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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí ACADÊMICO: RICARDO VIEIRA GRILLO São José (SC), junho de 2004.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Ricardo Grillo.pdf · Com o instituto da reforma agrária, ... segundo critérios e graus de existência

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí

ACADÊMICO: RICARDO VIEIRA GRILLO

São José (SC), junho de 2004.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. M. Eng.ª Rafael Burlani.

ACADÊMICO: RICARDO VIEIRA GRILLO

São José (SC), junho de 2004.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA

RICARDO VIEIRA GRILLO

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

São José, ......

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof. M.Eng.ª Rafael Burlani - Orientador

_______________________________________________________ Prof. - Membro

_______________________________________________________ Prof. - Membro

DEDICATÓRIA

Dedico este texto:

Aos meus pais que sempre me apoiaram na minha

formação profissional.

A minha namorada Elaine que sempre esteve comigo em

todos os momentos.

Aos meus avós pelo apoio irrestrito.

A minha tia Natércia, por ter sido a minha segunda mãe

enquanto estive longe de casa.

A todos que me ajudaram e me incentivaram nesta

caminhada em busca do conhecimento.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Rafael Burlani pelo auxílio e incentivo.

A todos aqueles que, de uma maneira direta ou indireta, contribuíram para a

realização desta pesquisa.

“O trabalho é o esforço aplicado; é qualquer coisa a que

nos dedicamos, qualquer coisa em que gastamos energia para

conquistar ou adquirir algo. O sentido fundamental do trabalho

não é aquilo por que lutamos para viver, mas o que fazemos com

nossa vida. A felicidade, como Aristóteles disse há muito tempo,

reside na atividade, tanto física como mental. Reside em fazer

coisas de que se possa orgulhar por fazer bem e, portanto, que se

tenha prazer em fazer”

William J. Bennett

SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................................ I

ABSTRACT.......................................................................................................II

INTRODUÇÃO................................................................................................10

1 O DIREITO DE PROPRIEDADE..............................................................16

1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA.........................................................................16

1.2 CONCEITO................................................................................................19

1.3 ESPÉCIES DE PROPRIEDADE ................................................................20

1.4 CARACTERÍSTICAS ................................................................................21

1.5 OBJETO DA PROPRIEDADE ...................................................................21

1.6 CONTEÚDO ..............................................................................................22

1.7 AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE ............................................................23

1.7.1 Classificação dos Modos de Adquirir a Propriedade .................................25

1.7.2 Da Aquisição pelo Registro ......................................................................27

1.7.3 Da Aquisição pela Acessão ......................................................................30

1.7.4 Da Aquisição por Usucapião ....................................................................32

1.7.5 Da Aquisição pelo Direito Hereditário......................................................33

1.7.6 Da Aquisição de Bens Móveis..................................................................33

1.8 PERDA DA PROPRIEDADE.....................................................................33

1.8.1 Extinção do Objeto...................................................................................34

1.8.2 Modos Voluntários de Perda de Propriedade ............................................34

1.8.3 Modos Involuntários de Perda da Propriedade ..........................................35

2 DA DESAPROPRIAÇÃO ...........................................................................37

2.1 CONCEITO................................................................................................37

2.2 FUNDAMENTOS DA DESAPROPRIAÇÃO ............................................37

2.3 FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE ................38

2.4 REQUISITOS DA DESAPROPRIAÇÃO...................................................39

2.5 COMPETÊNCIA PARA DESAPROPRIAR E PARA PROMOVER A

DESAPROPRIAÇÃO ........................................................................................39

2.6 OBJETO DA DESAPROPRIÇÃO..............................................................39

2.7 DIFERENÇAS ENTRE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE

PÚBLICA E POR INTERESSE SOCIAL ..........................................................40

2.8 A DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL.................................41

2.9 DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA ..41

2.9.1 Imóvel Rural ............................................................................................41

2.9.2 A função Social do Imóvel Rural..............................................................47

2.9.3 Desapropriação de Imóvel Rural para Fins de Reforma Agrária................52

3 REFORMA AGRÁRIA E A DESAPROPRIAÇÃO ..................................57

3.1 CONCEITO de rEFORMA AGRÁRIA ......................................................57

3.2 MÉTODOS PARA A REALIZAÇÃO DA REFORMA AGRÁRIA............59

3.3 CARACTERÍSTICAS ................................................................................59

3.4 OBJETIVOS...............................................................................................60

3.5 BENEFICIÁRIOS DA REFORMA AGRÁRIA..........................................60

3.6 DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRÁRIA................................61

3.6.1 A Luta pela Terra .....................................................................................61

3.6.2 Desapropriação voltada para Reforma Agrária .........................................63

3.7 Relação entre os institutos...........................................................................66

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................68

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................70

I

RESUMO

Esta pesquisa foi direcionada para a compreensão da desapropriação de imóvel rural

para fins de reforma agrária, analisando os limites do direito de propriedade, os requisitos

necessários para a realização da desapropriação e os motivos que levam o Estado a interferir

na propriedade privada, assim, inicialmente discorrendo sobre o direito de propriedade,

chegou-se a conclusão que ninguém pode ser privado do direito à propriedade por ser esta

inviolável, contudo quando analisada a desapropriação ficou constatado que o Estado está

autorizado a desapropriar imóveis rurais que não sejam explorados de maneira adequada, que

não atendam função social à que se destinam, inclusive, tendo amparo legal para realizar tal

ato e como conseqüência disso foi criado o instituto da reforma agrária que é o meio pelo qual

o Estado interfere nas propriedades que não são consideradas produtivas, visando uma justa

distribuição de terras, com um melhor aproveitamento agropecuário e com a intenção

principal de crescimento econômico com oportunidade para todos.

II

ABSTRACT

This research was directed to comprehend the dispossession of rural areas for

agrarian reform, analyzing the limits of property rights, the requirements needed to dispossess

and the motives that drive the State to interfere in the private property. So, initially reasoning

about the property rights, it follows that nobody can be restricted to the property right,

because it is inviolate, but when the dispossession is analyzed it was evident that the State is

authorized to dispossess rural areas that do not accomplish the social function that they are

devoted. Indeed the State has legal support to realize this act and consequently the agrarian

reform institution was developed, by means of that the State interfere in the properties that are

not considered productive, aiming a just land distribution with a better utilization and

economic growth with equal opportunities for all.

10

INTRODUÇÃO

Considerações iniciais.

Neste estudo sobre Desapropriação Rural para Fins de Reforma Agrária serão

analisados os requisitos e condições necessárias ligadas a desapropriação de imóveis rurais

por parte do poder público para a realização da reforma agrária.

As desapropriações de imóveis rurais para fins de reforma agrária são realizadas com

qual finalidade, já que ferem o direito de propriedade?

O direito à propriedade é sagrado e inviolável, não podendo ninguém ser dela

privado. Ocorre que certas propriedades não são exploradas de maneira que atenda as

classificações de produtividade.

Com o instituto da reforma agrária, o interesse público se sobrepõe ao interesse

privado e se a propriedade não atender a sua função social, esta será desapropriada para o

benefício da coletividade. O fundamento moral da desapropriação está na solidariedade

humana com o seu meio.

A reforma agrária gera muita polêmica e discussão na população, pois fere o direito

real de propriedade, tirando a propriedade de um, para dar a outro. O estudo servirá para uma

melhor compreensão desta medida utilizada em nosso país e da sua utilidade.

A pesquisa sobre desapropriação para fins de reforma agrária, demonstrará os

interesses do estado para com a coletividade, também esclarecerá a supremacia do estado

sobre o particular, a ponto de expropriar o bem de um para o interesse coletivo.

A função social da propriedade é outro ponto que deve ser abordado, para se ter

melhor compreensão prática da palavra "função social" e dos motivos que levam a classificar

uma propriedade como produtiva ou improdutiva.

Um estudo aprofundado sobre este tema servirá para uma melhor conclusão se a

aplicabilidade da desapropriação, atende ao seu fim ou se é uma medida que não tem a

eficácia que teoricamente deveria ter, pois vem como uma solução que pode tornar-se um

problema

11

A desapropriação rural para fins de reforma agrária vem regulamentada pela

Constituição Federal, com leis federais vigentes para a aplicabilidade da mesma, desta forma

o tema deve ser abordado à nível nacional, pois é uma questão que envolve todo o país.

O objetivo geral será a analise da desapropriação de imóveis rurais com base na

função social da propriedade para a realização da reforma agrária. Terá ainda por objetivo

específico a análise dos limites do direito de propriedade rural, compreendendo os requisitos

necessários utilizados para a desapropriação, esclarecendo os motivos que levam o Estado a

expropriar os bens de particulares, face a função social da propriedade.

Embasamento teórico.

O direito de propriedade já existia nos primórdios da civilização, de início coletivista

mas já tomando contornos individualistas. Com o passar dos tempos o direito de propriedade

sofreu inúmeras alterações, do direito romano até a atualidade ocorreram alterações

substanciais, mas sem perder a sua importância.

A propriedade emergiu da fase individualista para uma fase de solidarismo. Cada um

tem sua propriedade como um bem juridicamente assegurado, mas esta garantia que se dá ao

proprietário exige que a propriedade não permaneça ociosa, e, usada, o seja sem se apartar das

exigências do bem comum.

A ordem de valores da propriedade como direito natural, pode ser vista sobre três

planos: 1º - O homem por ser um animal racional, tem um direito natural ao apossamento dos

bens materiais, sendo isto fundamental para a sobrevivência humana; 2º - Uma das diferenças

do homem para com os irracionais, é que aquele não deve pensar apenas na sobrevivência

imediata, precisa estar preparado para as surpresas econômicas. Precisa da garantia do

exercício de liberdade, reservas econômicas ou uma ordem social que lhe assegure a

subsistência. Por este contexto, deve o homem ter assegurado o direito de propriedade; 3º - O

direito de propriedade deve ser condicionado ao momento histórico de cada povo, desde que

não seja negado.

A Constituição Federal de 1988 inscreveu o direito de propriedade entre os direitos e

garantias fundamentais.

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade

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do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXII - É garantido o direito de propriedade;

XXIII - A propriedade atenderá a sua função social;.

No art. 170 da Constituição Federal é reafirmado o princípio da propriedade privada

e o da função social da propriedade, que fundamentarão a ordem econômica.

Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça, observados os seguintes princípios:

II - Propriedade privada.

III - Função social da propriedade.

A Constituição Federal fixou que a propriedade produtiva será garantida por lei. Com

relação a função social da propriedade fixará normas para o cumprimento dos seus requisitos.

"Art. 185 - Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e

fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social."

O art. 186 enuncia quando ocorre a função social da propriedade.

Art. 186 - A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de existência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - Aproveitamento racional e adequado;

II - Utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - Exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários s dos trabalhadores.

Pelo texto constitucional conclui-se que o direito a propriedade é relativo, voltado

especialmente para um fim social, ou seja, a propriedade é protegida e garantida em razão de

sua função social, com posições restritivas e limitadas, sendo que seu uso está condicionado

ao bem-estar social.

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A função social é o equilíbrio entre os direitos e obrigações entre do cidadão,

devendo partir dos interesses individuais, atingindo os coletivos sem que haja atentado aos

direito individuais assegurados pela Constituição Federal.

A posse privada da propriedade é legitimada pela função social, ou seja, é a

faculdade que uma pessoa tem de dispor de uma coisa como própria, devendo utilizá-la

conforme exigir o bem-estar da comunidade.

O Estado pode intervir na propriedade privada retirando-a do seu legítimo titular.

Trata-se de domínio eminente do estado, sendo que o interesse público se sobrepõe ao

interesse privado. O estado deve indenizar plenamente o proprietário, não podendo este ter

prejuízo ou diminuição patrimonial. A justa indenização é fundamental para manter o

equilíbrio entre o estado e o particular na relação de prevalência da coletividade face o

interesse individual.

A propriedade é um direito sagrado e inviolável, não podendo ninguém ser dela

privado, salvo se a necessidade pública legalmente constatada o exigir e sob a condição de

uma justa e prévia indenização. O fundamento moral da desapropriação está na solidariedade

humana com o seu meio.

A tradição humana dos povos ao longo da história reconheceu ao estado o poder de

expropriar os bens dos particulares em benefício da coletividade.

Deve-se observar que a desapropriação, apesar dos fins que se destina, não ilide o

direito de propriedade; Ocorre que muitas vezes o poder público tem necessidade de um

determinado bem, que pelas circunstâncias só consegue adquirir através da desapropriação.

Presumivelmente, o estado quando desapropria busca atingir o bem comum, o bem-

estar coletivo. Sendo assim as razões morais e éticas devem estar presentes nesta forma de

manifestação de soberania do estado.

O instituto da desapropriação se apresenta por três formas: - Por utilidade pública ou

necessidade pública (Decreto lei 3.365/41, lei geral das desapropriações). - Por interesse

social (Lei 4.132/62). - Por interesse social para fins de reforma agrária (lei complementar

76/93).

Pela legislação e princípios brasileiros a propriedade não pode somente atender ao

interesse do indivíduo, mas também da coletividade.

No conceito de propriedade, destaca-se dois sentidos:

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a) sentido patrimonial: neste caso o bem que integra o patrimônio do indivíduo serve

para atender suas necessidades exclusivas.

b) bem de produção de alimentos e de matéria-prima para o setor industrial: a

produção agrária do trabalho do agricultor aplicado a produção é de interesse social e público.

O direito a propriedade corresponde ao dever do proprietário de fazer a terra

produzir, tendo a relação direito subjetivo/dever social.

A Constituição Federal de 88 tratou pela primeira vez da reforma agrária e da

política agrária em nível constitucional, introduzindo modificações nessa matéria e também

foi circunstanciada em outros aspectos como função social da propriedade e as medidas de

política agrícola.

Para que um imóvel rural seja desapropriado por interesse social para fins de reforma

agrária, são indispensáveis dois pressupostos básicos que devem preceder o ajuizamento da

ação de desapropriação:

a) a constatação de que o imóvel desatende a função social que lhe é inerente.

b) o conseqüente decreto presidencial apontando a desapropriação de tal imóvel

rural.

A "justa indenização" não está nos pressupostos, já que tal providência é condição

sine qua non para o recebimento da ação de desapropriação pelo poder judiciário.

O instituto jurídico da desapropriação é uma das medidas responsáveis pela

distribuição ou redistribuição das terras.

Um dos instrumentos para a realização da reforma agrária é a desapropriação de

imóveis rurais que não atendam a função social da propriedade, ou seja, que não atendam o

interesse da coletividade.

Com o surgimento da lei agrária essa modalidade de desapropriação foi efetivada

como meio hábil a efetivação do princípio da justiça social.

A Constituição Federal de 88 deu atenção especial a questão agrária. O Título VII,

Capítulo III trata da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária, ou seja, a questão

agrária recebeu um capítulo exclusivo, o que não ocorria nas constituições anteriores.

A reforma Agrária é uma forma de intervenção do estado na propriedade privada e

tem como fim principal a melhor distribuição da propriedade territorial rural, com a

modificação na posse e no uso da terra, reformando a estrutura fundiária.

15

O Estatuto da Terra (Lei 4.504 de 30 de novembro de 1964) traz a definição de

Reforma Agrária.

Art. 1º, § 1º Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição de terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender os princípios de justiça social e ao aumento de produtividade.

Esta definição explicita os objetivos principais da Reforma Agrária, ou seja, de uma

melhor distribuição da terra através de modificações no regime de sua posse e uso, atendendo

os princípios da justiça social e promovendo o aumento do produtividade que devem estar

juntos nos programas de Reforma Agrária, pois seu conceito tem amplo sentido social, sendo

inconveniente a Reforma Agrária que preocupando-se somente com a justiça social, esqueça-

se do aumento de produtividade, deixando neste caso de atender as finalidades para as quais

foi criada

Além de promover a justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador, a

Reforma Agrária deve atingir o desenvolvimento econômico. Assim o aumento de

produtividade é objeto de natureza econômica, mas com reflexos no campo social, pois visa

uma melhor distribuição de renda, já a função social tem como principal objetivo diminuir a

concentração de renda e terras sobre o domínio de poucos, buscando uma melhor distribuição

destes recursos para que a propriedade atinja a sua função social estabelecida na Constituição

Federal.

16

1 O DIREITO DE PROPRIEDADE

O direito de propriedade será o primeiro ponto a ser analisado nesta pesquisa, pois a

propriedade é o objeto atingido pela desapropriação, sendo então necessária a compreensão

deste instituto.

1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Na história da humanidade a propriedade teve diferentes formas sob a inspiração de

vários princípios distintos entre si.

A propriedade, antes do império romano, só existia para coisas móveis, sendo que as

coisas imóveis pertenciam à coletividade.

Antes da época romana, nas sociedades primitivas, somente existia propriedade para as coisas móveis, exclusivamente para objetos de uso pessoal, tais como peças de vestuário, utensílios de caça e pesca. O solo pertencia a toda a coletividade, todos os membros da tribo, da família, não havendo o sentido de senhoria, de poder de determinada pessoa (VENOSA, 1998, P 111). Essa situação nos tempos primevos facilmente se explica pelas condições de vida do corpo social de então (os povos primitivos que ainda hoje sobrevivem, distantes do contato com o homem civilizados mantêm a mesma organização). Enquanto os homens vivem exclusivamente da caça, da pesca e de frutos silvestres, não aflora a questão acerca da apropriação do solo. Admite-se a utilização em comum da terra pela família ou tribo. Não se concebe a utilização individual e exclusiva. Tanto a cultura do solo como a criação de animais são feitas em comum. Desaparecendo ou diminuindo os recursos naturais da caça pesca a agricultura no território, o grupo social deslocava-se para outra terras. Não estava o homem preso ao solo porque essa constante movimentação não o permitia. Destarte, não havia noção de utilização privativa do bem imóvel. No curso da história, a permanente utilização da mesma terra pelo mesmo povo, pela mesma tribo e pela mesma família passa a ligar então o homem à terra que usa e habita, surgindo daí, primeiramente, a concepção de propriedade coletiva e, posteriormente, individual. Houve povos que nunca instituíram a propriedade individual, enquanto outro somente a conceberam após muito tempo, não sem grandes lutas e sacrifícios (Fustel de Coulanges, v. 1, 1957: 83) (VENOSA, 1998, P 111/112).

