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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO CARTÕES DE CRÉDITO: Aspectos destacados acerca das cláusulas abusivas THIAGO BUSS COELHO Biguaçu, 10 de julho de 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

CARTÕES DE CRÉDITO: Aspectos destacados acerca das cláusulas abusivas

THIAGO BUSS COELHO

Biguaçu, 10 de julho de 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

CARTÕES DE CRÉDITO: Aspectos destacados acerca das cláusulas abusivas

THIAGO BUSS COELHO

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc. Moacir José Serpa

Biguaçu, 10 de julho de 2008

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AGRADECIMENTO

A Deus por nos dar a dádiva da vida e nos presentear a cada dia com muita saúde e fé para que alcancemos os objetivos almejados;

A meus pais Geraldino e Ruth, à minha irmã Mariana e minha namorada Dayana que me incentivaram e auxiliaram tanto na conclusão da pesquisa quanto ao longo da caminhada universitária;

A meus amigos de universidade: Aline, Bernardo, Gabriel, Marcos, Marcos Zé, Mariana, Rosalbo e Samuka, por me acompanharem nesses anos de muito estudo, festas e muitas risadas;

A meus amigos de “felicidade” Michel e Ney, que de certa forma, contribuíram para o andamento da pesquisa;

A meus professores, dos quais tive a honra de ser aluno e meus orientadores: Professor Gilmar Geraldo Barbosa Carneiro, por sua dedicação, atenção e prontidão em disponibilizar as obras necessárias para a pesquisa e Professor Msc. Moacir José Serpa, por toda sua competência, compreensão e admirável conhecimento que contribuíram para a conclusão da pesquisa.

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DEDICATÓRIA

A meus pais Geraldino Coelho e Ruth Mª Buss Coelho, que em todo e qualquer momento sempre estiveram ao meu lado, apoiando e incentivando-me a acreditar e seguir com meus objetivos e que com admirável e louvável empenho, puderam proporcionar-me o estudo universitário.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, 10 de julho de 2008

THIAGO BUSS COELHO Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Thiago Buss Coelho, sob o título

Cartões de Crédito: Aspectos destacados das Cláusulas Abusivas, foi submetida

em 09 de julho de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: Moacir José Serpa, Presidente; Rafael Burlani Neves, Membro e

Eunice Anisete de Souza Trajano, Membro e aprovada com a nota 9,5 (nove

virgula cinco).

Biguaçu, 10 de julho de 2008

Moacir José Serpa Orientador e Presidente da Banca

Professora MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CDC Código de Defesa do Consumidor CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Art. Artigo

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Contrato:

s. m. 1. Acordo ou convenção entre duas ou mais pessoas, para a execução de

alguma coisa, sob determinadas condições. 2. Documento em que se registra

esse acordo ou convenção. 3 Ato ou efeito de contratar. 4. Contrato leonino:

aquele no qual só uma das partes leva vantagem, ou as tem excessivas. 5.

Contrato unilateral: o que só obriga um dos contratantes. adj. 6 Que se contraiu.

Cartão de crédito:

1. documento emitido por instituição financeira, com o qual seu titular pode ter

compras e serviços debitados. 2. Retângulo de plástico em geral com faixa

magnética ou código de barras, usado como identificação para o titular de uma

conta corrente, de contrato de crédito etc.

Violação:

s. f. 1. Ato ou efeito de violar. 2. Ofensa ao direito alheio.

Consumo:

s. m. 1. Ato ou efeito de consumir. 2. Utilização de um bem material para

satisfação das necessidades econômicas do homem. 3. Aquisição de mercadorias

ou serviços. 4. Gasto; venda; procura.

Consumidor:

1. (ô) adj. e s.m. Que ou o que consome; aquele que compra para seu uso e não

para negócio. 2. s. m. Aquele que compra para o gasto próprio.

Direito:

s.m. 1. Aquilo que é conforme as regras, conforme à lei. 2. Faculdade legal de

praticar ou deixar de praticar um ato. 3. Prerrogativa que se tem de exigir de

outrem a prática ou abstenção de certos atos ou respeito a situação. 4. Conjunto

de leis ou regras que regem o homem na sociedade; jurisprudência. (O Direito

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abrange vários ramos ou especializações: Direito Administrativo, Direito Civil,

Direito Comercial, Direito Constitucional, Direito Internacional, Direito Penal etc.)

Usuário:

adj. e s.m. 1. Que ou aquele que possui ou frui alguma coisa por direito

proveniente do uso. adj. 2. Que serve para nosso uso. 3. Qualificativo do escravo

do qual se tinha o uso, mas não a propriedade.

Abusividade:

adj. Em que existe abuso.

Juro:

s.m. 1. Lucro que rende o dinheiro colocado ou emprestado. 2. Rendimento;

interesse. 3. Fam. Recompensa. s. m. 4. Taxa percentual incidente sobre um

valor ou quantia, numa unidade de tempo determinado.

Multa:

s.f. 1. Ação ou efeito de multar; pena pecuniária; condenação; pena; coima. 2.

Multa contratual: a que se paga quando se infringe um contrato. 3. Multa

penitencial: a que se paga em caso de arrependimento do contrato; arras.

Cláusula:

s.f. Condição que faz parte de um contrato, de uma escritura, de um documento;

disposição; preceito; artigo. Cf. clausula, do v. CLAUSULAR.

Princípios:

1. Regra, lei, preceito. 2. Ditame moral, sentença, máxima. 3. Teoria. S. m. pl. 1.

Os antecedentes. 2. As primeiras épocas da vida. 3. Doutrinas fundamentais ou

opiniões predominantes. 4. O princípio da vida. 5. Primícias; rudimentos;

antecedentes. 6. Opiniões, convicções. 7. Regras fundamentais e gerais de

qualquer ciência ou arte.

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................. I

ABSTRACT.............................................................................................................II

INTRODUÇÃO........................................................................................................1

CAPÍTULO 1...........................................................................................................4

CONTRATOS NO DIREITO PRIVADO .................................................................4 1.1 CONCEITO DE CONTRATO.............................................................................4 1.2 CLASSIFICAÇÃO DE CONTRATOS.............................................................. 5

1.2.1 Classificação.................................................................................................5 1.2.1.1 Contratos unilaterais e bilaterais.............................................................6 1.2.1.2 Contratos gratuitos e onerosos ...............................................................7 1.2.1.3 Contratos comutativos e aleatórios.........................................................8 1.2.1.4 Contratos consensuais, formais e reais..................................................9 1.2.1.5 Contratos nominados e inominados......................................................10 1.2.1.6 Contratos Instantâneos e de execução continuada.............................11 1.2.1.7 Intuitu personae ou pessoais, e impessoais.........................................12 1.2.1.8 Principais e acessórios...........................................................................13 1.3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL......................14 1.3.1 Consensualismo.........................................................................................14 1.3.2 Autonomia da vontade...............................................................................15 1.3.3 Igualdade.....................................................................................................15 1.3.4 Obrigatoriedade..........................................................................................16 1.3.5 Boa-fé...........................................................................................................17 1.4 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS DE ACORDO COM O NOVO CÓDIGO CIVIL E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR......................................................18 1.4.1 Boa-fé objetiva............................................................................................18 1.4.2 Dever de informar e Transparência...........................................................19 1.4.3 Relatividade dos efeitos.............................................................................20 1.4.4 Onerosidade excessiva..............................................................................21

CAPÍTULO 2..........................................................................................................24

DO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO E DO CONTRATO DE

ADESÃO................................................................................................................24 2.1 HISTÓRICO.....................................................................................................24

2.2 CARTÃO DE CRÉDITO, CONTRATO DE ADESÃO E SUAS GENERALIDADES................................................................................................28 2.2.1 Conceito de cartão de crédito....................................................................28 2.2.2 Conceito de contrato de adesão................................................................30 2.2.3 Espécies de cartões de crédito.................................................................31 2.2.3.1 Cartões de credenciamento....................................................................31 2.2.3.2 Cartões de crédito verdadeiros ou “stricto sensu”..............................32

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2.3 RELAÇÃO JURÍDICO-FINANCEIRA NO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO: PERSONAGENS DA RELAÇÃO JURÍDICA......................................32 2.3.1 Partes do “sistema” do contrato de cartão de crédito............................32 2.3.1.1 Administradora ou entidade emissora de cartão de crédito...............32 2.3.1.2 Fornecedor ou estabelecimento filiado.................................................33 2.3.1.3 Titular do cartão de crédito.....................................................................34 2.3.2 Relação jurídico-financeira........................................................................34 2.3.2.1 Relações entre o emissor (administradora) e o titular.........................35 2.3.2.2 Relações entre o emissor (administradora) e o fornecedor................35 2.3.2.3 Relação entre o titular e o fornecedor...................................................36

2.4 CLÁUSULAS CONTRATUAIS: ANÁLISE GERAL E MODELO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO.............................................................37

CAPÍTULO 3..........................................................................................................38

CARTÕES DE CRÉDITO: ASPECTOS DESTACADOS ACERCA DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS.....................................................................................38 3.1 CLÁUSULAS ABUSIVAS: CONCEITO E GENERALIDADES.......................38 3.2 DA NULIDADE ABSOLUTA...........................................................................41

3.3 CLÁUSULAS CONTROVERTIDAS: ASPECTOS POLÊMICOS E CONTROVÉRSIAS................................................................................................42 3.3.1 Cláusula-Mandato ......................................................................................42 3.3.2 Inexeqüibilidade no sistema de cartão de crédito...................................45 3.3.3 Inoponibilidade de exceções.....................................................................47 3.3.4 Alteração unilateral do contrato................................................................49 3.3.5 Perda, furto, roubo e extravio do cartão...................................................50 3.3.6 Juros, multa e encargos contratuais........................................................52 3.3.6.1 Juros moratórios......................................................................................52 3.3.6.2 Multa moratória........................................................................................53 3.3.6.3 Multa convencional ou compensatória..................................................54 3.3.6.4 Encargos contratuais..............................................................................55

CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................57

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...............................................................61

ANEXOS................................................................................................................63

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RESUMO

A presente monografia tem como objetivo a análise das

violações inerentes aos contratos de cartão de crédito decorrentes das cláusulas

abusivas, frente às previsões da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, o

Código de Defesa do Consumidor, utilizando-se, para tanto, o método dedutivo. O

primeiro capítulo trata dos contratos no Direito Privado, classificando-os e

confrontando seus princípios com a Lei nº. 10.406 de Janeiro de 2002, o Código

Civil e Código de Defesa do Consumidor. O capítulo seguinte demonstra o

histórico do cartão de crédito, seu surgimento e evolução, bem como, traz uma

análise das cláusulas constantes em um contrato de cartão de crédito. Por fim, o

terceiro capítulo aborda uma análise específica das cláusulas abusivas,

exemplificando-as e como influenciam na relação de consumo entre as partes do

sistema de cartão de crédito e as principais ações do consumidor frente a essas

violações.

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ABSTRACT

The present monograph has as objective the analysis of

violations inherent to the credit card contracts arising from unfair terms, against

the predictions of, Law nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, the Consumer

Defense Code, using, for that, the deductive method. The first chapter deals with

contracts in private law, classifying them and confronting its principles with Law nº.

10.406 de Janeiro de 2002, the Civil Code and Consumer Defense Code. The

following chapter shows the historic of credit card, its emergence and evolution,

and brings an analysis of the clauses contained in a contract of credit card. Finally,

the third chapter boards a specific analysis of unfair terms, exemplifying them and

how can influence in the consume relationship between the parts of the system of

credit card and the main consumer actions against such violations.

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INTRODUÇÃO

Com a constante evolução do mercado de consumo e

visando uma maior segurança e rapidez nas operações financeiras, de compra e

venda como exemplo, constata-se que há um grande volume de usuários

aderindo aos contratos de cartão de crédito. Verifica-se que há o constante

crescimento de aderentes dessa forma de moeda, considerado como o fenômeno

da massificação por ser considerado como o “dinheiro do futuro” e que possa vir a

substituir o “papel moeda”. Ao comprador, denominado titular ou consumidor,

destaca-se a praticidade e segurança na hora da compra, já ao receptor,

denominado estabelecimento ou fornecedor, vincula-se a certa garantia do

recebimento, sendo fielmente vantajoso para ambos. Por detrás destas ditas

facilidades, há um contrato regimental/disciplinar que denota as formas de uso,

taxas, juros, direitos e deveres contratuais que devem ser observados com certo

cuidado.

A presente Monografia tem como objeto “CARTÕES DE

CRÉDITO: Aspectos destacados acerca das cláusulas abusivas” e vem a analisar

as violações inerentes aos contratos de cartão de crédito, como cláusulas

abusivas ou aplicadas de maneira a privilegiar certa parte do contrato, não

condizendo com os princípios relacionados a tais contratos, frente à lei nº. 8.078,

de 11 de setembro de 1990, o Código de Defesa do Consumidor.

O seu objetivo é demonstrar quais as abusividades acerca

das cláusulas abusivas inseridas nos contratos de cartões de crédito e analisar de

que forma tais cláusulas poderão vir a lesar os consumidores frente as previsões

do Código de Defesa do Consumidor.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

� Pesquisar através de análise doutrinária, no sentido de verificar o posicionamento dos diversos cientistas do direito, trazendo coincidências e/ou divergências de opiniões e da

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análise jurisprudencial, no intuito de verificar os diversos argumentos utilizados pelos magistrados ao exercerem propósito de aplicar a lei aos contratos de cartão de crédito, identificando as abusividades decorrentes de cláusulas abusivas, verificando qual posicionamento adotado frente ao Código de Defesa do Consumidor.

Para tanto, inicia-se, no Capítulo 1, frisando os contratos em

geral e seus conceitos. Apresenta-se a classificação dos contratos em geral,

quanto à natureza da obrigação, à forma, à designação, ao objeto, ao tempo de

execução e à pessoa do contratante, demonstrando cada particularidade.

Apresentam-se os princípios contratuais, relacionados aos contratos, de forma a

defini-los e definir quais podem ser configurados e estarem relacionados ao

contrato de cartão de crédito. E ainda os princípios advindos do novo Código Civil

em cominação com o Código de Defesa do Consumidor.

No Capítulo 2, enfatiza-se a figura do Contrato de Cartão de

Crédito e de Adesão. Trata-se de apresentar um histórico com o surgimento e a

evolução do cartão de crédito, propriamente dito, sua conceituação e suas

generalidades, bem como as espécies de cartão de crédito. Demonstra-se a

relação jurídico-financeira entre as partes do contrato de cartão de crédito,

relacionando os personagens desse instituto e as relações jurídico-financeiras

existentes entre eles. Analisa-se, ainda, as cláusulas contratuais constantes de

um contrato de cartão de crédito, analisando a forma de apresentação e definição.

No Capítulo 3, trata-se de conceituar cláusulas abusivas e

suas generalidades, evidenciando o rol exemplificativo demonstrado pelo art. 51

do Código de Defesa do Consumidor, com uma análise frente à redação do

referido artigo, quanto à aplicabilidade aos contratos de cartão de crédito. Faz-se

uma análise quanto a nulidade absoluta das cláusulas abusivas e finalizando com

a demonstração das cláusulas controvertidas, seus aspectos polêmicos e

controvérsias que venham a incorrer frente aos contratos de cartão de crédito.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

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sobre as violações decorrentes das cláusulas abusivas constantes no contrato de

cartão de crédito.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na

elaboração do trabalho foi utilizado o Método Dedutivo.

