ir para congresso, a gente paga para comprar

livro, a gente paga para... a gente paga para tudo, para manter um

programa que, na verdade, não é meu e nem é da minha colega, é da

instituição, né. – trecho analítico de nova entrevista com professora-

enfermeira da região nordeste do país – PC02.

Essa situação também foi analisada por outro participante em momento de novas

entrevistas:

Então, eu concordo com isso, de que esses cargos e funções vão pontuando

nossa evolução na carreira, os critérios só crescem, esses cortes são

evidentes, infelizmente nesses últimos anos, isso verdade seja dita, eu sei que

você vai concordar, mas nos anos, principalmente no primeiro governo Lula

e tal e quando a gente tem uma ascensão na universidade bem significativa,

principalmente professores mais qualificados, paralelamente a gente teve

uma exigência também muito grande que foi aumentando, mas tudo bem.

Mas, atualmente, a gente não encontra isso, a gente tem tido cortes desde

que entrei na coordenação, a gente quer mudar uma fechadura de uma porta

já é uma luta para a gente conseguir e muitas vezes, a maioria das vezes, a

gente se cotiza, a gente paga do nosso próprio dinheiro. Enfim, a gente não

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vai, mesmo usando bem esses nossos produtos – trecho analítico de nova

entrevista com professora-enfermeira da região sudeste do país – PC04.

Dessa maneira, portanto, coadunamos com Laval (2004) que nem a escola, nem

a educação não devem ser vistas como se fossem empresas ou, muito menos,

mercadorias, concordando também que um dos dispositivos para a consolidação do

pensamento empresarial/gerencialista dentro da escola/da educação, certamente, é a

competitividade, que vemos nitidamente neste local estudado, mas também que tem se

alastrado para outros espaços e influenciado na atualização da instituição ‘docência no

ensino superior e o professor-enfermeiro’ no sentido gerencialista.

Efeito sanfona sobre o tempo na docência

Para a construção dos termos usados neste efeito, o termo sanfona é entendido

com o significado similar àquele utilizado no campo da música, mas será compreendido

a partir da característica resultante da modificação de seu aspecto expresso

externamente. O termo sanfona é um vocábulo regionalista nordestino brasileiro para

designar o instrumento acordeom, o qual consiste de um instrumento musical que,

atualmente, é composto de partes que se articulam para a produção de seu som

característico (PAIVA, 2014). É um instrumento flexível, tocado a partir de seu

estiramento e compressão, que causam pressão sobre o ar no interior do instrumento e

que para sair, o ar precisa passar por orifícios controlados pelo próprio instrumento e

pelo músico, produzindo uma variedade de sons (MASCARENHAS, 1978; PEREIRA;

NASCIMENTO, 2013). É esta característica de estiramento, compressão e controle de

saída do ar, que se utiliza para a caracterização deste efeito sobre o tempo do docente

universitário enfermeiro, uma vez que este tem tido alguns de seus tempos pressionados,

estirados e controlados durante o desenvolvimento de seu trabalho. Assim, o efeito

sanfona sobre o tempo docente está relacionado com uma série de aumentos,

diminuições e direcionamentos (implícitos e explícitos) de atividades direta e

indiretamente relacionadas ao trabalho do professor. Este efeito tem intensificado o uso

do tempo docente diante de um momento de cascata de ações que apertam (ou

afrouxam) o tempo docente cada vez mais.

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Um primeiro indicador deste efeito é a pressão das agências reguladoras sobre os

programas de pós-graduação para diminuírem os tempos de defesas dos estudantes de

doutorado e de mestrado, o que pode ser apreendido do último relatório da área de

enfermagem (CAPES, 2017). Entretanto, a universidade estudada manteve os mesmos

prazos na última mudança do Regimento Geral da Pós-Graduação. Entretanto, os dados

empíricos não serão apresentados para não revelar o local de estudo, uma vez que o

documento está disponível online (DOC-34; DOC-35).

No entanto, ao analisar os regulamentos de programas de pós-graduação

oferecidos no local/estabelecimento de estudo, foi constatado o encolhimento do tempo

de defesa dos estudantes de pós-graduação. O quadro seguinte demonstra como foi a

mudança para três programas principais com relação ao tempo de titulação (mestrado,

doutorado e doutorado direto):

Quadro 2 - Comparativo entre os tempos de defesa em três programas (Prog.) de

pós-graduação nos dois últimos regulamentos

DOC. REGULAMENTO 2009 REGULAMENTO 2014

Prog. 1

Mestrado, em no máximo 30 meses.

Doutorado, em no máximo 42

meses.

D. Direto, em no máximo 60 meses.

Mestrado, em no máximo 30 meses.

Doutorado, em no máximo 42 meses.

D. Direto, em no máximo 50 meses.

Prorrogação de até 120 dias.

N.º orientandos: máximo de 7. N.º orientandos: máximo de 7.

Recredenciamento docente*: 1

publicação por ano

Recredenciamento docente*:

titulação de 2 estudantes +

publicações (2 para mestrado e 3

para doutorado)

Prog. 2

Mestrado, em no máximo 30 meses.

Doutorado, em no máximo 42

meses.

D. Direto, em no máximo 60 meses.

Mestrado, em no máximo 28 meses.

Doutorado, em no máximo 44 meses.

D. Direto, em no máximo 55 meses.

Prorrogação de até 120 dias.

N.º orientandos: máximo de 7. N.º orientandos: máximo de 10.

Recredenciamento docente*:

titulação de 2 estudantes (M ou D) +

publicações (1 para mestrado e 2

para doutorado)

Recredenciamento docente*: titulação

de 2 estudantes (M ou D) +

publicações (2 para mestrado e 3

para doutorado)

Prog. 3 Mestrado, em no máximo 30 meses.

Doutorado, em no máximo 42

Mestrado, em no máximo 28 meses.

Doutorado, em no máximo 42 meses.

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meses.

D. Direto, em no máximo 60 meses.

D. Direto, em no máximo 52 meses.

Prorrogação de até 120 dias.

N.º orientandos: máximo de 7. N.º orientandos: máximo de 10.

Recredenciamento docente*:

titulação de 2 estudantes (M ou D) +

publicações (1 de mestrado e 2 de

doutorado)

Recredenciamento docente*: titulação

de 2 estudantes (M ou D) +

publicações (2 para mestrado e 3

para doutorado)

Fonte: construção do autor a partir de dados da pesquisa. * A cada período de 5 anos.

Como se pode ver, os tempos foram, em certa proporção, diminuídos,

especialmente para os cursos de mestrado e para os cursos de doutorado direto. Todavia,

foi criado um tempo adicional de 120 dias, em que os estudantes podem pedir

prorrogação, caso precisem, e que deve ser analisado pela referida Comissão

Coordenadora de Programa. Na mesma reforma, a maioria dos programas aumentou a

possibilidade de se ter até 10 orientandos ao mesmo tempo e intensificou as produções

científicas para o recredenciamento dos orientadores (docentes) nos seus referidos

programas a cada período de 5 anos (análise a partir dos seguintes documentos: DOC-

36, DOC-37, DOC-38, DOC-39, DOC-40, DOC-41). É notável que estes encolhimentos

no tempo de defesa são oriundos de medidas neoliberais e gerencialistas, pois não há

estudos que embasam estas decisões senão que por fundamentações financeiras e

economicistas. O que se vê propor, então, são formações aligeiradas de pesquisadores e

de ‘docentes’. Esse encurtamento do tempo pode ter impacto na escolha de referenciais

de pesquisa e de docência que se fundamentam na praticidade e na exequibilidade

dentro de tempos cada vez menores, diminuindo o tempo de reflexão sobre a implicação

das pesquisas, da formação de pesquisadores e de docentes na consolidação de uma

sociedade mais justa e democrática. Muitas vezes, as pesquisas e essas formações nos

dão a sensação de deslocamento da realidade, ou de descontextualização.

Pode ser que estas mudanças tenham sido estimuladas pelas fórmulas dos

cálculos realizados pela área de enfermagem da avaliação CAPES, em que os tempos de

defesas são um dos critérios considerados para geração de pontuações que participam da

avaliação geral de cada programa. Diminuindo o tempo de defesa, aumenta-se, em certa

proporcionalidade, a pontuação para este item. Ao mesmo tempo, o impulso que as

publicações ‘de qualidade’ (A1-A2-B1) e suas pontuações causam no aumento da nota

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dos programas podem ter incentivado no aumento tanto do número de orientandos

simultâneos como do número de publicações para se recadastrar como orientador nos

programas (análise a partir do DOC-30).

Sguissardi discute o quanto estes enxugamentos dos tempos de defesa dos

estudantes impactam sobre o tempo de orientação que os docentes precisam despender a

mais com cada orientando, para conseguir que suas defesas aconteçam dentro do menor

prazo possível, preferencialmente, gerando ao mesmo tempo maiores quantidades de

materiais publicáveis em menores períodos de tempo. Assim, aumenta-se o uso do

tempo docente com orientações, e diminui-se o tempo com outras atividades menos ou

não pontuadas, ou mesmo aquelas atividades que não geram recursos para a

universidade (SGUISSARDI, 2013).

Ao mesmo tempo, professores reclamam de um aumento significativo de

atividades administrativas que não faziam parte de seu cotidiano anteriormente

(accountability?), em meio a um discurso de crise veiculado pela universidade estudada,

com o lançamento de resoluções para contenção de gastos por meio, por exemplo, de

demissões voluntárias do quadro de profissionais técnico-administrativos (análise a

partir do DOC-31), a não reposição de cargos docentes vagos por aposentadoria, a

contratação de docentes temporários para o ensino de graduação (12h/sem), dentre

outras, o que diminuiu de certa forma o contingente de servidores que realizavam

algumas atividades-chave na universidade (os quadros 3 e 4 sintetizam esta questão).

Há, por exemplo, algumas cristalizações do accountability (acreditação/

responsabilização), ou mesmo sua naturalização, também já embutido na fala de alguns

professores jovens e/ou com menos de 6 anos de trabalho no estabelecimento, como é

possível ver em trecho analítico de entrevista individual:

acho que o negativo é essa dificuldade que a gente acaba tendo, muito

porque a gente tem tanta atribuição e a gente se desculpa muito na

atribuição e não corre atrás de um referencial que poderia sustentar melhor

a nossa atividade – P09 – trecho de entrevista individual.

Nessa direção, foi possível perceber por meio das falas dos participantes e por

meio da intensa imersão no campo de pesquisa, como as atividades administrativas

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cresceram no campo das atribuições docentes. O seguinte trecho de análise de uma

entrevista individual mostra esta questão:

Em vários momentos, eu acho que a pesquisa e a gestão tomam mais espaço

do que o ensino. Não que você deixe de dar aula para exercer a gestão e a

pesquisa, mas acho que momentos em que você poderia se dedicar para fazer

um planejamento de ensino, para estudar mais, fazer investimentos, buscas,

leituras para subsidiar mais a sua ação docente, você acaba tendo que

deixar esse tempo de lado para poder... dar conta das outras atividades de

gestão e de pesquisa – P06 – trecho de entrevista individual.

Nesse meio de tempo, também começaram a surgir com mais vigor os roteiros e

os guias autoinstrutivos/autoinstrucionais (fluxogramas, boletins informativos, modelos

de documentos e declarações, cursos instrucionais em plataformas virtuais, dentre

outros), disponibilizados nos principais sites, com o intuito de que as pessoas elas

mesmas busquem as respostas e ocupem menos tempo dos servidores técnico-

administrativos que restaram, ou seja, construção de manuais do tipo ‘faça-você-mesmo’

(do it yourself – DIY) – autorresponsabilização e autoempreendedorismo na busca por

informações e na realização das atividades cotidianas? Será que isto tem a ver com a

intensificação do ‘automatismo’ evidenciado no relatório de gestão 2010-2013 de um

setor administrativo da universidade (análise a partir do DOC-45)?

Quadro 3 – Evolução do número de docentes (doc.) e funcionários (func.) da

Universidade estudada nos últimos 11 anos

2005 2006 2007 2008 2009 2010

Doc. 5222 5358 5434 5638 5678 5846

Func. 15295 15409 15221 15438 15140 15997

Doc. 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Func. 5989 6005 6009 6090 5982 5844

16501 16826 17439 17192 15459 14859

Fonte: Construção do autor a partir de DOC-46, DOC-50, DOC-51 e DOC-52

Quadro 4 – Evolução do número de docentes por regime de trabalho no período de

2013-2016

Regime de

trabalho docente 2013 2014

Jul.

2015

Fev.

2016

Fev.

2017

Fev.

2018 % 2013-2018

RDIDP 5230 5328 5324 5262 5127 4956 -5,2%

RTC 669 658 645 626 608 598 -10,6%

RTP 110 104 103 88 88 87 -20,9%

Temporários -- -- 57 87 159 210 +368%

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208

TOTAL 6009 6090 6129 6063 5982 5851 -2,62%

Funcionários 17439 17192 15643 15500 14895 13730 -21,26%

Fonte: Construção do autor a partir de DOC-46, DOC-50, DOC-51, DOC-52 e

site de transparência da universidade estudada

Outro dado importante para essa análise é o regime de dedicação docente (vide

quadro 4). Ao verificar os dados disponibilizados no site de transparência da

universidade estudada, percebe-se uma contínua diminuição tanto do quadro docente

quanto dos servidores técnico-administrativos e, ao consultar o site de transparência da

universidade entre julho de 2015 e fevereiro de 2018, percebeu-se um aumento de 368%

na contratação de docentes temporários, enquanto o número de docentes em regime de

dedicação exclusiva caiu 5,2%.

Apesar do aumento no número de contratações de docentes temporários e

considerando o total de docentes da universidade em outros regimes de contratação,

houve de 2013 a 2018 um decréscimo de 2,62% no quantitativo total de docentes

(mesmo considerando o aumento de docentes temporários). Entretanto, ao considerar

apenas docentes efetivos (nos três regimes implementados na universidade estudada),

obtém-se um decréscimo de 6,12% no quadro de docentes efetivos. Porém, dado que em

2015 houve um aumento na contratação de docentes na universidade, ao se analisar este

período (2015-2018), o dado se expressa mais fortemente, com um decréscimo de

7,96% no quadro efetivo docente, ou um decréscimo de 4,53% no quadro total docente.

Dessa maneira, se destaca que a diminuição no quadro de docentes efetivos (nos três

regimes) está se agravando, mesmo com a contratação de temporários (12h/semana),

sabendo que estes não suprem a totalidade de atribuições que os docentes efetivos

exercem. Os seguintes trechos se referem a este ponto:

Porque na prática, no final, o temporário é muito mais caro para a

universidade, porque ele não produz. Ele não produz conhecimento ele não

traz recurso de financiamento de pesquisa, ele não traz, entendeu? Se você

for pensar mesmo, eu não estou errada, mas o temporário ele é muito mais

custoso, por assim, dinheiro assim ele é mais barato, mas de retorno, e

retorno inclusive de recurso, ele é muito mais caro para a universidade, mas

é o que a gente está... é o que a gente está vendo, é... o momento. E até

coloca que a gente está passando, a área e a gente espera receber um

professor com doutorado que saiba o que a gente faz. Porque nós não

estamos... por tudo isso que você apresentou não quero alguém que a gente

tenha que ensinar. Como a *** me ensinou, como a *** me ensinou.

Entende? Eu fui recebida, eu fui acolhida, eu fui estudando, mas eu também

fui aprendendo no processo. Hoje eu já não me ponho numa... se vier, é

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ótimo, vamos acolher, mas eu espero que venha alguém que, que já chegue

trabalhando. – P06 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

Até porque com 12 horas, não dá nem tempo ou a pessoa ajuda - entra já

ajudando com alguma coisa. Não tem esse tempo possível de você preparar

esse professor. – P07 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

O principal agravante deste quadro, além da visão gerencialista sobre a carreira

do docente no ensino superior, é que os docentes temporários, normalmente, prestam

serviços à universidade por 12 horas relativas ao ensino de graduação, enquanto que

seus antecessores, contratados, possivelmente em regimes de dedicação exclusiva,

trabalhavam 40 horas semanais em atividades de ensino, de pesquisa e de extensão.

Quando se perdem docentes em dedicação exclusiva e não são repostos neste mesmo

regime e, considerando que em relação aos programas de pós-graduação tem havido

intensificação nas demandas e exigências para que as notas CAPES sejam aumentadas

ou pelo menos mantidas, é provável que esteja acontecendo também uma intensificação

ainda maior da utilização do tempo dos docentes em dedicação exclusiva para com as

atividades de produção científica, já que com a diminuição da quantidade de pares neste

regime, a tendência seria que a produção científica ficasse diminuída – nem se fala de

extensão.

Um sutil indicador desta questão pode ser o incentivo da última gestão da

reitoria da universidade (2014-2017), em que se buscou investir na produção de livros

didáticos, inclusive ofertando um docente temporário para substituir um professor no

período em que ele esteja escrevendo um livro didático, podendo ser de até 12 meses.

Tratou-se de uma parceria entre a reitoria e a editora da universidade (DOC-47). Este

dado indica também que a universidade reconhece que o professor está sendo

incentivado a divulgar os conhecimentos produzidos por outras vias (tal como artigos

científicos) e que não estão produzindo livros ‘didáticos’ para um acesso mais popular

aos conhecimentos produzidos na universidade. Nesse sentido, a universidade

implementa medidas provisórias para gerar esses (i)números livros didáticos, ao invés

de revisitar o processo pelo qual a universidade tem caminhado no que se refere a seu

papel fundante – isso anuncia mais uma vez a visão gerencialista, quantitativa,

neoliberalista que tem hegemonia cada vez maior no cerne da universidade.

Portanto, percebe-se um sanfonamento sobre o tempo docente em, pelo menos,

quatro aspectos: 1 – aumento do tempo docente para orientações, possivelmente

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causado pelo aumento do número de pós-graduandos simultâneos para cada docente e

pela diminuição do tempo de defesa dos pós-graduandos; 2 – aumento no tempo de

dedicação para cumprimento das exigências dos programas de pós-graduação para fins

de recredenciamentos, causado possivelmente pelo aumento das exigências para se

conseguir o recredenciamento nos programas de pós-graduação; 3 – aumento do tempo

de dedicação às atividades administrativas pelos docentes, causado provavelmente pela

diminuição do número de servidores técnico-administrativos e aumento de produtos do

tipo autoinstrucionais e ‘faça-você-mesmo’; 4 – aumento do tempo docente para

dedicação às atividades do regime de dedicação exclusiva, causado provavelmente pelo

aumento de contratação de docentes temporários exclusivamente para o ensino de

graduação, pela diminuição dos docentes em regime de dedicação exclusiva e pela

diminuição do total de docentes na universidade.

A preocupação concernente a esta situação se refere ao fato de que possa estar

imperando a ideia e a prática do ‘faça mais em menor tempo’, ou seja, o segundo, o

minuto, a hora, o dia, a semana, o mês, o ano docentes têm sofrido um efeito sanfona,

pois os docentes têm tido que conseguir responder a quantidades cada vez maiores de

demandas dentro da mesma quantidade de tempo disponível/disponibilizado (o dia só

tem 24 horas, a semana tem apenas 7 dias etc.). Uma vez que o tempo cronológico é

imutável no sentido de que ele permanece o mesmo para todas as pessoas, esse efeito

sanfona age sobre o tempo individual, pessoal, particular, que cada indivíduo precisa

para realizar suas atividades e alcançar objetivos e metas, neste caso, impostos pelo

modelo de gestão operante e hegemônico na universidade – o modelo neoliberal,

funcionante sob a ótica da nova gestão pública e da cultura do management,

especialmente consolidado nas escritas documentais, relatórios etc., onde se inscrevem

termos como excelência, cliente (ao se referir aos cidadãos – comunidade, estudantes e

servidores da universidade) (DOC-29; DOC-45; DOC-47; DOC-48). Alguns trechos das

entrevistas ressaltam o trabalho extraturno, inclusive de feriados e nas próprias férias

para conseguir dar conta das atividades acumuladas:

Então, eu posso dizer que hoje eu tenho trabalhado três turnos, ontem foi

isso, para dar conta de forma responsável a essas demandas todas. Mas eu

confesso que é totalmente insalubre essa condição de vida nossa hoje.

Entendo que precisamos ter mudanças sim, por mais que nós temos esse

envolvimento e nos sentimos realizados com todas essas atividades que a

gente desenvolve [...] A nossa vida precisa ser um pouquinho mais

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organizada e poder olhar para esse mundo e viver outras experiências. Claro

que a universidade é mais importante. Mas, existem outros espaços

familiares, culturais que eu sempre frequentei e, que hoje está em segundo

plano – P05 – trecho de entrevista individual.

[...] e a gente está ficando com sobrecarga [...] Vira e mexe a gente tem que

levar coisas para casa, tem que trabalhar nas férias – P09 – trecho de

entrevista individual.

Mas, aí, não tem jeito! Tem que trabalhar final de semana? Em muitos

períodos sim! Tem que trabalhar em feriado? Em muitos períodos, tem sim!

[...] então, às vezes, eu largo outras coisas para fazer esses preparos essas

revisões de aula e por aí. Depois, eu tenho que dar conta de noite, fim de

semana das outras coisas. É a nossa vida na Universidade. Acho que é muito

árduo para o docente dedicado integralmente à docência e à pesquisa e à

extensão também. – P11 – trecho de entrevista individual.

Nessa direção, cabe destacar que é possível perceber que a lógica

gerencialista/neoliberalista, de incentivar e intensificar a responsabilização/acreditação

(accountability) dos docentes universitários enfermeiros acaba por produzir, de acordo

com os trechos anteriores, um efeito de sobreimplicação docente com as atividades e os

papéis docentes encomendados pela universidade-empresa, pois a sobreimplicação é

uma condição em que se está tão densamente dentro de algo, que as cristalizações e as

naturalizações ofuscam o olhar, não permitindo fazer uma análise minuciosa das

implicações (MONCEAU, 2008), nesse caso das implicações do docente universitário

enfermeiro. Desse modo, sobrar atividades e levá-las para casa, pode soar natural e ficar

invisível à análise de implicação em cenário onde isto acontece com frequência e

costumeiramente.

Enfim, esse movimento gerencialista induz a escolhas mais ágeis e fáceis para a

carreira docente, induz a priorização de certos produtos, o que torna o tempo docente

escasso para investimentos em questões pedagógicas, ou mesmo em questões de

extensão. Os seguintes trechos de análise durante um encontro coletivo para discussão

dos dados da pesquisa mostram esta preocupação:

Não, a gente não quer portfólio, a gente não quer nada que vai levar tempo

para a gente ler – P08 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

Agora fazendo sucupira quando você vai colocar como extensão, a gente

coloca extensão, pareceres que a gente dá para revista, para mim que isso

não é extensão em nada. Participar de uma banca? Para mim isso não é

extensão no sentido do que eu gostaria de estar fazendo como extensão. Eu

iniciei uma vez um projeto lá no *** com os funcionários e eu falei “ah

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agora eu vou conseguir extensão e eu não consegui continuar” não dá

tempo... – P09 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

E o professor acaba não tendo tempo para realizar atividades que são

consideradas importantes por eles, como apresentado por esta análise durante um

encontro coletivo para discussão dos dados:

Você fica nesse movimento e aí, eu estou completando em abril 10 anos de

serviço público, mas fiz enfermeira 2 anos, 8 anos na docência eu fiz a

pedagogia universitária, eu fiz o curso, só, não fiz mais nada. Como que a

gente deixa de investir na educação? Enquanto grande papel, o meu papel

aqui é a graduação, deveria ser a ênfase, mas não é. Eu trabalhei em uma

instituição privada em *** era uma fundação, mas não deixa de ser privada,

não tinha nenhum momento para discutir, porque não tinha pesquisa lá, você

não precisava fazer pesquisa nenhuma, eram poucos docentes, éramos em

10, eles falavam da hospitalar, da saúde pública, a gente se dividia as

disciplinas, cada uma dava a disciplina inteira, claro era uma turma só, mas

era assim a gente discutia o que não estava dando certo no ensino, trazia os

campos e falava “nós estamos com problemas” as reuniões eram assim.

Quando eu fico lembrando o que se discutia lá, na nossa área está tentando

se articular disciplinas e fala assim “a gente tem eixos, não tem”, parece que

a gente está perdendo isso agora a gente vê... é a gente vai discutindo as

coisas e fala assim “será que a gente está seguindo um eixo? Vamos parar

para pensar, tá? A gente marca uma reunião”, “não, vamos marcar”, fazer

uma oficina para discutir isso na área para ficar o dia todo a gente não

consegue fazer. A gente vai em um evento dividi os docentes aí tem a

contratação, perdemos duas docentes por aposentadoria. Ai a gente pega as

duas meninas que vem para o cargo temporário que estão substituindo, uma

já veio a outra está vindo, elas têm que entrar na disciplina para dar conta.

Aí, você percebe passou um ano, aí no final do ano de novo a gente de novo,

a gente não discutiu, “vamos mudar para o terceiro ano” a gente teve

dificuldade no quarto, então vamos voltar, a gente não volta. No processo os

docentes que estão envolvidos conseguem modificar, então usa outras

referências, usa outras estratégias “ah eu vi isso aqui”, mas a coisa vai

sendo assim. A graduação não é o eixo... é mesmo a pesquisa isso fica para

fora sabe? Eu não sei se a gente usa – P09 – trecho de análise durante o

encontro 2.2.

Para concluir esta reflexão, em um momento de novas entrevistas, uma

participante refere a falta de tempo, causada por uma diversidade de demandas,

culminando com a dificuldade de concluir atividades começadas ou mesmo priorizar

aquelas mais importantes, e ressalta que o tempo para a dedicação à docência e ao

ensino, inclusive momentos de reflexão sobre a prática docente, fica escasso:

E o nosso tempo ele é usurpado, juro para você, a gente não tem tempo.

Tempo hoje, do professor universitário, pelo menos na minha escola é... é

para fazer um monte de coisas ao mesmo tempo e, aí, eu estou me vendo, eu

estou dizendo agora de mim, da minha experiência, eu faço um monte de

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coisas ao mesmo tempo, para responder a um monte de demandas e no

fundo, no fundo, aquilo que preciso fazer com mais qualidade eu não estou

conseguindo fazer. Eu vou dar um exemplo bem básico, por exemplo, ter

tempo para preparar aulas de qualidade, pensar naquelas aulas e como

aquelas aulas que eu preciso dar, como professora, na graduação ou mesmo

na pós-graduação, de fazer esse meu movimento e meu momento específico,

aquele que eu estou na sala de aula, e pensar nesse momento como um

momento que seja de fato de cumprir o meu papel como educadora. E

cumprir o meu papel como educadora não é transmitir conhecimento, é falar

das coisas que eu acho que eu sei, não é ensinar os conteúdos obrigatórios,

que o currículo, seja na graduação ou na pós-graduação determina, é muito

mais do que isso. É, sobretudo, favorecer o espaço de troca e de mediação e

de diálogo para que essas pessoas, seja na graduação ou na pós-graduação,

elas se permitam se ver como pessoas construtoras do seu próprio saber, do

seu próprio conhecimento, de como esse saber e esse conhecimento vai

transformar a vida delas e os contextos em que elas estão. Porque eu acho

que é para isso que deve servir a escola, muito mais do que ensinar, a escola

para educar. [...] Então, hoje, nosso tempo como professor universitário está

abduzido! Pelas demandas milhares outras que não são demandas dedicadas

ao processo de aprendizagem, de constantemente reaprender e refazer-se

como educador. Eu não tenho tempo de sentar para pensar sobre a minha

prática, nem eu comigo mesma, nem os colegas uns com os outros. Nós não

temos tempo, porque a gente tem que fazer projeto para submeter, porque a

gente tem dez mil orientações, porque a gente tem um milhão de comissão,

porque a gente tem um milhão de... tem os artigos para produzir, porque a

gente tem as demandas mil, mas a essência do ser docente que, para mim, é

ser educador, a gente não tem tempo de refletir sobre a própria prática, de

aperfeiçoar essa prática, de reconduzir essa prática. Ou seja, aquilo que a

gente tanto fala, nós que somos, digamos educadores, ser reflexivos, de

pensar a partir da ação-reflexão-ação, a gente não tem tempo de fazer isso,

porque nós fomos abduzidos para dar resposta às demandas produtivistas

que, hoje, estão instaladas na universidade, infelizmente é isso – trecho

analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região

nordeste do país – PC02.

Nessa mesma direção, outra participante faz uma reflexão, em momento de nova

entrevista também que, devido ao excesso de atividades e seu aumento progressivo, tem

deixado atividades por fazer. Ressalta também que, por vezes, a infraestrutura fica a

desejar. O seguinte trecho analítico traz esta questão:

Então, eu tenho, estou sempre em débito, eu sempre estou, não no banco

graças a Deus, sempre em débito com as discussões, as atribuições, que vão

ficando cada vez mais volumosas, cada vez mais a exigência está

aumentando na universidade, com o aluno e tal. Então, a produção também,

tem a questão do dinheiro, de você investir, de poder pagar uma produção –

uma publicação hoje em dia é caríssima, o tempo que a gente despende para

isso. [...] é uma exigência imensa de a gente se manter no programa, a gente

entrar já é difícil. Depois, para se manter. E eu penso assim: é uma

exigência muito alta em função de uma infraestrutura que a gente não tem.

Então, tudo depende da gente, mesmo agora na coordenação a gente observa

assim, por exemplo, de três secretárias que eu tenho na nossa coordenação,

estamos efetivamente com uma, então, isso faz muita falta. Além é claro, de

wifi potente de um computador bacana, tudo isso a gente consegue, vem dos

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projetos e tal, mas rapidamente ficam defasados, aí, a universidade não

repõe. Os espaços, o próprio espaço do professor é pequeno. Enfim,

complicado, bem puxado, eu vejo que eu sou assim muito exigida, mas eu

procuro levar, assim como eu faço na minha vida também pessoal, as minhas

prioridades e minhas possibilidades. Então, eu faço as prioridades, eu falo o

que eu preciso para essa semana? O que é mais importante? Ah, tenho uma

defesa, tem uma apresentação de um evento, tenho uma aula inaugural,

alguma coisa que eu preciso fazer. Então, eu vou com checklist, fazendo as

minhas prioridades e dentro do possível, então, não fico angustiada, nervosa,

me sentindo um lixo, não, eu… mas acho que, isso, maturidade também

ajuda bastante, tem que ter também o bônus – trecho analítico de nova

entrevista com professora-enfermeira da região sudeste do país – PC04.

Efeito de contenção (camisa de força)

Para a construção deste efeito, buscou-se o significado do verbo conter. Tanto no

Dicionário Aurélio de Português Online como no Dicionário Priberam da Língua

Portuguesa, respectivamente, na terceira e na sexta acepções do termo ‘conter’,

encontra-se: “refrear; reprimir; deter.” (PRIBERAM, 2013; AURÉLIO, 2018). No

Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, em sua terceira acepção,

observa-se “exercer autoridade, controle ou poder sobre (alguém, algo ou si mesmo);

moderar(-se), refrear(-se), reprimir(-se)” (MICHAELIS, 2018a). Assim, o efeito de

contenção é entendido, neste estudo, a partir do termo conter, no sentido de tudo aquilo

está sob refreamento, controle, repressão ou moderação, neste caso, as atividades,

pensamentos, ações e atitudes docentes e suas concepções pedagógicas.

Um dos aspectos que marcam este efeito é a dúvida, a incerteza dos docentes

enfermeiros ao se referirem aos seus referenciais pedagógicos. Alguns deles referem

não seguir nenhum referencial pedagógico, apenas citam o uso de algum modismo que

se espalhou pelo ensino superior quando se fala em ensino, como é visto nos seguintes

trechos:

Mas eu não vou te dizer [que] a disciplina está dentro dos conceitos de Paulo

Freire, ou está dentro daquela questão da problematização. Não te posso

dizer que tem uma abordagem fechada para questão da enfermagem. Assim,

acho que foi muito da vivência da necessidade que eu fui sentindo de trazer

um pouco mais do lúdico para a sala de aula. Trabalhar, até porque a

disciplina de *** ela é pesada, ela é ciências humanas – P04 – trecho de

entrevista individual.

A problematização... é... Acho que entra... Não sei se pode falar em um

referencial único, acho que é uma coisa um pouco mais aberta nesse sentido,

né! Mas, a gente segue o Projeto Político Pedagógico da escola, né! Que é

centrado na formação ah... do enfermeiro generalista [...] Eu acho que ele

tem que passar, fazer passar por esse processo todo, ele tem que digerir tudo

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isso! Para, amanhã, ele conseguir reproduzir. Quando ele vai conseguir

reproduzir? Quando ele fez todo esse processo e bem feito, né? De tudo, aí

sim, ele estará pronto para ensinar, então, reproduzir. Mas quando ele

digere tudo isso? Quando ele digeriu muito bem todos esses conhecimentos e

aprendizado – P11 – trecho de entrevista individual.

A grande questão que se coloca é referente a como é possível implementar

alguma abordagem pedagógica sem referencial, ou mesmo, o que significa dizer que

não se usa/segue um referencial pedagógico – seria dúvida quanto à adequação do que

se faz? Seria essa fala para não se comprometer com nenhum referencial e fazer sem

compromisso de ‘errar’? Estes professores, quando observados em suas atividades

pedagógicas, apresentaram sobremaneira, atividades cujas características remetiam ora

às concepções tradicionais de ensino e de aprendizagem, ora às concepções

escolanovistas (centralidade do estudante, cognitivismo que se expressa sobremaneira

nas simulações), ora às concepções tecnicistas (ênfase nas práticas de técnicas, roteiros

e protocolos), que não estão em alinhamento com aquilo enunciado no projeto político-

pedagógico dos cursos em que atuam – Pedagogia Histórico-Crítica33 (as aprendizagens

em contexto social, histórico, humano, in vivo, face a face, com potencial

transformativo – tal como o ciclo pedagógico).

Nesta direção, os professores, de forma geral, também referem a falta de tempo

para a dedicação em atividades de estudo de referenciais pedagógicos, de planejamentos

de ensino voltados para o pedagógico, e não simplesmente os aspectos organizativos da

aula/do encontro:

Então, é assim, é pouco tempo que a gente tem para estruturar uma boa

disciplina com essas estratégias diversificadas. Precisa do tempo e, às vezes

o docente não tem e é o que dificulta mudanças que eu percebo em outras

disciplinas. [...] Agora, nas disciplinas em que a gente tem um número maior

de pessoas [docentes], as pessoas não têm a mesma disponibilidade de

tempo, tanto tempo cronológico de horário mesmo, e tempo interno de

buscar uma nova tecnologia, buscar uma nova estratégia. Aí, esbarra nestas

questões e acaba que a gente pode perceber sempre que pode melhorar, mas

não avança por conta das dificuldades que é de se deixar... deixar não... de

se investir no tempo de preparo da disciplina – P10 – trecho de entrevista

individual.

33 A Pedagogia Histórico-Crítica é uma abordagem proposta por Dermeval Saviani, notadamente embasada na teoria dialética, em que se propõe o uso da problematização, assim como do aproveitamento dos conhecimentos historicamente sistematizados pela humanidade, uma vez que aposta que é pela problematização e apropriação destes conteúdos pelas classes operárias e marginalizadas conseguirão lutar por um lugar na produção de uma sociedade mais justa.

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[...] não dá o tempo - é uma coisa maluca! Mas centrado, em silêncio, eu

consigo fazer isso com mais propriedade, eu consigo trabalhar um pouco

melhor. O tempo não existe para essa coisa na verdade, para você preparar,

adequadamente, uma aula, refletir sobre ela. Depois que você deu a aula

também. Eu faço sempre o processo de reflexão da revisão de tudo. O tempo

não existe para isso. A gente tem que criar quando está dormindo, às vezes,

para esse negócio. [...], mas a questão de tempo é muito complicado! Não

existe! – P11 – trecho de entrevista individual.

É saliente nas análises produzidas pelos docentes quanto à falta de investimento

para a formação pedagógica, tanto do âmbito individual quanto do âmbito do

estabelecimento de ensino superior, porque a estrutura organizacional, a lógica de

trabalho e a cultura do produtivismo no estabelecimento de ensino não têm permitido,

uma vez que essa questão não é valorizada, tal como notado nos seguintes trechos de

entrevistas individuais:

[...] cursos como o do *** que é a Pedagogia Universitária, ajuda muito na

sua formação. Só que eles são limitados também e acontecem, por exemplo,

aconteceu no começo da minha carreira. Agora, eu já estou com cinco anos

e isso não vai acontecer de novo se eu não correr atrás. Eu que teria que ir

atrás disso. E a dificuldade que a gente tem sobre a sobrecarga de trabalho

– P09 – trecho de entrevista individual.

Ou até o docente fala assim "olha eu não vou fazer isso porque agora eu

tenho tanta coisa para fazer, não vou fazer esse curso [de pedagogia

universitária] e tal", mas eu acho que é necessário, o papel da gestão é

investir, porque está em constante atualização, mesmo o ensino também.

Não só o conhecimento relacionado à prática profissional, questão da

assistência, cuidado etc. Mas também o ensino em constante atualização –

P10 – trecho de entrevista individual.

Da questão de formação docente, para dar aula inclusive, porque o docente

pode ser muito bem formado em pesquisa, mas para o ensino em si,

dificilmente, alguém tem uma formação específica na questão do ensino.

Então, eu acho que isso deveria ser um pouco melhor avaliado, visto.

Infelizmente, a Universidade patina muito nesse sentido – P11 – trecho de

entrevista individual.

Desse modo, o docente acaba ficando refém do cumprimento de algumas tarefas

específicas que são cobradas, pois são altamente avaliadas e pontuadas, assim como

referido anteriormente no efeito checklist. Por um lado, os docentes respondem

primeiramente às cobranças que emanam da encomenda da universidade, de suas

unidades, de seus departamentos e de seus programas de pós-graduação (em que são

credenciados), tanto no que se refere à pós-graduação como aquilo que gera

financiamentos, verbas, aumento de salários. Por outro lado, acabam virando “arqui-

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inimigos”, pois competem com seus pares por cargos, funções, progressões na carreira,

melhores salários. Tudo isso tem somado, negativamente, para a contenção dos docentes

a uma condição de atender às exigências e a seguir à risca os checklists estipulados

(ideologicamente, estruturalmente etc.), para que consigam, primeiramente, se manter

nos cargos, e secundariamente, conseguir galgar status e prestígio entre os pares,

nacional e internacionalmente. O trecho seguinte de uma entrevista individual ilustra

esta questão:

Então, volto mais para cargos, comissões etc., porque aspiro ao título, por

exemplo, de professor titular. E que isso é uma condição sine qua non. Você

tem uma carreira, mostrar os aspectos administrativos que você desenvolveu,

a sua competência. Mas eu acho que não são todos os docentes que têm

essa... Eu, por exemplo, colaboro, mas acho que atrapalha muito... essa

questão atrapalha muito a minha carreira de docente, vamos dizer, que é o

aspecto que eu gosto que é o ensino de graduação, da pós-graduação e a

extensão – P12 – trecho de entrevista individual.

Soma-se a isso, o efeito sanfona sobre o tempo docente, mencionado

anteriormente, como um dispositivo sagaz da ideologia neoliberal para a consolidação

da contenção dos docentes dentro de atividades que consolidem, mantenham e

continuem a reforma neoliberal sobre a universidade, a partir da reforma neoliberal do

aparelho do Estado. Por um lado, o efeito sanfona contribui para a consolidação de

mecanismos gerencialistas de gestão (Nova Gestão Pública) que, mesmo que queiram,

os docentes têm dificuldades de manter algumas condições estruturais que sustentavam

alguns referenciais pedagógicos que se alinham com perspectivas histórico-críticas ou

mesmo emancipatórias, ou seja, que demandam mais tempo docente para uma série de

atividades pedagógicas que acompanham estes referenciais. Por outro lado, esse

dispositivo se utiliza de conceitos espalhados e aculturados no meio social (movimento

típico da cultura do management), reformando os significados de alguns conceitos,

atribuindo-lhes novos sentidos para que, ao olhar menos criterioso, menos atento, mais

superficial, não se o perceba, com a finalidade de dar legitimidade para os mesmos,

sendo passíveis de utilização para as justificativas das escolhas, muitas vezes, no sentido

gerencial e, cada vez menos, no sentido pedagógico. Alguns dos trechos utilizados

anteriormente mostraram que o docente não consegue utilizar seu tempo para questões

relacionadas a aprofundamentos em referenciais pedagógicos e planejamentos

pedagógicos, e os trechos seguintes, advindos de análises com os participantes nos

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momentos de restituição individual, ilustram um pouco melhor a questão da

reformulação das estratégias de ensino-aprendizagem para atender às imposições

emanadas de encomendas da universidade:

Se já tínhamos algumas dificuldades, elas vão se acirrar um pouco mais

tanto devido às cobranças e também pelas limitações, por conta dos cortes. É

um jeito de fazer e de pensar que não valoriza a educação. Vemos, no

exterior, que há outros modelos de investimento em educação. No Brasil, a

gente faz de conta que ensina e a população faz de conta que aprende.

Talvez, teremos que tentar outras articulações em que a gente saia perdendo

e o estudante também. Para sairmos ganhando teríamos que pensar em outra

proposta, porque como a gente consegue trabalhar em propostas

emancipatórias com mais estudantes em sala de aula e menos professores?

Não sei, em curto prazo, se a gente consegue pensar uma melhora para isso.

Se a gente entrar nisso, a gente sabe que estará indo para o fundo do poço,

mas uma hora teremos que sair dele e reconstruir tudo de novo. Essa

situação já acontece no Brasil há algum tempo no ensino básico, e agora

está sendo percebida mais claramente no ensino superior. Vai precisar para

um ensino de qualidade, as pessoas terão que investir tempo, e tempo custa

dinheiro. As universidades públicas têm um referencial de qualidade, mas

daqui para frente pode ser que nem tanto. Será preciso repensar o jeito de

fazer, o jeito de ensinar. Como a gente consegue reestruturar com menos

recursos? É aquela questão – em tempos de crise, é preciso ter criatividade.

Então, a gente vai ter que repensar e usar a criatividade para ver como vai

trabalhar – P02 – trecho de análise durante uma restituição individual.

eu não sei até quando a gente vai resistir a esse modelo. Vou dar um exemplo

claro, com a aposentadoria de algumas colegas da área em que eu leciono,

eu não sei até quando a gente consegue manter essa proposta pedagógica

por uma questão numérica, como é que vamos conseguir trabalhar com 150

alunos das três disciplinas de cada semestre com três professores, dentro de

uma proposta de trabalhar com 10 estudantes por professor. Eu posso

querer, eu posso fazer, mas a instituição talvez não me dê condições para.

Então, não basta apenas aquilo que eu acredito, que minha colega acredita.

Existe uma série de outros fatores que independem da gente que acabam se

colocando nesse processo. E eu não vou ser hipócrita de dizer um ano, dois

anos, três anos, eu aguento, por exemplo, duplicando a minha carga horária,

tendo 20 horas de aula por semana, mas eu não vou conseguir fazer isso

para o resto da minha vida para suportar uma proposta que eu acredito, mas

a minha saúde e a minha qualidade de vida também está em jogo. Hoje eu

tenho medo de que se daqui a cinco anos a gente vai estar dentro desse

modelo ou se a gente vai ter voltado àquelas aulas chatas em que a gente põe

50 alunos dentro da sala e apresenta os conteúdos e eles copiam, fazem uma

prova, e pode ser uma prova um pouco mais que façam com que eles pensem

um pouco mais e individual e pronto! Não porque a gente queira, mas

porque esse modelo nos força a. Hoje não existe perspectiva de

preenchimento da vaga de *** que está em vias de aposentadoria. Sem ela a

gente consegue, porque está em quatro, mas a professora *** também já

disse que até o final do ano está aposentando. Aí, estaremos em três e como é

que vai ser? É uma força muito poderosa e eu acho que as pessoas não

percebem isso ou não querem perceber porque por outro lado esse modelo

traz um pouco mais de conforto, de facilidade, as coisas são mais práticas,

mais fáceis, mais acessíveis no sentido de muito consumismo. Então, as

pessoas acabam se seduzindo um pouco por isso e acabam não vendo o

impacto disso no futuro – P06 - – trecho de análise durante uma

restituição individual.

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Em encontro informal com P03, a professora afirma que, por conta dos cortes

e não recontratações docentes, sua disciplina terá que repensar suas

estratégias e métodos de ensino-aprendizagem, uma vez que trabalhavam em

4 professores para uma turma de 50 estudantes, sendo pequenos grupos entre

10-12 estudantes por professor, conforme as exigências do referencial

pedagógico utilizado para a formação de profissionais críticos, e agora terão

que trabalhar com um grupo maior por professor, aproximadamente 17

estudantes, ou mesmo fazer dois grupos de estudantes para cada professor, o

que ampliaria muito a carga horária docente de dedicação ao ensino de

graduação (ANOTAÇÃO DE DIÁRIO DE PESQUISA).

Do mesmo modo, durante a implementação do dispositivo de restituição

individual, P09 comenta a preocupação com relação à perda (sem reposição) de 3

docentes, referindo que sua área de ensino tinha 9 docentes e que estão em apenas 6.

Comenta que teme que, com essa política de não recontratações, as turmas possam ficar

mais cheias para cada professor, referindo que isso interferiria na qualidade do processo

de ensino-aprendizagem. Outra questão seriam os estágios, em que há uma normativa de

que haja apenas 10 estudantes por professor, o que aguça ainda mais as dificuldades

advindas a partir das medidas de contenção de gastos da universidade. Ela comenta

durante um encontro de restituição individual:

“será que vou ter que voltar a dar aulas para uma turma grande, de forma

transmissiva?” – P09 – trecho de análise durante uma restituição

individual.

A última fala ressalta um tanto mais como as medidas gerencialistas têm

interferido inclusive sobre as conformações curriculares a partir das dificuldades e

conflitos que estão gerando para os professores, atuando como amarras ou contenções, e

os professores ainda não sinalizam como vão superá-las.

Cabe destacar ainda, a dificuldade com que os docentes conseguiram/não

conseguiram participar desta pesquisa, uma vez que não dispunham de tempo para esta

finalidade de atividade em meio a tantas outras cobranças e demandas priorizadas. O

trecho seguinte de uma anotação no diário de pesquisa ajuda a elucidar este assunto:

É necessário destacar algumas características interessantes produzidas a partir

do dispositivo da entrega de documentos a serem analisados. Na maioria dos

casos os professores não tinham em mãos nem o plano de aula, nem o plano

de disciplinas, inclusive um dos participantes referiu que “até a gente que

ensina sobre o plano de aula, não consegue fazê-lo para cada aula” P07 –

fala de docente anotada em diário de pesquisa durante uma observação.

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Entretanto, em um caderno, este participante tinha todas as anotações que

havia feito para pensar o desenrolar daquele encontro observado, mesmo não

tendo identificado aquilo como plano de aula. Outros participantes enviaram

os planos por e-mail, havendo alguns casos de não se lembrarem qual tinha

sido o momento da observação, qual disciplina. Alguns enviaram com

prontidão, outros demoraram cerca de 3 meses para entregarem. Contudo, um

caso chamou à atenção: um dos participantes me mostrou um plano impresso

do encontro observado e disse que enviaria por e-mail (isso foi em 30 de

setembro de 2015), mas não enviou aquele plano mesmo depois de 6 contatos

por e-mails solicitando o plano de aula (entre 8 de outubro de 2015 e 18 de

setembro de 2016), além de encontros nos corredores e promessas de envio –

por fim, foi possível utilizar apenas o programa da disciplina disponibilizado

online (teria sido isto medo de exposição do plano, ou algo desta natureza?).

Esse participante ressaltou, em vários momentos, a quantidade expressiva de

atividades tinha que cumprir e a dificuldade de participar de outras

atividades, mas que faria o possível para consegui-lo e não expressou em

momento algum o desejo de sair do estudo (ANOTAÇÃO DO DIÁRIO DE

PESQUISA).

Nesse sentido, é interessante uma análise realizada por uma entrevistada da

região nordeste do país, em momento de novas entrevistas para ampliação da análise e

interpretações:

[...] os professores vão acabando se tornando o que? Burocratas! Então, o

que que ele faz? Ele busca cargos administrativos com gratificações, para

que ele possa, no futuro da carreira, ter um crescimento financeiro que

corresponda a 20 ou 30 anos de serviço. Porque o salário, por vezes, vai

ficando, de alguma forma, defasado. Então, hoje, o que nós temos visto é que

nós somos uma carreira, uma profissão que ainda precisa se consolidar, se

valorizar. Que no começo da carreira, eu acho que nessa relação custo

salário-trabalho, eu acho que atende a nossas expectativas, mas eu acho que

quando a gente vai crescendo profissionalmente, essa relação não

corresponde mais. Eu digo isso porque eu tenho uma colega com mais de 30

anos de serviço, que o salário dela corresponde ao de um recém ingressante

doutor, ela não é doutora. Então, eu acho que essas discrepâncias elas

também, elas por vezes são injustas, entendeu? – trecho analítico de nova

entrevista com professora-enfermeira da região nordeste do país– PC05.

DISCUTIR CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS COMO ANALISADOR DA

‘DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’

Alguns efeitos do pensamento neoliberal e da nova gestão pública sobre as

concepções pedagógicas de docentes enfermeiros

Os principais efeitos produzidos a partir deste analisador foram o efeito rosa dos

ventos sobre as concepções e as práticas pedagógicas e o efeito peneira, que serão

explorados a seguir.

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Efeito Rosa dos Ventos sobre as Concepções e as Práticas Pedagógicas

Para explicar o uso dos termos utilizados para a construção deste efeito, buscou-

se na geografia o termo ‘rosa dos ventos’ com o sentido de um dispositivo que indica a

orientação para todas as direções a partir de pontos cardeais principais (norte, sul, leste,

oeste), pontos colaterais (nordeste, noroeste, sudeste, sudoeste) e, ainda, pontos

subcolaterais (norte-nordeste, leste-nordeste, leste-sudeste, sul-sudeste, sul-sudoeste,

oeste-sudoeste, oeste-noroeste, norte-noroeste). A rosa dos ventos é também um

equipamento que indica a velocidade e a direção dos ventos, para que seja possível

planejar seu melhor aproveitamento, seja qual for o motivo, por exemplo, instalação de

unidades de produção de energia eólica (APPLEQUIST, 2012).

Assim, a partir deste conceito de rosa dos ventos se delineia, neste estudo, o

conceito de “efeito rosa dos ventos sobre as concepções e as práticas pedagógicas”

como um movimento em que os conceitos, atitudes e procedimentos utilizados e

pensados pelos professores na elaboração de suas aulas, nas escolhas metodológicas e

avaliativas, na interação com os estudantes, dentre outras situações de ensino-

aprendizagem, indicam as mais variadas teorias pedagógicas, com as mais variadas

intencionalidades e finalidades, como se fossem passíveis de serem somadas e utilizadas

juntas, intercaladamente e desinteressadamente, como um processo de tecnificação da

utilização dos conceitos pedagógicos de maneira instrumental e descomprometida com

referenciais ou teorias pedagógicas.

O grupo estudado trabalha em um estabelecimento de ensino superior público

com dois cursos de graduação em enfermagem (um de licenciatura e outro de

bacharelado em enfermagem), cujos projetos político-pedagógicos (PPP) enunciam a

utilização da teoria histórico-crítica como referencial pedagógico para o delineamento

dos mesmos (DOC-19, DOC-20, DOC-22, DOC-23). Entretanto, na fase de análise de

papel desta pesquisa socioclínica (como referido no tópico sobre o percurso

metodológico, analítico e de produção dos dados), foi possível perceber que esta

referência teórico-pedagógica (a pedagogia histórico-crítica) não tem sido, na maioria

das vezes, a base sobre a qual as escolhas docentes têm se pautado para a construção

curricular, para as escolhas dos conteúdos, da forma como se trabalhar o conteúdo, das

perspectivas avaliativas, dentre outras (DOC-24, DOC-25). Todavia, não se está

querendo afirmar aqui que o almejável é a unilateralidade das escolhas teórico-

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pedagógicas, mas se quer ressaltar que ainda existem distanciamentos entre o plano

(PPP) coletivo (macro) e os planos de aula e de disciplina (micro). Talvez esta escolha

possa ter acontecido para atender a legislações e perspectivas formativas que se alinham

com a formação de recursos humanos para o SUS, críticos, reflexivos, autônomos,

participativos, articulando desde o início do curso aproximações profícuas com os

cenários de saúde e podendo apoiar a consolidação do SUS ao mesmo tempo em que se

formam profissionais aptos para trabalhar nesta direção (MOTTA et al., 2004;

CARVALHO; CECCIM, 2012). Entretanto, a dúvida que fica é por que esse referencial

não consegue ser implementado por todos os docentes? Será que é porque ele demanda

maior investimento docente na preparação para as atividades? Na preparação para

trabalhar com as informações e conhecimentos sem sabê-los a priori, uma vez que essa

teoria propõe encontrar juntamente com os estudantes e outros envolvidos os problemas

da realidade, sobre os quais se trabalhará? Será que o tempo docente tem permitido se

apropriar de referenciais deste tipo, ou ainda, colocá-los em prática?

O grande dilema desta questão é que, normalmente, os docentes universitários,

principalmente os de áreas distantes das Ciências da Educação, não tiveram formação

específica para o exercício da docência no ensino superior, que pudesse ser disparadora

dos conhecimentos pedagógicos para apoiar a construção e a implementação dos

currículos onde atuam como docentes-pesquisadores (NUNES, 1998; FARIA;

CASAGRANDE, 2004). Autores já afirmavam que os docentes que não tinham sólida

formação pedagógica em sua formação inicial tendiam a reproduzir aquilo que

vivenciaram enquanto “educação” em sua formação de nível básico, ou mesmo, tendiam

a reproduzir aquilo que é passado ou vivenciado com seus pares docentes durante o

exercício da docência, ou seja, um exercício da docência no ensino superior baseado nas

experiências cotidianas espontâneas e no empírico, sem a existência de espaços formais

para um refinamento crítico, pedagógico e científico do fazer-pensar docente, o que

torna mais difícil reconhecer e praticar a cientificidade que sustenta a docência

(BENEDITO et al., 1996; PIMENTA; ANASTASIOU, 2010). Os trechos seguintes de

entrevistas individuais ilustram essa questão:

Então, na verdade, em relação a isso, eu não tive uma formação muito

específica, na minha graduação - eu fiz o bacharel. Depois também em

relação ao preparo que a gente tem na pós-graduação, eu acho que algumas

disciplinas até se modificaram hoje, eu vejo os pós-graduandos, inclusive os

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meus, pessoas que eu tenho mais contato, que estão em disciplina comigo ou

orientando, e comentando sobre isso. E eu vejo que está tendo...a gente teve

mudanças aqui. Principalmente, depois que começou o curso da licenciatura,

há uma preocupação maior com estas questões, mas na minha época isso

[formação para a docência] não era tão incisivo. [...], mas eu vejo que eu

gostaria de ter tido um preparo ainda maior em relação a isso [formação

pedagógica] - eu me sinto insatisfeita – P01 – trecho de entrevista

individual.

A gente, enquanto sendo pós-graduando, acaba não tendo tanto olhar para a

formação docente. [...] porque a gente acaba pensando mais na formação e

desenvolvimento da pesquisa do que a própria formação docente. Então,

quando você entra numa universidade, você consegue, através do título que

você tem, o de mestre e o de doutor, só que você não teve às vezes uma

formação, embasamento nesta questão da docência. Então, a gente entra

num cargo de professor, pensando no ensino, só que [...] os requisitos que

acabam sendo avaliados é que são muito de produção científica. Então,

enquanto a gente acaba olhando mesmo para nossa formação enquanto

professor, porque na verdade a gente não se formou professor, a gente é

enfermeiro de formação. Alguns com licenciatura, então, o quanto a gente

não olha para essas questões - que a gente está numa universidade, que a

gente é professor. Então, por exemplo, quando você fala assim "entrou um

enfermeiro que não tem licenciatura, ele chega à universidade e ele tem que

fazer um plano de aula". Eu preciso ver seu plano de aula, e fala assim:

"você tem uma estrutura?". Ele nunca viu um plano de aula na vida dele, ele

não sabe como que é isso. E ao mesmo tempo, por exemplo, onde está esse

plano de aula? Alguém te cobra esse plano de aula? Você tem aí uma

estrutura toda curricular, e onde é que está escrito o que você dá na sua

aula? Então, a gente não é nem cobrado em relação a isso. Esse

planejamento todo aí é muito mais individual do que institucional – P02 –

trecho de entrevista individual.

[...] existe uma dificuldade e um trabalho nosso para estar fazendo isso,

estou dizendo, para a gente chegar nesse nível em cinco anos e nos primeiros

dois anos eu tive que entender tudo isso, incorporar tudo isso, porque a

gente não tem preparo pedagógico para tudo isso [...] E é aquela coisa, não

tem receita de bolo, ninguém te passa uma receita, porque não existe uma

receita, você que tem que ir construindo aos poucos. Mas eu sinto que... eu

poderia usar referenciais mais específicos, ter isso na minha formação, tanto

de métodos mais ativos quanto teorias educacionais [...] E isso não está

fortalecido para mim. Então, às vezes vem uma dificuldade... como é que eu

poderia mudar isso, como é que eu não poderia. Então, eu sinto [...] para

mim falta... eu acho que eu deveria... ter uma formação mais específica [...]

nós somos enfermeiros, a gente vem faz o mestrado e doutorado e vem para a

academia e vem fazer isso que é a função muito pedagógica. Não é só o

conhecimento que a gente tem e a gente não tem formação pedagógica para

isso [...] Aí, quando você vai planejar as disciplinas, muitas vezes você tem

dificuldade de mudar alguma coisa, alguma estratégia, porque você diz ‘eu

não tenho esse referencial, eu não tenho esse conhecimento’, eu precisaria

buscar e isso ficaria muito mais fácil se a gente tivesse isso agregado na

nossa formação – P09 – trecho de entrevista individual.

Quando entrei aqui, eu falava assim "Ninguém vai passar o plantão para a

gente?", como é que são as coisas, você tem que ir descobrindo sozinho e

batalhando, perlutando e estudando etc. – P12 – trecho de entrevista

individual.

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Essa questão da formação pedagógica permanente ou educação permanente do

docente do nível superior foi analisada também por uma participante que refere que,

devido às excessivas demandas do produtivismo acadêmico, não existe tempo

disponível para a educação permanente do corpo docente na universidade:

Grande parte do meu tempo hoje na minha... na universidade, é responder a

essas demandas produtivistas. E, aí, aquela interação, aquilo que eu gostaria

de fazer, que para isso precisa, o professor precisa se preparar para fazer a

interação necessária é... quando eu penso na perspectiva de ser educador.

Ele precisa se preparar, ele precisa estudar, ele precisa ter os momentos de

formação permanente, de educação permanente que a gente não tem, não é?

– trecho analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da

região nordeste do país – PC02.

Entretanto, esse dilema continua presente no cotidiano do docente-enfermeiro e

é agravado por alguns efeitos já apresentados até este momento: efeito checklist, efeito

da livre-concorrência (competição e competitividade), efeito sanfona sobre o tempo na

docência, efeito de contenção (camisa de forças). Sumamente, cabe destacar destes

outros efeitos a título de exemplificação, as diversas barreiras instituídas para que o

docente não se dedique à formação permanente para a docência no ensino superior, pois

o controle sobre o docente universitário tem acontecido a partir da encomenda do

Estado neoliberal em construção a todo vapor, suas demandas para e sobre a

universidade, que controlam a dedicação do tempo docente quase que exclusivamente

para a construção e fixação de identidades docentes do tipo executores de demandas –

identidade que se assemelha à identidade empresarial referida por Sachs (2003) – e,

assim, apoiadores da definitiva consolidação do ideal neoliberal de universidade e de

docência – profissionalismo gerencialista (WHITTY, 2000), e a mercadorização e a

mercantilização de seus produtos – possivelmente uma implícita profissionalização

docente na vertente neoliberal acontecendo nos espaços formais e informais. Os trechos

seguintes de entrevistas individuais ilustram essa questão:

A gente está até vendo até alguma outra possibilidade de tentar fazer isso

[investir na formação pedagógica], mas a nossa jornada de trabalho é muito

maluca, no sentido de investir nessas coisas – P03 – trecho de entrevista

individual.

