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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ECONOMIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS JESSICA SANTOS DE JESUS ANÁLISE DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) COMO INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO DO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS RIACHÕES-BA SALVADOR 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE … Jessica... · do Pré-Assentamento Dois Riachões, ... nove em cada dez das 570 milhões de propriedades agrícolas no ... os agricultores

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE ECONOMIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS

JESSICA SANTOS DE JESUS

ANÁLISE DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) COMO

INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO DO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS

RIACHÕES-BA

SALVADOR

2015

JESSICA SANTOS DE JESUS

ANÁLISE DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) COMO

INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO DO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS

RIACHÕES-BA

Trabalho de conclusão de curso apresentado

no curso de Ciências Econômicas da

Universidade Federal da Bahia como

requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Ciências Econômicas.

Área de concentração: Desenvolvimento

Rural

Orientadora: Profa. Drª Gilca Garcia

Oliveira.

Co-orientador: Prof. Tiago Rodrigues

Santos

SALVADOR

2015

Ficha catalográfica elaborada por Vânia Cristina Magalhães CRB 5- 960

Jesus, Jessica Santos de

J58 Análise do programa de aquisição de alimentos (PAA) como

instrumento de desenvolvimento do pré-assentamento Dois

Riachões-BA./ Jessica Santos de Jesus. – Salvador, 2015.

78. Il. Tab.; quad.; graf.; fig.

Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Faculdade de

Economia, Universidade Federal da Bahia, 2015.

Orientadora: Profa. Dra. Gilca Garcia Oliveira.

Co-orientador: Prof. Tiago Rodrigues Santos.

1. Agricultura familiar. 2. Assentamento rural. I. Oliveira,

Gilca Garcia. II. Santos, Tiago Rodrigues. III. Título. IV.

Universidade Federal da Bahia.

CDD – 338.1098142

JESSICA SANTOS DE JESUS

ANÁLISE DO PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) COMO

INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO DO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS

RIACHÕES-BA

Trabalho de conclusão de curso apresentado no curso de Ciências Econômicas da

Universidade Federal da Bahia como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Ciências Econômicas.

Aprovada em 31 de maio de 2016.

Banca examinadora

.

Profa. Dra. Gilca Garcia de Oliveira

Universidade Federal da Bahia – UFBA

.

Prof. Dr. Daniel Lemos Jeziorny

Universidade Federal da Bahia – UFBA

.

Profa. Dra. Hingryd Inácio de Freitas

Instituto Federal da Bahia (IFBA/Campus Salvador)

Dedico este trabalho aos trabalhadores

rurais do Pré-Assentamento Dois Riachões.

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais e ao meu irmão pelo apoio, confiança, carinho e muita força nos

momentos difíceis. Agradeço também pela dedicação e segurança, que foram

fundamentais para me tranquilizar e me concentrar nos meus estudos.

Aos meus orientadores:

Professor Tiago Rodrigues por todo incentivo e apoio para eu desenvolver esse trabalho

que foi extremamente enriquecedor.

A Professora Érica Imbirussú pela atenção, pela disposição em me ajudar e

principalmente pelos conselhos;

A Professora Gilca Oliveira pelos conhecimentos repassados e por toda a sua gentileza

em me orientar.

Ao Movimento CETA pela oportunidade de conhecer mais de perto sua trajetória.

Aos assentados do Pré- assentamento Dois Riachões, em especial Luciano, Rubens e

Neto por toda atenção, colaboração que me deram e pela confiança.

Aos amigos que fiz na faculdade que muito me ajudaram e foram importantes em todos

esses anos. Em especial, Caio Bandeira, Elen Coutinho, Iana Fonseca e Iara Quele.

À Faculdade de Ciências Econômicas da UFBa, professores, porteiros, bibliotecários.

“Queremos plantar no outono

Para ter na primavera

Amor em vez de abandono

Fartura em vez de miséria.”

(Vinicius de Moraes)

RESUMO

A agricultura familiar é um dos principais responsáveis pelo abastecimento alimentar da

população brasileira. O termo agricultura familiar passou a ser amplamente discutido

nos espaços acadêmicos, principalmente após os anos de 1990, desde então inúmeras

definições e conceitos surgiram. Mas só a partir do reconhecimento da importância

dessa categoria social que surge diversas políticas públicas e programas voltados para o

fortalecimento e desenvolvimento da agricultura. Dentre eles surgiu em 2003, o

Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que se apresenta como um novo

instrumento para o desenvolvimento da agricultura familiar, a partir da diminuição de

um dos entraves para os agricultores, à comercialização da produção agrícola. O

objetivo principal dessa pesquisa foi analisar como este Programa se insere no contexto

do Pré-Assentamento Dois Riachões, situado no município de Ibirapitanga-BA, tendo

em vista que os agricultores assentados possuem uma dinâmica diferenciada em relação

aos agricultores familiares. Buscou-se através de uma abordagem qualitativa analisar as

influências do PAA para o desenvolvimento do pré-assentamento. A análise permitiu

verificar a importância desse Programa para os assentados, enquanto política pública

capaz de estimular a produção e a comercialização agrícola no pré-assentamento

gerando renda e viabilizando a permanência.

Palavras-chave: Pré-assentamento. Agricultura familiar. Programa de aquisição de

alimentos. Dois Riachões – Bahia.

ABSTRACT

Family farming is one of the main responsible for the brazilian population's food

supply. The term family agriculture became widely discussed in academic spaces,

mainly after the years of 1990, since then numerous definitions and concepts have

emerged. But only from the recognition of the importance of this social category which

arises several public policies and programs focused on the strengthening and

development of agriculture. Among them was founded in 2003, the food acquisition

Program (PAA), which bills itself as a new instrument for the development of family

farming, from the degradation of one of the obstacles to the farmers, the marketing of

agricultural production.The main objective of this research was to analyze how this

program falls within the context of Two Riachões Settlement, located in the

municipality of Ibirapitanga-BA, in order that farmers settled have a differentiated

dynamics in relation to family farmers. Sought through a qualitative approach analyzing

the influences of the PAA for the development of pré-assentamento. He was appointed

by the settlers of the importance of this program, while public policy able to stimulate

agricultural production and marketing in pré-assentamento generating income and

enabling the permanence.

Key words: Settlement. Family agriculture. Food acquisition program. Two Riachões –

Bahia.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1- Modalidades do PAA e seus principais objetivos e características 35

Quadro 2- Tipos de Modalidades, Forma de Participação, Limite, Origem do

recurso e Unidade executora

39

Gráfico

1-

Evolução dos Recursos do MDS/MDA aplicados no PAA, 2003-

2013

42

Gráfico

2-

Grupos de produtos e percentual de recursos alocados no período de

2011 a 2013

44

Figura

1- Centro de formação popular da regional Bonfim

49

Figura

2- Entrada do pré- assentamento Dois Riachões

76

Figura

3- Área do pré-assentamento Dois Riachões

76

Figura

4- Casa de Farinha em construção

77

Figura

5- Barraca de lona do pré-assentamento Dois Riachões

77

Figura

6- Produção de hortaliça

78

Figura

7- Secador de amêndoa

78

LISTA DE TABELAS

Tabela 1- Caracterização dos Estabelecimentos Agropecuários, segundo a Lei Nº

11.326. Brasil, 2006

25

Tabela 2- Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, Bahia,

1995/96 a 2006

26

Tabela 3- Participação da Agricultura na Produção de alguns produtos, 2006 27

Tabela

4-

Recursos Aplicados e Número de Agricultores Participantes de 2003 a

2013, por região geográfica

43

Tabela

5-

Índice de Gini. Ibirapitanga, 1970 a 2006

55

LISTA DE SIGLAS

ATES Assessoria Técnica Social e Ambiental

CAE Conselhos de Alimentação Escolar

CDA Coordenação do Desenvolvimento Agrário do Estado da Bahia

CDAF Compra Direta da Agricultura Familiar

CEAS Centro de Estudos e Ação Social

CEASA Central Estadual de Abastecimento

CETA Movimento Estadual de Trabalhadores/as, Assentados/as, Acampados/as e

Quilombolas

CONAB Companhia Nacional de Abastecimento

CONDRAF Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável

CONSEA Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

CPR

Estoque

Formação de Estoques pela Agricultura Familiar

CPT Comissão Pastoral da Terra

CRAS Centro de Referência da Assistência Social

CUT Central Única dos Trabalhadores

DAP Declaração de Aptidão ao PRONAF

EBDA Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola

EJA Educação de Jovens e Adultos

FAO Organização das Nações Unidas para a alimentação e a Agricultura

FCP Fundação Cultural Palmares

FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

FUNAI Fundação Nacional do Índio

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICMbio Instituto Chico Mendes

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário

MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

MSJ Movimento Socioambiental Jupará

MST Movimento Sem Terra

MSTR Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais

PAA Programa de Aquisição de Alimentos

PNAE Programa Nacional de Alimentação Escolar

PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

RACCA-

SUL

Rede de Associações Comunitárias dos Assentados e não Assentados do

Sul da Bahia

SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SIPE Sistema Integrado de Registro de Produto e Estabelecimento

SISAN Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 13

2 METODOLOGIA 18

3 CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA 20

3.1 AGRICULTURA FAMILIAR 20

3.2 ASSENTAMENTOS RURAIS 28

3.3 PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) 32

4 ESTUDO DO PAA NO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS RIACHÕES 45

4.1 MOVIMENTO DE LUTA PELA TERRA: MOVIMENTO CETA 45

4.2 CONTEXTUALIZANDO O PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS RIACHÕES 52

4.2.1 Perfil dos Beneficiários do Programa de Aquisição de Alimentos. 63

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 65

REFERÊNCIAS 67

APÊNDICES 72

13

1 INTRODUÇÃO

A criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),

em 1996, inicialmente vinculado ao Ministério da Agricultura e do Abastecimento1 foi

um avanço na política agrícola em termos da ampliação do acesso e a inclusão dos

agricultores familiares no crédito rural, uma vez que possibilitou a participação dos

agricultores que estavam à margem do sistema bancário e não apenas dos grandes

proprietários. Além de ter sido um elemento importante para formulaçãode políticas

para os agricultores que produzem em base familiar.

A agricultura familiar tem papel importante de impulsionar a economia local e reduzir o

número de pobreza, como também é importante para a segurança alimentar mundial

além de proteger a agrobiodiversidade. A agricultura familiar produz cerca de 80% dos

alimentos no mundo e preserva cerca de 75% de todos os recursos agrícolas do mundo

(FAO,2014).Cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil são produtos da

agricultura familiar. ( BRASIL,2015).

Segundo a FAO (2014) nove em cada dez das 570 milhões de propriedades agrícolas no

mundo são geridas por famílias, fazendo com que a agricultura familiar seja a forma

mais predominante de agricultura e, consequentemente, um potencial e crucial agente de

mudança para alcançar a segurança alimentar sustentável e a erradicação da fome no

futuro.

A importância de focar nessa categoria da agricultura contribui para o desenvolvimento

sustentável com a possibilidade de promover um crescimento mais equitativo e

equilibrado, contribuindo para diminuição do êxodo rural e para geração de riqueza haja

vista que parte dos agricultores familiares mora nos assentamentos rurais

1 Em 2001 a denominação do ministério é alterada para Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento (MAPA).

14

O desenvolvimento e o fortalecimento da agricultura dos trabalhadores assentados2 se

encontram em um processo de disputas por ações políticas que possam levar a sua

consolidação. A sua efetiva valorização e reconhecimento dependem da aplicação de

instrumentos que sejam implementados de forma articulada, respeitando os conjuntos de

fatores econômicos, sociais, políticos e culturais do espaço rural.

Dentre esses sujeitos sociais estão inseridos os agricultores assentados, que promovem

um intenso debate acerca dos diferentes projetos pra o desenvolvimento do campo e que

constituem um modo singular e específico dentro das formas de produção no campo,

diferenciando–se da agricultura familiar tradicional. Esses agricultores assentados estão

envolvidos em questões como a luta e a resistência pela posse da terra, a melhoria da

produção de alimentos, a soberania alimentar e nutricional. E, normalmente, encontram-

se ligados a algum movimento e/ou a organizações de luta pela terra.

No tocante à sua dinâmica, os agricultores assentados possuem um diferencial em

relação aos demais agricultores devido ao lugar no qual se encontram. O assentamento

conforme, ressalta Sauer (2005, p.61), é um local que deve ser compreendido como uma

“encruzilhada social”, uma vez que é um “espaço social e geográfico de continuidade da

luta pela terra”, no qual diferentes biografias e experiências se encontram. Como

também um espaço político de disputa de classes. Os assentados, portanto tem “como

principais fatores de mediação real e simbólica (interna e externa) a terra, o trabalho e a

produção”.

Medeiros e Leite (1999) apud Santana (2011, p.11) advertem que os assentamentos

rurais ao serem criados impõem novos desafios para o Estado, uma vez que, para ali são

dirigidas várias reivindicações no que se refere aos direitos básicos como: saúde,

educação, infraestrutura e melhores condições para a comercialização da produção

agrícola gerada nos assentamentos.

As dificuldades que perpassam esses assentados envolvem tanto o acesso ao mercado,

haja vista que as condições de abertura de mercado para a produção “estão geralmente

2 A pesquisa trabalha com a categoria agricultor familiar de acordo com os critérios estabelecidos pela Lei

11.326/2006 que é o critério utilizado na tipologia dos beneficiários do PAA, mas aqui se trata de

trabalhadores pré-assentados que trabalham na agricultura.

15

associados às limitações no sistema produtivo tais como: rendimento por unidade

(produtividade), qualidade do produto, logística de distribuição (estradas e distância),

eletrificação, abastecimento e qualidade de água, armazenamento e eficiência da

associação ou cooperativas” (PONTES et al, 2015,p.9), quanto a obtenção de

financiamento e crédito, sobretudo, devido a limitação do acesso destes as informações

econômicas e técnica.

Apesar do PRONAF representar um avanço na elaboração e gestão de políticas públicas

para o agricultor familiar tendo como intuito romper com a escassez de crédito e as

dificuldades de acesso, ele apresenta alguns impasses referentes a distribuição dos

recursos, haja vista que, a produção de culturas que estejam relacionadas aos complexos

agroindustriais e para o mercado externo tem maior facilidade de conseguir o

financiamento. Portanto, as regiões como o Sul e Sudeste são aquelas mais favorecidas,

enquanto a agricultura familiar que tem uma produção em sua maior parte voltada para

alimentação básica tem dificuldade de alcançar apoio financeiro ( MASSARETO,2011).

A desigualdade é tanto em relação às regiões quanto a de culturas financiadas. De

acordo com os dados do Censo Agropecuário de 2006 constatou-se que 3.586.365

agricultores familiares não tiveram acesso ao programa, ou seja, um percentual de

82,11% do total dos estabelecimentos familiares. (IBGE, 2006).

Os autores Carneiro e Maluf (2005) apud Le Moal (2013) ressaltam que o modelo

alternativo ao agronegócio apresentado por ocasião da implementação do PRONAF,

ainda que amparado na forma familiar de produção, foi dominado por uma visão

mercantil. Portanto privilegiaram-se aqueles produtores considerados viáveis

economicamente, ou seja, aqueles com capacidade de competir no mercado.

Outro impasse é referente às exigências dos bancos fazendo com que os assentados mais

desenvolvidos, ou seja, aqueles que possuem maiores garantias e estejam mais

integrados ao mercado tenham mais condições de conseguir o financiamento. O fato dos

agricultores assentados terem dificuldade para apresentar garantias, terem baixo nível

educacional e a falta de práticas contábeis completa a imagem construída a respeito dos

tomadores de crédito em pequena quantidade (MASSARETTO, 2011).

16

É diante dessas dificuldades que o governo passa a adotar diversas políticas públicas no

meio rural, sendo o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) um dos instrumentos

utilizados para alavancar o desenvolvimento local, promover a inclusão social no campo

e garantir a segurança alimentar e nutricional. Isso ocorre a partir da garantia de

comercialização de produtos vindos da agricultura familiar com a possibilidade de

incorporação de produtos orgânicos/agroecológico, através do estabelecimento de

preços regulados e com garantia de compra para abastecimento de redes de proteção e

promoção social.

