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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ
PAULA ELISA BRANDÃO GUEDES
DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO, SOROLÓGICO E MOLECULAR DA
INFECÇÃO POR Ehrlichia canis EM CÃES NATURALMENTE INFECTADOS EM
ITUBERÁ, BAHIA
ILHÉUS – BAHIA
2013
PAULA ELISA BRANDÃO GUEDES
DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO, SOROLÓGICO E MOLECULAR DA
INFECÇÃO POR Ehrlichia canis EM CÃES NATURALMENTE INFECTADOS EM
ITUBERÁ, BAHIA
ILHÉUS- BAHIA
MARÇO DE 2013
ILHÉUS- BAHIA
2013
Dissertação apresentada à Universidade
Estadual de Santa Cruz, como parte das
exigências para obtenção do título de Mestre
em Ciência Animal.
Área de concentração: Ciência Animal.
Orientador: Prof. Dra. Fabiana Lessa Silva.
G924 Guedes, Paula Elisa Brandão
Diagnóstico parasitológico, sorológico e molecular da infecção por Ehrlichia canis em cães naturalmente infectados em Ituberá, Bahia / Paula Elisa Brandão Guedes. – Ilhéus, BA: UESC, 2013.
x, 48 f.: il.; anexo. Orientadora: Fabiana Lessa Silva. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de
Santa Cruz. Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal.
Inclui referências.
1. Cão – Doenças – Ituberá (BA). 2. Cão – Parasito. 3. Zoonoses – Tratamento – Ituberá (BA). 4. Hemograma. 5. Carrapato – Controle – Ituberá (BA). I. Título.
CDD 636.7
PAULA ELISA BRANDÃO GUEDES
DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO, SOROLÓGICO E MOLECULAR DA
INFECÇÃO POR Ehrlichia canis EM CÃES NATURALMENTE INFECTADOS EM
ITUBERÁ, BAHIA
Ilhéus-BA, 25/04/13.
___________________________________
Fabiana Lessa Silva – DSc
UESC/DCAA
(Orientadora)
____________________________________
Alexandre Dias Munhoz – DSc
UESC/DCAA
___________________________________
Nadia Regina Pereira Almosny – DSc
UFF/DPCV
ILHÉUS- BAHIA
2013
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a Deus, em primeiro lugar, pois é Ele quem me guia, e
ilumina todos os meus passos, à minha família, que tanto amo e que é o alicerce de
minha vida, ao meu esposo, aos meus amigos do coração, que são como
verdadeiros irmãos, e à minha cadelinha Samantha.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu Senhor, por toda força e serenidade que me deu, não
só por toda minha vida, mas principalmente durante esses dois últimos anos,
em que me dediquei inteiramente a esse projeto.
À minha família, em especial aos meus pais, sempre tão presentes em
minha vida, apoiando-me, com muito amor e carinho.
Aos meus sogros, que amo como pais, e ao meu esposo, que sempre
paciente, soube entender meus muitos momentos de ausência por estar
envolvida nas atividades do Mestrado.
Aos meus amigos queridos de uma vida inteira Juliana Chaves, Cinthia
Azevedo, Karen Marra e Gabriel Nery, e aos que cultivei ao longo do mestrado
Paula Rocha, Taiane Nascimento, Valter Almeida, Adriana Lopes, e muitos
outros que estão guardados com muito amor em meu coração, e que sempre
estiveram ao meu lado quando mais precisei.
Aos alunos da graduação, que me receberam com respeito quando
ministrava aulas de Patologia Animal, e dos quais jamais esquecerei.
Aos alunos de iniciação científica, que me ajudaram na execução do
projeto, em especial Siberi Santos Castro.
À minha colega de Mestrado e amiga, Thaís Nascimento, uma pessoa
muito especial, que me ajudou durante todo esse período de estudos.
Ao amigo e técnico do Laboratório de Histopatologia da UESC, Ivo
Arouca, sempre muito competente e disponível para o que eu necessitasse. A
Maria Fabiana dos Santos, técnica da Sala de Esterilização e Lavagem de
Material Laboratorial, por todo material que esterilizou para que eu o pudesse
utilizar, e aos vigilantes que zelam por nossa segurança.
Ao doutorando Fábio Carvalho, pesquisador altamente qualificado, que
não poupou esforços em me ajudar durante todo o projeto, e à mestranda
Daniele Rocha, que também me auxiliou durante a realização das IFI´s.
À minha orientadora, professora Fabiana Lessa Silva, que acreditou no
meu potencial e me ajudou a ingressar no meio científico. É com muito carinho
que a agradeço por tudo que fez por mim, desde a graduação.
Aos professores Amauri Arias Wenceslau e Renata Santiago, que, com
competência e comprometimento, forneceram-me base para que
desenvolvesse de forma correta toda a pesquisa, e em especial aos
professores George Rêgo Albuquerque e Alexandre Dias Munhoz, que,
pacientemente, atenderam-me as muitas e muitas vezes que os procurava
repleta de dúvidas.
Ao Programa de Pós-graduação em Ciência Animal da Universidade
Estadual de Santa Cruz por possibilitar a realização e execução do projeto de
pesquisa.
A todos vocês, agradeço por fazerem parte da minha vida, e desse
momento tão importante.
vi
DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO, SOROLÓGICO E MOLECULAR DA
INFECÇÃO POR Ehrlichia canis EM CÃES NATURALMENTE INFECTADOS
EM ITUBERÁ, BAHIA.
RESUMO
Erliquiose é uma zoonose causada por bactérias do gênero Ehrlichia, que acomete animais de diversas espécies, incluindo o homem. A erlichiose monocítica canina é causada por bactérias da espécie Ehrlichia canis, transmitida através do carrapato vetor Riphicephalus sanguineus, durante seu repasto sanguíneo. Esta doença possui três fases: aguda, subclínica e crônica, que dentre diversos sintomas, leva a apatia, caquexia, anemia e trombocitopenia, podendo evoluir para o óbito. Os métodos de diagnósticos mais utilizados na rotina clínica são o esfregaço sanguíneo (ponta de orelha) e o hematológico, que busca alterações na população de leucócitos no sangue total do animal. Entretanto, as técnicas sorológicas e moleculares são as mais sensíveis na detecção de E. canis. O objetivo deste trabalho foi detectar a presença de Ehrlichia canis no sangue de cães naturalmente infectados do município de Ituberá, Bahia, testando a sensibilidade dos exames de esfregaço sanguíneo, sorológico e molecular. Além disso, este estudo objetivou identificar os fatores de risco associados com a doença nos cães desta localidade, através de estudo epidemiológico. Para isso, 379 cães foram submetidos ao exame clínico e à colheita de amostras de sangue, utilizadas para realização de hemograma, Imunofluorescência Indireta (IFI) para detecção de anticorpos anti-E. canis e Reação em Cadeia de Polimerase (PCR) para pesquisa de DNA de E. canis. Adicionalmente, foi realizado esfregaço sanguíneo a partir de amostras de sangue periférico de ponta de orelha, e nested PCR para detecção de DNA de E. canis nos carrapatos que parasitavam os animais positivos em estudo. Dos 379 animais avaliados, 47 (12,4%), 124 (32,7%) e 97 (25,6%) foram positivos nos exames de esfregaço sanguíneo, sorológico e molecular, respectivamente. Foram considerados infectados os cães positivos em qualquer dos três exames, 178 (46,9%) animais. Os fatores de risco associados à infecção foram idade, presença de carrapatos, contato com outros cães e habitat, e as alterações hematológicas observadas foram anemia e trombocitopenia. Concluiu-se que o município de Ituberá, Bahia, possui alta incidência de erliquiose canina e que as diferentes formas diagnósticas utilizadas para detecção de E. canis são complementares, e devem ser analisadas em conjunto. Palavras-chave: Ehrlichia canis. Hemograma. Imunofluorescência Indireta. PCR.
vii
PARASITOLOGICAL, SEROLOGIC AND MOLECULAR DIAGNOSIS OF
INFECTION Ehrlichia canis IN NATURALLY INFECTED DOGS IN ITUBERÁ,
BAHIA.
