110
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E A PRISÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE NA VISÃO DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA À LUZ DO DECRETO-LEI Nº 911/69 Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí ACADÊMICO: GIOVANI GIAN DA SILVA São José (SC), junho de 2004.

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E A PRISÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE NA VISÃO

DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA À LUZ DO DECRETO-LEI Nº 911/69

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí

ACADÊMICO: GIOVANI GIAN DA SILVA

São José (SC), junho de 2004.

Page 2: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E A PRISÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE NA VISÃO

DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA À LUZ DO DECRETO-LEI Nº 911/69

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. Ms. Leonardo Valles Bento.

ACADÊMICO: GIOVANI GIAN DA SILVA

São José (SC), junho de 2004.

Page 3: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E A PRISÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE NA VISÃO

DA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA À LUZ DO DECRETO-LEI Nº 911/69

GIOVANI GIAN DA SILVA

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

São José, junho de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof. Ms. Leonardo Valles Bento - Orientador

_______________________________________________________ Prof. «título, se houver» «Nome» - Membro

_______________________________________________________ Prof. «título, se houver» «Nome» - Membro

Page 4: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Aos meus pais, Antônio e Icléia, alicerces da minha

história pessoal.

Aos meus irmãos Giorgio, Giuliane, Giorgian e

Gabriel, pelo incentivo e amor dedicados.

“In memorian” de Deucleciano Nunes da Silva,

Dária Coelho e Valmir Silveira, sempre em meu

coração.

À minha avó Dona Léia, imagem de retidão e

sobriedade em minha vida.

Aos meus tios Marcos e Didi, pelo estímulo e

dedicação dispensada.

Aos grandes amigos do CPM, Fábio, João, Artur e

Flávio, pelo companheirismo e amizade existente há

10 anos - “Para sempre, custe o que custar...”

Aos companheiros de jornada, meus amigos,

Alexandre Martine, Jerfferson, Jailson, Marcelo,

Renato, Jonas, Alexandre, Saulo, Alex, Francielle e

Cibely, pela acolhida em sua turma, cumplicidade e

pelos debates acadêmicos.

A todos os funcionários da 5º Vara Cível da

Comarca da Capital, em especial a Silvia Pereira,

Silvia Miller, Valmir Ramos e ao Magistrado Saul

Steil, que acreditaram em meu potencial.

A todos aqueles que, embora não citados,

contribuíram de alguma forma a realização deste

trabalho e a concretização de meu grande sonho.

O meu eterno agradecimento.

Page 5: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

AGRADECIMENTOS

A Deus, meu protetor, que me faz levantar quando ultrapasso os limites de minhas forças.

Ao orientador deste trabalho, professor Ms. Leonardo Valles Bento, pelo incentivo, atenção,

orientação e compreensão ao longo desta jornada.

A todos os professores desta instituição de ensino, exemplos de talento e seriedade acadêmica.

Aos professores membro da banca, que participaram da defesa deste Trabalho de Conclusão

de Curso, enriquecendo a avaliação deste estudo.

A todos aqueles que, de uma maneira direta ou indireta, contribuíram para a realização desta

pesquisa.

Page 6: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Não importa quão longe seja o caminho que se quer

chegar o importante é saber onde se quer chegar.

William Shakespeare

Page 7: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

SUMÁRIO

RESUMO ...............................................................................................................................VIII

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 01

1 O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA .............................. 05

1.1 FONTES HISTÓRICAS ...................................................................................................... 05

1.2 A INSERÇÃO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA NO DIREITO BRASILEIRO .............. 08

1.3 O NEGÓCIO FIDUCIÁRIO ............................................................................................... 10

1.3.1 Conceito e elementos integrantes ..................................................................................... 10

1.3.2 O negócio fiduciário e a alienação fiduciária ................................................................... 12

1.4 A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA ............................................................. 13

1.4.1 Conceito e caracterização ................................................................................................. 13

1.4.2 Sujeitos da relação jurídica ............................................................................................... 14

1.4.3 Objeto da alienação fiduciária .......................................................................................... 16

1.4.4 A formalização do pacto de alienação fiduciária em garantia .......................................... 18

1.4.5 Os efeitos do registro do contrato de alienação fiduciária ................................................ 19

1.4.6 Prova da alienação fiduciária nos veículos automotores .................................................. 21

1.4.7 A proteção do crédito fiduciário ....................................................................................... 22

1.4.7.1 Ação de busca e apreensão ............................................................................................ 22

1.4.7.2 Ação de depósito ............................................................................................................ 26

1.4.7.3 Do Processo Executivo .................................................................................................. 29

2 O DEPÓSITO E À PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL ................................. 31

2.1 O INSTITUTO DO DEPÓSITO .......................................................................................... 31

2.1.1 Evolução histórica ............................................................................................................. 32

2.1.2 Natureza jurídica do contrato de depósito ........................................................................ 33

2.1.3 Espécies do depósito civil ................................................................................................. 35

2.1.4 Principais características ................................................................................................... 37

2.2 A PRISÃO CIVIL ................................................................................................................ 40

2.2.1 Origem histórica ................................................................................................................ 41

2.2.2 Prisão civil nas constituições brasileiras ........................................................................... 43

2.2.3 A natureza jurídica da prisão civil .................................................................................... 44

Page 8: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

3 A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR FIDUCIANTE ........................................................... 47

3.1 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À PRISÃO CIVIL ......................................................... 47

3.1.1 A recepção do Decreto-lei 911/69 pela Constituição Federal de 1988 ............................. 47

3.1.2 Equiparação legal do devedor-fiduciante ao depositário infiel ......................................... 49

3.2 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À PRISÃO CIVIL ........................................................ 51

3.2.1 Vedação constitucional do depósito por equiparação legal .............................................. 51

3.2.2 A desvirtuação do instituto do depósito na alienação fiduciária ....................................... 55

3.2.3 A prisão civil e os tratados internacionais ........................................................................ 57

4 A PRISÃO CIVIL FIDUCIÁRIA NA INTERPRETAÇÃO DOS TRIBUNAIS ............ 64

4.1 PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ............................................... 65

4.2 PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA .......................................... 71

4.3 PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA ........................................................... 74

CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 79

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 85

ANEXOS ................................................................................................................................... 97

Page 9: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

RESUMO

A presente monografia tem como objetivo identificar as questões relacionadas à prisão civil nos contratos de alienação fiduciária em garantia no que se refere aos argumentos utilizados pelos defensores e opositores desta forma de segregação, à luz do Decreto-lei n.º 911 de 1969. Foi constado que as principais argumentações levantadas pelos defensores da prisão do devedor-fiduciante pautam-se na recepção do referido Decreto-lei, pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e na disposição do artigo 1º, do mesmo Decreto-lei, que expressamente instituiu como depositário legal do bem alienado, o devedor-fiduciante, com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal. Já os opositores à prisão civil cingem-se seus argumentos, por não permitir a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, na extensão do conceito de depositário infiel por lei ordinária. Observou-se, que a cláusula de alienação fiduciária estaria por desvirtuar o instituto do depósito, pois o contrato de alienação fiduciária gera uma obrigação de garantia, que é acessória em relação à obrigação de pagar o financiamento e não uma obrigação estritamente de guarda, como se apresenta no instituto do depósito. Tem, ainda, que a incorporação ao sistema jurídico brasileiro da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Riva), revogou do ordenamento legal brasileiro à prisão do depositário infiel, tanto em nível Constitucional como infraconstitucional. A metodologia para a pesquisa foi à bibliográfica, o método foi o indutivo e o procedimento o monográfico.

PALAVRAS CHAVE: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA; DEPOSITÁRIO-INFIEL; PRISÃO

CIVIL.

Page 10: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

INTRODUÇÃO

A partir do advento da Lei de Mercados de Capitais (Lei n.º 4.728 de 1965), deu-se a introdução, no cenário jurídico nacional, da alienação fiduciária. Tendo como escopo principal, garantir as operações de crédito para a aquisição de bens móveis. Assim, assumiu este instituto no ordenamento jurídico, a forma de um contrato de garantia, destinado a proteger, de maneira mais efetiva, os financiamentos perpetrados.

A seu turno, a alienação fiduciária atendeu os anseios das entidades financeiras e dos próprios consumidores, eis que facilitou inegavelmente a concessão de crédito, oferecendo ao financiador garantia efetiva do ressarcimento deste, sem, no entanto, retirar do financiado seu direito de utilizar o bem alienado, assegurando-lhe o uso e gozo, podendo usufruí-lo da forma como entendesse.

Nestes termos, a alienação fiduciária em garantia é configurada como negócio jurídico bilateral em que uma das partes (fiduciante), tomador do empréstimo, aliena a propriedade de um bem ao financiador (fiduciário), até que se finalize a relação contratual pelo adimplemento ou pela inexecução das obrigações pactuadas. Porquanto, através deste contrato, transfere-se ao financiador o domínio resolúvel da coisa alienada e a posse indireta do bem dado em garantia, independentemente da efetiva tradição da coisa, tornando-se, o devedor, mero possuidor direto e, por força da lei, depositário do bem alienado.

Neste comenos, o legislador não visou apenas introduzir no ordenamento uma nova modalidade de negócio jurídico, mas procurou dotar especificadamente as operações de crédito que utilizassem a garantia fiduciária da segurança necessária, para que ela cumprisse seu papel em nossa economia. Assim, para que a alienação fiduciária cumpra com os objetivos a que se destina, tratou o legislador de impor, através do Decreto-lei n.º 911 de outubro de 19691, uma série de restrições quanto ao seu uso e sua forma. Impôs, ainda, procedimento especial para que o financiador (fiduciário) possa exigir a devolução de seu crédito do modo mais célere possível. Ainda com o fito de garantir o adimplemento da obrigação, o legislador pátrio, equiparou o devedor-fiduciante, por expressa determinação legal, a condição de depositário do bem alienado, com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem, de acordo com a lei civil e penal, possibilitando, desta forma, a prisão civil do devedor-fiduciante por depósito-infiel.

A inquietude gerada na doutrina e na jurisprudência em razão dessas importantes

questões motivou o interesse pela realização do presente estudo, especialmente acerca da prisão civil do devedor-fiduciante por depósito-infiel, quando compelido a devolver o bem alienado ao credor-fiduciário e não o faz.

O assunto em estudo há muitos anos vem sendo amplamente debatido pelos juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou não da prisão do depositário infiel nos contratos de alienação fiduciária. Mesmo nos tribunais superiores, em que a matéria é ventilada a mais de uma década, está longe, um entendimento pacífico sobre a possibilidade ou não, da prisão civil nos contratos fiduciários.

Neste afã, quando se entra em querelas sobre a segregação de um semelhante, mesmo as de cunho civil, que tende a ser mais incomum, entra-se numa seara nebulosa do direito em que se contrapõem ideais humanitários, em face ao cumprimento dos preceitos legais. Frisa-se, que o legislador constituinte brasileiro de 1988 prestigiou uma tradição constitucional brasileira: não há, nesta república, prisão civil por dívida; não se prendem 1 Nas demais referências ao Decreto-lei n.º 911 de outubro de 1969 será utilizada a abreviatura Decreto-lei 911/69.

Page 11: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

pessoas porque devem dinheiro. Contudo, abre duas exceções, no caso de omissão em prestar alimento e ao lado disso, o depositário infiel.

Por estas ponderações, necessária se faz a pesquisa sobre a prisão civil, do devedor-fiduciante, pelo descumprimento do contrato de alienação fiduciária.

A presente monografia tem como objetivo geral identificar as questões relacionadas à prisão civil nos contratos de alienação fiduciária em garantia. E especificamente tem por objetivo verificar as noções gerais acerca da alienação fiduciária. Observar os institutos da prisão civil e do depósito. Expor os principais argumentos utilizados pelos defensores e opositores desta forma de segregação, à luz do Decreto-lei 911/69.

Cabe ressaltar, que este estudo não se pauta na busca de uma resposta ou mesmo na defesa das teses de cabimento ou não da prisão civil nos contratos de alienação fiduciária, mas tem como principal interesse, demonstrar os fundamentos de ambas as correntes doutrinárias, para que desta forma, se possa proporcionar uma visão geral de toda a problemática existente. Por outro lado, o acadêmico deixará consignado nas considerações finais do presente trabalho, o entendimento pessoal quanto a possibilidade ou não, da prisão do devedor-fiduciante.

No estudo realizado, pela sua natureza e também pela diversidade de entendimentos sobre a matéria, não foi adotado um marco teórico exclusivo. O trabalho pauta-se por uma abordagem jurídica sistêmica, envolvendo doutrina, jurisprudência e legislação, especialmente a Lei n.º 4.728 de 1965, o Decreto-lei 911/69 e a Constituição da República Federativa do Brasil de outubro de 19882. No que diz respeito à metodologia empregou-se a técnica de pesquisa bibliográfica, o método de abordagem adotado foi o indutivo e o procedimento foi o monográfico.

Especificamente quanto ao conteúdo do trabalho, o tema foi dividido em quatro capítulos. O primeiro cinge-se na análise do instituto da alienação fiduciária em garantia e suas principais características. Para tanto, fez-se uma breve explanação histórica, em que se procurou identificar as fontes deste instituto, sendo que, em seguida, foram observados os motivos que ensejaram a inserção no sistema jurídico nacional de mais esta garantia contratual. Nestes termos, passa-se a delinear as características do negócio fiduciário, do qual a alienação fiduciária é espécie. A parte final deste capítulo é dedicada ao estudo do instituto da alienação fiduciária em garantia, propriamente dito, no qual observa-se desde os sujeitos da relação jurídica até os meios de defesa empregados pelo credor-fiduciário.

O segundo capítulo deste trabalho é dedicado ao estudo do depósito e da prisão

civil do depositário infiel. Tem por objetivo demonstrar as principais características desses

institutos, tendo em vista, que a prisão civil do devedor-fiduciante é decretada justamente por

conta de sua equiparação ao depositário por não devolver o bem alienado ao credor-fiduciário.

Para tanto, inicia-se procurando demonstrar a evolução histórica do depósito, sua natureza

jurídica, as modalidades e suas principais peculiaridades. No que consiste a prisão civil,

observa-se sua origem histórica, bem como a inserção desta nas constituições brasileiras com

algumas ponderações quanto à sua natureza jurídica.

No terceiro capítulo o foco da pesquisa foi direcionado ao objetivo primeiro deste

trabalho, apresentado alhures, o de delinear as principais teses encontradas na doutrina e na

2 Nas demais referências a Constituição da República Federativa do Brasil de outubro de 1988 será utilizada a abreviatura CRFB/88.

Page 12: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

jurisprudência dos que defendem o cabimento da prisão e em igual proporção dos que se

mostram contrários a esta segregação civil.

No quarto e último capítulo deste trabalho, tecem-se considerações acerca dos

entendimentos da jurisprudência pátria sobre a prisão civil do depositário infiel, com base nos

contratos de alienação fiduciária em garantia. Visa observar e demonstrar a dissensão

existente entre os principais Tribunais do país, tendo sempre em mente que a pesquisa

jurisprudencial é de suma importância para que se encontre respaldo na aplicação e utilização

dos institutos legais. Longe da pretensão de esgotar o tema, o trabalho que ora se apresenta

visa apenas propor uma reflexão sobre um importante aspecto do Estado Democrático de

Direito, mais especificamente sobre a prisão civil nos contratos de alienação fiduciária em

garantia, diante dos embasamentos teóricos da doutrina e da jurisprudência.

Page 13: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

1 1. O INSTITUTO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA

1.1

1.2 1.1 FONTES HISTÓRICAS

Para que se possa captar a melhor compreensão de um instituto jurídico deve-se

conhecer sua origem histórica, o contexto social de que emana e o seu desenvolvimento através dos tempos, “porque ele não é um produto arbitrário da vontade do legislador, mas o resultado dum processo evolutivo de longa e progressiva elaboração social” (OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 132).

A alienação fiduciária é conhecida desde o direito romano, em que o pactum fiduciae compreendia três modalidades a fiducia cum amico, fiducia remancipationis causa e a fiducia cum creditore.

Consoante a origem romanista explica o professor Deda, “para melhor compreensão do instituto, há que se atender à sua origem, a fidúcia romana, contrato real de boa-fé, mais antigo que o penhor e por este substituído no direito Justiniano”. (2000, p. 07).

Na fudicia cum amico havia a cessão de domínio da coisa para um amigo, na salvaguarda de interesses do próprio fiduciante. Essa transferência ocorria em situações de longas viagens, riscos de perecer em guerras, perdas vindas de intrigas políticas, dentre outras. Este instituto romano não tinha a finalidade de garantia, mas apenas dava ao fiduciante a administração do bem, muito embora perante terceiros fosse este o proprietário, permanecendo oculta a convenção que limitada suas atribuições.

Consistia em um amigo entregar a outro uma coisa com transferência a da propriedade, para dela fazer uso até ser pedido em restituição. Supunha relações mais afetivas entre fiduciante e fiduciário, como o próprio nome está a indicar. Seu uso era largamente utilizado em diversas circunstâncias, assemelhando-se com o Direito longorbardo. (BECK, 1990, p. 04).

A fiducia remancipationis causa, é intrinsecamente atrelado nas tradições familiares romanas, o “pacto pelo qual o paterfamilias vende um filho a outro parterfamilias, com a obrigação assumida por este de libertá-lo em seguida, de forma a tal que se obtenha o fim visado, que é a emancipação do filho”. (RESTIFFE NETO, 1975, p. 02).

Na fiducia cum creditore, ocorria à constituição da propriedade fiduciária como garantidora de créditos. O devedor vendia certos bens ao credor, com a ressalva de recupera-los mais adiante, desde que cumprisse com o pagamento da dívida, “aqui o devedor por força

Page 14: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

do contrato, transferia a propriedade da coisa ao credor, em garantia do pagamento de um débito”. (BECK, 1990, p. 04).

Com muita propriedade Mazzuoli caracteriza a fiducia cum creditore: [...] esta sim se estabelecia para garantia de dívida, conferindo ao credor excessiva vantagem, posto que lhe permitia conservar a propriedade de coisa de valor por vezes muito superior ao débito. Pela fiducia cum creditore, uma das modalidades do negócio fiduciário romano, o devedor transmitia ao credor o domínio de um bem, que, posteriormente, lhe seria restituído, quando do resgate da dívida. (1999, p. 28, grifo do autor).

Nota-se que em todas as modalidades da fidúcia romana encontra-se presente duas

características em comum. Em todas existe transferência da propriedade de algo ou alguém e esta propriedade está relacionada a fato extintivo ou resolutivo.

Traço comum às fidúcias era a efetiva transmissão da propriedade de determinado bem, com a ressalva de que essa transmissão era condicionada ao cumprimento de determinado fim, havendo, portanto, a obrigação do adquirente, ao fiduciante, de restituí-lo depois de cumprida o objeto definido no contrato. (CHALHUB, 2000, p. 13).

Um grave defeito é apontado pelos doutrinadores nas modalidades de fidúcia romana. A restituição da propriedade era uma obrigação pessoal do credor, assim não se constituindo uma obrigação real. Cuidando-se de obrigação real esta poderia ser oponível a terceiros em se tratando de pessoal, esta é exigível somente entre os contratados podendo vir a ser resolvida em perdas e danos.

Se direito real fosse, o fiduciante, após o pagamento da dívida, seria reinvestido na propriedade do bem, estivesse este em mãos do fiduciário ou de terceiro. Mas, como se tratava de direito pessoal, necessitava de procedimento judicial sempre que houvesse recusa do fiduciário em outorgar o instrumento de retorno da propriedade ao fiduciante. (MEZZARI, 1998, p.16).

O instituto do negócio fiduciário foi utilizado como garantia pelo Império Romano

somente até o século VI d.C, quando foi suprimida do Corpu Juris Civilis. Este é o motivo assinalado pela doutrina para a não inclusão do negócio fiduciário nos ordenamentos que utilizam o direito romano como sustentáculo legal.

Sua supressão no Corpus Iuris Civilis do VI século importou em que não recebeu acolheita nos sistemas romano-cristãos. Não penetrou no Código Francês de 1804, nem no BGB de 1896, e em conseqüência os códigos todos, filiados à corrente napoleônica e à tedesca, o ignoraram. Inclusive o brasileiro de 1916. Os sistemas da Common Law, todavia, desenvolveram o instituto da ‘trust’. (PEREIRA, 1974, p. 361).

Em que pese à origem clássica da fidúcia, temos como fonte mais próxima da

alienação fiduciária em garantia o trust receipt que a partir da Idade Média, passa a configurar-se na Inglaterra.

O trust pode ser caracterizado como sendo a entrega de certos bens a uma pessoa, para que deles faça uso conforme determinado encargo que lhe tenha sido cometido.

A seu turno, Gomes explica a sistemática deste instituto: O revendedor recebe um adiantamento correspondente a parte do custo do bem, que lhe é entregue em confiança, obrigando-se a resgatar a dívida contraída, tão-logo venda a mercadoria. O financiador garante-se, com o trust receipt, em virtude de registro do respectivo documento, através do qual os demais credores do

Page 15: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

revendedor podem saber que as mercadorias (automóveis, aparelhos de televisão, geladeiras) garantem o financiamento, liberando-as à medida que se forem vendendo. A propriedade das mercadorias é transferida ao financiador até o reembolso, mediante entrega do conhecimento de embarque, ficando o revendedor como depositário. (1975, p. 18-19, grifo do autor).

Todavia, embora acham similitudes do trust receipt e a alienação fiduciária, no

que consiste na boa fé e na transmissão da propriedade resolúvel a terceiro, encontram-se latentes certas discrepâncias entres os institutos, tanto que para Gomes não há que se confundir os institutos.

Vê-se semelhança entre os dois institutos na predominância do elemento fiduciário. No trust receipt, precisa o financiador ter confiança no revendedor, pois do contrário, venderá ele a mercadoria, apropriando-se do preço, sem resgatar o título correspondente ao adiantamento recebido, perdendo aquele a garantia, que é, em última análise, a própria mercadoria. Bem é de ver que se assegura por outros meios, como o seguro, e lhe resta a medida corretiva exigir imediatamente o pagamento dos outros títulos, representativos de adiantamento, emitidos pelo revendedor. Na alienação fiduciária em garantia, também importa fundamentalmente o fator confiança, porquanto o alienante permanece na posse do bem e se apresenta, aos olhos de todos, com seu proprietário, que está a usá-lo. Se faltar à confiança do financiador, deteriorando, por exemplo, o bem, diminui a garantia. É certo que outras garantias também são tomadas como no trust receipt, acentuando a semelhança, mais ainda assim, na se confundem os dois institutos. (1975, p. 19, grifo do autor).

No pensamento de Alves, também o negocio fiduciário instituído pelas leis

brasileiras, nos contornos dados por esta, não se confunde com o trust receipt, contudo aproximando-se em alguns aspectos.

Em conclusão, verifica-se que a alienação fiduciária em garantia, negócio jurídico típico que é, não se enquadra entre os negócios fiduciários propriamente ditos, diferenciando-se, também, dos negócios fiduciários do tipo germânico; e ainda que apresente semelhanças com o trust receipt, e vários pontos de contatos, é instituto próprio do direito brasileiro, em cujo sistema – do qual, à primeira vista parece aberrar – se ajusta dogmaticamente, já prestando amplo beneficio como instrumento jurídico adequado à segurança do crédito. (1987, p. 40, grifo do autor).

Deste modo, observou-se que a origem clássica da alienação fiduciária deve-se ao

direito romano, sendo que esta sofreu desdobramentos contemporâneos, como na Inglaterra com o trust receipt, conclui-se desta feita, que o instituto fidúcia proliferou no direito atual de várias legislações inclusive a brasileira a qual passa-se a estudar.

1.3

1.4 1.2 A INSERÇÃO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA NO DIREITO BRASILEIRO

A inclusão da alienação fiduciária no contexto nacional tem sua origem

intimamente ligada ao fomento econômico.

Page 16: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Para o crescente desenvolvimento da economia imperioso se faz o crédito, tanto para as indústrias como para os consumidores. Com efeito, sem disponibilidade de crédito não há que se falar em desenvolvimento industrial, nem mesmo em expansão do consumo.

O crédito permite o aumento do mercado consumidor e a ampliação da faixa de funcionamento das instituições financeiras, dando assim maior elasticidade ao mercado de capitais e reduzindo o risco das operações. A generalização do crédito ao consumidor fez com que se desse capacidade aquisitiva a um determinada classe de compradores, que não a teria em condições normais, de tal modo que um grande número de pessoas, que estavam marginalizadas no mercado consumidor, passaram a poder integrá-lo, em virtude do crédito a médio prazo que lhes foi concedido par a realização de certas compras. Essa medida, tornou-se um meio de evitar a recessão e de facilitar a própria industrialização, especialmente no campo dos automóveis e dos eletrodomésticos. (RESTIFFE NETO, 1975, p. 54).

Assim, para que as linhas de créditos pudessem ser disponibilizadas em larga

estala propiciando o desenvolvimento dos setores da indústria e do consumido, era indispensável armar o credor de garantias eficientes, da restituição de seu investimento, “a insegurança fatalmente prejudicaria a captação de recursos e financiamento, com retração na atividade de abertura de crédito para aquisição de utilidades e bens de produção”. (RESTIFFE NETO, 1975, p. 56).

Contudo, frente à crise3 ocorrida nos institutos de garantias do direito civil, uma vez que estes não constituem instrumentos céleres para o credor executar seu crédito em face do inadimplemento a disponibilidade de crédito tornava-se cada vez mais escasso.

Ainda, no que se refere à necessária instituição de novos meios de garantia do crédito dos investidores, pondera o professor Pereira, como segue:

O direito brasileiro tem experimentado novos instrumentos de garantia, uma vez que a complexidade da vida moderna não se satisfaz com aqueles de cunho tradicional. O penhor e a hipoteca revelam-se demasiado rígido para acompanharem a velocidade crescente do tráfico jurídico. O primeiro, exigindo a efetiva traditio da coisa apenhorada, não satisfaz às exigência da vida mercantil. A segunda, limitada aos bens imóveis, navios e aeronaves, tem seu campo de atuação de incidência estreito demais. E da anticrese não há falar, dado o desuso em que incorre em nosso direito, como em face da tendência moderna à sua supressão como direito real. (1974, p. 360, grifo do autor).

Desta forma, existia o embate de duas situações, inicialmente, como já destacado, a necessidade da indústria de aumentar a produção e o crescimento do consumo com a exigência cada fez maior da população pelas linhas de crédito, por conseguinte, as instituições financeiras não possuíam instrumentos legais que garantisse plenamente a devolução do capital disponibilizado à indústria e ao consumo.

Diante deste quatro através do artigo 66 da Lei 4.728, de 14 de julho de 1965 (lei do mercado de capitais), foi criado um instituto de garantia dos créditos, qual seja a alienação fiduciária, conforme destaca o professor Gomes, “a alienação fiduciária em garantia foi instituída na lei que disciplinou o mercado de capitais. Destinada a garantir operações próprias das sociedades de crédito e financiamentos”. (1975, p. 01).

3 Tem-se, todavia, que tal entendimento, o de haver uma crise, como equivocada, o professor Frederico Viegas de Lima, salienta “não haver uma crise no sistema de garantias civil e sim uma evolução de acordo com as novas necessidades sociais”. (1998, p. 24). Já o professor e Ex -Ministro do Supremo Tribunal Federal, Moreira Alves, afirma que “desde do inicio do século passado a sociedade tem sentido necessidade da instituição de novas formas de garantir o direito do credor”. (1987, p. 03).

Page 17: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Posteriormente, editou-se o Decreto-Lei 911/694, com o escopo de reformular o instituto, inseriu alterações, não só na seara do direito material quanto na procedimentalidade do instituto.

Deste modo, atendeu-se ao anseio social, acesso da grande faixa populacional ao crédito e por conseqüência ao consumo de bens, com o acolhimento das exigências almejadas pelos credores de uma garantia célere e eficaz na execução de seu crédito.

Como bem ponderado por Alves, “atendendo à aspiraçõe s de novas garantias reais, principalmente no mercado de capitais onde a necessidade de proteção ao crédito toma vulto maior, introduziu-se, no sistema jurídico brasileiro, o instituto da alienação fiduciária em garantia”. (1987, p. 07).

Assim, a alienação fiduciária em garantia teve sua criação com o claro objetivo de fortalecer o desenvolvimento econômico do país, propiciando o crescimento da indústria e do consumo através de instrumentos de garantia mais céleres ao credor.

Neste mister, passa-se a analisar os traços característicos do negócio fiduciário o que é de suma importância para os fins deste trabalho para um completo entendimento da alienação fiduciária em garantia.

4 Na exposição de motivos com que o Ministro da Fazenda, Delfin Neto, encaminhou o Projeto, de que resultou o Decreto-lei 911/69, ao Presidente da República, destaca-se como seus pontos principais: “A importância crescente do crédito ao consumidor está exigindo uma reformulação do Instituto da Alienação Fiduciária que passou a desempenhar função relevante como garantia nas operações feitas pelas instituições financeiras para financiamento ao usuário de bens de consumo ou de produção. Instituto novo, introduzido no direito brasileiro pelo artigo 66 da Lei n.º 4.728, de 14 de julho de 1965 (lei de mercado de capitais), a alienação fiduciária não tinha merecido, até o presente momento, uma adequada regulamentação processual. A ausência de normas sobre a matéria tem ensejado divergências jurisprudenciais e insegurança nas relações jurídicas que contam com a referida garantia, suscitando-se dúvidas quanto à ação própria a ser intentada pelo adquirente fiduciário contra o alienante. A demora nos processos para reaver o bem garantidor do débito tornou-se fonte de encarecimento das operações financeiras realizada com a garantia da alienação fiduciária. Pretendendo o governo baixar o custo operacional das instituições financeiras tornou-se indispensável dar solução rápida e eficaz na hipótese de inadimplemento do devedor, justificando-se, pois, a elaboração de um projeto de decreto-lei para atender a tais situações. O projeto define alienação fiduciária em garantia como uma propriedade resolúvel em favor do adquirente que se extingue com o pagamento do débito. Na hipótese de inadimplemento ou mora do devedor, credor pode realizar a busca e apreensão do bem dado em garantia, pois com a inexecução das suas obrigações o devedor perdeu o título que anteriormente justificava a sua posse. A busca e apreensão é, no caso, processo autônomo e exaustivo cuja decisão termina o litígio, autorizando a venda extrajudicial do bem, sem prejuízo de qualquer ação que o devedor possa intentar contra o credor se se julgar prejudicado. Admite-se, excepcionalmente, a purgação de mora quando o devedor já pagou mais de 40% do preço e requerer o pagamento do seu débito acrescido de juros, custas judiciais e honorários de advogado. Estabelece o projeto os requisitos dos contratos de alienação fiduciária, determinando o registro dos mesmos no cartório de títulos e documentos do domicílio do credor. O projeto admite que, não sendo encontrado o bem dado em garantia, posse ser intentada a ação de depósito. O credor preferindo, também poderá renunciar a garantia e executar os bens do devedor, nos termos do contrato. Finalmente, delega o projeto competência ao Conselho Nacional de Trânsito para regulamentar, no prazo de 60 (sessenta) dias, a aplicação do decreto lei no tocante aos veículos automotores. A elaboração do projeto, em última analise, visa dar maiores garantias às operações feitas pelas financeiras, assegurando o andamento rápido dos processos, sem prejuízo da defesa, em ação própria, dos legítimos interesses dos devedores. Obteve-se, assim, um justo equilíbrio e uma conciliação adequada entre as reinvidicações dos organismos financeiros, a proteção adequada dos investimentos e o resguardo dos direitos dos usuários e adquirentes dos bens de consumo e de produção, mediante a utilização do crédito direto.”