Então, a questão é: como o Programa de Aquisição de Alimentos, que tem como

pressuposto estimular a comercialização e a produção agrícola interfere na condição de

vida das famílias assentadas?

Assim sendo, a presente pesquisa tem como objetivo geral analisar o alcance do PAA

para o desenvolvimento da agricultura familiar no “Pré-assentamento”3 Dois Riachões,

situado no município de Ibirapitanga-BA.

Os objetivos específicos referentes à pesquisa são:

a. Analisar como o Programa modificou o perfil socioeconômico das famílias

beneficiárias;

b. Apontar as influências do PAA na realidade e na lógica produtiva;

c. Entender a ação do PAA na lógica estrutural do pré-assentamento;

d. Identificar a forma como o Programa interfere nas relações e no funcionamento das

organizações representativas.

Em termos da estruturação dessa pesquisa, no primeiro capítulo apresenta-se a

introdução ao tema, abordando em linhas gerais a importância da agricultura familiar e

do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). No segundo capítulo é demonstrada a

metodologia usada na pesquisa. O terceiro capítulo apresenta uma contextualização

3Pré-Projeto de Assentamento - Fase em que os imóveis já se encontram selecionados e decretados para a

desapropriação, ou pré-selecionados para a aquisição pelos programas de crédito fundiário, sendo

preparados sob os aspectos técnicos e jurídicos para receber as famílias classificadas como pré-assentados

selecionados para projetos em elaboração; (BRASIL,2002)

17

teórica que trata sobre a agricultura familiar no Brasil, a constituição e trajetória dos

assentamentos rurais trazendo breves considerações sobre a questão da terra e da sua

consquista e do PAA, importante ressaltar que não foi aprofundado todo o antecedente

histórico do Programa, mas, foram considerados os aspectos importantes para

compreensão da elaboração e consolidação do mesmo, identificando principalmente as

suas características e sua forma de execução. Em seguida, no quarto capitulo, tem-se o

estudo do PAA no pré-assentamento Dois Riachões, é feita uma contextualização

histórica do Movimento CETA, movimento de luta no qual os assentados do pré-

assentamento Dois Riachões estão inseridos. Ainda nesse capítulo a partir da pesquisa

documental e da pesquisa de campo fez-se a análise do Pré-assentamento e das famílias

beneficiárias do Programa. Por fim, na conclusão, realizam-se as considerações finais.

18

2 METODOLOGIA

O procedimento técnico utilizado na pesquisa integra uma revisão bibliográfica apartir

do levantamento das obras sobre o tema como fontes secundárias de informações.

Uma pesquisa documental a partir de dados institucionais e de documentos existentes na

Associação Dois Riachões, além de alguns documentos escritos sobre Movimento

Estadual Trabalhadores/as, Assentados/as, Acampado/as e Quilombolas (CETA) no

qual os assentados do pré-assentamento Dois Riachões do município de Ibirapitanga

estão referenciados.

Uma pesquisa por observação participante através da participação na VII Plenária

Estadual do CETA, em que se comemoravam 20 anos de Movimento. A Plenária

ocorreu no Centro de Formação Popular, Assentamento Serra Verde, no município do

Senhor do Bonfim, nos dia 29 a 31 de maio de 2015 e contou com a participação em

torno de 200 pessoas. Esta Plenária tinha como objetivo fazer análises de conjuntura das

políticas, sobretudo, referente à questão da reforma agrária, sobre os avanços e desafios

que perpassam o Movimento e com isso tirar encaminhamentos que balizem os

próximos dois anos. O espaço da Plenária possibilitou compreender a dinâmica e as

diretrizes em que o Movimento se apoia. Além de permitir o contato com as regionais

da Chapada, Sul, Médio São Francisco, Recôncavo, Bom Jesus da Lapa e Bonfim onde

se localizam os assentamentos do CETA dando uma noção da abrangência desse

movimento e os desafios e dificuldades que perpassam esses assentados.

A pesquisa contou também com a realização da coleta de dados apartir de um trabalho

de campo permitindo uma abordagem qualitativa com o intuito de entender a percepção

assim como a realidade dos assentados acerca da produção, comercialização e da

execução do PAA. A partir da visita ao pré-assentamento foi realizada a coleta de dados

com formulários4. Em um universo de 32 famílias residentes no Pré-assentamento Dois

Riachões, 24 delas responderam ao formulário, sendo assim alcançou-se 75% do total

das famílias.

4 O formulário utilizado encontra-se no Apêndice A.

19

Durante a visita foram feitas entrevistas semiestruturadas5 com o coordenador do CETA

da região onde se localiza o Pré-assentamento e com o coordenador da Associação Dois

Riachões com o objetivo de conhecer o histórico do assentamento, as características da

organização social e os aspectos produtivos bem como compreender o ponto de vista

destes sujeitos como representantes dos assentados em relação ao PAA e perspectivas

futuras para o pré-assentamento.

Para a realização da análise foi utilizado uma abordagem de análise qualitativa de

dados.

5 O roteiro das entrevistas encontra-se no Apêndice A.

20

3 CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA

3.1 AGRICULTURA FAMILIAR

Conceituar o termo “Agricultura familiar” é algo de grande importância, pois se tornou

uma forma de reivindicar as políticas e investimentos públicos para os pequenos

produtores de base familiar. Porém, essa conceituação ainda causa controvérsia dada à

complexidade que é a agricultura familiar, exigindo que a abordagem do tema se torne

uma tarefa cada vez mais presente no meio acadêmico e nas esferas públicas. Essa

temática sai da condição inicial de um objeto de preocupação de pesquisadores, para

uma categoria analítica fundamental para explicar o meio rural brasileiro e se afirmar

enquanto sujeito de intervenção no desenvolvimento nacional (SOUZA et al., 2014).

Segundo Wanderley (2004, p.43), existe certa dificuldade teórica pra atribuir valor

conceitual à categoria agricultura familiar no Brasil, pois as posições sobre esse

conceito variam bastante. Para alguns o conceito de agricultura familiar passou a se

confundir com a definição adotada para operacionalizar o PRONAF que sugere uma

tipologia de beneficiários em função da sua capacidade de atendimento. Enquanto que,

para outros a agricultura familiar corresponde aos chamados agricultores

“consolidados”, que seriam os pequenos produtores com capacidade de adaptarem-se as

modernas exigências do mercado, ou seja, que tem condições em curto prazo de se

consolidar e responder as exigências da sociedade e do mercado moderno.

Fala-se de uma agricultura familiar como um novo personagem diferente do

camponês tradicional, que teria assumido sua condição de produtor moderno;

propõem-se políticas para estimula-los, fundadas em tipologias que se

baseiam em sua viabilidade econômica e social diferenciada.

(WANDERLEY, 1996, p.2).

De acordo com Nazaré Wanderley (2004) tem se constituído a ideia de que o agricultor

familiar é um ator social da agricultura moderna. Entretanto, a autora ressalta que,

apesar do contexto socioeconômico da sociedade moderna no qual estão inseridos, que

obriga a realização de mudanças em sua forma de produzir e em sua vida tradicional,

eles não produzem uma ruptura total e definitiva com as formas anteriores

(WANDERLEY, 1996, p.2).

O agricultor familiar é, sem dúvida, um ator social do mundo moderno, o que

esvazia qualquer análise em termos de decomposição do campesinato, mas,

como afirma Marcel Jollivet (2001:80), “no agricultor familiar há um

camponês adormecido” (Aliás, um camponês bem acordado). Assim, o que

21

concede aos agricultores modernos a condição de atores sociais, construtores

e parceiros de um projeto de sociedade – e não simplesmente objetos de

intervenção do Estado, sem história - é precisamente a dupla referência à

continuidade e à ruptura. (WANDERLEY, 2004, p.47).

Demonstrando ser um portador da tradição camponesa, a agricultura familiar, é fundada

pela relação entre terra, trabalho e família. Baseando-se no uso coletivo da terra, na

valorização dos recursos que dispõem, na valorização do estabelecimento familiar e

priorizando investimentos que viabilizem a produção para gerações futuras. Desse modo

é preciso considerar que, embora haja uma adaptação às novas exigências da sociedade,

o agricultor familiar ainda reveste características camponesas, decorrente não somente

de sua origem, sobretudo, de sua diferenciação, ou até mesmo de sua oposição a

empresas capitalistas (WANDERLEY, 1996, 2004).

Segundo Ploeg (2006) apud Sabourin (2009, p.32) nessa natureza heterogênea que é a

agricultura familiar há características que definem nos tempos atuais o modo de

produção camponês que seriam:

I. A autonomia relativa ligada a uma dependência parcial, por

um lado, de mercados diversificados e, por outro, de

recursos naturais escassos; esta situação de tensão obriga o

camponês a buscar uma eficiência técnica, enquanto deve

preservar a qualidade de recursos naturais limitados;

II. A prioridade dada aos recursos em trabalho (familiar) sobre

os recursos em capital e, assim, a intensificação do trabalho;

III. A unidade orgânica entre os recursos sociais e materiais; a

produção e seu uso são governados por regras oriundas do

patrimônio cultural e por relações primordiais de gênero,

parentesco e reciprocidade;

IV. O caráter central do trabalho familiar e interfamiliar

(comunitário), tanto em termos de investimentos quanto de

inovações adaptadas às realidades sociais;

V. A relação de autonomia parcial perante mercados e em

particular o mercado capitalista

VI. A criação de valor agregado e de empregos produtivos que

diferenciem a unidade de produção camponesa da empresa

agrícola capitalista.

Para além dessas características, a agricultura familiar segundo Felício (2006) apud

Santana (2014, p.5) possui ainda características que promovem o surgimento de debates

relacionados às questões de aspectos ecológicos e sociais, destacando-se a reforma

agrária. Portanto o conceito estaria intrinsecamente ligado à persistência do

22

campesinato, haja vista que a família, ao possuir os meios de produção, torna-se

responsável pelo trabalho em seu estabelecimento de produção.

No que se refere à política agrícola brasileira, o foco sempre foi dado às grandes e

médias propriedades capitalistas, resultando numa crescente marginalização dos

agricultores familiares. Dessa forma, reproduzindo um padrão de desenvolvimento rural

bastante excludente e desigual.

A consolidação e compreensão da política para esses agricultores que, historicamente,

sempre foram tratados com desigualdade na aplicação dos recursos públicos, foram

motivadas pela constante mobilização de organizações sociais ligadas aos agricultores e

trabalhadores sem terra, principalmente a partir de 1980, com a redemocratização do

Estado Brasileiro. Nesse período foram criadas grandes expectativas de aumento da

participação e do controle social na formulação de políticas públicas que os incluíssem

no processo de desenvolvimento do país. Mas, foi a partir da década 1990, segundo

Schnieder, Mattei e Cazella (2004) que os setores ligados à agricultura brasileira

começam de fato a discutir sobre a noção de agricultura familiar, destacando a sua

relevância socioeconômica como um eixo fundamental para o desenvolvimento rural.

De acordo com Sauer (2008) no início dos anos 1990 tanto a apropriação das noções de

agronegócio quanto da agricultura familiar no Brasil, foi o resultado de uma disputa

política resultante da situação fundiária, especialmente após difusão da “Revolução

Verde”, no qual foi denominado por teóricos como um processo de “modernização

conservadora” do campo brasileiro. Neste sentido, o papel da agricultura segundo

Santana (2010) passa a ser limitado em relação ao processo de desenvolvimento

econômico capitalista, pois se torna mera fornecedora de insumos para áreas industriais.

A modernização foi consolidada no Brasil “a partir de meados de 1960, com

características conservadora, pois a estrutura da propriedade da terra continuou

inalterada, mantendo-se assim a forte concentração fundiária” (SANTANA, 2010, p.7)

que segue de forma expressiva até os dias atuais. Foi um processo que contava com um

sistema produtivo baseado no uso intensivo de técnicas que só eram acessadas por um

segmento “altamente capitalizado” favorecido por políticas publicas, ou seja, subsídios,

incentivos fiscais, assistência técnica, pesquisa, etc.

23

(...) o padrão tecnológico adotado e difundido não se adequa às necessidades

da pequena produção e as razões para isto são simples: as características

estruturais da agricultura familiar brasileira não se adequam ao padrão

tecnológico disponível; o processo não foi feito para os pequenos. De um

lado, características como limitada disponibilidade de terras para uso de

máquinas, condições ecológicas adversas - piores terras-, policultura,

insuficiência de recursos para investimentos e mão-de- obra numerosa

dificultam o acesso à moderna tecnologia. (ALENTEJANO, 1997, apud

SAUER, 2008, p.18).

Esse processo de modernização contribuiu para diferenciar os termos “agronegócio ou

agribusiness” e “agricultura familiar” sendo esta última considerada como uma “forma

arcaica e pouco eficiente de produção e cultivo de terra, especialmente pela não

incorporação de certa racionalidade técnica” (SAUER, 2009). Como também foi um

processo que gerou o agravamento da chamada questão agrária.

A questão agrária tem dois aspectos centrais: A concentração da propriedade

fundiária e a exclusão social e política, os quais estabelecem um claro e

profundo antagonismo entre o setor patronal (e suas entidades de

representação) e os segmentos populares (e seus movimentos sociais e

organizações). De um lado uma enorme quantidade de terra - em muitos

casos, subutilizados ou não utilizados - em mãos de poucos e, de outro, uma

massa de trabalhadores e trabalhadoras excluídas do acesso a terra ou com

inserção marginal - pouca terra, terra de baixa qualidade, etc. (SAUER, 2009,

p.43).

Os problemas sociais no campo não só permaneceram, sobretudo aumentaram

refletindo-se no aprofundamento das desigualdades sociais e no aumento da pobreza

(CERQUEIRA et al., 2002).

Diante da conjuntura econômica, das mobilizações sociais e da contribuição dos estudos

elaborados pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura

(FAO) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) que definiu

conceitualmente o termo “agricultura familiar” estabeleceu-se um conjunto de diretrizes

no intuito de nortear as políticas públicas para este segmento social (SHNEIDER;

CAZELLA; MATTEI, 2004, p.2). Em 1995, após esta contribuição teórica, o conceito

de agricultura familiar é consolidado no Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais

(MSTR), sob coordenação da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

(CONTAG) em seu 6 º congresso, que enfatizou a importância da reforma agrária como

um mecanismo de fortalecimento e ampliação da agricultura familiar e assumiu

definitivamente esse conceito em suas formulações e pautas de lutas (SAUER, 2009).

24

Foi um passo importante diante dos desafios enfrentados pelo sindicalismo rural à

época.

(...) a incorporação e a afirmação da noção de agricultura familiar mostrou-se

capaz de oferecer guarida a um conjunto de categorias sociais como, por

exemplo, assentados, arrendatários, parceiros, integrados à agroindústria,

entre outros, que não mais podiam ser confortavelmente identificados com as

noções de pequenos produtores ou, simplesmente de trabalhadores rurais. (SHNEIDER, 2003 apud SAUER, 2009).

Estes fatores colaboraram para dar um novo direcionamento às políticas que somente

contemplavam uma categoria da agricultura brasileira, a agricultura patronal. Portanto

observa-se a partir de 1990 a reinserção da reforma agrária na agenda política,

resultando na criação de diversos projetos de assentamentos, e na criação do PRONAF

(DA ROSA, 2009, p.13).

Com a implementação do PRONAF, em 1996, têm se a constatação da mudança de

enfoque no processo de implementação de políticas públicas para o espaço rural

brasileiro, devido à possibilidade de atender as demandas do sindicalismo rural no que

tange o crédito agrícola e o apoio institucional para os agricultores familiares.

No relatório divulgado pelo INCRA (2000) a partir das estatísticas oficiais do Censo de

1995/1996, considerou-se como familiares os estabelecimentos que atendiam,

simultaneamente, às seguintes condições: a direção dos trabalhos do estabelecimento

era exercida pelo produtor, e o trabalho familiar era superior ao trabalho contratado;

ficou estabelecida uma área máxima regional como limite superior para a área total dos

estabelecimentos familiares.

