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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Escola de Comunicações e Artes Departamento de Biblioteconomia e Documentação Ação cultural: reflexões em torno de um conceito e de uma prática Trabalho de conclusão de curso apresentado em cumprimento parcial de exigência para a obtenção do título de Bacharel em Biblioteconomia e Documentação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo Orientadora: Profa. Dra. Ivete Pieruccini Rômulo Martins Morishita Matutino – 2006

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Escola de Comunicações e Artes

Departamento de Biblioteconomia e Documentação

Ação cultural: reflexões em torno de um conceito e de uma prática

Trabalho de conclusão de curso

apresentado em cumprimento parcial de

exigência para a obtenção do título de

Bacharel em Biblioteconomia e

Documentação pela Escola de

Comunicações e Artes da Universidade

de São Paulo

Orientadora: Profa. Dra. Ivete Pieruccini

Rômulo Martins Morishita

Matutino – 2006

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A Deus, que tanto me ensina por meio de Jesus.

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Agradecimentos

Aos meus pais, que sempre me dão todo apoio.

Ao pessoal da Obra Social Paróquia São Mateus Apóstolo, pela receptividade e

empenho nos trabalhos comunitários.

À minha orientadora, profa. Ivete Pieruccini, pelas ricas discussões que me

ajudaram na reflexão sobre a ação cultural e tantos outros conceitos.

À profa. Maria Christina, pelo incentivo e apoio nos trabalhos comunitários.

Aos meus queridos amigos e amigas, que me suportam.

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RESUMO

Estudo sobre o conceito de ação cultural, e reflexões sobre novos

paradigmas frente às mudanças na ordem comunicacional contemporânea. Na

primeira parte, faz-se uma revisão bibliográfica sobre o conceito de ação

cultural, com ênfase no cenário brasileiro, e finaliza-se com uma reflexão sobre

a necessidade de se pensar em novas perspectivas para o conceito, devido às

inovações tecnológicas na área da comunicação, em especial a Internet. Na

segunda parte, analisa-se o Projeto Mudando a História, na Obra Social

Paróquia São Mateus Apóstolo, com base nos elementos extraídos da reflexão

conceitual.

Palavras-chave: Ação cultural; mediação; mediatização; dispositivos

informacionais; leitura.

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SUMÁRIO

Apresentação

PARTE I - QUADRO CONCEITUAL 1. Introdução: o problema ........................................................................ 9 2. Abordagem teórica............................................................................... 10

2.1 Ação cultural: aspectos conceituais................................................... 10 2.2 Ação cultural: a mediação ................................................................... 20 2.3 Ação cultural: cronologia e perspectivas........................................... 23 2.4 Sínteses ................................................................................................. 29

PARTE II - O OBJETO EMPÍRICO 3. Abordagem prática............................................................................... 33

3.1 Projeto Mudando a História: concepções norteadoras..................... 33 3.2 Projeto Mudando a História: o dispositivo da Obra Social Paróquia São Mateus Apóstolo ................................................................................. 37 3.3 Considerações finais à análise do dispositivo .................................. 43

Referências.................................................................................................. 45 Anexo ............................................................................................................ 48

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Apresentação

Quando dei início à elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso -

TCC -, no segundo semestre de 2003, pensava em realizar um projeto sobre o

processo de implementação de sistema de gestão integrado, motivado por

minha experiência como estagiário numa companhia farmacêutica

multinacional. Antes de concluir a faculdade, porém, decidi trancar o curso, por

um ano, para realizar um sonho: conhecer outras culturas, lugares, e viver a

aventura de ser um mochileiro. Viajei, com um amigo professor de história por

alguns paises da América do Sul, de carona, e, em meio a diversas

experiências fomos observando, refletindo e discutindo sobre a realidade social

latino-americana, as semelhanças históricas entre os países deste nosso

continente, mas, sobretudo, sobre os resultados que o modelo de ocupação e

de colonização impôs a todos nós.

Nossos percursos como viajantes, mesmo se marcados por felizes

descobertas, mostravam permanentemente uma desigualdade social de tal

ordem, que não pude ficar impassível diante da triste situação encontrada.

Como no filme1, fiquei sensibilizado com a situação de miséria e de abandono

das comunidades pobres do continente e não consegui mais deixar de pensar

sobre como atuar, a partir de ferramentas da minha área de formação

acadêmica, tendo em mente a importância do papel do profissional na inclusão

sociocultural e na promoção efetiva da participação cultural dos grupos

marginalizados.

Desse modo, ao retornar à faculdade, o antigo projeto de TCC, focado

em sistemas de organização e acesso à informação para públicos

especializados, - hiper informados e informatizados - já não me fazia muito

sentido naquele momento. Ao contrário, a experiência de mochileiro

provocara-me outros interesses, ampliando minha visão das possibilidades que

a profissão de bibliotecário poderia oferecer no encaminhamento de tais

problemas. Todavia, mesmo não sabendo muito bem como abordar a questão,

1 Diário de motocicleta, de Walter Salles, baseado no diário de Ernesto “Che” Guevara.

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percebi que se estudasse a ação cultural eu teria chances de refletir de modo

sistemático sobre essa realidade e passaria a ter elementos que contribuíssem

para a qualidade de meu trabalho profissional. Resolvi, por isso, debruçar-me

neste projeto.

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PARTE I - QUADRO CONCEITUAL

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1. Introdução: o problema

Considerando as novas preocupações que os resultados de minhas

buscas haviam produzido, entendi que seria pertinente redirecionar o foco de

estudo, dedicando-me às abordagens da área de ação cultural, uma vez que,

diferentemente das disciplinas de caráter técnico, poderia, a partir dela, ter

mais elementos de reflexão sobre princípios e usos das técnicas, que fossem

além da idéia de mera disponibilização da informação.

Resolvi, portanto, pesquisar sobre modos de se trabalhar com a cultura,

por entender, como afirma Milanesi (1991, p.181), ser ela fundamental na

busca pela diminuição da desigualdade social. Segundo o autor,

a ausência de espaços públicos de ação cultural não é conseqüência da miséria, mas uma de suas causas. Nenhuma sociedade faz a cultura essencial porque lhe sobram recursos, mas, ao contrário, porque há carências a serem superadas. Os paises mais desenvolvidos são aqueles que mais investem na educação e na cultura, nos programas de informação, nas formas que a sociedade encontra para tornar o conhecimento acessível a todos os cidadãos e nos esforços que faz para ampliar o conhecimento humano. Enquanto o país não tomar como prioridade a batalha do conhecimento, não haverá como superar todas as feridas das seqüelas que a ignorância propicia.

Nesta perspectiva, considerei que seria interessante realizar uma

abordagem da ação cultural, apoiada em bibliografia selecionada, de modo a

que pudesse compreender conceitualmente as implicações em torno da

problemática da mediação cultural, e, ao mesmo tempo, destacar categorias a

serem observadas nas práticas de ação cultural. Considerei importante, ainda,

observar concretamente uma prática em desenvolvimento no terreno, por

entender que a abordagem da realidade é importante na construção do

conhecimento. Por isso, inclui como objeto empírico neste trabalho, o estudo

que havia feito para a disciplina de Planejamento Bibliotecário I. Trata-se de um

diagnóstico elaborado por meio de questionários, observações diretas, e de

minha experiência no projeto Mudando a História, no qual busco refletir sobre

as práticas à luz de categorias aprendidas e apreendidas no meu estudo.

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2. Abordagem teórica

2.1 Ação cultural: aspectos conceituais

Ação cultural, de acordo com posições defendidas por Coelho Neto

(1989), além de definir-se como área específica de trabalho, ensino e pesquisa,

constitui-se num conjunto de conhecimentos e técnicas com o objetivo de

administrar o processo cultural - ou sua ausência, como é mais comum – de

modo a promover, uma distribuição mais eqüitativa da cultura.

O conceito de ação cultural possui semântica própria, e, se não pode ser

entendido a partir da mera junção das noções contidas na somatória dos

termos ação + cultura, esses permitem, todavia, uma primeira abordagem na

busca de compreensão de seu significado.

A palavra ação vem do grego práxis, oriundo do verbo pratto (fazer,

agir). Nesta acepção, trata-se de um fazer “cujo objeto não é um objeto exterior

e estranho ao ato que o produziu, mas esta mesma ação em sua realização”

(DETIENNE apud RUCK, 1979, p.36). O fazer que indica um objeto exterior é

representado por poieo (cf. inglês to do = pratto e to make = poieo) (RUCK,

1979). O estudioso da língua grega antiga, Vine (2002, p.827), afirma também

que práxis “é o ato cuja ação é vista como incompleta e em desenvolvimento”,

enquanto poieo denota trabalho concluído.

Na língua portuguesa, uma das dimensões da diferenciação acima

apontada (práxis x poieo, ou to do x to make), poderia ser indicada pela

contraposição dos termos ação e fabricação. Numa reflexão sobre o início do

século XX, quando a Tecnologia emergia como área de intersecção das

Ciências Naturais e Históricas, Arendt (1992, p.90) relaciona, a distinção

existente entre a ação e a fabricação, com a distinção entre o mundo

tecnológico e o mundo mecanizado, este surgido com a Revolução Industrial.

Segundo a autora, a industrialização ainda consistia na mecanização dos

processos de trabalho para melhoria da produção de objetos, e nessa época, a

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postura do homem perante a natureza ainda era de homo faber, a quem a

natureza fornece o material com que é erigido o edifício humano. No mundo

contemporâneo, acontece uma alteração importante, caracterizada pela ação

do homem sobre a natureza, responsável pela criação de processos

direcionados para as obras humanas e para a esfera dos negócios humanos,

ao contrário do desencadeamento de processos com vistas à construção e

preservação da obra humana como uma entidade relativamente permanente.

Assim, enquanto a ação visa à criação e ao desencadeamento de novos

processos sem um fim pré-estabelecido, a fabricação é caracterizada pela

repetição, continuidade e controle:

para que seja livre, a ação deve ser livre, por um lado, de motivos e, por outro, do fim intencionado como um efeito previsível. Isso não quer dizer que motivos e objetivos não sejam importantes em todo ato particular, mas sim que eles não são seus fatores determinantes e a ação é livre na medida em que é capaz de transcendê-los. (ARENDT, 1992, p.198).

A partir do momento que a ação deixa de ser livre, passa a caracterizar-se

como fabricação. Arendt ainda afirma que, quando livre, a ação não se

encontra subjugada nem ao intelecto, nem à vontade, embora necessite de

ambos para a execução de um objetivo qualquer; ela surge de algo distinto que

é o princípio2.

O mito da caverna, de Platão, ajuda-nos a compreender tal distinção.

Segundo ele,

o filósofo deixa a caverna em busca da verdadeira essência do Ser, sem um segundo pensamento na aplicabilidade prática do que ele vai encontrar. Somente mais tarde, ao encontrar-se novamente confinado na escuridão e na incerteza dos negócios humanos, e ao deparar com a hostilidade de seus semelhantes humanos, ele começa a pensar na ´verdade´ em termos de padrões aplicáveis ao comportamento de outras pessoas. (ARENDT, 1992, p.152).

2 “Ao contrário do juízo do intelecto que precede a ação e do império da vontade que a inicia, o princípio inspirador torna-se plenamente manifesto somente no próprio ato realizador”; sua validade é universal, não se ligando a nenhuma pessoa ou grupo em especial. Também conhecido como virtude, algumas de suas manifestações são: o amor a igualdade, a coragem e a honra. (ARENDT, 1992, p.199)

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Tal exemplificação indica uma das questões essenciais à definição do conceito

de ação, indispensável ao nosso estudo, ou seja, a de que a ação não se

submete à pressão do utilitarismo, pois limitadas são as reflexões e atitudes

que enfocam um fim pré-determinado.

Articulada ao termo cultural, ação não representa apenas a idéia de

intervenção ou de movimento no campo da cultura, não havendo termos que

lhe sejam equivalentes. O termo ação contempla significação única para o

conceito, e dadas as dimensões implicadas em tal termo, deve-se atentar para

a qualidade da ação e não apenas para o ato, o movimento em si.

Assim, do mesmo modo que ação e fabricação não se confundem, ação

e lazer e entretenimento alienantes também não se equivalem; ação, na

perspectiva aqui tratada, nem mesmo se aproxima da idéia de “recuperação

social”, como muitas vezes é visto pelas classes mais abastadas. Tais

iniciativas são constantemente rotuladas como ações culturais na

contemporaneidade, mas geralmente encobrem intenções comerciais,

eleitorais e de manipulação.

Grande interessada no comércio da cultura, a classe hegemônica cultiva

o mito de que somente o que ela reconhece como cultura tornará alguém culto

(geralmente é o que ela mesma produz), e assim desconsidera o significado da

ação transformadora do mundo pelas classes marginalizadas, dando

continuidade à sua dominação. Tal imposição é concretizada principalmente

pelos meios de massas, que levam os mesmos valores para pessoas e povos

de contextos distintos. Essa cultura, caracterizada como cultura de massas,

resulta da indústria cultural que fabrica entretenimento e lazer com o rótulo de

ação cultural.

Não há, evidentemente, problema, mas ao contrário é essencial às

relações sociais, o contato e troca de distintas visões de mundo (no caso elite x

povo), pois como afirma Kominek (2000, p.46) “a comunicação entre culturas

diferentes é um fenômeno que existe desde que há sociedades humanas sobre

a face da terra. Assim, a difusão e o empréstimo de traços culturais ocorre o

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tempo todo à medida que há contatos entre os povos, que reforça o caráter

dinâmico da cultura”. Porém, a questão está na supervalorização de uma

cultura em detrimento da outra, como meio de dominação. Por isso, na ação

cultural, não se pode sobrepor a visão do mundo de seus sujeitos e invadi-los

culturalmente. Pelo contrário, a tarefa que se coloca ao agente cultural, é a de,

partindo da visão local, tomada como um problema, atuar no sentido de que os

sujeitos consigam observá-la criticamente e disso resulte na sua inserção cada

vez mais consciente na realidade em transformação. (FREIRE, 1982). Desse

modo, ao mesmo tempo em que se busca reforçar a cultura local, a interação

com outras culturas não é evitada.