Page 18: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

1.5

1.6 1.3 O NEGÓCIO FIDUCIÁRIO

1.6.1

1.6.2 1.3.1 Característica e conceituação

Fidúcia, do latim fiducia, de fidere, confiar, é signo lingüístico que tem o

significado de confiança. (GUIMARÃES, 1995, p. 325, grifo do autor). Como afirmado pela doutrina, negócio fiduciário é gênero da espécie alienação

fiduciária em garantia. “A alienação fiduciá ria em garantia é uma espécie do gênero negócio fiduciário,

encerrando a transmissão da propriedade para um fim econômico”. (CHALHUB, 2000, p. 138).

O negócio fiduciário caracteriza-se como sendo o negócio jurídico do qual determinado indivíduo (fiduciante) transfere o domínio de um determinado bem a outra pessoa (fiduciário), sob condição de que esta o devolva.

Nas palavras de Chalhub, negócio fiduciário consiste: (...) negócio jurídico inominado pelo qual uma pessoa transmite a propriedade de uma coisa ou titularidade de um direito a outra, que se obriga a dar-lhe determinada destinação e, cumprindo esse encargo, retransmitir a coisa ou direito ao fiduciante ou a um beneficiário indicado no pacto fiduciária. (2000, p. 38).

Já na concepção de Oswaldo Opitz e Sílvia Opitz, negócio fiduciário é: Um pacto adjeto à mancipatio e à in jure cessio, consistente numa obrigação de fazer e não fazer. Assim, o adquirente se obriga a remancipar a coisa ao antigo dono, desde que se tenha verificado a condição ou termo estabelecido na cláusula acessória à transmissão da propriedade e, quando a transferência era para garantir uma dívida, devia retornar ao devedor, assim que se satisfizesse seu pagamento. (1984, p. 132, grifo dos autores).

Conforme a finalidade, o negócio fiduciário distingue-se em dois grupos, quais

sejam, os de garantia e os de administração. O negócio fiduciário de cunho administrativo compreende atos de gestão e de

investimento. Já o negócio fiduciário de garantia caracteriza-se, como sua nomenclatura indica,

pelo fito garantidor e assim “visa proporcionar ao prestamista maior segurança no recebimento da dívida”. (GOMES, 1975, p. 32).

Oswaldo Opitz e Sílvia Opitz observam sobre os grupos do negócio fiduciário: Por sua vez, distingui dois grupos principais de negócio fiduciário; a) fidúcia administrativa sem proveito próprio; b) a fidúcia de garantia em proveito próprio. Enquadra-se no primeiro grupo a alienação de um patrimônio a um fiduciário para sua utilização no interesse da totalidade dos credores do fiduciante ou a

Page 19: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

transferência de ume estabelecimento comercial para ser administrado em caráter fiduciário, ao passo que ao segundo grupo pertence a cessão e transferência de um direito patrimonial em garantia de um crédito. (1984, p. 136).

De outra banda, o negócio fiduciário pode ainda ser classificado conforme sua

natureza jurídica em típicos e atípicos. Nos típicos, o terceiro que adquire a coisa, o faz com base em uma propriedade

resolúvel e está obrigado a restituí-la ao alienante fiduciário, verificada a condição, são regrados conforme a legislação constante em cada país.

“Negócio fiduciário típico são aqueles previstos em lei. O uso o consagrou de modo que entraram na estrutura legal de cada nação, tais como o fideicomissoB e a alienação fiduciária em garantia no direito brasileiro”. (OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 134).

O negócio fiduciário típico, em regra é condicionada, v.g. quando o testador instituir herdeiro ou legatário por meio de fideicomisso, impondo a um deles, o fiduciário, a obrigação de, por morte sua, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir ao outro que se qualifica de fideicomissário, a herança ou legado. É obrigado a restituir e, para tanto, a lei concede ao fideicomissário o direito de exigir que o fiduciário preste caução. O domínio do fiduciário é resolúvel, portanto, desde que se verifique alguma das condições referidas, ele o perde, devendo passar ao fideicomissário, queira o não. Assim, também, na alienação fiduciária em garantia. Satisfeita a dívida, resolve o domínio da coisa, que foi transferida, para garantir o crédito. (OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 134).

No que consiste aos negócios atípicos, estes não são previstos em lei, a propriedade não sai do poder do terceiro adquirente que fica com o seu domínio definitivo, respondendo por perdas e danos.

Nos negócios atípicos, porque não há regras especiais, de modo que a propriedade da coisa se transfere realmente, apesar da fidúcia. Não há meio de se evitar essa transmissão e como conseqüência, a deslealdade do ‘accipiens’ se resolve em perdas e danos. (OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 135, grifo dos autores).

Analisadas as principais características do negócio fiduciário, suas classificações e conceitos, alvitra-se neste próximo tópico, as especificidades do instituto da alienação fiduciária em garantia, propriamente dito.

1.6.3

1.6.4 1.3.2 O negócio fiduciário e a alienação fiduciária

A alienação fiduciária em garantia é uma espécie do gênero negócio fiduciário,

como outrora destacado. Todavia, existem doutrinadores que não consideram a alienação fiduciária em garantia como uma espécie do negócio fiduciário, dentre os quais destacamos inicialmente Oliveira, que acredita ser “a alienação fiduciária em garantia é um contrato não mais baseado no elemento confiança, como eram os negócios fiduciários clássicos”. (2002, p. 24).

Em seguida, na mesmo vertente, Lima aduz que: [...] trata-se, por conseguinte, de negócio jurídico típico de direito civil, mais concretamente, de direitos reis – afastando-se a noção romana ou mesmo germânica

Page 20: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

de fidúcia -, onde a confiança deixa de ser fator relevante para a contratação, porquanto deriva do próprio ordenamento jurídico. (1998, p. 46).

Suas alegações subsistem com supedâneo em duas premissas, a primeira tem como principal argumento o fator confiança, desta forma, acreditam os doutos que este fator não é estritamente necessário nos contratos de alienação fiduciária em garantia. Sua segunda razão restringe-se ao fato de que a transmissão da propriedade fiduciária é de cunho temporário.

De outra banda, em que pese os argumentos, grande parte da corrente doutrinaria tem trajado a alienação fiduciária em garantia como espécie do negócio fiduciário.

Em seus estudos sobre a temática Chalhub elucida: [...] a doutrina é majoritária no sentido de conceber a alienação fiduciária em garantia como espécie do gênero negócio fiduciário, basicamente por dois motivos: a) porque o fiduciário deve agir sempre com lealdade, no sentido de devolver a propriedade assim que implementar a condição resolutiva; b) porque a transmissão da propriedade ocorre em dois momentos: primeiro, como garantia ao negócio fiduciário, esta, sim, temporária e transitória, como no negócio fiduciário, e depois, cumprindo o fiduciante a sua obrigação, o bem retorna automaticamente ao seu domínio, independente de interpelação. (2000, p. 139).

Neste diapasão, fica evidente que a alienação fiduciária em garantia possui diferenciações e características que lhe são peculiares, todavia tem como elementos intrínsecos os existentes no negócio fiduciário.

1.6.5

1.7 1.4 A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA5

1.7.1

1.7.2 1.4.1 Conceito e elementos integrantes

Como demonstrado anteriormente, a criação do instituto da alienação fiduciária em

garantia no direito positivo brasileiro teve como ponto de partida o contexto social em meados da década de 60, criou-se mecanismo de captação de recursos destinado ao desenvolvimento nacional, o que foi possível com o advento da Lei de Mercado de Capitais (Lei n.º 4.728 de 1965), sendo o instituto da alienação fiduciária inserido no inciso XIV, do artigo 66, da referida Lei.

5 O presente trabalho tem como escopo de estudo a prisão civil do devedor-fiduciante dos bens móveis, regulado pelo Decreto-lei 911/69. Esta distinção tem de ficar clara em razão da promulgação da Lei nº 9.514/97, que criou o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) e instituiu a alienação fiduciária de coisas imóveis. Esta nova lei, com a proposta de diminuir a inadimplência dos financiamentos através do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), trazendo regras mais flexíveis, possibilitará a formação de empréstimos destinados ao financiamento imobiliário em geral. Isso fica só a título de esclarecimento, posto que foge totalmente do tema a ser tratado no presente trabalho, não merecendo maiores considerações.

Page 21: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Contudo, as freqüentes dúvidas na aplicação do instituto da alienação fiduciária bem como as enormes lacunas existentes em conjunto com sua ambigüidade técnica determinaram sua retificação pelo Decreto-lei 911/69, no qual foram dadas novas redações às disposições legais e, ainda, introduziram-se regras de natureza processual, ficando assim positivada:

Artigo6 1º A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição, efetiva do bem, tornado-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal.

A alienação fiduciária representa para o credor uma garantia ao cumprimento da

obrigação através da cessão da propriedade, sob condição resolutiva, que lhe faz o devedor, do bem móvel durável adquirindo por meio do financiamento.

Para Gomes alienação fiduciária é o “negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, a propriedade de um bem, obrigando-se a devolvê-la quando se verificar o acontecimento a que se tenha subordinado tal obrigação”. (1975, p. 18).

Pereira define a alienação fiduciária como “a transferência, ao credor, do domínio e posse indireta de uma coisa, em garantia do pagamento de obrigação a que acede, resolvendo-se o direito do adquirente com a solução da dívida garantida”. (1974, p. 362).

Sobre o assunto Coelho ensina:

No contrato de alienação fiduciária em garantia, uma das partes (fiduciante) é devedora da outra, geralmente instituição financeira (fiduciária), e esta última titulariza, como garantia, a propriedade resolúvel e a posse indireta de certo bem, que aquela lhe alienou sob a condição de recebê-lo de volta, quando da quitação do débito. (2002, p. 293).

E, na concepção de Alves, alienação fiduciária em garantia poder ser conceituada

como sendo o “negócio jurídico bilateral, que visa a transferir a propriedade de coisa móvel com fins de garantia”. (1987, p. 45).

A partir destas definições, pondera-se que a alienação fiduciária trata do negócio no qual uma das partes – o fiduciante -, ao garantir o cumprimento de uma obrigação contraída, transfere à parte credora – fiduciário – a propriedade de um bem móvel. Em caso de cumprimento da obrigação, a propriedade desse bem volta automaticamente para o fiduciante.

Para melhor elucidar os conceitos do instituto colaciona-se o ensinamento de Gomes, ponderando que “se um comerciante tem necessidade de um crédito e não pode privar-se da posse de mercadorias, dando-as em penhor, transmite fiduciariamente a propriedade desses bens ao credor que o financia”. (1975, p. 16).

Ficando desta forma demonstrado o conceito legal e alienação fiduciária em garantia que, como todo negócio jurídico, reclama, para sua validade no mundo jurídico, agente capaz, objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei. Estes são os elementos integrantes da relação fiduciária em garantia que passaremos a evidenciar em seguida.

6 Nas demais referências ao termo ‘artigo’ será utilizada a abreviatura ‘art.’.

Page 22: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

1.7.3

1.7.4 1.4.2 Sujeitos da relação jurídica

São partes neste contrato de um lado o devedor alienante do bem dado em garantia

pelo empréstimo, que é chamado de fiduciante, e do outro encontramos o credor que adquirente a propriedade do bem depositado em garantia, denominado fiduciário.

Como explica Alves, “duas são as partes contratantes na alienação fiduciária em garantia: de um lado, aquele que aliena fiduciariamente a coisa móvel; de outro, o credor que lhe adquire a propriedade fiduciária”. (1987, p. 80).

O fiduciante, que na maior parte é o consumidor, pessoa física, que utiliza o financiamento para aquisição de determinado bem, sendo o contrato muito utilizado para a aquisição de automóveis, exempli gratia. De outra banda, nada impede que o sujeito da relação contratual, fiduciante, seja uma pessoa jurídica. Nas palavras de Deda “o alienante há que ser o consumidor final, que obteve crédito de uma financeira”. (2000, p. 16).

O que importa na observação quanto à constituição deste pólo contratual é a necessidade de estar o sujeito plenamente apto a praticar os atos da vida civil, ou seja, capacidade de agir nas palavras de Gomes (1975) e capacidade de consentir, nos ensinamentos de Alves (1987).

Se relativa sua capacidade civil, deverá obrigatoriamente ser assistida por representante legal, pois se assim não o for o negócio poderá ser anulado.

Ambos – alienante e adquirente -, para celebrarem validamente a alienação fiduciária em garantia, devem ter capacidade para consentir. Os incapazes somente podem figurar nesse contrato se, em se tratando de absolutamente incapazes, devidamente representados, ou na hipótese de relativamente incapazes, assistidos. Em caso contrário, o contrato será nulo por incapacidade absoluta da parte, ou se a incapacidade for relativa, anulável. (ALVES, 1987, p. 80).

Desta forma, quanto à capacidade das partes alienantes na alienação fiduciária em

garantia, estas se submetem as regras e princípios aplicáveis a qualquer negócio jurídico. Em seguida temos o fiduciário, o contratante que dispõe dos recursos e viabiliza o

negócio jurídico. Mormente, no caso do fiduciário há divergência na doutrina sobre a possibilidade da utilização deste contrato por sociedades que não as relacionadas com a área financeira.

Neste afã, sobre a legitimidade para figurar no pólo da relação jurídica transcreve-se os ensinamentos de Alves, sobre o tema:

[...] não aderimos à tese dominante, segundo a qual a alienação fiduciária em garantia só tem aplicação quando o credor é uma financeira, porque é instituto ao âmbito do mercado de capitais. Entendemos que qualquer instituição financeira em sentido amplo e, em conseqüência, as entidades bancárias que não são sociedades financeiras e até as que realizam operações de consórcios. (1987, p. 120).

Todavia Gomes é contrário a tese esposada anteriormente, acredita o professor que

“a posição de fiduciário é ocupada, nesse negócio translativo, pelas sociedades de crédito e financeiras autorizadas a funcionar pelas autoridades monetárias do país” (1975, p. 56).

Da forma exposta, somente as sociedades financeiras e de crédito que fossem reguladas pela lei de mercado de capitais é que seriam legitimas a figurar no pólo dos contratos de alienação fiduciária como fiduciário.

Page 23: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Ainda com relação à divergência, o professor Pereira pondera que “não vemos motivos para a restrição. Antes da lei disciplinadora do mercado de capitais já o nosso direito admitia, posto que em caráter atípico, o negócio fiduciário”. (1974, p. 366).

Sobre o assunto, enfatiza Restiffe Neto: Quem possui tal legitimação: a pessoa que figurar originariamente no contrato de alienação fiduciária como financiador, posição reservada às instituições financeiras legalmente autorizadas a operar no mercado de capitais e registradas no Banco Central; ou o avalista, fiador ou terceiro interessado, que tenha pago a dívida perante o credor, tomando o lugar deste, por sub-rogação no crédito e na garantia constituída pela alienação fiduciária. (1975, p. 340).

A jurisprudência majoritária é no sentido de admitir no pólo passivo todas as

instituições financeiras de crédito autorizadas pelo poder público e mais alta Corte de Justiça de Santa Catarina na apelação cível n.º 1998.009029-6, da lavra do desembargador Trindade dos Santos, diário da justiça de 28.11.02, assim ementou:

Empresa comercial privada não tem legitimação para instituir, sem seus

contratos, pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia, vez que restrita essa

possibilidade, no ordenamento jurídico pátrio, às instituições financeiras e

administradoras consorciais. Ajustado pacto nesse sentido, por sociedade comercial

privada, é ele despido de qualquer eficácia jurídica, não legitimando-a a fazer uso,

contra o devedor, de qualquer dos instrumentos processuais previstos no DL n.

911/69, entre os quais a ação de busca e apreensão e a de depósito.

Deste modo, não pode ser parte dos contratos como fiduciário as pessoas jurídicas que não exercem atividades financeiras ou mesmo de consórcio, por falta, de legitimação.

1.7.5

1.7.6 1.4.3 Objeto da alienação fiduciária

O contrato de alienação fiduciária em garantia deve restringir-se aos bens móveis,

conforme disposição expressa do § 3º, art. 1º, do Decreto-lei 911/69, estes devem ser bens duráveis e individualizados.

No que pertine a acepção de bens duráveis, estes são os que não se inutilizam no instante de consumo, em uma verdadeira antítese ao termo de bens deterioráveis. Nas palavras de Gomes, “diz -se que precisa ser bem durável, significa-se, com esta expressão, que a coisa alienada não pode ser das que se acabem com o primeiro uso” (1975, p. 57).

Em relação à necessidade de se individualizar os bens atingidos pelo pacto de alienação fiduciária, esta tem por escopo o pleno aproveitado do instituto como garantia dos débitos contraídos. Isto denota uma explicação de ordem prática, caso o fiduciante (devedor) não cumpra sua obrigação para com o fiduciário (credor) no momento em que este for resgatar sua garantia, deve ter a possibilidade de individualiza-la dentre outros bens, por meio de sinais característicos.

A mais, o bem fiduciariamente alienável deve ser certa corpora. Coisa que se possa identificar por sinais característicos. Coisa individualizada, pelo número e série de

Page 24: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

fabricação, pela marca da fábrica, por qualquer outro sinal indicativo. A exigência é compreensível, principalmente porque, permanecendo na posse do alienante, precisam terceiros saber que está onerada. (GOMES, 1975, p. 57, grifo do autor).

Ainda assim, mesmo com a exigência da individualização do bem objeto da garantia, ex vi o § 3º, do art. 1º, do Decreto-lei 911/69, que estatui:

Se a coisa alienada em garantia não se identifica por números, marcas e sinais indicativos no instrumento de alienação, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da identidade dos bens o seu domínio que se encontra em poder do devedor.

A possibilidade de a alienação fiduciária recair sobre bens fungíveis é plenamente viável, mesmo que em verdadeiro contra senso a finalidade do instituto.

Neste diapasão, Pereira elucida a implicação do importe dos bens fungíveis ao instituto da a alienação fiduciária.

Neste contrato, o devedor permanece na posse direta dos bens alienados fiduciariamente e o credor mantém consigo a propriedade. Contudo, a posse de bens fungíveis implica na aquisição do seu domínio, eis que, mesmo ocorrendo obrigação de restituir, isto ocorrerá em relação a objetos da mesma espécie – não necessariamente aqueles entregues quando do nascimento do pacto. (2001, p. 50).

O instituto da alienação fiduciária implica, como referido alhures, na transferência

ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta do bem, independente de tradição, tornando-se o devedor o possuidor direto ou útil do bem. De efeito, ao admitir a alienação de bens fungíveis à posse direta sobre a coisa fungível implica em propriedade, já que o possuidor não está obrigado a entregar ou a restituir a coisa mesma, mas outra igual a ela.

Os próprios estudiosos do tema são veementes ao analisar a impossibilidade da alienação de bens fungíveis no instituto de fidúcia.

Surpreendentemente, a lei pátria admite que seja objeto de alienação fiduciária mercadoria que se não identificadas por números, marcas e sinais indicativos. Resulta esse entendimento de disposição legal que transfere, ao proprietário-fiduciário, o ônus da prova do domínio, contra terceiros. Em face deste preceito, nenhuma dúvida se pode ter de que são suscetíveis de alienação fiduciária de bens cuja identidade não se possa estabelecer por sinais característicos. A autorização implícita não se justifica, entretanto, diante da estrutura e da finalidade desse negócio jurídico. Trata-se de uma aberração, que, ademais, expõe terceiros ao risco de perda do bem adquirido se o fiduciário prova que é o proprietário. (PEREIRA, 1975, p. 57 - 58).

Muito embora essa questão realmente fosse tormentosa e motivo de acirradas

divergências, está hoje pacificada na jurisprudência quanto à possibilidade de ser objeto de alienação fiduciária em garantia bens de natureza fungível.

Sobre a matéria, o Supremo Tribunal Federal, nos Recursos Extraordinários n.º (s) 86541, 86.329 e 93.176, firmou seu entendimento no sentido de que, em face do § 3ª, do art. 66 da Lei 4.728/65, na redação dada pelo Decreto-lei 911/69, as coisas fungíveis podem ser objeto de alienação fiduciária em garantia.

O Tribuna de Justiça de Santa Catarina, em aresto da lavra do desembargador Trindade dos Santos, proferido nos autos da apelação cível, n.º 96.005705-6, diário da justiça de 03.08.01, assim ementou:

Com a redação conferida ao artigo 66 da Lei n. 4.728, de 14 de julho de 1965, pelo artigo 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1º de outubro de 1969, passou o ordenamento jurídico pátrio a admitir, nos contratos de alienação fiduciária em garantia, a

Page 25: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

inserção de cláusula relativa à alienação da propriedade resolúvel de coisas fungíveis, mantida a vedação apenas no que concerne às coisas consumíveis.

Sem mais embargo, se retira destes ensinamentos, que mesmo não sendo

logicamente compatível com as finalidades escoimadas pelo instituto da alienação fiduciária é plenamente admissível a incidência desta sobre bens fungíveis.

1.7.7

1.7.8 1.4.4 A formalização do contrato de alienação fiduciária em garantia

Ao longo dos séculos o direto positivo brasileiro tem consagrado o princípio da

liberdade de forma na confecção dos pactos contratuais. Como denota em sua obra o jurista Gomes, “prevalece no direito moderno o princípio da liberdade de forma, os contratos se concluem, via de regra, pelo simples consentimento das partes, seja qual for o modo de expressão da vontade”. (1990, p. 86).

Neste afã, em que pese o princípio da liberdade de forma ser a regra geral na formalização dos contratos, o legislador consagrou para certas modalidades de contratos a exigência da observância da forma prescrita em lei.

Em atenção, porém, à conveniência de dar maior segurança ao comércio jurídico, a lei exige que certos contratos obedeçam a determinada forma, elevando-a à condição de requisitos essencial à sua validade. Neste caso, a vontade das partes não basta à formação do contrato. (GOMES, 1990, p. 86).

Negócio jurídico formal, a alienação fiduciária em garantia exige instrumento escrito (público ou particular), em conformidade com o preceito legal estampado no art. 66, § 1º, da Lei nº 4.728/65, na redação que lhe determinou o art 1º, §1º, do Decreto-lei 911/69:

A alienação fiduciária em garantia somente se prova por escrito e seu instrumento, público ou particular, qualquer que seja o seu valor, será obrigatoriamente arquivado, por cópia ou microfilme, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros, e conterá, além de outros dados os seguintes.

Ao exigir a prova escrita nos negócios de alienação fiduciária em garantia, à lei

teve, com muita propriedade, a preocupação dos efeitos do contrato em estudo. Como afirmado outrora, o contrato de alienação fiduciária em garantia foi criado para dar sustentáculo e fomentar os empréstimos a indústria e aos consumidores, objetivando, dar garantias aos patrocinadores dos financiamentos esta segurança não seria total se não fosse exercida, inclusive, contra terceiros.

Quiçá estes argumentos, a forma escrita dos contratos de alienação fiduciária em garantia é exigida com o claro intuito de dar publicidade ao pacto, que só assim terá eficácia contra terceiros e em caso da não observância desta imposição da lei, ocorrerá nulidade da garantia.

Ao exigir a forma escrita para a prova do negócio fiduciário, a lei seguiu a lógica do seu sistema. Destinando-se a produzir eficácia erga omnes, a exigência de publicidade era indeclinável e não poderia ser observada sem o registro, que pressupõe instrumento a registrar. (GOMES, 1975, p. 60, grifo do autor).

Page 26: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

A este respeito o Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, em cujos anais inscreve-se que:

O Decreto-lei 911/69, que rege a alienação fiduciária em garantia de bem móvel, é taxativo ao registrar que a alienação fiduciária somente se prova por escrito. Indispensável a exibição do contrato e seu contexto (cláusulas e condições), além da data e assinatura das partes, elementos essenciais em acordo de vontades formal. (Apelação Cível, n.º 609.048-00, Desembargador Francisco Casconi, Diário da Justiça de 21.02.01).

1.7.9 1.4.5 Os efeitos do registro do contrato de alienação fiduciária

A lei de mercado de capitais faz referência ao arquivamento do instrumento

negocial junto ao registro de título e documentos. Esta solenidade tem o intuito, como já afirmado em passo acelerado, de dar ciência a terceiros, efeito erga omnes.

Como pondera Pereira, “[...] a solenidade apenas tenciona dar conhecimento a terceiros, positivando a propriedade fiduciária e sua invocação absoluta”. (2001, p. 57).

Assim, ao exigir o registro do contrato no Oficio de Títulos e Documentos, comina

a lei, à sua falta, a sanção de ineficácia perante terceiros, como resulta do § 1º 7, do art 1º, do

Decreto-lei 911/69 e do art. 1298, 5º, da Lei n. 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos).

Gomes, após discorrer sobre a forma e constituição da garantia, observa:

A exigência do registro não é requisito de validade. Para as partes não é sequer de eficácia. Nem se prende, senão mediata e indiretamente, à forma do negócio. Constitui, em verdade, imposição legal para o fim específico de valer contra terceiros, pertencendo seu exame, por conseguinte, ao campo da publicidade. (1975, p. 61).

Nesta mesma esteira Batalha ensina:

A alienação fiduciária somente se prova por escrito e seu instrumento,

público ou particular, qualquer que seja o seu valor, será obrigatoriamente

arquivado, por cópia ou microfilme, no Registro de Títulos e Documentos do

domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros. (1979, p. 448).

Inversamente, o ajuste de alienação fiduciária em garantia, ainda que não levado

ao registro no Cartório de Títulos e Documentos mantém intacta a sua validade e eficácia

7 § 1º A alienação fiduciária somente se prova por escrito e seu instrumento, público ou particular, qualquer que seja o seu valor, será obrigatoriamente arquivado, por cópia ou microfilme no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros, e conterá, além de outros dados. 8 Artigo 129. Estão sujeitos a registros, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeito em relação a terceiros: (...) 5º os contratos de compra e venda em prestações, com reserva de domínio ou não, qualquer que seja a forma de que se revisam, os de alienação ou de promessa de venda referentes a bens móveis e os de alienação fiduciária.

Page 27: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

entre às partes que o celebraram, posto tratar-se esse registro de uma formalidade meramente

administrativa, indispensável, como dito, apenas para emprestar publicidade ao ato, tornando-

o oponível a terceiros.

Ainda sobre o tema da obrigatoriedade do registro do contrato de alienação

fiduciária preleciona, Restiffe Neto, “não será obrigatório o arquivamento, como não poderia

mesmo ser, para valer entre as partes, a não ser para eficácia contra terceiros” (1975, p. 132).

É, de igual modo, a orientação prevalecente na do Tribunal de Justiça do Estado de

Santa Catarina, cujos anais registram a seguinte ementa:

“Apenas a eficácia da avença em relação a terceiros é que exige o arquivamento do

pacto no Registro de Títulos e Documentos”. (Agravo de Instrumento, n.º 5.920,

Desembargador, Francisco Oliveira Filho, Diário da Justiça de 15.03.90).

Desta forma, ficou devidamente evidenciado o posicionamento tanto da doutrina

quando dos tribunais com relação ao registro de títulos e documentos do contrato em estudo

para sua eficácia erga omnes e que a não observação do registro não exclui o vínculo

obrigacional entre às partes.

1.7.10

1.7.11 1.4.6 Prova da alienação fiduciária nos veículos automotores

Nestes casos, quando o objeto dado em garantia tratar-se de veículo automotor9, a

lei exige mais do que o registro no Ofício de Título e Documentos, nos termos do § 10, art. 1º,

Decreto-Lei 911/69, assim prescreve a norma legal:

A alienação fiduciária em garantia de veículo automotor deverá, para fins

probatórios, constar do Certificado de Registro, a que se refere o artigo 5210 do

Código Nacional de Trânsito.

A averbação do gravame no certificado de registro do veículo vinculado ao

contrato de alienação fiduciária tem finalidade meramente probatória, posto que, através dela,

9 Não se procedeu a nenhum estudo estatístico, mas beira ao senso comum que quase a totalidade dos financiamentos de veículos automotores no país sejam feitos ou por alienação fiduciária em garantia ou por arredamento mercantil. 10 Atualmente, está em vigor a Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1997, que regra o registro do veículo automotor nos arts. 120 e 129.

Page 28: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

é que são preservados os direitos da financiadora contra eventual terceiro que, porventura,

venha a adquirir o veículo alienado.

Na prática o registro da garantia fiduciária no certificado de registro serve como

forma de dar publicidade ao gravame perante terceiros.

Elevando a matéria a ordem dos tribunais pátrios, o Supremo Tribunal Federal

externou seu posicionamento no teor é a Súmula 489, cujo enunciado expressa:

“A com pra e venda de automóvel não prevalece contra terceiros de boa-fé, se o

contrato não foi transcrito no Registro de Títulos e Documentos”.

Ainda, nesta mesma linha é a orientação esposada pelo Superior Tribunal de

Justiça que resultou na edição da Súmula 92:

“A terceiro de boa -fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no

Certificado de Registro do veículo automotor”.

Seria oportuno citar:

A alienação fiduciária, tratando-se de veículo automotor, há de ser

consignada no respectivo certificado de registro, como determina o parág. 10 do

artigo 66 da Lei 4.728/65. Não basta o arquivamento no Registro de Títulos e

Documentos, ao contrário do que sucede com outros bens (Recurso Especial, n.º

19.299 de São Paulo, Ministro Eduardo Ribeiro, Diário da Justiça de 11.03.92).

Todo o exposto bem evidencia que não basta a inscrição no Oficial de Registro

para ser oponível a alienação fiduciária a terceiro de boa-fé, há, também, que constar o

gravame no certificado de registro do veículo.

Desta feita, para que os contratos de alienação fiduciária tenham o efeito desejado,

oponibilidade contra terceiros, deve necessariamente ser registrado no seu órgão competente,

quais sejam, o cartório de registro de título e documentos, para os bens em geral, e no órgão

de trânsito para veículos automotores, sob pena de só serem exigíveis perante os contratantes.

Ressaltadas as características basilares do instituto da alienação fiduciária, passa-se a analisar o procedimento empregado pelo credor-fiduciário para o resgate de seu crédito em caso de mora ou inadimplemento contratual do devedor-fiduciante. 1.4.7 A proteção do crédito fiduciário

Os arts. 3º, 4º e 5º, do Decreto-lei 911/69, tratam dos meios processuais postos ao

alcance do credor para haver a coisa, apreendê-la ou cobrar a dívida, no caso de não

cumprimento voluntário da obrigação assumida.

Page 29: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Na ocorrência da mora11 ou do inadimplemento12 contratual do devedor, o credor, poderá utilizar-se dos procedimentos da busca e apreensão, da ação de depósito ou ainda, poderá retirar seu crédito diretamente do patrimônio do devedor pela ação executiva.

“Dentro da sistemática do instituto da alienação fiduciária em garantia, há sempre

um ponto constante: a faculdade do credor para usar de um ou outro remédio processual,

posto a seu alcance, em caso de mora ou inadimplemento das obrigações contratuais”.

(OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 256).

1.7.12

1.7.13 1.4.7.1 Ação de busca e apreensão

O primeiro deles é a ação de busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente

instituído pelo artigo 3º, do Decreto-lei 911/69, que assim dispõem:

“O proprietário fiduciário ou credor poderá requerer contra o devedor ou terceiros

a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente,

desde que comprovada a mora ou o inadimplemento do devedor”.