Após dez anos de PRONAF, foram estabelecidas através da Lei Nº 11.326, de 24 de

julho de 2006, as diretrizes para a formulação da política nacional da agricultura

familiar e empreendimentos familiares rurais. Os critérios para definição foram: a área

do estabelecimento ou empreendimento rural não deve exceder quatro módulos fiscais;

a mão de obra utilizada nas atividades econômicas desenvolvidas é predominantemente

da própria família; a renda familiar é predominantemente originada dessas atividades; e

o estabelecimento ou empreendimento é dirigido pela família. Reconhece-se também

um conjunto formado pela pequena e média propriedade, assentamentos de reforma

agrária e as comunidades tradicionais – extrativistas, pescadores, ribeirinhos,

quilombolas (BRASIL, 2006).

25

Segundo os dados do Censo Agropecuário de 2006, que utiliza os critérios definidos

pela Lei Nº 11.326, de 24 de julho de 2006, a participação da agricultura familiar no

Brasil corresponde, conforme Tabela 1, a 4.367,902 estabelecimentos, representando

84,% do total de estabelecimentos e ocupam uma área de 24%. Enquanto que os

agricultores não familiares que detém apenas 16% do total de estabelecimentos ocupam

76% da área. Esses dados demonstram que ainda há uma forte concentração na estrutura

fundiária, haja vista que, a área média dos estabelecimentos familiares é de 18,37ha e

dos não familiares de 309,18 ha.

Tabela 1 – Caracterização dos Estabelecimentos Agropecuários, segundo a Lei n. 11.326.

Brasil- 2006

Características Agricultura Familiar Não Familiar

Valor % Valor %

Número de Estabelecimentos 4.367.902 84 807.587 16

Área (Milhões ha) 80,3 24 249, 7 76

Mão de Obra (Milhões de Pessoas) 12,3 74 4,2 26

Valor da Produção (R$ Bilhões) 54,4 38 89,5 62

Receita (R$ Bilhões) 41,3 34 80,5 66

Fonte: IBGE, 2006 apud GROSSI; MARQUES , 2010

Em relação à participação de pessoas ocupadas vinculadas a agricultura familiar,

conforme Tabela 1, foi registrado que 74% desta mão de obra está ligada aos

estabelecimentos familiares, correspondendo a 12,3 milhões de pessoas ao passo que os

não familiares possuem apenas 4,2 milhões de pessoas. Esses valores de mão-de-obra

evidenciam a importância dos estabelecimentos familiares na geração de ocupação no

campo. Apesar de haver uma tendência de redução de pessoas ocupadas na agropecuária

desde a época de 1985, a agricultura familiar em 2006 conseguiu ser duas vezes

superior que o número de ocupações geradas pela construção civil (BRASIL, 2009).

Fazendo um recorte do Estado da Bahia e comparando com o Censo de 1996, conforme

Tabela 2, nesse período a Bahia tinha 623.536 estabelecimentos familiares, que

correspondia a 89,14% do total e possuía 66.816 estabelecimentos não familiares

26

representando 9,55% do total. No censo agropecuário de 2006 o número de

estabelecimentos familiares reduziu em 10,11% enquanto o número de estabelecimentos

não familiares aumentou em 25,56%. Entretanto em termos de participação relativa os

estabelecimentos familiares ainda são majoritários correspondendo a 86, 98% do total.

Tabela 2 – Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, Bahia, 1995/96 a

2006

Características

1996 2006

Agricultura

Familiar

Não

Familiar

Agricultura

Familiar

Não

Familiar

Valor % Valor % Valor % Valor %

Nº de Estabelecimentos 623.536 89,14 66.816 9,6 560.502 87 83.895 13,02

Área (ha) 11.323.676 38 18.366.189 62 9.955.563 118 19.224.996 228,46

Valor Bruto da

Produção (R$)

837.660 40 1.242.902 59 3.733,21 44,4 4.681.985 55,64

Fonte: IBGE, 2006 ; SANTOS, 2011

Conforme a Tabela 2 em relação à área, em 1996, a agricultura familiar ocupava 38%

da área total do Estado da Bahia, enquanto a não familiar ocupava 62%. Em 2006 houve

uma redução da participação relativa da agricultura familiar da agricultura familiar na

área total de 12%, passando a representar 34,12% da área total, enquanto isso ocorreu

um aumento de 4,68% na agricultura não familiar.

Segundo Santos (2011), a estrutura fundiária do Estado está altamente concentrada em

favor da agricultura não familiar, pois apesar de possuir um número bem menor de

estabelecimentos ocupa quase o dobro da área dos agricultores familiares. Percebe-se

que esse processo vem se fortalecendo ao longo dos últimos anos, inclusive com uma

redução da participação da agricultura familiar no campo baiano. Esse processo de

transformação pode ser entendido, ao observar que nesse período a produção para

exportação do Estado e do país foi se fortalecendo, seguindo o padrão de reprodução do

capital desde a colonização, o que favorece a consolidação de uma produção patronal

com concentração na produção, principalmente tipo exportação, enquanto a produção

familiar ainda se concentra no autoconsumo e no abastecimento de mercado interno,

função não menos importante.

27

No que tange a participação no valor bruto da produção do Estado, apesar da agricultura

familiar ter uma participação relativa menor que a agricultura não familiar, ainda assim

tem uma grande importância para a economia e para a soberania alimentar e nacional.

Em 1996, a agricultura familiar correspondia a 39,88% do valor da produção passando,

em 2006, para 44,36%. Já a agricultura não familiar correspondia em 1996 a 59,18%

passando, em 2006, a corresponder a 55,64% do valor bruto da produção do Estado.

Confirmando que, apesar de ter diminuído espaço, a agricultura familiar conseguiu

aumentar sua importância econômica (SANTOS, 2011).

Destaca-se que a produção da agricultura familiar como relação social que todo

processo social lhe impõe, é muito mais que relação econômica, ela garante a

manutenção das famílias no campo, a reprodução social e a reprodução de uma lógica

produtiva que pressupõem relações de sociabilidade e de convívio com a natureza

própria destes sujeitos.

Conforme a Tabela 3 é possível verificar os produtos que se destacam nos

estabelecimentos familiares. A agricultura familiar é responsável pela maioria dos

produtos de gênero alimentício típicos de consumo do mercado interno. Deste setor

87% são de produção de mandioca, 70% da produção de feijão, enquanto que 59% do

rebanho de suínos, 50% do rebanho de aves e 58% da produção de leite.

Tabela 3 – Participação da Agricultura na produção de alguns produtos, 2006

Cultura Agricultura Familiar (%) Não Familiar (%)

Mandioca 87 13

Feijão 70 30

Milho 46 54

Café 38 62

Arroz 34 66

Trigo 21 79

Soja 16 84

Continua

28

Tabela 3 – Participação da Agricultura na produção de alguns produtos, 2006 Conclusão

Cultura Agricultura Familiar (%) Não Familiar (%)

Leite 58 42

Aves 50 50

Suínos 59 41

Bovinos 30 70

Fonte: IBGE, 2006 apud GROSSI; MARQUES, 2010

Veiga (1998) apud Sauer (2010) inclusive ressalta a importância da necessidade do

Brasil adotar políticas fundiárias e agrícolas voltadas ao fortalecimento e à expansão da

agricultura familiar como base para o desenvolvimento local e regional. Para isso ele

chama atenção para a realização de uma reforma agrária que de fato desafogue os

minifúndios e ofereça terra aos sem-terra, possibilitando que se tornem agricultores

familiares viáveis.

Para Wanderley (2001) a reforma agrária seria sem dúvida o caminho para resolver a

questão da terra e com disseminação de assentamentos estes se tornariam uma

“sementeira” de agricultores familiares permitindo recuperar as forças sociais para o

desenvolvimento que existem na agricultura familiar. Conforme Guanziroli (2001) o

fortalecimento da agricultura familiar e a reforma agrária devem caminhar na mesma

direção, dando capacidade ao meio rural e à agricultura de ampliar sua contribuição

para o desenvolvimento do país.

3.2 ASSENTAMENTOS RURAIS

A luta pela terra e, consequentemente, pela reforma agrária- se constitui como uma

resistência ao processo de dominação e exclusão que incide aos agricultores familiares.

Essa resistência reforça a construção e o reconhecimento de novos atores políticos

(posseiros, sem-terra, parceiros, arrendatários, atingidos por barragens, etc...) e suas

demandas específicas.

Se ao longo de nossa história a luta por terra teve como um de seus

personagens centrais o posseiro, cuja legitimidade se calcava na noção

jurídica de posse, nas últimas décadas encontramos também quilombolas,

faxinalenses, comunidades de fundo e fecho de pasto, ribeirinhos entre

outras, reclamando seu direito à terra com base no uso imemorial, num

sentimento de pertencimento, que envolve valores culturais, tradições grupais

arraigadas que agora se declaram frente às ameaças a que estão

submetidos.Mais do que luta por terra, tratase da disputa pela legitimidade do

direito a um território. (MEDEIROS, 2015, p.).

29

Fazendo uma breve retrospectiva sobre a questão da luta pela democratização da terra

no país, Mattei (2005, p.169) divide em três momentos em que o papel da terra foi

decisivo na conformação da sociedade brasileira. Primeiro momento foi em 1850 com a

regularização pela Lei das Terras do acesso privado as terras, no qual impediu que parte

da população trabalhadora rural também tivesse esse direito. O segundo para o autor se

deu nas décadas de 1920 e 1930, quando o movimento tenentista questiona o latifúndio

improdutivo e inicia os primeiros debates sobre a necessidade de mudanças na estrutura

fundiária do país. O terceiro momento inicia-se nos anos pós-guerra, com as ligas

camponesas nos anos 60 e com o surgimento do Movimento Sem Terra (MST) nos anos

80, movimentos que transformaram o campesinato em um dos atores sociais mais

relevantes do país ao reivindicarem a reforma agrária como um dos principais

instrumentos de luta para transformar a sociedade brasileira. Outra organização social

que teve destaque foi a CONTAG que organizou as mobilizações chamadas de “Grito

da Terra Brasil” e junto com os setores da igreja teve papel decisivo na inclusão do

tema reforma agrária na agenda política nacional.

Medeiros (2015) ressalta que as décadas de 80 e 90 foram marcadas pelo crescimento

exponencial das ocupações e acampamentos que buscavam recolocar no espaço público

a questão da terra tendo como base tanto argumentos econômicos, ou seja, a

importância de produção de alimentos, quanto de argumentos morais que implicavam

na necessidade de eliminar a enorme injustiça social que marcava o campo brasileiro.

Destaca que à medida que essas iniciativas eram bem sucedidas mais famílias se

agregavam e mobilizavam provocando um chamado “espiral das ocupações de terra”.

Cabe destacar também que os anos 90 foi um período marcado pelo crescimento da

visibilidade dos agricultores familiares como também dos “sem terra” estes que foram

fruto do processo de pauperização ou expropriação de segmentos de trabalhadores que

antes tinham acesso a terra na condição de pequenos proprietários ou arrendatários e

que passaram a demandar terra na sua região de origem, negando-se a se inserir nos

projetos de colonização durante o período do regime militar.

A reforma agrária, bandeira que foi o cimento da construção da identidade

“trabalhador rural” pela Contag (Palmeira, 1985), foi aos poucos sendo

socialmente identificada com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem

Terra (MST), produtor de uma nova identidade política (“sem terra”) e que,

30

através de suas ações, passou a impulsionar desapropriações e assentamentos.

(CALDAR, 2000 apud MEDEIROS, 2001.p 107).

Conforme Leite (2012), o processo de constituição de assentamentos rurais colocou-se

como um dos fatos mais marcantes no cenário da questão agrária brasileira. O termo

assentamento rural surge no Brasil devido à atuação estatal direcionada ao controle e à

delimitação do novo “espaço” criado, sobretudo, em razão dos processos de luta e

conquista por terra pelos trabalhadores rurais. Deste modo o assentamento pode ser

entendido como regularização de áreas, viabilizando a permanência na terra de famílias

que geralmente estavam em acampamentos ou em ocupações em situação conflituosa.

Neves (1999, p.9) ressalta que

O processo de assentamento rural se objetiva enquanto uma forma de ação

coletiva – produto de condutas humanas reciprocamente referenciadas (cf.

Weber, 1977: 5) -, concertada em favor de uma causa associada a uma

atividade política (cf. Neves, 1996). Ele se expressa por um conjunto de

acontecimentos e práticas que denunciam formas de descontentamentos,

razão pela qual canaliza protestos e encaminhamentos de reivindicações.

Enquanto ação coletiva, sua viabilidade depende do engajamento e da

convergência entre uma pluralidade de agentes sociais.

Segundo Sauer (2005) a criação de um assentamento é um produto de conflitos, lutas

populares e demandas sociais pelo direito de acesso a terra. A mobilização e

organização sociais, o enfrentamento com os poderes políticos locais e nacionais, as

disputas com o latifúndio e com o Estado e os questionamentos das leis de propriedade

caracterizam o que o Bourdieu definiu como “as lutas pelo poder de di-visão”.

No sentido de ilustrar o processo de constituição e a trajetória de um assentamento,

Leite (2000) apresenta três diferentes fases. A primeira seria baseada no histórico da

região onde se localizam e dos conflitos que lhe deram origem. Nessa fase é um

momento no qual se geram lideranças, ocorre a constituição de alianças e oposições,

mas também é a fase da solidariedade e de identidade.

A luta pela terra e os procedimentos de constituição do assentamento

proporcionam a experiência de novas formas de participação e de

sociabilidade entre assentados rearranjando e/ou recuperando redes de

relações pessoais anteriores que dão origem a distintas formas de organização

ou constituindo novos. (LEITE, 2000 p.48).

A segunda fase é o momento da intervenção do Estado sobre o conflito, com a

regularização ou desapropriação das terras, delimitação das áreas dos assentados e o

31

fornecimento de políticas para o desenvolvimento. O autor assinala que o ato de

assentar significa que há um reconhecimento da situação de conflitos, dos agentes

sociais, das demandas, muitas das quais até então ignoradas e possivelmente a

transformação dela em direitos que implica em uma mediação legal para o conflito.

a constituição de um assentamento (em diversos casos, de mais de um

assentamento no âmbito de um mesmo município ou região) acarreta a

introdução de novos elementos e agentes que ocasionam alterações nas

relações de poder. Tratando-se de área de conflito fundiário, quer envolvendo

resistência, quer ocupação de terras, o simples fato de ocorrer uma

desapropriação e um assentamento significam o reconhecimento do conflito

por parte do Estado, que se concretiza na sua intervenção mediante

desapropriação. (LEITE, 2000, p.45).

Ainda segundo Leite (2000), a terceira fase é a da instalação e reprodução que implica

após a chegada a terra na delimitação de lotes e a distribuição da população no seu

interior; o trabalho nos lotes; as relações no interior do projeto e o perfil dos sistemas de

produção, isso tudo resulta em novas questões como: a necessidade de disputa de

créditos; a imposição de formas associativas, a diferenciação política que ela produz (ou

consolida) entre os assentados; a busca de mercados para os produtos; a manifestação de

uma série de carência com relação ao escoamento da produção e obtenção de insumos;

as carências com relação à saúde, educação e transporte.

Leite (2000) considera que a conquista da terra representa, portanto, um “ponto de

chegada”, como possibilidade de mobilidade e integração social dos beneficiários e um

“ponto de partida”, uma condição a partir da qual as famílias buscam desenvolver

projetos tecno-produtivos, praticar uma nova sociabilidade interna aos núcleos de

reforma agrária e inserir-se num jogo de disputas políticas - sobretudo, na sua relação

com o Estado-visando sua reprodução.

A política de assentamentos rurais se apresenta como a principal política de

democratização do acesso a terra. No entanto, é preciso assinalar que após a conquista

da terra, surgem novos problemas e desafios para a garantia da viabilidade

socioeconômica, inclusive porque a dinâmica de desenvolvimento de cada assentamento

está condicionada à combinação de uma série fatores: a área (clima, fertilidade dos

solos, relevo, água disponível); a infraestrutura produtiva e de uso social (estradas,

equipamentos, escola, moradia, saúde e saneamento); a organização da produção; o

32

crédito; a assistência técnica; os canais de comercialização; e o entorno

socioeconômico.

