214
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA CAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE PROGRAMAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA JOÃO MARCIO PALHETA DA SILVA PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO EM CARAJÁS Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia UNESP de Presidente Prudente, para obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito Presidente Prudente 2003

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

  • Upload
    ledat

  • View
    213

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA CAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE PROGRAMAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

JOÃO MARCIO PALHETA DA SILVA

PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO EM CARAJÁS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia UNESP de Presidente Prudente, para obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito

Presidente Prudente 2003

Page 2: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA CAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE PROGRAMAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

JOÃO MARCIO PALHETA DA SILVA

PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO EM CARAJÁS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia UNESP de Presidente Prudente, para obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito

Presidente Prudente 2003

Page 3: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação - UNESP – FCT – Campus de Presidente Prudente

S58p

Silva, João Márcio Palheta da. Poder, governo e território em Carajás / João Márcio

Palheta da Silva. – Presidente Prudente : [s.n.], 2004

198 f. : il., graf.

Tese (doutorado). – Universidade Estadual Paulista,

Faculdade de Ciências e Teconologia

Orientador: Eliseu Savério Sposito

1. Geografia. 2. Poder. 3. Governo. 4. Território. 5.

Carajás (PA) 6. Municípios. 7. CVRD. I. Silva, João Márcio

Palheta da.. II. Título.

CDD (18.ed.) 910

Page 4: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

AGRADECIMENTO ESPECIAL

À minha mãe, Lucimar Borges, por tudo que me deu na vida; in memoriam de meu

pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; à minha esposa, Franciele

Minhoto, por tudo e pelo apoio; e ao meu filho Enzo pela alegria que me contagia quando o

vejo.

Page 5: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

AGRADECIMENTOS

Nestes quase quatro anos que morei em São Paulo, especialmente morando

em Presidente Prudente e Clementina, poder conviver com várias pessoas que foram

fundamentais na minha trajetória acadêmica e humana foi um exemplo de vida. Exato, em 18

de fevereiro de 2000 mudei minha residência para a cidade de Prudente. Minha intenção era

perder um pouco do meu provincianismo e conhecer outras formas de perceber o Brasil.

Nessa trajetória conheci várias pessoas que me auxiliaram numa redescoberta do Brasil, dos

costumes, das culturas do modo de ser, pensar e viver da sociedade brasileira.

Quando aqui cheguei de imediato me senti estranho, tudo parecia diferente,

nada me fazia sentir pertencente ao lugar, senti falta da chuva, das músicas paraenses, das

festas, dos amigos, das noites, dos bares, da minha família, estava sozinho numa cidade cujo

significado não conseguia entender direito. Não conseguia também entender o que ela traria

para meu crescimento enquanto ser humano.

Lembro-me da primeira chuva que caiu em Prudente, foi tão bom sentir o

cheiro de terra molhada, sentir saudade de tudo. Ainda não conseguia compreender como

minha vida iria mudar completamente. Passei noites em claros, e por isso sempre chegava

atrasado às aulas da professora Carminha, não de propósito, mas porque não conseguia dormir

e tenho a mania de ficar estudando e lendo durante a madrugada, minha sorte é que as outras

disciplinas eram durante a tarde, assim conseguia assistir às aulas no horário marcado. Peço

desculpas à Carminha por esse comportamento, mas não conseguia acordar cedo, às oito

horas, pois sempre ia dormir às 6 horas da manhã.

Aos poucos ia conhecendo Prudente e as pessoas, meus professores, meus

amigos de disciplinas e de curso, ia conseguindo me sentir mais em casa. Lembro-me que

comecei a conhecer Prudente na primeira crise de saudade. Saí e conheci o Zapping, um

barzinho de música ao vivo. Comecei a ir ao cinema, ao teatro, ao Fran’z café, onde muitas

Page 6: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

noites terminavam minhas leituras tomando cafezinho. Comecei a olhar com mais

determinação a cidade e passei a entender que meu espaço, embora fosse provisório, durante

um bom tempo seria aquele, e eu precisava conhecê-lo.

Lembro-me dos conselhos de amigos que sempre me diziam que eu

precisava sair de Belém, para conhecer outros ares. Sou grato a todos eles. De repente estava

entendendo a cidade em que morava; as ruas pareciam com as de minha cidade, as pessoas

amigas, e eu não era mais estranho à cidade e nem a cidade a mim.

A universidade foi um espaço de conhecimento importante em minha

trajetória acadêmica, mas também foi um espaço de amizades, de novos amigos, de conversas

e de aprendizagem do ser humano. Todas as vezes que me olhar no espelho lembrarei com

saudades os momentos que aqui vivi, sem hierarquizá-los, todos foram importantes.

Sentirei falta do grupo de estudos que tínhamos, dos jogos de futebol no

parque do povo, das noites em que nos reuníamos na casa do Wallace ou em outro local para

conversamos sobre tudo, e assim estreitar nosso laços de amizades. Nossa turma na UNESP

nos deu amizade.

De repente, minha vida mudou. Mudei para a cidade de Clementina uns 130

quilômetros de Presidente Prudente, mas não perdi os laços com a cidade, e aqui começam

meus sinceros e eternos agradecimentos a todos que, sem exceção, foram fundamentais em

minha vida:

À Lucimar Borges Palheta, minha querida mãe, a quem devo meus

primeiros ensinamentos sobre a vida e como enfrentar meus desafios. Sem seu conhecimento

eu nada seria. Meu eterno obrigado. Amo-te.

Ao João Corrêa da Silva, meu querido pai, que há muito partiu, mas que

deixou um ensinamento profundo do que é a vida e como viver intensamente. Pelo pouco

Page 7: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

tempo que esteve entre nós, mostrando que a vida é cada momento, nunca o esqueceremos.

Amo-te.

Aos meus queridos e amados irmãos Ana Levinda, Ana Rita, João Bosco.

Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui. Amo muito vocês.

Aos meus queridos sobrinhos Julinho, Juninho, Rebeca e Mayara que com

seus sorrisos e alegrias me dão esperança de uma vida melhor. Obrigado pela força do sorriso

de vocês.

À minha esposa amada, Franciele Minhoto, que aturou meu mau humor e

minhas crises acadêmicas e que soube entender que eram passageiras, que com seu sorriso

sempre belo me fez ver que a vida é maravilhosa. Ainda bem que passou meu mau humor;

obrigado, meu amor.

Ao meu filho Enzo, que nestes nove meses me deu muita alegria

engatinhando pela casa e sempre sorrindo. Sua chegada me deixou mais feliz e acreditando

que poderia ser muito mais prazeroso escrever meu trabalho. Mesmo nas noites em que

ficamos juntos e você não saía do meu colo, o jeito era largar tudo e dedicar uma parte de meu

tempo para você, isso também me ajudou a crescer. Amo você, filho.

Aos meus professores do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Maria

Encarnação Beltrão Sposito, Eliseu Sposito, Dalton Moro, Horacio Bozzano, Iná Castro, Ana

Fany, Mauricio Abreu, Dirce Suertegaray, meu muito obrigado pelos ensinamentos.

À professora Josette Linz César, pelas sugestões. Muito obrigado.

Ao professor Nivaldo Hespanhol, pelas sugestões. Muito obrigado.

À professora Adélia Gimenes Greco, pela revisão gramatical.

Ao amigo Alan Guimarães, muito obrigado. À professora Maria Célia

Nunes Coelho, pelas sugestões, pela sua amizade e pela sua ajuda em minha trajetória. À

Francynette Melo, Fred e Maristela, obrigado pelo apoio.

Page 8: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Aos meus alunos dos Campi da UFPA de Conceição do Araguaia, Rondon

do Pará, Ourilândia do Norte, que me auxiliaram em meus trabalhos de campo e me ajudaram

a entender melhor a região que estudo. Eli Carlos, Zé Alves, Osório, Henrique, Tânia, sou

grato a todos vocês pela ajuda que recebi.

À Secretaria de Pós-Graduação do Curso de Geografia da UNESP. Muito

obrigado.

À Biblioteca da UNESP. Muito Obrigado.

Aos novos amigos Patrícia e César Gomes, amigo-irmão de tantas batalhas,

pelas discussões sempre produtivas sobre as relações de poder e a cultura brasileira. Pela sua

sincera amizade, obrigado, companheiro. Ao Wallace Oliveira, pelo companheirismo e

amizade também. Ao Antonio Firmino Neto pelas conversas sempre proveitosas que tivemos

sobre as questões brasileiras. Ao amigo Marcio Silveira pelas longas conversas sobre as

diferenças regionais, que renderam artigos muito interessantes e pela sua amizade. Ao

professor Jairo Mello, pelas sugestões, pelas conversas e pelo papo sempre agradável que

tivemos. Muito obrigado. Ao William e Lirian pela acolhida em Londrina e em Presidente

Prudente. Muito obrigado a vocês. A Aos amigos de Clementina, avó Estela, Valdi, Fernando,

Dilly e Elza, Rodrigo, Maurílio e Glória, a D. Maria e Israel, muito obrigado pela amizade.

Ao amigo paraense Luciano Rocha, pela ajuda sempre disposta em Belém e pelos papos em

Presidente Prudente; obrigado, companheiro. O que mais agradeço a todos meus amigos, além

da ajuda direta e indireta neste trabalho, é a amizade que não me deixou sentir sozinho. Sou

grato a todos vocês.

Aos amigos que fiz em Prudente, Elaine, Márcia, Carla, Helton, e a todos de

minha turma de doutorado, obrigado.

Page 9: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Ao meu orientador, professor Dr. Eliseu Sposito, pela sua orientação pela

sua sempre bem disposta acolhida em Presidente Prudente e pelas discussões acerca do tema

proposto que me fizeram avançar na minha pesquisa serei sempre grato.

Sei que esse caminho que trilhei não acaba aqui e que devo continuar

sempre olhando que os obstáculos precisam ser ultrapassados e que sempre existirão outros e

que com humildade sempre devo acreditar no conhecimento e reconhecer meus limites para

tentar superá-los. A todos que se fizeram presentes em minha vida meu muito obrigado, levo

comigo a certeza que sempre existirão novos amigos e que os que aqui fiz e os que sempre

tive serão auxiliares no meu caminho. Obrigado a todos vocês.

Escrever é uma tarefa solitária e ao mesmo tempo prazerosa e angustiante,

mas eu não teria conseguido dar mais este passo em minha vida se não tivesse um conjunto de

amigos que direta e indiretamente foram meus parceiros nesta produção acadêmica. Devo a

eles muito mais que um simples agradecimento, devo minha amizade sincera e, como já dizia

Renato Teixeira, “a amizade sincera, é um santo remédio, é um abrigo seguro, é natural da

amizade, um abraço, um aberto de mão, um abrigo, por isso conte comigo, amigo disponha,

lembre-se sempre que mesmo modesta minha casa será sempre sua”.

Page 10: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Resumo: A pesquisa aqui realizada trata da formação e relação entre grupos de poder

que articulam políticas para fazer a gestão municipal envolvendo práticas que se manifestam

no uso do território e no poder constituído no território de Carajás. Embora essas práticas

disciplinadoras de poder articulem a gestão do território diferentemente do período da

oligarquia do Tocantins, são objetos de uso e manipulação por parte da empresa de mineração

Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), e de contestação por diferentes atores sociais que

partilham o poder junto com aqueles que formam o poder local advindo da época da

oligarquia na área hoje correspondente aos municípios de Marabá, Curionópolis, Parauapebas,

Eldorado do Carajás, Canaã do Carajás e Água Azul do Norte. Dessa forma, a organização do

território em Carajás reflete a organização sócio-político-econômica, em que diferentes atores

sociais entram em conflitos ou aproximação com as práticas territorializadas de uma única

empresa (CVRD) que organiza, a partir do mercado internacional os espaços potenciais,

palcos de projetos de mineração instalados pela companhia. Tudo isto, tem provocado uma

corrida pelos recursos advindos dos royalties pagos pela empresa nos locais onde a mesma

tem projetos, e pelos diferentes interesses dos atores sociais no território para legitimar suas

práticas de poder, estimulando diferentes conflitos sociais, políticos e econômicos expressos,

sobretudo nas emancipações territoriais ocorridas desde a década de 1980.

Palavras-Chave: Poder, Governo, Território, Carajás, Municípios, CVRD.

Page 11: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Abstract: The research presented here aims to broach the formation of groups of

power – as well as their relationship - that articulate politics in order to run the management

of the territory of Carajás involving practices manifested by both the use of the land and the

power roles established in the territory. Even though those power disciplining practices

articulate the management of the territory in question differently than it used to be done

during Tocantins State’s oligarchy, they are also objects of use of the mining company

Companhia Vale do Rio Doce – CVRD – along with various social agents which share the

power with those who form the local power resulted from the oligarchy period in the area that

nowadays covers the territories of Marabá, Curionópolis, Parauapebas, Eldorado do Carajás,

Canaã do Carajás e Água Azul do Norte. In this regard, the territory of Carajás has been going

through its social, political, and economical organization in which different social agents

either conflict or approach the territorial practices of one single company – CVRD – which,

based on the international market, organizes the potential areas where their mining projects

are supposed to take place. This has been causing a rush for the resources that come from the

royalties paid by both CVRD where it runs its projects and the different social agents’

interests in the territory in order to legitimize their power practices, which stimulates various

social, political, and economical conflicts expressed especially by the territorial

emancipations that have occurred since the eighties.

Keywords: Power, Government, Territory, Carajás, Counties, CVRD.

Page 12: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

Résume: Cette recherche a, comme principal objectif, étudier la formation des groupes de pouvoir dans la région de Carajás, État du Pará et leur relations. Les groupes pratiquent la politique en adoptant un type de géstion différent de la période concernant la forte présence de la oligarchie qui commandait la région de Tocantins. Maintenant, elles ne sont plus les sujets les plus importants, mais se situent à l’aval de la Companhie Vale do Rio Doce (CVRD) et des différents organismes sociaux qui partagent le pouvoir avec les groupes qui conforment les actions sur le territoire depuis l’époque concernant le gouvernement de la oligarchie sur la región qu’aujourd’hui corresponde aux municipes de Marabá, Curionópolis, Parauapebas, Eldorado de Carajás, Canaã do Carajás et Água Azul do Norte. Ainsi, l’organisation de la région du Carajás connaît l’organisation social, politique et économique entraînée par différents organismes sociaux mais, par contre, se démontre opposée ou adopte les pratiques d’une seule entreprise, dont pouvoir s’organise à partir du marché international, ce qui resulte à l’occurrence de plusieurs conflits surtout à partir des années 1980. Mots-clés : Pouvoir, gouvernement, villes, Carajás, CVRD.

Page 13: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

LISTA DE SIGLAS

ACIC - Associação Comercial e Industrial de Curionópolis.

ACIM – Associação Comercial e Industrial de Marabá.

ACIP – Associação Comercial e Industrial de Parauapebas.

AMAT – Associação dos Municípios do Araguaia Tocantins.

ASICA – Associação das Siderúrgicas de Carajás

AMZA – Amazônia Mineração.

BASA – Banco da Amazônia.

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.

CDL – Clube de Diretores Lojistas.

CEDERE – Centro de Desenvolvimento Regional.

CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais.

CIB – Companhia Industrial do Brasil.

COOMIGASP – Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada.

COOPER – Cooperativa Mista dos Produtores Rurais da Região de Carajás.

COSIPAR – Companhia Siderúrgica do Pará.

CREA – Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.

CVRD – Companhia Vale do Rio Doce.

DNPM – Departamento Nacional de Pesquisas Minerais.

DOCEGEO – Rio Doce Geologia e Mineração.

EEPP - Equipe de Educação Popular de Parauapebas.

EFC – Estrada de Ferro Carajás.

FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional.

FDR - Fundo de Desenvolvimento Regional.

FICAP- Feira de Indústria, Comércio e Agropecuária de Parauapebas.

FLONA - Floresta Nacional de Carajás.

FNS – Fundação Nacional de Saúde.

FPM – Fundo de Participação dos Municípios.

FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de

Valorização do Magistério.

GETAT – Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins.

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

IBÉRICA – Ibérica Siderúrgica de Carajás

Page 14: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada.

IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados.

IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano

ISS – Imposto Sobre Serviços.

IUM - Imposto Único sobre Minerais.

METABASE – Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Exploração de Ferro e Metais

Básicos.

MLT – Movimento dos Trabalhadores Rurais na Luta pela Terra.

MSS - Mineração Serra do Sossego.

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

NAEA – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos.

NUCOR – Nucor Corporation.

ONG – Organização Não-Governamental.

PDS – Plano de Desenvolvimento Sustentável.

PFC – Projeto Ferro Carajás.

PGC – Programa Grande Carajás.

PIB – Produto Interno Bruto.

SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.

SEFA – Secretaria da Fazenda.

SEICOM – Secretaria de Indústria Comércio e Mineração.

SEMA – Secretaria de Meio Ambiente.

SIMARA – Simara Siderúrgica de Marabá S/A.

SIMETAL – Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos.

SIPRODUZ – Sindicato dos Produtores Rurais.

STN – Secretaria do Tesouro Nacional.

SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia.

SUMIC – Superintendência das Minas de Carajás.

TCM – Tribunal de Contas dos Municípios.

TCU – Tribunal de Contas da União.

TERRA NORTE - Terra Norte Metais.

UFPA – Universidade Federal do Pará.

Page 15: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

UHT – Usina Hidrelétrica de Tucuruí.

USIMAR – Usina Siderúrgica de Marabá

Page 16: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

16

Sumário 1 Introdução 17 2 Poder, Governo e Território 32

2.1 Refletindo sobre os Conceitos 32 2.2 Poder 34

2.2.1 Poder Local 36 2.2.2 Fragmentação do Poder 39 2.2.3 Poder: o uso do território 40 2.2.4 Poder Formal e Informal 41

2.3 Governo e Estado 41

2.3.1 Governo e Sociedade 44 2.3.2 Governo e Poder 45 2.3.3 Governo e Descentralização do Poder 46 2.3.4 Governo e Participação da Sociedade Civil 49

2.4 Território 50

2.4.1 Relações Territoriais 51 2.4.2 O Uso do Território 54 2.4.3 Território e Territorialidade 55

3 O Município de Marabá e sua Formação Territorial:

Breve consideração sobre o final do século XIX até os nossos dias 57 3.1 A Configuração Territorial de Marabá no Final do Século XIX

e Início do Século XX 59 3.2 Marabá no Contexto da Economia Local: do século XIX ao século XX 61 3.3 O Município de Marabá; Contextualizando a década de 1980 70 3.4 A Implantação dos Projetos de Mineração da

Companhia Vale do Rio Doce no Antigo Território de Marabá 81 3.5 Emancipação Territorial em Marabá 88 4 Territórios Sócio-Político-Econômicos, Relações

de Poder e Situação Financeira dos Municípios no Sudeste Paraense 95 4.1 Municípios e Suas Arrecadações:

Instrumentos de poder para a gestão territorial 100 4.2 Breve Análise das Arrecadações dos Municípios

de Marabá, Parauapebas,Curionópolis, Eldorado dos Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte 105

5 Polêmicas, Relações e Conflitos entre Poderes (da CVRD e dos poderes públicos) no Contexto das Realidades Municipais 120

5.1 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Marabá 121 5.2 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Parauapebas 133 5.3 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município

de Água Azul do Norte 141 5.4 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de

Canaã dos Carajás 149 5.5 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Curionópolis 157 5.6 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de

Eldorado do Carajás 163 5.7 Uma Visão Conjunta dos Problemas e Conflitos Municipais 168 6 Considerações Finais 177 7 Bibliografia 197 7.1 Bibliografia de Jornais 208

Page 17: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

17

1 – INTRODUÇÃO

No passado, a área correspondente ao antigo município de Marabá foi

dominada pelas elites oligárquicas tradicionais (Mutran, Almeida, Moraes, entre outras).

Atualmente, nos municípios que compõem o antigo município de Marabá (Parauapebas,

Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte), todavia, no

presente, o “poder local” é disputado por uma nova elite (composta de representantes de

empresários e pecuaristas), pelas antigas elites (foreiros da castanha tornados pecuaristas ou

seus representantes) e pelos diferentes movimentos sociais. Não só, mas particularmente

desde a década de 1980, as relações anteriormente vigentes vêm se modificando

dinamicamente, alterando as formas de gestão municipal e territorial com vistas a solucionar

conflitos através de mudanças nas formas de atuações.

Com o declínio da borracha (1912) até a década de 1970, a oligarquia dos

castanhais dominou as áreas que atualmente correspondem ao antigo município de Marabá.

Antes da 1980, as atividades da oligarquia marabaense estavam ligadas praticamente à

extração da Castanha-do-Pará e de pedras preciosas (como diamantes, por exemplo). As

famílias tradicionais, como os Mutran, Azevedo, Almeida, Moraes, Chamon, Queiroz, Leitão,

Salame, Lima, entre outras donas de castanhais, perderam forças, porém compõem ainda o

poder local dessa área. São hoje importantes aliadas das diversas empresas que se instalaram

na região. Em outras palavras, com a introdução de novos atores sociais (empresas,

fazendeiros, posseiros, etc.) a partir da primeira metade da década de 1970, houve uma

modificação nas estruturas político-sociais e econômicas desses municípios.

De um lado, os novos atores sociais capitalizados eram representados pela

CVRD, os bancos, os pecuaristas, os madeireiros, os fazendeiros empresários e fazendeiros

individuais, principalmente, vindos do Sudeste do país. De outro lado, os atores sociais não-

capitalizados eram constituídos dos muitos migrantes que vinham do Sudeste e

Page 18: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

18

principalmente do Nordeste do país em busca de empregos e terras para cultivar e/ou do ouro

dos diversos garimpos. Esses muitos migrantes foram fundamentais para alterar as relações

anteriormente comandadas e controladas hegemonicamente pelos donos de castanhais,

modificando a situação sócio-político-econômica local.

O enfraquecimento do poder das famílias tradicionais a partir de 1960, ou

mais particularmente de 1970, com a introdução de novos atores sociais no município de

Marabá, favoreceu a expansão do núcleo urbano do município e contribuiu para o avanço das

transformações político-econômicas em outras áreas adjacentes.

Os novos atores sociais nessa região organizaram-se de acordo com os

diversos segmentos sociais aos quais pertenciam. Surgiram assim: a Cooperativa de

Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP), a Associação dos Garimpeiros

de Serra Pelada, o Sindicato dos Garimpeiros, os Sindicatos dos Urbanitários, o Sindicato de

Trabalhadores Rurais, o Sindicato Patronal da Agropecuária, o Sindicato dos Trabalhadores

na Indústria de Exploração de Ferro e Metais Básicos (METABASE), o Sindicato dos

Trabalhadores Metalúrgicos (SIMETAL), além dos movimentos dos trabalhadores pela posse

e uso da terra, de forma organizada e reconhecida através de diferentes siglas, como o

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e o extinto MLT1, e as Organizações

Não-Governamentais, entre outros.

Mesmo com o surgimento e conquista de poder pelos novos atores, a

oligarquia não desapareceu, mas adequou-se às novas situações impostas pelas

1 O Movimento de Luta Pela Terra (MLT), que foi criado na Bahia, e em Curionópolis, foi formado pelo PC do B, teve uma breve atuação. Era formado por posseiros da região e tinha no ex-secretário de agricultura de Curionópolis sua coordenação no município. O movimento era apoiado por um antigo prefeito e por fazendeiros do município, que na esperança de suas terras serem desapropriadas pelo Governo Federal incentivavam suas ocupações, em conjunto com os militantes do MLT. Porém, como isso não ocorreu, o movimento perdeu força e depois da demissão do secretário de agricultura e com o final do mandando do prefeito na segunda metade da década de 1990 o movimento desapareceu. Esse movimento diferente do MST não tinha o apoio da Comissão Pastoral da Terra e de entidades como a FASE, pois eles eram acusados de fazer acordos com os fazendeiros e com isso enfraquecia os movimentos que lutam pela reforma agrária. Hoje a única área em que existe posseiro, cerca de 20 famílias, é uma área da fazenda do ex-prefeito, que foi o principal incentivador das ocupações.

Page 19: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

19

transformações da região. Para não desaparecer, ela vem aliando-se a alguns dos novos atores,

dando origem aos mais diferentes arranjos de poder.

Cada um desses atores sociais tem seus poderes acrescidos pela forma de

atuação e pela capacidade de aliar-se a outros atores dentro de seus respectivos territórios ou

extrapolam seus limites territoriais, compondo correlação de forças que lhes sejam favoráveis

e que lhes garantam exercerem seus poderes em diferentes períodos históricos.

As novas relações sociais estabelecidas a partir da década de 1980,

envolvendo novos agentes econômicos e atores sociais, na reestruturação sócio-espacial,

como é o caso da CVRD, empresas agropastoris, sindicato dos fazendeiros, sindicatos dos

trabalhadores rurais, Igreja, associações de moradores, Ongs, etc, também se fazem presentes.

A gestão territorial envolve práticas que se manifestam no uso do território e

no poder constituído ao longo dos anos no território de Carajás. Embora essas práticas de

poder articulem uma nova forma de fazer a gestão do território, este é objeto de uso por parte

das empresas de mineração e dos profissionais liberais que partilham o poder junto com

aqueles que formam o poder local advindo da época da oligarquia dos castanhais na área hoje

correspondente à área do antigo município de Marabá.

Sua relação direta ou indireta com a empresa Companhia Vale do Rio Doce

(CVRD), a partir da instalação do Projeto Ferro Carajás no começo da década de 1980, fez

com que ocorresse, no espaço do então antigo município de Marabá, uma fragmentação

territorial que simboliza, sobretudo, partilhar o poder e fazer novos laços entre os novos

representantes das elites locais, articulados ou não com a oligarquia do Tocantins.

O poder, dessa forma, acaba se tornando um campo de disputas entre o novo

e velho sistema de dominação exercido em Marabá. Agora empresa de mineração, bancos,

movimentos dos trabalhadores sem-terra (esse já na década de 1990), metalúrgicos,

Organizações Não-Governamentais (Ongs), movimentos de bairros, empresários, fazendeiros,

Page 20: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

20

enfim a sociedade civil em processo de organização em Carajás, formam assim o campo de

poder e dessa forma modificam as relações anteriormente estabelecidas pelos senhores dos

castanhais.

Em relação ao governo no território, poderíamos dizer que a modernização

das administrações municipais é um dos caminhos para que os municípios possam evoluir

visando a formas de planejamento competente e políticas públicas que contemplem o

conjunto da sociedade. Como exemplo podemos citar os novos municípios, como é o caso

estudado na área de Carajás, onde são quase inexistente um banco de dados e políticas que

articulem um conjunto de elementos que buscam resolver seus problemas, ou seja, que

contemplem a participação da sociedade civil e que seja prioritária para definição de políticas

públicas na forma de desenvolvimento municipal, não somente para legitimar o governo, mas

também para que haja decisão e participação nas políticas municipais.

Governo, no sentido do território em novos municípios, apresenta uma

diferenciação enquanto expressão de uma gestão compartilhada. Há tentativa, através da

pressão dos diferentes atores sociais, principalmente aqueles que se sentem excluídos dos

processos decisórios, de se inserir na definição do ato de governo, mas não como atores

passivos na modelagem do território, e sim como aqueles que têm na sua participação uma

forma de garantir seus projetos sociais e políticos, para não estarem cada vez mais à margem

dos processos econômico, social e político no município.

Porém há nesse território de Carajás uma superposição que tem a ver com a

forma de governo, ou melhor, com a legislação da área de domínio, onde prevalece um

conflito implícito entre a CVRD, o município, o Estado do Pará e a União. Nesse caso, o

governo perdeu o controle e o domínio sobre as áreas de seus interesses e se mostrou

despreparado para lidar com a questão da demanda acelerada por equipamentos urbanos a

serem disponibilizados no território. Entretanto, há uma falta de definição de competência

Page 21: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

21

quando se trata de lidar com os interesses da empresa, do município, do Estado e da própria

União, o que se reflete na ingovernabilidade dos territórios, exceto o da grande empresa de

mineração.

No entanto, podemos levantar um conjunto de questões que poderiam nos

auxiliar em nossa caminhada em busca de uma interpretação do governo estadual e dos

governos municipais em Carajás: quais seriam, então, as áreas de governo em que se pode

identificar quem tem a legislação sobre elas, a fim de, de uma forma ou de outra, impedir uma

superposição de áreas e mesmo de interesses? Há uma região de Carajás? Os municípios

desmembrados de Marabá formam uma região? O que significa governo na atual

configuração do território em Carajás, e quais são os atores sociais que modificam essa forma

de governar? Que governos estão modificando seu território em busca de recursos financeiros

para dinamizar o território e quais são os mecanismos utilizados por esses governos?

As diferenciações no território passam, sobretudo, em espaços como o de

Carajás, pela política econômica desencadeada em diferentes níveis, onde o global acaba por

influenciar as decisões locais e, no local, evidencia-se a diferença ocasionando conflitos de

diferentes naturezas.

O que se torna uma diferenciação evidenciada no território? Quais os atores

sociais que fazem com que as diferenciações aconteçam, e por que se torna tão difícil

caracterizar tais diferenciações territoriais? Seria pela sua natureza ou seria pela metamorfose

que o território sofre a partir das diferentes práticas sociais?

Para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “nas condições atuais, o

modelo econômico incidente sobre o território confere maior peso às forças centrífugas” (p.

268), o que, por sua vez, não deixa de ser verdade, pois, quando observamos Carajás,

podemos constatar que a maior parte das decisões que são tomadas sobre a regulação

econômica do território da empresa, principal “vetor” de industrialização local, são, na sua

Page 22: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

22

maior parte, decisões externas ao local. Isso, por sua vez, ocasiona, em determinados

momentos, conflitos de interesses envolvendo atores sociais e a grande empresa, ou em outros

momentos a união dos objetivos empresariais locais com o governo local.

Segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “o papel de

comando, todavia, é reservado às empresas dotadas de maior poder econômico e político e os

pontos do território em que elas se instalam constituem meras bases de operação,

abandonadas logo que as condições deixam de lhes ser vantajosas” (SANTOS; SILVEIRA,

2001, p. 291). Sendo assim, há uma particularidade no tempo histórico e no espaço geográfico

que caracteriza o comando das forças locais de organizar o território com fins econômicos:

recursos naturais de valores comercializados e escassos no planeta e sua durabilidade em

tempo geológico, como é o caso das jazidas minerais que a CVRD explora no Pará. Além do

mercado, a abundância e o alto teor dos minérios são de grande valia no mercado

internacional, o que faz com que a empresa tenha um tempo estimado para abandonar suas

operações a longo prazo.

Sendo assim, para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “cada

empresa, cada ramo da produção produz, paralelamente, uma lógica territorial. Esta é visível

por meio do que se pode considerar uma topologia, isto é, a distribuição no território dos

pontos de interesse para a operação dessa empresa” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.292).

Esses pontos estão, às vezes, diretamente ligados, como é o caso de Carajás com a escala

global, e responde a uma lógica do mercado mundial e da modernização da empresa. Segundo

Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001) “O resultado, quanto ao território, é de novo o

exercício de um controle parcial de certos pontos por lógicas que se interessam apenas por

aspectos particularizados. Quanto aos outros interesses, não respondem de forma neutra a essa

ação privativista, já que tal ação tem sobre eles reflexos indiretos” (p. 293).

Page 23: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

23

Em que medida a multiplicidade de atores sociais tem elevado a

complexidade das relações de gestão municipal nos municípios estudados? Como os

diferentes atores sociais vêm atuando e quais são as práticas por eles adotadas? Em que

medida os diferentes atores sociais através da gestão vêm participando da vida e dos destinos

municipais? Ainda, quais os momentos em que os interesses desses atores sociais aparecem

de forma mais intensa na gestão municipal? Onde começa e onde termina o papel exercido

pela CVRD na gestão dos municípios situados em área sob sua influência? Os municípios em

área de mineração ou sob a influência da CVRD têm tido mais condições de alcançar

autonomia financeira, modernizar suas administrações e gerir democraticamente seus

recursos? Nos municípios de criação recente, as barreiras colocadas pela estrutura de poder

tendem a ser menores do que nos municípios antigos, onde os valores tradicionais estão mais

arraigados?

Qual é o grau de autonomia financeira e administrativa de cada um desses

municípios? Como essa autonomia é obtida? E em que medida a articulação entre as esferas

municipal, estadual e federal tem se tornado um desafio fundamental para o sucesso do

desempenho da gestão nos problemas locais nesses municípios?

O Projeto Ferro Carajás e os projetos a ele associados vêm contribuindo

para mudança na estrutura social e, conseqüentemente, na formação do “poder local”. Assim,

a partir da década de 1980, no sul/sudeste do Pará acontece uma articulação entre os

diferentes padrões de relações existentes. As oposições aos interesses entre os diversos atores

sociais da região do antigo município de Marabá (governo local, empresas, governo estadual,

fazendeiros etc.) agravaram-se. Nesse contexto, as relações sociais tornam-se mais complexas

em escala local, já que “a localidade é menos um espaço físico e mais um conjunto de redes,

estruturadas em torno de interesses identificáveis” (FISCHER, 1992, p. 107).

Page 24: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

24

No caso dos municípios de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado

do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte podemos identificar de imediato alguns

grupos que aí sobressaem em termos de relações de poder Esse é caso da Companhia Vale do

Rio Doce (CVRD), da Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP), dos

sindicatos, das associações de moradores, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

(MST), das Organizações Não-Governamentais (Ongs), e das associações de municípios que

atuam nesses municípios. Dessa forma, o estudo do “local”2 volta-se tanto para a relação de

poder, que envolve alianças e confrontos entre atores sociais, como também para a busca por

uma identidade dos municípios e de políticas específicas.

Julgamos pertinente para o desenvolvimento da pesquisa a busca de uma

análise comparativa desses municípios recentes e antigos, porém com graus de autonomia

financeira e administrativa diferenciadas, a fim de desenvolver um quadro empírico com base

em trabalho de campo e investigar as relações que nele se configuram, identificando que

instituições, entidades ou atores sociais têm peso diferenciado dentro da área dos municípios

estudados e como os diversos atores sociais vêm as problemáticas locais e como articulam

com as instâncias de poder municipal, estadual e federal.

Nossa hipótese é de que Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Canaã dos

Carajás, Eldorado do Carajás e Água Azul do Norte são municípios com graus diferenciados

de subordinação às decisões de exploração mineral e ações de implementações de projetos da

empresa CVRD e das instâncias estadual e federal. O grau de autonomia administrativa e

financeira de cada um dos municípios reflete o bom ou o mau desempenho administrativo e a

gestão bem ou mal sucedida de seus problemas urbanos e rurais. Dessa forma, a eficácia da

gestão sócio-política, econômica e territorial desses municípios depende dos arranjos locais de

2 A concepção de “local” envolve, enquanto articulação e oposição entre os atores sociais, as interações entre interesses comuns a grupos localmente hegemônicos (PALHETA DA SILVA, 1999).

Page 25: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

25

poder e da composição com os poderes extralocais. Depende basicamente da iniciativa e

capacidade de seus governos locais de (a) estabelecer articulações entre o nível estadual e

com nacional e internacional através da busca de convênios ou parcerias; (b) gerar recursos

próprios e (c) dialogar com os atores extralocais.

Por se tratar de uma proposta inovadora, a gestão municipal envolve um

contato mais direto com a população, voltada para a descentralização do poder e participação

popular. Dessa forma, cogestão-descentralização torna-se mais democrática em torno da

capacidade de geração de recursos para decidir o que fazer, como fazer e quando fazer. Torna-

se necessário ainda avaliar como as prefeituras percebem as novas propostas de gestão

municipal e como elas vêm agindo a fim de encontrar soluções alternativas para os seus

problemas.

Nesses municípios, atuam atores sociais diversos e atores sociais comuns,

porém com complexidade variável. Esses novos municípios, criados em diferentes períodos,

têm suas peculiaridades, através das políticas direcionadas por partes do governo estadual e

federal. Destarte, torna-se necessário (1) identificar e mapear as áreas de influência dos

“novos” e “velhos” atores sociais e (2) investigar suas formas de atuação e suas

conseqüências na gestão municipal, tendo em vista as espeficidades históricas e geográficas

desses municípios. Identificar, investigar e analisar, ao nível de cada município: (a) os atores

sociais e suas práticas disciplinadoras ou não, exercidas em diferentes contextos, e seus

poderes de influência e interferência na organização e nas relações sociais, locais e regionais;

(b) as relações entre poderes locais, poder municipal e as demais esferas de poder e os

diferentes atores sociais; (c) a gestão dos problemas enfrentados pelos municípios e suas

conseqüências verificadas no antigo município de Marabá, porém distintos quanto ao grau de

autonomia financeira e administrativa; (d) analisar e comparar o grau de autonomia

Page 26: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

26

administrativa e financeira, além das formas de gestão encontradas nesses municípios,

geograficamente contíguos, de origens recentes e localizados no corredor da EFC.

Assim, o debate que envolve Poder, Governo e Território, coloca no centro

das discussões as formas democráticas que consigam elaborar canais de participação da

sociedade civil para que esta não apenas legitime os atos dos governos, mas que possam

também elaborar suas formas de desenvolvimento e colocá-las em prática.

Torna-se necessário entender as formas de desenvolvimento dos diferentes

níveis em que se encontra a sociedade civil e, por outro lado, criar parcerias em diferentes

níveis que vão desde a participação da sociedade civil organizada até a busca de novos

recursos humanos e econômico-financeiros para as administrações municipais.

A discusão dos três conceitos - poder, governo e território – foi o caminho

que optamos trilhar para entender e analisar as relações de poder que influenciam nas formas

de desenvolvimento encontradas por municípios novos e antigos que estão sob áreas de

mineração. Nesse ínterim, a área do antigo município de Marabá, que denominamos como

região de Carajás, nos servirá de objeto de análise para entender as formas de

desenvolvimento encontradas pelos municípios que surgiram a partir dos desmembramentos

ocorridos pós década de 1980 no então município de Marabá.

Esses vinte e três anos de estruturação ou de reestruturação territorial por

que passou a antiga área do município de Marabá, área onde se encontram os principais

projetos de mineração da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), principal empresa nessa

região, tem sido alvo de inúmeras pesquisas, haja vista a aceleração dos processos econômico-

sociais pelos quais tal área vem passando. A complexidade das relações sociais agravou-se

durante estes vinte três anos, e toda uma rede de processos sociais formou-se, direta e

indiretamente, em função das ações econômicas da CVRD na região.

Page 27: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

27

O surgimento de uma nova elite econômica, que se sobrepôs diferentemente

à antiga oligarquia dos castanhais, é agora formada por fazendeiros, empresários,

profissionais liberais (médicos e advogados), comerciantes, políticos, etc. E, de outro lado,

por uma rearticulação da antiga oligarquia da castanha, a fim de não perder totalmente o

poder que desde o começo do século XX vinha exercendo no então município de Marabá.

Uma rede de acontecimentos foi responsável pela fragmentação sócio-

territorial de Carajás. No começo da década de 1980, já se fazia surtir os efeitos das décadas

anteriores e um descontentamento da elite local do sudeste paraense em função da partilha

pelo poder político-econômico da região.

A relação que nos parece ser digna de investigação, entre território e

governo, é a relação do poder. A espacialidade do poder liga, a nosso ver, o conceito de

governo e território, e articula as práticas diferenciadas dos atores sociais e a gestão territorial

local.

Para nós, geógrafos, essa relação entre território e governo feita através das

relações e processos que organizam territorialmente o espaço é realizada através do exercício

do poder, institucionalizado ou não, que determinados atores sociais estabelecem como

relações diferenciadas em diferentes esferas institucionais, seja ela federal, estadual ou

municipal. Aqui, o território não é limítrofe, sua escala não é definida matematicamente, nem

fisicamente e, está em constante mutação, em se tratando das relações que dão vida a este

território: as relações sociais, suas potencialidades e seus recursos.

Pergunta-se então: como acontece a gestão territorial dentro desse conjunto

de relações e processos que estão estabelecidos e são constantemente transformados pela ação

dos atores sociais no território? Como definir quais seriam as relações de poder que unem

melhor e definem a escala de análise entre governo e território?

Page 28: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

28

A presente pesquisa justifica-se pelo fato de que são ainda reduzidas as

pesquisas sobre (a) a complexidade da gestão municipal desses municípios, ou ainda em quais

situações elas aparecem ou se modificam e (b) como se formam os poderes locais ou sobre

quem são e como atuam os atores sociais na área dos municípios de Marabá, Parauapebas,

Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte na região

sudeste paraense, que compõem os poderes locais na escala municipal.

Estudos específicos sobre a relação entre poderes locais e gestão municipal,

tendo em vista a compreensão da realidade dos municípios do sudeste paraense, ainda são

raros e pouco aprofundados. Os desafios municipais e a necessidade de encontrar soluções

novas para os diversos problemas não têm sido acompanhados pelo esforço de realização de

estudos sobre a problemática da gestão, principalmente nessa região, em que surgiram

municípios novos, onde atores sociais mais diversos se fazem presentes como é o caso da

CVRD. Essa é, entretanto, a proposta desta pesquisa, que se concentrará no exame dos

arranjos de poderes nos municípios de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do

Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte, esses cinco últimos de criação recentes e

localizados ao longo da Estrada de Ferro Carajás (EFC) no sudeste do Pará e desmembrados

do município de Marabá.

Como entender diferentes relações sociais sobrepostas de formas

contraditórias; ora fazendo seus pares no território, ora desenvolvendo ações e definindo

práticas de seus interesses? Ficamos observando e estudando essa região, da qual nos

tornamos admirador, tivemos interesse em entender e compartilhar, de forma direta ou

indireta, o conhecimento com aqueles que nos ensinaram tudo que pensamos saber sobre a

região e como também admirá-los por permanecerem na região desenvolvendo suas práticas

para melhorar as condições sociais dos municípios aos quais pertencem. Foi dessa forma que

Page 29: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

29

nos propusemos a tentar entender essa região, dentro de uma área limitada para nosso estudo,

mas com complexidade variada e peculiar.

A antiga área do município de Marabá parece ser um amplo laboratório

social para se desenvolverem pesquisas que possam contribuir para melhorar as formas

sociais que fazem dessa área uma das mais importantes do Estado do Pará e do Brasil, por

possuir uma infinidade de recursos naturais para o desenvolvimento do País, bem como é, ao

mesmo tempo, palco de inúmeros conflitos envolvendo diferentes atores sociais que

desenvolvem práticas sociais no território.

Realizamos nossa pesquisa concentrando esforços na revisão bibliográfica

sobre os conceitos analisados na tese. Na elaboração dos capítulos realizamos também

Pesquisa Bibliográfica sobre a área do antigo município de Marabá (Pesquisa Bibliográfica e

documental em Instituições para levantamento de dados nos municípios Estudados:

Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM); Tribunal de Contas dos

Municípios do Estado do Pará (TCM); Biblioteca do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos

(NAEA); IBGE (Belém); Biblioteca da Universidade Federal do Pará (UFPA); Fundação

Nacional de Saúde (FNS); Secretaria da Fazenda (SEFA-Pará); Tribunal de Contas da União

(TCU); Arquivo Público do Pará; SEBRAE-Pará e Associação dos Municípios do Araguaia

Tocantins (AMAT) e prefeituras dos municípios estudados).

Para melhor analisar estas questões, priorizamos elaborar na primeira parte

(Introdução) um panorama da situação de conflitos que envolvem os territórios dos

municípios estudados e a presença tanto da CVRD, como também de outros atores sociais na

desarticulação das formas de poder tradicionais que dominaram o antigo município de Marabá

através da oligarquia do Tocantins.

Na segunda parte da pesquisa priorizamos discutir os conceitos de Governo

e Território, tomando como ponto de ligação outro conceito que consideramos fundamental

Page 30: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

30

nessa tese, o de Poder, procurando estabelecer uma matriz que nos leve a analisar os conceitos

e sua aplicabilidade aos demais capítulos que tratam das questões dos municípios situados em

área de mineração no sudeste paraense.

Na terceira parte, a análise feita foi realizada sobre as relações e processos

de formação sócio-econômico-territorial do município de Marabá, antes das transformações

ocorridas durante a década de 1980, e como esse período foi de fundamental importância para

a formação e consolidação econômico-político-social de Marabá e os diferentes momentos

onde ocorreram emancipações no município de Marabá.

Na quarta parte da pesquisa, procuramos analisar e contextualizar a antiga

área do município de Marabá, durante a década de 1980, e os processos sócio-político-

econômico-financeiros que dinamizaram o período posterior e transformaram os municípios

de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul

do Norte como palco dos possíveis projetos da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD); a

dinâmica interna de cada município em relação a sua viabilidade econômico-financeira e as

formas de poder expressas através de produção sócio-político-econômica do território.

Da quinta parte em diante, vamos tratar dos municípios e de seus recursos

sócio-político-econômicos, e as materialidades das relações de poder tentando mostrar que o

território na região de Carajás é um território sócio-político-econômico, e que as relações de

poder são relações que fazem desse território um espaço de complexidades variadas, no tempo

e no espaço, pelos diferentes atores sociais nos municípios que sediam os principais projetos

da CVRD no sudeste do Pará. Com base em entrevistas e documentação que foram realizadas

in loco com atores locais envolvidos nas formas de produção do espaço geográfico,

procuramos analisar a década de 1990 e os processos que fizeram a área onde estão

localizados os principais projetos da CVRD no Pará, continuar a ser uma área que ainda tem

ações que podem levar a novas emancipações territoriais, bem como a mudança das ações da

Page 31: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

31

Companhia Vale do Rio Doce nos municípios que sediam seus projetos e estão sob sua área

de influência após suas privatização, e as implicações advindas de sua privatização para

gestão municipal de cada um dos municípios estudados.

Na sexta parte, vamos analisar como os processos analisados nos capítulos

anteriores deram à área do antigo município de Marabá a atual configuração territorial e quais

as perspectivas de desenvolvimento sócio-econômico desses municípios em razão da lógica

da privatização e dos conflitos territoriais surgidos ao longo de tempo em Carajás.

Sabemos que os diferentes conceitos interligados (poder, governo e

território) na pesquisa aqui proposta também são desafios para nós. Nestes 13 anos de

formação como aluno, professor e profissional de Geografia, temos percorrido um campo do

saber que nos tem dado prazer em continuá-lo; o campo da Geografia, principalmente, sem

deixar de lado a sua relação com outras ciências. Para nós, é um desafio trilhar neste caminho

que nós mesmos escolhemos, por gostar de fazer da Geografia um prazer na nossa vida, mas

sabemos também que é um sempre caminhar que não se acaba aqui, apenas me deixa com

mais instrumental no exercício da busca pelo conhecimento para prosseguir nesse caminho.

Page 32: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

32

2 - PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO.

A Geografia tem se preocupado com a análise dos conceitos ou noções

referentes às diversas problemáticas relacionadas ao território. Em Por uma Geografia do

Poder, Claude Raffestin (1993) analisa questões referentes ao papel da geografia política,

destacando conceitos como poder e território, questões que para nós são de extrema

relevância, e Milton Santos (1996), em A Natureza do Espaço, contribui para a análise dos

conceitos/noções que são importantes para a análise geográfica, apenas para citar dois

importantes teóricos da Geografia, dentre outros. Nessa trilha teórica, procuraremos analisar

Poder, Governo e Território enquanto instrumentais teóricos fundamentais para uma melhor

compreensão do objeto de estudo aqui proposto. São conceitos que analisaremos, não

perdendo o contexto histórico-geográfico, ou seja, a relação com a realidade dos municípios

estudados neste trabalho.

2.1 – Refletindo sobre os conceitos

Debater conceitos ou noções fazendo uma associação com a prática das

relações sociais, ou seja, os processos sociais que dão vida às formas que a sociedade

interpreta, parece ser ainda para nós um desafio. Para não cometermos o “erro”

epistemológico de confundir conceitos e noções, o exercício de revisão crítica necessita ser

feito para melhor precisar nossa pesquisa. Quando buscamos a formulação de nosso

problema, recorremos à prática de discussões de três conceitos que pensamos serem essenciais

à nossa pesquisa (Poder, Governo e Território), essa tríade que gera e está presente no dia-a-

dia das práticas sociais.

Porém, como na análise de Gilles Deleuze & Félix Guattari (1997), as

discussões que envolvem conceitos ou noções são a de “que cada conceito remete a outros

conceitos, não somente em sua história, mas em seu devir ou suas conexões presentes” (p.

Page 33: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

33

31). De uma forma ou de outra, a interpretação desses conceitos ou seu conteúdo está

expressa em práticas que o modificam a partir do momento em que as relações sociais vão se

modificando também. Eles vão afirmando mais que os conceitos “não são jamais criados do

nada” (p.31), daí o caráter material das relações sociais estar presente nos conceitos, ou seja,

há uma dialética entre essa relação do abstrato com o material, como já havia alertado Marx

em relação à crítica da economia política3.

As relações sociais em municípios-sede de atividades de mineração

(industrial associada à grande empresa, e artesanal relativa ao garimpo) no sudeste paraense

foram desenvolvidas ao longo da história dos lugares. Tais relações precisam ser

compreendidas dentro de um contexto de articulação entre diferentes atores sociais,

identificados em escalas diversas. Isso é essencial ao entendimento das conexões

estabelecidas entre o lugar (o município) e os agentes situados nas escalas estaduais, nacionais

e internacionais.

Destarte, as relações sociais, que são definidas por meio de práticas

diferenciadas e desenvolvidas de forma espacializada no território, carregam uma organização

que pode ser apresentada sob a forma de governo, compreendido no sentido da organização

política que envolve os órgãos oficiais do país, Estado ou município, e que aborda a

organização político-social dos diferentes atores sociais que materializam suas ações no

território.