ABSTRACT
Ehrlichiosis is a zoonotic disease caused by bacteria of the genus Ehrlichia that affects animals of many species, including man. Canine monocytic ehrlichiosis is caused by the bacteria Ehrlichia canis, transmitted through the tick vector Riphicephalus sanguineus during its blood meal species. This disease has three stages: acute, sub clinical and chronic, which among many symptoms, leads to apathy, cachexia, anemia and thrombocytopenia, and may progress to death. The most common diagnostic methods used in clinical routine are the blood smear (tip of ear) and the hematological, seeking changes in the population of leukocytes in whole blood of the animal. However, serological and molecular techniques are the most sensitive in the detection of E. canis. The aim of this study was to detect the presence of Ehrlichia canis in the blood of naturally infected dogs in the municipality of Ituberá, Bahia, testing the sensitivity of blood smear, serological and molecular examinations. Furthermore, this study also aimed to identify risk factors associated with illness in dogs in this locality, by conducting an epidemiological survey. For this, 379 dogs were subjected to clinical examination and collection of blood samples, used to hemogram, Indirect Immunofluorescent Assay (IFA) for detection of antibodies to E. canis and Polymerase Chain Reaction (PCR) for DNA detection of E. canis. Additionally, blood smear was performed from peripheral blood samples of ear tip, and nested PCR to detect DNA of E. canis in ticks that was parasitizing positive animals in this study. Of the 379 animals sampled, 47 (12.4%), 124 (32.7%) and 97 (25.6%) were positive in blood smear, serological and molecular tests respectively. Were considered infected dogs positive in all three tests, 178 (46.9%) animals. Risk factors associated with infection were age, presence of ticks, contact with other dogs and habitat, and the hematological changes observed were anemia and thrombocytopenia. It was concluded that the municipality of Ituberá, Bahia, has a high incidence of canine ehrlichiosis and that the different forms used for diagnostic detection of E. canis are complementary and should be considered together. Key-words: Ehrlichia canis. Hemogram. Indirect Imunofluorescent Assay. PCR.
viii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1
Tabela 2
Tabela 3
Prevalência de erliquiose monocítica canina em
diferentes estados brasileiros.
Distribuição da soropositividade para E. canis no
município de Ituberá-Bahia.
Comparação entre os resultados obtidos nos
esfregaços sanguíneos e sorologia dos cães do
município de Ituberá-Bahia.
16
27
30
Tabela 4 Comparação entre os resultados obtidos nos
esfregaços sanguíneos e teste molecular dos cães do
município de Ituberá-Bahia
30
Tabela 5 Comparação entre os resultados obtidos nos testes
sorológico e molecular dos cães do município de
Ituberá-Bahia.
31
Tabela 6
Achados clínicos e hematológicos presentes nos cães
positivos nos exames de esfregaço sanguíneo,
parasitológico, sorológico e molecular, provenientes do
município de Ituberá-Bahia.
33
Tabela 7 Fatores associados à infecção pela E. canis em cães
positivos provenientes do município de Ituberá-Bahia.
35
Tabela 8
Associação entre cães positivos e os fatores: idade,
presença de carrapatos e habitat, no município de
Ituberá-Bahia.
36
ix
SUMÁRIO
1.
2.
2.1
2.2
3.
3.1
3.1.1
3.1.2
3.1.3
3.1.4
3.1.5
3.1.6
3.1.6.1
3.1.6.2
3.1.6.3
3.1.6.4
3.1.7
4.
4.1
4.2
4.2.1
4.2.2
4.2.3
4.2.3.1
4.2.3.2
RESUMO vi
ABSTRACT vii
INTRODUÇÃO 11
OBJETIVOS 12
Geral 12
Específicos 12
REVISÃO DE LITERATURA 13
Erliquiose monocítica canina 13
Agente etiológico e histórico 13
Vetor e transmissão 14
Fatores predisponentes 14
Prevalência no Brasil 15
Patogenia e sinais clínicos 16
Diagnóstico 17
Avaliação de esfregaço sanguíneo 17
Diagnóstico por meio de isolamento e cultivo 18
Diagnóstico sorológico 18
Diagnóstico molecular 19
Tratamento e controle 20
MATERIAL E MÉTODOS 21
Características do município 21
Animais 21
Coleta de dados epidemiológicos, anamnese e exame clínico dos
animais 22
Coleta de carrapatos 22
Obtenção de amostras biológicas 22
Pesquisa direta de mórulas de E. canis 23
Análise de parâmetros hematológicos 23
x
4.2.3.3
4.2.3.4
4.2.4
4.3
4.4
5.
5.1
5.2
5.3
5.4
5.5
6.
Exames sorológicos 23
Extração de DNA e PCR 24
Avaliação do tempo de sangramento 25
Transferência dos resultados aos proprietários 25
Análise estatística 25
RESULTADOS E DISCUSSÃO 27
Diagnóstico 27
Achados epidemiológicos, clínicos e hematológicos 31
Tempo de sangramento 33
Fatores de risco associados à infecção pela E. canis 34
Diagnóstico molecular de E. canis em carrapatos R. sanguineus 36
CONCLUSÕES 37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38
ANEXO I 43
ANEXO II 47
11
1. INTRODUÇÃO
A erliquiose canina é uma enfermidade causada por bactérias gram
negativas do gênero Ehrlichia, que resulta basicamente em três tipos de
manifestação de doença. Estes tipos variam de acordo com as espécies
envolvidas, as células parasitadas e as manifestações clínicas, e são
classificados em: erliquiose trombocítica, granulocítica e monocítica canina
(DAGNONE, 2001).
A erliquiose trombocítica canina, caracterizada principalmente pela
trombocitopenia cíclica, é causada pela Anaplasma platys. Este agente era
anteriormente conhecido como Ehrlichia platys, entretanto, em virtude de uma
alteração na classificação taxonômica, atualmente pertence ao gênero
Anaplasma. A erliquiose granulocítica, por sua vez, é causada pelas espécies
E. ewingii e A. phagocytophilum, que parasitam os granulócitos de cães. Por
fim, a erliquiose monocítica canina é causada pelas espécies E. canis (agente
mais comum) e E. chaffensis (DAGNONE, 2001, DUMLER et al., 2001).
A erliquiose monocítica acomete cães de todas as idades e, no Brasil, é
causada principalmente por Ehrlichia canis, cujos vetores são carrapatos que
parasitam comumente cães domiciliados ou não, de áreas urbanas ou rurais. O
Rhiphicephalus sanguineus é o carrapato implicado na transmissão da
erliquiose monocítica canina em condições naturais (SOUSA, 2006). As
bactérias invadem e se multiplicam nos linfócitos e plaquetas do hospedeiro,
causando sérios distúrbios como febre, vômitos, perda de peso, anorexia,
trombocitopenia e hemorragias (MOREIRA et al., 2003).
Estudos recentes desenvolvidos no Brasil revelam que a prevalência da
erliquiose monocítica em cães é elevada. Numa pesquisa realizada por Ueno et
al. (2009), foi detectado o DNA de E. canis em 40% dos cães estudados
provenientes do Hospital Veterinário da Universidade Estadual Paulista, na
cidade de Botucatu, São Paulo. Azevedo et al. (2011) realizaram um estudo
sorológico de cães da região do semiárido da Paraíba, que revelou positividade
para E. canis em 72,5% dos casos. Em Salvador, capital baiana, o trabalho de
Meneses et al. (2008) revelou anticorpos anti-Ehrlichia canis em 98,66% dos
animais avaliados, enquanto a PCR revelou positividade em 33,3% dos cães.
12
Como se pode observar, o estudo da erliquiose monocítica canina tem
sido objetivo de diversas pesquisas pelo mundo, devido a alguns fatores como
a alta prevalência da infecção e as elevadas taxas de morbidade e mortalidade.
Além disso, trata-se de uma doença de fácil transmissão, uma vez que seus
vetores são carrapatos que comumente parasitam os cães domésticos
(AGUIAR, 2006). Levando-se em conta que os estados brasileiros possuem
características favoráveis à manutenção do vetor, como clima tropical e
subtropical, essa infecção ganha destaque no âmbito nacional, e embora muito
estudada, ainda carece de estudos a cerca da epidemiologia e prevalência em
diversas regiões brasileiras.
2. OBJETIVOS
2.1 Geral:
- Determinar a prevalência da erliquiose monocítica canina no município
de Ituberá, Bahia, tendo em vista que o município carece de estudos nesta
área.
2.2 Específicos:
- Detectar a presença de mórulas de E. canis em amostras de sangue de
ponta de orelha de cães do município de Ituberá, Bahia.
- Detectar a presença de anticorpos anti-E. canis em cães do município
de Ituberá, por meio de testes sorológicos (Imunofluorescência Indireta).
- Detectar a presença de DNA de E. canis no sangue de cães oriundos
do município de Ituberá, pela nested PCR.
- Detectar a presença de DNA de E. canis nos carrapatos encontrados
parasitando os cães positivos em estudo.
- Aplicar questionário epidemiológico, visando identificar os fatores de
risco relacionados à infecção por E. canis nos cães do município de Ituberá.
- Testar a sensibilidade do exame de ponta de orelha, confrontando seus
resultados com os obtidos através dos exames sorológicos e moleculares.