No regime adotado pela legislação fiduciária de bens móveis, a ação de busca e

apreensão13 não tem caráter preparatório, ou preventivo que lhe atribui o Código de Processo

Civil, tendo em conta que é caracterizada como processo autônomo, exaustivo, e “permite a

consolidação da propriedade e posse na pessoa do fiduciário, titular da propriedade

resolúvel”. (Chalhub, 2000, p. 181).

Gomes detalha com muita propriedade a medida judicial:

A ação de busca e apreensão é concedida ao fiduciário para obter que a coisa em poder do fiduciante passe à sua posse direta, tornando-se ele possuidor exclusivo. Não se trata de medida regulada no Código de Processo Civil, mas de procedimento sujeito a regras especiais, através do qual pode o credor obter a satisfação do crédito com a sentença que determina a consolidação da propriedade e legitima a venda extrajudicial da coisa. (1975, p.126).

11 Observa-se o fenômeno da mora quando não se cumpre uma obrigação pactuada, contudo esta poderá ser cumprida posteriormente. Assim, quanto à mora ainda que a prestação não tenha sido satisfeita no prazo convencionado poderá ser cumprida posteriormente com os devidos acréscimos legais. “Há m ora quando se retarda o cumprimento de uma obrigação, tornando-se impontual no pagamento da dívida ou de uma de suas prestações, sem que se torne definitivamente impossível o adimplemento”. (ALVES, 1987, p. 98). 12 O inadimplemento ocorre quando não se cumpre uma prestação que só poderia ser efetuada numa única oportunidade, isto é, a impossibilidade total de cumprir a obrigação. “Há inadimplemento propriamente dito quando não paga no vencimento e a prestação se torna definitivamente impossível de ser cumprida, por fator que lhe seja imputável, ou lhe não posse ser imputado”. (ALVES, 1987, p. 98). 13 O procedimento cautelar de busca e apreensão é regulado pelo artigo 839, do Código de Processo Civil, não se confunde com o procedimento de busca e apreensão existente no Decreto-lei 911/69.

Page 30: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

O procedimento da ação de busca e apreensão, como a maioria dos procedimentos

judiciais da legislação brasileira, verga-se aos requisitos da petição inicial14 e as condições da

ação15, sendo imprescindível para a concessão da medida liminar à comprobação da mora ou

o inadimplemento do devedor-fiduciante.

Isso porquanto, conforme leciona Restiffe Neto:

[...] mas exigindo a lei a sua comprovação por uma das duas formas estabelecidas, carta registrada enviada por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos ou instrumento de protesto, chega-se à conclusão de que ao menos para os fins que a lei exige essa comprovação (para requerer ação de busca e apreensão - art. 3º) a constituição da mora confunde-se com a sua prova, pois que sem esta não se admite ação fundada naquela. (1975, p. 297).

Cumpre ressaltar, que muito embora a mora referente ao cumprimento das

obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, decorra do simples

vencimento do prazo para o pagamento, como fixado pelo Decreto-Lei instituidor do

procedimento em seu § 2º, do artigo 2º, constitui requisito fundamental, a busca e apreensão

do bem alienado sua comprovação, por um dos modos determinados na lei de regência, quais

sejam: o protesto do título ou a notificação pessoal do devedor por carta registrada.

A mora decorre do simples vencimento do prazo para o pagamento de uma prestação ou de toda dívida, porém comprova-se pelo protesto do título, se houver, ou pela notificação feita, extrajudicialmente, pelo envio de carta registrada expedida por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos. (OPITZ e OPITZ S., 1984, p. 250).

É o que, também, reza a Súmula 72 do Superior Tribunal Justiça, assim editada:

“A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado

fiduciariamente”.

Desta forma, preenchido os pressupostos legais, com a comprovação da mora do

devedor e, em decorrência, a sua inadimplência contratual, o magistrado, inaudita altera

parte, deverá deferir a liminar de busca e apreensão do bem pertencente ao credor-fiduciário

que se encontra em poder do devedor-fiduciante.

Observa, a propósito, Restiffe Neto:

“Satisfeit os todos os pressupostos e requisitos legais, o deferimento da inicial

importará automaticamente na concessão da diligência de busca e apreensão” (1975, p. 357).

14 Os requisitos da petição inicial estão elencados na inteligência do artigo 282, do Código Buzaid. 15 As condições da ação são: a) possibilidade jurídica do pedido; b) interesse de agir; c) legitimidade ad causa. Sobre o tema - Miranda, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil, tomo IV, artigo 282 a 443, Rio de Janeiro: Forense, 1997.

Page 31: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Contudo, deve-se ressaltar, não integrado esse pressuposto, comprovação da mora,

o credor-fiduciário é carecedor da ação, com a conseqüente extinção do pedido.

Este é o entendimento do Tribunal Catarinense, que assim já ementou:

Inoperante o protesto do título, por desvestido de formalidades essenciais, comprovada não resulta a mora do devedor fiduciante, o que torna o credor fiduciário carecedor de ação de busca e apreensão embasada em contrato de alienação fiduciária em garantia (Apelação Cível, n.º 2001.020935-7, Desembargador Trindade dos Santos, Diário da Justiça de 14.02.2001).

Ainda em relação às peculiaridades da ação de busca e apreensão, somente depois

de executada a liminar de busca e apreensão do bem, ocorrerá a citação do devedor fiduciante

para apresentar sua resposta processual ou requerer o direito de purgar a mora, se já tiver

pagado mais de 40% do débito, isto no prazo de três dias.

Deferida a liminar, expede-se mandado de busca e apreensão e citação. Este último ato fica condicionado ao cumprimento do primeiro – não se pode providenciar a citação se não ocorrer, anteriormente, a localização do bem e a sua entrega ao sujeito ativo. (PEREIRA, 2001, p.71).

Preferindo contestar, sua defesa será limitada, somente podendo versar sobre o

pagamento do débito ou o cumprimento da obrigação contratual. Concernente à limitação das

matérias de defesa, em sede de contestação, “tem gerado controvérsias, quanto à sua

constitucionalidade”. (PEREIRA, 2001, p. 76).

Enfatizam, a propósito, Oswaldo Opitz e Sílvia C. B. Opitz, “ajuizada ação

autônoma de busca e apreensão, a contestação é limitada, visto que somente poderá alegar o

pagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações contratuais” (1984, p. 227).

Contrariamente a corrente doutrinaria e jurisprudencial16, proclama, o mestre em

direito processual Alves:

Afinal, quando se cogita desse contraditório se está, ontologicamente, referindo à possibilidade, quanto ao autor, de plena alegabilidade do suporte fático de incidência da regra jurídica de que extrai o direito, a pretensão e a ação de direito material. E com relação ao réu, de poder responder com plenitude máxima de defesa ao pedido. É ineliminável garantam-se mesmas oportunidades e instrumentos processuais, ação e reação coextensivas. Por isso mesmo, a regra jurídica limitativa do direito de defesa é inconstitucional, na medida que ofende às claras a regra jurídica constitucional consagrada no inc. LV do artigo 5º da Constituição da República. (1998, p. 156-157).

16 A contestação, em sede de busca e apreensão com origem no inadimplemento de contrato garantido por alienação fiduciária, não abre espaço para defesas de mérito diversas daquelas previstas em lei, cabendo ao devedor alegar, tão somente, o pagamento integral do débito exigido pelo credor ou o cumprimento das obrigações contratuais. A jurisprudência tolera, apenas, que se discuta eventual desvirtuamento do instituto em tela, cabendo levantamento de questões outras, em torno do contrato ou da dívida, em ação própria. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina - Apelação Cível n.º 1996.004635-6, Desembargador Gaspar Rubik, Diário da Justiça de 19.12.00).

Page 32: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Em que pese às doutas argumentações de Alves, o Supremo Tribunal Federal tem

postulado da constitucionalidade do dispositivo, conforme segue:

A ação de busca a apreensão do bem alienado fiduciariamente não comporta discussão acerca da validade de cláusula contratual ou de montante da dívida (salvo, na segunda hipótese, se houver pedido de purgação da mora). Por expressa disposição legal, Na contestação só se poderá alegar o pagamento do débito vencido ou do cumprimento das obrigações do contrato (Decreto-lei n.º 911/69, artigo 3º, parágrafo 2º), limitação que não viola o princípio da ampla defesa e do contraditório (Recurso Extraordinário n.º 141.320, Ministro Octávio Gallotti, Diário da Justiça de 14.06.96).

Se a purgação da mora for à escolha do devedor-fiduciante, deverá requerer no

prazo de resposta ao juiz da causa, que marcará data para o pagamento com a devida remessa

dos autos a contadoria judicial para os cálculos do débito, na forma do art. 2º e § 1º do

Decreto-lei, que regula a matéria. Neste afã, destaca-se que o devedor somente poderá pedir a

purgação da mora se tiver pagado pelo menos 40% do débito.

No que pertine a purgação da mora, a doutrina e a jurisprudência17 são uníssonas

em afirmar que tal limitação imposta fere os mais basilares princípios de justiça.

[...] o Decreto-lei 911/69 apenas autoriza a purgação da mora quando já ocorrido pagamento de pelo menos 40% do débito. Mas esta limitação tem sido posta em xeque, em face do Código de Defesa dos Direitos do Consumidor, que não indica a mesma limitação”. (PEREIRA, 2001, p.75).

Proclamou o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso

Especial n.º 157.688, Ministro Cesar Asfor Rocha, diário da justiça de 29.3.99, assim

consignou:

Devedor Fiduciante que não chegou a solver 40% do preço financiado. Admissibilidade em face do Código de Defesa do Consumidor. A exigência imposta pelo § 1º do artigo 3º do Decreto-lei n. 911/69 (pagamento no mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI, e 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90).

Desta forma poderá o devedor requerer o direito de purgar a mora, mesmo não

havendo pagado mais de 40% do débito, por imposição de princípios legais, como o Código

de Defesa do Consumidor.

Havendo contestação ou não ao pedido e não sendo requerida à emenda da mora, o

magistrado julgará, no prazo de cinco dias. A sentença, nos termos da lei, consolidará a

17 A exigência de prévio pagamento de 40% do financiamento para que se possa purgar a mora dentremostra-se desarrazoada, em face do Código de Defesa do Consumidor. É herança legislativa do tempo em que a preocupação centrava-se apenas na lei, sem ater-se à sua legitimidade. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina - Apelação Cível nº 1998.010564-1, Desembargador Pedro Manoel Abreu, Diário da Justiça de 04.07.01).

Page 33: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

propriedade e a posse plena e exclusiva nas mãos do credor-fiduciante, que deverá

obrigatoriamente vender18 extrajudicialmente o bem.

Contudo, na iminência de credor-fiduciário não encontrar o bem em poder do

devedor-fiduciante este poderá requerer a conversão da ação de busca e apreensão em ação de

depósito como destacado a seguir.

1.7.14

1.7.15 1.4.7.2 Ação de depósito

Entrementes, caso o mandado de busca e apreensão não seja cumprido, em face de

não ser encontrado o bem, ou não se achar em poder do devedor, tem o credor-fiduciário o

direito de requerer a conversão do pedido de busca e apreensão em ação de depósito,

conforme dispõe o art. 4º, do Decreto-lei 911/69:

Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá intentar ação de depósito, na forma prevista no Título XII, Livro IV, do Código de Processo Civil.

Oswaldo Optiz e Sílvia Optiz observam, a respeito, que:

A petição de busca e apreensão já preenche os requisitos do art. 282, de modo que o pedido de conversão se limitará a pedir a citação do devedor fiduciante, para no prazo de 05 (cinco) dias: I) entregar a coisa que lhe pertence e tem a posse precária, depositá-la em Juízo ou consignar-lhe o equivalente em dinheiro; ou II) contestar a ação (art. 901 do CPC). (1984, p. 255).

E, conforme já proclamou, do Superior Tribunal de Justiça:

Conversão em ação de depósito. A petição em que se pleiteia a

conversão de uma demanda em outra não precisa repetir o que se contém na inicial

da busca e apreensão. Deve, entretanto, ser formulado pedido adequado à ação de

depósito, obedecido o que, a propósito, determina a lei processual. (Recurso

Especial, n.º 11.697- Distrito Federal, Ministro Eduardo Ribeiro, Diário da Justiça

de 16.12.91).

Sob este manto, a ação de depósito é uma conseqüência da não efetivação da

liminar de ação de busca e apreensão. Tendo como objetivos, primordiais, a restituição da

coisa depositada ou o seu equivalente e dinheiro. “Cabe a ação de depósito contra ao

18 “O proprietário fiduciário não pode estipular pacto comissório para ficar com a coisa adquirida. Tem de

Page 34: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

fiduciário, justamente por que lhe corresponde a pretensão de restituição”. (GOMES, 1975, p.

131).

Assim, para evitar a extinção do processo por carência de ação, visto não se estaria

preenchendo um dos pressupostos do exercício da ação de busca e apreensão previsto no

Decreto-lei 911/69, o legislador, diante da inoperância apresentada nestes casos, possibilitou

ao credor a imediata conversão para ação de depósito.

Contudo, parte da doutrina endente não haver a conversão da ação de busca e

apreensão em ação de depósito, mais sim, a inserção desta nos autos daquela.

É o que nos ensina o preclaro Fabrício, quando observa:

“Embora a lei fale em conversão, o que realmente ocorre é uma inserção da ação

de depósito nos autos da ação de busca e apreensão, suspendendo-se o curso desta enquanto

aquela tramita”. (1990, p. 178).

Deste modo, a conversão em depósito não implica na extinção da busca e

apreensão, mas sim apenas na sua suspensão até que seja encontrado e entregue ao credor o

bem buscado. Localizado, apreendido ou entregue espontaneamente o bem ao credor, a ação

de busca e apreensão será reativada, tendo prosseguimento normalizado até que sobrevenha a

sentença final.

No mesmo sentido, acentua Restiffe Neto:

Logo, se o bem não for encontrado, ou não se achar na posse do devedor, a ação de busca e apreensão permanecerá paralisada até que, na ação de depósito, o credor consiga a recuperação da coisa alienada fiduciariamente. Restituído o bem, por força de sentença, prosseguir-se-á na primeira, nos limites de sua finalidade, observado o disposto no art. 3, do Decreto-Lei 911, posto que o credor, na ação de depósito, atendida a pretensão possível - de restituição da coisa - não poderá obter a satisfação de seu crédito (1975, p. 544).

Em igual diapasão, colaciona-se que:

A conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito provoca a suspensão da primeira, que só retomará o seu curso se o bem for encontrado e a liminar cumprida, abrindo ensanchas para a formação da relação processual, com a citação do devedor fiduciante, resultando na extinção do processo de ação de depósito. (PARIZATTO, 1998, p. 76).

vendê-la para se satisfazer no produto da venda.” (GOMES, 1999, p. 352, grifo do autor).

Page 35: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Então, uma fez certificado nos autos a não-localização do bem, no procedimento

de busca e apreensão, poderá o credor requerer a conversão daquela ação em demanda de

depósito.

No caso, a exordial deverá, obrigatoriamente, obedecer à ritualística exigida para

todas as iniciais, conforme exposto anteriormente, ainda, devendo obedecer aos requisitos

determinados no artigo 90219, Código de Processo Civil, que trás regrar especificas a ação de

depósito.

A petição inicial obedecerá, é evidente, os predicados expostos no artigo 282 e 902, caput, do CPC, com os necessários ajustes. Não é preciso reiterar a qualificação das partes. A descrição dos fatos e fundamentos jurídicos deve corresponder ao contrato de alienação fiduciária, à inadimplência e a frustração do cumprimento da medida de busca e apreensão. O pedido há que ser em consideração os objetivos da ação de depósito – a recuperação do objeto, mercê da natureza executiva em sentido amplo da demanda. O valor da causa adequa-se à avaliação econômica do bem, pois este é o objetivo econômico imediato da demanda e representa a tradução pecuniária do litígio. (PEREIRA, 2001, p. 93).

Uma vez deferido o pedido do credor-fiduciário, o juiz determinará a citação do

devedor-fiduciante para que, em cinco dias, entregar o bem, depositá-lo em juízo, consignar o

equivalente em dinheiro ou apresentar a contestação que tiver.

No caso de contestação, deverá ser observado o procedimento ordinário, art. 903,

do Código de Processo Civil20, quando poderá alegar nulidade ou falsidade do título e a

extinção da obrigação, além das defesas previstas em lei.

Se for julgado procedente o pedido o magistrado determinará a expedição de

mandado para que o devedor-fiduciante entregue, em vinte e quatro horas, o bem ou o

equivalente em dinheiro. Não sendo cumprido o mandado, será decretada a prisão do

depositário.

Procedente o pedido de depósito, o réu há de entregar o bem. A eficácia da sentença á preponderantemente executiva, de maneira que se tem por desiderato a entrega do objeto ao auto. Com o trânsito em julgado da decisão (a sentença está sujeita a apelação no duplo efeito), é expedido mandado de entrega, cientificando-se o réu para, em vinte e quatro horas, disponibilizar o objeto ou o “equivalente em dinheiro”. Caos o réu permaneça inerte, poderá ser expedido mandado de busca e apreensão, para que o oficial de justiça localiza o bem. (PEREIRA, 2001, p. 98).

Por muitos anos, contestou-se a admissibilidade da conversão da ação de busca e

apreensão na ação de depósito. O argumento central, dos que contestam a conversão, funda-se

na impossibilidade da condenação devedor-fiduciante em depositário infiel o que tornaria a

19 Art. 902. Na petição inicial instruída com a prova literal do depósito e a estimativa do valor da coisa, se não constar do contrato, o autor pedirá a citação do réu para, no prazo de 5 (cinco) dias. 20 Art. 903. Se o réu contestar a ação, observar-se-á o procedimento ordinário.

Page 36: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

ação de depósito despida de uma de suas finalidades e desautorizaria sua instrumentalização,

contudo o cabimento da prisão é exatamente o nó górdio do presente trabalho e será mais bem

abordada nos próximos tópicos.

1.7.16

1.7.17 1.4.7.3 Do Processo Executivo

Em seu art. 5º, o Decreto-lei 911/69, proporciona aos credores da garantia

fiduciária a possibilidade de utilizarem o procedimento de execução para buscar seus créditos.

Se o credor preferir recorrer à ação de execução ou, se for o caso, ao executivo fiscal, serão penhorados, a critério do autor da ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a execução.

Seja porque o objeto da alienação fiduciária em segurança pereceu, ou se

desvalorizou, tornando de nula eficácia o recurso de busca e apreensão.

“A ação executiva intenta -se quando o credor, desprezando a garantia, ou

considerando-a insuficiente, prefere agredir o patrimônio do devedor, penhorando quantos

bens bastem para assegurar a execução”.(GOMES, 1975, p. 109).

Visando à segurança do credor-fiduciário, o legislador introduziu duas

modificações no processo executivo. A primeira consiste no aniquilamento da prerrogativa de

o devedor nomear bens a penhora, desta conta, os bens do devedor serão penhorados a critério

do autor da ação. A segunda reflete na inaplicabilidade dos dispostos nos incisos VI e VIII do

art 64921 do Código Processo Civil, conforme o disposto no parágrafo único, do artigo 5º, do

Decreto-lei 911/69. Quer dizer, os bens ali aludidos, reputados categoricamente

impenhoráveis, por imposição legal, assim não se consideram quando o exeqüente for o

credor-fiduciário.

Destarte, o objeto da penhora, contudo, não pode ser o bem alienado

fiduciariamente, porque uma questão de simples elucidação, estes não pertence ao devedor e

sim ao próprio credor-fiduciário.

21 Artigo 649. São absolutamente impenhoráveis: (...) VI – os livro, as máquinas, os utensílios e os instrumentos necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; (...) VIII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se estas forem penhoradas;

Page 37: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Desta forma, “não implica renúncia à propriedade fiduciária o fato do credor

preferir intenta ação de execução, mas, uma vez satisfeito integralmente o direito do autor, o

bem dado em garantia reintegra-se ao patrimônio do alienante”. (ALVES, 1987, p. 202).

No mesmo sentido observa Gomes, que, “à evidência, seria um contra -sensu

propor ação executiva para penhorar bem que lhe pertence”. (1975, p. 112).

Deste modo, observou-se as principais peculiaridades existentes no instituto

alienação fiduciária em garantia, indo destes sua origem romanista, passando pelos sujeitos da

relação jurídica até os meios de defesa empregados na proteção do crédito pelo credor-

fiduciário. Neste norte, tendo por intuito o aprofundamento no estudo da alienação fiduciária

em garantia e dos institutos que permeiam esta complexa relação, passa-se a observar o

regramento e as nuances existentes no depósito e na prisão civil.

Page 38: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

2 O DEPÓSITO E PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL

2.1 O INSTITUTO DO DEPÓSITO

A terminologia - depósito - provém do latim depositum, que significa a confiança

pela qual alguém coloca uma coisa sob o poder de outrem. Nestes termos, muito embora o

propósito da lei não seja o de apresentar conceitos aos institutos legais, sendo esta uma tarefa

deixada a cargo da doutrina e jurisprudência, às vezes os dispositivos legais a isso se prestam.

Assim, apresenta expressamente o art. 627 do Código Civil a definição de depósito, que é o

negócio jurídico pelo qual se entrega a alguém um objeto móvel para a guarda, com o dever

de restituir.

A seu turno, depósito é “o contrato pelo qual uma pessoa recebe um objeto móvel

alheio, com a obrigação de guardá-lo e restituir em seguida”. (BEVILÁQUA, 1987 , p. 06).

Por outro lado, Monteiro define o pacto de depósito como:

“[...] o contrato pelo qual uma das partes, recebendo de outra uma coisa móvel, se

obriga a guardá-la, temporária e gratuitamente, para restituí-la na ocasião aprazada ou quando

lhe for exigida” (1977, p. 224).

Já nas palavras de Pontes de Miranda “o contrato de depósito é o contrato pelo

qual alguém, depositário, se incumbe de guardar (custodiar) coisa móvel de outrem, e entregá-

la ao depositante”. (1984, p. 317).

Observa ainda, o jurista, a distinção do contrato de depósito de outras figuras

contratuais:

O depósito distingue-se do comodato em que o interesse primacial, naquele, é o do depositante: nesse é o do comodatário. Não se fale de se diferenciar pela gratuidade ou pela usabilidade: o depósito também é gratuito, posto que se possa estabelecer a retribuição, e o comodato é gratuito; o depositário não pode, em regra usar o bem depositado, mas a lei permite a cláusula de uso (CCB, art. 1.275). O dever de diligência e de proteção, que assume o comodatário (CCB, art. 1.251), de modo algum tem a intensidade do dever de custódia, que é o do depositário (CCB, arts. 1.265, 1.267 e 1287). Muito são os contratos em que um dos figurantes entrega o bem e o outro figurante se vincula à restituição. No depósito, o fim é a custódia. No seqüestro, o fim é retirar a posse imediata da pessoa contra a qual se decreta o seqüestro.(1984, p. 329).22

Desta feita, partindo dos apontamentos doutrinários, tem-se que a finalidade do

depósito é a guarda do objeto móvel, com a entrega da coisa ao depositário não lhe

22 Na presente citação o autor faz referências ao Código Civil de 1916, que foi expressamente revogado pela Lei n.º 10.406, publicado em 10 de janeiro de 2002.

Page 39: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

transferindo a propriedade, assumindo aquele a obrigação de devolver ao proprietário e

depositante o bem, quando este o reclamar.

2.1.1 Evolução histórica

O instituto de depósito remonta aos áureos tempos helenísticos os quais o tinham

como sagrado. Para os gregos quem faltava ao dever de devolução do bem depositado era

desprezado pela sociedade e alvejado pela ira dos deuses.

O depósito de uso freqüente entre os gregos, que lhe deram o nome de parakatatheke, tanto ao contrato quanto à coisa depositada, e o consideravam especialmente protegido pelos deuses, como tendo alguma coisa de sagrado. Aquele, que se apropriava do depósito, que lhe fora confiado, era estigmatizado pela opinião pública, irritada contra sua vilania. (BEVILÁQUA, 1977, p. 262).

No entanto, mesmo tendo-o como um dever sagrado, o sistema legal dos gregos só

previa uma modalidade de ação para a restituição da coisa depositada ao depositante e nunca

sujeitando o depositário a privações de direitos. Destaca-se ainda, que “o seqüestro, voluntário

ou judicial, assim como o depósito irregular, haviam também encontrado localização nas leis

helênicas”. (BEVILÁQUA, 1977, p. 262).

Já para o direito clássico romano, “a posse e a prop riedade da coisa dada em

depósito continuavam sendo prolongamento da personalidade do depositante”. (QUEIROZ,

2004, p. 29). Para estes, o contrato de depósito era um contrato real e de boa-fé, mas cuja

posse e propriedade continuavam ligados à personalidade do depositante. O depósito

romanista tinha como características, ainda, a gratuidade e a expressa proibição da utilização

da coisa depositada.

Conforme Queiroz, que assim preleciona:

“Ao depositário cobrava -se o dever de conservação de restituição e não tinha

caráter oneroso, sendo ainda proibido o uso da coisa depositada, cujo desrespeito era

considerado furtum usus”. (2004, p. 30, grifo do autor).

Além das modalidades de depósito existentes no período helenístico, a legislação

romana criou o depósito necessário, “feito sob a pressão de uma força maior, de um caso

urgente, como um naufrágio, um incêndio ou outro acontecimento semelhante”.

(BEVILÁQUA, 1977, p. 263). Nestes casos, a não restituição do bem dado em depósito iria

repercutir no patrimônio do depositário, que era obrigado a restituir o valor do bem recebido

em dobro.

Page 40: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

2.1.2 Natureza jurídica do depósito

O depósito, em regra, possui os seguintes caracteres: unilateral, gratuito, real, não

solene e intuitu personae.

Nestes termos, o contrato de depósito, em princípio, é denominado de unilateral,

pois ocasiona obrigação, exclusivamente, ao depositário. Em sendo assim, após a entrega da

coisa, efetivamente, surge apenas a obrigação do depositário de guarda e de devolução do

bem quando requisitado pelo depositante.

Como bem observa Queiroz quanto à unilateralidade:

“Pois que de início só há obrigações atribuídas a uma das partes que é o

depositário”. (2004, p. 41).

Entretanto, havendo estipulação contratual de remuneração ao depositário pelo

depositante, criando para si uma obrigação, teremos um contrato bilateral ou sinalagmático,

ou seja, existem para as partes contratantes obrigações recíprocas.

[...] unilateral, por originar obrigação apenas para o depositário, embora às vezes se converta em bilateral no curso da execução, produzindo, p.ex., a obrigação para o depositante de pagar as despesas com a conservação da coisa ou de remunerar o depositário. (DINIZ, 2003, p. 242).

É, também, de natureza gratuita o depósito, contudo podem as partes estipular uma

remuneração, conforme a inteligência do art. 628, do Código Civil, que assim prescreve:

Art. 628. O contrato de depósito é gratuito, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.

Desta forma, só deixa de ser gratuito o contrato de depósito se houver expressa

convenção em sentido contrário, se resultar de negócio ou se for realizada por depositário

profissional, quanto então passará a ser oneroso.

Tenha-se presente, que o depósito é real, pelo simples fato de só aperfeiçoar-se

com a entrega da res deposita. Tal característica se extrai da análise do Código Civil, ao

determinar que recebe o depositário coisa móvel para ser guardada, art. 627, que assim

determina:

Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guarda, até que o depositante o reclame.

Pois para que se perfaça é necessário não só o consentimento das partes, mas a

efetiva entrega da coisa ao depositário, exceto se já estiver em sua posse.

Page 41: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Este recebimento está claramente a indicar que a entrega como conditio sine quo non para o aperfeiçoamento do contrato, o que também acontece no comodato, no mútuo, embora com uma relevante diferença. A tradição da coisa que é exigida no mútuo e no comodato, também contratos reais, aqui no depósito ocorre apenas para viabilizar a custódia e não, para ser transferida a propriedade ou a mera possa da coisa depositada. (QUEIROZ, 2004, p. 45).

Ainda, sobre a entrega do bem Monteiro em explanação minuciosa no que pertine

ao contrato depósito:

O contrato de depósito exige, em primeiro lugar, a entrega da coisa pelo depositante ao depositário. O depósito é assim, antes de mais nada, contrato real, porque não pode existir sem a tradição da coisa depositada; sem o recebimento desta pelo depositário, o contrato não se aperfeiçoa e não produz qualquer efeito. (1977, p. 219).

No mesmo tom, Rodrigues enfatiza a tradição, depois de dizer que é contrato real,

porque só se aperfeiçoa pela entrega da coisa, acrescenta que o acordo para celebração não é

depósito, “pois este só se completa com a entrega do objeto a ser depositado”. (1972, p. 115).

Assim, por mais que concordem depositante e depositário, na realização deste

contrato, nenhuma destas promessas produzirá efeitos jurídicos sem devida perfectibilização

da tradição do bem entregue em depósito.

Ainda, o contrato de depósito é tido como de natureza não solene, fundamentado

no art. 64623 do Código Civil, que expressamente indica deve ser ele provado por escrito.

Pode, contudo, ser evidenciado, por qualquer meio de prova admitida e não defesa em direito,

os depósitos ocorridos em razão de calamidades, com supedâneo no teor do parágrafo único

do art. 64824, do Código Civil.

Nestes termos, para que o contrato seja classificado como solene ou formal é

necessário para sua validade que o legislador tenha determinado forma especial.

“Não é formal o contrato, pois a forma escrita, no depósito voluntário, é exigid a

tão só para a prova do ato. Trata-se de forma ad probationem, portanto não é requisito de

validade do contrato”. (QUEIROZ, 2004, p. 45, grifo do autor).

Nessa linha, entende Stoco que:

“Ademais, para a caracterização da transferência da guarda do bem e

caracterização do contrato de depósito não se exige instrumento escrito, nem fórmulas

sacramentais e formalizadas, posto que a formalidade não é da sua essência”. (1997, p. 220).

23 Art.646. O depósito voluntário provar-se-á por escrito. 24 Art. 648. (...) Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se aos depósitos previstos no inciso II do artigo antecedente, podendo estes certificarem-se por qualquer meio de prova.

Page 42: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Ora, deve ficar claro para o interprete da norma que a intenção do legislador de

exigir a prova escrita do depósito não é a de tornar o contrato formal ou solene, mas

exclusivamente para impedir que este seja comprovado por prova unicamente testemunhal. In

casu, pode ocorrer o estranho fato de termos um contrato de depósito plenamente válido,

contudo que não possa ser comprovado.

A seu turno, tenha-se presente ainda, a característica de ser intuitu personae, por

ser o objeto do contrato de depósito confiado na pessoa do depositário, em sua fidelidade.

“ Intuitu personae, porque fundado na confiança que inspira o depositário, em geral

amigo do depositante”. (MILHOMENS, 1996, p. 232, grifo do autor).

Em sendo regra o caráter personalístico do contrato em estudo, nestes ternos

observa-se que a obrigação advinda do referido contrato só vinculará como titular passivo o

depositário originário, como determina o art. 64125, do Código Civil.