Há, portanto, pelo menos dois modos de se compreender a abordagem

no contato entre culturas distintas: o modo ativo, que pressupõe reelaboração

do que é recebido e o modo passivo, aceitando o que é recebido, evitando-se

passar por um crivo crítico. A ação cultural privilegia a primeira forma, uma vez

que aquilo que é recebido de outras culturas não deve ser assimilado

passivamente, mas, ao contrário, reelaborado, efetuando-se sua leitura,

interpretação e recriação: em termos contemporâneos, sua apropriação.

Freire (1976, p.42) nomeia esses dois tipos de postura, face à cultura,

denominando-as integração e acomodação.

A integração resulta da capacidade de ajustar-se à realidade acrescida da (capacidade) de transformá-la a que se junta a de optar, cuja nota fundamental é a criticidade. Na medida em que homem perde a capacidade de optar e vai sendo submetido a prescrições alheias que o minimizam, as suas decisões já não são suas, porque resultadas de comandos estranhos, já não se integra. Acomoda-se. Ajusta-se. O homem integrado é o Sujeito. A adaptação é assim um conceito passivo – a integração ou comunhão, ativo. Este aspecto passivo se revela no fato de que não seria o homem capaz de alterar a realidade, pelo contrário, altera-se a si para adaptar-se. A adaptação daria margem apenas a uma débil ação defensiva. Para defender-se, o máximo que faz é adaptar-se. Daí que a homens indóceis, com ânimo revolucionário, se chame de subversivos. De inadaptados.

Como considera Santos (2003), se cada realidade cultural tem sua

lógica interna, é importante relacionar a variedade das expressões culturais

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dentro de seus contextos (histórico, físico, econômico, etc.) e, neste sentido, a

idéia de hierarquização das culturas de diferentes povos é contraditória, pois

descontextualiza a análise, servindo apenas para a consolidação do domínio

da cultura dominante.

O rebaixamento de culturas locais e a imposição de uma cultura única

não dizem respeito apenas às disputas por uma pseudo-superioridade, mas

coloca em questão a própria humanidade dos seres.

É peculiar ao homem a grande necessidade de condutas, no que diz respeito a sua relação com a natureza e com seus semelhantes. Enquanto entre os animais o comportamento de toda espécie é estereotipado (instintivo, não aprendido), e somente em extensão diminuta variável e não dependente da tradição local, a conduta humana não é estereotipada no mesmo sentido e não pode ser dita instintiva. Ela depende da tradição local e é aprendida. (BOAS apud MOURA, 2004, p.139-140).

Dessa forma, a cultura humana diferencia o homem do mundo animal por não

ser estereotipada. A uniformização da cultura e a perda de contato com a

tradição local, contribuem para o declínio do modo de existência peculiar ao

homem.

Daí que a humanização é uma das características da ação cultural, pois,

conforme afirma Freire (1982), enquanto os animais vivem imersos em seu

meio, simplesmente se ajustando a ele, fazendo apenas associações de

imagens sensoriais por suas experiências, num hoje constante de que não têm

consciência, o homem existe, não está imerso inconscientemente num hoje

constante, mas emerge dele, transcende e interage com seu entorno,

transformando-o.

Nesse sentido, compreender determinadas implicações da disseminação

cultural por meio das mídias de massa merece destaque, uma vez que em tais

processos prevalece a imposição sobre a troca cultural. Sobre isso, Milanesi

(1991, p.23) discorreu no início da década de 1990:

os dois veículos, o rádio e a televisão, colocavam-se acima da vida das cidades, uma vez que havia uma central que produzia os

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programas para o consumo coletivo. As cidades, assim, progressivamente passaram a incorporar padrões geralmente estranhos (que se diferenciavam das tradições locais). Tanto o rádio, como a televisão, propiciaram a incorporação homogênea de alguns valores novos ou já existentes, ainda que de formas menos acentuadas. Essa integração coletiva de novos padrões culturais exaustivamente renovados – ainda que não em sua essência, mas nas aparências – permitiu a criação de uma faixa que poderia ser chamada homogeneização cultural. Isso, sem dúvida, sacrificou tradições e peculiaridades locais. O que era tradição coletiva que incorporava as populações (dos trabalhadores mais rústicos aos letrados) transformou-se em curiosos destroços por vezes chamados “folclore” ou padrões vergonhosos a serem superados. Essa importação eletrônica de novos valores e modelos tornou anacrônico aquilo que estava gravado na crônica das cidades. Na tensão entre o homogêneo e o tradicional diversificado, o primeiro acabou se impondo majoritariamente, ainda que fossem providenciadas com freqüência tentativas de resgate cultural, uma espécie de recuperação daquilo já dissolvido na cultura industrializada. A produção cultural das localidades, com isso, perdeu parte do seu sentido e daí a abdicação da criatividade e o atrofiamento da capacidade de inventar passaram a ser menos exceção do que regra.

Decorre que a comparação de culturas distintas, num instinto

competitivo, gera especulações típicas de uma elite que luta pela manutenção

da dominação, da hegemonia socioeconômica que exerce.

Nesse sentido, a problematização do papel exercido pela indústria

cultural3 na problemática da ação cultural deve ser considerado, uma vez que

ela contribui, para a chamada homogeneização da vida e da visão de mundo

(Santos, 2003), pois em sua ânsia pela comercialização da “cultura” promove a

indistinção ao diluir as diferenças e afirmar que tudo é cultura. Tal

uniformização, conseqüentemente, potencializa a comercialização, pois

expande a gama de produtos “culturais”, por meio da adaptação da arte ao

consumo, ou mesmo pela fabricação direta de bens culturais para o consumo:

(...) quando os grupos no poder, sob a capa do Estado ou da iniciativa privada, abrem seus teatros e museus “ao povo”, quase nunca pensam em criar as condições para esse povo chegar à criação, mas

3 No conceito de indústria cultural, alega-se que para oferecer cultura para milhões de pessoas, certos processos de reprodução são necessários, e assim inevitavelmente, esperam-se necessidades idênticas, em contextos distintos, para que sejam satisfeitas com bens padronizados da produção em alta escala. O resultado é um circulo de manipulação e necessidades retroativas, no qual a unidade do sistema cresce cada vez mais forte, sacrificando qualquer distinção entre a lógica do trabalho e lógica do sistema social. (HORKHEIMER & ADORNO, 1972).

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apenas em cultivar novos espectadores e admiradores, quer dizer, novos públicos, novos consumidores. (COELHO NETO, 1989).

A cultura massiva e industrializada, que se distingue tanto da cultura de

elite quanto da cultura do povo, oscila entre o erudito e o popular, de modo a

que o público possa sentir-se “superior” à sua própria condição, evitando-se o

risco de “inferiorização” ante o incompreensível. Diminuindo a distância cultural

entre a elite e o povo com o objetivo de atingir amplos segmentos com

programações únicas, essa indústria depende do consumo, e por isso trabalha

sobre o desejo da posse para incrementá-lo. (MILANESI, 1991).

Frente à massa informe da indústria cultural, instala-se – e é

responsável por sua manutenção – o que Coelho Neto (1989, p.27) chamou de

barbárie:

Quando uma época não consegue distinguir entre uma coisa e seu contrário, essa é uma época de barbárie. A ação cultural lida com a cultura, não com a barbárie. Por tudo isso, a ação cultural é também uma ação social ou não é. Uma ação sociocultural.

Nesse sentido, a ação cultural não pode perder de vista seu propósito de

atuar a favor da construção do discernimento, da liberdade e da capacidade de

significação do mundo pelos indivíduos, distinguindo-se frontalmente, da

fabricação que, conforme explica Coelho Neto (1989, p.12-13),

é um processo com um início determinado, um fim previsto e etapas estipuladas que devem levar ao fim pré-estabelecido. A ação, de seu lado, é um processo com início claro e armado, mas sem fim especificado e, portanto, sem etapas ou estações intermediárias indispensáveis a seu processo, já que não há ponto terminal a que se pretenda ou espere chegar. Na fabricação, o sujeito produz um objeto, assim como o marceneiro faz um pé torneado. Na ação, o agente gera um processo, não um objeto. O objeto pode até resultar de todo o processo, mas não se pensou nele quando se deu início ao processo, e nisso está toda a diferença.

Em razão disso, Coelho Neto (1989) refere-se criticamente ao sistema

educacional brasileiro, observando que a ação cultural está para a ação

educativa, assim como a ação está para a fabricação. Em outros termos, o

autor não apenas identifica distinções, mas, sobretudo, oposições entre Cultura

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e Educação, numa escala maniqueísta de valores, diferentemente de Paulo

Freire, que, na década de 1960, defendia idéias de uma ação cultural

intrinsecamente ligada à noção de ação educativa.

Nesse quadro, vale tomar como referência as abordagens de Arendt

(1992), ao comentar sobre o pragmatismo na educação. Segundo ela, o

sistema de ensino não busca ensinar conhecimentos, mas está viciado em

inculcar nos alunos habilidades que lhes sirvam de sustento no futuro. O

brincar, de onde surge a espontaneidade do criar, é “suavemente” censurado

para a perpetuação do fazer com fins premeditados, da produção, do trabalho.

Dessa discussão inicial é importante reter, em síntese, que a discussão

chama a atenção para o perigo da fabricação cultural, admitindo e

considerando que, como parte da condição humana, as características da ação

dos homens, assim como em todos os fenômenos políticos, estão

estreitamente ligadas à pluralidade que nos é característica e, enquanto tal,

impossível de predizer-se. (ARENDT, 1992, p.90-95).

Outra distinção importante a ser considerada no estudo do conceito de

ação cultural diz respeito à noção de animação cultural. Enquanto a ação

cultural visa desencadear o processo de ação por parte dos sujeitos, na

concepção da animação cultural, o animador toma toda a ação do processo, se

torna o único sujeito, e deixa para o público o entretenimento alienante.

(COELHO NETO, 1989). Nestes termos, na animação cultural a cultura é

tomada como produto de consumo, e, como tal, descaracterizada enquanto

totalidade das reações e atividades mentais e físicas que caracterizam a conduta dos indivíduos que compõem um grupo social, coletiva e individualmente, em relação ao ambiente natural, a outros grupos, aos membros dos próprios grupos e a cada individuo consigo próprio,

conforme a define o antropólogo, Frans Boas (1911, p.139-140). Segundo o

autor, a cultura inclui os produtos dessas atividades e seu papel na vida dos

grupos e os extrapola na medida em que seus elementos não são

independentes, mas, ao contrário, têm uma estrutura, que, ao mesmo tempo

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em que influencia o indivíduo na sua formação, é influenciada pela formação do

indivíduo, e mesmo que aparente uniformidade em determinados locais, se

manifesta de modo único em cada indivíduo. É por isso, afirma Laraia (1986

p.69) ao citar Ruth Benedict, que se poderia dizer que “a cultura é como uma

lente através da qual o homem vê o mundo. Homens de culturas diferentes

usam lentes diversas e, portanto, têm visões desencontradas das coisas.”.

Como conjunto de elementos estruturados, a cultura “denota um sistema

de valores de determinada forma de vida humana, e objetiva interpretar e

transmitir esses valores de modo que gerações futuras possam achar

significado e propósito. É um dispositivo que contribui para o controle do

homem sobre as mudanças de direção da espécie” (HONDERICH, 1995,

p.172-173), estando em íntima relação, portanto, com a memória do sujeito.

Conforme Coelho Neto (1997, p.383) indica,

cultura é um estado de espírito ou mental formador da vida coletiva e individual, influenciado pela ordem social global, que se manifesta numa variedade de comportamentos e atos sociais”. “Cultura é o que move o indivíduo, o grupo, para longe da indiferença, da indistinção, é uma construção, que só pode proceder pela diferenciação. (COELHO NETO, 1989, p.21).

Assim, se a animação cultural está ligada a finalidades de

entretenimento - meio eficaz para a transmissão quase que subliminar de

valores, pois é durante o entretenimento que o indivíduo “abaixa a guarda” do

senso crítico e se coloca mais vulnerável às ideologias da classe que controla

os meios de massas -, não contempla, como se pode observar o caráter

complexo da noção de cultura, quando tomada na perspectiva antropológica do

termo. A animação cultural, ao contrário, serviria aos interesses da sociedade

de massas, caracterizada pela busca por entretenimento, parte do processo

vital da sociedade, uma vez que o indivíduo da massa tem como característica

a alta capacidade de consumo aliada à inaptidão para julgar, o egocentrismo e

a alienação do mundo. (ARENDT, 1992).

Por outro lado, na cultura contemporânea, o refinamento pessoal

emerge como um bem a ser adquirido. A cultura como refinamento estaria

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ligada a idéia de cultivo. De origem latina, o verbo colere - cultivar, habitar,

tomar conta, criar e preservar – estava ligado às atividades agrícolas, e,

posteriormente foi utilizado no âmbito religioso (ex. cultuar) e artístico,

implicando, também, atitude de um cuidado carinhoso, em contraposição ao

esforço de subjugar a natureza à dominação humana, desenvolvida pelos

gregos. A dupla conotação romana de cultura tanto no sentido de ato de tornar

a natureza um lugar habitável para as pessoas como cuidado com os

monumentos do passado, perdura até hoje e influencia diretamente o

significado do conceito de cultura contemporâneo. (ARENDT, 1992).

Todavia, extrapolando a noção de cuidado com os bens materiais,

antigos pensadores romanos ampliaram esse significado, utilizando o termo

para se referir ao refinamento pessoal. A concepção romana trouxe a idéia de

cultura como conhecimento erudito de acesso, limitado às classes dominantes,

em contraposição ao conhecimento da maioria da população, este entendido

como inferior e ultrapassado. (SANTOS, 2003). Nesta perspectiva, os quadros

históricos dominantes monopolizaram a cultura, em função da manutenção de

seus objetivos próprios, tais como posição social e status. No contexto

histórico, segundo Arendt (1992, p.254), tal atitude está intimamente ligada à

posição social inferior das classes médias européias. Segundo afirma a autora:

[estas] se viram – tão logo adquiriram a riqueza e o lazer suficientes – em uma acirrada luta contra a aristocracia e o desprezo desta pela vulgaridade do mero afã de ganhar dinheiro. Nessa luta por posição social, a cultura começou a desempenhar enorme papel como uma das armas, se não a mais apropriada, para progredir socialmente e para ‘educar-se’.