Na Antigüidade, dois povos que tiveram grande influência universal atingindo até

mesmo os dias atuais, já tratava da questão propriedade nas suas sociedades. Eram eles os

gregos e os romanos.

A propriedade grega e romana colocava-se ao lado de duas outras instituições: a religião doméstica e a família, ambas com íntima relação entre si (Fustel de Coulanges, v 1, 1957:84). A propriedade privada ligava-se a própria religião e esta, por sua vez, à família, com o culto dos antepassados, os deuses-lares. O lar da família, lugar de culto, tem íntima relação com a propriedade do solo onde se assenta e onde se habitam também os deuses. Ali se situam o altar, o culto e a

17

propriedade do solo e das coisas que o guarnecem sob o poder do pater. Daí o sentido sagrado que se atribui ao lar, à casa, sentido que sempre permaneceu na civilização ocidental. Os deuses pertenciam somente a uma família, assim como o respectivo lar. Foi, portanto, a religião que garantiu primeiramente a propriedade. As divindades domésticas a protegiam (VENOSA, 1998, P 112).

Em algumas cidades gregas, a maior parte de suas colheitas deveriam ser gastas em

sociedade, mas mesmo assim tinham a propriedade absoluta do solo. A terra tinha mais valor

para eles do que os frutos provenientes desta, a colheita embora fruto do trabalho, tinha menos

importância do que a propriedade da terra.

O direito romano distinguiu três espécies de propriedade: a quiritária, a pretoriana ou

bonitária e a provincial.

A quiritária, protegida pelo direito civil transmitia-se por atos solenes e recaia sobre

bens imóveis nos solos itálicos, sendo que os titulares eram cidadãos romanos e correspondia

a uma espécie de soberania territorial, dominada pelo pater familias, cuja autoridade não

sofria restrições, gozando inclusive de imunidade fiscal, pois a cobrança de impostos seria

uma diminuição a onipotência do chefe da família, exercendo este um poder jurídico e

jurisdicional estando sua autoridade identificada com a propriedade dos bens da família.

Como em determinadas ocasiões alguns bens eram transferidos a terceiros de boa fé

sem as solenidades necessárias, os Pretores sentiram a necessidade de conceder uma proteção

àqueles que embora não sendo titulares do domínio, estavam na condição de verdadeiros

proprietários, surgindo assim as legis actiones, criadas pelos pretores em favor destes

proprietários. Esta nova propriedade cujos fundamentos encontram-se na equidade aplicada

pelos magistrados denominou-se pretoriana ou bonitária.

Algum tempo após, as províncias foram incorporadas ao Senado, havendo assim

duas espécies de domínio, uma do Senado ou do Imperador e outra através de concessões

feitas para aqueles que realmente usavam e gozavam das terras, nascendo assim a propriedade

provincial.

Posteriormente todos os habitantes do império romano passaram a gozar da cidadania

romana e aos poucos o Estado romano retira da família a sua competência política, atrofiando

os poderes do pater, reduzindo o direito de propriedade e desaparecendo os modos solenes de

sua transferencia, extinguindo assim as diversas espécies de propriedade, surgindo então um

novo conceito unitário de domínio, caracterizado pela sua exclusividade.

Como se vê, no seio dos gregos e romanos a propriedade assumiu contornos individualistas. Para estes últimos, apresentava-se ela como o jus utendi, fruendi et abutendi, isto é, o direito de usar, fruir e dispor da coisa. Cada coisa tem seu dono. Os poderes inerentes à propriedade são bem amplos, mas não absolutos (ROCHA, 1992, p. 22).

18

Em traços largos, o conceito de propriedade que veio a prevalecer entre os romanos, após longo processo de individualização, é o que modernamente se qualifica como individualista. Cada coisa tem apenas um dono. Os poderes do proprietário são os mais amplos (GOMES, 1998, P 101).

Na Idade Média o conceito unitário de propriedade modifica-se, ocorrendo uma

concorrência de proprietários, uma hierarquia oriunda do Direito Público. De um lado o

domínio eminente, direto (senhor) e do outro, o domínio útil (vassalo). O suserano delegava

poderes ao vassalo e consequentemente o vassalo tinha certas obrigações de caráter financeiro

e militar para o suserano, ou seja, o titular do domínio eminente concede o direito de

utilização econômica do bem e recebe em troca serviços ou rendas. O vassalo possui o dever

de solidariedade e fidelidade ao suserano como também uma série de encargos fiscais e

militares.

A propriedade medieval caracteriza-se pela quebra deste conceito unitário. Sobre o mesmo bem, há concorrência de proprietários. A dissociação revela-se através do binômio domínio eminente + domínio útil. O titular do primeiro concede o direito de utilização econômica do bem e recebe, em troca, serviços ou rendas. Quem tem o domínio útil perpetuamente, embora suporte encargos, possui, em verdade uma propriedade paralela (GOMES, 2001, P. 101/102). Na época medieval, já no século V, os senhores feudais (os nobres), detinham a propriedade absoluta dos domínios feudais, isto é, os nobres eram os únicos donos das terras. "Feudo" tem origem na palavra fêhod, do germânico, que significa concessão de terras. Isto é, os fêudos se originaram de concessões, que o rei fazia, transmitindo o domínio de certa quantidade de terras aos senhores feudais, em troca da ajuda contra as invasões estrangeiras. Entre o rei (suserano) e seus vassalos, havia direitos e obrigações recíprocas para a defesa das terras (DOWER, P 96).

A abolição dos privilégios da nobreza ocorreu na Revolução Francesa, onde o direito

de propriedade foi afastado dos direitos políticos, direitos de cobrar impostos e poder de

jurisdição, afirmando-se como direito civil, direito de utilização econômica da coisa com

ampla liberdade, dentro dos limites da regulamentação legal existente.

Foi a revolução francesa, em 1789, que aboliu, definitivamente, os privilégios e os direitos feudais, restabelecendo a unidade e exclusividade do direito de propriedade e impondo o critério da aquisição da propriedade pela livre iniciativa (DOWER, P 96).

No século XIX, época do Liberalismo, os poderes do proprietário foram

reconhecidos amplamente, sendo que o estado somente poderia intervir na propriedade em

casos excepcionais.

A Constituição Imperial Brasileira de 1824, art. 179, n. 22 garantia o direito de

propriedade em toda sua plenitude. A Constituição de 1934, art. 113, n. 17, frisou que esse

direito não poderá ser exercido contra o interesse social e coletivo, já a Carta de 1937, art.

122, n. 14, relegou para a legislação ordinária a regulamentação do conteúdo e dos limites do

19

direito de propriedade. Com a Constituição de 1946, ficou assegurado em caso de

desapropriação uma justa e prévia indenização (art. 141, § 16), permitiu a intervenção do

Estado no domínio econômico (art. 146), condicionando o uso da propriedade ao bem-estar

social, autorizando a lei ordinária a promover a justa distribuição da propriedade (art. 147).

A Constituição de 1967, art. 153, § 22, estabeleceu a possibilidade de desapropriação

por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social. A Constituição de 1988 garante o

direito de propriedade, com a possibilidade de desapropriação por necessidade ou utilidade

pública ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro (art. 5º, XXII

e XXIV) e, ainda o art. 5º, XXIII e art. 170, III assentam que a propriedade atenderá a sua

função social.

Com a evolução ocorreu uma socialização da propriedade, submetendo os interesses

individuais às exigências do bem-estar comum.

Vimos assim a evolução do direito de propriedade, diretamente vinculada as condições econômicas e políticas do momento, oscilando entre a exclusividade romanista e a dispersão ou superposição medieval, ora com amplas garantias para seu titular, ora dependendo do interesse social representado pela vontade estatal. É, assim, um dos conceitos mais maleáveis do direito, adaptando-se sempre às contingência do momento, como verdadeiro instrumento do equilíbrio social, procurando conciliar as exigências, muitas vezes antagônicas, da segurança e da justiça, dos interesses coletivos e individuais (WALD, 2002, p. 115).

1.2 CONCEITO

Antes da conceituação de propriedade, inteligível é saber seu sentido etimológico:

para alguns vem do latim proprietas, derivado de proprius, designando o que pertence a uma

pessoa, desta forma, em sentido amplo seria toda relação jurídica de apropriação de um certo

bem corpóreo ou incorpóreo. Para outros vem de domare, que significa dominar,

correspondendo a idéia de domus, casa em que o senhor da casa se denomina dominus, assim

seria o poder que se exerce sobre as coisas que lhe estiverem sujeitas. Nota-se que no direito

romano a palavra dominium indicava tudo que pertencia ao chefe da casa, tendo um sentido

mais restrito que "propriedade", sendo que esta abrangia coisas corpóreas e incorpóreas. Já

nos dias atuais empregam-se estes dois termos para designar a mesma coisa, sendo que não há

diferença de conteúdo.

A propriedade é o mais amplo dos direitos reais, o mais amplo direito do senhorio

sobre uma coisa, abrange todas as categorias dos direitos reais.

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Sua conceituação pode ser feita à luz de três critérios: o sintético, o analítico e o descritivo. Sinteticamente, é de se defini-lo, com Windscheid, como a submissão de uma coisa, em todas as suas relações, a uma pessoa. Analiticamente, o direito de usar, fruir e dispor de um bem e de reavê-lo de quem injustamente o possua. Descritivamente, o direito complexo, absoluto perpétuo e exclusivo pelo qual uma coisa fica submetida à vontade de uma pessoa, com as limitações da lei (GOMES, 1998, P 97).

Como conceituação básica tem-se propriedade como o direito que a pessoa física ou

jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar gozar e dispor de um bem, corpóreo ou

incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha.

O direito de usar é utilizar a coisa, sem que haja modificação da sua substância, bem

como deixar de utilizá-lo, mantendo-o inerte; o direito de gozar é a percepção dos frutos e a

utilização dos produtos da coisa; já o direito de dispor abrange o poder de consumi-la, grava-

la de ônus ou submetê-la ao serviço de outrem; e o rei vindicatio é o poder que tem o

proprietário de ingressar ação judicial para obter o bem de quem injustamente o possua. O

proprietário pode servir-se da coisa, de perceber seus frutos e de lhe dar a destinação.

1.3 ESPÉCIES DE PROPRIEDADE

Com relação à extensão do direito do seu titular:

a) é plena quando todos os direitos elementares que a formam se acham reunidos na

pessoa de seu proprietário; quando o seu titular pode usar, gozar e dispor do bem de modo

absoluto exclusivo e perpétuo, bem como reivindicá-lo de quem injustamente o possua.

b) é restrita quando um ou alguns de seus poderes se desmembra e passa a ser de

outrem. Por estes processos formam-se os direitos reais sobre coisas alheias. Pode-se citar

como exemplo o usufruto, onde o nu proprietário tem sua propriedade limitada, pois o

usufrutuário tem o uso e o gozo.

c) é nua os direitos que a formam não estão na pessoa do proprietário.

Com relação a perpetuidade do domínio:

a) é perpétua quando tem duração ilimitada

b) é resolúvel a que se encontra, no seu título constitutivo, um razão de sua extinção,

ou seja, as partes estabelecem uma condição resolutiva. Temos como exemplo a retrovenda,

onde o vendedor tem o direito de resgatar a coisa vendida, dentro de determinado prazo,

pagando o mesmo preço ou diverso, previamente convencionado.

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1.4 CARACTERÍSTICAS

a) absoluta: pois o proprietário tem sobre a coisa que lhe pertence o mais amplo

poder jurídico, podendo usar e desfrutar da coisa da maneira que quiser. Porém está sujeito a

certas limitações impostas por interesse público, sendo assim o proprietário não pode molestar

com o exercício do poder de propriedade, o interesse da sociedade.

É absoluta porque o seu proprietário tem sobre a coisa que lhe pertence o mais amplo poder jurídico, podendo usar e desfrutar da coisa de maneira que lhe aprouver. Vale dizer, o proprietário da coisa pode decidir livremente se deve usar, alienar, abandonar ou destruí-la como bem entender. Está sujeito, porém, a certas limitações impostas pelo interesse público. Por isso, prevalece o entendimento de que uma pessoa, embora na situação privilegiada de proprietário, não pode molestar com o exercício desse poder, o interesse da comunidade. E, como consectário desse poder jurídico especial é que se manifesta a oponibilidade erga omnes (contra todos) (DOWER, P 93).

b) exclusividade: a propriedade é exclusiva, sendo que pessoa estranha não pode

interferir na coisa de propriedade alheia. A coisa não pode pertencer com exclusividade e

simultaneamente, a duas ou mais pessoas.

A propriedade sobre a coisa corpórea é exclusiva, vale dizer, a pessoa estranha não pode exercer ação alguma. Da exclusividade decorre que a coisa não pode pertencer, com exclusividade e simultaneamente, a duas ou mais pessoas. Cada coisa tem, pois, apenas um dono (DOWER, P 93). O princípio da exclusividade sofre ainda outra limitação: é possível o desmembramento de parcelas da propriedade, distribuídas a outrem, como acontece, por exemplo, no usufruto: o uso e o gozo são do usufrutuário, enquanto a disponibilidade é do nu-proprietário (DOWER, P 94).

c) perpetuidade: sua duração é ilimitada; uma vez adquirida passa, por sucessão, aos

herdeiros do dono atual, indefinidamente, exceto se o título de sua constituição, por vontade

das partes tiver condição resolutiva.

A propriedade é perpétua, porque é de duração ilimitada. A propriedade, uma vez adquirida, passa, por sucessão, aos herdeiros do dono atual, indefinidamente, exceto se o título de sua constituição, por vontade das partes, contiver condição resolutiva. A propriedade será, então, resolúvel, como acontece na retrovenda, com fideicomisso etc. Normalmente a propriedade tem duração ilimitada; por exceção, admite-se propriedade revogável pela vontade das partes (DOWER, P 94).

1.5 OBJETO DA PROPRIEDADE

Tradicionalmente pode ser objeto de domínio os bens corpóreos (móveis ou

imóveis), mas também se estende aos bens incorpóreos.

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O objeto do direito de propriedade não é definido em termos incontroversos. Tradicionalmente, afirma-se que hão de ser os bens corpóreos, mas, contra essa doutrina, que foi pacífica, levantou-se corrente doutrinária que o estende aos bens incorpóreos. Seus partidários admitem a existência de propriedade literária, artística e científica, que, recaindo nas produções do espírito humano, teria como bens imateriais. Outros vão adiante, sustentando que os direitos podem ser objeto de propriedade. Recentemente, o conceito de propriedade alarga-se abrangendo certos valores, como o fundo de comércio, a clientela, o nome comercial, as patentes de invenção e tantos outros. Fala-se, constantemente, em propriedade industrial para significar os direitos dos inventores e o que se assegura aos industriais e comerciantes sobre as marcas de fábricas, desenhos e modelos. Chega-se até a admitir a propriedade de cargos e empregos (GOMES, 1998, P 98/99).

Os objetos corpóreos do direito de propriedade atem-se a três princípios:

corporiedade ou materialização, individualização e acessoriedade. Sendo assim tal objeto

deverá ter valor econômico materializado, individualmente determinado, com todos os seus

acessórios.

Admitem-se os bens incorpóreos como objeto de propriedade, sendo que os

ordenamentos jurídicos da propriedade imaterial são regulados como relação de domínio do

mesmo teor dos bens corpóreos.

O fenômeno da propriedade incorpórea explica-se como reflexo do valor psicológico da idéia de propriedade, mas embora esses direitos novos tenham semelhança com o de propriedade, porque também são exclusivos e absolutos, com ela não se confundem. A assimilação é tecnicamente falsa. Poderiam enquadrar-se, contudo, numa categoria à parte, que, alhures, denominamos quase-propriedade (GOMES, 1998, P 99).

1.6 CONTEÚDO

O direito de propriedade com relação a sua extensão deve ser apreciado em duplo

aspecto: extrínseco e intrínseco.

No aspecto extrínseco, consiste em determinar os limites objetivos do poder do

proprietário. Se recair sobre bens móveis, não há nenhuma dificuldade em limitar o direito de

propriedade, pois além de serem suscetíveis de individualização, ocupam no espaço lugar

definido, podendo ser materialmente isolados. Se recair sobre bens imóveis, sua extensão é

objeto de controvérsias, pois embora possa ser delimitada horizontalmente, sua extensão

vertical gera muita polêmica com relação ao subsolo e ao espaço aéreo.

Sob o aspecto extrínseco, consiste o problema em determinar os limites que circunscrevem o objetivamente o poder do proprietário. Para sua solução, há que distinguir a propriedade mobiliária da imobiliária. Se a propriedade recai em móveis, nenhuma dificuldade surge, porque tais bens, além de suscetíveis de perfeita individualização que permite determinação específica, ocupam, no espaço, lugar precisamente definido, podendo ser materialmente isolados, mas se a propriedade

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incide sobre coisas imóveis, o problema de sua extensão complica-se, porque, embora possa ser delimitada horizontalmente, confinando-se entre vizinhos, sua extensão vertical é objeto de controvérsias,... ( GOMES, 1998, P 100).

Já no aspecto intrínseco pode-se analisar o conteúdo sobre dos ângulos. Deve-se

determinar a extensão dos direitos do proprietário, e fixar as limitações que a ordem jurídica

impõe ao seu exercício.