Leite (2000, p. 48) ressalta que

A existência de assentamentos em áreas inapropriadas para o

desenvolvimento da agricultura (com má qualidade dos solos, erosão,

degradação, etc.) é bastante recorrente. Esse fator agregado à necessidade de

buscar ganhos imediatos tem resultado em intensificação do desgaste do solo,

limitando as possibilidades de produção e de sobrevivência.

O desenvolvimento e consolidação do assentamento tem como barreira significativa sua

integração às condições do sistema produtivo, especialmente no que concerne a

comercialização da produção agrícola. Desde modo a formulação de estratégias de

desenvolvimento para essas unidades produtivas exige um entendimento da realidade na

qual eles estão inseridos, ou seja, as práticas técnicas, sociais e econômicas destes

agentes e os elementos que as determinam.

Da Rosa (2009, p. 35) ressalta que a viabilidade da reforma agrária depende da

desconcentração da propriedade da terra e da transferência de recursos públicos para

aumentar a produtividade dos sistemas de produção no assentamento. Após o processo

de desapropriação e a criação do assentamento a reinserção econômica-social dos novos

assentados deve ser uma ação contínua do Estado. Pois deixar os assentamentos à mercê

das forças de mercado permite a desigualdade de oportunidades e de capacidades,

incompatíveis com a ideia de desenvolvimento com justiça social. Destaca que quando

ocorre a omissão política do Estado os assentamentos geralmente tendem a uma

economia de subsistência ou a se integrarem à dinâmica da grande agroindústria na

condição de integração que esta determina.

3.3 PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA)

Constituído como uma das principais ações estruturantes do Programa Fome Zero, o

Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) apresenta-se como um instrumento de

fortalecimento do agricultor familiar, atuando em uma área muitas vezes esquecida

pelas políticas públicas e considerada como um dos principais entraves para a

sustentabilidade econômica dos agricultores familiares: a comercialização da produção.

33

O PAA foi criado em 2003, como resultado de discussões que ocorreram na década de

1990, referentes à questão da segurança alimentar, do combate à fome e da necessidade

de promover a inclusão social e econômica no campo. O Programa parte de uma

concepção intersetorial de segurança alimentar e nutricional contemplando tanto as

demandas de acesso aos alimentos das populações em situação de insegurança alimentar

como as necessidades dos agricultores familiares de conseguir mercados para seus

produtos (GRISA et al., 2011, p. 35).

Um dos aspectos que também favoreceu a criação do PAA foi o reconhecimento da

categoria agricultura familiar no âmbito nacional com a criação do Programa Nacional

de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) demandando mais políticas

públicas específicas para esse grupo social.

O diálogo estabelecido, a partir dos anos 1990, entre diferentes expressões de

crítica ao modelo de agricultura e desenvolvimento rural hegemônico no

Brasil e uma concepção abrangente de segurança alimentar e nutricional, que

não se restringia, unicamente, ao acesso ao alimento, possibilitou que

questões relacionadas à necessidade de transformação da matriz produtiva da

agricultura familiar fossem incorporadas ao processo de formulação do PAA.

(GRISA et al. 2011, p.34).

Segundo Le Moal (2013) a diversificação das ações do governo frente ao fortalecimento

da agricultura familiar foi à constatação de que a simples liberação de crédito em si não

bastava para alcançar o desenvolvimento. Guanzaroli (2007) ressalta que um dos pontos

críticos do PRONAF refere-se à capacidade de pagamento de crédito por parte dos

beneficiados, que não parece ter sido assegurada convenientemente pelas autoridades, já

que precisaram conceder contínuas renegociações e resseguros dos empréstimos que

ficaram em atraso ou estavam ficando inadimplentes.

Guanziroli (2007) em sua pesquisa sobre os 10 anos de implementação do PRONAF

sintetiza alguns fatores que influenciaram negativamente o processo de geração de

renda dos agricultores, impedindo, portanto, que se viabilizasse o reembolso dos

empréstimos: Falta de assistência técnica ou baixa qualidade da mesma; dificuldades no

gerenciamento dos recursos de crédito; a falta de integração nos mercados, de estrutura

de comercialização e de agregação de valor; sistema bancário conservador e

despreparado para atender os assentados; a falta de uma política pública mais

consistente com a realidade da reforma agrária.

34

De acordo com (SILVA, 2007 apud Le MOAL, 2013, p.16) é preciso considerar que as

dificuldades metodológicas e de percepção da heterogeneidade socioambiental que

envolvem os agricultores familiares têm limitado a efetividade das políticas públicas

particularmente do PRONAF, no que se referente à potencialização das unidades

produtivas em uma perspectiva sustentável nos aspectos econômicos, social e ambiental.

Segundo os autores Oliveira e Mazzini (2010) apud Pontes (2015) a comercialização

sempre foi considerada uma barreira para o desenvolvimento e estabilidade dos

pequenos produtores, sobretudo, os assentados pela reforma agrária e com atividade

classificada como agricultura familiar. Neste sentido, o PRONAF não conseguiu

alcançar toda demanda e heterogeneidades sociais e políticas locais dos beneficiários,

apesar dessa política tenha o intuito de estimular a constituição de “um agente social em

gestação, capaz de corresponder a diferenciadas expectativas, agora vinculada a novos

modelos criados para reafirmar outros processos de modernização social” (NEVES,

2010, p.2)

Portanto, o surgimento do PAA tem que ser compreendido conforme afirma Mieltiz

(2013, p.61) como parte de “um conjunto de instrumentos constitutivos de uma

reorientação nos papéis esperados e/ou funções atribuídas ao mundo rural e à produção

agrícola no processo de desenvolvimento nacional, particularmente no que se refere à

agricultura familiar”.

Instituído pelo artigo 19 da Lei 10.696/2003 e Decreto nº 7.775, de 4 de julho de 2012,

o Programa foi criado para atender dois objetivos principais: promover o acesso à

alimentação e incentivar a agricultura familiar. Integrado ao Sistema Nacional de

Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) compreende as seguintes finalidades

(BRASIL, 2014):

I - Incentivar a agricultura familiar, promovendo a sua inclusão econômica e

social, com fomento à produção com sustentabilidade, incentivo ao

processamento da produção e à geração de renda;

II - Incentivar o consumo e a valorização dos alimentos produzidos pela

agricultura familiar;

III - Promover o acesso à alimentação, em quantidade, qualidade e

regularidade necessárias, às pessoas em situação de insegurança alimentar e

nutricional, sob a perspectiva do direito humano à alimentação adequada e

saudável;

IV–Promover o abastecimento alimentar por meio de compras

governamentais, inclusive para prover a alimentação escolar, quando

necessário, nos âmbitos municipal, estadual, distrital e federal, e nas áreas

abrangidas por consórcios públicos;

35

V - Constituir estoques públicos de alimentos produzidos por agricultores

familiares;

VI - Apoiar a formação de estoques pelas cooperativas e demais organizações

formais da agricultura familiar;

VII - Fortalecer circuitos locais e regionais e redes de comercialização;

VIII - Promover e valorizar a biodiversidade e a produção orgânica e

agroecológica de alimentos, incentivar hábitos alimentares saudáveis em

nível local e regional;

IX - Estimular o cooperativismo e o associativismo.

O Programa é destinado à aquisição de produtos agropecuários produzidos por

agricultores, enquadrados no PRONAF que possuam a Declaração de Aptidão ao

PRONAF (DAP), incluídos assentados da reforma agrária, silvicultores, aquicultores,

extrativistas, pescadores artesanais, indígenas assim como as comunidades

remanescentes de quilombos rurais e de demais povos e comunidades tradicionais, que

atendam aos requisitos previstos na lei que estabelece as diretrizes para a formulação da

Política Nacional da Agricultura Familiar. Os beneficiários consumidores são as pessoas

e famílias em situação de vulnerabilidade social; com eminente risco de insegurança

alimentar e nutricional, atendidas por entidades socioassistencial; programas nacionais

de promoção de segurança alimentar e nutricional e em beneficiários fornecedores que

são os agricultores familiares e empreendedores familiares rurais (CONAB, 2010).

Atualmente o Programa é operado através de seis modalidades considerando diferentes

formas de relacionamento da agricultura familiar com os mercados e as distintas

necessidades de promoção e suporte da segurança alimentar e nutricional. O Quadro 1, a

seguir, apresenta as seis modalidades do programa e suas características.

Quadro 1 – Modalidades do PAA seus principais objetivos e características

Modalidade Principais objetivos e Características

Compra com Doação Simultânea Tem como finalidade o atendimento de demandas locais

de suplementação alimentar, promovendo o Direito

Humano à Alimentação Adequada. A Modalidade

incentiva que a produção local da agricultura familiar

atenda às necessidades de complementação alimentar das

entidades da rede socioassistencial dos equipamentos

públicos de

alimentação e nutrição (Restaurantes Populares, Cozinhas

Comunitárias e Bancos de Alimentos) e, em

condições específicas definidas pelo Grupo Gestor do

PAA, da rede pública e filantrópica de ensino. Os

alimentos são diversificados podendo estar "in natura" ou

processados.

36

Compra Direta da Agricultura

Familiar

Tem como finalidade a sustentação de preços de uma

pauta específica de produtos definida pelo Grupo Gestor

do PAA, a constituição de estoques públicos desses

produtos (arroz, feijão, milho, trigo, sorgo, farinha de

mandioca, farinha de trigo, leite em pó integral, etc...) e o

atendimento de demandas de programas de acesso à

alimentação.

Apoio à Formação de Estoque Tem como finalidade apoiar financeiramente a

constituição de estoques de alimentos por organizações da

agricultura familiar, visando agregação de valor à

produção e sustentação de preços. Posteriormente, esses

alimentos são destinados aos estoques públicos ou

comercializados pela organização de agricultores para

devolução dos recursos financeiros ao Poder Público.

Incentivo a Produção

e ao consumo de leite

Tem como finalidade contribuir com o aumento do

consumo de leite pelas famílias que se encontram em

situação de insegurança alimentar e nutricional e também

incentivar a produção leiteira dos agricultores familiares.

Esta modalidade é executada pelos estados do Nordeste e

Minas Gerais (Região Norte).

Compra Institucional

Tem a finalidade de garantir que os estados, Distrito

Federal e municípios, além de órgãos federais também

possam comprar alimentos da agricultura familiar, com

seus próprios recursos financeiros, dispensando-se a

licitação, para atendimento às demandas regulares de

consumo de alimentos. Poderão ser abastecidos hospitais,

quartéis, presídios, restaurantes universitários, refeitórios

de creches e escolas filantrópicas, entre outros.

Aquisição de Sementes

A modalidade permite que a CONAB compre sementes

mediante apresentação de proposta, para atender às

demandas dos órgãos demandantes: MDA, Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA),

pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Fundação

Cultural Palmares (FCP), Instituto Chico Mendes

(ICMBio), além de governos estaduais, por meio das

Secretarias Estaduais de Agricultura ou pelas empresas de

Assistência Técnica e Extensão Rural.

A aquisição é feita de organizações da agricultura familiar

detentoras da Declaração de Aptidão ao PRONAF – DAP

Jurídica

Fonte: : Elaboração própria, 2015 com base em BRASIL, 2015

O Programa prevê a aquisição e a comercialização de alimentos produzidos pela

agricultura familiar, sendo dispensada a licitação, desde que os preços sejam

compatíveis com aqueles praticados nos mercados regionais e os destina às pessoas em

situação de insegurança alimentar e nutricional e aquelas atendidas pela rede

socioassistencial, pelos equipamentos públicos de segurança alimentar e nutricional e

pela rede pública e filantrópica de ensino. Também contribui para a constituição de

37

estoques públicos de alimentos produzidos por agricultores familiares e para a formação

de estoques pelas organizações da agricultura familiar (BRASIL, 2015).

Em sua formulação o PAA permite que as aquisições sejam feitas com base em preços

de referência considerando as diferenças regionais e a realidade da agricultura familiar.

Para Grisa e outros (2011) e Le Moal (2013) trata-se de uma inovação pois

considerando que a Política de Garantia de Preços Mínimos, criada em 1945 e

reestruturada em 1960, utilizava mecanismos de aquisição de caráter universal

submetendo grupos distintos às mesmas exigências na hora da comercialização,

consequentemente reduzia o acesso dos familiares a esses instrumentos. Portanto, o

Programa rompe com essa tradição ao destinar suas ações para um segmento específico

da agricultura familiar, os agricultores familiares, respeitando as diferenças regionais

nos preços de referência.

Segundo Mattei (2005) ao dispensar as regras de licitação requeridas pela Lei 8.666/93,

criou-se um marco jurídico capaz de possibilitar uma maior presença do Estado no

apoio aos processos de comercialização da produção dos agricultores familiares.

Ghizelini (2006) apud Silva (2016) ressalta que a ausência de licitação, adotada pelo

PAA, foi uma estratégia para resolver a problemática da pouca capacidade de

diversificação da produção e de comercialização dos agricultores familiares.

Delgado e outros (2005) chamam atenção para os benefícios indiretos advindos da

recuperação dos preços recebidos pelos produtores. Os autores relatam que houve casos

em que o simples anúncio da compra pública de determinada quantidade do produto foi

suficiente para elevar os preços aumentando a remuneração do produtor com a venda no

mercado local. Destacam também o aumento, a diversificação e a melhoria da qualidade

da produção para o autoconsumo, fatores que extrapolam para o comércio local.

Segundo os autores, há registros da estruturação de produtores para o abastecimento de

outras praças, além daquela em que a produção está sendo apoiada pelo PAA.

Para Grisa e outros (2011, p.37)

O PAA sinaliza um novo estágio no que se refere às políticas de

fortalecimento da agricultura familiar, sobretudo porque abre um canal de

comercialização para essa categoria social, garantindo a aquisição de seus

38

produtos pelo Estado por meio de mecanismos diferenciados. A garantia de

comercialização traz um novo alento a essas famílias, que podem lançar mão

de suas especificidades, de seus valores e suas práticas locais para articular-

se com diversos públicos consumidores.

Ao submeter as aquisições de produtos tendo como base os preços de referências que

consideram as diferenças regionais, além de ser uma inovação possibilita a minimização

do poder dos chamados “atravessadores”.

Cria as condições necessárias para que o Estado possa atuar no mercado de

produtos agrícolas, exercendo não apenas um efeito regulador sobre os

preços regionais, mas dando um tratamento diferenciado para os agricultores

familiares, buscando reforçar sua autonomia em relação aos chamados

“atravessadores” e fortalecendo sua posição frente aos diferentes agentes de

mercado. (SCHMITT, 2005, p. 83 apud ROCHA, 2007).

Segundo Grisa e outros (2011), ocorreram mudanças qualitativas na matriz produtiva

das unidades familiares referente à diversificação produtiva, devido a restauração da

policultura, “predicado de um modo de vida camponês”. Pois o período de

modernização da agricultura fez com que, em muitas regiões do Brasil, os agricultores

ingressassem na monocultura e na produção de commodities acentuando a

vulnerabilidade social.

O PAA promove a aquisição de um conjunto diverso de alimentos, resultante da

oportunidade de agricultores e suas organizações ofertarem o que dispõem para

comercializar, desde que seja sinalizado e acordado nos projetos estabelecidos com a

Conab ou prefeituras e governos estaduais. Esse processo possibilita que as famílias

tenham a chance de ofertar um leque de produtos, dessa forma contribuindo para que

haja o fortalecimento e o resgate da cultura alimentar regional. Diversos produtos

podem ser adquiridos de uma mesma unidade familiar, muitos deles produzidos

anteriormente sem destinação comercial, restritos aos espaços do consumo familiar.

Além da diversificação da produção, o PAA promove a transição de um modelo de

produção convencional para a produção baseada em princípios agroecológicos, ou seja,

que utilize técnicas de cultivo orgânico com sustentabilidade social. O Programa paga

um preço 30% superior para os produtos cultivados em sistemas de base

agroecológica/orgânica.

39

[...] o PAA incentiva a produção em bases agroecológicas ou orgânicas, ou

seja, apoia sistemas de produção que prezam pela preservação do meio

ambiente, pela valorização da biodiversidade, pelo aproveitamento dos

recursos locais, pela utilização de sementes crioulas e pelo respeito à

diversidade cultural e aos saberes locais. (GRISA, 2011, p.36).