O filisteísmo, nome dado a esse tipo de comportamento, que surgiu no

final do século XVIII, não deve, todavia, ser confundido com o consumismo da

sociedade de massas, embora explicite uma visão que perdura nas práticas

culturais contemporâneas. Segundo Arendt (1992, p.254),

o que irritava no filisteu educado não era que ele lesse os clássicos, mas que ele o fizesse movido pelo desejo dissimulado de auto-aprimoramento, continuando completamente alheio ao fato de que Shakespeare ou Platão pudessem ter a dizer-lhes coisas mais importantes do que a maneira de se educar. O lamentável era que ele

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escapasse para uma região de “pura poesia” para manter a realidade fora de sua vida – coisas “prosaicas” como uma crise de batatas, por exemplo – ou para contemplá-las através de um véu de “doçura e luz.

Milanesi (1991, p.82) chama a atenção e critica o uso da concepção de

cultura como erudição na ação cultural. Segundo ele,

se a cultura for uma prova de erudição, uma capa de bom gosto, não há por que estender essa capa nos ombros esquálidos daqueles que não têm o que comer e, muito menos, oportunidade de trabalhar. No entanto, se ela for uma forma de desvelamento da realidade, uma possibilidade de permitir e estimular o acesso ao conhecimento, deixa de ser identificada como um enfeite de perdulários e passa a ser um investimento uma vez que informação, ninguém discute isso, é um elemento essencial ao desenvolvimento da sociedade. A ignorância é excelente para o atraso.

Em síntese, ao conceito de ação cultural se contrapõem às noções de

fabricação, animação e filisteísmo, modos mais ou menos explícitos de

dominação cultural. Enquanto na fabricação e na animação a dominação

basicamente se realizaria por meio da alienação, no filisteísmo, ela seria

viabilizada pela super valorização de bens culturais, estes, tidos meramente

como meio de ascensão social.

2.2 Ação cultural: a mediação

Uma questão enfatizada em meados dos anos de1970, dizia respeito às

relações entre espontaneísmo versus dirigismo na ação cultural. Coelho Neto

(1989), ao discutir o assunto, nega o espontaneísmo em vista da experiência

mal sucedida com os Centros de Cultura Popular (CPC), mas também refuta o

dirigismo, pois entende que tal perspectiva transformaria os sujeitos da ação

cultural em meros objetos. Assim, os agentes culturais devem apenas dar a

partida ao processo, incitar os sujeitos à criação, fornecer condições para que

eles sejam autônomos. Em outros termos, de acordo ainda com o autor, não se

deve negar a intervenção, mas a intervenção continuada.

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O agente cultural/mediador, no processo da ação cultural, procura

conectar o artista, a arte, a coletividade, o indivíduo e os recursos econômicos,

a fim de sensibilizar os sujeitos para a criação, dando-lhes recursos para repelir

a homogeneização cultural, e, se possível, abrir-lhes condições para tornarem-

se artistas. (COELHO NETO, 1989). Tanto o mediador quanto o mediado

devem negar a exclusividade de seus papéis, e assim agirem também de

maneira inversa ao padrão. (FREIRE, 1982).

Além disso, o mediador deve estar ciente do que está em jogo

socialmente e antropologicamente, ao realizar determinada ação cultural, pois

não existe o mediador neutro e apolítico: a própria abstenção do refletir sobre

sua condição já é um posicionamento que favorece a classe dominante.

(COELHO NETO, 1986). Conforme afirmou Freire (1995), ao referir-se

especialmente à educação libertadora, não existe educação sem política e nem

política sem educação. Ao agir, o educador/mediador influencia com sua visão

de mundo e contribui para a constituição de valores. A opção libertadora não

vem pela manipulação nem pelo espontaneísmo, mas por uma ação consciente

que valorize a capacidade de criar do mediado.

Nesse sentido, o conceito de ação cultural aponta também para a

importância da participação da comunidade, e, mais uma vez, chamando a

atenção para o fato de que a ação não deve ser confundida com o

assistencialismo, que apesar de trazer resultados vistosos e imediatos, acaba

por contribuir para a solidificação da conjuntura dominante-dominado. Saber de

tal diferenciação é vital, sobretudo num país como o Brasil, que tem em sua

base sociocultural uma formação paternalista, desde o início da colonização,

com a chegada dos portugueses4. O assistencialismo faz de quem recebe a

assistência um objeto passivo, tira-lhe a possibilidade de participar do processo

4 Sobre esse tema, Freire (1972, p.68-69) discorre sobre o Brasil colonial, quando “nas grandes propriedades separadas umas das outras, pelas próprias disposições legais, por léguas, não havia mesmo outra maneira de vida, que não fosse a de se fazerem os “moradores” desses domínios, “protegidos” dos senhores. Tinham de se fazerem protegidos por eles, senhores todo-poderosos, das incursões predatórias dos nativos. Da violência arrogante dos trópicos. Das arremetidas até de outros senhores. Ai se encontram, realmente, as primeiras condições culturológicas em que nasceu e se desenvolveu no homem brasileiro o gosto, a um tempo de mandonismo e de dependência, de “protecionismo”, que sempre floresce entre nós em plena fase de transição.” Nessas condições referidas se encontram as raízes do paternalismo brasileiro.

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de sua própria recuperação e cria a dependência. Por isso, Freire (1982) afirma

que a comunidade precisa de uma mudança de percepção, que se dá na

problematização da realidade conflitiva em que ele se encontra, e por meio

desse processo, ela se apropriará de seu contexto, se inserirá nele, e não mais

ficará apenas aderido, como um tripulante que nada interfere na direção do

navio. É necessário o enfrentamento do indivíduo com a sua realidade. Se a

história induziu o país a uma posição passiva face à realidade, não significa,

todavia, que a reversão não seja possível:

uma crise só se torna um desastre quando respondemos a ela com juízos pré-formados, isto é, com preconceitos. Uma atitude dessas não apenas aguça a crise como nos priva da experiência da realidade e da oportunidade por ela proporcionada à reflexão. (ARENDT, 1992, p.223)

Para tanto, porém, afirmam os autores, é necessário que agentes –

mediadores culturais – compreendam as práticas culturais sob a ótica política

da construção social, como ato coletivo.

Em sua teoria da Ação Comunicativa, Habermas estabelece que todo

falante, possuidor ou não de um saber formal e sistematizado, tem

possibilidade de crítica e de percepção pois é possuidor intuitivamente de um

saber igualmente válido e valioso. Desta forma, refuta também a idéia de que

somente os “estudados” possuiriam conhecimento válido e importante, ou seja,

de que somente eles teriam “cultura”. (KOMINEK, 2000). Ao contrário,

conforme considera Vygostky (apud FREITAS,1995), todo o mundo da cultura

é produto da imaginação e da criação humana e o ato criador não existe

apenas nas obras dos grandes inventores e sábios, mas está presente sempre

que o ser humano imagina e cria algo novo.

Habermas (apud Kominek, 2000), incluía a importância do diálogo,

sendo este, um meio para os agentes realizarem a revisão crítica criativa dos

saberes culturais e hábitos de convivência, no qual a linguagem, tem um papel

especial, pois serve para a comunicação dum entendimento sobre o mundo,

para a produção de um nexo intersubjetivo através da interação, e não apenas

para a mera transmissão de informação.

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Os processos de criação nos indivíduos, desde a infância, se

desenvolvem a partir dos elementos tomados da realidade, constituindo, pois,

processos de relação e reelaboração do antigo com o novo, de modo que, toda

invenção é um produto de cada época e de cada ambiente. Cada homem é

responsável por sua existência e, segundo Geertz (apud KOMINEK, 2000), o

homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu,

sendo que a cultura são essas teias e seus elementos de análise.

Da mesma forma, o mediador cultural deverá evitar a visão messiânica

de cultura como solução para os problemas da humanidade, pois, conforme

afirma COELHO NETO (1989, p.58),

o produto cultural ou artístico em si mesmo não é o que interessa, mas sim os componentes do processo cultural-artístico, os elementos do pensamento, do corpo que se entregam a uma prática cultural ou artística. O que interessa destacar e estimular é essa modalidade de organização do mundo como elemento de oposição e refação da vida contemporânea.

Nesse sentido, tais reflexões contribuem para a clareza da importância

da ação/agente cultural enquanto instâncias de ação política, realizada por

meio da produção simbólica registrada, ou não-registrada, existente que

povoam os repertórios dos indivíduos.

2.3 Ação cultural: cronologia e perspectivas

Alguns autores no Brasil dedicaram-se especialmente ao estudo da ação

cultural definindo, inclusive, tendências específicas que marcaram políticas e

práticas culturais no país. Coelho Neto (1989), refere-se à ação cultural como

ação sócio-cultural, com foco principal na arte, na distribuição mais eqüitativa

da cultura. Nesta perspectiva, segundo ele, durante a história destacaram-se

três momentos da ação cultural. O primeiro surgiu com a ascensão dos

museus, com enfoque sobre a obra. Nesta fase, a ênfase visava à preservação

do patrimônio, reforçava a sacralização do produto e seu valor econômico.

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Num segundo momento, em torno do final da Segunda Guerra Mundial,

as instituições culturais passaram a enfatizar a preocupação com as pessoas –

grupos, segmentos – que entravam em contato com o objeto cultural, e menos

com, com o objeto propriamente em si. Já no terceiro momento, final da década

de 1960, a ênfase das ações não se localizava nem na obra, nem nas pessoas

como um todo, mas no indivíduo.

Notam-se, assim, duas tendências marcantes que definem o

desenvolvimento da ação cultural, tomada na perspectiva de processo e prática

intencional de mediação de objetos culturais. Uma primeira, de caráter

predominantemente patrimonialista e outra de natureza participativa. Essa

última buscava a transformação dos indivíduos e a desalienação dos contatos

humanos.

No enfoque proposto pelas concepções do terceiro momento, aparece

no Brasil a idéia da ação cultural, provavelmente idealizada por Mário de

Andrade, durante a década de 1940, com o nome de arte-ação. Por meio da

arte-ação, Mário visava fazer da arte e da cultura, instrumentos de mudança do

homem e do mundo. (COELHO NETO, 1989). Contudo, a proposta não

conseguiu subsistir, tal como ele a imaginara, em razão das alterações do

quadro político brasileiro, permanecendo reprimida principalmente pelo regime

ditatorial do Estado Novo.

No término da década de 1970, as políticas e práticas de ação cultural,

entre nós, são redefinidas por influência estrangeira. Imitando modelos

franceses, iniciou-se a construção de centros de cultura, sobretudo nas

grandes metrópoles. Após os anseios pela construção de teatros, cinemas e

museus, agora era a vez dos centros de cultura que, assim como aconteceu

com seus predecessores, eram vistos como um avanço cultural.

Nesse contexto, a década de 1980 foi marcada pelo modismo da

construção de centros de cultura, e o que se questionava era se as atividades

desenvolvidas nesses centros eram verdadeiramente ações culturais, ou, se

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conforme alertavam os teóricos, tais práticas não teriam suas concepções

embasadas, sobretudo, na idéia de fabricação cultural e nas relações “filistéias”

e consumistas que grande parte da sociedade tinha com a cultura. A

sociedade, dizia Coelho Neto, passava por uma crise de valores, sendo

incapaz de discernir o que era cultura, num contexto em que esta era diluída e

homogeneizada para fins mercantilistas. (COELHO NETO, 1989). Assim como

Freire (1982) combateu a visão deturpada da letra como amuleto, combatia-se

agora a idéia de que a mera construção de centros culturais efetuaria

magicamente uma ação cultural.

Paulo Freire, por sua vez, identifica a ação cultural às experiências com

a alfabetização de adultos pelas rodas de cultura, num contexto de

efervescência dos movimentos populares pré-64 e de expectativa por um país

democrático. Nesse sentido, ele alargou o conceito de ação cultural, ao fazer

suas análises levando em conta os contextos socio-econômico-culturais e a

formação histórica do país. Ao mesmo tempo que enxergava, em sua época,

uma grande oportunidade para a democracia no Brasil, reconhecia os

obstáculos, sobretudo em razão da inexperiência democrática do povo

brasileiro, afirmando, que “o Brasil nasceu e cresceu sem experiência de diálogo.

De cabeça baixa, com receio da Coroa. Sem imprensa. Sem relações. Sem escolas.

“Doente”. Sem fala autêntica.” (FREIRE, 1976, p.66). Para ele, era claro a importância

do diálogo, pois:

as sociedades a que se nega o diálogo – comunicação – e, em seu lugar, se lhes oferecem “comunicados”, resultantes de compulsão ou “doação”, se fazem preponderantemente “mudas”. O mutismo não é propriamente inexistência de resposta. É resposta a que falta teor marcadamente crítico. (FREIRE, 1976, p.69).

Assim, Freire (1976), com o intuito de dar suporte ao povo para

expressar seus anseios, relacionados tanto a política nacional como local,

entendia que o aprendizado da escrita e da leitura constituía uma espécie de

chave, com que o analfabeto iniciaria a sua introdução no mundo da

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comunicação escrita5. Nesse sentido, as concepções de Freire indicam uma

outra dimensão da ação cultural ligada à cultura do escrito, essencial a

reflexões e práticas na Ciência da Informação.

Diferentemente do contexto observado na década de 1960, entretanto,

novos fatores, hoje, interferem nos processos de diálogo cultural. Na

atualidade, as tecnologias de informação, dentre elas a Internet, alteraram as

fontes, os suportes e conteúdos informacionais, atuando, assim, sobre os

processos de apropriação cultural. Ao discutir o papel da tecnologia, Kominek

(2000) afirma que o mundo está mais próximo e torna-se mais acessível em

todos os setores. Esta grande quantidade de novidades, no entanto, se não for

bem aproveitada pode levar o indivíduo a um “soterramento” pelas

informações. Hoje, não bastam, dentre outros, aprender a ler e escrever,

interpretar textos, conhecer e fazer uso da produção artística, conforme

indicaram as referências teóricas estudadas até aqui. A nova realidade propõe

desafios conceituais e práticos que atendam às necessidades contemporâneas

de desenvolvimento de atitudes, interesses e competências face à informação

(e às tecnologias de informação).