Poderíamos organizar nosso pensamento partindo dos vínculos existentes

entre Poder, Governo e Território. A inter-relação que existe entre esses conceitos encontra-se

expressa na prática sócio-político-econômica observada nos municípios ou nas ações

espacializadas dos atores sociais, que participam da vida sócio-política dos municípios em

geral.

3 Contribuição à Crítica da Economia Política. Karl Marx. 2ª ed. (tradução de Maria Helena Barreiro Alves). São Paulo: Martins Fontes, 1983.

Page 34: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

34

Toda e qualquer ação que a sociedade desenvolve acontece/materializa-se

no território através de relações sociais entre os níveis mais diferenciados nas escalas social,

política, econômica e cultural.

Milton Santos e Maria Laura Silveira nos colocam a importância de

entender que “a categoria de análise é o território utilizado” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.

247). Sendo assim essa utilização do território, continuam os dois autores, “Quando

quisermos definir qualquer pedaço do território, deveremos levar em conta a interdependência

e a inseparabilidade entre a materialidade, que inclui a natureza, e o seu uso, que inclui a ação

humana, isto é, o trabalho e a política” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 247).

Os usos do território caracterizados por Milton Santos e Maria Laura

Silveira (2001) permitem-nos analisar a relação dos conceitos e das noções e aplicá-los ao

nosso objeto de pesquisa, evidenciando a relação entre trabalho e política e esses na relação

entre Poder, Governo e Território. A produção do território na definição das diferentes formas

de territorialidades implica práticas sociais, práticas essas que diferenciam territórios e se

diferenciam no território. Dessa forma, Poder, Governo e Território estão dentro desta análise,

mas não como as únicas formas de entender a utilização do território, mas como elementos

que podem contribuir para dar enfoque em determinados momentos da produção desse

território.

2.2 - Poder

Quando falamos em poder, devemos definir ou contextualizar da melhor

maneira, porque nosso objeto de pesquisa necessita ter interface com a escala de análise que

queremos explicitar, ou melhor dizendo, revelando uma matriz de análise que nos permita

caracterizar melhor as relações de poder dentro do território que é o nosso caso neste estudo.

Page 35: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

35

Como ponto de partida, o poder pode ser caracterizado, no referente estudo,

como um campo de forças (BOURDIEU, 1998) que envolve, de maneira diferenciada, atores

sociais que buscam exercer uma relação de poder dependendo do momento histórico para

assim tentar reproduzir suas relações sociais. Poder aparece como um conteúdo diferenciado;

dessa forma, devemos explicitar que tipos de relações de poder estamos tratando, para não

confundir com outras relações de poder.

Pode acontecer que, em relação às formas de poder, ao criarem (os

movimentos sociais organizados, ONG, etc.) um campo de atuação diferenciado de outros

campos que comportam poder, estimulam comportamentos sociais que produzem efeitos no

ordenamento do território. A formação de um determinado grupo que articula relações de

poder pode fazer com que ocorra uma criação diferenciada de relações que esses grupos

configuram em determinados momentos históricos, onde poderão ou não se encontrar

enfraquecidos por utilizarem tais mecanismos para dar continuidade na partilha pelo poder.

Dessa forma, a relação que estimula o poder é definida pela relação social e

pelo posicionamento de atores sociais na resolução de seus objetivos no território para

garantirem sua reprodução e fortalecerem seus laços dentro de uma determinada ordem social.

O poder político-social (DANIEL, 1988; BOBBIO, 1997), aqui definido

pelas suas ações que produzem efeitos no território, é co-relacionado ao campo de poder que

se forma toda vez que existem diferentes interesses no território onde os mesmos não

alcançam um grau de negociação, ocorrendo assim uma fragmentação na disputa pelo poder,

onde os grupos mais coesos tendem a sobressair.

Dessa forma, podemos entender que as múltiplas faces do poder se

manifestam em estruturas político-econômicas, que de uma forma direta e indireta interferem

no poder local, constituindo formas contraditórias que demonstram a fragmentação do poder.

O poder que aqui analisamos é o composto por interesses político-econômicos que dão um

Page 36: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

36

conteúdo diferenciado nas relações dos atores sociais. Isso não quer dizer que sejam anuladas

outras formas de expressar o poder (ARENDT, 1994; DANIEL, 1988; BOBBIO, 1998;

FOUCAULT, 1979; LEDRUT, 1981; FISCHER, 1992; DAVIDOVICH, 1993). Podemos

então dizer que, em determinados momentos, o poder torna-se inerente à vontade econômico-

política de determinados atores que disputam a hegemonia do poder local, porém não anula a

participação de outros, que, inseridos no momento histórico, têm seus interesses diferenciados

dos demais, que estão no poder.

2.2.1 - Poder Local

Por Poder Local entendemos as relações que delimitam e reorganizam o

poder entre os diferentes movimentos sociais, não somente da estrutura municipal, imposta

pelo poder legal, conferido aos governantes, através principalmente de alianças político-

econômicas, mas também daqueles que interferem nas práticas das políticas municipais no

reordenamento territorial (DANIEL, 1988).

O poder local que aqui discutimos, ou seja, o poder social e político, está

relacionado tanto à questão da institucionalização do poder, ou seja, o constitutivo formal

onde a sociedade é poder por excelência, quanto às outras formas de exercício do poder, que

são formas oriundas do conjunto da sociedade civil organizada, que as exercem por meio do

poder sócio-político-econômico.

Para Filomeno (1997), “Poder político aparece com a institucionalização do

poder social e com a criação do Estado, que é sociedade política por excelência”

(FILOMENO, p.125). O poder não é neutro, as relações que são exercidas através dele

expressam sem dúvida a vontade daqueles atores sociais que estão em determinados

momentos históricos no poder ou no controle, seja do Estado seja da economia; enfim, como

Page 37: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

37

ressalta Filomeno, surge um núcleo peculiar de poder onde existem determinados fins e

propósitos (FILOMENO, 1997).

Esse poder, que se faz por alianças, define práticas diferenciadas entre

atores sociais que participam na mesma escala de poder, ou melhor dizendo, que possuem

interesses comuns. Pode carregar também conflitos internos que permitem verificar

fragmentos de interesses e, posteriormente, afetará a relação de poder.

Dentro desse contexto podemos destacar

Os grupos de pressão nada mais são do que entidades, agremiações ou instituições que, para defenderem interesses próprios ou da comunidade em geral, influem direta ou indiretamente nas deliberações governamentais (de cunho legislativo e executivo). São exemplos disso as associações de classe, sindicatos, grupos empresariais, bancos e suas entidades representativas, as diversas igrejas, a imprensa etc. (FILOMENO, 1997, p. 128).

Dessa forma, podemos observar que as possíveis neutralidades do poder

institucionais não existem, e que essas entidades interferem, como foi destacado acima

(através dos grupos de pressão), nas deliberações a serem efetivadas no território. As

articulações entre as escalas de poder permitem verificar também, dentre outras coisas, a

materialização de interesses exógenos e endógenos no território (SANTOS, 1996). O poder é

uma relação instável em que os conflitos surgem constantemente obrigando as relações de

poder a serem refeitas a todo momento dentro da sociedade.

Celso Daniel (1988), analisando o poder local no Brasil, define três formas

de poder: o poder econômico local, o poder social local e o poder político local. Assim para

ele,

O exercício do poder econômico local é levado a efeito a partir de instituições específicas, que possuem ser as próprias empresas, isoladas ou agrupadas, ou mesmo uniões formalizadas dessas empresas em associações representativas de seus interesses (p.29). [...] o poder social local, em suas diferentes modalidades, alcança sua eficácia no plano simbólico, ainda que sempre acompanhado de um substrato material. Na realidade, não se trata de apenas um poder social, mas de múltiplas expressões sociais de poder, a que correspondem outras tantas culturas políticas, referências para a legitimação do poder político e da própria sociedade (p.30). O poder político local – fruto da conjugação dos poderes executivo, legislativo e administrativo – é

Page 38: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

38

exercido, respectivamente, as instituições do governo, da Câmara e do aparelho administrativo municipais. As decisões políticas locais, além disso; são o resultado de um processo sobre o qual os poderes econômico e social buscam exercer influência (p. 33).

As relações de bases material e econômica do poder econômico junto

àquelas relacionadas ao poder social investido nas elites locais e nos movimentos sociais

diversos são relações que definem práticas territoriais e, conseqüentemente, na gestão

territorial de uma maneira peculiar, o que por sua vez expressa que, em determinados

momentos, essas relações definem a configuração territorial que corresponde aos interesses

relacionados tanto com as empresas, quanto com as elites ou movimentos sociais na busca por

seus interesses.

Assim, a capacidade de cada ator social em produzir efeitos que modificam

as formas de gestão ou que, de uma maneira ou de outra, possibilita alcançar seus interesses,

depende, também, dessas formas de gestão, entendidas como formas de negociação

estabelecidas entre os diferentes interesses dos atores envolvidos no território e o das práticas

articuladas do exercício de poder. Os exercícios de poder são na verdade manifestações de

reorganização de forças oriundas de diferentes atores sociais, que materializam suas ações

dentro de um determinado território (PALHETA DA SILVA, 1999, p. 23).

Gestão territorial, dessa forma, envolve atores sociais, de maior ou menor

poder, num processo dinâmico (PALHETA DA SILVA, 1999, p.30), bem como o

desenvolvimento de estratégias para envolver atores interessados no destino de um

determinado espaço geográfico de atuação.

Como, então, classificar os tipos de relações de poder que interferem em

determinados momentos em diferentes escalas e que, em cada uma, produziu um efeito

diferenciado partindo de um mesmo ator social? Em escala global, nacional ou local efeitos

produzem relações diferenciadas e vice-versa, porém é na escala local que esses efeitos são

Page 39: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

39

mais perceptíveis e alcançam um número maior de problemas, embora não percamos de vista

sua produção mais ampla.

2.2.2 - Fragmentação do Poder

Nas relações sociais, as definições econômico-políticas são relações que

interferem nas práticas territoriais e definem posições dentro de um contexto político-social e

econômico vivido por esses territórios. Todas as vezes que ocorrer uma modificação das

relações sociais no território, produzida por interesses de poder diferenciados, ocorre uma

rearticulação de outras relações de poder que, por ora, estavam fora da escala de decisão

político-econômica no território e que ressurgem por causa das fragmentações e dos interesses

partilhados por outros atores sociais. Na verdade, há um complexo campo de poder que não é

definido, nem pode ser, por haver interesses diferenciados e alianças multiplicáveis

dependendo das relações que podem ser agrupadas no território em determinado momento

histórico, em virtude de um único interesse mais amplo de determinados atores sociais.

Dessa forma, as relações sócio-econômicas no território não entrariam em

contradição quando tentam conciliar diferentes interesses e mesmo assim promover o bem

estar da sociedade, sem prejuízos, sem deixar de perder de vista o desenvolvimento local? E

como articular as diferentes relações de poder não segregando parcelas significativas da

sociedade e promover o desenvolvimento sócio-econômico? Como ter um governo no

território que contemple as relações de poder e consiga fazer dessas relações diferenciadas de

poder um canal em que a sociedade possa alcançar seus interesses e desenvolver uma gestão

que envolva toda a sociedade civil?

Entender a natureza do poder e como as relações de poder se formam, quais

seus interesses e que impactos elas causarão, é uma tarefa para se ter um governo no território

que possa tentar organizar esses mecanismos da melhor maneira possível e possa também

Page 40: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

40

criar canais de participação da sociedade na elaboração de projetos para tentar conter as

diferenças sociais.

2.2.3 – Poder: o uso do Território

O poder torna-se relações de processo de uso do território, materializado ou

virtualizado pelas formas de atuação dos atores sociais locais. Sendo assim, poder é uma

relação estabelecida entre interesses divergentes com fins específicos de utilização do

território.

Os conflitos gerados pelo uso do território também são formas de poder,

embora muitas das vezes o poder esteja em risco, como afirma Hannah Arendt (1993), o que,

para essa autora, aconteceria pelo uso da força ou da violência, ou seja, só há violência onde o

poder está em risco.

O poder é objetivação política do território utilizado para se atingir

determinado objetivo, e um de seus recursos é o convencimento do outro. Dessa forma, é na

relação de poder que podemos evidenciar soluções e conflitos que podem ser gerados pela não

associação de sua prática em relação ao outro, nesse caso as relações político-econômico-

sociais entre o governo local (aqueles que representam interesses de determinados atores

sociais que os ajudaram a se elegerem) e a sociedade civil (aquela que tem dois momentos de

participação: uma que participa indiretamente do poder local; e a outra em sua maioria esta

excluída da maioria das decisões importantes tomadas no território). Que atores sociais

possuem mais poder que outros? E como articulam suas formas de uso no território? Que

parcelas do território são alvos de interesses de determinados atores sociais, e por quê?

Page 41: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

41

2.2.4 - Poder Formal e Informal

Quais são os atores sociais que mais partilham o poder e que interesses estão

em jogo? Em que esfera social ou política o poder torna-se mais ativo? Estamos numa

diferenciação entre o poder formal, institucional e poder informal advindo dos movimentos

sociais, e aqui faremos uma diferenciação entre o formal e o informal. O formal seria aquele

da instituição política, vinculada à idéia da esfera municipal, estadual e federal; e o poder

informal é o da sociedade civil organizada, incorporado no papel dos movimentos sociais

diversos e de seus representantes junto às três esferas que mencionamos.

Não estamos querendo dizer que entre essas escalas não aconteçam

associações, mas queremos apenas, para fim de análise, diferenciar seu campo de negociação.

Sabemos que, entre essas escalas, acontecem interferências, seja no poder formal, seja no

poder informal, e que entre esses poderes acontece uma dialética na definição das formas de

desenvolvimento e de uso no território.

Interferência em um tem resultado no outro e vice-versa. Uma

associação/negociação entre os poderes se faz necessária para que aconteçam tanto acordos

quanto divergências, que podem se tornar produtivos no território e fazer com que

determinada relação de poder possa ser concretizada no território com uma definição que

marca o papel de cada movimento social no território. Nessa ocasião, dependendo da decisão

tomada determinados atores sociais poderão sair prejudicados por não terem suas intenções

realizadas no território.

2.3 – Governo e Estado

Estado e Governo fazem parte da mesma unidade de controle do território.

A relação que existe entre Estado e Governo está vinculada à interdependência de suas

existências, enquanto as práticas de cada governo é algo que depende e está sujeito a um

Page 42: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

42

tempo pré-determinado, pois os governos mudam. Por exemplo, governo com intervalos de

quatro ou mais anos, garantidos pela Constituição de cada Estado. O Estado tem sido

permanente, em sua existência garantida pela constituição, fazendo com que permaneça o

mesmo em sua estrutura enquanto existe a garantia que o legitima através de sua

regulamentação pelas leis, ou seja, o Estado é um ente institucionalizado, e o governo é um

dos seus elementos essenciais.

Segundo Filomeno (1997),

Quando houver uma clara definição um núcleo de poder (governo) da sociedade (geralmente uma nação, ou mais de uma), bem como das fontes subjetivas e objetivas das normas de conduta – aqui entendidas como os órgãos que as criam – e as normas efetivamente no que tange à sua forma e características; então nós podemos dizer que nesse momento nasce o Estado. (FILOMENO, 1997, p. 63).

Dessa forma, podemos observar que o governo é uma estrutura para manter

o Estado, sua existência depende do Estado e vice-versa. Podemos então destacar que o

Estado é constituído por Elementos Materiais (Território e População), Elementos Formais

(Ordenamento Jurídico e Governo Soberano) e Final (Bem Comum). De maneira genérica,

esses seriam os elementos essenciais na configuração de um Estado. O Governo surge

precisamente da necessidade do Estado ter um núcleo de Poder e esse núcleo constituir,

também, o Estado, ou seja, um Governo composto por órgãos do Estado que exerçam controle

sobre as deliberações e sobre a legislação do território e, conseqüentemente, sobre o bem

comum de sua sociedade. Segundo Filomeno (1997), “pode ainda conceituá-lo como a

organização necessária para o exercício do poder político do Estado” (p.83).

Porém, o Estado também assume diferentes formas dependendo de seus

interesses, e daqueles que estão no poder de direcionar esses interesses. Nesse caso o Estado

permanece em contradição e conflitos, muito embora esses conflitos, para se tornarem

aparentes, necessitem dos interesses das relações sócio-econômico-políticas em confrontos,

Page 43: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

43

fazendo com que o Estado apareça nesse momento como um elemento de “violência

concentrada e organizada da sociedade”. O Estado aparece como um aparelho ideológico do

próprio capital. Na intermediação dos interesses sócio-econômico-sociais e sua utilização no

território, o Estado é contestado em seus processos de realização como produto de uma classe

social que acaba sendo representada por ele, haja vista que, quando não colocada a sua

posição em contestação, ele não se posiciona contra aqueles que em outro momento eram seus

potenciais aliados. Nesse caso, o Estado é resultado das contradições internas da sociedade e

se encontra em permanente conflito4.

A noção de Estado está relacionada com a nação politicamente organizada,

o que por sua vez implica conflitos de interesses (FILOMENO, 1997, p. 57). Dessa forma,

podemos acrescentar que a organização do Estado tem seus fundamentos na Constituição que

define normas de regulação das formas político-legislativas do território, controlando sua

sociedade e fazendo cumprir suas leis. Sendo assim, ainda segundo Filomeno (1997),

O Estado como uma sociedade organizada que ocupa um território definido e possui um governo efetivo independente de controle externo; a essência do Estado é a soberania, ou o poder de fazer executar leis, preservando a ordem social pela punição daqueles que infringem essas leis(FILOMENO, 1997, p. 58).

De acordo com certas peculiaridades de determinados territórios, podemos

dizer que, no governo, o domínio torna-se relativo quando visualizamos um conjunto

complexo de conflitos envolvendo diferentes atores sociais em busca de seus interesses. O

controle do Estado e o governo no território, quando observamos seus conceitos, vai além

deles, não fica restrito ao direito do Estado e do Governo, mas depende de um conjunto de

forças que atuam no território modificando, de acordo com seus interesses, as políticas

territoriais, o que exige uma nova análise sobre o papel dos governos locais no plano

territorial. 4 As questões referentes ao Estado tentam articular as contradições e os conflitos internos e externos gerados pelos atores sociais e pela sua representação no conjunto da sociedade e tiveram como motivações os questionamentos realizados por Marx, Engels, Lênin.

Page 44: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

44

2.3.1 - Governo e Sociedade

A própria discussão do governo remete a tempos antigos, quando Bobbio

(1997) fala das tipologias clássicas das formas de governo existentes em Aristóteles,

Maquiavel e Montesquieu. Para Bobbio, esses três autores têm uma contribuição fundamental

na discussão de governo. Segundo Bobbio, em Aristóteles, no livro A Política, há uma

classificação da constituição com base no número de governantes; em Maquiavel, apenas

monarquia e república merecem destaque; Montesquieu define três formas: monarquia,

república e despotismo.

Quando aparece a palavra governo, de imediato acontece uma ligação com

uma outra palavra: regra. Neste sentido, as relações pautadas em regras estabelecidas por

constituições, políticas oriundas de um conjunto seleto da sociedade, aqueles que são

incumbidos de fazer uma constituição para terem sob regras seus cidadãos, de uma forma ou

de outra, para que os cidadãos convirjam em ordem segundo a regra “socialmente”

estabelecida.

Porém, em se tratando de governo, ou daqueles que estão sob um governo,

as relações que se fazem presentes em regras governamentais aparecem margeadas por

conflitos de interesses. O conjunto da sociedade na qual um governo exerce seu domínio legal

se encontra em conflito quando direitos sociais são usurpados, o que poderia ser mediado por

relações sociais, que são regras governamentais pautadas numa constituição maior, sob a qual

estados e municípios estão sub judice.

A política de Aristóteles reflete que o bom cidadão seria o bom governo e

vice-versa. Ser um bom cidadão para as relações políticas seria fundamental. Para Aristóteles,

Um cidadão integral pode ser definido por nada mais nem nada menos que pelo direito de administrar justiça e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são limitadas quanto ao tempo de exercício, de tal modo que não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de certos intervalos de tempo pré-fixados; para

Page 45: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

45

outros encargos não há limitações de tempo no exercício das funções públicas (ARISTÓTELES, 1997, p. 78).

Sendo assim, todo cidadão tem o direito de estabelecer, através do governo,

uma estrutura para manter a cidadania, ou seja, o governo precisa garantir aos cidadãos seus

direitos, assim o tempo de exercício das funções do governo poderia ser limitado, ou não,

havendo, de uma forma ou de outra, uma legislação sobre o território. Esta seria realizada

através do governo, cujas regras pré-estabelecidas organizam os setores da sociedade e

estabelecem quem poderia exercer o comando das relações territoriais.

Para Aristóteles, nenhuma das formas de governo atua para a sociedade

como um todo, todas elas têm uma tendência, e é nessa tendência que gostaríamos de alinhar

nosso pensamento. Seguindo Aristóteles, como definir então para quem se governa segundo a

forma de governo? Para ele,

Se os cidadãos em sua maioria fossem ricos e controlassem o governo, essa maioria no governo seria democracia? Da mesma forma, se em algum lugar os pobres fossem menos numerosos que os ricos e detivessem o poder por serem mais forte, poder-se-ia dizer que o governo seria oligárquico por ser controlado pela minoria?...Riqueza e liberdade são os fundamentos para as reivindicações das duas classes quanto ao exercício do poder político (ARISTÓTELES, 1997, p. 92).

Segundo a afirmação de Aristóteles, poderíamos analisar o pacto político em

relação ao governo, quando grupos chegam ao poder governamental através de representações

de setores da sociedade civil e que, em determinados momentos históricos, dominam as

relações locais e que quando não ascendem ao poder elegem seus representantes, o que, por

sua vez, pode provocar conflitos de interesses entre setores da sociedade que não foram

contemplados.

2.3.2 - Governo e Poder

O governo, sob a égide do conflito social, clama por definições e práticas

contraditórias dependendo da maneira como são estabelecidas as relações sócio-politico-

Page 46: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

46

econômicas num determinado território. Dessa forma, em determinados momentos históricos,

atores sociais competem pelo poder político e por decisões que são além de sociais, relações

político-econômicas. A forma de governo assume determinados padrões não lineares,

podendo variar conforme o curso das relações sócio-políticas. Isso depende das forças de

poder que participam das disputas pelos territórios sob diferentes interesses conflitando na sua

maioria quando estabelecem práticas autoritárias de poder para fazer valer a vontade de

determinados segmentos sociais.

2.3.3 - Governo e Descentralização do Poder

Outro fator, essencial no governo, refere-se à questão da descentralização

como forma de atribuição de poder em sua mais variada conceituação. É dado poder de

decisão para os governantes e poder para a sociedade decidir sob a forma de distribuição dos

recursos existentes no território, ou seja, a sociedade passa a ter um certo poder de decidir

sobre a forma de organizar o desenvolvimento no território. Os canais que a sociedade devem

ter para decidir junto ao governo municipal são de extrema importância para o

desenvolvimento local.

Descentralizar significa, a nosso ver, atribuir um conjunto de relações

fiscais, econômicas, jurídicas e sociais etc., para que o governo e a sociedade possam decidir,

no território, relações que possam contribuir para o município ter condições de

desenvolvimento efetivo.

Governo significa associação e parceria entre o poder público e a sociedade.

Sem essa união não será possível um desenvolvimento que, mesmo com conflitos e

desigualdades, leve o município a pensar possibilidades de resolução dos problemas urbanos e

rurais. Torna-se necessária a construção de canais de participação da sociedade civil no

governo municipal, ampliando essas relações às esferas estadual e federal. Isso implica

Page 47: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

47

relações de poder que podem ser negociadas para melhor definir as formas de

desenvolvimento de diferentes setores da sociedade, mas sem perder de vista seu contexto

mais amplo, que implica associar diferentes escalas. Nem sempre essas relações de poder

serão negociadas sem conflitos de interesses envolvendo diferentes atores sociais e, mesmo

aqueles que têm interesse comum em um momento, podem entrar em conflito em outro

momento, dependendo do grau de interesse que esteja em discussão e das relações de poder

que estejam em jogo.

Ao analisar as definições de governo, temos a impressão que estão

carregadas de uma maneira formal de legalizar ações, de manter comportamentos, de

legitimar atos, e de formalismo através de regras preestabelecidas. Embora a palavra controle

esteja também presente no ato de garantir comportamentos, é através de regras que o controle

assume seu papel significativo no ato de governar.

Porém, em outro ponto de vista, para que esse governo seja legitimado no

território através de suas ações, torna-se necessário que tenha um efeito positivo para

diferentes atores sociais, muito embora saibamos que essas diversidades de atores e de

interesses acabem fazendo com que ocorram conflitos em virtude dos anseios e das

contradições sociais existentes no território. Este, por sua vez, tem que incluir a sociedade,

construindo canais de negociação para que essa sociedade tenha papel ativo, participação

efetiva nas políticas municipais, definindo formas de desenvolvimento em conjunto com o

governo local.

Segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001),

Fala-se hoje muito em guerra fiscal, na medida em que a disputa de Estados e municípios pela presença de empresas e a busca pelas empresas de lugares para se instalar lucrativamente é vista sobretudo nos seus aspectos fiscais. A realidade é que, do ponto de vista das empresas, o mais importante mesmo é a guerra que elas empreendem para fazer com que os lugares, isto é, os pontos onde desejam instalar-se ou permanecer, apresentem um conjunto de circunstâncias vantajosas do seu ponto de vista. Trata-se, na verdade, de uma busca de lugares “produtivos” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 296).

Page 48: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

48

O papel desempenhado por grupos empresariais no controle de

determinadas atividades econômicas no território acaba, por sua vez, fazendo com que

ocorram conflitos pelas disputas de projetos a serem efetivados nos territórios,

proporcionando as disputas dos lugares por atividades econômicas e os favores fiscais que

cada lugar oferece para atrair determinados empreendimentos econômicos. Embora a escala

local mereça ênfase neste estudo, não podemos esquecer que ela faz parte de um conjunto

maior, que é o governo estadual, o federal e as implicações internacionais que modificam as

relações sócio-econômicas em todas essas escalas. Segundo Milton Santos e Maria Laura

Silveira (2001), “de modo geral, e como resultado da globalização da economia, o espaço

nacional é organizado para servir às grandes empresas hegemônicas e paga por isso um preço,

tornando-se fragmentado, incoerente, anárquico para todos os demais atores” (SANTOS;

SILVEIRA, 2001, p. 258).

A organização econômica do território realizada pelos grandes grupos

econômicos acaba por projetar, também, problemas na ordem social, onde a migração pela

busca de empregos nesses projetos e de melhores condições de vida acaba por acarretar

problemas sérios ao lugar, apenas para citar um dos elementos que os grandes

empreendimentos atraem quando selecionam determinados territórios como ponto para sua

implantação. Geralmente esses pontos econômicos são territórios potenciais para o

empreendimento da empresa, o que por outro lado acaba gerando problemas sérios para os

governos locais, que, na sua maioria, apenas conseguem ver o lado positivo dos projetos,

através dos impostos e geração de empregos, sem se preocupar com os problemas que

poderiam ser gerados a partir de suas instalações.

Esses fatores reabrem uma discussão salutar nos planejamentos territoriais,

sobre que tipo de sistema de governo se exerce a soberania do Estado e, conseqüentemente,

do governo local, considerando o papel dos lugares (municípios) na capacitação de atrair

Page 49: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

49

recursos econômicos para seus territórios e o papel desempenhado pela sociedade civil na

organização da gestão territorial.

Em relação à gestão territorial dos governos locais, podemos analisar que

tipo entrou na discussão para fundamentar nossa análise quando se discute a relação entre os

interesses públicos do governo e privados dos grandes grupos econômicos. Nossa forma de

governo republicano nos permite visualizar

o modelo de valorização do poder em um espaço territorial menor está vinculado à idéia de espaço econômico, cultural e político que fundamenta a unidade municipal, e sua viabilidade econômica deve ser fator primeiro a ser observado na recomposição dos municípios brasileiros, possibilitando a construção de uma nova federação onde os municípios cumpram o papel mais importante de construção de uma democracia, e de uma cidadania plena a ser exercida pela população (MAGALHÃES, 1999, p. 118).

As relações exógenas permanecem reordenando as relações político-

econômicas do território, modificando a função dos lugares (municípios), e sobrepondo

poderes e interesses entre o público e o privado. Podemos ver a força da globalização

econômica modificando as relações territoriais e a pressão dos grandes grupos econômicos

modificando a economia local, conectando o território às diferentes escalas, em conflito com

diferentes interesses e com as formas de gestão territorial.

2.3.4 - Governo e Participação da Sociedade

Diante do exposto, como podemos entender o poder institucional e a

sociedade civil sem o processo de organização para que ocorra mudança significativa na

gestão territorial? Podemos ver na afirmação de José Luiz Quadros de Magalhães (1999):

não serão a forma de Estado e o sistema de governo que permitirão a mudança, mas sim a criação de condições sociais e econômicas e o estabelecimento de canais de comunicação e participação, de uma população informada, que permitirão a mudança constante e a evolução permanente do processo democrático juntamente com as transformações do ser humano (MAGALHÃES, 1999, p. 62).

Page 50: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

50

Assim, o papel desempenhado pela sociedade civil é um dos caminhos para

uma melhor gestão municipal; com os canais de participação dessa sociedade ampliam-se as

possibilidades de mudanças significativas na gestão territorial, e dessa forma, para que as

decisões sobre a organização econômico-social do território possam ser democráticas e tentar

amenizar os problemas urbanos e rurais de cada lugar.

Outra forma de conceber tal organização é a relação que se poderia fazer

sobre o papel de decisão dos lugares (municípios) como entes federados a partir da

Constituição de 1988, que atribuiu aos municípios mais poderes decisórios. Aqui tratamos do

governo republicano de caráter federalista, como é conhecida a república brasileira, que é

nossa forma de governo. Nesse contexto, a descentralização do governo no território pode ser

pensada sob o ângulo das mais diversas correntes político-econômicas em se tratando de

sistema de governo.

2.4 - Território

O território que aqui tentaremos abordar em uma breve discussão é o dos

geógrafos, aquele das relações e das múltiplas territorialidades/materialidades sociais. O

território que vamos analisar é o político-econômico-social, onde as práticas dos diferentes

atores sociais se materializam, sejam elas internas ou externas ao território. Nessa perspectiva,

optamos pelo uso do conceito de território, pois esse oferece, em termos de abordagem

teórico-metodológica, parte significativa da existência do Estado e conseqüentemente do

governo. O território é a institucionalização do poder por excelência e é nele que podemos

evidenciar os conflitos de interesses entre a institucionalização do poder (poder formal) e os

poderes que lhes são paralelos (poder informal) e que buscam satisfazer seus exercícios

convergindo ou divergindo dele (PALHETA DA SILVA, 1999).

Page 51: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

51

A utilização do conceito de território pelos diferentes atores sociais

caracteriza a luta pelo poder que envolve conflitos por definições de territórios. As práticas

reveladoras de interesses dentro do campo de poder (BOURDIEU, 1998) envolvem interesses

contrários e convergentes.

Como, então, discutir as práticas reveladoras de ações sociais5 que se

materializam no território e definem campo de poder associados aos atores sociais portadores

de diferentes interesses? Que atores sociais têm mais peso que outros no uso do território

específico num momento histórico particular? Quais são as alianças e os conflitos gerados

pelo uso do território? De que forma os atores sociais usam o território definindo práticas de

poder? Esses são alguns questionamentos que aparecem quando nos deparamos com um

campo de poder conflituoso, no qual os exercícios do poder e de suas práticas reorganizam o

território e definem a gestão territorial dos governantes e dos sujeitos das políticas

governamentais.

O território, dessa forma, torna-se um palco de relações e processos no qual

os atores sociais definem suas práticas espaciais de poder e sua territorialidade. O território

parece, de imediato, um campo de forças de poder diferenciado, com graus distintos de

legalidade. Determinados tipos de atores sociais se unem, através de sindicatos, ONG,

movimentos de bairros etc, para, por meio de sua organização, poder fazer partilhar ou tentar

partilhar o poder no território.

2.4.1 - Relações Territoriais

A territorialização das ações que marca a presença no território “conduzida”

por atores sociais é caracterizada pela diferenciação de interesses que forçaram 5 Para Émile Durkheim “é fato social toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independe de suas manifestações individuais” (DURKHEIM, p.13). Utilizamos aqui o termo ações sociais com a finalidade mais ampla no conjunto do atores sociais que modificam as relações sociais presentes no território, definindo práticas disciplinadoras de atuação.

Page 52: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

52

posicionamentos diferentes causando conflitos no território. Os atores sociais possuem, a

partir de seus interesses, posições que delimitam seus respectivos poderes no território,

definindo e redefinindo suas territorialidades. A luta expressa por meio de conflitos reais e

latentes entre atores sociais de interesses diversos redefinem um território mais ou menos

sujeito às interferências, tanto internas como externas, de outros atores situados em escalas

diferentes que tentam reorientar o local a partir de seus próprios interesses.

Conseqüentemente, na imagem desejada de um território nem sempre se revela o

planejamento pretendido pelo ator social ou por atores sociais, demonstrando a multiplicidade

de interesses e as interferências que se caracterizam nos planos do território. As ações

político-econômico-sociais de diferentes atores hegemônicos criam a superposição de

territórios localmente estabelecidos.

Segundo Claude Raffestin (1993),

o território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator “territorializa” o espaço. Evidentemente, o território se apóia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção, a partir do espaço...Qualquer projeto no espaço que é expresso por uma representação revela a imagem desejada de um território, de um local de relações (RAFFESTIN, 1993, p. 143-144).

Essa produção, a partir do espaço, é feita através do uso que a sociedade

realiza no território. Os atores sociais ao realizarem suas ações político-econômico-sociais

territorializam práticas sociais para suas permanência nele. Mas nem sempre as práticas

territoriais revelam-se como desejadas por seus atores sociais, pois elas dependem de um

conjunto de fatores de negociação e conflitos que envolvem quase sempre mais de um

interesse no território.

O território do município torna-se, assim, o locus privilegiado para análise

das práticas de gestão territorial e do campo de poder na definição do território no qual

melhor podemos evidenciar o uso do território pelos diferentes atores sociais. É no município

Page 53: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

53

que esses atores buscam resolver seus anseios e garantir seus acessos aos recursos sociais.

Para isso lutam para ampliar as possibilidades de participação efetiva nas políticas sócio-

econômico-culturais.

Quais os territórios que podemos identificar como possibilidades de ação e

transformação de diferentes atores sociais? Quais as multiplicidades territoriais que

superpõem interesses e criam campos conflituosos?

Claude Raffestin (1993), ao tratar do território e da territorialidade, levanta a

questão do poder presente no território. Assim, para ele,

os homens “vivem”, ao mesmo tempo, o processo territorial e o produto territorial por intermédio de um sistema de relações existenciais e/ou produtivistas. Quer se trate de relações existenciais ou produtivistas, todas são relações de poder, visto que há interação entre os atores que procuram modificar tanto as relações com a natureza como as relações sociais. Os atores sem se darem conta disso, se automodificam também. O poder é inevitável e, de modo algum, inocente. Enfim, é impossível manter uma relação que não seja marcada por ele (RAFFESTIN, 1993, p. 158-159).

O território, para Raffestin, é uma interferência de poder constante pelas

práticas dos atores que modificam esse território a todo instante. As relações que carregam

conteúdos de poder, ou seja, intenções a serem materializadas no território, são parciais, têm

uma intencionalidade, ou melhor, carregam a “vontade” de grupos que mantêm o poder e se

manifestam no território através de seus interesses. A característica de cada território está

carregada de diferentes intenções sobre as quais os atores expressam suas vontades no

território, territorializando relações que são marcadas pelo poder e, dependendo do contexto

histórico, de conflitos de interesses que formam o campo conflituoso no território marcado

pelo poder em conflito.

As redefinições de relações que se tornem mensageiras de soluções

elaboradas por determinados atores sociais que compartilham o poder local e que definem

formas de desenvolvimento no âmbito municipal são elementos essenciais na configuração

das práticas territoriais efetivadas no espaço do município. Todas as decisões que podem

Page 54: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

54

modificar práticas territoriais ou que podem atingir direta ou indiretamente determinados

setores da sociedade civil são relações que poderiam ser analisadas e ter como partícipes os

cidadãos dentro de uma gestão territorial participativa.

As formas que organizam o território, pelas relações que distintos atores

sociais materializam, transformam o território em campo conflituoso pelas disputas de seus

direitos. Para se resolverem direitos conflitivos, estratégias territoriais são lançadas nas

formas de ações político-econômicas e sociais.

2.4.2 – O Uso do Território

Para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), o território possui

determinados pontos que possuem uma forma modernizada que, por sua vez, atraem, para ele,

uma característica de produção. Esses territórios, acima de tudo, são pontos únicos.

Observamos que, em seus entornos, há, em geral, uma ordem diferente daquele estabelecido

pela modernização especializada, uma ordem que foge à lógica da modernização imposta no

caso por uma grande empresa, ou seja, é uma lógica diferente da lógica da organização

produtiva do território modernizado pela empresa.

Dessa forma, segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001),

as configurações territoriais são o conjunto de sistemas naturais, herdados por uma determinada sociedade, e dos sistemas de engenharia, isto é, objetos técnicos e culturais historicamente estabelecidos. As configurações territoriais são apenas condições de sua materialidade, isto é, sua significação real, advém das ações realizadas sobre elas (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 248).

Os recursos existentes no território, que são elementos de intencionalidade

através das práticas sócio-político-econômicas, materializam, segundo Milton Santos e Maria

Laura Silveira, as configurações territoriais. Dessa forma, tornam-se passíveis de serem

questionados por aqueles que se sentem excluídos dos seus usos ou que de alguma forma são

Page 55: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

55

parcialmente contemplados. Assim, tanto os recursos naturais existentes como os recursos

político-econômicos são alvos de questionamentos sociais que pleiteiam a sua socialização

para uso geral da sociedade.

O território, neste caso, passa pelas relações sociais, que também são

produto e produtores de novas configurações territoriais e definem práticas reveladoras de

diferentes interesses, partindo de diferentes atores sociais que no território expressam suas

vontades, seus anseios, enfim suas práticas sociais, culturais, econômica e política em

diferentes contextos históricos fazendo ocorrerem conflitos sociais de diferentes natureza.

Há uma flutuação entre os níveis global, nacional e local. O local assume

uma forma bem mais heterogênea que os demais, por possuir uma diferença bem mais visível

na escala municipal. É na escala local que se evidenciam essas diferenciações. As práticas

políticas, disciplinadoras ou não, de organização territorial e de relações, definem tanto a

gestão como os conflitos virtualizados pelas novas ações diferenciadas, ou não, dos atores

sociais.

No território, está expressa a vontade e a materialidade de formas

diferenciadas de poder seja ele político, econômico, social ou cultural, considerado

isoladamente ou em combinação, mas que expressam a singularidade do território e dos atores

sociais envolvidos, definindo práticas de governo em suas diferentes frentes.

2.4.3 - Território e Territorialidade

A territorialidade torna-se, assim, uma condição para se atingir a resistência

nos lugares e a organização em setores da sociedade civil para elaborarem suas metas para

atingir suas ações e seus anseios em relação ao desenvolvimento sócio-econômico-político. O

significado do território está diretamente relacionado com as diferentes territorialidades que

os atores sociais materializam por força de suas relações de poder. Buscar desenvolver

Page 56: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

56

estratégias de desenvolvimento sócio-econômico-político passa a ser objetivo dos atores, que

precisam garantir suas territorialidades.

As estratégias de territorialidades que os atores sociais materializam no

território dão origem a uma rede de relações sociais que tornam suas relações de poder mais

solidificadas. Dependendo do momento histórico e do campo de força no qual eles estão

envolvidos, criam estratégias para marcar suas presenças no território.

A classificação dos territórios faz-se a partir de suas territorialidades através

da multiplicidade de fenômenos que ocorrem no seu território e qualificam as práticas sociais

que os atores sociais desenvolvem no uso do território. As diferenciações e as práticas sociais

dependem do conjunto de forças que atuam no espaço territorial e das relações de interesses

que estão em jogo em determinados momentos históricos.

Embora a territorialidade seja obtida muitas vezes por relações de poder,

estas nem sempre são visualizadas facilmente. Mas é na escala do município que melhor

podemos evidenciá-las, como já foi dito anteriormente. Porém, toda territorialidade é uma

relação direta com a busca de interesses diferenciados entre os que se territorializam e as

outras diferentes territorialidades.

Outra tentativa de avançar sobre a questão da territorialidade e de seu

domínio político é proposta por Bertrand Badie, quando ele analisa que “não sendo uma

questão em si, o território é, pelo menos, o atributo material do objetivo visado, isto é, do

exercício do poder” (BADIE, 1995, p. 198). Porém, toda relação de poder no território é

também uma forma conflituosa de territorialidade e de materialização das ações de diferentes

atores sociais uma vez que existe mais de uma territorialidade e conseqüentemente mais de

um interesse no território.

Page 57: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

57

3 – O MUNICÍPIO DE MARABÁ E SUA FORMAÇÃO TERRITORIAL: BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE O FINAL DO SÉCULO XIX ATÉ OS NOSSO DIAS

As questões referentes aos municípios no Brasil perpassam a sua viabilidade

econômico-financeira e a possibilidade de cada um na capacitação de recursos para viabilizar

tanto o planejamento quanto o desenvolvimento municipal. A relação de viabilidade

econômica em municípios como Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás,

Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte é bem diferenciada. Marabá, o município-mãe, que

deu origem aos demais, tem sua história econômico-social pautada em economias agrárias

exportadoras, o que proporcionou o surgimento de grupos políticos locais, no domínio das

políticas públicas e na formação de uma elite oligárquica que dominou seu território durante

décadas, desde sua formação até a entrada de um outro tipo de extrativismo na região.

Destarte, com os ciclos econômicos pelos quais esse município passou e

com o surgimento de novos tipos de extrativismo, principalmente o mineral, ocorreu uma

mudança na estrutura de poder local: grupos de profissionais liberais, empresas e bancos,

passaram a exercer o poder em conjunto com a oligarquia local, ora convergindo, ora

divergindo nos seus interesses. Esse clima que ocorreu, a partir da segunda metade da década

de 1970 (EMMI, 1988), carregou indícios dos tempos áureos da borracha e da castanha, na

formação econômica do território de Marabá, onde podemos ver que a estrutura da oligarquia

local ainda subsiste, embora se tivesse rearticulado (diante de um novo modelo econômico,

que envolve diferentes atores sociais na conquista econômica do território) com os novos

atores sociais, para não perder totalmente o poder na região, através de diferentes formas de

favores políticos e união dos grupos locais de poder.

Marabá continuou com seu papel de pólo regional, em função das relações

político-econômicas que já vinham do início do século XX. Com a abertura das estradas, na

década de 1960 e 1970, e dos projetos de mineração na década de 1980 em seu território, o

Page 58: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

58

município se tornou ainda mais estratégico para o desenvolvimento do Estado e do País,

devido à exportação de produtos minerais para o mercado internacional e do valor

significativo de suas reservas minerais existentes em seu território.

No Pará e em geral no Brasil, a maioria dos municípios criados,

principalmente aqueles que foram criados pós-década de 1980 no sudeste paraense, surgiram

em razão de fatores políticos, o que tem colocado em xeque seu papel enquanto forma para se

atingir o desenvolvimento sócio-econômico local.

O município de Marabá e municípios criados a partir de sua fragmentação

territorial, na década de 1980, que analisamos aqui, não fogem ao contexto dos fatores

políticos-econômicos citados acima. Políticas arraigadas do tradicionalismo por parte das

elites oligárquicas e sem perspectivas de melhorar as condições de vida das populações foram

exacerbadas por práticas sociais que se consolidaram no domínio de municípios como Marabá

durante décadas. Na ausência de uma visão de planejamento voltada para a sua sociedade,

acabaram deixando passar momentos importantes da história sócio-econômico-política desse

município, causando graves problemas sociais, que se refletem nas atuais configurações

territoriais dos municípios e nos conflitos de poder, que se traduzem, também, nas

emancipações territoriais, aqui estudadas.

O papel desempenhado por uma elite que sustentou o poder durante décadas

e, com ele, se consolidou no domínio do poder local no sudeste paraense, manipulando as

relações político-econômicas, sobretudo, para garantir seus domínios na região e com isso

estreitar os laços políticos com a capital paraense, era uma forma de conseguir enfrentar as

crises que oscilavam entre as economias extrativistas da borracha e, posteriormente, da

castanha-do-Pará, que quase sempre os ajudavam a manter a estrutura de poder local; por

outro lado, deixava de lado os problemas urbanos e rurais de seus núcleos urbanos,

desconsiderando as verdadeiras funções do governo no município.

Page 59: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

59

Porém, o que se viu no Pará foi a formação dos “currais eleitorais” no

sul/sudeste paraense com seus coronéis no domínio das políticas municipais, centralizando,

ainda mais, o poder da federação na região, tendo como aliada a elite política da capital

paraense, da qual eram seus representantes na região. As elites que dominavam as relações de

poder no Pará precisavam assegurar seus domínios, por isso expandiram seus interesses até as

áreas mais longínquas, como a de Marabá, para garantir suas alianças tanto políticas quanto

econômicas e, assim, consolidar seu papel de dominação na fronteira, tanto com o Estado do

Maranhão, quanto a parte do Estado de Goiás (hoje Tocantins), favorecendo seus pares e,

dessa maneira, continuar na manutenção do controle político-econômico do Estado,

fortalecendo seus representantes locais.

3.1 - A Configuração Territorial de Marabá no Final do Século XIX e Início do Século XX

A formação territorial paraense tem ligação com a expansão portuguesa para

controlar a fronteira de seu território na região Norte contra a invasão de outros países. O que

fazia parte do domínio português, no século XVII, era alvo de penetrações de outras nações

européias e deveria ter um ponto estratégico para controlar a entrada da região voltada para o

Oceano Atlântico. Belém surgiu em 1616 com a fundação do Forte do Presépio, às margens

da baía do Guajará, como ponto de apoio à fiscalização da região e como área militarizada

pelos portugueses para controle da região sobre os recursos que eram objetos de invasões de

outros países, principalmente, as drogas do sertão. É a partir desse contexto que a ocupação

do território passa a ser fundamental para o controle da região, e, assim, vão surgindo

estratégias de ocupação como as missões e os fortes na região ao longo dos diferentes rios da

Amazônia.

A segunda metade do século XIX e o início do século XX foram marcados

por formas que indicavam o progresso paraense em alguns setores, como o de energia, o de

Page 60: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

60

transportes, entre outros. A capital paraense despontava como uma das cidades brasileiras

cujo o crescimento de atividades econômicas realizadas através de investimentos era um dos

mais significativos e cujo o capital local estava associado ao capital estrangeiro, que fazia a

diferença na economia local.

Relatos da viagem de Ignácio Moura6 colocam-nos diante da realidade do

século XIX na região do vale do Tocantins, e do período histórico vivido pelo Estado do Pará,

e dos investimentos que já se faziam presentes no território paraense,

o nosso regime comercial se desenvolve; as duas linhas inglesas de barcos a vapor, as linhas para a América, e as companhias alemães põem-nos em rápida comunicação com o mundo exterior. O gênio do Barão de Mauá, criando a navegação a vapor para o Amazonas, marcou meta gloriosa ao desenvolvimento do Pará [...] A par do desenvolvimento da navegação, e com ela o do comércio, as instituições bancárias se multiplicam, o valor dos bens imóveis aumenta, novos produtos se descobrem, novas aplicações são estudadas e os créditos públicos, que em 1847 mal chegavam a mil contos, em 1897 ascendem a quatorze mil (MOURA, 1989. p. 34).

Assim foram surgindo territórios econômicos no Pará, ligados tanto à

economia internacional, como aos investimentos do capital local, o que indicava de imediato

os ciclos pelos quais a economia paraense teria que passar, para atender aos interesses

econômicos internacionais, o que, por sua vez, proporcionou a formação de uma elite local,

com vínculos aos interesses ligados à escala internacional.

Essas relações econômicas favoreceram e fortaleceram a implantação da

economia local, no sudeste paraense, principalmente a economia agrária exportadora da

castanha, fazendo surgir, sobretudo, os comerciantes como força política local. Dessa forma,

outras regiões paraenses foram direta ou indiretamente se beneficiando do papel

desempenhado pela capital paraense.

Por sua vez, municípios que tinham uma certa expressão econômica como

Marabá, Tucuruí, Santarém, além de outros, constituíram-se em cidades importantes em 6 Em seu livro Ignácio Moura relata a viagem que realizou de Belém a São João do Araguaia no vale do rio Tocantins.

Page 61: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

61

virtude de suas relações político-econômicas, já que se tornaram ponto de apoio à economia

do Estado e de suas regiões. É nesse contexto que Marabá assume o papel político-econômico

proeminente dentro da região sul/sudeste paraense.

3.2 - Marabá no Contexto da Economia Local: do século XIX ao século XX

O município de Marabá foi emancipado, em 1913, desmembrado do então

município de São João do Araguaia. As relações que davam vida à sua configuração territorial

eram constituídas a partir da oligarquia do Tocantins, que tinha como economia fundamental

a castanha-do-Pará. Suas relações econômico-políticas eram exercidas por famílias

oligárquicas que tinham controle dos principais castanhais da região.

O controle dos castanhais era feito por famílias de brasileiros que vieram,

primeiramente, em busca do caucho (borracha) e, logo em seguida, por famílias de libaneses,

que, além de terem sido atraídos pela economia da borracha, tinham empreendimentos no

comércio de outras cidades do Maranhão, e que transferiram suas atividades econômicas para

Marabá. As primeiras famílias que chegaram à região tinham por objetivo a coleta da

borracha (caucho) que no final do século XIX era abundante na região de Marabá, e que tinha

mercado internacional significativo.