13
3. REVISÃO DE LITERATURA
3.1 Erliquiose monocítica canina
3.1.1 Agente etiológico e histórico
A erliquiose monocítica canina é uma enfermidade causada por
bactérias da espécie Ehrlichia canis, que pertencem à ordem Rickettsiales,
família Anaplasmataceae e ao gênero Ehrlichia. Os agentes etiológicos são
bactérias gram negativas, intracelulares obrigatórias, que parasitam,
principalmente, células do sistema fagocítico mononuclear (ANEXO I)
(DUMLER et al., 2001).
Atualmente, o gênero Ehrlichia possui cinco espécies, que causam
diferentes manifestações de erliquiose: E. canis, E. chaffeensis, E. ewingii, E.
muris e E. ruminantium. No Brasil há relatos apenas de infecção por E. canis. A
espécie E. platys, antes classificada no gênero Ehrlichia, recentemente sofreu
uma modificação na classificação taxonômica e hoje é conhecida como
Anaplasma platys, pertencendo, assim, ao gênero Anaplasma (DUMLER et al.,
2001).
Estas bactérias podem acometer diversas espécies animais, como
caninos, felinos, equinos, e, inclusive, o homem, e a doença causada por elas é
caracterizada como zoonose (PAROLA et al., 2005; PEREZ et al., 2005).
A E. canis foi descoberta na Argélia, no ano de 1935, por Donatien e
Lestoquard, durante o estudo de esfregaços sanguíneos de cães infestados por
carrapatos da espécie R. sanguineus. Devido à semelhança do agente com
rickettsias, eles a chamaram de Rickettisia canis. Entretanto, em 1945, ela foi
renomeada pelo pesquisador Moshkovshi como E. canis, homenageando o
bacteriologista Paul Ehrlich. A partir de então, a erliquiose pode ser encontrada
em diversos países, especialmente nos tropicais e subtropicais, uma vez que
estes possuem condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento do vetor
(IQBAL et al., 1994). No Brasil, o primeiro relato da doença ocorreu em 1973 na
cidade de Belo Horizonte (Costa et al., 1973). Atualmente essa enfermidade
está presente em todas as regiões brasileiras (AGUIAR, 2006).
14
3.1.2 Vetor e transmissão
A E. canis é transmitida durante o repasto sanguíneo de carrapatos da
espécie R. sanguineus (Ordem Acarina, família Ixodidae e gênero
Rhipicephalus), conhecidos popularmente como carrapatos marrons do cão
(SOUSA, 2006). Quando esses vetores se alimentam do sangue de um animal
infectado, eles ingerem os leucócitos contendo as bactérias, as quais se
multiplicam nos hemócitos e células da glândula salivar desses artrópodes,
propiciando, assim, a transmissão transestadial. Ao realizar o repasto
sanguíneo em um animal não infectado, o carrapato, então, inocula as
bactérias, que se multiplicarão sob a forma de corpúsculos elementares nas
células sanguíneas e em células do sistema fagocítico mononuclear, as quais
estão presentes no fígado, baço e linfonodos. Posteriormente, a E. canis se
multiplica nos fagolisossomos do animal, e se desenvolve em corpúsculos
iniciais e mórulas, seu estágio final. Estas, que possuem inúmeros corpúsculos
elementares, os liberam quando há rompimento dos leucócitos infectados ou
mesmo por exocitose, reiniciando, assim, o ciclo da infecção no animal
(DAGNONE et al., 2001; McQUISTON et al., 2003; SANTARÉM, 2003). Há
relatos na literatura de transmissão da infecção via transfusão sanguínea
(SOUSA, 2006).
Segundo Lewis Jr. et al. (1977), a passagem de E. canis para o
carrapato durante o repasto sanguíneo ocorre cerca de 2 a 3 semanas após o
cão ser infectado. A explicação para isso é que, na fase aguda da doença, há
maior número de leucócitos infectados circulantes.
3.1.3 Fatores predisponentes
Há alguns fatores predisponentes que costumam ser avaliados quando
há infecção por E. canis, como idade, raça e sexo do animal infectado, tipo de
habitat no qual está inserido (rural ou urbano) e contato com outros cães,
embora nem todos tenham seu papel comprovado no estabelecimento da
infecção. Aguiar (2006) e Azevedo et al. (2011) observaram em seus estudos
maior frequência da soropositividade nos cães mais velhos pela maior chance
de exposição ao agente. Em contrapartida, Faierstein et al. (2008) observaram
15
maior prevalência da doença em animais jovens, o que pode ser justificável
pelo fato do sistema imunológico destes ainda estar em formação, facilitando
possíveis infecções.
Apesar da raça não ser um fator determinante na instalação da doença,
cães Pastor Alemão manifestam uma resposta clínica mais severa à infecção
pela E. canis, enquanto os Beagles costumam apresentar um curso moderado
e persistente, o que pode ser explicado pela diferença na capacidade de
produzir resposta imune celular (SOUZA, 2008). O sexo dos animais, de
acordo com Almeida et al. (2010), não influencia na infecção pela E. canis.
Estudos desenvolvidos por Aguiar (2006) revelaram que a ocorrência da
erliquiose foi maior em cães de zona urbana em relação aos de áreas rurais,
com frequência de 37,9% e 24,8%, respectivamente. Azevedo et al. (2011)
também analisaram a variável contato com outros cães, e concluíram ser este
um fator de risco, visto que para a transmissão da doença é necessária a
presença do cão infectado. Dessa forma, o contato entre cães aumenta as
chances de se transmitir a doença, especialmente cães errantes, que carecem
de cuidados veterinários e profiláticos para doenças.
3.1.4 Prevalência no Brasil
A erliquiose monocítica canina já foi descritas em diversos países, como
Estados Unidos, Singapura, Vietnã e países europeus (IQBAL et al., 1994;
SOUZA, 2008). No Brasil, a infecção pode ser encontrada em cães de todas as
regiões, como pode ser obervado na tabela 1.
16
Tabela 1. Prevalência de erliquiose monocítica canina em diferentes estados brasileiros.
Estado
Esfregaço
Sorologia
PCR
Referência
Bahia Bahia Bahia Bahia
- - -
5,33%
35,65%
36% -
98,66%
34,5%
- 7,8% 33,3%
Souza et al. (2010) Carlos et al. (2007)
Carvalho et al. (2008) Meneses et al. (2008)
Goiás
5,56% - - Mundim et al. (2008)
Mato Grosso
- 42,5% - Silva et al. (2010)
Minas Gerais
15,97% - - Moreira et al. (2003)
Paraíba
- 72,5% - Azevedo et al. (2011)
Rio de Janeiro
13,89% - - Albernaz et al. (2007)
Rio Grande do Sul
- 4,43% - Krawczak et al. (2012)
Rondônia
- 31,2%
- Aguiar et al. (2007)
São Paulo - - 40% Ueno et al. (2009)
3.1.5 Patogenia e sinais clínicos
A erliquiose monocítica canina possui três estágios clínicos: agudo,
subclínico e crônico, e sugere-se que as alterações e sinais encontrados em
cães infectados tenham relação com distúrbios no sistema imunológico. O
primeiro estágio se inicia cerca de 8 a 20 dias após o animal ser infectado com
as bactérias, que se multiplicam no sistema fagocítico mononuclear,
principalmente no fígado, baço e linfonodos, causando hiperplasia linforreticular
e vasculite. Então, há a invasão das células sanguíneas (leucócitos e
plaquetas). Durante esta fase observa-se principalmente hipertermia, anorexia,
letargia, vômito, descarga ocular, linfadenomegalia, esplenomegalia,
hemorragias, principalmente petéquias e equimoses na pele, leucopenia e
trombocitopenia. O último achado é explicado pelo aumento no consumo de
plaquetas causado pela inflamação endotelial, pela elevação do sequestro
destas no baço e pela redução do seu tempo de vida devido à injúria ao
sistema imunológico (HARRUS, 1999; CASTRO et al., 2004; SKOTARCZAK,
2003; SOUSA, 2006; HARRUS, WANER, 2011).
17
A fase subclínica se desenvolve cerca de 40 a 120 dias após a infecção
e pode durar anos. Nesta, as bactérias continuam se multiplicando no
hospedeiro, elevando, assim, os títulos de anticorpos. A fase subclínica não
costuma ter sinais clínicos evidentes, apenas discretas alterações
hematológicas, como uma leve trombocitopenia (WANER et al., 1997;
SKOTARCZAK, 2003; HARRUS, WANER, 2011).