No tocante aos recursos da operacionalização, o Programa é desenvolvido com recursos

provenientes do MDS e MDA. Suas diretrizes são definidas por um grupo gestor

interministral coordenado pelo MDS e composto pelos Ministérios da Fazenda; do

Planejamento, Orçamento e Gestão, representado pela CONAB; do Desenvolvimento

Social e Combate à Fome e do Ministério da Educação e tem como objetivos orientar e

acompanhar sua implementação. Além desse grupo gestor o Programa ainda conta com

a participação do CONSEA, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural

Sustentável (CONDRAF) e dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE) como

representantes do Controle social dos projetos.

São considerados como unidade executora, conforme pode ser verificado no Quadro 2,

os órgãos ou entidades da administração pública estadual, do Distrito Federal ou

municipal que firmem compromisso com o Termo de adesão ou que tenha convênios

com a MDS ou MDA; e a CONAB e outros órgãos ou entidades da administração

pública federal que celebrarem termo de cooperação com o MDA e com o MDS

(BRASIL, 2015).

Para acessar algumas modalidades do Programa, conforme pode ser verificado no

Quadro 2, existe a necessidade do agricultor estar organizado em associações ou

cooperativas.

Quadro 2 – Tipos de Modalidades, Forma de Participação, Limite, Origem do Recurso e

Unidade Executora

Modalidade Forma de Participação Limite Origem do

Recurso Unidade

Executora

Compra da

Agricultura Familiar Individual R$ 6,5 mil MDS

Entes Federados

que aderiram ao

40

para Doação

Simultânea Organizações

(cooperativas/

associações) R$ 8 mil

programa,

CONAB

Formação de

Estoques pela

Agricultura Familiar

(CPR Estoque)

Organizações

(cooperativas/

associações) R$ 8 mil MDS/MDA CONAB

Compra Direta da

Agricultura Familiar

(CDAF)

Individual ou

organizações

(cooperativas/

associações)

R$ 8 mil

Individual

R$ 500 mil

Organizações

MDS/MDA CONAB

Incentivo à

Produção e

Incentivo de Leite

(PAA Leite)

Individual ou

organizações

(cooperativas/

associações)

R$ 4 mil por

semestre MDS

Governos Estaduais do Nordeste e

do estado de Minas Gerais

Compra

Institucional

Individual ou

organizações

(cooperativas/

associações)

R$ 20 mil

Dotação própria

dos órgãos compradores

Órgão

Comprador

Aquisição de

Sementes

Individual ou

organizações

(cooperativas/

associações)

R$ 6 milhões MDS CONAB

Fonte: Elaboração própria ,2015 com base em BRASIL, 2015

Conforme o Quadro 2, o MDA disponibiliza os recursos para a operacionalização das

modalidades Compra Direta e Formação de Estoque pela Agricultura Familiar, que

contribui para os estoques públicos e possibilitam que o agricultor familiar formem

estoques de produtos para posterior comercialização. Já o MDS executa as modalidades

de Compra com Doação Simultânea, Incentivo à Produção e ao Consumo de Leite e

Aquisição de sementes. O recurso da modalidade Compra Institucional é proveniente

das entidades proponentes. Cada modalidade apresenta um limite monetário anual por

DAP, sendo possível ao agricultor ou as organizações acessarem mais de uma

modalidade do PAA simultaneamente, desde que sejam atendidos os critérios

estabelecidos do Programa. No caso da Compra Institucional cada produtor pode vender

até R$20 mil por ano para instituições que fornecem alimentação regularmente como

hospitais, quartéis, presídios, restaurantes universitários, asilos, creches, etc.

41

Na modalidade Compra Institucional o PAA é voltado para atender demandas de

alimentação escolar de alguns estados e municípios. Contudo, não há obrigatoriedade de

participação no Programa e sua execução depende de dotação orçamentária estabelecida

anualmente e do interesse das instituições elegíveis.

Importante salientar que a partir de 2009, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da

Educação (FNDE) passou a utilizar parte dos recursos destinados à alimentação escolar

na aquisição de produtos da agricultura familiar.

Art. 14. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito

do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na

aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do

empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os

assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e

comunidades quilombolas. (BRASIL, 2015).

A ampliação do acesso ao mercado para os agricultores foi um fato importante para o

Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que por meio da Lei nº 11.947, de

2009, criou um mercado institucional no qual o poder público é obrigado a destinar pelo

menos 30% dos recursos vinculados ao PNAE com produtores da agricultura familiar.

De 2003 a 2013, o Programa esteve presente em 3.915 municípios em todo o país

atendendo cerca de 20 mil entidades socioassistencias e contando com mais de 2 mil

organizações da agricultura familiar. O volume total de recursos aplicados nesse

período foi equivalente a R$ 5,35 bilhões de reais sendo que 91% oriundo do MDS e

9% do MDA. Lembrando que somente a partir de 2006 que o MDA inclui ações

vinculadas ao PAA no seu orçamento.

No ano de 2003 foi aplicado um montante de cerca de R$145 milhões de reais e

passando os anos esse montante apresentou uma tendência positiva de crescimento

alcançando no ano de 2012 um patamar de R$ 885 milhões de reais, ou 16,5% do total

dos recursos, um incremento de 511% em relação ao ano de 2003. No ano seguinte há

uma queda brusca dos recursos repassados, chegando a cerca de R$437 milhões

equivalente a metade do valor que foi aplicado no ano anterior.

42

O Relatório de Execução da CONAB de 2013 atribui como fatores para baixa execução,

a seca ocorrida no Nordeste, o envolvimento das Superintendências Regionais

(Deslocamento de funcionários que trabalham com PAA) no programa Venda em

Balcão, redução da demanda de compra Direta, cancelamento da Formação de Estoque

com liquidação física e a remodelação dos normativos. Grisa (2015, p. 158) acrescenta

como um fator para a baixa execução o efeito da criminalização e “apreensão judicial”

que recaiu sobre o Programa e aos atores envolvidos em sua execução, seja em âmbito

nacional, seja nos espaços locais.

Gráfico 1- Evolução dos Recursos do MDS/MDA aplicados no PAA, 2003-2013

Fonte: BRASIL, 2014

Na Tabela 4, a seguir é possível verificar a distribuição regional dos recursos e o

número de agricultores participantes durante os 10 anos de Programa. Nota-se que a

região nordeste foi a que mais recebeu recursos, 47% do total, por conseguinte

expressou maior participação de agricultores. Isso segundo Grisa (2015) é resultante da

existência da modalidade PAA Leite que é direcionada para a região (nordeste e o norte

do estado de Minas Gerais) que tem mais incidência de insegurança alimentar e pobreza

rural. Logo em seguida o Sul com e o Sudeste com 21,8% e 21,5, respectivamente. As

regiões Norte e Centro-Oeste tiveram 5,8% e 3,7% de recursos aplicados,

respectivamente.

R$ 0,00

R$ 225,00

R$ 450,00

R$ 675,00

R$ 900,00

R$ 1.125,00

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

43

Tabela 4 - Recursos Aplicados e Número de Agricultores Participantes de 2003 a 2013, por

Região Geográfica

Região

Volume de

Recursos em

Bilhões ($)

(%) Recursos

Nº de Agricultores

Familiares

Participantes

(%) Agricultores

Centro –

Oeste 195.670.713 3,7 54.280 4,04

Nordeste 2.503.600.220 47,2 592.578 44,13

Norte 308.847.592 5,8 105.756 7,87

Sudeste 1.140.649.742 21,5 268.696 20,01

Sul 1.157.807.546 21,8 321.626 23,95

TOTAL 5.306.575.812 100 1.342.936 100

Fonte: BRASIL, 2014

No que se refere aos produtos adquiridos pelo programa é possível verificar que são

extremamente diversificados, totalizando mais de 400 tipos de produtos desde 2003

(BRASIL, 2014). O Gráfico 2 mostra os grupos de produtos, adquiridos dos

beneficiários fornecedores no período de 2011 a 2013. Muitos desses produtos são

regionais, e sua aquisição opera no intuito de valorizar e respeitar os hábitos alimentares

locais e a aptidão agrícola regional. Observa-se que os laticínios e frutas foram os

produtos mais adquiridos, chegando a 26%. Logo em seguida as hortaliças,

correspondendo a 19% dos produtos. Representando cerca de 2% dos produtos

adquiridos do PAA, as sementes terão uma nova representatividade nos próximos anos,

após a consolidação da nova modalidade que é a Modalidade Aquisição de Sementes.

44

Gráfico 2 – Grupos de Produtos e Percentual de Recursos Alocados no período de 2011 a 2013

Fonte: BRASIL, 2014

Para Graziano Silva (2013), diretor da FAO, alguns fatores se tornaram determinantes

para o progresso dessa política: A ideia simples e contundente de canalizar o poder de

compra do Estado para quem sempre apresentou dificuldades no campo rural, ou seja,

os agricultores familiares e de subsistência; a vinculação do PAA com outras políticas

captadas pelo Programa Fome Zero; a recuperação e ampliação da CONAB para

operacionalizar junto ao produtor; a implantação de um sistema de monitoramento

permanente das aquisições, passando pelo controle, entre outros, do CONSEA e por fim

o reconhecimento da capilaridade difusa da pequena produçã.

45

4 ESTUDO DO PAA NO PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS RIACHÕES

4.1 MOVIMENTO DE LUTA PELA TERRA: MOVIMENTO CETA

Antes de fazer uma análise do pré-assentamento Dois Riachões é pertinente trazer um

breve histórico do movimento de luta pela terra no qual ele se insere, o Movimento

CETA6.

O Movimento CETA, luta pela terra e por uma Reforma Agrária que seja capaz de dar

condições de sustentabilidade, comercialização, lazer, formação e emancipação aos

trabalhadores e trabalhadoras rurais, tendo como princípios o respeito à democracia, ao

meio ambiente e relações equitativas de gênero, raciais e de geração. O Movimento

surge em 1995 no Estado da Bahia, a partir de acampamentos e assentamentos

acompanhados pela CPT tendo como objetivo pressionar o Estado a realizar a

democratização do acesso a terra.

Santos (2010) destaca os principais momentos da trajetória do surgimento do

Movimento: Comissão (1995-1999), Coordenação (1999-2002) e atualmente

Movimento (2002- dias atuais).

O primeiro momento se refere ao período que é constituído uma Comissão após um

Encontro que tinha sido pautado devido ao diagnóstico feito pela CPT que revelava os

problemas (Conflito pela posse da terra, falta de infraestrutura básica e de produção,

problemas de acesso a crédito, entre outros.) que os trabalhadores rurais enfrentavam

nas áreas de ocupações e assentamentos. Com esse diagnóstico foi sentido pela CPT e

demais organizações a necessidade de fazer o “Encontro de Assentamentos e Áreas de

conflito da Bahia” ,em 1995 na Sede da CPT em Salvador, no intuito de articular as

áreas que estavam “abandonadas” pelos órgãos responsáveis pela reforma agrária no

Estado e sem movimento social, para trocar experiências e conseguir delinear uma linha

de frente, fortalecendo a luta e pressionando o Estado para que proporcionassem

políticas públicas para o campo. Dessa forma a comissão teve como objetivo se articular

nas regiões Oeste, Sul, Extremo Sul, Médio São Francisco e Sudeste, de organizar a luta

6 Essa contextualização histórica do Movimento será baseada na pesquisa “CETA: nossa luta é justa e certa!”:

Formação e territorialização do Movimento CETA (1994-2009) do autor Tiago Rodrigues Santos (POSGEO/UFBA).

46

e mobilizações, como também de cobrar dos políticos de esquerda uma atuação mais

efetiva sobre o assunto, incentivar o relacionamento com outras organizações, como

CUT e MST (SANTOS, 2010,p. 64)

Essa Comissão, após o segundo Encontro que ocorre em 1996, muda sua composição

sendo então composta apenas por trabalhadores e com as entidades participando

somente com o apoio. Para o autor isso é importante “pois insere no movimento aquilo

que corresponde um dos princípios de sua principal assessoria, a CPT: o protagonismo

dos trabalhadores” (SANTOS, 2010, p. 64).

Com as discussões sobre a comissão no que se refere a sua identidade e o modelo de

organização que pela avaliação da comissão já estava esgotado por conta da

complexidade que o processo de luta estava tomando, (aumento de números de áreas

acompanhadas, aumento dos conflitos, a visibilidade e a legitimidade face aos órgãos

públicos entre outras questões) fez com que gerasse vários questionamentos. “A questão

da estrutura da organização foi destaque na avaliação, como poderiam ter uma estrutura

que pudesse dar condições a realização das demandas? Como poderia ser organizar a

nível estadual, regional e até mesmo local para encaminhar as demandas dos

trabalhadores?” (SANTOS, 2010, p. 72).

Portanto, o segundo momento da trajetória do Movimento envolve o problema da

identidade e da organização que para sua resolução em 1999 a comissão dá lugar a uma

“Coordenação de Assentados e Acampados da Bahia”. Sua organização passar a ser

estruturada a partir de assembleias regionais, sendo então definidas coordenações

Regionais, com um número variado de coordenadores (que dependeria do tamanho da

regional, número de municípios que abrangesse) e uma Coordenação Estadual, que seria

composta por dois representantes da coordenação regional indicados pelos trabalhadores

e trabalhadoras. A escolha dos coordenadores sendo feita semestralmente.

Em Abril 2001 essa coordenação participa de uma marcha com o MST, partindo de

Feira de Santana em direção á Salvador (cerca de 180 km), no intuito de ocupar a sede

do INCRA para colocar na ordem do dia as demandadas dos movimentos e cobrar mais

agilidade no andamento da reforma agrária no Estado. Segundo o autor “Pontos como

estes devem ser ressaltados, ao se avaliar que para a CETA seria imprescindível, se

quisesse se constituir como um movimento forte deveria buscar essa articulação,

47

também, com os outros sujeitos sociais que lutam pela terra no estado, principalmente o

MST” (SANTOS, 2010, p. 73).

Como resultado das ocupações, o INCRA em acordo com os movimentos sociais decide

realizar 75 vistorias que foram exigidas pelo CETA e pelo MST, destas vistorias

acordadas somente 31 foram realizadas em áreas acompanhadas pelo CETA. Essa

Coordenação ainda conseguiu o comprometimento da Coordenação do

Desenvolvimento Agrário do Estado da Bahia (CDA) de acrescentar 20% aos recursos

destinados para infraestrutura. Santos (2010. p.76) destaca que “conquistas como essas

demonstram a força da visibilidade e legitimidade, tanto frente ao Estado quanto frente

aos camponeses do Estado.” Essa marcha teve também como resultado uma nova

discussão sobre a identidade da coordenação, após uma avaliação de que a CPT durante

a ocupação e em outros momentos, teve uma postura, que não respeitava o

protagonismo dos trabalhadores, desde modo surgiu à necessidade de discutir a

autonomia da CETA.

O debate sobre a autonomia da CETA foi ponto central de encontros dos

coordenadores. Foi debatido que a CETA só teria sua autonomia quando

conseguisse tomar algumas medidas, como reunir-se sozinha, isto é, sem os

parceiros, conseguir planejar e organizar mobilizações próprias, entre outros

aspectos. Nesse sentido, a CETA caminhava para uma discussão mais

profunda sobre sua identidade, que viria a desembocar na concepção de que

havia se chegando a hora de deixar de ser uma simples “Coordenação” e

passar a ser, efetivamente, um “Movimento” . (SANTOS, 2010, p. 354).

Deste modo, o ano de 2002 foi um ano de consolidação da organização, no qual pela

primeira vez é proposta a elaboração de um regimento interno do CETA que passava a

se chamar Movimento dos Trabalhadores Assentados e Acampados da Bahia com a

mesma sigla por conta da visibilidade que já tinha alcançado no Estado. Foram

realizadas plenárias regionais e uma estadual que definiu a linha política do movimento

e o seu estatuto.

Para participar do CETA o trabalhador tem que estar associado ou organizado em

assentamento ou acampamentos, concordar com seus princípios, ter um compromisso

orgânico e ativo de participação nas lutas e mobilizações e que a ocupação ou

assentamento fosse dirigido pelo CETA.