Segundo Brandão (1998), o território do antigo município de Marabá já

tinha sido alvo de visitas estrangeiras no século XVI, o que desencadeou a vinda de

Bandeirantes para o local, mas foi só a partir de 1892 que essa área sofreu com mais

intensidade a procura por parte de migrantes vindos principalmente do Maranhão atrás da

borracha e fugindo da guerra de Boa Vista. Tais migrantes encontravam na fronteira do Pará

com Goiás (hoje Tocantins) e Maranhão um território propício para fixarem suas atividades.

A origem e a ocupação do território de Marabá são contadas por formas

diferenciadas: a mais antiga diz respeito à estratégia de ocupação portuguesa no Pará, com a

Page 62: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

62

instalação dos fortes e com a entrada dos bandeirantes (os bandeirantes atrás de índios para

escravizá-los e atrás de ouro, foram um dos primeiros a adentrarem o corredor do vale do

Araguaia-Tocantins, seguidos pelos jesuítas, que tinham além das catequeses, interesses

comerciais nas drogas do sertão e nos minérios); a mais recente diz que no século XIX,

devido à guerra civil de Boa Vista (Goiás), refugiados da guerra migraram para a região,

ocupando áreas da região sudeste paraense onde uma delas formou o Burgo de Itacaiúnas.

Vicente Sales, prefaciando o livro de Ignácio Moura, relata a conquista do

território do Araguaia Tocantins,

O território regado pelos rios Tocantins e Araguaia foi devassado, explorado e colonizado por duas correntes de expansão, uma de sudeste e de sul para norte e outra de norte para o sul. A primeira, iniciada com os bandeirantes da Piratininga, partindo de São Paulo vinha pelos sertões adentro em procura do ouro das minas; a segunda, dos colonos portugueses do Grão-Pará, rios Tocantins e Araguaia acima, ia ao resgate de índios. Uns e outros deixavam ao longo da caminhada sinais da passagem, aqui e ali pessoas que se desgarravam ou se fixavam na terra, estabelecendo núcleos populacionais e direitos de ocupação, reconhecidos a partir de regras consuetudinárias e legitimados pela legislação colonial. Essa legislação delimitou a jurisdição das terras ocupadas e estabeleceu direitos aos territórios jurisdicionados por governos sediados em Belém, São Luís e Vila Boa de Goiás, que usaram dela para manter as terras incorporadas à sua entidade político-administrativa de capitania, de província e de Estado (SALES apud MOURA, 1989. p. 07).

A ocupação do Tocantins-Araguaia só pôde ser efetivada no século XX. Os

fatores determinantes para sua ocupação foram, a borracha, a castanha, os garimpos e o

sistema pastoril, os quais atraíram diferentes correntes migratórias para a região, como os

paulistas e mineiros (DA MATA; LARAIA, p.62-63). Essa expansão proporcionou a

instalação de povoados, como Alcobaça (hoje Tucuruí) e o Burgo de Itacaiúnas (hoje

Marabá)7. A importância desses dois núcleos urbanos foi fundamental para que, em 1927,

começasse a construção de uma ferrovia (Estrada de Ferro Tocantins, com 117 km), que só foi

7 O rio Itacaiúnas foi importante, principalmente no início do século XX, pois fazia a ligação para oeste com a Serra dos Carajás, na região que é hoje o município de Parauapebas.

Page 63: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

63

terminada na década de 1940, para dinamizar a exportação da castanha e da borracha na

região (DA MATA; LARAIA, 1978, p. 66).

Segundo Roberto da Mata e Roque Laraia (1978),

além da catequese, das bandeiras, da busca do ouro e da caça aos índios, e da expansão pastoril, devemos citar as expedições geográficas que, a partir do século XVIII, procuraram estabelecer ligações fluviais entre o norte e o sul do país, sendo ora determinadas pelo governo de Goiás, ora pelo do Pará. Dentro deste programa, para facilitar a navegação, foram fundados vários povoados e fortes (P.62).

O território paraense estava voltado muito mais para o comércio exterior

que propriamente para o restante do Brasil. Assim a borracha tinha um papel peculiar na

economia e seu valor, no mercado internacional, direcionava os movimentos da economia

paraense. O sudeste paraense, nesse contexto, teve um valor significativo para a economia do

Estado, pois no seu território o caucho teve um valor representativo e despertou o interesse de

outros comerciantes, tanto brasileiros quanto estrangeiros, que vieram para a região e

começaram a fazer a exploração dos seringais paraenses.

A área do antigo município de Marabá era então dominada por relações de

aviamento que envolviam donos de barracões e aqueles que se aventuraram na procura do

látex. Os ciclo se iniciaram no século XVI pelas drogas do sertão, passam pelo minério, pelo

ouro do vale do Tocantins, pela borracha e, entre o final do século XIX e início do século XX,

desencadearam uma corrida pelo extrativismo da goma. Era a partir dessas economias que se

dava a ocupação do território na região sudeste do Pará.

O então burgo do Itacaiúnas surgia, dessa forma, como refúgio daqueles que

fugiam da guerra de Boa Vista e vinham em busca do caucho na região, como já foi citado

anteriormente. O valor econômico da borracha e o ponto estratégico no qual estava localizado

o burgo, na confluência dos rios Tocantins e Itacaiúnas, favoreciam o comércio e o transporte

da borracha para outros locais. Vicente Sales, analisando esse período no prefácio do livro de

Ignácio Moura, relata:

Page 64: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

64

é o tempo em que Ignácio Moura é comissionado pelo governo do Estado, 1896, ainda governança de Lauro Sodré, para inspecionar o burgo de Itacaiúnas, onde, com os favores do Estado, o célebre coronel Carlos Leitão recolhera em colônia agrícola os foragidos da guerra de Boa Vista, Goiás [...] Esses conflitos, mais os que aconteceram em Conceição do Araguaia, ao tempo de frei Gil Vila-Nova, - que resultou na criação do município em 1900, - chamaram a atenção dos governos do Maranhão, Pará e Goiás. O sul do Pará começou a entrar mais decididamente na história do Estado com a criação do burgo de Itacaiúnas, que auxiliava e reforçava a ocupação da terra, o longínquo posto de Conceição do Araguaia e o destacamento de São João do Araguaia, até onde chegava a jurisdição do Grão-Pará (SALES apud MOURA, 1989. p. 15).

No período da segunda metade do século XIX, Goiás disputava as terras do

Estado do Pará que ficavam na fronteira entre os dois Estados, na região sudeste paraense,

mais precisamente onde se localizava o município de Marabá. Comerciantes, descontentes

com as políticas da capital paraense em relação ao município de Marabá, ameaçavam aliar-se

a Goiás e, assim, pedir a anexação de Marabá8 ao Estado vizinho. Devido à distância de

Marabá em relação à sede Belém, o maior contato ocorria com Goiás (hoje Tocantins) e

Maranhão, o que favorecia a vinda de pessoas dessas localidades às terras do sul/sudeste

paraense e, assim, o burgo de Itacaiúnas era formado por maranhense e goianos,

principalmente. As diferentes famílias que vieram para o então antigo município de Marabá

tinham na economia da borracha o seu “ouro negro”, e com ele pensavam, através do

comércio, aumentar seus ganhos e dinamizar o comércio local e extra-local.

Logo um dos barracões de castanha foi denominado com o nome de

Marabá, nome dado pelo proprietário, em homenagem ao poema de Gonçalves Dias. O

barracão prosperava e famílias se formavam nas proximidades dele, vindas atrás da castanha

ou para trabalhar nos castanhais. Destarte, Marabá ia tomando características de uma vila e,

posteriormente, de núcleo urbano de maior expressão na região, além de ser ponto estratégico

de comercialização da castanha. Contudo, nem sempre a economia da borracha ou da castanha

8 O pleito que elevou Marabá a ser emancipado de São João do Araguaia também está relacionado com esse episódio histórico.

Page 65: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

65

interessou quem se predispôs a penetrar no vale do Araguaia –Tocantins. Segundo Sales

(1989),

pastores e mineradores, os brasileiros do centro, ao contrário não manifestavam grande vocação para penetrar na floresta e dela extrair borracha e castanha. Logo descobriram a botija de diamantes que se escondia nos poções da foz do Itacaiúnas e do Araguaia, rolando das terras mais altas juntamente com os seixos. E assim surgiu Marabá bafejada por sua invejável localização. Em 1896 Ignácio Moura encontrará ali apenas um morador isolado, o maranhense Francisco Coelho da Silva, admirador de Gonçalves Dias, a quem se deve a denominação do sítio (SALES apud MOURA, 1989. p.16).

Os relatos de que no sudeste paraense a borracha existia em abundância fez

com que, rapidamente, houvesse um grande número de comerciantes que vieram explorar a

borracha, fazendo com que ocorresse um esgotamento das fontes seringais nas proximidades

de Marabá, o que forçou os comerciantes a rumarem em direção ao vale do Xingu, atrás do

caucho para dar continuidade ao comércio da borracha. Outro fato importante foi o fim das

duas grandes guerras mundiais e a concorrência com os seringais da Malásia que fizeram com

que a borracha tivesse uma queda significativa no mercado internacional, tornando quase que

inviável a sua exploração na Amazônia, o que prejudicou os comerciantes de Marabá.

Logo, outras atividades surgiram em função do acúmulo dos rendimentos da

borracha e houve a tentativa de saída para outro tipo de economia: a da castanha, que

sustentava os períodos de ida e vinda da economia da borracha, acabando por substituí-la.

Dessa forma, os castanhais tornaram-se a principal atividade econômica da região sudeste

paraense, especialmente, a do antigo município de Marabá.

Os castanhais, produtos dos aforamentos ocorridos no século XIX, em sua

maioria, tiveram como principais donos famílias maranhenses e libaneses, que tornaram essa

atividade meio de sobrevivência, dinamizando e substituindo a economia da borracha,

fazendo crescer o comércio local e extra-local. A economia da castanha tornou-se a atividade

Page 66: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

66

responsável pela manutenção da elite do Tocantins no comando das relações políticas de

Marabá.

Dessa forma, para exercerem o controle tanto do território como das

atividades econômicas, tornava-se necessário criar estratégias efetivas de organização

político-econômico-militar na região do vale do Tocantins-Araguaia. Sendo assim, foram

criadas formas de ocupação do território, como as colônias, presídios, todos com aparato

militar para promoverem povoações e garantir a segurança nacional ao longo dos rios

Araguaia-Tocantins. Segundo José Brandão (1998), “algumas povoações foram fundadas na

margem esquerda do Araguaia e Tocantins porém, elas somente subsistiam enquanto a mesma

estivesse em evidência e desapareciam todas as vezes que a navegação por um ou por outro

motivo era interrompida e voltavam a existir, quando a navegação era restabelecida”

(BRANDÃO, 1998, p. 126).

Não obstante, certas localidades que acabaram exercendo certa importância

na região sobreviveram aos períodos de interrupção de navegação dos rios. Durante todo o

período, a ocupação do território se deu dessa forma. Só a partir do final do século XIX e

início do século XX, com a fundação do burgo do Itacaiúnas, aconteceu de fato que

povoações se tornaram permanentes. Esse fato ocorreu devido às fugas dos escravos do então

Goiás, pelos rios do Pará, e o contrabando do ouro das minas, o que levou à proibição da

navegação nos rios Tocantins e Araguaia durante certos períodos.

o governador da capitania do Grão-Pará, José de Nápoli Menezes, mandou fundar a povoação de São Bernardo da Perdeneira, em 1781, tendo mais tarde mudado a sua localização e seu nome para Alcobaça, que hoje é a cidade de Tucuruí (BRANDÃO, 1998. p. 127). A notícia de constantes invasões de franceses, holandeses e ingleses que faziam um grande contrabando de ervas do sertão, muito fartamente encontradas nos vales do Araguaia-Takayuna-Pacajá-Tocantins, onde corria frouxa a coleta predatória da baunilha, borracha, cacau, canela, cravo e guta-percha, que eram levados para os seus países sem a anuência da Capitania e do governo português (BRANDÃO, 1998. p. 132).

Page 67: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

67

Os rios Araguaia e Tocantins foram as estradas fluviais que durante longo

período tornaram-se os principais meios de penetração e comunicação na região de Marabá e

foram importantes para o estabelecimento de povoações às margens desses rios. Em virtude

das fugas dos escravos ocorridas nas minas de ouro de Goiás, a navegação no vale dos rios

Araguaia e Tocantins ficava interrompida constantemente, todas as vezes em que ocorriam as

fugas.

em 1731, D. Francisco de Assis Mascarenhas, pediu a proibição da navegação nos rios Araguaia-Tocantins e, em 27 de outubro de 1733, saiu o Alvará de proibição. Aquele expediente tinha a finalidade de coibir a fuga de escravos das minas de ouro de Goiás, o contrabando do ouro que se fazia por esta via e também a evasão de criminosos de alta periculosidade que se evadiam pelos rios. A partir daí, as regiões ribeirinhas e as minas de ouro, passaram a ser abastecidas por Pernambuco e Bahia, pelo rio São Francisco a partir da vila de São Romão nas Minas Gerais, fato que prevaleceu até 1782 (DOLE Apud BRANDÃO 1998, p. 135).

Assim, em 1802, foi que surgiu o presídio de Taquanhonha, onde hoje está

situada a Marabá pioneira (BRANDÃO, 1998), dando assim, os primeiros indícios da

formação do que mais tarde ficou conhecido como núcleo urbano de Marabá, que só se

consolidou na segunda metade do século XIX.

A ocupação do território de Marabá começou a interessar ainda mais os

vizinhos comerciantes do Estado do Maranhão, em virtude dos interesses comerciais que

tinham pela economia da borracha. Nesse período, a atividade comercial era arriscada, pois

antigos moradores da área, os índios (Caiapó, Gavião, etc) defendiam seu território contra a

invasão daqueles que iam em busca da economia extrativista. O ataque dos índios era uma

constante; quando seringueiros e castanheiros se embrenhavam na mata atrás da borracha e da

castanha, os índios quase sempre defendiam seu território atacando os invasores, de forma que

bem poucos saíam com vida no conflito pela posse e uso do território e pela goma e castanha,

que tinham valor monetário para os comerciantes. Os conflitos, aos poucos, com a ocupação

Page 68: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

68

do território e com as milícias que iam se formando pelos donos de barracões, intimidavam as

investidas dos indígenas e afugentava-os, cada vez mais para o centro da floresta.

Dessa forma, os castanhais também foram sendo apropriados e seus donos

tomando posses através da legislação que concedia seu domínio àqueles que obtivessem sua

exploração, favorecendo a hegemonia da oligarquia na região. A ocupação do território

ostentava as famílias tradicionais (Quadro 01), pois era dela o poder local paraense.

Necessitava-se fazer alianças tanto para o controle do território quanto para garantir os

espaços político-econômicos de Belém.

Quadro 01 - Algumas Famílias Pioneiras na Formação do Antigo Município de Marabá Nome Origem Atividade Exercida Francisco Coelho da Silva Maranhense Comerciante Levino Moraes Maranhense Comerciante/Fazendeiro Carlos Leitão Maranhense Coronel da Guarda Nacional Antonio da Rocha Maia Maranhense Político Kalil Mutran Libanês Comerciante João Anastácio de Queiroz Maranhense Político Pedro Peres Fontenelli Maranhense Comerciante/fazendeiro Quirino Franco de Castro Goiano Major

Fonte: adaptado pelo autor segundo os dados de Brandão, 1998.

Outrossim, o poder exercido pelas autoridades locais na distribuição e na

forma de ocupação do território foi fundamental para que a oligarquia do Tocantins pudesse

desenvolver suas atividades e, posteriormente, se consolidasse como uma das forças políticas

locais e do Estado do Pará.

O poder econômico das famílias que dominavam os castanhais, durante o

final do século XIX e a primeira metade do século XX, só iria sofrer uma fragmentação,

principalmente no final da década de 1970, com a presença de novos atores sociais, dentre

eles as empresas de mineração. Esse conjunto de acontecimentos (aberturas das estradas, os

garimpos de beira de estrada, empresas de mineração, fazendeiros e bancos, etc.) que levou à

fragmentação do poder econômico na região de Carajás agravou-se mais ainda com o início

da década de 1980.

Page 69: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

69

A década de 1980 vai marcar definitivamente as posições político-

econômicas no antigo município de Marabá e terá reflexo nos sucessivos desmembramentos

territoriais que esse município sofreria no decorrer da década de 1980 e, posteriormente, na

década de 1990. A divisão do poder político e os novos atores sociais que partilham o poder já

não são somente os remanescentes da oligarquia do Tocantins. Os municípios passam a ser

palco de uma disputa político-econômica pelos seus territórios tanto pelas empresas quanto

pelos diferentes atores sociais que agora compõem a gestão territorial desses municípios.

A complexidade de relações envolvendo diferentes atores sociais ocasionará

uma infinidade de conflitos sociais pela resolução dos problemas, tanto os da sede do

município quanto do seu meio rural. Isso servirá também para consolidar novos atores sociais

pela disputa do poder político-econômico na região dos municípios aqui estudados.

Segundo Stephen Bunker, Maria Célia Coelho e Adaíse Lopes,

O início dos trabalhos nas minas de Carajás, a construção da estrada e da ferrovia e os rumores em todo o país de que havia empregos e oportunidades econômicas a serem exploradas aceleraram o fluxo de migrantes para área onde a maior parte da terra disponível já havia sido objeto de disputas. Por volta de 1976, ocorreu o primeiro conflito direto entre os donos de castanhais e camponeses sem terra; rapidamente esses conflitos se tornaram violentos, pois sua proliferação encorajava novas invasões de terras por parte dos camponeses e uma resistência mais determinada por parte dos donos de terra. Os conflitos de terras intensificaram-se, pois Carajás atraía mais pessoas à procura de emprego em Marabá, ao mesmo tempo em que novas estradas que levavam a Carajás tornavam os velhos castanhais mais acessíveis, especialmente durante a estação da seca, quando os proprietários não tinham muitas razões para controlá-los (BUNKER; COELHO; LOPES, 2002, p.25).

Ainda segundo Stephen Bunker, Maria Célia Coelho e Adaíse Lopes “os

incentivos fiscais tinham facilitado a expansão da pecuária e das madeireiras. Era o início do

fim de um período do domínio dos castanhais e, conseqüentemente, do poder político e

econômico dos donos de castanhais” (BUNKER; COELHO, LOPES, 2002. p. 27). É nesse

contexto que a década de 1980 servirá como marco referencial para nossa análise e precisará

Page 70: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

70

ser contextualizada, relacionando os principais acontecimentos que marcaram a complexidade

das relações e dos conflitos sociais que perfazem a configuração territorial desses municípios.

3.3 - O Município de Marabá: Contextualizando a década de 1980

A década de 1980 é marcada por uma profunda transformação na estrutura

político-econômica e territorial dos municípios do sudeste paraense, principalmente aqueles

que estão em áreas de mineração e que foram e continuam sendo alvos de projetos de

empresas de mineração, dentre elas a de maior expressão na região, a Companhia Vale do Rio

Doce (CVRD). Sua importância se deve ao fato de ela conectar a escala local à internacional

devido à sua abrangência econômica, negociando minerais de valor econômico significativo

no mercado nacional e internacional como: ferro, manganês, ouro, níquel, entre outros,

explorados ou a serem explorados por ela em área de concessão real de uso9 e pelo seu

complexo mínero-metalúrgico envolvendo as suas minas em Carajás, a sua estrada de ferro

cortando os Estados do Pará e do Maranhão e seu terminal de exportação: o porto de ponta da

madeira no Estado do Maranhão.

Segundo Breno dos Santos (1981),

após a descoberta e o requerimento das áreas de pesquisa em meados de 1967, pela Companhia Meridional de Mineração – subsidiária da United States Steel -, negociações políticas conduzidas pelo governo brasileiro levaram à criação da Amazônia Mineração S. A. (AMZA), em abril de 1970, com a composição acionária de 50,9% do Grupo CVRD e de 49,1% do grupo multinacional. Com a conclusão dos trabalhos de pesquisa e dos estudos preliminares de viabilidade, em 1974, foi elaborado o projeto básico de desenvolvimento, que previa a produção inicial de 12 milhões de toneladas de minério em 1979, e que deveria sofrer ampliações anuais, atingindo 50 milhões de toneladas em 1986 (SANTOS, 1981, p. 75).

Investimentos em prospecção e a busca por minerais tornaram o sudeste do

Estado paraense uma área especial para o crescimento econômico do país, por parte do

9 A área de concessão de uso da CVRD corresponde a 411.984,87 hectares (direito real de uso).

Page 71: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

71

governo federal, principalmente, com a descoberta do ferro em Carajás e com o garimpo de

ouro em Serra Pelada, áreas que na época pertenciam ao município de Marabá.

Quadro 02 - CVRD e suas Reservas Minerais no Brasil Mineral Reservas Estimadas Duração Estado

Ferro 37,5 bilhões de toneladas 540 anos Pa e MG Bauxita 1,1 bilhões de toneladas 137 anos PA Manganês 135 milhões de toneladas 135 anos PA e MS Ouro 300 toneladas 25 anos PA, BA e MG Cobre 100 milhões de toneladas 24 anos PA Caulim 100 milhões de toneladas 330 anos PA Florestas 566.000 hectares renováveis BA e MG

Fonte: CVRD, 1993; Benatti, 1997.

A CVRD é uma das maiores mineradoras do mundo; seu potencial em

minerais pode ser comprovado com o quadro acima (Quadro 02); suas reservas são

estimativas de média a longa duração; seu potencial a ser explorado também coloca a empresa

em números como uma das maiores empresas do mundo, e seus minerais são cobiçados pelos

países, principalmente os mais ricos do mundo, por serem um material escasso que o Brasil

tem em abundância: suas reservas dão créditos à empresa e seu potencial administrativo

também a coloca como uma das empresas mais modernas no ramo dos minerais estratégicos.

O Estado do Pará (no Estado o grupo CVRD tem o controle de exploração

de diversos espaços conforme demonstra a Figura 01), como pode ser comprovado no mapa,

aparece como um dos Estados brasileiros com um grande potencial para exploração e

exportação mineral favorável em termos de ferro, bauxita, manganês, ouro, cobre e caulim.

As principais reservas minerais da CVRD correspondente a bauxita, caulim e cobre são

encontradas apenas no território paraense. A existência desses minerais coloca em expectativa

econômica os municípios paraenses, principalmente aqueles aqui estudados (Marabá,

Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte).

Uma expectativa em termos de ganhos econômicos a partir dos projetos da companhia e

daqueles que virtualmente virão a ser implantados, mesmo com as crises financeiras que

Estados e municípios passam.

Page 72: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

72

Page 73: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

73

Embora tenhamos no país uma crise econômica, que muitos economistas

classificam como a década perdida, a década de 1980 é marcada por profundas modificações,

que repercutiram também no sudeste do Pará, o que, por sua vez, não impediu que se criasse

na Amazônia toda uma estrutura para que fossem implantados os projetos da CVRD, como

uma das mais importantes empresas estatais, criada em 1942. Na época, era associada ao

capital internacional, para que realizasse suas pesquisas sobre a potencialidade mineral na

Amazônia.

O extrativismo continuou a dominar a economia local, no sudeste paraense,

só que a extração mineral, diferentemente da castanha-do-Pará, acabou direta e indiretamente

desestruturando o regime político-econômico da oligarquia do Tocantins, fazendo surgir uma

nova elite, composta por fazendeiros empresários, funcionários da CVRD ou de suas contratas

ou subsidiárias, bancos, profissionais liberais como médicos, advogados, políticos e

comerciantes.

O arranjo político local ocasionou uma fragmentação na estrutura político-

econômico-territorial do município de Marabá, fazendo com que fosse pleiteada a criação de

novos municípios, desmembrados de seu território. Esse arranjo era oriundo tanto dos

investimentos locais realizados pela CVRD como pela disputa política entre o novo regime da

elite, recentemente forjada para disputar o poder político local, e o regime da oligarquia dos

castanhais querendo continuar a manutenção do seu domínio no território de Marabá.

Dessa forma, o que vemos é uma articulação entre esses regimes de poder,

estabelecidos através da base econômica extrativista, que nem sempre funcionou, devido ao

surgimento de atores sociais que se encontravam fora do campo de poder político local

dominado pela oligarquia do Tocantins.

Surge então um sistema de poder político-econômico, paralelo ao

anteriormente citado, favorecido pelas empresas de mineração, pelos bancos e pelos

Page 74: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

74

empresários, que viam na oligarquia um empecilho aos seus interesses presentes e futuros. Por

outro lado, a oligarquia, vendo-se enfraquecida e cercada pelos novos atores econômicos,

buscou uma aproximação com esses atores sociais para não perder totalmente seu poder

político-econômico no município.

Entretanto, uma rede de poder político de uma nova elite passa a comandar

as relações político-econômicas do antigo município de Marabá, fazendo com que

acontecesse uma pressão desses novos grupos pela partilha do poder político na região,

ocorrendo, dessa forma, emancipações territoriais, com o surgimento de novos municípios,

desmembrados de Marabá, para então fortalecer os grupos políticos que surgiram e

disputavam o poder político-econômico nos novos municípios.

Outrossim, surgem paralelamente ao movimento das elites pela busca e

hegemonia do poder político-econômico, os que estavam excluídos do processo decisório do

município (colonos, posseiros, sindicatos rurais, sindicatos urbanos, movimentos de bairros,

etc), bem como com as organizações populares e Organizações Não-Governamentais (Ongs),

a Igreja Católica com as pastorais, que passam juntos a formar ou tentar formar lideranças e,

assim, exigir seus diretos, para participar direta ou indiretamente das decisões político-

econômicas dos municípios de que fazem parte.

Essas parcerias acima citadas resultaram na formação, nos centros urbanos

desses municípios, de organizações de trabalhadores insatisfeitos com as políticas

municipalistas. Na demonstração de seu peso político, em virtude de sua organização,

passaram a exigir participação nas decisões dos projetos dos quais eram alvos e, embora

timidamente, nas decisões municipais e começam mais diretamente a vivenciar os conflitos de

interesses, envolvendo os “donos do poder” (FAORO, 2000) e suas vítimas, os excluídos de

qualquer forma de participação política municipal.

Page 75: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

75

Embora a CVRD, através de seus projetos de mineração, direta ou

indiretamente, mude a função dos municípios que estão sob sua área de influência, ela sozinha

não é responsável por todos os problemas que afetam os municípios que abrigam seus

projetos, e não se desvia de sua função de empresa mineradora.

Surge, assim, a tentativa de organização da sociedade civil, com os

movimentos urbanos dos metalúrgicos, entre outros, que passam a convergir suas discussões e

seus interesses, unindo assim forças para tentar participar nas decisões dos governos locais.

Embora seus objetivos sejam virtualmente diferentes, essas organizações

percebem sua exclusão e usam a formação de suas lideranças e seu grau de consciência

política para questionarem os mandos dos governos locais e seus representantes.

Dessa forma, a década de 1980 é um embocadouro de múltiplos processos

que vão tomando corpo e se formando ao longo das décadas posteriores. Os conflitos que vão

surgindo são acompanhados, embora timidamente, mas com certa personalidade, de embriões

do amadurecimento dos atores sociais excluídos do poder que procuram se inserir no processo

político-econômico territorial dos novos municípios, de sorte que os governos e as elites

locais não podem mais ignorar os problemas locais. Sendo assim, também o questionamento

da presença dos grandes grupos econômicos nesses municípios se faz necessário e torna-se

tema presente nos debates local.

Os atores sociais buscam a participação, procurando interferir no processo

sócio-econômico-político, para que, nesse processo, não fiquem excluídos das decisões locais

e encontrem a resolução dos problemas urbanos e rurais.

Embora ainda seja incipiente, a flexibilização do poder local para com a

gerência da participação da sociedade civil começa a existir, sendo esse um dos caminhos

encontrados pelos atores sociais para resolução dos conflitos de interesses. A forma de

governar e a participação da sociedade civil organizada ainda podem, no entanto, ser

Page 76: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

76

insuficientes em se tratando dos municípios que passaram décadas sendo dominados e

governados pelos “coronéis da castanha” e, posteriormente, por seus representantes.

A configuração territorial dos municípios que surgiram da fragmentação

político-territorial de Marabá pode ainda ter o formato já citado, mas com certeza sofreu uma

mudança qualitativa com o surgimento de diferentes movimentos sociais, que passaram a

pressionar o poder político local, fazendo-o não ignorar suas presenças no ordenamento

territorial.

Os novos municípios aqui estudados (Marabá, Parauapebas, Curionópolis,

Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte) possuem áreas nas quais a

CVRD tem projetos efetivos ou virtuais, mas possuem complexidade variada e grau de

autonomia econômico-financeira diferenciada também.

Sendo assim, a estrutura sócio-econômica de cada município depende de um

conjunto de fatores correlacionados, com busca de recursos e parcerias com a CVRD ou

outras empresas e atores econômicos, o que também depende quase que diretamente do grau

de viabilidade econômico-social e da sua potencialidade em gerenciar tanto os recursos

naturais em seus territórios como o do planejamento viável que possibilite aumentar sua

receita e arrecadação.

Aqui, entendemos que o recurso é uma possibilidade de organização sócio-

econômico-territorial, e a potencialidade o grau de sujeição do recurso ao seu melhor

aproveitamento, ou seja, para o município, potencialidade são todos os recursos disponíveis

no território, sejam eles naturais ou humanos, bem como a melhor aplicação e

proporcionalidade pensada para cada um no desenvolvimento local.

Se olharmos para cada um dos municípios aqui estudados, poderemos notar

que sua estrutura urbana é bem diferenciada; a planta urbanística de cada um apresenta

Page 77: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

77

características dos processos sócio-econômicos que tanto antecederam a economia mineral

quanto, após sua implantação, aceleraram o processo de ocupação desordenado do território.

A ocupação desordenada em seus territórios tem gerado conflitos sociais

graves. Em relação ao meio rural, este permaneceu, aparentemente, semelhante enquanto

estrutura de concentração de terras e dominação por parte dos que se sucederam, ou dos que

continuaram os processos de aquisição de terras na região. Surgiu, por outro lado, uma nova

categoria de trabalhadores rurais organizados, os trabalhadores rurais sem terra, fazendo-nos

crer que a mudança mais evidente aconteceu no meio rural.

Embora o movimento de trabalhadores esteja no meio rural, esse aconteceu,

principalmente, como reflexo dos grandes projetos implantados na região amazônica, como a

Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT), o Projeto Ferro Carajás (PFC), a abertura de estradas,

como a Transamazônica e a Belém-Brasília e à falta de uma política agrária que amenizasse

os conflitos envolvendo o contraste entre as áreas de latifúndio e os expropriados que

aumentam a massa de sem-terra, refletindo a elevação demográfica e o acirramento dos

conflitos na região sudeste paraense.

De uma maneira ou de outra, Carajás tornou-se um território vinculado a

economia extrativista mineral, ligada à escala econômica internacional, onde uma única

empresa, a CVRD, tornou-se a principal empresa nesse território, com interferência direta ou

indireta em cada município, que estão sob a sua área de influência, conectando-os a diferentes

escalas, que ora vai do local ao internacional ou do local ao nacional e, articulando diferentes

interesses, aliando-se ou não a diferentes atores político-sociais locais, nacionais e

internacionais de acordo com seus interesses.

As administrações municipais sofreram uma drástica mudança na forma de

conceber a ligação de cada município, em diferentes escalas. Hoje, o que vemos nos

comandos das administrações locais são alguns indícios de que a visão administrativa mudou

Page 78: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

78

com a presença de médicos, comerciantes, etc, em relação à visão tradicionalista da oligarquia

da castanha, que dominavam a economia e a política local até a segunda metade da década de

1970.

Parcerias são feitas com diferentes empresas e setores da sociedade civil;

projetos são realizados ou ampliados a partir das pressões da sociedade civil, o que

demonstra, de uma forma ou de outra, a presença do poder desta sociedade organizada.

Dessa forma, podemos evidenciar que o poder co-relacionado ou divergente

interfere na organização do território, fazendo com que os governos locais mudem sua visão

de desenvolvimento. Mesmo que essa mudança seja parcial, torna-se necessário dividir a

mesa de decisões, pois fica evidente que a presença de setores da sociedade civil tem peso

significativo no desenvolvimento do município, obrigando o poder municipal a dar voz de

participação nas decisões aqueles que anteriormente eram excluídos dos processos decisórios.

Poder, governo e território são conteúdos que a sociedade civil organizada

ou em processo de organização, como é o caso de alguns municípios recém criados, utilizam

no seu planejamento para pensar um desenvolvimento relacionado à diferença político-

econômica local e para a resolução dos conflitos de interesses, bem como para organizar a

gestão territorial.

Entretanto, há múltiplas ações no território de Carajás superpondo poderes,

sejam eles: judiciário, executivo ou legislativo bem como aqueles oriundos dos movimentos

sociais organizados, o que faz com que se estabeleçam formas diferenciadas de atuação no

território e alterações nas relações de poder dos governos locais.

A sobreposição de territórios demonstra, também, os conflitos de interesses

dos poderes locais e, até certo ponto, a omissão dos poderes federal, estadual e municipal em

relação a outros poderes econômicos e não institucionalizados.

Page 79: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

79

Essa sobreposição de território e de interesses favoreceu também o processo

de emancipação dos municípios criados a partir de Marabá, na década de 1980, e os de

segunda geração, criados na década de 1990, na disputa pelo poder político local (Figura 02).

Esses conflitos de interesses, que envolvem políticos locais, empresas de

mineração, bancos, movimentos sociais urbanos e rurais, e movimentos indígenas entre outros

fazem parte tanto da história mais antiga desses municípios quanto dos processos ocorridos

pós-década de 1980, que aceleraram as transformações territoriais locais.

O surgimento de movimentos sociais nas décadas posteriores ao início da

década de 1980, como os sindicatos urbanos e dos metalúrgicos, o Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra, entre outros, são reflexos tanto das crises econômico-sociais

quanto dos processos advindos desde a época dos castanhais, que se acirraram com a falta de

planejamento local para esses municípios. O fato de não considerar a participação da

sociedade como prioritária na solução dos problemas locais é o reflexo de um contexto mais

amplo, no qual Carajás está envolvido. Com a crise econômica brasileira e internacional, na

década de 1980, a busca por novos mercados de minerais no mundo levou à adoção de

políticas que desconsideravam o contexto local e sua sociedade.

Marabá, por ser um município com uma estrutura político-econômica mais

sólida que os demais, que surgiram de sua fragmentação, é um dos pólos regionais do sudeste

paraense, e de todo o Estado do Pará, em termos de arrecadação e receita, o que faz desse

município um dos territórios mais cobiçados pelos políticos locais e estaduais. Assim, Marabá

assume o papel de líder político-administrativo da região, tudo convergindo ou para Marabá

ou para capital Belém.

O município de Marabá, assim como o de Parauapebas, assumem um papel

estratégico para o Estado do Pará e para os políticos regionais e locais, em se tratando dos

projetos da CVRD, principalmente, depois da privatização da companhia em 1997.

Page 80: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

80

Page 81: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

81

Depois de sua privatização, a CVRD mudou sua estratégia econômica local

deixando em dúvida se iria ou não implantar seus projetos. Quando ainda era estatal, tinha

quase certas suas implantações nesses municípios, como é o caso do projeto Serra Leste em

Curionópolis, hoje em impasse. Se for viável ou não sua implantação, esta depende de um

conjunto de fatores que responde ao mercado internacional e aos interesses da CVRD, que

agora, privatizada, responde à economia de mercado, sem a preocupação com o Estado

Nação.

Isso tem feito com que o poder político local tenha ficado insatisfeito diante

da atitude da companhia. Alguns municípios viam, nesses projetos virtuais, uma forma de

aumentar suas arrecadações, bem como a criação de novos empregos, já que a grande maioria

dos municípios tem na prefeitura a sua maior empregadora municipal. A implantação desses

projetos poderia também atrair para os municípios outras empresas para prestarem serviços à

CVRD.

3.4 - A Implantação dos Projetos da Companhia Vale do Rio Doce no Antigo Território

de Marabá

As minas de Carajás, na década de 1980, pertenciam ao território de

Marabá. Dessa forma, Marabá continuava a exercer o papel de pólo da região sudeste

paraense e líder político-econômico regional no sul/sudeste do Estado. O primeiro projeto a

ser implantado em Marabá foi o Projeto Ferro Carajás, carro-chefe do Programa Grande

Carajás (PGC)10 (um pacote de incentivos fiscais11), anunciado na década de 1980, a fim de

atrair investimentos para Amazônia Oriental (relativos à agricultura, ao reflorestamento, à

pecuária e ao setor mínero-metalúrgico) e industrializar esse território. Dessa maneira

10 Decreto Lei nº 1813 de 24 de novembro de 1980. 11 Os incentivos fiscais também foram regulamentados pelo Decreto Lei nº 1815 de 24 de novembro de 1980, a todos os empreendimentos numa área que abrangia os Estados do Pará, Tocantins e Maranhão, num total de 895.236 Km2.

Page 82: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

82

qualquer projeto que estivesse relacionado e integrado nesse território teria direito aos

chamados incentivos fiscais atribuídos pelos organismos financeiros de Estado, que nesse

caso era representado pela Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM).

Para esses empreendimentos, seria necessário montar toda uma infra-

estrutura para alocar esses projetos e fazê-los funcionar. Assim em anos anteriores já tinham

sido traçados os eixos de desenvolvimento através dos planos de viabilização econômica para

essa região e para que empresas nela se instalassem. A Hidrelétrica de Tucuruí (Figura 03) é o

maior exemplo da grandiosa ambição que se pensou para a Amazônia brasileira a fim de atrair

o capital nacional e internacional. A abertura das estradas em anos anteriores foi o primeiro

passo para preencher a condição necessária para levar o capital a se instalar na Amazônia,

viabilizando as políticas dos governos brasileiros.

Figura 03: Hidrelétrica de Tucuruí construída para atender principalmente os Grandes Projetos (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 1997).

Para José Helder Benatti (1997),

A própria instalação autoritária do PGC, em 1980, reflete a política centralizadora e de caráter militar, segundo a qual foi concebido nos anos de 1970. Para a implantação dessa política, os governos militares utilizaram-se de decretos-leis, o que significava, na prática, a exclusão do poder legislativo federal, estadual e da sociedade civil brasileira da discussão e implementação de políticas públicas. O decreto-lei foi um instrumento jurídico criado pelo Regime Militar, e por ser de lavra exclusiva do Poder Executivo, é uma usurpação das prerrogativas do Poder Legislativo, fazendo

Page 83: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

83

com que a elaboração e aprovação se restringisse aos gabinetes palacianos (BENATTI, 1997, p. 80).

A sobreposição de poderes dentro das instâncias governamentais serviu para

legitimar atos que eram pensados para a região Amazônica com fins econômicos, o que, por

sua vez, explica o autoritarismo com que o projeto foi implantado e a sua completa

desvinculação com a realidade local, contrariando os interesses da sociedade que ali se

encontra. Em conseqüência as expectativas sociais e ambientais que hoje caracterizam Carajás

fazem dessa região uma das áreas mais problemáticas do país em termos de conflitos sociais.

Outros projetos foram implantados como o projeto manganês do Igarapé do

Azul, em 1985 e, o projeto ouro do Igarapé Bahia, em 1990 (já esgotado). Além da

exploração mineral, a CVRD verticalizou seus empreendimentos, investindo em setores como

o de transporte, como o sistema roll-on-roll-off; participou de convênios e parcerias como no

caso do projeto soja no sudeste paraense através do sistema integrando rodovia-ferrovia-

hidrovia, incluindo a possível viabilização da hidrovia Araguaia-Tocantins, e elaborou

projetos virtuais como o do cobre do Salobo e o do níquel. Assim, desde a implantação do

projeto ferro a CVRD dinamizou sua economia investindo em diferentes setores mostrando o

potencial que a companhia adquiriu desde que está instalada no Estado do Pará.

Vale a pena ressaltar que a CVRD tem outros projetos fora da região sudeste

paraense, mas que permaneceram dentro do Estado do Pará, como a exploração da bauxita

pela Mineração Rio do Norte. O grupo CVRD possui todo um aparato que foi montado pelo

governo federal no Pará para exploração dos recursos minerais que, hoje, estão nas mãos da

iniciativa privada, em decorrência do processo de privatização das estatais realizado pelo

governo federal (durante a década de 1990).

O efeito multiplicador que o Programa Grande Carajás tenderia a gerar não

se concretizou; o que vemos hoje na região, principalmente a que vai de Parauapebas no Pará

a Santa Inês, no Maranhão: um corredor de problemas sociais. A maioria dos municípios que

Page 84: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

84

se encontra no corredor da Estada de Ferro Carajás encontra-se em situação de pobreza sem

expectativa de crescimento econômico e sem conseguir resolver seus problemas urbanos e

rurais. O trem de passageiros da CVRD é um verdadeiro navio sobre rodas, com migrantes

indo e vindo atrás de trabalho (nos projetos da companhia ou em outras empresas quando não

nas fazendas localizadas nesse trecho) e melhores condições de vida nesse corredor.

Segundo Maria Célia Nunes Coelho (1997),

A CVRD, como toda grande empresa, tenta localmente imprimir ordem (regras) no espaço restrito a seu território. Os núcleos urbanos exemplares/ordenados da companhia contrastam com os núcleos caóticos vizinhos. Sem dúvida, elas, as grandes empresas, têm um papel entrópico em relação às demais áreas. Este é o caso da CVRD que mantém a ordem nos seus territórios (que incluem seus núcleos urbanos). Entretanto, ainda que involuntariamente, a CVRD e suas subcontratadas têm papel entrópico em relação às áreas urbanas vizinhas (COELHO, 1997, p. 77).

Figura 04: Vista parcial da Floresta Nacional de Carajás ao fundo o núcleo residencial de Carajás (Foto :João Marcio Palheta da Silva, 2003).

A implantação dos grandes projetos na Amazônia intensificou a explosão

demográfica dos diversos núcleos urbanos na região sudeste paraense, quando não foi

responsável pelas suas criações. A ordem da qual Maria Célia Nunes fala é a ordem que faz

do núcleo urbano de Carajás (Figura 04), assim como dos condomínios fechados da CVRD

tanto no Pará como no Maranhão, exemplos do ordenamento territorial criado pela

Page 85: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

85

companhia, não só para abrigar seus funcionários, mas também para vender uma imagem

ordenada de seus projetos.

Seus núcleos habitacionais são exemplos das cidades de primeiro mundo em

termos de organização, porém existe um controle social não só para aqueles que moram em

seus núcleos urbanos, como também para aqueles que adentram seu território. O controle de

entrada e saída das pessoas é uma das formas da companhia manter a ordem dentro dos seus

núcleos (Figura 05), diferente do que acontece com aqueles povoados ou núcleos que estão

em seu entorno.

Figura 05: Portão de acesso ao Núcleo Urbano de Carajás controlado pela CVRD (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Exemplo dessa natureza é Parauapebas, no sopé da Serra dos Carajás, onde

apenas uma parte da cidade foi planejada para abrigar, logo no início da instalação do PFC, os

trabalhadores que viabilizaram a obra de exploração de ferro, assim como aqueles que

trabalhavam na construção da estrada que dá acesso à Serra dos Carajás. Logo após sua

instalação, ocorreu uma explosão demográfica, intensificada ao longo dos anos que

sucederam a instalação do PFC, o que ajudou a fazer de Parauapebas umas das cidades mais

populosas dessa região, porém com todos os problemas urbanos: falta de infra-estrutura,

problemas de saúde, prostituição, o que não ocorre na CVRD.

Page 86: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

86

Quadro 03 - Quantidade de Passageiros Transportados pelo Trem da CVRD12 Ano Número de Passageiros

1986 212.342 1987 401.192 1988 424.447 1989 498.838 1990 590.901 1991 520.659 1992 428.012 1993 460.645 1994 631.889 Total 4.168.925

Fonte: CVRD, 1997.

As principais estações ferroviárias da CVRD no trecho entre Pará e

Maranhão são: a do Anjo da Guarda, a de Santa Inês, a de Açailândia, a de Imperatriz, todas

no Maranhão, e as de Marabá e Parauapebas no Pará. Como podemos ver, todas essas

estações foram pontos de chegada ou de saída para diversas localidades no Pará e no

Maranhão (Quadro 03). Os que migram nesse corredor têm diferentes histórias para contar

quanto à sua migração. Paraenses e maranhenses que mudam de lugar em busca de melhores

condições de vida, indo ou voltando ajudaram a modificar as relações no sudeste paraense13,

principalmente nos municípios aqui estudados.

Esses fatores estão sobretudo relacionados às expectativas econômicas que o

Brasil vivia na época de instalação dos projetos da CVRD na Amazônia. Havia um conjunto

de fatores que favoreceram as condições para que esses projetos fossem pensados na

Amazônia, além dos recursos naturais que existiam na região. As variáveis que serviram de

justificativa para a implantação dos projetos na Amazônia estavam relacionadas às condições

de “duplicarem as exportações brasileiras, e com isso, conseguiriam mais dólares para o

pagamento da dívida externa brasileira” (BENATTI, 1997, p. 82).

12 Não foi possível obter dados mais recentes. 13 Relatório de viagem que serviu como tema para o ensaio “Impressões do ”Passageiro de Ferro”: reflexões de um viajante”. Publicado no livro: 10 Anos da Estrada de Ferro Carajás em 1997 pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA).

Page 87: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

87

Com isso, ficaria mais fácil justificar, através do autoritarismo, a

implantação que legalizou a instalação dos projetos na Amazônia, associados ao esgotamento

das reservas da Companhia Vale do Rio Doce no centro-sul do Brasil, à expectativa vinculada

pelo Banco Mundial em relação à carência do ferro no mundo na década de 1980, a outros

recursos minerais existentes em Carajás e à possibilidade de crescimentos das divisas para

pagamento dos juros da dívida externa (BENATTI, 1997, p. 82).

Dessa forma, a Amazônia brasileira estava relacionada a uma das fronteiras

de expansão do capital internacional na América Latina. Toda essa forma estava também

associada à possibilidade de “desenvolvimento” da Amazônia. Assim, o governo conseguiu

desenvolver sua estratégia de associação do capital privado nacional e internacional ao capital

estatal numa associação que era de 51% do capital da CVRD tendo o Estado Nacional como

seu principal acionista e os outros 49% pulverizados em diferentes capitais nacionais e

internacionais. Associava, assim, a escala local à internacional visando sobretudo ao mercado

internacional de exportação do ferro. Ainda segundo Benatti (1997), um dos financiadores do

Projeto Ferro Carajás (PFC) foi

o Banco Mundial que interveio no co-financiamento juntamente com os bancos comerciais; empréstimos japoneses; créditos europeus ligados à Comunidade Européia do Carvão e do Aço, e um empréstimo dado pelo Banco de Desenvolvimento da Alemanha Federal (KFW); financiamentos para aquisição de equipamentos dos EUA – Eximbank na Europa e no Japão; um euro-prêt de US$ 30 milhões, empréstimo realizado por um consórcio de bancos dirigidos por Morgan Quaranty Trust; e instituições de créditos brasileiras que completaram o empréstimo para o projeto (BENATTI, 1997, p. 83-84).

Esses empréstimos consolidaram a viabilização do PFC e sua instalação no

município de Marabá no começo da década de 1980, vindo a fazer seu primeiro transporte de

ferro em 1985, com a inauguração da Estrada de Ferro Carajás ligando as minas de Carajás no

Pará ao porto de Itaqui-Madeira no Maranhão. Era o começo de uma nova era para os

municípios do sudeste paraense e, conseqüentemente, para o Pará a era dos minérios, que se

Page 88: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

88

tornavam a principal economia da região. A CVRD, que já era uma das maiores empresas de

mineração do Brasil, ganhava mais elementos para se transformar numa das maiores empresas

de mineração do mundo. Opera em dois sistemas destacados por ela, o sistema norte e o

sistema sul, o que indicava o crescimento que a empresa vinha ganhando com a instalação de

seus projetos no Brasil e na Amazônia.

O território de Marabá sofreu conseqüências com todos esses

acontecimentos, que foram provocados pela implantação dos projetos da CVRD e também por

outros fatores, o que contribuiu em muito com o crescimento demográfico e com a

fragmentação não só do seu território, mas das relações político-econômicas, a partir da

fragmentação dos grupos de poder na partilha do poder político e do domínio econômico do

município, e conseqüentemente da região sul/sudeste paraense.

3.5 - Emancipação Territorial em Marabá.

A primeira emancipação territorial que Marabá sofreu foi a de Parauapebas,

onde estava a mina de Carajás da CVRD e a de Curionópolis, onde se encontrava o garimpo

de Serra Pelada, que teve seu auge entre os anos de 1980 e 1986. Parauapebas e Curionópolis

foram emancipados de Marabá, em 1988. Marabá perdeu duas importantes áreas de

mineração, e conseqüentemente uma parte significativa de seu território, de sua receita e de

sua população.

Parauapebas teve uma história um pouco diferenciada de Curionópolis. Uma

parte de seu território tinha sido planejada pela CVRD para abrigar cerca de 5.000 pessoas

relacionadas aos trabalhadores que vieram para o Projeto Ferro Carajás (PFC) e de suas

subsidiária. Essa parte planejada hoje é conhecida como Cidade Nova, enquanto no alto da

Serra Norte, onde fica a mina de ferro, foi construído um outro núcleo urbano para abrigar os

altos funcionários da CVRD. Duas realidades muito diferentes. De um lado, Parauapebas, que

Page 89: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

89

a cada dia crescia e ia além da parte planejada, principalmente a parte que hoje se tornou um

dos bairros mais populosos de Parauapebas e que na época era conhecido como Rio Verde.