Caso o sistema imunológico do cão não responda ao agente e este
permaneça nas células monocíticas, inicia-se a fase crônica, a qual pode
reagudizar em casos de imunossupressão do hospedeiro. Nesta fase, a
erliquiose passa a ter características de uma doença autoimune, assim, os
animais ficam mais susceptíveis a infecções secundárias, além de
apresentarem os mesmos sinais da fase aguda, porém, atenuados. Em alguns
casos, devido à deposição de complexos imunes, o animal pode apresentar
glomerulonefrite (SKOTARCZAK, 2003; SOUSA, 2006). As principais
alterações observadas são hemorragias, edema, intensa trombocitopenia,
anemia e leucopenia (SKOTARCZAK, 2003; HARRUS, WANER, 2011), além
de alterações bioquímicas, como hipoalbuminemia, hipergamaglobulinemia e
hiperglobulinemia (HARRUS, 1999; SOUSA, 2006).
3.1.6 Diagnóstico
O diagnóstico da erliquiose é baseado em pesquisa de mórulas em
esfregaço sanguíneo, isolamento da bactéria, bem como em técnicas
sorológicas e moleculares, como a Reação em Cadeia de Polimerase (PCR),
aliados à observação dos sinais clínicos, alterações hematológicas e
bioquímicas do sangue do animal (HARRUS, 1999; SOUSA, 2006).
3.1.6.1 Avaliação de esfregaço sanguíneo
Este método diagnóstico baseia-se na visualização microscópica de
mórulas ou inclusões em esfregaços de sangue total, capa de leucócitos,
aspirados de medula óssea ou de baço, que podem ser corados por Giemsa ou
Diff-Quik. São observadas inclusões intracitoplasmáticas basofílicas ou
púrpuras em leucócitos (especialmente monócitos) (ANEXO I). Este método
18
também pode ser realizado a partir de amostras de líquido cefalorraquidiano ou
sinovial (DAGNONE, 2001).
Apesar de ser um método rápido e de baixo custo, esse tipo de
diagnóstico possui baixa sensibilidade. Isto é justificável já que a possibilidade
de detectar as mórulas ocorre principalmente na fase aguda da doença,
quando há maior frequência de leucócitos parasitados. Consequentemente, a
chance de resultados falsos negativos em estágios mais avançados é grande,
requerendo, assim, confirmação por métodos sorológicos e/ou moleculares
(SOUSA, 2006).
3.1.6.2 Diagnóstico por meio de isolamento e cultivo
Apesar de se tratar de uma técnica sensível e segura de detecção, o
isolamento e cultivo das bactérias é um método difícil de ser praticado, uma
vez que demanda um longo tempo para obtenção dos resultados, possui custo
elevado, além de requerer uma cultura de qualidade confiável e condições
adequadas de laboratório (IQBAL et al., 1994).
3.1.6.3 Diagnóstico sorológico
Os principais testes sorológicos utilizados no diagnóstico da erliquiose
são a imunofluorescência indireta (IFI), imunoensaio enzimático (ELISA) e
western immunoblotting (SOUSA, 2006).
A IFI é uma das técnicas mais utilizadas para o diagnóstico de
erliquiose, sendo que a produção de IgA e IgM começa cerca de quatro a sete
dias após o cão ser infectado, e a IgG pode ser encontrada no soro após
quinze dias (WANER et al., 2001; HESS et al., 2006). Os títulos de anticorpos
podem durar anos após a cura espontânea do animal, e até cinco meses após
tratamento terapêutico. Vale ressaltar que títulos elevados de anticorpos não
significam necessariamente uma boa resposta imune ao parasita e muitas
vezes revelam um agravamento na evolução do quadro (HARRUS, 1999).
Apesar de ser uma técnica simples, a IFI pode gerar reações inespecíficas,
devido à presença de antígenos comuns com outras espécies do gênero
Ehrlichia (SOUSA, 2006).
19
O DOT-ELISA é um método diagnóstico barato e sensível, além de
permitir que o antígeno permaneça estável por mais de 12 meses, o que
fornece um registro duradouro das reações (CADMAN et al., 1994; OLIVEIRA
et al., 2000). De acordo com estudos desenvolvidos por Nakaghi et al. (2008),
não há diferença significativa entre os resultados obtidos com o uso da IFI e do
DOT-ELISA para detecção de E. canis.
O western immunoblotting auxilia na determinação da diversidade
antigênica entre cepas de E. canis, e costuma ser utilizado para confirmar os
resultados da IFI, mas possui alto custo (SUKASAWAT, 2000).
3.1.6.4 Diagnóstico molecular
Além de possuir alta sensibilidade e especificidade na detecção de
infecções por Ehrlichia sp., a PCR diferencia as espécies do gênero Ehrlichia,
ao contrário das demais técnicas. A nested PCR é ainda mais sensível para a
detecção da E. canis, já que possui uma segunda etapa de amplificação do
DNA obtido a partir da PCR tradicional (WEN et al., 1997; SOUSA, 2006).
Além disso, a PCR permite distinguir os animais que continuam
infectados daqueles que foram tratados com sucesso, mas permanecem com
altos títulos de anticorpos na imunofluorescência, e detecta a infecção mesmo
em estágios precoces da doença (SUKASAWAT et al., 2000). A técnica pode
ser realizada a partir de amostras de sangue, tecidos, medula óssea e
carrapatos (STEIN et al., 1992).
Iqbal et al. (1994) observaram, em um estudo comparativo de técnicas,
que a sensibilidade da PCR é igual ou ligeiramente inferior às sensibilidades
dos diagnósticos através do isolamento e cultivo, IFI e western immunoblotting.
Nakaghi et al. (2008) também realizaram pesquisa comparando o esfregaço
sanguíneo e os testes sorológico e molecular, e concluíram que a sorologia e a
nested PCR são mais adequados para a confirmação da infecção pela E. canis,
mas sugeriram que estas técnicas devem ser complementares aos exames
clínico e hematológico. Harrus e Waner (2011) também concluíram que a PCR
é o método mais sensível de detecção da E. canis.
20
3.1.7 Tratamento e controle
O tratamento da erliquiose canina é baseado na administração de
antibacterianos, como as tetraciclinas e seus derivados. O dipropionato de
imidocarb também pode ser utilizado, especialmente em casos de co-infecção
com Babesia sp. O tratamento não evita que animais curados possam se re-
infectar e a forma mais eficaz de controle dessas doenças é o combate aos
carrapatos vetores (DAGNONE, 2001).
21
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1 Características do município
O estudo foi realizado no município de Ituberá (ANEXO I), situado na
região do Sul baiano (13º 43’ S 39º 08’ O), distante aproximadamente 150 km
da capital baiana, Salvador (ANEXO I). A região tem clima quente, temperatura
média de 25,3º C e amplitude térmica anual de 5,6º C, com pluviosidade anual
variando entre 1.800 e 2.400mm, distribuídos ao longo do ano. O bioma do
município é representado pela Mata Atlântica. O município tem uma população
aproximada de 26.591 habitantes, área total de 417 km2 e densidade de 71,5
habitantes/km2 (IBGE, 2010).
4.2 Animais
Fizeram parte desse estudo 379 cães adultos (idade igual ou superior a
um ano), domiciliados. O cálculo do tamanho amostral foi realizado utilizando-
se o software Epi Info 3.5.3, com intervalo de confiança de 95%, considerando-
se o tamanho da população canina como sendo 10% da população humana no
município (CIFUENTES, 1988). A frequência estimada de animais infectados
foi considerada como sendo de 50%, uma vez que não existem estudos de
frequência prévios de erliquiose canina no município, e erro amostral de 5%. A
coleta das amostras foi realizada entre os meses de maio e setembro de 2012,
e distribuída homogeneamente pelos bairros do município, abrangendo tanto a
zona rural quanto a zona urbana, respeitando a proporção da população de
cada bairro em relação à população total do município. Para cada residência
visitada, um máximo de dois cães foi avaliado.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso de Animais
(CEUA) da Universidade Estadual de Santa Cruz, sob o protocolo 028/12.
22
4.2.1 Coleta de dados epidemiológicos, anamnese e exame clínico dos
animais
Os proprietários dos animais incluídos no estudo foram submetidos a um
questionário epidemiológico (Anexo II). Para tanto, eles deveriam ser maiores
de idade, e, no momento da visita, serem responsáveis pelo domicílio. As
perguntas foram elaboradas visando uma melhor compreensão das
características sociais, culturais e econômicas dos proprietários dos cães, com
a finalidade de identificar os fatores de risco de exposição dos animais ao
agente etiológico e vetores de E. canis no município de Ituberá (ANEXO I).
Adicionalmente, foi realizada anamnese e exame clínico de cada cão
incluído no estudo, a fim de investigar se havia alterações clínicas compatíveis
com a doença, como vômitos, diarréia, hemorragias e alterações de linfonodos,
bem como presença de ectoparasitos, principalmente carrapatos.