48

Os princípios que regem o CETA são: protagonismo dos trabalhadores; participação

democrática; respeito ao meio ambiente; solidariedade; relações equitativas de gênero;

visão integrada e autonomia; a luta pela promoção da vida digna dos trabalhadores e

trabalhadoras do campo.

A estrutura organizacional é composta pela coordenação estadual, coordenações

regionais e plenárias. Com eleição a cada 2 anos, onde as plenárias regionais elegeriam

a coordenação regional e entre os eleitos indicariam dois para compor a coordenação

estadual. Totalizando 12 coordenadores estaduais, dos quais seriam eleitos, em plenária

estadual, um coordenador geral, um secretário, e um tesoureiro para um mandato de

igual período.

Em sua primeira Plenária que ocorreu em Salvador e que contou com trabalhadores das

regiões: Médio São Francisco, Chapada Diamantina, Lapa, Recôncavo, Bonfim e Sul.

Foi tirado que o CETA tinha como missão ser:

Um movimento social de trabalhadores/as, assentados/as e acampados, sem

distinção de cor, raça, sexo, credo, ideologia política que dá rumo e coordena

a luta pela terra, mobilizando e articulando as regiões para a conquista da

reforma agrária sonhada pelos (as) trabalhadores e suas organizações.

(CETA, 2002, apud SANTOS, 2010).

E com o objetivo de lutar por uma reforma agrária que acabe com o latifúndio,

preservando o meio ambiente e dando condições para que os trabalhadores/as

permaneçam na terra, com crédito adaptado e rápido, acompanhamento técnico, apoio à

produção e comercialização, moradia, lazer, educação, saúde, garantias de direitos,

visando o fortalecimento da organização na perspectiva de uma nova sociedade. Santos

(2010, p. 81) ressalta que a “a proposição de construir “uma nova sociedade”

significava um avanço nas posturas do CETA que até então tinha se pautado na busca

por inserção no sistema e não como forma de denúncia do mesmo”.

O Movimento CETA desde sua consolidação como um Movimento participou de várias

mobilizações, reintegrações e ocupações. Ainda em 2002, participou da Marcha de

Abril junto com o MST e paralelamente ocupou a Usina Itapetingui, também em

49

conjunto com o MST no município de Amélia Rodrigues. Já em 2003 conseguiu

mobilizar sem o MST, 1500 trabalhadores sem terra, quilombolas e fundos de pastos em

caminhada a salvador para pressionar o governo. O ano de 2004 é marcado pela

inclusão na segunda plenária do Movimento do termo “Quilombola” à sua sigla

refletindo a atuação e abrangência em que o Movimento CETA estava tomando. Desde

então vem engrossando as fileiras de luta pela democratização do acesso a terra

(SANTOS, 2010).

Na VII Plenária Estadual do Movimento que ocorreu em 2015 foi comemorado 20 anos

do Movimento. Nela foram levantadas as conquistas do movimento durante esses 20

anos como também os desafios do Movimento. Essa plenária reuniu em torno de 200

pessoas, dentre elas o representante do INCRA, do GeografAR, da CPT, deputados

estaduais, um coletivo universitário e a participação das regionais: Chapada, Sul,

Médio São Francisco, Recôncavo, Bom Jesus da Lapa e Bonfim. A Plenária ocorreu no

Centro de Formação Popular, Assentamento Serra Verde, no município de Senhor do

Bonfim, vale ressaltar que o centro de formação foi uma conquista do Movimento.

Figura 1 - Centro de Formação Popular da Regional Bonfim

Fonte: Pesquisa de campo, maio 2015

50

Foi avaliado que a conjuntura tem demonstrado estar cada vez mais desfavorável para

os trabalhadores rurais e que a reforma agrária segue paralisada por conta da crise

econômica que assola o país, pela política governamental que não demonstra interesse

algum pela democratização da terra e com uma bancada do congresso conservadora.

Com todos estes desafios tem sido cada vez mais difícil, portanto, a organização e a

articulação se torna cada vez mais imprescindível para o Movimento.

Dentro do Governo a pauta da reforma agrária não é tema principal, pois os

subsídios para o agronegócio também é lucrativo. Estes e outros elementos

têm grandes influencias na luta, nas conquistas e reivindicações em torno da

Reforma Agrária. Algumas consequências disso é a redução de números de

famílias assentadas e com o CETA não foi diferente. (CETA, 2015).

Segundo o coordenador do CETA, o Movimento tem de 14 a 15 mil famílias com

acesso a terra, em diferentes situações, regulamentadas, acampadas e em processo de

regulamentação. Os desafios perpassaram por acampar ou ocupar, posteriormente

assentar e isso ocorre a partir de estratégias diferenciadas que depende da área em que

se encontram, como por exemplo, a regional do Recôncavo.

Começamos ocupando duas áreas: uma em Itaparica e outra em Mata de São

João. Em Itaparica, teve o processo de mobilização, reconhecimento e

relatórios da terra. Infelizmente, ocorreu alguns conflitos internos, acabando

um “racha” do movimento, depois da conquista da terra, mesmo assim

conseguimos assentar diversas famílias pelo CETA. A outra área foi a

ocupação a usina de Assimbo, na Região de Mata de São João, ocupamos e

conseguimos conquistar a terra, que hoje tem 21 famílias. (CETA, 2015).

Outro exemplo, da Regional Sul.

Os quilombolas buscavam alternativas para poder resolver suas questões a

partir da articulação com a CPT e participando de mobilizações, o contato

com o CETA foi se dando e caminhando juntamente. Posteriormente outros

quilombos foram se aproximando e fazendo parcerias. Nós lutamos, com

suas especificidades, mas conjuntamente!. ( CETA, 2015).

Dentre os desafios de acesso a terra, a plenária relatou outros desafios que se

apresentam após o acesso à terra. Para as áreas consolidadas tem-se o desafio de

avançar na produção e comercialização ressaltando a importância de pensar em uma

produção de base agroecológica, sem agrotóxico, a necessidade de obter outras formas

51

de agregação de valores para que haja um desenvolvimento econômico no

assentamento, como também o de obter políticas públicas, haja vista que, com o recuo

da reforma agrária muitas políticas foram reduzidas ou não existem mais. Viu-se

também a necessidade de atenção especial à juventude e às mulheres.

Temos duas discussões: Acesso a terra e outra a cooperativa. O CETA nasce

para conquistar a terra e trabalhar a produção. Ao longo de sua história,

vários outros temas e eixos foram incorporados, desde PRONERA, até

questões de gênero, que necessitamos fortalecer. Há diversos desafios:

nacionalização do movimento? Qual será a estratégia de comercialização e

produção? Como vamos trazer e abordar estes temas? E a recuperação das

sementes crioulas? Uma coisa importante para observarmos é que temos

potencializar os indivíduos do PRONERA, parceiros nas universidades para

fortalecer laços e ampliar a capacidade de intervir nas áreas do Movimento. E

por fim, mas não menos importante, temos que entender a importância do

trabalho de base e fortalecer, voltar a fazê-lo como uma das prioridades.

(CETA, 2015).

Compreendendo os desafios a que os trabalhadores estão submetidos, foi relatada a

necessidade da ampliação das relações com outros parceiros, seja de movimentos

sociais, seja da universidade para o fortalecimento do Movimento. A realização de

ocupações de protesto para dar visibilidade à pauta da reforma agrária, reforçar as

vistorias realizadas pelo movimento, acessar os programas de comercialização (PAA,

PNAE entre outros), a constituição de cooperativas, garantir que o a produção seja a

base agroecológicas para obter o selo orgânico entre outras necessidades que visam à

soberania e melhoria de vida dos trabalhadores.

O Movimento CETA desde sua formação e consolidação compreende a luta pela terra

como uma luta de classe, que a reforma agrária tem uma perspectiva de organizar a

classe trabalhadora e superar relações de dominação ao criar oportunidade de trabalho.

Como também um processo social e político que não se limita apenas a uma dimensão

econômica. Conforme o Sauer (2010) que diz que “as mobilizações, lutas e conquistas

consistem em processos políticos de transformação social, que questionam valores,

estabelecem novas práticas e constituem sujeitos políticos modernos”. Portanto, tem-se

o Movimento como esse sujeito político que anseia por melhores condições de vida e o

protagonismo dos trabalhadores e trabalhadoras.

52

4.2 CONTEXTUALIZANDO O PRÉ-ASSENTAMENTO DOIS RIACHÕES

O conjunto Dois Riachões antiga Fazenda Dois Riachões, que tem esse nome por conta

de um rio e um riacho que corta a propriedade ao meio, fica localizado no município de

Ibirapitanga a 10 km de distância da sede da cidade, situado na margem da BA 652 e a 3

km da BR 330 sentido Ubatã. A fazenda possui uma área de 413 hectares, com três

sedes compostas de casas, barcaças e estufas, sua extensão de terra se divide em 70%

em Ibirapitanga e 30% de terra em Marau.

É nessa propriedade que se encontra atualmente o pré-assentamento Dois Riachões, que

surgiu em 2002 após a crise da vassoura de bruxa que devastou a produção do cacau na

região Sul e provocou o desemprego de muitas famílias devido à falência que os donos

das fazendas sofreram.

Até 1980 a produção de cacau era uma atividade econômica hegemônica na região sul,

com o colapso que ocorreu no final da década, quando a “Vassoura de Bruxa”, uma

necrose provocada por um fundo Crinippellis perniciosa se alastrou devastando as

lavouras cacaueiras e com a queda do preço do cacau no mercado internacional

comprometeu toda a economia da região, devido à queda brusca ocasionada da

produção. As grandes propriedades de terra foram sendo abandonadas, após as

tentativas do governo de financiar a continuidade da produção. Foi o fim de um ciclo de

riqueza do sul da Bahia que gerou o desemprego de mais de 200 trabalhadores da

lavoura cacaueira (ROCHA, 2008).

A região do Sul da Bahia teve como alicerce a concentração da terra, do poder político

nas mãos dos coronéis do cacau e da precarização socioeconômica dos trabalhadores.

Essa concentração de terra pode ser verificada a partir da análise do Índice de Gini7 do

munícipio de Ibirapitanga no período de 1970 a 2006, conforme se verifica na Tabela 5.

7 Índice de Gini é um indicador utilizado para verificar a distribuição de um bem, no caso a terra. Este Índice é uma

unidade variável adimensional, apresentando valores compreendidos entre 0 e 1. Quanto maior o resultado aproxima-

se de zero, menor o grau de concentração e quanto mais se aproxima de 1 maior o grau de concentração. Foi utilizado

como referencia a seguinte classificação: 0,000 concentração nula; de 0,100 a 0,250 concentração de nula a fraca, não

se encontrando, em todo o período, nenhum município baiano neste grupo; de 0,251 a 0,500 concentração fraca a

média; entre 0,501 a 0,700 concentração média a forte; de 0,701 a 0,900 concentração forte a muito forte e,

finalmente, de 0,901 a 1,000 uma concentração fundiária classificada como muito forte a absoluta..

53

Tabela 5 - Índice de Gini. Ibirapitanga, 1970 a 2006

Ano Índice de Gini

1970 0,391

1975 0,422

1980 0,605

1985 0,641

1996 0,625

2006 0,694

Fonte: PROJETO GEOGRAFAR, 2011

Ao analisar o Índice de Gini do município de Ibirapitanga, entre os anos de 1970 a 2006

é possível verificar que há uma concentração fundiária que vem se acentuando durante

os anos. Fruto do processo da modernização da agricultura que se iniciou a partir de

1960. De 1970 a 1975 verifica-se o grau de concentração considerada fraca a média e a

partir do ano de 1980 no auge da produção de cacau o índice de gini apresenta uma

concentração média a forte. Apesar da década de 90 ter sido um período de constantes

mobilizações dos movimentos sociais por reforma agrária, a estrutura não teve uma

mudança significativa de distribuição desde então.

Com a crise da lavoura, as famílias que trabalhavam nas grandes fazendas de cacau se

viram desempregadas e a partir de então iniciaram sua luta pelo reconhecimento de seus

direitos como trabalhadores. Nesse período ainda não se encontravam organizados em

movimento social, mas já tinham uma articulação com a CPT que os aproximaram para

a luta pela reforma agrária.

A CPT organizou juntos com trabalhadores uma “Rede de Associações comunitárias

dos Assentados e não Assentados do Sul da Bahia” (RACCA-SUL), e juntos passaram a

levantar áreas para vistoria com o intuito de destiná-las ao processo de reforma agrária,

a Dois Riachões foi uma delas. Enquanto aguardavam a vistoria, as famílias acamparam

na margem da estrada na BA 652 em frente à fazenda Dois Riachões e, inicialmente,

contavam com aproximadamente 50 famílias vindas de diversas cidades circunvizinhas.

Essa mobilização contou com a articulação da RACAA - Sul e do Movimento

Socioambiental Jupará (MSJ).

54

No processo de acampamento ocorreram vários conflitos, a proprietária moveu várias

ações judiciais para a retirada dos trabalhadores que estavam em frente a propriedade.

Também foi o período em que a Comissão dos Assentados e Áreas de Conflitos da

Bahia havia se consolidado como a Coordenação de Assentados e Acampados da Bahia

e o RACCA- SUL se agregado a essa coordenação que tempo depois se transforma em

Movimento CETA.

Com a Marcha de Abril em 2002, que ocorreu em Salvador, o Movimento CETA coloca

na pauta do INCRA a vistoria da Fazenda Dois Riachões, que já havia sido solicitado

pela RACCA- SUL mas que não tinha sido atendida. Essa Marcha teve êxito para os

acampados da Fazenda Dois Riachões e, em junho de 2002, ocorre a vistoria da área

que constatou em laudo topográfico a improdutividade da propriedade. No entanto,

devido a diversas ações judiciais emitidas pela proprietária para contestar o laudo do

INCRA, e os constantes conflitos tanto interno como externo os trabalhadores e a

demora da emissão de posse os trabalhadores, eles permaneceram 5 anos na “lona

preta” aguardando a desapropriação.

Então, em 2007, no dia 1º de maio com avaliação e vistoria da fazenda pelo INCRA, o

laudo topográfico com o resultado de improdutividade da terra e tendo como base o

Decreto de 5 de agosto 2004 do Presidente Lula, no qual dizia que a propriedade foi

desapropriada para fim de reforma agrária, as famílias tomaram a decisão de ocupar a

área.

Tomada à decisão de ocupar a área, no dia primeiro de maio de 2007, depois

de quase cinco anos de acampamento, às duas horas da manhã, ocupa a

fazenda Dois Riachões, expulsando os empregados da proprietária, os que

ficaram ao amanhecer o dia tiveram que ir embora. Conta os trabalhadores

que se tinha na ocupação aproximadamente 400 pessoas, vinda de vários

assentamentos e acampamentos na região, ocupando primeiro a sede grande e

depois as outras duas. Após este feito, começou os acampados sofrerem

ameaça dos empregadores da fazenda conhecidos como meeiros da

proprietária. (OLIVEIRA, 2014).

Após a ocupação, as famílias se viram reféns de constantes ameaças e dificuldades.

Enfrentaram ameaças de despejo, medo de outro grupo entrar na área, brigas internas,

medo da área não ser emitida posse e a justiça fazer reintegração de posse. No entanto,

55

as famílias ainda resistem na área. Segundo Oliveira (2014) “é da terra que tiramos o

sustento, se sairmos daqui, vamos para onde? Viver de que?”.

Essa luta tem quinze anos e já passaram por várias fases, existe a fase da luta

mais intensa que é quando você está na disputa pelo imóvel que ai a partir do

momento, por exemplo, em 2007 quando feita a ocupação houve muita

ameaça de morte, muitos indícios de ameaças claras, tanto de pessoas ligadas

a proprietária, mas da própria polícia militar que intimidava e fazia várias

ameaças ao longo dos anos, mas também a gente também fazendo o processo

de divulgar isso e colocar isso para os órgãos competentes para poder tratar

dessa situação... Já teve uma reintegração nessa área quando o pessoal era

acampado no acampamento teve reintegração de posse, porém hoje não tem

mais reintegração porque a área vai ser desapropriada a fim de reforma

agrária foi um acordo feito na casa militar junto com a ouvidoria agrária

nacional que suspendeu a reintegração de posse. (SILVA, 2015).