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CAPÍTULO 1

CONTRATOS NO DIREITO PRIVADO

O presente capítulo tratará sobre os contratos no direito privado, seus

pressupostos conceituais, suas classificações, bem como sobre os princípios

contratuais decorrentes do contrato em si e os que venham a convencionar-se de

acordo com o novo Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.

1.1 Conceito de contrato

Fran Martins1 caracteriza o contrato como o “acordo de duas

ou mais pessoas para, entre si, constituir, regular ou extinguir uma relação jurídica

de natureza patrimonial”.

Segundo Gagliano2 contrato é:

Um negócio jurídico por meio do quais as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades.

Os contratos são acordos de vontade, entre duas pessoas

em igualdade de condições, livres para contratar perante o direito e a sociedade,

passando a assumir todas as obrigações convencionadas segundo a vontade dos

contraentes. 3

Pereira4 trata do contrato como:

1 MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. ed. ver. e aum. Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 62. 2 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume IV: contratos, tomo 1: teoria geral / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho – São Paulo: Saraiva, 2006, p. 11. 3 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. Cartão de crédito. Curitiba: Juruá, 2000, p. 50 4 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Teoria Geral do Direito Civil, vol. 1, 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 02.

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Um negócio jurídico bilateral, e de conseguinte exige o consentimento; pressupõe, de outro lado, a conformidade com a ordem legal, sem o que não teria o condão de criar direitos para o agente; e, sendo ato negocial, tem por escopo aqueles objetivos específicos. Com a pacifidade da doutrina, dizemos então que o contrato é um acordo de vontades, em conformidade com a lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos. Dizendo-o mais sucintamente, podemos definir contrato como o “acordo de vontades com a finalidade de produzir efeitos jurídicos”.

Analisando o conceito de contrato, basicamente, nota-se que

contrato é um acordo entre duas ou mais pessoas com um objetivo em comum e

com intuito de produzir efeitos jurídicos, mas para isso os contratos podem ter

formas e características diferenciadas identificadas na sua classificação.

1.2 Classificação de contratos

1.2.1 Classificação

É de costume, analisando a natureza dos contratos

comerciais, classificá-los de acordo com sua forma, suas obrigações, das

vantagens que possam ou não trazer às partes, da realidade da contraprestação,

dos requisitos exigidos para a sua formação, do papel que tomam na relação

jurídica, do modo de execução, do interesse que tem a pessoa com quem se

contrata e da sua regulamentação legal ou não5.

Diniz6 ao analisar os contratos em si mesmos, sem qualquer

relação com outros, procura classificá-los quanto:

a) à natureza da obrigação entabulada, hipótese em que se

terão contratos unilaterais e bilaterais; onerosos e gratuitos; comunicativos e

aleatórios;

5 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 85. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 3º volume: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais – São Paulo: Saraiva, 2006. p. 86.

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b) à forma, caso em que poderão ser consensuais, formais e

reais;

c) à designação, dividindo-se eles em nominados e

inominados;

d) ao objeto, quando, em atenção ao conteúdo do direito

conferido pelos contratos, haverá os de alienação de bens, os de transmissão de

uso e gozo, os de prestação de serviços e os de conteúdo especial;

e) ao tempo de execução, hipótese em que surgem os

contratos de execução imediata, de execução diferida e sucessiva, e

f) à pessoa do contratante, quando se têm contratos intuitu

personae e impessoais, salientando todos os seus caracteres e a importância

dessa classificação no direito civil brasileiro.

1.2.1.1 Contratos unilaterais e bilaterais

Em se tratando o contrato uma fonte de obrigações, tais

obrigações poderão, sobrepor-se sobre apenas uma ou sobre ambas as partes.

Quando do contrato nascem obrigações apenas para uma das partes diz-se que

esse contrato é unilateral; se as obrigações forem para as duas partes, o contrato

é bilateral. 7

Expõe Orlando Gomes8:

Sob o ponto de vista de formação, negócio jurídico unilateral é o que decorre fundamentalmente da declaração da vontade de uma só pessoa (...) o contrato é unilateral se, no momento em que se forma, origina obrigação tão-somente, para uma das partes – ex uno latere. A outra parte não se obriga. O peso do contrato é todo de um lado, os efeitos são somente passivos de um lado, e somente ativos de outro.

Rizzardo9 trata que:

7 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 87. 8 GOMES, Orlando. Contratos. 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 76-77.

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Contratos bilaterais são aqueles que criam obrigações para ambas as partes e essas obrigações são recíprocas; cada uma das partes fica adstrita a uma prestação (...) Como bem se percebe, as obrigações criadas pelo contrato bilateral recaem sobre ambos os contratantes; cada um destes é ao mesmo tempo credor e devedor.

Os contratos unilaterais configuram-se quando um só dos

contratantes assumir obrigações em face do outro, de tal sorte que os efeitos são

ativos de um lado e passivos do outro, pois uma das partes não se obrigará, não

havendo, portanto, qualquer contraprestação. Já os contratos bilaterais ocorrem

quando cada um dos contraentes é simultânea e reciprocamente credor e

devedor do outro, pois produz direitos e obrigações para ambos, tendo por

característica principal o sinalagma, ou seja, a dependência recíproca de

obrigações; daí serem também denominados contratos sinalagmáticos. 10

1.2.1.2 Contratos gratuitos e onerosos

O contrato gratuito é do que resulta vantagem apenas para

uma das partes, qual é beneficiada com a gratuidade. Já o oneroso é aquele em

que há proveito para ambas as partes. 11

Venosa12 observa que:

Nos contratos gratuitos, toda a carga contratual fica por conta de um dos contratantes; o outro só pode auferir benefícios do negócio. Daí a denominação também consagrada de contratos benéficos. Inserem-se nessa categoria a doação sem encargo, o comodato, o mútuo sem pagamento de juros, o depósito e o mandato gratuitos. Há uma liberalidade que está ínsita ao contrato, com a redução do patrimônio de uma das partes, em benefício da outra, cujo patrimônio se enriquece. Não deixa de ser gratuito o contrato que circunstancialmente impõe deveres à parte beneficiada, como o dever do donatário em não incorrer em ingratidão. Essa espécie de obrigação, que mais tem cunho de dever moral, não tem o caráter de uma contraprestação (...). A

9 RIZZARDO, Arnaldo, Contratos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 68. 10 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 87. 11 MARTINS, Fran. op. cit., p. 88. 12 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos contratos. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, v. II, p. 401.

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mesma situação ocorre no mandato gratuito, quando o mandante deve reembolsar o mandatário de despesas para o desempenho do mandato. Essa obrigação não retira do mandato seu caráter gratuito, o que ocorreria caso as partes tivessem estipulado uma retribuição por seu desempenho. Nesse último caso, o espírito que imbuiu as partes ao contratar foi oneroso.

Por sua vez, onerosos classificam-se os contratos quando

as partes assumem reciprocamente direitos e obrigações. Mais claramente,

constituem aqueles os quais as partes transferem certos direitos uma à outra,

mediante determinada compensação. 13

Maria Helena Diniz leciona que os contratos a título oneroso

são aqueles que trazem vantagens para ambos os contraentes, pois estes sofrem

um sacrifício patrimonial, correspondente a um proveito almejado. Os contratos

benéficos ou a título gratuito são aqueles que oneram somente uma das partes,

proporcionando à outra uma vantagem, sem qualquer contraprestação. 14

1.2.1.3 Contratos comutativos e aleatórios

Os comutativos são os contratos em que as prestações são

certas e determinadas, já os aleatórios são os contratos em que uma prestação,

pode deixar de existir em virtude de um acontecimento incerto e futuro. 15

Como ensina Gomes16:

nos contratos aleatórios, há incerteza para as duas partes sobre se a vantagem esperada será proporcional ao sacrifício. Os contratos aleatórios expõem os contraentes à alternativa de ganho ou perda. O equivalente, como reza o Código Civil francês, consiste ‘dans la chance de gain ou de pert por chacune dês parties’. Aleatório é, em suma, o contrato em que, seguramente, é incerto o direito à prestação, como no jogo, a duração desta, como na renda vitalícia, ou a individualização da parte que vai supri-la, como na aposta(...).

13 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p 74. 14 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 89-90. 15 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 88. 16 GOMES, Orlando. ob. cit., p. 74.

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Rizzardo17 dá a definição de contratos comutativos e

aleatórios:

Comutativo é o contrato quando os contratantes celebram uma relação em que recebem a vantagem e prestam a obrigação, consistem em coisa certa e determinada, embora sem escapar aos riscos relativos à mesma, nem à oscilação sobre o seu valor.

Aleatório é o contrato no qual uma ou ambas as prestações apresentam-se incertas, porquanto a sua quantidade ou extensão fica na dependência de um fato futuro e imprevisível, o que torna viável e venha a ocorrer uma perda, ou um lucro para uma das partes.

Será comutativo o contrato a título oneroso e bilateral em

que a extensão das prestações de ambas as partes, conhecida desde o momento

da formação do vínculo contratual, é certa, determinada e definitiva, apresentando

uma relativa equivalência de valores que, por sua vez, são insuscetíveis de

variação durante o implemento do contrato. Já o aleatório é aquele em que a

prestação de uma ou de ambas as partes dependeria de um risco futuro e incerto,

não se podendo antecipar o seu montante. 18

1.2.1.4 Contratos consensuais, formais e reais

No tocante aos contratos consensuais ou não-solenes e aos

contratos reais, Martins19 explica que:

Entende-se por contratos consensuais aqueles que se tornam perfeitos pelo simples consentimento das partes.

Existem certos contratos que, para nascerem, além do consentimento exigem que uma coisa seja entregue por uma parte à outra; a esses contratos damos o nome de reais (...).

Quanto à caracterização do contrato real, pela entrega de

coisa ou objeto, Rizzardo explica que a vontade é impotente para formar o

17 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p 76. 18 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 92. 19 MARTINS, Fran. op. cit., p. 86.

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contrato, além do consentimento das partes, ou do acordo de vontades, é

necessária a entrega da coisa, pois, sem a entrega, tem-se apenas uma

promessa de contrato real.20

Venosa21 sobre a importância da classificação dos contratos

consensuais ou reais, observa que:

Parte da doutrina tacha, modernamente, de supérflua essa distinção. No entanto é importante distingui-los para determinar o exato momento da formação do contrato. No direito romano, a classificação importava mais fortemente, porque as obrigações em geral eram cercadas de formalidades, e a entrega da coisa era uma delas para os contratos mencionados. De qualquer forma, a classificação serve para explicar o mecanismo de certos contratos. Não se anula o principio geral de que o consentimento é bastante para aperfeiçoar o contrato. Alguns contratos, porém, exigem algo mais, que é a entrega da coisa, sob pena de desnaturarmos a relação contratual, fora do hermetismo da classificação.

Já nos contratos ditos consensuais, basta exclusivamente o acordo de vontade, como ocorre, por exemplo, na locação, compra e venda e mandato.

Os contratos formais ou solenes consistem naqueles para os

quais há previsão legal, dando-lhes forma especial e existência, de tal modo que,

se as formalidades legais não forem cumpridas, estes não terão validade. Desse

modo, além dos elementos gerais do negócio jurídico, dependerão, para se

efetivarem, de forma especial. 22

1.2.1.5 Contratos nominados e inominados

Dizem-se nominados ou típicos os contratos para os quais

há regras jurídicas próprias e denominação estipulada em lei; inominados ou

atípicos são os que ainda não foram regulados em lei. 23

20 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p 79. 21 VENOSA, Silvio de Salvo. ob. cit., p. 413-4. 22 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 101. 23 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 90.

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Rizzardo24 faz a distinção entre contratos nominados e

inominados:

Oriunda do direito romano, a distinção atual se refere aos contratos que possuem denominação e aos que não possuem nomen júris. Como nominados se classificam os contratos previstos e regulados na lei. Inominados consideram-se aqueles que não se enquadram numa figura típica prevista pelo legislador. Ou seja, os primeiros estão expressamente previstos na lei, que os regula através de normas, ao passo que os segundos se firmaram e se impõem pelo costume.

Os contratos nominados ou típicos abrangem, como leciona

Antunes Varela, as espécies contratuais que têm nomem iuris e servem de base à

fixação dos esquemas, modelos ou tipos de regulamentação específica da lei. Já

os contratos inominados, ou seja, atípicos, afastam-se dos modelos legais, pois

não são disciplinados ou regulados expressamente pelo Código Civil ou por lei

extravagante, porém são permitidos juridicamente, desde que não contrariem a lei

e os bons costumes, ante ao princípio da autonomia da vontade e a doutrina (...),

em que se desenvolvem as relações contratuais. 25

1.2.1.6 Contratos Instantâneos e de execução continuada

No entendimento de Martins26:

Contratos instantâneos são aqueles em que as prestações podem se realizar em um só momento, seja esse imediatamente após a conclusão do acordo, seja em um período posterior. De execução continuada, também chamados de duração, são aqueles em que a contraprestação é feita de modo continuado.

Gagliano27 explica que:

Por contratos instantâneos, compreendam-se as relações jurídicas contratuais cujos efeitos são produzidos de uma só vez. É o caso, por exemplo, da compra e venda a vista de bens móveis, em que o contrato se consuma com a tradição da coisa.

24 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p 77. 25 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 103. 26 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 89. 27 GAGLIANO, Pablo Stolze. ob. cit., p. 134-135.

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Já os contratos de duração, também chamados de contratos de execução continuada, são aqueles que se cumprem por meio de atos reiterados, como, por exemplo, o contrato de prestação de serviços, compra e venda a prazo e contrato de emprego.

Os contratos de execução continuada são os que se

protraem no tempo, caracterizando-se pela prática ou abstenção de atos

reiterados, solvendo-se num espaço mais ou menos longo de tempo. 28

1.2.1.7 Intuitu personae ou pessoais, e impessoais

Em alguns contratos, as partes dão o consentimento tendo

em vista a pessoa com quem contratam, denominando-se contratos intuitu

personae ou pessoais; em outros, é indiferente quem seja essa pessoa, sendo

estes os contratos impessoais. 29

Quanto a importância da pessoa do contratante para a

celebração e produção de efeitos do contrato, Gagliano30 leciona que:

Os contratos pessoais, também chamados de personalíssimos, são os realizados intuitu personae, ou seja, celebrados em função da pessoa do contratante, que tem influencia decisiva para o consentimento do outro, para quem interessa que a prestação seja cumprida por ele próprio, pelas suas características particulares (habilidade, experiência, técnica, idoneidade etc.). Nessas circunstâncias, é razoável se afirmar, inclusive, que a pessoa do contratante torna-se um elemento causal do contrato.

Já os contratos impessoais são aqueles em que somente interessa o resultado da atividade contratada, independentemente de quem seja a pessoa que irá realizá-la. Assim, se contrato uma sociedade empresária para reformar um prédio, pouco me importa se o pedreiro responsável será o empregado João ou o empregado José, desde que a prestação seja cumprida da forma como pactuada.

28 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 105. 29 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 89. 30 GAGLIANO, Pablo Stolze. ob. cit., p. 130.