Este formava quase que outro núcleo urbano que tinha até mais população que aquela parte

construída pela CVRD no sopé da Serra. Ao longo dos anos, Rio Verde e Parauapebas

cresciam com todos os problemas de um núcleo urbano, sem infra-estrutura, até se unirem

formando um só núcleo. Embora a parte planejada tivesse aspectos de serviços que só eram

encontrados em Marabá, a CVRD atraiu para seu interior os serviços que, pela distância de

Marabá, ficava mais viável serem implantados em Parauapebas.

Em 1985, a situação dos serviços oferecidos nesses núcleos era a seguinte

(Quadro 04):

Quadro 04 – Situação dos Núcleos Urbanos no Trecho Mina-Marabá em 1985 Localidade Distância em

Relação a EFC

Principal Atividade

Rede de Água Energia Elétrica

Esgoto Limpeza Urbana

Principais Acessos

Núcleo Urbano da CVRD

10 Km Serviços de Mineração

Sim Sim Sim Sim PA-275

Parauapebas 12 Km Serviços de apoio a mineração

Escasso Escasso Escasso Parcial PA-275

Rio Verde 13 Km Serviços de apoio a mineração

Não Não Em implantação

Não PA-275

Curionópolis 20 km Serviços de apoio ao garimpo

Não Não Não Não PA-275

Eldorado do Carajás

50 Km Serviços de apoio ao garimpo

Não Não Não Não PA-275

Marabá Atravessa a área urbana

Entreposto de produtos primários (castanha, madeira, gados e centro de seviços).

Sim Sim Sim Sim PA-275, PA-150, BR-230 e BR-222

Fonte: CVRD/SUMIC, 1985.

A realidade dos núcleos residenciais começou a mudar a partir da segunda

metade da década de 1980. Houve uma melhoria, porém os problemas não desapareceram.

Parauapebas e Curionópolis tornaram-se municípios, porém com características muito

diferentes. Enquanto a CVRD continuava com o projeto ferro, Curionópolis conheceu a

decadência do garimpo de Serra Pelada na segunda metade da década de 1980.

Page 90: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

90

Figura 06: Garimpo de Serra Pelada 20 anos depois da sua descoberta (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 1999).

Com a decadência do garimpo de Serra Pelada (Figura 06), Curionópolis

acabou perdendo população e uma parte de sua arrecadação, vendo-se obrigado a procurar

outras formas de desenvolvimento econômico. Isto fez com que os governos do Município

depositassem suas esperanças na possibilidade da CVRD vir a explorar o cobre do Serra

Leste, que está dentro de seu território, depositando suas expectativas na geração de empregos

e royalties vindos da CVRD. Enquanto a receita de Parauapebas crescia, Curionópolis via a

sua diminuir progressivamente, depois do auge do garimpo de Serra Pelada.

Quadro 05 – População dos Municípios no Trecho Mina-Marabá Município 1970 1980 1991 2000

Marabá 24.474 59.915 123.668 167.873 Parauapebas - - 53.335 71.651 Eldorado do Carajás - - - 29.244 Água Azul do Norte - - - 21.443 Curionópolis - - 38.672 19.387 Canaã dos Carajás - - - 10.826 Total 24.474 59.915 217.666 322.424

Fonte: IBGE Censos demográficos do Pará de 1970, 1980 e 1991. Sinopse Preliminar do Censo de 2000.

Essa área tornou-se densamente populosa (Quadro 05), os núcleos urbanos

foram crescendo e acabaram sendo alvo de políticos interessados na partilha do poder político

e acabaram pleiteando as suas emancipações de Marabá. Foi assim que, depois do surgimento

de Parauapebas e Curionópolis como municípios, surgiram outros novos municípios de

Page 91: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

91

segunda geração desmembrados de Marabá. O município de Eldorado do Carajás, em 1991,

desmembrado de Curionópolis, e Água Azul do Norte, também em 1991, desmembrado de

Parauapebas, e no ano de 1993 Canaã dos Carajás se emancipou de Parauapebas (Quadro 06).

Quadro 06 – Data de Criação dos Municípios da Mesorregião Sudeste do Pará Município Ano de

Criação Município de Origem Lei de Criação

Marabá 1913 São João do Araguaia Lei nº 1.278 Conceição do Araguaia 1935 Marabá Lei nº 1.091 Itupiranga 1947 Marabá Lei nº Lei 62 alterada pela Lei 158

Tucuruí 1947 Baião Lei nº Lei 62 – alterada pela Lei 158

Santana do Araguaia 1961 Conceição do Araguaia Lei nº 2.460 São João do Araguaia 1961 Marabá Lei nº 2.460 São Félix do Xingu 1961 Altamira Lei nº 2.460 Jacundá 1961 Itupiranga Lei nº 2.460 Paragominas 1965 São Domingos do Capim e Viseu Lei nº 3.235

Redenção 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Rio Maria 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Rondon do Pará 1982 São Domingos do Capim e Mojú Lei nº 5.027

Xinguara 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Parauapebas 1988 Marabá Lei nº5.443 Santa Maria das Barreiras 1988 Santana do Araguaia Lei nº 5.451 Bom Jesus do Tocantins 1988 Conceição do Araguaia Lei nº 5.455 Curionópolis 1988 Marabá Lei nº 5.443 Ourilândia do Norte 1988 São Félix do Xingu Lei nº 5.449 Tucumã 1988 São Félix do Xingu Lei nº 5.455 São Geraldo do Araguaia 1988 Xinguara Lei nº 5.441 Dom Eliseu 1988 Paragominas Lei nº 5.450 Brejo Grande do Araguaia 1988 São João do Araguaia Lei nº 5.448 Goianésia do Pará 1991 Rondon do Pará, Jacundá, Moju e

Tucuruí. Lei nº 5.686

Breu Branco 1991 Tucuruí, Moju e Rondon do Pará. Lei nº 5.703

Água Azul do Norte 1991 Parauapebas Lei nº 5.694 São Domingos do Araguaia 1991 São João do Araguaia Lei nº 5.706 Novo Repartimento 1991 Tucuruí, Jacundá e Pacajá. Lei nº 5.702 Eldorado do Carajás 1991 Curionópolis Lei nº 5.687 Abel Figueiredo 1991 Bom Jesus do Tocantins Lei nº5.708 Palestina do Pará 1991 Brejo Grande do Araguaia Lei nº 5.689 Ulianópolis 1991 Paragominas Lei nº 5.697 Pau D’Arco 1991 Redenção Lei nº 5.696 Cumarú do Norte 1991 Ourilândia do Norte Lei nº 5.710 Floresta do Araguaia 1993 Conceição do Araguaia Lei nº5.760 Nova Ipixuna 1993 Jacundá e Itupiranga Lei nº 5.687 Bannach 1993 Ourilândia do Norte Lei nº 5.761 Canaã dos Carajás 1993 Parauapebas Lei nº 5.860 Piçarra 1995 São Geraldo do Araguaia Lei nº 5.934 Sapucaia 1996 Xinguara Lei nº 5.961

Fonte: IBGE, Diário Oficial da União, TCM, AMAT.

Page 92: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

92

No conjunto da mesorregião sudeste paraense, o município de Marabá na

década de 1970 era o segundo maior município em população com seus 14.585 habitantes,

perdendo apenas em números populacionais para o município de Conceição do Araguaia, que

tinha na época 28.953 habitantes. Na década de 1980, Marabá continuou no segundo lugar em

população; Tucuruí em primeiro lugar em números populacionais com 61.140 habitantes,

contra 59.915 de Marabá e 11.551 de Conceição do Araguaia. Já na década de 1990 houve

uma inversão: Marabá passou a ser o primeiro município em população da mesorregião

sudeste com 123.668 habitantes contra 81.623 habitantes do segundo colocado, o município

de Tucuruí, 67. 075 habitantes de Paragominas, 55.968 habitantes do município de Redenção

e 53.335 habitantes de Parauapebas, município que foi desmembrado do território de Marabá.

No começo de 2000 Marabá continuou com aumento populacional passando para 167. 873

habitantes, Paragominas com 76.095 habitantes, Tucuruí com 73.740 habitantes, Parauapebas

com 71.651 e Redenção com 63.197 habitantes; esses são os números que ilustram o

crescimento populacional na mesorregião sudeste paraense. Em relação ao total populacional

da mesorregião sudeste paraense, os seis municípios estudados representam cerca de 20 % do

total da população.

No seu conjunto em números de habitantes os municípios aqui estudados

apresentam a seguinte colocação: Marabá é o primeiro município em população da

mesorregião sudeste, Parauapebas é o quarto, Eldorado do Carajás no décimo sexto, Água

Azul do Norte o vigésimo, Curionópolis o vigésimo terceiro e Canaã dos Carajás trigésimo

segundo município em números populacionais. Curionópolis, que teve Eldorado do Carajás

emancipado de seu território, hoje perde população (em função principalmente do fim da

lavra manual do garimpo de Serra Pelada), sendo entre os seis municípios o quinto em

números populacionais, só estando na frente de Canaã dos Carajás (Quadro 07).

Page 93: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

93

Quadro 07– População por Município na Mesorregião Sudeste Paraense 2000. Posição Município População Total 1 Marabá 167.873 2 Paragominas 76.095 3 Tucuruí 73.740 4 Parauapebas 71.651 5 Redenção 63.197 6 Itupiranga 50.213 7 Conceição do Araguaia 43.453 8 Novo Repartimento 41.819 9 Jacundá 40.830 10 Rondon do Pará 39.856 11 Dom Eliseu 39.428 12 Xinguara 34.760 13 São Félix do Xingu 34.516 14 Breu Branco 32.907 15 Santana do Araguaia 30.966 16 Eldorado do Carajás 29.244 17 São Geraldo do Araguaia 27.641 18 Tucumã 26.504 19 Goianésia do Pará 22.642 20 Água Azul do Norte 21.443 21 São Domingos do Araguaia 19.883 22 Ourilândia do Norte 19.645 23 Curionópolis 19.387 24 Ulianópolis 19.067 25 Rio Maria 17.091 26 Floresta do Araguaia 14.286 27 Bom Jesus do Tocantins 13.015 28 Piçarra 12.627 29 São João do Araguaia 12.165 30 Nova Ipixuna 11.865 31 Santa Maria das Barreiras 11.163 32 Canaã dos Carajás 10.826 33 Palestina do Pará 7.527 34 Brejo Grande do Araguaia 7.460 35 Pau D’Arco 7.125 36 Abel Figueiredo 5.951 37 Cumaru do Norte 5.818 38 Sapucaia 3.789 39 Bannach 3.776 Total da Mesorregião 1.191.244 Fonte: IBGE – Sinopse preliminar do Censo Demográfico de 2000.

Essas emancipações tiveram várias manifestações (entre elas o crescimento

demográfico), mas tiveram, principalmente motivações político-econômicas. Como se vê, o

poder municipal só se preocupava com a sede do município e acaba esquecendo o interior, as

áreas rurais, deixando-as em completo atraso econômico. Essa visão levou à criação de vários

Page 94: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

94

municípios não só no Pará, mas também no Brasil. Favoráveis à criação de municípios são

também aqueles que reivindicam que os serviços concentrados na sede municipal sejam

ampliados para o interior, pois essas áreas ficam em completa dependência dos serviços da

sede, a qual não tem condições de atender a todos aqueles que estão fora dos limites da sede

do município.

Assim a história dos municípios aqui estudados tem uma única vertente

territorial, que é a de serem originários do município de Marabá, mas, por sua vez, têm suas

peculiaridades e suas próprias configurações territoriais. Seus territórios são desdobramentos

das fragmentações políticas do poder local de Marabá. Suas transformações político-

econômicas têm reflexos também nos projetos da CVRD e do conjunto de ações promovidas

por grupos políticos locais e extralocais. Seus representantes podem ter vínculos políticos,

caso dos representantes políticos, mas dependendo dos interesses político-econômicos,

fragmentam-se ou associam-se, dependendo do grau de viabilidade e favorecimento que está

em jogo.

Page 95: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

95

4 – TERRITÓRIOS SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICOS, RELAÇÕES DE PODER E SITUAÇÃO FINANCEIRA DOS MUNICÍPIOS NO SUDESTE PARAENSE

O município é a escala de análise que privilegiamos, por acreditarmos que é

nela que podemos evidenciar todas as formas de relações sociais de maneiras explícitas.

Mesmo naquelas formas que são oriundas dos atores econômicos externos à escala local do

município, podemos constatar suas intenções e modificações, a partir de diferentes

complexidades.

Os seis municípios que aqui estudamos são frutos de políticas diferenciadas

e de diferentes complexidades que envolvem também diferentes atores sociais. É, portanto, na

escala municipal que percebemos as diferentes territorialidades, com suas diferentes formas

de organização no território, as formas de gestão adotadas pelos poderes públicos e os

diferentes graus de interferência da sociedade civil.

Essas alterações no território do município têm reflexo nas diferenciações de

poderes e nos arranjos locais de poder que comandam as relações municipais. O governo

municipal, nesse contexto, acaba sofrendo interferências econômicas de diferentes formas

organizadas a partir de grupos que participam do campo de poder no município. As estratégias

criadas pelo poder municipal acabam se confundindo com as estratégicas dos grupos de poder

que direta ou indiretamente participam do exercício de poder no território.

Essas estratégias no município nem sempre são alternativas para se fazer

uma gestão territorial ampla envolvendo a sociedade civil. A gestão acaba tendendo para um

lado que, nesse momento, comanda as relações de poder que decidem as grandes obras no

território ou influencia sua decisão. Dessa forma, uma parcela considerável da sociedade fica

de fora dos arranjos econômicos e dos benefícios (nas formas de equipamentos urbanos para

melhorar as condições de vida da população) que poderiam ser elementos para melhorar a

Page 96: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

96

tomada de tais decisões. Em conseqüência, origina-se uma hierarquia no poder, onde o

município é o intermediário entre os diferentes poderes e, muitas vezes, sendo anulado, acaba

se tornando aquela esfera que legalizará as decisões de determinados atores sociais, sem, no

entanto, ter poder de decisão ou de influenciar a decisão. Assim, podemos ver as

interferências de determinados grupos demonstrando a parcialidade do poder público.

No Brasil, são os poderes executivo, legislativo e judiciário que demandam

as decisões, cada um com sua forma de legalizar decisões, respeitando a Constituição. A

Constituição de 1998 deu ao município o caráter de ente Federado, como os Estados, o

Distrito Federal e a União. Esse caráter atribuiu aos municípios uma tomada de poder

diferentemente das constituições anteriores, que tinham no município apenas um elo de

ligação com a escala do Estado.

O município, desde a Constituição de 1988, tem associado caráter

descentralizador ao poder de decisão, respondendo aos diversos mecanismos que expandiram

seus recursos enquanto município, em áreas que antes eram de responsabilidade dos Estados e

da União, e que passaram para a esfera municipal, como saúde, educação, proteção à

sociedade civil, planos de desenvolvimento econômico, dentre outros.

Segundo Sílvia Regina Pacheco (1999),

essa agenda ambiciosa se forma num contexto de profundo questionamento do papel do Estado e de escassez de recursos públicos para responder ao conjunto das demandas sociais. Por um lado, isto implica repensar a organização do Estado – especialmente do governo local – como uma network de agentes capazes de impulsionar novas soluções, catalisados pelo Poder Público. Por outro lado, tornam-se de fundamental importância as políticas para melhorar a qualidade do serviço e a produtividade do setor público, visando à melhoria de sua performance (PACHECO, 1999, p. 40).

A escassez dos serviços públicos ainda é algo que diferencia no primeiro

momento os municípios no Brasil. Podemos notar a grande diferenciação entre os mais de

5.000 municípios existentes no território nacional. A maioria desses municípios é considerada

como micro municípios e apresentam diferentes problemas sócio-econômicos, que

Page 97: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

97

aumentaram nas últimas décadas do século XX. Houve assim uma inversão da população

municipal no Brasil como demonstra a Figura 07.

A inversão ocorrida na população dos municípios brasileiros foi a seguinte:

os 60% de municípios que possuíam mais de 20 mil habitantes, passaram, já no período de

1940 a 1963, para 14%, e na segunda metade da década de 1990, para 2% (Figura 07).

Enquanto isso os municípios que possuíam até 20 mil habitantes aumentavam no Brasil,

passando de 40% antes de 1940, para 86% entre os anos de 1940 e 1963. Já na década de

1990, esse número subiu de 90% para 98% dos municípios com até 20 mil habitantes. Essa

inversão demográfica ajudou na fragmentação territorial de diversos municípios brasileiros.

Surgiu, principalmente a partir da Constituição de 1988, no Brasil, uma “febre das

emancipações”, sem, no entanto, serem criados critérios de viabilidade econômico-financeira

e sem ser analisado o desempenho municipal para garantir que aqueles que pleiteavam suas

emancipações poderiam gerar riquezas para suas populações e não o contrário, como

aconteceu com a maioria dos novos municípios no Brasil, que geraram mais problemas

sociais e aumentaram a dívida de Estados e municípios.

40%

60% 86%

14%

83%

17%

90%

10%

97%

3%

98%

2%

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Antesde 1940

1940 a1963

1964 a1988

1989 a1992

1993 a1996

após1996

Fonte: IBGE, 2000.

Figura 07 - Ano de Instalação dos Municípios por Tamanho da População (1999)

Até 20 mil habitantes

Acima de 20 milhabitantes

Page 98: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

98

A Figura 07 demonstra a grande proliferação de pequenos municípios no

Brasil a partir da Constituição de 1988 (surgiram 1.307 municípios desde então). Dessa

forma, a reestruturação municipal se faz necessária por diversos fatores. O primeiro é a

necessidade de atender a diversos setores da sociedade civil antes excluídos e que têm

ocasionado diversos segmentos sociais, como os sem-teto, os sem-terra e outros que surgiram

ao longo das últimas de décadas no Brasil, frutos de um processo social que os colocou como

vítimas de uma política que desconsiderava os setores sociais que, hoje, não podem mais

passar despercebidos diante de tantos conflitos sociais gerados pelas políticas de Estado e

municípios no Brasil. Um segundo fator que justifica a reestruturação municipal é o número

de municípios que surgiram sem a menor condição de viabilidade econômico-financeira e,

conseqüentemente, sem recursos para atender a seus habitantes.

O Brasil encontra-se em diferentes estágios em relação às questões político-

administrativas. De Norte a Sul do país, encontramos formas variadas de desenvolvimento

econômico e modelos de gestão pública, o que demonstra a diversidade dos caminhos

encontrados pelos governos locais para enfrentarem seus problemas urbanos e rurais, porém a

maioria dos pequenos municípios ainda está sob condições quase nulas de viabilidade

econômico-financeira. Sabemos que só a questão econômico-financeira não resolverá os

problemas municipais, mas poderá contribuir para melhorar as administrações públicas.

As questões referentes aos municípios brasileiros, especialmente os que

estudamos neste caso, os do sudeste paraense, são questões que perpassam as suas formas e

funções de viabilidade econômico-financeiras. Esse desafio em relação à captação de recursos

para aumentar a capacidade de arrecadação municipal está diretamente relacionado com as

formas de gestão encontradas pelos municípios em virtude dos diferentes graus de

dificuldades econômicas que cada um encontra em relação aos problemas urbanos e rurais.

Page 99: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

99

Todo e qualquer arranjo espacial no território acaba por influenciar o

potencial dos municípios. Essa potencialidade municipal, muitas vezes, acaba sendo

direcionada para atividades econômicas com maior rentabilidade e maior potencial de

arrecadação de impostos na geração da receita municipal, sem se preocupar com os possíveis

impactos gerados pela implantação dessas atividades, que, no caso em estudo, são atividades

de mineração.

Dessa forma, o desafio municipal está na coordenação conjunta entre a

captação de recursos, geração de empregos e melhorias nas condições de vida dos munícipes.

Um dos elementos é a falta de infra-estrutura inversamente proporcional ao crescimento

demográfico, o que tem ajudado a aumentar os problemas sociais locais, como os de saúde,

em municípios sem receita para solucioná-los.

Embora a descentralização tenha por objetivo aumentar o poder municipal, a

fim de solucionar os problemas locais, ela também aumenta a responsabilidade do município

quanto aos gastos e investimentos em determinados setores, que antes eram responsabilidade

do Estado e da União. Uma dessas responsabilidades é o recente processo de municipalização,

que, no caso os municípios estudados, provocou um repasse dos problemas sociais (falta de

infra-estrutura, migração, dentre outros) gerados pelo Estado e pela União para os municípios,

muitos dos quais sem condições de gerirem seus problemas.

Dessa forma, sobressaem os municípios com receita e arrecadação

suficientes para colocar em sintonia a descentralização e o poder de decidir; para esses a

descentralização é um elemento de democracia. Em outros a descentralização acaba por

onerar ainda mais os problemas municipais. Sem condições de terem alguns setores

municipalizados passam cada vez mais a aumentar suas dívidas internas, aumentando sua

dependência tanto dos Estados como da União na busca de aumentar suas receitas.

Page 100: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

100

Outro elemento que inviabiliza a descentralização municipal é o pensamento

tradicional de muitos poderes locais que continuam a inibir a participação da sociedade civil,

obstando a criação de canais de participação dessa sociedade. Com canais abertos para

participação da sociedade civil, poderíamos alcançar uma melhor estrutura municipal e

começar a mudar de certa forma a organização da própria sociedade e a gestão municipal.

Por outro lado, essa responsabilidade não veio acompanhada pela

modernização da estrutura municipal, ou seja, muitas prefeituras continuam no atraso

burocrático, sem conseguir criar estratégias para definir seus eixos de desenvolvimento para

atingir tanto o crescimento econômico e, conseqüentemente, o aumento de suas receitas, como

também melhorar as condições de vida de suas sociedades.

4.1 Municípios e suas arrecadações: instrumentos de poder para a gestão territorial

Poder, governo e território são elementos para analisarmos as relações

político-econômico-sociais que no sudeste paraense fazem da gestão territorial uma cadeia de

processos que envolvem diferentes atores sociais e se manifestam em diferentes interesses no

processo de arranjo territorial, demarcando assim territórios de interesses e suas alianças em

função de determinados processos sócio-ecônomicos locais.

Ao mesmo tempo, acontecem buscas por recursos econômicos para

viabilizar políticas setoriais para geração do crescimento econômico local. Muitos dos

municípios da mesorregião sudeste paraense dependem diretamente dos repasses dos tributos

do governo estadual e da União, sem, no entanto, apresentar políticas que os tornem capazes

de aumentar suas arrecadações e assim dar soluções aos seus problemas urbanos e rurais.

As arrecadações oriundas das atividades econômicas que representam as

receitas municipais em certos casos não são suficientes para dar condições de viabilidade

econômica aos municípios, a começar pelo fato que seus orçamentos acabam concentrando

Page 101: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

101

gastos nos serviços públicos, como o pagamento do salário do funcionalismo municipal. A

grande questão e, ao mesmo tempo, o desafio das administrações municipais em conjunto

com a sociedade civil organizada, é como capacitar a gestão territorial para que ela, ao mesmo

tempo em que aumenta suas receitas, possa traduzi-las em benéficos para a sociedade, criando

um efeito multiplicador no município. Como captar recursos sem colocar em risco a

viabilidade municipal é um grande desafio dos municípios do sudeste paraense.

No entanto, ainda pode ser precoce afirmar a viabilidade dos municípios que

surgiram das emancipações territoriais que Marabá sofreu durante as décadas de 1980 e 1990.

Marabá, o município que deu origem aos demais municípios, tem toda uma história político-

econômico-social na região, que permite analisá-la com mais precisão, enquanto municípios

novos como Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Água Azul do Norte e Canaã

dos Carajás não podem ser analisados da mesma forma. Mas eles devem servir como

exemplos de recortes territoriais diferenciados a partir dos projetos econômicos (voltados para

mineração), que foram implantados em seus territórios, e da capacidade de organização

político-social de suas sociedades.

Suas histórias de criação se confundem com a partilha pelo poder

econômico de Marabá, mas também são frutos de novos tempos econômicos pensados para a

região Amazônica, dentro do projeto de desenvolvimento econômico do país, a partir da

década de 1960. Não podemos descartar a forma pela qual a Amazônia é inserida dentro do

projeto de globalização econômica de seu território no espaço nacional e mesmo

internacional. Seu território sofreu com a ganância econômica de grandes grupos empresariais

tanto nacionais quanto internacionais e com as políticas governamentais orientadas para a

região.

É nesse contexto de tentar inserir a Amazônia em um cenário econômico

nacional e mesmo internacional que o território econômico de Marabá sofreu profundas

Page 102: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

102

transformações e deu origem a novas formas econômico-políticas locais, que acabaram por

fomentar as disputas territoriais locais e a partilha pelo poder econômico e político da região

sudeste paraense.

Territórios até então “esquecidos” tornaram-se estratégicos para diferentes

grupos empresariais locais, nacionais e até mesmo internacionais. É dentro desse novo cenário

econômico, principalmente a partir da década de 1980, que Marabá se torna ainda mais um

pólo regional e ganha estatutos políticos de um grande centro regional na Amazônia em

virtude da presença do grupo CVRD e da exploração das riquezas minerais existentes em seu

território.

Assim, as relações de poder político-econômico vão se tornando mais

explícitas, e as formas de governo do território vão assumindo caráter diferenciado do período

da oligarquia dos castanhais no que diz respeito à inserção da região no cenário internacional

e na mudança de visão em torno da economia local (como já foi citado anteriormente no

capítulo 02 com a inserção de novos atores sociais).

A visão empresarial mudou com a chegada dos bancos e, principalmente,

dos projetos da CVRD na região; a relação político-econômico-social agora era de conviver

economicamente com um grande grupo empresarial na exploração dos minérios da região

sudeste paraense. É assim que muitos municípios passam a depositar suas esperanças de

aumento de receita e de criação de novos espaços econômicos com os possíveis tributos

advindos das explorações minerais em seus municípios, o que também faz aumentar a disputa

pelos projetos da companhia e pela disputa do poder político-econômico local.

A introdução de novos atores sociais modificou a forma de ver e administrar

a gestão nesses municípios. Um conjunto de elementos foi fundamental para tais mudanças,

entre eles: a experiência de muitos empresários em outras áreas do país, a presença de uma

das maiores companhias de mineração do mundo com uma visão empreendedora de

Page 103: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

103

exploração mineral em alta escala e a formação de um novo tipo de organização da sociedade

civil, com novos políticos (médicos, comerciantes, enfim profissionais liberais de toda parte

do país) advindos de outros ramos econômicos, com a formação de sindicatos, e com a

própria organização do MST. Tudo isso contribuiu para a nova gestão territorial.

Era necessário pensar a viabilidade econômica como expressão de poder

local, não só para fortalecer os municípios, mas ainda para expressar seus domínios na

política local. Dessa forma, a receita municipal é um instrumento de poder político-

econômico no governo do território nos municípios utilizados pela elite local tanto para

fundamentar os discursos emancipacionistas quanto para sua manutenção no poder municipal.

A organização econômica do território expressa, sem dúvida, o poder das novas alianças

político-econômicas locais e extralocais na gestão territorial.

Figura 08: Monumento em homenagem aos mortos da curva do “S” em Eldorado do Carajás (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Assim não seria mais possível excluir ou ignorar a presença dos conflitos de

interesses existentes nesses municípios. Embora os conflitos continuem existindo. A

sociedade civil tem suas representações na forma organizada de reivindicar seus direitos

Page 104: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

104

diante dos novos governos que se sucedem nas administrações locais. Entretanto, em certos

municípios ainda persistem formas tradicionais de domínio em que o poder local é exercido

de forma autoritária e até mesmo coercitiva e, para lembrar uma expressão de Hannah Arendt

(1993), onde o poder está em risco, quando se usa a força física e, a coerção para se resolver

direitos conflitivos. O maior exemplo dessa natureza foi o massacre de Eldorados dos

Carajás14 (Figura 08), onde dezenove trabalhadores rurais foram assassinados.

Em outros municípios, entretanto, embora a estrutura de poder se mantenha

nas mãos da elite político-econômica local, essas formas não são tão visíveis assim, o que

reflete tanto os interesses econômicos locais e extralocais, como o grau de organização da

sociedade civil. Para expressar tais interesses e conflitos, optamos pelos impostos arrecadados

para direcionar quais municípios são ou não dependentes das receitas adquiridas e qual é seu

grau de viabilidade diante de tais recursos financeiros. Sempre faremos referência a todos os

municípios da mesorregião sudeste paraense para uma análise comparativa em seu conjunto

durante os anos de 1995 a 2000.

As fontes de arrecadações, os impostos, têm sido suas únicas saídas para

aumentar suas receitas e, dessa forma, criar mecanismo de desenvolvimento local. Por isso o

aumento desses recursos é um desafio para os governos locais. O poder econômico-político-

social municipal tem como parceiros o Estado e a União, o que cria uma relação de

dependência entre essas instâncias e o município, apesar de ser este um ente federado.

14 Episódio do dia 17 de abril de 1996, onde foram assassinados 19 trabalhadores rurais do Movimento dos Sem-Terra (MST) na curva do “S” no município de Eldorado do Carajás. Os trabalhadores protestavam na PA-275 e em passeata, iam com destino até a capital Belém para pedirem a desapropriação do complexo de fazendas Macaxeira, quando foram cercados por policias militares e ficarem em fogo cruzado, onde ocorreram as mortes dos trabalhadores, até o presente momento ninguém foi oficialmente responsabilizado pelas mortes.

Page 105: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

105

4.2 Breve Análise das Arrecadações dos Municípios de Marabá, Parauapebas Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte.

Os seis municípios aqui estudados possuem suas arrecadações diferenciadas

e suas dinâmicas econômicas próprias. Embora Marabá, que deu origem aos demais, tenha

uma dinâmica econômica própria mais desenvolvida, não podemos deixar de destacar

Parauapebas, em cuja região se encontram os principais projetos da CVRD. Desde suas

emancipações, municípios como Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e

Água Azul do Norte, criados em diferentes períodos, enfrentam problemas comuns e com

grau de capacidade de resolução diferenciado de acordo com sua potencialidade político-

econômico-social para resolvê-los, sejam eles urbanos e rurais.

Muitos desses municípios, após sua emancipação, não conseguem

desenvolver aquilo que seus mentores/emancipacionistas pregavam quando de sua separação,

em relação ao município em que sua área estava associada. O discurso da elite local de que

seus impostos não são traduzidos em melhoria para essas áreas acaba sendo apenas um

elemento para direcionar interesses político-econômicos e, assim, fortalecerem seus laços de

poder, sem, no entanto, esse discurso ser traduzido em melhoria para a população

emancipada.

Como elemento para analisarmos melhor essas questões que implicam as

relações de poder que organizaram o território e fundamentaram o governo local, é necessário

analisarmos suas arrecadações que, no discurso, não deixam de ser elementos de poder e de

organização do governo no território.

Sendo assim, vamos analisar os repasses de FPM nos municípios da

mesorregião sudeste paraense, com destaque para os municípios que selecionamos para

estudo. Esses repasses têm sido cada vez mais questionados, por ocasião do investimento em

setores que seriam prioritários para o crescimento econômico do município. A maioria dos

governos locais, sem capacidade de atrair novos recursos, tem nesses repasses sua única via

Page 106: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

106

de investimento na melhoria de vida de suas sociedades e na capacidade de investimento

local.

Assim, ICMS, FPM, IPI e os próprios royalties da CVRD são soluções e

esperança de crescimento econômico local. Acreditam os governos municipais que esses

recursos são a “tábua de salvação” dos municípios que não conseguem atrair investimentos e

vêem, nesses repasses, seu grande “filão” para manter o discurso emancipacionista e para

continuar a garantir suas relações de poder no território e a manutenção de seus governos.

O repasse de ICMS entre os anos de 1995 e 2000 tem nos dados das tabelas

(Tabelas 01 e 02), uma definição de quanto cada município do sudeste paraense tem

arrecadado nesses últimos anos. Esses repasses têm oscilado ao longo dos anos que

analisamos. Nos municípios como Marabá pode-se fazer uma análise mais detalhada dos anos

de arrecadação do ICMS, mas em outros municípios, como Canaã dos Carajás, que foi

recentemente criado, não podemos. Por essa razão, em alguns momentos não temos dados

suficientes para analisarmos comparativamente suas arrecadações com aquelas de municípios

mais antigos e com os mais economicamente dinâmicos, como é o caso de Marabá e

Parauapebas.

Tabela 01 – Repasses de ICMS aos Municípios da Mesorregião Sudeste Paraense em R$ Municípios

Total do Ano 1995 Total do Ano 1996 Total do Ano 1997

Água Azul do Norte 221.997,91 257.594,53 234.615,59 Canaã dos Carajás - - 167.582,56 Curionópolis 806.861,79 936.239,35 837.912,82 Eldorado do Carajás 143.403,36 166.397,61 167.582,56 Parauapebas 5.665.779,71 6.574.268,29 10.982.866,60 Marabá 3.543.885,31 4.112.135,31 3.737.091,19 Soma dos seis municípios 10.159.930,17 11.789.040,56 16.129.648,32 Demais Municípios 13.204.835,18 15.322.185,74 48.320.430,132

Fonte: SEFA, 2001.

Municípios Total do Ano 1998 Total do Ano 1999 Total do Ano 2000

Page 107: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

107

Tabela 02 – Repasses de ICMS aos Municípios da Mesorregião Sudeste Paraense em R$ Fonte: SEFA, 2001.

Mas o importante é notarmos que a dinâmica interna de cada município

depende de um conjunto de fatores a serem postos em prática pelas gestões municipais. O

grau de viabilidade econômica de cada município não depende só de suas arrecadações,

depende também das formas como os seus planejamentos têm sido realizados. O desafio não

está só em captação de recursos, mas também na maneira como a sociedade pode participar na

elaboração de planos mais democráticos e salutares para o desenvolvimento local de cada

município e do seu entorno.

Não basta ter recursos naturais e ter empresas em seus territórios, as práticas

de poder na organização econômica do território dependem da capacidade da sociedade civil

em acordo com a gestão municipal de elaborar suas formas de crescimento econômico-

político-social.

Um conjunto de idéias e de diferentes interesses por parte dos atores sociais

poderá ser um dos caminhos que cada administração municipal tenderia a trilhar caso canais

de participação para a sociedade civil fossem abertos. Esses canais seriam discutidos com a

sociedade civil organizada para melhor se fazer a gestão territorial e organizar

democraticamente o governo e suas relações de poder com a sociedade civil.

Embora a arrecadação municipal de alguns municípios tenha aumentado nos

últimos anos, se não ocorrer uma reestruturação nas relações de poder no território, fazendo

com que parcelas significativas da sociedade tenham espaço na gestão municipal para

Parauapebas 11.134.072,31 17.913.590,23 27.649.158,83 Marabá 3.819.843,27 5.346.340,65 7.201.875,62 Curionópolis 856.467,10 789.041,42 3.349.123,97 Água Azul do Norte 239.810,79 375.332,20 629.534,58 Eldorado do Carajás 171.293,42 309.223,24 478.446,28 Canaã dos Carajás 171.293,42 223.919,04 553.990,43 Total dos Sei Municípios 16.392.780,31 24.957.446,78 39.862.129,71 Total dos Demais Municípios 18.826.329,39 18.761.224,14 25.533.922,64

Total da Mesorregião 35.219.009,70 43.718.670,92 65.496.052,35

Page 108: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

108

resolução dos problemas, ou seja, que os problemas sejam discutidos pela sociedade, formas

autoritárias de governos e de exclusão da sociedade civil tenderão a coexistir, sem, no entanto,

levar à melhoria da gestão territorial e inviabilizando o crescimento econômico local. Dessa

forma, apesar dos conflitos de interesses co-existirem, a sociedade civil não pode ser apenas

legitimadora das relações de decisão municipal, ela tem que fazer parte das decisões.

Os repasses de verbas e as formas como os municípios buscam arrecadar

seus tributos são expressões de poder político-econômico e social. Essas dinâmicas, no

território, refletem o grau de campo de poder e de governo nas suas formas mais expressivas

de organização do território.

Todo e qualquer elemento a ser incorporado pela gestão territorial tem como

ponto de partida relações de poder que, no território, refletem práticas de governos e seus

interesses. No caso dos municípios do sudeste paraense, essas práticas, que vêm oriundas das

oligarquias dos castanhais, são disciplinadoras e reveladoras de novos tempos, muito embora

ocorra uma manutenção de seus eleitos no poder, no caso os representantes das elites locais.

Os movimentos sociais organizados fazem pressões de diferentes maneiras para que ocorra

ressonância e, conseqüentemente, a amplitude dos benefícios sociais no que diz respeito ao

orçamento municipal, e assim beneficiam a sociedade como um todo. Como podemos notar

nas tabelas 01 e 02 onde são relacionados no período que vai de 1995 a 2000 os repasses do

ICMS aos municípios do sudeste paraense, há indicação também da maneira como a gestão

territorial e os discursos político-econômicos têm sido direcionados de acordo com o

crescimento econômico local.

Nos seis anos de repasses para os municípios do sudeste paraense, os seis

municípios aqui estudados, principalmente Marabá e Parauapebas, municípios que sediam

projetos da CVRD e que têm suas atividades no comércio e na mineração, alcançaram um

certo grau de independência financeira em relação aos demais municípios aqui estudados.

Page 109: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

109

Porém, depois da promulgação da Lei Kandir, esses repasses acabaram

sendo diminuídos em virtudes da redução da cota do ICMS. Certas atividades, que antes

condicionaram um incremento dos repasses, depois da Lei Kandir desabaram no sentindo de

diminuir os repasses.

Os repasses são expressões não só do crescimento econômico municipal

mas da dependência ou independência econômica dos municípios. Entretanto o aumento ou a

diminuição dos repasses expressa também relações de poder na ordem do governo no

território, bem como o território econômico e sua gestão territorial em cada município.

Os dados das tabelas 01 e 02, nos períodos que vão de 1995 a 2000,

expressam nitidamente o grau de dependência econômico-financeira de cada município e as

possibilidades de crescimento bem como as oscilações de cada município em termos de

arrecadação. Cada um tem sua peculiaridade, assim como sua capacidade de melhor gerir seus

recursos.

Fica difícil compararmos ano a ano os seis municípios, em virtude dos

períodos de emancipação de cada um, porém faremos uma análise a partir do ano de 1995,

quando podemos observar uma certa expressão não só nos municípios de primeira geração,

mas também nos municípios de segunda geração.

As relações de poder na organizam da gestão no território, expressam de

uma forma ou de outra esse crescimento ou diminuição nas arrecadações. As formas de

implantação e de viabilidade dependem de um conjunto de fatores que congregam os três

conceitos analisados nessa pesquisa: poder, governo e território. Essa tríade explica como a

organização econômica do território se apresenta complexa tanto na forma quanto na função

de cada atividade econômica no desencadeamento dos processos econômico-político-sociais e

culturais em cada município.

Page 110: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

110

Nesse conjunto de repasses de ICMS para mesorregião sudeste paraense

cada município tem sua participação em relação aos repasses realizados nos períodos de 1995

a 2000. De acordo com sua posição em cada período. Parauapebas é o primeiro município em

arrecadação de ICMS, seguido de Tucuruí, Marabá e Curionópolis como os maiores

arrecadadores; enquanto municípios como Água Azul do Norte, Canaã dos Carajás e Eldorado

do Carajás seguem entre aqueles que menos arrecadam dentro da mesorregião sudeste.

Por terem períodos de criação diferenciada e por Marabá ser o município-

mãe que originou os demais, escolhemos a década de 1990 para analisarmos os repasses

realizados pelo Estado e pela União para os seis municípios, para termos uma análise

comparativa mais detalhada. Marabá, município que sediava projetos da CVRD na década de

1980 e que tem uma história econômica de destaque na região, Tucuruí, que possui a

Hidrelétrica, e Parauapebas, sede dos atuais projetos da CVRD na região, são municípios que

se destacam em termo de repasse, por possuírem em seus territórios projetos ou atividades que

são sedimentadas em relação aos demais municípios da mesorregião.

O crescimento ou a diminuição nos repasses depende do momento histórico

que cada município vivia ou vive. De uma forma ou de outra, a região que corresponde aos

municípios que pertenciam a Marabá é uma região onde a atividade mineral domina. A ordem

econômica traduzida nos repasses ou nas arrecadações em cada município tem como elo de

intermediação os diferentes conflitos que compõem as relações sociais nesses municípios do

sudeste paraense.

Cada projeto implantado em seus municípios expressa de uma forma direta

ou indireta o poder econômico de cada ator social na organização econômica do território. E,

dessa forma, o governo local, na concepção do poder local, acaba direcionando seus interesses

para melhor expressar suas formas de domínio tanto político quanto econômico nesses

municípios. Na própria concepção de poder local, como expressa por Celso Daniel (1988), o

Page 111: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

111

poder acaba fazendo parceria com o governo na organização do território com a finalidade

explícita de direcionar a gestão municipal e dessa forma visa satisfazer os anseios dos atores

sociais envolvidos no fortalecimento de cada atividade local seja ela industrial, mineral ou

comercial, fortalecendo os atores sociais no poder local.

As transferências de receitas são depositadas no FPM, no ICMS e no IPI

basicamente. Dessa forma podemos constatar que o aumento gradativo dessas transferências

tem esbarrado na boa ou má administração municipal. Assim elas beneficiam municípios

como Marabá e Parauapebas e contribuem com as parcerias e com outros tributos como os

royalties para aumentar a arrecadação municipal. No caso dos municípios como Eldorado do

Carajás, Curionópolis, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte essas transferências são

essenciais porque esses municípios dependem diretamente desses recursos para viabilizar a

gestão territorial local.

As tabelas seguintes mostram ao longo dos últimos seis anos a distribuição

das transferências e do PIB municipal dos municípios estudados. No conjunto dos municípios

da mesorregião do sudeste paraense, em matéria de IPI o município que mais tem arrecadado

nos últimos três anos é Parauapebas, sendo ele o primeiro município arrecadador de IPI

(Tabela 03) seguido de Tucuruí e Marabá respectivamente. Isso demonstra que, entre os

municípios da mesorregião, Parauapebas e Marabá têm se destacado, o que não ocorre quando

comparamos com os demais municípios de nosso estudo.

Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios estudados ele

tem sido, ao longo do tempo, um desafio aos novos municípios, e incluindo Marabá,

município-mãe, para a melhoria da gestão dos recursos no território e sua distribuição na

sociedade civil. Para ilustrar essa questão Gustavo Gumes e Maria Cristina MaC Dowell

(2000) analisam a importância das transferências municipais e como elas, de uma maneira ou

Page 112: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

112

de outra, colocam em cheque a questão da descentralização e o papel de cada município no

desenvolvimento econômico nacional.

Na sua acepção mais ampla, o processo envolve a redistribuição de poder – e, portanto, de prerrogativas, recursos e responsabilidades – do governo para a sociedade civil, da União para os estados e municípios, e do Executivo para o Legislativo e o Judiciário[...] Outra evidência é a proliferação de pequenas cidades, que veio junto com a descentralização política implementada após 1984. Os distritos se converteram em municípios, em primeiro lugar, porque suas populações e elites políticas percebem que podem fazê-lo, ou seja, porque a descentralização política lhes deu uma parcela de poder anteriormente monopolizada por Brasília; e, em segundo, porque isso lhes aumenta o status – e os recursos financeiros (GOMES MaC DOWELL, 2000, p. 8-9)

Tabela 03 – Imposto Sobre Produto Industrializado na Mesorregião SE do Pará em R$

Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Marabá 292.134,34 367.887,30 425.428,45 393.053,65 425.728,45 551.281,52 Parauapebas 467.049,20 588.159,10 271.884,70 1.145.672,07 1.240.912,53 2.116.458,41 Curionópolis 66.512,32 83.759,54 38.719,01 88.128,62 95.545,81 48.188,94 Canaã dos Carajás

- - - 17.625,72 190.090,96 42.406,27

Eldorado do Carajás

11.821,22 14.886,56 6.881,52 17.625,72 19.090,96 36.623,60

Água Azul do Norte

18.300,03 23.045,39 26.727,35 24.676,01 31.828,35 48.188,94

Total do Seis Municípios

857.812,11 1.079.733,89 771.638,03 1.688.779,79 2.005.196,06 2.845.147,68

Fonte: SEFA, 2001.

Nesse caso, os autores afirmam que os pequenos municípios, principalmente

aqueles que possuem até cinco mil habitantes, dependem diretamente das transferências dos

impostos. Segundo os autores, em relação ao ano de 1996 apenas “9% da receita corrente

disponível dos municípios de até 5 mil habitantes no Brasil era própria, no sentido de resultar

de recurso arrecadados por eles próprios” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 11). Marabá,

município de melhor renda com mais de 100 mil habitantes e que tem uma receita

considerável tanto em relação à mesorregião sudeste paraense, quanto em relação ao Estado

do Pará devido a sua história econômica e por sua dinâmica política (desde o período da

borracha e da castanha), é considerado um dos pólos político-econômico-adiministrativos do

Estado.

Page 113: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

113

Tabela 04 - Produto Interno Bruto dos Municípios do Estado do Pará - PIB (em U$ 1,00 - 1998) Municípios 1970 1975 1980 1985 1990 1996

Água Azul do Norte - - - - - 15.272.378

Curionópolis - - - - 26.826.687 33.154.696

Eldorado do Carajás - - - - - 16.198.710

Marabá 44.716.990 53.808.425 137.004.877 359.563.931 441.869.214 455.154.875

Parauapebas - - - - 90.074.108 105.198.528

Total do Estado Sem os Cinco Municípios 2.706.618.905 4.085.118.633 8.783.062.117 10.851.780.369 15.194.310.564 16.651.060.743

FONTE: Dados básicos: IBGE e IPEA.

No que diz respeito ao PIB (Tabela 04) dos municípios estudados, no ano de

1996 eles se destacam em relação aos demais municípios paraenses. Dentre os 18 maiores PIB

do Estado do Pará estão a capital Belém em primeiro lugar seguido de Ananindeua, Santarém,

Marabá, Castanhal, Itaituba, Capanema, Tucuruí, Altamira, Redenção, Bragança, Rondon do

Pará, Santa Izabel do Pará, Dom Eliseu, São Domingos do Capim, Oeiras do Pará, Tomé-Açu

e Parauapebas. Entre eles Marabá aparece em quarto lugar e Parauapebas em décimo oitavo

na lista dos maiores municípios paraenses em arrecadação. Essa classificação demonstra o

peso de Marabá e Parauapebas dentro do Estado do Pará e dentro da mesorregião sudeste

paraense, assim como de Tucuruí, Redenção, Rondon e outros municípios política e

economicamente importantes no Estado do Pará.

Dentro dessa análise, dos municípios que foram desmembrados de Marabá

apenas Parauapebas demonstra viabilidade econômico-financeira, devido à presença da

CVRD e os projetos a ela associados, como também aos recursos financeiros dos diversos

assentamentos rurais existentes em seu território, como é o caso dos assentamentos do MST.

Esses assentamentos ajudam a impulsionar em momentos de crises, o comércio local de

Parauapebas.

De uma forma ou de outra, municípios como Água Azul do Norte e Canaã

dos Carajás acabam dependendo do crescimento econômico e dos novos investimentos de

seus vizinhos como Parauapebas, enquanto aguardam possíveis projetos que a CVRD poderá

implantar em seus territórios, como é o caso de Canaã com a entrada em funcionamento do

Page 114: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

114

Projeto Mineração Serra do Sossego (MSS) em 2004 e de Curionópolis do Serra Leste

(pendente desde sua privatização em 1997). Por sua vez Eldorado do Carajás e Água Azul do

Norte dependem diretamente do comércio local e da agricultura, para fazer parceria com o

impulso que esses outros municípios já citados poderão ter, apostando no efeito multiplicador

para crescerem economicamente.

Tabela 05 - Fundo de Participação dos Municípios do Estado do Pará entre os anos de 1995- 200015 em R$. MUNICÍPIOS 1995 1996 1997 1998 1999 2000

ÁGUA AZUL DO NORTE 693.591,96 784.687,28 782.974,11 1.621.942,93 2.188.900,34 2.469.733,10

CURIONÓPOLIS 2.543.170,38 2.877.186,70 1.565.948,01 1.621.942,93 1.740.856,05 1.701.981,02

ELDORADO DO CARAJÁS 924.789,27 1.046.249,76 782.974,11 810.971,60 938.100,40 1.058.457,32

MARABÁ 8.640.023,90 9.774.792,05 9.999.495,11 10.220.167,45 9.558.221,08 9.697.492,40

PARAUAPEBAS 2.311.973,08 2.615.624,24 1.826.939,31 2.162.590,44 2.501.600,31 2.822.552,13

Total dos cinco Municípios 15.115.543,59 17.100.536,03 14.960.327,65 16.439.613,35 16.929.677,18 17.752.215,97

Total dos Municípios Paraenses 269.774.795,88 305.206.661,12 293.577.131,64 316.351.194,04 349.229.444,652.976.545.124,85

Fonte: Ministério da Fazenda – Secretaria do Tesouro Nacional.

Ao analisar os repasses dos principais impostos dos municípios do sudeste

paraense, constatamos que ocorre uma imensa diferença entre aqueles municípios novos que

foram criados a partir de 1988 (Tabela 05) e em cujo território possuem projetos efetivos de

mineração da CVRD e aqueles que não os possuem. Por exemplo: Parauapebas, que foi

emancipado em 1988 junto com Curionópolis, possui grau de arrecadação diferenciada.