Sob o aspecto intrínseco, o problema do conteúdo do direito de propriedade pode ser encarado de dois ângulos diversos. Do primeiro, consiste em determinar as faculdades inerentes a esse direito, firmando-se, em resumo, a extensão dos poderes do proprietário como direito complexo que é. Do segundo, em fixar as limitações que a ordem jurídica impõe ao seu exercício. A visão por qualquer desses ângulo será sempre estreita e unilateral. Tanto o conteúdo positivo como o negativo devem ser destacados para o esclarecimento completo dos termos do problema. As faculdades inerentes ao domínio resumem-se, em apertada síntese, no jus vindicandi e, compreendido no jus abutendi, o jus disponendi, como é óbvio. As limitações atingem o exercício do direito, do ponto de vista intensivo (GOMES, 1998, P 100).

1.7 AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

O sistema de aquisição do domínio a ser adotado pelo Brasil, tinha dois grandes

modelos a disposição, o sistema francês e o sistema germânico.

No sistema francês a propriedade é adquirida entre outros modos, pelo contrato, ou

seja, o simples contrato de compra e venda transmite a propriedade, não sendo necessário

qualquer outro ato para a sua transmissão. O registro do título aquisitivo de propriedade, no

registro de imóveis, serve apenas para dar publicidade e conhecimento a terceiros da venda do

imóvel.

Para o sistema francês, a transcrição no registro imobiliário não é constitutiva de direito real. O efeito translativo decorre do próprio contrato de compra e venda, doação permuta e etc. O contrato é, ao mesmo tempo, obrigação e fato gerador do direito real. Transfere-se a propriedade pelo simples consentimento. Quanto aos imóveis, existe nesse direito duas fases distintas: quando do contrato, a propriedade transfere-se, acarretando efeitos entre as partes; com o registro imobiliário, o direito alcança o efeito erga omnes. O registro tem apenas o efeito de tornar o negócio público e oponível perante terceiros. Comenta Serpa Lopes, v. 6, 1964:517): Do ponto de vista formal, o sistema do Registro de Imóveis do Direito francês é calcado sobre o critério do nome das pessoas, não se levando em conta o imóvel. O número de atos subordinados ao registro são em número deficiente. Os efeitos da transcrição limitam-se, como já vimos, aos de simples oponibilidade do ato em relação a terceiros. Têm caráter puramente negativo. Nenhuma presunção de exatidão (VENOSA, 1998, P 123). No sistema franco-italiano, o contrato transfere a propriedade entre as partes, e só o registro a transfere para terceiros. Desse modo, assinado o contrato de compra e venda, por exemplo, o vendedor não pode recusar-se a entregar a coisa vendida ao comprador. Este já tem a propriedade do objeto em virtude da simples assinatura do contrato, e pode, pois, reivindicá-la, embora os terceiros só reconheçam a sua propriedade após a transcrição do ato no Registro de Imóveis. Ocorre, assim, o que

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se denominou efeito real limitado, ou seja, a criação de direito real (pois não se resolve em perdas e danos) entre as partes e não em relação a terceiros (WALD, 2002, P 149).

Já no sistema germânico, a aquisição da propriedade imóvel depende para sua

validade, além do contrato entre as partes, a sua inscrição no registro de imóveis. O contrato é

o negócio jurídico e gera a obrigação entre as partes, mas não produz por si só a transferência

do domínio. Sendo assim enquanto não houver a inscrição no registro de imóveis o titular do

direito alienado permanece proprietário, não permitindo ao adquirente transferir ou gravar o

imóvel.

Pelo sistema alemão, a ato jurídico que cria a obrigação de transferir a propriedade é independente do ato pelo qual a propriedade se transfere. Este é uma convenção feita com esse objetivo especial, que, tendo embora como causa o outro negócio jurídico, a ele não está condicionado, porque, na transmissão da propriedade, abstrai-se a causa. Também nesse sistema, o contrato, que serve de causa à aquisição da propriedade, não é suficiente para produzi-la. Outro negócio se faz necessário, e é, por seu intermédio, que se verifica a inscrição no Registro Imobiliário de que resulta a transmissão do domínio. Distingue-se do sistema romano porque, neste, há vinculação do modo ao título; a causa não é abstraída; e não é necessário outro negócio jurídico (GOMES, 1998, P 134). No sistema germânico e brasileiro, o contrato só cria obrigações, cujo inadimplemento importa perdas e danos, isto é, o ressarcimento do prejuízo causado. Mas o contrato, por si só, não transfere a propriedade. Assim, se o vendedor não entrega a coisa vendida e a escritura de venda, por qualquer motivo, não pode ser transcrita no Registro de Imóveis, a única possibilidade para o comprador é rescindir a compra e pedir uma indenização pelos prejuízos que o vendedor lhe causou (WALD, 2002, P 149).

No Brasil, antes da vigência do Código Civil de 1916, o sistema adotado era o

francês, ou seja, a aquisição da propriedade se dava apenas pelo contrato entre as partes e o

título aquisitivo era levado ao registro de imóveis apenas para dar publicidade a terceiros.

O sistema em vigor no Brasil, até a vigência do Código Civil, em 1917, era o sistema francês: a aquisição da propriedade se fazia tão só pelo contrato. A compra e venda produzia eficácia real imediata, por força do consentimento das partes. O título aquisitivo era levado ao Registro de Imóveis para dar publicidade a terceiros, tendo, portanto, a função de conceder, por exemplo, prioridade àquele em cujo o nome se registrou o imóvel, num conflito entre dois títulos opostos (DOWER, P 107).

Com o Código Civil de 1916, passou a vigorar no Brasil o sistema germânico. A

aquisição de propriedade imóvel por ato inter vivos passou a depender de sua inscrição no

registro de imóveis, ou seja a transcrição do título passou a ser formalidade indispensável para

a aquisição do imóvel. Vale observar que quando a transferência se da por causa mortis, o

registro é ato de publicidade e para que o adquirente possa dispor da propriedade.

A partir de então, a aquisição da propriedade imóvel, por ato inter-vivos, passou a depender não só do título, mas, também, da sua transcrição (registro) no Registro de Imóveis. A transcrição (registro) do título passou a ser, portanto, formalidade indispensável para a aquisição do imóvel (DOWER, P 107).

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Portanto para se ter o domínio de um imóvel, não basta a escritura pública referente à sua compra, sendo necessário, também, o registro dos títulos aquisitivos imobiliários no Cartório de Registro de Imóveis. É nesse momento que o oficial do Cartório transfere a propriedade para o nome do adquirente. Assim, aquele cujo o nome se encontra registrado (transcrito) no Registro Imobiliário, é o dono do imóvel, em conseqüência de um ato reconhecido por lei. O registro a que nos referimos, tem também a finalidade de tornar público o ato de transmissão do imóvel (DOWER, P 105/106).

1.7.1 Classificação dos Modos de Adquirir a Propriedade

Os modos de se adquirir a propriedade classificam-se por diversos critérios, como os

que levam em conta a distinção dos bens, os que consideram a causa de aquisição e os que se

baseiam em seu objeto encarado sob o seu aspecto de individualização.

Conforme o primeiro critério, os modos de adquirir classificam-se com apoio na distinção fundamental entre bens móveis e imóveis. Subdividem-se em modos de adquirir peculiares aos imóveis, peculiares aos móveis e comuns aos móveis e imóveis. O modo de adquirir peculiar aos imóveis é a transcrição. Os modos de adquirir peculiares aos móveis são: a ocupação, a especificação, a confusão, a comistão, a adjudicação e a tradição. São modos comuns de aquisição da propriedade, servindo tanto para os móveis como para os imóveis, a sucessão, a usucapião e, segundo alguns, a acessão. De acordo com o segundo critério, os modos de adquirir classificam-se em originários e derivados. São modos originários: a ocupação, a usucapião e a acessão natural. Todos os outros modos de adquirir são derivados. Segundo o terceiro critério, classificam-se em modos de adquirir a título singular e a título universal. O modo único de aquisição a título universal admitido pelo nosso direito é a sucessão hereditária. Os outros são a título singular, cumprindo notar que a própria sucessão tem este caráter na parte em que contém legados (GOMES, 1998. P 135/136).

Dos modos de aquisição, devemos destacar a desapropriação, que não é um ato

negocial, mas um ato de império que exige registro não dependente de título anterior.

1.7.1.1 Aquisição de Bens Móveis e Imóveis

É importante distinguir a aquisição de propriedade imóvel da propriedade móvel.

Bens imóveis adquirem-se por transcrição, sucessão, usucapião e acessão, já os bens móveis

adquirem-se por tradição, sucessão, usucapião, ocupação, especificação, comistão, confusão e

adjudicação.

Constata-se que a transmissão de bens móveis se dá ordinariamente pela simples

tradição, enquanto que a transmissão de bens imóveis por ato inter vivos se dá pela transcrição

do título no registro público competente. As solenidades exigidas para a transmissão de bens

imóveis dão maiores garantias para a circulação imobiliária, assim é que a alienação de bens

imóveis deve obedecer necessariamente à forma da escritura pública. O título revestido de

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todas as formalidades necessárias é levado para a transcrição para que produza os seus efeitos

da transmissão.

É de grande importância prática a distinção entre os modos de adquirir os bens móveis e imóveis. Basta atentar na circunstância de que os bens imóveis se adquirem ordinariamente inter-vivos pela transcrição do título em registro público apropriado, enquanto os bens móveis se adquirem por simples tradição. A lei cerca de maiores garantias a circulação da riqueza imobiliária, exigindo solenidades para a transmissão da propriedade dos bens imóveis, que se estendem até o próprio título. Assim é que a alienação de tais bens deve obedecer necessariamente à forma da escritura pública. O título, se revestido das solenidades legais, há de ser levado à transcrição para que se produza o efeito translativo. Por outro lado, os prazos para a aquisição da propriedade de um bem imóvel por usucapião são mais dilatados do que para a aquisição da propriedade de um bem móvel. Em suma, diversos se apresentam, nas legislações em geral, os regimes a que se subordina a transferência da propriedade mobiliária e imobiliária (GOMES, 1998, P 136).

1.7.1.2 Modos Originários e Derivados

A aquisição originária não pressupõe transmissão por quem quer que seja. Temos

como aquisição originária o usucapião, a acessão e a ocupação.

Já a aquisição derivada pressupõe transmissão, ou seja, a transferência de uma

propriedade de uma pessoa para outra, por ato inter vivos, ou fato causa mortis. Temos como

exemplo de aquisição derivada o registro da escritura pública e o direito hereditário.

A distinção entre modos originários e derivados funda-se na existência ou inexistência da relação entre precedente e conseqüente sujeito de direito. Sempre que há, o modo é derivado. Caso contrário, originário. Tanto na ocupação como na usucapião e na acessão natural, inexiste a relação. Por isso, dizem-se modos originários (GOMES, 1998, P 137). Distinguem-se, outrossim, os modos originários e derivados de aquisição da propriedade, sendo os primeiros aqueles em que o direito do titular independe de qualquer relação com um titular anterior, enquanto a propriedade derivada é a decorrente de alguma operação com um predecessor na titularidade do direito. Existem, na realidade, duas acepções de propriedade originária. Para alguns consiste no domínio de coisa que jamais anteriormente fora apropriada. Por exemplo, a propriedade oriunda de caça e pesca. Para outros, é a propriedade de bens que, anteriormente, puderam ser ou não objeto de propriedade alheia mas na qual existe qualquer relação entre o proprietário anterior e o novo. É o que ocorre, por exemplo, no caso de usucapião. Pode o bem usucapido ter sido de outrem, mas o novo titular adquiriu o seu direito sem que este decorresse do antigo proprietário. Trata-se de propriedade juridicamente originária (WALD, 2002, P 153).

Tal distinção tem importância, nos efeitos que produzem. Se a aquisição de

propriedade ocorre por modo originário, esta se incorpora ao patrimônio do adquirente em

toda a sua plenitude. Se ocorrer pelo modo derivado, transfere-se com os mesmo atributos,

restrições e qualidades que possuía no patrimônio do transmitente, se condiciona a do

predecessor, adquirindo o novo proprietário o direito que tinha e lhe transmitiu o antigo

proprietário.

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Tem-se a aquisição originária quando o indivíduo faz seu o bem sem que este lhe tenha sido transmitido por alguém, não havendo qualquer relação entre o domínio atual e o anterior, como sucede na acessão e no usucapião. Diz-se derivada a aquisição quando houver transmissibilidade de domínio, por ato causa mortis ou inter vivos. Tal se da no direito hereditário e em negócio jurídico seguido de transcrição (DINIZ, 2001, P 119).

1.7.1.3 Modos de Adquirir a Título Singular e a Título Universal

Ocorre aquisição a título singular quando tem por objeto um ou vários bens

individualizados. A aquisição a título particular pode recair nas coisas singulares, compostas e

universalidades de fato. Verifica-se, ordinariamente, por negócios inter vivos, mas que

também ocorre por ato causa mortis, como por exemplo, no legado onde o testador transfere

ao legatário um bem individualizado e específico.

Já na aquisição a título universal a transmissão da propriedade recai num patrimônio.

Analisando o princípio da unidade do patrimônio, o melhor exemplo do modo de aquisição a

título universal é a sucessão hereditária. O adquirente sucede em todos direitos reais e

processuais do transmitente e nas obrigações dele para com terceiros, haja vista que o

sucessor continua a pessoa de quem o adquirente recebe a coisa; já na aquisição a título

singular, o adquirente sucede nos direitos, não se tornando responsável pelas obrigações

pessoais contraídas pelo alienante.

Será a sucessão singular quando o novo titular assume a condição jurídica do antecessor, sem, contudo, se sub-rogar na totalidade dos seus direitos, pois a aquisição tem por objeto coisas individualizadas. Ocorre, em regra, nos negócios jurídicos inter vivos , se bem que, como nos casos dos legados, pode originar-se de ato mortis causa. Na sucessão universal o novo proprietário sucede o anterior em todos os seus direitos e obrigações; essa transmissão se dá por meios de atos causa mortis, em que o herdeiro( legítimo ou testamentário) ocupa o lugar do de cujus (DINIZ, 2001, P 120). Na aquisição, a título universal o sucessor assume todos os direitos reais e obrigações do transmitente, com relação a este e a terceiros. Na aquisição singular têm-se em mira exclusivamente os direitos que cercam a coisa certa e determinada transmitida (VENOSA, 1998, P 126).

1.7.2 Da Aquisição pelo Registro

O Código Civil de 1916 refre-se a transcrição como primeira hipótese de aquisição

de propriedade imóvel. No entanto, este vocábulo deve ser adaptado ao Código Civil de 2002,

onde a palavra transcrição deve ser substittuída pela palavra registro. Assim, o que a dutrina

baeada no Código de 1916 chamava de transcrição, agora deve ser tratada como registro.

O registro da propriedade dos bens imóveis, além de dar publicidade ao ato, traz

maior segurança no que diz respeito a circulação imobiliária. Esta organização é baseada na

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importância econômica e social atribuída aos bens imóveis, como também na possibilidade de

sua individualização.

A transmissão de propriedade de bens imóveis, para ter validade, deve se realizada

no Registro de Imóveis, permitindo assim, que todos tenham conhecimento de quem

realmente pertence o imóvel.

É o principal modo de aquisição de propriedade imóvel, sem o registro, não se

adquire a propriedade do bem imóvel. Além do título translativo, deve ocorrer o registro.

Sem transcrição, não se adquire inter vivos a propriedade do bem imóvel. É seu principal modo de aquisição. Não basta o título translativo. Preciso é que seja registrado. Do contrário, não opera a transferência, a que simplesmente, serve de causa. Assim é nos sistemas jurídicos, como o nosso, que não reconhecem força translativa aos contratos. Neles, o negócio jurídico, que tenha a função econômica de transferir o domínio, produz, tão somente, a obrigação de o transferir. Quem quer adquirir a título oneroso um bem de raiz serve-se do contrato de compra e venda, instrumentado numa escritura pública, que é apenas o titulus adquirendi, da propriedade da coisa comprada. Para que a transferência se verifique, isto é, para que o comprador se torne o dono da coisa comprada, é preciso que o título de aquisição seja registrado no Ofício de Imóveis (GOMES, 1998, P 140).

O registro da propriedade não produz somente o efeito de transferência do domínio,

mas também para dar publicidade ao ato, levando-o ao conhecimento da sociedade, para todos

terem conhecimento da situação do imóvel, com seu histórico e os ônus que o gravam. "Face

o exposto, podemos concluir, finalmente, que o registro ocasiona dois efeitos: 1) é forma de

aquisição do domínio da propriedade imobiliária; 2) é meio de publicidade e de

disponibilidade da coisa (DOWER, P 113)."

O domínio do imóvel, não passa do alienante para o adquirente, antes de preenchidas

as formalidades do registro do título de transmissão. Até o registro está o alientante como

senhor do imóvel e, por conseguinte retém todos os direitos sobre o domínio do imóvel,

podendo instituir ônus reais, hipotecar, alienar e etc. Como também o imóvel fica sujeito ao

pagamento de suas dívidas. O adquirente antes do regisro, não pode dispor do imóvel, gravá-

lo de ônus reais, hipotecá-lo, reivindicá-lo ou repelir com exceção de domínio as ações reais,

penhoras, arrestos, seqüestros, promovidos por terceiros.

A posição do adquirente é muito clara.

Só adquiri o domínio com a transcrição; antes dela não tem domínio; - é portanto um mero credor do alienante, contra o qual só lhe compete ação pessoal para obrigá-lo ou a entregar o imóvel, ou indenizar perdas e danos; nem tampouco pode invocar a ação de reivindicação contra terceiros (DOWER, P 113).

Nenhum titulus adquirendi, - como, por exemplo: a compra e venda, a troca ou

permuta, dação em pagamento, transação em que imóvel estranho ao litígio, doação - é título

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hábil para transmitir a propriedade do bem imóvel. Todos estão sujeitos ao registro, sejam

onerosos ou gratuitos.

A transcrição está para os imóveis como a tradição para os móveis. È uma tradição solene, pela publicidade de que se reveste. Teixeira de Freitas, referindo-se a transcrição exigida na lei hipotecária e depois ampliada à aquisição da propriedade imobiliária, afirmou que passara a ser o modo de tradição das coisas imóveis (GOMES, 1998, P 141).