[...] não posso dizer que não tem apoio da universidade, mas a universidade

não reconhece o trabalho do docente nessas outras perspectivas [não-

tradicionais ou emancipatórias], que é um trabalho que exige maior carga

horária, que demanda mais tempo do professor para se preparar também.

[...] Muitas vezes, eu não consigo devolver o portfólio no tempo adequado

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para aquele aluno, porque eu não consegui terminar de ler o material.

Então, esse modelo de trabalho que a gente também está inserida não

favorece essa nossa atuação – P07 – trecho de entrevista individual.

Nos trechos seguintes de anotações do diário de pesquisa e de entrevista

individual, é percebida a complementaridade aos trechos anteriores:

Esta questão da dificuldade na entrega/devolutiva do portfólio também foi

observada em campo no acompanhamento da docente P04 (ANOTAÇÕES

DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Foi observado, também, que outras atividades emergem a partir das escolhas

pedagógicas (neste caso acompanhar de perto os estudantes, lendo suas

produções, dando devolutivas, conversando), tal como revisar ou repassar

conjuntamente os planos de aulas que os estudantes fazem antes de

assumirem uma aula em campo de estágio. Isto ocorre, portanto, ao longo da

semana e fora do horário da disciplina devido a sua imprevisibilidade, dado

que depende do momento dos estudantes e sua interação com os professores

do campo de estágio. Também é uma escolha pedagógica esta característica

de dar tempo ao estudante para que consiga produzir sua inserção e

protagonismo (não se tratando de uma obrigação ou uma imposição) – (P05).

Segundo os professores, estas atividades e escolhas pedagógicas estão

ficando cada vez mais difíceis de serem realizadas e a ideologia da

universidade-empresa tende a empurrar estas escolhas para questões cada vez

mais previsíveis, executáveis, de forma simples e rápida (efetiva)

(ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Está lá escrito, só que na hora da operacionalização é muito difícil. [...] nós

temos um currículo híbrido ainda. Então, tem professor que trabalha nessa

lógica, tem professor que trabalha numa lógica mais tradicional com

algumas inovações em sala de aula, tem professor que trabalha numa linha

muito tradicional e o aluno quando ele vai para a sala de aula, que o

professor vai operacionalizar, vai estar em ação, o aluno também tem

dificuldade, porque aí ele não sabe, ele fica, ele não sabe por que o professor

está fazendo pergunta, porque o professor está instigando ele a pensar,

porque aí eu acho que vem daí a questão da abordagem crítica, da

aprendizagem significativa. Então, o aluno acha também que o professor tem

que trazer tudo pronto. E quando o professor não traz, o professor está

deixando de ensinar [...] alguns professores também ficam muito ansiosos ao

utilizar essa abordagem [o ciclo pedagógico], porque ele também ao ver o

aluno sentindo necessidade de ter uma coisa mais rápida, aí ele abre mão de

usar essa metodologia e volta, para utilizar de metodologias que ele traz as

coisas mais prontas, porque é mais rápido, porque responde àquilo que o

aluno está... então, a gente fica nesse meio do caminho – P08 – trecho de

entrevista individual.

Nessa direção, também foram produzidas falas que podem remeter a uma

naturalização dos processos de planejamento como momentos organizativos ou de

atualização de conteúdos, tal como no trecho de entrevista individual a seguir:

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Para você rever slides, porque as coisas... Tem algo novo que saiu. Para,

realmente, você atualizar. Eu costumo falar para os alunos que a gente está

dando uma aula e aquilo pode ser a maior burrice do mundo, porque alguém

já descobriu uma coisa nova diferente lá na China. Dali duas horas, saiu na

internet e o que você falou não é mais verdade. Então, eu procuro fazer essa

atualização e investimento de estudar [...] Então, o que acontece, quando a

gente fazia troca de campo, muitas vezes, a gente não queria pegar

determinado aluno de determinado colega, porque vinha com muita

dificuldade. Então, parecia que sempre você estava tentando suprir, então a

gente optou por pegar um aluno e ele é seu do começo ao fim da disciplina.

[...], mas, eu acho que do ponto de vista de experiências do aluno, a gente

privou ele de ter contato com campos que são diferentes. Acho que por um

lado a gente beneficiou, por outro, a gente prejudicou – P13 – trecho de

entrevista individual.

Ao contextualizar brevemente esta questão, é possível prosseguir para a

apresentação do “efeito rosa dos ventos sobre as concepções e as práticas pedagógicas”

e suas características no grupo de docentes-enfermeiros estudado.

Inicialmente, tratar-se-á esse efeito de maneira generalizada, explorando a

diversidade de concepções produzidas ao longo de todo este percurso investigativo. Na

continuidade, abordar-se-ão as especificidades e o que conduziu as interpretações desta

pesquisa para outros dois efeitos que serão apresentados na sequência.

A figura 1 a seguir ilustra o efeito rosa dos ventos sobre as concepções e práticas

pedagógicas e apoiará a sistematização de sua explanação. O apêndice 7 detalha

pormenorizadamente as características das concepções e práticas que fundamentaram a

elaboração deste efeito, constituindo-se de um quadro analítico que considerou a

produção de dados a partir de entrevistas semiestruturadas, observações participantes,

análises documentais, e que foi se aprofundando de acordo com os outros dispositivos

desta pesquisa, apresentados no tópico percurso metodológico, analítico e produção de

dados.

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Figura 1 - Representação do Efeito Rosa dos Ventos sobre as Concepções e

Práticas Pedagógicas de Docentes-Enfermeiros

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

Os indicadores que compõem o efeito rosa dos ventos sobre as concepções e

práticas pedagógicas de docentes-enfermeiros se referem: ao papel do professor no

processo de ensino-aprendizagem (PEA), à postura do professor no PEA, às

metodologias e estratégias no PEA, à avaliação no PEA e à finalidade do planejamento

do PEA.

Para questão de explanação, foram adotados os termos reminiscência e

propensão para indicar a transitoriedade ou transição/trânsito entre as várias concepções

pedagógicas entre os participantes desta pesquisa. O termo reminiscência foi utilizado

para aqueles professores já posicionados, de certo modo, em perspectivas histórico-

críticas ou neste caminho e que apresentaram traços de outras perspectivas – o conjunto

destes traços será chamado nesta pesquisa de reminiscências. O termo reminiscência

também foi utilizado em ocasiões em que os professores tendentes às abordagens

pedagógicas renovadas, mantinham ainda traços de abordagens pedagógicas

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tradicionais, embora que ambas as tendências pedagógicas tenham fundamentação na

teoria positivista. O termo propensão, ao contrário, se refere aos traços de tendências

histórico-críticas que apareceram nas abordagens de professores que se posicionaram,

de certo modo, em referenciais pedagógicos fundamentados na teoria positivista.

Em relação ao papel do professor no PEA, produziram-se algumas concepções

que são: professor mediador, professor facilitador, reminiscência do papel de professor

transmissor e tecnicista.

Professor Mediador Com relação à concepção de professor mediador, buscou-se a construção deste

conceito com embasamento na teoria histórico-crítica ou dialética, em que o professor

fundamenta suas escolhas pedagógicas a partir destes preceitos. Nesta concepção, se

acredita que ensino e aprendizagem compõe um processo integral e entrelaçado

(processo de ensino-aprendizagem). Assim, tanto o professor como os estudantes

encarnam papel ativo no processo de ensino-aprendizagem (PEA), em que o ensino

informa a aprendizagem e a aprendizagem informa o ensino. Neste caso, o papel do

professor é também de intervir, no sentido de estar entre e, portanto, provoca e produz

conhecimentos juntos com os estudantes. O professor está no centro do ensino e o

estudante no centro da aprendizagem. Existe um foco na aprendizagem integral dos

conteúdos (dimensões cognitiva, procedimental, atitudinal, perpassando pelos aspectos

pessoais, coletivos, sociais, políticos, psicológicos, econômicos etc.) e, nesse sentido, os

conteúdos e situações de ensino-aprendizagem são organizados para a produção de

conhecimentos que perpassem por essas dimensões do conteúdo.

Há uma valorização do protagonismo estudantil sustentado na teoria dialética e,

portanto, intimamente relacionando e integrando a construção de conhecimentos com a

transformação da realidade imediata, ou seja, os estudantes são protagonistas na

construção de seus conhecimentos, de suas identidades, que estão em transformação em

relação dialética com a realidade problematizada e também em transformação. Assim,

há ênfase em um trabalho teórico-prático, integrando os vários momentos do processo

de ensino-aprendizagem, momentos de reflexão, de ação, de reflexão-ação, de

transformação.

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O principal diferencial da teoria histórico-crítica ou dialética é que não tem

como não abordar as relações de poder, os movimentos e lutas de classes, os

referenciais de sociedade, de mundo, de homem, na contextualização e na

problematização dos conteúdos de ensino-aprendizagem e também das estratégias

metodológicas e avaliativas e suas finalidades e os propósitos a que atendem, não

ficando apenas na teorização sobre as transformações que se almeja, mas participando

delas (FARIAS et al., 2011).

Essa abordagem se aproxima da ideia de que o ensino é uma mediação, no

sentido que Vygotsky propõe de aproximar cada vez mais a zona de desenvolvimento

real da zona de desenvolvimento potencial do estudante, ressaltando o papel importante

do professor na zona de desenvolvimento proximal (REGO, 1995; FARIAS et al.,

2011), em que, por meio de abordagem dialética, busca-se avançar para além do

conhecimento espontâneo e imediatista da realidade (síncrese), para um conhecimento

cada vez mais elaborado (síntese) (SAVIANI, 2014). Tudo isso é muito diferente de

abordagens que propõem ou sugerem um abandono do estudante à própria sorte ou ao

próprio destino na elaboração de seu conhecimento (FARIAS et al., 2011). Os seguintes

dados ilustram esta questão, advindos de entrevista individual e também anotação em

diário de pesquisa:

com muita discussão, muito com essa questão do diálogo, de trazer o aluno

junto e de pedir para que ele contribua, trabalhar o que ele já traz e tentar

elaborar em cima disso uma... trabalhando junto com ele para a gente

construir um conhecimento novo mais consolidado [...] Então, eu tento

trabalhar de uma forma que ele consiga contextualizar, perceber a

importância de a gente trabalhar tal/ determinado assunto/ conteúdo,

competência, seja lá o que a gente tiver que trabalhar naquele momento, mas

para ele conseguir contextualizar, para isso fazer sentido, e fazer sentido de

uma forma mais ampla. "Por que estou fazendo isto?" "Por que eu sou

enfermeiro?" "Que diferença que o enfermeiro faz no mundo?" "Por que eu

tenho que aprender esse conteúdo?" "Para que ele vai ser útil?" ou não. E de

que maneira utilizar [...] Eu tenho valorizado essa questão da pedagogia

histórico-crítica - eu acho muito interessante. Eu vejo que em alguns pontos

a gente consegue aplicar bem. Mesmo quando tem alguma coisa muito

específica para você trabalhar, meio que da formação do enfermeiro e eu

acho muito interessante [...] Eu tento trabalhar mais dentro dessa linha, não

que eu consiga atingir tudo a todo o momento, que é como eu te disse, a

gente tem que ir ligando várias coisas – P01 – trecho de entrevista

individual.

Em momento de observação de P01 e P03, percebeu-se o quanto existe um

movimento de incentivar o protagonismo dos estudantes tanto no sentido da

ação como do pensamento, por meio de reflexões e de críticas fundamentadas

que convidam os estudantes a irem além dos conteúdos conceituais,

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procedimentais e atitudinais, buscando o máximo de coerência nas ações,

pensamentos e atitudes com os referenciais pertinentes para a formação de

enfermeiros brasileiros, inclusive sentindo-se integrantes dos processos

transformativos por que passam os locais onde realizam estágio

(ANOTAÇÃO DE DIÁRIO DE PESQUISA).

Os seguintes trechos de entrevista individual e de anotação em diário de

pesquisa continuam esta reflexão:

Eu acho que o meu trabalho se pauta em alguns elementos, [...] a questão da

aprendizagem pelo trabalho, aprendizagem a partir da experiência em

serviço, pela experiência. A questão da problematização das vivências.

Então, a perspectiva do Paulo Freire, o referencial do Arco de Maguerez

para ajudar os alunos para percorrerem, para explorarem o conhecimento, o

processo de aprendizagem a partir da vivência, para refletir, para teorizar,

para retornar à realidade. Isso é uma referência que estrutura as disciplinas

em que eu trabalho - qualquer uma delas. [...] A gente tem como referência

os processos reflexivos. Então, [...] eu acho que, a formação de profissionais

reflexivos é um referencial que a gente adota no sentido de entender que esse

é o diferencial da formação, nessa composição de estratégia pedagógica,

mas como um eixo, uma preocupação constantemente presente e que

direciona o processo [...]. Então, olhar para um orelhão quebrado,

destruído, ele pode não relacionar imediatamente à questão do processo

saúde-doença. Mas, quando a gente estimula para que ele pense como

aquela população num período noturno, por exemplo, as pessoas até tem

celular, as pessoas têm, mas não têm crédito. E como ela faz para se

comunicar, tem o telefone público, aí o telefone público está estragado.

Então, essa dimensão - tem taxi, não tem, mas não adianta não tem dinheiro.

Então, essa dimensão, o adolescente, se ele não for estimulado, não entra –

P03 – trecho de entrevista individual.

O conhecimento não está em mim. Acho que o conhecimento está aí e cabe a

eu mediar como o aluno vai entender aquele conhecimento, mas quem

constrói o conhecimento é o aluno ou o grupo de alunos, eu não vou

construir nada por eles. Se eles não estiverem motivados, interessados, se eu

não conseguir fazer a mediação, eles também vão ter dificuldade de

construir, mas eu não entendo que o conhecimento é meu – P06 – trecho de

entrevista individual.

Em momentos de observação (P01, P02, P03, P06, P07, P08), foi notado

momentos de reflexão crítica por parte dos docentes inclusive sobre os

processos de ensino-aprendizagem, sobre os métodos e avaliações utilizados,

sobre os conteúdos, sobre a perspectiva epistemológica, sobre as

transformações, dentre outros (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Professor Facilitador Esta perspectiva se baseia nos preceitos da Pedagogia Renovada (Movimento da

Escola Nova, Pedagogia Escolanovista etc.) que tem fundamentação na Teoria

Positivista (FARIAS et al., 2011).

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O foco desta perspectiva é sobre a aprendizagem, entendida como um processo

cognitivo de apropriação e construção de conhecimentos, em que o estudante ocupa a

centralidade do processo de aprendizagem. Assim, os estudantes são entendidos como

protagonistas da construção cognitiva de seus conhecimentos e este protagonismo está

relacionado a um tipo de metodologia ativa baseada nos procedimentos do método

científico de experimentação. Para tanto, colocam-se os estudantes em movimento de

construção de seus conhecimentos de maneira cognitiva, por meio do pensamento, da

reflexão cíclica, associação de ideias, comparação de fatos etc. Professa-se concepções

do tipo “aprender a aprender” (FARIAS et al., 2011, p.41).

O lema desta perspectiva é que o professor esteja por perto facilitando o

processo de aprendizagem, interferindo o mínimo possível. É dessa concepção que

nasce a ideia de que qualquer professor pode ser um facilitador (o professor de

psiquiatria pode ser facilitador de um grupo que esteja estudando biologia celular, por

exemplo). As aprendizagens baseadas em problemas (ABP ou PBL em inglês) e suas

derivações, tal como a aprendizagem baseada em contexto (CBL em inglês), fazem

parte desta perspectiva de aprendizagem focada no processo cognitivo de construção de

conhecimentos – ou mesmo, apenas teorização sobre as mudanças, sem ao menos se

aproximar do lócus onde a transformação poderia/deveria acontecer. Aqui também estão

contempladas as ideias de aprendizagens significativas, notadamente ausubelianas34 e

rogerianas35. Outro aspecto fundamental da perspectiva de professor facilitador é o

“aprender fazendo”, em que o estudante vai se apropriando dos conteúdos

cognitivamente e psicomotoramente ao realizar mecanicamente ações, atitudes,

comportamentos desejáveis para a interação com as outras pessoas (FARIAS et al.,

2011).

Entretanto, o grande marco desta perspectiva recai sobre o fato de não

implementarem uma abordagem crítica, uma vez que não questionam o modelo de

sociedade, as relações de classes, de trabalho, não tocando nas desigualdades sociais,

34 Termo referente às ideias do psicólogo educacional estadunidense David Paul Ausubel, tal como citado nas páginas 235 e 239. 35 Termo referente às ideias do psicólogo estadunidense Carl Ransom Rogers, tal como citado nas páginas 235 e 239.

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materiais, sustentando, portanto, um ideal neoliberal e capitalista, contribuindo para a

manutenção do status quo (FARIAS et al., 2011).

A seguir, alguns trechos de entrevista individual e de anotação de diário de

pesquisa que ilustram esta questão:

conduzindo o aluno no processo de construção do aprendizado. A gente

entende, eu entendo que a minha função é fazer... ser um facilitador desse

processo de construção [...] A gente parte da compreensão de que o aluno

tem que vivenciar o processo de aprendizagem e ele vai construindo o seu

conhecimento e nós somos o facilitador desse processo [...] a ideia é que o

aluno vivencie o mundo do trabalho, é o grande ponto dessa disciplina – P09

– trecho de entrevista individual.

O meu planejamento é para atingir o meu objetivo e o meu objetivo, em

geral, ele tem aspecto voltado para o conhecimento cognitivo, mas também

muitas aulas para as questões psicomotoras. Então, o meu planejamento é

focado em cumprir estes dois objetivos – P10 – trecho de entrevista

individual.

nas supervisões, a gente vai discutir com ele [estudante], ele vai apresentar o

que ele... a interação, o que ele falou, o que ele ouviu, como ele devolveu. E,

nas supervisões, é que nós vamos mostrar para ele se está correto ou não.

Ou seja, ele está sendo terapêutico com aquela pessoa com quem ele está

interagindo ou não? Então, ele aprende observando tanto em laboratório

quanto na clínica. Depois, ele vai interagir, ele vai fazer e ele vai, nas

supervisões, trazer para a gente a sua interação e a gente vai discutir, vai

mostrar se está correto, se não está correto – P11 – trecho de entrevista

individual.

E, aí, que intervenções eles vão fazer em relação à diabetes, por exemplo. Eu

falo "vamos lá ao livro de fundamentos, na parte de higiene corporal tem um

capítulo que fala sobre os cuidados com os pés do diabético" e que isso

também está nas diretrizes do ministério da saúde, das intervenções básicas

que deveriam ser feitas, com aquele paciente cadastrado no HiperDia que

vocês viram – P12 – trecho de entrevista individual.

Em momentos de observação (P13), foi possível notar a ênfase tanto no

desenvolvimento cognitivo quanto na dimensão técnica, no aprender fazendo,

na aprendizagem por problemas com ênfase na dimensão cognitiva (estudos

de caso reais com foco no exame físico, diagnóstico, planejamento e

implementação das ações de enfermagem) (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE

PESQUISA).

Com relação às reminiscências, estas ficaram bastante acentuadas na questão do

professor transmissor e tecnicista. Explicitar-se-ão estas características, a seguir, dado

que não foram apresentadas anteriormente.

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Reminiscência do Papel de Professor Transmissor e Tecnicista Basicamente, esta perspectiva do papel do professor está relacionada com a

Pedagogia Tradicional de fundamentação positivista também (FARIAS et al., 2011).

Trata-se de uma maneira pela qual o professor se encontra na centralidade do ensino e a

aprendizagem é compreendida como resultado do que foi ensinado. Assim, logicamente,

uma vez que o professor ensinou, é esperado que o estudante tenha aprendido (causa-

consequência). Freire refere-se a esta perspectiva como abordagem narradora e

dissertadora, em seus próprios termos, uma “educação bancária”, em que os

professores se ocupam da tarefa de “encher os educandos dos conteúdos de sua

narração” (FREIRE, 2014, p.79). Assim, essa perspectiva do professor transmissor

convoca e aguça um papel memorizador dos estudantes. Os encontros (as aulas) se

resumem a momentos em que o professor palestra sobre algum assunto, os estudantes

prestam atenção, fazem anotações, memorizam as informações e as reproduzem diante

das perguntas feitas pelo professor ou nas ‘provas’, ou seja, a aprendizagem é

compreendida como um processo mecânico e cognitivo de retenção, memorização de

informações professadas pelo professor transmissor a partir do saber final

cientificamente cunhado pela ‘ciência’, as quais devem ser reproduzidas pelos

estudantes em seu processo de adaptação ao sistema político-social e econômico em

vigência (FARIAS et al., 2011; FREIRE, 2014).

Em relação ao aspecto tecnicista, esse papel do professor como tecnicista sofre

influências da Pedagogia Tecnicista, também de fundamentação positivista, que foi

elaborada em contrapartida às perspectivas pedagógicas renovadas, notadamente,

durante o Regime da Ditadura Militar Elitista, instalada no Brasil a partir do Golpe de

1964, com a finalidade de preparar de forma rápida mão de obra para os serviços

técnico-profissionais (CUNHA, 2007; FARIAS et al., 2011). O papel do professor na

modalidade tecnicista é o foco na instrumentalidade, na técnica, no desempenho, nas

competências, nas habilidades acima de qualquer outra dimensão do saber humano.

Aqui também impera a ideia do “aprender fazendo”.

O destaque relativo a estas perspectivas sobre o papel que ocupa o professor, ou

seja, relativo à concepção sobre professor, é feito neste trabalho não no sentido de

separar ou categorizar o papel docente em diferentes compartimentos, por meio da

atribuição de adjetivos diferentes e explicações baseadas em referenciais pedagógicos.

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Trata-se, pois, de exemplificar algumas práticas e aproximações que foram produzidas

ao longo desta pesquisa. Assim, é importante ressaltar que essas são apenas tendências

sobre o papel do professor e que, enquanto alguns se posicionaram conceitualmente e

em sua prática pedagógica, outros demonstraram dificuldade de identificação com um

papel docente que fosse coerente com as práticas implementadas, ou mesmo, alguns

expressaram seus desejos pela busca de tendências que se articulassem melhor com os

modismos contemporâneos sobre o papel do professor e o papel do estudante “ativo”.

Os seguintes trechos de entrevista individual e de anotação em diário de pesquisa

denotam esta perspectiva:

[...] a gente tem algumas aulas que são um pouco mais expositivas, a gente

usa um pouco de powerpoint, que a gente vai falar um pouco do referencial

de educação permanente, liderança, relacionamento, tomada de decisão,

negociação de conflitos, que a gente vai usando, num primeiro momento,

propor para o aluno poder ir para o estágio – P09 – trecho de entrevista

individual.

Eu ministro aulas, algumas mais teóricas, outras no campo de estágio

totalmente práticas, e algumas teórico-práticas – P10 – trecho de entrevista

individual.

Em momentos de observação (P11, P12, P13), notou-se a ênfase na

estratégia das aulas expositivas (ANOTAÇÃO EM DIÁRIO DE

PESQUISA).

E este ano, eu fui dar aula de *** para a turma do bacharel [...]. Eu nunca

tive problema de dar aula, os alunos sempre participam, eu faço perguntas.

E os alunos não paravam de conversar. Era uma aula extensa de cárdio e eu

já estava extremamente rouca – P13 – trecho de entrevista individual.

Em suma, há professores posicionados em perspectivas dialéticas e em

perspectivas positivistas, havendo reminiscências e propensões que apareceram:

reminiscências do professor transmissor e tecnicista e propensão ao professor mediador.

Com relação ao indicador postura do professor, produziram-se as seguintes:

postura docente dialógica, crítica e democrática, postura docente dialogal, postura

docente centralizadora e pouco democrática.

Postura docente dialógica, crítica e democrática Esta postura se alinha bastante com o papel mediador do professor e com a

teoria histórico-crítica ou dialética (pedagogia libertadora, pedagogia libertária,

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pedagogia histórico-crítica/crítico-social dos conteúdos). O conjunto de características

fundamentais durante PEA, produzido nesta pesquisa, que indicou esta postura foram:

abordagens pedagógicas que promovem a integração teoria-prática; o diálogo e o

confronto de ideias como propulsor da construção de conhecimentos; acompanhamento

crítico e reflexivo durante todo o PEA e uso de instrumentos avaliativos que o

permitam; devolutivas periódicas e permanentes; problematização de conceitos, atitudes

e procedimentos; relações horizontalizadas entre professor e estudantes; tomada de

decisão compartilhada; discussão sobre o próprio processo de ensino-aprendizagem,

sobre a relação professor-estudantes, sobre o processo avaliativo e a construção de

critérios de avaliação conjuntamente em momentos reservados no cronograma da

disciplina.

Nesse sentido, a dialogicidade a que se refere neste indicador se aproxima

bastante daquela que só existe por meio da indissociabilidade reflexão-ação, ou seja, na

práxis, em que as ações e atitudes buscam e estão em coerência e convergência com o

processo reflexivo dos indivíduos (FREIRE, 2014) em ‘inter-ação’ e ‘inter-venção’ no

mundo. Não obstante, essa dialogicidade se manteve preocupada com perguntas que vão

além do conhecimento específico a ser trabalhado no PEA, pois houve preocupação

com a problematização dos mesmos, buscando dar vida, sentido e contexto (imersões na

realidade) para o que era construído pelos integrantes (professor e estudantes), ou seja,

essa dialogicidade se baseava na teoria dialética, que se preocupa com as relações de

poder, de classes sociais etc. que constantemente atravessam o processo de ensino-

aprendizagem (FARIAS et al., 2011). Contudo, havia também uma característica

memorável que era a da democracia deliberativa participativa direta (AVRITZER,

2000; LÜCHMANN, 2002) no seio das disciplinas com essa fundamentação, o que

significa uma participação direta dos estudantes no PEA (tomada de decisões,

construção de critérios de avaliação, busca, discussão e construção do conhecimento

etc.).

Alguns exemplos desta postura são possíveis de observar no seguinte trecho de

entrevista individual:

A internalização de um conhecimento se dá na interação social e no diálogo

entre as pessoas. Então, eu não vejo como construir conhecimento se nós não

tivermos claro tudo isso. Mas de forma organizada, de forma pensada,

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planejada e, aí todo o suporte da didática nesse investimento. [...] Eu parto

de estratégias que normalmente o aluno necessita de reflexão ou atividade

que ele realiza, para depois desenvolver um diálogo em cima do que é

colocado como objetivo – P05 – trecho de entrevista individual.

No seguinte trecho, P07 problematiza (junto com um grupo de estudantes de

graduação em enfermagem no curso de licenciatura) a atuação do professor-enfermeiro

do ensino técnico quando na condição de acompanhar os estudantes do nível técnico em

campo de estágio:

Professora faz a seguinte reflexão com os estudantes “Mas como o professor

está lá no estágio? Formalmente, a escola tem um cronograma de estágio

com supervisão do professor. Que ausência é essa? O professor muitas vezes

está presente, mas não faz seu papel adequadamente. Ele tem em média 9-10

estudantes. O professor fica no posto de enfermagem, mas e a supervisão

direta? O que seria importante o professor fazer? O que qualifica seu

trabalho? [...] quem é esse professor? Qual a relação do ensino que eles

oferecem com a qualidade da formação desses profissionais? Como são os

professores que estão atuando no ensino? Será que o ensino é um "bico"?

Quando o professor é enfermeiro da unidade, como fica o papel de

professor? E o enfermeiro-professor faz o planejamento do estágio como

professor ou como enfermeiro? [...] agora é importante a gente olhar para o

papel do professor no campo de estágio. Como a gente faria diferente?” –

(ANOTAÇÃO DE DIÁRIO DE PESQUISA).

Na análise de planos de aulas e de disciplinas (P05, P06, P07, P08), observou-se

a preocupação com participação maior por parte dos estudantes na seleção dos

conteúdos a serem estudados (ciclo pedagógico), nas tomadas de decisões, inclusive a

discussão, construção e implementação dos critérios avaliativos nas disciplinas (DOC-

04; DOC-07). Em momentos de observação (P05, P06, P07, P08), notou-se, ainda, a

busca pela horizontalidade na relação professor-estudantes, uso da problematização e da

tomada de decisão compartilhada.

Postura docente dialogal Esta postura se diferencia da anteriormente mencionada no sentido de que faz

uso do diálogo (aqui entendido como sinônimo de conversa), em que professor conversa

com seus estudantes de maneira aberta, havendo tomada de decisão compartilhada sobre

algumas situações excepcionais que vão surgindo ao longo da disciplina. Assim, o

diálogo direto entre professor e estudantes é a maior abertura produzida, pois em todo o

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restante do processo, as decisões são centralizadas no professor ou grupo de professores

que trabalham na mesma disciplina ou uma decisão da área de ensino (especialistas).

Nesse sentido, a participação estudantil se resume a representações discentes em órgãos

colegiados, em que estudantes são eleitos pelos pares para representarem a categoria

nestes espaços deliberativos (democracia representativa). Nesta postura, há uso de

algumas estratégias que envolvem mais ativamente os estudantes no PEA, embora a

grande maioria das decisões pedagógicas fiquem sob decisão quase que exclusiva do

corpo docente. Pode-se inferir que esta postura ocupe um papel de transição entre

teorias educativas (teoria positivista – teoria dialética).

Alguns exemplos desta postura são possíveis de observar nos seguintes trechos:

Então, eu acho que é uma relação muito horizontal mesmo com eles

[estudantes], mas com papéis claros, bem definidos [...]. Então, não é porque

eu sou nova, por exemplo, que eu estou ali para ser amiga de todo mundo, e

deixo sempre claro para os alunos, desde o primeiro momento que a gente

tem [...] todos os contratos que a gente tem na disciplina. É lógico que em

alguns momentos, a gente tem que retomar isso, porque às vezes o aluno se

esquece, se perde um pouco, mas questões do que eu espero dele nesse

processo, não só na avaliação final, mas nesse processo [...]. Então, eu

procuro ser muito clara em relação a essas questões dos papéis, das

definições, da avaliação, do processo, de tudo que a gente tem que fazer em

relação a contratos, o que eu espero deles, o que eles esperam de mim - para

a gente alinhar essas coisas – P01 – trecho de entrevista individual.

eu tento ser um pouco mais acessível, não tenho aquela postura de botar

medo e que o aluno não vai chegar e perguntar. Então, eu tento ser mais

acessível – P02 – trecho de entrevista individual.

Eu tento me colocar o mais disponível possível para os alunos. Eu sempre

fico, geralmente, depois da aula, sempre têm alunos que ficam para

conversar, têm alunos que me procuram em sala de aula e fora de sala de

aula também – P04 – trecho de entrevista individual.

quando o aluno chega, eu tento já de início dizer que nós somos... eu entendo

que a gente é um grupo, e a gente vai tentar se desenvolver dessa maneira,

que eu não sou nada mais que coordenador daquele momento e que eu estou

ali naquele momento, mas daqui a uns anos eles podem estar no meu lugar.

E que por ser a coordenadora naquele momento, explico as funções dos

supervisores que são os enfermeiros, a minha função que é coordenar todo

esse processo, por exemplo, nessa disciplina, mas que nós estamos, eu não

vejo diferença entre eu e os alunos, não existe isso – P09 – trecho de

entrevista individual.

Eu sempre falo para o aluno: 'a pior coisa que você pode fazer é se

distanciar de mim! Se aproxime! Você tem dificuldade? Então, vêm

conversar comigo. Não fuja, não guarde as dificuldades, sempre procure se

aproximar!' [...]. Então, eu sempre tento criar um ambiente de acolhimento,

de um modo geral, com todos os alunos e deixar mais aberto possível esse

canal para a aproximação. Isso é fato em sala de aula, em campo de estágio,

em qualquer situação de ensino-aprendizagem ou teórico-prático. Eu sempre

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busco, realmente, criar canais para que o aluno se aproxime. [...] E criar

esse vínculo, que eu acho que, realmente, ajuda na questão do ensino-

aprendizagem [...]. Inclusive, o aluno que tem dificuldade com a gente. Eu

deixo, inclusive, bem aberto: 'oh, se você tem dificuldade comigo,

particularmente, têm vários outros colegas docentes aí que você pode

conversar se você não se sente à vontade com a gente, esteja muito à

vontade, para procurar algum outro colega e para discutir suas

dificuldades!' Porque, aí, a gente também o deixa bem à vontade mesmo –

P11 – trecho de entrevista individual.

Em momentos de observação (P01, P02, P03, P04, P09, P11, P12, P13),

apareceram alguns momentos de abertura para o diálogo, uso de perguntas provocadoras

de reflexão e busca pela horizontalidade na relação professor-estudantes dentro da sala

de aula ou no campo de estágio (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Postura docente centralizadora e pouco democrática Neste tipo de postura, observou-se a predominância quase que exclusivamente

de decisão sobre as atividades pedagógicas pelo corpo docente (nas várias instâncias

decisórias), cujo planejamento acontece previamente ao início das atividades de ensino,

inclusive a divisão dos estudantes em grupos é feita antes. As decisões quando

compartilhadas acontecem eventualmente sobre questões muito pontuais. Incentiva a

proatividade dos estudantes, mas dentro de uma demarcação precisa que parte do

conhecimento específico a ser trabalhado na disciplina (e selecionado previamente pelos

professores – os textos que serão lidos, os vídeos que serão utilizados, as situações de

aprendizagem que serão usadas). A participação do estudante se resume a realizar as

tarefas, provas, testes, exercícios, participar de simulações, demonstrar habilidades

técnicas e conhecimentos específicos. Esta postura docente responde idealmente aos

anseios positivistas de manutenção do status quo no caminho educativo, nas relações

professores-estudantes etc. (FARIAS et al., 2011). Os seguintes trechos de entrevistas

individuais e de anotação em diário de pesquisa trazem esta perspectiva:

a gente espera, de repente, que o aluno venha mais preparado. E, às vezes,

não está tão preparado. Eu acho que essa questão ativa, essa metodologia, o

aluno tem que estudar, e chega para nossa disciplina e ele tem que ter feito

uma leitura prévia para fazer uma prova, é novo para o aluno. Então, às

vezes, ele não percebeu o papel dele ativo, e não se percebem... eles esperam

aula ou que a gente vai retomar todas as aulas. E nós não fazemos isso.

Claro que a gente tem uma carga horária [...] pequena e a gente trabalha o

essencial. Algumas questões ele tem que estudar mesmo. E a gente dá uma

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diretriz muito básica do atendimento e depois ele tem que ir buscar. E, às

vezes, então, a gente espera que está mais preparado, mas ele não está – P10

– trecho de entrevista individual.

Então, eu tenho procurado diminuir um pouco as aulas [teóricas]... Nas de

clínica; e a gente fazer mais discussão sobre os casos da prática. E, ainda,

sinto que o nosso aluno, embora tenha uma carga horária grande, que

precisaria diminuir conteúdo, principalmente, do terceiro ano para frente e,

ele ter mais carga horária prática – P13 – trecho de entrevista individual.

Esta postura tem aparecido na forma de situações de ensino-aprendizagem,

em que tudo já é planejado anteriormente e o professor utiliza com frequência

aulas expositivas, sendo atividades com menor possibilidade de interação e

participação dos estudantes, ou também naquelas situações em que parte do

processo – a dimensão avaliativa, a nota – reside mormente sobre o poder do

professor, sem momentos de discussão sobre como se chegou naquele

resultado, sem considerar a representação dos estudantes sobre o processo de

aprendizagem, baseando-se quase que exclusivamente nas

interpretações/representações dos próprios professores sobre os estudantes e

seu desempenho (avaliação informal). (Momentos de observação de P01,

P02, P03, P04, P09, P10, P11, P12, P13 – ANOTAÇÕES EM DIÁRIO DE

PESQUISA).

Entretanto, no intercruzamento, na transição ou no transitar entre estas posturas,

foi possível perceber algumas reminiscências quanto à postura docente autoritária,

punitiva, centralizadora e pouco democrática (o poder da nota).

Reminiscência de postura docente autoritária, punitiva, centralizadora e pouco democrática

Como a característica centralizadora e pouco democrática já foi apresentada

anteriormente, apresentar-se-á nesta seção apenas a característica autoritária e punitiva.

O aspecto punitivo remonta às teorias pedagógicas comportamentalistas

(behavioristas), baseadas no pensamento skinneriano36 e pavloviano37. Na corrente

comportamentalista, a ênfase é sobre os comportamentos, ressaltando a importância do

reforço positivo sobre os comportamentos desejáveis e a punição (ou reforço negativo)

diante de comportamentos indesejáveis (MOREIRA, 2011).

36 Burrhus Frederic Skinner ficou conhecido por seus estudos comportamentalistas e pelo comportamentalismo operante. 37 Ivan Petrovich Pavlov foi um fisiologista que marcou o condicionamento clássico e que influenciou as ideias de Skinner no campo do comportamentalismo/behaviorismo.

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Ao reportar esta questão para a relação professor-estudantes, percebe-se o uso da

influência e do estatuto de professor para submeter os estudantes às crenças e cultura

que o professor quer sustentar com sua abordagem pedagógica escolhida. Notadamente,

esta abordagem foi e tem sido usada pelas correntes positivistas para apoiarem o

discurso da sociedade capitalista, concebendo a sociedade como uma grande máquina,

que atua harmoniosamente, em que cada peça (indivíduos) tem uma função específica a

ser desempenhada (FARIAS et al., 2011). Portanto, é tarefa da educação

comportamentalista garantir que essa função seja alcançada pelo reforço dos

comportamentos que se alinham com os anseios capitalistas e a reprovação ou punição

dos comportamentos divergentes. Assim, a postura docente vai ser punitiva no sentido

de atender a essas demandas ou à encomenda maior da sociedade capitalista.

Em relação à postura autoritária, provavelmente, ela herda esta característica do

Regime Militar, o qual se utilizava quase que exclusivamente de medidas repressivas

para contenção e controle, e que esteve no poder em território brasileiro por volta de 20

anos (décadas de 1960 e 1980) (CUNHA, 2007), fazendo reformas, promovendo

pensamentos e disseminando ideologias que atravessam a educação e o fazer

pedagógico dos professores que não estão atentos a estas questões ou que são adeptos

deste pensamento. Esta postura autoritária, ou seja, a soberania do professor diante das

decisões, tem sido usada no campo da educação e formação de pessoas para sustentar

decisões, por vezes arbitrárias, que os professores querem tomar e não encontram

fundamentação em nenhuma outra corrente ou teoria pedagógica, de ensino, de

aprendizagem etc. Aliás, acaba se fundamentando nos preceitos da pedagogia

tradicional e comportamentalista.

Em momentos de observação (P01, P10, P11, P12, P13), foi observado

postura centralizadora, autoritária e punitiva. Para um destes, percebeu-se a

ênfase do uso dessa perspectiva em uma situação em que uma estudante

conversa com a professora, dizendo que vai precisar entregar o portfólio

depois do prazo e a professora refere que se o portfólio fosse entregue após a

data daquele encontro, ele valeria menos pontos, sugerindo que a estudante o

entregasse ainda naquele dia no departamento até às 19h30, e pedindo para a

secretária dar um visto de recebimento no documento. Outro exemplo se dá

em uma situação, em que o professor para a aula, disse que ia fazer a

chamada e ia passar a lista para o pessoal assinar e quem estivesse

conversando ou fazendo outra atividade que estaria livre para fazê-lo em

outro lugar, porque ele não queria ficar rouco tendo que falar mais alto.

Professor fez a chamada oralmente e depois passou a lista para estudantes

assinarem (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

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Quanto ao indicador metodologia e estratégias de ensino-aprendizagem, é

necessária uma prévia contextualização antes de se introduzir como os dados foram

produzidos nesta pesquisa quanto a essa questão.

Na área da saúde, têm havido muitos pensadores que discutem a questão das

metodologias ativas na formação de profissionais de saúde para atenderem tanto as

especificidades formativas para o SUS como para atender às DCN para os cursos da

área da saúde (IOCHIDA, 2004).

O consenso é de que este tipo de metodologia (as metodologias ativas) nasce sob

influência da Pedagogia Renovada, em que as características fundamentais são a

centralidade do estudante, o foco na aprendizagem, o protagonismo dos estudantes na

construção de seus conhecimentos e a explícita aversão às estratégias tradicionais e

narradoras de ensino (MITRE et al., 2008). Assim, o foco recai sobre o processo

cognitivo de aprendizagem e de construção de conhecimentos e, por vezes, inclui

também a afetividade como elementos para se alcançar a aprendizagem das habilidades

necessárias para a manutenção do sistema produtivo capitalista e neoliberal (FARIAS et

al., 2011). São teóricos contribuintes desta corrente David Ausubel, com a

aprendizagem significativa de fundamentação cognitivista; e Carl Rogers, com a

aprendizagem significante, de fundamentação cognitiva, afetiva e psicomotora

(MOREIRA, 2011).

Entretanto, tem havido também a associação destas prerrogativas das

metodologias ativas tanto pela Pedagogia Renovada como com a proposta de

problematização da Pedagogia Libertadora (MITRE et al., 2008; SILVA; SCAPIN,

2011; DIESEL et al., 2017), isso se devendo pelo viés de se olhar para estas questões

apenas pela dimensão instrumental (o método pelo método), o que causa uma sensação

de possibilidade de articulação, quando da leitura superficial destas abordagens

pedagógicas, pois elas atendem a finalidades educativas divergentes. Enquanto a

primeira, assim como já referido anteriormente, atende aos pressupostos positivistas,

não se importando com a questão de classes sociais e relação de poder na sociedade, se

aproximando ou se apropriando de conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias

para a manutenção da sociedade capitalista, a segunda, fundamentada na teoria dialética,

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se ocupa sumamente destes aspectos de libertação das classes oprimidas por meio de

uma aproximação consciente, crítica, reflexiva e transformadora da realidade imediata

(FARIAS et al., 2011), em um jogo constante entre transformar para aprender, aprender

para transformar, transformar aprendendo e aprender transformando. Desse modo,

entende-se que não é possível essa associação (Escola Nova e Pedagogia Libertadora).

Assim, nesta pesquisa, produziu-se o seguinte em relação às metodologias e

estratégias utilizadas no PEA: metodologia ativa crítica e metodologia ativa cognitivista

e psicomotora.

Metodologia ativa crítica Refere-se como metodologia ativa crítica, todas as propostas de intensificação

do protagonismo estudantil, da ênfase na aprendizagem, mas que se baseie na teoria

dialética (ou histórico-crítica), ou seja, que atrele ao PEA a contextualização integral do

processo educativo, perpassando pela questão de classes, relação de poder,

desigualdades diversas causadas pelo capitalismo financeiro ferrenho e acirrado que

vem se consolidando aos moldes neoliberais. Nessa direção, é sugerido que esse tipo de

metodologia aconteça de forma integrada entre ensino, trabalho e aprendizagem, em que

todos os envolvidos (estudantes, professores e profissionais da saúde) não sejam apenas

espectadores, mas agentes a seu modo, em que os estudantes não apenas teorizem e nem

apenas pratiquem procedimentos repetitivamente, mas que consigam dar sentido para o

resultados de suas ações e reflexões ao longo de ciclos pedagógicos, em que há trocas

recíprocas entre os integrantes do processo de ensino-aprendizagem (PARANHOS;

MENDES, 2010).

Nesse sentido, as principais características que foram produzidas de metodologia

ativa crítica se referem, principalmente, ao uso de metodologias que propiciam maior

participação integral dos estudantes e dos professores em todo o processo de ensino-

aprendizagem (tomada de decisão compartilhada, construção crítica, consciente e

compartilhada de conhecimentos, ressignificação problematizada de conceitos, ações e

atitudes etc.). Neste caso, apareceram o uso do ciclo pedagógico (CORRÊA et al., 2011)

associado ao uso de narrativas contínuas, críticas e reflexivas que reportam às

aprendizagens e reflexões dos estudantes durante todo o ciclo pedagógico, em um

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movimento de ir e vir, em que os conhecimentos vão sendo co-construídos,

reconstruídos e ressignificados ao longo do processo de ensino-aprendizagem

(FORTUNA et al., 2012; FORTUNA et al., 2014b). Os seguintes trechos de entrevista

individual e de anotação em diário de pesquisa ilustram esta questão:

[...] vendo isso mesmo em outros momentos em que o aluno traz algo, por

exemplo, lá no campo de imersão você vê "nossa! Fez sentido para ele,

então, aquele outro momento que a gente teve antes" ou o contrário também.

Na disciplina *** eu tive que aprender muito, porque eu não estava

habituada a esse tipo de ... estruturação da disciplina, não estava

acostumada a trabalhar com o ciclo pedagógico, não tive a experiência do

ciclo, mas vejo que ele tem um potencial grande. Então, isso também tem

sido satisfatório – P01 – trecho de entrevista individual.

por exemplo, em relação ao primeiro ano, nós fizemos uma atividade

preparatória ao processo de territorialização do distrito. Então, na atividade

preparatória eles trabalharam em pequenos grupos o que eles poderiam

observar no território, o que seria essa exploração de território. E como eles

iriam conversar com os trabalhadores nas unidades de saúde em que eles

iriam parar, entendendo a unidade de saúde como um equipamento social do

território. E que nessa unidade de saúde eles encontrariam trabalhadores e

usuários, então, como eles conversariam com trabalhadores e usuários,

pensando nessa perspectiva de ser mais um informante para que eles

pudessem compreender o viver neste território e o processo saúde doença

neste território. Então, uma atividade com múltiplas dimensões, porque ele

tinha que observar o território, identificando risco para a saúde, uma certa

dinâmica do viver ali, os equipamentos disponíveis ali daquele território.

Então, ele tem que pensar em muitas coisas e observar. Depois, a gente,

porque, às vezes, se a gente não estimula, fica difícil para um adolescente, ao

percorrer uma rua, uma avenida, um bairro, ele não está atento a relacionar

as coisas que ele observa ao processo saúde-doença – P03 – trecho de

entrevista individual.

Eu acho que principalmente vivido. Dar significado a uma aprendizagem é

viver essa aprendizagem. É isso que eu procuro hoje trabalhar com os

alunos – P05 – trecho de entrevista individual.

Com essa proposta do ciclo pedagógico, em que o aluno vai para a

realidade, faz a imersão na realidade, depois, faz... tudo trabalhando em

pequenos grupos - faz a síntese provisória, tira uma questão de

aprendizagem a partir da discussão realizada, vai fazer busca, síntese e

estudar sobre o assunto, e aí a gente volta para rediscutir, na nova síntese,

refazer o conceito que foi construído, reconstruir esse conceito e tal [...].

Então, o ciclo pedagógico, para nós, foi a estratégia utilizada - ele não é

uma concepção da educação crítica - ele é a forma como ela foi organizada,

como é o estudo de caso, como é o ensino clínico, como é a dramatização,

utilizar um filme - são estratégias que a gente vai propor para que o aluno

entre como sujeito ativo naquele processo de ensino-aprendizagem – P07 –

trecho de entrevista individual.

Em momentos de observação (P06, P07), foi notada uma forma peculiar de

se fazer um estudo de caso. Foi proposto que, a partir do que o ciclo

pedagógico propiciou aos estudantes e professores (imersões nos cenários,

sínteses provisórias, buscas, novas sínteses, avaliações), os estudantes

refletissem em três pequenos grupos e elaborassem um caso, o qual seria

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apresentado para os outros grupos. Assim, cada grupo ficou responsável por

analisar um dos casos apresentados (exceto o seu), tendo mais algum tempo

para refletir sobre o que foi apresentado e tentando organizar uma proposta

de solução para o caso. Tudo isso em um encontro de quatro horas e que se

remetia a todos os encontros anteriores e o que o grupo já havia estudado e

vivenciado (ANOTAÇÃO DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Tem sido discutida uma diferença importante de alguns modismos que têm

aparecido, notadamente, na área da saúde, tal como a problematização e a aprendizagem

baseada em problemas. Enquanto a primeira se ocupa de uma aprendizagem baseada na

perspectiva freireana, em que o problema é descoberto e trabalhado a partir de

interações e imersões na realidade, o qual é discutido para se encontrar soluções

possíveis a serem implementadas, a segunda parte de um problema previamente

elaborado por especialistas, o qual é lido, estudado, debatido e analisado pelos

estudantes (IOCHIDA, 2004), o que evidencia a ênfase no aspecto cognitivo de

apropriação de conhecimentos. Assim, enquanto o primeiro se fundamenta na

aprendizagem ativa por meio de busca de problemas reais e contextualizados que vão

ser estudados com a finalidade de elaborar proposições para sua resolução em contexto

(foco também na aprendizagem transformativa e transformadora), o segundo se ocupa

apenas de rechaçar as abordagens tradicionais, em que o professor se ocupa da maior

parte das atividades de ensino, e começa a implementar uma proposta em que quem age

na maior parte do tempo é o estudante, que passa a se responsabilizar quase que

integralmente pela sua aprendizagem cognitiva de conteúdos que emanam a partir de

problemas elaborados por especialistas, ou seja, o estudante apenas teoriza sobre a

transformação.

Assim, se quer referir à metodologia ativa crítica, quando se fala de

problematização na perspectiva exposta acima (IOCHIDA, 2004), mas também olhando

para novas propostas colocadas por outros pensadores nacionais, tal como a proposta da

pedagogia histórico-crítica ou crítico-social dos conteúdos (SAVIANI, 2014), pois esta

última propõe um processo similar de imersão na realidade, problematização,

instrumentalização, catarse e prática social, em que durante todo o percurso o professor

mediador lança mão de seus recursos (suas sínteses já um tanto elaboradas) para apoiar

o processo de aprendizagem de seus estudantes (os quais partem de uma visão um tanto

mais sincrética da realidade e um pouco menos elaborada). Entretanto, a principal

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diferença é que na proposta de Saviani, é integrada a importância dos conteúdos

historicamente sistematizados pela humanidade durante o processo de passagem de uma

visão sincrética para uma visão mais sintética da realidade. Para Freire, isso seria uma

espécie de invasão cultural, já que para ele a cultura é entendida como uma construção

imediata e intimamente relacionada com o contexto, entendendo que os conhecimentos

elaborados historicamente respondem aos anseios da cultura dominante, servindo para

este fim (FREIRE, 2008). Neste trabalho, portanto, vê-se um caminho entre estas duas

ideias, ambas fundamentadas na teoria dialética.

Metodologia Ativa Cognitivista e Psicomotora Nessa perspectiva de metodologia, o realce é sobre o protagonismo estudantil

sob a ótica da corrente cognitivista, da aprendizagem significativa ausubeliana ou

significante rogeriana (MOREIRA, 2011), do aprender fazendo delorsiano38 (DELORS

et al., 1998) e a ênfase na aprendizagem pela experiência baseada na perspectiva

deweyniana39 (DEWEY, 1997). Pode-se dizer que se trata de uma proposta que encontra

bases na pedagogia renovada e fundamentação na teoria positivista, uma vez que não

expressa preocupação com a questão de classe social, desigualdades e assimetrias todas

existentes e acentuadas pelo sistema político-econômico capitalista (FARIAS et al.,

2011).

Dessa maneira, as características que foram produzidas neste sentido nesta

pesquisa se referem à utilização de estratégias em que há, de certa forma, maior

participação dos estudantes na execução de atividades, na prática de habilidades, com

ênfase na dimensão procedimental e cognitiva da construção de saberes e

conhecimentos sem, no entanto, abordar o contexto em que referidas técnicas ou

procedimentos, conhecimentos e saberes, foram produzidos e a que finalidade

respondem. Assim, cabem aqui também abordagens que se assemelham à aprendizagem

38 Jacques Lucien Jean Delors é um político francês mundialmente conhecido porque foi responsável pela autoria e organização de um relatório da UNESCO, logo de sua presidência da Comissão Europeia, no qual se enfatiza os quatro pilares da educação do século XXI, quais sejam: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. 39 John Dewey foi um filósofo e pensador da pedagogia estadunidense, principal representante da corrente pragmatista, cuja principal característica era o instrumentalismo para ajudar o homem a se adaptar ao mundo moderno.

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baseada em problemas (IOCHIDA, 2004) e também alguns tipos de simulações de casos

fictícios. Também, observa-se um discurso de tornar o estudante mais ‘autônomo’,

dando-lhe a possibilidade de escolha do horário de estudo que as tecnologias à distância

permitem, assim os estudantes se apropriam sozinhos e cognitivamente do conteúdo de

textos, videoaulas etc. Os seguintes trechos de entrevistas individuais exemplificam essa

perspectiva:

[...] com aulas expositivo-dialogadas, com seminários, com convidados, com

simulação, com dramatização, com... às vezes, trabalho mais em conjunto,

em grupo [...] a gente traz cartões [...] para os alunos analisarem, depois a

gente faz uma discussão com o grupo – P02 – trecho de entrevista

individual.

Tem muitas coisas que eu faço [...], que tem uma relação com o que é

denominado de metodologias ativas; jogos eletrônicos, júri simulado [...].

Tem momentos em que eu ainda trabalho a questão do slide, principalmente,

porque eu trabalho muito a história da arte, história do cinema. Então,

preciso do multimídia. Têm coisas que eu ainda trabalho no slide, num

movimento mais de conversa sabe? São coisas que eu ainda não consegui,

mas aí, junto com isso tentado trabalhar essas questões mais ativas que dá

naquele momento - estão entendendo, não estão. Eu tenho usado um jogo

eletrônico para avaliar como eles entenderam a aula – P04 – trecho de

entrevista individual.

Os próprios alunos avaliam essas estratégias de uso do Moodle e de ensino

simulado, debriefing, pequenas estações... então a gente faz a simulação em

vinte minutos e depois faz o debriefing. Não é muito tempo. O uso do pré- e

pós-testes. Isso tudo tem possibilitado o aprendizado muito mais ativo,

porque o conteúdo é muito grande. Realmente é uma crítica que os alunos

fazem. Só que por conta das diversas estratégias, eles conseguem apreender

[...]. Para mim ativo é algo que se constrói junto, porque o aluno sempre tem

conhecimento e ele pode construir um novo. E, assim, eu não vejo

dificuldade do conteúdo teórico-cognitivo, porque isso tudo está dado nos

livros, na apostila, a dificuldade na enfermagem é de fazer sentido. Então,

para mim, metodologia ativa é isso. É algo que seja significativo para o

aluno, não tem que memorizar, gravar. Algo que tenha significado na

prática, que ele vai lembrar, que traz os princípios fundamentais que ele não

esqueça, que isso norteia a prática dele. Para mim, isso é metodologia ativa,

é algo que se constrói junto, que não tem nada pronto, que traga um

significado para o aluno, para o estudante – P10 – trecho de entrevista

individual.

Uma estratégia que a gente usa na disciplina é o estudo de caso. O estudo de

caso onde eles vão pôr em prática as fases da sistematização da assistência.

Eles já tiveram oportunidade na disciplina de semiologia, de fazer a teoria

do exame físico, um pouco a parte prática e, depois, chegam no hospital e

eles vão precisar fazer. E o estudo de caso permite isso. Eu, por exemplo,

não exijo semiotécnica de todos os sistemas etc. Daquele paciente que ele

está ali, vamos dizer, o paciente ortopédico, um acamado com fratura de

fêmur ou outra coisa, que dados são importantes? Como é que ele vai coletar

esses dados? Como ele identifica esses problemas, em relação às

necessidades humanas básicas? Eles fazem em dupla este estudo de caso, a

gente tem um roteiro, depois eu tenho um livro, por exemplo, de intervenções

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de enfermagem, onde têm os exemplos de estudos de caso, como você faz o

agrupamento de dados – P12 – trecho de entrevista individual.

Eu acredito no portfólio, não só como um espaço para ele [estudante] fazer a

colocação dos sentimentos, mas eu acho que é uma forma como se fosse um

diário de campo. Então, nosso portfólio na disciplina é o estudo de caso que

ele [estudante] vai construindo ao longo da disciplina. À medida que ele vai

melhorando os conhecimentos e vai vivenciando as situações de cuidado no

campo de estágio ele vai reconstruindo aquele estudo de caso – P13 – trecho

de entrevista individual.

Então, assim, eu acho que o aluno, quando você dá possibilidades de ele

escolher a hora que ele vai estudar, o momento que ele vai ler e o que ele vai

ler, o aluno se interessa mais do que você ficar dentro de uma sala de aula,

cansado, o docente está cansado, o aluno está cansado, você dá

oportunidades para o aprendizado, não forçar o aprendizado. Eu acho que é

o melhor caminho que a gente pode estar oferecendo, porque nós

trabalhamos com adultos jovens, alunos, muitas vezes, que trabalham – P10

– trecho de entrevista individual.

Ainda, quanto às metodologias no PEA, houve reminiscências das metodologias

transmissoras (aulas expositivas, uso de perguntas do tipo sim-não e informativas,

centralidade do professor na implementação das estratégias), assim como houve

propensão às metodologias ativas críticas (início do uso do ciclo pedagógico, uso de

portfólio, trabalhos em grupos, breve e sutil abordagem contextualizadora durante

exposição).

À continuação, outro indicador importante das concepções e práticas

pedagógicas é a questão das abordagens avaliativas. E, antes de começar a escrita do

que foi produzido nesta pesquisa para este indicador, é necessária uma breve

contextualização conceitual. Para tanto, nesta pesquisa, avaliação é entendida como um

processo em que instrumentos avaliativos são utilizados para se alcançarem finalidades

desejadas e desejáveis. Por isso, palavras como prova, teste, exercício cognitivo,

portfólio, média ponderada etc. são entendidas como instrumentos e formas avaliativas,

podendo significar que o processo avaliativo é muito maior que estes instrumentos (ou

não).

Nessa direção, o que foi produzido para a questão da avaliação, nesta pesquisa,

se configurara entre algumas finalidades: a avaliação formativa, a avaliação somativa

(dentro desta, ressaltam as características da avaliação informal e pouco democrática, e

da avaliação punitiva), além de propensões à avaliação formativa e das reminiscências

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da avaliação somativa, da avaliação punitiva, da avaliação pouco democrática. Além

disso, houve também situações de descompasso nas perspectivas avaliativas.

Avaliação formativa A avaliação de finalidade formativa é um tipo de avaliação processual que visa

avaliar para a aprendizagem, ou seja, todo e qualquer resultado avaliativo ao longo do

PEA, nesta perspectiva, retroalimenta a continuidade do próprio PEA. Nesse sentido,

ressalta-se que a avaliação é ‘para’ a aprendizagem (retroalimenta o processo) e não

avaliação ‘da’ aprendizagem (classifica, seleciona pontualmente) (FERNANDES,

2008). Para tanto, nesta modalidade de avaliação, enquanto o estudante não aprende, o

professor continua lançando mão de inúmeras estratégias de ensino-aprendizagem, até

que o objetivo maior seja alcançado: a aprendizagem. Assim, o estudante passa a ser a

referência para si mesmo no processo avaliativo. Entretanto, se faz fundamental a

intervenção formativa para se alcançar o objetivo final estabelecido no projeto político-

pedagógico e, assim, a qualidade das ações implementadas (LUCKESI, 2011).