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Os contratos pessoais são aqueles em que a pessoa do

contraente é considerada pelo outro como elemento determinante de sua

conclusão. A pessoa do contratante, nesses contratos, tem influencia decisiva no

consentimento dou outro, quem tem interesse em que as obrigações contratuais

sejam por ele cumpridas, por sua habilidade particular, competência, idoneidade,

etc. Já os contratos impessoais são aqueles em que a pessoa do contratante é

juridicamente indiferente, não importando quem execute a obrigação, pois o único

objetivo é que a prestação seja cumprida. 31

1.2.1.8 Principais e acessórios

Chamam-se principais, por serem autônomos, os contratos

cuja existência independe da existência de outros; acessórios, pelo contrário, são

contratos que ficam subordinados a existência de outro(s), não tendo, assim, vida

própria. 32

Rizzardo33 explica:

Como se infere do nomen, principais denominam-se os contratos que têm vida por si mesmos, não dependendo de outros. Constituem figuras típicas consagradas por leis, e se expressam soberanamente em relação aos outros. É o caso da locação, da compra e venda e da empreitada.

Acessórios nomeiam-se aqueles subordinados e dependentes da outra espécie, os principais, sem os quais não subsistem. A fiança é um exemplo evidente, pois a sua função e garantir o cumprimento da obrigação assumida no contrato principal, como na hipótese da locação. Destacam-se outros, como o penhor, a caução, a anticrese, a hipoteca e o aval.

Os contratos principais são os que existem por si, exercendo

sua função e finalidade independentemente de outro, já os contratos acessórios

31 DINIZ, Maria Helena, citando Orlando Gomes. ob. cit., p. 107. 32 MARTINS, Fran. ob. cit., p. 89. 33 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p 85.

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são aqueles cuja existência jurídica supõe a do principal, pois visam assegurar a

sua execução. 34

A classificação dos contratos, destacando suas formas,

exigências e objetos, ou seja, evidenciando suas características, traz às partes

uma maior segurança ante a elaboração do contrato de seu interesse, sela ele

qual for, pois desde que sejam seguidas tais características, estas vêm a tornar o

contrato válido e hábil a produzir os efeitos desejados. Após a análise das

classificações dos contratos, com o intuito de identificar as características a serem

seguidas, faz-se necessário um embasamento nos princípios fundamentais do

direito contratual, pois, estes vêm a dar a tutela jurídica necessária às partes, para

que se efetivem os efeitos desejados.

1.3 Princípios fundamentais do direito contratual

Neste item serão abordados os princípios fundamentais do

direito contratual, com suas definições e como se aplicam aos contratos.

1.3.1 Consensualismo

Lisboa35 traça seu entendimento a respeito do princípio do

consensualismo:

Entre os variados reflexos que a massificação negocial gerou sobre a sociedade, está o da impossibilidade de perfazimento de todas as avenças, mediante simples manifestação convergente das vontades das partes. (...) Para a garantia do conteúdo dos negócios jurídicos celebrados, diante da excessiva contratação, os acordos passaram a ser impressos, em boa parte das vezes por predisposição de uma das partes (...). A liberdade, que já não era a rigor no Direito Clássico, atualmente é considerada cada vês mais como liberdade responsável, para que o seu exercício não venha a sacrificar direitos alheios, em especial os de natureza fundamental.

34 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 108. 35 LISBOA, Roberto Senise. Contratos Difusos e Coletivos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 79.

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Segundo o princípio do consensualismo, o simples acordo

de duas ou mais vontades basta para gerar o contrato válido, pois, não se exige,

em regra, qualquer forma especial para a formação do vínculo contratual. Embora

alguns contratos, por serem solenes, tenham sua validez condicionada à

observância de certas formalidades estabelecidas em lei, a maioria deles á

consensual, já que o mero consentimento tem o condão de criá-los, sendo

suficiente para sua perfeição e validade. 36

1.3.2 Autonomia da vontade

A autonomia da vontade vem ceder lugar ao principio da

proteção ao hipossuficiente. Deparando-se o economicamente mais fraco, diante

da possibilidade de contratar, junto a apenas uma determinada pessoa,

monopolizadora de algum produto ou serviço. Podendo haver, ainda, a

predisposição de cláusulas e até a impossibilidade de obter o produto ou o serviço

em vista da quantidade ou qualidade desejada. 37

Diniz38 explica que:

O princípio da autonomia da vontade, no qual se funda a liberdade contratual dos contratantes, consistindo no poder de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Esse poder de auto-regulamentação dos interesses das partes contratantes, condensado no princípio da autonomia da vontade, envolve liberdade contratual, que é a determinação do conteúdo da avença e a de criação de contratos atípicos, e liberdade de contratar, alusiva à de celebrar ou não o contrato e à de escolher o outro contratante.

1.3.3 Igualdade

Lisboa39 leciona a respeito, trazendo que a igualdade

metafísica da teoria clássica não se mostrou hábil para contornar uma realidade:

a da disparidade de condições econômicas dos contratantes, nos âmbitos 36 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 39. 37 LISBOA, Roberto Senise. ob. cit., p. 80. 38 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 33. 39 LISBOA, Roberto Senise. ob. cit., p. 81.

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externos e internos do negócio realizado. Além disso, há casos em que as partes

possuem o poder unilateral de dispor da avenca, muito embora se encontrem em

equilíbrio de direitos e obrigações, no que concerne ao seu objeto. É o que se dá,

por exemplo, nos contratos administrativos, onde a Administração Publica

contraente tem a possibilidade de suspender unilateralmente os efeitos internos

do contrato, podendo até vir a denunciá-lo (resilição unilateral); ou nos contratos

de consumo, nos quais o adquirente do produto pode vir a se retratar da compra

efetivada, no prazo de 07 (sete) dias da assinatura do instrumento ou do

recebimento da coisa (Lei 8.078/90, Art. 4940 Código do Consumidor).

1.3.4 Obrigatoriedade

Diniz41 trata que:

O princípio da obrigatoriedade, pelo qual as estipulações feitas no contrato deverão ser fielmente cumpridas (pacta sunt servanda), sob pena de execução patrimonial contra o inadimplente. Isto é assim porque o contrato, uma vez concluído livremente, incorpora-se ao ordenamento jurídico, constituindo uma verdadeira norma de direito, autorizando portanto, o contratante a pedir a intervenção estatal para assegurar a execução da obrigação porventura não cumprida segundo a vontade que a constituiu.

Pinto42 trata que o princípio da obrigatoriedade está

inteiramente vinculado ao contrato e que esta vinculação não significa uma

impossibilidade de um comportamento material contrário aos vínculos emergentes

do contrato. Significa, apenas, que cada uma das partes deve comportar-se de

acordo com a eficácia do contrato em que, se o não fizer, infringe os deveres

contratuais.

40 Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. 41 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 39 42 PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. Coimbra, 1996, p. 93.

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1.3.5 Boa-fé

Cláudia Lima Marques43, explica que como ensinam os

doutrinadores europeus, fides significa hábito de firmeza e de coerência de quem

sabe honrar os compromissos assumidos, significa, mais além do compromisso

expresso, a “fidelidade” e coerência no cumprimento da expectativa alheia

independentemente da palavra que haja sido dada, ou do acordo que tenha sido

concluído; representando, sob este aspecto, a atitude de lealdade, de fidelidade,

de cuidado que se costuma observar e que é legitimamente esperada nas

relações entre homens honrados, no respeitoso cumprimento das expectativas

reciprocamente confiadas. É o compromisso expresso ou implícito de “fidelidade”

e “cooperação” nas relações contratuais, é uma visão mais ampla, menos textual

do vínculo, é a concepção leal do vínculo, das expectativas que desperta

(confiança).

Diniz44 explana que:

O princípio da boa-fé está intimamente ligado não só à interpretação do contrato, pois, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida na declaração de vontade das partes, mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma vez que as partes deverão agir com lealdade, honestidade, honradez, probidade, denodo e confiança recíprocos, isto é, proceder com boa fé, esclarecendo os fatos e o conteúdo das cláusulas, procurando o equilíbrio nas prestações, evitando o enriquecimento indevido, não divulgando informações sigilosas etc.

Nota-se que os princípios fundamentais do direito contratual,

além de tornarem-se requisitos essenciais à elaboração de qualquer contrato

servem de estrutura basilar para a consolidação e validação dos mesmos. Com

isso, notadamente, além dos princípios fundamentais os princípios contratuais de

acordo com o novo Código Civil Brasileiro e Código de Defesa do Consumidor,

vêm a solidificar ainda mais a segurança contratual para ambas as partes.

43 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 106. 44 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 43.

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1.4 Princípios contratuais de acordo com o Novo Código Civil e o Código de

Defesa do Consumidor

1.4.1 Boa-fé objetiva

O código de Defesa do Consumidor veio a positivar o

princípio da boa-fé no sentido objetivo, consagrando-o como princípio explícito

orientador de todo o sistema de defesa do consumidor no artigo 4º, inciso III45, e

também como cláusula geral de conduta no artigo 51, inciso IV46, com principal

finalidade de controlar a abusividade nas relações contratuais. 47

Figueiredo48 trata que:

A boa-fé objetiva permeia as relações contratuais desde as negociações preliminares, bem como durante sua formação, execução e conclusão do negócio jurídico, impondo às partes um comportamento leal e digno, sob pena da revisão e resolução do contrato, haja vista a incidência da onerosidade excessiva, a proteção contra cláusulas abusivas, a lesão contratual, em especial nas relações entre titular (consumidor) e emissora (administradora) de cartões de crédito, ante o reconhecimento da doutrina e da jurisprudência como relações de consumo, incidindo a menção expressa do art. 4º, III e o art. 51, IV, ambos do CDC, ou seja, o microssistema das relações de consumo assegura a aplicabilidade do princípio geral da boa-fé.

O princípio da boa-fé tem como função viabilizar os ditames

constitucionais da ordem econômica49, compatibilizando interesses

45 Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores; 46 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; 47 OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Contratos bancários eo código de defesa do consumidor: análise da decisão do Supremo Tribunal Federal na adin nº 2.591. São Paulo: Lex Editora, 2006. p. 85. 48 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. ob. cit., p. 64.

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aparentemente contraditórios, como a proteção do consumidor e o

desenvolvimento econômico e tecnológico. 50

1.4.2 Dever de informar e Transparência

Figueiredo51, explica que:

O dever de informar assegura ao consumidor o direito de informação clara e verdadeira. O direito e dever de está consubstanciado na boa-fé, objetivando garantir a igualdade entre o titular (consumidor) e a administradora (fornecedor) de cartões de crédito, bem como assegurar informação precisa acerca dos objetos dos contratos e da publicidade não enganosa, com carga vinculante, que garanta ao aderente ao sistema de cartão de crédito uma informação geral e exata sobre as condições gerais da avença.

O dever de informar é princípio fundamental no Código de

Defesa do Consumidor, elencado no art. 6º, inciso II52, trata-se de um dever

exigido mesmo antes do início de qualquer relação, passando, a relacionar-se

diretamente com o princípio da transparência, estampado no caput do art. 4º53,

49 APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO - CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO - REVISÃO - POSSIBILIDADE - INCIDÊNCIA DO CDC, ART. 6º, V - INEXISTÊNCIA DE PACTO EXPRESSO ACERCA DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS - LIMITAÇÃO EM 12% AO ANO - MANTENÇA - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS MENSAL AFASTADA - INCIDÊNCIA EM PERÍODO ANUAL MANTIDA SOB PENA DE REFORMACIO IN PEJUS - REPETIÇÃO DE INDÉBITO DEVIDA INDEPENDENTE DE PROVA DE ERRO - SUMULA N. 322. DO STJ - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. A revisão das cláusulas contratuais não constitui ofensa ao ato jurídico perfeito, e, também, não fere o princípio da autonomia privada em razão deste já se encontrar mitigado pela consagração da boa - fé objetiva e da função social dos contratos (...). (TJ/SC - Acórdão: Apelação Cível 2006.017096-5. Relator: Anselmo Cerello. Data da Decisão: 15/03/2007) 50 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 2 ed. ver., modif. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p 129. 51 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. ob. cit., p. 66. . 52 Art. 6º São direitos básicos do consumidor: II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; 53 Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo (...).

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qual traz a obrigação de o fornecedor dar ao consumidor a oportunidade de tomar

conhecimento do conteúdo do contrato que está sendo apresentado. 54

Marques55 destaca:

A idéia central é possibilitar uma aproximação e uma relação contratual mais sincera e menos danosa entre consumidor e fornecedor. Transparência significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e consumidor, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial dos contratos de consumo.

Assim, da soma dos princípios, compostos de dois deveres,

o da informação e o da transparência, fica estabelecida a obrigação de o

fornecedor dar cabal informação sobre seus produtos e serviços oferecidos e

colocados no mercado, bem como das cláusulas contratuais por ele estipuladas.56

1.4.3 Relatividade dos efeitos

Lisboa57, a respeito do princípio da relatividade dos efeitos,

enfatiza:

Repousava o princípio da relatividade na noção metafísica de que o contrato obriga apenas as partes e seus efeitos a elas se limitam na autonomia da vontade, razão pela qual não havia motivo para que os outros viessem a sofrer conseqüências benéficas ou maléficas do pactuado. (...) Não se nega a necessidade de manutenção do princípio geral da relatividade dos efeitos. Porém, é imprescindível a aceitação de uma ruptura cada vez mais acentuada a ele, com exceções que possibilitem pela aferição da situação fática, a oposição de terceiros interessados fundada no princípio da oponibilidade.

O princípio da relatividade dos efeitos vincula-se

exclusivamente as partes que no contrato intervieram. O contrato somente produz

54 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. ob. cit., p. 129. 55 MARQUES, Cláudia Lima. ob. cit., p. 286. 56 NUNES, Luiz Antonio Rizzato. ob. cit., p. 130. 57 LISBOA, Roberto Senise. ob. cit., p. 110.

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efeitos entre os contratantes58. O ato negocial deriva de acordo de vontade das

partes, sendo lógico que apenas as vincule, não tendo eficácia em relação a

terceiros. Assim, ninguém se submeterá a uma relação contratual, a não ser que

a lei o imponha ou a própria pessoa o queira. 59

1.4.4 Onerosidade excessiva

O Novo Código Civil Brasileiro consagra em seus artigos

478, 479 e art. 480 a questão da onerosidade excessiva:

Art. 478 - Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude dos acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.

Art. 479 – a resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.

Art. 480 – se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

Figueiredo60 explana sobre a onerosidade excessiva:

Constitui direito básico do consumidor a “modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em razões de fatos

58 DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. RÉ CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS DE TELEFONIA. EXISTÊNCIA DE CONTRATO DE COMODATO DE LINHA TELEFÔNICA ENTRE A AUTORA E TERCEIRO EM QUE RESTOU ESTIPULADA A OBRIGAÇÃO DO ÚLTIMO PELO PAGAMENTO DAS FATURAS. RÉ QUE PASSA A EMITIR AS FATURAS EM NOME DO COMODATÁRIO. ANUÊNCIA DA RÉ QUANTO AO COMODATO. INSCRIÇÃO DO NOME DA AUTORA PELO NÃO PAGAMENTO DE UMA DAS FATURAS. ILEGALIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. DESNECESSIDADE DE PROVA. O princípio da relatividade dos contratos tem por escopo limitar a eficácia do ato negocial às partes diretamente envolvidas. Todavia, se terceiro anui com a avença e sujeita-se livremente aos seus efeitos, não pode invocar referido princípio para se escusar da obrigação de indenizar um dos contratantes, dentro do limite da obrigação espontaneamente assumida. (...) (TJ/SC - Acórdão: Apelação cível 2005.032776-7. Relator: Jorge Henrique Schaefer Martins. Data da Decisão: 31/10/2005.) 59 DINIZ, Maria Helena. ob. cit., p. 41-42. 60 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. ob. cit., p. 75.