Enquanto Parauapebas sobrevive com mais recursos financeiros, Curionópolis está entregue a

sua própria sorte.

Parauapebas, ao ser emancipado de Marabá, herdou os principais projetos da

CVRD e ainda dispõe dos royalties da mineração. Enquanto isso Curionópolis, que tinha

Serra Pelada, com o fim da lavra manual depositou toda a sua esperança no projeto Serra

Leste, cuja viabilidade e implantação no município citado ainda hoje está em discussão.

Os fins político-econômicos pelos quais esses municípios foram criados em

muitos casos não se traduziram em melhorias, pelo contrário, aumentaram as dívidas

municipais e suas sociedades não melhoraram e, em muitos casos, pioraram suas condições de

15 Não foi possível conseguir dados sobre Canaã dos Carajás.

Page 115: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

115

vida. Com receitas insuficientes e sem possibilidade de captar recursos externos, esses

municípios inviabilizam seu desenvolvimento sócio-econômico.

Dependentes dos repasses da União e do Estado, suas estruturas, enquanto

formas de desenvolvimento, continuam inexistentes, suas elites político-econômicas fecham

os olhos para o futuro e permanecem com sua visão de desenvolvimento como se ainda

fossem os oligarcas do Tocantins e mantiveram seu pensamento econômico e sua economia

presa ao século XIX.

O grau de dependência econômica dos novos municípios tem ocasionado a

discussão sobre os canais de participação da sociedade civil. Por outro lado, como Alain

Bourdin (2001) bem analisou em seu livro a respeito das questões referentes às formas de

desenvolvimentos das mobilidades, estas “são tratadas como fatores perturbadores e como

perigos, mas não se pensa que elas possam produzir novas definições da localidade”

(BOURDIN, 2001. p.59). Assim, nos municípios estudados, diríamos que a questão local tem

proporcionado o surgimento e o fortalecimento dos atores sociais devido à mobilidade que

existe nessas áreas atratoras de migração, em função das atividades econômicas fazendo

surgir diferentes formas de organização social das disputa pelos recursos utilizados no

território. Por outro lado essa mobilidade serviu aos interesses das elites locais. Esses

interesses estão associados a discursos emancipacionistas que tanto serviram para legitimar o

poder local e fizeram emergir novos atores sociais na disputa pelo campo de poder na

organização do governo territorial no sudeste paraense.

Na questão da mobilidade existe a respeito do FPM (Tabela 05) uma relação

direta entre aqueles municípios que não possuem atividades econômicas atrativas para as

empresas de mineração como a CVRD; nesse caso o FPM é uma das principais fontes

financeiras para o município. Para outros, que possuem projetos definidos pela CVRD, e que

Page 116: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

116

recebem os royalties da mineração, o FPM é um elemento a mais na sua arrecadação (Nesse

caso os novos municípios dependem diretamente das transferências dos impostos).

Assim o local (município) é a escala que melhor expressa essas trilhas

financeiras que equivalem a relações de poder nas disputas tantos entre os municípios quanto

entre os atores político-econômicos locais e extra locais.

Ainda, segundo Alain Bourdin (2001)

Chegamos a uma definição do local que não faz dele nem uma necessidade antropológica nem um conteúdo herdado e inevitável, mas uma forma social que constitui um nível de integração das ações e dos atores, dos grupos e das trocas. Essa forma é caracterizada pela relação privilegiada com um lugar, que varia de intensidade e em seu conteúdo. A questão se desloca então da definição substancial do local à articulação dos diferentes lugares de integração, à sua importância, à riqueza de seu conteúdo (BOURDIN, 2001. p. 56).

É nessa perspectiva que se pode entender a integração das atividades

mineradoras presentes em municípios como Marabá, Canaã e Parauapebas e a possível

virtualidade de outros projetos em Curionópolis, por exemplo. Nessa ótica não só o Estado,

mas também as empresas e os diferentes atores econômicos utilizaram-se dos recursos

financeiros tornando-os elementos através dos quais os discursos do poder local mobilizam a

sociedade local para tentar garantir seu domínio municipal. Porém, sociedade civil organizada

no sudeste paraense, especialmente nos municípios estudados, tem seu papel bem definido no

que diz respeito à busca pelos recursos disponíveis nos territórios.

Quando comparamos diferentes áreas dentro de um mesmo território, como

é o caso da cidade de Parauapebas e do núcleo urbano de Carajás (administrado pela CVRD),

os contrastes na paisagem local vão além da distinta organização sócio-espacial que tem

levado à organização da sociedade civil e à disputa por melhores condições de vida dessas

populações.

As arrecadações são diferenciadas, porém as práticas que levam esses

municípios a se emanciparem são praticamente as mesmas. O discurso da elite de que os

Page 117: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

117

impostos não são traduzidos em recursos acabam ecoando na população. Pela sua própria

mobilidade, a maioria dessa população vinda do vizinho Estado do Maranhão, um Estado com

menos recursos que o Estado do Pará quando comparamos as formas de desenvolvimento,

vêem nesses discursos formas de melhoria de vida; assim o discurso de desenvolvimento

sócio-econômico que seria da sociedade, acaba sendo apropriado e distorcido pela elite local,

no intuito de partilhar o poder político-econômico.

Destarte, por ocasião dos desmembramentos dos municípios bem poucos

governos locais criam canais de participação para aqueles que os ajudaram a realizar seus

sonhos de poder territorial. A gestão municipal, dessa forma, acaba sendo uma gestão

hegemônica da elite que controla o poder político-econômico da região. Por isso depois da

fragmentação alcançada, a situação das áreas urbanas e rurais em quase nada melhora. Novos

cargos de prefeitos e vereadores são a forma do reducionismo desenvolvimentista pensado

pelo poder local na fragmentação do poder no sudeste paraense.

Para Gustavo Gomes e Maria MaC Dowell (2000), “para custear suas

despesas (inclusive, é claro, as despesas com sua própria administração), os pequenos

municípios dependem fortemente das transferências de impostos, especialmente dos imposto

federais, via Fundo de Participação dos Municípios” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 11).

De uma forma ou de outra, sempre a discussão sobre a viabilidade econômico-financeira dos

municípios aqui estudados passa pela direta ou indireta dependência desse imposto, e da

capacidade de captar recursos, principalmente com a implantação de possíveis projetos da

CVRD na região.

Outro fato a destacar, como podemos observar, é a discussão sobre a

participação dos municípios na cota parte do FPM, já que dos 5.506 municípios existentes no

Brasil (Quadro 08) 4.119 municípios têm até 20 mil habitantes. Assim, segundo os autores

eles oneram a outra parcela dos municípios com mais de 100 mil habitantes. Os municípios

Page 118: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

118

aqui estudados não fogem à regra das distribuições e das maneiras como foram criados

municípios em áreas em que os discursos políticos sobressaíram em relação às suas condições

de viabilidade econômico-financeira. Segundo Gustavo Gomes e Maria MaC Dowell “para o

Brasil como um todo, os grupos de municípios com mais de 100 mil habitantes financiam (via

FPM) os municípios com menos de 100 mil habitantes” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p.

14).

Quadro 08 – Municípios e Faixas de População no Brasil

Fonte: IBGE – Perfil dos Municípios Brasileiros, 1999 (adaptado pelo autor).

Ainda segundo Gomes e MaC Doweel,

Os grandes beneficiários dos critérios de repartição de recursos tributários (especialmente federais) entre os municípios são os pequenos municípios e, dentre estes, especialmente os de até 5 mil habitantes. Nos últimos anos, o processo de descentralização política, com intensa criação de municípios e proliferação dos pequenos municípios, tem implicado uma transferência de renda tributária cada vez maior para esses municípios, pelo simples fato de que eles proliferam e de que há uma cota mínima, por estado, para o recebimento do FPM pelos municípios (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 16).

Considerando que os municípios que estudamos estão dentro da faixa que

vai de 10 mil habitantes (como é o caso de Canaã dos Carajás) até 160 mil (como é o caso de

Marabá), podemos evidenciar que, com exceção de Marabá e Parauapebas, todos os outros

municípios que estudamos se encontram dentro da análise feita num dilema de dependência

Faixas de População Municípios Até 5.000 1.407 De 5.001 a 10.000 1.320 De 10.001 a 15.000 860 De 15.001 a 20.000 532 De 20.001 a 50.000 908 De 50.001 a 100.000 279 De 100.001 a 200.000 106 De 200.001 a 500.000 68 De 500.001 a 1.000.000 15 Mais de 1.000.000 11 Total 5.506

Page 119: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

119

direta dos repasses constitucionais, com pouca viabilidade econômico-financeira quando

olhamos sua configuração no território. Suas formas de gestão ainda confusas, por persistirem

resquícios de uma visão de desenvolvimento sócio-econômico-político que não engloba a

sociedade civil como um todo, se vêem na dependência de possíveis projetos de mineração da

CVRD.

Page 120: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

120

5 - POLÊMICAS, RELAÇÕES E CONFLITOS ENTRE PODERES (DA CVRD E DOS PODERES PÚBLICOS) NO CONTEXTO DAS REALIDADES MUNICIPAIS.

As relações de poder que se formam a partir dos processos conflituosos

dependem do embate com atores sociais, sejam eles a CVRD, os produtores rurais patronais,

os trabalhadores rurais sem terra, pequenos colonos, posseiros, fazendeiros individuais ou

empresariais, garimpeiros dentre outros, junto ao poder público municipal.

Todas as relações que contribuem para a gestão territorial dos municípios

aqui estudados se diferenciam pelo grau e pela complexidade que cada ator social desenvolve

ao longo das trajetórias político-econômico-sociais em seus territórios, mesmo acontecendo

momentos em que alguns atores sociais atuem em mais de um município.

O poder que organiza o território é um poder fragmentado, que, embora

exista em parceria entre atores, se fragmenta pelo número e importância dos atores sociais e

por seus objetivos alcançados no território.

Dividiremos nossas análises em cada um dos municípios, explicando suas

questões de acordo com as entrevistas e os documentos coletados, de forma que possamos

entender suas problemáticas, realizando uma breve conclusão em cada uma delas de acordo

com as prerrogativas que consubstanciam as relações de domínio na região sul/sudeste do

Pará. Nesse caso, o território é entendido pelo seu uso, pelas relações e as ações entre a

CVRD, poderes públicos e atores sociais manifestas na organização e consolidação dos

municípios. Assim, embora fragmentadas, podem ser lidas também no seu conjunto, não

dissociando os processo que foram mais expressivos dentro de cada unidade territorial.

Page 121: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

121

5.1 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Marabá

Como primeiro passo, começaremos nossas análises sobre o município de

Marabá (Figura 09), município que deu origem aos demais, considerando a importância

político-econômico-social que o município tem na região e no conjunto dos municípios

paraenses. Em entrevista realizada no município com o presidente da Associação Comercial e

Industrial de Marabá (ACIM), que é uma das entidades mais importantes na região sudeste

paraense, o representante da ACIM destacou a perda que o Estado do Pará vem tendo nos

últimos anos em função da mudança para o Maranhão de quase toda a base logística da

CVRD, que comandava as relações em Carajás. Mudando-se para o vizinho Estado do

Maranhão, beneficiou este Estado, tornando os paraenses meros fornecedores de matéria-

prima.

Figura 09: Vista Parcial da Cidade de Marabá pólo da mesorregião sudeste paraense (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Segundo seu presidente,

A associação Comercial e Industrial de Marabá aglutina a classe empresarial do sul do Estado. Ela é como se diz a porta voz. Por exemplo, o pólo siderúrgico quem denunciou, fomos nós. Eu acho até que muita coisa que se perdeu na região, ou foi desconhecimento da própria classe política do Estado, ou da própria riqueza que o Estado do Pará tem. A Vale tinha uma política predatória. Esse pólo siderúrgico começou a ser montado há dez anos atrás. A elite de Belém é extremamente conservadora, o Estado não tem uma política industrial, um Estado que vive praticamente do extrativismo,

Page 122: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

122

seja vegetal ou mineral. O Estado não tem ninguém que discuta tecnicamente com a Vale do Rio Doce. Em determinado momento pode ter até emoção, mas depois, tem que ter razão é sentar, é estudo de viabilidade técnica, econômica. O Estado tem que se preparar, se o Estado souber negociar, a gente tem que pensar no Estado como um todo (Trabalho de Campo, 2003).

A crítica empresarial realizada pela ACIM de Marabá à elite política

paraense ressalta que sempre teve seus momentos convergentes e divergentes. Uma das

divergências se deu por conta da tentativa de criação do Estado do Carajás16, que os políticos

e empresários da região sul e sudeste paraense tentaram realizar. No momento (2003) está

suspensa qualquer criação de Estado e Município, decisão tomada por parte do governo

federal. Em outras ocasiões, como a da crise do pólo siderúrgico instalado no Maranhão,

unificam-se os interesses do Estado e daqueles que representam a região sudeste paraense.

Outra crítica fundamental, realizada pelo ACIM, está relacionada à falta de

visão de planejamento industrial futuro para o Estado, e diz respeito às obras rodoviárias

realizadas pelo governo paraense. Segundo os empresários, ao invés de se construir a alça

viária ligando Belém ao sul/sudeste do Pará por via rodoviária, o Estado deveria ter investido

na construção das eclusas de Tucuruí, pois segundo o presidente da ACIM a alça viária17 “liga

nada a lugar nenhum”. Tucuruí, segundo ele, tem toda uma relação que poderia dinamizar a

região sul e sudeste paraense, tornando-se muito mais estratégica para o Estado, porém esse

planejamento para viabilizar a construção das eclusas deveria incluir negociações e parcerias

com empresas como a CVRD, ao invés de ter investido na alça viária.

16 A tentativa de criação do Estado do Carajás teve na comissão Brandão seu principal articulador entre os políticos locais para viabilizar a emancipação. O projeto foi rejeitado pela Assembléia Legislativa do Estado, mas continua o impasse e há fortes indícios que no futuro voltará a ser questão central para os políticos do sudeste paraense. 17 A alça viária é composta por quatro pontes, com 4,5 km de extensão e 70 km de rodovia, o complexo viário representou um investimento de R$ 246 milhões e vai integrar a região metropolitana de Belém ao leste paraense, onde está concentrada a maior parte da população do Estado. A maior das quatro pontes localizada sobre o rio Guamá tem 1,9 km de comprimento. As demais pontes são Moju-cidade, com 878 metros de comprimento; a Moju-alça, também com 878 metros, e a ponte sobre o Rio Acará, que tem 860 metros de extensão.

Page 123: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

123

A preocupação da ACIM em querer pensar o futuro da mineração no Estado

está relacionada também aos projetos que estão sendo direcionados para municípios na região

sul e sudeste do Pará, como é o caso do projeto MSS em Canaã dos Carajás. Segundo o

presidente da ACIM,

O pólo guseiro está se deslocando de Minas Gerais para o Maranhão e para o Pará, porque lá já desmataram demais, lá já tinha pouca mata e, eles acabaram o trabalho. Tem que ter um pólo guseiro auto sustentável, porque o mercado internacional é cada vez mais exigente nessa qualidade. A Vale fez essa sociedade com a Nucor. É boa porque ela vai pagar outros guseiros, ela vai fazer reflorestamento, ela vai usar o carvão de áreas reflorestadas, deixa de dizimar as florestas, de incentivar as queimadas, porque ela compra o carvão das siderúrgicas, nesse aspecto é bom (Entrevista realizada em 2003).

Dessa forma, as empresas CVRD e a Nucor18 poderiam amenizar as

questões ambientais na região, porém o que se verifica é que, embora haja uma legislação de

reflorestamento, muito do carvão comprado pelas guserias presentes em Marabá vem de

municípios vizinho como São João do Araguaia, onde o agricultor familiar, em virtude de

adversidades nas formas como foram realizados seus assentamentos, estão derrubando a mata

para fazer carvão e vender para as guserias em Marabá. Assim eles aumentam as queimadas e

prejudicam seu futuro como agricultor.

Há uma contradição entre as práticas otimizadas para o desenvolvimento

industrial de Marabá. O perigo do que ocorreu com Minas Gerais, em relação às guserias, é

transferido para o Estado do Pará. A pressão sobre a floresta, e o baixo nível de receita obtida

pelo pequeno produtor com a agricultura por falta de infra-estruturas e apoio financeiro dentre

outros, faz com que ele se torne refém das guserias, ou melhor, dos atravessadores que vêm

comprar carvão vegetal em seus pequenos lotes induzindo-os a aumentar suas remessas de

carvão em virtude do valor pago. Cada caminhão de carvão vegetal equivale a mil reais,

18 A parceria entre a Companhia Vale do Rio Doce e a siderúrgica americana Nucor tem um primeiro projeto anunciado, com investimento de US$ 400 milhões, e inclui a produção de ferro gusa no Brasil e a ativação da usina Trayco nos EUA (Gazeta Mercantil, 29/04/02).

Page 124: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

124

fazendo com o trabalhador fique iludido pelo retorno financeiro que está tendo sem se

preocupar com a preservação da floresta.

A questão do pólo siderúrgico torna-se assim um elemento a ser discutido,

por causa do impacto regional e local, em relação à agricultura familiar, que é a base de

sustento da maioria dos pequenos municípios na região. Ainda, segundo o presidente da

ACIM, o Pará perdeu a disputa na questão do pólo siderúrgico em virtude de toda a infra-

estrutura da CVRD ter sido montada no Maranhão, e nessa relação, ocorreu um erro que é

histórico, e se deve no “passado de uma elite conservadora, em parceria com a elite política

nacional, que não se preocupou com o futuro da economia do Estado com um todo”.

Para ressaltar o que afirmamos acima, no começo da década de 1980,

Ricardo Bueno (1984) criticou as formas como os nossos recursos naturais estavam sendo

extraídos, e exportados na Amazônia, por diversas multinacionais. Ele afirmava que corria o

risco da Companhia Vale do Rio Doce ficar apenas coma exploração do ferro. Depois de anos

a CVRD deixou de ser estatal, em 1997, e passou ao capital privado, expandiu seus negócios,

associou-se aos diferentes capitais e tem monopolizado os minérios no Estado do Pará,

contrariando a preocupação de Ricardo do Bueno no começo da década de 1980. Quando na

época a CVRD ainda pertencia ao Estado, e o capital privado internacional não estava

interessado na companhia, mas nas jazidas minerais da Amazônia. Dentre as empresas

interessadas estavam, segundo ele,

Exxon e Inço para exploração das reservas do cobre avaliadas em 1 bilhão de toneladas, a Sheel de olho nas reservas de bauxita, o grupo Patino que deseja a cassiterita e a Anglo-American que quer se apropriar das reservas de ouro. Retalhada a Serra dos Carajás, a Vale do Rio Doce ficaria apenas com o minério de ferro. Uma tese que áreas entreguistas do Ministério das Minas e Energias vêem com simpatia (BUENO, 1984. P. 139).

Em parte Ricardo Bueno não perdeu sua análise. A CVRD não só ficou com

o ferro, como também se associou as diversas empresas para explorarem juntas os minérios na

Amazônia. Na década de 1990 quando foi privatizada; nem o ferro o Estado Brasileiro

Page 125: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

125

conseguiu controlar. Por exemplo, a CVRD conversou muito com a Anglo-American para

exploração de minas de ouro no Pará. E deu um passo significativo ao se associar com

empresas chinesas no ramo da siderurgia mundial, voltando seus interesses mais para os

mercados mundiais de que para os interesses do Estado Brasileiro. Nisso a velha lógica do

entreguismo reapresentada por Ricardo Bueno parece estar correta nesse sentido; empresas

estão levando ferro, ouro, manganês, cobre e outro minerais, e isso aqui na Amazônia; o que

há muitos anos não despertava tanto interesse mundial (Carajás) agora está sendo utilizado; o

que era reserva, está sendo apropriado pelo capital mundial para atender aos mercados de

outros países.

Nesse caso, a demanda do mercado mundial e as novas relações que a

CVRD agora, como empresa privada, possui, alteraram completamente suas relações com o

Estado brasileiro e com os interesses nacionais. O pólo siderúrgico (instalado no Maranhão) é

uma questão passada, mas torna-se necessário repensar como a região paraense pode ser

beneficiada com os erros ocorridos no passado, colocando-se diante da empresa e se

posicionando no que o Estado quer em termos de industrialização para a região,

diferentemente daquele que teve como principal indutor o Projeto Ferro Carajás. Segundo

Félix Miranda, presidente da ACIM,

Pelas informações que a gente obteve com os técnicos da Vale sobre o pólo siderúrgico, usando o carvão mineral, nesse caso por isso que São Luís é economicamente mais viável, porque é uma empresa da China, ela importa o carvão da China, faz a placa de aço e depois exporta para a própria China, para ser no Pará, teria que trazer esse carvão mineral para Marabá e depois voltar, ninguém paga frete, ninguém fica passeando, quando pode encurtar o caminho, além do que em São Luís eles fizeram a logística do porto e da ferrovia, eles fizeram tudo, e o governo do Estado foi aceitando as coisas. Não adianta achar que a Vale vai resolver o problema da pobreza do Pará (Entrevista Realizada em 2003).

Há, contemporaneamente, uma tentativa de se compensar o Pará, não por

parte da CVRD, mas por parte de políticos paraenses. Projetos não faltam; um exemplo é o da

senadora Ana Júlia Carepa é de aumentar o percentual relativo aos royalties; a tentativa é de

Page 126: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

126

compensar, não só as perdas que o Estado vem tendo ao longo dos mais de vinte anos de

Projeto Ferro Carajás, mas tentar amenizar os impactos diretos e indiretos que os municípios

vêm sofrendo em função da instalação dos projetos da companhia na região.

Para o presidente da ACIM, o problema não está diretamente relacionado

com arrecadação proporcionada pelos royalties, pois segundo ele, se assim fosse, como dizem

aqueles que defendem que seus municípios só prosperariam se recebessem o recurso da

exploração mineral, Parauapebas não teria problemas. Segundo o secretário,

eu acho que a lei que tinha que aprovar os royalties, tinha que dizer quanto dos royalties tinham que ser utilizados em educação, saúde, investimentos. Parauapebas esta aí, entra um monte de dinheiro e não vai resolver nada, tu vais a Parauapebas e vê que lá é muito mais atrasado que outros municípios (entrevista realizada em 2003).

A implantação dos grandes projetos na Amazônia, segundo o presidente da

ACIM, foi indutor dos desmembramentos territoriais. Dessa forma Marabá perdeu

importantes áreas de mineração, contudo não perdeu sua importância regional, continuou

sendo o pólo político-econômico da região, junto com Tucuruí, cidade que abriga a Usina

Hidrelétrica de mesmo nome. No final do século XX houve uma corrida pela criação de novos

municípios, que foi freada pelo governo federal, mas esses discursos ainda sustentam a

posição da elite político-econômica, insatisfeita com a distribuição das arrecadações, que

disputa o poder na região sul e sudeste paraense. Segundo Félix Miranda,

esses projetos de mineração foram criando núcleos que fatalmente se separam, isso prejudicou Marabá. Eu vejo também em cima da incapacidade nossa, eu digo nossa, porque os políticos da época não souberam negociar, fizeram separar Parauapebas e Marabá aceitou. Assim perdeu ferro, perdeu o ouro. A sorte de Marabá é sua posição geográfica que é estratégica tem interligação com ferrovia, rodovia, e no dia que tiver as eclusas de Tucuruí, ela fica uma cidade completa. Tem uma estrutura de serviços melhor, todas as sedes das repartições públicas federais e estaduais ficam em Marabá, as regionais. É importante, a siderurgia é, mas siderurgia não é um ramo de economia de grande fator de distribuição de renda, é concentrador de renda, é diferente de uma agricultura forte (entrevista realizada em trabalho de campo, 2003).

Page 127: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

127

As criticas recaem na falta de representatividade dos políticos paraenses,

segundo a ACIM “você sente até na divisão de poder. O Pará é levado a sério?”. Os jornais no

Estado do Pará deram destaques para políticos que na época da implantação do Projeto Ferro

Carajás eram importantes, mas que nada fizeram para mudar o rumo da história que apontava

o Estado do Maranhão como beneficiado pelos minérios do Pará, declarando-se

impossibilitado de mudar os rumos dos acontecimentos que marcaram a história político-

econômica do Estado.

As discussões não terminam com a saída do pólo siderúrgico para o

Maranhão, mas destaca-se que a política de mineração que o Estado do Pará tem em relação,

não só à CVRD, mas ao Estado como um todo, é equivocada. A crítica recai sobre um Estado

omisso em suas decisões, enquanto planejamento futuro da economia no Estado. Foi-se

deixando levar, era fácil pedir à CVRD e a empresa atender os pedidos.

Ou o Estado não se preparou, ou aqueles que estavam preparados para

discutir com a CVRD não tinham espaço nem a representatividade, pois precisavam do

Estado para questionar o papel da empresa. E a lógica de desenvolvimento implantada na

região ficou a mercê das vontades econômicas e sociais da CVRD.

Para a ACIM os erros do passado foram responsáveis pelo desmanche que a

CVRD fez no Estado, e esses erros começaram quando foi entregue à CVRD o domínio sobre

411.000 hectares. Segundo o presidente da ACIM,

não tem como tirar a Vale do negócio, pois é a empresa que detêm a riqueza da região, do Estado. A gente pode dar um equilíbrio e ter um crescimento planejado, meu medo é que quando eu digo o Estado eu digo os técnicos do Estado. O Estado enquanto máquina é muito despreparado, para isso, mas despreparados que nós, não existe isso, a gente que impôs a verticalização do cobre, a verticalização do alumínio. Porque você tem que discutir isso agora, porque daqui a cinco ou seis anos vai ser montada essa metalurgia, se você não começar preparar agora o Estado para poder ter isso, você não vai ter nada.Temos aqui a COSIPAR que é a maior ferrogusa, tem a SIMARA que é a segunda maior, tem a USIMAR que é a terceira maior tem a IBÉRICA que a quarta maior e têm a TERRA NORTE que é a quinta, cinco siderúrgicas (entrevista realizada em 2003).

Page 128: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

128

Marabá acabou ficando com a siderurgia (guserias) de menor porte, algumas

delas vão buscar sua matéria-prima em outros municípios, devido à pressão que existe em

Marabá em função da questão ambiental. Para entendermos mais a questão ambiental em

Marabá, entrevistamos seu secretario de Meio Ambiente, Antonio Rosa, para exemplificar o

papel das guserias e como a questão ambiental vem sendo tratada em relação ao município, e

com a principal empresa na região, a CVRD. Segundo ele,

a SEMA tem um papel tipicamente urbano. Ela ficou de fora do licenciamento em áreas rurais, a questão das queimadas na zona rural, fica muito difícil à gente atuar dentro dessa área. As discussões mais em níveis regional e nacional perpassam pela questão do arco do desmatamento na Amazônia, o arco do fogo, Marabá esta dentro e a questão dos recursos naturais. Quanto à questão dos recursos minerais nos firmamos um convênio como DNPM que nos permite fiscalizar, monitorar e licenciar atividades de mineração em pequena e média escala. Então, o que a gente faz só com o DNPM é solicitar a autorização de lá, mediante a autorização de lá, nós concedemos o licenciamento. (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003)

A Prefeitura de Marabá articula participar mais ativamente das questões

ambientais do município, principalmente em virtude dos problemas que o município vem

enfrentando em relação às queimadas e aos recursos naturais. O município também vem se

preparando para enfrentar no futuro o projeto Salobo, que a CVRD poderá implantar, em vista

do programa de cobre elaborado pela companhia e inaugurado como o projeto Mineração

Serra do Sossego em Canaã dos Carajás.

O município encontra-se dentro de uma área em que os problemas sociais

vêm crescendo nos últimos anos, a do corredor da Estrada de Ferro Carajás. Por causa da

briga que se tem em captar recurso, os gestores municipais não se preocupam com os

problemas que poderão surgir com os projetos instalados, e se preocupam apenas com a

geração de emprego e receita para o município. Dessa forma, é o município que acabará

sofrendo as conseqüências de sua corrida por projetos, principalmente de mineração e outros

ligados a ele.

Segundo Antônio Rosa,

Page 129: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

129

muita gente me criticava.O pessoal dizia vamos trazer o pólo siderúrgico para o Estado do Pará. Vamos trazer o pólo siderúrgico para Marabá, mas ninguém pensava assim: e as conseqüências desse pólo siderúrgico ao nível de passivo ambiental que vai ser gerado dentro da região; que comprometimento que a Vale teria no caso, a partir da instalação desse pólo em Marabá, que tipo de sistema de monitoramento, como ela vai recuperar a área degradada? Ninguém se perguntava, a preocupação era trazer o pólo siderúrgico para o Pará. Eu vejo, por exemplo, cinco guserias implantadas dentro do município. Eu vejo uma série de problemas ambientais que estão postos, estão se agravando a cada dia e, eu não vejo movimentação por parte de nenhum desses guseiros em tentar resolver o problema do passivo ambiental, que elas estão gerando. Com cinco guseiros nós já sofremos a pressão sobre nossa mata, imagine com quinze, vinte empreendimentos desses, pressão sobre a floresta, sobre as comunidades tradicionais são muito grande (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Oura questão levantada pelo secretario de Meio Ambiente de Marabá diz

respeito à poluição que, segundo ele, vem ocorrendo no rio Itacaiúnas por ter sido

contaminado pela exploração do ouro do Igarapé Bahia. Responsabilizar a CVRD é para a

secretaria uma questão de chamar a companhia a ter mais responsabilidade pelos locais onde

ela desenvolve atividades de risco ambiental, pois são passiveis de poluição e merecem um

controle mais rigoroso. O município não pode arcar sozinho com a recuperação dos danos

causados pela exploração do minério.

Segundo o secretario, há algumas questões prioritárias com que a secretaria

tem que começar a se envolver diretamente:

nós temos questões aqui para discutir muito séria. Por exemplo, a poluição no Igarapé Bahia contaminou o rio Itacaiúnas, o que a Vale vai fazer para recuperar esse rio, repovoar esse rio? Qual é o papel da Vale nas eclusas? O que ela poderia fazer para viabilizar as eclusas? Nós temos aí dentro do município de Marabá 48% de área degradadas. O que é que a Vale pode fazer, para recuperar essas áreas degradadas? Que tipo de investimento a Vale pode gerar para o município e para região, como alternativa? Marabá não tem vocação para ser uma cidade industrial, ela tem vocação para ser uma cidade de serviços, por isso desenvolveu o setor de serviços, Marabá é confluência, o município mais importante da região, o setor de serviços é o que mais cresce que gera mais recursos (Entrevista realizada em 2003).

A relação de Marabá com a questão dos minerais explorados pela

Companhia Vale do Rio Doce é diferente em relação aos demais municípios estudados nesta

pesquisa, pois ela não depende dos recursos que a companhia repassa por meio dos royalties.

Page 130: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

130

Marabá, como foi relatada na parte três, tem uma história de cidade concentradora de

atividades na região, e se tornou importante pólo econômico e político, além da sua tão

destacada posição geográfica, que o secretario comentou.

Com a perda da mina de ferro e de Serra Pelada, por meio do

desmembramento municipal, o município, embora tenha perdido receita e importantes áreas,

não perdeu sua importância. Marabá continua a ter sua vida direcionada não para a questão

mineral, diferente de Parauapebas, por exemplo, que direciona todas suas formas de

desenvolvimento para questão mineral, por possuir importantes minas em seu território.

Marabá tem encontrado outras saídas, embora não descarte parcerias com a CVRD, segundo o

secretário:

a secretaria agora que se adequou para buscar recursos ao nível nacional e internacional, então nos estamos na fase de elaboração desses projetos.Quais são os nossos interesses principais: seqüestro de carbono, essa é uma área importantíssima que a gente precisa atuar dentro do município; o aproveitamento de resíduo da indústria madeireira, hoje nos temos três setores que vivem desse resíduo da indústria madeireira, vamos operacionalizar esses resíduos para poder trabalhar o oleiro e o guseiro. O frigorífico também esta utilizando este resíduo; a recuperação do rio Itacaiúnas essa é uma questão que o município tem que ter o compromisso de fazer e nesse processo envolver a Companhia Vale do Rio Doce que é a principal poluidora do rio Itacaiúnas, além disso, a gente pretende fazer o zoneamento econômico-ecológico do município que ainda não existe (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Outro elemento fundamental é o tradicionalismo político herdado da época

da oligarquia do Tocantins. A burocracia das prefeituras e seu baixo nível técnico impedem

um melhor traçado de seu desenvolvimento vindo a depender de outros para traçar suas metas

de crescimento e desenvolvimento econômico-social.

Para o secretário de Planejamento de Marabá, o município não apresenta

tantos problemas como seus vizinhos, pois tem sua independência financeira diferenciada, não

está totalmente atrelada às implantações dos projetos da CVRD. A companhia tem feito

parcerias que são dívidas antigas contraídas na época da implantação da mina em Carajás. O

município, como não disponibilizava de tanto investimento para aplicar em asfaltamento de

Page 131: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

131

vias, fez um acordo com a CVRD, e ela se responsabilizou em asfaltar alguns trechos dentro

da sede do município, considerados pela prefeitura como pontos críticos.

Outra parceria é o projeto Salobo, previsto nos planos da CVRD “O salobo

quando entrar em operação Marabá terá benefícios”. Segundo o secretário, não tem como

receber nada em função da implantação do futuro projeto.

Essa parceria é uma dívida antiga da Vale, de certa forma tava na justiça, rolando muito tempo. São os ISS da construção da própria mina de Carajás. Quando se tentou negociar com a Vale, a companhia aceitou fazer um acordo, esse acordo foi: o prefeito não quis dinheiro, eu tenho quatro, cinco pontos críticos de Marabá que não tenho recursos para fazer, asfaltamento da universidade, da avenida verde mares, da avenida do cemitério, a Vale aceitou (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Em relação a importantes áreas que o município perdeu para Parauapebas e

Curionópolis, segundo o secretário, municípios que têm extensas áreas fatalmente irão perdê-

las no futuro, como foi o caso de Marabá. Segundo ele, mesmo perdendo essas áreas, ainda é

um município muito extenso em dimensão territorial, e poderá no futuro sofrer novos

desmembramentos.

Parauapebas mais cedo ou mais tarde ia se separar, uma mina dessa dá uma força à microrregião. O município é ainda município muito grande, até hoje nós sofremos, nós temos áreas de 350 km de distância.Para você chegar lá é um sacrifício, como a gente vai asfaltar uma estrada municipal de 350 km se Estado e União penaram anos para construir a BR 222, para ir daqui a Dom Eliseu, que é menos de 222 km (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Outra questão fundamental para o município é a instalação da NUCOR, uma

associação com a Companhia Vale do Rio Doce para explorar o aço. Segundo o secretário,

a proposta é da Vale e da NUCOR que é uma gigante americana no ramo de aço. A Vale tem uma área já reflorestada podendo ser usada para o carvão, na divisa de Marabá com o Maranhão. Aquele negócio de pólo siderúrgico parece que está pendendo para o lado do Maranhão, mas são duas coisas independentes não é uma compensação, a NUCOR ia fazer a proposta mesmo que o pólo tivesse ficado aqui (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

A região apresenta várias questões que podem ser associadas à problemática

da mineração na Amazônia, em especial ao território do município de Marabá: a questão do

Page 132: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

132

desmatamento, o reflorestamento, a preocupação com a implantação de grandes projetos para

explorar os minerais. A NUCOR ainda é debate entre o empresariado local e os representantes

do poder público municipal, que acompanham de longe os resultados adversos para o

município em relação à perda do pólo siderúrgico para o Maranhão. Não acreditam mais em

promessas feitas pela companhia, e esperam e contam com apoio dos parlamentares

paraenses, na realização de uma onda de protestos em relação à participação da Companhia

Vale do Rio Doce nas formas de desenvolvimentos e em problemas sócio-ambientais que

surgiram ao longo de sua presença na região.

Um passo importante foi a criação do Curso de Engenharia de Minas em

Marabá em parceria com a CVRD e a Universidade Federal do Pará (que receberá da CVRD

R$ 1,2 milhão para investir em construção de um prédio, na montagem de laboratório e custos

operacionais), pois o pessoal formado por esse curso deverá ser absorvido pela demanda dos

projetos de mineração implantados em Carajás.

Segundo o prefeito de Marabá, “nós sabemos que o fundamental para se

desenvolver a região sul e sudeste do Pará é transformar isso aqui num pólo de

conhecimento”, que segundo ele será fundamental para a criação de uma universidade, pois

em Marabá existe apenas por enquanto um campus da Universidade Federal do Pará, com

cursos que em sua maioria funcionam em períodos intervalares. Segundo o prefeito, o apoio

da CVRD no Curso de Engenharia de Minas mostrará o papel que a companhia deve ter na

região, nos próximos anos.

Page 133: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

133

5.2 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Parauapebas

O Município de Parauapebas, emancipado em 1988, por sediar a CVRD e a

infra-estrutura montada pelo Projeto Ferro Carajás (PFC), apresenta condições de expansão e

desenvolvimento singulares em relação aos outros municípios. A influência direta da

Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) no seu começo, com a formação do núcleo urbano de

Parauapebas (Figura 10) para abrigar funcionários que iriam trabalhar na implantação do PFC,

e posteriormente, com os royalties foram fatores fundamentais para sua emancipação. Este

município continua a ser dinamicamente influenciado pela atuação local dessa companhia.

Figura 10: Vista parcial do Núcleo Urbano de Parauapebas (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

As relações político-econômicas do município sofrem influência direta e

indireta da CVRD, o que por um lado favoreceu a conjuntura sócio-político-econômica do

município. A sociedade civil em Parauapebas cresceu e traçou seus projetos em função das

possibilidades que a companhia trazia para o município em relação aos investimentos. Assim,

surgiram movimentos sociais de metalúrgicos e profissionais liberais. Os movimentos de

posseiros, colonos (vindos de todos os cantos do Brasil, principalmente da região Nordeste,

do Estado do Maranhão) e o novo movimento de trabalhadores rurais sem-terra na região,

influenciaram nas decisões municipais.

Page 134: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

134

Atores sociais diversos criaram estratégias de participação popular, ao longo

dos anos. Associação de moradores, cooperativas, Ongs, sindicatos se fizeram presentes no

município a fim de defender seus interesses diante daqueles que estavam no domínio do poder

local em Parauapebas.

A relação de poder nesse município foi alterada, na medida que o município

crescia e novos atores sociais ascendiam ou tentavam ascender ao poder. O município cresceu

em população e em problemas sociais também, o que por sua vez favoreceu também os

discursos políticos locais em virtude da captação de recursos para se resolverem os problemas

que estavam surgindo.

Um dos representantes desses novos atores sociais, a Associação Comercial

e Industrial de Parauapebas (ACIP), é a entidade de representação de empresários locais.

Segundo seu vice-presidente, essa representação vem crescendo. Argumenta que, embora a

associação esteja se fortalecendo, a atividade industrial depende do desenvolvimento das

atividades da CVRD, a principal empresa. O desenvolvimento do comércio depende da

CVRD, das empreiteiras que prestam serviços a companhia e do crescimento populacional do

município.

Quando ocorre a expansão local da CVRD, o comércio melhora suas

vendas, caso contrário acontece a retração das atividades comerciais, às vezes até o chamado

calote acontece, por parte de empregados de empreiteiras que terminando os serviço, migram

para outras localidades e com elas os empregos que estavam sendo gerados no município,

assim há uma diminuição no volume de negócios e de dinheiro circulando pela cidade. Assim

o município acaba dependendo das atividades da CVRD. Dessa forma, segundo o presidente

da ACIP,

Hoje, a nossa missão é buscar mais representatividade junto à classe. Hoje nós temos por volta de 270 associados, mais o universo do comércio, da indústria e muito maior. Quem gera mais emprego é o comércio, mas a economia local tem a sua maior participação na indústria devido às

Page 135: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

135

atividades minerárias da Vale do Rio Doce. Toda economia gira em função da presença dos projetos, o comércio tem que buscar alternativas, se qualificar para poder atender, enquanto fornecedor as expectativas desse grande comprador que são os projetos minerários (Trabalho de Campo 2003).

Segundo a representação que tem a ACIP no município, e as parcerias (com

SEBRAE, CVRD e outros) que surgem, são destaques principais três elementos, considerados

fundamentais para a realização de eventos e de projetos que são desenvolvidos no município.

Segundo seu presidente, essa tríade é formada pela CVRD, a Prefeitura Municipal e o

SEBRAE (embora no município aconteçam outras parcerias, esses são fundamentais, não

podem ficar de fora de nada), que poderá ainda mais fortalecer o papel da ACIP, em

Parauapebas. De uma maneira ou de outra, qualquer parceria, segundo ele, deve passar por

um ou por mais desses parceiros, que a associação não pode deixar de fora. O vice-presidente

da ACIP destaca:

crescimento acredito que houve, principalmente nos últimos dois e três anos. Temos apoio da Vale em alguns projetos. Quando se fala em parceria não podemos fugir de três nomes aqui, Vale do Rio Doce, Prefeitura Municipal e SEBRAE, com esses a gente cresce. Tem que associar a esses nomes. Nós temos um projeto, o primeiro projeto da iniciativa privada, a FICAP Feira da Indústria, Comércio e Agropecuária de Parauapebas, estamos tocando esse evento junto com a ACIP, o CDL e o SIPRODUZ que é a Associação dos Sindicatos dos Produtores Rurais, e temos como parceiros principais a Vale e a Prefeitura e estamos buscando essa parceria com o SEBRAE, com focos em negócios (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Outro ponto de destaque apontado pela associação diz respeito às migrações

que vêm ocorrendo para Parauapebas, e que sempre ocorreram desde a implantação do

Projeto Ferro Carajás, que acelerou esse processo migratório para o Município.

Eu diria que tirando a atividade minerária, temos vocação para agropecuária. O comércio ele tende a crescer, ele tem atraído mais investimentos para a cidade. Mas o que esbarra no calcanhar aqui é a migração. A migração desordenada, super acelerada, trás um ônus muito grande para o município, principalmente o social, tem muita gente chegando na cidade, tem hoje mais de 100 mil habitantes é um grande desafio para todos nós (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Um representante local, um dos fundadores da Equipe de Educação Popular

de Parauapebas (EEPP), destaca que o papel da entidade a única ONG que era presente no

Page 136: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

136

município, já passou. Segundo ele, a EEPP cumpriu o papel que tinha no município e criou

possibilidades tanto dentro da zona rural como da urbana e proporcionou uma visão mais

ampla do que é desenvolvimento para região. Para ele,

se a EEPP tivesse que continuar, e foi essa nossa proposta para a agência financiadora, a Miserio, que fosse funcionar apenas como uma instituição de formação política, sindical e popular. Alguma coisa, assim, temos um projeto nesse sentido, apresentado a Miserio, só que até agora a Miserio não se manifestou. A minha saída da EEPP, se deu num momento em que a gente percebeu que meu papel já é outro. Nesse momento, meu papel não é de trabalhar numa entidade, mas de ser uma das ferramentas para conquistar o poder aqui na cidade, devolver ao povo a possibilidade de governar. Então, a partir do momento que a gente viu isso, não teria mais sentido ficar trancado numa entidade. Depois da eleição de deputado estadual, onde tive 23% dos votos da cidade, acaba me cacifando para uma coisa maior (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

A projeção de conquista de poder por parte de integrantes de entidades que

trabalham há anos no município deixou de ser somente uma utopia e passou a convencer até

membros do empresariado local de que o município precisava mudar. Para isso a EEPP

cumpriu seu papel atuando de forma a ampliar as conquistas sociais dentro do município. A

cooperativa (COOPER)19 foi criada com apoio da EEPP pelos agricultores familiares. Estes

estão começando a comercializar frutos regionais como o cupuaçu. É o maior exemplo do

trabalho da ONG. Segundo seu integrante, agora o momento é outro.

A EEPP era uma entidade de assessoria, uma vez cumprido o seu objetivo, ela é transitória, enquanto uma entidade classe é permanente. Criamos a COOPER, foram treze anos de trabalho. A partir de 1996, começamos o trabalho na área urbana na organização das entidades de apoio; acompanhamento do projeto de água e esgoto. Nesse sentido, alcançamos nossos objetivos, de 30% que estavam previstos na época, nós conseguimos por conta das denúncias ao Banco Mundial, ampliar isso para uma porcentagem maior, uma vez que no projeto estava escrito que era para cidade toda. O projeto só atenderia 30%, foi aí que entrou toda uma nova reorientação do tipo de projeto a ser implantado, e acabou sendo o projeto chamado condominial (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

A conquista do projeto de saneamento básico foi um ponto fundamental

para a sociedade parauapebense. Sua ampliação uma conquista de membros da sociedade civil 19 A Cooperativa Mista dos Produtores Rurais da Região de Carajás (COOPER) foi fundada com objetivo de industrializar e comercializar os frutos tropicais da área de Carajás. Foi articulada pela EEPP junto com os trabalhadores da Região de Carajás.

Page 137: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

137

organizada, que, por sua vez, melhorou as condições de vida do povo de Parauapebas. Muito

embora os problemas de saúde continuem no município, o salto qualitativo em termos da água

e de certa forma do esgoto na cidade melhorou.

As questões referentes aos investimentos sofrem críticas de alguns

empresários, associações e sindicatos que estão fora do poder público. Segundo alguns

entrevistados, o que o município arrecada não tem se traduzido em investimentos que tenham

beneficiado a sociedade como um todo, seja no setor urbano, seja no rural.

Porém, segundo os ex-membros da entidade, há necessidade de uma

reavaliação do potencial político dos atores sociais, que de uma forma ou de outra, estão de

fora das principais decisões que definem a forma de viabilidade municipal. Segundo eles, em

algumas circunstâncias a sociedade não consegue separar seus interesses individuais dos

coletivos e acaba sendo fragilizada.

Existem figuras que querem se eleger presidente de uma associação de moradores para poder exigir do poder público um emprego, tem muito disso aqui, isso eu entendo que de repente seja falta de formação política. Hoje nós temos associação de moradores que estão começando a repensar a própria ação deles, enquanto entidade que acaba se rendendo ao poder público municipal. O presidente vai a prefeitura leva uma pastinha com 500/600 associados e diz, isso é meu poder e tenta vender a associação e os associados. Tem acontecido muito desses casos aqui (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Esse é o principal motivo que levou ex-membros da EEPP a tentarem

reativar a entidade em função da necessidade de formação política e sindical na região.

Embora a EEPP tenha desenvolvido atividades juntos à comunidade, esse não era seu objetivo

principal, já que a mesma foi criada com função mais rural do que urbana.

Por sua vez, o secretário de Planejamento de Parauapebas acredita que o

município não interfere no processo de desenvolvimento industrial. Já que o principal

elemento que modifica o território são os interesses em relação à área mineral, é a CVRD que

provoca essa modificação. Segundo ele,

Page 138: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

138

Aqui nós temos um processo que é induzido, ele é induzido pela própria Vale, a Vale que gera emprego, a Vale que contrata empreiteira, a Vale que gera uma boa receita para o município, tanto para a população através da geração de empregos, quanto para o poder público, o problema nosso não é de atrair as empresas, isso é automático, elas já vem atrás da Vale (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Embora a presença da CVRD seja marcante, o secretário acredita que ela

por si só “é atratora de novos investimentos na área mineral”, e que o município acaba sendo

dependente dessa relação desigual, mas combinada em que a CVRD se torna um ator

hegemônico, e o município um reflexo do poder da companhia. A CVRD gera recursos para

receita municipal e torna o município um dos mais importantes do Estado do Pará (ver

capítulo 3). Segundo ele não depende do município atrair novas instalações industriais,

porque há uma restrição de espaços necessário para formação de um distrito industrial.

Nós temos um limite, porque o município é isso aqui, 80% é reserva florestal tem a parte agrícola, tem o núcleo urbano e tem a parte do CEDERE I. Área para se colocar indústria aqui nós temos dificuldade muito grande, que todo mundo quer para perto da Estrada de Ferro, só que lá na frente já é assentamento, lá nos assentamentos não podemos comprar uma área para construir um distrito industrial (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Outra questão inibidora, segundo o secretário, é a forte e contínua migração

para o município. Estudos realizados na segunda metade da década de 1990, a pedido da

CVRD, acusaram que para cada um emprego gerado, outras sete ou oito pessoas migrariam

para a cidade. Dessa forma um número considerável de desempregados acabaram inchando os

movimentos sociais rurais e a parte urbana do município.

Parauapebas tem uma realidade interessante: verdadeiros bairros são

formados com migração de outros Estados como Maranhão, por exemplo, facilitada pela

Estrada de Ferro Carajás (EFC), e de outros município como Curionópolis. Com isso os

problemas sociais também se agravam.

Segundo o secretário,

Canaã agora vai ter um desemprego muito grande. Canaã vai passar por um processo agora que nosso município passou há dezoito anos atrás. Aquele

Page 139: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

139

boom para implantar o projeto gerou muitos empregos, a estrada gerou emprego, a mina gerou emprego. A mina em Canaã vai necessitar de mil pessoas. Dizem que há quase vinte mil pessoas lá. Para onde vão essas pessoas? Possivelmente um pouco vai ficar lá, e outro vai vir para cá para somar com a massa desempregada (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

A maneira como se tratará a questão das migrações e dos problemas gerados

por ela e por projetos que a CVRD poderá implantar, em Parauapebas e municípios vizinhos,

é um desafio para a gestão municipal e para toda a sociedade civil organizada do município.

De uma forma ou de outra, será necessário fazer com que a presença da CVRD seja

importante nessas discussões. Não se pode colocar a empresa fora dos problemas gerados.

Não é só o benefício que interessa, o que ela gera em relação de receita para o município, mas

o que realmente se poderá fazer em função da presença de um grande projeto de mineração

que acelerou as transformações territoriais do município.