Pieruccini (2004, p.29) aprofunda a análise, e, afirma que

no novo contexto, as formas de transmissão direta de informação concorrem, cada vez mais, com formas indiretas, mediadas por instâncias de naturezas e dinâmicas diversificadas, definidas por estudiosos da nova cultura como dispositivos6, qualificação que indicaria a existência de uma nova e atuante fonte de produção de significação e de conhecimento, em nosso mundo, de tal ordem

5 Na época em que Freire escreveu o texto citado (década de 1960), a porcentagem de analfabetos ainda estava em torno de 40% (IBGE apud FERRARO, 2002), e de fato era um dos grandes empecilhos que impedia o povo de usufruir do diálogo, em suas diferentes dimensões. O analfabetismo diminuiu, mas, todavia, ainda é um grave problema brasileiro. 6 Segundo Pieruccini (2004, p.34-36), “dispositivos podem ser percebidos como espaço transacional, organizador da ação, fazendo parte dos modos de regulação da sociedade e componentes de um quadro contemporâneo de mecanismos de fabricação da identidade dos sujeitos.”. “Não apenas expressam como também definem, por meio dos discursos implícitos em sua configuração, modos de relação entre os sujeitos e o universo simbólico (documentos, registros, informações, conhecimento) que guardam.”. Ainda, ao citar Peraya, Pieruccini afirma que “os dispositivos, incluindo as tecnologias de informação, articulam três níveis de interação: a semiótica, a social e a técnica. O chamado dispositivo técnico-semio-pragmático (TSP) pode ser definido como o conjunto de interações entre esses três universos, realizados a partir de uma tecnologia de informação, de um sistema de apresentação ou, ainda, de uma mídia pedagógica ou não.”

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surpreendente e singular que, segundo Peraya, do ponto de vista epistemológico, torna-se extremamente necessário, na época atual, distinguir mediação e mediatização, já que o primeiro termo coloca em pauta instâncias semióticas e relacionais, enquanto o segundo acrescenta a estas a instância tecnológica que marca a contemporaneidade.

Ressalta-se, todavia, que o reconhecimento da importância dos

dispositivos, não deve conduzir a uma dicotomia extremista, na qual se

contrapõem o simbólico e o material, o sujeito e o objeto/dispositivo, o humano

e o não-humano, porém, ambos os lados, devem ser considerados

interdependentes. Segundo Piaget (apud FREITAS, 1995, p.64), “o

conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma

programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas

com elaborações constantes de estruturas novas”, ou seja, as ações do sujeito

sobre o objeto e deste sobre aquele são recíprocas, o que garante a

construção do conhecimento e das estruturas cognitivas.

Porém, a passagem de uma condição de mediação, com ênfase nas

relações para a de mediatização, significa a alteração dos processos

envolvidos na formação do conhecimento, e também das relações dos sujeitos

com ele. Este novo quadro traz a tona, conseqüências que Platão (apud

PIERUCCINI, 2004) previa ao referir-se ao advento da escrita. Ele alertava que

ao se separar o enunciador do enunciatário, se separaria também o enunciado

do quadro da enunciação, assim, conferindo-lhes autonomia e colocando em

risco os destinos da República: não seria mais a relação direta entre os

cidadãos que definiria a construção, a circulação e a recepção dos discursos e

das significações, mas a relação com um suporte material, erigido em objeto

portador-produtor de sentidos.

Do mesmo modo que o surgimento da escrita alterou, “não apenas a

memória enquanto matéria, mas a natureza, propriedade e características dos

processos de sua transmissão e troca entre pessoas,” a Internet altera e

revoluciona os processos de mediação contemporâneos. Não se trata apenas

de uma mudança, mas de uma nova ordem que incorpora às antigas questões

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da ação/mediação cultural uma nova problemática trazida pela velocidade,

excesso, fragmentação da informação.

Por isso, torna-se essencial, a apropriação dos dispositivos (entendidos

como instâncias de significação da informação), que implica não somente o

que Dudziak (2003) indicou como information literacy, ligada a “processo

contínuo de internalização de fundamentos conceituais, atitudinais e de

habilidades necessário à compreensão e interação permanente com o universo

informacional e sua dinâmica, de modo a proporcionar um aprendizado ao

longo da vida.”.

Torna-se evidente que a mediação cultural incorpore como problema,

além de competências informacionais que implicam saber-fazer, a apropriação

da informação como capacidade e competência de busca7 dos e nos

dispositivos e formação de atitudes que levem o sujeito a lançar-se de modo

ativo sobre o conhecimento. Dentre elas identificam-se:

domínio de ferramentas técnicas e tecnológicas; capacidades cognitivas compatíveis com a natureza das relações materiais e simbólicas em articulação nos dispositivos; domínio de linguagem; comportamentos e atitudes de recepção interessada e ativa, iniciativa e capacidade de julgar e tomar decisões apropriadas com o fim desejado. (PIERUCCINI, 2004, p.22).

Portanto, é importante entender a ação cultural de forma abrangente,

como processo comunicacional, que inclua os novos fatores. Ignorá-los, seria

tomar uma postura reducionista, similar à que Perrotti (1990, p.59) combatia

em seu estudo sobre a leitura. Neste estudo o autor, citando Escarpit, afirma

que quando não inserida num processo vital,

animada por uma necessidade social ou psicológica, a leitura numa sociedade de consumo torna-se naturalmente atividade marginal, uma forma de consumo não empenhado, o que teria levado filantropos e neofilantropos a tomar o distributivismo como saída mágica para a “crise da leitura”.

7 “Buscar, não é simplesmente ato de localização e processamento de matéria cuja dimensão simbólica e destinos são indiferentes aos sujeitos e aos contextos de que participam. É, antes, movimento duplo e dinâmico de construção de identidade e de criação de significados para o mundo” (PIERUCCINI, 2004, p.5)

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Por isso, da mesma forma, a ação cultural deve ser pensada num quadro

comunicacional integrado, que abranja todos os fatores que venham a alterar

seus processos. No novo contexto informacional contemporâneo, a ação

cultural exige, pois, que se considerem as condições contemporâneas de

produção, circulação e recepção cultural, tendo em vista a redefinição do

conceito de modo a que possa oferecer referenciais necessários aos processos

gerais de construção de autonomia dos protagonistas sociais face à cultura.

2.4 Sínteses

A abordagem do conceito de ação cultural, tratado na primeira parte

deste trabalho, permitiu o conhecimento de idéias, perspectivas e aspectos que

se mostraram essenciais à compreensão dos processos culturais,

especialmente em contextos institucionais em nosso país. Observa-se, que

apesar das diferentes nuances que o conceito possui – Coelho Neto pelo

prisma da arte e Freire pela educação – existe um aspecto no qual ambos os

autores são unânimes: a importância dos processos de mediação. Ao abordá-la

Coelho Neto foca sua discussão na questão da distribuição igualitária de bens

culturais, afirmando que para tal, são necessários agentes culturais

devidamente preparados para a realização de mediação não-alienante, ou seja,

da ação cultural. Foi possível notar, portanto, uma visão distributivista da

cultura e uma concepção do processo de mediação centrado nos sujeitos, no

caso, nas possíveis atitudes dos agentes culturais e, sobretudo, de sua postura

como o fator crítico na mediação.

No novo contexto informacional, porém, o problema não se concentra na

distribuição - disseminação - da informação e da cultura, pois vivemos numa

era marcada pelo excesso de informação, e, por isso, a questão não está

exclusivamente na falta de acesso aos conteúdos, mas na apropriação da

informação. Segundo Haak (2005), esse contexto traz possibilidades

radicalmente distintas das que proporcionavam os clássicos meios de

distribuição de conteúdos, como os livros impressos. A Internet, nesse sentido,

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é uma poderosa ferramenta para mediatização de conteúdos, sendo, portanto,

necessário repensar a mediação com o uso de ferramentas de comunicação

que permitem a adoção de formas de interação sincrônica ou asincrônica,

bidirecional ou multidirecional. Com a mediatização, as possibilidades de

mediação se ampliam muito além das fronteiras da relação entre sujeitos.

O conceito de dispositivo (Pieruccini) mostrou um novo enfoque à

problemática da mediação, na medida em que agora, na ação cultural, não se

trata mais de identificar um foco (o mediador, a obra de arte, a alfabetização),

mas compreender que o dispositivo é um discurso, portanto, uma ferramenta

de significação. E, nesse sentido, é importante compreender que, conforme

indica Peraya (apud PIERUCCINI, 2004) os dispositivos colocam em pauta

novas propriedades de regulação da produção, organização, circulação e

distribuição da informação, uma vez que, sua configuração atua na natureza e

nos processos da mediação. O dispositivo é, segundo Pieruccini (2004, p.35),

signo, mecanismo de intervenção sobre o real, que atua por meio de formas de organização estruturada, utilizando-se de recursos materiais, tecnológicos, simbólicos e relacionais, que atingem os comportamentos e condutas afetivas, cognitivas e comunicativas dos indivíduos. Dessa forma, os efeitos dos dispositivos, ou seja, dos meios dirigidos, ultrapassam os limites técnicos visíveis para tornarem-se, em nossa sociedade, instrumento da relação conosco, com os outros e com o mundo. Nesta perspectiva, os comportamentos culturais contemporâneos (como visitar museus, navegar na Internet, ir à biblioteca) são formas de atuação com e nos dispositivos, orientadas por regras e leis próprias dos meios em que se encontrem.

Além de apontar para os perigos da fabricação, animação e filisteísmo, o

estudo do conceito permitiu refletir sobre a importância da mediação cultural

nos processos de apropriação, da fundamental importância da inclusão dos

sujeitos como produtores de cultura. Do mesmo modo, a reflexão sobre as

influências do novo contexto informacional, possibilitou a identificação de

outros elementos de análise, numa nova perspectiva de ação cultural,

considerando que o surgimento da mediatização requer um estudo cuidadoso

dos dispositivos informacionais. Em suma, o estudo do conceito de ação

cultural e a reflexão sobre as influências do novo contexto informacional

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possibilitaram o levantamento de elementos-chaves, úteis à abordagem de

projetos culturais e que neste trabalho terá como objeto o Projeto Mudando a

História.

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PARTE II - O OBJETO EMPÍRICO

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3. Abordagem prática

3.1 Projeto Mudando a História: concepções norteadoras

A análise do Projeto Mudando a História (PMH) se dará com base num

estudo realizado no primeiro semestre de 2006, durante a disciplina de

Planejamento Bibliotecário I, na qual foi desenvolvido um diagnóstico sobre o

PMH, na Obra Social Paróquia São Mateus Apóstolo (Anexo). Também

introduzi informações adicionais, frutos do contato que mantenho até o

presente momento, com os participantes do PMH na Obra Social Paróquia São

Mateus Apóstolo. As reflexões e abordagens terão como foco o processo de

mediação, a relação dos participantes com o dispositivo, e também a estrutura

como um todo, considerando as questões que envolvem a ação cultural.

O PMH é uma prática cultural, que busca formar jovens de 13 a 25 anos

para atuarem como mediadores de leitura e multiplicadores dessa ação.

Jovens, estudantes de escolas públicas e particulares, universitários,

participantes de organizações não-governamentais e projetos, atuam como

mediadores de leitura para crianças que freqüentam creches, escolas de

educação infantil ou instituições de atendimento direto à infância em situação

de risco. A metodologia utilizada pouco difere da aplicada no projeto Biblioteca

Viva8. Há basicamente dois diferenciais no Mudando a História: o de unir

jovens de contextos sociais e econômicos diferentes para que trabalhem

juntos, e o de formar jovens como multiplicadores, ou seja, além de atuarem

junto às crianças que freqüentam o projeto, os jovens se tornam formadores de

outros jovens e/ou pessoas mediadoras de leitura.

O PMH é um dispositivo complexo, e como Pieruccini (2004) afirmou

sobre a biblioteca, o PMH também é composto por elementos heterogêneos

interligados: arquitetura e ambiente, técnicas e tecnologias, conteúdos,

produtos e processos, que sobrepõem significados aos significados por ele

guardados, constituindo-se elementos de sua natureza. 8 O Biblioteca Viva é um programa desenvolvido desde 1995 pela Fundação Abrinq em parceria com o Citigroup, no qual o livro é considerado um direito e a leitura fundamental para o exercício pleno da cidadania. O programa buscar oferecer acesso de crianças e adolescentes à leitura e a outras atividades culturais importantes para o seu processo formativo e desenvolvimento pessoal.

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O espaço físico é variado, não havendo lugares fixos, e nem critérios

pré-estabelecidos que delimitem o espaço ideal. Os jovens da Obra Social

fazem mediações de leitura em creches, parques, hospitais, e alguns a fazem

até mesmo nos ônibus, extrapolando o horário pré-estabelecido pelo projeto

para as mediações. Na medida do possível, se busca um lugar confortável e

aconchegante para leitura e reflexão do texto e, geralmente, utiliza-se um

lençol ou tapete para dispor os livros e almofadas como encosto. Os livros são

dispostos de forma aleatória, em geral jogados ao chão no meio de uma roda

de crianças e mediadores. Tal disposição dos livros contrapõe a ordem rígida e

fixa da biblioteca tradicional e contribui para uma relação mais espontânea das

crianças com os livros (o único suporte utilizado), já que a busca não está

condicionada a uma classificação prévia como a Classificação Decimal de

Dewey (CDD). O ambiente flexível, confortável e desprovido de cobranças,

contrasta com características da biblioteca escolar tradicional, em que as

mesas e cadeiras para adultos, e a leitura como um ato obrigatório para a

fabricação de trabalhos escolares, são marcas características. Essa prática

parece contribuir para livrar a leitura de associações negativas, e para a

associação da leitura a um ato prazeroso, a um brincar. A percepção dessas

práticas, indica algumas das deficiências das instituições educacionais

parceiras, que geralmente entendem a biblioteca como um mero suporte às

atividades desenvolvidas nas classes de aula, e não, como um dispositivo

integrado ao processo educacional. Nesse sentido, a atuação do PMH poder-

se-ia ser articulada com as instituições parceiras, pois então haveria a

possibilidade de se discutir o papel e a importância dos elementos utilizados no

PMH, abrindo-se também, um canal para o repensar das práticas vigentes,

tanto no PMH, como nas instituições parceiras. O diálogo com as instituições

parceiras, bem como com outros projetos que envolvam a prática da leitura, é

imprescindível, por ser base para o repensar crítico sobre as intervenções

realizadas.