No Brasil, as terminologias que vem sendo utilizadas para se reportar à avaliação

de finalidade formativa são a avaliação emancipatória, avaliação mediadora, avaliação

dialógica, dentre outras (VILLAS BOAS, 2008). Nesse caminho, esta finalidade

avaliativa se alinha com propostas emancipatórias, em que os estudantes participam

ativamente de seu processo de aprendizagem, inclusive das decisões avaliativas, o que

designa um caráter democrático a este tipo de avaliação, que leva em consideração,

além das representações dos professores sobre a aprendizagem dos estudantes, as

representações que portam os próprios estudantes sobre seu processo avaliativo e de

aprendizagem, assim como permite ao estudante acompanhar sua aprendizagem e ao

professor acompanhar o seu ensino (SAUL, 2008). Trata-se, pois, de um movimento

avaliativo que visa o processo e a transformação em processo, por meio de abordagens

democráticas e emancipatórias (SAUL, 2008).

É um tipo de avaliação calcado em devolutivas contínuas, oferecendo

informações constantes tanto para os professores (que as usam para dar continuidade em

seus processos pedagógicos, escolha dos procedimentos seguintes e tomadas de decisão

etc.) como para os próprios estudantes, os quais podem acompanhar o seu desempenho,

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seu avanço, suas limitações, o que demanda um PEA democrático e transparente, tendo

os estudantes como coautores na produção do processo de ensino-aprendizagem. Nesse

sentido, é um processo avaliativo que precisa aliar as devolutivas constantes aos

estudantes que os professores conseguem fazer a partir de suas leituras/representações

por meio de variados instrumentos avaliativos, aos movimentos autoavaliativos tanto

por parte dos estudantes (para se reconhecerem no PEA) como por parte dos professores

(para perceberem o que precisam implementar para dar continuidade no PEA, revisar

escolhas e objetivos de aprendizagem etc.) (FERNANDES, 2008; VILLAS BOAS,

2008; SILVA; MENDES, 2017).

Assim, nesta pesquisa foram observadas as seguintes características de

avaliações formativas: acontece de forma sistemática por meio de portfólio, com

devolutivas permanentes ao longo do PEA, participação dos estudantes na discussão e

construção dos critérios de avaliação da disciplina. Isso pode ser percebido a partir dos

trechos de entrevista individual seguintes:

Então, ou é o portfólio, em que a gente tem que trabalhar com aquilo que ele

está se expressando, o que ele está expressando também, se demonstra

amadurecimento ou não. Então, isso vai desde habilidades voltadas à escrita

até o amadurecimento mesmo enquanto um futuro enfermeiro – P01 – trecho

de entrevista individual.

Antes de discutir os critérios de avaliação com os alunos, a gente fez a

leitura de um texto. E aí, durante a nossa discussão, nós deixamos claro para

os alunos que a avaliação não vai ser punitiva, que nós não vamos perseguir

o erro, não é. E que a gente vai utilizar a avaliação amorosa, dialógica e

quando eu sou amoroso e quando eu sou preocupado, eu tenho sim que

apontar o que precisa ser melhorado, não é. Então, foi bem legal, porque

ficou bem claro para eles que a gente não vai passar a mão na cabeça, ao

mesmo tempo em que a gente entende, né, mas têm limites na disciplina que

precisam ser respeitados – P06 – trecho de entrevista individual.

Nós trabalhamos com uma das propostas de avaliação que é o portfólio –

P07 – trecho de entrevista individual.

Em documentos analisados (planos de aula, planos de disciplinas, programas de

disciplinas), os seguintes trechos desses documentos construídos por professores e

grupos de professores expressam esta perspectiva avaliativa:

A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados

para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do

estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno

grupo e no cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo

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construído pelo estudante. [...] o portfólio do estudante deverá ser

estruturado de modo a evidenciar o seu caminho (processo) no

desenvolvimento dos ciclos pedagógicos, por meio da síntese das

experiências; reflexão sobre suas aprendizagens; delimitação das questões

de aprendizagem; busca por recursos para fundamentar seus conhecimentos

e ações; registros da aplicação das aprendizagens; autoavaliação das

relações interpessoais vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos,

bem como sua inter-relação com o grupo. O portfólio deverá estar disponível

durante as atividades, a fim de possibilitar o registro das experiências. Esse

material será analisado pelo professor com foco na reflexão do

desenvolvimento do estudante no processo de aprendizagem, registrando

suas considerações. Ele será analisado ao longo do ano. O professor

registrará as observações sobre os estudantes, apreendidas nos ciclos

pedagógicos, no decorrer da disciplina – trecho de DOC-02.

A avaliação formativa e articulada terá como referência os desempenhos

esperados, sendo feita de forma sistemática, com registro e ciência do

estudante. Constarão da avaliação: o desempenho do estudante no cenário

de prática - escola profissionalizante de enfermagem, no pequeno grupo nos

momentos de síntese provisória e no grande grupo nos momentos de nova

síntese, produtos desenvolvidos na disciplina e o portfólio reflexivo

construído pelo estudante, sendo considerados aspectos cognitivos, afetivos e

procedimentais – trecho de DOC-04.

O seguinte trecho do diário de pesquisa também aborda momentos de

observação que estão em sintonia com esta temática:

Em momentos de observação de encontros (P03), notou-se um momento

reservado para “devolutiva”, em que professora e estudantes revisaram os

exercícios cognitivos discursivos, feitos individualmente por cada estudante,

em que a professora expressou aos estudantes quais que tinham sido os

critérios que ela utilizou e pediu para que os estudantes os revisassem. Os

estudantes se colocaram e questionaram alguns pontos e a professora se

colocou aberta para revisá-los e/ou reconsiderá-los a partir da discussão com

os estudantes. Houve também momentos observados (P05, P06), em que

após uma atividade realizada pelos estudantes em campo de imersão ou de

estágio, o(a) professor(a) reservou um momento para discutir/refletir com os

estudantes sobre a atividade em si, dentre outras questões relacionadas com

cada estudante (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Avaliação somativa Esta finalidade avaliativa está associada à ideia de que a avaliação, assim como

os outros elementos do processo pedagógico, não é mais que uma operação de

classificação ou medida, em que a aprendizagem é entendida como o resultado do

ensino (que é proferido pelo professor) e, portanto, obedecem a uma lógica instrumental

e fragmentada. É desse pensamento que descende a lógica classificatória, que dá ao

processo de ensino e ao professor a característica autoritária para usar a nota como

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elemento de controle e poder sobre os estudantes (VIANA, 2013). Ainda, essa lógica de

avaliação serve também como barreiras, como contenção e, em suma, uma forma de

exclusão (VIANA, 2013).

Essa perspectiva foca na classificação pela ênfase atribuída à nota (quantificação

da aprendizagem), reduzindo o processo avaliativo à mecânica verificação da

memorização cognitiva e reprodução de conteúdos (conceituais e procedimentais), em

que os números ou as notas atribuídas em cada instrumento avaliativo são somados para

se chegar a uma média numérica ao final do processo, que classifica e rotula os

estudantes (LUCKESI, 2011; VIANA, 2013). A avaliação somativa baseada em testes e

exames considera o ser humano como algo já dado e findo, portanto, não passível de

transformação, mas passível de aquisição/memorização estática. Assim, de influência da

pedagogia tradicional, a avaliação somativa visa classificar o que já está dado no ser

humano ou aquilo que já fora sistematizado pela humanidade (LUCKESI, 2011).

Ainda, com o advento do neoliberalismo e sua influência nos espaços

formativos, espalhou-se a ideologia da meritocracia, em que os indivíduos são vistos de

acordo com seu desempenho e mérito, apartados de suas realidades sociais, sendo

assim, a avaliação serve para classificar e rotular os méritos e os fracassos e servindo

como mais um dispositivo de exclusão social, selecionando apenas os mais

‘capacitados’ (GENTILI, 1996; VASCONCELLOS, 2008).

As avaliações nesta perspectiva, frequentemente, se veem associadas a duas

características – a punições e a processos pouco democráticos. Isso toma corpo,

especialmente, diante do que se nomeia como avaliação informal, um tipo de avaliação

cujos critérios passam pelo julgamento subjetivo, interpretativo e representacional do

professor, em que, na maioria das vezes, os estudantes não tomam ciência de como se

processa essa avaliação (SILVA; MENDES, 2017). Palavras como assiduidade,

participação, desempenho, pontualidade foram as que produziram esse sentido nesta

pesquisa.

Dessa maneira, nesta pesquisa, os elementos produzidos que se aproximaram

desta perspectiva avaliativa foram: foco na nota, foco no conteúdo específico, uso de

médias para cálculos de notas finais, uso de estratégias avaliativas associadas a

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pontuações, acréscimos e decréscimos na nota, a punição e pouca ou nenhuma abertura

para que os estudantes participem mais ativamente de seu processo avaliativo e da

avaliação informal. O seguinte trecho de entrevista individual traz esta ideia:

[...] eu acho que a gente tem um problema maior do que ensinar, que é

relacionado à avaliação. Então, como ser o mais imparcial possível na hora

de avaliar o desempenho. E o quanto nós temos que incorporar outras

ferramentas que não seja a prova [...]. Então, eu acho que nós também temos

um sistema de avaliação muito precário. E o aluno por outro lado, como ele

é avaliado por nota para uma série de coisas ele reclama e sempre quer nota

maior [...]. Eu acho que a nota deveria ser sete como nas outras

universidades, ou, a gente deveria ter outro sistema de fazer avaliação. E

uma coisa, eu sou insatisfeita comigo também, em termos de avaliação.

Porque, na verdade, a gente teria que conseguir fazer a do aluno quando

começou e quando saiu. Quando a gente trabalha em grupo, eu ainda não

consegui – eu tento, mas vencer aquela coisa de botar na escada os alunos.

Esse foi melhor que esse. Aí, é como se botasse tudo num saco e tentasse

estabelecer uma ordem. Isso é uma coisa que tem gerado insatisfação e

reflexão. Mas assim, também não avancei muita coisa, não. Mas tenho

tentado comparar o aluno com ele mesmo [...] então, teve aluno na minha

disciplina que fez uma cobrança, que quando chegou lá na frente na hora de

cobrar, não cobrou. Então, os alunos também têm que cobrar, deveriam

fazer parte de cobrar uma melhora em termos pedagógicos. Mas porque eles

não fazem isso? Porque têm medo da repercussão da maledetta da nota –

P13 – trecho de entrevista individual.

Em análise documental (planos de aulas, planos de disciplinas e programas de

disciplinas), foi notada a ênfase na finalidade avaliativa somativa:

Constará de quatro avaliações: duas provas teóricas e uma prova teórico-

prática em laboratório de prática simuladas e uma avaliação de desempenho

em cenário de prática profissional. Será aprovado o aluno que obtiver nota

igual ou superior a 5 (cinco) na média aritmética das três avaliações (duas

provas teóricas e uma prova teórico prática) e nota igual ou superior a 5

(cinco) em cenário de prática profissional e frequência mínima de 70% nas

atividades programadas. O estudante com nota inferior a 5 (cinco) na média

aritmética das avaliações teórica e teórico-práticas e nota inferior a 5

(cinco) em cenário de prática profissional estará automaticamente de

recuperação. O aluno que obtiver nota menor que 5 (cinco) em cenário de

prática profissional e/ou frequência menor que 70%, e/ou nota inferior a 3

(três) na média aritmética das avaliações teórica e teórico-práticas estará

automaticamente reprovado, sem direito à recuperação [...]. Será realizada

uma prova teórica e uma prova teórico-prática sobre o conteúdo

programático da disciplina. Será considerado aprovado o aluno que obtiver

nota maior ou igual a 5 (cinco) nas duas avaliações. A nota final será a

média aritmética das duas provas. – trecho do DOC-12.

A avaliação se realizará de forma contínua e coparticipada objetivando a

melhoria do processo ensino-aprendizagem e o desenvolvimento do

estudante, considerando aspectos cognitivos e de desempenho nas atividades

propostas em sala de aula. Constará de duas provas escritas valendo de zero

a nove cada uma delas – trecho do DOC-14.

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A avaliação do estudante constará da soma de: Nota 1: atividade de

expressão cognitiva - valor de zero a 10. Nota 2: média das notas obtidas

nas atividades teórico-práticas em cada um dos contextos [...] – valor de zero

a 10 – trecho do DOC-15.

A avaliação realiza-se de forma coparticipada, objetivando a melhoria do

processo ensino-aprendizado e o desenvolvimento do estudante e professor.

A auto avaliação e a avaliação do grupo sobre o desempenho de cada um

ocorre durante todo o processo. A avaliação da disciplina está ancorada no

desempenho do estudante nas atividades teórico-práticas e na atividade de

expressão cognitiva. O desempenho do estudante nas situações simuladas do

mundo do trabalho fundamenta-se na análise do desenvolvimento dos

atributos na realização das tarefas nas situações da prática profissional,

tendo como referência os desempenhos esperados para a disciplina. [...] Os

alunos serão avaliados no decorrer das atividades programadas e serão

atribuídas três notas: Atividade de Expressão Cognitiva do Pré-Teste (Peso

1); Atividade de Expressão Cognitiva do Pós-Teste (Peso 3); Atividade de

Expressão Cognitiva Final (Peso 6); Será aprovado o aluno que obtiver nota

igual ou superior a 5 (cinco). O aluno que não obtiver nota mínima de 3

(três) na avaliação ou frequência de 70% será reprovado – trecho do DOC-

16.

A nota final será obtida considerando-se: media das três avaliações

cognitivas (peso 4) e média das atividades práticas (inclui competência e

habilidade para realizar procedimentos no cuidado integral de enfermagem

em saúde mental e desenvolvimento de um estudo de caso, o que terá peso 6)

– trecho do DOC-17.

A avaliação terá como referência os desempenhos esperados para a

disciplina. Constarão da avaliação da participação do estudante em

exercício de trabalho em grupo, com apresentação de seminário reflexivo em

forma de debate (3 pontos), exercícios de trabalho em grupo para resolução

de problemas sobre o aprendizado trabalhado em sala, utilizando jogos

eletrônicos – QUIZ (3 pontos) e exercício de avaliação cognitiva (4 pontos)

de modo que a soma entre eles totalize 10 [...] O desempenho do aluno será

avaliado constantemente e discutido no final da disciplina (avaliação

formativa e somativa) – trecho do DOC-18.

Mas também se evidenciou a utilização de finalidades avaliativas antagônicas

em um mesmo planejamento, em um mesmo documento, o que pode sugerir dúvida

quanto ao entendimento, de fato, dos referenciais avaliativos utilizados. Talvez estas

finalidades avaliativas estejam sendo compreendidas instrumentalmente como ‘técnicas

de se avaliar’ e não como finalidades. Isto pode ser visto nos seguintes trechos de

documentos:

Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no

cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído

pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa

e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado de modo a

evidenciar o seu caminho (processo) no desenvolvimento dos ciclos

pedagógicos, por meio da síntese das experiências; reflexão sobre suas

aprendizagens; delimitação das questões de aprendizagem; busca por

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recursos para fundamentar seus conhecimentos e ações; registros da

aplicação das aprendizagens; autoavaliação das relações interpessoais

vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos, bem como sua inter-

relação com o grupo – trecho do DOC-02 [grifos nossos].

A avaliação do estudante será formativa e somativa, considerando os

aspectos: cognitivo (factual e conceitual), procedimental e afetivo no

desempenho das seguintes atividades: - avaliação cognitiva (prova escrita);

- teórico-prática na unidade de internação clínica; - apresentação

escrita/oral de estudos de casos clínicos. [...] A avaliação do estudante

constará de três notas: nota 1: Avaliação cognitiva (prova escrita), com

valor de 0 (zero) a 10,0 (dez): peso 4; nota 2: Atividade teórico-prática na

unidade de internação clínica, com valor de 0 (zero) a 10,0 (dez): peso 5;

nota 3: Apresentação escrita/oral de estudos de casos, com valor de 0 (zero)

a 10,0 (dez): peso 1 [...] A nota final constará da somatória das notas 1, 2 e

3 com valor de 0 (zero) a 10,0 (dez). Será aprovado o aluno que obtiver nota

final igual ou superior a 5 (cinco) e frequência mínima de 70% nas

atividades programadas da disciplina. O aluno que não obtiver nota final

mínima de 3 (três) ou frequência mínima de 70% será reprovado. – trecho

do DOC-09 [grifos nossos].

Essa visão é complementada e corroborada por um trecho analítico de uma

professora-enfermeira em momento de novas entrevistas:

Quanto às concepções, como eu disse, o projeto, ele apresenta uma

concepção crítica da avaliação do processo, da metodologia crítica, mas

que, por mais que esteja explícito e é uma professora que ela tem trabalhado

com isso ela tem trabalhado com a formação, que por mais que esteja

explícito no projeto, ele não é, muitas vezes, incorporado na prática docente.

Então, nós temos lá um projeto que fala movimento do prático, teórico-

prático, mas que no fundo é uma aula expositiva. Certo? Transmissão direta

que você fala da avaliação do processo, mas que faz prova, três provas

individuais na disciplina. Então, há essa incoerência também – trecho

analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região

nordeste do país – PC05.

Avaliação Informal A avaliação entendida enquanto informal se produz sempre dependente e

preponderante no campo das representações, uma vez que o professor toma como

verdade, ou se convence de algo a partir de um conjunto de representações que ele

possui sobre os estudantes, sobre a aprendizagem, sobre o ensino, sobre o processo de

ensino-aprendizagem, sobre as relações professor-estudantes, dentre outros, que se

produziram em determinadas situações e contextos de interação. Este jogo de

representações do professor é, então, utilizado para atribuir um conceito ao estudante. A

avaliação informal abre margem para interpretações e é questionada enquanto um

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instrumento repressor/opressor, uma vez que coloca nas mãos do professor critérios

criados aleatoriamente para a edificação de conceitos/notas a respeito dos estudantes.

Essa modalidade avaliativa também é destacada como forte propiciadora de exclusão

social dentro da universidade, uma vez que dá possibilidades ao professor de partir

apenas de suas representações sobre inúmeras questões, tal como o olhar vicioso para

com os estudantes cotistas ou aqueles advindos de escolas públicas (SILVA; MENDES,

2017).

Assim, os resultados da avaliação informal interferem na avaliação formal (feita

por meio de instrumentos e critérios formalizados) e isto é discutido no sentido de ser

mais um mecanismo de exclusão construído dentro dos espaços educativos para conter,

principalmente, as classes menos favorecidas que agora chegam a estes espaços pelas

reivindicações e pressões sociais, mas também como uma forma menos cara de manter

os excluídos dentro destes espaços, de certa forma, sem aprendizagem real,

evidenciando uma forma de adiamento da exclusão, que acaba sendo feita por meio

deste tipo de avaliação informal (FREITAS, 2005; SILVA; MENDES, 2017).

Exemplos de avaliação de modalidade informal pode ser observado nos

seguintes trechos dos documentos analisados (planos de disciplinas e de aulas):

Além disso, haverá avaliação contínua em sala de aula levando-se em conta

os critérios de assiduidade, pontualidade e participação nas atividades

previstas, valendo de zero a um ponto, devendo ser somado a cada nota da

prova – trecho do DOC-14.

A avaliação será contínua, baseada na assiduidade, participação nas

atividades em aula, estudos, desempenho nas atividades práticas em campo

de estágio e pelas avaliações cognitivas. [...] e média das atividades práticas

(inclui competência e habilidade para realizar procedimentos no cuidado

integral de enfermagem em saúde mental [...] – trecho do DOC-17.

A avaliação será realizada de forma contínua utilizando o conhecimento

abordado nas atividades teórico-práticas. O aluno será avaliado, ainda,

quanto ao seu desempenho nas atividades em sala de aula e em laboratório e

cenário de prática profissional, levando-se em conta os aspectos de

assiduidade, pontualidade, ética e participação nas atividades previstas. [...]

e nota igual ou superior a 5 (cinco) em cenário de prática profissional –

trecho do DOC-12.

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Para finalizar o tópico avaliação, também foi destacado por um professor em

entrevista individual, o quanto a falta de clareza sobre avaliação tem interferido na

relação professor-estudantes:

E isso [não conversar mais ampliadamente sobre avaliação] tem dificultado

muito a relação professor-aluno aqui na escola. Os alunos questionam a

avaliação, mas não se tem uma clareza sobre o que é avaliar, para que

avaliar e como avaliar – P08 – trecho de entrevista individual.

Para finalizar esta parte de concepções pedagógicas, falaremos de um indicador

que tem (ou não) potencial integralizador de todos os componentes do processo de

ensino-aprendizagem, que é o planejamento, o acompanhamento e a gestão do processo

de ensino-aprendizagem. Nesta pesquisa, foram produzidos os seguintes elementos:

planejamento, acompanhamento e gestão com foco no processo e planejamento,

acompanhamento e gestão com foco no produto.

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no processo Quando esta importante dimensão do processo de ensino-aprendizagem, formada

pelo conjunto planejamento, acompanhamento e gestão enfatiza o processo, isso

significa que ela responde às prerrogativas da teoria dialética (ou histórico-crítica) e

busca no seu orquestramento trabalhar as convergências, as divergências e as

contradições (que existem do processo histórico e crítico da existência humana) a favor

do aspecto formativo e processual do processo de ensino-aprendizagem.

Nesta direção, este tipo de abordagem fomenta outras escolhas pedagógicas que

se alinham, tais como algumas já mencionadas anteriormente: metodologias ativas

críticas, avaliação formativa, o que demanda também uma postura docente dialógica,

crítica e democrática, por meio de um papel mediador do professor ao longo de um

processo em que ensino e aprendizagem se inter-relacionam intimamente.

Assim, nesta pesquisa, este tipo de abordagem apareceu com maior intensidade

em processos menores, nos microespaços das disciplinas, em que os professores podiam

articular as outras concepções de avaliação formativa, metodologia ativa crítica, com

papel mediador e postura dialética, crítica e democrática. Desse modo, o planejamento

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ora cabia ao grupo de professores em alguns aspectos metodológicos (escolha do uso do

ciclo pedagógico e do portfólio), ora compartilhado e construído com os estudantes (o

próprio ciclo pedagógico permite que a construção do conhecimento seja um processo

partilhado de debate, de crítica e de reflexão entre o vivenciado e espontâneo e o

conhecimento historicamente sistematizado pela humanidade), tal como a discussão e a

construção dos critérios de avaliação da disciplina junto com os estudantes, os quais

seriam utilizados tanto pelos estudantes como pelos professores da disciplina durante o

processo avaliativo. No entanto, esta questão da participação do estudante na construção

dos critérios de avaliação apareceu apenas em quatro dos treze participantes (como se

pode notar nos trechos das falas e nos trechos de documentos utilizados anteriormente

para apresentar a questão da avaliação).

Nesta direção, esta modalidade de planejamento, acompanhamento e gestão

focada no processo, assim nomeada nesta pesquisa, se alinha muito bem com os

pressupostos da gestão democrática, baseada nas propostas progressistas, em que se

busca a educação como um direito humano universal, e se coloca contrariamente às

propostas gerencialistas, neoliberais, e focadas no mercado capitalista de competências

frias, técnicas e instrumentalizadoras para o mercado de trabalho (GOMES;

ANDRADE, 2009; PAULA, 2010).

Cabe ressaltar, ainda, o investimento que a gestão democrática faz sobre o

desenvolvimento da autonomia dos indivíduos, na produção de horizontalidade nas

relações interpessoais, construções e decisões tomadas coletivamente, propiciação de

espaços de reflexão crítica, revelando os conflitos (normalmente ocultados e/ou

negligenciados por outras lógicas) (PEREIRA; SILVA, 2007; PEREIRA, 2008).

Nesse sentido, o planejamento se dá na perspectiva dialética do conhecimento,

em que se questiona a relação realidade-finalidade, buscando compreender os fins da

educação, a quem ela favorece, contra quem e contra o que ela se coloca, que visão de

homem, de sociedade ela porta. Essa perspectiva visa à transformação, em que o

planejamento é visto como um processo vivo e em movimento. Desse modo, estar

consciente das finalidades e intencionalidades, participar ativamente do processo de

transformação são as características que fundamentam esta perspectiva de planejamento.

Por isso, essa perspectiva é contrária a qualquer movimento de manutenção ou

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reprodução do sistema hegemônico e vigente, visto sua ‘ineficiência’ em resolver os

problemas sociais, senão que acentuá-los/exacerbá-los. Para galgar a transformação, a

perspectiva dialética se pauta em tudo que valorize a construção, a participação, o

diálogo, o poder da coletividade, buscando a formação de uma consciência crítica,

refletindo sobre como se operacionaliza a transformação. Para tanto, ela objetiva

transformar as relações de poder de autoritárias e verticais para relações que se pautem

na igualdade e na horizontalidade, por meio de estratégias dialógicas e democráticas.

Em suma, o planejamento nesta perspectiva tem como intencionalidade última intervir

na realidade para produzi-la no sentido de uma sociedade baseada em preceitos de

justiça, transparência e solidariedade (VASCONCELLOS, 2014).

O planejamento nesta perspectiva, a partir desta pesquisa, tem acontecido em

reuniões periódicas (algumas até previstas em cronograma de disciplina nos momentos

em que os estudantes estão em busca), em que os docentes analisam a(s)

aprendizagem(ns) dos estudantes a fim de pensarem estratégias para a consolidação das

aprendizagens pretendidas dentro da perspectiva dialética do conhecimento. Este

movimento é possível por meio de um acompanhamento atento, contínuo e processual

que os docentes implementam, utilizando para tal anotações qualitativas sobre seus

estudantes em um caderno que levam para todos os espaços de interação com seus

grupos de estudantes. Nesse caderno, são anotadas as mais diversas informações

qualitativas que dão pistas aos docentes com relação ao processo de aprendizagem de

seus estudantes ao longo de toda a disciplina ou disciplinas em que se encontram com

seus estudantes. Outra estratégia utilizada também é a autoavaliação ao longo dos

momentos do ciclo pedagógico, que permitem que os estudantes e professor se analisem

enquanto participantes daquele processo de ensino-aprendizagem no qual todos estão

trabalhando juntos para a construção de saberes e conhecimentos. A autoavaliação

também é um momento riquíssimo por meio do qual os professores conseguem melhor

produzir suas representações sobre a(s) aprendizagem(ns) de seus estudantes.

Neste mesmo sentido, uma diversidade de atores está envolvida nos processos de

planejamento das situações de aprendizagem, uma vez que se busca as situações vivas e

reais em que se dá a complexidade da vida, das relações humanas, da existência de uma

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profissão e uma profissionalidade enquanto um vir a ser, como ilustrado no seguinte

trecho de entrevista individual:

Com relação ao planejamento das atividades, acho que a gente acaba

fazendo investimento muito maior de planejamento prévio nos LPPs

[Laboratórios de Práticas Profissionais]. Eu não sei se o ciclo pedagógico

como ele já está muito incorporado em nós, eu não fico... a gente tem um

planejamento, por exemplo, na primeira visita de famílias. Na semana

anterior, a gente já tinha feito todo um contato prévio com a equipe, com os

agentes, com a enfermeira, os gerentes. Para passar o cronograma para

dizer os dias de prática, para conversar sobre os tipos de família. Então, tem

um investimento, isso é planejamento da prática, para que a gente, nesse dia,

a gente tenha os agentes já conversado com as famílias para ver se elas

aceitam receber os alunos. Então, temos que ter esse planejamento – P03 –

trecho de entrevista individual.

Dessa maneira, estas características, que deveriam ser do estabelecimento de

ensino como um todo quanto aos assuntos de gestão, apareceram resumidamente no

âmbito de algumas disciplinas, ou mesmo na individualidade dos professores ou grupos

de professores. Veremos melhor esta questão no tópico ‘resistência como analisador da

docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’ e que tem íntima relação com os

movimentos que vão atualizando a forma de planejar o processo de ensino-

aprendizagem, uma vez que se percebe que o planejamento com foco no processo está

contido ao microespaço e, no momento atual, a resistência ofensiva está relegando-o a

espaços cada vez mais apertados e menores. E apesar de aqui o foco ser sobre o

processo, existe um produto, que é a aprendizagem em uma perspectiva dialética,

portanto, tendo a formação como objetivo último, enquanto devir (em que todos os

elementos da vida, todas as experiências etc., vão compondo a realidade, atualizando a

instituição educação, a instituição enfermagem, portanto como um eterno vir a ser) e

não como uma somatória ou checklist de competências e habilidades. Alguns trechos de

entrevistas individuais seguintes ilustram estas atividades de planejamento realizadas

pelos professores:

Então, até tem aluno que, por exemplo, tem problema com a gente na

disciplina, às vezes você acompanha aluno que teve dificuldades sérias e

que, em vários momentos, você precisou sentar e conversar "olha! Você, se

continuar nesse ritmo até o fim do ano, não tem como dizer se você vai

atingir os objetivos que a gente tem aqui para você na disciplina. Precisa

melhorar nisso e naquilo" e fazendo esse processo desde o mais precoce

possível. Então, eu percebo isso também - eu tento pelo menos desenvolver o

papel ativo nesses aspectos – P01 – trecho de entrevista individual.

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A gente tem momentos na malha [horária] que o aluno está em período de

busca, mas nós [professores da disciplina] estamos em sala discutindo a

disciplina. E a gente tem tentado garantir esses momentos, duas a três vezes

ao longo do semestre. Mas, ao mesmo tempo, têm muitas dificuldades,

principalmente, em relação à agenda. Acho agenda, por sermos de áreas

diferentes, estarmos em disciplinas diferentes, isso dificulta bastante, mas a

gente já tenta montar o programa também pensando nisso. Que olha, no

momento que o aluno está em busca, você já põe aí na sua agenda que você

está comprometido na reunião da disciplina. E, aí, esses planejamentos que a

gente faz [...] a gente discute situações individuais de estudantes, como é que

está a situação de ensino-aprendizagem, discute os próximos LPPs – P04 –

trecho de entrevista individual.

Mas o programa, as sequências de atividades são reavaliadas pelo grupo [de

docentes] em reuniões, em que se estabelecem já as modificações desse

programa, e como nós vamos conduzir esse programa – P05 – trecho de

entrevista individual.

Toda a minha aula, eu faço um planejamento, especialmente das aulas que

são teóricas aqui e do estágio, porque não da imersão? Porque a imersão eu

dependo do contexto, não é? Como as nossas imersões o aluno vai para

acompanhar o professor, então, lá o meu planejamento depende do

professor, então, o meu planejamento acaba acontecendo lá na hora. Já

aconteceram situações de eu chegar lá e de eu ter planejado no meu caderno

com quais professores os alunos iriam acompanhar e chegar lá e a turma ter

ido para estágio, então, eu ter que refazer o planejamento – P06 – trecho de

entrevista individual.

Eu acho que na proposta que a gente tem de acompanhar o aluno no terceiro

ano, no quarto ano e no quinto ano, eu consigo perceber ao longo dos anos,

não é? Porque de alguma forma a gente acaba acompanhando a turma, o

desenvolvimento do aluno. Então, hoje têm alunos do quinto ano comigo, que

no terceiro ano não conversavam, não conseguiam se expor, não tinham

pensamento crítico, não conseguiam articular o que eles viam na prática

com as discussões teóricas. E que hoje no quinto ano, nas aulas do quinto

ano, eu me calo para ouvir, porque em alguns momentos eu me sinto

aprendendo. Então, a satisfação é ver que é uma abordagem que demanda

tempo, que demanda esforço, que demanda você acreditar que o aluno é

capaz, estimular para que ele compreenda, que ele acredite que ele é capaz,

não é? E que ao longo do tempo eu consegui ver sucessos nessa trajetória –

P06 – trecho de entrevista individual.

Então, além desse planejamento anual, que ele não é só anual, a gente faz

reuniões mensais com um grupo de professores, para ver qual a evolução, o

encaminhamento, como estão acontecendo as coisas, para replanejar alguma

situação – P07 – trecho de entrevista individual.

O primeiro passo para conseguir trabalhar é conhecer um pouco os alunos.

A gente tem trabalhado com pequenos grupos - isso também facilita bastante.

Conhecer os alunos desde a idade que eles têm, de onde eles vêm, como eles

estão vivendo aqui em ***, como eles estão estudando. Eu tento olhar um

pouco para a vida deles, o dia-a-dia deles aqui. No processo de ensino-

aprendizagem, eu procuro fazer trocas com os alunos; se eu percebo

dificuldades, eu já vou conversando com eles. Então, ter uma postura mesmo

de contingente, de buscar compreender o que eles estão vivendo, quais as

dificuldades e buscar um caminho para isso [...]. Eu tento trabalhar nessa

perspectiva de favorecer a relação professor-aluno, de buscar estratégias

para contribuir com o aprendizado dele. Se percebo que ele está com

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dificuldade de estudar, de fazer síntese, a gente propõe trabalhar junto – P07

– trecho de entrevista individual.

É quando a gente chega no 5.º ano e a gente vê um aluno realmente crítico,

que consegue questionar algumas coisas, que consegue fazer uma análise

crítica de um texto que ele lê, que consegue perceber diferença [...] diferença

nas abordagens, nas diferentes abordagens, ele consegue perceber lá no

final onde ele está e porque ele está aprendendo ou porque que ele não está

aprendendo – P08 – trecho de entrevista individual.

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no produto Esse é o tipo de gestão que prevaleceu na dimensão macro e também apareceu

na dimensão micro de algumas disciplinas, em que os participantes desta pesquisa eram

docentes. Tomamos aqui micro e macro a partir da corrente institucionalista, para

ressaltar que as macromudanças são resultados de forças instituintes que se destacam a

partir dos microespaços, e que é a partir do micro que irrompe o novo e as

transformações, e o macro é o que se apercebe enquanto as regularidades – o micro se

reflete no macro e o macro se reflete no micro (BAREMBLITT, 1996). Nessa direção, o

macro nesta questão de planejamento é o que se tem mais atualizado a partir dos

movimentos instituintes do momento e que conseguiram sua hegemonia e perpetuação –

o planejamento com foco no produto. Abordaremos melhor esta questão quando

falarmos da resistência ofensiva e defensiva no tópico resistência como analisador da

‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’.

Esta modalidade de gestão se alinha com a perspectiva de gestão conhecida

como gestão empresarial, gerencialismo (PAULA, 2010), que foca na gestão do

conhecimento a partir da perspectiva da administração de empresas, visando à

mensuração do conhecimento (GROTTO, 2001; SANTOS et al., 2001). Esta gestão

estratégica de administração do conhecimento se baseia em uso de técnicas e estratégias

para conseguir mapear os conhecimentos, competências e práticas de excelência,

consideradas como eficientes e que precisam ser mantidas e transferidas (PROBST et

al., 2002; GASPAR et al., 2010).

Aqui, a ênfase é no produto, mas o produto referido aqui é fruto de um processo

instrumental e mecânico de obtenção de números e notas, os quais apenas inserem os

estudantes em estatutos de aprovado, em recuperação e de reprovado. A aprendizagem

aqui é entendida como o resultado/produto do ensino segundo a lógica ‘se o professor

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ensina, logo o estudante tem que aprender’. Assim, a aula/o encontro só termina quando

o professor tenha terminado de ensinar, mesmo que o estudante possa não ter aprendido,

uma vez que é deste a responsabilidade de memorizar informações e depositá-las em

instrumentos avaliativos que visam quantificar a aprendizagem em números para

classificar e rotular os estudantes. Desse modo, percebe-se que este modelo de gestão se

alinha com concepções pedagógicas, tais como a avaliação somativa, metodologias que

focam no cognitivo e no procedimental, em posturas docentes autoritárias,

classificatórias, punitivas que, por vezes, utiliza-se do diálogo, mesmo não chegando a

propiciar espaços democráticos. Está alinhada com a teoria positivista, com a

manutenção, com a reprodução do sistema político-econômico vigente, portanto que não

visa à transformação, senão que a uma transformação das estruturas que respondam

mais eficientemente à ideologia neoliberal.

Esta modalidade de planejamento, acompanhamento e gestão focada no produto

se mostra como a hegemônica nos macroespaços do estabelecimento de ensino e da

organização (universidade), o que foi possível perceber segundo as seguintes

características observadas: sistema de gestão de graduação com caráter apoiador de

currículos na vertente disciplinar, fragmentado, foco na nota e médias classificadoras

dos estudantes (avaliação somativa se alinha melhor com este sistema), grade curricular

dos cursos cheios de travas (pré-requisitos), horários dos cursos abarrotados de

disciplinas, com poucas áreas verdes livres para os estudantes (DOC-24; DOC-25;

DOC-57; DOC-58; DOC-61). Ainda, em reflexão anotada em diário de pesquisa:

A participação discente nas decisões é por meio de democracia representativa

(são eleitos representantes para participarem de espaços decisórios, que

supostamente levariam a voz dos pares, colocando-a sozinhos em reuniões

cheias de docentes), mas os pares (estudantes) dificilmente participam de

encontros com os representantes discentes para analisarem as propostas e

fazerem proposições, apoiando na construção de consensos da categoria

(ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

O acompanhamento se faz por meio de instrumental técnico e quantitativo, em

que as avaliações acontecem por meio de provas e números que são atribuídos, gerando

médias e pontuações, números e índices que quantificam as atividades realizadas. Mais

recentemente no estabelecimento de ensino, começou a se institucionalizar um teste de

progresso e continuará a ser implementado, segundo a proposta da nova direção do

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estabelecimento (DOC-56), o qual possui questões de múltipla escolha e quantificáveis,

para se obter um olhar generalizado sobre os estudantes (nesse caso se detendo à

dimensão cognitiva e dos conteúdos abordados nos testes – que não compreende a

totalidade, a integralidade e a riqueza de conteúdos trabalhados e aprendidos pelos

estudantes ao longo da formação). Inclusive esta modalidade de teste ao ser

implementada começa a induzir, legitimar e reafirmar práticas avaliativas de finalidade

somativa no cenário de estudo.

Portanto, esta modalidade de planejamento está pautada na perspectiva

metafísica do conhecimento, fundamentada nos preceitos da administração de cunho

instrumental e normativo, consolidada por meio de protocolos e modelos, roteiros,

manuais, panfletos informativos, dentre outros, sustentada em discursos da praticidade,

da ordem lógica, travada por meio de pré-requisitos, delineando sequências e passo a

passo a serem seguidos estritamente. Assim, se alinha muito bem com tendências

pedagógicas tradicionais, tecnicistas, cuja fundamentação teórica se faz nos preceitos

positivistas e cartesianos. Nesse sentido, há influência também das perspectivas da

Qualidade Total, trazendo para dentro da Educação conceitos e práticas do tipo

‘eficiência’ e ‘eficácia’. Por fim, este modelo, falaciosamente sustentado no discurso da

neutralidade, analisa e interpreta as questões internas da educação e dos

estabelecimentos educativos, como se estes fossem descolados da realidade social e da

prática social, não revelando as contradições da realidade (VASCONCELLOS, 2014).

Essa perspectiva foca na organizacionalidade do planejamento, do acompanhamento e

da gestão, ocorrendo sumamente em reuniões de área, de disciplinas e na

individualidade docente para questões técnicas, procedimentais e organizacionais.

Talvez aqui, as escolhas docentes estejam atravessadas pela característica tecnicista e

metódica tradicional e típica da institucionalização de enfermagem. Esta característica

pode ter sido adquirida desde o surgimento da profissão dentro de instituições totais

como o hospital, atravessadas pelo poder, controle, vigia e punição – excessiva

disciplina e excesso de regras (FOUCAULT, 2000) e também um desejo inquietante de

ocultar/apagar as memórias de uma profissão que começou com trabalho de baixo

prestígio e valorização (GASTALDO; MEYER, 1989).

Os seguintes trechos de entrevistas individuais exemplificam esta perspectiva:

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Eu acho que ainda [o planejamento] é muito centrado na individualidade ou

do docente ou da área de ensino onde que ele está inserido. Então, a gente

teve alguns movimentos depois que começou a se reformular o currículo

para tentar pensar mais coletivamente, eu acho que essa questão, mas eu

acho que ainda está muito centrado na responsabilidade individual do

docente ou da área de ensino dele [...]. Então, a gente acaba olhando um

pouco mais isso dentro da área. E, depois, na individualidade, cada docente

em disciplina, acaba pensando em alguma estratégia, acaba, talvez, trazendo

algumas coisas de conteúdo que tem mais afinidade – P02 – trecho de

entrevista individual.

A gente sempre se reúne todas as semanas para discutir como serão as

nossas aulas da segunda. Então, a gente faz o planejamento sempre assim,

antes do início das disciplinas, no decorrer porque a gente tem que planejar

cada aula e de uma forma a gente tenta balizar conhecimentos, o que a gente

vai discutir – P09 – trecho de entrevista individual.

Então, é uma discussão muito grande, coletiva. [...] ocorre o planejamento

em si da disciplina, mas no campo prático acaba sendo muito mais aí meu,

mais individual, a forma como que eu vou trabalhar com esse aluno, a

avaliação. Então, tem algo maior que a disciplina, mas tem o mini, o meu

microespaço, vamos dizer assim, em que eu consigo trabalhar e efetivar

aquilo que está no papel na prática, porque a disciplina é eminentemente

prática. Então, eu levo esse aluno para a questão prática. Então, como eu

faço isso na prática é uma coisa mais individual. [...]. Então, planejar a

gente faz tudo coletivo, não é algo assim "eu quero trabalhar a disciplina

dessa forma". No geral, a gente vai discutindo, propondo mudanças, é... às

vezes, é aceito de imediato, às vezes a gente experimenta, mas o tempo até a

gente perceber o que é melhor, às vezes a gente fala "não, vamos dar... isso

vai trazer tanto impacto, vai mexer com tanta [gente], vamos esperar mais

um pouco", mas eu acho que algumas mudanças que são necessárias, a gente

vai fazendo a cada semestre, a gente vai percebendo aquilo ali e sempre vai

tentando mudar – P10 – trecho de entrevista individual.

Os alunos variam muito de um semestre para o outro, tanto de um curso

para o outro, como de um semestre para o outro. E eu fico pensando em que

oportunidades eu posso criar, o que eu posso fazer para desenvolver aquelas

competências que, tanto de habilidade mesmo, como conhecimento e atitudes

do aluno em relação aquilo que ele está... que é esperado que ele fizesse

naquele semestre, naquele período – P12 – trecho de entrevista individual.

a gestão do ensino é... eu acho que seria assim - o que seria, não o que é,

seria você ter o perfil do profissional que a gente quer formar, quais as

competências que a gente tem que desenvolver e como nós todos na unidade

vamos trabalhar para atender a isso aí. Então, teria que ser um trabalho

colaborativo, participativo etc., mas isso não acontece. [...] no próprio

departamento, nós temos disciplinas que vão acompanhando o aluno durante

a sua formação e uma disciplina não fala com a outra, né. Não fala, talvez

por falta de tempo, por falta de ter uma gestão [...]. Na própria avaliação, o

aluno fala que tem repetição de conteúdo, aspectos que ele não vê,

competências que não foram desenvolvidas, que ele não teve oportunidade -

a gente sabe disso também. E isso vem se agravando com o tempo. Eu

percebo que vem se agravando. Está inchando muito conteúdo e coisas

básicas que o enfermeiro precisava saber... não só saber, mas desenvolver

para ser um enfermeiro... não está tendo, eu acho que por falta de

coordenação, de a gente conversar, de a gente... e um dos fatores limitantes é

a própria forma de trabalho - a gente quer fazer tudo, e quer fazer tudo e

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mais um pouco e aí o tempo nosso é limitado, mas falta também, eu acho que

liderança nesse aspecto – P12 – trecho de entrevista individual.

Para você rever slides, porque as coisas... Tem algo novo que saiu. Para,

realmente, você atualizar. Eu costumo falar para os alunos que a gente está

dando uma aula e aquilo pode ser a maior burrice do mundo, porque alguém

já descobriu uma coisa nova diferente lá na China. Dali duas horas, saiu na

internet e o que você falou não é mais verdade. Então, eu procuro fazer essa

atualização e investimento de estudar [...]. Então, o que acontece, quando a

gente fazia troca de campo, muitas vezes, a gente não queria pegar

determinado aluno de determinado colega, porque vinha com muita

dificuldade. Então, parecia que sempre você estava tentando suprir, então a

gente optou por pegar um aluno e ele é seu do começo ao fim da disciplina

[...]. mas, eu acho que do ponto de vista de experiências do aluno, a gente

privou ele de ter contato com campos que são diferentes. Acho que por um

lado a gente beneficiou, por outro, a gente prejudicou – P13 – trecho de

entrevista individual.

Ao percorrer todas estas concepções que se mostraram mais salientes ao longo

desta pesquisa, é importante fazer algumas outras considerações que dão um corpo

crítico a este efeito rosa dos ventos sobre as concepções e práticas pedagógicas.

Um primeiro ponto concerne à questão dos referenciais pedagógicos, que elenca

algumas características: o mito do ‘não sigo nenhum referencial pedagógico’;

dificuldade de transposição teórico-prática; o reconhecimento de influências de

tendências tradicionais de ensino em suas concepções pedagógicas; e a busca pela

coerência entre as concepções pedagógicas implementadas, o projeto político-

pedagógico do estabelecimento formador, as diretrizes curriculares nacionais para

formação de enfermeiros, as prerrogativas de um projeto nacional de sistema de saúde

em construção (SUS) e suas contradições.

Foi produzido no discurso docente o que se entendeu pelo mito do ‘não sigo

nenhum referencial pedagógico’. Aqui, entende-se a palavra mito no sentido de algo

hipotético (PRIBERAM, 2018), ou mesmo, como uma narrativa que visa à transmissão

ou objetivação de um pensamento que surge a partir de uma simbologia (MICHAELIS,

2018b). Nessa direção, pode-se remeter à alegoria platônica do ‘mito da caverna’, que

representa uma passagem, em que pessoas formulavam hipóteses ou pressupostos a

respeito de como seria a vida e os habitantes de fora de uma caverna, a partir de

sombras projetadas nas paredes da caverna. Os habitantes da caverna imaginavam como

eram os habitantes e se assustavam com as imensas sombras projetadas e não ousavam

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sair da caverna, pois haviam criado um mito imaginário (JAPIASSÚ; MARCONDES,

2008, p.43). Talvez esta alegoria permita estabelecer melhor o sentido do termo mito

utilizado neste estudo.

Nesse caminho, alguns docentes, quando perguntados sobre os fundamentos de

suas escolhas pedagógicas, metodológicas e avaliativas, referiam com certa

assertividade que não seguiam nenhum referencial pedagógico, que não tinham um

autor em quem se embasassem para organizar suas escolhas e pensamentos

pedagógicos. Entretanto, utilizavam-se de termos correntes e recorrentes no meio do

ensino superior para justificar as atividades que implementavam com os estudantes, tais

como: metodologia ativa, problematização, protagonismo do estudante, dentre outros.

De fato, a dúvida que fica é em relação ao ‘não saber pedagógico’, o que levaria o

professor a não reconhecer a cientificidade do saber pedagógico e das abordagens

pedagógicas, ou a um tipo de comportamento do ‘não se comprometer com referenciais

pedagógicos’, o que poderia deixar o professor em condição mais confortável para

promover e implementar mudanças sem ter que passar pela crítica ou reflexão quanto

aos preceitos de alguma ou outra corrente de pensamento pedagógico. A seguinte

situação é exemplificada nos seguintes trechos de entrevistas individuais:

Eu não tenho um referencial teórico escolhido. Eu não tenho isso. Eu não

vou dizer "ah, eu uso Paulo Freire, eu uso...não!" Eu não tenho. A gente

segue essa, vamos dizer, essa tendência da universidade de usar, de fazer

cada vez mais essa questão da educação mais emancipatória e tudo isso e

tentar ir fazendo isso [...]. Então, a gente usa assim... não tem muito definido,

a gente tem uns exercícios que são meio... padrões que a gente sempre usa

na disciplina, mas a gente tenta mudar muito, fazer assim, então às vezes

uma técnica nova, mas não tem um referencial – P09 – trecho de entrevista

individual.

Eu não tenho nenhum autor específico que eu uso e nem sei se existe uma

filosofia, concepção específica. Eu busco trabalhar com os alunos a questão

mais da reflexão, de crítica e também utilizando estratégias mais ativas. Não

aquele aluno, aquela aula de transmissão apenas de conteúdo. Então, eu não

sei... não uso um autor específico, mas também descarto aqueles autores que

falam, conteudistas – P10 – trecho de entrevista individual.

O segundo ponto se trata, de certa forma, do que foi notado quando da

observação de aulas e encontros, e análise de planos e programas de disciplinas, de

alguns docentes que referiram, em entrevista, ‘não seguir nenhum referencial

pedagógico’. Por exemplo, os que referiram utilizar a problematização implementaram

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um processo de fazer perguntas para os estudantes, visando à aprendizagem de

conceitos, sem a utilização explícita da exposição de conteúdos. Como se percebe, trata-

se de usar o termo problematização de forma instrumental pouco elaborado, como se

fosse uma técnica implementável e que não partisse de um arcabouço complexo

construído a partir de um referencial teórico-pedagógico com finalidades específicas

para o que se entende por educação, sociedade, ser humano etc. Ainda neste exemplo,

ao focar nos conteúdos conceituais e no trabalho cognitivo de apropriação dos mesmos,

no jogo de perguntas e respostas, aliado ao uso de avaliação cognitiva e somativa,

percebe-se um posicionamento pedagógico explicitamente relacionado com a tendência

pedagógica tradicional de orientação positivista.

Outro exemplo é o uso de finalidades avaliativas contraditórias em um mesmo

plano de disciplina, o que pode indicar duas questões: ou conhecimentos pouco

aprofundados sobre avaliação, ou o embate ideológico e defesa de referenciais

avaliativos divergentes pelos professores de algumas disciplinas. Uma pista quanto à

primeira opção foi produzida em momento de devolutiva individual em que o professor

referiu que tinha dificuldade de entender a diferença entre avaliação somativa e

formativa (P04) e, também, em alguns planos de disciplina. Os trechos a seguir são de

documentos (planos de disciplinas) e ilustram esta questão:

Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no

cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído

pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa

e somativa [...] – trecho do DOC-02 – grifos nossos.

A avaliação do estudante será formativa e somativa, considerando os

aspectos [...] – trecho do DOC-09 – grifos nossos.

Seria esta ressignificação ou descompasso terminológico feito para atender às

demandas de modismos metodológicos que surgem? Teria isso a ver com o que os

professores referem quanto à deficitária formação para o exercício da docência no

ensino superior, inclusive a dificuldade de participar de processos permanentes de

formação para a docência na universidade que propiciem um olhar complexo e

contextualizado sobre a docência? Qual seria o problema em assumir que suas

abordagens pedagógicas se alinham mais com referenciais tradicionais? Será que isso

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realmente importa? O seguinte trecho de entrevista individual denota a necessidade de

formação para a docência:

Então, eu acho que às vezes a gente fica assim meio..., mas a gente tem

estudado constantemente, participando nas disciplinas de graduação e

disciplinas de pós-graduação. Mas, sinto que para nós, professores de

enfermagem, é uma deficiência muito grande. A gente não tem uma formação

para atuação de professor, nem uma formação básica no planejamento –

P07 – trecho de entrevista individual.

Entretanto, alguns docentes, mesmo referindo a vontade de trabalhar em

perspectivas problematizadoras, por exemplo, reconhecem que suas abordagens

pedagógicas estão impregnadas de/atravessadas por conceitos, práticas, atitudes e

comportamentos que convergem para referenciais positivistas de educação (pedagogia

tradicional, pedagogia renovada, pedagogia tecnicista, dentre outras). O seguinte trecho

de uma reflexão de um professor como resultado de uma restituição individual ilustra

esta questão:

O feedback oferecido pelo aluno confirma minha história cultural, e aponta

que ocorreram mudanças, que na minha compreensão foram significativas

na prática docente, porém com lacunas que necessitam ser superadas.

Percebo, que minha trajetória educacional na Escola Nova e na Tradicional,

ainda ecoa na minha pretensa prática que tenta se apoiar na abordagem

democrática, libertadora, em que o diálogo e a autonomia na construção do

conhecimento coloca o aluno e suas necessidades em foco – P05 – trecho de

análise durante uma restituição individual.

Referem ainda a dificuldade de verem os acordos feitos na construção dos

projetos político-pedagógicos serem implementados e de não terem tido uma formação

para a mudança curricular, usando isso para justificar um retrocesso para tendências

pedagógicas mais tradicionais e conhecidas – isso será mais bem explorado no efeito

adaptação-resistência. Os seguintes trechos de entrevistas individuais ilustram esta

questão:

algumas questões das próprias disciplinas, eu vejo que poderia ser diferente,

questão de área verde que todo mundo fala que não tem, que eu penso que

seria interessante. A estruturação mesmo de algumas questões - o próprio

currículo. Então, a gente vai, discute, até o PPP, depois discute o currículo.

Tem algumas questões que a gente gostaria de atender e que pelo menos

estão assim nas discussões, mas que às vezes a gente vê que não conseguem

ser implementadas mesmo. Então, esta questão de área verde, de algumas

integrações que nem sempre são possíveis – P01 – trecho de entrevista

individual.

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Não é uma coisa ah hoje vamos mudar o currículo e vai dar certo. Tem que

ter um tempo e um investimento nas pessoas. [...] tinha uma expectativa em

relação ao currículo. Só que a universidade sempre privilegiou nos docentes

a especialização. E, aí, da noite para o dia, o especialista teve que ser

generalista. [...] então, mudou tudo [o currículo] muito de uma vez, não foi

progressivo – P13 – trecho de entrevista individual.

Por fim, houve também os professores que se dizem adeptos da teoria dialética,

na qual fundamentam as escolhas metodológicas, avaliativas, de planejamento, dentre

outros elementos de suas concepções e práticas pedagógicas. Estes professores

sinalizam a importância da contextualização do conhecimento, da maneira de conhecer,

da participação dos estudantes no PEA, utilizando estratégias e métodos que propiciem

maior interação ensino-aprendizagem, professor-estudantes, realidade-finalidade,

instituído-instituinte, manutenção-transformação, microespaço-macroespaço, dentre

outros. Estes buscam coerência entre as escolhas formativas e os vários projetos ético-

políticos e sociais em andamento: o SUS como referência para a formação de

profissionais da saúde (CARVALHO; CECCIM, 2012), as diretrizes curriculares

nacionais para a formação de profissionais da saúde, os projetos político-pedagógicos

dos cursos em que lecionam, etc. Estes professores reconhecem também que existem

contradições em suas práticas e que estão em processo de formação para a docência,

mesmo que de forma individualizada, em momentos de estudos particulares de cada um,

ou diante de alguns embates frequentes para a conseguir manter minimamente suas

escolhas teórico-pedagógicas diante de pressões dos pares, da perspectiva de gestão e da

estrutura da universidade – este ponto será mais bem discutido no efeito adaptação-

resistência.

Portanto, o efeito rosa dos ventos sobre as concepções pedagógicas é entendido

como a expressão de um movimento de coexistência de várias concepções e práticas

pedagógicas ao mesmo tempo, o que se entende nesta pesquisa como algo desejável,

pois é no embate que as construções vão acontecendo e se tecendo, no embate

instituído-forças instituintes, que o processo de institucionalização se processa. Nesse

sentido, os saberes pedagógicos vão se atualizando conforme os movimentos que

resistem e sustentam suas ideias vão alcançando hegemonia no local de estudo, dando

tons à instituição docência no ensino superior (do professor enfermeiro), ou seja,

atualizando-a. Entretanto, a principal característica que se quer destacar neste efeito é

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que estas concepções (que revelam os sentidos dos saberes pedagógicos docentes e os

legitimam) coexistem implicitamente, nas práticas, nos pensamentos e nas atitudes dos

docentes, sem que se perceba, minimamente, as contradições, produzindo uma sensação

de que os conceitos pedagógicos, as estratégias de ensino aprendizagem, os referenciais

e instrumentos avaliativos compusessem um cardápio, do qual o professor pudesse fazer

a maior diversidade de arranjos e combinações possíveis, sem nenhum prejuízo e

comprometimento com ideologias, correntes, tendências e pressupostos teórico-

pedagógicos.

O seguinte trecho de uma restituição coletiva sobre os dados desta pesquisa traz

uma análise dessa situação:

acho legal pensar que o professor tenta fazer diferente, mas ainda tem

questões que tem a ver com o modo como foi formado, né, com tudo isso que

a gente já sabe, e também, professores que estão propensas a mudanças né,

mesmo que eles ainda tão dentro do modelo, mas eles ainda, eles estão

tentando caminhar. Talvez eles estão tendo dificuldade pelo que a *** falou.

A [estabelecimento estudado] não tem um referencial claro, cada um faz o

que quer. Essa é a grande verdade, cada disciplina, cada professor trabalha

de um jeito que acha que é melhor para ele, mas eu achei interessante que há

professores que estão motivados e tentando caminhar. Talvez se a gente

tivesse dentro de uma proposta universitária de formação continuada, que a

gente teve há uns anos atrás... – P06 – trecho de análise durante o

encontro 2.1.

O seguinte trecho também contribui para a ampliação das discussões sobre a

formação em enfermagem e os referenciais pedagógicos. Em uma oportunidade de

conversa informal com um especialista sobre sistematização da assistência de

enfermagem em um evento nacional sobre educação em enfermagem, pôde-se produzir

a seguinte reflexão:

Em conversa informal com um especialista e professor universitário sobre um

referencial de ‘pensamento crítico’ (científico/acadêmico) o qual propunha

uma escala para ‘medi-lo/quantificá-lo’ ou talvez ‘identificá-lo’ diante das

ações, pensamentos e atitudes de enfermeiros e formandos-enfermeiros para

avaliar o ensino/a aprendizagem da sistematização da assistência de

enfermagem (SAE), perguntei se o professor percebia relação com alguma

corrente pedagógica, ou ainda com a pedagogia histórico-crítica. Fiz este

questionamento para refletir sobre a SAE, uma vez que a compreendo como

um saber docente do campo específico de atuação deste professor no ensino e

que, portanto, se faz necessário desvelar a tendência pedagógica que mais se

aproxima da SAE, ou seja, os saberes pedagógicos que acompanham o

ensino/a aprendizagem da SAE. Me surpreendi, a priori, com a resposta de

que o professor não tinha tido formação para ser professor e que não saberia

me responder. Fiquei pensando o quanto podemos estar nos aventurando em

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lógicas no campo da educação/da formação sem uma reflexão aprofundada

sobre as origens e finalidades de referenciais e o quanto nos falta tempo (nos

é roubado o tempo) para fazê-lo de forma que traga uma repercussão

importante para a sociedade para além de organizar uma profissão aos moldes

encomendados pelo mercado de trabalho gerencialista (ANOTAÇÕES DO

DIÁRIO DE CAMPO).

Desse modo, também já começamos a sinalizar como o Estado e suas

reformas/atualizações no sentido neoliberal/gerencialista têm produzido efeitos em

cascata sobre a universidade pública e sobre os docentes-enfermeiros. O próximo efeito

– o efeito peneira – vai sinalizar um tanto melhor como o Estado Neoliberal e suas

políticas indutoras estão atuando sobre a docência universitária do professor-enfermeiro

e suas concepções e práticas pedagógicas.

Efeito Peneira (cada vez mais seletiva)

O efeito peneira é assim concebido, por se assemelhar ao efeito produzido

quando se usa uma peneira para separar alguma coisa de outra, restando algo desejável e

eliminando algo indesejável, ou vice e versa. Assim, este efeito foi produzido a partir de

análise documental, observação atenta e contínua nos cenários de produção de dados,

em entrevistas individuais com os participantes, e relato de situações vivenciadas ao

longo da pesquisa, registrado no diário de campo – notadamente quando se discutia

concepções e práticas pedagógicas com os participantes desta pesquisa, ou seja, usando

a discussão de concepções e práticas pedagógicas como analisador da instituição

‘docência no ensino superior e o professor-enfermeiro’.