Ressalta-se, neste passo, a lição de Diniz:

Se, porventura, o depositário se tornar incapaz na pendência do depósito, não mais tendo condições para responder por suas obrigações contratuais, na pessoa que lhe assumir a administração deverá providenciar a imediata restituição da coisa depositada, uma vez que, sendo alheio ao vínculo contratual, não poderá substituir o depositário, podendo não merecer a mesma confiança do depositante, e, se depositante ao quiser ou não puder recebe-la, pedir seu recolhimento ao depósito público par que receba em juízo ou, então, promover a nomeação de novo depositário. (2000, p. 864).

Desta forma, observada as principais características do contrato de depósito parte-

se agora para o estudo de suas modalidades.

2.1.3 Espécies do depósito civil

Inicialmente deve-se distinguir as duas categorias de depósito, feitas pela

doutrina26 pátria, que endente que o depósito pode ter sua origem ligada a um contrato ou em

decorrência de imposição da relação jurídica.

Conforme Gomes, o contrato de depósito “pode ser voluntário ou obrigatório,

subdividindo-se este em depósito legal e depósito necessário ou miserável”. (1990, p. 38 2).

25 Art. 641. Se o depositário se tornar incapaz, a pessoa que lhe assumir a administração dos bens diligenciará imediatamente rstituir a coisa depositada e, não querendo ou não podendo o depositante e, não querendo ou não podendo o depositante recebê-la, recolhe-la-á ao Depósito Público ou promoverá nomeação de outro depositário. 26 Contudo, a própria doutrina diverge quanto à classificação dos contratos de depósito, como exemplo podemos citar a professora Diniz que divide o contrato de depósito em cinco modalidades: depósito voluntário ou convencional; depósito necessário, subdividido em depósito miserável e depósito do hoteleiro ou do hospedeiro; depósito irregular; depósito judicial e depósito civil ou comercial. (2003). No presente trabalho elegeu-se a classificação adotada pelo professor Gomes (1990).

Page 43: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

O depósito voluntário ou convencional tem suas regras determinadas pela lei civil,

normas de direito privado “é aquele convencionado livremente pelas partes”. (QUEIROZ,

2004, p. 31).

Neste contrato, os bens dados em depósito são de livre escolha do depositante, de

acordo com seu grau de necessidade.

O depósito voluntário ou convencional, regido pelos arts. 627 e 646 do Código Civil, advém de livre convenção dos contraentes, visto que o depositante escolhe espontaneamente o depositário, confinante à sua guarda coisa móvel corpórea para ser restituída quando reclamada, sem sofrer quaisquer pressões das circunstâncias externas. Somente se prova por escrito (CC, art. 646), podendo ser feito por instrumento particular ou público. (DINIZ, 2003, p. 247).

Na segunda categoria de depósito encontra-se o depósito obrigatório, que é

“aquele em que o depositante, não podendo escolher livremente a pessoa do depositário, é

forçado pelas circunstâncias a efetuar o depósito com pessoa, cujas virtudes desconhece”.

(RODRIGUES, 1972, p. 265).

Já nas palavras de Gomes depósito obrigatório pode ser conceituado como “o que

se realiza em conseqüência de circunstâncias que o impõem”. (1990, p. 383).

Assim, o depósito obrigatório resulta do desempenho de uma obrigação legal

(depósito legal) ou de circunstâncias emergenciais ou de calamidades públicas como incêndio

ou inundações (depósito necessário ou miserável).

O primeiro é determinado pela lei, “diz -se legal o depósito efetuado em

desempenho de obrigações prescritas em lei, como os das bagagens nos hotéis”. (GOMES,

1990, p. 383).

Outro exemplo de depósito legal é o que ocorre por determinação judicial de bens

penhorados. Neste tipo, o depositário apenas detém a coisa temporariamente, até que por ato

judicial seja determinada sua devolução, não havendo posse, a modalidade em questão

encontra-se determinada no Código de Processo Civil.

“O depósito judicial é determinado por mandado do juiz, que entrega a terceiro a

coisa litigiosa (móvel ou imóvel), com o intuito de preservar a sua incolumidade, até que se

decida a causa principal, para que não haja prejuízo dos direitos dos interessados”. (DINIZ,

2003, p. 251).

No que consiste ao depósito necessário ou miserável este ocorre em situações

calamitosas, estando disciplinado no inciso II do art 64727, Código Civil.

27 Art. 647. É depósito necessário: II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou o saque.

Page 44: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

“Chame -se de miserável o depósito que se faz necessariamente por ocasião de

alguma calamidade, com o dos moveis retirados de casas que esta incendiando”. (GOMES,

1990, p. 382).

Deve-se ainda registrar como espécie de depósito o de coisa litigiosa, denominado

de seqüestro, que conforme suas característica especificas deve ser observado como

modalidade especial.

Feita esta distinção basilar, passa-se agora para o estudo das principais

características do contrato de depósito.

2.1.4 Principais características

Com relação ao objeto do contrato de depósito, o art. 627 do Código Civil, na

definição de depósito deixa permeado que somente os bem móveis podem ser objeto de

depósito.

Assim, somente as coisas móveis e não fungíveis podem ser depositado, sendo esta

modalidade de depósito denominado de regular.

Só as coisas móveis podem ser objeto de depósito. O depósito de

imóveis é admitido em algumas legislações. Repele-se a maioria. Principal razão

para excluí-las e que sua guarda exige atos de administração incompatíveis com a

função econômico-social do contrato. Seria, assim um contrato de guarda, vizinho

do depósito. A tendência é, no entanto para admitir o depósito de imóveis, já

permitido no seqüestro. (GOMES, 1990, p. 382).

Entretanto para esse preceito legal, de que somente seria possível o depósito de

bens móveis e não fungíveis, existe exceção. Isto ocorre no caso do depósito irregular,

“admite -se o depósito de coisa que o depositário se obrigue a restituir outra do mesmo gênero,

qualidade e quantidade”. (GOMES, 1990, p. 383), e que se extrai do art. 645 28 do Código

Civil.

A respeito do depósito irregular ensina Queiroz:

Teremos o considerado depósito irregular que se aproxima do mútuo,

também denominado empréstimo de consumo; mas mútuo não será. O depósito

irregular, porque depósito, é feito no interesse do depositante - que é o credor da

28 Art. 645. O depósito de coisa fungível, em que o depositário se obrigue a restituir objetos do mesmo gênero, qualidade ou quantidade, regular-se-á pelo dispositivo acerca do mútuo.

Page 45: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

obrigação de restituir; o mútuo ocorre no interesse do mutuário - que é devedor

dessa obrigação de devolução, haja vista o que ocorre nos depósitos bancários. Já a

característica da fungibilidade é da essência do mútuo. Parte da doutrina, porém,

aponta certa dificuldade em se fazer a diferenciação entre os dois institutos, o

mútuo e o depósito de coisa fungível, chegando mesmo a apontar que só a intenção

das partes será norte suficientemente seguro para extremar as duas figuras. (2004,

p. 34).

Essa perquirição é necessária em vista do tratamento dispensado às diversas

formas de depósito, que pode seguir a disciplina do depósito propriamente dito ou a do mútuo,

conforme se trate de contrato regular ou irregular.

Como se depreende, a primeira modalidade comporta obrigação de restituição da

coisa individualizada, enquanto a segunda estabelece o encargo da devolução de bem da

mesma espécie, qualidade e quantidade.

Dessa feita, quando se tratar de depósito de bem fungível, deve-se seguir a

disciplina do mútuo, não podendo utilizar-se à ação de depósito.

Como bem ficou consignado no julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

Ação de depósito. Bem fungível e consumível. Inviabilidade. Contrato

disciplinado pelo regime do mútuo. O contrato de depósito de bens fungíveis e

consumíveis, também denominado irregular, é disciplinado pelas regras do mútuo,

descabendo ação de depósito com pedido de prisão civil do depositário. (Apelação

Cível n. 1999.006916-8, de Itajaí. Desembargador Pedro Manoel Abreu, Diário da

Justiça de 25.10.01).

No que consiste a utilização do objeto dado em depositado, consta que a obrigação

basilar que emana do contrato de depósito consiste na permanência, junto ao depositário, da

custódia de determinado bem, não lhe sendo permitida a utilização do bem, salvo autorização

do depositante.

A custódia da coisa constitui a principal obrigação do depositário.

Incumbe-lhe guardá-la com o cuidado e diligência que costuma ter com a coisa que

lhe pertence, procedendo, numa palavra, como bonus pater familias. Não a recebe

para outro fim. Ao depositário não se concede servi-se da coisa depositada. Admite o

direito pátrio, no entanto, que o use a coisa depositada com expressa licença do

depositante. Na hipótese de usá-la sem permissão, não autoriza o depositante a resilir

o contrato, limitando-se a declarar que o depositário responderá por perdas e danos.

(GOMES, 1990, p. 284).

Page 46: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

A sua finalidade maior é a guarda, custódia da coisa, utiliza-la é violar o contrato

de depósito, transformando em comodato ou locação.

Desta forma, em nosso direito, assim como no direito romano, a coisa não deve ser

usada, nem dada a outrem, salvo se assim for convenciono entre as partes, segundo o art.

64029 do Código Civil. Entretanto, em alguns casos o uso do bem depositado será objeto da

própria natureza do contrato, verbi gratia, como ocorre com os depósitos bancários.

Ainda, outra obrigação capital do depósito é, sem dúvida alguma, a de restituir a

coisa tão logo seja exigida pelo depositante, não podendo furtar-se o depositário à sua

restituição, sob pena de ser compelido a fazê-lo mediante prisão civil.

“A função prática do depósito é a custódia, a marca do depósito é a

disponibilidade. Por isso mesmo a coisa estará como o depositário só e até que o depositante a

reclame”. (QUEIROZ, 2004, p. 35).

Está obrigação deve ser cumprida prontamente e independe do decurso do prazo

ajustado entre as parte, podendo “extinguir -se a todo o tempo, pouco se dando que o prazo

não esteja esgotado. Justifica-se semelhante particularidade por ser o depósito um contrato

que se realiza no interesse do depositante”. (GOMES, 1990, p. 384).

Assenta o artigo 65230 que não cumprido o depositário com o seu dever de

apresentar o bem sempre que lhe for requerido pelo depositante ou ordenado pelo juiz, poderá

ser condenado como depositário infiel.

Este é o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina,

assentado pelo desembargador Ayres Gama Ferreira de Mello, no Habeas Corpus, n.º 29.380,

Diário da Justiça de 28.04.77, assim pontificado.

“[...] seja voluntário ou necessário o depósito, o de positário que o não restituir,

quando exigido, será compelido a fazê-lo, mediante prisão, não excedente a um ano, e a

restituir os prejuízos”.

Portanto, o depositário infiel é aquele que se enquadra nos parâmetros do art. 652

do Código Civil, face às condições características do contrato de depósito.

O depositário que não devolver a coisa depositada, quando reclamada, é

compelido a restituí-la mediante prisão. Pouco importa que o depósito seja

29 Art. 640 - Sob pena de ser responsabilizado por perdas e danos, não pode o depositário, sem licença expressa do depositante, servir-se da coisa depositada, nem a dar em depósito a outrem. 30 Art. 652. Seja o depósito voluntário ou necessário, o depositante que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano, e ressarcir os prejuízos.

Page 47: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

voluntário ou necessário. Indiferente também que o inadimplemento da obrigação

de restituir seja intencional ou fruto de negligência. Doloso ou culposo, sujeita-o a

coerção. (GOMES, 1990, p. 388).

Assim, as ações de depósito têm como pressuposto básico a possibilidade de prisão

civil do depositário infiel como conseqüência da não entrega do bem que lhe foi confiado.

Deste modo, restou demonstrada as principais característica do depósito seus objetivos

primordiais a relação jurídica existente entre os atores deste negócio e as conseqüências

empregadas ao depositante que deixa de cumprir com suas obrigações, passa-se neste

momento a observa-se as características da prisão civil.

2.2 A PRISÃO CIVIL31

Inicialmente, se observa que a prisão civil é um instrumento de coação colocado à

disposição do credor e que tem por fim precípuo o cumprimento da obrigação assumida.

“A prisão existente na jurisdição civil é simples fator coercitivo, de pressão

psicológica, ou técnica executiva, com fins de compelir o depositário infiel ou o devedor de

alimentos, a cumprirem sua obrigação”. (MARMITT, 1989, p. 07).

Consta preceituar que, segundo a ordem jurídica estabelecida pela CRFB/88,

somente é admissível prisão civil por dívida nas hipóteses de inadimplemento voluntário e

31 “Na França, a situação da prisão civil oscilou entre governantes que tentaram aboli -la e outros que tentaram mantê-la. Na época do feudalismo, no ano de 1274, a prisão por dívidas foi parcialmente obolida, permanecendo nos casos de débito com o Tesouro Público. Em 1867 ela deixou de existir de forma definitiva. A legislação francesa não prevê sanção de natureza civil pelo descumprimento de obrigação alimentar. Existe, no caso, o crime de abandono de família, caracterizado pelo não pagamento voluntário da pensão alimentícia devida pelo período de dois meses. A pena aplicável seria a prisão do devedor pelo período de três meses a um ano ou o pagamento de 300 a 6.000 francos, além da destituição dos direito civis e do pátrio poder. No direito italiano existia prisão civil por dívida em relação aos débitos de condenação criminais ex delicto. Todavia, o Código Civil d e1942 aboliu tal instituto. Consta que, na Inglaterra, após intensa reação da sociedade, a Rainha Vitória editou em 1869 o Debtor’s Act, em que a prisão por dívida seria cabível apenas nos casos de insolvência fraudulenta e por um período não superior a seis semanas. Na Argentina, as disposições referentes à prisão civil tinham origem na legislação espanhola, que permitia a prisão por dívida. Em 1872, a Lei n.º 514 aboliu, exceto para os casos de falência e insolvência civil decorrentes de dolo ou fraude por parte do devedor”. (CAVALCANTI, 2001, p. 47, grifos do autor).

Page 48: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

inescusável de obrigação alimentícia e de depositário infiel, normatização esculpida em art.

5º, inciso LXVII32.

Sobre o assunto é valida a lição de Mazzuoli, averbando as seguintes dizeres:

“[...] em se tratando de depósito, a Constituição Federal de 1988,

somente permite a prisão por dívid a civil, no caso de infidelidade do depositário

propriamente dito, ou seja, nos casos estritos de depósito, entendido este na sua

conceituação clássica, genuína, isto é, naquelas hipóteses em que alguém, por força

de imposição legal ou de contrato, recebe objeto móvel alheio para guardá-lo, até

que o depositante o reclame, e não nos casos de depósitos atípicos instituídos por

equiparação visando apenas reforçar as garantias em favor dos credores. (1999, p.

55-56).

Dados esses conceitos introdutórios, passa-se a demonstra a evolução histórica da

prisão e sua inserção na ordem nacional vigente.

2.2.1 Origem histórica

Destaca-se, inicialmente, que uma das primeiras codificações a tratar sobre a

prisão civil remonta dos primórdios da civilização oriental, constituída pelos reinos da

Babilônia, Índia, Egito e Judéia.

A prisão civil por dívida encontra seu primeiro sinal já entre os egípcios, que

acreditavam que os deuses testemunhavam o compromisso do devedor com o credor e

menosprezavam seu inadimplemento. Desta forma, “o devedor que se tornava escravo não se

liberava nem depois de sua morte, já que até mesmo os rituais religiosos eram negados na

ocasião de seu sepultamento”. (CAVALCANTI, 2001, p. 46).

Ainda, destaca-se Hamurabi, rei da Babilônia, entre 1728 e 1686 a.C, elaborou

uma das mais antigas compilações de lei que se tem notícia o denominado Código de

Hamurabi, esculpindo em seu § 115, a pena de prisão civil.

32 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depósito infiel;

Page 49: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

“Assim, pelo § 115, se uma pessoa tinha contra outra um crédito de trigo ou de

prata e se o credor tomasse, em garantia desse crédito, uma pessoa, e se esta pessoa executada

morresse, de morte natural, no caso de credor, essa causa não motivava qualquer reclamação”.

(AZEVEDO, 2000, p. 15).

Já no antigo direito romano, a prisão civil por dívidas foi primeiramente codificada

pela Lei das XII Tábuas, de 450 a.C., que permitia a execução do devedor pessoal do devedor

da seguinte maneira:

Tábua Terceira, Lei IV - Aquele que confessa dívida perante o magistrado ou é condenado, terá 30 dias para pagar; V - Esgotado os 30 dias e não tendo pago, que seja agarrado e levado à presença do magistrado; VI - Se não paga e ninguém se apresenta com fiador, que o devedor seja levado pelo seu credor e amarrado pelo pescoço e pés com cadeias com peso até o máximo de 15 libras; ou menos, se assim quiser o credor; VII - O devedor preso viverá à sua custa, se quiser; se não quiser, o credor que o mantém preso dar-lhe-á por um dia uma libra de pão ou mais, a seu critério. VIII - Se não há conciliação, que o devedor fique preso por 60 dias, durante os quais será conduzido em 3 dias de feira ou comitium,onde se proclamará, em altas vozes o valor da dívida; IX - Se são muitos os credores, é permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando cortar mais ou menos; se os credores preferirem, poderão vender o devedor a um estrangeiro, além do Tibre. (AZEVEDO, 2001, p.20, grifo do autor).

Mas ainda antes de Cristo, em 326, essa admissão foi deixada de lado, após

manifestações populares contrarias às crueldades físicas sofridas pelos devedores, surgindo a

Lex Poetelia Papiria, que reformulou esta prática determinando que a execução das dívidas

recaíssem sobre o patrimônio do devedor, muito embora existisse ainda a escravidão por

débitos, nos casos de inadimplemento de obrigações decorrentes de delitos.

Com o surgimento da Lex Poetelia Papiria, de 326 a.C, o não pagamento do débito passou a ensejar não mais a execução pessoal, mas do patrimônio do devedor. A Lex Poetelia Papiria, resultou de um violento levante popular contra o inclemente maltrato físico de um jovem devedor hebreu. A partir dessa lei, só as obrigações, provenientes de delito, possibilitavam a escravidão dos devedores. Apenas, portanto, o patrimônio dos nexi passou a responder por suas dívidas, e não mais sua pessoa. (FREITAS, 1987, p. 43, grifo do autor).

Posteriormente, no direito romano clássico, com a implantação de novos institutos

processuais, a prisão civil, que já se restringia aos débitos decorrentes dos delidos, foi ainda

mais atenuado com a instituição do sistema de trabalhos forçados, sendo estes gradualmente

abolido em detrimento ao instituto da fraude contra credores.

Na época clássica, com a edição da Lex Iulia, em 17 a.C., o imperador César Otaviano Augustos, ao implantar o novo sistema processual performulas, em detrimento do sistema das legis actiones, abrandou a execução pessoal do devedor, ficando abolida a morte e a sua sujeição à condição de escravo. O devedor permanecia em débito com o credor, prestando-lhe serviços até alcançar o preso de

Page 50: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

sua liberdade, situação que o colocava na condição de escravo de fato. Posteriormente, a prisão do devedor foi sendo paulatinamente abolida, em beneficio de uma execução exclusivamente patrimonial. Esta evolução gerou a necessidade da criação de um instituto que resguardasse os bens dos atos de má-fé dos devedores. Surgiu, então, o instituto da fraude contra credores (fraudis creditorum), instrumento através do qual o pretor poderia anular as alienações fraudulentas que provocavam a insolvência do devedor, mantendo a integridade do patrimônio para uma futura execução. Com este fim, o Imperador Justiniano sistematizou a Ação Pauliana, com os seus dois requisitos até hoje existentes: o consilium fraudis e o eventus damni. (CAVALCANTI, 2001, p. 46 , grifos do autor).

Após a tomada de Constantinopla, capital do Antigo Império Bizantino, pelos

bárbaros, teve início o período medieval. Neste contexto, houve a fragmentalização do poder

político, até então concentrado na mão dos grandes Impérios Europeus - Grécia, Roma,

Bizâncio, dentro outros. Surge assim, um novo sistema de organização denominado de

feudalismo o qual não se furtou a reutilizar a prisão civil do devedor como meio coercitivo ao

pagamento das obrigações assumidas.

Na era medieval, com a queda do Império Romano, a prisão do devedor voltou a ter previsão legal, regredindo o Direito à época de Roma Antiga. A Lei Sálica 61 traduzia um pensamento de vingança contra o devedor insolvente. Aquele que não pagasse os seus débitos, nem tivesse uma família que o fizesse, ficaria à mercê do credor, que possuía poderes de vida ou morte sobre o devedor. (CAVALCANTI, 2001, p. 46).

Já, no direito interno brasileiro, o instituto da prisão civil foi inserido ainda nos

primórdio da vigência das Ordenações Portuguesas. As compilações legais portuguesas

vigoraram entre nós até o advento no Código Civil de 1916, sendo revogadas expressamente

pelo artigo 180733, daquele diploma.

Salienta-se que, como colônia lusa o Brasil por um logo período teve como

sistema legal o mesmo utilizado pela metrópole colonizadora. Assim, fica fácil entender a

inserção em nosso direito da prisão civil através das Ordenações Portuguesas.

O Brasil como colônia de Portugal, teve, em seu território, aplicado esse direito português, já tendo sido, por nós, ressaltado que, com a nossa independência, a Assembléia Geral Constituinte e Legislativa do Império, pela Lei de 20.10.1823, determinou que continuassem a viger, em nosso País, as ordenações, leis, regulamentos, alvarás, decretos e resoluções portuguesas. (AZEVEDO, 2000, p. 61).

Desta feita, demonstrada, em rápidas pinceladas, a origem do instituto da prisão

civil, bem como sua inserção no direito brasileiro, passa-se neste ponto a destacar a prisão

civil nas constituições nacionais.

33 Art. 1807. Ficam revogadas as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes concernentes às matérias de direito civil regulada neste Código.

Page 51: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

2.2.2 Prisão civil nas constituições brasileiras

Neste caso, quanto às disposições constitucionais a despeito da prisão civil, deve-

se ponderar que as primeiras cartas políticas, Constituição Imperial do Brasil de 1924, bem

como a Constituição da República do Brasil de 1891, não trataram sobre a prisão por dívida.

Dá-nos conta desse fato, Azevedo que assim observa:

A constituição Política do Império do Brasil, de 25.03.1824, como também a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 25.02.1891, com as Emendas de 07.09.1926, bem como a Constituição de 10.11.1937, foram omissas quanto ao tratamento da prisão civil por dívidas. (2000, p. 70).

Ressalta-se que a elevação do instituto da prisão civil aos patamares de norma

constitucional ocorreu com a promulgação da Constituição Republicana de 1934, que foi

incisiva, em não admitir exceções quando em seu artigo 113, nº 30, decreta, que não existirá

prisão por dívidas multas ou custas.

Como aduz Azevedo:

“[...] com a promulgação da Constituição de 16.07.34, foi corajosamente

instituído, no n. 30 de seu art. 113, a proibição da prisão por dividas ficando assim

estabelecido: Não haverá prisão por dívidas, multas ou custas”. (2000, p. 70)

Observa-se, que a constituição de 1937 suprimiu de seu texto a garantia

constitucional pertinente à prisão, deixando ao alvitre do legislador ordinário a questão da

prisão civil por dívidas.

Em seguida, a carta constitucional de 18 de setembro de 194634 e de 24 de janeiro

de 1967, bem como sua Emenda Constitucional n.º 1 de outubro de 196935, trouxeram

novamente ao cenário constitucional a proibição da prisão por dividas, contudo

excepcionaram a permissão quando ao caso do devedor de alimentos e do depósito infiel,

sendo ambas com redação quase idêntica.

Tenha-se presente, ainda, que o inciso LXVII, artigo 5º da CRFB/88, manteve a

tradição das cartas políticas anteriores, afastando a prisão de natureza civil, manteve as

34 Constituição do Brasil de 1946 - Art. 141. A constituição assegura a brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direito concernentes á vida, á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos têrmos seguintes: (...) § 32. Não haverá prisão civil por dívidas, multas ou custas, salvo o caso do depositário infiel e o de inadimplemento de obrigação alimentar na forma da lei. 35 Constituição do Brasil de 1967 com redação dada pela Emenda Constitucional n.º 1 de 17.10.1969 - Art. 153. § 17. Não haverá prisão civil por dívidas, multas ou custas, salvo o caso do depositário infiel ou do responsável pelo inadimplemento de obrigação alimentar, na forma da lei.

Page 52: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

exceções, com o acréscimo da qualidade do inadimplemento da obrigação alimentar em

“voluntário e inescusável”, e suprimento do texto a expressão “na forma da lei”.

Pondera Bastos, comentando o art. 5º, inciso LXVII, da CRFB/88:

Nos tempos modernos, já não se aceita mais, que seja preso o devedor inadimplente, devendo executar-se seu patrimônio. No entanto a constituição abre duas exceções, a prisão de que trata a Constituição é de natureza civil. Com isto quer-se significar que ela não visa um meio extremamente violento de coerção, diante do qual, é de se presumir, cedam resistências do inadimplente. É por isto que, paga a pensão ou restituído o bem depositado, automaticamente cessa a prisão. (2000, p. 305-306).

Partindo-se destes apontados conceitos, “há que se considerar que,

tradicionamente, no direito pátrio, tem sido admitida a pesada cominação de pena para o

indivíduo que se torna inadimplente face a uma obrigação contratual”. (QUEIROZ, 2004, p.

120).

2.2.3 A natureza jurídica da prisão civil

Inicialmente, insta perquirir que a prisão civil é espécie do gênero prisão

administrativa por tratar de uma prisão que transcende as cominações do direito penal.

Segundo o entendimento esposado por Mirabete que aduz:

Doutrinariamente, tem-se conceituado a prisão administrativa como sendo aquela decretada por autoridade administrativa, há um conceito amplo de prisão administrativa, como prisão extrapenal, que se divide em duas espécies: prisão administrativa em sentido estrito e a prisão civil. (1998, p. 397).

Cumpre observar ainda a diferença existente entre a prisão civil e a de cunho

criminal, nesta esteira pontificou o Supremo Tribunal Federal, em aresto do Ministro Firmino

Paz, esclareceu a nítida distinção entre as duas sanções:

Cumpre distinguir, no sistema jurídico brasileiro, a) prisão criminal e b) prisão civil. São, ambas, efeitos diretos do exercício do poder jurídico estatal de punir. a) – e de constranger ao cumprimento de obrigação de restituir ou de alimentar – em b) Sinale-se, outrossim, que a causa primeira indireta, mediata, da prisão criminal é o crime, acto jurídico ilícito absoluto. A causa, porém, primeira, indireta, imediata, da prisão civil é, também, acto jurídico ilícito, mas relativo. São causas diferentes. Não poderiam, logicamente, nunca, produzir efeitos jurídicos iguais e da mesma natureza. Impõe-se, portanto, a distinção conceptual. Sendo, assim, distintos os conceitos de prisão, distintos por suas causas e, conseqüentemente, por seus fins, tem-se ser inaplicável a uma o regime jurídico previsto, em lei, para a outra ordem de prisão (Habeas Corpus, n.º 59.643-6 de São Paulo, Diário da Justiça de 02.03.82).

Tal entendimento foi contemporaneamente exposto pelo Ministro do Supremo

Celso de Mello:

Page 53: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

A prisão civil, embora medida privativa da liberdade de locomoção física do depositário infiel, não tem conotação penal, pois a sua única finalidade consiste em compelir o devedor a satisfazer obrigação que somente a ele compete executar. Trata-se, na realidade, de efeito de pretensão civil e não criminal. Por isso mesmo, o STF, por sua Primeira Turma, ao analisar a prisão civil, nela destacou o ‘caráter constritivo’ que lhe anima, como elemento primordial que é, a sua própria configuração jurídica (Habeas Corpus n. 71.038-7 de Minas Gerais, Diário da Justiça de 15.03.94).

É importante lembrar que, segundo os ensinamentos de Monteiro, explicando o

artigo 1.28736, do Código Civil de 1916, a decretação da prisão “não é propriamente uma

pena, mas medida compulsória de natureza civil ou administrativa”. (1995, p. 242).

É oportuna a lição de Theodoro Júnior, ao tratar da prisão civil por dívida

alimentar, tem-se que “a prisão civil não é meio de execução, mas apenas meio de coação, de

maneira que não impede a penhora de bens do devedor e o prosseguimento dos atos

executivos propriamente ditos”. (2000, p. 266).

De outro norte, transcrevemos as palavras de Marmitt:

Sua finalidade e exclusivamente econômica, pois não busca punir, mas convencer o devedor relapso de sua obrigação de pagar. É sempre conseqüência da aplicação de um processo coercitivo, com o fito de despertar o inadimplente, de conscientizá-lo dos compromissos que assumiu, para que ele satisfaça o quantum que lhe é exigido, ou devolva a coisa que lhe foi confiada. (1989, p. 08).

Desses conceitos extrai-se, que a prisão não é tida como repressão a um ilícito,

mas tão-somente como um meio de forçar o devedor a adimplir o seu compromisso. Em

outras palavras, a prisão civil instituída pelo legislador não possui caráter de punição, mas se

constituiu numa medida criada a fim de compelir o depositário a devolver o bem ou ao

inadimplente de pensão alimentícia de pagar seu débito.

Desta feita, no próximo tópico observar-se-á as principais alegações perpetradas

pelos que opositores da prisão civil do devedor-fiduciante, bem como daqueles que acreditam

ser está segregação legal.

Page 54: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

3 A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR FIDUCIANTE

Muito já se escreveu e muito ainda há para escrever acerca da alienação fiduciária

em garantia, ao menos enquanto perdurar os entendimentos que possibilitam ao credor da

dívida garantida por este instituto se resguardar através da prisão civil do devedor.

Assim, a luz da doutrina e da jurisprudência, pretende-se abordar os argumentos,

essenciais, dos defensores da prisão civil, bem como as teses levantadas por aqueles que

negam o cabimento da segregação dos contratos munidos com cláusulas de garantia

fiduciária.

3.1 ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À PRISÃO CIVIL

3.1.1 A recepção do Decreto-lei 911/69 pela Constituição Federal de 1988

Consta preceituar, preambularmente, que um dos pontos nefrálgicos em relação ao

estudo do Decreto-lei 911/6937, e da prisão dele decorrente, cinge-se ao redor de sua alegada

inconstitucionalidade frente aos preceitos democráticos da atual CRFB/88, seja porque aquela

foi editada por Junta Militar que comandava o país ou mesmo por transgredir aos conceitos

legais da Constituição vigente. Conforme se pode observar pelas palavras de Marinoni, que

deixa sua valiosa crítica sobre a lei de regência da alienação fiduciária:

No procedimento da busca e apreensão, o réu, na contestação, só poderá

‘alegar o pagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações

36 Dispositivo correspondente no Código Civil de 2002: artigo 652. 37 Sobre a natureza do Decreto-lei, na vigência da Constituição 1967, pondera Ataliba que: “A lei - suprema manifestação da vontade do Estado e soleníssima e eminente norma jurídica - a lei é produto da ação do Poder Legislativo. Resulta de um processo complexo que se instaura por iniciativa dos congressistas (art. 59), ou do Presidente da República (art. 60), ou dos Tribunais nacionais (art. 59), concorrente ou privativamente, conforme o caso. Culminando o processo, a sanção dá existência à Lei (art. 62 ou seu § 5º). Esta vigerá e será obrigatória, incondicionalmente, a partir de sua publicação. O termo inicial de sua eficácia é fixada expressa ou tacitamente, pela própria lei. Com o decreto-lei tudo se passa diversamente, quanto ao processo de produção. Ato privativo do Presidente da República, surge por iniciativa sua, independentemente de qualquer provocação ou processo. Vigora imediatamente, embora sua eficácia dependa absolutamente de aprovação externa (de outro órgão). Seus efeitos próprios são precários e limitados. Só se convalidará - perdendo a precariedade e ganhando estabilidade - após o pronunciamento do Congresso. Donde se vê que este - o pronunciamento do Congresso - é que lhe dá eficácia, plenitude de efeitos, estabilidade e força de lei a que se refere a cabeça do art. 58. É só a partir da aprovação parlamentar deste decreto que ele tem força de lei. Só então é que são revogadas as leis e normas de grau inferior, anteriores, com ele incompatíveis. Se por outro lado, não lograr a aprovação do Congresso, expressa ou ficta, desaparecerá pura e simplesmente, em nada alterando o sistema normativo; não deixando nenhum traço na ordem jurídica”. (1967, p. 24 -26).