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A seleção e distribuição dos livros para as ramificações do projeto

como um todo, é realizada pela equipe de A Cor da Letra9. Na seleção têm-se

como critérios básicos: a diversidade, tanto na ampliação de linguagens visuais

e verbais quanto de temas e gêneros; a presença de clássicos da literatura

nacional e estrangeira, incluindo mitos, contos de fadas, contos populares e

folclóricos, fábulas e lendas. Procura-se contemplar também a poesia, a ficção

científica, o romance policial e de suspense, os contos de terror e de mistério,

histórias de amor, e histórias do cotidiano. Contudo, falta um tipo de obra que é

essencial aos processos de ação cultural: a memória local. A ausência destes

repertórios denuncia a falta de estrutura para a documentação e ordenação da

cultura local, e revela a necessidade de incentivo à criação/ação, e

consequentemente, ao diálogo com os “livros” e com outras comunidades.

Outra indagação a ser feita, é se apenas a leitura dos livros, não estaria

contribuindo para a super valorização e perpetuação dos valores duma classe

hegemônica, detentora dos dispositivos que selecionam e disseminam os livros

conforme seus interesses? Não se deveria pensar em dispositivos que além de

proporcionarem o contato com outras culturas, fortificassem a cultura local,

auxiliando os indivíduos a não só denunciar, como também a anunciar?

(FREIRE, 1982), pois, conforme afirmava Freire, a leitura deveria funcionar

como elemento motivador para que os leitores passassem a redigir seus

próprios textos, e assim quebrar a voz uníssona de uma elite que domina a

mídia.

A seleção dos jovens participantes é de responsabilidade da Fundação

Abrinq10, em parceria com escolas públicas e particulares, instituições

assistenciais e organizações comunitárias que trabalham diretamente com

crianças e adolescentes. A participação é voluntária, e para se tornar um

9 Desde 1998, este centro de estudos realiza ações sócio-educacionais e culturais, desenvolvendo e acompanhando projetos nas áreas de cultura, leitura, literatura, educação, juventude, e saúde; além de desenvolver metodologias de formação de educadores, profissionais de educação e saúde, voluntários em geral e voluntariado corporativo. 10 A Fundação Abrinq é uma organização sem fins lucrativos, que foi criada em 1990, ano da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Sua missão é a de promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania da criança e do adolescente, e por isso, embasa seu trabalho na Convenção Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1989), na Constituição Federal Brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990.

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mediador de leitura o jovem recebe uma formação inicial de 40 horas e,

posteriormente, é acompanhado a cada mês pela equipe técnica do projeto.

Durante a formação, ele participa de dinâmicas em que se discute e reflete

sobre como trabalhar com crianças e adolescentes e como se organizar para o

trabalho; procura-se, também, enriquecer seu conhecimento sobre livros e

literatura infantil. Além disso, os jovens realizam estágios práticos. Os locais de

formação são geralmente centrais para facilitar o acesso, e todos os

participantes recebem lanche e transporte. Vale salientar, que um critério

fundamental na seleção, é que o voluntário seja vinculado e tenha

compromisso com a instituição e com a comunidade local, para evitar o risco

da descontinuidade do trabalho.

O multiplicador é o mediador que já tem experiência da prática e

deseja formar novos mediadores. O PMH oferece a esse jovem uma formação

para que se torne multiplicador. Depois de formado, o multiplicador deverá

elaborar um projeto de formação e acompanhamento de mediadores, e

planejar as ações necessárias para mobilizar outros jovens e instituições. Após

a capacitação, o multiplicador supervisionará o mediador por meio de registros,

reuniões, observação e/ou realização conjunta das situações de mediação de

leitura. Irá acompanhar diretamente suas atividades, dando prosseguimento ao

processo de formação. Os multiplicadores também podem promover encontros

com mediadores de outras instituições para a troca de experiências. No todo, o

projeto é supervisionado por uma equipe técnica de 5 pessoas da ONG A Cor

da Letra. Essa equipe promove encontros mensais sistemáticos, que

possibilitam a conversa e a troca de registros entre os participantes, sejam

registros escritos, fotográficos ou audiovisuais.

O mediador precisa planejar cada dia de atividade. Programa com

antecedência a ação que pretende desenvolver e providencia os meios para

sua realização: livros, almofadas, tapetes, papel, lápis etc. Para tal, é

recomendável que ele já conheça o público, o contexto em que vai atuar, e

também todo o acervo disponível.

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Durante a mediação, busca-se uma comunicação, e não extensão,

instaurando-se um clima de descontração e liberdade, em que as crianças

ouvem e lêem os livros, falam e comentam o que quiserem, sem obrigação de

apresentar um trabalho ou algum produto sobre a leitura. A leitura é realizada

sem qualquer supressão ou alteração do texto ou imagem, pois entende-se que

o encontro com o desconhecido é parte importante do processo de

aprendizagem. No geral, tal postura na mediação se alinha às idéias da ação

cultural, pois como Freire (1995) afirmou, o mediador não deve apenas falar,

mas também estar disposto a escutar, considerar e interagir com seus

ouvintes. Em uma das sessões de mediação que assisti, presenciei uma cena

incomum, na qual ao invés dum jovem mediar um livro para as crianças, uma

criança estava mediando para as outras crianças e para os jovens mediadores.

O mais interessante, era que a criança não sabia ler, mas, contudo, via

algumas ilustrações do livro e as interpretava contando a história da maneira

que entendia (extrapolando o escrito). Sobre isso, Freire (1982) também

defendia que tanto o mediador quanto o mediado devem negar a exclusividade

de seus papéis, e assim agirem de maneira inversa ao padrão.

3.2 Projeto Mudando a História: o dispositivo da Obra Social Paróquia São

Mateus Apóstolo

Na Obra Social Paróquia São Mateus, o PMH iniciou suas atividades em

abril de 2005. Além desse projeto, a Obra Social ainda trabalha com abrigos,

creches, núcleos de educação complementar e com o Projeto Agente Jovem,

que visa à educação ambiental. Os principais fatores que levaram a Obra

Social a apoiar o PMH, foram a ausência da prática da leitura na comunidade e

a identificação dos educadores locais com a proposta pedagógica do projeto,

que incentiva os jovens a serem protagonistas de intervenções positivas na

comunidade.

Ao todo são 50 jovens formados em mediação de leitura, dentre os quais

15 são multiplicadores. Em cada núcleo que se desenvolve a mediação existe

um educador, também formado como mediador de leitura, que acompanha os

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mediadores. Além de realizarem mediações de leitura com as crianças da

creche localizada na paróquia, os jovens desenvolvem trabalhos de mediação,

sensibilização e capacitação de mediadores em núcleos sócio-educativos

(ONGs), centros de educação infantil e escolas. A formação dos mediadores é

feita conforme a demanda, e a de multiplicadores é realizada duas a três vezes

por ano. A supervisão do projeto acontece por meio de uma reunião mensal

com a equipe técnica de A Cor da Letra, e outra semanal somente com os

participantes do projeto na paróquia.

O coordenador do PMH na Obra Social, José Roberto da Silva (Beto),

afirma que, durante as mediações, é normal encontrar resistência por parte dos

adultos das instituições onde os jovens fazem a mediação, pois muitos

desprezam a capacidade dos jovens, sobretudo por serem de periferia. Para

comprovar, cita um acontecimento em relação a uma ação desenvolvida num

CEU (Centro Educacional Unificado), em que o bibliotecário, ao ver os jovens,

trancava-se em sua sala, saindo apenas para repreendê-los.

O acervo do PMH na paróquia é formado por 150 livros infanto-juvenis,

com predominância da literatura juvenil. Os livros, em geral têm predominância

de texto e poucas ilustrações. Beto, o coordenador, lembrou que em visita da

avaliadora da Nokia11 foi sugerido o enriquecimento do acervo para mediação e

a formação de um acervo para os jovens mediadores, bem como para idosos.

Em entrevista realizada com 27 jovens participantes do PMH na Obra

Social, perguntou-se o motivo de participação no projeto, e, a partir disso,

foram identificadas 9 categorias de respostas, conforme tabela 1 a seguir:

11 A Nokia é a mantenedora do projeto. O PMH é um dos desdobramentos do programa de cidadania corporativa Make a Connection, desenvolvido globalmente pela International Youth Foundation em parceria com a Nokia, e no Brasil, a iniciativa é da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança, e a execução da A Cor da Letra.

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Por que você participa do projeto? (Questão aberta)

Nº de entrevistados

Por gostar de compartilhar o prazer de ler 7 Porque gosta de ler 5 Porque gosta de crianças 5 Para adquirir novos conhecimentos 4 Por ser um projeto diferente 3 Por incentivar um modo diferente de ler 2 Para fazer novas amizades 2 Porque é um trabalho voluntário 2 Para não ficar desocupado 1

Tabela 1 – Principais razões de participar do projeto

Nota-se que a leitura, não tem a conotação de obrigatoriedade entre

esses jovens, e mais do que um ato prazeroso para si, é vista como algo a ser

compartilhado. O gostar de compartilhar o prazer de ler e o gostar de ler são

respostas similares, porém o que as distingue é fator chave para o

desenvolvimento da sociedade, pois o compartilhar contrapõe-se ao

individualismo característico da sociedade contemporânea e favorece o diálogo

entre as pessoas. Além disso, a baixa incidência de participações no PMH com

a finalidade de não ficar desocupado, é favorável a práticas culturais

interessadas não apenas em cobrir um tempo ocioso dos participantes, de

modo a que não estejam disponíveis para a prática de atos condenados pela

sociedade, mas buscam dar suporte aos indivíduos para que sejam

protagonistas de ações críticas frente à realidade que os cercam.

Definir questões para avaliar a eficácia de uma ação cultural é um

grande desafio, pois a própria natureza do conceito de ação cultural é avesso a

uma finalidade pré-estabelecida, não almeja resultados pré-determinados.

Deflagra-se a ação e não se tem controle sobre seus resultados. As

capacidades de inventar e reinventar não são externalizadas de modo

padronizado para que sejam facilmente analisadas, ainda mais que, projetos

sociais estão inseridos em realidades complexas, carregadas de

interveniências e permeadas por múltiplos fatores, processos, relações e

pessoas. Dessa forma, reconheço que faltam a mim, como aluno de graduação

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ainda, elementos precisos para tal análise. Por isso, entendo ser mais

adequado e pertinente, apoiar a reflexão no questionamento dos participantes

sobre o que foi significativo para eles a partir da participação no projeto,

conforme tabela 2.

Algo mudou em sua vida ao participar do projeto? (Questão aberta)

Nº de entrevistados

Contribuiu para o hábito de ler 13 Melhorou o relacionamento com crianças 10 Se tornou mais comunicativo 7 Aumentou o senso crítico 5 Melhorou os relacionamentos em geral 2 Aumentou a responsabilidade 2 Aumentou a popularidade 1

Tabela 2 - Mudanças na vida ao participar do projeto

Freire (1982) ressaltava a importância da prática da leitura, afirmando

que o exercício da crítica por meio da leitura dos livros contribui para uma

leitura crítica do mundo, pois o exercício de reflexão pelo qual se alcança a

razão dos fatos, traz uma visão cada vez mais lúcida dos fatos. Parece que tal

afirmação ganhou consistência na resposta de 5 dos entrevistados, que

afirmaram notar terem desenvolvido maior senso crítico devido à participação

no PMH. No ato de conhecer, tanto pela leitura do mundo como pela leitura do

livro, se reconhece uma unidade entre subjetividade e objetividade, pois a

realidade concreta nunca é somente o dado objetivo, o fato em si, mas a

percepção que se tem dela, e, citando Chomsky, Freire dizia que enquanto a

estrutura específica (objetiva) traz apenas elementos frutos de uma

codificação, a estrutura profunda (subjetiva) é o momento da decodificação,

que abre possibilidades a análises críticas sobre a realidade codificada. Assim,

a leitura, quando entendida na perspectiva de Freire, num trabalho interligado

com as dimensões do objetivo e do subjetivo, contribui para uma ação cultural,

ainda mais no PMH, no qual não se trata de um hábito artificialmente mantido

pelas atividades do projeto, mas, de algo que já faz parte da vida dos jovens

(Tabela3, abaixo). A melhora no relacionamento com as crianças (10) e em

geral (2), e na facilidade para se comunicar (7), refletem mais uma vez,

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melhoras no processo de diálogo, essencial para a emancipação de que Freire

falava.

Fora a mediação de leitura, com que freqüência você lê livros? (Questão fechada)

Nº de entrevistados

Não leio 1 Um por ano 3 Dois por ano 4 Três por ano 6 Mais de três por ano 13

Tabela 3 – Número de livros lidos por ano

O impacto do projeto vai além dos momentos agendados de mediação

de leitura, pois 93% dos entrevistados afirmaram que suas participações no

projeto influenciaram familiares e/ou amigos (as), e apenas dois responderam

que não influenciaram ninguém, devido à falta de interesse das pessoas. O

reflexo dessa influência foi notada basicamente pelo aumento da prática da

leitura e pela manifestação do interesse em participar do projeto. Segundo o

coordenador Beto, pais solicitam reuniões mensais para saberem sobre os

filhos, momento em que também demonstram desejo de serem mediadores.