Ressalta ainda que a articulação do CETA com a CPT e com o Centro de Estudos e

Ação Social (CEAS) e demais organizações foram fatores que asseguraram não haver

reintegração de posse até agora. Mas que a dificuldade da imissão de posse é devido à

situação do INCRA que se encontra em um processo de enfraquecimento político-

administrativo no Governo Federal, portanto, segue sem imitir a posse das áreas em

diversas fazendas com desapropriação já decretadas, a exemplo dos Dois Riachões.

A demora do acesso a terra e da desapropriação por conta de que mesmo a

área sendo improdutiva e sendo declarada pelo INCRA como improdutiva e

ela sendo indicada a fim de reforma agraria a proprietária não tem interesse

na negociação de vender, por isso tem um desgaste ao longo do período,

porque aqui já poderia ser um assentamento, mas por questão judicial ela

ainda continua sem imissão da posse, embora o INCRA tenha ganhado todos

os recursos e ela já chegou a ultima instância vai ser emitida a posse com

tranquilidade para os assentados poderem acessar as politicas que tá dentro

do INCRA que pertence ao INCRA, mas que só podem acessar a partir do

SIPRA8, precisa ser “siprado” para poder acessar. Essa é um dos desafios que

as famílias passam ao longo desses quinze anos. (SILVA, 2015).

No entanto, apesar de ainda estarem aguardando a decisão judicial para imissão do

título de posse os trabalhadores continuam residindo no conjunto Dois Riachões,

produzindo e comercializando suas produções. Atualmente residem 32 famílias

8 Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (INCRA/ SIPRA)

56

morando em casas antigas da fazenda e em barracos de lona no entorno da área com

uma população de aproximadamente 124 pessoas.

Já no primeiro ano de ocupação os trabalhadores fizeram uma limpeza nas áreas de

cacau e recuperaram pastos e cercas. Devido à necessidade que tinham de ter um pedaço

de terra para produzirem, contrataram com recurso dos próprios trabalhadores uma

equipe de topografia no qual dividiram os lotes de cacau ficando 4 hectares para cada

família, e a partir de então começaram a trabalhar na produção seguindo a orientação

do Movimento que tem como referencia a não utilização de produtos químicos visando

um modelo de agricultura sustentável prezando pela aplicação de calcário, esterco,

cinzas e outros produtos orgânicos no cacaueiro.

Em 2009, a partir da articulação do Movimento CETA em parceria com o Serviço

Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR) do município de Ibirapitanga os

trabalhadores tiveram acesso a uma capacitação para o melhoramento da diversificação

e aumento da produção nas áreas de fruticultura, piscicultura, enxertia de cacaueiro,

mandiocultura e apicultura. Nesse mesmo ano através do núcleo da Empresa Baiana de

Desenvolvimento Agrícola (EBDA) e da Assessoria Técnica Social e Ambiental

(ATES) iniciaram um processo de acompanhamento dos trabalhadores do pré-

assentamento Dois Riachões desenvolvendo atividades de organização da associação e

do acesso a políticas públicas.

Importante ressaltar que desde o processo de acampamento os trabalhadores se

organizavam em uma associação, a “Associação Dois Riachões”, no entanto não era

regularizada por medo de represálias devido aos inúmeros conflitos que eram

submetidos. Sendo então regularizada somente no ano de 2014.

Na verdade a gente desde que é acampamento já tinha um regimento interno

como associação, mas regularizada não era, desde que a gente vem nessa luta

ai com medo da gente fazer ocupação e o processo de responder por essa

ocupação juridicamente ter uma pessoa que responde a associação

responderia, por isso que a gente não criou a associação antes, só viemos

criar a associação em 2014 por medo disso, porque qualquer coisa na

propriedade poderia vim em nome da associação, qualquer ação da

proprietária. Ai quando você pega não tem associação, então responde todo

mundo, o Movimento. (FROES, 2015).

57

Os assentados viram a necessidade de organizarem a produção de modo a viabilizar a

permanência das famílias em seus lotes, visto que não conseguiam produzir o suficiente

para superar a mera subsistência e mesmo quando ocorria excedente da produção se

deparavam com a dificuldade de comercializar seus produtos tendo que muitas vezes

depender de atravessadores. Desde modo, a partir do conhecimento da existência de um

Programa de fomento a comercialização, o PAA, informação apresentada pelos técnicos

do EBDA a partir da experiência do Assentamento Santa Irene via Cooperativa de

Coaraci, a Associação Dois Riachões e o Movimento CETA se articularam para se

inserir nesse Programa. Contudo, dentro das atribuições do PAA há a promoção do

associativismo, ou seja, tem se o critério que para a participação no Programa o

agricultor precisa estar inserido em alguma organização formal, em associação ou

cooperativa. Nesse período, a associação do pré-assentamento ainda não estava

regularizada, portanto, tiveram que acessar o PAA a partir da Associação do

Assentamento Serra de Areia (ASA) localizada no município de Ibirapitanga e ligada ao

Movimento CETA. Assim, viabilizaram a inserção no Programa entregando os produtos

pela ASA durante 4 anos. Somente a partir de 2014, com a regularização da Associação,

passam a acessarem pela Associação Dois Riachões.

A modalidade do Programa que participam é o da “Doação Simultânea” que implica na

comercialização dos produtos com o objetivo de doá-los para entidades da rede

socioassistencial. Nessa modalidade a execução é feita através da CONAB, a associação

faz o levantamento da oferta e demanda em relação aos alimentos, e em seguida mapeia

a produção das famílias e as entidades socioassistenciais beneficiárias consumidoras.

Com os dados dos produtos disponíveis e a demanda reconhecida, a associação elabora

através do PAANet uma proposta contendo a relação de agricultores envolvidos (todos

com o DAP), os produtos a serem fornecidos e as respectivas quantidades e as entidades

a serem atendidas. Essa proposta é enviada à CONAB e submetida à apreciação da

instância de controle social. Após a proposta aprovada, a associação que se torna a

organização proponente passa a entregar mensalmente os produtos para as entidades que

forem indicadas por elas. A cada entrega é feita a prestação de conta junto à CONAB,

que depois de verificada realiza o pagamento para a associação que realiza o pagamento

aos agricultores.

58

É o seguinte porque o gargalo de quem mora na roça é a comercialização que

produção na verdade não é problema, tanto na área de reforma agrária como

pequeno agricultor familiar, como meeiro, como qualquer família que more

na roça, o problema é vender o que se produz isso que acontece muito é a

questão da gente, o produtor produz e não vende. Então, o PAA vem para

fortalecer essa questão da comercialização isso é de fundamental importância

à questão do PAA (...). (FROES, 2015).

As entidades receptoras geralmente são as do município de origem. No entanto devido a

falta de interesse da prefeitura constatada pela associação os produtos foram ofertados

para entidades de outros municípios como o de Ubatã. Sendo então distribuídos os

produtos para o CRAS da Barra do Rocha, o Centro comunitário da Igreja Batista de

Ubatã e Associação Terra de Canãa localizado também em Ubatã.

O prefeito não teve interesse de junto com sua secretaria de agricultura

apresentar as entidades do município que poderia receber esses produtos

então a nossa equipe de assistência técnica fez uma reunião com todo mundo

e discutiu. As associações, o próprio movimento discutiu, mas eles não

repassaram essas entidades para poder receber como Ubatã é um município

que tem uma população carente grande, mas não tem uma quantidade de

agricultores grande, a região da zona rural de Ubatã é pequenininha, é muito

pequena acabou que a gente por esse critério acabou tirando esses produtos

de Ibirapitanga e colocando em Ubatã porque tinha entidades organizadas e

que queriam e tinha demanda para poder receber os produtos então por isso

que o critério que foi usado foi esse, não por uma questão de que a gente não

quis entregar no município que a gente mora ou que a gente tem parte que já

faz parte dele, mas por conta de uma decisão politica municipal. (SILVA,

2015).

Um aspecto importante é a possibilidade de definir quais produtos vão ser entregues

para o Programa, pois demonstra autonomia tanto da associação quanto dos produtores

em relação a sua produção e também a organicidade do coletivo. Dado que cada projeto

possui um limite de produção e prazo de entrega, uma prática que eles utilizam para não

terem dificuldades para a entrega é o rodízio da produção entre eles tendo como base

uma escala de produção para garantir que o fornecimento seja contínuo, ou seja, ocorre

as vezes de um produtor vender seu excedente de produção em nome de outro

assentado.

Se o projeto do PAA é durante um ano então a gente aqui tem duas entregas

por mês, então o produto que colocar tem que consegui ter uma escala de

produção que não adianta a gente colocar um inhame que ele vai produzir

uma vez no ano, então tem que ter escala, por isso que aqui é interessante, se

um produtor planta aipim agora, no outro mês outro já planta para ter o

aipim, a banana da terra, o alface, o coentro a cebolinha durante todo o ano

(...) complicado é organizar isso e ter uma escala de produção para entregar,

que muitas vezes você tem a produção e sai tudo de uma vez, então você faz

59

um lote de abobora e sai madura só de uma vez você tem que ter esse

trabalho dentro da comunidade, com os produtores para poder ter essa

produção. (FROES, 2015).

O rodízio de entrega dos produtos ocorre tanto em âmbito interno do pré-assentamento

como externo, há uma articulação entre os assentamentos do Movimento CETA na

região para garantir a diversificação dos produtos para as entidades.

Muitas vezes todos os assentamentos entregaram na mesma entidade que lá

ele tem mil famílias ai divide, a dois Riachões atende 200, a Serra de Areia

atende mais 200, Cruzeiro atende 200, Santa Irene atende mais 200 e são

João atende mais 200. (...) A entidade a gente distribui para todos os

assentamentos nossos, para ter a diversidade dos produtos entendeu, porque

muitas vezes Dois Riachões tem o produto e São João não tem, Serra de

Areia tem um produto e a gente não tem, por isso todas as entidades à gente

prefere dividir a quantidade de consumidores que tem para poder todos os

assentamentos passarem esse rodízio para poder ter diversidade do produto.

(FROES, 2015).

Em relação aos preços o procedimento para definição é a partir da realidade regional.

Entretanto há uma percepção dos assentados que o preço pago não é atrativo, segundo o

Coordenador do CETA a tabela de preço que a CONAB usa é baseada a partir das 4

Centrais Estaduais de Abastecimento (CEASA) da Bahia e que às vezes não leva em

consideração os preços regionais ou territoriais e quando feita a comparação do preço da

CONAB com o preço atual do atacado percebe-se que o preço é menor.

Tem essa diferenciação que é uma coisa que todo mundo reclama que o preço

da Conab tá baixo, mas o preço da Conab é baixo por conta de que ele regula

a partir do preço mínimo e não o preço máximo da produção então mesmo

sendo baixo esse valor ele perpetua por um ano, então o produto pode chegar

10 reais e pode chegar a 1 real ele vai valer na Conab o preço que foi

definido de tabela no inicio do projeto. (SILVA, 2015).

As produções encontradas na área e entregues no PAA pelos assentados do Dois

Riachões estão diretamente ligados à subsistência do núcleo familiar. Os principais

produtos alimentícios produzidos são in natura: aipim, frutas (principalmente cajá,

banana, jaca), hortaliças e legumes como, cenoura, quiabo, abóbora entre outros. Nos

relatos dos coordenadores eles destacam ainda a necessidade de processamento para

verticalizar e agregar valor aos produtos através de agroindústrias como uma estratégia

para alavancar o desenvolvimento da produção no assentamento. Pois com a cultura da

mandioca que é presente no assentamento, pode ser oferecida uma gama de produtos e

subprodutos como beijus, tapioca, puba, tucupi e etc. No entanto existe uma dificuldade

60

na entrega desses produtos beneficiados, pois para isso precisam possuir um alvará de

processamentos dos alimentos.

Tem se a estratégia também de transformar alguns produtos in natura em

produtos beneficiado para a gente agregar valor e ao mesmo tempo também é

colocar o produto agregado, beneficiado no programa então, por exemplo, a

casa de farinha não é apenas para produzir farinha, mas a ideia é produzir

beiju, produzir tapioca para poder comercializar no PAA então assim, as

famílias que tem aptidão hoje e que não consegue colocar esses produtos

beneficiados no programa, com a casa de farinha com a unidade de

processamento de mandioca e com o selo da vigilância sanitária ela vai poder

comercializar esses produtos então a ideia é também avançar na

comercialização dos produtos beneficiados. (SILVA, 2015).

Entretanto, apesar dessa limitação para a comercialização dos produtos beneficiados,

uma estratégia utilizada pela associação, dado que a área possui um grande potencial de

produção de frutas como o cacau, cajá entre outras, transforma-la em polpa para eles era

muito mais rentável. Mas para isso precisariam do Sistema Integrado de Registro de

Produtos e Estabelecimento (SIPE) então tiveram a iniciativa junto com a assistência

técnica do EBDA de enviar vários projetos na CAR para a aquisição de unidade de

beneficiamento de fruta, porém não tiveram êxito. A alternativa encontrada foi fazer um

contrato. Inicialmente foi com a Associação de Frutas de Coaraci, mas atualmente é

com a Fábrica Nature do município de Aurelino Leal. Eles repassam a matéria prima

para a fábrica, que processa o produto e coloca a CNPJ dela, embala e depois redistribui

nas entidades do Programa que a associação está cadastrada. O valor pelo

processamento é de um 1 real por quilo e o valor das polpas no projeto equivale a 4,60

reais, destaca o Coordenador da Regional Sul.

Ressalta ainda que,

Esse modelo que esta sendo comercializada a polpa de fruta no programa é o

que a gente quer?! Não, a gente quer uma unidade de beneficiamento de fruta

nossa em que a gente possa fazer a gestão e possa comercializar a produção

dos agricultores. Então a ideia nossa é que a gente tenha uma agroindústria

de processamento de fruta. E, além disso, tenha uma câmara fria para poder

armazenar a quantidade de produção de polpa de fruta nossa. Então assim a

gente fez um calculo por baixo de que se a gente consegue beneficiar toda

nossa produção de polpa de fruta ai a gente chega a um valor de quase um

milhão de reais em produção de polpa de fruta que acaba às vezes não tendo

como colocar no programa. (SILVA, 2015).

Além do beneficiamento de fruta, os assentados tem a perspectiva de utilizar o cacau

que é predominante na região para a produção de um produto beneficiado, o chocolate.

61

Pois como o cacau não pode ser entregue no PAA eles são levados a comercializar para

uma firma. O coordenador relata que o cacau nunca saiu da produção, a comercialização

sempre foi da amêndoa seca, no entanto ressalta que quem ganha dinheiro com a

produção do cacau não é o agricultor familiar, seja pequeno, médio ou grande e sim

quem ganha são as indústrias de chocolate que processam e revendem geralmente para

exportação. Para ele sair da amêndoa do cacau para a produção de chocolate seria uma

forma de aumentar a renda dos agricultores e para ele isso só é possível através da

organização das associações e a criação das cooperativas, inclusive a constituição de

uma cooperativa foi um ponto discutido na VI Plenária do Movimento exatamente

como proposta para ter autonomia na produção dos assentamentos.

Então qual é a estratégia que é as associações, cooperativas, as organizações

estão pensando é de que precisa montar pequenas unidades de produção d

chocolate que é uma coisa inédita no Brasil para poder em vez de vender o

cacau para o atravessador da cidade que compra esse cacau e passa para as

grandes empresas, para poder comercializar, pra gente poder processar ele na

propriedade e vender, e colocar ele em uma escala de produção, seja ela uma

escala, por exemplo, das compras governamentais que ai o PNAE é uma

estratégia fundamental para poder é produzir e comprar chocolate para

merenda escolar ou o próprio PAA comprar esse chocolate em barra é chegar

às famílias carentes, essa é uma estratégia que tá se trabalhando para chegar

isso, o cacau não é produto do PAA ele é um produto a parte que os

produtores repassam aos atravessadores então a estratégia é justamente essa é

criar as unidades de produção de chocolate da agricultura familiar e dentro

dessa unidade de produção de chocolate da agricultura familiar poder atingir

mercados então um dos mercados estratégicos é o PAA, é o PNAE além de

outros mercados que tá se descontando do ponto de vista da produção é do

chocolate e com a qualidade superior ao chocolate que estão no mercado, tipo

a Nestlé e outros mercados que não chega a 20 reais de cacau bruto no

chocolate então a gente come mais outros produtos do que o próprio

chocolate e açúcar. ( SILVA, 2015).