Page 55: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

contratuais’ (art. 3º, § 2º, do Decreto-lei n. 911/69). O procedimento ora objeto da

nossa análise, além de permitir a apreensão liminar do bem alienado

fiduciariamente (art. 3º, caput), restringe a matéria de defesa; é óbvio que estas

limitações da cognição, a primeira no sentido vertical e a segunda no horizontal,

têm por fim único a construção de um procedimento que atenda aos interesses de

uma determinada classe. (1994, p. 16).

Ao passo desta alegação, os defensores do instituto em análise ponderam, que a

circunstância de ter sido o Decreto-lei 911/69, editada pelo regime militar que então se

apoderara dos destinos do país, não a torna, só por isso, inconstitucional. A alegação de

inconstitucionalidade deve ser, acima de tudo, vinculada à existência de afronta ou à não

receptividade da mesma pela CRFB/88.

E, ao contrário do apregoado, não vulnera referido diploma legal os princípios da

igualdade, ampla defesa e do devido processo legal, porquanto ao legislador, dentro dos

critérios adotados, é lícito estabelecer tratamento diferenciado para matérias diversas.

O Decreto-lei n. 911/69 não ofende aos princípios constitucionais da

igualdade, da ampla defesa e do contraditório, ao conceder ao proprietário

fiduciário a faculdade de requerer a busca e apreensão do bem alienado

fiduciariamente (art. 3 caput) e ao restringir a matéria de defesa alegável em

contestação. Em verdade, trata-se de procedimento especial de jurisdição

contenciosa extravagante, cuja técnica possibilita alteração de prazos, natureza

dúplice, limitação da área de defesa, isto para melhor tutelar lesão específica de

direito. (RESTIFFE NETO e RESTIFFE, 2000, p. 911).

Neste passo, devem ser lembrados, exempli gratia, os institutos que como na

alienação fiduciária determinam em numerus clausus as alegações permitidas em sede de

respostas, dentre ele destacam-se, a consignação em pagamento, que no art. 896 do Código de

Processo Civil, determina que o réu somente poderá alegar que não houve a falta recusa ou

mesmo que esta foi justa, ou ainda que o depósito não foi integral; ainda como exemplo da

determinação da matéria a ser alegada na contestação encontra-se o parágrafo único do art.

3638 da Lei n.º 6.515 de 1977 (Lei do Divórcio), no sentido de que, contra o pedido de

38 Art. 36. Do pedido de referido no artigo anterior, será citado o outro cônjuge, em cuja resposta não caberá reconvenção. Parágrafo único - A contestação só pode fundar-se em: I - falta de decurso de 1 (um) ano de separação judicial; II - descumprimento das obrigações assumidas pelo requerente na separação.

Page 56: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

conversão em divórcio, somente poderá ser alegado a falta de transcurso de tempo e o não

cumprimento de alguma obrigação assumida.

Em todos esse casos, a lei fixa o âmbito da contestação em harmonia com a

matéria em discussão, não havendo, pois, infração ao preceito constitucional da ampla defesa

e do contraditório.

Além disto, a longa vigência da lei já afastaria a alegação de inconstitucionalidade,

segunda das regras gerais de presunção de constitucionalidade como poderá Maximiliano:

“Forte é a presunção da constitucionalidade de um ato ou de uma interpretação,

quando datam de grande número de anos, sobretudo se foram contemporâneos da época em

que a lei fundamental foi votada”. (1998, p. 301).

Neste ínterim, colocando um ponto final sobre as especulações e teorias que

afirmavam a não recepção do Decreto-lei 911/69, o Supremo Tribunal Federal, guardião

maior de Constituição Nacional, assim proclamou: “[...] o Decreto -lei n.º 911/69 foi

recepcionado pela ordem constitucional vigente”. ( Habeas corpus n.º 71.286-0, Ministro

Francisco Rezek, Diário da Justiça, de 04.08.95).

A seu turno, o Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina confirmando este

entendimento deixou ementado em seus anais:

O transcurso de mais de duas décadas de pacífica eficácia do Dec-lei nº

911/69, bem como sua covigência com disposições procedimentais análogas, num

contexto constitucional consagrador dos mesmos princípios ditos afrontados pelo

diploma criticado, estão a delinear um quadro de incerteza quanto a sua

inconstitucionalidade, que os doutos não aconselham a acolhida, em prestígio ao

princípio da presunção de constitucionalidade das leis, só sendo autorizável quando

transparece de forma induvidosa e indissolúvel à definição judicial do litígio.

(Apelação Cível, n.º 1997.010511-8, Desembargador Anselmo Cerello, Diário da

Justiça de 26.11.91).

Desta forma, resta demonstrado que o Decreto-lei regulador da alienação

fiduciária em garantia está devidamente abarcada pela CRFB/88, não subsistindo qualquer

forma de vício ou incompatibilidade que o levaria a inconstitucionalidade.

3.1.2 Equiparação legal do devedor-fiduciante ao depositário infiel

No caso em lide, os defensores da prisão civil nos contratos de financiamento

com cláusula de garantia fiduciária utilizam, como fundamentação legal, o art. 66, da Lei n.º

Page 57: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

4.728/65, com a redação dada pelo art. 1º, do Decreto-lei 911/69, que por expressa disposição

legal instituiu o depósito legal ou necessário, como segue:

Art. 66. A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio

resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição

efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e

depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo

com a lei civil e penal.

Assim o artigo 4º39 do referido Decreto-lei, permite a implementação da ação de

depósito, com todos os seus consectários legais, contra o devedor-fiduciante em mora

contratual que além da condição de devedor, é “equipara ao depositário para lhe impor os

encargos e responsabilidades inerentes ao exercício dessa função”. (GOMES, 1975, p. 130).

É o que ensinam Restiffe Neto e Restiffe:

[...] e o art. 4º do Decreto-lei prevê a ação de depósito contra o infiel

depositário, fixando expressamente os casos em que se configura a infidelidade

depositária. É quando, no caso de mora ou inadimplemento, operada, em

conseqüência, a resolução do contrato de garantia, exige o proprietário credor,

através da ação de busca e apreensão, a entrega do bem, mas este não é encontrado

ou não se acha na posso do devedor ou fiduciante. (2000, p. 872).

Note-se que o art. 66, da Lei nº 4.728/65, desde logo, estabelece um depósito

legal do bem em mãos do devedor, que também por direito se responsabiliza pelos encargos

que lhe incumbem, como depositário, nos termos da lei civil.

A alienação fiduciária, que é negócio jurídico constituído

contratualmente por instrumento escrito, contém o depósito legal, ou necessário,

que ocorre da própria natureza do instituto da garantia fiduciária, em que o devedor

aliena para garantir, continuando, com as responsabilidades de depositário, até

operar-se a revisão configuração do depósito da vontade das partes sempre que se

realize uma alienação fiduciária em garantia, por força de disposição legal, torna-se

o alienante depositário necessário ex vi legis, com todas as responsabilidades e

39 Art. 4º. Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do pedido de busca e apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, na forma prevista no Capítulo II, do Título I, do Livro IV, do Código de Processo Civil.

Page 58: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

encargos de acordo com a lei civil e penal. (RESTIFFE NETO, 1975, p. 235, grifo

do autor).

Afora isso, pontifica a corrente favorável que na realidade a prisão não se daria

em detrimento à garantia da dívida, mas decorreria da “ocultação ou disposição fraudulenta

do bem alheio de que tinha a posse direta o devedor”. (Restiffe Neto e Restiffe, 2000, p. 872).

Nestes termos, a prisão do devedor-fiduciante, seria um ônus decorrente da

sistemática da garantia fiduciária, a ser suportada pelo devedor, que se beneficia do exercício

da posse em nome próprio.

Se não trair, se não fraudar, ou seja, se não frustrar a garantia pela

disposição indevida do objeto, que não lhe pertence, não se configurará a

infidelidade depositaria e, porquanto, não se sujeitará a prisão correspondente. A

compulsão é exclusivamente para que o devedor não sonegue, sem motivo justo, o

objeto do depósito, ou não disponha fraudulentamente do bem alienado, cuja posse

lhe foi assegurada em razão da estrutura jurídica da alienação fiduciária em

garantia, e que cessa, pela mora, se o credor optar pela via da excussão real da

garantia constituída pela propriedade fiduciária. (RESTIFFE NETO E RESTIFFE,

2000, p. 876).

Na concepção de Alves a permissão para o decreto prisional é assim explicada:

A nosso ver, não há, na espécie, qualquer vislumbre de inconstitucionalidade. Não fora assim, e também não deveria caber ação de depósito contra hospedeiro ou estalejadeiro, com fundamento na equiparação feita no art. 1.284 do Código Civil, onde se lê: ‘A esse depósito é equiparado o das bagagens dos viajantes, hóspedes ou fregueses, nas hospedarias, estalagens ou casas de pensão, onde eles estiverem. O hospede ou estelajeiros por elas responderão como depositários, bem como pelos furtos e pelos roubos que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas as suas casas’. Nem se pretenda que, em se tratando de alienação fiduciária em garantia, não haveria essa equiparação, porque é da índole da posse direta do alienante o uso e o gozo da coisa comum. Isso em nada desnatura o depósito legal, pois até no convencionado podem as partes estipular – como permite o art. 1.275, Código Civil – que o depositário se servirá da coisa depositada. (1987, p. 124).40

Nesta linha de raciocínio, tem-se que o contrato de alienação fiduciária é

permeado por uma modalidade de depósito legal, decorrente da própria natureza do instituto

sob foco e que se operar independentemente da vontade das partes. O Decreto-lei 911/69

criou, portanto, a obrigação legal de o devedor fiduciante, possuidor direto do bem alienado

fiduciariamente, desempenhando o papel de depositário legal.

Page 59: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Não se trata, pois, de mera atribuição de ‘responsabilidade’; o alienante -

fiduciante torna-se depositário, com todas as responsabilidades destes, civis e

penais. Toda dúvida é abolida, e à jurisprudência não resta outra alternativa senão

acatar o cabimento da ação de depósito nas relações de alienação fiduciária, mesmo

porque a lei passa a prevê-la expressamente. (FELICIANO, 1999, p. 392).

Em conseqüência do depósito legal, fica o devedor-fiduciante sujeito às

disposições dos art. 65241, do Código Civil, que lhe impõem a pena depositário infiel, com

prisão não excedente a 1 (um) ano, e a compensar os prejuízos.

3.2 ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À PRISÃO CIVIL

3.2.1 Vedação constitucional do depósito por equiparação legal

A prima facie cumpre salientar, como escoimado no segundo capítulo do

presente trabalho, que as exceções ressalvadas no inciso LXVII, do art. 5º, CRFB/88, já em

longa data vem se projetando no ordenamento jurídico pátrio, seja perante as ordenações

portuguesas ou mesmo na esfera das Constituições de 1934, 1946, 1967 e a emenda

constitucional de 1969.

Sendo que, interessa-nos mais, agora, apenas as duas últimas Constituições

brasileiras, bem como a comparação de seus textos.

Desta forma, destaca-se a constituição de 1967, vigente a época da promulgação

do Decreto-lei 911/69, bem como sua emenda constitucional de 1969, antecessoras da atual

CRFB/88, que pontifica em seu art. 153, § 17, o seguinte:

Não haverá prisão civil por dívida, multa ou custas, salvo o caso de

depositário infiel e o de inadimplente de obrigação alimentar, na forma da lei”.

(grifo nosso).

In casu, observa-se que entre o atual texto Constitucional e a Carta revogada42

subsistia importante diferença quanto à parte final desta que trazia a expressão “na forma da

40 É oportuno esclarecer que o autor citado utilizou em sua fundamentação os artigos do Código Civil de 1916. 41 O presente artigo foi devidamente transcrito às folhas 39, do presente trabalho. 42 No entender de Diniz revogar “é tornar sem efeito uma norma, retirando sua obrigatoriedade. Revogação é um termo genérico, que indica a idéia de cessação da existência da norma obrigatória. A revogação é gênero que contém duas espécies: a) a ab-rogação, que é a supressão total da norma anterior, por ter a nova lei regulado

Page 60: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

lei”. A expressão, assim disposta, suscitou controvérsias, vez que apresentava duplo sentido,

podendo ser entendido como a necessidade de regulamentação por lei ordinária, ou ainda

poderia significar uma restrição ao procedimento adotado.

Esclarecendo o sentido da norma Mazzuoli afirma que esta locução possuía “o

significado de delegar a regulamentação à lei ordinária” (1999, p. 52), das possibilidades e

modalidades permitidas de prisão civil.

Ora, o atual dispositivo constitucional que trata da prisão civil, inciso LXVII, do

art. 5º, ao ser promulgado sem a expressão ‘na forma da lei’, constante do art. 153, § 17, da

antiga carta, vedou a ampliação dos casos em que cabe o constrangimento através de lei

ordinária, assim entende parte dos doutrinadores.

A antiga Constituição Federal de 1967/69 trazia em seu art. 153, § 17, a

seguinte expressão: Não haverá prisão civil por dívida, multa ou custas, salvo o

caso de depositário infiel e o de inadimplente de obrigação alimentar, na forma da

lei. No inc. LXVII, da atual Constituição, tentou-se abrir a mesma margem para o

legislador infraconstitucional, mesmo sem o uso da expressão? Não se acredita

nesta possibilidade. Se houve supressão ou alteração de texto constitucional, é

razoável inferir que se pretendeu alterar o significado do comando normativo,

inferir que se pretendeu modificar o alcance da norma. Neste sentido, reitera-se a

noção de vedação à atuação do legislador constitucional para se criarem novas

figuras de depositório, passiveis de sujeição à prisão estatuída pelo inc. LXVII, do

art. 5º da Constituição Federal. (OLIVEIRA, 2002, p. 90-91, grifo do autor).

Neste mesmo diapasão a jurisprudência também se manifestou, como bem

exprimiu o voto do desembargador Antonio Carlos Malheiros, do Tribunal de Justiça de São

Paulo, ao suprimir a mencionada expressão, “o legislador tornou impossível à figura do

depósito infiel na legislação ordinária, de forma a não mais se justificar a admissão de um

conceito mais abrangente do contrato de depósito”. ( Habeas Corpus, n.º 674.380-2 de São

Paulo, Diário da Justiça de 14.02.96).

inteiramente a matéria, ou por haver entre ambas incompatibilidade explícita ou implícita. b) a derrogação, que torna sem efeito uma parte da norma. A norma derrogada não perderá sua vigência, pois somente os dispositivos atingidos é que não mais terão obrigatoriedade”. (1999, p. 66, grifos do autor). Continua Diniz em relação à revogação da Lei, “a revogação poderá ser, ainda: a) expressa, se a norma revogada declarar qual a lei que está extinta em todos os seus dispositivos ou apontar os artigos que pretende retirar. b) tácita, quando houver incompatibilidade entre a lei nova e a antiga, pelo fato de que a nova passa a regular parcial ou inteiramente a matéria tratada pela anterior, mesmo que nela não conste a expressão revogam-se as disposições em contrário, por ser supérflua”. (1999, p. 67, grifo do autor).

Page 61: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Ressalta-se neste passo, que o presente entendimento parte da analise da eficácia

da norma constante do art. 153, § 17 na Carta Constitucional de 1969. Sob este enfoque, como

se pôde ver, a norma constitucional em estudo é classificada como de eficácia contida, neste

ponto, necessário se faz colacionar os ensinamentos do magistério de Silva43, entendendo-se

com norma de eficácia contida, aquelas normas “em que o legislador constituinte regulou

suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação

restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei

estabelece”. (2001, p. 159).

Partindo desses apontados conceitos, em tendo a Constituição de 1969 no fim do

artigo em estudo, que a prisão civil do depositário seria na ‘forma da lei’, tal afirmação abriu a

possibilidade de o legislador ordinário, como no caso do Decreto-lei 911/69, por ficção legal,

equiparar o depositário infiel ao devedor-fiduciante, pois a própria Constituição autorizava a

normatização infraconstitucional.

A Constituição Federal de 1969, em seu art. 153, § 17, estabelecia: ‘Não

haverá prisão civil por dívida, multa ou custas, salvo o caso de depositário infiel e o

de inadimplente de obrigação alimentar, na forma da lei’. Tínhamos neste depósito

o que José Afonso da Silva denomina norma constitucional de eficácia contida: seu

âmbito de aplicabilidade deveria ser, como foi, delimitado pela lei

infraconstitucional, abrindo exceções à regra de vedação das prisões por dívida.

Como a Lei 4.728 foi recepcionada pela Carta Constitucional, não havia quaisquer

óbices à compreensão de que efetivamente o legislador infraconstituinte optara por

ampliar o rol das exceções para além dos lindes do Código Civil e Código de

Processo Civil, abarcando também as relações entre fiduciante e fiduciário: o

fiduciante inadimplente, ao não devolver o bem que alienara e sobre o qual

mantivera a posse direta, tornava-se depositário infiel, na forma da lei.

(FELICIANO, 1999, p. 392, grifos do autor).

Deste modo, não se poderia cogitar a inconstitucionalidade de leis ordinária que

estendessem a exegese contida no parágrafo do referido art. 153 da Constituição de 1969, pois

estava ‘na forma da lei’.

43 José Afonso da Silva descrimina em três categorias as normas constitucionais quanto à eficácia e aplicabilidade, quais sejam: a) norma de eficácia plena, de aplicabilidade direta, imediata e integral; b) normas constitucionais de eficácia contida, de aplicabilidade direta, imediata, mas possivelmente não integral e; c) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, as quais se subdividem em declaratórias de princípios ou organizativos e declaratória de princípios programáticos. (2001).

Page 62: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

[...] cabendo à lei definir a figura do depositário infiel, passou o STF a

entender de forma reiterada que não ofendia a Constituição Federal a decretação da

prisão civil do devedor alienante fiduciário, porque a própria lei o constitui

depositário (art. 66 da Lei 4.728/65, com redação do Decreto-lei 911/69), sendo

certo que tal decisão serviu de orientação para os tribunais estaduais. (MAZZUOLI,

1999, p. 52).

Nestes termos, por este entendimento, com a promulgação da CRFB/88, em que

foi suprimida a expressão ‘na forma da lei’, do art. 5º, inciso LXVII, o legislador constituinte

tornou impossível à figuração do depósito infiel na legislação ordinária, de forma a não mais

se justificar a admissão de um conceito mais abrangente do instituto do depósito, extraindo do

poder legiferante ordinário a possibilidade de equiparações.

Ainda sobre o assunto, pode-se ponderar que com a supressão do termo em

estudo o dispositivo deixou de ter eficácia contida, com explicado anteriormente, passando a

comportar-se como norma de eficácia plena, e em sendo assim categorizada “é norma que,

desde a entrada em vigor da constituição, produz todos os efeitos essenciais, todos os

objetivos visados pelo legislador constituinte, porque este criou, desde logo, um norma para

isso suficiente”. (SILVA, 2001, p. 159).

É o que defende Mazzuoli:

O legislador constituinte de 1988, no art. 5º, LXVII, retirou de seu texto

a partícula de restrição na forma da lei, e assim o fazendo, deixou claro a absoluta

impossibilidade da figurar do depositário infiel ser prevista na legislação ordinária,

para permitir a aplicação, por extensão, do preceito constitucional. Hoje, a

Constituição não mais se utiliza da expressão na forma da lei no final do citado

artigo. A Lei n.º 4.728/65, que dispõe sobre o Mercado de Capitais, se estava de

acordo com a Constituição revogada, agora não mais está com a Constituição de

1988. A prisão civil por dívida não mais se prende à forma de nenhuma lei, como se

prendia ao tempo da ordem constitucional caduca. Quando a Constituição fala,

hoje, em depositário infiel, está ela a se referir somente àquele depósito do Código

Civil, e a mais nenhum outro que a ele seja, por disposição de lei, equiparado.

(1999, p. 52-53, grifos do autor).

Neste mesmo entendimento é o parecer de Albuquerque, que afirma:

Conquanto o art. 1º do Decreto-lei 911, de 01.10.1969, tenha alterado o

art. 66 da Lei 4.728, de 14.07.1965, equiparou o devedor fiduciante a depositário do

bem fiduciariamente alienado. Tal disposição não foi recepcionada pelo art. 5º,

Page 63: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

LXVII, da Constituição Federal vigente, que excluiu a expressão na forma da lei,

no § 17, do art. 153 da Carta anterior. Vedou, assim, o novo Texto Constitucional a

possibilidade de a lei ordinária criar equiparação do depositário infiel circunscrita a

hipótese de infidelidade apenas aos casos de depósitos clássicos previstos nos arts.

1.265 e 1282 do Código Civil. (1998, p. 95-96, grifo do autor).

Com supedâneo neste entendimento, o devedor fiduciante não pode ser

considerado depositário infiel, passível de sofrer constrição de sua liberdade, já que não existe

permissivo legal, da constituição, para a extensão do conceito de depositário infiel pela lei

ordinária. Ora, quando a CRFB/88 dispõe que não haverá prisão civil por dívidas, salvo o

caso de depositário infiel, está se referindo àquele depósito genuíno conceituado no Código

Civil e do Código de Processo Civil, único diploma legal a dispor sobre o contrato de

depósito, não se refere à CRFB/88 ao devedor-fiduciante, que é simplesmente equiparado a

depositário infiel do diploma civil.

3.2.2 A desvirtuação do instituto do depósito na alienação fiduciária

De outra banda, e ainda levantando à bandeira da ilegalidade da prisão civil do

devedor fiduciante, existem aqueles que acreditam na desvirtuação do depósito quando

utilizado nos contratos de alienação fiduciária.

É de recapitular-se inicialmente, que o instituto da alienação fiduciária

consagrou que aquele que transfere o domínio resolúvel e a posse indireta de um bem que

integra seu patrimônio é equiparado a depositário, com todas as responsabilidades e encargos

previstos na lei.

Contudo, a finalidade elementar do instituto do depósito, como dito alhures, não

é outra se não a custódia da coisa, a sua guarda, pouco importando a modalidades do depósito.

Em face disto surge à polêmica de que na realidade “o contrato de alienação fiduciária gera

uma obrigação de garantia, que é acessória em relação à obrigação de pagar o empréstimo que

é obrigação principal”. (CHALHUB, 2000, p. 185).

Neste afã, sendo o depósito feito no interesse de quem deposita, a inversão desse

interesse ou o deslocamento das obrigações contratuais o desnatura, já que a guarda da coisa é

o seu fim precípuo.

Analisando o depósito em detrimento ao instituto da alienação fiduciária em

garantia, a doutrina é veemente em apontar características antagônicas entre estes, dentre os

quais destacamos a descaracterização da finalidade do contrato de depósito como garantia e

Page 64: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

não guarda, a inexistência da propriedade do fiduciário-depositante e o uso e gozo do bem

dado em garantia pelo devedor-fiduciante, melhor explicitado a seguir.

Os pactos de financiamento com garantia de alienação fiduciária representam,

inegavelmente, uma dívida, não uma entrega, em depósito, de bem alheio, pelo que a prisão

civil, em função desses ajustes, resulta em inequívoca ilegalidade, antagonizando-se com

todos os princípios que informam as normas de direito acerca do depósito. É claro que para

caracterizar o depósito, é preciso que o negócio jurídico tenha por finalidade a guarda, se a

finalidade for de garantia, não se tratará de depósito.

No caso de infidelidade do depositário propriamente dito, ou seja, nos casos estritos de depósito, entendendo este na sua conceituação clássica, genuína, isto é, naquelas hipóteses em que alguém, por força de imposição legal ou de contrato, recebe objeto móvel alheio para guardá-lo, ou até que o depositante o reclame, e não nos casos de depósito atípicos instituídos por equiparação visando apenas reforçar as garantias em favor dos credores. Por isso, não cabe a prisão do alienante fiduciário por equiparação, com base na circunstância de que, no caso, não ocorreria, em verdade um depósito, mas situações bastante diversas que a lei ordinária equipara a depósito. (MAZZUOLI, 1999, p. 52, grifo do autor).

Propugna da mesma opinião Gomes, quando diz:

“O devedor -fiduciante não é, a rigor, depositário, pois não recebe a coisa para

guardar, nem o credor-fiduciário a entrega para esse fim, reclamando-a quando não mais lhe

interesse a custodia alheia”. (1 975, p. 130).

Em precedente do Superior Tribunal de Justiça encontra-se reforço a tese

levantada por parte da doutrina:

A hipótese não se confunde com o depósito (alienação fiduciária); aqui, constitui cláusula de reforço para honrar obrigação civil. A restituição não é o fim em si mesma. Ao contrário, roteiro para compelir o devedor a efetuar o pagamento. Está superada a quadra histórica que enseja a prisão por dívida civil. (Recurso Especial, n.º 12548-95, Rio Grande do Sul, Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Diário da Justiça de 17.10.94).

Desta forma, segundo os defensores desta argumentação, a prisão civil, tem por

elemento um contrato de depósito, não avença pessoal que decorre do contrato de alienação

fiduciária, como instituto destinado a oferecer maior segurança às operações de crédito, em

sendo assim tratado terá por caracterizado o desvio de finalidade do instituto de depósito.

Argumentam ainda aqueles que se filiam a essa corrente que o devedor-

fiduciante tem a posse do bem dado em garantia, para seu uso e gozo, o que não é permitido

no verdadeiro depósito.

[...] tendo o devedor fiduciante a posse imediata desse bem, exatamente para seu uso e gozo, circunstância inexistente real contrato de depósito, claro está, que nesse

Page 65: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

tipo de contrato, o depositante não faz depositário, descabendo, assim, a prisão por dívida civil. Na alienação fiduciária o depósito é para garantia do crédito e não para a guarda do bem. (MAZZUOLI, 1999, p. 56).

Se a coisa já integra o patrimônio do indigitado depositário ou se este já a

possuía como se sua fosse, não é de depósito que se cuida, “pode tratar -se de mútuo, de

comodato, de locação, de venda com condição suspensiva etc, haveria, assim um desvio de

finalidade essencial do depósito”. (ALBUQUERQUE, 1998, p. 82).

O legislador da alienação fiduciária optou por transformar o credor em

proprietário do bem dado em garantia, e o devedor, em depositário, quando, na verdade, não

há nem propriedade, nem depósito.

Esta é a diferença apontada por Azevedo:

Sendo o credor-fiduciário proprietário desse objeto, que foi transmitido,

deveria correr os riscos normais do direito de propriedade, tal como a perda do

objeto, em mãos de outrem, sem culpa deste. Ocorre que tal princípio, consagrado

por todo o sistema obrigacional do Código Civil, não é observado na alienação

fiducária em garantia pois, perdida a coisa fiduciada, sem culpa do devedor, o

credor executa o contrato com as outras garantias nele constantes. Isto é, para

executar sua garantia, o credor é proprietário; perdido o bem, o proprietário que

sofre o prejuízo é o devedor. (2000, p. 108).

Portanto, na alienação fiduciária em garantia, não existe a figura do depositário,

pois, em verdade, o fiduciante é o proprietário, pois desde o início negocial, sofrerá ele o risco

do depauperamento do bem alienado. “Ninguém pode ser condenado, portanto, como

depositário infiel, se correr o risco da perda da coisa; isto, porque, reafirme-se, o depositário

deve guardar bem alheio e não bem próprio”. (AZEVEDO, 2000, p. 109).

Sendo assim, como não existe um efetivo depósito, a eventual infidelidade do

devedor-fiduciante não permite a sua segregação física, contrariamente do que sucede, em

verdade, nas hipóteses nas quais, a guarda do bem alheio seja a finalidade do depósito.

3.2.3 A prisão civil e os tratados internacionais

Page 66: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Merece destaque ainda, a tese que tem como causa para a impossibilidade da

prisão civil a inserção na legislação pátria de tratado internacionai, em destaque a Convenção

Americana de Direitos Humanos44 (Pacto de San José da Costa Rica).

Antes de adentrar em pormenores sobre o tema em analise são necessárias

algumas ponderações sobre a teoria dos tratados internacional.

Sendo que, na concepção de Accioly, os tratados são, “acordos ou ajustes

internacionais, são atos jurídicos por meio dos quais se manifesta o acordo de vontade entre

duas ou mais pessoas internacionais”. (2000, p. 120).

De ressaltar-se, que no regime estabelecido pela CRFB/88, a competência para celebrar tratados, convenções e atos internacionais, é privativa do Presidente da República, conforme a inteligência do art. 84, inciso VIII45.

Estes atos, todavia, após serem firmados pelo Presidente são enviados ao Congresso Nacional que então, edita um Decreto Legislativo, aprovando ou não o tratado, como é a dicção do art. 49, inciso I46, também da CRFB/88. Finalmente, o Presidente promulga o tratado por meio de Decreto com a sua posterior publicação no Diário Oficial da União. A partir da publicação, o tratado passa a integra a ordem jurídica nacional.

Deste modo, observa-se que a adesão do Brasil aos termos dos acordos

internacionais demanda o esforço dos Poderes Executivos e Legislativos, como se verifica no

magistério de Piovesan:

Consagra-se, assim, a colaboração entre o Executivo e Legislativo na

conclusão de tratados internacionais, que não se aperfeiçoa enquanto a vontade do

Poder Executivo, manifestada pelo Presidente da República, não se somar à

vontade do Congresso Nacional. Logo, os tratados internacionais demandam, para

seu aperfeiçoamento, um ato complexo onde se integram a vontade do Presidente

da República, que os celebra, e a do Congresso Nacional, que os aprova, mediante

decreto legislativo. Ressalta-se que, considerando o histórico das Constituições

anteriores, constata-se que, no Direito Brasileiro, a conjugação de vontade entre

Executivo e Legislativo sempre se fez necessária para a conclusão de tratados

internacionais. (1997, p. 92).

44 Adotado e aberta à assinatura na Conferência Especializada Interamericana sobre Direito Humanos, em Sam José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1969 - ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 1992, pelo Decreto Executivo n.º 678. 45 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República. (...) VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional. 46 Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.

Page 67: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Neste viés, ficou demonstrado, em rápidas palavras, o modo com que os tratados

são incorporados no sistema jurídico nacional, passa-se a analisar, especificadamente, o

tratado que versa sobre a prisão civil por dívida e que foi incorporado ao sistema legal

brasileiro, qual seja a Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de

San José da Costa Rica.

No tocante a Convenção Americana de Direitos Humanos, que veda a prisão por

dívida, (artigo 7º, item 7)47, existem duas posições doutrinarias, os que entendem que os

tratados de âmbito internacional não têm qualquer tipo de gerência sobre as regras da prisão

civil por dividas e que ingressam no ordenamento interno como simples norma ordinária e

gerais não podendo revogar as de caráter especifico, de outra banda, encontramos os que

ponderam que os pactos internacionais são incorporados como normas de caráter

constitucional vedando por completo a prisão civil por dividas no ordenamento interno.