Um dos principais pontos a serem destacados no efeito peneira se refere à

concepção e à concretização de um arcabouço estrutural que sustenta algumas

concepções e práticas pedagógicas hegemônicas instituídas na universidade e no

estabelecimento estudados. Para tanto, analisaram-se documentos de domínio público

da universidade no formato de resoluções, regimentos e estatutos. Ao analisar um

conjunto de documentos que se referiam direta e indiretamente às questões pedagógicas,

observaram-se algumas características que ajudam a consolidar alguns caminhos e

escolhas pedagógicas. O regimento geral da universidade incentiva o caráter disciplinar

quanto à concepção curricular, definindo que “a unidade de ensino é a disciplina” e que

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“disciplina é um conjunto sistematizado de conhecimentos afins, correspondente a

número determinado de créditos”, notadamente em seus artigos 65, 66 e 67 (DOC-42).

Neste sentido, o estatuto da universidade referenda o caráter disciplinar do currículo ao

definir o currículo como “conjunto articulado de disciplinas, adequado à conquista de

determinada qualificação universitária”, em seu art. 62 (DOC-43).

Em seu artigo 70, o regimento geral da universidade suscita que as disciplinas

devem acontecer de maneira integrada, mas deixando transparecer que o termo

‘integrado’ utilizado se refere ao tipo de articulação entre as disciplinas que acontece na

lógica dos requisitos (pré-requisitos) (DOC-42). Essa lógica dos requisitos é observada

com grande intensidade na grade curricular dos cursos oferecidos no estabelecimento de

ensino onde esta pesquisa se desenvolve, em que as disciplinas têm uma articulação

visível na lógica dos requisitos (DOC-24; DOC-25).

O sistema de gerenciamento da graduação da universidade, criado na década de

1990, com início de suas atividades na pré-matrícula de 1998 (DOC-44), tem por

finalidade oferecer um espaço mais organizado de “gerenciamento da graduação”, onde

o estudante pode acompanhar seu desempenho acadêmico, emitir documentos,

matricular-se nas disciplinas, dentre outros. Existem dois componentes do sistema de

gerenciamento da graduação: um que é de acesso restrito a professores e funcionários; e

outro que está na Internet para acesso dos estudantes e para acesso geral de parte de seu

conteúdo. Além de tornar mais cômoda a vida acadêmica para os estudantes, esse

sistema também facilita para os servidores que trabalham nas seções de graduação,

diminuindo o acúmulo de trabalho destes. A parte corporativa do sistema permite que os

servidores docentes e não-docentes tenham acesso a uma variedade de informações

sobre os estudantes, inclusive uma facilidade que permite que os docentes possam

lançar as notas dos seus estudantes nesse sistema a partir da Internet e de onde

estiverem. Esse sistema também tornou mais acessíveis os dados acadêmicos, tais como

tempo de conclusão de curso, evasões etc., permitindo um melhor planejamento por

parte da Pró-reitoria de graduação. Em sua fase teste 1996-1997, os responsáveis

buscavam ouvir as críticas e sugestões para conseguirem se adequar melhor às

necessidades mais específicas das unidades (REFERÊNCIAS OMITIDAS PARA

PRESERVAR O ANONIMATO).

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273

Entretanto, esse sistema vem sendo aprimorado para que tudo seja integrado e

disponibilizado. As melhorias consideram muito as sugestões, dúvidas e necessidades

dos seus usuários e a equipe desenvolvedora tem trabalhado também na produção de

vídeos e tutoriais para facilitar a utilização desta ferramenta de gerenciamento da

graduação (REFERÊNCIAS OMITIDAS PARA PRESERVAR O ANONIMATO).

Como se pode observar, a universidade conta com um arcabouço de

gerenciamento da graduação e de concepção e prática educacional que indicam,

principalmente, perspectivas tradicionais de ensino, a avaliação que tem como principal

instrumento a prova, que focaliza na nota (somativa e meritocrática) e, cada vez mais

uma transferência de responsabilidade para os indivíduos de alimentar os sistemas,

ressaltando práticas individualistas e individualizantes (o estudante ele mesmo se

matricula nas disciplinas, emite e imprime documentos, os professores devem lançar e

avalizar as notas no sistema, dentre outras questões. Alguns trechos de análise de

encontros de restituição sobre os dados da pesquisa referendam esta perspectiva de que

a depender de como o gerenciamento acadêmico é implementado ele pode induzir

algumas perspectivas educativas:

É, eu acho que isso fica muito claro na estrutura curricular que foi. Ela vai

tornando esse formato mesmo de, é a coisa administrativa, tem que

responder o sistema *** tem os itens lá que eu tenho que pôr no programa,

eu tenho que atender, enfim. Um curso tem que ser igual ao outro, tem que

ser tudo padronizado... – P07 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

você acha que tem que pensar em abertura de turma em abril? Sexta-feira

reunião para ver abertura de turma, da turma que começa em agosto, que é

uma questão administrativa. Não que eu acho que tem que ser em julho, não

é isso, mas assim, espera a disciplina correr um pouco, espera a gente ter

noção de como está sendo o trabalho docente. Sabe? Você tem que propor na

disciplina do ano que vem, sem ter terminado de avaliar essa. – P06 – trecho

de análise durante o encontro 2.1.

É percebido na literatura, que as últimas reformas curriculares porque passou

o(s) curso(s) de enfermagem do estabelecimento estudado realmente impulsionaram as

concepções pedagógicas de perspectivas tradicionais e tecnicistas para perspectivas

mais ativas e renovadas, com alguns movimentos com o desejo de se alcançar a teoria

dialética, histórico-crítica, crítico-reflexiva e ao mesmo tempo refletindo sobre a

experiência das tentativas de implementação de um currículo problematizador

(REFERÊNCIAS OMITIDAS PARA PRESERVAR O ANONIMATO).

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274

Entretanto, a literatura também oferece algumas pistas implícitas de

atravessamentos que culminaram com apostas em modelos formativos densamente

mergulhados em perspectivas neoliberais, tais como as aprendizagens por competências,

que respondem à lógica do mercado de trabalho liberal, mesmo que em perspectivas

apontadas como dialógicas (LIMA, 2005), pois estas também não tratam de forma

favorável no processo de ensino-aprendizagem as questões das desigualdades de classe,

causadas pela centralização do poderio capitalista, e o mesmo para as aprendizagens

significativas e as metodologias ativas (PARANHOS; MENDES, 2010), cuja influência

nasce no seio das teorias cognitivistas ausubelianas e rogerianas e sob influência

primordial das tendências pedagógicas escolanovistas de orientação positivista

(FARIAS et al., 2011). Isso se passa exatamente em um período em que o próprio

Estado já vinha de movimentos de reformas gerencialistas (Nova Gestão Pública)

também de orientação neoliberal, com pinceladas da vertente societal que se anunciava

sutilmente com a ascensão da aliança popular-nacional no governo do Brasil

(BRESSER-PEREIRA, 2002a; b; PAULA, 2010; DASSO JÚNIOR, 2014). Aqui já se

percebe a influência da atualização neoliberal que a instituição Estado vem sofrendo no

Brasil, induzindo processos neoliberalizantes sobre a universidade pública e sobre as

concepções e práticas pedagógicas dos docentes-enfermeiros.

É diante desta breve contextualização que se formula o efeito peneira sobre as

concepções pedagógicas dos docentes universitários enfermeiros, pois ao analisar a

estrutura curricular contida nas entrelinhas da universidade, por meio de seus

documentos instituídos (regimento geral, estatuto, resoluções etc.), e documentos

instituintes (relatórios de gestão da pró-reitoria de graduação, divulgações públicas

relacionadas à questão da docência no ensino superior etc.), dentre outros, percebe-se

com maior clareza a estruturação da perspectiva neoliberal dentro da universidade e a

disseminação e fixação de seus conceitos e ideologias, por meio da infiltração de

terminologias instrumentais, mercadológicas, globalizantes etc. nos documentos, nos

vídeos, na estruturação dos sistemas de ‘gerenciamento’ utilizados pela universidade

(palavras do tipo eficiência, empreendedorismo, etc.). Nesse sentido, por um lado, vai

sendo construído um arcabouço de sustentação para as perspectivas, concepções e

práticas pedagógicas que se fundamentam na ideologia neoliberal, positivista

(tendências tradicional, renovada, tecnicista). Por outro lado, todas as outras concepções

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que não se fundamentam estruturalmente nestas abordagens, não encontram pilares de

sustentação e ao efeito da peneira, se diluem e escorrem, não permanecendo.

É possível perceber esse efeito tanto nos discursos docentes como na trajetória

construção-reconstrução curricular dos cursos oferecidos pelo estabelecimento de

ensino onde a pesquisa foi realizada. Estudos recentes apontam que o visado currículo

integrado não aconteceu para um dos cursos estudados, havendo algumas disciplinas

integradoras trabalhando na lógica da problematização (nove disciplinas) e muitas

outras disciplinas trabalhando na lógica tradicional (cinquenta e três disciplinas)

(REFERÊNCIAS OMITIDAS PARA PRESERVAR O ANONIMATO), ou seja, nem

se chegou a operacionalizar de fato a transição para o modelo integrado de currículo. Ao

longo dos anos, das disciplinas integradoras oferecidas na modalidade do ciclo

pedagógico, com uso do portfólio reflexivo, a maioria foi progressivamente

abandonando esta perspectiva e retornando às modalidades mais positivistas de ensino,

perdendo parte importantíssima de sua característica fundadora de formar para a

transformação e a consolidação do SUS.

Some-se a isto, nesta pesquisa, alguns relatos dos participantes que enunciaram

outra preocupação. Professores que lecionam em disciplinas que ainda utilizam

propostas pedagógicas orientadas pela problematização, pelo ciclo pedagógico e pela

teoria dialética/crítica e que, portanto, demandam conformações estruturais específicas

para acontecerem, tais como maior quantidade de tempo de dedicação ao ensino e ao

acompanhamento da aprendizagem, número maior de professores por turma, dentre

outras, estão relatando que, diante das não reposições de professores aposentados, dos

cortes da universidade (o que já foi apresentado nos outros efeitos), estão tendo que

fazer adaptações pouco sólidas para continuarem trabalhando nesta perspectiva

pedagógica. Essas adaptações se referem a aumentar ainda mais o tempo de dedicação

às atividades de ensino, aumento do número de estudantes por grupo e por professor.

Neste efeito, entende-se que estas disciplinas ou estas perspectivas pedagógicas

estão sendo peneiradas até o momento em que não se tenha mais nenhum recurso em

que se sustentar e se sucumba às perspectivas pedagógicas que se “encaixam” melhor na

estrutura neoliberal em progressiva edificação neste local de pesquisa, assim como na

universidade estudada e também pelo mundo, em que três ‘E’s se enraízam cada vez

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mais fortemente nos estabelecimentos formadores (Excelência, Empreendedorismo,

Empregabilidade) (NÓVOA, 2015). Os seguintes trechos de análise de restituição

individual e de anotações em diário de pesquisa ilustram este efeito:

Se já tínhamos algumas dificuldades, elas vão se acirrar um pouco mais

tanto devido às cobranças e também pelas limitações, por conta dos cortes

[...]. Talvez, teremos que tentar outras articulações em que a gente saia

perdendo e o estudante também [...]. Será preciso repensar o jeito de fazer, o

jeito de ensinar. Como a gente consegue reestruturar com menos recursos? É

aquela questão – em tempos de crise, é preciso ter criatividade. Então, a

gente vai ter que repensar e usar a criatividade para ver como vai trabalhar

– P02 – trecho de análise durante uma restituição individual.

Em encontro informal com P03 no estabelecimento de ensino, ela reportou

que “vamos precisar repensar como trabalhamos na disciplina, pois estamos

com menos professores”. Ela referiu que devido aos cortes, e com os

rearranjos que foram sendo feitos, talvez terão que trabalhar com maior

número de estudantes por professor – o questionamento que fica é o quanto

esta situação tem potencial inviabilizador das perspectivas emancipatórias, tal

como o uso do ciclo pedagógico, a perspectiva de avaliação formativa, o

acompanhamento atento, dentre outros aspectos (ANOTAÇÕES DO

DIÁRIO DE PESQUISA).

P10 também reportou com muito pesar que sua disciplina que usa

metodologias ativas (mesmo que na perspectiva cognitivista e psicomotora)

está sendo pressionada por conta das aposentadorias, das não contratações,

etc. a retornar para as modalidades expositivas (Pedagogia tradicional

positivista), que poderia aproveitar melhor os professores, com turmas

numerosas e um trabalho mais generalizante (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO

DE PESQUISA).

eu não sei até quando a gente vai resistir a esse modelo. Vou dar um exemplo

claro, com a aposentadoria de algumas colegas da área em que eu leciono,

eu não sei até quando a gente consegue manter essa proposta pedagógica

por uma questão numérica, como é que vamos conseguir trabalhar com 150

alunos das três disciplinas de cada semestre com três professores, dentro de

uma proposta de trabalhar com 10 estudantes por professor. Eu posso

querer, eu posso fazer, mas a instituição talvez não me dê condições para.

Então, não basta apenas aquilo que eu acredito, que minha colega acredita.

Existe uma série de outros fatores que independem da gente que acabam se

colocando nesse processo – P06 – trecho de análise durante uma

restituição individual.

Ainda, o seguinte trecho de análise durante um encontro de restituição de dados

enuncia uma preocupação com relação à dissolução de disciplinas com fundamentação

nas áreas de humanas, que são fundamentais para o cuidado em enfermagem:

A *** falou do cuidado, né, é nós não estamos formando o enfermeiro para o

cuidado. O cuidado ele precisa de outras áreas de conhecimento... que vão

estar compondo para formar um aluno, um profissional, um enfermeiro que

vai cuidar. O que nós estamos fazendo? Excluindo as disciplinas de ciências

humanas da nossa área, estão excluindo... Nós estamos tirando, nós estamos

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no departamento sem professor de área de didática, de sociologia e de

psicologia, anos a fio, e isso tem importância? Não tem, por quê? Porque a

área da saúde acha que dá conta de formar o profissional sem que essas

áreas. São poucas pessoas que... Então, são poucas as pessoas que pensam,

né, que a formação de um profissional depende de outras áreas do

conhecimento, né. Então eu acho que esse movimento nós não estamos

fazendo... – P08 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

Antes de passar para o analisador resistência (análise pelas resistências), é

interessante acrescentar que em conversa informal com professores de três diferentes

instituições em três estados brasileiros (Alagoas, Minas Gerais e Santa Catarina), cujo

encontro se deu em evento importante sobre a educação em enfermagem, algumas

reflexões foram mobilizadas:

Em conversa com três professores enfermeiros (Alagoas, Minas Gerais e

Santa Catarina) sobre a docência no ensino superior, em momento informal,

refletimos sobre alguns pontos (condição/condicionamento docente;

produção científica; tempo docente; dinheiro; concepções pedagógicas).

Perpassamos como o trabalho e o tempo docente está cada vez mais voltado

para produzir aquilo que traz dinheiro para a universidade, num movimento

em que o docente quer/precisa estar menos na graduação (tempo) para poder

ser mais produtivo e corresponder às pontuações mínimas estabelecidas para

a manutenção no credenciamento da pós-graduação, além de que isto está

ficando cada vez mais atrelado à progressão na carreira e aumento salarial

(ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

E, nesse caminho, durante um momento de novas entrevistas, uma participante

ressalta que a partir das propostas gerencialistas, e suas consequências para a

universidade e para a docência, as pessoas têm se afastado da prática pedagógica. Tal

reflexão é apresentada no seguinte trecho analítico:

Nessa turma, por exemplo, que eu estou dando aula, uma turma com mais de

50 alunos e a sala tem, acho que 48 cadeiras, então, o espaço é pequeno

para a gente fazer dinâmicas participativas. Você, então, conhece muito bem

isso. Eu até adoro trabalhar assim, mas tem assuntos também que eu vejo

que uma aula expositivo-dialogada também dá conta. Por exemplo, estudo

teórico do exame físico, como que eu vou fazer isso, artigos, complicado.

Técnica, você tem que demonstrar em fotos, slides e tal, e depois a gente faz

a prática, tem uma aula só de prática antes de eles irem para a prática

efetivamente no hospital, nas unidades básicas. Então, eu penso que, mais ou

menos é isso o que acontece, que é, esse profissionalismo, gostei disso,

profissionalismo gerencialista que vai acontecendo vai, as pessoas vão

realmente se afastando da prática pedagógica, da prática docente, e uma das

exigências dessas metodologias ativas como se fossem também a panaceia

que vai resolver tudo e não vai, mas que a gente poderia introduzir com mais

frequência – trecho analítico de nova entrevista com professora-

enfermeira da região sudeste do país – PC04.

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RESISTÊNCIA COMO ANALISADOR DA ‘DOCÊNCIA NO ENSINO

SUPERIOR E O PROFESSOR-ENFERMEIRO’

A análise a partir das ou pelas resistências, permitiu olhar de outro ângulo para a

instituição “docência no ensino superior e o professor-enfermeiro”, revelando o

potencial analisador que portam as resistências. Com relação ao analisador resistência

sobre a docência no ensino superior, foi possível produzir dados junto aos participantes

que sinalizaram alguns efeitos, tais como o efeito adaptação-resistência, o efeito

adoecimento-resistência e o efeito alastramento-resistência.

Efeito Adaptação-Resistência

Tomaremos aqui o conceito de resistência como uma força que se opõe ao

poder, mesmo entendendo que na tentativa de equilíbrio o poder sempre se sobressai.

Assim, os polos da resistência contemplam tanto lutar contra forças opressoras, como

um movimento de manter as coisas como já estão – movimento que se assemelha com a

ideia, respectivamente, de instituinte e de instituído, no processo de institucionalização

(MONCEAU, 1997a; 2002; DOBIES; L'ABBATE, 2016). Nessa direção, a análise

pelas resistências se processa considerando também o contexto sociopolítico

(MONCEAU, 1997a), colocando a resistência como mais um dos analisadores da

instituição “docência no ensino superior e o professor-enfermeiro” nesta pesquisa.

Para tanto, o autor propõe alguns momentos de análise pela resistência,

ressaltando seu movimento dialético, dinâmico, em que a resistência vai se atualizando

e se ‘com-formando’, se expressando também por meio de algumas interferências,

marcadas pelo autor como zonas de interação entre os momentos da resistência

(MONCEAU, 1997a). A figura seguinte ilustra o conceito produzido por Monceau

(1997), a qual foi traduzida por Dobies e L’Abbate (2016):

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Figura 2 - Representação da dialética dos três momentos do conceito de resistência.

Criado por Monceau (1997) e traduzido por Dobies e L'Abbate (2016).

No ensejo de continuar um pouco mais na produção deste conceito, o autor

ressalta a necessidade de olhar para este esquema representacional para além de uma

captura de uma fotografia instantânea, capturando a dinamicidade e dialeticidade

operacionais da resistência. Para tanto, o autor explora três momentos (defensivo,

ofensivo, integrativo) e suas respectivas zonas de interferência (MONCEAU, 1997a).

O momento defensivo é produzido no sentido de exprimir um movimento em

que a autodissolução prevalece sobre o movimento de institucionalização, uma vez que

poder e resistência se confrontam. Nesse sentido, a resistência busca destruir o poder e,

consequentemente, desaparece também. Trata-se de um momento conservador,

contemplando: intransigência (preservação de si, sem compromisso com o poder);

destruição do poder (o poder, ao ser atacado de modo anti-institucional, se fortalece

cada vez mais e o atacante consegue sua própria autoexpulsão do sistema, uma vez que

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não possui um plano alternativo); sobrevivência/sobrevida (defesa da integridade física,

psíquica, coletiva em experiências extremas) (MONCEAU, 1997a).

O momento ofensivo se identifica com a resistência, constituindo um novo poder

na lógica contrainstitucional. Assim, a resistência é dinâmica no sentido de ser

instituinte de novas formas de poder, contra as quais podem manifestar também novas

formas de resistência. Este momento se constitui de: integração conflituosa (a própria

constituição de um novo poder acontece na contradependência do próprio poder,

especialmente quando adota um modo de agir institucional); construção de um novo

poder (ao se institucionalizar, a resistência se transforma no seu contrário: o poder);

intransigência (o novo poder em construção refuta qualquer compromisso com o poder

dominante: dissidência) (MONCEAU, 1997a).

O momento integrativo representa uma alternativa entre os momentos ofensivo e

defensivo, não se estabelecendo necessariamente entre os dois. Se a autodissolução não

tem mais força que o movimento de institucionalização, então, a resistência é

assimilada, saindo do espectro observável. Entretanto, os efeitos são percebidos quando

dos conflitos e disfunções nos estabelecimentos, culminando com encomendas

socioanalíticas. Ele se apresenta como: sobrevivência/sobrevida (aparecimentos de

contraplanos, falsificações, dissimulações, absenteísmos, preservação de zonas de

incertezas, retiradas/saídas, desafeições, ou seja, estratégias para se manter integrado e

protegido); assimilação (surgimento de formas adaptativas, tais como: adaptação,

sobreadaptação, conversão, identificação); integração conflituosa (integração de grupos

minoritários a grupos maiores) (MONCEAU, 1997a; DOBIES; L'ABBATE, 2016).

Desse modo, da resistência partem três eixos centrífugos, um rumo ao

desaparecimento do poder (pela sua destruição), outro rumo ao desaparecimento da

resistência (pela sua assimilação ao poder), e um último rumo à constituição de um

novo poder (pela construção de uma alternativa) (MONCEAU, 1997a).

É nesta direção que foi constituído o efeito adaptação/resistência nesta pesquisa.

Este efeito se relaciona com todos os outros efeitos e interfere diretamente na atuação

docente e na concepção pedagógica.

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Para se explorar esta questão, é necessário resgatar a trajetória da construção

curricular e do projeto político-pedagógico do estabelecimento formador desde as

discussões para reformulação dos mesmos, dizendo de passagem que um dos cursos

(licenciatura) foram criados em meio a essas discussões. A reformulação do currículo

do curso de bacharelado teve sua implementação em 2005 e o curso de licenciatura e

seu respectivo currículo foram implementados em 2006. Alguns elementos ajudam

nesse olhar. Em entrevista, alguns participantes disseram que atuaram ativamente nas

mudanças curriculares e que, à época, ocupavam posições-chave (coordenações de

cursos e de graduação, chefias de departamentos, por exemplo) com influência direta no

processo de institucionalização de um currículo baseado na teoria dialética, nas

metodologias ativas e na formação por competências. Foi referido que se aproximaram

destas perspectivas formativas muito mais pela ótica procedimental e metodológica que

pelos fundamentos teóricos e pedagógicos dessas escolhas. Os seguintes trechos de

entrevistas individuais e anotações de reflexões em diário de pesquisa ilustram esta

questão:

É... não eu não tenho curso de licenciatura. Eu fiz um curso de formação de

professores da própria Pró-reitoria de graduação [...] e uma outra

aproximação pedagógica foi o projeto larga escala [...]. Então, essa é minha

formação e, depois, eu fui me aproximando até devido à minha atuação na

própria universidade na comissão de graduação e a gente assumiu a

responsabilidade de coordenar o processo de construir o projeto político-

pedagógico, criar novo curso, então, nós fomos buscando. Então, dentro da

área da pedagogia, a minha formação, basicamente, é o curso de pedagogia

universitária da Pró-reitoria de graduação. E o resto de estudos, discussões,

participação em assessorias, que nós tivemos aqui. Então, eu também sinto

que é uma pena a gente não ter tempo disponível para conseguir se

aprofundar e eu tenho dificuldade sim... eu acho que a gente se aproximou

muito mais na prática de concepções pedagógicas, do que do referencial

teórico antes [...]. A gente aprendeu na prática, nós aprendemos fazendo e

tem muito... poderia ser muito mais proveitoso, muito mais rico se a gente

tivesse tido a oportunidade de discutir isso, estudar mais – P07 – trecho de

entrevista individual.

Então, sempre tinha uma técnica de grupo que a gente utilizava nas

disciplinas. E aí... isso tudo meio que no senso comum, né, sem ter uma...

pensar que isso era uma estratégia ligada a uma tendência pedagógica, na

época eu nem pensava isso. Aí, depois fazendo esses cursos, eu fui me

aproximando mais de alguns referenciais teóricos é... da pedagogia e

quando eu fiz o curso de especialização, o curso inteiro ele foi montado é...

com a utilização de ciclo pedagógico. Então, ele... eu não entendi muito bem

também. Ele tinha um instrumento que era o portfólio é... a gente trabalhava

com relatos de prática, síntese provisória, nova síntese. Ele foi um curso

oferecido pela Fiocruz, né, pelo Ministério da Saúde "Formação de

Professores da Área da Saúde", um curso específico para professores. Na

época, eu era coordenadora do curso de bacharelado daqui da escola.

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Então, eu achei que era importante eu fazer esse curso e entender mais isso.

E foi aí que me despertou um olhar para outro modelo de ensino, né. E, a

partir de então, eu comecei a estudar mais eu tenho uma aproximação, né,

com a... a tendência pedagógica da abordagem crítica, né. Estudei bastante

o Saviani e estudo. Não tenho nenhuma... não sou pedagoga, sou enfermeira,

mas tenho me aproximado mais dessa abordagem pedagógica e eu gosto

bastante e acredito nela – P08 – trecho de entrevista individual.

Entretanto, é preciso explicitar que estes participantes faziam, naquele

momento, resistência ao modelo tradicional curricular e de ensino, ou seja, se

opunham ao instituído enquanto modelo formativo tradicional e buscaram,

para isso, a construção de um poder alternativo, ocupando posições-chave

dentro do estabelecimento a partir de onde conseguiriam fazer uma

mobilização suficiente para a constituição de um novo poder que permitisse

repensar o modelo formativo. Esta feita foi galgada em termos de escrita dos

projetos político-pedagógicos e implementada enquanto à mudança dos

nomes de algumas disciplinas que passariam a ser os eixos integradores da

formação, juntamente com um aparato de instrumentos formativos e

avaliativos (portfólio, método do ciclo pedagógico, aproximação centros

formadores-serviços de saúde, dentre outros que respondiam melhor às

encomendas do Ministério da Saúde e Ministério da Educação em relação à

Educação e à Formação de profissionais da Saúde). Tudo isso se passou em

momento em que a pró-reitoria de graduação era conduzida por uma

estudiosa da educação. (ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA).

Naquele momento, a resistência (o momento defensivo) por parte dos

opositores à mudança curricular se manifestou de diversificadas formas

contra a institucionalização dessas novas perspectivas curriculares, utilizando

a própria dificuldade do grupo em implementar essas novas práticas de

ensino em outras perspectivas pedagógicas, das quais não se tinha ainda o

domínio suficiente, integrando alguns dos estudantes na defensiva, apoiando

o movimento conservador do currículo anterior e mais bem conhecido pelo

grupo docente (o currículo tradicional) com discursos do tipo “para que

mudar algo que estava dando certo”, “não se mexe em time que está

ganhando”, dentre outros. Isso já anunciava um desejo de não mudar por

parte de algum grupo de resistência a essa mudança. Houve até mesmo

manifestações ‘por parte dos estudantes’ para retorno ao modelo anterior e

mais conhecido de formação (REFLEXÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA A

PARTIR DE EXPERIÊNCIAS VIVIDAS).

Como a argumentação não foi suficiente para conseguir derrubar a reformulação

curricular, tudo se encaminhou, momentaneamente, para um momento integrativo, tal

como elaborado por Monceau (1997). A dissimulação fica evidente nos seguintes

trechos de reflexão do diário de pesquisa e de entrevista individual:

Para sobreviverem nesse momento, grupos implementam formas de

resistência baseados na dissimulação (disciplinas e práticas permanecem

como o eram antes, apenas com novos nomes e contornos etc.), preservando

uma zona de incerteza (o mito do não saber pedagógico: “não tivemos

formação para a mudança”, “não sigo nenhum referencial pedagógico”,

dentre outros) (REFLEXÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA A PARTIR DE

EXPERIÊNCIAS VIVIDAS E DADOS PRODUZIDOS AO LONGO DA

PESQUISA).

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Está lá escrito, só que na hora da operacionalização é muito difícil. [...] nós

temos um currículo híbrido ainda. Então, tem professor que trabalha nessa

lógica, tem professor que trabalha numa lógica mais tradicional com

algumas inovações em sala de aula, tem professor que trabalha numa linha

muito tradicional e o aluno quando ele vai para a sala de aula, que o

professor vai operacionalizar, vai estar em ação, o aluno também tem

dificuldade, porque aí ele não sabe, ele fica, ele não sabe por que o professor

está fazendo pergunta, porque o professor está instigando ele a pensar,

porque aí eu acho que vem daí a questão da abordagem crítica, da

aprendizagem significativa. Então, o aluno acha também que o professor tem

que trazer tudo pronto. E quando o professor não traz, o professor está

deixando de ensinar – P08 – trecho de entrevista individual.

Com a saída de algumas pessoas de posições-chave de chefias de

departamentos, de direção da unidade, de presidências de comissões

organizadoras de curso e comissões de graduação, notadamente a partir de

meados de 2012, percebeu-se, então, a oportunidade de implementação de um

novo movimento ofensivo de resistência com a finalidade de retorno às

perspectivas tradicionais de ensino, com especial ênfase para o currículo do

curso de licenciatura que tinha conseguido ser mais amplamente

implementado no novo modelo curricular e estava sendo atacado e destruído,

de acordo com uma fala pública de um de seus professores em evento de

formatura (ANOTAÇÕES DE REFLEXÕES EM DIÁRIO DE PESQUISA).

Nesse sentido, um novo movimento consegue maior sustentação no discurso de

crise financeira da universidade pública que passa a olhar suas atividades a partir da

perspectiva de gasto, apoiando-se também no discurso da excelência, eficiência,

eficácia, empreendedorismo, empregabilidade (DOC-28; DOC-29; DOC-45; DOC-46;

DOC-47; DOC-48; DOC-50; DOC-56). Discursos como “precisamos aproveitar melhor

os nossos recursos humanos” começam a ser o lema desse novo momento ofensivo de

resistência ao modelo curricular que, até então, estava em fase de implantação em uma

vertente crítica e dialética para responder aos preceitos formativos para a consolidação

do SUS. Começa a imperar o currículo da praticidade, da ‘inovação prática’, ou seja,

inovação como sinônimo de tecnologias duras e instrumentais (e-books, plataformas de

interação virtual, videoaulas, foco na didática instrumental, dentre outras), das

avaliações somativas travestidas de diagnósticas, tal como testes generalizadores e

focados em conteúdos exclusivamente cognitivos, intitulados com termos do tipo “teste

de progresso” (DOC-56), dentre outros (REFLEXÕES A PARTIR DE ANOTAÇÕES

EM DIÁRIO DE PESQUISA E SOBRE EXPERIÊNCIAS VIVIDAS).

Desse modo, essa resistência aos currículos críticos e dialéticos tem se alinhado

com os novos pressupostos neoliberais e gerenciais da universidade, passando a ocupar

um lugar hegemônico nas decisões do estabelecimento de ensino e encontrando

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fundamentações a partir das decisões mais gerais da universidade, o que tem legitimado

algumas decisões sobre os currículos dos cursos. Assim, tem-se percebido, pelo menos

dois movimentos.

O primeiro justifica sua existência a partir dos efeitos causados sobre a docência

universitária advindos de um modelo de universidade hegemônico em construção

baseado nos princípios neoliberais e positivistas, que espelham suas escolhas em

perspectivas instrumentalizadoras, generalizadoras e focadas em um processo de

produção de conhecimentos, entendidos como produtos quantificáveis e passíveis de

serem analisados/avaliados/medidos por meio de fórmulas matemáticas e estatísticas.

Um exemplo deste processo são as avaliações CAPES (agência reguladora) sobre os

programas de pós-graduação e a avaliação de produtividade dos docentes da

universidade de acordo com seus regimes de trabalho e evolução na carreira (esse

movimento vem se constituindo na direção do que já se discutiu aqui quanto ao efeito

checklist, pois departamentos e unidades estão discutindo com seus docentes os critérios

para avaliar seus docentes e tem imperado uma perspectiva bastante quantitativa) e

seguindo as mesmas ideologias hegemônicas presentes na universidade na lógica da

performatividade e meritocracia. Esse movimento se alinha com a resistência ao

currículo dialético e crítico, porque o currículo nesta lógica oferece riscos à efetiva

consolidação da universidade-empresa, pois demanda maior envolvimento docente,

maior tempo de dedicação docente ao ensino, o que não é viável para o modelo

hegemônico (neoliberal e gerencialista) de universidade que se está por construir –

economia de tempo provoca cortes em referenciais teóricos que necessitam de maior

tempo de dedicação docente. Alguns professores se integraram a esse movimento quase

que de forma instantânea, por assimilação, colocando-se em uma posição defensiva e

contra à continuação da implementação dos currículos na perspectiva dialética e crítica

(REFLEXÕES A PARTIR DE ANOTAÇÕES DO DIÁRIO DE PESQUISA). Outros

professores acabam entrando no movimento de assimilação por não terem outra opção a

fazerem, naquele momento, como mostra o seguinte trecho analítico de uma restituição

individual:

Primeiramente, precisamos avaliar melhor todo o processo, para a gente

conseguir olhar de forma mais crítica, para conseguir em espaços mais

formais de negociação, para mudar isso. Sem um diagnóstico mais

formalizado, fica difícil conseguir mudar. A gente é pesquisador e a gente

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sabe que a gente precisa de evidência científica para conseguir mudar isso.

Então, a gente precisa investir um pouco mais nisso, para conseguir

negociar nos espaços, senão ficamos pisando no mesmo lugar. Investir em

estudos na área da educação, como o seu estudo, já é um caminho que vai

dar mais respaldo para isso. Nesses últimos anos com as mudanças todas da

universidade, a gente fica um pouco sem saber o que fazer, um pouco de

insegurança, mas a gente vai dançando conforme a música. Cada hora é

uma novidade e você tem que se adequar. A gente tem sim certa autonomia

em relação a outras instituições, mas a gente tem perdido um pouco essa

autonomia – P02 – trecho de análise durante uma restituição individual.

O segundo movimento, ao contrário, justifica sua existência ao se negar a aceitar

um modelo de universidade focado em quantificações que descaracterizam o papel

fundante da universidade e seu caráter formativo e intrinsecamente relacionado com a

sociedade. Nessa direção, professores contra-hegemônicos referem resistir às

imposições do modelo hegemônico em construção. Entretanto, para tal, lançam mão de

dispositivos pouco estruturados, dissolúveis e tendentes ao fracasso. Exemplo deste

dispositivo de resistência é: aumentar a própria carga horária de dedicação semanal ao

ensino de graduação para superar a diminuição de docentes, com a finalidade de manter

o oferecimento de disciplinas em perspectivas formativas diferentes que demandam

maior quantidade de tempo docente, o que permite que algumas perspectivas

metodológicas, avaliativas e pedagógicas permaneçam quase que inalteradas. Um efeito

rebote deste dispositivo de resistência escolhido pelos professores se refere à questão da

produtividade científica, uma vez que o professor ao utilizar mais tempo para a

dedicação à docência para conseguir manter os modelos formativos críticos e dialéticos,

acaba se distanciando um tanto mais da produção de conhecimento (hegemônica) em

forma de artigos, livros, participações em eventos, internacionalização (que fazem parte

do modelo CAPES de avaliação e da maneira como são e serão avaliados pela

universidade enquanto docentes), empobrecendo-se com relação à moeda de troca para

conseguir financiamentos de projetos, ocupar cargos e funções, ascender na carreira, e

alcançar posições que permitam maior articulação entre pares para a manutenção e/ou

criação de dispositivos que sustentem modelos de universidade mais alinhados com o

social. Os seguintes trechos, um de análise em restituição individual e outro em

momento de restituição coletiva dos dados, trazem essa ideia:

eu acho que o movimento econômico, pelo próprio nome, por envolver

economia, por envolver dinheiro, envolve poder. Não quero ser pessimista,

mas acho difícil organizarmos um movimento forte de resistência que mude

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esse cenário! Onde vejo que posso e tenho tentado fazer mudanças, porque é

difícil unir a pessoas porque cada um entende e pensa de um jeito diferente,

eu acho que é fazer o trabalho de formiguinha mesmo, tentando disseminar

de formiguinha em formiguinha e daqui a pouco temos um formigueiro

inteiro de pessoas pensando e fazendo um movimento contra – P06 – trecho

de análise durante uma restituição individual.

Eu acho que têm umas coisas que a gente precisa pensar, né, como nós

estamos fazendo esse movimento de resistência, né, a gente responde a tudo.

Eu estou falando agora assim, eu fui chefe de departamento, então eu acho

que eu estou falando como uma pessoa que ocupou esse espaço né, é, vem

uma ordem, né, do órgão superior chega na unidade, a gente vai

respondendo sem fazer uma análise daquilo. Então, a gente tem que fazer

tudo, tudo, para poder responder àquilo que eles querem. Eu acho que para

tudo a gente estava fazendo isso, né, a gente não faz um movimento de

resistência coletivo. – P08 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

De certo modo, pode-se perceber que ao estarem tão envolvidos com seus

referenciais pedagógicos e atacados por vários lados nesse modelo de universidade-

empresa, os professores acabam deixando passar o importante papel de resistência

defensiva – o que pode indicar certo grau de sobreimplicação, ou seja, suas verdades e

certezas podem ofuscar uma análise mais criteriosa da situação.

O primeiro movimento se alinha com um movimento de adaptação às novas

exigências do modelo hegemônico de universidade em construção, referindo que,

devido às mudanças ocasionadas pelo modelo do corte de gastos assumido pela

universidade a partir de 2010, terão que retornar a modelos de ensino mais alinhados

com perspectivas tradicionais de ensino, adaptando-se para obedecer às exigências e

continuar na linha de frente das produções, encomendas e demandas da universidade, e

de um tipo de produção de conhecimentos, focado nos produtos quantificáveis (artigos,

capítulos, livros, internacionalização etc.). Trata-se de abandonar qualquer inovação

curricular que se tenha ousado fazer em outra direção do que é encomendado pela

universidade operacional (Chauí, 1999). Isso se aproxima muito com o efeito peneira,

referido anteriormente.

Nessa direção, ao colocar as resistências como analisador, foi possível produzir

uma segunda acepção deste termo, como um movimento contrário e questionador da

perspectiva hegemônica, revelando uma postura de manter-se em determinadas escolhas

(custando o que custar) o máximo possível. Entretanto, não é apresentado e nem

mencionado nenhum mecanismo de resistência de largo alcance que possibilite

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organizar uma resistência efetiva. É um movimento que visa destruir o poder

hegemônico, sem plano de ação concreto. Esse grupo tem resistido dentro de suas

poucas disciplinas, por enquanto.

Alguns professores se dizem imobilizados diante das desconstruções que têm

sido implementadas na universidade, no estabelecimento de ensino, nos currículos. O

seguinte trecho de restituição individual sinalizou isto:

eu não sei até quando a gente vai resistir a esse modelo. Vou dar um exemplo

claro, com a aposentadoria de algumas colegas da área em que eu leciono,

eu não sei até quando a gente consegue manter essa proposta pedagógica

por uma questão numérica, como é que vamos conseguir trabalhar com 150

alunos das três disciplinas de cada semestre com três professores, dentro de

uma proposta de trabalhar com 10 estudantes por professor. Eu posso

querer, eu posso fazer, mas a instituição talvez não me dê condições para.

Então, não basta apenas aquilo que eu acredito, que minha colega acredita.

Existe uma série de outros fatores que independem da gente que acabam se

colocando nesse processo. E eu não vou ser hipócrita de dizer um ano, dois

anos, três anos, eu aguento, por exemplo, duplicando a minha carga horária,

tendo 20 horas de aula por semana, mas eu não vou conseguir fazer isso

para o resto da minha vida para suportar uma proposta que eu acredito, mas

a minha saúde e a minha qualidade de vida também está em jogo. Hoje eu

tenho medo de que se daqui a cinco anos a gente vai estar dentro desse

modelo ou se a gente vai ter voltado àquelas aulas chatas em que a gente põe

50 alunos dentro da sala e apresenta os conteúdos e eles copiam, fazem uma

prova, e pode ser uma prova um pouco mais que façam com que eles pensem

um pouco mais e individual e pronto! Não porque a gente queira, mas

porque esse modelo nos força a. Hoje não existe perspectiva de

preenchimento da vaga de *** que está em vias de aposentadoria. Sem ela a

gente consegue, porque está em quatro, mas a professora *** também já

disse que até o final do ano está aposentando. Aí, estaremos em três e como é

que vai ser? É uma força muito poderosa e eu acho que as pessoas não

percebem isso ou não querem perceber porque por outro lado esse modelo

traz um pouco mais de conforto, de facilidade, as coisas são mais práticas,

mais fáceis, mais acessíveis no sentido de muito consumismo. Então, as

pessoas acabam se seduzindo um pouco por isso e acabam não vendo o

impacto disso no futuro – P06 – trecho de análise durante uma restituição

individual.

É importante destacar que os espaços de discussão estão ficando muito tensos,

segundo analisa a seguinte professora, em momento de restituição individual:

É um processo de erros e acertos, mas ao mesmo tempo esse processo é

muito árduo, porque para fazer isso você tem que enfrentar muita gente, você

tem que bater muita boca, mesmo com colegas, com pessoas que você tem

um bom relacionamento e em alguns momentos, você precisa se colocar e se

indispor para fazer com que aquilo que você acredita tenha alguma valia.

Algumas vezes você ganha, algumas vezes você perde. Faz parte! E esse

processo é bastante desgastante... às vezes, eu me sinto bastante desgastada.

Esse processo de discussão curricular que tivemos há dois anos, foi um

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processo muito triste para mim, porque eu vi que as pessoas não conseguem

entender que a formação do aluno é superior ao meu conteúdo. O que eu vi

foi uma briga por conteúdo, o meu conteúdo é mais importante do que o seu.

Então, eu preciso de 15 horas a mais... ah essa disciplina não vai usar nada

que eles vão usar na prática, então, vamos tirar ela. Muito mais um

egocentrismo por parte dos professores do que olhar para aquele conjunto

de coisas e dizer ok como é que a gente vai fazer com que isso faça sentido

para a formação do enfermeiro? Eu vou continuar fazendo a minha parte,

mas eu não posso deixar de dizer que eu estou... não é enfraquecida, mas

entristecida por várias situações que eu passei durante a reestruturação

curricular que me fizeram me fechar um pouco. Calar um pouco a boca,

sabe? Porque as pessoas não sabem diferenciar que as coisas que são ditas

ali são dentro de um espaço de trabalho e não é uma briga pessoal.

Fortalecida pelos alunos, mas entristecida pelos processos de trabalho que

tenho vivido aí na escola – P06 – trecho de análise durante uma

restituição individual.

Entretanto, apesar de P06 ter citado que havia certa discussão de priorização de

alguns conteúdos sobre outros, quando do início da pesquisa, em encontro final com os

participantes, estes analisam e assinalam uma mudança importante neste sentido, pois

(re)analisam o fato e produzem um novo sentido: um movimento de não querer mais

carga horária de disciplinas – pois como não está tendo muita recontratação de

professores, as brigas por territórios e cargas horárias vão sendo integradas ao

movimento de ‘menos carga horária na graduação’ para se conseguir manter a produção

daquilo que é moeda de troca na universidade. Esse trecho analítico de um encontro de

restituição coletiva coaduna a hipótese de que as concepções gerencialistas estão cada

vez mais se sobrepondo às teorias pedagógicas, quando na fundamentação de escolhas

que interferem no processo de ensino-aprendizagem:

Eu acho que nós estamos indo no movimento contrário, pelo menos nesses

últimos dois anos de “não quero mais carga horária não” nas disciplinas

por conta de não ter professor, eles estão abrindo mão de suas cargas

horárias. – P13 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

Alguns participantes, ainda acrescentam a importância da ocupação de espaços

tanto para fazer enfrentamentos (mesmo que isso desgaste e adoeça o professor, assim

como o coloca em situação delicada com os pares que fazem a resistência em outra

direção) ou mesmo para manter-se atualizado e acompanhando as mudanças (estar fora

destes espaços deixa o professor alheio ao fluxo de informações, dos encaminhamentos

e das decisões). Os trechos analíticos a seguir advindos de encontro de restituição

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coletiva dos dados sinalizam e aprofundam os movimentos de resistência e como têm se

operacionalizado no estabelecimento:

sabe por que? Por que eu acho que você faz muito mais inimizades nessa

situação, mais do que daquela questão da livre concorrência que você

colocou. Eu acho que tem muitas inimizades quando você quer enfrentar as

situações, por acreditar em concepções pedagógicas diferentes. Você arruma

muito mais inimizades na [estabelecimento estudado], você tem dificuldades

de aprovação de uma série de questões, até aprovações de coisas pequenas,

você tem dificuldade. Tem dificuldade de afastamentos, porque as pessoas

começam a te julgar a partir.... Você entendeu? Dificuldade de aprovação de

alunos na pós-graduação. Assim, é um mecanismo de perversidade que se

formam em torno daqueles que se... contrapõe [...] que se contrapõe a esse

modelo neoliberal que o cansaço, que... não é porque a pessoa não tem

motivação, interesse, não acredita naquela mudança, mas você se recolhe,

porque ou você se recolhe se protege, protege o seu trabalho, para você ter

minimamente condições de trabalho, ou você se põe no olho do furação e se

vê, sendo atropelada por uma série de outras coisas. E aqui o jogo de

pressão é muito grande, pressão também vem de vários lados diferentes.

Então, as pessoas acabam mesmo cansando de, de acreditar agua molhe

pedra dura, tanto bate até que fura, não vale. Algumas pessoas aquilo não

vale... – P06 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

Se a gente consegue colocar pessoas também dentro desses espaços né, que

são espaços é... eles são espaços de poder no sentido de se estar

acompanhando um pouco mais próximo, o que vem acontecendo, as

diretrizes, né. Porque quando a gente sai desses espaços parece que você

entra no buraco negro sabe. – P07 – trecho de análise durante o encontro

2.1.

Ainda, apesar de ressaltarem que ocupar posições é um caminho de resistir,

mesmo diante de posicionamentos gerenciais diferentes, as condições em que estas

ocupações de espaços estão se dando, estão causando certa descrença neste dispositivo

de resistência, e as pessoas estão deixando de ocupar espaços e de fazer o embate. O

seguinte trecho analítico de um encontro de restituição de dados denota esta questão:

é eu acho que é resistência mesmo, né, até pela convicção de que isso tem

favorecido a formação de cidadãos, de profissionais comprometidos com a

profissão, com a formação de novos profissionais. Então, eu acho que... essa

resistência, ela nos ajuda, né, acho que a encontrar energia, fôlego, para

continuar nessa... perspectiva de trabalho docente, né, principalmente na

graduação. Encontrar maneiras de manter algumas questões que a gente

acredita que têm valido a pena, é, tem muito pouco ainda, é... se a gente for

pensar em termos do curso que a gente trabalha [...] ainda tem poucas

vivencias, desta perspectiva da formação critica na saúde, com disciplinas

que trabalhem nessa perspectiva um pouco mais na educação, mas que

também entre nós, com concepções diferentes, é, mas pelo menos a gente tem

conseguido, eu não sei até quando... eu não sei até quando a gente consegue

manter estas questões, né. É uma pena que, nesse momento, eu acho que é

reflexo de todo esse embate que a graduação vive, é... que nós estamos aí

numa possibilidade, possibilidade não, vai haver mudança com a mudança

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de direção, um novo é regimento está colocando para a universidade que os

colegiados eles estão vinculados a direção, então, sinalizou os mandatos de

todos os membros, os presidentes e os vice-presidentes, tem que fazer novas

eleições, e as pessoas não estão afim de continuar nesse embate de continuar

nessa resistência – P07 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

Para finalizar este tópico, em momentos de novas entrevistas uma participante

faz uma análise das influências do produtivismo acadêmico sobre o currículo crítico e

dialético, sinalizando algum tipo de resistência que se tem feito. O seguinte trecho

analítico apresenta essa reflexão:

Hoje nós estamos na escola no processo de reforma curricular, a gente não

chegou a isso nessa... nesse cenário onde você está, fazendo a sua pesquisa

que a gente tem uma tendência, inclusive, de aumentar a carga horária, de

voltar para a graduação, mas é muito em função de um grupo que é minoria

e que a gente está fazendo das tripas coração, e a gente não, não, não

permitir que... a graduação e o currículo, ele seja ainda mais sacrificado em

função dessas demandas produtivistas, mas eu confesso a você que isso não é

fácil. Por exemplo, a gente está nisso há muito tempo, se depender de alguns

colegas, inclusive uma grande crítica que fazem é que faz muito tempo que a

gente só pensa, pensa, pensa e a gente não faz, entende? Porque para muitas

pessoas, para a maioria inclusive, mudar currículo, reformar currículo é

mudar a matriz curricular, tira daqui, bota daqui, bota carga horária, não

sei o quê, muda o nome da disciplina e está feita a reforma, não é isso! É

muito mais do que isso e as pessoas não entendem que, para fazer uma

reforma curricular real, a gente tem que discutir coisas que são

fundamentais, não é? Que enfermeiro que eu quero formar? Para quê eu

quero formar esse enfermeiro? Qual a finalidade dessa formação? A quem

vai servir essa formação? As pessoas não querem pensar nisso, né? – trecho

analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região

nordeste do país – PC02.

Outra participante durante momento de novas entrevistas também traça algumas

hipóteses sobre o porquê da resistência a se usar metodologias ativas e referenciais

dialéticos, possivelmente, fazendo um paralelo com o tipo de universidade, e demandas

e encomendas à que estão respondendo e as escolhas pedagógicas possíveis. O seguinte

trecho analítico apresenta esta questão:

A gente já busca, a gente já tem algumas disciplinas que conseguiram

implementar durante toda a programação, conteúdos e episódios com mais

participação dos docentes e dos discentes. Como também tem ainda aquele

professor que não está muito interessado nisso, acho que também se sente

inseguro, porque, como a gente falou lá no começo também, nessa falta

mesmo de aprimoramento, de aperfeiçoamento, é de qualificação, é de se

aprimorar com essas mudanças que vão acontecendo para essa nova prática

docente, que para mim nem é nova. Desde que eu entrei na universidade que

eu ouço falar, até já temos aí Paulo Freire, Brandão, Fals Borda... tanta

gente falando e a gente ainda diz que é uma nova estratégia, uma nova

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didática, uma nova pedagogia e na verdade não é. A verdade, são ideias que

tem resistência muito grande de serem implementadas, encontram uma

resistência ainda muito grande em relação à vertente tradicional, mas eu já

percebo, assim, nos últimos anos uma mescla de que as pessoas já estão mais

preocupadas em envolver o aluno, em trazer práticas e conteúdos mais

relacionados diretamente à prática. Principalmente, aquelas disciplinas no

básico que era antropologia, sociologia, que eram totalmente distante da

prática de saúde e que, hoje em dia, a gente já tem também a preocupação,

assim, como a própria, as próprias disciplinas mais do currículo já formal

mesmo de quando entra já para a prática de enfermagem propriamente [...].

como eu falei uma certa distância, uma preocupação maior de que haja pelo

menos algumas estratégias de ensino mais participativas, isso eu já percebo,

o uso de tecnologias de informática, filme, da web Quest por exemplo, que

usando durante a aula. Então, existe realmente essa questão de resistir, do

não quero, mas, eu acho que esse não quero nem é só questão pedagógica

que, muitas vezes, é a falta mesmo de conhecimento, de informação, de

possibilidade, porque, afinal de contas, a maioria dos professores, acredito

que quase que a totalidade, foi formada pela educação tradicional, pela

vertente tradicional, então, a gente também tem essa dificuldade, desvincular

dessa zona nossa de conforto e de trazermos os slides e ficar naquela

exposição sem fim – é mais cômodo com certeza, deixa a gente muito mais

segura. E quando a gente faz uma aula participativa, que a gente use o ciclo

pedagógico, que a gente use a web Quest por exemplo, que consultando sites

fidedignos que a gente disponibiliza para os alunos os sites e eles buscam

nos sites, e eles constroem as suas, os seus slides e eles depois apresentam e

tal. Quando acaba uma aula dessas, a gente está realmente muito cansada,

demanda muito mais tempo, muito mais energia, muito mais conhecimento e

segurança. E também a segurança de dizer eu não sei. O professor fica meio,

não gosta de se expor, na maneira de dizer, ah eu saí, que hoje em dia eles

procuram tudo que você está falando no quadro negro eles estão procurando

lá, o smartphone na mão, eles têm o mundo na palma da mão – trecho

analítico de nova entrevista com professora-enfermeira da região sudeste

do país – PC04.

Portanto, cabe ressaltar a legitimidade de todos esses movimentos, quando

analisados a partir da perspectiva das correntes institucionalistas e no jogo de resistência

e poder para colocar em marcha ideologias e práticas mais variadas possíveis, tratando-

se de processo de institucionalização, em que a instituição ‘docência no ensino superior

e o professor-enfermeiro’ e as outras instituições que a atravessam vão sofrendo

atualizações conjuntamente. Assim, as forças instituintes e a defesa do instituído

elaboram seus dispositivos de resistência, ao longo do processo de institucionalização.

Efeito Adoecimento-Resistência

Ao longo da produção de dados com o analisador ‘resistência’ (pela resistência),

o adoecimento foi um dos efeitos que foi se tornando um tanto significativo dentro do

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grupo, mais especificamente a preocupação com o adoecimento próprio e com o

adoecimento dos pares, que tem acontecido.

O seguinte trecho analítico durante o primeiro encontro (encontro sem objetivo

explícito) mostra que mesmo diante do adoecimento dos pares, não há um movimento

de solidariedade e preocupação, acolhimento e apoio ao outro, como indagado:

Nossa, eu posso assinar embaixo! Porque eu fiquei doente o ano passado e

conta aqui ó [mostra os dedos de uma mão] quem que se preocupou! – P13 –

trecho de análise durante o encontro 1.

Outro trecho analítico deste mesmo encontro mostra como um participante olhou

para a situação de trabalho, para tomar a decisão de se aposentar e mudar de ares:

E essas coisas, essas doenças e essas mortes de nossos colegas serviram

muito para ver que a hora que vencesse a aposentadoria eu tinha que sair e

não ser sênior. Então, eu vou fazer outras coisas, cuidar de doentes de

graça, fazer o que eu quiser, mas não dá para se sacrificar mais. Eu acho

que é mais ou menos por aí. – P12 – trecho de análise durante o encontro

1.

Em um encontro para discutir a aprofundar a análise dos dados produzidos nesta

pesquisa, um participante relaciona o que foi apresentado e produzido como dados com

relação ao adoecimento e aos afastamentos que têm ocorrido, ou seja, produziu nova

análise:

é eu acho que esse panorama que você mostra justifica os afastamentos, o

adoecimento, é... leva as pessoas a exaustão, faz com que elas acabem

saindo né, lá do que você coloca do movimento de defensivo pra um

movimento integrativo, no sentido de conseguir sobreviver é eu achei muito,

muito claro, um panorama muito claro, mas muito entristecedor ao mesmo

tempo [...]. Porque eu acabei, eu sou uma do grupo do cansaço. Há pouco

tempo na universidade, mas eu assumo, por que? Por que eu estou falando

isso? Porque eu trago a história do adoecimento e eu adoeci. Então, eu

preferi me recolher nesse momento, pode ser que daqui a algum tempo, um

ano, dois anos, eu decida ir para a frente de batalha de novo, mas nesse

momento eu decidi me recolher, mas pelo menos dentro do meu microespaço,

dentro do meu microgrupo, dos alunos com quem eu trabalho eu tenho

tentado disseminar algumas ideias e propor no processo de trabalho o que

eu acredito, pode ser que não seja o melhor, mas é aquilo que eu tenho

pensado em fazer. – P06 – trecho de análise durante o encontro 2.1.

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Essa preocupação é referendada por outro participante em outro encontro para

análise dos dados, continuando a reflexão sobre o adoecimento no local de trabalho:

A gente vê o pessoal falando assim, uma colega outro dia estava

conversando “Ah *** eu não sei eu preciso não fazer mais isso, nem isso,

nem isso, o que eu estou fazendo, eu preciso sair dessa função, da outra, não

estou aguentando, não estou conseguindo, não estou estudando” a gente

estava nesse papo, daí o colega me disse “Ah eu tive um problema sério

psicológico de procurar psiquiatra” Ai eu falei gente que dó né, na hora

aquilo me chocou, ai outro eu estava pensando “eu não estou precisando de

um psiquiatra também?” – P09 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

Ainda, o mesmo participante, reflete, relacionando a capacidade de resiliência,

de resistir, de ir para o embate, com as questões de adoecimento e outro participante

complementa a reflexão:

Por isso que eu perguntei da questão do movimento individual e coletivo de

resistência, porque eu acho que a gente fica nisso o tempo inteiro, sabe? E

dependendo de como você resiste o quanto você é resiliente ou não, você vai

adoecer ou não, você vai se deixar ou não, você vai abandonar alguns

valores ou não [...]. Eu ouvi você dizendo “ eu não estou dando mais conta”

eu já estou nesse momento. Eu estou saindo de algumas comissões e estou

falando “olha eu não estou dando mais conta, eu não estou bem”. Está

chegando, eu estou no mês de abril, final de abril, estou extremamente

cansada, porque ainda tenho, final de semestre tenho outro, e a gente fala

“não, não dá”. Eu fico imaginando assim, eu tenho 41 anos, imagina uma

docente, por exemplo a *** pediu para sair de uma, diminuir o número de

alunos dela do estágio supervisionado, porque ela não estava aguentando, eu

me coloquei no lugar dela, imagina quando eu tiver 60 e alguma coisa, o que

que eu vou? Fisicamente, é isso, a pessoa não está mais, mas não é só isso...

a pessoa não está mais aguentando, estou dando o exemplo da *** porque

ela é próxima e tal, mas assim só para a gente pensar. Aí, você se coloca no

lugar do outro Fala “61 anos” e outro dia uma colega falou e nós vamos vir

usando fralda geriátrica, [...] vamos ter que trabalhar aqui até não sei

quando. É isso então enfim... – P09 – trecho de análise durante o encontro

2.2.

Esses dias eu me peguei “Gente, eu não estou dando conta, eu preciso

aposentar”. Essa coisa de sobrecarga que interfere que, aí, nós temos

exigências em termos de produção ela acaba levando a um esgotamento e

esse esgotamento você leva você tem mecanismos de defesa, aí, eu imagino

que são mecanismos de defesa de sobrevivência mesmo de não adoecimento

mental – P05 – trecho de análise durante o encontro 2.2.

Este efeito também permeou os momentos de novas entrevistas, em que uma

participante faz uma análise da questão do adoecimento, atrelando-o à questão do

produtivismo acadêmico e à ‘onda reformista’, causando também ruptura nas relações

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interprofissionais (o que se relaciona também com o efeito já apresentado de livre

concorrência). O seguinte trecho analítico apresenta esta reflexão:

Então, aqui nós somos uma meia dúzia segurando a unhas e dentes,

literalmente, é... essa onda, essa onda reformista que na verdade de

reformista não tem nada, não é? Mas é muito mais uma onda de... de

responder a essas demandas produtivistas, que a cada ano estão aí mais e

mais e mais presentes nas nossas práticas. E o mais grave, isso tem adoecido

as pessoas, muitas pessoas adoecendo e mais grave, tão grave quanto uma,

uma quebra e uma, não sei se é quebra, mas é uma... trazendo problemas

muito graves nas relações entre as pessoas, entende? Então, as pessoas estão

meio que se... grupos que isso é natural de enfrentamento que são

perspectivas, é... e paradigmas completamente diferentes e aí as pessoas na

disputa né, desses paradigmas, mas isso está adoecendo as pessoas, é... A

opressão do cotidiano, a opressão, a coisa da pressão, então é opressão,

repressão e pressão, para responder a essas demandas, as rupturas nas

relações em função dos choques né, dos paradigmas, isso tem causado

ruptura nas relações muito fortes, que são mais do que conflitos, eles são

rupturas das relações. E, aí, eu acho que isso tem dado, cada dia mais, um

caldo, é... muito danoso, né, nos processos de construção e reconstrução dos

processos de trabalho no cotidiano. E, aí, meu querido, a gente olha para as

minhas colegas e para mim mesma e está todo mundo com as caras assim de

que, está sabe assim? Que parece que está a ponto de explodir? E, assim,

vamos tentando sobreviver a essa loucura e nem todo mundo tem a

compreensão do que está acontecendo e isso acaba influenciando e

impactando negativamente nessas relações, o que tem tornado o processo de

trabalho muito complicado e muito difícil, entende? É isso - trecho analítico

de nova entrevista com professora-enfermeira da região nordeste do país

– PC02.