O registro do imóvel subordina-se a três princípios: o da obrigatoriedade; o da fé

pública e o da possibilidade de retificação.

No princípio da obrigatoriedade o registro do título translativo é indispensável para a

aquisição da propriedade por ato inter vivos. Somente o registro confere propriedade, não

bastando à escritura e antes de tal registro o alienante continua como dono do imóvel, sendo

responsável inclusive por seus encargos. Caso o alienante vender o imóvel para duas pessoas

diferentes com duas escrituras, adquire a propriedade àquela que primeiro registrou o imóvel,

independente de ter firmado a escritura posteriormente. Qualquer pessoa pode promover o

registro, sendo o título hábil para a transcrição, ou seja, uma vez realizada todas as

formalidades exigidas, constitui título hábil para ser levado a registro.

Pelo princípio da fé pública o próprio registro traduz o valor da sua prova,

incumbindo ao prejudicado provar que tal registro é falso, pois se presume verdadeiro até que

se prove o contrário.

A retificação importa na alteração substancial do registro, pois tem como

conseqüência, a devolução da propriedade, independente do consentimento daquele a quem a

retificação prejudica.

Um registro defeituoso não deve subsistir. A inexatidão pode ocorrer em relação aos fatos, como no caso de descrição incompleta do imóvel, ou à própria situação jurídica, como na hipótese de aquisição a non domino. Se o teor do registro não exprime a verdade, o prejudicado pode reclamar a retificação. A reclamação deve ser feita em processo contencioso. Se procedente, o juiz ordena a retificação. O Ministério Público deve ser ouvido no pedido de retificação. Impugnado o pedido, o juiz remete o interessado para as vias ordinárias. O registro pode ser nulo de pleno direito. Neste hipótese, provada a nulidade, tem-se por inválido independentemente de ação direta. Pode também ser anulado por efeito de julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade do título translativo, e ainda de sentença sobre fraude à execução. A presunção estabelecida pelo registro em favor da pessoa em cujo o nome a propriedade foi registrada, sendo juris tantum, pode ser destruída. Verificado que não é o verdadeiro proprietário quem tem o imóvel registrado em seu nome, o registro terá de ser anulado, se a boa-fé não o validar nos termos já expostos. O registro pode ser cancelado. O cancelamento se faz por decisão judicial, ou documento hábil. Antes de feito produz todos os efeitos legais, ainda que por outra maneira se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido. Já a matrícula cancela-se em razão de alienações parciais do imóvel e por aglutinações de imóveis contíguos pertencentes ao mesmo dono (GOMES, 1998, P 147).

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Fala-se ainda no princípio da continuidade onde é necessário o registro do título

anterior, nas transmissões.

O momento da aquisição da propriedade dá-se pelo registro, quando o título

translativo é registrado.

São documentos hábeis para o registro: os escritos particulares revestidos das

formalidades legais; as escrituras públicas; os atos autênticos de países estrangeiros; as cartas

de sentença e os mandados judiciais.

1.7.3 Da Aquisição pela Acessão

O vocábulo acessão pode ter várias compreensões. Em um sentido mais amplo

significa aumento da coisa objeto de propriedade. Esse aumento tanto pode ser dar no volume

quanto no aumento do bem. Se a acessão de dá por forças internas da coisa, chama-se acessão

discreta e se manifesta na produção de frutos, sendo que não é acessão propriamente dita, pois

não é modalidade de aquisição de propriedade. Se a acessão se dá por forças externas, chama-

se acessão contínua e é considerado um modo de aquisição da propriedade.

Já em seu sentido mais estrito, significa o aumento do volume ou valor do objeto da

propriedade, devido a forças externas, ou seja, é a acessão contínua, pela qual uma coisa se

incorpora a outra por ação humana ou causa natural.

A acessão pode realizar-se por três modos: a) de imóvel a imóvel; b) de móvel a

imóvel; c) de móvel a móvel.

São espécies de acessão de imóvel a imóvel: a aluvião; a avulsão; e a formação de ilhas em rio. A cessão de móvel a imóvel verifica-se com as plantações e construções. Por fim, alguns consideram modos de acessão de móvel a móvel a comistão, a confusão, a adjudicação e a especificação (GOMES, 1998, P 150).

A acessão pode ainda ser classificada em natural e artificial ou industrial.

Divide-se, ainda, a acessão em natural e artificial ou industrial. Natural quando a união ou incorporação da coisa acessória à principal resulta de acontecimento natural. Artificial ou industrial, quando é conseqüência do trabalho humano. A aluvião, a avulsão e a formação de ilhas são casos de acessão natural. As plantações e as contruções, de acessão artificial (GOMES, 1998, P 150).

1.7.3.1 Da Acessão pela Formação de Ilhas

A formação de ilhas nos rios que não sejam públicos pertence aos proprietários dos

terrenos ribeirinhos de ambas as margens, em proporção as suas testadas. Se a ilha se formar

entre uma das margens e a metade do rio, esta pertencerá ao proprietário da margem mais

próxima.

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A formação de ilhas no leito de rios não navegáveis dá origem à propriedade dos titulares das margens ribeirinhas na proporção de suas testadas: insula in flumine nata. O fenômeno pode decorrer da sedimentação paulatina que faz nascer a ilha ou pelo rebaixamento de águas que coloca solo à mostra no leito do rio. As ilhas formadas no meio do rio são consideradas acréscimo aos terrenos ribeirinhos. Divide-se o rio pela linha da metade do álveo, fracionando-se a ilha em duas partes (VENOSA, 1998, P 131).

Se a ilha se formar em um rio navegável, a acessão se verifica em proveito da pessoa

de direito público, em cujo domínio se encontrem, seja a União, os Estados ou os Municípios.

1.7.3.2 Da Acessão por Aluvião

Esta forma de acessão se verifica pelo acréscimo paulatino de terras que o rio deixa

naturalmente nos terrenos ribeirinhos, em que o rio tira de uma das margens para depositar em

outra, sem que se possa saber ao certo de onde se desprenderam as aluviões, sendo que o

referido acréscimo passa a pertencer aos donos dos terrenos marginais.

Para haver aluvião, o incremento deve se realizar imperceptivelmente, sem que se possa saber a quem pertencem as terras trazidas pela corrente, sem que se possa determinar o lugar de onde se desprenderam. Nisso se distingue, precisamente, da avulsão que é uma porção de terra destacada por força natural violenta deslocada de uma só vez. Na aluvião, o acréscimo se há de ser sucessivo, lento, paulatino, imperceptível (GOMES, 1998, P 154).

1.7.3.3 Da Acessão por Avulsão

É a separação brusca a violenta de terras de uma propriedade para aumentar outra.

Nesta hipótese o beneficiado tem a opção entre permitir a remoção das terras ou indenizar o

prejudicado pela diminuição patrimonial sofrida. O proprietário desfalcado tem o direito de

reclamar, obedecendo ao prazo decadencial.

Avulsão é o desprendimento, por força natural violenta, de uma porção de terra que se vai juntar ao terreno de outro proprietário. A avulsão só é forma de acessão quando o proprietário do terreno acrescido não consente que a porção de terra seja removida. Atribiu-lhe a lei direito de opção entre aquiescer que se remova a parte acrescida ou indenizar ao dono do terreno do qual se destacara a porção de terra. Se prefere indenizar, torna-se proprietário da parte acrescida, verificando-se, então, a acessão por avulsão (GOMES, 1998, P 155).

1.7.3.4 Da Acessão por Álveo Abandonando

O álveo abandonado é o leito do rio que secou, podendo ser tanto pelo desvio da

corrente ou por ter o rio secado. Tal álveo pertence aos proprietários ribeirinhos de sua

margem, estendendo-se da margem até o meio do rio. Tendo o rio desviado sua trajetória por

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força natural, não terão direito a indenização os donos dos terrenos por onde o rio venha a

passar; se a mudança deu-se por utilidade pública e meio artificial, cabe indenização.

O álveo a abandonado é o leito do rio que secou, seja por desvio da corrente, seja por desaparecimento do rio. Esse álveo pertence aos proprietários ribeirinhos das suas margens, estendendo-se aos prédios marginais até o meio do álveo. Os donos dos terrenos pelos quais as águas abrirem novo curso não terão direito a indenização alguma, salvo se a mudança da corrente se fez por utilidade pública. Caso posteriormente o rio retorne ao seu antigo rumo, o leito abandonando volta aos antigos donos. Tratando-se de lagoa, o direito de cada proprietário estender-se-á desde a margem até a linha ou ponto mais conveniente para uma divisão eqüitativa, na extensão da testada de cada quinhoeiro (Código Civil, art. 544, e Código das Águas, arts. 9º, 10, 26 e 27) (WALD, 2002, P 163).

1.7.3.5 Da Acessão por Construções e Plantações

As Construções e Plantações que aderem ao solo são consideradas acessórios do

principal. Pelo princípio geral de que o acessório segue o principal, as plantações e

construções que aderem ao solo passam a pertencer ao proprietário deste. Porém esta

presunção não é absoluta, competindo ao interessado elidi-la.

Pela regra geral o proprietário do solo adquire a propriedade das plantações e

construções. Mas existe a possibilidade de quem - agindo de boa-fé - cosntruiu ou plantou

adquirir a propriedade do solo mediante indenização.

1.7.4 Da Aquisição por Usucapião

É o modo de adquirir a propriedade pela posse continuada por certo lapso de tempo.

É um meio de aquisição da propriedade pelo qual o possuidor se torna proprietário. É um

modo originário de aquisição de domínio.

O usucapião é, pois, um modo originário da aquisição de domínio. O antigo dono perde o domínio, enquanto o usucapiente se beneficia, sem fazer acarretar nenhuma relação entre o precedente titular com o subsequente sujeito do direito; através do usucapião, surge um novo domínio, sem qualquer vinculação com o direito do titular precedente (DOWER, P 125).

O usucapião favorece o possuidor contra o proprietário, sacrificando a este com a

perda de um direito que não está obrigado a exercer.

Os requisitos para a ocorrência de usucapião dividem-se em: pessoais, reais e

formais.

Requisitos pessoais são as exigências em relação à pessoa do possuidor que quer adquirir a coisa por usucapião e do proprietário que, em conseqüência, vem a perdê-la. Os requisitos reais concernem às coisas e direitos suscetíveis de serem usucapidos. Os requisitos formais compreendem os elementos característicos do instituto, que lhe dão fisionomia própria. Alguns são condições comuns, como a

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posse e o lapso de tempo. Outros especiais, como o justo título e a boa-fé (GOMES, 1998. P 164/165).

O usucapião pode ser ordinário ou extraordinário. No usucapião extraordinário a

propriedade é adquirida pelo possuidor, em prazo mais longo, independentemente de justo

título e boa-fé. No usucapião ordinário, além da posse e do lapso de tempo, exigem-se o justo

título e a boa-fé, tendo o prazo mais curto que o usucapião extraordinário.

1.7.5 Da Aquisição pelo Direito Hereditário

A sucessão hereditária é um dos modos de aquisição da propriedade. Aberta a

sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se desde logo aos herdeiros. O herdeiro

adquire desde logo a propriedade da herança, independente de transcrição. A transcrição

ocorrerá após a partilha, e é exigida para manter a matrícula, pois o herdeiro necessitará do

registro para dispor do bem que se encontra em nome do autor da herança. Mas a

transferência de propriedade já ocorreu com a morte do autor da herança.

1.7.6 Da Aquisição de Bens Móveis

Adquire-se a propriedade de bens móveis por ocupação; especificação; comistão;

cunfusão; adjudicação; tradição; sucessão hereditária e usucapião.

A ocupação e usucapião são modos originários, os demais derivados.

1.8 PERDA DA PROPRIEDADE

Perde-se a propriedade por fato relativo à própria pessoa; ao seu objeto; ou ao

próprio direito.

Pode-se destacar a perda da propriedade por fato relativo à pessoa com a morte

natural; por fato relativo ao seu objeto pelo perecimento da coisa ou por sua união ou

incorporação a outra coisa pertencente a outrem; e por fato relativo ao próprio direito, por

abandono, renúncia, alienação e transmissão independente da vontade do proprietário

(desapropriação, arrematação e adjudicação); também se deve destacar a perda de propriedade

por condição resolutiva que tenha sido subordinada no ato de sua constituição.

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1.8.1 Extinção do Objeto

Com o perecimento da coisa o direito não lhe sobrevive, extingue-se por falta de seu

objeto.

Considera-se extinto o direito de propriedade quando seu objeto perde as qualidades essenciais ou o valor econômico, se confunde com outro, ou fica em lugar de onde não pode ser retirado. Nesses casos, o perecimento resulta do fato involuntário, de um acontecimento natural, como um raio, o incêndio, o terremoto. Mas pode ser conseqüência de ato de vontade do próprio titular do direito como no caso de destruição (GOMES, 1998, P 184).

Também ocorre a perda da propriedade pela acessão, que pode ser total ou parcial.

Parcial ocorre na acessão de imóvel a imóvel, onde o proprietário perde parte do objeto de seu

direito. Total ocorre na acessão de imóvel a móvel onde a perda do objeto é total.

Na especificação também ocorre a perda da propriedade pelo objeto.

1.8.2 Modos Voluntários de Perda de Propriedade

Ocorre a perda da propriedade de modo voluntário pelo abandono, pela renúncia e

pela alienação.

1.8.2.1 Perda pelo Abandono

Ocorre quando o proprietário se desfaz da coisa que lhe pertence por não querer

continuar seu dono, onde a intenção de abandonar é imprescindível.

O abandono não é forma de extinção subjetiva do direito de propriedade, porque nenhum vínculo jurídico se estabelece entre o proprietário, que assim perde o domínio, e aquele que adquire a res derelicta pela ocupação (GOMES, 1998, P 185). O abandono da propriedade imóvel é uma forma de renúncia de direito respectivo. A diferença está em que, na renúncia, o proprietário expressamente manifesta sua vontade, no sentido de despojar-se do seu direito, enquanto que no abandono, o titular da coisa abre mão do seu direito em qualquer formalidade (DOWER, P 165).

1.8.2.2 Perda pela Renúncia

É um ato unilateral pelo qual seu titular, voluntariamente abre mão de seu direito,

declarando explicitamente o propósito de despojar-se dele. Seus efeitos passam a vigorar a

partir da transcrição do ato renunciativo no Registro de Imóveis.

Renúncia é o ato pelo qual o proprietário declara explicitamente o propósito de despojar-se do seu direito. Independe de abandono material da coisa. Para valer, não necessita de aceitação de quem quer que seja. É, nimiamente, um ato unilateral. Mas para produzir efeitos, mister se faz, em nosso direito, que o ato renunciativo seja transcrito no Registro de Imóveis. A renúncia da propriedade dos bens móveis não está subordinada a qualquer exigência para a sua eficácia (GOMES, 1998, P 185).

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1.8.2.3 Perda pela Alienação

É o ato pelo qual o proprietário por vontade própria transmite para outrem o direito

sobre a coisa. É forma de extinção subjetiva da propriedade.

A palavra alienar significa tornar alheio, transferir para outrem. A alienação é o meio de transferir a propriedade de uma coisa por ato voluntário de seu titular. O ato pode-se processar através de contrato a título oneroso, como a compra e venda, troca, dação em pagamento e etc., ou a título gratuito, como a doação (DOWER, P 164).

1.8.3 Modos Involuntários de Perda da Propriedade

Perde-se a propriedade, independente da vontade do proprietário por desapropriação,

arrematação, adjudicação, ou implemento de condição resolutiva.

Na arrematação e na adjudicação ocorre transmissão forçada determinada por ato

judicial. Nada arrematação ocorre quando um bem é penhorado e levado à hasta pública, onde

o proprietário perde o bem em favor do adquirente. Na adjudicação o exeqüente incorpora ao

seu patrimônio o próprio bem.

Quando a propriedade é resolúvel, extingue-se o direito com o implemento da

condição resolutiva, transmitindo-se a outrem. O proprietário sobre condição resolutiva, perde

a propriedade, quando tal condição se verifique.

1.8.3.1 Perda pela Desapropriação

A desapropriação não se trata de uma compra e venda, de um negócio jurídico, ou de

um confisco de um bem particular. É um ato de direito público, ditado pela necessidade ou

utilidade pública ou por interesse social, quando se traslada um bem particular para o

patrimônio coletivo ou em benefício de outrem, mediante prévia e justa indenização em

dinheiro ou em títulos especiais conforme o caso. A desapropriação só é possível se existir a

declaração de utilidade pública ou interesse social através do Poder Executivo ou Legislativo.

A desapropriação é um ato unilateral a que tem direito as pessoas de direito público propriamente dito (União, Estado, Município e etc.) ou os concessionários de serviços públicos e os estabelecimentos de caráter público, ou ainda, os que exercem funções delegadas de interesse geral. A União pode desapropriar bens dos Estados, dos Territórios, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como os Estados podem desapropriar bens dos Municípios (DOWER, P170).

A desapropriação é modo de perda da propriedade, pois o dono da coisa se vê

compelido a transmiti-la ao expropriante, sendo que a transmissão é involuntária e o dono da

coisa não pode impedi-la.

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A desapropriação por necessidade ou interesse público pode ocorrer: na defesa do

território nacional, na segurança pública, nos casos de calamidade, no alargamento de ruas, na

construção de estradas de ferro, entre outros.

A desapropriação por interesse social destina-se a realizar a justiça social, com base

no princípio da função social da propriedade, onde o poder público retira a propriedade de um

particular e entrega a outros, para solucionar um problema social. Não é um benefício para

todos os cidadãos e sim para um certo grupo social determinado. É o que ocorre na

desapropriação para fins de reforma agrária, onde é desapropriado um latifúndio, para dividir

em pequenas propriedades agrícolas em benefício de determinado grupo de pessoas.

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2 DA DESAPROPRIAÇÃO

Esta pesquisa é direcionada para a desapropriação rural para fins de reforma agrária

sendo então direcionada para esta espécie de desapropriação, porém, analisaremos também

um pouco das outras espécies de desapropriação para melhor elucidar o instituto.