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supervenientes que as tornem excessivamente onerosas” (CDC, art. 6º, V).

Esse princípio modifica inteiramente o sistema contratual do direito privado tradicional, mitigando o dogma da intangibilidade do conteúdo do contrato, consubstanciado no antigo brocardo pacta sunt servanda. O direito básico do consumidor, reconhecido no art. 6º, V, do Código, não é o de desonerar-se da prestação por meio da resolução do contrato, mas o de modificar a cláusula que estabeleça prestação desproporcional, mantendo-se íntegro o contrato que se encontra em execução ou de obter a revisão do contrato se sobrevierem fatos que tornem as prestações excessivamente onerosas ao consumidor.

O juiz reconhecendo que houve cláusula estabelecendo prestação desproporcional ao consumidor, ou que houve fatos supervenientes que tornaram as prestações excessivamente onerosas para o consumidor, deverá solicitar das partes a composição no sentido de modificar a cláusula ou rever efetivamente o contrato. Caso não haja acordo, na sentença deverá o magistrado, atendendo aos princípios da boa-fé, da equidade e do equilíbrio que devem presidir nas relações de consumo, estipular a nova cláusula ou as novas bases do contrato revisto judicialmente. Emitirá sentença determinativa, de conteúdo constitutivo-integrativo e mandamental, vale dizer, exercendo verdadeira atividade criadora, completando ou mudando alguns elementos da relação jurídica constituída.

Assim, a onerosidade excessiva, oriunda de evento

extraordinário e imprevisível, que dificulta extremamente o adimplemento da

obrigação de uma das partes61, é motivo de resolução contratual, por se

61 APELAÇÃO CÍVEL - REVISÃO CONTRATUAL - LEASING - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR -APLICABILIDADE - EXEGESE DO ART. 3º, § 2º, DO CDC - INDEXAÇÃO PELO DÓLAR NORTE-AMERICANO - MODIFICAÇÃO ABRUPTA NA POLÍTICA CAMBIAL DO PAÍS - OSCILAÇÃO IMPREVISTA E OCORRÊNCIA DE ONEROSIDADE EXCESSIVA - RUPTURA DA BASE NEGOCIAL - INCIDÊNCIA DO ART. 6º, VI DO CDC - INEXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE PROVA DE CAPTAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS NO MERCADO EXTERNO - POSTULAÇÃO ACATADA - INSUBSISTÊNCIA DO DECISUM - RECLAMO RECURSAL PROVIDO. - Inserindo-se o contrato de leasing dentre os contratos de consumo, uma vez que sua natureza mista é preponderantemente financeira (a arrendadora não se limita a locar a coisa, mas a adquire e financia ao arrendatário) não encontra meios de escapar do enquadramento do § 2º do art. 3º do CDC. - "A abrupta elevação da cotação do dólar norte-americano, verificada inesperadamente no limiar do ano de 1999, afetou a base econômico-financeira dos contratos de prestação continuada que, a exemplo dos de leasing financeiro, estavam indexados àquela moeda

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considerar subentendida a cláusula rebus sic stantibus, que corresponde à

fórmula de que, nos contratos de trato sucessivo ou a termo, o vínculo obrigatório

ficará subordinado, a todo tempo, ao estado de fato vigente à época de sua

estipulação. 62

Analisando a conceituação dos contratos em geral, suas

classificações, formas e os princípios que os regem, tem-se uma noção geral

frente aos contratos em geral, para que seja aprofundada uma análise em um tipo

de contrato específico, como o contrato de cartão de crédito.

O capítulo a seguir, trata do contrato de cartão de crédito, já

de forma mais específica, trazendo um breve histórico acerca do surgimento e

evolução do cartão de crédito, a conceituação de cartão de crédito e contrato de

cartão de crédito, demonstrando quais os tipos de cartão de crédito, as partes

integrantes de um contrato de cartão de crédito e as relações jurídicas aos quais

se relacionam.

estrangeira. Tal circunstância, podendo ser considerada excepcional, acarretou excessiva onerosidade aos devedores, autorizando a modificação da respectiva cláusula, para adoção do indexador oficial: o INPC". (Apelação Cível n. 2002.014519-5, de São José. Relator: Des. Trindade dos Santos). 62 OLIVEIRA, Celso Marcelo de. ob. cit., p. 145-146.

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CAPÍTULO 2

DO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO E DO CONTRATO DE ADESÃO

Neste capítulo será abordado um histórico demonstrando o surgimento e a

evolução do cartão de crédito, seu conceito, suas generalidades, suas espécies, a

relação jurídico-financeira decorrente do contrato de cartão de crédito e de que

forma essa relação influencia as partes do sistema de cartão de crédito e

finalmente uma análise geral das cláusulas contratuais de um contrato de cartão

de crédito.

2.1 Histórico

No Brasil, o sistema de cartão de crédito pioneiro foi o do

Diners Club, em meados dos anos 50. O cartão de crédito teve seu surgimento

nos paises europeus, por volta de 1914 e a partir de 1930, nos Estados Unidos.

Surgiu nessa época, dos cartões na Franca, na Alemanha e na Inglaterra,

utilizados por empresas hoteleiras, para o uso exclusivo de seus clientes fixos e

selecionados. O sistema funcionava da seguinte forma: entregava-se aos clientes

uma credencial com a qual podiam debitar os gastos de hospedagem e

alimentação. Periodicamente, o hotel apresentava as faturas correspondentes e

eram pagas à vista. 63

Como se depreende, nesse processo só intervinha duas

partes: o hotel que concedia o crédito e o cliente que o utilizava por um prazo fixo.

O crédito era restrito a grupo exclusivo de pessoas, e o hotel corria com todos os

riscos da insolvência. A essas relações aplicavam-se as disposições de Direito

Civil relativas aos contratos de prestação de serviços. 64

63 CASTRO, Moema Augusta Soares de. Cartão de crédito: a monética, o cartão e o documento eletrônico. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 7. 64 CASTRO, Moema Augusta Soares de. op. cit., p. 07.

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Para Castro:

O sistema estendeu-se a grandes armazéns e cadeias de estações de serviços. Daí a origem do sistema de crédito que os estabelecimentos comerciais outorgavam a seus clientes, e ao qual se aplicavam as normas sobre os contratos de mútuo oneroso, compra e venda, e prestação de serviços a prazo, com o detalhe de que o pagamento (obrigação do cliente) era efetuado mediante a apresentação de credencial conferida pelo estabelecimento e assinatura na fatura que amparava a compra.

Nessa primeira etapa, eram evidentes as vantagens

apresentadas pelos cartões de crédito, a saber:

� seu uso evitava a necessidade de se portarem grandes quantias de dinheiro, necessárias para realização de compras ou solicitação de serviços;

� constituíam, por si só, elemento de prestígio a demonstrar status;

� e davam certa segurança ao beneficiário e garantia ao estabelecimento.65

Tal sistema funcionou até a Segunda Grande Guerra,

desaparecendo dos países europeus, por causa das restrições governamentais

adotadas para a concessão de crédito e para os gastos de consumo. Já em 1945,

terminada a guerra, os estabelecimentos comerciais americanos o colocaram

novamente em circulação. Em 1947, as linhas aéreas e as ferrovias deram início

à emissão de seus próprios cartões, com iguais características. Entretanto, só em

1949 é que se dá um passo definitivo e acelera-se o desenvolvimento dos cartões

de crédito, ao aparecer o Diners Club como entidade financeira dos cartões

emitidos pelos restaurantes dos Estados Unidos. 66

Historicamente, Figueiredo67, demonstra que:

65 CASTRO, Moema Augusta Soares de. Cartão de crédito: a monética, o cartão e o documento eletrônico. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 7-8. 66 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999, ob. cit, p. 7-8. 67 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. Cartão de crédito. Curitiba: Juruá, 2000 - Histórico extraído do site ABECS – Associação Brasileira de Cartões de Crédito e Serviços – www.abecs.org.br.

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No ano de 1950, três executivos americanos saíram para jantar. Entre uma conversa e outra terminaram. A conta é apresentada. Aí é que os amigos perceberam que estavam sem dinheiro ou talão de cheques. Após uma pequena discussão, o dono do restaurante concordou em “pendurar” a conta, mediante a colocação da assinatura na nota de despesas.

Já no entendimento de Lacerda Filho68:

De acordo com a tradição, mas sem que se tenha qualquer prova concreta disso, o cartão de crédito teria nascido quando milionário norte-americano Alfred Bloomingdale, proprietário da cadeia de lojas conhecidas pelo seu sobrenome, ao jantar com os amigos Frank Mac Namara e Ralph Schneider, a quem convidara, viu-se surpreendido por haver esquecido o seu talão de cheque e não dispor de moeda sonante, que pessoas de seu nível abominam carregar. Como fosse pessoa muito conhecida, não teve dificuldades em “pendurar” a nota de despesas, mas iniciou, naquela mesma noite, uma acalorada discussão com os amigos acerca das vantagens que o público de um modo geral poderia ter se pudesse desfrutar de “gentilezas” correlatas àquela que lhe havia sido dispensada, por parte dos donos do restaurante. Imaginou o interesse que teria, então, a criação de um documento de identificação de crédito que, comprovando a idoneidade do portador, garantisse simultaneamente a sua solvabilidade. A concepção inicial do sistema, portanto, previa a utilização do cartão identificador apenas em restaurantes, daí se originando o nome Diners Club, com que passou a ser conhecida a sociedade fundada pelos três.

Por acaso ou não, quanto à origem do Diners Club, é

importante destacar o surgimento da entidade financeira, onde o Diners servia de

intermediário entre compradores e vendedores, assumindo a responsabilidade

pelo pagamento das despesas feitas por aqueles69.

Castro70, a respeito, leciona:

Não obstante o surgimento do terceiro agente, a instituição financeira, foi conservado as antigas relações referentes à seleção

68 LACERDA FILHO, Fausto Pereira. Cartões de Crédito. Curitiba: Juruá Editora, p. 19. 69 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. cit, p. 9. 70 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. cit, p. 9.

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criteriosa que se fazia entre os usuários. A iniciativa foi copiada por outras empresas, o que deu origem à American Express e à Carte Blanche.

Somente em 1951 apareceram os primeiros cartões de

crédito expedidos por bancos, sendo primeiro, o Franklin National Bank, de Nova

Iorque. Durante os anos de 1953 e 1954, quase cem pequenos bancos começam

a operar com o sistema, interrompido logo depois, porque os investimentos gastos

com a implantação não tiveram o retorno esperado. Em 1958 e 1959, dois

grandes bancos – Bank of América e Chase Manhattan Bank, convencidos do

sucesso do sistema, introduziram seus planos de cartão no mercado americano, e

foram seguidos por numerosos outros estabelecimentos financeiros. Em 1962, o

Chase Manhattan vendeu seu sistema de cartão de crédito devido à

impossibilidade de poder gerar um volume de suficiente tamanho para retorno

econômico. O Bank of América persistiu no seu intento e hoje em dia é um dos

maiores de todos os sistemas de cartões existentes no mundo. Em 1965,

consolidou-se o sistema e estendeu-se a tal ponto que ultrapassou a fronteira dos

Estados Unidos, e continua a prosseguir numa trajetória cada vez maior.71

Ainda, Castro72 ensina que:

Em 1958, o Bank of América lançava o Bankamericard, o primeiro cartão bancário dos Estados Unidos. Experimentado durante todo o ano de 1959, na Califórnia, ele foi generalizado ao conjunto dos Estados Unidos, em 1965. Desse programa de pagamento por cartão surgiu, alguns anos mais tarde, a rede Ibanco transformada em seguida na Visa International, associação interbancária para a gestão do conjunto de transações deste tipo. Em 1968, sob os auspícios dos bancos Continental Illinois e Citibank, foi criada uma outra organização interbancária, que acabou se transformando finalmente na Mastercard, em 1979.

No Brasil, o sistema de cartão de crédito pioneiro foi o do

Diners Club, em meados dos anos 50, e era do tipo não bancário, emitido em

associação com parte da família Klabin, durante mais de uma década.

71 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. cit, p. 10. 72 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. ci, p. 11, 18-19.

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Posteriormente, seu título foi negociado com a Credicard S/A – Administradora de

Cartões de Crédito, que explora, também, o cartão que leva seu nome, em

associação com o gigante americano Mastercard. Desde o surgimento do Diners,

apareceram outros cartões, tais como o Cartão Elo, atualmente Bradesco,

associado ao sistema Bankamericard, o American Express, que atua como

produto altamente elitizado, e o Ourocard, do Banco do Brasil, também associado

ao sistema Visa, além daqueles chamados cartões de crédito de credenciamento,

de larga utilização.

Em 1988, totalizavam 3,5 milhões de cartões em circulação

no País, com a liderança do Bradesco, detentor de 1,5 milhão de usuários,

seguido pelo 1,25 milhão do Credicard Mastercard, pelos 110.000 sócios do

Diners, pelos 330.000 associados do American Express, pelos 240.000 titulares

do ex-Nacional, hoje Unibanco, e pelos 50.000 usuários do Ourocard.

Nesses últimos dez anos, houve grande expansão do

segmento. Somente a Credicard, em 1990, detinha 3,8 milhões de portadores; em

1995, 5 milhões. 73

Em 2007, O total de cartões de crédito em circulação no país

no fechou em fevereiro o total de 77,9 milhões. 74

2.2 Cartão de crédito, Contrato de adesão e suas generalidades

Neste item serão destacados os conceitos de cartão de

crédito e contrato de adesão, e as espécies de cartão de crédito, com suas

especificidades e características.

2.2.1 Conceito de cartão de crédito

Quanto à figura do cartão de crédito Figueiredo75, preceitua

que:

73 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. cit, p. 18-19. 74 http://www.consumidormoderno.com.br/web

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O cartão de crédito consiste em um cartão plástico brilhante, colorido, retangular, padronizado, medindo 85mm por 54mm, com tarja magnética e identificação do usuário, emitido por uma administradora de cartões de crédito (fornecedora do serviço) ao usuário do cartão (consumidor), que o utiliza para aquisições de produtos e serviços ou para efetuar pagamentos em estabelecimentos comerciais conveniados.

Segundo Castro76, cartão de crédito é um documento de

identificação do portador e ao mesmo tempo instrumento de pagamento em

relação ao fornecedor, uma vez que este é credor do emissor e não do comprador

(titular do cartão).

Fran Martins77, ao tratar dos cartões de crédito, ensina que

estes podem ser emitidos por organismos que não contam com a participação de

estabelecimentos bancários ou por outros que contam com essa participação,

sendo duas as modalidades dos cartões de crédito verdadeiros: os cartões de

crédito bancários e os cartões de crédito não-bancários:

I - Cartões de crédito bancários: o que caracteriza os cartões

de crédito bancários é o fato de participarem do organismo emissor instituições

bancárias. Essa participação, (...) pode ser direta ou indireta, isto é, um banco ou

um grupo de bancos pode ser o emissor dos cartões de crédito, ou criar uma

sociedade ou associação para administrar a emissão desses cartões, devendo,

entretanto, as operações feitas por meio dos cartões estarem ligadas aos bancos,

incluindo-se, assim, como operações bancárias.