Outro participante, ainda durante o momento de novas entrevista, também tece

uma reflexão sobre a questão do adoecimento:

E eu acho que o produtivismo nocivo é que prejudica muito a saúde mental

de professores né. Tem professor aqui que desencadeia vários tipos de

doença porque fica nesse produtivismo que é muito nocivo – trecho analítico

de nova entrevista com professor-enfermeiro da região norte do país –

PC01.

Nessa direção, esse efeito está relacionado com a resistência, no sentido

defensivo (manter aquilo que se acredita o quanto e enquanto for possível), no sentido

ofensivo (o que a lógica produtivista está impondo às universidades, aos professores) e

no sentido integrativo (mais aguçadamente quando o professor cede, se excede com

pares, adoece e sai da batalha momentaneamente, para continuar existindo, mesmo que

de outra forma).

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Efeito Alastramento-Resistência

O alastramento aqui é entendido como um movimento não apenas de

disseminação de algo, mas também de sua impregnação e seu espalhamento duradouro.

Foi durante as novas entrevistas que este efeito foi produzido, notadamente pela análise

de um dos participantes quando da recepção de pares que se afastam para continuar suas

formações em pós-graduação em grandes centros de referência nacionais no ensino

superior e, ao retornarem, portam ideias impregnadas de concepções de cunho

produtivista e promovem embates no local de trabalho para que se espelhem nesses

centros de referência, notadamente pela dimensão da docência no ensino superior como

sinônimo de fazer um determinado tipo de pesquisa e produzir um determinado tipo de

conhecimento. O seguinte trecho analítico desvela esta questão:

Chegou, não posso dizer a você que não chegou, essa ideia do produtivismo,

do professor pesquisador, mas ainda não é tão forte como aqui [região

sudeste]. Por exemplo, em que você tem, lá já começou, não é tão forte,

professor que não quer ir mais para dar aula na graduação. Muitos recém-

doutores que vieram dessas instituições, que viram como é que isso acontece,

voltam dizendo assim “Opa! Eu só quero dar aula agora na pós-

graduação”. Então, querem uma ou duas aulas na graduação e desenvolver

megaprojetos financiados por A, B e C, e ser pesquisador de renome. Então,

eu acho que o desejo, no fundo, hoje, dos professores é ser um pesquisador

de referência internacional numa determinada área. Então, quando eles se

veem assim “qual sua perspectiva de futuro? ” “Eu quero ser a referência.

Eu quero ser citado tantas vezes. Eu quero ter tantos artigos A1, A2...

publicados. Eu quero que quando falem determinado tema, meu nome seja

citado imediatamente”. Então, eu acho que o que significa hoje ser professor

está mudando e me preocupa essa mudança, entendeu? – trecho analítico de

nova entrevista com professora-enfermeira da região nordeste do país –

PC05.

O trecho analítico seguinte esclarece um pouco melhor esse processo:

Só que nesse percurso, alguns professores foram saindo para as

qualificações, né, doutoramento, mestrado depois doutoramento, e aí

quando, nisso que a gente sabia onde a gente queria chegar. Então a gente

sabia que onde a gente queria chegar no ensino de graduação. Por muito

tempo, o nosso norte era entender que a nossa maior responsabilidade é com

a graduação e com o enfermeiro que tem que ter um comprometimento ético-

político com a transformação da realidade. Então, na medida em que alguns

professores – não só da enfermagem de outros cursos também – foram

saindo e eles voltaram com uma lógica diferente, entendendo que o

comprometimento não é só com a graduação é com quantos artigos você

tem. Então, recentemente chegou uma professora do doutorado e ela disse

assim: “Olhe gente, no meu doutorado eu publiquei mais de 20 artigos.

Então, nós temos que imprimir essa lógica aqui”. Então, você entende que,

até então, isso não era, você não ia para uma instituição para fazer qualquer

coisa ou fingir que faz pesquisa, porque 20 artigos, venhamos e

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convenhamos, em um doutorado de 4 anos, é uma coisa né, tem alguma coisa

errada. Porque, assim, publicar 20 artigos em 4 anos, tem alguma coisa

errada ou é na qualidade ou você apenas bota seu nome. Enfim, não quero

entrar no mérito disso, mas volta com esse espírito, entendeu? Eu não sei se

o processo de qualificação, que nós saímos para nos qualificar se, de fato,

ele está formando ou deformando os professores. Porque, nós tínhamos uma,

nós tínhamos clareza do que era ser professor num determinado tempo no

comprometimento com a graduação e quando a gente volta, a gente volta

pensando que o nosso comprometimento não é mais só com a graduação,

mas é com a produção, com pesquisa, que nós precisamos de um programa,

e esse programa de pós-graduação [...], mas é como se, os programas eles

também estivessem contribuindo para uma deformação da qualificação do

ser professor. Porque os programas de pós-graduação que em tese é o que

está qualificando o professor, está qualificando o professor para ser

pesquisador. Então, quando ele volta ao invés de ele fortalecer o ensino de

graduação, a graduação, entendendo lógico que a graduação no tripé

ensino-pesquisa-extensão, mas acaba fortalecendo um outro lado, numa

maneira que vai sobrepondo aos demais. Assim, eu acho que precisa

entender qual o sentido e qual a finalidade desses programas de qualificação

em níveis de mestrado e doutorado e até que ponto eles estão de fato

contribuindo para a formação do professor universitário ou eles estão

contribuindo apenas para qualificação para um pesquisador que trabalha

em uma universidade. – trecho analítico de nova entrevista com

professora-enfermeira da região nordeste do país – PC05.

Outros participantes, durante um momento de novas entrevistas, elucidam

melhor esta questão, deixando evidente a ênfase na pesquisa e o desejo de diminuir

carga horária da graduação (das 40 horas de dedicação exclusiva semanalmente) para

que se possa dedicar mais à pós-graduação, como expressado em análise realizada pelos

seguintes participantes, mesmo que o segundo trecho se trate de uma preocupação da

participante:

Aqui é assim, é uma universidade que o foco é ainda muito na graduação,

não tem grandes pesquisadores, só tem o mestrado em enfermagem né, e está

caminhando ainda. Mas é uma sobrecarga de trabalho muito grande, as

turmas são muito grandes, você tem que levar aluno para a prática, teoria e

não há, até agora pelo que eu vi, não há uma diminuição da sua carga

horária na graduação pelo fato de você estar na pós-graduação [...] ...

precariza agora um professor com 10 horas de aula né. – trecho analítico

de nova entrevista com professor-enfermeiro da região norte do país –

PC01.

Tem gente também que não quer ser nem mais docente, já se autointitula de

pesquisador, eu entendo que eu sou uma professora que pesquisa com os

meus alunos – trecho analítico de nova entrevista com professora-

enfermeira da região sudeste do país – PC04.

E nessa direção, tem suscitado um movimento de resistência defensiva por parte

dos professores que querem a manutenção da finalidade crítica com que já vinham

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trabalhando na formação de enfermeiros. O seguinte trecho analítico apresenta esta

questão:

O nosso PPP tem em suas bases teórico-metodológicas uma intencionalidade

crítica, né, no sentido da transformação. Então, em tese o nosso projeto ele

tem esse comprometimento crítico, né, e aí vão desde as bases, as

concepções de saúde doença, concepções de enfermagem, a concepção de

homem, de sociedade que vai nortear todo PPP, que tem por base da

metodologia, da aprendizagem, da problematização do Arco de Maguerez.

Então, é com uma realidade, mas não é uma realidade fictícia é uma

realidade concreta, tendo como finalidade a transformação dessa realidade

com projetos de intervenção. Então, hoje, a nossa resistência é no sentido de

manter o que existe. Porque existe o que é um movimento articulado e é um

pouco do que eu estou querendo estudar no meu doutorado que é uma onda,

não é esse o termo, mas nós estamos vivendo um processo de retrocesso na

enfermagem, é uma ideia que eu tenho a princípio, nós estamos sendo

invadidos novamente por uma concepção cada vez mais tecnicista da

enfermagem, uma concepção cada vez mais conservadora da enfermagem.

Então, isso requer dos cursos que têm uma concepção mais crítica, resistir a

isso. Porque existe um movimento agora de fora para dentro dos cursos que

são críticos, que é o nosso caso, de permanecer crítico. Então, nós temos aí

hoje, a gestora do curso defendendo o empreendedorismo dentro do curso.

Então, que seja um enfermeiro empreendedor. Então, é nitidamente o

mercado entrando dentro da formação. Então, não é a formação mais para o

SUS, para atendimento das necessidades, mas uma formação para que o

enfermeiro individualmente seja um grande empresário. Então, nós vamos

tendo, além disso a ênfase em práticas, em conteúdos, as retomadas de

conteúdos cada vez mais clínicos, cada vez mais tecnicistas. Então, nosso

exercício e que nós estamos passando por isso é resistir, não é para um

projeto de fato ele ficar engessado, nós temos que entender que ele está em

permanente construção a partir do contexto em que ele está inserido, mas

nunca perder de vista que a intencionalidade daquela formação,

intencionalidade crítica para a transformação. – trecho analítico de nova

entrevista com professora-enfermeira da região nordeste do país – PC05.

Assim, é possível perceber a partir da análise da participante que há alguns

atravessamentos da visão gerencialista, possivelmente facilitado pela reforma neoliberal

do Estado brasileiro.

Dessa maneira, é possível perceber o quanto os efeitos apresentados até este

momento e, notadamente, o adoecimento-resistência têm potencial na intensificação do

mal-estar docente, na indução de escolhas que sinalizam uma profissionalização docente

gerencialista (influência da Nova Gestão Pública – vertente gerencialista) e uma

identidade empresarial, as quais respondem às demandas e à encomenda da

universidade-empresa, que são o cumprimento das tarefas, das novas atribuições,

priorização daquilo pelo que são analisados, avaliados, legitimados e reconhecidos e

que lhes tragam menos problemas (Ball, 2005; Feldfeber, 2007; Oliveira, 2007;

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Rodrigues, 2007; Paula, 2010; Sguissardi, 2013; Auarek, 2014; Flores, 2014; Bianchetti

e Sguissardi, 2017; Vosgerau et al., 2017), que por vezes pode estar se afastando das

prerrogativas iniciais da criação/existência da universidade.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o intuito de iniciar as considerações finais à escrita desta tese, faremos um

repasso sintético pelos dados produzidos, reafirmando-os no sentido de evidenciar

melhor a tese defendida.

A partir das análises e interpretações implementadas ao longo desta pesquisa foi

possível notar, principalmente, como a reforma de Estado de 1998 tem influenciado e

induzido a docência no ensino superior do professor-enfermeiro, notadamente por sua

influência sobre a modalidade de universidade que está em institucionalização. Nessa

direção, foi possível perceber a institucionalização de uma ‘universidade-empresa’, quer

dizer, uma universidade pública sendo gerenciada na lógica de uma empresa, focada na

perspectiva do management (eficiência, eficácia, excelência, rankings, competições,

empregabilidade, empreendedorismo, dentre outros termos que têm aparecido nas

notícias, documentos e comunicações da universidade).

Somando-se a isso está a política indutora da agência reguladora CAPES com

seu modelo da avaliação dos programas de pós-graduação, sua distribuição de critérios e

notas aos programas, consequentemente, afetando a gestão dos recursos de pós-

graduação e financiamentos de pesquisas e projetos, ou seja, o dinheiro que entra na

universidade via agências de fomento à pesquisa.

Nessa direção, a partir de alguns analisadores, foi possível desvelar como a

instituição ‘docência no ensino superior do professor-enfermeiro’ tem se atualizado a

partir da universidade-empresa e da reforma do Estado na perspectiva gerencialista.

A partir dos dados produzidos, das análises implementadas e das interpretações

consumadas nesta pesquisa, foi possível perceber que a identidade docente, os saberes

docentes, a profissionalização docente, concernentes ao professor enfermeiro no ensino

superior, estão num processo denso de institucionalização na perspectiva gerencialista,

da nova gestão pública, que respondem aos anseios e propostas neoliberalistas.

Com relação ao analisador relação tempo-dinheiro, os efeitos produzidos

caracterizam um processo de institucionalização de uma docência universitária em

enfermagem cujas dimensões estão sendo formatadas para atender aos anseios

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neoliberais gerencialistas. Estes efeitos foram nomeados efeito checklist, efeito da livre-

concorrência, efeito sanfona sobre o tempo na docência, efeito de contenção.

O efeito checklist está relacionado com a indução que as concepções e práticas

dos docentes-enfermeiros estão sofrendo a partir do modelo CAPES de avaliação e do

modelo de universidade como empresa que está se institucionalizando. Se trata

basicamente de cumprir determinadas demandas obrigatórias para a questão da

dimensão ensino, em que o mínimo necessário é a régua utilizada e cumprir e/ou

superar as demandas/encomendas de pesquisa, em que existe um mínimo obrigatório

(sempre em ascendência) que deve ser alcançado, mas há vários incentivos para que

estes sejam superados cada vez mais.

O efeito da livre-concorrência está relacionado com um movimento no qual os

docentes-enfermeiros estão sendo colocados em extrema competição para angariar

recursos de pesquisa, ascensão nos cargos e funções, ou seja, os ideais neoliberais de

competição estão sendo atrelados aos planos de carreira e de melhoria salarial, assim

como para assunção de cargos que têm pró-labore. Isto tem produzido não-amizades e

um trabalho individualizado e individualista.

O efeito sanfona sobre o tempo na docência está relacionado com o uso do

tempo do docente-enfermeiro, notadamente para atender aos ideais neoliberais da

universidade-empresa. Nesse sentido, há incentivos para certa economia de tempo para

as questões relacionadas com a dimensão ensino e um certo incentivo para

afrouxamento do tempo para as atividades relacionadas com a dimensão pesquisa, ou

seja, as atividades de pesquisa e seu gerenciamento estão ocupando cada vez mais o

tempo e as preocupações dos docentes-enfermeiros, enquanto que as atividades

relacionadas ao ensino tem sofrido uma máxima economia de tempo, notadamente com

uso de tecnologias à distância, estratégias de ensino-aprendizagem com maior

praticidade de utilização para o professor. Isso se agrava mais ainda com o movimento

de não contratação de docentes para os cargos vacantes, os quais vêm sendo repostos

com docentes temporários para o ensino de graduação, em condições salariais bastante

não-atrativas. Soma-se a isso o crescente aumento de atividades administrativas que

estão sendo transferidas para o professor-enfermeiro, desde o gerenciamento das

questões de ensino por meio de um sistema online, até o gerenciamento de todas as

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etapas de suas pesquisas, aumento do número de orientandos, diminuição no tempo de

defesa (mestrado e doutorado), aumento do rigor e quantidade de ‘insumos’ para se

manter credenciado em programas de pós-graduação, avaliação quantitativa docente

quanto às três dimensões ensino-pesquisa-extensão, com possibilidade de mudança de

regime de trabalho caso o docente não esteja atendendo aos critérios avaliativos, com

drástica mudança salarial.

O efeito de contenção se refere a uma síntese dos outros efeitos, uma vez que

evidencia um mecanismo de controle e contenção dos docentes-enfermeiros dentro de

determinado movimento, o que é um dos ideais e dos modos de implementação do

neoliberalismo – deixar o indivíduo sem escolha, para que ele siga o caminho imposto

pelo neoliberalismo. Soma-se a isso, o intenso incentivo pelo uso do tempo para aquilo

que traz dinheiro para a universidade e seus programas de pós-graduação, inclusive

aquilo que traz dinheiro ou aumento salarial para os professores-enfermeiros que, de

certo modo, estão cada vez mais atrelados. Assim, tudo aquilo que não ajuda nesse

movimento financeiro da universidade e dos programas de pós-graduação tem sido cada

vez menos incentivado, o que tem dificultado a participação de docentes enfermeiros

em cursos de formação permanente para o pedagógico.

Com relação ao analisador discutir concepções e práticas pedagógicas, os efeitos

produzidos foram o efeito rosa dos ventos sobre as concepções e práticas pedagógicas e

o efeito peneira. O primeiro efeito mostrou o quanto estas as concepções/práticas

pedagógicas estão relegadas a segundo plano ou entendidas enquanto um conjunto de

técnicas que poderiam ser utilizadas das mais variadas combinações possíveis, uma vez

que falta conhecimentos pedagógicos. É somado a isso o fato da ‘falta’ de tempo para

investimento em aprendizagens pedagógicas estar cada vez mais escasso, pois o tempo

tem sido usado com maior ênfase para atender à encomenda de pesquisa da

universidade e do país e seus produtos (artigos A1-A2-B1 e internacionalização)

(indutos do modelo CAPES de avaliação). Desse modo, tem sido buscada uma

praticidade para as questões de ensino, com uso cada vez menor de tempo para a

dimensão ensino, muitas vezes associada a estratégias e formas avaliativas com

fundamentação em teorias pedagógicas divergentes. Tudo isso com a finalidade de que

os docentes-enfermeiros consigam dar conta das atribuições e demandas de produção

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científica (encomenda CAPES). O segundo efeito mostrou como ‘as grades’ neoliberais

sobre o currículo tem propiciado com que certas formas e fundamentações pedagógicas

prevaleçam enquanto outras esmaeçam e desapareçam. Assim, aquelas que se alinham

na manutenção e sustentação dos ideais neoliberais e da universidade-empresa se

solidificam cada vez mais (tradicionais, escola nova, tecnicista, tecnologias à distância),

enquanto outras de tendência crítica, que buscam o desenvolvimento do pensamento

crítico, o envolvimento maior docente com a formação em campos de imersão, com

aproximação ensino-serviço, atuando no ensino e na transformação dos serviços de

saúde para ajudar na consolidação do SUS – essas estão desvanecendo.

Com relação ao analisador resistência, os efeitos produzidos, quando da análise

pelas resistências, ajudaram a olhar um pouco mais especificamente para os

movimentos de resistência, para a história das resistências com relação à implementação

curricular no estabelecimento estudado e para os movimentos atuais de resistência em

acontecimento. Foram produzidos três efeitos com os participantes: efeito

adaptação/resistência, efeito adoecimento/resistência e efeito alastramento/resistência.

O primeiro ajudou a perceber que o que os participantes estavam chamando de

resistência se assemelha a um processo de adaptação às demandas e encomendas

neoliberais sobre a universidade, a qual se institucionaliza cada vez mais como uma

empresa, repercutindo sobre a docência universitária em enfermagem, que é

impulsionada a uma profissionalização gerencialista, cujas identidades docentes são

fixadas para atender a estes propósitos, e os saberes docentes são ‘peneirados’ para

restarem apenas aqueles que se alinham com estes pressupostos, caracterizando-se por

estratégias e formas de ensino baseadas na praticidade e na economia de tempo (isso

está intimamente relacionado com o efeito peneira já mencionado) Assim, enquanto

alguns querem resistir sem ainda ter clareza de dispositivos para tal, outros acabam

sendo assimilados e forçados a sucumbir aos pressupostos neoliberais sobre a

universidade.

O segundo é o efeito adoecimento/resistência e se referiu a um movimento em

que os docentes que são contrários a esta proposta neoliberal sobre a universidade e se

colocam nos espaços com argumentações fundamentadas em teorias pedagógicas estão

se exaurindo no embate, e buscam a todo custo manter o máximo possível suas práticas

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pedagógicas inabaladas e, para isso, muitas vezes estão se dedicando mais horas na

dimensão ensino e, assim como discutido nos efeitos produzidos pelo analisador relação

tempo-dinheiro, essa dedicação maior àquilo que não produz a moeda de troca para se

manter na universidade, manter seu salário inalterado, manter-se como pesquisador em

programas de pós-graduação etc., não é profícua uma vez que tende à sucumbência por

insuficiência de possibilidades de estratégias de resistência e por adoecimento, com

pedidos de afastamento. Dessa maneira, a resistência ao modelo neoliberal aparece já

quase totalmente no momento integrativo, em que se vê a dissolução do currículo

crítico, integrado no movimento da tecnologização/instrumentalização do ensino.

O terceiro efeito ajudou a olhar para o cenário nacional e as influências dos

grandes centros formadores dos pesquisadores e professores enfermeiros, notadamente

aqueles que se formam em pós-graduação stricto sensu, e voltam com um olhar

produtivista para o seu estabelecimento de origem, especialmente perceptível a partir do

desejo declarado de não mais estar envolvido no ensino de graduação, com

argumentações fundamentadas na necessidade de estar mais envolvido na pós-

graduação para alcançar a demanda de produções de conhecimentos como sinônimo de

produção de artigos científicos do grupo A1-A2-B1, que é a principal encomenda da

CAPES.

Todos estes efeitos nos mostra os caminhos pelos quais a profissionalização

docente tem sido impulsionada, o tipo de identidade docente que se tem produzido e se

quer produzir e como isso tem atravessado as concepções e práticas pedagógicas,

notadamente para a formação de profissionais que ajudem na consolidação do SUS.

Quanto ao processo de constituição da identidade docente, os efeitos sinalizam

um forte movimento de tecnocracia com relação ao ser docente/professor, cujos saberes

se configuram e se limitam à instrumentalidade didática, uma identidade fixa e

tecnocrática, que responde bem às propostas quantificadoras e tecnificantes, passíveis e

dóceis para serem mensuradas e avaliadas, respondentes às encomendas da perspectiva

neoliberalista. Ou seja, tem sido produzida por meio de uma profissionalização do

docente-pesquisador-enfermeiro pautada no desenvolvimento de competências

tecnocráticas (gerencialista) para responder bem às novas demandas de praticidade tanto

no ensino (por meio de tecnologias que, sugestivamente, cumprem a maior parte da

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mediação pedagógica), como na pesquisa, com softwares e modalidades de pesquisa

que utilizam recursos tecnológicos que tornam os processos de produção e de

processamento de dados e as análises cada vez mais impessoalizadas, frias, sem vida,

distantes da realidade, mas que respondem bem aos critérios dos meios de publicação,

aos critérios dos índices de avaliação da produção científica, que classifica as revistas,

que classifica os programas de pós-graduação, que classifica as universidades em

rankings, que legitimam lógicas quantificantes.

Nos jogos da dialética institucional, os movimentos de profissionalização

docente que imperam (em institucionalização), então, são aqueles que conformam as

identidades docentes empresariais, o docente gestor de seu trabalho, responsabilizado

pelas escolhas, prestador de contas, que é metrificado por índices de produtividade e

que servem de retroalimentação para manutenção dessa lógica. Isso é fortemente

marcado pelos modelos avaliativos da CAPES e também da universidade estudada que

atrela a ascensão na carreira ao cumprimento de objetivos alinhados com a perspectiva

produtivista, desenvolvendo um modelo conhecido como meritocracia – mas esta

pautada na superficialidade do ‘fez ou não fez algo’, do ‘produziu ou não produziu

algo’, do ‘ocupou ou não ocupou determinada função’, aos quais as mais diversas

fórmulas e cálculos matemáticos e estatísticos são atrelados.

À análise de implicação, foi possível observar que um dos grandes motivos para

a profissionalização (em enfermagem na universidade) foi a necessidade de se conseguir

mais segurança e independência financeiras, denotando as implicações histórico-

existenciais relacionadas à descendência da classe operária. Com relação à escolha para

a docência universitária, observou-se também o quanto a questão das implicações

histórico-existenciais influenciou, mas também a relação trabalho intelectual-trabalho

manual teve papel fundamental nesta escolha, uma vez que a docência universitária na

profissão em enfermagem intensifica o prestígio e o status social dentro da profissão,

incorporando também o status de pesquisador. Também foi possível, perceber algumas

sobreimplicações tanto no sentido de não percebimento de necessidade de resistir e

organizar formas de resistência, como no sentido de aceitar como ‘naturais’ os modelos

em consolidação neoliberalistas que influenciam a avaliação docente e dos programas

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de pós-graduação e que impulsionam a instituição universidade para uma atualização no

sentido de uma empresa.

Nessa direção, esta pesquisa buscou mostrar como a institucionalização do

Estado neoliberal brasileiro, que começou a partir da EC 1998, durante o governo da

aliança social-liberal (1995-2002), tem influenciado na institucionalização da

universidade – agora na direção empresarial, na institucionalização de uma

profissionalização docente de cunho gerencialista, em que a identidade docente sai de

um movimento subjetivo e como devir, para um status de fixidez e passível de ser

encomendada a priori, e produzida a partir de indicadores que impulsionam os docentes

universitários enfermeiros para uma identidade empresarial, como se esta fosse uma

mercadoria. Nesse ensejo, as concepções e escolhas pedagógicas ficam por embasar-se

cada vez mais em perspectivas gerencialistas de cunho neoliberal (em

institucionalização), e cada vez menos em referenciais pedagógicos, notadamente os de

caráter emancipatório (em dissolução). E o conjunto das teorias que buscam estudar o

docente do ensino superior se encerra em uma profissionalização, profissionalidade e

profissionalismo gerencialista, identidade empresarial, saberes baseados em

competências instrumentais, normatizados, quantificados à luz do positivismo. Nesse

sentido, a condição docente se deteriora, e o docente pode começar a ceder lugar para

um tecnocrata do ensino e da pesquisa, que produz aceleradamente com escolhas que se

sustentam na praticidade, na objetividade, na automaticidade.

Portanto, essa tese ajudou a observar como a instituição Estado tem atravessado

a institucionalização da universidade, e também o profissionalismo do docente-

enfermeiro; tem produzido um conjunto de dispositivos que sustentam apenas escolhas

que se alinham com a perspectiva neoliberal, o que impulsiona à atualização da

profissionalização docente em lógicas mais instrumentais, denotando aspectos

gerencialistas, enquadrando as identidades docentes de forma fixa e demandadas a

priori. Nesse caminho, não sobra espaço/lugar para o desenvolvimento ou consideração

da professoralidade ou espaço para a aprendizagem docente pedagógica de forma

compartilhada. Assim, toma lugar um movimento em que as escolhas dos docentes-

enfermeiros para o ensino/aprendizagem em enfermagem (formação de profissionais)

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ficam cada vez mais embasadas no gerencialismo e cada vez menos em referenciais

pedagógicos e estudos de natureza pedagógica e científica.

Defendo, então, a tese de que as perspectivas da Nova Gestão Pública,

notadamente sua vertente gerencialista, que foram inculcadas no Estado a partir da

Emenda Constitucional de 1998, quando da Reforma do Estado por Bresser-Pereira, têm

causado profundos efeitos sobre a universidade pública, sobre os docentes universitários

enfermeiros e, consequentemente sobre suas concepções pedagógicas, sendo o principal

efeito o fato de as escolhas docentes estarem cada vez mais fundamentadas em induções

gerencialistas e cada vez menos fundamentadas em referenciais pedagógicos,

notadamente aqueles que resguardam aspectos crítico-emancipatórios e que são

fundamentais para a formação de profissionais de saúde no sentido da saúde coletiva

com a finalidade de apoiarem a consolidação do SUS enquanto a mais importante

política de implementação do direito universal humano à saúde – isso ajuda a apoiar o

princípio de que os caminhos e ideologias que têm atualizado a instituição universidade,

também têm disparado atualizações sobre a profissionalização docente do professor-

enfermeiro (profissionalismo gerencialista), sobre sua identidade (identidade

empresarial), sobre seus saberes e práticas docentes (saberes e práticas cada vez mais

instrumentais) e sobre a qualidade de formação de profissionais enfermeiros que não se

alinha com as necessidades de saúde da população brasileira e com as necessidades

formativas para o exercício profissional dentro da perspectiva da saúde enquanto um

direito universal do ser humano, ou seja, não preparado para atuar e apoiar na

consolidação do SUS.

Apresentamos como limites deste estudo o não envolvimento direto dos

discentes de graduação e de pós-graduação ao longo da pesquisa, por meio de

dispositivos específicos para tal, inclusive dispositivos que pudessem integrar melhor

docentes e discentes no processo de produção dos dados sobre a ‘docência no ensino

superior e o professor-enfermeiro’. Os discentes participaram de forma indireta ao

estarem nos espaços em que os professores estavam sendo observados, ao provocarem

as condutas e escolhas docentes, ao serem os grupos aos quais os docentes traçavam

seus planejamentos, seus planos etc. Assim, a escuta dos discentes poderia ter

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307

complementado e produzido sentidos outros, que estudos subsequentes poderão se

debruçar, a partir dos presentes resultados, para dar continuidade nesta temática.

Do mesmo modo, pensamos que estudos que produzam dispositivos mais

específicos para analisar a relação do Estado sobre a docência no ensino superior em

enfermagem poderão contribuir mais amplamente para as tomadas de decisão dentro da

universidade pública, na esfera pública e na vida social.

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333

APÊNDICES E ANEXOS

ANEXO 1 - Último ofício de aprovação pelo Comitê de Ética

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334

APÊNDICE 1 - Roteiro para entrevista semiestruturada A. Parte I: dados de identificação

I. Pessoais (sexo, idade, estado civil, religião e crenças);

II. Formação: nível de estudo (mestrado, doutorado, pós-doutorado, outro);

complementar (complementação pedagógica, licenciatura).

III. Profissionais: tempo de atuação/data de ingresso como docente na instituição; área

de atuação no ensino; nome das disciplinas de graduação em que leciona.

B. Parte II: questionário semiestruturado informativo

1. O que você entende por carreira docente/ de professor universitário?

2. Que abordagem/filosofia pedagógica você segue? O que lhe motivou a fazê-lo? Por

quê?

3. Relate alguma experiência satisfatória e seus elementos positivos, alguma

insatisfatória e seus elementos negativos, que você tem identificado com o uso da

referida abordagem pedagógica e metodologias.

4. Comente sobre a relação que você estabelece com seus alunos no processo de ensino-

aprendizagem. Destaque as características que facilitam e dificultam as relações com

os alunos.

5. Como você vê o processo de planejamento de ensino e sua relação com a abordagem

pedagógica?

6. Livre para se expressar sobre o que quiser.

APÊNDICE 2 - Roteiro para observação das abordagens pedagógicas

do professor 1. Nas abordagens pedagógicas e nas relações/interações com os sujeitos, quais os

comportamentos, as atitudes que prevalecem?

2. Houve conflitos? Como foi resolvido/solucionado? Quais atitudes, comportamentos,

comentários, decisões permearam essas situações?

3. Que outros eventos e detalhes do cotidiano relacionados com as abordagens

pedagógicas ou interação de ensino-aprendizagem apareceram?

APÊNDICE 3 - Roteiro para Análise Documental 1. Nos planos de aula, nos planos de disciplina (o documento que for fornecido pelo

professor) e nos programas de disciplinas disponibilizados no sistema online de

graduação da universidade - quais os conceitos explícitos e implícitos referentes às

concepções pedagógicas assumidas?

2. Que tipos de conteúdos são escolhidos? Qual a finalidade dos objetivos? Que

métodos são utilizados? Quais a formas avaliativas? Há conversa entre estes

elementos do planejamento de ensino e destes com alguma concepção pedagógica

explícita ou implícita?

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APÊNDICE 4 - Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (últimas

versões)

- FRENTE DO TCLE-1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO VERSÃO 06_TCLE_Maio/2017

Título da Pesquisa: DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO TRABALHO DO DOCENTE-

ENFERMEIRO NO CURSO DE ENFERMAGEM: ELEMENTOS EMANCIPATÓRIOS E SITUAÇÕES-LIMITES Prezado (a) Senhor (a),

Meu nome é José Renato Gatto Júnior, estou em fase de doutoramento pelo Programa de Enfermagem

Psiquiátrica da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Eu, em conjunto

com minha supervisora professora doutora Sonia Maria Villela Bueno e coorientadora Prof.ª Dr.ª Cinira

Magali Fortuna, também da mesma faculdade, somos responsáveis por esta pesquisa. Nesta investigação,

nós estamos realizando uma pesquisa referente à dimensão pedagógica do trabalho do professor

universitário enfermeiro. Essa pesquisa será de suma importância para a construção de conhecimentos,

práticas e atitudes favoráveis à docência em nível superior.

Caso você se interesse em participar desta pesquisa, você será convidada(o) para uma fase exploratória,

com entrevista (30min aproximadamente); momentos de observação participante em disciplinas da

graduação (a combinar); também será pedido algum documento dessa disciplina (plano de aula, plano de

disciplina, plano de estágio, ou qualquer outro planejamento pessoal) para realização de análise

documental. Essas informações serão trianguladas, identificando elementos emancipatórios e levantar-se-

ão os nós críticos. Haverá uma restituição individual das planilhas com os elementos emancipatórios e

com as situações-limites e você deverá verificar se quer fazer alguma adequação ou sugestão. Após a

análise prévia, haverá momentos de restituição coletiva (± 90 minutos cada, em uma sala no

estabelecimento de ensino superior em que você trabalha - com data previamente combinada conforme

sua disponibilidade e sala divulgada por e-mail) para discutir os achados iniciais. Acredita-se que serão

necessários pelo menos 3 encontros de restituição coletiva.

Liberdade de escolha e direito de recusar: Você não precisa participar da pesquisa, caso não queira, embora sua participação seja muito importante

para esse estudo. Você pode decidir se quer ou não participar dessa pesquisa. Você pode também, interromper sua participação a qualquer momento. Basta informar aos pesquisadores. A decisão de não

participar da pesquisa não afeta em seu trabalho, e nem traz prejuízo ao andamento dessa investigação.

Riscos e Benefícios: Não há riscos em responder as questões deste estudo. Em caso de haver desconforto ou incômodo de

falar sobre a sua concepção pedagógica, ou ter sua abordagem pedagógica observada, ou de participar

das discussões coletivas virtuais e presenciais, terá a liberdade de interromper a pesquisa, podendo

retomá-la, se quiser, em um outro momento, sem prejuízo a si próprio ou para o nosso estudo. O

benefício de colaborar com esse estudo pode estar na possibilidade de discutir assuntos de seu interesse

sobre a formação didático-pedagógica do docente universitário e outros assuntos pertinentes,

contribuindo na construção de seus conhecimentos neste tema, que o ajudará na sua vida pessoal e

profissional. Você não terá gastos e nem auxílio financeiro para participar da pesquisa. No entanto, terá

direito a indenização, caso ocorra dano decorrente de sua participação na pesquisa, por parte do

pesquisador e das instituições envolvidas nas diferentes fases da pesquisa.

Privacidade e o aspecto confidencial: Você é livre para decidir se quer ou não participar da pesquisa. Toda informação que você der será

mantida em sigilo. Esta pesquisa foi analisada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da

Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/USP, pois respeita as questões éticas necessárias para a sua

realização. Assim, se for necessário, poderá entrar em contato com este CEP pelo telefone (16) 3315-

9197 ou pelo e-mail [email protected]. O horário de funcionamento deste CEP, em dias úteis, é de

segunda a sexta, das 10h às 12h e das 14h às 16h. Caso deseje falar conosco, você poderá nos encontrar

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336

por meio dos telefones (16) 3315-3950 (segunda a sexta, das 8h às 17h) ou (16) 98152-5655, também

aos finais de semana ou à noite, ou poderá nos procurar, em dias úteis, na Escola de Enfermagem de

Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Avenida Bandeirantes, 3900 - Campus Universitário,

Ribeirão Preto – SP.

Agradecemos antecipadamente a sua colaboração.

Pesquisadores principais: José Renato Gatto Júnior. E-mail: [email protected]; Professora doutora

Sonia Maria Villela Bueno. E-mail: [email protected]; e Prof.ª Dr.ª Cinira Magali Fortuna. E-mail:

[email protected].

- VERSO DO TCLE-1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO VERSÃO 06_TCLE_Maio/2017

Eu,____________________________________________________________, abaixo assinado, após ter recebido as informações sobre sua pesquisa intitulada “DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO TRABALHO

DO DOCENTE-ENFERMEIRO NO CURSO DE ENFERMAGEM: ELEMENTOS EMANCIPATÓRIOS E SITUAÇÕES-LIMITES”, que tem como objetivo geral compreender e analisar as concepções didático-pedagógicas que permeiam o cotidiano profissional de docentes-enfermeiros da educação superior de uma escola de enfermagem do interior paulista. Essa identificação e análise das concepções pedagógicas ocorrerão a partir da análise do trabalho de docentes universitários enfermeiros, com a titulação de doutor, inseridos em atividades de ensino de graduação em uma instituição de ensino superior do interior paulista. Como me enquadro neste perfil, concordo em participar desta pesquisa. Confirmo ter recebido as informações sobre a pesquisa a ser desenvolvida, e estou ciente sobre os direitos abaixo relacionados:

1. A garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a dúvidas acerca dos

procedimentos, riscos, benefícios e outros relacionados à pesquisa.

2. A liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo,

sem que isso traga qualquer prejuízo para o entrevistado.

3. A segurança de que serão preservadas a identidade e privacidade do entrevistado.

4. O compromisso de me valer da legislação em caso de dano, como por exemplo, indenização, em

situações cabíveis.

5. A garantia de que caso ocorra riscos ou desconfortos, poderei interromper minha participação

podendo retomá-la em outro momento. E que não terei gastos de qualquer natureza.

6. A garantia de seguir todas as exigências que constam na Resolução nº466, de 12 de dezembro de

2012, que regulamenta o desenvolvimento de pesquisas envolvendo seres humanos.

Esclareço que em caso de dúvida, fui orientado a procurar o aluno de doutorado José Renato Gatto Júnior e a professora doutora Sonia Maria Villela Bueno. Declaro que tenho conhecimento dos direitos acima descritos, e consinto em participar deste estudo, realizado pelos pesquisadores que subscreve este termo de consentimento. De acordo,

Ribeirão Preto, _____ de ________________ de_________

_______________________________ _______________________________ Participante da pesquisa Responsável pela pesquisa

Este termo deverá ser feito em duas vias originais, que serão assinadas tanto pelo participante quanto pelo pesquisador, e uma delas ficará com o participante.

____________________________

RUBRICA DO

PESQUISADOR

____________________________

RUBRICA DO

RESPONSÁVEL

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337

- FRENTE DO TCLE-2-

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO VERSÃO01_TCLE2_Maio/2017

Título da Pesquisa: DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO TRABALHO DO DOCENTE-

ENFERMEIRO NO CURSO DE ENFERMAGEM: ELEMENTOS EMANCIPATÓRIOS E

SITUAÇÕES-LIMITES

Prezado (a) Senhor (a),

Meu nome é José Renato Gatto Júnior, estou em fase de doutoramento pelo Programa de Enfermagem

Psiquiátrica da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Eu, em conjunto

com minha coorientadora professora doutora Cinira Magali Fortuna, também da mesma faculdade, somos

responsáveis por esta pesquisa. Nesta investigação, nós estamos realizando uma pesquisa referente à

dimensão pedagógica do trabalho do professor universitário enfermeiro. Essa pesquisa será de suma

importância para a construção de conhecimentos, práticas e atitudes favoráveis à docência em nível

superior.

Você está sendo convidado a participar de uma fase bastante importante desta pesquisa. Caso você se

interesse em participar, você será convidada(o) a participar de uma fase chamada de entrevista

convergente (30min aproximadamente), em que a partir dos dados obtidos em fase anterior desta

pesquisa, alguns questionamentos foram feitos na tentativa de ampliar os olhares sobre o objeto de estudo,

a docência no ensino superior. Esta fase ajudará a aprofundar em determinados pontos sobre a dimensão

pedagógica da docência no ensino superior. Esta entrevista será realizada em local, data, horário e

modalidade que lhe melhor convir, podendo ser presencial ou à distância (skype, por exemplo).

Liberdade de escolha e direito de recusar:

Você não precisa participar da pesquisa, caso não queira, embora sua participação seja muito importante

para esse estudo. Você pode decidir se quer ou não participar dessa pesquisa. Você pode também,

interromper sua participação a qualquer momento. Basta informar aos pesquisadores. A decisão de não

participar da pesquisa não afeta em seu trabalho, e nem traz prejuízo ao andamento dessa investigação.

Riscos e Benefícios:

Não há riscos em responder as questões deste estudo. Em caso de haver desconforto ou incômodo de

falar sobre a sua concepção pedagógica, terá a liberdade de interromper a pesquisa, podendo retomá-la,

se quiser, em um outro momento, sem prejuízo a si próprio ou para o nosso estudo. O benefício de

colaborar com esse estudo pode estar na possibilidade de discutir assuntos de seu interesse sobre a

formação didático-pedagógica do docente universitário e outros assuntos pertinentes, contribuindo na

construção de seus conhecimentos neste tema, que o ajudará na sua vida pessoal e profissional. Você

não terá gastos e nem auxílio financeiro para participar da pesquisa. No entanto, terá direito a

indenização, caso ocorra dano decorrente de sua participação na pesquisa, por parte do pesquisador e das

instituições envolvidas nas diferentes fases da pesquisa.

Privacidade e o aspecto confidencial:

Você é livre para decidir se quer ou não participar da pesquisa. Toda informação que você der será

mantida em sigilo. Esta pesquisa foi analisada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da

Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/USP, pois respeita as questões éticas necessárias para a sua

realização. O CEP também tem a finalidade de proteger as pessoas que participam da pesquisa e

preservar seus direitos. Assim, se for necessário, poderá entrar em contato com este CEP pelo telefone

(16) 3315-9197 ou pelo e-mail [email protected]. O horário de funcionamento deste CEP, em dias úteis, é

das segunda a sexta, das 10h às 12h e das 14h às 16h. Caso deseje falar conosco, você poderá nos

encontrar por meio dos telefones (16) 3315-3950 (segunda a sexta, das 8h às 17h) ou (16) 98152-5655,

também aos finais de semana ou à noite, ou poderá nos procurar, em dias úteis, na Escola de

Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Avenida Bandeirantes, 3900 - Campus

Universitário, Ribeirão Preto – SP. Agradecemos antecipadamente a sua colaboração.

Pesquisadores principais: José Renato Gatto Júnior. E-mail: [email protected] e Professora doutora

Cinira Magali Fortuna. E-mail: [email protected].

__________________ ___________________

RUBRICA DO PESQUISADOR RUBRICA DO RESPONSÁVEL

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338

- VERSO DO TCLE-2 -

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO VERSÃO01_TCLE2_Maio/2017

Eu,____________________________________________________________, abaixo assinado, após ter

recebido as informações sobre sua pesquisa intitulada “DIMENSÃO PEDAGÓGICA DO

TRABALHO DO DOCENTE-ENFERMEIRO NO CURSO DE ENFERMAGEM: ELEMENTOS

EMANCIPATÓRIOS E SITUAÇÕES-LIMITES”, que tem como objetivo geral compreender e

analisar as concepções didático-pedagógicas que permeiam o cotidiano profissional de docentes-

enfermeiros da educação superior de uma escola de enfermagem do interior paulista. Essa identificação e

análise das concepções pedagógicas ocorrerão a partir da análise do trabalho de docentes universitários

enfermeiros Concordo em participar desta pesquisa, na modalidade de entrevista convergente. Confirmo

ter recebido as informações sobre a pesquisa a ser desenvolvida, e estou ciente sobre os direitos abaixo

relacionados:

1. A garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a dúvidas acerca dos

procedimentos, riscos, benefícios e outros relacionados à pesquisa.

2. A liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo,

sem que isso traga qualquer prejuízo para o entrevistado.

3. A segurança de que serão preservadas a identidade e privacidade do entrevistado.

4. O compromisso de me valer da legislação em caso de dano, como por exemplo, indenização, em

situações cabíveis.

5. A garantia de que caso ocorra riscos ou desconfortos, poderei interromper minha participação

podendo retomá-la em outro momento. E que não terei gastos de qualquer natureza.

6. A garantia de seguir todas as exigências que constam na Resolução nº466, de 12 de dezembro

de 2012, que regulamenta o desenvolvimento de pesquisas envolvendo seres humanos.

Esclareço que em caso de dúvida, fui orientado a procurar o aluno de doutorado José Renato Gatto Júnior

e a professora doutora Cinira Magali Fortuna.

Declaro que tenho conhecimento dos direitos acima descritos, e consinto em participar deste estudo,

realizado pelos pesquisadores que subscreve este termo de consentimento.

De acordo,

_____________________, _____ de ________________ de_________

_______________________________ _______________________________

Participante da pesquisa Responsável pela pesquisa

Este termo deverá ser feito em duas vias originais, que serão assinadas tanto pelo participante quanto pelo

pesquisador, e uma delas ficará com o participante.

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APÊNDICE 5 - Exemplo de quadros com elementos emancipatórios e quadros com situações-limites Quadro 2.1.1 - Quadro Individual de Apresentação dos Elementos Emancipatórios

ELEMENTOS EMANCIPATÓRIOS – P01 UNIDADES DE REGISTRO

GESTÃO E ACOMPANHAMENTO CONTÍNUO DO PROCESSO DE ENSINO-

APRENDIZAGEM

ENTREVISTA Existem outras atividades que vão depender muito do aqui agora também, por exemplo, quando a gente está num momento de realizar uma síntese provisória, não tem como realizar um planejamento muito detalhado disso e nem seria interessante, porque ele vai depender muito do que os estudantes vivenciaram, é lógico que o planejamento é o meu preparo, meu preparo para conduzir, mas eu não tenho uma estrutura, algo muito rígido em relação a isso. Têm os momentos, momento de iniciar a discussão, momento de como vai ser conduzida, como a gente vai fazer esse fechamento, autoavaliação dos alunos, avaliação do encontro, avaliação do facilitador ou do moderador, ou do docente. (PLANEJAMENTO DO CICLO PEDAGÓGICO É ÚNICO E DEPENDENTE DE CADA CICLO E DA VIVÊNCIA E PARTICIPAÇÃO DOS ESTUDANTES) Então, aquele aluno que não tem uma necessidade muito grande a ser trabalhada [...] um déficit. Eu vou fazer um acompanhamento, vou reforçar todos os pontos positivos que ele tem, vou dar várias devolutivas em relação a isso. Tento, sempre que possível, eu acho que ter uma relação próxima para compreender como que ele está vivenciando, se ele está conseguindo aprender ou não, e com cada aluno a gente tem algo a ser trabalhado, principalmente nesse primeiro ano, que tem várias questões que a gente está avaliando ele também e trabalhando ao longo do tempo. (ACOMPANHAMENTO PRÓXIMO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM) Então, até tem aluno que, por exemplo, tem problema com a gente na disciplina, às vezes você acompanha aluno que teve dificuldades sérias e que, em vários momentos, você precisou sentar e conversar "olha! Você, se continuar nesse ritmo até o fim do ano, não tem como dizer se você vai atingir os objetivos que a gente tem aqui para você na disciplina. Precisa melhorar nisso e naquilo" e fazendo esse processo desde o mais precoce possível. Então, eu percebo isso também - eu tento pelo menos desenvolver o papel ativo nesses aspectos. (ACOMPANHAMENTO DO ESTUDANTE DURANTE O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM) Então, ou é o portfólio, em que a gente tem que trabalhar com aquilo que ele está se expressando, o que ele está expressando também, se demonstra amadurecimento ou não. Então, isso vai desde habilidades voltadas à escrita até o amadurecimento mesmo enquanto um futuro enfermeiro. (USO DO PORTFÓLIO PARA ACOMPANHAMENTO DA APRENDIZAGEM INTEGRAL DO ESTUDANTE)

OBS. PARTICIPANTE Professora inicia o encontro, dizendo que quer ver como os estudantes estão se planejando para a visita. [...] Professora refere para o grupo a importância de planejar, mas que apesar do planejado, é preciso ir se adequando às necessidades que vão surgindo ao longo. (ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM) Uma estudante traz uma anotação para a professora olhar. Professora lê e faz comentário de que as estudantes deveriam contemplar no relato as intervenções realizadas, devolvendo o texto para as mesmas completarem. (ACOMPANHAMENTO INDIVIDUAL DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM) Professora foi anotando em uma folha algumas coisas que os estudantes foram falando. (ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM - CADERNO)

AN. DOCUMENTAL O plano da disciplina apresenta cronograma detalhado das atividades a acontecer em cada semestre, com entrega de portfólio a cada final de ciclo.

PROFESSOR FACILITADOR/MEDIADOR ENTREVISTA

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DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

[...] com muita discussão, muito com essa questão do diálogo, de trazer o aluno junto e de pedir para que ele contribua, trabalhar o que ele já traz e tentar elaborar em cima disso uma... trabalhando junto com ele para a gente construir um conhecimento novo mais consolidado. (APREÇO POR CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO JUNTO COM OS ESTUDANTES) Então, eu tento trabalhar de uma forma que ele consiga contextualizar, perceber a importância de a gente trabalhar tal/ determinado assunto/ conteúdo, competência, seja lá o que a gente tiver que trabalhar naquele momento, mas para ele conseguir contextualizar, para isso fazer sentido, e fazer sentido de uma forma mais ampla. "Por que estou fazendo isto?" "Por que eu sou enfermeiro?" "Que diferença que o enfermeiro faz no mundo?" "Por que eu tenho que aprender esse conteúdo?" "Para que ele vai ser útil?" ou não. E de que maneira utilizar [...] (CONTEXTUALIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM) Têm os momentos, momento de iniciar a discussão, momento de como vai ser conduzida, como a gente vai fazer esse fechamento, autoavaliação dos alunos, avaliação do encontro, avaliação do facilitador ou do moderador, ou do docente. (FACILITADOR/MODERADOR/DOCENTE)

OBS. PARTICIPANTE Professora começa a exposição com slides contendo perguntas sobre o tema motivação: “o que é motivação? Por que trabalhar a motivação na saúde?” Professora usa ora perguntas informativas ora problematizadoras para buscar a participação dos alunos. (USO DE PERGUNTAS NAS DIAPOSITIVAS DE AULA EXPOSITIVO-DIALOGADA) A professora dá um exemplo de que ela está indecisa sobre casar ou não e pede para os alunos darem motivos para ela casar - alunos participam. Aluno pergunta se é possível oferecer motivos positivos e negativos para a pessoa decidir - professora joga a pergunta para a turma - outro aluno responde que talvez fosse melhor ouvir os motivos da pessoa. (BUSCA O ENVOLVIMENTO DOS ESTUDANTES DURANTE A AULA) Professora explica uma técnica motivacional. Professora usa exemplos para ilustrar cada explicação. (USO DE EXEMPLOS DURANTE A AULA) Uma dupla relatou que sua família está tendo problema com a unidade de saúde, pois ela queria um pronto atendimento no núcleo e está muito brava com a unidade de saúde - professora comenta que vai levar essa devolutiva para o núcleo, já que vai lá ainda essa semana e não pode deixar para dar essa devolutiva só na próxima imersão. (DEMONSTRAÇÃO DE ATITUDES QUE DENOTAM SERIEDADE E ENVOLVIMENTO COM A UNIDADE DE SAÚDE) Professora refere que quer ouvir os que ficaram quietinhos até agora. Alguns se colocaram outros não. Ao final dos comentários que surgiram, professora faz o apelo para participação de quem não tinha falado até então. Nessa segunda tentativa, a professora consegue a participação de quem não tinha falado até o momento. (BUSCA ENVOLVER TODOS OS ESTUDANTES NA DISCUSSÃO) Estudante se confunde sobre o termo BUSCA na disciplina, professora resgata o ciclo pedagógico para explicar para estudante. (CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE A METODOLOGIA DE ENSINO UTILIZADA) Professora referiu que precisou interferir um pouco na discussão e dar rumo à questão de aprendizagem, porque não sairia uma pergunta que não faria muito sentido para o grupo (PROFESSOR MEDIADOR NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM)

AN. DOCUMENTAL No plano de disciplina, os conteúdos estão organizados por saberes cognitivos, procedimentais e atitudinais. No plano da disciplina, o cronograma contempla momentos de aprendizagem do uso do portfólio. No plano da disciplina, o cronograma contempla momentos de aprendizagem de como fazer busca de informações e conhecimentos em bases de dados científicas.

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No plano de aula, há uso de vídeo para sensibilização dos estudantes para o tema da aula.

USO DE METODOLOGIAS ATIVAS DURANTE O PROCESSO DE ENSINO-

APRENDIZAGEM

ENTREVISTA [...] mas de perceber a importância de outras estratégias que vão envolver mais a participação do aluno. Então, independente da estratégia, se a gente tiver que fazer como a gente já fez, por exemplo, algumas estratégias que vão estar mais articuladas a uma discussão, a um grupo de discussão, ou a trazer alguns elementos que vão nortear, seja um texto, seja um caso clínico, questões disparadoras, mesmo com uma leitura prévia ou não. Sabe? Eu vejo que algumas questões, trazer um vídeo e os fazer refletirem sobre isso, uma notícia e colocar isso em discussão - eu vejo que algumas dessas coisas fizeram sentido. Laboratórios, algumas experiências com simulação, aproveitar muitas questões da prática, aquilo que eles estão vivenciando, que nem sempre a gente valoriza tanto quanto deveria, mas as experiências que eles têm no campo de imersão, e associar, ajudar a associar isso a outras questões e a levantar muitos outros pontos. E, aí, eu passei a perceber o quanto, na verdade, isso é mais significativo para eles e para mim também no processo. (ATIVIDADES QUE ENVOLVEM MAIS OS ESTUDANTES PARECEM FAZER MAIS SENTIDO PARA ESTUDANTES E PROFESSOR) Eu tenho várias experiências que têm sido satisfatórias, mas principalmente, como eu te disse, envolvendo essas metodologias mais ativas, estratégias, na verdade, mais ativas. (EXPERIÊNCIAS MAIS SATISFATÓRIAS COM USO DE METODOLOGIAS ATIVAS) [...] vendo isso mesmo em outros momentos em que o aluno traz algo, por exemplo, lá no campo de imersão você vê "nossa! Fez sentido para ele, então, aquele outro momento que a gente teve antes" ou o contrário também. Na disciplina *** eu tive que aprender muito, porque eu não estava habituada a esse tipo de ... estruturação da disciplina, não estava acostumada a trabalhar com o ciclo pedagógico, não tive a experiência do ciclo, mas vejo que ele tem um potencial grande. Então, isso também tem sido satisfatório. (SATISFAÇÃO NO USO DO CICLO PEDAGÓGICO)

OBS. PARTICIPANTE Professora convida um estudante para ir até à frente, porque ela precisa de alguém para simular um exemplo de abordagens com o cliente. Professora demonstra dois modelos: um do profissional que diz o que precisa ser feito para parar de ter tal comportamento; e o modelo em que ela vai questionando os motivos do cliente para tal comportamento. Neste exemplo, a professora vai demonstrando e reforçando os aspectos positivos do cliente em relação à superação do comportamento sendo discutido. (USO DE SIMULAÇÃO) Professora explica a próxima atividade: cada grupo deverá escolher um estágio dos que ela explicou - identificar as intervenções aplicáveis a esse estágio. Alunos devem apresentar para todos. Fazem um intervalo. Na volta se dividem de novo, para ensaiarem uma cena para apresentarem. Professora traz cartões que vai distribuir para os cinco grupos. [...] Ela lhes deu 30 minutos para tal. Professora passa de grupo em grupo e conversa com os alunos. (USO DE TRABALHOS EM PEQUENOS GRUPOS) Professora lembra a importância da construção do genograma e ecomapa, mas sugere aos estudantes que o compartilhem com as famílias, porque às vezes a própria família ajuda a validar o que foi construído. (INCENTIVO AO COMPARTILHAMENTO DAS INFORMAÇÕES COLETADAS NO ESTÁGIO COM AS PRÓPRIAS FAMÍLIAS)

AN. DOCUMENTAL No plano de aula, há uso de múltiplos métodos, sendo estes mais reflexivos, ativos e problematizadores: "aula expositivo-dialogada, vídeo [vídeo para sensibilização], role-playing com aluno [simulação], trabalho em grupo, dramatização, apresentação e discussão". No plano da disciplina, na metodologia, explicita-se o uso do ciclo pedagógico (inserção na realidade, síntese provisória, busca de informações/conhecimentos, nova síntese, avaliação). No plano de aula, os objetivos apresentados também estão voltados para a perspectiva da aprendizagem.

POSTURA DOCENTE DIALÓGICA E ENTREVISTA

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EMANCIPATÓRIA NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Então, eu acho que é uma relação muito horizontal mesmo com eles [estudantes], mas com papéis claros, bem definidos (RELAÇÃO PROFESSOR-ESTUDANTES) Então, não é porque eu sou nova, por exemplo, que eu estou ali para ser amiga de todo mundo, e deixo sempre claro para os alunos, desde o primeiro momento que a gente tem [...] todos os contratos que a gente tem na disciplina. É lógico que em alguns momentos, a gente tem que retomar isso, porque às vezes o aluno se esquece, se perde um pouco, mas questões do que eu espero dele nesse processo, não só na avaliação final, mas nesse processo. [...] Então, eu procuro ser muito clara em relação a essas questões dos papéis, das definições, da avaliação, do processo, de tudo que a gente tem que fazer em relação a contratos, o que eu espero deles, o que eles esperam de mim - para a gente alinhar essas coisas. (PROFESSOR FAZ CONTRATO PEDAGÓGICO DE TRABALHO COM ESTUDANTES)

OBS. PARTICIPANTE No início da aula, professora usa um vídeo bem tocante de uma pessoa sem braços e sem pernas que consegue fazer tudo que quer. Ao terminar o vídeo, professora traz uma questão sobre o que passou no vídeo, o que os estudantes viram no vídeo. Ela pergunta “como podemos motivar alguém? Vocês acham que conseguiriam motivar alguém como a pessoa do vídeo a pescar, a jogar golfe, como o faz a pessoa do vídeo?” A professora afirma que temos que ter a consciência de que o motivo para a motivação é de cada um. O melhor é trabalhar com os motivos da pessoa. (USO DE PERGUNTAS QUE INCITAM A REFLEXÃO) Professora termina uma demonstração e faz pergunta para os alunos: "o que vocês perceberam nos dois exemplos?". Aluna pergunta se está relacionado com a reflexão. Professora refere que a pessoa precisa encontrar os motivos para a mudança, diz que precisa encontrar as motivações que já existem na pessoa, que há que evocar os motivos. (REFLEXÃO SOBRE AS SIMULAÇÕES) Para o trabalho em grupo, professora diz que não vai dividir os alunos, eles próprios o farão. (ESTUDANTES COM LIBERDADE PARA SE ORGANIZAR EM GRUPO) Diante de um conflito de ideias, a professora expõe que pode estar havendo uma compreensão diferente de um termo que ambos os grupos utilizaram para explicar uma determinada situação. A professora refere que os alunos estão se expressando de formas diferentes, e estes contrapontos de ideias ajudam os alunos a afinarem a forma que se comunicam. (USO DO CONFLITO DE IDEIAS PARA A APRENDIZAGEM) Professora explora as apresentações de cada grupo, fazendo questões para o grupo, tais como, “pessoal como vocês percebem o trabalho com pacientes que não reconhecem que têm algum problema?” (USO DA REFLEXÃO SOBRE O CONTEÚDO) Professora diz que se os estudantes quiserem falar algo específico sobre o portfólio/prova em particular e que tenham vergonha de falar na frente dos demais que podem procurá-la, separadamente. (ABERTURA PARA O DIÁLOGO) Professora conversa com estudante que tinha chegado atrasada no estágio e foi direto para a casa da família visitada. Aluna referiu que foi algo atípico. Professora referiu que isso não pode ser a regra, que espera que seja uma exceção. Professora aproveita para dizer que achava que tinha sido muito direta com a estudante em outra conversa e que tinha ficado preocupada se a estudante tinha entendido. Estudante refere que foi boa a conversa com a professora naquele momento, e que ela "acordou" para algumas coisas. Professora refere que prefere ser honesta com o estudante quando percebe que algo não está indo bem. Estudante refere que vai ser honesta também, dizendo que não tem feito os relatos de acordo e no devido momento, e que prefere falar a verdade. Professora refere que também prefere falar a verdade e que não poderia deixar de falar algo que tenha percebido e que a estudante tem muito potencial, mas um elemento de seu desenvolvimento não estava acompanhando o avanço dos outros elementos. (DIÁLOGO ABERTO, HONESTO E TRANSPARENTE COM ESTUDANTES) A sala estava previamente em círculo antes mesmo de a professora chegar. (ORGANIZAÇÃO DA SALA EM CÍRCULO) Durante o encontro para discussão, é referido que a professora ajuda para além da disciplina, ajuda para a vida, que a professora tem uma preocupação com os estudantes como pessoas também. (PROFESSORA VALORIZA O ASPECTO PESSOA NAS RELAÇÕES COM OS ESTUDANTES)

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AN. DOCUMENTAL No plano de aula, há menção de uso de métodos mais reflexivos e problematizadores.

AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM VOLTADA PARA O

PROCESSO FORMATIVO DO INDIVÍDUO

ENTREVISTA Então, ou é o portfólio, em que a gente tem que trabalhar com aquilo que ele está se expressando, o que ele está expressando também, se demonstra amadurecimento ou não. Então, isso vai desde habilidades voltadas à escrita até o amadurecimento mesmo enquanto um futuro enfermeiro. (USO DO PORTFÓLIO PARA ACOMPANHAMENTO DA APRENDIZAGEM INTEGRAL DO ESTUDANTE)

OBS. PARTICIPANTE Professora refere que vai discutir sobre o portfólio, dizendo que foi um pouco mais rigorosa, para ajudar os estudantes a melhorarem em alguns aspectos, tal como a forma de escrever. (VALORIZAÇÃO DO PORTFÓLIO TAMBÉM PARA O APRIMORAMENTO DA ESCRITA) Estudantes voltam na discussão da despedida da família e da evolução da família, professora refere que também percebe evolução dos estudantes, nos portfólios. (DEVOLUTIVA GERAL AOS ESTUDANTES) Professora pede que estudantes façam uma rodada de avaliação, de três pontos: “como eu estou indo na disciplina hoje, como o grupo foi hoje, como a professora e a estudante-PAE foram no encontro. Isso ajuda a melhorar e a perceber o que tem melhorado”. Estudantes elogiam muito a professora. (AUTOAVALIAÇÃO GRUPAL AO FINAL DO ENCONTRO)

AN. DOCUMENTAL No plano da disciplina, é explicitada a utilização da perspectiva da avaliação formativa, por meio do portfólio, e os critérios de avaliação estão apresentados.

SER MAIS PROFESSOR

ENTREVISTA Eu tenho valorizado essa questão da pedagogia histórico-crítica - eu acho muito interessante. Eu vejo que em alguns pontos a gente consegue aplicar bem. Mesmo quando tem alguma coisa muito específica para você trabalhar, meio que da formação do enfermeiro e eu acho muito interessante [...] Eu tento trabalhar mais dentro dessa linha, não que eu consiga atingir tudo a todo o momento, que é como eu te disse, a gente tem que ir ligando várias coisas. (VALORIZAÇÃO DA PERSPECTIVA DA PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA) Como você vai ajudando ele a se desenvolver como enfermeiro, como cidadão e n coisas que a gente tem que trabalhar. (PREOCUPAÇÃO COM A FORMAÇÃO PARA A CIDADANIA) [...] mas tinha muito aquela questão de dar uma boa aula, e às vezes parece que "nossa preciso dar uma aula ótima e os alunos vieram e elogiaram a aula e tal" e parece que aquilo foi super legal e aí você vê que ninguém aprendeu nada depois. Então, eu comecei, até por essas experiências práticas também, a ver que não fazia muito sentido ficar utilizando esse tipo de estratégia só (EXPOSIÇÃO PODE NÃO LEVAR A BONS RESULTADOS NA APRENDIZAGEM) É lógico que, como eu disse, nem sempre... tem hora que a gente percebe "Nossa! Mas por que eu não incluí tal coisa?" ou então "Por que eu estou dando ênfase para um aspecto que não é muito relevante?". Mas é algo que a gente está sempre tentando melhorar. (O PROFESSOR REFLEXIVO SOBRE SUA PRÁTICA PEDAGÓGICA)

OBS. PARTICIPANTE Professora se autoavalia, referindo que há pontos positivos e negativos, dizendo que queria ter podido acompanhar um pouco mais os estudantes, e que queria melhorar alguns aspectos, principalmente quando não há visita lá no campo de estágio e não há outra atividade. Avalia muito bem o grupo. Refere que a experiência com os estudantes está sendo muito rica para ela também. (PROFESSOR REFLEXIVO – AUTOAVALIAÇÃO DE SUA ATUAÇÃO)

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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Quadro 3.3.5 - Quadro de Apresentação das Situações-Limites Individuais

SITUAÇÕES-LIMITES (em forma de questões) – P13

UNIDADES DE REGISTRO

DIVERGENTES

1. Como ser mais professor diante das várias adversidades no

trabalho docente?

ENTREVISTA [...] às vezes, a gente pesquisa... Nem sempre você está numa disciplina, ou você é alocado em uma disciplina que você tem a possibilidade de ensinar na graduação a mesma coisa em outro nível na pós e fazer a extensão. (FALTA ARTICULAÇÃO ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO) Não é uma coisa ah hoje vamos mudar o currículo e vai dar certo. Tem que ter um tempo e um investimento nas pessoas. [...] tinha uma expectativa em relação ao currículo. Só que a universidade sempre privilegiou nos docentes a especialização. E, aí, da noite para o dia, o especialista teve que ser generalista. (REFORMULAÇÃO CURRICULAR SEM FORMAÇÃO PERMANENTE PARA A MUDANÇA) [...] então, mudou tudo [o currículo] muito de uma vez, não foi progressivo. (MUDANÇA REPENTINA DO CURRÍCULO SEM PROCESSO FORMATIVO)

2. Como superar os dilemas e problemas do planejamento de ensino

e da gestão do processo de ensino-aprendizagem?

ENTREVISTA Não é suficiente [o tempo]. Justamente por conta do alto grau de exigência de publicação, de saída de aluno de pós-graduação [tachado feito pelo participante durante restituição individual] professor para o pós-doc [no exterior]. (TEMPO DE PLANEJAMENTO DE ENSINO INTERFERIDO POR OUTRAS DEMANDAS ACADÊMICAS) Então no mínimo, no mínimo, não necessariamente no período do trabalho, duas horas de planejamento para cada determinada aula. (PLANEJAMENTO DE ENSINO REALIZADO FORA DO EXPEDIENTE) Para você rever slides, porque as coisas... tem algo novo que saiu. Para, realmente, você atualizar. Eu costumo falar para os alunos que a gente está dando uma aula e aquilo pode ser a maior burrice do mundo, porque alguém já descobriu uma coisa nova diferente lá na China. Dali duas horas, saiu na internet e o que você falou não é mais verdade. Então, eu procuro fazer essa atualização e investimento de estudar. (PLANEJAMENTO DE ENSINO REDUZIDO A CONTEÚDOS CONCEITUAIS E TEORIAS) Então, o que acontece, quando a gente fazia troca de campo, muitas vezes, a gente não queria pegar determinado aluno de determinado colega, porque vinha com muita dificuldade. Então, parecia que sempre você estava tentando suprir, então a gente optou por pegar um aluno e ele é seu do começo ao fim da disciplina. [...] mas, eu acho que do ponto de vista de experiências do aluno, a gente privou ele de ter contato com campos que são diferentes. Acho que por um lado a gente beneficiou, por outro, a gente prejudicou. (GESTÃO DO ENSINO-APRENDIZAGEM VOLTADA PARA O TRABALHO DO PROFESSOR E NÃO PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM)

OBSERVAÇÃO Referiu também que estão usando estudos de casos fictícios na disciplina, mas já percebeu que a estratégia não tem sido muito boa a partir da avaliação dos estudantes. Referiu que para o próximo ano, certamente, vão reorganizar a disciplina para o estudante aproveitar, ao máximo, a experiência dos casos do estágio.

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(REORGANIZAÇÃO DA DISCIPLINA PARA UM GRUPO DE ESTUDANTES A PARTIR DAS INDICAÇÕES FEITAS POR OUTRO GRUPO DE ESTUDANTES)

3. Como compreender e conhecer a própria prática

pedagógica?

ENTREVISTA Então, ele traz as vivencias dele com o paciente. A gente faz imersão quarta e quinta, e toda terça à noite a gente senta para discutir as vivências do campo. Para que isto não tome tempo para ele escrever no portfólio, a gente faz isto discutindo no final de cada dia do estágio o que foi bom e o que foi ruim. É lógico que tem dia que é mais tumultuado não dá! (O TEMPO COMO PARÂMETRO DELIMITADOR DAS ESCOLHAS PEDAGÓGICAS) Mas, nem sempre sua estratégia de ser mais próxima, ou... [...] às vezes, brincar não dá certo. [...] É, algumas coisas são dificultadas, porque falta uma estrutura para que a gente possa fazer e adotar estratégia mais emancipadora para o aluno. Porque a gente ainda tem um grande número de disciplina que têm uma carga grande de abordagem teórica. (REFERE A DIFICULDADE PARA IMPLEMENTAR ENSINO EMANCIPATÓRIO)

AN. DOCUMENTAL O tópico critérios de avaliação, no plano da disciplina é pouco claro e um tanto incompleto, não mencionando os critérios para a avaliação atitudinal.

4. Como reconhecer e superar as abordagens pedagógicas

tradicionais?

ENTREVISTA [...] uma aluna que tinha um procedimento para fazer o que exigia uma habilidade técnica, [...] Falei, vamos lá para você fazer... Ela falou ‘eu não vou fazer isso’, ‘eu não quero fazer esse procedimento’, ‘eu não gosto desse procedimento’; e tem mais, ‘eu não vou ser enfermeira de hospital; eu vou ser enfermeira de saúde da família’. [...] Mas é um direito do aluno. A gente conversou. Isso teve interferência na nota do enfrentamento. (AVALIAÇÃO SUBJETIVA E SOMATIVA) E este ano, eu fui dar aula de *** para a turma do bacharel - são oitenta alunos. Eu nunca tive problema de dar aula, os alunos sempre participam, eu faço perguntas. E os alunos não paravam de conversar. Era uma aula extensa de cárdio e eu já estava extremamente rouca. (EXPOSIÇÃO/NARRAÇÃO E POSTURA PASSIVA E POUCO PARTICIPATIVA DOS ESTUDANTES) [...] eu acho que a gente tem um problema maior do que ensinar, que é relacionado à avaliação. Então, como ser o mais imparcial possível na hora de avaliar o desempenho. E o quanto nós temos que incorporar outras ferramentas que não seja a prova. [...] Então, eu acho que nós também temos um sistema de avaliação muito precário. E o aluno por outro lado, como ele é avaliado por nota para uma série de coisas ele reclama e sempre quer nota maior [acrescentado pelo participante durante a devolutiva individual]. (NECESSIDADE DE UTILIZAR OUTROS INSTRUMENTOS E FORMAS AVALIATIVAS) Eu acho que a nota deveria ser sete [a nota] como nas outras universidades, ou, a gente deveria ter outro sistema de fazer avaliação. E uma coisa, eu sou insatisfeita comigo também, em termos de avaliação. Porque, na verdade, a gente teria que conseguir fazer do aluno quando começou e quando saiu. Quando a gente trabalha em grupo, eu ainda não consegui eu tento, mas vencer aquela coisa de botar na escada os alunos. Esse foi melhor que esse. Aí, é como se botasse tudo num saco e tentasse estabelecer uma ordem. Isso é uma coisa que tem gerado insatisfação e reflexão. Mas assim, também não avancei muita coisa, não. Mas tenho tentado comparar o aluno com ele mesmo.(ÊNFASE PARA A AVALIAÇÃO SOMATIVA E CLASSIFICATÓRIA) [...] então, teve aluno na minha disciplina que fez uma cobrança, que quando chegou lá na frente na hora de cobrar, não cobrou. Então, os alunos também têm que cobrar, deveriam fazer parte de cobrar uma melhora em termos pedagógicos. Mas porque eles não fazem isso? Porque têm medo da repercussão da maledetta da nota. (O PODER DA NOTA) Então, eu tenho procurado diminuir um pouco as aulas [teóricas]... Nas de clínica; e a gente fazer mais discussão sobre os casos da prática. E, ainda, sinto que o nosso aluno, embora tenha uma carga horária grande, que precisaria diminuir conteúdo, principalmente, do terceiro ano para frente e, ele ter mais carga horária prática. (SEPARAÇÃO TEORIA E PRÁTICA)

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OBSERVAÇÃO

Este encontro tratou-se de uma aula teórica e expositiva. Professora diz que a aula vai ser mais tranquila e pergunta para os estudantes se pode ir direto, sem intervalo. A aula aconteceu em um auditório com uma turma de aproximadamente oitenta estudantes. (NARRAÇÃO - AULA EXPOSITIVA) Durante a aula, a professora faz tentativa de conversar com os estudantes. Professora faz perguntas informativas, por exemplo, "O que psoríase?" e logo responde. Professora pergunta para estudantes como se faz um referido teste, os estudantes respondem e a professora complementa. (PERGUNTAS INFORMATIVAS) Professora para a aula, diz que vai fazer a chamada e vai passar a lista para o pessoal assinar e quem estivesse conversando ou fazendo outra atividade que está livre para fazê-lo em outro lugar, porque ela não quer ficar rouca tendo que falar mais alto. Perguntou se os estudantes tinham prova. Estudantes referem que sim (microbiologia). Professora fez a chamada oralmente e depois passou a lista para estudantes assinarem. (AS CONSEQUÊNCIAS DA AULA EXPOSITIVA/NARRAÇÃO) Ao final da aula, a professora mostra a nota da prova, os estudantes têm que se dirigir até à frente da sala para verem individualmente sua nota. Eles ficam alvoroçados e vão e se aglomeram ao redor da professora. (O PODER DA NOTA) Outra estudante veio perguntar para a professora se ela podia fazer uma medicação endovenosa para um paciente que estava fora da enfermaria, ele estava no local de convívio 'tomando um sol'. Professora informa que é melhor pedir para ele entrar, fazer a medicação no leito e depois ele pode sair de novo. Referiu que é melhor assim, porque se o paciente tiver alguma intercorrência, ele já estará dentro da enfermaria. (ABORDAGEM INFORMATIVA EM ESTÁGIO) [...] o foco é no conteúdo específico a ser discutido e não na forma de apresentação do estudo de caso. E complementa dizendo que "não é para sair dizendo depois nas disciplinas didáticas que a professora de clínica deixou apresentar sentada!". (COMPREENSÃO INSTRUMENTAL DE DIDÁTICA) Professora, durante a apresentação da estudante, pergunta e responde ela mesma suas próprias perguntas, tais como "O que entraria aí para a gente considerar risco de exposição a patógeno?"; "O que aumenta o risco de exposição a patógeno?", e responde "Estar hospitalizado". (PERGUNTA E RESPONDE) Professora usa perguntas do tipo informativas e responde com gestos. Um exemplo disso foi: "Ele tem problema renal?" - e com a cabeça sinalizou que não, ou seja, perguntando e respondendo suas perguntas. (PERGUNTAS INFORMATIVAS)

AN. DOCUMENTAL Os objetivos no plano da disciplina visam apenas conhecimentos e habilidades, não mencionando as atitudes. Os conteúdos expressos no plano da disciplina não demonstram preocupação com a formação atitudinal. No tópico avaliação, do plano de aula, há menção à avaliação atitudinal quanto à "participação do aluno nas atividades teórico-práticas nos laboratórios e em sala de aula". No tópico norma de recuperação, do plano de disciplina, fala-se em processo de recuperação, mas aqui entendendo processo como a situação de refazer provas de

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conteúdo conceitual. Segundo a norma de recuperação do plano de disciplina "para a média final da recuperação será considerado as notas anteriormente obtidas nas avaliações do período regular da disciplina e a nota final da avaliação realizada na recuperação. Será aprovado o aluno que obtiver média maior ou igual a 5".

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 6 - Exemplo de anotação durante um momento de restituição individual Quadro P06 - Quadro contendo anotações no diário de pesquisa durante uma restituição individual

RESTITUIÇÃO INDIVIDUAL P06 07-FEV-2017

Quanto à devolutiva, fizemos um skype no dia 7 de fevereiro de 2017, às 14 horas, com duração de 30 minutos. Neste momento, conversamos a partir de três questões: 1-) comente sobre seus dados; 2-) Comente sobre as políticas neoliberais, fazendo um olhar sobre seus dados (elementos emancipatórios e situações-limites; 3-) Comente como você se sente diante das políticas atuais, aquilo que é sentido diretamente no seu local de trabalho, relacionando com seus dados. Relato da conversa: Professora parabeniza o trabalho que tem sido feito nesta pesquisa, refere achá-lo bastante interessante. Se surpreendeu com o modo como tratei os dados, o modo como fiz a comparação entre o discurso e a prática. Professora diz ‘quando eu recebi o seu e-mail, eu não o abri, porque fiquei assim com aquele medo, ai como eu fui avaliada, não é!’. Refere que quando abriu, percebeu que os dados faziam uma comparação entro o seu discurso e sua prática. Referiu que o referencial teórico que usei casa bem com o processo, com a prática pedagógica. Referiu que, de primeiro momento, teve um pouco de dificuldade de entender os dados, e que resolveu essa dúvida comigo por e-mail. A professora disse ‘fui ler o que eu falei e pensei – será que penso desse jeito ainda? Será que isso me reflete mesmo?’. E ela refere que acha que não em algumas coisas, pois justifica esta percepção a partir de um momento em que está fora do Brasil, distante das questões de seu local de trabalho. Refere não saber se teria a mesma percepção se estivesse aqui no Brasil. Refere que talvez sua percepção tenha sido diferente por estar fora, ‘saindo desse mundo de rotina de escola, de sala de aula, de planejamento, de reuniões pedagógicas, enfim, da vida do professor da *** [universidade]. Refere que pensa que é fundamental para se refazer professor saindo um pouco para olhar de fora, voltar a estudar. Refere ‘não é só o ensino, a pesquisa e a extensão que nos fazem professores, o fato de voltar a estudar, de parar para pensar... nem tanto a questão de sair do país, mas de conhecer outra realidade de ensino e pensar sobre aquilo faz muita diferença’. Refere que isso não é feito no Brasil e nem no contexto onde atua como docente ‘a gente acaba não parando para pensar nisso’. Ela refere que mantém a maior parte do que está nos dados, referindo que não se sentiu em nenhum momento incomodada, mal avaliada, coagida, ou pensando que aquilo não a reflete. Continua dizendo que o conjunto dos dados a reflete sim. Na parte de como ser mais professor diante das adversidades, ela refere que quando se está no seu lugar de trabalho, se pensa que nunca há um lugar pior e que a experiência no exterior a fez perceber que as dificuldades são muito parecidas. Refere que o caminho não é só reclamar ou dizer que não tem jeito, porque ‘a gente vai ter que achar um jeito para resolver’. Quando peço para a professora para comentar sobre a segunda pergunta, referente às questões neoliberais, dos objetivos do Banco Mundial, da privatização das universidades, do ensino à distância, com relação aos dados e com relação ao seu papel como professora e pesquisadora. Ela me responde ‘eu acho que o movimento econômico, pelo próprio nome, por envolver economia, por envolver dinheiro, envolve poder. Não quero ser pessimista, mas acho difícil organizarmos um movimento forte de resistência que mude esse cenário! Onde vejo que posso e tenho tentado fazer mudanças, porque é difícil unir a pessoas porque cada um entende e pensa de um jeito diferente, eu acho que é fazer o trabalho de formiguinha mesmo, tentando disseminar de formiguinha em formiguinha e daqui a pouco temos um formigueiro inteiro de pessoas pensando e fazendo um movimento contra’. Professora refere, a partir de sua experiência no exterior, que mesmo os dirigentes no poder que tem tentado fazer resistência às políticas neoliberais têm tido muitas dificuldades. Refere ‘eu não sei até quando a gente vai resistir a esse modelo. Vou dar um exemplo claro, com a aposentadoria de algumas colegas da área em que eu leciono, eu não sei até quando a gente consegue manter essa proposta pedagógica por uma questão numérica, como é que vamos conseguir trabalhar com 150 alunos das três disciplinas de cada semestre com três professores, dentro de uma proposta de trabalhar com 10 estudantes por professor. Eu posso querer, eu posso fazer, mas a instituição talvez não me dê condições para. Então, não basta apenas aquilo que eu acredito, que minha colega acredita. Existe uma série de outros fatores que independem da gente que acabam se colocando nesse processo. E eu não vou ser hipócrita de dizer um ano, dois anos, três anos, eu aguento, por exemplo, duplicando a minha carga horária, tendo 20 horas de aula por semana, mas eu não vou conseguir fazer isso para o resto da minha vida para suportar uma proposta que eu acredito, mas a minha saúde e a minha qualidade de vida também estão em jogo. Hoje eu tenho medo de que se daqui a cinco anos a gente vai estar dentro desse modelo ou se a gente vai ter voltado àquelas aulas chatas em que a gente põe 50 alunos dentro da sala e apresenta os conteúdos e eles copiam, fazem uma prova, e pode ser uma prova um pouco mais que façam com que eles pensem um pouco mais e individual e pronto! Não porque a gente queira, mas porque esse modelo nos força a. Hoje não existe perspectiva de preenchimento da vaga de *** que está em vias de aposentadoria. Sem ela a gente consegue, porque está em quatro, mas a professora *** também já disse que até o final do ano está aposentando. Aí, estaremos em três e como é que vai ser? É uma força muito poderosa e eu acho que as pessoas não percebem isso ou

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não querem perceber porque por outro lado esse modelo traz um pouco mais de conforto, de facilidade, as coisas são mais práticas, mais fáceis, mais acessíveis no sentido de muito consumismo. Então, as pessoas acabam se seduzindo um pouco por isso e acabam não vendo o impacto disso no futuro’. Peço para professora comentar suas anotações nos quadros sobre a questão das abordagens tradicionais e ela faz uma explicação melhor do que quis dizer, referindo que ela acredita que precisamos abandonar as perspectivas tradicionais de ensino e isso não significa que se tenha que abolir a estratégia da aula expositiva, referindo que esta última é uma estratégia que pode ser usada caso seja necessária dentro de uma abordagem não tradicional. Ela diz ‘algumas coisas a gente tem que apresentar para o aluno. Eu não vejo mal em usar em alguns e poucos momentos uma apresentação de slides, uma aula um pouco mais expositiva de algumas coisas que às vezes eu percebo que ao longo do processo não estão sendo apreendidas por eles’. Quando falamos de metodologias ativas, professora refere que ‘o grande drama que se criou no *** [estabelecimento de ensino] é que há dois grupos, o grupo que acha que metodologia ativa é você não dar aula, é o aluno tem que fazer tudo sozinho, tem que buscar tudo sozinho. Não posso dar uma aula expositiva porque senão eu estou quebrando o método... e um outro grupo que não entende que ser mais ativo não significa eu abrir mão daquilo, porque aquele professor que tem 30 anos [de carreira] ele cresceu dentro daquilo, como é que eu vou fazer com que ele do nada... eles não vão conseguir. Então, eu acho que um grande erro foi que as pessoas não souberam equalizar isso. Entender isso que você está falando, de que existe meio termo... então, pode ser por isso que a gente viva dois modelos pedagógicos...”. Em relação à pergunta 3 como a professora se sente, ela diz ‘eu me vejo como alguém que possa fazer mudanças... eu acho que talvez eu não consiga fazer grandes impactos, por exemplo, eu não me vejo como uma professora que vai ser reconhecida nacionalmente, mundialmente, ou por ter colaborado de alguma forma por mudanças na formação, mas eu me vejo como alguém que faz mudanças e que colabora para a formação do aluno individualmente, dentro do grupo com aqueles com quem eu trabalho. Os seus dados acabaram me ajudando a confirmar um pouco mais isso, pelo sucesso dos meus alunos especialmente no final do quinto ano... e por saber que eles ainda levam aquela sementinha de fazer diferente, de pensar criticamente. É um processo de erros e acertos, mas ao mesmo tempo esse processo é muito árduo, porque para fazer isso você tem que enfrentar muita gente, você tem que bater muita boca, mesmo com colegas, com pessoas que você tem um bom relacionamento e em alguns momentos, você precisa se colocar e se indispor para fazer com que aquilo que você acredita tenha alguma valia. Algumas vezes você ganha, algumas vezes você perde. Faz parte! E esse processo é bastante desgastante... às vezes, eu me sinto bastante desgastada. Esse processo de discussão curricular que tivemos há dois anos, foi um processo muito triste para mim, porque eu vi que as pessoas não conseguem entender que a formação do aluno é superior ao meu conteúdo. O que eu vi foi uma briga por conteúdo, o meu conteúdo é mais importante do que o seu. Então, eu preciso de 15 horas a mais... ah essa disciplina não vai usar nada que eles vão usar na prática, então, vamos tirar ela. Muito mais um egocentrismo por parte dos professores do que olhar para aquele conjunto de coisas e dizer ok como é que a gente vai fazer com que isso faça sentido para a formação do enfermeiro? Eu vou continuar fazendo a minha parte, mas eu não posso deixar de dizer que eu estou... não é enfraquecida, mas entristecida por várias situações que eu passei durante a reestruturação curricular que me fizeram me fechar um pouco. Calar um pouco a boca, sabe? Porque as pessoas não sabem diferenciar que as coisas que são ditas ali são dentro de um espaço de trabalho e não é uma briga pessoal. Fortalecida pelos alunos, mas entristecida pelos processos de trabalho que tenho vivido aí no *** [estabelecimento de ensino]’. Referiu que alguns colegas lhe disseram para não voltar do exterior e o que a surpreendeu bastante diante das questões que estão acontecendo.

Quanto às planilhas, professora fez importantes reflexões nos seguintes itens: A) ELEMENTOS EMANCIPATÓRIOS: 1-) GESTÃO CONTÍNUA E ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM Toda a minha aula, eu faço um planejamento, especialmente das aulas que são teóricas aqui e do estágio, porque não da imersão? Porque a imersão eu dependo do contexto, não é? Como as nossas imersões o aluno vai para acompanhar o professor, então, lá o meu planejamento depende do professor, então, o meu planejamento acaba acontecendo lá na hora. Já aconteceram situações de eu chegar lá e de eu ter planejado no meu caderno com quais professores os alunos iriam acompanhar e chegar lá e a turma ter ido para estágio, então, eu ter que refazer o planejamento. (NO ESTÁGIO O PLANEJAMENTO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM ACONTECE IMEDIATAMENTE ANTES DE SEU INÍCIO) – Entendo como compreender como um processo dinâmico, que dependem de interações sociais. Aqui, eu consigo exercer a docência do modo como eu acredito, até porque existe um grupo de pessoas que acreditam na mesma abordagem que eu. Então, o trabalho em grupo acaba fortalecendo e fazendo com que a gente consiga permanecer dentro dessa abordagem, que a gente acredita. (PROFESSORES COMPARTILHAM REFERENCIAL PEDAGÓGICO) – mas isso não

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significa que não haja conflitos até mesmo dentro do próprio grupo. Agora, com a mudança da estrutura curricular, são os saberes que a gente espera que eles desenvolvam, para que eles percebam se eles estão dando conta ou não. (PROFESSORA ACOMPANHA MUDANÇAS CURRICULARES) – mas hoje vejo que é difícil aderir a elas, ou fazer com que os colegas entendam a relevância de suas discussões. 2-) PROFESSOR FACILITADOR/MEDIADOR DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM O conhecimento está dado e cabe a eu ajudá-los a fazer esta compreensão, não é? Ajudá-los a fazer essa aprendizagem cognitiva, de procedimento, de atitude, mas não que eu sou detentora, que eu sei tudo (MEDIAÇÃO DO CONHECIMENTO NAS DIMENSÕES COGNITIVA, PROCEDIMENTAL E ATITUDINAL) – tenho dúvidas sobre essa fala. Hoje penso que o conhecimento não está dado, ele é construído, desconstruído e construído de novo, depende de quem se apropria dele. B) SITUAÇÕES-LIMITES:

1. Como ser mais professor diante das várias adversidades no trabalho docente? Estando fora do país, consegui perceber que todas as instituições de ensino enfrentam a mesma situação. Isso não é só da *** [universidade], infelizmente é um movimento global. Ou você adere a ele ou sofre as consequências.

2. Como compreender e conhecer a própria prática pedagógica? Eu acho que a minha concepção é a crítico-emancipatória, não é? Entender assim que eu preciso fazer com que o aluno se torne, aquele jargão, não é... crítico-reflexivo, mas que eu o emancipe (PROFESSOR EMANCIPA O ESTUDANTE – QUEM EMANCIPA QUEM?) – ainda penso que estou em formação, tenho pouco tempo de carreira docente para me sentir segura. O que sei é que quero que os alunos aprendam a pensar por si próprios e tomarem decisões acertadas, dentro daquilo que seja melhor para a formação de bons professores, enfermeiros.

3. Como reconhecer e superar as abordagens pedagógicas tradicionais? Não vejo mal em usar abordagens tradicionais. O problema está em usá-las o tempo todo. Alguns tipos de conteúdo são muito difíceis de serem apreendidos em métodos mais ativos. Em alguns momentos, se faz importante parar e realmente “passar” algumas informações que tornarão o processo mais calmo e menos conflituoso para o aluno.

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 7 - Quadro analítico gerador do efeito rosa dos ventos P01

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (dependência do imediato; ciclo pedagógico; uso de portfólio reflexivo; devolutiva constante; anotação em bloco de notas; acompanhamento contínuo; devolutiva periódica; foco na formação)

Produtivismo acadêmico (novas demandas; sobreposição e sobrecarga de atividades; cumprimento de prazos) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (insuficiência e insatisfação) Itinerância constante do professor recém ingressante (mudança de campos; desequilíbrio no poder de decisão) Problemas com a implementação curricular (discute o PPP, o currículo, a necessidade de áreas verdes no currículo – tempo para os estudantes, mas não é implementado) Reminiscência da tendência pedagógica tradicional (centralidade do professor; uso da exposição; foco no conteúdo; avaliação somativa)

Papel do Professor no PEA

Professor mediador (usa o ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; usa o diálogo; incentiva a participação do estudante; trabalha a partir dos conhecimentos prévios; trabalha e constrói junto com estudantes um conhecimento mais consolidado; interfere e participa ativamente no processo de ensino-aprendizagem; contextualização: sentido dos conteúdos na formação do enfermeiro para o mundo; usa exemplos; faz reflexão com estudantes sobre o sentido do método de ensino-aprendizagem; se identifica com a Pedagogia Histórico-Crítica; no plano da disciplina há momentos de aprendizagem sobre o método de ensino-aprendizagem utilizado – ciclo pedagógico, e os saberes são trabalhados nas dimensões cognitiva, procedimental e atitudinal)

Reminiscência de professor transmissor (Pedag. Tradicional) (centralidade do professor; uso da exposição; foco no conteúdo; avaliação somativa) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina; refere ter tido experiências mais satisfatórias com o uso de metodologias ativas e que as atividades que envolvem mais os estudantes parecem fazer mais sentido para os estudantes e para o professor; uso de trabalhos em pequenos grupos durante parte de uma aula expositivo-dialogada; sugere aos estudantes que compartilhem o genograma e o ecomapa que eles construíram com as respectivas famílias; professora constrói plano de aula em seu caderno, em que consta na parte de estratégias, múltiplos métodos que valorizam questões reflexivas, ativas e problematizadoras: vídeo para sensibilização, role-playing com os estudantes, trabalho em grupo, apresentação e discussão; no plano de aula, ainda, os

Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia Tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem; no plano da disciplina, os objetivos estão escritos na perspectiva do ensino, mesmo que no plano de aula a professora os tenha escrito na perspectiva da aprendizagem)

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objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem; uso de questões problematizadoras; refere valorizar a perspectiva da pedagogia histórico-crítica e se preocupa com a formação para a cidadania)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (refere ter uma relação horizontal com os estudantes, mas com uma definição clara dos papéis de cada um; faz contrato pedagógico com os estudantes durante o processo de ensino-aprendizagem; usa perguntas problematizadoras; usa o conflito de ideias para a aprendizagem; em trabalho em grupo, professora refere que os próprios estudantes vão decidir e se dividir para fazê-lo; em observação, professora se mostra aberta para o diálogo; uso da sala de aula em círculo; demonstra atitude de compromisso com o serviço de saúde)

Reminiscência de postura punitiva e pouco democrática (o poder da nota) (Em conversa com uma estudante em sala de aula, a estudante diz que vai precisar entregar o portfólio depois. Professora refere que se o portfólio for entregue após a data daquele encontro, ele valeria menos pontos. Sugeriu que a estudante entregasse ainda naquele dia no departamento até às 19h30, e pedindo para a secretária dar um visto de recebimento no documento; utilização dos critérios de avaliação de uma maneira pouco democrática – os critérios de avaliação não são construídos e/ou discutidos com os estudantes)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (mesmo que no plano da disciplina é mencionado o uso das duas finalidades avaliativas somativa e formativa, o ciclo pedagógico e o portfólio abrem margem para a utilização da finalidade formativa da avaliação: ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado de modo a evidenciar o seu caminho (processo) no desenvolvimento dos ciclos pedagógicos, por meio da síntese das experiências; reflexão sobre suas aprendizagens; delimitação das questões de aprendizagem; busca por recursos para fundamentar seus conhecimentos e ações; registros da aplicação das aprendizagens; autoavaliação das relações interpessoais vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos, bem como sua inter-relação com o grupo. O portfólio deverá estar disponível durante as atividades, a fim de possibilitar o registro das experiências. Esse material será analisado pelo professor com foco na reflexão do desenvolvimento do estudante no processo de aprendizagem, registrando suas considerações. Ele será analisado ao longo do ano. O professor registrará as observações sobre os estudantes, apreendidas nos ciclos pedagógicos, no decorrer da disciplina’; foram observados e acompanhados momentos de devolutiva com estudantes; professora teve momento para fazer devolutiva e discutir com os estudantes o

Reminiscência da avaliação somativa (no plano da disciplina há a seguinte menção: ‘como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado [...]’ – percebe-se, então, que o plano de disciplina refere duas finalidades distintas e divergentes da avaliação – foco na nota ou foco na formação?; há certo foco na nota e médias: ‘Será realizada a média entre: 1-desempenho do estudante nos ciclos pedagógicos, avaliados através do portfólio (peso 3), 2-Desempenho na imersão (peso 2), 3-Atividade nos pequenos grupos (peso 3), 4- Média das notas das avaliações cognitivas (realizada no final de cada semestre) (peso 2).’) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes) Reminiscência de avaliação punitiva (Em conversa com uma estudante em sala de aula, a estudante diz que vai precisar entregar o portfólio depois. Professora refere que se o portfólio for entregue após a data daquele encontro, ele valeria menos pontos. Sugeriu que a estudante entregasse ainda naquele dia no departamento até às 19h30, e pedindo para a secretária dar um visto de recebimento no documento)

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resultado do exercício cognitivo, mas isto não está mencionado no plano da disciplina)

Outros dados Fundamenta sua concepção em preceitos da teoria histórico-crítica ou dialética (refere valorizar a perspectiva da pedagogia histórico-crítica, tentando trabalhar nesta perspectiva; refere preocupar-se com formação para a cidadania; professora, em entrevista, demonstra refletir sobre sua prática pedagógica com um discurso reflexivo; professora de autoavalia em um encontro com os estudantes)

P02

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (foco nos objetivos formativos; olhar para conteúdos; participação em planejamento curricular; acompanha e participa das discussões curriculares; acompanha de perto os estudantes no cenário; realiza procedimentos junto com os estudantes; dá devolutiva constante; acompanhamento contínuo; faz junto com o estudante; foco na formação; refere preparo prévio para os laboratórios – preparam roteiros, vai para o laboratório e treina antes de ter os encontros ou aulas nos laboratórios com os estudantes)

Produtivismo acadêmico (cobranças quantitativas de produção científica; sobreposição e sobrecarga de atividades; cumprimento de prazos) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (não teve olhar para isso em sua pós-graduação; foco na pesquisa; ingresso baseado na produção científica; não se vê como professor; não é exigido o planejamento das aulas) Disponibilidade de tempo e grade horária dificultam o planejamento (carga horária/tempo insuficiente para trabalhar conteúdo; escolha de métodos expositivos que deem conta do conteúdo; questões burocráticas dificultam trabalho com metodologias ativas: grade horária fechada, horários delimitados, número de estudantes) Reminiscência da tendência pedagógica tradicional (planejamento centrado no professor e sua área de ensino; planejamento solitário; uso da exposição; foco no conteúdo; avaliação somativa)

Papel do Professor no PEA

Professor facilitador (Pedagogia Renovada) (não trabalha somente conteúdo conceitual e cognitivo, olha para atitudes e comportamentos, com postura não impositiva, mas reflexiva; incentiva que o estudante busque e estude; valoriza e incentiva a participação dos estudantes; utiliza exemplos seus e dos estudantes; disponibiliza material complementar para estudantes; indica leituras; demonstração de uma consulta de enfermagem real para os estudantes; usa abordagem questionadora; plano da disciplina: preocupação com visão integral dos conteúdos, organizados em saberes cognitivos, procedimentais e atitudinais; método foca no conteúdo específico em sala de aula, e conteúdo prático em estágio e foca na aprendizagem) Professor transmissor (Pedagogia Tradicional) (planejamento centrado na área de ensino – conteúdo, ou no professor; uso da exposição dialogada, com frequentes perguntas confirmativas e informativas; avaliação se aproxima da perspectiva somativa) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (Pedagogia Renovada e Pedagogia Tecnicista) (a disciplina, em que a professora leciona, usa como principais estratégias a aula expositivo-dialogada, estudo de caso real, seminário, laboratório de prática profissional, atividade prática no mundo do trabalho – estágio, elaboração e execução de atividade educativa – por meio do que se observou ênfase tanto nas questões cognitivas quanto nas questões procedimentais; quando professora refere

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questões atitudinais, ela se reporta a reflexões sobre comportamentos tais como quando os estudantes colocam os pés na cadeira ‘Eu estava numa sala de aula e tinha uma menina que tirou o sapato e ergueu o pé na carteira da frente. Então, o que eu fiz? Eu a chamei para conversar, eu acho que, aqui dentro, a gente também precisa pensar que a formação dela enquanto profissional perpassa pelo comportamento que ela tem, pela postura que ela tem’; refere acreditar em uma ‘metodologia mais proativa, em que o aluno, ele é o foco, que a gente tem que estimular esta questão mais reflexiva dele’; foco na aprendizagem cognitiva e psicomotora; refere que não usa mais o método do ciclo pedagógico, mas usam estratégias que se assemelham; refere que usa laboratórios de prática profissional, vídeos, filmes, recortes e construção de linha do tempo, tempestade de ideias, cartões para estudantes analisarem, aulas expositivo-dialogadas, seminários, professores convidados, simulação, trabalhos em grupos com discussões; em observação de supervisão de estágio, professora sugere a estudantes que trabalhem em dupla e analisem as informações da paciente antes de irem conversar com a mesma e prestar os cuidados; professora explica o caso de uma paciente e pede para estudantes fazerem um cálculo, ela também faz e ao final conferem juntos; em demonstração de atendimento para estudantes, professora pede para a paciente se os estudantes podem praticar um procedimento sob sua supervisão – durante a realização do procedimento, professora vai fazendo questões para ajudar os estudantes em relação ao raciocínio clínico; no plano da disciplina, os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (professora refere buscar ser acessível aos estudantes; em observação, percebeu-se o uso da exposição dialogada com alguns momentos de interação e abertura para conversa e diálogo com estudantes, mesmo que dentro de um movimento para o desenvolvimento do raciocínio clínico, com foco no desenvolvimento cognitivo; demonstra atitudes de envolvimento com o cenário de estágio e com a aprendizagem de seus estudantes por meio de questionamentos e exercícios cognitivos)

Reminiscência de postura centralizadora e pouco democrática – o poder da nota (Pedagogia Tradicional) (refere em entrevista opção por atividades com menor participação dos estudantes – deixam de usar a encenação pelos estudantes para uma demonstração pelos professores; uso da exposição de conteúdos conceituais e ênfase no cognitivo; predomínio de perguntas confirmativas e informativas durante a aula expositiva; uso da avaliação somativa no plano da disciplina, em que os critérios de avaliação não são discutidos ou construídos junto com os estudantes)

Avaliação no PEA Avaliação somativa (foca no conteúdo; foco na nota; usa médias para cálculo das notas; a parte formal usa uma atividade de expressão cognitiva valendo de 0 a 10 pontos e média das notas obtidas em cada cenário de estágio: ‘A avaliação do estudante constará da soma de: Nota 1: atividade de expressão cognitiva­ valor de zero a 10. Nota 2: média das notas obtidas nas atividades teórico-práticas em cada um dos contextos (consultórios de admissão e observação/centro obstétrico; unidade de alojamento conjunto; unidade de internação de Ginecologia) – valor de zero a 10’) Avaliação informal (no plano da disciplina, refere-se ‘média das notas obtidas nas atividades teórico-práticas em cada um dos contextos (consultórios de admissão e observação/centro obstétrico; unidade de alojamento conjunto; unidade de internação de Ginecologia) – valor de zero a

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10’ – isso sinaliza o uso da avaliação informal, em que se sobressaem as representações do professor sobre o desempenho dos estudantes, não ficando claro no plano da disciplina nem o caminho e nem os critérios para se obter essa nota) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados

P03

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (dependência do imediato; ciclo pedagógico; envolve equipe de saúde, gerentes e cidadãos da comunidade; administrar o tempo da atividade acontecendo; compartilhado com os estudantes em devolutivas de portfólio – foco no plano da disciplina e conteúdos a serem trabalhados; planejamento democrático com estudantes: compartilhamento de responsabilidade no PEA; planejamento prévio minucioso para realização de laboratórios de prática profissional; uso de portfólio reflexivo; devolutiva constante e individual; acompanhamento contínuo; devolutiva periódica e individual; foco na formação)

Produtivismo acadêmico (malabarismo para articular todas as funções – ensino-pesquisa-extensão; jornada de trabalho maluca) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (curso de pedagogia universitária não responde às necessidades específicas; jornada de trabalho dificulta investimento na formação pedagógica) Reminiscência da tendência pedagógica tradicional (objetivos escritos na perspectiva do ensino; finalidades avaliativas divergentes: avaliação somativa e avaliação somativa; critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com estudantes – pouco democrático) Falta apoio institucional (para trabalhar com estudantes com dificuldades)

Papel do Professor no PEA

Professor mediador (uso do ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; busca despertar a curiosidade dos estudantes para explorar a unidade de saúde; busca protagonismo dos estudantes; problematiza as discussões; integra profissionais de saúde e cidadãos que utilizam o SUS nos processos de ensino-aprendizagem; incentiva estudantes a ajudarem nas atividades políticas da unidade de saúde – divulgação da organização da comissão local de saúde; busca integrar os estudantes com os servidores da unidade de saúde; busca corresponsabilização dos estudantes com as atividades dos locais de imersão; reflete com estudantes sobre o uso do portfólio, sobre ser ativo no processo de ensino-aprendizagem; visa a transformação)

Reminiscência do Professor Facilitador (Se nomeia facilitador no processo de ensino-aprendizagem) Reminiscência do papel do professor transmissor (Pedagogia Tradicional) (no plano da disciplina, objetivos escritos na perspectiva do ensino, refere-se utilizar ambas as finalidades avaliativas – somativa e formativa; critérios de avaliação formulados previamente pelos professores) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; prefere trabalhos em pequenos grupos em sala de aula – refere ter formação em grupo operativo de Pichon Rivière; ao falar dos laboratórios de prática profissional que ocorrem junto com o ciclo pedagógico, professora refere: ‘[...] porque a gente tem os laboratórios de prática profissional e, em cada um deles, a

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gente faz um desenho conforme necessidade, ou objetivo daquela atividade. Então, em geral a gente tem uma atividade disparadora, para mobilizar a atenção e o foco do que se quer trabalhar. Depois, partindo dos elementos que os estudantes podem trazer sobre o tema, a gente busca fazer uma atividade ativa, em que o estudante, em pequenos grupos, trabalham as questões, ou fazem uma leitura ou uma tarefa que depois tem um momento de compartilhar, e tem o momento de teorização, mais ao final, para um certo fechamento’; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina; refere que utiliza a estratégia da territorialização com os estudantes para inseri-los cada vez mais na comunidade onde se localiza a unidade de saúde onde fazem as imersões ao longo do ano; uso de questões problematizadoras e refere o uso da problematização e a importância da experiência ‘Eu acho que o meu trabalho se pauta em alguns elementos, [...] a questão da aprendizagem pelo trabalho, aprendizagem a partir da experiência em serviço, pela experiência. A questão da problematização das vivências. Então, a perspectiva do Paulo Freire, o referencial do Arco de Maguerez para ajudar os alunos para percorrerem, para explorarem o conhecimento, o processo de aprendizagem a partir da vivência, para refletir, para teorizar, para retornar à realidade. Isso é uma referência que estrutura as disciplinas em que eu trabalho - qualquer uma delas’; em interação com estudantes, demonstra preocupação com o processo formativo que faça sentido; expressa o desejo da formação de profissionais reflexivos)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (no ciclo pedagógico, a ênfase é no diálogo, na discussão de ideias, na reflexão, na crítica, visando à construção do conhecimento; o professor acompanha a escrita do portfólio – no plano da disciplina há momentos de entrega do portfólio – e foi possível observar também que a professora dá devolutiva do que leu no portfólio de cada estudante de forma individual; traz sua apreciação do exercício cognitivo para discutir com estudantes em sala de aula e se coloca aberta a revisões; faz uso de perguntas problematizadoras sobre conceitos, atitudes e procedimentos; expressa o desejo de formação de profissionais reflexivos e comprometidos com os serviços de saúde; disposição da sala de aula em círculo, em que professor e estudantes podem se olhar nas discussões; foi observado o uso de contrato pedagógico com o grupo de estudantes e momento de tomada de decisão compartilhada entre professora e estudantes, havendo acolhimento,

Reminiscência de postura pouco democrática - o poder da nota (decisão da nota final nas mãos do professor – critérios avaliativos não construídos e nem discutidos com estudantes – pouco democrático)

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abertura e espaços para o diálogo entre professora e estudantes; no plano da disciplina, constam dois momentos oficiais de devolutiva com os estudantes)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (mesmo que no plano da disciplina é mencionado o uso das duas finalidades avaliativas somativa e formativa, o ciclo pedagógico e o portfólio abrem margem para a utilização da finalidade formativa da avaliação: ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado de modo a evidenciar o seu caminho (processo) no desenvolvimento dos ciclos pedagógicos, por meio da síntese das experiências; reflexão sobre suas aprendizagens; delimitação das questões de aprendizagem; busca por recursos para fundamentar seus conhecimentos e ações; registros da aplicação das aprendizagens; autoavaliação das relações interpessoais vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos, bem como sua inter-relação com o grupo. O portfólio deverá estar disponível durante as atividades, a fim de possibilitar o registro das experiências. Esse material será analisado pelo professor com foco na reflexão do desenvolvimento do estudante no processo de aprendizagem, registrando suas considerações. Ele será analisado ao longo do ano. O professor registrará as observações sobre os estudantes, apreendidas nos ciclos pedagógicos, no decorrer da disciplina’; foram observados e acompanhados momentos de devolutiva com estudantes; professora teve momento para fazer devolutiva e discutir com os estudantes o resultado do exercício cognitivo, mas isto não está mencionado no plano da disciplina)

Reminiscência da Avaliação somativa (no plano da disciplina há a seguinte menção: ‘como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado [...]’ – percebe-se, então, que o plano de disciplina refere duas finalidades distintas e divergentes da avaliação – foco na nota ou foco na formação?; há certo foco na nota e médias: ‘Será realizada a média entre: 1-desempenho do estudante nos ciclos pedagógicos, avaliados através do portfólio (peso 3), 2-Desempenho na imersão (peso 2), 3-Atividade nos pequenos grupos (peso 3), 4- Média das notas das avaliações cognitivas (realizada no final de cada semestre) (peso 2).’) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, mesmo que a professora tenha compartilhado sua decisão sobre a apreciação dos exercícios cognitivos, por exemplo)

Outros dados Desejo de transformação da ‘prática profissional’ por meio da docência (professora refere que seu principal desejo de vir para a docência se refere às experiências prévias como trabalhadora dos serviços de saúde – inclusive da Secretaria Municipal de Saúde – onde percebia práticas não tão adequadas às necessidades dos serviços de saúde – em momento em que o município estava implantando as equipes de saúde da família)

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Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (reuniões com pares para discutir PEA enquanto estudantes estão em momento de busca; usa caderno para planejar atividades esperadas em cenário de imersão; planejamento Solitário em disciplinas em que o professor leciona sozinho; acompanha de perto os estudantes no cenário, participando e fazendo sugestões; uso de caderno para anotações e registros sobre o PEA e seus estudantes; se coloca atenta às discussões com os estudantes, usando exemplos deles para ilustrar os encontros; acompanhamento contínuo; participa e discute com o estudante; foco na formação)

Produtivismo acadêmico (cumprimento do planejamento didático não é prioridade diante das cobranças da universidade; não consegue participar de curso de pedagogia universitária: agenda não permite dedicação ao curso; reuniões de gestão; comissões administrativas) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (refere não seguir nenhum referencial pedagógico; não consegue tempo na agenda para fazer e se dedicar a curso de pedagogia universitária) Reminiscência da tendência pedagógica tradicional (uso da exposição de conteúdo; objetivos escritos na perspectiva do ensino; finalidades avaliativas divergentes: avaliação somativa e avaliação somativa; critérios de avaliação não são compartilhados ou discutidos com estudantes – pouco democrático) Reminiscência do planejamento instrumental (foco no método; foco no conteúdo; feito de forma solitária)

Papel do Professor no PEA

Propensão a professor mediador (em aula expositiva, fala sobre a importância da dimensão política na profissão)

Professor facilitador (uso do ciclo pedagógico; estratégias envolventes e participativas para trabalhar conteúdos conceituais e atitudinais; incentivo a trabalho em grupo; tenta desincentivar a competição entre os estudantes; conversa com estudantes sobre o sigilo das informações das famílias em seus portfólios; reflete sobre alguns comportamentos com os estudantes no sentido de manter o vínculo profissional com a família; aprendizagem da visita domiciliária a partir de uma perspectiva técnica; reflete com estudantes como lidar com as emoções no exercício profissional; quando estudantes e professora já construíram a questão de aprendizagem, professora refere que é preciso pensar em palavras-chave para buscarem nas bases de dados; professora lembra os estudantes que para o próximo relato de busca que é preciso ter mais referências) Reminiscência do professor transmissor (pedagogia tradicional) (uso da exposição de conteúdo; objetivos escritos na perspectiva do ensino; finalidades avaliativas divergentes: avaliação somativa e avaliação somativa; critérios de avaliação não são compartilhados ou discutidos com estudantes – pouco democrático) Referencial pedagógico oculto (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Propensão à Metodologia ativa crítica (na disciplina é usado o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; usa trabalhos em grupos na sala de aula; refere que utiliza muitos jogos, teatro em sala de aula para envolver os estudantes no processo de ensino-aprendizagem; no plano da disciplina, os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem; refere aos estudantes a importância da dimensão política da profissão, apresentando nomes de representantes sindicais e pessoas renomadas na profissão)

Metodologias ativas cognitivas e psicomotoras (Pedagogia Renovada e Pedagogia Tecnicista) (uso de jogos eletrônicos; uso do júri simulado; foco em conceitos, fatos e na dimensão cognitiva da aprendizagem; uso de estratégias de ensino-aprendizagem mais envolventes; busca a cooperação entre os estudantes em sala de aula para resolução de exercícios cognitivos; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina; ênfase no passo a passo, na técnica e no procedimento; técnicas de comunicação; no ciclo pedagógico, refere aos estudantes para irem aumentando a quantidade de referências citadas nas buscas ao longo da disciplina, a cada entrega de portfólio, a cada escrita do relato de busca) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia Tradicional) (uso da narração; uso majoritário de perguntas informativas e confirmativas; os objetivos estão escritos na perspectiva do ensino no plano de disciplina; no plano da disciplina, os estudantes não participam de discussão e da construção dos critérios avaliativos)

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Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (usa questões problematizadoras durante sua interação com os estudantes; refere o uso da problematização; refere conversar com os estudantes de uma maneira transparente)

Reminiscência de postura pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Avaliação no PEA Propensão à avaliação formativa (mesmo que no plano de uma das disciplinas é mencionado o uso das duas finalidades avaliativas somativa e formativa, o ciclo pedagógico e o portfólio abrem margem para a utilização da finalidade formativa da avaliação: ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado de modo a evidenciar o seu caminho (processo) no desenvolvimento dos ciclos pedagógicos, por meio da síntese das experiências; reflexão sobre suas aprendizagens; delimitação das questões de aprendizagem; busca por recursos para fundamentar seus conhecimentos e ações; registros da aplicação das aprendizagens; autoavaliação das relações interpessoais vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos, bem como sua inter-relação com o grupo. O portfólio deverá estar disponível durante as atividades, a fim de possibilitar o registro das experiências. Esse material será analisado pelo professor com foco na reflexão do desenvolvimento do estudante no processo de aprendizagem, registrando suas considerações. Ele será analisado ao longo do ano. O professor registrará as observações sobre os estudantes, apreendidas nos ciclos pedagógicos, no decorrer da disciplina’)

Avaliação somativa (avaliação diagnóstica com foco no conteúdo conceitual por meio de jogos e quizzes; refere que busca incentivar a não competição entre seus estudantes por meio de uma avaliação em que os estudantes são incentivados a cooperarem para responder questões conceituais e factuais – quizz; foco no quantitativo, refere para estudantes mais referências na próxima busca, pois haviam combinado de aumentar progressivamente o número de referências usadas; foco na nota – usa a nota para mobilizar os estudantes para responderem e participarem dos quizzes e nas aulas; refere muito soma pontos, perde pontos durante os jogos, quizzes etc.; ‘A avaliação terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina. Constarão da avaliação da participação do estudante em exercício de trabalho em grupo, com apresentação de seminário reflexivo em forma de debate (3 pontos), exercícios de trabalho em grupo para resolução de problemas sobre o aprendizado trabalhado em sala, utilizando jogos eletrônicos – QUIZ (3 pontos) e exercício de avaliação cognitiva (4 pontos) de modo que a soma entre eles totalize 10’; no plano de outra disciplina em que a professora leciona consta: há certo foco na nota e médias: ‘Será realizada a média entre: 1-desempenho do estudante nos ciclos pedagógicos, avaliados através do portfólio (peso 3), 2-Desempenho na imersão (peso 2), 3-Atividade nos pequenos grupos (peso 3), 4- Média das notas das avaliações cognitivas (realizada no final de cada semestre) (peso 2).’) Avaliação informal (há uso da avaliação informal em meio a outras estratégias e instrumentos avaliativos: ‘Constarão da avaliação da participação do estudante em exercício de trabalho em grupo, com apresentação de seminário reflexivo em forma de debate (3 pontos)’ – o que seria participação e como se avalia participação? Esse tipo de avaliação dá margem para sobressaírem as representações da professora sobre os estudantes, já que não existe na disciplina um espaço para discussão das notas e seus pesos com os estudantes) Descompasso na concepção de avaliação (no plano da disciplina é referido o uso de avaliação de finalidade somativa e de finalidade formativa ao mesmo tempo ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática, avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. Como um dos principais instrumentos de avaliação formativa e somativa, o portfólio do estudante deverá ser estruturado de modo a evidenciar o seu caminho (processo) no desenvolvimento dos ciclos pedagógicos, por meio da síntese das experiências; reflexão sobre suas aprendizagens; delimitação das questões de aprendizagem; busca por recursos para fundamentar seus conhecimentos e ações; registros da aplicação das aprendizagens; autoavaliação das relações interpessoais vivenciadas; suas limitações, dificuldades e sucessos, bem como sua inter-relação com o grupo’) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação)

Outros dados Busca a integração ensino-pesquisa (professora refere conseguir

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integrar aos conteúdos que trabalha em sala de aula, os temas e resultados de suas pesquisas)

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Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (reuniões com pares para discutir PEA; usa caderno para registrar e anotar informações para planejar as atividades seguintes ou mediatas; acompanha de perto os estudantes; uso de caderno para anotações e registros sobre o PEA e seus estudantes; registra em planilha as atividades já realizadas e as que faltam ser realizadas pelos estudantes; se coloca atenta, assiste e participa das aulas e atividades de seus estudantes em cenário de imersão; acompanhamento contínuo; participa e discute com o estudante; foco na formação; reuniões com pares; plano de disciplina com alguns referenciais pedagógicos)

Produtivismo acadêmico (pressão por produtividade; contratação por portfólio de pesquisas – incentivo à ênfase na pesquisa; ênfase na carreira acadêmica científica; trabalho extraturno – insalubre, outras questões da vida têm ficado em segundo plano para cumprir exigências da universidade: lazer, espaços familiares) Não reconhecimento do pedagógico (algumas atividades realizadas que fazem parte da metodologia utilizada em suas disciplinas não são reconhecidas e contabilizadas em sua carga horária docente: devolutiva individual com cada estudante; revisão dos planos de aula feitos pelos seus estudantes; leitura do portfólio – são realizadas por fora) Plano de disciplina sem explicitação do referencial pedagógico (no plano da disciplina há apenas métodos, conteúdos e formas avaliativas, com menção de algumas palavras de uso corrente na educação, mas sem as referências às tendências e teorias pedagógicas que as fundamentaram)

Papel do Professor no PEA

Professor Mediador (uso do ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; uso de sensibilização inicial do encontro: poesia, pensamento, história, filme, pequena oficina – despertar o estudante para a atividade proposta, o objetivo do encontro; apresenta o objetivo das aulas aos estudantes; usa estratégias que valoriza o conhecimento dos estudantes; envolve profissionais do campo de estágio no acompanhamento e avaliação de seus estudantes; problematiza pensamentos e atitudes junto com os estudantes; no plano da disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais; professora participa tão ativamente como seus estudantes no processo de ensino-aprendizagem; professora faz intervenções durante as aulas de seus estudantes; preferência pela teoria crítica e abordagem histórico-cultural de Vygotsky e na mediação proposta por Freire)

Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; usa trabalhos em pequenos grupos em sala de aula; refere ‘Dar significado a uma aprendizagem é viver essa aprendizagem. É isso que eu procuro hoje trabalhar com os alunos’; refere que utiliza muitos jogos, teatro em sala de aula para envolver os estudantes no processo de ensino-aprendizagem; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem, , e há momentos para que

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o estudante participe da discussão, construção e implementação dos critérios avaliativos da disciplina, há também uso de estudos dirigidos de texto para construções de apresentações, os estudantes apresentam e alguns de seus colegas são os debatedores; refere ter aproximação com a abordagem histórico-cultural, citando como principais pensadores Freire e Vygotsky; refere valorizar a experiência e o vivido; refere também que usa o ciclo pedagógico e metodologias ativas dentro de uma abordagem crítico-reflexiva)