Outro questionamento feito está relacionado à posição do METABASE, e

tem como principal foco a terceirização, que segundo membros do sindicato tem prejudicado

a representatividade, e não deixa aumentar o número de associados, pois acabam vindo de

outros Estados, como Minas Gerais, empresas cujos trabalhadores são sindicalizados. Essa

rotatividade de empresas que vêm prestar serviços para a CVRD, segundo o METABASE,

tem prejudicado o sindicato.

Em relação à CVRD, a atual diretoria (2003) disse não ter tido problemas,

muito pelo contrário. Segundo sua diretoria eles conseguiram negociar um reajuste de

reposição de 100%, o maior que o sindicato já teve. Para eles, a CVRD é uma parceira, e não

se tem motivo para questionar o papel da empresa na região.

Em relação aos grandes produtores e pecuaristas, o vice-presidente do

Sindicato dos Produtores Rurais (SIPRODUZ) destacou que o sindicato tem procurado se

fortalecer. Onde o sindicato atua (Parauapebas, Canaã dos Carajás, Curionópolis e Eldorado

Page 140: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

140

do Carajás) seu principal objetivo tem sido o fortalecimento dos pecuaristas e produtores

rurais.

Segundo ele, a pecuária está em pleno desenvolvimento no município junto

com a agricultura.

Nós temos mais ou menos uns 800 associados. O gado desses quatros municípios está sendo abatido em Eldorado do Carajás, mas nós temos Frigoríficos em Marabá, Xinguara e Redenção. Desse gado que é abatido, o Estado do Pará não consome nem 50% da carne que é produzida. Exportamos principalmente para os Estados do Nordeste, em função das barreiras sanitárias que existe, porque para o Sul, Centro-Oeste e Sudeste não pode ir o gado a não ser o desossado (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

O sindicato critica as formas como o poder público vem atuando no

município. Segundo seu vice-presidente “nós somos privilegiados em viver em Parauapebas

por ser um município muito rico. Agora questionamos muito como são aplicadas essas

riquezas aqui. Somos um município muito rico de pessoas muito pobre”.

O questionamento se dá pela presença da CVRD e dos recursos que são

adquiridos, em função da exploração das minas de Carajás, e dos impostos gerados pelas

contratadas da CVRD no município. Todavia, há um domínio de paisagem pobre, uma vez

que o município de Parauapebas apresenta bairros sem infra-estrutura e sistema de saúde

deficientes. Há falta de apoio aos produtores familiares.

As críticas contra ou a favor da presença da companhia, e das formas de

desenvolvimento encontradas pelo poder público em Parauapebas, são relacionadas a um

conjunto de múltiplos fatores que envolvem diferentes interesses e são determinantes na

forma como o município vem realizando a gestão territorial.

Page 141: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

141

5.3 - Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Água Azul do Norte

Em Água Azul do Norte (Figura 11), foram identificados pelo menos dois

discursos sobre a presença e parceria com a Companhia Vale do Rio Doce. Um deles

questiona os repasses da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais

(CFEM20), em virtude do município não receber esses benefícios, mesmo dispondo de parte

do território da Floresta Nacional do Carajás; O outro não se posiciona em relação a CFEM,

mas focaliza sua atenção na atual arrecadação que o município dispõe sem ter planos futuros

em relação à possibilidade de vir a receber recursos com a exploração das riquezas minerais

contidas na Floresta Nacional de Carajás.

Figura 11: Via principal (Pa-279) corta o município de Água Azul do Norte (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

20 Segundo o DNPM “A CFEM, estabelecida pela Constituição de 1988, em seu Art. 20, § 1o, é devida aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios, e aos órgãos da administração da União, como contraprestação pela utilização econômica dos recursos minerais em seus respectivos territórios. A Compensação Financeira é calculada sobre o valor do faturamento líquido, obtido por ocasião da venda do produto mineral. Para efeito do cálculo da CFEM, considera-se faturamento líquido o valor da venda do produto mineral, deduzindo-se os tributos, que incidem na comercialização, como também as despesas com transporte e seguro. Quando não ocorre a venda, porque o produto mineral é consumido, transformado ou utilizado, pelo próprio minerador, então considera-se como valor, para efeito do cálculo da CFEM, a soma das despesas diretas e indiretas ocorridas até o momento da utilização do produto mineral. As alíquotas aplicadas sobre o faturamento líquido para obtenção do valor da CFEM, variam de acordo com a substância mineral. Aplica-se a alíquota de 3% para: minério de alumínio, manganês, sal-gema e potássio. Aplica-se a alíquota de 2% para: ferro, fertilizante, carvão e demais substâncias. Aplica-se a alíquota de 0,2% para: pedras preciosas, pedras coradas lapidáveis, carbonados e metais nobres. Aplica-se a alíquota de 1% para: ouro”.

Page 142: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

142

Encontramos também uma disputa política pelo poder local. Essa disputa

vem desde a emancipação de Água Azul do Norte. Nela se acham aqueles que não

participaram diretamente do projeto de consulta à população sobre a criação do município e

outros que foram os que começaram a fazer o movimento pela criação do município.

Esse conflito político pelo poder local está de acordo com o que nós

discutimos na segunda parte do trabalho, sobre os conceitos de poder, governo e território,

uma vez que há disputa pelo controle da gestão municipal que acaba formando um “campo de

poder”. Existe mais de um interesse diferenciado entre os atores locais sobre as formas de

buscar recursos para o município e de como esses recursos serão úteis em seus discursos para

a sua reprodução no poder, e, conseqüentemente, controlar o poder político local, e expandir

seu domínio no território de Água Azul do Norte.

Água Azul do Norte é um município recente. Num ponto os atores sociais

que disputam o poder local convergem: é necessário o asfaltamento da PA-279, tanto no

trecho que vai para o município de Ourilândia do Norte e para o município de Tucumã, como

o que vai para o município de Xinguara. A estrada no período de chuva fica intransitável, e no

período sem chuvas, leva-se até 3 horas para trafegar um trecho de 70 quilômetros. Essa

dificuldade inviabiliza qualquer forma de escoamento da produção que o município venha a

desenvolver e prejudica as demais existentes, como a pecuária.

O município apresenta a pecuária como principal atividade econômica, com

o quarto maior rebanho do Estado, o que fez com que um grupo de São Paulo começasse a

instalação de um frigorífico no município, às margens da PA-279, no sentido Ourilândia-

Tucumã.

O município possui além desse empreendimento dois outros grupos de

lacticínios, o Leite Bom e o Hilda. A bacia leiteira chega a produzir de 80 a 90 mil litros de

leite por dia. O secretário afirma que a produção de grãos é uma tendência econômica que o

Page 143: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

143

município começa a apresentar, e há todo um investimento sendo realizado na Vila Canadá,

para viabilizar a produção de grãos. Há também madeireira.

A parceria com o Estado tende a aumentar a produção de grãos, no que diz

respeito ao armazenamento da produção. A falta de armazéns e silos para estocagem

aumentava a dependência de Água Azul do Norte em relação aos outros municípios como Rio

Maria, que abastece a região de Xinguara, Rio Maria, e da capital Belém. As carretas vinham

buscar de 35 a 40 toneladas e levavam para esse município.

Na PA-279 estão sendo construídos frigoríficos. Em Água Azul a previsão é

de abater 800 bois por dia; os outros três frigoríficos são em Ourilândia do Norte, Tucumã e

São Félix do Xingu, pertencentes a empresários de São Paulo, que atuam também no Estado

do Mato Grosso.

Segundo o secretário de planejamento, o município é dependente dos

repasses federais, como o Fundo de Participação Municipal (FPM), pois sua arrecadação

ainda é insuficiente, apesar do melhoramento que segundo ele ocorreu no município depois de

sua emancipação.

Não há arrecadação própria. O município depende diretamente do ICMS e

do FPM, que servem também para manter a folha de pagamento em dia. Entretanto,

percebemos que o município, por ser recente, teve apenas três administrações, desde a sua

criação. Tem suas políticas municipais ainda indefinidas; a Lei Orgânica Municipal foi

aprovada recentemente.

Seu comércio é pequeno, não tem indústrias, além daquelas já mencionadas.

Segundo alguns moradores, na década de 1980, com o esgotamento da madeira, as

madeireiras que atuavam nessa região migraram para os municípios de Ourilândia, Tucumã e

Xinguara, ficando apenas uma madeireira, que praticamente não explora mais a madeira. O

gado passou a ser a frente de expansão da economia local, o gado de engorda. Há 650 mil

Page 144: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

144

cabeças de gado no município. Segundo o secretário, são abatidos em sua maioria em

frigoríficos em Xinguara e Redenção.

O descaso com essa região levou ao fortalecimento do discurso

emancipacionista pela criação do município, que quando ainda pertencia a Marabá já

solicitava um melhor tratamento (e por sua distância considerável da sede Marabá) dos

políticos marabaenses. Houve então a pressão e coincidiu com a instalação do Projeto Ferro

Carajás, que com a infra-estrutura que deu a Parauapebas possibilitou tanto a emancipação de

Parauapebas como, anos depois, a de Água Azul do Norte de Parauapebas. Como depois da

emancipação de Parauapebas o problema de Água Azul, que pertencia ainda a Parauapebas

continuava, a área conseguiu eleger um vereador que começou com outros políticos da região

o processo de emancipação política do município.

Briguei para emancipação de Parauapebas e Água Azul do Norte. Eu formei quase dez comissões, tudo por minha conta. Os grandes que podiam ajudar eram todos contra, diziam que aqui era uma curutela. O vice-prefeito atual dizia que era uma vergonha a gente emancipar Água Azul, porque era uma curutela que até o prefeito ia passar fome, hoje é a segunda gestão dele. Em Parauapebas, foi fácil demais emancipar, porque lá todo mundo ajudou com dinheiro e lá todo mundo queria emancipar, e nós aqui tinha um pessoal que não queria, o município é fraco mais é muito melhor do que esta dependendo de Parauapebas. (Entrevista em 2003 com o primeiro vereador eleito por Água Azul do Norte).

No processo de emancipação, segundo o primeiro vereador eleito por Água

Azul, Xinguara reivindicava uma parte do território que vai até o Rio Água Azul, que deu

nome ao município, o que não foi atendido, ainda porque, segundo outros moradores, cercado

por fazendas o município não tem para onde crescer.

Segundo o secretário de Administração e Planejamento, Obras e Transporte

do município de Água Azul do Norte,

temos uma malha viária de 2.800 quilômetros de estradas vicinais para dar manutenção. Temos três motos niveladoras, temos áreas de 160, 170 quilômetros da sede do município. O município é dividido em oito regiões, temos 5 vilas, três bem estruturadas que são: as vilas Canadá, Jussara e Paraguassu, que exige mais, e outras duas menores que são as vilas União e a Racha Placa (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Page 145: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

145

O discurso relembra o que Ana Brasileiro (1973) já havia analisado em seu

estudo sobre os municípios como sistemas políticos, que recai sobretudo no abandono que o

poder público direciona para as áreas rurais porque concentra seus recursos para a sede

municipal. Dessa forma não atende os “pedidos” das áreas mais longínquas. Essa atitude do

poder público faz com que certas localidades pleiteiem suas emancipações, mesmo aquelas

que não têm certa infra-estrutura, mas por estarem mais distantes das sedes municipais,

também tentam viabilizar sua emancipação do município, como é o caso da vila Canadá.

Nesse caso em particular, segundo depoimento de uma antiga moradora do município, “na

minha opinião não é bom perder a vila Canadá, porque Água Azul vai perder uma parte

melhor, eu acredito que tem interesse do próprio prefeito, ele tem interesse de emancipar,

porque ele tem família lá, e toda a vida ele foi de lá de Xinguara, mas ele sempre andou por

lá”.

O município de Água Azul, de acordo com depoimentos, não possui

capacidade de investimentos próprios; a saída é buscar convênios para fomentar a capacidade

de investir no município. Quando ocorrem, os convênios são executados com a administração

direta, sem contratação de terceiros, segundo o secretário “porque os recursos são poucos e

nenhuma firma vai querer realizar a obra com poucos recursos que conseguimos. Isso faz com

que a prefeitura economize” e como ela consegue economizar de acordo com o secretário, só

assim ela consegue investir em outras áreas do município.

Outra maneira de conviver com a falta de recursos, segundo o secretário, é

com a sobra do FPM e do ICMS, ela paga as peças e os combustíveis das quatro caçambas

basculhadeiras de uma carregadeira e de três motos niveladores. Como dessa forma 70 % dos

convênios que a prefeitura consegue são executados com a administração direta, a própria

prefeitura realiza a obra.

Page 146: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

146

O comércio da cidade é na base dos secos e molhados. Não há cobrança do

IPTU, de taxa de água, de limpeza, e apenas 30% do comércio, segundo a prefeitura, é

legalizado.

Por outro lado, um dos moradores mais antigos do município critica a falta

de técnicos agrícolas e de agrônomos, que para ele poderiam ajudar a sociedade a trabalhar

melhor a terra, e não se dedicar somente à cultura do pasto. Para ele isso acontece por falta de

desconhecimento técnico dos agricultores, o que faz com que o município acabe dependendo

de Anápolis no que diz respeito à agricultura.

Diz um antigo morador que Água Azul era uma cidade tranqüila. O

garimpo, a madeira, a abertura da estrada PA-279 e os projetos de colonização direcionada

pelo governo federal em Tucumã ajudaram a cidade a crescer, mas depois da construção da

estrada e da cidade de Tucumã e de Ourilândia, a cidade acabou perdendo população para

esse dois municípios.

Quando começou Água Azul era uma cidadezinha boa, cheia de garimpeiros. Aqui era cheio de casa por tudo que era parte, quando abriu Tucumã, Ourilândia arrancaram todas as casas daqui e foram para lá, aí Água Azul caiu lá embaixo.Todas as madeireiras daqui Perachi, Campos Altos levaram embora, aqui na época forte tinha 22 madeireiras, quando pertencia a Marabá, de 1980 a 1987, aí as madeireiras começaram a ir para Tucumã, Ourilândia, Água Azul saiu prejudicada saiu tudo que foi madeira, e não construíram nada aqui. (Entrevista Realizada em 2003).

Na década de 1980, a fuga das madeireiras seguiu o mesmo trajeto que a

região do Pará e Maranhão vinha sofrendo. A madeira foi se esgotando elas migram para

outras aéreas; vieram de Açailândia e Imperatriz no Maranhão, e chegaram ao Pará, entrando

pela região sul e sudeste do Estado. Água Azul passou pelo garimpo, pelas madeireiras e

chega à pecuária como um município que não teve nenhum investimento.

Seus moradores reclamam da falta de infra-estrutura do município. Segundo

alguns moradores,

viver em Água Azul é difícil. Tudo você depende de Xinguara, você não tem Banco, o telefone recentemente foi instalado, energia era muito precária,

Page 147: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

147

agora que esta mais estabilizada. Agora a gente já tem três farmácias, que tem bastantes medicamentos, um hospital que funciona, já faz cirurgias de emergências (Entrevista realizada em 2003).

Por outro lado, o processo emancipatório de Água Azul foi conturbado e

teve como fonte os interesses políticos, e a própria localização geográfica do município, que

acaba tendo contato muito mais com Xinguara do que com Parauapebas e Marabá. Devido às

péssimas condições de acesso pela PA-279, o município fica praticamente isolado no período

de chuvas. Segundo depoimentos de alguns moradores, o município quando ainda pertencia a

Marabá sofreu pressão do poder público para não apoiar a emancipação de Parauapebas.

O prefeito Hamilton Bezerra no discurso dele, não queria perder Água Azul para Parauapebas, naquela época, e aí ele nos usava. Nós que estávamos na educação e o pessoal que atuava na saúde para fazer esse trabalho de conscientização na população para não se emancipar. Água Azul apoiou o plebiscito de Parauapebas, no sentido de que a Vale ia ajudar o município, então o povo que morava em Água Azul achava que ia se beneficiar disso. Havia na época interesse de apoiar Parauapebas, pensando no futuro se emancipar de Parauapebas. Nessa época, os próprios políticos que moravam em Água Azul que queriam, pensando que no futuro a Vale pudesse atuar em Água Azul (Entrevista Realizada em 2003).

Por sua vez, a questão da própria emancipação de Água azul foi realizada

com base em favorecimentos pelo apoio que tinha dado a Parauapebas. Sendo assim, o

plebiscito do município ocorreu com certas irregularidades. Segundo uma das pessoas que

ficou responsável pela coleta de assinaturas para votação no município,

O plebiscito foi feito, no sentido de que, o povo que morava no município de Água Azul tinha que votar com o título eleitoral de Parauapebas. Como os de lá tinham, também que votar, mas como na época não ia dar coro para a eleição do plebiscito, então eles liberam para votar com a carteira de identidade. A representante fazia vista grossa, foi para um churrasco numa fazenda, e nos deixou trabalhando com o povo, então qualquer caminhoneiro daqueles que passavam ali votava, se era ou não do município, se vinha do Maranhão (Entrevista Realizada em 2003).

Essa forma beneficiava quem estava interessado na emancipação do

município. Diante do discurso da elite, que queria a emancipação, a idéia era passada para a

população, que acatava sem questionamentos. Segundo depoimento de moradores, quem fosse

contrário sofria perseguição. Ainda hoje, segundo depoimentos, para aqueles que viveram a

Page 148: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

148

época do plebiscito e para os que vieram para o município trabalhar no serviço público

ocorrem perseguições “é o que mais tem, se alguém for contra ele é remanejado, mexe no

vencimento do salário, deixa ele inútil”.

Page 149: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

149

5.4 - Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Canaã dos Carajás

O município de Canaã dos Carajás foi desmembrado de Parauapebas em

1993, surgiu do antigo CEDERE II21. Atualmente (2003) o município vive um período único

de sua história, cercado de loteamentos realizados na época do CEDERE. O seu núcleo

residencial presencia uma metamorfose catastrófica, uma ebulição populacional, gente vindo

de todas as partes do sul e sudeste paraense e do nordeste, principalmente do Maranhão, em

função da implantação do Projeto Mineração Serra do Sossego da CVRD (com duração de 20

anos), que começará a explorar o cobre22 em 2004 e que está em fase de implantação no

município,

o Projeto Mineração Serra do Sossego, situado a cerca de 30 quilômetros da sede de Canaã dos Carajás e a 54 quilômetros de Parauapebas, deve ser o divisor de águas da história de extração de minério de cobre do grupo Vale do Rio Doce. No Auge de sua produção, o Sossego exportará 150 mil toneladas/ano, o que deve contribuir sensivelmente para a auto-suficiência do país com relação ao cobre, uma vez que, atualmente, o país importa quase 100% do que a indústria utiliza. Em 2007, quando entrarão em funcionamento as unidades de mineração da Vale (Sossego/Sequeirinho, Alvo 188, Igarapé Bahia, alemão e Salobo), com uma produção estimada em 768 mil toneladas/ano, o Brasil deixará de ser um país importador de cobre para se inserir no seleto grupo dos cinco maiores países produtores de cobre (Jornal Correio do Pará, Região, 06 a 09 de maio de 2003, p. 06).

Para realização do projeto foi desenvolvido o Plano de Desenvolvimento.

Sustentável (PDS). Segundo Raphael Bloise diretor da CVRD,

o Plano de Desenvolvimento Sustentável vai ser o ponto fundamental, pois não é um projeto de implantação com tempo definido, é de longa duração e vai buscar a sustentabilidade do município. Os primeiros passos são para mitigar a primeira onda e a partir daí, o projeto continua com a sociedade toda participando. Quero frisar que o plano não é da empresa, é da sociedade, que vai estudar seus problemas e vai buscar suas soluções. O município vai ter outras fontes de recursos, como os royalties, por exemplo, (Jornal Correio do Pará, 06 a 09 de maio de 2003, Cidade/Região p.07).

21 Centro de Desenvolvimento Regional criados pelo GETAT na década de 1980. 22 Segundo o Informe Mineral do DNPM “A produção de cobre vem declinando paulatinamente a cada ano, tornando-se insuficiente ao atendimento interno, configurando, assim, uma dependência externa de 80%. Em relação ao ano anterior, a produção de concentrado, em termos de metal contido, situou-se abaixo de 9,5%. Essa desaceleração constatada é fruto da paralisação e encerramento das atividades da mina a céu aberto da Mineração Caraíba S/A, ocorrida em setembro de 1998” (DNPM, 2000, pág 08).

Page 150: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

150

Segundo o Plano de Desenvolvimento Sustentável (PDS) em relação ao

fluxo migratório,

a execução em ritmo mais intenso das obras de implantação e operacionalização da mina de cobre da MSS vem contribuindo para o aumento rápido e substancial dos fluxos migratórios que se destinam a Canaã dos Carajás. Esse problema continua a ocorrer, apesar das medidas de triagem e orientação que vêm sendo postas em práticas pela MSS, com o apoio da Prefeitura. Os principais contingentes migratórios provêm dos Estados do Maranhão e do Tocantins e de algumas regiões no Estado do Pará. (I Relatório Parcial de Consulta à Comunidade Livro Verde do PDS).

O Projeto Mineração Serra do Sossego (Figura 12), sem dúvida nenhuma,

está transformando o município de Canaã dos Carajás em um território de atração

populacional; esse município teve seu objetivo inicial que era de Centro de Desenvolvimento

Regional (CEDERE II) com base agrícola. Todavia, sua base econômica mudou recentemente

para economia extrativa mineral. Com isso, as atividades da Companhia Vale do Rio Doce

mudam a função dos municípios que estão sob sua área direta de atuação.

Figura 12: Implantação do Projeto Cobre da CVRD em Canaã (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Mesmo com o PDS, não há como evitar a migração para o município. Antes

mesmo de entrar em operação o projeto já atraiu muita gente, e o município virou um canteiro

de obras, com gente vindo de todos os lugares da região e do vizinho Estado do Maranhão.

Com isso aumentam os problemas sociais desses municípios como é o caso de Canaã, que não

possui condições de absorver toda essa população. Num ponto as administrações municipais

Page 151: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

151

estão de acordo: as migrações acabam ficando na periferia da cidade em condições também

precárias. Com isso o tamanho de cada cidade ao longo do tempo vai aumentando e

verdadeiros bairros como os bairros Liberdade e Maranhão, em Parauapebas, vão se

formando,

com apenas duas administrações municipais, nas eleições de 1996 e 2000, na história dos seus oito anos de emancipação de Parauapebas, completos em outubro próximo, o município de Canaã dos Carajás se prepara hoje para receber seu primeiro asfalto. O projeto de urbanização do município, do qual o asfaltamento é parte, está sendo feito com recursos a fundo perdido da ordem de R$ 25 milhões. O investimento é fruto de uma parceria da Prefeitura Municipal com a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e Mineração Serra do Sossego (MSS) (Jornal Opinião 07 e 08 de agosto de 2003, Região, p. 9).

Figura 13: Rodovia Pa- 160 estrada que servirá para o transporte do cobre (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Embora se tenha todo um investimento no município com infra-estrutura,

este não evitará a desordem urbana que, segundo depoimentos, já começa a ocorrer.

Loteamentos aparecem em todos os cantos da cidade. Antes o valor da terra em Canaã era

baixo, porém, com a infra-estrutura que a CVRD está montando com construção de estrada

(Figura 13) ligando o município à Estrada de Ferro Carajás, no município de Parauapebas, o

valor do lote tanto urbano quanto rural aumentou, fazendo com que o preço da terra se

multiplicasse da noite para o dia. Com isso muitos agricultores familiares estão vendendo seus

Page 152: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

152

lotes, transferindo-se para outros locais ou para a cidade e dando origem a loteamentos

urbanos.

Nesse caso, os investimentos que a CVRD está fazendo em parceria com a

prefeitura não conseguirão evitar a desordem urbana, nem a vinda de mais migrantes para

cidade. É comum encontrar migrantes andando pelas ruas sem asfaltos do município. Eles

acabaram de chegar ali, não possuem qualquer relação com a cidade. Foram atraídos pelo

Projeto Mineração Serra do Sossego. Esse projeto, ao mesmo tempo em que gera

investimentos no município, traz junto com eles graves problemas sociais, cuja solução ficará

no futuro a cargo do poder público municipal.

No discurso de um antigo morador que veio na época dos CEDERES

trabalhar como técnico agrícola, havia uma estratégia para os Centros Regionais, que junto

com a reforma agrária era conter e viabilizar todo o cinturão de proteção da área da

Companhia Vale do Rio Doce. Para ele,

precisamente em 1983, tempo que estavam fazendo esse projeto aqui, que hoje para mim esta claro que, naquele tempo não era só a questão da reforma agrária, dá o lote para o colono, mas na verdade, a Vale estava tentando um projeto aqui de assentamento, alias fazendo um projeto de mineração. Era área de conflito essa região aqui, tinha muita terra devoluta, eles bolaram esse projeto.Na minha visão, e tem muita gente que compartilha comigo, que na verdade ele foi feito ao redor da Vale antes de tudo para pegar e tomar aquele pedaço de terra e acabar com os conflitos e acomodar as tensões agrárias nessa região. Assentaram naquela época 2.500 colonos, eram de vários lugares, Maranhão, Goiânia, até mesmo do Ceará veio gente (Entrevista Realizada em 2003).

As migrações eram controladas; dentro da área dos CEDERES. O GETAT

se encarregava de disciplinar a questão de distribuição dos lotes. E, com os técnicos agrícolas

que foram mandados para lá para ficarem somente seis meses, viabilizando as técnicas para

facilitar a produção do CEDERE II, o projeto logo começou a apresentar problemas. Havia

também outros interesses, um deles é que os centros deveriam servir de abastecimento para os

trabalhadores da CVRD, ao produzirem teriam como destino a própria CVRD como

Page 153: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

153

consumidora. Porém, só o CEDERE II conseguiu um certo sucesso na fixação do trabalhador

no campo, e com as dificuldades que foram surgindo nem o próprio CEDERE II conseguiu

sustentar todos que para ali migraram. Acabaram por vender seus lotes a terceiros, e aos

poucos, os mais capitalizados foram formando grandes fazendas, ainda mais com a saída dos

técnicos agrícolas que depois do término do contrato foram embora,

era muito difícil pedir para um cara solteiro, com a expectativa que ele tinha, ficar numa realidade dessa. Foram todos embora, inclusive quando acabou o salário já não tinha mais ninguém. Era seis meses de salário e a única diferenciação que nos tínhamos enquanto técnicos, era que naquele tempo, o GETAT cedia para gente uma compra num supermercado lá em Carajás. Por exemplo, uma lata de óleo você não encontrava na região para comprar, tudo era caro, era coisa de garimpo mesmo, a única diferença é que nos técnicos íamos de Kombi e comprávamos esse mantimento, acabou que hoje nós somos cinco, não atuamos como técnico, mas agora somos empreendedores mesmo (Entrevista Realizada em 2003).

A situação piorou, na visão de um morador antigo, quando o GETAT

abandonou o projeto. E as dificuldades aumentaram, o CEDERE II ficou quase que isolado do

resto da região, o que fez com que muitos dos antigos moradores vendessem seus lotes e

migrassem para Marabá, Parauapebas e outras localidades, e a pecuária foi tomando cada vez

mais espaço na região do CEDERE II.

Dessa forma, o CEDERE II foi ficando esquecido como centro de

abastecimento agrícola para as localidades próximas como Parauapebas, e como as estradas

ficaram ruins, o tempo de duração do percurso entre o CEDERE II e Parauapebas aumentou,

dificultando ainda mais a vida dos colonos,

e quando foi de 1987 para cá, começou uma outra realidade do projeto. Até então você tinha suporte: logística de estrada e saúde, infra-estrutura boa. O que aconteceu, o GETAT que era o órgão gestor disso, e implantador disso, praticamente abriu mão quando acabou a missão dele. Os colonos ficaram a mingua, e aí as estradas se acabaram. Quando a gente fazia uma viagem de três horas para Parauapebas, passou ser um dia até mais, aí foram embora basicamente 60% dos colonos. O pessoal começou realmente a passar dificuldade aqui, não tinha saúde, não tinha escola, o pessoal que chegou novo, os casais novos, quando começou a precisar de aula, foi um dos fatores que levou o pessoal a ir embora daqui, além da expectativa econômica. Ninguém tem bola de cristal, ninguém ia saber que seria essa magnitude que é hoje. Então, quem ficou ou porque se contentou com a realidade, o colono não tinha aquela visão do que era hoje, ou porque

Page 154: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

154

especulava, ou os técnicos do GETAT tivessem uma idéia do que seria hoje. Começou uma troca desse colono que vivia de subsistência, que plantava; pelo que vinha com um pouquinho de dinheiro, geralmente de venda de terra. O cara vendia sua propriedade lá, quando ele chegava aqui dava para comprar um meio mundo de terra. Esse pessoal veio e trouxe outra cultura, trouxeram outra maneira de lidar com a terra, o processo produtivo mudou de agricultura, passou basicamente para a pecuária. Começou a se instalar e foi crescendo e tomando corpo, de forma que na minha visão quem tem dinheiro hoje, esta capitalizado, se capitalizou, a partir desse processo. A assistência técnica não trouxe solução para essa região (Entrevista Realizada em 2003).

Para um antigo morador, a cidade apresenta hoje uma alteração que

acompanhou as transformações do município, de uma base agrária para uma extrativa

mineral, como o Projeto Mineração Serra do Sossego (MSS). A cidade não é mais a mesma,

os antigos moradores ficam assustados com a transformação pela qual o município está

passando, com a chegada de estranhos para trabalhar, interessados em empregos no projeto.

Hoje ocorre uma confusão por causa da infra-estrutura que está sendo

montada, não se encontra mais nada no lugar, as casas, o comércio vão se formando em

função da via principal, prédios estão sendo construídos da noite para o dia, hotéis vão

surgindo para abrigar os trabalhadores da MSS, muitos dos quais ainda estão dormindo em

Parauapebas, onde a maioria dos hotéis está reservada para as empresas que estão trabalhando

na construção do Sossego,

Canaã tem três grupos: os colonos, que você vai achar no mesmo supermercado, se vestindo do mesmo jeitinho, dessa forma acanhado naquele cantinho, porque ele chega e não acha mais aquela cidadezinha que ele via; tem outro grupo que esta conseguindo intermediar isso e esta ganhando dinheiro, nós que conseguimos entender o que esta acontecendo com o município, esta tirando proveito da situação e; tem os forasteiros que na verdade chegam sem compromisso, é só mão-de-obra rotativa, que esta construindo a cidade, mas acho que nem esta entendendo direito o que vai ser Canaã (Entrevista Realizada em 2003).

A crítica de um antigo morador recai na falta de posicionamento do poder

local. Ele acredita que o projeto que está sendo construído na cidade é um projeto com visão

somente da CVRD, não tem a visão do cidadão de Canaã, e dessa forma o projeto fere os

interesses e os costumes locais. Quem estava acostumado com um estilo de vida e uma forma

Page 155: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

155

de viver e pensar a cidade, o tempo da cidade mudou, mudou por fatores econômicos que

inseriram o município na economia do cobre e modificou sua relação com o lugar, com as

pessoas, que passaram a viver em função do projeto ou da expectativa que ele pode dar a cada

um dos que vivem ali, que estão vendo reconstruírem sua cidade, sem pedirem sua opinião,

sem consultar seus anseios. Para outro antigo morador,

no meu ponto de vista, até um pouco polêmico, até um pouco questionável, é que o projeto aqui é um pouco diferente da realidade de Parauapebas. Parece que houve mais intervenção do poder público lá. É isso que realmente os cidadãos querem, querem um projeto da cidade, e aqui parece ao meu ver que não tem um projeto da cidade, tem um projeto da empresa, da mineradora que implanta. Independente dos benefícios disso, eu acho que a questão democrática, a questão da imposição do próprio cidadão, onde eu quero minha praça, o que é que eu quero, eu acho que esta sendo atropelado (Entrevista Realizada em 2003).

Segundo o secretário de planejamento do município a sociedade está sendo

consultada. Ele rebate as críticas dizendo que o PDS é um instrumento construído pelo

município, reuniões de demanda para elaboração do PDS foram realizadas, as reuniões foram

promovidas pela MSS, para elaboração do livro verde, que traçou um plano sustentável para o

município. Segundo o secretário a sociedade participou das discussões, e no dia em que a

MSS não existir mais esse plano tem que prosseguir,

aqui no meio rural a gente vê que está escasso. Enquanto está chegando gente, aqui no núcleo urbano, o meio rural fica meio esvaziado. O preço da terá encareceu. O pessoal vende aqui, compra duas três aí pra fora. Na realidade a gente vê como uma chuva passageira, uma enchente que vai passar. No entanto, até o comércio sofre com esse enchimento. Essa praça cheia de gente, não significa que o comércio está se dando bem, eles compram, ou melhor, eles pagam no vencimento, no final do mês, alguns comércios estão se dando bem porque vendem bebidas, é uma coisa preocupante. Há dois anos atrás existia um bairro só, de um ano pra cá o negócio expandiu, há loteamento por todo lado, e não digo que é ordenado não, é um negócio bem desordenado, isso aqui era uma cidade que não tinha pedinte. Tinham pessoas necessitadas, mas hoje o negocio aqui está feio e é só com pessoal de fora, de qualquer forma esta causando um dissabor (Entrevista Realizada em 2003).

Para o secretário a migração é preocupante embora ele aposte que a infra-

estrutura que está sendo feita vai diminuir esse problema. O problema é que a cada hora do

Page 156: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

156

dia surge um novo loteamento, e o plano acabará deixando esses que surgiram depois da

viabilização do PDS fora de sua área de atuação.

Por outro lado, ele deposita toda sua esperança nos recursos que virão com a

implantação do projeto da MSS (em 2004), o projeto começará a pagar os royalties da

mineração e com isso a receita municipal vai aumentar, é nisso em que quase todos os

municípios apostam e pleiteiam nos projetos da CVRD, esperando que os recursos que a

companhia vai repassar aos municípios sirvam como elementos de investimentos no local, e

sejam um indicador de desenvolvimento. Segundo o secretário de Canaã,

é lógico que isso aí vai ser uma vida para Canaã. Acho que aqui nós ainda estamos felizes devido essa área de projeto. Se não houvesses esses avanços, com a arrecadação dos tributos federais, estaduais nós não íamos ter isso aqui, então a relação entre o poder público e a mineração é boa (entrevista realizada em 2003).

Por uma razão ou outra, o poder público não está ainda interessado nos

elementos adversos que surgirão, problemas urbanos e rurais, e sim na viabilização financeira,

no aumento das receitas, sem se preocupar se tais atividades poderão gerar prejuízo aos

municípios. Assim não se preocupa com a sustentabilidade social do município e com o

desenvolvimento das condições sócio-econômicas do município, só concentra suas atenções

no aumento de receita que esses projetos poderão atrair para o município.

Page 157: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

157

5.5 –Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Curionópolis

O município de Curionópolis (Figura 14), como já foi dito anteriormente,

foi emancipado de Marabá, em 1988, e teve como ponto principal o garimpo de Serra Pelada,

disputado em vários momentos pela COOMIGASP e pela CVRD, por ocasião da privatização

da companhia. Na segunda metade da década de 1990, o município viveu a possibilidade de

ter o projeto Serra Leste implantando em seu município. Na época o poder público acreditava

que o projeto seria a salvação de Curionópolis. Depois de privatizada a companhia não se

pronunciou mais sobre a viabilização do projeto da mesma forma como quando ainda era

estatal.

Figura 14: Vista de uma das ruas do município de Curionópolis (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

O município ainda deposita suas esperanças em possíveis projetos que a

companhia venha a instalar no seu território. Sua grande esperança está direcionada em

relação aos Projetos Cristalino e Serra Leste, segundo entrevista com o presidente da

Associação Comercial e Industrial de Curionópolis.

Durante o fórum paraense de desenvolvimento de 50 anos de mineração no Pará, eu fiz a pergunta ao representante da Vale: o que Curionópolis poderia esperar em curto prazo? Já que o município tinha duas áreas de mineração e

Page 158: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

158

estava concluído o trabalho de pesquisa, o Serra Leste e o Projeto Cristalino. Ele me disse: olha Curionópolis em curto prazo, tem investimento na ordem de 8 a 10 milhões dólares, nesses dois projetos, pode ter certeza que isso é irreversível e entrará em operação o mais rápido possível. Eu questionei quanto ao problema do garimpeiro, ele me informou que o problema do garimpeiro estava mais fácil de ser resolvido, do que já esteve nesses dezesseis anos (Entrevista Realizada em 2003).

O município vive um período de perda populacional, principalmente para o

município de Parauapebas, que lhe é contíguo. O município possui o lacticínio como única

indústria, e tem um comércio que apresenta problemas, e como nos demais município a

prefeitura é que mais emprega, “hoje a área comercial encontra-se decadente.O único meio de

geração de emprego seria a prefeitura e lacticínio. O lacticínio emprega em torno de 300 e a

prefeitura, 500”, destaca o presidente da Associação Comercial e Industrial de Curionópolis

(ACIC). Para o presidente da ACIC a esperança do município é que a CVRD num período

curto de tempo passe a explorar a jazida de cobre que existe no município dentro do projeto

que começou em Canaã, só assim a arrecadação municipal começará a crescer, e novos

investimentos poderão ser feitos, caso contrário, o município continuará na mesma.

Parece que a CVRD é a única alternativa que tem os municípios como

Curionópolis e Canaã de verem suas receitas aumentarem, e de alguma forma poder investir

no município. Segundo o vice-prefeito do município,

a gente tem dificuldade de convênios. As promessas da Vale do Rio Doce são fundamentais para o município. Os serviços do município não têm como atender a demanda da população, o único empregador que tem aqui é a prefeitura, e não podemos mais contratar e acaba que as pessoas vão para outro município, nós lamentavelmente, mas não temos condições de segurar todo mundo (Entrevista Realizada em 2003).

Para ele a população hoje está estável. Segundo o seu depoimento o

município não tem mais nada para perder. Quando questionado em relação ao papel de Serra

Pelada para o município, o vice-prefeito disse que nas questões de Serra Pelada ele não tinha

domínio e que a Serra era uma questão do prefeito Sebastião Curió.

Page 159: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

159

Na entrevista com uma antiga moradora de Curionópolis, ela nos falou que

veio para Curionópolis para trabalhar como enfermeira, hoje (2003) tinha montado uma

farmácia e estaria candidata a vereadora nas próximas eleições. Ela disse que viver em

Curionópolis era uma questão de honra, pois sobreviver no município era difícil, e que tudo

que ela tinha foi construído em cima de viver no município.

Para ela Serra Pelada foi decisiva na sua vinda para o município, pois a

questão de saúde era precária, e ela acabou se acostumando a cuidar dos garimpeiros e das

pessoas que ficavam morando em Curionópolis, enquanto seus filhos e marido iam trabalhar

no garimpo.

Para outro morador de Curionópolis,

chegamos no auge de Serra Pelada. Eu encontrei não era bem um município, era uma curutela, como o garimpeiro costumava chamar. Tudo era distrito de Marabá. Essa curutela, Curionópolis era o local mais perto de Serra Pelada, e onde os garimpeiros costumavam deixar suas famílias. Não era permitido a entrada de família em Serra Pelada, só de homens (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

A cidade, que surgiu em função do garimpo de Serra Pelada, cresceu de

forma desordenada, cercada de fazendas. A maioria de suas habitações sendo cabarés, suas

ruas eram formadas por casas noturnas que atendiam os garimpeiros, que desciam da Serra

Pelada para se divertirem. Na época a maioria dos habitantes vivia dos garimpos e das casas

de prostituição que se formavam em Curionópolis.

O exército assumiu o garimpo, na pessoa do Major Curió. Em 1982 ele se

elegeu deputado federal com os votos dos garimpeiros de Serra Pelada. Curió foi eleito

prefeito do município e esta no seu segundo mandato consecutivo (2003). Por muito tempo,

Curió exerceu o controle e ordenou, através da criação da Cooperativa de Mineração dos

Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP criada por ele), a entrada e saída dos garimpeiros

na época evitando os chamados furões, que, embora ilegais, conseguiam entrar no garimpo.

Segundo um antigo morador que trabalhou no garimpo, “a primeira coisa que Curió fez

Page 160: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

160

quando assumiu o garimpo foi credenciar todos os garimpeiros e expedir para eles uma

carteira para controlar a entrada e saída”.

Em 1987, com a permissão das mulheres entrarem no garimpo, as famílias

puderam mudar seus domicílios para Serra Pelada e acabaram formando uma localidade que

hoje possui formato de um núcleo urbano desestruturado, sem condições infra-estruturais com

muitos garimpeiros que vivem da extração do ouro em pequena escala e da agricultura

familiar.

Curionópolis surgiu em função do garimpo, mas não foi um garimpeiro seu

primeiro prefeito. Segundo entrevista com um antigo morador sobre a emancipação do

município,

tinham pessoas bem influentes que iniciaram essa política, uma dessas pessoas foi o senhor Salatiel, inclusive ele se tornou o primeiro prefeito de Curionópolis. Era farmacêutico, evangélico da Assembléia de Deus. Ele tinha uma grande influência por ser bom farmacêutico, e dono de uma das maiores farmácias que tinha aqui, numa região dessa que todo mundo adoece, o farmacêutico logo se torna um destaque (Entrevista Realizada em 2003).

É comum nessa região o profissional da saúde ser uma pessoa importante e

de respeito, pois há uma carência em virtude sobretudo da falta de saneamento básico na

maior parte dos núcleos urbanos. É comum assumirem a prefeitura dos municípios, nessa

região, médicos, farmacêuticos, enfermeiros. Dessa forma, acabam assumindo compromissos

que os levam para a política. Com o interesse de Parauapebas se emancipar, Curionópolis viu

a possibilidade de também conseguir seu desmembramento de Marabá. Nesse caso, segundo

um antigo morador “Parauapebas tinha essa idéia muito antes de Curionópolis, Parauapebas

tinha o Projeto Ferro Carajás que dava suporte bem maior para que se emancipasse, e

Curionópolis estava vivendo a decadência de Serra Pelada, esse período começa a decadência

de Serra Pelada”.

Com a decadência do garimpo de Serra Pelada, na segunda metade da

década de 1980, o município de Marabá perdeu uma importante área de mineração, e com

Page 161: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

161

impossibilidade da lavra manual e acreditando perder população, o município levou adiante a

idéia de se desmembrar. Como no caso de Água Azul e Parauapebas, já citados, ocorreu em

Curionópolis uma troca de favores para apoiar seu desmembramento de Marabá.

Sem a produção do ouro em alta escala em Serra Pelada, com a

emancipação o município recuperou áreas e continuou a manter suas relações político-

econômicas com sucesso, acreditando que num futuro, tanto Serra Pelada, como outras áreas

pudessem vir a ser exploradas no município. No entanto, com o sucesso de Parauapebas em

torno da implantação do PFC, o município perdeu parte de sua população para Parauapebas.

Passadas as “fofocas”23 dos garimpos, como costumam chamar os novos

garimpos, Curionópolis continuava com alguns garimpos como o Serra Verde e o da Cotia,

que sobrevivem com pouca produção. O Serra Verde, mais antigo garimpo e o da Cotia

depois do boom de Serra Pelada. Essa luta é traduzida na briga pelo controle da

COOMIGASP, que na última eleição teve o representante do prefeito Curió (o fundador da

cooperativa) como vencedor. A disputa pela Cooperativa sempre foi conflituosa entre os

grupos opositores a Curió e sempre terminaram em confusão e até mesmo em assassinato.

Sobre os convênios que a prefeitura pretende fazer para melhorar as

condições de vida dos mais de 6.000 habitantes que vivem hoje em Serra Pelada. Curió

declarou à imprensa que a “Vale vai montar infra-estrutura, o maquinário, e a COOMIGASP

vai explorar o calcário com a obrigação de vendê-lo para a CVRD, a preço de mercado.

Então, é um avanço muito grande para a comunidade de Serra Pelada” (Correio do Tocantins,

março de 2003, p.17).

A tendência, segundo Curió, é de que Serra Pelada se transforme em distrito

que, no futuro poderá, ser emancipada de Curionópolis. Para ele, isso poderá acontecer com

os investimentos que a CVRD poderá fazer em Serra Pelada. Assim, tudo indica que esse será

23 As “fofocas” de garimpeiro correspondem à descoberta de uma nova mina.

Page 162: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

162

o caminho do antigo garimpo. Segundo Curió Curionópolis terá o projeto de ouro e cobre, o

Cristalino, e o Projeto de Ferro Serra Leste, além de ter um projeto para exploração de platina.

Segundo Curió “a CVRD já está preparando um campo social para iniciar esses projetos.

Então, sem dúvida alguma, está começando uma nova fase de progresso, para gerar emprego

para o povo e a comunidade” (Correio do Tocantins, marco de 2002 p. 17).

O poder público em Curionópolis aposta na viabilidade econômico-social do

município a partir dos investimentos que poderão ser realizados pela Companhia Vale do Rio

Doce. Para o prefeito Curió,

baseado em fontes seguras há projetos sendo definidos pela Companhia Vale do Rio Doce para serem implantados em nosso território, cujos investimentos, gerarão emprego, renda e oportunidade para muitas empresas aqui se instalarem. O Próprio Projeto Sossego, em Canaã dos Carajás, nos trará dividendos, já que parte das jazidas a serem exploradas ali, está em nosso território. Isso vai redundar em royalties para os cofres do município (Jornal de Curionópolis junho de 2000).

O interessante é que em municípios como Curionópolis o poder público

acredita que toda e qualquer forma de viabilidade econômica passa pela CVRD, e que sem a

presença da companhia esses municípios seriam enviáveis, e suas arrecadações não poderiam

dar conta nem de fomentar sozinhas o desenvolvimento local.

Por enquanto, tudo não passa de projetos virtuais que a CVRD poderia

implantar em Curionópolis, e seus gestores ficam na expectativa de verem esses projetos em

atividades, gerando recursos para os municípios.

Page 163: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

163

5.6 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Eldorado do Carajás24

Eldorado do Carajás (Figura 15) é um Município com menos expectativas

em relação à presença de projetos da Companhia Vale do Rio Doce. Muito embora esteja

dentro da área de influência da Estrada de Ferro Carajás. O município que surgiu em função

das madeireiras e foi emancipado de Curionópolis em 1991. Seus gestores municipais

acreditam que sobreviva de suas principais atividades, agricultura e a pecuária, e que eles não

dependem da possibilidade de implantação de projetos da CVRD em seu município.

Acreditam que, não existindo nenhuma jazida no município, este seja desinteressante para a

companhia.

Figura 15: PA-275 que liga Eldorado ao Município de Parauapebas e a Serra dos Carajás (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).

Em entrevista o presidente da Câmara Municipal de Eldorado do Carajás,

um dos moradores mais antigos, comenta:

eu fui um dos fundadores da política de Eldorado. Eu e o ex-prefeito Jair, nós em 1986, começamos a dar os primeiros passos políticos. Eldorado pertencia a Marabá, aqui era uma área de segurança e, todos os municípios pertenciam a Marabá, Parauapebas, Curionópolis e Eldorado. Em 1988, veio

24 No município de Eldorado do Carajás não há Associação Comercial e Industrial.

Page 164: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

164

à primeira eleição, desmembramos Curionópolis e Parauapebas, na primeira eleição eu já participei (Entrevista Realizada em 2003).

Para o presidente da Câmara Municipal, emancipar o município foi uma

maneira de fazer com que ele criasse expectativas de se desenvolver sozinho, já que os outros

municípios apresentavam características minerais e Eldorado não, e estava distante do

principal centro, que era Marabá.

Outra característica fundamental para o presidente da câmara é que o

município está no entroncamento da PA-275 com a PA-150, que dá acesso tanto para Marabá

quando para Xinguara, o que facilita o escoamento da produção local. Em relação à

perspectiva de crescimento,

Eldorado já nasceu com o destino marcado. Parauapebas é extração de minério, jazida de ferro. Curionópolis teve aquele foco de Serra Pelada e ainda a poderá ser a salvação, o garimpo de Serra Pelada. Então, Eldorado já nasceu com destino traçado, é a pecuária. A madeira é coisa passageira. A madeira acabou, não existe mais madeira. Mineração nós não temos, eu acompanho desde 1980 a Vale fazer pesquisa, nós não temos nada de minério dentro do município, então é agricultura e a pecuária. Nós temos um grande potencial na pecuária, hoje o Eldorado tem umas 700 mil cabeças de gado (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

De todos os municípios pesquisados, até o presente momento, Eldorado é o

único que escapa em não atrelar seus interesses públicos à questão da presença da CVRD no

município. E, embora seja um município recente, acreditam seus gestores que a agricultura e a

pecuária sejam as únicas formas de crescimento econômico para viabilizar o município e

assim atrair investimentos e empregos. Para um vereador do município,

o futuro de Eldorado, o crescimento de Eldorado é baseado na agricultura e na pecuária, a prova é que chegou um lacticínio aqui em Eldorado. Ele fez uma estrutura pensando em trabalhar inicialmente com dez mil litros de leite, no primeiro mês ele já pegou 32 mil litros de leite. Nós temos uma associação na Boca do Cardoso, com 280 associados, nós estamos fazendo um financiamento no BASA vai sair dinheiro para cada produtor para comprar vinte vacas leiteiras (Entrevista Realizada em 2003).

O município de Eldorado e os demais da região estão atraindo os laticínios,

pelo potencial da bacia leiteira dentro dos seus territórios. Frigoríficos também migram para

esses municípios pelo potencial da pecuária, o que já foi destacado durante este capítulo, e

Page 165: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

165

Eldorado do Carajás possui um frigorífico que, junto com a prefeitura, é um grande

empregador local.