Outro dado importante a ser analisado refere-se à utilização das

bibliotecas do distrito de São Mateus, em que 78% dos entrevistados afirmaram

não utilizar nenhuma delas, alegando que com exceção das escolares, não

existem outras unidades. Porém, conforme pode ser constatado no portal da

Prefeitura Municipal de São Paulo12 existe a biblioteca do CEU São Rafael que

está localizada na subprefeitura de São Mateus. Porém, dada a sua localização

parece que a biblioteca não é acessível à maioria dos entrevistados, que

preferem buscar livros com amigos (as) e familiares (tabela 4, a seguir).

12 < http://www4.prefeitura.sp.gov.br/biblioteca >

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Quando quer ler algum livro, onde você o busca? (Questão semi fechada) Nº de entrevistados Com amigos (as) / familiares 18 Na biblioteca da escola 11 Numa biblioteca municipal 6 Num CEU (Centro Educacional Unificado) 2 Numa livraria 1 Outro. Especificar: 1, nas creches onde

faz mediação Tabela 4 – Fontes de busca de livros

Nos comentários sobre suas respostas da tabela 4, a maioria prefere

buscar com amigos e familiares pela possibilidade de troca de livros e por

causa da troca de informações e impressões sobre os livros. Tais dados

chamam a atenção para parte de um problema que Perrotti ressaltou em sua

tese sobre o confinamento cultural: a falta de articulação das várias esferas que

afetam a leitura na infância. Considerando que segundo Jeanson (apud

COELHO NETO, 1986, p.13), a “ação cultural tem por finalidade única fornecer

às pessoas o máximo de meios para a invenção conjunta de seus próprios

fins”, é importante pensar formas de intervenção que articulem processos e

recursos de modo a que os participantes possam avançar na busca de

informações, uma vez que, é impossível a um único projeto suprir sozinho

todas as necessidades e demandas. Nota-se, mais do que a mera falta de

estruturas que disponibilizem ou facilitem o acesso físico aos livros, o fato dos

familiares e amigos (as) serem mais solicitados na busca por livros do que as

bibliotecas escolares, demonstra que essas mesmo sendo acessíveis, não

atendem a demanda dos jovens. O interesse que eles apresentam pela troca

de livros devido a possibilidade da troca de informações sobre os livros,

indicam a necessidade de um dispositivo que vá além do disponibilizar de

livros, e seja também, dentre outras funções, um espaço para discussões, para

o diálogo; que contribuirá para a apropriação o conteúdo simbólico.

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3.3 Considerações finais à análise do dispositivo

Um dos principais objetivos do PMH, ou seja, a formação de jovens

mediadores e multiplicadores, para atuarem como agentes de intervenções e

transformações sociais, tem um bom respaldo para o seu cumprimento, na

paróquia São Mateus. As mudanças na vida de cada jovem são sensíveis, a

descoberta do prazer na leitura não só ajuda no desempenho escolar e nos

relacionamentos, mas também possibilita ao jovem vislumbrar outras visões de

mundo que podem auxiliá-lo na crítica da realidade. As transformações sociais

podem ser vistas na influência dos jovens mediadores sobre seus amigos e

familiares, incluindo-se nesse quadro as crianças que participam das

mediações realizadas pelos jovens. Contudo, não se pode ignorar a

complexidade que envolve a questão da leitura, em especial, em nosso país.

De um lado, a carência de dispositivos adequados a práticas de leitura, de

outro, a própria condição de vida das pessoas em nossa cidade, dentre elas,

mudanças na estrutura familiar, o crescente confinamento de crianças e jovens

em instituições de educação e cultura, a perda dos tradicionais espaços de

criação (praças, ruas, quintais) (PERROTTI, 1990), são alguns dos fatores que

devem ser considerados num programa de leitura que pretende desenvolver

práticas mais livres e espontâneas de trocas culturais.

Nessa perspectiva, o PMH parece contemplar muitos aspectos positivos,

como o protagonismo juvenil e a construção de elementos que possibilitam a

descoberta da leitura como algo prazeroso, capaz de estabelecer vínculos

significativos entre seus participantes a partir das trocas simbólicas estimuladas

pelas leituras.

Evidentemente, porém, ainda é necessário muito mais para o

desenvolvimento de estruturas e/ou articulações que levem seus participantes

ao desenvolvimento de práticas efetivas de criação, nas perspectivas

apontadas pelo estudo aqui desenvolvido.

Todavia, não se trata, neste estudo, de apontar falhas ou hiatos no

projeto. Antes de tudo, foi importante conhecer e compreender a organização

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geral implícita neste projeto, reconhecendo a existência de uma proposta que

busca levar com seriedade ações de inclusão cultural de uma comunidade

interessada em participar, mas que não conta com os recursos para tal

finalidade; de outro lado, é importante registrar também que os resultados

deste trabalho, poderão instigar algumas discussões que parecem ser

indispensáveis ao (re)conhecimento do trabalho por seus próprios

protagonistas.

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Anexo

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Escola de Comunicações e Artes

Departamento de Biblioteconomia e Documentação

Proposta do Diagnóstico

Avaliação do Projeto “Mudando a História” na paróquia São Mateus

Planejamento Bibliotecário I

Profa. Dra. Christina Barbosa de Almeida

Aluno: Rômulo Martins Morishita

Período Matutino

São Paulo

2006

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2

Sumário

1.0 Apresentação .............................................................................................................. 3

2.0 Introdução................................................................................................................... 3

2.1 Objetivo geral ......................................................................................................... 3 2.2 Justificativa............................................................................................................. 4 2.3 Metodologia para coleta de dados .......................................................................... 5 2.4 Cronograma ............................................................................................................ 7

3.0 Projeto Mudando a História........................................................................................ 8

3.1 Instituições responsáveis pelo Projeto Mudando a História................................... 9 3.2 Objetivos do Projeto Mudando a História ............................................................ 10 3.3 Metas .................................................................................................................... 11 3.4 A proposta: mediação de leitura ........................................................................... 11 3.5 Projeto Mudando a História na paróquia São Mateus .......................................... 14

4.0 Análise dos dados ..................................................................................................... 16

5.0 Conclusão ................................................................................................................. 19

6.0 Referências ............................................................................................................... 21

Anexos............................................................................................................................ 22

Anexo1 – Questionário para o coordenador do Projeto Mudando a História (e-mail)22 Anexo2 – Questionário para A Cor da Letra (e-mail) ................................................ 24 Anexo3 – Questionário para os mediadores de leitura ............................................... 26

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1.0 Apresentação

Cada vez mais o graduando é forçado a uma formação voltada ao

mercado. A dificuldade para se encontrar um emprego, as exigências das

organizações que apenas visam o lucro, e as instituições de ensino que se

amoldam totalmente às exigências dos empregadores, conduzem a uma

formação utilitarista. Tal conjuntura, além de não favorecer o surgimento de

massa crítica, o que é esperado da universidade pública, à medida que deixa

de dar esse retorno à sociedade, representa má utilização de fundos públicos.

Uma universidade pública, mantida por impostos pagos pela sociedade, deve

encontrar formas pelas quais os estudantes possam retribuir à sociedade pela

oportunidade de uma formação acadêmica gratuita. Trata-se de uma dupla

responsabilidade: do estudante e da própria universidade. Ambos devem estar

comprometidos com a melhoria das condições de vida dos cidadãos.

Acreditando nisso, vejo, na presente iniciativa, uma oportunidade

favorável à aplicação dos conhecimentos adquiridos na universidade em um

projeto social. O diagnóstico focaliza o projeto “Mudando a História”, que tem o

objetivo de formar jovens de diferentes contextos sociais para atuarem como

mediadores de leitura e multiplicadores. Trata-se de um projeto de ação

cultural, que, segundo Teixeira Coelho, é um processo que oferece condições

para que as pessoas envolvidas descubram sua capacidade de criar, inventar e

reinventar seus objetivos, uma vez que as atividades não lhes são impostas

nem dirigidas para alcançar determinados resultados. É importante ressaltar

essa função não utilitária, pois é comum encontrarmos iniciativas que atrelam a

atividade de leitura à aprendizagem formal, e esse não é o foco do projeto.

2.0 Introdução

2.1 Objetivo geral

Avaliar, com base nos pontos fortes e fracos a serem analisados no

projeto Mudando a História (PMH) desenvolvido na paróquia São Mateus, a

viabilidade de implantação de uma biblioteca comunitária no local,

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4

considerando o potencial existente quanto a recursos humanos, físicos e

materiais.

2.1.1Objetivos específicos

- Conhecer e avaliar a ação desenvolvida pelo projeto Mudando a História na

paróquia São Mateus

- avaliar os principais resultados alcançados, levando-se em conta os objetivos

do projeto (formação de mediadores de leitura e multiplicadores)

- analisar a necessidade / o desejo da comunidade de ter uma biblioteca no

local

- analisar as potencialidades da comunidade para a implantação de uma

biblioteca comunitária

2.2 Justificativa

A avaliação de projetos sociais é essencial para a tomada de decisão

quanto à sua manutenção, desenvolvimento, revisão ou encerramento.

Pretende-se que a avaliação do projeto Mudando a História na paróquia de São

Mateus, além de verificar a fidelidade aos objetivos do projeto e analisar seus

processos e resultados, sirva de subsidio à implementação de uma biblioteca

comunitária naquela comunidade.

Apesar de o projeto Mudando a História, como um todo, já ter sido

avaliado, essa avaliação não foi desenvolvida com o foco que se pretende dar

neste diagnóstico. É importante lembrar, também, que a avaliação feita por um

avaliador externo pode trazer contribuições novas, pois :

- seus julgamentos podem ser menos parciais, por estar mais distanciados do

programa;

- dirige um “novo olhar” ao programa, podendo identificar questões importantes,

que não são observadas pelas pessoas de “dentro” do programa.

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5

2.3 Metodologia para coleta de dados

Definir uma metodologia para avaliar a eficácia de uma ação cultural é

um grande desafio. Em primeiro lugar, a própria natureza do conceito de ação

cultural é avesso a uma finalidade restrita, pois não almeja resultados pré-

determinados. Deflagra-se a ação e não se tem controle sobre seus resultados.

As capacidades de inventar e reinventar não são externalizados de modo

padronizado para sejam facilmente analisadas. Projetos sociais estão inseridos

em realidades complexas, carregadas de interveniências e permeadas por

múltiplos fatores, processos, relações e pessoas. Por isso, se trabalhará com

conjuntos de fatores (indicadores) que sinalizam uma evolução quanto ao

objetivo conceitual da ação cultural.

O processo de avaliação iniciou-se, portanto, pelo conhecimento do

contexto e do projeto em foco, que se concretizou por meio do levantamento de

informações sobre o projeto e sobre as organizações envolvidas disponíveis

em publicações impressas e/ou eletrônicas. Posteriormente, por meio de

entrevistas informais e questionários, foram consultados os organizadores e os

jovens participantes do projeto. As visitas realizadas também permitiram a

observação direta do projeto na paróquia São Mateus.

Durante revisão bibliográfica sobre o projeto e as instituições envolvidas,

foram levantadas questões estruturais e estatísticas que não podiam ser

respondidas pelos documentos em análise. Elaboraram-se então, dois

questionários, um para a representante da A Cor da Letra e outro para o

coordenador do PMH da paróquia São Mateus, os quais foram enviados e

respondidos via email. (anexos 1 e 2)

Antes da estruturação dos questionários para os jovens mediadores,

efetuou-se uma visita exploratória no centro de estudos A Cor da letra e outra

no PMH na paróquia São Mateus, na qual, por meio de observações e

conversas com organizadores e participantes, obtiveram-se informações

importantes.

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6

Após essa familiarização com o projeto e seus envolvidos, elaborou-se

um questionário (anexo3) para os

mediadores visando avaliar o impacto do

projeto na vida dos jovens e a viabilidade da

implementação de uma biblioteca

comunitária na paróquia. O questionário foi

aplicado no dia 20 de junho de 2006, logo

após a reunião semanal dos mediadores da

paróquia. Todos os que estavam presentes responderam o questionário,

totalizando 27 questionários respondidos, de um total de 50 mediadores na

paróquia.

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2.4 Cronograma

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3.0 Projeto Mudando a História

O projeto surgiu em 2001, em decorrência das experiências

desenvolvidas no projeto Biblioteca Viva e do interesse demonstrado pela

Nokia do Brasil e pela International Youth Foundation (Harasawa). É um dos

desdobramentos do programa de cidadania corporativa Make a Connection,

desenvolvido globalmente pela International Youth Foundation em parceria com

a Nokia. A iniciativa no Brasil é da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança,

e a execução da A Cor da Letra. (Fundação Abrinq)

O projeto busca formar jovens de 13 a 25 anos para atuarem como

mediadores de leitura e multiplicadores dessa ação. Esses jovens, estudantes

de escolas públicas e particulares, universitários, participantes de organizações

não-governamentais e projetos atuam

como mediadores de leitura para

crianças que freqüentam creches,

escolas de educação infantil ou

instituições de atendimento direto à

infância em situação de risco. (GIFE)

A metodologia utilizada pouco difere da aplicada no projeto Biblioteca

Viva*, e basicamente são dois os diferenciais que o Mudando a História traz: o

de unir jovens de contextos sociais e econômicos diferentes para que

trabalhem juntos, e o de formar jovens como multiplicadores, ou seja, além de

atuarem lendo para crianças, os jovens se tornarão formadores de outros

jovens e/ou pessoas mediadoras de leitura. (GIFE)

* O Biblioteca Viva é um programa desenvolvido desde 1995 pela Fundação Abrinq em parceria com o Citigroup. Trata-se de uma ação cultural que considera o livro um direito e a leitura fundamental para o exercício pleno da cidadania. O programa buscar oferecer acesso de crianças e adolescentes à leitura e a outras atividades culturais importantes para o seu processo formativo e desenvolvimento pessoal.

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Atualmente o projeto encontra-se em sua terceira fase, caracterizada

pelo enfoque na formação de multiplicadores de multiplicadores. Na primeira

fase, em 2001, foram formados mediadores, e, na segunda, em 2003, foram

formados multiplicadores.