Postura do Professor no PEA

Postura docente dialógica, crítica e democrática (no ciclo pedagógico, a ênfase é no diálogo, na discussão de ideias, na reflexão, na crítica, visando à construção do conhecimento; o professor acompanha a escrita do portfólio – no plano da disciplina há momentos de entrega do portfólio – e também dá devolutiva do que leu no portfólio de cada estudante de forma individual, há devolutiva também sobre as aulas que os estudantes deram; uso de perguntas problematizadoras sobre conceitos, atitudes e procedimentos; disposição da sala de aula em círculo, em que professor e estudantes podem se olhar nas discussões; foi observado momento de tomada de decisão compartilhada entre professora e estudantes; no plano da disciplina, há momentos no cronograma para que se discuta o processo de avaliação, e momentos para se discutir e construir os critérios de avaliação usados na disciplina)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (no plano da disciplina, refere-se o uso de avaliação formativa ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática [...], exercício de avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. A nota final da disciplina varia de zero a dez e, em um processo de construção coletiva em sala de aula, coordenado pelas professoras responsáveis, são determinados valores ao desempenho do aluno no pequeno grupo, no cenário de prática profissional, no exercício de avaliação cognitiva e no portfólio reflexivo, de modo que a soma entre eles totalize 10’; no cronograma do plano da disciplina, há momentos para discussão, construção e implementação dos critérios de avaliação juntamente com os estudantes; em observação, percebeu-se o acompanhamento atento e próximo do professor e uso de instrumentos avaliativos que permitem devolutivas constantes sobre o processo de ensino-

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aprendizagem – tais como o portfólio, o ciclo pedagógico, o acompanhamento que a professora faz de poucos estudantes nos cenários de imersão e nas discussões; professora incentiva a autoavaliação)

Outros dados Busca integração ensino-pesquisa (professora refere que tem buscado integrar suas atividades de ensino e de pesquisa ‘Com relação à pesquisa, a minha pesquisa está envolvida ah nas ações que são realizadas com esses alunos e nos cenários que eu frequento na minha atuação profissional com os alunos. Que eu entendo que deve ser integrada toda a questão tanto de ensino quanto da pesquisa. Então, basicamente eu procuro integrar o que eu faço, os espaços que eu frequento, e dentro da formação dos alunos, com a pesquisa’) Fundamenta sua concepção na teoria histórico-crítica ou dialética (baseia-se em Freire e em Vygotsky; integração teoria e prática; valoriza a experiência; metodologia ativa crítica; refere fundamentar-se na teoria histórico-cultural; faz intervenções no processo de ensino-aprendizagem quando julga necessário)

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Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (dependência do imediato; ciclo pedagógico; reuniões com pares para discutir PEA; usa caderno para registrar e anotar informações para planejar as atividades seguintes ou mediatas e discutir com estudantes; acompanha o estudante ao longo do curso em disciplinas diferentes; acompanha de perto os estudantes; uso de caderno para anotações e registros sobre o PEA e seus estudantes; se coloca atenta, assiste e participa das aulas e atividades de seus estudantes em cenário de imersão; uso de devolutiva sobre as atividades realizadas pelos estudantes; acompanha as mudanças curriculares; acompanhamento contínuo do PEA; participa e discute com o estudante; foco na formação; reuniões com pares; plano de disciplina com alguns referenciais pedagógicos)

Produtivismo acadêmico (foco maior é na pesquisa; dificuldade de tentar convencer sobre a importância do ensino; pesquisa e gestão tomam mais espaço que ensino e dificultam a dedicação ao planejamento de ensino; universidade analisa o docente pela pesquisa e não pela inserção no ensino) Não reconhecimento do pedagógico (foco maior é na pesquisa; dificuldade de tentar convencer sobre a importância do ensino; pesquisa e gestão tomam mais espaço que ensino e dificultam a dedicação ao planejamento de ensino; universidade analisa o docente pela pesquisa e não pela inserção no ensino) Plano de disciplina sem explicitação do referencial pedagógico (no plano da disciplina há apenas métodos, conteúdos e formas avaliativas, com menção de algumas palavras de uso corrente na educação, mas sem as referências às tendências e teorias pedagógicas que as fundamentaram)

Papel do Professor no PEA

Professor mediador (uso do ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; professora se entende como mediadora do processo de ensino-aprendizagem; compartilha objetivos da aula com os estudantes; sempre retoma o programa, os objetivos e as habilidade e competências da disciplina com estudantes; professora faz

Reminiscência do professor transmissor (uso de abordagem informativa e explicativa dentro do ciclo pedagógico; refere emancipar o estudante – o que estaria relacionado com o professor no centro do poder no processo de ensino-aprendizagem) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

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intervenções e participa nas aulas de seus estudantes; professora bastante envolvida com o cenário de imersão e com os profissionais; no plano da disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais, há uso de estudos dirigidos de textos; refere que sua concepção é a crítico-emancipatória)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; professora discute com estudantes como usar o conhecimento que o ciclo pedagógico permite construir mais proximamente daquilo que é vivenciado no cenário – imersão – para encontrar problemas e soluções; usa trabalhos em pequenos grupos em sala de aula; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem, há preocupação com formação de dimensão política, gerencial, pedagógica e relacional, por meio da reflexão sobre a prática docente, e há momentos para que o estudante participe da discussão, construção e implementação dos critérios avaliativos da disciplina, há também uso de estudos dirigidos de texto para construções de apresentações, os estudantes apresentam e alguns de seus colegas são os debatedores; refere ter aproximação com a tendência pedagógica de abordagem crítica)

Postura do Professor no PEA

Postura docente dialógica, crítica e democrática (no ciclo pedagógico, a ênfase é no diálogo, na discussão de ideias, na reflexão, na crítica, visando à construção do conhecimento; o professor acompanha a escrita do portfólio – no plano da disciplina há momentos de entrega do portfólio – e também dá devolutiva do que leu no portfólio de cada estudante de forma individual, há devolutiva também sobre as aulas que os estudantes deram; uso de perguntas problematizadoras sobre conceitos, atitudes e procedimentos; disposição da sala de aula em círculo, em que professor e estudantes podem se olhar nas discussões; no plano da disciplina, há momentos no cronograma para que se discuta o processo de avaliação, e momentos para se discutir e construir os critérios de avaliação usados na disciplina)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (no plano da disciplina, refere-se o uso de avaliação formativa ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da

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avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática [...], exercício de avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. A nota final da disciplina varia de zero a dez e, em um processo de construção coletiva em sala de aula, coordenado pelas professoras responsáveis, são determinados valores ao desempenho do aluno no pequeno grupo, no cenário de prática profissional, no exercício de avaliação cognitiva e no portfólio reflexivo, de modo que a soma entre eles totalize 10’; no cronograma do plano da disciplina, há momentos para discussão, construção e implementação dos critérios de avaliação juntamente com os estudantes; em observação, percebeu-se o acompanhamento atento e próximo do professor e uso de instrumentos avaliativos que permitem devolutivas constantes sobre o processo de ensino-aprendizagem – tais como o portfólio, o ciclo pedagógico, o acompanhamento que a professora faz de poucos estudantes nos cenários de imersão e nas discussões; professora incentiva a autoavaliação)

Outros dados Resistência/Persistência (professora comenta que acredita que ainda estão conseguindo manter o referencial pedagógico, porque há um grupo que compartilha a mesma abordagem pedagógica)

Inconsistência/Descompasso na concepção pedagógica (Professora afirma estar em uma concepção crítico-emancipatória, mas refere que emancipa o estudante, o que tem fortes associações com os preceitos de uma pedagogia tradicional, em que o professor tem o poder, o conhecimento mais válido e ele faz com que os estudantes cheguem até onde ele chegou: ‘Eu acho que a minha concepção é a crítico-emancipatória, não é? Entender assim que eu preciso fazer com que o aluno se torne, aquele jargão, não é... crítico-reflexivo, mas que eu o emancipe’)

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Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (acompanhamento atento das atividades para informar novos planejamentos; dependência do imediato; ciclo pedagógico; reuniões com pares para discutir PEA; usa caderno para registrar e anotar informações para planejar as atividades seguintes ou mediatas e discutir com seus estudantes; acompanha de perto os estudantes: conhecê-los, ajudá-los; uso de caderno para anotações e registros sobre o PEA e seus estudantes; se coloca atenta, assiste e participa das atividades de seus estudantes; acompanha avanços e retrocessos curriculares; acompanhamento contínuo do PEA; participa e discute com o estudante; foco na formação; reuniões com pares; plano de disciplina com alguns referenciais pedagógicos)

Produtivismo acadêmico (foco maior é na pesquisa; modelo de trabalho docente na universidade dificulta trabalho com tendências pedagógicas que exigem maior dedicação e tempo do docente; universidade analisa o docente pela pesquisa e não pela inserção no ensino; refere que não chega a 4 horas por semana para fazer todas as atividades advindas das atividades de ensino: ler portfólio, estudar e se preparar) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (refere dificuldade com referenciais pedagógicos e falta de tempo para poder se aprofundar mais; aprendeu fazendo – método versus tendência pedagógica; tem aprendido mais com pares em disciplinas pedagógicas da pós-graduação em que leciona; o enfermeiro não tem formação para a atuação de professor) Não reconhecimento do pedagógico (universidade não reconhece trabalho docente em outras perspectivas pedagógicas: que demandam maior carga horária e mais tempo de dedicação e atuação dos professores no ensino) Plano de disciplina sem explicitação do referencial pedagógico (no plano da disciplina há apenas métodos, conteúdos e formas avaliativas, com menção de algumas palavras de uso corrente na educação, mas sem as referências às tendências e teorias pedagógicas que as fundamentaram) Modelo de universidade dificulta o encontro entre os professores (refere o desejo de ter

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‘períodos de reuniões para preparo, planejamento do próximo ano, com todos os professores, que ajudaria muito. Mas, nesse modelo da universidade, a gente não consegue fazer isso para o planejamento’)

Papel do Professor no PEA

Professor mediador (usa o ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; investe na relação professor-estudante para trabalhar conteúdos atitudinais e, para isso, precisou mudar perspectiva de ensino e o processo avaliativo; reflete com estudantes sobre a importância da construção do relato de imersão para o desenvolvimento da questão de aprendizagem com sentido para o grupo na síntese provisória – reflexão sobre o método de ensino-aprendizagem; apresenta o objetivo do encontro para seus estudantes; valorização do aspecto afetivo no processo de ensino-aprendizagem; incentiva a participação dos estudantes na nova síntese, sempre se reportando à questão de aprendizagem; nos planos de disciplinas: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais e preocupação com a formação de dimensão política, gerencial, pedagógica e relacional; refere trabalhar na perspectiva da teoria crítica)

Reminiscência do professor transmissor (assume atividade que poderia ter sido desempenhada pelos estudantes – retorno à centralidade do professor?) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; uso de estudo de caso real encenado e discutido pelo grupo, em que os estudantes escolhem uma situação, faz uma encenação, discutem e remontam a encenação; refere-se à educação crítica ‘essa estratégia que a gente tem usado de inserir o estudante na realidade do mundo do trabalho, de trabalhar na perspectiva da educação crítica e do aluno mais ativo no processo de ensino-aprendizagem, ajudam no amadurecimento deste estudante’; entende que a construção do conhecimento é um ir e vir, em que os conteúdos vão aparecendo e sendo retomados conforme a necessidade do grupo; usa trabalhos em pequenos grupos em sala de aula, usa questões problematizadoras, que insere o estudante de forma participativa, reflexiva e crítica diante dos conhecimentos construídos, dos cenários de imersão, e das próprias estratégias e método utilizado na disciplina, assim como, o estudante participa da discussão, construção e implementação dos critérios avaliativos; refere o uso da problematização por meio do ciclo pedagógico; estudantes assumem papel ativo e têm iniciativa em sala de aula a partir do incentivo constante da professora; no plano da disciplina,

Reminiscência da Metodologia Transmissora (Pedagogia Tradicional) (assume atividade que poderia ter sido desempenhada pelos estudantes – retorno à centralidade do professor?)

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há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem, há preocupação com formação de dimensão política, gerencial, pedagógica e relacional, por meio da reflexão sobre a prática docente; refere se embasar na educação crítica)

Postura do Professor no PEA

Postura docente dialógica, crítica e democrática (no ciclo pedagógico, a ênfase é no diálogo, na discussão de ideias, na reflexão, na crítica, visando a construção do conhecimento; o professor acompanha a escrita do portfólio – no plano da disciplina há momentos de entrega do portfólio – e também dá devolutiva do que leu no portfólio de cada estudante de forma individual; observou-se nos encontros momentos de tomada de decisão junto com os estudantes; uso de perguntas problematizadoras sobre conceitos, atitudes e procedimentos; uso do contrato pedagógico com os estudantes; disposição da sala de aula em círculo, em que professor e estudantes podem se olhar nas discussões; no plano da disciplina, há momentos no cronograma para que se discuta o processo de avaliação, e momentos para se discutir e construir os critérios de avaliação usados na disciplina)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (no plano da disciplina, refere-se o uso de avaliação formativa ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática [...], exercício de avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. A nota final da disciplina varia de zero a dez e, em um processo de construção coletiva em sala de aula, coordenado pelas professoras responsáveis, são determinados valores ao desempenho do aluno no pequeno grupo, no cenário de prática profissional, no exercício de avaliação cognitiva e no portfólio reflexivo, de modo que a soma entre eles totalize 10’; no cronograma do plano da disciplina, há momentos para discussão, construção e implementação dos critérios de avaliação juntamente com os estudantes; em observação, percebeu-se o acompanhamento atento e próximo do professor e uso de instrumentos avaliativos que permitem devolutivas constantes sobre o processo de ensino-aprendizagem – tais como o portfólio, o ciclo pedagógico, o acompanhamento que a professora faz de poucos estudantes nos cenários de imersão e nas discussões; professora incentiva a

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autoavaliação e se autoavalia junto com o grupo)

Outros dados Investimento pessoal em formação pedagógica (referiu que buscou leituras, fez discussões em grupos, teve que mudar a prática pedagógica) Resistência/Persistência (‘Todas as disciplinas da área da educação, nós ainda mantemos a proposta de trabalhar na perspectiva do ensino crítico-reflexivo, trabalhando na proposta da problematização a partir da realidade [...] inserindo os estudantes na escola [...] e trabalhando a partir dessa realidade’)

P08

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PROCESSO (refere fazer planejamento antes de ir para qualquer aula; dependência do imediato: ciclo pedagógico; usa caderno para registrar e anotar informações para planejar as atividades seguintes ou mediatas e discutir com seus estudantes; acompanha de perto os estudantes: constituição do grupo; uso de caderno para anotações e registros sobre o PEA e seus estudantes; acompanhamento atento dos estudantes e suas atividades; refere que o professor deve participar da gestão pedagógica dos cursos em que leciona; refere que o referencial teórico e pedagógico do PPP é a teoria crítica e aprendizagem significativa; acompanha o desenvolvimento do pensamento crítico dos estudantes ao longo do curso; acompanhamento contínuo do PEA; participa e discute com o estudante; foco na formação; plano de disciplina com alguns referenciais pedagógicos)

Produtivismo acadêmico (carreira docente na universidade tem foco maior na pesquisa; contexto de trabalho faz com que o planejamento didático seja feito horas antes das aulas ou em finais de semana) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (falta estudo entre os pares; falta vivenciar o método entre os pares com assessoria pedagógica: acompanhamento dos professores) Dificuldade de implementação da educação crítica (currículo híbrido: professores que trabalham na lógica crítica, outros na lógica tradicional com algumas inovações, professores que trabalham na linha tradicional; estudantes acham que o professor deve trazer tudo pronto, falta de clareza de referenciais avaliativos; essas dificuldades incitam professores a abandonarem a perspectiva crítica; professores não dialogam sobre suas abordagens pedagógicas – não há trabalho coletivo) Planejamento didático fora do tempo de dedicação ao ensino (o tempo para planejamento didático não é contemplado na carga horária de dedicação ao ensino; é feito horas antes de cada aula ou fora do expediente) Plano de disciplina sem explicitação do referencial pedagógico (no plano da disciplina há apenas métodos, conteúdos e formas avaliativas, com menção de algumas palavras de uso corrente na educação, mas sem as referências às tendências e teorias pedagógicas que as fundamentaram)

Papel do Professor no PEA

Professor mediador (uso do ciclo pedagógico – possibilidade de transformação da realidade ao mesmo tempo que provoca formação; resgata exemplos dos estudantes durante as discussões; faz reflexões com seu grupo de estudantes sobre o papel ativo do professor no processo de ensino-aprendizagem; faz reflexões com o grupo sobre o próprio processo de ensino-aprendizagem, sobre a relevância da teoria crítica; busca envolver os estudantes no processo de ensino-aprendizagem, retomando o sentido das atividades sempre que necessário; uso do contrato pedagógico; no plano de disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais e preocupação com a formação de dimensão política, gerencial, pedagógica e relacional; tem

Reminiscência do professor facilitador (algumas palavras ainda permanecem: quando a professora se nomeia facilitadora ‘Então, eu acredito que o aluno, ele traz um conhecimento prévio e que, a partir desse conhecimento, a gente vai construindo outro conhecimento e acredito que o professor é... eu acredito na aprendizagem não centrada no professor, centrada no aluno, mas que o professor tem o conhecimento e o professor é que vai trazer e facilitar que o aluno possa é... construir o conhecimento conjuntamente’. No plano da disciplina, o professor ainda é referido como facilitador do processo de ensino-aprendizagem ‘ao final de cada atividade, é realizada a autoavaliação, avaliação do grupo e avaliação do professor/facilitador’) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

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aproximação com a tendência pedagógica de abordagem crítica; apesar de se nomear facilitadora tanto no plano da disciplina como na seguinte fala, há indicadores na seguinte fala que denotam o papel ativo do professor em um processo de interação professor-estudantes para construir o conhecimento, partindo de elementos sincréticos para elementos mais elaborados: ‘Então, eu acredito que o aluno, ele traz um conhecimento prévio e que, a partir desse conhecimento, a gente vai construindo outro conhecimento e acredito que o professor é... eu acredito na aprendizagem não centrada no professor, centrada no aluno, mas que o professor tem o conhecimento e o professor é que vai trazer e facilitar que o aluno possa é... construir o conhecimento conjuntamente’)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa crítica (usa o ciclo pedagógico – imersão, relato reflexivo de imersão, síntese provisória, busca, imersão, nova síntese, avaliação e autoavaliação; usa portfólio reflexivo escrito ao longo do ciclo pedagógico; professora discute com estudantes como usar o conhecimento que o ciclo pedagógico permite construir mais proximamente daquilo que é vivenciado no cenário – imersão – para provocar transformações; usa trabalhos em pequenos grupos em sala de aula, usa questões problematizadoras, que insere o estudante de forma participativa, reflexiva e crítica diante dos conhecimentos construídos, dos cenários de imersão, e das próprias estratégias e método utilizado na disciplina, assim como, o estudante participa da discussão, construção e implementação dos critérios avaliativos; estudantes assumem papel ativo e têm iniciativa em sala de aula a partir do incentivo constante da professora; no plano da disciplina, há menção do uso do ciclo pedagógico, também evidenciado pelo cronograma da disciplina, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem, há preocupação com formação de dimensão política, gerencial, pedagógica e relacional, por meio da reflexão sobre a prática docente; refere ter aproximação com a tendência pedagógica de abordagem crítica)

Postura do Professor no PEA

Postura docente dialógica, crítica e democrática (no ciclo pedagógico, a ênfase é no diálogo, na discussão de ideias, na reflexão, na crítica, visando a construção do conhecimento; o professor acompanha a escrita do portfólio – no plano da disciplina há momentos de entrega do portfólio – e também dá devolutiva do que leu no portfólio de cada estudante de forma individual; observou-se nos encontros momentos de tomada de decisão junto com os estudantes; uso de perguntas problematizadoras sobre conceitos,

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atitudes e procedimentos; uso do contrato pedagógico com os estudantes; disposição da sala de aula em círculo, em que professor e estudantes podem se olhar nas discussões; no plano da disciplina, há momentos no cronograma para que se discuta o processo de avaliação, e momentos para se discutir e construir os critérios de avaliação usados na disciplina)

Avaliação no PEA Avaliação formativa (no plano da disciplina, refere-se o uso de avaliação formativa ‘A avaliação formativa, que terá como referência os desempenhos esperados para a disciplina, será feita de forma sistemática, com registro e ciência do estudante. Constarão da avaliação o desempenho do estudante no pequeno grupo e no cenário de prática [...], exercício de avaliação cognitiva e o portfólio reflexivo construído pelo estudante. A nota final da disciplina varia de zero a dez e, em um processo de construção coletiva em sala de aula, coordenado pelas professoras responsáveis, são determinados valores ao desempenho do aluno no pequeno grupo, no cenário de prática profissional, no exercício de avaliação cognitiva e no portfólio reflexivo, de modo que a soma entre eles totalize 10’; no cronograma do plano da disciplina, há momentos para discussão, construção e implementação dos critérios de avaliação juntamente com os estudantes; em observação, percebeu-se o acompanhamento atento e próximo do professor e uso de instrumentos avaliativos que permitem devolutivas constantes sobre o processo de ensino-aprendizagem – tais como o portfólio, o ciclo pedagógico, o acompanhamento que a professora faz de poucos estudantes nos cenários de imersão e nas discussões)

Outros dados Investimento pessoal em formação pedagógica (fez cursos de especialização durante o exercício da docência, referindo que foi aí que se despertou para a importância de o professor ter uma formação pedagógica; mas refere que entende a formação do professor universitário como algo em permanente construção; para tanto, refere o quão seria importante que os professores pudessem refletir sobre suas práticas pedagógicas junto com os parem e problematizarem isso juntos)

P09

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PRODUTO (execução e controle) (refere que há reuniões com os pares toda semana para pensarem as aulas da semana; observou-se breves reuniões com pares nos intervalos para trocarem ideias sobre a continuidade da disciplina; acompanha a inserção dos estudantes nos grupos; acompanha o estudante ao longo da disciplina: espera ver o estudante discutindo e questionando as coisas do estágio com o professor; usa

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questões reflexivas em sala de aula; encontros prévios dos professores para discussão sobre a disciplina e sobre cada aula; encontros nos intervalos para equilibrar o que foi trabalhado com cada turma – fazer um balanço sobre o andamento da aula; foca no desenvolvimento de cada aula: o que foi discutido, os procedimentos seguintes) Produtivismo acadêmico (trabalha além da carga horária semanal de dedicação ao ensino; demanda de trabalho muito grande e sobrecarga de atividades; leva trabalho para realizar fora do expediente – em casa, nas férias; cumprimento de prazos; naturaliza o ‘ter muitas atribuições’ e deixa de investir na apropriação de referencial pedagógico; sobrecarga de trabalho dificulta participação em curso de pedagogia universitária) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (não tem preparo pedagógico; sente falta de uma formação mais específica para a docência; foca na pesquisa e não foca na apropriação de referenciais pedagógicos; naturaliza o ‘ter muitas atribuições’ e deixa de investir na apropriação de referencial pedagógico; não teve formação para a docência na pós-graduação; sobrecarga de trabalho dificulta participação em curso de pedagogia universitária; docente contratado pela área do ensino, mas sem olhar para o preparo pedagógico; professor não refere referencial pedagógico que embasa sua prática; plano de disciplina sem referencial pedagógico) Reminiscência da tendência pedagógica tradicional (uso da exposição; foco no conteúdo; avaliação somativa; critérios de avaliação voltados para a perspectiva somativa)

Papel do Professor no PEA

Professor Facilitador (usa estratégias de ensino-aprendizagem que focam no desenvolvimento cognitivo e relacional: dinâmicas de grupo, relatos de vivências, discussões, construção de sínteses, leitura de textos dirigidos, filmes; refere conduzir o estudante na construção da aprendizagem; se nomeia facilitador; refere que em campo de estágio, faz demonstrações de conteúdos de natureza procedimental e atitudinal; refere valorizar a experiência do mundo do trabalho na formação do estudante; em encontro para discussão com os estudantes, professor insiste para que estudantes participem; ao apresentar alguns pensamentos em um slide, professora dá tempo para os estudantes pensarem; em campo de estágio, professora conversa com profissionais do campo sobre o andamento dos estudantes, incentiva o trabalho integrado e cooperativo dos estudantes no campo de estágio; valoriza a reflexão; trabalha teoricamente questões de relação de poder na profissão; no plano de disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem; refere desejo para uso de referencial emancipatório, mas comenta que não segue nenhum referencial ou teria que fundamenta a prática pedagógica) Reminiscência do professor transmissor e tecnicista (Pedagogia Tradicional e Pedagogia Tecnicista) (refere que existem na disciplina alguns exercícios-padrão que são sempre usados na disciplina e refere que, às vezes, mudam uma técnica, mas referindo não seguir um referencial pedagógico; usa slides e narração de conteúdos conceituais ou um texto para fazer uma ‘síntese’ do conteúdo discutido previamente com os estudantes; uso majoritário de perguntas informativas e confirmativas durante o encontro com os estudantes; uso de avaliação somativa e foco no conteúdo cognitivo) Referencial pedagógico oculto (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da

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educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (influência da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista) (ênfase no desenvolvimento cognitivo por meio de reflexões sobre o conteúdo específico; uso de trabalhos em grupos; no programa da disciplina online, há palavras como reflexão, participação ativa, relatos de vivências, discussões, dinâmicas de grupos, os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem; no plano de aula feito pela professora, refere-se o uso de sínteses do conteúdo já estudado, discussões, trabalho em pequenos grupos, leitura de textos, filmes; mas não é citado referencial pedagógico nem no programa da disciplina online nem no plano de aula, apenas menciona-se o termo ‘pedagogia da problematização como estratégia de ensino-aprendizagem’ no programa da disciplina e em entrevista a professora refere ‘Eu não tenho um referencial teórico escolhido. Eu não tenho isso. Eu não vou dizer "ah, eu uso Paulo Freire, eu uso...não!" Eu não tenho. A gente segue essa, vamos dizer, essa tendência da universidade de usar, de fazer cada vez mais essa questão da educação mais emancipatória e tudo isso e tentar ir fazendo isso [...]’) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal com propensão democrática (usa o contrato pedagógico para trabalhar em sala de aula; trabalha com a sala de aula em círculo para que todos possam se ver e se olhar nas discussões; compartilha tomada de decisão com estudantes em sala de aula; postura aberta e acolhedora e uso do diálogo com estudante em supervisão de estágio)

Reminiscência de postura pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Avaliação no PEA Avaliação somativa (foca no conteúdo; foco na nota; usa médias para cálculo das notas; a parte formal usa duas provas escritas valendo de 0 a 9 pontos: ‘será aprovado o aluno que obtiver média aritmética igual ou superior a 5 (cinco) nas avaliações e frequência mínima de 70% nas atividades programadas. O aluno que obtiver média aritmética inferior a cinco e superior ou igual a três será submetido à recuperação. O aluno será reprovado se obtiver média inferior a três. A recuperação constará de uma prova escrita, valendo de zero a dez, sendo aprovado o aluno que obtiver média aritmética igual ou superior a cinco entre a média final da disciplina e da prova de recuperação’) Avaliação punitiva (‘A recuperação constará de uma prova escrita, valendo de zero a dez, sendo aprovado o aluno que obtiver média aritmética igual ou superior a cinco entre a média final da disciplina e da prova de recuperação’. Mesmo que o estudante tire 10 na prova de recuperação, essa nota será somada à média obtida na disciplina e será aplicada nova média... ou seja, fica a sensação de punição... ou o estudante não pode ter estudado e avançado nesses aspectos cognitivos cobrados? Por que então não o deixar com a nota que tira na prova de recuperação?) Descompasso na Avaliação (ora a avaliação é dita coparticipada, com uso de autoavaliação e avaliação do grupo – num sentido mais democrático, ora é somativa baseada em notas que partem apenas de exercícios cognitivos – vide critérios)

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Avaliação informal (há também a dimensão da avaliação informal quando se fala em avaliar o desempenho dos estudantes nas atividades propostas em sala de aula, segundo ‘assiduidade, pontualidade e participação nas atividades previstas, valendo de zero a um ponto, devendo ser somado a cada nota da prova’ – como essa nota é obtida? Como ela é usada pelo professor? Qual a finalidade dessa avaliação no processo formativo?) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados Inconsistência/Descompasso na concepção pedagógica (não é citado referencial pedagógico nem no programa da disciplina online nem no plano de aula, apenas menciona-se o termo ‘pedagogia da problematização como estratégia de ensino-aprendizagem’ no programa da disciplina e em entrevista a professora refere ‘Eu não tenho um referencial teórico escolhido. Eu não tenho isso. Eu não vou dizer "ah, eu uso Paulo Freire, eu uso...não!" Eu não tenho. A gente segue essa, vamos dizer, essa tendência da universidade de usar, de fazer cada vez mais essa questão da educação mais emancipatória e tudo isso e tentar ir fazendo isso [...]’)

P10

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PRODUTO (execução e controle) (planejamento de disciplina acontece de forma geral com decisões coletivas dos professores; implementação é feita pelo professor na sua individualidade, observando o que foi planejado coletivamente; currículo como norteador dos planejamentos; não formar apenas profissionais, mas cidadãos coerentes com seu papel na sociedade; uso de devolutiva de simulações de casos fictícios em laboratório de simulação virtual; faz as simulações junto com os estudantes; refere que o estudante não é um papel em branco; currículo como norteador; uso de aprendizagem ativa - aprender fazendo; ) Produtivismo acadêmico (dificuldade de integrar tudo: divisão ensino-pesquisa-extensão; exigências dificultam equilíbrio no tripé da universidade; crença de que ‘com o tempo seja possível acontecer isso’; dificulta investimento na formação pedagógica para a docência: muitas coisas a fazer; economia de tempo: vai gravar vídeo sobre conteúdos conceituais para sobrar mais tempo para as práticas em laboratório) Problemas com a implementação curricular (uma escola muito grande: dificuldade de integrar tudo, divisão entre ensino-pesquisa-extensão; falta tempo para conseguir consolidar mudanças: tempo cronológico, tempo interno para buscar e tempo para preparo das disciplinas; disciplinas com muitos professores – agendas divergentes – dificuldade de disponibilidade para planejamento; não refere seu referencial pedagógico: apenas que trabalha com a reflexão, a crítica e estratégias ativas) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (muitas exigências dificultam participação em cursos de formação pedagógica; visto enquanto um movimento de atualização) Reminiscências da Pedagogia Tradicional, da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista (Planejamento de simulação se baseia em uso de vídeo (conceitos e demonstrações), pré-testes (conceitos), simulação fictícia (procedimentos fictícios, conceitos e atitudes fictícias), devolutiva da

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simulação fictícia (reflexão sobre o caso fictício e os procedimentos e atitudes fictícias) – estudantes no centro da aprendizagem e responsáveis por ler textos e ver vídeos; não refere seu referencial pedagógico: apenas que trabalha com a reflexão, a crítica e estratégias ativas)

Papel do Professor no PEA

Professor Facilitador (utiliza simulação de casos fictícios elaborados por especialista em laboratório de alta fidelidade; refere que o planejamento foca no conhecimento cognitivo e na dimensão psicomotora; refere que não considera o estudante como um papel em branco; refere que evita falar muito durante os encontros, falando apenas quando percebe alguma coisa muito errada na simulação; em laboratório de simulação, professora explica o caso a ser simulado; reflete sobre questões técnicas da profissão; aproveita exemplos dos estudantes; valoriza a dimensão afetiva e estética; utiliza devolutiva e reflete com estudantes sobre seu uso no processo de ensino-aprendizagem; no plano de disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais, e os objetivos estão escritos na perspectiva da aprendizagem, as ações dos verbos dos objetivos denotam a preocupação com o cognitivo, critérios de avaliação focam no desenvolvimento cognitivo) Reminiscência do professor transmissor (Pedagogia Tradicional e Pedagogia Tecnicista) (refere que ainda ministra algumas aulas teóricas; utiliza videoaulas sobre os conteúdos da disciplina, disponibilizados no Moodle – plataforma interativa online, para que os estudantes assistam antes das simulações; entende que os estudantes têm que entender e implementar seu papel protagonista na aprendizagem) Referencial pedagógico oculto (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (influência da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista) (professora leciona em disciplina que utiliza aulas expositivas, videoaulas, leituras prévias dirigidas com a finalidade de preparar os estudantes para práticas de simulação de casos fictícios elaborados por especialistas do estabelecimento de ensino; utiliza-se também pré-testes com foco no conteúdo específico cognitivo, que são realizados antes das simulações; alguns estudantes juntamente com a professora simulam o caso, enquanto alguns outros estudantes observam; após as simulações é feita uma reflexão/debriefing sobre o que foi simulado, em que é abordado os procedimentos realizados, a adequação dos mesmos, os sentimentos que apareceram; professora refere que oferece uma quantidade de materiais para leitura e oferece um tempo para que os estudantes leiam; refere que utiliza uma abordagem da aprendizagem baseada na perspectiva técnico-científica e ética; para ela ‘ativo é algo que se constrói junto, porque o aluno sempre tem conhecimento e ele pode construir um novo. E, assim, eu não vejo dificuldade do conteúdo teórico-cognitivo, porque isso tudo está dado nos livros, na apostila, a dificuldade na enfermagem é de fazer sentido. Então, para mim, metodologia ativa é isso. É algo que seja significativo para o aluno, não tem que memorizar, gravar. Algo que tenha significado na prática, que ele vai lembrar, que traz os princípios fundamentais que ele não esqueça, que isso norteia a prática dele. Para mim, isso é metodologia ativa, é algo que se constrói junto, que não tem nada pronto, que traga um significado para o aluno, para o estudante’; no programa da disciplina online, os objetivos

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estão escritos na perspectiva da aprendizagem, há variadas estratégias de ensino-aprendizagem citadas, mas não são indicados referenciais pedagógicos; em uma disciplina de 45 horas há uma lista de três páginas e meia de conteúdos) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura pouco democrática (As atividades da disciplina são planejadas a priori, inclusive a divisão dos estudantes nos grupos de simulação é feita pela professora. Há pouco investimento democrático e tomadas de decisão compartilhadas nas situações de aprendizagem. Professora refere que, ao dar os textos para os estudantes lerem antes das simulações e do pré-teste e também tempo para o fazer, está deixando os estudantes escolherem quando ler os textos, no seu tempo, mas no programa da disciplina não é referido o tempo reservado para a leitura dos textos dirigidos – infere-se que este tempo deva acontecer fora da carga horária da disciplina. Assim, a leitura de textos fora da carga horária da disciplina passa a ter um tom impositivo e imperativo para a realização do pré-teste e da simulação, mesmo que o desejo seja deixar o estudante à vontade para ler e estudar quando esteja com vontade; o processo avaliativo no programa da disciplina também não evidencia preocupação democrática; há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Avaliação no PEA Propensão à avaliação formativa (professora refere que os pré-testes são utilizados para que os estudantes possam ver o que precisam melhorar e os pós-testes que acontecem após as simulações, ajudam os estudantes a verem o que conseguiram avançar na aprendizagem. Após a simulação, o debriefing também oferece uma devolutiva para os estudantes que simularam sobre sua atuação, o que mostra um investimento no processo formativo, mesmo que limitada apenas a dimensões cognitiva, psicomotora e estética, faltando a dimensão democrática e de fato participativa)

Avaliação somativa (foca no conteúdo; usa pesos diferentes para cada instrumento avaliativo para fazer cálculos da nota final; foco na nota: ‘a avaliação realiza-se de forma coparticipada, objetivando a melhoria do processo ensino-aprendizado e o desenvolvimento do estudante e professor. A autoavaliação e a avaliação do grupo sobre o desempenho de cada um ocorre durante todo o processo. A avaliação da disciplina está ancorada no desempenho do estudante nas atividades teórico-práticas e nas atividades de expressão cognitiva. O desempenho do estudante nas situações simuladas do mundo do trabalho fundamenta-se na análise do desenvolvimento dos atributos na realização das tarefas nas situações da prática profissional, tendo como referência os desempenhos esperados para a disciplina’; os critérios de avaliação são: ‘Os alunos serão avaliados no decorrer das atividades programadas e serão atribuídas três notas: atividade de expressão cognitiva do pré-teste [peso 1], atividade de expressão cognitiva do pós-teste [peso 3], atividade de expressão cognitiva final [peso 6]. Será aprovado o aluno que obtiver nota igual ou superior a 5 (cinco). O aluno que não obtiver nota mínima de 3 (três) na avaliação ou frequência de 70% será reprovado’; a recuperação é a frequência e aproveitamento em um programa de recuperação, que não está explicado no programa da disciplina online) Descompasso na Avaliação (ora a avaliação é dita coparticipada, com uso de autoavaliação e avaliação do grupo – num sentido mais democrático, ora é somativa baseada em notas que partem apenas de exercícios cognitivos – vide critérios) Avaliação informal (há também citação de avaliação informal quando se fala em avaliar o desempenho dos estudantes nas situações simuladas, mas não é explicada como é feita essa avaliação e muito menos como é considerada no processo avaliativo) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca

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participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados Se prepara para o ensino (preparo prévio para os laboratórios; envolve muitos profissionais no planejamento e implementação da simulação dos casos fictícios; enuncia desejo em organizar uma pesquisa para avaliar a disciplina; refere que o papel do docente é muito além de formar profissionais, é formar cidadãos, profissionais mais críticos)

Inconsistência/Descompasso na Concepção Pedagógica (Professora refere que ‘segue uma busca de uma metodologia mais crítica, reflexiva e ativa do aluno’. Entretanto, refere que não segue nenhum referencial pedagógico ‘Eu não tenho nenhum autor específico que eu uso e nem sei se existe uma filosofia, concepção específica. Eu busco trabalhar com os alunos a questão mais da reflexão, de crítica e também utilizando estratégias mais ativas. Não aquele aluno, aquela aula de transmissão apenas de conteúdo. Então, eu não sei... não uso um autor específico, mas também descarto aqueles autores que falam, conteudistas’)

P11

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PRODUTO (execução e controle) (disciplinas em contexto do projeto político-pedagógico (PPP); refere a problematização como um dos referenciais, dizendo que o PPP deve ser algo mais aberto quanto a referenciais; cada docente se movimenta no PPP de forma diferente: se adequar ao máximo ao PPP, atuar no contexto que a escola propõe; precisa fazer adaptações no modo de a disciplina acontecer; recuperação entendida como algo que acontece ao longo da disciplina – mesmo que não evidenciado como; uso do estágio na realidade; uso de estudo de caso real vivenciado em estágio no cenário de prática profissional; senta com os estudantes no final de cada dia de estágio para ver como estão evoluindo: a partir do que eles falam; estudantes com dificuldades – supervisões individuais; recuperação entendida como algo que acontece ao longo da disciplina; usa bloco de notas para anotar o que vai discutir com estudantes sobre apresentação de estudo de caso real; senta com estudante ao final de cada estágio; faz acompanhamento individual de estudantes com dificuldades; refere pensar a disciplina a partir de decisões coletivas – PPP; usa bloco de anotações para acompanhamento e planejamento do que discutir com estudantes) Produtivismo acadêmico (trabalha fora do expediente: de final de semana, em feriado; ênfase na pesquisa: cobrança quanto ao envolvimento com a pesquisa, divulgação do produto das pesquisas, publicações extremamente exigentes, grandes cobranças para produção científica – demanda muito tempo; árduo para o docente dedicado integralmente para o ensino, a pesquisa e a extensão; falta tempo para o planejamento de ensino) Não reconhecimento do pedagógico (menor tempo de dedicação ao ensino de graduação, exigências da universidade não são voltadas ao ensino de graduação, a tendência futura é investir menos na graduação; o tempo para o planejamento de ensino não existe; leva trabalho para casa) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (poucos docentes têm formação específica na questão do ensino) Reminiscência da Pedagogia Tradicional (refere que utiliza a problematização, mas que não há um referencial pedagógico único, que o PPP deve ser algo mais aberto; programa da disciplina sem referências pedagógicas; predomínio da transmissão de conteúdo – aula expositiva; estudantes dormem durante a aula; silêncio durante a aula; avaliação de finalidade somativa no plano da disciplina – foco na nota e nas médias; alguns estudantes não atingem ao final da disciplina – avaliação ao final)

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Papel do Professor no PEA

Professor Facilitador (atua em uma disciplina com aulas expositivas de conteúdos conceituais, e acompanha um pequeno grupo de estudantes em cenário de prática profissional hospitalar; refere que incentiva o estudante à busca do conhecimento; refere que busca despertar a vontade e o entusiasmo no estudante; na supervisão de estágio, refere que demonstra para o estudante algumas atitudes com os pacientes, e que conversa com os estudantes sobre suas atuações e atitudes em campo de estágio com os pacientes, completando que o professor vai sinalizando o que está correto e o que não está; em aula expositiva, professor explicita os objetivos da aula, usa uma sensibilização inicial com um vídeo para introduzir o assunto, uso de exemplos vividos em campo de estágio; mostrou comprometimento e responsabilidade com o campo de estágio onde leva seus estudantes; no plano de disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais, ressaltando na parte de conteúdos o trabalho nas dimensões biológica, psicológica e sociocultural, sem explicitação de referencial pedagógico) Reminiscência do professor transmissor (Pedagogia Tradicional e Pedagogia Tecnicista) (refere que o estudante precisa aprender para reproduzir conhecimentos; uso da exposição de conteúdos conceituais: estudantes dormem durante a aula, faz e responde suas próprias perguntas, silêncio dentro da sala de aula, uso majoritário de perguntas e abordagens informativas; uso de avaliação somativa) Referencial pedagógico oculto (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (influência da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista) (uso de estudo de caso real, o qual é apresentado pelos estudantes no pequeno grupo, discutido e debatido pelo professor com foco nos cuidados de enfermagem e necessidades humanas básicas, visando o cuidado de enfermagem e necessidades de saúde de pacientes psiquiátricos e o planejamento da assistência; ênfase no desenvolvimento cognitivo; disciplina contempla carga horária expositiva – foco em conteúdos conceituais – e estágio em cenário de práticas profissionais sob a supervisão do professor – foco nos conteúdos práticos e procedimentais; em entrevista, professor refere focar no processo de aprendizagem; não há citação no plano de aula de referenciais pedagógicos que embasam as escolhas metodológicas) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura docente dialogal com propensão democrática (em entrevista, professor refere promover a liberdade para a autonomia, incentivar os estudantes a aprenderem com a vida, trabalhar na perspectiva da autoeducação e do autoconhecimento, assim, desejando que o estudante seja um transformador; refere que estabelece uma relação dialógica e de proximidade com os estudantes; refere também fazer o estudante pensar e refletir; em observação de supervisão de estágio, professor tem espaço para

Reminiscência de postura pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

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estudantes tirarem dúvidas, incentiva a autonomia dos estudantes e tomada de decisão conjunta sobre algumas questões da disciplina; em apresentação de estudos de caso reais, professor usa perguntas reflexivas e os estudantes ficam à vontade para participar da apresentação e discussão com o professor; em observação de supervisão de estágio, professor demonstra conhecer pelos nomes os pacientes da enfermaria, assim como os profissionais da ala e também seus estudantes. Ele também fala de forma tranquila, calma com seus estudantes, com os profissionais e pacientes da enfermaria. Em encontro para apresentação de estudo de caso real, diante de uma estudante que se emocionou, professor ressalta que é impossível não se envolver com o paciente, não se aproximar do paciente. Professor refere que essa aproximação deve acontecer de forma ética e profissional e é fundamental para o cuidado)

Avaliação no PEA Propensão à avaliação formativa (na disciplina é referido o uso de estudo de caso real e, em entrevista, professor refere que usa o acompanhamento do estudo de caso real e sua apresentação, assim como o acompanhamento dos estudantes em cenário de estágio para conseguir implementar avaliação contínua e processual – mas esta perspectiva não está explícita no programa da disciplina online. No campo de estágio, professor utiliza o diálogo na coleta de dados para avaliação. No programa da disciplina, é referido que a recuperação acontecerá ao longo da disciplina, não estando prevista recuperação após o término da disciplina – mas isso não é muito bem explicado como ocorrerá na disciplina)

Avaliação somativa (foca no conteúdo; usa média para fazer cálculos da nota final; foco na nota: ‘A nota final será obtida, considerando-se: media das três avaliações cognitivas (peso 4) e média das atividades práticas – inclui competência e habilidade para realizar procedimentos no cuidado integral de enfermagem em saúde mental e desenvolvimento de um estudo de caso, o que terá peso 6’) Avaliação informal (‘A avaliação será contínua, baseada na assiduidade, participação nas atividades em aula, estudos, desempenho nas atividades práticas em campo de estágio [...]’ – critérios que se baseiam em representações e julgamentos de valor) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados Se prepara para o ensino (professor refere, em entrevista, que dedica período letivo do ano com maior ênfase no ensino de graduação, mesmo que continuem as atividades de orientação da pós-graduação) Refere engajamento em atividades de extensão (‘Então, ao longo da carreira, eu não deixei de prestar serviços à comunidade. Eu acho que isso é extremamente importante, o docente ter projeto de extensão na carreira acadêmica, e fazer, realmente, os projetos em benefício da comunidade.’)

P12

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PRODUTO (execução e controle) (professora considera a variação dos estudantes: turmas diferentes, semestres diferentes; criação de oportunidades para desenvolver competências, habilidades, conhecimentos e atitudes; usa a observação atenta dos estudantes para acompanhar a aprendizagem e planejar as próximas ações;

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traz materiais adicionais de leitura; uso do diálogo; conhecer o estudante; ficar mais perto do estudante; observação atenta dos estudantes visando às aprendizagens; incentiva estudantes para coleta de dados do estudo de caso real com os pacientes que estão cuidando; faz algumas atividades juntamente com os estudantes; planeja oportunidades de aprendizagem; acompanha aprendizagem; observa estudantes para replanejar situações de aprendizagem; proporciona materiais extra para aprimorar aprendizagem) Produtivismo acadêmico (universidade exige muito do docente; dificuldade para cumprir as demandas) Problemas com a formação para o exercício da docência no ensino superior (lógica de avaliação da carreira docente atrapalha o desenvolvimento para o ensino: ocupar cargos, participar de comissões, mostrar competência administrativa; competição muito grande para ocupar funções e cargos comissionados; ninguém ‘passa o plantão’, tem que descobrir sozinho) Problemas com a implementação curricular (gestão de ensino como trabalho colaborativo não acontece; disciplinas de um mesmo departamento não se relacionam; repetição de conteúdos; competências não desenvolvidas; excesso de conteúdos; falta foco no que é básico e essencial; falta coordenação, falta diálogo entre os pares; docente quer fazer muitas atividades e o tempo é limitado) Reminiscência da Pedagogia Tradicional (plano de disciplina com várias estratégias sem explicitação de referencial pedagógico; uso da narração de conteúdos; pouco tempo para estudantes participarem das aulas; ênfase no conceitual e no cognitivo)

Papel do Professor no PEA

Professor Facilitador (leciona em uma disciplina com aulas expositivas, práticas das técnicas em laboratório e estágio em hospital; professora se preocupa com formação de conteúdos atitudinais e afetivos; professora refere se preocupar com a leitura; refere se preocupar com a humanização do cuidado e do estudante; em supervisão de estágio, incentiva a cooperação entre os estudantes para a aprendizagem; incentiva a busca na literatura e em livros e manuais; incentiva os estudantes a se ajudarem na coleta de dados para o estudo de caso real dos pacientes que acompanham; incentiva os estudantes a se responsabilizarem pelos pacientes que acompanham no estágio; busca envolver estudantes com dificuldades e se coloca bastante envolvida com o campo de estágio; usa exemplos durantes as aulas expositivas; traz objetos para mostrar aos estudantes durante suas aulas; demonstração de procedimentos e técnicas alternativos aos convencionais; chega antes do horário de estágio para escolher e preparar as situações de aprendizagem; incentiva os estudantes na inter-relação com a equipe de saúde do hospital; traz leituras complementares para os estudantes consultarem durante o estágio; no plano de disciplina: conteúdos organizados por saberes: cognitivos, atitudinais e procedimentais) Reminiscência do professor transmissor (Pedagogia Tradicional e Pedagogia Tecnicista) (uso da exposição; pouco tempo para estudantes participarem da aula expositiva; professora pergunta e responde suas próprias perguntas; uso majoritário de perguntas informativas; ênfase na dimensão conceitual e cognitiva; referencial pedagógico não explicitado) Referencial pedagógico oculto (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

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Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (influência da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista) (uso de estudo de caso real, o qual é apresentado pelos estudantes no pequeno grupo, discutido e debatido pela professora com foco nos cuidados de enfermagem e necessidades humanas básicas, visando a sistematização da assistência em enfermagem; ênfase no desenvolvimento cognitivo; disciplina contempla carga horária expositiva –foco em conteúdos conceituais – laboratórios para treino de habilidades e técnicas, e estágio em cenário de práticas profissionais sob a supervisão do professor – foco nos conteúdos práticos e procedimentais; em entrevista, professora refere focar no processo de aprendizagem; não há citação no plano de aula de referenciais pedagógicos que embasam as escolhas metodológicas) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (em entrevista, professora refere que são os próprios estudantes que elegem quais estudos de casos reais serão apresentados para o grande grupo – 80 estudantes – da disciplina; refere que usa a problematização, mesmo que não possa afirmar em qual autor se embasa; em observação de supervisão de estágio, professora acompanha os estudantes dando espaço para que eles se desenvolvam, provoca reflexão de procedimentos e de atitudes reais com os estudantes, compartilha tomada de decisão com os estudantes; em observação de aula de laboratório, faz reflexões com estudantes sobre situações que acontecem no laboratório, percebe duas estudantes se esquivando das práticas dos procedimentos e vai até elas e propõe que elas treinem as técnicas para conseguirem fazer em campo de estágio – mesmo assim, professora deixa os estudantes bem à vontade para aproveitarem o laboratório)

Reminiscência de postura pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Avaliação no PEA Avaliação somativa (foca no conteúdo; usa média aritmética para fazer cálculos da nota; foco na nota; recuperação como sinônimo de refazer novas provas e obtenção de média aritmética maior ou igual a 5) Avaliação informal (avaliação de desempenho em cenário de prática profissional; o aluno será avaliado, ainda, quanto ao seu desempenho nas atividades em sala de aula e em laboratório e cenário de prática profissional, levando-se em conta os aspectos de assiduidade, pontualidade, ética e participação nas atividades previstas – critérios que se baseiam em representações e julgamentos de valor) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados Se prepara para o ensino (professora refere e foi observado que chega antes no campo de estágio para se preparar para as atividades de supervisão de estágio e escolher as melhores

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situações de aprendizagem; refere, também, em entrevista, que dedica período letivo do ano com maior ênfase no ensino de graduação, e refere que isso a deixa mais relaxada para conseguir se dedicar melhor para esta atividade)

P13

Planejamento Acompanhamento e

Gestão no PEA

Planejamento, acompanhamento e gestão com foco no PRODUTO (execução e controle) (estuda para acompanhar estudantes em campo de estágio; se preocupa com a formação clínica dos enfermeiros em discussão curricular; em supervisão de estágio, escolhe pacientes que ofereçam melhores oportunidades de aprendizagem aos seus estudantes; uso de estudo de casos reais e sua discussão com estudantes; professora acompanha as mudanças curriculares; professora atenta à aprendizagem na discussão de estudos de casos reais, conhece o campo de estágio e os pacientes; incentiva estudantes a buscarem por meio de perguntas e depois dialoga com estudantes para ver se buscaram; observa, anota e conversa com os estudantes em estágio; planeja suas atividades no sentido da formação dos estudantes; dialoga com estudantes; incentiva a busca a partir de uma necessidade em estágio; conversa sobre a busca) Produtivismo acadêmico (falta articulação ensino-pesquisa-extensão; ênfase na pesquisa; alto grau de exigência para publicação; ênfase na internacionalização: exigência de saída para o exterior; docentes dando aula em inglês antes mesmo de resolver necessidades internas de formação de profissionais para o SUS; planejamento de ensino feito fora do expediente;) Planejamento didático fora do tempo de dedicação ao ensino (exigência de publicações; saídas ao exterior; planejamento de ensino feito fora do expediente;) Problemas com a implementação curricular (não houve investimento no tempo para que as pessoas pudessem se preparar para a implementação do novo currículo; mudança repentina; não foi mudança progressiva) Reminiscência da Pedagogia tradicional e da Pedagogia Tecnicista (foco no conteúdo específico e técnico da profissão; planejamento de ensino feito de forma solitária: atualização de slides, aulas expositivas; planejamento centrado no professor; avaliação da condução da disciplina feita quando ela acaba; foco no conteúdo específico: deixou de usar o portfólio para aproveitar melhor o tempo; as discussões de final de estágio que substituíram o portfólio nem sempre acontecem; grande quantidade de conteúdo teórico dificulta trabalho em perspectivas emancipatórias; avaliação somativa e foco na nota) Divergência conceitual (separa o SUS da rede hospitalar)

Papel do Professor no PEA

Professor Facilitador (leciona em uma disciplina com aulas expositivas e com estágio em hospital/ usa exemplos durante as aulas; expõe o conteúdo e explica os porquês; professora busca a participação dos estudantes na aula por meio de perguntas; explica a relevância da disciplina para os estudantes; em supervisão de estágio, faz procedimentos junto com os estudantes, demonstrando outros aspectos relacionais e atitudinais; incentiva a busca; conversa individualmente com estudantes que apresentam dificuldades; se preocupa com o uso adequado de insumos e recursos materiais; no plano de disciplina: na parte de avaliação menciona-se as dimensões

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cognitiva, atitudinal e procedimental, percebe-se ênfase no cognitivo e no procedimental) Reminiscência do professor transmissor (Pedagogia Tradicional e Pedagogia Tecnicista) (ênfase no conteúdo; ênfase no cognitivo; exposição de conteúdos; avaliação somativa; ênfase na nota; refere que é preciso diminuir ‘conteúdo’ e que o estudante tenha mais carga horária prática: separação teoria e prática; uso majoritário de perguntas informativas; muitas vezes pergunta e responde suas próprias perguntas; objetivos da disciplina visam apenas conhecimentos e habilidades) Referencial pedagógico oculto no plano ou programa de disciplina (há uso de uma série de termos correntes utilizados na área da educação, mas não há menção de referenciais e teorias pedagógicas em que se embasam as escolhas feitas)

Metodologias e Estratégias no PEA

Metodologia ativa cognitiva e psicomotora (influência da Pedagogia Renovada e da Pedagogia Tecnicista) (uma disciplina usa estágio em cenário de práticas profissionais sob a supervisão do professor – foco nos conteúdos práticos e procedimentais e uso de estudo de caso real, o qual é apresentado pelos estudantes no pequeno grupo, discutido e debatido pela professora com foco no raciocínio clínico; ênfase no desenvolvimento cognitivo; outra disciplina também contempla carga horária expositiva –foco em conteúdos conceituais – laboratórios para treino de habilidades e técnicas; em entrevista, professora refere focar no processo de aprendizagem; não há citação nos planos das disciplinas de referenciais pedagógicos que embasam as escolhas metodológicas) Reminiscência das metodologias transmissoras (Pedagogia tradicional) (uso da exposição em aula e ênfase na abordagem do tipo pergunta e resposta, em que professora pergunta e estudantes respondem)

Postura do Professor no PEA

Postura dialogal (refere em entrevista, que esta estratégia de acompanhar os estudantes em estágio tem ajudado a olhar os estudantes mais de perto e ajudá-los na tomada de decisão sobre a profissão; refere querer ensinar o estudante ‘a pensar maior’; em observação de supervisão de estágio, usa abordagem reflexiva na interação com os estudantes; em observação de encontro para discussão de estudo de caso real, professora também usa abordagem questionadora e compartilha tomada de decisão com os estudantes)

Postura autoritária (em uma aula expositiva, professora, incomodada com as conversas paralelas dos estudantes, pede algumas vezes o silêncio, mas como não foi suficiente para que os estudantes o fizessem, ela passa a lista de presença e diz para que todos assinem e que quem estiver insatisfeito que ficasse à vontade para deixar a sala para não incomodar a aprendizagem dos outros estudantes) Reminiscência de postura pouco democrática – o poder da nota (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação não são construídos ou discutidos com os estudantes; estudantes fazem cobranças nos microespaços e têm medo de colocá-las no macroespaço com medo da avaliação punitiva)

Avaliação no PEA Propensão à avaliação formativa (em observação de supervisão de estágio, percebeu-se que a professora utiliza a observação, a anotação e o diálogo como ferramentas para coleta de dados avaliativos em estágio; refere fazer um olhar individualizado do estudante com ele mesmo ao longo da disciplina; usa breve autoavaliação ao final do estágio e utiliza um bloco de notas para registrar as informações de acompanhamento dos estudantes ao longo do estágio)

Avaliação somativa (foca no conteúdo; usa média aritmética para fazer cálculos da nota; foco na nota; recuperação como sinônimo de refazer novas provas e obtenção de média aritmética maior ou igual a 5) Avaliação informal (avaliação atitudinal: participação do aluno nas atividades teórico-práticas nos Laboratórios e em sala de aula – critérios que se baseiam em representações e julgamentos de valor) Avaliação pouco democrática (quem decidiu os pesos dos instrumentos avaliativos? Há pouca participação direta do estudante em sua avaliação, no plano da disciplina, os critérios de avaliação

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não são construídos ou discutidos com os estudantes)

Outros dados Se prepara para o ensino (professora refere e foi observado que chega antes no campo de estágio para se preparar para as atividades de supervisão de estágio e escolher as melhores situações de aprendizagem; refere, também, em entrevista, que dedica período letivo do ano com maior ênfase no ensino de graduação, e refere que isso a deixa mais relaxada para conseguir se dedicar melhor para esta atividade; refere que professor também estuda e também aprende; refere um exemplo de uma atitude de um docente do seu processo formativo que ela a fez refletir sobre a postura docente)

Inconsistência/Descompasso na concepção pedagógica (professora refere, em entrevista, que se identifica com a docência – notadamente em campo de estágio; refere também a educação libertadora, dizendo que o estudante deve fazer parte daquilo que ele aprende; entretanto, em sua abordagem há momentos de autoritarismo, especialmente nas aulas expositivas)

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 8 - Quadro analítico gerador de outros efeitos a partir das restituições individuais Part. GRANDE DEMANDA DE ATIVIDADES - TEMPO

P01

Quanto à devolutiva, professora refere, no dia 28-09-2016, que não sabe se poderá continuar na pesquisa devido à grande demanda de atividades em que ela está envolvida (falta de tempo para participar da pesquisa), por ter que entregar relatório CERT ainda, por não ter terminado ainda seu período probatório. Disse-me que me responderia por e-mail se daria para continuar ou não. Em novembro de 2016, a encontrei no corredor do local de estudo e perguntei se ela havia decidido e ela me perguntou se não havia me respondido e pediu desculpas por não ter respondido e que realmente não conseguiria continuar na pesquisa.

P02

MUDANÇAS RECENTES NA UNIVERSIDADE

CAUSA INSEGURANÇA

CORTES SOBRE A EDUCAÇÃO

ADAPTAÇÃO PARA CONTINUAR DENTRO DE OUTRA PROPOSTA

CONCEITOS EMPRESARIAIS

NA UNIVERSIDADE –

TEMPO – EFICIÊNCIA -

DINHEIRO

NECESSIDADE DE DIAGNÓSTICO E EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS PARA PARTICIPAR

DE ESPAÇOS DE NEGOCIAÇÃO

“Nesses últimos anos com as mudanças todas da universidade, a gente fica um pouco sem saber o que fazer, um pouco de insegurança, mas a gente vai dançando conforme a música. Cada hora é uma novidade e você tem que se adequar. A gente tem sim certa autonomia em relação a outras instituições, mas a gente tem perdido um pouco essa autonomia.”