Outro ponto a ser destacado pelo poder público é a relação com os

assentamentos realizados; como exemplo a fazenda Macaxeira, onde a produção cacaueira

vem sendo estimulada e com isso, segundo o presidente da câmara municipal, “então está se

concentrando tudo na pecuária e na agricultura depende do crescimento baseado que nós

temos na invasão. Eldorado hoje tem dezessete assentamentos de sem terras (entre os novos e

os antigos realizados na época do GETAT na região), e nós temos ainda várias fazendas

grandes, que não adianta elas vão ser invadidas”. Os assentamentos, na visão do presidente,

são uma questão positiva para o município, pois os incentivos que virão junto com eles

poderão viabilizar a agricultura no município.

Para o vereador, a produção de grãos deve ser incentivada, e a viabilidade

de construção das eclusas de Tucuruí poderá ser um dos caminhos para aumentar a produção,

visto que vai baratear os custos de transporte, principalmente da soja. Para ele “o sul do Pará

pode ser um grande produtor de soja do Brasil. Santana do Araguaia, Redenção, Conceição,

Santa Maria são só cerrado e só campo é só incentivar”. Para ele é por aí que o poder público

estadual pode buscar parcerias com a CVRD e tornar essa região um pólo produtor de grãos.

Em companhia com a CVRD, viabilizaria as eclusas, o que tornaria a região ainda mais

próspera para investimentos em agricultura.

Porém as fortes migrações, segundo o poder público, são entraves ao

desenvolvimento do município. Na declaração do representante da câmara municipal, “nossa

região tem muita migração que vem do Maranhão, vem do Piauí, no nordeste, pensando que

aqui é um mar de rosas, é aonde nós temos os problemas sociais, eles vem e não tem no que

trabalhar”.

Page 166: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

166

Como os municípios não têm capacidade de investir, de atrair novas

empresas e gerar empregos, eles acabam formando verdadeiros bolsões de pobrezas. Segundo

entrevistas, os pobres acabam indo para os movimentos sociais como o MST, sua única

alternativa.

Outra forma de tentar tornar o município atrativo é tentar, segundo o

presidente da câmara, esquecer alguns equívocos que foram praticados dentro do município e

que não foram de responsabilidade do poder municipal, mas acabaram fazendo com que ele

ficasse com a imagem de um município violento, “aquele massacre da curva do “S” levou

uma má imagem de Eldorado e nós estamos recuperando ela aos poucos”.

O comércio apresenta problemas, ocasionados sobretudo, como declararam

alguns comerciantes, pelo período de chuvas na região, que atrapalha o processo nas

madeireiras, o que por sua vez causa desemprego, e o comércio tem suas vendas reduzidas.

Segundo entrevistas de comerciantes à imprensa, “nós dependemos da prefeitura e das

madeireiras, como elas não estão funcionando e a prefeitura demora a contratar, acontece

isso”. Para outros comerciantes a falta de indústrias na cidade é que acaba sendo responsável

por esses acontecimentos.

Eldorado do Carajás, como outros municípios do corredor da Estrada de

Ferro Carajás, apresentam graves problemas sociais, como falta de saneamento básico, dentre

outros e que precisam ser solucionados, mas esbarram em viabilizar parcerias e promover a

integração da sociedade civil na resolução dos problemas urbanos e rurais.

A economia do município ainda é incipiente para gerar ganhos aos cofres

públicos, e o município ainda depende em sua maior parte da infra-estrutura de municípios

vizinhos, como Parauapebas e Marabá, que acabam sobrecarregando suas atividades com os

problemas gerados por município como Eldorado.

Page 167: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

167

Não há uma forma definida de gestão. Embora eles apontem o caminho da

agricultura e da pecuária, faltam investimentos nessas áreas. A prefeitura e as madeireiras

ainda presentes no município (no período de chuva diminuem seus serviços, por isso acaba

diminuindo também o consumo no comércio na cidade, pois deixam de contratar nesse

período) junto com o frigorífico acabam sendo os responsáveis pelos empregos no local.

Page 168: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

168

5.7 – Uma Visão Conjunta dos Problemas e dos Conflitos Municipais

Todas as questões que envolvem as relações de poder e as formas de

desenvolvimento dos municípios estão ainda longe de serem resolvidas, devido a diferentes

interesses dos atores locais. Parauapebas, Curionópolis, Canaã dos Carajás, Água Azul do

Norte e Eldorado do Carajás são ainda municípios novos, em termos de emancipação política

e econômica. Como Marabá, esses municípios apresentam antigos problemas sociais

agravados com a introdução da mineração e por planejamentos realizados sem a participação

da sociedade civil ou de grupos rivais que disputam o poder local.

Em relação à questão econômico-financeira, destacada no capítulo IV, a

grande maioria dos municípios da mesorregião sudeste paraense são pobres, com pequena

arrecadação, dependem do repasse do governo federal e têm sua receita atrelada à questão do

FPM. São municípios que têm dependências financeiras, que acabam onerando outros

municípios por não possuírem infra-estrutura suficiente para atender sua população, que acaba

buscando serviço melhor em outra localidade próxima, e também acaba migrando para

municípios como Parauapebas ou para Marabá, os dois mais bem estruturados, entre o seis

municípios estudados e que acabam recebendo problemas que deveriam ser resolvidos nos

municípios adjacentes.

Segundo um ex-integrante da EEPP:

a questão da saúde pública é uma calamidade em Parauapebas. A maioria do pessoal diante de qualquer problema vai para Teresina, no Piauí. Isso é aparentemente um absurdo para uma cidade que dispõem de recursos, que o paciente tenha que ser levado para outra cidade que é capital de um dos Estados mais pobres do Brasil (Entrevista realizada em 2003).

As prefeituras acabam sendo o principal empregador. Sem perspectivas de

atrair indústrias e serviços, esses municípios entregam seu futuro em termos de

desenvolvimento econômico às vontades dos projetos que poderiam ser implantados por parte

da Companhia Vale do Rio Doce.

Page 169: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

169

Outro destaque está relacionado à dependência que os municípios têm das

atividades de mineração da CVRD, que monopoliza a exploração dos minérios na região. Nas

entrevistas, foi quase que unânime a questão da necessidade de abertura do sul e sudeste

paraense para outras empresas realizarem suas prospecções. Outras empresas precisam dividir

junto com a CVRD a responsabilidade econômica e social pelo desenvolvimento dos projetos

na região. Acredita-se que só assim haverá uma redistribuição de poder econômico em virtude

da quebra do monopólio exercido pela CVRD na região.

Para tentar mudar esse quadro considerado crítico em relação não só ao

poder público, mas em função das atividades desenvolvidas pela CVRD, que tem impactado

alguns municípios que não têm em seu território projetos da companhia, ou aqueles que

futuramente poderão abrigar projetos dela, criou-se uma alternativa, proposta pela Senadora

Ana Júlia Carepa: aumentar alíquota dos royalties para tentar amenizar os problemas sociais e

econômicos tanto para os que possuem projetos como para aqueles que acabam sofrendo

influência desses projetos. Segundo depoimento de antigos participantes da EEPP,

o município Parauapebas recebe 22% do CFEM do país pela extração mineral em seu município. O projeto dos royalties pretende dobrar essa alíquota que é cobrado sobre o lucro líquido da empresa, e beneficiar de forma residual outros municípios. Na verdade seriam os municípios que fazem fronteiras com o município sede. No caso aqui seria Curionópolis, Canaã, Eldorado, Água Azul, Marabá, que pegaria o projeto Carajás. Por outro lado, de Canaã nós também pegaríamos, nós também sofremos impacto do projeto Mineração Serra do Sossego. Então fica justo, ela é correta, embora ocorram críticas de como isso se sustente ao longo do tempo. Tem muitos lugares que o projeto é mais demorado, tem lugares que é menos, municípios que tem projeto mais a longo prazo vão dizer não, nós não queremos isso, depois nós só vamos esta dando, não vamos estar recebendo (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Uma outra questão está relacionada ao projeto da senadora Ana Júlia, depois

da decisão da CVRD de implantar o pólo siderúrgico no Maranhão. Os paraenses ficaram

questionando o papel da companhia dentro do Estado e, principalmente, na região de Carajás.

Muitos manifestos foram feitos, principalmente por políticos paraenses, dentre eles o projeto

da senadora Ana Júlia, que não foi somente motivado pela questão do pólo siderúrgico, mas

Page 170: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

170

sim pela pobreza que impera dentro da área em que a CVRD tem projetos, ou seja, daqueles

municípios que recebem, e de outros que não recebem benefícios da companhia.

Segundo o secretário de Planejamento de Parauapebas,

O projeto até que é bom, mas eu acho que se a Vale hoje coloca minério na China, num preço melhor do que a Austrália vende, é em função dessas vantagens. Então teria que ver até que ponto implica na exportação do minério, que além de ajudar o município uma parte desses recursos fica com Estado, outra parte vai para o DNPM, o município não vai ter perda nenhuma (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Porém, toda a região no momento vive as expectativas do Projeto

Mineração Serra do Sossego em Canaã. Parauapebas é o primeiro caminho para se chegar a

Canaã pela Estrada de Ferro Carajás, principalmente, portanto a chegada de migrantes

atraídas pelo Projeto de Mineração Serra do Sossego também causa impacto em Parauapebas.

Segundo representantes da ACIP, diferentemente de outros municípios é

Parauapebas que acaba sendo o pólo da microrregião, por possuir as atividades principais da

CVRD na região. Segundo a associação, “Canaã é um filme de Parauapebas, é um filme que

passou aqui, e está passando lá, um boom de emprego, uma cidade que há dois anos tinha 13

mil habitantes, só hoje, em mão-de-obra gerada no projeto tem 30 mil. É um canteiro de obras

daqui até lá, Parauapebas foi isso. Parauapebas vai continuar sendo o pólo dessa

microrregião”. Para o vice-presidente da ACIP, não terá outro jeito; com o fim do primeiro

estágio do projeto em Canaã, ocorrerá uma migração inversa em direção a Parauapebas, a

principal e mais próxima com infra-estrutura melhor do que Canaã. Por tal motivo, ele

acredita que esses migrantes que estão indo em busca de empregos vão acabar ficando em

Parauapebas. Nem todos irão conseguir empregos em Canaã, e Parauapebas será o local

melhor para eles tentaram a sorte.

Page 171: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

171

Fonte: Informativo Mineral DNPM, 2000.25

Em se tratando da CFEM, o Estado do Pará, em conjunto com o Estado de

Minas Gerais, responderam em 1999 por 73% de sua arrecadação (Figura 16), sendo

respectivamente 31,7 e 41,4% da arrecadação do País. A crítica recai na própria experiência

de Parauapebas, que recebe recurso (o município recebeu em 1997 R$ 11.954.930,07, em

1998 recebeu R$ 14.394.61485 e em 1999 recebeu R$ 15.326.455,45 de CFEM) por possuir

os projetos da CVRD em seu município, muito embora o próprio município apresente graves

problemas sociais, como o de saúde e de infra-estrutura em alguns bairros mais distantes,

como é o caso do bairro Liberdade (antigo cortinão), em contraste com o núcleo pioneiro da

cidade, que recebeu investimento da CVRD no começo da implantação do Projeto Ferro. Em

relação à forma como o município vem se desenvolvendo, um ex-integrante da EEPP destaca:

para o desenvolvimento regional, não adianta desenvolver uma ilha num município pequeno, porque você vai ter todos os problemas da cidade vizinha, que acabam desembocando aqui. Hoje, por exemplo, qualquer problema maior, o hospital aqui de Parauapebas atende Canaã, atende Curionópolis, atende Eldorado, apesar de terem pequenas unidades nesses

25 Segundo o DNPM “Considerando a arrecadação por municípios, em 1999, o recolhimento da CFEM foi encabeçado por Parauapebas-PA, Oriximiná-PA e Itabira-MG, que representaram, respectivamente, 22,0%, 11,0% e 10,0%. Juntos, são responsáveis por 43,0% da arrecadação nacional” (Informativo Mineral, 2000).

F ig u ra 1 6 - P A R T IC IP A Ç Ã O D O S P R IN C IP A IS M U N IC ÍP IO S N A A R R E C A D A Ç Ã O - 1 9 9 9

2 2 ,3 %

1 1 ,0 %

1 0 ,2 %4 ,4 %4 ,3 %3 ,4 %

2 ,7 %

2 ,6 %

2 ,3 %

1 ,7 %

3 5 ,1 %

P A R A U A P E B A S (P A ) O R IX IM IN A (P A ) IT A B IR A (M G )

O U R O P R E T O (M G ) N O V A L IM A (M G ) M A R IA N A (M G )

IT A B IR IT O (M G ) V IT O R IA D O J A R I (A P ) R O S A R IO D O C A T E T E (S E )

IP IX U N A D O P A R A (P A ) O U T R O S

Page 172: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

172

municípios, mas que não tem a infra-estrutura que tem aqui, então na verdade a gente acaba tendo mais problemas do que o necessário, se você canalizar os recursos para esses municípios, eles também, vão poder construir uma infra-estrutura decente (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Segundo o secretário de Parauapebas, investimentos feitos em municípios

como Canaã podem beneficiar Parauapebas.

A abertura da estrada de Canaã com 80 quilômetros de asfalto, e com a influência que nós temos nos assentamentos dentro de Marabá, além disso, o mercado consumidor deles é o município de Parauapebas. É, 80 quilômetros daqui até lá, e para Marabá é 120/180 quilômetros, e as estradas são ruins. Eu vejo amanhã o pessoal de Água Azul, Tucumã, Ourilândia, São Feliz do Xingu querendo ir para Marabá ou para Belém, vão querer passar aqui por dentro, isso aqui vai ser um corredor de exportação, essa região (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Outra crítica realizada pelo secretário é em função da perda dos

investimentos para o Estado do Maranhão. Como esses municípios que têm em seu território

projetos de mineração recebem muitos migrantes, para a CVRD junto com o Estado e

município é um desafio pensar essa questão. Embora não seja função da empresa, essas

questões em parte são de sua responsabilidade indireta, devido à metamorfose que ocorreu nas

últimas duas décadas. É preciso repensar a questão da mineração no Pará, definindo,

sobretudo, a área que está sob a influência da CVRD e aplicar recursos para minimizar esses

problemas diferentemente de como era na época do Fundo de Compensação das Áreas de

Influência da CVRD,

o minério é nosso, está dentro do Estado do Pará e vai gerar emprego para os de lá. Eu vejo que quem esta perdendo muito com isso é o próprio Estado, porque gente de lá para cá vem de monte. Agora gente daqui para lá não vai. Não se vê ninguém do Pará morando no Maranhão é raridade, mas maranhenses aqui na nossa cidade 60% correspondem a população (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Há falta de banco de dados com indicadores sócio-econômicos, comum em

todos os municípios estudados nesta pesquisa, e não se tem ainda definido qual seria o eixo de

desenvolvimento desses municípios. Isso facilita ações de domínio como as que são em parte

Page 173: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

173

inerentes da CVRD na região, o que fragmenta as relações de poder dentro do município, não

deixando espaço para novas idéias no que diz respeito às políticas econômicas e sociais

traçadas a médio e longo prazo para o município.

Em função do pólo siderúrgico surge outro questionamento relacionado ao

aumento das alíquotas da CFEM que transita no Congresso Nacional por parte de políticos

paraenses. A questão vai além do aumento da alíquota e sua distribuição e sobre quais seriam

as áreas sob a influência da CVRD no Pará, e de que forma seriam aplicados esses recursos.

Os questionamentos feitos por alguns municípios, dentre eles Parauapebas, é

sobre a vida útil de cada projeto que a CVRD tem na região. Em alguns casos como Canaã o

projeto tem vida curta, e uma parte do repasse proposto pelo novo projeto da senadora não iria

beneficiar Parauapebas. Talvez por isso a indiferença do secretário, que já alertava sobre as

possíveis migrações que viriam de Canaã em direção a Parauapebas aumentando os

problemas sociais do Município.

Segundo depoimentos, é impossível negociar com a empresa questões de

interesses da sociedade. Com outras empresas presentes no município, necessariamente

ocorrerá uma disputa para ver quem melhor assume um papel de destaque, tanto no setor

econômico, como no social nos municípios. Crescerá assim o número de futuros projetos, de

maneira que poderá realmente acontecer a verticalização da produção dentro do território

paraense. Para isso é preciso evitar também que haja fuga de projetos para beneficiamento dos

minérios em outros locais, fora do Estado do Pará. Dessa forma, segundo depoimento de

integrantes da EEPP:

primeiro nós temos que pintar um cenário com vários atores que nós temos aqui. Nós temos a Vale do Rio Doce. Não é possível discutir desenvolvimento sem colocá-la no cenário. É daí que vem a maior parte da riqueza que é produzida aqui. Eu sinto que aqui há uma tendência do poder público municipal, hoje de tentar segurar novas indústrias aqui, porque os empregados de uma indústria ou de nova empresa grande que se instale aqui, eles necessariamente não estão submissos ao poder público. Vejo que o desenvolvimento tem sido travado de alguma forma por isso, porque a disputa eleitoral aqui acaba influenciando demais na questão do

Page 174: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

174

desenvolvimento. Deixa de se fazer muitas coisas por conta do medo de perde apoio político, apoio do voto (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Por outro lado, a questão dos empregados, com a presença de outras

empresas nos municípios, está relacionada à liberdade de expressar seus descontentamentos

com a administração local, e de mostrar como o poder local age em função de seus interesses.

Segundo alguns depoimentos, essa crítica que poderia ocorrer caso outras empresas viessem a

se instalar em Parauapebas forçaria e diminuiria a perseguição política que ocorre, caso os

empregados se posicionem contra a vontade do poder público e dos seus representantes.

A tentativa de ex-membros da EEPP participarem do poder público ou de

reativarem sua própria entidade representa iniciativas de viabilizar seus próprios discursos de

desenvolvimento atrelado à formação política de atores excluídos do poder local. Seus

membros procuram, a partir da experiência adquirida, definir qual seria a forma de se

posicionar diante de um grande grupo econômico que monopoliza a economia no município.

Diante do fato político e de outros, como o econômico, os moradores

sentem-se prejudicados pelo posicionamento do poder público municipal. Segundo eles “a

proposta da prefeitura não é uma proposta, é uma imposição; a relação de diálogo entre o

poder público e a sociedade não existe nessa cidade”. Dessa forma, o discurso de ex-membros

da entidade é de tornar o município um espaço público dinamizado pela participação popular.

Outro ponto relevante está relacionado com o poder público, que acaba

inibindo a entrada de outras indústrias para competir, sobretudo com a CVRD; mas segundo

depoimento de ex-integrantes da EEPP, a própria CVRD não abrirá mão de suas jazidas ou da

parte que contempla, principalmente a Floresta Nacional de Carajás. A CVRD sente-se

ameaçada por ser possível a exploração da floresta por uma outra empresa, que não seja ela.

Agora por exemplo tem toda essa discussão em relação da Floresta Nacional de Carajás, já tem pelo menos duas ou três empresas que querem fazer pesquisas nessa floresta. A Vale junto com IBAMA, inclusive foi criado o conselho da floresta para ajudar, acompanhar a questão do manejo e o potencial, seja no ponto de vista da questão da produção vegetal, seja

Page 175: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

175

mineral, que na verdade a Vale não quer que outras empresas entrem. A partir do momento que outras empresas atuem aqui vai ter concorrência, seja na produção, seja no social. Então ela jamais vai querer grupos que possam se contrapor a própria política dela (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).

Essa preocupação ambiental tem levantado questionamentos em relação à

Floresta Nacional de Carajás (FLONA) e tem preocupado a comunidade da área técnica com

restrições por parte dos ambientalistas, que vêem pela primeira vez um caso de exploração de

uma Floresta Nacional, que coloca em risco a questão ambiental na região e no Estado como

um todo.

Segundo o jornal O Liberal,

a Floresta Nacional de Carajás, cobrindo exatamente a área que a CVRD já vinha (e vem) mantendo sob seu domínio desde 1986, foi criada no dia 02 de fevereiro de 1998. Para seu uso, foi elaborado um plano diretor que prevê, entre outras coisas, a pesquisa, a lavra, a industrialização, o transporte e a comercialização de recursos minerais, além da promoção de manejos dos recursos florestais. A partir do momento que foi criada lá a Floresta Nacional, uma unidade de conservação pertencente ao Ministério do Meio Ambiente, qualquer empresa só poderá requerer ao DNPM um alvará de autorização de pesquisa, em Carajás, se apresentar, junto com o requerimento, a anuência do IBAMA. Do contrário, o requerimento é liminarmente indeferido. Um obstáculo novo e quase intransponível para as mineradoras, com uma única exceção: por ter títulos minerários na área, a Companhia Vale do Rio Doce consegue facilmente a anuência do IBAMA (Jornal O Liberal 08 de junho de 2003, painel, p. 2).

Por essas e outras questões ambientais locais e extralocais, o secretário de

meio ambiente de Marabá, Antônio Rosa, destacou a importância de cada município ter em

sua prefeitura uma lei ambiental e normas para licenciamento ambiental considerados por ele

indispensáveis para o desenvolvimento dos municípios. O Problema da FLONA é uma

questão que, de forma direta ou indireta, mostra o peso político-econômico que a CVRD tem

na região, monopolizando cada vez mais a questão mineral na região.

De uma maneira ou de outra, o importante é que se tem que repensar o papel

da mineração no Pará e das empresas como a CVRD, que atuam dentro do Estado, e no efeito

multiplicador que foi gerado por esses projetos na Amazônia. A questão do aumento da

Page 176: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

176

alíquota tem que ser acompanhada por uma nova forma de pensar o desenvolvimento na

região, que leve em consideração a sociedade local, e os impactos gerados por esses projetos.

É preciso não repetir os mesmos erros do passado, não apenas na quantificação, mas na

qualificação da aplicação desses recursos, e não permitir que as empresas montem suas infra-

estruturas fora do Estado, ficando este somente como o fornecedor da matéria-prima.

Page 177: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

177

6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS A CVRD como ator hegemônico na região de Carajás organiza suas

relações a partir de sua exploração mineral e de seus contratos econômicos com quem

financia seus projetos. Ela desenvolve relação com a gestão pública local e com os demais

atores sociais que participam da vida ativa do Estado e dos municípios onde ela possui

projetos.

De uma maneira ou de outra, o poder que a companhia adquiriu localmente

vem de longos anos de sua trajetória como uma grande empresa de mineração não só no

cenário nacional, como também no internacional. Não se pode afirmar que a CVRD omitiu

sua participação na vida econômica dos municípios, pois seus projetos trouxeram recursos

financeiros onde estavam instalados, porém pela falta de uma visão de futuro dos políticos

paraenses, não foi possível exigir da empresa um outro tipo de participação qualitativa, para

que ela pudesse participar mais ativamente em parcerias com os municípios na resolução de

seus problemas urbanos e rurais.

Isso não quer dizer que a CVRD deixou de participar do desenvolvimento

local, mas queremos dizer que sua participação poderia e pode se dar de uma outra maneira,

possibilitando aos municípios não dependerem somente da empresa, mas permitindo que

possam construir alternativa que não a do minério.

De fato, os 411.000 hectares que estão sob o poder de exploração da

empresa impedem a abertura de uma outra frente que correlacione o poder na região. Com o

monopólio da CVRD fica difícil negociar. Não foi possível quebrar as barreiras do

protecionismo da empresa e criar abertura para que outras empresas brasileiras viessem a

explorar a região com compromisso e responsabilidade com o desenvolvimento dos locais

onde estivessem sendo instalados novos empreendimentos. Se isso tivesse acontecido teria

evitado fugas de projetos para outros Estados, viabilizando realmente seus interesses com

Page 178: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

178

compromisso de efeito multiplicador na região. Houve no caso ausência de planejamentos que

levassem em conta a participação efetiva da sociedade local, criando alternativas de

viabilidade não só econômica, mas também social, respeitando as sociedades atingidas pelos

projetos.

Embora os atores sociais entrassem em conflitos pelo poder local e por

outro tipo de ordenamento no território, sempre deixaram de fora de maneira direta a CVRD.

Com raras exceções, como a do MST, a companhia não teve questionado seu papel na região,

com força suficiente que fizesse a empresa mudar seu comportamento no Estado do Pará.

Com a privatização aos poucos a empresa mudou para o vizinho Estado do

Maranhão sua base logística que tinha na capital paraense. Houve reclamações, mas não com

a devida notoriedade, pelo simples fato de a empresa não temer a ordem legal dos paraenses.

Outra mudança importante foi a decisão de instalar o pólo siderúrgico no

Maranhão e não no Pará. Segundo Lúcio Flávio Pinto,

Desarmado, o Estado reage aos fatos buscando compensações e derivações, ao invés de encarar a Vale do Rio Doce com sua própria visão do setor. Mas como criar essa visão sem estar habilitado a isso e sem buscar respaldo técnico, sempre recorrendo à própria empresa para custear estudos e projetos, como aconteceu com os planos de Eliezer Batista e Raphael de Almeida Magalhães – e se repete agora com a fábrica de placas? (Jornal Pessoal, 2003. P. 05).

A afirmativa acima de Lúcio Flávio corrobora com a nossa no seguinte

sentido: quais definições e proposta de desenvolvimento com base local o Estado apresentou

em relação à companhia? Na visão do senso comum, desde o primeiro trem carregado de

minério que saiu de Carajás através da estrada de ferro que vai da mina no Pará até o porto de

Itaqui, no Maranhão, a população apenas vê o minério sair, sem nada se fazer. Para ela parece

que o Estado ficou alheio a sua condição de organizar e governar o território diante da lógica

econômica imposta pela empresa. Assim, deixa a cargo da empresa a tarefa que de fato seria

sua de direito: responsabilizar-se pela viabilidade dos territórios ocupados pela CVRD.

Page 179: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

179

Ainda segundo Lúcio Flávio Pinto,

a conclusão do estudo realizado pela Natrontec e a Macrotempo...de que São Luís do Maranhão é o melhor lugar para instalação da primeira usina de placas de aço do Brasil, significa o ponto final na história da siderurgia no Pará? O Estado tem a melhor jazida de minério de ferro que existe no planeta, localizada na província mineral de Carajás. Mas até agora o único passo adiante na transformação da matéria prima, um quarto de século depois de iniciada a mineração do ferro, foi dado pelas cinco usinas de gusa implantadas no distrito industrial de Marabá (Jornal Pessoal, 2003. p. 04).

O destino da fábrica de placas seria outro, se de fato há muito tempo o poder

público paraense tivesse deixado de lado seus interesses individuais e olhado para o futuro da

mineração no Estado. As relações que a CVRD vem estabelecendo localmente viabilizam o

desenvolvimento de suas ações rumo ao Maranhão. Um conjunto de processos pesou na

decisão de instalar a fábrica no Estado do Maranhão, o porto está localizado em São Luís e a

Estrada de Ferro Carajás tem como destino final esse Estado. Dessa forma, fica muito mais

em conta para a empresa diminuir seus custos instalando a fábrica no Maranhão do que

atender às reivindicações dos paraenses.

Outra condição encontrada pela companhia para garantir suas pretensões de

instalar a fábrica no Maranhão é explicada por Lúcio Flávio Pinto,

desde o ano passado, a primeira pelotizadora de ferro, que faz a agregação do minério fino, funciona em São Luís. Ela é uma das três maiores usinas de pellets do país, com capacidade de produção de seis milhões de toneladas por ano. Pelotas de ferro e minério granulado são dois insumos para a fabricação de chapas de aço, que representam um estágio mais avançado na industrialização. Se depender do estudo realizado por encomenda da Companhia Vale do Rio Doce, a primeira fábrica de chapas, em sociedade com os chineses, também ficará na capital maranhense, produzindo 3,7 milhões de toneladas anuais. A outra siderúrgica, com metade do tamanho da de São Luís, está surgindo ao lado do porto de Pecém, no Ceará, a mais nova do Nordeste, mas também utilizando o minério de Carajás (Jornal Pessoal, 2003. p. 04).

Alguns dos argumentos da CVRD poderiam ter sido contestados em relação

à instalação do pólo siderúrgico no Maranhão, mas, como já ressaltou Lúcio em vários livros

e artigos publicados no Pará, a elite paraense só contesta o fato depois de consumado. Mais do

Page 180: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

180

que a capacidade de contestar é necessário pensar num Estado, não somente como mais um

mero centro minerador e produtor de semi acabados das empresas do Grupo CVRD.

Durante vários meses do ano de 2003, ocorreu um debate, sem muito efeito

para a CVRD, entre os representantes do poder público e da elite paraense, sobre a definição

do pólo siderúrgico. Reuniões foram realizadas, debatidas, tudo depois de uma possível

constatação que o Pará não seria o centro das intenções da empresa para instalação do pólo

siderúrgico.

O Liberal publicou diversos artigos sobre a CVRD, alguns deles acusando a

companhia de débitos em relação aos royalties, que, segundo estudo realizado pelo

Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), estão aproximadamente em 226

milhões de reais. Segundo nota na imprensa, a CVRD disse “não concordar com os critérios

utilizados pelo DNPM para a apuração desses valores e, portanto, a CVRD considera que

esses valores não são devidos” (O Liberal, 2003 painel, p. 2).

Por outro lado o DNPM acusa ainda a CVRD de ter ficado anos sem pagar a

taxa de pesquisa. Esta é relativa ao pagamento anual por hectare que o DNPM cobra de todas

as empresas mineradoras que fazem pesquisas geológicas de exploração mineral. Com base

no memorial da empresa o DNPM expede o alvará de pesquisa, e com isso cobra a taxa que

representa R$ 1,06, que contabiliza uma dívida de R$ 13 milhões.

Desde 1998, quando contestou na justiça a cobrança da taxa, a CVRD vinha

depositando em juízo os depósitos relativos ao pagamento da taxa. No início de 2003, a

companhia voltou a pagar ao DNPM.

O Estado do Pará elaborou um documento denominado Agenda Pará

exigindo compensações da CVRD. O documento destaca a verticalização do cobre e do

alumínio no Pará, investimentos em relação ao ferro-gusa, além da construção de 40 mil casas

populares para a população com renda mensal de até R$ 30,00.

Page 181: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

181

Outros 180 milhões de reais (correspondentes em dólares de hoje) estão

incluídos na Agenda Pará para a realização das obras de construção das eclusas de Tucuruí.

Esse documento é uma resposta do Estado e de entidades de classes pela decisão da CVRD de

instalar a fábrica de placas de aço no Maranhão. Caso a CVRD diga não à Agenda Pará,

afirma o governador: “impõe não só uma urgente releitura da realidade paraense por parte da

companhia, mas também uma mudança de comportamento que indique a todo o Pará um novo

momento” (O Liberal, agosto de 2003: atualidades p. 6).

O escritor Benedito Monteiro quando era deputado ressaltou que combateu

o Decreto Lei 1.164 baixado pelo governo militar, que transferiu 75 % das terras públicas do

Estado do Pará para a União. Segundo ele,

O que esse decreto tem a ver com a Companhia Vale do Rio Doce? Tudo, tudo, pois os mais de 400 mil hectares de terras públicas do Pará, que foram doados a essa companhia pelo Governo Federal, não poderiam nem ser vendidos, se obedecesse a legislação de terras estadual. E é nesse verdadeiro latifúndio, particular, que se encontram a maior mina de ferro a céu aberto do mundo e mais jazidas de ouro, manganês, níquel e cobre, que a Vale do Rio Doce já está explorando e lucrando mais, muito mais que todo o Estado do Pará (O Liberal, agosto de 2003, painel, p. 2).

Paraguassu Éleres, o principal questionador das terras que foram doadas à

CVRD, afirmou categoricamente que ajuizou, em 1999, ação popular sobre o

cancelamento do registro imobiliário de 411.948 hectares de terras na província mineral de Carajás, ilegalmente arrecadados pela União, à época da ditadura militar de 1964, e dados gratuitamente à Vale do Rio Doce...A ação popular da iniciativa de pessoa do povo (como facultam a Lei 4.717/1965 e a Constituição de 1988, artigo 5º, LXXIII) não seria ajuizada se em 1996 a procuradoria Geral do Estado cumprisse o que autorizou o procurador-geral Pedro Bentes Pinheiro Filho, formalizando ação sobre a federalização de áreas do Estado ocupadas pela Companhia Vale do Rio Doce (O Liberal, maio de 2003, painel, p. 3).

Desses 411.000 hectares a CVRD tem explorado uma parte, e suas

pesquisas delineiam que serão utilizados outros tantos quantos forem de interesse da

Page 182: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

182

companhia. E Paraguassu Éleres mostra a omissão do poder público, o mesmo poder que hoje

contesta o tratamento dispensado pela CVRD ao Estado do Pará.

A privatização levou ao esquecimento projetos tidos como certos no Pará, e

à mudança de comportamento da companhia em relação ao território em que atua. Municípios

ficaram só na esperança e sem qualquer justificativa aceitável: por que os projeto antes

prioritários ao Estado e da companhia hoje estão no esquecimento, e por que compromissos

assumidos foram esquecidos?

O governador Simão Jatene declarou na imprensa que

o royalty hoje no Pará, na área de tudo que o Pará produz em termos de minérios, para o governo do Estado fica alguma coisa em torno de R$ 1,5 milhão, uma quantia que é absolutamente irrisória. Se nós quiséssemos fazer uma comparação, rápida: vi alguma coisa no jornal que a Companhia Vale do Rio Doce parece que nesse carnaval do Rio gastou alguma coisa em torno de R$ 6 milhões. Ou seja, no carnaval do Rio a Vale gastou quatro vezes mais – e não só a Vale, é maior do que as empresas de mineração deixam no Estado do Pará em um mês (O Liberal fevereiro de 2003, cidade 03).

Não se pode dizer o mesmo em relação aos municípios que recebem os

royalties; na sua maioria os municípios paraenses no sudeste do Estado vivem em precárias

condições e dependem dos repasses dos fundos do governo federal e estadual.

Parauapebas é o maior exemplo da falta de investimentos em setores sociais.

Canaã dos Carajás, que está recebendo o Projeto Mineração Serra do Sossego da CVRD,

também deposita suas esperanças nos royalties e nas arrecadações advindas das empresas que

virão para o município.

Segundo o economista Armando Mendes,

a questão da Vale do Rio Doce que está mexendo tardiamente com os brios dos paraenses, principalmente os das nossas elites políticas, deve ser avaliada com sensatez e sabedoria, para evitar ações que precipitadas e indesejáveis que possam vir a prejudicar ainda mais a dinâmica do desenvolvimento do Estado do Pará...Instalado o projeto, nunca houve interesse dos paraenses de aprofundar a questão e, governo após governo, o projeto ficou como originalmente determinou a elite dominante, sem reação e nenhuma contestação das nossas lideranças políticas regionais, satisfeitas com a montagem e grandeza do projeto e os recursos que os royalties

Page 183: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

183

proporcionariam para engordar o “caixa” do governo. Inebriados com a magnitude do projeto, nossas lideranças não tiveram a curiosidade de saber se tão majestoso investimento contribuiria, na verdade, para desenvolver o Estado, ou se iria repetir, em grau muito mais elevado, os mesmos erros de avaliação do passado com a borracha, que apesar de ser genuinamente amazônida, enriqueceram outros povos e deixou a Amazônia estagnada (O Liberal, março de 2003, painel, p. 2).

Mendes tem razão, as relações de poder que comandam as ações políticas

dos paraenses quase sempre foram desfavoráveis ao Estado do Pará, muito embora tenhamos

representantes nos poderes do Estado Brasileiro. A Amazônia passou por experiências

desastrosas e pouco se tomou como lição, ocorre uma continuação na repetição de erros do

passado quando se trata de falta de planejamento, para o Pará e para toda a Amazônia.

Destarte, a maior experiência que se venha a tirar das relações da empresa

com o Estado é que precisamos evoluir em termos de proposta e de viabilidade econômica,

financeira e social. É necessário conhecermos os recursos naturais que podem contribuir para

o desenvolvimento da sociedade paraense.

O Estado precisa ter um projeto de desenvolvimento não setorizado, mas

que atinja o seu território como um todo. Só teríamos condições de conceber as riquezas e dar

condições às sociedades locais para participarem do desenvolvimento de cada localidade se

viabilizássemos as condições político-econômico-sociais das sociedades locais.

A questão do pólo siderúrgico que se instala no Maranhão parece ser coisa

do passado para o Estado do Pará. O desenvolvimento paraense poderia ser pensado em

termos do presente, e para o futuro é indispensável criar condições para viabilizar a parceria

da CVRD, sem que esta seja o maior interlocutor dos recursos do Pará, o Estado que tem que

ter nos recursos naturais seu poder de barganha.

“Os donos do poder” (FAORO, 2000) são hoje aqueles que recebem

influência dos dirigentes da CVRD, e o Estado um mero coadjuvante na economia dos

recursos minerais, aquele Estado que legitimou a ação da companhia que hoje ele contesta. E

atrelado ao “poder dos donos” (BURSZTYN, 1984), sem uma proposta de desenvolvimento

Page 184: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

184

que envolva a companhia num compromisso de planejamento, a partir dos recursos que dele

ela extrai, o Estado faz com a CVRD uma parceria para se atingir o desenvolvimento das

sociedades atingidas pelos seus projetos.

Enquanto a elite paraense manifesta seu descontentamento com a empresa,

para o Maranhão ela dirige todo o seu potencial de parque industrial, não só na instalação do

pólo siderúrgico, mas na construção do píer de seu porto no Maranhão, para aumentar a

capacidade dos navios. Segundo a ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney, “o novo

investimento reafirma a confiança da Companhia Vale do Rio Doce no Maranhão”. Segundo

a matéria do jornal O Liberal, quando entrar em funcionamento em 2004, a capacidade do

terminal portuário aumentará de 56 milhões de toneladas para 85 milhões a capacidade do

porto de Ponta da Madeira no Maranhão, com isso estima-se que a quantidade de navios

chegue a 50 por mês.

Segundo jornal O Liberal,

de acordo com a Companhia Vale do Rio Doce, a construção do novo píer é parte de um plano de expansão da capacidade portuária para atender à demanda de movimentação de granéis sólidos, como minério de ferro, manganês, ferro gusa, soja, e ainda a exportação de pelotas. O Píer III terá no início 364 metros de comprimento e 18 metros de largura, com capacidade de carregamento de oito mil toneladas/hora e calado de 21 metros. A segunda fase compreende o complemento das obras civis e ampliação do cais para 580 metros (O Liberal, fevereiro de 2003, painel p.02).

A CVRD prepara-se para ampliar sua exploração mineral no Pará, e prepara

sua infra-estrutura para receber essa produção no Maranhão. A elite paraense diz que em troca

recebe a migração que passa a ocupar o território do sul/sudeste paraense, e o minério fica no

Maranhão. A contradição está na crença de que a economia do minério irá trazer sozinha o

desenvolvimento para os dois Estados. Nesses anos todos em que a companhia vem

explorando o minério na região amazônica pouca coisa mudou, em se tratando da melhoria

das condições e qualidade de vida daqueles municípios que estão sob a área de influência da

empresa nos dois Estados.

Page 185: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

185

Outro fato importante é que a preparação da segunda fase do porto de Itaqui

e Madeira no Maranhão proporcionará à CVRD receber a atracação do maior graneleiro do

mundo, “Berge Stahl”. Hoje o único porto que recebe com capacidade para até 360 mil

toneladas de carga é o de Rotterdã, na Holanda.

Enquanto o Pará vai à imprensa e denuncia, o Maranhão prepara seu espaço

e a infra-estrutura de seu território abrindo possibilidades de novos empreendimentos da

CVRD. Nesse ínterim, parece que a questão locacional favorece as proximidades do Porto,

que recebe cada vez mais infra-estrutura e se moderniza para novos tempos de globalização e

de inserção da empresa no mercado internacional.

Segundo Lúcio Flávio Pinto,

incapaz de detectar as situações no momento mesmo em que elas são criadas e de ter um domínio da extensão dos processos que aqui emergem na figura dos “grandes projetos”, usando, por isso, uma agenda desatualizada, a Amazônia talvez só venha a se dar conta de sua história cotidiana, no que ele tem de contemporânea, quando o tempo, como o trem simbólico, sempre usado para definí-lo, tiver passado (Pinto, 1997: p.84).

Há alguns anos a afirmação de Lúcio Flávio estava relacionada à pergunta

que aqueles que comandam a economia e os rumos do desenvolvimento no Estado do Pará

não queriam responder. Hoje ela é uma certeza; a realidade com os processos de poder que

vieram junto com os interesses de um grande grupo de mineração, a Companhia Vale do Rio

Doce, aos poucos suplantou o poder do Estado paraense e até mesmo o nacional. A CVRD

multifacetou e criou sua hegemonia no território que ela domina em Carajás, direcionando

seus interesses muito diferentes dos interesses do Estado do Pará.

Uma outra questão relevante está relacionada ao papel das siderúrgicas que

atuam em Marabá. Depois de decidido o pólo siderúrgico para o Maranhão, a Companhia

Page 186: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

186

Vale do Rio Doce anunciou a join-venture26 com uma empresa norte-americana Nucor. A

CVRD deverá vender minério de ferro para a empresa norte-americana, que o transformará

em ferro-gusa e o exportará para sua matriz nos Estados Unidos, onde será transformado em

aço. Pelo projeto será construída uma usina em Marabá. Segundo o presidente da ASICA,

Nacib Hetti:

as treze siderúrgicas que fazem parte da ASICA27 vendem 70% do ferro-gusa fabricado para a Nucor, que importa tudo para sua matriz nos Estados Unidos. Com esta associação, a Vale e a Nucor produzirão todo ferro-gusa, retirando a maior parte do nosso mercado e iniciando a criação de um outro monopólio (O Liberal, agosto de 2003, painel, p.06).

Segundo o diretor comercial da área de minério de ferro da Companhia Vale

do Rio Doce, Nelson Silva,

esta notícia é velha e isso já foi anunciado há seis meses. No entanto, a nova empresa não destruirá o setor porque vai produzir 350 mil toneladas de ferro-gusa por ano. Lá em Carajás, as demais empresas produzem dois milhões de toneladas por ano. O que vai mudar é algo muito simples: surgirá a 14ª siderúrgica, porém, que não representará nenhuma ameaça a ninguém. As trezes siderúrgicas que fazem parte da ASICA compram, por ano, da própria Vale, 3,5 milhões de toneladas de ferro. Querer acabar com esse mercado é dar um tiro no pé (O Liberal, agosto de 2003, painel p.06).

Estudos realizados pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura

(CREA-PA) indicam a possibilidade de construção de mais usinas no Pará, uma de placas de

ferro e outra para produção de blocos, tarugos e aços longos. Segundo o geólogo Evaldo Pinto

da Silva, “a produção do Maranhão está estimada em 3,7 milhões de toneladas/ano, enquanto

a demanda mundial de placas hoje é de 26 milhões de toneladas/ano e a previsão para o ano

de 2010 é de 35,5 milhões de toneladas/ano” (O Liberal, agosto de 2003, painel, p. 07).

Outro grande empreendimento que vem sendo realizado no Pará é o projeto

MSS da CVRD. Segundo Raphael Bloise da CVRD,

26 Segundo Paulo Sandroni (1999) “expressão em inglês que significa “união de risco” e designa o processo mediante o qual pessoas, ou, o que é mais freqüente, empresas se associam para o desenvolvimento e execução de um projeto específico no âmbito econômico e/ou financeiro” (SANDRONI, 1999. p. 315). 27 Associação das Siderúrgicas de Carajás (ASICA) congrega treze siderúrgicas: 8 estão no Estado do Maranhão e 5 no Estado do Pará.

Page 187: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

187

O Sossego é o primeiro projeto dos muitos que estão nos planos de implantação da Companhia Vale do Rio Doce e a previsão de entrada de operação é para o final de março de 2004. O projeto tem duração de 20 anos, conforme as pesquisas que até então efetuamos. Entretanto, a variação de preço, novas pesquisas ou outros fatores, podem fazer a perspectiva aumentar. A produção será 150 mil toneladas de cobre metal ano, além de um subproduto que é o ouro. O ouro é encontrado na mina agregado ao minério de cobre, na ordem de 0,03 grama por tonelada de cobre (Correio do Pará, maio de 2003, p.07).

Além da MSS, Canaã dos Carajás terá o projeto Alvo 188. Outros projetos

de cobre seguirão: Cristalino em Curionópolis, Igarapé Bahia e Alemão em Parauapebas e

Salobo em Marabá completam o projeto cobre da CVRD no Pará. Em 2007 estarão todos

funcionando com uma produção estimada de 768 mil toneladas de concentrado de cobre por

ano e 261 mil toneladas de cobre catodo, com isso o Brasil deixará de ser depende da

importação do minério. A CVRD será uma das maiores empresas produtoras de cobre, e o

Brasil um dos cinco maiores produtores do minério.

Segundo o Relatório Social da CVRD,

para Carajás foi destinado cerca de 74% do orçamento de 2002, contemplando as atividades de cobre, níquel, ouro, metais do grupo da platina e manganês. Para o restante do Brasil foram desembolsados US$ 10,6 milhões. No estado do Pará, excluindo-se Carajás, focou-se em caulim - na bacia do Rio Capim - e bauxita - na região de Paragominas. O programa de exploração para cobre incluiu os estados do Ceará, Piauí e Pernambuco. Na pesquisa do ouro, priorizou-se os estados de Mato Grosso e Goiás. Para o níquel, o programa abrangeu alguns estados das regiões Nordeste e Sudeste. (Relatório Social da CVRD 2002).

Grande parte dos investimentos a CVRD destinou para Carajás, mas pouco

está relacionada à verticalização da mineração no Pará. O minério continua saindo quase que

in natura, sendo agregado pouco valor ao produto. Com isso o Estado deixa de arrecadar, e a

sociedade local acaba não sendo beneficiada pelos investimentos realizados pela companhia

conforme deveria ser.

Todos os investimentos que foram feitos pela companhia são importantes,

não podemos negar sua contribuição, muito embora essa contribuição só agora seja

questionada, ou seja, só agora aqueles que comandam a vida política do Estado perceberam

Page 188: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

188

que não bastam somente esses projetos sociais28, tem que haver muito mais para gerar o efeito

multiplicador na região de Carajás e assim beneficiar a sociedade local.

Desde que saiu o primeiro carregamento de minério de ferro do território

paraense, essa região mudou completamente suas relações econômicas com a empresa e seus

diferentes atores sociais que estão presentes no sudeste paraense. Atraídos pelos projetos,

migrantes, empresas e empresários vieram em busca dos investimentos que a CVRD estava

fazendo em Carajás.

A CVRD montou sua base logística em Carajás, em São Luís e em Belém, a

Docegeo e uma base administrativa. Depois da sua privatização a empresa desativou quase

tudo na capital paraense. Aos poucos a CVRD foi transferindo todas as suas bases de Belém

para São Luís, deixando apenas um de seus funcionários, o diretor de marketing David Leal,

num pequeno escritório. O desmonte realizado pela empresa na capital paraense era

irreversível, a empresa não tinha mais nenhuma razão para continuar em Belém, sua ligação

permanecia apenas com seus projetos que estão localizados nos municípios paraenses.

Segundo o ex-deputado estadual Oswaldo Mello,

aqui em Belém já funcionou uma unidade administrativa da Fundação Vale do Rio Doce, que em determinada época chegou a abrigar cerca de 40 funcionários. Pois bem, essa unidade foi desativada, os funcionários demitidos e suas atribuições transferidas para a unidade com isso fortalecida – instalada em São Luís do Maranhão. Sediado em Belém, o distrito Amazônia da Docegeo, empresa responsável pelas mais importantes descobertas minerais ocorridas até hoje em território paraense, chegou a ter perto de 1.300 funcionários, entre geólogos, pesquisadores, técnicos de diversas áreas e pessoal de apoio administrativo. Pois bem a base local da Docegeo – a exemplo dos demais distritos administrativo – acabou sendo extinta, e da empresa sobrou apenas um núcleo central, sediado próximo a Belo Horizonte. Alguns poucos geólogos foram transferidos para Carajás, mas o restante do pessoal foi sumariamente demitido. Daqui não se salvou nem o laboratório, um dos mais sofisticados do país em ensaios geológicos (O Liberal, março de 1999. Painel, p. 4).

28 Não temos os valores que são investidos em projeto sociais no Pará, mas certamente são pouco representativos no conjunto do lucro da CVRD. Na sua maioria, são projetos paliativos, que não resolvem os problemas sociais.

Page 189: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

189

Quando a elite paraense se deu conta, a CVRD apenas continuava no Pará

em razão de seus projetos, pois as minas não se deslocam de lugar. A CVRD aos poucos

também está indo embora e leva consigo a maior riqueza do subsolo paraense, seus minérios.

Através de seu acelerado volume de exploração e tecnologia, aos poucos a empresa carrega

para o exterior riquezas das jazidas que a natureza formou durante um longo período

geológico. Como já ressaltou Stephen Bunker (1985), o que mudará nessas economias

extrativistas será a aceleração do ritmo de exploração, como se pode visualizar na falta de

verticalização da produção de minérios em Carajás.

Segundo esse autor:

Há uma distinção entre “economias de produção” e “economias extrativas” de recursos naturais. Estas últimas, típicas de sistemas econômicos como o amazônico, envolvem a exportação de produtos com baixa incorporação de trabalho e de capital fixo ao valor. As diferenças entre o dinamismo interno dos modos de extração e dos modos de produção criam uma troca desigual, não somente em termos de valor de trabalho incorporado na produção, mas também através da apropriação direta, principalmente de recursos não-renováveis, sujeitos ao rápido esgotamento. Nesse contexto, o subdesenvolvimento é a materialização, no tempo e no espaço, de um avanço na degeneração de processos físicos e sociais (BUNKER apud COELHO, 1997, p. 53-54).