II - Cartões de crédito não-bancários: são eles emitidos por

organismos não-bancários que, com recursos próprios, assumem a posição de

intermediários entre compradores e vendedores. Nessa modalidade de cartões, a

empresa emissora responde com seus recursos privados pelas despesas

efetuadas pelos portadores dos cartões junto aos fornecedores.

75 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. Cartão de crédito. Curitiba: Juruá, 2000, p. 23. 76 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999. ob. cit, p. 59. 77 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 516.

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2.2.2 Conceito de contrato de adesão

Como um dos princípios contratuais, tem-se o da autonomia

da vontade, em que cada parte tem o direito de, livremente, dispor sobre as

condições do contrato. 78

Fran Martins79 escreve a respeito:

Na segunda metade do século passado, entretanto, surgiu uma nova espécie de realização de contratos, restringindo a manifestação da vontade de uma das partes, no caso aquela a quem a proposta era dirigida. De acordo com essa inovação, o proponente apresentava a sua proposta com cláusulas fixas e imutáveis, iguais para todos os contratantes. Esses contratos tiveram a denominação, que ainda hoje conservam, de contratos-tipos, e os contratos assim realizados passaram a denominar-se contratos de adesão, pois a parte a quem a proposta é dirigida não a discute nem a modifica, simplesmente adere aos termos dela (...).

A lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, conhecido como

Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 5480 dispõe que contrato de

adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade

competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos e

serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu

conteúdo.

Para Silvio Rodrigues81:

contrato de adesão é aquele em que todas as cláusulas são previamente estipuladas por uma das partes, de modo que a outra no geral mais fraca e na necessidade de contratar, não tem poderes para debater as condições, nem introduzir modificações,

78 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 82. 79 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 82. 80 Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. 81 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade. São Paulo: Saraiva, vol. 3, p. 42.

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no esquema preposto. Este último contraente aceita tudo em bloco ou recusa por inteiro.

No mesmo sentido, Orlando Gomes82 traz que contrato de

adesão é o negócio jurídico no qual a participação de um dos sujeitos sucede pela

aceitação em bloco de uma série de cláusulas formuladas antecipadamente, de

modo geral e abstrato, pela outra parte, para constituir o conteúdo normativo e

obrigacional de futuras relações concretas.

Fica evidenciado, por suas características, que o contrato de

cartão de crédito é um contrato de adesão, tendo em vista que o consumidor,

futuro titular do cartão de crédito, quando pretende aderir ao sistema do cartão de

crédito, se sujeita e concorda com as cláusulas já predispostas no contrato.

2.2.3 Espécies de cartões de crédito

Os cartões de crédito são de duas espécies diferentes e se

caracterizam pelo modo como os serviços são prestados aos beneficiários:

cartões de credenciamento e cartões de crédito verdadeiros. 83

2.2.3.1 Cartões de credenciamento

Os cartões de credenciamento ou cartões de bom pagador

são aqueles emitidos por uma empresa em favor de seus próprios clientes,

dando-lhes a possibilidade de adquirir bens ou serviços para um pagamento

posterior.

Em seu modo de utilização existem apenas dois elementos:

o emissor, que é também o vendedor; e o beneficiário. As operações que se

realizam com a interferência desses cartões são simples vendas a prazo ou a

crédito, sendo o emissor o credor do comprador em virtude dessa venda. 84

82 GOMES, Orlando. Contratos. 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 32. 83 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 513. 84 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 513-514.

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2.2.3.2 Cartões de crédito verdadeiros ou “stricto sensu”

São os cartões que concedem aos seus titulares a faculdade

de adquirir bens ou serviços nos mais diversos estabelecimentos filiados ao

sistema.

Têm em seu mecanismo três elementos: o titular, o

fornecedor, e o organismo emissor. Na emissão e uso dos cartões de crédito há,

também, a utilização do crédito por parte do titular, mas com a participação de um

intermediário, o organismo emissor que abre o crédito ao titular e não o vendedor.

Em seu processo de utilização o titular-comprador tem à sua disposição grande

número de fornecedores-vendedores, podendo, assim, escolher qualquer deles

para realizar suas compras. 85

Com isso, já que destacam-se o titular, o fornecedor, e o

organismo emissor como elementos do contrato de cartão de crédito, faz-se

necessária, a análise das relações jurídico-financeiras que venham a incorrer

entre tais elementos.

2.3 Relação jurídico-financeira no contrato de cartão de crédito:

personagens da relação jurídica

Neste item ficam denotadas as partes integrantes do sistema

de cartão de crédito, conceituadas e destacando de que forma vêm a relacionar-

se entre si.

2.3.1 Partes do “sistema” do contrato de cartão de crédito

2.3.1.1 Administradora ou entidade emissora de cartão de crédito.

A entidade emissora é geralmente uma pessoa jurídica,

dificilmente será uma pessoa física, pela própria natureza da atividade, que é

configurada como uma atividade econômica organizada para o fornecimento de

cartões que credenciam as pessoas por ela selecionadas a adquirir bens ou

85 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 514-515.

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serviços de uma série de estabelecimentos filiados ao sistema que com ela

mantém contrato. 86

Figueiredo87 define que:

A administradora do cartão de crédito é a responsável pela organização e administração do sistema, compreendendo um conjunto de pessoas (emissora, estabelecimentos credenciados, bancos associados, portadores de cartões, consumidores etc) que interagem através de procedimentos, contratos, tecnologia de ponta e segurança contra o uso fraudulento do cartão e o monitoramento de seu uso pelo consumidor (...).

Na realidade, o emissor não vende, apenas facilita uma

venda agindo como intermediário, credenciando, por meio da emissão dos

cartões, o titular a adquirir mercadorias ou serviços de que necessite junto a um

terceiro, o fornecedor. 88

2.3.1.2 Fornecedor ou estabelecimento filiado.

Branco89 define que fornecedor ou estabelecimento filiado “é

qualquer pessoa que preste serviço ou tenha produtos à venda e que esteja

cadastrado, filiado ao sistema”.

No mesmo sentido Figueiredo90 define que “o fornecedor de

bens e/ou serviços, nacional ou estrangeiro, credenciado, está autorizado a

aceitar os cartões emitidos pela administradora de cartão de crédito”.

O fornecedor é uma pessoa física ou jurídica que está

devidamente habilitada a vender produtos ou prestar serviços, mantendo um

contrato com o emissor, regulando as relações entre ambos. Esse contrato é em

regra chamado de contrato de filiação; é em virtude dele que o emissor se obriga

a pagar ao fornecedor, antes mesmo de recebê-las do comprador as despesas

86 CASTRO, Moema Augusta Soares de. 1999, p. 66. 87 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. Cartão de crédito. Curitiba: Juruá, 2000, p. 30-31. 88 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 510. 89 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. O sistema contratual do cartão de crédito. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 79 90 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. Cartão de crédito. Curitiba: Juruá, 2000, p. 34

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feitas por intermédio dos cartões, onde passa o emissor a ser o devedor do

fornecedor nas operações por esse realizadas através dos cartões de crédito. 91

Os contratos de cartão de crédito também se enquadram

nas relações jurídicas tuteladas pelo Direito do Consumidor, pois são contratos

típicos de adesão, cujas cláusulas são pré-redigidas pela emissora do cartão,

cabendo ao consumidor aceitar ou não as regras impostas, sendo este

consumidor o possuidor do cartão de crédito, ou seja, o titular. 92

2.3.1.3 Titular do cartão de crédito

O titular, usuário ou consumidor do cartão de crédito pode

ser qualquer pessoa física ou jurídica, desde que esteja legitimado a utilizar o

cartão, após aprovação prévia de seus dados cadastrais pela administradora,

passando a usufruir de direitos e obrigações convenientes ao contrato e que

esteja predisposto a aceitá-las. 93

Sobre titular de cartão de crédito, Fran Martins94, define:

Titular, beneficiário, usuário ou portador é a pessoa credenciada pelo emissor a fazer as aquisições junto ao fornecedor. O titular deve, naturalmente, ser uma pessoa capaz, mas o problema principal que existe em relação a ele é que tenha patrimônio suficiente para arcar com as despesas que podem ser feitas com o uso do cartão.

2.3.2 Relação jurídico-financeira

São três os elementos que compõem um sistema de cartões

de crédito não-bancários: a organização emissora, os titulares dos cartões e os

fornecedores. Necessário será, assim, estudar-se essas relações contratuais para

se entender o mecanismo do sistema.

91 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 510-511. 92 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 55. 93 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit, p. 33. 94 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 510.

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2.3.2.1 Relações entre o emissor (administradora) e o titular

Para ser admitido como beneficiário em um sistema de

cartões de crédito o titular faz um contrato com o emissor, onde com esse

contrato, o emissor credencia o titular a utilizar o cartão e se compromete a pagar

as dívidas contraídas sem nenhum ônus para o portador. Este deve, em regra,

pagar certa importância anual, conhecida com anuidade, ao emissor pelo

credenciamento que este lhe faz, sendo este uma contraprestação pelos serviços

prestados pelo emissor do beneficiário. 95

Figueiredo96 explica que:

A relação jurídica entre a administradora e o titular ou portador do cartão ocorre através da formalização de um contrato de adesão, cabendo à administradora o processamento das transações e sua liquidação junto aos fornecedores de bens ou serviços credenciados e ao titular o pagamento das importâncias devidas à administradora até a data de vencimento.

O contrato feito entre emissor e titular encerra, assim, uma

prestação de serviços (credenciamento junto a vários fornecedores) e uma

abertura de crédito, com cláusula de que as despesas dentro dessa abertura de

crédito deverão ser feitas junto aos estabelecimentos filiados, ou fornecedores, os

quais cederão onerosamente esses créditos ao emissor. 97

2.3.2.2 Relações entre o emissor (administradora) e o fornecedor

A relação jurídica entre administradora e o fornecedor se

origina através de um contrato de filiação, que credencia o estabelecimento

comercial a aceitar os cartões daquela administradora como forma de pagamento

da venda de mercadorias e da prestação de serviços. 98

Fran Martins99 define que:

95 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 516-517. 96 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 35. 97 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 518. 98 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 42. 99 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 518.

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Para a aceitação dos cartões de crédito por parte do fornecedor, este firma um contrato com o emissor em que são reguladas as obrigações de ambas as partes. O fornecedor se obriga a aceitar os cartões, sem acréscimo de despesas dos produtos a serem vendidos, dando quitação ao comprador quando este assina a nota de venda; o emissor se obriga a pagar as despesas feitas por meio dos cartões, devendo o fornecedor ceder-lhe os créditos para que haja tal pagamento. Assim, o fornecedor fica com o direito de cobrar do emissor as despesas feitas com os cartões. Para que haja a cessão, o fornecedor se obriga a pagar ao emissor uma comissão sobre o montante dos créditos cedidos (essa comissão varia de 5 a 10% do total das despesas feitas pelos titulares), considerando-se que essa comissão se refere também ao encaminhamento de fregueses ao fornecedor.

O contrato entre o emissor e o fornecedor contém,

preliminarmente, uma prestação de serviços pelo fato de serem agenciados para

o fornecedor compradores diversos do que geralmente possui, visando a

constante evolução e o crescimento de consumidores filiados. 100

2.3.2.3 Relação entre o titular e o fornecedor

A relação entre o consumidor e o fornecedor de bens ou

serviços corresponde exclusivamente a um contrato de consumo, ou seja, a

compra e venda ou a prestação de serviços, tratando de um negócio típico

regulado pelas normas do Código Civil Brasileiro e do Código de Defesa do

Consumidor. 101

As relações entre o titular e o fornecedor são as de uma

compra ou prestação de serviços em que o pagamento do preço será feito por

terceiro determinado, no caso o emissor. Por tal razão o fornecedor dá quitação

ao titular, já que a determinação, para o terceiro efetuar o pagamento, é

irrevogável, e como tal foi expressamente aceita pelo vendedor. Responde,

entretanto, o vendedor, perante o comprador, pelos vícios da coisa; e terá contra

ele se, na aquisição dos bens, houve fraude por parte do titular, como, por

100 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit, p. 519. 101 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 40.

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exemplo, se ultrapassou enganosamente o limite do crédito ou usou o cartão com

o prazo de vigência extinto. 102

O consumidor satisfaz no ato da compra e venda ou da

prestação de serviço à prestação, como se o pagamento por meio de cartão de

crédito correspondesse ao pagamento em moeda corrente, exaurindo para ambas

as partes a relação com a extinção do vínculo obrigacional, ou seja, com entrega

da coisa e o recebimento do preço. 103

Analisando os conceitos de cartão de crédito, seus tipos e

formas, os elementos do contrato de cartão de crédito e suas relações, pode-se

fazer uma análise frente as cláusulas constantes em um contrato de cartão de

crédito.

2.4 Cláusulas contratuais: análise geral e modelo de contrato de cartão de

crédito

Faz-se necessária a análise das cláusulas contratuais

constantes em um contrato de cartão de crédito, conforme modelos de contrato

de cartão de crédito, apresentados em anexo.

Analisando o contrato de cartão de crédito, tem-se por base

o conhecimento das cláusulas gerais e constantes de um contrato de cartão de

crédito. Ao capítulo seguinte demonstram-se as cláusulas abusivas, decorrentes

dos contratos de cartão de crédito, quanto sua nulidade absoluta e as cláusulas

controvertidas e suas controvérsias.

102 MARTINS, Fran. 1999. ob. cit., p. 519-520. 103 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 41.

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CAPÍTULO 3

CARTÕES DE CRÉDITO: Aspectos destacados acerca das cláusulas abusivas

Neste capítulo serão demonstradas as cláusulas abusivas,

evidenciando as exemplificadas pelo artigo 51 do Código de Defesa do

Consumidor, dando um enfoque às cláusulas polêmicas e controvertidas,

decorrentes do contrato de cartão de crédito.

3.1 Cláusulas abusivas: conceito e generalidades

Gama104 conceitua que cláusulas abusivas são aquelas que,

inseridas num contrato, possam contaminar o necessário equilíbrio ou possam, se

utilizadas, causar uma lesão contratual à parte a quem desfavoreçam.

Ainda, a respeito da conceituação de cláusula abusiva,

Nelson Nery Junior, traz que:

Cláusula abusiva é aquela que é notoriamente desfavorável à parte mais fraca na relação contratual, que, no caso de nossa análise, é o consumidor, aliás, por expressa definição do art. 4º, I, do CDC. A existência de cláusula abusiva no contrato de consumo torna inválida a relação contratual pela quebra do equilíbrio entre as partes, pois normalmente se verificam nos contratos de adesão, nos quais o estipulante se outorga todas as vantagens em detrimento do aderente, de quem são retiradas as vantagens e a quem são carreados de todos os ônus derivados do contrato. As cláusulas abusivas não se restringem aos contratos de adesão, mas todo e qualquer contrato de consumo, escrito ou verbal, pois o desequilíbrio contratual, com a supremacia do fornecedor sobre o consumidor, pode ocorrer em qualquer contrato, concluído mediante qualquer contrato, mediante qualquer técnica contratual.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 51,

enumera um rol exemplificativo de cláusulas abusivas 105. 104 GAMA, Hélio Zagheto. Curso de Direito do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 138.