4.2.2 Coleta de carrapatos
Carrapatos com características macroscópicas compatíveis com o
Rhipicephalus sanguineus que parasitavam os cães deste estudo no momento
da análise clínica foram coletados para posterior realização de testes
moleculares, objetivando a identificação de infecção por E. canis.
4.2.3 Obtenção de amostras biológicas
Foram coletados 8 mL de sangue venoso, após contenção física, por
meio de punção da veia cefálica ou jugular, dos quais 5mL foram dispensados
em tubos de plástico com anticoagulante (EDTA) e 3mL em tubos sem
anticoagulantes. Os tubos foram acondicionados em isopores com gelo
reciclável e encaminhados ao Laboratório de Análises Clínicas do Hospital
Veterinário da Universidade Estadual de Santa Cruz. Além disso, foram
coletadas amostras de sangue periférico em ponta de orelha de todos os
animais desse estudo, após contenção física, através da perfuração com
agulha 30 x 7 mm.
23
4.2.3.1 Pesquisa direta de mórulas de E. canis
A partir das amostras de sangue periférico obtidas, foram
confeccionados esfregaços sanguíneos corados com Diff-Quick, que foram
analisados ao microscópio óptico no Laboratório de Parasitologia do Hospital
Veterinário da Universidade Estadual de Santa Cruz, buscando a visualização
de mórulas de E. canis.
4.2.3.2 Análise de parâmetros hematológicos
Das amostras de sangue venoso obtidas em tubos com EDTA, 2mL
destinaram-se à análise hematológica, a qual foi realizada utilizando-se o
Contador Automático de Células Sanguíneas ABC VET, Horiba TM, do
Laboratório de Análises Clínicas do Hospital Veterinário da Universidade
Estadual de Santa Cruz. Neste, foram avaliados valores hematológicos tais
como o número de plaquetas, hemácias e leucócitos, e o valor referente ao
hematócrito. A contagem específica dos granulócitos e agranulócitos foi
realizada através da análise do esfregaço de sangue venoso corado com Diff-
Quick, sob a luz do microscópio óptico.
4.2.3.3 Exames sorológicos
As amostras de sangue sem EDTA foram encaminhadas ao laboratório
de Análises Clínicas do Hospital Veterinário da Universidade Estadual de Santa
Cruz, onde foram centrifugadas para obtenção de soro, que foi armazenado a
-20º C. Posteriormente, foi realizada a técnica de Imunofluorescência Indireta
para detecção de anticorpos anti-E. canis. A reação foi feita de acordo com
técnica previamente descrita por André (2008), para detecção de anticorpos da
classe IgG anti-E. canis, utilizando antígeno da cepa Jaboticabal. Os controles
positivo e negativo utilizados neste trabalho foram provenientes de cães
estudados na região de Ilhéus e Itabuna (CARLOS et al., 2007). Inicialmente,
os soros foram diluídos em PBS, na diluição inicial de 1:20, e 10 µL de cada
amostra foram depositados em cada poço das lâminas com antígeno de E.
canis, reservando-se dois poços para os soros controle positivo e negativo. As
24
lâminas foram incubadas a 37°C, por 30 minutos, em câmara úmida, seguindo-
se três lavagens em PBS de 5 minutos cada. Em seguida, secaram-se as
lâminas e foram adicionados 10 µL do anticorpo anti-IgG de cão conjugado
com isotiocianato de fluoresceína (FITC-Sigma, F4012), diluído conforme
orientação do fabricante. As lâminas foram novamente incubadas por 37°C, por
30 minutos, seguindo-se novas lavagens e montagem destas com lamínulas e
glicerina tamponada com tampão carbonato-bicarbonato de sódio, pH 9,0. As
amostras que apresentaram resultado positivo foram submetidas a diluições
seriadas na base dois, até a máxima diluição positiva. A leitura das lâminas foi
feita em microscópio equipado com luz fluorescente.
4.2.3.4 Extração de DNA e PCR
Das amostras de sangue acondicionadas em tubos com EDTA, 3mL
foram destinados à realização da Reação em Cadeia de Polimerase (PCR).
Inicialmente as amostras foram processadas para extração de DNA a partir das
capas leucocitárias com o kit Easy-DNA (Invitrogen®), sendo o DNA extraído
posteriormente estocado à temperatura de -20° C. Na primeira etapa de
amplificação do DNA do gênero Ehrlichia, foram utilizados os primers ECC (5’-
AGAACGAACGCTGGCGGCAAGC-3’) e ECB (5’-
CGTATTACCGCGGCTGCTGGCA-3’), que amplificam parte do gene 16S
rRNA de Ehrlichia spp. Posteriormente, para identificação da espécie E. canis,
foram utilizados os primers ECAN (5’-
CAATTATTTATAGCCTCTGGCTATAGGA-3’) e HE3 (5’-
TATAGGTACCGTCATTATCTTCCCTAT-3’), seguindo metodologia descrita por
Carvalho et al. (2008). Para cada reação, foram utilizados 6 μL de DNA
purificado, 0.2 mM de cada dNTP, 1.5 mM MgCl2, 50 mM KCl, 10 mM Tris-HCl,
pH 9.0, 0.2 μM de cada primer e 2U de Taq DNA polimerase (Invitrogen®),
obtendo um volume total de 25 μL. Os parâmetros da primeira reação
consistiram de desnaturação por 3 minutos a 94°C, seguida de 35 ciclos de
desnaturação a 94°C por 1 minuto, anelamento a 68°C por 2 minutos, e, por
fim, extensão a 72°C por 2 minutos. Os parâmetros da segunda reação (nested
PCR) consistiram de desnaturação por 3 minutos a 94°C, seguida de 35 ciclos
25
de desnaturação a 94°C por 1 minuto, anelamento a 58°C por 2 minutos, e
extensão a 72°C por 1,5 minuto.
Os produtos da PCR foram submetidos à eletroforese em gel de agarose
a 2% contendo brometo de etídio. Para cada seis amostras a serem
amplificadas foram adicionados um controle positivo e um controle negativo
(CARVALHO et al., 2008). A verificação da presença de bandas foi feita com o
auxílio de transiluminador.
Um pool de dois a três carrapatos coletados de cada animal com
resultado positivo na nested PCR foi macerado em nitrogênio líquido, com
posterior extração e amplificação do DNA, seguindo o mesmo protocolo
descrito acima.
4.2.4 Avaliação do tempo de sangramento
A avaliação do tempo de sangramento foi realizada com o objetivo de
verificar a função hemostática dos animais. O método utilizado neste estudo foi
o Duke (LABES, 2011). Após contenção física, realizou-se uma pequena
incisão em um vaso de pequeno calibre no lóbulo da orelha de cada animal
com uma agulha descartável (calibre 30 mm x 7 mm), secando-a a cada 30
segundos, até a parada do sangramento, sendo esse tempo cronometrado.
4.3 Transferência de resultados aos proprietários
Após o término das análises de todas as amostras coletadas, os
resultados obtidos foram entregues aos proprietários dos cães pessoalmente,
com o auxílio dos agentes de saúde de cada bairro.
4.4 Análise estatística
Para análise de concordância entre as técnicas diagnósticas utilizadas
no trabalho, foi usado o teste Kappa, e a análise dos fatores associados à
infecção foi realizada em duas etapas: análise bivariada e multivariada. Na
primeira, cada variável independente foi cruzada com a dependente (positivo
ou negativo), e as que apresentaram valor de p igual ou inferior a 20% ao teste
26
de qui-quadrado ou teste exato de Fisher foram selecionadas e submetidas à
correlação de Spearman para determinação da multicolinearidade (p>0,8),
utilizando o programa Epi-Info 3.5.1. Foi realizada, então, uma análise
multivariada de regressão logística não-condicional, com modelo final
construído através da entrada e saída das variáveis (sistema backward).
27
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 Diagnóstico
No esfregaço sanguíneo, mórulas ou inclusões de Ehrlichia foram
observadas em 47(12,4%) animais. A sorologia (IFI) teve resultados positivos
em 124 (32,7%) cães, com título de anticorpos variando de 1:20 (ponto de
corte) a 1:1280 (tabela 2). Por fim, a nested PCR apresentou resultados
positivos em 97 (25,6%) cães (ANEXO I). Foram considerados infectados os
animais com resultados positivos em qualquer das três técnicas de diagnóstico
realizadas, totalizando 178 (46,9%) cães.
Tabela 2. Distribuição da soropositividade para E. canis no município de Ituberá-Bahia
1:20
1:40
Titulação
1:80
1:160
1:320
1:640
Total
Positivos
89
08
17
04
03
03
124
Considerando os resultados da análise de esfregaço sanguíneo obtidos
nesse estudo, observa-se que eles são semelhantes aos encontrados por
Albernaz et al. (2007) e Moreira et al. (2003) que verificaram 13,89% e 15,97%
de positividade nos esfregaços sanguíneos, respectivamente, em condições
climáticas semelhantes às da região onde o presente estudo foi desenvolvido.