Nestes termos, os defensores da prisão civil fazem uma digressão acerca da

posição que as convenções internacionais ocupam na hierarquia das leis, devendo situar-se no

mesmo patamar da legislação ordinária infraconstitucional. É indubitável a supremacia da

Constituição da República sobre todas as convenções internacionais que a ela devem

obediência.

Nesta linha, são as ponderações de Chalhub:

“Ora, a Carta Política de 1988 prescreve, no inciso LXVII, do art. 5º, o

cabimento da prisão civil por dividas, não podendo esta ser contrariado por tratado

incorporado ao sistema vigente”. (2000, p. 188).

Vale ressaltar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, consoante aresto

da lavra do Ministro Moreira Alves, ao assentar que:

[...] o Pacto de São José da Costa Rica, além de não poder contrapor-se à

permissão do artigo 5º, LXVII, da mesma Constituição, não derrogou, por ser

norma infraconstitucional geral, as normas infraconstitucionais especiais sobre

prisão civil do depositário infiel (Recurso Extraordinário, n.º 293.378, de Minas

Gerais, Diário da Justiça de 10.08.01).

47 Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal. 7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

Page 68: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Ainda, ponderam, que a Convenção Americana de Direitos Humanos, por ser

norma geral é incapaz de refogar uma lei especial, ou seja, exige que ambas as leis sejam

gerais ou especiais.

Quanto a este aspecto, importante que se tenha presente o fato de que esse Tratado ingressou no direito brasileiro como norma infraconstitucional geral, e, portanto, não tem, como tal, o poder de derrogar as normas infraconstitucionais especiais atinentes à prisão civil de depositário infiel. Nesse caso, ter-se-ia, de um lado, uma norma geral, que é a do pacto de São José da Costa Rica, e, de outro lado, normas especiais consubstanciadas na legislação pertinente à prisão civil de depositário infiel, decorrente de depósitos convencionais ou de depósito necessários. (CHALHUB, 2000, p. 188).

É de observar-se, por fim, que o § 2º do artigo 5º da CRFB/88 “não se aplica aos

tratados internacionais sobre direitos e garantias fundamentais que ingressaram em nosso

ordenamento jurídico, e isso porque ainda não se admite tratado internacional com força de

emenda constitucional”. (FERREIRA FILHO, 1998, p. 113).

Assim, admitir a inserção dos tratados internacionais, em nível constitucional,

significaria uma perigosa flexibilidade da Constituição brasileira, concebida como de caráter

rígido. Nestes pensar, por meio de tratados internacionais firmados pelo Presidente da

República ter-se-ia verdadeiras Emendas Constitucionais.

O Ministro Maurício Corrêa, ao proferir seu voto no Habeas Corpus, n.º 72.131,

destacou quanto à natureza dos tratados:

[...] os compromissos assumidos pelo Brasil em tratado internacional de que seja parte (§ 2º do art. 5º da Constituição) não minimizam o conceito de soberania do Estado-povo na elaboração da sua Constituição; por esta razão, o art. 7º, nº 7, do Pacto de São José da Costa Rica, deve ser interpretado com as limitações impostas pelo art. 5º, LXVII, da Constituição. A Carta Magna, como expressão máxima da soberania nacional, está acima de qualquer tratado ou convenção internacional que com ela conflite. (Habeas Corpus, n.º 72.131 – Rio de Janeiro, Diário da Justiça de 01.08.03)

Assim, é o entendimento dos que defendem a manutenção, na ordem jurídica

nacional, da segregação civil do depositário infiel. Que a Convenção de San José da Costa

Rica, como norma de caráter ordinário, hierarquicamente inferior a CRFB/88, não pode

restringir o alcance das exceções previstas no art. 5º, inciso LXVII e que sendo a convenção

norma de caráter geral não pode revogar norma especifica, no caso o Decreto-lei 911/96.

Page 69: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Noutro pensar, encontram-se os que entendem que a partir do momento em que

ingressou no direito interno, mencionado pacto passa a gozar, consoante o § 2º do art. 5º48, da

CRFB/88, do privilégio de garantia dos direitos fundamentais do homem. Desse modo,

entendem os doutos, que quando o tratado internacional versar sobre direitos e garantias

fundamentais do homem, como é a liberdade, deve ingressar no ordenamento jurídico como

norma de grau constitucional, além “de terem natureza de norma constitucional, têm

incorporação imediata no ordenamento jurídico interno”. (MAZZUOL I, 1999, p. 113).

Ainda sobre o assunto, se poderá que os demais tratados, que não tratam de

garantias fundamentais, além de apresentarem natureza infraconstitucional nos termos do art.

105, inciso III, ‘a’ 49, da CRFB/88, não são incorporados de forma automática pelo nosso

ordenamento interno, devendo passar pelos trâmites da promulgação e publicação, como

doravante demonstrado.

Como bem explica Piovesan:

[...] justifica-se na medida em que os tratados internacionais de direitos

humanos apresentam um caráter especial, distinguindo-se dos tratados

internacionais comuns. Enquanto estes buscam o equilíbrio e a reciprocidade de

relações entre Estados partes, aqueles transcendem os meros compromissos

recíprocos entre os Estados pactuantes. Os tratados de direitos humanos objetivam a

salvaguarda dos direitos do ser humano e não das prerrogativas dos Estados. (1997,

p. 82).

No mesmo norte é a lição de Trindade que assim prega:

O dispositivo no art. 5º, § 2, da constituição brasileira de 1988 se insere na nova tendência de constituições latino-americanas recentes de conceder um tratamento especial ou diferenciado também no plano do direito interno aos direito e garantias individuais internacionamente consagradas. A especificidade e o caráter especial dos tratados de proteção internacional dos direitos humanos encontram-se, com efeito, reconhecidos e sancionados pela Constituição brasileira de 1988: se, para os tratados internacionais em geral, se tem exigido a intermediação pelo Poder Legislativo de ato com força de lei, de modo a outorgar às suas disposições vigência ou obrigatoriedade no plano do ordenamento jurídico interno, distintamente, no caso dos tratados de proteção internacional dos direitos humanos

48 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. 49 Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência.

Page 70: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

em que o Brasil é parte, os direitos fundamentais neles garantidos ‘passam’, consoante o art. 5º, §§ 1º e 2º, Constituição brasileira de 1988, a integrar o elenco dos direitos constitucionais consagrados e direta e imediatamente exigíveis no plano do ordenamento jurídico interno. (1991, p. 139).

A seu turno, por este lado da doutrina, resta consagrada a inserção das

convenções internacionais no plano interno, quando tratarem sobre direitos humanos, como

norma constitucional de eficácia imediata.

Neste diapasão, todas estas argumentações sobre a inserção e a natureza do

tratado no direito interno são para determinar que Convenção Americana de Direitos

Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), que em seu art. 7, item 7, proíbe a prisão civil

por dividas tornou-se, “uma emenda constitucional, porta nto, restringiu a incidência do art. 5º,

inciso LXVII, da CRFB/88, que prevê a possibilidade da referida medida restritiva para o

devedor de alimentos e para o depositário infiel.” (OLIVEIRA, 2002, p. 60).

Já, nas palavras de Mazzuoli:

De forma que, a cláusula do § 2º do artigo 5º, da Carta da República, está a admitir (isto é bem visível!) que tratados internacionais de diretos humanos ingressem no ordenamento jurídico interno brasileiro a nível constitucional, e não no âmbito de legislação ordinária, como quer a posição majoritária do Supremo Tribunal Federal. Os tratados internacionais de direitos humanos, por isso, tem o que chamamos de efeito aditivo, pois adicionam ao texto constitucional, através de cláusula do § 2º do artigo 5º, da Constituição Federal. (1999, p. 108).

Deste modo, pelos conceitos apontados pela doutrina, com a inserção no cenário

nacional do Pacto de San José da Costa Rica, incorporado no ordenamento pátrio como norma

constitucional, restringida está a prisão civil a hipótese do inadimplemento de obrigação

alimentar por encontra-se parcialmente revogado o art. 5º, inciso LXVII, da CRFB/88.

É oportuno lembrar, que o Supremo Tribunal Federal tem como pacifico em seus

julgados que os tratados internacionais ratificados pelo Brasil passam a fazer parte do

conjunto legislativo ordinário, não revogando, dispositivos Constitucionais, pontifica ainda a

Corte, que não pode o Pacto de San José da Costa Rica guerrear norma de caráter especial por

ser aquela categorizada como geral, como devidamente comentado acima.

Por este pensar, os adeptos do entendimento em estudo, tentando contra-

argumentar os julgados da Suprema Corte, procurando partir por um viés alternativo,

ponderam que caso a CRFB/88 não contivesse o preceito do art. 5º, § 2º, ainda assim a

Convenção Americana de Direitos Humanos, incidiria limitando as hipóteses de prisão civil

no âmbito de lei ordinária.

Page 71: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

In casu, admitindo referido tratado como lei ordinária, conforme o entendimento

do Supremo, seria a convenção em analise lei geral, não podendo, deste modo, revogar norma

de caráter especifico como é o caso do Decreto-lei 911/69.

Por outro lado, ressalta-se, que a previsão para a prisão do depositário se

encontra no artigo 1.287 do Código Civil de 191650 e o procedimento estabelecido nos arts.

902 e 904 do Código de Processo Civil, não trazendo o Decreto-lei 911/69 qualquer norma

disciplinadora sobre a prisão, utiliza-se somente dos dispositivos mencionados, sendo estes o

suporte legal para a ação de depósito do Decreto-Lei.

Assim, como a Convenção Americana de Direitos Humanos, com supedâneo nos

entendimentos do Supremo, ingressa em nosso sistema legal como lei ordinária, de caráter

geral, afastará outras normas de categoria geral, como são o Código Civil e o Código de

Processo Civil, ficando o Decreto-lei 911/69, sem o seu sustentáculo legal, ora, não existindo

mais no ordenamento legal pátria norma autorizadora da prisão civil por depósito infiel restou

o Decreto-lei, no que se refere à prisão civil levado ao vazio normativo.

Admitindo o Pacto de San José com lei ordinária, é ele lei geral, portanto, afasta o diploma específico que versa sobre a alienação fiduciária em garantia de cosas móveis. Afastará, face a escolha do legislador no art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil, no entanto, as normas gerais do Código Civil e do Código de Processo Civil, ao coibir prisão por dividas, exceto a dívida de alimentos, tendo esta última, incidência somente no pertinente ao depósito judicial. Pelo assim, o Dec.-lei

50 Neste patamar é importância fazer algumas ponderações; a tese em estudo

está levando em consideração o Código Civil de 1916, contudo mesmo tratando-se de norma

expressamente revogada (Código Civil de 2003), necessária se faz sua análise, tendo em vista

que muitos dos atuais financiamentos foram pactuados ainda na vigência daquele diploma,

devendo por ela serem regulados. No mais, deve-se ponderar ainda, sobre a problemática

existente quanto ao atual Código Civil em relação ao instituto da alienação fiduciária. A entrada

em vigor da Lei 10.406/02, em 11 de janeiro de 2003, após um ano de vacatio legis, trouxe

poucas inovações a respeito da alienação fiduciária em garantia, ao regulamentar a propriedade

fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368. Com a entrada em vigor desta lei nova, seria de se

perguntar: Sendo o Código Civil por natureza norma geral e posterior, haveria derrogado a

Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), no que pertine a

prisão civil por infidelidade depositária? E mais: Entendendo-se que o Decreto-lei 911/69 foi

esvaziado em seu conteúdo em face da Convenção Americana de Direitos Humanos, voltaria,

com esse novo diploma, a se preencher? São ponderações que existem, mas que não fazem

parte do objetivo do presente estudo, que possui sua problemática delimitada a alienação

fiduciária em relação ao Decreto-lei 911/69.

Page 72: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

911/69, ficou sem o seu start, sem seu suporte de validade, não havendo condições de ser aplicado. (OLIVEIRA, 2002, p. 67, grifo do autor).

A propósito, a declaração de voto vencido do desembargador Alcides Aguiar,

do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, no Agravo de Instrumento, n.º 00.015006-1, diário

da justiça de 11.10.00, que bem demonstrar a assertiva exposta:

Entretanto, no plano infraconstitucional, como tratado internacional, com eficácia no direito doméstico brasileiro, o Pacto de São José de Costa Rica está em plena vigência como norma de caráter geral. E, assim, derrogou todas as previsões legislativas de caráter geral sobre prisão civil e os procedimentos sobre prisão civil e os procedimentos para sua aplicação, por infidelidade depositária, inclusive e principalmente o art. 1.287 do CC e os arts. 885, parágrafo único, e 902, § 1º, e 904, parágrafo único, todos do CPC. O Decreto-Lei n. 911/69, muito embora seja lei especial – não revogável diretamente por lei de caráter geral, como é o caso do Pacto de São José da Costa Rica –, foi esvaziado reflexamente por não cominar a prisão civil do fiduciante infiel depositário, mas tão-somente fazer remissão à fonte cominatória derrogada (Códigos Civil e Processual Civil), de modo que remissão à responsabilidade imposta pela lei civil geral e à forma procedimental de sua aplicação, feita no Decreto-Lei n. 911/69, cai no vazio. Logo, não há responsabilidade civil cujo comprimento possa ser exigível coercitivamente sob cominação de prisão civil, seja no depósito genuíno, seja no depósito derivado, como no da alienação fiduciária em garantia, penhor mercantil, rural, etc., até que outra norma revogue o Pacto de São José da Costa Rica, represtinando a antiga redação do art. 1.287 do CC e preenchendo o vazio deixado nos arts. 885, 902 e 904 do CPC. 51

Por último, colaciona a lição de Mazzuoli que bem pondera a controvérsia aqui

arrazoada:

Sendo a Conveção Americana de Direitos Humanos, norma de caráter geral, capaz somente de revogar normas de caráter geral, é de se entender, sem muito esforço que, sendo o Código Civil e Código de Processo Civil, leis “gerais”, tanto o disposto no art. 1287 do primeiro diploma, quanto aos arts. 902, § 1º e 904, parágrafo único, do diploma processual, reputam-se derrogados pelo referido Pacto que eles sobreveio. Tendo sido o Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil em 1992, e tendo sido o Código Civil e de Processo Civil, editados antes dessa data, não há que se concluir por outra forma senão a de que, o Pacto de San José da Costa Rica, sendo lei nova geral (como quer o Supremo Tribunal Federal), derrogou os dispositivos, daqueles dois diplomas citados. Aplica-se assim o princípio lex posterior derogat priori. (1999, p. 96, grifo do autor).52

Deste modo, atribuída à condição de norma infraconstitucional a Convenção

Americana de Direitos Humanos, ele sugeri, de modo indireto, a não-aplicabilidade do

Decreto-lei 911/69, no que tange à cominação da prisão, pela simples falta de instrumento

processuais e materiais para tanto, já que os referidos instrumentos estavam constantes na

parte revogada pelo tratado, no Código Civil e Código de Processo Civil.

51 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito. 52 O autor está utilizando-se dos artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 73: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Assim, restou demonstrados os entendimentos das correntes que defendem a

prisão civil e a que se contrapõe a esta, passando-se neste ponto a observar, com maior

detalhe, como a jurisprudência vem tratando a prisão civil nos contratos com cláusula de

garantia fiduciária.

4 A PRISÃO FIDUCIARIARIA NA INTERPRETAÇÃO DOS TRIBUNAIS

A análise do instituto da alienação fiduciária em garantia ganhou especial relevo

com os recentes julgamentos do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça,

merecendo estudo mais acurado, na interpretação dos dispositivos do Decreto-lei 911/69,

especialmente ao que pertine a prisão civil do devedor fiduciante, aplicada por aqueles

Tribunais. Em sendo assim, para que a interpretação do instituto da alienação fiduciária em

garantia ocorra satisfatória, resta evidente, a necessidade de um aprofundamento maior aos

patamares da jurisprudência pátria.

Nestes termos, é pertinente inicialmente ponderar-se o que vem a ser esta fonte do

direito denominada jurisprudência.

É cediço que “a doutrina ao lado da jurisprudência, é fonte mediata de direito”.

(MONTEIRO, 1977, p. 12).

Nas palavras de Lopes, “a jurisprudência é uma propulsora do direito e só num

caso excepcional pode ser elevada à categoria de fonte do Direito: quando, pela reiteração de

um julgado, se estabelece um costume”. (1988, p. 93).

O professor Pereira sobre a importância da jurisprudência alega:

Não negamos à jurisprudência o valor de fonte informativa ou intelectual do direito. Na sua função específica, os tribunais, aplicam e interpretando a lei, vivificam-na e adaptam-na às transformações econômicas e sociais. Pela autoridade intelectual de seus juízes, como em razão de constituírem os julgamentos o meio material de se apurar como a regra jurídica dever ser entendida, a consulta a jurisprudência é elemento informativo de constante utilidade. (1980, p. 63).

Neste afã, a análise dos julgados, sobre uma determinada matéria, permite-nos

identificar com maior precisão os pontos de divergência sobre o tema.

No caso em estudo, a prisão civil do devedor fiduciário, observa-se uma

verdadeira divisão jurisprudencial, de um lado encontramos o Supremo Tribunal Federal,

Page 74: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

guardião máximo da Constituição Federal, que é favorável a prisão; do outro o Superior

Tribunal de Justiça, competente pela análise das normas infraconstitucionais, taxativamente

contrário ao entendimento daquele.

A seu turno, passa-se a analisar os principais julgados sobre o tema nos Tribunais

Superiores e posteriormente o tratamento da matéria a luz dos Tribunais Estaduais.

4.1 PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Supremo Tribunal Federal11 mantém até hoje um posicionamento conservador,

admitindo o cabimento da prisão civil dos devedores nos contratos de alienação fiduciária em

garantia.

Este entendimento foi se mantendo constante no Tribunal em vista da influência e

da posição adotada pelo Ministro Aposentado José Carlos Moreira Alves, que é autor de

obra12 especializada sobre a alienação fiduciária e ainda por ser o eminente Ministro

considerado como um autêntico intérprete da norma, haja vista que cooperou na feitura do

Decreto-lei 911/69.

Sendo inclusive o Ministro Alves o relator do aresto que até hoje é considerado o

principal precedente13 sobre o tema naquele Tribunal, no qual, além de sempre rechaçar, com

muita veemência, a aplicabilidade do Pacto de San José, pondera que o devedor-fiduciante foi

equiparado, por expressa determinação legal, a condição de depositário do bem alienado com

cláusula de alienação fiduciária, o que se extraí do Habeas Corpos n.º 72.131 - Rio de Janeiro,

Diário da Justiça, 01.08.2003, assim proclama:

Ao nosso ver, não há espécie, qualquer vislumbre de inconstitucionalidade. Não fora assim, e também não deveria caber ação de depósito contra hospedeiro ou estalajadeiro, com fundamento na equiparação feita no art. 1.284 do Código Civil, onde se lê: ‘A esse depósito é equiparado o das bagagens dos viajantes, hóspedes ou fregueses, nas hospedarias, estalagens ou casas de pensão, onde eles estiverem. O hospede ou estelajeiros por elas responderão como depositários, bem como pelos furtos e pelos roubos que perpetrarem as pessoas empregadas ou admitidas as suas casas’. Nem se pretenda que, em se tratando de alienação fiduciária em garantia,

11 Atualmente a Suprema Corte é representada pelos seguintes magistrados: Ministro Nelson Jobim (Presidente do Tribunal); Ministro Celso de Mello; Ministro Sepúlveda Pertence; Ministro Carlos Velloso; Ministro Marco Aurélio; Ministra Ellen Graice; Ministro Gilmar Mendes; Ministro Cezar Peluso; Ministro Carlo Britto; Ministro Joaquim Barbosa. O Ministro Maurício Corrêa fez parte do Tribunal até abril do corrente ano, data em que teve sua aposentadoria aprovada. 12 ALVES, José Carlos Moreira. Da alienação Fiduciária em Garantia. 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 1987. 13 Habeas Corpus n.º 72.131 - Rio de Janeiro, julgado em dezembro de 1995, o relatório inicial ficou a cargo do Ministro Marco Aurélio Mello que teve seu voto vencido, passando a relatar a decisão o Ministro José Carlos Moreira Alves, público no Diário da Justiça de 01.08.03.

Page 75: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

não haveria essa equiparação, porque é da índole da posse direta do alienante o uso e o gozo da coisa comum. Isso em nada desnatura o depósito legal, pois até no convencionado podem as partes estipular – como permite o art. 1.275, Código Civil – que o depositário se servirá da coisa depositada. 14

No mais, o Ministro Alves, entende que o Decreto-lei 911/69 foi plenamente

recepcionado pela CBFB/88. E que como depositário da coisa por depósito necessário, em

consonância com o disposto no inciso I, do art. 647, Código Civil, que reza que é depósito

necessário o que se faz em desempenho de obrigação legal.

Em suma o Ex. Ministro Moreira Alves tem por conta que o depósito existente no

contrato de alienação fiduciário em garantia é considerado necessário, pois têm sua origem

estatuída por lei, e que assim devem ser aplicadas as regras estabelecidas ao depósito

necessário, em conformidade com o art. 652, do Código Civil.

No que se pertine à Convenção de San José da Costa Rica, por estabelecer, no § 7º,

de seu art. 7º, que “ninguém deve ser detido por dívidas”, entende o Ministro Alves que,

sendo pacifico na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os tratados ingressam em

nosso ordenamento jurídico tão somente com força de lei ordinária.

Desta forma, sendo a Convenção de San José da Costa Rica, norma de caráter

ordinário, hierarquicamente inferior a CRFB/88, não pode restringir o alcance das exceções

previstas no art. 5º, inciso LXVII. Destaca ainda, que a convenção sendo norma de caráter

geral não pode revogar norma especifica, no caso o Decreto-lei 911/69. E que o próprio § 2º,

do art. 7º, da convenção em estudo, deve ser observada com a advertência existente, que esta

não tem força imperativa em detrimento de condições fixadas pelas cartas políticas dos

estados signatários.

Que sendo o art. 7º, § 7º, dessa convenção norma de caráter geral, não pode revogar o disposto, em legislação especifica como é a relativa a alienação fiduciária em garantia. Podendo acrescentar, também, que esse § 7º, deve ser interpretado com a prudente ressalva constante do § 2º, do mesmo art. 7º, dessa convenção que estabelece, "ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas palas constituições política dos estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. (Habeas Corpus, n.º 72.131 – Rio de Janeiro, Diário da Justiça de 01.08.03).

O Ministro Aposentado Ilmar Galvão, em seus votos, considerava em sua

fundamentação, que a prisão do depositário infiel, nos contrato de alienação fiduciária em

garantia, são decorrentes da resistência na devolução do bem dado em garantia e não em

decorrência de dívida.

14 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 76: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

É fora de dúvida que, com a alienação do bem, o alienante depoja-se da propriedade deste, tornando-se, pela traditio bervi Manu, seu fiel depositário. São figuras albergadas pelo direito positivo, não podendo ser consideradas fictícias. O adquirente fiduciário, ao executar o contrato de depósito, não está exigindo o pagamento de prestações vencidas, mas à restituição do bem depositado. A resistência à restituição é que pode acarretar a prisão, não o inadimplemento. Não há que se falar em prisão por dívida. (Habeas Corpus, n.º 72.131 – Rio de Janeiro, Diário da Justiça de 01.08.03).

Em resumidas palavras, o Ministro Aposentado, Sydney Sanches prelecionava

sobre seu entendimento:

Fiz estudo aprofundado, segundo minhas possibilidades, é claro, e cheguei, a conclusão de que era perfeitamente compatível com a Constituição de com o Código Civil a assunção da condição de depositário, pelo alienante-fudiciante, sujeito, pois, a prisão civil, se incidisse em infidelidade no cumprimento dos deveres respectivos. (Habeas Corpus, n.º 76.561-3 - São Paulo, Diário da Justiça de 02.02.01).

O Ministro Celso de Mello segue orientação idêntica. No julgamento do Recurso

Extraordinário n.º 24.997 - Rio Grande do Sul, diário da justiça de 24.9.2002, asseverou que:

“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem enfatizado que a equiparação do devedor

fiduciante ao depositário infiel não ofende a Constituição Federal”.

Vai mais além ao discorrer sobre o tema:

Esse preceito, contido no inciso LXVII, do art. 5º, da Carta Federal brasileira, qualifica-se como típica norma de eficácia contida ou restringível, eis que em função do seu próprio conteúdo material, contempla a possibilidade de o legislador comum limitar o alcance da vedação constitucional pertinente à prisão civil, autorizando-a a excepcionar a cláusula proibitória em duas hipóteses: (a) inadimplência da obrigação alimentar e (b) infidelidade depositaria. (Recurso Extraordinário, n.º 24.997 - Rio Grande do Sul, Diário da Justiça de 14.06.02).

Em seguida observa-se, o voto proferido pelo Ministro Maurício Corrêa, do

Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus n.º 72.131-1 - Rio de Janeiro, diário da justiça,

01.08.03, como segue:

Uma coisa é alguém comprar num Shopping Center em par de sapatos a prazo, e vencida a duplicata, ser preso porque não adimpliu. Uma outra coisa é alguém se dirigir a uma concessionária de automóveis e adquirir um veículo, ali mesmo assinar contrato de alienação fiduciária com certa financeira, cujo domínio não lhe é passado, e conscientemente se obriga ao pagamento de determinada prestação, tendo plena convicção de que, passando o carro para outrem, ou desaparecendo como coisa, se colocar na condição de depositário infiel submetendo-se às penas da lei. Não me parece que o inciso LXVII ao fazer menção expressa ao depositário infiel, admitindo a prisão civil, restrinja a sua abrangência apenas ao depósito voluntário, excluindo-se o legal, decorrente do contrato, naquelas hipóteses em que é disciplinado e definido pela própria lei. A alienação fiduciária se consolida no depósito, e, portanto na prisão.

Page 77: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Assim, como os votos proferidos anteriormente, o Ministro Maurício Corrêa,

também tem o entendimento que o contrato alienação fiduciária em garantia, consolida-se

pela formação de um depósito necessário e que não há ofensa a ordem contida no inciso

LXVII, do art. 5º, da CRFB/88.

O atual presidente do Colendo Tribunal, Ministro Nélson Jobim, é plenamente

favorável à tese esposada até agora, como demonstrado no seu voto no Hábeas Corpus n.º

76.561-3 de São Paulo, diário da justiça de 02.02.2001, que assim proferiu:

“Sr. presidente, o Plenário já decidiu pela constitucionalidade da prisão civil do

depositário infiel, em casos de alienação fiduciária. Reafirmo a decisão do Plenário, no

sentido da plena legitimidade jurídico-constitucional da prisão civil do depositário infiel.

Indefiro o habeas corpus”.

Desta feita, denota-se pelos votos dos arestos transcritos que a corrente que impera

no Supremo Tribunal Federal é a que admite a prisão do devedor fiduciante equiparando-o a

figura do depositário infiel, valendo-se dos seguintes argumentos: 1 - O Decreto-lei 911/69,

foi devidamente recepcionado pela CRFB/88; 2 - O depósito existente no contrato de

alienação fiduciário em garantia é considerado um depósito necessário, origem imposta por

lei, devendo ser aplica a regra do art. 647, do Código Civil; 3 – O Pacto dos Direito Humanos

sobre a prisão civil - Pacto de São José da Costa Rica - é hierarquicamente inferior a

CRFB/88, não pode restringir o alcance das exceções previstas no art. 5º, inciso LXVII; 4 -

Ainda, o Pacto de São José da Costa Rica, como norma infraconstitucional geral, não

derrogou o Decreto-lei 911/69, que é norma infraconstitucional especial sobre a prisão civil

do depositário-infiel.

De outra banda, a polêmica sobre o cabimento da prisão civil do devedor

fiduciante é deveras controvertido, que no próprio bojo do Supremo Tribunal Federal existem

votos dissidentes a prisão.

A corrente minoritária é liderada pelo Ministro Marco Aurélio, que já prolatou o

seguinte voto:

Conforme a melhor doutrina, condição indispensável a que se possa considerar alguém como depositário é a formalização de um contrato de depósito nos moldes definidos no Código Civil, art. 1265. E que se tenha firmado ajuste no sentido de que a obrigação precípua de uma das partes seja não a de pagar, por um bem, certo preço em prestações sucessivas, mas de devolvê-lo a quem de direito, ou seja, ao detentor do domínio [...]. Definiu-se o contrato de alienação fiduciária em garantia como a que transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor e o possuidor direito e depositário, com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal [...]. O preceito inserto no inc. LXVII do rol de garantias constitucionais outro sentido não tem

Page 78: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

senão o de situar, com passível de ver a ser preso, o depositário infiel, ou seja, aquele que, à mercê da celebração de contrato, o de depósito, haja recebido um objeto móvel, para guardar, até que a parte contrária, o depositante, reclamasse-o. Exsurge como objeto único nesse ajuste a entrega do bem móvel em depósito e a obrigação de devolvê-lo tão logo o depositante manifeste a vontade de tê-lo de volta. As peculiaridades do negócio jurídico é que respaldam o elemento de coerção drástico que é a possibilidade de o detentor vir a ser preso. Alguém, na titularidade do domínio de um bem, entrega-o, sem aliená-lo, a outrem, que assume, por sua vez, a obrigação não só de preservá-o, como também a principal de proceder à devolução no momento em que instado a assim fazê-lo. (Habeas Corpus, n.º 72.131 – Rio de Janeiro, Diário da Justiça. 01.08.2003).15

Desta maneira, o douto Ministro posiciona-se pela incorreção na equiparação do

fiduciante ao depositário infiel pela distinção nítida entre os institutos. Alega, que no caso

específico da alienação fiduciária em garantia, não se tem contrato de depósito genuíno. O

devedor fiduciante não está na situação jurídica de depositário e credor fiduciário não tem o

direito de exigir dele a entrega do bem.

Não obstante, em outro aresto o eminente Ministro Marco Aurélio, confirmou a

tese já exposta alhures, no Habeas Corpus, nº. 74.383-8 - Minas Gerais, diário da justiça de

27.06.97, assinalou que:

O fato de o Brasil haver subscrito o Pacto de San José da Costa Rica, que todos sabemos, coloca-se no mesmo patamar da legislação ordinária, o que implica dizer que esta, no previa a prisão de certos devedores, ficou revogada, quando passou a ser obrigatório o Pacto no território brasileiro. Para ser mais preciso, restou ab-rogado.

Neste diapasão, das doutas palavras do Ministro Marco Aurélio, que sob seu ponto

de vista, com o advento do Pacto de São José da Costa Rica, não mais é possível, à luz da

legislação infraconstitucional, a prisão do devedor fiduciante, em detrimento a derrogação

desta no que extrapolava a hipótese de prisão civil por inadimplemento de prestação

alimentícia.

Ainda, como corrente dissidente no Supremo Tribunal Federal, encontra-se o voto

do Ministro Carlos Velloso, que assim foi proferido:

Temos, então, na alienação fiduciária em garantia, mais de uma ficção: a ficção que leva à falsa propriedade do credor-fiduciário, a ficção do contrato de depósito, em que o devedor é equiparado ao depositário, certo que o credor tem, apenas, a posse indireta do bem, posse indireta que não possa, também, de outra ficção. E a partir dessa ficção, fica o comprador-devedor, na alienação fiduciária, sujeito à prisão civil. Mas o que deve ficar esclarecido é que a Constituição autoriza a prisão civil apenas do depositário infiel, ou seja, daquele que, recebe do proprietário um certo bem para guardar, se obriga a guardá-lo e a devolvê-lo quando o proprietário pedir a sua devolução (Cód. Civil, arts. 1265 e segs., art. 1287).