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O art. 51 do CDC materializou as interpretações dos nossos

tribunais acerca das cláusulas potestativas ou leoninas nos contratos, mas o

mesmo, não esgota o rol das cláusulas que sejam consideradas abusivas nos

contratos. Por isso o art. 58 do Decreto nº. 2.181, de 20/03/1997, que regula o

Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC, qual deverá, dentre outras

atividades, prestar aos consumidores orientação permanente sobre seus direitos,

autorizou ao Secretário Nacional de Direito Econômico a editar anualmente um

elenco exemplificativo de cláusulas abusivas. 106

Fiscalizar e aplicar as sanções administrativas previstas no

Código de Defesa do Consumidor e solicitar instauração de inquérito para

apuração do delito contra o consumidor. Complementando esse dispositivo legal,

o artigo 56 do Decreto nº. 2.181/97 estabelece que, no sentido de orientar o

Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, divulgará, anualmente, elenco

complementar de cláusulas contratuais consideradas abusivas.

105 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao

fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código; III - transfiram responsabilidades a terceiros; IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor; VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor; X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor; XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor; XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração; XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. § 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes. § 3° (Vetado). § 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

106 GAMA, Hélio Zagheto. 2006. ob. cit., p. 138.

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A massificação dos contratos de cartões de crédito

possibilita às administradoras a inclusão de cláusulas opressivas, além de não

possibilitar ao titular o conhecimento e o alcance jurídico de tais clausulas, em

decorrência da dificuldade em decifrar os termos técnicos e da redação em letras

miúdas dos contratos. Nesse sentido, o próprio CDC nulifica as cláusulas que

“estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o

consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa-fé e

eqüidade”. 107

Gama108 tece seu comentário a respeito da redação do art.

51 do CDC:

A presença de uma cláusula abusiva não invalida inteiramente o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração das demais normas contratuais, vier ocorrer ônus excessivo para qualquer das partes. Assim, caberá ao interpretador do contrato verificar se, abstraindo-se a aplicação da cláusula abusiva, poderá ele permanecer com as doses de equilíbrio que a boa ordem jurídica recomende, em especial, tendo em vista, a inexistência da possibilidade de lesões contratuais, do respeito ao consumidor e da equidade de direitos dele resultantes.

Como ao Ministério Público cabe velar para a ordem jurídica, o § 4º do art. 51 do CDC conferiu-lhe legitimidade para propor Ação judicial para ser declarada a nulidade de uma cláusula que contrarie o disposto no Código, ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes, nos casos dos interesses individuais, a iniciativa de propor a Ação está condicionada à representação do consumidor ou de entidade que o represente e estará limitada ao pleito para ser julgada nula a cláusula abusiva. Nos casos de interesses coletivos, a Ação não está condicionada à representação e poderá invocar pleitos pelo ressarcimento de danos nos casos de satisfações dos interesses previstos no parágrafo único do art. 81 do CDC.

107 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 81-82. 108 GAMA, Hélio Zagheto. 2006. ob. cit., p. 140-141.

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As cláusulas predispostas nos contratos de cartão de

crédito, antes mesmo da validação, já podem estar incursas em nulidade

absoluta.

3.2 Da nulidade absoluta

Diferentemente do Código Civil, que dispõe sobre dois tipos

de nulidade: a absoluta, nulidades de pleno direito do art. 166; e a relativa,

anulabilidades do art. 171, o Código de Defesa do Consumidor apenas reconhece

as nulidades absolutas de pleno direito, fundadas no seu art. 1º, que estabelece

que as normas regulam as relações de consumo são de ordem pública e

interesse social.109

Por isso, não há que falar em cláusula abusiva que se possa

validar; ela sempre nasce nula, ou, melhor dizendo, foi escrita e posta no contrato,

mas é nula desde sempre. Em função, então, desse caráter, Rizzardo110, traz que:

não está obrigado o consumidor a cumprir qualquer obrigação que se lhe imponham mediante cláusula abusiva. Se a questão tiver de ser levada a juízo, isso poderá ser feito pelo consumidor, mediante ação diretamente proposta contra o fornecedor, ou poderá ser alegada em defesa: contestação ou embargos à execução. E, claro, pode ser argüida em reconvenção. Diga-se então que a decisão judicial que reconhece a nulidade dessa cláusula abusiva será não declaratória, mas “constitutiva negativa”.

Como a cláusula abusiva é nula, tem de ser destituída de

validade e efeito já antes do pronunciamento judicial111. Não há por que aguardar

que se busque a declaração de algo que de fato já é. Por isso o efeito da decisão

109 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p. 622. 110 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p. 622. 111 APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO. REVISÃO DE TODA RELAÇÃO JURÍDICO-CONTRATUAL CONTRATOS FINDOS PELA QUITAÇÃO. POSSIBILIDADE DE REVISÃO. A nulidade absoluta das cláusulas contratuais abusivas não se convalida pelo cumprimento da obrigação, sendo, pois, passível de revisão o contrato extinto pela quitação. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO E DECLARAÇÃO EX OFFICIO DA NULIDADE DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. (TJ/RS - Apelação Cível nº 70012309373. RELATOR: Sejalmo Sebastião de Paula Nery.)

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judicial é ex tunc, uma vez que nela se reconhece a nulidade existente desde o

fechamento do negócio. E, aliás, dada a característica da nulidade e a

contrariedade da cláusula abusiva ao Código de Defesa do Consumidor, que é de

ordem pública e interesse social, o magistrado tem o dever de se pronunciar de

ofício. Mesmo que a parte, isto é, seu advogado, não alegue a nulidade, é dever

do juiz declará-la por ato ex officio.112

3.3 Cláusulas controvertidas: aspectos polêmicos e controvérsias

Constata-se que no sistema do cartão de crédito existem

várias cláusulas consideradas abusivas pela doutrina. Entre elas, podem-se citar:

Cláusula-mandato; cláusulas de transferência de riscos; cláusulas que permitem a

cobrança excessiva de juros; cláusula que permite a cumulação de comissão de

permanência com a correção monetária; cláusula que permite a cobrança de juros

capitalizados; etc.

3.3.1 Cláusula-Mandato

A cláusula-mandato no sistema de cartão de crédito consiste

na outorga, pelo titular do cartão de crédito, de um mandato à administradora,

com poderes especiais para representá-lo perante toda e qualquer instituição

financeira, podendo obter, em nome e por conta do titular, financiamento por valor

não superior ao saldo devedor do cartão, podendo ainda, a administradora

negociar e ajustar prazos, acertar condições e o custo do financiamento e demais

encargos da dívida cobrados pela instituição financeira, além de assinar contratos

de abertura de crédito ou instrumentos de qualquer natureza necessários para a

efetivação do financiamento. 113

Abrão114 explica o funcionamento do sistema de Cartão de

Crédito:

Ao receber a fatura incumbe ao usuário, dentro do prazo de vencimento, efetuar o pagamento, se não o fizer obedecendo à

112 RIZZARDO, Arnaldo. ob. cit., p. 622/623. 113 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 83-84. 114 ABRÃO, Carlos Henrique. Cartões de crédito e débito. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2005, p. 37.

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modalidade à vista, pelo total da soma, e sim pelo mínimo, isso representa a outorga que se traduz no financiamento, mediante crédito rotativo, a favor da mandatária administradora do cartão de crédito que terá liberdade para, agindo em nome do mandante, buscar junto ao mercado recursos adequados à satisfação da obrigação.

(...), uma vez sobrando saldo a pagar terá a administradora de contratar junto aos bancos o numerário, sendo aberta uma conta vinculada ao negócio jurídico subjacente. Com ampla liberdade de contratar a instituição financeira, a conta terá como titular o aderente e eventualmente devedor solidário.

De fato, a administradora com isso pode, para efeito de se desincumbir do mandato, prestar aval, fiança, hipótese na qual será cobrada do titular do cartão a chamada remuneração de garantia.

A abusividade da cláusula-mandato115 ocorre quando

provoca desequilíbrio contratual entre as partes, causando desvantagem

excessiva ao consumidor e o conflito de interesses. Na verdade, a cláusula geral

que outorga o mandato116 especial à administradora pelo consumidor não impõe

limites quanto à taxa de juros e encargos, não nomina quais instituições

115 RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO - LETRA DE CÂMBIO EMITIDA E ACEITA COM BASE EM CLÁUSULA-MANDATO - INOPERANTE A DISTINÇÃO ENTRE AUTORIZAÇÃO E PROCURAÇÃO - ACEITE APOSTO EXPRESSAMENTE AMPARADO EM PROCURAÇÃO DO SACADO - RECURSO ADMITIDO E DESPROVIDO. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça, amparados na Súmula nº 60, no sentido de que é nula a chamada cláusula-mandato, que outorga poderes à instituição bancária para sacar e aceitar títulos em nome e contra o devedor. (TJ/SC - Acórdão: Apelação Cível 2000.022229-1. Relator: Cercato Padilha. Data da Decisão: 31/10/2002) 116 Cláusula-Modelo: “O titular, neste ato, nomeará a companhia... (identificar a companhia) como

sua procuradora, outorgando-lhe poderes especiais e expressos para, em nome e por conta do outorgante, efetivar negócios; obter crédito junto à instituição financeira escolhida pela companhia, para financiar despesas do titular feitas mediante uso de cartão de crédito (...) (nome do cartão) e os encargos da dívida; assinar contratos de financiamento; abrir contas bancárias para movimentar os valores obtidos pelos financiamentos; assinar títulos representativos do débito do titular, inclusive notas promissórias; acertar prazos, estipular juros, comissões e encargos da dívida, que será tida como líquida e certa e cobrável pela via executiva”. (in SANT’ANNA, Valéria Maria. Manual Prático dos contratos – teoria – prática – modelos - 3ª ed. Ver., atual., ampl., Bauru, SP: Edipro, 2005, p. 181-183.)

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financeiras serão contratadas e não especifica qual será a “remuneração” da

administradora pela garantia prestada às instituições financeiras. 117

À luz da relação de consumo, tem-se questionado a validade

da cláusula-mandato, pois, imputa em condição de uma verdadeira outorga

compulsória e sem a perspectiva da revogação desta outorga, com isso, os

interesses do aderente (titular) podem conflitar com o da administradora voltado

exclusivamente para o lucro, tendo a matéria forte apoio do art. 51, VIII, do

CDC118, na situação de nulidade da cláusula de pleno direito. 119

Figueiredo120 traz que:

É evidente a nulidade da cláusula-mandato se considerar que o mandato foi outorgado no exclusivo interesse da administradora, objetivando assegurar a sua remuneração da forma que melhor lhe convier, assim como de negociar e repactuar prazos, taxas de juros, condições, custo do financiamento, emitir títulos representativos de débito e demais encargos financeiros.

Já Theodoro Junior121 sustenta que a cláusula mandato não

tem qualquer vestígio de ilegalidade ou mácula que pudesse infirmá-la, na medida

em que instrumentaliza o sistema e serve de base operacional para o

financiamento, elemento substancial da geração do crédito.

Finalizando, Waldirio Bugarelli122, antes mesmo da vigência

do Código de Defesa do Consumidor, quando não existia norma legal proibindo

esta prática, já ensinava que:

Certa espécie não se tenham bem enquadrado essa inefável procuração, inserta no bojo de um contrato, pelo qual o titular do

117 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 84. 118 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; 119 ABRÃO, Carlos Henrique. ob. cit., p. 38. 120 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 85. 121 HUMBERTO THEODORO JUNIOR e Outros. O Contrato de Cartão de Crédito e a Cláusula-Mandato em face do Código de Defesa do Consumidor. In Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem. 16/abril-junho/2002. 122 BULGARELLI, Waldirio. Comentário à jurisprudência. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 26, 1977. p. 125.

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cartão entrega-se às mãos da sociedade emissora, dando-lhes poderes amplos de emitir títulos em nome do titular, contra ele mesmo. Não é só por se tratar de uma cláusula espúria, introduzida, matreiramente, em letras impressas de tipo microscópio, mas, também, porque, substancialmente, determina a capitulação do devedor perante o credor. Não é, então, de se perquirir a intenção do contratante, e saber a letra do contrato revela exatamente o que ele queria, no ato de contratar? Que queria o titular do cartão? Apenas um meio de obtenção mais fácil de crédito, não pretendendo, com isso, desfazer-se das defesas que a lei assegura. Passar, assim por via dessa procuração, do campo contratual para o mais rígido e formal do direito cambiário, é, sem dúvida, uma fraude de quem ditou ou impôs o contrato.

O Código de Defesa do Consumidor não veda a outorga de

mandato à administradora pelo consumidor e tampouco a emissão de títulos

cambiais por mandatário, desde que não se verifique a ocorrência de conflitos de

interesses. 123

3.3.2 Inexeqüibilidade no sistema de cartão de crédito124

De Plácido e Silva125, a respeito da inexeqüibilidade,

conceitua que:

é o adjetivo empregado na terminologia jurídica, em regra geral, para mostrar a condição ou a situação do que não pode ser executado ou não pode ser cumprido. A inexeqüibilidade, que assinala a qualidade ou caráter de que é inexeqüível, em seu

123 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 86. 124 AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO AO CONSUMIDOR PARA LIQUIDAÇÃO DE DÍVIDAS DE CARTÕES DE CRÉDITO - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - INEXISTÊNCIA DE TÍTULO LÍQUIDO, CERTO E EXIGÍVEL - REJEIÇÃO - INEXEQÜIBILIDADE NO SISTEMA DE CARTÃO DE CRÉDITO QUE CONTAMINA A SUBSEQÜENTE CONFISSÃO DE DÍVIDA - EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO. O contrato de cartão de crédito, assim como a fatura mensal de cobrança e o título de crédito emitido em decorrência da cláusula-mandato, não se erigem à condição de títulos executivos extrajudiciais. Pronuncia-se que somente ocorre o instituto da novação quando houver a intenção de se constituir uma nova obrigação, com o escopo de extinguir a obrigação antecedente, ou seja, quando houver a substituição do devedor por outro; do credor por outro (novação subjetiva ou pessoal); ou do objeto por outro (novação objetiva ou real). Destarte, não se perfaz o referido instituto com a sucessão do contrato de cartão de crédito por instrumento particular de empréstimo para liquidação de dívida de cartão de crédito. Decorre disso que a inexeqüibilidade do primeiro contrato atinge o segundo, impondo-se, destarte, a extinção da ação de execução. (TJ/SC - Acórdão: Agravo de Instrumento 2001.010475-0. Relator: Cercato Padilha. Data da Decisão: 24/10/2002) 125 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, v. II, 1978, p. 824.

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conceito jurídico quer mostrar a impossibilidade material ou legal, que obsta a execução de qualquer ato jurídico processual.

Dentre os requisitos necessários para qualquer execução,

destacam-se: o inadimplemento do devedor (CPC, arts. 580 a 582) e o título

executivo, judicial ou extrajudicial (CPC, arts. 583 a 586).