Santarém (2003), por sua vez, encontrou em seu trabalho 26,67% de
positividade nos esfregaços de sangue de ponta de orelha. A elevada
frequência de resultados positivos encontradas por este autor pode ser devida
ao grande número de animais na fase aguda da doença no momento da
colheita, fase de maior parasitemia, o que aumenta a possibilidade de
visualização das mórulas nos leucócitos.
Vale ressaltar que a sensibilidade do esfregaço sanguíneo para E. canis
é baixa, uma vez que depende da fase de maior parasitemia. Assim, não se
espera, comumente, encontrar alta positividade através deste método, e a
baixa frequência de resultados positivos em esfregaços sanguíneos obtida
neste trabalho é justificada pelas chances elevadas de falsos negativos. Por
28
outro lado, ao contrário da sensibilidade, a especificidade do esfregaço
sanguíneo é alta, o que significa que uma vez visualizada a mórula no leucócito
do cão, o animal está infectado.
Nos animais desse estudo a soroprevalência observada foi de 32,7%,
inferior aos valores encontrados por Nakaghi et al. (2008) e Silva et al. (2010),
os quais foram, respectivamente, de 63,3% e 42,5%. Entretanto, esse valor foi
semelhante ao encontrada no trabalho realizado por Souza (2008), de 35,6%.
A IFI só é capaz de detectar anticorpos anti-E.canis cerca de 15 dias
após o animal ser infectado, devido à necessidade de tempo para a produção
de imunoglobulinas, ou seja, em fases mais avançadas da infecção (WANER et
al., 2001). Dessa forma, este método, apesar de mais sensível que o esfregaço
sanguíneo, também possui elevadas chances de falsos negativos, o que
resulta, muitas vezes, em resultados subestimados.
Vale ressaltar que Nakaghi et al. (2008) e Silva et al. (2010)
desenvolveram seus trabalhos nas cidades de Jaboticabal e Cuiabá,
respectivamente, ambas regiões de alta prevalência da erliquiose monocítica
canina. Por sua vez, Souza (2008) realizou seus estudos em Salvador,
localidade com condições climáticas para manutenção do vetor e fatores de
risco associados à infecção semelhantes aos do município de Ituberá. Além
disso, Salvador e Ituberá são municípios muito próximos um do outro, o que
pode explicar a semelhança da soroprevalência encontrada nestas localidades.
A nested PCR detectou DNA de E. canis em 25,6% das amostras
avaliadas, valor superior aos obtidos por Carvalho et al. (2008) e Carlos et al.
(2011) em pesquisas também realizadas na região sul da Bahia, cujos
resultados foram de 7,8% e 11%, respectivamente. Estes resultados indicam
que, embora sejam municípios muitos próximos uns dos outros (cerca de 200
km de distância), as taxas de infecção para E. canis são bem diferentes. Um
dos pontos que podem justificar a diferença entre esses resultados é o fato do
município de Ituberá carecer de clínicas veterinárias e, consequentemente, da
conscientização da população sobre manejo e cuidados profiláticos com seus
animais. Aliado a isso, deve-se levar em conta que Ituberá é um município com
habitat e condições climáticas ideais para o desenvolvimento e manutenção do
carrapato vetor.
29
Comparando os resultados da análise do esfregaço sanguíneo em
relação à sorologia, a sensibilidade e especificidade do primeiro método de
diagnóstico foram de 16,13% (IC= 10,69 a 23,6%) e 89,41% (IC= 85,03 a
92,62%), respectivamente. Quando essa mesma comparação foi feita com os
resultados obtidos com a técnica de PCR, os valores de sensibilidade e
especificidade foram respectivamente 32.99% (IC= 24,44 a 42,84%) e 94.68%
(IC= 91,41 a 96,75%). A comparação realizada entre os resultados da nested
PCR e a IFI obteve valores de sensibilidade e especificidade de 43,55% (IC=
35,15 a 52,34%) e 83,14% (IC= 78,06 a 87,23%). Analisados em conjunto, os
dados acima mostram que as diferentes técnicas de diagnóstico realizadas
nesse estudo tiveram sensibilidade e especificidade diferentes. Em todos os
casos os valores de sensibilidade foram baixos e os de especificidade altos,
revelando que as chances de falsos negativos foram altas e as de falsos
positivos baixas.
Amostras de 27 cães avaliados foram positivas no esfregaço sanguíneo
e não foram à sorologia, enquanto 104 animais tiveram resultados positivos na
IFI e pesquisa de mórulas negativa (tabela 3). Ao comparar os valores de
sensibilidade e especificidade do esfregaço de ponta de orelha aos da
sorologia, nota-se que as chances de falsos negativos foram muito elevadas,
enquanto que as chances de falsos positivos foram baixas. Este resultado já
era esperado, uma vez que a sensibilidade do diagnóstico em esfregaço
sanguíneo depende da fase de infecção do animal no momento da coleta. Na
fase inicial, quando há maior parasitemia, há maiores chances de se encontrar
leucócitos parasitados nos esfregaços sanguíneos. Já nas fases subclínica e
crônica essas chances diminuem, mas aumenta a probabilidade de detecção
sorológica, uma vez que a IFI detecta anticorpos apenas após alguns dias de
infecção (Nakaghi et al., 2008). Deve-se lembrar, ainda, que na IFI pode haver
reações cruzadas com outras espécies do gênero Ehrlichia e até mesmo com o
gênero Anaplasma (SOUSA, 2006; ADHAMI et al., 2011), elevando as chances
de falsos positivos. Em relação à especificidade, como já foi dito anteriormente,
espera-se que esta seja alta no diagnóstico pelo esfregaço sanguíneo, como foi
encontrado neste trabalho.
30
Tabela 3. Comparação entre os resultados obtidos nos esfregaços sanguíneos e sorologia dos cães do município de Ituberá-Bahia.
Sorologia
Positivo Negativo Total
Positivo 20 27 47
Esfregaço Negativo 104 228 332
Total 124 255 379
Kappa = 0,06592 (IC= -0,01822 – 0,1501)
Por outro lado, 15 animais foram positivos no esfregaço sanguíneo e
negativos na nested PCR, enquanto 65 cães tiveram resultados positivos na
nested PCR, mas tiveram pesquisa de mórulas de Ehrlichia negativa (tabela 4).
Analisando a sensibilidade e especificidade do esfregaço sanguíneo
comparado ao diagnóstico molecular, nota-se, assim como na análise anterior,
que a sensibilidade foi menor que a especificidade. Entretanto, neste caso, o
valor da sensibilidade do esfregaço sanguíneo mostrou-se maior do que
quando comparado ao diagnóstico pela IFI, o que pode ser explicado pelo fato
da PCR conseguir detectar o DNA da bactéria mesmo em estágios precoces da
infecção (SUKASAWAT et al., 2000), nos quais há mais leucócitos infectados,
ao contrário da IFI. Deve-se lembrar, ainda, que o diagnóstico através de
esfregaço sanguíneo pode resultar em falsos negativos nas fases subclínica e
crônica, já que é mais sensível na fase aguda (SOUSA, 2006), o que pode
justificar o número elevado de amostras negativas na análise do esfregaço
sanguíneo, mas positivas na nested PCR.
Tabela 4. Comparação entre os resultados obtidos nos esfregaços sanguíneos e teste molecular dos cães do município de Ituberá-Bahia
Molecular
Positivo Negativo Total
Positivo 32 15 47
Esfregaço Negativo 65 267 332
Total 97 282 379
Kappa = 0,333 (IC= 0,2415-0,4245)
Por fim, comparando-se os resultados obtidos entre a IFI e a nested
PCR, 70 cães foram positivos na primeira técnica e negativos na segunda,
enquanto nas amostras de 43 animais foi detectado DNA de Ehrlichia, porém
sem detecção de anticorpos específicos (tabela 5). O fato do soro de 43
31
animais positivos pela nested PCR não possuírem anticorpos anti-E.canis pode
ser devido ao fato da IFI ser mais eficaz em estágios mais avançados da
doença, o que reduz sua sensibilidade na fase inicial de infecção. Por outro
lado, a nested PCR, apesar de não possuir limitações de detecção quanto ao
estágio da infecção, tem sua sensibilidade dependente do tipo de tecido
amostrado. Assim sendo, quando amostras de baço ou medula são coletadas,
as chances de encontrar DNA de E. canis aumentam bastante (HARRUS et al,
1998). Com isso, a ausência de detecção do DNA nas 70 amostras positivas na
sorologia pode ser justificada pelo fato destas serem provenientes de sangue, o
que possivelmente reduziu a sensibilidade da nested PCR. Adicionalmente, a
sorologia pode gerar reações inespecíficas, elevando as chances de falsos
positivos.