Embora ocorra um aumento nas exportações do Pará, esse crescimento

econômico não vem acompanhado pela modernização da indústria, nem pela ressonância

econômica nos municípios, traduzidos em qualidade de vida para suas populações.

Nada garante que o Pará, cada vez mais um Estado Minerador, possua e

tenha como base somente esse tipo de economia para seu desenvolvimento. Torna-se

necessário criar estratégias de desenvolvimento em outras escalas, como por exemplo

aproveitar o potencial agrícola do Estado.

A indústria que permanece em Carajás, seja ela da CVRD, sejam suas

associadas, bem como as que prestam serviço ou são parceiras da companhia, não têm

apresentado significativos avanços na criação de pólos de desenvolvimento (que não deram

Page 190: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

190

certo na região) nem acarretado benefícios à sociedade local. Pelo contrário, em se tratando

das guseiras, a floresta da região corre risco de total desaparecimento, pois não ocorre

reflorestamento para se obter o carvão vegetal. Muitas vezes são trabalhadores rurais que em

seus lotes utilizam a economia do carvão e vendem para guserias de Marabá, colocando em

risco seu próprio futuro. É comum passar pela Transamazônica e entrar em um dos diversos

ramais que levam a assentamentos rurais e comunidades que associam a agricultura à prática

de comercialização do carvão com as guserias, sem qualquer projeto de reflorestamento.

Nesse sentido, a industrialização acabou fazendo na economia capitalista

uma verdadeira mudança de valores, pois a industrialização virou sinônimo de

desenvolvimento. Segundo Altvater (1995), o desenvolvimento é contrário ao meio ambiente,

pois transforma numa desordem aquilo que a natureza levou milhões e milhões de anos para

deixar no estado em que se encontra hoje. O tempo da natureza e do capital são incompatíveis

nesse caso.

Assim a CVRD, ao se apropriar das diversas jazidas que explora, coloca em

risco o desenvolvimento do Estado do Pará. A matéria-prima necessita ser beneficiada senão

há agregação de valor, e há outras perdas além das econômicas. Por outro lado, segundo

Maria Célia Nunes Coelho,

em decorrência de sua ainda reduzida atuação regional, a CVRD vem sendo pressionada a ampliar sua participação no desenvolvimento local/regional. À CVRD interessa participar da elaboração de planos junto ao governo estadual que lhe possibilitem aumentar o sucesso de seus empreendimentos locais (COELHO, 1997, p.76).

Suas relações com Estado e municípios foram mudando, a partir de sua

privatização. Embora tenha interesse em manter sua imagem de companhia que tem

responsabilidade e quer manter cordialidade com quem negocia, a empresa radicalmente

mudou seu comportamento em relação às suas prioridades para diminuir custos e aumentar

seus lucros, e de certa forma ocorreu uma omissão dos representes do poder público paraense.

Page 191: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

191

A CVRD desconsiderou as manifestações que os paraenses fizeram e vêm fazendo contra as

decisões que ela vem tomando agora diferentemente da época quando 51% de suas ações

pertenciam ao governo brasileiro.

Não foi só a privatização da empresa que acelerou esse processo. Embora

seja o fator primordial, as flutuações da economia mundial junto com a busca de novas fontes

energéticas no planeta aceleram a viabilização dos interesses da CVRD. Também as

prioridades da economia globalizada, na busca de cobre, ouro, manganês e mais ferro,

favoreciam certos investimentos em capital estrangeiro na Amazônia. Não se pode

responsabilizar a CVRD pela gestão municipal, mas pode-se cobrar dela e do próprio Estado

do Pará parcerias efetivas que viabilizem no município, não só a economia extrativista mas o

desenvolvimento de sua sociedade local.

Nesse sentido segundo Oswaldo Mello,

no Estado que contribui para seu enorme faturamento e lhe garante lucros fantásticos – no ano passado foram mais de US$ 1 bilhão – a Vale deixa apenas buracos e nenhum beneficio. Os empregos para os profissionais locais são muito poucos e limitados quase que exclusivamente aos serviços gerais, que têm os mais baixos padrões de remuneração. A empresa, que no passado recolhia aos cofres estaduais em média R$ 7 milhões por mês em impostos, hoje recolhe em torno de R$ 300 mil, beneficiada que foi pela Lei Kandir, que desonerou de impostos as exportações (O Liberal, março de 1999. Painel, p. 4).

A Lei Kandir (de setembro de 1996) impactou significativamente a

economia do Pará no que diz respeito às exportações, diminuindo as contribuições que a

CVRD depositava todo mês para o Estado. A implantação dessa lei trouxe um conjunto de

medidas que não só oneraram a economia do Estado, mas também aumentaram as intenções

da companhia, em parceria com suas associadas, de instalar novos projetos de exportações no

território paraense e de beneficiamento no Maranhão, com destino ao mercado internacional,

como no caso das placas de aço para o mercado Chinês. Alguns defendem que esses

Page 192: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

192

incentivos de que a CVRD dispõe tornam a empresa também competitiva no mercado

globalizado.

Segundo Maria Célia Nunes Coelho,

a inclusão do Imposto Único Sobre Minerais/IUM no imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços/ICMS e, posteriormente a Lei complementar 087, de setembro de 1996, acarretaram perdas na arrecadação do ICMS sobre os recursos extraídos do subsolo, aumentando-lhes a dependência da União, suas insatisfações e conflitos com grandes empresas mineradoras. Dessa forma, o minério continua a sair dos Estados sem provocar a tão propalada integração vertical e sem instrumentos de política que levem à geração dos efeitos fiscais que poderiam conferir capacitação financeira aos Estados de investir em áreas que fossem avaliadas como estratégicas ao seu desenvolvimento (COELHO, 2000, p.144).

De uma maneira ou de outra, não é com punição que se vai resolver o

problema da verticalização da produção mineral, que conta com várias dificuldades para ser

viabilizada no território paraense, mas com planejamento associando a economia do ferro às

demais economias do Estado e viabilizando o projeto de desenvolvimento para o Estado do

Pará, tendo na CVRD um de seus principais parceiros para novos investimentos na região

sudeste paraense e no Estado.

Outra questão a ser definida está relacionada à área sob influência da

CVRD. Falamos de área sob influência, não área de influência, pois muitos dos projetos da

CVRD extrapolam os territórios dos municípios que os abrigam influenciando outras áreas de

outros municípios.

O jornal O Liberal de março de 1998 publicou uma matéria sobre a venda da

CVRD na qual destacou que os municípios que seriam beneficiados pela venda da companhia,

através do Fundo para o Desenvolvimento Regional com Recursos da Desestatização (FDR)

em substituição ao Fundo de Desenvolvimento da CVRD, seriam treze municípios no Pará:

Parauapebas, Marabá, Curionópolis. Eldorado do Carajás, Bom Jesus do Tocantins,

Page 193: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

193

Itupiranga, Abel Figueiredo, Nova Ipixuna, Rondon do Pará, São Domingos do Araguaia, São

João do Araguaia, Água Azul do Norte e Brejo Grande do Araguaia.

Maria Célia Nunes Coelho a esse respeito destacou que

o poder de barganha dos Estados e municípios nas negociações com a CVRD estatal foi sempre reduzido. Ás vésperas de sua privatização, por pressões dos governos estaduais, ela destinou 8% de seu lucro líquido anual à aplicação em projetos sociais nos municípios da área de sua influência. A relação da CVRD com o desenvolvimento destes municípios deixou de existir como obrigação. Como forma de compensação, foi criado o Fundo para o Desenvolvimento Regional com Recursos da Desestatização/FDR, de R$ 200,9 milhões, a ser administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social/BNDES. Do valor de R$ 200,9 milhões, R$ 85 milhões são oriundos do patrimônio da estatal (o equivalente ao estoque de investimentos da CVRD no setor social) e o restante do orçamento do banco. A cada balanço anual da CVRD, uma parcela do FDR deveria ser liberada (COELHO, 2000, p. 144).

Há um questionamento em virtude de novos empreendimentos a serem

instalados pela CVRD, por exemplo Canaã dos Carajás com o Projeto Mineração Serra do

Sossego, ampliando assim a área sob influência da CVRD. Novos estudos deverão ser feitos

para definir de fato quais seriam as áreas sob influência da companhia no Pará para beneficiar

esses municípios.

Enquanto não se definir essa questão, o Estado paraense precisa elaborar

metas de desenvolvimento que contemplem a empresa como um de seus parceiros, e não a

tomem como inimiga, como querem alguns políticos, que sempre foram omissos, e quando

puderam interferir numa melhor definição do papel da companhia em território paraense nada

fizeram.

As relações de poder que definem práticas espacializadas tanto da empresa

como do poder público precisam ser revistas, a fim de se criarem condições de negociações

entre as partes envolvidas e os representantes da sociedade civil. O território assim torna-se

um campo onde atuam diferentes forças, que condicionam práticas diferenciais de atores

sociais em busca de seus anseios. Essas práticas tornam-se opressoras para outros atores

Page 194: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

194

sociais quando eles se sentem prejudicados por elas. O campo de poder que se forma é

marcado por conflitos de interesses, nesse caso entre a companhia e representantes da

sociedade civil.

Agora como uma empresa privada, não podendo omitir-se do papel que a

consagrou com uma empresa que recebeu o aval de organismos financeiros internacionais

pelo papel que desempenhava na região, quando ainda era empresa estatal, a CVRD

apresentando-se como aquela empresa que cuida do meio ambiente, que investe em projetos

sociais e que, de uma forma ou de outra, mantém diálogo com aqueles que querem com ela

debater.

A empresa não pode ter apenas a imagem de uma companhia que cumpre

com suas obrigações financeiras sem ter nas formas de implantação de seus projetos os

benefícios para as sociedades locais o que garante respeito no mercado internacional. Deve

preocupar-se com os impactos sócio-ambientais na sua área de atuação.

Por isso, com os pagamentos dos royalties a CVRD equipou a cidade de

Parauapebas de infra-estrutura e em outros municípios fez parcerias para tratamento de água,

construção de escolas, e outros investimentos. De alguma forma, a CVRD tem participado,

muito embora a maioria desses projetos tenham como mentor a própria companhia, já que

muitos municípios deixam nas mãos da empresa o papel de elaboração e realização do

projeto.

Dessa forma, aos poucos a empresa assumiu, sem a menor pretensão, o

papel que deveria ser do Estado e do município. Antes tudo começava e terminava na CVRD,

ela decidia quem contratava e elaborava as formas pelas quais seriam realizados seus projetos

sociais que estariam em benefício dos municípios que tinha como parceiros.

O poder que a empresa aos poucos foi conquistando ultrapassou seu poderio

econômico na região. Alguns de seus funcionários ou ex-funcionários tornaram-se

Page 195: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

195

empregados do poder público nos municípios em que a empresa atuava, e outros tantos

acabavam sendo confundidos com aqueles que tinham poder dentro do município.

O século XXI começa com os mesmos conflitos do passado, agravados pela

falta de transparência de ambas as partes, Estado e empresa, na definição de suas prioridades

no território que está sob seus domínios. As sobreposições de territórios e de domínios deixam

claros os diversos conflitos que surgem envolvendo diferentes setores da sociedade civil. A

resolução desses conflitos passa pela definição de prioridades e do grau de desenvolvimento

que cada um terá em relação ao território de seu domínio ou de sua influência, sem

desconsiderar outras partes.

Sejam eles MST, empresa de mineração, siderurgias, castanheiros, há

necessidade de uma definição clara e de uma reavaliação do uso do território em Carajás.

Como já ressaltaram Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), é o uso do território que

interessa. Nesse caso os recursos que estão disponíveis no território e sua utilidade respondem

a sua função social e econômica na definição do projeto de desenvolvimento da sociedade de

Carajás.

Neste caso, a ordem que faz surgir é a de um conflito de interesses quando

observamos espaços dos municípios que estão sob área de mineração em Carajás. Esses

municípios são “escolhidos” pelas empresas mineradoras para efetivarem seus projetos.

Enquanto isso outras áreas, que são potencialmente virtuais para possíveis projetos, que não

fazem parte direta do conjunto de interesses da grande empresa, ficam momentaneamente

excluídas do processo de organização econômica do território. A organização territorial que

envolve outros atores sociais, como é o caso de Carajás, acontece pela forma de conflito

envolvendo diferentes interesses e atores sociais que não estão diretamente ligados à empresa

de mineração.

Page 196: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

196

Dessa forma, há um ponto no território no qual emanam energias em várias

direções com variáveis diferenciadas e com maior ou menor grau de poder e interferência na

organização territorial local. A existência de locais que a empresa seleciona como espaços

potenciais para sua operação gera conflitos de interesses com outros atores sociais que, direta

ou indiretamente, são afetados por esses projetos.

A organização territorial, na atualidade (2003), passa pela regulação

econômica do território em Carajás; são as práticas globalizadas de uma única empresa –

CVRD - que organiza, a partir do mercado internacional, o território econômico, os espaços

potenciais a serem palcos de projetos virtuais ou efetivamente instalados para a inserção de

Carajás num mundo econômico globalizado. A globalização, nesse aspecto, é a globalização

da economia num ponto do território, aquele que a empresa projeta e define como seu

território e o une à escala global e local, o que, por sua vez, passa por formas de governos

municipal, estadual ou federal.

Page 197: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

197

7 – Bibliografia ABREU, José Coelho da Gama. As regiões amazônicas: estudos chorographicos dos Estados do Gram Pará e Amazonas. Belém: SECULT, 1992. AFONSO, R. B. A; SILVA, P. L. B (Orgs.). Federalismo no Brasil: reforma tributária e federação. São Paulo: UNESP, 1995. ALTVATER, Elmar. O Preço da Riqueza. São Paulo: UNESP, 1995. ANDRADE, Manuel Correia de. As raízes do separatismo no Brasil. São Paulo: UNESP, 1999. ANDRADE, Regis Castro (Org.). Processo de Governo no Município e no Estado. São Paulo: EDUSP, 1998. ARENDT, Hannah. Entre o Passado e o Futuro. São Paulo: Perspectiva,1968. ARENDT, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994. ARISTÓTELES. Política. Trad. Mário Kury. 3. ed. Brasília: UNB, 1997. ARRIGHI, Giovani; SILVER, Beverly. Caos e governabilidade no moderno sistema mundial. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto/UFRJ,2001. 334 p. ARRIGHI, Giovanni. A Ilusão do Desenvolvimento. Petrópolis: Vozes, 1998. ASSEMBLÉIA Legislativa do Pará. Comissão especial de Estudos das Possibilidades Econômicas e Administrativas de Emancipação das Sub-Regiões Tapajós e Carajás. Relatório Geral. Belém, 1995. ASSOCIAÇÃO Independente dos Fiscais de Tributos do Estado do Pará. Pará Fiscal. Belém: ASIFEPA, 1997. n.116. AZEVEDO, J. L. Os Jesuítas no Grão-Pará: suas missões e a colonização. Belém: SECULT, 1999. BADIE, Bertrand. O fim dos territórios. Lisboa: Instituto Piaget, 1995. BANDECCHI, Brasil. O Município no Brasil e sua função política. 5. ed. São Paulo: Pannartz, 1983. BARROSO, J. R (Coord.). Globalização e Identidade Nacional. São Paulo: Atlas,1999. BAUMAN, Z. Z. Em Busca da política. Rio de Janeiro: Zahar, 2000. BENATTI, J. H. Carajás: desenvolvimento ou destruição? In: COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (Orgs.). 10 anos da estrada de ferro Carajás. NAEA/UFPA, 1997. p. 79-106.

Page 198: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

198

BENJÓ, ISAAC. Fundamentos de Economia da Regulação.Rio de Janeiro: THEX, 1999. BIAREZ, Sylvie. Le povoir local. Paris: Econômica, 1989. BOBBIO, N.; MATTEUCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: UNB, 1998. v.1, v.2. BOBBIO, Norberto. Estado, gobierno y sociedad: por una teoría general de la política. México: Fundo de Cultura Econômica, 1996. BOBBIO, Norberto. Igualdade e Liberdade.Rio de Janeiro:Ediouro, 1997. BOBBIO, Norberto. O Conceito de Sociedade Civil. Rio de Janeiro: Graal, 1982. BOURDIEU, P. Campo de poder, campo intelectual e habitus de classe. In: A Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1992. BOURDIEU, P. O poder simbólico. Lisboa: Difel, 1998. BOURDIN, Alain. A questão local. Tradução Orlando dos Santos. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. BOURRICAUD, F. et al. La oligarquia em el Peru: ensaios y una polemica. Lima: Instituto de Estudios Peruanos, 1969. BOYER, Robert. A Teoria da Regulação: uma análise crítica. São Paulo: Nobel, 1990. BOZZANO, Horacio. Territorios Reales, Territorios Pensados, Territorios Posibles: aportes para una teoría territorial del ambiente. Buenos Aires: Espacio, 2000. BRANDÃO, J. S. As origens de Marabá. São Sebastião do Paraíso: Chromo Arte, 1998. BRASIL Mineral. A Integração de Carajás. Ano IV. n.28. março de 1986. BRASIL Mineral. Para Onde Vai a Vale. Ano V. n.43. Junho de 1987. BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Notas remissivas e textos integrais das emendas constitucionais. São Paulo: Saraiva, 2001. BRASILEIRO, A. O Município como Sistema Político. Rio de Janeiro: FGV, 1973. BUENO, Ricardo. Entregando o Ouro (e o ferro, nióbio, etc.) para os Bandidos. In: BUENO. Ricardo (Coord). O ABC do Entreguismo no Brasil. Rio de Janeiro: Vozes, 1984. p. 125-139. BUNKER, S. G; COELHO, M. C. N; LOPES, A. G. Ferro, Castanha-do-Pará e a Luta pela Terra: o em torno de um projeto de mineração na Amazônia. In: PALHETA DA SILVA, J; SILVEIRA, M. R (Orgs.). Geografia Econômica do Brasil: temas regionais. Presidente Prudente: UNESP, 2002. p.15-40. BURSZTYN, Marcel. O Poder dos Donos. Petrópolis: Vozes, 1984.

Page 199: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

199

CADERNOS da AMAT. Hidrovia Tocantins-Araguaia: caminhos do desenvolvimento. Belém: AMAT, 1996. CÂMARA Municipal de Belém. Visita ao projeto Carajás. Abril de 1995. CARAJÁS. Mesa redonda Internacional – Relatório. Fórum Carajás, 1995. CAREPA, A. J. Um Novo Modelo de Desenvolvimento para a Amazônia. Brasília: Senado Federal, 2003. CASTELLS, M. O Poder da Identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999. CASTRO, Edna M. R; HÉBETTE, Jean (Org.), Na Trilha dos Grandes Projetos: modernização e conflito na Amazônia. Belém: UFPA/NAEA, 1989. CASTRO, I. O Mito da necessidade.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992. CHANLAT, Alain ; FACHIN, Roberto (Orgs.). Governo municipal na América Latina: inovações e perplexidades. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 1998. CLAVAL, Paul. Espaço e Poder. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. COELHO, Maria Célia Nunes. Sócio-economic impacts of the Carajás railroad in Maranhão – Brasil. Syracuse (USA): Syracuse University, 1991. (Tese de Doutoramento). COELHO, Maria Célia Nunes; COTA, Raymundo Garcia (Orgs.). 10 Anos da Estrada de Ferro Carajás. NAEA/UFPA, 1997. COLETÂNEA de Darcy Ribeiro. Formas e sistemas de governo. Petrópolis: Vozes, 1993. COMPANHIA Vale do Rio Doce. Atividades no Pará. Rio de Janeiro: CVRD, 2003. COMPANHIA Vale do Rio Doce. Carajás Atualizado. CVRD, 1995. COMPANHIA Vale do Rio Doce. Relatório Anual. Rio de Janeiro: CVRD, 1994. COMPANHIA Vale do Rio Doce. Relatório Social. Rio de Janeiro: CVRD, 2002. COMPANHIA Vale do Rio Doce. The Carajas Experiences. Rio de Janeiro: CVRD, 1993. CORRÊA, Roberto L. Região e Organização Espacial. São Paulo: Ática, 1990. COTA, Raymundo Garcia. Carajás: a invasão desarmada. Petrópolis: Vozes, 1984. CRUZ NETO, R. G; GRUDA, J. P. Sudeste do Pará: uma estudo de sua história. Vol. I. Marabá: CEPASP, 1990. CUNHA, Euclides da. Um Paraíso Perdido: ensaios, estudos e pronunciamentos sobre a Amazônia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986.

Page 200: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

200

DA MATTA, Roberto; LARAIA, Roque de Barros. Índios e castanheiros: a empresa extrativista e os índios no médio Tocantins. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. DAHL, R. La poliarquia: participacion y oposocion. México: Rei, 1993. DANIEL, Celso. Poder local no Brasil urbano. In: Espaço & Debates: Revista de Estudos Regionais e Urbanos. n.24. p. 27-39, 1988. DAVIDOVICH, F. Poder local e município: algumas considerações. In: Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro, n.27, p. 5-14, jan/mar. 1993. DELEUZE, G; GUATTARI, F. O que é a filosofia. Rio de Janeiro: Editora 34, 1997. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Anuário Mineral Brasileiro. Brasília: DNPM, 1997. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Balanço Mineral Brasileiro. Brasília: DNPM, 2001. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Boletim informativo – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). Brasília: DNPM, outubro de 2002. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Informe Mineral. Brasília: DNPM, 2000. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Informe Mineral. Brasília: DNPM, 2003. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Sumário Mineral. Belém: DNPM/ SEICOM, 1999. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Tributação Mineral no Brasil. Brasília: DNPM, 2000. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Universo da Mineração Brasileira: a produção das 1.372 minas no Brasil. Brasília: DNPM, 1997. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Universo da Mineração Brasileira: a produção das 1.862 minas no Brasil. Brasília: DNPM, 2000. DEPARTAMENTO Nacional de Produção Mineral. Universo da Mineração Brasileira: a produção das 1.704 minas no Brasil. Brasília: DNPM, 1999. DESCARTES, René. Discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes, 1996. DEUTSCH, Karl. Política e Governo. Brasília: UNB, 1983.

Page 201: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

201

DREIFUSS, René. Política, Poder, Estado e Força: uma leitura de Weber. Petrópolis: Vozes,1993. DURKHEIM, E. As Regras do Método Sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 1995. DUTRA, Manuel. O Pará Dividido: discurso e construção do estado do Tapajós. Belém: NAEA/UFPA, 1999. EMMI, Marilia. F. A oligarquia do Tocantins e o domínio dos castanhais. Belém: NAEA/UFPA, 1988. ENGELS, F. A Dialética da Natureza. Rio de Janeiro, 1979. ENGELS, F. A Questão da Habitação. Belo Horizonte: Aldeia Global, 1979. ENGELS, F. Anti-Duhring. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. ESTERCI, Neide. Conflito no Araguaia: peões e posseiros contra a grande empresa. Petrópolis: Vozes, 1987. FAORO, R. Os Donos do Poder: formação do patronato político brasileiro. São Paulo: Globo; Publifolha, 2000. 10ª ed. v. 1 e 2. (Grandes Nomes do Pensamento Brasileiro). FELICÍSSIMO, J. R; BARRETO. M. I (Coord.). Superando Fronteiras. São Paulo: FUNDAP, 1998. FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de teoria geral do estado e de ciência política. 2a ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. FISCHER, T. Poder local: um tema em análise. In: Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro. v. 4, n.26, p. 105-113, out.dez. 1992. FORBES, D. K. Uma Visão Crítica da Geografia do Subdesenvolvimento. Bertrand Brasil, 1989. FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979. FUNDAÇÃO Prefeito Faria Lima – CEPAM. O Município no Século XXI: cenários e perspectivas. Ed. Especial. São Paulo: CEPAM, 1999. GALVES, Carlos. Manual de Economia Política Atual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993. GAZETA Mercantil. A Recompensa da Terra - Pará. Gazeta Mercantil, 1998. GAZETA Mercantil. Balanço Anual – Pará. Gazeta Mercantil, 2001. GOMES, G. M; Mac DOWELL, M. C. Descentralização Política, Federalismo Fiscal e Criação de Municípios: o que é mau para o econômico nem sempre é bom para o social. Brasília: IPEA, 2000.

Page 202: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

202

GONÇALVES, Reinaldo. Globalização e Desnacionalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999. HAESBAERT, Rogério. Des-territorialização e Identidade: a rede “gaúcha” no nordeste. Rio de Janeiro: EDUFF, 1997. HAESBAERT, Rogério. Territórios Alternativos. São Paulo: Contexto, 2002. HÉBETTE, Jean (Org.). O Cerco Está se Fechando. Belém: NAEA/UFPA, 1991. HESPANHOL, Nivaldo. A atuação do Estado no processo de desenvolvimento brasileiro. In: FCT 40 anos. MENEGUETTE JÚNIOR, Messias; ALVES JÚNIOR, Neri (Orgs.). Presidente Prudente: UNESP/FCT, 1999. p. 21-41. HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. Tradução Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002. INSTITUTO Brasileiro de Administração Municipal. Municípios. 2003. INSTITUTO Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Perfil dos Municípios Brasileiros – Pesquisa de Informações Básicas Municipais. IBGE, 1999. LAVINAS, L.; CERLEIAL, L, M, F.; NABUCO, M. R (Orgs.). Integração, Região e Regionalismo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1994. LEDRUT, R. Política urbana e poder local. In: Espaço & Debates. São Paulo: Cortez. 1981. n.3, ano 1, set. LEFEBVRE, Henri. A Re-Produção das Relações de Produção. Porto: Escorpião, 1973. LEFEBVRE, Henri. A revolução Urbana. Belo Horizonte: UFMG, 1999. LENCIONE, Sandra. Região e Geografia. São Paulo: EDUSP,1999. LÊNIN, V. I. O Estado e a revolução. São Paulo: Hucitec, 1983. LÉVY, Jacques. L´espace legitime: sur la dimension géographique de la fonction politique. Paris: Fondation Nationale des sciences Politique, 1994. LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Tradução de Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002. LOJKINE, Jean. O Estado Capitalista e a Questão Urbana. São Paulo: Martins Fontes, 1997. MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Poder municipal: paradigmas para o estado constitucional brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. MALATO, O. R. Zoneamento ecológico-econômico e gestão ambiental e territorial: propostas alternativas ou novas retóricas? Belém: NAEA/UFPA, 1997 (Dissertação de Mestrado).

Page 203: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

203

MAQUIAVEL, N. O Príncipe. São Paulo: Moraes, 1999. MARRAMAO, Giacomo. Poder e Secularização. São Paulo: UNESP, 1995. MARTINS, J. S. O poder do atraso: ensaios de sociologia da história lenta. São Paulo: Hucitec, 1994. MARX, K. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. (tradução de Maria Helena Barreiro Alves). São Paulo: Martins Fontes, 1983. MARX, K; ENGELS, F. Manifesto Comunista. São Paulo: Bontempo, 1999. MELLO, Osvaldo Ferreira de. Tendências do federalismo no Brasil. Florianópolis: Lunardelli, 1990. MORAES, A. Q. Pelas trilhas de Marabá. São Sebastião do Paraíso: Chromo Arte, 1997. MOURA Ignácio Baptista de. De Belém a S. João do Araguaia: vale do rio Tocantins. Belém: FCPTN/SECULT, 1989. NOSSO Pará. A Economia dos Contrastes. Belém: Ver Editora, 1999. OLIVEIRA, E. Dimensions dramatiques de la violence em Amazonie. XIV Congrés internacional de droit penal. Vienne, 1989. ORTIZ, R. Um Outro território. São Paulo: Olho D’Água, 1998. PACHECO, Regina Silvia. Administração pública gerencial: desafios e oportunidades para os municípios brasileiros. IN: FUNDAÇÃO Prefeito Faria Lima – CEPAM. O Município no Século XXI: cenários e perspectivas. Ed. Especial. São Paulo: CEPAM, 1999. p. 39-49. PALHETA DA SILVA, J. M. Considerações sobre o Debate Tempo e Espaço. In: Revista Formação. Presidente Prudente; UNESP, 2001. n.8 PALHETA DA SILVA, J. M. Desigualdades geográficas: territórios de globalização na Amazônia. In: Caderno Prudentino. Presidente Prudente: AGB, 2000. v.22. PALHETA DA SILVA, J. M. Exercícios do poder: os exemplos de gestão e viabilidade financeira de Parauapebas e Curionópolis. 1999. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento) – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, Belém. PALHETA DA SILVA, J; SILVEIRA, M. R (Orgs.). Geografia Econômica do Brasil: temas regionais. Presidente Prudente: UNESP, 2002. PINTO, Lúcio Flávio. Amazônia: no rastro do saque. São Paulo: Hucitec, 1980. PINTO, Lúcio Flávio. Amazônia: o século perdido. Belém: Edição Jornal Pessoal, 1997.

Page 204: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

204

PIQUET, Róselia. Cidade-Empresa: presença na paisagem urbana brasileira. Rio de Janeiro: Zahar,1998. PLANO de Desenvolvimento Sustentável de Canaã dos Carajás. I Relatório Parcial de Consulta à Comunidade – Livro Verde do PDS. Canaã dos Carajás: CVRD/MSS/PMCC, 2003. POULANTZAS, Nicos. O Estado, O Poder, O Socialismo. Rio de Janeiro: Graal. 1985. PREFEITURA Municipal de Canaã dos Carajás. Orçamento Municipal 1998. Canaã dos Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Canaã dos Carajás. Orçamento Municipal 1997. Canaã dos Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Canaã dos Carajás. Orçamento Municipal 2000. Canaã dos Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Canaã dos Carajás. Orçamento Municipal 2001. Canaã dos Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Canaã dos Carajás. Orçamento Municipal 2002. Canaã dos Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Curionópolis. Orçamento Municipal 2000. Curionópolis, 2003 PREFEITURA Municipal de Curionópolis. Orçamento Municipal 2002. Curionópolis, 2003. PREFEITURA Municipal de Curionópolis. Orçamento Municipal 2003. Curionópolis, 2003. PREFEITURA Municipal de Curionópolis. Plano Plurianual 2002/2005. Curionópolis, 2003. PREFEITURA Municipal de Eldorado do Carajás. Lei Orgânica Municipal. Eldorado do Carajás, 2002. PREFEITURA Municipal de Eldorado do Carajás. Orçamento Municipal 2003. Eldorado do Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Eldorado do Carajás. Orçamento Municipal. Eldorado do Carajás, 2001. PREFEITURA Municipal de Eldorado do Carajás. Plano Plurianual 2002/2005. Eldorado do Carajás, 2003. PREFEITURA Municipal de Marabá. Diagnóstico do Setor Oleiro Cerâmico de Marabá. Marabá: SEMMA, 2003. PREFEITURA Municipal de Marabá. Lei Ambiental do Município de Marabá. Marabá: SEMMA, 2002.

Page 205: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

205

PREFEITURA Municipal de Marabá. Licenciamento Ambiental do Município de Marabá. Marabá: SEMMA, 2002. PREFEITURA Municipal de Marabá. Relatório de Inspeção Ambiental para Diagnóstico dos matadouros no Município de Marabá. Marabá: SEMMA, 2003. PREFEITURA Municipal de Parauapebas. Orçamento Municipal 1997. Parauapebas, 2003. PREFEITURA Municipal de Parauapebas. Orçamento Municipal 1998. Parauapebas, 2003. PROPOSTA de Regimento interno do Conselho Consultivo da Floresta Nacional de Carajás. QUIDORT, João. Sobre o Poder Régio e Papal. Petrópolis: Vozes, 1989. RAFFESTIN, C. Por Uma Geografia do Poder. São Paulo: Ática, 1993. RAMIRES, J. C. L. As grandes corporações e a dinâmica sócio-espacial: a ação da Petrobrás em Macaé. Rio de Janeiro: UFRJ, 1991. (Dissertação de Mestrado). ROBERTS, J. T. Squatters and urban growth in Amazônia. (Mimeo). ROMANO, Égidio. Sobre o Poder Eclesiástico. Petrópolis: Vozes, 1989. ROSENAU, J. N; CZEMPLIEL, E. Governança sem Governo: ordem e transformação na política mundial. Brasília: UNB, 2000. ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. São Paulo: Martins Fontes, 1996. SACHS, Wolfgang. (Org.). Dicionário do Desenvolvimento. Petrópolis: Vozes, 2000. SÁNCHEZ, J. E. La geografia y el espacio social del poder. Barcelona: Los libros de la frontera, 1981. SANDRONI, Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. São Paulo: Best Seller, 1999. SANTOS JÚNIOR, Orlando Alves dos. Democracia e governo local: dilemas da reforma municipal no Brasil. Rio de Janeiro: Revan; FASE, 2001. 246 p. SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade.São Paulo: Cortez, 2001. SANTOS, Breno Augusto dos. Amazônia: potencial mineral e perspectivas de desenvolvimento. São Paulo: EDUSP, 1981. SANTOS, Milton. A natureza do Espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SANTOS, Milton. Por uma outra Globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2000.

Page 206: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

206

SANTOS, Milton.; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. São Paulo: Record, 2001. SECRETARIA de Estado de Indústria Comércio e Mineração. Pará Rico por Natureza. Belém: SEICOM, 1999. SECRETARIA do Tesouro Nacional. Finanças do Brasil – dados contábeis dos municípios 1996-2002. Brasília: STN, 2003. SEVERO, A. O moderno município brasileiro. Porto Alegre: Thurmann, 1946. SHCEIBE, Luiz F. O Município como geossistema: uma visão integradora. In: GEOSUL. Florianópolis: UFSC, 1997. v.12 n.23 jan/jun. SOARES, M. A S. O plebiscito, o referendo e o exercício do poder. São Paulo: Celso Basto, 1998. SOPEÑA, M. B. Sonegação fiscal de ICMS no estado do Pará: estudo acerca dos fundamentos de política tributária. Belém: NAEA, 1997 (Dissertação de Mestrado). SOUZA, Marcelo L. de. O Planejamento e a Gestão das Cidades em uma Perspectiva Autonomista. In: Território. Rio de Janeiro: Laget/UFRJ, 2000. n.8. SPOSITO, Eliseu Savério (Org.). Dinâmica econômica, poder e novas territorialidades. Presidente Prudente-SP: GASPER/UNESP, 1999. THÉRET Bruno; BRAGA, J. Carlos de Souza (Orgs.). Regulação econômica e globalização. Campinas: Unicamp/IE, 1998. TRECCANI, Girolamo Domenico. Violência e Grilagem: instrumentos de aquisição da propriedade da terra no Pará. Belém: ITERPA/UFPA, 2001. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Marabá. Belém: 2002. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Parauapebas. Belém: 2002. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Canaã dos Carajás. Belém: 2002. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Curionópolis. Belém: 2002. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Eldorado do Carajás. Belém: 2002. TRIBUNAL de Contas dos Municípios do Estado do Pará. Município de Água Azul do Norte. Belém: 2002.

Page 207: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

207

VAINER, C. B; ARAÚJO, F. G. B de. Grandes Projetos Hidrelétricos e Desenvolvimento. Rio de Janeiro: CEDI, 1992. WEBER, Max. Ciência e Política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 1993. XAVIER, Nacif Hélia. Desenvolvimento econômico local e meio ambiente. Rio de Janeiro: IBAM, 1998.

Page 208: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

208

7.1 - Bibliografia de Jornais A Vale samba o Pará dança. O Liberal. Belém, 02 de mar. 2003. Atualidades, p. 02. Ação obriga Vale do Rio Doce a indenizar o Pará. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 29 de abr. 2003. Cidade, p. 05. Al agiliza aprovação de projetos contra a Vale. O Liberal. Belém, 05 ago. 2003. Painel, p.06. Al aprova taxação a atividade poluidora. O Liberal. Belém, 13 ago. 2003. Painel, p.06. Ameaça de confronto entre garimpeiros de Serra Pelada. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 22 de nov. 2002. Região, p. 08. Americanos da Nucor são recebidos por prefeito e vereadora. Opinião. Marabá, 17 e 18 de jul. 2003. Cidade, p.03. Asfalto começa a mudar a cara das ruas de Canaã. Opinião. Marabá, 07 e 08 ago. 2003. Região, p.09. BRASIL, M. Municípios ricos em minérios investem pouco para melhorar vida da população. O Liberal. Belém, 22 fev. 1998. Painel, p.05. BRITO, C. As siderúrgicas e Parauapebas. Correio do Pará. Parauapebas, 07 a 11 de mar. 2003. Diversos, p. 02. CÂMARA pode declarar a Vale persona non grata. O Liberal. Belém, 02 ago. 2003. Painel, p. 06. Câmara volta a discutir pólo siderúrgico no município. Correio do Pará. Parauapebas, 11 a 15 abr. 2003. Cidade, p. 06. Canaã dos Carajás vive explosão imobiliária. Correio do Pará. Parauapebas, 18 a 21 mar. 2003. Região, p. 10. Canditado de Curió vence a eleição da Coomigasp em Serra Pelada. Correio do Tocantins. Marabá, 8 a 10 jun. 2003. Caderno 3, p.03. Cerimônia marca a formatura de aprendizes da Vale. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 18 abr. 2003. Cidade, p.08. Cia Vale do Rio Doce não soube explicar a existência do protocolo de intenções. Correio do Pará. Parauapebas, 21 a 25 fev. 2003. Cidade, p.06. Comércio de Canaã vive fase de bons negócios. Correio do Pará. Parauapebas, 28 mar. 01 de abr. 2003. Cidade, p. 05. Comércio de Eldorado passa por crise financeira. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 28 de mar. 2003. Cidade, p. 06.

Page 209: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

209

Comunicação da Vale se reúne com a imprensa local. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 22 nov. 2002. Região, p. 05. Conflitos atrapalham retorno de garimpeiros à Serra Pelada. Correio do Pará. Parauapebas, 27 set. a 04 out. 2002. Cidade, p.07. Coomigasp passa por reestruturação interna. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Regional, p. 10. CREA aponta viabilidade para três usinas. O Liberal. Belém, 5 ago. 2003. Painel, 07. Curió é reeleito para diretoria da AMAT. Correio do Pará. Parauapebas, 31 jan. a 04 fev. 2003. Diversos, p. 02. Curió: Curionópolis tem um futuro brilhante a ser construído. Curionópolis. Curionópolis. 2003. Entrevista, p.12. Diretor da Vale afirma que empresa está disposta a negociar com o governo. Correio do Tocantins . Marabá, 2003. Cad 02, p. 5. Educação é prioridade em Canaã dos Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 29 abr. 2003. Região, p. 08. Eleição da Coomigasp agita Serra Pelada. Opinião. Marabá, 10 e 11 jul. 2003. Polícia, p. 15. ÉLERES, P. Rico de Minérios, mas pobre de coragem? O Liberal. Belém, 11 mai. 2003. Painel, p. 03. Esperança da Vale é cada vez menor para o Salobo. Correio do Tocantins. Marabá, 20 a 22 de jan. 1998. Cad. 3, p.03. Farras dos municípios vai acabar. O Liberal. Belém, 28 mai. 2000. Painel, p.06-07. Fazenda Macaxeira vive produção cacaueira. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 28 de mar. 2003. Cidade, p. 07. Fluxo migratório instalado em Canaã dos Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 14 a 18 de mar. 2003. Região, p. 08. Gazeta Mercantil, 29 de abril de 2002. Garimpeiro faz esculturas para sobreviver em Serra Pelada. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Regional, p. 05. Garimpeiros voltam a Marabá para discutir retorno a Serra Pelada. Correio do Tocantins. Marabá, 15 a 18 de mar. 2002. Cad. 3, p.07. Gestor anuncia projetos da Vale para desenvolver Curionópolis. Correio do Tocantins. Marabá, 15 a 18 de mar. 2002. Cad. 3, p.17.

Page 210: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

210

Governo exige compensação da Vale. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p. 06. Governo fixa prazo para a Vale dar resposta. O Liberal. Belém, 1 ago. 2003. Painel, p.06. Impasse entre Vale e Gavião continua. O Liberal. Belém, 29 jun. 2003. Atualidades, p 11. Laticínio de Eldorado vai gerar 300 empregos. Correio do Pará. Parauapebas, 31 de jan. a 04 de fev. 2003. Cidade, p.08. Leitor comenta a desordem em Canaã dos Carajás. O Carajás. Parauapebas, 10 a 25 maio. 2002. p.07. Maranhão já comemora a implantação do pólo siderúrgico. Opinião. Marabá, 15 e 16 jul. 2003. Cidade, p.03. MELLO, O. Quem pode acreditar na Vale? O Liberal. Belém, 14 mar. 1999. Painel, p.04. MELO, O. A Vale não vale para o Pará. O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. METABASE fecha o melhor acordo em 10 anos. Correio do Pará. Parauapebas, 12 a 15 ago. 2003. Cidade, p.05. Mina de Cobre terá US$ 50 milhões. O Liberal. Belém, 7 abr. 1996. Painel, p. 01. Minérios da Amazônia vão parar na Sapucaí. O Liberal. Belém, 2 maio. 2003. Atualidades, p. 06. MLT avança pacificamente. O Liberal. Belém, 14 mar. 1998. Painel, p.06. MONTEIRO, B. As terras da Vale do Rio Doce. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.02. MSS implanta parceria com a prefeitura de Canaã. Correio do Pará. Parauapebas, 30 maio. 03 jun. 2003. Região, p. 08. NOGUEIRA, M. A nós, o ônus. Aos outros, o bônus. Correio do Pará. Parauapebas, 07 a 11 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Ainda temos cartas na manga. Correio do Pará. Parauapebas, 21 a 25 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Chega de perder. Correio do Pará. Parauapebas, 28 fev. a 04 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Não precisamos de mais dinheiro, precisamos de mais empregos. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 04 abr. 2003. Painel, p. 03. NOGUEIRA, M. O bônus para o Maranhão, o ônus para o Pará. Correio do Pará. Parauapebas, 29 jul. a 01 ago. 2003. Painel, p.03.

Page 211: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

211

NOGUEIRA, M. O quarteto mágico da região de Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 31 jan. a 04 fev. 2003. Painel, p.03. O fim da farsa. Revisa Isto É. 27 de setembro de 2000. O maior julgamento dos últimos tempos será em Marabá. Correio do Pará. Parauapebas, 10 a 20 nov. 1998. Cidade, p.10. OZIEL alerta contra isolamento do Pará. O Liberal. Belém, 01 jun. 2003. Painel, p. 04. Pará começa a discutir o futuro Estado de Carajás. Carajás. Marabá, 08 ago. 1995. Ano I n.01. Parlamentares frustram Curionópolis e prometem apoio aos garimpeiros. Correio do Tocantins. Marabá, 19 a 25 jul. 1996. Cad. 3, p.08. PASSARINHO, J. Carajás, da descoberta a hoje. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Cidade, p.02. PINTO, Lúcio Flávio. Pirotecnia do cobre. Jornal Pessoal. Belém, nov. 1998. n.199. ano XII. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. A boa causa das eclusas. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.03. PINTO, Lúcio Flávio. As lições de 30 anos. Jornal Pessoal. Belém, jul. 1997. n.167. ano X. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. Caso Eldorado: inocência terá um preço muito alto. Jornal Pessoal. Belém, set. 1997. n.171. ano X. p.07. PINTO, Lúcio Flávio. CVRD não dá conta da demanda por ferro. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.11. PINTO, Lúcio Flávio. Gusa em brasa. Opinião. Marabá, 12 e 13 jul. 2003. Ponto de Vista, p. 06. PINTO, Lúcio Flávio. Hidrelétricas: O rendimento do Caos. Jornal Pessoal. Belém, set. 1989. n.48. ano III. p. 01. PINTO, Lúcio Flávio. Mineração: um retorno desigual. Jornal Pessoal. Belém, maio 1989. n.41. ano III. p.04. PINTO, Lúcio Flávio. Minérios: tudo só para eles? Jornal Pessoal. Belém, set. 1989. n.47. ano III. p.01. PINTO, Lúcio Flávio. O metal vai para a Bahia. Jornal Pessoal. Belém, set. 1997. n.171. ano X. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. O publico vai Ganhar? Jornal Pessoal. Belém, ago. 2003. n.306. ano XVI. p.01

Page 212: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

212

PINTO, Lúcio Flávio. Pará: sem voz. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. Placas vão para São Luís: fim do sonho siderúrgico? Jornal Pessoal. Belém, ago. 2003. n.306. ano XVI. p. 4-5. PINTO, Lúcio Flávio. Serra Pelada acabou. Jornal Pessoal. Belém, mar. 1996. n 135. ano IX. p.1-2. Pólo siderúrgico vai mesmo para São Luís do Maranhão. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Estado, p.07. População de Parauapebas insatisfeita protesta contra a Vale. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 28 fev. 2007. Cidade, p.07. Porto maior embarcará riquezas do Pará. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Painel, p.02. Prefeito diz que curso é o embrião da universidade do sudeste do Pará. Correio do Tocantins. Marabá. 2003. Cad 02 p. 5. Prefeitura de Canaã dos Carajás inaugura obras. Correio do Pará. Parauapebas, 07 a 11 fev. 2003. Região, p. 08. Prefeitura de Curionópolis e Vale distribuem cestas básicas. Correio do Pará. Parauapebas, 18 a 25 out. 2002.Curionópolis, p. 08. Presidente da Coomigasp é destituído sob acusação de irregularidades. Correio do Pará. Parauapebas, 25 out. a 01 nov. 2002. Região, p 10. Projeto Sossego faz da CVRD uma exportadora de cobre. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.06. Projeto Sossego vai produzir 150 mil toneladas/ano de cobre. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.12. Raphael Bloise: um apaixonado pelo Projeto Sossego. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.07. Raphael Bloise: um apaixonado pelo Projeto Sossego. Correio do Pará. Parauapebas, 23 a 27 maio. 2003. Cidade, p. 06. RIBEIRO, L. C. P. OS pioneiros de Carajás e o p-322: dezoito anos depois. Correio do Pará. Parauapebas, 27 a 30 maio. 2003. Diversos, p.02. Royalties não compensam o Pará pela exploração de seus minérios. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Cidade, p.02. Sargentos são absolvidos no Júri de Eldorado do Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 31 maio a 07 jun. 2002. Polícia, p.11.

Page 213: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

213

Sarney diz que profetizou siderúrgica no MA em 1973. A Notícia. Parauapebas, 08 a 14 ago. 2003. p.02. Senador vai à tribuna e faz duras críticas contra a Vale. Correio do Tocantins. Marabá, 19 a 25 jul. 1996. Cad. 3, p.09. Senadora Ana Júlia visita Parauapebas e região. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 04 abr. 2003. Cidade, p. 07. Sessão inaugural debate implantação de pólo siderúrgico. Correio do Pará. Parauapebas, 21 a 25 fev. 2003. Cidade, p.06. Siderúrgicas temem joint-venture da Vale. O Liberal. Belém, 12 ago. 20003. Painel, p.06. SIQUEIRA, F. Débitos dos royalties vão a R$ 226 mi. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.02. SIQUEIRA, F. DNPM aponta: Vale deve R$ 151 milhões à União. O Liberal. Belém, 2 mar. 2003. Painel, p.01. SIQUEIRA, F. FLONA de Carajás é alvo de desconfianças. O Liberal. Belém, 8 jun. 2003. Painel, p 02. SIQUEIRA, F. Maranhão na dianteira para ganhar pólo. Belém: Jornal O Liberal 11 de maio de 2003. Painel p.03. SIQUEIRA, F. Minério do Pará é brilho do Maranhão. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Painel, p.01-02. SIQUEIRA, F. novos municípios multiplicam a pobreza. O Liberal. Belém, 17 ago. 1997. Painel, p. 4-5. SIQUEIRA, F. Província de Carajás se torna feudo da Vale. O Liberal. Belém, 08 jun. 2003. Painel, p 01. SIQUEIRA, F. Questão siderúrgica não é palanque, diz Jatene. O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. SIQUEIRA, F. Vale ficou cinco anos sem pagar taxa de pesquisa. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.01. SOARES, A. A Vale e o Pará.O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. Tetê acha que Pará foi injustiçado pela Companhia Vale do Rio Doce. Opinião. Marabá, 07 e 08 ago. 2003. Cidade, p.05. Trabalhadores marcham em protesto à impunidade de Eldorado do Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 18 abr. 2003. Cidade, p.07.

Page 214: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE … · pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; ... Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui

214

Trabalho Infantil persiste em Parauapebas. Correio do Pará. Parauapebas, 12 a 15 ago. 2003. Cidade, p.07. Trincheira no acampamento. O Liberal. Belém, 15 mar. 1998. Atualidades, p. 08. Um projeto fundamental para o Brasil. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.06. Vale antecipa investimentos para expansão de Carajás. Diário do Pará. Belém, 15 agos. 2003. Mercantil, p.01. Vale forma primeira turma de aprendizes dos projetos Cobre e Níquel. Correio do Pará. Parauapebas, 11 a 15 abr. 2003. Regional, p. 08. Vale vai reavaliar siderúrgica no Maranhão. Correio do Pará. Parauapebas, 14 a 18 mar. 2003. Cidade, p. 06. Vereadores aprovam moção de protesto contra a CVRD. Correio do Pará. Parauapebas, 28 fev. a 04 mar. 2003. Cidade, p.06. Vereadores visitam guserias de olho na Nucor. Opinião. Marabá, 08 e 09 jul. 2003. Cidade, p.06. Vice-Prefeito dá apoio a sem-terra. O Liberal. Belém, 15 mar. 1998. Atualidades, p. 11. VINAS, S. Emancipação do Tapajós tem aval de comissão no Senado. O Liberal. Belém, 28 maio. 2000. Painel, p.05. VINAS, S. Venda da Vale ajuda municípios. O Liberal. Belém, 14 mar. 1998. Painel, p.01.