Segundo o site da Fundação Abrinq (acesso em 25/06/2006), 3.883

jovens já foram formados como mediadores e multiplicadores de leitura, e

54.550 crianças foram beneficiadas pela ação destes jovens. A abrangência do

projeto atinge os estados de São Paulo (SP), Manaus (AM), Parintins (AM),

Mogi das Cruzes (SP), Ribeirão Preto (SP) e Santos (SP).

3.1 Instituições responsáveis pelo Projeto Mudando a História

3.1.1 A Cor da Letra

Desde 1998, o centro de estudos realiza ações sócio-educacionais e

culturais. Desenvolve e acompanha projetos nas áreas de cultura, leitura,

literatura, educação, juventude, e saúde; também desenvolve metodologias de

formação de educadores, profissionais de educação e saúde, voluntários em

geral e voluntariado corporativo. (A Cor da Letra)

Possui diferentes parceiros como associações de moradores,

organizações não governamentais, entidades de atendimento direto à criança e

ao adolescente, escolas públicas e particulares. Em seu trabalho com jovens,

realiza a capacitação e organização de grupos de jovens para atuarem em

projetos sociais, projetos de documentação, formação profissional e ações

culturais. (A Cor da Letra)

A direção e coordenação dos projetos é responsabilidade de Cíntia

Carvalho, bacharel em Letras, Patrícia Bohrer Pereira Leite, psicóloga e Márcia

Wada, pedagoga e psicóloga. Já a equipe técnica é composta por Amanda

Leal, socióloga, Valquíria R. Fagundes, pedagoga, Alcione Ribeiro, estudante

de comunicação social, e Bruna Baldin, estudante de ciências sociais.

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3.1.2 Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do

Adolescente

A Fundação Abrinq é uma organização sem fins lucrativos, que nasceu

em 1990, ano da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Sua

missão é a de promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania da

criança e do adolescente, por isso, embasa seu trabalho na Convenção

Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1989), na Constituição Federal

Brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990.

A fundação é mantida por pessoas, empresas e agências nacionais e

internacionais que apóiam a causa da criança e do adolescente. Possui um

Conselho de Administração constituído por empresários de diferentes setores;

um Conselho Consultivo formado por especialistas na área da infância e da

adolescência, que garantem a discussão de temas relacionados à defesa dos

direitos; e um Conselho Fiscal, responsável pela assessoria e fiscalização

financeira e contábil da organização.

3.2 Objetivos do Projeto Mudando a História

• “Fortalecer e disseminar a concepção de jovem como agente de

intervenções e transformações sociais positivas;

• aprofundar o conhecimento dos jovens e organizações sociais parceiras

sobre a formação de grupos de mediadores de leitura;

• fortalecer a relação entre os jovens, suas organizações e sua

comunidade;

• promover o intercâmbio e a identificação entre grupos de jovens de

diferentes contextos sociais;

• contribuir com conhecimento para formulação de políticas e propostas

na área da juventude. “

(Fundação Abrinq)

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3.3 Metas

Após uma avaliação, em 2003, foram apresentadas as seguintes metas

para o período de 2004-2007:

a) Número de beneficiários diretos

60 organizações parceiras

500 jovens participando das formações de multiplicadores

5.000 jovens mediadores de leitura, formados pelos multiplicadores

50.000 crianças beneficiadas pelos mediadores

b) Número de beneficiários indiretos

7.500 famílias dos jovens

50.000 famílias das crianças beneficiadas

50 organizações sociais e escolas beneficiadas pelos jovens mediadores

c) Outros resultados esperados

• criação de um site pelos jovens e de um informativo periódico,

conectando via internet os diversos grupos das cidades participantes do

projeto

• formação das organizações sociais para que desenvolvam projetos e

programas de qualidade com adolescentes e jovens. (GIFE)

3.4 A proposta: mediação de leitura

3.4.1Conceitos e processo

Duas ou mais pessoas estabelecem

uma relação por meio da leitura, aquele que

lê acompanha o outro na escuta e acolhe as

colocações que virem a surgir, sem o dever

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de intervir. Busca-se uma verdadeira comunicação, e não extensão,

instaurando-se um clima de descontração e liberdade, em que as crianças

ouvem e lêem os livros, falam e comentam o que quiserem e não têm

obrigação de apresentar um trabalho ou algum produto sobre a leitura.

A leitura deve ser feita sem qualquer supressão ou alteração do texto ou

imagem, pois entende-se que o encontro com o desconhecido é parte

importante do processo de aprendizagem. A repetição na leitura de livros é

aconselhada na medida em que for solicitada, pois as crianças gostam de

escutar a mesma história várias vezes: isso lhes dá segurança e sensação de

conhecimento. (Harasawa)

O mediador precisa planejar cada dia de atividade. Programa com

antecedência a ação que pretende desenvolver e providencia os meios para

sua realização: livros, almofadas, tapetes, papel, lápis etc. Para tal, é

imprescindível que o mediador já conheça o público e o contexto em que vai

atuar. Além disso, recomenda-se que o mediador tenha conhecimento de todo

o acervo disponível, para que possa fazer da leitura uma atividade significativa

e esteja preparado para acolher as reações das crianças. (Harasawa)

3.4.2 O espaço físico da mediação e a disposição dos

livros

Na medida do possível, deve-se

proporcionar um lugar confortável e

aconchegante para leitura e meditação;

geralmente utiliza-se um lençol ou tapete

para dispor os livros, e almofadas como

encosto. A criança tem autonomia para

pegar o livro que quiser, e pode até levá-

lo para casa, se houver algum sistema de empréstimo. (Harasawa)

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3.4.3 A seleção dos livros

A seleção e distribuição dos livros para as ramificações do projeto é feita

pela equipe da A Cor da Letra. Na seleção têm-se como critérios básicos: a

diversidade, na ampliação de linguagens visuais e verbais quanto de temas,

assuntos e gêneros; e a presença de clássicos da literatura nacional e

estrangeira, incluindo mitos, contos de fadas, contos populares e folclóricos,

fábulas e lendas. Procura-se contemplar também a poesia, a ficção científica, o

romance policial e de suspense, os contos de terror e de mistério, histórias de

amor, e histórias do cotidiano. (Harasawa)

3.4.4 A formação de mediadores

A seleção dos jovens participantes é

de responsabilidade da Fundação Abrinq,

em parceria com escolas públicas e

particulares, instituições assistenciais e

organizações comunitárias que trabalham

diretamente com crianças e adolescentes.

A participação é voluntária, e para se tornar

um mediador de leitura o jovem recebe uma formação inicial de 40 horas e,

posteriormente, é acompanhado a cada mês pela equipe técnica do projeto.

Durante a formação, ele participa de dinâmicas onde se discute e reflete sobre

como trabalhar com crianças e adolescentes e como se organizar para o

trabalho; procura-se, também, enriquecer seu conhecimento sobre livros e

literatura infantil. Além disso, os jovens realizam estágios práticos. Os locais de

formação são geralmente centrais para facilitar o acesso, e todos os

participantes recebem lanche e transporte. (Fundação Abrinq)

Vale salientar que um critério fundamental na seleção, é que o voluntário

seja vinculado e tenha compromisso com a instituição e com a comunidade

local, para evitar o risco da descontinuidade do trabalho. (Harasawa)

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3.4.5 A formação de multiplicadores

O multiplicador é o mediador que já tem experiência e deseja formar

novos mediadores. O Projeto Mudando a História oferece a esse jovem uma

formação para que se torne multiplicador. Depois de formado, deverá elaborar

um projeto de formação e acompanhamento de mediadores e planejar as

ações necessárias para mobilizar outros jovens e instituições. (GIFE)

3.4.6 Acompanhamento e supervisão

Após a capacitação, o

multiplicador supervisionará o mediador

por meio de registros, reuniões,

observação e/ou realização conjunta

das situações de mediação de leitura.

Irá acompanhar diretamente suas

atividades, dando prosseguimento ao

processo de formação. Os multiplicadores também podem promover encontros

com mediadores de outras instituições para a troca de experiências.

No todo, o projeto é supervisionado por uma equipe técnica de 5

pessoas da ONG A Cor da Letra. Essa equipe promove encontros mensais

sistemáticos, que possibilitam a conversa e a troca de registros entre os

participantes, sejam registros escritos, fotográficos ou audiovisuais.

3.5 Projeto Mudando a História na paróquia São Mateus

O PMH iniciou-se em abril de 2005 na paróquia São Mateus, onde é

coordenado pela Obra Social São Mateus, que, além desse projeto, trabalha

com abrigos, creches, núcleos de educação complementar e o Projeto Agente

Jovem, que visa a educação ambiental. A ausência do hábito de ler na

comunidade e a identificação dos educadores locais com a proposta

pedagógica que incentiva o jovem a intervir positivamente na sociedade foram

os principais fatores que incentivaram a obra social a apoiar o PMH.

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Ao todo são 50 jovens formados em mediação de leitura, dentre eles 15

multiplicadores. Em cada núcleo que se desenvolve a mediação existe um

educador, também formado como mediador de leitura, que acompanha os

mediadores. Além de realizarem a mediação de leitura com a comunidade da

paróquia, os jovens desenvolvem trabalhos de mediação, sensibilização e

capacitação de mediadores em núcleos sócio-educativos (ONGs), centros de

educação infantil, escolas, e, atualmente, analisam a possibilidade de uma

ação no hospital municipal de São Mateus. A formação dos mediadores é feita

conforme a demanda e a de multiplicadores é realizada duas a três vezes por

ano. A supervisão do projeto acontece por meio de uma reunião mensal com a

equipe técnica da A Cor da Letra, e outra semanal somente com os

participantes do projeto na paróquia.

Durante as mediações, o coordenador do projeto, José Roberto da Silva

(Beto), disse que é normal encontrar resistência por parte dos adultos das

instituições onde os jovens fazem a mediação, pois muitos desprezam a

capacidade do jovem, ainda mais sendo esse de periferia. Ele até cita um

acontecimento de uma ação desenvolvida num CEU (Centro Educacional

Unificado), onde o bibliotecário, ao ver os jovens, se trancava em sua sala e

saia apenas para repreendê-los.

O acervo do PMH na paróquia contém 150 livros infanto juvenis, com

predominância da literatura juvenil, na qual existe mais texto do que imagem.

Beto lembrou que em visita da avaliadora da Nokia foi sugerido o

enriquecimento do acervo para mediação e a formação de um acervo para os

jovens mediadores e idosos. Ao falar sobre a possibilidade de se constituir uma

biblioteca comunitária, a coordenadora da obra social São Mateus, Marilda

Fonseca, lembra que já houve uma biblioteca na obra social, mas que ninguém

a utilizava e por isso os livros agora estão guardados em caixas. Ela

complementa dizendo que existem várias bibliotecas a disposição da

comunidade na região, mas que são subutilizadas, pois a leitura não é um

hábito da comunidade.

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O impacto do projeto na família dos jovens voluntários é nítido: os pais

solicitam reuniões mensais com o coordenador para saberem sobre o

progresso dos filhos e muitos demonstram o desejo de serem mediadores

também. Beto afirma que o projeto contribui para a leitura que o jovem passa a

fazer das situações cotidianas e que a presença de jovens de diversos

contextos sociais permite uma constante e enriquecedora troca de visões de

mundo.

4.0 Análise dos dados

Dos 27 entrevistados, 20 (74%) têm entre 16 e 18 anos de idade e o

restante (26%) têm entre 13 e 15 anos de idade. Todos cursam o ensino

médio.

A paróquia São Mateus está localizada na subprefeitura de São Mateus

(nº 30 da figura1), distrito de São Mateus. Todos os entrevistados moram no

distrito de São Mateus.

Figura 1: Parte da zona leste do município de São Paulo Fonte: Secretaria Municipal de Planejamento – Sempla / Depto. de Estatística e Produção de Informação – Dipro < http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/md/ter/mapa_indice.pdf >

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Dos entrevistados, 25 têm entre quatro e seis meses de projeto, um tem

menos de três meses, e também um tem mais de um ano de projeto.

Dentre os principais motivos dos entrevistados participarem do projeto,

estão a oportunidade de ler e compartilhar o hábito de ler, e o prazer em

trabalhar com crianças. Na tabela 1 seguem todas as categorias identificadas

para essa questão:

Por que você participa do projeto? (Questão aberta)

Nº de entrevistados

Por gostar de compartilhar o hábito de ler 7 Porque gosta de ler 5 Porque gosta de crianças 5 Para adquirir novos conhecimentos 4 Por ser um projeto diferente 3 Por incentivar um modo diferente de ler 2 Para fazer novas amizades 2 Porque é um trabalho voluntário 2 Para não ficar desocupado 1

Tabela 1 – Principais razões de participar do projeto

Na questão sobre o que mudou na vida ao participar do projeto, apenas

uma pessoa respondeu que nada mudou, e as demais afirmaram que

houveram mudanças, conforme tabela 2.

Algo mudou em sua vida ao participar do projeto? (Questão aberta)

Nº de entrevistados

Contribuiu para o hábito de ler 13 Melhorou o relacionamento com crianças 10 Se tornou mais comunicativo 7 Aumentou o senso crítico 5 Melhorou os relacionamentos em geral 2 Aumentou a responsabilidade 2 Aumentou a popularidade 1

Tabela 2 - Mudanças na vida ao participar do projeto

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O hábito de ler entre os mediadores é confirmado pela tabela 3:

Fora a mediação de leitura, com que freqüência você lê livros? (Questão fechada)

Nº de entrevistados

Não leio 1 Um por ano 3 Dois por ano 4 Três por ano 6 Mais de três por ano 13

Tabela 3 – Número de livros lidos por ano

O impacto do projeto vai além dos momentos agendados de mediação

de leitura; 25 entrevistados afirmaram que suas participações nos projeto

influenciaram familiares e/ou amigos (as), e apenas dois responderam que não

influenciaram ninguém, por falta de interesse das pessoas. O reflexo dessa

influência foi notada basicamente pelo aumento do hábito de ler e pela

manifestação de desejo de participar do projeto.