Tabela 5. Comparação entre os resultados obtidos nos testes sorológico e molecular dos cães do município de Ituberá-Bahia.
Sorologia
Positivo Negativo Total
Positivo 54 43 97
PCR Negativo 70 212 282
Total 124 255 379
Kappa = 0,2827 (IC=0,1835-0,3819)
Do total de cães avaliados, dezesseis apresentaram resultados positivos
nas três técnicas de diagnóstico realizadas, enquanto 193 tiveram resultados
negativos em todas elas (ANEXO I). Iqbal et al. (1994) compararam as técnicas
de IFI e PCR e concluíram que a combinação de ambas otimiza o diagnóstico,
o que reforça os resultados obtidos nessa pesquisa, onde as diferenças de
sensibilidade e especificidade dos exames nos diferentes estágios de infecção
demonstram que um complementa o outro.
5.2 Achados epidemiológicos, clínicos e hematológicos
Dos 379 cães avaliados nesse estudo, a maioria era de machos (62,5%),
menores de quatro anos (70,7%) e que habitavam zonas urbanas (85,2%),
como pode ser observado na tabela 7. Os demais achados epidemiológicos,
32
clínicos e hematológicos referentes aos cães desta pesquisa podem ser
observados nas tabelas 6 e 7.
Dos achados clínicos e hematológicos, apenas anemia e
trombocitopenia apresentaram diferenças significativas, representadas por
43,8% e 65,1% dos animais positivos, respectivamente (tabela 6). Os valores
de hematócrito, plaquetas e leucócitos variaram de 12 a 60, 15.000 a 900.000,
e 2.700 a 30.700, e foram considerados com anemia, trombocitopenia e
leucopenia os animais com valores abaixo de 37, 200.000 e 7.000,
respectivamente.
A ocorrência de anemia nos cães com erliquiose também tem sido
descrita por outros autores. Albernaz et al. (2007) e Santarém (2003)
detectaram anemia em 60,73% e em 86,67% dos animais avaliados,
respectivamente, enquanto Carlos (2005) verificou no seu estudo que os
animais positivos tiveram 3,58 mais chances de estarem anêmicos ao
hemograma. A elevada frequência de anemia em cães com erliquiose pode ser
explicada pela atuação do sistema fagocítico mononuclear sobre os eritrócitos.
Por meio deste, as hemácias são removidas da circulação e, posteriormente,
lisadas pela ação do sistema complemento. Além disso, há supressão da
eritropoiese na medula óssea, especialmente na fase crônica (MOREIRA et al.,
2003).
No presente estudo a trombocitopenia foi o achado hematológico mais
frequente nos animais avaliados. Esse resultado está de acordo com os obtidos
por Albernaz et al. (2007), Carlos (2005), Meneses et al. (2008) e Santarém
(2003), que observaram redução do número de plaquetas circulantes em
76,71%, 66,7%, 60,0% e 96,66% dos cães avaliados, respectivamente. Alguns
fatores associados à redução no número de plaquetas são o aumento no
consumo causado pela inflamação endotelial, elevação do sequestro destas
pelo baço durante a infecção, e redução do seu tempo de vida pela injúria ao
sistema imunológico que a infecção causa (HARRUS, 1999). Apesar da
presença de petéquias não ter demonstrado significância estatística, foi
observada associação destas com a trombocitopenia, uma vez que dos 14
animais com petéquias, 09 (64,3%) também estavam com plaquetas abaixo
dos valores de referência. Esses resultados corroboram com dados da
literatura, que afirmam que hemorragias são distúrbios associados à erliquiose
33
monocítica devido à redução no número de plaquetas (HARRUS, 1999; UENO
et al., 2009).
Tabela 6. Achados clínicos e hematológicos presentes nos cães positivos nos exames de esfregaço sanguíneo, sorológico e molecular, provenientes do município de Ituberá-Bahia.
Variável N Cães positivos
Prevalência (%)
OR 95% CI P-valor
Desidratação Sim Não
30 349
12 166
40,00 47,56
0,73 1*
0,34-1,57
0,54
Petéquias Sim Não
14 365
08 170
57,14 46,57
1,52 1*
0,52-4,49
0,61
Diarréia Sim Não
16 363
09 169
56,25 46,55
1,47 1*
0,53-4,04
0,61
Vômito Sim Não
34 345
21 157
61,76 45,50
1,93 1*
0,93 –3,98
0,08
Linfonodos alterados
Sim Não
83 296
42 136
50,60 45,94
1,20 1*
0,74 –1,96
0,53
Anemia Sim Não
129 250
78 100
60,46 40,00
2,28 1*
1,48 –3,54
0,0002
Trombocitopenia Sim Não
185 194
116 62
62,70 31,95
3,57 1*
2,34-5,46
<0,0001
Leucopenia Sim Não
22 357
11 167
50,00 46,77
1,13 1*
0,48– 2,69
0,94
* Referência
5.3 Tempo de sangramento
Quanto ao tempo de sangramento, o valor médio nos animais positivos
foi de 49 segundos (variando de 14 a 218 segundos) e 44 segundos nos
negativos (variando de 10 a 199 segundos). O tempo de sangramento em um
animal sadio varia de 60 a 180 segundos (LABES, 2011). Dessa forma, os
valores médios encontrados foram inferiores ao mínimo, tanto nos animais
infectados por Ehrlichia quanto nos não infectados. Sabendo-se que o tempo
de sangramento prolongado pode estar associado à trombocitopenia severa, a
análise deste parâmetro pode ser útil na avaliação subjetiva de infecção pela E.
canis, já que a redução do número de plaquetas é um achado comum nesta
doença. Como esperado, o grupo de animais positivos revelou um tempo de
sangramento maior do que o dos negativos, entretanto, não houve diferença
34
estatística significativa entre eles (p>0,05). Dos 178 cães positivos, 116
(65,16%) estavam com número de plaquetas abaixo dos valores de referência,
enquanto dos 201 negativos, apenas 69 (34,32%) apresentavam
trombocitopenia, o que reforça a hipótese da relação direta da trombocitopenia
com o tempo de sangramento prolongado.
5.4 Fatores de risco associados à infecção pela E. canis
Os fatores de risco associados à infecção foram idade, habitat, contato
com outros cães e presença de carrapatos. Os cães com mais de quatro anos
de idade, os que habitavam zonas urbanas, os que tiveram algum contato com
outros cães (domiciliados ou não) e os que estavam parasitados por carrapatos
R. sanguineus apresentaram maior predisposição à doença (tabelas 7 e 8).
Os resultados obtidos neste estudo corroboram com os trabalhos de
Azevedo et al. (2011), Aguiar (2006) e Trapp et al. (2006), que constataram que
o aumento da frequência da soropositividade dos cães estava diretamente
relacionado ao aumento da idade. Este achado pode ser explicado pelo fato de
que animais mais velhos têm maior tempo de contato com a bactéria, além de
que os cães jovens costumam ser mantidos pelos proprietários em seu
domicílio, recebendo cuidados especiais boa parte do tempo, o que,
consequentemente, reduz sua exposição ao carrapato vetor (Azevedo et al.,
2011). O parasitismo por carrapatos também revelou ser um fator de risco para
a infecção, como nos trabalhos de Santarém (2003), Trapp et al. (2006), Costa
Jr et al. (2007) e Carlos et al. (2011). Isso é esperado, uma vez que, sendo o R.
sanguineus vetor da erliquiose, o parasitismo pelo mesmo eleva a possibilidade
de infecção dos cães.
Adicionalmente, verificou-se que cães provenientes de áreas urbanas
têm maior predisposição de adquirir a doença quando comparados aos de
zonas rurais, da mesma forma que no estudo realizado por Aguiar et al.(2007).
Tal resultado pode ser justificado pelo fato da ocorrência do R. sanguineus em
zonas urbanas ser mais frequente do que em áreas rurais, onde há
predominância dos carrapatos do gênero Amblyomma (COSTA JR et al.,
2007), o que, consequentemente reduz a exposição dos cães de zonas rurais
ao vetor da E. canis. Aliado a isso, o ambiente rural acaba por agir como fator
35
de proteção para os animais que nele vivem, uma vez que nesses ambientes
as propriedades tendem a ser distantes umas das outras, o que reduz o
contato entre cães de diferentes domicílios e/ou errantes, e, dessa forma,
diminui as chances de exposição à infecção. Segundo Azevedo et al. (2011), o
contato entre cães é um fator de risco, o que também foi confirmado através
deste estudo. A explicação para isto é a necessidade da presença do cão
infectado para a transmissão da erliquiose, logo, quanto maior o contato entre
cães, maiores são as chances de exposição a um cão infectado pela E. canis.