2.1 CONCEITO

É o procedimento pelo qual o poder público retira alguém de sua propriedade e a

adquire, mediante indenização, devendo ser fundada em interesse público.

À luz do Direito Positivo brasileiro, desapropriação se define como o procedimento através do qual o Poder Público, fundado em necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, compulsoriamente despoja alguém de um bem certo, normalmente adquirindo-o para si, em caráter originário , mediante indenização prévia, justa e pagável em dinheiro, salvo no caso de certos imóveis urbanos ou rurais, em que, por estarem em desacordo com a função social legalmente caracterizada para eles, a indenização far-se-á em títulos da dívida pública, resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, preservado seu valor real (MELLO, 2003, P 734/735). A desapropriação, segundo propomos é o ato através do qual a autoridade pública competente , nos casos prefigurados em lei e mediante indenização, determina a transferência da propriedade particular a quem dela vá se utilizar em função da necessidade pública , da utilidade pública, do interesse social e do interesse social para fins de reforma agrária (ROCHA, 1992, P 50).

Portando existem dois tipos de desapropriação no Direito Brasileiro, em uma delas a

indenização é prévia, justa e em dinheiro, na outra o pagamento se dá pela emissão de títulos

especiais da dívida pública resgatáveis em parcelas anuais e sucessivas, neste segundo caso a

indenização também deve ser justa, mas não é prévia, sendo que pode ocorrer em duas

hipóteses: na desapropriação para a política urbana (com competência apenas dos municípios)

e na desapropriação para fins de reforma agrária (competência do governo federal).

2.2 FUNDAMENTOS DA DESAPROPRIAÇÃO

A desapropriação está fundada e alicerçada em 04 (quatro) fundamentos: político,

jurídico, normativo e infraconstitucional.

O fundamento político da desapropriação é a supremacia do interesse coletivo sobre o individual, quando incompatíveis. O fundamento jurídico teórico consiste na

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tradução dentro do ordenamento normativo dos princípios políticos acolhidos no sistema. Corresponde à idéia do domínio eminente de que dispõe o Estado sobre todos os bens existentes em seu território. O fundamento normativo constitucional encontra-se nos arts.5º, XXIV, 182, §4º, III e 184 e parágrafos do Texto Magno brasileiro. O fundamento infracosntitucional reside nas diferentes leis e decretos-leis que disciplinam a matéria. Merecem especial realce o Decreto-lei 3.365, de 21.6.41, com as alterações posteriores, a Lei 4.132, de 10.9.62, e o Decreto-lei 1.075, de 22.1.70. O primeiro dos textos citados é a lei básica sobre desapropriações, cogitando, entretanto, especialmente da desapropriação por necessidade e utilidade pública. O segundo trata da desapropriação por interesse social; e o terceiro dispõe sobre a imissão de posse initio litis em imóveis residenciais urbanos habitados pelo proprietário ou por compromissário comprador que tenha compromisso registrado (MELLO, 2003, P 739/740).

2.3 FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE

A desapropriação é forma originária de aquisição de propriedade, pois é suficiente

por si só para ser declarada em favor do Poder Público, não se levando em conta o título

jurídico do proprietário anterior.

Dizer-se que a desapropriação é forma originária de aquisição de propriedade significa que ela é , por si mesma, suficiente para instaurar a propriedade em favor do poder público , independentemente de qualquer vinculação com o título jurídico do anterior proprietário. É a só vontade do Poder Público e o pagamento do preço que constituem propriedade do Poder Público sobre o bem expropriado (MELLO, 2003, P 740).

Por ser modo originário de aquisição de propriedade, da desapropriação decorrem

conseqüências; dentre as principais pode-se destacar: se o poder público indenizar quem não

for o legítimo proprietário, não se invalidará a expropriação, sendo que deverá ser realizado

novo processo expropriatório, pois a propriedade está de qualquer forma adquirida pelo Poder

Público; outra conseqüência relevante é a de que uma vez efetuada a expropriação, o Poder

Público adquire o bem livre de quaisquer gravames reais que nele pudessem existir.

Os terceiros titulares de direitos reais de garantia sobre o bem desapropriado têm seus direitos sub-rogados no preço, isto é, passam a estar garantidos pelo valor pago a título de indenização na desapropriação. Os terceiros titulares de direitos obrigacionais relacionados com o bem expropriado só poderão encontrar satisfação para suas pretensões jurídicas através de ação direta, e não na ação expropriatória (MELLO, 2003, P 741).

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2.4 REQUISITOS DA DESAPROPRIAÇÃO

Os requisitos da desapropriação estão previstos na Constituição Federal em seu art.

5º, XXIV, necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, pagamento de

indenização prévia, justa e em dinheiro na desapropriação comum; e em títulos especiais da

dívida pública quando se tratar de desapropriação para política urbana ou para reforma

agrária, como previsto na Constituição Federal, em seus arts. 182 e ss., 184 e ss.

As hipóteses em quem se define se entende necessário a desapropriação, estão

previstas nas normas infraconstitucionais.

2.5 COMPETÊNCIA PARA DESAPROPRIAR E PARA PROMOVER A

DESAPROPRIAÇÃO

Celso Antônio Bandeira de Mello define com clareza quem tem competência para

desapropriar e para promover a desapropriação:

Competentes para submeterem um bem à força expropriatória , isto é, competentes para declararem a utilidade pública ou o interesse social de um bem para fins de desapropriação, são a União, Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. Além disto, excepcionalmente , igual poder, tendo em vista objetivos rodoviários, recebeu o DNER, pelo Decreto-lei 512, de 21.3.1969, entidade, esta, todavia, cuja a extinção já está estabelecida, sem que haja outorgado o mesmo poder a outro órgão ou entidade federal de atuação neste mesmo setor (MELLO, 2003, P 744). Podem promover a desapropriação, isto é, efetivar a desapropriação, ou seja, praticar os atos concretos para efetuá-la (depois de existente uma declaração de utilidade pública expedida pelos que tem poder para submeter um bem à força expropriatória), além, da União, Estados, Municípios, Distrito Federal, e Territórios, as autarquias, os estabelecimentos de caráter público em geral ou que exerçam funções delegadas do Poder Público e os concessionários de serviços, quando autorizados por lei ou contrato (MELLO, 2003, P 744).

2.6 OBJETO DA DESAPROPRIÇÃO

Qualquer bem que seja objeto de propriedade pode ser objeto de desapropriação,

sendo móvel ou imóvel, corpóreo ou incorpóreo como também direitos em geral, exceto

direitos personalíssimos.

Pode ser objeto de desapropriação tudo aquilo que seja objeto de propriedade. Isto é, todo bem, móvel ou imóvel, corpóreo ou incorpóreo, pode ser desapropriado. Portanto, também, se desapropriam direitos em geral. Contudo, não são desapropriáveis direitos personalíssimos, tais o de liberdade, o direito à honra etc. Efetivamente, estes não se definem por um conteúdo patrimonial, antes se

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apresentam como verdadeiras projeções da personalidade do indivíduo ou consistem em expressões de um seu status jurídico, como o pátrio poder e a cidadania, por exemplo (MELLO, 2003, P 744).

Também não se desapropria a moeda corrente do país e pessoas, mas apenas seus

bens ou direitos. Dinheiro estrangeiro ou moeda rara podem ser desapropriados.

Os bens públicos podem ser desapropriados, sendo que a União pode desapropriar

bens dos Estados Municípios e Territórios, já os Estados e Territórios podem desapropriar

bens do Município, e estes não podem desapropriar bens das autarquias federais e dos estados,

já os estados não podem desapropriar bens das autarquias da união.

Bens públicos podem ser desapropriados, nas seguintes condições e forma: a União poderá desapropriar bens dos Estados, Municípios e Territórios; os Estados e Territórios poderão expropriar bens de Municípios. Já, as recíprocas não são verdadeiras. Sobremais, há necessidade da autorização legislativa do poder expropriante para que se realizem tais desapropriações. Além disso, Municípios não podem desapropriar bens das autarquias federais e dos Estados e estes não desapropriam bens das autarquias da União, pois não teria sentido que tais entidades administrativas, tendo sido criadas como pessoas públicas, havidas como meio eficiente de realização de propósitos dessa ordem, ficassem ao desabrigo da norma protetora. Seria inaceitável que União e Estados, ao adotarem processos reputados mais eficientes de atuação, fossem onerados exatamente por isto, ao criarem entidades que co-participam de suas naturezas no aspecto administrativo (MELLO, 2003, P 745).

2.7 DIFERENÇAS ENTRE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA E POR

INTERESSE SOCIAL

A norma vigente diferencia a forma de desapropriação por utilidade pública e por

interesse social, tendo esta última maior destaque neste trabalho acadêmico.

O prazo de caducidade da declaração de utilidade pública para a desapropriação

fundada em necessidade ou utilidade pública é de cinco anos, enquanto que na desapropriação

por interesse social, seu prazo de caducidade da declaração de interesse social é de dois anos.

Na desapropriação por utilidade pública as hipóteses legais que autorizam o exercício do poder expropriatório , como visto, são diferentes daquelas previstas na desapropriação por interesse social. Além disso, o prazo de caducidade da declaração de utilidade pública para desapropriação realizada com fundamento em necessidade ou utilidade pública é de cinco anos e o prazo de caducidade da declaração de interesse social, com fins de desapropriação, é de dois anos (MELLO, 2003, P 743).

A União, Estados, Municípios e Territórios podem desapropriar por necessidade ou

utilidade pública, tal entendimento é pacífico. O que se discute é se a desapropriação por

interesse social é privativo da União ou se os Estados, Territórios e Municípios podem

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realizar este processo expropriatório. É certo, entretanto que a desapropriação por interesse

social para fins de reforma agrária, com base o art. 184 da Constituição Federal, é privativa da

União.

Há divergência na matéria. O correto, todavia, é entender que quaisquer das pessoas referidas podem desapropriar sob os três fundamentos. Com efeito, a Lei 4.132, que disciplina a desapropriação por interesse social, é omissa quanto a isto, mas ela mesma estabelece, em seu art. 5º, que, no que for omissa, aplica-se o Decreto-lei 3.365, o qual confere tal poder indistintamente à União, Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios. É certo, contudo, que na desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, com base no art. 184, unicamente a União é competente, consoante estabelece o art. Citado na Carta Magna (MELLO, 2003, P 743).

2.8 A DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL

A desapropriação por interesse social se destina a solucionar os problemas sociais,

isto é, aqueles atinentes às classes mais pobres, aos trabalhadores e à massa do povo em geral

pela melhoria nas condições de vida, por uma melhor distribuição de riqueza, em fim, para

diminuir as desigualdades sociais. Nesta espécie de desapropriação, a necessidade ou utilidade

pública não está presente, o seu fulcro está voltado para o interesse social.

É aquela que é promovida para atender ao melhor uso da propriedade, ao seu

rendimento, a sua capacidade de produtividade, que possa ser utilizada de maneira mais

eficaz, proporcionando aos mais necessitados a oportunidade de tirar proveito da propriedade

que não era utilizada de maneira adequada.

Para resolver os denominados problemas sociais é que o Estado, em certas condições interfere na propriedade particular e, mediante o confronto entre duas pretensões em conflito (o individual e social), sacrifica aquele em benefício desta, o que se reflete no importante instituto da desapropriação, em qualquer uma de suas modalidades, mas principalmente nesta última – a desapropriação por interesse social (Cretella Junior, 1972: 401-402) (ROCHA, 1992, P 68).

2.9 DESAPROPRIAÇÃO RURAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA

2.9.1 Imóvel Rural

O art. 4º, I da Lei 4.504/64 conceitua imóvel rural como sendo o prédio rústico, de

área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine à exploração extrativa

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agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer

através de iniciativa privada.

Examinado este artigo, consta-se que o legislador tirou da destinação do imóvel o

elemento caracterizador de sua ruralidade. Como conseqüência, o prédio rústico que estiver

no perímetro urbano de um município será caracterizado como imóvel rural se tiver como

destinação agrária.

Porém a maior parte dos imóveis rurais estão situados fora do perímetro urbano das

cidades, ou seja, estão situados na zona rural. E os que estão situados no perímetro urbano

sofrem grande valorização, tornando-se desta forma antieconômico a sua exploração

agropecuária. Desta forma passa a ser avaliado por metro quadrado e não mais por alqueire ou

hectare.

Embora o critério adotado pelo legislador agrário para dar a característica de ruralidade ao imóvel tenha sido o da destinação e não o da localização, considerando como tais os situados fora do âmbito urbano dos municípios, parece-nos evidente que imóveis rurais na zona urbana têm caráter puramente residual. A grande massa dos imóveis rurais está situada efetivamente fora do perímetro urbano dos municípios, na chamada zona rural. E isto porque quando alcançado pelo perímetro urbano o imóvel de destinação agrária sofre acentuado processo de valorização que, via de regra, se torna antieconômico explorá-lo em atividades agropecuárias (ROCHA, 1992, P 79).

2.9.1.1 Características

O imóvel rural possui como elementos caracterizadores: prédio rústico, área

contínua, qualquer localização e destinação voltada para as atividades agrárias.

Não é a situação do imóvel que qualifica o prédio como urbano ou rústico, mas o seu

aproveitamento. Por prédio entendem-se não apenas as casas e construções das cidades ou dos

campos, mas também as propriedades territoriais rurais. Prédio urbano é a edificação para a

moradia e prédio rústico aquele destinado para as coisas rústicas como as propriedades rurais

e sua benfeitorias, ou seja, destinados para as atividades agropecuárias.

Com relação à área contínua, deve-se entender que área é o terreno destinado ao uso

rústico na agropecuária e contínua significa que deve haver continuidade na utilização do

imóvel.

Quanto à destinação, pode ser a atual ou a potencial, ou seja, tanto o imóvel que

esteja sendo utilizado em atividade agrária, como aquele que possua todas as condições para o

desenvolve-las, mas que está sendo mantido inativo, inexplorado e improdutivo podem ser

tidos como rural. Caso contrário, a classificação como imóvel rural estaria condicionada a

vontade de seu titular, assim, bastaria o mesmo deixar de explorar o imóvel em atividade

43

agropecuária, para que o mesmo sendo improdutivo perderia a característica de ruralidade.

Desta forma deixariam de existir os latifúndios improdutivos.

A localização do imóvel pode ser tanto na área rural como no perímetro urbano.

2.9.1.2 Classificação

O imóvel rural é classificado em minifúndio, propriedade familiar, pequena

propriedade, média propriedade, latifúndio, empresa rural e propriedade produtiva.

2.9.1.2.1 Minifúndio

Minifúndio é uma pequena gleba de terra, onde trabalha uma família e mesmo

absorvendo toda a força de trabalho desta família, é insuficiente para propiciar a subsistência

e o progresso social e econômico do grupo familiar. É o imóvel rural de áreas e

possibilidades inferiores às da propriedade familiar. Está expresso no art. 4º, IV, da Lei

4.504/64.

2.9.1.2.2 Propriedade Familiar

Está expressa no art. 4º, II da Lei 4.504/64 “... o imóvel rural que, direta e

pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força do trabalho,

garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada

para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalhado com a ajuda de terceiros”.

Desta forma tem-se que é uma área compatível com a força de trabalho de uma

família, na qual possa garantir aos seus membros a subsistência e o progresso social e

econômico. A propriedade familiar tem o tamanho de um módulo que é calculado de acordo

com cada região e tipo de exploração.

A propriedade familiar pressupõe os seguintes elementos: a) titulação, que é o título de domínio em nome de algum dos membros da entidade familiar; b) exploração direta e pessoal, pelo titular do domínio e sua família que lhes absorva toda a força de trabalho; c) área ideal para cada tipo de exploração, conforme a região; d) possibilidade eventual de ajuda de terceiros (MARQUES, 1998, P 71).

2.9.1.2.3 Pequena Propriedade

A pequena e a média propriedade foram instituídas na Constituição Federal Vigente,

em seu art. 185, considerando-as insuscetíveis de desapropriação por interesse social para fins

de reforma agrária.

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A pequena propriedade foi definida pela lei 8.629/93, art. 4º, I, alínea “a”, como

sendo o imóvel rural de área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais.

Somente exigiu o tamanho da área e nada mais.

2.9.1.2.4 Média Propriedade

A lei 8.629/93 também definiu a média propriedade, como sendo o imóvel rural de

área entre 4 (quatro) e 15 (quinze) módulos fiscais.

2.9.1.2.5 Latifúndio

O Estatuto da Terra ( Lei 4.504/64, art. 4º, V, alíneas “a” e “b”) classificou o

latifúndio como sendo o imóvel rural que tem área igual ou superior ao módulo rural sendo

mantido inexplorado ou com exploração inadequada ou insuficiente às suas potencialidades,

ou seja, não sendo propriedade familiar (pois tem área igual ou superior ao módulo rural), é o

imóvel rural que não cumpre sua função social.

Art. 4º............................................................................................................................

V – “Latifúndio”, o imóvel rural que:

a) exceda a dimensão máxima fixada na forma do art. 46, § 1º, alínea b, desta lei, tendo-se em vista as condições ecológicas, sistemas agrícolas regionais e o fim a que se destine;

b) não excedendo o limite referido na alínea anterior, e tendo área igual ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, seja mantido inexplorado em relação às possibilidades fiscais, econômicas e sociais do meio, com fins especulativos, ou seja deficiente ou inadequadamente explorado, de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural.”

O decreto 84.685/80 em seu art. 22 - que regulamentou a Lei 6.746/79 que trata do

Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – estabeleceu nova conceituação ao latifúndio,

dispondo o seguinte:

Art. 22 – Parta efeito do disposto no art. 4º incisos IV e V, e no art. 46, § 1º, alínea “b”, da Lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964, considera-se:

I - .............................................................................................................................