15 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 79: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

A constituição, no art. 5º, LXVII, não autoriza a prisão civil de quem não é depositário e, porque não é depositário, na exata compreensão jurídica, não pode autorizar a prisão civil - art. 5º, LXVII – apenas do depositário infiel, vale dizer, daquele que se tornou depositário mediante contrato de depósito, não de devedor que se torna depositário em razão de uma equiparação baseada numa mera ficção legal. Mas, repete-se a prisão civil é autorizada, em caráter excepcional, pela Constituição, art. 5º, LXVII. Ora, a Constituição vigente, reconhecidamente uma Constituição liberal, que estabelece uma série de garantias à liberdade, não tolera, certamente, equiparações com base em ficções, para fim de incluir na autorização constitucional, a prisão. O que deve ser entendido é que a prisão civil somente cabe relativamente ao verdadeiro depositário infiel, não sendo toleradas equiparações que têm por finalidade resolver, com a prisão, uma obrigação civil. (Hábeas Corpus, n.º 76.561-3 – São Paulo, Diário da Justiça de 02.02.01).16

No seu entender, o Ministro Velloso argumenta que o contrato de alienação

fiduciária na realidade nada mais é do que uma ficção jurídica, e desta forma a própria

elevação do devedor fiduciante ao status de depositário não passaria de uma equiparação com

finalidades de resolver obrigação civil. Assim, segue a linha de raciocínio do Ministro Marco

Aurélio, de que não existe um efetivo contrato de depósito no contrato de alienação fiduciária

em garantia nos moldes estampados pela legislação Civilista.

Noutro decompor, o Ministro Sepúlveda Pertence, em voto de excelente

fundamentação observa:

É manifesto que a Constituição excetuou, da proibição de prisão por dívida, a prisão do inadimplente de obrigação alimentar e a do depositário infiel. A extensão dessa norma de exceção, não o contesto, pode sofrer mutações ditadas do legislador ordinário e até por Tratado. (...). Mas, também me parece, ninguém discordará, em tese, de que, ao concretizar os seus termos - isto é, os conceitos de obrigação alimentar ou de depositário infiel - o legislador não pode, mediante ficções ou equiparações, ampliar arbitrariamente o texto constitucional, além da opção constituinte nele traduzida. E esta há de ser aferida à base da Constituição e de suas inspirações. Não, à base da lei. Em outras palavras, a admissibilidade, segundo a Constituição, da prisão por dívida de alimentos e da prisão do depositário infiel não é cheque em branco passado ao legislador ordinário. Assim como não lhe será lícito, até com uma aparente base constitucional no art. 100, autorizar a prisão do governador que atrase a satisfação de débito de natureza alimentar da Fazenda Pública, não creio que possa estender, além da marca que há de ser buscada dentro da própria Constituição, o âmbito conceitual do depósito. O mesmo, a meu ver, sucede, mutatis mutandis, com as normas do Decreto 911/69, que atribuiu ao devedor inadimplente da operação de crédito garanta pela alienação fiduciária as responsabilidades do depositário. (...). Ao que penso - e não vou sequer me arriscar a longas dissertações a respeito - o que há, no Decreto-lei nº 911, é a outorga ao credor, ao financiador, de um direito real, é verdade, mas de um direito de garantia, próximo ao direito de propriedade, na medida em que lhe dá algumas prerrogativas de proprietário, mas que não se identifica com o domínio. Por essas e por outras, minha convicção é velha, portanto, no sentido da inconstitucionalidade da prisão do alienante fiduciário que se pretenda albergar na exceção constitucional da vedação da prisão por dívidas. Mas creio que o problema é constitucional e a interpretação que leva a reduzir a prisão civil como um meio coercitivo de força satisfação de obrigações patrimoniais serve melhor aos princípios fundamentais da constituição.

16 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 80: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Tentei mostrar que o verdadeiro proprietário, embora limitado o seu domínio, como o de todo proprietário que tem sobre uma coisa um direito real de garantia do credor, é o devedor, dito alienante fiduciário. E não concebo depositário de coisa própria. (Habeas Corpus, n.º 72.131 – Rio de Janeiro, Diário da Justiça, 01.08.03).

Por inequívoco, o Ministro considera que o legislador ordinário está a ampliar os

conceitos constitucionalmente de depositário infiel. Por seu turno, entende que o contrato de

alienação fiduciária não estabeleceria uma garantia, mas sim um direito real de propriedade ao

devedor e conclui afirmando que não pode haver depósito de algo que lhe pertence.

Feitas estas explicações deve ponderar que o entendimento do Supremo Tribunal

Federal poderá mudar de acordo com a composição do órgão julgador. Antigamente, a tese

majoritária dividia o Tribunal em 4 (quatro) votos favoráveis e 3 (três) votos contra, o

cabimento da prisão. Atualmente, com a assunção dos novos Ministros no final de 2003

(Ministro Cezar Peluso; Ministro Carlo Britto; Ministro Joaquim Barbosa)17, e com a escolha

do novo ministro para a vaga aberta pela aposentadoria do Ministro Maurício Corrêa, em um

futuro não muito distante esta orientação pode mudar. Destaca-se que até a presente data não

foi possível precisar qual a linha de entendimento que os recém empoçados Ministros

seguirão.

Desta forma, contabilizando os votos dos Ministros que já se posicionaram quanto

ao tema em estudo, encontra-se assim dividida a Suprema Corte Nacional.

Favoráveis a segregação: Ministros - Nélson Jobim; Celso de Mello; Ellen Gracie;

Gilmar Mendes.

Contrários a prisão: Ministros - Marco Aurélio; Sepúlveda Pertence; Carlos

Velloso.

Assim, resta demonstrado que o próprio Supremo Tribunal Federal possui

interpretações divergentes quanto ao cabimento ou não da prisão de devedor fiduciário. Em

um fronte temos os que apóiam a prisão com supedâneo nos ensinamentos doutrinários o Ex-

Ministros Moreira Alves, endentem estes que o depósito existente no contrato de alienação

fiduciário é um depósito necessário, e ainda, que a prisão é em detrimento a resistência do

devedor na devolução do bem e não pelo inadimplemento. Do outro lado, existe a corrente

que alega que no contrato de alienação fiduciária não encontramos um autêntico contrato de

depósito, sendo esta uma mera ficção jurídica para proteger a obrigação civil.

17 Em repostas a correspondência enviada a acessória de comunicação do Supremo Tribunal Federal foi informado que até a presente data - 21 de abril de 2004, os novos Ministros não tiveram a oportunidade de participar do debate ou votação da matéria em estudo. Informou ainda, aquela acessória, que a última votação sobre a prisão do devedor fiduciário ocorreu em julho de 2003, sendo que os egrégios Ministros ascenderam ao Supremo em data posterior.

Page 81: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Nestes termos, passa-se agora para a exposição e análise da interpretação do

Decreto-lei 911/69, sob a hígida do Superior Tribunal de Justiça.

4.2 PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

A despeito da reiterada orientação do Supremo Tribunal Federal pelo cabimento da

prisão civil em casos de inadimplemento nos contrato de alienação fiduciária em garantia, vai-

se firmando no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a prisão civil está agora

reservada apenas às hipóteses de inadimplemento de obrigações alimentares.

Todavia, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que era vacilante no que

tange a esse assunto, admitiu por vezes a prisão, outras tantas afastado-a, sua sedimentação foi

provocada pelas contradições nos acórdãos proferidos por esse Tribunal, ensejando a oposição

de embargos de divergência com vistas a tornar uniformes as decisões sobre tal assunto.

Contudo, naquela Corte Especial, decidiu-se do seguinte modo:

Na linha do entendimento do Supremo Tribunal Federal, intérprete maior do texto constitucional, e sem embargos da força dos argumentos em contrário, a prisão do depositário infiel na alienação fiduciária não vulnera a legislação federal infraconstitucional (Recurso Especial, nº 3.623 - Relator Ministro Bueno de Souza, Diário da Justiça de 29.10.96).

Na ocasião, consoante as notas do julgamento, foi decisivo para a prolação deste

entendimento o voto do Ministro Sálvio de Figueiredo, Relator para o acórdão, adotando, no

entanto, as ressalvas feitas pelo Ministro Bueno de Souza.

Depois, nas próprias Turmas do Tribunal, foi seguida a orientação da Corte, do

cabimento da prisão, como, por exemplo, 18 no Recurso Especial n.º 175.047, diário da justiça

de 30.11.98, que determina:

“ [... ] não há ilegalidade na prisão do devedor, caso não entregue ao credor o bem

alienado fiduciariamente, já é da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme

esses precedentes, por suas ementas”.

A prima facie, após o julgamento do Recurso Especial 7.943, do Rio Grande do

Sul, publicado no diário da justiça de 10.06.91, cuja relatoria foi do Ministro Athos Gusmão

Carneiro, passou o Superior Tribunal de Justiça a decidir de maneira uniforme no sentido de

sopesar inoportuno a incidência da prisão civil advinda do inadimplemento do contrato de

alienação fiduciária em garantia, que assim sentimento:

18 Ainda como neste precedente: Habeas Corpus, n.º 6.504 - São Paulo, Diário da Justiça de 17.2.90.

Page 82: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

A esse propósito, parece-me muito oportuno lembrar que todas as pessoas capazes são, sim, livres de dispor de seu patrimônio e, inclusive, de comprometê-lo em garantia. Mas ninguém e livre de comprometer a sua liberdade física a título de garantia patrimonial. E nisso importaria a extensão da reforçadíssima garantia da alienação fiduciária, que tem a potencialidade, pelo menos, de conduzir à prisão civil, a toda e qualquer espécie de mútuo, como se está a pretender. A lei admite a possibilidade de serem fiduciariamente alienados os bens já antes pertencentes ao devedor, e, portanto não adquiridos com o produto do financiamento. Exclusão, todavia, da cominação de prisão civil, não essencial à natureza mesma da ação de depósito e excluída do permissivo do art. 5º LXVII, da Constituição Federal, que pertine tão-somente aos depósitos clássicos, previstos no Código de Civil, sem possível ampliação que ponham em risco a liberdade dos devedores em geral. Recurso Especial conhecido e provido em parte, com exclusão da cominação de prisão civil.

Em seu voto o ministro faz menção de que os depósitos existentes nos contratos de

alienação fiduciária são depósitos atípicos e que se contrapõem em termo aos depósitos

clássicos da legislação civil. In casu, vislumbra-se que este é o mesmo posicionamento

adotado pela corrente divergente do Supremo Tribunal Federal, qual seja, que o depósito na

alienação fiduciária não é um depósito com fins de guarda, mas caracteriza-se como um

depósito que almeja a segurança de uma obrigação contratual.

Neste mesmo diapasão, temos o voto do Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, que

pontificou:

A Constituição da República enseja a prisão civil, por dívida, em dois casos: inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e do depositário infiel (art. 5º, LXVII). No depósito, a coisa é entregue a terceiro para restituí-la, quando solicitada, a quem de direito. A hipótese não se confunde com o depósito (alienação fiduciária); aqui, constitui cláusula de reforço para honrar obrigação civil. A restituição não é o fim em si mesma. Ao contrário, roteiro para compelir o devedor a efetuar o pagamento. Está superada a quadra histórica que enseja a prisão por dívida civil. (Recurso Especial, n.º 8.483 - Rio Grande do Sul, Diário da Justiça de 22.06.96).

Ainda, no mesmo sentido o corolário do voto do Ministro Waldemar Zveiter:

Não há como se admitir a ameaça de prisão decorrente do texto legal pela eventual inexistência do bem depositado, sabido que a privação da liberdade por causa tal se contrapõe ao princípio constitucional de impossibilidade de prisão por dívida (Recurso Especial, n.º 3.909- Rio Grande do Sul, Diário da Justiça de 29.10.91).

E o voto do Ministro Vicente Leal, no Recurso Especial, n.º 3.552-6 - São Paulo,

diário da justiça de 06.11.95:

Segundo a ordem jurídica estabelecida pela Carta Magna de 1988, somente é admissível prisão civil por dívida nas hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e de depositário infiel (CF. art. 5ª., LXVII). O devedor-fiduciante que descumpre a obrigação pactuada e não entrega a coisa ao credor-fiduciário não se equipara ao depositário infiel, possível de prisão civil, pois o contrato de depósito, disciplinado nos arts. 1.265 a 1.287, do Código Civil, não se equipara, em absoluto, ao contrato de alienação fiduciária. - A regra do art. 1°, do

Page 83: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

DL n. 911/69, que equipara a alienação fiduciária em garantia ao contrato de depósito, perdeu a sua vitalidade jurídica em face da nova ordem constitucional.

De outra banda, mesmo sendo a linha de entendimento do Superior Tribunal de

Justiça, existem Ministros que possuem linha contrária de pensamento como no voto

proferido pelo Ministro Castro Filho, no Recurso Especial em Habeas Corpus, nº 15.431 -

São Paulo, diário da justiça de 09.03.04, que assim firmou:

Tenho expressado o entendimento de que legítimo se faz o

constrangimento imposto, em razão da posição do Supremo Tribunal Federal que,

reiteradamente, tem elucidado haver o Decreto-lei n. 911• 69 sido recepcionado pela

Carta Política atual. Em verdade, se há um "depósito legal", instituído por uma

norma cuja constitucionalidade vem sendo, repetidamente, confirmada pela Corte

Suprema, à qual compete dar a última palavra sobre a constitucionalidade ou não de

lei, a mim não caberia decidir de forma diferente. É como sempre pensei e como

sempre julgava, embora vencido, desde quando membro do egrégio Tribunal de

Justiça do Estado de Goiás. Todavia, não ignoro que a egrégia Corte Especial deste

colendo Superior Tribunal de Justiça já decidiu em sentido diverso ao do Supremo

Tribunal Federal, em acórdãos assim ementados: Por isso, voto pelo não

conhecimento do recurso, em face à sua intempestividade, mas, ressalvando meu

ponto de vista, concedo a ordem de habeas corpus, para afastar a imposição de

prisão em decorrência do débito de que trata este feito, na linha de entendimento

desta colenda Corte.

Desta forma, o Ministro demonstra que concorda com o pensamento traçado pelo

Supremo Tribunal Federal, contudo, em respeito aos precedentes do Superior concede a

ordem de liberação da prisão.

Nestes termos, não há necessidade de alongarmos a análise dos precedentes

emanados do Superior Tribunal de Justiça, crive-se na reiteração das decisões impostas com o

mesmo fundamento legal, que assim pode-se resumir: 1 - O devedor fiduciante não se

equipara integralmente ao depositário da lei civil, tal equiparação tem em mira apenas a plena

garantia do devedor fiduciário; 2 - O contrato de alienação fiduciária é um contrato atípico o

que impossibilita sua equiparação a contrato de depósito típico, contrapondo ao princípio

constitucional de impossibilidade de prisão por dívida.

Assim, restou evidenciado que hoje a posição do Superior Tribunal de Justiça é no

sentido de não admitir a prisão do devedor-fiduciante, por ilegal, divergindo, pois da do

Supremo Tribunal Federal - que tem defendido a pertinência da prisão civil no depósito

genuíno como em seus equiparados.

Page 84: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Agora, destaca-se a análise da interpretação dada por alguns dos Tribunais de

Justiça dos Estados ao cabimento da prisão civil nos contratos de alienação fiduciária em

garanta.

4.3 PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA

Por inequívoco, não se averiguou qualquer subsídio de proeminência dos Tribunais

Estaduais na acepção de inovar as considerações sobre o cabimento da prisão do fiduciante

inadimplente. O que se verificou foi o emprego do posicionamento, ora do Supremo Tribunal

Federal ora do Superior Tribunal de Justiça.

Neste intento, com intuito de não tornar o trabalho prolixo, trazendo teses já

apontadas e estudadas, será destacado o posicionamento de alguns Estados e do Distrito

Federal tão-somente de modo a referendar de que não há novidades em termos de teses

jurídicas nas instâncias ordinárias.

No Estado do Rio Grande do Sul, é clara a adoção da corrente do Superior Tribuna

de Justiça, que prima pelo não cabimento da prisão civil. Por ocasião do julgamento do

Habeas Corpus, n.º 70007758600, 3ª Câmara Cível, Porto Alegre, diário da justiça de

26.02.04, da lavra da Desembargadora Ângela Terezinha de Oliveira Brito, que assim ficou

consignado:

Deve ser definitivamente concedida a ordem, a fim de fazer cessar o constrangimento ilegal a que está sendo submetida a paciente. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido da inadmissibilidade da prisão civil em hipóteses como a presente, em que se trata de depósito atípico, vale dizer, de todo distinto daquele previsto no Código Civil, no qual o elemento essencial é a obrigação do depositário à guarda e zelo da coisa depositada e cujo corolário é a imediata restituição de dita coisa ao depositante quando este a exija. Aqui, ao contrário, trata-se de operação de crédito, cujo elemento essencial é a obrigação do devedor de satisfazer o pagamento das parcelas devidas. A instituição da alienação fiduciária nada mais é do que garantia de pagamento da dívida, de sorte que, embora convertida a conseqüente ação de busca e apreensão em ação de depósito, não dá ensejo à medida extrema do decreto de prisão. Isso porque, na origem, o que se discute é dívida civil diversa daquelas que autorizam, na forma da Constituição Federal, a prisão do devedor, ou seja, o débito de alimentos e o depósito típico, ou próprio, previsto no Código Civil. Resta, apenas, ressaltar que esta Câmara tem posição pacificada a esse respeito, que deve, mais uma vez, ser adotada.

Já o Estado do Rio de Janeiro, também é fiel a corrente doutrinária do Superior

Tribunal de Justiça, como se pode constatar no acórdão colacionado a seguir.

Inicialmente, quero fixar em palavras sintéticas as linhas se meu pensamento sobre o assunto. O alienante fiduciário não é depositário no sentido técnico jurídico do termo, e pouco importa que a lei ordinária lhe tenha atribuído essa qualidade. Ao

Page 85: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

legislador comum não é dado modificar o texto constitucional, individuais outorgadas pela Lei Máxima e atribuir a determinados credores o privilégio de levar em seus devedores à prisão. O tomador de um empréstimo de dinheiro vinculado à compra de um bem não é depositário no sentido técnico-jurídico do termo. A Lei ordinária não tem o dom de transformar em depósito uma relação jurídica que não o seja, forcejando os conceitos jurídicos, para burlar garantias constitucionais, e possibilitar às empresas financeiras obterem a prisão dos seus devedores inadimplentes. Concordaria se o texto do art. 66 fosse uma emenda à Constituição. Nada mais legítimo que uma constituição ser modificada por outra norma constitucional. Porém, não poderá sê-lo por uma lei ordinária, pois o mínimo atributo de validade de uma lei ordinária é ser conforme a Constituição. (Apelação Cível, n.º 3.429-87, Rio de Janeiro, Desembargador Paulo Roberto de Freitas, Diário da Justiça de 03.02.90).

O Tribunal de Justiça o Estado de São Paulo demonstrou inicialmente tendência no

sentido de admitir a prisão civil do devedor do contrato de alienação fiduciária em garantia. O

segundo tribunal de alçada paulista, por meio de uma de suas câmaras prolatou o seguinte

julgamento:

Promulgada a Carta Magna atual, de longa data já se conhecia a redação da legislação infra-constitucional em que foi assinalada a figura do depositário infiel decorrente da conversão de busca e apreensão, originária de alienação fiduciária, em ação de depósito. Inexistindo ressalva no Texto Maior e ausentes modificações na legislação ordinária, calha a admissibilidade da cominação de prisão civil ao depositário infiel nos casos de alienação fiduciária. (Apelação Cível n.º 479.095 - São Paulo, Desembargador Radislau Lamotta, Diário da Justiça de 02.04.97).

De outra banda, observa-se o aresto do Desembargador Gama Pellegrino, na

Apelação Cível, n.º 479910-01, de São Paulo, diário da justiça de 16.08.98, que afasta o

cabimento da prisão civil, por não haver a equiparação do depositário do bem ao devedor

fiduciante, nestes termos:

Se o devedor-fiduciário descumpre a obrigação pactuada e não entrega a coisa ao credor-fiduciante, não pode ser equiparado ao depositário infiel, posto que o contrato de depósito disciplinado nos arts. 1265 a 1287 do Código Civil, não se equipara, absolutamente, ao contrato de alienação fiduciária. Ademais, o § 2º, do art. 5º, da CF, dispõe que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos por princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais que o país seja parte. Ocorre que, pelo ordenamento constitucional, texto do pacto internacional sobre direitos civis e políticos, que em seu art. 11, veda taxativamente a prisão civil por descumprimento de obrigação contratual. Por estas razões, dá-se provimento parcial ao recurso, unicamente para excluir a ameaça de prisão civil do devedor fiduciário. 19

Chega-se ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, que sempre

coadunou com a incidência da cominação da prisão civil à inadimplemento do fiduciante,

defendendo a tese adotada pelo Supremo Tribunal Federal, como se destaca no acórdão nº

19 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 86: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

2003.00.2004420-4, relatoria do Desembargador Mário Machado, Diário da Justiça de

09.02.04, que assim foi proferido.

Quanto ao cabimento da constrição, a posição predominante no Supremo

Tribunal Federal, objeto de reiterados julgados, é no sentido de ser constitucional a

prisão do devedor alienante que não entrega o bem alienado fiduciariamente. Segundo

a Corte Suprema, que dá a palavra final em tema constitucional, o Pacto de São José

da Costa Rica não se pode contrapor à permissão do art. 5º, LXVII, da Constituição

Federal, e não derrogou, por ser norma infraconstitucional geral, as normas

infraconstitucionais especiais sobre prisão civil do depositário infiel (HC 72.131-RJ –

Pleno – Rel. Min. Moreira Alves). Essa posição é, por igual, a predominante neste

Tribunal, encontrando-se sumulada: “é cabível a prisão civil de devedor que não

efetua a entrega do bem alienado fiduciariamente” (Súmula nº 9). Acresça-se que

não colhe a alegada prescrição da dívida, de acordo com o artigo 206, § 5º, I, do

vigente Código Civil, que reduziu o prazo de vinte para cinco anos. Primeiro, não se

cuida de cobrança de dívida, mas de decreto de prisão civil, conseqüência de sentença

transitada em julgado, por descumprimento do dever de depositário fiel. 20

Ainda no que se refere ao entendimento Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios é na mesma esteira do acórdão citado alhures, cola-se do o aresto n.º

2001.07.1006897-6, do eminente Desembargador Mário-Zam Belmiro, diário da justiça de

16.02.2004.

No mais, não vejo como demover a r. sentença

vergastada, já que, na esteira do posicionamento

que tenho firmado acerca do tema em debate, em

consonância com a jurisprudência prevalente no

egrégio TJDFT, acompanhando a linha definida

pela Suprema Corte, é constitucional a norma

(Decreto-Lei nº 911/69) que estabelece a cominação

de prisão ao devedor fiduciário que, instado para

tanto, deixa, no prazo legal, de entregar o bem que

lhe fora confiado ou pagar o equivalente em

dinheiro. A propósito, já pude proclamar:

“Conforme iterativa juris prudência do colendo

20 Nesta jurisprudência está utilizando-se de artigos do Código Civil de 1916, referentes ao depósito.

Page 87: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Supremo Tribunal Federal e deste egrégio Tribunal

de Justiça, o Decreto-lei nº 911/69 não colide com a

Constituição Federal de 1988. Firmado contrato de

financiamento, com cláusula de alienação fiduciária

em garantia, comprovada a mora e não encontrado

o bem na posse da parte devedora, configurado está

o depósito infiel, de sorte que, se não efetua a

entrega do veículo ou seu equivalente em dinheiro,

possível é a decretação de sua prisão civil” (APC

48668, Reg. Acórdão 142.282, Diário da Justiça de

12/09/2001). Neste passo, reproduzo aos eminentes

pares ementa de julgado do excelso Supremo

Tribunal Federal que bem espelha a dicção ora

proclamada: No mesmo sentido, esta egrégia Corte

de Justiça, sedimentando orientação reiterada em

seus diversos órgãos fracionários, editou a Súmula

nº 09, que estabelece: “É cabível a prisão de

devedor que não efetua a entrega do bem alienado

fiduciariamente”. (Apelação Cível, n.º 4951-3,

Acórdão 178.978, 3a Turma Cível, Desembargador

Lécio Resende, Diário da Justiça de 08.10.2003).

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios chegou a uniformizar seu

posicionamento, por meio da Súmula 09, que estabelece:

“É cabível a prisão civil de devedor que não efetua a entrega do bem alienado

fiduciariamente”.

Ao fim, destaca-se a posição do Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Assim, como alguns outros tribunais o Tribunal de Justiça de Santa Catarina,

iniciou seu posicionamento pelo cabimento da segregação civil, como se pode sopesar no

Habeas Corpus nº 12.755, aresto da lavra do Desembargador Amaral e Silva, Diário da

Justiça de 05.03.96, que assim ficou gravado nos anais do Tribunal.

O Supremo Tribunal Federal já proclamou que o

Decreto-lei n. 911/69, que disciplina a alienação

Page 88: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

fiduciária em garantia de financiamento concedido

por instituição financeira, foi recepcionado pela

Carta Magna de 1988. Pela alienação fiduciária o

devedor transfere ao credor o domínio resolúvel do

bem, do qual, por força legal e contratual, torna-se

depositário, com todas as responsabilidades

inerentes ao depósito civil. Note-se que o art. 66, da

Lei nº 4.728/65 desde logo estabelece um depósito

legal do bem em mãos do devedor, que também por

direito se responsabiliza pelos encargos que lhe

incumbem, como depositário, nos termos das leis

civis. Afora isso, os contratos de financiamento com

alienação fiduciária, assumindo uma feição mista,

como em Direito Privado é cediço, trazem cláusula

específica quanto ao depósito do bem

fiduciariamente alienado, em mãos do devedor.

Dessa sorte, o depósito, além de legal, também se

torna contratual, voluntário. E o financiado assume,

além da condição de devedor, também a de

depositário do bem que alienou ao financiador. Em

conseqüência do depósito legal e geralmente

também contratual, fica o devedor-fiduciante sujeito

às disposições dos arts. 1.265 a 1.287, do Código

Civil, entre as quais as dos arts. 1.266 e 1.287, que

lhe impõem os seguintes ônus: “Art. 1.266. O

depositário é obrigado a ter na guarda e

conservação da coisa depositada o cuidado e

diligência que costuma com o que lhe pertence, bem

como a restituí-la, com todos os frutos acrescidos,

quando lho exija o depositário”. “Art. 1.287. Seja

voluntário ou necessário o depósito, o depositário,

que o não restituir, quando exigido, será compelido

a fazê-lo, mediante prisão não excedente a 1 (um)

ano, e a ressarcir os prejuízos (art. 1.273).” A

Page 89: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

prisão civil do depositário infiel também vem

cominada nos arts. 902, § 1º, e 904, parágrafo

único, do Código de Processo Civil: “Art. 90 2, § 1º.

Do pedido poderá constar, ainda, a cominação da

pena de prisão até um (1) ano, que o juiz decretará

na forma do art. 904, parágrafo único.” “Art. 904.

Julgada procedente a ação, ordenará o juiz a

expedição de mandado para a entrega, em vinte e

quatro (24) horas, da coisa ou do equivalente em

dinheiro. “Parágrafo único. Não sendo cumprido o

mandado, o juiz decretará a prisão do depositário

infiel”. Cessa, a prisão, com a entrega da coisa ou

do equivalente em dinheiro, independentemente do

valor da dívida. Disso tudo resulta a possibilidade

de conversão da ação de busca e apreensão em ação

de depósito, nos termos do art. 4º, do Decreto-lei nº

911/69, quando o bem não é encontrado em mãos do

devedor-depositário. E, ao final, se o depositário

não cumprir sua obrigação, tornar-se-á passível de

sofrer a prisão civil constitucionalmente autorizada.

Por outro lado, vê-se que o atual posicionamento que impera, de forma pacífica, é

o que não comporta a prisão civil ao devedor do contrato de alienação fiduciária.

Toma-se como exemplo, o voto proferido pelo Desembargador Trindade dos

Santos, na Apelação Cível n.º 2003.015389-6, Diário da Justiça de 11.09.03, que assim

preleciona:

A prisão civil, medida essencialmente coercitiva, é restrita, nos moldes da

nossa Magna Carta, às hipóteses de inadimplemento voluntário e inescusável de

obrigação alimentícia e de infidelidade depositaria. Como implicação lógica,

descabida afigura-se a prisão civil do devedor que descumpre contrato gravado com

alienação fiduciária em garantia, ao argumento de que, em tais contratos e por força

do disposto no DL n. 911/69, o devedor e alienante assume a condição de depositário

fiel do bem, assumindo, em decorrência, todos os percalços desse encargo.

Entendimento oposto, ou seja, a admissibilidade da prisão do devedor, em hipóteses

Page 90: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

tais, nada mais estaria a expressar do que uma mera e ilegal prisão civil por dívida. E

o nosso Texto Magno é incisivo ao dispor, em seu art. 5º, inciso LXVII: “Não haverá

prisão civil por dívida (...).” Depositário infiel, para os efeitos de sujeição à pena de

prisão civil, é, apenas, aquele enquadrado nos parâmetros do art. 1.287 do Código

Civil, em face das condições características do contrato de depósito, às quais não

podem ser igualadas, sequer por ficção legal, aquele decorrente de contrato de

alienação fiduciária em garantia, de forma a autorizar a decretação da prisão civil do

alienante inadimplente, com o desiderato exclusivo de compeli-lo a cumprir os termos

da avença firmada. Os pactos de financiamento com garantia de alienação fiduciária

representam, inegavelmente, dívida no sentido estrito, não uma entrega, em depósito,

de bem alheio, pelo que a prisão civil, em função desses ajustes, resulta em

inequívoca ilegalidade, antagonizando-se com todos os princípios que informam as

normas gerais de direito acerca do contrato de depósito. Destarte, inexistindo, na

espécie, a figura do depositário, a extinção do feito sem julgamento do mérito é

medida inquestionavelmente necessária, por ausência de uma das condições da ação,

qual seja, o interesse processual.

Desta forma, procurou-se delinear, em rápidas pinceladas, como a jurisprudência

pátria vem conduzindo o tema, da prisão do devedor nos contratos de alienação fiduciária. E

em conclusão, pode-se destacar que a teoria que prevalece hoje nos tribunais pátrios é a

seguida pelo Superior Tribunal de Justiça, do não cabimento da segregação do devedor

fiduciário, em detrimento a tese pacificada no Supremo Tribunal Federal, da legalidade da

prisão, que é seguida, exclusivamente, no âmbito dos Estados pelo Tribunal de Justiça do

Distrito Federal e Territórios.

Page 91: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste comenos, procurar-se-á sintetizar as principais contribuições teóricas que possibilitaram a compreensão das argumentações utilizadas pelos que advogam o cabimento da prisão civil nos contratos com cláusula de alienação fiduciária, bem como na percepção das teses levantadas pelos que se dizem contrários à segregação em estudo. Ainda, apresenta-se a análise dos objetivos propostos no início do estudo, à luz da problemática formulada.