A associação também entrega para o PNAE alguns produtos derivados e in natura, no

entanto, em escala menor por ser um Programa que possui muitas exigências, uma delas

é a entrega semanal, portanto exige uma maior regularidade de produção, de

planejamento de produção, necessita também uma escala maior de produção, desde

modo eles decidiram que daria prioridade para a produção voltada mais para o PAA que

o PNAE, portanto é um Programa que poucos agricultores do pré-assentamento

participa.

Em relação às mudanças no pré-assentamento Dois Riachões eles relatam que desde a o

período de ocupação o Conjunto Dois Riachões não tinha água encanada, havia apenas

62

a água da represa que tem dentro da propriedade, após começarem a acessar o PAA eles

conseguiram instalar água por gravidade. Em todas as 3 sedes da Fazenda possuem água

encanada, com energia elétrica. Os recursos são provenientes das famílias e da

Associação que recebe o repasse de 7% do projeto do PAA para gastos com despesas

dos projetos (documentação, entrega de prestação de conta em Salvador e etc.), o

excedente fica para a associação que utiliza para cobrir as despesas do pré-

assentamento.

Outra mudança foi a reforma feita em um espaço para a implementação de uma casa de

polpa que ainda está em fase de finalização, mas que só foi possível com o recurso do

PAA, relatam os coordenadores, que incluem ainda a aquisição de freezers, trator, a

construção de uma casa de farinha, a reforma do secador de amêndoas e das barcaças

como estruturas adquiridas graças ao acesso ao Programa.

Reconhecem ainda que o acesso dos agricultores ao PAA para além do assentamento

ajuda a desenvolver a economia do município já que os produtores passam a demandar

materiais agropecuários para desenvolver sua produção.

Os agricultores que acessam o programa ele tem aumento de sua renda ele

tinha cacau agora tem PAA também, quando junta a renda dele aumenta no

ano. Além disso, são alguns itens agropecuários que são comprados com

esses recursos então, por exemplo, que produz que colocou dois mil esse ano

que quer produzir 2 mil reais para entregar no PAA, no ano que vem ele quer

produzir oito, mas ele precisa investir na produção dele então ele compra

semente ele compra caixa, compra cano, ele compra mangueira, ele vai

comprar uma série de produtos, roçadeira, ele compra vários produtos, ou

seja, vários equipamentos, ele comprou carro, ele vai poder deslocar a

produção dele e isso ajuda no desenvolvimento local e regional então o PAA

é uma estratégia de desenvolvimento local e regional então aumenta renda do

município e aumenta também o a qualidade de vida desses agricultores no

campo. (SILVA, 2015).

Para o coordenador da Associação Dois Riachões, o acesso tem promovido também a

qualidade de vida das famílias, pois houve uma melhora nos alimentos de autoconsumo.

Os assentados tiveram condições de adquirir móveis pra suas casas e coletivamente eles

podem adquirir vários instrumentos de incentivo a produção, como planejar a

implantação da agroindústria de beneficiamento de chocolate. Possibilidades que

influenciam para que haja avanços no assentamento.

63

4.2.1 Perfil dos Beneficiários do Programa de Aquisição de Alimentos

Dos 32 agricultores familiares que participam do Programa 24 foram entrevistados, ou

seja, 75% dos beneficiários. Dentre os entrevistados 50% era do sexo feminino e 50%

do sexo masculino. Em relação à faixa etária 29% dos entrevistados estavam na faixa de

51 a 60 anos, 25% acima de 60 anos, 21% na faixa de 20 a 30 anos de idade, 13% de na

faixa de 41 a 50 anos e 12% de 31 a 40 anos.

Em relação ao nível de escolaridade 54% dos entrevistados possuíam o ensino

fundamental, 29% eram analfabetos, 9% o ensino técnico e 4% o ensino médio e 4% o

ensino superior pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA)

Vale destacar que no pré-assentamento funciona uma escola que foi reformada pela

Prefeitura de Ibirapitanga e que atende da 1ª a 4ª série e funciona também como Escola

de Jovem e de Adulto (EJA).

A prefeitura fez uma reforma nesse espaço que é um espaço da comunidade,

ela fez uma adaptação para pessoas que tem deficiência, aqui não tem, mas

caso tenha para atender a necessidade de crianças especiais, então tem rampa,

tem geladeira, tem uma TV, tem professor, auxiliar, tem merendeira. (...) A

gente conseguiu ter alguém indicado pela própria comunidade para dá aula

para os filhos, pois a gente entende que a educação ela tem que ser

contextualizada e precisa o professor entenda, conheça a luta, conheça a

organização, saber como funciona para valorizar a luta do campo. (SILVA,

2015).

Dentre os entrevistados 8 ainda residem em barracas de lonas e 16 em casa de bloco.

Quando questionados sobre outra atividade além da agricultura apenas 2 entrevistados

apresentaram outras atividades, um como professor do EJA na escola da comunidade e

a outra como merendeira da Escola.

Quanto à produção foi de grande dificuldade para os entrevistados responder o quanto

produzem, o custo da produção e a renda média devido a oscilação na oferta do produto.

Contudo a partir do limite do DAP é possível ter uma base do quanto os agricultores

possuem de renda proveniente do PAA. Considerando que o limite para cada agricultor

é de R$ 8 mil por ano, eles obtêm uma renda mensal de cerca de 670 reais, menor que o

salário mínimo. Além do PAA, 46% dos entrevistados comercializam via

64

atravessadores, 33% comercializam apenas para o Programa, 13% além do PAA

comercializam em feiras e 8% além do PAA comercializam para o PNAE. Dentre os

entrevistados 50% recebem o Bolsa Família, 46% não participam de nenhum programa

de transferência de renda e 4% recebem aposentadoria.

Apesar da dificuldade de mensurar a renda obtida os entrevistados relataram que após o

acesso ao PAA foi possível adquirir eletrodomésticos, móveis, celular, automóvel e até

animais como cavalo, gado, burro etc.

Sobre as atividades desenvolvidas em seus lotes os entrevistados relatam que contam

com a própria familia para trabalhar na produção e também com o trabalho coletivo a

partir de mutirões com os moradores do pré-assentamento.

Quanto ao principal problema para a produção para 42% dos entrevistados tem

problemas com o clima da região, 37 % com as pragas já que não utilizam produtos

químicos e 21% colocam a falta de adubo como um problema frequente na produção.

Em relação a comercialização dos produtos com o PAA, 29% diz não ter nenhum

problema ou dificuldade; 21% questionam o preço dos produtos, destacam sobre a

diferença dos preços estabe1ecidos pela CONAB e pelo Estado/município e que alguns

produtos ocorre de estarem abaixo do valor do mercado; 17% dos entrevistados

apontam a sazonalidade como um fator problema; 17% consideram que a legislação

sanitária dificulta a comercialização.

No tocante à importância do PAA em sua unidade produtiva familiar os entrevistados

relataram que o Programa foi responsável pela melhoria da qualidade de vida (62%),

além de incentivar a produção agrícola (21%) e oportunizar a comercialização (17%).

No que concerne à avaliação têm-se que os agricultores aprovaram sua existência como

ótimo (54%) e bom (46%), destaca-se que nesse questionamento foram levantados

preocupações sobre a questão da permanência desse Programa. Para eles o PAA não

pode ser termporário e sim uma política pública que não fique vulnerável a mudanças

de governo. Neste sentido houve receio dos entrevistados de dá uma avaliação negativa

ao Programa pelo medo de não existi mais, portanto muitos afirmaram não ter nada

negativo no Programa.

65

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A agricultura familiar por apresentar aspectos diversificados necessita de uma

construção de uma série de políticas públicas que sejam direcionadas ao campo,

principalmente para áreas de reforma agrária. Após conquistarem a terra, os assentados

se deparam com novas incertezas, expectativas e desafios quanto às organizações

econômica e social dentro do assentamento e em relação á sociedade como um todo.

Para o pré-assentamento o desafio se torna ainda maior, pois apesar de já ter sido

declarado a desapropriação para fins de reforma agrária a imissão de posse ainda não foi

feita, desse modo às políticas públicas direcionadas para os assentados da reforma

agrária eles não tem acesso, inclusive o PRONAF A.

Dado que o desenvolvimento e consolidação dos assentamentos têm como fator

limitante as condições do sistema produtivo, especialmente em relação à

comercialização da produção agrícola e com a disputa de recurso público com o

agronegócio, se torna imprescindível que haja uma organização coletiva dos

trabalhadores rurais. Portanto, a articulação do Movimento CETA, com a CPT, e os

técnicos do EBDA são fatores que contribuem para que possam se desenvolver na área.

O acesso ao PAA foi determinante para mudar o panorama do Pré-Assentamento Dois

Riachões na medida em que ganham confiança quanto à venda de seus produtos. A

diversificação da produção passa a ser predominante na estratégia de produção, dado

que o limite só diz respeito aos valores anuais pagos ao produtor desde modo ficando

livre a quantidade e variedade dos produtos. Desde modo, podemos inferir que essa

diversidade de produtos contribuiu para a reconversão produtiva marcada pela

monocultura presente na própria fazenda ocupada e promoveu a reestruturação

produtiva do espaço rural como também a territorialização desse grupo social. Essa

reestruturação representa um retorno a lógica da produção familiar e garante a soberania

alimentar das famílias assentadas.

Com o Programa o assentado produz com segurança, porque sabe que a CONAB vai

pagar a cota de produção encomendada podendo então usar o excedente para o

autoconsumo como também ser usado para a venda em comercialização em feiras

livres. Um aspecto importante presente nas falas dos entrevistados deu-se em função da

66

diminuição da relação do atravessador no processo de venda, “diminuição”, pois apesar

da ligação direta entre a organização dos assentados e o público beneficiário eles ainda

mantêm a venda através do atravessador devido ao cacau que não é comercializado no

PAA.

O acesso ao Programa propiciou um aumento na renda que pôde ser notada a partir dos

bens adquiridos pelos assentados como também foi um fator essencial para o

desenvolvimento do pré-assentamento. Além da mudança na infraestrutura da

comunidade tem-se a expectativa de mudanças na produção a partir da implantação de

uma agroindústria, aquisição de equipamentos para padronizar os produtos, a

constituição de uma Cooperativa do Movimento que envolva as organizações dos

agricultores circunvizinhos.

No contexto atual nacional, no qual o próprio INCRA e o MDA tem seu protagonismo

reduzido ainda mais, se questiona quais serão os rumos que a reforma agraria e as

políticas ligadas a produção familiar seguirão, confirmando a preocupação dos

assentados quanto a vulnerabilidade das políticas públicas voltadas para o campo. A

subordinação do MDA e do IINCRA a uma estrutura política conservadora deixa ainda

mais evidente o “componente de classe” das políticas públicas. A transformação da

agenda da agricultura familiar de desenvolvimento para a política social representa o

retrocesso do desenvolvimento agrário e agropecuário do Brasil. Cerca de de 70% dos

alimentos consumidos pela sociedade brasileira é proveniente da agricultura familiar. A

agricultura familiar possui a ideia de desenvolvimento, e não só social e econômico,

mas de também de segurança alimentar .

67

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72

APÊNDICES

73

APÊNDICE A - Roteiro de entrevista com o coordenador do movimento ceta da

regional sul e com o coordenador da associação Dois Riachões

1. Como surgiu o pré-assentamento Dois Riachões?

2. As famílias vieram todas do município de Ibirapitanga?

3. Quantas famílias tem no pre-assentamento?

4. Como é a relação entre vocês e o proprietário da fazenda?

5. Qual a relação com o município de Ibitarapitanga?

6. Como está a infraestutura do pré-assentamento?

7. De onde provem o recurso?

8. Quando foi criado a associação ?

9. Como obtiveram conhecimento sobre o paa?

10. Desde quando entregam para o PAA?

11. Qual a modalidade que acessam?

12. Quais as entidades? Como foram definidas?

13. Como vocês definem o que vão produzir?

14. Como é definido o que vocês irão entregar tais produtos?

15. Como é definido o preço?

16. Vocês já tiveram algum problema para poder atender o limite da produção?

17. Tiveram alguma dificuldade para adquirir a DAP?

18. Qual o numero de famílias que participam do programa?

19. Tem planos de aumento de produção?

20. Já acessaram o pnae?

21. Como é feita o pagamento?

22. Como é o relacionamento e a operacionacionalização do programa no

município?

23. Programa surte alguma influencia no município?

24. Quais as mudanças vistas após o acesso ao programa?

74

Formulário para as famílias assentadas do pré-assentamento Dois Riachões

1. Nome:

2. Idade : ( )

3. Sexo : ( ) Masculino ( ) Feminino

4. Estado Civil : ( ) Solteiro ( ) Casado ( ) Amigado ( ) Separado ( )

Desquitado ( ) Divorciado ( )Viúvo

5. Escolaridade: ( ) Analfabetismo ( ) Primário ( ) Fundamental ( ) Médio

( ) Superior

6. Naturalidade :

Município:

7. Condição de habitação : ( ) Casa ( ) Barraco

8. Tem filhos? ( ) Não ( ) Sim – Quantos?

9. Moram com você? ( ) Não ( ) Sim

10. Quantas pessoas trabalham nas atividades rurais desenvolvidas em sua propriedade?

11.Todas as pessoas que trabalham na sua propriedade são do seu domicilio?

( ) Sim ( ) Não

12. Além da atividade da agricultura tinha outra ativadade? ( ) Não ( ) Sim. Quais ?

13. Qual a área do lote?

14. Quais as principais culturas produzidas?

15. Onde é comercializado sua produção?

16. Sementes: ( ) Próprias ( ) Compradas

17. Correção do Solo: ( ) Não usa ( ) Adubos químicos ( ) Adubos Orgânicos

18. Assistido por algum programa do governo federal ?

19. Renda Familiar mensal :

20. Fontes de Renda

Cultivo area Quantidade valor Consumo Total Vendido Preço médio

Produção Agrícola

Produção Pecuária

Trabalho assalariado

Aposentadoria

Outras rendas

75

21. Bens que possui : 22. Quanto tempo acessa o PAA?

23. Em sua opinião os preços oferecidos pela produção

agrícola no PAA são atrativos ( ) Não ( ) Sim

24. Para quem são fornecidos os produtos?

25. Você consegue atender as quantidades e prazos para entrega da produção?

( ) Sim ( ) Não

26. Qual o principal problema para a produção agrícola?

( ) Clima ( ) Atravessador ( ) Pragas ( ) Outros

27. Qual a principal dificuldade para comercializar com PAA?

( ) Legislação Sanitária ( ) Cardápio Regionalizado ( ) Preço ( ) Sazonaliade ( )

Outros

28. Como senhor (a) avalia o PAA ? ( ) ótimo ( ) Bom ( ) Regular ( ) Ruim

Telefone

Fixo

Celular

Televisor

Computador

Rádio

Geladeira

Fogão

Carro

Moto

Caminhão

Trator

Feiras

Mercado municipal

Venda direta/

Atravessador

Programas Sociais

Rede de supermercado

Conab

PAA

Outros

76

APÊNDICE B- Fotos do local

Figura 2 – Entrada do Pré-Assentamento Dois Riachões

Fonte: Pesquisa de campo, 2015

Figura 3- Área do Pré-Assentamento Dois Richões

Fonte: Pesquisa de campo ,2015

77

Figura 4- Casa de Farinha em construção

Fonte: Pesquisa de campo, 2015

Figura 5- Barraca de lona do Pré-Assentamento Dois Riachões

Fonte: Pesquisa de campo, 2015

78

Figura 6 – Produção de Hortaliça

Fonte: Pesquisa de campo, 2015

Figura 7– Secador de Amêndoa

Fonte: Pesquisa de campo, 2015