II – Latifúndio, o imóvel rural que:

exceda a seiscentas vezes o módulo fiscal calculado no forma do art. 5º;

não excedendo o limite referido no inciso anterior e tendo dimensão igual ou superior a um módulo fiscal, seja mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com fins especulativos, ou seja, deficiente ou

45

inadequadamente inexplorado, de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural;”

Observa-se que a nova redação dada ao art. 4º, V do Estatuto da Terra, apenas

substitui a expressão “módulo rural” por “módulo fiscal”, como parâmetro dimensional de

áreas a considerar.

O Latifúndio pode ser classificado em duas espécies: por extensão e por exploração.

O primeiro com relação ao tamanho do imóvel e o segundo pela exploração deficiente ou

inexploração.

Desses dispositivos legais se extrai, sem maior esforço, que o latifúndio pode ser classificado em duas espécies: a) por extensão; e b) por exploração. A primeira caracteriza-se pelo tamanho do imóvel (600 vezes o módulo fiscal) e o segundo, pela não exploração ou exploração deficiente, vale dizer, pelo mau uso da terra (MARQUES, 1998, P 77).

Desta forma, nota-se que o conceito de latifúndio não é mais aquele de grande

domínio privado, podendo hoje ser aquele de grande extensão como também aquele do

tamanho de um módulo, bastando que não seja explorado, ou que seja explorado de forma

inadequada, com relação as possibilidades físicas, econômicas e sociais do local em que se

encontre.

Benedito Ferreira Marques elenca algumas exceções sobre o latifúndio:

Esses parâmetros estabelecidos em lei, para configuração do instituto jurídico do latifúndio, sofrem exceções. De fato, de conformidade com o parágrafo único do mesmo art.4º, do ET, não se considera latifúndio por dimensão o imóvel rural, qualquer que seja a sua área, cujas características recomendem, sob o ponto de vista técnico e econômico, a exploração florestal racional, mediante adequado planejamento, bem como aqueles que tenham como objeto a preservação florestal ou de outros recursos naturais, consoante aferição feita pelo órgão competente (INCRA). Também não se consideram latifúndio: a) o imóvel rural com área igual à do módulo fiscal, não caracterizado como Propriedade Familiar, mas adequadamente utilizado e explorado; b) o imóvel rural com área superior ao módulo fiscal, desde de que não exceda 600 vezes a ele, utilizado com adequados e racionais critérios econômicos; c) o imóvel rural que satisfizer os requisitos de empresa rural; d) o imóvel rural que, embora não classificado como empresa rural e situado fora de área prioritária de reforma agrária, tiver aprovado pelo órgão competente do Governo Federal (INCRA) e em execução, projeto que, em prazo determinado, o eleve aquela categoria; e) o imóvel rural classificado como Propriedade Familiar, Pequena Propriedade e Média Propriedade (MARQUES, 1998, P 77/78).

Tanto quanto os minifúndios, que são nocivos à economia rural, os latifúndios por

extensão como por exploração, é combatido por não cumprirem sua função social.

Para o combate do latifúndio existem dois instrumentos eficazes: a desapropriação

(art. 16 e 20 do Estatuto da Terra) e tributação, obedecidos aos critérios de progressividade e

de regressividade (art.49 do mesmo Estatuto).

46

2.9.1.2.6 Empresa Rural

O Estatuto da Terra, em seu art. 4º, VI, como sendo:

Art. 4º............................................................................................................................

VI - “Empresa Rural” é o empreendimento de pessoa física ou j urídica, pública ou privada que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro de condições de rendimento econômico...da região em que se situe e que explore área mínima agricultável do imóvel segundo padrões fixados, pública e previamente, pelo Poder Executivo. Para esse fim, equiparam-se as áreas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e artificiais e as áreas ocupadas com benfeitorias.

O Decreto 84.685/80, em seu art. 22, III, alterou a redação do art. 4º,VI do Estatuto

da Terra:

Art. 22...........................................................................................................................

III - Empresa Rural, o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro das condições de cumprimento da função social da terra e atendidos simultaneamente os requisitos seguintes:

a) tenha grau de utilização da terra igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado na forma da alínea ‘a’, do art. 8º;

b) tenha grau de eficiência na exploração, calculado na forma do art. 10, igual ou superior a 100% (cem por cento);

c) cumpra integralmente a legislação que rege as relações de trabalho e os contratos de uso temporário da terra.

Por estas definições pode-se extrair as seguintes características: tem por finalidade o

lucro; deve ser um estabelecimento voltado para atividades agrárias; é um estabelecimento em

área de imóvel rural, pertencente ou não ao empresário; tem natureza civil, não sendo

industrial ou comercial.

A empresa rural tem como requisitos: deve ter o grau de utilização da terra igual ou

superior a 80% (oitenta por cento), como o grau de eficiência na exploração igual ou superior

a 100% (cem por cento); a empresa rural deve cumprir a sua função social; também são

incluídos pela doutrina os requisitos de adoção de práticas conservacionistas, o emprego

mínimo de tecnologia utilizada na zona de situação da empresa, como também a manutenção

de condições mínimas de administração.

2.9.1.2.7 Propriedade Produtiva

A Lei 8.629/93, em seu art. 6º, definiu a propriedade produtiva como sendo:

47

Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

§ 1º O grau de utilização da terra , para efeito do caput deste artigo, deverá se igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

§ 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática:

I – para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

II – para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

III – a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem) determina o grau de eficiência da exploração.

A função social do imóvel rural deve ser vista sobre três óticas: econômica, social e

ecológica. Pelo art. 6º da Lei 8.629/93, da propriedade produtiva somente foi exigido o

componente econômico, abstraindo-se o social e ecológico. Embora a Constituição Federal

em seu art. 185, § único tenha sido taxativa quanto à necessidade de que a lei fixasse normas

para o cumprimento da função social a serem cumpridos pela propriedade produtiva, a Lei

8.629/93 não estabelece esses critérios especificamente para a Propriedade Produtiva, como

fez o Decreto 84.685/80, art. 22,III com relação a empresa rural, pois este exigiu além dos

requisitos de natureza econômica (graus de utilização e eficiência), o cumprimento da função

social. Esta é a razão fundamental para que estas duas entidades não se confundam.

2.9.2 A função Social do Imóvel Rural

O princípio da função social inseriu-se como um elemento estrutural do direito de

propriedade, não banindo o direito de propriedade, apenas o condicionando ao cumprimento

da função social.

Tratar-se-á aqui de um instituto que vem modificando o regime de propriedade no decorrer da história moderna, especificamente em seu conteúdo, retirando dele a marca excessivamente individualista, de domínio absoluto, e colocando-a em submissão aos interesses da comunidade, assumindo um caráter mais social (ARAUJO, 1998, P 53).

48

2.9.2.1 Aspectos Históricos

Foi Aristóteles o primeiro a manifestar-se sobre a questão da função social da

propriedade. Entendia que aos bens deveria se dar uma destinação social. O homem tinha o

direito de possuir bens e deles retirar proveitos para sua própria manutenção, mas também

devia satisfazer aos outros.

Registram os doutos que foi Aristóteles, filósofo grego de citação obrigatória, o primeiro a manifesta-se sobre essa questão, entendendo que aos bens se devia dar uma destinação social, para o que, a seu pensar, seria necessária a apropriação pessoal. Esta justificaria aquela, vale dizer, o homem tinha o direito de possuir bens e deles retirar a sua própria manutenção, mas também devia satisfazer aos outros (MARQUES, 1998, P 49).

Esta idéia somente teve impulso maior com a igreja católica, a partir de São Tomás

de Aquino. Segundo ele, o homem tinha o poder natural de adquirir bens materiais, incluindo

aí a manutenção pela própria sobrevivência, mas deveria manter o dever do bem comum.

A idéia do grande filósofo da antigüidade, todavia, somente ganhou impulso maior com a pregação vigorosa desenvolvida pela igreja católica, a partir de Santo Tómas de Aquino, a quem se atribui o papel mais relevante, com sua “Summa Theológica”, na qual disseminou o sentido do bem comum. Para ele, o homem tinha o direito natural de adquirir bens materiais , até para manter a própria sobrevivência. Mas não podia abstrair o dever do “bem comum” (MARQUES, 1998, P 49)

Mas foi com Duguit (jurista francês), que o direito de propriedade perdeu o caráter

subjetivista que se incorporava, dando espaço a idéia de que a propriedade era, em si, uma

função social.

Mas foi com Duguit, escorado no pensamento positivista de Comte, que o direito de propriedade se despiu do caráter subjetivista que o impregnava, para ceder espaço a idéia de que a propriedade era, em si, uma função social. Para o grande jurista francês, que era professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Bordéus, na França, a propriedade não era um direito subjetivo, asm a subordinação da utilidade de u bem a um determinado fim, conforme o direito objetivo (MARQUES, 1998, P 50).

No direito brasileiro a concepção de função social não é recente, pois já no período

colonial, mais especificamente na época das concessões das Sesmarias, já havia a

preocupação com a função social, pois entre as obrigações impostas aos sesmeiros, estava o

cultivo da terra, ocorrendo assim o aproveitamento econômico.

Também o saudoso jus-agrarista Fernando Pereira Sodero, já observava que “de fato na concessão de sesmarias, fora determinado que se concedessem glebas em quantidade que um homem de cabedais pudesse explorar...E que se ele não a explorasse dentro de um determinado lapso de tempo, que era prefixado, esta terra reverteria ao patrimônio da Ordem de Cristo, que era administrada por Portugal...” (MARQUES, 1998, P 51).

49

A idéia de função social ganhou espaço na Constituição de 1934, com a expressão

“bem -estar-social”. Ganhou mais vigor na de 1946 e foi definitivamente incorporada em

nosso ordenamento jurídico no Estatuto da Terra e foi solidificada na Constituição de 1988.

2.9.2.2 Conceituação Legal

No Brasil, a função social da propriedade está solidificado na Constituição Federal

em seu art. 5º, XXIII. Como também a função social do imóvel rural – que é o que mais

interessa para o presente estudo - que está previsto no mesmo texto constitucional em seu art.

184 e seguintes; na Lei 4.504/64, art. 2º, § 1º (Estatuto da Terra) e Lei 8.629/93 em seu art. 9º

minudenciou os requisitos da “função social da propriedade rural”.

O Estatuto da Terra condiciona o acesso à propriedade rural ao cumprimento de sua

função social, pela qual toda riqueza produtiva tem uma finalidade social e econômica, e

quem a detém deve fazê-la frutificar, em benefício próprio e da comunidade em que vive.

A Constituição de 88 garante o direito de propriedade (art. 5º, XXII) desde que ela

atenda sua função social (art. 5º, XXIII).

A íntima correlação entre esses dois dispositivos indica movimento ao conceito de “propriedade”, como se refere José Afonso da Silva: (...) embora prevista entre os direitos individuais, ela não mais poderá ser considerada puro direito individual, relativizando-se seu conceito e significado, especialmente porque os princípios da ordem econômica são preordenados à vista da realização de seu fim: assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Se é assim, então a propriedade privada, que, ademais, tem que atender a sua função social, fica vinculada a consecução daquela princípio. É claro que, também, não é sem conseqüência o fato de estar inserida, no seu aspecto geral , entre as normas de previsão dos direitos individuais. É que, previsto como tal, fica assegurada a instituição, não mais, porém, na extensão que o individualismo reconheceu (ARAUJO, 1998, P 79).

O art. 186 da Carta Magna deixa claro que todo proprietário tem que cumprir os

requisitos constitucionais quanto a sua propriedade, pois o atendimento da função social se

sobrepõe ao próprio domínio. Desta forma, o proprietário que cumpra a função social do

imóvel rural, está salvo da desapropriação rural para fins de reforma agrária.

A lei 8.629/93, em seu art. 9º, regulamenta o art. 186 da Constituição Federal e dá

os requisitos para o cumprimento da função social:

Art. 9º. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta Lei, os seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

50

III – Observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV- exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Os parágrafos do mesmo artigo definem os critérios técnicos que determinam quando

uma propriedade rural está cumprindo ou não a função social.

§ 1º. Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta lei.

O sentido racional significa que as técnicas utilizadas devem estar em consonância

com a tecnologia disponível, tornando mais eficientes os processos do trabalho agrícola. Já o

sentido de adequado quer dizer que a produção e o modo de produzir devem ser apropriados

para o solo e o clima daquela região.

Para a aferição da produtividade da terra, utiliza-se o grau de utilização e de

eficiência. A utilização deve ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento) calculado pela

relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel

(art. 6º, § 1º da Lei 8.629/93) e o grau de eficiência deve ser igual ou superior a 100% (cem

por cento) (art. 6º, § 2º da lei 8.629/93). Desta forma o aproveitamento da propriedade em

percentuais inferiores a estes, faz com que a mesma não produza de acordo com suas

potencialidades, não alcançando assim a condição de propriedade produtiva.

§ 2º. Considera-se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.

A terra, por suas características de solo e clima, é própria a determinadas culturas ou

tipo de produção e a utilização em contrário a condenaria ao rápido esgotamento de sua

cultura.

§ 3º. Considera-se preservação do meio ambiente a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

Neste parágrafo o legislador faz uma inter-relação entre o direito agrário e o

ambiental, visando a conservação da terra, dos rios, das espécies em extinção, vegetais ou

animais, à manutenção do sistema agro-biológico. A terra deve ser utilizada e explorada sem

desrespeitar os limites de capacidade de carga do ecossistema no qual está envolvida. A busca

por resultados econômicos rápidos, não pode botar em risco um patrimônio que pertence a

gerações futuras.

51

§ 4º. A observância das disposições que regulam as relações te trabalho implica tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parcerias rurais.

A condição privilegiada de proprietário ou patrão não deve permitir uma relação

injusta com os empregados, arrendatários ou parceiros, pois deve respeitas as leis para que

todos os envolvidos na produção rural, dela tirem proveito.

§ 5º. A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.

Este parágrafo visa atingir o bem-estar social no campo, onde proprietários e

trabalhadores aproveitem os frutos de seu trabalho, possibilitando-lhes uma existência digna,

pois toda forma de exploração irracional gera conflitos e tensões sociais.

2.9.2.3 Requisitos Legais

1º - Aproveitamento racional e adequado ou níveis satisfatórios de produtividade: é

mensurado pelo grau de utilização e eficiência na exploração, que é fixado em 80% para o

primeiro e 100% para o segundo, que são os mesmos índices exigidos para a configuração da

propriedade produtiva.

2º - A adequada utilização dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente:

manutenção do potencial produtivo do imóvel combinado com as características próprias do

meio natural e também qualidade dos recursos ambientais.

...exige o respeito à vocação natural da terra, com vistas à manutenção tanto do potencial produtivo do imóvel como das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, para o equilíbrio ecológico da propriedade e, ainda, a saúde a qualidade de vida das comunidades vizinhas (MARQUES, 1998, P55).

3º - A observância das disposições que regulam as relações de trabalho: não somente

os contratos de trabalho, mas também, os contratos agrários. Quem sede o uso específico de

imóvel rural ou o uso e o gozo, transfere para este o uso da função social.

4º - Bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais: a busca da paz, a preocupação

com as tensões e conflitos sociais no imóvel.

A configuração da função social de propriedade se divide em três óticas: 1ª

econômica – refere-se a produtividade, aproveitamento racional e adequado; 2ª social –

observância das disposições que regulam as relações de trabalho como também o bem-estar

dos proprietários e dos trabalhadores; 3ª ecológica – utilização dos recursos naturais e

preservação do meio ambiente.

52

Para o cumprimento da função social deve-se analisas todos os requisitos.

Impõe-se assinalar, neste passo, que os requisitos alinhados nos preceitos legais examinados devem ser observados simultaneamente, vale dizer, todos ao mesmo tempo. Não se cumpre a função social, observando-se apenas um ou dois requisitos (MARQUES, 1998, P 56).

2.9.2.4 Fiscalização dos Requisitos

Uma das questões mais controvertidas é comprovar o cumprimento dos requisitos da função social.

Com relação às questões econômicas e ecológicas cabe a avaliação ao INCRA e ao

IBAMA. O ponto polemico gira em torno da questão social, pois existe grande divergência de

quem é competente para analisar tal questão. Seria o Ministério do Trabalho? A Justiça do

Trabalho? Como se comprova o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais?

Benedito Ferreira Marques conclui da seguinte forma:

Em face desse quadro de dificuldades, arrisca-se o diagnóstico, tido como consensual entre os agraristas de que a maior desobediência se situa no requisito das relações trabalhistas, exatamente pela indefinição do órgão fiscalizador (MARQUES, 1998, P 58). De tudo se conclui que a não fiscalização do cumprimento dos requisitos da função social da propriedade da terra, a despeito das claras disposições legais analisadas, deixa vulnerável a grande maioria dos estabelecimentos rurais em nosso país. Mas, de outra parte, não se pode esperar das autoridades governamentais atitudes mais agressivas, na medida em que a política agrícola desenvolvida, na atual conjuntura, registra distorções mercantes, que tem inviabilizado ao empresário rural uma performance mais satisfatória (MARQUES, 1998, P 59).

2.9.3 Desapropriação de Imóvel Rural para Fins de Reforma Agrária

Como já visto anteriormente, a desapropriação implica evidentemente, a privação da

propriedade, seja privada, seja pública. Sempre que desapropria, o estado está, ao menos

presumivelmente buscando atingir o bem comum, o bem-estar coletivo.

A Constituição Federal em seu art. 5º, XXII e XXIII, estabelece o direito de

propriedade, condicionado a sua função social.

A desapropriação apresenta-se sobre três formas: por utilidade ou necessidade

pública (Dec.-lei 3.365/41, a lei geral das desapropriações), por interesse social (Lei 4.132/62)

e por interesse social para fins de reforma agrária (Lei Complementar 76/93), sendo esta

última a que interessa para este estudo.