“se já tínhamos algumas dificuldades, elas vão se acirrar um pouco mais tanto devido às cobranças e também pelas limitações, por conta dos cortes. É um jeito de fazer e de pensar que não valoriza a educação.” Como a gente consegue reestruturar com menos recursos?”

“Talvez, teremos que tentar outras articulações em que a gente saia perdendo e o estudante também. Para sairmos ganhando teríamos que pensar em outra proposta, porque como a gente consegue trabalhar em propostas emancipatórias com mais estudantes em sala de aula e menos professores? Não sei, em curto prazo, se a gente consegue pensar uma melhora para isso. Se a gente entrar nesse a gente sabe que estará indo para o fundo do poço, mas uma hora teremos que sair dele e reconstruir tudo de novo.” “Será preciso repensar o jeito de fazer, o jeito de ensinar” “É aquela questão – em tempos de crise, é preciso ter criatividade. Então, a gente vai ter que repensar e usar a criatividade para ver como vai trabalhar.” “mas a gente vai dançando conforme a música. Cada hora é uma novidade e você tem que se adequar. A gente tem sim certa autonomia em relação a outras instituições, mas a gente tem perdido um pouco essa autonomia.”

“Vai precisar para um ensino de qualidade, as pessoas terão que investir tempo, e tempo custa dinheiro.” - EFICIÊNCIA

“Primeiramente, precisamos avaliar melhor todo o processo, para a gente conseguir olhar de forma mais crítica, para conseguir em espaços mais formais de negociação, para mudar isso. Sem um diagnóstico mais formalizado, fica difícil conseguir mudar. A gente é pesquisador e a gente sabe que a gente precisa de evidência científica para conseguir mudar isso. Então, a gente precisa investir um pouco mais nisso, para conseguir negociar nos espaços, senão ficamos pisando no mesmo lugar. Investir em estudos na área da educação, como o seu estudo, já é um caminho que vai dar mais respaldo para isso.”

P03

FALTA TEMPO PARA PLANEJAR:

CONFLITO DE IDEIAS DEMANDA

MUITO TEMPO, ATIVIDADES POR

FAZER, ÊNFASE NO USO INDIVIDUAL

DÚVIDA SOBRE PARTICIPAÇÃO DOCENTE NOS

ENCONTROS DA PESQUISA

INVESTIMENTO NA PERSPECTIVA FORMATIVA

FALTA INTERCÂMBIO, INTEGRAÇÃO E

ARTICULAÇÃO COM PARES PARA

DRIBLAR DIFICULDADES PEDAGÓGICAS

ESFORÇO PARA MANTER A

TEORIA CRÍTICA – BUSCANDO

ALTERNATIVAS

POUCO TEMPO PARA REALIZAR AS ATIVIDADES – EXCESSO DE

DEMANDAS

REDUÇÃO DO NÚMERO DE DOCENTES –

REORGANIZAÇÃO CURRICULAR –

ENTRE RESISTÊNCIA E

ADAPTAÇÃO

NECESSIDADE DE APROFUNDAMENTO

CONCEITUAL

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DAS AGENDAS

Professora diz: não tenho uma visão educacional que não é da maioria e sinto que tenho que trabalhar como acredito e fico muito cansada. Ficam coisas por fazer e a qualidade do trabalho não tem correspondido. Sinto que está muito desgastante em pensar sobre processos coletivos, pois há diferenças de pensamentos sobre as formas de ensino e isso leva tempo para se expressar e para ouvir, tempo para sentar juntos e conversar. Seria preciso parar para planejar (semana de planejamento), pois aqui não conseguimos, cada um aqui na IES usa sua agenda muito individualmente. Tudo isso gera um intenso conflito. Por isso, procuro fazer articulações com quem está mais próximo de mim. Entretanto, busco deixar claro que o perfil de formação não

Comentei sobre um possível encontro para debates com outros participantes desta pesquisa – professora refere que tem dúvidas se os docentes teriam disponibilidade para esse encontro para debate.

Referiu que o ciclo pedagógico se constitui em um elemento de formação e não se restringe apenas à informação, buscando estimular os estudantes para a formação profissional por meio de aproximações sucessivas a esse universo e pelo compartilhamento de experiências, destacando que a aprendizagem acontece à medida que aquilo faz sentido naquele momento. Essas estratégias buscam as experiências mais marcantes e transformadoras, ou seja, é um processo. Referiu ainda que, ao mesmo tempo, estimula o cognitivo, o conhecimento específico, os conceitos de forma ampliada, podendo-se trabalhar com a diferença – há alunos que buscam mais; por meio do portfólio e da devolutiva, é

Quando conversamos sobre a questão curricular, professora refere os dilemas: agrupa ou não agrupa as disciplinas?; estudantes abaixo de medianos – aprova ou não aprova?. Professora discute que seria preciso buscar atividades convergentes, construir atividades em comum, que os docentes pudessem intercambiar nas disciplinas dos colegas para driblar as dificuldades.

Quanto questiono sobre a situação das políticas neoliberais mais contundentes na atualidade e peço para a professora comentar os resultados da fase exploratória desta pesquisa nesse contexto, professora reflete: “Há um esforço para manter alguns aspectos que a gente acha fundamental para o processo (educação crítica): o portfólio demanda muito trabalho e, por isso, está na contramão. Que outras estratégias adotar, não abrindo mão de ajudar o estudante a se desenvolver, a se relacionar com outras pessoas?” Ela sugere a narrativa de histórias de vida.

Reflete ainda que toda essa demanda excessiva de trabalho gera uma baixa qualidade do trabalho, feito sempre de véspera devido ao pouco tempo disponível.

Em conversa com a professora, nos corredores do estabelecimento de ensino, a mesma refere que com as perdas no quadro docente, a disciplina em que leciona juntamente com outros docentes terá que ser reorganizada no sentido do número de estudantes acompanhados pelos docentes nos campos de estágio, lembrando as normativas a respeito. Refere que o número anterior era de 10-12 estudantes, e acredita que terão que assumir por volta de 17-18. Professora afirma que, mesmo com essas imposições, limitações, dificuldades, ela seguirá na posição de resistência.

AB2 referiu que a uma leitura superficial, percebeu a questão da avaliação formativa como predominante, apesar de ainda terem a prova cognitiva – referi que pude acompanhar um encontro em que ela fazia uma discussão com os estudantes sobre a correção que ela havia feito da prova cognitiva, perguntei a ela se o fato de usar o instrumento ‘prova cognitiva’ para continuar o processo formativo de seus estudantes (discussão aberta a revisões) se isso já não estava dentro dos preceitos de uma avaliação de finalidade formativa – ela concordou.

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é partidário e que segue uma visão de referencial de formação de profissionais da saúde que atendam os princípios do SUS.

possível interagir mais com o estudante. Referiu “é preciso que você saiba para cuidar amanhã” – buscando com isso despertar o interesse do estudante.

P04

GRANDE DEMANDA DE ATIVIDADES NECESSIDADE DE APROFUNDAMENTO CONCEITUAL

Combinamos que ela faria uma breve reflexão e me enviaria por e-mail. No dia 11 de outubro de 2016, enviei-lhe um e-mail lembrando. Sem resposta. Alguns dias após, lhe encontrei nos corredores do estabelecimento de ensino, e ela me disse para ajudá-la a se lembrar disso e que ela costuma esquecer no meio de tantas atribuições.

Professora menciona que, ao ler o resultado da análise da fase exploratória, ela conseguiu fazer-se algumas perguntas sobre alguns conceitos e me pediu para ajudá-la a refletir sobre conceitos como “avaliação formativa” e “avaliação somativa”, sobre os objetivos estarem ora escritos na “perspectiva do ensino” e ora na “perspectiva da aprendizagem”. Conversamos um pouco sobre essas questões.

P05

GRANDE DEMANDA DE ATIVIDADES – TEMPO POUCOS MOMENTOS PARA REFLEXÕES PEDAGÓGICAS

Em 16 de janeiro de 2017, encontrei a professora nos corredores do local de estudo e ela me disse que estava com muitas atividades acadêmicas e que não tinha tido tempo ainda de me responder e pediu que eu enviasse outro e-mail para ajudá-la a se lembrar da atividade. Neste mesmo dia, enviei-lhe um e-mail lembrando sobre a atividade pendente. Em 17 de janeiro de 2017, a professora me responde por e-mail o seguinte: “Tentei zerar meus compromissos antes das férias. Pura ilusão. Farei o melhor que puder com relação à reflexão.”. Em 23 de fevereiro de 2017, a professora responde por e-mail o seguinte: “Com atraso segue a reflexão. Espero que ainda possa contribuir com seu estudo.”

Na prática docente vivemos para conhecer e compartilhar conhecimentos de toda ordem, mas poucos são os momentos em que podemos (re)conhecer como e porque realizamos nossas escolhas metodológicas e pedagógicas, como nesta pesquisa.

P06

DESGATE DO DEBATE E

ENFRENTAMENTO – INDISPOSIÇÃO COM PARES – FOCO NO CONTEÚDO E NA TERRITÓRIO DE ATUAÇÃO DO

DOCENTE – VITÓRIA PELO CANSAÇO

ECONOMIA, DINHEIRO E

PODER – DIFICULDADE DE

RESISTÊNCIA AO MOVIMENTO

MAIS AMPLO

RESISTÊNCIA – TRABALHO DE

FORMIGUINHA – VAI TER QUE

ACHAR UMA SAÍDA

APOSENTADORIAS – MANTER PROPOSTA PEDAGÓGICA – N.º

DOCENTES/N.º ESTUDANTES – DESEJO/PODER

ENTRE RESISTÊNCIA E ADAPTAÇÃO –

AUMENTAR CARGA HORÁRIA SEMANAL PARA

MANTER REFERENCIAL

PEDAGÓGICO – INCERTEZA DE

CONTINUIDADE – MODELO

HEGEMÔNICO FORÇA A

ADAPTAÇÃO

MODELO HEGEMÔNICO

SEDUTOR – PRATICIDADE, FACILIDADE –

MENOS COMPLEXICO E

MENOS COMPLICADO DE EXECUTAR

PAPEL MEDIADOR DO PROFESSOR: ESTRATÉGIAS x REFERENCIAL PEDAGÓGICO

ENTRE REFERENCIAIS PEDAGÓGICOS –

PROCESSO E TEMPO

‘mas ao mesmo ‘eu acho que o Na parte de como ser ‘eu não sei até quando E eu não vou ser É uma força ela acredita que ‘o grande drama que se

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tempo esse processo é muito árduo, porque para fazer isso você tem que enfrentar muita gente, você tem que bater muita boca, mesmo com colegas, com pessoas que você tem um bom relacionamento e em alguns momentos, você precisa se colocar e se indispor para fazer com que aquilo que você acredita tenha alguma valia. Algumas vezes você ganha, algumas vezes você perde. Faz parte! E esse processo é bastante desgastante... às vezes, eu me sinto bastante desgastada’. ‘Esse processo de discussão curricular que tivemos há dois anos, foi um processo muito triste para mim, porque eu vi que as pessoas não conseguem entender que a formação do aluno é superior ao meu conteúdo. O

movimento econômico, pelo próprio nome, por envolver economia, por envolver dinheiro, envolve poder. Não quero ser pessimista, mas acho difícil organizarmos um movimento forte de resistência que mude esse cenário!’

mais professor diante das adversidades, ela refere que quando se está no seu lugar de trabalho, se pensa que nunca há um lugar pior e que a experiência no exterior a fez perceber que as dificuldades são muito parecidas. Refere que o caminho não seja só reclamar ou dizer que não tem jeito, porque ‘a gente vai ter que achar um jeito para resolver’. ‘Onde vejo que posso e tenho tentado fazer mudanças, porque é difícil unir a pessoas porque cada um entende e pensa de um jeito diferente, eu acho que é fazer o trabalho de formiguinha mesmo, tentando disseminar de formiguinha em formiguinha e daqui a pouco temos um formigueiro inteiro de pessoas pensando e fazendo um movimento contra’. ‘eu me vejo como

a gente vai resistir a esse modelo. Vou dar um exemplo claro, com a aposentadoria de algumas colegas da área em que eu leciono, eu não sei até quando a gente consegue manter essa proposta pedagógica por uma questão numérica, como é que vamos conseguir trabalhar com 150 alunos das três disciplinas de cada semestre com três professores, dentro de uma proposta de trabalhar com 10 estudantes por professor. Eu posso querer, eu posso fazer, mas a instituição talvez não me dê condições para. Então, não basta apenas aquilo que eu acredito, que minha colega acredita. Existe uma série de outros fatores que independem da gente que acabam se colocando nesse processo.

hipócrita de dizer um ano, dois anos, três anos, eu aguento, por exemplo, duplicando a minha carga horária, tendo 20 horas de aula por semana, mas eu não vou conseguir fazer isso para o resto da minha vida para suportar uma proposta que eu acredito, mas a minha saúde e a minha qualidade de vida também está em jogo. Hoje eu tenho medo de que se daqui a cinco anos a gente vai estar dentro desse modelo ou se a gente vai ter voltado àquelas aulas chatas em que a gente põe 50 alunos dentro da sala e apresenta os conteúdos e eles copiam, fazem uma prova, e pode ser uma prova um pouco mais que façam com que eles pensem um

muito poderosa e eu acho que as pessoas não percebem isso ou não querem perceber porque por outro lado esse modelo traz um pouco mais de conforto, de facilidade, as coisas são mais práticas, mais fáceis, mais acessíveis no sentido de muito consumismo. Então, as pessoas acabam se seduzindo um pouco por isso e acabam não vendo o impacto disso no futuro’.

precisamos abandonar as perspectivas tradicionais de ensino e isso não significa que se tenha que abolir a estratégia da aula expositiva, referindo que esta última é uma estratégia que pode ser usada caso seja necessária dentro de uma abordagem não tradicional. Ela diz ‘algumas coisas a gente tem que apresentar para o aluno. Eu não vejo mal em usar em alguns e poucos momentos uma apresentação de slides, uma aula um pouco mais expositiva de algumas coisas que às vezes eu percebo que ao longo do processo não estão sendo apreendidas por eles’.

criou na escola de enfermagem é que há dois grupos, o grupo que acha que metodologia ativa é você não dar aula, é o aluno tem que fazer tudo sozinho, tem que buscar tudo sozinho. Não posso dar uma aula expositiva porque senão eu estou quebrando o método... e um outro grupo que não entende que ser mais ativo não significa eu abrir mão daquilo, porque aquele professor que tem 30 anos [de carreira] ele cresceu dentro daquilo, como é que eu vou fazer com que ele do nada... eles não vão conseguir. Então, eu acho que um grande erro foi que as pessoas não souberam equalizar isso. Entender isso que você está falando, de que existe meio termo... então, pode ser por isso que a gente viva dois modelos pedagógicos...

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que eu vi foi uma briga por conteúdo, o meu conteúdo é mais importante do que o seu. Então, eu preciso de 15 horas a mais... ah essa disciplina não vai usar nada que eles vão usar na prática, então, vamos tirar ela. Muito mais um egocentrismo por parte dos professores do que olhar para aquele conjunto de coisas e dizer ok como é que a gente vai fazer com que isso faça sentido para a formação do enfermeiro?’ ‘Eu vou continuar fazendo a minha parte, mas eu não posso deixar de dizer que eu estou... não é enfraquecida, mas entristecida por várias situações que eu passei durante a reestruturação curricular que me fizeram me fechar um pouco. Calar um pouco a boca, sabe? Porque as pessoas não sabem diferenciar que as

alguém que possa fazer mudanças... eu acho que talvez eu não consiga fazer grandes impactos, por exemplo, eu não me vejo como uma professora que vai ser reconhecida nacionalmente, mundialmente, ou por ter colaborado de alguma forma por mudanças na formação, mas eu me vejo como alguém que faz mudanças e que colabora para a formação do aluno individualmente, dentro do grupo com aqueles com quem eu trabalho. Os seus dados acabaram me ajudando a confirmar um pouco mais isso, pelo sucesso dos meus alunos especialmente no final do quinto ano... e por saber que eles ainda levam aquela sementinha de fazer diferente, de pensar criticamente. É um processo de erros e acertos’

pouco mais e individual e pronto! Não porque a gente queira, mas porque esse modelo nos força a.

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coisas que são ditas ali são dentro de um espaço de trabalho e não é uma briga pessoal.

P07

ABANDONO DAS PERSPECTIVAS

CRÍTICAS NA UNIVERSIDADE

INSTITUIÇÃO JÁ SUSCITA

REDUÇÃO DO NÚMERO DE

VAGAS E NÃO PODER FICAR

COM DOIS CURSOS

RESISTÊNCIA DE DOCENTES AOS REFERENCIAIS PEDAGÓGICOS DIALÉTICOS - IMOBILISMO

NECESSIDADE DE FORMAÇÃO

PERMANENTE DIALÉTICA PARA OS

DOCENTES ENFRENTAREM A

CRISE

NEOLIBERALISMO, PRODUTIVISMO ACADÊMICO, ATAQUE À TEORIA CRÍTICA E DESMONTE DA UNIVERSIDADE PÚBLICA – ÊNFASE NAS ATIVIDADES DE PESQUISA

Em conversa com a professora, esta refere estar tentando se desapegar, visto que já está próxima do período de aposentadoria. E refere que a universidade parece pressionar “vão ficar ou vão aposentar?” – se emocionou bastante ao referir isto. Continuou dizendo que com ou sem ela, a situação de abandono das perspectivas críticas vai continuar.

Percebe que no microespaço, têm havido redução no número de professores concursados, que já se ouve a direção da escola falar em redução do número de vagas dos cursos de graduação, referindo preocupação se vai dar para manter os dois cursos: bacharelado em enfermagem e licenciatura e bacharelado em enfermagem.

Refere que há docentes envolvidos e preocupados com a situação, com as perdas, mas percebe certo imobilismo em muitos, que não mudam, mesmo tendo havido as primeiras mudanças no PPP com a inclusão de referenciais mais ativos, críticos e emancipatórios.

Refere que seria preciso que houvesse um processo formativo do corpo docente parecido com o ciclo pedagógico, em que cada docente contribuiria com sua trajetória, discutir assuntos e temas, analisando as questões de aprendizagem, buscando estratégias para superar as presentes dificuldades.

Quando perguntada sobre a questão das ideias neoliberais que se estruturam cada vez mais pelo cenário brasileiro, ela refere ver o desmonte da universidade pública, por meio de: falta de docentes, retrocessos ou perda do que havia sido conquistado, sobrecarga de trabalho, diminuição de carga horária de disciplinas pedagógicas ou de licenciaturas e, em seu caso, retirada de referencial teórico-metodológico do ciclo pedagógico, com potencial emancipatório para o desenvolvimento do pensamento crítico. Reflete que, pelo outro lado não há reduções no número de projetos de pesquisas e orientações.

P08

SE SENTE EM UMA CAMISA DE FORÇAS, MAS VAI BUSCAR UM MEIO DE SE SOLTAR RESISTÊNCIA À PROPOSTA NEOLIBERAL

Em conversa com a professora, pedi para que ela apreciasse os dados da fase exploratória desta pesquisa apresentados a ela, fazendo uma reflexão com a situação mundial, nacional, na sua universidade e em suas disciplinas. Professora responde que se sente contida, como se estivesse em uma “camisa de forças”, daquelas usadas na época em que a psiquiatria fazia uso

Referiu ainda que o neoliberalismo tem ficado mais claro e mais forte, declarado, principalmente a partir das décadas de 80 e 90. Referiu que o poder em todas as instâncias mundial, nacional, estadual, municipal, da universidade, da faculdade tem integrantes que anseiam por esta proposta, mas o caminho é a resistência, seja a forma que for necessária.

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delas para conter os pacientes agitados. No entanto, refere que, assim como os pacientes psiquiátricos da época, ela buscaria uma forma de sair disso, que não é impossível, não é uma contenção absoluta.

P09

PREPARO INSUFICIENTE PARA

A DOCÊNCIA

ADAPTAÇÃO ATÉ ONDE CONSEGUIR – INSEGURANÇA – VOLTAR A AULAS EXPOSITIVAS

TEMPO – AGENDAS LOTADAS REDUÇÃO NO Nº DE PROFESSORES – NÃO RECONTRATAÇÕES –

PROBLEMAS ESTRUTURAIS

Relata ainda que sente que não tem o preparo suficiente para dar conta destes aspectos pedagógicos.

Quando questionada sobre o que fazer, professora refere não saber o que fazer. Disse que vai tentar ir se ajustando até onde conseguir, mas que isso tem gerado bastante insegurança sobre o que vem no futuro – “será que vou ter que voltar a dar aulas para uma turma grande, de forma transmissiva?!”.

Refere ainda que, às vezes, não consegue oferecer o tempo necessário para que os estudantes possam refletir e desenvolver suas ideias diante de um questionamento ou uma problematização. Refere que precisa dar mais tempo para o estudante pensar. Professora comenta que está sempre com a agenda lotada e que isso tem dificultado inclusive o estudo de seu próprio tema de ensino.

Traz a preocupação de que sua área de ensino possuía 9 professores e que, com as perdas por aposentadorias, estão em apenas 6 docentes. Continua dizendo que com esse enxugamento, com a política de contratações/ reposições mínimas, teme que as turmas fiquem mais cheias para cada professor, o que geraria uma redução clara na qualidade do processo de ensino-aprendizagem. Refere que está bastante preocupada com a questão dos estágios, porque somente é permitido 10 estudantes para cada docente e que, com as perdas de recursos humanos, a questão do estágio vai ficar mais complicada.

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REDUÇÃO NO Nº DE PROFESSORES – NÃO RECONTRATAÇÕES – VOLTAR A

DISCIPLINAS TRANSMISSORAS PROFESSOR MUITO ATAREFADO

Em um último encontro com a professora nos corredores do estabelecimento de ensino no dia 15-09-2017, professora comenta espontaneamente que acredita que, por conta do contingenciamento na contratação de novos docentes, todo o investimento, planejamento e implementação de uma disciplina com uso de simulações poderá voltar para a perspectiva transmissora. Refere isso com muito pesar e preocupação.

Quanto à devolutiva, entrei em contato com a participante no dia 17 de novembro de 2016, enviando-lhe as planilhas 1 e 2. Não obtive retorno. Entrei em contato novamente no dia 16 de janeiro de 2017 sobre o mesmo aspecto, não obtendo retorno também. Em 05 de junho de 2017, faço nova tentativa de contato por e-mail para verificar o interesse em continuar na pesquisa. Uma observação importante é que a professora não respondeu nenhum dos e-mails anteriores relacionados a um plano de aula que ela me disse que enviaria por e-mail (datas dos e-mails sem resposta: 30 de setembro de 2015– e-mail para confirmar observação participante sem resposta; 08 de outubro de 2015 – primeiro e-mail pedindo o plano de aula; 18 de novembro de 2015 – segundo e-mail solicitando o plano de aula; 19 de janeiro de 2016, terceiro e-mail solicitando o plano de aula; 02 de maio de 2016, quarto e-mail; 17 de julho de 2016, quinto e-mail; 18 de setembro de 2016, sexto e último e-mail dessa série). Quando entrei em contato com a professora por e-mail após a haver encontrado no corredor do local de estudo, ela me enviou a seguinte resposta diante do convite para participar dos encontros: “Olá ***, bom dia! Desde que eu cheguei estou muito atarefada com as pendências de trabalho. Até final de outubro - não estou assumindo novos compromissos. Estou em duas disciplinas de graduação, uma de pós-graduação e vários alunos para defender o mestrado. Estou mesmo muito atarefada. Em função disto, não posso confirmar minha presença no encontro.”.

P11

DESCOMPASSO ENTRE REFERENCIAIS DO CONHECIMENTO ESPECÍFICO E OS

DO CONHECIMENTO PEDAGÓGICO

PRODUTIVISMO ACADÊMICO – ÊNFASE NA PESQUISA – FALTA TEMPO PARA ‘AMARRAR’ TODAS AS AÇÕES

DESEJO DE SER PROFESSOR x INCENTIVO

Quando pergunto sobre os referenciais pedagógicos, referindo que isto tinha aparecido como uma situação-limite, pois não ficava claro os referenciais pedagógicos utilizados, o professor responde que nas reuniões eram discutidos

Quando pergunto como ele se sente em relação a essa situação, ele refere que se sente frustrado, dizendo que queria que a docência e a extensão fossem mais valorizados, porque o ensino é a base para a pesquisa. Ele questiona: “será que precisa de tanta produção? Será que esta produção está sendo utilizada?” – quando se refere à pesquisa. Refere que não sobra tempo para amarrar todas as ações de

Faço uma pergunta para que o professor possa comentar sobre os resultados dessa fase exploratória, relacionando-os com o cenário político-econômico e social que vive o Brasil, e por consequência a universidade. Professor começa a explicar o porquê escolheu a docência, referindo que esta era uma vontade anterior, que começou a ser despertada

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referenciais utilizados nas disciplinas, referindo dois referenciais teóricos/metodológicos do conhecimento específico que leciona (o da reabilitação psicossocial e o do inter-relacionamento pessoal), referindo-se a eles como modelos de abordagem dentro do campo da psiquiatria/saúde mental.

ensino-pesquisa-extensão. Assim, conclui que fez enfermagem, porque queria ensinar enfermagem. Refere que quem tem este pensamento e este desejo de ensinar, consegue superar todos os outros problemas e dificuldades. Mas, lembra que a universidade dá maior valor à pesquisa e que o incentivo à docência fica limitado.

desde o colegial. Refere que ensinar o outro é sua maior alegria. Assim, conclui que fez enfermagem, porque queria ensinar enfermagem. Refere que quem tem este pensamento e este desejo de ensinar, consegue superar todos os outros problemas e dificuldades. Mas, lembra que a universidade dá maior valor à pesquisa e que o incentivo à docência fica limitado.

P12

PROFESSORA SE APOSENTOU DURANTE O TEMPO DA PESQUISA DESEJO DE APRENDER MAIS SOBRE O ASSUNTO DA PESQUISA

Quanto à devolutiva, professora respondeu por e-mail. “Li o material e concordo com a categorização que você fez e com a transcrição do que falei na entrevista e com o que você observou. Na verdade, estando afastada do ensino de graduação desde final de junho, relembrei várias situações ocorridas por anos à fio enquanto docente em sala de aula, laboratório e campo de estágio. Tive um sentimento de que essas coisas estão tão distantes... embora só seis meses se passaram desde a aposentadoria... Quanto às planilhas, professora referiu que concordou com as categorias encontradas e que a fizeram lembrar-se dos anos como docente na instituição, mesmo tendo passado apenas seis meses naquele momento.

Senti que a docente referiu que por já ter aposentado que talvez não conseguisse contribuir mais para o estudo. Enviei um e-mail verificando esta situação. Quando a questionei sobre minha sensação, a docente respondeu: “Posso contribuir sim no que mais for necessário e na verdade tenho interesse em aprender mais sobre o assunto.” Assim, ela continuará participando mesmo tendo aposentado.

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FALTA DE EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL DIFICULTA A DEDICAÇÃO À DOCÊNCIA

CARREIRA DOCENTE POR PRODUTIVIDADE – SALÁRIO

COMPLEMENTADO POR AGÊNCIAS DE FOMENTO –

MODELO AMERICANO

DESTRUIÇÃO DA CARREIRA DOCENTE NA UNIVERSIDADE –

PROFESSOR TEMPORÁRIO

RELACIONA MODELO NEOLIBERAL, PRIVATIZAÇÃO E CLASSES MAIS FAVORECIDAS QUE BUSCAM A

UNIVERSIDADE PÚBLICA, JUSTIFICANDO A PRIVATIZAÇÃO

Quando falo de tempo, professora refere que talvez não seja esse o caminho. Ela refere que pode ser algo relacionado à identidade, uma identificação com o ensino. Ela conta que existem professores que não têm a prática profissional, a identidade profissional porque não trabalharam como enfermeiro antes e têm muita ansiedade quando têm que ir ao campo de estágio. Então, ela refere que a identificação com a profissão e com a docência é essencial para olhar a questão da docência, mas refere que a pessoa vai entrando em ‘mil comissões’, dizendo que está mais relacionado com a identificação, uma maneira de se identificar com aquilo que você gosta. Professora refere que gosta mais do ensino em campo de estágio. Assim, a professora refere que é importante que a pessoa se identifique com aquilo que faz para que faça melhor e com qualidade.

Quanto à carreira docente, professora acredita que pode ser que esta fique parecida ao que acontece nos Estados Unidos, em que o professor recebe um pequeno salário e ele vive dos recursos de agência de fomento, por isso tendo que ser muito bom.

Falamos sobre a categoria de professor temporário, e professora refere que é um processo na contramão de tudo, pois vê diversos problemas: contratação de um professor para várias disciplinas com altos níveis de complexidade; relação com campos de estágios fragilizados.

Quanto à questão neoliberal na universidade, professora comenta que não seria o ideal, mas que vai acabar acontecendo um processo de privatização, já que as universidades públicas têm sido buscadas por classes mais favorecidas.

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 9 - Quadro analítico de alguns efeitos do dispositivo de pesquisa Parts. EFEITOS

P03

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE CONCEITOS PEDAGÓGICOS

AB2 referiu que a uma leitura superficial, percebeu a questão da avaliação formativa como predominante, apesar de ainda terem a prova cognitiva – referi que pude acompanhar um encontro em que ela fazia uma discussão com os estudantes sobre a correção que ela havia feito da prova cognitiva, perguntei a ela se o fato de usar o instrumento ‘prova cognitiva’ para continuar o processo formativo de seus estudantes (discussão aberta a revisões) se isso já não estava dentro dos preceitos de uma avaliação de finalidade formativa – ela concordou.

P04

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE CONCEITOS PEDAGÓGICOS

Professora menciona que, ao ler o resultado da análise da fase exploratória, ela conseguiu fazer-se algumas perguntas sobre alguns conceitos e me pediu para ajudá-la a refletir sobre conceitos como “avaliação formativa” e “avaliação somativa”, sobre os objetivos estarem ora escritos na “perspectiva do ensino” e ora na “perspectiva da aprendizagem”. Conversamos um pouco sobre essas questões.

P05

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE CONCEITOS PEDAGÓGICOS

PROVOCOU A ANÁLISE DO PERCURSO METODOLÓGICO DESSA PESQUISA

O feedback oferecido pelo aluno confirma minha história cultural, e aponta que ocorreram mudanças, que na minha compreensão foram significativas na prática docente, porém com lacunas que necessitam ser superadas. Percebo, que minha trajetória educacional na Escola Nova e na Tradicional, ainda ecoa na minha pretensa prática que tenta se apoiar na abordagem democrática, libertadora, em que o diálogo e a autonomia na construção do conhecimento coloca o aluno e suas necessidades em foco. Como defende Libâneo (2010; p.30; p.35; p.37), as novas atitudes docentes implicam em “conhecer estratégias do ensinar a pensar, ensinar a aprender a aprender”; de “persistir no empenho dos alunos a buscarem uma perspectiva crítica dos conteúdos, a se habituarem a aprender as realidades enfocadas nos conteúdos escolares de forma crítico-reflexiva”; enfim “assumir o ensino como mediação da aprendizagem ativa do aluno com a ajuda pedagógica do professor”. Concluo que a pesquisa nos aponta para um modelo de avaliação da prática docente em que potencializa um processo de fortalecimento da reflexão e da crítica, que prescinde do diálogo pedagógico fundamentado num colegiado que sabe o que pretende socialmente com a formação do enfermeiro.

Para Esteban (2008), as críticas que convidam, com objetivos e argumentos às vezes diferentes, geram impactos na dinâmica da sala de aula, na gestão da escola e na organização do sistema educacional. Porque provocam indagações para os professores que tecem seu cotidiano nas diversas funções que assumem. De fato, as interações sociais resultantes do trabalho complexo do professor prescindem de um mergulho consciente nos valores que guiam nossas escolhas e orientam nossas ações. De fato, a ideologia está presente em todas as atividades humanas, de forma consciente ou não, e em todas as mensagens, a atividade científica e seu respectivo discurso são também afetados por ela. Então, quem faz qualquer trabalho científico, além de convencer-se e convencer outrem sobre a verdade de suas conclusões, tem obrigação de desnudar-se ideologicamente (ROMÃO, 2011). Está claro que nesta pesquisa, a qual fui participante, a abordagem é dialética, pois foi concebida como um processo, compreendida não como um estoque de saber irremovível, mas um processo de inovação. Esta pesquisa proporciona esta aventura sistematizada do autoconhecimento, ao ampliar a janela da comunicação com nossos pares, aos olhares e na perspectiva de quem nos observam e vivenciam os mesmos espaços da educação, ou seja, da vida. Ou seja, no olhar de Humboldt apud Adorno (2003, p.27), a formação autêntica, implica numa reconciliação entre homem e o mundo, em que aquele, ao se impor ao mundo, adquiri sua realidade, objetivando-se, enquanto o mundo simultaneamente, se humaniza pelo trabalho dos homens. O ciclo proposto pelo pesquisador é intenso, com possibilidades de reflexões que ajudam a ampliar o significado e a coerência de nossas ações como docente, ao desvelar o fenômeno da educação quando de fato imerge nos fatos. Um portfólio de informações que desnuda o fazer docente dentro de uma perspectiva interacionista e dialógica, que certamente potencializa os resultados. Os movimentos decorrentes da proposta da pesquisa em nenhum momento nos deixaram desconfortável ou alterou a dinâmica dos diversos espaços de aprendizagem, o que qualifica o respeito mútuo nas relações pedagógicas e de pesquisa.

P06 PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE SUA CONCEPÇÃO

PEDAGÓGICA PROVOCOU A ANÁLISE DO

PERCURSO METODOLÓGICO FEZ SUGESTÕES TEXTUAIS

SOBRE AS ANÁLISES COM/SEM MEDO DA AVALIAÇÃO

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DESSA PESQUISA MUDANÇA DE SENTIDO

A professora disse ‘fui ler o que eu falei e pensei – será que penso desse jeito ainda? Será que isso me reflete mesmo?’. E ela refere que acha que não em algumas coisas, pois justifica esta percepção a partir de um momento em que está fora do Brasil, distante das questões de seu local de trabalho. Refere não saber se teria a mesma percepção se estivesse aqui no Brasil. Refere que talvez sua percepção tenha sido diferente por estar fora, ‘saindo desse mundo de rotina de escola, de sala de aula, de planejamento, de reuniões pedagógicas, enfim, da vida do professor da ***’. Refere que pensa que é fundamental para se refazer professor saindo um pouco para olhar de fora, voltar a estudar. ‘Os seus dados acabaram me ajudando a confirmar um pouco mais isso, pelo sucesso dos meus alunos especialmente no final do quinto ano... e por saber que eles ainda levam aquela sementinha de fazer diferente, de pensar criticamente. É um processo de erros e acertos’

Refere que quando abriu que percebeu que os dados faziam uma comparação entro o seu discurso e sua prática. Referiu que o referencial teórico que usei casa bem com o processo, com a prática pedagógica. Referiu que, de primeiro momento, teve um pouco de dificuldade de entender os dados, e que resolveu essa dúvida comigo por e-mail.

Professora fez comentários ao longo de sua análise dos quadros de situações-limites e elementos emancipatórios, refletindo sobre suas concepções ora mantendo o seu posicionamento, ora repensando o que disse e o que fez.

Professora diz ‘quando eu recebi o seu e-mail, eu não o abri, porque fiquei assim com aquele medo, ai como eu fui avaliada, não é!’

P07

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE SUA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA

Professora refere que percebeu fortalezas nos materiais que leu (planilhas 2 e 3 da fase exploratória desta pesquisa), referindo que viu o quão conseguiu colocar em prática um referencial teórico e pedagógico, reconhecendo que precisaria de aprofundamentos teóricos para melhorar sua prática pedagógica.

P08

FEZ SUGESTÕES TEXTUAIS SOBRE AS ANÁLISES SEM MUDANÇA DE SENTIDO

Quanto às planilhas, professora sugeriu, no primeiro elemento emancipatório ‘Gestão contínua e acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem’, nos dados advindos de observação: 1-) a ampliação do núcleo de sentido do primeiro trecho para “USO DE UM CADERNO PARA ACOMPANHAR O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM PARA REGISTRO DAS FALAS DOS ESTUDANTES A PARTIR DOS PONTOS-CHAVES”. 2-) a inclusão do termo “dos estudantes” no segundo trecho.

P09

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE SUA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA COMPARTILHAR RESULTADOS DA PESQUISA COM PARES

Professora refere que, por meio dos resultados da fase exploratória da presente pesquisa, consegue ver em sua abordagem pedagógica questões relacionadas à facilitação, ao acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem, à metodologia ativa.

Refere que a presente pesquisa lhe ajudou a olhar mais atentamente sobre estas questões e que gostaria de compartilhar os achados com seus pares docentes da disciplina em que leciona.

P10

NÃO RESPONDE OS E-MAILS – CONVERSA APENAS NOS CORREDORES

Quanto à devolutiva, entrei em contato com a participante no dia 17 de novembro de 2016, enviando-lhe as planilhas 1 e 2. Não obtive retorno. Entrei em contato novamente no dia 16 de janeiro de 2017 sobre o mesmo aspecto, não obtendo retorno também. Em 05 de junho de 2017, faço nova tentativa de contato por e-mail para verificar o interesse em continuar na pesquisa. Uma observação importante é que a professora não respondeu nenhum dos e-mails anteriores relacionados a um plano de aula que ela me disse que enviaria por e-mail (datas dos e-mails sem resposta: 30 de setembro de 2015– e-mail para confirmar observação participante sem resposta; 08 de outubro de 2015 – primeiro e-mail pedindo o plano de aula; 18 de novembro de 2015 – segundo e-mail solicitando o plano de aula; 19 de janeiro de 2016, terceiro e-mail solicitando o plano de aula; 02 de maio de 2016, quarto

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e-mail; 17 de julho de 2016, quinto e-mail; 18 de setembro de 2016, sexto e último e-mail dessa série).

P11

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE SUA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA

FEZ SUGESTÕES TEXTUAIS SOBRE AS ANÁLISES COM/SEM MUDANÇA DE SENTIDO

DESCONFORTO COM OS DADOS

Professor refere que não havia percebido que algumas coisas que já são feitas por ele na sua atuação pedagógica eram emancipatórias.

SEM MUDANÇA DE SENTIDO Quanto às planilhas, professor sugere alteração de alguns termos, como segue abaixo. Trocou a palavra “incerteza” pela palavra “dúvida”.

Professor ficou um pouco apreensivo quando viu o termo ‘produtivismo acadêmico’ em seus quadros – penso aqui o peso que deve recair sobre seus ombros como coordenador de um programa de pós-graduação.

P13

PROVOCOU REFLEXÃO SOBRE SUA CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA FEZ SUGESTÕES TEXTUAIS SOBRE AS ANÁLISES COM/SEM MUDANÇA DE SENTIDO

Quanto à devolutiva, conversamos por 48 minutos sobre os dados. Começamos a conversar sobre situações-limites. Professora reconhece que utiliza um pouco da perspectiva tradicional e do autoritarismo “disfarçado” em sua prática pedagógica. Ressaltamos uma estratégia interessante que a professora utilizou em um momento do estágio, com um tipo de brincadeira séria para chamar o estudante à atenção. Professora reconhece que já foi muito “linha dura”. A professora refere que vai tentando e usando novas abordagens e vendo como vai lidando com as questões, os nuances.

COM MUDANÇA DE SENTIDO Na revisão das planilhas, a professora utilizou novas frases agregadas aos trechos de suas falas. Em um momento para expressar duração da construção do estudo de caso, professora acrescentou ‘ao longo da disciplina’; em outro momento, acrescenta uma frase ‘e entender o lado do aluno. Isso ocorreu quando eu fiz o curso de licenciatura’. Diante de uma situação de ênfase na nota, avaliação somativa, professora acrescenta o trecho referente ao estudante: ‘ele reclama e sempre quer nota maior’ e outro trecho na mesma direção ‘mas tenho tentado comparar o aluno com ele mesmo’. O restante das alterações não muda o sentido.

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 10 - Quadro analítico integrador dos efeitos produzidos CARACTERÍSTICAS E

FUNDAMENTOS DA NOVA GESTÃO PÚBLICA (NGP) – VERTENTE GERENCIAL E

CARACTERÍSTICAS DA CULTURA DO MANAGEMENT

(CM)

POSSÍVEIS DISPOSITIVOS DE IMPLANTAÇÃO, DISSEMINAÇÃO E CONTROLE SOBRE A EDUCAÇÃO

SUPERIOR EFEITOS SOBRE OS DOCENTES

EFEITOS SOBRE AS CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS

CONCEITOS FUNDAMENTAIS (NGP): a) A lógica do setor privado

deve ser a referência a ser seguida (enfoque empresarial):

Redução de custos;

Eficiência;

Eficácia;

Clientelização dos cidadãos;

b) O mercado é quem deve formular políticas públicas;

c) Os serviços públicos devem abandonar as fórmulas burocráticas para assumir a modalidade de concorrência empresarial;

d) A gestão deve ser apartada da política (Paula, 2005; 2010; Dasso Júnior, 2014)

ELEMENTOS DA NGP: 1. Profissionalização da

gestão nas organizações públicas;

2. Padrões de desempenho e

VIA AGÊNCIAS REGULADORAS:

CAPES o No art. 7º do DECRETO N.º 2.026, DE 10 DE OUTUBRO

DE 1996, é referido que “Cabe à CAPES a avaliação dos cursos de mestrado e doutorado, que será realizada de acordo com critérios e metodologia próprios” (Brasil, 1996a);

o Avaliação quantitativa ou quali-quantitativa para ranqueamento e classificação dos programas de pós-graduação e dos docentes credenciados:

o Foco em artigos A1, A2 e B1; o Avaliação das revistas (Qualis); o Parametrizações de defesas n.º de defesas (DO e ME) e

tempo para defesa; n.º de estudantes e docentes credenciados, dentre outros;

o Avaliação do tempo de defesas (valorização de tempos de defesa cada vez menores – tempo é dinheiro);

o Oferta de cursos presenciais e EAD não têm pesos diferentes, o que pode incitar a oferta de cursos EAD;

o Avaliação informal, com utilização de termos, tais como fraco, regular, bom, muito bom, na ficha de avaliação;

o Foco na internacionalização: eventos, publicações, parcerias, projetos; reforça a internacionalização por meio da publicação em periódicos com fator de impacto, com assuntos de referência para a enfermagem mundial (incentivo a focalizar em assuntos generalizáveis?); reconhecimento internacional via citações;

o Refere como centros de excelência internacional da pós-graduação em enfermagem aqueles top-ranqueados pela

EFEITO CHECKLIST:

Cumprimento de tarefas, exigências, demandas a partir da nova encomenda da universidade-empresa;

Efeitos indutores de avaliações CAPES;

Peso do dinheiro sobre a indução dos caminhos da universidade, da pós-graduação etc.;

Poucos incentivos para avanços na melhoria do ensino de graduação, ou profissionalização docente; EFEITO DA ‘LIVRE’-CONCORRÊNCIA:

Atrelamento da encomenda neoliberal da universidade-empresa à progressão na carreira e no salário;

Acumular, estocar quantidades da moeda de troca (produtos desejáveis e encomendados) para:

o Consecução de cargos; o Progressão na carreira (horizontal e

vertical); o Aumento de salários; o Reconhecimento entre os pares

(nacional e internacional);

CAPES: aumento de artigos A1-A2-B1;

EFEITO ROSA DOS VENTOS NAS CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS:

Nos discursos, há menção de várias nomenclaturas da área da educação, inclusive de fundamentações pedagógicas ora convergentes, ora divergentes;

A produção dos textos (documentos – planos de aula, de disciplina e programas de disciplina) há menção de várias nomenclaturas da área da educação, inclusive de fundamentações pedagógicas ora convergentes, ora divergentes;

A implementação ora busca coerência teórico-prática ora sofre distorções e atravessamentos de diferentes e divergentes tendências pedagógicas;

Multiplicidade de perspectivas metodológicas, avaliativas, epistemológicas etc.;

Mito do “não sigo nenhum referencial pedagógico”;

Sensação de que esta diversidade de concepções compõem um menu a partir do qual o professor pode

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medidas de avaliação com objetivos mensuráveis e claramente definidos;

3. Ênfase no controle e nos resultados;

4. Desagregação das grandes unidades do setor público;

5. Introdução da competição no setor público;

6. Uso de práticas de gestão do setor privado;

7. Ênfase na disciplina e na utilização dos recursos, cortando custos e procurando maior eficiência e economia. (Hood, 1991)(p.4-5)

CARACTERÍSTICAS DA CM:

Produção de livros, revistas e outros objetos de consumo presentes no mundo dos negócios, bem como por símbolos que permeiam as organizações e a mente dos indivíduos que com elas se relacionam, como é o caso dos “gurus”, dos “gerentes-heróis”, dos consultores e outros portadores de “fórmulas infalíveis” de gestão; (Paula, 2005; Wood Jr. e Paula, 2006; Paula, 2010; Ituassu e Tonelli, 2014)

QS World University Ranking (Reino Unido), cujo ranqueamento é feito por especialistas (em quê?) – todos os estabelecimentos citados são de países de colonização e origem anglo-saxônica (EUA, Canadá, Inglaterra);

o Área está aumentando acordos de cooperação internacional (notadamente com países de origem e colonização anglo-saxônica e parte francesa do Canadá); aumentou também captação de recursos financeiros com instituições estrangeiras (notadamente de origem e colonização anglo-saxônica);

o Após toda a avaliação, os programas que obtiveram indicação de nota 6 ou 7, passam por um olhar quanto à excelência e inserção internacional por meio de 2 condições: desempenho equivalente ao de centros internacionais de excelência na área (quais são e como são excelentes?); nível de desempenho altamente diferenciado em relação aos demais programas da área (comparação entre os programas?);

o Programas, mesmo que atinjam pontuação para ultrapassar dois níveis, por exemplo, não o é permitido por meio de consenso entre membros da Comissão de Avaliação (por que não?); (DOCUMENTO DOC-30) REFORMAS INTERNAS NA UNIVERSIDADE ESTUDADA (AUTARQUIA):

Reformulação do Estatuto Docente: o Flexibilização dos regimes de trabalho e de contratação; o Possibilidade de indicação de mudança de regime de

trabalho após avaliação docente

Avaliação docente e institucional por meio de indicadores quantitativos ou quali-quantitativos com tendências para perspectivas autoritárias, centralizadoras, punitivas e pouco democráticas; (DOCUMENTO DOC-26)

aumento de atividades de internacionalização; expansão quantitativa ou dentro da “qualidade” estabelecida como excelência pela CAPES – moeda de troca para: aprovação de projetos de pesquisa em agências de fomento;

UNIVERSIDADE: atrela a ascensão na carreira à lógica CAPES e a avaliações quantitativas focadas em produtos mensuráveis nas três dimensões ensino-pesquisa-extensão; programas de pós-graduação intensificam critérios quantitativos para credenciamento e recredenciamento dos docentes; EFEITO SANFONA SOBRE O TEMPO DOCENTE:

Diminui tempo de defesa de seus orientandos – aumenta tempo de dedicação docente para que cada orientando consiga cumprir prazos cada vez mais curtos – quanto menor melhor;

Diminui funcionários técnico-administrativos – aumento de atividades administrativas pelos docentes (responsabilização dos docentes, os quais tem que acompanhar os tutoriais e vídeos autoinstrutivos criados pelos poucos funcionários restantes);

Aumento de atividades administrativas dos docentes – diminuição de áreas verdes nas agendas docentes;

Aumento do uso do tempo para

fazer os mais variados arranjos e combinações sem compromisso teórico-pedagógico; EFEITO PENEIRA:

Empurra a formatação curricular e, neste caso, as disciplinas, para concepções mais alinhados com a perspectiva neoliberal e modelo gerencialista, seguindo esses preceitos;

O que não cabe e não encontra sustentação na estrutura neoliberal em consolidação se esvanece – escorre pela peneira e não fica (teoria crítica; avaliação formativa; etc.);

Estatuto e Regimento da universidade: induz a ideia de currículo disciplinar; integração curricular por pré-requisitos; incentiva o uso de provas e trabalhos escritos; incita a ideia de avaliação somativa;

Sistema online e informatizado da universidade dita as regras das conformações disciplinares, induz avaliação por notas;

Inclusão de testes de progresso para avaliar estudantes, ainda com forte ideologia somativa e foco no cognitivo – podem induzir professores a preparar os estudantes para conseguirem ir bem neste teste;

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Pressupostos: crença numa sociedade de mercado livre; a visão do indivíduo como autoempreendedor; o culto da excelência como forma de aperfeiçoamento individual e coletivo; eficiência; o culto de símbolos e figuras emblemáticas, como palavras de efeito (inovação, sucesso, excelência); a crença em tecnologias gerenciais que permitem racionalizar as atividades organizadas grupais;

Homens e mulheres de negócio têm ocupado papel dominante no processo de socialização dos indivíduos (educação, habilidades, experiências);

Mídia vem veiculando valores do mundo dos negócios (símbolos, linguagem, crenças).

(Deeks, 1993 apud Paula, 2010).

Plano de Demissão Voluntária: o Enxugamento do quadro de profissionais não-docentes de

assistência técnica e administrativa; o Terceirização de serviços;

(DOCUMENTO DOC-31)

Mudança de rota na formação permanente dos docentes universitários:

o Desconsideração de grupos pedagógicos que estavam trabalhando na lógica da formação contínua do professor universitário, por meio de cursos de Pedagogia Universitária (formativos) –; (DOCUMENTOS DOC-27 E DOC-28)

o Constituição de outra lógica de formação docente, com enfoque da didática instrumental, constituição de índices quantitativos sobre a questão da formação contínua docente, por meio de eventos do tipo palestras, seminários (informativos); propostas de avaliação docente pelos estudantes (influência do clientelismo?); não menção/consideração dos grupos pedagógicos que ainda existem (descontinuação das atividades de formação docente implementadas em gestões anteriores? Por quê?) – o relatório de gestão usa palavras como excelência, qualidade do ensino, treinamento, tecnologias: “Tem como objetivo também acompanhar as mudanças de abordagens educativas derivadas da evolução dos meios de comunicação, da tecnologia e das próprias demandas de qualificação profissional advindas da sociedade.” (p.24); foco em olhar quantitativo de palestras para docentes sobre questões didáticas; criação de uma revista sobre assuntos da graduação. (DOCUMENTO DOC-29)

consecução dos produtos das cobranças ou daqueles que atraem recursos para a universidade (dinheiro) – diminuição do uso do tempo para atividades não oficialmente cobradas ou que não geram recursos para a universidade (dinheiro); EFEITO DE CONTENÇÃO:

Professores inseguros e indecisos diante das dicotomias;

Prisioneiro do cumprimento de tarefas;

Disputando com pares: financiamentos, ranqueamentos, avaliação, cargos e funções;

Sequestro do tempo e do espaço para a dedicação exclusiva à consolidação da perspectiva neoliberal, pelo modelo gerencialista.

Dificuldade para se dedicar à formação para a docência:

o Falta tempo para esse investimento; o Isso não é valorizado; o Estrutura e cultura organizacional têm

dificultado esse investimento. ADOECIMENTO

Professores relatam adoecimento de si de pares:

o Falta tempo para lazer; o Extrapolam o turno de trabalho para

dar conta das demandas.

EFEITO ADAPTAÇÃO-RESISTÊNCIA:

Os opositores à perspectiva neoliberal promovem adaptações para resistir: aumento de carga horária semanal de dedicação à docência na perspectiva pedagógica escolhida, deixando a proposta de trabalho e as escolhas metodológicas, avaliativas e pedagógicas quase inalteradas do ponto de vista do trabalho pedagógico, mas isto causa descompensações na dimensão produtiva da moeda de troca (artigos, internacionalização etc.);

Fazem esse movimento até quando for possível, com tendência a se adaptar ao modelo neoliberal pelas limitações estruturais impostas por este modelo;

Os não adeptos à perspectiva crítica, fizeram e fazem resistência para que as mudanças até então alcançadas no currículo crítico não se consolidem; implementam movimento de dissolução do aspecto crítico-emancipatório: coações, enfrentamentos duros com os pares, exaustão nas discussões, etc.

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.

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APÊNDICE 11 - Quadro com todos os documentos analisados nesta pesquisa (alguns com identificação

ocultada) CÓDIGO DE

REFERÊNCIA DO

DOCUMENTO

PARTICIPANTES REFERÊNCIA

TIPO DE DOCUMENTO FORMA DE OBTENÇÃO DO DOCUMENTO DATA/CONSULTA DO DOCUMENTO

DOC-01 P11 Slides de uma aula Documento cedido pelo professor 31-03-2015

DOC-02 P01, P02, P03,

P04, P07 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 24-04-2015

DOC-03 P09 Plano de aula do 7º encontro Documento cedido pelo professor 27-04-2015

DOC-04 P05, P06 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 30-04-2015

DOC-05 P03 e-mail informando replanejamento de uma atividade e-mail enviado pelo professor 17-06-2015

DOC-06 P01, P02, P03,

P04, P07 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 06-08-2015

DOC-07 P05, P06, P07,

P08 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 10-08-2015

DOC-08 P01 Plano de aula de um encontro Documento cedido pelo professor 12-08-2015

DOC-09 P13 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 13-08-2015

DOC-10 P12 Slides 1 de uma aula Documento cedido pelo professor 18-08-2015

DOC-11 P12 Slides 2 de uma aula Documento cedido pelo professor 18-08-2015

DOC-12 P12 Plano de Disciplina Documento cedido pelo professor 18-08-2015

DOC-13 P09 Plano de aula do 8º encontro Documento cedido pelo professor 03-09-2015

DOC-14 P09 Programa da Disciplina Documento disponibilizado online 16-11-2015

DOC-15 P02 Programa da Disciplina Documento disponibilizado online 18-11-2015

DOC-16 P10 Programa da Disciplina Documento disponibilizado online 18-11-2015

DOC-17 P11 Programa da Disciplina Documento disponibilizado online 18-11-2015

DOC-18 P04 Programa da Disciplina Documento disponibilizado online 01-05-2016

DOC-19 Estabelecimento Projeto Pedagógico do Curso 1 de Graduação em enfermagem (versão 2014)

Documento disponibilizado online 31-05-2017

DOC-20 Estabelecimento Projeto Pedagógico do Curso 2 de Graduação em enfermagem (versão 2014)

Documento disponibilizado online 31-05-2017

DOC-21 Estabelecimento Avaliação Institucional (2010 - 2014) - Parecer da Autorização concedida pela Direção do estabelecimento 17-01-2018

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Comissão Avaliadora estudado

DOC-22 Estabelecimento Projeto Pedagógico do Curso1 de Graduação em enfermagem (versão 2017)

Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-23 Estabelecimento Projeto Pedagógico do Curso 2 de Graduação em enfermagem (versão 2017)

Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-24 Estabelecimento Grade Curricular do Curso 2 Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-25 Estabelecimento Grade Curricular do Curso 1 Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-26 Universidade Resolução da Universidade sobre o estatuto docente Documento disponibilizado online 15-01-2018

DOC-27 Universidade Relatório de Gestão - Pró-Reitora de Graduação (2006-2009)

Documento disponibilizado online 03-02-2018

DOC-28 Universidade Relatório de Gestão - Pró-Reitora de Graduação (2010-2013)

Documento disponibilizado online 03-02-2018

DOC-29 Universidade Relatório de Gestão - Pró-Reitora de Graduação (2014-2017)

Documento disponibilizado online 03-02-2018

DOC-30 CAPES/MEC Relatório de Avaliação CAPES - Enfermagem - Avaliação Quadrienal 2017

Documento disponibilizado online - http://www.capes.gov.br/images/stories/download/avaliacao/relatorios-finais-quadrienal-2017/20122017-ENFERMAGEM-quadrienal.pdf

03-02-2018

DOC-31 Universidade Resolução da universidade sobre plano de demissões

Documento disponibilizado online 04-02-2018

DOC-32 Universidade Resolução 1 da universidade sobre processo avaliativo docente

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-33 Universidade Resolução 2 da universidade sobre processo avaliativo docente

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-34 Universidade Resolução 1 da universidade sobre regimento pós-graduação

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-35 Universidade Resolução 2 da universidade sobre regimento pós-graduação

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-36 Estabelecimento Normas específicas da Comissão Coordenadora do Programa de Pós-Graduação 1 de 2009.

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-37 Estabelecimento Resolução que regulamenta o programa de pós-graduação 1

Documento disponibilizado online 09-02-2018

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DOC-38 Estabelecimento Normas específicas da Comissão Coordenadora do Programa de Pós-Graduação 2 de 2009.

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-39 Estabelecimento Resolução que regulamenta o programa de pós-graduação 2

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-40 Estabelecimento Normas específicas da Comissão Coordenadora do Programa de Pós-Graduação 3 de 2009.

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-41 Estabelecimento Resolução que regulamenta o programa de pós-graduação 3

Documento disponibilizado online 09-02-2018

DOC-42 Universidade Resolução sobre regimento geral da universidade Documento disponibilizado online 19-02-2018

DOC-43 Universidade Resolução sobre estatuto da universidade Documento disponibilizado online 19-02-2018

DOC-44 Universidade Resolução que altera o Calendário Escolar dos Cursos de Graduação (1997)

Documento disponibilizado online 19-02-2018

DOC-45 Universidade Relatório de Gestão (2010-2013). Vice-Reitoria Executiva de Administração. Janeiro de 2014.

Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-46 Universidade Relatório de Gestão (2005-2009). Reitoria da Universidade.

Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-47 Universidade Relatório de Gestão (2014-2017). Reitoria. Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-48 Universidade Relatório Administrativo da Universidade - Gestão 2014-2017

Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-49 Universidade Resolução referente à jornada de trabalho Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-50 Universidade Relatório de Gestão (2014-2017). Reitoria. Documento disponibilizado online 20-02-2018

DOC-51 Universidade Estatística da Evolução do quadro de Docentes por regime de trabalho

Documento disponibilizado online 21-02-2018

DOC-52 Universidade Estatística da Evolução do quadro de Servidores Técnicos e Administrativos distribuído por Unidade

Documento disponibilizado online 21-02-2018

DOC-53 Universidade Resolução 1 sobre docentes temporários Documento disponibilizado online 21-02-2018

DOC-54 Universidade Resolução 2 sobre docentes temporários Documento disponibilizado online 21-02-2018

DOC-55 Universidade Resolução 3 sobre docentes temporários Documento disponibilizado online 21-02-2018

DOC-56 Estabelecimento Documento referente às propostas de direção do estabelecimento estudado

Documento disponibilizado online 11-03-2018

DOC-57 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 1 2017 último ano Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-58 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 1 2018 último ano Documento disponibilizado online 29-03-2018

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DOC-59 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 2 2017 último ano Documento disponibilizado online 21-12-2017

DOC-60 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 2 2018 último ano Documento disponibilizado online 29-03-2018

DOC-61 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 1 2018 segundo ano

Documento disponibilizado online 29-03-2018

DOC-62 Estabelecimento Horários das disciplinas do Curso 2 2018 terceiro ano

Documento disponibilizado online 29-03-2018

DOC-63 CAPES/MEC

PORTARIA Nº 182, DE 14 DE AGOSTO DE 2018. Dispõe sobre processos avaliativos das propostas de cursos novos e dos programas de pós-graduação stricto sensu em funcionamento.

Disponível em: http://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/16082018-PORTARIA-N-182-DE-14-DE-AGOSTO-DE-2018.pdf

21-08-2018

Fonte: elaborado pelo autor a partir de dados da pesquisa.