Tabela 7. Fatores associados à infecção pela E. canis em cães positivos provenientes do município de Ituberá-Bahia.
Variável
N
Cães
positivos
Prevalência
(%)
OR
95% CI
P-valor
Sexo
Fêmea Macho
142 237
64 114
45,07 48,10
0,88 1*
0,58-1,34
0,64
Idade (anos) 1-4 > 4
268 111
114 64
42,53 57,65
0,54 1*
0,34-0,85
0,01
Carrapatos Presença Ausência
114 265
62 116
54,38 43,77
1,53 1*
0,98-2,38 0,07
Habitat Rural Urbano
56 323
18 160
32,14 49,53
0,48 1*
0,296-0,88
0,02
Contato com outros cães
Sim Não
280 99
138 40
49,28 40,44
1,43 1*
0,90 – 2,28
0,16
Dorme no domicílio
Sim Não
94 285
48 130
51,06 45,61
1,24 1*
0,78-1,98
0,42
* Referência
36
Tabela 8. Associação entre cães positivos e os fatores: idade, presença de carrapatos, habitat e contato com outros cães, no município de Ituberá-Bahia.
Variável
Odds Ration
Intervalo de Confiança à 95%
P-valor
Idade
0,53
0,33-0,84
0,0076
Carrapato 1,72 1,08-2,72 0,0211
Habitat
Contato com outros cães
0,39
1,71
0,20-0,73
1,05-2,77
0,0038
0,0296
p= 0,0716
likehood= 0,0002
5.5 Diagnóstico molecular de E. canis em carrapatos R. sanguineus
Dos 97 cães que foram positivos na nested PCR, 21 (21,6%) estavam
parasitados por carrapatos R. sanguineus em diferentes estágios do ciclo de
vida no momento da coleta. Das amostras de carrapatos dos 21 cães, duas
(9,5%) apresentaram resultados positivos na nested PCR (ANEXO I). Os dois
cães cujas amostras de carrapatos apresentaram resultados positivos na
nested PCR tiveram resultados positivos nas três formas de diagnóstico
realizadas.
A detecção do DNA de E. canis em carrapatos R. sanguineus era algo
esperado, uma vez que estes são vetores comprovados na transmissão da
erliquiose monocítica canina. Souza (2008) também investigou a presença do
DNA de E. canis em carrapatos parasitando cães de seu estudo, e observou
que 20% dos carrapatos coletados possuíam DNA compatível com E. canis.
Entretanto, estudos acerca da presença de E. canis em carrapatos ainda são
escassos no Brasil, inclusive a investigação do papel de outras espécies de
carrapato na transmissão de E. canis.
37
6. CONCLUSÕES
A partir dos resultados obtidos com este trabalho, conclui-se que o
município de Ituberá-Bahia possui quase 47% dos cães infectados por E. canis,
e em diferentes estágios da doença.
A idade do animal e o ambiente em que ele vive influenciam na
instalação da erliquiose, de maneira que cães maiores de quatro anos e que
habitam áreas urbanas tem mais chances de se infectar. Além disso, o contato
com outros cães e o parasitismo pelo vetor também revelam ser fatores de
risco para a infecção, ressaltando-se que Ituberá possui condições climáticas
favoráveis ao desenvolvimento e manutenção do carrapato vetor. Dentre os
achados clínicos e hematológicos avaliados, somente anemia e
trombocitopenia foram significantes nos cães infectados pela E. canis.
Os exames de esfregaço sanguíneo, sorológico e molecular utilizados no
estudo revelaram diferença em suas sensibilidades e especificidades, o que
indica o uso complementar dos testes para o diagnóstico da erliquiose
monocítica canina na região em estudo.
38
REFERÊNCIAS
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43
ANEXO I
Figura 1. Fotomicrografia de monócito de cão infectado por E. canis
sob a forma de mórula (seta). Panótico rápido. Aumento de 100X.
Fonte: Arquivo pessoal, 2012.
Figura 2. Esfregaço sanguíneo de ponta de orelha. Notar monócitos
de cão infectados com E. canis, onde se observam múltiplas inclusões
basofílicas (setas). Panótico rápido. Aumento de 100X.
Fonte: Souza, 2008.
44
Figura 3. Município de Ituberá-Bahia.
Fonte: www.bahiatododia.com.br
Figura 4. Localização de Ituberá na Bahia. Fonte: www.wikipedia.org
45
Figura 5. Preenchimento de questionário epidemiológico.
Fonte: Arquivo pessoal, 2012.
Figura 6. Fotografia de eletroforese em gel de agarose 2,0%, corado com brometo de etideo. Os amplímeros mostrados na foto são relativos a nested PCR para E. canis obtidos com os oligonucleotídeos iniciadores ECAN/HE3. Canaleta 1: Marcador de peso molecular em escala de 100 pares de bases (Invitrogen R), Canaleta 2: controle positivo (396pb), canaletas 3, 5, 7, 16 a 19: amostras de cães positivos (setas), canaletas 4, 6, 8, 9,11 a 15 e 20: amostras de cães negativos, canaleta 10: controle negativo. Fonte: Arquivo pessoal, 2012.
46
Figura 8. Fotografia de eletroforese em gel de agarose 2,0%, corado com brometo de etídeo. Os amplímeros mostrados na foto são relativos a nested PCR para E. canis obtidos com os oligonucleotídeos iniciadores ECAN/HE3. Canaleta 1: marcador peso molecular em escala de 100 pares de bases (Invitrogen R), canaleta 2: controle positivo (396 pb), canaleta 4: amostra de carrapato positivo (seta), canaletas 3, 5 a 7: amostras de carrapatos negativos, canaleta 8: controle negativo. Fonte: Arquivo pessoal, 2012.
Figura 7. Esquema representativo de concordância entre os resultados obtidos através dos exames de esfregaço sanguíneo (PO), sorológico (RIFI) e molecular (nested PCR). Fonte: Arquivo pessoal, 2013.
11 66
4
47
ANEXO II
Questionário epidemiológico e clínico
Proprietário
Nome:_________________________________________________________
Endereço:______________________________________________________
Zona: ( ) rural* ( ) urbana
Telefone: _______________________________________________________
E-mail:_________________________________________________________
Data de nascimento: ____/_____/______
Sexo: ( ) F ( ) M
Grau de instrução:
( ) nunca frequentou escola ( ) primário ( ) 1° grau incompleto
( ) 1° grau completo ( ) 2° grau incompleto ( ) 2° grau completo
( ) 3° grau incompleto ( ) 3° grau completo ( ) pós-graduação
Profissão/Ocupação:_______________________________________________
Horário de trabalho:_______________________________________________
Renda familiar:
( ) menos que 1 salário ( ) 1 salário ( ) entre 1 a 2 salários
( ) de 2 a 3 salários ( ) de 3 a 5 salários ( ) acima de 5 salários
Há quanto tempo você mora neste domicílio?__________________________
Há quanto tempo você possui o(s) cão(s)?______________
Onde ele(s) foram adquirido(s)?
( ) no domicílio atual ( ) outro___________________
Se possuir cão, em qual lugar do domicílio ele fica a maior parte do tempo?
( ) dentro de casa ( ) fora de casa ou quintal
Onde o cão dorme? ( ) quintal ( ) dentro de casa, no cômodo___________
Você adquiriu outro cão? ( )S ( ) N
O domicílio, mesmo que esporadicamente, é visitado por:
( ) gato ( ) roedores ( ) gambás ( ) cães errantes ( ) Outro:__________
48
Quais cuidados veterinários o seu cão recebe?
( ) Sempre levo ao veterinário ( ) Nunca levo ao veterinário
Animal
Nome:________________________________________________________
Número:_______
Raça:________________________________________________________
Sexo: ( ) M ( ) F
Idade:________
Exame físico do animal
Coloração das mucosas:
( ) icterícia
( ) anemia
( ) petéquias
Sangramentos:( ) Sim ( ) Não
Hidratação:( ) Sim ( ) Não
Petéquias:( ) Sim ( ) Não
Descrever: ______________________________________________________
Carrapatos:( ) Sim ( ) Não
Diarréia:( ) Sim ( ) Não
Vômito:( ) Sim ( ) Não
Linfonodos:( ) Alterados ( ) Normais
Tempo de sangramento:____________________________________________
Assinatura do proprietário:__________________________________________
OBSERVAÇÕES_________________________________________________
*Entende-se por zona rural o ambiente onde se localizam fazendas, chácaras ou pequenas propriedades rurais, afastadas da cidade (dados fornecidos pela Secretaria do Município de Ituberá).