Propriedade privada, função social da terra e desapropriação, são conceitos que se

unem sob um fundamento único: o bem comum. Desta forma surgiu o instituto da

desapropriação rural para fins de reforma agrária, que atualmente está estabelecida pela

53

Constituição Federal, Estatuto da Terra, Lei 8.629/93 (reforma agrária), Lei complementar

76/93, esta última relativo as questões processuais e Decreto 95.715/88.

Hoje, pode-se mesmo afirmar que propriedade privada, função social da terra e desapropriação são conceitos que se interligam sob um fundamento único: o bem comum. Deste, então surge especificamente o instituto da desapropriação para fins de reforma agrária, estabelecida pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Terra e pela Lei Complementar n.76/93, no que toca aos aspectos processuais (SOUSA, 1994, P 72).

Esta espécie de desapropriação é um dos instrumentos de maior relevo para a

realização de Reforma Agrária, e atinge aqueles imóveis rurais que contrariem a função social

da propriedade, ou seja, aquelas propriedades improdutivas ou aquelas que não produzam de

acordo com suas condições legalmente definidas.

O art. 184 da Constituição Federal diz que a União é competente para realizar a

desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, sendo assim somente a União

pode efetuar esta espécie de desapropriação. E o art. 185 especifica as propriedades que são

insuscetíveis de desapropriação, como sendo: a pequena e média propriedade rural, desde que

seu proprietário não possui outra e a propriedade produtiva.

De Acordo com o art. 17 do Estatuto da Terra, o acesso à propriedade rural pode-se

dar pela desapropriação por interesse social, cuja as finalidades estão no artigo seguinte:

Art. 18. A desapropriação por interesse social tem por fim:

a) condicionar o uso da terra a sua função social;

b) promover a justa e adequada distribuição da propriedade;

c) obrigar a exploração racional da terra;

d) permitir a recuperação social e econômica de regiões;

e) estimular pesquisas pioneiras, experimentação, demonstração e assistência técnica;

f) efetuar obras de renovação, melhoria e valorização dos seus recursos naturais;

g) incrementar a eletrificação e a industrialização do meio rural;

h) facultar a criação de áreas de proteção à fauna, à flora ou a outros recursos naturais, a fim de preservá-los de atividades predatórias.

54

2.9.3.1 Decreto Expropriatório e Ação de Desapropriação

Para que um imóvel rural seja desapropriado por interesse social para fins de reforma

agrária, são indispensáveis dois pressupostos básicos: a constatação que o imóvel desatende a

função social (CF, arts. 5º, XXIII, 184 e186); e o decreto presidencial apontando a

desapropriação (CF, art. 184, § 2º; Lei Complementar 76/93, arts. 2º, § 2º., e 5º, I). A prévia e

justa indenização é condição sine qua non para o recebimento da ação.

O decreto expropriatório é um ato declaratório administrativo, pois indica qual bem

deverá sofrer desapropriação. Mas para que ocorra a desapropriação é necessário que a União

ingresse com ação de desapropriação, pois somente é declarada a desapropriação por sentença

judicial.

2.9.3.2 A Lei 8.629/93

A propriedade rural que não atinja a função social prevista no art. 9º é passível de

desapropriação (art. 2º), e de acordo com seu § 1º, compete a União à realização da

desapropriação, através de seu órgão competente. O INCRA (Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária) é o órgão federal competente para a realização da reforma

agrária.

É o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) o órgão federal responsável para executar a reforma agrária, o qual está autorizado a ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamentos de dados e informações, com prévia notificação (§ 2º). É através desse exame preliminar, verificando o nível de produção exercitado na propriedade, que se determinará quais serão passíveis de desapropriação (ARAUJO, 1998, P 131).

O art. 5º fala sobre a indenização que será prévia e justa em títulos da dívida agrária,

já as benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro (§ 1º). Para estabelecer o

valor da indenização o INCRA deve fazer uma ampla pesquisa, inclusive mercadológica,

sendo que o proprietário pode questionar na ação de desapropriação os valores estabelecidos.

Mas é através de uma ampla pesquisa, inclusive mercadológica, que o INCRA deve estabelecer o valor da propriedade. Se houver um arbitramento em valores bem abaixo do mercado, o proprietário pode questioná-lo no andamento da ação desapropriatória (ARAUJO, 1998, P 132).

Uma vez realizada a desapropriação, o INCRA terá prazo máximo de 03 (três) anos,

contados da data do registro do título translativo de domínio, para destinar a área aos

beneficiários da reforma agrária, admitindo-se, para tanto, formas de exploração individual,

condominial, cooperativa, associativa ou mista (art. 16).

55

2.9.3.3 Do processo Expropriatório pela Lei Complementar 76/93

Dispõe sobre o procedimento contraditório especial, de rito sumário, para as

desapropriações de imóveis rurais para fins de reforma agrária.

Com esse procedimento o legislador assegurou aos litigantes uma ampla defesa, bem

como procurou evitar prejuízos aos expropriado, em virtude de uma prolongada demanda

judicial.

Como já visto anteriormente a competência para ingressas com a ação de

desapropriação é da União, através de seu órgão competente (INCRA), sendo que a Lei

Complementar 76/93 determinou que a ação seja processada e julgada por juiz federal (art. 2º,

§ 1º), precedida de decreto declarando o imóvel de interesse social para fins de reforma

agrária (art. 2º).

Depois de publicado o decreto declarando o interesse social sobre determinado

imóvel rural, o expropriante está autorizado a promover a vistoria e avaliação do imóvel e

mediante prévia autorização do juiz, poderá utilizar força policial, ficando responsável por

eventuais perdas e danos (art. 2º, § 2º).

Após a publicação do decreto declaratório, a ação de desapropriação deverá ser

proposta no prazo de 2 (dois) anos (art. 3º).

Depois de interposta a ação de desapropriação - que será processada em de acordo

com esta Lei e subsidiariamente o Código de Processo Civil - o juiz proferirá sentença. Da

Sentença caberá recurso de apelação, com efeito, devolutivo se interposta pelo expropriado e

em ambos os efeitos se interposta pelo expropriante (art. 13).

A indenização fixada na sentença será deposita em dinheiro, quanto às benfeitorias

úteis e necessárias e em títulos da dívida agrária (TDA’s), referente à terra nua (art. 14).

Os imóveis rurais desapropriados, uma vez registrados em nome do expropriante,

não poderão ser objeto de ação reivindicatória (art. 21).

2.9.3.4 Títulos da Dívida Agrária como Forma de Pagamento

A indenização é em dinheiro, somente para as benfeitorias úteis e necessárias, já para

a terra nua a indenização é feita com a emissão de títulos da dívida agrária TDA’s.

O estatuto da terra trata dos TDA’s em seus arts. 105 e 106, tendo o decreto 578/92

regulado o lançamento de tais títulos.

Os TDA’s são títulos especiais da dívida pública que são utilizados para o pagamento

das indenizações de imóveis rurais desapropriados para fins de reforma agrária, “com cláusul a

de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até 20 anos, a partir do segundo ano de

56

sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. Art. 184, CF”. São emitidos pelo poder

executivo através do Ministério da Fazenda.

57

3 REFORMA AGRÁRIA E A DESAPROPRIAÇÃO

A Constituição Federal de 1988 deu atenção especial à questão agrária, pois seu

título VII, capítulo III trata da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária. Desta

forma a Carta Magna deu um capítulo exclusivo para a questão agrária, o que não ocorreu nas

constituições anteriores.

3.1 CONCEITO DE REFORMA AGRÁRIA

Reformar, do seu ponto de vista etimológico, advém de reformare (re+formare), que

significa dar nova forma, refazer, restaurar, melhorar, corrigir, transformar.

Do ponto de vista etimológico, reformar advém de reformare (re+formare) que significa dar nova forma, refazer, restaurar, melhorar, corrigir, transformar. A afirmação de que o Direito Agrário tem um compromisso com a transformação, explica-se por sua preocupação primordial com a reforma agrária, cujo sentido maior reside na reformulação da estrutura fundiária (MARQUES, 1998, P 165). Etimologicamente, reforma vem das palavras re e formare, lembra Nestor Duarte. Reformar significa mudar uma estrutura anterior, para modificá-la em determinado sentido. O prefixo re significa a idéia de renovação, enquanto formare é a maneira de existência de um sentido ou de uma coisa. Reforma agrária é, pois, na acepção etimológica, a mudança do estado agrário vigente. Mas uma mudança tem de operar-se em determinado sentido. Procura-se mudar o estado atual da situação agrária. Esse estado que se procura modificar é o do feudalismo agrário e da grande concentração agrária em benefício das massas trabalhadoras do campo. Por conseqüência, as leis de reforma agrária se opõem a um estado anterior de estrutura agrária que se procura modificar. (FERREIRA, 1990, P 240).

A reforma agrária constitui uma forma de intervenção do Estado na propriedade

privada, e, conseqüentemente no domínio econômico. É a redistribuição da propriedade

territorial rural pela modificação na posse e no uso da terra.

O conceito de reforma agrária não se restringe ao aspecto de melhor distribuição de

terras. É mais abrangente, envolvendo outras medidas de amparo ao beneficiário da reforma.

Mas o conceito de Reforma Agrária não se prende apenas ao aspecto da distribuição das terras. É mais abrangente, porque envolve a adoção de outras medidas de amparo ao beneficiário da reforma, que são chamadas de “Política Agrícola”... (MARQUES, 1998, P 165).

Alguns autores definem o conceito de reforma agrária, com base no texto legal, com

rápidas alterações vocabulares, sem alterar a substância conceitual. Já outros, aprofundam

mais a definição do seu conceito enriquecendo, desta forma, o instituto.

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O processo pelo qual o Estado modifica os direitos sobre a propriedade e a posse dos bens agrícolas, a partir da transformação fundiária e da reformulação das medidas de assistência em todo o país. Com vista a obter maior oferta de gêneros e a eliminar as desigualdades sociais no campo (laranjeira) [MARQUES, 1998, P 166]. A reforma agrária seria um conjunto de medidas administrativas e jurídicas levadas a efeito pelo poder público, visando a modificação e à regência de alguns institutos jurídicos, à revisão das diretrizes da administração ou à parcial reformulação das normas e medidas, com o objetivo precípuo de sanear os vícios intrínsecos e extrínsecos do imóvel rural e de sua exploração, sem a derrogação dos princípios que asseguram a propriedade imóvel (Stefanini) [MARQUES, 1998, P 166]. Mudança de estrutura agrária nas áreas carentes de tal transformação, implicando o conceito de uma nova mentalidade sobre as relações homem-terra-produção e um novo conceito do direito de propriedade, com fundamento na doutrina da sua função social e econômica (Sodero) [MARQUES, 1998, P 166]. É válido trazer à colação a opoinião do economista José Eli Veiga, que a fez com as seguintes palavras: “A modificação da estrutura agrária de um país, o u região, com vistas a uma distribuição mais eqüitativa da terra e da renda agrícola é a definição mais usual de reforma agrária. Tal enunciado consta em qualquer bom dicionário. Como geralmente acontece com as conceituações sintéticas, nela está apenas implícita uma idéia-chave para o seu entendimento: de que se trata de uma intervenção deliberada do Estado nos alicerces do setor agrícola. É isto que permite distinguir reforma agrária de transformação agrária” (MARQUES, 1998, P 167).

O Estatuto da Terra definiu tanto a Reforma Agrária como a Política Agrícola:

Art. 1°........................................................................................................................

§ 1° Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade.

§ 2° Entende-se por Política Agrícola o conjunto de providências de amparo à propriedade da terra que se destinem a orientar, interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do País.

Enquanto a reforma agrária visa à redistribuição da terra pela modificação na sua

posse e uso, sempre que as circunstâncias assim o exigirem, a política agrícola visa

especificamente amparar a propriedade da terra no interesse da economia rural.

O entendimento do conceito de reforma agrária tem propiciado um debate teórico

entre seus conceituadores, mas a grande maioria converge em um aspecto: é um ato do Poder

Público que visa a modificar uma estrutura vigente, um “status quo”, o que implica dizer,

mudar as relações de poder em uma determinada área.

A reforma agrária surge quando se está diante de um conflito, onde os trabalhadores

e os proprietários divergem sobre a terra e o acesso desses trabalhadores à terra somente

ocorre na medida em que modifica a estrutura fundiária, com objetivo distributivo.

59

3.2 MÉTODOS PARA A REALIZAÇÃO DA REFORMA AGRÁRIA

Pela doutrina dominante, há duas formas de se fazer à reforma agrária: coletivista e

privatista.

No primeiro caso ocorre a nacionalização da terra, passando a propriedade para o

estado. É fundamentada na doutrina socialista, onde os meios de produção são de propriedade

do Estado, cabendo ao beneficiário apenas o direito de uso.

O primeiro, chamado “coletivista”, consiste na nacionalização da terra, passando a propriedade para o estado. Fundamente-se na doutrina socialista, segundo a qual os meios de produção são de propriedade do Estado, cabendo ao campesino apenas o direito de uso (MARQUES, 1998, P 167/168).

Já no segundo método se admite a propriedade privada e a terra é de quem trabalha,

seja ele pequeno médio ou grande produtor. Baseia-se na teoria pela qual o homem deve se

apropriar dos bens, pois estes existem para a satisfação daqueles. Não é um direito absoluto,

pois está condicionado ao bem comum.

O segundo método – o “privatista” - é aquele em que se admite a propriedade privada. A terra é de quem a trabalha, seja pequeno, médio ou grande produtor, que convivem harmoniosamente. Esse método é baseado na doutrina de Aristóteles, que foi seqüenciada por Santo Tomás de Aquino e pregada pela Igreja Católica através de várias encíclicas papais. Baseia-se na teoria, segundo a qual os bens existem para a satisfação do homem, que deve se apropriar deles, não sendo, porém, um direito absoluto, porque está condicionado ao bem comum. É o método perseguido nas tentativas de reforma agrária feitas no Brasil (MARQUES, 1998, P 168).

3.3 CARACTERÍSTICAS

A reforma agrária possui as seguintes características segundo Marques:

a) é uma forma de intervenção do estado na propriedade privada, na medida em que os principais instrumentos são a desapropriação e a tributação; b) é peculiar a cada país, vale dizer, a que se faz em determinado país não serve para outro, porque cada qual tem a sua formação territorial diferenciada. Por exemplo, a do Brasil não foi igual a do Peru, ou do Uruguai, ou da Argentina, mesmo tratando-se de países latino-americanos e vizinhos; c) é transitória, ou, como diz Paulo Torminn Borges, “ é um fenômeno episódico... um mero acidente...” No Brasil, ela é preconizada como tarefa a ser executada paulatinamente, extinguindo-se gradualmente o minifúndio e o latifúndio, sendo a distribuição das terras a ela destinadas feita sob a forma de propriedade familiar. Pode-se imaginar que, daqui a algumas décadas, seja pregada outra reforma agrária em nosso País, dessa feita, remembrando propriedades familiares em grandes empresas; d) passa por um redimensionamento das áreas mínimas e máximas (1 módulo, no mínimo, e 600, no máximo); e) depende de uma Política Agrícola eficiente. Devem ser compatibilizadas as ações da Política Agrícola com as da Reforma Agrária (art. 187, § 2°, CF). A reforma agrária não se esgota na simples distribuição de terras aos seus beneficiários. Faz-se mister que a

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estes se dêem condições mínimas para desenvolverem as atividades agrárias com vistas a alcançarem os seus objetivos (MARQUES, 1998, P 168/169). Para o professor Paulo Guilherme de Almeida, a mais importante característica da reforma agrária é a sua natureza constitucional (MARQUES, 1998, P 169). Não se exclua, ainda como característica da Reforma Agrária em nosso País, a natureza punitiva da desapropriação, posto que a indenização da terra nua é paga com Títulos da Dívida Agrária (TDA)...(MARQUES, 1998, P 170).

3.4 OBJETIVOS

Promover a justiça social e o aumento da produtividade são objetivos básicos da

reforma agrária.

O estatuto da terra elencou os objetivos a serem seguidos nos programas de reforma

agrária:

Art. 16. A Reforma Agrária visa a estabelecer um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, capaz de promover a justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do País, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio.

A reforma agrária visa uma melhor distribuição de terra com um sistema de relações

entre o homem, a propriedade rural e o uso que atendam aos princípios da justiça e ao

aumento da produtividade, que garanta o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o

desenvolvimento do País.

Não existem limites para os objetivos da reforma agrária, pois além daqueles

previstos no texto legal, existem vários outros objetivos necessários para a realização da

reforma agrária.

Em verdade, não se pode limitar os objetivos da Reforma Agrária. Nem se pode reduzi-los apenas ao atendimento do princípio da justiça social, à promoção do aumento da produtividade e ao estabelecimento de uma classe rural média estável e próspera. Os objetivos são muito mais abrangentes, pois não se deve olvidar que ela também se presta para aumentar o número de proprietários rurais, reduzindo o nível de concentração hoje existente; para estancar ou inibir o êxodo rural; para aumentar o nível de emprego, para matar a fome de milhões de brasileiros que vivem na mais completa miséria, e muitos outros (MARQUES, 1998, P 172).

3.5 BENEFICIÁRIOS DA REFORMA AGRÁRIA

De acordo com o art. 19 da Lei 8.629/93, são beneficiários da reforma agrária, o

homem ou a mulher, independente de estado civil.

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Art. 19. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente de estado civil, observada a seguinte ordem preferencial:

I – ao desapropriado, ficando-se assegurada a preferência para a parcela na qual se situe a sede do imóvel;

II – aos que trabalham no imóvel desapropriado como posseiros, assalariados, parceiros ou arrendatários;

III – aos que trabalham como posseiros, assalariados, parceiros ou arrendatários em outros imóveis;

IV – aos agricultores cujas propriedades não alcancem a dimensão da propriedade familiar;

V – aos agricultores cujas propriedades sejam, comprovadamente, insuficientes para o sustento próprio e o de sua família.

Parágrafo único. Na ordem de preferência de que trata este artigo, terão prioridades os chefes de família numerosa, cujos membros se proponham a exercer a atividade agrícola na área a ser distribuída.