Quanto a utilização das bibliotecas do distrito de São Mateus, 78% dos

entrevistados afirmaram não utilizar nenhuma biblioteca de São Mateus,

alegando que com exceção das escolares, não existem bibliotecas em São

Mateus. Na verdade, existe a biblioteca do CEU São Rafael que está localizada

em São Mateus, porém não é acessível para a maioria dos entrevistados, que

preferem buscar livros com amigos (as) e familiares (tabela 4).

Quando quer ler algum livro, onde você o busca? (Questão semi fechada) Nº de entrevistados Com amigos (as) / familiares 18 Na biblioteca da escola 11 Numa biblioteca municipal 6 Num CEU (Centro Educacional Unificado) 2 Numa livraria 1 Outro. Especificar: 1, nas creches onde

faz mediação Tabela 4 – Fontes de busca de livros

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Nos comentários sobre suas respostas da tabela 4, a maioria prefere

buscar com amigos e familiares pela possibilidade de troca de livros e por

causa da troca de informações e impressões sobre os livros.

Sobre o desenvolvimento de uma biblioteca comunitária na paróquia, 26

entrevistados se manifestaram a favor, e apenas 1 se manifestou contra. Na

justificativa, defende-se que existência de uma biblioteca seria um incentivo a

leitura, ainda mais quando não existem bibliotecas acessíveis à comunidade

local. Quando foram questionados se estariam dispostos a participarem da

criação e desenvolvimento de uma biblioteca, 78% dos entrevistados disseram

estar dispostos, principalmente para ajudar na organização e formação do

acervo (doando e buscando doações); os demais que responderam não

alegaram falta de tempo.

Quanto a aceitação da comunidade com relação a biblioteca, 26

entrevistados afirmaram que a biblioteca seria bem recebida e utilizada pela

comunidade, e apenas 1 entrevistado escreveu que não seria bem recebida. O

motivo mais citado a favor da boa aceitação é a falta de uma biblioteca

acessível na região.

Para os entrevistados, o principal fator que facilitaria a implementação

de uma biblioteca seria a vontade e disposição da comunidade, e como

dificuldade para a implementação eles enxergam a falta de verbas.

5.0 Conclusão

O objetivo do projeto que é a formação de jovens mediadores e

multiplicadores, que sejam agentes de intervenções e transformações sociais,

tem sido alcançado na paróquia São Mateus. A mudança na vida de cada

jovem é sensível, o aumento no hábito de ler não só ajuda no desempenho

escolar e nos relacionamentos, mas possibilita ao jovem o vislumbramento de

outras visões de mundo, que o auxiliará a fazer uma leitura crítica de sua

realidade. As transformações sociais podem ser vistas na influência dos jovens

mediadores sobre seus amigos e familiares, isso sem contar as crianças que

recebem as mediações de leitura.

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A necessidade de uma biblioteca acessível para a comunidade de São

Mateus, próxima à paróquia, é evidente. O coordenador do projeto afirmou que

é mais fácil ir à biblioteca do CEU Aricanduva, do que à biblioteca do CEU em

São Mateus. O fato dos familiares e amigos (as) serem mais solicitados na

busca por livros do que as biblioteca escolares, demonstra que essas mesmo

sendo acessíveis, não atendem a demanda dos jovens.

As condições na paróquia são propícias para o desenvolvimento de uma

biblioteca comunitária, pois o mais importante que é a disposição da

comunidade local, já existe. Vários projetos como o Biblioteca Viva pararam

após a saída de seus patrocinadores, pois não têm como base a participação e

apropriação da comunidade local, e/ou não houve interesse por parte dos

participantes. A participação da comunidade local faz-se essencial para evitar

ações assistencialistas, e buscar ações culturais que incentivem seus

participantes criarem seus próprios meios e fins.

analisar a necessidade / o desejo da comunidade de ter uma biblioteca no local

- analisar as potencialidades da comunidade para a implantação de uma

biblioteca comunitária

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6.0 Referências

A Cor da Letra. Quem somos. Disponível em:

< http://www.acordaletra.com.br/menu.html >. Acesso em: 21 abr 2006

Grupo de Instituto Fundações e Empresas (GIFE). Casos concretos: projeto

mudando a história. Disponível em:

<http://www.gife.org.br/casos_noticias.php?codigo=6444&tamanhodetela=2&tip

o=ie> Acessado em: 05 mai 2006.

HARASAWA, Ely (Coord). Biblioteca Viva: fazendo a história com livros e

leituras. Fundação ABRINQ. Coleção dá pra resolver. Disponível em:

<http://www.fundabrinq.org.br/_Abrinq/documents/biblioteca/biblioteca_viva[1].p

df > Acessado em: 28 mar 2006.

Fundação Abrinq. Programa Mudando a História. Disponível em:

<http://www.fundabrinq.org.br/portal/alias__abrinq/lang__pt-

BR/tabid__115/default.aspx >. Acesso em: 30 abr 2006.

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Anexos

Anexo1 – Questionário para o coordenador do Projeto

Mudando a História (e-mail)

--------------------------------------------------------------------------------

Jose Roberto da Silva <[email protected]> Mon, May 8, 2006 at 3:19 PM

To: [email protected] , [email protected] , [email protected] ,

[email protected], [email protected] ,

[email protected]

>From: "Romulo Morishita" <[email protected]>

>To: [email protected]

>Subject: mudando a historia

>Date: Thu, 4 May 2006 15:46:33 -0300

>

>Olá Beto,

>

>tudo bom?

>

>Conforme conversei com vc por telefone, seguem algumas perguntas.

>obs.: o teclado esta com problemas de acentuacao...

>>

1- Por que a paróquia São Mateus apóia o proj. Mudando a História (PMH)?

>Ela apóia o projeto mudando pois tem uma proposta pedagógica que bate

muito com a proposta de trabalho do projeto. Também pela região não ter um

>trabalho que de fato incentive a leitura, ou que seja mais do que

>emprestar livros. E por muitos educadores se identificarem com o projeto

>que tem como foco o Jovem intervindo na sociedade de forma positiva.

>

2- Quando iniciou-se o PMH na paroquia?

>Iniciou no ano passado com uma formação em Abril. O projeto já tem um ano

>

3- Quantos organizadores, multiplicadores, e mediadores participam do

projeto?

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>São 50 jovens formados em mediação d leitura e entre eles 15

>multiplicadores e em cada núcleo que tem o projeto. Uma educador foi

>formada mediadora de leitura e acompanha os mediadores

>

4- Desde o inicio do projeto, quantos organizadores, multiplicadores, e

>mediadores foram formados pelo PMH da paroquia?

>Mediadores a organização já formou 80 e multiplicadors quem forma é a cor

>da letra, empresa responsavel pelo projeto

>

5- Em media, quantas pessoas vao ouvir/interagir com os mediadores?

>Existe algum controle formal?

>Exite o registro e as reuniões com coordenadora e educadora, onde temos o

>parecer destes profissionais. Mais ou menos 500 pessoas

>

6- Com que freqüência é feita as formações de mediadores e multiplicadores?

>A formação de mediador são feitas pela demanda de pessoas que se

interessam pelo projeto. E as de multiplicador duas a tres vezes por ano

>

7- Houve alteraçoes no projeto desde sua implementação? Quais?

>Alterações não

>

8- Existe algum plano para a expansao (tanto em alcance, qto em variedade

>de atividades/servicos) do PMH?

>Em São Mateus pensamos em alcanças as organizações educacionais e

>hopitalares da região.

>

9- Existem outros projetos sociais (em qualquer area, seja saude,

>educacao, arte...) na paroquia? Voce conhece algum outro projeto

>social fora da paroquia que atinja a mesma comunidade que frequenta a

>paroquia?

>Muitos projetos, porém cada um com um foco diferente

>

10- Quais as mudancas que o PMH traz para a vida de um jovem?

>Acredito que a maior visão é a de contribuição sobre a leitura e o olhar

>que o jovem passa a ter nas situações cotidiana e é u projeto que como

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>caracteristica tem jovens de diversos contextos sociais. A troca é

>constante.

>

11- Como e feita a surpervisao e avaliacao do projeto?

>As supervisão com a cor daletra acontece uma vez por mes e na Obra uma

vez

>por semana

>

>obrigado,

>Romulo

Anexo2 – Questionário para A Cor da Letra (e-mail)

On 6/6/06, Alcione Ribeiro - Projeto Mudando a História

[email protected]> wrote:

Olá Romulo, desculpe-me pela demora no envio das respostas, você verá que

deixei duas questões sem responder (em vermelho), pois gostaria que fosse

mais claro. Em anexo segue uma avaliação do Projeto Mudando a História

realizada em 2003. Prometo te enviar mais coisas até amanhã, estou super

enrolada por aqui.

um abraço,

Alcione

Sobre A Cor da Letra

1- A Cor da Letra é uma ONG?

Não, a A Cor da Letra é um centro de estudos, registrado como empresa,

porém seu campo de atuação é inteiramente

voltado para o terceiro setor.

2- Quais são os projetos ativos na A Cor da Letra?

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A Cor da Letra realiza diversas atividades de assessoria/consultoria em leitura

e literatura infantil, porém, entre os

projeto e consultorias realizadas os que mais se destacam são:

*Projeto Mudando a História (São Paulo e Manaus) - parceria entre Fundação

Abrinq e NOKIA

*Projeto Guia de Histórias (Poços de Caldas) - parceria entre Instituto Lambari

e Exportadora Astro Café

*Consultoria para Expediação Vaga Lume (Amazônia)

*Consultoria para projeto da Cargill (Santarém)

Projetos desativados: Biblioteca Viva - parceria entre Fundação Abrinq e

Citibank; Biblioteca Viva em Hospitais - parceria entre Fundação Abrinq /

Citibank e Ministério da Saúde.

3- Poderia fornecer o organograma, se possível com a formação acadêmica

dos funcionários da ONG?

Direção e Coordenação geral: Cíntia Carvalho - Bacharel em Letras

Márcia Wada - Psicóloga e Pedagoga

Patrícia B. Pereira Leite - Psicóloga

Equipe Técnica atual: Amanda Leal - Socióloga

Valquíria R. Fagundes - Pedagoga

Alcione Ribeiro - estudante de Comunicação

Social (Propaganda e Marketing)

Bruna Baldin - estudante de Ciências Sociais

4- Atualmente quantos são os voluntários que trabalham pela A Cor da Letra?

Não temos voluntários atuando diretamente na A Cor da Letra, somente

funcionários

5- Quais são as principais ONGs que atuam na mesma área da A Cor da

Letra? Como é o relacionamento da A Cor da Letra com elas? Existe

cooperação?

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6- Existe algum centro de documentação (ex. biblioteca...)? Se sim, quem é

o(a) responsável? Quem são seus usuários? Como é feita a ordenação dos

documentos (fitas, livros...)? Existe alguma base eletrônica?

Todo acervo de pesquisa e documentação da A Cor da Letra é organizado pela

própria equipe, não existe um sistema padrão para isso, uma vez que tudo é

muito pequeno e não demanda tanta estrutura, porém, temos um banco de

dados onde registramos alguns lançamentos e livros utilizados nos acervos de

mediação de leitura.

7- Existem metas traçadas a serem alcançadas? Se sim, quais são elas?

8- Segundo cada projeto ativo, quais são os parceiros/finaciadores da A Cor da

Letra?

Já citei acima

9- Como a A Cor da Letra busca financiadores? Existe alguma estratégia?

Estamos traçando algumas estratégias ainda, não temos nada definido

Anexo3 – Questionário para os mediadores de leitura

Este questionário é parte de um estudo desenvolvido sobre o programa

Mudando a História na Obra Social São Mateus. Qualquer dúvida, por favor,

me pergunte!

Rômulo

1- Nome completo e um contato (telefone ou email)

2. Faixa etária

( ) entre 13 e 15

( ) entre 16 e 18

( ) entre 19 e 21

( ) entre 22 e 24

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( ) 25 ou mais

3. Escolaridade

( ) ensino fundamental (1ª. a 4ª.)

( ) ensino fundamental (5ª. a 8ª.)

( ) ensino médio

( ) EJA (supletivo)

( ) curso superior. Especificar:

( ) outro. Especificar:

4. Bairro em que mora:

5. Há quanto tempo você participa do Projeto Mudando a História (PMH)?

( ) há menos de três meses

( ) entre quatro e seis meses

( ) entre sete e nove meses

( ) entre dez e doze meses

( ) mais de um ano

6- Por que você participa do projeto?

7- Algo mudou em sua vida ao participar do projeto?

( ) sim ( ) não

Em caso afirmativo, o quê?

8- Sua participação no projeto influenciou de alguma forma as pessoas com as

quais você convive diariamente?

( ) sim. Quais?

De que forma?

( ) não. Comente:

9- Fora a mediação de leitura, com que freqüência você lê livros?

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( ) não leio

( ) um por ano

( ) dois por ano

( ) três por ano

( ) mais de três por ano. Especifique:

10- Quando quer ler algum livro, onde você o busca?

( ) na biblioteca da escola

( ) numa biblioteca municipal

( ) num CEU (Centro Educacional Unificado)

( ) numa livraria

( ) com amigos(as) / familiares

( ) outro. Especificar:

Comente sua escolha:

11- Você utiliza alguma biblioteca em São Mateus?

( ) sim. Qual(is)?

( ) não. Por quê?

12- Entendendo que em uma biblioteca comunitária pode-se encontrar livros,

periódicos (revistas e jornais) e materiais audiovisuais (quadrinhos, DVDs, CDs

e etc), você

12.1 acha viável o desenvolvimento de uma biblioteca comunitária na Obra

Social São Mateus?

( ) sim. Por quê?

( ) não. Por quê?

12.2 gostaria de participar da criação e desenvolvimento dessa biblioteca?

( ) sim. Como?

( ) não. Por quê?

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12.3 acha que seria bem recebida e utilizada pela comunidade?

( ) sim. Por quê?

( ) não. Por quê?

12.4 acha que haveria uma equipe de voluntários para tocar o projeto?

( ) sim. Por quê?

( ) não. Por quê?

12.5 que dificuldades imagina existirem para a implementação do projeto?

12.6 que facilidades imagina existirem para a implementação do projeto?

Obrigado por sua contribuição!