Com isso, para que uma dívida seja executada, esta deve

estar formalizada através de um título executivo, judicial ou extrajudicial, previsto

no rol taxativo dos arts. 584 e 585 do CPC. Caso o título executivo não seja

líquido, certo e exigível, torna-se nula a execução, conforme redação do art. 618, I

do CPC. 126

A sistemática do cartão de crédito127 compõe-se dos

seguintes documentos:

a) contrato de prestação de serviços de administração

de cartão de crédito128. A adesão ao sistema ocorre com a assinatura do

consumidor no recibo de entrega do cartão, na utilização do cartão, no pagamento

do cartão, em compras efetuadas com o cartão e no desbloqueio do cartão junto à

Central de atendimento da administradora. Não caracterizando assim, o disposto

no art. 585, II, do CPC, qual confere a condição de título executivo extrajudicial ao

documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas;

b) fatura mensal de cobrança. A fatura mensal do cartão

de crédito é enviada mensalmente ao consumidor pela administradora. É um

documento que contém os dados cadastrais do consumidor, a data de

vencimento, o limite de crédito, os débitos e despesas, os pagamentos, os

126 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 87-88. 127 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 89-92. 128 Ação de revisão de cláusulas contratuais. Contrato de cartão de crédito celebrado entre o autor e o banco demandado. Instrumento particular de cessão de direitos. Transferência dos direitos e obrigações referentes ao "Contrato de Prestação de Serviços de Emissão, Utilização e Administração do Cartão de Crédito" por Banco Comercial Uruguai S/A ao Banco Rural S/A. Cessão dos mesmos direitos e obrigações ao Banco Simples S/A. Código Civil de 2002, art. 286. Dispensabilidade da notificação da cessão ao devedor no caso concreto. Ilegitimidade passiva ad causam do Banco Comercial Uruguai S/A. Código de Processo Civil, art. 267, inc. VI. Recurso provido. ( TJ/SC - Acórdão: Apelação cível 2007.003482-0. Relator: Nelson Juliano Schaefer Martins. Data da Decisão: 10/05/2007)

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encargos contratuais, taxa de inscrição e anuidade, juros de mora, multa, saldo

anterior e atual, valor do pagamento mínimo, constituindo-se no principal meio de

pagamento. O referido demonstrativo, não configura como título executivo

extrajudicial, por não estar expressamente previsto nos incisos do art. 585 do

CPC;

c) título de crédito emitido pelo mandatário. No sistema

de cartão de crédito, a administradora, através de cláusula-mandato, emite nota

promissória ou letra de câmbio, pelo montante total da dívida, com vencimento à

vista, constituindo um título executivo, através de suposta convenção entre as

partes, diga-se por adesão do consumidor ao contrato, ou seja, cria contra o

próprio mandante um título executivo.

Nesse contexto, a doutrina tem sedimentado a invalidade da

cláusula-mandato, ou seja, o título cambial emitido contra o próprio mandante

pela emissora do cartão é nulo, por vulneração do art. 115 do CC/2002 e por não

constituir título executivo extrajudicial. 129

3.3.3 Inoponibilidade de exceções130

A cláusula que estabelece a inoponibilidade de exceções

pelo consumidor à administradora contém uma redação simples, que passa

despercebida pelo titular do cartão por ocasião de sua adesão131, ou seja, não

apresenta informações suficientes para que o consumidor possa analisar o seu

alcance e o real significado de suas conseqüências futuras.132

Branco133, afirma que:

129 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 93. 130 O princípio da inoponibilidade das exceções é aquele que não permite que uma pessoa deixe de cumprir suas obrigações, opondo exceções pessoais com qualquer obrigado anterior. (In MARTINS, Fran. Títulos de Crédito. Rio de janeiro: Forense, 12. ed., v. I, p. 7) 131 Cláusula-Modelo: “A companhia não se responsabilizará pelas eventuais restrições à utilização

do cartão de crédito (...) (nome do cartão), nem por reclamações atinentes à qualidade ou quantidade dos bens adquiridos pelo usuário do cartão junto aos fornecedores filiados ao sistema.” (in SANT’ANNA, Valéria Maria. Manual Prático dos contratos – teoria – prática – modelos - 3ª ed. Ver., atual., ampl., Bauru, SP: Edipro, 2005, p. 181-183.)

132 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 94. 133 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 155.

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Essa cláusula elimina a possibilidade de o titular exercer defesas pessoais e certas faculdades no caso inadimplemento total, parcial, ou então fatos e vícios do produto ou serviços ocorridos na relação junto ao fornecedor.

Segundo Cláudia Lima Marques134:

A nulidade desta cláusula deve ser declarada ex officio pelo Poder Judiciário, pois trata-se de cláusula contrária às normas do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, abusiva e ilícita. Para tanto, cita como exemplo, o art. 25 do CDC: “vedada a estipulação contratual que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar”; eis que a obrigação de indenizar prevista no CDC não pode ser afastada por claúsula contratual. E, complementa a seguir, que o legislador brasileiro sentiu a necessidade de ratificar a proibição do art. 25, com o disposto no art. 51, inc. I, do CDC que considera abusiva e nula a cláusula contratual que exonere a responsabilidade por vícios de qualquer natureza ou implique renúncia ou disposição de direitos.

Marques135 diz ainda:

A doutrina brasileira e a jurisprudência anterior ao CDC já combatiam este tipo de cláusula, ora porque tentavam regular aspectos da responsabilidade extracontratual em sede de contrato, ora porque contrariavam normas de ordem pública, violando deveres legais impostos a estes agentes econômicos, ora porque transferiram obrigações essenciais do contratante, exonerando a responsabilidade por dolo ou culpa, exonerando de deveres de cuidado que interessam à saúde, à proteção da vida, da integridade física ou econômica do outro contratante.

Ademais, a cláusula em questão nega vigência também ao

disposto nos arts. 12 e seguintes do CDC que exonera a responsabilidade do

fornecedor pela reparação dos danos causados aos consumidores, isto é, todos

aqueles que desenvolvem as atividades descritas no art. 3º do CDC136. Além

134 MARQUES, Cláudia Lima. ob. cit., p. 429. 135 MARQUES, Cláudia Lima. ob. cit., p. 430. 136 Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

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disso, a doutrina reconhece que entre a relação fornecedor e administradora

existe uma cessão de crédito. 137

Para Branco138, o art. 51, inc. I do CDC impede que se

exonere a responsabilidade do fornecedor, sendo latente a nulidade a cláusula

em questão, devendo ser declarada nula de ofício, com observância do previsto

no §4º do mesmo art. 51. Acrescenta-se ainda, que a cláusula em questão é

incompatível com a boa-fé e equidade, cujo princípio encontra-se inserido e

existente e, todas as relações jurídicas e em especial nas relações massificadas

de consumo, por força do art. 51, inc. IV do CDC.

3.3.4 Alteração unilateral do contrato

Os contratos de cartão de crédito, previamente redigidos

pela emissora do cartão, trazem cláusulas que podem ser alteradas

unilateralmente, através de um mero aviso ao consumidor, por informações

lançadas na fatura mensal ou com uma nova redação do contrato, muitas vezes

ocorrendo que o contrato é alterado sem nem sequer que o consumidor tome

conhecimento139.

Exemplificando: no caso de extravio da fatura mensal, neste

caso o consumidor não tomaria conhecimento da alteração contratual, perdendo o

exercício do direito de rescindir o contrato. Como conseqüência, a aceitação tácita

e a adesão às novas condições do contrato, decorrente da falta de atenção do

consumidor. O titular do cartão não observa as informações escritas na fatura

mensal, ou seja, efetua o pagamento da fatura. Como conseqüência, aceita as

condições e a adesão às novas condições do contrato; extravio da comunicação

escrita enviada pela administradora; registro do novo contrato, sem qualquer

aviso da administradora ou simples informação na fatura mensal; entre outras

137 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 96. 138 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 156. 139 AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. CAUTELAR INOMINADA VISANDO À LIBERAÇÃO DAS TRANSAÇÕES COM CARTÃO DE CRÉDITO. É entendimento pacífico deste órgão fracionário que a garantia oferecida em contrato, visando resguardar o credor acerca do cumprimento da avença, constitui cláusula contratual válida sendo, portanto, vedada a alteração unilateral. Em decisão monocrática, nego seguimento ao agravo de instrumento. (Agravo de Instrumento Nº 70016112294, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glênio José Wasserstein Hekman, Julgado em 28/07/2006)

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situações que possam ocorrer, ocasionando sempre a aceitação tácita (silêncio

do consumidor) ou a adesão pelo uso do cartão. 140

Segundo Branco141, o titular do cartão de crédito também

deveria ter a faculdade de poder alterar unilateralmente o contrato. A simples

informação escrita ao titular, por qualquer meio de comunicação (correspondência

ou fatura mensal), não permite ao consumidor dimensionar o alcance das

alterações contratuais, além de ser contrária à cláusula geral da boa-fé, da

eqüidade e do equilíbrio nas relações jurídicas no sistema consumerista. 142

Em verdade, se nas relações jurídicas do sistema contratual

do cartão de crédito possa existir a aceitação tácita de serviços ofertados aos

consumidores, isto não quer dizer que o conteúdo das cláusulas contratuais não

deva ser amplamente discutido entre as partes, além de exigir a manifestação

expressa do titular a respeito de sua adesão às novas condições contratuais. 143

3.3.5 Perda, furto, roubo e extravio do cartão

O cartão de crédito não passa de um documento auxiliar de

identificação de indivíduos que participam do sistema, ou seja, em vez de o

consumidor levar consigo uma cópia do contrato, leva o cartão, que contém sua

assinatura, seu nome, o número do contrato, data de validade, para controle do

consumidor. 144

Desta forma, tratando-se de um documento de identificação

não pode o titular do cartão ser responsabilizado pelo extravio ou furto,

independentemente da comunicação ou não à administradora145. O risco desta

140 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 98. 141 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 166. 142 MARQUES, Cláudia Lima. ob. cit., p. 421. 143 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 99. 144 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 150. 145 Ação de indenização por danos morais. Cartão de crédito furtado. Compras não realizadas pelo titular. Comunicação do furto e bloqueio do cartão. Seguro contra perda, furto e roubo contratado e posteriormente estornado. Cobertura vigente à data do furto. Impugnação acerca dos valores cobrados indevidamente. Inscrição do nome do autor nos cadastros de proteção ao crédito. Afastamento da tese de culpa concorrente por parte do autor. Negligência da administradora do cartão de crédito. Ofensa à imagem, boa fama e credibilidade. Responsabilidade objetiva e exclusiva da instituição financeira prestadora de serviços. Dispensa de comprovação do dano. Constituição da República, art. 5º, incs. V e X. Código de Defesa do Consumidor, arts. 3º, § 2º e

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atividade deve ser do fornecedor que deveria identificar o portador antes de

concretizar a transação ou da administradora que tem o dever de fornecer

informações e condições necessárias para que o fornecedor possa identificar o

titular do cartão. 146

Com efeito, transferindo-se a responsabilidade pelas

transações efetuadas dos cartões extraviados, roubados ou furtados do

consumidor, além de ser cômodo às administradoras, nega vigência ao princípio

da boa-fé e desequilibra os direitos e obrigações das partes, transferindo a

responsabilidade para a parte mais fraca do contrato. Aliás, os bancos que são

proprietários das seguradoras não querem assumir este risco e recorrer a

seguros, com objetivo de assegurar a cobertura entre o extravio e a comunicação

do consumidor. 147

Por outro lado, parte da jurisprudência tem entendido que a

responsabilidade pela guarda do cartão é do consumidor, assim como a

comunicação imediata do furto, roubo ou extravio. Desta forma, não ocorrendo

esta comunicação, o consumidor responde pelas compras efetuadas por terceiro.

Em se tratando de uso indevido após a comunicação do consumidor à emissora

do cartão, a jurisprudência é unânime em responsabilizar a administradora. O

entendimento predominante é de que o titular, agindo com diligência,

comunicando o furto, perda, roubo ou extravio imediatamente à emissora do

cartão de crédito, a partir dessa comunicação, ficará isento de qualquer

responsabilidade pelo uso indevido que vier a acontecer. 148

Por sua vez, Branco149 entende que a responsabilidade será

sempre da emissora ou do fornecedor, traçando as seguintes ponderações:

As características do moderno sistema comercial e a necessidade de uma justa divisão de riscos e proteção dos pólos mais fracos

14. Manutenção do quantum indenizatório definido na sentença. Ônus da sucumbência e honorários advocatícios mantidos em 15% sobre o valor da condenação. Código de Processo Civil, art. 20, § 3º. Recurso desprovido. ( TJ/SC - Acórdão: Apelação cível 2005.033927-4. Relator: Nelson Juliano Schaefer Martins. Data da Decisão: 24/08/2006) 146 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 100. 147 BUGARELLI, Waldirio apud BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 152. 148 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. ob. cit., p. 102. 149 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. ob. cit., p. 153.

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na relação contratual devem fulminar essa modalidade de cláusula que trata do extravio ou furtos de cartões. Se o titular tem o dever de bem guardar o cartão e comunicar a forma mais rápida possível o seu desapossamento, pode ele ser penalizado com multa ou afastado do sistema, mas, em hipótese alguma, obrigado a responder por negócios jurídicos dos quais não participou.

3.3.6 Juros, multa e encargos contratuais

Os juros e a multa moratória correspondem aos débitos

lançados pela administradora na fatura mensal, em decorrência do atraso, falta de

ou pagamento inferior ao valor mínimo na data de vencimento. Os encargos

contratuais correspondem ao débito lançado na sua fatura mensal, haja vista o

financiamento do saldo devedor pelo titular do cartão, os quais são compostos

pelo custo do financiamento e pela remuneração da garantia efetuada pela

emissora do cartão. 150

3.3.6.1 Juros moratórios151

Nas palavras de Gabriel Wedy, pode-se dizer que juros

moratórios é a indenização pelo retardamento no pagamento da dívida, ao

contrário dos compensatórios que são o fruto do capital empregado. Assim, os

compensatórios são, ordinariamente, convencionais, isto é, estabelecidos por

contrato: e os moratórios podem ser legais ou convencionais. 152

150 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 104-105. 151 Ação revisional c/c repetição de indébito. Contrato de cartão de crédito. Operação bancária. Submissão à disciplina jurídica do Código de Defesa do Consumidor. Súmula 297 do STJ. Flexibilização do princípio do pacta sunt servanda. Encargos contratuais. Cláusulas gerais não subscritas pelo devedor. Invalidade. Art. 1.079 do Código Civil de 1916 e 52, inciso II, do CDC. Precedentes. Juros remuneratórios limitados, neste caso, em 12% ao ano. Incidência conjunta dos juros moratórios de 6% ao ano até a vigência do Novo Código Civil (11.01.2003) e, a partir dessa data, 12% ao ano, e de atualização monetária (INPC). Capitalização de juros. Ausência de previsão contratual válida. Vedação. Admissibilidade da restituição simples dos valores eventualmente cobrados em excesso, após a compensação. Art. 42, parágrafo único, do CDC. Êxito do autor. Despesas processuais e honorários advocatícios suportados exclusivamente pelo estabelecimento financeiro. Recurso provido, em parte. (TJ/SC - Acórdão: Apelação cível 2005.021863-3. Relator: Ronaldo Moritz Martins da Silva. Data da Decisão: 31/08/2006). 152 WEDY, Gabriel. O Limite Constitucional dos Juros Reais. Porto Alegre: Síntese, 1997, p. 31.

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3.3.6.2 Multa moratória

A multa moratória é aquela imposta face à mora, ou seja, a

falta de cumprimento de uma obrigação em determinada época, sendo que seu

termo inicial deve ser fixado a partir do vencimento da obrigação153 de pagamento

em dinheiro. 154

Figueiredo155 a respeito escreve que:

no sistema de cartão de crédito, a multa moratória é de 2% sobre o saldo devedor, por atraso ou insuficiência de pagamento. A propósito, o Código de Defesa do Consumidor estabelecia em seu art. 52, § 1º que as “multas de mora decorrentes do inadimplemento da obrigação no seu termo não poderão ser superiores a dez por cento do valor da prestação”. Todavia, a Lei 9.298, de 01.08.96, alterou a redação do § 1º do art. 52 do CDC, estabelecendo que “as multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação”.