Os imóveis rurais desapropriados podem ser distribuídos para seus beneficiários

através de títulos de domínio (venda, doação ou outras forma de transmissão da propriedade

imóvel), ou através de concessão de uso. Em ambos os casos, é obrigatória a cláusula de

inegociabilidade pelo prazo de 10 (dez) anos. Os beneficiários também assumem a obrigação

de cultivar o imóvel recebido, pessoalmente, por seu grupo familiar ou até através de

cooperativas, não podendo, entretanto ceder o uso a terceiros, a qualquer título, antes de

encerrado o prazo de 10 (dez) anos.

3.6 DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRÁRIA

3.6.1 A Luta pela Terra

A luta pela terra no Brasil existe desde os primórdios da organização da sua

sociedade. Essa luta contra a estrutura fundiária privilegiando as grandes propriedades,

sempre foi de certa forma violenta e com o passar dos tempos ela continua forte no cenário

nacional mostrando a sua importância social.

Essa luta contra uma estrutura fundiária voltada para o privilegiamento da grande propriedade sempre foi reprimida pela violência. Nem por isso, de tempos em

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tempos ela deixa de retornar ao cenário nacional, cada vez com mais vigor, retomando a sua importância social (ARAUJO, 1998, P 173).

Nessa luta cujo objetivo é uma melhor distribuição de terras, surgiram os

movimentos sociais. Esses movimentos definem ações a serem desenvolvidas para alcançar

determinados resultados.

Desses movimentos sociais nasceu o movimento dos Sem-Terra, que na luta pelo

acesso do trabalhador a terra, com a mudança na estrutura fundiária, encontrou na reforma

agrária com a desapropriação das grandes propriedades, o meio de conseguir uma melhor

distribuição de terras.

A estrutura agrária brasileira fez com que as terras ficassem concentradas nas mãos

de poucos o que favoreceu a formação de mão-de-obra rural desocupada. O colono pobre teve

seu acesso a terra dificultado e o acumulo de trabalhadores do campo sem seu pedaço de terra

foi inevitável.

A modernização da agricultura brasileira também contribuiu para o aumento dos

sem-terra, pois o pequeno agricultor não conseguiu acompanhar o custo da modernização que

somente se preocupou em aumentar a produção e a produtividade, sem se preocupar com a

estrutura fundiária. Isso provocou a expulsão de milhares de trabalhadores ligados a pequena

produção.

Os sem-terra reivindicam em sua luta, que sejam desapropriadas terras improdutivas

e através da reforma agrária sejam mais bem distribuídas entre aqueles que dela necessitam

para a sua sobrevivência.

Essa reivindicação deve ser analisada sob dois aspectos: no plano social e econômico

e no plano do direito.

No plano social e econômico o que prevalece é a inserção na economia, no processo

produtivo.

No plano social e econômico, o que os colonos sem terra exigem é a sua inserção no mundo da economia, pois se consideram excluídos de todo o processo produtivo. Dessa forma, o acesso a terra é o meio de que dispõem para se transformarem de excluídos em incluídos (ARAUJO, 1998, P 206).

A modernização da agricultura originou novas técnicas de produção agrícola com a

utilização de insumos artificiais e a mecanização da lavoura, o que aumentou de maneira

significativa o custo da produção, necessitando desta forma, o produtor de acesso ao crédito

para custear sua produção. Esse é o problema dos pequenos produtores que não tiveram

acesso a crédito e consequentemente foram excluídos da cadeia produtiva. Assim a grande

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massa de trabalhadores rurais que desejam ser incluídos forma a base dos movimentos do

meio rural.

No plano jurídico devem ser levadas em conta duas vertentes fundamentais: a que

deriva de leis constitucionais e a que deriva de leis ordinárias.

Já no plano jurídico, o exame deve levar me conta duas vertentes fundamentais: a que deriva das leis constitucionais, principalmente os decorrentes daqueles princípios que designam qualitativamente a propriedade, e por outra, aquelas que derivam das leis ordinárias, em especial, o Estatuto da Terra (ARAUJO, 1998, P 206).

No plano jurídico, as reivindicações têm respaldo jurídico tanto na constituição como

na legislação vigente, ou seja, a legislação busca uma melhor distribuição da terra para que se

leve ao campo uma situação de justiça social.

3.6.2 Desapropriação voltada para Reforma Agrária

A partir do estatuto da terra é que passou a existir um sistema permitindo a

intervenção do estado no meio rural capaz de promover a reforma agrária e estabelecer bases

de uma política agrícola com o fim de desenvolver o setor.

Mas o que se deve ressaltar é que só a partir do Estatuto da Terra passou a existir um sistema de direito positivo organicamente estruturado e bastante atualizado de forma a permitir uma intervenção eficiente do Poder Público no agrobrasileiro, não só com o objetivo de promover a execução da Reforma Agrária como também de estabelecer as bases de uma Política Agrícola, capaz de promover o desenvolvimento nesse setor (ROCHA, 1992, P 77).

A Constituição Federal de 88 estabeleceu em seu art. 184 a desapropriação para fins

de reforma agrária, em imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social. Desta forma

classificou a propriedade rural em duas espécies: a propriedade que cumpre a sua função

social e, portanto insuscetível de desapropriação e a propriedade que não cumpre a sua função

social podendo ser desapropriada pelo estado para a realização de reforma agrária.

A carta constitucional em seu art. 185 exclui ainda da desapropriação para fins de

reforma agrária a pequena e média propriedade desde que o proprietário não possua outra e a

propriedade produtiva, neste ultimo caso, desde que cumpra a sua função social.

Assim, a propriedade possui garantias que evitam a desapropriação.

Dessa forma, a garantia para que a propriedade não seja desapropriada para fins de reforma agrária é dada pela condição de ser produtiva, ao mesmo tempo em que cumpre com a sua função social. Em não estando nessa condição, o caminho está aberto para a intervenção do estado (ARAUJO, 1998, P 236).

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A desapropriação rural para fins de reforma agrária é motivada por interesse social,

interesse de terceiros, da comunidade, desta forma, a ordem econômica deixa de lado o

individualismo e passa a ter um destino social, buscando o benefício para todos.

A desapropriação para fins de reforma agrária só pode ser motivada pelo interesse social, entendendo-se este como sendo o interesse de terceiros, no caso, a comunidade, isto é, a ordem econômica deixa de estar sob a égide do individualismo e passa a ter um destino social, devendo trazer benefícios a todos (ARAUJO, 1998, P 121).

É um ato do Estado onde o interesse público prevalece sobre o privado, ocorrendo à

expropriação dos imóveis rurais que não atendam a função social. É o meio para a realização

da reforma agrária, para justa distribuição de terras.

Analisando o conceito do instituto de desapropriação, Cretella Júnior elenca uma série de seis elementos que entram na composição de sua definição. O primeiro elemento é o ato ou procedimento, unilateral, emanado de determinada pessoa jurídica pública, atingindo determinado objeto, que em geral é privado, mas também podendo ser público. O segundo elemento é o Estado: “a desapropriação é um ato, mas ato de império, ato de poder público, ato do Estado, da Administração – nunca ato particular”. O terceiro elemento é a existência do bem a ser desapropriado, pertencente ao particular ou ao próprio Estado. O quarto elemento é a supressão-aquisição do bem, “que passa das mãos de uma pessoa (privada ou pública) para as mãos de uma pessoa pública (desapropriação por necessidade ou utilidade pública) ou para as mãos de pessoas privadas (desapropriação por interesse social)”. O quinto elemento é a finalidade, que é de natureza pública, pois há no ato expropriatório a preponderância do interesse público sobre o privado; portanto, jamais pode ser de natureza privada. Já o sexto elemento é a indenização, que é a compensação oferecida pelo Estado ao sacrifício imposto à propriedade particular, podendo ser prévia, justa, em dinheiro, ou ainda em títulos (ARAUJO, 1998, P 122/123).

Feita a desapropriação, as terras desapropriadas serão distribuídas entre os

beneficiários, que de acordo com o art. 189 da constituição receberão o título de domínio ou

de concessão de uso, inegociáveis por 10 (dez) anos.

O beneficiário da reforma agrária tem o compromisso de cultivar, obrigatoriamente o

imóvel, direta e pessoalmente, ou por seu grupo familiar e até cooperativa. Um dos grandes

problemas para o agricultor assentado é conseguir recursos para produzir o suficiente para o

sustento de sua família, o que o faz vender a terra adquirida e voltar a participar dos

movimentos dos sem-terra. Ocorrendo isto, a reforma agrária regride, deixa de ser produtiva,

não atendendo mais ao fim para qual foi criada, aumentando o número de miseráveis no

campo. Na atualidade é o que mais ocorre.

Outro ponto importante é o compromisso que tem o beneficiário de título de domínio ou de concessão de uso de cultivar obrigatoriamente o imóvel direta e pessoalmente, ou através de seu núcleo familiar, mesmo que seja através de cooperativas (art. 21). Aqui reside um dos problemas mais delicados na política agrária. Muitos dos assentados, ao receberem seus lotes para se instalarem e produzirem, não conseguem levar adiante o sonho de se tornarem produtores independentes. Dessa forma, abandonam a terra e colocam à venda os lotes. É

65

justamente a desistência e o abandono que geram as críticas mais contundentes à política de reforma agrária (ARAUJO, 1998, P 146).

A reforma agrária que atenda ao fim a que se destina é de grande importância para o

desenvolvimento do país.

A importância da reforma agrária é decisiva porque permite e consolida a

estabilidade econômico-financeira de um país. Nenhuma nação poderá ser próspera enquanto

seu campesinato estiver na miséria social-econômica. Daí a necessidade da "libertação" dos

camponeses, numa base econômica de aliança harmônica entre o proprietário e os

trabalhadores rurais. Por conseqüência disto, a reforma agrária não é contra a propriedade

privada no campo. Ao contrário, descentraliza-a democraticamente, favorecendo as massas e

beneficiando o conjunto da nacionalidade. É um imperativo da realidade social atual, devendo

atender a função social da propriedade, evitando-se assim, as tensões sociais e conflitos no

campo. Uma reforma agrária no País, moderada e sábia, será uma das causas principais do

progresso nacional.

É preciso ver a reforma agrária como uma decisão política do estado para solucionar

uma "questão agrária", que entrava o desenvolvimento da Nação. Diz-se que o

desenvolvimento de um país está ligado por uma "questão agrária" quando as relações

econômicas, sociais culturais e políticas no meio rural produz uma dinâmica perversa que

bloqueia tanto esforço de aumentar a produção e a produtividade, como as tentativas de

melhorar o nível de vida da população rural e sua participação ativa no processo político

democrático.

Essa dinâmica é a resultante de uma cadeia causal que deriva, em última instância, da

concentração da propriedade da terra, porque é esta que determina a concentração do poder

econômico e do poder político, criando estruturas de sujeição da população rural e gerando

uma cultura incompatível com um tipo de exploração racional da terra compatível com o

desenvolvimento nacional. É um problema de ordem institucional, ligado aos mecanismos

jurídico, políticos e culturais que se formam e se automatizam, no meio rural, em decorrência

de dois processos interligados: a concentração da propriedade e a existência de uma grande

população rural destituída de terra. Esses mecanismos produzem efeitos perversos -

agronômicos (sistemas agrícolas pouco produtivos e devastadores da natureza); econômico

(baixa rentabilidade, dualidade tecnológica); sociais (pobreza, êxodo rural); políticos

(mandonismo, clientelismo, violência) e culturais (analfabetismo) - que operam

automaticamente, criando um círculo vicioso inibidor de qualquer possibilidade de

desenvolvimento dos mais e de iniciativas que signifiquem um aproveitamento mais racional

66

do potencial agrícola do país. Quando se constata a formação desse circulo vicioso, não pode

haver dúvida: o desenvolvimento do país em questão defronta-se com uma "questão agrária".

Trata-se de uma questão estrutural, porque não pode se solucionada exclusivamente com

medidas de política agrícola ou social, uma vez que a eficácia dessas políticas é anulada por

uma estrutura fundiária defeituosa.

Com a simples redistribuição, sem uma assistência técnica, creditícia e de comércio adequadas, não resultou em um aumento na produção, passou-se a entender que uma proposta de reforma agrária só poderia ser feita se acompanhada de políticas adequadas de apoio para aqueles que iriam receber os lotes da desapropriação. Com o que, para os conservadores, mais importante era dar ênfase à política de assistência do que propriamente a redistribuição, permitindo assim, adotar uma reforma agrária que mantivesse as estruturas intocadas (ARAUJO, 1998, P 112).

Não se pode confundir reforma agrária com a política de fazer assentamentos rurais

para reduzir tensões sociais localizada. No Brasil, a reforma agrária compõe-se de duas partes

indispensáveis e complementares: assentamento de famílias sem terra em grandes

propriedades desapropriadas nas regiões em que se manifestam de forma aguda os defeitos da

estrutura agrária; e viabilização técnica e financeira da agricultura familiar, nas regiões em

que ela já está implantada. É necessário que seja feita desta forma porque a reforma precisa

visa substituir a "dinâmica perversa", que fabrica miséria e bloqueia o desenvolvimento, por

uma dinâmica de desenvolvimento nacional que redistribua riqueza, renda e poder, viabilizar

a agricultura familiar, aumentar a produção com o desenvolvimento equilibrado da exploração

dos recursos naturais.

3.7 RELAÇÃO ENTRE OS INSTITUTOS

Pelo exposto neste capítulo, é cristalino que a desapropriação e a reforma agrária

estão necessariamente ligadas para a mudança na estrutura agrária brasileira.

A reforma agrária faz com que as terras que não cumpram a sua função social, que

não atinjam os índices necessários de produtividade sejam redistribuídas para aqueles que tem

interesse em produzir, em trabalhar na terra de maneira que ela seja aproveitada

adequadamente. Assim, os interesses do Estado em prol da sociedade poderão ser sanados, no

aspecto social com a melhor distribuição de terras e de renda e no aspecto econômico com o

aumento da produtividade e aquecimento da economia.

Da definição legal ressaltam claramente definidos os objetivos principais da reforma agrária, ou seja, de uma melhor distribuição da terra através de modificações no regime de sua posse e uso: a) atender os princípios da justiça social; b) promover o aumento da produtividade (Sousa, 1994, P 66).

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E a desapropriação é o meio pelo qual as terras serão desapropriadas para que a

reforma agrária seja efetivada.

O instituto jurídico da desapropriação, no contexto da legislação agrária, tem uma importância singular, na medida em que dela depende, basicamente, a almejada reforma agrária brasileira (MARQUES, 1998, P 173).

68

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por todo o exposto, conclui-se que a desapropriação de imóveis rurais para fins de

reforma agrária é o meio pelo qual o Estado intervém na propriedade particular em benefício

da coletividade. Esta ação é justificável pelos motivos que a seguir serão expostos.

O direto de propriedade foi introduzido na Constituição Federal de 1988, entre os

direitos e garantia fundamentais, sendo desta forma um direito assegurado pelo texto

constitucional. A propriedade é inviolável, tendo o proprietário garantias sobre seus bens,

podendo usar, gozar e dispor da maneira que achar necessário.

Da mesma forma que a Constituição garante o direito de propriedade, ela condiciona

à sua função social. Com isso a propriedade será garantida desde que atenda ao fim a que se

destina, sendo então, o direito de propriedade relativo, voltado para um fim social, ou seja, a

propriedade é protegida e garantida em razão de sua função social, com posições restritivas e

limitadas e o seu uso está condicionado ao bem-estar social.

A função social da propriedade se sobrepõe ao próprio domínio, é o equilíbrio entre

os direitos e obrigações do cidadão, com este utilizando-a conforme o bem-estar da

comunidade, não podendo privilegiar sues interesses pessoais em detrimento dos interesses

coletivos.

Assim, o Estado intervém na propriedade improdutiva retirando-a de seu legítimo

titular com o interesse público se sobrepondo ao privado.

Esta ação do Estado está prevista, tanto no texto constitucional como no

infraconstitucional, estando assim amparado pela legislação vigente e o meio pelo qual o

estado se utiliza é a desapropriação.

A desapropriação se apresenta por três formas, mas esta pesquisa foi direcionada

para a desapropriação de imóvel rural para fins de reforma agrária. Essa modalidade de

desapropriação foi criada como uma das medidas responsáveis pela redistribuição de terras,

como um meio hábil para a efetivação de justiça social.

As terras produtivas são insuscetíveis de desapropriação, pois este instituto foi criado

para interferir na propriedade que não seja produtiva, que esteja ociosa, não havendo motivos

para desapropriar aquelas terras que colaboram para o desenvolvimento econômico do País,

que produzem, geram riquezas e criam postos de trabalho.

69

A questão diz respeito aquelas propriedades que não alcançam ao fim à que se

destinam, que não são aproveitadas de acordo com o seu potencial, que não atinjam a

condição produtiva que podem chegar. Com isso essas propriedades serão transferidas pelo

Estado para outras pessoas que “em tese” farão as mesmas produzirem, atingindo assim ao

fim à que se destinam.

O instituto da reforma agrária é a justificativa pela qual é realizada a desapropriação.

Tal instituto foi criado para remodelar a estrutura agrária, para que o agronegócio se torne

mais próspero, para que todas as terras que possuem potencial produtivo sejam exploradas e

gerem as conseqüências de desenvolvimento econômico e social.

Como foi discorrido na pesquisa, a desapropriação tem muitos motivos positivos

para a sua realização e a sua ligação com a reforma agrária é necessária. Ambos os institutos

estão interligados para o desenvolvimento do campo, para a redistribuição de terras e para o

desenvolvimento sócio-econômico.

Na teoria, esta questão é de suma importância para o desenvolvimento do País, mas

na prática é notório que ainda não alcança os objetivo perseguidos, pois necessita de reformas

e ajustes para que chegue ao seu objetivo principal que é a justa distribuição de terras

cumulado com desenvolvimento e prosperidade.

70

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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