De tudo que foi abordado extrai-se inicialmente, a grande importância que o instituto da alienação fiduciária teve frente à população por facilitar a obtenção de crédito, aumentando assim, o seu poder aquisitivo, bem como, foi de suma importância para a indústria brasileira por possibilitar seu desenvolvimento em uma época de franca recessão econômica. Ainda, que o instituto da alienação fiduciária em garantia, que hoje se encontra enraizado na cultura jurídica nacional, tem como fonte primitiva os institutos romanos do pactum fiduciae que era compreendido por três modalidades distintas: a fidúcia cum amico, fiducia remancipationis causa e a fiducia cum creditore. Não obstante, constatou-se que a fidúcia foi largamente utilizada a partir da Idade Média, na Inglaterra, com a denominação de trust receipt, sendo este, o instituto mais próximo da alienação fiduciária em garantia existente no Brasil.

Pode-se observar, que o instituto da alienação fiduciária em garantia, foi inserido no contexto nacional através da Lei n.º 4.728 de 1965, contudo, freqüentes dúvidas na aplicação do instituto da alienação fiduciária e as enormes ambigüidades técnicas, determinaram sua retificação pelo Decreto-lei 911/69, no qual foram dadas novas redações às disposições legais e, ainda, introduziram-se regras de natureza processual. Salientou-se que, ao instituir esta garantia o legislador determinou, dentre outras especificidades, que somente as sociedades financeiras e de crédito, devidamente autorizadas pelo Banco Central, seriam legítimas a figurar no pólo dos contratos de alienação fiduciária como credor-fiduciário.

Em relação aos objetos que podem ser alienados fiduciariamente, encontrou-se uma séria divergência entre a doutrina e a jurisprudência, alguns doutrinadores afirmam ser inviável a utilização de bens fungíveis nos contratos fiduciários, contudo, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se pela admissibilidade da coisa fungível ser objeto de alienação fiduciária em garantia. Já, em relação à forma, os contratos de alienação fiduciária, por expressa determinação legal, devem ser efetuados por instrumento escrito, particular ou público, devendo ainda, ser registrados no Cartório de Títulos e Documentos, para que, deste modo, tenha efeito erga omnes. E, em sendo constatada a ocorrência do inadimplemento contratual do devedor, o credor, poderá utilizar-se dos procedimentos da busca e apreensão, da ação de depósito ou ainda, poderá buscar seu crédito diretamente do patrimônio do devedor pela ação executiva.

No mais, em relação ao instituto do depósito foi observado que a finalidade última deste é a guarda do objeto. E com a entrega da coisa o depositário fica obrigado a devolver ao depositante o bem, quando este o reclamar. Ainda sobre o depósito, que este somente se

Page 92: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

aperfeiçoa com a efetiva tradição do bem ao depositário, por isto entende-se que o pacto de depósito tem natureza real. Ressalta-se, neste passo, que o depósito pode ser voluntário, quanto determinado pelas próprias partes, ou obrigatório, por força de norma legal, tendo como pressuposto básico a possibilidade de prisão civil do depositário que descumpre a obrigação assumida de guarda e restituição do bem que lhe foi confiado.

Em relação à prisão civil, observa-se que esta não tem natureza de repressão a um ilícito, mas tão-somente como um meio de forçar o devedor a adimplir o seu compromisso. Em outras palavras, a prisão civil instituída pelo legislador não possui caráter de punição, mas se constituiu numa medida criada, a fim de compelir o depositário a devolver o bem que lhe foi confiado.

Quanto aos principais argumentos utilizados pelos defensores da prisão civil na alienação fiduciária em garantia cingem-se, inicialmente, sob a alegação de constitucionalidade do Decreto-lei 911/69, que inseriu no ordenamento a prisão do devedor-fiduciante. Mesmo sendo esta editada em pleno regime militar, não a torna, só por isso, inconstitucional. Para haver a inconstitucionalidade de um dispositivo legal deve ser, acima de tudo, vinculada à existência de afronta ou à não receptividade da mesma pela CRFB/88. Ainda, não se pode utilizar como argumento para a inconstitucionalidade de referido dispositivo de lei a incompatibilidade com os princípios da igualdade, ampla defesa e do devido processo legal, norteadores da atual Constituição, por ser possível o legislador ordinário estabelecer tratamento diferenciado para matérias diversas. Desta forma, quando o Decreto-lei 911/69 determina em numerus clausus as alegações permitidas na defesa do devedor-fiduciante, pelo inadimplemento contratual, ou mesmo ao permitir o deferimento da liminar de busca e apreensão do bem, sem a instauração do contraditório, não está infringindo os princípios constitucionais, destacados anteriormente. Em relação a liminar de busca e apreensão, o dispositivo legal apenas relega a observação do contraditório a um instante posterior do procedimento, após a efetivação do busca do bem objeto da alienação. Já em relação à delimitação da matéria de defesa pelo Decreto-lei, este apenas está fixando o âmbito da contestação em harmonia com a matéria em discussão, o que é largamente utilizado no ordenamento jurídico.

Neste passo, outro argumento justificador da prisão civil nos contratos fiduciários é a sua expressa imposição legal. O Decreto-lei 911/69 equipara o devedor-fiduciante ao depositário legal, impondo-lhe os encargos e responsabilidades inerentes ao exercício dessa função. Tendo como escopo que o devedor não sonegue, o objeto do depósito, ou não disponha fraudulentamente do bem alienado, cuja posse lhe foi assegurada em razão da estrutura jurídica da alienação fiduciária em garantia. Assim, a cláusula de alienação fiduciária em garantia é constituída por uma modalidade de depósito legal, decorrente da própria natureza do instituto e que se opera independentemente da vontade das partes. O Decreto-lei em estudo criou a obrigação legal de o devedor-fiduciante, desempenhar o papel de depositário legal do bem financiado.

Por outro lado, os argumentos empregados pelos opositores da prisão civil levam

em conta, dentre outros argumentos, que a CRFB/88 dispõe que não haverá prisão civil por

dívidas, salvo o caso de depositário infiel, e está se referindo àquele depósito genuíno

celebrado intuito persona, devidamente conceituado no Código Civil, único diploma legal a

dispor sobre o instituto do depósito, e não ao devedor-fiduciante, que é simplesmente

equiparado a depositário infiel do diploma civil. Este raciocínio abstrai-se pela seguinte razão,

o atual dispositivo constitucional que trata da prisão civil, foi promulgado sem a expressão ‘na

‘forma da lei’, constante do art. 153, § 17, da Constituição de 1967, desta modo,

Page 93: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

anteriormente mostrava-se possível ao legislador ordinário, por delegação expressa do próprio

constituinte, criar hipóteses outras de depósito por equiparação ou ficção jurídica, não

havendo maiores discussões a este respeito, exatamente por que a expressão, ‘na forma da

lei’, constava do texto constitucional. Contud o, com a promulgação da CRFB/88, a situação

mudou em vista da supressão da expressão ‘na forma da lei’, limitado -se a exceção, no caso

do depósito infiel, aos de depósito genuínos, e não a estendendo às hipóteses de depósito por

equiparação. Assim, com a promulgação da atual Constituição, que retirou do legislador

ordinário o poder de legislar sobre a prisão civil, a equiparação por ficção jurídica do

devedor-fiduciante ao depositário infiel não restou recepcionada pela nova ordem

constitucional. O art. 5º, inciso LXVII, da CRFB/88, só permite a prisão no caso do

depositário infiel, em se tratando de depósito genuíno, voluntário ou necessário, ou aqueles

decorrentes de ordem judicial.

Tem-se ainda a ilegalidade da prisão civil do devedor fiduciante pela desvirtuação,

do instituto de depósito quando utilizado nos contratos com cláusula de alienação fiduciária.

Nesta exegese, para uma melhor compreensão deste argumento é necessário vislumbrar e

confrontar a finalidade última destes institutos: o depósito tem por fim precípuo a guarda do

bem entregue, já a alienação fiduciária visa justamente garantir o pagamento de um débito.

Assim, o devedor-fiduciante não pode ser caracterizado como sendo um depositário, pois não

recebe a coisa para guardar, mas com o intuito de se tornar proprietário desta e muito menos o

credor-fiduciário entrega o bem com interesse que o devedor o guarde, na realidade a

alienação fiduciária destina-se a oferecer maior segurança às operações de crédito e não à

guarda dos bens alienados, em sendo assim, claro está o desvio de finalidade do depósito nos

contratos fiduciários.

A derradeira argumentação encontra-se pautada na inserta da Convenção

Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Do momento em

ingressou no direito interno, em conformidade com o § 2º do art. 5º, da CRFB/88, passou a ter

status de norma constitucional. Deste modo, com a integração da Convenção Americana de

Direitos Humanos, que em seu art. 7, item 7, proíbe a prisão civil por dívidas, restringida está

a prisão civil a hipótese do inadimplemento de obrigação alimentar por encontrar-se

parcialmente revogado o art. 5º, inciso LXVII, da CRFB/88. Por outro lado, tomando em

conta o raciocínio do Supremo Tribunal Federal, de que os tratados internacionais fazem parte

do conjunto legislativo ordinário, ainda assim, a Convenção Americana de Direitos Humanos,

incidiria limitando a prisão civil por depósito infiel no âmbito de lei ordinária. Neste norte, a

Convenção Americana de Direitos Humanos, foi ratificada posteriormente a edição do Código

Page 94: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Civil e de Processo Civil, não há que se concluir por outra forma senão a de que, o tratado

internacional em estudo, sendo lei ordinária de natureza geral, revogou os dispositivos, dos

diplomas citados, pelo princípio lex posterior derogat priori. A Convenção Americana de

Direitos Humanos ao revogar os dispositivos concernentes a prisão civil no Código Civil e no

Código de Processo Civil, restou por retirar o suporte legal do Decreto-lei 911/69, tendo em

vista que referido Decreto-lei utilizava-se dos dispositivos revogados como sustentáculo legal

para a decretação da prisão civil.

Frente a tudo que foi explanado à luz da doutrina e da jurisprudência, o acadêmico

considera s.m.j, no pertine o objetivo central do presente estudo pelo não cabimento da prisão

civil por depósito infiel do devedor fiduciante. Frente às teses apontadas até aqui, tem-se que

a mais correta é a que pondera pela desvirtuação do instituto do depósito em detrimento a

alienação fiduciária em garantia. Neste diapasão, antes de enfocar as argumentações que

norteiam o entendimento do acadêmico, imperativo se faz ponderar sobre as demais teses

levantadas.

E com todas as vênias, ousa-se discordar do posicionamento adotado quando se

afirma que a CRFB/88 dispõe que não haverá prisão civil por dívidas, salvo os casos de

depósito infiel, referidos no Código Civil e no de Processo Civil, isto em vista da retirada da

expressão ‘na forma da lei’, da atual Constituição, que assim restringiu o poder de legislar

sobre a prisão civil. A presente argumentação parte de duas premissas, inicialmente que com

o advento da nova constituição sem a expressão ‘na forma da lei’, o conceito de depósito

infiel deveria ser restrito as modalidades do depósito genuíno contidas no Código Civil e de

Processo Civil; a segunda cinge-se que as equiparações legais ao conceito de depositário infiel

não foram recepcionadas pela nova ordem constitucional.

Contudo, ao analisar estas ponderações insurge a seguinte indagação:

Por não estar mais disposto que o

depósito infiel dar-se-ia ‘na forma da lei’, a

constituição que outrora entrava em vigor também

não teria revogado o próprio Código Civil e o

Código de Processo Civil, no que pertine a pena de

prisão civil?

Deste modo, se este posicionamento fosse

levado à risca não haveria mais no ordenamento

jurídico a possibilidade de qualquer tipo de prisão

civil estribada no depósito infiel. Porque da mesma

Page 95: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

forma que a CRFB/88, ao retirar o termo ‘na forma

da lei’, impossibilitou a recepção do Decreto-lei em

estudo, tornaria revogados os dispositivos existentes

nos Código Civil e de Processo Civil, o que se

mostraria por demais preciosismo. Assim, tenha-se

que a retirada do termo ‘na forma da lei’, não pode

suspender ou mesmo impedir a utilização de

instituto que já está consagrado no ordenamento,

deste os tempos das Ordenações Portuguesas.

Ressalta-se, que o legislador constituinte não

inseriria um dispositivo na constituição que não

pudesse ser utilizado, pois com esta tese o instituto

da prisão civil por depósito infiel cairia no desuso,

frente a falta de regulamentação do legiferante

ordinário.

De outra banda, em relação à inserção no ordenamento jurídico da Convenção

Americana de Direitos Humanos, mais uma vez, ousa-se discordar dos argumentos

colacionados no presente estudo. In casu, os defensores desta tese pontificam que com a

entrada no sistema legal deste tratado, a prisão civil estaria limitada ao caso do

inadimplemento inescusável de pensão alimentícia em vista do disposto que em seu art. 7º,

item 7, do tratado que proíbe a prisão civil por dívidas. Neste afã, partindo do entendimento

majoritário do Supremo Tribunal Federal que, por mais de uma vez, externou o entendimento

no sentido de que os tratados internacionais aderem no direito positivo em nível de legislação

infraconstitucional, como leis ordinárias. E o fez, há de se reconhecer, com sólida

fundamentação, argumentando que a CRFB/88 no seu art. 105, inciso III, submeteu à

competência do Superior Tribunal de Justiça, julgar, mediante recurso especial, decisões que

contrariem tratado ou lei federal, ou mesmo pelo disposto no art. 102, inciso III, ‘b’, em que

se determina que só alcança o Supremo se questionada a constitucionalidade do tratado.

Assim, a própria Constituição teria equiparado os tratados à lei federal. Partindo desses

conceitos, é totalmente insubsistente a presente tese, tendo em mente que a CRFB/88, lei

maior do ordenamento jurídico, em seu artigo 5º, inciso LXVII, esculpiu a possibilidade da

existência da prisão civil por depósito infiel, neste compasso, havendo uma determinação

expressa, permitindo esta modalidade de segregação, não se poderá ter como válida norma

hierarquicamente inferior e contrária a este permissivo constitucional. Ora, a Convenção

Page 96: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

Americana de Direitos Humanos, por tratar-se de norma infraconstitucional, não pode se

contrapor à permissão expressa do art. 5º, inciso LXVII da CRFB/88, que permite à prisão

civil do depositário infiel. Assim, sob este foco, pondera-se que o art. 7º, item 7, da

Convenção, face aos termos da CRFB/88, padece do vício de inconstitucionalidade.

Entretanto, mesmo refutando as teses anteriores, é necessário reafirmar, que o

acadêmico tem como entendimento o não cabimento da prisão civil por depósito infiel nos

contratos com cláusula de alienação fiduciária em garantia, segundo a presente vertente. O

devedor fiduciário nunca será um depositário (na concepção genuína do depósito). Ele não

recebe a coisa da mão do depositante, para guardá-la e conservá-la até que o depositante a

reclame. Em realidade o fiduciante a adquire de um financiamento. E o credor-fiduciário,

supostamente depositante, tampouco entrega a coisa para este fim, reclamando-a quando não

lhe interessar a custódia alheia. Sequer poderá o credor pedir que a coisa lhe seja devolvida a

qualquer momento (como no caso do depósito tradicional). Para que ele peça a restituição

daquilo, que na verdade ele nunca entregou, é necessário haver a mora do devedor, suposto

depositário. Por outro lado, o verdadeiro depositário guarda a coisa alheia, sendo este o

escopo primordial do depósito, não havendo possibilidade de que o depositário dela se

apodere. Na alienação fiduciária, a rigor, acontece o contrário. O fictício depositário torna-se

proprietário do bem, ainda que através de propriedade resolúvel, e adquire a propriedade

plena, bastando, para tanto, adimplir ao contrato de financiamento. O escopo do contrato aqui

não é a guarda de bem alheio, mas a garantia da dívida.

Finalizando estas considerações e imbuído na importância da alienação fiduciária em garantia para a economia nacional, bem como tendo em relevância a entrada em vigor do Código Civil de 2003, propõe-se o desenvolvimento de novos estudos que possibilitem medir a influência do Código Civil em vigor e o instituto da Alienação Fiduciária.

Page 97: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

1.8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. 14 ed. rev. Pelo

Embaixador Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva. São Paulo: Saraiva, 2000.

ATALIBA, Geraldo. O Decreto-lei na Constituição de 1967. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1967.

ALBUQUERQUE, J. B. Torres de. Da alienação fiduciária de bens móveis e

imóveis. São Paulo: Albuquerque Editores Associados, 1998.

ALVES, José Carlos Moreira. Da alienação fiduciária em garantia. 3ª ed. São

Paulo: Forense, 1987.

ALVES, Vilson Rodrigues. Alienação fiduciária em garantia: Ação de busca e

apreensão: A impossibilidade de prisão civil do devedor. São Paulo: Millennium,

1998.

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Prisão civil por dívida. 2ª ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2000.

BATALHA, Wilson de Souza Campos. Comentários à Lei de Registros Públicos. 2ª

ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 21ª ed. São Paulo: Saraiva,

2000.

Page 98: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

BECK, Luiz Augusto. Alienação fiduciária em garantia. Rio de Janeiro: Forense,

1990.

BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro:

Forense, 1987.

______. Direito das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, 1977.

BUSSADA, Wilson. Alienação fiduciária em garantia: Interpretação pelos tribunais.

São Paulo: Jurídica Brasileira, 2000.

BRASIL. Constituição da República Federal do Brasil (1988), Organização dos

textos, notas remissivas e índices por Nylson Pain de Abreu Filho. 4ª ed. Porto Alegre: Verbo

Jurídico, 2004.

BRASIL. Código Civil, Organização dos textos, notas remissivas e índices por

Nylson Pain de Abreu Filho. 4ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2004.

BRASIL. Código de Processo Civil, Organização dos textos, notas remissivas e

índices por Nylson Pain de Abreu Filho. 3ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003.

BRASIL. Lei nº 3.071, de 01 de janeiro de 1916, Instituiu o Código Civil de 1916.

Organização dos textos, notas remissivas e índices por Nylson Pain de Abreu Filho. 3ª ed.

Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003.

BRASIL. Decreto-lei nº 911, de 01 de outubro de 1969. Altera a redação do art. 66,

da Lei 4.728, de julho de 1965. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Nylson

Pain de Abreu Filho. 3ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003.

BRASIL. Lei 4.728, de 14 de julho de 1965. Dispõe sobre os Registros Públicos, e dá

outras providências. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Nylson Pain de

Abreu Filho. 3ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003.

Page 99: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

BRASIL. Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977. Regula os casos de dissolução da

sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá outras

providências. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Nylson Pain de Abreu

Filho. 3ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n.º 72. A comprovação da mora é

imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 26 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n.º 92. A terceiro de boa-fé não é

oponível a alienação fiduciária não anotada no Certificado de Registro do veículo automotor.

Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 26 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 19.299, Relator

Ministro Eduardo Ribeiro, Diário da Justiça de 11.03.92. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 22 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 11.697, Relator Ministro

Eduardo Ribeiro, Diário da Justiça de 16.12.91. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 02 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 12548-95, Relator

Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Diário da Justiça de 17.10.94. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 02 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 157.688, Relator

Ministro Cesar Asfor Rocha, Diário da Justiça de 29.3.99. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 02 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 3.623, Relator Ministro

Bueno de Souza, Diário da Justiça de 29.10.96. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 20 de abr. 2004.

Page 100: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 175.047, Relator

Ministro Athos Gusmão Carneiro, Diário da Justiça de 10.06.91. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 20 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 7.943, Relator Ministro

Bueno de Souza, Diário da Justiça de 30.11.98. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 20 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 8.483, Relator Ministro

Luiz Vicente Cernicchiaro, Diário da Justiça de 22.06.96. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 20 de abr. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 3.909, Relator Ministro

Waldemar Zveiter, Diário da Justiça de 29.10.91. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 29 de mar. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 3.552-6, Relator Ministro

Vicente Leal, Diário da Justiça de 06.11.95. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 29 de mar. 2004.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 15.431, Relator Ministro

Castro Filho, Diário da Justiça de 09.03.04. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/SCON/index.jsp>. Acesso em: 29 de mar. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n.º 489. A compra e venda de

automóvel não prevalece contra terceiros de boa-fé, se o contrato não foi transcrito no

Registro de Títulos e Documentos. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26

de abr. 2004.

Page 101: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n.º 141.320. Relator

Ministro Octávio Gallotti, Diário da Justiça de 14.06.96. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 10 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 59.643-6. Relator Ministro

Firmino Paz, Diário da Justiça de 02.03.82. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 10 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 71.038-7. Relator Ministro

Celso de Mello, Diário da Justiça de 15.03.94. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 10 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 71.286-0. Relator Ministro

Francisco Rezek, Diário da Justiça de 04.08.95. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 10 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 293.378. Relator Ministro

Moreira Alves, Diário da Justiça de 10.08.01. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 10 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 72.131. Relator do Ministro

Moreira Alves, Diário da Justiça de 01.08.03. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 72.131. Voto do Ministro

Maurício Corrêa, Diário da Justiça de 01.08.03. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 72.131. Voto do Ministro

Ilmar Galvão, Diário da Justiça de 01.08.03. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 72.131. Voto do Ministro

Marco Aurélio, Diário da Justiça de 01.08.03. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

Page 102: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 72.131. Voto do Ministro

Sepúlveda Pertence, Diário da Justiça de 01.08.03. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 76.561-3. Relator do

Ministro Sydney Sanches, Diário da Justiça de 02.02.01. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 24.997. Relator do Ministro

Celso de Mello, Diário da Justiça de 20.06.94. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 74.383. Relator do Ministro

Marco Aurélio, Diário da Justiça de 27.06.97. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 76.561-3. Relator do

Ministro Carlos Velloso, Diário da Justiça de 02.02.01. Disponível em:

<http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/jurisp.asp>. Acesso em: 25 de abr. 2004.

CAVALCANTI, Cláudia Parente. Prisão Civil - Evolução histórica e direito

comparado. Consulex, Brasília, DF, ano V, n.º 113, p. 46-47, set. 2001.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

CHALHUB, Melhim Namem. Negócio fiduciário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar,

2000.

DEDA, Artur Oscar de Oliveira. Alienação fiduciária em garantia: Doutrina e

Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2000.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro.17ª ed. Vol. IV, São Paulo:

Saraiva, 2002.

______. Compêndio de introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 1993.

Page 103: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

______. Código Civil Anotado. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

______. Tratado teórico e prático dos contratos. 4ª ed. Vol. III, São Paulo: Saraiva,

2003.

______. Lei de introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 5º ed. São Paulo:

Saraiva, 1999.

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

Apelação Cível n.º 2003.00.2.004420-4, Relator Desembargador Mário Machado, Diário da

Justiça de 09.02.04. Disponível em: <http://www.tjdft.gov.br>. Acesso em: 28 de mar. 2004.

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

Apelação Cível n.º 2001.07.1.006897-6, Relator Desembargador Mário-Zam Belmiro, Diário

da Justiça de 16.02.04. Disponível em: <http://www.tjdft.gov.br>. Acesso em: 28 de mar.

2004.

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

Súmula n.º 09. É cabível a prisão civil de devedor que não efetua a entrega do bem alienado

fiduciariamente. Disponível em: <http://www.tjdft.gov.br>. Acesso em: 05 de abr. 2004.

FABRÍCIO, Adroaldo Furtado. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. VIII,

Tomo III. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

FACHIN, Luiz Edson. Comentários ao Código Civil: parte especial: direto das

coisas, Vol. XV (arts. 1.277 a 1.368), São Paulo: Saraiva, 2003.

FELICIANO, Guilherme Guimarães. Tratado de alienação fiduciária em garantia:

Das bases romanas à Lei n. 9.514/97. São Paulo: LTr, 1999.

FERREIRA FILHO, Manoel. Prisão de depositário infiel. São Paulo: Albuquerque

Editores Associados, 1998.

Page 104: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

FORSTER, Nestor José. Alienação fiduciária em garantia. 2º ed. Porto Alegre:

Livraria Sulina, 1970.

FREITAS, Juarez. Direito Romano e Direito Civil Brasileiro: um paralelo. Porto

Alegre: Acadêmica. 1987.

GOMES, Orlando. Alienação fiduciária em garantia. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense,

1975.

______. Contratos. 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

______. Direitos Reais. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

GRINOVER, Ada Pellegrini. Os Princípios Constitucionais e o Código de Processo

Civil, 4ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário técnico jurídico. São Paulo: Rideel,

1995.

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. Da alienação fiduciária em garantia de coisa

imóvel. Curitiba: Juruá, 1998.

LOPES, Serpa. Curso de direito civil. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1988.

MARMITT, Arnaldo. Prisão civil por alimentos e depositário infiel. Rio de Janeiro:

Aide, 1989.

MARINONI, Luiz Guilherme. Efetividade do Processo e Tutela de Urgência, Porto

Alegre: Fabris, 1994.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 18ª ed. Rio de

Janeiro: Forense, 1998.

MEZZARI, Mário Pazutti. Alienação fiduciária. São Paulo: Saraiva, 1998.

Page 105: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

MAZZUOLI, Valério de Oliveira, Alienação fiduciária em garantia e a prisão do

devedor-fiduciário: uma visão critica a luz dos direito humanos. São Paulo: Agá Juris, 1999.

MILHOMENS, Jônatas. Manual Prático dos Contratos. Rio de Janeiro: Forense,

1996.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal, 8ª ed. São Paulo: Atlas, 1998.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 15ª ed. Vol. I, São

Paulo: Saraiva, 1977.

_______. Curso de direito civil. 28ª ed. Vol. V, São Paulo: Saraiva, 1995.

NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil anotado e

legislação extravagante. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

OLIVEIRA, Marcelo Ribeiro. Prisão civil na alienação fiduciária em garantia.

Curitiba: Juruá, 2002.

OPITZ, Oswaldo e OPITZ, Sílvia. Alienação Fiduciária em Garantia. 4ª ed. São

Paulo: Síntese, 1984.

PARIZATTO, João Roberto. Alienação Fiduciária, Mato Grosso do Sul: Edipa,

1998.

PEREIRA, Hélio do Valle. Alienação Fiduciária em Garantia: Aspectos

Processuais. Florianópolis: Habitus, 2001.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 4ª ed. Vol. VI, Rio de

Janeiro: Forense, 1974.

_______. Instituições de direito civil. 5ª ed. Vol. I, Rio de Janeiro: Forense, 1980.

PIOVESAN, Flávia. Direito humano e o direito constitucional internacional. 3ª ed.

São Paulo: Max Limonad, 1997.

Page 106: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Comentários ao Código de

Processo Civil. Tomo IV: art. 282 a 443. 3ª. ed. Atualizado por Sergio Bermudes, Rio de

Janeiro: Forense. 1997.

______. Tratado de Direito Privado. Tomo XLII. 3ª ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1984.

QUEIROS, Odete Novais Carneiro. Prisão Civil e os Direitos Humanos. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2004.

RABELLO, José Geraldo de Jacobina. Alienação fiduciária em garantia e prisão

civil do devedor. São Paulo: Saraiva, 1985.

RÁO, Vicente, O direito e a vida dos direitos. 2ª ed. Vol. I, São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1991.

RESTIFFE NETO, Paulo. Garantia fiduciária: direito e ações. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 1975.

_______ e RESTIFFE, Paulo Sérgio. Garantia fiduciária: direito e ações: manual

teórico e prático com jurisprudências. 3ª ed. atual e ampliando, São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2000.

REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 7ª ed. São

Paulo: Saraiva, 1998.

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Habeas Corpus n.º

3.429-87, Relator Desembargador Paulo Roberto de Freitas, Diário da Justiça de 03.02.90.

Disponível em: <http://www.tjrj.gov.br>. Acesso em: 26 de mar. 2004.

RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível

n.º 70007758600, Relatora Desembargadora Ângela Terezinha de Oliveira Brito, Diário da

Justiça de 26.02.04. Disponível em: <http://www.tjrs.gov.br>. Acesso em: 15 de mar. 2004.

Page 107: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

RODRIGUES, Silvio. Dos contratos e das declarações unilaterais de vontade. 27ª

ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

______. Direito Civil. 4ª ed. Vol. III, São Paulo: Saraiva, 1972.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Agravo de

Instrumento n.º 5.920, Relator Desembargador Francisco de Oliveira Filho, Diário da Justiça

de 15.03.09. In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Vol. 5, 2004. CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Agravo de

Instrumento n.º 2000.015006-1, Relator Desembargador Alcides de Aguiar, Diário da Justiça

de 11.10.00. In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Vol. 5, 2004. CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1996.004635-6, Relator Desembargador Gaspar Rubik, Diário da Justiça de 19.12.00. In:

FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1996.005705-6, Relator Desembargador Trindade dos Santos, Diário da Justiça de 03.08.01.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1997.010511-8, Relator Desembargador Anselmo Cerello, Diário da Justiça de 26.11.91. In:

FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1998.010564-1, Relator Desembargador Pedro Manoel Abreu, Diário da Justiça de 04.07.01.

Page 108: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1998.009029-6, Relator Desembargador Trindade dos Santos, Diário da Justiça de 28.11.02.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

1999.006916-8, Relator Desembargador Pedro Manoel Abreu, Diário da Justiça de 25.10.01.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

2001.020935-7, Relator Desembargador Trindade dos Santos, Diário da Justiça de 14.02.01.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n.º

2003.015389-6, Relator Desembargador Trindade dos Santos, Diário da Justiça de 11.09.03.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Habeas Corpus n.º

29.380, Relator Desembargador Ayres Gama Ferreira de Mello, Diário da Justiça de 15.11.83.

In: FOLIO VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004.

CD-ROM.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Habeas Corpus n.º

12.755, Relator Desembargador Amaral e Silva, Diário da Justiça de 05.03.96. In: FOLIO

VIEWS: Base de Acórdãos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Vol. 5, 2004. CD-ROM.

Page 109: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Habeas Corpus n.º 674.380-02,

Relator Desembargador Antonio Carlos Malheiros, Diário da Justiça de 14.02.96. Disponível

em: <http://www.tjsp.gov.br>. Acesso em: 02 de mar. 2004.

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n.º 479.095-01,

Relator Desembargador Radislau Lamotta, Diário da Justiça de 02.04.97. Disponível em:

<http://www.tjsp.gov.br>. Acesso em: 02 de mar. 2004.

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n.º 479.910-01,

Relator Desembargador Gama Pellegrino, Diário da Justiça de 16.08.98. Disponível em:

<http://www.tjsp.gov.br>. Acesso em: 02 de mar. 2004.

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível n.º 609.048-00,

Relator Desembargador Francisco Casconi, Diário da Justiça de 21.02.01. Disponível em:

<http://www.tjsp.gov.br>. Acesso em: 02 de mar. 2004.

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 6ª ed. Vol. I,

Processo de Conhecimento, São Paulo: Saraiva, 1998.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivado. 17ª ed. São

Paulo: Malheiros, 2001.

SOUZA, Nelson Orcar de. Manual de direito Constitucional, Rio de Janeiro:

Forense, 1994.

STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise: uma exploração

hermenêutica da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial, 2ª ed. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A proteção internacional dos direitos

humanos fundamentos jurídicos e instrumentos básicos. São Paulo: Saraiva, 1991.

Page 110: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Giovani Silva.pdf · juristas pátrios, não se tendo acolhido um consenso sobre a legalidade ou

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 30ª ed. Vol. II,

Rio de Janeiro: Forense, 2000.

______. Curso de direito processual civil. 23ª ed. Vol. III, Rio de Janeiro: Forense,

2000.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Reais. São Paulo: Atlas, 1995.

ANEXOS