153 APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE EMISSÃO E UTILIZAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - AUTO-APLICABILIDADE DO ART. 192, § 3o, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - INADMISSIBILIDADE NO CASO EM TELA - MULTA CONTRATUAL - LIMITAÇÃO EM 2% - INVIABILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OS JUROS MORATÓRIOS - CORREÇÃO MONETÁRIA - ATUALIZAÇÃO DO DÉBITO PELO INPC - RESTITUIÇÃO E/OU COMPENSAÇÃO - POSSIBILIDADE - RECURSO DESPROVIDO. Aplicam-se as disposições do CDC às relações de consumo que envolvem as entidades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, por força de seu art. 3o, § 2o. Reputa-se ilegal, em face da desnecessária edição de norma regulamentadora do art. 192, § 3o, da Constituição da República Federativa do Brasil, a cobrança de juros acima do patamar de 12% (doze por cento) ao ano. A Emenda Constitucional n. 40/03 somente será aplicada nos contratos firmados após a sua publicação. Tratando-se de contratos assinados sob o amparo da regra limitadora, permanece imutável a proibição anterior, fulcrada em norma constitucional tida por auto-aplicável. Não se admite a capitalização de juros nos contratos de emissão e utilização de cartões de crédito, vez que estes não se enquadram nas hipóteses que prevêem tal possibilidade. A multa moratória, a teor da nova redação dada pela Lei n. 9.298/96 ao art. 52, § 1o, do CDC, não pode ser cobrada em patamar superior a 2% (dois por cento) do valor da prestação, sendo vedada a sua cumulação com os juros moratórios, os quais são devidos a partir da citação, consoante prescreve o art. 219 do CPC, assim como a Súmula n. 163 do STF. Em substituição à TR, utiliza-se o INPC como fator de correção monetária, vez que tal índice é proporcional aos efeitos da inflação sobre o valor da moeda. (TJ/SC - Acórdão: Apelação Cível 2004.009761-1. Relator: Ricardo Orofino Da Luz Fontes. Data da Decisão: 20/05/2004) 154 PARIZATTO, João Roberto. Multas e Juros no Direito Brasileiro. Ouro Fino: Edipa, 2. ed., 1998, p. 32. 155 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 106.

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3.3.6.3 Multa convencional ou compensatória

A multa convencional ou compensatória incide sobre o saldo

devedor do titular do cartão toda vez que se verifica a rescisão contratual ou

cancelamento do cartão de crédito, por inadimplemento contratual ou de

quaisquer obrigações do usuário156.

Figueiredo157, quanto à determinação do Despacho 79, de

13/10/1998:

Hodiernamente, as cláusulas contratuais que previam multas convencionadas estão sendo retiradas dos contratos de cartões de crédito, pois foram declaradas “nulas de pleno direito” pelo despacho do Diretor da Secretaria de Direito Econômico do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor – despacho 79, de 13.10.98 – publicado no Diário Oficial da União de 15.10.98.

Desta forma, as administradoras de cartões de crédito, atendendo à determinação da Secretaria de Direito Econômico supra, estão substituindo os contratos firmados com os consumidores, suprimindo as cláusulas que prevêem multas convencionais de: a) até 20% (vinte por cento), incidente sobre o saldo devedor, aplicável cada vez que ocorrer o inadimplemento de qualquer cláusula ou condição que de causa à rescisão do contrato; b) de 50% (cinqüenta por cento) incidente sobre o valor da obrigação, por descumprimento das normas determinadas pelo Banco Central.

156 APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO - CONTRATO DE EMISSÃO E UTILIZAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO - CERCEAMENTO DE DEFESA - TEMÁTICA RECHAÇADA - JUROS REMUNERATÓRIOS - LIMITAÇÃO EM 12% AO ANO - CLÁUSULA MANDATO - LEGALIDADE - PREQUESTIONAMENTO - ÔNUS SUCUMBENCIAIS - EXAME JUDICIAL DOS ENCARGOS NOS CONTRATOS - CONTROLE EX OFFICIO - CORREÇÃO MONETÁRIA - APLICAÇÃO DO INPC/IBGE - MULTA CONVENCIONAL OU COMPENSATÓRIA - AFASTAMENTO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (...)Os juros remuneratórios avençados acima de 12% (doze por cento) ao ano são considerados ilegais e abusivos, porquanto vêm a gerar prejuízos às classes produtoras e enriquecimento ilícito aos concedentes de empréstimos, devendo ser expurgados da relação contratual, mesmo quando se trate de contratos bancários, em atenção ao disposto no artigo 51, inciso IV, do Código do Consumidor. (...) A imposição da multa compensatória sobre o mesmo fato gerador da multa moratória acarreta dupla penalização, devendo ser banido do contrato por ser abusiva. (TJ/SC - Apelação Cível 2004.011724-8. Relator: Fernando Carioni. Data da Decisão: 17/11/2005) 157 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 108.

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3.3.6.4 Encargos contratuais

Os encargos contratuais, de acordo com estipulação

contratual, são compostos do custo do financiamento e remuneração de garantia.

O custo do financiamento se origina quando o usuário,

através de cláusula-mandato, autoriza a emissora do cartão obter empréstimo ou

financiamento em seu nome para quitação das compras, serviços, saldo devedor,

entre outros. Isto acontece quando o valor do saldo devedor não for integralmente

pago pelo titular ou deixar de ser quitado.

O custo deste financiamento é negociado diretamente pela

administradora, sem qualquer participação do usuário158, repassando este custo

através de percentuais que incidirão sobre o valor financiado. A remuneração de

garantia nasce do aval que a administradora fornece ao obter o empréstimo ou

financiamento, pois de acordo com o contrato a administradora será fiadora e

principal pagadora dos valores financiados. O valor da remuneração desta

garantia fornecida pela emissora do cartão não é informada ao consumidor e nem

está prevista no contrato. A administradora mensalmente repassa o valor desta

garantia, após transformar em percentual a sua remuneração, que é acrescida ao

custo do financiamento, transformando-se em um percentual (taxa de juros) que

incidirá sobre o valor do saldo devedor constante da fatura mensal. 159

158 CARTÃO DE CRÉDITO. AÇÃO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. JUROS EXTORSIVOS E ENCARGOS ILEGAIS. EMBUTIMENTO. FALTA DE ESPECIFICAÇÃO NO INSTRUMENTO CONTRATUAL. PERÍCIA CONTÁBIL. DEFERIMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS PROBANTE. DECISÃO CORRETA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. . Ao consumidor, segundo as normas protetivas inseridas no Código de Defesa do Consumidor, devem ser concedidas amplas chances para, dentro de um espírito de igualitarismo que deve reger as relações contratuais, rever cláusulas ou condições às quais aderiu ele, na busca de um equilíbrio mais consentâneo com as imposições legais. Destarte, em contrato de cartão de crédito, alegando o consumidor a abusividade e a extorsividade dos encargos impostos, com o embutimento de juros excedentes aos permitidos legalmente e com a indevida capitalização dos mesmos, não se mostra passível de censura a decisão judicial que, atenda aos princípios jurídicos incidentes, defere a realização de prova pericial especializada. . Presumida a hipossuficiência do consumidor, em face da desproporção econômica entre ele e a administradora de cartões de crédito, impõe o Código de Defesa do Consumidor, à vista do disposto no seu art. 6º, VIII, a inversão do ônus probatório, como condição mesmo de atenuar-se a inferioridade do contratante, minorando os efeitos da eqüidistância existente entre ele e a parte economicamente mais privilegiada. (TJ/SC - Acórdão: Agravo de Instrumento 00.022530-4. Relator: José Trindade dos Santos. Data da Decisão: 24/05/2001) 159 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 111-112.

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Os encargos contratuais consistem na remuneração do

empréstimo ou financiamento auferido indiretamente pelo titular do cartão de

crédito. Com isso, os encargos contratuais são taxas de juros reais praticadas

pelas administradoras de cartões de crédito, não podendo exceder a 12% (doze

por cento) ao ano160, sob pena de incorrerem no crime de usura. 161

Nota-se que as cláusulas constantes de um contrato de

cartão de crédito, podem já previamente configurar-se como abusivas, mesmo

antes da validação do contrato, ou tornarem-se ao longo do contrato abusivas, já

que muitas vezes, nem sequer são verificadas, analisadas e discutidas pelos

consumidores ou aderentes ao contrato, mesmo decorrendo de um contrato de

adesão, qual presume-se que não possa ser alterado, por ser considerado um

contrato massificado. Verifica-se ao longo da pesquisa que essa opção é possível

e autorizada legalmente.

160 Ação de revisão. Contrato de cartão de crédito. Operação bancária. Submissão à disciplina jurídica do Código de Defesa do Consumidor. Súmula 297 do STJ. Flexibilização do princípio do pacta sunt servanda. Encargos contratuais. Cláusulas gerais não subscritas pela devedora. Invalidade. Artigos 1.079 do Código Civil de 1916 e 52, inciso II, do CDC. Precedentes. Juros remuneratórios limitados, neste caso, em 12% ao ano. Incidência conjunta de juros moratórios de 6% ao ano até a vigência do Novo Código Civil (11.01.2003) e, a partir dessa data, 12% ao ano, e de atualização monetária (INPC). Capitalização de juros. Ausência de previsão contratual válida. Vedação. Admissibilidade da restituição simples dos valores eventualmente cobrados em excesso, após a compensação. Artigo 42, parágrafo único, do CDC. Recurso provido, em parte. ( TJ/SC - Acórdão: Apelação cível 2006.016831-7. Relator: Ronaldo Moritz Martins da Silva. Data da Decisão: 24/08/2006) 161 FIGUEIREDO, Alcio Manoel de Sousa. 2000. ob. cit., p. 117.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho de conclusão de curso trouxe alguns

esclarecimentos acerca da relação jurídica havida entre as partes contratantes e

as abusividades decorrentes dos contratos de cartão de crédito frente às

previsões do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil.

Pode-se observar que, os acordos de vontade entre duas

pessoas que assumem obrigações e contratam deveres conforme sua vontade,

chamados contratos, possuem características e princípios fundamentais próprios

que são a estrutura basilar para torná-los válidos e hábeis a produzir efeitos.

O Código de Defesa do Consumidor veio a consagrar alguns

princípios com a finalidade de controlar a abusividade existente frequentemente

nas relações contratuais, entre eles, o princípio da informação e da transparência,

que vem ser a obrigação de informar ao usuário tudo a respeito dos seus

produtos e serviços, bem como, das cláusulas contratuais estipuladas pelo

fornecedor, bem como, o princípio da onerosidade excessiva, que se constitui na

cláusula advinda de evento extraordinário e imprevisível que venha a dificultar o

adimplemento da obrigação.

Outra questão posta em análise e que se encontra definida

pelo Código de Defesa do Consumidor são as cláusulas estabelecidas

unilateralmente pelo fornecedor sem que o usuário possa discutí-las ou modificar

os seus conteúdos, as constantes nos Contratos de Adesão. Assim, através

dessas características, resta evidente que o contrato de cartão de crédito é um

contrato de adesão, uma vez que o seu titular apenas concorda com as cláusulas

já constantes no contrato.

Nesse diapasão, tem-se que cartão de crédito é o cartão

emitido por entidade financeira ao seu titular, para que este o utilize na realização

de compras ou até mesmo como pagamento de prestações de serviços.

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O cartão de crédito surgiu em meados dos anos 1914, nos

países europeus e em 1930, nos Estados Unidos, vindo a ser adotado no Brasil

por volta dos anos 50.

Inicialmente, o sistema era utilizado por um grupo restrito de

pessoas, tendo como partes apenas o fornecedor do crédito, que respondia pelos

riscos do inadimplemento, e o cliente que o utilizava. Após alguns anos, surgiu a

figura da entidade financeira, que veio a intermediar a relação entre fornecedor e

usuário, assumindo a responsabilidade pelo inadimplemento.

São três os participantes da relação existente no contrato de

cartão de crédito, quais sejam: a administradora, ou entidade financeira, que

emitirá os cartões e participará como intermediário entre o usuário e o terceiro

fornecedor; o titular do cartão de crédito, que é legítimo a utilizar os serviços a ele

disponibilizados e cumprirá as obrigações inerentes ao contrato do cartão; e por

fim, o fornecedor, que será uma pessoa física ou jurídica que manterá um

contrato de filiação com a administradora emissora do cartão, habilitado a

fornecer produtos e serviços ao titular.

A doutrina dominante trata o titular do cartão de crédito

como parte vulnerável na relação obrigacional havida entre as partes acima

mencionadas, interpretando as situações fáticas de forma mais favorável ao

hipossuficiente, protegendo-o pelo Código de Defesa do Consumidor.

A presente monografia visou demonstrar as abusividades

das cláusulas dos cartões de crédito, aquelas que venham a contribuir para um

desequilíbrio entre as partes e causar lesão à parte desfavorecida.

Algumas dessas cláusulas estão elencadas no artigo 51 do

Código de Defesa do Consumidor, entretanto, não esgota todas as possibilidades,

razão pela qual, o artigo 58 do Decreto nº 2.181, de 20/03/1997, com o fito de

orientar o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, concedeu autorização ao

Secretário Nacional do Direito Econômico a editar um elenco de cláusulas

abusivas face à massificação dos contratos de cartão de crédito e a grande

expansão desse seguimento.

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Com a massificação do contrato de cartão de crédito, cria-se

a possibilidade das administradoras a inclusão de cláusulas consideradas

opressivas, com redações extravagantes de difícil compreensão de um leigo, pois,

trazem termos técnicos.

Nesse sentido, o próprio Código de Defesa do Consumidor

nulifica tais cláusulas que estabeleçam obrigações abusivas ou que venha trazer

desvantagem ao consumidor.

Em determinada cláusula-mandato, o consumidor ou

aderente ao contrato de cartão de crédito, nomeia à administradora de cartão

crédito, poderes como de representá-lo em qualquer instituição financeira e até

usar de financiamentos em nome do mesmo, imputando em uma verdadeira

outorga compulsória sem que se possa alterar, a não ser por cessão de contrato.

Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor, prevê

que esta faculdade é lícita, desde que não hajam conflitos de interesse entre

consumidor e administradora, sendo que o da última é apenas o lucro.

Ante a massificação e ao uso de cláusulas controversas, em

análise aos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, nota-se que o

consumidor é colocado como parte pormenorizada, em virtude da abusividade

constatada nos contratos de cartão de crédito.

Tais abusividades, nem sempre são verificadas pelos

consumidores, com isso, os contratos de adesão, ou especificamente, os

contratos de cartão de crédito, vinculam-se a si tais paradigmas de que jamais

poderão ser alterados ou complementados.

Portanto, desde que haja uma análise detalhada e de que

sejam discutidas e possivelmente negociadas as cláusulas contratuais constantes

nos contratos de cartão de crédito, ou nos contratos de adesão em geral, os

paradigmas serão eliminados, tornando-os, talvez, mais vantajosos e honestos

para com os usuários e consumidores.

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Dessarte, o assunto pesquisado é relativo de divergências

doutrinárias e que essa pesquisa deve ser aprofundada no sentido de uniformizar

o entendimento, num todo, da Justiça brasileira.

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ANEXOS